ensino de genética e evolução no livro didático

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ENSINO DE GENÉTICA E EVOLUÇÃO NO LIVRO DIDÁTICO Lyndon Johnson Batista de Souza* Ricardo Henrique Duarte Barbosa* Orientador: Ms Luiz Gonzaga Pires** Resumo O livro didático é uma importante ferramenta no processo de aprendizagem, pois trata das temáticas relativas aos programas que deverão ser lecionados, servindo assim de orientação e estímulo para o nível de escolaridade a que se destina. O avanço da tecnologia tem amplificado o volume de informações e contribuído para uma melhor interpretação dos fenômenos já conhecidos, isso faz necessário uma constante atualização do livro-texto. Esse trabalho teve o objetivo de avaliar o progresso do conjunto de conhecimentos de Genética e Evolução que vem sendo apresentado aos estudantes do Ensino Médio no livro didático da professora Doutora Sônia Lopes e, ao mesmo tempo, verificar como as grandes descobertas relativas a tais tópicos têm ocupado espaço nesses livros desde a sua primeira edição em 1985, até a sua quinta e mais recente edição de 2006. Procurou- se nessa análise verificar o conteúdo de cada edição quanto aos seguintes aspectos: contextualidade, nível de atualização, evolução gráfica (tabelas, ilustrações, esquemas, mídia) e a presença de tópicos que propiciassem uma discussão dos aspectos éticos ligados aos avanços da Genética e Evolução. A análise dos resultados mostrou que ocorreu uma grande disparidade entre os conhecimentos adquiridos pela biologia desde 1970 e o avanço letárgico dessas informações nos livros de ensino médio. Esse estudo poderá auxiliar numa reestruturação do ensino de Genética e Evolução no sentido de torná-lo mais reflexivo através de uma abordagem sempre atualizada, dinâmica e interdisciplinar, contribuindo para o entendimento da realidade à sua volta, possibilitando aos jovens estudantes utilizar esses conhecimentos diante de situações do cotidiano. Palavras-Chave: Genética, Evolução, Ensino e educação, Biotecnologia, Livro-texto.

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Ensino de genética e evolução

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Page 1: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático

ENSINO DE GENÉTICA E EVOLUÇÃO NO LIVRO DIDÁTICO

Lyndon Johnson Batista de Souza*Ricardo Henrique Duarte Barbosa*Orientador: Ms Luiz Gonzaga Pires**

Resumo

O livro didático é uma importante ferramenta no processo de aprendizagem, pois

trata das temáticas relativas aos programas que deverão ser lecionados, servindo assim

de orientação e estímulo para o nível de escolaridade a que se destina. O avanço da

tecnologia tem amplificado o volume de informações e contribuído para uma melhor

interpretação dos fenômenos já conhecidos, isso faz necessário uma constante

atualização do livro-texto.

Esse trabalho teve o objetivo de avaliar o progresso do conjunto de conhecimentos

de Genética e Evolução que vem sendo apresentado aos estudantes do Ensino Médio no

livro didático da professora Doutora Sônia Lopes e, ao mesmo tempo, verificar como as

grandes descobertas relativas a tais tópicos têm ocupado espaço nesses livros desde a

sua primeira edição em 1985, até a sua quinta e mais recente edição de 2006. Procurou-

se nessa análise verificar o conteúdo de cada edição quanto aos seguintes aspectos:

contextualidade, nível de atualização, evolução gráfica (tabelas, ilustrações, esquemas,

mídia) e a presença de tópicos que propiciassem uma discussão dos aspectos éticos

ligados aos avanços da Genética e Evolução.

A análise dos resultados mostrou que ocorreu uma grande disparidade entre os

conhecimentos adquiridos pela biologia desde 1970 e o avanço letárgico dessas

informações nos livros de ensino médio. Esse estudo poderá auxiliar numa

reestruturação do ensino de Genética e Evolução no sentido de torná-lo mais reflexivo

através de uma abordagem sempre atualizada, dinâmica e interdisciplinar, contribuindo

para o entendimento da realidade à sua volta, possibilitando aos jovens estudantes

utilizar esses conhecimentos diante de situações do cotidiano.

Palavras-Chave:

Genética, Evolução, Ensino e educação, Biotecnologia, Livro-texto.

Page 2: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático

Abstract

The didactic book is an important tool in the process on learning, because it

responsible to the thematic relative to the programs that must be selected, in the

intension to guide and stimulate the level of schooling in which it is destined. The

advance of technology has amplified the amount of information and contributed to a

better interpretation of the phenomena already known, so it has been necessary a

constant actualization of the text book.

This work had the objective to evaluate the progress of the set of knowledge of

Genetic and Evolution that has been presented to the students of high school in the

didactic book of professor doctor Sônia Lopes and, at the same time, verify how the

great discoveries related to such topics have occupied space in these books since its first

edition in 1985, until its fifth and also more recent edition in 2006. In this analysis, it

was verified the subjects of each edition in such aspects: contextualization, level of

actualization, graphic evolution (table, illustrations, schemes, and media) and the

presence of topics which propitiate a discussion of ethics aspects related to the advances

of Genetic and Evolution.

The analyze of the results showed that occurred a very big disparity among the

acquired knowledge by biology since 1970 and the lethargic advance of these

information in the books to high school. This study can contribute to a rebuild in the

teaching of Genetic and Evolution on the way to get it more reflexive through an

approach always actualized, dynamic and interdisciplinary, aiding to the

comprehension of the reality around it, making possible to the young students utilize

these knowledge in the current situations.

Key-words:

Genetic, Evolution, Teaching and learning, Biotechnology, Text book.

*Biólogos e concludentes do curso de pós-graduação lato sensu em Genética e Evolução com ênfase emdocência superior pela Universidade Federal do Piauí (UFPI).

**Físico e pedagogo, mestre em educação e professor de didática e metodologia da pesquisa naUniversidade Federal do Piauí (UFPI).

Page 3: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático

01. A importância do livro didático no ensino

O livro didático é um importante instrumento de orientação para os professores,

seja no planejamento das atividades escolares, ou na elaboração das aulas. Massabni e

Arruda (2000) afirmam que muitos professores tomam o conhecimento científico neles

contido como padrão do que devem ensinar a seus alunos. Tal afirmativa não deixa de

ser verdade uma vez que o livro é na grande maioria das vezes a única ferramenta

utilizada na preparação dos conteúdos. Por isso é de total relevância que o professor

tenha uma qualificação e um amplo conhecimento da área em que leciona, pois só assim

poderá ter uma visão crítica do conteúdo abordado no livro-texto adotado. Como muitos

professores de ensino médio iniciam suas carreiras sem terem a graduação, não sabem o

que devem ensinar aos alunos e o livro didático acaba sendo à base desse ensino.

Com os adventos da tecnologia, o livro didático tem passado por profundas

modificações. A necessidade da atualização das informações como, por exemplo, a

introdução de novos dados aos conteúdos das obras, fez com que as editoras

especializadas no setor desenvolvessem projetos gráficos arrojados, tornando o livro

mais atraente. Em virtude disso, o livro-texto acaba também por se tornar um fator de

motivação para professores e alunos.

Para Lajolo e Zilberman (1999), entretanto, apesar de ilustre, o livro didático é o

primo pobre da literatura, texto para ler e botar fora, descartável porque anacrônico: ou

ele fica superado dados os progressos da ciência a que se refere ou o estudante o

abandona, por avançar em sua educação. Sua história é das mais esquecidas e

minimizadas, talvez porque os livros didáticos não são conservados, suplantado seu

"prazo de validade”. A cada nova edição, tenham ocorrido grandes reformulações ou

[.....] Mais do que fornecer informações, é fundamental que o ensinode Biologia se volte ao desenvolvimento de competências quepermitam ao aluno lidar com as informações, compreendêlas, elaborá-las, refutá-las, quando for o caso, enfim compreender o mundo e neleagir com autonomia, fazendo uso dos conhecimentos adquiridos daBiologia e da tecnologia.

PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS (ENSINO MÉDIO)Ciências da Natureza - p. 19, 1998

Fernando Fernandez O poema imperfeito

Page 4: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático

não, o livro didático com uma “nova capa” desvaloriza a edição anterior. Isso o torna no

primo rico das editoras, na medida em que se transforma em um bem de consumo, "um

produto típico da indústria cultural, um produto destinado ao consumo que editores e

autores têm interesse em comercializar, uma mercadoria entre outras que circula pelo

mercado e produz lucro, muito lucro" (apud Bittencourt, op. cit., p. 77).

02. Ensino de genética e evolução no livro didático

O ensino de genética na escola básica brasileira tem se caracterizado pela ênfase

aos fenômenos mendelianos simples e pela repetição de conceitos e exemplos clássicos

da hereditariedade. É notória a fragilidade da abordagem de aspectos da genética

humana, das aplicações do conhecimento sobre a estrutura e ação gênicas e das

biotecnologias vegetais e animais. Vale ressaltar que nenhuma ciência evoluiu tanto nos

últimos 50 anos quanto à genética nos seus vários setores. Paradoxalmente, no ensino

médio, a genética não tem acompanhado esse avanço e os livros mostram-se,

claramente, desconectados dos novos grandes temas da área. Há uma uniformidade

marcante no ensino da genética que resiste tanto ao tipo de escola (pública ou privada),

quanto à região do país onde é ensinada. Há uma repetição de conteúdos programáticos,

de conceitos, problemas, refletidos nos diversos livros didáticos. Não somente nas

várias edições da autora em questão, como em edições de autores diferentes, há uma

quase inacreditável, coincidência dos conteúdos tanto na sua composição quanto na sua

organização. A forma canônica de uma genética clássica é clonada e adotada pelos mais

diversos autores tornando o ensino de genética algo previsível. O enfoque, os exemplos

adotados, torna os discursos dos professores uma espécie de “cantochão” didático.

Em qualquer canto do país os jovens são apresentados aos seguintes temas, quase

sempre, nessa ordem:

- Primeiras idéias sobre hereditariedade: Aqui são apresentadas teorias vitalistas e pré-

formacionistas da hereditariedade;

- As ervilhas de Mendel: apesar da importância do método científico adotado pelo “pai

da Genética”, essa abordagem é apresentada de forma demorada dentro dos livros

contribuindo para consolidar uma visão mecanicista e puramente estatística da Genética.

- Cruzamentos e probabilidades: quase todos os tipos de cruzamentos apresentados são

frutos de trabalhos publicados nas primeiras décadas do Séc. XX. Os ratos de Cuenot, as

Page 5: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático

galinhas de Bateson, as moscas de Morgan e a macaca Rhesus de Landsteiner só para

citar alguns exemplos da série de outros tantos que se repetem ano após ano.

As informações referentes ao ensino de evolução praticamente não evoluíram.

Tratada pelos livros didáticos como sendo mais um tópico no rol dos conteúdos da

biologia, não se evidencia a evolução como eixo integrador que envolve todas as áreas

da biodiversidade como se destina. Assim como no ensino de genética, a evolução tem

sido abordada de maneira repetitiva dando ênfase as evidências evolutivas (homologias,

analogias, fósseis, órgãos vestigiais...), as teorias evolutivas e aos mecanismos da

especiação. Não que tais temas sejam irrelevantes, porém a forma como são abordados

utilizando-se dos mesmos exemplos (pescoço das girafas, bico dos tentilhões, burro

como um híbrido estéril resultante do cruzamento entre o jumento e a égua e tantos

outros), revela a defasagem no material didático. Talvez estes problemas contribuam

para o fato de determinados conhecimentos científicos não se apresentarem nas escolas

como o esperado.

“Nada tem sentido em biologia, exceto à luz da evolução” já dizia Dobzhansky.

Utilizar os conhecimentos evolutivos para a classificação dos seres aplicando os

princípios da escola cladística, aplicar noções de deriva continental e tectônica de placas

para a compreensão da vicariância, realizar conexão entre os mecanismos da genética

para a especiação de cada grande grupo de seres vivos, seriam apenas algumas

indicações que poderiam remover as idéias errôneas que muitos professores e alunos

possuem da idéia de evolução associada ao progresso e de adaptação ligada à idéia de

melhoria. "A visão de evolução que predomina nas escolas é a de um processo lento,

resultado do acúmulo progressivo de mudanças aleatórias vantajosas em seu material

genético, que são selecionadas pelo processo da seleção natural. Outras visões, como a

Teoria do Equilíbrio Pontuado, de Stephen Jay Gould, e as evidências do Neutralismo,

praticamente não aparecem nos livros escolares" (Dorvillé 2005).

03. Vinte e dois anos de ensino de genética e evolução

Tradicionalmente a genética era estudada na 2ª série do ensino médio, porém, nos

últimos anos com a implantação de vestibulares seriados seu conteúdo passou a ser

ministrado na 3ª série. A carga horária semanal varia de escola para escola nas redes

públicas e privadas, e é bastante comum na 3ª série rever concomitantemente os

assuntos das séries anteriores em função dos vestibulares. Além de genética e evolução,

Page 6: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático

o professor que ministrar esta “frente” normalmente encerra os trabalhos com o assunto

de ecologia, pois este é um tema global e unificador de todos os tópicos do programa do

ensino médio. Então a seqüência tradicional do ensino fica sendo: Genética

Evolução Ecologia.

A coleção didática da professora Sônia Lopes pesquisada nesse trabalho, trás um

de seus compêndios com os temas de Genética, Evolução e Ecologia desde a 1ª edição

até a mais recente, lançada e utilizada por muitas escolas no Brasil. Após o lançamento

das edições, o livro foi utilizado em sala de aula nos seguintes anos:

1ª Edição (1985) – Livro verde 85, 86, 87, 88, 89, 90, 91 e 92.

2ª Edição (1992) – Bio 3 93, 94, 95, 96 e 97.

3ª Edição (1997) – Bio 3 98, 99, 00, 01 e 02.

4ª Edição (2002) – Bio 3 03, 04, 05 e 06.

5ª Edição (2006) – Bio 3 2007.

Serão apresentados a seguir os programas de Genética e Evolução constantes nas

várias edições (anexo), bem como uma análise de cada um.

Page 7: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático

Livro verde BIO Volume 3. / Sônia Lopes – São Paulo: 1ª ed. Ática, 1985.

O conteúdo de Genética apresentado está relacionado direta ou indiretamente com

a Genética Mendeliana. Somente no final do programa apresentado é que a autora trás

uma unidade (3º unidade) revelando o modo de ação do material genético. Nesta, são

apresentados os experimentos de Beadle e Tatum (Gene Enzima), o código genético

e o mecanismo de expressão gênica. Tal apresentação foi bastante salutar, uma vez que

proporciona ao aluno uma melhor compreensão do conceito de gene.

A grande falha observada por esta pesquisa foi a de não ter aparecido e nem se

quer mencionado em nenhum momento, a tecnologia do DNA recombinante, pois até

1985, ano de publicação desta edição, a biotecnologia já era uma realidade social.

Muitos outros fatos importantes relacionados à Genética, principalmente aqueles

vinculados a natureza química do gene poderiam ter constado na obra. É bom

lembrarmos que os Prêmios Nobel de Medicina e Fisiologia de 1978, 1980 e 1983 estão

relacionados com a Genética molecular, e discutir os impactos que tais tecnologias

poderiam trazer para a sociedade seria de grande relevância para os jovens estudantes.

O conteúdo de Evolução é apresentado de forma clássica e histórica não atingindo

os objetivos a que se destina. Nesta edição, não fica evidenciado a conexão entre os

demais assuntos da biologia que é um dos principais objetivos do ensino de Evolução.

Apesar dos trabalhos de Henning serem conhecidos desde 1966, a sistemática

filogenética não é mencionada nem a importância da Evolução em tal mecanismo.

Dentro dos conceitos de populações e espécies (parte II, capítulo 3), a autora revela

noções da escola Lineana e afirma que até hoje esse sistema de classificação puramente

tipológico é utilizado!

Page 8: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático

A autora Sônia Lopes não contempla na 1ª edição nenhum aspecto relacionado à

Evolução humana e não levanta qualquer questionamento de especiação por anagênese

e cladogênese. No estudo das mutações (capítulo 4), poderia ter sido citado exemplos

em cada um dos casos, facilitando assim a compreensão.

A ausência total de propostas que possam transportar o aluno de um cenário

meramente científico para um contexto em que estão envolvidos vários aspectos da

Genética e da Evolução biológica, é notória do início ao fim desta primeira edição.

Livro BIO Volume 3. / Sônia Lopes – São Paulo: 2ª ed. Ática, 1992.

Na apresentação desta 2ª edição a autora comenta:

“Após vários anos de seu lançamento, a coleção BIO foi agora totalmente

reformulada. [...] O conteúdo foi atualizado de modo a contemplar o crescente

desenvolvimento da área biológica, um dos campos do conhecimento que mais

tem ampliado suas fronteiras atualmente”.

No entanto, o que se observa no cerne da obra é que foram mantidos os mesmos

tópicos, mesmos conceitos, mesmos exemplos e praticamente os mesmos problemas. O

que houve na realidade foi uma supressão da edição anterior com a eliminação de

muitos tópicos (noções de citologia, probabilidade de muitos eventos independentes,

regulação da atividade gênica e noções de sistemática).

Até o ano de lançamento desta edição (1992), a genética e a evolução juntamente

com a biologia molecular, desfrutavam de um status impressionante. Os progressos no

campo do sequenciamento de genes, da produção de proteínas humanas de valor

Page 9: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático

terapêutico, da reprodução medicamente assistida, do melhoramento genético animal e

vegetal e da transgenia foram fartamente propagados e já eram assuntos que começavam

a fazer parte do repertório coletivo. Porém o que se observa é que o ensino de Genética

e Evolução no livro-texto se demonstrava totalmente desconectado das grandes

transformações que ocorriam no mundo que eram noticiadas diariamente nos meios de

comunicação.

Assim como a ausência da biotecnologia, na parte referente ao conteúdo de

Evolução, continua não constando à evolução humana. Na pesquisa foi encontrado um

erro, onde o favorecimento das pessoas heterozigóticas para o alelo da anemia

falciforme em regiões onde a malária é endêmica, é citado como sendo um tipo de

seleção disruptiva. A autora ainda comete um equívoco na página 21 – Leitura

complementar: A difração de raios X e a estrutura da molécula de DNA – onde é

afirmado que Rosalind Franklin compartilhou o Prêmio Nobel de 1962 com Watson e

Crick. Na realidade o prêmio foi partilhado com Maurice Wilkins, pois Rosalind

morrera em 16 de abril de 1958, vitimada de câncer de mama.

Livro BIO Volume 3. / Sônia Lopes – São Paulo: 3ª ed. Ática, 1997.

Com esta 3ª edição, a coleção “BIO – 3” começa realmente a passar por

significativas reformulações, havendo uma redução de tamanho e passando a ser

totalmente colorido. Nesta, é introduzido no final da maioria dos capítulos um “tema

Page 10: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático

para discussão”. Embora dos doze temas propostos, seis sejam uma mera repetição do

item “Leitura complementar” da edição anterior, isso já revela uma considerável

modificação, uma vez que os temas inéditos tratam de assuntos que circulavam

constantemente nos meios de comunicação na época do lançamento (Projeto Genoma

Humano, Mapeamento genético e Dilemas bioéticos). Também faz parte das inovações,

o surgimento de um capítulo inteiro destinado à biotecnologia e a engenharia genética

(capítulo 13 – anexo). Ora, a pauta dos principais noticiários é pontuada completamente

por assuntos ligados a essas biotecnologias e assim, não seria concebível a continuidade

da omissão dessas questões por parte da autora.

A Evolução Humana aparece como um tópico dentro do capítulo de especiação.

Sob a capa de que tal assunto gera muita discussão entre os biólogos, a autora limita-se

apenas a sistemática, com uma abordagem dos Primatas, Hominídeos e do Homo

sapiens, o que não deixa de ser um grande salto, pois tal assunto é totalmente ausente

nas edições anteriores. O erro da edição anterior sobre a anemia falciforme foi

devidamente corrigido e o equívoco do Nobel de 62 foi negligenciado! A essência do

conteúdo de evolução foi mantida, porém noções de deriva continental foram

pertinentemente mencionadas na página 236, ainda que de maneira bem simplificada.

Infelizmente os exemplos de fenômenos hereditários (codominância, polialelia,

interações gênicas, linkage, genética do sexo...) continuam sendo os mesmos das

edições anteriores nos quais aparecem os mesmos organismos-modelo (ervilhas,

moscas, coelhos e galinhas) das experiências conduzidas entre o final do século XIX e

as primeiras décadas do século XX. A utilização de exemplos envolvendo seres

humanos ou plantas e animais de maior interesse é quase desprezível.

Livro BIO Volume 3. / Sônia Lopes – São Paulo: 4ª ed. Ática, 2002.

Page 11: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático

Alegando relacionar o conteúdo do dia-a-dia do aluno com a teoria exposta na

obra, a professora Sônia Lopes apresenta esta 4ª edição com muitas inovações gráficas e

teóricas. Muito bem diagramado e ricamente ilustrado, onde as fotografias da abertura

de cada capítulo dão um requinte estimulante à leitura, fazem desta obra a mais didática

das edições, sendo um “embrião” do grau máximo de perfeição gráfica que estará por

vir no próximo lançamento.

Ao final de cada capítulo, foi introduzido um roteiro de estudo, um tema para

discussão, testes e questões discursivas. No final da obra constam como anexo, uma

tabela de atualização de nomenclatura, um índice remissivo, uma bibliografia mais

ampla e o significado das siglas de instituições responsáveis pelos vestibulares de onde

foram retiradas as questões para os exercícios.

No cerne da obra vale ressaltar que foram feitas atualizações em função da

revelação do genoma humano, como por exemplo, o número estimado de genes, que na

edição anterior fala-se em 100 mil genes e agora em cerca de 40 mil. DNA codificante,

não codificante, introns, exons, DNA-lixo, eletroforese, proteoma e PCR são

mencionados também. A clonagem e as vacinas gênicas ganharam tópicos individuais

dentro do capítulo de Biotecnologia, que por sinal é o grande destaque inovador quando

comparado com os demais capítulos.

A possível explicação para uma mudança tão considerável nessa última edição

baseia-se na escalada e difusão das descobertas dos últimos anos no tocante a clonagem

de mamíferos, final do sequênciamento do genoma humano, comercialização de

transgênicos, manipulação de embriões e de células-tronco, a popularização dos testes

de DNA e todo um leque de estudos gênicos que prometem revolucionar a medicina, a

zootecnia e a agricultura.

Apesar da estrutura seqüencial sobre o conteúdo de Evolução ter sido mantida, os

transposons, retrotransposons e a seleção sexual ganharam espaço. No capítulo de

especiação a autora finalmente introduz conceitos que são indispensáveis na

compreensão do mecanismo evolutivo: gradualismo x equilíbrio pontuado; anagênese x

cladogênese. A evolução humana ganhou mais espaço e uma ênfase maior, com

informações sobre as possíveis rotas migratórias promovidas pelo Homo sapiens e a

evolução da cultura.

Page 12: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático

Livro BIO Volume 3. / Sônia Lopes – São Paulo: 5ª ed. Ática, 2006.

Mediante as transformações ocorridas na edição anterior, estimava-se que neste

lançamento de 2006 a continuidade da evolução do projeto gráfico fosse acompanhada

de atualizações teóricas significativas, mais não! Comparando essas duas últimas

edições percebe-se que as alterações foram bem marcantes no aspecto gráfico – tipo de

papel, dimensões, fotografias, tabelas, visualização – e bastante insignificantes no

contexto teórico. As inovações ficaram por conta do acompanhamento de um CD-ROM

com diversas atividades, da introdução da seção “Aplique o que aprendeu” nos

exercícios, dos textos de abertura de cada unidade (Por que estudar...?) e de pequenas

modificações ao longo do texto principal.

Os quatro anos que separam os lançamentos dessas duas obras foram marcados

por intensos debates Bioéticos. A lei de biossegurança e a manipulação de organismos

geneticamente modificados, bem como a utilização das células-tronco embrionárias,

pairaram na mídia quase que diariamente. Mesmo levando em consideração que a

essência da obra deve ser mantida, não parece ser justificável a inércia do ensino de

genética, a não atualização, a não contextualização do seu programa e não inclusão de

uma abordagem das questões éticas, legais e sociais que afloram dessas novas

pesquisas. Também seria salutar lembrarmos a total falta de informação sobre a genética

do desenvolvimento e o processo de morte celular programada, que também foram bem

alardeados nos meios de divulgação científica durante este período.

Na parte destinada ao ensino de Evolução as mudanças praticamente não

ocorreram. Nada de novo ao texto foi acrescentado – será que não tivemos evolução? –

no entanto as modificações no texto ocorreram em termos organizacionais, ou seja, a

Page 13: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático

genética de populações foi extraída do capítulo da teoria sintética e acrescentada ao

estudo da especiação. Sobre a evolução humana tudo foi mantido como na edição

anterior.

O livro didático é o primeiro e provavelmente o mais acessível veículo de

mudança. O conteúdo de um livro didático deve ser elaborado no sentido de provocar

professores e alunos para o debate das novas questões que a biologia apresenta. Para

isso o boxe “Tema para discussão” deveria ser mais criterioso, estando voltado com

temas sincronizados com o capítulo que o precede.

04. Considerações finais

O resultado da análise das cinco edições da coleção BIO 3 da professora Sônia

Lopes, leva à constatação de que os livros didáticos de Genética e Evolução não

incorporaram as novidades e revoluções geradas por essas ciências no lançamento de

cada edição. As inovações tipográficas foram muito mais ordenadas que as informações

teóricas, pois estas, na grande maioria da obra, são repetitivas e chegam a ser

previsíveis. Se não fossem pelas mudanças nos exercícios e testes de vestibulares, um

aluno portando a 3ª edição acompanharia normalmente sua série escolar ao lado

daqueles que utilizassem a 5ª edição.

Os professores já demonstram inquietação diante da demanda dos estudantes

pelas descobertas da Genética e da Evolução. Se os vestibulares são elaborados com

base na literatura do aluno, cabe aos autores e editores conciliarem as inovações com a

realidade dos estudantes. Temas como ciência, poder e injustiça, vulnerabilidade de

populações pobres diante das pesquisas genéticas, acesso a serviços de saúde, direito à

informação genética, direitos reprodutivos, desenvolvimento ecologicamente

sustentável, bem como o resgate de conceitos da ética e da moral são plenamente

cabíveis no universo da escola básica, desde que haja uma adequação na forma de

apresentar esses assuntos.

Que a última edição, com sua excelente diagramação e perfeita sintonia didática,

sirva de molde para absorver as inovações que ainda foram omitidas ou as que ainda

estão por vir. O próximo passo, depois dessa renovação do livro didático, mantendo-se

agora sim sempre atualizado, seria a reformulação do currículo de Genética e Evolução.

O intuito seria de combinar essas novidades técnicas do livro-texto com enfoque

Page 14: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático

bioético, tendo como objetivo geral dessa combinação, o desenvolvimento da percepção

pública crítica das novas biotecnologias no contexto de um país com o panorama sócio-

econômico e cultural como o nosso.

Por sermos professores de ensino médio e utilizarmos essa prestigiada coleção

desde seu primeiro lançamento, sentimos a obrigação de realizar essa pesquisa com a

intenção de despertar a necessidade da conexão entre os avanços da Genética e

Evolução e o ensino, por meio do livro didático. Isso seria uma forma de não manter em

atraso os nossos jovens em relação aos estudantes dos paises ricos que têm acesso em

grande proporção aos novos conceitos da genômica e das biotecnologias do DNA.

Page 15: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático

05. Anexo – Sumário das edições

Livro verde BIO Volume 3. / Sônia Lopes – São Paulo: 1ª ed. Ática, 1985.

Page 16: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático
Page 17: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático

Livro BIO Volume 3. / Sônia Lopes – São Paulo: 2ª ed. Ática, 1992.

Page 18: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático
Page 19: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático
Page 20: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático

Livro BIO Volume 3. / Sônia Lopes – São Paulo: 3ª ed. Ática, 1997.

Page 21: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático
Page 22: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático

Livro BIO Volume 3. / Sônia Lopes – São Paulo: 4ª ed. Ática, 2002.

Page 23: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático
Page 24: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático
Page 25: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático

Livro BIO Volume 3. / Sônia Lopes – São Paulo: 5ª ed. Ática, 2006.

Page 26: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático
Page 27: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático
Page 28: Ensino de Genética e Evolução No Livro Didático

REFERÊNCIAS

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