faculdades integradas do brasil - unibrasil · pdf filepaulinho da viola (para ver as meninas)...

100
FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL GUILHERME DE PAULA PIRES A EDIÇÃO COMO ESTILO: INVESTIGAÇÃO DA ROTINA PRODUTIVA DA SEÇÃO ESQUINA DA REVISTA PIAUÍ CURITIBA 2012

Upload: ngokhanh

Post on 06-Feb-2018

218 views

Category:

Documents


1 download

TRANSCRIPT

Page 1: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL

GUILHERME DE PAULA PIRES

A EDIÇÃO COMO ESTILO: INVESTIGAÇÃO DA ROTINA PRODUT IVA

DA SEÇÃO ESQUINA DA REVISTA PIAUÍ

CURITIBA

2012

Page 2: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL

GUILHERME DE PAULA PIRES

A EDIÇÃO COMO ESTILO: INVESTIGAÇÃO DA ROTINA PRODUT IVA

DA SEÇÃO ESQUINA DA REVISTA PIAUÍ

Trabalho de Conclusão apresentado à Banca Examinadora do Curso de Comunicação Social com Habilitação em Jornalismo das Faculdades Integradas do Brasil.

Professora Orientadora: Maura Oliveira

Martins.

CURITIBA

2012

Page 3: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

3

“Quem sabe de tudo não fale,

quem não sabe nada se cale

se for preciso eu repito

porque hoje eu vou fazer,

ao meu jeito eu vou fazer,

“um samba sobre o infinito”

Paulinho da Viola

(Para ver as meninas)

Page 4: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

4

RESUMO

A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

seção esquina. Para tanto, a pesquisa se deteve em três frentes: valores-

notícias subdivido em valores-notícias de seleção e construção; investigação

da rotina produtiva da seção por meio da metodologia etnográfica; e por fim, a

pesquisa discute o processo de edição das reportagens e como se dá o

relacionamento repórter/editor da seção esquina.

Palavras-chave: esquina, valores-notícias, rotina produtiva, edição.

Page 5: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

5

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO 8

2. REVISTA PIAUÍ: PRETO NO BRANCO 10

2.1 E como se conta? O new journalism na esquina 13

2.2 Discurso jornalístico. Nada mais que a verdade 15

2.3 O narrador jornalista 16

2.4 O gênero reportagem 18

2.4.1 Reportagem na seção esquina 20

2.5 O humor na esquina 21

3. ESTRATÉGIAS DE EDIÇÃO 23

3.1 Canalha ou herói? A relação entre jornalistas e editores 25

3.2 A edição na seção esquina 28

4. VALORES-NOTÍCIAS NA ESQUINA 30

4.1 Valores-notícias de seleção na esquina 33

4.2 Valores-notícias de construção na esquina 36

5. A ROTINA PRODUTIVA NO JORNALISMO 41

5.1 Etnografia para entender a rotina produtiva na seção esquina 43

6. A REDAÇÃO: PIAUÍ, UMA REVISTA DA RUA 45

6.1 O difícil caminho até a publicação 51

6.2 Um canteiro de obras: não sobra pedra sobre pedra 55

7. CONCLUSÃO 63

REFERÊNCIAS 65

ANEXOS 68

Anexo 01 - Capa da revista piauí 69

Anexo 02 – piauí vem aí 70

Anexo 03 – Texto de apresentação da revista piauí 71

Page 6: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

6

Texto de apresentação da Revista Piauí - 1ª edição Outubro-2006 71

Anexo 04 – Revista destinada aos anunciantes. Quem lê piauí 72

Anexo 05. Revista destinada aos anunciantes. Seção Esquina 73

Anexo 06. Revista destinada aos anunciantes. Apresentação 74

Anexo 07. Cartão de visitas do repórter e editor Bernardo Esteves 75

Anexo 08. O que é uma esquina? 76

Anexo 09. Email, colaboradora, Vanessa Bárbara 77

Anexo 10. Email, colaboradora, Vanessa Bárbara 78

Anexo 11. Email, colaboradora, Vanessa Bárbara 79

Anexo 12. Email, colaborador, Rafael Urban 80

Anexo 13. Email, repórter e editor da esquina, Bernardo Esteves 81

Anexo 14. Email, repórter e editor da esquina, Bernardo Esteves 82

Anexo 15. Roteiro de perguntas aos jornalistas de piauí. Carol Pires 83

Anexo 16. Roteiro de perguntas aos colaboradores de piauí. Raquel Freire Zangrandi 88

Anexo 17. Roteiro de perguntas aos colaboradores de piauí. Bruno Cirillo 91

Anexo 18. Roteiro de perguntas aos colaboradores de piauí. Felipe Marra 94

Anexo 19. Roteiro de perguntas aos colaboradores de piauí. Tomás Chiaverini 96

Anexo 20. Roteiro de perguntas aos colaboradores de piauí. Vanessa Barbara 98

Anexo 21. Roteiro de perguntas aos editores de piauí. 100

Page 7: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

7

LISTA DE FIGURAS

Figura 01 – Valores-notícia de seleção na seção esquina 36

Figura 02 – Locais que se passaram as reportagens 36

Figura 03 - Valores-notícia de construção na seção esquina 40

Figura 04 – Cena produtiva: Sala dos jornalistas 46

Figura 05 – Cena produtiva: Sala da secretária de redação e da diretora de arte 47

Figura 06 – Cena produtiva: Sala dos editores 48

Figura 07 – Sala de reunião 48

Figura 08 – Cozinha da revista 49

Figura 09 – Cena produtiva: Redação da revista 50

Figura 10 – Diagrama de circulação das esquina dentro da redação 54

Page 8: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

8

1. INTRODUÇÃO

Esta monografia procura investigar de que forma se dá a produção da

notícia na seção esquina, identificar quais são seus valores-notícias, e tem o

propósito de iniciar uma discussão a cerca do processo de edição que as

reportagens dos jornalistas são submetidas na edição a fim de ficarem com o

padrão desejado pelo periódico.

Antes, porém, a pesquisa se deteve em estreitar a discussão a cerca da

revista piauí, e da seção esquina, quando, no capítulo dois, mostramos

semelhanças na narrativa e no discurso da revista piauí, há outras

antecessoras suas.

No capítulo três, a pesquisa trata sobre a relação entre jornalistas e

editores e suas estratégias na tentativa de obterem um produto final.

No capítulo quatro dessa pesquisa, estão presentes os resultados dos

valores-notícias da seção esquina no período de seis meses, de janeiro a julho

de 2011, totalizando assim 42 textos analisados, sete por edição, e

categorizados segundo os valores-notícias de construção, que para Wolf

(1985), agem como uma linha guia para a construção da matéria. E os valores-

notícias de seleção, ainda para Wolf (id), serve como bussola ao jornalista na

hora de escolher que o assunto retratado por ele é mais importante em

detrimento ao outro.

Nessa fase da pesquisa, a monografia optou por se basear em Nelson

Traquina, por ser contemporâneo de Wolf, e deixar bem claro, quais são seus

valores-notícias de construção e de seleção. Essa divisão se mostrou

importante durante o trabalho, uma vez que a peculiaridade da seção em

mostrar o pitoresco, e o possivelmente banal, mostra que o jornalista tem que

voltar os seus olhos a esse tipo de situação para ter a sua matéria publicada na

seção (valor-notícia de seleção).

Por outro lado, a distinção do valor-notícia de construção se mostrou

importante pela forte edição que os textos dos jornalistas são submetidos a fim

de ficarem com o formato exigido pelo periódico.

Como principal objetivo desta monografia, que discorre a partir do

capítulo cinco, a pesquisa ainda se deteve em investigar a rotina produtiva da

Page 9: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

9

seção esquina, na tentativa de entender o processo de produção da notícia,

uma vez que a seção trabalha em conjunto com jornalistas da revista, e

colaboradores de fora.

Para isso, a pesquisa se deteve, em demonstrar a possibilidade do uso

da metodologia de pesquisa etnográfica, (Geertz apud Benetti e Lago, 2008)

cuja característica tem como a observação participante, entrevistas em

profundidade e análise documental como foco principal de análise, nos

objetivos propostos pela monografia.

Como pode ser visto ao longo do capítulo seis, para se adequar a

metodologia de pesquisa etnográfica, foi agendada uma visita a revista piauí

com o objetivo de observar o funcionamento da produção de notícia da seção

esquina. Na mesma data foram feitas entrevistas com Bernardo Esteves,

repórter e atual editor da seção esquina, e Roberto Kaz, repórter da revista

semanal de O Globo, e antigo editor da seção.

Também foram enviados questionários por email com perguntas aos

jornalistas e colaboradores do periódico, a fim de entender o processo de

produção e edição das suas reportagens.

Ainda no capítulo seis, a pesquisa demonstra através de ilustrações, a

rotina produtiva da seção e o caminho que as esquina são submetidas até a

publicação final.

Já na última etapa da pesquisa, no capítulo sete, a monografia traz

exemplos de reportagens de jornalistas antes de serem editadas, e depois, já

publicadas com as alterações propostas pelo editor, e traz pontos na tentativa

de contribuir para o debate sobre a relação jornalista/editor.

O desmembramento da pesquisa em três frentes (valor-notícia; rotina

produtiva; processo de edição) se mostrou importante, uma vez que foi

observado que em qualquer etapa desse processo (inicial; intermediário; final),

as reportagens da esquina podem ser excluídas da publicação.

Em todo o caminho traçado, a presente pesquisa tem o objetivo de, a

partir do entendimento das rotinas produtivas da seção, levantar a discussão a

cerca dos possíveis benefícios ou malefícios do processo de edição que as

reportagens da esquina são submetidas.

Page 10: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

10

2. REVISTA PIAUÍ1: PRETO NO BRANCO

Anunciada em agosto de 2006 na Festa Literária de Paraty (Flip), pelo

fundador e documentarista, João Moreira Salles, e Luís Schwarz, editor da

Companhia das Letras, a revista piauí chegou às bancas dois meses depois,

em outubro de 2006, com o propósito de ser uma revista que devolvesse aos

leitores o prazer da leitura. De periodicidade mensal, piauí é uma revista que

abriga poesias, quadrinhos, ficção, crítica, ensaio, mas, sobretudo é um

periódico de reportagem. “Ela buscará os temas atuais, embora não tenha

pressa em chegar primeiro às últimas notícias” 2. Além de jornalistas, é

possível encontrar textos assinados por artistas, escritores, desenhistas,

ensaístas e críticos.

Editada pela editora Alvinegra, piauí é impressa em papel pólen bold 90

gramas nas capas, e pólen soft 70 gramas no miolo, pela Companhia Suzano

Papel e Celulose, criada especialmente para a revista. Com um tamanho

peculiar, em formato de tabloide, 27x35 cm, piauí foi criada “para quem gosta

de histórias com começo meio e fim” 3. Na própria capa, na qual não há fotos,

só ilustrações, que “nem sempre (ou quase nunca) têm relação com as

matérias que estão lá dentro” 4, ou pelas manchetes5, já é possível notar um

dos aspectos mais marcantes da revista. O uso do humor: “A revista não será

sisuda nem chata. Sisudez não é sinônimo de seriedade. Uma coisa não tem

nada a ver com a outra. piauí terá humor, graça” 6.

Outra característica do periódico é que na piauí, “jornalistas e escritores

têm o tempo necessário para investigar e escrever, livres das urgências do

jornalismo diário” 7. Ou seja, a revista oferece a oportunidade para os

jornalistas descobrirem histórias novas, ou ângulos novos sobre assuntos já

1 Para o nome da seção e o da revista serão usados as grafias esquina e piauí, seguindo a opção da publicação de escrevê-los em letras minúsculas. 2 piauí vem aí. Ver anexo 02. 3 Texto de apresentação da revista piauí – 1ª edição, outubro de 2006. Ver anexo 03 4 Revista destinada aos anunciantes. 5 Exclusivo, nenhuma manchete sobre a morte de Michael Jackson. (piauí, edição 34, 2011) 6 Texto de apresentação da revista piauí – 1ª edição, outubro de 2006. Ver anexo 03 7 (id)

Page 11: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

11

abordados anteriormente pela mídia, mostrando que “não terá pressa em

chegar primeiro às últimas notícias” 8.

Nesse aspecto, piauí lembra duas revistas anteriores a ela: a revista

Senhor, que circulou de 1959 a 1964, e conquistou um espaço de vanguarda

nas publicações culturais do país. E a revista Realidade, produzida por dez

anos e tornou-se observadora participante de uma época de transgressão de

valores culturais nacionais, que teve a perspicácia de entender o momento no

qual o Brasil vivia (Lima, 2004).

As duas revistas, assim como a piauí, contavam com nomes importantes

do jornalismo e da literatura. Senhor abrigava nas suas redações nomes como:

Clarice Lispector, Jorge Amado, Graciliano Ramos, Nelson Rodrigues, Glauber

Rocha, Zuenir Ventura, Ferreira Gullar, Paulo Francis, Jaguar, Ivan Lessa,

entre outros.

Por outro lado, assinavam as reportagens da revista Realidade,

escritores como José Marão, José Hamilton Ribeiro, Nilson Monteiro, entre

outros.

Outra revista que carrega traços semelhantes a da piauí é a The New

Yorker. O periódico americano começou a circular em 1925 e tem como foco

principal a cultura norte americana. Assim como piauí e Senhor, suas capas

quase nunca contêm fotos. Ela também usa o mesmo recurso gráfico que

Senhor usava e que piauí resgata no jornalismo brasileiro: desenhos ou

ilustrações que dizem pouco sobre o conteúdo da revista.

Rigorosa quanto à apuração e a edição no que diz respeito ao jornalismo

político, a revista The New Yorker também abre espaço para comentário,

ensaio, crítica, ficção, humor, cartuns e poesia. Todos os elementos que

podem ser encontrados na revista piauí.

Apesar de alegarem não ter feito uma pesquisa de mercado antes do

lançamento da revista, em outubro de 2006, para saber qual era o público

preferencial do periódico9, podemos encontrar na revista destinada aos

anunciantes, o que para piauí, é o seu leitor10:

8 (id) 9 Narração e jornalismo. O narrador na “esquina de piauí”. Jaqueline Crestani. 10 Quem lê piauí. Ver anexo 04.

Page 12: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

12

universitários – se o universitário pertence à elite do público jovem, o estudante que lê piauí está no topo dessa elite; formadores de opinião – quem define o que estará sendo pensado – e feito – no Brasil daqui um ano está lendo piauí hoje; imprensa – a liberdade editorial, a profundidade de apuração e o tempo para escrever fizeram da leitura da revista um hábito de grande parte da imprensa brasileira; elite brasileira – são pessoas que se interessam por artes, literatura, música, comportamento, arquitetura, e tantos outros assuntos que piauí cobre de maneira particular. Brasília – piauí já entrou na rotina das pessoas que definem a agenda política no país. mercado financeiro – perfis e grandes reportagens sobre o mercado financeiro fazem da revista leitura obrigatória para esse segmento. meio cultural – pela intenção de sempre revelar histórias que ainda não foram contadas, piauí repercute como nenhuma outra publicação no meio artístico.

piauí tem tiragem mensal. Informações contidas na edição 72, de 2012,

mostra que a tiragem da revista é de 54.000 exemplares. Não possui uma

política editorial definida, haja vista que apenas três seções são encontradas

desde o primeiro exemplar da revista: chegada, que “é a abertura da piauí. São

reportagens que ocupam apenas uma página, sobre um acontecimento que

esteja estreando no mês em curso” 11; despedida, “que em oposição à seção

chegada, fecha cada edição da revista com um assunto que se encerrou no

mês anterior” 12; e esquina, objeto de pesquisa dessa monografia, abordado de

forma mais aprofundada no decorrer do trabalho.

Além de abrigarem grandes escritores e jornalistas dentro da redação,

outra característica que aproxima essas publicações é a forma como eram, no

caso de Realidade e Senhor, e como são construídos, piauí e The New Yorker,

os textos jornalísticos. O uso de técnicas da literatura “na captação, redação e

edição dos textos sobre a vida real que pressupõe um mergulho intenso do

narrador no ambiente sobre o qual escreve” (Lima, 2003).

Mesmo que não reconhecido pelo publisher da revista piauí13, fica claro

nas reportagens ali publicadas, que a forma é tão importante quanto o

conteúdo, como afirma Salles:

11 Chegada. Revista destinada aos anunciantes. 12 Despedida. Revista destinada aos anunciantes. 13 Em entrevista ao programa sempre um papo. Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=P8V5QnHAlmo&feature=gv

Page 13: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

13

Acertamos quando alguém começa a ler uma reportagem sobre um assunto que não lhe diz respeito e sobre o qual nunca pensou e chega ao final pelo simples prazer da leitura. Por essa razão o processo de edição é tão intenso. O conteúdo interessa, claro, mas a estrutura e a prosa também. Não é apenas o que se conta, mas como se conta14.

Portanto, ao expressar a sua apreciação pelo texto bem escrito, Salles

deixa claro que assim como o que acontece na revista norte americana The

New York Times, e aconteceu com as suas antecessoras, Realidade e Senhor,

o modo de contar uma narrativa interessa tanto quanto o fato em si.

2.1 E como se conta? O new journalism na esquina

Outro movimento estilístico que pode ser observado na revista piauí é o

new journalism. Para Lima (2004), o new journalism pensa na forma, na

qualidade literária do texto, sem deixar o conteúdo, um dos preceitos do

jornalismo tradicional. Marcelo Bulhões (2007), ao falar do new journalism, diz

que essa nova tendência em fazer jornalismo, aproximou mais os dois gêneros:

romance e jornalismo passaram a estreitar as relações influenciando tanto um

quanto o outro.

Segundo Wolfe (2005), há pelo menos quatro recursos principais que

podem ser identificados nas obras dos novos jornalistas.

O primeiro recurso citado por Wolfe é a “a construção cena a cena”.

Nela, o autor fugiria do simples relato histórico, e com uma sequência de

cenas, descrita com o maior número possível de detalhes, o jornalista traz o

leitor para próximo do acontecimento.

O segundo aspecto diz respeito ao uso de diálogos. No jornalismo

tradicional o uso dos diálogos é também chamado de fontes. Muitas vezes

servem apenas para a confirmação de algo que o jornalista quer falar, mas não

poderia. No new journalism, o uso de diálogos é usado para criar ambientes,

gerar tensão, e são usadas de forma diluída por toda a narrativa.

14 Narração e jornalismo. O narrador na “esquina de piauí”. Jaqueline Crestani.

Page 14: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

14

Os escritores de revista, assim como os primeiros romancistas, aprenderam por tentativa e erro algo que desde então tem sido demonstrado em estudos acadêmicos: especificamente, que o dialogo realista envolve o leitor mais completamente que qualquer outro recurso. Ele também estabelece e define o personagem mais depressa e com mais eficiência do que qualquer outro recurso. (Wolfe, 2005, p. 54).

A terceira característica citada por Wolfe (Id) é o “ponto de vista da

terceira pessoa”. Quando o jornalista usa desse recurso, está querendo levar o

leitor para mais perto do personagem retratado, de modo a compartilhar do

sentimento que a cena retrata. Novos jornalistas faziam isso para fugir do tom

autobiográfico dos textos do jornalismo daquela época.

E por último, o quarto recurso, segundo o autor foi o menos assimilado.

Trata-se da estratégia do registro do status da vida do personagem. Observar

qualquer maneirismo do personagem pode ser essencial para entendê-lo.

Antes de invocar o personagem de forma precipitada ao leitor, ele procura

descrevê-lo em detalhes, inclusive os fatos que o cercam para que o leitor se

habitue do personagem em sua plenitude.

Ao longo de toda a revista piauí, podemos notar a apropriação das

técnicas do jornalismo literário e do new journalism, como por exemplo na

reportagem, O doce mais doce que o doce, da seção esquina de outubro de

2011:

Apertado em carteiras de fórmica bege, os 38 aspirantes a detetive particular silenciaram assim que Zé do Caixão adentrou a sala de aula. Passava um pouco das 10 horas de sábado. O sol entrava pelos janelões e diminuía a aura macabra do cineasta, levemente encurvado aos 75 anos. As unhas longuíssimas, encardidas e retorcidas- seu traço distintivo mais marcante - haviam sido cortadas duas semanas antes. Ele também pouco trajava a característica capa preta sobre a camisa. Mas isso não impediu que, ao lado do quadro negro, José Mojica Marins atraísse total atenção dos alunos do Instituto Universal dos Detetives Particulares, no Centro de São Paulo (Piauí, 61, 2011).

Portanto, apesar das negativas do publisher, é possível observar que o

estilo que tem uma maior expressão na revista é a do jornalismo literário.

Page 15: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

15

2.2 Discurso jornalístico. Nada mais que a verdade

Mesmo quando o texto escrito pelo repórter têm as características do

jornalismo literário, o que como vimos, possibilita uma maior abertura durante a

narrativa, o jornalista tem o compromisso com a realidade. Portanto, o

jornalismo é visto como um coparticipante da realidade no sentido de

representar o real, pois o jornalista necessita de acontecimentos externos para

produzir um conhecimento particular sobre os fatos que presenciou.

O objetivo do jornalista é “fazer com que os leitores/ouvintes interpretem

os fatos narrados como verdades, como se os fatos estivessem falando por si

mesmos” (Motta, 2012, p. 16). O discurso jornalístico cria pequenas narrativas

de acontecimentos individuais dentro de uma sociedade e o transforma em

episódios ou acontecimentos. “O jornalismo trabalha com a redução de

complexidades produzidas por outros sistemas, dando forma e produzindo

inteligibilidades naquilo que parece sem nexo” (Fausto Neto, 2006, p. 47).

Como uma busca de comprovar veracidade aos seus textos, Motta

(2012) diz que o jornalista busca referenciais geográficos, lugares para situar o

leitor onde aquilo aconteceu; citações de autoridades para passar a impressão

de que são pessoas reais que falam e não o jornalista; datação de

acontecimentos para situar o leitor espaço temporalmente sobre o acontecido e

o uso de números e estatísticas para conferir precisão aos relatos.

Segundo Klondy (2012), “o autor de textos jornalísticos tem a

responsabilidade de transferir ideias, fatos e pontos de vista a leitores com um

construto cultural muito diversificado” (p. 2).

De importância vital para o jornalismo, a sociedade precisa acreditar na

veracidade do discurso jornalístico. “É por meio do jornalismo que o leitor

espera ler o mundo” (Benetti e Jacks, 2012, p. 6). Como lembra Nelson

Traquina,

Lemos as notícias acreditando que elas são um índice do real; lemos as notícias acreditando que os profissionais do campo jornalístico não irão transgredir a fronteira que separa o real da ficção. E é a existência de um ‘acordo de cavalheiros’ entre jornalistas e leitores pelo respeito dessa fronteira que torna possível a leitura das notícias enquanto índice do real e, igualmente, condena qualquer

Page 16: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

16

transgressão como ‘crime’(Traquina apud Benetti e Jacks, 1993, p. 168).

Sendo assim, quando Traquina diz que “lemos as notícias acreditando

que elas são um índice do real”, isso nos leva a crer que o discurso jornalístico

só se dá na sua plenitude quando o sujeito que lê se sensibiliza com o discurso

do jornalista, formando assim um “contrato de leitura” entre jornalista e leitor.

Quando lemos a reportagem da esquina, “Sambódromo no punjab. Jai

Hindustan! Pakistan Zindabad”, que retrata um evento nas fronteiras entre

Paquistão e Índia (piauí, 55, 2011), só acreditamos na veracidade da

reportagem, tendo em vista que o periódico é brasileiro, porque assinamos um

contrato de leitura na qual o discurso jornalístico não se permite mentir.

Nesse contexto, o leitor dá credibilidade ao jornal de sua preferência

para que ele tenha a permissão de opinar, mesmo que ele não concorde com

as opiniões ali presentes, ou fale de fatos que ele não conhece, porque ambos

assinam esse contrato instaurando assim uma relação de cumplicidade.

2.3 O narrador jornalista

Traduzindo conhecimento em relato, a narrativa nos coloca em

perspectiva de um determinado acontecimento em seu desenrolar lógico e

cronologicamente. “Isto é, a qualidade de descrever algo enunciando uma

sucessão de estados de transformação” (Motta, 2009, p. 2).

Segundo Motta (2009), as narrativas podem ser factuais, como o

jornalismo e a história, que buscam estabelecer relações lógicas e cronológicas

das coisas físicas15. Ou narrativas imaginárias, essas sem compromisso com o

real, com sua lógica interna. Os campos de narração imaginária, como o

cinema, a literatura e as telenovelas, não procuram ser fiéis à realidade. Suas

narrativas estão impregnadas de valores éticos, morais e estéticos.

Indiferente se ela é narrativa imaginária ou factual, para Fernando

Resende16:

15 Por exemplo, jornalistas e historiadores procuram preservar a objetividade do relato. 16 O jornalismo e a enunciação: Perspectivas para um narrador-jornalista.

Page 17: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

17

Vemos a narrativa como uma forma de representação coletiva, como um elemento que cria e recria sociabilidades, como práticas comunicativas sociais que definitivamente contribuem na sociedade mediatizada para o alargamento dos horizontes de experiência. (Resende, 2012, pg. 3).

Rocha (2007) marca o aparecimento da figura do narrador quando a

tradição dos discursos era a expressão oral. Segundo a autora, na épica, o

narrador se colocava em um nível superior, como representante da voz de

outro ser. Já na modernidade, com o advento do romance, e a difusão da

informação, aquele narrador que “traz o saber que vem de longe” (Benjamin

apud Cavalcanti, 2006) já não existe mais, como explica Benjamin (apud

Resende, 2012).

Perde sua vitalidade – narrador - no momento de exacerbação de uma prática cotidiana, burocratizante e limitadora (...), sendo assim, o ato de narrar, quando burocratizado pelas fundamentações epistemológicas do discurso jornalístico, torna-se limitado e limitador (Resende, 2012, pg. 3).

Ainda segundo Benjamin (apud Cavalcanti, 2006), a dimensão utilitária

do narrador pode aparecer em um ensinamento moral ou uma sugestão

prática. Portanto, o narrador é uma pessoa que se posiciona e por

consequência sabe dar conselhos.

Esse tipo de narrador é decretado como morto por Benjamin, pois para o

pensador alemão, o ser humano perdeu a capacidade de partilhar

experiências, de contar e ouvir, porque esse tipo de argumentação possibilita o

leitor a “interpretar a história como quiser” (Cavalcanti apud Benjamin, 2006, p.

181). Para Cavalcanti (Id), o narrador típico de Benjamin foi substituído pelo

lead17. Marcado pela ausência do narrador, as matérias do hardnews estão

mais preocupadas em dar explicações, “narrar-se sozinhas”, como diz

Cavalcanti (2006, p. 81). Para Lima (2004), a única saída para um resgate do

narrador no campo jornalístico é o gênero reportagem.

17 Expressão inglesa que significa guia. Fornece a informação básica sobre o tema na qual devem ser respondidas seis perguntas: O que? Quem? Quando? Onde? Por quê? Como?

Page 18: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

18

2.4 O gênero reportagem

Pode-se entender reportagem como ampliação da notícia. Na

reportagem, o jornalista tem a oportunidade de ir além das respostas do lead.

Ele busca ampliar o espaço característico da notícia: o agora, o já. A

reportagem trabalha com o antes do agora, ou seja, o passado. Ela amplia “os

limites do acontecer, para um estar acontecendo” (Medina e Leandro apud

Lima, 2004, p.20).

Para Lage (2001), a notícia é inédita, atual e mais breve. Já a

reportagem, tem um estilo menos rígido em relação ao tempo e espaço, onde o

levantamento de dados e a interpretação são fundamentais para contextualizar

a reportagem.

Segundo Lima (2004), a reportagem situa-se em um subgênero, o

jornalismo interpretativo que, “busca não deixar a audiência desprovida de

meios para compreender o seu tempo, as causas e origens dos fenômenos que

presencia suas consequências no futuro” (p. 20).

Resultado de uma evolução iniciada nos anos de 1910, na revista norte-

americana Time, que buscava uma conexão entre os acontecimentos, de modo

a oferecer uma compreensão aprofundada da realidade (Lima, 2004), a

reportagem, segundo o autor se distingue em três modelos:

a) a reportagem dos fatos, onde os acontecimentos obedecem a uma

ordem cronológica de importância;

b) a reportagem de ação, que tenta envolver o leitor com a visualização

das cenas que o jornalista viu durante a coleta do material, assim como num

filme;

c) e a reportagem documental, cujo relato é acompanhado de citações

com o objetivo de esclarecer o assunto tratado.

Segundo Sodré e Ferrari (apud Lima, 2004), as características

apresentadas pela reportagem são a predominância da forma narrativa,

humanização dos fatos, texto de natureza impressionista e a objetividade dos

fatos narrados.

Diferentes autores classificam as reportagens, como já vimos. Enquanto

para Lima (2004), ela é dividida em reportagem dos fatos, reportagem de ação

Page 19: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

19

e reportagem documental, para Coimbra (1993), o gênero da reportagem está

subdividida em:

a) reportagem dissertativa , quando a dissertação é a estrutura

predominante. É percebida pelo uso corriqueiro de aspas dos entrevistados

comentando aqueles fatos afirmados anteriormente pelo repórter;

b) reportagem narrativa, cuja sua principal característica é de contar

os fatos dentro de uma relação espaço tempo diferentes do que na reportagem

dissertativa. Enquanto a anterior contém um ângulo fixo em relação às

mudanças das pessoas, na reportagem narrativa as mudanças estão

ocorrendo;

c) reportagem dissertativo-narrativa e narrativo-disse rtativa é

evidenciada quando há os dois tipos de texto na mesma reportagem, mas um

ou outro é predominante. Enquanto que no primeiro ocorre o pronunciamento

do autor, em parte explicita e implícita, no segundo tipo de reportagem, os fatos

parecem estar ocorrendo aos olhos do leitor;

d) reportagem descritiva, bloco e fragmento, quando a reportagem

se fixa em único espaço de tempo, sem as mudanças temporais características

da reportagem narrativa. Esse tipo de reportagem simplesmente descreve um

fato sem contextualiza-lo.

Para Lima (2004), a reportagem eleva o jornalista e o leitor a um

“patamar superior” de compreensão da contemporaneidade. “É uma tentativa

de fazer emergir no discurso jornalístico a figura do narrador” (Cavalcanti,

2006). Na reportagem, Lima (2004) defende que a pauta deve ser defendida a

partir da noção da contemporaneidade. Que o jornalista precisa (re) aprender a

ouvir, dar voz ao entrevistado e superar “o anacronismo de sua linguagem

verbal” (Lima, 2004, p. 104). Para ele, a narrativa jornalística deve se aproximar

da literária.

Apesar de possibilitar uma maior liberdade ao jornalista, quando esse,

absorve essas características, Lima (2004) reitera que o jornalista tem a

responsabilidade de traduzir o real. Portanto, a reportagem deve se aproximar

da forma literária, empregar seus recursos, mas não ficcionalizar um relato,

inventar temas ou personagens.

Page 20: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

20

2.4.1 Reportagem na seção esquina

Publicada desde o lançamento da revista em outubro de 2006 no mesmo

espaço, logo após a seção chegada, os textos da esquina variam de cinco a

sete mil caracteres. Na esquina, encontramos relatos sobre festas, palestras,

eventos inusitados, políticos, atividades profissionais extravagantes e outros

temas variados. Mas, sobretudo, o foco principal da esquina está nos

personagens, principalmente em pessoas anônimas, desconhecidas e sem

fama. “Nunca temas gerais - a educação no Brasil, a crise da odontologia

nacional, etc. Sempre histórias singulares, com sujeito claro” 18.

As reportagens da seção esquina quase sempre se passam no ambiente

urbano, da grande metrópole, onde uma pluralidade de histórias passa

despercebida do cotidiano dos passantes, e até mesmo de outros repórteres.

Na esquina, os assuntos considerados menos importante pelos grandes

veículos, inclusive a própria revista, ganham visibilidade, como a dificuldade

encontrada pelo sargento de conseguir achar um instrumentista de fole em

Brasília (O novo tom do planalto. Em Brasília escocês não é só uísque. In piauí,

53, 2011); o senhor que montou um tanque de guerra no quintal de casa (O

Bricoleur de parada de Lucas. Um ferro velho para chamar de quartel general.

In piauí, 56, 2011), ou, ainda, o pesquisador que luta para demonstrar a

importância dos gambás (Incompreendido e injustiçado. As pesquisas de

Jared, o caçador, para provar que os gambás são legais. In piauí, 56, 2011).

Podem-se observar, também, em menor ocorrência, reportagens que

tratam de pessoas mais conhecidas, sobretudo políticos, como nesse exemplo

em que o repórter retrata os futuros herdeiros dos numerosos livros de Delfim

Neto (Para a alma Mater. Até a poltrona de Delfim fica com a USP. In piauí, 55,

2011). Há também espaço para reportagens cujo acontecimento se deu pouco

tempo anterior à edição ser publicada. É o caso da reportagem na qual nos é

mostrado como se deu a fuga dos traficantes através dos tubos de esgoto da

favela (E por falar em aceleração. Fuga de traficantes inaugura galerias de

águas pluviais no Complexo do Alemão. In piauí, 52, 2011).

18 O que é uma esquina. Ver anexo 08.

Page 21: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

21

Por muito tempo a esquina não foi assinada19. Essa informação só era

encontrada no site da revista. Segundo João Moreira Salles, “a seção não é

assinada para que eu possa tentar dar a todos os textos uma espécie de

espírito comum” 20.

Reunidos, todos os sete textos de cada edição ganham um conjunto de

uniformidade. Tanto na narrativa, pois em todos os textos pode se perceber a

presença do narrador em terceira pessoa, comentando sobre o assunto,

fazendo assim um resgate do narrador de Benjamin, quanto na disposição da

seção nas páginas. Os relatos, dispostos em quatro colunas, aparecem

seguidamente. Além dos títulos, em negrito, e das ilustrações de Andrés

Sandoval, tudo que o leitor vê nas páginas da revista são letras, o que confirma

o discurso de apresentação da revista: “piauí será uma revista para quem gosta

de ler” 21.

Também é possível observar que o humor é o traço mais marcante da

seção esquina, embora exista, em algumas reportagens, principalmente fora da

seção, reportagens mais sisudas. “O jornalismo publicado na seção esquina dá

mostras de um narrador que ironiza o enunciado sério, tomando liberdades

com ele e com os homens que o proferem” (Magela, 2011, p. 36).

Na revista destinada aos anunciantes, piauí é apresentada como “uma

revista mensal de jornalismo, ideias e humor” 22. Portanto, a revista, e por

consequência a seção, dá mostras do seu funcionamento no sentido de querer

informar, fazer pensar e rir.

2.5 O humor na esquina

Não negada à existência de um discurso jornalístico dos moldes que já

definimos anteriormente, a busca pelo humor na seção esquina proporciona

uma maior abertura para assuntos diversos que não aqueles

epistemologicamente conhecidos do jornalismo. Na carta “o que é uma

19 As reportagens começaram a ser assinadas a partir da edição 66. 20 O que é uma esquina. Ver anexo 08 21 Texto de apresentação da revista piauí. Ver anexo 03. 22 Revista destinada aos anunciantes, grifo deles.

Page 22: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

22

esquina” (anexa neste trabalho)23, João Moreira Salles evidencia qual será o

tom da seção. “Quando possível, quero humor, mas humor quieto, aquele que

corre por baixo do texto, meio disfarçado. Humor de inglês - quanto mais

ridículo o assunto, mais sério o tratamento” 24.

Segundo Escarpit (apud Magela, 2011), o humor inglês, também

conhecido pela expressão wit, é um gracejo a partir de uma situação ou

pessoa.

O sinônimo wit se desinteressa da palavra, mas se refere à coisa, ao fenômeno e ele encontra uma relação lógica com um fenômeno semelhante, o wit que nós traduzimos aproximadamente por “espírito”. (Escarpit apud Magela, 2011, 38).

Para Magela, o wit tem várias significações: Juízo, capacidade, aptidão,

sabedoria, agilidade intelectual, frieza e o distanciamento. Quando os

narradores da piauí comentam sobre determinado assunto parecendo estar

acima do acontecido, eles estão exercendo o humor inglês, o wit, algo

solicitado desde a carta “o que é uma esquina” e aparentemente assimilado

pelos jornalistas e colaboradores da revista. “Tem esse esqueminha de

terminar com um fator surpreendente ou declaração engraçada, e ter uma

pessoa irônica olhando por cima de tudo”25.

Veja (apud Magela, 2011) afirma que o humor é uma luta para não

chegar aos seus dois limites: tragédia e comicidade. Na tragédia, segundo

Magela, “o ser humano é vítima de uma situação superior às suas forças. Há

uma necessidade maior, algo que deve se cumprir e que o herói trágico e

demais envolvidos desconhecem” (2011, p. 45).

Já na comicidade todos conhecem a necessidade de fazer o correto,

menos o personagem cômico. “Alguém, por exemplo, que não consegue se

vestir de maneira a ser aceito pelos seus contemporâneos ou que repete um

movimento esquisito involuntariamente vai parecer ridículo” (id).

Para Freud, no ensaio O humor (1973), há duas maneiras pelas quais o

processo humorístico pode se realizar. Em relação a uma pessoa isolada,

23 O que é uma esquina. Ver anexo 08 24 (Id). 25

Em conversa com o pesquisador por email em 18/09/2012. Ver anexo 09.

Page 23: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

23

quando ela própria adota a atitude humorística, e num segundo passo quando

o espectador é convidado a participar do processo humorístico como objeto de

contemplação. “O humor não é resignado, mas rebelde. Significa não apenas

o triunfo do ego, mas também o do princípio do prazer, que pode aqui afirmar-

se contra a crueldade das circunstâncias reais” (Freud, 1973, p. 191). Sendo

assim, a seção esquina busca o humor para falar de assuntos sérios, ou não,

na tentativa de tornar seus textos mais agradáveis de serem lidos aproximando

assim o seu leitor do assunto retratado.

3. ESTRATÉGIAS DE EDIÇÃO

O processo de definição do que é notícia, ou o que é mais importante

dentre os acontecimentos do dia, e, por consequência, merece ser destaque

nas páginas do dia seguinte nos jornais, rádios ou TVs, é possivelmente uma

das mais complexas atividades da produção jornalística. O manual de redação

do jornal Folha de São Paulo, define a edição como um processo formado pela

“exposição hierárquica e contextualizada das notícias e distribuição espacial

correta e interessante de reportagens, análise, artigos, críticas, fotos, desenhos

e infográficos”. (MFSP, 2002, p. 33). Dessa maneira, entende-se por edição

tanto o trabalho de seleção do que é notícia, tanto o exercício de adequação do

texto as normas pré-estabelecidas pela linha editorial.

Dessa forma, para Marocco e Berger (2006), o trabalho de editor é uma

tarefa complexa “que conjuga o gesto individual, as estratégias empresariais e

as práticas jornalísticas a condições históricas de possibilidades” (p. 17).

Segundo Clóvis Rossi (1980), a tarefa da edição está associada a cinco

filtros: a angulação, que segundo Cremilda Medina (1988), é a primeira força

do processo jornalístico. Divididos em grupal, quando o grupo econômico e

político da empresa influenciam diretamente na produção de um texto.

E a angulação pessoal. Essa quando o jornalista consegue se

estabelecer frente aos aspectos de angulação grupal e de massa o seu estilo

no texto.

Page 24: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

24

Outros filtros, segundo Rossi (1980), são: a extensão da matéria,

incluindo aí o número de linhas e caracteres, o sentido do texto e a sua

importância na página.

O editor, segundo essas visões, é compreendido como um sujeito bem

informado, que distribui pautas, definindo assim os assuntos a serem cobertos.

Para Cremilda Medina (1988), o editor precisa ser:

Sensível à demanda, que antevê a oportunidade de determinadas coberturas, que sabe selecionar as informações ‘essenciais’ que o repórter traz, e que sugere perguntas e, acima de tudo, que angula a matéria. Neste momento, editoria e angulação mantêm uma relação estrutural indiscutível. O editor está em perfeita sintonia com a angulação da empresa, com a angulação - massa - ou seja, age como elemento regulador da oferta e da demanda (p. 79).

Com todas as características acima citadas pela autora, pode-se inferir

que nem todos os jornalistas estão adequados para ser um editor. Pensando

nisso, Cláudio Abramo (apud Marocco e Berger, 2006) sugere uma divisão

entre “jornalistas e jornalistas”. Para ele, o fazer jornalístico está imbuído no

conhecimento sobre como produzir um primeiro relato, a coleta de informações,

ou sobre como editar, ou seja, trabalhar em cima do que já feito anteriormente.

Alguns jornalistas são excelentes para produzir, imaginar matérias, reportagens, artigos, bolar ligações entre um fato e outro (...). Outra coisa, diferente e até oposta, é a edição, o trabalho de editar o que o produto oferece (...). Ele deve ter uma noção espacial e visual. Deve trabalhar com a realidade, com as narrativas, os comentários, as análises, as fotos e as charges, isto é, coisas materiais. Deve transformar tudo isso num conjunto inteligível para o leitor, tanto intelectualmente quanto fisicamente. (Abramo apud Marocco e Berger, 2006, p. 20).

Como todo processo de escolha, a rotina de um editor pode ser pautada

pela subjetividade, ou seja, “juízos de valor baseados no conjunto de

experiências carregadas na sua carreira jornalística” (White apud Marocco e

Berger, 2006, p. 24). “Enquanto Gatekeeper, o editor foi construído como uma

conexão entre o jornal e o mundo, desvinculando-se das pressões externas do

seu trabalho” (Hardt apud Marocco e Berger, 2006, p. 18). A edição, centrada

no papel do editor, deve criar uma situação de estabilidade entre as pressões

externas ao jornalismo observando as idiossincrasias da edição, a linha

Page 25: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

25

editorial da empresa, as normatizações jornalísticas e o gosto do leitor

(Marocco e Berger, 2006).

Talvez seja por isso que o exercício de edição diz se aprender no dia-a-

dia. Mais do que apenas delegar funções, trabalhar no texto escrito pelo

repórter, diagramar espacialmente imagens, o editor deve ser um sujeito

político e apaziguador e estar atento a tudo o que acontece dentro da redação.

3.1 Canalha ou herói? A relação entre jornalistas e editores

Geralmente ocupando esses dois extremos, a relação entre jornalista e

editor na rotina produtiva de um periódico pode resultar em atritos, quando o

produto final é fundamentalmente alterado sem a aceitação do jornalista que o

produziu. Ou agradecimentos, quando o jornalista que produziu a matéria

aceita de bom grado as alterações impostas pelo editor para se ter um produto

final, que para eles, repórter e editor, se tornou melhor depois da edição.

No posfácio da reportagem “A casa de velhos”, do livro, O olho da rua

(2008), a jornalista Eliane Brum traz um sintoma da típica relação que os

jornalistas mantêm com os editores.

Não acho que seja fácil para um editor compreender essa relação. E concordo que há repórteres bem mais fáceis de trabalhar, que não se importam de ter seus textos reescritos por inteiro. Mas eu não sou um desses repórteres. E pago o preço por isso (Brum, 2008, p. 128).

A citação acima demonstra certa relação conflituosa entre Eliane Brum e

editores. Podemos supor que a premiada jornalista já sofreu inúmeras sanções

dentro dos veículos em que trabalhou por não aceitar a edição nos seus textos,

e por isso, Eliane Brum, pode ser conhecida no meio jornalístico como uma

jornalista de difícil relacionamento. Quando Eliane Brum diz “e pago o preço

por isso”, podemos imaginar que mesmo um jornalista premiado está sujeito a

edição. E quando não aceito, poderá sofrer sanções, como o desprestígio na

redação, matérias menos interessantes repassadas a ela, ou mesmo

demissão. O que fica claro no discurso de Eliane Brum é que todos dentro da

redação estão sujeitos a edição, porém, nem todos a aceitam.

Page 26: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

26

Em uma pesquisa, Robert Darnton (apud Marocco e Berger, 2006, p. 27-

28) examinou no final do século passado a estrutura da sala de redação e seu

conjunto de hierarquia no periódico norte-americano The New York Times. Nas

suas observações, Darnton apontou que existe uma relação de interesses

entre editores e repórteres. Trata-se de um sistema de controle de produção

que vai desde o “tapinha nas costas” a almoços e agradecimentos dos editores

aos repórteres. “Para entrar nesse jogo, os repórteres acabam escrevendo

para agradar os editores” (Darnton apud Marocco e Berger, 2006, p. 28).

Enquanto brigam pela aprovação dos editores, os repórteres desenvolvem um sentimento de solidariedade contra os editores. Para eles, um editor é uma pessoa que, mais do que qualquer outra coisa, tenta melhorar a sua posição dentro de sua própria hierarquia à parte, subindo com ideias brilhantes e fazendo com que sua equipe escreva de acordo com elas (p. 28).

Um episódio datado do final do século passado protagonizado pela

revista Veja e o jornalista Mario Sergio Conti, autor do livro Notícias do Planalto

a Imprensa e Fernando Collor (1999), é sintomático no que diz respeito às

relações entre repórter e editor.

Até então chefe de redação da revista Veja, Conti foi demitido poucas

semanas após o lançamento do livro-reportagem em que se debruça sobre a

relação da imprensa na campanha presidencial de Fernando Collor. Na ocasião

do lançamento do livro, Conti foi o entrevistado do programa Roda Viva, da TV

Cultura26, no qual hoje é apresentador. Na entrevista, entre outros assuntos, o

autor deu mais detalhes da rotina produtiva da revista e foi sumariamente

demitido logo após o término do programa. Em uma passagem do livro, Mario

Sergio Conti dá a dimensão do possível atrito entre repórter e editor na

produção da revista.

O ciclo poderia começar com um repórter querendo fazer uma matéria. Ele tinha de convencer o seu editor de que a ideia, a pauta, era boa (...). O encarregado escrevia o texto, seu editor pedia complementos e determinava que fosse reescrito (...). Esse ir-e-vir levava dias, às vezes semanas e, no gargalo final, era extenuante e neurótico (...). Às três horas da madrugada, o chefe poderia decidir que a reportagem fosse reduzida para duas páginas (...). Como de praxe em Veja, a reportagem não era assinada. (Conti, 1999, p. 63).

26 Íntegra da entrevista disponível no link: www.youtube.com/watch?v=1DCZEa2NOEE

Page 27: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

27

Até mesmo iniciantes na tribo jornalística já sabem do tenso ambiente

que poderão encontrar dentro da redação. No blog do trainee da Folha de São

Paulo27, espaço destinado a treinar novos jornalistas para o veículo, o jovem

jornalista Trajano Pontes faz uma reflexão sobre o papel da edição no

jornalismo. Para ele, a dificuldade em se desapegar de um texto vale pela

melhoria do produto final.

Entretanto, a menção acima vale exclusivamente para o texto que

aborda notícias factuais. Já em textos voltados às técnicas do jornalismo

literário, conhecido pela imersão do jornalista no assunto e pela ênfase no

estilo do repórter, Pontes é reticente: “Claro que o trabalho de edição é mais

grave e potencialmente perigoso em textos literários que em jornalísticos. Pela

própria natureza das coisas, choca mais a modificação por terceiros”28.

Para Maura Martins29 (2006), os textos literários adquirem um caráter

reflexível sobre os fatos, pois quem os produz trabalha com a experiência

qualitativa e estética da notícia, atributos singulares da personalidade

profissional de cada jornalista. Logo se opõe a produção tipicamente

jornalística, o hardnews, vista como mecanicista, repetitiva e parte de um

pequeno processo mais complexo. Por isso, aos repórteres parece mais

aceitável as interferências nas produções diárias do que às voltadas ao

trabalho artístico, ligado a consolidação de um estilo pessoal.

É o mesmo sentimento que parece refletir na seção esquina. Apesar de

usar recursos do jornalismo literário e do new journalism, as análises dos

valores-notícias nos possibilita identificar uma mecanicidade nas reportagens,

como a busca pela novidade, a simplificação do assunto, a dramatização dos

eventos que sugere a reportagem. Nesse sentido, poderia se argumentar que

não existe a consolidação de um estilo pessoal na seção esquina, mesmo esse

sendo próximo do jornalismo literário. O que existe na seção é o estilo da

revista. Esse, ainda acima do estilo do editor.

27 Prática diária do desapego com o “seu” texto. Disponível em: http://novoemfolha.blogfolha.uol.com.br/2012/0614/a-pratica-diaria-do-desapego-com-o-seu-texto. Acesso em: 20/09/2012 28 (id) 29 Ver artigo “Rotinas jornalísticas em um trabalho autoral: Uma aproximação à crônica de David Coimbra”.

Page 28: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

28

3.2 A edição na seção esquina

Como já vimos anteriormente, os textos da seção esquina são

reportagens cujas características se aproximam do chamado jornalismo

literário. Partindo desse pressuposto, poderíamos imaginar que existe um forte

atrito entre repórter e editor durante a edição dos textos da seção. Mas, em

resposta aos questionários enviados por email aos colaboradores e jornalistas

do periódico, pudemos constatar justamente o contrário. Para Rafael Urban30,

“a reportagem teve uma edição bastante pesada, o que ajudou muito a ter um

texto final bastante melhor”.

Na verdade, de todos os colaboradores e jornalistas entrevistados

durante a pesquisa, somente a colaboradora Vanessa Barbara, 30 anos, não

concordou com a edição final dos seus textos. Segundo ela, a relação entre

jornalista e editor “é tensa, como a de qualquer repórter com um editor”. E

continua, expressando a sua contrariedade em relação à edição: “cada vez

pior. Apesar de agora ser assinada, parece que a seção está ficando mais e

mais padronizada”31.

Já outro colaborador, Bruno Cirillo, 22 anos, avalia que a versão final do

seu texto ficou “sem dúvidas melhor”32. Para Raquel Freire Zangrandi, 44 anos,

secretária de redação, que eventualmente escreve reportagens, credita a

melhora dos textos a experiência que Bernardo Esteves, editor da seção

esquina possui no tratamento dos textos. “Tenho a sensação de que ela

sempre fica melhor depois de editada. O editor é bastante experiente com

esquina e faz com que os textos tenham o tom certo”33.

Mais do que fazer parte do jogo, como diz Roberto Kaz, antigo editor da

esquina, ou o discurso autoritário que ambos evidenciaram usar com os

colaboradores, durante a entrevista, mostrando a posição de superioridade que

eles possuem na hierarquia do periódico, “acho que eles aprovam, ou pelo

menos deveriam aprovar. Se não aprovam o problema é deles”34, ou o que diz

30 Em conversa com o pesquisador por email em 12/08/2012. Ver anexo 12. 31 Em resposta ao questionário enviado aos colaboradores por email. Ver anexo 20. 32

Em resposta ao questionário enviado aos colaboradores por email. Ver anexo 17. 33

Em resposta ao questionário enviado aos jornalistas por email. Ver anexo 16 34 Entrevista concedida ao pesquisador na redação do jornal O Globo no dia 9 de outubro de 2012.

Page 29: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

29

Bernardo Esteves: “os colaboradores normalmente acatam as alterações

propostas sem criar muito caso”35.Outro possível motivo para a aceitação da

edição nos textos dos colaborares é o sentimento de pertencimento que uma

pessoa externa passa a ter dentro da redação: “é a gratidão em ser editado por

alguém de piauí”36. Mais um elemento observado durante a pesquisa foi a

possível ascenção profissional do jornalista: “pega bem no currículo. Trocar

email com João Moreira Salles é um privilégio”37, como evidencia Tomás

Chiaverini, 31 anos, que já escreveu onze esquina, e tem seu atual emprego

(Roda Viva) atrelado ao seu trabalho como colaborador na seção, formam as

principais características para a aceitação do colaborador em ter seu texto

editado38.

Portanto, o que segundo Warren Breed (apud Marocco e Berger, 2006)

diz sobre a aceitabilidade em o jornalista ver seu texto alterado e mesmo assim

concordar com as mudanças, também foi observado durante a pesquisa.

a) A autoridade institucional e as sanções . Ou seja, como em sua

maioria os jornalistas que escrevem para a seção são colaboradores, o repórter

sente-se receoso em contestar a forte edição, uma vez que tem a aspiração de

voltar a escrever para a esquina;

b) Os sentimentos de dever e estima para com os sup eriores. A

redação da revista piauí, é repleta de jornalistas com décadas de experiência

no fazer jornalismo. O publisher da revista, mentor da carta de recomendações

da esquina, já filmou vários documentários, entre eles Santiago. De sobre

nome de peso no meio cultural e econômico, talvez haja um sentimento de

agradecimento ao ser editado pelo dono da revista ou por jornalistas com mais

experiência no ramo, como Mario Sergio Conti, Dorrit Harazim, Fernando

Barros e Silva, entre outros;

c) As aspirações à mobilidade profissional . Conhecida pela sua

qualidade editorial, ter uma reportagem publicada na revista pode abrir novas

oportunidades na carreira jornalística do colaborador;

35 Entrevista concedida ao pesquisador na redação da revista piauí no dia 08 de outubro de 2012. 36 Entrevista concedida ao pesquisador na redação do jornal O Globo no dia 9 de outubro de 2012. 37 (Id) 38

Em resposta ao questionário enviado aos colaboradores por email. Ver anexo 19.

Page 30: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

30

d) A ausência de fidelidades de grupo contrapostas. Uma vez que

os colaboradores não necessariamente frequentam a redação da revista, a

discussão sobre o produto final não ocorre. Sendo assim, perde-se o

sentimento de solidariedade contra o editor, um dos aspectos citado por Robert

Darnton, em sua observação na redação do The New York Times;

e) O caráter agradável do trabalho. Como vimos, a esquina busca

como pauta o pitoresco, o inusitado, algo que não costumamos observar com

frequência no jornalismo diário. Além do fato de que segundo ela mesmo se

intitula ter conquistado

Um espaço imaginário dos jornalistas: O daquele lugar onde ele sonha em trabalhar. A liberdade editorial, a profundidade de apuração e o tempo para escrever fizeram da leitura da revista um hábito de grande parta da imprensa brasileira.39

f) E por último, o fato da notícia ser transformada em valor. Ou seja, o

resultado do trabalho de apuração do jornalista durante o tempo em que

trabalhou em cima da reportagem, publicada em um revisa mensal conhecida

pela sua qualidade editorial.

4. VALORES-NOTÍCIAS NA ESQUINA

Muitos pesquisadores já se dedicaram ao tema da seleção de notícias

com o objetivo de tentar entender como, entre inúmeras situações que ocorre

no dia-a-dia, se escolhe a notícia que será assunto da próxima edição, e com

que destaque ela será dada. Simplesmente compactuar com os velhos ditados

jornalísticos de que as notícias se pautam sobre tudo pelo “inesperado, Um

homem que morde o cão”, e pela “negatividade, Boas notícias e más notícias”,

seria, como já foi observado por inúmeros pesquisadores, minimizar outros

aspectos do que Gislene Silva (2005) chama de critérios de noticiabilidade, ou

seja, um conjunto de elementos que vão agir na definição do que é notícia.

Compreendendo noticiabilidade como todo e qualquer fator potencialmente capaz de agir no processo da produção da notícia,

39 Revista destinada aos anunciantes

Page 31: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

31

desde características do fato, julgamentos pessoais do jornalista, cultura profissional da categoria, condições favorecedoras ou limitantes da empresa de mídia, qualidade do material (imagem e texto), relação com as fontes e com o público, fatores éticos e ainda circunstâncias históricas, políticas, econômicas e sociais (Silva, 2005, p. 96).

Para a autora, o estudo dos critérios de noticiabilidade, se dá em três

instâncias: Na origem dos fatos , relacionada à seleção primária das notícias.

Aqui se faz presenta a figura do gatekeeper, selecionando os acontecimentos

que são noticiáveis. Apesar de estar na origem do fato noticiável, para Gislene

Silva (id), após a seleção é preciso hierarquizar o que é mais ou menos

importante. Portanto, a seleção transporta-se para dentro da redação,

resultando no segundo critério de noticiabilidade, chamado de tratamento dos

fatos . Esse segundo critério de noticiabilidade, refere-se à hierarquização da

notícia dentro da redação. Nesse momento a organização da empresa pode

interferir no trabalho do jornalista quando a estrutura, a política editorial, ou o

tempo não são adequados para a produção da matéria. E na visão dos fatos ,

características epistemológicas do jornalismo, como objetividade, interesse

público, imparcialidade.

Para Mauro Wolf (1985), assim como para Gislene Silva, o processo de

seleção do que é notícia está presente ao longo de todo o processo de

produção jornalística. Tanto na seleção dos acontecimentos, isto é, quando o

jornalista escolhe que determinado acontecimento é relevante frente a outro e

começa escrever sobre ele, quanto ao processo de construção das notícias,

esses referentes à apresentação e à delimitação do que é prioritário na

construção da matéria.

Traquina (2005) diz que os valores-notícias são elementos básicos na

construção da realidade do jornalismo e são assimilados pela rotina produtiva

dos jornalistas.

Os jornalistas não podem obviamente, decidir sempre como devem selecionar os fatos que surgiram. Isso tornaria seu trabalho impraticável. A principal exigência é, por conseguinte, rotinizar tal tarefa, de forma a torná-la exequível e gerível. Os valores-notícias servem, exatamente para esse fim (Wolf, 1985, p. 197).

Page 32: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

32

Apesar de parecerem rígidos ou já pré-estabelecidos pela linha editorial

do meio, Magistretti (apud Wolf, 1985), levanta a hipótese de que os processos

de produção da informação são negociados entre os jornalistas “em diferentes

graus de importância e de rigidez e em diferentes momentos do processo

produtivo” (1985, p. 193).

No caso da seção esquina, a hipótese de Magistretti, pode se tornar

verdadeira. Bernardo Esteves, atual editor da seção esquina diz que não existe

uma reunião de pauta para dizer aos jornalistas quais assuntos eles devem

prioritariamente abordar40. Logo, o processo de seleção de notícias fica a cargo

exclusivamente do repórter, excluindo o editor dessa parte do processo, o que

geralmente não acontece nos jornais diários.

Nesse tipo de periódico, o editor muitas vezes delega as pautas para os

jornalistas irem à rua coletar dados sobre o assunto já pré-estabelecido

anteriormente, na reunião de pauta. Sendo assim, o jornalista muitas vezes não

escolhe o assunto que irá cobrir.

Embora a seção esquina dê mais liberdade ao jornalista quanto aos

aspectos dos valores-notícias de seleção, o que para Wolf (1985) refere-se à

decisão de escolha do jornalista que aquele fato é candidato a virar notícia no

lugar de outro acontecimento, o processo de “edição pesada” que as

reportagens passam, já mencionado anteriormente por Rafael Urban,

demonstra uma característica de que os valores-notícias de construção, que

Wolf (id) identifica com uma espécie de linha guia para o jornalista seguir,

sugerindo o que deve ser realçado ou tirado do texto, possui uma relevância

maior para a linha editorial da seção, uma vez que, segundo João Moreira

Salles, os textos da seção sofrem fortes intervenções do editor para que

tenham um espirito comum entre eles41.

Embora realce aqui as características dos valores-notícias para a seção,

esse não é o objetivo central da pesquisa. Os valores-notícias aparecem aqui

como um desdobramento de um corpus de uma análise maior, ou seja, uma

etapa da qual a pesquisa precisa passar para demonstrar a frequência dos

assuntos abordados na esquina demonstrando assim quais valores-notícias, 40 Entrevista concedida ao pesquisador na redação da revista piauí no dia 08 de outubro de 2012. 41 O que é uma esquina. Ver anexo 08.

Page 33: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

33

tanto de seleção, quanto de construção aparecem com maior assiduidade na

seção, o que revela uma preocupação da revista em seguir a sua linha

editorial. Característica essa que parece estar acima do próprio editor, como se

pode observar nos resultados dos valores-notícia.

Para tanto, a pesquisa se deteve no período de seis meses, entre janeiro

de 2011 a junho do mesmo ano, resultando em um total de 42 textos, e optou

por se basear nas categorias de Nelson Traquina (2005), uma vez que o autor

faz a distinção entre valores-notícias de seleção e valores notícias de

construção. Esse desmembramento em dois campos de análise dos valores-

notícia, proposto incialmente por Mauro Wolf, e depois por Traquina, é

importante para a pesquisa, haja vista que existe uma carta para nortear o

repórter sobre as características dos assuntos abordados da seção (Valores-

notícias de seleção) e de como ele deve escrever (valores-notícias de

construção).

4.1 Valores-notícias de seleção na esquina

Após a leitura dos 42 textos, observando seus valores-notícias de

seleção, é possível verificar alguns aspectos marcantes na esquina, como a

busca pela novidade, o pitoresco, ou o que João Moreira Salles chama de

“temas mais tolos” 42, que provavelmente não ganhariam espaço em outros

periódicos. Nelson Traquina (2005) chama esse valor-notícia de equilíbrio. Está

relacionado com a quantidade de notícias sobre este acontecimento ou assunto

na mídia. Na seção esquina, pudemos quantificar 41 textos com essa

característica. Até mesmo quando o assunto já foi abordado anteriormente,

perdendo a sua característica de novidade, a busca da seção pelo pitoresco se

sobressai, como se pode observar na reportagem, “E por falar em aceleração.

Fuga de traficantes inaugura galerias de águas pluviais no Complexo do

Alemão”, (piauí, 52, 2011). Na reportagem citada, podemos observar o

jornalista retratar a história da fuga dos traficantes do Complexo do Alemão por

outro viés do que aquela que vimos na TV. Sempre de forma irônica, o repórter

42 O que é uma esquina. Ver anexo 08.

Page 34: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

34

mostra que a fuga dos traficantes se deu pela rede de esgoto da favela e não

somente pela estrada de chão, como vimos nos telejornais. Ou seja, a

reportagem traz novas informações sobre um assunto de amplo conhecimento

da população.

Traquina (id) também cita o valor-notícia visualidade, que segundo ele é

mais particular no telejornalismo, pois essa usa recursos de imagens. Só que

na esquina, esse também é um aspecto recorrente uma vez que todas as

reportagens são ilustradas por Andrés Sandoval e sempre com os mesmos

traços: Olhos fechados e aspectos físicos arredondados.

Outro valor-notícia de seleção é a disponibilidade, “isto é, a facilidade

com que é possível fazer a cobertura do acontecimento” (Traquina, 2005, p.

88). Como a seção esquina trabalha também com colaboradores, logo existe

uma maior facilidade por parte dos jornalistas em não necessariamente estar

no Rio de Janeiro, sede da revista. Assim como concorrência, haja vista o

caráter singular da seção, e por ser muito abrangente tentar mensurar as

notícias que saem nos outros periódicos, uma vez que esse não é o objetivo

central da pesquisa.

O valor-notícia de seleção tempo também foi observado. Subdivido em

efemeridade, caráter passageiro da notícia e seu posterior esquecimento, e

atualidade, quando um acontecimento foi abordado recentemente e busca-se

um gancho para voltar a falar sobre ele, foi observada em 23 reportagens da

seção. Das 17 reportagens com características de efemeridade, quatro

noticiavam palestras, 12 eventos e uma mostrava a presença de uma

especialista em Monteiro Lobato em um programa de televisão43. As seis

reportagens que apresentaram características do valor-notícia de seleção

tempo, subdividido no grupo atualidade, apesar de falarem algo que já estava

na mídia, foi buscado outro ângulo de abordagem do fato. A reportagem

“Patrimônio ameaçado. A reforma do Mineirão põe em risco o tropeirão” (piauí,

56, 2011), no qual o jornalista usa o gancho da reforma dos estádios da Copa

do Mundo, para falar sobre um prato típico de um dos estádios que serão

reformados, demonstra a apropriação de um assunto maior, Copa do Mundo,

43 “Missão pedagógica. A produção da entrevista de Marisa Lajolo sobre Monteiro Lobato”. Edição, 54, março de 2011.

Page 35: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

35

que está na mídia, para falar de algo específico e pitoresco, tropeirão do

Mineirão.

Outra característica da seção é a presença de indivíduos que viabilizam

o discurso do jornalista. Eles são especialistas, ou são o tema da palestra ou

do evento. Para Traquina isso se chama notoriedade. 22 reportagens

apresentaram esse fenômeno. Essa característica aparece para validar a

presença daquela reportagem na revista, uma vez que esse é um dos pedidos

de João Moreira Salles, transmitidos aos jornalistas através da carta. “Sempre

histórias singulares, com sujeitos claros”44.

O valor-notícia de seleção, infração, “violação, ou transgressão das

regras” (Traquina 2005, p. 85) aparece somente duas vezes no período

analisado. Nas reportagens “Sanguinários arriba! De sombrero, bota e pistola,

somos nosostros, mi compa” (piauí, 57, 2011), na qual o jornalista conta como

os cantores de “narcorrido”, atividade considerada ilegal no México,

sobrevivem. E em outra reportagem “Em defesa do esporão. Um

conservacionista a favor da briga de galo” (piauí, 54, 2011), em que o

personagem defende a briga de galo, esporte considerado ilegal no Brasil.

O valor notícia proximidade não deteve atenção da pesquisa, uma vez

que a revista é de circulação nacional. Embora valha ressaltar aqui que mesmo

trabalhando com colaboradores, que acredita-se estar espalhado por várias

cidades, as reportagens em sua maioria se passam nas cidades de São Paulo

e Rio de Janeiro.

Abaixo podemos observar dois gráficos. O primeiro mostra os valores-

notícias de seleção na esquina no período de janeiro a junho de 2011. Já no

segundo gráfico, podemos observar que mesmo trabalhando com

colaboradores, que não necessariamente precisem estar todos os dias na sede

da revista, no rio de Janeiro, foi constatado que a maioria das reportagens se

passou nas duas maiores economias do país, São Paulo e Rio de Janeiro.

44 O que é uma esquina. Ver anexo 08.

Page 36: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

36

Figura 01 – Valores-notícia de seleção na seção esquina

02468

1012141618202224262830323436384042

Equilíbrio

Efemeridade

Atualidade

Notoriedade

Infração

Figura 02 – Locais que se passaram as reportagens

0123456789

10111213141516 Brasília

Minas GeraisParaíbaRio de JaneiroPorto AlegreSão PauloNatalÍndiaPaquistãoReino UnidoMéxicoEstados UnidosHimalaia

4.2 Valores-notícias de construção na esquina

Page 37: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

37

Após a mensuração dos valores-notícias de seleção na esquina, a

pesquisa se deteve em observar nesse momento os valores-notícias de

construção dos mesmos 42 textos já analisados anteriormente. Entende-se

valor notícia de construção (Wolf 1985) como uma fase seguinte do processo.

Depois do fato já ter chamado a atenção do jornalista em detrimento ao outro,

pelos aspectos já mencionados acima, os valores-notícias de construção agem

com uma linha-guia para a construção da matéria, realçando ou omitindo

aspectos da notícia.

Nelson Traquina (2005) cita cinco características desse valor-notícia. O

primeiro é a simplificação , que é quando o jornalista busca a fácil

compreensão da notícia a fim de reduzir a natureza polissêmica do fato; a

amplificação da notícia, ou seja, quanto mais à notícia é de alcance de um

maior numero de pessoas, mais possibilidades tem a notícia de ser notada;

a relevância , que é a busca do jornalista em demonstrar que a

reportagem é importante para o público;

a dramatização da notícia, ou seja, reforçar a natureza do conflito, o

lado emocional da notícia.

e por último, a personalização . Esse valor-notícia se refere à

singularidade da notícia. Para Besnman e Lilienfield (apud Traquina 2005), a

personalização permite que outras pessoas que não estejam envolvidas no

acontecimento possam entender o que diz a reportagem. “Inúmeros estudos

sobre o discurso jornalístico apontam para a importância da personalização

como estratégia para agarrar o leitor” (Traquina, 2005, p. 92).

Os resultados das análises dos valores-notícias de construção atestam

a hipótese de que a seção é muito editada uma vez que todos os 42 textos

apresentaram simplificação como característica mais marcante.

Quando Traquina diz que o jornalista busca a simplificação da notícia

para ser compreendido mais facilmente pelo público, podemos notar que em

todas as reportagens da esquina existe pelo menos um paragrafo, que aqui

chamamos de parágrafo enciclopédico sobre o fato. Na reportagem, “Movidos a

vapor. Eles são gente como a gente, mas pendem para o século XIX” (piauí,

52, 2011), a reportagem, que até então não era assinada na versão impressa,

retrata um encontro de pessoas que se vestem como se vivessem no século

Page 38: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

38

XIX. Nos dois primeiros parágrafos da reportagem o repórter detalha onde foi o

encontro, como os participantes estavam vestidos e desde quando eles se

reúnem. São narizes de cera45, ou seja, é uma forma mais leve, e personalista

do jornalista introduzir o fato ao leitor. Se excluíssemos essa parte, ainda sim o

leitor saberia do que se tratava o assunto. Em outro momento da reportagem,

podemos identificar o parágrafo enciclopédico, que para Traquina é chamado

de simplificação.

O termo steampunk surgiu na década de 1980, quando os escritores americanos Bruce Sterling e William Gibson lançaram livros de ficção científica ambientados no século XIX. Durante uma entrevista, quando lhe perguntaram se havia criado um novo subgênero literário, Streling concordou e, de brincadeira, juntou as palavras steam (“vapor”) e punk (referência, no caso, cyberpunk, uma vertente nostálgica da ficção científica) – era assim que definia sua escrita. (Revista piauí, 52, p. 10)

Nesse paragrafo podemos notar que o repórter traz o conceito de origem

do termo steampunk para situar o leitor do que ele está falando. E continua, no

parágrafo seguinte explicando como o steampunk surgiu no Brasil:

A coisa pegou rápido nos Estados Unidos e na Europa. Já no Brasil, a estética Steampunk só chegou em 2007, quando o carioca Bruno Accioly, de 39 anos, criou o steampunk.com.br. o primeiro site em português sobre o tema. ‘Steampunk é, acima de tudo, literatura’ (id).

Esse recurso, usado pelo jornalista, é para deixar claro o assunto e

eliminar qualquer tipo de ambiguidade sobre o termo Steampunk e quando ele

surgiu.

Na reportagem “Posteridade. Futuro da nação começa mal, mas acaba

entrando nos trilhos” (piauí, 52, 2011), assinada pelo repórter Ricardo Cabral,

podemos notar a apropriação dos mesmo recursos utilizados pelo jornalista

Bruno Moreschi, autor da reportagem anterior.

Na reportagem de Cabral, primeiro há uma apresentação do que é o

fato: Uma foto de formatura, no Aterro do Flamengo. Nos dois parágrafos

seguintes o repórter tenta situar o leitor da bagunça que os formandos fazem

45 Parágrafo introdutório em um texto que retarda a abordagem do assunto enfocado. É o oposto do lead.

Page 39: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

39

para serem fotografados e as artimanhas que o fotografo, Olivan Barros,

utilizava para prender a atenção dos fotografados. Depois de trazer o

personagem da reportagem à tona, o repórter trata de traçar um histórico da

vida do fotografo e da sua empresa.

Olivan barros está no ramo há quase três décadas. Aos quinze anos, conseguiu um emprego como assistente de laboratório e hoje, aos 41, dirige a Olivan fotografias. De notória excelência em assuntos de formatura (bailes, colações, festas e cerimônias em geral), ocasionalmente a empresa faz também casamentos e aniversários. O pacote acadêmico, incluindo revelação e álbum, pode chegar a 500 reais por formando (Revista piauí, 52, p. 11).

Trazemos a tona esses dois exemplos distintos, porém semelhantes,

para demonstrar que a seção, por abranger assuntos pitorescos que

provavelmente não sejam de conhecimento de uma maioria dos leitores do

periódico, como é tirada a foto de uma formatura, ou a reunião de Steampunk,

o jornalista procura a simplificação da notícia no sentido de elucidar o

acontecido ao leitor. Ou seja, eliminar o caráter polissêmico que o fato poderia

sugerir em parágrafos aqui chamados de parágrafos enciclopédicos. Apesar

de serem dois textos assinados por repórteres diferentes, podemos notar que

ambos utilizam desse recurso, o que nos leva a supor que essa é uma

característica trabalhada durante a edição.

O valor-notícia seguinte, chamado de personalização foi observado em

mais da metade dos 42 textos da seção. Ao todo, 26 textos apresentaram

personagens que validaram a notícia estar ali. Como nessa reportagem “As

Esganadas vem aí. Jô Soares fala de seu novo livro na Academia” (piauí, 57,

2011), em que o repórter nos mostra um jantar em homenagem ao humorista,

apresentador e escritor, Jô Soares.

Ou em outra reportagem “The voices. Peripécias do avatar vocal de Tom

Cruise, Al Pacino e Richard Gere” (piauí, 57, 2011), em que nos é mostrado a

como é feita uma dublagem de filme.

Ambas as reportagens mostram um acontecimento maior, o jantar na

Academia Brasileira de Letras e como é a dublagem de filmes, mas se

apropriam de personagens para validar a sua reportagem. Observando esse

valor-notícia, podemos constatar que alguns repórteres se apropriam da carta

Page 40: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

40

de João Moreira Salles, uma vez que ele é taxativo em dizer como é o

funcionamento de uma esquina. “Nunca temas gerais – a educação no Brasil, a

crise odontológica nacional. Sempre histórias singulares com sujeito claro. Um

provador de café, um entregador de cartas”46.

Dramatização é outro valor-notícia de construção para Traquina. Esse

valor-notícia foi encontrado em 10 dos 42 textos analisados. “E o chiquê, que

fim levou. No Jockey Club do Rio, agora vale até barriga de fora” (piauí, 52,

2011), no qual ex-presidentes do clube discutem com o atual sobre a política

de gestão do Jockey. E “Missão pedagógica. A produção da entrevista de

Marisa Lajolo sobre Monteiro Lobato” (piauí, 54, 2011), no qual o repórter narra

a tensão entre entrevistado e produtora do programa acerca de uma entrevista

sobre Monteiro Lobato.

O valor-notícia amplificação foi descartado na análise uma vez que não

é o objetivo da seção falar sobre grandes acontecimentos, e na leitura não foi

observado nenhum grande tema de abrangência nacional. Quanto à relevância,

por ser um valor-notícia muito subjetivo, porque o que pode ser relevante para

um grupo particular de leitores, pode não ser para outro, também foi

descartado na análise.

Figura 03 - Valores-notícia de construção na seção esquina

02468

1012141618202224262830323436384042 Simplificação

Dramatização

Personalização

46 O que é uma esquina. Ver anexo 08.

Page 41: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

41

Após a leitura dos 42 textos desse primeiro semestre de 2011 da revista,

podemos observar alguns aspectos que permeiam todo o campo de trabalho

do jornalista que escreve para seção. Desde a escolha dos temas, como ficou

comprovado no período analisado, a busca pela novidade, o pitoresco, parece

demonstrar um dos caráteres de aceitabilidade perante o editor para ter sua

matéria publicada na seção. E uma vez aceita, o jornalista parece se

condicionar a construir a matéria de uma forma sempre muito parecida. Um

narrador que a todo instante está comentando sobre o acontecimento, o uso do

humor para eventualmente contextualizar a dramaticidade do fato, e por preferir

falar de algo novo para muitos que leem a revista, partes do texto reservados a

explicar, por muitas vezes trazendo fatos históricos, para situar o leitor a cerca

do assunto.

Como são vários os jornalistas que escrevem para a seção, cada um

com os seus “óculos especiais a partir dos quais veem certas coisas e não

outras, e veem de certa maneira as coisas que veem. Eles operam uma

seleção e uma construção do que é selecionado" (Bordieu, 1996, p. 25), a

seção esquina, parece contradizer Bourdieu já que, uma vez bem treinados e

as condições para se escrever na seção encontradas na carta de João Moreira

Salles assimiladas, os óculos singulares, de cada jornalista, passam a ser os

óculos do coletivo, da revista piauí, representado na figura do editor da seção

esquina.

5. A ROTINA PRODUTIVA NO JORNALISMO

No processo de produção das notícias, o estabelecimento de uma rotina

produtiva é buscado no meio jornalístico como uma forma de o jornalista se

adequar às características do veículo para o qual trabalha. Para Gritti, (apud

Medina, 1988), inconscientemente o jornalista aplica determinados padrões

que não são a priori procurados quando ele está escrevendo uma reportagem a

fim de se adequar às pressões que os jornalistas muitas vezes se submetem,

como a questão dos fatos e os prazos.

Para Traquina (2005), o jornalista vê isso como algo normal. Segundo o

autor, a adequação do jornalista a rotina é visto como profissionalismo. “O

Page 42: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

42

conhecimento de formas rotineiras de processar diferentes tipos de ‘estórias’

noticiosas permite aos repórteres trabalhar com maior eficácia” (Traquina,

2005, p.193).

Portanto, além dos valores notícias e a linha editorial, o que também

pode interferir na produção dos jornalistas é o tipo de rotina produtiva que o

veículo ou a seção pela qual ele atualmente trabalha o submetem, como

evidencia Stella Martini (apud Martins, 2003).

Cada meio e cada seção tem uma maneira de ordenar o trabalho e um acordo sobre o que supostamente o jornalista deve fazer e se espera que ele faça, assim como critérios que indicam o que é publicável, noticiável, e que formam parta de qualquer organização dos meios de comunicação (Martini apud Martins, 2003, pg. 6).

Para se adequar às linhas editorias do veículo ao qual trabalha, o

jornalista passa a ser socializado dentro da redação. Ele entende as

especificidades do veículo e passa a trabalhar de acordo com elas, como o

caso do antigo editor da seção esquina, Roberto Kaz. O repórter, que assim

como o atual editor, Bernardo Esteves, editava a seção esquina, trabalhou

durante três anos na revista. Após sair da piauí, trabalhou na Folha de S.Paulo

e atualmente é repórter da revista semanal do jornal O Globo. Para ele, o

jornalista tem que se adequar as características de cada veículo.47

Para Warren Breed (apud Traquina, 2005), o repórter deixa a

experiência rotineira que passou em outros veículos e passa a assimilar a

rotina para qual está atualmente trabalhando.

Basicamente, a aprendizagem da política editorial é um processo através do qual o novato descobre e interioriza os direitos e as obrigações do seu estatuto, bem como as suas normas e valores. Aprende a antever aquilo que se espera dele, a fim de obter recompensas e evitar penalidades. (Traquina, apud Breed, 2005, p. 153).

Com um deadline mais curto em relação à revista piauí, Roberto Kaz,

mesmo em horário de almoço, realizou uma entrevista com o sambista Arlindo

47 Entrevista concedida ao pesquisador na redação do jornal O Globo no dia 9 de outubro de 2012.

Page 43: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

43

Cruz enquanto conversava com o pesquisador48. Com uma semana para

entregar pronta suas matérias, diferentemente da rotina produtiva da piauí,

que, de acordo com Bernardo Esteves, as grandes reportagens levam em

média de dois a quatro meses para ficarem prontas, pode se perceber que o

frenesi do ritmo da redação de um grande jornal de circulação diária foi

assimilado pelo antigo editor da esquina, apagando assim a antiga rotina, mais

“ociosa”, segundo Kaz, e interiorizando uma nova, comprovando assim a

socialização do repórter em uma nova rotina produtiva.

5.1 Etnografia para entender a rotina produtiva na seção esquina

As percepções iniciais de assimilação de uma nova rotina produtiva por

Roberto Kaz foram evidenciadas durante as entrevistas realizadas no dia 9 de

outubro de 2012, na redação do jornal O Globo, local onde o antigo editor da

seção esquina trabalha atualmente.

A partir dessas considerações, o objetivo proposto pela pesquisa se

encaixou mais adequadamente nos métodos da vertente etnográfica, ou estudo

de povos e cultura49. Para Geertz (apud Benneti e Lago, 2008), a etnografia é

uma descrição densa de uma determinada cultura, feito a partir de um trabalho

de campo, cuja observação participante tem como principal característica.

Já Bronosky (2010), usa uma definição de etnografia que se adequa

mais ao problema proposto pela pesquisa. Segundo ele, “a etnografia trata-se

de um processo/método de captura, descrição e análise de dados provenientes

de observações qualitativas realizadas em agrupamentos específicos” (p. 125).

Apesar de se tratar de uma disciplina dos estudos antropológicos, a

sociologia também se utiliza dos procedimentos etnográficos. “Muitos

sociólogos utilizam a observação participante, entrevistas em profundidade ou

não estruturadas e análise documental no decurso das suas pesquisas”

(Burgess apud Bronosky, 2010, p. 125).

48 (Id) 49 Dicionário Eletrônico Houaiss: Registro descritivo da cultura material de um determinado povo

Page 44: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

44

Na verdade, além da sociologia, o jornalismo desde o início do século

XX, quando a Escola de Chicago analisou o meio urbano e o relacionou com os

estudos da mídia, tem se apropriado dessa linha de pesquisa em seus estudos,

especialmente pelo sociólogo e jornalista Robert Park. Para se ter uma ideia,

estudos de newsmaking são fundamentadas pela linha de pesquisa

etnográfica, como foi identificado por Schlesinger:

A abordagem etnográfica, ao contrário de outras abordagens centradas no produto de mass media, permite a observação, teoricamente orientada, das práticas sociais efetivas que dão lugar à produção cultural. (apud Wolf, 1995, p. 167).

Portanto, a etnografia é uma linha de pesquisa ou método de captura de

análise de dados derivadas de observações participantes e qualitativas em

determinados grupos. Segundo Bronosky (2010), “no âmbito do jornalismo,

essa perspectiva tem contribuído significativamente nos debates sobre os

processos de produção noticiosa, no sentido de compreender o que é notícia e

como elas são elaboradas” (p. 125).

Em um ensaio sobre sociologia e jornalismo, Gaye Tuchman (apud

Bronosky, 2010), discute a objetividade na produção jornalística na tentativa

dos jornalistas se manterem neutros durante o processo a fim de evitarem

represálias. Em sua pesquisa, a autora também se utiliza de técnicas

etnográficas.

Outra pesquisa que se apropria da etnografia para falar do ambiente de

trabalho dos jornalistas é a de Travancas (2011). No trabalho, a autora reflete

sobre a formação do jornalista no ambiente de redação para a construção de

sua identidade.

E por fim, outra pesquisa, bem próxima a que se realiza aqui, é de Vizeu

(apud Bronosky, 2010). O pesquisador dedicou-se a pensar sobre as rotinas

produtivas internas de um telejornal como fatores decisivos do que é ou não

notícia.

Esse tipo de abordagem – etnográfica – é importante, pois segundo

Felipe Pena (2005), “a ‘tribo’ dos jornalistas tem efetivamente seus próprios

costumes e ritos” (p. 152).

Page 45: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

45

Assim, os estudos propostos pela pesquisa, que intenta investigar a

rotina produtiva da seção esquina, que engloba tanto a função do editor,

quanto a do repórter, se apropriam não da sua totalidade dos conceitos

etnográficos, mas sim de alguns aspectos, como a observação participante na

redação da revista, a entrevista semiestruturada em profundidade com os

editores Bernardo Esteves e Roberto Kaz, e a entrevista por email com alguns

dos autores das reportagens da seção esquina.

6. A REDAÇÃO: PIAUÍ, UMA REVISTA DA RUA 50

O acesso à redação da revista foi relativamente tranquilo. Bernardo

Esteves, editor da seção esquina, foi o interlocutor do pesquisador na tentativa

de convencer João Moreira Salles, publisher, e Fernando Barros e Silva, diretor

de redação, a permitirem meu acesso, se mostrou bastante atencioso em

atender os meu pedidos. No geral, apenas uma solicitação foi negada durante

a pesquisa: quando, na tentativa de obter os textos escritos pelos

colaboradores, antes de passarem pelo processo de edição, Bernardo Esteves

disse que teria de perguntar a Fernando Barros e Silva para que ele

autorizasse ou não a divulgação dessas versões. Como previsto, a resposta foi

negativa. “Como eu tinha antecipado, ele não aceitou que te mandássemos

versões das esquina anteriores à publicação ou que autorizássemos os

colaboradores a fazê-los”. 51

Após mais algumas conversas por email a fim de que fosse autorizado o

acesso à redação, algo que se fosse negado teria alterado significativamente a

pesquisa, a visita foi aprovada desde que não coincidisse com o fechamento da

revista que acontece sempre na última semana de cada mês. Segundo ele, “o

fechamento da revista é um período muito atribulado para todos na redação”52.

Portanto, a visita ficou agendada para o dia 8 de outubro às 10h, no Rio

de Janeiro, sede do departamento de jornalismo do periódico53. Como

50 Tendo em vista a questão dos métodos etnográficos e a participação do pesquisador no entorno da pesquisa, optou-se pelo uso da primeira pessoa nessa seção do trabalho. 51 Em conversa com o pesquisador por email em 22/08/2012. Ver anexo 13. 52 Em conversa com o pesquisador por email em 23/08/2012. Ver anexo 14. 53 O departamento comercial da revista fica localizado em São Paulo.

Page 46: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

46

mencionado anteriormente pelo editor, durante a presença do pesquisador na

revista não seria autorizado fotos, e apenas o jornalista Renato Terra, e a

secretária de redação Raquel Freire Zangrandi estavam presente no dia. O

restante, segundo Esteves, estava em campo fazendo reportagens, ou

trabalhando em casa, de acordo com ele, algo típico dos repórteres do

periódico.

A redação da piauí ocupa o quarto andar de um prédio comercial,

localizado na Rua do Russel. A estrutura física da redação é pequena e escura.

Logo ao sair do elevador, à esquerda, fica a recepcionista em uma pequena

sala. Passando, fica a sala dos jornalistas. A redação conta com seis

repórteres fixos que ficam dispostos de acordo com a figura abaixo:

Figura 04 – Cena produtiva: Sala dos jornalistas

Page 47: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

47

À direita de quem entra na sala dos jornalistas, em uma pequena sala

que parece ter sido adaptada a acomodar os profissionais, trabalham a diretora

de arte, que frequenta a redação somente nos dias próximos a data de

fechamento da revista; e a secretária de redação, Raquel Freire Zangrandi, que

diferentemente dos jornalistas, cumpre horário diário das 10h às 19h. Raquel

cuida do trânsito das matérias, dos prazos e do cronograma de trabalho, além

de entrar em contato com autores, tradutores e editoras para que autorizem a

publicação dos textos. Além disso, eventualmente escreve reportagens para a

revista.

Figura 05 – Cena produtiva: Sala da secretária de r edação e da diretora de

arte

Ao passar por essa espécie de antessala, chegamos à sala dos editores.

Dispostos um de frente para o outro, formando um triângulo entre as mesas, o

que nos supõem uma forte comunicação entre eles, estão João Moreira Salles,

publisher da revista, Cláudia Antunes, editora da Companhia das Letras, e

Fernando Barros e Silva, diretor de redação da piauí.

Page 48: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

48

Figura 06 – Cena produtiva: Sala dos editores

No espaço físico da redação há também uma sala de reunião onde foi

realizada a entrevista com Bernardo Esteves, e uma ampla cozinha industrial,

maior até que a sala dos editores e a da secretária de redação, onde são feitas

as receitas publicadas no blog Questões de Forno e Fogão.

Figura 07 – Sala de reunião

Page 49: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

49

Figura 08 – Cozinha da revista

Diferentemente do ambiente de redação dos jornais, como evidenciou

Bronosky (2010), em que a competividade pelo furo jornalístico e o clima de

tensão imperam, segundo Roberto Kaz, a redação da revista “é um lugar muito

saudável e silencioso”54. Carol Pires, 26 anos, repórter de piauí, menciona

alguns aspectos do agradável ambiente de redação da revista55:

A equipe é pequena, é quase impossível não ter um clima de amizade entre todos. Acho que éramos nada mais que sete repórteres e, como cada um tem sua história, não tem a competição por furo e coberturas especiais que costuma haver nas redações de jornal. É comum que cada um tenha uma área de interesse também – o Bernardo com ciência, o Renato Terra com humor, por exemplo.

Durante o período visitado na redação, pode-se observar o ambiente

silencioso (o telefone tocou duas vezes) e a entrevista não foi interrompida em

nenhum momento, diferentemente do que aconteceu com Roberto Kaz, quando

por diversas vezes a entrevista foi interrompida para o repórter da revista

semanal de O Globo, conversar por telefone com fontes.

54 Entrevista concedida ao pesquisador na redação do jornal O Globo, no dia 9 de outubro de 2012. 55 Em resposta ao questionário enviado aos repórteres de piauí por email. Ver anexo 15.

Page 50: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

50

Há de se levar em conta também as datas escolhidas pelo editor da

piauí, logo após o fechamento da revista, que presume-se sejam os mais

calmos de todo o mês. Mesmo assim, foi possível observar pelas entrevistas

feitas com os jornalistas do periódico, e a observação do ambiente de redação,

que o clima da piauí, até por ser de periodicidade mensal, é lenta, silenciosa e

vazia.

Figura 09 – Cena produtiva: Redação da revista

Page 51: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

51

6.1 O difícil caminho até a publicação

Um assunto que possa render uma esquina geralmente é pensado de

fora da redação. Portanto, não há uma reunião de pauta para definir os

assuntos que serão escritos pelos repórteres da seção. Nesse aspecto, como

evidenciado anteriormente, quando foram analisados os valores-notícias de

seleção, o autor fica livre para escolher qualquer tema que ele ache que renda

uma esquina e depois a envia para o editor, desde que se enquadre ao perfil

da seção, resumido por Bernardo Esteves, sendo:

histórias corriqueiras, banais, e que aparentemente, em um primeiro momento, você possa não enxergar notícia, mas há um jeito de chegar nela, tem um jeito de contar ela que você pode mostrar a língua pequena, uma estranheza.

O contato de um colaborador, de fora da redação, é sempre por email.

Quando o neófito tenta um primeiro contato com o editor da seção, ele

geralmente fala que foi indicado por outra pessoa que já escreveu para a

seção, pois acha que a pauta que tem em mãos pode vir a ser uma esquina.

Para a pauta, ou os textos já prontos, enviados para Bernardo Esteves,

afim de serem selecionados para a publicação seguinte, é preciso passar pelo

crivo da reunião de pauta que acontece na primeira semana de cada mês.

Nela, Esteves leva de oito a nove textos ou pautas, que para ele são as

melhores, e a equipe de piauí conversa sobre elas, entre outras coisas da

revista durante a reunião. Nessa fase, já foi possível notar o primeiro filtro para

a publicação de uma esquina. Segundo ele, depois da reunião de pauta,

já saio dali com uma lista de esquina reprovadas ou aprovadas, que ao longo do mês, em conversas paralelas com o Fernando, são levadas outras sugestões, e a aprovação final é dele. E obviamente, as que me mais parecem interessantes eu vendo de uma maneira mais palpitante para ele. As ideias que eu não acredito muito já aviso para o Fernando. Essas são as que eu não fico mais à vontade para descartar logo de cara.

Portanto, logo na primeira fase, que é uma pré-seleção das esquina que

serão publicadas, já é possível notar a figura do editor como um gatekeeper,

quando ele apresenta as esquina que mais lhe agradam “de uma maneira mais

Page 52: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

52

palpitante” ao chefe de redação Fernando Barros e Silva. Apesar da palavra

final ser do chefe de redação, Bernardo Esteves, na posição de editor da seção

esquina, obviamente tem sua palavra levada em conta na decisão do que é ou

não publicado na próxima edição. Se ele apresenta as esquina que mais lhe

agradam de um jeito mais palpitante, o chefe de redação irá levar em conta

quando acontecer a decisão final sobre as esquina que serão publicadas, o que

ocorre no decorrer do mês.

A segunda semana na redação de piauí é para conversas entre

Bernardo Esteves e Fernando Barros e Silva para definir, entre oito ou nove

textos pré-selecionados na reunião de pauta quais serão publicadas na

próxima edição. Nessa segunda semana, os textos da esquina passam por

mais um filtro no qual é buscado um equilíbrio temático, geográfico e uma

equiparidade entre repórteres e colaboradores. Logo, um texto da esquina

pode cair porque na mesma edição há muitos textos de colaboradores ou a

cidade já está presente em outra matéria, ou mesmo o tema é parecido com

outra esquina e há então uma escolha entre elas. Nessa segunda semana as

sete reportagens que serão publicadas já estão praticamente definidas.

Durante esse tempo, enquanto são pensadas as esquina, Bernardo

Esteves, que também é repórter de piauí56, realiza outras tarefas paralelas,

como postagens em seu blog, Questões de Ciência, no site da revista, e outras

reportagens que segundo ele “demandam meses de apuração”.

Normalmente o repórter tem vinte dias entre a reunião de pauta e o

deadline para enviar seu texto pronto para o editor. E esse, por sua vez, leva

de cinco a sete dias para editar os sete textos que serão publicados na próxima

edição.

As atividades paralelas de Bernardo só são interrompidas na terceira

semana do mês, período que ocorre a edição dos textos que os colaboradores

e repórteres enviam para ele. Nessa fase, todas as atenções do editor se

voltam ao processo de edição dos textos da seção.

Como já foi dito anteriormente, as edições são feitas geralmente na

terceira semana de cada mês e eventualmente sobra alguma esquina para ser

editada na quarta semana. Durante esse período, onde ele diz parar tudo e se 56 Cartão de visitas do repórter Bernardo Esteves. Ver anexo 07.

Page 53: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

53

concentra em editar esquina, geralmente são trocados cinco email entre autor e

editor. Isso ocorre porque segundo Roberto Kaz “os textos já vem prontos e é

só organizá-los e enquadrá-los ao espirito da seção”, o que para Vanessa

Barbara “são sempre temas prosaicos escritos com pompa e garbo”57.

Bernardo Esteves credita a pouca troca de email entre autor e editor ao

“olho treinado para a esquina (por parte dos colaboradores). Nós os chamamos

aqui dentro da redação de esquineiros”. Quando o repórter absorve essas

características do olhar treinado, ou seja, ficar atento aos detalhes, os trejeitos

do personagem, ao pitoresco, descrever o assunto relatado com certo tom

humorístico, o editor diz que o texto “já vem esquinizado”.

Portanto, o editor sugere que quem participa da esquina já tem

interiorizado a lógica produtiva da seção que, como consequência, o repórter

teria menos alterações no seu texto e teria mais pautas escolhidas para serem

publicadas. Segundo Roberto Kaz, além do talento do jornalista para o estilo de

texto narrativo, o repórter com o passar do tempo “domina o produto e passa a

entender para onde está escrevendo”.

Ainda na terceira semana, e eventualmente até a terça-feira da quarta

semana, que é o deadline final para as esquina serem editadas, começa o

processo de pós-edição. Nessa fase, na quarta semana do mês, as esquina

passam por várias etapas que chamamos aqui de filtros de redação.

Depois do texto do autor ser editado por Bernardo Esteves, ele é

encaminhado para o chefe de redação, Fernando Barros e Silva, que

encaminha para a secretária de redação, Raquel Freire Zangrandi com as

alterações no texto que ele acha necessário. Ela, por sua vez, repassa para a

revisora, uma profissional de fora da redação, que deverá encontrar eventuais

erros de português. Depois de o texto ser revisado, ela devolve para Raquel

que encaminha até a checadora que verifica grafias de nomes próprios, de

instituição, números, fatos, e se há pontos de discordância com a informação

do repórter, ela entra em contato com o jornalista para eventuais

considerações.

Passada essa etapa, chamada de check the fact, a reportagem é

devolvida para Raquel que faz uma pré-impressão para o editor da esquina 57 Em resposta ao questionário enviado aos colaboradores por email. Ver anexo 20.

Page 54: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

54

realizar a última leitura e depois, paralelamente editor e chefe de redação,

conversam sobre ordenamentos de reportagens. Qual reportagem inicia e qual

fecha. Nessa fase, também são pensadas as chamadas para o índice e a

última leitura é feito pelo chefe de redação e eventualmente pelo publisher. A

decisão final sobre a publicação ou não da reportagem cabe a eles.

Após ter passado por todo esse processo, que, para Roberto Kaz é “um

caminho saudável, pois é algo raro na imprensa brasileira”, Bernardo Esteves

envia os textos para o ilustrador Andrés Sandoval. Por fim, Sandoval ilustra as

sete esquina, publicadas naquela edição, e que são devolvidas para Bernardo

Esteves, que finalmente repassa para Raquel enviar para a gráfica.

Figura 10 – Diagrama de circulação das esquina dentro da redação

Page 55: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

55

Segundo Bernardo Esteves, “esquina caem. Elas podem ser derrubadas

desde a pauta até a checagem final”. Portanto, apesar de ser uma seção com

textos curtos que abordam assuntos que aparentam ter certa inutilidade, ou

baixo valor-notícia para quem está lendo, o rigoroso caminho que os textos dos

repórteres são submetidos demonstra que a forma é tão importante quanto o

conteúdo.

6.2 Um canteiro de obras: não sobra pedra sobre ped ra

A primeira leitura de um texto de esquina por Bernardo Esteves é feito

no papel. É o processo que ele chama de “canteiro de obras”. Nessa fase,

ocorrem as maiores intervenções no texto. É comum os parágrafos serem

tirados da ordem, conforme o original, de acordo com o entendimento do editor.

O processo, para alguns jornalistas, tenciona com a questão da autoria

em um texto compreendido como esteticamente trabalhado e de cunho autoral.

A colaboradora Vanessa Barbara atribui isso ao “estado de espírito do editor”58.

Segundo ela, “quando o João Moreira Salles era o editor as esquina eram mais

preservadas”.

Na reportagem Onde os fracos não tem vez (piauí, 67, 2012), de Paulo

Henrique Martins, podemos observar a forte edição que os textos dos autores

são submetidos a fim de ficarem com o formato característico da seção. Na

versão original encontramos o seguinte parágrafo de abertura:

Era um domingo de inverno em Perton, Staffordshire, uma localidade a 20 minutos de Wolverhampton, na Inglaterra. Uma fina camada de gelo cobria alguns pontos dos lagos que faziam parte do trajeto da Tolha Guy Rache (corrida dos durões), considerada por muitos (e autoproclamada) a corrida mais difícil do mundo. O termômetro marcava perto de 1ºC naquela manhã de janeiro quando o canhão disparou a tiro de largada, liberando uma turba de 3,4 mil pessoas de várias idades, vindas de todos os lugares do mundo, algumas fantasiadas. Havia uma boa porcentagem de mulheres e talvez uma dezena de homens usando saias de balé. Desse total presente na largada – pelo menos um terço não consegue terminar o percurso de cerca de 13 km.

58 Em conversa com o pesquisador por email em 01/10/2012.Ver anexo 11.

Page 56: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

56

Já na versão editada, o primeiro parágrafo é localizado somente no

sétimo parágrafo da versão original. O texto publicado na edição de abril de

2012 começa assim:

“Aceito que, caso eu morra durante a prova, a culpa terá sido única e exclusivamente minha”. Com essas palavras de estímulo, concluía se o termo de compromisso assinado por cada participante da Tough Guy Challenge, a Corrida dos Durões, realizada numa fazenda do município de Perton, no Centro Oeste da Inglaterra. Os atletas receberam um folheto que listava as possíveis consequências da competição: hipotermia, hipertemia, desidratação, cortes profundos, sangramentos e ossos quebrados. A vacina contra tétano era um pré-requisito para a inscrição. A contratação de um seguro saúde não compulsória era veemente recomendada.

Nesse primeiro exemplo exposto pela pesquisa, podemos notar que a

alteração proposta pelo editor da esquina acentuou a tensão narrativa da

reportagem. A ironia (“Com essas palavras de estímulo”), uma das

características da seção, também é presente na versão impressa desde a

abertura, o que não acontece na versão original. Também é possível notar que

as várias cidades que o autor cita na abertura do seu texto (“Perton,

Staffordshire, uma localidade a 20 minutos de Wolverhampton”), foram

substituídas por “município de Perton, no Centro Oeste da Inglaterra”.

Portanto, a edição de Bernardo Esteves nesse parágrafo inicial da

reportagem, procura evidenciar as características da seção, não acrescentando

nada do que não está no texto original, inclusive com a alteração do título da

reportagem.

Na versão original, encontramos o seguinte título: “Só para machões.

Lama, hipotermia e choque elétrico na corrida mais difícil do mundo”. Enquanto

na versão impressa lemos: “Onde os fracos não tem vez. Lama, hipotermia e

choque elétrico na corrida mais difícil do mundo”. Essa analogia com o título do

filme dos irmãos Cohen, - e tangencialmente com a obra que origina o filme,

“onde os velhos não tem vez”, de Cormac McCarthy -, evidencia um sentimento

bem característico do periódico e citado por Roberto Kaz durante a entrevista.

“Esse é o grande ponto da piauí, a diferença para qualquer outro produto

jornalístico. piauí tem fé no seu leitor”. O seja, o texto é previsto de uma forma

Page 57: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

57

a conter referências sutis que serão captadas pelo leitor, fazendo-a para dar

fruição ao texto.

Portanto, essa analogia com o filme só é possível porque o editor

acredita que a maioria das pessoas que lê a revista tem apreço por cultura e

logo assimilarão a referência.

Outro texto que se pode observar a “fé no leitor” é a reportagem “O

verdadeiro rei dos animais. Melancolia e ginástica na academia dos galos-de-

briga baianos” (piauí, 02, 2006), do jornalista Roberto Kaz, e antigo editor da

seção. Em um determinado momento da versão do repórter, o “Clube do Galo”,

vira “Madison Square Garden, a Meca do boxe americano”. Na versão

publicada encontramos somente a expressão “Madison Square Garden”, o

editor dessa reportagem, João Moreira Salles, retira essa informação “a Meca

do boxe americano” possivelmente por acreditar que o seu leitor sabe que o

local é a sede dos maiores encontros do esporte. De alguma forma, pode se

inferir que a edição entende que conservar o oposto seria menosprezar o leitor.

Em outra reportagem, “Tudo pela monga própria. Um cineasta itinerante

quer um circo para chamar de seu”, (piauí, 66, 2012), da colaboradora Vanessa

Bárbara, encontramos mais duas alterações características do periódico: a

adequação da ordem de tamanho de caracteres e o uso das expressões em

língua estrangeira.

Quanto ao uso de estrangeirismos nos textos, esse é um recurso

utilizado em todos os textos lidos pela pesquisa. Mas a alteração mais incisiva

ocorre no texto citado acima. Enquanto a versão escrita pela autora, antes de

passar pela edição, elencava algumas características que a personagem

central, Cris Siqueira, possuía (“não era exatamente uma moça delicada, loira e

magra”), fora substituída pela expressão francesa “physique du rôle”, segundo

roberto Kaz, a pedido do então chefe de redação Mario Sergio Conti, conhecido

por ter apreço pela cultura francesa.

Para a jornalista, os editores usam esses termos para sofisticar a

reportagem. “Acho que eles colocam o texto para parecer mais sério, irônico,

Page 58: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

58

mas às vezes sacrificam o original só pra meter uma piada que nem é tão legal

assim”59.

O outro exemplo que buscamos desse texto é em relação ao número de

caracteres. No texto original da colaboradora a história era contada em 11.715

caracteres, enquanto as reportagens da seção só comportam até sete mil

caracteres. Portanto, algumas informações que para Vanessa Barbara eram

importantes para o contexto da reportagem tiveram que ser cortadas.

Ao todo, foram cortados cinco parágrafos da versão original e toda a

história do sonho da personagem rodar um documentário sobre a história do

circo no Brasil. Dos parágrafos cortados, três referiam-se ao documentário. O

que mais uma vez trouxe insatisfação à colaboradora, que ainda tentou

negociar uma nova versão com o editor para que comportasse as informações

sobre a rodagem do documentário. Segundo ela, a negociação foi sem

sucesso.

Não há muito que se possa fazer a não ser recusar a publicação. E como a gente não recebe nada se não publicam, e como já escreve pensando em formato esquina, acaba dando de ombros e deixando que publiquem60.

A recusa do editor em considerar uma nova versão, (discurso de

autoridade) e a aceitação da edição mediante pagamento (sentimento de

conformidade do repórter) evidenciam que ambos assumem o seu papel na

hierarquia de produção. Segundo Bourdieu (2010), isso acontece graças ao

“poder simbólico” que ambos assumem. Que é aquele “poder invisível o qual só

é aceito se exercido com a cumplicidade daqueles que não querem saber que

lhe estão sujeitos ou mesmo que o exercem” (Bourdieu, 1989, p. 8).

Portanto, mesmo quando contesta a versão do editor, o repórter aceita a

edição porque sabe que aquela é a sua função, e que se provavelmente

estivesse no papel do editor, faria o mesmo com o texto de outra pessoa. Ao

mesmo tempo em que reclama da versão e aceita a publicação, mesmo que

seja mediante pagamento, o colaborador se torna uma espécie de cúmplice do

59 Em conversa com o pesquisador por email em 25/09/2012. Ver anexo 10. 60 Em conversa com o pesquisador por email em 01/10/2012. Ver anexo 11.

Page 59: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

59

editor. Porque, como disse Roberto Kaz, “o repórter não pode reclamar da

edição porque ele sabe (que será editado). Faz parte do pacote”61.

O ultimo aspecto de edição, e que parece ter ocorrido a maior

intervenção por parte do editor, porque esse muda o sentido do texto, é a

reportagem “O mistério das cascudas. Fluxo de tartarugas intriga moradores de

prédio carioca” (piauí, 67, 2012).

Na reportagem assinada pela colaboradora Vanessa Barbara e a

jornalista Clara Becker, o mistério gira em torno do aumento do número de

tartarugas em um prédio do Rio de Janeiro. As autoras, durante o texto, dão

várias pistas no sentido de tentar desvendar o mistério. Elas citam o segurança

do prédio, os donos dos apartamentos em férias, um médico que passou pelo

local, o porteiro e um menino que frequentava o lago todos os dias.

Embora existam vários suspeitos, as autoras não são taxativas em

acusar ninguém, pois o tema central da reportagem ronda na tentativa de

desvendar o mistério. O que não necessariamente ocorre na versão impressa

da reportagem.

Na referida versão, além da alteração de ordem dos parágrafos, (o

segundo parágrafo da versão publicada encontra-se no quarto parágrafo da

versão original), há uma mudança no foco narrativo da reportagem. Enquanto

para as autoras todos eram suspeitos e nenhum culpado, para o editor, todos

ainda continuavam suspeitos, mas um aparecia como o principal, ou até

colocado como culpado, tamanho o tom inquisitório do texto. Na versão original

o menino aparece no nono parágrafo como:

Outro elemento supostamente envolvido no esquema é um menino que frequentava o lago todos os dias. Passava para dar tchau, chamava a bichinha pelo nome – nitidamente era dele. A mãe deve ter pedido pra se livrar dela, então levou pro prédio vizinho, supõe a subsíndica.

De repente, na versão impressa, o menino, que passa a ser chamado de

menor, ganha ares de culpado:

61 Entrevista concedida ao pesquisador na redação do jornal O Globo no dia 9 de outubro de 2012.

Page 60: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

60

Subitamente, um inocente menino que frequentava o lago todos os dias ganhou ares de suspeito. “Ele passava para dar tchau, chamava a bichinha pelo nome, nitidamente era dele”, contou Eliane. “A mãe deve ter pedido para se livrar do bicho e ele o levou para o prédio vizinho” supôs a subsíndica. Estaria aí a resposta para o mistério? O menor não foi localizado pela reportagem para esclarecer o caso.

Como podemos perceber pela transcrição desse parágrafo, a versão

editada nos faz pensar que o menino apareceu durante o trabalho de

reportagem. O que, a considerar a versão original, não é verdade.

Portanto, além do tempo da narrativa ser alterada, a reportagem passa a

remontar a um tipo de discurso policial, o que não ocorre na versão original,

com o uso expressões do tipo “o menor”, quando se refere ao menino, ou a

readequação de aspas ao longo do texto para a mesma finalidade, “o lago do

condomínio Parque Guinle, em Laranjeiras, é um conhecido lugar de desova".

E até mesmo a presença de um veterinário, Rafael Torres, que não se encontra

na versão original, e que segundo Bernardo Esteves foi uma exigência dele

para com as repórteres, aparece na tentativa de elucidar o caso como uma

espécie de autoridade, invalidando assim a principal característica do texto

original: o mistério da procriação das tartarugas no prédio, e readequando

assim o texto às regras convencionais do discurso jornalístico com a presença

de fontes especializadas.

Ao analisar a reportagem em questão, podemos identificar uma

desconstrução da versão original a partir do entendimento do editor, que por

sua vez, supostamente o faz pensando nas características da seção, a revelia

das autoras.

Acho meio triste e desonesta essa reescrita das esquina à luz do que o editor acha que deveriam ser. É claro que ele pode sugerir outras abordagens, mas ninguém melhor para dar a palavra final do que os repórteres que estavam lá, e nesse caso ele simplesmente achou graça num trocadilho do “menor”, que originalmente é só um detalhe engraçado, e refez a esquina a partir dessa ideia que ele achou mais divertida. É tão perigoso isso62.

Quando a colaboradora diz que “é tão perigoso isso”, ou seja, a reescrita

do texto conforme entende ser o gosto pessoal do editor, ou para se adequar

62 Em conversa com o pesquisador por email em 01/10/2012. Ver anexo 11.

Page 61: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

61

as características da seção, surgem situações como a relatada por uma fonte,

Edmilson Caminha, que fora entrevistado pelo colaborador Bruno Moreschi

para a reportagem “Anonimato público: os ghost writers da Câmara: (piauí, 26,

2008).

No artigo, “Clodovil e eu, vítimas da piauí”, publicado pelo Observatório

da Imprensa, Edmilson relata a preocupação ao repórter em não expor nenhum

nome de parlamentar para não causar nenhum constrangimento. Segundo ele,

quando recebe um pedido de qualquer pessoa que queira saber do seu

trabalho ele sempre esclarece dessa forma:

Além do perfil ideológico, da filiação partidária e das metas a que visa com o pronunciamento, importa saber o grau de instrução do orador. Quando me chegam solicitações de parlamentares menos conhecidos, consulto o Repertório biográfico da legislatura para ter ideia dos limites a que me sujeitar. Em um universo de 513 brasileiros, o estudo varia da pré-escola ao pós-doutorado – nem poderia ser diferente, pois esse é o país em que vivemos. Deve-se, portanto, adequar o texto, quanto ao fundo e à forma, aos conhecimentos daquele a quem se destina, até para não levá-lo a discorrer sobre o que não sabe. Suponhamos Guimarães Rosa e Garrincha – para cogitar apenas dos que já se foram – eleitos para a Câmara: se referências literárias e citações históricas ficariam bem na boca do primeiro, as falas do segundo teriam de ser despojadas e diretas, compatíveis com as poucas letras do jogador63

Como podemos notar em nenhum momento desse discurso o

profissional cita nome de parlamentares. Mas, quando lemos a versão

publicada em novembro de 2008, observamos a seguinte narrativa:

Outra preocupação é saber para quem se escreve. No computador de Caminha, o currículo de Clodovil Hernandes, do PTC paulista, por exemplo, define-o como professor, comunicador, estilista, apresentador e cantor. Apesar do perfil multimídia, o redator conclui sem nenhuma maldade aparente: ‘Fica evidente que não dá para construir um discurso rebuscado para ele.

Revoltado, Edmilson Caminha entrou em contato com o jornalista Bruno

Moreschi, que alegou que a sua reportagem tinha sido reescrita e que não

pudera ver a ultima versão, pois morava distante da redação. Segundo o

63 Clodovil e eu, vítimas da piauí. Disponível em: http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/_ed702_clodovil_e_eu_vitimas_da_piaui. Acesso em: 20/09/2012.

Page 62: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

62

repórter, a abordagem que ele faz do Clodovil era muito diferente do que fora

publicado.

Entendo suas críticas. Isso não me isenta de nenhuma culpa, mas editaram meu texto original, que não menciona Clodovil exatamente dessa forma. Contava que você navegava na internet diante do currículo do deputado e então comentou de forma genérica: ‘Para deputados com menos conhecimento acadêmico, fica evidente que não dá para construir um discurso rebuscado’. Lembro-me de que tive o cuidado de não ligar sua frase a nenhum deputado específico.

Infelizmente a pesquisa não teve acesso à versão original desse texto

para a comprovação da veracidade da abordagem do repórter. Mas, levando

em conta a alteração ocorrida na reportagem, “O mistério das cascudas. Fluxo

de tartarugas intriga moradores de prédio carioca”, (piauí, 67, 2012), citada

acima, acreditamos ser possível que essa mudança tenha sido ocorrido

durante o processo de edição, uma vez que essa é uma das características das

reportagens da esquina: “Sempre histórias singulares, com sujeito claro”64.

Quando perguntado sobre o assunto durante a observação do ambiente

da redação, o editor Bernardo Esteves disse que “não se sentiria à vontade

para responder tal pergunta, pois quem editou esse texto foi o Mario Sérgio

Conti”.

Nessa breve discussão que a pesquisa aborda sobre a edição na seção

esquina, fica demonstrado que as reportagens são realmente muito editadas,

mas que na maioria das vezes a edição busca ressaltar aspectos da própria

seção, presentes na carta “o que é uma esquina”, de João Moreira Salles.

Portanto, Bernardo Esteves, ou qualquer outro editor que tenha passado pelo

periódico, edita conforme as regras da instituição que estão acima do gosto

pessoal do editor.

64 O que é uma esquina. Ver anexo 08.

Page 63: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

63

7. CONCLUSÃO

Para alcançar o objetivo deste trabalho monográfico de investigar as

rotinas produtivas da seção esquina, percorremos uma considerável trajetória

teórica a fim de subsidiar a posterior investigação no período visitado na

redação. Iniciamos com uma discussão sobre a revista e sobre o jornalismo,

que como pudemos verificar ele pode ser analisado como discurso e, sendo

como linguagem ele é dialógico. Portanto, o jornalismo não é feito somente por

quem produz, mas também pelo sujeito leitor, haja vista que assinamos um

“contrato de leitura” com o jornalista que nos comunica.

Porém, para chegarmos a essa relação com o sujeito que lê, o jornalista

pode lançar mão de inúmeras estratégias textuais, como pudemos verificar

nessa pesquisa, uma delas o humor.

A seguir, através de uma breve discussão sobre reportagem,

percebemos que a reportagem, texto característico da seção, é o gênero que

mais possibilita a fruição de ideias do repórter. E que a revista, por ser de

periodicidade mensal, possibilita ainda mais o profissional trabalhar em seu

texto.

A partir daí, a presente pesquisa começou a analisar os valores-notícias

e seus critérios de noticiabilidade e constatamos que o que estava presente na

carta de João Moreira Salles, publisher da revista, alguns critérios são

necessários para que o repórter tenha sua reportagem publicada na seção.

Como, por exemplo, o pitoresco, a novidade. Embora como pudemos observar

ao longo da pesquisa, os repórteres muitas vezes não conhecem o conteúdo

da carta e que as percepções do funcionamento da seção são absorvidas

durante as leituras que eles fazem do periódico.

Após catalogarmos os valores-notícias para a esquina, a pesquisa se

voltou para entender a rotina produtiva da seção e entender o difícil caminho

que um texto curto, para os padrões da revista, são submetidos a fim de

ficarem com as características do periódico. Nessa fase, também observamos

que os repórteres, na sua maioria jovens entre 20 e 30 anos, ao verem seus

nomes nas páginas da revista piauí, vislumbram uma possibilidade de sucesso

profissional em outros periódicos. Assim, podemos afirmar que escrever uma

Page 64: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

64

esquina, mesmo que tenha muita alteração no seu texto é um ganho

profissional para o jovem repórter.

Também pudemos notar que o rigoroso processo de edição, chamados

pela pesquisa de filtros de redação, podem derrubar uma esquina há qualquer

momento, e que os editores acham esse caminho saudável, demonstrando

assim que realmente a forma importa tanto quanto o conteúdo para a revista.

No ultimo capítulo, quando a pesquisa se detêm a falar sobre a edição

nos textos dos repórteres, observamos que realmente os textos sofrem fortes

edições, mas que aos olhos da pesquisa, essas alterações veem ressaltar

aspectos da seção. E que, como foi observado durante a visita a redação, e em

resposta ao questionário enviado aos repórteres e colaboradores da seção,

mesmo que seja por meios muitas vezes arbitrários e ou econômicos, os

repórteres aceitam de bom grato às alterações solicitadas pelo editor nos seus

textos.

Portanto, a relação demonstrada entre colaboradores e jornalistas,

entrevistados para essa pesquisa, se mostrou cordial, com eventuais

discussões sobre pontos específicos do texto.

Page 65: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

65

REFERÊNCIAS

AGRA, Lúcia de Oliveira Klondy. A importância do sentido culturalmente construído na tecedura do texto jornalístico . Disponível em: http://www.bocc.ubi.pt/pag/agra-klondy-importancia-do-sentido-pdf. Acesso em: 20/08/2012 BOURDIEU, Pierre. Sobre a televisão: a influência do jornalismo e os jogos olímpicos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997. _______________. O poder simbólico . Rio de Janeiro: Bertrand, 2003. BRONOSKI, Marcelo Engel. Manuais de redação e jornalistas: estratégias de apropriação. Ponta Grossa: Editora UEPG, 2010. BRUM, Eliane. A casa dos velhos . (In) O olho da rua: uma repórter em busca da literatura da vida real. São Paulo: Globo, 2008. BULHÕES. Marcelo. Jornalismo e literatura em convergência . São Paulo: Ática, 2007. CAVALCANTI, Jauranice Rodrigues. No “mundo dos jornalistas”: interdiscursividade, identidade, ethos e gêneros. Tese (Programa de Pós-Graduação em Linguística). Unicamp, 2006. COIMBRA, Oswaldo. O texto da reportagem impressa. Um curso sobre a sua estrutura . São Paulo: Ática, 1993. Conti, Mario Sergio. Notícias do planalto. A imprensa e Fernando Collor . São Paulo: Companhia das Letras, 1999. CRESTANI, Jaqueline. Narração e jornalismo. O narrador na “ esquina ” de piauí . Monografia. Departamento de Comunicação da Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2010. BEATRIZ, Marocco; BERGER, Christa. A dupla falta do editor, nos livros e cursos de jornalismo. (In) FELIPPI, Ângela; SOSTER, Demétrio de Azeredo; PICCININ, Fabiana (org). Edição em jornalismo. Ensino, teoria e prática . Rio Grande do Sul: Edunisc, 2006. LAGE, Nilson. A reportagem : teoria e técnica de entrevista e pesquisa em jornais. Rio de Janeiro: Record, 2001. LAGO, Cláudia. Antropologia e jornalismo : uma questão de método. (In) BENETTI, Marcia; LAGO, Cláudia (org). Metodologia de pesquisa em jornalismo . Rio de Janeiro: Vozes, 2008.

Page 66: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

66

LEITE, Paula. A prática diária do desapego com o “seu texto” . Novo em folha. Disponível em: http://novoemfolha.blogfolha.uol.com.br/2012/06/14/a-pratica-diaria-do-desapego-com-o-seu-texto. Acesso em: 20/09/2012 LIMA, Edvaldo Pereira. Páginas Ampliadas : o livro-reportagem como extensão do jornalismo e da literatura. São Paulo: Editora da Unicamp, 2004. __________________. Registros breves para uma história futura . Disponível em: http://www.abjl.org.br/detalhe.php?conteudo=fl20030902203904&category=ensaios&lang=. Acesso em 15/06/2012. MACHADO, Marcia Benetti; JACKS, Nilda. O discurso jornalístico . (In) A representação da Argentina e dos argentinos na imprensa sulina. Rio Grande do Sul: UFRGS, 2012. MANUAL DE REDAÇÃO DA FOLHA DE S.PAULO. Folha de São Paulo. 2004. Martins, Maura. Rotinas jornalísticas em um trabalho autoral . Cadernos de Comunicação da UniBrasil . Nº4. Disponível em: http://apps.unibrasil.com.br/revista/index.php/comunicacao/article/view/65/ . Curitiba: UniBrasil, 2006. Acesso em 15/09/2012 MEDINA, Cremilda. Notícia um produto à venda : Jornalismo na sociedade urbana e industrial. São Paulo: Summus Editorial, 1978. MOTTA, Luiz Gonzaga. A análise pragmática da narrativa jornalística . Disponível em: http://www.port.com.intercom.org.br/pdfs/105768052842738740828590501726523142462.pdf. Acesso em 20/09/2012 NETO, Fausto. Mutações nos discursos jornalísticos: Da ‘construçã o da realidade’ a ‘realidade da construção’ . (In) FELIPPI, Ângela; SOSTER, Demétrio de Azeredo; PICCININ, Fabiana (org). Edição em jornalismo. Ensino, teoria e prática. Rio Grande do Sul: Edunisc, 2006. PENA, Felipe. Teoria do jornalismo. São Paulo: Contexto, 2005. PIAUÍ. Rio de Janeiro: Edição 02. Novembro de 2006. PIAUÍ. Rio de Janeiro: Edição 34. Julho de 2009. PIAUÍ. Rio de Janeiro: Edição 52. Janeiro de 2011. PIAUÍ. Rio de Janeiro: Edição 53. Fevereiro de 2011. PIAUÍ. Rio de Janeiro: Edição 54. Março de 2011. PIAUÍ. Rio de Janeiro: Edição 55. Abril de 2011.

Page 67: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

67

PIAUÍ. Rio de Janeiro: Edição 56. Maio de 2011. PIAUÍ. Rio de Janeiro: Edição 57. Junho de 2011. PIAUÍ. Rio de Janeiro: Edição 61. Outubro de 2011. PIAUÍ. Rio de Janeiro: Edição 66. Março de 2012. PIAUÍ. Rio de Janeiro: Edição 67. Abril de 2012. RESENDE, Fernando. O jornalismo e a enunciação. Perspectivas para um narrador jornalista. Disponível em www.ufrgs.br/gtjornalismocompos/.../fernandoresende2005.doc. Rio Grande do Sul: 2005. ROCHA, Patrícia. Jornalismo em primeira pessoa : a construção de sentidos das narradoras da revista TPM. Dissertação. Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Informação. Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), 2007. ROSSI, Clóvis. O que é jornalismo. São Paulo: Brasiliense, 2000. SIGMUND, Freud. O humor . Disponível em: http://www.meuucci.com.br/wp-content/uploads/2010/08/freud-o-humor.pdf. Acesso em: 22/09/2012. SILVA, Bianca Magela Melo. Jornalismo e humor : narrativas atrevidas na esquina. Dissertação. Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social. Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), 2011. SILVA, Gislene. Para Pensar critérios de noticiabilidade . (In) Estudos em jornalismo e mídia. Vol 2 nº 1. Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), 2005. TRAQUINA, Nelson. Teorias do jornalismo volume 1 : Porque as notícias são como são. Santa Catarina: Insular, 2005. ________________. Teorias do jornalismo volume 2 . A tribo jornalística – uma comunidade interpretativa transnacional. Santa Catarina: Insular, 2005. TRAVANCAS, Isabel Siqueira. O mundo dos jornalistas. São Paulo: Summus, 1993. WOLF, Mauro. Teoria da comunicação . Portugal: Editorial Presença, 1985. WOLFE, Tom. Radical chique e o novo jornalismo . São Paulo: Companhia das Letras, 2005.

Page 68: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

68

ANEXOS

Anexo 01 - Capa da revista piauí 69

Anexo 02 – piauí vem aí 70

Anexo 03 – Texto de apresentação da revista piauí 71

Anexo 04 – Revista destinada aos anunciantes. Quem lê piauí 72

Anexo 05. Revista destinada aos anunciantes. Seção esquina 73

Anexo 06. Revista destinada aos anunciantes. Apresentação 74

Anexo 07. Cartão de visitas do repórter e editor Bernardo Esteves 75

Anexo 08. O que é uma esquina? 76

Anexo 09. Email, colaboradora, Vanessa Bárbara 77

Anexo 10. Email, colaboradora, Vanessa Bárbara 78

Anexo 11. Email, colaboradora, Vanessa Bárbara 79

Anexo 12. Email, colaborador, Rafael Urban 80

Anexo 13. Email, repórter e editor da esquina, Bernardo Esteves 81

Anexo 14. Email, repórter e editor da esquina, Bernardo Esteves 82

Anexo 15. Roteiro de perguntas aos jornalistas de piauí. Carol Pires 83

Anexo 16. Roteiro de perguntas aos colaboradores de piauí. Raquel Freire Zangrandi 88

Anexo 17. Roteiro de perguntas aos colaboradores de piauí. Bruno Cirillo 91

Anexo 18. Roteiro de perguntas aos colaboradores de piauí. Felipe Marra 94

Anexo 19. Roteiro de perguntas aos colaboradores de piauí. Tomás Chiaverini 96

Anexo 20. Roteiro de perguntas aos colaboradores de piauí. Vanessa Barbara 98

Anexo 21. Roteiro de perguntas aos editores de piauí. 100

Page 69: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

69

Anexo 01 - Capa da revista piauí

Page 70: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

70

Anexo 02 – piauí vem aí

Page 71: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

71

Anexo 03 – Texto de apresentação da revista piauí

Texto de apresentação da Revista Piauí - 1ª edição Outubro-2006 piauí será uma revista para quem gosta de ler. Para quem gosta de histórias com começo, meio e fim. Como ainda não se inventou nada melhor do que gente (apesar de inúmeras exceções vide...deixa pra lá) a revista contará histórias de pessoas. De mulheres e homens de verdade. Ela pretende relatar como pessoas vivem, amam e trabalham, sofrem ou se divertem, como enfrentam problemas e como sonham. piauí partirá sempre da vida concreta.

A revista será mensal e terá um tamanho maior que o habitual. A periodicidade de quatro semanas permitirá que ela aprofunde os assuntos, em vez de resumi-los. E também que o acabamento, tanto na escrita como na apresentação gráfica , seja caprichado. O formato grande fará com que se encontre bastante coisa para ler e ver em piauí. Para que ele dure um mês na mão dos leitores. Para que as reportagens e narrativas terminem quando o assunto terminar, em vez de serem exprimidas porque o espaço acabou. O tamanho maior favorecerá a inventividade, possibilitará a publicação de imagens reveladoras sem perda de nuances e detalhes.

piauí não perderá de vista os temas atuais, mas não terá pressa em chegar primeiro às últimas notícias. Levará em conta, sempre, que a informação vem antes do comentário, que os fatos são mais importantes que as opiniões. Apurará com rigor e escreverá com clareza. Fugirá dos clichês e envidará todos os esforços para evitar expressões como “envidar todos os esforços”. Não terá restrições temáticas, políticas ou ideológicas. Preferirá a serenidade ao histrionismo. Cobrirá qualquer assunto que uma reportagem tornar interessante. Vale tudo, esporte,medicina, política, cultura, religião, urbanismo, televisão, turismo etc. Só não valem reportagens sobre celebridades instantâneas e déficit público.

Tentará explicar o que teima em ser obscuro (com uma exceção, a razão de piauí se chamar piauí, até porque não sabemos direito).Mostrará o enredo do que parecia ser desconexo e fragmentário. Fugirá do academicismo, da vulgaridade e do beletrismo. Tanto que, desde já, está proibido o uso das expressões “governança corporativa”. "Tá ligado”, “home-theater”, “recursos não contabilizados”, “Roberto Justus” e “galera” a não ser como sobrenome. Ela dará importância ao que, por ignorado, é tido como insignificante. Tratará de achar novidades no que, por esquecido, parece velho ou ultrapassado. A revista não será sisuda nem chata. Sisudez não é sinônimo de seriedade. Uma coisa não tem nada a ver com a outra. piauí terá humor, graça.

Para dar conta das situações que estão além do poder da narrativa jornalística piauí publicará ficção. Na forma de contos, trechos de romances e histórias em quadrinhos. E também poemas.

Jornalistas, escritores, artistas gráficos, ensaístas, críticos e humoristas de todas as idades buscarão expressar em piauí diferentes aspectos da vida nacional. A matéria prima será a bagunça brasileira. Ela terá como pano de fundo um período histórico de perplexidade geral. Numa situação como esta é melhor ser curioso e ir atrás do real, do que prescrever receitas infalíveis de salvação. Um pouco de dúvida e ceticismo não faz mal a ninguém – e a nenhuma revista. piauí não tem resposta para nada. Nem para quem pergunta por que ela se chama piauí.

piauí veio para ficar. Esta é a aposta.

Page 72: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

72

Anexo 04 – Revista destinada aos anunciantes. Quem lê piauí

Page 73: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

73

Anexo 05. Revista destinada aos anunciantes. Seção Esquina

Page 74: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

74

Anexo 06. Revista destinada aos anunciantes. Aprese ntação

Page 75: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

75

Anexo 07. Cartão de visitas do repórter e editor Be rnardo Esteves

Page 76: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

76

Anexo 08. O que é uma esquina ?

O que é uma esquina?

JMS

Não existem muitas regras. Eu diria que os textos são serenos, não opinativos, nunca

militantes. Quando possível, quero humor, mas humor quieto, aquele que corre por

baixo do texto, meio disfarçado. Humor de inglês -- quanto mais ridículo o assunto,

mais sério o tratamento. Nunca temas gerais -- a educação no Brasil, a crise da

odontologia nacional, etc. Sempre histórias singulares, com sujeito claro: um provador

de café, um entregador de cartas, um lançamento imobiliário, um político, e assim por

diante. Tensão narrativa é essencial. Esquinas nunca têm lead e sub-lead. Se fosse

possível chegar lá, eu diria que cada esquina deveria ser um continho. A seção é

muito editada (geralmente por mim), ou seja, reescrita para acolher todas essas

idiossincrasias. É claro que a edição é feita em colaboração com o autor. Os toques

variam entre 5 mil e 7 mil. De um modo geral, busca-se um certo equilíbrio entre temas

mais tolos (um festival de rock na Coréia do Norte) e temas mas sérios (uma visita ao

Palácio dos Bandeirantes para uma conversa com o Serra). Tento evitar a tentação do

exótico (mendigos sábios, convenção de ufólogos), e do Brasil profundo (o poeta

popular do Sertão, os violeiros dos pampas). A seção não é assinada para que eu

possa tentar dar a todos os textos (em geral, 8 esquinas por edição) uma espécie de

espírito comum.

Page 77: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

77

Anexo 09. Email, colaboradora, Vanessa Bárbara

Page 78: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

78

Anexo 10. Email, colaboradora, Vanessa Bárbara

Page 79: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

79

Anexo 11. Email, colaboradora, Vanessa Bárbara

Page 80: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

80

Anexo 12. Email, colaborador, Rafael Urban

Page 81: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

81

Anexo 13. Email, repórter e editor da esquina, Bernardo Esteves

Page 82: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

82

Anexo 14. Email, repórter e editor da esquina, Bernardo Esteves

Page 83: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

83

Anexo 15. Roteiro de perguntas aos jornalistas de piauí. Carol Pires

A EDIÇÃO COMO ESTILO: INVESTIGAÇÃO DA ROTINA PRODUT IVA

DA SEÇÃO ESQUINA DA REVISTA PIAUÍ

1 - Há quanto tempo trabalha na revista?

A primeira reportagem que publiquei foi em 2009, ainda como freelance,

se chamava “Suplicy: Sensual”, uma esquina. Depois segui colaborando até

janeiro deste ano, quando fui contratada para a equipe.

2 - Como você descreve seu trabalho. Você gosta?

A Piauí é o trabalho dos sonhos: você tem tempo de pensar nas

histórias, tempo de apurar e, depois, tempo para escrever, editar, discutir com

seu editor. Você sente que o trabalho sempre sairá bem feito porque é pensado

em equipe.

3 - O que você acha do ambiente da redação?

Eu ficava em Brasília e não no Rio (desde final de agosto estou em Nova

York fazendo um mestrado, portanto meu contrato lá acabou no final do mês).

No entanto, volta e meia precisava ir ao Rio discutir as pautas e o ambiente é

tranquilo, divertido. A equipe é pequena, é quase impossível não ter um clima

de amizade entre todos. Tem que checar, mas acho que éramos nada mais

que sete repórteres e, como cada um tem sua história, não tem a competição

por furo e coberturas especiais que costuma haver nas redações de jornal. É

comum que cada um tenha uma área de interesse também – o Bernardo com

ciência, o Renato Terra com humor, por exemplo.

4 - Quais são suas rotinas, seus passos, aqui na re dação?

Cada reportagem demanda um tempo, uma dedicação e uma viagem

diferente, então não tem muita rotina. Cada nova reportagem é aprender de

novo como apurar e escrever.

5- Vários “esquineiros” dizem que é preciso treinar os olhos para

escrever uma esquina . Você poderia explicar melhor o que é isso?

Treinar os olhos para ser “esquineiro” é entender o espírito do que são

as esquinas. Acho – só acho, o Bernardo Esteves quem pode te falar sobre

isso - que tem muita gente que oferece pauta que claramente não serve de

Page 84: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

84

esquina, que seria uma nota no jornal e nada mais. Fica a impressão de que a

pessoa nunca leu de verdade a revista. Eu fiquei anos lendo esquinas antes de

ter confiança de oferecer alguma. E ainda hoje ofereço algumas que não são

aceitas. Primeiro de tudo tem que ser um assunto novo. Por exemplo, um

personagem de quem ninguém nunca ouviu falar ou um lado de um

personagem conhecido que ninguém nunca viu (As cartas de amor que recebe

o senador Suplicy, que eu escrevi uma ida à prisão com o Suplicy para visitar o

Césare Battisti, como fez o Mario Sérgio Conti). Acho que dá pra falar de temas

sérios, mas que tenha uma dose de humor, de ironia (O partido pirata na

Alemanha, como o João Moreira Salles fez, ou os perfis do Russomano e do

Alexandre Schneider, que saíram não como grandes-perfis, mas sim como

esquinas). Se for um assunto muito absurdo, que seja tratado como sério (fiz o

sommelier de águas, por exemplo, e tem uma ótima antiga que não me lembro

de quem fez chamada Paquiderme que se preze ouve Bob Dylan, que é

também um bom exemplo de levar à sério um tema aparentemente ridículo).

Acho que as esquinas são minha seção favorita da revista porque você

pode trabalhar o texto pelo texto em si, pelo prazer de escrever bem ou ler algo

bem escrito. O tema pode ser informativamente inútil, mas você sai da leitura

animado ou inspirado.

6 - Quanto tempo leva para escrever uma reportagem da esquina ?

Depende do tema. A esquina do Alexandre Schneider me tomou duas

semanas – uma acompanhando ele na campanha do Serra e outra decupando

e escrevendo. A das cartas de amor do Suplicy fiz em 2 ou 3 dias - um para ler

as cartas e falar com ele e outros dois pra escrever. A do Sommelier de Águas,

por exemplo, o entrevistei em duas horas, mas demorei para escrever porque

era confuso explicar do que se tratava. O do cara que desenha as toalhas do

Mcdonalds também só me custou uma entrevista e uns dias de escritura. Teve

outra, Deputado não resiste à oncinha, que fiquei dois ou três dias

acompanhando ela no trabalho e depois outros tantos apurando se era verdade

o que ela me disse, sobre os projetos, dados sobre o deputados que ela me

apontava. Normalmente você tem quase 20 dias, entre a reunião de pauta e o

dead-line, e dentro disso organiza seu tempo.

Page 85: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

85

7 - Você já teve que escrever uma reportagem mais e xtensa e uma

esquina na mesma edição? Como foi?

Já, mas eram esquinas não muito complicadas. No mês que publiquei o

perfil da amizade do Cachoeira e do Demóstenes não fiz esquina, apesar de ter

pauta aprovada, porque não daria tempo.

8 - Como você lida com a edição que as reportagens das esquina s

são submetidas?

Eu gosto de ter a figura do editor para me ajudar a ver mais claramente

onde o texto pode ser melhorado. O texto sempre sai melhor da edição, mesmo

que a princípio seja assustador que alguém vá cortar seu trabalho de dias fora.

Já escrevi para meia dezena de revistas do Brasil e de outros países da

América Latina e o processo de edição da Piauí é o mais rigoroso – tem

edição, checagem de informação e de gramática. Muitas vezes é editada por

mais de um editor. Como as esquinas tem um quase “padrão” na narrativa,

essa edição é essencial para que todas tenha mais ou menos o mesmo tom

divertido ou irônico.

9 - Como é a sua relação com o editor da seção esquina , Bernardo

Esteves?

Como assim? Quantas vezes no mês tenho que lidar com ele ou minha

relação pessoal? Bernardo é ótimo editor e amigo, faz um ótimo trabalho com

as esquinas.

10 - Você tem conhecimento da carta “o que é uma esquina ” de

João Moreira Salles? Se sim, você já a consultou al guma vez? Com que

frequência você consulta?

Fui saber da existência dessa carta há poucos meses, mas quando eu

comecei a escrever as primeiras esquinas, no começo de 2009, o João era

diretamente responsável pela edição delas, então entendi o espírito durante o

processo de edição das primeiras.

11 - Por favor, detalhe como é fazer uma reportagem da seção

esquina . (se quiser escolher uma e detalhar como foi) Como ficou

sabendo do assunto da reportagem? A apuração, a hor a de escrever, a

troca de email, ou o diálogo com o editor e a leitu ra do produto final.

Page 86: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

86

Vou falar da esquina do “Suplicy: Sensual”. A escrevi para a Piauí sendo

freelance. Na época eu era setorista de Congresso Nacional pelo jornal

Estadão. O Suplicy era uma fonte ali na cobertura e um dia, conversando sobre

assuntos alheios à política ele comentou que as secretárias do gabinete

guardavam todas as cartas de amor que ele recebia numa pasta vermelha.

Achei curioso que um senador – ainda mais o Suplicy – recebesse cartas de

amor. Perguntei para outros senadores se isso acontecia com eles e não, não

acontecia. Pedi para ver a pasta e ele me deu acesso, contando que não desse

nomes. O Suplicy, como você sabe, é um personagem; é muito fácil para um

repórter ter boas cenas e frases deles. As cartas eram especialmente

engraçadas e tudo fez com que a confecção da reportagem fosse mais fácil e

divertida. Lembro que uma mulher dizia que tinha se apaixonado porque o viu

sorrir para ela num aeroporto. E quando perguntei para o Suplicy se ele andava

por aí sorrindo para mulheres ele respondeu como se fosse uma pergunta

verdadeiramente séria. Disse algo como: tenho certeza que foi um

cumprimento inocente. Casei as cartas com os comentários dele sobre ela e fiz

a esquina. Como eu me diverti muito lendo as cartas e falando com o senador,

foi fácil na hora de escrever. Acho que se você escreve rindo, alguém também

vai rir ao ler.

Passo 1: ler as cartas. Achei salvo aqui o arquivo da minha apuração

salvo em 16/02 de 2009.

2. Fiz entrevistas com as 3 secretárias do senador no dia seguinte.

3. Falei com o senador no gabinete dele no mesmo dia que falei com as

secretárias.

4. Mandei a primeira versão do texto para o Roberto Kaz, que na época

era o editor das esquinas no lugar do Bernardo no dia 18, ou seja, dois dias

depois de ler as cartas.

Não achei minha troca de emails sobre a edição, mas lembro que

primeiro foi o Roberto Kaz quem “limpou o texto” porque eu colocava

informações que, apesar de interessantes, quebravam o ritmo do texto. Eu

dizia, por exemplo, sobre a rotina de exercícios do senador e terminava falando

sobre uma apresentação de piano que ele faria nos dias seguintes. Pensava

Page 87: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

87

que assim ajudava a compor a imagem de “conquistador” do Suplicy. Mas,

concordo com a edição: acabava tirando o ritmo da leitura das cartas, que são

divertidas e sustentam o texto sozinho. Por fim o João deu um último retoque e

incluiu o que eu considero a melhor frase do texto. Eu explicava usando quase

todo um parágrafo como eram as feições e reações do Suplicy, e o João trocou

por “com um misto de placidez e marketing que o torna inimitável”. Acho que

resume à perfeição o senador.

Conforme fui fazendo outras esquinas o texto foi sendo cada vez menos

mexido, já que fui entendendo o tom e a forma.

12 - Como você avalia versão final da reportagem de pois da

edição?

. Acho que de todas as muitas esquinas que já escrevi, essa é ainda a

que eu mais gosto porque representa esse espírito de “assunto inútil” que ainda

assim vale a pena ler porque ficou bem escrita e divertida.

Nome e idade: Carol Pires, 26 anos.

Page 88: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

88

Anexo 16. Roteiro de perguntas aos colaboradores de piauí. Raquel Freire Zangrandi

A EDIÇÃO COMO ESTILO: INVESTIGAÇÃO DA ROTINA PRODUT IVA

DA SEÇÃO ESQUINA DA REVISTA PIAUÍ

1 - Há quanto tempo trabalha na revista?

Trabalho desde julho de 2006.

2 - Como você descreve seu trabalho. Você gosta?

Gosto muito, é um trabalho dinâmico e me proporciona a oportunidade de falar

diariamente com pessoas do mundo inteiro.

3 - O que você acha do ambiente da redação?

O convívio na redação da Piauí é muito harmonioso, somos poucos e todos se

dão muito bem. Além disso, estão todos sempre muito bem informados a

respeito dos mais variados assuntos, então a troca de informação é sempre

interessante.

4 - Quais são suas rotinas, seus passos, aqui na re dação?

Trabalho como secretária de redação. Venho à redação todos os dias, e

diferente dos jornalistas, geralmente cumpro horário diário das 10 às 19. Na

semana de fechamento, não tenho hora pra sair, enquanto as matérias não

estiverem prontas. Cuido do trânsito das matérias, dos prazos e do cronograma

de trabalho, faço o contato com autores estrangeiros, agentes literários e

editoras. Trato diretamente com os tradutores, editores, revisores e a

checadora. Supervisiono tudo o que vai para a gráfica antes de cada matéria

ser impressa. E, eventualmente, escrevo reportagens.

5- Vários “esquineiros” dizem que é preciso treinar os olhos para

escrever uma esquina . Você poderia explicar melhor o que é isso?

Escrever uma esquina talvez seja mais difícil do que parece. Os textos são

curtos, têm de ter um certo estilo (que varia de acordo com a natureza do

Page 89: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

89

assunto), tensão narrativa, uma dose suave de humor (quando o tema permite)

e se aproximam muito da prosa ficcional, apesar de serem 100% reportagem. A

forma importa tanto quanto o conteúdo. Eu diria que a precisão factual pesa

tanto quanto a precisão estilística num texto de Esquina.

6 - Quanto tempo leva para escrever uma reportagem da esquina ?

Varia muito de acordo com o tema, mas entre a apuração e o tempo de

escrever, dá em média uma semana, podendo chegar a dez dias.

7 - Você já teve que escrever uma reportagem mais e xtensa e uma

esquina na mesma edição? Como foi?

Não, mas algumas vezes já tive que escrever uma matéria grande e fazer o

trabalho de secretária de redação ao mesmo tempo. No momento de escrever

a matéria, trabalhei nos meus horários de folga, fora da redação, virei noites e

fins de semana pra não deixar que a concentração de escrever o texto

interferisse no meu trabalho rotineiro do fechamento.

8 - Como você lida com a edição que as reportagens das esquina s

são submetidas?

É muito comum que o texto volte da edição bem diferente do que foi escrito, e

isso pode ser um pouco desconcertante para quem escreveu, mas acho que

faz parte do espírito de equipe aceitar a palavra final do editor.

9 - Como é a sua relação com o editor da seção esquina , Bernardo

Esteves?

É ótima, ele já editou algumas esquinas que escrevi. Temos liberdade de

negociar trechos da reportagem que consideramos importantes, e tudo acaba

se resolvendo bem.

10 - Você tem conhecimento da carta “o que é uma esquina ” de

João Moreira Salles? Se sim, você já a consultou al guma vez? Com que

frequência você consulta?

Page 90: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

90

Sim, acho que todos na redação já leram esse texto do João. Ele resume muito

bem o espírito de uma Esquina. Tenho ele sempre em mente ao escrever uma

esquina, ele é muito esclarecedor e serve de bússola para escolher a forma de

abordar um tema.

11 - Por favor, detalhe como é fazer uma reportagem da seção

esquina . (se quiser escolher uma e detalhar como foi) Como ficou

sabendo do assunto da reportagem? A apuração, a hor a de escrever, a

troca de email, ou o diálogo com o editor e a leitu ra do produto final.

Geralmente aprovo uma pauta com o diretor de redação ou com o Bernardo,

eles dão sugestões de como tratar o tema, dizem os tópicos que consideram

cruciais, e vou para a apuração. Se tenho alguma dúvida, volto ao editor antes

de começar a escrever, depois envio uma primeira versão do texto. Ele pode

devolver com cortes, alterações e pedidos de reapuração de dados; eu

reescrevo alguns trechos, refaço algumas passagens de parágrafo, e entrego

uma versão quase pronta. O editor faz a edição final e os cortes para que fique

no tamanho certo. Ele me devolve para uma última leitura e, caso haja algum

impasse, conversamos e tudo se acerta.

12 - Como você avalia versão final da reportagem de pois da

edição?

Tenho a sensação de que ela sempre fica melhor depois de editada. O editor é

bastante experiente com Esquinas e faz com que os textos tenham o tom certo,

às vezes difícil de alcançar pelo repórter sozinho.

Nome e idade: Raquel Freire Zangrandi – 44 anos

Page 91: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

91

Anexo 17. Roteiro de perguntas aos colaboradores de piauí. Bruno Cirillo

A EDIÇÃO COMO ESTILO: INVESTIGAÇÃO DA ROTINA PRODUT IVA DA SEÇÃO ESQUINA DA REVISTA PIAUÍ

1 - Você trabalha em algum outro lugar? Qual? Sim, no Diário de Comércio, Indústria e Serviços (DCI), um jornal de

economia e negócios sediado no Centro de São Paulo. 2 - Há quanto tempo colabora com a revista? Colaborei duas vezes com a Piauí, ambas em 2011. 3 - Quantas esquina já escreveu? Uma dupla de esquinas. 4 - Você acha que publicar uma reportagem na revist a piauí lhe

ajuda profissionalmente? Penso que enriquece o meu currículo, como uma espécie de

reconhecimento da minha aptidão para a escrita. 5 - Vários “esquineiros” dizem que é preciso treina r os olhos para

escrever uma esquina. Você poderia explicar melhor o que é isso? Acho que eles se referem ao olhar sutil inerente à proposta não só das

esquinas, mas da revista inteira. Ignora-se, em tal publicação, os padrões editoriais e estilos de reportagem convencionais, impostos pelo modelo norte-americano e o senso comum. Sempre me identifiquei com a busca da Piauí pelos fatos curiosos, a riqueza de linguagem, as maneiras incomuns de abordar um assunto e ornar a narrativa a respeito desse objeto.

6 - Quanto tempo leva para escrever uma reportagem da esquina ? Em apenas um dia inspirado, seria possível apurar e contar a história –

claro que, neste caso, seria prudente dar um tempo e revisar a matéria dias depois, antes de enviá-la. Levei entre três e cinco dias de trabalho concentrado, incluindo apuração e redação, para realizar as minhas duas.

7 - Como você lida com a edição que a esquina é submetida? Excelente. Sempre tive, pessoalmente, certo rancor contra os editores –

medíocres, em geral – que, na pretensão de encaixar meu texto num padrão, destruíram seu estilo. No caso da Piauí, a edição é ideal: realça o estilo, garimpa o minério das pedras e acrescenta frases, tiradas e informações que só fazem melhorar a reportagem.

8 - Como é a sua relação com o editor da seção esquina , Bernardo

Esteves? Meramente virtual. Pessoalmente, tive a honra de conhecer Dorrit

Harazim e o prazer de conversar com Raquel Zangrandi.

Page 92: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

92

9 - Você tem conhecimento da carta “o que é uma esquina ” de João Moreira Salles? Se sim, você já a consultou alguma vez? Com que frequência consulta?

Desconhecia, até então, a existência dessa carta. 10 - Já deixou de publicar alguma reportagem por nã o concordar

com a edição do editor? Jamais. As ocasiões em que não pude publicar foram, na verdade,

propostas recusadas pelos editores. 11 – Qual a sua rotina, seus passos ao escrever uma reportagem

para a seção esquina? Por favor, detalhe como é faz er uma reportagem da seção esquina. (se quiser escolher uma e detalhar c omo foi) Como ficou sabendo do assunto da reportagem? A apuração, a hor a de escrever, a troca de email com o editor e a leitura do produto final.

Pois bem... tive chance de escrever à revista por meio de um concurso que venci (a proposta era escrever contos de seis palavras; fiquei em segundo lugar numa das rodadas), e após o qual escrevi à Redação pedindo para participar do conteúdo. Para minha surpresa, Dorrit respondeu-me o e-mail com muita atenção, convidando-me a tentar uma pauta. Propus-lhe, então, o assunto do momento: eu seria mesário na mesma semana e gostaria de relatar como esse tipo de empregado temporário passa o domingo das Eleições. Ela aceitou de cara.

A apuração foi confortável: passei o dia de mesário anotando em um discreto bloco de notas as características e ações dos meus colegas e de eventuais eleitores que se destacavam entre os outros. O apego à caneta foi tanto que me apelidaram de Chico Xavier. Esforçava-me para criar, em mente, possibilidades de lide e parágrafos interessantes. A escrita já se fazia in loco – algumas frases eram anotadas, junto às anotações, para o uso posterior.

Lembro-me que redigi a reportagem na mesma noite e durante a tarde do dia seguinte, pois havia conseguido um dia de folga do lugar monótono em que trabalhava à época – usei de justificativa o fato real, “escreverei para a Piauí, e isso é importante, porra”, e o diretor da empresa concordou. Texto criativo, frases bem construídas, ironia, percepções apuradas sobre as situações, isto é, interpretações de falas e gestos que levam a sentidos universais. Na matéria, também procurei intercalar momentos da Seção 46 (este é o título) com o contexto político daquelas Eleições, a situação dos candidatos e como os eleitores encaram “a festa da democracia” no Brasil.

Entrementes, a assessoria de imprensa da Justiça Eleitoral respondeu a um e-mail, em que eu pedia informações numéricas e técnicas a respeito dos mesários, com tal prontidão e presteza que jamais obtive escrevendo em nome de outros veículos de comunicação.

Depois de entregue, a reportagem voltou revisada após uma semana, das mãos da própria Dorrit. Aceitei-a de bom grado, devolvendo uma ou outra correção, após o que a grande jornalista me disse: “gostamos dos escribas que brigam por suas esquinas”. Ou seja, preza-se, naquela Redação, pela autonomia dos repórteres – coisa que vejo rara nos lugares-comuns.

No final do processo, foi-me dito que o diretor de conteúdo da época derrubou o texto, pois este envelheceria demais até a publicação, em troca de

Page 93: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

93

uma reportagem escrita por ele mesmo. Todavia, a matéria saiu no site. Senti-me frustrado, mas logo propus outra pauta, que saiu no papel de duas ou três edições posteriores.

12 - Como você avalia a versão final da reportagem depois da edição?

Sem dúvidas, melhor. Nome e idade: Bruno Cirillo, 22.

Page 94: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

94

Anexo 18. Roteiro de perguntas aos colaboradores de piauí. Felipe Marra

A EDIÇÃO COMO ESTILO: INVESTIGAÇÃO DA ROTINA PRODUT IVA DA SEÇÃO ESQUINA DA REVISTA PIAUÍ

1 - Você trabalha em algum outro lugar? Qual? Sim. Sou editor de um site de notícias chamado Evening Edition

(evening-edition.com) e também colunista de tecnologia da revista Carta Capital.

2 - Há quanto tempo colabora com a revista? Há dois anos, mais ou menos. 3 - Quantas esquina já escreveu? Duas, com uma terceira para a próxima edição. 4 - Você acha que publicar uma reportagem na revist a piauí lhe

ajuda profissionalmente? Não, e nem era essa minha intenção. Faço pelo prazer de poder

colaborar com a revista, que é a melhor coisa surgida no mercado editorial brasileiro em muito tempo.

5 - Vários “esquineiros” dizem que é preciso treina r os olhos para

escrever uma esquina . Você poderia explicar melhor o que é isso? Eu não sei se concordo com isso. Acho importante ficar sempre atento

aos detalhes, gestos, tentar não perder o que pode deixar a esquina mais interessante. Isso vai desde um trejeito de um personagem até algo escrito na faixa de uma torcida de futebol. Mas acho que não dá pra treinar os olhos - é algo que acontece naturalmente.

6 - Quanto tempo leva para escrever uma reportagem da esquina ? Depende, mas leva uma ou duas semanas. Para ser sincero, leva

algumas horas de desespero pouco antes do prazo. 7 - Como você lida com a edição que a esquina é submetida? Eu sempre concordo com todas as edições que são feitas, elas

costumam melhorar muito o texto. 8 - Como é a sua relação com o editor da seção esquina , Bernardo

Esteves? É muito boa. A gente se "fala" muito por e-mail para discutir eventuais

pautas e acertar detalhes. 9 - Você tem conhecimento da carta “o que é uma esquina ” de João

Moreira Salles? Se sim, você já a consultou alguma vez? Com que frequência consulta?

Não sabia da existência dessa carta! Vou pedir uma cópia ao Bernardo.

Page 95: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

95

10 - Já deixou de publicar alguma reportagem por nã o concordar

com a edição do editor? Não. 11 – Qual a sua rotina, seus passos ao escrever uma reportagem

para a seção esquina ? Por favor, detalhe como é fazer uma reportagem da seção esquina . Como ficou sabendo do assunto da reportagem? A apuração, a hora de escrever, a troca de email com o editor e a leitura do produto final.

Eu não posso te afirmar que existe uma rotina, visto que minhas duas esquinas tiveram assuntos muito diferentes. Uma foi sobre uma viagem até a fronteira entre o Paquistão e a índia, outra foi sobre a falência de um dos grandes times de futebol da Escócia. Por exemplo, para essa última, da Escócia, eu fui até Glasgow para ir a um jogo dos Rangers. Fui ao estádio com um simples bloco e caneta e passei a anotar tudo o que eu achava interessante, detalhes, gritos de torcida e eventuais conversas com torcedores. Não tinha uma estrutura muito bem definida. Depois ao voltar para Londres e sentar para escrever o texto, achei um fio que pudesse unir aquilo à história central, da questão financeira complicada do clube. E partir daí escrevi o texto. Não sei se isso te ajuda a entender uma rotina… é mais um exercício de observação para depois tentar descrever com o máximo de fidelidade o que eu vi.

12 - Como você avalia a versão final da reportagem depois da

edição? A versão final é sempre melhor do que o texto inicial que tinha entregue.

Sem dúvida.

Felipe Marra Mendonça, 32 anos.

Page 96: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

96

Anexo 19. Roteiro de perguntas aos colaboradores de piauí. Tomás Chiaverini

A EDIÇÃO COMO ESTILO: INVESTIGAÇÃO DA ROTINA PRODUT IVA

DA SEÇÃO ESQUINA DA REVISTA PIAUÍ

1 - Você trabalha em algum outro lugar? Qual?

Sim. No programa Roda Viva, da TV Cultura.

2 - Há quanto tempo colabora com a revista?

Há cerca de dois anos.

3 - Quantas esquina já escreveu?

Consegui lembrar de onze.

4 - Você acha que publicar uma reportagem na revist a piauí lhe

ajuda profissionalmente?

Sim. Meu emprego atual está diretamente relacionado com meu trabalho

na revista Piauí.

5 - Vários “esquineiros” dizem que é preciso treina r os olhos para

escrever uma esquina . Você poderia explicar melhor o que é isso?

A esquina tem uma abordagem e principalmente uma estética própria. O

primeiro passo para isso é, obviamente, a escolha da pauta. Mas a forma como

os fatos são narrados também deve se adequar a essa estética que, de certa

forma, faz uma releitura dos acontecimentos. Quem vai escrever uma esquina

tem de voltar a atenção às ironias, ao discretamente bizarro, ao pitoresco, ao

divertido das situações. Acho que é isso que um olho treinando busca.

6 - Quanto tempo leva para escrever uma reportagem da esquina ?

Varia. Já levei mais de uma semana, já levei uma tarde.

7 - Como você lida com a edição que a esquina é submetida?

Eu acato, a não ser quando há erros de informação, o que é raro.

8 - Como é a sua relação com o editor da seção esquina , Bernardo

Esteves?

O Bernardo editou apenas duas esquinas minhas. As demais foram

editadas pelo Mario Sergio Conti e pelo João Moreira Sales. Sempre

conversamos por email, e ainda não pude conhecê-lo pessoalmente.

Page 97: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

97

9 - Você tem conhecimento da carta “o que é uma esquina ” de João

Moreira Salles? Se sim, você já a consultou alguma vez? Com que

frequência consulta?

Não.

10 - Já deixou de publicar alguma reportagem por nã o concordar

com a edição do editor?

Não.

11 – Qual a sua rotina, seus passos ao escrever uma reportagem

para a seção esquina ? Por favor, detalhe como é fazer uma reportagem da

seção esquina . (se quiser escolher uma e detalhar como foi) Como ficou

sabendo do assunto da reportagem? A apuração, a hor a de escrever, a

troca de email com o editor e a leitura do produto final.

São rotinas muito variadas, porque os assuntos são diversos. Já viajei

algumas vezes para fazer esquinas. Por outro lado, escrevi uma em que não

houve nenhum trabalho de campo (sobre um perfil falso no Facebook). Mas,

geralmente, envio uma sugestão de pauta aos editores que aprovam ou não a

ideia. Como a esquina é muito pautada em acontecimentos curiosos, em

ambientações e narrativas, gosto de acompanhar os personagens em campo.

Depois sento e escrevo. Em geral deixo ela um ou dois dias parada, depois

releio antes de entregar. A edição, na maior parte das vezes, foi bem discreta e

pontual.

12 - Como você avalia a versão final da reportagem depois da

edição?

Em geral acho os textos excelentes.

Nome e idade: Tomás Chiaverini, 31.

Page 98: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

98

Anexo 20. Roteiro de perguntas aos colaboradores de piauí. Vanessa Barbara

A EDIÇÃO COMO ESTILO: INVESTIGAÇÃO DA ROTINA PRODUT IVA DA SEÇÃO ESQUINA DA REVISTA PIAUÍ

1 - Você trabalha em algum outro lugar? Qual? Sim, para a Folha de S.Paulo. 2 - Há quanto tempo colabora com a revista? Desde o primeiro número. 3 - Quantas esquina já escreveu? 24 4 - Você acha que publicar uma reportagem na revist a piauí lhe

ajuda profissionalmente? Sim, claro. 5 - Vários “esquineiros” dizem que é preciso treina r os olhos para

escrever uma esquina . Você poderia explicar melhor o que é isso? As esquinas em geral falam de um tema prosaico com pompa e garbo,

então é só encarar o mundo desse jeito. 6 - Quanto tempo leva para escrever uma reportagem da esquina ? Depende da apuração, mas a fase da escrita demora poucos dias. 7 - Como você lida com a edição que a esquina é submetida? Cada vez pior. Apesar de agora ser assinada, parece que a seção está

ficando mais e mais padronizada. 8 - Como é a sua relação com o editor da seção esquina , Bernardo

Esteves? Tensa, como a de qualquer repórter com um editor. Mas não é nada

pessoal com o Bernardo, sempre foi assim com os outros editores de esquina, como o Roberto Kaz e o João.

9 - Você tem conhecimento da carta “o que é uma esquina ” de João

Moreira Salles? Se sim, você já a consultou alguma vez? Com que frequência consulta?

Não. 10 - Já deixou de publicar alguma reportagem por nã o concordar

com a edição do editor? Não. Quando se é colaborador, você recebe mediante publicação, aí fica

difícil não publicar. O máximo que faço é publicar em outro veículo.

Page 99: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

99

11 – Qual a sua rotina, seus passos ao escrever uma reportagem para a seção esquina ? Por favor, detalhe como é fazer uma reportagem da seção esquina . Como ficou sabendo do assunto da reportagem? A apuração, a hora de escrever, a troca de email com o editor e a leitura do produto final.

Acho que já respondi nos emails. 12 - Como você avalia a versão final da reportagem depois da

edição? Às vezes você tem sorte e fica bem fiel ao original, mas muitas vezes ela

é cortada ou reelaborada, e aí é uma tristeza. Nome e idade: Vanessa M. Barbara, 30 anos

Page 100: FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL · PDF filePaulinho da Viola (Para ver as meninas) 4 RESUMO A presente monografia visa discutir o processo de produção das notícias da

100

Anexo 21. Roteiro de perguntas aos editores de piauí.

A EDIÇÃO COMO ESTILO: INVESTIGAÇÃO DA ROTINA PRODUT IVA

DA SEÇÃO ESQUINA DA REVISTA PIAUÍ

1 - Há quanto tempo trabalha na revista? Quanto tempo é o editor

responsável pela seção?

2 - Como você avalia a função do editor?

3 - O que você acha do ambiente da redação?

4 - Como é a sua rotina, seus passos, aqui na redação?

5 - Vários “esquineiros” dizem que é preciso treinar os olhos para

escrever uma esquina. Isso também ocorre com a edição?

6 - Quanto tempo leva para editar uma reportagem da esquina?

7 – Há alguns jornalistas que se adequam mais ao formato da seção?

Eles já assimilaram as características da esquina e por isso seus textos são

menos alterados?

8 - Como é a sua relação com os jornalistas que escrevem para a

esquina? Já houve algum tipo de negociação sobre a edição nos textos?

9 - Já deixou de publicar uma esquina por que o jornalista que escreveu

não concordou com a sua edição?

10 - Na hora da edição você já escreveu, ou foi procurar mais dados,

especialistas, que não constavam na versão original?

11 - Quais são seus hábitos, seus passos ao editar uma reportagem

para a seção esquina? Por favor, detalhe como é editar uma reportagem da

seção esquina.

12 - Você acha que os jornalistas que escrevem para a seção, de um modo geral, aprovam ou desaprovam suas versões finais impressas?