fasul - direito das coisas - posse e propriedade - … · romano é ainda nos dias de hoje tratado...

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Direito das Coisas I - Posse e Propriedade http://professorhoffmann.wordpress.com | 4 1. Introdução aos direito das coisas Os direitos patrimoniais pessoais estão disciplinados no Código Civil pelo tratamento dado ao Direito das Obrigações (arts. 233 a 420 e arts. 854 a 965), ao Direito Contratual (arts. 421 a 853) e ao Direito de Empresa (arts. 966 a 1.195). Também há regras pessoais patrimoniais nos livros dedicados ao Direito de Família e ao Direito das Sucessões. Já os direitos patrimoniais de natureza real estão previstos entre os arts. 1.196 a 1.510, no livro denominado ‘Do Direito das Coisas’, isto é, o Livro III da Parte Especial do Código Civil. 1.1 Conceito de direito das coisas Recebe o nome de direito das coisas ou de direitos reais, sendo este na clássica definição de Clóvis Beviláqua, o complexo de normas reguladoras das relações jurídicas referentes às coisas suscetíveis de apropriação pelo homem. Tais coisas são, ordinariamente, do mundo físico, porque sobre elas é que é possível exercer o poder de domínio. Abrange o conjunto das normas que regulam as relações jurídicas referentes às coisas suscetíveis de apropriação, estabelecendo um vínculo imediato e direto entre o sujeito ativo ou titular do direito e a coisa sobre a qual o direito recai e criando um dever jurídico para todos os membros da sociedade. Como ponderou Lafayette: É o que afeta a coisa direta e imediatamente, sob todos ou sob certos respeitos, e a segue em poder de quem quer que a detenha. Caracteriza-se pelas seguintes peculiaridades: a) tem por objeto imediato a coisa corpórea, móvel ou imóvel.

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Direito das Coisas I - Posse e Propriedade

http://professorhoffmann.wordpress.com | 4

1. Introdução aos direito das coisas

Os direitos patrimoniais pessoais estão disciplinados no Código Civil

pelo tratamento dado ao Direito das Obrigações (arts. 233 a 420 e arts. 854 a 965), ao

Direito Contratual (arts. 421 a 853) e ao Direito de Empresa (arts. 966 a 1.195). Também

há regras pessoais patrimoniais nos livros dedicados ao Direito de Família e ao Direito

das Sucessões.

Já os direitos patrimoniais de natureza real estão previstos entre os arts.

1.196 a 1.510, no livro denominado ‘Do Direito das Coisas’, isto é, o Livro III da Parte

Especial do Código Civil.

1.1 Conceito de direito das coisas

Recebe o nome de direito das coisas ou de direitos reais, sendo este na

clássica definição de Clóvis Beviláqua, o complexo de normas reguladoras das relações

jurídicas referentes às coisas suscetíveis de apropriação pelo homem. Tais coisas são,

ordinariamente, do mundo físico, porque sobre elas é que é possível exercer o poder de

domínio.

Abrange o conjunto das normas que regulam as relações jurídicas

referentes às coisas suscetíveis de apropriação, estabelecendo um vínculo imediato e

direto entre o sujeito ativo ou titular do direito e a coisa sobre a qual o direito recai e

criando um dever jurídico para todos os membros da sociedade.

Como ponderou Lafayette: É o que afeta a coisa direta e imediatamente,

sob todos ou sob certos respeitos, e a segue em poder de quem quer que a detenha.

Caracteriza-se pelas seguintes peculiaridades:

a) tem por objeto imediato a coisa corpórea, móvel ou imóvel.

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b) põe a coisa que é seu objeto em relação imediata com o sujeito de

direito, sem dependência de ato ou prestação de pessoa determinada, isto é, a existência

e, o exercício do direito real pressupõe tão-somente o sujeito ativo do direito e a coisa

sobre a qual recai.

c) por parte de terceiros corresponde-lhe, na obrigação positiva de dar

ou fazer, mas a obrigação negativa e geral de lhe respeitar o exercício, a obrigação comum

a todos os direitos e, que se traduz na inviolabilidade que os reveste.

d) da aderência direta e absoluta do direito real à coisa resulta que as

ações criadas para protegê-lo podem ser intentadas contra quem quer que o usurpe ou

ofenda.

Compete demonstrar, que parte da doutrina afirma que melhor seria

que a disciplina em apreço se chamasse ‘Da posse e dos Direitos Reais’. Nesse sentido há

proposta de alteração legislativa para alterar tal Título, conforme constante no Projeto

de Lei 276/2007.

1.2 Característica do direito das coisas

Reflete exatamente a vida política, social e econômica por que passa uma

sociedade, possuindo características próprias em cada legislação. Ao contrário disso,

temos o direito das obrigações que, com um azo de universalidade chega a congregar

vários países num único sistema, como é o caso do projeto franco-italiano de Código das

Obrigações, ou então como o caso da Turquia que adotou integralmente o Código Suíço

de Obrigações, não obstante as importantes diferenças de ordem econômica, social e

religiosa, existente entre os dois países.

De outra banda, o direito das coisas possui variáveis, inclusive de ordem

local. Não é à toa que, quando da unificação política da Alemanha, reunindo-se o direito

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nacional em torno do BGB, limitou-se este a fixar as normas gerais referentes ao direito

das coisas, mantendo em vigor as leis locais reguladoras da matéria.

O mesmo pode-se dizer que cada fase histórica representa uma fase do

direito das coisas. O conceito de propriedade tem sido moldado por cada pulo histórico

que a humanidade realiza. A mudança realizada no conceito de propriedade no passar

dos anos.

No direito romano prevaleceu o aspecto individualista, bem como, se

concebeu o instituto com feições de poder ilimitado.

No período feudal foi este concebido, como:

a) propriedade comunal, que basicamente constituía uma propriedade

comum, sendo proprietária a tribo, com o uso e gozo para todos os seus membros;

b) propriedade alodial, que se assemelha à propriedade livre,

caracterizando-se pela possibilidade de alienação por parte daquele que era

proprietário e que fazia a terra produzir;

c) propriedade beneficiária, que era cedida por reis ou nobres, para que

fosse explorada pelo plebeu; àquele que explorava a terra concedia-se o domínio direto

ou útil, mas não a possibilidade de disposição;

d) propriedade censual, que cabia àquele que explorasse a terra e a

fizesse produzir, desde que pagasse um ‘cânon’ a alguém;

e) propriedade servil, deferida aos servos, só enquanto ligados à gleba.

Nesta época, via de regra, a disponibilidade real do bem cabia àquele

que detinha o poder político. A transmissão da propriedade por herança se dava de

senhor a senhor, e de proprietário beneficiário a proprietário beneficiário, pois a

sociedade era marcadamente estratificada. Assim, por herança, um servo da gleba

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jamais poderia tornar-se senhor. E dificilmente poderia sair desta condição, exceto por

dois caminhos: o clero ou as armas.

Havia todo um sistema hereditário para garantir que o domínio

permanecesse numa dada família de tal forma que esta não perdesse o seu poder no

contexto do sistema político.

No contexto cristão, fins do século XIX, ligou-se a idéia de propriedade a

uma renovada idéia de dignidade humana.

Com a Revolução Francesa, a liberdade idealizada, praticamente

absoluta, a estrutura rígida do direito das coisas veio a proporcionar segurança ao novo

proprietário. Nesta época colocou-se a propriedade num verdadeiro altar, cujo

sacerdote era o proprietário. Inúmeros doutrinadores do século passado, através da

análise do Código Civil francês informam da possibilidade de o proprietário abusar do

seu direito de propriedade, ou o direito de, em se comportando como proprietário, vir

mesmo a exercer o direito de proprietário de uma maneira absoluta.

Com o advento das mudanças, foi-se delineando uma imagem social da

propriedade, sendo esta inclusive consagrada na encíclica Quadragésimo ano, do Papa

Pio XI, que deixou surpreender o esboço de uma visão social da propriedade,

reafirmando a necessidade de o Estado reconhecê-la e defendê-la, porém, em função do

bem comum.

Esta idéia foi retomada por Duguit, que sustentou dever ser ínsito ao

conceito de propriedade a impossibilidade do abuso do poder. A partir de então, o

proprietário passou a ter, cada vez mais, ao lado de um feixe de poderes, um

somatório de deveres.

O exercício do direito de propriedade tem tido seu perfil modificado

atualmente, e principalmente nas zonas mais densas, que são indubitavelmente as

urbanas. As modificações que têm sido expostas a este perfil visam a tornar possível a

coexistência de um sem-número de proprietários em áreas relativamente pouco

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extensas, e mais, acomodar o exercício de seus respectivos direitos à idéia da função que

devem exercer.

Cabe por fim, ressaltar que ao contrário do direito das coisas, no

direito das obrigações, vê-se que o mesmo conceito de contrato pregado pelo direito

romano é ainda nos dias de hoje tratado.

1.3 Evolução do direito das coisas

Como outros ramos do direito este sofreu a influência da socialização

do século XX. Iniciou-se a restrição à onipotência do proprietário, que na mais acertada

doutrina, desempenha hoje verdadeira função social. Há uma atuação continua e

progressiva do Estado para limitar a liberdade e o arbítrio do titular do direito em favor

do bem comum e dos interesses sociais.

No Brasil a propriedade imobiliária segue a legislação alemã, exigindo a

transcrição no Registro de Imóveis, enquanto que no sistema francês e italiano o simples

contrato é considerado meio idôneo para operar a transferência do direito de

propriedade. O Código Civil brasileiro acatou a tradição jurídica lusitana, recebendo,

outrossim a influência da doutrina germânica e do BGB.

1.4 Distinção entre direitos reais e direitos pessoais.

Não há critério preciso para distinguir o direito real do direito pessoal.

Costumam os autores destacar alguns traços característicos dos direitos reais, com o

objetivo de compará-los e diferenciá-los dos direitos pessoais.

Adotando o conceito de Guillermo Allende, este entende que o direito

real é um direito absoluto, de conteúdo patrimonial, cujas normas, substancialmente de

ordem pública, estabelecem entre uma pessoa (sujeito ativo) e uma coisa determinada

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(objeto) uma relação imediata, que prévia publicidade obriga a sociedade (sujeito passivo)

a abster-se de praticar qualquer ato contrário ao mesmo (obrigação negativa), nascendo,

para a hipótese de violência, uma ação real que outorga a seus titulares as vantagens

inerentes ao jus persequendi e ao jus proeferendi.

Os direitos pessoais (obrigações) têm por objeto imediato, não coisas

corpóreas, senão atos ou prestações de pessoas determinadas. Um grande número

destes atos uma vez realizados dão em resultado um direito real ou conduzem ao

exercício desse direito.

Aos direitos pessoais, atenta a sua essência (prestação ou ato de

terceiro) corresponde à obrigação de dar ou fazer, de pessoa cuja vontade se acha

vinculada por uma necessidade jurídica.

A existência dos ditos direitos pressupõe o sujeito ativo do direito, o

sujeito passivo da obrigação e o objeto do direito – o ato ou prestação.

É, também outro corolário, da natureza dos direitos pessoais, que as

ações destinadas a torná-los efetivos não podem ser dirigidas senão contra a pessoa

vinculada pela obrigação.

Enquanto as obrigações se classificam de acordo com o dever jurídico

que recai sobre o sujeito passivo em obrigações de dar (oriundas de compra e venda) e

de fazer (contrato de locação de serviços), nos direitos reais o dever jurídico pode

consistir em fazer (facere), em não fazer (non facere), e em sofrer ou tolerar.

Assim pode-se, caracterizar os direitos reais:

a) são direitos erga omnes, onde todos os membros da coletividade são

sujeitos passivos na relação jurídica em que o sujeito ativo é titular do direito real;

b) recai sobre objeto exterior à personalidade do sujeito ativo;

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c) é aderente à coisa, pelo fato de seguir a coisa nas mãos de quem quer

a tenha, se manifestando em dois aspectos: um passivo, denominado ambulatoriedade

(hipoteca), e o segundo ativo ou direito de seqüela (reivindicar);

d) o titular do direito real pode exercer o seu direito sobre a coisa

independentemente de qualquer prestação do sujeito passivo, enquanto nos direitos de

crédito, a satisfação do sujeito ativo depende de prestação do sujeito passivo ou de

decisão judicial;

e) o dever jurídico pode consistir em fazer, não fazer ou sofrer, e o

inadimplemento do sujeito passivo dá margem à execução compulsória e não apenas às

perdas e danos, como ocorre, na maioria dos casos, nos direitos obrigacionais;

f) os direitos reais são os definidos por lei taxativamente (numerus

clausus), não se admitindo a criação de outros não legislativamente previstos. As partes

não podem criar um direito real que a lei não tenha definido como tal.

Observe o quadro resumo abaixo:

Direito das Coisas

1.5 Princípios fundamentais dos direitos reais

Dentre eles destacam

a) Princípio da aderência

vínculo, de senhoria entre o sujeito e a coisa, sendo independente de qualquer

colaboração do sujeito passivo. Tal característica não se vê nos direitos pessoais, pois

que, neste, o vínculo obrigacional existente entre credor e devedor conf

Direitos reais

Relações jurídicas entre uma pessoa (sujeito ativo) e uma coisa.

O sujeito passivo não é determinado, mas é toda a coletividade

Princípio da publicidade (tradição e registro)

Efeitos erga omnes. Os efeitos podem ser restringidos.

Rol taxativo (numerus clausus), segundo a visão clássica – art. 1.225 do CC.

A coisa responde (direito de seqüela)

Caráter permanente.

Instituto típico: propriedade.

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1.5 Princípios fundamentais dos direitos reais

Dentre eles destacam-se com maior ênfase:

Princípio da aderência, especialização ou inerência

vínculo, de senhoria entre o sujeito e a coisa, sendo independente de qualquer

colaboração do sujeito passivo. Tal característica não se vê nos direitos pessoais, pois

que, neste, o vínculo obrigacional existente entre credor e devedor conf

Direitos reais

Relações jurídicas entre uma pessoa (sujeito ativo) e

O sujeito passivo não é determinado, mas é toda a coletividade

Princípio da publicidade (tradição e registro)

. Os efeitos podem ser restringidos.

), segundo a visão art. 1.225 do CC.

A coisa responde (direito de seqüela)

Caráter permanente.

Instituto típico: propriedade.

Direitos pessoais de

cunho patrimonial

Relações jurídicas entre uma pessoa (sujeito ativo credor) e outra (sujeito passivo

Princípio da autonomia privada (liberdade)

Efeitos inter partes. Há uma tendência de ampliação dos efeitos.

Rol exemplificativo (numerus apertus

CC – criação dos contratos atípicos.

Os bens do devedor respondem (princípio da responsabilidade patrimonial)

Caráter transitório, em regra, o que vem sendo mitigado pelos contratos relacionais ou cativos de

longa duração. Instituto típico: contrato.

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inerência, estabelece um

vínculo, de senhoria entre o sujeito e a coisa, sendo independente de qualquer

colaboração do sujeito passivo. Tal característica não se vê nos direitos pessoais, pois

que, neste, o vínculo obrigacional existente entre credor e devedor confere ao primeiro

Direitos pessoais de

cunho patrimonial

Relações jurídicas entre uma pessoa (sujeito ativo –credor) e outra (sujeito passivo – devedor).

Princípio da autonomia privada (liberdade)

. Há uma tendência de ampliação dos efeitos.

numerus apertus) – art. 425 do criação dos contratos atípicos.

Os bens do devedor respondem (princípio da responsabilidade patrimonial)

Caráter transitório, em regra, o que vem sendo mitigado pelos contratos relacionais ou cativos de

Instituto típico: contrato.

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somente o direito de exigir a prestação prometida pelo segundo. Este princípio é

encontrado no artigo 1.228 do CC, que faculta ao proprietário usar, gozar e dispor da

coisa, e reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.

b) Princípio do absolutismo, isto é, os direitos reais se exercem erga

omnes. Se exercem contra todos, que devem se abster de molestar o titular. Deste, nasce

o direito de seqüela, isto é, de perseguir a coisa e de reivindicá-la em poder de quem

quer que esteja, bem como, o direito de preferência.

c) Princípio da publicidade ou da visibilidade. Significa que os bens

imóveis somente se adquirem com o registro, no Cartório de Registro de Imóveis do

respectivo título (CC, 1.227). Quanto aos móveis, estes só se adquirem pela tradição (CC,

1.226 e 1.267).

d) Princípio da taxatividade ou numerus clausus ou tipicidade que

decorre exatamente do fato de os direitos reais serem criados pelo direito positivo. A lei

enumera de forma taxativa quais são os direitos reais, não podendo haver aplicação

analógica (CC, 1.225). No ordenamento jurídico brasileiro, toda limitação ao direito de

propriedade que não esteja prevista na lei como direito real tem natureza obrigacional,

uma vez que as partes não podem criar direitos reais. E por uma razão muito simples,

como assevera San Tiago Dantas: porque, sendo certo que os direitos reais prevalecem

erga omnes, seria inadmissível que duas, três ou mais pessoas pudessem, pelo acordo de

suas vontades, criar deveres jurídicos para toda a sociedade. Neste sentido, é o Código

Civil Argentino, que contempla no art. 2.502 que os direitos reais só podem ser criados

por lei. Todo o contrato ou disposição de última vontade que constituir outros direitos

reais, ou modificar os que por este Código se reconhecem, só valerá como constituição de

direitos pessoais, se como tal puder valer. No mesmo sentido é Código Civil Português, ao

contemplar no art. 1.306 que: Não é permitida a constituição, com caráter geral, de

restrições ao direito de propriedade ou de figuras parcelares deste direito senão nos casos

previstos na lei; toda a restrição resultante de negócio jurídico, que não esteja nestas

condições, tem natureza obrigacional.

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e) Princípio da perpetuidade decorre do fato de a propriedade não se

perder por seu não-uso, mas somente pelos meios e formas legais.

f) Principio da exclusividade, consigna que não podem haver dois

direitos reais, de igual conteúdo, sobre a mesma coisa. Duas pessoas não ocupam o

mesmo espaço jurídico, deferido com exclusividade a alguém, que é o sujeito do direito

real. Assim, não é possível instalar-se direito real onde outro já exista. No condomínio,

cada consorte tem direito a porções ideais, distintas e exclusivas.

g) Princípio do desmembramento, o qual ocorre nos direitos reais sobre

coisas alheias, que de forma transitória, há o desmembramento do direito-matriz, que é

a propriedade. Quando ocorre a extinção deste direito, ocorre a consolidação deste

direito nas mãos do proprietário.

1.6 Classificação dos direitos reais

Enquanto os direitos reais só existem quando criados pela lei, pois

impõem um dever jurídico a todos os membros da coletividade, os direitos pessoais ou

de crédito dependem exclusivamente, na sua configuração, da vontade das partes,

constituindo, para terceiros (não contratantes), uma res inter alios acta1, que não pode

ser causa ou fonte de qualquer dever jurídico para quem não foi parte na convenção.

Dentro da nossa sistemática, os direitos reais são pois típicos e

definidos pelas normas legais, enquanto que os direitos de crédito podem ser atípicos.

A propriedade é o direito real por excelência que abrange a coisa em

todos os seus aspectos, sujeitando-a completamente ao titular do direito real.

Os direitos reais limitados abrangem alguns dos poderes

desmembrados do direito de propriedade, exercidos parcial ou totalmente pelos seus

1 Significa: coisa feita entre outros.

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titulares. São direitos sobre coisa alheia, ou seja, sobre a coisa de propriedade de outrem

e a respeito da qual o titular do direito real limitado tem a possibilidade de praticar

determinados atos.

Os direitos reais limitados ou sobre coisa alheia podem importar num

direito à substancia da coisa, constituindo então os direitos reais limitados de fruição, ou

num direito ao valor da coisa, abrangendo os direitos reais limitados de garantia.

São direitos reais de fruição a servidão predial, o usufruto, o uso, a

habitação, a enfiteuse e a renda real. Acerca destes, pode-se afirmar que a servidão

predial é uma restrição ao direito de propriedade exercida sobre o prédio serviente em

favor do prédio dominante, podendo importar passagem livre, uso de águas, dever de

não construir, não tirar a luz ou a vista etc. O usufruto é o direito que assiste ao

usufrutuário de temporariamente usar e gozar (receber frutos e produtos) a coisa alheia

pertencente ao nu-proprietário. O uso, por sua vez, é o direito real de usar a coisa

alheia, enquanto que a habitação é o direito de uso limitado à finalidade residencial. A

enfiteuse é um direito em que o enfiteuta tem o uso, gozo e a disposição restrita do bem,

sendo titular do domínio útil e ficando o domínio eminente com o proprietário

(enfiteutificador), que tem o direito de receber um pagamento periódico do enfiteuta

(foro), podendo, no caso de venda dos direitos do enfiteuta, exercer a preferência ou

exigir o pagamento de certa percentagem do preço da alienação (laudêmio). Por fim, a

renda real é o direito de receber uma renda garantida pelo valor de um prédio.

Os direitos reais de garantia, nos quais o titular tem um direito, não a

substancia, mas ao valor do objeto, tem-se a hipoteca, o penhor e a anticrese. A hipoteca

é o direito de garantia que recai sobre um imóvel, ficando este na posse do devedor,

enquanto que o penhor é o direito de garantia sobre móvel, que normalmente fica na

posse do credor. Por sua vez, a anticrese é direito de garantia que recai sobre os frutos

ou rendimentos de certo bem, por exemplo, os aluguéis de um imóvel.

Resumo dos direitos reais:

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Direitos Reais

Sobre coisa própria

Direito de propriedade

Uso

Gozo

Disposição

Sobre coisa alheia

Direito de fruição (substância)

Servidão: uso limitado

Uso: uso

Habitação: uso restrito

Usufruto: uso e gozo

Renda real: gozo

Enfiteuse: uso, gozo e disposição com

restrição

Direito de garantia (valor)

Penhor móvel: posse do credor

Hipoteca imóvel: posse do devedor

Anticrese: gozo (garantia de

aluguéis)

Alienação fiduciária: móvel e posse com

o devedor

De adqurir

coisa

Promessa de compra

e venda irretratável de imóveis

e promessa de cessão

(Lei n. 4.308/64 e CC, 1.225).