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ELEMENTOS FUNCIONAIS E ORNAMENTAIS DA ARQUITETURA ECLÉTICA PELOTENSE: 1870-1931 ESTATUÁRIA Amanda Dutra 1 Ana Luiza Alves 2 Davi Domingues dos Santos¹ Jamila Lima Macedo¹ Letícia Alves Pereira¹ Prof. Dr. Carlos Alberto Ávila Santos 3 Resumo: A pesquisa estuda a estatuária aplicada às fachadas arquitetônicas ecléticas da cidade de Pelotas, construídas entre os anos de 1870 e 1931. Inicialmente, foram selecionados edifícios que apresentam esculturas em suas fachadas voltadas para a praça Cel. Pedro Osório. Em outro momento foram analisadas construções arquitetônicas que se distanciam deste entorno. Estes prédios refletem o período de apogeu econômico da sociedade pelotense, baseado na criação de gado, no processo de salga das carnes bovinas e na exportação do charque e de seus subprodutos. No período compreendido entre as datas citadas, charqueadores e estancieiros buscaram na arquitetura eclética historicista, em moda na Europa e transposta para o Brasil e para a cidade de Pelotas, uma maneira de evidenciar sua ascensão econômica e cultural. Nas esculturas que ornam os frontispícios, as platibandas e os frontões das construções selecionadas, buscamos estudar as origens, seus significados, assim como os materiais empregados para sua manufatura. Através da pesquisa de campo, foram realizados registros fotográficos da estatuária dos prédios. Por meio da pesquisa bibliográfica buscamos estabelecer relações das alegorias escultóricas e de seus atributos com aquelas produzidas por outras culturas, sobretudo, no classicismo greco-romano, na arte da renascença, no maneirismo e no barroco. Nossas conclusões iniciais apontam para uma maior representação de imagens escultóricas relacionadas com a mitologia grega e romana, divindades protetoras do comércio, da indústria e das artes, e de alegorias das estações do ano. Esses elementos ornamentais das fachadas dos edifícios ecléticos estavam atrelados às funções dos prédios e às ideologias de seus proprietários. Palavras-chave: História da arte, ecletismo, estatuária. Introdução A presente pesquisa estuda a estatuária aplicada às fachadas arquitetônicas ecléticas dos prédios pelotenses, construídos entre os anos de 1870 e 1931. Estes edifícios materializaram o período de apogeu econômico da cidade e de sua 1 Licenciados em Artes Visuais - UFPel 2 Acadêmica do curso de Artes Visuais Licenciatura - UFPel 3 Orientador da pesquisa - UFPel.

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ELEMENTOS FUNCIONAIS E ORNAMENTAIS DA ARQUITETURA

ECLÉTICA PELOTENSE: 1870-1931 – ESTATUÁRIA

Amanda Dutra1

Ana Luiza Alves2

Davi Domingues dos Santos¹

Jamila Lima Macedo¹

Letícia Alves Pereira¹

Prof. Dr. Carlos Alberto Ávila Santos3

Resumo: A pesquisa estuda a estatuária aplicada às fachadas arquitetônicas ecléticas da cidade de Pelotas, construídas entre os anos de 1870 e 1931. Inicialmente, foram selecionados edifícios que apresentam esculturas em suas fachadas voltadas para a praça Cel. Pedro Osório. Em outro momento foram analisadas construções arquitetônicas que se distanciam deste entorno. Estes prédios refletem o período de apogeu econômico da sociedade pelotense, baseado na criação de gado, no processo de salga das carnes bovinas e na exportação do charque e de seus subprodutos. No período compreendido entre as datas citadas, charqueadores e estancieiros buscaram na arquitetura eclética historicista, em moda na Europa e transposta para o Brasil e para a cidade de Pelotas, uma maneira de evidenciar sua ascensão econômica e cultural. Nas esculturas que ornam os frontispícios, as platibandas e os frontões das construções selecionadas, buscamos estudar as origens, seus significados, assim como os materiais empregados para sua manufatura. Através da pesquisa de campo, foram realizados registros fotográficos da estatuária dos prédios. Por meio da pesquisa bibliográfica buscamos estabelecer relações das alegorias escultóricas e de seus atributos com aquelas produzidas por outras culturas, sobretudo, no classicismo greco-romano, na arte da renascença, no maneirismo e no barroco. Nossas conclusões iniciais apontam para uma maior representação de imagens escultóricas relacionadas com a mitologia grega e romana, divindades protetoras do comércio, da indústria e das artes, e de alegorias das estações do ano. Esses elementos ornamentais das fachadas dos edifícios ecléticos estavam atrelados às funções dos prédios e às ideologias de seus proprietários. Palavras-chave: História da arte, ecletismo, estatuária.

Introdução

A presente pesquisa estuda a estatuária aplicada às fachadas arquitetônicas

ecléticas dos prédios pelotenses, construídos entre os anos de 1870 e 1931. Estes

edifícios materializaram o período de apogeu econômico da cidade e de sua

1 Licenciados em Artes Visuais - UFPel

2 Acadêmica do curso de Artes Visuais – Licenciatura - UFPel

3 Orientador da pesquisa - UFPel.

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sociedade, baseado na criação de gado, no processo de salga das carnes bovinas e

na exportação do charque e de seus subprodutos. No período compreendido entre

as datas citadas, charqueadores e estancieiros buscaram na arquitetura eclética

historicista, em moda na Europa e transposta para o Brasil e para Pelotas, uma

maneira de evidenciar sua ascensão econômica e cultural.

Inicialmente, o estudo se deteve na análise dos edifícios voltados para a Praça

Coronel Pedro Osório, núcleo central da área urbana da cidade. Nas esculturas que

ornamentam os frontispícios das construções selecionadas, buscamos estudar suas

origens, seus significados, assim como os materiais empregados para sua

manufatura. Através da pesquisa de campo foram realizados registros fotográficos

da estatuária dos prédios. Por meio da pesquisa bibliográfica buscamos estabelecer

relações das alegorias escultóricas e de seus atributos com aquelas produzidas por

outras culturas, sobretudo, no classicismo greco-romano, na arte da Renascença, no

maneirismo e no barroco.

No segundo momento da pesquisa, os prédios analisados distanciam-se do

entorno da Praça Coronel Pedro Osório. Ainda assim, são peças importantes do

patrimônio artístico e cultural da cidade pelo seu valor histórico e estético. No que se

refere às esculturas aplicadas à arquitetura, em alguns casos, as estátuas repetem

os modelos analisados no primeiro estágio do trabalho, o que evidencia que esses

materiais ornamentais eram produzidos em série e importados. Em outros prédios,

encontramos diferentes representações de novas alegorias.

Um dado significativo para o estudo foi o recente contato, via Internet, com a

pesquisadora Ana Margarida Portela, de Portugal. Seu trabalho de doutorado

recupera a memória da antiga Fábrica de Cerâmica das Devesas, localizada na

cidade de Villa Nova de Gaya, em Portugal. A fábrica foi um importante complexo

industrial que comercializava artefatos de cerâmica alouçada com o exterior,

inclusive com o Brasil e, por conseqüência, com Pelotas. A pesquisadora forneceu –

para nossa consulta – o catálogo produzido pela fábrica no ano de 1910, onde

encontramos obras escultóricas, algumas semelhantes e outras idênticas às

encontradas nas fachadas ecléticas pelotenses.

Os edifícios e a estatuária ornamental

Na primeira parte da pesquisa, foram analisadas as esculturas peculiares às

fachadas dos prédios da Biblioteca Pública, do Clube Caixeiral, das residências dos

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barões de Cacequi e de São Luis, do prédio de uso misto de Antônio Raimundo de

Assumpção (já demolido). Na segunda parte do estudo as fachadas analisadas são:

as do frontispício da capela de São João Batista, na Santa Casa de Misericórdia,

das residências de João Simões Lopes Filho, de Cândida Assumpção, da família

Souza, do Teatro Guarani, da Escola de Belas Artes, do antigo palacete do visconde

de Jaguary, do solar dos Campos.

Na fachada da Biblioteca Pública Pelotense4, duas cariátides sustentam os

capitéis jônicos do entablamento, inspiradas nas cariátides do Erecteion, templo da

Acrópole de Atenas [Imagens 1, 2 e 3]. Coroando o frontão encontra-se uma

escultura do globo terrestre, evidenciando a América do Sul, o Brasil, o Rio Grande

do Sul, e Pelotas, na linha de visão do espectador que está no nível do chão, na

calçada fronteira à construção [Imagem 4]. Provavelmente, a representação do

globo e da região de Pelotas em primeiro plano estivesse relacionada com a

inserção da cidade ao restante do mundo, através do conhecimento e da cultura

apreendidos por meio dos livros do acervo do estabelecimento e dos cursos

noturnos que eram ministrados nas salas interiores da biblioteca. Ressaltamos a

cartela com as inscrições: “trabalho, instrucção, progresso”, palavras de ordem da

filosofia positivista que fundamentou o Governo gaúcho na época da reforma do

prédio. Os ramos de palmeira significam o triunfo da “ordem e progresso”

estampados na Bandeira Nacional.5

Imagem 1: Biblioteca Pública Pelotense.

4 Segundo SANTOS, Carlos Alberto Ávila. Espelhos, máscaras, vitrines: estudo iconológico de

fachadas arquitetônicas – Pelotas, 1870-1930. Pelotas: EDUCAT, 2002. pp. 84 e 85. A Biblioteca foi projetada por José Isella e construída entre os anos de 1978 e 1888. Foi reformada entre 1911 e 1913, com projeto de Caetano Casaretto, quando ganhou o segundo pavimento. 5 TRESSIDER, Jack. Los símbolos y sus significados. Barcelona: Blume, 2008. p. 81.

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Imagem 2: Biblioteca Pública Pelotense –

Cariátides. Imagem 3: Biblioteca Pública Pelotense –

Cariátides.

Imagem 4: Biblioteca Pública Pelotense – Globo (trabalho, instrucção, progresso).

No edifício de uso misto – residencial no segundo pavimento e comercial no

térreo – que abrigava a loja de tecidos Torre Eiffel, de propriedade de Antônio

Raimundo de Assumpção e erguido em 1880, existia no frontão da fachada principal

um busto representando Michelangelo Buonarroti, moldado em massa de cimento

pelo construtor José Isella, responsável pelo projeto da obra.6 A construção foi

demolida, mas a escultura ainda se encontra sob posse da família, guardada na

estância Nossa Senhora dos Prazeres, no Laranjal [Imagens 5 e 6].

6 CHEVALIER, Ceres. Vida e obra de José Isella: arquitetura em Pelotas na segunda metade do

século XIX. Pelotas: Mundial, 2002. pp. 196 e 197.

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Imagem 5: Edifício de Uso misto – residencial e comercial (Torre Eiffel)

Imagem 6: Edifício de Uso misto – busto representando Michelangelo.

O Clube Caixeiral foi construído por Caetano Casaretto e inaugurado em

19057 [Imagem 7]. No módulo central da fachada principal destacam-se esculturas

moldadas em cimento que remetem à mitologia greco-romana. Duas esculturas são

masculinas, a da esquerda representa Hefestos ou Vulcano, deus da metalurgia,

representado em idade avançada e barbudo, com seus atributos: o capacete, a forja

e a bigorna. [Imagem 8] A representação do deus grego aponta para a classe

industrial que usufruía dos eventos realizados pela associação recreativa. No lado

direito está Hermes ou Mercúrio, deus do comércio, geralmente representado jovem,

com o torso desnudo e portando o capacete alado, um barril com pólvora, um baú

com tesouros e uma âncora [Imagem 9]. A escultura simboliza a classe de

comerciantes que também se associou à entidade. As estátuas de duas musas

complementam as alegorias da fachada. Na mitologia grega, as musas eram deusas

protetoras das artes liberais, normalmente ligadas à poesia e à literatura [Imagens

10 e 11]. Uma das musas está tocando uma lira, a outra lê um livro, as duas aludem

às apresentações de teatro, de dança e de concertos musicais organizados pelo

clube.

7 SANTOS. Op. cit. p. 63.

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Imagem 7: Clube Caixeiral.

Imagem 8: Clube

Caixeiral - Hefestos ou Vulcano.

Imagem 9: Clube Caixeiral - Hermes ou

Mercúrio.

Imagem 10: Clube Caixeiral - Deusa

protetora das artes liberais.

Imagem 11: Clube Caixeiral - Deusa

protetora das artes liberais.

A residência de Francisco Antunes Maciel, o barão de Cacequi, foi

construída em 1878.8 [Imagem 12], Sobre a platibanda e o frontão da fachada

principal encontram-se dois vasos em estilo clássico e duas estátuas. Uma das

esculturas representa uma figura feminina que possui uma coroa sobre a cabeça,

ela está apoiada em uma coluna que sustenta um globo [Imagem 13]. É bem

provável que o globo simbolize a cultura que, como vimos, também aparece na

fachada da Biblioteca. A coroa sobre a cabeça da alegoria pode estar associada à

deusa grega Atena, que é a divindade da sabedoria. A partir do catálogo da Fábrica

Devesas, esta escultura está identificada como Europa [Imagem 14].

8 SANTOS, Carlos Alberto Ávila. Ecletismo na fronteira meridional do Brasil: 1870-1931. Tese

(Doutorado em Arquitetura – Área de Conservação e Restauro: Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal da Bahia, 2007. p. 172.

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Imagem 12: residência de Francisco Antunes Maciel.

Imagem 13: residência de Francisco Antunes

Maciel – Europa. Imagem 14: catálogo da Fábrica Devesas –

Europa.

A segunda estátua observada, segura em uma das mãos um tocheiro, que está

relacionado à classe industrial [Imagem 15]. Escultura semelhante foi encontrada no

catálogo da Fábrica Devesas, identificada como a indústria [Imagem 16]. No livro

“Estatuária e ideologia”, o autor Arnoldo Doberstein registrou uma imagem com o

mesmo atributo, uma alegoria da indústria executada pelo artista Paul Landowski,

para a fachada do Palácio Piratini, sede do Governo do Estado, em Porto Alegre9

[Imagem 17].

9 DOBERSTEIN, Arnoldo. Porto Alegre 1900 – 1920: estatuária e ideologia. Porto Alegre: Secretaria

Municipal de Cultura, 1992. p. 37.

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Imagem 15: residência de Francisco Antunes Maciel

Indústria.

Imagem 16: catálogo da Fábrica Devesas – Industria.

Imagem 17: escultura de Paul Landowski – Indústria.

No alto da fachada lateral do palacete do barão de Cacequi havia quatro

esculturas, uma delas foi roubada recentemente. A primeira das três ainda

existentes representa uma figura masculina jovial, com o peito desnudo e

carregando sobre os ombros uma espécie de baú, associamos a escultura ao deus

do comércio Hermes ou Mercúrio. O catálogo da Fábrica Devesas registra a

representação do Outono [Imagens 18 e 19].

Imagem 18: residência de Francisco Antunes

Maciel – associado à representação de Hermes ou Mercúrio.

Imagem 19: catálogo da Fábrica Devesas – Outono.

Duas outras estátuas, provavelmente também simbolizam as estações do ano.

Na primeira, vemos uma figura masculina com um manto que lhe cobre a cabeça e o

corpo, sua postura é retraída, ele se encolhe sob o tecido que o envolve, trata-se de

uma alegoria do Inverno [Imagem 20]. O catálogo da Fábrica Devesas confirma essa

denominação [Imagem 21]. Além disso, em exposição realizada pela SECULT

durante o ano de 2008, encontramos escultura idêntica restaurada, que traz inscrita

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no pedestal a palavra Inverno, o que confirmou nossas especulações [Imagem 22].

Na segunda escultura, vemos uma figura feminina com uma leve túnica que permite

ver as belas formas do corpo, ela porta uma coroa de flores e, possivelmente

simboliza a Primavera [Imagens 23 e 24]. Nesta residência havia outras estátuas de

porcelana que foram roubadas, encontrou-se imagem de uma delas no portal do

IPHAN na internet, antes mesmo de ter acesso à imagem arriscou-se dizer que esta

estátua fosse uma alegoria do Verão. Esta imagem encontrada é uma representação

masculina, assim como uma estátua similar encontrada no catálogo da Fábrica

Devesas, com o nome de Estio [Imagens 25 e 26].

Imagem 20: residência Francisco Antunes Maciel – Inverno.

Imagem 21: catálogo da Fábrica Devesas – Inverno.

Imagem 22: convite de exposição - SECULT.

Imagem 23: residência de Francisco Antunes

Maciel – Primavera. Imagem 24: catálogo da Fábrica Devesas

– Primavera.

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Imagem 25: Estátua roubada.

(http://portal.iphan.gov.br/) Imagem 26: catálogo da Fábrica

Devesas – Estio.

Como citamos anteriormente, os vasos que ornamentam as platibandas

copiaram originais gregos. Na Grécia, jarros, ânforas e vasos serviam para guardar e

transportar o mel, o azeite de oliva, o leite ou o vinho. As formas desses recipientes

definiram diferentes denominações. Neste caso, temos a representação de uma

krater10 ou cratera [Imagens 27 e 28].

Imagem 27: residência Francisco Antunes Maciel – vaso em estilo grego.

Imagem 28: reprodução de vaso grego - Krater.

10

Krater: vaso que possui corpo redondo e abertura grande, utilizado pelos gregos para misturar vinho com água. É originado da palavra grega “Kerannmi” que significa mistura, daí a denominação de “vaso de mistura”.

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No palacete do Senador Joaquim Augusto de Assumpção Junior,

construído entre os anos de 1884 e 1889,11 temos ânforas coroando os frontões. Na

fachada da rua Lobo da Costa ainda é possível observar as duas alças da ânfora, já

pela rua Félix da Cunha, o ornamento está sem as alças [Imagens 29 e 30].

Imagem 29: palacete do Senador Joaquim Augusto de Assumpção Junior.

Imagem 30: palacete do Senador Joaquim Augusto de Assumpção Junior – ânforas.

A residência de Leopoldo Antunes Maciel, o barão de São Luís, foi concluída

em 1879,12 possui sobre a platibanda vazada e no frontão triangular seis estátuas de

louça [Imagem 31]. Dentre estas, duas são iguais. Ou seja, temos cinco diferentes

alegorias. São todas representações femininas, uma delas segura com a mão

esquerda uma ave e, provavelmente esteja relacionada com a avicultura, uma

réplica dessa estátua faz par com ela, no lado oposto do frontão. Ao mesmo tempo,

estas duas estátuas poderiam estar relacionadas com a lenda mitológica de Leda e

o Cisne. Desde a Antigüidade, escultores criaram obras associadas à infidelidade de

Zeus, como o escultor grego Timóteo, cuja cópia romana do século IV a. C.

retiramos do livro “La escultura griega desde el siglo IV hasta la época de

Alejandro”13 [Imagens 32, 33 e 34]. Uma terceira escultura tem como atributo a

bigorna e, simboliza a indústria [Imagens 35 e 36]. A quarta estátua representa a

agricultura, conforme é observado no catálogo da Fábrica Devesas [Imagens 37 e

38]. Além destas existem duas esculturas, das quais não conseguimos visualizar os

atributos, dificultando a identificação [Imagens 39 e 40].

11

SANTOS. Op. cit. p. 177. 12

Ibid. p. 172. 13

COLLIGNON, Maximo. Scopas e Praxiteles: la escultura griega desde el siglo IV hasta la época de Alejandro. Buenos Aires: Ateneo, 1948. p. 120.

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Imagem 31: residência de Leopoldo Antunes Maciel.

Imagem 32: residência de Leopoldo Antunes Maciel –

relacionada com a avicultura.

Imagem 33: Leda de Timóteo – representação da lenda

mitológica.

Imagem 34: Leda e o Cisne cópia de obra de Leonardo da Vinci - representação da lenda

mitológica.

Imagem 35: residência de Leopoldo Antunes Maciel – Indústria.

Imagem 36: indústria com bigorna, catálogo da Fábrica Devesas – Indústria.

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Imagem 37: residência de Leopoldo Antunes Maciel – Agricultura.

Imagem 38: catálogo da Fábrica Devesas – Agricultura.

Imagens 39: residência de Leopoldo Antunes Maciel.

Imagens 40: residência de Leopoldo Antunes Maciel.

O acesso dessa residência se faz através de um portão que dá entrada para

um jardim ornamentado com uma fonte, moldada em massa de cimento. O tanque

da fonte apresenta a forma de uma concha, e tem como elemento principal um putto,

plural de putti14. A alegoria segura um peixe pela cauda. Encontramos outros putti na

pintura de Ticiano intitulada “Vênus e Adônis”, de 1560, e numa escultura em bronze

de Verochio, fundida em 1470, onde o menino nu brinca com um golfinho [Imagens

41 a 44].

14

Segundo BECKETT, Wendy. A história da pintura. São Paulo: Ática, 1997. p. 134. Os putti são meninos

nus, freqüentemente alados, que aparecem em muitas esculturas e pinturas da Primeira Renascença, destinados a

representar anjos e cupidos.

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Imagem 41: residência de Leopoldo Antunes

Maciel – Putti. Imagem 42: representação de Afrodite com

Eros.

Imagem 43: Vênus e Adônis.

Imagem 44: Putto com golfinho

O peixe e a concha encontram-se ligados diretamente com a água, são

alegorias do mar, dos rios e dos lagos, o que é reforçado pelos juncos moldados

atrás do menino, vegetação típica da região, facilmente encontrada nas margens

dos arroios, dos banhados e da laguna dos Patos.

A concha presente nesta fonte é parecida esteticamente, com a concha pintada

por Sandro Botticelli, na obra de 1480, intitulada “O nascimento de Vênus” [Imagem

45]. Em algumas lendas da mitologia greco-romana Vênus (ou Afrodite) aparece

como mãe de Cupido (ou Eros).

Imagem 45: O nascimento de Vênus.

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O frontispício da Capela de São João Batista da Santa Casa de

Misericórdia, edificada pelos construtores José Isella e Guilherme Marcucci entre os

anos de 1877 e 1884, apresenta no alto duas esculturas femininas de gosto clássico

[Imagens 46 e 47]. Uma delas carrega uma cruz e simboliza a Fé [Imagens 48 e 49].

A outra acolhe duas crianças e significa a Caridade15 [Imagens 50 e 51].

Imagem 46: Santa casa de Misericórdia

Imagem 47: Capela de São João Batista da Santa Casa de Misericórdia.

15

Santos. Op. cit. 298.

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Imagem 48: Capela de São João Batista da Santa Casa de Misericórdia – Fé.

Imagem 49: Fé - catálogo da Fábrica Devesas – Fé.

Imagem 50: Capela de São João Batista da

Santa Casa de Misericórdia – Caridade. Imagem 51: Caridade - catálogo da Fábrica

Devesas – Caridade.

Na fachada lateral da Santa Casa de Misericórdia estão dispostas mais duas

esculturas, ambas são representações femininas, como as do frontispício [Imagem

52]. Uma delas [Imagem 53] foi apresentada na exposição da SECULT [Imagem 22]

como Consciência, denominação reafirmada no catálogo da fábrica portuguesa

[Imagem 54]. O mesmo catálogo identifica a outra estátua desta fachada como

Esperança [Imagens 55 e 56]. Na platibanda, podemos encontrar novamente vasos

em estilo grego [Imagens 57 e 58].

Imagem 52: Fachada lateral da Santa Casa de Misericórdia.

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Imagem 53: Santa Casa de Misericórdia – Consciência.

Imagem 54: catálogo da Fábrica Devesas – Consciência.

Imagem 55: Santa Casa de Misericórdia – Esperança.

Imagem 56: catálogo da Fábrica Devesas – Esperança.

Imagem 57: Santa Casa de Misericórdia. Imagem 58: Santa Casa de Misericórdia - Vasos

em estilo grego.

Na residência de João Simões Lopes Filho, o visconde da Graça, localizada

na rua Uruguai, tem na extremidade direita da fachada principal uma entrada em

arco, com portão de grades [Imagem 59]. A parte central do arco é ornamentada

com a cabeça de um imponente leão com a boca entreaberta, ladeado por duas

águias que se voltam para o centro do portão, com as asas abertas prontas para

levantar vôo e atacar [Imagem 60]. Estes animais surgem como símbolos de poder

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dos moradores da casa. Também encontramos sobre as platibandas desta

residência, vasos e outros ornamentos de inspiração grega [Imagem 61].

Imagem 59: residência de João Simões Lopes Filho, o visconde da Graça.

Imagem 60: residência de João Simões Lopes Filho – Leão e águias como símbolo de poder.

Imagem 61: Vasos e ornamentos de inspiração grega.

No palacete de Cândida Clara de Assumpção, esposa de Joaquim José de

Assumpção, o barão do Jarau, localizada na rua XV de novembro,16 a fachada

contém o ano provável da conclusão da obra do prédio, que é ornamentado com

globos e compoteiras [Imagem 62]. Na fachada secundária há um portão ladeado

por duas colunas unidas por um arco pleno, sobre cada uma das colunas há um leão

de longa juba, que repousa as patas dianteiras sobre um globo. Os dois animais e

os globos são identificados como símbolos de poder [Imagem 63].

16

Ibid. p. 161.

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Imagem 62: palacete de Cândida Clara de Assumpção.

Imagem 63: palacete de Cândida Clara de Assumpção – Leões com globo como símbolos de poder.

Na fachada da casa da família Souza, construída em 1876 e localizada na rua

Marechal Deodoro, a entrada principal é coroada pelo frontão, que apresenta a data

da construção em números romanos e é ornamentado por três vasos de inspiração

grega, com características semelhantes as de uma ânfora [Imagens 64, 65 e 66].

Sobre as extremidades opostas da platibanda encontram-se estátuas femininas de

gosto clássico. A da extrema direita usa túnica de inspiração grega e tem a cabeça

encoberta [Imagens 67 e 68]. Pelos atributos que ostenta: um pergaminho e uma

coluna com um globo – elementos relacionados com a sabedoria – provavelmente

seja uma representação da deusa Atena ou uma alusão à Europa [Imagens 69 e 70].

Na extremidade oposta, também vestida com túnica, a imagem porta uma coroa de

flores e, possivelmente simbolize a deusa mitológica Flora, deusa da primavera. No

catálogo da Fábrica Devesas encontramos alegorias da Primavera com atributos

parecidos [Imagens 71 e 72].

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Imagem 64: casa da família Souza.

Imagem 65: casa da família Souza – frontão com vasos semelhantes à ânfora grega.

Imagem 66: reprodução de ânfora Grega.

Imagens 67: casa da

família Souza – relacionada com a deusa Atena e com a representação da Europa.

Imagens 68: casa da família Souza - relacionada com a deusa Atena e

com a representação da Europa.

Imagens 69: Europa, catálogo da

Fábrica Devesas. Imagens 70: Europa, catálogo da

Fábrica Devesas.

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Imagem 71: casa da família Souza – relacionada

com a deusa Flora, a deusa da priavera Imagem 72: catálogo da Fábrica Devesas –

Primavera.

Na fachada desta residência ainda temos, em ambos os lados do prédio,

pórticos de entrada em arcos plenos. Encimam os arcos as estátuas de dois leões,

que como já pontuamos, simbolizam o poder econômico dos proprietários [Imagens

73 e 74]. Nas construções da Antiguidade, as figuras de leões também simbolizavam

poder e proteção, encontradas nos baixos relevos das muralhas da cidade caldéia

de Babilônia, ou nas esfinges egípcias que antecediam os túmulos e os templos dos

faraós. O povo Aqueu construiu palácios cercados por muralhas de pedra. Destas

fortalezas sobreviveu a Porta dos Leões, onde um relevo acima da porta é composto

por dois leões que ladeiam uma coluna minóica. Os musculosos leões são os

guardiões da entrada do palácio [Imagem 75].

Imagens 73: casa da família Souza – leões simbolizam poder econômico.

Imagens 74: casa da família Souza - leões simbolizam poder econômico.

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Imagem 75: Porta dos leões, Arte Minóica.

O Theatro Guarany teve projeto do arquiteto Stanislau Szarfarki, foi construído

pela firma Rodrigues & Cia17 [Imagem 76]. O prédio localiza-se na esquina da rua

Lobo da Costa com Gonçalves Chaves. A data de 1920 no tímpano do frontão – que

não corresponde à finalização da obra concluída em 1921 – comemora os 50 anos

da estréia da ópera “O Guarany” no Teatro Alla Scalla de Milão.18 Na fachada do

teatro destacam-se mascarões e alegorias, ora com inspirações indígenas, ora pré-

colombianas. Em sua totalidade são treze esculturas em massa de cimento

ornamentando a fachada do prédio. A figura central representa um índio com seus

atributos característicos: arco, flecha, cocar e tanga com plumas [Imagens 77 e 78].

Entretanto, é importante ressaltar as proporções seguidas para a criação da figura,

esguia ou alongada, e não segue as “reais” características físicas de um nativo

indígena brasileiro. Por essa razão, a figura está associada ao romantismo

brasileiro, pois ainda segue as características acadêmicas de proporção e

composição.

17 CALDAS, Pedro Henrique. Guarany: o grande teatro de Pelotas. Pelotas: Semeador, 1994. 18

SANTOS. Op. cit. p. 270.

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Imagem 76: Theatro Guarany.

Imagem 77: Theatro Guarany. Imagem 78: Theatro Guarany – Índio.

Ao observarmos as figuras das laterais, próximas à imagem do índio, vemos

duas máscaras com inspirações em esculturas pré-colombianas, como a figura de

um pendente Mixteca de ouro, que representa Xipe Tótec, deus da primavera

[Imagens 79, 80 e 81]. Estas máscaras também são repetidas nas duas

extremidades da fachada, formando um total de oito figuras iguais. Ainda fazendo

alusão ao romantismo, temos quatro liras moldadas, que também se relacionam com

as apresentações musicais do teatro [Imagem 82].

Imagem 79: Theatro Guarany – máscaras.

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Imagem 80: máscara Theatro Guarany – relação

com arte pré-colombiana. Imagem 81: pendente Mixteca de ouro – Arte

pré colombiana.

Imagem 82: Theatro Guarany – Lira.

O prédio da antiga Escola de Belas Artes localiza-se na esquina das ruas

Marechal Floriano e Barão de Santa Tecla [Imagem 83]. Construído em 1881 e

pertencente à família Trápaga, o edifício foi doado em 1963, por Carmem Trápaga

Simões, para a utilização e funcionamento da extinta escola. A fachada apresenta

oito esculturas em estilo clássico, marcado pelo contraposto das figuras e pelos

panejamentos e drapeados das vestes das mesmas. Na fachada da rua Barão de

Santa Tecla, a alegoria da esquerda segura uma ave que, de acordo com o catálogo

da Fábrica Devesas está associada à Gratidão [Imagens 84 e 85]. Já a figura da

direita segura um vaso, como se despejasse algum líquido ali contido. Após

processo de restauração o vaso aparece fechado. [Imagens 86, 87 e 88]. O catálogo

já citado associa a imagem com as Naiades. Naiades são ninfas aquáticas que

viviam em fontes ou nascentes e deixavam beber de sua água, mas não se banhar,

e puniam os infratores com doenças. Na platibanda temos dois globos, um com

relevos estrelares e outro representando os continentes. Entretanto, após processo

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de restauração, o globo com pinturas relacionadas, num primeiro momento, aos

continentes, aparece agora com novas pinturas estrelares [Imagens 89, 90 e 91].

Imagem 83: Escola de Belas Artes.

Imagem 84: Escola de Belas Artes – gratidão. Imagem 85: catálogo Fábrica Devesas – gratidão.

Imagem 86: Escola de Belas Artes – Náiade.

Imagem 87: Escola de Belas Artes – Náiade após processo

de restauro.

Imagem 88: catálogo Fábrica Devesas – Náiade.

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Imagens 89: globos Escola de Belas Artes.

Imagens 90: globos Escola de Belas Artes.

Imagem 91: Globo com relevos de continentes, após restauro aparecem pinturas estrelares.

Na fachada da rua Marechal Floriano [Imagem 92], duas esculturas

representam índios, com proporções clássicas. A figura da esquerda representa uma

índia com uma tanga de plumas, uma corda trespassada sobre o colo que sustém

um porta-flechas [Imagem 93]. A posição de uma das mãos leva a crer que a figura

segurava outro atributo, talvez uma flecha. Podemos associar a imagem com a

representação da América, por sua semelhança com as peças de mesmo significado

encontradas no catálogo da Fábrica Devezas [Imagens 94 e 95]. Encontramos

representações similares da América em escultura que ornamenta o jardim da

charqueada São João, em Pelotas, e na escultura exposta no Museu do Cabildo, em

Montevidéu [Imagens 96 e 97].

Imagem 92: Escola de Belas Artes.

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Imagem 93: Escola de Belas Artes – associada à América.

Imagem 94: catálogo Fábrica Devesas – América.

Imagem 95: catálogo Fábrica Devesas – América.

Imagem 96: Charqueada São João, Pelotas – América.

Imagens 97: Museu do Cabildo, em Montevidéu – América.

Ainda nessa fachada, a figura da direita representa um índio [Imagem 98],

acompanhado de um animal e, podemos associá-la à representação da África,

fundamentando-nos no catálogo da Fábrica Devezas [Imagens 99 e 100] e de outra

escultura exposta no Museu do Cabildo, na capital uruguaia. Por fim, ainda temos as

reproduções de vasos gregos que se assemelham ao Krater da Casa do barão de

Cacequi, já citados anteriormente [Imagens 101 e 102].

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Imagem 98: Escola de Belas

Artes – África. Imagens 99: catálogo Fábrica

Devesas – África. Imagens 100: catálogo Fábrica

Devesas – África.

Imagem 101: Escola de Belas Artes – vasos em

estilo grego. Imagem 102: catálogo Fábrica Devesas – vasos

em estilo grego.

A antiga residência de Cândida Dias foi erguida em 1875 pelos construtores

Bartolomeu e José Isella,19 localizada na rua Andrade Neves [Imagem 103].

Atualmente é mais conhecida como “Casa Amarela”, estabelecimento de cunho

comercial. Juntamente ao frontão que ornamenta a platibanda existem duas

estátuas de louça, ambas são figuras femininas.

Imagem 103: residência de Cândida Dias.

19

SANTOS. Op. cit. p. 161.

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A primeira é a representação de uma índia com o busto nu, com uma tanga de

plumas e com uma pena sobre a cabeça, a figura leva um cesto de palha nas

costas. Estes atributos remetem à cultura indígena. Concluímos que a estátua

representa a América. A alegoria está apoiada em um tronco, o contraposto, a

expressão facial e as proporções do corpo são referentes ao classicismo. [Imagem

104]. Relacionamos esta imagem com a pintura intitulada Moema, de Vitor Meireles,

pois a maneira romântica como o artista representou o tema pitoresco e a nativa

brasileira também seguem os padrões clássicos [Imagem 105].

Imagem 104: residência de Cândida Dias – associada à Moema.

Imagem 105: Victor Meirelles – Moema.

A segunda escultura, provavelmente, é uma representação da Europa. No

entanto, existe uma imagem igual ornamentando o frontão lateral da residência do

barão de Cacequi, que o catálogo da Devezas identifica como a alegoria da

Primavera [Imagens 106 e 107].

Imagem 106: residência de Cândida Dias – associada à representação da Europa.

Imagem 107: catálogo Fábrica Devesas – Primavera.

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O palacete do visconde de Jaguary foi erguido em 1835, na esquina das ruas

7 de Setembro e Félix da Cunha [Imagem 108]. Mais tarde foi adquirida pelo Jockey

Clube de Pelotas, que transformou a antiga residência em sua sede social.

Recentemente, a construção foi vendida ao Cartório Florenzi, cujo proprietário

restaurou totalmente o prédio. Analisando a fachada do edifício encontramos quatro

estátuas. A primeira representa uma musa que porta uma engrenagem, e alude à

indústria [Imagens 109, 110 e 111]. A segunda musa leva em uma das mãos o

caduceu de Hermes ou Mercúrio, com a outra mão segura uma âncora, significa o

comércio [Imagens 112, 113 e 114]. A terceira imagem carrega uma lira e remete à

música [Imagem 115]. A última musa apresenta um livro em uma das mãos e uma

pena para escrever na outra, simboliza a literatura [Imagem 116].

Imagem 108: palacete do visconde de Jaguary.

Imagem 109: palacete do visconde de Jaguary –

Indústria.

Imagens 110: catálogo Fábrica Devesas – Indústria.

Imagens 111: catálogo Fábrica Devesas – Indústria.

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Imagens 112: palacete do visconde de Jaguary –

Comércio.

Imagens 113: palacete do visconde de Jaguary –

Comércio.

Imagem 114: catálogo Fábrica Devesas – Comércio.

Imagens 115: palacete do visconde de Jaguary – Música.

Imagens 116: palacete do visconde de Jaguary – Literatura.

O Solar dos Campos foi construído para o fazendeiro José Antônio Campos e

se localiza na rua Santa Tecla. Sua construção provavelmente é de 187920 [Imagem

117]. O pórtico de entrada da residência abriga um portão de ferro que dá acesso à

escadaria que leva à porta principal, ladeado por pilares onde estão dispostas duas

esculturas. Solução diferente dos outros prédios estudados, onde as esculturas

aparecem sobre as platibandas e frontões. Primeiramente, acreditávamos ser a

representação de duas ninfas. O catálogo da Fábrica Devezas arrola uma das

alegorias como uma bailarina com castanholas [Imagens 118, 119 e 120]. A outra

escultura não foi encontrada no catálogo [Imagens 121 e 122]. Novamente na

platibanda é observado o uso de elementos ornamentais que sugerem o gosto

clássico [Imagens 123 e 124].

20

Ibid. p. 180.

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Imagem 117: Solar dos Campos

Imagens 118: Solar dos Campos - Bailarina com

castanholas.

Imagens 119: Solar dos Campos - Bailarina com

castanholas.

Imagem 120: catálogo Fábrica Devesas – Bailarina com

castanholas.

Imagem 121: Solar dos Campos. Imagem 122: Solar dos Campos.

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Imagem 123: Solar dos Campos – na platibanda o uso de elementos ornamentais sugere o gosto

clássico.

Imagem 124: Solar dos Campos – na platibanda o uso de elementos ornamentais sugere o gosto

clássico.

Conclusão

Nossas conclusões apontam para uma maior representação de imagens

escultóricas relacionadas com a mitologia grega e romana, divindades protetoras do

comércio, da indústria e das artes, e de alegorias das estações do ano ou dos

diferentes continentes. Ao mesmo tempo, encontramos uma série de vasos e

compoteiras de gosto clássico, que também ornamentam as platibandas. A

bibliografia consultada e o catálogo obtido da Fábrica Devezas revelaram que

grande parte dessas estátuas de cerâmica alouçada era originária da cidade de Villa

Nova de Gaya, em Portugal. Outras tantas eram feitas em barro cozido e alouçado,

ou então eram moldadas em massa de cimento, realizadas em ateliês que se

criaram na cidade de Pelotas, que segundo as informações dos jornais da época,

possuíam qualidade e beleza equiparável àquelas importadas.21

Esses elementos ornamentais das fachadas dos edifícios ecléticos estavam

atrelados às funções dos prédios e às ideologias de seus proprietários. Foram

resultantes do interesse das classes dominantes em evidenciar sua cultura, a partir

do conhecimento da história e dos mitos europeus.

21

SANTOS. Op. cit. p. 164.

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Observa-se então, através das esculturas que se distribuem nas fachadas da

arquitetura eclética historicista pelotense, que a utilização desses ornamentos

ampliou a suntuosidade e riqueza dos programas compositivos dos frontispícios. As

esculturas foram empregadas tanto em prédios privados e residenciais, como nos

edifícios públicos e semi-públicos com diferentes funções. As estátuas da

Antigüidade clássica e da Renascença italiana se fizeram modelo e modernas na

arquitetura eclética do final do século XIX e princípios do XX, tornaram-se repertório

para a multiplicação das esculturas criadas ou copiadas e destinadas à

ornamentação das fachadas.

Referências bibliográficas:

BECKETT, Wendy. A história da pintura. São Paulo: Ática, 1997.

CALDAS, Pedro Henrique. Guarany: o grande teatro de Pelotas. Pelotas: Semeador, 1994.

CHEVALLIER, Ceres. Vida e obra de José Isella : arquitetura em Pelotas na segunda metade do seculo XIX. Pelotas :Ed. Liv. Mundial,2002.

COLLIGNON, Maximo. Scopas e Praxiteles: la escultura griega desde el siglo IV hasta la época de Alejandro. Buenos Aires: Ateneo, 1948. p. 120.

COSTA, Antônio Almeida da. Catálogo de Cerâmica e de Fundição das Devezas. Vila de Gaya: 1910.

DOBERSTEIN, Arnoldo. Porto Alegre 1900-1920: estatuária e ideologia. Porto Alegre: Secretaria Municipal da Cultura, 1992.

SANTOS, Carlos Alberto Ávila. Ecletismo na fronteira Meridional do Brasil (1870-1931). Tese (Doutorado em Arquitetura – Área de Conservação e Restauro) Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal da Bahia. 2007.

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TRESSIDER, Jack. Los símbolos y sus significados. Barcelona: Blume, 2008.