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Encontro Nacional BETÃO ESTRUTURAL - BE2012 FEUP, 24-26 de outubro de 2012 Ensaios de receção ao novo viaduto ferroviário da Trofa Rémy de Faria 1 Filipe Cavadas 2 João Rio 2 Joaquim Figueiras 2 RESUMO O novo viaduto ferroviário na variante da Trofa da linha do Minho, com 327 m de comprimento, foi construído a leste da atual estação da Trofa, junto à Igreja nova. Antes da sua entrada em serviço no dia 16 de Agosto de 2010, pretendia-se conhecer o desempenho da estrutura submetida a solicitações semelhantes às ações a que vai estar sujeita durante a sua utilização corrente, em termos de comportamento e deformabilidade. Para o efeito foi planeado e executado um ensaio de carga e um ensaio ambiental, tendo a estrutura sido devidamente monitorizada para avaliar o seu comportamento. No ensaio de carga foram observados deslocamentos verticais e rotações de diversas secções sob a ação de diferentes veículos ferroviários, quer efetuando paragens em secções críticas, quer obtendo linhas de influência das cargas circulantes. No ensaio ambiental foram observados os movimentos das juntas de dilatação e a temperatura ambiente. Todos os resultados foram obtidos de forma automática, permitindo a observação em tempo real das grandezas mais relevantes para avaliação do comportamento do viaduto. Estes ensaios tinham por objetivo verificar a conformidade entre a resposta estrutural do viaduto construído e o projetado e estabelecer um estado inicial de referência com vista a futuras avaliações. Palavras-chave: Viaduto ferroviário, Estruturas de betão, Ensaio de carga, Sistemas de monitorização, Avaliação do comportamento. 1. INTRODUÇÃO No final da construção de uma obra de arte, a condução de ensaios de caracterização do comportamento tem como objetivos principais a aferição e validação dos modelos numéricos, a avaliação das condições de segurança e de integridade da estrutura e averiguar a conformidade da estrutura executada face aos pressupostos subjacentes ao projeto [1]. Durante estes ensaios é observado o comportamento da obra face a um conjunto de ações estáticas e dinâmicas. Com vista à caracterização do comportamento estático são conduzidas provas de carga, são definidas linhas de influência e é observado o efeito das ações ambientais. Nestes ensaios é caracterizado com o máximo rigor a ação e os respetivos efeitos induzidos na estrutura. Para a caracterização do comportamento dinâmico podem ser realizados ensaios de vibração ambiental e ensaios de vibração forçada. Nas obras de arte existentes coloca-se frequentemente a questão de determinar as condições de segurança em que estas são ou serão utilizadas [2]. As incertezas decorrem do envelhecimento dos materiais estruturais, da eventual ocorrência de danos, da alteração das condições de utilização e das novas exigências de segurança. Nesta perspetiva, é útil a monitorização e compreensão do comportamento inicial de estrutura, de forma a poder servir de referência a estudos futuros quando 1 NewMENSUS, Rua do Actor Ferreira da Silva, 100, 4200-298 Porto, Portugal. [email protected] 2 LABEST, Faculdade de Engenharia, Universidade do Porto, Porto, Portugal. [email protected] (Filipe Cavadas); [email protected] (João Rio); [email protected] (Joaquim Figueiras)

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Encontro Nacional BETÃO ESTRUTURAL - BE2012 FEUP, 24-26 de outubro de 2012

Ensaios de receção ao novo viaduto ferroviário da Trofa

Rémy de Faria1 Filipe Cavadas2 João Rio2 Joaquim Figueiras2

RESUMO O novo viaduto ferroviário na variante da Trofa da linha do Minho, com 327 m de comprimento, foi construído a leste da atual estação da Trofa, junto à Igreja nova. Antes da sua entrada em serviço no dia 16 de Agosto de 2010, pretendia-se conhecer o desempenho da estrutura submetida a solicitações semelhantes às ações a que vai estar sujeita durante a sua utilização corrente, em termos de comportamento e deformabilidade. Para o efeito foi planeado e executado um ensaio de carga e um ensaio ambiental, tendo a estrutura sido devidamente monitorizada para avaliar o seu comportamento. No ensaio de carga foram observados deslocamentos verticais e rotações de diversas secções sob a ação de diferentes veículos ferroviários, quer efetuando paragens em secções críticas, quer obtendo linhas de influência das cargas circulantes. No ensaio ambiental foram observados os movimentos das juntas de dilatação e a temperatura ambiente. Todos os resultados foram obtidos de forma automática, permitindo a observação em tempo real das grandezas mais relevantes para avaliação do comportamento do viaduto. Estes ensaios tinham por objetivo verificar a conformidade entre a resposta estrutural do viaduto construído e o projetado e estabelecer um estado inicial de referência com vista a futuras avaliações. Palavras-chave: Viaduto ferroviário, Estruturas de betão, Ensaio de carga, Sistemas de monitorização, Avaliação do comportamento. 1. INTRODUÇÃO No final da construção de uma obra de arte, a condução de ensaios de caracterização do comportamento tem como objetivos principais a aferição e validação dos modelos numéricos, a avaliação das condições de segurança e de integridade da estrutura e averiguar a conformidade da estrutura executada face aos pressupostos subjacentes ao projeto [1]. Durante estes ensaios é observado o comportamento da obra face a um conjunto de ações estáticas e dinâmicas. Com vista à caracterização do comportamento estático são conduzidas provas de carga, são definidas linhas de influência e é observado o efeito das ações ambientais. Nestes ensaios é caracterizado com o máximo rigor a ação e os respetivos efeitos induzidos na estrutura. Para a caracterização do comportamento dinâmico podem ser realizados ensaios de vibração ambiental e ensaios de vibração forçada. Nas obras de arte existentes coloca-se frequentemente a questão de determinar as condições de segurança em que estas são ou serão utilizadas [2]. As incertezas decorrem do envelhecimento dos materiais estruturais, da eventual ocorrência de danos, da alteração das condições de utilização e das novas exigências de segurança. Nesta perspetiva, é útil a monitorização e compreensão do comportamento inicial de estrutura, de forma a poder servir de referência a estudos futuros quando

1 NewMENSUS, Rua do Actor Ferreira da Silva, 100, 4200-298 Porto, Portugal. [email protected] 2 LABEST, Faculdade de Engenharia, Universidade do Porto, Porto, Portugal. [email protected] (Filipe Cavadas);

[email protected] (João Rio); [email protected] (Joaquim Figueiras)

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Ensaio de receção ao novo viaduto ferroviário da Trofa

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forem conduzidas provas de carga e sempre que estejam em causa as condições de segurança da estrutura [3]. No presente artigo são apresentados os resultados dos ensaios de receção do viaduto ferroviário da Trofa, que incluíram um ensaio de carga e um ensaio ambiental, e a descrição do sistema de monitorização utilizado para acompanhar o seu comportamento. É também apresentado um modelo numérico cujos resultados serviram de base de comparação com as grandezas medidas. 2. VIADUTO FERROVIÁRIO DA TROFA 2.1 Descrição geral da obra O viaduto ferroviário da Trofa, na linha do Minho entre os km 2+392 e km 2+719, ilustrado na Fig. 1, desenvolve-se, em planta, ao longo de duas curvas e um alinhamento reto, e segundo um trainel inclinado, em alçado, com a face inferior do tabuleiro situada entre 4 m a 5 m de altura em relação à cota final do terreno circundante [4]. Com um comprimento total de 327 m, divide-se em 12 tramos: dois de 21.0 m (tramos extremos) e 10 de 28.5 m (tramos intermédios).

Figura 1. Alçado e planta ao nível do tabuleiro do viaduto ferroviário da Trofa.

a) Zona sem cais de embarque b) Zona com cais de embarque

Figura 2. Secções transversais tipo do viaduto ferroviário da Trofa.

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A solução estrutural preconizada é a de um tabuleiro contínuo em laje vigada de betão armado, com secção transversal em “U”, em que a laje tem cerca de 10.0 m de largura e 0.5 m de espessura, e as vigas de bordo têm cerca de 2.2 m de altura e 0.6 m de espessura; Como se ilustra na Fig. 2, o perfil transversal apresenta duas secções distintas:

• Zona sem cais de embarque (tramos 1, 2, 11 e 12) com largura total de 13.34 m; • Zona com cais de embarque (tramos 3 a 10) com largura total de 17.84 m.

Simplesmente apoiado, com pré-esforço aderente nas direções longitudinal e transversal, o tabuleiro descarrega sobre pares de pilares de betão armado com 1.50 m de diâmetro e sobre os encontros também de betão armado. A transmissão de carga é feita por intermédio de aparelhos de apoio, sendo que na zona central (P4 a P8) os aparelhos de apoio dos pilares são de rigidez controlada, capazes de absorver movimentos dinâmicos de grande amplitude. Os restantes pilares estão equipados com aparelhos de apoio unidirecionais em panela de aço. Nos encontros, os aparelhos de apoio são do tipo óleo-dinâmicos de força controlada. A fundação dos pilares e dos encontros é constituída, cerca de 2/3 do total, por fundações indiretas do tipo estacas com comprimento até 10 m na zona Sul (do lado do Porto), e cerca de 1/3 do total, por fundações diretas do tipo sapatas maioritariamente na zona Norte (do lado de Braga). 2.2 Modelo numérico Com o intuito de analisar os resultados dos ensaios de receção realizados no viaduto ferroviário da Trofa, nomeadamente os valores das flechas medidos durante o ensaio de carga, foi desenvolvido um modelo numérico que simula o comportamento da estrutura [5]. O modelo numérico é constituído exclusivamente por elementos finitos de casca, como se ilustra na Fig. 3. As características geométricas e as características elásticas e de resistência foram obtidas da memória descritiva do projeto de execução [4]. Foi modelado somente o tabuleiro, em betão da classe C40/50, com comportamento linear elástico, cujo perfil transversal ficou definido por painéis de diferentes espessuras localizados nos eixos dos elementos estruturais da secção. No modelo não foram considerados os pilares, tendo-se materializado os apoios diretamente em nós dos painéis das vigas, onde foram impedidos os movimentos vertical e transversal. Com o intuito de simplificar a modelação e aligeirar o esforço computacional, foi modelada apenas metade do tabuleiro, com secção constante e em alinhamento reto, com plano de simetria sobre o alinhamento dos pilares P6 onde foram impedidos deslocamentos longitudinais e rotações em torno do eixo transversal. Esta consideração de simetria não é válida para carregamentos não simétricos, onde a rotação sobre o apoio P6 (pilar central) é diferente de zero. Por este motivo, não se consideram as situações de carregamento sobre o tramo 6 para efeitos de comparação com os valores medidos. Contudo, para solicitações sobre os restantes tramos entende-se que as simplificações implementadas são aceitáveis para a análise de carregamentos verticais levada a cabo.

Figura 3. Vista isométrica do modelo numérico.

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3. SISTEMA DE MONITORIZAÇÃO A observação do comportamento da obra de arte durante os ensaios de receção compreendeu a medição de vários tipos de grandezas nomeadamente, deslocamentos verticais, rotações longitudinais e transversais, deslocamentos nas juntas de dilatação e temperaturas. A utilização de um sistema de aquisição e registo integrado, de base elétrica, permitiu a medição automática e simultânea da totalidade das grandezas, com o mínimo de intervenção de operadores.

Figura 4. Planta do Viaduto da Trofa ilustrando a localização dos sensores.

Para a medição dos deslocamentos verticais (DV) foram utilizados transdutores elétricos do tipo LVDT. Foram instalados aos pares, num total de oito transdutores, a meio-vão dos tramos 1, 3, 5 e 7, quer do lado da via ascendente (VA) quer do lado da via descendente (VD), como se ilustra na Fig. 4. A Fig. 5.a ilustra a instalação do sensor instalado a meio-vão do tramo 7, do lado da VD (DV8). As rotações (IS) foram medidas com inclinómetros elétricos do tipo do ilustrado na Fig. 5.b. As rotações longitudinais do tabuleiro foram observadas em duas secções de apoio, uma de extremidade, no encontro do lado do Porto (IS01), e outra de continuidade, sobre o Pilar P2 (IS02). As rotações transversais do tabuleiro foram medidas a meio-vão dos tramos 5 e 7, designadas, respetivamente, por IS03 e IS04. A posição dos inclinómetros, todos do lado da VD, pode ser consultada na Fig. 4. Para a medição dos movimentos das juntas de dilatação (DH) foram utilizados transdutores elétricos também do tipo LVDT. Como se ilustra na Fig. 4, foram instalados dois transdutores em cada uma das juntas de dilatação: no encontro do lado do Porto (DH01 e DH02) e no do lado de Braga (DH03 e DH04). A Fig. 5.c ilustra a instalação do transdutor utilizado para medir o deslocamento da junta de dilatação do lado da VA, no encontro do lado de Braga (DH03). Complementarmente, foram utilizados dois sensores de temperatura (ST), de tipo resistivo, instalados junto aos encontros (Fig. 4) com o intuito de registar as variações de temperatura ambiente. Durante o ensaio de carga a sua medição visava permitir, sempre que necessário, a compensação dos efeitos das variações de temperatura na resposta dos restantes sensores. No ensaio ambiental, a sua medição tinha como objetivos facilitar a interpretação dos resultados e permitir estabelecer uma correlação entre os deslocamentos medidos e a variação de temperatura.

a) Deslocamento Verticais;

b) Rotações;

c) Deslocamento nas juntas;

Figura 5. Instalação dos sensores utilizados durante os ensaios de receção.

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4. CONDUÇÃO DO ENSAIO DE CARGA No ensaio de carga foram utilizados uma locomotiva, uma máquina estabilizadora DGS 62 N (a ser designada ao longo do presente trabalho apenas por estabilizadora) e quatro vagões balastreiros, carregados e nivelados, de duas caixas por vagão. As principais características dos veículos utilizados, quer em termos de dimensões quer em termos de carga por eixo, são apresentadas na Fig. 6. De forma a gerar esforços na estrutura próximos dos que se obtêm com o valor frequente da sobrecarga regulamentar, permitindo assim uma interpretação mais cabal dos resultados, foi utilizado um comboio de cargas composto pela locomotiva e por quatro vagões balastreiros. Num total de 20 eixos, quatro correspondentes à locomotiva e 16 relativos aos vagões balastreiros, a carga distribui-se ao longo de cerca de 75 m, sendo a distância entre o eixo traseiro da locomotiva e o eixo frontal do primeiro vagão de 3.75 m e a distância entre vagões de 3.50m.

a) Locomotiva; b) Estabilizadora;

c) Vagão balastreiro de 2 caixas;

Figura 6. Características dos veículos utilizados. O ensaio de carga foi realizado em condições próximas das condições de utilização, i.e., os materiais e equipamentos que fazem parte do viaduto estavam quase todos instalados, e todo o equipamento que fez parte dos trabalhos de construção estava removido. Contudo, verificaram-se algumas restrições à passagem dos veículos ferroviários utilizados no carregamento, nomeadamente no que concerne aos limites máximos de velocidade, visto a linha férrea não estar ainda finalizada à data do ensaio. O ensaio contemplou um conjunto de passagens, associando-se a cada uma delas uma sequência de posições ou movimento dos veículos sobre o viaduto. A Passagem A incluiu dois trajetos com posições estáticas de carga da locomotiva e da estabilizadora que consistiram em paragens dos veículos, lado a lado, a meio-vão dos tramos 1 a 8, sempre no sentido Porto-Braga. No trajeto A.1 a locomotiva circulava na VA e a estabilizadora na VD. No trajeto A.2 a locomotiva circulava na VD e a estabilizadora na VA. Na Passagem B, a locomotiva deslocou-se isoladamente em cada uma das vias de circulação, a uma velocidade lenta de aproximadamente 5 km/h, no sentido Porto-Braga, e a uma velocidade mais elevada de aproximadamente 50 km/h, no sentido Braga-Porto.

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Na Passagem C, o comboio de cargas composto pela locomotiva e pelos vagões balastreiros circulou em cada uma das vias de circulação, a uma velocidade lenta de aproximadamente 5 km/h, no sentido Porto-Braga, e a uma velocidade mais elevada de aproximadamente 50 km/h, no sentido Braga-Porto. A posição dos veículos na linha ferroviária determinou que no sentido Braga-Porto a locomotiva circulasse à frente e assim “puxasse” os vagões balastreiros enquanto no sentido Porto-Braga aquela circulava atrás “empurrando” estes. Foram ainda feitas passagens do comboio de cargas composto pela locomotiva e pelos vagões balastreiros com frenagens totais nos sentidos Porto-Braga e Braga-Porto, em ambas as vias, na zona instrumentada junto ao encontro sul (do lado do Porto), com uma velocidade de entrada no viaduto de aproximadamente 50 km/h. 5. RESULTADOS DOS ENSAIOS Nos ensaios de receção realizados no viaduto ferroviário da Trofa foi recolhido um conjunto alargado de resultados de forma a caracterizar adequadamente o comportamento estrutural, verificar a sua repetibilidade e estabelecer um estado de referência que possa ser utilizado para futuras avaliações do estado de conservação da estrutura. Nesta Secção serão apresentados alguns dos resultados mais relevantes recolhidos quer durante o ensaio de carga quer durante o ensaio ambiental. 5.1 Ensaio de carga Na Fig. 7 apresentam-se os resultados das medições das flechas e rotações longitudinais efetuadas durante o trajeto A.2. Como se referiu anteriormente, este trajeto, em que a locomotiva circulava na VD e a estabilizadora na VA, incluiu oito casos de carga que consistiram na paragem dos veículos, lado a lado, a meio-vão dos tramos 1 a 8.

-2.5

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23:36 23:40 23:44 23:49 23:53 23:57 0:02

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Tempo - (hh:mm)

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Ro

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^-3

⁰)

Tempo - (hh:mm)

IS01

IS02

Tramo 1 Tramo 3 Tramo 5 Tramo 7

a) Deslocamentos verticais b) Rotações longitudinais

Figura 7. Resultados das medições efetuadas durante o trajeto A.2. Como se pode ver na Fig. 7.a, as flechas observadas no lado da VD são superiores às do lado da VA. Assim, além da flexão longitudinal, regista-se também a deformação transversal do tabuleiro decorrente da assimetria do carregamento. Note-se que apesar de a carga de qualquer dos veículos em apreço ser semelhante, distribuindo-se em ambos os casos por quatro eixos, o facto de a carga total da locomotiva ser mais concentrada, em virtude da distância entre eixos ser inferior (ver Fig. 6), justifica as diferenças observadas. Nesta figura pode ainda verificar-se que as flechas observadas nos tramos intermédios, quer do lado da VA, quer do lado da VD, são bastante semelhantes. No tramo extremo, apesar de ter liberdade de rotação sobre o encontro, por ser mais curto do que os demais, as flechas observadas são menores. Os resultados das medições das flechas efetuadas durante o trajeto A.2 são comparados com os valores estimados com o modelo numérico, descrito na Secção 2.1, no Quadro 1. Além das simplificações já

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referidas, o carregamento dos veículos sobre a estrutura é considerado, simplificadamente, através de uma carga por eixo posicionada no respetivo centro de gravidade, ou seja, são simuladas apenas quatro cargas pontuais por cada um dos veículos. Não obstante, os valores medidos não se desviam significativamente dos valores estimados com o modelo numérico. Assim, pode afirmar-se que o modelo desenvolvido representa de forma adequada o comportamento estrutural do viaduto para solicitações verticais.

Quadro 1. Comparação dos deslocamentos verticais medidos com os estimados com o modelo numérico.

Tramo carregado

Origem Deslocamento Verticais em mm

DV1 DV2 DV3 DV4 DV5 DV6 DV5 DV6

Tramo 1 medido -0.9 -1.1

modelo -0.79 -1.01

Tramo2 medido 0.3 0.4 0.5 0.5

modelo 0.31 0.36 0.4 0.44

Tramo 3 medido

-1.7 -1.9

modelo

-1.41 -1.69

Tramo 4 medido

0.4 0.5 0.4 0.4

modelo

0.4 0.45 0.4 0.45

Tramo 5 medido

-1.6 -1.9

modelo

-1.39 -1.67

Na Fig. 7.b ilustram-se os resultados das rotações longitudinais medidas durante o trajeto A.2. Como se pode observar, quando a carga está localizada nos tramos adjacentes à secção sobre o pilar P2 – tramos 2 e 3 – os valores absolutos da rotação longitudinal dessa secção (IS02) são semelhantes. No caso em que os veículos se encontram estacionados no tramo 1 verifica-se que a rotação longitudinal da secção sobre o encontro (IS01) é ligeiramente superior à rotação da secção sobre o pilar P2 (IS02). Apesar de se tratar de uma secção com rotação livre, uma vez que o tramo é mais curto, a diferença observada para a secção de continuidade não é significativa. Como se referiu anteriormente, a Passagem A incluiu um trajeto (A.1) análogo àquele cujos resultados são ilustrados na Fig. 7. Contudo, no trajeto A.1 os veículos circulavam em vias “trocadas”, i.e., a locomotiva circulava na VA e a estabilizadora na VD. Os resultados das medições das flechas e rotações longitudinais efetuadas durante o trajeto A.1 são apresentados na Fig. 8.

-2.5

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22:50 22:55 22:59 23:03 23:08 23:12 23:16

De

loca

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m)

Tempo - (hh:mm)

DV01DV02

DV03DV04DV05

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Tramo 1 Tramo 3 Tramo 5 Tramo 7Tramo 1 Tramo 3 Tramo 5 Tramo 7

a) Deslocamentos verticais;

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10

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22:50 22:55 22:59 23:03 23:08 23:12 23:16

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Tempo - (hh:mm)

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IS02

Tramo 1 Tramo 3 Tramo 5 Tramo 7

b) Rotações longitudinais; Figura 8. Resultados das medições efetuadas durante o trajeto A.1.

No que concerne às flechas, pode verificar-se que os valores observados na VA e na VD na Fig. 7.a são análogos, respetivamente, aos observados na VD e VA na Fig. 8.a. Assim, pode concluir-se que o viaduto apresenta um comportamento simétrico e linear, quer longitudinal quer transversalmente. Não obstante as rotações observadas durante o trajeto A.1 serem ilustradas na Fig. 8.b, a sua comparação com os resultados apresentados na Fig. 7.b não é passível de ser feita na medida em que só se observou a rotação de secções do lado da VD.

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Como se referiu na Secção 4, o ensaio de carga contemplou um conjunto vasto de passagens de natureza diversa, utilizando diferentes tipos de veículos, de forma a caracterizar adequadamente o comportamento estrutural do viaduto. Os resultados das medições das flechas e das rotações durante as passagens da locomotiva isoladamente (Passagem B) e do comboio de cargas composto pela locomotiva e pelos vagões balastreiros (Passagem C) são apresentados nas Figs. 9 e 10 respetivamente. Em ambos os casos os veículos deslocavam-se a uma velocidade lenta, de aproximadamente 5 km/h, no sentido Porto-Braga.

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0

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22:23 22:23 22:23 22:24 22:24 22:24 22:24 22:25 22:25

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Tramo 1 Tramo 3 Tramo 5 Tramo 7

a) Deslocamentos verticais;

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⁰)

Tempo - (hh:mm)

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Tramo 1 Tramo 3 Tramo 5 Tramo 7

b) Rotações longitudinais; Figura 9. Resultados da passagem lenta da locomotiva, isoladamente, na VD, no sentido Porto-Braga.

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)

Tempo - (hh:mm)

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a) Deslocamentos verticais;

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21:05 21:06 21:07 21:07 21:08 21:09 21:10

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⁰)

Tempo - (hh:mm)

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b) Rotações longitudinais; Figura 10. Resultados da passagem lenta da locomotiva e vagões balastreiros, na VD, no sentido Porto-Braga.

Como se observou anteriormente, em qualquer dos carregamentos agora em apreço, além da flexão longitudinal, regista-se também a deformação transversal do tabuleiro decorrente da assimetria do carregamento. Sob a ação da locomotiva, carga relativamente concentrada, verifica-se que os valores máximos das flechas medidas no lado da via solicitada (VD) são cerca de três vezes os observados do lado oposto (VA), ver Fig. 9.a. Sob o efeito do comboio de cargas, carregamento distribuído, a relação é ligeiramente superior (Fig. 10.a). Nestas figuras verifica-se, uma vez mais que os tramos intermédios, quer do lado da VA, quer do lado da VD, apresentam flechas bastante semelhantes e que as do tramo extremo são menores do que aquelas. Quando a estrutura é solicitada por um carga relativamente concentrada, como é o caso da locomotiva, quando a carga passa a meio-vão dos tramos adjacentes ao instrumentado, no caso dos intermédios, regista-se um deslocamento vertical para cima de cerca de 20%-25% do observado quando a locomotiva se encontra a meio-vão do mesmo (ver Fig. 9.a). Nos casos em que a estrutura é solicitada por um comboio de cargas a resposta depende do seu comprimento total e da distribuição de cargas. No caso ilustrado na Fig. 10.a, em que a estrutura é solicitada por um comboio de cargas cujo comprimento é cerca de 2,5 vezes o comprimento de um tramo intermédio, esta relação é ligeiramente menor.

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Rémy, Cavadas, Rio e Figueiras

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No que se refere à evolução das flechas dos tramos intermédios ilustradas na Fig. 10.a distinguem-se claramente cinco extremos locais que correspondem às sucessivas posições do comboio em relação ao tramo em apreço. Os dois máximos “ascendentes” registam-se quando a parte frontal do comboio está à entrada do tramo instrumentado (primeiro) e quando a parte traseira passa à saída do mesmo (segundo). O primeiro dos dois máximos “descendentes” observa-se quando parte frontal do comboio se encontra à saída do tramo instrumentado enquanto o segundo se regista quando a parte traseira está à entrada do mesmo. O extremo local observado entre os máximos “descendentes” regista-se quando o comboio está aproximadamente centrado sobre o tramo instrumentado, posição na qual, dado o seu comprimento, solicita não só o tramo instrumentado como também os adjacentes. A diferença de magnitude entre os máximos “descendentes” deve-se ao facto de a locomotiva, com uma distribuição de cargas mais concentrada do que os vagões balastreiros, se deslocar na traseira do comboio. As rotações longitudinais recolhidas, quer durante a passagem da locomotiva (Fig. 9.b), quer durante o comboio de cargas (Fig. 10.b), atendem, naturalmente, também à posição dos veículos em relação à secção instrumentada. Assim, no que concerne à rotação sobre o pilar P2, na primeira distinguem-se quatro extremos locais e na segunda seis. Assim, para a passagem do comboio de cargas o primeiro extremo local ocorre quando a parte frontal do comboio está localizada junto ao pilar P1 e o sexto verifica-se quando a parte traseira do comboio está junto ao pilar P3. 5.2 Ensaio ambiental O ensaio ambiental, que decorreu durante cerca de três dias, teve como objetivo a medição dos movimentos das juntas de dilatação associados aos ciclos diários de variação de temperatura. Na Fig. 11.a apresentam-se os resultados medidos pelos transdutores de deslocamentos e pelos sensores de temperatura instalados em cada uma das juntas de dilatação. De acordo com a convenção adotada, à contração do tabuleiro, e portanto movimentos de abertura da junta, correspondem variações positivas de deslocamento. De forma a facilitar a interpretação dos resultados, no eixo vertical à direita, correspondente à temperatura ambiente, os valores são apresentados por ordem inversa.

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5-Nov 6-Nov 7-Nov 8-Nov

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C]

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m]

DH01DH02DH03DH04ST_SST_N

a) Séries temporais dos deslocamentos horizontais e das temperaturas;

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2.5

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5-Nov 6-Nov 7-Nov 8-Nov 9-Nov

De

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m]

DH01

DH02

DH03

DH04

b) Comparação dos deslocamentos horizontais através da aplicação de um fator de escala apropriado;

Figura 11. Resultados das medições efetuadas durante o Ensaio Ambiental. Como se pode ver, há uma boa concordância entre os deslocamentos e a temperatura ambiente. No entanto, a trajetória dos deslocamentos não segue rigorosamente a temperatura ambiente. Com efeito, os instantes correspondentes aos extremos locais de deslocamento das juntas não correspondem aos dos extremos locais de temperatura ambiente. Ainda assim deve ter-se em consideração que a temperatura da estrutura pode não corresponder à temperatura ambiente, podendo verificar-se um desfasamento entre a variação desta com a temperatura da estrutura. Em termos de magnitude, verifica-se que os deslocamentos registados no encontro do lado do Porto (DH01 e DH02) têm uma variação globalmente menor do que os do lado de Braga (DH03 e DH04). Considerando os valores máximos dos deslocamentos em cada um dos dias, verifica-se que, em média, os deslocamentos observados nos encontros dos lados do Porto e de Braga correspondem, respetivamente, a cerca de 45% e 55% da variação total do comprimento do tabuleiro. Na Fig. 11.b

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Ensaio de receção ao novo viaduto ferroviário da Trofa

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ilustra-se a comparação dos deslocamentos observados no encontro do lado de Braga com os do lado do Porto afetados do fator de escala resultante da relação anterior: 1.22=55/45. Como se pode ver, as curvas ajustam-se de forma satisfatória, quer em expansão, quer em contração. Assim, tendo em consideração o comprimento total do tabuleiro (327 m), estima-se que o ponto fixo aparente do tabuleiro se encontra a cerca de 16.4 m do centro geométrico, para o lado do Porto. Este desvio em relação ao centro geométrico da estrutura pode dever-se à existência de contacto entre o edifício da estação, localizado entre os alinhamentos do pilar P4 e P6, e o viaduto, impedindo desta forma a expansão livre do tabuleiro naquela zona. 6.CONCLUSÕES Os ensaios de receção, constituídos por um ensaio de carga e um ensaio ambiental, consistiram num conjunto de passagens lentas, passagens rápidas, paragens, frenagens de veículos ferroviários e ciclos diários de variação de temperatura ambiental, durante os quais foram monitorizados os deslocamentos verticais, deslocamentos horizontais e rotações em secções de interesse, assim como a variação de temperatura. Os resultados apresentados têm, em geral, uma qualidade satisfatória, fornecendo informação relevante sobre a resposta da estrutura sob ações conhecidas. Estes resultados permitem assim estabelecer um estado inicial de referência para a estrutura que é essencial para no futuro poderem ser detetados e identificados problemas de degradação de elementos e componentes estruturais de significado para a conservação da obra. AGRADECIMENTOS Os autores gostariam de agradecer à REFER pelo apoio prestado e à Fundação para a ciência e tecnologia, FCT, nomeadamente pelo financiamento prestado no âmbito do programa Ciência 2008 e da bolsa de doutoramento SFRH/BD/42315/2007; ao Laboratório da Tecnologia do Betão e do Comportamento Estrutural, LABEST, pelo apoio dado em instalações, equipamento e recursos humanos. REFERÊNCIAS [1] Brownjohn, J. (2007). Structural health monitoring of civil infrastructure. Philosophical

transactions. Series A, Mathematical, physical, and engineering sciences, Vol. 365, N. 1851, pp. 589-622. DOI: 10.1098/rsta.2006.1925.

[2] Farrar, C. R.; Worden, K. (2007). An introduction to structural health monitoring. Philosophical transactions. Series A, Mathematical, physical, and engineering sciences, Vol. 365, N. 1851, pp. 303-15. DOI: 10.1098/rsta.2006.1928.

[3] Worden, K.; Farrar, C. R.; Manson, G.; Park, G. (2007). The fundamental axioms of structural health monitoring. Proceedings of the Royal Society A: Mathematical, Physical and Engineering Sciences, Vol. 463, N. 2082, pp. 1639-1664. DOI: 10.1098/rspa.2007.1834

[4] REFER e CPL (2008). Memória Descritiva do Projeto de Execução da “Empreitada Geral de Construção Civil, via e Catenária, da Variante da Trofam da Linha do Minho”, E-Contrato 4349, VDTROFA-PE-MD01.

[5] Rio, J.; Cavadas, F.; Rémy, F.; Figueiras. J. (2010). Observação Durante o Ensaio de Carga do Tabuleiro do Viaduto Ferroviário da Trofa na Linha do Minho entro os km 2+392 e 2+719, Relatório de Observação durante o Ensaio de Cargo. LABEST. FEUP.