farmacognosia

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FARMACOGNOSIA – DA PLANTA AO MEDICAMENTO A Farmacognosia consiste de um ramo da Farmácia que estuda drogas naturais e produtos naturais de importância farmacêutica, abordando as propriedades físicas, químicas, bioquímicas e biológicas de tais substâncias de origem natural, além da busca por novas substâncias oriundas das plantas. Trata-se de uma área interdisciplinar por excelência, abrangendo história, distribuição, cultivo, coleta, preparo, identificação, avaliação, preservação e comércio das plantas cujas substâncias biológicas ativas são estudadas. Diferentes áreas como Botânica, Farmacologia, Fitoterapia, Nutrição e Medicina, entre outras, atuam concomitantemente nas pesquisas desde a bioprospecção das plantas, com levantamento prévio das substâncias de possível interesse, até a comercialização dos produtos obtidos. Entendo que a biodiversidade, apesar de apresentar-se desigualmente distribuída, constitui um pré-requisito fundamental para o desenvolvimento e avanço científico acerca as propriedades farmacológicas de produtos vegetais variados. A produção pelas plantas de substâncias ativas constitui modelo importante para a síntese de fármacos de propriedade biológicas aplicáveis na indústria farmacêutica. A conservação de tal fonte de informações deve ser viabilizada por meio da preservação e acesso à biodiversidade existente. Processos de destruição e fragmentação de ecossistemas, além de outros estresses ambientais como o aquecimento global e a poluição generalizada contribuem para a perda da diversidade genética das plantas, e dificultam seu acesso. A perda de conhecimentos da medicina tradicional também tem importante contribuição neste processo. A pirataria biológica, presente principalmente nos países que concentram as maiores parcelas da biodiversidade mundial, também perfaz um obstáculo a ser superado nesse longo caminho, visto que com isso, muitas patentes são desapropriadas – uma vez que os países donos da biodiversidade na maioria das vezes não são os donos das patentes –, e dessa forma, importante fonte de renda que poderia ser empregada nas pesquisas de produtos naturais é perdida.

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FARMACOGNOSIA – DA PLANTA AO MEDICAMENTO

A Farmacognosia consiste de um ramo da Farmácia que estuda drogas naturais e produtos naturais de importância farmacêutica, abordando as propriedades físicas, químicas, bioquímicas e biológicas de tais substâncias de origem natural, além da busca por novas substâncias oriundas das plantas. Trata-se de uma área interdisciplinar por excelência, abrangendo história, distribuição, cultivo, coleta, preparo, identificação, avaliação, preservação e comércio das plantas cujas substâncias biológicas ativas são estudadas. Diferentes áreas como Botânica, Farmacologia, Fitoterapia, Nutrição e Medicina, entre outras, atuam concomitantemente nas pesquisas desde a bioprospecção das plantas, com levantamento prévio das substâncias de possível interesse, até a comercialização dos produtos obtidos.

Entendo que a biodiversidade, apesar de apresentar-se desigualmente distribuída, constitui um pré-requisito fundamental para o desenvolvimento e avanço científico acerca as propriedades farmacológicas de produtos vegetais variados. A produção pelas plantas de substâncias ativas constitui modelo importante para a síntese de fármacos de propriedade biológicas aplicáveis na indústria farmacêutica. A conservação de tal fonte de informações deve ser viabilizada por meio da preservação e acesso à biodiversidade existente. Processos de destruição e fragmentação de ecossistemas, além de outros estresses ambientais como o aquecimento global e a poluição generalizada contribuem para a perda da diversidade genética das plantas, e dificultam seu acesso. A perda de conhecimentos da medicina tradicional também tem importante contribuição neste processo. A pirataria biológica, presente principalmente nos países que concentram as maiores parcelas da biodiversidade mundial, também perfaz um obstáculo a ser superado nesse longo caminho, visto que com isso, muitas patentes são desapropriadas – uma vez que os países donos da biodiversidade na maioria das vezes não são os donos das patentes –, e dessa forma, importante fonte de renda que poderia ser empregada nas pesquisas de produtos naturais é perdida.

As características genéticas das plantas e os avanços nas pesquisas nessa área em muito contribuem para o desenvolvimento de técnicas biotecnológicas que permitem a manipulação e melhoramento genético de plantas de interesse comercial. A possibilidade da utilização de plantas melhoradas e/ou transgênicas para a obtenção de substâncias biologicamente ativas aponta para um caminho que pode ser mais amplo do que se imaginava anteriormente, e pode permitir além da conservação da biodiversidade pesquisada, a produção em larga escala de plantas de atividades farmacológicas importantes, permitindo assim o avanço das pesquisas.

A utilização da matéria-prima vegetal diretamente na obtenção de fármacos de utilização popular tem contribuído para a drástica redução da diversidade natural dos ecossistemas tropicais, de modo que uma possível domesticação e cultivo de tais plantas aparecem no cenário atual como alternativa tanto para a conservação da flora como para a indústria farmacêutica. Os inventários florestais permitem a caracterização das espécies presentes e melhor conhecimento da matéria-prima disponível e também do que está disponível para possíveis tentativas de cultivo e manejo. Assim, a fim de maximizar processos de produção vegetal, mantendo os níveis

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e teores de substâncias ativas, é necessário também que haja mão-de-obra qualificada para tal, bem como investimentos e financiamentos.

A sistematização das espécies vegetais disponíveis com base em agrupamento das características semelhantes. Essa classificação pode ser dar morfologicamente ou quimicamente, sendo que ambos os métodos apresentam seus prós e contras. O que se deve destacar é que o agrupamento de características semelhantes pode servir como fonte para pesquisas de fontes naturais com base em informações prévias de outras plantas de mesmas características, ampliando assim a lista de opções de plantas a serem pesquisadas. Acredita-se que, na verdade, o tripé morfologia-metabolismo-ecogeografia constituiria uma base concreta na busca de produtos naturais bioativos.

Na busca de novas substâncias com papéis biológicos/farmacológicos, a importância da cultura popular se destaca, servindo como princípio para pesquisas, indicando caminhos e orientando os pesquisadores. Na pesquisa das plantas medicinais, em especial, a soberania da cultura popular, uma forma empírica do saber, a partir de sociedades aborígenes ou mesmo das tradicionais, merece o devido destaque visto que essa forma de conhecimento é transmitida de pais para filhos desde os tempos remotos, e principalmente, porque esta forma de saber se baseia nas observações feitas na própria natureza, levando em conta características apresentadas pelas plantas, ou até mesmo a partir de hábitos de utilização animal. E esse conhecimento está se perdendo ao longo do tempo. A observação da forma como esses povos utilizam e manipulam o solo, fazendo de suas terras, muitas vezes, até auto-suficientes, e da possibilidade de domesticação das espécies utilizadas, ou não, constituiria guia importante para as pesquisas

É óbvio que a presença da tecnologia moderna também não pode ser menosprezada, visto que a disponibilidade das abordagens biotecnológicas constituem importantes ferramentas na otimização dos níveis dos metabólitos de interesse farmacológico, nos estudos enzimáticos e de vias biossintéticas, além das análises de interações das plantas com microorganismos patológicos ou não e a avaliação da qualidade de matéria-prima obtida a partir de certa planta.

A partir das informações e amostras coletadas e pesquisadas, as análises fitoquímicas constituem o principal meio para a elucidação do papel real dos compostos bioativos em análise, por meio da determinação do grupo a que determinada substância pertence e pelo esclarecimento de sua estrutura química bem como do seu papel na planta. A partir deste passo, outros se seguem, como os ensaios biológicos pré-clinicos, e os testes clínicos, que devem preceder a liberação de qualquer produto para consumo a fim de se prever quaisquer possíveis reações que venham a ser desencadeadas pelo composto ativo.