economia, desenvolvimento regional e mercado de trabalho do

368
ORGANIZADORES: Amilton Moretto, José Dari Krein, Marcio Pochmann e Júnior Macambira Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do Brasil Fortaleza Instituto de Desenvolvimento do Trabalho Banco do Nordeste do Brasil Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho 2010

Upload: vankiet

Post on 30-Dec-2016

221 views

Category:

Documents


2 download

TRANSCRIPT

Page 1: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

ORGANIZADORES:Amilton Moretto, José Dari Krein,

Marcio Pochmann e Júnior Macambira

Economia, DesenvolvimentoRegional e Mercado de

Trabalho do Brasil

FortalezaInstituto de Desenvolvimento do Trabalho

Banco do Nordeste do BrasilCentro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho

2010

Page 2: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

E17e Economia, desenvolvimento regional e mercado de trabalho do Brasil / organizadores, Amilton Moretto ... [et al.]; autores, Liana Carleial ... [et al.]. – Fortaleza: Instituto de Desenvolvimento do Trabalho, Banco do Nordeste do Brasil, Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho, 2010. 364 p.

ISBN: 978-85-7563-384-7 I. Moretto, Amilton. II. Carleial, Liana. III. Título.

CDD: 330

ECONOMIA, DESENVOLVIMENTO REGIONAL E MERCADO DE TRABALHO DO BRASIL

© 2010 Amilton Moretto, José Dari Krein, Marcio Pochmann e Júnior Macambira (Orgs.)

TODOS OS DIREITOS RESERVADOS AOS AUTORES

REVISÃO DE TEXTOMaria Luísa Vaz Costa

NORMALIZAÇÃO BIBLIOGRÁFICAPaula Pinheiro da Nóbrega

PROGRAMAÇÃO VISUAL E DIAGRAMAÇÃOJosé Wendell de Oliveira Sá

Page 3: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

APRESENTAÇÃO 07

PARTE 01 VISÃO GERAL DA CRISE E O IMPACTO SOBRE O MERCADO DE TRABALHO NO BRASIL 11

CAPÍTULO 01CRISE ECONÔMICA INTERNACIONAL E CRISE DO TRABALHO: O QUE JÁ PODEMOS ANTECIPAR?Liana Carleial 13

CAPÍTULO 02 CRISE ECONÔMICA E EMPREGO NO BRASIL Paulo Baltar 41

CAPITULO 03 CRISE ECONÔMICA MUNDIAL: MUDANÇAS NAS CARACTERÍSTICAS DO DESEMPREGO NO MERCADO DE TRABALHO BRASILEIRO? Maria Cristina Cacciamali e Fábio Tatei 55

CAPÍTULO 04 REAÇÃO DO MERCADO DE TRABALHO NO BRASIL METROPOLITANO FRENTE À CRISE INTERNACIONAL Marcio Pochmann 81

PARTE 02 ASPECTOS REGIONAIS DO MERCADO DE TRABALHO 103

CAPÍTULO 05ASPECTOS ESTRUTURAIS DO MERCADO DE TRABALHO EM CONTEXTO RECENTE DA ECONOMIA BRASILEIRA: CONTRAPONTO NORDESTE-SUDESTE Tarcisio Patricio de Araújo e Roberto Alves de Lima 105

CAPÍTULO 06 MAPEAMENTO DO TRABALHO AGRÍCOLA NO BRASIL Marcelo Weishaupt Proni 139

CAPÍTULO 07 TRABALHO EM TURISMO E SUAS DIFERENÇAS REGIONAIS NO BRASIL Fernando Meloni de Oliveira 179

Page 4: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

CAPÍTULO 08 EVOLUÇÃO DAS DISPARIDADES REGIONAIS NO BRASIL 1950-2008: ANÁLISE COM BASE NO GTDN Fernando J. Pires de Sousa 223

CAPÍTULO 09 CONCENTRAÇÃO GEOGRÁFICA E PRODUTIVIDADE INDUSTRIAL Diego de Maria André, Francisco de Assis Soares, Sandra Maria dos Santos e Júnior Macambira 259

PARTE 03AS POLÍTICAS PARA O MERCADO DE TRABALHO 287

CAPÍTULO 10OS EFEITOS DISTRIBUTIVOS DO SALÁRIO MÍNIMO NO MERCADO DE TRABALHO BRASILEIRO E NORDESTINO NO PERÍODO DE 2002 A 2007 Henrique Dantas Neder e Rosana Ribeiro 289

CAPÍTULO 11 O PAPEL DO SINE NA INTERMEDIAÇÃO DE MÃO-DE-OBRA NO BRASIL – NORDESTE E SUDESTE João Saboia e Josiane Fachini Falvo 323

CAPÍTULO 12 AS POLÍTICAS DE MERCADO DE TRABALHO E A CRISE DE 2008 Amilton Moretto 347

Page 5: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

5

APRESENTAÇÃOA ideia inicial deste livro era fazer um balanço das mudanças recentes obser-

vadas no mercado de trabalho brasileiro. Buscava-se compreender com maiores detalhes a recuperação do emprego formal (isto é, o emprego assalariado com registro em carteira de trabalho) que se iniciara com a desvalorização cambial de 1999, mas que ganhara impulso a partir de 2003 com o bom desempenho da ba-lança comercial, em grande medida decorrente da elevação da demanda mundial por commodities e dos preços destas. O bom desempenho do produto devido ao setor exportador foi, aos poucos, se espraiando para o restante da economia, abrindo novas oportunidades de negócios e repercutindo favoravelmente sobre a geração de novos postos de trabalho.

O crescimento do emprego e da renda, particularmente com os aumentos reais do salário mínimo, permitiu à população de mais baixa renda maior acesso ao crédito, cujas famílias se endividaram com taxas impensáveis em economias civilizadas, mas com prazos longos permitindo que as prestações coubessem no bolso do trabalhador.

O dinamismo da economia brasileira, cujo crescimento médio do produto de 2003 a 2008 foi de 4,2% ao ano, apesar do conservadorismo da política econômica baseada exclusivamente nas metas de inflação, gerou forte otimismo, só ameaçado pela crise global deflagrada a partir dos Estados Unidos, em setembro de 2008.

A crise colocou um elemento novo para os estudiosos do mercado de tra-balho. Em certa medida, esse fato obrigou, de acordo com o tema tratado, maior ou menor referência às consequências da crise. O objetivo inicial, portanto, foi readequado para poder incluir os desdobramentos da crise no plano internacional e suas repercussões sobre a economia brasileira e, consequentemente, sobre o mercado de trabalho.

Assim sendo, os artigos incorporaram o problema da crise na medida em que a evolução dos acontecimentos permitiu se avançar mais ou menos na análise. O resultado final nos dá uma visão ampla da situação do mercado de trabalho de antes da crise e o que se pode esperar após sua superação e, mais importante, quais as questões novas que ela trouxe sobre as diretrizes futuras da economia mundial e da brasileira em particular.

O livro está organizado em três partes. Na primeira são apresentados os aspectos gerais da crise e do mercado de trabalho brasileiro no período recente.

Page 6: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

6

Quatro artigos estão inseridos aqui: Crise econômica internacional e crise do tra-balho: o que já podemos antecipar?, de Liana Carleial, que discute as mudanças observadas no capitalismo contemporâneo e seus impactos sobre o trabalho, as possíveis repercussões sobre o trabalho no plano internacional e no Brasil, apon-tando para a importância de um relativo resgate do papel do Estado e da regu-lação sobre o sistema financeiro. O segundo artigo, Crise econômica e emprego no Brasil, de Paulo Baltar, destaca o contexto recente do mercado de trabalho brasileiro, cujo desempenho indicava o movimento de recuperação do emprego assalariado formal. Diante da crise surgem dúvidas sobre a continuidade desse processo que dependerá da capacidade de o Estado brasileiro responder rápida e eficazmente aos desafios da queda do produto. O terceiro, Crise econômica mundial: mudanças nas características do desemprego no mercado de trabalho brasileiro?, de Maria Cristina Cacciamali e Fábio Tatei, concentra-se em avaliar as diferenças do desemprego decorrentes da crise financeira atual com as crise da década de 1990, pois esta é de natureza distinta das anteriores. Constata que os principais setores atingidos pela recessão foram os mais dinâmicos, o manu-fatureiro, os que dependem do crédito e os que dependem da demanda externa. Dessa forma, o ajuste no mercado de trabalho ocorreu com forte eliminação de postos de trabalho, especialmente de homens com alta escolaridade. Por outro lado, ampliou-se o número de mulheres de mais idade, em geral cônjuges, ocupa-das. No último artigo desta primeira parte, Marcio Pochmann, no artigo Reação do mercado de trabalho no Brasil metropolitano frente à crise internacional, ava-lia os impactos da crise sobre o mercado de trabalho e suas repercussões sobre a pobreza, detectando que, diferentemente do observado nas crises anteriores, a pobreza manteve sua trajetória de queda, o que atribui em grande medida aos mecanismos de proteção social.

Na segunda parte do livro, os artigos focam aspectos regionais do merca-do de trabalho brasileiro. Tarcísio Patrício e Roberto Alves, no artigo Aspectos estruturais do mercado de trabalho em contexto recente da economia brasileira: contraponto Nordeste-Sudeste, analisam as diferenças estruturais do mercado de trabalho da região Nordeste e da região Sudeste. Depois de apresentar a forma-ção do mercado de trabalho nordestino, o autor apresenta a evolução da estru-tura dos mercados de trabalho analisados para concluir que as diferenças entre eles não se alterou substancialmente. Ademais, dadas as diferenças na estrutura produtiva, o Sudeste apresentou uma redução mais rápida do nível de emprego em resposta à crise comparativamente ao Nordeste, mas também é mais rápida a recuperação. Ademais, as taxas de desemprego são maiores no Nordeste que no Sudeste. O autor destaca, ainda, a importância de se definir uma política de desenvolvimento regional que permita ao Nordeste se apropriar dos benefícios

Page 7: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

7

do pré-sal, concentrado na região Sudeste. O artigo Mapeamento do trabalho agrícola no Brasil, de Marcelo W. Proni, coloca em discussão questões relacio-nadas com as desigualdades regionais em termos do mercado de trabalho rural. O autor afirma que o desempenho positivo da agropecuária após 2003 não foi capaz de gerar empregos em quantidade suficiente para absorver o grande contin-gente de trabalhadores agrícolas existente no País e elevar de forma significativa seus rendimentos. Também analisa os profundos desníveis no desenvolvimento regional, particularmente em relação ao grau de mecanização da agricultura e de sofisticação da pecuária, que se refletem nos problemas relacionados ao mercado de trabalho rural, procurando identificar os estados onde a população rural está exposta a um maior grau de vulnerabilidade, aqueles onde predomina o assalaria-mento com relações de trabalho precárias, e outros onde a agricultura familiar está mais bem estruturada. A análise sugere que os diferenciais relacionados ao perfil dos trabalhadores agrícolas mostraram que o recorte por grandes regiões pode ocultar especificidades importantes, sendo aconselhável estabelecer comparações entre as situações estaduais para obter um diagnóstico mais preciso dos proble-mas e potencialidades. Em resumo, o artigo procura mostrar que as condições do mercado de trabalho rural são mais favoráveis onde os agronegócios estão melhor estruturados, que permanecem muitas precariedades a serem enfrentadas nas re-giões onde a agropecuária é mais atrasada, que foi tímida a melhoria observada no perfil dos trabalhadores agrícolas no período 2003-2007, e que tal melhoria se processa muito lentamente quando a modernização é encaminhada pelas forças do mercado. Portanto, é necessário renovar o debate sobre as políticas públicas prioritárias para estruturar melhor o mercado de trabalho agrícola no Brasil. Tra-balho em turismo e suas diferenças regionais no Brasil, de Fernando Meloni, trata da capacidade do setor de turismo em gerar novos postos de trabalho, dado que tem crescido a preocupação com as atividades de turismo no País como uma ativi-dade que deve ser melhor explorada e que apresenta amplas perspectivas de cres-cimento. A análise procura verificar o papel que essa atividade ocupa nas diversas regiões do País. Conclui que as expectativas do turismo como alavanca para o desenvolvimento regional não se concretizou, verificando-se maior concentração dessa atividade nas regiões Sudeste e Sul, bem como a diferença entre a qualidade dos empregos gerados (visto pela remuneração, rotatividade, escolaridade e for-malização) nestas regiões superiores em relação às demais. No artigo Evolução das disparidades regionais no Brasil 1950-2008: análise com base no GTDN, o au-tor Fernando Pires de Sousa faz um esforço para analisar a evolução das desigual-dades regionais brasileiras a partir do Nordeste, tomando como ponto de partida o esforço do Grupo de Trabalho de Desenvolvimento do Nordeste. Verifica que a retomada do dinamismo recente da economia deverá contemplar a consolidação dos investimentos previstos para a região Nordeste. Contudo, constata que tais

Page 8: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

8

investimentos ainda estão muito aquém das transformações necessárias para dar ao Nordeste maior autonomia e independência econômica. Por fim, nesta segun-da parte, Diego Maria André e coautores, no artigo Concentração geográfica e produtividade industrial, busca averiguar o impacto que as economias de escala e o número de estabelecimentos têm sobre a produtividade industrial. A análise é aprofundada com a inclusão das características regionais e da indústria, e a influ-ência que estas têm em atenuar ou acentuar os efeitos das economias de escala e do número de estabelecimentos no resultado da produtividade.

Os três textos da terceira e última parte do livro discutem o tema das po-líticas de mercado de trabalho. No primeiro artigo, Os efeitos distributivos do salário mínimo no mercado de trabalho brasileiro e nordestino no período de 2002 a 2007, Henrique Neder e Rosana Ribeiro discutem a contribuição do salá-rio mínimo para o processo de desconcentração dos rendimentos do trabalho no intervalo de 2002 a 2007. A análise concentra-se sobre os trabalhadores brasilei-ros como um todo e os trabalhadores nordestinos em particular. O resultado da investigação levou à verificação de que a política de elevação do salário mínimo desconcentrou os rendimentos do trabalho no período recente para brasileiros e nordestinos, tanto homens como mulheres. Essa política de elevação gradual do salário mínimo real no período analisado ocorreu sem a elevação do desem-prego, como defende a teoria ortodoxa, reduzindo a dispersão dos rendimentos do trabalho. João Sabóia e Josiane Falvo, no artigo O papel do Serviço Nacio-nal de Emprego (SINE) na intermediação de mão-de-obra no Brasil: Nordes-te e Sudeste, apresentam o desempenho do serviço de intermediação do SINE para as diferentes regiões do País, analisando o perfil da intermediação por meio da Classificação Brasileira de Ocupações. Em avaliação mais detalhada, é feita uma comparação entre o desempenho do SINE na região Nordeste e Sudeste, constatando-se melhor desempenho na primeira. No último texto, As políticas de mercado de trabalho e a crise de 2008, Amilton Moretto discute o papel das políticas de mercado de trabalho como instrumento de proteção social e de apoio à estruturação do mercado de trabalho tomando como pressuposto um ritmo de crescimento adequado do produto para gerar as oportunidades ocupacionais necessárias para incorporar o conjunto da população ativa.

Por fim, cabe destacar que esta iniciativa só foi possível pelo apoio recebido do Banco do Nordeste do Brasil, que encampou a ideia de sua realização desde o princípio. Resta deixar que o livro fale por si aos leitores e ajude a todos a compreender um pouco melhor os caminhos novos pelos quais o mercado de trabalho no Brasil tem trilhado.

Os organizadores

Page 9: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

1PARTE

VISÃO GERAL DA CRISE E O IMPACTO SOBRE O

MERCADO DE TRABALHO NO BRASIL

Page 10: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do
Page 11: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

1CAPÍTULO

CRISE ECONÔMICA INTERNACIONAL E CRISE DO TRABALHO: O QUE JÁ

PODEMOS ANTECIPAR?1

Liana Carleial2

O objetivo deste artigo é discutir quais são as tendências que já se abatem sobre o trabalho no contexto desta fase do capitalismo, após a eclosão da crise financeira explicitada a partir de 15 de setembro de 2008, quando a falência do Lehman Brothers foi reconhecida.

Certamente a crise vinha sendo gestada lentamente e, desde 1987, o interva-lo entre as crises financeiras que atingiram os países desenvolvidos e subdesenvol-vidos, em maior ou menor grau, era de apenas três anos.

O modo de regulação que engendrou essa crise esteve assentado numa que-da da taxa de acumulação, associada ao crescimento da taxa de lucro e a uma crescente perda de participação dos salários na renda gerada. No âmbito das famí-lias o ajuste foi feito pelo endividamento. No nível agregado esse endividamento ganhou força, como se pudesse substituir o investimento produtivo. Além disso, a revolução tecnológica que aproximou comunicação e informação permitiu a reestruturação das firmas, a deslocalização dos investimentos e a reorganização do trabalho.

A acumulação e a dominação financeira magnificaram o caráter fetichista intrínseco às sociedades capitalistas, escondendo o que interessa e insinuando que seria possível produzir sem trabalho e que os ganhos obtidos na esfera financeira seriam autônomos e independentes do lado real da economia.

1 Versão modificada deste artigo foi apresentada no JIST2009-XIIémes Journées Internationales de Sociologie du Travail, no atelier 6, Dinâmica e Crise do Capitalismo, nos dias 24-26 de junho, em Nancy-França e publicada nos anais da referida jornada em formato digital.

2 Professora titular da Universidade Federal do Paraná (UFPR), pesquisadora do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e, atualmente, diretora de estudos regionais e urbanos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA).

Page 12: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

12

O trabalho, então, foi submetido a uma intensa desregulamentação que pro-curou impor aos mercados de trabalho o mesmo resultado dos mercados finan-ceiros: liquidez, rapidez, retornos rápidos e crescentes.

E diante desta crise global, que é financeira, bancária, produtiva e social, o que ocorrerá com o trabalho? Na ausência de novas revoluções tecnológicas, como se farão os ajustes? Será um ajuste pelo desemprego aberto? Novos ciclos de reorganização do trabalho serão tentados? Enfim, quais são as tendências que já podem ser vislumbradas?

Este capítulo está organizado em duas partes além desta introdução e das considerações finais. Na parte inicial apresentam-se as origens da crise e o seu caráter estrutural. Na segunda parte discutem-se a crise financeira e a crise do trabalho em quatro passos. No primeiro passo introduz-se a natureza da crise do trabalho instalada nos anos 80 do século passado; em seguida, analisam-se os impactos da crise sobre a produção e o emprego, os movimentos migratórios e as reações dos trabalhadores e das sociedades. Apresentam-se, de modo sucinto, os efeitos da crise sobre o Brasil e, em seguida, as considerações finais.

1.1 – Crise Internacional: Antecedentes Remotos

1.1.1 – A natureza da crise

A crise financeira intensificada a 15 de setembro passado pela quebra do Lehman Brothers é apenas a chamada “ponta do iceberg”. A questão central são a natureza assumida pela fase do capitalismo intitulada de acumulação à escala financeira e o modo de regulação do capital nos últimos 30 anos.

O período do pós-Segunda Guerra Mundial até os anos 80 do século pas-sado, além de ter configurado o período da reconstrução capitalista, foi também o período de um mundo bipolar no qual a presença do socialismo real facilitou sobremaneira a correlação de forças políticas entre o capital e o trabalho. Do ponto de vista da estrutura de classes no capitalismo, foi um período relevante para a ação sindical e de relativa redução de poder da classe capitalista. A natureza da regulação permitiu que crescimento e emprego tivessem um comportamento solidário, os lucros fossem reinvestidos e o Estado, entendido como portador do

Page 13: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

13

fundo público, operasse “dentro” da economia. Mas, a rentabilidade do capital, ou seja, a taxa de lucro, caía.

O final dos anos 70 foi de reorganização dos movimentos do capital. No en-tanto, a lógica era outra. Instalou-se, então, uma fase que seria intitulada erronea-mente de neoliberal. O fio condutor desse período foi buscar inverter as tendências vividas no período anterior, ou seja, reduzir a ingerência do Estado na economia (com destaque para a privatização de empresas estatais), subordinar o capital pro-dutivo ao financeiro, fragilizar a correlação de forças anteriormente mais favoráveis aos trabalhadores e alterar o padrão concorrencial com fusões e aquisições entre empresas. Tudo isso submetido a uma relação institucional definida, num polo, pela dominância dos mercados, e noutro, pelas formas de regulação recriadas.

Esse formato pareceu adequado para aquela etapa pontuada por uma intensa movimentação internacional dos mercados de bens e financeiro, produzindo mer-cados de trabalho cada vez mais fragilizados pelo lento crescimento econômico, pela perda de poder político dos sindicatos, pelo ataque sistemático aos modelos de Estado de Bem-Estar no mundo desenvolvido e, ainda, pela quase impos-sibilidade de implementação desses modelos nos países subdesenvolvidos. Na realidade, ao lado de um claro movimento de globalização produtiva e financeira, deu-se a concorrência entre os modelos de Estado Social, cada qual buscando ser o mais atraente possível para sediar novos investimentos, incitados cada vez mais pelo poder sedutor das condições chinesas de produção de então.

Essa fase também foi alavancada por mudanças tecnológicas que já vinham em curso no período anterior: a microeletrônica, a convergência tecnológica que impulsionou novas tecnologias da informação e comunicação, alterando proces-sos e formas de gestão do trabalho. A gestão do trabalho alterou-se para se cen-trar no trabalho em grupo que busca ampliar a produtividade e, ainda, permite um controle coletivo do trabalho, mesmo sem a personificação no gerente (ou gestor) (GAULEJAC, 2005), mantendo a avaliação individualizada de cada trabalhador. Tal avaliação utiliza medidas diferentes (e quase obscuras) expressas em modelos de avaliação de competência. Assim, foram alteradas as formas de remuneração. Nem sempre o trabalho corresponde ao salário. Os trabalhadores podem ser pa-gos com ações da própria empresa, por fundos previdenciários ou participações nos lucros. No caso de funções específicas em grandes bancos, a remuneração pode ser ainda mais diversificada incluindo bônus, aplicações etc. Todas essas mudanças redundaram na redução da participação dos salários no Produto Inter-no Bruto (PIB), consistentemente, na Europa e nos Estados Unidos, conforme evidenciam os Gráficos 2 e 3.

Page 14: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

14

O argumento até aqui desenvolvido é reforçado por três fatos. O desloca-mento industrial da Europa Central em direção à Europa Oriental, iniciado já nos anos 80, e dos Estados Unidos em direção à Ásia, tornou-se possível pela mudan-ça de base material do capitalismo, que permitiu o controle de parques produtivos à distância. Já mais recentemente, a incorporação aos mercados da China e da Índia também contribuiu para a tendência de manter mais baixos os salários. Em terceiro lugar, a queda do muro de Berlim, simbolicamente insinua a dominância dos mercados. Neste sentido, o modo de regulação do capital implementado nestes últimos anos construiu todas as condições para a precarização do trabalho e a redução dos salários, assim como para a subordinação do capital produtivo à lógica rentista e especulativa, comprometendo inclusive o Estado, com tais condi-ções em um contexto de economia globalizada.

Hoje é sabido que a queda dos salários na equação macroeconômica geral foi “compensada” pelo endividamento das famílias, bem como, agregadamente, procurava compensar a redução da acumulação.3

Assim, o modo de regulação vigente no período, acrescido da proliferação da prática de titularização e da desregulamentação financeira, ampliaram a ten-dência endógena a crises. Não sem razão, nesse período as crises financeira e real se sucederam, sendo que a partir de 1987 o intervalo entre uma e outra foi de apenas três anos.

Logo, na base da crise financeira estavam os capitais livres (no sentido de não aplicados no setor real da economia) em busca de ganhos. Tais capitais eram originários dos salários em franco descenso, da redução da taxa de acumulação e do aumento da rentabilidade do capital (da taxa de lucro), ao contrário do período anterior e não só da relativa facilidade de crédito disponível nos mercados, como algumas análises insistem em propor.

Até o final dos anos 70, as taxas de acumulação e de lucro nos Estados Unidos, Europa e Japão caminharam juntas; a partir daí, até 2007, observa-se um hiato que evidencia a inversão da regulação macroeconômica desse perí-odo, destacando-se a queda na taxa de acumulação mesmo diante de taxa de lucro ascendente.

3 De acordo com Sapir (2009b), o endividamento das famílias como proporção do Produto Interno Bruto (PIB) de cada país, na Europa, em 2006, era o seguinte: França: 45%; Alemanha: 68%; Espanha: 84%; Inglaterra: 107% e Itália:39%. Segundo o Federal Reserve, nos Estados Unidos esse endivida-mento chegou a ser 135% do PIB, em 2007, quando era 46%, na década de 80 do século passado.

Page 15: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

15

Gráfico 1 - Taxa de Lucro e Taxa de Acumulação Estados Unidos + União Europeia + Japão

Fonte: Disponível em: <http://hussonet.free.fr>. Taxa de acumulação = taxa de crescimento do volume de capital líquido Taxa de lucro= benefício/capital (ano 2000:base 100)

Os Gráficos 2 e 3 a seguir auxiliam no entendimento desse período

A - Estados Unidos

Gráfico 2 - Salários e Consumo Privado no Produto Interno Bruto

(PIB)Fonte: Disponível em: <http://hussonet.free.fr>.

Page 16: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

16

B-União Européia

Gráfico 3 - Salários e Consumo Privado no Produto Interno Bruto (PIB)

Fonte: Disponível em: <http://hussonet.free.fr>.

Nos dois casos o comportamento dos gastos do consumo como proporção do PIB se desvencilha do comportamento dos salários. Nos Estados Unidos, o consumo, aliás, cresce significativamente em relação ao PIB; na Europa, ele é mais ou menos constante, mas também se mostra desvinculado dos salários. A área entre os dois agregados indica que o problema de reprodução identificado pelo Gráfico 1 encontra aqui a solução. Solução aqui é mera licença de linguagem.

Assim, a crise revela um problema estrutural dessa fase do capitalismo que não parece ter ainda encontrado encaminhamento favorável. Na realidade, o des-vendamento da natureza da crise auxilia em sua melhor compreensão e alerta para o fato de que não é possível apenas tentar resolver os problemas gerados pela ruptura, recuperando a crença no mercado financeiro e criando outras inovações financeiras.

Do ponto de vista de Housson (2009), o único meio de quebrar a regulação rentista de mercado, vigente nos últimos trinta anos e mesmo após a atual crise, é “fechar as torneiras que alimentam a esfera financeira; a principal delas é o recuo dos salários”. Assim, seria necessário modificar a distribuição das riquezas: menos dividendos e mais salários e orçamento social. É imprescindível, portanto, outro modo de regulação do capital.

Page 17: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

17

Segundo Housson (2009), há uma significativa margem para isso, uma vez que os dividendos produzidos pelas sociedades não-financeiras representam hoje 12% de sua massa salarial. No caso francês era de apenas 4% em 1982. O autor indica, mais uma vez, que o modo de regulação vigente levou a um conflito dis-tributivo importante: a necessidade de esse padrão de regulação se alterar, recu-perando a participação dos salários no PIB e pregando ainda a necessidade de a finança ser submetida à economia real.

Esta é uma análise que expõe a razão estrutural da crise, sinalizando a insufi-ciência da abordagem conjuntural que até o momento prende a atenção da maio-ria dos analistas. É evidente que é importante implementar medidas que permitam a retomada do crédito para a produção, reduzam os efeitos sobre o desemprego e invertam as expectativas negativas quanto ao futuro das economias. No entanto, a questão central é alterar o padrão distributivo instalado que penaliza fortemen-te os salários. Certamente esse encaminhamento não será possível sem algum grau de protecionismo, sem controle no movimento de capitais e de bens entre países e, ainda, sem algum limite à prática de deslocalização produtiva em busca de produzir pagando salários mais baixos. Estas práticas colocariam um freio ao chamado movimento de globalização ou mundialização vivido nos últimos qua-renta anos.

1.2 – Crise Econômica Internacional e Crise do Trabalho: O Que Podemos Avançar?

A crise do trabalho instalou-se na produção acadêmica mundial, nas fábricas, na mídia, na vida das pessoas à medida que a revolução microeletrônica e os no-vos modelos de gestão da produção e do trabalho avançavam.

Na realidade, o capitalismo mudou de forma significativa após a crise dos anos 70 do século passado. Simultâneamente à chegada definitiva da ciência como força produtiva, as sociedades conheceram um forte ajustamento para inverter a queda da rentabilidade e da produtividade. O acordo que permitiu essa inversão exigiu, então, uma nova forma de organização da empresa na qual o caráter fun-damental foi o comportamento inovador, técnico, organizacional ou tecnológico da firma. A pressão da concorrência e a exigência dos consumidores num mundo globalizado impuseram também novas regras. As palavras de ordem foram com-petitividade e flexibilidade.

Page 18: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

18

A grande empresa enquanto tendência dominante foi substítuida por um modelo mais leve, a firma-rede.4 Da subcontratação clássica (ALTHERSON, 1997) ao co-desenvolvimento (LAIGLE, 1997), existem muitas maneiras de divi-dir o trabalho entre as empresas num mesmo território, num mesmo país ou ainda no nível mundial.

As estratégias de ajustamento estrutural que foram postas em prática pelos diferentes países e coordenadas pelo pensamento único objetivaram a eliminação das barreiras aduaneiras, a redução do papel do Estado, a desregulamentação dos mercados financeiros e do trabalho e a redução da inflação.

Paralelamente, assistiu-se a uma nova lógica de expansão das firmas multi-nacionais que parecem ter adquirido ainda maior poder sobre os territórios e as políticas econômicas nacionais. De uma certa, esses fenômenos explicitam o mo-vimento que chamamos de globalização, a qual, por sua vez, pode se desenvolver mediante regionalizações do mundo, tal como a União Europeia ou o Mercado Comum do Sul (Mercosul).

Desse movimento resulta uma interdependência hierarquizada entre os pa-íses, deixando os Estados nacionais de países subdesenvolvidos mais fragilizados para planejar a economia. Adicionalmente, esse frágil poder ainda ficou partilhado com os organismos internacionais – Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Mundial e as grandes firmas multinacionais5. Por outro lado, os estados nacionais ficaram muito fortes para modificar as regras de proteção aos trabalhadores, para desregulamentar os mercados e liberar os mercados financeiros. Na realidade os estados nacionais acabaram por referendar a financeirização em curso.

Esse novo ordenamento do capitalismo contemporâneo igualmente cons-truiu um novo mundo do trabalho. No lugar de um trabalho homogêneo, regular e contínuo, passou-se a ter um trabalho heterogêneo, irregular e intermitente. Suas manifestações concretas são a redução do número de trabalhadores porta-dores de contrato de trabalho com duração indeterminada nos países desenvol-vidos, a ampliação do número de trabalhadores em tempo parcial, temporário, 4 Ver Veltz (2000).

5 A bem da verdade, porém, é importante registrar que o poder dos organismos multilaterais foi redu-zido ao longo do período e até as vizinhanças da crise atual eles estavam com a sua atuação restrita aos países subdesenvolvidos; o fórum dos países desenvolvidos era, sem dúvida, o G-8. No entanto, com a eclosão da crise, esses organismos foram revigorados, talvez em decorrência da necessidade de socorrer os países do leste asiático; ainda não se pode antever o epílogo nesse relacionamento. Entretanto, a crise trouxe uma sobrevida não esperada a tais organismos.

Page 19: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

19

subempregados, subcontratados e, ainda, a decalagem entre os padrões de inser-ção no mercado de trabalho entre homens e mulheres.6 Enfim, a precariedade e a flexibilização do trabalho, que culminaram nos países da Europa do Norte, na proposta de flexsecurité, que pretende uma associação entre flexibilidade (em todos os níveis) do trabalho mas com alguma segurança.

Além disso, o trabalho não necessariamente corresponde ao salário. O trabalha-dor pode também ser remunerado através de participação nos lucros das empresas, de ações das empresas do grupo, de contas de poupanças, de viagens, de bonus etc.

O capital e o trabalho se tornaram unidades problemáticas. Entretanto, o capital, apesar de sua multiplicidade, é reconhecido por sua unidade na luta pela sua valorização. O trabalho passou a ser cada vez mais atravessado por diferen-ças, fragmentações, diferenças/ausências de possibilidade de organização política, comprometendo parte importante dos trabalhadores com os ganhos originalmen-te recebidos apenas pelos detentores do capital, tais como juros, rendimento de ações etc. A realidade fica cada vez mais difícil de interpretar, gerando, assim, para alguns, a crise da sociedade do trabalho.

A maior parte dos autores que compartilham essa ideia de crise optou por considerar como efetiva e real a impossibilidade de o trabalho se manter como meio central de ligação social nas nossas sociedades.

Offe (1989) considera que a substituição do trabalho pela questão do empre-go na análise sociológica é o início da desarticulação dessa categoria, bem como da perda de sua posição central nas sociedades capitalistas. Keynes teria possibili-tado essa substituição. Gorz (1988) argumenta que é a vida que deve ser remune-rada, e não o trabalho. Essa virada no pensamento de Gorz (1988) foi sustentada pelo artigo clássico de Habermas (1987), no qual ele propõe a substituição do paradigma da produção pelo paradigma da comunicação para interpretar o mun-do diante da perda da energia utópica oriunda da dominância do assalariamento, ou seja, do trabalho indiferenciado sob o capital.7

O trabalho é, então, posto em questão como ligação social. (GORZ; 1998, 1997; MÉDA, 1995). Rifkin (1995) denuncia o fim do trabalho e defende a criação do terceiro setor como meio de geração de ocupações. Aznar (1992) propõe o pa-

6 Para uma análise aprofundada ver: Hirata (1998).

7 Na realidade, isto não acontece; o tamanho do assalariamento é crescente no mundo contemporâ-neo. O que se alteram são a força política dos assalariados e as condições sob as quais o trabalho assalariado é regido.

Page 20: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

20

gamento pelo Estado de um segundo cheque mesmo para aqueles que trabalham, mas não recebem o suficiente. Temos aqui a matriz de pensamento mais relevante para a sustentação de uma crise do trabalho.

Mas, se o trabalho não é mais o ponto central da sociedade em torno do qual ela se organiza, o que poderá substituí-lo? Na realidade, essa fase retrata mais um momento do avanço das forças produtivas, do avanço tecnológico concretizado em mudanças efetivas nos processos produtivos, mas que não tem prescindido do trabalho. De forma incisiva a tecnologia é utilizada como meio de valorização.

O trabalho, certamente, não desapareceu; ele foi redefinido dentro e fora da fábrica, entre grandes e pequenas empresas subcontratadas, entre países desen-volvidos e subdesenvolvidos através, especialmente, da presença das firmas-rede mundiais, e reposicionado entre os diferentes setores econômicos.

A produção acadêmica mais recente (LALLEMENT, 2007) e a prática con-creta de gestão de pessoas nas firmas acabaram por reconhecer que o trabalho continua sendo a forma de ligação social e de pertencimento de cada indivíduo na sociedade; do mesmo modo o assalariamento se mantém como a forma preva-lente de inserção nos mercados de trabalho. (CARLEIAL; AZAIS, 2007). Logo, é necessário acompanhar os impactos sobre o trabalho.

Mas, nesta crise, o que dizer? A crise atual é entendida por alguns como a primei-ra grande crise do capitalismo globalizado. Neste quadro o que pode acontecer com o trabalho? Na ausência de uma revolução tecnológica que permita uma nova orga-nização do trabalho serão retomadas as condições que instituíram a anterior crise do trabalho? Serão intensificadas as práticas de flexibilização das legislações trabalhistas? O ajuste se fará por cortes no emprego e nas horas trabalhadas? Ainda é muito cedo para se ter uma ideia mais concreta dos reais impactos sobre o trabalho. Neste sentido discutem-se alguns sinais dos impactos que já são visíveis sobre o trabalho.

1.3 – Impactos sobre a Produção e o Emprego

O primeiro impacto visível da crise sobre o lado real da economia foi o recuo da produção mundial. Do grupo de países analisados pelo FMI há uma previsão de queda de 1,0 % para o ano de 2009. Entre os países desenvolvidos a principal queda prevista é a do Japão (-5,8%), seguida da zona do Euro (-3,2%), Reino Unido (- 2,8%), e os EUA (-2,6%).

Page 21: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

21

Gráfico 4 - PIB mundial- Blocos e Países, Anos 2007 e 2008 –Projeção 2009

Fonte: FMI.

A previsão do FMI é até mais otimista que a produzida pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Em 31 de março passado, essa instituição divulgou uma previsão de queda da atividade mundial de 4,3%, em 2009, para os países de sua área, sendo que o Japão apresentaria uma queda de 6.6%, a zona do euro perderia 4,1% e os EUA 4,0%. Assim, o impacto da crise, de um modo ou de outro, está tendo um forte impacto negativo na ati-vidade econômica mundial.

Fica, então, evidente que não há crise financeira sem repercussão no lado real da economia. Considerando ainda a velocidade com a qual a transmissão se fez nessa crise atual, o efeito imediato tem sido a ampliação do desemprego aberto, como evidencia a Tabela 1, com as consequências sobre a ampliação dos gastos governamentais, seguro-desemprego e indenizações8.

8 O volume de recursos que os Estados nacionais injetaram em suas economias certamente ampliará os seus déficits, com implicações de médio e longo prazo sobre as suas capacidades de intervenção futura.

Page 22: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

22

Tabela 1 - Desemprego nos Países da OCDE - Taxas, Valores Ab-solutos e Projeções

Países

Percentagem da força de trabalho Milhões

Projeções Projeções

2007 2008 2009 2010 2007 2008 2009 2010

América do Norte

Canadá 6,0 6,1 7,0 7,5 1,1 1,1 1,3 1,4

México 3,4 4,1 4,6 4,4 1,5 1,9 2,1 2,0

EUA 4,6 5,7 7,3 7,5 7,1 8,8 11,4 11,8

Ásia

Japão 3,9 4,1 4,4 4,4 2,6 2,7 2,9 2,9

Coreia 3,2 3,2 3,6 3,6 0,8 0,8 0,9 0,9

Europa

Áustria 5,1 4,9 5,7 6,0 0,2 0,2 0,3 0,3

Bélgica 7,4 6,8 7,4 7,8 0,4 0,3 0,4 0,4

República Checa 5,3 4,5 5,2 5,5 0,3 0,2 0,3 0,3

Dinamarca 3,7 3,1 4,0 4,5 0,1 0,1 0,1 0,1

Islândia 6,9 6,2 6,5 6,8 0,2 0,2 0,2 0,2

França 8,0 7,3 8,2 8,7 2,2 2,1 2,3 2,5

Alemanha 8,3 7,4 8,1 8,6 3,6 3,2 3,5 3,7

Grécia 8,1 7,6 8,0 8,2 0,4 0,4 0,4 0,4

Hungria 7,4 7,9 8,9 9,2 0,3 0,3 0,4 0,4

Islândia 2,3 2,8 7,4 8,6 0,0 0,0 0,0 0,0

Irlanda 4,6 5,9 7,7 7,8 0,1 0,1 0,2 0,2

Itália 6,2 6,9 7,8 8,0 1,5 1,7 2,0 2,0

Luxemburgo 4,4 4,5 6,5 7,0 0,0 0,0 0,0 0,0

Holanda 3,3 3,1 3,7 4,1 0,3 0,3 0,3 0,4

Noruega 2,5 2,6 3,0 3,3 0,1 0,1 0,1 0,1

Polônia 9,6 7,2 7,1 7,6 1,6 1,2 1,2 1,3

Portugal 8,0 7,6 8,5 8,8 0,4 0,4 0,5 0,5

Eslováquia 11,0 9,7 9,4 9,0 0,3 0,3 0,3 0,2

Espanha 8,3 10,9 14,2 14,8 1,8 2,5 3,3 3,4

Suécia 6,1 6,1 7,0 7,7 0,3 0,3 0,3 0,4

Suíça 3,6 3,5 3,9 4,2 0,2 0,2 0,2 0,2

Continua

Page 23: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

23

Tabela 1 - Desemprego nos Países da OCDE - Taxas, Valores Abso-lutos e Projeções

Países

Percentagem da força de trabalho Milhões

Projeções Projeções

2007 2008 2009 2010 2007 2008 2009 2010

América do Norte

Austrália 4,4 4,3 5,3 6,0 0,5 0,5 0,6 0,7

Nova Zelândia 3,6 4,0 5,4 6,0 0,1 0,1 0,1 0,1

OECD Europaα 7,1 6,9 8,0 8,5 16,0 15,8 18,3 19,6

EU-15α 7,0 7,0 8,2 8,8 13,3 13,5 15,9 17,0

EU-19α 7,2 7,0 8,1 8,6 15,8 15,6 18,0 19,3

Total OECDα 5,6 5,9 6,9 7,2 31,9 34,0 40,1 42,1Fontes: OECD... (2009).a) Taxas agregadas de desemprego são computadas usando-se ponderações da força de trabalho. EU-15 refere-se a Áustria, Bélgica, Dinamarca, Finlândia, França, Alemanha, Grécia, Ireland, Itália, Luxemburgo, Holanda, Portugal, Espanha, Suécia, Reino Unido. EU-19 refere-se a EU-15 e República Checa, Hungria, Polônia e Eslovákia Eslovena. Os países da OECD Europa inclui a EU-19 e, ainda, Islandia, Noruega, Suécia, Switzerland e Turquia.

Entretanto, o maior impacto se deu nos EUA, epicentro da crise. Na realidade, a desaceleração do PIB americano já começara no último trimestre de 2007, quando en-tão se iniciou a fragilização de famílias e empresas, especialmente as automobilísticas.

Segundo o Instituto de Finanças Internacionais (IIF), está em curso um pro-cesso de empobrecimento do país que já destruiu US$ 16,5 trilhões da riqueza dis-ponível entre as famílias nos últimos quinze meses9. Do ponto de vista da cultura americana, a crise atingiu as suas duas principais formas de poupança: os imóveis e as ações negociadas em bolsas de valores, cujos preços caíram acentuadamente, sendo inusitado o número de ações negociadas por um valor unitário abaixo de um dólar. Todo esse processo atinge a sociedade americana, que já vem de um período de mais de trinta anos de intensa concentração de renda10. O relatório 9 Dados publicados no Jornal Folha de São Paulo de 8 de março de 2009, página B15.

10 Essa tem sido a tendência em todos os países do mundo na era da globalização financeira, porém parece bem intensificada no caso norte-americano, especialmente quando se associa à crise na saúde e ao nível de exclusão da população a esses serviços.

(Continuação)

Page 24: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

24

elaborado pela Global Policy Network, em 2007, indicava que no período de 1979 a 2004, a renda dos 20% mais pobres subiu apenas 2,0%, enquanto a renda do 1,0% mais rico cresceu 152,9%11.

Do ponto de vista do impacto sobre o emprego, segundo a OCDE, esse país que possuía uma taxa de desemprego aberto de 4,6% de sua força de trabalho, em 2007, conta com a previsão de ter, em 2010, 7,5% de sua força de trabalho na condição de desempregada. No entanto, há previsões menos conceituadas que já apontam um desemprego de dois dígitos nos EUA, em 2010. Em março de 2009, a indústria americana atingiu o mais baixo nível de utilização da capacidade instalada em 42 anos.

Os setores mais atingidos foram o bancário, as instituições financeiras, o imobiliário, a construção civil e toda a cadeia automotiva12. A análise, entretanto, é dificultada, pois praticamente todos os dias as previsões de demissões se alteram. É sabido o volume de recursos já injetados nos bancos americanos e nas grandes montadores de automóveis, mas mesmo assim não se sabe ao certo a amplitude e os possíveis desdobramentos da crise. O caso da GM é exemplar.

A GM já recebeu 13,4 bilhões de dólares do Estado, e hoje, dia 13 de abril de 2009, o Jornal ECHOS anuncia que há duas possibilidades de encaminhamento dessa empresa: na primeira, a GM declararia falência; na segunda, a empresa seria separada em duas. Uma agregaria os bons ativos e a segunda empresa assumiria o restante. Mesmo assim, aquela sã precisaria ainda receber de 5 a 7 bilhões de dólares do Governo; já a segunda empresa seria liquidada em vários anos a um custo provável de 70 bilhões de dólares ao Estado americano.

Na Europa, os efeitos são diferenciados e o desemprego cresce mais lenta-mente. A previsão mais negativa atinge a Espanha, pois segundo a OCDE, em 2010, a taxa de desemprego deverá atingir quase 15% de sua força de trabalho, quando em 2007 essa taxa tinha sido de 8,3%.

11 Disponível em: <www.gpn.org>.

12 A crise na indústria automobilística exige muita atenção. Posicionada no centro do debate da pos-sibilidade da construção de economias de baixo carbono enquanto tendência mundial, essa indústria se debate também para manter suas posições no “hanking mundial” da produção e, ainda, transitar para carros elétricos, portanto portadores de tecnologia, menores e com reduzida autonomia, con-trastando com os movimentos recentes de “empurrar” carros possantes e caros até mesmo para cir-cular em centros urbanos. Por enquanto, nesse embate, a produção chinesa ultrapassa fortemente o Japão, os EUA e a Alemanha (o que era esperado acontecer só em 2020), enquanto o Brasil (ou seja, as multinacionais localizadas aqui) passa da 11ª posição para a 6ª, segundo informações divulgadas no Jornal O Estado de São Paulo, de 23 de setembro de 2009, página B9).

Page 25: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

25

Tal impacto não é também homogêneo entre os setores de atividade econô-mica. Na Europa, o setor automotivo vem sendo muito atingido; na Espanha e Ir-landa o setor da construção sofreu as consequências, evidenciando a propagação da crise para ramos de atividade não diretamente ligados à “crise do subprime” mas que foram atingidos via redução do crédito e desconfiança dos consumido-res. Na Espanha estima-se que há uma disponibilidade de um milhão de moradias sem compradores.

O caso francês exige um comentário adicional. Contrariamente aos EUA, a França é o país da OCDE, entre os trinta membros dessa organização, que mais reduziu as desigualdades nos últimos 20 anos, bem como a sua taxa de pobreza, que passou de mais de 8% de sua população para pouco menos de 7%.

Nos países da OCDE, os 10% de pessoas mais ricas ganham, em média, nove vezes mais que as pessoas que estão na faixa dos 10% mais pobres. Na França, porém, essa distância é menor, é de seis vezes. A razão dessa diferença na França, segundo Martine Durand, da OCDE, decorre da importância do salário mínimo francês (mais de 60% do salário mediano), do número de empregos criados e do sistema governamental de redistribuição. A crise, então, atingirá esses ganhos.

De fato, em apenas nove meses a França passou de uma situação de cresci-mento positivo de 1,5% para uma posição de queda de -2,9%, o equivalente a 85 bilhões de euros do PIB francês. De acordo com o Institut National de la Statisti-que et des Études Économiques (INSEE), entre outubro de 2008 e abril de 2009 o número de desempregados deverá ser acrescido de 430.000 pessoas.

Observando o Gráfico 5, identifica-se que o ritmo de criação de empregos inicia uma desaceleração já a partir de meados do ano 2007 e, no segundo semes-tre de 2008, configura-se, então, a perda de postos de trabalho.

Page 26: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

26

Gráfico 5 - Criação de Empregos Assalariados nos Setores de Mercado (Exceto Agricultura) Variações Semestrais em Milhares

Fonte: Dados sobre Estimativas de Emprego Coletados em INSEE.

Essa perda de postos de trabalho atinge diferentemente os setores de ativi-dade econômica, estando previsto para 2009 uma perda importante na indústria e no setor terciário.

Quanto ao perfil dos trabalhadores que estão sendo demitidos, segue o mes-mo padrão de crises anteriores: os jovens, os migrantes, os trabalhadores pouco qualificados, os trabalhadores temporários e, relativamente, atinge mais fortemen-te os homens do que as mulheres. Até o momento não parece haver sinais de ajustes significativos na jornada de trabalho, ou seja, não há mudanças que confi-gurem saídas de mais longo prazo para a crise que atinge duramente o emprego.

1.4 – Impactos sobre os Movimentos Migratórios

Grande parte das análises sobre a globalização contrariava o ponto de vista de que a desregulamentação dos mercados facilitaria a migração da força de tra-balho pelo mundo, à exceção, evidentemente, dos blocos econômicos nos quais o acordo entre os países permite o livre trânsito dos trabalhadores. No entanto, o historiador Demétrius Papademetriou considera que nos primeiros sete anos do século XXI havíamos entrado na era da mobilidade, dada a intensificação dos flu-xos migratórios no mundo, incluindo a migração de trabalhadores qualificados e

Page 27: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

27

ilegais. (PAPADEMETRIOU, 2009). Os EUA, que possuem a maior participação de migrantes na sua população, detêm 1/3 dos trabalhadores ilegais do mundo. No entanto, nos EUA e no Reino Unido a chegada de migrantes já vinha tendo um comportamento mais tímido desde 2007. Segundo esse autor, a migração ilegal é a que mais responde ao ciclo econômico, porém a abertura dos mercados teria criado uma necessidade de migrantes qualificados nos EUA e na Europa.

Diante da crise, Papademetriou (2009)13 considera que ocorrerão consequ-ências graves para os migrantes. Em primeiro lugar, os países de origem desses migrantes serão atingidos duramente, pois a migração internacional é um elemen-to de redução da pobreza dos países mais pobres.

Em 2008, o volume de remessas registradas de dinheiro atingiu a marca de US$ 400 bilhões, dos quais US$ 305 bilhões foram enviados a países em desen-volvimento, assim distribuídos: Índia(15%), China(11%), México(9%) e o Brasil, 23º do ranking, recebeu 1% desse valor.

É importante lembrar que em 2006, a China foi o principal país de origem dos migrantes para os países da OCDE; já entre os membros da OCDE, foi da Polônia que mais partiram os migrantes.

Outro risco apontado pelo autor é que a população migrante, especialmente a ilegal, seja alvo de pressões das populações locais em razão da disputa por pos-tos de trabalho.

Na realidade, essa pressão já é concreta em alguns casos. O Japão, que detém, por exemplo, uma significativa participação de trabalhadores brasileiros, estabeleceu o pagamento de um valor correspondendo a R$ 6.700 (aproximadamente 2.300 euros) ao brasileiro que queira retornar ao Brasil14. Os trabalhadores que aceitarem esse pagamento não poderão mais requisitar visto de trabalho naquele país.

A Europa, conhecida pelo seu sistema de proteção social mais amplo que o dos EUA, detém, em média, 10% de migrantes em sua população e, neste mo-mento, aperta o cerco sobre os trabalhadores ilegais. As medidas entre os países se diferenciam, mas a Espanha e o Reino Unido são considerados os mais rigo-rosos. Na Espanha há uma ação policial, confirmada pelo sindicato dos agentes de polícia, com a determinação de que cada oficial prenda 35 imigrantes por mês. 13 Entrevista concedida ao Jornal Folha de São Paulo, no dia 6 de abril de 2009, página A12.

14 Se o brasileiro tiver constituído família, haverá também um valor per capita a ser pago pelo Governo japonês.

Page 28: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

28

No Reino Unido a ação de fiscalização foi intensificada, as multas ampliadas e o slogan de campanha de Gordon Brown: “Empregos britânicos para trabalhadores britânicos” parece dar o tom da investida contra os imigrantes. Há diferenças entre as ações dos países do bloco, mas em 2010, deve entrar em vigor a polêmica “Diretiva do Retorno”, que trata da deportação de imigrantes.

Já nos EUA, a fiscalização aumentou significativamente e a deportação do migrante ilegal é imediata, diferentemente do que acontecia anteriormente, quan-do o migrante ilegal era identificado e só posteriormente ele deveria se apre-sentar15. Há também evidências de que vistos de trabalho não estão sendo mais renovados mesmo para os trabalhadores qualificados, como é o caso de médicos.

Para Papademetriou (2009), entretanto, esses fatos não configuram o fim do movimento da migração internacional. Quando a economia voltar a prosperar os países ricos sentirão falta desses imigrantes.

1.5 – A Crise e as Reações dos Trabalhadores e da Sociedade Civil

A crise certamente atinge classes e segmentos de classes de modo diferen-ciado. Os anos de dominação das políticas concebidas no âmbito do Consenso de Washington praticamente soterraram a possibilidade de ampliação de organização das classes trabalhadoras fragilizadas pelo lento crescimento econômico, pela re-dução da participação dos salários nas rendas geradas, pelas práticas de flexibili-zação da proteção social ao trabalho, pela deslocalização industrial e, ainda, pela primazia do mercado globalmente aceita.

Na realidade, Theret (1993, p. 17) argumenta que

o neoliberalismo no caso da França foi um dos fatores da perda de sentido da tradicional distinção esquerda/direita e de sua substituição por uma dispersão das elites político-admi-nistrativas, transversal aos partidos governamentais tanto de direita como de esquerda, entre, de um lado, o pólo financeiro internacional e, de outro, o social local, fratura desestabiliza-dora da ordem política nacional que a ideologia neoliberal se revela incapaz de reduzir e engessar.

15 Informação dada pelo senhor João Almino, Cônsul Geral do Brasil em Chicago, publicada no Jornal Gazeta do Povo, dia 8 de março de 2009, página 2.

Page 29: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

29

Num certo sentido esta constatação revela que os anos do neoliberalismo mu-daram o próprio conceito e o contexto da ação política. Por outro lado, é evidente que há um conteúdo de classe nas medidas até então implementadas pelos gover-nos dos diferentes estados nacionais. Recursos antes inexistentes para atender, por exemplo, a saúde e a educação, saem multiplicados dos cofres públicos para salvar bancos e empresas. O mecanismo de socialização dos prejuízos historicamente acei-to pelas sociedades capitalistas está em plena atuação. Mesmo assim, consideramos que os diferentes grupos sociais não têm ainda muito claro como são e continuarão sendo atingidos pela crise, à exceção, é claro, daqueles que já perderam ou estão prestes a perder os seus empregos. Esse quadro explica a reação desorganizada, errática e muitas vezes sem resultado concreto que se vê até o momento.

Além das greves e passeatas que têm ocorrido em alguns países e, ainda, do forte clamor popular nas cidades que sediam os encontros internacionais de cúpula, como aconteceu com o G-20 em Londres, chama a atenção a prática de sequestro de dirigentes de grandes empresas, como último recurso para tentar impedir demissões e/ou negociar as condições de saída da empresa. Segundo o jornal Le Monde, do dia 15/04.09, foram sequestrados os dirigentes da Faurecia, Scapa, Fulmen, Caterpillar, Heuliez, 3M e Sony, por enquanto, pois os analistas acham que essa prática deve continuar.

Há alguns aspectos a considerar aqui. Em primeiro lugar, a divulgação dos valores estratosféricos que são pagos sob a forma de bônus aos dirigentes de bancos nos EUA (mesmo após a imensa injeção de recursos públicos realizada). As remunerações pagas aos dirigentes de grandes empresas na Europa tornam visível o privilégio de segmentos de classes mesmo num momento de forte crise econômica. Como a mesma reportagem atesta, uma enquete realizada pela IFOP – Paris Match entre 1010 pessoas, na França, apenas 7% condenavam as práticas de sequestro de dirigentes empresariais realizadas até aquele momento16.

Em segundo lugar, o período de restrição de liberdade é curto e não tem havido agressões físicas; em terceiro lugar, os patrões ou os quadros que foram retidos não fizeram denúncia policial, apesar de alguma associação patronal ter reagido contra a prática. Finalmente, essa prática tem atingido plantas industriais ameaçadas de fechamento ou que instituíram planos de ação social.

É importante considerar que o presidente do Medef, Laurence Parisot, não só divulgou uma nota declarando preocupação com os acontecimentos, como também tem dito que é necessário uma maior flexibilização para que as empresas possam demitir.

16 IFOP é um Instituto de Sondagem de Opinião, Marketing e de Mídias.

Page 30: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

30

A pergunta a se fazer é: diante dessa situação as empresas alterarão seus planos? E as práticas de deslocalização industrial serão suspensas? E as práticas de gestão do trabalho caminharão em qual direção? Na ausência de sinais claros de mudanças tecnológicas para além da convergência entre comunicação e infor-mação, já em curso, há possibilidades de novas mudanças na base material do ca-pitalismo que enseje uma nova fase na gestão do trabalho? Não temos respostas para este conjunto de questões, o que exige um acompanhamento cotidiano da crise e de seus desdobramentos.

Há indícios, porém, de que “o fazer a política” vai ser diferenciado, errático e talvez surpreendente. Ou seja, está aberto um campo de novas formas de agir politicamente. Um fato importante foi divulgado pelo The Wall Street Journal de 17/04/09, de que o The United Food and Commercial Workers Union está de-senvolvendo um grande esforço para sindicalizar os trabalhadores da Wall-Mart. Essa rede possui 1,4 milhão de trabalhadores e mais de 3.600 lojas. Na realidade, o sindicato precisa da adesão de mais de 50% dos trabalhadores; no entanto, essa sindicalização pode ser feita por departamentos e não, necessariamente, pelo con-junto de cada unidade. Esse movimento tem o aval direto do presidente Obama, pois, em 2007, ele criticou a Rede Wall-Mart, sugerindo que ela precisaria pagar melhor os seus trabalhadores e a Casa Branca confirmou a afirmação do senhor presidente. Será possível, então, ampliar a sindicalização num momento de crise?

Outro exemplo vem do Japão, onde 28.000 trabalhadores perderam seus empregos na atividade automobilística desde janeiro deste ano. Odaira (2009) re-vela que nesse país, já fortemente atingido pela globalização, no qual os jovens estão cada vez mais sem lugar na produção, iniciou-se a Rede de Proteção contra a Pobreza, coordenada por Makoto Yuasa, cuja primeira atividade foi organizar entre 31 de dezembro de 2008 e 5 de janeiro de 2009, a “Vila de trabalhadores temporários para o Réveillon”, implantada no parque Hibiya, no centro de Tokyo. Essa iniciativa contou com o apoio de 1.700 voluntários. Esses trabalhadores tem-porários, que não têm qualquer proteção, perderam a ocupação de um dia para o outro. Segundo o Ministério da Saúde e do Trabalho, até o mês de abril de 2009, 157.000 trabalhadores temporários terão perdido a sua ocupação. Que peso tais práticas terão no redirecionamento da saída da crise?

Page 31: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

31

1.6 – Uma Rápida Análise do Caso Brasileiro

Os países subdesenvolvidos e não atingidos diretamente pela crise financei-ra, como é o caso brasileiro, sofrem os seus impactos em razão do enxugamen-to do crédito internacional, da redução dos preços das commodities, da queda das exportações em razão da redução da demanda internacional, da maior ou menor presença das firmas transnacionais em seus territórios e, ainda, das expectativas negativas geradas pela crise. Quanto aos países subdesenvolvidos, a OCDE pre-vê perdas para o PIB brasileiro (-3%), russo (-5,6%), indiano (-4.3%) e chinês (-6,3%)17. Entretanto, não é objetivo deste artigo estabelecer um paralelo entre os impactos da crise sofridos pelos países desenvolvidos e subdesenvolvidos. Nesta seção, o intuito é apenas evidenciar que há consequências também pesadas para países que haviam feito a lição de casa, ou seja, haviam se submetido às regras impostas pelo Consenso de Washington, e mesmo assim estavam encontrando o seu caminho para o desenvolvimento. Este é o caso brasileiro.

O Brasil vinha numa trajetória positiva de crescimento dos investimentos, do emprego formal, do mercado interno e do PIB, gerando redução do desemprego aberto e da informalidade. Do mesmo modo, implementou uma recuperação do valor real do salário mínimo, que atinge 25 milhões de trabalhadores e 18 milhões de aposentados, ampliou o seu programa social, “O Bolsa Família”, estimulou a indústria da construção civil, consolidando a tendência de mobilidade de segmen-tos de classes da base da pirâmide social18. Instituiu o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que abriga investimentos importantes na cadeia do petróleo e do gás, da indústria naval, das hidroelétricas, da infraestrutura e da logística (in-cluindo portos, aeroportos, ferrovias, estradas) e, ainda, programa de regulariza-ção fundiária e renovação urbana em favelas importantes do País. Do lado fiscal o Brasil também vinha numa boa trajetória. As receitas cresceram 7,7%, o superavit primário foi de 4,1% do PIB e a dívida líquida do setor público vinha caindo nos últimos anos e, em 2008, atingiu 36% do PIB.

No front internacional, o Brasil ampliou as suas reservas internacionais, di-versificou o destino de suas exportações, reduzindo significativamente a sua de-

17 A reação chinesa à crise tem sido forte e ancorada num amplo programa de investimentos em infraestrutura. A sua posição é privilegiada, uma vez que esse país detém reservas da ordem de um trilhão de dólares. De um lado, essa posição lhe permite comprar ativos no exterior, mas, de outro lado, estabelece-se uma “solidariedade” com a posição americana.

18 Entre 2003 e junho de 2009, o valor real do salário mínimo aumentou 60%.

Page 32: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

32

pendência dos EUA, fortalecendo a sua integração na América Latina e com os novos mercados emergentes da China, da Índia e da África, destacando o cresci-mento de exportações para Angola. Todas essas alterações de rota se fizerem no contexto de uma política monetária restritiva.

Tal como nos países desenvolvidos, as medidas contracíclicas implementa-das no Brasil foram centradas em desonerações fiscais, manutenção/ampliação dos gastos de governo, ampliação dos recursos voltados para o seguro desempre-go, medidas especiais para setores estratégicos em dificuldades, como é o caso da indústria automotiva. Entretanto, pela primeira vez na história recente do nosso País, a crise encontra o setor público bem organizado e o setor privado, em média, também organizado. O problema dos “ativos tóxicos” ou das consequências de especulações com o câmbio atingiram poucas empresas, como a Sadia e a Ara-cruz. Houve um único caso de fusão entre dois bancos: o Unibanco e o Itaú. O Banco Central criou linhas de crédito para os exportadores, iniciou uma redução da taxa de juros básica da economia, efetuou leilões de dólares, redução do depó-sito compulsório dos bancos, aumentou a rapidez do redesconto, favoreceu que os bancos públicos comprassem pequenas instituições financeiras em dificulda-des, ampliou os prazos de recolhimentos dos impostos, ampliou o orçamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o maior banco de financiamento da produção a longo prazo, criando novas linhas de fi-nanciamento de caminhões, ônibus e tratores, ampliou os recursos para a safra agrícola 2008/09 e os recursos para os fundos constitucionais que financiam o desenvolvimento regional.

Relembrando o início desta seção, o PIB brasileiro vinha crescendo nos três primeiros trimestres de 2008, a uma taxa de 6,4%, mas no último trimestre o PIB se contraiu em 3,6%. O impacto sobre a atividade econômica deveu-se, em parte, à ação da política monetária que vinha ampliando a taxa básica de juros desde abril de 2008 e que foi magnificada pela crise internacional. No mesmo período, a atividade industrial sofreu uma queda de 20%, a maior de todas as recentes crises que afetaram a economia brasileira (crises do México, da Ásia, da Rússia, da Argentina, e a do final do governo FHC), segundo a Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib). O impacto sobre o emprego formal também foi significativo, aproximadamente 600 mil postos de trabalho.

Em abril de 2009 o quadro geral parece mais positivo; o Banco Central já reduziu a taxa de juros, o superávit primário foi reduzido para 2,5% do PIB, o Governo lançou um grande programa de habitação e já há sinais de recuperação da atividade industrial e do emprego.

Page 33: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

33

Num primeiro momento da eclosão da crise houve um forte movimento de defesa da flexibilização da legislação trabalhista, suspensão de contratos de traba-lho e negociações específicas entre empregados e empregadores. Entretanto, o Governo freou as pressões para a flexibilização e passou a assinalar a necessidade de contrapartidas das empresas beneficiárias de financiamento público, cujo foco central seria a manutenção dos empregos, abrindo um espaço para a discussão de novas institucionalidades na relação empresas-Governo. Por outro lado, o Brasil ainda não ratificou a Convenção 158 da OIT, a qual eliminaria a arbitrariedade das demissões, bem como reduziria a prática da demissão sem justa causa19; ambas se confundem, pois nos dois casos não há registro na carteira do trabalhador. Além disso, a empresa se obriga a notificar com antecedência ao sindicato e às autorida-des judiciárias as razões que levaram à prática de demissões.20

1.7 – Considerações Finais

A atual crise global jogou um conjunto relevante de países numa estratégia para relançar e estimular o consumo e o investimento, ajudar os bancos a se li-vrarem dos chamados ativos tóxicos para, finalmente, criar as condições para a circulação do crédito, fortemente atingido.

As medidas tentam recompor a produção e o emprego, mas, também, re-cuperar o modo antigo de regulação, ou seja, buscam recuperar a confiança no sistema bancário e exercer um certo controle sobre as chamadas “inovações fi-nanceiras”. No centro dessa atuação encontra-se o Estado. Soerguido de uma posição subalterna quando comparado ao vigor dos mercados, os estados na-cionais recuperaram sua posição de centralidade nos rumos da economia e das sociedades. Mantida a direção das políticas até agora implementadas (ou pelo menos indicadas), o conflito de classes que esteve na origem da crise se mantém. Mas como os diferentes grupos sociais reagirão? Até que ponto a ligação entre as esferas produtiva e financeira permitirá uma ruptura significativa?

Uma grande expectativa rondou a reunião do G-20, ocorrida em Londres a 2 de abril passado. O grupo reúne 19 das principais economias industrializadas e em desenvolvimento, mais a União Europeia, e tem substituído, aos poucos, o grupo G7/G8 na “condução” da economia mundial. Mas certamente esse grupo é pro-

19 O senhor Presidente da República já enviou a Convenção para ser ratificada pelo Congresso Na-cional, o que não aconteceu até o momento.

20 Agradeço ao técnico do IPEA, José Carlos Ferreira, a observação sobre este ponto.

Page 34: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

34

fundamente desigual no que se refere ao poder econômico e à representatividade regional. No caso africano, o único país participante é a África do Sul.

A análise dos resultados traz à tona dois pontos muito relevantes: a declaração de Gordon Brown de que o neoliberalismo teria acabado, e a de Barack Obama quanto à necessidade de mudar o papel dos EUA no cenário mundial. Ou seja, não é mais possível contar com os EUA como o grande incentivador do consumo mundial. Se o neoliberalismo acabou, quais serão os princípios ideológicos que comandarão essa nova fase do capitalismo? E se a queda do consumo dos EUA é uma estratégia de saída da crise, quais serão os grandes impactos sobre a economia mundial?

A tônica da reunião foi o referendo ao relance das economias com a injeção de novos recursos para o comércio mundial, para fortalecer o FMI21, e o consenso quanto à ampliação do controle e fiscalização dos mercados financeiros. De modo geral as nações envolvidas se comprometeram a aumentar a vigilância sobre os paraísos fiscais, os bônus pagos aos executivos de grandes empresas e, ainda, a criação de um sistema de antecipação de riscos e crises financeiras.

O grupo também reforçou a necessidade de políticas monetárias expansio-nistas e de resistência às práticas protecionistas22 e, finalmente, de construir uma economia mais compromissada com o meio ambiente.

Na imprensa brasileira circulou a informação de que entre as medidas pro-postas havia a de ampliação da flexibilização da legislação trabalhista, e que Brasil e Argentina teriam se posicionado contrariamente, o que redundou na exclusão da medida. A conferir.

Pleno de boas propostas, o G20 não lançou uma luz maior sobre como será resolvido o conflito distributivo que está no cerne da crise; do mesmo modo não avançou na perspectiva de vislumbrar se essa crise será suficientemente transfor-madora no sentido de propiciar a transição para um capitalismo menos desigual e mais limpo. Talvez o fato mais relevante desse momento de crise, e que antecedeu ao G20, tenha sido a sugestão da China de uma moeda universal alternativa ao 21 O fortalecimento do FMI, cujo papel no cenário mundial estava muito limitado, mais precisamente

a supervisionar os países pobres, parece ter endereço certo: ajudar a salvar os bancos europeus que foram para a Europa Oriental e que estão em apuros.

22 O protecionismo, tão criticado, tem sido praticado no estilo: “faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço”. Os exemplos se multiplicam: a Alemanha declarou que não apoiará bancos não-alemães; a França não permite a venda de empresas francesas a não-franceses e criou um programa para proteger as suas empresas campeãs; os EUA sugerem que os americanos só comprem os seus produtos.

Page 35: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

35

dólar, formada por uma cesta de moedas, tal o Direito Especial (DES) de saque ainda em vigência, mas pouco utilizado. Como se sabe, a Ásia tem negociado in-ternamente sem utilizar o dólar, e o Brasil tem feito o mesmo na América Latina e está em negociações com a própria China para efetuarem transações à revelia do dólar. Este assunto não parece ter sido tratado naquela ocasião.

As evidências reunidas neste artigo apontam para o fato de que esta não chega nem mesmo a ser crise do neoliberalismo, uma vez que grande parte de seu receituário está mantido, bem como o conflito distributivo que a originou. Entretanto, a dimensão social tem aberto um espaço maior para a reflexão sobre os rumos que a acumulação capitalista à escala financeira tem imposto, especial-mente aos mais pobres.

Neste balanço, o relativo resgate do papel dos Estados nacionais é um fato relevante. Concretamente, o que parece mais provável é, na melhor das hipóteses, a recondução do capitalismo financeiro com um maior grau de regulação dos mercados. A depender do sucesso das medidas implementadas, e na ausência de novos desdobramentos, a atividade econômica pode ser retomada e a crise social minimizada23. Quanto ao futuro do trabalho, à sua gestão e organização, é neces-sário um acompanhamento minucioso para identificar melhor as suas tendências. Por enquanto, como se vê, muito pouco pode ser adiantado. Entretanto, dada a magnitude da crise, é possível antever que nos próximos anos essa questão estará na ordem do dia.

23 Em agosto de 2009, as informações sobre o desempenho das economias americana, alemã, fran-cesa e japonesa revelaram uma saída da recessão e uma reanimação dos mercados financeiros já no segundo trimestre do ano, mesmo que nem sempre implique redução do desemprego aberto, como é o caso dos Estados Unidos. Entre os emergentes, o desempenho da economia brasileira é positivo no mesmo período, mesmo que mais acanhado do que a China e a Rússia. Entretanto, segundo Rou-bini (2009), estes fatos não significam que a recessão acabou. Segundo ele, além do crescimento do PIB, é necessário acompanhar o comportamento da renda real, as vendas no varejo e no atacado, a produção industrial e o emprego. Na sua opinião, pelo menos nos EUA “esses indicadores tendem a melhorar no segundo semestre de 2009 em relação ao primeiro, mas vão permanecer em contração ou registrar crescimento inferior à média histórica. Entretanto, a influência decisiva mesmo será o nível de emprego”.

Page 36: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

36

ReferênciasALTHERSON, C. La sous-traitance à l’aube du XXIe siècle. Paris: L’Harmattan, 1997.

AZNAR, G. Travailler moins pour travailler tous. Paris: Syros, 1992.

CARLEIAL, L.; AZAIS, C. Mercados de trabalho e hibridização: uniformidade e diferenças França-Brasil. Cadernos CRH, v. 1, p. 401-417, 2007.

CASTEL, R. La fin du travail, un mythe démobilisateur. Paris Le Monde Di-plomatique, Paris, p. 24-25, Set. 1998.

GAULEJAC, V. La société malade de la géstion. Paris: Le Seuil, 2005.

GORZ, A. Métamorphoses du travail: quête du sens: critique de la raison économique. Paris: Galilée, 1988.

______. Misères du présent: richesse du possible. Paris: Galilée, 1997.

HABERMAS, J. A nova intransparência. Cadernos Cebrap, São Paulo, n. 18, p. 103-114, set. 1987.

HIRATA, H. Restructuration industrielle et division sexuelle du travail: une perspective comparative. [S.l.: s.n.], 1998. (Tiers Monde, n. 154).

HOUSSON, M. El capitalismo tóxico. Viento Sur, n. 101, nov. 2008. Disponí-vel em: <www.houssonet.free.fr>. Acesso em: 2009.

LAIGLE, L. La coopération inter-firmes, approches théoriques et appli-cation au cas des relations constructeurs-fournisseurs dans l’industrie automobile. Paris: Latts, 1997.

LALLEMENT, M. Le travail: une sociologie contemporaine. Paris: Gallimard, 2007.

MEDA. D. Le travail: une valeur en voie de disparation. Paris: Alto Aubier, 1995.

ODAIRA, N. O Japão fora dos trilhos. Le Monde Diplomatique, p. 16-17, abr. 2009.

Page 37: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

37

OECD ECONOMIC OUTLOOK, n. 84, nov. 2008. Disponível em: <www.oecd.org>. Acesso em: jun. 2009.

OFFE, C. Le travail comme catégorie de la sociologie. Les Temps Modernes, n. 466, p. 2058-2095, 1986.

PAPAMEDRIOU, D. Crise econômica ameaça era histórica de mobilidade. Folha de São Paulo, São Paulo, 6 abr. 2009.

RIFKIN, J. O fim dos empregos. São Paulo: Makron Books, 1995.

ROUBINI, N. O fim da recessão?. Carta Capital, São Paulo, ano 15, n. 560, p. 57, 26 ago. 2009.

SAPIR, J. Crise économique: nous allons connaître une grande incertitude su le dollar. Le Monde, Paris, 14 Abr. 2009a.

______. Les racines sociales de la crise financière: implications por l´Europe. [S.l.: s.n.], 2008. Disponível em: <www. france.attac.org>. Acesso em: 2009b.

THERET, B. O neoliberalismo como retórica econômica e modo de ação políti-ca: de uma clivagem esquerda/direita a uma fratura entre o financeiro e o social: o caso francês. In: ENCONTRO ANUAL DA ANPOCS, 17., 1993, Caxambu. Anais... Caxambu, 1993.

VELTZ, P. Le nouveau monde industriel. Paris: Gallimard, 2000.

ZARIFIAN, P. Vers un peuple-monde?. Cahiers du Gedisst, n. 21, p. 149-164, 1998.

Page 38: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do
Page 39: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

2CAPÍTULO

CRISE ECONÔMICA E EMPREGO NO BRASIL

Paulo Baltar1

A crise mundial provocou um forte impacto na economia brasileira, que vinha crescendo em ritmo cada vez mais intenso nos últimos três anos. Como consequência dos efeitos da crise, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontou uma redução do PIB de 3,6% nos últimos três meses de 2008 em comparação com o trimestre imediatamente anterior. O Produto Interno Bruto (PIB) do último trimestre de 2008 ainda foi 1,3% superior ao do trimestre aná-logo do ano anterior, mas como a economia vinha crescendo no ritmo anual de 7,8% (na comparação dos terceiros trimestres de 2008 e 2007), houve uma desa-celeração da atividade econômica equivalente a 6,5 pontos percentuais do PIB no último trimestre de 2008.

Nos três primeiros meses de 2009 o PIB voltou a cair 1,4% em relação ao trimestre imediatamente anterior. Na comparação com o primeiro trimestre de 2008, a diminuição do PIB foi de 1,8%, confirmando a gravidade dos efeitos da crise mundial sobre a atividade da economia brasileira. O IBGE ainda não infor-mou o que ocorreu exatamente com o PIB no segundo trimestre de 2009, mas tudo indica que em vez de uma terceira queda trimestral consecutiva, houve um aumento de cerca de 2% em relação ao trimestre imediatamente anterior. Neste caso, o PIB do segundo trimestre de 2009, em relação ao do trimestre análogo de 2008, teria sido 1,4% inferior.

A evolução trimestral do PIB já indica os efeitos iniciais das medidas toma-das pelo governo para interromper a queda no ritmo de atividade da economia, mas vai ser preciso muito empenho para evitar que o PIB do conjunto do ano 2009 seja menor que o de 2008. Essa comparação tem grande significado, pois desde o início da década de 30 do século XX, o PIB anual mostrou queda signi-ficativa somente em 1981 (4,5%), 1983 (2,9%) e 1990 (4,4%), tendo se mantido praticamente o mesmo do ano anterior em 1988 (0,1%), 1992 (0,5%), 1998 (0,0%) e 1999 (0,3%).

1 Professor do Instituto de Economia da UNICAMP e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit).

Page 40: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

40

No julgamento do que acontecerá com o PIB em 2009, entretanto, é preciso levar em conta que foi enorme a crise mundial e que ela ocorreu em um momento em que a economia brasileira estava acelerando seu ritmo de atividade. Em todo caso, os resultados do esforço que vem realizando o Governo serão julgados numa perspectiva mais ampla por se tratar de uma tentativa de impedir que ocorra a primeira queda expressiva do PIB anual, desde a redefinição dos rumos da eco-nomia brasileira, com a privatização e a abertura comercial e financeira do início da década de 90.

A crise mundial vem atingindo o Brasil desde que a bancarrota do Lehman Brothers provocou um colapso no sistema de crédito internacional. Os emprés-timos internacionais não passam do equivalente a 10% do total dos empréstimos realizados no País, mas os efeitos da sua paralisação sobre o desempenho da economia brasileira foram maiores que o indicado por essa proporção. Os em-préstimos internacionais são fundamentais para as exportações que, por sua vez, com a inserção do País na globalização, passaram a ter um papel estratégico na determinação do ritmo de atividade da economia, não tanto por sua expressão quantitativa em comparação com a magnitude do PIB nacional, mas por sua in-fluência nas expectativas das empresas e dos bancos, expectativas estas que afe-tam tanto o investimento quanto as condições dos empréstimos articulados em moeda nacional.

O crescimento do PIB nacional, em 2007 e 2008, foi comandado pela expansão do consumo de bens duráveis das famílias e do investimento das em-presas, mas o desempenho das exportações, desde 2003, teve um papel deci-sivo para, sob os novos rumos da economia brasileira, criar as condições que promoveram a ampliação do consumo de bens duráveis e do investimento. O fato de o PIB ter crescido com superávit de comércio suficiente para compen-sar o déficit dos serviços e das contas financeiras do balanço de pagamentos justificou expectativas de bancos e de empresas no sentido da continuidade do crescimento das vendas e, portanto, da geração de emprego e renda, mantendo o estímulo ao investimento e a articulação de empréstimos em moeda nacional. Essas expectativas também eram confirmadas pelo fato de o crescimento do PIB não ter inviabilizado o controle da inflação, através do manejo das taxas de juros para empréstimos de prazo curto. A inflação se manteve no intervalo estabelecido como meta, apesar dos aumentos dos preços internacionais de commodities. Contribuiu para a continuidade do controle da inflação a estabi-lização do preço do dólar em real num nível relativamente baixo, depois de ele ter diminuído expressivamente, em simultâneo ao enorme aumento no valor em dólar das exportações.

Page 41: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

41

A situação da economia nacional modificou-se radicalmente com o colapso do crédito internacional. A interrupção dos empréstimos internacionais afetou especialmente a situação das empresas exportadoras que tinham compensado os efeitos da queda do preço do dólar sobre a receita da exportação, tomando em-préstimos internacionais a juros muito menores do que os praticados em emprés-timos articulados em reais. Além de proporcionar financiamento mais barato para a empresa exportadora, o acesso ao mercado financeiro internacional permitiu ganhar com a diferença de taxas de juros e a empresa exportadora chegou a apli-car em derivativos que apostavam na manutenção do baixo preço do dólar em reais que tanto estava prejudicando a receita da exportação em moeda nacional. Com o colapso da economia mundial as exportações diminuíram bruscamente e o preço do dólar passou em poucos meses de R$1,66 para R$2,40, mas em vez de beneficiar os exportadores ao compensar o declínio de suas vendas no exterior, provocou enormes perdas em suas aplicações financeiras.

A brusca deterioração da situação econômica das empresas exportadoras foi uma sinalização evidente da mudança de perspectiva para a economia brasileira. A redefinição das expectativas das empresas em geral e dos bancos em particular atingiu o investimento e os empréstimos articulados em moeda nacional, afetan-do os dois componentes principais da ativação recente da economia brasileira: o investimento e o consumo de bens duráveis. Na verdade a retração dos emprésti-mos em reais atingiu todo o financiamento da economia, inclusive o da atividade corrente das empresas.

A desaceleração da economia brasileira foi primeiramente um fenômeno do setor industrial, e particularmente da indústria manufatureira, tendo afetado significativamente o emprego formal. Os dados do Cadastro Geral de Emprega-dos e Desempregados (CAGED) sobre admissões e desligamentos de pessoas contratadas conforme a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), indicam que entre setembro de 2008 e fevereiro de 2009 houve queda de emprego de 6% na indústria de transformação e de 4,7% na construção civil. Em outros setores de atividade a indicação do CAGED é de que o nível de emprego celetista de feve-reiro de 2009, comparado com o de setembro de 2008, é praticamente o mesmo no comércio e na prestação de serviços. Para o total das atividades da economia, o emprego celetista teria diminuído 2,3% entre setembro de 2008 e fevereiro 2009.

A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP) tem um índice do que ocorre com o emprego industrial no Estado de São Paulo: o emprego industrial de fevereiro de 2009 foi 9,3% menor que o de setembro de 2008. É verdade que o emprego industrial sempre diminui no final do ano, e só aumenta

Page 42: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

42

a partir de março e abril, mas entre setembro de 2006 e fevereiro de 2007, a di-minuição do emprego industrial no Estado de São Paulo foi de apenas de 1,6% e repetiu o 1,6% entre setembro de 2007 e fevereiro de 2008.

Não parece haver qualquer dúvida de que a desaceleração da economia já provocou expressiva redução no emprego formal do setor industrial e também se pode dizer que afetou particularmente o emprego das grandes empresas. Isto foi importante porque uma das características do crescimento da economia brasileira anterior ao impacto da crise mundial foi, justamente, a volta do emprego nas gran-des empresas, notadamente da produção industrial. Esta foi uma novidade porque nos anos 1990 a grande empresa reduziu brutalmente o pessoal empregado em uma proporção da ordem de 40%. Desde então não tinha voltado mais a aumentar o em-prego, salvo com o crescimento recente da economia. Agora, o emprego na grande empresa está sendo novamente reduzido em proporção significativa.

Dados da Pesquisa Mensal de Emprego do IBGE para o conjunto das seis principais regiões metropolitanas brasileiras (Recife, Salvador, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, São Paulo, Porto Alegre) mostram que a queda do emprego formal, observada no total do País, não provocou até agora uma alteração mais substan-cial na situação global do mercado de trabalho metropolitano, em grande parte porque algumas das atividades econômicas mais afetadas pela crise mundial não estão localizadas naquelas áreas metropolitanas.

É possível ter uma ideia da dimensão do mercado de trabalho assalariado atra-vés da soma dos números de desempregados e de empregados assalariados, incluin-do tanto os contratados por estabelecimentos dedicados às mais diversas atividades econômicas quanto os contratados por famílias para realizar trabalhos domésticos remunerados. A taxa de desemprego do mercado de trabalho assalariado seria, en-tão, a relação entre o número dos desempregados e a soma dos desempregados mais os empregados assalariados. Trata-se de uma medida diferente da convencio-nal que compara os desempregados com a população economicamente ativa que inclui, além dos empregados assalariados e desempregados, os trabalhadores por conta própria, os familiares que trabalham sem remuneração e os empregadores.

A Tabela 1 apresenta informação da Pesquisa Mensal de Emprego (PME) que ajuda a avaliar o que aconteceu no mercado de trabalho metropolitano entre 2003 e 2008 e o que vem ocorrendo desde setembro de 2008. É preciso levar em conta como vinha evoluindo o mercado de trabalho metropolitano para se ter uma compreensão mais adequada dos efeitos da interrupção do crescimento da economia sobre aquele mercado de trabalho. Neste sentido, uma primeira consta-

Page 43: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

43

tação é que a retomada do crescimento do PIB, desde 2004, não aumentou a taxa de participação na atividade econômica da população com mais de 10 anos de idade residente nas metrópoles. Pelo contrario, a proporção dessa parcela da po-pulação que tem ou procura ter uma ocupação decorrente da atividade econômica foi pouco menor em 2007-2008 (57,5%) do que em 2003-2004 (cerca de 58%).

Tabela 1 - Mercado de Trabalho Metropolitano – 2003 a 2009

Mês e AnoTaxa de

Participação (A)

Dimensão do Mercado de Trabalho (B)

Taxa de Desemprego

(C)

Grau de Formalização dos Empregos

(D)

Set 2003 58,1 76,8 16,9 69,6

Set 2004 57,7 76,4 14,3 69,0

Set 2005 57,0 76,9 12,6 70,1

Set 2006 57,8 77,9 12,8 70,5

Set 2007 57,5 77,5 11,6 72,7Set 2008 57,4 78,0 9,8 73,5Fev 2009 56,3 78,0 10,9 75,2

Junho 2009 56,4 78,2 10,4 75,2Fonte: PME.Observações:A= relação percentual entre população economicamente ativa e população com idade ativa.B= relação percentual entre a soma de empregados assalariados e desempregados e a população economicamente ativa.C= relação percentual entre desempregados e a soma de desempregados e empregados assalariados.D= relação percentual entre empregados com carteira, militares e estatutários e o total de empregados assalariados.

Já a desaceleração do crescimento do PIB depois de setembro de 2008 parece ter sido acompanhada da queda na taxa de participação que atingiu 56,4% em junho de 2009, tendo sido de 57% em junho de 2008. É preciso um estudo específico para esclarecer o que está acontecendo nas metrópoles brasileiras com a taxa de partici-pação na atividade econômica. Sabe-se que durante a década de 90 essa taxa conti-nuou aumentando com a ampliação da participação das mulheres adultas mais do que compensando a diminuição da participação dos homens jovens. É importante esclarecer este assunto porque a evolução da taxa de participação afetou expressiva-mente os números que indicam o desempenho do mercado de trabalho.

Page 44: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

44

Uma segunda constatação é que a retomada do crescimento do PIB aumentou o peso do mercado de trabalho assalariado na absorção da população economica-mente ativa nas metrópoles. A relação percentual entre a soma de empregados e desempregados e o total da população ativa passou de 76,8% para 78%, entre 2003 e 2008. A ampliação do mercado de trabalho assalariado foi mais intensa que a da PEA. Porém, no mesmo período a População Economicamente Ativa (PEA) cres-ceu em ritmo menor do que a população total com mais de dez anos de idade, como indica a redução já comentada na taxa de participação. Uma simulação do que teria ocorrido com o peso do mercado de trabalho assalariado na absorção da PEA, se não tivesse diminuído a taxa de participação, indica a importância desta última para o resultado positivo do aumento do peso do mercado de trabalho na absorção da PEA metropolitana. Se a taxa de participação de 2008 fosse a de 2003, com a PEA crescendo no ritmo em que aumentou a População em Idade Ativa (PIA), a relação percentual entre, de um lado, a soma de empregados assalariados e desemprega-dos, e do outro o total da população ativa, teria sido de 77.1%, e não 78%, como realmente verificado. Ou seja, é possível dizer que do aumento verificado no peso do mercado de trabalho assalariado na absorção da PEA (1,2 pontos percentuais da PEA) somente 25% (0,3 pontos percentuais da PEA) estão relacionados com a ampliação do mercado de trabalho em ritmo superior ao do aumento da população com mais de dez anos de idade, enquanto 75% (0,9 pontos percentuais da PEA) estão associados à redução verificada na taxa de participação.

A desaceleração do crescimento do PIB não diminuiu o peso do mercado de trabalho assalariado na absorção da população ativa residente nas metrópoles (essa proporção foi de 78% em setembro de 2008 e 78,2% em junho de 2009). Novamente a queda da taxa de participação teve um papel fundamental nesse resultado. Simulação análoga à realizada mostra que o peso do mercado de trabalho assalariado na absorção da PEA metropolitana teria sido de 76,8% caso não tivesse havido a queda na taxa de participação no período examinado. Simulando o peso do mercado de trabalho assa-lariado com a taxa de participação de setembro de 2003, teria sido de 75,9% em junho de 2009. Ou seja, caso não tivesse havido o declínio da taxa de participação na ativi-dade econômica verificada desde 2003, o peso do mercado de trabalho assalariado na absorção da PEA teria evoluído de 76,8% em 2003 para 77,1% em 2008 e novamente 76,8% em junho de 20092. Porém o que realmente ocorreu foi que a queda da taxa de participação ressaltou o aumento do peso do mercado de trabalho em 2003-2008 e evitou sua redução entre setembro de 2008 e junho de 2009. É, portanto, muito importante esclarecer o que está ocorrendo desde 2003 com a taxa de participação na atividade econômica das pessoas que residem nas áreas metropolitanas.

2 É importante lembrar que em todos os anos ocorrem mudanças sazonais na taxa de participação que fazem com que a magnitude dessa proporção em junho seja sempre menor do que em setembro.

Page 45: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

45

Uma terceira constatação é que a taxa de desemprego do mercado de traba-lho assalariado, que chegou a ser de 16,9% em setembro de 2003, foi diminuindo para 14,3% em setembro de 2004, 12,6% em setembro de 2005, ficou em 12,8% em setembro de 2006, voltou a diminuir para 11,6% em setembro de 2007, che-gando a 9,8% em setembro de 2008. Este foi o efeito da volta do crescimento da economia brasileira sobre o mercado de trabalho assalariado metropolitano. Pro-vocou uma queda na taxa do desemprego de 17% para 10%, porém desemprego de 10% do mercado de trabalho assalariado ainda é muito grande, mesmo se tratando de um mercado de trabalho de alta rotatividade da mão-de-obra, como é o caso do mercado de trabalho das metrópoles brasileiras. Ou seja, o cresci-mento do PIB nacional melhorou a situação do mercado de trabalho assalariado metropolitano, reduzindo a taxa do desemprego, mas em setembro de 2008, antes da desaceleração do PIB, o desemprego ainda era muito grande. A desaceleração do PIB aumentou a taxa de desemprego, que passou para 10,9% em fevereiro de 2009, mas em junho de 2009 caiu para 10,4%. A taxa de desemprego sempre tende a aumentar de setembro para fevereiro, e a diminuir de fevereiro a junho, mas o aumento de setembro de 2008 para fevereiro de 2009 foi muito grande, sinalizando o efeito da desaceleração da economia sobre o mercado de trabalho metropolitano, sendo que o movimento parece estar começando a ser revertido pelas medidas do governo para conter a queda da atividade econômica.

Uma quarta constatação é a de que o grau de formalização dos empregos assalariados no conjunto das metrópoles, medido pela proporção desses empregos que têm o vínculo formalizado em conformidade com as leis vigentes no País, au-mentou de 69,6% em 2003 para 73,5% em 2008, e não parece ter diminuído com a desaceleração do crescimento do PIB, pois em fevereiro e em junho de 2009 essa proporção atingiu e se manteve em 75,2%. A variação sazonal da atividade econô-mica sempre faz o mês de junho ter mercado de trabalho mais firme que em feve-reiro, mas a evolução conjunta, entre esses dois meses, da taxa de participação, da dimensão relativa do mercado de trabalho assalariado, da taxa de desemprego e do grau de formalização dos empregos assalariados parece indicar um relativo êxito das medidas tomadas pelo governo procurando sustentar a atividade da economia, evi-tando que afete negativamente a situação do mercado de trabalho. Em todo o caso, o que virá a ocorrer com o emprego assalariado formal, com o emprego assalariado que não respeita as leis, com a absorção do restante da PEA, nas metrópoles e nas outras localidades do País, dependerá fundamentalmente do que venha a acontecer com o PIB da economia brasileira durante o ano 2009 e nos anos seguintes.

A evolução do PIB depende do que esteja ocorrendo com o consumo indi-vidual das famílias, com o consumo coletivo de serviços prestados pelo governo,

Page 46: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

46

com o investimento de empresas, famílias e do governo, com as exportações e importações de bens e serviços. A Tabela 2 mostra o peso relativo dos compo-nentes da demanda efetiva e como esta motivou a produção doméstica (PIB) e as importações. A exportação, que chegou a representar 15% da demanda efetiva em 2004, teve uma diminuição de sua importância relativa e atingiu 12% da demanda efetiva em 2008. Já o investimento, que representou 14% da demanda efetiva em 2003-2005, aumentou sua importância relativa e alcançou 17% da demanda efetiva em 2008. Essas modificações nos pesos relativos da exportação e do in-vestimento, como componentes da demanda efetiva, traduzem a importância que teve a exportação para a recuperação da atividade econômica, desde 2003, bem como o fato de essa recuperação ter se tornado uma retomada do crescimento em 2007-2008, o que é mostrado também pela aceleração do crescimento do PIB. Não obstante, o total do consumo final (a soma do consumo individual das famí-lias com o consumo coletivo dos serviços proporcionados pelo governo) passou de 72% para 71% do total da demanda efetiva, notando-se uma queda da parcela do consumo individual das famílias (55% para 53%) e um aumento da parcela relativa do consumo do governo (17% para 18%).

Tabela 2 - Componentes da Demanda Efetiva e Efeitos sobre PIB e Importações em 2003-2008

Componentes 2003 2994 2005 2006 2007 2008

Consumo Famílias 55 53 54 54 54 53

Consumo Governo 17 17 18 18 18 18

Investimento 14 15 14 15 16 17

Exportação 14 15 14 13 12 12

Demanda Efetiva 100 100 100 10 10 100

PIB 89 89 90 90 89 88

Importação 11 11 10 10 11 12Fonte: Contas Nacionais Publicadas pelo IBGE.

A intensa ampliação da demanda efetiva em 2007 e 2008, comandada pelo investimento, foi acompanhada de forte crescimento das importações. A relação nominal entre a importação e o PIB aumentou de 10% para 12%. Uma fração importante das compras provocadas pelo investimento resultou na importação de máquinas e equipamentos e a ampliação das vendas de bens duráveis de consumo motivou intensa importação de insumos e componentes tecnologicamente mais sofisticados. Deste modo uma parcela crescente da maior demanda efetiva resul-

Page 47: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

47

tou na geração de emprego e renda em outros países, mas o crescimento do PIB doméstico foi também muito intenso em 2007 e 2008.

A situação da economia brasileira alterou-se radicalmente com o colapso do crédito internacional em setembro de 2008. A exportação diminuiu bruscamente e com a crise mundial não será fácil reverter essa queda. O investimento privado também está diminuindo. Tudo indica que serão adiados todos os investimentos passíveis de adiamento. Nestas circunstâncias, seria fundamental aumentar o in-vestimento público e melhorar e ampliar a prestação de serviços pelo governo. As dificuldades para agir nessa direção são de diferentes ordens. Antes de qualquer outra coisa, a arrecadação de recursos públicos deverá diminuir com a atividade da economia e com eventuais reduções de impostos, procurando sustentar a ativi-dade econômica. Além disso, o governo é pressionado para evitar aumentos mais expressivos do déficit público, porque sua dívida ainda é elevada, em comparação com o PIB, e tem prazo relativamente curto. Existe, entretanto, a possibilidade de o governo aumentar sua disponibilidade sobre os recursos que arrecada. Uma parte importante daqueles recursos é imobilizada pela administração da dívida pública. Outra parcela significativa dessa dívida é indexada à taxa básica de juros do sistema financeiro brasileiro que tem se mantido muito alta. Uma diminuição substancial da taxa básica de juros, colocando-a mais próxima do nível internacional, diminuiria expressivamente as enormes despesas do governo com o serviço da dívida pública, liberando recursos para melhorar e ampliar os serviços públicos e para fazer frente ao maior investimento público. O problema não é, entretanto, somente de disponi-bilidade de recursos públicos. O governo tem enfrentado dificuldades para acelerar o investimento público e não são triviais as ações necessárias para melhorar e am-pliar adequadamente os serviços que o governo presta à população.

A aceleração do investimento público e a melhora e ampliação dos serviços prestados pelo governo, além de contribuírem para a sustentação do ritmo de atividade da economia, impedindo maior contração do emprego e da renda, aju-dariam a preparar as condições para que a futura retomada do crescimento ocor-resse sob novas bases que seriam mais adequadas para o bem-estar da população. Porém, do ponto de vista da simples sustentação do ritmo de atividade da econo-mia, é importante o que venha a ocorrer com o consumo das famílias e também com as importações. Em grande medida, a diminuição das importações apenas reflete o menor investimento privado e uma eventual queda do consumo, prin-cipalmente de bens duráveis em cuja produção tem elevado peso a importação de componentes tecnológicos mais sofisticados. Porém, uma parte menor da im-portação está relacionada ao aumento do preço do dólar, que tornou mais com-petitiva uma parte da produção nacional que tinha sido prejudicada pelo baixo

Page 48: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

48

preço do dólar, que vigorou desde o começo do crescimento do PIB, em 2003-2004. O consumo das famílias, por sua vez, depende do que venha a ocorrer com o crédito e com a renda disponível da população. Articular crédito exclusivamente em moeda nacional, prescindindo completamente do apoio da entrada de recursos externos, não parece trivial, é uma questão central para a definição do rumo da economia brasileira.

Quanto à questão da renda disponível, é importante verificar o que aconteceu com o crescimento recente da economia brasileira que foi provocado por intenso aumento do consumo e do investimento. Sem menosprezar o papel dos esque-mas de transferência de renda, desde bolsa família a aposentadoria rural, passando pelo seguro desemprego e pela renda mínima para o idoso, foi fundamental o País ter voltado a ampliar substancialmente o mercado de trabalho assalariado, fazendo a economia brasileira crescer nestes últimos anos. E na melhora do mercado de trabalho assalariado destacaram-se a formalização dos empregos e o aumento do valor do salário mínimo. Na formalização dos empregos foi importante o fato de a grande empresa ter voltado a gerar emprego, de um lado, e a maior formalização das empresas pequenas e dos contratos de trabalho dos seus empregados, do outro lado. Essa formalização dos empregos foi fundamental pelos benefícios que garan-tiu para os empregados e para a arrecadação das contribuições sociais.

O aumento do valor do salário mínimo colaborou para fortalecer a amplia-ção da renda dos empregados com e sem carteira de trabalho que têm remune-ração pouco abaixo ou pouco acima do salário mínimo legal. As mudanças que aconteceram entre 2004 e 2007, na distribuição dos empregados, por faixas de salário, expressadas em múltiplos do valor do salário mínimo de 2007, mostram claramente a importância que teve o aumento do valor do salário mínimo, junto com o crescimento da economia, a ampliação do nível de emprego e a formaliza-ção dos contratos de trabalho. (Tabela 3).

Tabela 3 - Distribuição dos Empregados por Faixas de Salário Mínimo de 2007

Salário Mínimo 2007 2004 2005

Menos que Um 40 17Um a Dois 34 52Dois a Cinco 19 23Cinco e Mais 7 8Total 100 100

Fonte: PNAD.

Page 49: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

49

Os empregados assalariados são contratados, com ou sem formalização ade-quada dos termos desse contrato, por empresas, órgãos públicos, entidades sem fins lucrativos e famílias. Aumentos expressivos no valor do salário mínimo, reajustes das categorias profissionais maiores do que a inflação, aumentos desproporcionais dos empregos com carteira de trabalho, diminuição na proporção de empregos em ocupa-ções pior remuneradas (agrícolas e de prestação de serviço), em favor das ocupações com remuneração de nível intermediário (venda, trabalho manual não-agrícola, ser-viço de apoio administrativo), e das ocupações melhor remuneradas (técnico de nível médio, profissionais de nível superior e pessoal de chefia, gerência e direção), provo-caram uma recuperação do nível médio dos salários que estava muito baixo em 2004, por ter diminuído desde 1999, com o aumento da inflação e a contenção no ritmo de atividade da economia. Uma novidade destes acontecimentos foi que, no que pode ser constatado pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), o aumento do salário médio foi acompanhado de redução nas diferenças entre os salários dos trabalhadores. Cabe observar, entretanto, que a tendência de ampliação da parcela variável da renda do trabalho vem aumentando a dificuldade de aferição do nível do salário, mesmo no caso do emprego formalizado. A PNAD, ao se referir a um mês do ano, tem subestimado a renda do trabalho, possivelmente em maior proporção no caso dos maiores salários. Por este motivo é possível que, considerando a totalidade da renda do trabalho, tenha sido menos pronunciada do que a indicada pela PNAD a verdadeira redução nas diferenças de renda dos trabalhadores.

Em todo caso, segundo os dados sobre salários da PNAD, 40% dos empre-gados assalariados, em setembro de 2004, ganhavam menos que o equivalente ao valor do salário mínimo de 2007, que era 29% maior do que o valor do salário mí-nimo de 2004. Desses assalariados, metade ganhava algo entre os valores desses dois salários mínimos, de modo que a proporção de assalariados ganhando menos que o salário mínimo vigente não aumentou com o intenso aumento do valor do salário mínimo. Pelo contrário, essa proporção de assalariados ganhando menos que o salário mínimo legal chegou a diminuir, passando de 20% para 17%. Isto quer dizer que foram criados muitos empregos pagando entre um e dois salários mínimos e que do estoque de empregos pagando um pouco mais que o salário mínimo de 2004, muitos deles acompanharam o aumento do valor do salário mínimo e continuaram pagando mais que o salário mínimo vigente em 2007. Em consequência, a proporção de assalariados ganhando entre um e dois salários mínimos de 2007, aumentou de 34% para 52%. Não obstante, a fração de assala-riados ganhando mais que dois ou cinco salários mínimos de 2007 não diminuiu, e até aumentou ligeiramente, traduzindo a intensidade da geração de empregos nas ocupações melhor remuneradas, bem como a importância dos reajustes das categorias profissionais terem sido em geral maiores que a inflação.

Page 50: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

50

A situação atual é bastante diferente do momento em que a economia cres-ceu em 2004-2007. O PIB já não cresce e pode até diminuir em 2009, prejudi-cando a geração de emprego e renda. O emprego nas grandes empresas, parti-cularmente na indústria de transformação, está diminuindo. Ao menos a inflação está baixa e não deve aumentar, e se preservou, pelo menos em 2009, o aumento do valor do salário mínimo. O grande esforço nacional será no sentido de ten-tar evitar a queda do PIB e restaurar o mais rápido possível as condições para a economia voltar a crescer, bem como cuidar da continuidade da formalização das empresas e dos contratos de trabalho de seus empregados.

O fato de um país subdesenvolvido como o Brasil ter passado praticamente a quarta parte de um século sem ter um crescimento do PIB expressivo e continu-ado foi consolidando graves problemas na forma como o estoque de população ativa é absorvido por ocupações decorrentes da atividade da economia. A carac-terização desses problemas é fundamental para entender a necessidade de se ter um crescimento do PIB mais forte e continuado e de se construir instituições que afetam as relações de trabalho para que aquele crescimento vá melhorando, do modo mais rápido possível, a maneira como o estoque da PEA é absorvido pelas ocupações geradas pelas atividades econômicas. A importância dessa construção institucional, em meio a um crescimento do PIB mais vigoroso, é ressaltada ao se mostrar como foi pouco o que conseguiu melhorar aquela absorção da PEA com três a quatro anos de retomada do crescimento com forte geração de emprego, formalização dos contratos de trabalho, reajustes profissionais maiores que a in-flação e intenso aumento do valor do salário mínimo.

Na questão da lentidão da melhora na absorção da PEA ressalta-se a inten-sidade ainda bastante grande no conjunto do País com que aumenta o número de pessoas que passam a procurar uma ocupação na atividade econômica. Assim, entre 2004 e 2007, a PEA cresceu 2,1% ao ano, para uma população total cres-cendo a 1,4%. Em três anos, significou a incorporação de mais seis milhões de pessoas na busca de uma ocupação na atividade econômica. O mercado de tra-balho assalariado ampliou-se, com o crescimento da economia desses três anos, incorporando mais 5,5 milhões de trabalhadores, praticamente o equivalente a todo o aumento da PEA. O número de desempregados pouco diminuiu, cerca de 200 mil pessoas num total de 8,2 milhões de desempregados, mas a comparação do número de desempregados com o tamanho do mercado de trabalho passa de 13,5% para 12,1% e continuou diminuindo ao longo de 2008.

O grau de formalização do emprego assalariado passou de 62% para 65%. O emprego sem carteira, entretanto, não diminuiu. Apenas deixou de aumentar e

Page 51: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

51

o crescimento do emprego formalizado foi muito intenso, principalmente o em-prego com carteira, contratado conforme a CLT. Entre 2004 e 2007 o emprego formal cresceu no ritmo anual de 5,1%.

Porém, mesmo no emprego formal é grande a rotatividade do trabalho. Dei-xando de lado os servidores públicos que ainda têm estabilidade no emprego, a simples manutenção do nível de emprego dos que não são servidores públicos, sem qualquer acréscimo, tendo apenas as contratações necessárias para compen-sar os desligamentos, implica a necessidade de uma contratação mensal do equi-valente a 4,5% do nível de emprego. A dimensão desses fluxos de desligamento e contratação que ocorrem todos os meses fica patente, recordando que um cres-cimento relativamente intenso do nível de emprego (3% ao ano) equivale a uma contratação mensal de 0,25% do estoque de empregados.

Isto no chamado emprego formal, a parte nobre do mercado de trabalho que costuma respeitar as leis do País. É uma selvageria e reflete o fato de se dis-pensar a mão-de-obra logo que não se tem atividade para justificar a sua manu-tenção. Pagando as indenizações especificadas na lei não se tem de prestar contas a ninguém, seja uma autoridade pública, seja um sindicato. E esses grandes fluxos de dispensa e contratação estão sempre renovando o quadro de pessoal das em-presas. Assim, 31% dos que estão em determinados empregos no começo do ano, no final do mesmo ano não estarão mais. E muitos dos que são contratados ao longo do ano ficam pouco tempo no serviço. Isto faz com que 63% dos desliga-dos ao longo de um ano tenham menos de um ano no serviço e não mais de 14% tenham mais de três anos no emprego.

Considerando-se todos os empregados, inclusive os servidores públicos, 32% têm menos de um ano no serviço e só 53% têm mais de dois anos no emprego. Como o emprego formal de estabelecimentos é 54% do mercado de trabalho, o emprego minimamente estável, aquele em que o empregado tem dois anos ou mais no serviço, é de somente 29% desse mercado. Ou seja, menos de 1/3 dos que estão no mercado de trabalho tem emprego formal há mais de dois anos. Outros 25% têm emprego formal em estabelecimento, mas há menos de dois anos. Outros 3% têm emprego formal no serviço doméstico remunerado. Outros 31% têm emprego assalariado sem carteira, para estabelecimento ou para família, no serviço doméstico remunerado, e 12% não têm qualquer emprego e buscam um trabalho remunerado.

Este é o mercado de trabalho brasileiro e abrange somente 68% da PEA, ou seja, 2/3. O outro 1/3 da PEA está fora do mercado de trabalho, sendo formado

Page 52: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

52

por pessoas localizadas no autoconsumo agrícola (4% da PEA), pelos emprega-dores (3%), e pelos não-remunerados (5%), mas a principal parcela é de trabalha-dores por conta própria (20%). Uma parte desses trabalhadores por conta própria que tem crescido muito, a partir dos anos 90, é na verdade emprego assalariado disfarçado, equivalente ao empregado sem carteira, mas que se declara trabalha-dor por conta própria na pesquisa de amostra domiciliar para aferição da situação socioeconômica da população.

Com o PIB deixando de crescer e com a PEA crescendo vigorosamente vai piorar sensivelmente a absorção da PEA, que só melhorou, e pouco, com três anos de crescimento mais vigoroso. A alta rotatividade do trabalho não pode ser atribuída à crise, mas ela facilitou o ajuste de pessoal das empresas diante de menor atividade. Normalmente sempre ocorrem muitas dispensas. Quando tem menos atividade basta contratar menos pessoal. O fluxo de desligamentos não aumenta muito, salvo quando é muito grande a queda de atividade. Uma queda de atividade normalmente aparece como menos contratação, e não como mais dis-pensas. Porém, numa queda mais intensa de atividade, a empresa despede pessoas que já tinham sido incorporadas ao seu quadro permanente.

As perspectivas para o mercado de trabalho não são boas. É preciso empe-nho do governo para sustentar a atividade da economia. O aumento dos salários mínimos e as transferências de renda ajudam na sustentação do consumo, mas é preciso continuar atuando para evitar o aperto do crédito e sustentar o investi-mento, ampliando o que é realizado pelo setor público.

A queda do PIB é sempre uma catástrofe para o mercado de trabalho, parti-cularmente quando se tem um crescimento da PEA que coloca, todos os anos, na busca de uma ocupação na atividade econômica, quase dois milhões de pessoas. Mesmo que não diminua o PIB em 2009, a crise mundial interrompeu o início lento de uma melhora que se esperava progressiva, na absorção da PEA que tinha se agravado enormemente, com a estagnação da economia brasileira, depois do colapso da dívida externa na década de 1980 do século XX.

Page 53: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

3CAPÍTULO

CRISE ECONÔMICA MUNDIAL: MUDANÇAS NAS CARACTERÍSTICAS DO DESEMPREGO NO MERCADO DE

TRABALHO BRASILEIRO?Maria Cristina CacciamaliFábio Tatei1

3.1 – IntroduçãoO objetivo do presente ensaio é verificar se a crise econômica mundial, inicia-

da em 2007, e com efeitos sobre a economia brasileira desde outubro de 2008, pro-vocou, no Brasil, mudanças no padrão e nas características do desemprego vis-à-vis a outros períodos de crise. A recente crise mundial é de natureza distinta de outras crises financeiras da década de 90 do século XX. Nos Estados Unidos a inadimplên-cia de mutuários de financiamento habitacional ocasionou efeito dominó no mer-cado internacional de crédito e atingiu o setor real da economia dos países centrais.

A crise nos países periféricos é subproduto da recessão dos países centrais, que contraiu as exportações e estreitou o crédito no mercado mundial. Desde a 1 Maria Cristina Cacciamali, Mestra, Doutora e Professora Livre-Docente pela Universidade de São

Paulo, com Pós-Doutoramento pelo Massachusetts Institute of Technology (USA). Atualmente é Professora Titular do Departamento de Economia e Presidente do Programa de Pós-Graduação em Integração da América Latina da Universidade de São Paulo, onde leciona e pesquisa na Área de Estudos do Trabalho. Pesquisadora do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico desde 1995; membro da Câmara de Avaliação dos Cursos de Pós-Graduação Interdis-ciplinares da Comissão de Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível Superior, desde 2008; Assessora do Conselho de Administração da Organização Internacional do Trabalho para o Seguimento dos Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho (2001-2008); e Presidente da Associação Brasileira de Estudos do Trabalho (ABET) (2001-2003). E-mail: [email protected]; http://www.econ.fea.usp.br/cacciamali/. Fabio Tatei é Bacharel em Economia pela Faculdade de Economia e Adminis-tração da Universidade de São Paulo (FEA/USP), Mestrando pelo Programa de Pós-Graduação em Integração da América Latina, pesquisador da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), e membro do Núcleo de Estudos de Política Internacional. Estudos internacionais de Políticas Comparadas, Nespi/CNPq/USP, foi bolsista CNPq. Nas etapas iniciais este estudo contou com a colaboração de Jackson William Rosalino, graduando em Economia pela FEA/USP e bolsista Fipe.

Page 54: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

54

década de 90, o ciclo ascendente dos negócios naquele mercado propiciou pros-peridade e fortaleceu as condições econômicas, domésticas e externas de países asiáticos e, na década seguinte, até 2008, de países latino-americanos e africanos. A acumulação dos efeitos positivos dessa fase retardou os mecanismos de trans-missão e contágio da crise mundial aos países periféricos.

Os setores exportadores – gatilhos do crescimento econômico dos países periféricos, Brasil incluso – mantêm níveis elevados de produtividade e contratam força de trabalho, frente às demais atividades, relativamente mais bem qualificada e de alta remuneração. Esses setores foram os mais afetados negativamente pela crise mundial. Seria de se esperar, então, que o ajustamento do mercado de traba-lho à queda do nível de atividade provocada pela recente crise mundial atingisse o mercado de trabalho não apenas estreitando o número de postos de trabalho, mas diminuindo, relativamente, ao menos no início do ciclo descendente, a força de trabalho mais bem qualificada e de altos salários.

Essa problemática foi analisada neste documento por meio de três seções, além desta introdução e das considerações finais. Na primeira seção constatam-se os efeitos da crise financeira mundial sobre as economias periféricas, especialmente o Brasil. Na segunda apresentam-se o padrão e as principais características do de-semprego no Brasil. Na terceira seção comparam-se os resultados do ajustamento do mercado de trabalho em dois períodos de crise econômica, entre outubro e mar-ço de 1997-1998 e de 2008-2009. Por fim, tecem-se as considerações finais.

3.2 – Os Efeitos da Crise Mundial sobre as Economias Periféricas, Ênfase na Economia Brasileira

A economia da América do Sul, depois de um longo período de estagnação e instabilidade econômica, ao longo das duas décadas anteriores, apresentou desem-penho positivo no início do século XXI. O ciclo ascendente do comércio mundial de 2003-2007 dinamizou a economia da região por meio da oferta abundante de financiamento, do alto preço das commodities no mercado internacional e do volume expressivo de remessas dos emigrantes. (GRIFFITH; OCAMPO, 2009). Embora com diferenças de magnitude, de velocidade e ritmo entre os países da região, o momento econômico favorável caracterizou-se, segundo as informações da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), por cresci-

Page 55: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

55

mento elevado do Produto Interno Bruto (PIB), ingresso de capitais, aumento do investimento, queda do desemprego, melhora nas finanças públicas, superávit nas contas externas, aumento das reservas internacionais e redução do endividamento externo. (CEPAL, 2009; MANUELITO; CORREIA; JIMÉMEZ, 2009).

No início da crise mundial as reservas acumuladas e o baixo nível de en-dividamento externo permitiram que alguns países, tais como Brasil, México e Venezuela, se protegessem inicialmente da interrupção do fluxo de capital, mas a contração da oferta de crédito, seu alto custo e o adiamento de investimentos reduziram o nível da atividade econômica.2 Os empréstimos bancários para os mercados emergentes, segundo Griffith e Ocampo (2009), diminuíram de US$ 410 bilhões, em 2007, para US$ 167 bilhões, em 2008, e a projeção para 2009 é de empréstimos da ordem de US$ 60 bilhões. Assim, desde o segundo semestre de 2007, os países latino-americanos registraram aumento da pressão inflacionária, menor crescimento da demanda externa, interrupção da melhora nas finanças públicas e elevação da percepção de risco.

A maioria dos analistas concorda que a crise econômica em curso é a mais intensa desde a grande depressão de 1930. Mais intensa do que, por exemplo, a crise do endivi-damento externo dos anos de 1980, que impactou sobremaneira a região latino-ameri-cana, e/ou as crises financeiras da década de 90 que tiveram foco nos fluxos financeiros de determinados países periféricos. A crise mundial atual, além de se originar da esfera monetária e financeira internacional, entrelaça-se com a esfera real e repercute na esfe-ra tecnológica e comercial. Com relação aos ciclos descendentes anteriores, a expecta-tiva é que, principalmente nos países centrais, o declínio e/ou estagnação da atividade econômica perdurará por tempo relativamente longo, até a depuração e reprecificação dos ativos financeiros, da restituição da confiança dos investidores e dos consumido-res, e da refuncionalidade sistêmica dos mecanismos de crédito. Outra distinção do atual momento com relação aos anteriores se refere a um conjunto de atribulações adi-cionais que perpassam a sociedade mundial e implicarão mudanças de médio e longo prazos em sua organização econômica, como a mudança climática, as crises de energia, de alimentos e ambiental, que não restringem apenas as alternativas de recuperação econômica, mas também a velocidade para superá-la.3

2 Os países mencionados apresentaram, respectivamente, os seguintes coeficientes entre dívida exter-na e Produto Nacional Bruto (PNB): 18,7%, 19,5% e 24,7%.

3 De acordo com Stern (2009), as causas da crise climática e a atual crise econômica estão relacionadas, bem como a solução de ambas. O economista defende o investimento verde, ou seja, aquele que foca sobre companhias ou projetos que são comprometidos com a conservação dos recursos natu-rais, a produção e a descoberta de fontes de energias alternativas, práticas de negócios conscientes em termos ambientais. Tais investimentos viabilizariam o crescimento que o mundo necessita.

Page 56: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

56

No que tange à América do Sul, o Fundo Monetário Internacional (FMI), em relatório recente, prevê que o processo de ajustamento será mais lento do que nos países centrais ou naqueles da Ásia, devido à maior vulnerabilidade de inserção da região no comércio mundial perante o resto do mundo.4 Entretanto, a utilização adequada do policy space de cada país pode implicar resultado oposto, ou seja, levar à saída mais rápida da crise. Os mecanismos de transmissão da crise na América Latina e na Ásia são subprodutos da crise financeira – retração brusca do crédito e do comércio mundial que deprimem o nível da atividade econômica regional. Os governos de Chile e do Peru, países extremamente dependentes do comércio internacional, ainda no último trimestre de 2008 utilizaram fundos anti-cíclicos pré-existentes e medidas fiscais para dinamizar as respectivas economias.

No caso do Brasil, a maioria dos especialistas acredita que a crise será bran-da, caso a política anticíclica atinja os objetivos propostos e recupere o tempo per-dido.5 Depois dos resultados negativos do último trimestre de 2008 e do primeiro trimestre de 2009, colhidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e Confederação Nacional da Indústria (CNI), indicam sinais, se bem que de baixa intensidade, de recuperação no consumo, assim como no ingresso de capitais externos voláteis e, em menor escala, na retomada dos investimentos.

Essa posição, entretanto, não é consensual. Filgueiras e Gonçalves (2007), por exemplo, diagnosticaram uma situação próxima à defendida pelo FMI.6 Os autores apoiam a sua racionalização em dois conceitos de vulnerabilidade externa: conjuntural e estrutural. O ciclo ascendente da economia internacional de 2003-2007, segundo os autores, não foi suficiente e/ou convenientemente aproveitado

4 A maioria dos países latino-americanos depende das receitas derivadas da venda de commodities no mercado internacional – hidrocarbonetos, minerais e alimentos, e a crise global redundou, especial-mente, depois de 2008, na contração do volume demandado e na diminuição dos preços. Soma-se a esse mecanismo, a diminuição das remessas internacionais dos emigrantes, muitos desempregados e/ou com níveis de renda rebaixados devido à crise, e, como destacado anteriormente, a contração do crédito internacional. (WORLD..., 2008).

5 Depois da falência do Lehman Brothers, em 15 de setembro de 2008, o governo central deveria ter assumido medidas anticíclicas profundas e inequívocas, como por exemplo, diminuir drasticamente a taxa de juros doméstica. Em setembro de 2008, a taxa de juros doméstica era de 13,39% aa, e em dezembro de 13,66% a.a., 0,7 pontos percentuais superior ao patamar de 2007, apresentando o valor real de 7,2% a.a. Medidas governamentais anticíclicas, conforme veremos mais à frente, começaram a ser colocadas em prática principalmente em 2009.

6 Gonçalves (2008), por exemplo, ironiza o argumento oficial do Governo brasileiro de que a eco-nomia brasileira esteja blindada aos efeitos da crise mundial contra-argumentando que seria uma blindagem de crepon.

Page 57: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

57

para superar a vulnerabilidade externa estrutural da economia brasileira. Afir-mam, ainda, Filgueiras e Gonçalves (2007), que a proposição de que a economia brasileira passaria pela crise mundial sem sofrer consequências profundas se ba-seia em, pelo menos, três falsos argumentos: menor dependência das exportações brasileiras em relação ao mercado dos Estados Unidos, elevado nível de reservas internacionais e forte dinamismo da absorção interna.

Quanto ao primeiro argumento, de fato, stricto sensu, as exportações bra-sileiras, desde 2003, dependem menos do mercado dos Estados Unidos, devido à maior participação da China e do México no total das exportações brasileiras. 7Como essas últimas economias dependem da primeira, a redução das impor-tações estadunidenses, por relação triangular, afetará as exportações brasileiras. Contudo, quanto a este primeiro argumento, a expectativa pessimista de Filgueiras e Gonçalves (2007) pode ser relativizada. O crescimento da China, voltado para o mercado interno, deverá perdurar, se bem que em ritmo menor, e a manutenção da demanda por importações de commodities deverá suavizar a queda das expor-tações brasileiras e de outros países latino-americanos e africanos.

Quanto ao segundo argumento, o nível de reservas internacionais, o Brasil correria, segundo Filgueiras e Gonçalves (2007), o risco de uma crise cambial, caso o Banco Central decidisse manter a taxa de câmbio estável e ocorresse uma queda abrupta de reservas. As contas externas brasileiras, segundo esses dois au-tores, estariam apresentando dois problemas: o crescimento do desequilíbrio do estoque derivado do crescimento do passivo externo, desde 2003; e a deterioração dos fluxos das balanças de pagamento, a partir de 2007.

Essa proposição, contudo, também pode ser relativizada. Dados do Banco Central mostram que, entre 2003 e 2007, o passivo externo de fato aumentou, mas depois daquele ano decresceu, e de níveis superiores a 60% do PIB, entre 2003 e 2007, atingiu 44,8% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2008. Esse com-portamento contradiz a afirmativa de Filgueiras e Gonçalves (2007) acerca do descontrole da política macroeconômica sobre o estoque, embora a composição do estoque, segundo os registros do Banco Central, inspire cuidados por ser de curto prazo, empréstimos intercompanhias, ações, renda fixa, derivativos e cré-ditos comerciais, ou seja, de alta volatilidade. No que concerne à deterioração das contas externas, a situação também pode ser relativizada. Conforme discu-tido anteriormente, a queda do preço das commodities no mercado mundial e a diminuição da demanda externa incidiram negativamente no saldo comercial 7 A China, no segundo trimestre de 2009, superou os Estados Unidos e se constitui no primeiro

parceiro comercial do Brasil.

Page 58: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

58

brasileiro e a previsão é de que em 2009 esse comportamento se mantenha. As contas externas, até meados de 2009, mantiveram-se positivas devido à entrada de capitais. Entretanto, a entrada de divisas apreciou a taxa de câmbio e deprimiu ainda mais o incentivo à exportação. Nunca é demais lembrar que, conforme Filgueiras & Gonçalves apontam, caso haja uma saída abrupta de capitais, como ocorreu diversas vezes no passado, a situação poderia ficar crítica. Contudo, essa é uma alternativa entre outras e, em meados de 2009, no curto prazo, a reversão do fluxo de capitais não parece iminente, tendo em vista a lenta recuperação dos mercados financeiros internacionais vis-à-vis ao comportamento desse mercado no Brasil e à alta remuneração dos títulos públicos brasileiros.

O terceiro argumento, desenvolvido por Filgueiras e Gonçalves (2007), sobre a insuficiência de demanda para a recuperação econômica brasileira, pode ser sintetizado por três pontos: a retração do comércio internacional reduzirá o nível de renda interna; o risco Brasil mais o spread cobrado tendem a aumentar, o que limitará ainda mais o crédito e o investimento; e a intervenção do governo será insuficiente, por si só, para manter o dinamismo da economia em um prazo mais longo.

O cenário pessimista de Filgueiras e Gonçalves (2007) foi traçado com base no comportamento e na reação historicamente tradicional entre os países centrais e periféricos. No caso da economia brasileira, a previsão dos autores é que a re-tração do comércio mundial e a escassez de crédito internacional deflagrem uma crise cambial, com todas as consequências derivadas, como recessão, inflação e perda de reservas, entre outras.8

8 Os autores concluem que o modelo liberal periférico de inserção internacional da economia brasi-leira ficará exposto em todas as suas fragilidades com o evolver da crise econômica mundial. Com a crise, todos os países periféricos precisarão de fluxo de capital externo para fechar a conta do balanço de pagamento, as taxas de juros exigidas para os capitais no curto prazo deverão subir – inclusive, como usualmente acontece, a tendência desses capitais é refugiar-se nos títulos do tesouro do governo estadunidense. O aumento das taxas de juro internacionais elevará as taxas de juro domésticas. A vulnerabilidade estrutural da economia brasileira se explicitará pelo lado comercial e pelo lado financeiro. O aumento da vulnerabilidade externa, num quadro de elevadas taxas de juro e redução dos saldos da balança comercial, será acompanhado de uma aceleração do crescimento da dívida interna e externa, o que tornará mais débeis os efeitos de elevados superávits primários. Esse fato, segundo Filgueiras & Gonçalves, evidenciará que o problema da fragilidade financeira do Estado se localiza na vulnerabilidade financeira e na política monetária.

Page 59: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

59

Entretanto, essa prospecção pode não se realizar, conforme os contra-argu-mentos apresentados anteriormente. A maior resistência e a menor vulnerabili-dade do setor externo, a política econômica anticíclica e a recomposição das ex-portações contribuirão para manter o crescimento econômico brasileiro menor, porém, perante os anos que precederam à crise econômica mundial.9

Informações sobre o comportamento da economia brasileira no segundo trimestre de 2009, ensejam a acreditar na contenção dos mecanismos de transmis-são dos efeitos da crise internacional sobre a economia brasileira, pelo menos no curto prazo. Entre abril e junho de 2009, houve lenta recuperação do consumo e da produção industrial, pequeno crescimento dos investimentos e estagnação do nível de desemprego. Em princípio, os sinais indicam a direção de baixo e lento crescimento econômico entre 2009 e 2010, ao invés de manutenção da recessão. Torna-se necessário destacar, contudo, que uma restrição à manutenção das polí-ticas de cunho fiscal é a elevada carga tributária do País (38% PIB). Neste campo, a comparação do Brasil frente a outros países periféricos e, até perante alguns países centrais, indica que, caso a crise seja prolongada, existe pouco espaço para aumento de impostos que suportem gastos do Governo.

3.3 – O Que Sabemos sobre a Estrutura e a Duração do Desemprego no Brasil?

No Brasil, a taxa de desemprego aberto começou a ser mensurada, de forma regular, a partir de 1980.10 Antes da década de 80, os estudos sobre o tema utilizavam-se de dados de pesquisas domiciliares e censitárias. Entre o final dos anos 1960 e o primeiro lustro de 1970 apontavam estimativas da ordem de no máximo 3%.11 Em vista disso, a maior parte dos especialistas daquele período relegara a análise do de-semprego e centrava-se em estudos sobre a pobreza e o emprego de baixa renda.12

9 Em 2008, por exemplo, a taxa efetiva do Federal Funds era de 1,9% ao ano, ao passo que a taxa real da NTN-B era de 6% ao ano.

10 Fonte dos dados de IBGE (2009), dados do PIB disponíveis a partir de 1962 pelo Banco Central e Pesquisa de Emprego e Desemprego (início em janeiro de 1985) da Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (SEADE).

11 Estimativas derivadas de Salm (1974).

12 Veja-se, por exemplo, Goodman e Oliveira (1977).

Page 60: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

60

Goodman e Oliveira (1977), por exemplo, em artigo de 1977, analisaram as relações entre a probabilidade de desemprego e as características sociodemográ-ficas de membros secundários da família na cidade de Belo Horizonte. Entre os resultados os autores destacaram que a taxa de desemprego aberto urbano é signi-ficativamente maior entre os membros secundários jovens das famílias pobres, de renda per capta inferior à metade do salário mínimo. Mantidas constantes as demais variáveis, a idade desponta como uma das variáveis mais importantes na explica-ção do desemprego urbano. Os autores, ademais, detectam uma característica que se constituiu em um padrão no mercado de trabalho brasileiro e de muitos países: a relação entre educação e desemprego distribui-se na forma de uma curva com formato de U invertido.13

A crise econômica da década de 80, denominada na literatura de crise do endividamento externo, originária, entre outros fatores, do choque do petróleo, da década de 70, e da elevação da taxa de juros norte-americana, no final dessa década encerrou um período de crescimento acelerado da economia brasileira. Iniciou-se, então, um período de estagnação econômica, instabilidade e elevação do desemprego que se transpõe para o século XXI. (Gráfico 1).

Gráfico1 - Taxa de Desemprego e Crescimento Real do PIB. Brasil (1980-2008)

Fonte: Banco Central.

13 Esse comportamento é revisitado por Camargo e Reis (2005).

Page 61: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

61

O Gráfico 1 indica a tendência elevada da taxa de desemprego aberto. Mes-mo assim, a despeito do comportamento de alta, alguns autores, como Amadeo e Camargo (1995), por exemplo, nos anos de 1990, consideravam as taxas de desemprego relativamente baixas frente aos países centrais e mantiveram os es-tudos sobre esse tema em plano secundário. A convivência entre baixas taxas de desemprego e elevadas taxas de participação no mercado de trabalho informal re-novou, segundo esses especialistas, o argumento da década de 70, ou seja, de que os estudos devem se orientar para apresentar diagnósticos e formas de superação da baixa qualidade dos empregos gerados.14

Todavia, na década de 90, nem todos os pesquisadores da área de estudos do trabalho confirmaram essa posição. Corseuil; Reis e Urani (1996), por exemplo, defenderam a relevância de investigações sobre a taxa de desemprego aberto, sobretudo, de forma desagregada, com o objetivo de averiguar a existência de grupos da população em situação de desvantagem devido à ocorrência de altas taxas de desemprego ou por estarem afeitos ao desemprego de longa duração. (CORSEUIL; REIS; URANI, 1996). Corseuil; Reis e Urani (1996) construíram, com os microdados da Pesquisa Mensal de Emprego (PMP), um quadro dos movimentos estoque-fluxo da População Economicamente Ativa (PEA), para o período compreendido entre 1986 e 1995, para todas as regiões metropolitanas brasileiras pesquisadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O objetivo era investigar a evolução, a incidência e a decomposição da taxa de desemprego aberto para cada uma das regiões mencionadas – São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Salvador, Recife e Belo Horizonte, segundo grupos selecio-nados. Para cumprir o proposto, os autores desagregaram e classificaram a PEA de acordo com os seguintes aspectos: escolaridade, idade, sexo, posição na família e regiões metropolitanas. Corseuil; Reis e Urani (1986) verificaram que, entre 1986 e 1995, a taxa de desemprego aberto aumentou para a maioria dos recortes consi-derados. Ou seja, a taxa de desemprego aberto aumentou para todas as faixas de escolaridade, para todas as idades; para homens e mulheres; e para os membros responsáveis pelos domicílios, cônjuges e filhos. Entre as regiões metropolitanas, apenas a região do Rio de Janeiro apresentou pequena retração na taxa de desem-prego; as demais mostraram aumento, principalmente Salvador.

Picchetti e Fernandes (1999) complementaram o quadro das características sobre o desemprego aberto em estudo publicado. (PICHETTI; FERNANDES, 1999). Pichetti e Fernandes (1999) estimaram, por meio de um modelo de re-gressão da classe multinomial logit, a condição de ocupado, desocupado e ina-tivo, aplicado aos microdados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio

14 Amadeo e Camargo (1995).

Page 62: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

62

(PNAD) de 1995. A probabilidade da condição de atividade de um indivíduo foi estimada em função de 16 variáveis, entre as quais sexo, cor, anos de estudo, idade, renda familiar líquida15, posição, tamanho e composição na família e local de residência, entre outras. No que se refere às variáveis escolaridade e idade, as estimativas mostraram que as referidas probabilidades se distribuem, na primeira variável, sob a forma de um U invertido, e na segunda, de maneira decrescente.16 Resultados que confirmaram o comportamento observado, em 1977, por Good-man e Oliveira (1977) para a cidade de Belo Horizonte.

A probabilidade de estar na situação de inativo, conforme esperado, apre-sentou relação negativa com os anos de escolaridade e com a idade. A renda familiar líquida impactou negativamente sobre a probabilidade do desempre-go e positivamente sobre a probabilidade da inatividade. Pessoas do sexo fe-minino e de cor parda ou negra foram portadoras de maior probabilidade de desemprego e de inatividade; os homens mostraram comportamento oposto e, em famílias com maior número de filhos as probabilidades de desemprego e de inatividade foram mais elevadas. Nos domicílios a probabilidade de desem-prego é maior na condição de filho, ao passo que a probabilidade da condição de inatividade foi superior para aquela de cônjuge.

Ao final da década de 90, Camargo e Reis (2005) analisaram para o Brasil uma das características que distinguem o mercado de trabalho de outros mercados: a assimetria de informações entre trabalhadores e em-pregadores.17 Utilizando-se da metodologia proposta por Akerlof (1970), aplicada aos microdados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicí-lios (PNAD) de 1999, os autores estudaram as relações entre anos de es-colaridade, idade e taxa de desemprego aberto para os membros da Po-pulação Economicamente Ativa (PEA). Concluíram que os jovens e os trabalhadores de 4 a 10 anos de escolaridade (denominados pelos autores de semiqualificados), são os que mais se ressentiram do desemprego devi-do à assimetria de informações no mercado de trabalho. Estimativas sobre a homogeneidade dos rendimentos e as elevadas taxas de desemprego entre esses

15 Renda familiar líquida proveniente do indivíduo compreende todas as rendas de que dispõe (juros, dividendos, entre outros), excluída a renda do trabalho, mais a renda dos demais membros da família.

16 Com relação à idade, a distribuição é decrescente no caso de estimativa binomial (empregado, desempregado), no caso de estimativa multinomial apresenta forma de U invertido, devido ao efeito da variável inatividade.

17 Outro mercado que se caracteriza por acirradas assimetrias de informação é o mercado de crédito.

Page 63: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

63

dois grupos da população confirmaram esses argumentos.18 Destaca-se, contudo, que os resultados encontrados por Camargo e Reis (2005) adicionam informa-ções, mas não esgotam as causas do desemprego dos jovens e dos semiqualifi-cados. Outros determinantes, tão ou mais importantes, devem ser salientados, como por exemplo, a insuficiência de oferta de empregos para essa mão-de-obra e as restrições à contratação formal aos 17 anos de idade. (CACCIAMALI, 2009).

Bivar (1991) aplicou a técnica de análise de sobrevivência aos microdados da Pesquisa Mensal de Emprego (PME) para estimar a duração esperada da situação de desemprego para a Região Metropolitana (RM) de São Paulo durante os anos de 1980. No período, o programa Seguro Desemprego, aprovado em 1986, não fora completamente desenhado e implantado. Dessa maneira, de modo geral, as estimativas apontaram que o desemprego no Brasil é de curta duração, a ausência de mecanismos efetivos de proteção aos trabalhadores os obriga a buscar uma estratégia mínima de sobrevivência. Nota-se, também, que elevada parcela das ocorrências de desemprego termina em inatividade, saída da força de trabalho.

No primeiro lustro da década de 2000, Menezes Filho e Picchetti (2001) utilizaram-se de distintas técnicas complementares, aplicadas aos microdados da PME de 1997, para a Região Metropolitana de São Paulo. O objetivo era averiguar as principais características dos desempregados associadas ao tempo de desem-prego e à probabilidade de sair da condição de desemprego.19 Menezes Filho e Picchetti (2001) estimaram que a probabilidade de permanência no desemprego é menor com o decorrer dos meses; e, para qualquer período de duração do desem-prego a probabilidade de continuar no desemprego é menor para os responsáveis pelo domicílio e para aqueles que buscam o reemprego. A duração esperada do desemprego, por outro lado, é maior para indivíduos que dispõem de maior nú-mero de anos de escolaridade, são mais velhos, que foram demitidos do emprego, que o último emprego era no mercado de trabalho formal e que trabalharam por mais tempo.

18 Camargo e Reis (2005) verificaram que, entre trabalhadores mais jovens ou com menos experiência no mercado, o grau de dispersão dos rendimentos é menor para os trabalhadores semiqualificados. À medida que mais informações são reveladas aos empregadores, a desigualdade de rendimentos desse grupo aumentaria mais do que para qualquer outro grupo. O mesmo fenômeno ocorre à medida que aumenta a experiência dos trabalhadores. Outra constatação é uma possível associação positiva entre assimetria e desemprego, gerada através da relação entre maior dispersão de rendi-mentos e menor taxa de desemprego.

19 Menezes Filho e Picchetti (2001) desenvolvem testes paramétricos, semi e não-paramétricos e funções de risco.

Page 64: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

64

Menezes Filho e Picchetti (2001) não interpretaram nem contrastaram os resultados estimados com outros estudos, entretanto podem-se extrair algu-mas ilações. O comportamento das estimativas de Menezes Filho e Picchetti (2001) é aderente com os resultados da literatura especializada brasileira e do exterior. (AHN; RICA; UGIDOS, 1999). Ademais, as estimativas sugerem, como esperado à luz da teoria convencional, a influência do salário de reserva e do seguro desemprego sobre a busca do reemprego. A expectativa de se em-pregar por um salário maior ou pelo menos condizente com o último salário eleva o salário de reserva e pode aumentar a dificuldade de conseguir uma ocupação no mercado. Efeito análogo advém da existência de transferência de renda – Seguro Desemprego – instituição pública estabelecida para permitir a busca da melhor alternativa de emprego disponível.

Estudo publicado em 2008 confirma as hipóteses levantadas acima so-bre as relações entre o salário de reserva e o comportamento da duração do desemprego de determinados grupos de desempregados. Oliveira e Carvalho (2008) constataram que o salário de reserva afeta negativamente a função ris-co, ou seja, quanto maior o salário de reserva, menor a probabilidade de um indivíduo deixar a situação de desemprego. Em paralelo, indivíduos de maior escolaridade apresentam expectativa de obter salários elevados, o que implica prolongar a sua situação de desemprego. Em média, cada ano adicional de escolaridade reduzia a situação de sair do desemprego em 5,3%. Em relação aos homens, as mulheres mostraram maior probabilidade de sair do desem-prego (19%), assim como os indivíduos casados e aqueles que procuraram se estabelecer por conta própria. Acredita-se que esses grupos estejam entre outros que, por razões distintas, aceitam trabalhar, muitas vezes, por salários abaixo do mercado.

Sintetizando, a literatura indicou estimativas comuns à maioria dos autores analisados.20 Destaca-se, então, um comportamento tradicional detectado pela literatura sobre as relações entre desemprego, anos de escolaridade e idade. A relação entre a taxa de desemprego e os anos de escolaridade mostra formato de U invertido; entre a taxa de desemprego e a idade se apresenta decrescente, enquanto a relação entre a probabilidade de sair do desemprego com a idade e anos de escolaridade é negativa. Por sua vez, a taxa de inatividade é inversamente relacionada com os anos de escolaridade e distribui-se em U com relação à idade.

20 Entre os resultados contrastantes e controversos, ressalta-se o de Abras e Felício (2005), que re-jeitam relação entre probabilidade de saída do desemprego e a sua duração. As autoras creditam as diferenças nas probabilidades de saída do desemprego às heterogeneidades das características dos indivíduos.

Page 65: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

65

Indivíduos na situação de responsáveis pela família e cônjuges expõem taxa de desemprego menor quando comparados com a média total, sendo que o mesmo padrão de comportamento é observado para homens e pessoas de cor branca. A RM de São Paulo, quando comparada com a média das regiões, apresenta a maior taxa de desemprego e a menor taxa de inatividade, a RM de Porto Alegre mostra a menor taxa de desemprego e inatividade, e a RM de Recife exibe a maior taxa de inatividade.

3.4 – Ajustamento do Mercado de Trabalho no Período Imediatamente Posterior às Crises de 1997-1998 e 2007-2008

A fim de verificar se a presente crise alterou o padrão e/ou as carac-terísticas do desemprego no País, a análise das informações sobre o ajusta-mento do mercado de trabalho no período de 2008 e 2009 tem como con-traponto, neste estudo, aquele de 1997 e 1998, sendo que a comparação será realizada no que se refere ao primeiro trimestre de cada ano e ao trimestre do ano subsequente.

Inicialmente, destacam-se as diferenças das medidas de políticas eco-nômicas adotadas para a superação dos ciclos decrescentes da atividade eco-nômica. A crise financeira de 1997 e 1998 na Ásia, no Japão e na Rússia, respectivamente, foi enfrentada pelas autoridades econômicas brasileiras mantendo a política de metas de inflação. Para tanto, se utilizaram de duas medidas: o aumento da taxa interna de juro para reduzir a saída de capital externo e controlar o aumento dos preços; e a diminuição dos gastos públi-cos para aumentar o superávit primário. Depois de um crescimento real de 3,4% em 1997, o PIB estagnou em 1998 e, nesse período, a média anual da taxa de desemprego aberto aumentou 2,1 pontos percentuais, passando de 6,2% para 8,3%. (Tabela 1).21

21 Relembra-se que os dados sobre o comportamento do mercado de trabalho nos anos 1997/1998 e 2008/2009 não são comparáveis em magnitude devido às mudanças metodológicas na PME em 2002. Entretanto, as modificações na margem e a tendência mantêm comparabilidade.

Page 66: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

66

Tabela 1 – Taxas Médias Anuais e Trimestrais de Crescimento Real do PIB, e Taxas de Ocupação, Desemprego Aberto, e Inatividade. Brasil (em %)

Indicadores Ano Média Anual

Média1º Trimestre

Média2º Trimestre

Média3º Trimestre

Média4º Trimestre

Taxa de crescimento real do PIB1

1997 3,4 3,7 4,9 1,6 3,4

1998 0,0 0,8 1,5 -0,1 -1,9

2008 5,1 6,1 6,2 6,8 1,3

2009 -0,72 -1,8 -1,72 -1,22 2,42

Taxa de Ocupação3

1997 55,2 55,0 55,2 55,4 55,3

1998 53,8 53,6 53,9 54,0 53,7

2008 57,8 56,9 57,4 57,9 58,8

2009 – 56,8 – – –

Taxa de Desemprego Aberto3

1997 6,2 6,0 6,4 6,4 5,8

1998 8,3 8,4 8,8 8,5 7,6

2008 7,8 8,4 8,0 7,8 7,2

2009 – 8,6 – – –

Taxa de Inatividade3

1997 41,1 41,5 41,0 40,9 41,2

1998 41,3 41,4 40,9 41,0 41,9

2008 37,3 37,9 37,6 37,2 36,6

2009 – 37,9 – – –Fonte: Elaboração Própria dos Autores a partir de IBGE (2009).(1) Taxas trimestrais em relação ao mesmo trimestre do ano anterior, sem ajuste sazonal.(2) Média das expectativas do mercado em 5 de junho de 2009.(3) Calculado para a população com 15 anos e mais.

O comportamento do PIB entre outubro de 2008 e março de 2009 diminuiu cerca de 10 pontos percentuais,22 a taxa de ocupação diminuiu 2 pontos percentuais e a taxa de desemprego aberto nas regiões metropolitanas ampliou-se 1,4 pontos percentuais. Por sua vez, a Tabela 1 indica que, no período mencionado, a população inativa somou à sua participação na PIA 1,3 pontos percentuais, passando de 36,6% para 37,9%, o que impediu maior expansão da taxa de desemprego aberto. Ou seja, embora o Governo, nesse período, alardeasse que a crise financeira mundial passaria ao largo da economia brasileira, a população se manifestava pessimista com relação à probabilidade de alcançar

22 Variação acumulada do PIB nesse período.

Page 67: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

67

um posto de trabalho ou uma atividade que gerasse renda, e se retirava da PEA.23 Esse comportamento se constitui em uma diferença com o período anterior, na medida em que a taxa de inatividade se manteve praticamente inalterada, não se constituindo em uma variável de ajuste. (Tabela 1).

A recente redução dos postos de trabalhos evidenciou-se no período entre ou-tubro de 2008 e março de 2009. Segundo o saldo líquido do Cadastro Geral de Em-prego e Desemprego (Caged) do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), neste período foram eliminados 692 mil postos do mercado de trabalho formal, sobretudo nos setores industrial e agropecuário. Entre os ramos mais atingidos destacaram-se Alimentos e Bebidas, Agricultura, Indústria do Material de Transporte, Indústria Têx-til, Construção Civil e Indústria Mecânica e Metalúrgica. Por sua vez, as regiões metro-politanas de São Paulo, Belo Horizonte, Campinas e Curitiba foram as mais atingidas, confirmando o impacto da crise sobre o núcleo dinâmico da economia.24

As oscilações de comportamento dos indicadores no período recente re-fletem dois aspectos: a mudança da estrutura da PEA nos últimos dez anos e os efeitos específicos da crise atual sobre o mercado de trabalho. Quanto ao primeiro aspecto, devemos destacar pelo menos quatro fatores: maior participação das mu-lheres no mercado de trabalho; maior escolaridade e idade da força de trabalho; e o aumento do patamar da taxa de desemprego aberto desde a última década do século passado. Vamos examinar o segundo.

Em períodos de crises econômicas, a tendência é a queda nas taxas de ocu-pação e a elevação das taxas de desemprego para homens e mulheres, tudo o mais constante.25 Os dois períodos de crise seguem o comportamento esperado, entre-

23 Conforme assinalado pelo presidente Luís Inácio Lula da Silva: “Lá (nos EUA), ela é um tsunami; aqui, se ela chegar, vai chegar uma marolinha que não dá nem para esquiar”. (GALHARDO, 2008).

24 Assim, em maio de 2009, a magnitude da redução do emprego industrial levou o governo a executar uma das primeiras ações para conter os efeitos sociais negativos do momento econômico: o aumento do número de parcelas do seguro desemprego – de cinco para sete meses – para os desempregados dos setores expostos à crise econômica. Essa medida, entretanto, ainda é débil, caso ocorra uma ampliação expressiva na taxa de desemprego. De acordo com a PME, o contingente de desempregados nas RMs consistia, em março de 2009, de 2,1 milhões de pessoas, enquanto o número total de segurados era de 745 mil pessoas em todo o Brasil. A insuficiente cobertura do seguro desemprego pode ser atribuída principalmente ao elevado grau de trabalhadores assalariados sem registro no Brasil. Em março de 2009, os assalariados sem registro significavam 12,6% da PEA, o que totalizava 2,9 milhões de pessoas na soma das RMs no referido mês.

25 Ressalta-se a impossibilidade de comparar magnitudes entre os períodos 1997-1998 e 2008-2009 devido às mudanças de metodologia da PME, o que não impede verificar e analisar as diferenças intraperíodos e/ou as diferenças entre períodos.

Page 68: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

68

tanto há uma diferença entre os dois períodos em tela. (Tabela 2). No primeiro período, o ajustamento por meio do desemprego é maior entre as mulheres (2,8 pps vs 2,2 pps), enquanto no segundo período a taxa de desemprego aumentou menos do que o esperado, e apenas para os homens (0,4 pps). Por outro lado, a tendência esperada de redução na taxa de ocupação não se verificou entre as mulheres no primeiro trimestre de 2009, ao contrário, esse indicador aumentou em 0,3 pontos percentuais. De forma consistente, o ajustamento pelo desalento ocorreu sobre os homens, enquanto as mulheres, em ambos os períodos, mais intensamente no primeiro, ingressaram no mercado de trabalho – na condição de ocupadas ou desocupadas. Em 2008/2009, predominou a condição de ocupada.

O que se observa, nesse caso, é o reflexo de dois aspectos: a manutenção da tendência à feminização do mercado de trabalho; e o impacto da crise sobre os se-tores mais dinâmicos da economia. Na primeira situação o ajustamento no período 2008-2009 confirmou a manutenção de práticas sexistas no mercado de trabalho brasileiro. As mulheres apresentam taxa de ocupação cerca de 30 pontos percentu-ais menores do que os homens. Elas se defrontam com maiores dificuldades para ocupar postos de trabalho de melhor qualidade e apresentam praticamente o dobro nos níveis das taxas de desemprego.26 Esse comportamento, por sua vez, ratifica o segundo aspecto mencionado – maior impacto sobre os setores dinâmicos. Devido à diminuição do crédito e das exportações, o impacto da crise econômica foi maior na indústria e na agropecuária, o que reduziu os empregos de melhor qualidade no mercado de trabalho; enquanto os ramos do comércio e de serviços, mais intensivos em força de trabalho feminina e em empregos de menor qualidade, experimentaram menos, nos primeiros meses de 2009, os efeitos da recessão, pois, inclusive, aumen-taram as contratações formais. Essas informações corroboram o comportamento da alocação da força de trabalho familiar em momentos de crise. Os responsáveis pela família, em geral, homens, e os membros na condição de filhos mostram a redução da taxa de ocupação e a elevação da taxa de desemprego e/ou a manu-tenção ou elevação da inatividade. Cabe aos cônjuges, em geral mulheres, ingressar no mercado de trabalho para recuperar, parcialmente, a renda familiar, o que pode redundar em conseguir uma ocupação ou passar da inatividade para a desocupação (Tabela 3). Outra mudança, então, que se quer destacar é que, em 1997/1998, a taxa de desemprego das mulheres aumentou impulsionada, também, pelo ingresso de cônjuges no mercado de trabalho, enquanto em 2008/2009, até março, a taxa de desemprego das mulheres se manteve constante.

Nos dois períodos, a análise da distribuição da taxa de desemprego segundo a coorte etária confirma resultados da literatura especializada, e mostra formato

26 Vejam-se mais informações em Cacciamali e José-Silva (2008).

Page 69: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

69

decrescente conforme o aumento da idade, nos dois períodos. (Tabela 4). O período recente, contudo, mostra duas singularidades com relação ao período de 1997-1998. A primeira refere-se à faixa etária dos jovens de 15 a 19 anos. A taxa de desemprego nessa faixa etária caiu 1 pps, o que indica a menor probabilidade de esse grupo se inserir no mercado de trabalho diante da atual conjuntura econômica – o que pode ser constatado por meio do crescimento do desalento. Os jovens se defrontam com reduzidas taxas de ocupação e elevadas taxas de desemprego vis-à-vis as demais co-ortes etárias. Mesmo com a sua retirada da PEA, a taxa de desemprego dos jovens é maior que o dobro daquela dos jovens adultos, e é maior que o triplo da média.

A relação entre taxa de desemprego e anos de escolaridade segue, nos dois períodos analisados, o padrão de formato de U invertido. (Tabela 5). Ou seja, a estrutura esperada, para essa desagregação, se confirmou: pessoas de maior quali-ficação – maior número de anos de escolaridade – apresentaram as maiores taxas de ocupação, além das menores taxas de desemprego e inatividade. O comporta-mento dos demais indicadores nos períodos pré e pós-crises econômicas também se apresentou conforme esperado: a taxa de ocupação nos períodos posteriores às crises é sempre descendente, enquanto a taxa de desemprego é ascendente, com exceção das pessoas não qualificadas – analfabetas ou com nível fundamental.

Nos períodos pós-crise, a taxa de inatividade cresceu para os indivíduos menos escolarizados e, no período mais recente, a abrangência do desalento se ampliou. No período 2008/2009, a maior inatividade incidiu até o nível fundamental completo, en-quanto para o ano de 1997-1998, o crescimento ocorreu para os analfabetos e aqueles com fundamental incompleto. Nos dois períodos, no imediato pós-crise, a taxa de ocupação diminuiu para todos os níveis de escolaridade, mas a queda foi maior para os menos escolarizados. Nota-se, entre os dois períodos analisados, outra diferença. Em 1997/1998, a taxa de desemprego aumentou para todos os níveis de escolaridade, mas, relativamente, menos, para os trabalhadores mais escolarizados, enquanto no período mais recente a taxa de desemprego diminuiu para os menos escolarizados até o ensino fundamental completo, e aumentou para os demais níveis de escolaridade, especialmente para os trabalhadores de nível superior.

O comportamento distinto entre os dois períodos corrobora o fato de a crise recente ter afetado, em um primeiro momento, sobretudo, empregos de melhor qualidade. Por outro lado, a ampliação, depois da crise, do desalento dos trabalhadores menos escolarizados pode estar associada ao maior acesso e à am-pliação dos benefícios dos programas de transferência de renda oferecidos por todos os níveis de governo, mais notadamente pelo governo central por meio dos programas Bolsa Família e Benefício de Prestação Continuada.

Page 70: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

70

Por fim, a desagregação dos indicadores por RM na Tabela 6 aponta, conforme o esperado, que a região metropolitana economicamente menos dinâmica, Recife, apresentou a menor taxa de ocupação, enquanto no outro extremo, Belo Horizonte, São Paulo e Porto Alegre apresentaram as maiores taxas de ocupação. Ademais, a capital baiana se encontrou em posição ainda mais desfavorável ao apresentar as mais elevadas taxas de desemprego, seguida pela região metropolitana paulista.

Com relação aos efeitos decorrentes das crises econômicas, em geral, verificou-se queda da taxa de ocupação nos anos pós-crise, com exceção de Porto Alegre em 1997/1998, e São Paulo em 2008/2009, as RMs com as economias mais avançadas. Em contrapartida, na atual crise econômica, observa-se uma distinção: a taxa de de-semprego decresceu em praticamente todas as RMs, tendência oposta à esperada em virtude do aumento do desalento. Em Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro e Porto Alegre, a menor taxa de desemprego, no período 2008-2009, está fortemente ligada à saída da população da atividade econômica, isto é, aos movimentos da popu-lação para a inatividade como consequência das perspectivas negativas diante da crise. Em Recife e São Paulo ocorreu o inverso, a taxa de inatividade diminuiu no período 2008/2009, a taxa de ocupação aumentou e, em são Paulo, a taxa de desemprego aumentou, enquanto no Recife o efeito foi inverso, a taxa de desemprego diminuiu.

Tabela 2 – Condição de Atividade segundo Sexo. Regiões Metropo-litanas. 1º Trimestre de Cada Ano (Em %)

Indicadores Ano Homem Mulher Total

Taxa de Ocupação

1997 70,9 41,0 55,0

1998 68,7 40,5 53,6

2008 68,7 46,8 56,9

2009 68,1 47,1 56,8

Taxa de Desemprego

1997 5,5 6,7 6,0

1998 7,7 9,5 8,4

2008 6,4 10,7 8,4

2009 6,8 10,7 8,6

Taxa de Inatividade

1997 25,0 56,1 41,5

1998 25,6 55,2 41,4

2008 26,5 47,6 37,9

2009 27,0 47,3 37,9Fonte: Elaboração Própria dos Autores a partir de IBGE (2009).

Page 71: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

71

Tabela 3 – Indicadores das Condição de Atividade por Posição na Família. Regiões Metropolitanas. 1º Trimestre de Cada Ano (em %)

Indicadores Ano Chefe Cônjuge Filho Total

Taxa de Ocupação

1997 69,7 38,2 51,3 55,0

1998 67,6 38,5 49,2 53,6

2008 64,7 50,6 53,1 56,9

2009 64,0 51,6 52,9 56,8

Taxa de Desemprego

1997 3,7 4,1 11,1 6,0

1998 5,5 6,3 15,0 8,4

2008 4,5 7,1 15,6 8,4

2009 4,9 7,4 15,6 8,6

Taxa de Inatividade

1997 27,6 60,2 42,3 41,5

1998 28,5 58,9 42,1 41,4

2008 32,2 45,6 37,0 37,9

2009 32,7 44,3 37,3 37,9Fonte: Elaboração Própria dos Autores a partir de IBGE (2009).

Tabela 4 – Indicadores das Condições de Atividade por Faixa Etária. Regiões Metropolitanas. 1º Trimestre de Cada Ano (em %)

Indicadores Ano 15 a 19 anos

20 a 29 anos

30 a 39 anos

40 a 49 anos

50 a 59 anos

60 anos ou mais Total

Taxa de Ocupação

1997 29,9 65,7 72,2 69,9 51,3 17,2 55,0

1998 28,2 64,5 71,4 68,4 49,2 17,4 53,6

2008 25,6 68,3 75,9 72,9 57,5 18,4 56,9

2009 24,8 67,7 75,8 73,7 58,9 19,1 56,8

Taxa de

1997 15,4 8,8 4,5 3,2 2,1 1,1 6,0

1998 20,7 11,7 6,8 4,7 3,5 2,0 8,4

2008 29,1 12,7 6,1 4,5 3,3 2,1 8,4

2009 28,1 13,1 7,0 4,7 3,6 2,4 8,6

Taxa de Inatividade

1997 64,6 28,0 24,5 27,8 47,6 82,6 41,5

1998 64,5 26,9 23,4 28,2 49,0 82,3 41,4

2008 63,9 21,7 19,2 23,6 40,6 81,2 37,9

2009 65,6 22,1 18,5 22,7 38,9 80,4 37,9Fonte: Elaboração Própria dos Autores a partir de IBGE (2009).

Page 72: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

72

Tabela 5 – Indicadores das Condições de Atividade por Grau de Escolaridade Completo. Regiões Metropolitanas. 1º Trimestre de Cada Ano (Em %)

Indicadores AnoAnalfabeto ou Fundamental Incompleto

Fundamental Médio Superior Total

Taxa de Ocupação

1997 48,2 52,3 64,9 79,5 55,0

1998 46,2 50,3 64,5 78,2 53,6

2008 33,7 51,1 66,2 78,0 56,9

2009 32,8 50,5 66,1 77,3 56,8

Taxa de Desemprego

1997 5,8 8,2 6,3 2,2 6,0

1998 8,4 10,5 9,2 3,9 8,4

2008 6,0 10,9 10,0 3,2 8,4

2009 5,9 10,6 10,4 4,0 8,6

Taxa de Inatividade

1997 48,9 43,1 30,8 18,7 41,5

1998 49,6 43,8 28,9 18,7 41,4

2008 64,2 42,7 26,4 19,5 37,9

2009 65,1 46,5 26,2 19,5 37,9Fonte: Elaboração Própria dos Autores a partir de IBGE (2009).

Tabela 6 – Indicadores das Condições de Atividade por Região Metropolitana. Regiões Metropolitanas. 1º Trimestre de Cada ao (Em %)

Indicadores Ano Belo Horizonte

Porto Alegre Recife Rio de

Janeiro Salvador São Paulo Total

Taxa de Ocupação

1997 58,1 56,3 47,7 52,7 52,0 57,3 55,0

1998 56,5 56,7 47,1 52,2 51,6 54,8 53,6

2008 59,9 58,8 46,7 54,8 55,1 59,3 56,9

2009 59,4 58,1 47,4 54,7 54,9 59,4 56,8

Taxa de Desemprego

1997 5,1 6,1 5,6 4,0 7,4 7,1 6,0

1998 9,1 7,8 8,6 5,9 10,0 9,6 8,4

2008 7,1 6,5 10,3 6,7 12,1 9,1 8,4

2009 6,5 6,0 9,4 6,6 11,4 10,0 8,6

Taxa de Inatividade

1997 38,8 40,0 49,5 45,1 43,9 38,4 41,5

1998 37,9 38,5 48,5 44,5 42,7 39,4 41,4

2008 35,4 37,2 47,9 41,3 37,3 34,7 37,9

2009 36,4 38,2 47,7 41,4 38,1 34,0 37,9Fonte: Elaboração Própria dos Autores a partir de IBGE (2009).

Page 73: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

73

3.5 – Considerações FinaisA economia brasileira entrou tecnicamente em recessão no primeiro trimes-

tre de 2009 reagindo à crise econômica mundial que se iniciou em 2008. Ao longo do último trimestre de 2008 e o primeiro de 2009, a economia do País perdeu, praticamente, 10 pps no valor do PIB, a taxa de ocupação diminuiu 2 pps e a taxa de desemprego aberto cresceu 1,4 pps. A inatividade neste período aumentou 1,3 pps, o que impediu maior ampliação da taxa de desemprego aberto.

Diagnóstico realizado, com base no Cadastro Geral de Empregados e De-sempregados do Ministério do Trabalho e Emprego (Caged), indicou que, entre outubro de 2008 e março de 2009, a retração recaiu sobre os setores mais dinâ-micos, a manufatura e os setores que dependem de crédito e da demanda externa, como a agroindústria. Esse comportamento, distinto do período análogo da crise financeira de 1997/1998, mais os resultados dos indicadores de atividade da Po-pulação em Idade Ativa (PIA), produzidos a partir dos microdados da Pesquisa Mensal de Emprego (PME)/IBGE, geraram a motivação deste estudo. O obje-tivo foi o de encontrar distinções do padrão e das características do desemprego no Brasil na crise econômica de 2008/2009 vis-à-vis a outros períodos recessivos no final do século passado.

Assim, não obstante em 2008/2009 os padrões básicos do comportamen-to do desemprego se mantivessem, como, por exemplo, a relação entre taxa de desemprego e anos de escolaridade em formato de U invertido e/ou a relação decrescente entre taxa de desemprego e idade, nos primeiros seis meses da crise recente verificam-se distinções que merecem destaque.

Inicialmente, ressaltaram-se a natureza distinta e a abrangência global da cri-se de 2008/2009 frente às demais, assim como a política econômica posta em prática pelo Governo central para superá-la – metas de inflação vs. medidas anticí-clicas. Em segundo lugar salientaram-se as singularidades do ajustamento do mer-cado de trabalho neste último período. A principal particularidade refere-se ao estreitamento do número de empregos formais, em geral, ocupados por homens, de escolaridade relativamente alta que ficaram na condição de desempregados ou de inativos; enquanto as mulheres, especialmente, mais velhas, com a posição de cônjuge na família, e escolaridade de nível fundamental completo, diminuíram a inatividade e ampliaram a condição de ocupadas. Neste último período a proba-bilidade de os jovens entre 15 e 19 anos conseguirem emprego diminuiu. Essa coorte etária ampliou o desalento, diminuiu a taxa de ocupação e diminuiu a taxa de desemprego. Por outro lado, os empregadores buscaram reduzir a assimetria

Page 74: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

74

de informações e contrataram, relativamente, mais indivíduos maiores de 40 anos. As coortes etárias superiores a 40 anos diminuíram a inatividade, e aumentaram a taxa de ocupação e de desemprego.

Quanto à escolaridade, a inatividade cresceu entre os menos escolarizados – até o nível fundamental completo – a taxa de ocupação diminuiu para todos os níveis de escolaridade, mas a taxa de desemprego aumentou apenas para os trabalhadores mais escolarizados, especialmente de nível superior; para os traba-lhadores com até o nível fundamental completo a taxa de desemprego diminuiu. Conjugando essa informação com o aumento do desalento, entre os indivíduos desse grupo, podemos sugerir uma hipótese a ser investigada: a saída do mercado de trabalho a fim de obter transferência pública de renda oferecida pelo Governo central, por exemplo, o programa Bolsa Família, e pelos governos subnacionais.

Entre seis regiões metropolitanas, em quatro a inatividade se constituiu na forma de ajustamento, sendo as exceções São Paulo e Recife. Na primeira região o ajustamento do mercado de trabalho ocorreu pelo desemprego: diminuiu a ina-tividade e a taxa de ocupação, e aumentou a taxa de desemprego. Na segunda região diminuiu a inatividade, e o ajustamento ocorreu pela maior ocupação e pela menor taxa de desemprego.

Por fim, destaca-se que a manutenção da política anticíclica dependerá ao menos de três fatores: a capacidade de reação do mercado interno; a recuperação da demanda internacional pelos países asiáticos; e de nenhum refluxo brusco e expressivo de capital externo. Lembrando que, mesmo sem sobressaltos de saída de capitais, em virtude da elevada carga tributária atingida pelo País – 38% do PIB, o Governo central se defrontará com dificuldade para elevar impostos, o que restringirá a sustentação do nível de gasto e de renúncia fiscal propostos em 2009. Evidente que mudanças na política econômica anticíclica poderão mudar os níveis de desemprego e agravarão o perfil do desemprego, diagnosticado para os seis primeiros meses dos efeitos sobre o mercado de trabalho brasileiro da recente crise econômica mundial.

Page 75: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

75

Referências

ABRAS, A. L.; FELÍCIO, F. de. Duração e taxa de saída do desemprego: evidências de ausência de dependência na duração para as regiões metropolitanas do Brasil (1984-2000). In: ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA, 33., 2005, Natal. Anais... Natal: ANPEC, 2005.

AHN, A.; RICA, S.; UGIDOS, A. Willingness to move for work and unemployment duration in Spain. Economica, v. 66, n. 263, p. 335-357, ago. 1999.

AKERLOF, G. The market for lemons: qualitative uncertainty and the market mechanism. Quarterly Journal of Economics, v. 89, p. 488-500, 1970.

AMADEO, E.; CAMARGO, J. M. Regulations and flexibility of labor market in Brazil. Rio de Janeiro: Departamento de Economia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, 1995. (Texto para Discussão, 33).

AMADEO, E. et al. A natureza e o funcionamento do mercado de trabalho brasileiro desde 1980. Rio de Janeiro: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, 1994. (Texto para Discussão, 353).

BANCO CENTRAL DO BRASIL. Disponível em: <http://www.bcb.gov.br>. Acesso em: 2009.

BIVAR, W. Estimativas da duração média do desemprego no Brasil. Pesquisa e Planejamento Econômico, Rio de Janeiro, v. 23, n. 2, p. 275-312, 1991.

BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. Caged. Disponível em: <http://estatistica.caged.gov.br/>. Acesso em: 2009.

CACCIAMALI, M. C.; JOSÉ-SILVA, M. F. (Org.). A construção da igualdade de gênero e raça na América Latina: o caso do Brasil. São Carlos: Suprema, 2008. V. 1.

CACCIAMALI, M. C. Mercado de trabajo juvenil: Argentina, Brasil y México. Genebra: Organização Internacional do Trabalho, 2005. Disponível em: <http://www.ilo.org/public/english/employment/strat/download/esp2005-2.pdf>. Acesso em: 2009.

CAMARGO, J. M.; REIS, M. C. Desemprego: o custo da desinformação. Revista Brasileira de Economia, Rio de Janeiro, v. 59, n. 3, p. 381-425, 2005.

Page 76: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

76

CEPAL. Macroeconomic policy and volatility: (2007-2008). Disponível em: <www.eclac.org>. Acesso em: mar. 2009.

CORSEUIL, C. H.; REIS, C.; URANI, A. Determinantes da estrutura de de-semprego no Brasil: 1986-1995. In: ENCONTRO NACIONAL DE ECONO-MIA DA ANPEC, 1996, [S.l.]. Anais... [S.l.:s.n.], 1996.

FILGUEIRAS, L.; GONÇALVES, R. A economia política do governo Lula. Rio de Janeiro: Contraponto, 2007.

GALHARDO, R. Lula: crise é tsunami nos EUA e, se chegar ao Brasil, será ‘marolinha’. O Globo, Rio de Janeiro, 10 out. 2008.

GONÇALVES, R. A crise internacional na América Latina, com referência ao caso especial do Brasil. Rio de Janeiro: IUPERJ, 2008.

GOODMAN, D. E.; OLIVEIRA, D. R. Desemprego urbano no Brasil. Pesqui-sa e Planejamento Econômico, Rio de Janeiro, v. 7, n. 3, p. 551-580, 1977.

GRIFFITH-JONE, S.; OCAMPO, J. A. The financial crisis and its impacts on developing countries. Brasília, DF: IPC-IG, 2009. (International Policy Centre for Inclusive Growth Working Paper, 53/2009).

IBGE. Pesquisa mensal de emprego. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br>. Acesso em: 2009.

INTERNATIONAL MONETARY FUND. World economic outlook: finan-cial stress, downturns, and recoveries. Washington, DC, 2008. Disponível em: <http://www.imf.org/external/pubs/ft/weo/2008/02/pdf/text.pdf>. Acesso em: 2009.

MANUELITO, S.; CORREIA, F.; JIMÉMEZ, L. F. La crisis sub-prime en Estados Unidos y la regulación y supervisión financeira: lecciones para América Latina y el Caribe. In: CEPAL. Macroeconomía del desarrollo. Santiago de Chile, 2009.

MENEZES-FILHO, N. A.; PICCHETTI, P. Os determinantes da duração do desemprego em São Paulo. Pesquisa e Planejamento Econômico, Rio de Janeiro, v. 30, n. 1, p. 23-48, abr. 2001.

OLIVEIRA, V. H. de; CARVALHO, J. R. Uma perspectiva microeconométrica do salário de reserva e do desemprego na década de 1990 no Brasil. Pesquisa e

Page 77: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

77

Planejamento Econômico, Rio de Janeiro, v. 38, n. 2, p. 227-252, ago. 2008.

PICHETTI, P.; FERNANDES, R. Uma análise da estrutura do desemprego e da inatividade no Brasil metropolitano. Pesquisa e Planejamento Econômico, Rio de Janeiro, v. 29, n. 1, p. 87-112, 1999.

SALM, C. Evolução do mercado de trabalho 1962-1972. Novos Estudos CEBRAP, São Paulo, n. 8, p. 103-119, 1974.

SÃO PAULO. Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados. Disponível em: <http://www.seade.gov.br>. Acesso em: 2009.

STERN, N. Connecting climate change and economic recovery. Disponível em: <http://www.mckinseyquarterly.com/Connecting_climate_change_and_economic_recovery_2303>. Acesso em: 2009.

WORLD ECONOMIC OUTLOOK. Financial stress, downturns, and recoveries. [S.l.]: International Monetary Fund, 2008.

Page 78: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do
Page 79: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

4CAPÍTULO

REAÇÃO DO MERCADO DE TRABALHO NO BRASIL METROPOLITANO FRENTE

À CRISE INTERNACIONAL Marcio Pochmann1

Neste artigo procura-se tratar da contaminação da economia brasileira na recente crise internacional, especialmente no que se refere ao comportamento do mercado de trabalho. Com a recessão instalada por dois trimestres seguidos no interior do setor produtivo, sobretudo industrial, entre outubro de 2008 e março de 2009, o mercado de trabalho registrou importantes evidências de piora para quem depende fundamentalmente de sua força física e mental para sobreviver.

Os efeitos de piora no interior do mercado de trabalho transcorreram, contudo, postergados e, ainda, contidos no tempo. Ademais de muito distintos dos verificados anteriormente em crises econômicas a partir do segundo quartel do século 20.

Tudo isso será tratado a seguir, sendo este artigo dividido em cinco partes, além desta breve apresentação e das considerações finais. Enquanto a primeira procura recuperar o conjunto de efeitos sociais constatados durante a crise atu-al, bem como nas crises econômicas anteriores, a segunda trata da trajetória da situação da pobreza no Brasil metropolitano entre 2002 e 2009, como forma de identificar se a recessão alterou sua evolução de contração.

Na terceira parte analisam-se os principais elementos de enfrentamento da recente crise econômica internacional no Brasil, sobretudo no que diz respeito à base da pirâmide social brasileira, por intermédio das políticas públicas. Na sequência, a quarta parte considera o conjunto dos efeitos da desaceleração e da recuperação econômica sobre o mercado de trabalho nas seis principais regiões metropolitanas do País.

Por fim, considera-se somente o comportamento do mercado de trabalho formal com o objetivo de evidenciar os mais importantes aspectos relacionados

1 Professor licenciado do Instituto de Economia e do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da Universidade Estadual de Campinas. Presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA).

Page 80: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

80

ao ajuste induzido pela crise internacional. Destaca-se, ainda, que todas as infor-mações sistematizadas para o presente estudo têm como fonte oficial de dados a Pesquisa de Emprego e Desemprego do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística e o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados do Ministério do Trabalho e Emprego.

4.1 – Inflexões no Ciclo de Expansão Econômica e Consequências Sociais

No último quartel do século 20, a economia brasileira registrou quatro importantes movimentos de inflexão desaceleradora no nível de produção, com importantes impactos sobre o consumo, o investimento, o emprego e a renda. Nas décadas de 80 e 90 do século XX, o Brasil conviveu com duas importantes e prolongadas recessões econômicas.

Entre 1981 e 1983, por exemplo, houve a crise da dívida externa, enquan-to durante os anos de 1990 e 1992, a queda da produção se deu por conta da adoção de programas voltados ao combate à inflação e da nova inserção externa da economia nacional (abertura comercial, produtiva e financeira). Posteriormente, nos anos de 1998 e 1999, e de 2008 e 2009, o Brasil registrou novamente importantes desacelerações econômicas, ambas relacionadas às crises de origem financeira internacional.

Em função disso, os quatro períodos diferentes de tempo foram selecio-nados para serem brevemente considerados, justamente porque as desacele-rações econômicas provocaram, em consequência, modificações não despre-zíveis no mercado de trabalho. Na crise da dívida externa durante o último Governo militar (Figueiredo), por exemplo, o Produto Interno Bruto (PIB) caiu 2,9% entre 1982 e 1983, enquanto na recessão do Governo Collor o PIB foi reduzido em 4,2% (1990 e 1991).

Na desaceleração econômica do Governo Cardoso (1998 e 1999), o PIB desacelerou fortemente para somente 0,2%. No Governo Lula, a desacelera-ção econômica também foi forte entre o último trimestre de 2008 e o primei-ro trimestre de 2009, com queda acumulada de 3,8%, para depois registrar rápida recuperação.

Page 81: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

81

Gráfico 1 - Brasil Metropolitano – Índice de Evolução da Taxa de Desemprego em Períodos de Desaceleração Econômica Selecionados

Fonte: Elaboração do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) Baseada nos Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – Pesquisa Mensal de Emprego (PME).

De acordo com a taxa de desemprego aberto nas seis principais regiões metropolitanas do País nos doze meses seguintes à manifestação da crise eco-nômica para cada um dos períodos de forte desaceleração econômica, notam-se efeitos diferenciados para o conjunto da classe trabalhadora. Para os anos de 1982/83, por exemplo, constata-se que a taxa de desemprego cresce mais de 50%, enquanto para os anos de 1989 e 1990, a taxa de desemprego foi multipli-cada por mais de duas vezes.

Entre os anos de 1998 e 1999, a desaceleração econômica resultou na am-pliação do desemprego, embora abaixo dos períodos anteriores de recessão. Na recente desaceleração econômica a taxa de desemprego também aumentou, porém quatro meses depois, sem ter apresentado a mesma intensidade, como verificado a partir do décimo mês.

Quando se considera a evolução da taxa de pobreza nas seis principais regiões metropolitanas do País durante os doze meses que se sucederam a cada um dos períodos considerados de alta desaceleração econômica, pode-se ob-servar o impacto do movimento de inflexão da produção sobre a pobreza. Nos anos de 1982/83, por exemplo, constata-se que a taxa de pobreza cresceu rápida e imediatamente.

Page 82: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

82

No segundo período (1989/90), a taxa de pobreza se elevou mais lentamen-te, sem atingir o mesmo patamar da recessão do início da década de 80. Já no ter-ceiro período (1998/99), a desaceleração econômica também implicou elevação importante na taxa de pobreza do Brasil metropolitano. Somente no quarto perío-do de tempo selecionado (2008/09) de desaceleração econômica não se observou aumento importante na taxa de pobreza, pelo contrário, certa continuidade da queda, salvo no terceiro, oitavo, nono e décimo meses.

Gráfico 2 - Brasil Metropolitano – Índice de Evolução da Taxa de Pobreza em Períodos de Desaceleração Econômica Selecionados

Fonte: Elaboração do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) Baseada nos Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – Pesquisa Mensal de Emprego (PME).

Nos primeiros doze meses de manifestação da crise internacional no Brasil (set/08-ago/09) registra-se a diminuição em mais de 1 milhão de pessoas da con-dição de pobreza no Brasil metropolitano. No período anterior selecionado de desaceleração econômica (1998/99), a quantidade de pobres aumentou em quase 1,9 milhão de pessoas.

Page 83: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

83

Gráfico 3 - Brasil Metropolitano – Evolução do Número de Pobres em Períodos de Desaceleração Econômica Selecionados

Fonte: Elaboração do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) Baseada nos Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – Pesquisa Mensal de Emprego (PME).

Nos períodos recessivos a pobreza aumentou mais. Entre 1982/83, a quantidade de pobres cresceu em quase 7,7 milhões de pessoas nas seis regiões metropolitanas, en-quanto em 1989/90, o número de pobres cresceu em mais de 3,8 milhões de brasileiros.

4.2 – Pobreza Recente no Brasil Metropolitano

O Brasil apresenta tendência de queda da taxa de pobreza nas seis regiões metropolitanas desde abril de 2004. Todavia, entre março de 2002 e abril de 2004, por exemplo, a quantidade de pobres metropolitanos cresceu em 2,1 milhões de pessoas, enquanto no período de abril de 2004 a outubro de 2009, a quantidade de pobres foi reduzida em mais 4,9 milhões de pessoas.

Em virtude disso, a taxa de pobreza, que era 42,5% do total da população das seis regiões metropolitanas no mês de março de 2002, passou para 42,7% em abril de 2004, com o aumento de 0,5%. Para o mês de outubro de 2009, a taxa de pobreza no Brasil metropolitano foi de 30,3%, o que significou queda de 29% em relação ao mês de abril de 2004.

Page 84: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

84

Com os sinais de internalização da crise internacional no Brasil desde ou-tubro de 2008, observa-se que não houve, até o mês de outubro de 2009, inter-rupção no movimento de queda da taxa de pobreza nas seis principais regiões metropolitanas do País. A taxa de pobreza de 30,3% de outubro de 2009 foi 1,3% menor que a de outubro de 2008, acusando também redução de 556 mil pessoas da condição de pobreza (queda de 3,1% no número de pobres).

Gráfico 4 - Brasil Metropolitano– Evolução da Taxa de Pobreza no Total da População desde Março de 2002 (em %)

Fonte: Elaboração do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) Baseada nos Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – Pesquisa Mensal de Emprego (PME).

Ademais da manutenção na tendência de queda na taxa de pobreza, consta-ta-se também que no mês de outubro de 2009 havia 54,5% do total dos desempre-gados nas seis principais regiões metropolitanas do País na condição de pobres, enquanto em março de 2002 eram quase 63% nesta mesma condição. A queda de 13,1% na taxa de pobreza entre os desempregados pode indicar que a piora no interior do mercado de trabalho provocada pela crise internacional desde outubro de 2008 não atingiu os segmentos de menor rendimento.

Page 85: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

85

Gráfico 5 - Brasil Metropolitano – Evolução do Índice de Desempregados (Mar./02 = 100) e da Parcela de Trabalhadores Pobres no Total dos Desempregados (em %) desde 2002

Fonte: Elaboração do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) Baseada nos Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – Pesquisa Mensal de Emprego (PME).

Mesmo com a contaminação da economia brasileira pela crise internacional não houve significativa modificação no comportamento da taxa de pobreza entre os de-sempregados. De outubro de 2008 a outubro de 2009, a taxa de pobreza entre os desempregados caiu 1,4%, enquanto o número de desempregados diminuiu 1,8%.

Mesmo com o desemprego manifestando-se mais acentuadamente no inte-rior da população não-pobre, percebe-se, ainda, a existência de diferenças enormes no interior da população. Entre os pobres, por exemplo, a taxa de desemprego nas seis regiões metropolitanas alcançou quase 22% da População Economicamente Ativa (PEA), enquanto no interior da população não-pobre a taxa de desemprego atinge somente 4,2% da força de trabalho em outubro de 2009.

4.3 – Base da Pirâmide Social e Política Pública

Tendo em vista o comportamento distinto da taxa de pobreza no Brasil metropolitano em relação aos outros três períodos anteriores selecionados de de-saceleração econômica, cabe questionar algumas das razões explicativas. Embora se possa considerar que a crise atual ainda não tenha se manifestado plenamente,

Page 86: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

86

podendo ocorrer mais tardiamente, observa-se que o País conta com uma rede de atenção pública voltada, sobretudo, à base da pirâmide social, outrora pouco ou quase nada desenvolvida.

Também se pode mencionar o papel do valor real do salário mínimo em relação à base da pirâmide social, especialmente aos trabalhadores ocupados e aos inativos associados às políticas de garantia de renda. Seus valores encontram-se indexados ao valor do salário mínimo, que no período recente manteve uma trajetória de elevação real.

Durante os quatro períodos de desaceleração econômica considerados, no-ta-se que somente no período atual o valor real do salário mínimo conseguiu guardar seu valor real superior (8%). Entre os anos de 1998/99, o salário mínimo perdeu 3,1% do seu poder aquisitivo. Na recessão de 1989/90, o valor real do salário mínimo caiu 33,6%, enquanto entre 1982/83 a perda do poder de compra do salário mínimo foi de 8,2%.

Gráfico 6 - Brasil– Índice de Evolução do Poder de Compra do Salário Mínimo em Períodos de Desaceleração Econômica Selecionados

Fonte: Elaboração do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) Baseada nos Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – Pesquisa Mensal de Emprego (PME).

Além da importância do valor do salário mínimo para os trabalhadores ati-vos no interior do mercado de trabalho, convém destacar a sua relação para os benefícios da previdência e assistência social. Como os benefícios monetários encontram-se indexados ao valor do salário mínimo nacional, parcela importante da população inativa também termina sendo beneficiada pelo poder aquisitivo garantido nos períodos de forte desaceleração econômica.

Page 87: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

87

Gráfico 7 – Brasil – Percentual da População Total que Recebe Benefícios Monetários Condicionados pela Previdência e Assistência Social

Fonte: Elaboração do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) Baseada nos Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – Pesquisa Mensal de Emprego (PME).

A base da pirâmide social brasileira conta, atualmente, com uma rede de garantia de poder de compra originária nos programas de transferências condi-cionadas de renda. O programa Bolsa Família destaca-se pelo universo de bene-ficiados em todo o País. Somadas as parcelas com benefícios previdenciários e assistenciais, o Brasil conta atualmente com 34,1% da população, sobretudo a de menor rendimento, protegida com algum mecanismo de garantia de renda, o que se constitui algo inédito em relação aos outros períodos de forte desaceleração econômica no País.

4.4 – Desaceleração Econômica e Mercado de Trabalho Metropolitano

Desde a crise da dívida externa, em 1981-1983, o Brasil não havia voltado a percorrer um período mais longo de expansão dos investimentos como o verifi-cado entre 2004 e 2008. Mas no último trimestre de 2008, a evolução dos inves-timentos sofreu uma importante inflexão como decorrência da contaminação da economia brasileira pela crise internacional.

Page 88: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

88

O resultado final foi a queda no comportamento do Produto Interno Bruto (PIB), colocando em xeque, inclusive, a trajetória positiva de expansão combinada dos investimentos e da produção com o avanço social. Isso pode ser observado, por exemplo, pela forte ampliação na formalização, nos anos de 2000, do total das ocupações, salvo na recessão econômica recente.

Gráfico 8 - Brasil – Índice de Evolução Trimestral do Produto Interno Bruto, dos Investimentos e da Formalização das Ocupações nas Seis Regiões Metropolitanas desde 2002

Fonte: Elaboração do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) Baseada nos Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – Pesquisa Mensal de Emprego (PME).

Os indicadores de ocupação total e desemprego apresentaram piora a partir do segundo semestre de 2008. Mas a partir do fim do primeiro trimestre de 2009, contudo, percebem-se sinais importantes de recuperação. O comportamento do salário médio real, por exemplo, manteve leve efeito negativo na crise no início de 2009, para se recuperar a partir daí.

Como se pode perceber, a inflexão na dinâmica econômica nacional recente trouxe impactos não homogêneos por regiões, setores e perfil populacional. Por efeito sazonal o quarto trimestre de cada ano tende a registrar as melhores condi-ções quantitativas de emprego da mão-de-obra, enquanto o primeiro trimestre de cada ano apresenta situação inversa.

Page 89: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

89

Gráfico 9 - Brasil Metropolitano – Índice de Evolução da Ocupação, da Taxa de Desemprego e do Salário Médio Real desde 2002

Fonte: Elaboração do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) Baseada nos Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – Pesquisa Mensal de Emprego (PME).

De fato, o comportamento do mercado de trabalho nas metrópoles brasileiras so-mente teve interrompida a tendência de queda do desemprego verificada entre fevereiro e dezembro do ano passado a partir do mês de janeiro de 2009. Até maio deste ano, as condições de emprego da mão-de-obra se agravaram consideravelmente, com elevação do desemprego acima do constatado durante o mesmo período de 2008.

Gráfico 10 - Brasil Metropolitano - Evolução Mensal dos Desempregados (em mil)Fonte: Elaboração do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) Baseada nos Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – Pesquisa Mensal de Emprego (PME).

Page 90: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

90

Entre dezembro de 2008 e março de 2009, a quantidade de desempre-gados no Brasil metropolitano aumentou 33,1% (516 mil trabalhadores). No mesmo período do ano passado o número de desempregados tinha crescido 13,9% (236 mil trabalhadores). Mas desde março de 2009, o número de de-sempregados vem caindo. No mês de outubro, as seis principais regiões me-tropolitanas registraram 1,753 milhão de trabalhadores sem ocupação, ou seja, 324 mil a menos (-15,6%).

Em virtude dessa importante modificação na trajetória do desempre-go, apresenta-se brevemente um conjunto de informações relevantes sobre as principais consequências recentes da crise internacional para o mercado de trabalho metropolitano.

4.5 – Oferta e Demanda de Trabalhadores nas Metrópoles Brasileiras

No trimestre de março/maio de 2009, em comparação com o trimestre de março/maio de 2008, as seis principais regiões metropolitanas brasileiras incor-poraram 505 mil novas pessoas no total da População em Idade Ativa (PIA). Des-te universo, 250 mil pessoas assumiram a condição de inatividade (sem procurar ou realizar algum trabalho), e 255 mil ingressaram no mercado de trabalho como População Economicamente Ativa (PEA).

Com isso, a expansão da PEA foi de 1,1%, ou seja, 21,4% inferior ao cresci-mento da PIA. Assim, a taxa de participação, que era 62,2% entre março e maio de 2008, decresceu levemente para 62,1% entre março e maio de 2009, evitando, ainda, uma maior pressão na oferta de mão-de-obra sobre o total de postos de trabalho gerados.

Do total de 255 mil pessoas que ingressaram no mercado de trabalho no trimestre de março/maio de 2009, somente 95 mil (37,2%) obtiveram algum tipo de ocupação. A parte restante de trabalhadores (160 mil pessoas) tornou-se, em consequência, desempregada (62,8% do total de ingressantes no merca-do de trabalho).

Page 91: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

91

Gráfico 11 - Brasil Metropolitano - Evolução da População em Idade Ativa (PIA), da População Economicamente Ativa (PEA), da População Economicamente Ativa Ocupada e Desempregada entre Março-Maio de 2008 e 2009 (em %)

Fonte: Elaboração Própria do Autor a partir dos Dados do IBGE/PME.

Dos novos desempregados, 62,6% (100 mil pessoas) tinham entre 24 e 39 anos de idade, 20,5% (33 mil pessoas) encontravam-se na faixa de 20 a 55 anos de idade, 12,3% (19 mil pessoas) estavam com mais de 55 anos de idade e 4,9% tinham menos de 24 anos de idade. Para o caso dos 95 mil trabalhadores que conseguiram alguma ocupação, 128 mil novas vagas foram para quem tinha de 40 a 55 anos de idade e 124 mil postos de trabalho para pessoas de mais de 55 anos de idade. As faixas etárias com menos de 24 anos e de 24 a 29 anos de idade registraram diminuição no nível de ocupação de 124 mil e 12 mil postos de trabalho, respectivamente.

Ainda em relação às 95 mil novas vagas abertas no mercado de trabalho das principais metrópoles brasileiras, observa-se a expansão somente do em-prego assalariado formal. Entre os assalariados o saldo de emprego gerado no mesmo período de tempo foi de 173 mil vagas, sendo o aumento de 199 mil ocupações formais e de queda de 61 mil vagas informais.

As ocupações não-assalariadas, como autônomo, conta própria e empre-gador, por exemplo, registraram queda no total dos postos de trabalho. Ou seja, com fechamento líquido de 42 mil ocupações não-assalariadas no mesmo período de tempo.

Page 92: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

92

4.6 – Comportamento da Ocupação e do Desemprego nas Metrópoles Brasileiras

Seguindo a distribuição da força de trabalho por faixa etária, percebem-se comportamentos muito distintos em relação à ocupação e ao desemprego. No tri-mestre de março/maio de 2009, em comparação com o mesmo período de 2008, nota-se a contração da PIA e da PEA para a faixa etária de 15 a 23 anos de idade, de -1,5% e -3,5%, respectivamente.

Gráfico 12 - Brasil Metropolitano - Evolução da População em Idade Ativa (PIA) e da População Economicamente Ativa (PEA) entre Março-Maio de 2008 e 2009 segundo Faixas Etárias (em %)

Fonte: Elaboração Própria do Autor a partir dos Dados do IBGE/PME.

Para as demais faixas etárias houve expansão tanto da PIA como da PEA. Para os trabalhadores com mais de 55 anos de idade, a expansão da PIA (4,9%) e da PEA (6,1%) foram as mais significativas para o mesmo período de tempo considerado.

Page 93: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

93

Gráfico 13 - Brasil Metropolitano - Evolução da População Economicamente Ativa Ocupada e Desempregada entre Março-Maio de 2008 e 2009 segundo Faixas Etárias (em %)

Fonte: Elaboração Própria do Autor a partir dos Dados do IBGE/PME.

Diante do diferencial de comportamento na força de trabalho segundo a dis-tribuição por faixas etárias nas seis principais regiões metropolitanas brasileiras, constata-se que a ocupação foi reduzida para os trabalhadores com até 39 anos de idade e aumentada para a população com idade de 40 anos e mais.

4.7 – Ajuste no Mercado de Trabalho Metropolitano na Crise Internacional

Desde a contaminação da economia brasileira pela crise internacional, a par-tir do último trimestre de 2008, o mercado de trabalho no Brasil metropolitano apresentou importantes sinais. Os principais são recuperados a seguir.

O primeiro deles percebe-se pelo comportamento da participação relativa do rendimento do trabalho dos ocupados nas seis principais regiões metropolita-nas em relação à renda nacional. Durante o último trimestre de 2008 e o primeiro de 2009, por exemplo, o rendimento do trabalho cresceu relativamente às demais rendas durante a recessão nacional.

Page 94: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

94

Gráfico 14 - Brasil Metropolitano – Participação dos Salários na Renda Nacional (em %)

Fonte: Elaboração Própria do Autor a partir dos Dados do IBGE/PME.

De certa forma, observa-se que a queda no comportamento do PIB implicou maior prejuízo às rendas da propriedade (lucros, juros, aluguéis, renda da terra) do que ao rendimento do trabalho. No primeiro trimestre de 2009, o peso relativo do rendimento do trabalho na renda nacional foi 11,6% maior que o penúltimo trimestre de 2008.

Gráfico 15 - Brasil – Evolução Mensal do Saldo do Emprego FormalFonte: Elaboração Própria do Autor Baseada nos Dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE)/ Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED).

Page 95: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

95

Para o mesmo período do ano anterior, o peso do rendimento do trabalho no primeiro trimestre de 2008 foi somente 2,5% superior ao penúltimo trimes-tre de 2007. Já no segundo trimestre de 2009, com a recuperação da economia brasileira, a participação do rendimento do trabalho na renda nacional foi 11,2% menor, enquanto no mesmo período anterior a queda foi de 7,5%.

Em outras palavras, a queda na taxa de lucro durante a recessão ocorreu paralelamente à expansão do rendimento do trabalho nas seis regiões metropoli-tanas brasileiras. Com a recuperação dos lucros, a partir dos segundo trimestre de 2009, o peso relativo dos salários voltou a se reduzir.

Gráfico 16 - Brasil – Participação no Saldo Total Mensal dos Empregos Formais das Ocupações de Até Dois Salários Mínimos Mensais (em %)

Fonte: Elaboração Própria do Autor Baseada nos Dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE)/ Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED).

Também em relação ao emprego formal, observa-se uma importante re-cuperação após somente três meses de queda. Onze meses após a inflexão do emprego formal, o Brasil voltou a registrar ritmo de expansão equivalente ao verificado antes da crise internacional.

Page 96: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

96

Gráfico 17 - Brasil – Evolução do Saldo do Emprego Formal segundo Escolaridade dos Ocupados (em %)

Fonte: Elaboração Própria do Autor Baseada nos Dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE)/ Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED).

A perda no total de emprego formal ocorreu em todos os níveis de remu-neração, embora mais fortemente nas mais altas faixas de rendimento. Para quem recebe até dois salários mínimos mensais, por exemplo, somente o mês de novem-bro de 2008 teve queda no saldo entre geração e destruição de postos de trabalho.

A saída da crise internacional representou para o mercado de trabalho na-cional a maior expressão de ocupações formais concentradas em até dois salários mínimos mensais. Neste sentido, o ajuste no interior do mercado de trabalho metropolitano foi mais pelo preço da contratação da mão-de-obra do que pela quantidade de trabalhadores ocupados.

Se considerado o perfil das ocupações geradas, descontadas as vagas destru-ídas, nota-se que o ajuste no mercado de trabalho transcorreu fundamentado nos trabalhadores de menor escolaridade. Especialmente aqueles com escolaridade entre quatro e oito anos de estudos. Já para os trabalhadores com escolaridade superior a queda foi muito menor.

Page 97: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

97

Gráfico 18 - Brasil – Evolução do Saldo do Emprego Formal segundo Faixa Etária dos Ocupados (em %)

Fonte: Elaboração Própria do Autor Baseada nos Dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE)/ Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED).

Em relação à faixa etária, percebe-se que a evolução do emprego formal durante a crise ocorreu mais fortemente para os trabalhadores entre 25 e 49 anos de idade. Os trabalhadores com mais idade foram menos atingidos pelos efeitos da crise internacional no Brasil.

Para o segmento etário de até 24 anos de idade também houve queda impor-tante durante a recessão econômica, porém sua recuperação foi mais rápida do que os outros segmentos da força de trabalho. Dois meses de recuperação econô-mica foram suficientes para retomar a composição do emprego formal pré-crise.

No quesito gênero, o ajuste no mercado de trabalho formal se deu concen-trado entre os trabalhadores masculinos. As mulheres também foram afetadas, porém em ritmo e período inferiores.

Também as mulheres recuperaram o ritmo dos empregos formais pré-crise mais rapidamente que os homens. Mas a partir do quarto mês pós-crise o empre-go masculino cresceu mais rapidamente.

Page 98: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

98

Gráfico 19 - Brasil – Evolução do Saldo do Emprego Formal segundo Sexo dos Ocupados (em %)

Fonte: Elaboração Própria do Autor Baseada nos Dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE)/ Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED).

Entre as grandes regiões geográficas nota-se que a região Sudeste foi a mais afetada, seguida da região Sul. As regiões menos industrializadas terminaram com o comportamento do mercado de trabalho menos atingido, como no caso das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

Gráfico 20 - Brasil – Evolução do Saldo do Emprego Formal segundo Grandes Regiões Geográficas dos Ocupados (em %)

Fonte: Elaboração Própria do Autor Baseada nos Dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE)/ Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED).

Page 99: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

99

Todavia, a saída da crise internacional no Brasil foi mais estimulada pelo com-portamento do mercado de trabalho da região Sudeste. Embora mais lenta, a recu-peração econômica no Sudeste foi geradora de forte expansão do emprego formal.

Gráfico 21 - Brasil – Evolução do Saldo do Emprego Formal segundo Setor de Atividade Econômica dos Ocupados (em %)

Fonte: Elaboração Própria do Autor Baseada nos Dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE)/ Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED).

Por fim, segundo os setores de atividade econômica, constata-se que a in-dústria foi a mais afetada durante a crise internacional. Como é o setor que tem os empregos com as melhores condições de trabalho, em geral, com forte ocupação do sexo masculino e de jovens, estes terminaram sendo os segmentos da força de trabalho que mais sentiram a crise internacional.

4.8 – Considerações Finais

A inflexão no comportamento geral do mercado de trabalho a partir do último trimestre de 2008 foi reflexo direto da crise internacional no Brasil. Essa alteração no comportamento do mercado de trabalho não se mostrou equivalente para toda a classe trabalhadora, tampouco registrou os mesmos sinais percebidos durante ou-tras crises econômicas pronunciadas desde o último quartel do século 19.

Os trabalhadores industriais foram os mais afetados recentemente, assim como os do sexo masculino e os mais jovens. Os ocupados de maior remuneração

Page 100: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

100

acusaram mais rapidamente e por mais tempo os efeitos nefastos da crise no Brasil.

Com o desempenho diferenciado no interior do mercado de trabalho, e con-siderando o impacto positivo do conjunto das políticas públicas para os trabalha-dores de menor remuneração, percebe-se que a pobreza nas seis regiões metropo-litanas seguiu a tendência de queda desde abril de 2004. Ou seja, a recessão não foi suficiente para interromper o movimento de redução na taxa de pobreza anterior à própria crise internacional.

Em função disso, observa-se que o comportamento do mercado de trabalho na crise recente se deu diferenciadamente do verificado em períodos similares anteriores. Nas recessões de 1982/83 e de 1989/90, por exemplo, houve forte aumento da pobreza no Brasil metropolitano. Mesmo que a taxa de pobreza das regiões metropolitanas não tenha se elevado tanto quanto nos períodos recessi-vos, também se registra que a desaceleração ocorrida entre 1998 e 1999 causou perdas importantes na base da pirâmide social.

A diferente natureza da crise recente, seguida de políticas sociais de novo tipo, impediu que os mais pobres sofressem os principais efeitos do ajuste no mercado de trabalho. A elevação do valor real do salário mínimo e a existência de uma rede de garantia de renda aos pobres contribuíram decisivamente para que a base da pirâmide social não fosse a mais atingida, ao contrário do observado em períodos anteriores de forte desaceleração econômica no Brasil.

Page 101: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

2PARTE

ASPECTOS REGIONAIS DO MERCADO DE TRABALHO

Page 102: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do
Page 103: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

5Capítulo

ASPECTOS ESTRUTURAIS DO MERCADO DE TRABALHO EM

CONTEXTO RECENTE DA ECONOMIA BRASILEIRA: CONTRAPONTO

NORDESTE-SUDESTETarcisio Patricio de Araújo Roberto Alves de Lima (1)

Para um trabalho da natureza do que se desenvolve neste capítulo é útil que seja caracterizado, em termos sumários, o padrão de crescimento da economia brasileira desde que, no início dos anos 80 do século XX, o País teve esgotado o modelo de industrialização por substituição de importações. Durante as déca-das de preeminência desse modelo (1930-1980), o Estado (mobilizando vultosos volumes de recursos financeiros, produzindo diretamente bens intermediários e equipamentos, provendo infraestrutura, propiciando um câmbio favorável à in-dústria nacional e buscando poupança externa, além de cumprir o papel precípuo de manejo das políticas macroeconômicas), foi o grande protagonista da consoli-dação da industrialização brasileira.

A mudança dos ventos desde os anos oitenta – tanto no plano ideológico (as-censão do thatcherismo na Inglaterra e da ideologia politicamente representada nos Estados Unidos pelo governo Ronald Reagan, na linha de defesa da supremacia do mercado como antítese do Estado) quanto no plano estritamente econômico (final da “era de ouro” do capitalismo nos países desenvolvidos, crise da dívida externa e “estagflação” no Brasil e em outros países em desenvolvimento) – mudou radical-mente o panorama e a rota de crescimento do País. O Brasil vem experimentando nos últimos 28 anos um crescimento de 2,5% ano, muito abaixo do padrão histórico consolidado no pós-guerra (7,1% de média anual, entre 1947 e 1980).

No que concerne ao Produto Interno Bruto (PIB) per capita, só a partir de 1995 o Brasil logra obter – com auxílio de um baixo crescimento demográfico

1 Professores do Departamento de Economia da Universidade Federal de Pernambuco.

Page 104: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

104

(1,4% ao ano) – valores acima do nível de 1980; no entanto, o crescimento médio do PIB per capita entre 1980 e 2008 se situa no nível de 0,8% ao ano, influenciado por uma modesta recuperação a partir de 1995. Disso se extrai que os recentes ganhos em termos de redução da inflação ao patamar típico de países desenvol-vidos (período pós-Plano Real) não foram acompanhados por um nível confor-tável de crescimento da economia. Considerados diversos subperíodos, o melhor desempenho do PIB e do PIB per capita se verifica nos últimos cinco anos (2004 a 2008): o produto global cresce a 4,7% ao ano e o produto por habitante a 3,5% ao ano – quando a economia brasileira se beneficia de um contexto internacional muito favorável e recupera um melhor nível de demanda agregada, por conta de impactos da própria atividade exportadora, da permanência de aumentos reais do salário mínimo e de impulso adicional ao consumo, propiciado pela expansão do crédito pessoal e do volume de recursos oriundos de transferências públicas de renda. No período pós-Real, entre 1994 e 2008, o produto per capita cresce a 1,7% ao ano (o PIB global se expandindo a 3,1% ao ano ao longo destes últimos catorze anos)2, sendo este o ganho depois que o País passou a conviver com nível de inflação próximo do padrão de países desenvolvidos.

Esse quadro de modesto crescimento não é, evidentemente, uniforme em termos espaciais. Polos e subpolos de crescimento em algumas regiões têm se estabelecido ao longo dos anos – em grande parte influenciados por tendência favorável das exportações e por afluxo de investimento externo. Em tal contexto, comparar características socioeconômicas entre regiões de um país amplo e dife-renciado como o Brasil é um enfoque metodológico que propicia bons resultados analíticos, mesmo sabendo-se que dentro de cada região existem diferenças im-portantes. No caso em apreço, trata-se de confrontar características do mercado de trabalho do Nordeste e do Sudeste, dois polos que constituem elementos-chave de uma formação econômico-industrial fundada em desigualdade e san-cionadora de disparidades sociais. Deve-se antecipar que, a despeito da referida diferenciação e de contrastes em termos regionais, o espaço do mercado de tra-balho (particularmente na esfera urbana metropolitana) apresenta traços comuns – sobretudo no que se refere à precarização de relações de trabalho – diferenças regionais ocorrendo na magnitude de determinados fenômenos.

De forma a se estabelecer ponto de partida que forme uma base para a análise que se esboça nesta Introdução, é feita – na seção 2 – uma recuperação su-

2 Com respeito ao crescimento da economia brasileira no pós-guerra, a fonte é a tabela 1 de Serra (1983, p. 58). Todas as outras referidas médias têm por base dados do IPEADATA, cuja informação primária é constituída por dados do IBGE. Os valores do PIB per capita em que se baseiam as variações médias anuais estão, na fonte, estimados em US$ mil de 2008, ano em que o produto por habitante atinge o patamar de US$ 8,31 mil.

Page 105: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

105

mária da formação econômico-social nordestina vis-à-vis à formação do Sudeste, com referência a aspectos que importa serem destacados, particularmente no que concerne a conexões com o propósito encerrado neste artigo: discussão sobre di-ferenças, entre as duas regiões, em termos de mercado de trabalho. À seção 3 cabe esse contraponto Nordeste-Sudeste. Ao final, retomam-se aspectos salientados ao longo do texto e adicionam-se novas considerações. Impactos sobre a geração de empregos nas duas regiões, em período recente – no qual a economia brasileira, assim como a economia mundial, convive com a mais recente crise econômica – formam parte da análise empreendida neste artigo.

5.1 – Notas sobre a Formação Econômico-Social do Sudeste e do Nordeste

A diversidade regional no espaço brasileiro tem amplitude e complexidade que espelham a extensão continental do País e diferenciações entre as várias macrorre-giões no que concerne ao lugar que cada espaço ocupou na colonização brasileira e à passagem de espaços socioeconômicos “isolados” para um espaço econômico de caráter nacional. Não é parte do escopo deste artigo recuperar esse processo histórico. Tendo-se o confronto Nordeste-Sudeste como elemento básico de análise – oposição que constitui um contraste emblemático da formação desigual brasileira, não por acaso ocupando posição destacada na literatura sobre disparidades regio-nais – interessa apenas salientar aspectos vinculados à preeminência do Sudeste na industrialização brasileira e as especificidades da formação nordestina.

Como ponto de partida assinale-se que é sabido o caráter “tardio” da in-dustrialização brasileira. Conforme a literatura sobre o desenvolvimento indus-trial do País, embora a incipiente indústria brasileira tenha se ampliado no pe-ríodo de 1870-80 até os anos vinte do século XX3, o “deslocamento do centro dinâmico” da economia brasileira só ocorre a partir de 1929/30 (FURTADO, 2007), quando se dá a ruptura (econômica, política, ideológica) com o padrão

3 De fato, no primeiro censo industrial (1907) já se registrava que a mão-de-obra do setor no País constituía um contingente de 151.841 trabalhadores, para o que as atividades de produção têxtil (“fiação e tecelagem” e “roupas brancas”) e produção de alimentos e bebidas (açúcar, cerveja, vinho e outras bebidas, erva-mate, charque, sal, moagem de cereais) – indústrias mais antigas – emprega-vam, respectivamente, 54.210 e 31.536 pessoas. Ver na Tabela 1 apresentada por Versiani e Suzigan (1990, p. 6). Na época, “a maior parte do consumo aparente de vários produtos manufaturados de uso corrente no País já era atendida pela produção nacional.” (VERSIANI; SUZIGAN, 1990, p. 5). Para a evolução industrial do Brasil desde o último quarto do século XIX, ver Suzigan (2000).

Page 106: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

106

agrário-exportador. A crise da economia cafeeira, decorrente da crise internacional, contribui para que capitais vinculados ao café se desloquem para atividades indus-triais – constituindo um processo de diversificação – como reflexo da percepção de risco mais elevado que representava a produção de café para exportação.

No plano político, o governo que se instala em 1930 passa a compor com interesses associados à indústria. Na vertente ideológica, o “país essencialmente agrícola” tem relevância reduzida frente ao avanço do ideário que pregava a in-dustrialização como saída para a vulnerabilidade representada por exportações centradas em produtos primários – embora a disputa ideológica ainda permane-cesse bastante viva mesmo nos anos 50, até que o período Juscelino Kubitscheck constituísse o grande golpe na ideologia da preeminência agrária. Ocorre que, tomando-se o período 1956-60 como benchmark, tal salto qualitativo na direção da consolidação industrial no Brasil se dá dois séculos depois do marco da primeira Revolução Industrial (1750-60), com epicentro na Inglaterra. Daí o caráter obvia-mente tardio da industrialização brasileira, particularmente em contraste com os Estados Unidos, de colonização contemporânea à do Brasil4.

Por outro prisma, a vinculação da expansão urbano-industrial brasileira, antes de 1930, à própria atividade exportadora, é sabidamente um importante aporte de conhecimento – propiciado pela literatura especializada dedicada à for-mação histórico-econômica do País5. As interligações do setor agroexportador com outras atividades econômicas ocorriam em pelo menos quatro vertentes: a) o efeito-renda da atividade exportadora amplia o mercado interno e propicia a expansão da demanda de bens de consumo, insumos e bens de capital leves para o setor agroexportador, para o setor de transportes e para o processamento de produtos de exportação – cuja produção passa a ser em parte realizada no País; b) investimentos em infraestrutura (estradas de ferro e portos) promovem o desen-volvimento do sistema de transportes, com desdobramento positivo em termos de integração do mercado interno; c) a expansão da receita de exportações amplia a monetização da economia e contribui para o surgimento e a expansão de um sis-tema bancário; d) na esfera do trabalho, o aumento da demanda por mão-de-obra contribui para romper a inércia do sistema escravista e propiciar a formação de um mercado de trabalho atendido por fluxos imigratórios. Ademais, a acumulação

4 Como se sabe, o contraste Brasil X EUA na análise da formação econômico-social brasileira é um recurso metodológico utilizado por Furtado e por historiadores, a exemplo de Vianna Moog, no clássico Bandeirantes e Pioneiros.

5 Ver Furtado (2007); Versiani e Versiani (1977); Suzigan (2000); Versiani e Suzigan (1990); Negri (1994) – entre outros.

Page 107: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

107

de capital comercial favorece o surgimento de grupos empresariais6. Obviamente, embora a importância relativa do setor exportador não tenha hoje a mesma ex-pressão de então, efeitos multiplicadores do setor exportador, em termos de renda e emprego, na economia brasileira, desempenham papel de relevo no País – daí a importância de polos industriais com fortes vínculos com o mercado externo.

É importante ressaltar, no entanto, que o desenvolvimento da indústria no Brasil mantém o viés de desigualdade da formação econômico-social, estabele-cendo-se grande concentração da atividade industrial na região Sudeste, principal-mente em São Paulo. Assim, os desdobramentos em cada estado ou região – da geração e da expansão de atividades industriais na esteira do desenvolvimento da atividade exportadora – encerram especificidades concernentes a fatores so-ciais e históricos próprios de cada espaço. Ou seja, mesmo que analiticamente se estabeleçam vinculações ou associações de natureza econômica, fatores outros, característicos de cada região, contribuem para moldar diferentes histórias. Consi-deramos que o reconhecimento de uma esfera de ação interna às regiões ou espa-ços socioeconômicos é fundamental para – em particular quando se trata de país imenso e diverso como o Brasil – serem evitadas generalizações que levem a se enxergar apenas o que seria o lado reflexo da economia brasileira, como periferia do centro industrial desenvolvido7.

Tal reconhecimento da dimensão interna da economia brasileira, como pe-riferia no âmbito mundial, mesmo quando a dinâmica econômica dependia for-temente do comércio externo, é fundamental para se assimilar que a desigualdade social no interior do espaço brasileiro é um traço comum às diversas regiões, des-de sempre. A propósito, recorra-se a Fragoso (1998, p. 23-24). Em estudo sobre as “origens das grandes fortunas dos barões do café”, em particular em Paraíba do Sul (no Rio de Janeiro), Fragoso identifica, na origem dessas fortunas, comer-ciantes “das praças do Rio de Janeiro e de Minas Gerais”, com atividade exporta-dora, mas também operando no mercado interno. Os titulares de cinco famílias “detinham, nos anos de 1860 e 1870, mais de 40,0% da superfície do Município de Paraíba do Sul, e mais de 15,0% da sua população escrava”. O autor identifica origens de grandes fortunas dos comerciantes de café em outras localidades do

6 As notas acima sobre interligações entre o setor exportador e outras atividades econômicas no Brasil do século XIX têm por base Suzigan (2000, p. 17-18, 30). Observe-se que Suzigan, sem rejeitar as formulações de Furtado (2007) e Tavares (1972), critica e complementa a visão desses autores ao demonstrar que o crescimento da indústria brasileira induzido pelo setor exportador não se limitava a bens de consumo e materiais de construção, e envolvia um processo mais amplo de diversificação de atividades industriais e de modernização da economia no Brasil da época.

7 Para tal mister, contribui expressivamente a historiografia – representada por, por exemplo, Frago-so (1998) e Florentino (1997) – que critica a abordagem clássica de Novais (1983).

Page 108: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

108

Rio de Janeiro. (FRAGOSO, 1998, p. 24). Ademais, Fragoso – ao investigar a ori-gem do Médio Vale do Paraíba do Sul – estabelece vinculação entre a montagem da agricultura canavieira de Campos (RJ) e “notáveis” comerciantes da praça do Rio de Janeiro. Na região o número de engenhos teria aumentado de 50 para 400 unidades (700%) entre 1777 e 1810, assinalando o autor que “71,4% das doações de sesmarias corresponderam ao período 1770-1820”. Configura-se, neste caso, um exemplo de interação entre o capital comercial e a economia agroexportadora.

A preocupação central da corrente historiográfica aqui representada por Fra-goso é demonstrar que a economia colonial não era tão-somente reflexa da dinâmi-ca externa – possuindo uma capacidade de acumulação endógena, mesmo que cen-trada na captação de excedente, resultante da inter-relação da economia exportadora com formas “não capitalistas” de produção para o mercado interno (abastecimento de charque, farinha, trigo e aguardente) e da compra de escravos, cujo comércio era dominado por capital mercantil de origem local. Nossa preocupação é – utilizando uma interpretação que corretamente dá a devida ênfase a determinações internas da formação econômico-social brasileira, sem rejeitar a visão consagrada na histo-riografia sobre a importância da dinâmica externa em uma economia periférica – chamar a atenção para raízes da formação social desigual, cujos determinantes são inteiramente endógenos e têm centro na política de alocação de terras e no atraso educacional propiciado por omissão ou insuficiência de políticas públicas.

Tais elementos podem, assim, conduzir a um importante aspecto em uma discussão em que analiticamente se vinculam mercado de trabalho e desigualdade. Trata-se de considerar o evento da instituição, em 1850, da Lei de Terras. Sabe-se que tal dispositivo legal dispunha “sobre as terras devolutas no Império, e acerca das que são possuídas por título de sesmaria sem preenchimento das condições legais, bem como por simples título de posse mansa e pacífica: determina que, medidas e demarcadas as primeiras, sejam elas cedidas a título oneroso, assim para empresas particulares, como para o estabelecimento de colônias de nacionais e de estrangeiros, autorizado o Governo a promover a colonização estrangeira na forma que a lei declara” (Lei de Terras, 1850, preâmbulo). Terras devolutas eram conceituadas como “As que não se acharem aplicadas a algum uso público nacional, provincial, ou municipal” (Lei de Terras, 1850, Artigo 3º., parágrafo primeiro). O artigo 1º. rezava: “Ficam proibidas as aquisições de terras devolutas por outro título que não seja o de compra”; e o artigo 2º. estabelecia: “Os que se apossarem de terras devolutas ou de alheias, e nelas derribarem matos, ou lhes puserem fogo, serão obrigados a despejo, com perda de benfeitorias, e demais sofrerão a pena de dois a seis meses de prisão e multa de 100$000 (cem mil-réis), além da satisfação do dano causado”.

Page 109: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

109

É também sabido – a partir de Furtado (2007) – que na segunda metade do século XIX a economia cafeeira experimentava longo ciclo de expansão e se beneficiava da grande elasticidade da oferta de terras. A Lei de Terras consolida e sanciona a desigualdade da distribuição de terras e, particularmente no Nordeste, como assinala Furtado (2007), a estrutura fundiária e a economia de subsistência contribuem – na formação do mercado de trabalho brasileiro, pós-Abolição – para o estabelecimento de um nível de salário real no patamar de subsistência da fase da escravidão. Observe-se que a Lei de Terras, ao formalizar esse ativo como mercadoria, levou a acréscimo de preço, mas mesmo assim a economia cafeeira – como registra Furtado – se expandiu sem significativa pressão de custo da terra, assim como também se beneficiava de um salário real que também não crescia ou tendia à estagnação (por conta da elasticidade da oferta de mão-de-obra, princi-palmente depois que o celeiro representado pela economia de subsistência passou a operar como reservatório de força de trabalho). Portanto, distribuição desigual da terra e economia de subsistência foram pilares para a acumulação capitalista no País – formando a base do que viria a ser uma sociedade marcada por dispa-ridades sociais.

No assinalado período de primeiro grande impulso da economia cafeeira, o núcleo produtor (São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo) definia o ritmo de crescimento dessa economia. Era um momento de ampliação da demanda exter-na e de vigor industrial das economias que já se beneficiavam dos primeiros cem anos desde a primeira Revolução Industrial (1750-60). A demanda externa por produtos primários e a dinâmica da industrialização do Velho Mundo produziam, para os países periféricos, vantagens de preços relativos de exportação (produtos primários) e importação (principalmente produtos industrializados)8.

Essa vinculação ao mercado externo também era elemento-chave para a eco-nomia do outro Estado que compunha o Sudeste: Minas Gerais. Ainda conforme Furtado (2007), o século XVIII constituiu um período em que o que veio a ser a região Sul-Sudeste do País sofreu importantes transformações para o que a economia do ouro das Minas Gerais desempenhou papel fundamental. A eco-nomia mineira gerava um mercado complementar de proporções superiores às do mercado propiciado pelo auge da economia açucareira – se considerada a de-manda por gado para corte e por animais para uso no transporte; os impactos decorrentes, nesse caso, teriam sido, para a região criatória, mais significativos que os efeitos da economia açucareira sobre o sertão nordestino. A economia mineira

8 Segundo Furtado (2007), comparando-se médias entre os anos 1890s e 1840s, os preços dos produ-tos exportados pela economia colonial portuguesa no Brasil cresceram 46% versus um decréscimo de 8% nos preços dos produtos importados, e o índice de quantum das exportações brasileiras cresceu 214% no período, refletindo a ampliação de mercados – em particular no caso do café.

Page 110: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

110

teria aberto “novo ciclo de desenvolvimento” para diversas “regiões” do Sul e do Sudeste do País e mesmo do Mato Grosso, estabelecendo relações de inter-dependência entre esses espaços, que se especializavam uns na criação, outros na engorda e distribuição, ou constituindo mercados consumidores. Ou seja, a eco-nomia mineira, ao alimentar a procura por gado, constituía um centro dinâmico irradiador de impactos econômicos sobre diversas regiões.

Enquanto a evolução do Sudeste apontava para forte concentração indus-trial em São Paulo, no Nordeste formava-se uma economia em que açúcar, algo-dão e pecuária constituíam os principais sistemas econômicos. Como já referido, nesta região a passagem do trabalho escravo para o trabalho assalariado havia se estabelecido em bases mais frágeis – comparativamente ao Sudeste – para o que contribuía a grande concentração da propriedade da terra e a importância social da economia de subsistência no entorno do sistema pecuário, que passaria a per-der mercado para a pecuária do Rio Grande do Sul. (NEGRI, 1994).

Sobre o caso do Nordeste, pode-se recorrer à sistematização proposta por Guimarães Neto (1997), pela qual são identificadas na evolução da economia nor-destina as seguintes fases:

a) consolidação de uma estrutura econômica e social que tradicionalmente se identificou como o Complexo Econômico do Nordeste, constituído de vários segmentos exportadores que, via vinculação a atividades voltadas para o mercado interno, a exemplo da pecuária, tinham razoável capacidade de absorção de força de trabalho (povoamento e colonização do que viria a ser o Nordeste, abrangendo a maior parte do período colonial e alcançando a primeira metade do século XIX);

b) período no qual o complexo regional volta-se para o mercado interno e passa a se articular, da perspectiva comercial – como produtor ou como consu-midor – com os demais espaços nacionais, compondo movimento mais amplo de constituição e consolidação do mercado interno brasileiro (entre final do sé-culo XIX e primeira metade do século XX). Importante registrar, como o faz Guimarães Neto (1997), que foi nessa fase quando produtores e exportadores nordestinos, obedecendo ao comportamento-padrão de diversificação de riscos e fugindo da crise do setor exportador nordestino nas décadas finais do século XIX, passaram a buscar articulação comercial com a emergente economia cafe-eira, transferindo para essa economia porções de excedentes antes totalmente canalizados para mercados internacionais;

c) fase de superação da articulação comercial anterior, caracterizada – em pe-ríodo mais recente e correspondente à consolidação dos segmentos mais impor-

Page 111: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

111

tantes da indústria pesada no País – por transferência, para o Nordeste, de frações do capital produtivo (público e privado) que buscavam novas oportunidades de investimento, assim contribuindo para a integração produtiva de regiões perifé-ricas, já articuladas comercialmente (momento desde a consolidação da indústria pesada no final dos anos 50 e 60, com mobilização de vultosos recursos, públicos e privados, e com incentivos governamentais). Período que marcou o auge do modelo brasileiro de industrialização por substituições de importações.

Como resultado de desdobramentos de uma configuração econômica que se consolida a partir do momento de integração produtiva, a economia regional “passou a acompanhar de perto o crescimento da economia brasileira (perío-do 1960-75) e até a superá-lo (1975-80).” (GUIMARÃES NETO, 1997, p. 47). Diversificação industrial, modernização de espaços agrícolas (sobretudo com o avanço de economias de irrigação), expansão de um terciário “moderno”, parti-cularmente em grandes centros urbanos metropolitanos e em capitais de Estados, ao lado do contraponto da expansão da economia informal, constituem marcos da configuração econômico-social rural e urbana da economia nordestina. Era um quadro que também refletia questões (estrutura fundiária concentrada, atraso edu-cacional) não enfrentadas pelo mesmo Estado que promoveu imensa expansão industrial no País, com reflexos consideráveis sobre o espaço econômico-social brasileiro, gerando profundas marcas nos centros urbanos do País. Tais marcas se expressam no mercado de trabalho, esfera que reflete expressivos impactos de mudanças na estrutura produtiva.

A propósito dessa temática, é útil que se retomem argumentos de Araújo; Souza e Lima (1997), com respeito a traços evolutivos do Nordeste açucareiro – do qual, desde cedo, emergiriam elementos que iriam contribuir para a formação de um mercado de trabalho que espelhava a desigualdade enraizada no ambiente socioeconômico regional.

Araújo; Souza e Lima (1997) identificam – a partir da literatura sobre o de-senvolvimento da região – duas fases do desenvolvimento do Nordeste no século XX: a) relativo isolamento regional e letargia, herança de recorrentes e prolongadas crises do setor primário-exportador, tal isolamento sendo expressão regional da fase nacional de formação das economias regionais, nas primeiras décadas do século XX; b) crescente articulação regional, notadamente com o Sudeste do País, inicialmente na década de 40 e, em particular, nos anos 50 (“etapa concorrencial”), e a partir dos anos 60 pós-Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), de “integração da estrutura produtiva inter-regional”, via transferência de capitais – incentivada pelo Estado – de regiões mais desenvolvidas do País (principalmente o Sudeste) para o Nordeste, o que propicia uma fase de dinamismo. Passa-se a ter

Page 112: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

112

uma política de desenvolvimento regional, centrada na ampliação e na consolidação da atividade industrial, o que inclui fomento à modernização, sendo a indústria têxtil um objeto dessa estratégia – a partir dos anos 60.

Interessa destacar que essa política de desenvolvimento, fomentando um certo padrão de modernização do Nordeste, acoplava-se a um processo de inte-gração inter-regional, o que naturalmente também contribuía para a integração de mercados de trabalho. Por razões que não cabem no escopo deste estudo, o que veio a ser o mercado de trabalho no País terminou por ter a marca nacional da informalidade e da precarização das condições de trabalho, ao que se vêm adicionar maiores níveis de desemprego ou desocupação, em particular a partir dos anos 90. Nesse contexto, o Nordeste materializa um mercado de trabalho cujo funcionamento e características refletem, como já assinalado, a permanência de uma estrutura fundiária marcada pela desigualdade, o que alimenta intensos fluxos migratórios e contribui para o rebaixamento de salários. Por outro lado, o também mencionado atraso educacional traz, para o mercado de trabalho, um problema que desde a instituição de políticas de desenvolvimento (nacional e regional) constitui um fator de entrave ao desenvolvimento. A propósito, Araújo; Souza e Lima (1997, p. 72) assinalam:

O Nordeste “enfrenta desvantagem no que respeita à qualificação da mão-de-obra” e a “indicadores sociais básicos, num momento em que fica evidente que o novo padrão tecnológico exige níveis de escolaridade e de conhecimento geral bem acima da média regional”, o que chama “atenção para problemas reais relativos ao mercado de trabalho regional”, do que decorreria que “soluções têm importantes elos com decisões de política macroeconômica e com a retomada da formulação e execução de programas nacionais e regionais de desenvolvimento, certamente em bases novas relativamente ao tipo de planejamento e de incentivos que predominou até os anos 70”.

Por outro lado, os referidos autores já ponderavam que a região

comporta grande heterogeneidade de situações na qual, no quadro geral de atraso e de lamentáveis indicadores sociais, existem pólos locais de crescimento (fruticultura, agricultura de grãos, petroquímica, serviços) com boa capacidade de ge-ração de empregos. (ARAÚJO; SOUZA; LIMA, 1997, p. 72).

De fato, os resultados da política de desenvolvimento regional inaugurada nos anos 60 são amplos, aqui se destacando o que mais diretamente se vincula à natureza da análise procedida neste estudo. Registre-se que os anos 60 marcam

Page 113: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

113

uma diferenciação regional em que alguns estados se beneficiam mais cedo dos desdobramentos regionais do auge do modelo de industrialização por substitui-ção de importações, do qual a política de desenvolvimento do Nordeste veio a ser uma peça importante. A Bahia, com o Polo Petroquímico de Camaçari, e o Maranhão, com o complexo de ferro, são exemplos típicos. (ARAÚJO, 1997).

Nesse contexto, Pernambuco constitui uma singularidade e – apesar de atu-almente considerado uma economia relativamente diversificada – atravessou as décadas de crise e estagnação dos anos 80 e 90 mantendo, apesar de transfor-mações industriais fomentadas pela política de desenvolvimento regional, traços de uma economia cuja bússola é fortemente influenciada pela atividade sucroal-cooleira, segmento que veio a também incorporar processos de modernização tecnológica, mas que mantém nítidas marcas do passado.

Ocorre que – nesse quadro regional de avanço e transformação industrial – a economia pernambucana, em contraste com a economia baiana9, só recentemente passou a contar com maior impulso de ampliação e diversificação do Complexo Portuário-Industrial de Suape, particularmente depois de um maior influxo de recursos públicos e privados, em especial investimentos referentes à implantação de uma refinaria de petróleo e de um estaleiro naval, o que já exerce efeito de atração de novos projetos.

Elementos característicos dessa expansão industrial – que constituem traços da expansão que se dá em manchas de industrialização em diversas regiões do País – compreendem: i) crescimento industrial fundado no tripé “capital estatal, capital estrangeiro e capital privado nacional”; ii) acelerada urbanização – traço típico da industrialização brasileira; iii) inserção de espaços regionais na lógica do modelo nacional de industrialização.

Portanto, a economia brasileira – estabelecida a integração entre as regiões, consolidados polos regionais de crescimento, observados o desenvolvimento e o ocaso de um sistema de planejamento regional – consolidou-se como espaço nacional que dispõe de moderno setor industrial, amplo e moderno segmento terciário, e um segmento de moderno agronegócio que contribui expressivamen-te para as exportações do País. No entanto, o País – em particular o Nordeste – permanece com considerável atraso na pequena produção agrícola de caráter familiar e carrega marcas fortes de desigualdade, a despeito de relativa queda do 9 Sabe-se que já nos anos 70 a Bahia se beneficiava de um processo de descentralização industrial,

quando passou a abrigar, na Região Metropolitana de Salvador, um importante complexo de ativida-des industriais – o já referido Polo Petroquímico de Camaçari.

Page 114: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

114

coeficiente de GINI da distribuição da renda do trabalho, a partir de 1995 – um dos indicadores mencionados na seção seguinte. Por outro lado, considera-se que o País tem um mercado de trabalho nacional integrado e unificado – com caracte-rísticas de desigualdade social que permeiam todo o espaço nacional. No entanto, diferenças regionais persistem – inclusive no fato de que o Nordeste mantém maiores índices de desigualdade e de pobreza. Estabelecer uma discussão sobre diferenças entre o Sudeste e o Nordeste, reveladas no mercado de trabalho, é objetivo da próxima seção.

5.2 – Mercado de Trabalho no Nordeste e no Sudeste: Traços Estruturais

A análise até aqui conduzida sugere que o Nordeste e o Sudeste têm, na formação socioeconômica e na consolidação industrial, especificidades que dife-renciam as duas regiões e que alimentam disparidades, em termos inter-regionais. Por outro lado – em particular no que se refere ao espaço urbano – o mercado de trabalho no Brasil possui marcas (desemprego e precarização das relações de trabalho) que estão associadas a reflexos, nesse mercado, de fatores geradores de desigualdade, particularmente quanto à estrutura de apropriação de ativos (terra, capital, educação). Em outros termos: qualquer que seja o macroespaço socioe-conômico no País (Nordeste, Sudeste ou qualquer outra região), é forte o traço da desigualdade distributiva e, portanto, da desigualdade social; no entanto, quando se comparam regiões, percebem-se diferenças entre espaços – sendo a compara-ção Nordeste-Sudeste uma oposição exemplar na literatura sobre desigualdades regionais no País, dada a importância histórica das duas regiões na formação do espaço econômico-social brasileiro e também pelo fato de que tais regiões repre-sentam cerca de 70% da força de trabalho nacional (população economicamente ativa). Ademais, como visto na seção anterior, as duas regiões constituem – na história da formação econômico-social brasileira – dois polos associados a ciclos fundamentais dessa formação: o açucareiro e o do café, cuja evolução tem pri-mórdios ainda no regime de trabalho escravista; portanto, trata-se de raízes que precedem a formação do mercado de trabalho brasileiro e que têm vinculação com o perfil de desigualdade que se revela nessa esfera da economia.

Neste sentido, é importante que, de antemão, sejam recuperadas informa-ções sobre PIB e população no País – observando-se a evolução dessas duas variáveis básicas que devem sempre ser consideradas em estudos sobre mercado

Page 115: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

115

de trabalho. Com base em dados disponíveis no IPEADATA10, extraem-se as seguintes constatações, considerado o ano base de 1980 – quando o Brasil deu o último suspiro de crescimento do período de industrialização por substituição de importações:

a) Até 1994, o PIB per capita seguia em compasso de estagnação, sem recu-perar consistentemente o nível de 1980 (6.710, em US$ de 2008; 12.310, em R$ de 2008).

b) Só a partir de 1995 (PIB per capita de 6.780, em US$ de 2008) o ritmo melhora, para 1,7% ao ano na média, até alcançar US$ 8.310 em 2008 (em dólares do próprio ano).

c) No período que engloba a fase favorável da economia mundial, de 2004 a 2007, o crescimento é maior: 2,85% ao ano, mas o ritmo de crescimento popula-cional se reduziu de 1,314% para 1,045%.

d) No longo prazo (1981 a 2008), o PIB per capita cresceu menos de 1% (0,767%) ao ano, a despeito da redução do ritmo de crescimento populacional – de 2,350% em 1981 para 1,045% em 2008.

Tais números evidenciam fatos que precisam, sempre, ser considerados em estudos sobre a esfera da economia – o mercado de trabalho – que recebe im-portantes impactos do que ocorre nas matrizes de produção e distribuição do sistema econômico e na política macroeconômica11. Observa-se que a recupera-ção recente da economia brasileira se deu a um ritmo modesto a partir de 1995, e ganhou maior aceleração no período 2004-2008; neste período recente conta-se com influência da conjuntura de crescimento da economia mundial e também da demanda interna impulsionada por aumentos reais do salário mínimo, por ex-pansão do crédito pessoal e por maior volume de recursos de programas federais de transferência de renda, além de efeitos multiplicadores da atividade expor-tadora beneficiada por grande expansão da demanda externa por commodities industriais e agrícolas; trata-se, no entanto, de um crescimento modesto quando confrontado com o contingente populacional do País, o que se traduz em per- 10 Disponível em: <www.ipea.gov.br/ipeadata>.

11 Interessa ponderar que o mercado de trabalho não é uma instância meramente reflexa do que ocor-re em outras esferas da economia; de fato, eventos típicos do mercado de trabalho – em particular aqueles voltados para a disputa distributiva entre salários e lucros, assim como fatores de discrimina-ção ou fatores sancionadores de desigualdades, expressos nessa esfera – podem gerar impactos que se refletem na microeconomia das empresas e na configuração do sistema econômico.

Page 116: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

116

manência de níveis elevados de desocupação da força de trabalho, a despeito de uma desaceleração da taxa de desemprego no período 2002-2009 (1º. semestre)12.

Um primeiro conjunto de informações que propiciam analiticamente esta-belecer-se diferenciação entre as duas macrorregiões é apresentado na Tabela 1.

Um observador atento desses números – que cobrem os primeiros oito anos da presente década, quando se consolidam no País ganhos e perdas da inédita, pela duração, estabilidade monetária – pode extrair importantes constatações, com vistas à identificação de traços do mercado de trabalho nas regiões Nordeste e Sudeste e como se configuram, nessas regiões, certas características estruturais desse mercado.

Tabela 1 - Nordeste e Sudeste do Brasil - Pessoas de 10 Anos ou Mais de Idade, segundo Condição de Atividade e de Ocupação na Semana de Referência

Especificação2001 2008

Nordeste Sudeste Nordeste Sudeste

Total(1) 38.195 61.278 44.124 68.919

Economicamente ativas 22.516 36.628 26.546 42.712

Ocupadas 20.551 32.652 24.549 39.397

Desocupadas 1.965 3.976 1.997 3.315

Não economicamente ativas 15.679 24.650 17.578 26.207Fonte: Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD)/IBGE. (1) Não consideradas pessoas que não declararam condição de atividade.

Considere-se, como ponto de partida, que o contingente de pessoas eco-nomicamente ativas das duas regiões tomadas conjuntamente forma – em 2008 – um total de cerca de 69,3 milhões. Ou seja, trata-se de expressiva representação da força de trabalho do País e isso implica que, a despeito de especificidades que possam ser identificadas em outras regiões, resultados analíticos de um estudo centrado no Sudeste e no Nordeste dizem muito do que constitui o mercado de trabalho brasileiro.

12 Taxa de desemprego aberto (30 dias), do IBGE, dados mensais até julho 2009. Entre março de 2002 e julho de 2009, a taxa de desemprego saiu de picos de 13% (março 2002 - março 2004), para picos sempre inferiores aos antecedentes, até julho 2009. Portanto, a curva de desemprego descreve uma tendência decrescente – particularmente de 2004 a 2007, embora taxas de desemprego aber-to na faixa de 8% a 9% (na primeira metade de 2009) ainda sejam bastante altas, se considerado também o fenômeno do subemprego e da informalidade – embora decrescente, a informalidade (medida pela proporção, sobre a população ocupada, do contingente representado por assalariados sem carteira profissional, trabalhadores por conta própria e trabalhadores não remunerados) ainda se situava, em 2007, acima da marca de 50%. Disponível em: <www.ipea.gov.br/ipeadata>.

Page 117: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

117

Com respeito à dinâmica do mercado de trabalho, o crescimento da Popu-lação Economicamente Ativa (PEA) revela-se diferenciado entre as duas regiões, no período 2001-2008. De fato, os valores apresentados na Tabela 1 refletem um crescimento anual da força de trabalho no Nordeste (2,4%), um pouco acima do observado no Sudeste (2,2%). Por outro lado, a evolução da taxa de ocupação, associada ao que se observa sobre a taxa de participação, traduz uma dinâmica em que o maior ritmo de expansão da força de trabalho, no Nordeste, é acompanha-do de menor incremento, no período como um todo, do contingente de ocupados (19,5% no Nordeste; 20,7% no Sudeste) – o espelho disso sendo ampliação do contingente de desempregados na primeira região (1,6%) e decréscimo de 16,6% na segunda. Significa, portanto, que no período em destaque, quando a economia brasileira passa por recuperação da capacidade de geração de empregos, o Sudeste responde melhor ao processo - já que, nesta região, o ritmo de crescimento da ocupação supera o da PEA por um diferencial acima do observado no Nordeste. E isso pode ser claramente notado na evolução da taxa de desocupação nas duas regiões: no Nordeste, esse indicador se reduz, no período, de 8,7% para 7,5%; no Sudeste, de 10,9% para 7,8% - evidenciando que esta última região se beneficia de maior decréscimo do nível de desemprego.

A tarefa de se buscar qualificar o que ocorre no mercado de trabalho das duas regiões, no período de referência da análise, ganha elementos adicionais ao se incorporar o conjunto de informações apresentadas nas Tabelas 2 e 3, que introduzem a questão de gênero.

Tabela 2 - Nordeste e Sudeste do Brasil - Homens com 10 Anos ou Mais de Idade, segundo Condição de Atividade e de Ocupação

2001/2008 (em mil pessoas)

Especificação2001 2008

Nordeste Sudeste Nordeste Sudeste

Total(1) 18.447 29.302 21.345 32.926

Economicamente ativas 13.300 21.093 15.266 23.726

Ocupadas 12.381 19.228 14.398 22.402

Desocupadas 919 1.865 868 1.324

Não economicamente ativas 5.147 8.209 6.079 9.200Fonte: Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD)/IBGE. (1) Não consideradas pessoas que não declararam condição de atividade.

Page 118: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

118

Tabela 3 - Nordeste e Sudeste do Brasil - Mulheres com 10 Anos ou Mais de Idade, segundo Condição de Atividade e de Ocupação na Semana de Referência

2001/2008 (em mil pessoas)

Especificação2001 2008

Nordeste Sudeste Nordeste Sudeste

Total(1) 19.748 31.976 22.779 35.993

Economicamente ativas 9.216 15.535 11.280 18.985

Ocupadas 8.170 13.424 10.151 16.995

Desocupadas 1.046 2.111 1.129 1.990

Não economicamente ativas 10.532 16.441 11.499 17.008Fonte: Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD)/IBGE. (1) Não consideradas pessoas que não declararam condição de atividade.

Um aspecto a ser destacado é o fato de que o crescimento da PEA masculina no Nordeste é de 2,0% ao ano, e 1,7% ao ano no Sudeste. Por outro lado, em ambas as regiões o crescimento da PEA tem peso significativo do contingen-te feminino (que cresce a 2,9% ao ano no Nordeste, mesmo ritmo observado no Sudeste). No que diz respeito a ocupação e a desemprego, no entanto, nas duas regiões o segmento masculino da PEA se beneficia mais da recuperação: no Nordeste, a redução da taxa de desocupação entre os homens (6,9% para 5,7%) corresponde a 17,4%, enquanto entre as mulheres tal redução é bem menor (de 11,3% para 10,0%, um decréscimo de 11,5%); no Sudeste – 36,4% de redução na desocupação da força de trabalho masculina, e de 22,8% entre as mulheres. Tais proporções e variações refletem mudanças relativas nas taxas de desemprego em cada grupo, segundo gênero; quando se observa, no entanto, a variação per-centual do contingente de desempregados, entre homens e entre mulheres, uma particularidade é explicitada: apenas a fração feminina da força de trabalho do Nordeste revela aumento do número absoluto de pessoas desempregadas (1.046 para 1.129), entre os anos de 2001 e 2008; no outro extremo, a fração masculina da força de trabalho do Sudeste revela a maior redução do número de desempre-gados (1.865 para 1.324).

Essa particularidade é explicada pelo confronto entre evolução da PEA e evolução da população ocupada. Os dados apresentados nas Tabelas 2 e 3 infor-mam: a) o crescimento da PEA feminina é, nas duas regiões, muito maior que o da PEA masculina (incremento total de mais de 22% no primeiro caso contra 12,5% da PEA masculina no Sudeste e 14,8% no Nordeste; b) o incremento da população ocupada também é muito maior no que se refere às mulheres (26,6% no

Page 119: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

119

Sudeste; 24,2% no Nordeste), o que revela uma forte dinâmica de geração de ocu-pações para o contingente feminino; c) no entanto, enquanto os incrementos da PEA e da população ocupada se aproximam no caso das mulheres, entre os homens o diferencial é muito maior: 16,5% de aumento da população ocupada versus 12,5% de incremento da PEA, no Sudeste; e respectivamente 16,3% versus 14,8% no Nor-deste. E é na força de trabalho feminina do Nordeste que ocorre a maior aproxi-mação entre aumento da PEA (22,4%) e aumento da força de trabalho ocupada (24,2%): o grande aumento da ocupação foi compensado por forte aumento da procura por trabalho, do que resultou um incremento do efetivo de desempregados.

Portanto, quando se observa o aspecto gênero, nas duas regiões o quadro de desemprego revela viés favorável aos homens, a despeito da forte dinâmica de geração de ocupações entre as mulheres; e a fração feminina da força de trabalho nordestina sofre o pior resultado líquido, expresso no aumento do nível de deso-cupação. Em termos de confronto entre as duas regiões, a situação é francamente favorável ao Sudeste, tanto no que se refere aos homens quanto às mulheres

Pode-se agora – via informações apresentadas nas Tabelas 4 e 5 – examinar a distribuição etária da força de trabalho ocupada, segundo gênero – observando-se o padrão da composição desse contingente nas duas regiões.

Tabela 4 - Nordeste e Sudeste do Brasil - Distribuição Percentual das Pessoas Ocupadas do Sexo Masculino, segundo Grupos de Idade

2001/2008

GRUPOS DE IDADE (anos)

2001 2008

Nordeste Sudeste Nordeste Sudeste

Total 100,0 100,0 100,0 100,0

10 a 14 5,4 1,5 3,0 0,7

15 a 17 6,3 3,5 4,5 2,9

18 ou 19 5,2 4,6 4,2 4,0

20 a 24 13,5 13,3 13,5 12,0

25 a 29 12,5 13,1 13,4 13,4

30 a 39 22,6 25,4 22,9 23,6

40 a 49 16,1 20,9 18,6 21,8

50 a 59 10,5 11,4 11,8 14,3

60 ou mais 7,9 6,2 8,0 7,2

Fonte: Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD)/IBGE.

Page 120: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

120

Tabela 5 - Nordeste e Sudeste do Brasil - Distribuição Percentual das Pessoas Ocupadas do Sexo Feminino, segundo Gru-pos de Idade

2001/2008

GRUPOS DE IDADE (anos)

2001 2008

Nordeste Sudeste Nordeste Sudeste

Total 100,0 100,0 100,0 100,0

10 a 14 3,9 1,0 2,0 0,5

15 a 17 4,6 3,3 3,0 2,1

18 ou 19 4,1 4,6 3,7 3,4

20 a 24 12,8 13,9 12,1 11,8

25 a 29 12,6 13,1 13,6 13,6

30 a 39 25,1 26,7 24,9 25,5

40 a 49 19,0 22,3 20,9 23,2

50 a 59 11,4 10,5 12,9 13,9

60 ou mais 6,5 4,6 7,0 5,9Fonte: Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD)/IBGE.

Deve-se notar que, tanto entre homens quanto entre mulheres, as duas regiões mantêm – nos estratos do intervalo de 20 a 39 anos de idade – composição bem similar, nos dois anos destacados. Diferença notável é observada no que se refere a estratos de menores de idade (10 a 17 anos), pelo que se observa – nos dois anos, tanto entre homens quanto entre mulheres – uma bem maior proporção no Nordeste comparativa-mente ao Sudeste. Tal evidência reflete a maior presença relativa, na região menos desen-volvida, do segmento informal da economia, no qual o trabalho de menores de 18 anos desempenha expressivo papel. Mas também se deve destacar o fato de que, entre os dois anos, há – em ambas as regiões – redução relativa desse contingente, o que é resultado da recuperação do mercado de trabalho via aumento da renda média do trabalho, além de possíveis efeitos de políticas públicas que contribuem para reduzir a participação, em cada domicílio, de menores de idade na geração da renda domiciliar.

Aos aspectos até aqui contemplados deve ser acrescentado algo que, como elemento estrutural, pertence à esfera da formação histórica e da consolidação do mercado de trabalho urbano na industrialização brasileira: a ocorrência de relações informais de trabalho em proporção que – a despeito de desaceleração recente – permanece extremamente elevada. De fato, trata-se de um aspecto que já brotava da análise até aqui conduzida.

Page 121: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

121

São várias as formas de se estimar o grau de informalidade no mercado de tra-balho brasileiro. Para efeito deste artigo, destaquemos duas. Na primeira, bastante utilizada na literatura sobre mercado de trabalho no Brasil, a taxa de informalidade é estimada pelo quociente “(empregados sem carteira + trabalhadores por conta pró-pria + não-remunerados)/(total de pessoas ocupadas)”. Essa forma de medição da informalidade deve superestimar o fenômeno, tendo-se em conta que parte dos traba-lhadores por conta própria (profissionais liberais, por exemplo) não estão inseridos no segmento informal do mercado de trabalho; apesar disso, fornece uma dimensão da precariedade do emprego na economia e, como tal, serve como indicador de tendên-cia da informalidade nas relações de trabalho.

A segunda forma de estimação, também utilizada em estudos acadêmicos, é dada pela proporção, na força de trabalho, dos indivíduos que não contribuem para a previdência social. Trata-se de estimativa razoável da informalidade, por refletir, com proximidade – conforme um indicador de inserção formal, legal, no mercado de trabalho – o grau de precariedade da inserção ocupacional de impor-tante fração da população ocupada. Neste caso, pode-se argumentar que haveria algum viés de subestimação, já que um trabalhador autônomo (a exemplo de en-canador, eletricista, marceneiro), que contribua para a previdência via recolhimen-to pela Guia da Previdência Social (GPS), seria considerado como pertencente ao segmento formal do mercado de trabalho. De todo modo, não há estimativa livre de alguma objeção – o que não impede que seja usada para se avaliar a dimensão do fenômeno. Ademais, como se observa a partir de informações divulgadas por instituições de pesquisa, a curva da taxa de informalidade – a despeito de uma tendência de queda em período recente – revela uma ainda muito alta dimensão do fenômeno no panorama social brasileiro. É o que se observa a partir de dados publicados pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), que – segun-do a primeira forma de estimação aqui destacada – apontam para um grau de informalidade, no País, de 56,8% em 1992, e 50,9% em 2007.

Quando se considera o critério do recolhimento de contribuição previdenciária, a tendência de redução do grau de informalidade também é observada, agora em se tratando de duas regiões que conjuntamente representam cerca de 70% da força de tra-balho do País. De fato, segundo dados de PNADs, por esse critério a informalidade nas duas regiões focadas neste artigo alcançava, em 2001, algo como 72,3% no Nordeste e 43,3% no Sudeste; e as respectivas proporções teriam evoluído para 66,1% e 37,1% em 2008 - revelando uma redução proporcionalmente maior na região mais desenvolvida.

Portanto, as duas estimativas mencionadas sugerem a mesma tendência de redução da informalidade, ao mesmo tempo em que evidenciam que é muito alta

Page 122: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

122

– principalmente no Nordeste – a precariedade das relações de trabalho, chegando a se aproximar dos 40% na região cuja economia é, no âmbito nacional, a mais de-senvolvida. Isso significa que, mesmo na região que representa o eixo fundamental da moderna economia brasileira há importante fração da força de trabalho que opera com nível de produtividade bem abaixo do que se espera de uma economia cujo perfil, em termos globais, qualifica-a entre as maiores no plano internacional.

Informações sobre a distribuição da força de trabalho segundo a posição ocupacional em que os indivíduos ou grupos se inserem no mercado – ver Tabela 6 – suplementam a análise aqui conduzida, propiciando visão de pontos de con-tato com a questão da informalidade no mercado de trabalho.

Os grupos ocupacionais de empregados remunerados e de empregadores seriam a melhor aproximação do mercado formal de trabalho. O grupo de trabalhadores por conta própria é – conforme alguns critérios empíricos – associado a relações informais, embora uma parte desse grupo seja constituída de profissionais liberais. Os empregados não-remunerados, os trabalhadores na produção para consumo próprio ou na constru-ção para o próprio uso constituem estratos típicos da informalidade. Por outro lado, se o recolhimento previdenciário for utilizado como critério de corte, pode ser identificada alguma proporção de informalidade nos grupos de empregados remunerados e empre-gadores, e proporção majoritária no grupo dos trabalhadores por conta própria.

Tabela 6 - Nordeste e Sudeste do Brasil - Distribuição Percentual das Pessoas Ocupadas, segundo Posição na Ocupação

2001/2008

GRUPOS DE IDADE (anos)

2001 2008

Nordeste Sudeste Nordeste Sudeste

Empregados remunerados 50,0 70,0 54,8 73,4

Empregados não-remunerados 12,8 3,7 8,3 2,4

Conta Própria 28,1 19,1 24,8 17,4

Empregadores 2,7 4,8 3,3 4,7

Trabalhador na produção para o próprio consumo 6,2 2,1 8,6 1,9

Trabalhador na construção para o próprio uso 0,1 0,2 0,1 0,1

TOTAL 100,0 100,0 100,0 100,0Fonte: Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD)/IBGE.

Tendo-se em conta tais qualificações, pode ser observado que, entre os anos 2001 e 2008, fica evidente – nas duas regiões – o crescimento da participação de em-

Page 123: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

123

pregados remunerados no conjunto da população ocupada, o que pode ser associado à expansão de postos de trabalho com carteira assinada, fenômeno que vem acompa-nhando a recuperação recente da economia brasileira, e que teve no Nordeste notável expressão. A significativa redução da proporção de trabalhadores não-remunerados constitui outra evidência do fenômeno diminuição da taxa de informalidade, con-forme observado via indicadores correntemente utilizados na literatura. Permanece evidente a diferenciação regional já observada com respeito a taxas de informalidade, quando se identifica a bem maior proporção dos empregados na população ocupada, no Sudeste (73,4%), comparativamente ao Nordeste (54,8%).

Por outro lado, uma diferenciação regional corrobora conhecido quadro que resiste à passagem do tempo: maior proporção, no Nordeste, de trabalhadores por conta própria e de não-remunerados também ilustra a maior importância re-lativa, na região menos desenvolvida, do fenômeno da informalidade no mercado de trabalho, com óbvios reflexos sobre diferenças entre perfis de distribuição da renda do trabalho das duas regiões.

A essa caracterização da força de trabalho nas duas regiões em destaque neste artigo pode-se adicionar um aspecto que é obviamente fundamental para qualificar o potencial da força de trabalho, em termos de produtividade. Trata-se de informações concernentes ao nível educacional da mão-de-obra. As Tabelas 7 e 8 contêm números que permitem avaliar tal elemento contemplando-se diferenciação entre gêneros.

Com respeito ao atributo educação, destaque-se que a melhor posição relati-va é, em 2008, alcançada pelas frações feminina e masculina da força de trabalho do Sudeste: 9,2 e 8,4 anos de escolaridade; são valores que respectivamente se distanciam das médias de 8,2 e 7,3 registradas em 2001, e que estão bem acima das verificadas para o Nordeste – 7,3 (mulheres) e 5,9 (homens), em 2008. Embora obviamente se trate de notável melhora do grau de escolaridade, deve-se ter em conta pelo menos as seguintes qualificações: i) mesmo a mais alta média alcança-da pelas mulheres no mercado de trabalho do Sudeste se traduz em nível ainda abaixo do que representaria conclusão do ensino fundamental completo; ii) tais indicadores são apenas médias, sem consideração de eventual descontinuidade de escolarização de parcela das pessoas ocupadas e, tampouco, sem filtro com respeito a desigualdades de distribuição do acesso a educação de boa qualidade. Isso significa, portanto, que tais médias escondem situações ainda mais precárias em termos de qualificação da força de trabalho no que diz respeito a estratos com maior dificuldade de acesso a educação.

Page 124: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

124

Tabela 7 - Nordeste e Sudeste do Brasil - Número Médio de Anos de Estudo das Pessoas Ocupadas do Sexo Masculino, segundo Grupos de Idade

2001/2008

GRUPOS DE IDADE (anos)

2001 2008

Nordeste Sudeste Nordeste Sudeste

TOTAL 4,4 7,3 5,9 8,4

10 a 14 2,5 4,6 3,4 5,0

15 a 17 4,1 7,0 5,6 7,7

18 ou 19 5,0 8,2 7,1 9,1

20 a 24 5,4 8,4 7,7 9,9

25 ou mais 4,3 7,2 5,6 8,2Fonte: Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD)/IBGE.

Tabela 8 - Nordeste e Sudeste do Brasil - Número Médio de Anos de Estudo das Pessoas Ocupadas do Sexo Feminino, segundo Grupos de Idade

2001/2008

GRUPOS DE IDADE (anos)

2001 2008

Nordeste Sudeste Nordeste Sudeste

TOTAL 5,8 8,2 7,3 9,2

10 a 14 3,2 5,1 4,2 5,4

15 a 17 5,1 7,8 7,0 8,5

18 ou 19 6,7 9,3 8,6 10,2

20 a 24 7,5 9,8 9,3 10,8

25 ou mais 5,6 7,9 7,0 9,0Fonte: Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD)/IBGE.

Também se destaca a grande disparidade entre médias globais de escolarida-de, no confronto Nordeste-Sudeste, naturalmente de forma desfavorável à primeira região. Trata-se de diferencial em 2008, entre os homens, de 2,5 pontos percentuais (5,9 versus 8,4 anos); entre as mulheres, diferencial de 1,9 ponto – 7,3 versus 9,2 anos. Mas é importante que se observe a aproximação entre as regiões quando se trata de particularizar os estratos de 18 a 24 anos: as disparidades regionais são bem menores, revelando possível efeito de avanços educacionais e de maior esforço de qualificação da população, em resposta a demandas do mercado de trabalho. Na verdade o diferen-cial também se reduz significativamente no estrato de 15 a 17 anos. O mais notável, no entanto, é que a redução de disparidade regional é mais acentuada entre as mulheres,

Page 125: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

125

particularmente nos estratos de 18 a 24 anos – o que aparentemente expressa maior determinação da mão-de-obra feminina em busca de qualificação, com o intento de enfrentar práticas de discriminação, embora – como será visto neste artigo – diferen-ças de remuneração entre homens e mulheres ainda persistam a despeito da maior média de escolaridade do contingente feminino (como atestam as Tabelas 7 e 8), o que constitui uma fonte de desigualdade gerada no mercado de trabalho.

Os traços do mercado de trabalho nas duas regiões confrontadas na análise empreendida neste trabalho dizem respeito a elementos concernentes à estrutura desse mercado e a características da população ocupada. São aspectos que pro-duzem impactos sobre a produtividade do trabalho, afetando também o perfil da distribuição da renda do trabalho e contribuindo para explicar situações de insuficiência de renda de vários estratos da população.

A questão distributiva é, então, incorporada à análise, com apoio em informações sistematizadas nas Tabelas 9 a 12, que propiciam examinar-se inclusive a disparidade entre homens e mulheres quando se trata de recompensa monetária pelo trabalho.

Uma primeira constatação – ver Tabela 9 – é a grande disparidade Nordeste-Sudeste no que respeita à proporção, na força de trabalho ocupada, de pessoas com até um salário mínimo de remuneração.

Tabela 9 - Distribuição Percentual da População em Idade Ativa, Ocupada na Semana de Referência, por Região, segundo

Classe de Rendimento Mensal de Todos os Trabalhos2001/2008

Classes de rendimentos (em unidades de salário

mínimo)

2001 2008

Nordeste Sudeste Nordeste Sudeste

Até 01 SM 41,0 16,5 48,2 20,8

Mais de 01 a 2 SM 21,3 27,0 20,4 35,7

Mais de 2 a 5 11,6 30,4 9,6 26,0

Mais de 5 a 10 SM 3,2 10,8 2,5 6,7

Mais de 10 SM 2,2 6,9 1,5 3,5

Sem rendimento 19,5 6,3 16,8 4,5

Sem declaração 1,1 2,2 1,0 2,8

Total 100,0 100,0 100,0 100,0Fonte: Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD)/IBGE.

Page 126: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

126

No Nordeste, o estrato de pessoas na faixa-teto de um salário mínimo representava – em 2001 – 41% da força de trabalho ocupada, proporção que evolui para 48,2% em 2008; no Sudeste os percentuais alcançam 16,5% e 20,8%. Trata-se de diferença que reflete, entre outros possíveis fatores, maior proporção de relações informais de trabalho na região menos desen-volvida, assim como um padrão inferior de qualificação da mão-de-obra, como já observado neste trabalho. Por outro lado, deve ser notado que é crescente em ambas as regiões a proporção de pessoas ocupadas com remuneração até um salário mínimo – o que sugere que a recuperação do mercado de trabalho em período recente se dá principalmente com geração de ocupações com baixa remuneração, mesmo no segmento formal do mer-cado. De fato, o peso relativo de estratos de pessoas ocupadas com remune-ração superior a dois salários mínimos é decrescente, no período analisado, em ambas as regiões. Ademais, enquanto no Nordeste o estrato de pessoas ocupadas com mais de um até dois salários mínimos praticamente perma-nece com a mesma proporção (em torno de 20%), no Sudeste o percentual se amplia de 27,0% para 35,7%. Dessa forma, 56,5% do pessoal ocupado no mercado de trabalho do Sudeste auferia, em 2008, remuneração máxima de dois salários mínimos, enquanto, em ambas as regiões, se reduz o peso relativo dos estratos acima de cinco salários mínimos – uma evidência que qualifica a redução do Índice de Gini observada no Brasil, nos últimos anos. Portanto, o perfil distributivo permanece em um patamar que reflete, de fato, uma grande e persistente desigualdade, além de sinais de insuficiência de renda para expressiva parcela da força de trabalho brasileira.

Outras informações – ver Tabelas 10, 11 e 12 – permitem que se exa-mine outro aspecto, agora concernente a um resultado da dinâmica recente do mercado de trabalho. Trata-se de como evolui, em termos reais, a remu-neração média mensal do trabalho nas duas regiões. Para a força de trabalho ocupada como um todo (Tabela 10), entre 2004 e 2008 o rendimento médio mensal real do trabalho – a preços de setembro de 2008 – cresce de R$ 439 para R$ 568, no Nordeste; e de R$ 975 para R$ 1.123, no Sudeste. Significa que na primeira região o rendimento médio do trabalho foi multiplicado por 1,29385, enquanto no Sudeste o multiplicador foi menor (1,15179). Tal crescimento diferenciado com viés pró-Nordeste se traduz em redução da disparidade entre a média do Sudeste e a média do Nordeste (no entorno de 2,2 até 2007), acelerando-se tal decréscimo em 2008 – quando a relação Sudeste/Nordeste passa a ser 2,0 – como resultado do grande diferencial de crescimento médio, em 2008, do rendimento do trabalho no Nordeste (7,6%) versus apenas 0,8% no Sudeste.

Page 127: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

127

Tabela 10 - Rendimento Médio Mensal Real de Todos os Trabalhos das Pessoas de 10 Anos ou Mais de Idade, Ocupadas na Semana de Referência

2004/2008

ANOS NORDESTE SUDESTE RELAÇÃO SUDESTE/NORDESTE

2004 439 975 2,2

2005 454 1.020 2,2

2006 518 1.089 2,1

2007 528 1.144 2,1

2008 568 1.123 2,0Fonte: Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD)/IBGE.Nota: Rendimento médio em R$ de 2008 (INPC, setembro 2008=100).

Tabela 11 - Rendimento Médio Mensal Real de Todos os Trabalhos das Pessoas do Sexo Masculino, de 10 Anos ou Mais de Idade, Ocupadas na Semana de Referência

2004/2008

ANOS NORDESTE SUDESTE RELAÇÃO SUDESTE/NORDESTE

2004 508 1.155 2,3

2005 523 1.200 2,3

2006 584 1.292 2,2

2007 605 1.309 2,2

2008 648 1.321 2,0Fonte: Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD)/IBGENota: Rendimento médio em R$ de 2008 (INPC, setembro 2008=100).

Quando se faz distinção entre gêneros, pode ser observado que, de fato, o crescimento do rendimento médio, nas duas regiões, é maior entre as mulheres que entre os homens. No entanto, a distância entre rendimen-to médio dos homens e rendimento médio das mulheres se aproxima, em 2008, de um multiplicador 1,4 no Nordeste, e de 1,5 no Sudeste. Nota-se que de alguma forma o contingente feminino da força de trabalho logra reduzir diferenças atribuíveis a questões de gênero, talvez como resultado de aparente maior esforço de qualificação educacional e profissional das mulheres, embora tal redução ainda ocorra de forma mais lenta que a que seria socialmente desejável.

Page 128: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

128

Tabela 12 - Rendimento Médio Mensal Real de Todos os Trabalhos das Pessoas do Sexo Feminino, de 10 Anos ou Mais de Idade, Ocupadas na Semana de Referência

2004/2008

ANOS NORDESTE SUDESTE RELAÇÃO SUDESTE/NORDESTE

2004 340 735 2,2

2005 356 777 2,2

2006 423 827 2,0

2007 419 860 2,1

2008 456 865 1,9Fonte: Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD)/IBGENota: rendimento médio em R$ de 2008 (INPC, setembro 2008=100).

Pode-se agora incorporar um indicador sintético de desigualdade distributiva – o Índice de Gini, ver Tabela 13 –, referente ao período 1993-2008. A redução do Índice de Gini, extremo a extremo da série, é realmente considerável: de 0,643 para 0,546 no Nordeste, e de 0,573 para 0,496 no Sudeste – o que sugere ter sido um pouco mais significativa, na primeira região, a redução da desigualdade. É importante que seja observado, no entanto, que no Nordeste a redução da desi-gualdade ocorreu com maior diferencial entre 1993 e 1995, caindo quase cinco centésimos – o que pode ser associado ao impacto distributivo do Plano Real, beneficiando as camadas sociais de menor renda, com maior representação nesta região. Ademais, o mercado de trabalho pós-Plano Real teve reduzido o nível de desemprego até 1996, depois de então seguindo uma rota de elevação do nível de desocupação da força de trabalho até a recuperação que vem se processando a partir de 2004. Depois desse maior impulso de redução, o Índice de Gini passa a decrescer mais lentamente, no Nordeste, seguindo padrão similar ao do Sudeste – padrão esse que, em ambas as regiões, revela desaceleração nos anos finais da série, de forma mais nítida no Nordeste.

Por outro lado, a relação de maior desigualdade no Nordeste, medida pelo quociente NE/SE informado na Tabela 13, não revela tendência de redução. De fato, depois da brusca redução desse quociente no início da série – reflexo de relativamente maior impacto distributivo do Plano Real no Nordeste – o valor modal dessa relação permanece no entorno de 1,08 – sem indício consistente de tendência decrescente; e, no último ano da série, a relação cresce para 1,10.

Page 129: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

129

Tabela 13 - Índice de GINI da Distribuição do Rendimento Men-sal de Todos os Trabalhos da População de 10 Anos ou Mais de Idade, Ocupadas na Semana de Referência, com Rendimento do Trabalho

1993/2008

ANOS NORDESTE SUDESTE RELAÇÃO SUDESTE/NORDESTE

1993 0,643 0,573 1,1222

1995 0,596 0,561 1,0624

1996 0,603 0,554 1,0884

1997 0,601 0,552 1,0888

1998 0,590 0,546 1,0806

1999 0,587 0,537 1,0931

2001 0,576 0,546 1,0549

2002 0,574 0,541 1,0610

2003 0,564 0,535 1,0542

2004 0,569 0,523 1.0888

2005 0,557 0,526 1.0589

2006 0,565 0,523 1,0803

2007 0,547 0,505 1,0832

2008 0,546 0,496 1,1008Fonte: Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD)/IBGE.

Portanto, o padrão de maior desigualdade no Nordeste, comparativamente ao Sudeste, não revela – nestes quase 15 anos de relativa estabilidade monetária – evidência de consistente melhora favorável à região menos desenvolvida, o que deve refletir, entre outros fatores, permanência de um maior grau de precariedade das relações de trabalho (informalidade e subembrego), sinônimo de baixa pro-dutividade do trabalho. Em tal ambiente socioeconômico, a emergência de mo-dernos polos de crescimento, industriais e de serviços modernos – como ocorre no Nordeste e em outras regiões, no âmbito de um processo de desconcentração industrial relativamente ao Sudeste – tende a abrir o leque salarial nessas regiões absorvedoras desses novos investimentos, dado o contraponto entre maiores re-munerações médias do trabalho nesses polos e baixos salários em amplos seg-mentos de ocupação de baixa produtividade.

Page 130: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

130

5.3 – À Guisa de Conclusão: Efeitos da Crise Econômica sobre Indicadores do Mercado de Trabalho no Nordeste e no Sudeste

Evidências de que o perfil da distribuição da renda do trabalho tem conexão com a estrutura do mercado de trabalho – na qual se sobressai a desfavorável posição relativa em que se situam determinados estratos da população ocupada – foram fornecidas pela análise conduzida neste artigo. Ademais, fica sugerido que o País enfrenta problema de insuficiência de renda entre estratos sociais cuja inserção no mercado de trabalho se dá via remuneração insuficiente para prover adequado nível de consumo de uma família. Tal contingência, mesmo sendo mais significativa no Nordeste (região que tem grande representação de ocupações informais, de baixa produtividade e de ocupações formais de relativamente baixa remuneração), também se verifica no Sudeste: na primeira região, 68,6% da popu-lação ocupada tinha, em 2008, remuneração até o teto de dois salários mínimos, afora um percentual de 16,8% de pessoas ocupadas sem remuneração; na segun-da, os respectivos percentuais alcançavam 56,5% e 4,5%. Trata-se de números que mantêm sinalização de cautela com respeito a interpretações do real significado, em termos de benefício social, da tendência declinante do Índice de Gini, obser-vada no Brasil nos últimos anos.

Podem ser agregadas outras ponderações para a qualificação do significado dessa tendência recente de redução da desigualdade da renda do trabalho. Uma advém de evidências observadas por Barros et al. (2006): a) a proporção da renda apropriada pelos 10% da cauda inferior da distribuição era maior no final dos anos 1970 e início dos anos 1980 do que hoje; b) o contingente de 1% na cauda superior da distribuição ainda se apropria de proporção da renda total, que é ba-sicamente a mesma parcela que cabe aos 50% de menor renda.

Outra qualificação é provida por Araújo e Lima (2007), que explicitam o conteúdo – em termos de nível de renda – do que significa uma posição entre os estratos de maior renda. Com base em dados para 2004, os autores observaram que, no Brasil, menos de 1% das pessoas ocupadas ganhavam acima de 20 salários mínimos por mês; entre os 10% com maior renda, mais de 60% auferiam remu-neração mensal entre R$ 1.300 (cinco SM) e R$ 2.600 (10 SM). No Nordeste, no

Page 131: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

131

estrato dos 10% com maior renda encontravam-se pessoas com renda mensal inferior a R$ 780 (três SM); e a maioria se situava entre R$ 780 (três SM) e R$ 1.300 (cinco SM). Portanto, estar entre os “mais ricos” pode significar uma renda individual claramente insuficiente para prover o sustento de uma família. Ou seja, trata-se de uma distribuição ainda muito concentrada no topo da pirâmide de renda, o que se traduz em – mesmo tendo havido redução da desigualdade – per-manência de amplos estratos sociais com nível de renda na faixa da insuficiência.

Quando a redução da desigualdade é considerada no plano comparativo Sudes-te-Nordeste, esta última região permanece – como já observado – com maior grau de desigualdade, não havendo tendência de que venha recentemente se beneficiando de redução da desigualdade da renda do trabalho, em comparação com o Sudeste.

Neste momento da análise é útil se observar como a recente crise econômica afeta as duas regiões, no que respeita a variáveis que repercutem sobre a geração de empregos e a distribuição da renda do trabalho. De antemão, registre-se que se revelaram significativos, no período de setembro de 2008 a agosto de 2009, alguns efeitos da recente crise sobre indicadores do mercado de trabalho.

Observe-se a evolução do emprego formal em período recente (2004-2009, considerado em cada ano o conjunto dos dois primeiros quadrimestres), confor-me informações projetadas no Gráfico 1.

Em primeiro lugar, é importante ser destacado que, nos primeiros oito me-ses de cada ano, no período 2004-2008, foram gerados – no País como um todo – mais de 1.200.000 postos de trabalho formais; particularmente nos primeiros oito meses de 2008, o número de novos postos de trabalho alcança cerca de 1.800.000. Trata-se de indicador que revela o quanto a economia brasileira se be-neficiava de fatores favoráveis à persistência de certo ritmo de crescimento, entre os quais podem ser enumerados os seguintes: manutenção de estabilidade mo-netária, economia internacional em expansão, e sustentação da demanda interna, esta favorecida pela permanência de uma sistemática de aumentos reais do salário mínimo (iniciada em maio de 1995), por ampliação de programas de transferência de renda e por expansão do crédito (pessoal e das empresas).

A reversão da tendência de crescimento dos cinco anos encerrados em 2008 se expressa – reflexo da crise econômica mundial iniciada no segundo semestre de 2007 na economia americana – nos primeiros oito meses de 200913, quando o

13 Reflexos da crise mundial na economia brasileira passaram a ser de fato sentidos no último trimestre de 2008.

Page 132: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

132

número de empregos formais criados se reduz para menos de 700.000; embora um número respeitável, comparativamente ao que ocorria na economia norte-americana, trata-se de uma geração de empregos muito aquém do que vinha sen-do observado nos últimos anos – um milhão de emprego a menos, em compara-ção com igual período de 2008.

Gráfico 1 - Brasil, Nordeste, Sudeste - Saldo Líquido de Empregos - 2004-2009, Janeiro a AgostoFonte: Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED)/Ministério do Trabalho e Emprego.

Em segundo lugar, fica evidente que a criação líquida de empregos formais no Nordeste, durante o período em que o mercado de trabalho ensaia uma recu-peração (2004-2007, considerados os dois primeiros quadrimestres de cada ano), segue basicamente o mesmo passo do que se observa no Sudeste, embora a infle-xão da curva reflita uma recuperação um pouco mais rápida nesta última região e particularmente no Brasil como um todo, revelando que o Nordeste se recupera mais modestamente no contexto nacional. A recuperação ocorrida de 2007 para 2008 torna tal relação ainda mais nítida: o ritmo de geração de novos empregos é maior no Sudeste e no País como um todo que no Nordeste. Quando o mercado de trabalho finalmente reflete efeitos da crise econômica – ao longo dos dois pri-meiros quadrimestres de 2009 – a destruição de postos de trabalho é mais rápida

Page 133: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

133

no Sudeste (e no País), comparativamente ao Nordeste, já que na primeira região há maior representatividade de empresas com vinculação à economia internacional.

Adicione-se ao quadro uma comparação entre taxas de desocupação da mão-de-obra no período da crise, consideradas as duas regiões, de antemão pon-derando-se que se trata de indicador para todo o mercado de trabalho (incluído o segmento informal), e não apenas o mercado formal. Conforme dados do IBGE (Pesquisa Mensal de Emprego), enquanto o indicador de desemprego para regi-ões metropolitanas – entre agosto de 2008 e agosto de 2009 – permanece abaixo de 10% no Sudeste (São Paulo, de 8,0% para 9,1%; Rio de Janeiro, de 6,9% para 5,6%; Belo Horizonte, de 6,1% para 7,5%), no Nordeste supera os 10% (Recife, de 8,3% para 10,9%; Salvador, de 11,6% para 11,4%). Ou seja, pelo menos na esfera metropolitana a posição relativa do Nordeste (região em que o fenômeno da precariedade das relações de trabalho tem dimensão bem mais ampla que no Sudeste) permanece desfavorável vis à vis à outra região. Ou seja, embora nesse período em que a crise econômica atinge o mercado de trabalho a destruição de empregos formais tenha sido menos severa no Nordeste, esta região permanece como espaço em que são mais altas as taxas de desemprego.

Cabe um comentário final – de caráter prospectivo – tendo-se em conta expectativas a respeito da exploração de petróleo na camada do pré-sal, algo que é considerado um eixo fundamental do desenvolvimento brasileiro em futuro pró-ximo. Ocorre que esse potencial núcleo produtor é fortemente concentrado no Sudeste (Rio de Janeiro, São Paulo e Espírito Santo); dada a grande dimensão dos investimentos que tal exploração requer, do que decorrem importantes efeitos de interligação com diversas cadeias produtivas, se uma política regional não for incorporada ao processo – de modo a promover uma distribuição espacial dos be-nefícios desse novo núcleo de atividade econômica – é possível que persista ou se amplie a desigualdade relativa entre as duas regiões focadas neste trabalho, mesmo tendo-se em conta os investimentos atualmente projetados para o Nordeste. Em síntese, é fundamental que o Estado brasileiro disponha de uma efetiva política de desenvolvimento regional, considerada a ampliação da base produtiva nacional e a necessidade de eliminação de persistentes disparidades sociais e econômicas entre regiões, particularmente no que concerne às regiões Nordeste e Sudeste.

Page 134: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

134

Referências

ARAÚJO, T. B. de. Herança de fragmentação e futuro de diferenciação. Estudos Avançados 29, São Paulo, v. 11, n. 29, p. 7-36, jan./abr. 1997.

ARAÚJO, Tarcisio Patrício de; SOUZA, Aldemir do Vale; LIMA, Roberto Alves de. Nordeste: Economia e mercado de trabalho. Estudos Avançados 29, São Paulo, v. 11, n. 29, p. 55-77, jan./abr. 1997.

ARAÚJO, T. P. de; LIMA, R. A. de. Estrutura ocupacional e renda do trabalho: traços recentes de desigualdades regionais e sociais. In: MACAMBIRA, Júnior; SANTOS, S. M. dos. Brasil e Nordeste: ocupação, desemprego e desigualdade. Fortaleza: Banco do Nordeste do Brasil, 2007. p. 259-288.

______. Nordeste: economia e mercado de trabalho. Estudos Avançados, v. 11, n. 29, p. 55-77, jan./abr. 1997.

BARROS, R. P. de et al. Uma análise das principais causas da queda recente na desigualdade de renda brasileira. Rio de Janeiro: IPEA, 2006. (Texto para Discussão, n. 1203).

BRASIL. Lei nº 601, de 18 de setembro de 1850. Disponível em: <http://www.justica.sp.gov.br/Itesp/leis/lei601.htm>. Acesso em: 4 ago. 2007.

FLORENTINO, M. Em costas negras: uma história do tráfico de escravos en-tre a África e o Rio de Janeiro (séculos XVIII e XIX). São Paulo: Companhia das Letras, 1997.

FRAGOSO, J. L. Homens de grossa aventura. Rio de Janeiro: Civilização Bra-sileira, 1998.

FURTADO, C. Formação econômica do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.

GUIMARÃES NETO, L. Trajetória econômica de uma região periférica. Estu-dos Avançados, São Paulo, v. 11, n. 29, p. 37-54, jan./abr. 1997.

MOOG, V. Bandeirantes e pioneiros. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1989.

Page 135: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

135

NEGRI, B. Concentração e desconcentração industrial em São Paulo (1880-1990). 1994. 280 f. Tese (Doutorado) - Universidade Estadual de Campinas, Cam-pinas, 1994.

NOVAIS, F. A. Portugal e Brasil na crise do antigo sistema colonial (1777-1808). São Paulo: Hucitec, 1983.

SUZIGAN, W. Indústria brasileira: origem e desenvolvimento. São Paulo: Hu-citec, 2000.

SERRA, José. Ciclos e Mudancas Estruturais na economia brasileira no pós-guer-ra. In: BELLUZZO, L.G., COUTINHO, R. (Org.). Desenvolvimento capitalis-ta no Brasil: ensaios sobre a crise 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 1983. v. 1.

TAVARES, M. C. Da substituição de importações ao capitalismo financeiro. São Paulo: Zahar Editores, 1972.

VERSIANI, F. R.; SUZIGAN, W. O processo brasileiro de industrialização: uma visão geral. Brasília, DF: Universidade de Brasília, 1990. (Série Textos Didá-ticos, n. 10).

VERSIANI,F. R.; VERSIANI, M. T. A industrialização brasileira antes de 1930: uma contribuição. In: VERSIANI, F. R.; BARROS, J. R. M. de. Formação eco-nômica do Brasil: a experiência da industrialização. São Paulo: Saraiva, 1977.

Page 136: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do
Page 137: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

6CAPÍTULO

MAPEAMENTO DO TRABALHO AGRÍCOLA NO BRASIL

Marcelo Weishaupt Proni1

6.1 – IntroduçãoA produção no ramo agropecuário passou por transformações profundas

nos últimos trinta anos no Brasil. Entre outras, foram verificadas mudanças im-portantes no volume e no perfil dos trabalhadores agrícolas em todas as ma-crorregiões do País, ainda que tais mudanças tenham se concentrado nas áreas economicamente mais avançadas. Nas décadas de 80 e 90 do século XX, os des-dobramentos do processo de mecanização da agricultura e a adoção de novas estratégias de gestão dos agronegócios ampliaram a defasagem econômica entre o grande estabelecimento e a pequena propriedade, tornando ainda mais graves os efeitos da conhecida concentração fundiária. Evidentemente, essa modernização recorrente contribuiu para aumentar a capacidade de produção de alimentos e matérias-primas, mantendo as atividades agropecuárias como um ramo de gran-de importância para a economia nacional. Contudo, as flutuações na conjuntura macroeconômica causaram impactos sobre o desempenho econômico do setor.

Na década de 90 os produtores rurais foram bastante afetados pelas polí-ticas macroeconômicas adotadas e vários segmentos tiveram sua rentabilidade comprometida. A abertura comercial indiscriminada acarretou uma queda gene-ralizada dos preços das commodities agrícolas, ao passo que as altas taxas de juros adiaram grande parte dos investimentos necessários para elevar a competitividade do setor. A política de valorização cambial inibiu um crescimento substantivo das exportações de vários produtos agrícolas e carnes. Além disso, a redução das linhas de financiamento com crédito subsidiado e a relutância do governo federal em adotar mecanismos eficientes de proteção para o setor (como a garantia de preços mínimos) deixaram os produtores agrícolas e os criadores ao sabor das forças de mercado. (MATTEI, 1998). Por outro lado, houve uma reestruturação dos grandes empreendimentos agrícolas, com mudanças significativas provoca-

1 Professor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e pesquisa-dor do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit).

Page 138: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

138

das pela adoção localizada de inovações tecnológicas (aquisição de máquinas e tratores, uso de novos fertilizantes e insumos, utilização de defensivos agrícolas e desenvolvimento de novas técnicas de produção) nas áreas mais capitalizadas. (VIEIRA FILHO; CAMPOS; FERREIRA, 2005).

Entre 1990 e 2000, a maioria das atividades agropecuárias teve um desem-penho econômico muito ruim, mas algumas commodities obtiveram bons resul-tados (caso da soja, do café beneficiado e do frango), o que manteve o valor total da produção do setor praticamente constante, em termos reais, equivalendo a 8% do Produto Interno Bruto (PIB). (PRONI; GARRIDO, 2005).

Ao longo da década atual, ao contrário, a agropecuária brasileira demonstrou grande vigor, com taxas expressivas de expansão do valor bruto da produção rela-cionadas, em parte, ao incremento nas exportações de produtos agrícolas (princi-palmente soja e seus derivados) e de carnes. De acordo com o Ministério da Agri-cultura, em 2004 o setor chegou a ser responsável por 9% do PIB brasileiro (62% na agricultura e 38% na pecuária). Nos anos seguintes continuou aumentando o preço das commodities no mercado mundial, o que beneficiou vários segmentos. Em 2008, as exportações de produtos agropecuários alcançaram a marca de R$ 71,8 bilhões, ao passo que as importações ficaram em R$ 11,8 bilhões, confirman-do a importância do setor para o saldo positivo da balança comercial brasileira. Segundo a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), também em 2008 o conjunto do chamado “agronegócio” (que inclui insumos, produtos bási-cos, agroindústria e distribuição) correspondeu a 28% do PIB nacional, 37% das exportações brasileiras e 37% dos empregos diretos e indiretos no País.

Outra observação fundamental para entender o dinamismo da agropecuá-ria, na década atual, diz respeito ao aumento da Produtividade Total dos Fatores (PTF). Entre 2000 e 2005, a PTF contribuiu com dois terços (64,6%) do cresci-mento do produto, enquanto o aumento no uso de insumos – especialmente terra e capital – foi responsável por um terço (34,0%) do aumento do produto agrope-cuário. O importante a ressaltar é que a PTF tem apresentado taxas elevadas no período recente (a média de crescimento anual entre 1975-2005 foi de 2,51%, mas a maior expansão da produtividade foi na primeira metade dos anos 2000, quando o crescimento da PTF atingiu 3,87% ao ano). A agropecuária brasileira, portan-to, vem crescendo dentro de um padrão diversificado e de alta produtividade. Em parte esse comportamento esteve relacionado ao aumento da produtividade do trabalho, motivado pela maior qualificação da mão-de-obra e pela maior dis-ponibilidade de capital nos empreendimentos voltados para o mercado externo. Outros fatores relacionados aos aumentos do produto e da produtividade foram

Page 139: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

139

a expansão acentuada do crédito rural nos anos recentes e seus impactos no acesso a novas tecnologias e a ampliação da escala de produção. Finalmente, a pesquisa agropecuária deve ser citada como um fator que contribuiu para os ganhos de pro-dutividade verificados na agricultura. (GASQUES; BASTOS; BACCHI, 2008).

O importante a ressaltar é que a maneira como esse processo de desen-volvimento agrícola ocorreu, nestes trinta anos, afetou diretamente o mundo do trabalho no campo, em particular no que diz respeito à estrutura ocupacional e às formas de inserção no mercado de trabalho rural. Em vários casos as condições de trabalho no campo ficaram mais precárias e diminuíram as possibilidades de absorção da população trabalhadora em atividades agrícolas, indicando que os re-sultados do desenvolvimento agrícola não foram positivos para o bem-estar social de parcela expressiva dessa população. Entre 1992 e 2001, por exemplo, o número de ocupados nesse setor se reduziu de 18,5 milhões para 15,6 milhões de pessoas. (BALSADI, 2007). Além disso, tais transformações se manifestaram com inten-sidades distintas nos variados cantos do território nacional, ampliando diferenças regionais tanto em termos de desenvolvimento tecnológico e empresarial quanto ao perfil dos trabalhadores em atividades agropecuárias.

Na década atual, as tendências do mercado de trabalho rural apresentam sinais divergentes. Por um lado, parece ter aumentado o número de trabalhado-res agrícolas não-remunerados, permanecendo elevada a proporção dos que têm rendimento mensal inferior a um salário mínimo e aumentado o uso de contratos temporários, assim como há indícios de uma maior precariedade nas condições de trabalho em certas culturas. Por outro lado, destacam-se o aumento do emprego com carteira de trabalho assinada e a modesta melhoria em termos de elevação da remuneração média, a redução da jornada média de trabalho, a queda do tra-balho infantil e o aumento da taxa de sindicalização no campo. Podem ocorrer divergências na interpretação de tais indicadores ou na ênfase das tendências mais significativas, assim como há diferenças metodológicas referentes à mensuração das mudanças na situação ocupacional e à verificação das alternativas de renda da população rural2.

A própria definição do que é o “mercado de trabalho rural” ou o “mundo do trabalho no campo” tem sido objeto de polêmica. Trata-se, sem dúvida, de um universo bastante heterogêneo. É verdade que as mudanças impostas pelos agronegócios modernos redefiniram o espaço econômico e as relações de traba-lho predominantes em várias microrregiões, mas também é fato que a agricultura 2 Ver, neste sentido, as distintas abordagens dos artigos reunidos no livro coordenado por Buainain

e Dedecca (2008).

Page 140: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

140

familiar tradicional manteve sua importância no abastecimento alimentar do mer-cado interno e na reprodução da população rural. (OLIVEIRA, 2009). Por sua vez, embora os pequenos municípios, em quase todos os estados do País, vivam em função das atividades agrícolas ou da pecuária, não se pode desconsiderar que têm surgido situações em que ganham relevo certas atividades não-agrícolas no campo, como o turismo. Portanto, dada esta enorme heterogeneidade estrutural, não é uma tarefa simples a análise dos determinantes da dinâmica regional do mercado de trabalho rural no Brasil. (PRONI; GARRIDO, 2005).

Lentamente as condições de trabalho e de vida no campo vêm se trans-formando. A energia elétrica, a telefonia, as melhores condições de transporte e moradia, os serviços públicos como saúde, educação e água tratada vêm aos poucos se difundindo no meio rural. Contudo, em muitas áreas rurais brasileiras o campo continua sendo um espaço extremamente carente de progresso técnico e de elementos da civilização moderna. Embora as relações capitalistas tenham penetrado profundamente na organização das atividades econômicas rurais, há um contingente elevado de unidades produtivas onde as relações mercantis ainda são escassas. E não se pode deixar de lembrar que, em vários lugares, a disputa pela terra ainda produz tensões sociais e violência física. Por isso, é aconselhável evitar uma caracterização geral das condições de vida e de trabalho no meio rural brasileiro, entendendo que esta pode traduzir diferentes configurações, depen-dendo do contexto econômico e social. Na medida do possível, os estudos sobre esta temática devem oferecer um panorama que contemple a diversidade de con-figurações produtivas e de contextos sociais. (BUAINAIN; DEDECCA, 2008).

Este artigo pretende discutir algumas questões relacionadas à evolução re-cente do mercado de trabalho rural no Brasil, procurando, em especial, mapear as desigualdades regionais. Para tanto, a argumentação está dividida em quatro seções. Na primeira, é feito um breve panorama econômico da agropecuária bra-sileira, enfocando as diferenças regionais da estrutura produtiva no campo. Na segunda, a atenção se concentra em estudos acadêmicos sobre a evolução do emprego e dos rendimentos na agricultura, nos últimos anos, também destacando as diferenças regionais. Na terceira seção examinam-se informações fornecidas pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do IBGE para 2003 e 2007, priorizando as distintas situações verificadas nos estados mais representativos. Na quarta, é feita uma comparação do perfil dos trabalhadores agrícolas nos estados selecionados, procurando colocar em evidência as diferenças inter e intrarregio-nais. Ao final do artigo são propostas algumas reflexões sobre aspectos relaciona-dos às desigualdades regionais do trabalho no ramo agrícola que persistem desa-fiando as políticas públicas no País.

Page 141: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

141

6.2 – Desigualdade Regional na Estruturação do Setor Agropecuário no Brasil

Historicamente, tem-se reproduzido uma enorme heterogeneidade econômi-ca nas atividades agropecuárias no Brasil. Tal heterogeneidade se manifesta, por exemplo, nos diferenciais de produtividade média e de desempenho econômico registrados no setor, os quais estão relacionados ao tamanho dos estabelecimentos, à disponibilidade de máquinas e equipamentos, ao grau de organização empresarial, entre outros fatores. Ao lado dos grandes e prósperos produtores rurais sobrevivem os pequenos produtores, que encontram dificuldades crônicas, algumas vezes insu-peráveis, para conseguir financiamentos e para obter acesso à inovação tecnológica.

Para que se tenha uma ideia da elevada concentração da propriedade, basta mencionar que cerca de metade dos estabelecimentos rurais no País são pequenas propriedades (menos de 10 hectares), às quais correspondem apenas 2% da área total, ao passo que apenas 1% dos estabelecimentos são grandes propriedades (1.000 hectares ou mais) que concentram cerca de 45% da área total. Além disso, a concentração da propriedade fundiária apresenta grandes diferenças regionais: quase dois terços dos estabelecimentos com tamanho inferior a 10 hectares es-tavam no Nordeste, enquanto quase metade das propriedades rurais com pelo menos dois mil hectares estava no Centro-Oeste. De modo geral, tem predo-minado uma relativa estabilidade estrutural no campo brasileiro, não tendo sido constatada tendência de redução na enorme desigualdade da distribuição da área dos empreendimentos agrícolas, mesmo com o aumento no número de assenta-mentos rurais. (HOFFMANN, 2001).

De acordo com o Censo Agropecuário de 1996, os estabelecimentos do tipo patronal representavam 11% do universo pesquisado, ocupavam 68% da área rural brasileira e eram responsáveis por 61% do valor bruto da produção, enquanto os de tipo familiar somavam 85%, abrangiam apenas 30% da área e respondiam por 38% do valor da produção agropecuária nacional. Em termos regionais, ressalte-se que as propriedades de tipo patronal geravam cerca de 82% do valor adicionado pela agropecuária no Centro-Oeste, 75% no Sudeste, 55% no Nordeste, 42% no Sul e 37% no Norte, ao passo que a agricultura familiar também apresentava um peso bem diferenciado nessas regiões: 16%, 24%, 43%, 57% e 58%, respectivamente. (PRONI et al., 2005).

Page 142: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

142

Tabe

la 1

- In

form

açõe

s so

bre

os E

stab

elec

imen

tos

Agr

opec

uário

s po

r Gra

nde

Reg

ião

- Bra

sil:

2006

Info

rmaç

ãoN

NE

SES

CO

BR

ASI

L

Est

abel

ecim

ento

s (un

idad

es)

479

158

2 4

69 0

70 9

25 6

13 1

010

335

319

954

5 2

04 1

30

Est

abel

ecim

ento

s (%

)9,

2%47

,4%

17,8

%19

,4%

6,1%

100,

0%

Áre

a to

tal (

ha)

67

461

295

80

528

648

60

321

606

46

482

262

100

071

723

354

865

534

Áre

a to

tal (

%)

19,0

%22

,7%

17,0

%13

,1%

28,2

%10

0,0%

Áre

a m

édia

do

esta

bele

cim

ento

(ha)

141

3365

4631

368

Util

izaç

ão d

as te

rras

(dist

ribui

ção)

100,

0 %

100,

0 %

100,

0 %

100,

0 %

100,

0 %

100,

0 %

La

vour

as

11,0

%27

,6 %

26,4

%39

,4 %

12,9

%21

,6 %

Pa

stag

ens

48,4

%40

,5 %

53,2

%39

,0 %

56,8

%48

,6 %

M

atas

e fl

ores

tas

39,0

%31

,8 %

19,8

%17

,3 %

28,0

%28

,1 %

Pess

oal o

cupa

do (p

esso

as)

1 6

63 3

46 7

686

806

3 1

91 7

70 2

884

474

988

332

16

414

728

Pess

oal o

cupa

do (%

)10

,1%

46,8

%19

,4%

17,6

%6,

0%10

0,0%

Trat

ores

(uni

dade

s) 2

5 92

3 5

8 73

6 2

41 6

90 3

41 8

11 1

19 8

93 7

88 0

53

Trat

ores

(%)

3,3%

7,5%

30,7

%43

,4%

15,2

%10

0,0%

Ocu

pado

s por

trat

or (n

úmer

o m

édio

)64

131

138

821

Font

e: C

enso

Agr

opec

uário

de

2006

Pub

licad

o pe

lo In

stitu

to B

rasil

eiro

de

Geo

grafi

a e

Est

atíst

ica

(IBG

E).

Page 143: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

143

Na Tabela 1 podem ser observadas informações do último Censo Agrope-cuário de 2006 do IBGE, que ilustram algumas desigualdades regionais. Quase metade (47%) dos estabelecimentos agropecuários está localizada no Nordeste, onde é menor o tamanho médio das propriedades rurais (33 ha). Por outro lado, no Centro-Oeste estão apenas 6% dos estabelecimentos, os quais possuem um tamanho médio muito superior à média nacional (313 contra 68 ha).

No que se refere à utilização das terras, nota-se que havia no Sul uma distri-buição equitativa entre lavouras e pastagens, ao passo que no Norte e no Centro-Oeste a porcentagem destinada às lavouras era bem menor que para as pastagens. No País como um todo quase metade das terras estava destinada às pastagens e apenas um quinto às lavouras.

Em relação ao número de trabalhadores ocupados em atividades agropecu-árias, o Censo de 2006 indica que havia mais de 16,4 milhões de pessoas, o que corresponde a cerca de 3,2 ocupados por estabelecimento, em média. A distri-buição dos ocupados por grande região acompanha a dos estabelecimentos, com destaque, mais uma vez, para a região Nordeste.

Por sua vez, a distribuição de tratores e outras máquinas agrícolas também indica uma enorme desigualdade regional: no Sul estavam 43% dos tratores, con-tra apenas 7,5% no Nordeste e 3% no Norte. Sem dúvida, é possível afirmar que há diferenças significativas no acesso à tecnologia. Além disso, destaca-se a grande desproporção entre o número de trabalhadores e de tratores na região Nordes-te (131 ocupados para cada trator), principalmente, enquanto nas regiões Sul e Centro-Oeste havia uma proporção mais razoável (8:1).

Outra evidência da heterogeneidade estrutural pode ser obtida nas infor-mações sobre os tipos de produção predominantes e o valor da produção3. As características da produção agropecuária se diferenciam bastante conforme a re-gião do País e mesmo entre estados próximos. De acordo com o IBGE, cerca de um terço do valor adicionado do setor se concentra na região Sudeste, mais de um quarto no Sul, um quinto no Centro-Oeste, um oitavo no Nordeste e menos de um décimo no Norte. Os estados de maior produção agropecuária continuam 3 Convém esclarecer que, no Brasil, a agricultura é responsável por quase dois terços do valor gerado

no setor e que há um leque muito grande de produtos agrícolas, mas a produção se concentra em uma dezena de culturas. Em 2004, a soja, o milho e a cana-de-açúcar somaram mais da metade (cerca de 30%, 12% e 11%, respectivamente) do valor bruto total da agricultura. Por sua vez, a carne bovina, o frango e o leite geraram cerca de 86% (46%, 23% e 17%, respectivamente) do valor correspondente à pecuária naquele ano.

Page 144: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

144

sendo São Paulo, Rio Grande do Sul, Paraná e Minas Gerais, mas tem crescido a participação de outros estados, como Goiás e Mato Grosso.

Dando sequência à montagem do panorama da estrutura produtiva do cam-po no Brasil, pode-se observar na Tabela 2 o peso diferenciado das grandes regi-ões na produção agrícola nacional. A produção de soja está concentrada nas regi-ões Sul e Centro-Oeste; a de arroz e de milho no Sul; a de café e de cana-de-açúcar no Sudeste; a da mandioca está distribuída entre o Nordeste, o Norte e o Sul; a produção de algodão está concentrada no Centro-Oeste; e o feijão é plantado principalmente no Nordeste e no Sudeste. De fato, há uma grande diferenciação regional em termos de culturas agrícolas predominantes4.

O mesmo pode ser dito em relação à pecuária nacional. Há uma grande concentração da criação de suínos e de aves na região Sul. (Tabela 3). No caso dos bovinos, a maior participação é do Centro-Oeste. Por sua vez, a produção de leite de vaca tem um peso maior no Sudeste. E a produção de ovos de galinha está concentrada no Sul e no Sudeste.

Tabela 2 - Distribuição Regional da Produção de Culturas Agrícolas Selecionadas Brasil: 2006

Região Soja Milho Cana-de-açúcar Mandioca Feijão Arroz Algodão Café

Norte 2,0 2,6 0,7 24,9 4,3 10,6 0,1 3,6

Nordeste 6,8 7,9 14,6 26,5 33,6 10,5 28,5 6,6

Sudeste 7,3 23,2 66,7 12,9 30,1 3,3 5,2 84,3

Sul 42,0 43,5 8,3 26,0 20,7 66,3 0,6 4,3

Centro-Oeste 42,0 22,8 9,8 9,7 11,3 9,3 65,7 1,2

Brasil 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0Fonte: Censo Agropecuário de 2006 Publicado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

4 O mesmo ocorre em relação à produção de frutas (a região Sul é a maior produtora de uva e maçã, ao passo que a região Sudeste é a maior produtora de laranja e o Nordeste é o maior produtor de abacaxi).

Page 145: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

145

Tabela 3 - Distribuição Regional de Itens da Pecuária Nacional - Brasil e Grandes Regiões: 2006

Região Efetivo deBovinos

Efetivo deSuínos

Efetivo deAves

ProduçãoLeite de Vaca

Ovos de Galinha

Norte 18,4 5,0 2,2 5,7 2,1

Nordeste 15,3 12,4 8,4 13,4 13,0

Sudeste 20,6 17,2 25,9 37,7 35,7

Sul 14,1 54,4 50,4 29,1 39,6

Centro-Oeste 31,6 11,1 13,1 14,1 9,5

Brasil 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0Fonte: Censo Agropecuário de 2006 Publicado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Comparando a década atual com a anterior, houve uma elevação significativa dos índices de produtividade média na agricultura nacional, considerando o volu-me da produção por hectares plantados. (MAIA et al., 2005). É importante frisar que a produtividade dos empreendimentos agrícolas – a qual depende do tama-nho do estabelecimento e do grau de mecanização das lavouras – também varia de forma significativa conforme a região do País, o que se reflete na capacidade de absorção de trabalhadores na produção5.

Examinando as estratégias de concorrência no segmento produtor de grãos, pode-se afirmar que os ganhos de produtividade e a redução no custo de produ-ção se tornaram uma exigência do modo como operam os sistemas agroindus-triais (cadeias produtivas). A introdução de inovações tecnológicas concentra-se no “polígono dinâmico agroindustrial” (macrorregião que engloba os estados das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, ficando de fora o Norte e o Nordeste), onde está a maioria dos empreendimentos agrícolas mais modernos e mais rentáveis. (VIEIRA FILHO; CAMPOS; FERREIRA, 2005).

Para completar este panorama sintético deve-se esclarecer que há diferenças entre os estados de uma mesma região. Na Tabela 4 estão reunidos os estados bra-sileiros mais representativos em termos de valor bruto da produção agropecuária (em conjunto respondem por mais de 90% do total) e do número de trabalhado-res agrícolas (80% do total). Algumas diferenças estaduais merecem ser destaca-das. Por exemplo, o tamanho médio dos estabelecimentos no Mato Grosso e no

5 Em 2000, as culturas que mais demandaram mão-de-obra agrícola foram: milho (16,7%), café (11,6%), feijão (10,6%), mandioca (10%), cana-de-açúcar (9,6%) e arroz (9%). Por sua vez, embora fosse a cultura com mais hectares plantados, a soja não teve participação importante (5,8%) na ocu-pação de trabalhadores agrícolas.

Page 146: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

146

Mato Grosso do Sul é superior a 400 ha, ao passo que no Espírito Santo é de 33 ha e no Ceará apenas 22 ha. Enquanto nos três estados do Sul a área média é muito semelhante, nos quatro estados do Nordeste selecionados há diferenças significativas (a média no Ma-ranhão é mais que o dobro da média no Ceará e quase o dobro da média em Pernambuco).

No que se refere à utilização de terras, nota-se uma elevada porcentagem destinada às lavouras em Pernambuco e no Paraná, ao passo que no Mato Grosso do Sul e em Goiás é muito alta a porcentagem utilizada para pastagens. No Pará, 40% das terras ainda estavam reservadas para matas e florestas.

Tabe

la 4

- In

form

açõe

s so

bre

os E

stab

elec

imen

tos

Agr

opec

uário

s - B

rasi

l e

Est

ados

Sel

ecio

nado

s: 2

006

UF

Áre

a

méd

ia

(ha)

Áre

a pa

raLa

vour

as

(%)

Áre

a pa

ra

Past

agen

s (%

)

Dis

trib

uiçã

oO

cupa

dos

(%)

Rel

ação

Ocu

pado

s /

Est

abel

ecim

ento

Dis

trib

uiçã

oTr

ator

es

(%)

Rel

ação

Trat

or /

100

Ocu

pado

s

PA12

211

,848

,44,

93,

61,

11,

10

MA

5227

,241

,16,

13,

40,

70,

59

CE

2226

,335

,47,

03,

00,

70,

48

PE28

52,7

28,7

5,8

3,1

0,7

0,55

BA36

21,7

46,7

14,1

3,0

3,3

1,13

ES

3333

,347

,31,

83,

51,

64,

11

MG

6519

,457

,611

,33,

411

,44,

83

SP83

38,7

44,7

5,3

3,8

16,7

15,1

1

GO

183

14,4

62,1

2,5

3,0

5,4

10,6

1

MT

424

14,2

47,2

2,2

3,2

5,2

11,2

0

MS

403

8,4

69,6

1,2

3,1

4,3

16,9

9

PR47

46,1

32,6

6,7

2,9

14,1

10,1

2

SC47

32,4

37,5

3,5

2,9

8,8

12,2

2

RS45

36,7

45,4

7,4

2,8

20,5

13,2

4

Con

junt

o70

22,8

49,2

79,8

3,1

94,5

5,69

Bra

sil

6821

,648

,610

0,0

3,2

100,

04,

80Fo

nte:

Cen

so A

grop

ecuá

rio d

e 20

06 P

ublic

ado

pelo

Inst

ituto

Bra

silei

ro d

e G

eogr

afia

e E

stat

ístic

a (I

BGE

).

Page 147: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

147

Outra informação relevante diz respeito à distribuição dos ocupados no se-tor. O estado com a maior participação relativa é a Bahia (14%), que possui o dobro dos trabalhadores agrícolas do Ceará. Em segundo lugar, aparece Minas Gerais (11%), mais que o dobro da participação de São Paulo. E o Mato Grosso do Sul tem apenas 1,2%, metade da participação de Goiás.

A distribuição dos tratores e máquinas agrícolas também apresenta diferen-ças significativas. O Rio Grande do Sul era o estado com maior porcentagem (20,5%), seguido por São Paulo e Paraná (16,7% e 14%, respectivamente). Por sua vez, a relação entre o número de ocupados e o número de tratores indicava, ainda que de forma imprecisa, o grau de mecanização: o Mato Grosso do Sul e São Paulo tinham os índices mais elevados (17 e 15 tratores para cada 100 ocupados), seguidos de perto por Rio Grande do Sul e Santa Catarina, depois Mato Grosso, Goiás e Paraná, enquanto Minas Gerais e Espírito Santo tinham índices próximos à média nacional. Por outro lado, os estados do Nordeste e do Norte apresenta-vam índices muito baixos (embora a Bahia e o Pará tivessem uma situação melhor do que a dos demais). Este indicador mostra claramente que há uma defasagem regional imensa entre as formas de organização da produção no campo.

Em suma, há estados onde predominam empreendimentos agropecuários modernos, com elevada produtividade física, mas há outros onde continuam pre-dominando as tradicionais técnicas de cultivo e criação. E, além das evidentes di-ferenças regionais no que se refere à estrutura produtiva na agropecuária nacional, percebe-se que há também diferenças intrarregionais relevantes. É preciso, agora, examinar como essa heterogeneidade estrutural se manifesta na configuração do mercado de trabalho e no tipo de ocupações geradas no campo.

6.3 – Tendências do Mercado de Trabalho no Campo

A inflexão no modelo de desenvolvimento nacional, as novas diretrizes das políticas macroeconômicas e as mudanças verificadas no padrão de crescimento da agropecuária brasileira, a partir dos anos 80, e de forma mais intensa na década de 90, alteraram a dinâmica do mercado de trabalho no campo. Em particular, deve-se mencionar que a elevação da produção deixou de se pautar na expansão da área cultivada (à medida que vão se esgotando as fronteiras agrícolas) e pas-sou cada vez mais a depender do aumento da produtividade física das lavouras. (MATTEI, 1998). Tanto a mecanização da produção agrícola nos estabelecimen-

Page 148: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

148

tos de grande e médio portes quanto a falta de uma política efetiva e duradoura de apoio à agricultura familiar afetaram diretamente as oportunidades de trabalho no campo. Observou-se, por exemplo, a transformação de grande número de pequenos produtores em trabalhadores volantes ou trabalhadores sem-terra. Em paralelo, houve uma retração absoluta da população ocupada neste ramo econô-mico. De acordo com o Censo Agropecuário do IBGE, o pessoal ocupado em atividades agropecuárias se reduziu de 21,1 milhões, em 1980, para 17,9 milhões em 1996 (redução de 3,2 milhões de trabalhadores em 16 anos), e depois para 16,4 milhões em 2006 (redução de 1,5 milhões em 10 anos)6.

Na década de 90 as tendências do mercado de trabalho rural apontavam para um quadro muito preocupante. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), entre 1992 e 1999 a população ocupada no ramo agrícola se reduziu de quase 14,9 milhões para pouco menos de 13,7 milhões de pessoas, redução que afetou principalmente os empregados (de 5,1 para 4,5 milhões) e os trabalhadores não remunerados (de 4,8 para 4,3 milhões). Em outras palavras, houve uma redução no número de postos de trabalho na agricultura, num período de expansão da produção física, sem que crescesse a área cultivada, o que indica forte elevação da produtividade no campo. (BELIK et al., 2003).

O processo de modernização tecnológica concentrou-se nas regiões mais capitalizadas do campo brasileiro, agravando as desigualdades regionais em ter-mos de emprego e renda. A ocupação agrícola não se modificou muito nas áreas mais pobres (onde predominam as atividades voltadas para a subsistência), ao passo que nas áreas onde avançou a produção para a exportação aumentou a informalidade nas relações de assalariamento, sobretudo no caso do emprego temporário. Em meados da década passada quase metade da ocupação agrícola estava concentrada no Nordeste, onde cerca de 70% dos trabalhadores agrícolas estavam em unidades familiares (somando os que trabalham por conta própria, os sem remuneração e os que trabalham para o autoconsumo). O problema é que só uma pequena parcela dos produtores familiares conseguia se inserir na lógica estabelecida pelos grandes conglomerados agroindustriais (exceto, em certa me-dida, na região Sul), permanecendo a maioria trabalhando em condições precárias e com baixos níveis de produtividade. (MATTEI, 1998).

Por sua vez, nas regiões agrícolas mais dinâmicas do País, as colheitadeiras e demais máquinas agrícolas “inteligentes” tiveram um impacto expressivo no 6 A expulsão de um grande contingente de pessoas das áreas rurais e a falta de oportunidades de em-

prego e renda nas cidades estimularam a criação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), em 1984, e ajudam a entender a sua vitalidade nos últimos 25 anos.

Page 149: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

149

emprego agrícola. Para se ter uma ideia de tal impacto sobre a demanda por mão-de-obra, basta considerar que uma colheitadeira permite dispensar entre 100 a 120 trabalhadores na cultura da cana-de-açúcar, cerca de 160 postos de trabalho nas fazendas de café, entre 100 a 120 pessoas na cultura do feijão, e de 80 a 150 trabalhadores rurais na colheita do algodão. (BELIK et al., 2003).

O caso da cana-de-açúcar ilustra bem este processo: no início da década de 90 do século XX era a segunda cultura a demandar mão-de-obra agrícola, passan-do a ocupar apenas a quinta colocação em 2000, o que ocorreu principalmente por conta do intenso processo de mecanização. A soja, apesar de ter alcançado a marca de 28,4% da área cultivada, respondia por apenas 5,8% da demanda por mão-de-obra agrícola. Quando se observa o desempenho agregado das culturas7, nota-se que, apesar da pequena redução na área cultivada no período compreen-dido entre 1990 e 2000 (2,7%), a redução na demanda por mão-de-obra agrícola foi da ordem de 21,5%. (BELIK et al., 2003).

Também é relevante mencionar que a renda dos ocupados na agricultura variou bastante, desde o início dos anos 1990. (HOFFMANN; NEY, 2004). O rendimento médio mensal desses trabalhadores foi bastante afetado pela recessão em 1992 (R$ 282,90), recuperou-se até 1996 (R$ 371,00), depois declinou até 1999 (R$ 324,50) e então começou a se recuperar (R$ 336,50 em 2002). Em compara-ção com outros setores de atividade, na agricultura os rendimentos são bem mais baixos, na média, e sua distribuição é mais desigual, o que está relacionado com determinantes estruturais: a concentração da posse da terra e a associação entre a área do empreendimento, de um lado, e o tipo de atividade predominante, de outro. Para esses autores, os efeitos das mudanças conjunturais tendem a ser con-dicionados pelas características estruturais do setor: distribuição acentuadamente desigual da riqueza, diferenças de escolaridade entre as pessoas e expressivos con-trastes regionais.

Se as atividades essencialmente agrícolas vinham perdendo peso relativo nos anos 90, a população rural passava cada vez mais a exercer atividades não-agrícolas, sendo possível verificar um aumento da pluriatividade (combinação de duas ou mais atividades distintas em que pode variar a posição na ocupação). O surgimento de um “novo rural brasileiro” (GRAZIANO DA SILVA, 2002), em especial nas áreas mais dinâmicas, estaria indicando uma tendência ao aumento da diversidade de atividades econômicas coexistindo no mesmo espaço, com uma 7 Em 2000, as culturas do arroz, do café, da cana-de-açúcar, do feijão, da mandioca e do milho

concentravam 67,5% da demanda por horas de trabalho ao longo do ano e detinham 59% da área cultivada.

Page 150: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

150

estrutura produtiva dividida basicamente em quatro grandes subconjuntos: i) a agropecuária moderna, baseada na produção de commodities e com íntimas liga-ções com a agroindústria; ii) as atividades de subsistência, nas quais predominam a agricultura rudimentar e a criação de pequenos animais (este subconjunto é ain-da responsável pela manutenção de um exército de mão-de-obra no campo sem qualquer garantia, ou seja, sem terra, sem emprego fixo, sem qualificação); iii) as atividades não-agrícolas, ligadas à construção de moradias, ao lazer e a várias ati-vidades industriais e de prestação de serviços; iv) por fim, um conjunto de novas atividades industriais, localizadas em nichos específicos de mercados.

Na década atual, houve uma mudança importante no quadro geral do mer-cado de trabalho rural. Em razão de uma conjuntura econômica mais favorável, a partir de 1999, o número de ocupados no ramo agrícola se recuperou, em parte, passando em 2003 para pouco mais de 14 milhões, segundo a PNAD8. Por outro lado, as ocupações não-agrícolas no meio rural não cresceram, entre 1999 e 2003, conforme era esperado (ao contrário, houve uma retração de 4,6 milhões para 3,7 milhões de trabalhadores, nesse período). Ou seja, o mercado de trabalho rural continuava sendo predominantemente agrícola,9 em todas as regiões do País, ain-da que no Sudeste essa predominância fosse menos intensa. (PRONI et al., 2005).

A tendência de redução da ocupação agrícola, após 1995, esteve concentrada nas regiões Sudeste e Centro-Oeste, apresentando um movimento mais lento no Nordeste e no Sul. Depois de 1999, a evolução do ramo agrícola, centrada no agronegócio apoiado no financiamento privado, referendou as características perversas do mercado de traba-lho rural (como os baixos rendimentos) e sinalizou a possibilidade de aprofundamento das diferenças regionais, acarretando impactos negativos sobre as já precárias condições sociais prevalecentes nas áreas mais pobres do País. (MAIA et al., 2005).

Outro aspecto que precisa ser ressaltado diz respeito ao fato de o mercado de trabalho agrícola ser marcado por uma segmentação específica. Inclusive por-que a sazonalidade da produção e a relativa rigidez do processo produtivo têm implicações sobre a organização do trabalho, o tipo de relações de trabalho e a oferta e demanda por mão-de-obra. A taxa de assalariamento, a proporção de trabalhadores temporários e a qualidade do emprego, por exemplo, podem variar muito conforme a região e a natureza do empreendimento agropecuário.

8 Esta mensuração se refere ao conceito de “PEA restrita”, isto é, desconsidera os ocupados na pro-dução para o próprio consumo, que numa análise rigorosa estariam fora do mercado de trabalho.

9 Nos primeiros seis anos da década atual houve uma reafirmação da importância da renda do traba-lho agrícola em detrimento da renda do trabalho não-agrícola. (CAMPOLINA; SILVEIRA, 2008).

Page 151: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

151

Nos últimos anos houve uma polarização do mercado de trabalho assalariado na agricultura. (BALSADI, 2007). As informações disponíveis mostraram melhores condições de emprego (em especial, no que se refere ao rendimento mensal e ao grau de formalidade) nos estabelecimentos que produzem commodities internacionais, em comparação com as unidades destinadas a culturas domésticas tradicionais. Dentre os fatores específicos diretamente relacionados com essa polarização podem ser citados: (i) a marcante diferença de rentabilidade das atividades mais dinâmicas vis-à-vis as mais tradicionais (que têm enormes dificuldades em formalizar e remunerar bem a força de trabalho, tanto a contratada quanto a familiar); (ii) o processo de moder-nização e mecanização que se aprofundou na agricultura de grande escala (a qual emprega poucos trabalhadores qualificados e muitos com baixa qualificação); e (iii) a importância que ainda tem a mão-de-obra temporária nas atividades agropecuárias (particularmente na colheita de algumas grandes culturas como cana, laranja e café).

Embora tenha havido um aumento da formalização do emprego nas áreas ru-rais, há um aspecto negativo que se observa pela primeira vez: o desemprego aberto, fenômeno que até o início dos anos 90 era muito raro no meio rural brasileiro. Em 2006, a taxa de pessoas desocupadas nas áreas rurais chegou a 3% da População Eco-nomicamente Ativa (PEA). (CAMPOLINA; SILVEIRA, 2008). Ainda que não seja relativamente elevada, quando comparada com as áreas urbanas, essa taxa indica a presença de uma parcela dos trabalhadores rurais que não conseguiram encontrar sequer um trabalho temporário e que não estavam acomodados em atividades não-remuneradas ou de subsistência.

Note-se que, no período 1995 a 2006, ocorreu uma significativa elevação da parti-cipação relativa dos trabalhadores na produção para o próprio consumo na composição dos ocupados em atividades agropecuárias. (NEDER, 2008). Este segmento é consti-tuído basicamente por mulheres, cônjuges, com número reduzido de horas trabalhadas. Por sua vez, entre os trabalhadores não-remunerados predominam os filhos com idade entre 10 e 20 anos. Neder (2008) esclarece, ainda, que praticamente 30% do esforço ocupacional (medido em termos de quantidade de horas acumuladas de trabalho) em atividades da agropecuária estavam concentrados em formas ocupacionais não-remune-radas. Além disto, vem sendo observada uma redução do número médio de horas tra-balhadas (com exceção da produção para o próprio consumo e de algumas atividades).

Convém mencionar que o mercado de trabalho assalariado no campo prio-riza a força de trabalho masculina e que as mulheres foram mais afetadas pela redução dos postos de trabalho no ramo agrícola. Em 2003, 80% das mulheres ocupadas nesse ramo de atividade não estavam subordinadas a uma relação mer-cantil, isto é, não recebiam salário ou qualquer renda monetária, ao passo que entre os homens essa porcentagem era de 26%. (PRONI et al., 2005).

Page 152: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

152

É importante constatar que continuaram ocorrendo reconfigurações na de-manda por mão-de-obra entre as atividades que compõem o ramo agropecuário. Segundo a PNAD-2006, entre os 16,4 milhões de ocupados neste ramo pouco mais de um quarto trabalhava na pecuária (15,2% na criação de bovinos e 9,4% na cria-ção de aves), enquanto na agricultura as atividades mais importantes eram: cultivo de milho (10% dos ocupados), cultivo de produtos de horticultura (9,8%), cultivo da mandioca (7,8%), cultivo do arroz (4%), cultivo da cana-de-açúcar (3,6%), cultivo do café (3,6%), cultivo do fumo (2,8%) e cultivo da soja (1,8%). As duas principais culturas vinculadas a grandes empreendimentos (cana-de-açúcar e soja) incorpora-vam apenas 5,4% da ocupação agrícola, ao passo que as principais culturas respon-sáveis pela geração de ocupações eram dominadas pela pequena propriedade. (BU-AINAIN; DEDECCA, 2008). Além disso, pode-se constatar que a remuneração mensal média no cultivo da soja (R$ 1.222,00) era muito superior à remuneração na criação de bovinos (R$ 674,00) que, por sua vez, era superior às remunerações nas demais atividades mencionadas, tais como o cultivo de cana-de-açúcar (R$ 535,00) e de milho (R$ 398,00), ficando a menor remuneração média por conta do cultivo da mandioca (R$ 219,00). E, acrescente-se, persistem diferenças regionais expressivas no rendimento médio em todas as classes de atividade agrícola.

Finalmente, também é possível observar uma tendência de ampliação dos diferenciais de qualificação entre os mercados de trabalho agrícola e não-agrícola, bem como os diferenciais de remuneração existentes entre eles. É provável que a baixa remuneração reflita a baixa qualificação da maioria dos trabalhadores rurais, tendo pouca relação com a produtividade corrente nos segmentos em que a força de trabalho agrícola se insere. Mas, mesmo considerando que não há uma relação estreita entre a remuneração e a produtividade nos empreendimentos agrícolas, é fácil verificar que o rendimento médio auferido guarda relação com o desempe-nho produtivo e que a diferenciação de remuneração está associada à heterogenei-dade da estrutura produtiva agrícola. (BUAINAIN; DEDECCA, 2008).

Em suma, a modernização da agropecuária brasileira não foi um processo uniforme – ou seja, não atingiu igualmente todas as culturas nem todos os ti-pos de produtor rural – e aprofundou ainda mais as desigualdades regionais no campo. (PRONI; GARRIDO, 2005). Foram beneficiadas as atividades ligadas à agroindústria, ao passo que uma parcela significativa de produtores ficou à mar-gem desse processo por insuficiência de renda e/ou dificuldades de obtenção de crédito para a aquisição das novas tecnologias. Somando-se os efeitos da mecani-zação aos impactos da queda de rentabilidade das atividades agropecuárias e do enfraquecimento dos tradicionais instrumentos de políticas para o setor, nos anos 90, formou-se um quadro bastante preocupante nas áreas rurais. Na década atual, o dinamismo do ramo agropecuário centrado no agronegócio favoreceu que a

Page 153: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

153

taxa de assalariamento no campo se elevasse e que alguns indicadores mostras-sem melhoria, mas isso não ofereceu uma solução adequada para os problemas estruturais presentes no mercado de trabalho rural, mantendo um elevado grau de precariedade das condições de trabalho e uma alta vulnerabilidade na maioria dos trabalhadores rurais. (OLIVEIRA, 2009). Seguindo nessa direção a análise a seguir procura discutir se as tendências aqui mencionadas provocaram maior polarização ou aumento das desigualdades econômicas e sociais no campo.

6.4 – Mercado de Trabalho Rural e Ocupação na Agropecuária em Estados Selecionados

Para examinar de forma mais detalhada como se comportou o mercado de trabalho no ramo agropecuário, no período recente, torna-se fundamental um mapeamento das diferenças na intensidade como aquelas tendências se manifes-taram. Neste sentido, pretende-se explicitar onde se localizaram as alterações mais importantes no mercado de trabalho no campo, procurando destacar diferenças regionais e contrastar a situação observada nos estados brasileiros que concen-tram a maior parte da produção e da população ocupada nesse ramo. A análise toma como base as informações fornecidas pela PNAD e, nesta seção, não inclui os ocupados residentes no meio rural da região Norte10.

Na Tabela 5, pode-se observar que as atividades agrícolas respondiam, em 2007, por cerca de 17% da ocupação no País, mas o peso do trabalho agrícola na estrutura ocupacional variava de acordo com o estado (de 5% em São Paulo a 40% no Maranhão). Entre 2003 e 2007, houve redução no peso do trabalho agrícola em quase todos os estados selecionados11.

10 A PNAD só passou a incluir as áreas rurais da região Norte a partir de 2004. Esclarecimentos sobre o uso da PNAD e as dificuldades colocadas para a análise do comportamento da ocupação agrícola em razão da precariedade das informações disponíveis podem ser encontrados em Soares (2008).

11 A participação dos estados na distribuição da população ocupada no setor agropecuário não corresponde ao peso que cada um tem no valor da produção agropecuária nacional (por exemplo, a Bahia concentrava quase 15% dos trabalhadores agrícolas, ao passo que em São Paulo estavam 6,5%), mas parece acompanhar o peso de cada estado na distribuição da população rural brasileira (destaque para Bahia e Minas Gerais). Os estados onde a população residente no campo era nume-ricamente maior não são, necessariamente, os que apresentam maior produção agrícola (São Paulo, Rio Grande do Sul, Paraná e Minas Gerais). Fica evidente, portanto, que há grandes diferenciais regionais de produtividade entre os trabalhadores rurais, os quais remetem a diferentes graus de desenvolvimento regional.

Page 154: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

154

No País como um todo, a população ocupada no ramo agropecuário se re-duziu de 16,5 milhões para 15,5 milhões (excluindo o Norte rural), entre 2003 e 2007, indicando que tais atividades não têm sido capazes de garantir uma oferta satisfatória de ocupação e renda. Mas, de modo indireto, podem induzir a expan-são do emprego em outras atividades.

Tabela 5 - População Ocupada na Agropecuária - Brasil e Estados Selecionados: 2003, 2007 (Em %)

Unidade da Federação

Trabalhadores Agrícolasem 2003

Peso daOcupação

Agrícola 2003

Trabalhadores Agrícolasem 2007

Peso daOcupação

Agrícola 2007

Maranhão 7,3 42,3 7,4 39,6

Ceará 7,3 32,0 7,2 29,0

Pernambuco 7,3 32,8 6,7 28,6

Bahia 14,9 38,7 14,7 35,2

Espírito Santo 2,4 24,0 2,3 21,2

Minas Gerais 13,1 22,5 12,5 19,7

São Paulo 6,3 5,5 6,5 5,0

Goiás 2,7 16,3 2,9 15,4

Mato Grosso 2,2 28,8 2,6 28,7

Mato Grosso do Sul 1,3 18,4 1,4 18,5

Paraná 7,1 21,6 6,2 17,4

Santa Catarina 3,8 20,3 3,9 18,4

Rio Grande do Sul 8,9 24,8 8,4 22,1

Total dos 13 84,4 -- 83,2 --

Brasil (1) 100,0 20,5 100,0 17,4

16.484.261 15.455.697Fonte: IBGE/PNAD 2003/2007.(1) Exclui a zona rural da região Norte.

Page 155: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

155

Tabela 6 - População Ocupada Residente no Meio Rural - Brasil e Estados Selecionados: 2003, 2007 (Em %)

Unidade da Federação

População Rural Ocupada

(2003)

População Rural Ocupada

(2007)

ProporçãoAtiv. Agrícola

(2003)

ProporçãoAtiv. Agrícola

(2007)

Maranhão 7,1 7,2 83,7 76,7

Ceará 7,1 6,9 77,0 73,5

Pernambuco 7,4 6,9 83,0 77,7

Bahia 15,3 15,3 83,9 80,7

Espírito Santo 2,3 2,3 81,4 76,7

Minas Gerais 11,1 11,3 81,3 77,6

São Paulo 6,6 7,4 35,5 31,5

Goiás 2,5 2,2 71,7 76,8

Mato Grosso 2,1 2,6 80,4 78,8

Mato Grosso do Sul 1,2 1,2 68,9 69,0

Paraná 6,8 6,6 77,4 73,0

Santa Catarina 4,3 4,4 72,7 68,0

Rio Grande do Sul 9,5 9,1 77,2 74,3

Total dos 13 83,4 83,7 76,4 72,3

Brasil (1) 100,0 100,0 75,8 71,5

14.847.945 14.955.760Fonte: IBGE/PNAD 2003/2007.(1) Exclui a zona rural da região Norte.

Embora tenha diminuído o número de trabalhadores agrícolas, a população ocupada residindo no meio rural aumentou em pouco mais de 100 mil pessoas, nesse período de quatro anos. (Tabela 6). Certamente, nem todos os trabalhado-res residentes na zona rural estavam ocupados no setor agropecuário: em 2007, 28,5% estavam trabalhando em atividades não-agrícolas. É significativo que a proporção dos ocupados no meio rural, diretamente vinculados a uma atividade agropecuária, tenha se reduzido de 75,8% para 71,5% entre 2003 e 2007.

Entre os estados selecionados chama a atenção a situação invertida no Es-tado de São Paulo, onde apenas 31,5% da população rural ocupada estavam inse-ridos numa atividade agrícola. Não há dúvida de que, pelo menos neste estado, o chamado “novo rural” deu origem a uma configuração distinta para o mercado de

Page 156: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

156

trabalho, na qual mais de dois terços dos trabalhadores se distribuem em ativida-des ligadas ao comércio, à construção, à indústria, aos serviços domésticos, entre outras. Mesmo na região Nordeste, a tendência à redução do peso das ocupações agrícolas é visível (no Maranhão, queda de sete pontos percentuais). De qualquer modo, na Bahia, a proporção ocupada em atividades não-agrícolas ainda era infe-rior a 20%, em 2007, indicando que a transformação do campo vem ocorrendo de forma gradual.

Tabela 7 - População Ocupada no Ramo Agrícola segundo a Área de Residência - Brasil e Estados Selecionados: 2003, 2007 (Em %)

Unidade da Federação

2003Res. Urbana

2003Res. Rural

2007Res. Urbana

2007Res. Rural

Maranhão 26,5 73,5 28,0 72,0

Ceará 32,7 67,3 31,5 68,5

Pernambuco 24,3 75,7 23,0 77,0

Bahia 22,3 77,7 18,8 81,2

Espírito Santo 29,9 70,1 25,0 75,0

Minas Gerais 37,8 62,2 31,7 68,3

São Paulo 66,3 33,7 65,2 34,8

Goiás 40,2 59,8 42,2 57,8

Mato Grosso 30,1 69,9 23,0 77,0

Mato Grosso do Sul 42,1 57,9 39,6 60,4

Paraná 32,5 67,5 28,1 71,9

Santa Catarina 25,7 74,3 26,0 74,0

Rio Grande do Sul 25,0 75,0 22,0 78,0

Total dos 13 32,0 68,0 29,5 70,5

Brasil (1) 31,7 68,3 30,8 69,2

5.227.919 11.256.342 4.762.116 10.693.581Fonte: IBGE/PNAD 2003/2007.(1) Exclui a zona rural da região Norte.

Por sua vez, na Tabela 7 pode-se constatar que, em 2007, dos quase 15,5 milhões de trabalhadores em atividades agrícolas, no Brasil, 10,7 milhões residiam em áreas rurais, ao passo que 4,8 milhões residiam em áreas urbanas (isto é, 31% dos ocupados agrícolas moravam no meio urbano). Entre 2003 e 2007, a redução

Page 157: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

157

foi proporcionalmente maior entre os que residem em áreas urbanas. Conside-rando a distribuição nos estados selecionados, vê-se que na maioria dos casos a porcentagem dos que moram no campo aumentou no período (sete pontos percentuais no Mato Grosso). Em São Paulo, mais uma vez, as porcentagens apa-recem invertidas: quase dois terços dos trabalhadores agrícolas residiam no meio urbano e apenas pouco mais de um terço no meio rural, em 2007.

Tabela 8 - População Ocupada no Ramo Agrícola segundo a Posição na Ocupação - Brasil e Estados Selecionados: 2003, 2007 (Em %)

UF Empregado Permanente

Empregado Temporário

Conta Própria Empregador Não

RemuneradoConsumo Próprio

Total (1)

2003

MA 3,7 6,5 36,7 0,9 26,2 20,6 100,0

CE 6,2 11,0 28,9 2,4 25,9 15,4 100,0

PE 10,6 15,1 18,1 2,1 23,6 23,1 100,0

BA 11,0 16,4 26,0 1,8 27,3 11,1 100,0

ES 21,3 12,5 16,5 4,0 22,1 16,3 100,0

MG 16,5 16,3 14,5 3,5 12,3 26,9 100,0

SP 32,0 23,0 13,3 4,3 5,3 11,3 100,0

GO 26,5 17,1 20,1 5,9 8,9 15,8 100,0

MT 24,2 9,1 28,2 3,0 18,4 11,9 100,0

MS 29,7 7,7 17,2 6,0 8,6 21,1 100,0

PR 10,8 9,5 22,7 2,0 26,6 21,9 100,0

SC 8,7 6,7 24,7 5,1 33,8 17,5 100,0

RS 8,2 3,0 29,0 1,9 29,1 26,5 100,0

Brasil (2) 12,8 12,2 23,9 2,6 22,2 18,7 100,0

2.115.136 2.012.810 3.935.456 436.813 3.654.305 3.077.127 16.484.261

2007

MA 5,8 9,9 19,4 1,1 20,1 43,7 100,0

CE 6,2 11,2 29,7 2,1 25,9 24,9 100,0

PE 10,4 16,7 20,0 2,2 22,5 28,3 100,0

BA 13,3 17,4 25,7 2,1 22,5 19,1 100,0

ES 28,1 10,3 17,8 6,0 23,3 14,5 100,0

Continua

Page 158: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

158

Outra informação importante diz respeito à posição na ocupação. Na Tabela 8 pode-se notar que entre os trabalhadores agrícolas brasileiros é baixa a taxa de assalaria-mento: em 2007, apenas 29,5% tinham uma relação de emprego, sendo quase a metade empregos temporários (aí se incluindo o trabalhador volante). Em contrapartida, a cha-mada agricultura familiar respondia por cerca de dois terços desse conjunto. O trabalho por conta própria e o trabalho não-remunerado de membro do domicílio somavam 44% do total (24% e 20%, respectivamente), ao passo que a proporção de ocupados no ramo agrícola que produziam para consumo próprio alcançava quase um quarto (24%). Pode-se dizer que havia cerca de 6,7 milhões de trabalhadores agrícolas que estavam à margem das relações mercantis e que, se houvesse outro tipo de política de desenvol-vimento rural, poderiam ser efetivamente inseridos no mercado de trabalho no campo. Enfim, embora a posição na ocupação agrícola possa variar, durante o ano – em razão da sazonalidade da produção agrícola, principalmente – estes dados ajudam a dimensio-nar a grande heterogeneidade e a precariedade das situações presentes no meio rural.

Note-se que, entre 2003 e 2007, aumentou o número de empregados perma-nentes (+322 mil) e o número de empregados temporários (+108 mil); em compen-sação, diminuiu o número de trabalhadores por conta própria (-188 mil), o número de

Tabela 8 - População Ocupada no Ramo Agrícola segundo a Posição na Ocupação - Brasil e Estados Selecionados: 2003, 2007 (Em %)

UF Empregado Permanente

Empregado Temporário

Conta Própria Empregador Não

RemuneradoConsumo Próprio

Total (1)

2007

SP 40,6 24,5 13,0 3,6 5,2 13,2 100,0

GO 29,9 15,7 19,6 4,9 6,0 23,9 100,0

MT 33,5 5,4 27,8 2,1 16,8 14,5 100,0

MS 32,8 11,2 17,9 5,0 9,7 23,3 100,0

PR 15,1 10,0 27,3 2,5 22,2 23,1 100,0

SC 11,5 5,3 28,6 3,9 28,3 22,5 100,0

RS 10,6 4,0 31,1 2,4 29,4 22,6 100,0

Brasil (2) 15,8 13,7 24,2 2,5 20,0 23,8 100,0

2.437.772 2.120.354 3.743.835 393.692 3.086.648 3.673.396 15.455.697

Fonte: IBGE/PNAD 2003/2007. (1) Inclui “sem declaração”.(2) Exclui a zona rural da região Norte.

(Continuação)

Page 159: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

159

empregadores (-44 mil) e o número de trabalhadores não-remunerados (-568 mil). O aumento no número de trabalhadores na produção para consumo próprio foi de qua-se 600 mil pessoas, no período, mas provavelmente isso de deve, em parte, ao elevado número de trabalhadores que não declararam a ocupação em 2003 (7,5% do total).

Existem diferenças inter e intrarregionais expressivas em relação à posição na ocu-pação. No caso de São Paulo, a taxa de assalariamento em 2003 era de 55% e passou para 65% em 2007 (é o estado com as maiores porcentagens de empregados permanentes e temporários), enquanto a proporção de trabalhadores não-remunerados manteve-se em apenas 5%. Por outro lado, no Rio Grande do Sul, a taxa de assalariamento era de apenas 11% e subiu para 14,6%, enquanto o trabalho não-remunerado manteve-se em 29% e o trabalho por conta própria elevou-se para 31%, em 2007. Em geral, a agricultura familiar no Sul é muito diferente da agricultura familiar no Nordeste, mas a Tabela 8 não permite maiores comentários a esse respeito. Dentro de uma mesma região também há diferen-ças expressivas. Por exemplo, no Maranhão a participação de trabalhadores por conta própria alcançava 37% e caiu para 19% em 2007, ao passo que a dos não-remunerados caiu de 26% para 20% e a porcentagem dos que produzem para consumo próprio subiu de 20,6% para 43,7% no período. Por sua vez, a porcentagem dos que trabalham por conta própria na Bahia se manteve em 26%, a dos não-remunerados caiu de 27% para 22,5% e a da produção para consumo próprio subiu de 11% para 19%. Por fim, convém mencionar que o peso dos empregadores era maior no Espírito Santo (duas vezes maior que a porcentagem em Minas Gerais), seguido por Mato Grosso do Sul e Goiás (mais do que o dobro que a proporção no Mato Grosso).

Tabela 9 - Remuneração Média dos Ocupados com Rendimento no Ramo Agrícola - Brasil e Estados Selecionados: 2003, 2007 (Em R$)

Unidade da Federação

2003 2007 Var. real

nominal corrigida (1) nominal 2007/2003

Maranhão 190,70 230,83 410,98 78,0%

Ceará 157,87 191,09 221,87 16,1%

Pernambuco 193,26 233,93 303,22 29,6%

Bahia 237,92 287,99 318,89 10,7%

Espírito Santo 384,87 465,86 652,47 40,1%

Minas Gerais 400,45 484,72 552,41 14,0%

São Paulo 691,11 836,55 785,88 -6,1%

Goiás 532,53 644,59 844,74 31,0%

Mato Grosso 599,33 725,45 772,92 6,5%

Continua

Page 160: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

160

Tabela 9 - Remuneração Média dos Ocupados com Rendimento no Ramo Agrícola - Brasil e Estados Selecionados: 2003, 2007 (Em R$)

Unidade da Federação

2003 2007 Var. real

nominal corrigida (1) nominal 2007/2003

Paraná 627,85 759,97 884,67 16,4%

Santa Catarina 754,51 913,29 762,40 -16,5%

Rio Grande do Sul 540,69 654,47 815,35 24,6%

Brasil (1) 379,32 459,14 534,66 16,4%Fonte: IBGE/PNAD 2003/2007.(1) Valores corrigidos pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) (R$ de set/2007).(2) Exclui a zona rural da região Norte.

Para completar esta análise, deve-se examinar o rendimento médio dos ocupados no ramo agropecuário. (Tabela 9). Entre 2003 e 2007, no conjunto do País, houve um ganho real de 16,4%. Contudo, observando os estados selecionados, percebe-se que houve com-portamentos muito diferentes nos respectivos mercados de trabalho. A maior elevação relativa na remuneração média foi registrada no Maranhão, seguido pelo Mato Grosso do Sul, ao passo que em Santa Catarina e São Paulo houve redução do rendimento médio, no período. Acrescente-se que, em Goiás, a remuneração média acompanhou a elevação real do salário mínimo nacional (que foi de 32% no mesmo período). Ainda que na PNAD a captação dos rendimentos não seja precisa, podendo haver flutuação de um ano para outro em razão da amostragem, as tendências verificadas são coerentes.

A remuneração média dos ocupados (excluindo os que não têm rendimento mone-tário) ajuda a indicar as desigualdades em termos de organização empresarial dos empre-endimentos agropecuários no Brasil. Em 2007, entre os estados selecionados percebe-se que o rendimento médio mais elevado encontrava-se no Mato Grosso do Sul, muito acima das médias computadas nos demais estados. No polo oposto, o nível médio mais baixo corresponde ao Ceará. Em todos os estados do Nordeste o rendimento médio era inferior à média nacional. Observe-se que, entre 2003 e 2007, aumentaram as diferenças intrarre-gionais no Nordeste e no Centro-Oeste, enquanto no Sudeste e no Sul elas diminuíram.

Em suma, no período aqui examinado, de 2003 a 2007, podem ser constatados sinais claros de mudança no mercado de trabalho rural, com diminuição do peso do tra-balho agrícola e certa melhoria em indicadores da qualidade das ocupações neste ramo de atividade, seguindo as tendências gerais do mercado de trabalho não-agrícola. Con-tudo, tais melhorias se distribuíram de maneira diversa entre os estados. Pode-se afirmar que aumentou a polaridade, uma vez que se ampliou a taxa de assalariamento (tanto de emprego permanente quanto temporário) e aumentou a porcentagem de trabalhadores

Conclusão

(Continuação)

Page 161: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

161

à margem das relações mercantis (aqueles que podem ser recrutados pelos empreendi-mentos organizados nos momentos de ápice da demanda por mão-de-obra). Também ficou claro que as situações precárias continuam predominantes e que a heterogeneidade estrutural tende a permanecer. E, pelos dados apresentados, há indicações de aumento das desigualdades em alguns aspectos, mas de redução em outros. A análise a seguir pro-cura avançar um pouco mais no mapeamento da situação do trabalho na agropecuária para subsidiar a discussão das diferenças inter e intrarregionais existentes no País.

6.5 – Diferenças Regionais no Perfil dos Trabalhadores Agrícolas

Para compreender melhor a configuração do mercado de trabalho no campo e as especificidades do trabalho na agropecuária, no Brasil, convém começar examinando as características pessoais desses trabalhadores. Note-se que, nesta seção, foi incluída a população rural da região Norte (o que permitiu acrescentar o Estado do Pará). Em 2007, a PNAD estima em 16.578.880 o total dos ocupados no ramo agrícola, no País.

Tabela 10 - Remuneração Média dos Ocupados com Rendimento no Ramo Agrícola - Brasil e Estados Selecionados: 2003, 2007 (Em R$)

Unidade da Federação Homens Mulheres Total

Pará 69,8 30,2 100,0

Maranhão 65,2 34,8 100,0

Ceará 70,7 29,3 100,0

Pernambuco 68,2 31,8 100,0

Bahia 68,3 31,7 100,0

Espírito Santo 69,5 30,5 100,0

Minas Gerais 67,4 32,6 100,0

São Paulo 75,2 24,8 100,0

Goiás 76,3 23,7 100,0

Mato Grosso 72,8 27,2 100,0

Mato Grosso do Sul 72,6 27,4 100,0

Paraná 64,2 35,8 100,0

Santa Catarina 58,6 41,4 100,0

Rio Grande do Sul 60,0 40,0 100,0

Brasil 67,9 32,1 100,0Fonte: IBGE/PNAD 2007.

Page 162: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

162

Em primeiro lugar, a Tabela 10 confirma que os homens continuam sendo maioria (mais de dois terços do total nacional, em 2007). De um modo geral, as di-ferenças regionais na divisão por gênero da população ocupada no ramo agrícola apontam uma participação maior das mulheres no Sul e menor no Centro-Oeste. Destaque-se que a participação feminina variava de 24% em Goiás e 25% em São Paulo até 40% no Rio Grande do Sul e 41% em Santa Catarina.

Por sua vez, quando observada a idade dos trabalhadores agrícolas brasi-leiros, nota-se uma porcentagem relativamente alta nas primeiras faixas etárias e na última. (Tabela 11). Em 2007, 14,4% tinham idade entre 10 e 19 anos e 16% tinham 60 anos ou mais. As diferenças regionais indicam uma frequência de tra-balhadores agrícolas com menos de 20 anos de idade maior no Nordeste (21% no Maranhão e 20% em Pernambuco), e menor no Centro-Oeste (apenas 7% em Goiás). Observe-se que em São Paulo foi registrada a menor porcentagem de ocu-pados com menos de 15 anos de idade. Por outro lado, entre os estados seleciona-dos, a proporção com idade acima de 60 anos era mais expressiva no Rio Grande do Sul (21%) e menor no Pará (11%), no Mato Grosso e no Maranhão (12%).

Tabela 11 - Ocupados no Ramo Agrícola segundo Faixas Etárias - Brasil, Estados Selecionados: 2007 (Em %)

UF 10 a 14 anos 15 a 19 20 a 24 25 a 29 30 a 39 40 a 49 50 a 59 60 anos

ou mais Total (1)

PA 7,4 11,7 11,6 10,8 19,5 15,4 12,4 11,3 100,0

MA 9,2 11,5 8,8 9,0 18,8 17,5 13,1 12,2 100,0

CE 6,5 11,9 9,2 8,5 16,0 16,9 14,2 16,7 100,0

PE 6,6 13,2 11,5 9,2 17,0 15,6 13,9 13,1 100,0

BA 5,0 9,7 10,4 10,7 19,5 16,5 14,3 13,9 100,0

ES 3,2 7,0 8,6 10,3 20,0 19,9 17,0 14,1 100,0

MG 3,9 7,5 7,7 9,0 18,7 19,6 15,9 17,7 100,0

SP 1,4 8,4 9,9 11,1 20,3 20,2 13,4 15,4 100,0

GO 1,7 5,5 7,9 8,8 19,8 20,2 18,3 17,8 100,0

MT 2,8 6,9 8,3 12,6 21,3 20,5 15,8 11,8 100,0

MS 2,7 7,4 7,0 8,7 17,8 21,3 16,2 18,8 100,0

PR 5,8 8,1 6,6 7,1 17,1 21,8 16,3 17,2 100,0

SC 5,1 9,6 9,1 7,1 14,7 20,1 17,6 16,7 100,0

RS 5,8 7,3 5,5 4,7 15,6 19,6 20,7 20,8 100,0

Brasil 5,3 9,5 9,1 9,2 18,2 18,1 15,3 15,4 100,0Fonte: IBGE/PNAD 2007.(1) Inclui “sem declaração”.

Page 163: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

163

Quanto ao grau de instrução formal dos trabalhadores agrícolas, ainda que esteja em curso uma melhoria gradual, a condição da maioria permanece ainda muito pre-cária. Na Tabela 12, vê-se que, entre os que estavam ocupados nesse setor, no Brasil, metade era analfabeta funcional, em 2007: 25% não tinham estudado ou não tinham completado o primeiro ano escolar; e outros 24% tinham frequentado apenas as pri-meiras séries do antigo curso primário (entre 1 e 3 anos de estudo). Por outro lado, apenas 17% tinham completado ou ultrapassado o ensino fundamental (8 anos ou mais de estudo). Em termos regionais, a maior proporção de trabalhadores agrícolas com carência educacional absoluta estava no Nordeste (35% sem instrução na Bahia e 34% no Maranhão), enquanto no extremo Sul era mais raro encontrar trabalhadores sem instrução (8% em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul). Os estados onde uma parcela maior desses trabalhadores apresentava um nível de escolaridade um pouco melhor, em 2007, eram São Paulo, Mato Grosso do Sul e Paraná (14%, 12,5% e 11%, respectivamente, tinham pelo menos o ensino médio completo). É provável que as diferenças estaduais tenham relação com o acesso à escola no meio rural e nas peque-nas cidades do interior, assim como deve ter alguma relação com a maior ou menor exigência de qualificação profissional nessas atividades.

Tabela 12 - Ocupados no Ramo Agrícola segundo Faixa de Anos de Estudo Completo Brasil, Estados Selecionados: 2007 (Em %)

UF Sem instrução Entre 1 e 3

Entre 4 e 7

Entre 8 e 10

Entre 11 e 14

15 anos ou mais Total (1)

PA 27,8 29,4 28,9 10,7 2,9 0,1 100,0

MA 33,9 31,5 25,1 7,3 1,8 0,2 100,0

CE 33,4 24,6 26,3 9,8 5,2 0,2 100,0

PE 31,8 25,5 30,4 8,0 3,6 0,2 100,0

BA 34,7 25,1 27,2 8,3 4,4 0,1 100,0

ES 21,1 16,3 41,4 13,6 6,7 0,8 100,0

MG 18,9 25,1 37,0 11,7 6,4 0,8 100,0

SP 14,1 20,8 35,4 15,6 12,6 1,5 100,0

GO 19,3 23,7 36,1 11,2 8,0 1,6 100,0

MT 19,6 20,2 39,3 12,6 6,6 1,6 100,0

MS 17,5 22,9 35,8 11,2 9,5 3,0 100,0

PR 13,4 21,0 40,8 13,4 10,3 0,9 100,0

SC 7,7 19,2 51,6 12,0 8,3 0,4 100,0

RS 8,2 17,7 54,9 12,0 6,2 1,0 100,0

Brasil 24,8 24,3 33,9 10,3 5,8 0,6 100,0Fonte: IBGE/PNAD 2007.(1) Inclui “sem declaração”.

Page 164: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

164

Os trabalhadores agrícolas estão entre os que recebem, no Brasil, os mais baixos rendimentos. Em 2007, 59% dos ocupados no ramo agropecuário ganhavam até 1 salário mínimo (excluindo-se os que não recebiam rendimentos monetários), ao passo que só 7,6% recebiam acima de 3 salários mínimos. Contudo, de acordo com a Tabela 13, nota-se que há diferenciais importantes entre os estados no que se refere à remu-neração mensal na ocupação principal. Os estados da região Nordeste apresentavam uma situação mais precária (no Ceará e no Maranhão mais da metade desses trabalha-dores ganhava no máximo 0,5 salário mínimo). Em contrapartida, essa porcentagem era muito pequena em São Paulo (3%) e Santa Catarina (5%). No polo oposto, chama atenção a maior proporção dos que tinham rendimento superior a 3 salários mínimos no Rio Grande do Sul, Paraná e Mato Grosso do Sul (15%). Em Minas Gerais e no Pará as distribuições eram semelhantes. Embora as desigualdades regionais na distri-buição dos rendimentos fossem bem evidentes, diferenças significativas também eram observadas entre estados da mesma região.

Certamente, a alta concentração de ocupados nas primeiras faixas (até 2 s.m.) implica uma renda média muito baixa. As diferentes distribuições de acordo com faixas de renda ajudam a entender melhor as diferenças por estado na remunera-ção média do trabalho agrícola.

Tabela 13 - População Ocupada no Ramo Agrícola segundo Faixas de Rendimento Mensal Brasil, Estados Selecionados: 2007 (Em %)

UF Até 0,5 s.m. (1) Mais de 0,5 a 1,0

Mais de 1,0 a 2,0

Mais de 2,0 a 3,0

Mais de 3,0 a 5,0

Acima de 5,0 s.m. Total (2)

PA 11,5 45,5 30,3 4,4 3,9 2,9 100,0

MA 50,5 30,2 10,9 1,9 1,9 4,5 100,0

CE 56,9 30,5 7,8 1,4 0,8 0,5 100,0

PE 36,0 41,7 14,7 2,1 0,7 0,8 100,0

BA 31,9 48,1 15,1 2,1 0,7 1,1 100,0

ES 7,7 37,9 33,5 8,8 4,4 5,7 100,0

MG 14,7 42,8 29,6 5,8 2,5 4,4 100,0

SP 3,4 18,6 51,6 14,6 4,4 5,8 100,0

GO 6,7 28,5 40,8 10,7 5,3 7,1 100,0

MT 6,5 20,7 42,9 13,6 7,1 6,5 100,0

MS 9,7 22,5 41,6 11,4 6,9 7,9 100,0

PR 13,5 28,6 33,5 7,6 6,6 8,5 100,0

SC 5,3 19,1 40,8 18,3 8,9 5,7 100,0Continua

Page 165: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

165

Tabela 13 - População Ocupada no Ramo Agrícola segundo Faixas de Rendimento Mensal Brasil, Estados Selecionados: 2007 (Em %)

UF Até 0,5 s.m. (1) Mais de 0,5 a 1,0

Mais de 1,0 a 2,0

Mais de 2,0 a 3,0

Mais de 3,0 a 5,0

Acima de 5,0 s.m. Total (2)

RS 12,4 27,4 31,5 11,6 6,4 8,8 100,0

Brasil 24,4 34,4 26,2 6,2 3,0 3,9 100,0Fonte: IBGE/PNAD 2007.(1) Exclui os “sem rendimentos”.(2) Inclui os “sem declaração”.

Tabela 14 - Ocupados no Ramo Agrícola segundo Faixas de Jornada de Trabalho Semanal Brasil, Estados Selecionados: 2007 (Em %)

UF Até 14 horas (1) Entre 15 e 39

Entre 40 e 44

Entre 45 e 48

Acima de 48 horas Total (1)

PA 17,5 36,1 23,7 13,4 9,4 100,0

MA 20,4 42,5 26,0 6,1 4,9 100,0

CE 15,3 41,5 25,3 11,2 6,7 100,0

PE 13,6 40,8 22,8 9,6 13,2 100,0

BA 11,1 40,6 27,0 10,0 11,3 100,0

ES 13,3 29,7 20,4 17,4 19,2 100,0

MG 17,4 25,7 24,6 15,4 16,9 100,0

SP 10,3 14,4 32,9 17,3 25,2 100,0

GO 17,2 17,0 19,2 15,5 31,0 100,0

MT 16,2 21,1 18,1 19,1 25,5 100,0

MS 21,5 21,2 16,3 16,8 24,2 100,0

PR 24,9 26,6 17,4 9,6 21,4 100,0

SC 18,4 23,7 15,3 7,2 35,4 100,0

RS 22,4 28,6 13,2 7,2 28,7 100,0

Brasil 16,8 33,3 22,5 11,1 16,3 100,0Fonte: IBGE/PNAD 2007.(1) Inclui “sem declaração”.

Outra informação relevante diz respeito à grande variação no que se refere à jornada de trabalho semanal no setor agropecuário. (Tabela 14). Se, de um lado, havia uma proporção considerável dos ocupados nessas atividades que trabalha-vam acima de 48 horas por semana (16%), em 2007, por outro lado, 50% tinham jornada inferior a 40 horas, sendo que 17% trabalhavam no máximo 14 horas

(Continuação)

Page 166: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

166

semanais. Como já foi mencionado, os trabalhadores na produção para consumo próprio e os não-remunerados têm jornadas bem menores do que os assalariados. Por sua vez, destaca-se a menor parcela dos que trabalhavam acima de 48 horas nos estados do Nordeste (em especial, no Maranhão e no Ceará) e no Norte, assim como a elevada parcela com jornada mais extensa em Santa Catarina (35%) e Goiás (31%). Em contrapartida, a porcentagem dos trabalhadores agrícolas que tinham jornada semanal inferior a 15 horas era maior no Paraná (25%) e menor em São Paulo (10%) e na Bahia (11%). Mais adiante serão apresentadas as médias das jornadas semanais de trabalho por estado.

Tabela 15 - Ocupados no Ramo Agrícola com Remuneração segundo a Posição na Ocupação Brasil, Estados Selecionados: 2007 (Em %)

UF Empregado Cart. Assin.

Empregado Sem Cart.

Conta Própria Empregador Total (1)

PA 6,7 35,5 52,5 5,3 100,0

MA 5,8 36,4 54,8 3,0 100,0

CE 3,9 31,8 59,9 4,4 100,0

PE 20,3 36,8 38,3 4,6 100,0

BA 10,0 42,7 43,6 3,7 100,0

ES 16,9 45,4 28,1 9,7 100,0

MG 25,3 40,3 29,4 5,0 100,0

SP 54,4 26,2 15,2 4,2 100,0

GO 28,1 37,4 27,8 6,7 100,0

MT 30,3 27,8 38,7 3,2 100,0

MS 38,0 27,7 26,8 7,5 100,0

PR 20,0 26,2 49,3 4,6 100,0

SC 13,0 21,3 57,6 8,1 100,0

RS 12,9 17,7 64,5 4,9 100,0

Brasil 18,5 33,5 43,6 4,4 100,0Fonte: IBGE/PNAD 2007.(1) Exclui “não remunerado” e “produção para o próprio consumo”.

Na Tabela 15 pode ser observada a distribuição relativa dos ocupados com remuneração mensal monetária (pouco mais de 9 milhões de pessoas), de acor-do com a posição na ocupação. Em 2007, no Brasil, um terço desses ocupados era empregado sem carteira assinada e menos de um quinto tinha o registro em carteira, ao passo que 44% trabalhavam por conta própria. Ou seja, excluindo o trabalho não-remunerado e o trabalho na produção para consumo próprio, a taxa de assalariamento nas atividades agropecuárias era de 52%.

Page 167: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

167

Comparando os estados, chama a atenção o elevado grau de formalização do emprego agrícola em São Paulo, onde 54% dos ocupados com remuneração eram empregados com carteira assinada e 80% eram assalariados. Por outro lado, a porcentagem com carteira assinada era muito baixa no Nordeste, em especial no Ceará e no Maranhão (4% e 6%). Também devem ser destacadas as elevadas porcentagens de trabalho por conta própria no Rio Grande do Sul (64,5%) e no Ceará (60%), assim como a maior participação dos empregadores no Espírito Santo (10%), onde também foi registrada a maior porcentagem de empregados sem carteira assinada (45%).

Tabela 16 - Rendimento Médio dos Ocupados no Ramo Agrícola segundo Gênero Brasil e Estados Selecionados: 2007

Unidade da Federação

Homens(R$)

Mulheres(R$)

Total(R$)

Homens(S.M.)

Mulheres(S.M.)

Total(S.M.)

Pará 571,50 286,74 541,74 1,50 0,75 1,43

Maranhão 472,18 80,70 410,98 1,24 0,21 1,08

Ceará 225,44 171,00 221,87 0,59 0,45 0,58

Pernambuco 313,45 200,63 303,22 0,82 0,53 0,80

Bahia 337,29 213,45 318,89 0,89 0,56 0,84

Espírito Santo 656,10 604,09 652,47 1,73 1,59 1,72

Minas Gerais 573,65 364,16 552,41 1,51 0,96 1,45

São Paulo 854,64 484,64 785,88 2,25 1,28 2,07

Goiás 853,60 697,15 844,74 2,25 1,83 2,22

Mato Grosso 796,54 479,31 772,92 2,10 1,26 2,03

Mato Grosso do Sul 1.330,70 655,89 1.277,12 3,50 1,73 3,36

Paraná 922,00 603,40 884,67 2,43 1,59 2,33

Santa Catarina 801,40 565,91 762,40 2,11 1,49 2,01

Rio Grande do Sul 848,17 582,81 815,35 2,23 1,53 2,15

Brasil (1) 558,96 350,26 534,66 1,47 0,92 1,41Fonte: IBGE/PNAD 2007.

Dando prosseguimento à análise do perfil dos ocupados no ramo agrícola, com ênfase nas diferenças estaduais, é importante considerar que entre as carac-terísticas mais marcantes do mercado de trabalho rural no Brasil estão as desi-gualdades de rendimentos por gênero. Deve-se frisar que, na Tabela 16, foram excluídos os ocupados sem rendimentos no cálculo da renda média para evitar distorções (lembrando que a proporção de mulheres ocupadas sem remuneração é bem maior que a dos homens). No contexto nacional, nota-se que o rendimento médio dos trabalhadores agrícolas situava-se em torno de 1,41 salário mínimo, em

Page 168: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

168

2007, e que as mulheres ganhavam 63% do que recebiam os homens (0,92 s.m. contra 1,47 s.m.). O Espírito Santo é o Estado onde a disparidade entre as rendas médias por gênero era menor (os homens ganhavam 9% mais que as mulheres). Por outro lado, no Mato Grosso do Sul os homens ganhavam, em média, mais que o dobro (mas a remuneração média das mulheres era maior que na maioria dos demais estados). E era imensa a disparidade registrada no Maranhão (os ho-mens recebiam quase seis vezes mais) porque as mulheres ganhavam apenas 0,21 s.m., em média.

A Tabela 16 também permite comparar os diferenciais de rendimento do tra-balho na agropecuária entre os estados selecionados. O rendimento médio entre os trabalhadores agrícolas no Mato Grosso do Sul (3,36 s.m.) correspondia a 2,4 vezes a média nacional, ao passo que no Pará (1,43 s.m.) era equivalente à média nacional e no Ceará (0,58 s.m.) correspondia a 41,5% da média nacional. Também se pode destacar o fato de o rendimento médio variar dentro da mesma região. E mencionar que as mulheres em Goiás recebiam, em média, mais do que os homens em Minas Gerais e no Espírito Santo, enquanto os homens ocupados neste ramo no Nordeste ganhavam menos que as mulheres nas regiões Sul e Centro-Oeste.

Tabela 17 - Rendimento Médio na Atividade Agrícola segundo a Posição na Ocupação - Brasil, Estados Selecionados: 2007 (Em R$)

UF Empregado Permanente

Empregado Temporário

Empregado Cart. Assin.

Empregado Sem Cart.

Conta Própria Empregador Total (1)

PA 453,93 303,04 528,37 338,34 509,71 2.245,98 541,74

MA 382,63 188,68 580,39 205,19 417,61 2.462,32 410,98

CE 307,09 192,25 496,75 201,05 170,48 836,93 221,87

PE 346,72 285,89 444,77 234,53 229,84 841,29 303,22

BA 399,37 217,77 528,05 241,41 298,79 889,49 318,89

ES 464,57 345,53 502,12 407,02 768,68 1.729,89 652,47

MG 499,31 345,77 549,87 353,66 580,41 2.016,84 552,41

SP 619,57 533,55 649,24 458,30 1.107,17 3.432,05 785,88

GO 696,28 435,07 761,37 489,04 891,97 2.988,66 844,74

MT 713,21 515,73 835,81 521,87 738,40 2.779,85 772,92

MS 748,56 396,72 764,22 514,30 619,44 9.032,98 1.277,12

PR 590,74 319,38 657,43 346,61 1.083,59 2.807,97 884,67

SC 576,25 407,44 580,56 488,39 823,21 1.346,31 762,40

RS 554,61 296,75 612,88 387,60 795,45 3.162,01 815,35

Brasil 515,23 305,39 602,89 314,66 509,26 2.168,40 534,66Fonte: IBGE/PNAD 2007.(1) Exclui “não remunerado” e “produção para o próprio consumo”.

Page 169: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

169

Os diferenciais de rendimentos entre os ocupados em atividades agrope-cuárias também são expressivos quando se considera a posição na ocupação. A Tabela 17 contempla os dois critérios de classificação dos empregados agrícolas utilizados pelo IBGE. No Brasil, em 2007, os empregadores em empreendimento agrícola tinham uma renda média mais de sete vezes superior à dos empregados temporários, que eram os que detinham a menor remuneração média. No cená-rio nacional, o salário médio dos empregados permanentes era 69% maior que o dos empregados temporários e era um pouco maior que o rendimento médio dos trabalhadores por conta própria. Por sua vez, o salário médio dos empre-gados sem carteira assinada era metade (52%) do recebido pelos empregados com registro em carteira.

Comparando os valores registrados por estado, destacam-se algumas si-tuações que destoam da média nacional. Entre os empregados permanentes o maior rendimento médio estava no Mato Grosso do Sul (1,97 s.m.) e o menor estava no Ceará (0,81 s.m.). Entre os empregados temporários essa diferença também era expressiva: 1,36 s.m. no Mato Grosso e 0,50 s.m. no Maranhão. O diferencial também era alto entre os empregados com carteira assinada (2,20 s.m. no Mato Grosso contra 1,17 s.m. em Pernambuco) e entre os sem carteira (1,37 s.m. no Mato Grosso contra 0,53 s.m. no Ceará). Já entre os trabalhadores por conta própria o maior rendimento médio estava em São Paulo (2,91 s.m.), 6,5 vezes maior que o rendimento médio análogo ao Ceará (0,45 s.m.). Além disso, é muito importante ressaltar, ainda, as diferenças no rendimento do tra-balho agrícola dentro da mesma região. Por exemplo, os níveis médios registra-dos para os empregados com carteira assinada, para os trabalhadores por conta própria e para os empregadores, no Maranhão, eram superiores aos dos demais estados selecionados do Nordeste.

Ainda em relação a este ponto, mencione-se que a disparidade entre os rendimentos de acordo com a posição na ocupação era mais baixa em Santa Catarina (onde os empregadores tinham renda 3,3 vezes superior à renda dos empregados temporários). Também era relativamente baixa a disparidade de renda em Pernambuco (3,7 vezes). Por outro lado, tal disparidade alcançava 22,8 vezes no Mato Grosso do Sul e 10,7 vezes no Rio Grande do Sul.

Para completar a análise aqui empreendida, resta comparar as diferenças de jornada média de trabalho relacionadas ao gênero e à posição na ocupação. É pos-sível supor, desde logo, que os diferenciais de rendimento médio podem estar em parte relacionados com as diferenças em termos de horas trabalhadas por semana.

Page 170: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

170

Tabela 18 - Jornada Média dos Ocupados no Ramo Agrícola segundo o Gênero - Brasil e Estados Selecionados: 2007 (Em Horas/Semana)

Unidade da Federação Homens Mulheres Total

Pará 41,5 32,2 40,6

Maranhão 37,8 28,1 36,3

Ceará 40,0 28,8 39,3

Pernambuco 42,7 32,8 41,8

Bahia 40,3 32,9 39,2

Espírito Santo 44,2 40,8 44,0

Minas Gerais 45,1 37,3 44,3

São Paulo 45,9 43,2 45,4

Goiás 48,4 40,6 47,9

Mato Grosso 46,2 39,8 45,7

Mato Grosso do Sul 46,7 38,3 46,0

Paraná 44,4 36,4 43,5

Santa Catarina 49,0 41,5 47,7

Rio Grande do Sul 47,4 36,1 46,0

Brasil 43,1 34,9 42,1Fonte: IBGE/PNAD 2007.(1) Exclui “não remunerado” e “produção para o próprio consumo”.

Na Tabela 18 a primeira observação a ser feita é que foram computados apenas os ocupados em atividades remuneradas. Evidentemente, as mulheres ti-nham jornada semanal média menor que os homens (35 horas contra 43 horas, no contexto nacional). Se fossem incluídos os ocupados sem rendimento monetário, certamente a jornada de trabalho feminina seria bem menor, em especial nos estados do Nordeste.

Na comparação regional, as médias gerais mais baixas pertenciam ao Nor-deste, e as mais elevadas ao Centro-Oeste e ao Sul. Entre os estados selecionados ressalte-se que os trabalhadores agrícolas trabalhavam 48 horas por semana, em média, em Goiás e em Santa Catarina, mas apenas 36 horas no Maranhão. As maiores disparidades também estavam no Nordeste: no Ceará os homens tra-balhavam 11 horas a mais que as mulheres, e em Pernambuco 10 horas a mais. Por outro lado, em São Paulo a defasagem era de menos três horas, uma vez que a jornada média feminina era relativamente alta (43 horas, maior que a jornada masculina nos estados selecionados do Norte e do Nordeste).

Page 171: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

171

Tabe

la 19

- Jo

rnad

a M

édia

de

Trab

alho

dos

Ocu

pado

s na

Ativ

idad

e Ag

rícol

a po

r Pos

ição

na

Ocu

paçã

o B

rasi

l, E

stad

os S

elec

iona

dos:

2007

(Em

Hor

as/S

eman

a)

UF

Em

preg

ado

Car

t. A

ssin

.E

mpr

egad

o Se

m C

art.

Con

ta

Próp

riaE

mpr

egad

orN

ão R

emun

.da

Fam

ília

Out

roN

ão R

em.

Con

sum

oPr

óprio

Tota

l

PA44

,843

,038

,440

,325

,930

,710

,632

,2

MA

47,1

37,3

34,4

37,2

22,6

32,8

24,1

28,3

CE

45,6

40,6

38,2

38,4

25,2

32,1

19,2

30,6

PE47

,739

,940

,243

,426

,523

,724

,233

,1

BA47

,639

,936

,934

,424

,435

,023

,032

,7

ES

46,6

44,8

41,4

42,8

32,4

22,0

12,2

36,5

MG

47,8

43,1

43,0

44,3

30,0

29,3

17,1

35,4

SP47

,143

,242

,945

,429

,446

,317

,440

,6

GO

51,2

48,6

44,8

43,4

29,0

35,5

18,2

39,6

MT

49,0

46,5

42,6

44,9

26,4

28,0

13,7

37,5

MS

50,1

46,0

40,7

44,7

23,0

10,0

12,1

35,8

PR48

,642

,041

,946

,428

,729

,813

,333

,0

SC46

,645

,247

,756

,837

,342

,714

,537

,3

RS50

,641

,545

,950

,834

,035

,812

,634

,9

Bra

sil

48,0

41,6

39,9

42,9

27,6

30,7

18,9

33,6

Font

e: IB

GE

/PN

AD

200

7.

Page 172: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

172

Quando considerada a posição na ocupação (Tabela 19), percebe-se que os trabalhadores agrícolas com maior jornada, no Brasil, eram os empregados com carteira assinada (em média, 48 horas por semana), ao passo que os trabalha-dores por conta própria tinham jornada média de 40 horas semanais. Os não-remunerados membros da família trabalhavam, em média, menos de 28 horas, e os trabalhadores para consumo próprio (a maioria mulheres), apenas 19 horas semanais. No conjunto, incluindo os ocupados que estavam à margem das rela-ções mercantis, a jornada média na atividade agropecuária situava-se em torno de 34 horas por semana, em 2007, mas essa média resulta da combinação de extensas jornadas de uma parcela da força de trabalho, de um lado, com jornadas reduzidas de outra parcela dos ocupados, de outro. Sem dúvida, os trabalhadores agrícolas despendem maior ou menor número de horas na atividade econômica, conforme a posição na ocupação.

Na comparação regional merecem destaque: a) a elevada jornada entre em-pregados com carteira assinada em Goiás e no Rio Grande do Sul (51 horas por semana), e entre os sem carteira em Goiás (49 horas); b) a elevada jornada entre os trabalhadores por conta própria em Santa Catarina (48 horas); c) a menor jornada entre empregadores na Bahia (34 horas) e a alta jornada dos empregadores em Santa Catarina (57 horas); d) a relativamente elevada jornada média dos membros da família não-remunerados em Santa Catarina (37 horas); e) a maior jornada na produção para consumo próprio no Nordeste, em particular no Maranhão e em Pernambuco (24 horas), que se contrapõe à menor jornada análoga no Pará (11 horas); e f) a maior jornada média dos trabalhadores agrícolas em São Paulo (41 horas).

Enfim, o mapeamento dos perfis regionais e estaduais dos trabalhadores na agropecuária indica claramente as diferentes situações ocupacionais, que cer-tamente têm correspondência com as características da estrutura produtiva e o maior ou menor dinamismo do agronegócio em cada estado ou região do País.

6.6 – Considerações Finais

As transformações estruturais observadas na agropecuária brasileira desde os anos 80 e intensificadas pelas políticas macroeconômicas dos anos 90 tive-ram, em grande medida, consequências negativas em termos de geração direta de ocupações e de condições de trabalho. Mas, na década atual, as tendências do mercado de trabalho rural têm exigido leituras mais detalhadas que permitam exa-minar a complexidade das questões envolvidas. É verdade que muitas ocupações

Page 173: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

173

foram criadas em atividades adjacentes à produção agropecuária, em especial nos pequenos municípios, mas os resultados positivos da expansão dos agronegócios, no que se refere ao mercado de trabalho no campo, parecem ter ficado limitados aos polos mais dinâmicos da agroindústria nacional – e, mesmo nesses casos, observa-se a combinação entre atraso e modernidade, com a ampliação recente das relações de assalariamento em meio à reprodução de graves situações de vulnerabilidade social.

Embora tenha havido, nos últimos anos, um desempenho vigoroso da agro-pecuária, o comportamento do emprego na agricultura permaneceu muito aquém do necessário para absorver o grande contingente de trabalhadores agrícolas ain-da existente e para elevar de forma significativa os seus rendimentos. A lógica do grande empreendimento agrícola é a da acumulação intensiva em capital, que gera relativamente poucos postos de trabalho na produção. A maioria dos ocupa-dos continua trabalhando em pequenos estabelecimentos e vivendo em situação muito instável (essas pessoas continuam sujeitas à sazonalidade das culturas, às variações climáticas e às oscilações dos preços básicos). É possível dizer, inclusive, que o estoque de trabalhadores agrícolas sem remuneração monetária, ocupados em atividades de subsistência ou auxiliando a pequena produção do seu núcleo familiar, corresponde a uma espécie de “desemprego oculto”, que ajuda a ali-mentar uma alta rotatividade nos postos de trabalho (uma vez que é fácil trocar trabalhadores pouco qualificados) e pressiona os salários para baixo.

Como existem profundos desníveis no desenvolvimento regional (e diferen-ças internas a cada região), particularmente em relação ao grau de mecanização da agricultura e de sofisticação da pecuária, os problemas relacionados ao mercado de trabalho rural ganham colorido diferente em cada área produtiva do País, sen-do possível identificar onde a população rural está exposta a um maior grau de vulnerabilidade, áreas onde predominam o assalariamento com relações de traba-lho precárias e áreas onde a agricultura familiar está melhor estruturada. Mesmo havendo uma movimentação espontânea de trabalhadores agrícolas oriundos de áreas estagnadas em direção a localidades mais dinâmicas ou a escassas áreas de fronteira agrícola ainda abertas, na ausência de uma intervenção eficaz do Estado é provável que o imenso estoque de força de trabalho ociosa (ou subutilizada) no campo perdure por muito tempo, assim como é provável que se mantenham as desigualdades regionais no meio rural aqui relatadas. Embora o Governo Federal tenha ampliado consideravelmente os recursos destinados a programas de fomen-to à agricultura familiar, como o PRONAF, tais programas poderiam apresentar resultados melhores se houvesse um conjunto de políticas convergentes (taxa de câmbio, juros, garantia de preço mínimo etc.) e se alcançassem um número maior de famílias vivendo nas zonas rurais.

Page 174: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

174

Os distintos perfis dos trabalhadores agrícolas colocam em evidência os tra-ços mais visíveis de uma problemática que denota as precárias condições ocupa-cionais dessa população. Em primeiro lugar, há um elevado número de pessoas trabalhando no meio rural à margem das relações mercantis, as quais podem ser classificadas como “exército agrícola de reserva” (ainda que uma parcela nunca alcance uma inserção produtiva em empreendimentos agrícolas). Por outro lado, a maioria daqueles que estão empregados em estabelecimentos agropecuários é submetida a baixos níveis de rendimento mensal e a jornadas de trabalho exten-sas. Qualquer que seja a região do País, a situação ocupacional das mulheres é claramente mais desfavorável que a dos homens. Além disso, destaque-se que os trabalhadores agrícolas são precocemente iniciados na vida ativa e, em geral, não deixam de trabalhar com o avanço para faixas etárias acima de 60 anos. Chamam a atenção, ainda, o baixo grau de instrução e a dificuldade de qualificação profis-sional dessa população, o que não parece ter impedido a introdução de inovações tecnológicas nos grandes empreendimentos.

O foco da análise se concentrou nas diferenças regionais e na explicitação do grau de heterogeneidade presente nas atividades agrícolas. Os diferenciais entre as Unidades da Federação relacionados ao perfil dos trabalhadores agrícolas mostra-ram que o recorte por grandes regiões pode ocultar especificidades importantes. De fato, as comparações estaduais fornecem uma riqueza de detalhes que torna mais útil o mapeamento dos problemas centrais. Portanto, embora seja essencial uma política de fomento às atividades rurais em âmbito nacional, os programas específicos destinados à superação das distintas situações de precariedade aqui explicitadas devem tomar como referência o contexto socioeconômico em cada estado, em particular no que se refere aos diferentes níveis de desenvolvimento agropecuário e de estruturação da agricultura familiar.

Em resumo, a caracterização das pessoas economicamente ocupadas no ramo agrícola sugere: (i) que as condições do mercado de trabalho rural são mais favoráveis onde os agronegócios estão melhor estruturados; (ii) que foi tímida a melhoria observada no perfil dos trabalhadores agrícolas no período 2003-2007, permanecendo ainda muitas precariedades a serem enfrentadas, em especial nas regiões onde a agropecuária é mais atrasada; e (iii) que tal melhoria se processa muito lentamente quando a modernização é encaminhada pelas forças do merca-do, sendo fundamental o aprimoramento das políticas públicas nessa área.

Finalizando, cabe acrescentar que o mapeamento realizado permite não só afirmar que é fundamental o desenvolvimento de alternativas de ocupação no meio rural, como enfatizar que são necessárias políticas de desenvolvimento

Page 175: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

175

agrário que possam contribuir para a diminuição das desigualdades regionais e para combater as mazelas sociais provocadas pelos elevados níveis de desem-prego oculto e pelas baixas remunerações no campo. Em particular, é preciso democratizar o acesso à terra e ampliar a cobertura dos programas voltados ao financiamento dos pequenos produtores agrícolas, assim como para o estímulo a atividades rurais não-agrícolas – como pequenas agroindústrias destinadas ao be-neficiamento da produção de uma microrregião ou, ainda, o incentivo a atividades ligadas ao turismo rural e ecológico. Dessa forma, talvez seja possível, inclusive, reduzir ou mesmo reverter o fluxo migratório campo-cidade.

ReferênciasBALSADI, O. V. Evolução da ocupação e do emprego na agricultura brasileira no período 1992-2006. In: BUAINAIN, A. M.; DEDECCA, C. S. (Coord.). Emprego e trabalho na agricultura brasileira. Brasília, DF: IICA, 2008.

______. O mercado de trabalho assalariado na agricultura brasileira no período de 1992 e 2004 e suas diferenças regionais. 2007. 266 f. Tese (Doutorado em Desenvolvimento Econômico) - Unicamp, Campinas, 2007.

BELIK, W. et al. O emprego rural nos anos 90. In: PRONI, M. W.; HENRIQUE, W. (Org.) Trabalho, mercado e sociedade: o Brasil nos anos 90. São Paulo: Editora da Unesp, 2003.

BUAINAIN, A. M.; DEDECCA, C. S. Introdução. In: BUAINAIN, A. M.; DEDECCA, C. S. (Coord.). Emprego e trabalho na agricultura brasileira. Brasília, DF: IICA, 2008.

CAMPOLINA, B.; SILVEIRA, F. G. O mercado de trabalho rural: evolução recente, composição da renda e dimensão regional. In: BUAINAIN, A. M.; DEDECCA, C. S. (Coord.). Emprego e trabalho na agricultura brasileira. Brasília, DF: IICA, 2008.

GASQUES, J. G.; BASTOS, E. T.; BACCHI, M. R. P. Crescimento da agricultura e produtividade da mão-de-obra no Brasil. In: BUAINAIN, A. M.; DEDECCA, C. S. (Coord.). Emprego e trabalho na agricultura brasileira. Brasília, DF: IICA, 2008.

GRAZIANO DA SILVA, J. O novo rural brasileiro. Campinas: Unicamp, 2002. (Coleção Pesquisas).

HOFFMANN, R. A distribuição da posse da terra no Brasil de acordo com as PNAD de 1992 a 1999. In: CONCEIÇÃO, J. C.; GASQUES, J. G. Transformações da agricultura e políticas públicas. Brasília, DF: IPEA, 2001.

Page 176: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

176

HOFFMANN, R.; NEY, M. G. Desigualdade, escolaridade e rendimentos na agricultura, indústria e serviços, de 1992 a 2002. Economia e Sociedade, Campinas, n. 23, p. 51-79, jul./dez. 2004.

MAIA, A. G. et al. A evolução recente da ocupação e do rendimento no setor agrícola. In: CONGRESSO DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE ECONOMIA E SOCIOLOGIA RURAL, 44., 2005, Ribeirão Preto. Anais... Ribeirão Preto: Sober, 2005.

MATTEI, L. A evolução do emprego agrícola no Brasil. São Paulo: ABET, 1998. (Coleção ABET Mercado de Trabalho, v. 4).

NEDER, H. D. V. Estrutura do mercado de trabalho agrícola no Brasil: uma análise descritiva da evolução de suas categorias entre 1995-2006. In: BUAINAIN, A. M.; DEDECCA, C. S. (Coord.). Emprego e trabalho na agricultura brasileira. Brasília, DF: IICA, 2008.

OLIVEIRA, T. A. Agronegócio e mercado de trabalho na agricultura brasileira: 2003-2007. 2009. 31 f. Monografia (Especialização em Economia do Trabalho e Sindicalismo) – Unicamp, Campinas, 2009.

PRONI, M. W. et al. O mercado de trabalho no campo. In: TEIXEIRA, M.; LADOSKY, M. H.; DOMINGUES, M. R. (Org.). Negociação e contratação coletiva da qualificação socioprofissional nas relações capital-trabalho. São Paulo: CUT, 2005.

PRONI, M. W.; GARRIDO, F. Agricultura, desigualdade regional e trabalho no Brasil. Revista da ABET, v. 5, n. 2, p. 219-247, jul./dez. 2005.

SOARES, P. R. B. Os grandes números da evolução e situação atual do trabalho na agropecuária. In: BUAINAIN, A. M.; DEDECCA, C. S. (Coord.). Emprego e trabalho na agricultura brasileira. Brasília, DF: IICA, 2008.

VIEIRA FILHO, J. E. R.; CAMPOS, A. C.; FERREIRA, C. M. C. Abordagem alternativa do crescimento agrícola: um modelo de dinâmica evolucionária. Revista Brasileira de Inovação, Rio de Janeiro, v. 4, n. 2, p. 425-476, jul./dez. 2005.

Page 177: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

TRABALHO EM TURISMO E SUAS DIFERENÇAS REGIONAIS

NO BRASIL

Fernando Meloni de Oliveira

7.1 – Introdução

A partir de meados dos anos 1990 aos dias de hoje, acompanha-se um for-te processo de crescimento e consolidação do turismo no Brasil, que apresenta impactos muito significativos sobre a organização econômica, social, política e ambiental de muitos territórios.

Motivado pelas diversas mudanças nos fluxos de pessoas, pelas transforma-ções nas formas de comunicação e transporte, além dos investimentos e inova-ções nas estratégias comerciais de vários destinos nacionais, de fato desde 1990 se conjugam alguns fatores cruciais para a intensa ampliação do turismo brasileiro e a importância dada ao segmento, tais como o grande crescimento da atividade no âmbito internacional; a criação, em 1990, do World Travel & Tourism Council (WTTC), órgão que reúne as maiores empresas mundiais ligadas ao segmento e que exerce fortes pressões em prol do desenvolvimento do turismo em diversos países; a reelaboração, em 1991, das funções da Empresa Brasileira de Turismo (Embratur) - agora denominado Instituto Brasileiro de Turismo; o surgimento de vários programas de desenvolvimento turístico no Nordeste brasileiro, como o Programa de Desenvolvimento do Turismo (Prodetur), entre outros.

Subjacente ao processo de expansão do turismo há, também, nesse perí-odo, um novo contexto histórico muito relevante para que se possa entender o desempenho da atividade e os elementos que impulsionam a transformação das ações públicas destinadas ao segmento. Assim, pode-se dizer que o crescimento do turismo nas últimas décadas foi marcado, sobretudo, pela hegemonia de um projeto político neoliberal na esfera econômica, que corresponde a uma aposta na

7CAPÍTULO

Page 178: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

178

pouca interferência do Estado sobre os mecanismos de mercado, e pela constante preocupação governamental quanto ao desemprego, que se elevou fortemente após a abertura à concorrência internacional e com o avanço do processo de reestruturação produtiva das empresas.

À medida que se aprofunda no País a elaboração de estudos, a publicação de artigos e reportagens, a implantação de planos e programas federais e estaduais, os investimentos públicos e privados e a divulgação de discursos políticos, de uma maneira geral, pode-se perceber, quer seja no meio acadêmico, político ou midiático, que o turismo vem ganhando, desde meados da década de 90, novos significados e maior status, com um evidente destaque para a sua propagada im-portância econômica na geração de emprego e renda e na capacidade de induzir o desenvolvimento, com a redução das desigualdades regionais e a melhoria da in-serção do País no mercado mundial. No entanto, isto revela que houve e ainda há uma forte idealização da atividade, muitas vezes designada para desempenhar um papel que ultrapassa as suas capacidades. Uma situação reforçada, em primeiro lugar, pelo seu difícil monitoramento, que permitiria a confirmação da extensão de suas assumidas virtudes e mesmo a melhoria de seu desempenho e das ações públicas para o segmento. Em segundo lugar, pelo fato de que a percepção dos atores sociais quanto aos entraves e aos impactos negativos do turismo continua, na maioria dos casos, relegada a um segundo plano.

Se o turismo tem se ampliado e tem sido colocado como um importante ele-mento de desenvolvimento econômico brasileiro, o objetivo principal do presente texto é analisar com mais detalhes qual tem sido o papel real do turismo na criação de empregos, especialmente do ponto de vista das regiões do País.

Deste modo, este artigo, composto por esta introdução, por mais três seções e pelas considerações finais, organiza a exposição de modo a apresentar, na segun-da parte, uma caracterização dos principais traços e transformações pelos quais passa a atividade turística no País, ao que se segue, na terceira parte, a exposição e discussão da situação das ocupações do núcleo central do turismo, no âmbito na-cional. Na quarta parte, faz-se o detalhamento dos dados e o aprofundamento do debate em relação às diferenças regionais das ocupações existentes no segmento.

Page 179: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

179

7.2 – Evolução Recente do Turismo no Brasil

Com as intensas transformações que ocorreram no sistema econômico na-cional na década de 90, é fácil verificar que o setor terciário ampliou em muito a sua importância na geração de empregos e riqueza do País, ao mesmo tempo em que ocorreu um grande movimento de modernização e de redefinição dos processos de trabalho e as formas de organização de suas empresas. (DIEESE, 2005). Neste contexto, o turismo foi muito afetado pelas mudanças substanciais que acompanham o novo cenário político e econômico nacional, ou seja, foi impactado pelo acirramento da concorrência entre as firmas, pela forte desna-cionalização e concentração das empresas, pela maciça introdução de inovações tecnológicas e organizacionais e, ainda, pelas profundas alterações na regulação de diversos ramos de atividade econômica.

A trajetória e o perfil do segmento turístico no Brasil são marcados, pois, pela forte expansão da atividade e por uma grande heterogeneidade, tanto com relação às grandes diferenças regionais na oferta e demanda de serviços turísti-cos quanto aos ramos de atividades que compõem o núcleo do segmento. Deve-se ressaltar, ainda, que do ponto de vista da lógica e dos modelos de turismo implantados, os últimos quinze anos também apresentaram clivagens regionais importantes, pelo predomínio de projetos turísticos internacionais nas regiões Nordeste, Norte e Centro-Oeste do País e pelas tentativas mais fortes de desen-volvimento alternativo do turismo, tais como o turismo rural, nas regiões Sudeste e Sul, principalmente. (LUCHIARI; SERRANO, 2002).

Para explicar o processo de expressivo crescimento do turismo destaca-se a influência de vários fatores, entre os quais, no âmbito internacional, o avanço da globalização econômica, que amplia os negócios internacionais; as transforma-ções dos transportes; o barateamento das passagens aéreas e a desregulamentação do tráfego aéreo comercial; o crescimento dos cruzeiros marítimos e fluviais; a melhora dos sistemas de comunicação; e o avanço das tecnologias da informação, que atingem toda a cadeia turística. (REJOWSKI; SOLHA, 2002; BNB, 2000). Já no âmbito nacional é possível ressaltar, ainda, a estabilização econômica, que favoreceu os investimentos (nacionais e estrangeiros) e também permitiu a am-pliação do crédito ao consumidor; a diversificação dos meios de hospedagem; também o barateamento do transporte aéreo, inclusive pela possibilidade de fre-tamento de aeronaves (voos charter); o surgimento de políticas específicas para o

Page 180: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

180

segmento; a ampliação da infraestrutura básica e turística e a própria diversifica-ção da atividade. (LIMA, 2003; CRUZ, 2001; SOLHA, 2002).

Para retratar a intensidade do crescimento do segmento tem-se, na Tabela 1, a trajetória do número de turistas internacionais no mundo e no Brasil entre os anos de 1995 e 2007. Deve-se ressaltar que tal expansão acompanha, na realidade, um longo movimento de aumento dos fluxos de viagens no mundo1 e que tem, por várias razões, um papel muito importante sobre o dinamismo interno do segmento.

Tabela 1 – Número de Turistas Internacionais no Brasil

AnoChegada de Turistas

Mundo (Milhões)

Variação (%)

América do Sul (Milhões)

Variação (%)

Brasil (Milhões)

Variação (%)

1995 565,5 - 11,8 - 1,9 -

1996 596,5 5,48 12,9 9,32 2,7 42,11

1997 610,8 2,40 13,5 4,65 2,8 3,70

1998 626,6 2,59 15,5 14,81 4,8 71,43

1999 650,2 3,77 15,1 (2,58) 5,1 6,00

2000 689,2 6.00 15,2 0,66 5,3 4,03

2001 688,5 (0,10) 14,6 (3,95) 4,8 (10,16)

2002 708,9 2,96 12,7 (13,01) 3,8 (20,70)

2003 696,6 (1,74) 13,7 7,87 4,1 9,19

2004 765,5 9,89 16,2 18,40 4,8 15,99

2005 802,5 4,83 18,2 12,20 5,4 11,76

2006 847,3 5,58 18,7 2,75 5,0 (6,36)

2007 903,3 6,61 19,9 6,42 5,0 0,18Fontes: Embratur (2003b) e Brasil (2008a, 2008b).

É visível o aumento contínuo do número de turistas internacionais no período destacado, com exceção de apenas dois anos (2001 e 2003) em que ocorreram quedas no fluxo de viajantes, mas que, entretanto, não afetaram o crescimento de 59,7% no total de turistas captados pela Organização Mundial de Turismo (OMT), um total de 903,3 milhões de pessoas em 2007. Sem dúvida, trata-se de uma expansão muito significativa, tanto em comparação com os demais segmentos de atividade econômica quanto pelos fortes impactos (sociais, econômicos, culturais, ambientais) gerados pela atividade.

1 É o que se evidencia a partir dos dados da OMT, de 1974, o número de turistas internacionais alcançava 205,7 milhões; em 1984, este número atingia a marca de 316,4 milhões; e em 1994, 550,5 milhões de pessoas realizaram viagens internacionais. (REJOWSKI; SOLHA, 2002).

Page 181: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

181

No Brasil, com a exceção de poucos anos (2001, 2002 e 2006), de modo geral o aumento de visitantes externos também foi muito elevado, com grandes picos, sobretudo em 1998, em 1996 e, em menor medida, entre 2003 e 20052. Des-ta maneira, ao final do período o número de turistas internacionais havia quase triplicado, atingindo a casa de 5 milhões, com um crescimento de 163%, bem à frente da média encontrada nos países sul-americanos – reforçando, com isso, as indicações sobre o grande potencial de expansão da atividade no País, que parecia reprimida anteriormente.

Em relação ao número de turistas domésticos no Brasil, pelas inúmeras difi-culdades de mensuração são poucos os dados que se encontram disponíveis. As es-timativas apresentadas na Tabela 2, compreendendo os anos de 1998, 2001 e 2005, apontam, respectivamente, 38,2 milhões, 41,3 milhões e 42,8 milhões de turistas3, representando entre 23% e 24% (2001) da população brasileira, que são indicadores reduzidos frente a vários outros países. Nota-se, contudo, que nesse intervalo de tempo houve um importante crescimento de 12% no total de turistas domésticos e que a participação deste grupo no total de viagens do País, em comparação com a demanda internacional, é francamente majoritária (em torno de 90%).

Tabela 2 – Número de Turistas Domésticos no Brasil – 1998/2005

Anos População Total (milhões)

Turistas Domésticos (milhões)

Total de Turistas em relação à Pop. (%)

Variação (%)

1998 161,8 38,2 23,6 -

2001 172,4 41,3 24,0 8,12

2005 183,4 42,8 23,3 3,63Fontes: Fundação Instituto... (2002, 2007) e IBGE (2007).

Entre os demais indicadores da expansão da atividade turística um dos mais importantes e incertos diz respeito à contribuição do turismo na geração de riqueza, isto é, refere-se à participação da atividade no PIB brasileiro. É interessante notar que os primeiros dados existentes para a década de 90 revelavam as dificuldades de mensuração e uma evidente superestimação da importância econômica do turismo, demonstrando tanto a falta de dados precisos quanto do empenho e interesse em le-gitimar e/ou comprovar o bom desempenho da atividade no Brasil. (SAAB, 1999).

2 Ressalta-se, no entanto, que em 1998 o grande aumento do número de visitantes deve-se às mudan-ças na metodologia de contagem de ingressantes no País por via terrestre. (ALBAN, 2006).

3 A base de cálculo para o número de turistas leva em consideração a propensão média a viajar por domicílio, que por sua vez varia por classe de tamanho urbano do município onde se insere o domi-cílio. (FUNDAÇÃO INSTITUTO..., 2002).

Page 182: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

182

Algumas informações mais recentes, todavia, elaboradas pelo WTTC e que abarcam o período de 1995 a 2007, parecem auxiliar uma estimativa um pouco mais apurada dos impactos econômicos do turismo. Para isso a instituição trabalha com os conceitos de indústria do turismo e de economia do turismo, sendo que o primeiro deles procura abarcar apenas os impactos econômicos das atividades diretamente rela-cionadas ao turismo e que o segundo é voltado para a percepção dos efeitos diretos e indiretos da atividade. Embora permaneçam algumas das dificuldades na mensuração do peso econômico do segmento, na Tabela 3 é possível observar o desempenho da atividade na geração de riqueza dentro da economia mundial e brasileira.

Tabela 3 – PIB da Indústria e da Economia do Turismo no Brasil e no Mundo – 1995/2007 (Em US$ Bilhões, Valores de 2000)

Ano

Mundo Brasil

Economia do Turismo

Indústria do Turismo

Eco. Tur./ PIB (%)

Ind. Tur./ PIB (%)

Economia do Turismo

Indústria do Turismo

Eco. Tur./ PIB (%)

Ind. Tur./ PIB (%)

1995 2745,14 1023,92 9,91 3,70 31,0727 11,3835 5,34 1,96

1996 2922,14 1093,42 10,23 3,82 32,3181 12,3932 5,43 2,08

1997 3069,92 1148,81 10,39 3,87 35,0155 13,5711 5,69 2,20

1998 3213,73 1198,30 10,69 3,99 35,8466 14,1487 5,82 2,30

1999 3324,94 1237,31 10,79 4,02 38,5317 15,7348 6,23 2,55

2000 3449,89 1279,37 10,71 3,97 39,6132 16,1451 6,15 2,51

2001 3438,65 1262,14 10,56 3,87 41,2532 16,4959 6,28 2,51

2002 3391,13 1238,05 10,26 3,74 42,5536 17,2199 6,21 2,51

2003 3353,97 1218,95 9,89 3,59 42,1759 17,5175 6,16 2,56

2004 3474,54 1241,77 9,85 3,51 44,0786 17,7661 6,14 2,48

2005 3601,45 1267,12 9,84 3,44 44,5221 18,1925 5,98 2,44

2006 3707,27 1285,19 9,71 3,34 45,4303 18,3048 5,91 2,38

2007 3861,34 1333,90 9,71 3,32 49,4301 19,7853 6,05 2,42

Fontes: World Travel... 2008.

No período destacado vê-se um expressivo aumento da geração de valores na economia do turismo no mundo (de US$ 2.745 bilhões para US$ 3.861 bilhões, ou um acréscimo de 40,6%, a preços de 2000), superior à própria ampliação da indústria do turismo, que também teve um desempenho bastante positivo – com um crescimento de 30,3%, passando de aproximadamente US$ 1.024 para 1.334 bilhões – indicando toda a importância dos efeitos encadeadores da atividade so-bre o desenvolvimento econômico, principalmente nos países mais pobres.

Page 183: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

183

As estimativas da participação econômica do turismo no Produto Interno Bruto (PIB) mundial indicam também que esta representa um percentual muito elevado, em torno de 10% do produto, embora apresente um decréscimo e algu-ma oscilação no período. Quanto à participação relativa da indústria do turismo no PIB, mais acentuadamente ocorre uma redução de 0,38 p.p. entre 1995 e 2007, porque no primeiro ano selecionado a atividade representava 3,7% da economia mundial, e no último, somente 3,32%. Se a economia e a indústria do turismo de-monstram sua importância, a observação da dinâmica do segmento sugere pers-pectivas mais modestas e instáveis do que usualmente se aponta.

No caso do Brasil, por outro lado, os índices de variação da economia do turismo se colocaram de maneira um pouco mais evidente, apresentando uma alta expressiva de 59%, saindo de US$ 31 bilhões para US$ 49,4 bilhões. A indústria do turismo cresceu além (74,3%), passando dos US$ 11,3 bilhões, em 1995, para US$ 19,7 bilhões em 2007, num ritmo bastante à frente do restante da economia nacional. Isto também se revela, em menor medida, no aumento da participação do segmento no PIB brasileiro. A economia do turismo representava 5,34% do produto em 1995 e chegou ao patamar de 6% em 2007, ao passo que a indústria do turismo significava 1,96% e atingiu 2,42% do PIB em doze anos.

Mesmo com um crescimento expressivo, destaca-se que são números muito mais modestos do que aqueles postulados ao longo dos anos 90 pelas entidades do setor, inclusive as oficiais (EMBRATUR, 2000; SAAB, 1999), ficando, ademais, também bastante abaixo da participação média do turismo na economia mundial.

Outra ordem de processos que permitem visualizar o crescimento e o dina-mismo do turismo brasileiro nos últimos anos diz respeito à rápida diversificação da atividade, seja de destinos, seja das suas várias modalidades. Segundo Solha (2002), a partir de 1996, quando ocorreu a expansão do número de empresas turísticas e a melhoria das condições de acessibilidade, outras localidades turísticas começaram a se destacar para o público doméstico e internacional, para além da já reconhecida cidade do Rio de Janeiro, intensamente visitada durante o verão e o Carnaval. No mesmo sentido, a diversificação do turismo no Brasil também pode ser ilustrada nos 87 roteiros turísticos prioritários identificados no Ministério do Turismo, que englobam 2.819 municípios, colocados em 200 regiões turísticas. (BRASIL, 2007).

Contudo, por trás dos indicadores de um rápido e importante crescimento da atividade nos últimos anos, é fundamental ressaltar alguns aspectos estruturan-tes de toda a cadeia que delimita mais profundamente o seu desenvolvimento e as principais características e entraves encontrados no turismo do País.

Page 184: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

184

Segundo uma série de estudos, destaca-se, a respeito da organização e de-sempenho do segmento no Brasil, ao menos cinco aspectos essenciais. O primei-ro é a participação pouco significativa da atividade no Brasil dentro do contexto do turismo mundial, de maneira próxima à participação do PIB brasileiro na eco-nomia global. Em segundo lugar, a baixa competitividade do segmento no Brasil em comparação com os 41 países com maior PIB turístico no mundo, o que situa o País no grupo de países com baixo dinamismo turístico (taxa de crescimento abaixo da média mundial, embora o turismo possa ter aumentado a sua partici-pação na economia doméstica) e com baixo grau de importância da atividade na economia nacional4. Em terceiro lugar, a alta concentração do turismo nas regiões Sul e Sudeste do País, tanto do ponto de vista da geração de riqueza e oferta de serviços turísticos quanto dos fluxos emissores e receptores de visitantes (nacio-nais e internacionais), o que restringiria em muito o potencial de desenvolvimento da atividade em outras regiões mais pobres. Em quarto lugar, a baixa renda da maioria da população e a reduzida participação do consumo turístico nas despe-sas familiares, limitando drasticamente a capacidade de crescimento da atividade5. E, por fim, em quinto lugar, a fraca competitividade do turismo em relação à média do setor de serviços quanto aos índices de produtividade, de escala, de capacidade de agregação de valor e de rentabilidade. (SARTI; HIRATUKA; SABBATINI, 2006).

Os aspectos acima ressaltados deixam claro, portanto, que o Brasil está longe de se consolidar como uma referência no mercado turístico mundial, ao mesmo tempo em que se explicita que a pequena expressão da atividade na economia nacional está ligada às condicionantes estruturais do desenvolvimento do País, tais como as desigualdades regionais e de renda, aliadas a uma situação técnica e empresarial pouco competitiva.

4 No estudo sobre a competitividade do turismo os países foram separados em quatro grupos. No pri-meiro grupo situam-se as nações com um maior dinamismo da atividade (crescimento bem superior à taxa média mundial entre 1994 e 2004), cujo turismo possui uma participação elevada no PIB. No segundo grupo estão os países onde a atividade apresenta um grande dinamismo, mas uma pequena importância no PIB. No terceiro grupo colocam-se os países nos quais o grau de importância da atividade turística é superior à média mundial e que, no entanto, o dinamismo da atividade tem sido fraco. O Brasil (juntamente com a Argentina, a Bélgica, o Japão, a Alemanha, a Indonésia e outros) pertence, assim, ao quarto grupo de países, cujas características foram descritas acima. (SARTI; HIRATUKA; SABBATINI, 2006).

5 As informações da Pesquisa de Orçamento Familiares (POF) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), sobre o biênio 2002/2003, revelavam o quanto o turismo ainda pode ser considerado um bem de luxo, pois, em média, os gastos com viagens significavam apenas 1,6% do consumo das famílias brasileiras e, além disso, quase a metade dos gastos turísticos esteve concen-trada entre as famílias dos estratos mais elevados de renda total (20 ou mais salários mínimos), que representam uma parcela muito limitada da população nacional, de apenas 9,7% do total de famílias. (SARTI; HIRATUKA; SABBATINI, 2006).

Page 185: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

185

Outro aspecto relevante envolvendo o turismo e a distribuição de renda nacional remete à questão da grande desigualdade regional existente no Brasil. O potencial da atividade turística na promoção do desenvolvimento local e regional é amplamente enfatizado no meio político e acadêmico, contudo o fato é que, do ponto de vista do consumo, os gastos das famílias brasileiras das regiões mais ricas do País se distribuem apenas marginalmente nas regiões mais pobres, concentrando-se nas próprias regiões de origem ou no exterior. (SARTI; HIRATUKA; SABBATINI, 2006).

Sob o ângulo da distribuição dos fluxos de turistas domésticos, na Tabela 4, reforça-se a mesma percepção da grande concentração regional da atividade. Os da-dos disponíveis permitem acompanhar a evolução dos fluxos de pessoas entre 1998 e 2005. O Sudeste é a região com a maior emissão e recepção de turistas nacionais: entre 1998 e 2005, a participação dessa região aumenta tanto como origem dos visitantes (de 40,8% para 64,7%) quanto como destino dos turistas (de 38,0% para 52,0%), assi-nalando a tendência de uma intensificação da concentração da atividade.

Tabela 4 – Regiões Emissoras e Receptoras de Turistas. Brasil – 1998/2005

RegiõesOrigem (%) Destino (%) Relação Emissão/

Recepção

1998 2001 2005 1998 2001 2005 1998 2001 2005

Norte 9,4 3,5 2,0 8,1 2,7 2,2 1,16 1,29 0,91

Nordeste 27,5 24,2 10,2 31,8 29,1 19,3 0,87 0,83 0,53

Centro-Oeste 6,2 5,5 5,3 5,8 6,3 7,0 1,07 0,88 0,76

Sudeste 40,8 49,2 64,7 38,0 43,5 52,0 1,07 1,13 1,24

Sul 16,0 17,5 17,5 16,2 18,4 19,5 0,99 0,95 0,90

Brasil 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 1,00 1,00 1,00Fontes: Fundação Instituto... (2002) e Fundação Instituto... (2007).

Do ponto de vista da distribuição espacial é possível ressaltar que, além de concentrado regionalmente, o turismo brasileiro também possui como uma carac-terística expressiva uma forte concentração nos grandes centros urbanos. (FUN-DAÇÃO INSTITUTO..., 2002). Deste modo, destaca-se que apesar do grande e diversificado potencial turístico existente nas regiões mais empobrecidas do ter-ritório (Norte, Centro-Oeste e Nordeste) e em seus pequenos municípios, que poderiam se beneficiar muito do desenvolvimento (sustentável) da atividade, o turismo ainda se expande de maneira muito concentrada nas regiões mais ricas da nação, principalmente nas capitais e nos grandes centros.

Page 186: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

186

Além da desigualdade de renda, uma das razões levantadas para a concentra-ção dos fluxos do turismo e que se constitui num importante gargalo da atividade, seriam as diferenças quanto às condições de infraestrutura básica e turística entre os destinos nacionais e, também, as difíceis condições de acesso e a baixa capila-ridade dos transportes de grande parte desses locais6.

No plano macro, as regiões Norte e Nordeste apresentariam as condições mais precárias de infraestrutura, sob todos os aspectos, ao passo que nas regiões Centro-Oeste, Sul e Sudeste haveria indicações de condições bem melhores, em-bora também existam aí importantes diferenças. A homogeneidade de tais con-dições entre capital e interior ocorreria, efetivamente, apenas nos Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo e o no Distrito Federal. Vê-se que tanto do ponto de vista da competitividade externa quanto a respeito da con-centração dos fluxos turísticos regionais, são enormes os desafios encontrados, dados os problemas estruturais da nação.

Uma questão adicional sobre os fluxos internacionais do turismo se refere ao seu potencial de captação de divisas para o País, refletido no saldo da conta turismo. Historicamente, são diversos os países que atuam de forma estratégica na atração de turistas estrangeiros para a captação de recursos em moeda forte, po-rém, apesar da grave situação de endividamento externo e vulnerabilidade cambial que perpassa a trajetória da economia brasileira nas últimas décadas – particular-mente nos anos 1990 –, observa-se que o Brasil tem desperdiçado as oportuni-dades de acúmulo de divisas com a recente fase de crescimento da atividade. A Tabela 5 revela os vários déficits operados nas transações da conta turismo entre 1995 e 2007.

6 A partir de um trabalho de caracterização e análise das condições de infraestrutura, dentro de uma abordagem que enfatiza a necessidade de equilíbrio entre a infraestrutura de acesso (transportes) e de recepção de turistas (água encanada, coleta de lixo, acesso a energia elétrica e serviços de teleco-municações) como garantia de um desenvolvimento sadio da atividade, Ruas e Laplane (2006) con-cluem que só em uma pequena parcela do território nacional essa relação de equilíbrio é encontrada.

Page 187: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

187

Tabela 5 – Conta Turismo do Brasil – 1995/2007, em US$ MilhõesAnos Receita Despesa Saldo

1995 971,6 3.391,3 (2.419,7)

1996 839,8 4.438,3 (3.598,5)

1997 1.069,0 5.445,8 (4.376,9)

1998 1.585,7 5.731,7 (4.146,1)

1999 1.628,2 3.085,3 (1.457,1)

2000 1.809,9 3.894,1 (2.084,2)

2001 1.730,6 3.198,6 (1.468,0)

2002 1.998,0 2.395,8 (397,8)

2003 2.478,7 2.261,1 217,6

2004 3.222,1 2.871,3 350,8

2005 3.861,4 4.719,9 (858,4)

2006 4.315,9 5.763,7 (1.447,8)

2007 4.952,0 8.209,0 (3.257,0)Fontes: Dados de 2008 Fornecidos pelo Banco Central do Brasil.

Uma vez que o fluxo turístico internacional, tanto emissivo quanto recep-tivo, é extremamente sensível às variações da taxa cambial e ao nível de concen-tração de renda, mesmo com o incremento do número de turistas e da receita cambial gerada desde 1995, o saldo da conta turismo foi negativo em quase todo o período, devido à sobrevalorização cambial da moeda nacional.

Após delinear-se, em linhas gerais, o processo de crescimento e as caracterís-ticas marcantes da atividade no País durante os anos recentes, parece importante destacar as transformações e a enorme heterogeneidade existente na organização e dinâmica dos ramos que compõem o núcleo do Complexo Econômico do Tu-rismo (CET). As diferenças encontradas dizem respeito tanto à estruturação e ao desempenho de cada um dos ramos principais da cadeia turística (hospedagem, transporte aéreo de passageiros, transporte rodoviário de passageiros, agências de viagens, locação de veículos e atividades recreativas e culturais), quanto à própria disponibilidade de informações sobre essas atividades específicas.

Embora com efeitos e intensidade diferenciadas, dois aspectos merecem destaque por atingirem todo o segmento. O primeiro ponto é que, a partir de meados dos anos 90, houve no Brasil e na América Latina um forte processo de internacionalização dos serviços turísticos, com impactos marcantes sobre as

Page 188: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

188

funções e atividades desempenhadas pelo diversos agentes e, consequentemente, sobre a geração e apropriação do valor agregado no interior das cadeias turísticas nacionais7. O segundo aspecto importante é a disseminação de novas Tecnologias de Informação e de Comunicação (TIC), que afetam a maioria dos agentes da atividade e promovem grandes transformações na organização e comercialização dos produtos turísticos, com a redução numérica e a modificação do papel dos intermediários (sobretudo agências e operadoras de viagens) na venda e na distri-buição de serviços. (BONIN, 2003).

De início, tratando do ramo hospedagem, que foi um dos maiores respon-sáveis pelo incremento dos investimentos e pela reestruturação do segmento turístico ao longo dos últimos anos, pode-se apontar, embora com algumas diferenças de metodologia, que o peso econômico dessa atividade é estimado entre 10,2% (em 1999) e 12% (2004) do PIB do turismo brasileiro, segundo estudos analisados por Correa (2006).

Mesmo uma grande heterogeneidade entre os estabelecimentos8, a partir da segunda metade dos anos 90, parece inequívoca a ocorrência de um forte processo de crescimento do ramo hoteleiro no Brasil, que o atinge como um todo. Tal cres-cimento fica expresso no aumento de 14.027 unidades de alojamento, em 1995, para 17.831 em 2004 (elevação de 27,1%), segundo os dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS). (EMBRATUR, 2003c; ÁRIAS; ZAMBONI, 2006).

Outro traço marcante em relação ao ramo de alojamento é que, assim como os fluxos de viagens, a oferta de meios de hospedagem também se expandiu de maneira muito concentrada na região Sudeste, a despeito do crescimento recente do número hotéis na região Nordeste. Neste sentido, em 1996, os dados da Em-bratur apontavam que 48% dos meios de hospedagem nacionais concentravam-se

7 Acompanhando um movimento de integração vertical e horizontal das grandes empresas turísti-cas mundiais, a internacionalização dos negócios no Brasil, sobretudo nos transportes, operadoras de viagens e meios de hospedagem, deu-se sob uma grande concentração e desnacionalização das companhias, na medida em que o crescimento da atividade demandava um volume cada vez maior de capital e de tecnologia para concretização das ações, favorecendo, assim, os grandes grupos estrangeiros já consolidados, ao passo que as empresas brasileiras permaneceram com uma pequena atuação no mercado internacional. (SARTI; HIRATUKA; SABBATINI, 2006).

8 Uma característica marcante do ramo é a sua constituição variada de tipos de empresas e serviços, de qualidade muito diferenciada. Um primeiro grupo de empresas seria composto pelos médios e pe-quenos hotéis, pousadas e outros tipos de alojamento mais simples e de preços mais acessíveis, mui-tas vezes constituídos como empresas familiares, e que formam a maioria de meios de hospedagem do País. Por outro lado, também há um conjunto expressivo de grandes hotéis, de alto padrão e com diárias mais elevadas, que em geral são controlados por redes hoteleiras nacionais e internacionais, administrados por gerentes profissionais, e que representam um segmento bastante monopolizado.

Page 189: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

189

na região Sudeste, num número muito além daquele encontrado nas regiões Sul (com 25% do total), Nordeste (18%), Centro-Oeste (5%) e Norte, com apenas 4% dos alojamentos. (BEZERRA, 2002).

Em 2002, em relação às onze principais redes estrangeiras, Lima (2003) indicava um crescimento de 77% no número de estabelecimentos de tais redes entre 1999 e 2002 e uma concentração de 62,8% dos estabelecimentos na região Sudeste, seguida pelas regiões Nordeste (17,1%), Sul (14,6%), Centro-Oeste (3,8%) e Norte (1,7%).

Outra atividade central ao desenvolvimento do turismo, e que sofre intensas transformações a partir do crescimento do fluxo de viagens no território, é o ramo de transporte aéreo. De acordo com dados da Infraero, vislumbra-se a gran-de expansão do número de passageiros nacionais e internacionais (considerando-se tanto os voos regulares como os não regulares) no Brasil, no aumento do montante de aproximadamente 19,3 milhões de pessoas para 38 milhões, no que se refere aos embarques (de 1996 até 2005), e de 19,3 milhões para 56,4 milhões de passageiros (entre 1996 e 2007), no que se refere aos desembarques. (BRASIL, 2006; BRASIL, 2008a, 2008b).

Segundo alguns autores, o crescimento do ramo, além de impulsionado pela melhoria do desempenho da atividade turística, está relacionado à supervaloriza-ção cambial (até 1999) e ao processo de desregulamentação da atividade, sem que, entretanto, estivessem com isso resolvidas algumas das questões centrais ao seu desenvolvimento no longo prazo9. (FERREIRA; LAPLANE, 2006).

Somando-se a estes fatores, o processo de desregulamentação do transporte aéreo produziu tanto o aumento da concorrência, com o crescimento da parti-cipação das companhias estrangeiras no mercado, quanto à ampliação da oferta de voos e linhas aéreas, muitas vezes com substanciais quedas dos preços das passagens - inclusive, pela elevação do número de voos não regulares (charters). No entanto, com o crescimento do transporte aéreo também se evidenciaram os vários problemas que culminaram na crise mais recente da atividade, envolvendo, 9 Na medida em que a maior parte dos insumos das empresas nacionais era, e permanece sendo, im-

portado (combustíveis, manutenção, peças de reposição, seguros, leasing de aeronaves, treinamento de pessoal, suprimentos, entre outros), durante o período de valorização cambial ocorre, de fato, uma substancial queda nos custos dessas empresas, que se refletiu no barateamento das passagens e no aumento das vendas, ainda que nos últimos anos o ramo tenha absorvido também um substan-cial aumento do preço do petróleo. Em adição, argumenta-se que a valorização cambial favoreceu a realização de viagens internacionais pelos turistas nacionais, trazendo novos estímulos à aviação do País, já que este é o principal transporte usado nos deslocamentos externos.

Page 190: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

190

sobretudo a falta de infraestrutura aeroportuária e falhas no sistema de controle operacional do tráfego, pelo descasamento de investimentos e o descuido do se-tor público frente à expansão da atividade.

Tomando-se agora outro ponto do sistema de transporte nacional, esta análise dirige-se ao transporte rodoviário de passageiros, que concentra 96% do índice de passageiros/Km do País (SANTOS, 2007) – mas do qual, infelizmente, se dispõe de um conjunto limitado de informações e estudos. Esta forma de deslocamento, deve-se reforçar, até o início dos anos 2000 predominava entre os turistas domés-ticos e por isso absorveu, em grande parte, a crescente demanda por transportes, observada ao longo anos 90, atingindo, em 2001, a marca de mais de 75 milhões de passageiros nacionais transportados. A partir desse ano, contudo, mesmo mantendo o predomínio em relação aos demais meios de transporte, observa-se uma tendên-cia para a contração de usuários, com uma consequente perda de espaço frente às demais modalidades10.

Tabela 6 – Locação de Automóveis. Brasil – 2001/2006Locação de Automóveis 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Faturamento (Em R$ Bilhões) 1,89 2,26 2,35 2,68 2,91 3,17

Frota do Setor 155.000 178.000 181.900 203.650 223.811 250.204

Usuários (Em Milhões) 7,3 8,3 8,7 10,1 12,2 14,1

Locadoras (Por Regiões) - - - - - -

Nordeste - 668 610 497 484 477

Norte - 158 127 117 125 124

Centro-Oeste - 232 195 153 147 138

Sudeste - 1016 992 867 889 888

Sul - 437 416 351 319 325

Brasil - 2511 2340 1985 1964 1952Fontes: Associação Brasileira... (2007).

10 De acordo com Castro (2008), o processo de diminuição do volume de passageiros transportados pode estar ancorado no fato de que o modal rodoviário esteve sob uma forte e crescente concor-rência do transporte aéreo, no que se refere às longas distâncias, e sob igual pressão do automóvel, no que toca às distâncias curtas e médias. Com a grande queda verificada nos preços de passagens aéreas e nos custos de aquisição de automóveis, não é difícil compreender tal retração na partici-pação do transporte rodoviário de passageiros no mercado e o declínio da renda apropriada pelas empresas do ramo. Além disso, aponta o autor, o crescimento do transporte alternativo (informal) e do transporte não regular são elementos que tencionam cada vez mais o desempenho desta ativi-dade, que é bastante heterogênea.

Page 191: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

191

No mesmo sentido, outro segmento que se expandiu concorrendo diretamente com o transporte rodoviário e que merece atenção é o ramo de aluguéis de veículos – em especial, o segmento de aluguel de automóveis. Esta atividade, em particular, de acordo com as informações da Associação Brasileira de Locadoras de Automóveis (ABLA), vem apresentando um desempenho bastante positivo nos últimos anos, o que se explicaria, segundo a mesma fonte, pela influência direta do crescimento eco-nômico nacional e pela ampliação do turismo interno, através da desvalorização da moeda, que favoreceu as viagens domésticas em detrimento das internacionais.

Com base nas informações da Tabela 6 acima, que englobam o universo das locadoras de veículos associadas à ABLA, é possível atestar o grande crescimento do faturamento das empresas, da frota de veículos e do número de usuários, de 67,7%, 61,4% e de 93,1% respectivamente, em apenas cinco anos: em 2006, calculava-se em R$ 3,1 bilhões o total de faturamento das locadoras do País, atendendo-se a mais de 14 milhões de usuários e com uma frota de mais de 250 mil veículos.

A ampliação da atividade, entretanto, também se fez acompanhada de um aumento da concorrência entre as locadoras, do que resulta a queda do número de empresas em todas as regiões. No total, o número de locadoras de automóveis cai 22,2% entre os anos de 2002 e 2006, embora mais acentuadamente no Centro-Oeste, e de maneira mais lenta no Sudeste, região que concentra a maior oferta do serviço no Brasil.

Ligada intimamente à rede de locação de automóveis, mas com um papel ainda mais central na articulação de todos os serviços da cadeia turística, as agências de via-gens compõem outro importante elo do centro deste complexo de atividades que teve um desempenho bastante diferenciado em relação aos demais, pela profundidade das transformações sofridas nos últimos anos, tanto no Brasil quanto no mundo.

Inicialmente, é preciso indicar que tal segmento encontra-se organizado em tor-no de dois tipos de empresas. Por um lado, existem aquelas que são responsáveis pela produção e operação de pacotes turísticos (operadoras de viagens) e que se apresen-tam em número reduzido, com um grande poder de mercado, e por outro, aquelas empresas cujo foco de atuação é a distribuição dos serviços gerados pelas grandes operadoras (as agências de viagens), tratando-se aí de um conjunto altamente pulveri-zado de micro e pequenas empresas. Assim, tanto no que se refere ao aproveitamento das novas oportunidades de ganhos quanto à capacidade de adaptação aos novos cenários, há que considerar as operadoras e agências de viagens que desenharam trajetórias muito distintas.

Page 192: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

192

De acordo com Cunha e Ribeiro (2006), dentre os processos de integração, internacionalização e concentração dos negócios que afetaram a cadeia turística mundial como um todo, importaria salientar, mais uma vez, que o processo de disseminação das Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) e o conse-quente aprofundamento das tendências de desintermediação e reintermediação dos serviços turísticos foram os aspectos mais marcantes da reestruturação re-cente do ramo no País.

Esse conjunto de transformações do ramo de agências de viagens, somada às mudanças cambiais – que tem um peso bastante importante sobre a atividade, na medida em que a utilização dos serviços das agências tem uma forte ligação com o turismo internacional (receptivo e emissivo) – parecem bem ilustradas na Tabela 7, pelo enorme decréscimo do número de agências de viagens cadastradas na Embratur (reduzindo-se de 13.107 estabelecimentos para 10.227), ao longo do período de 1996 a 2005.

Tabela 7 – Distribuição de Agências de Viagens Cadastradas na Embratur, por Regiões. Brasil – 1996/2007

Região1996 2000 2005 2007

No % No % No % No %

Norte 498 3,8 300 3,7 415 4,5 534 5,2

Nordeste 1.515 11,6 1.065 13,3 1.449 15,9 1.546 15,1

Sudeste 7.803 59,5 4.215 52,6 4.223 46,2 5.021 49,1

Sul 2.473 18,9 1.794 22,4 2.217 24,3 2.282 22,3

Centro-Oeste 818 6,2 631 7,9 826 9,0 844 8,2

Total 13.107 100,0 8.005 100,0 9.130 100,0 10.227 100,0Fontes: Embratur (2001, 2003a) e Brasil (2006, 2008a, 2008b).

Por outro lado, se as transformações estruturais do ramo se refletem nessa grande redução do número de empresas, do ponto de vista regional, também é bastante visível a concentração dos estabelecimentos nas regiões Sudeste e Sul, embora se apresente uma melhora dessa distribuição nos últimos anos.

Por último, em relação ao conjunto de atividades que estruturam o núcleo duro do desenvolvimento econômico do turismo, cabe ressaltar o ramo das ati-vidades recreativas e culturais. Apesar das dificuldades metodológicas de delimi-tação do grau de utilização dos serviços culturais e recreativos de uma localidade

Page 193: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

193

pelos turistas, trataremos aqui das atividades de parques de diversões (sobre-tudo os parques temáticos e aquáticos), e em menor medida, de parques e reservas nacionais abertas à visitação.

Com relação ao primeiro grupo (parques de diversões), para dimen-sionar a importância do ramo, em um estudo viabilizado pela Embratur, pôde-se destacar, em 1996, a existência de 130 parques de diversões e en-tretenimento de médio e grande portes, que somavam, à época, um fatura-mento anual de R$ 72 milhões. (FUNDAÇÃO DE APOIO..., 1998). Outras estimativas, em 2004, da principal entidade ligada ao ramo, a Associação das Empresas de Parques de Diversões do Brasil (ADIBRA), apontavam 195 empreendimentos em operação, entre os quais seriam 11 parques temáticos, 22 parques aquáticos, 30 parques de diversões fixos, 27 parques móveis e 105 Centros de entretenimento familiar, a maioria deles instalada na região Sudeste. (OLIVEIRA, 2005).

Em relação ao segundo grupo (parques naturais), deve-se destacar que atualmente existem dezenas de parques nacionais e outros tipos de reser-vas naturais espalhadas pelo território brasileiro, como o Parque Nacional do Iguaçu (PR), o Parque Nacional de Jaú (AM) e o Parque Nacional da Serra da Capivara (PI) – que abriga o Museu do Homem Americano – embora ainda atraiam um público limitado de visitantes, sobretudo se comparados com os parques de países como os EUA e Canadá, em virtude, provavelmente, do predomínio da oferta de destinos turísticos litorâneos.

Além disso, coloca D’Antona (2001), ainda são poucos aqueles conside-rados abertos à visitação pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), isto é, que reúnem regularização fundiária, plano de manejo e infraestrutura capaz de atender as necessidades de visitantes, pesquisadores e funcionários de manutenção da integridade do patrimônio ambiental, no sentido de se evitarem problemas existentes em alguns parques nacionais – por vezes considerados “fechados”, mas que efe-tivamente recebem visitação – tais como a superexploração de recursos, a poluição ambiental e o crescimento urbano desordenado do entorno.

Por fim, com relação à evolução do turismo no Brasil, cabe atentar para a acentuada incorporação da região Nordeste, e em menor medida, das regiões Norte e Centro-Oeste, em projetos de “turismo estrangeiro”, isto é, ligados aos grandes empreendimentos hoteleiros internacionais – sobretudo os resorts – e aos projetos de urbanização turística que representam uma forte segregação so-

Page 194: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

194

cioespacial11, em contraposição ao surgimento de iniciativas que adequam melhor o desenvolvimento da atividade turística com as características e a dinâmica so-cioeconômica locais, como tem se observado com maior frequência nas regiões Sul e Sudeste, através de experiências de ecoturismo e turismo rural. (LUCHIARI; SERRANO, 2002).

Embora existam algumas experiências positivas de desenvolvimento turís-tico local, no qual as atividades tradicionais são preservadas ou integradas, de maneira mais ou menos harmônica, aos novos impulsos do turismo em todas as regiões do País, (FRACALANZA; OLIVEIRA; BALTAR, 2006), é possível salientar que as três regiões, o Nordeste em particular, vêm sendo marcados pela

[...] criação de territórios homogeneizados pela obediência a um modelo internacional de urbanização turística do litoral, calca-do na concentração do equipamento e na segregação espacial de turistas e residentes. [...] Esses territórios, assim turistifi-cados, constituem ‘ilhas de lazer e contemplação’ que, se por um lado, atendem às expectativas do turista, por outro, pouco contribuem para melhor qualidade de vida das populações dos respectivos núcleos receptores. Ao contrário, em muitos casos, canalizam para si – em detrimento de outros projetos urbanís-ticos – grande parte dos recursos municipais e/ou estaduais. (CRUZ, 1999, p. 216).

7.3 – A Ocupação no Núcleo Duro do Turismo (2002-2007)

Para detalhar a caracterização das ocupações no turismo, evitando, em parte, as imprecisões ligadas a um recorte muito amplo do segmento, concentra-se o foco sobre o grupo de atividades do Núcleo Duro do Turismo (NDT) que representam de maneira mais direta as transformações e o desempenho da atividade no período recente. Para tanto, abaixo, a Tabela 8 traz a composição do NDT por ramo de ati-vidade e a evolução do número de ocupados no intervalo de 2002 a 2007.

11 Concentrados no Nordeste e demandando grandes investimentos, tais hotéis caracterizam-se pela oferta de diversos serviços no próprio empreendimento, por pagamentos antecipados de despe-sas (contribuindo de modo limitado à economia local) e pelo isolamento entre os visitantes e as comunidades onde se situam os hotéis, estes empreendimentos também trazem, em geral, outros impactos sociais indesejáveis, como o deslocamento dos moradores do entorno, a privatização de espaços públicos e a inviabilização das atividades de subsistência tradicionais, como revelam diversos estudos. (CRUZ, 2001).

Page 195: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

195

Tabela 8 – Distribuição dos Ocupados no Núcleo Duro do Turis-mo, segundo o Ramo de Atividade. Brasil: 2002/2007

Ramos de Atividade 2002 (%) 2005 (%) 2007 (%) Cresc. (%)

Alojamento 291.108 12,9 323.499 13,7 371.734 14,2 27,7

Transporte Terrestre 1.389.425 61,5 1.446.132 61,1 1.593.908 61,0 14,7

Transporte Aéreo 59.413 2,6 56.904 2,4 56.391 2,2 (5,1)

Agências de Viagens 85.092 3,8 71.638 3,0 89.680 3,4 5,4

Aluguel de Veículos 16.786 0,7 19.560 0,8 21.650 0,8 29,0

Atividades Recreativas e Culturais 418.450 18,5 448.415 18,9 478.586 18,3 14,4

Total 2.260.274 100,0 2.366.148 100,0 2.611.949 100,0 15,6 Fontes: IBGE/ Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD).

Concentrando-se nas atividades de alojamento, transporte terrestre, transporte aéreo, agências de viagens, aluguel de veículos e atividades recreativas e culturais, as ocupações no turismo apresentaram um crescimento de 15,6%, saindo do patamar de 2,26 milhões de ocupados para 2,61 milhões entre 2002 e 2007. Por sua vez, este contingente significaria apenas 3,0% dos ocupados na População Economicamente Ativa (PEA), uma aproxima-ção um pouco mais realista da importância econômica da atividade no País.

Em síntese, a evolução das ocupações nos ramos de atividade do NDT seguiu trajetórias bastante distintas, de modo que a ampliação dos investimentos no turismo no País parece ter afetado especialmente o nível de ocupação nos ramos de alojamen-to e aluguel de veículos e, em menor medida, os ramos de transporte terrestre e de atividades recreativas e culturais, enquanto o crescimento econômico do segmento turístico como um todo não produziu reflexos positivos sobre o volume de ocupação nos ramos de transporte aéreo e de agências de viagens.

Um ponto marcante do processo de desenvolvimento do turismo no País diz respeito à baixa qualificação profissional dos trabalhadores na atividade, que se liga de maneira crucial ao baixo nível de escolarização da população (um problema profundo que também se coloca para o mercado de trabalho e para a sociedade brasileira como um todo), ainda que outros aspectos também sejam vitais dentro desta questão12.

12 Além da baixa escolarização, outros entraves encontrados para a melhoria dos níveis de capacitação dos trabalhadores em turismo seriam a falta de recursos e de interesse dos pequenos estabelecimen-tos do segmento em aprofundar os investimentos neste sentido; a falta de incentivos gerados pela baixa remuneração oferecida aos ocupados; a grande rotatividade de trabalhadores causada pela alta sazonalidade da atividade; e a própria dificuldade de estabelecer cursos e treinamentos adequados às demandas do mercado. (HAZIN; OLIVEIRA; MEDEIROS, 2000).

Page 196: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

196

Tabe

la 9

– D

istr

ibui

ção

dos

Ocu

pado

s no

Núc

leo

Dur

o do

Tur

ism

o, s

egun

do R

amos

de

Ativ

idad

e e

o G

rau

de I

nstr

ução

. Bra

sil:

2002

/200

7

Ano

s de

Est

udo

2002

Alo

jam

ento

Tran

spor

te

Terr

estr

eTr

ansp

orte

A

éreo

Agê

ncia

s de

V

iage

nsA

lugu

el d

e Ve

ícul

os

Ativ

idad

es

Rec

reat

ivas

e

Cul

tura

isTo

tal

(%)

(%)

(%)

(%)

(%)

(%)

(%)

Nen

hum

3,3

2,8

2,5

2,2

-1,

82,

6

De

1 a

7 an

os42

,544

,815

,114

,914

,924

,838

,7

De

8 a

10 a

nos

20,2

23,1

8,9

17,9

16,2

23,4

22,2

De

11 a

15

anos

29,3

26,6

54,2

44,2

58,0

38,1

30,7

16 a

nos o

u m

ais

4,4

2,3

19,3

20,5

10,9

11,4

5,5

Tota

l10

0,0

100,

010

0,0

100,

010

0,0

100,

010

0,0

Ano

s de

Est

udo

2007

Nen

hum

5,3

3,4

-1,

6-

2,3

3,3

De

1 a

7 an

os27

,534

3,2

15,5

17,4

18,7

28,8

De

8 a

10 a

nos

21,3

25,9

5,3

14,6

11,8

20,3

23,3

De

11 a

15

anos

37,9

34,1

61,8

44,3

54,6

42,8

37,3

16 a

nos o

u m

ais

7,2

2,2

29,4

24,0

16,3

15,3

6,8

Tota

l10

0,0

100,

010

0,0

100,

010

0,0

100,

010

0,0

Font

e: IB

GE

/PN

AD

.N

ota:

Tot

al in

clui

os o

cupa

dos s

em d

ecla

raçã

o.

Page 197: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

197

Se, na Tabela 9, pode-se observar um aumento do nível de escolarização dos ocupados no turismo entre 2002 e 2007, por outro lado, a proporção de ocupa-dos com formação completa em cursos superiores (16 anos de estudo ou mais) continuava a representar uma parcela diminuta do total (5,5% em 2002 e 6,8% em 2007), contraposta à falta de ensino médio completo (11 anos de estudo ou mais) da maioria dos trabalhadores (que representava 63,5% e 55,4%, em 2002 e 2007, respectivamente). Da Tabela também se depreende que os níveis de esco-larização são inferiores entre os ocupados dos ramos de alojamento e transporte terrestre, e que houve, de modo pouco esperado, uma elevação do percentual de analfabetos no período (no total, de 2,6% para 3,3%). No entanto, a tendência de elevação da escolaridade predomina com a mudança de concentração do número de ocupados no ensino fundamental incompleto (38,7%), em 2002, para a cate-goria de ensino médio completo (37,3%), em 2007, com destaque para os ramos de transporte aéreo e de agência de viagens.

Com relação à posição na ocupação, o tipo de distribuição dos ocupados entre os diferentes ramos de atividade traz distinções importantes. No ramo de transporte aéreo, de alojamento e, em menor medida, de aluguel de veículos, a maioria das ocupações ocorre na forma de assalariamento com carteira. Em con-trapartida, o trabalho por conta própria predomina nas atividades recreativas e culturais (no qual o trabalho sem carteira também é forte) e é muito elevado no transporte terrestre.

Page 198: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

198

Tabe

la 1

0 –

Dis

trib

uiçã

o do

s O

cupa

dos

no N

úcle

o D

uro

do T

uris

mo,

seg

undo

o R

amo

de A

tivid

ade

e Po

siçã

o na

Ocu

paçã

o. B

rasi

l: 20

02/2

007

Ram

o de

Ativ

idad

e

2002

Em

preg

ado

com

car

teira

Em

preg

ado

sem

car

teira

Con

ta

Próp

riaE

mpr

egad

orFu

nc.

Pub.

Trab

. sem

Tota

lR

em.

(%)

(%)

(%)

(%)

(%)

(%)

(%)

Alo

jam

ento

72,6

16,8

2,6

6,3

-1,

710

0,0

Tran

spor

te T

erre

stre

46,9

14,1

34,5

3,1

0,9

0,6

100,

0

Tran

spor

te A

éreo

92,7

3,9

2,0

1,4

--

100,

0

Agê

ncia

s de

Via

gens

47,4

24,3

13,9

13,7

-0,

710

0,0

Alu

guel

de

Veíc

ulos

69,4

8,2

4,6

14,9

-2,

810

0,0

Ativ

idad

es R

ecre

ativ

as e

Cul

tura

is11

,429

,847

,64,

73,

53,

110

0,0

Tota

l45

,017

,430

,94,

21,

21,

210

0,0

Ram

o de

Ativ

idad

e20

07

Alo

jam

ento

74,0

17,2

2,8

4,3

-1,

610

0,0

Tran

spor

te T

erre

stre

45,8

13,4

37,7

1,9

0,6

0,6

100,

0

Tran

spor

te A

éreo

82,5

7,1

4,0

2,0

4,1

0,3

100,

0

Agê

ncia

s de

Via

gens

55,1

16,9

13,2

14,0

-0,

810

0,0

Alu

guel

de

Veíc

ulos

49,1

9,4

23,4

15,8

-2,

310

0,0

Ativ

idad

es R

ecre

ativ

as e

Cul

tura

is15

,828

,242

,06,

35,

32,

510

0,0

Tota

l45

,416

,631

,83,

61,

41,

110

0,0

Font

e: IB

GE

/PN

AD

.

Page 199: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

199

Como se pode verificar na Tabela 10, acima, há uma pequena mudança do quadro geral das ocupações em direção ao aumento da formalização do emprego, com redução dos assalariados informais, acompanhada, por outro lado, pela ele-vação do percentual de ocupados por conta própria no NDT.

Associada de maneira bastante forte à questão da alta informalidade (e às bai-xas remunerações), as jornadas de trabalho extensas e a grande rotatividade dos ocupados são outras duas características marcantes do segmento turístico observa-das nas Tabelas que vêm a seguir. Conformando um conjunto de situações que se influenciam mutuamente, vale lembrar que esses aspectos também aparecem liga-dos à sazonalidade própria que marca a atividade, o que contribui para realimentar alguns dos problemas e dificuldades enfrentadas no segmento13.

13 A sazonalidade se caracterizaria pela intensificação das atividades de trabalho e das jornadas na alta tem-porada, lado a lado à forte queda dos rendimentos das empresas e dos ocupados por conta própria e na drástica redução do número de empregos na baixa estação. (HAZIN; OLIVEIRA; MEDEIROS, 2000).

Page 200: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

200

Tabe

la 1

1 –

Dis

trib

uiçã

o do

s O

cupa

dos

no N

úcle

o D

uro

do T

uris

mo,

seg

undo

a Jo

rnad

a de

Tra

ba-

lho

Sem

anal

(em

núm

ero

de h

oras

). B

rasi

l: 20

02/2

007

Jorn

ada

de

Trab

alho

2002

Alo

jam

ento

Tran

spor

te

Terr

estr

eTr

ansp

orte

A

éreo

Agê

ncia

s de

V

iage

nsA

lugu

el d

e Ve

ícul

os

Ativ

idad

es

Rec

reat

ivas

e

Cul

tura

isTo

tal

(%)

(%)

(%)

(%)

(%)

(%)

(%)

Até

14

hora

s1,

30,

91,

45,

03,

418

,74,

4

15 a

39

hora

s9,

110

,725

,515

,06,

236

,415

,8

40 a

44

hora

s28

,824

,246

,840

,052

,118

,425

,1

45 a

48

hora

s32

,021

,413

,319

,616

,98,

320

,0

49 h

oras

ou

mai

s28

,842

,613

,020

,521

,418

,034

,5

Tota

l10

0,0

100,

010

0,0

100,

010

0,0

100,

010

0,0

Jorn

ada

de T

raba

lho

2007

Até

14

hora

s1,

61,

91,

95,

41,

615

,64,

5

15 a

39

hora

s10

,311

,428

,311

,215

,940

,116

,9

40 a

44

hora

s34

,630

,446

,850

,849

,823

,230

,9

45 a

48

hora

s30

,518

,59,

212

,118

,87,

017

,7

49 h

oras

ou

mai

s22

,937

,713

,820

,613

,914

,030

,0

Tota

l10

0,0

100,

010

0,0

100,

010

0,0

100,

010

0,0

Font

e: IB

GE

/PN

AD

.N

ota:

Tot

al in

clui

os o

cupa

dos s

em d

ecla

raçã

o.

Page 201: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

201

Do ponto de vista mais geral, as jornadas de 49 horas ou mais concentram quase um terço do número de ocupados, tanto em 2002 quanto em 2007, com 34,5% e 30% do total, respectivamente. Apesar da redução da participação nesta categoria, tal percentual revela o quão extensas são as jornadas no segmento, espe-cialmente, no caso do ramo de transporte terrestre. Nas jornadas de 45 a 48 horas, acima do limite previsto pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), também se incluem uma grande parcela dos ocupados no NDT, com destaque para o ramo de alojamentos (mais de 30%). Ocorre no período, todavia, a elevação da participação dos ocupados com jornada de trabalho entre 40 e 44 horas (de 25,1% para 30,9%), o que corresponde à jornada de trabalho semanal padrão.

A grande rotatividade do segmento turístico, destacada na bibliografia existen-te, pode ser vista nos dados na Tabela 12, a seguir. É válido ressaltar que o pouco tempo de permanência dos ocupados no segmento possui implicações evidentes sobre os (baixos) rendimentos auferidos e sobre a limitada qualificação e experiên-cia profissional dos mesmos, de que tanto depende a competitividade internacional do turismo no Brasil. (BALTAR; PRONI, 1996; OURIQUES, 1998)14.

14 Ilustrando este ponto, temos a opinião de um gerente de hotel na Região Metropolitana de Recife, segundo o qual: “A rotatividade é altíssima por causa da baixa qualificação e da falta de perspectiva no segmento [...] o emprego é como um quebra-galho”. (HAZIN; OLIVEIRA; MEDEIROS, 2000, p. 29).

Page 202: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

202

Tabe

la 1

2 –

Dis

trib

uiçã

o do

s O

cupa

dos

no N

úcle

o D

uro

do T

uris

mo,

seg

undo

a F

aixa

de

Tem

po d

e Tr

abal

ho. B

rasi

l: 20

02/2

007

Tem

po d

e Tr

abal

ho

2002

Alo

jam

ento

Tran

spor

te

Terr

estr

eTr

ansp

orte

A

éreo

Agê

ncia

s de

V

iage

nsA

lugu

el d

e Ve

ícul

os

Ativ

idad

es

Rec

reat

ivas

e

Cul

tura

isTo

tal

(%)

(%)

(%)

(%)

(%)

(%)

(%)

Até

11

mes

es22

,515

,68,

827

,417

,217

,517

,1

De

12 a

35

mes

es31

,724

,029

,820

,538

,624

,625

,3

De

36 a

59

mes

es13

,816

,213

,617

,817

,517

,816

,2

De

60 a

119

mes

es15

,522

,318

,018

,516

,215

,819

,9

120

mes

es o

u m

ais

16,4

21,9

29,8

15,8

10,4

24,5

21,5

Tota

l10

0,0

100,

010

0,0

100,

010

0,0

100,

010

0,0

Tem

po d

e Tr

abal

ho20

07

Até

11

mes

es26

,813

,514

,019

,117

,515

,315

,9

De

12 a

35

mes

es29

,922

,729

,522

,829

,823

,424

,1

De

36 a

59

mes

es15

,716

,016

,212

,117

,713

,115

,3

De

60 a

119

mes

es15

,621

,820

,519

,321

,617

,119

,9

120

mes

es o

u m

ais

12,0

26,1

19,6

26,7

13,4

31,1

24,8

Tota

l10

0,0

100,

010

0,0

100,

010

0,0

100,

010

0,0

Font

e: IB

GE

/PN

AD

.

Page 203: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

203

Pelos números, em 2002, a principal categoria em que se agrupam os ocupa-dos é a do tempo de vínculo de 12 a 35 meses, com 25,3%, e que em 2007, a faixa de tempo de 120 meses ou mais possui um volume maior (24,8%), representando uma melhora no perfil do NDT. Porém, as três primeiras faixas em conjunto agre-gam a maioria dos ocupados nos dois anos (mais de 55%), demonstrando que as ocupações no segmento possuem um caráter bastante instável, com grande rotati-vidade dos ocupados, em especial no ramo de alojamento e de agência de viagens.

As informações da Tabela seguinte permitem traçar um perfil dos rendimen-tos das ocupações no NDT. Nota-se rapidamente pelos dados que um melhor padrão de remuneração pertence ao ramo de transporte aéreo e que, de modo contrário, o pior padrão de remuneração deve-se às atividades recreativas e cul-turais e de alojamento. Ademais, de modo geral também se vislumbra uma leve redução, entre 2002 e 2007, da participação relativa dos ocupados nas faixas supe-riores de rendimentos. Tomado como um todo, é bastante claro o baixo nível das remunerações no turismo, inclusive pelo aumento da concentração da participa-ção de ocupados na faixa de 1 a 2 salários mínimos entre 2002 e 2007, somando 40,3% do total.

Page 204: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

204

Tabe

la 1

3 –

Dis

trib

uiçã

o do

s O

cupa

dos

no N

úcle

o D

uro

do T

uris

mo,

seg

undo

Fai

xa d

e R

endi

men

tos

e R

amo

de A

tivid

ade.

Bra

sil:

2002

/200

7

Ren

dim

ento

s

2002

Alo

jam

ento

Tran

spor

te

Terr

estr

eTr

ansp

orte

A

éreo

Agê

ncia

s de

V

iage

nsA

lugu

el d

e Ve

ícul

os

Ativ

idad

es

Rec

reat

ivas

e

Cul

tura

isTo

tal

(%)

(%)

(%)

(%)

(%)

(%)

(%)

Sem

Ren

dim

ento

s1,

80,

7-

0,7

2,8

3,6

1,4

Até

1 S

M30

,915

,33,

613

,310

,631

,119

,8

De

1 a

2 SM

43,9

32,5

17,9

31,8

32,2

27,3

32,6

De

2 a

3 SM

11,3

27,0

19,0

17,5

15,4

14,0

21,9

De

3 a

5 SM

4,5

14,6

17,1

14,3

17,6

8,3

12,2

Mai

s de

5 SM

7,7

9,9

42,5

22,4

21,3

15,8

12,1

Tota

l10

0,0

100,

010

0,0

100,

010

0,0

100,

010

0,0

Ren

dim

ento

s20

07

Sem

Ren

dim

ento

s1,

60,

60,

30,

82,

32,

61,

1

Até

1 S

M6,

19,

22,

14,

91,

120

,410

,5

De

1 a

men

os d

e 2

SM63

,838

,813

,632

,836

,731

,640

,3

De

2 a

men

os d

e 3

SM11

,625

,618

,820

,917

,116

,921

,6

De

3 a

men

os d

e 5

SM7,

014

,416

,411

,812

,49,

312

,3

Mai

s de

5 SM

7,0

9,4

43,5

22,4

30,4

14,9

11,4

Tota

l10

0,0

100,

010

0,0

100,

010

0,0

100,

010

0,0

Font

e: IB

GE

/PN

AD

.N

otas

: (1)

Sal

ário

s Mín

imos

em

R$

de se

t./20

07 -

valo

res d

e 20

02 c

orrig

idos

pel

o Ín

dice

Nac

iona

l de

Preç

os a

o C

onsu

mid

or (I

NPC

). (2

) To

tal i

nclu

i os o

cupa

dos s

em d

ecla

raçã

o.

Page 205: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

205

A partir da caracterização do perfil das ocupações no Núcleo Duro do Turis-mo, discute-se, na próxima seção, como a heterogeneidade existente nas formas de trabalho e colocação no interior do segmento se reflete no âmbito regional.

7.4 – Diferenças Regionais entre os Ocupados no Turismo

As informações que se seguem, tratam, pois, das diferenciações existentes entre as macrorregiões nacionais, das quais se ressaltam, especialmente, as desi-gualdades e diferenças na distribuição do número dos rendimentos, na distribui-ção das posições ocupacionais e no grau de escolaridade dos ocupados.

Tabela 14 – Distribuição dos Ocupados no Núcleo Duro do Turis-mo, segundo Regiões. Brasil: 2002/2007

Regiões 2002 (%) 2005 (%) 2007 (%)Cresc.

2002/07 (%)

Norte 123.719 5,5 153.889 6,5 179.325 6,9 31,0

Nordeste 530.417 23,5 582.251 24,6 632.948 24,2 16,2

Sudeste 1.162.044 51,4 1.183.079 50,0 1.268.366 48,6 8,4

Sul 304.623 13,5 296.780 12,5 356.329 13,6 14,5

Centro-Oeste 139.471 6,2 150.149 6,3 174.981 6,7 20,3

Total 2.260.274 100,0 2.366.148 100,0 2.611.949 100,0 13,5

Fontes: IBGE/PNAD.

Com relação à distribuição dos ocupados, observa-se a concentração dos mesmos no Sudeste e Sul do País, que somam mais de 60% do total durante todo o período. Houve, por outro lado, uma elevação da participação das regiões Norte e Centro-Oeste, com um crescimento constante e mais elevado do que nas demais regiões, com variações respectivas de 31% e 20,3%. A região Nordeste aparece na sequência em termos de crescimento das ocupações (16,2%) e ainda responde pelo segundo lugar no País em termos de absorção de mão-de-obra no turismo (24,2% do total em 2007). Com um aumento do número de ocupações acima da média nacional (14,5%), a região Sul aparece com uma participação estável, concentrando 13,6% das ocupações em 2007 (contra 13,5% em 2002). Por fim,

Page 206: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

206

também se revela a importância, ainda que decrescente, do Sudeste no total dos ocupados do NDT, pois a região representava 51,4% do montante geral, em 2002, e passou a 48,6% em 2007, tendo um crescimento relativo de 8,4% no período, bem abaixo da média das regiões, 13,5%.

A seguir, visualizam-se diferenciais expressivos na alocação de pessoal em cada região com relação ao tipo de atividade do NDT. Embora o Sudeste aglutine a maior parte do pessoal ocupado, especialmente dos ramos de transportes aéreo e terrestre, a evolução das ocupações apresentou tendências bem distintas entre eles.

Tabe

la 1

5 –

Dis

trib

uiçã

o do

s O

cupa

dos

no N

úcle

o D

uro

do

Tur

ism

o, s

egun

do R

egiõ

es e

Ram

os d

e A

tivid

ade.

B

rasi

l: 20

02/2

007

Reg

iões

2002

Alo

jam

ento

Tran

spor

te

Terr

estr

eTr

ansp

orte

A

éreo

Agê

ncia

s de

Via

gens

Alu

guel

de

Veíc

ulos

Ativ

idad

es

Rec

reat

ivas

e

Cul

tura

isTo

tal

(%)

(%)

(%)

(%)

(%)

(%)

(%)

Nor

te4,

75,

64,

64,

59,

15,

75,

5

Nor

dest

e23

,225

,74,

614

,831

,220

,223

,5

Sude

ste

45,1

50,8

74,9

57,5

38,3

53,9

51,4

Sul

19,0

11,6

10,1

16,2

13,6

15,6

13,5

Cen

tro-O

este

8,0

6,2

5,7

7,0

7,8

4,6

6,2

Tota

l10

0,0

100,

010

0,0

100,

010

0,0

100,

010

0,0

Reg

iões

2007

Nor

te5,

77,

49,

45,

913

,05,

56,

9

Nor

dest

e20

,426

,112

,016

,129

,123

,724

,2

Sude

ste

47,3

48,7

59,4

47,7

35,1

48,7

48,6

Sul

17,5

12,0

12,4

19,8

19,1

14,8

13,6

Cen

tro-O

este

9,1

5,8

6,8

10,5

3,6

7,4

6,7

Tota

l10

0,0

100,

010

0,0

100,

010

0,0

100,

010

0,0

Font

e: IB

GE

/PN

AD

.

Page 207: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

207

Em especial, enquanto na atividade de alojamento houve um movimento de crescimento relativo das ocupações na região Sudeste (de 45,1% para 47,3%) e das participações das regiões Norte (de 4,7% para 5,7%) e Centro-Oeste (de 8% pra 9,1%), contrastado pela queda da participação do Nordeste (de 23,2% para 20,4%), em todas as demais atividades é o Sudeste que perde importância relativa, e a região Nordeste que amplia a sua participação no total.

Com o foco no grau de escolaridade dos ocupados por região (Tabela 16), é possível apontar o predomínio do Sudeste na concentração de ocupados com maior escolaridade, mas também, em segundo lugar, um pequeno rearranjo das diferenças de escolarização entre as regiões, com uma clara melhora do perfil da região Norte.

Tabela 16 – Distribuição dos Ocupados no Núcleo Duro do Turismo, segundo Regiões e Grau de Instrução. Brasil: 2002/2007

Regiões

2002

Nenhum De 1 a 7 anos

De 8 a 10 anos

De 11 a 15 anos

16 anos ou mais Total

(%) (%) (%) (%) (%) (%)

Norte 9,3 5,4 6,7 4,7 3,1 5,5

Nordeste 46,1 27,4 19,4 21,0 13,5 23,5

Sudeste 31,8 47,4 52,9 54,9 66,8 51,4

Sul 7,8 13,4 14,1 13,7 11,9 13,5

Centro-Oeste 5,0 6,4 6,8 5,7 4,7 6,2

Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

Regiões 2007

Norte 8,4 6,8 8,2 6,3 5,0 8,4

Nordeste 45,3 28,0 22,0 23,1 12,6 45,3

Sudeste 29,8 44,1 50,2 50,9 58,7 29,8

Sul 9,2 12,8 13,6 13,8 17,8 9,2

Centro-Oeste 7,3 8,3 5,9 5,9 5,9 7,3

Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0Fonte: IBGE/PNAD.

Salientando-se as duas situações mais díspares, vê-se que o Nordeste con-centra os maiores índices de analfabetismo (mais de 45% nos dois anos), ao passo que 58,7% dos ocupados com nível superior completo estavam localizados no Sudeste, em 2007. Na realidade, em 2002, a concentração dos ocupados com

Page 208: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

208

16 anos de estudo ou mais era ainda maior no Sudeste (66,8%), demonstrando um pequeno processo de desconcentração da força de trabalho mais qualificada. Os ganhadores de participação relativa neste estrato foram, então, as regiões Sul, Norte e Centro-Oeste, ao que se soma a queda da participação do Nordeste, um processo, de certo modo, inconsistente com o crescimento e modernização dos empreendimentos turísticos ocorridos nesta área em particular. Nas demais faixas de escolaridade as participações relativas sofreram poucas alterações, com ressalvas para a perda de presença da região Sudeste em todas elas e aumento, em menor medida, da participação da região Norte em todas as categorias.

Nos dados mostrados a seguir, na Tabela 17, destacam-se as mudanças ocorridas na distribuição regional dos ocupados com relação às posições na ocupação. Mais uma vez, além da forte concentração das ocupações na região Sudeste, é possível visualizar certa desconcentração relativa do pessoal, em especial, para as regiões Norte e Centro-Oeste.

Tabela 17 – Distribuição dos Ocupados no Núcleo Duro do Turismo, segundo Regiões e Posição na Ocupação. Brasil: 2002/2007

Regiões

2002

Empregado com Carteira

Empregado sem Carteira

Conta Própria Empregador Func.

Públicos

Trab. sem

Rem.Total

(%) (%) (%) (%) (%) (%) (%)

Norte 4,0 6,7 6,8 5,6 4,3 8,3 5,5

Nordeste 17,3 28,3 29,8 22,6 16,6 29,9 23,5

Sudeste 56,4 44,6 48,6 49,2 59,3 33,0 51,4

Sul 15,5 13,5 9,9 16,1 11,4 23,1 13,5

Centro-Oeste 6,7 6,8 4,9 6,4 8,5 5,7 6,2

Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

Regiões 2007

Norte 4,7 7,9 8,7 10,8 6,9 13,4 6,9

Nordeste 17,3 25,5 33,4 22,6 27,4 27,4 24,2

Sudeste 54,9 46,4 42,7 36,9 41,2 37,8 48,6

Sul 16,1 13,1 9,5 19,8 20,5 12,5 13,6

Centro-Oeste 7,1 7,1 5,7 10,0 4,0 8,9 6,7

Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

Fonte: IBGE/PNAD.

Page 209: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

209

No caso da região Norte, o crescimento da participação na ocupação ocorre com mais rapidez entre os empregadores (de 5,6% para 10,8%) e no trabalho por con-ta própria (de 6,8% para 8,7%), ainda que o assalariamento também tenha se expandi-do. No Nordeste, porém, o aumento de peso relativo se faz apenas entre os ocupados por conta própria, havendo queda (emprego sem carteira assinada) ou estabilidade nas demais categorias. No Sudeste, a principal queda de participação ocorreu entre os empregadores (de 49,2% para 36,9%), ocorrendo um acréscimo percentual entre os trabalhadores sem carteira assinada (de 44,6% para 46,4%) e sem remuneração. Na re-gião Sul o crescimento relativo se dá especialmente entre os empregadores (de 16,1% para 19,8%) e no emprego formal (de 15,5% para 16,1%), enquanto entre os empre-gados informais e os trabalhadores por conta própria houve uma pequena diminuição. Na região Centro-Oeste o que se nota também é o crescimento mais expressivo da participação entre os empregadores (de 6,4% para 10%), e entre os ocupados por conta própria (de 4,9% para 5,7%), sendo que nas demais categorias também ocorreu um aumento da presença da região (inclusive entre os sem-remuneração), ainda que a mesma possua uma parcela reduzida do total inserido na atividade.

Na Tabela 18 encontra-se a distribuição das remunerações em relação às macror-regiões nacionais. Em cada uma delas predomina uma participação mais elevada dos ocupados na faixa de um a menos de três salários mínimos, ocorrendo uma queda da participação nas maiores remunerações, apesar das diferenças entre as mesmas.

Page 210: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

210

Tabela 18 – Distribuição dos Ocupados no Núcleo Duro do Turismo, segundo Regiões e Faixa de Rendimentos. Brasil: 2002/2007

Regiões

2002

Sem Rendimentos

Menos de 1 SM

De 1 a menos

de 2 SM

De 2 a menos

de 3 SM

De 3 a menos

de 5 SM

Mais de 5 SM

Total

(%) (%) (%) (%) (%) (%) (%)

Norte 1,8 27,7 37,6 20,2 6,3 6,4 100,0

Nordeste 1,6 35,5 34,9 17,1 5,6 5,2 100,0

Sudeste 1,0 12,7 29,5 24,7 16,3 15,8 100,0

Sul 2,1 16,1 35,9 22,3 12,0 11,7 100,0

Centro-Oeste 1,1 20,3 37,7 18,2 9,5 13,1 100,0

Total 1,4 19,8 32,6 21,9 12,2 12,1 100,0

Regiões 2007

Norte 2,3 8,7 49,2 20,3 9,5 9,3 100,0

Nordeste 1,3 23,1 46,8 16,1 6,3 6,1 100,0

Sudeste 0,9 6,4 35,8 23,4 14,5 14,3 100,0

Sul 1,0 6,2 38,8 23,9 16,7 12,3 100,0

Centro-Oeste 1,7 5,3 43,0 25,6 12,8 10,9 100,0

Total 1,1 10,5 40,3 21,6 12,3 11,4 100,0Fonte: IBGE/PNAD.Notas: (1) Salários Mínimos em R$ de set./2007 (valores de 2002 corrigidos pelo

INPC). (2) Total inclui os ocupados sem declaração de escolaridade.

Na região Norte observa-se que o número relativo de ocupados sem ren-dimentos se ampliou e a região passou a se destacar com relação a este aspecto. Outros pontos a frisar são a queda da participação dos ocupados com menos de um salário mínimo, o aumento da faixa entre um e menos de dois salários e o crescimento da participação dos ocupados com maiores rendimentos (de 3 a me-nos de cinco e de cinco ou mais salários mínimos). Na realidade, com a exceção do Sudeste e do Centro-Oeste (apenas na última categoria), as faixas superiores apresentaram crescimento.

A região Nordeste, em comparação com as demais, é que possui um perfil mais achatado na distribuição dos rendimentos dos ocupados, com apenas 6,1% dos mesmos na faixa de cinco ou mais salários mínimos e 6,3% na faixa entre três e cinco salários em 2007, enquanto a média do NDT apontava para uma participação de 11,4% e 12,3% em cada uma destas faixas, respectivamente. A participação de ocupados com menos de um salário mínimo também é muito

Page 211: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

211

mais elevada, a despeito da sua redução (de 35,5% para 23,1%), quando a média encontrada em 2007 foi de 10,5%.

No Sudeste o perfil de distribuição de remunerações se deteriorara, muito embora ainda fique em patamar superior ao das demais regiões. Apesar de os ocupados com menos de um salário mínimo se reduzirem até o nível de 6,4%, a participação dos ocupados nas duas faixas superiores (de três a cinco e de cinco ou mais salários mínimos), que representavam mais de 30% do total em 2002, cai 2%. Na região Sul, ao contrário, houve melhoras, justamente pelo aumento da participação dessas categorias, além da queda percentual dos ocupados com menos de um salário mínimo. No Centro-Oeste, por último, a queda dos rendi-mentos foi sentida tanto na maior participação dos ocupados sem remuneração quanto na queda da participação dos ocupados com renda de cinco ou mais sa-lários mínimos. Porém, também ocorreu uma grande queda das ocupações cujos rendimentos eram inferiores a um salário mínimo.

Tabela 19 – Distribuição dos Ocupados no Núcleo Duro do Turis-mo, segundo Unidades da Federação. Brasil: 2002/2007

UF 2002 (%) 2007 (%) Variação (%)

Rondônia 15.607 0,7 10.310 0,4 (33,9)

Acre 6.261 0,3 6.844 0,3 9,3

Amazonas 32.608 1,4 49.971 1,9 53,2

Roraima 3.685 0,2 4.099 0,2 11,2

Pará 53.416 2,4 84.841 3,2 58,8

Amapá 3.320 0,1 9.925 0,4 198,9

Tocantins 8.822 0,4 13.335 0,5 51,2

Maranhão 63.884 2,8 55.739 2,1 (12,7)

Piauí 26.720 1,2 41.179 1,6 54,1

Ceará 78.803 3,5 90.040 3,4 14,3

Rio Grande do Norte 30.918 1,4 45.349 1,7 46,7

Paraíba 34.495 1,5 42.421 1,6 23,0

Pernambuco 104.336 4,6 116.912 4,5 12,1

Alagoas 21.198 0,9 35.675 1,4 68,3

Sergipe 25.412 1,1 29.520 1,1 16,2

Bahia 144.651 6,4 176.113 6,7 21,8

Minas Gerais 246.989 10,9 258.139 9,9 4,5

Continua

Page 212: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

212

Tabela 19 – Distribuição dos Ocupados no Núcleo Duro do Turis-mo, segundo Unidades da Federação. Brasil: 2002/2007

UF 2002 (%) 2007 (%) Variação (%)

Espírito Santo 38.728 1,7 45.751 1,8 18,1

Rio de Janeiro 326.434 14,4 367.251 14,1 12,5

São Paulo 549.893 24,3 597.225 22,9 8,6

Paraná 129.763 5,7 139.835 5,4 7,8

Santa Catarina 64.107 2,8 67.130 2,6 4,7

Rio Grande do Sul 110.753 4,9 149.364 5,7 34,9

Mato Grosso do Sul 19.651 0,9 27.363 1,0 39,2

Mato Grosso 21.485 1,0 28.334 1,1 31,9

Goiás 66.133 2,9 78.603 3,0 18,9

Distrito Federal 32.202 1,4 40.681 1,6 26,3

Total 2.260.274 100,0 2.611.949 100,0 15,6Fonte: IBGE/PNAD.

Pela Tabela 19, em relação ao total de ocupados por Unidades da Federação (UF), pode-se ressaltar a forte concentração de pessoal em São Paulo, Rio de Ja-neiro, Minas Gerais e Bahia, ao passo que as UF com menor percentual de ocupa-ções são Roraima, Acre e Rondônia. De todo modo, também ocorre um proces-so de desconcentração regional, pelo dinamismo da elevação das ocupações nos Estados do Amapá, Alagoas, Pará, Piauí, Amazonas, Tocantins e Rio Grande do Norte (embora se trate de UF com pequeno volume de ocupações), e pela queda de participação – em termos relativos – de Minas Gerais, Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Pernambuco, Rio de Janeiro e Ceará, apesar da grande importância dos Estados do Sudeste e Nordeste no volume geral, e da queda – em termos absolutos – da ocupação em Rondônia e no Maranhão.

Tabela 20 – Rendimentos Médios dos Ocupados no Núcleo Duro do Turismo, segundo Unidades da Federação. Brasil: 2002/2007

UFRendimentos Médios

2002 2007 Var. (%)

Rondônia 755,18 1.029,95 36,4

Acre 1.033,34 729,68 (29,4)

Amazonas 727,98 971,68 33,5

Continua

(Continuação)

Page 213: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

213

Tabela 20 – Rendimentos Médios dos Ocupados no Núcleo Duro do Turismo, segundo Unidades da Federação. Brasil: 2002/2007

UFRendimentos Médios

2002 2007 Var. (%)

Pará 784,5 925,66 18,0

Amapá 1.129,54 806,78 (28,6)

Tocantins 511,13 958,09 87,4

Maranhão 872,1 867,26 (0,6)

Piauí 545,66 766,91 40,5

Ceará 718,5 719,63 0,2

Rio Grande do Norte 595,84 659,02 10,6

Paraíba 548,59 719,10 31,1

Pernambuco 674,58 624,97 (7,4)

Alagoas 666,03 1.046,40 57,1

Sergipe 632,28 778,79 23,2

Bahia 755,72 752,39 (0,4)

Minas Gerais 938,25 904,04 (3,6)

Espírito Santo 920,23 823,94 (10,5)

Rio de Janeiro 1.297,17 1.229,32 (5,2)

São Paulo 1.293,02 1.284,62 (0,6)

Paraná 1.050,89 1.145,51 9,0

Santa Catarina 1.122,90 1.148,49 2,3

Rio Grande do Sul 1.152,55 1.101,74 (4,4)

Mato Grosso do Sul 901,57 869,61 (3,5)

Mato Grosso 1.173,56 898,84 (23,4)

Goiás 1.009,19 1.227,94 21,7

Distrito Federal 1.435,31 1.371,92 (4,4)

Total 1.044,92 1.041,48 (0,3)Fonte: IBGE/PNAD.Notas: (1) Valores de 2002 corrigidos pelo INPC (set./2007).

(2) Rendimentos médios excluem ocupados sem remuneração.

Com relação aos rendimentos médios, um panorama pouco distinto se co-loca devido: à enorme diferença entre os dois extremos de remunerações médias

(Continuação)

Page 214: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

214

encontrados no País (Distrito Federal e Pernambuco); às diferenças profundas entre a renda média dos ocupados nos Estados das regiões Sudeste e Sul em comparação com as regiões Norte e Nordeste; e à evolução bastante positiva nos Estados de Tocantins, Alagoas, Piauí, Amazonas, Rondônia e Paraíba, contrastada com a queda dos rendimentos encontrados, em 2007, sobretudo no Acre, Amapá, Mato Grosso e Espírito Santo.

7.5 – Considerações Finais

No breve panorama do turismo no Brasil, desenvolvido até aqui, frisa-se que a trajetória da atividade e os números do mercado de trabalho no segmento trazem uma maior cautela sobre o potencial da atividade turística no sentido de amenizar os graves problemas econômicos e sociais do País e, em particular, de suas regiões mais empobrecidas. Em primeiro lugar, pode-se dizer que o turis-mo brasileiro não está plenamente consolidado nem do ponto de vista da oferta (diante do potencial de atrações turísticas existentes e da heterogeneidade das empresas que atuam nos seus segmentos), nem consegue explorar plenamente o seu potencial de demanda (em relação à demanda nacional ou internacional).

Como se vê, alguns indicadores gerais e relativos aos diferentes ramos da atividade apontam para: i) o aumento do número de turistas nacionais e interna-cionais; ii) a ampliação da participação da atividade turística na economia; iii) a diversificação de destinos e roteiros turísticos; e iv) a expansão e modernização de diversos equipamentos e serviços turísticos, em particular, nos ramos de hote-laria, as agências de viagens e parques de diversões. Mas, por outro lado, aspectos negativos permanecem presentes, tais como: a alta concentração do turismo nas regiões Sul e Sudeste do País, tanto no que toca à geração de riqueza e à oferta de serviços turísticos quanto em relação aos fluxos emissores e receptores de visitantes (nacionais e internacionais); as precárias condições de infraestrutura, em particular, nas regiões Norte e Nordeste; a reduzida participação do consumo turístico nas despesas familiares; e o saldo negativo e elevado da conta turismo em quase todo o período analisado. Apesar de sua grande expansão, encontram-se ainda muitos obstáculos ao “pleno desenvolvimento” do turismo no Brasil, isto é, obstáculos a um desenvolvimento sustentável da atividade, com amplo usufruto popular e desconcentração espacial.

Em segundo lugar, a análise do perfil das ocupações deixa claro que algumas das principais contribuições ao desenvolvimento econômico nacional e regional que eram esperadas com o crescimento do turismo não se concretizaram, pois,

Page 215: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

215

como ficou demonstrado, são precárias as condições de trabalho no turismo – pelo menos para a maioria das pessoas ligadas à atividade – pelas baixas remu-nerações, pelos baixos níveis de formalização do emprego, baixa escolaridade, elevada rotatividade e pelo reduzido tempo de vínculo de trabalho dos ocupados.

Ademais, paradoxalmente ao fato de ter havido um período de grande ex-pansão do segmento no Brasil, observa-se que também houve, desde 2002, ape-nas uma leve melhora no grau de formalização do emprego, contrastada por um aumento muito mais significativo da participação dos trabalhadores por conta própria na atividade, ao mesmo tempo em que se dá uma elevação do percentual de ocupados com menores remunerações, isto é, um aumento mais expressivo das ocupações nas faixas de rendimento de até dois salários mínimos, representando mais da metade do total.

Sobre a sazonalidade e as jornadas de trabalho, ambas se mostraram ainda elevadas (especialmente no transporte terrestre), mesmo com a melhora no perfil de contratação da força de trabalho – de maneira que quase metade dos ocupados pos-sui jornada igual ou superior a 45 horas semanais – e com o pequeno aumento do percentual daqueles com mais tempo de vínculo no estabelecimento (destacando-se os ramos de alojamento e aluguel de veículos com os vínculos mais instáveis).

A comparação entre os ramos de atividade, por seu turno, permitiu visualizar grandes diferenças entre os mesmos. Os níveis de escolarização são inferiores entre os ocupados dos ramos de alojamento e transporte terrestre; existe uma informalidade mais alta no transporte terrestre e nas atividades recreativas e cul-turais; as remunerações são mais elevadas nos ramos de transporte aéreo e mais reduzidas nas atividades recreativas e culturais e no ramo de alojamento.

Por fim, a distribuição geográfica das ocupações no turismo, inclusive da-quelas com melhor remuneração, por seu turno, permaneceu concentrada na re-gião Sudeste, e em menor grau, na região Sul, ficando as regiões Nordeste, Norte e Centro-Oeste com os piores indicadores de remuneração, escolaridade e informa-lidade das ocupações. A breve comparação no interior das macrorregiões também revela, de maneira mais grave, que alguns poucos estados concentram melhores condições em cada uma das regiões, acentuando a dificuldade de se pensar o turis-mo e melhora das desigualdades regionais sem ações mais diretas sobre o desenvol-vimento da atividade no território nacional.

Page 216: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

216

Referências

ALBAN, M. Turismo no Brasil: a estratégia de expansão espacial e seus problemas. Turismo - Visão e Ação, Itajaí, v. 8, n. 2, maio/ago. 2006.

ÁRIAS, A. R.; ZAMBONI, R. A. Sistema integrado de informações sobre o mercado de trabalho no setor turismo no Brasil: a experiência do IPEA: sistema de informações sobre o mercado de trabalho do setor turismo. Brasília, DF: IPEA, 2006.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE LOCADORAS DE AUTOMÓVEIS. Princi-pais indicadores. Disponível em: <www.abla.com.br>. Acesso em: 21 nov. 2007.

BALTAR, P. E. A.; PRONI, M. W. Sobre o regime de trabalho no Brasil: rotativi-dade da mão-de-obra, emprego formal e estrutura salarial. In: OLIVEIRA, C. E. B.; MATTOSO, J. E. L. (Org.). Crise e trabalho no Brasil: modernidade ou volta ao passado?. São Paulo: Scritta, 1996.

BEZERRA, M. M. O. Turismo e financiamento: o caso brasileiro a luz das ex-periências internacionais. 2002. 177 f. Tese (Doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2002.

BNB. O setor turismo. Fortaleza, 2000.

BONIN, M. V. Tecnologia de comunicação e informação e as adequações do mercado de distribuição de produtos turísticos. 2003. 147 f. Dissertação (Mestra-do) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2003.

BRASIL. Ministério do Turismo. Anuário estatístico Embratur 2006. Brasília, DF, 2006.

______. Estatísticas básicas de turismo: Brasil (2003-2007). Brasília, DF, 2008. Disponível em: <www.turismo.gov.br>. Acesso em: 12 out. 2008a.

______. Investimentos e financiamentos 2006. Disponível em: <www.turis-mo.gov.br>. Acesso em: 15 set. 2008b.

______. Plano Nacional de Turismo 2007/2010: uma viagem de inclusão. Bra-sília, DF, 2007.

Page 217: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

217

CASTRO, N. Transporte rodoviário de passageiros: estrutura, desempenho e de-safios regulatórios. Disponível em: <www.nemesis.org.br>. Acesso em: 9 jan. 2008.

CORREA, A. L. Serviços de hospedagem. In: BRASIL. Ministério do Turismo. O turismo no Brasil: panorama geral, avaliação da competitividade e propostas de políticas públicas: relatório de pesquisa. Brasília, DF, 2006.

CRUZ, R. C. O Nordeste que o turismo(ta) não vê. In: RODRIGUES, A. B. (Org.). Turismo, modernidade, globalização. São Paulo: Hucitec, 1999.

______. Política de turismo e território. São Paulo: Contexto, 2001.

CUNHA, A. M.; RIBEIRO, A. R. O segmento de agências e operadoras de viagens e turismo. In: BRASIL. Ministério do Turismo. O turismo no Brasil: panorama geral, avaliação da competitividade e propostas de políticas públicas: relatório de pesquisa. Brasília, DF, 2006.

D’ANTONA, A. O. Turismo em parques nacionais. In: FUNARI, P. P.; PINSKY, J. Turismo e patrimônio cultural. São Paulo: Contexto, 2001.

DIEESE. Mercado de trabalho e modernização do setor terciário brasilei-ro: estudos DIEESE/CESIT. São Paulo, 2005. CD-ROM.

EMBRATUR. Anuário estatístico Embratur 2001. Brasília, DF, 2001.

______. Equipamentos e serviços turísticos 1995 a 1999. Disponível em: <www.embratur.gov.br>. Acesso em: 15 ago. 2003a.

______. Evolução do turismo no Brasil: 1992 a 2001. Disponível em: <www.embratur.gov.br>. Acesso em: 30 ago. 2003b.

______. Mão de obra empregada nas atividades turísticas RAIS (1994-2001). Disponível em: <www.embratur.gov.br>. Acesso em: 10 jul. 2003c.

______. A revolução silenciosa. Disponível em: <www.embratur.gov.br>. Acesso em: 15 mar. 2000.

FERREIRA, M. J. B.; LAPLANE, G. O transporte aéreo no Brasil: panorama geral, avaliação da competitividade e propostas de políticas públicas para o setor. In: BRASIL. Ministério do Turismo. O turismo no Brasil: panorama geral, avaliação da competitivi-dade e propostas de políticas públicas: relatório de pesquisa. Brasília , DF, 2006.

Page 218: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

218

FRACALANZA, P. S.; OLIVEIRA, F. M.; BALTAR, C. Turismo e a dimensão social. In: BRASIL. Ministério do Turismo. O turismo no Brasil: panorama ge-ral, avaliação da competitividade e propostas de políticas públicas: relatório de pesquisa. Brasília, DF, 2006.

FUNDAÇÃO DE APOIO AO DESENVOLVIMENTO DA UNIVERSIDA-DE FEDERAL DE PERNAMBUCO. Estudo econômico-financeiro dos meios de hospedagem e parques temáticos no Brasil. In: EMBRATUR. Estudos do turismo brasileiro. Brasília, DF, 1998.

FUNDAÇÃO INSTITUTO DE PESQUISAS ECONÔMICAS. Caracteriza-ção e dimensionamento do turismo doméstico no Brasil - 2002 e 2006: rela-tório executivo sintético. Brasília, DF, 2007.

______. Estudo do mercado interno de turismo 2001. Brasília, DF: EMBRA-TUR, 2002.

HAZIN, A. L.; OLIVEIRA, C. F. G.; MEDEIROS, R. Turismo e mão-de-obra: entre o real e o ideal. Recife: FUNDAJ, 2000.

IBGE. Estimativas de população. Disponível em: <www.ibge.gov.br>. Acesso em: 11 ago. 2007.

LIMA, R. A. P. F. O avanço das redes hoteleiras internacionais no Brasil. 2003. 223 f. Tese (Doutorado) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2003.

LUCHIARI, M. T. D. P.; SERRANO, C. Tourism and environment in Brazil. In: HOGAN, D. J.; BERQUO, E.; COSTA, H. S. M. (Ed.). Population and envi-ronment in Brazil: Rio+10. Campinas: CNPD, 2002.

OLIVEIRA, F. M. Estudo da atividade de turismo no Brasil na década de 90. In: DIEESE (Org.). Mercado de trabalho e modernização do setor terciário brasileiro: estudos DIEESE/CESIT. São Paulo, 2005. CD-ROM.

OURIQUES, H. R. Turismo em Florianópolis: uma crítica à “indústria pós-moderna”. Florianópolis: Editora da UFSC, 1998.

REJOWSKI, M.; SOLHA, K. T. Turismo em um cenário de mudanças. In: RE-JOWSKI, M. (Org.). Turismo no percurso do tempo. São Paulo: Aleph, 2002.

RUAS, J. A. G.; LAPLANE, M. Infra-estrutura. In: BRASIL. Ministério do Turis-

Page 219: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

219

mo. O turismo no Brasil: panorama geral, avaliação da competitividade e pro-postas de políticas públicas: relatório de pesquisa. Brasília, DF, 2006.

SAAB, W. G. L. Considerações sobre o desenvolvimento do setor de turismo no Brasil. Rio de Janeiro: BNDES, 1999. (BNDES Setorial, n. 10).

SANTOS, M. M. Transporte rodoviário de cargas no Brasil: transportadores e sindicalismo a partir dos anos 1990. 2007. 178 f. Dissertação (Mestrado) - Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2007.

SARTI, F.; HIRATUKA, C.; SABBATINI, R. Competitividade da oferta e de-manda turísticas no Brasil. In: BRASIL. Ministério do Turismo. O turismo no Brasil: panorama geral, avaliação da competitividade e propostas de políticas pú-blicas: relatório de pesquisa. Brasília, DF, 2006.

SOLHA, K. T. Evolução do turismo no Brasil. In: REJOWSKI, M. (Org.). Turis-mo no percurso do tempo. São Paulo: Aleph, 2002.

WORLD TRAVEL & TOURISM COUNCIL. Tourism satellite accounting tool. Disponível em: <www.wttc.travel>. Acesso em: 3 dez. 2008.

Page 220: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do
Page 221: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

8CAPÍTULO

EVOLUÇÃO DAS DISPARIDADES REGIONAIS NO BRASIL 1950-2008:

ANÁLISE COM BASE NO GTDN

Fernando J. Pires de Sousa1

8.1 – Introdução

A economia nordestina experimentou mudanças significativas a partir da metade do século passado, graças à forte presença do Estado, que passou a adotar as técnicas de planejamento como instrumento de promoção do desenvolvimento regional. Na realidade isso se verifica em decorrência da disseminação desse ins-trumental no contexto brasileiro de expansão econômica norteada pelos grandes planos governamentais. O Plano de Metas, do governo Juscelino Kubitschek, na segunda metade dos anos 50 do século passado, foi o primeiro e mais significativo pela amplitude e profundidade das transformações almejadas. Em nível regional, o Grupo de Trabalho de Desenvolvimento do Nordeste (GTDN) define uma po-lítica de desenvolvimento econômico para o Nordeste (GTDN, 1997) não menos ambiciosa, pois se constituiu no documento seminal que analisou amplamente a questão nordestina com vistas a inserir a região na lógica de acumulação do capital em nível nacional.

A rigor, poder-se-ia mesmo ponderar que, na realidade, o Plano de Metas era também um plano regional, considerando que as metas, as estratégias, as po-líticas e as medidas adotadas – embora explicitamente expostas como de caráter nacional – visavam ao avanço do capital industrial no Brasil privilegiando a região Sudeste. De fato, esta foi profundamente favorecida com a convergência de ações, subsídios e concentração de investimentos públicos na indústria de base e na in-fraestrutura econômica como suporte para a atração de recursos do setor privado,

1 Doutor em Economia pela Université Paris XIII, França. Professor do Departamento de Teoria Econômica (FEAAC) e do curso de pós-graduação em Avaliação de Políticas Públicas da Universi-dade Federal do Ceará.

Page 222: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

222

com forte estímulo ao capital externo pela via do investimento direto. Essa fase foi marcante para a questão regional no Brasil, uma vez que, por um lado, intensificou os desníveis regionais que já apresentavam ritmos de crescimento diferenciados a favor do Sudeste e, por outro, politicamente se constituiu em forte justificativa para uma to-mada de decisão no sentido compensatório, o que foi objetivado pelo GTDN. Depois do Plano de Metas outros planos e outras fases da economia brasileira exerceram tam-bém efeitos significativos na economia regional e nas suas evoluções e desigualdades.

Vale registrar que o GTDN, há muito amplamente analisado e discutido, se constitui sempre numa referência basilar para a compreensão da problemática regio-nal e nordestina e para o seu processo de desenvolvimento econômico e social desde os anos sessenta do último século. A partir dele foi instituída a Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), que cumpriu um papel importante com res-peito às transformações estruturais na região, em particular no seu processo de indus-trialização e de integração no mercado nacional, imprimindo um ritmo significativo de crescimento econômico, o que contribuiu para, pelo menos, se contrapor à tendência de aprofundamento das desigualdades regionais com referência ao Sudeste do País.

Desta forma, realizamos aqui um esforço no sentido de, à luz do próprio diag-nóstico constante no GTDN, sendo fiel às variáveis, aos indicadores, aos métodos e às relações utilizadas, reproduzi-lo agora, depois de mais de meio século. O propó-sito maior consiste em analisar a economia nordestina a longo prazo, mais especifi-camente no que se refere aos desníveis inter-regionais, em particular com relação à região Sudeste, como também seu processo de industrialização e as transformações estruturais e espaciais verificadas, procurando evidenciar a influência exercida pelas diversas conjunturas que moldaram a evolução da economia brasileira.

8.2 – Diretrizes da Política de Desenvolvimento Econômico para o Nordeste

No GTDN Celso Furtado2 analisa a questão nordestina na perspectiva de mostrar as desigualdades regionais no Brasil em termos de disparidades de níveis 2 É sabido que o eminente Celso Furtado foi o autor do referido documento, que por conveniência

política terminou sendo publicado como de autoria do Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste (GTDN), sob sua coordenação. Ressalte-se que utilizamos aqui a edição republicada deste documento na Revista Econômica do Nordeste, em 1997. (GTDN, 1997).

Page 223: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

223

de renda, como também os ritmos diferenciados de crescimento comparando o Nordeste com o Centro-Sul conforme a composição regional adotada. Estes dois aspectos são fundamentais como justificativa para a política de desenvolvimen-to econômico proposta para o Nordeste, cuja essência reside na industrialização como estratégia capaz de investir contra os fatores historicamente condicionantes do atraso socioeconômico desta região. No mais, Furtado, imbuído das ideias cepalinas de deterioração dos termos de troca entre países desenvolvidos e sub-desenvolvidos, considera que este mesmo fenômeno também contribuía para a profunda assimetria então existente entre a região mais rica e a mais pobre do Brasil, e que tal situação tenderia a piorar com os fortes investimentos realizados pelo Plano de Metas no Centro-Sul e com as políticas econômicas de abrangência nacional adotadas. Apresenta, então, uma proposta ambiciosa, capaz de promo-ver transformações estruturais no sentido de reverter a situação, favorecendo o Nordeste, cuja base produtiva convergiria do setor primário impulsionado pelo mercado externo para o setor secundário voltado para o mercado interno.

Obviamente que este objetivo se deparava com obstáculos praticamente in-transponíveis de caráter político-econômico arraigados num status quo patrimonia-lista e oligárquico avesso a mudanças que comprometessem a estrutura de poder, de dominação e de posse. Por outro lado, a consolidação do Centro-Sul enquanto região hegemônica no processo de acumulação, centralização e concentração do ca-pital no Brasil impunha um nível de produtividade – assinalado por Oliveira (1977) de “equivalente geral” – à economia brasileira, difícil de ser alcançado pelas estrutu-ras produtivas primário-exportadoras do restante do País.

Para Furtado, a concorrência desigual só seria enfrentada se fosse promovida uma industrialização baseada em pressupostos capitalistas capazes de elevar os níveis de pro-dutividade do Nordeste. E isto só poderia ser viabilizado a partir de uma abrangente e profunda reorganização produtiva na região envolvendo os dois setores da economia. A agricultura seria reestruturada no sentido de transformar a propriedade agrícola com vistas a inseri-la na economia de mercado, priorizando a produção de mercadorias em detrimento da agricultura de subsistência. Ao mesmo tempo, o incentivo a frentes de co-lonização para as áreas úmidas do Nordeste, em especial no Maranhão, contribuiria tan-to para reduzir a pressão populacional e a demanda por alimentos no semiárido quanto se constituiria em suporte para o processo de industrialização pela via do rebaixamento do custo de reprodução da força de trabalho graças às perspectivas de aumento da oferta de alimentos e a consequente redução de seus preços.

É óbvio que tudo isso contrariava fortes interesses, pois de fato modificaria as estruturas agrárias e de produção no campo, reduzindo o poder latifundiário e

Page 224: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

224

da propriedade agrícola improdutiva. Pelo flanco da industrialização a prioridade era edificar uma indústria de base na região e fortalecer a indústria tradicional, tendo a criação de uma burguesia formada por residentes nordestinos como es-tratégia para evitar transferências de renda da região e, portanto, reter capitais e estimular a capacidade empreendedora. Acreditava-se que assim o Nordeste po-deria se impor enquanto região competitiva, com uma estrutura produtiva autô-noma e independente, frente ao poder concorrencial da região Centro-Sul do País.

Estas considerações são por demais pertinentes para o entendimento do subsequente desenvolvimento econômico do Nordeste brasileiro, em particular no que se refere ao seu processo de industrialização. Neste sentido analisaremos, a seguir, à luz dos indicadores do GTDN, a questão relativa à evolução das dis-paridades regionais envolvendo o Nordeste e o Centro-Sul, como também em comparação ao Sudeste, de acordo com a delimitação regional hoje em voga.

8.3 – Disparidades de Níveis de Desenvolvimento

Referindo-se às disparidades de níveis de desenvolvimento, o GTDN faz uma comparação entre população e renda do Nordeste e Centro-Sul, respectiva-mente, para o ano de 1956. Visando destacar a situação no referido ano, sendo fiel à classificação geográfica definida por Furtado, no GTDN, utilizamos os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) (organizados e divul-gados pelo IPEADATA) referentes às séries históricas que remontam à década de 1950. Comparamos, então, com a situação atual para apreender a evolução da questão das disparidades regionais, particularmente estruturais, entre as regiões Nordeste e Sudeste do País ao longo de todo este período. Desta forma, as tabelas a seguir reproduzem os dados dos Quadros 1 e 2 do GTDN (1997, p. 390-391) organizados com vistas a satisfazer os propósitos do presente trabalho.

Para uma melhor compreensão, valem alguns esclarecimentos metodológicos:

- as classificações utilizadas pelo GTDN para as regiões Nordeste e Centro-Sul foram diferentes das que distinguem atualmente as regiões brasileiras. Assim, o Nordeste não incluía o Estado do Maranhão, e o Centro-Sul era bem maior do que o Sudeste atual, pois abrangia não apenas esta região, mas também a região Sul e a antiga região Centro-Oeste, a qual abarcava todo o Mato Grosso e Goiás3;3 De fato, segundo o GTDN (1997, p. 390): o Nordeste brasileiro é “considerado como tal a região

Page 225: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

225

- na primeira parte das Tabelas 1, 2 e 3 reproduzimos e calculamos os dados conforme a classificação regional do GTDN, acima referida. Na segunda parte utilizamos os dados de acordo com a classificação oficial do IBGE, na qual o Nordeste compreende nove estados, da Bahia ao Maranhão; e o Sudeste, quatro estados, ou seja, Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo;

- na Tabela 1, os dados do IBGE de 1956, como sendo intercensitários, estimamos a partir da taxa geométrica de crescimento do período 1940 a 1950;

- na Tabela 2, ao longo do tempo existiram mudanças na metodologia de cálculo do Produto Interno Bruto (PIB). O conceito utilizado antes de 1985 se referia a custo de fatores, e a partir de 1985 a preços de mercado. Mas para os anos de 1939 e de 1947 a 1969 era utilizado o Produto Interno Líquido a custo de fatores, elaborado pela Fundação Getúlio Vargas. Para 2002 a 2006 utiliza-se o Sistema de Contas Regionais, referência 2002. Os dados foram deflacionados pelo Deflator Implícito do Produto Interno Bruto (PIB) nacional, cuja série histórica é disponibilizada pelo Ipeadata;

- a Tabela 3 foi elaborada a partir da relação entre os valores dos PIBs (Ta-bela 2) e das populações (Tabela 1), respectivamente.

Com referência ao diagnóstico sobre as disparidades regionais, uma das ar-gumentações centrais de Furtado consistia na evidência demográfica relativa ao grande contingente populacional do Nordeste vivendo em condições de pobreza, no contexto do semiárido, o que equivalia ao dobro da população do conjunto de vários países latino-americanos de renda per capita similar à nordestina. Compa-rando com o Centro-Sul do País observava que “a população do Nordeste, equi-valendo a 50 por cento do [seu] efetivo demográfico, auferia uma renda per capita da ordem de 32 por cento”. (GTDN, 1997, p. 390). Estes dados são reproduzidos nas Tabelas 1 e 3, colunas 2.

Analisando o longo período de 1956 a 2008, ou seja, de 52 anos, constata-se que a população do Centro-Sul cresceu mais do que a do Nordeste, ocorrendo

que se estende da Bahia ao Piauí. [...] A região Centro-Sul, referida no presente trabalho, compre-ende os Estados litorâneos, do Espírito Santo ao Rio Grande do Sul, e os Estados mediterrâneos (Minas Gerais, Mato Grosso e Goiás).” É importante esclarecer que Celso Furtado, no GTDN, adotou classificação própria, diferente da existente na época, que conforme o censo de 1950 excluía Sergipe e Bahia do Nordeste e incluía Maranhão e Fernando de Noronha. Na realidade, na divisão fisiográfica do Brasil não constava a região Centro-Sul (ou Sudeste), mas sim a região considerada como Leste, compreendendo os estados de Sergipe, Bahia, Minas Gerais, Espírito Santo, Rio de Janeiro, Distrito Federal e ainda Serra dos Aimorés. São Paulo compunha a região Sul, juntamente com os demais estados da configuração atual.

Page 226: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

226

o mesmo com a brasileira, como indicam as taxas geométricas médias anuais de crescimento populacional, o que se retrata na menor proporção da população nordestina em 2008. De fato, com uma taxa de crescimento populacional de 1,8% ao ano – contra 2,34% do Centro-Sul, e 2,25% do Brasil – em termos de partici-pação a população nordestina passou de 50,4% para 38,5% (redução de 12 pontos percentuais) da população do Centro-Sul, e de 31,1% para 24,8% da brasileira (menos 6,3 pontos percentuais), entre 1956 e 2008, respectivamente. (Tabela 1). Refinando a análise comparativa, verificamos que em referência à atual configura-ção das regiões Nordeste e Sudeste as proporções populacionais da primeira em relação à segunda são bem mais significativas, assim como suas reduções, passan-do de 80,3% para 67% (menos 13,3 pontos percentuais), e de 34,4% para 28,2% (menos 6,2 pontos percentuais), entre os anos em enfoque, respectivamente.

Na realidade, esse comportamento é coerente com a evolução demográ-fica verificada no Brasil, onde o processo migratório, fortemente vinculado ao dinamismo econômico brasileiro e regional, constitui fator basilar para a expli-cação dos crescimentos desproporcionais das populações das duas regiões. Foge ao escopo deste trabalho explorar este aspecto, todavia vale aludir que o saldo migratório nordestino com o resto do Brasil, e em especial com a região Sudeste, historicamente foi negativo, significando que continuamente se perdia população com forte fluxo nos períodos de auge do desenvolvimento da economia paulista e sudestina. Sabe-se, todavia, que a dinâmica demográfica apresenta especificidades diretamente vinculadas ao processo de acumulação do capital e à divisão social do trabalho, portanto, às formas específicas de reprodução do capital no espaço, o que não garante comportamento uniforme e inexorável de tendência irreversível das taxas de crescimento populacional. (FERREIRA, 2007).

Page 227: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

227

Tabe

la 1

- Po

pula

ção

do N

orde

ste,

Cen

tro-

Sul,

Sude

ste

e B

rasi

l, 19

56-2

008

(Mil

Pess

oas)

Cla

ssifi

caçã

o R

egio

nal d

o G

TD

N(d

ados

do

GT

DN

e d

o IB

GE

)C

lass

ifica

ção

Reg

iona

l do

IBG

E(d

ados

do

IBG

E)

Reg

iões

1956

2008

(IB

GE

) (B

)(B

)/(A

)T

C(%

)R

egiõ

es19

56

(C)

2008

(D)

(D)/

(C)

TC

(%)

(GT

DN

)(I

BG

E) (

A)

Nor

dest

e18

.714

18.6

6447

.093

2,52

1,80

Nor

dest

e20

.501

53.4

932,

611,

86

Cen

tro-S

ul37

.135

36.8

1012

2.43

63,

332,

34Su

dest

e25

.519

79.8

003,

132,

22

Bras

il60

.080

59.6

6118

9.95

33,

182,

25Br

asil

59.6

6118

9.95

33,

182,

25

Ne/

C-S

(%)

50,4

50,7

38,5

--

Ne/

Su (%

)80

,367

,0-

-

Ne/

Br (%

)31

,131

,324

,8-

-N

e/Br

(%)

34,4

28,2

--

Font

e: E

labo

raçã

o Pr

ópria

Bas

eada

nos

Dad

os d

o G

TDN

e IB

GE

.N

ota:

TC

é a

Tax

a M

édia

Geo

mét

rica

de C

resc

imen

to A

nual

no

perío

do.

Page 228: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

228

No que se refere aos diferenciais de renda entre as regiões em análise4, observa-se que em termos de proporções os dados do GTDN não são muito diferentes dos dados do IBGE, para 1956, segundo a classificação geográfica do GTDN. Por este documento, a renda total do Centro-Sul era superior em 6,2 vezes à do Nordeste. Em proporção, a renda desta região equivalia a apenas 16% da respectiva para o Centro-Sul, no referido ano. Já para os dados de PIB, do IBGE, as relações são de 6,7 vezes e de 14,8%. (Tabela 2). Por ambos as fontes comprova-se o quanto realmente era profunda a disparidade regional nessa remo-ta data, ou seja, em meados do século passado.

Verifiquemos agora se depois de passados 50 anos – ou seja, em 2006, último ano em que se tem dado de PIB por estado – essa discrepância ainda se mantém ou foi reduzida. Pela classificação regional do GTDN, e utilizando os dados do IBGE, observa-se que ela se manteve praticamente imutável (taxas de crescimen-to de 5,1% para o Nordeste, e de 5,2% para o Centro-Sul), apresentando, inclusi-ve, uma pequena piora na relação do PIB do Nordeste sobre o do Centro-Sul, de 14,8% para 14,6%. Da mesma forma, não se poderia considerar que ocorreram grandes progressos ao se comparar a pequena melhoria na participação do PIB do Nordeste em relação ao Sudeste, de 20,7% para 23,1% (apenas 2,4 pontos per-centuais) ao longo de meio século, resultante de uma pequena superioridade da taxa de crescimento do Nordeste (5,2% contra 5,0% anual). No mais, verifica-se até que o Nordeste perde espaço no País como um todo, de 13,4% para 13,1%.

4 Ressalve-se que o GTDN empreende essa análise evolutiva entre os anos de 1948 e 1956, no tópico 2, “Disparidades de Ritmo de Crescimento”. Obviamente que nos interessa aqui verificar, à luz das variáveis e das relações utilizadas no referido documento, se há compatibilidade dos resultados aí encontrados com os respectivos resultados depois de meio século. Assim, o GTDN assinala que haviam aumentado as disparidades de renda entre o Nordeste e o Centro-Sul, de 1948 a 1956 (Tabela 3), pois a renda do Nordeste na renda total do País passou de 15,5% para 13,4%, e a produção real do Nordeste cresceu 37% (taxa de 4% a.a., Quadro 4), enquanto a do Centro-Sul foi de 51,2% (taxa anual de 5,3%).

Page 229: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

229

Tabe

la 2

- PI

B d

o N

orde

ste,

Cen

tro-

Sul,

Sude

ste

e B

rasi

l, 19

56-2

006

(em

Bilh

ões

de R

$ de

200

8)

Cla

ssifi

caçã

o R

egio

nal d

o G

TD

N(d

ados

do

GT

DN

e d

o IB

GE

)C

lass

ifica

ção

Reg

iona

l do

IBG

E(d

ados

do

IBG

E)

Reg

iões

1956

2006

(B)

(B)/

(A)

TC

(%)

Reg

iões

1956

(C

)20

06(D

)(D

)/(C

)T

C(%

)G

TD

N(1

)IB

GE

(A)

Nor

dest

e10

2,2

25,5

310,

312

,15,

1N

orde

ste

27,3

341,

712

,55,

2

Cen

tro-S

ul63

6,9

172,

02.

129,

112

,45,

2Su

dest

e13

1,9

1.47

7,8

11,2

5,0

Bras

il76

4,1

203,

52.

602,

612

,85,

2Br

asil

203,

52.

602,

612

,85,

2

C-S

/Ne

6,2

6,7

6,9

--

Su/N

e4,

84,

3-

-

Br/N

e7,

58,

08,

4-

-Br

/Ne

7,5

7,6

--

Ne/

C-S

(%)

16,0

14

,814

,6-

-N

e/Su

(%)

20,7

23,1

--

Ne/

Br (%

)13

,412

,611

,9-

-N

e/Br

(%)

13,4

13,1

--

C-S

/Br (

%)

83,4

84,5

81,8

--

Su/B

r (%

)64

,856

,8-

-

(1) D

ados

refe

rent

es à

Ren

da T

otal

em

bilh

ões d

e C

ruze

iros d

e 19

56.

Font

e: E

labo

raçã

o Pr

ópria

do

Aut

or B

asea

da n

os D

ados

do

GTD

N e

IBG

E.

Not

a: T

C é

a T

axa

Méd

ia G

eom

étric

a de

Cre

scim

ento

Anu

al n

o pe

ríodo

.

Page 230: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

230

Mas é com respeito à renda per capita que os resultados são reveladores da dinâmica entre a relação PIB e população ao longo de todo esse período. De fato, observa-se que aqui há uma nítida melhoria da posição relativa do Nordes-te em comparação ao Sudeste e ao Brasil. (Tabela 3)5. Pela classificação regional do GTDN, passa-se de uma participação do PIB per capita do Nordeste em relação ao do Centro-Sul, de 29,3%, em 1956, para 39%, em 2006, respectiva-mente, segundo os dados do IBGE; aumento de dez pontos percentuais, quase o mesmo em relação ao Brasil, que evoluiu de 40,1% para 49%. E este ganho é também o mesmo (dez pontos) ao se tomar a configuração atual do Nordeste e comparar com a do Sudeste, evoluindo de 25,7% para 35,7%, e foi um pouco menor com respeito ao Brasil (de 39% para 47,5%; 8,5 pontos percentuais), entre os referidos anos.

É sugestivo observar também de outra forma, ou seja, a de que a renda de um sudestino, em 1956, era em média superior a cerca de quatro vezes a de um nordestino (R$ 5.170,00 contra R$ 1.330,00, a preços do ano de 2008), reduzindo-se para próximo de três vezes, em 2006 (R$ 18.528,00 contra R$ 6.608,00). Já tomando o Brasil com relação ao Nordeste, a diferença se reduz de apenas 2,6 para 2,1 vezes.

5 Já o GTDN (1997, p. 392-393) sublinha a existência de queda da renda per capita do nordestino em proporção da renda per capita do habitante do Centro-Sul: que passa de 37,3% para 32%; e que a renda per capita desta região aumentou a uma taxa de cerca de 3,5%, ao passo que a do Nordeste ficou em menos de 1,5%, portanto, um pouco mais da metade da observada naquela região.

Page 231: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

231

Tabe

la 3

- PI

B P

er C

apita

do

Nor

dest

e, C

entr

o-Su

l, Su

dest

e e

Bra

sil,

1956

-200

6 (e

m R

$ de

200

8)

Cla

ssifi

caçã

o R

egio

nal d

o G

TD

N(d

ados

do

GT

DN

e d

o IB

GE

)C

lass

ifica

ção

Reg

iona

l do

IBG

E(d

ados

do

IBG

E)

Reg

iões

1956

2006

(B)

(B)/

(A)

TC

(%)

Reg

iões

1956

(C)

2006

(D)

(D)/

(C)

TC

(%)

GT

DN

(1)

IBG

E (A

)

Nor

dest

e 5

.461

1.

369

6.81

85,

03,

3N

orde

ste

1.33

06.

608

5,0

3,3

Cen

tro-S

ul17

.151

4.

674

17.4

843,

72,

7Su

dest

e5.

170

18.5

283,

62,

6

Bras

il12

.718

3.

411

13.9

014,

12,

8Br

asil

3.41

113

.901

4,1

2,8

C-S

/Ne

3,1

3,4

2,6

--

Su/N

e3,

92,

8-

-

Br/N

e2,

32,

52,

0-

-Br

/Ne

2,6

2,1

--

Ne/

C-S

(%)

3

1,8

29,

3 3

9,0

--

Ne/

Su (%

)25

,7 3

5,7

--

Ne/

Br (%

)

42,

9 4

0,1

49,

0-

-N

e/Br

(%)

39,0

47,

5-

-

(1) D

ados

refe

rent

es à

Ren

da P

er C

apita

em

Cru

zeiro

s de

1956

.

Fo

nte:

Ela

bora

ção

Próp

ria B

asea

da n

os D

ados

do

GTD

N e

IBG

E.

Page 232: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

232

As comparações acima precisam ser bem qualificadas para que se possa apreender com clareza a questão em pauta do problema das disparidades inter-re-gionais no Brasil. Como vimos, embora tenham ocorrido crescimentos significa-tivos nos PIBs reais ao longo dos 50 anos em estudo, tanto para o Nordeste (com aumento de 12,5 vezes, Tabela 2) quanto para o Sudeste (11,2 vezes) e o Brasil como um todo (12,8 vezes), praticamente não se verificou progressos com respei-to à redução das injustas diferenças de renda entre a região mais desenvolvida e a mais atrasada do País. Todavia, o mesmo não se passou com os diferenciais de renda per capita, uma vez que em média um residente nordestino aufere hoje uma renda anual não tão discrepante da do habitante do Sudeste, comparativamente a esta situação na metade do século passado.

Ora, como os diferenciais de renda entre estas regiões praticamente não mudaram, mas, por outro lado, houve redução nos diferenciais de renda per capita, constata-se que a dinâmica populacional exerceu papel fundamental a este respei-to. Na realidade, a perda de população nordestina e o respectivo ganho do Sudeste – com a forte migração verificada, principalmente na fase de elevado crescimento econômico desta região brasileira – explica bem a melhoria da renda per capita do Nordeste em proporção à do Sudeste. Verifique-se que a população nordestina aumentou em 2,6 vezes, enquanto a do Sudeste, em 3,1 vezes (comportamento semelhante ao do Brasil, Tabela 1)6.

Desta forma, relacionando os crescimentos absolutos dos PIBs aos dos res-pectivos contingentes populacionais (Tabelas 1 e 2), verifica-se que o PIB do Nor-deste cresceu 4,8 vezes mais do que a população; já para o Sudeste tal relação foi de 3,6 vezes. Nesta região, o PIB cresceu um pouco menos do que o nordestino e a população cresceu mais, o que contribui duplamente para uma performance menor na evolução da renda per capita em comparação à respectiva para o Nordes-te, ou seja, menor variação do numerador e maior variação do denominador no cômputo deste indicador. Em síntese, a discrepância de renda per capita entre as duas regiões diminuiu no período em estudo, e o fator que mais contribuiu para isso concerne à dinâmica demográfica, em especial à mobilidade populacional verificada do Nordeste no sentido do Sudeste do País.

6 Não cabe aqui analisar a evolução das taxas de fecundidade e mortalidade destas regiões ao longo deste período, apenas ressaltar que os diferenciais de crescimento vegetativo entre estas regiões se mantiveram praticamente constantes.

Page 233: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

233

8.4 – Comparação Econômica Entre as Regiões

Na comparação entre as economias do Nordeste e do Centro-Sul, o GTDN (1997, p. 391) indica que uma das desvantagens da primeira diz respeito, por um lado, a “uma proporção menor da população ativa no total da população: 31,1 contra 33,9 por cento”, e, por outro, “uma proporção maior da população ativa ocupada na agricultura: 71,7 contra 51,1 por cento”.

De fato, as primeiras proporções praticamente conferem ao se tomar os dados do IBGE conforme a classificação geográfica do GTDN: 31,1% contra 34,2%, corroborando a assertiva do referido documento de que o Centro-Sul apresentava, em 1950, a vantagem de ter uma população ativa superior à do Nor-deste em proporção das respectivas populações totais. Todavia, ao se comparar o Nordeste com o Sudeste, segundo as dimensões geográficas atuais, constata-se que ao contrário do especificado no GTDN, naquele ano o Nordeste era superior ao Sudeste em termos de proporção da população ativa na população total, com 31,1% contra 24,1%7. Pode-se presumir que isto seja justificável pelo fato de que pelo GTDN a área de abrangência do Centro-Sul era bem maior – compreen-dendo as regiões do Sudeste, Sul e Centro-Oeste – e o Nordeste era menor, sem o Estado do Maranhão, do que as dimensões do Sudeste e do Nordeste como definidas hoje. Deste modo, era no Centro-Sul que se concentrava a produção na-cional, com 83,4% do PIB brasileiro em 1956, enquanto o Sudeste correspondia a 64,8%, na configuração atual (um diferencial de 18,6 pontos percentuais, Tabela 2). Do mais, naquela época a população ativa nordestina ainda não tinha migrado em grandes proporções para o Sudeste em busca de melhores oportunidades de trabalho, o que, em hipótese, pode explicar a referida superioridade do Nordeste no que diz respeito à participação da população ativa na população total.

Com respeito à segunda assertiva do GTDN, ou seja, a de que, em 1950, o Nordeste se encontrava em desvantagem relativamente ao Centro-Sul pelo fato de ostentar uma maior proporção populacional da população ativa ocupada na agricultura (71,8% contra 51,5%, Tabela 4), constata-se que esta relação realmen-te procede e se torna ainda mais significativa ao se comparar o Nordeste com o 7 Segundo o censo demográfico de 1950, neste ano o Nordeste contava com 16.390 mil pessoas (con-

forme a configuração geográfica do GTDN), e 17.973 mil (conforme a atual do IBGE); o Centro-Sul, 31.919 mil, e o Sudeste, 22.560 mil. As referidas proporções podem ser encontradas dividindo as populações ativas da Tabela 4 pelas respectivas populações acima especificadas.

Page 234: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

234

Sudeste (72,1% contra 39,8%), segundo a configuração atual. Note-se, ainda, que ao se observar estas comparações concernentes ao setor industrial, constata-se a superioridade do Sudeste, uma vez que 24,1% de sua população, naquele ano, cor-respondiam aos que se encontravam ocupados em atividades industriais, contra somente 9,9%, no caso do Nordeste.

As relações acima se reportam a 1950. É interessante agora verificar a si-tuação atual no sentido de apreender possíveis mudanças ao longo de todo este período. Para tanto, a partir das proporções calculadas entre populações ativas e totais, respectivamente (Tabelas 4 e 1), verifica-se que segundo a configuração do GTDN, o Nordeste continua apresentando, em 2008, uma proporção menor da população ativa na população total (46,0%) do que a respectiva para o Centro-Sul (50,3%). Já com respeito à comparação entre o Nordeste e o Sudeste, segundo a configuração geográfica atual, há uma inversão relativamente àquele ano (1950) segundo a análise feita anteriormente, isto é, em 2008 esta última região apresenta uma proporção maior deste indicador do que a da primeira (49,3% contra 45,7%). Este resultado parece corroborar, então, nossa hipótese do fluxo migratório Nor-deste-Sudeste, que significou um extraordinário translado de população ativa, principalmente para São Paulo, durante sua fase de rápido desenvolvimento eco-nômico, ocorrido no terceiro quartil do século passado. (POCHMANN, 2007).

Page 235: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

235

Tabe

la 4

- Pe

ssoa

s Pr

esen

tes,

de

10 A

nos

e M

ais,

seg

undo

os

Ram

os d

e A

tivid

ade

Prin

cipa

l e G

rand

es

Reg

iões

- 19

50-2

008

(em

1.0

00 P

esso

as)

Ram

os d

e at

ivid

ade

prin

cipa

l

Nor

dest

eC

entr

o-Su

l Pe

ssoa

s A

tivas

(C

lass

if. G

eog.

GT

DN

)

Sude

ste

Pess

oas

Ativ

as

(Cla

ssif.

Geo

g. I

BG

E)

Pess

oas

Ativ

as

(Cla

ssif.

Geo

g.

GT

DN

)

Pess

oas

Ativ

as

(Cla

ssif.

Geo

g.

IBG

E)

1950

(A)

2008

(B)

1950

(A)

2008

(B)

1950

(A)

2008

(B)

1950

(A)

2008

(B)

Agr

icul

tura

3.66

4 6.

579

4.02

8 7.

567

5.61

7 7.

449

2.16

1 3.

500

Indú

stria

493

2.22

0 55

2 2.

398

1.96

3 10

.719

1.

309

7.15

4

Com

érci

o24

4 3.

484

260

3.98

1 77

8 10

.925

46

9 6.

989

Out

ros

Serv

iços

699

9.36

5 74

6 10

.516

2.

548

32.5

07

1.49

6 21

.712

Tota

l5.

100

21.6

485.

586

24.4

6210

.906

61.6

005.

435

39.3

55

%%

(B)/

(A)

%%

(B)/

(A)

%%

(B)/

(A)

%%

(B)/

(A)

Agr

icul

tura

71

,830

,41,

872

,130

,91,

951

,512

,11,

339

,88,

91,

6

Indú

stria

9

,710

,34,

59,

99,

84,

318

,017

,45,

524

,118

,25,

5

Com

érci

o

4,8

16,1

14,3

4,7

16,3

15,3

7,1

17,7

14,0

8,6

17,8

14,9

Out

ros

Serv

iços

13

,743

,313

,413

,443

,014

,123

,452

,812

,827

,555

,214

,5

Tota

l10

0,00

100,

004,

210

0,00

100,

004,

410

0,00

100,

005,

610

0,00

100,

007,

2Fo

ntes

: Ela

bora

ção

Próp

ria B

asea

da n

os D

ados

de

1950

; Anu

ário

Est

atíst

ico

do B

rasil

de

1956

Pub

licad

o pe

lo IB

GE

e D

ados

de

2008

Pu

blic

ados

na

Pesq

uisa

Nac

iona

l por

Am

ostra

de

Dom

icíli

os (P

NA

D) d

o IB

GE

.

Page 236: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

236

Mais marcante ainda é verificar as transformações estruturais nos últimos 58 anos a partir da distribuição regional e setorial da população ativa. No geral ressalte-se que houve aumento relativo da população ativa no Brasil ao se com-parar 1950 com 2008, de 37,5% para 48,6% (11,1 pontos percentuais) sobre as respectivas populações totais8. Da mesma forma, tanto no Nordeste quanto no Sudeste suas populações ativas cresceram mais do que as respectivas populações totais, sendo mais significativo nesta última região. De fato, passa-se de 31,1% para 45,7% (14,6 pontos percentuais) no caso nordestino; e de 24,1% para 49,3% (25,2 pontos percentuais) no caso sudestino. Isto reafirma não só o efeito migra-tório acima referido como também retrata a contribuição das dinâmicas demográ-ficas e econômicas no que diz respeito ao aumento mais do que proporcional das populações ocupadas em comparação aos totais populacionais.

Estruturalmente, as transformações foram também expressivas. O desen-volvimento econômico brasileiro a partir da metade do século passado significou – como classicamente caracteriza a evolução capitalista – uma sociedade predo-minantemente agrícola, em termos de produção e pessoal ocupado, para uma sociedade industrial e principalmente de serviços. Entretanto, esse processo não se verificou de forma homogênea no território nacional, considerando o anacro-nismo até agora existente entre as regiões brasileiras, com um Nordeste ainda distinguido pela forte presença de pessoal ocupado na agricultura, embora tenha havido uma redução significativa de 72,1%, em 1950, para 30,9%, em 2008, das populações ativas, respectivamente. Ressalte-se que esta última proporção é pró-xima à do Sudeste de 58 anos atrás, quando registrava 39,8%, a qual passa para apenas 8,9% hoje. (Tabela 4).

É evidente o processo de industrialização brasileiro e sua influência na urba-nização e no avanço das atividades terciárias. Enquanto a participação do pessoal ocupado na indústria nordestina se manteve praticamente o mesmo durante todo esse período (cerca de 10%, mas com incremento absoluto de 4,3 vezes), comér-cio e serviços correspondem a 59,3% do pessoal ativo total, enquanto em 1950 representava 18,1% (em 2008 o número de pessoas ocupadas nestes dois setores foi cerca de 15 vezes superior ao daquele ano). Já para o Sudeste, como era de se esperar, as transformações foram ainda mais profundas, considerando que em 2008 apenas 8,9% da população ativa se encontrava na agricultura, e 18,2% na in-dústria, contra 73% no comércio e serviços; enquanto em 1950 estes percentuais correspondiam a 39,8%, 24,1% e 36,1%, respectivamente. Um fato interessante 8 Pelo censo de 1950, neste ano o Brasil tinha uma população de 51.941 mil pessoas e uma população

ativa de 19.487 mil; em 2008, segundo o documento Síntese dos Indicadores Sociais 2009-IBGE, passa para 189.953 mil e 92.395 mil, respectivamente.

Page 237: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

237

a registrar diz respeito à semelhança entre Nordeste e Sudeste no que se refere à expansão setorial da população ativa nesse período: 1,9 e 1,6 vezes na agricultura; 4,3 e 5,5 vezes na indústria; 15,3 e 14,9 no comércio; e 14,1 e 14,5 vezes nos ser-viços, respectivamente.

8.5 – Comparação de Ritmos de Crescimento Regionais

O GTDN constata, ainda, que o Centro-Sul apresenta ritmos superiores de crescimento setorial em relação ao Nordeste, de 1948 a 1956. Como não tem muito sentido a análise da comparação restrita a este período de apenas oito anos, examina-se, então, desde 1950, verificando se este comportamento se manteve, comparando, todavia, somente o Sudeste com o Nordeste conforme a classifica-ção geográfica atual do IBGE, visando a simplificar e facilitar a compreensão9. Ressalte-se que já analisamos anteriormente este aspecto no que diz respeito à evolução entre os PIBs globais – como também entre os PIBs per capitas – destas regiões. Considerando, entretanto, que por setor econômico só existem dados referentes ao valor adicionado, utilizaremos esta variável como proxi da composi-ção do PIB para o referido período.

No geral, observe-se que praticamente os ritmos de crescimento foram idên-ticos, pois o Nordeste apresentou apenas uma pequena superioridade em relação ao Sudeste, aumentando em cerca de 14 vezes sua produção total entre 1950 e 2006, como resultado de uma taxa de crescimento anual de 4,8% contra 13 vezes e 4,7% no caso do Sudeste, respectivamente. (Tabela 5). Em termos setoriais as transformações estruturais corroboram os resultados encontrados na análise feita sobre pessoal ocupado, com os grandes avanços ocorridos nos segmentos secundários e terciários – como se pode depreender a partir das mudanças na contribuição de cada setor na formação dos valores adicionados totais entre os referidos anos, em ambas as regiões –, com o Nordeste apresentando ritmos mais acentuados do que o Sudeste (vide taxas de crescimento).

Quanto à assertiva do GTDN de que o descompasso de ritmos de cresci-mento era bem maior no setor industrial nordestino pelo fato de que a diferen-ça entre as taxas de crescimento da agropecuária e da indústria era menor no

9 De qualquer forma, mostramos na Tabela 5 também as informações referentes às regiões Nordeste e Centro-Sul conforme a classificação geográfica do GTDN.

Page 238: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

238

Centro-Sul10, verifica-se que isto procede ao se analisar o período de 1950 a 2006. Com efeito, enquanto a indústria nordestina cresceu a uma taxa anual de 6,2%, correspondendo a 3,6 vezes à da agropecuária, que registrou 1,7%, no Sudeste, o setor industrial apresentou um ritmo bem mais acelerado em comparação ao agropecuário (5,2% contra 0,9%, superior, portanto, em 5,8 vezes, Tabela 5). As-sim, segundo constatou Furtado para o período 1948 a 1956, a desvantagem se encontra ainda no setor secundário, embora o ritmo de crescimento da agricultura no Nordeste tenha sido superior em 1,9 vezes o respectivo do Sudeste, e a indús-tria 1,2 vezes, durante os últimos 56 anos.

10 Em termos setoriais, o GTDN assinala que o descompasso de ritmos de crescimento é bem maior no setor industrial, pois no Nordeste a agropecuária cresceu a uma taxa anual de 2,8%, pouco mais da metade da taxa da indústria (5,2%); enquanto no Centro-Sul a taxa da agropecuária foi de 3,6%, menos da metade da taxa da indústria. 7,7%. (GTDN, 1997, p. 394) e Tabela 5. (GTDN, 1997, p. 395).

Page 239: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

239

Ta

bela

5 -

PIB

- Va

lor A

dici

onad

o do

Nor

dest

e, C

entr

o-Su

l e S

udes

te, 1

950-

2006

(em

Milh

ões

de R

$ de

20

08)

Ram

os d

e at

ivid

ade

prin

cipa

l

Nor

dest

eC

entr

o-Su

l C

lass

if. G

eog.

GT

DN

Sude

ste

Cla

ssif.

Geo

g. I

BG

EC

lass

if. G

eog.

GT

DN

Cla

ssif.

Geo

g. I

BG

E

1950

(A)

2006

(B)

(B)/

(A)

1950

(C)

2006

(D)

(D)/

(C)

1950

(E)

2006

(E)

(F)/

(E)

1950

(G)

2006

(H)

(H)/

(G)

Agr

icul

tura

8.46

318

.922

2,24

8.99

023

.620

2,63

34.6

4887

.173

2,52

23.2

8138

.572

1,66

Indú

stria

2.52

069

.803

27,7

02.

618

75.3

3128

,77

26.6

7053

1.02

119

,91

22.4

6038

9.28

717

,33

Com

érci

o4.

108

34.5

948,

424.

344

38.6

938,

9120

.602

227.

820

11,0

616

.632

149.

195

8,97

Out

ros

Serv

iços

4.90

514

6.53

529

,87

5.17

716

0.44

230

,99

38.7

3497

4.41

925

,16

33.5

5767

3.44

420

,07

Tota

l19

.996

269.

854

13,5

021

.129

298.

086

14,1

112

0.65

41.

820.

433

15,0

995

.930

1.25

0.49

813

,04

(%)

(%)

TC

(%)

(%)

(%)

TC

(%)

(%)

(%)

TC

(%)

(%)

(%)

TC

(%)

Agr

icul

tura

42,3

7,0

1,5

42,5

7,9

1,7

28,7

4,8

1,7

24,3

3,1

0,9

Indú

stria

12,6

25,9

6,1

12,4

25,3

6,2

22,1

29,2

5,5

23,4

31,1

5,2

Com

érci

o20

,512

,83,

920

,613

,04,

017

,112

,54,

417

,311

,94,

0

Out

ros

Serv

iços

24,5

54,3

6,3

24,5

53,8

6,3

32,1

53,5

5,9

35,0

53,9

5,5

Tota

l10

0,0

100,

04,

810

0,0

100,

04,

810

0,0

100,

05,

010

0,0

100,

04,

7

Font

es: P

ara

2006

, Sist

ema

de C

onta

s Reg

iona

is, R

efer

ênci

a 20

02. P

ara

o A

no d

e 19

50, P

rodu

to In

tern

o Lí

quid

o a

Cus

to d

e Fa

tore

s E

labo

rado

pel

a Fu

ndaç

ão G

etúl

io V

arga

s (FG

V).

Not

a: T

C é

a T

axa

Méd

ia G

eom

étric

a de

Cre

scim

ento

Anu

al n

o Pe

ríodo

.

Page 240: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

240

Aqui valem alguns comentários em relação ao período estudado pelo GTDN, que advertia sobre os efeitos do Plano de Metas no sentido de aprofun-dar as disparidades regionais no Brasil. Certamente, os elevados e concentrados investimentos beneficiavam esta última região, contribuindo para o seu maior di-namismo no contexto nacional. Ressalte-se, no entanto, que posteriormente, com o advento da Sudene como proposta arrojada do GTDN para o desenvolvimento do Nordeste, como também com o surgimento de bancos regionais, com desta-que para o Banco do Nordeste do Brasil (BNB), e das universidades públicas, se estrutura um arranjo institucional que, se não teve condições de reduzir os des-níveis regionais, pelo menos contribuiu para imprimir um ritmo de crescimento compatível com o do Sudeste, não permitindo, assim, que aumentasse o fosso econômico com respeito ao Nordeste.

Por outro lado, isto também permite salientar que ao longo destes 50 anos – da fase áurea de atuação da Sudene com a utilização dos instrumentos de incen-tivos fiscais, 34\18 e Fundo de Investimentos do Nordeste (FINOR), e, poste-riormente, com o abandono do planejamento regional, a extinção desta Superin-tendência e o advento da guerra fiscal, já sob a égide neoliberal, conduzida pelo “livre” jogo do mercado em concubinato com os governos estaduais e munici-pais na atração de empresas – o Nordeste não conseguiu avançar suficientemen-te para reduzir a vergonhosa assimetria em termos econômicos com relação ao Sudeste do País. Isto retrata que tendo o Estado como protagonista dos grandes planos nacionais de desenvolvimento e dos programas e políticas setoriais im-plementados11, promoveu-se uma transformação estrutural significativa a partir da industrialização do País e do programa de substituição de importações com fortalecimento do mercado interno e integração das economias regionais, mas de caráter dependente e complementar em relação à região mais dinâmica, maior beneficiada pelo processo de concentração de atividades produtivas no esteio de expansão do capital oligopolista e monopolista.

Pode-se aventar, então, que a atuação do Estado por meio de tais planos, programas e políticas globais de promoção do desenvolvimento econômico bra-sileiro apresentava um forte viés concentracionista e centralizador, espacialmente. Desta forma, sob o prisma das disparidades regionais, se as instituições e políticas de promoção do desenvolvimento nordestino exerceram um papel importante neste sentido, contudo não foram capazes de transcender à dimensão compen-satória e, conforme a profunda interpretação do nosso maior poeta popular, Pa-

11 Registre-se que se vivia o contexto internacional conduzido pelos preceitos keynesianos que mol-daram teórica e ideologicamente o Estado desenvolvimentista e o Estado de bem-estar social nos países centrais inerentes à era dourada do capitalismo do pós-guerra e até o advento do neolibera-lismo, em meados da década de 70 do século XX. Para maior aprofundamento ver Sousa (2003).

Page 241: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

241

tativa do Assaré, “aproximar o Brasil de baixo do Brasil de cima”. Ou mesmo sobre a rica análise de Ferreira (2006) acerca do Nordeste enquanto contraponto inacabado da acumulação.

Por último, o GTDN se reporta à renda média por pessoa ocupada em 1950, considerando que era cerca de 2,5 vezes maior no Centro-Sul, enquanto no setor agrícola essa diferença aumentava para 2,8 vezes, indicando que era neste setor que se verificava a maior desvantagem relativa do Nordeste. (GTDN, 1977). Ao analisar esta situação em 2006, constata-se que isto ainda se verifica e até aumenta o diferencial da renda por pessoa ocupada na agricultura a favor do Sudeste (3,5 vezes à respectiva para o Nordeste), enquanto no total a renda por pessoa ocupa-da nesse ano era superior em 2,6 vezes. Verifica-se, ainda, que o pessoal ocupado na indústria do Sudeste recebia em média 1,7 vezes mais do que o respectivo para o Nordeste, e para o conjunto do comércio e serviços esta superioridade era de duas vezes. (Tabela 6). Portanto, é realmente na agricultura onde o diferencial de renda dos trabalhadores entre as duas regiões é mais acentuado. Todavia, vale registrar que para os três setores houve aproximação entre estas rendas das duas regiões, ao se comparar 2006 com 1950.

Por fim, duas outras informações são bastante relevantes por se reportarem às discrepâncias intersetoriais de renda das pessoas ocupadas, como também à evolução entre os dois períodos acima. No Nordeste, um trabalhador da indústria recebeu em média uma renda de R$ 34 mil em 2006 (a preços de 2008, Tabela 6) contra somente R$ 3 mil de um trabalhador da agricultura, ou seja, mais de 11 vezes (em 1950 esta diferença era de apenas duas vezes). Já no Sudeste estes valores correspondem a R$ 58 mil contra R$ 10 mil, 5,8 vezes mais, cuja diferença, em 1950, era de 1,5 vezes.

Para ambas as regiões o setor industrial é o que melhor remunera o trabalho, seguido dos serviços, do comércio e, por último, da agricultura. Além do mais, as maiores taxas de crescimento anual da renda por pessoa ocupada foram as da indústria, com destaque para o Nordeste (3,6%), sendo negativas para o comércio (-0,9%), nesta região, e para a agricultura (-0,1%) e o comércio (-0,9%), no Sudes-te. Isto significa que em 2006 as rendas dos trabalhadores nestes setores chegaram a ser inferiores, em termos reais, ao que eles recebiam em 1950, ou seja, o poder aquisitivo deles chegou ao ponto de diminuir ao longo destes 58 anos, o que é no mínimo uma verdadeira aberração. Estas informações revelam ainda uma questão central da nossa assimetria social: a da diferença da renda do trabalho entre áreas urbanas, onde se concentram as atividades industriais, comerciais e de serviços; e as áreas rurais, onde predominam os maiores bolsões de pobreza do País em consequência da baixíssima renda do trabalhador da agricultura.

Page 242: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

242

Tabe

la 6

- R

enda

por

Pes

soa

Ocu

pada

do

Nor

dest

e, C

entr

o-Su

l e S

udes

te, 1

950-

2006

(em

Mil

R$

de 2

008)

Ram

os d

e at

ivid

ade

prin

cipa

l

Nor

dest

eC

entr

o-Su

l C

lass

if. G

eog.

GT

DN

Sude

ste

Cla

ssif.

Geo

g. I

BG

EC

lass

if. G

eog.

GT

DN

Cla

ssif.

Geo

g. I

BG

E

1950

(A

)20

06

(B)

(B)/

(A)

TC

(%)

1950

(C

)20

06

(D)

(D)/

(C)

TC

(%)

1950

(E

)20

06

(F)

(F)/

(E)

TC

(%)

1950

(G

)20

06

(H)

(H)/

(G)

TC

(%)

Agr

icul

tura

2,3

2,8

1,2

0,3

2,2

3,0

1,3

0,5

6,2

11,1

1,8

1,1

10,8

10,4

0,97

-0,1

Indú

stria

5,1

34,6

6,8

3,5

4,7

34,1

7,2

3,6

13,6

52,9

3,9

2,5

17,2

58,1

3,4

2,2

Com

érci

o16

,810

,40,

6-0

,916

,710

,30,

6-0

,926

,521

,10,

8-0

,435

,521

,20,

6-0

,9

Out

ros

Serv

iços

7,0

17,3

2,5

1,6

6,9

16,9

2,4

1,6

15,2

32,0

2,1

1,3

22,4

32,4

1,5

0,7

Com

. + S

erv.

9,6

15,4

1,6

0,9

9,5

15,1

1,6

0,8

17,8

29,2

1,6

0,9

25,5

29,6

1,2

0,3

Tota

l3,

913

,13,

32,

23,

812

,83,

42,

211

,130

,82,

81,

917

,732

,71,

91,

1

Font

e: E

labo

raçã

o Pr

ópria

a p

artir

da

Rela

ção

entre

os D

ados

das

Tab

elas

5 e

4N

ota:

TC

é a

Tax

a M

édia

Geo

mét

rica

de C

resc

imen

to A

nual

no

Perío

do.

Page 243: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

243

8.6 – Disparidades Regionais e as Conjunturas da Economia Brasileira

Até aqui analisamos a questão regional à luz do diagnóstico realizado pelo GTDN sobre as discrepâncias entre as regiões Nordeste e Centro-Sul, segun-do a configuração geográfica adotada neste documento, como também entre o Nordeste e o Sudeste, conforme a configuração atual, ao longo dos últimos 58 anos, respectivamente, mas confrontando os anos extremos deste período. Para qualificar melhor as transformações verificadas, nesta seção analisaremos com-parativamente a evolução da economia nordestina e sudestina, de acordo com as diversas conjunturas da economia brasileira, sempre na perspectiva de contemplar repercussões sobre a problemática das disparidades regionais. Neste sentido, os gráficos seguintes são elucidativos sobre resultados já indicados anteriormente.

Como referência geral do comportamento da economia brasileira, os Gráfi-cos 1 e 1A permitem identificar as fases de expansão, estagnação e recessão eco-nômicas. Grosso modo, pode-se visualizar pelo menos quatro subperíodos. Um longo, que se estende de 1940 a 1967, ou seja, de 27 anos, no qual o PIB atinge a cifra aproximada de meio trilhão de reais. Em seguida tem-se uma fase de rápido crescimento econômico, que em apenas 13 anos, até 1980, chega a uma produ-ção total equivalente a quase 1,5 trilhões de reais, portanto, triplicando o valor alcançado em 1967. Depois vêm mais 12 anos, mas de fraquíssimo desempenho econômico, até 1992, quando o PIB apresenta pouca expressividade em termos de evolução. E, por último, o período que se estende até 2008, compreendendo 16 anos, cuja curva do PIB volta a apresentar forte inclinação positiva, chegando próximo dos três trilhões de reais, 1,7 vezes superior ao valor de 1992.

Pode-se aventar até que nossa longa fase desenvolvimentista transcende mesmo o grande ciclo de expansão capitalista do pós-guerra até a metade dos anos 1970, pois compreende mais de 30 anos. Em efeito, o Gráfico 1 mostra ape-nas dados a partir de 1940, conforme disponibilidade de séries temporais retros-pectivas confiáveis, divulgadas pelas instituições estatísticas oficiais. Desta forma, considerando deste ano a 1980, tem-se 40 anos de crescimento praticamente con-tínuo da economia brasileira, até a malfadada década perdida. Neste período, os PIBs e PIBs per capitas evoluíram, respectivamente, a taxas médias anuais de 6,9% e 4,1%. Já nos 28 anos seguintes, até 2008, estas taxas caíram para 2,5% e 0,8%. (Tabela 7).

Page 244: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

244

Gráfico 1 - PIB e PIB Per Capita do Brasil, 1940-2008 (em R$ de 2008)Fonte: Elaboração Própria do Autor, a partir de Dados do IBGE.

Gráfico 1A - Variações anuais do PIB e PIB Per Capita do Brasil, 1940-2008

Fonte: Elaboração Própria, a partir de Dados do IBGE.

Pode-se aventar até que nossa longa fase desenvolvimentista transcende mesmo o grande ciclo de expansão capitalista do pós-guerra até a metade dos anos.

Analisando agora especificamente o comportamento das economias do Nordeste e do Sudeste segundo as diversas fases conjunturais, verifica-se que re-almente nos anos 1950 há aumento das disparidades entre o Sudeste e o Nordeste em termos de crescimento do PIB, o que confirma a advertência do GTDN ao se referir aos fortes investimentos do Plano de Metas naquela região e às políticas

Page 245: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

245

econômicas destinadas a viabilizá-lo. De fato, em 1947 o PIB nordestino equiva-lia a pouco menos de um quarto do sudestino, caindo para cerca de um quinto de 1953 a 1957, e recuperando o patamar anterior até 1966, porém com leves flutuações anuais (Gráfico 2), condicionando, assim, a evolução do PIB per capita (Gráfico 2A)12.

Tabela 7 - Taxas Médias Anuais de Crescimento do PIB e PIB Per Capita do Brasil, Nordeste e Sudeste para Períodos Selecionados, 1940-2008 (em %)

PeríodoPIB PIB Per Capita

Brasil Nordeste Sudeste Brasil Nordeste Sudeste

1940-1980 6,9 - - 4,1 - -

1980-2008 2,5 - - 0,8 - -

1940-1959 6,2 - - 3,5 - -

1940-1967 5,9 - - 3,1 - -

1968-1980 9,0 - - 6,3 - -

1960-1962 8,2 - - 5,0 - -

1963-1967 3,5 - - 0,5 - -

1968-1973 11,2 - - 8,3 - -

1974-1980 7,1 - - 4,6 - -

1981-1983 -2,1 - - -4,4 - -

1984-1987 6,1 - - 3,8 - -

1988-1992 -0,1 -0,1 -0,1 -1,9 -2 -2,1

1993-1997 4,0 2,8 2,4 2,4 1,6 0,9

1998-2002 1,7 3,2 2,7 0,2 1,9 1,2

2003-2006 3,5 3,8 3,6 2,2 2,6 2,1

2003-2008 4,1 - - 2,9 - -

1986-1992 1,5 0,4 1,4 -0,4 -1,5 -0,6

1986-2006 2,5 2,3 2,3 0,9 0,8 0,7Fonte: Elaboração Própria do Autor, a partir de Dados do IBGE.

12 Até 1980, o IBGE só divulgou dados sobre população por Estado para intervalos quinquenais, motivo pelo qual este gráfico não apresenta resultados anuais da razão entre os PIBs per capita até o referido ano, não mostrando, portanto, as respectivas flutuações (como no Gráfico 2), já que para uma melhor visualização apenas ligamos, por meio de retas, os pontos correspondentes aos valores dos anos de início e metade das décadas de 50 a 80. Já para os Gráficos 3 e 3 A, optamos por manter apenas os pontos referentes aos valores dos anos para os períodos quinquenais.

Page 246: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

246

A partir de 1959, portanto, observa-se uma ascendência das curvas e uma redução da discrepância entre as duas regiões13, cujos índices de crescimento são próximos, até 1967, após uma fase de cinco anos, desde 1963, de forte redução da atividade econômica. (Gráficos 3 e 3A, e Tabela 7). De fato, este é um período conjuntural desfavorável resultante da euforia do Governo Juscelino Kubitschek, por conta do Plano de Metas, quando as consequências no desequilíbrio dos agre-gados macroeconômicos, como nas contas públicas, na dívida externa e na infla-ção, acompanhado por aumento da concentração de renda, desencadeou também forte instabilidade política que marcou o Governo João Goulart e precipitou o golpe militar de 1964.

Gráfico 2 - Participação dos PIBs do Nordeste nos PIBs do Sudeste e do Brasil, respectivamente, 1947-2006

Fonte: Elaboração Própria do Autor, a partir de Dados do IBGE.

13 Vale ressaltar aqui que a Sudene, criada em 1959, já começa a exercer seu papel de promoção do desenvolvimento do Nordeste, contribuindo, assim, para imprimir certo ritmo de crescimento na economia desta região.

Page 247: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

247

Gráfico 2A - Participação dos PIBs Per Capitas do Nordeste nos PIBs Per Capitas do Sudeste e do Brasil, respectivamente, 1950-2006

Fonte: Elaboração Própria do Autor, a partir de Dados do IBGE.Nota: Não foi possível calcular o PIB Per Capita por região para períodos anteriores a 1950 devido à falta de dados.

Gráfico 3 - Índices de Crescimento dos PIBs do Brasil, Nordeste e Sudeste, 1950-2006 (Base: 1950=100)

Fonte: Elaboração Própria do Autor, a partir de Dados do IBGE.

Page 248: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

248

Gráfico 3A - Índices de Crescimento dos PIBs Per Capita do Brasil, Nordeste e Sudeste, 1950-2006 (Base: 1950=100)

Fonte: Elaboração Própria, a partir de Dados do IBGE

Celso Furtado, Ministro do Planejamento, procurou equilibrar a economia por meio do Plano Trienal (1963-1965) que, embora com a intenção de não sa-crificar o crescimento, apresentava caráter recessivo, mas que foi abortado pelo golpe, portanto não chegou a ser efetivamente implementado. Já sob o regime di-tatorial, o Plano de Ação Econômica do Governo (PLAEG) adotou uma série de reformas institucionais e uma estratégia gradualista de combate à inflação – que aliado à recessão então vigente – foi exitoso e importante para a grande retomada do crescimento, quando do I Plano Nacional de Desenvolvimento (I PND), a partir de 1968, conhecido como o Milagre Econômico brasileiro, conforme as elevadas taxas anuais do PIB e do PIB per capita, até 1973 (vide Gráfico 1A e Tabela 7).

Pelas características do plano, com investimento público em infraestrutura e nas empresas estatais, expansão do crédito ao consumidor, incentivo à construção civil etc., com a retomada da demanda interna das exportações e dos setores de bens de consumo duráveis e de capital, a região Sudeste se constituiu novamente no lócus de expansão capitalista no Brasil. Nota-se claramente o grande impulso do PIB desta região, que não foi acompanhado, no mesmo ritmo, pelo PIB do Nordeste, voltando a aumentar, portanto, a distância econômica que separa estas duas regiões (Gráficos 2 e 3), sendo 1975 o ano mais crítico a este respeito, quan-do o PIB do Nordeste corresponde a apenas 17% do PIB do Sudeste, e o PIB per capita menos de 25%.

Page 249: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

249

É importante salientar o caráter espacialmente concentrador dessa fase ex-pansionista, claramente retratado pela redução da participação do PIB per capita nordestino no respectivo da região Sudeste (Gráfico 2A), o que indica aumen-tos muito mais substanciais do PIB sudestino em comparação ao nordestino – conforme vimos acima, com quedas da participação do PIB do Nordeste no do Sudeste (Gráfico 2) –, mesmo com forte fluxo migratório no sentido daquela região, principalmente durante este período. Já no período de 1975 a 1985 tem-se novamente tendência de reaproximação econômica entre estas regiões, voltando a se distanciarem até 1990 e apresentando, a partir daí, nova tendência convergente, não obstante a existência de flutuações anuais. (Gráficos 2, 2A e 3).

É interessante analisar aqui esta grande fase, da década de 70 até agora, considerando as grandes transformações econômicas ocorridas nos contextos internacional, nacional e regional. Brevemente, pode-se considerar este período como outro grande marco das condicionantes impostas pela dinâmica do avan-ço capitalista, com o fim da chamada Era de Ouro – caracterizada pelo círculo virtuoso de crescimento econômico do pós-guerra com construção dos direitos sociais universais, graças à regulação keynesiana do “Estado desenvolvimentista” – e o retorno dos preceitos liberais como corretivos da crise recessiva instalada já no início da referida década, com a derrocada do acordo de Bretton Woods e o fim do padrão ouro-dólar, o crash da bolsa de Nova York, os dois choques do petróleo e os consequentes desequilíbrios nos balanços de pagamentos dos países em geral, em particular dos importadores deste produto14.

Em nível nacional, esse choque externo pega a economia brasileira em plena euforia do Milagre Econômico, reduzindo seu ritmo em 1974 e 1975 (vide Gráficos 1 e 1A), mas retomando o crescimento já a partir de 1976, graças à implementação do II Plano Nacional de Desenvolvimento-II PND, no início do mandato do Gene-ral Ernesto Geisel. Com objetivos estruturantes, este plano ignorou a conjuntura re-cessiva mundial visando a dar continuidade ao elevado crescimento econômico do período do Milagre por meio de elevados investimentos em infraestrutura econômi-ca, especialmente nos segmentos de energia e de insumos básicos concernentes ao propósito de “completar” o Programa de Substituição de Importações (PSI), cuja maior lacuna estrutural residia justamente na dependência externa destes produtos que pressionavam a balança de transações correntes do País.

As consequências, não só para o Brasil, mas para todos os países que se en-dividaram pela via da forte liquidez internacional, principalmente os da América Latina, proporcionada pelos petrodólares a um custo muito baixo – foram a forte

14 Para uma análise mais detalhada deste período ver Sousa (2010).

Page 250: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

250

recessão do início da década de 80 e os flagelos da elevada dívida externa e da inflação. Mas a economia brasileira, conduzida pela “marcha forçada” do II PND, conforme ressaltam Castro e Souza (1985), apresentou recuperação em 1984 e superávits nas balanças comerciais que se acumularam anualmente, servindo in-clusive como reserva monetária fundamental para viabilizar a estabilidade dos preços com a implantação do Plano Real, em meados da década de 90.

Aqui vale também tecer importantes referências sobre os efeitos regionais do II PND. Contrariamente ao Plano de Metas e ao I PND, este plano promove um processo de desconcentração industrial a partir de projetos de investimentos dire-cionados às outras regiões brasileiras, ou seja, fora da região Sudeste, contemplando a formação de polos/complexos industriais, o que favoreceu significativamente o Nordeste brasileiro15. Todavia, esse padrão inseria esta região na economia nacional, porém especializada em produzir bens intermediários, portanto de caráter comple-mentar à indústria instalada no Sudeste e dependente de sua dinâmica.

Sobre este fenômeno, Cano (1997) assinala que o papel estratégico desempe-nhado pelas políticas públicas possibilitou a desconcentração econômica ocorrida entre os anos de 1970 e 1985, fenômeno que favoreceu todas as regiões brasilei-ras, especialmente a Nordeste. Neste período a participação nacional do Estado de São Paulo na indústria de transformação caiu para 52%; a produção nacional de bens intermediários e não-duráveis de consumo caiu de 52% para 43% e a produção nacional de bens de capital e de consumo durável caiu de 75% para 66%. Ressalta, ainda, que esse movimento atesta a perda de posição relativa dos Estados de São Paulo e Rio de Janeiro em direção ao interior paulista, a outros estados da região Sudeste e Sul, aos estados das regiões Centro-Oeste e Norte (especialmente Zona Franca de Manaus) e aos estados nordestinos. No Nordeste destacou-se a produção de bens intermediários (minerais não-metálicos, metalúr-gica, papel, borracha e química), aumentando a participação da região no valor total da transformação industrial brasileira: de 6,9% em 1959, reduziu-se para 5,7% em 1970, atingindo 8,6% em 1985. (CANO, 1997).

15 Neste sentido, foi edificado o complexo petroquímico de Camaçari, na Bahia, o complexo minero-metalúrgico de Carajás, no Maranhão, e o polo têxtil/confecções de Fortaleza. Como polo agrícola, tem-se o complexo agroindustrial de Juazeiro/Petrolina na divisa do Estado da Bahia com Per-nambuco (na realidade constitui-se em focos de modernidade voltados para a exportação e com limitado poder de internalizar a renda na própria região). Além destes podemos citar outros menos dinâmicos, mas nem por isso menos importantes, no que se refere a geração de renda e empre-go, quais sejam: sal-gema em Alagoas, metal-mecânico em Pernambuco e fertilizantes em Sergipe. (ARAÚJO, 1997).

Page 251: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

251

Observe-se que há realmente melhoria da posição relativa dos PIBs nordes-tinos nos respectivos da região Sudeste ao se comparar 1975 com 1985, passando de 17,1% para 24%, ocorrendo o mesmo com respeito aos PIBs per capita (Gráfi-cos 2 e 2A), e que as curvas dos índices de crescimento destes indicadores, prin-cipalmente dos últimos, melhoram para o Nordeste. (Gráficos 3 e 3A). Todavia, a partir de 1986 ocorre novamente redução dessas participações, aumentando a distância econômica entre as referidas regiões, voltando a se aproximarem depois de 1990, mas alcançando 23,1% com respeito ao PIB, em 2006, ou seja, participa-ção inferior às registradas em 1947, 1965 e 1985.

O período de 1986 a 2006 pode ser mais bem visualizado por meio da com-paração das taxas médias anuais de crescimento dos PIBs (Tabela 7 e Gráfico 4). De 1986 a 1992 o Nordeste apresentou taxa média inferior à do Sudeste, passan-do a um desempenho um pouco superior até 2006, conforme os subperíodos destacados na Tabela 716. Todavia, se tomarmos todo o período de 1986 a 2006, as taxas médias anuais de crescimento das duas regiões são idênticas (2,3%), o que indica que ambas cresceram praticamente no mesmo ritmo. Ora, isto pressupõe que embora tenham ocorrido investimentos significativos no processo de des-concentração industrial, conforme visto anteriormente – e uma vez estes sendo maturados, o que possivelmente ocorreu no período 1970-1985 – e não havendo novos surtos ou continuidade de elevados investimentos no Nordeste, isto não foi suficiente para uma mudança estrutural capaz de reduzir substancialmente o fosso entre as duas regiões.

Neste sentido, consideram-se ainda alguns aspectos importantes que con-dicionaram o desempenho econômico brasileiro e regional a partir da “década perdida”. As conjunturas a partir dos anos 1980 foram fortemente marcadas pe-los flagelos da dívida externa, depois da dívida interna; pelo problema da inflação, depois pela administração da estabilidade monetária a partir do Plano Real, o que continuou mesmo após a desvalorização da moeda nacional, em 1999. Ressalte-se que a prioridade na estabilidade dos preços permanece durante os governos Lula, envolvidos na problemática vulnerabilidade externa, retomada do crescimento econômico e controle dos agregados macroeconômicos, sempre condicionados pela administração das metas de inflação, o que tem mantido a economia sob forte rigidez com respeito à taxa de juros e ao crescimento.

16 Observe-se que historicamente o Brasil apresentava taxas positivas e elevadas de crescimento, mas nas décadas de 80 e 90 se tornaram frequentes situações de estagnação e de recessão – 1981 a 1983, 1988, 1990 a 1992, e 1998 e 1999 – e mesmo nos anos 2000, mais precisamente a partir de 2004, as taxas de crescimento são muito inferiores às verificadas até os anos 1980, ou seja, durante o longo ciclo desenvolvimentista. (Gráfico 1A).

Page 252: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

252

Gráfico 4 - Variações Anuais do PIB e PIB Per Capita do Nordeste e Sudeste, 1986-2006

Fonte: Elaboração Própria do Autor, a partir de Dados do IBGE.

Em nível mais geral e fundamental tem-se um novo paradigma que passa a comandar o processo de acumulação do capital, com o abandono dos preceitos keynesianos que davam guarida ao Estado como promotor do desenvolvimento econômico, comumente apontado de Estado Desenvolvimentista. Sob a égi-de neoliberal, o mercado assume papel primordial neste processo, impondo a privatização de empresas estatais e a abertura, a desregulamentação e a flexi-bilização dos mercados em geral, ou seja, de bens, serviços e de capitais com consequências significativas em diferentes âmbitos: no sistema produtivo, no mercado de trabalho, no sistema financeiro, nas finanças públicas, nas políti-cas sociais etc. Este “abandono” do papel do Estado é sentido principalmente no que se refere à questão regional, pois o que passa a ser determinante são formas “espúrias” de atração de empreendimentos produtivos em detrimento da experiência histórica do planejamento regional, muito bem desempenhado pela Sudene, no caso do Nordeste. Ironicamente, a concorrência, tão inerente aos mercados, foi então “imposta” também ao Estado, a partir de uma guerra fiscal que põe em concorrência governos estaduais e municipais pela atração de empresas, muitas vezes sem uma estratégia planejada de desenvolvimento a médio ou longo prazo. A própria Sudene foi sacrificada neste processo, sendo extinta, e não substituída à altura pela Agência de Desenvolvimento do Nor-deste (Adene), criada mais para efeito simbólico do que real, como tentativa de legitimação de prioridade da questão nordestina não assumida pelo Governo conforme promessa de campanha à eleição presidencial.

O acirramento da concorrência num ambiente de globalização e abertura ao capital externo caracteriza a economia brasileira a partir da década de 90, desenca-

Page 253: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

253

deando processos de desindustrialização e de desnacionalização17. Neste sentido, durante os governos do Presidente Fernando Henrique Cardoso, como delineado nos projetos “Avança Brasil” e “Brasil em Ação”, se privilegiam áreas competiti-vas do território nacional para a convergência de investimentos em infraestrutu-ra visando a inseri-las no comércio internacional, o que, pelo caráter “passivo e submisso” dessa inserção reforça a especialização e exacerba as rivalidades regio-nais18. Desta forma, o Nordeste mais uma vez se encontra em desvantagem para a atração de empreendimentos ligados à lógica de acumulação do capital internacio-nal. O que se verifica, então, é a concentração de investimentos em reestruturação produtiva – informática, microeletrônica, telecomunicações e automação – que convergem na conformação de um polígono19, situado nas regiões Sul e Sudeste e liderado pelo Estado de São Paulo20.

Esta tendência, além dos fatores inerentes à globalização econômica, é resul-tante de forças que atuam para a concentração de investimentos nas áreas tradi-cionalmente dinâmicas do País referentes aos novos requisitos locacionais da acu-mulação flexível, como: melhor oferta de recursos humanos qualificados, maior proximidade dos centros de produção de conhecimento e tecnologia, maior e mais eficiente dotação de infraestrutura econômica e proximidade dos mercados consumidores de mais alta renda. (ARAÚJO, 1997). Por outro lado, as dificul-dades do Nordeste referentes à atração de investimentos compreendem: econo-mia frágil e pouco competitiva, mercado limitado para gerar escalas eficientes de 17 O primeiro refere-se à destruição de elos das cadeias industriais em razão do aumento da concor-

rência vinculado à paridade cambial do Plano Real. O segundo reflete o movimento de fusões e aquisições de empresas nacionais por corporações estrangeiras.

18 Como bem remarca Araújo (2000, p. 91): “O regionalismo dos ricos, negam o chamado Brasil po-bre e querem é inserir sua “ilha” dinâmica na economia mundial. É a exacerbação de rivalidades e a formação ampliada de bolsões de miséria, tudo apontando para a inviabilização do país como projeto nacional”.

19 Diniz (1994) e Diniz e Crocco (1996) identificam uma nova reorganização produtiva sobressaindo-se cidades médias, nas regiões Sudeste e Sul, como forças de atração de empreendimentos industriais no que denominam de “polígono dinâmico”. Além do Estado de São Paulo, o polígono abrange as cidades de Curitiba, Maringá, Blumenau, Joinville, Porto Alegre, Caxias, Belo Horizonte e Uberlân-dia. As razões apontadas para essa tendência variam desde a maior disponibilidade de infraestrutura e centros de pesquisa até ao aumento da participação na produção industrial total e à proximidade com o MERCOSUL. (ARAÚJO, 2000; OLIVEIRA; SOUSA, 2006).

20 Alguns autores falam em fragmentação da Nação. “É a isto que me refiro como tendência de fragmentação da economia nacional, pela quebra dos laços de solidariedade econômica que existem entre as regiões brasileiras e que manifestavam um enorme potencial de crescimento nas fases de aceleração cíclica”. (PACHECO, 1996, p. 135).

Page 254: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

254

produção, sérias deficiências de infraestrutura econômica, mão-de-obra regional despreparada, economia que não possibilita uma maior diversificação produtiva voltada para a conquista de novos mercados externos e indisponibilidade de ato-res empresariais de porte e com agressividade para se inserirem na globalização, competitivamente.

Por fim, vale referir que a redução das disparidades regionais no Brasil, no que concerne essencialmente à discrepância entre a região mais pobre e a mais rica – objeto de análise deste trabalho – dependerá não só da ocorrência de um prolongado ciclo de expansão da economia brasileira capaz de promover inclusão social e distribuição de renda, como também de um paradigma que contemple um desenvolvimento que favoreça primordialmente as regiões menos desenvol-vidas, em particular o Nordeste. Neste sentido, espera-se que após a forte crise de 2008, que tem abalado o mundo capitalista, mas da qual o Brasil tem se sa-ído relativamente bem, dando sinais concretos de recuperação da economia, se consiga ingressar na referida fase longa de prosperidade. Também se espera que os significativos investimentos, notadamente em infraestrutura econômica, pre-vistos para o Nordeste, em especial a siderúrgica, a refinaria, a Transnordestina e a transposição do rio São Francisco, sejam realmente capazes de atrair empre-endimentos produtivos e inaugurar uma nova etapa no percurso de integração às economias nacional e internacional.

Todavia, pelas características dos referidos investimentos, e por estarem vin-culados a uma lógica de inserção complementar e dependente da dinâmica de acumulação do capital nacional e internacional, nos parece que ainda está muito longe de se promover no Nordeste uma transformação estrutural capaz de con-ferir à região maior autonomia e independência econômica. Em outras palavras, de edificar realmente um parque industrial produtor de bens de capital e bens finais de consumo que confiram capacidade competitiva na produção de bens que incorporem alta tecnologia e, portanto, de elevado valor agregado. Caso contrário, o grande sonho de Celso Furtado, conforme explicitado no GTDN e referido no início deste trabalho, de construção de uma economia nordestina pujante, com condições de se impor no mercado nacional frente à força da região mais desen-volvida do País, ainda estará muito longe de ser alcançado, ainda é uma utopia.

Page 255: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

255

Agradecimentos

Agradeço aos bolsistas e alunos de Economia Inácio Fernandes e Thiago Holanda, pela inestimável colaboração na parte referente à estatística descritiva deste trabalho, como também à Fundação Cearense de Apoio ao desenvolvimen-to Científico e Tecnológico (Funcap), e à Universidade Federal do Ceará (UFC) pela concessão das referidas bolsas.

Referências

ARAÚJO, T. B. de. A promoção do desenvolvimento das forças produtivas do nordeste: da visão do GTDN aos desafios do presente. Revista Econômica do Nordeste, Fortaleza, v. 28, n. 4, p. 451-468, out./dez. 1997.

______. A questão regional e a questão nordestina. In: TAVARES, M. C. (Org.). Celso Furtado e o Brasil. São Paulo: Perseu Abramo, 2000.

CANO, W. Concentração e desconcentração econômica regional no Brasil: 1970-95. Revista Economia e Sociedade, São Paulo, n. 8, p. 101-141, jun. 1997.

CASTRO, A. B. de.; SOUZA, F. E. Pires de. A economia brasileira em marcha forçada. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985.

DINIZ, C. C.; CROCCO, M. A. Reestruturação econômica e impacto regional: o novo mapa da indústria brasileira. Nova Economia, Belo Horizonte, v. 6, n. 1, p. 77-103, jul. 1996.

DINIZ, C. C. A dinâmica regional recente da economia brasileira e suas perspectivas. Brasília, DF: IPEA, 1994.

FERREIRA, A. A aventura da sobrevivência: migrações cearenses na década de 1990. Fortaleza: Banco do Nordeste do Brasil, 2007. 248 p. (Série BNB Teses e Dissertações, 5).

______. O nordeste brasileiro: contraponto inacabado da acumulação?. In: BER-NAL, M. C. C. (Org.). A economia do nordeste na fase contemporânea. For-taleza: Banco do Nordeste do Brasil, 2006.

Page 256: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

256

GTDN: uma política de desenvolvimento econômico para o Nordeste. Revista Econômica do Nordeste, Fortaleza, v. 28, n. 4, p. 387-432, out./dez. 1997.

OLIVEIRA, A. J. P. de; SOUSA, F. J. P. de. A desconcentração industrial e o nordeste: do estado desenvolvimentista à globalização. In: BERNAL, M. C. C. (Org.). A economia do Nordeste na fase contemporânea. Fortaleza: Banco do Nordeste do Brasil, 2006.

OLIVEIRA, F. de. Elegia para uma re(li)gião. São Paulo: Paz e Terra, 1977.

PACHECO, C. A. Desconcentração econômica e fragmentação da economia nacional. Revista do Instituto de Economia da UNICAMP - Economia e Sociedade, Campinas, p. 113-140, jun. 1996.

POCHMANN, M. Geoeconomia do emprego no nordeste brasileiro. In: MA-CAMBIRA, J.; SANTOS, S. M. (Org.). Brasil e Nordeste: ocupação, desempre-go e desigualdade. Fortaleza: IDT, 2007.

SOUSA, F. J. P. de. Percalços da América Latina: de Bretton Woods à atual crise financeira global. In: SOUSA, F. J. P. de. (Org.). Poder e políticas públicas na América Latina. Fortaleza: Edições UFC, 2010.

______. Proteção social e a crise do emprego. In: BRAGA, E. M. F. (Org.). Amé-rica Latina: transformações econômicas e políticas. Fortaleza: Editora UFC, 2003.

Page 257: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

9CAPÍTULO

CONCENTRAÇÃO GEOGRÁFICA E PRODUTIVIDADE INDUSTRIAL

Diego de Maria AndréMestrando do Curso de Mestrado emEconomia Curso de Pós-Graduação em Economia (CAEN)/Universidade Federal do Ceará (UFC)

Francisco de Assis SoaresProfessor Dr. do Curso de Mestrado em Economia CAEN/UFCe do Curso de Pós-Graduação em Administração e Controladoria (PPAC)/UFC

Sandra Maria dos Santos Professora Dra. Curso de Pós-Graduação em Administração e Controladoria/PPAC/UFC

Júnior MacambiraDiretor de Estudos e Pesquisas do Instituto de Desenvolvimento do Trabalho – IDT eMestre em Planejamento e Políticas Públicas/UECE

9.1 – Introdução

Estudos sobre produtividade constituem um importante tópico de análise em economia devido à sua importância em níveis microeconômico e macroeco-nômico. A produtividade é um importante fator para se compreender desde o salário recebido por um trabalhador até o nível de competitividade de uma região ou de um país. Indivíduos mais produtivos recebem, em média, salários maiores, da mesma forma que empresas mais produtivas auferem lucros maiores, e países mais produtivos têm um grau de desenvolvimento mais elevado.

Diversos trabalhos têm apontado diferentes fatores para explicar aumen-tos de produtividade como, por exemplo, a reestruturação produtiva (FEIJÓ; CARVALHO, 1993; CARVALHO; BERNARDES, 1996), a abertura comercial (FEIJÓ; CARVALHO; RODRIGUEZ, 2003; ROSSI JÚNIOR; FERREIRA, 1999), a concentração de capital humano (RAUCH, 1991; ARAÚJO JÚNIOR;

Page 258: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

258

SILVEIRA NETO, 2004; MIRANDA, 2004) e, finalmente, a concentração indus-trial. (CARLINO, 1979; HENDERSON, 1986; IDSON; OI, 1999; MARÉ; TIM-MINS, 2006; WHEELER, 2006; FEIJÓ; CARVALHO; RODRIGUEZ, 2003).

Como esta é uma linha de pesquisa ainda pouco explorada na literatura na-cional (FEIJÓ; CARVALHO; RODRIGUEZ, 2003), principalmente quando se trata de problemas regionais relativos à concentração geográfica, este artigo incor-pora a questão da produtividade segundo a metodologia desenvolvida por Whee-ler (2006) para determinar a relação entre a especialização geográfica, decomposta em economias de escala e o número de estabelecimentos (SOARES; SANTOS; FREITAS, 2008), e a produtividade industrial na economia brasileira.

Sendo assim, o objetivo geral desta pesquisa é analisar o impacto da concen-tração (especialização), mais especificamente o impacto das economias de escalas e do número de estabelecimentos sobre a produtividade industrial.

A pesquisa está direcionada para regiões metropolitanas brasileiras definidas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), existentes no ano de 2000. Quanto à base de dados, foram utilizadas informações da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) para os anos de 2000 e 2005, sobre quantidade de emprego, número de estabelecimentos e remuneração média dos trabalhadores.

São estimados modelos econométricos usando o método dos Mínimos Quadrados Ordinários (MQO) para verificar como as economias de escala e o número de estabelecimentos afetam a produtividade nas regiões metropolitanas brasileiras. Nesses modelos foram incluídas variáveis dummies para verificar se as características regionais, o tempo e as características industriais influenciam a in-tensidade dessas relações. Além disso, foi realizada uma agregação das indústrias de acordo com a classificação dos setores por grau de intensidade tecnológica da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), para analisar se o grau de uso de tecnologias influencia a produtividade.

Além desta introdução e das considerações finais, este trabalho apresenta mais três seções. Na seção 2, que trata do referencial teórico, abordará as bases te-óricas, tanto da produtividade quanto da concentração industrial, que dão suporte ao desenvolvimento deste trabalho. Na seção 3, que trata da metodologia, serão abordados os modelos econométricos utilizados neste trabalho, além de uma dis-cussão sobre a base de dados utilizada nesta pesquisa. E, por fim, na seção 4 será abordada a análise dos resultados.

Page 259: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

259

9.2 – Fontes da Concentração Industrial Geográfica

Nos últimos anos desenvolveu-se uma vasta gama de estudos que abordam diferentes linhas metodológicas objetivando a identificação, a classificação, a di-nâmica e a presença de economias de escalas em aglomerações produtivas com ênfase na concentração industrial, seguindo diferentes metodologias, mas encon-trando resultados com elevado grau de convergência. (AZONNI, 1985; CROC-CO et al., 2003; CASSIOLATO; LASTRES, 2003; IPEA, 2008; KRUGMAN, 1991; HOLMES; STEVENS, 2002; LAFOURCADE; MION, 2007).

No processo de migração regional de indústrias observou-se que novas aglo-merações industriais surgiram nas regiões periféricas, fazendo com que as pesqui-sas sobre aglomeração industrial ganhassem um grande espaço para debate no meio acadêmico e nos órgãos de promoção do desenvolvimento tanto nacional quanto regional, e em instituições de apoio às pequenas e microempresas.

Devido a esse processo de relocalização da indústria nacional, pioneiramente analisado por Azzoni (1987), novos estudos aprofundaram as análises anteriores. Crocco et al. (2003); SEBRAE (2002); IPEA (2008), Zissimos; Ribeiro e Hasen-clever (2007) recorreram a metodologias diferenciadas da econometria espacial para entender a formação das aglomerações produtivas regionais, realçando os as-pectos setoriais embutidos no processo de formação dos aglomerados industriais.

No âmbito internacional, Kim (1995) mostra que os padrões de localiza-ção da indústria americana para o período de 1860-1987 podem ser explicados pelas economias de escala e pelo modelo de Heckscher-Ohlin, mostrando que as indústrias se localizam em áreas em que elas tenham mais acesso aos insumos necessários à sua produção, mas não podem ser explicadas pela presença de eco-nomias externas.

Seguindo a proposta metodológica de Kim (1995), Lafourcade e Mion (2006) chegaram a conclusões similares para a economia italiana ao mostrarem que as economias de escalas são influenciadas positivamente pela concentração da indústria regional, isto é, grandes estabelecimentos industriais tendem a estar mais presentes em regiões especializadas.

Usando dados de áreas urbanas, Dinlersoz (2003), em um estudo para a economia americana, mostra que, em média, para a indústria de transformação

Page 260: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

260

o número de estabelecimentos industriais de uma cidade cresce mais do que pro-porcionalmente com o crescimento do seu mercado, medido pela proxy número de habitantes da cidade, enquanto o emprego cresce na mesma proporção. Com isso, o tamanho médio do estabelecimento diminui com o aumento da população, indi-cando que quanto maior for um mercado, menores serão as economias de escalas obtidas pelas empresas que ali estão inseridas. Assim, ele chega à conclusão de que grandes cidades tendem a acomodar mais empregos industriais, não pelo aumento do tamanho médio dos estabelecimentos, mas pela expansão do número de estabe-lecimentos, ou seja, pela diversificação através do efeito demanda interna.

Por outro lado, Holmes e Stevens (2002), ao investigarem a relação entre a especialização industrial e a presença de economias de escalas para a indústria de transformação americana, utilizaram a decomposição do quociente locacional para captar dois fatores importantes que determinam a especialização industrial de uma região: o efeito da presença de economias de escalas e o efeito do número de estabelecimentos por trabalhador. O estudo não leva em conta o grau de urba-nização regional. Eles descobriram que plantas industriais que estão inseridas em áreas onde existe uma concentração industrial tendem, em média, a ser maiores, refletindo, portanto, maiores economias de escala.

Partindo do pressuposto de que os resultados obtidos por Holmes e Stevens (2002) não seriam tão robustos, Barrios; Bertinelli e Strobl (2003) realizaram um estudo para a Irlanda incorporando em sua análise variáveis dummies para captar o efeito das características industriais e das regiões, além das mudanças estruturais da economia. Com essa expansão do modelo encontraram resultados cujo impac-to da especialização sobre a presença de economias de escala era maior do que o encontrado por Holmes e Stevens (2002), sinalizando que as estimativas destes últimos estavam subestimadas devido à ausência de tais regressores.

Com base no trabalho de Holmes e Stevens (2002), e observando os resul-tados obtidos por Barrios; Bertinelli e Strobl (2003) e Soares; Santos e Freitas (2008) realizaram um estudo semelhante para o Brasil. Eles estimaram um mode-lo econométrico expandido utilizando-se de um painel de dados da Relação Anual de Informações Sociais do Ministério do Trabalho e Emprego (RAIS/MTE), em nível microrregional, para os anos de 1995 e 2005. Concluíram, de igual modo, que a não incorporação no modelo dessas diferenças gerariam subestimativas do efeito da especialização sobre a economia de escala.

Para reforçar ainda mais a importância da inclusão desses efeitos, Soares; Santos e Freitas (2008) constataram que, a depender da indústria e da região, o efeito da especialização sobre a economia de escala torna-se diferenciado. Desta

Page 261: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

261

forma, estimaram o modelo original de Holmes e Stevens (2002) para a economia brasileira e obtiveram resultados semelhantes aos da economia americana. No entanto, quando o modelo expandido foi estimado, notaram que a especialização tinha um impacto mais expressivo sobre a economia de escala.

Em um estudo alternativo para a economia americana, Holmes e Stevens (2004) explicam o padrão de especialização de pequenas e grandes cidades, mos-trando que as grandes cidades se especializam no setor de serviços, e as pequenas cidades se especializam no setor industrial. Em ambos os casos os estabelecimen-tos do setor especializado apresentam um tamanho médio maior do que a média nacional, enquanto os estabelecimentos do setor não-especializado apresentam um tamanho médio menor do que a média nacional.

Segundo tais autores, o que explica esse padrão de especialização entre as pe-quenas e grandes cidades é o custo de transporte, uma vez que os produtos manu-faturados têm um custo de transporte menor do que o custo de transportar pessoas para realizarem os serviços. Desta forma, como há uma maior demanda por servi-ços nas grandes cidades, devido à sua grande população, as cidades se especializam nos serviços e importam os bens manufaturados das pequenas cidades. Por fim, a explicação de Holmes e Stevens (2004) para o fato de que os estabelecimentos das indústrias são menores em grandes cidades é que existe uma parte da demanda que só pode ser atendida pela produção local, uma demanda por produtos personaliza-dos ou que só podem ser produzidos próximos aos pontos de venda. Desta forma, é necessária a presença de produtores que ofereçam esses produtos.

Observa-se nas discussões anteriores que o problema da aglomeração produtiva, da economia de escala, do número de firmas, do tamanho das ci-dades etc., foi analisado por metodologias distintas, mas em nenhuma delas a produtividade surge como fator explicativo. Como exposto na seção anterior, esta parece ser uma questão importante para entender as economias locais.

9.3 – Incorporando a Produtividade Industrial ao Debate da Economia Regional

A partir dos anos 90 do século XX, quando a globalização se fortalece, estudos sobre a produtividade industrial ganharam grande destaque na literatura nacional, devido, sobretudo, às significativas taxas de crescimento da produtividade obtidas pela economia brasileira no período, especialmente pós-1994. Na primeira metade da década o debate centrava-se na determinação das causas do aumento da produti-

Page 262: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

262

vidade, se seria um movimento defensivo frente à recessão, semelhante ao ocorrido no início dos anos 80, ou se esse aumento de produtividade estaria ligado a uma reestruturação produtiva da economia brasileira. (CARVALHO; FEIJÓ, 2000).

A reestruturação produtiva, com a adoção de novas técnicas que racionalizam a produção, de novos métodos de gestão, da informatização e da automação dos processos produtivos, impactou positivamente os níveis de produtividade da econo-mia brasileira. (FEIJÓ; CARVALHO, 1993; CARVALHO; BERNARDES, 1996).

Feijó e Carvalho (1993), embora considerem esses fatores, não os tratam como preponderantes, e enxergam a redução do emprego como principal causa do aumento da produtividade por trabalhador no ano de 1992, o que eles chamam de “produtividade perversa”. Carvalho e Bernardes (1996), por outro lado, afir-mam que o aumento da produtividade industrial no período não decorre apenas de ajustes recessivos, mas é efeito da adoção de estratégias de modernização das empresas com vistas à obtenção de vantagens competitivas.

Na segunda metade dos anos 90, o impacto da abertura econômica sobre a produtividade industrial concentrou os debates sobre o tema. Vários autores desta-cam os efeitos positivos que a abertura teria exercido sobre a produtividade industrial. (FEIJÓ; CARVALHO; RODRIGUEZ 2003; ROSSI JÚNIOR; FERREIRA, 1999).

Para Feijó; Carvalho e Rodriguez (2003), a abertura teria atuado de duas formas sobre a produtividade: barateamento dos custos de insumos e de bens de capital (até a mudança de regime cambial, do câmbio fixo para o câmbio flu-tuante, em janeiro de 1999); aumento da concorrência dos produtos nacionais com os importados, o que forçou os produtores brasileiros a modernizarem suas estruturas produtivas.

Outra linha de estudo destaca a influência do capital humano sobre a produ-tividade. Nesta linha destacam-se os trabalhos de Rauch (1991); Araújo Júnior e Silveira Neto (2004) e Miranda (2004).

Rauch (1991), em um estudo para as regiões metropolitanas americanas, propõe que a concentração de capital humano gera impactos positivos sobre os salários e, consequentemente, sobre a produtividade dessas regiões. Ele utilizou como proxies do capital humano os níveis médios de educação formal e de expe-riência para, em seguida, estimar o efeito de um ano adicional de educação sobre a produtividade total dos fatores. Rauch (1991) descobriu que um ano adicional de educação aumenta a produtividade geral dos fatores em cerca de 2.8%, com um desvio-padrão de 0.8%

Page 263: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

263

Araújo Júnior e Silveira Neto (2004) estudaram como a concentração de capital humano influencia a produtividade individual nas regiões brasileiras e gera, consequen-temente, as disparidades regionais. Eles propõem que a concentração de capital humano afeta positivamente a produtividade individual, como uma externalidade que eleva a renda dos agentes, e que esse efeito é maior nos níveis superiores de renda, onde supos-tamente estão os indivíduos mais produtivos. Além disso, eles constataram que a con-centração de capital humano se mostra um fator importante para explicar as disparida-des regionais de renda, principalmente da região Sudeste em relação à região Nordeste.

No trabalho de Miranda (2004) ele analisa conjuntamente a influência da aber-tura comercial, do capital humano e da concentração de renda sobre a produtivi-dade dos estados brasileiros. Utilizando dados em painel e a partir de uma função Cobb-Douglas ele estimou a produtividade total dos fatores e a utilizou em uma regressão em função do índice de Gini, do grau de abertura, medida pela soma das importações e das exportações dividida pelo produto interno bruto, e do estoque de capital humano, medida pela proxy anos de estudo médios da população ocupada. Ele encontrou que estados com um maior estoque de capital e com maior grau de abertura possuem um nível maior de produtividade, enquanto que estados com maior concentração de renda tendem a possuir um menor nível de produtividade.

Recentemente, tem-se desenvolvido uma nova linha de pesquisa que associa a produtividade industrial à concentração industrial, que é o objeto de estudo desta pesquisa. Na literatura internacional destacam-se os trabalhos de Carlino (1979); Hen-derson (1986); Idson e Oi (1999); Maré e Timmins (2006) e Wheeler (2006), enquanto na literatura nacional tem-se o trabalho de Feijó; Carvalho e Rodriguez (2003).

Em sua análise da relação entre a concentração e a produtividade Carlino (1979) utilizou dados do censo das manufaturas dos Estados Unidos. Ele utilizou como proxy da produtividade os retornos de escala e da concentração o tamanho médio do estabelecimento. Ele encontrou evidências de influências positivas do ta-manho médio do estabelecimento sobre a produtividade. Hendeson (1986), por sua vez, utilizando a base de dados semelhante, utilizou como proxy da produtividade uma relação da produção por unidade de trabalho e concluiu que a relação entre a concentração e a produtividade é fraca.

Idson e Oi (1999) propõem em seu trabalho uma relação positiva entre o tama-nho da planta industrial e o salário pago nessa indústria. Segundo eles, os trabalha-dores de grandes plantas industriais são mais produtivos e, por isso, recebem salários maiores. A explicação proposta por eles é que as grandes indústrias criam empregos que necessitam de trabalhadores mais produtivos por causa do uso de tecnologia, or-ganização do trabalho, dentre outros fatores, e, por isso, pagam altos salários.

Page 264: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

264

Maré e Timmins (2006) realizaram um trabalho para a Nova Zelândia em que eles estudaram a relação entre a concentração geográfica e a produtividade da firma. Eles descobriram que a produtividade do trabalho, medida pelo valor adicionado por trabalhador, é maior para as firmas que estão inseridas em áreas onde as firmas estão geograficamente mais concentradas, efeito localização, e para as firmas que estão in-seridas em áreas onde existe uma maior diversificação industrial, efeito urbanização, e, ainda, para as firmas que atuam onde existem grandes mercados de trabalhos.

No trabalho de Wheeler (2006) ele destacou a relação entre a produtividade e a presença de economias de escalas, mas antes analisando a relação entre o emprego industrial local e a presença de economias de escalas. Ele observou que o tamanho médio do estabelecimento, isto é, as economias de escalas, crescem substancialmente com o crescimento do emprego industrial das áreas metropolitanas. E, segundo, que a produtividade, medida pelo salário médio dos trabalhadores, está mais correlacionada com as economias de escalas do que com o número total de estabelecimentos. Dessa forma, o aumento da produtividade é explicado mais pelo aumento do tamanho mé-dio do estabelecimento do que pelo aumento do número total de estabelecimentos.

Feijó; Carvalho e Rodriguez (2003) analisam a relação entre a concentração in-dustrial e o aumento do grau de intensidade tecnológica, a relação entre o emprego e a intensidade tecnológica, e entre a concentração e a produtividade, e, por último, a relação entre concentração, produtividade e participação do capital estrangeiro na indústria nacional. Utilizando dados da RAIS, do censo industrial de 1985, o censo cadastro de 1995 e a pesquisa industrial de 1998, eles encontraram que a concentra-ção industrial aumentou com a abertura econômica e que o aumento da produtivi-dade no período foi acompanhado por um aumento da concentração.

Os outros resultados encontrados foram que os setores de alta e média alta tecnologia ganharam espaço na estrutura industrial brasileira em detrimento dos setores de baixa e média baixa tecnologia. Houve, ainda, um aumento da escola-ridade dos trabalhadores devido à retração de empregos na faixa de escolaridade mais baixa e, por fim, que a maior presença de capital estrangeiro foi importante para o aumento da concentração da indústria.

9.4 – Metodologia9.4.1 – Base de dados

Esta pesquisa utilizou como principal fonte de dados a Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), uma

Page 265: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

265

vez que os principais índices de concentração industrial são calculados a partir de dados sobre o pessoal ocupado por área geográfica e setores de atividades. Foram levantadas a partir da RAIS/MTE as seguintes informações para os anos de 2000 e 2005: a quantidade de empregos na região, a quantidade de estabelecimentos industriais da região e a remuneração média dos trabalhadores a preços de 2005, corrigidos pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), for-mando, assim, um painel de dados que foram utilizados para construir as variáveis utilizadas no modelo econométrico. Embora os dados da RAIS estejam sujeitos a algumas restrições de representatividade (RESENDE; WYLLIE, 2005), tem sido muito frequente o seu uso em estudos regionais pela sua abrangência e qualidade, bem como pela facilidade de acesso.

Utiliza-se agregação de dois dígitos da Classificação Nacional de Atividades Econômicas 1.0 (CNAE), formada por 23 divisões que compõem a seção da in-dústria de transformação, sob a hipótese de que essa classificação responde muito bem à análise setorial. (Quadro 1).

As divisões da indústria de transformação foram agrupadas por grau de in-tensidade tecnológica segundo a classificação, com base nos gastos com P&D pelo valor adicionado ou pela produção, da Organization for Economic Coopera-tion and Development (OCDE), a saber: alta intensidade tecnológica, média alta intensidade tecnológica, média baixa intensidade tecnológica e baixa intensidade tecnológica. (Quadro 2). Essa classificação, embora elaborada para países desen-volvidos, representa uma boa aproximação da realidade brasileira.

Segundo IBGE (2000 apud FEIJÓ; CARVALHO; RODRIGUEZ, 2003, p. 24), pois

É bastante semelhante a ordenação de atividades CNAE de acordo com a taxonomia da OCDE e a ordenação das mes-mas atividades na Pesquisa de Atividade Econômica Paulista (PAEP) 1996 (Fundação SEADE), de acordo com a participa-ção das empresas inovadoras no valor agregado setorial, o que mostra que esta taxonomia é também aplicável para o Brasil.

A base geográfica de análise foram as 33 regiões metropolitanas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), existentes no ano de 2000, que permi-tem agrupar vários municípios em áreas de influência de municípios maiores, para que se possam captar as possíveis relações industriais que ultrapassam as fronteiras dos municípios. Pode-se perceber que a maior concentração de regiões metropolita-nas ocorre nas regiões Sul e Sudeste, com 25 das 33 regiões metropolitanas.

Page 266: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

266

CÓDIGO DESCRIÇÃO

15 Fabricação de produtos alimentícios e bebidas

16 Fabricação de produtos do fumo

17 Fabricação de produtos têxteis

18 Confecção de artigos do vestuário e acessórios

19 Preparação de couros e fabricação de artefatos de couro, artigos de viagem e calçados

20 Fabricação de produtos de madeira

21 Fabricação de celulose, papel e produtos de papel

22 Edição, impressão e reprodução de gravações

23 Fabricação de coque, refino de petróleo, elaboração de combustíveis nucleares e produção de álcool

24 Fabricação de produtos químicos

25 Fabricação de artigos de borracha e plástico

26 Fabricação de produtos de minerais não metálicos

27 Metalurgia básica

28 Fabricação de produtos de metal - exclusive máquina e equipamentos

29 Fabricação de máquinas e equipamentos

30 Fabricação de máquinas para escritório e equipamentos de informática

31 Fabricação de máquinas, aparelhos e materiais elétricos

32 Fabricação de material eletrônico e de aparelhos e equipamentos de comunicação

33 Fabr. de equip. de instrum. para usos médico-hospitalares, instrumentos de precisão e ópticos, ...

34 Fabricação e montagem de veículos automotores, reboques e carrocerias

35 Fabricação de outros equipamentos de transporte

36 Fabricação de móveis e indústrias diversas

37 Reciclagem

Quadro 1 - Divisões da indústria de transformaçãoFonte: IBGE/CONCLA (2008)

Classificação de intensidade tecnológica da OCDE Divisão CNAE

Baixa tecnologia 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 36, 37

Média baixa tecnologia 23, 25, 26, 27, 28

Média alta tecnologia 24, 29, 31, 33, 34, 35

Alta tecnologia 30, 32

Quadro 2 – Classificação dos Setores de Atividades de acordo com o Uso de Tecnologia

Fonte: Adaptado por Feijó; Caravalho e Rodriguez (2003).

Page 267: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

267

9.5 – Modelo Econométrico de WheelerEm um estudo para a economia Americana, Wheeler (2006) desenvolveu

uma proposta de análise da produtividade industrial baseada na presença de eco-nomias de escalas em regiões onde havia um alto emprego industrial. Nesse tra-balho ele propôs que a produtividade está mais correlacionada com a presença de economias de escala do que com o número de estabelecimentos industriais presentes na região. Para chegar a tal conclusão ele dividiu sua análise em dois momentos: o primeiro foi estudar a relação existente entre o emprego industrial local e a presença de economias de escala; e o segundo foi estudar a relação entre a presença de economias de escala e a produtividade.

Em primeiro lugar, ele construiu dois índices que medem o tamanho médio dos estabelecimentos industriais em cada região do País. O primeiro deles foi uma média simples do número de trabalhadores por estabelecimentos em cada indús-tria i de cada região c, que pode ser obtido pela seguinte expressão:

Onde: Emp (i,c) = número de empregos da indústria i na cidade c

Est (i,c) = número de estabelecimentos da indústria i na cidade c

Tendo em vista que uma média simples de trabalhadores por estabeleci-mentos pode distorcer a média real de trabalhadores por planta, Wheeler (2006) utilizou uma média ponderada pela participação de cada faixa de emprego no emprego total da indústria i na cidade c, para, desta forma, captar o efeito da concentração de empregos em determinadas plantas. Pode-se calcular esse índice pela seguinte expressão:

Onde: ESWA (i,c) = tamanho médio ponderado do estabelecimento

Page 268: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

268

Emp (k,i,c) = número de empregos da indústria i na cidade c, na classe de tamanho k.

Est (k,i,c) = número de estabelecimentos da indústria i na cidade c, na classe de tamanho k

Emp (i,c) = número de empregos da indústria i na cidade c.

Estes dois índices foram utilizados para estimar duas regressões diferentes que forneceram a relação entre a economia de escala, medida pela proxy tamanho médio do estabelecimento, e o emprego industrial local. O modelo estimado foi o seguinte:

Onde: Empict= emprego total da indústria i, da cidade c no ano t

Zct = vetor de variáveis que podem influenciar o tamanho da planta

αi, δt, μc = efeitos fixos da indústria, do tempo e da cidade sobre o tamanho médio das plantas

ϵict = erro.

Pelo formato dessa equação pode-se perceber que o coeficiente β representa a elasticidade da economia de escala com relação ao emprego industrial. Outra observação importante acerca desse modelo é a composição do vetor de variáveis zct, que tem o objetivo de capturar o efeito do custo da urbanização através das variáveis, em logaritmos, população, densidade populacional e renda per capita; a característica da força de trabalho local através das variáveis percentual da popu-lação com ensino superior, percentual da população com menos de dezoito anos e com mais de 64 anos; e o efeito dos ciclos econômicos locais através da taxa de desemprego. Desta forma, Wheeler (2006) esperava que esse vetor de variáveis capturasse os efeitos que, de alguma forma, pudessem influenciar o tamanho da planta.

Os resultados encontrados por Wheeler (2006) foram que o emprego indus-trial local influencia de forma positiva a presença de economias de escala e que o impacto é maior quando considerado o índice ponderado e, ainda, que esse vetor de variáveis não é significante para explicar o tamanho médio da planta industrial

Page 269: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

269

de uma região.

O passo seguinte de Wheeler (2006) foi estimar um modelo que lhe possi-bilitasse estudar o impacto da presença de economias de escalas sobre a produti-vidade, que foi medida pela proxy salário médio. A expressão (4) mostra a forma desse modelo.

Onde: w j ict = salário médio do trabalhador j da indústria i da cidade c no

ano t

x iict = vetor de variáveis que influenciam os salários

Emp (ict) = emprego total da indústria i na cidade c no ano t

Zct= vetor de variáveis que podem influenciar o tamanho da planta

αi,δt,μc= efeitos fixos da indústria, do tempo e da cidade sobre o salário médio dos trabalhadores

ϵjict =termo do erro.

A interpretação da segunda equação é semelhante à primeira, ou seja, o coefi-ciente θ mede a elasticidade da produtividade através dos salários com relação ao em-prego industrial local. No segundo modelo a variável que merece alguns comentários é o vetor de variáveis, que é um vetor de variáveis que influenciam os salários e é com-posto pelas seguintes variáveis: anos de educação completos, uma variável qualitativa de ensino médio completo, uma variável qualitativa de ensino superior completo, anos de educação interagindo com cada variável qualitativa, além de experiência, e outras variáveis qualitativas como raça, sexo, estado civil e um indicador de ocupações.

Porém, para conseguir a relação que Wheeler (2006) se propôs a analisar, isto é, a relação entre economia de escala e produtividade, foi necessária a decom-posição do efeito da variável emprego industrial local, mostrando os efeitos da economia de escala e do número de estabelecimentos sobre a produtividade. Ele realizou essa decomposição de acordo com a expressão (5).

Page 270: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

270

Substituindo a expressão (5) na expressão (4) o modelo terá a forma dada na expressão (6), então, tem-se que:

Uma ressalva importante feita por Wheeler (2006) sobre essa análise é o fato de o nível de salário influenciar as decisões dos trabalhadores e dos produtores. Dessa forma, é possível que os coeficientes estimados do número de emprego, do tamanho médio da planta e do número de plantas sejam viesados. Porém, ele considerou que os vieses são similares, o que proporcionou a realização de algu-mas inferências sobre a magnitude desses coeficientes.

A principal conclusão de Wheeler (2006) nessa análise é que os seus resul-tados mostram que uma variação no número de estabelecimentos, condicionado a um dado tamanho médio de estabelecimento, não é um fator importante para explicar a relação entre localização e salários, sugerindo que o impacto do efeito economia de escala é maior do que o efeito número de estabelecimentos sobre a produtividade. Dessa forma, ele encontrou que θ1> θ2.

9.6 – Especificação do Modelo para Estimação

Espera-se que as regiões mais especializadas tenham uma produtividade maior do que as regiões não especializadas. Dessa forma, espera-se que haja uma relação positiva entre a especialização industrial e a produtividade industrial de uma região. Seguindo essa lógica e os trabalhos de Holmes e Stevens (2002); Barrios; Bertinelli e Strobl (2003) e Soares; Santos e Freitas (2008), que identifica-ram as economias de escala, e não o número de estabelecimentos como fonte de especialização das regiões que eles estavam estudando, espera-se que o efeito das economias de escala tenha um impacto maior do que o impacto do número de estabelecimentos sobre a produtividade de uma região.

Sendo assim, o fundamento metodológico desta pesquisa segue a proposta de análise desenvolvida por Wheeler (2006), para o estudo da relação entre a concentra-ção industrial e a produtividade industrial. Como proxy da produtividade industrial foi utilizado o salário médio pago pelas indústrias, e o modelo foi reespecificado de forma que ele pudesse captar os efeitos do uso da tecnologia sobre a produtividade das plantas industriais. Dessa forma, os setores da indústria de transformação fo-

Page 271: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

271

ram agregados de acordo com o grau de intensidade tecnológica e foram incluídas variáveis dummies para cada classificação do grau de intensidade tecnológica. Sendo assim, o modelo a ser estimado assume a seguinte especificação:

Onde: SM= salário médio

Ii= dummy intensidade tecnológica, assumindo o valor um para toda indús-tria pertencente à classificação i e zero nos demais casos;

Ll= dummy região, onde cada região metropolitana l de certa região assume o valor um e zero nos demais casos;

Tt=dummy temporal, assumindo valor um para 2005 e zero para 2000.

Esse modelo foi especificado para captar os efeitos das diferenças regionais, do efeito do uso da tecnologia e das políticas econômicas sobre a produtividade industrial. Nessa etapa também foram estimadas regressões para cada divisão da CNAE e para cada classificação do grau de intensidade tecnológica.

Nesse modelo espera-se que ß1>ß2, indicando que a produtividade está mais ligada à presença de economias de escala do que ao número de estabelecimentos na região. Espera-se, ainda, que os salários mais altos sejam pagos nas indústrias de alta tecnologia e instaladas nas regiões Sul e Sudeste. Dessa forma, espera-se que as variáveis dummies nesse tipo de indústria e nessas regiões apresentem valores positivos e superiores aos apresentados nas regiões menos industrializadas e nos outros tipos de indústria.

Esse modelo também foi estimado em nível setorial, de acordo com a clas-sificação da CNAE 1.0, para que se pudesse realizar uma comparação entre os efeitos das economias de escala e do número de estabelecimentos sobre a produ-tividade nessas duas formas de agregação da indústria de transformação.

Quanto à estimação, o modelo utilizou dados em painel tridimensional e sob as premissas do modelo clássico de regressão linear, os Mínimos Quadrados Ordinários (MQO).

Page 272: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

272

9.7 – Análise dos ResultadosOs resultados da estimação do modelo dado pela equação (7), que mede o impacto

das economias de escala e do efeito número de estabelecimentos sobre os salários, que é utilizado como uma proxy para medir a produtividade, estão apresentados na Tabela 1, para todas as divisões da CNAE, considerando-se as quatro especificações: a primeira coluna mostra o modelo puro, sem a incorporação dos efeitos regionais e temporais; a segunda incorpora o efeito temporal; a terceira incorpora o efeito regional; e a última mostra o modelo completo, incorporando os efeitos regionais e temporais.

Tabela 1 - Estimação da Regressão da Especialização em Função das Economias de Escala, por Setores da CNAE

IndústriaSem Efeito Efeito Temporal Efeito Regional Efeitos Combinados

β¹ β² β¹ β² β¹ β² β¹ β²

divisão 15 0.001777 0.157156* 0.002319 0.156852* 0.038908 0.152871* 0.041079 0.151815*

divisão 16 0.066788 0.061500 0.071134 0.059521 0.041610 0.120062 0.046437 0.116683

divisão 17 0.042214 0.119500* 0.043381 0.117520* 0.049907 0.111503* 0.051598 0.109026*

divisão 18 0.052765 0.064564* 0.053011 0.063277* 0.050643* 0.071403* 0.051030* 0.069940*

divisão 19 0.030121 0.037493 0.028065 0.038968 0.050437* 0.021640 0.047708* 0.023626

divisão 20 0.043955 0.112791* 0.040545 0.114599* 0.019337 0.108808* 0.014988 0.110824*

divisão 21 0.269863* 0.053271 0.271396* 0.055433 0.286027* 0.037055 0.287704* 0.039209

divisão 22 0.123211* 0.116666* 0.116681* 0.123488* 0.141211* 0.096474* 0.133638* 0.104271*

divisão 23 0.286717* 0.286463* 0.290294* 0.286201* 0.270688* 0.253000 0.269793* 0.252942

divisão 24 0.135464* 0.165774* 0.135926* 0.162609* 0.158730* 0.159823* 0.158577* 0.156358*

divisão 25 0.188799* 0.072619* 0.188437* 0.072222* 0.163392* 0.072975* 0.162929* 0.072430*

divisão 26 0.124798* 0.126234* 0.124420* 0.125213* 0.107795* 0.119560* 0.107437* 0.118342*

divisão 27 0.223998* 0.007786 0.223916* 0.006940 0.212608* 0.010000 0.212447* 0.009121

divisão 28 0.063707* 0.113141* 0.066115* 0.109104* 0.068556* 0.110688* 0.071090* 0.106220*

divisão 29 0.091373* 0.094519* 0.092145* 0.094761* 0.101679* 0.084821* 0.102567* 0.085075*

divisão 30 0.086367 0.155843 0.099754 0.143495 0.072734 0.165321 0.086178 0.153064

divisão 31 0.125265* 0.117650* 0.125297* 0.118084* 0.109943* 0.133148* 0.109964* 0.133653*

divisão 32 0.148665* 0.148300* 0.146490* 0.150039* 0.155667* 0.127267* 0.153477* 0.128999*

divisão 33 0.118766* 0.045700 0.121438* 0.044486 0.087899* 0.073729 0.090179* 0.072720

divisão 34 0.181226* 0.094424* 0.181722* 0.093824* 0.171413* 0.099796* 0.172111* 0.098746*

divisão 35 0.056500 0.213001* 0.049439 0.217763* 0.050353 0.229536* 0.042545 0.234195*

divisão 36 0.068614* 0.082237* 0.065923* 0.082633* 0.086831* 0.073409* 0.084052* 0.073992*

divisão 37 0.190785* 0.054879 0.190700* 0.056599 0.186312* 0.018729 0.185885* 0.015968

Fonte: Elaboração Própria dos Autores.Nota: * significante a 5%.

Page 273: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

273

Como mostra a Tabela 1, as estimativas de β1 apresentam o sinal positivo espera-do e são estatisticamente significantes ao nível de confiança de 5% para a maioria das indústrias, com exceção das indústrias representadas pelas seguintes divisões: Divisão 15 (fabricação de produtos alimentícios e bebidas), Divisão 16 (fabricação de produtos do fumo), Divisão 17 (fabricação de produtos têxteis), Divisão 20 (fabricação de pro-dutos de madeira), Divisão 30 (fabricação de máquinas para escritório e equipamentos de informática) e Divisão 35 (fabricação de outros equipamentos de transporte). Com relação às estimativas de β2 , em 14 das 23 divisões da indústria de transformação ana-lisadas neste trabalho, elas apresentaram estimativas menores do que as estimativas de β1, confirmando a hipótese de que a produtividade e, consequentemente os salários, estão mais associados ao efeito escala do que ao efeito número de estabelecimentos.

A inclusão da variável dummy para captar o efeito temporal não altera de forma significativa as estimativas de β1 e β2, indicando que as políticas econômicas do perí-odo não influenciaram a intensidade da relação entre a produtividade e as economias de escala e o número de estabelecimentos. Enfatiza-se, aqui, que o período de análise é demasiado curto para que ocorressem mudanças estruturais na economia.

Com a incorporação dos efeitos regionais as estimativas de β1 e β2 tiveram alte-rações significativas, com o aumento em algumas indústrias e a diminuição em outras, o que mostra que as diferenças entre as regiões influenciam a intensidade da relação entre a produtividade e as economias de escala e o número de estabelecimentos.

A última coluna da Tabela 1, que mostra os efeitos combinados das diferenças regionais e temporais, praticamente não difere da coluna anterior, o que já era espera-do, devido ao efeito praticamente nulo do efeito temporal sobre a relação em estudo.

Por fim, há dois fatos interessantes a serem destacados após a análise das tabelas. O primeiro é que existem indústrias onde as estimativas de β2 são maiores do que as estimativas de β1, indicando que nessas indústrias o impacto do efeito número de estabelecimentos é maior do que o impacto do efeito escala sobre a produtividade. As indústrias onde isso ocorre são representadas pelas seguintes divisões: Divisão 15 (fabricação de produtos alimentícios e bebidas), Divisão 17 (fabricação de produtos têxteis), Divisão 18 (Confecção de artigos do vestuá-rio e acessórios), Divisão 20 (fabricação de produtos de madeira), Divisão 26 (Fabricação de produtos de minerais não metálicos), Divisão 28 (Fabricação de produtos de metal - exclusive máquina e equipamentos) e Divisão 35 (fabricação de outros equipamentos de transporte). O segundo, em duas indústrias a Divisão 16 (fabricação de produtos do fumo) e a Divisão 30 (fabricação de máquinas para escritório e equipamentos de informática), as estimativas de β1 e β2 são

Page 274: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

274

simultaneamente não significantes ao nível de confiança de 5%, indicando que a produtividade nessas indústrias não pode ser explicada pelas economias de escalas nem pelo número de estabelecimentos.

Para captar o efeito das características industriais o modelo foi estimado para toda a indústria de transformação, com os resultados sendo apresentados na Tabela 2.

A incorporação do efeito industrial altera significativamente tanto as esti-mativas de β1 quanto as estimativas de β2. Com relação às estimativas de β1, a inclusão da variável dummy responsável pela captação do efeito industrial atenua o impacto das economias de escala sobre a produtividade industrial, com as esti-mativas de β1 passando de 0,19 para 0,13.

Fato mais interessante ocorre com as estimativas de β2. Analisando a Tabela 2, pode-se perceber que sem a inclusão das características industriais o impacto do número de estabelecimentos sobre a produtividade é negativo, ou seja, o aumento do número de estabelecimento diminui a produtividade da indústria. Porém, com a in-clusão das características industriais, o impacto do número de estabelecimentos sobre a produtividade torna-se positivo, e as estimativas de β2 passam de -0,06 para 0,08. Além disso, a incorporação do efeito industrial melhora o ajustamento da regressão, medido pelo R2 ajustado, que passa de 0,26 para 0,58. Dessa forma, conclui-se que as diferenças industriais são uma importante fonte explicativa para se entender a relação entre a produtividade e as economias de escala e o número de estabelecimentos.

Page 275: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

275

Tabe

la 2

- R

egre

ssão

dos

Sal

ário

s em

Fun

ção

das

Eco

nom

ias

de E

scal

a pa

ra T

oda

a In

dúst

ria d

e Tr

ansf

orm

ação

Div

idid

a (C

NA

E).

Variá

veis

de

pend

ente

sRe

gres

são

1Re

gres

são

2Re

gres

são

3Re

gres

são

4Re

gres

são

5Re

gres

são

6Re

gres

são

7Re

gres

são

8

Eon

omia

s de

esc

ala

0.19

6972

(0

.011

039)

(0

.000

0)

0.19

5906

(0

.010

830)

(0

.000

0)

0.19

6437

(0

.010

970)

(0

.000

0)

0.13

4811

(0

.011

192)

(0

.000

0)

0.19

5311

(0

.010

759)

(0

.000

0)

0.13

4351

(0

.011

238)

(0

.000

0)

0.13

4534

(0

.011

147)

(0

.000

0)

0.13

4053

(0

.011

186)

(0

.000

0)

Est

abel

ecim

ento

s-0

.061

128

(0.0

0982

4)

(0.0

000)

-0.0

6987

0 (0

.009

857)

(0

.000

0)

-0.0

6120

6 (0

.009

828)

(0

.000

0)

0.08

3921

(0

.009

835)

(0

.000

0)

-0.0

6997

1 (0

.009

855)

(0

.000

0)

0.07

8066

(0

.010

348)

(0

.000

0)

0.08

3769

(0

.009

858)

(0

.000

0)

0.07

7869

(0

.010

374)

(0

.000

1)

Dum

mie

s pa

ra a

regi

ãoN

ãoSi

mN

ãoN

ãoSi

mSi

mN

ãoSi

m

Dum

mie

s pa

ra o

tem

poN

ãoN

ãoSi

mN

ãoSi

mN

ãoSi

mSi

m

Dum

mie

s pa

ra a

indú

stria

Não

Não

Não

Sim

Não

Sim

Sim

Sim

R² a

just

ado

0.26

3460

0.29

0942

0.26

3520

0.58

5571

0.29

4685

0.60

5439

0.58

5425

0.60

5328

Font

e: E

labo

raçã

o Pr

ópria

dos

Aut

ores

.

Page 276: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

276

A Tabela 3 mostra os resultados da estimação do modelo da relação entre a produtividade e as economias de escala para cada categoria de intensidade tecnológica.Ta

bela

3 -

Est

imaç

ão d

a R

egre

ssão

da

Esp

ecia

lizaç

ão e

m F

unçã

o da

s E

cono

mia

s de

Esc

ala,

por

C

ateg

oria

de

Inte

nsid

ade

Tecn

ológ

ica

Indú

stria

Sem

efe

itoE

feito

tem

pora

lE

feito

regi

onal

Efe

itos C

ombi

nado

s

β¹β²

β¹β²

β¹β²

β¹β²

alta

tecn

olog

ia0.

0298

030.

1779

54*

0.07

3481

*0.

1245

81*

0.02

4615

0.18

4573

*0.

0647

34*

0.13

4022

*

méd

ia a

lta te

cnol

ogia

0.13

1866

*0.

1052

32*

0.13

1393

*0.

1050

35*

0.12

6300

*0.

1035

59*

0.12

5760

*0.

1033

13*

méd

ia b

aixa

tecn

olog

ia0.

2523

96*

0.07

8068

*0.

2534

84*

0.07

5604

*0.

2319

24*

0.08

1928

*0.

2330

04*

0.07

9373

*

baix

a te

cnol

ogia

0.06

4071

0.04

0208

0.06

2733

0.03

9690

0.10

9089

0.02

3158

0.10

7600

0.02

2688

Font

e: E

labo

raçã

o Pr

ópria

dos

Aut

ores

.N

ota:

* si

gnifi

cant

e a

5%.

Page 277: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

277

Os resultados da Tabela 3 mostram que as estimativas de β1 têm o sinal es-perado e são significantes para quase todas as categorias ao nível de confiança de 5%, exceto na categoria baixa tecnologia, onde as estimativas se mostraram não significantes do ponto de vista estatístico, ao mesmo nível de significância de 5%. Com relação às estimativas de β2, todas elas se apresentaram menores do que as estimativas de β1, confirmando o resultado esperado, com exceção da indústria de alta tecnologia, onde as estimativas de β1 foram superiores às estimativas de β2, indicando que nesse tipo de indústria o efeito número de estabelecimentos se mostrou mais relevante sobre a produtividade do que o efeito escala.

A inserção da variável dummy para captar o efeito temporal, com exceção da indústria de alta tecnologia, onde ela acentua o efeito escala e atenua o efeito do número de estabelecimentos sobre a produtividade, mais uma vez não afeta significativamente as estimativas de β1 e β2, como mostrado na segunda coluna da Tabela 3.

Com a inclusão dos efeitos regionais, conforme mostra a terceira coluna da Tabela 3, as estimativas de β1 diminuem em todas as indústrias, com exceção da indústria de baixa tecnologia, onde a estimativa deste coeficiente aumenta, contu-do permanecendo não significante ao nível de confiança de 5%. Já as estimativas de β2 aumentam nas indústrias de alta e média baixa tecnologia, e diminuem ligeiramente nas indústrias de média alta e baixa tecnologia, embora nesta última permaneçam não significantes ao nível de confiança de 5%. Desta forma, conclui-se que o efeito regional irá acentuar a relação entre as economias de escala e a produtividade, bem como a relação entre número de estabelecimentos e a produ-tividade nas indústrias de alta e média baixa tecnologia, além de atenuar também nas indústrias de média alta e baixa tecnologia.

A última coluna da Tabela 3 apresenta o resultado para o modelo com os efeitos regional e temporal. Tendo como referência o modelo sem efeitos, a inclu-são dos dois efeitos atenua a relação entre as economias de escala e a produtivi-dade nas indústrias de média alta e média baixa tecnologia, enquanto atenua nas indústrias de alta e baixa tecnologia, embora esta última continue não significante ao nível de confiança de 5%. Já o efeito número de estabelecimentos é atenuado em quase todas as indústrias, com exceção da indústria de média baixa tecnologia, onde a estimativa do coeficiente apresenta uma leve alta.

Por fim, a Tabela 4 apresenta os resultados da estimação do modelo com a incorporação do efeito industrial. Como se pode ver, a incorporação do efeito industrial atenua o efeito das economias de escala sobre a produtividade, com as estimativas de β1 passando de 0,12 para 0,08, enquanto o efeito do número de es-

Page 278: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

278

tabelecimentos sobre a produtividade é acentuado, inclusive passando de negativo para positivo, com as estimativas de β2 passando de -0,006 para 0,107.

Além disso, a incorporação do efeito industrial melhora o ajustamento da regressão, medido pelo R2 ajustado, que passa de 0,19 para 0,43. Dessa forma, conclui-se, tal qual para o modelo estimado para as divisões da CNAE, que as diferenças industriais são uma importante fonte explicativa para se entender a relação entre a produtividade e as economias de escala.

Page 279: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

279

Tabe

la 4

- E

stim

ação

da

Reg

ress

ão d

os S

alár

ios

em F

unçã

o da

s E

cono

mia

s de

Esc

ala

para

Tod

a a

Indú

stria

de

Tran

sfor

maç

ão D

ivid

ida

por G

rau

de I

nten

sida

de T

ecno

lógi

caVa

riáve

is

depe

nden

tes

Regr

essã

o 1

Regr

essã

o 2

Regr

essã

o 3

Regr

essã

o 4

Regr

essã

o 5

Regr

essã

o 6

Regr

essã

o 7

Regr

essã

o 8

Eon

omia

s de

esc

ala

0.12

2038

(0

.016

395)

(0

.000

0)

0.11

1271

(0

.016

348)

(0

.000

0)

0.12

6718

(0

.016

221)

(0

.000

0)

0.08

6543

(0

.018

323)

(0

.000

0)

0.11

5350

(0

.016

203)

(0

.000

0)

0.07

8374

(0

.017

423)

(0

.000

0)

0.09

0871

(0

.018

096)

(0

.000

0)

0.08

2152

(0

.017

155)

(0

.000

0)

Est

abel

ecim

ento

s-0

.006

830

(0

.013

485)

(0

.613

0)

-0.0

1013

0

(0.0

1326

7)

(0.4

459)

-0.0

0772

1

(0.0

1346

6)

(0.0

5669

)

0.10

7448

(0

.020

534)

(0

.000

0)

-0.0

1086

2

(0.0

1326

9)

(0.4

138)

0.10

2644

(0

.021

296)

(0

.000

0)

0.10

5945

(0

.020

383)

(0

.000

0)

0.10

1414

(0

.021

329)

(0

.000

0)

Dum

mie

s pa

ra a

regi

ãoN

ãoSi

mN

ãoN

ãoSi

mSi

mN

ãoSi

m

Dum

mie

s pa

ra o

tem

poN

ãoN

ãoSi

mN

ãoSi

mN

ãoSi

mSi

m

Dum

mie

s pa

ra a

indú

stria

Não

Não

Não

Sim

Não

Sim

Sim

Sim

R² a

just

ado

0.19

2688

0.25

3802

0.19

4650

0.43

1054

0.25

4568

0.48

0638

0.43

2614

0.48

1383

Font

e: E

labo

raçã

o Pr

ópria

dos

Aut

ores

.N

ota:

Des

vio

padr

ão e

p-v

alor

ent

re p

arên

tese

s.

Page 280: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

280

9.8 – Considerações FinaisEste trabalho procurou oferecer uma nova alternativa metodológica para

interpretar e analisar os impactos dos efeitos da concentração industrial so-bre a produtividade. O aspecto relevante desta construção metodológica é oferecer instrumentos analíticos que ampliam os fatores que influenciam a produtividade das plantas industriais e, consequentemente, das regiões onde elas estão inseridas.

A análise da relação entre produtividade e economias de escala e número de estabelecimentos mostrou, como esperado, que o impacto das economias de escala sobre a produtividade é maior do que o impacto do número de esta-belecimentos sobre a produtividade, revelando que a produtividade está mais relacionada às economias de escala do que ao número de estabelecimentos.

A inclusão dos efeitos temporais, devido à estabilidade do período, não afetou de forma significativa a relação entre a produtividade e as economias de escala e o número de estabelecimentos. Por outro lado, a inclusão das diferenças regionais, a depender da indústria, pode acentuar ou atenuar os efeitos das economias de escala e do número de estabelecimentos sobre a produtividade. Com a inclusão das características industriais, o impacto das economias de escalas sobre a produtividade é atenuado, enquanto o impacto do efeito número de estabelecimentos é acentuado, mudando, inclusive, de direção, passando de negativo para positivo, mostrando que as características industriais são importantes fontes de explicação da produtividade industrial.

Quando foram incluídas as diferenças de intensidade tecnológica houve mudanças significativas no impacto dos efeitos economias de escala e número de estabelecimentos sobre a produtividade. A inclusão dessas diferenças ate-nuou o impacto das economias de escala e acentuou o impacto do número de estabelecimentos sobre a produtividade, tornando o efeito do primeiro menor e o do segundo maior do que na desagregação setorial.

Uma limitação do modelo é a não incorporação de variáveis econômicas, sociais e de infraestrutura que possam explicar a presença de economias de es-cala e a produtividade de uma região. Recomenda-se avançar com a aplicação desta metodologia com a inclusão dessas variáveis para caracterizar as regiões metropolitanas de modo a se detectar os fatores que explicam a existência de economias de escala e os padrões de produtividade de uma região.

Page 281: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

281

Recomenda-se, ainda, a aplicação desta metodologia em nível microrregional para cada indústria e região, cujos resultados podem orientar uma política econômi-ca regional de longo prazo com o objetivo de redução das desigualdades regionais.

Referências

AMARAL FILHO, J. do. Globalização, transformações estruturais, desenvolvi-mento local e regional, um olhar sobre o nordeste brasileiro. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL TRAJETÓRIAS DE DESENVOLVIMENTO LOCAL E REGIONAL: UMA COMPARAÇÃO ENTRE AS REGIÕES DO NOR-DESTE BRASILEIRO E A BAIXA CALIFÓRNIA, MÉXICO, 2008, Fortaleza. Anais... Fortaleza: UFC, 2008. CD-ROM.

AMARAL FILHO, J. do; SCIPIÃO, T. T.; SOUZA, D. L. R. de. Identificação e mapeamento das aglomerações produtivas especializadas no Ceará: pis-tas para identificação de Arranjos Produtivos Locais (APLs). Fortaleza: IPECE, 2004. (Texto para discussão, n. 14).

AQUINO, A. L.; BRESCIANI, L. P. Arranjos produtivos locais: uma abordagem conceitual. Organizações em Contexto, ano 1, n. 2, p. 153-167, dez. 2005.

ARAÚJO JUNIOR, I. T. de; SILVEIRA NETO, R. M. Concentração geográfica de capital humano, ganhos de produtividade e disparidades regionais de renda: evidências para o Brasil metropolitano. Revista Econômica do Nordeste, For-taleza, v. 35, n. 3, p. 297-314, jul./set. 2004.

AZZONI, C. R. Indústria e reversão da popularização no Brasil. São Paulo: USP, 1986. (Ensaios econômicos, 58).

BARRIOS, S.; BERTINELLI, L.; STROBL, E. Geographic concentration and establishment scale: can panel data tell us more?. Louvain: Université Catholi-que de Louvain, 2003. (Discussion Paper, n. 36).

BRASIL. Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Manu-al de apóio aos arranjos produtivos locais. Brasília, DF, 2006.

CARLINO, G. A. Increasing returns to scale in metropolitan manufacturing. Journal of Regional Science, v. 19, n.3, p. 363-372, Ago. 1979.

Page 282: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

282

CARVALHO, P. G. M.; FEIJÓ, C. A. Produtividade industrial no Brasil: o debate recente. Indicadores Econômicos FEE, v. 28, n. 3, p. 232-255, 2000.

CARVALHO, R. Q. de; BERNARDES, R. Reestruturação industrial, produtivida-de e emprego. São Paulo em Perspectiva, São Paulo, v. 10, n. 1, p. 53-62, jan./mar. 1996.

CASSIOLATO, J. E.; LASTRES, H. M. M. O foco em arranjos produtivos e inovativos locais de micro e pequenas empresas. In: LASTRES, H. M. M.; CAS-SIOLATO, J. E.; MACIEL M. L. (Org.). Pequenas empresas: cooperação e desenvolvimento local. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2003. Cap. 1.

CROCCO, M. A. et al. Metodologia de identificação de arranjos produtivos potenciais. Belo Horizonte: CEDEPLAR, 2003. (Texto para discussão, n. 212).

DINLERSOZ, E. M. Cities and the organization of manufacturing. Regional Science and Urban Economics, v. 34, n.1, p. 71-100, Jan. 2004.

FEIJÓ, C. A.; CARVALHO, P. G. M. de. Produção, emprego, salário e produtivi-dade industrial em 1992: um ano de paradoxos. Indicadores econômicos FEE: Análise Conjuntural, Porto Alegre, v. 21, n. 1, p. 62-66, maio 1993.

FEIJÓ, C. A.; CARVALHO, P. G. M. de; RODRIGUEZ, M. S. Concentração industrial e produtividade do trabalho na indústria de transformação nos anos 90: evidências empíricas. Economia, Niterói, v. 4, n. 1, p. 19-52, jan./jun. 2003.

GALVÃO, O. J. A. Clusters e distritos industriais: estudo de caso em países sele-cionados e implicações de política. Planejamento e Políticas Públicas, n. 21, p. 3-49, jun. 2000.

HENDERSON, J. V. The efficiency of resource usage and city size. Journal of Urban Economics, v. 19, n. 1, p. 47-70, Jan. 1986.

HOLMES, T. J.; STEVENS, J. J. Geographic concentration and establishment scale. The Review of Economic and Statistic, v. 84, n. 4, p. 682-690, Nov. 2002.

______. Geographic concentration and establishment size: analysis in an alterna-tive economic geography model. Journal of Economic Geographic, v. 4, n. 3, p. 227-250, Jun. 2004.

Page 283: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

283

IBGE. PIB dos municípios. Disponível em: <ftp://ftp.ibge.gov.br/Pib_Muni-cipios>. Acesso em: 16 mar. 2009.

IDSON, T. L.; OI, W. Y. Workers are more productive in large firms. American Economic Review, v. 89, n. 2, p. 104-108, May 1999.

IPEA. Identificação, caracterização e georeferenciamento de Arranjos Produtivos Locais (APLs) no Brasil. Disponível em: <http://www.ipea.gov.br/005/00502001.jsp?ttCD_CHAVE=286>. Acesso em: 15 out. 2008.

KIM, S. Expansion of markets and the geographic distribution of economic acti-vities: the trends in U.S. regional manufacturing structure, 1860-1987. The Quar-terly Journal of Economics, v. 110, n. 4, p. 881-908, Nov. 1995.

KRUGMAN, P. Increasing returns and economic geography. The Journal of Political Economy, v. 99, n. 3, p. 483-499, Jun. 1991.

LAFOURCADE, M.; MION, G. Concentration, agglomeration, and the size of plants. Regional Science and Urban Economics, v. 37, n. 1, p. 46-68, Jan. 2007.

MARÉ, D. C.; TIMMINS, J. Geographic concentration and firm productivity. Wellington, DC: Motu Economic and Public Policy Research, 2006. (Working paper, 06-08).

MIRANDA, E. P. J. de. A influência da abertura comercial, capital humano e concentração de renda na produtividade dos estados brasileiros. 2004. 54 f. Dissertação (Mestrado em Economia) - Centro de Aperfeiçoamento dos Econo-mistas do Nordeste, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2004.

RAUCH, J. E. Productivity gains from geographic concentration of human capital: evidence from the cities. Massachusetts: National Bureau of Economic Research, 1991. (Working paper, n. 3905).

RESENDE, M.; WYLLIE, R. Aglomeração industrial no Brasil: um estudo em-pírico. Estudos Econômicos, São Paulo, v. 35, n. 3, p. 433-460, jul./set. 2005.

ROSSI JÚNIOR, J. L.; FERREIRA, P. C. Evolução da produtividade industrial brasileira e abertura comercial. Pesquisa e Planejamento Econômico, Rio de Janeiro, v. 29, n. 1, p. 1-36, abr. 1999.

Page 284: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

284

SEBRAE. Subsídios para identificação de clusters no Brasil: atividades da indústria. São Paulo, 2002.

SOARES, F. A.; SANTOS, S. M.; FREITAS, E. E. Especialização industrial e economia de escala: uma análise a partir das microrregiões brasileiras. Dispo-nível em: <http://www.bnb.gov.br/content/aplicacao/eventos/forumbnb2008/gerados/anais_encontro.asp>. Acesso em: 4 dez. 2008.

WHEELER, C. H. Productivity and the geographic concentration of industry: the role of plant scale. Regional Science and Urban Economics, v. 36, n. 3, p. 313-330, May 2006.

ZISSIMOS, I.; RIBEIRO, E.; HASENCLEVER, L. Configurações produtivas lo-cais no nordeste: uma nova proposta de identificação. In: ENCONTRO REGIO-NAL DE ECONOMIA, 12., 2007, Fortaleza. Anais... Fortaleza: BNB, 2007. CD-ROM.

Page 285: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

3PARTE

AS POLÍTICAS PARA O MERCADO DE TRABALHO

Page 286: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do
Page 287: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

10CAPÍTULO

OS EFEITOS DISTRIBUTIVOS DO SALÁRIO MÍNIMO NO MERCADO DE

TRABALHO BRASILEIRO E NORDESTINO NO PERÍODO DE 2002 A 2007

Henrique Dantas Neder1

Rosana Ribeiro

10.1 – Introdução

Em pleno século XXI, a desigualdade na distribuição de renda no Brasil segue em patamares elevados. Neste capítulo o interesse principal se refere à dis-paridade existente entre os rendimentos do trabalho. Esse recorte se justifica por que, no ano de 2005, cerca de 76% da renda total das famílias brasileiras foram provenientes da renda do trabalho. (DEDECCA, 2006).

Existe enorme controvérsia sobre as políticas distributivas mais eficazes. Algumas atuam mais rapidamente sobre a dispersão dos rendimentos, como os programas de transferência de renda. Além disso, existem transformações, como aquelas que se referem às dimensões populacionais e das famílias, que contribuem para mudanças no quadro distributivo de um país. Ou seja, algumas ações têm impactos no curto prazo, enquanto os efeitos de algumas mudanças e políticas sobre a concentração dos rendimentos somente se verificam no longo prazo. Esse debate abarca, inclusive, o papel distributivo do salário mínimo.

No período recente assiste-se, no Brasil, a uma valorização do salário mí-nimo. À guisa de ilustração, quando se compara o valor real do salário mínimo no mês de abril de 2002 e de 2007, observa-se um aumento de 32%, segun-do informações da base de dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA/DATA). Alguns autores apontam a importância dessa valorização para o

1 Professores Associados do Instituto de Economia da Universidade Federal de Uberlândia.

Page 288: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

288

decréscimo nos indicadores de desigualdade do País no período recente (SALM, 2006; DEDECCA, 2006), enquanto outros, como Barros (2006), advogam que o Programa Bolsa Família seria um instrumento mais efetivo para promover uma melhora distributiva, sobretudo no que se refere à cauda inferior da distribuição de renda. Cabe observar que muitas vezes essas divergências em relação à im-portância das políticas, transformações e instrumentos distributivos se devem à confusão existente acerca da temporalidade que envolve cada um deles.

O objetivo deste capítulo é investigar a contribuição do salário mínimo para o processo de desconcentração dos rendimentos do trabalho no intervalo de 2002 a 2007, para os trabalhadores brasileiros em seu conjunto e os nordestinos. A amostra estudada contempla todos os trabalhadores que recebem renda com va-lor positivo e com idade maior do que 15 anos e menor do que 71 anos. Além dis-so, o estudo se concentrou nas pessoas que trabalham semanalmente 20 horas ou mais. Os microdados utilizados são oriundos da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (PNAD/IBGE).

Utilizou-se a metodologia de simulação contrafactual proposta em DiNardo; Fortin e Lemieux (1996), com algumas adaptações. As variáveis causais conside-radas neste estudo foram o salário mínimo, o grau de formalidade e os atributos pessoais. Os resultados das simulações para trabalhadores dos gêneros feminino e masculino brasileiros e nordestinos apontaram que o salário mínimo teve impacto desconcentrador em ambos os casos, contudo o impacto na amostra referente às mulheres é mais acentuado, sobretudo para as nordestinas.

O capítulo está organizado em seis seções, além desta introdução. A seção inicial traz algumas considerações teóricas acerca do impacto do salário mínimo no quadro distributivo, enquanto a segunda seção corresponde a uma breve sín-tese da literatura nacional sobre os efeitos do salário mínimo após o Plano Real. A terceira seção apresenta a metodologia utilizada, sendo dividida em três subse-ções que tratam, em particular, dos impactos do grau de formalidade e atributos pessoais, do salário mínimo e da estimação das funções de densidade Kernel. A seção seguinte compreende a interpretação e discussão dos resultados encontra-dos a partir da aplicação da metodologia de simulação contrafactual e divide-se em duas subseções que compreendem a decomposição dos índices de desigualda-de calculados a partir das funções de densidade hipotéticas tanto para ocupados brasileiros e nordestinos quanto para assalariados brasileiros e nordestinos. Por fim, as notas conclusivas.

Page 289: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

289

10.2 – Ponderações Teóricas

Os efeitos do salário mínimo são amplamente debatidos na literatura inter-nacional e nacional, sobretudo seus impactos sobre o nível de emprego. Neste capítulo opta-se por discutir os impactos do salário mínimo a partir de duas abor-dagens: o modelo neoclássico padrão e a abordagem keynesiana.

No modelo de concorrência perfeita2, firmas e trabalhadores defrontam-se no mercado, de forma que aquelas buscam maximizar lucros e estes tentam otimizar sua utilidade. A construção da curva de demanda de trabalho das empresas obedece, por-tanto, ao princípio de maximização dos lucros. Pelo pressuposto da lei dos rendimentos decrescentes, o produto marginal do trabalho se reduz com o aumento do número de empregados, e isso dá um formato negativamente inclinado a essa curva. O somatório dessas demandas individuais corresponde à curva de demanda agregada por trabalho, que prevê, para cada salário real de mercado, a quantidade ótima de contratações.

No âmbito da oferta de trabalho3, os trabalhadores maximizam suas funções-uti-lidade, compostas de bens ou serviços – renda proveniente do trabalho – e de lazer, no ponto em que a utilidade derivada do salário real é igual à desutilidade do trabalho. Deste modo, o trabalhador decide a oferta de trabalho que maximiza sua função-utilidade es-tabelecendo uma quantidade ótima de trabalho para cada salário real. O somatório das ofertas individuais de trabalho fornece uma curva de oferta agregada, que pressupõe uma inclinação positiva4.

No ponto em que as curvas de oferta e de demanda se interceptam, são determinados o salário real e o nível de emprego; este ponto de equilíbrio se caracteriza pela eficiência produtiva, pois o salário real é igual à produtividade marginal do trabalho, que, por sua vez, iguala-se à taxa marginal de substituição entre consumo e lazer. Nesse modelo a força de trabalho é tratada como um bem qualquer, além de ser considerada homogênea: admite-se a perfeita substituição entre os trabalhadores. No ponto de equilíbrio não existe, então, desemprego.

2 As hipóteses sobre o comportamento das empresas são de que estas maximizam lucros; os salários e os preços são dados, e a tecnologia permanece inalterada.

3 As hipóteses em relação à oferta de trabalho são as seguintes: os trabalhadores têm funções de uti-lidade estáveis, o trabalho gera desutilidade, os bens e o lazer geram utilidades, salários e preços são dados, e os trabalhadores maximizam suas utilidades.

4 A inclinação dessa curva depende inteiramente dos efeitos substituição e renda, sobre os quais nada se pode afirmar a priori.

Page 290: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

290

Se os policy-markers considerarem o salário estabelecido pela interação da oferta e da demanda de trabalho como inaceitável por não assegurar as condições mínimas de bem-estar material, podem optar pela fixação de um salário mínimo nominal. Para os teóricos do modelo de concorrência perfeita esse salário pro-moveria uma elevação inclusive no salário real, desde que se considere o nível de preços dado. A fixação desse salário resultaria numa remuneração acima da pro-dutividade marginal do trabalho para diversos trabalhadores, em especial aqueles pouco qualificados. Esse grupo seria mais fortemente atingido pela desproporção entre remuneração e produtividade, na medida em que esses trabalhadores têm os menores índices de produtividade. O desdobramento final da introdução do salário mínimo seria o desemprego dos trabalhadores pouco qualificados. Nou-tras palavras, os impactos negativos recairiam sobre os trabalhadores que se quer proteger. Assim, a adoção do salário mínimo teria um efeito positivo por meio da elevação do piso salarial, mas também um efeito negativo por via do desemprego. Posto isso, os estudiosos que se apoiam nos modelos convencionais apontam para a neutralização dos efeitos distributivos do salário mínimo.

Cabe ressaltar que nessa abordagem os impactos do salário mínimo depen-dem da elasticidade emprego-salário da curva de demanda de trabalho. Quanto mais elástica essa curva, maior será a redução no número de empregos.

Numa perspectiva distinta encontra-se a abordagem keynesiana, que se limi-ta a investigar os impactos em termos de variações dos salários nominais. Keynes (1983) não tem uma teoria dos determinantes do salário nominal, entretanto, no capítulo 19 de sua obra “Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda”, há uma reflexão sobre os impactos das variações do salário nominal sobre o nível de em-prego. Essas reflexões podem ser utilizadas para derivar os possíveis impactos do salário mínimo sobre o mercado de trabalho. Segundo Keynes (1983), na análise neoclássica os salários são vistos somente como componentes do custo da em-presa, enquanto o papel desempenhado pelos salários na demanda agregada não é considerado. Além do que, para Keynes (1983), o nível de emprego é resultado do ponto de operação das empresas ou ponto de demanda efetiva. Esse ponto é resultado das decisões empresariais que são influenciadas pelas expectativas de curto prazo. A partir desse ponto de operação os resultados de uma variação do salário nominal sobre o nível de emprego somente serão conhecidos após um estudo acerca dos impactos dessa variação sobre os parâmetros que influenciam a decisão de produção. Essa decisão depende, em especial, das expectativas acerca dos gastos com consumo e investimento. Assim, Keynes (1983) pondera os efei-tos de uma variação do salário nominal sobre esses gastos. Para esse autor não é possível afirmar que uma elevação de salário nominal necessariamente provoque

Page 291: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

291

uma redução do nível de emprego porque o impacto das variações do salário no-minal sobre o nível de emprego depende de seus efeitos sobre a demanda efetiva. Noutras palavras, Keynes (1983) rejeita a interpretação da teoria convencional de que elevações do salário nominal geram necessariamente um aumento na taxa de desocupação.

Esse raciocínio pode ser estendido para os efeitos da introdução do salário mínimo, bem como para o impacto de suas variações sobre o nível de emprego. Ou seja, se considerarmos que existem impactos sobre os custos dos emprega-dores, mas também sobre o nível de demanda da economia, não se pode afirmar, a priori, que essas variações promovam uma elevação da taxa global de desocu-pação da economia. Em suma, os efeitos do salário sobre o nível de emprego dependem do nível em que é fixado e de seus impactos sobre a decisão de produ-ção dos empregadores. Em geral, espera-se que uma política de elevação gradual do salário mínimo não promova uma elevação drástica da taxa de desocupação e permita uma redução na dispersão dos rendimentos.

Existem outras abordagens sobre os efeitos do salário mínimo, como o mo-delo do monopsônio (VARIAN, 1999) e a teoria do salário-eficiência. (REBIT-ZER; TAYLOR, 1995).

Essas teorias revelam também que a introdução do salário mínimo não teria como consequência uma redução no emprego.

De acordo com Freeman (1996), o efeito redistributivo do salário mínimo depende da relação entre essa política e o sistema de relação de trabalho. Num contexto em que os trabalhadores que recebam valores superiores ao salário mí-nimo tenham o poder de elevar seus salários no mesmo patamar da variação do salário mínimo, esse efeito será eliminado. No entanto, se esses trabalhadores não tiveram tal poder haverá uma redução na dispersão salarial.

As abordagens que não se filiam ao modelo de concorrência perfeita apon-tam que os efeitos do salário mínimo sobre o emprego e a distribuição de ren-dimentos dependem de uma série de fatores, como o nível no qual é fixado, seu impacto sobre a produtividade dos trabalhadores, sua influência sobre os determi-nantes da demanda efetiva e do sistema de relações de trabalho. Assim, qualquer tentativa de apontar os impactos do salário mínimo sobre o nível de emprego e a dispersão dos rendimentos exige uma reflexão acerca de várias mediações impor-tantes nesse processo.

Page 292: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

292

A importância do efeito redistributivo do salário mínimo é assinalada, in-clusive, pelas normas da Organização Internacional do Trabalho. A partir dessas normas as funções do salário mínimo seriam atingir a mão-de-obra não-sindicali-zada e não qualificada – e, na medida em que um piso salarial é fixado institucio-nalmente, condiciona-se a definição da maioria dos demais salários da estrutura salarial, limitando a dispersão dos salários – proteger categorias de trabalhadores de setores econômicos menos organizados, de forma a diminuir os diferenciais de salários entre os trabalhadores de categorias de menor e maior poder de barganha nas negociações coletivas; e estabelecer normas para que trabalhos iguais tenham a mesma remuneração – em geral estabelecida por meio dos acordos coletivos, devido às dificuldades para reconhecer situações de igualdade ou desigualdade no que concerne às funções que são desempenhadas no mercado de trabalho, espe-cialmente entre setores econômicos. (CACCIAMALI, 2007).

No Brasil, alguns autores discutem a influência do piso salarial sobre a dis-persão dos rendimentos. De acordo com Souza (1980), em sua reflexão sobre a determinação dos salários em economias atrasadas, a abertura do leque dos ren-dimentos será influenciada pela heterogeneidade estrutural da indústria, pela con-centração dos setores de ponta dessas economias em relação aos demais setores e pelo baixo nível da taxa de salário (piso salarial). No Brasil, o salário mínimo teve e tem o papel de piso salarial, exceto no Milagre Econômico5. Porém, esse salário apresentou uma trajetória de perda de poder aquisitivo no regime autoritário e no período de elevada inflação no País. A partir do Plano Real, iniciou-se uma políti-ca de valorização do salário mínimo6 que, segundo Salm (2004), será uma política eficiente se, primeiro, alguns movimentos de convergência se verificarem como

[continuidade na] elevação do valor do Salário Mínimo, dado que continua sendo o principal fator na determinação dos sa-lários mais baixos. Segundo, o fortalecimento da representa-ção sindical, condição para conquistar maiores pisos salariais nas Negociações Coletivas. Terceiro, a diminuição da oferta de mão-de-obra não-qualificada, sem o quê aqueles dois mo-vimentos não se sustentam. (SALM, 2004, p. 7).

5 A polêmica em torno da importância do salário mínimo como piso nacional se originou a partir dos estudos de Macedo e Garcia (1980) e de Souza e Baltar (1980).

6 Comparando o salário mínimo real de maio de 1995 e o de abril 2007, verifica-se uma valorização de 58%.

Page 293: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

293

O terceiro fator apontado por Salm (2004) depende do esforço das autori-dades governamentais na promoção da qualificação dos trabalhadores e também de um crescimento econômico sustentável. A elevação da qualificação da mão-de-obra somente se justifica num cenário de geração de postos de trabalhos compa-tíveis com novos patamares de qualificação.

A partir da constatação da valorização real do salário mínimo, iniciaram-se, no País, vários estudos acerca dos seus impactos distributivos. A seção seguinte corresponde a uma breve síntese dessas pesquisas.

10.3 – Os Impactos Distributivos do Salário Mínimo e a Literatura Nacional

Neste capítulo opta-se por analisar alguns estudos sobre os impactos distributivos do salário mínimo que incluíram também o período após o Plano Real. Um dos primeiros estudos que contemplaram esses anos foi realizado por Azevedo e Silveira (2001), que escolheram o método de experimento na-tural. Esse método exige uma diferenciação entre grupo de controle (não atin-gido pelas mudanças) e grupo de tratamento (atingido pelas mudanças). Os autores utilizaram os dados da Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED) da Região Metropolitana de Salvador, no período de dezembro de 1996 a novembro de 1999. Os valores monetários brutos dos rendimentos foram deflacionados pelo Índice de Preços ao Consumidor para Salvador. As infor-mações foram divididas em dois períodos, que corresponderam aos seis meses anteriores e posteriores às elevações do salário mínimo verificadas no mês de maio dos anos de 1997, 1998 e 1999. O grupo de controle corresponde aos dados do período anterior ao reajuste (dezembro a maio), enquanto o grupo de tratamento compreende as informações do período posterior (junho a no-vembro). Entretanto, os dados da PED não são longitudinais, portanto não se pode assegurar que os grupos de controle e tratamento tenham características similares, o que é recomendável nesse procedimento.

O cálculo do Índice de Gini e Entropia (E (0)) – que é mais sensível às va-riações na cauda inferior da distribuição de renda –, antes e após a valorização do salário mínimo para os anos 1997 e 1998, considerando o rendimento dos ocupa-dos, revelou pequena flutuação em seus valores no período em que essa valoriza-ção foi relativamente mais elevada, enquanto o cômputo desses indicadores para 1999 indicou uma elevação na concentração dos rendimentos após a elevação do

Page 294: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

294

salário mínimo. Esse ano teve relativamente a menor variação do salário mínimo, além de verificar-se uma elevação da taxa de participação e do desemprego. Os resultados desses índices, calculados com base na renda familiar, também aponta-ram trajetória similar aos resultados obtidos a partir dos rendimentos individuais.

Fajnzylber (2001), por sua vez, investiga os efeitos do salário mínimo sobre os rendimentos e o emprego dos trabalhadores, por meio dos dados longitudinais da Pesquisa Mensal de Emprego/IBGE no período de 1982 a 1997. O autor uti-lizou a metodologia desenvolvida por Neumark; Schweitzer e Washer (2000), no intuito de mensurar os efeitos da variação do salário mínimo em diversas faixas de rendimentos, além de calcular os impactos correntes e defasados dessa variação. Essa metodologia foi utilizada para estimar os impactos do salário mínimo para trabalhadores formais, assalariados informais e trabalhadores por conta própria. Os resultados revelaram efeitos significativos do salário mínimo sobre os rendi-mentos individuais em toda a distribuição de renda dos trabalhadores formais e informais. A elasticidade de renda com relação ao salário mínimo teve valor unitário, no caso de indivíduos com rendimento próximo ao valor desse salário. Entretanto, entre as pessoas que recebem os maiores rendimentos essa elasticida-de atingiu valores menores.

Soares (2002) estudou os impactos distributivos do salário mínimo no pe-ríodo 1994 a 1999, por meio dos dados da Pesquisa Nacional de Amostragem Domiciliar (PNAD) e da Pesquisa Mensal de Emprego (PME), ambas do IBGE. O autor utilizou três metodologias, sendo que na primeira abordagem o mesmo indivíduo foi acompanhado antes e após a elevação do salário mínimo, através dos dados longitudinais da PME. Na segunda abordagem observa-se a renda média de cada centésimo do rendimento dois meses antes do aumento, no mês anterior e no mês após a elevação do salário mínimo. A terceira metodologia envolve o método de diferenças em diferenças temporais por centésimo, ao longo de 64 meses. Ou seja, o autor computa uma regressão tendo como variável dependente o logaritmo da renda média de cada centésimo e como variáveis independentes o logaritmo do valor real do salário mínimo, o logaritmo do valor real da renda média geral e uma tendência temporal.

Os resultados da primeira abordagem são incongruentes, na medida em que entre as 25 elasticidades calculadas, cinco são menores que um e quatro menores que zero. Os cálculos da segunda e terceira metodologias convergem na mesma direção: a elasticidade da renda em relação ao salário mínimo seria pequena (0,2), enquanto para os centésimos inferiores da distribuição de renda essa elasticidade atinge valor mais elevado (0,6), e para pessoas que se situam nos dois quintos

Page 295: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

295

superiores da distribuição de renda seu valor atinge zero. Segundo o autor, esses resultados revelam que o impacto redistributivo do salário mínimo é pequeno. Entretanto, uma elasticidade de renda em relação ao salário mínimo de 0,6 não é desprezível, sobretudo se considerarmos que esse valor foi encontrado entre os menores rendimentos.

Enfim, os resultados dos trabalhos de Fajnzylber (2001) e Soares (2002) re-velam um impacto distributivo do salário mínimo para as pessoas inseridas nos estratos de menor remuneração. No intuito de investigar de forma mais acurada o impacto distributivo do salário mínimo no período recente, utilizamos em nosso estudo/nossa pesquisa uma metodologia inovadora, que é resumida a seguir.

10.4 – Metodologia

Neste trabalho seguimos estritamente a metodologia proposta em DiNardo; Fortin e Lemieux (1996). Estes autores consideram um vetor de observações indi-viduais (w,z,t), sendo w o valor do salário, z um vetor de atributos individuais e t o tempo. Cada observação individual pertence a uma distribuição conjunta F(w,z,t) de salários, atributos individuais e datas. F(w,z|t) é a distribuição condicional de w e z em um ponto do tempo. Essa distribuição pode também depender de algumas características distributivas como o salário mínimo (mt).

A densidade de salários em um ponto do tempo ft(w) pode ser escrita como a integral da densidade de salários condicionada a um conjunto de atributos indi-viduais e ao tempo tw, sendo expressa como f(w|z,tw;mt), - sobre a distribuição de atributos individuais F(z|tz) na data tz

7:

,( ) ( , | ; ) ( | , ; ) ( | )

( ; , , )z z

t w z t w t zz z

w z t

f w dF w z t t m f w z t t m dF z t t

f w t t t t m∈Ω ∈Ω

= = = = =

= = =

∫ ∫ (1)

onde:

zΩ é o domínio de definição dos atributos individuais.

De acordo com DiNardo; Fortin e Lemieux (1996), para a estimação das funções de densidade contrafactuais é necessária a combinação de diferentes pe-

7 Observa-se, na exposição metodológica em sequência, basicamente a descrição apresentada em Dinardo; Fortin e Lemieux (1996).

Page 296: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

296

ríodos do tempo. A última linha da equação (1) tem como objetivo preencher essas condições ao introduzir a notação que leva em conta essa combinação. À guisa de exemplo, 2002( ; 2002, 2002, )w zf w t t m= = é a função densidade (contrafactual) que prevaleceria em 2002 se a distribuição dos atributos individuais fosse a mesma de 2007.

No intuito de estimar a função de densidade contrafactual anterior, con-sidera-se a hipótese de que a estrutura de salários de 2002 (representada por

2002( ; , 2002, )wf w z t m= ) não depende da distribuição de atributos. Neste caso a densidade hipotética 2002( ; 2002, 2007, )w zf w t t m= = é:

2002 2002

2002

( ; 2002, 2007, ) ( | , 2002, ) ( | 2007)

( | , 2002, ) ( ) ( | 2002)w z w z

w z z

f w t t m f w z t m dF z t

f w z t m z dF z tψ

= = = = =

= = =∫

(2)

O termo ( )z zψ é a função de “reponderação” definida como:

( ) ( | 2007) / ( | 2002)z z zz dF z t dF z tψ = = = (3)

e

2002

2002ˆ ˆ( ; 2002, 2007, ) ( ) ( )i i

w z zi S

w Wf w t t m z Kh hθ ψ

−= = = ∑ (4)

O termo h é o parâmetro que regula o grau de suavidade de uma densidade Kernel. Esse parâmetro é denominado de janela ou bandwidth.

A diferença entre a função densidade efetiva de 20028 e a função densidade hipotética corresponde ao efeito das mudanças na distribuição dos atributos dos trabalhadores. Em seguida, detalha-se a metodologia utilizada na identificação da contribuição de cada fator (salário mínimo, grau de formalidade e atributos) nos indicadores de desigualdade.

8 Como veremos adiante, ao contrário de Dinardo; Fortin e Lemieux (1996), iremos estimar os con-trafactuais no ano inicial do período de análise, 2002.

Page 297: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

297

10.5 – Efeitos das Mudanças no Grau de Formalidade do Mercado de Trabalho e Outros Atributos

O conjunto de atributos individuais z consiste do status de formalização9 da ocupação u (representado por uma variável dummy) e um vetor x de atributos que inclui experiência10, escolaridade, raça, grupos ocupacionais e ramos da atividade econômica.11 Em uma linguagem algébrica a distribuição dos atributos F(z|tz=t) é igual ao produto de F(u|x,tu|x=t) e F(x|tx=t).

A função densidade dos salários em 2002 é definida a partir da equação (1). Ou seja, essa equação corresponde a:

| 2002

2002 |

2002 | |

( ; 2002, 2007, 2002, )

( | , , 2002; ) ( | , 2007) ( | 2002)

( | , , 2002; ) ( , ) ( | 2002) ( | 2002)

w u x x

w u x x

w u x u x x

f w t t t m

f w u x t m dF u x t dF x t

f w u x t m u x dF x t dF x tψ

= = =

= = = =

= = = =

∫∫∫∫

(5)

O primeiro passo na estimação da função densidade hipotética corresponde à construção da função densidade de salários que teria prevalecido em 2002 se os graus de formalidade e informalidade, mas não os outros atributos, tivessem o mesmo nível de 200712. A partir desse objetivo introduz-se uma hipótese adicional em que a função densidade condicional ( | , , ; )w tf w u x t m não depende do grau de formalidade e 9 O mercado formal de trabalho compreende os assalariados com carteira de trabalho assinada, traba-

lhadoras domésticas com carteira de trabalho assinada, militares e funcionários públicos, enquanto o mercado informal inclui os assalariados e trabalhadores domésticos sem carteira de trabalho assi-nada, autônomos e trabalhadores sem remuneração.

10 A variável experiência corresponde à diferença entre a idade do trabalhador e a idade em que esse trabalhador começou a trabalhar. Essas informações estão disponíveis nos microdados da PNAD.

11 No vetor de atributos x não é incluída a variável nominal posição na ocupação, pois esta já é utili-zada para obter a variável dummy que representa o status de formalização u.

12 O texto de DiNardo; Fortin e Lemieux (1996) investigou o impacto da variável sindicalização sobre os indicadores de desigualdade, porém em nosso mercado de trabalho os ganhos auferidos na negocia-ção coletiva são repassados para todos os trabalhadores, independentemente de sindicalização. Diante disso, optou-se por substituir essa variável pelo grau de formalidade ou informalidade do mercado de trabalho, na medida em que esses mercados têm determinantes dos rendimentos distintos.

Page 298: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

298

informalidade. Assim, calcula-se a função densidade que prevaleceria em 2002 se os graus de formalidade e informalidade fossem os mesmos registrados no ano de 2007, embora os demais atributos permanecessem nos níveis de 2002. Essa função é na verdade uma versão reponderada da função densidade de 2002:

| 2002

2002 |

2002 | |

( ; 2002, 2007, 2002, )

( | , , 2002; ) ( | , 2007) ( | 2002)

( | , , 2002; ) ( , ) ( | 2002) ( | 2002)

w u x x

w u x x

w u x u x x

f w t t t m

f w u x t m dF u x t dF x t

f w u x t m u x dF x t dF x tψ

= = =

= = = =

= = = =

∫∫∫∫

(6)

O termo | ( , )u x u xψ é uma função reponderada e definida como:

| | |

| |

| |

( , ) ( | , 2007) / ( | , 2002)Pr( 1| , 2007) Pr( 0 | , 2007). [1 ]Pr( 1| , 2002) Pr( 0 | , 2002)

u x u x u x

u x u x

u x u x

u x dF u x t dF u x tu x t u x t

u uu x t u x t

ψ = = =

= = = == + −

= = = = (07)

A última parte da equação (7) é obtida considerando que o status de forma-lidade u toma somente os valores de zero (setor informal) e 1 (setor formal) e, portanto, | | |( | , ) Pr( 1| , ) [1 ]Pr( 0 | , )u x u x u xdF u x t u u x t u u x t= = + − = .

A função de reponderação | ( , )u x u xψ pode ser estimada por meio da razão

entre as probabilidades condicionais |Pr( 1| , )u xu x t= estimadas para |u xt =2007 e 2002 para as observações que fazem parte do setor formal e por meio da razão entre as probabilidades condicionais |Pr( 0 | , )u xu x t= estimadas para |u xt =2007 e 2002. O modelo padrão para estimar essa probabilidade é o modelo probit, qual seja: ' '

|Pr( 1| , ) Pr( ( )) 1 ( ( ))u x i iu x t t H x H xε β β= = = > − = −Φ − (8)

onde (.)Φ é a distribuição normal cumulativa e H(x) é um vetor de variáveis independentes, que é uma função de x (o vetor de atributos individuais) e pode ser tratado como um polinômio de baixa ordem em x.

Para levar em consideração a influência dos demais atributos (vetor x), va-mos considerar a densidade de salários que teria prevalecido em 2002 se a distri-buição de u e x fossem as mesmas de 2007:

| 2002

2002 |

2002 | |

( ; 2002, 2007, 2007, )

( | , , 2002; ) ( | , 2007) ( | 2007)

( | , , 2002; ) ( , ) ( | , 2002) ( ) ( | 2002)

w u x x

w u x x

w u x u x x x

f w t t t m

f w u x t m dF u x t dF x t

f w u x t m u x dF u x t x dF x tψ ψ

= = =

= = = =

= = = =

∫∫∫∫

(9)

Page 299: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

299

onde ( ) ( | 2007) / ( | 2002)x x xx dF x t dF x tψ = = = . Aplicando a regra de Bayes13, esta relação pode ser escrita como:

Pr( 2007 | ) Pr( 2002)( ) .Pr( 2002 | ) Pr( 2007)

x xx

x x

t x txt x t

ψ = ==

= = (10)

A probabilidade condicional de estar no período t, dados os atributos individuais x, pode ser estimada por meio de um modelo probit, tal como definido abaixo:

' 'Pr( | ) Pr( ( )) 1 ( ( ))x i it t x H x H xε β β= = > − = −Φ − (11)

As probabilidades não condicionais Pr( 2002)xt = e Pr( 2007)xt = podem ser facilmente calculadas como o número total de observações de cada ano em relação ao número total de observações para os dois. Nesses cálculos utilizam-se os pesos de amostragem para pessoas, disponíveis nos CDs das PNADs.

10.6 – Efeitos das Mudanças no Salário Mínimo

No presente estudo adotam-se as mesmas hipóteses adotadas por DiNardo; Fortin e Lemieux (1996), porém adaptadas ao mercado de trabalho brasileiro.

Hipótese 1: O salário mínimo não tem efeitos de spillover na distribuição de salários acima do salário mínimo. No caso de dois valores mo e m1 (mo ≤ m1) de salário mínimo, as funções densidades condicionais f(w|z,tw,m0) e f(w|z,tw,m1) são as mesmas para salários acima do maior valor de salário mínimo (m1).

No Brasil constata-se uma elevação do valor real do salário mínimo no pe-ríodo analisado, entre 2002 e 2007, porém na economia americana, no período estudado por DiNardo; Fortin e Lemieux (1996), verificou-se uma desvalorização real desse salário. Neste trabalho o valor de m1 corresponde ao valor real do salário mínimo no ano de 2007, e mo ao valor do mínimo em 2002. Além disso, 13 Dados dois eventos A e B, então ( )( | ) ( | )

( )P AP A B P B AP B

= × . Portanto, transpondo para o presente

caso,

( )Pr( 2007 | )Pr( | 2007) ( 2007) Pr( 2007 | ) ( 2002)

( )( )Pr( | 2002) Pr( 2002 | ) ( 2007)Pr( 2002 | )

( 2002)

xx x x x

xx x x

xx

P xt xx t P t t x P t

xP xx t t x P tt x

P t

ψ= ×

= = = × == = =

= = × == ×=

.

Page 300: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

300

constrói-se a função contrafactual para o ano inicial do período estudado, em vez do ano final, como no trabalho de DiNardo; Fortin e Lemieux (1996).

Vale observar que essa hipótese é conservadora, na medida em que se per-mitirmos efeitos de spillover nos salários acima do valor do salário mínimo – mas abaixo da média e mediana –, os impactos da valorização do salário mínimo se-riam ainda maiores. A notação algébrica dessa hipótese se expressa por meio da equação abaixo:

1 0 1 1[1 ( )] ( | , , ) [1 ( )] ( | , , )w wI w m f w z t m I w m f w z t m− ≤ = − ≤ (12)

Focalizando o caso brasileiro, essa equação seria definida como:

2007 2002 2007 2007[1 ( )] ( | , , ) [1 ( )] ( | , , )w wI w m f w z t m I w m f w z t m− ≤ = − ≤ , onde

I(.) é uma função indicadora que vale 1 se o seu argumento (a condição entre parênteses) for verdadeiro e 0 em caso contrário.

Hipótese 2: a forma da densidade condicional dos salários reais abaixo e no valor do salário mínimo depende somente do valor (real) do salário mínimo. Quando se consideram dois anos, to e t1, e dois valores do salário mínimo mo e m1 (mo ≤ m1), a forma da densidade condicional f(w|z,to,m1) que prevaleceria em t0 se m0 se se elevas-se para m1 é proporcional à forma da função densidade condicional f(w|z,t1,m1) para os salários abaixo ou iguais ao maior valor de salário mínimo (m1).

Em particular para o Brasil, assume-se que para valores iguais ou abaixo do salário mínimo de 2007, ou seja, para w tal que I(w≤m2007)=1, a função densidade de salários que prevaleceria em 2002, se o salário mínimo fosse elevado ao seu nível de 2007, é proporcional à função densidade condicional de salários em 2007:

2007 2007

2007 2007 2007

( ) ( | , 2007, )( , ) ( ) ( | , 2002, )

w

w w

I w m f w z t mz m I w m f w z t mψ

≤ =

= ≤ = (13)

onde 2007( , )w z mψ é uma função de reponderada, definida adiante.

Hipótese 3: O salário mínimo não tem efeito na probabilidade de se obter uma ocupação.

No caso dessa hipótese, constrói-se a função densidade condicional de 2002, mas o valor do salário mínimo permanece no patamar do ano de 2007. Para construir a função densidade condicional seleciona-se parte da função densidade de 2002 acima do salário mínimo de 2007 (m2007) e parte da função densidade

Page 301: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

301

de 2007 que corresponde ao valor exato do salário mínimo em 2007, bem como os valores inferiores a esse valor. Outro procedimento adotado é que se pré-multiplica a função densidade de 2007 por uma função de reponderação para as-segurar que a integral definida total da função obtida seja igual a 1. Em linguagem algébrica essas operações correspondem à equação abaixo:

2007 2007 2007 2007

2007 2002

( | , 2002; ) ( ) ( , ) ( | 2007; )[1 ( )] ( | , 2002; )

w w w

w

f w z t m I w m z m f w t mI w m f w z t m

ψ= = ≤ =+ − ≤ =

(14)

onde

2007

20072007

Pr( | , 2002)( , )Pr( | , 2007)

ww

w

w m z tz mw m z t

ψ ≤ ==

≤ = (15)

Para obter o efeito do salário mínimo sobre a distribuição total de salários em 2002, integra-se a densidade condicional na equação (14) sobre a densidade de atributos:

2007 2007

2007 2007 2007

2007 2002

2007 2007

( ; 2002; 2002; ) ( | , 2002; ) ( | 2002)

( ) ( , ) ( | , 2007; ) ( | 2002)

[1 ( )] ( | , 2002; ) ( | 2002)

( ) ( , ) ( | , 200

w z w z

w w z

w z

w w

f w t t m f w z t m dF z t

I w m z m f w z t m dF z t

I w m f w z t m dF z t

I w m z m f w z t

ψ

ψ

= = = = =

= ≤ = =

+ − ≤ = =

= ≤ =

∫∫

∫ 12007

2007 2002

7; ) ( ) ( | 2007)

[1 ( )] ( | , 2002; ) ( | 2002)

z z

w z

m z dF z t

I w m f w z t m dF z t

ψ − =

+ − ≤ = = (16)

O termo 2007( , )w z mψ é definido na equação (15) e o termo 1( )z zψ − segue definido logo abaixo:

1 2007

2007

Pr( 2002 | , ) Pr( 2007)( ) .

Pr( 2007 | , ) Pr( 2002)w z

zw z

t z w m tzt z w m t

ψ − = ≤ ==

= ≤ = (17)

Após a aplicação da regra de Bayes, o produto das funções reponderação pode ser simplificado e definido pela seguinte equação:

12007 2007( , ) ( , ). ( )

2 Pr( 2007)Pr( 200 | , 2007) .Pr( 2007 | , 2007) Pr( 2002)

w z

zw

w z

z m z m ztt z w

t z w t

ψ ψ ψ −=

== ≤=

= ≤ = (18)

O cálculo da probabilidade de estar na data t , dados certos atributos indi-viduais z e um salário abaixo do salário mínimo de 2007, é obtido por meio do modelo Probit assim definido:

Page 302: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

302

Pr( | , Pr( ' ( )) 1 ( ( ))2007)wt t z H z H zw ε= = > − = −Φ −≤ β β' (19)

A Tabela 1, abaixo, resume o sistema de reponderação utilizado na determi-nação das funções de densidade contrafactuais. No interior da Tabela 1 estão os pesos que foram definidos a partir das equações (7), (10) e (18).

Tabela 1 - Sistema de Ponderação Utilizado na Decomposição das Funções de Densidade de Kernel

Ordem primária:Densidades contrafactuais

(1)Salário mínimo

(2)(1) + Informal

(3)(2) + CaracterísticasIndividuais

f(w,tw,tu|x,tx,mt)ano / amostra

tw=2002, tu|x=2002, tx=2002,mt=2007

tw=2002, tu|x=2007 tx=2002,mt=2007

tw=2002, tu|x=2007, tx=2007, mt=2007

2002 w ≤ m2007 0 0 0

2002 w > m2007 1 ψu|x ψu|x ψx

2007 w ≤ m2007 Ψ ψ ψu|x ψ ψu|x ψx

2007 w > m2007 0 0 0

Fonte: Elaboração Própria dos Autores.

10.7 – Estimação das Funções de Densidade Kernel

Outro procedimento empírico crucial é a estimação das funções de densida-de Kernel. Isso se deve ao uso de ponderações utilizadas nas etapas anteriores que se baseiam nessa função e também na necessidade de calcular essa função para que se possa obter os indicadores de desigualdade dos rendimentos, sobretudo para funções hipotéticas. As funções de densidade Kernel com ponderação, em especial o método intitulado Adaptive kernel density estimation (KERM, 2003; JANN, 2007), e o comando do Software Stata denominado akdensity foram uti-lizados nas estimativas em nosso estudo. Esse método propicia melhores re-sultados para distribuições multimodais com bandwidth variável. A função de densidade Kernel é expressa por meio da seguinte equação:

Page 303: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

303

1

1

1ˆ ( ) ( )n

i in

i i ii

i

w x xf x Kh hw =

=

−= ∑∑ (20)

Onde:

ix são os valores dos logaritmos da renda

iw são os pesos

K (.) é uma função Kernel

i ih h λ= × e iλ é o fator de proporcionalidade local.

No caso das funções de densidade Kernel estimadas para os anos de 2002 e 2007, utilizaram-se os pesos da PNAD, porém normalizados para assegurar que o somatório dos pesos fosse igual a um. Em relação às funções de densidade contrafactuais, os pesos são obtidos através do produto dos pesos de amostragem da PNAD e os pesos obtidos pela metodologia de reponderação. (Tabela 1). Mais uma vez esse produto foi normalizado para assegurar que o somatório dos pesos fosse igual a um. Os valores das funções de densidade Kernel foram estimados em 1000 pontos da variável x, que corresponde ao logaritmo natural do rendi-mento mensal do trabalho principal.

O Índice de Theil, por sua vez, é calculado por meio das funções de den-sidade Kernel estimadas e envolve as seguintes etapas: 1) retorna-se ao va-lor do rendimento do trabalho em cada ponto da abscissa x utilizado na esti-mativa das funções de densidade através da expressão v = exp(x), onde x é o logaritmo natural do rendimento do trabalho; 2) estima-se a função densi-dade de v (f(v)) que é igual à f(x) / v; 3), calcula-se o valor estimado da mé-

dia de v pela expressão max

( )v

v vf v dvm−∞

= ∫ utilizando-se o comando Stata

denominado integ14. Em resumo, o Índice de Theil é igual a max

ln( )v

v v

v v dvm m−∞

∫ .

Por outro lado, o cálculo do Índice de Gini exigiu um procedimento mais com-14 O comando integ produz valores de integrais definidas de funções de densidade empíricas através

de método de integração numérica.

Page 304: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

304

plexo. Inicialmente estima-se a função de distribuição cumulativa de v a partir da inte-gração de sua função densidade. Em seguida, calcula-se a curva de Lorenz a partir da

expressão 01

0

0

( )1( ) ( )

( )

p

pQ q dqL p dqQ q

Q q dqm

= =∫

∫∫

onde Q é a função quantílica e p é a proporção acumulada da população. Por último, o Índice de Gini é dado pela

expressão 1

0

2 ( ( ))G p L p dp= −∫ 15.

10.8 – Interpretação e Discussão dos Resultados

Nas tabelas seguintes apresentam-se os resultados da aplicação da metodolo-gia anteriormente descrita aos microdados das PNADs referentes aos anos de 2002 e 200716 para os trabalhadores brasileiros e, em particular, para os nordestinos. Nes-sas tabelas tem-se as medidas de concentração de renda (índices de Theil e de Gini), calculadas a partir dos valores que constam efetivamente nas PNADs no período estudado. Ademais, há os valores dos indicadores de desigualdade estimados para as funções de densidade contrafactuais do ano de 2002. Primeiro, essa função con-trafactual é construída para o valor real do salário mínimo de 2007 (2002cfmínimo), em seguida estima-se essa função a partir da manutenção das características de for-malidade de 2007 sobrepostas à distribuição contrafactual anterior (2002cfFormal). Por último, na estimação da função densidade hipotética do ano de 2002, utilizam-se os atributos individuais de 2007 sobrepostos às distribuições contrafactuais ante-riores (2002cfAtributo). Após a estimação de cada função densidade contrafactual calculam-se os indicadores de desigualdade.

15 Ver Apêndice de Cowel (2001).

16 Foram também calculados valores de decomposição para o período 1996-2001, mas em virtude de limitação de espaço serão apresentados apenas os resultados para o período mais recente. Os resultados para o primeiro período estão disponíveis e podem ser solicitados aos autores. Foram também realizados testes da metodologia para os dados do EUA utilizados por DiNardo; Fortin e Lemieux (1996) e foi possível replicar aproximadamente os seus resultados. Os autores também disponibilizam as rotinas STATA utilizadas nos cálculos.

Page 305: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

305

Os valores da quinta coluna das tabelas representam as diferenças entre es-ses indicadores. Para cada indicador o primeiro valor corresponde à diferença efetiva do indicador entre 2007 e 2002, enquanto o segundo valor corresponde ao resíduo da decomposição, o terceiro valor corresponde ao efeito causal da variação real do salário mínimo, o quarto valor refere-se ao efeito da variação no grau de for-malidade e o quinto valor corresponde ao efeito das mudanças na distribuição dos demais atributos individuais.17 Inicialmente, interpretamos os resultados da decom-posição para o conjunto dos trabalhadores (trabalhadores por conta própria e assa-lariados) brasileiros e nordestinos e, em seguida, nos concentramos nos assalariados.

10.9 – O Impacto do Salário Mínimo para o Conjunto dos Trabalhadores no Brasil e no Nordeste

A Tabela 2 contém os indicadores de desigualdade estimados para homens e mulheres em uma amostra que inclui todos os ocupados no Brasil, exceto os empregadores e trabalhadores sem remuneração. No caso das pessoas do sexo masculino, o índice de Theil se reduziu em 0,0714 entre 2002 e 2007. Desse total, 0,0238 pode ser atribuído ao salário mínimo e 0,0029 se deve ao grau de formali-zação. O salário mínimo em 2007 teve valor real mais elevado em relação ao pata-mar de 2002, bem como o grau de formalização em 2007. Assim, na construção da função densidade hipotética consideramos os efeitos da elevação do valor real do salário mínimo e do grau de formalização sobre os indicadores de desigualda-de dos rendimentos do trabalho em 2002. Constata-se que ambos teriam efeitos desconcentradores, ou seja, reduziriam o grau de concentração dos rendimentos. (Quadro 1 no Apêndice). Nota-se também que os atributos contribuíram com efeito negativo de -0,0199. Ou seja, no cálculo do Índice de Theil a partir da fun-ção densidade contrafactual, considerando a distribuição dos atributos de 2007, o resultado seria uma elevação no indicador de desigualdade. O resíduo da decom-posição do indicador da desigualdade corresponde a 0,0647.

17 Os valores positivos das colunas Dif e % devem ser interpretados como efeitos desconcentradores, enquanto que valores negativos referem-se a efeitos concentradores dos fatores.

Page 306: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

306

Tabela 2 - Resultados da Decomposição de Índices de Distribuição de Renda pelo Método DFL para Todos os Trabalhadores do Gênero Masculino ou Feminino no Brasil - 2002 e 2007

Ano Índice Fator*Homens Mulheres

Valor Dif** %*** Valor Dif** %***

2002 Theil 0,5928 0,0714 0,5086 0,0762

2007 Theil Resíduo 0,5214 0,0647 90,5 0,4323 0,0743 97.4

2002cfminimo Theil Salário 0,5691 0,0238 33.3 0,4833 0,0252 33.1

2002cfFormal Theil Formal 0,5662 0,0029 4.0 0,4911 -0,0078 -10,2

2002cfAtributos Theil Atributos 0,5860 -0,0199 -27.8 0,5066 -0,0155 -20,3

2002 Gini 0,5270 0,0340 0,5013 0,0419

2007 Gini Resíduo 0,4930 0,0313 92.0 0,4595 0,0355 84.7

2002cfminimo Gini Salário 0,5152 0,0118 34.6 0,4799 0,0215 51.3

2002cfFormal Gini Formal 0,5124 0,0027 8.1 0,4813 -0,0014 -3.4

2002cfAtributos Gini Atributos 0,5242 -0,0118 -34.7 0,4949 -0,0137 -32.6

Fonte: Elaboração Própria dos Autores.Legenda: Fator*= os valores desses fatores encontram-se nas colunas Dif**; Dif**= variações absolutas dos índices correspondentes a cada um dos fatores; %***= os efeitos relativos de cada fator.

Focalizando a contribuição desses fatores para a variação total do índice de Theil em termos relativos, pode-se observar que o salário mínimo, o grau de formalidade, os atributos e o resíduo contribuíram respectivamente com 33,3%, 4%, -27,8% e 90,5% dessa variação. Ou seja, o salário mínimo e o grau de formalidade tiveram impactos desconcentradores, enquanto os atributos exerceram efeitos concentradores. Esse exercício de decomposição refeito para o índice de Gini revela resultados semelhantes aos encontrados na decomposição do índice de Theil. O elevado valor relativo do resíduo da decomposição provavelmente se deve ao fato de que não utilizamos fatores de variação na oferta e demanda do trabalho18. Esses fatores, no trabalho de DiNardo; Fortin e Lemieux (1996), tiveram uma contribuição relativa da ordem de 30%, en-quanto os resíduos assumiram um valor equivalente a tal contribuição. Cabe lembrar que os resíduos contemplam fatores desconhecidos que certamente estão afetando a distribuição dos rendimentos, mas o seu valor elevado não invalida os valores relativos estimados para os três fatores considerados.

No caso das pessoas do gênero feminino observa-se mais uma vez uma queda nos indicadores de desigualdade dos rendimentos de 2002 para 2007. 18 Esse procedimento foi adotado por DiNardo; Fortin e Lemieux (1996).

Page 307: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

307

(Tabela 2). A decomposição do Índice de Theil, calculado a partir das funções de densidade hipotéticas, revela que a contribuição relativa do salário mínimo, o grau de formalidade, os atributos e os resíduos são de 33,1%, -10,2%, -20,3% e 97,4%, respectivamente. Tanto para mulheres quanto para homens o salário mí-nimo teria um efeito desconcentrador dos rendimentos do trabalho, enquanto o grau de formalidade promoveria uma pequena desconcentração para os homens e uma elevação na desigualdade de renda para as mulheres19. Os atributos também tiveram o efeito de elevar o grau de concentração dos rendimentos tanto para a força de trabalho masculina quanto para a feminina.

A decomposição do Índice de Gini calculado para mulheres revelou o mesmo impacto dos fatores, embora o efeito do salário mínimo seja mais elevado e o do grau de formalidade menor, em termos absolutos, quando comparados com os resulta-dos do Índice de Theil. Sabe-se que o Índice de Gini é mais sensível a variações nas porções mais próximas à média da distribuição, enquanto o Índice de Theil (no caso o Theil-L, que foi aqui utilizado), é mais sensível a mudanças na cauda esquerda da distribuição. Desta forma, os aumentos reais do salário mínimo estariam causando mudanças mais fortes nos valores medianos da distribuição de renda do que propria-mente em valores de magnitudes mais reduzidas. Posto isso, entende-se por que o salário mínimo em algumas decomposições, principalmente para mulheres, teve maior impacto relativo sobre o Índice de Gini do que em relação ao índice de Theil.

As decomposições revelam também um impacto maior do salário mínimo para pessoas do gênero feminino. Esse resultado não surpreende, na medida em que os dados da PNAD para o ano de 2007 apontam que 8% dos homens ocupa-dos receberam exatamente o valor do salário mínimo, enquanto entre as mulheres essa proporção atingiu 11%.

No caso da região Nordeste, a Tabela 3 mostra que o Índice de Theil também se reduziu para as pessoas de gênero masculino em 0,0330. A decomposição do Índice de Theil calculado a partir das funções de densidade hipotéticas para os homens revela que a contribuição relativa do salário mínimo, o grau de forma-lidade, os atributos e os resíduos são de 115,18%20, -46,29%,- 4,41 e 35,52%, 19 Não é objetivo deste trabalho investigar os determinantes dos impactos dos fatores grau de forma-

lidade e atributos para nordestinos. Porém no futuro tentaremos responder essas questões.

20 Pode parecer estranho que um determinado fator, por exemplo a variação real do salário mínimo, possa produzir um efeito relativo maior do que 100%, ou seja, maior do que a variação efetiva do ín-dice no período analisado. No entanto, se considerarmos que os efeitos dos distintos fatores podem se contrabalançar mutuamente, pode-se pensar que efeitos relativos desconcentradores maiores do que 100% seriam compensados por efeitos concentradores de outros fatores.

Page 308: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

308

respectivamente. Noutras palavras, o impacto do salário mínimo sobre os ren-dimentos dos trabalhadores do Nordeste foi desconcentrador, enquanto os demais fatores contribuiriam para concentração da renda. (Quadro 2 no Apên-dice). O Índice de Gini, novamente, reduziu-se de 0,5293 para 0,5123 entre 2002 e 2007. O exercício de decomposição do Índice de Gini mostra tendências semelhantes às apontadas anteriormente, apesar de o efeito concentrador abso-luto dos atributos sobre os rendimentos ser maior em relação ao valor obtido na decomposição do Theil.

Tabela 3 - Resultados da Decomposição de Índices de Distribuição de Renda pelo Método DFL para Todos os Trabalhadores do Gênero Masculino ou Feminino no Nordeste - 2002 e 2007

Ano Índice Fator*Homens Mulheres

Valor Dif** %** Valor Dif** %***

2002 Theil 0,6623 0,0330 0,6084 0,1198

2007 Theil Resíduo 0,6293 0,0117 35,52 0,4886 0,0651 54,34

2002cfminimo Theil Salário mínimo 0,6243 0,0380 115,18 0,5387 0,0697 58,15

2002cfFormal Theil Formal 0,6396 -0,0153 -46,29 0,5307 0,0080 6,71

2002cfAtributos Theil Atributos 0,6410 -0,0015 -4,41 0,5537 -0,0230 -19,21

2002 Gini 0,5293 0,0170 0,5219 0,0454

2007 Gini Resíduo 0,5123 0,0154 90,68 0,4765 0,0237 52,31

2002cfminimo Gini Salário mínimo 0,5092 0,0201 117,80 0,4843 0,0376 82,92

2002cfFormal Gini Formal 0,5165 -0,0073 -42,61 0,4859 -0,0017 -3,69

2002cfAtributos Gini Atributos 0,5277 -0,0112 -65,87 0,5003 -0,0143 -31,54

Fonte: Elaboração Própria dos Autores.Legenda: Fator*= os valores desses fatores encontram-se nas colunas Dif**; Dif**= variações absolutas dos índices correspondentes a cada um dos fatores; %***= os efeitos relativos de cada fator.

Em relação às mulheres nordestinas, nota-se uma queda do Índice de Theil em 0,1198. Na contribuição dos fatores para a variação total do Índice de Theil em termos relativos, pode-se observar que o salário mínimo, o grau de formali-dade, os atributos e o resíduo contribuíram respectivamente com 58,15%, 6,71%, -19,21% e 54,34% dessa variação. Ou seja, o salário mínimo e o grau de formali-

Page 309: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

309

dade atuaram no sentido de desconcentrar os rendimentos e os atributos promo-veram a concentração dos rendimentos. A decomposição do Índice de Gini calcu-lado a partir das funções de densidade hipotéticas mostra que as contribuições do salário mínimo, o grau de formalidade, os atributos e os resíduos foram 82,92%, -3,69%, -31,54% e 52,31%, respectivamente. Nota-se que o salário mínimo teve novamente efeito desconcentrador, porém o grau de formalidade e os atributos exerceram impactos concentradores sobre os rendimentos.

Contrapondo-se os resultados da decomposição dos índices de desigualdade dos rendimentos no País e na região geográfica estudada, observa-se, no caso dos homens nordestinos e brasileiros, que o salário mínimo e os atributos tiveram o mesmo efeito, sendo que o primeiro foi desconcentrador e o segundo concentrador, conquanto o impacto do grau de formalidade tenha efeito desconcentrador para os rendimentos dos trabalhadores brasileiros e concentrador para os nordestinos.

No caso das mulheres, as decomposições dos índices de desigualdade para brasileiras, no total, e nordestinas, revelam que as tendências dos impactos dos fa-tores coincidem, sobretudo para o Gini, que deixou ver que o salário mínimo teve efeito desconcentrador e o grau de formalidade e os atributos exerceram impactos concentradores em ambos os exercícios. Uma diferença que fica evidente, no caso da decomposição do Índice de Theil, é o efeito concentrador do grau de formalida-de sobre os rendimentos para as brasileiras, e desconcentrador para as nordestinas.

Em resumo, as decomposições mostram que a contribuição relativa do sa-lário mínimo para variações dos índices assume um patamar mais elevado para os ocupados nordestinos do que para os trabalhadores brasileiros. Esse resultado seria esperado na medida em que o percentual de ocupados que recebem salário mínimo no Nordeste é mais elevado em relação à proporção de trabalhadores brasileiros em geral que ganham valor equivalente ao mínimo21.

10.10 – O Impacto do Salário Mínimo para os Assalariados no Brasil e no Nordeste

Deve-se considerar que o salário mínimo tem importância crucial para os as-salariados. À guisa de ilustração, segundo dados da PNAD, no ano de 2007, 13% dos assalariados e 4% dos trabalhadores por conta própria recebiam rendimentos

21 Em 2007, segundo dados da PNAD/IBGE, em torno de 14% dos trabalhadores nordestinos recebiam salário mínimo, enquanto para os brasileiros homens esse percentual correspondia a 10%.

Page 310: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

310

no valor exato ao do salário mínimo no Brasil, enquanto na região Nordeste esses percentuais se elevam ainda mais e atingem 23% dos assalariados e 6% dos traba-lhadores autônomos. Diante disso, optou-se por novo exercício de decomposição dos indicadores de desigualdade calculado somente para os assalariados. Os resul-tados dessas decomposições se encontram nas Tabelas 4 e 5.

Tabela 4 - Resultados da Decomposição de Índices de Distribuição de Renda pelo Método DFL para Amostra de Assalariados do Gênero Masculino e Feminino Brasil - 2002 e 2007

Ano Índice Fator*Homens Mulheres

Valor Dif** %* Valor Dif** %***

2002 Theil 0,5776 0,0750 0,4839 0,0804

2007 Theil Resíduo 0,5026 0,0827 110,2 0,4034 0,0816 101.4

2002cfminimo Theil Salário 0,5548 0,0228 30,4 0,4482 0,0356 44.3

2002cfFormal Theil Formal 0,5565 -0,0017 -2.2 0,4632 -0,0150 -18.7

2002cfAtributos Theil Atributos 0,5853 -0,0288 -38.4 0,4850 -0,0218 -27.1

2002 Gini 0,5168 0,0407 0,4849 0,0455

2007 Gini Resíduo 0,4761 0,0417 102.2 0,4394 0,0406 89.1

2002cfminimo Gini Salário 0,5015 0,0153 37.6 0,4570 0,0280 61.4

2002cfFormal Gini Formal 0,5006 0,0009 2.2 0,4622 -0,0052 -11.4

2002cfAtributos Gini Atributos 0,5177 -0,0171 -42.0 0,4799 -0,0178 -39.1

Fonte: Elaboração Própria dos Autores.Legenda: Fator*= os valores desses fatores encontram-se nas colunas Dif**; Dif**= variações absolutas dos índices correspondentes a cada um dos fatores; %***= os efeitos relativos de cada fator.

No que diz respeito às pessoas brasileiras no seu conjunto e do gênero mas-culino que trabalham como assalariadas, constata-se uma queda do Índice de Theil de 0,577 em 2002, para 0,502 em 2007. A decomposição aponta que a parti-cipação relativa do salário mínimo, o grau de formalidade, os atributos e o resíduo na variação total desse índice foi, respectivamente, de 30,4%, -2,2, -38,4 e 110,2%. O salário mínimo teve o efeito de desconcentrar os rendimentos, enquanto os demais fatores atuaram concentrando a renda. (Quadro 3 do Apêndice).

A decomposição do índice de Gini calculado para os homens revelou impac-tos semelhantes dos fatores, porém o grau de formalidade teve o impacto de des-concentrar os rendimentos, sendo a sua contribuição relativa muito baixa (2,2%).

Page 311: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

311

Por outro lado, os indicadores de desigualdade estimados para as mulheres brasileiras assalariadas sinalizam uma queda na dispersão dos rendimentos. A tí-tulo de exemplo, o Índice de Theil variou de 0,483, em 2002, para 0,403 em 2007. A decomposição do Theil indica que os efeitos do salário mínimo, o grau de formalidade, os atributos e os resíduos são, respectivamente, de 44.3%, -18,7%, -27,1% e 101%. O salário mínimo, novamente, tem impacto desconcentrador, mas os demais fatores atuam de forma concentradora sobre os rendimentos. Na decomposição do Índice de Gini observa-se o mesmo sentido no impacto dos parâmetros, sendo que a influência do salário mínimo é maior.

Se destacarmos os assalariados nordestinos, os índices de Theil e Gini tiveram quedas de 0,0231 e 0,0206, respectivamente. (Tabela 5). A decomposição do Índice de Theil mostra que a participação relativa do salário mínimo, o grau de formalida-de, os atributos e o resíduo na variação total desse índice foram, respectivamente, de 75,92%, 13,04%, -13,02% e 24,06%. Noutras palavras, o salário mínimo e o grau de formalidade atuaram de forma desconcentradora e os atributos contribuíram para concentrar os rendimentos. (Quadro 4 no Apêndice). No caso da decomposição do Índice de Gini, as tendências de atuação dos fatores são semelhantes, exceto no caso do grau de formalidade que atua concentrando os salários.

Tabela 5 - Resultados da decomposição de índices de distribuição de renda pelo método DFL para amostra de assalariados do gênero masculino e feminino no Nordeste - 2002 e 2007

Ano Índice Fator*Homens Mulheres

Valor Dif** %** Valor Dif** %***

2002 Theil 0,6712 0,0958 0,5566 0,1184

2007 Theil Resíduo 0,5753 0,0231 24,06 0,4382 0,0644 54,42

2002cfminimo Theil Salário 0,5984 0,0727 75,92 0,4832 0,0734 62,02

2002cfFormal Theil Formal 0,5859 0,0125 13,04 0,4775 0,0057 4,82

2002cfAtributos Theil Atributos 0,5984 -0,0125 -13,02 0,5026 -0,0252 -21,26

2002 Gini 0,5246 0,0408 0,4973 0,0516

2007 Gini Resíduo 0,4837 0,0206 50,44 0,4458 0,0259 50,24

2002cfminimo Gini Salário 0,4847 0,0398 97,59 0,4483 0,0490 94,98

2002cfFormal Gini Formal 0,4890 -0,0043 -10,56 0,4530 -0,0046 -8,96

2002cfAtributos Gini Atributos 0,5043 -0,0153 -37,47 0,4717 -0,0187 -36,25

Fonte: Elaboração Própria dos Autores.Legenda: Fator*= os valores desses fatores encontram-se nas colunas Dif**; Dif**= variações absolutas dos índices correspondentes a cada um dos fatores; %***= os efeitos relativos de cada fator.

Page 312: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

312

Para as assalariadas nordestinas, mais uma vez, os indicadores de desigualda-de dos rendimentos indicam uma queda de 0,1184 para o Índice de Theil e 0,0516 para o Índice de Gini. A decomposição do Índice de Theil calculado a partir das funções de densidade hipotéticas mostra que as contribuições do salário mínimo, o grau de formalidade, os atributos e os resíduos foram 62,02%, 4,82%, -21,26% e 54,42%, respectivamente. Deste modo, o salário mínimo e o grau de forma-lidade exerceram um impacto desconcentrador nos rendimentos e os atributos tiveram uma atuação concentradora. A decomposição do Índice de Gini revela que o salário mínimo teve uma contribuição relativa 94,98% para a variação total da renda e, portanto, exerceu mais uma vez um impacto desconcentrador, se bem que o grau de formalidade e os atributos contribuíram em termos relativos com -8,96% e -36,25% e, portanto, agiram concentrando a renda.

Cabe observar que os resíduos assumiram valores menores nos resultados das decomposições para os assalariados nordestinos em relação aos valores obti-dos nas decomposições para os assalariados brasileiros em geral. Este resul-tado é perfeitamente compreensível na medida em que estamos trabalhando com uma amostra menor e mais homogênea do mercado de trabalho. Neste caso, os determinantes residuais dos rendimentos contribuem com efeitos menores nas decomposições.

Na decomposição dos índices de desigualdades para assalariados nordes-tinos e brasileiros verifica-se que os fatores salário mínimo e atributos agiram na mesma direção. Desse modo, o primeiro fator promoveu desconcentração de renda e o segundo contribuiu para concentrar os rendimentos.

Todavia, o fator grau de formalidade na decomposição do Índice de Theil tanto para homens quanto para mulheres brasileiras atuou concentrando os ren-dimentos, enquanto na decomposição para o Índice de Gini para os homens bra-sileiros, o grau de formalidade agiu desconcentrando renda e concentrando renda entre as mulheres brasileiras.

Para os assalariados nordestinos a decomposição do Índice de Theil revela que o grau de formalidade promoveu a desconcentração dos rendimentos para homens e mulheres, enquanto a decomposição do Índice de Gini mostra que esse fator atuou concentrando renda. Este resultado, aparentemente discrepante, pode ser compreendido na medida em que, conforme ressaltamos anteriormente, esses indicadores são sensíveis a mudanças na distribuição em distintos intervalos dos rendimentos. O Índice de Theil tem maiores modificações quando a distri-buição se altera nos intervalos de menores rendimentos, enquanto o Índice de Gini apresenta maiores alterações quando se altera a distribuição nos intervalos

Page 313: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

313

medianos dos rendimentos. Deste modo, o efeito do grau de formalidade foi desconcentrador na cauda esquerda da distribuição dos rendimentos, porém esse fator promoveu concentração dos rendimentos nas regiões intermediárias dos rendimentos do trabalho.

Mais uma vez, a contribuição relativa do salário mínimo para variação total dos indicadores de desigualdade é mais acentuada para os trabalhadores nordesti-nos em comparação aos trabalhadores brasileiros.

Em suma, em todos os exercícios de decomposição dos indicadores de de-sigualdade calculados por meio das funções hipotéticas, o salário mínimo teve o impacto de desconcentrar rendimentos para os assalariados brasileiros em seu conjunto e para os nordestinos. Contudo, o resultado dos demais fatores exige maior reflexão, que será realizada em trabalhos futuros.

10.11 – Considerações Finais

A metodologia de simulação, adaptada do estudo de DiNardo; Fortin e Le-mieux (1996), foi aplicada em primeiro lugar para todos os trabalhadores com renda positiva (assalariados e trabalhadores por conta própria), tanto para a de-composição do Índice de Theil quanto para a decomposição do Índice de Gini entre trabalhadores brasileiros em seu conjunto e nordestinos. A decomposição do Índice de Theil para os trabalhadores do gênero masculino brasileiros reve-lou que a maior contribuição relativa correspondeu ao salário mínimo que, assim como o grau de formalidade, teve impactos desconcentradores sobre os rendi-mentos, enquanto os atributos pessoais tiveram efeito concentrador. Idêntico exercício de decomposição, repetido para o Índice de Gini, revelou resultados semelhantes.

Os resultados das decomposições dos índices de desigualdade para os ho-mens nordestinos também apontaram, para os fatores estudados, impactos seme-lhantes àqueles verificados para os brasileiros, exceto o grau de formalidade que teve efeito concentrador para os rendimentos dos nordestinos.

No caso da decomposição do Índice de Theil para todas as trabalhadoras brasileiras, o salário mínimo tem um efeito desconcentrador dos rendimentos do trabalho, enquanto o grau de formalidade e os atributos promovem uma ele-vação na desigualdade de renda para as mulheres. A decomposição do Índice de Gini calculado para mulheres brasileiras também revelou o mesmo impacto dos

Page 314: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

314

fatores, embora o efeito do salário mínimo seja mais elevado e o do grau de for-malidade menor, em termos absolutos, quando comparados com os resultados do Índice de Theil.

Para as trabalhadoras nordestinas o impacto dos fatores estudados coin-cide com o efeito identificado para as brasileiras na decomposição do Índice de Gini, ainda que o resultado da decomposição do índice de Theil mostre que para as nordestinas o grau de formalidade desconcentra os rendimentos.

Enfim, as decomposições revelaram que o salário mínimo tem impactos desconcentradores para homens e mulheres brasileiros e nordestinos, enquanto os atributos atuam de forma concentradora. Contudo, as decomposições reve-lam também um impacto maior do salário mínimo para os ocupados nordesti-nos em relação aos brasileiros. A diversidade de resultados se localiza nos im-pactos do grau de formalidade que, no caso dos homens brasileiros, seu efeito se revelou desconcentrador, porém para homens nordestinos esse fator atuou concentrando rendimentos. A decomposição dos índices de desigualdade para as mulheres brasileiras apontou que o grau de formalidade atuou concentrando rendimentos, embora para as nordestinas a decomposição do Índice de Theil tenha revelado que o grau de formalidade causou desconcentração de rendi-mentos, enquanto no caso do índice de Gini o efeito foi concentrador.

Essas decomposições foram também realizadas somente para os assalaria-dos. Focalizando os assalariados brasileiros do gênero masculino e nordestinos, as decomposições dos índices de Theil e de Gini revelaram que o salário míni-mo tem efeito desconcentrador, enquanto os atributos pessoais atuam concen-trando renda. Vale observar, novamente, a diversidade de efeitos do fator grau de formalidade na medida em que a decomposição do Índice de Theil mostra que para os assalariados brasileiros seus impactos foram desconcentradores, enquanto a decomposição de Gini aponta que os efeitos desse fator contri-buíram para a concentração dos rendimentos. Para os homens nordestinos os resultados das decomposições apontaram uma atuação do grau de formalidade na direção oposta aos resultados verificados para os homens brasileiros.

No caso das mulheres assalariadas brasileiras e nordestinas, as decompo-sições do índice de Theil e de Gini indicam que os efeitos do salário mínimo são desconcentradores, enquanto os atributos promovem a concentração dos rendimentos. Para as assalariadas brasileiras o fator grau de formalidade atuou de forma concentradora em ambas as decomposições. Todavia, em relação às mulheres nordestinas, mais uma vez temos divergência nos resultados encon-

Page 315: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

315

trados para o grau de formalidade. A decomposição do Índice de Theil mostra que esse fator atuou de forma desconcentradora sobre os rendimentos, porém os resultados da decomposição do Índice de Gini sinalizam que esse fator cau-sou concentração dos rendimentos.

A variedade de resultados acerca dos impactos do grau de formalidade nas decomposições dos índices de desigualdade deve-se, em parte, às distintas sensibilidades desses indicadores às mudanças nas rendas. Conforme ressaltado anteriormente, o Índice de Theil sofre maior influência das mudanças verifica-das na cauda inferior, enquanto no caso do Índice de Gini as alterações no meio da distribuição dos rendimentos são captadas mais intensamente.

O resultado encontrado em todas as decomposições é que o salário mí-nimo atuou desconcentrando os rendimentos do trabalho no período recente para brasileiros e nordestinos. Essa contribuição das variações reais do salário mínimo para o processo de desconcentração dos rendimentos pode ser ampa-rada na argumentação teórica Keynesiana. Segundo Keynes (1983), as variações de salário nominal, como no caso das mudanças do salário mínimo, têm impac-tos sobre os custos dos empregadores, mas também sobre o nível de demanda da economia. Portanto, não se pode afirmar, a priori, que essas variações pro-movam uma elevação da taxa global de desocupação da economia e piore o perfil distributivo dos rendimentos. A política de elevação gradual do salário mínimo real estabelecida no Brasil no período de 2002 a 2007 não coincidiu com uma elevação do desemprego e, simultaneamente, permitiu uma redução na dispersão dos rendimentos do trabalho. Noutras palavras, o impacto das variações nominais do salário mínimo sobre o nível de demanda possivelmente ultrapassou seus efeitos sobre os custos, permitindo uma elevação do patamar de produção e do emprego.

Em suma, as simulações confirmam a importância do salário mínimo para a desconcentração dos rendimentos no mercado de trabalho brasileiro e nor-destino no período de 2002 a 2007. A trajetória dos rendimentos do trabalho, a partir da eclosão da crise que se instaurou em grande parte dos países, após o final de 2008, dependerá, em parte, da continuação ou suspensão da política de valorização do salário mínimo pelas autoridades governamentais.

Page 316: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

316

Referências

AZEVEDO, J. S. G.; SILVEIRA, P. F. Salário mínimo e renda familiar: mecanis-mos de ajustes individuais e familiares. In: ARAÚJO, T. P.; LIMA, R. A. (Org.). Ensaios sobre o mercado de trabalho e políticas de emprego. Recife: Edi-tora Universitária da UFPE, 2001.

BARROS, R. P. A Efetividade do salário mínimo em comparação à do Progra-ma Bolsa Família como instrumento de redução da pobreza e da desigualdade. In: BARROS, P. B.; FOGUEL, M.; ULYSSEA, G. Desigualdade de renda no Brasil: uma análise da queda recente. Brasília, DF: IPEA, 2006. V. 2. p. 507-549.

CACCIAMALI, M. C. A política de salário mínimo e a sua influência na distri-buição de renda. In: SEMINÁRIO SALÁRIO MÍNIMO E DESENVOLVI-MENTO, 2005, Campinas. Anais... Campinas: Unicamp, 2005. Disponível em: <http://www.mtb.gov.br/sal_min/t03.pdf>. Acesso em: 27 abr. 2007.

COWEL, F. Measuring Inequality. [S.l.: s.n.], 2000. Disponível em: <www,http://sticerd,lce,ac,uk/research/frankweb/MeasuringInequality/index,html>. Acesso em: dez. 2001.

DEDECCA, C. S. A redução da desigualdade no Brasil: uma estratégia complexa. In: BARROS, P. B.; FOGUEL, M.; ULYSSEA, G. Desigualdade de renda no Brasil: uma análise da queda recente. Brasília, DF: IPEA, 2006. V. 1. p. 299-330.

DINARDO, J.; FORTIN, N. M.; LEMIEUX, T. Labor market institutions and the distribution of wages: 1973-1992: a semiparametric approach. Econometri-ca, v. 64, n. 5, p. 1001-1044, Sept. 1996.

DUCLOS, J-Y.; ARAARY, A. Poverty and equity: measurement, policy and es-timation with DAD: CIRPEE and Poverty and Economic Policy (PEP) network, Pavillon de Seve. Québec: Université Laval, 2004.

FAJNZYLBER, P. Minimum wage effects throughout the wage distri-bution: evidence form Brazil’s formal and informal sectors. Belo Horizonte: Cedeplar, 2001. (Texto para discussão, n. 151).

FREEMAN, R. B. The minimum wage as a redistributive tool. The Economic Journal, v. 106, n. 436, p. 639-649, May 1996.

Page 317: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

317

JANN, B. Univariate kernel density estimation ETH Zurich. Switzerland, 2007.

KEYNES, J. M. Teoria geral do emprego do juro e da moeda. São Paulo: Abril Cultural, 1983.

KERM, P. V. Adaptive kernel density estimation. In: UK STATA USERS MEE-TING, 9., 2003, London. Anais... London: Royal Statistical Society, 2003.

MACEDO, R. B.; GARCIA, M. E. Salário mínimo e taxa de salário no Brasil: comentário. Pesquisa e Planejamento Econômico, Rio de Janeiro, v. 3, n. 10, p. 1013-1044, 1980.

NEUMARK, D.; SCHWEITZER, M.; WASCHER, W. The effects of mini-mum wages throughout the wage distribution. [S.l.: s.n.], 2000. (NBER Working Paper, 7.519).

REBTZER, J. B.; TAYLOR, L. J. The consequences of minimum wage laws some new theoretical ideas. Journal of Public Economics, v. 56, p. 245-255, 1995.

SALM, C. Crescimento sustentado e política de emprego. In: VELLOSO, J. P. Economia do conhecimento, crescimento e inclusão social. Rio de Janeiro: José Olympio, 2004.

______. Sobre a recente queda da desigualdade de renda no Brasil: uma leitu-ra crítica. In: BARROS, P. B.; FOGUEL, M.; ULYSSEA, G. Desigualdade de renda no Brasil: uma análise da queda recente. Brasília, DF: IPEA, 2006. V. 1. p. 279-297.

SOARES, S. O impacto do salário mínimo: a distribuição individual dos rendi-mentos do trabalho. Rio de Janeiro: IPEA, 2002. (Texto para discussão, n. 873).

SOUZA, P. R. A determinação dos salários e do emprego em economias atrasadas. 1980. Tese (Doutorado em Economia) - Instituto de Economia, Uni-camp, Campinas, 1980.

SOUZA, P. R.; BALTAR, P. E. Salário mínimo e taxa de salários no Brasil: réplica.Pes-quisa e Planejamento Econômico, Rio de Janeiro, v. 10, n. 3, p. 1045-1058, 1980.

STATACORP. Stata statistical software: release 10, college station, TX: stata-corp LP. [S.l.], 2005.

Page 318: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

318

VARIAN, H. R. Microeconomia: princípios básicos. Rio de Janeiro: Elsevier, 1999.

Page 319: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

319

Apêndice

Ano Índice Fator*Homens Mulheres

Efeito Efeito

2002cfminimo Theil Salário Desconcentrador Desconcentrador

2002cfFormal Theil Formal Desconcentrador Concentrador

2002cfAtributos Theil Atributos Concentrador Concentrador

2002cfminimo Gini Salário Concentrador Concentrador

2002cfFormal Gini Formal Concentrador Concentrador

2002cfAtributos Gini Atributos Desconcentrador Concentrador

Quadro 1 – Efeitos dos Fatores nas Decomposições dos Índices de Theil e Gini pelo Método DFL para Todos os Trabalhadores do Gênero Masculino ou Feminino no Brasil - 2002 e 2007

Fonte: Elaboração Própria dos Autores.

Ano Índice Fator*Homens Mulheres

Efeito Efeito

2002cfminimo Theil Salário Desconcentrador Desconcentrador

2002cfFormal Theil Formal Concentrador Desconcentrador

2002cfAtributos Theil Atributos Concentrador Concentrador

2002cfminimo Gini Salário Desconcentrador Desconcentrador

2002cfFormal Gini Formal Concentrador Concentrador

2002cfAtributos Gini Atributos Concentrador Concentrador

Quadro 2- Efeitos dos Fatores nas Decomposições dos Índices de Theil e Gini pelo Método DFL para Todos os Trabalhadores do Gênero Masculino ou Feminino no Nordeste - 2002 e 2007

Fonte: Elaboração Própria dos Autores.

Page 320: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

Ano Índice Fator*Homens Mulheres

Efeito Efeito

2002cfminimo Theil Salário Desconcentrador Desconcentrador

2002cfFormal Theil Formal Concentrador Concentrador

2002cfAtributos Theil Atributos Concentrador Concentrador

2002cfminimo Gini Salário Desconcentrador Desconcentrador

2002cfFormal Gini Formal Desconcentrador Concentrador

2002cfAtributos Gini Atributos Concentrador Concentrador

Quadro 3 - Efeitos dos Fatores nas Decomposições dos Índices de Theil e Gini pelo Método DFL para Todos os Trabalhadores do Gênero Masculino ou Feminino no Brasil - 2002 e 2007

Fonte: Elaboração Própria dos Autores.

Ano Índice Fator*Homens Mulheres

Efeito Efeito

2002cfminimo Theil Salário Desconcentrador Desconcentrador

2002cfFormal Theil Formal Desconcentrador Desconcentrador

2002cfAtributos Theil Atributos Concentrador Concentrador

2002cfminimo Gini Salário Desconcentrador Desconcentrador

2002cfFormal Gini Formal Concentrador Concentrador

2002cfAtributos Gini Atributos Concentrador Concentrador

Quadro 4 - Efeitos dos Fatores nas Decomposições dos Índices de Theil e Gini pelo Método DFL para Todos os Trabalhadores do Gênero Masculino ou Feminino no Nordeste - 2002 E 2007

Fonte: Elaboração Própria dos Autores.

Page 321: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

11CAPÍTULO

O PAPEL DO SINE NA INTERMEDIAÇÃO DE MÃO-DE-OBRA

NO BRASIL – NORDESTE E SUDESTE1

João Saboia2

Josiane Fachini Falvo3

O Sistema Nacional de Emprego (SINE) é o principal programa público de intermediação de trabalhadores do Brasil e atua integradamente ao sistema de pagamento do seguro-desemprego, valendo-se dos recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Em 1993, o Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat) promoveu a reestruturação dos SINEs e vinculou o repasse dos recursos ao desempenho da instituição, em termos de trabalhadores colocados e requerimentos de seguro-desemprego, o que incenti-vou a expansão dos serviços.

Atualmente, o sistema possui uma estrutura limitada, e abrangente espa-ço para expandir, pois atinge somente 1/5 dos municípios brasileiros e apenas 70% dos 1.100 postos de atendimento são informatizados, segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Além disso, sofre certa “concor-rência” de outros esquemas de busca de emprego, como agências públicas ou privadas de intermediação, anúncios em jornais, revistas, internet e redes de relacionamento.

A principal função do SINE é agilizar a reinserção do trabalhador adulto desempregado em um posto de trabalho assalariado. No entanto, os meios de 1 Este trabalho está parcialmente baseado na quarta parte do Estudo Transversal 4, Tendências da

Qualificação da Força de Trabalho, do Projeto Perspectivas do Investimento no Brasil, realizado pelo Instituto de Economia da UFRJ para o BNDES. Ver Saboia (2009).

2 João Saboia é professor titular do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

3 Doutoranda no programa de pós-graduação em Desenvolvimento Econômico no Instituto de Eco-nomia da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).

Page 322: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

322

comunicação constantemente divulgam que a instituição não atende a toda demanda do mercado de trabalho porque as exigências da seleção seriam su-periores ao perfil dos trabalhadores cadastrados.

Há um reconhecimento de que o SINE não consegue atender importante par-cela da demanda, sendo muito comum as empresas exigirem um nível de qualificação elevado frente à remuneração oferecida. A título de exemplo, o SINE não consegue atender grande parte da demanda por atendentes de call center porque geralmente as pessoas que possuem desenvoltura para realizar este tipo de serviço não aceitam os salários pouco atrativos.

No entanto, constata-se que o SINE reflete em grande medida a demanda do mercado de trabalho, embora sua imagem esteja fortemente relacionada às vagas que exigem baixa competência. Diante disso, o desafio atual do sistema é modificar esse estigma por meio da melhora do perfil das vagas disponibilizadas e dos candidatos cadastrados, além de ampliar os mecanismos de contato com os trabalhadores.

A próxima seção discorre acerca do desempenho do SINE no período 2003/2008, destacando as diferenças na intermediação de trabalhadores entre as regi-ões. Em seguida, detalha-se o perfil da intermediação realizada pelo SINE em 2008, a partir da análise dos dados da Classificação Brasileira de Ocupações (CBO). Por fim, é traçado um paralelo entre os resultados obtidos pelo SINE nas regiões Nordeste e Sudeste, mostrando uma taxa de “sucesso” bem mais elevada na primeira.

11.1 – O Desempenho do SINE no Período 2003/2008

Esta seção analisa o desempenho do SINE a partir da apresentação dos da-dos sobre a quantidade de vagas oferecidas, de vagas preenchidas e da colocação de trabalhadores no mercado de trabalho. As vagas oferecidas representam a pro-cura das empresas por trabalhadores cadastrados no banco de dados do SINE. As vagas preenchidas correspondem à quantidade de profissionais intermediada no ano de referência, mesmo que as vagas tenham sido disponibilizadas no ano anterior e não preenchidas imediatamente por falta de trabalhadores com a qua-lificação exigida.

No entanto, oficialmente, o SINE disponibiliza as informações acerca das colocações (inserções) de profissionais no mercado de trabalho por representa-

Page 323: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

323

rem a quantidade de vagas ofertadas e preenchidas no mesmo ano. Ao se excluí-rem as vagas disponibilizadas no ano anterior, verifica-se a capacidade do SINE em atender a demandas no curto prazo, ou seja, o desempenho imediato.

Na Tabela 1 nota-se que no período de 2003 a 2008 a quantidade de vagas oferecidas pelo SINE passou de 1.509.586 para 1.905.799, o que significou um aumento de 26,2%. O crescimento da capacidade de preencher as vagas foi maior, 39,1% no mesmo período, de 517.691 para 720.324, indicativo de certo avanço na gestão da instituição. Quanto ao aproveitamento das vagas, ou melhor, a relação entre as vagas preenchidas e as oferecidas, após a queda da intermediação em 2006 (32,9%), o recrutamento aumentou em 2007 para 36,6% e em 2008 para 37,8%, embora ainda possa ser considerado relativamente baixo o aproveitamen-to das vagas disponibilizadas.

Tabela 1 – Vagas Oferecidas e Preenchidas pelo SINE de 2003 a 2008

Ano Vagas Oferecidas

Vagas preenchidas

Aproveitamento de vagas (%)*

2003 1.509.586 517.691 34,3

2004 1.593.234 562.090 35,3

2005 1.626.658 554.367 34,1

2006 1.674.783 550.829 32,9

2007 1.820.168 666.184 36,6

2008 1.905.799 720.324 37,8 Fonte: Elaboração Própria dos Autores Baseada nos Dados do MTE.* Vagas preenchidas / Vagas oferecidas.

A quantidade de colocações pelo SINE, que significa a capacidade de oferta e preenchimento das vagas no mesmo ano de referência, segue a mesma tendên-cia: decréscimo nos anos de 2005 e 2006 e aumento de 20,7% em 2007 e de 14,3% em 2008. (Tabela 2). Não obstante, em todo o período, o número de trabalha-dores colocados aumentou 43,1%, superior ao acréscimo de vagas preenchidas (39,1%), o que representa uma pequena melhora na agilidade do SINE quanto à captação de profissionais com o perfil exigido pelas vagas ofertadas. Nota-se que os melhores resultados de 2007 e 2008, provavelmente, também devem estar associados à performance mais favorável da economia nesses últimos dois anos.

Page 324: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

324

Tabela 2 – Colocações Realizadas pelo SINE de 2003 a 2008

Ano Colocações no ano

Variação anual das colocações (%) *

2003 316.987 -

2004 340.064 7,3

2005 336.455 -1,1

2006 328.776 -2,3

2007 396.984 20,7

2008 453.677 14,3 Fonte: Elaboração Própria dos Autores Baseada nos Dados do MTE.*Ano base: 2003.

A Tabela 3 disponibiliza informações acerca das intermediações realizadas pelo SINE nas macrorregiões nacionais nos anos de 2003 e 2008. Destaca-se a re-gião Nordeste, por apresentar as maiores taxas de aproveitamento das vagas, mes-mo com a redução de 68,3% em 2003 para 53,2% em 2008. Embora os índices do SINE do Sudeste sejam inferiores às demais regiões, melhoraram o desempenho no aproveitamento das vagas nos últimos anos de 24% em 2003 para 31,5% em 2008. Quanto ao crescimento do número de colocações anuais de trabalhadores, a região Centro-Oeste mais que dobrou (106,9%) no período analisado, enquan-to as demais regiões apresentaram indicadores inferiores a 50%: Norte (32,7%), Nordeste (33,1%), Sudeste (45%) e Sul (16%).

O técnico do Ministério do Trabalho, Gleide Costa, explica a diferença de atuação do SINE entre as regiões pelo tamanho do mercado de trabalho. No Sul e no Sudeste tende a ser menor o aproveitamento das vagas da instituição justa-mente porque o mercado de trabalho é mais ativo e há maior “concorrência” com uma série de outros meios de intermediação. Por outro lado, devido ao reduzido volume de vagas ofertadas nas unidades federativas do Norte e do Nordeste, os postos de atendimento destas localidades realizam a intermediação de maneira mais artesanal e personalizada, tendo mais sucesso no preenchimento das vagas.

Page 325: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

325

Tabela 3 – Vagas Oferecidas, Preenchidas e Quantidade de Colocações do SINE em 2003 e em 2008

UF Ano Vagas oferecidas

Vagas preenchidas

Aproveitamento de vagas (%)

Colocações no ano

Crescimento colocações (%)

Norte2003 27.055 15.483 57,2 7.685

2008 53.883 21.658 40,2 10.197 32,7

Nordeste2003 207.966 141.964 68,3 85.353

2008 352.818 187.649 53,2 113.574 33,1

Sudeste2003 1.024.281 246.113 24,0 154.151

2008 1.040.500 328.052 31,5 223.461 45,0

Sul2003 137.503 65.244 47,4 41.767

2008 194.425 69.448 35,7 48.436 16,0

Centro-Oeste

2003 112.781 48.887 43,3 28.031

2008 251.415 94.991 37,8 58.009 106,9

Total2003 1.509.586 517.691 34,3 316.987

2008 1.893.041 701.798 37,1 453.677 43,1

Fonte: Elaboração Própria dos Autores Baseada nos Dados do MTE.

No geral, o aumento do número de colocações e da taxa de aproveitamen-to das vagas sugere a melhora da capacidade de intermediação da mão-de-obra no curto prazo pelo SINE. No entanto, a grande diferença nos desempenhos regionais da intermediação de trabalhadores confirma a desigual estruturação da instituição e a distinta dinâmica dos mercados de trabalho nas várias regiões.4

11.2 – Aproveitamento de Vagas pelo SINE em 2008, segundo Grandes Grupos (GG) e Subgrupos (SG) da CBO

Os principais instrumentos utilizados para operacionalizar os serviços de intermediação do SINE são: o banco de dados dos trabalhadores demandantes, o banco de dados das vagas ofertadas, o registro das empresas e a classificação das ocupações segundo a Classificação Brasileira de Ocupações (CBO). A definição do posto de trabalho oferecido e da experiência profissional do trabalhador pela

4 Em Saboia (2009) as informações das regiões são desagregadas para os estados confirmando o forte desnível existente entre eles.

Page 326: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

326

CBO é fundamental para estabelecer “uma linguagem comum entre a empresa e o serviço de intermediação”. (MORETTO, 2007, p. 213), o que auxilia a orientação profissional no processo de recrutamento, na prospecção principalmente de pequenas e de médias empresas e no processo de informação sobre o mercado de trabalho.

Nesta seção apresentam-se os dados acerca do desempenho do SINE no ano de 2008, agregados segundo a noção de Grandes Grupos (GG) e Subgrupos (SG) da CBO.5 Os nove GGs listados na Tabela 4 equivalem à agregação mais geral das ocu-pações, identificadas de acordo com as habilidades cognitivas comuns e os respectivos níveis de competência, em uma escala de 1 a 4, definidos pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).6 Excluindo-se o GG1, de dirigentes, que não possui nível de compe-tência definido, os GGs 2 e 3 exigem as maiores competências (respectivamente, níveis 4 e 3) e os GGs 4 a 9, níveis inferiores (no máximo o nível 2). Em outras palavras, os GGs 2 e 3 concentram os melhores empregos e as maiores exigências de qualificação.

Tabela 4 - Nível de Competência do GGs da CBOGG Grandes Crupos Nível de Competência

1 Dirigentes Não definido

2 Profissionais das ciências e das artes 4

3 Técnicos de nível médio 3

4 Trabalhadores de serviços administrativos 2

5 Trabalhadores do comércio e outros serviços 2

6 Trabalhadores agropecuários, florestais, da caça e pesca 2

7 Trabalhadores industriais de processos discretos 2

8 Trabalhadores industriais de processos contínuos 2

9 Trabalhadores de manutenção e reparação 2Fonte: Elaboração Própria dos Autores Baseada nos Dados do MTE. Disponível em: <http://www.mtecbo.gov.br/informacao.asp>. Acesso em: 28 mar. 2009.

Na Tabela 5 consta a agregação das vagas do SINE em 2008 por Grandes Gru-pos e os respectivos índices de aproveitamento. O maior volume de vagas ofertadas e preenchidas em 2008 ocorreu nos GGs 5 e 7, formados por ocupações relacionadas 5 Essas duas formas de classificação são as mais agregadas da Classificação Brasileira de Ocupações (CBO).

6 Para o MTE, a competência tem duas dimensões: “Nível de competência: é função da complexidade, amplitude e responsabilidade das atividades desenvolvidas no emprego ou outro tipo de relação de trabalho” e Domínio (ou especialização) da competência: relaciona-se às características do con-texto do trabalho como área de conhecimento, função, atividade econômica, processo produtivo, equipamentos, bens produzidos que identificarão o tipo de profissão ou ocupação. Disponível em: <http://www.mtecbo.gov.br/informacao.asp>. Acesso em: 28 mar. 2009.

Page 327: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

327

ao comércio e aos processos industriais discretos, que exigem em geral níveis baixos de competência. Também é relativamente elevado o número de vagas oferecidas e preenchidas no GG 4, referente aos serviços administrativos.

A oferta de vagas nos GGs 2 e 3, com patamares mais elevados de compe-tência, é relativamente baixa, 1,5% e 4,8% do total, respectivamente. O mesmo ocorre com o preenchimento das vagas: 1,3% e 3,4% em 2008.

O GG6 teve o melhor aproveitamento das vagas em 2008, de 76,0%, for-mado por ocupações do setor agropecuário. A situação mais desfavorável foi a do GG 9, constituída por ocupações relacionadas a reparação e a manutenção (20,7%). O desempenho dos demais GGs se manteve entre 20% e 40%, inclusive os GGs 2 e 3, que exigem maiores níveis de competências dos trabalhadores, respectivamente 32,0% e 27,1%. Tal resultado sugere para os trabalhadores mais qualificados o mesmo nível de dificuldade encontrado na intermediação dos tra-balhadores menos qualificados.

Tabela 5 – Vagas do SINE segundo os GGs da CBO – 2008

Grandes grupos (GGs) Vagas Oferecidas % Vagas

Preenchidas % Aproveitamento das vagas (%)

1 - Dirigentes 8.240 0,4 1.905 0,3 23,1

2 - Profissionais das Ciências e das artes 29.427 1,5 9.422 1,3 32,0

3 - Técnicos de nível médio 90.591 4,8 24.505 3,4 27,1

4 - Trabalhadores de serviços administrativos 368.256 19,3 139.348 19,3 37,8

5 - Trabalhadores do comércio e outros serviços 662.937 34,8 235.483 32,7 35,5

6 - Trabalhadores agropecuários, florestais, caça e pesca 93.882 4,9 71.323 9,9 76,0

7 - Trabalhadores industriais de processos discretos 564.513 29,6 215.059 29,9 38,1

8 - Trabalhadores industriais de processos contínuos 35.667 1,9 12.434 1,7 34,9

9 - Trabalhadores de reparação e manutenção 52.178 2,7 10.822 1,5 20,7

Total* 1.905.691 100,0 720.304 100,0 37,8

Fonte: Base de dados do SINE/MTE.* Há uma pequena diferença de 108 vagas preenchidas e 23 vagas oferecidas, entre o total da Tabela 3 e o da Tabela 4 na tabulação do próprio MTE, que não foi possível ser sanada.

Page 328: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

328

Na Tabela 6 consta o perfil ocupacional geral das vagas que as empresas disponibilizaram em maior quantidade no SINE nacional no ano de 2008,7 sem distinção do GG a que pertencem. Destacam-se as 104.720 vagas para auxiliar de linha de produção, as 57.626 para oficial de serviços gerais e as 52.157 para auxiliar de limpeza. Importante enfatizar que as 20 ocupações listadas pertencem aos GGs 4 a 7, ou seja, que exigem nível de competência no máximo igual a 2. A maior taxa de aproveitamento entre as ocupações mais oferecidas foi obtida para os trabalhadores rurais (79,9%), e a menor para os carpinteiros (23,2%).

As 20 ocupações mais oferecidas totalizam cerca de 750 mil vagas, o que sig-nifica que quase 40% da quantidade total do banco de dados de ofertas do SINE são constituídas por ocupações pouco qualificadas. Esta informação nos permite concluir que, por um lado, o mercado de trabalho cria um montante muito supe-rior de vagas que exigem pouca qualificação e, por outro, o próprio mercado de trabalho demanda do SINE relativamente poucas vagas dos GGs 2 e 3, talvez por identificar a instituição como intermediadora de mão-de-obra pouco qualificada.

Tabela 6 – Perfil das Vagas Mais Oferecidas pelo SINE – 2008Ocupações Vagas

oferecidas Vagas preenchicdas Aproveitamento das vagas (%)

7842.05 Auxiliar de linha de produção 104.720 59.882 57,2

5143.25 Auxiliar de serviços gerais 57.626 29.932 51,9

5143.20 Auxiliar de limpeza 52.157 17.821 34,2

4223.10 Operador de telemarketing ativo e recep. 46.146 25.297 54,8

4223.05 Operador de telemarketing ativo 44.449 10.599 23,8

4223.15 Operador de telemarketing receptivo 42.693 16.821 39,4

7152.10 Pedreiro 42.321 14.039 33,2

5211.15 Promotor de vendas 34.780 9.493 27,3

7170.20 Servente de obras 34.680 20.642 59,5

6231.10 Trabalhador rural 32.568 26.018 79,9

5211.10 Vendedor interno 31.667 9.127 28,8

4211.25 Operador de caixa 30.639 11.672 38,1

5174.10 Porteiro 30.619 8.815 28,8

5121.20 Empregado doméstico diarista 28.690 10.334 36,0

5134.35 Atendente de lanchonete 24.073 8.195 34,0

7155.05 Carpinteiro 23.640 5.490 23,2

7825.10 Motorista de caminhão 23.067 7.166 31,1

7152.05 Ajudante de calceteiro 21.848 7.225 33,1

7 Há milhares de ocupações classificados ao nível de seis dígitos da CBO.

Continua

Page 329: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

329

Tabela 6 – Perfil das Vagas Mais Oferecidas pelo SINE – 2008Ocupações Vagas

oferecidas Vagas preenchicdas Aproveitamento das vagas (%)

5173.30 Vigilante 20.125 8.309 41,3

5211.25 Operador de supermercados 19.727 10.192 51,7

Total 746.235 317.069 42,5Fonte: Base de Gestão IMO/CSINE/CGER/DES/SPPE/MTE.

As 20 ocupações com maior volume de vagas preenchidas pelo SINE nacio-nal em 2008 representam 321.555 vagas ou 44,6% do total. (Tabela 7). Significa dizer que pouco menos da metade das vagas intermediadas está concentrada em um rol de 20 ocupações pertencentes aos GGs 4 a 7, que exigem níveis inferiores de competência. Destas, o maior indicador de aproveitamento das vagas foi o de trabalhadores da cultura de uva (92,3%). As ocupações com maior quantidade de vagas preenchidas foram: 59.882 auxiliares de linha de produção, 29.932 oficiais de serviços gerais e 26.018 trabalhadores rurais. Essas ocupações não exigem muita especialização, constituídas majoritariamente por trabalhadores que se su-jeitam a qualquer atividade para se livrarem do desemprego.

Tabela 7– Perfil das Vagas Mais Preenchidas pelo SINE – 2008Ocupações Vagas

oferecidas Vagas preenchicdas Aproveitamento das vagas (%)

7842.05 Auxiliar de linha de produção 104.720 59.882 57,2

5143.25 Oficial de serviços gerais 57.626 29.932 51,9

6231.10 Trabalhador rural 32.568 26.018 79,9

4223.10 Operador de telemarketing ativo e recep. 46.146 25.297 54,8

7170.20 Servente de obras 34.680 20.642 59,5

5143.20 Auxiliar de limpeza 52.157 17.821 34,2

4223.15 Operador de telemarketing receptivo 42.693 16.821 39,4

7152.10 Pedreiro 42.321 14.039 33,2

4211.25 Operador de caixa 30.639 11.672 38,1

4223.05 Operador de telemarketing ativo 44.449 10.599 23,8

5121.20 Empregado doméstico diarista 28.690 10.334 36,0

5211.25 Operador de supermercados 19.727 10.192 51,7

5211.15 Promotor de vendas 34.780 9.493 27,3

5211.10 Vendedor interno 31.667 9.127 28,8

5174.10 Porteiro 30.619 8.815 28,8

6225.15 Trabalhador da cultura de uva 9.132 8.432 92,3

Continua

(Continuação)

Page 330: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

330

Tabela 7– Perfil das Vagas Mais Preenchidas pelo SINE – 2008Ocupações Vagas

oferecidas Vagas preenchicdas Aproveitamento das vagas (%)

5173.30 Vigilante 20.125 8.309 41,3

7842.05 Alimentador de linha de produção 13.372 8.301 62,1

5134.35 Atendente de lanchonete 24.073 8.195 34,0

4221.05 Recepcionista atendente 19.370 7.634 39,4

Total 719.554 321.555 44,7Fonte: Base de Gestão IMO/CSINE/CGER/DES/SPPE/MTE.

As ocupações mais oferecidas e as mais preenchidas pelo SINE têm em comum a exigência de baixo nível de competência. Do mesmo modo, as análises dos GGs e dos SGs também apontam que há maior quantidade de vagas disponi-bilizadas e aproveitadas nas ocupações que exigem menor grau de competência. Ao mesmo tempo, os resultados não confirmam que estaria havendo falta gene-ralizada de mão-de-obra qualificada, na medida em que as taxas médias de preen-chimento das vagas são relativamente próximas, independentemente do nível de competência (com exceção das taxas mais elevadas do GG6).

A seguir é desenvolvida a análise dos GGs desagregados por subgrupos de dois dígitos.

Na Tabela 8 constam os subgrupos do GG1, formado por dirigentes, em cujas ocupações não há níveis de competência definidos. Por representarem altos cargos, em sua maioria, o SINE faz a intermediação de um número muito reduzi-do de profissionais, tendo maior expressividade as vagas para gerentes.

Tabela 8 – Vagas do SINE do GG1 - Dirigentes - Subgrupos Principais 2008

SG Descrição Vagas oferecidas

Vagas preenchidas

Aproveitamento das vagas (%)

11 Membros superiores e dirigentes do poder público 106 46 43,4

12 Dirigentes de empresas e organizações 67 24 35,8

13Diretores e gerentes em empresa de serviço de saúde, educação ou de serviços culturais, pessoais ou sociais

114 53 46,5

14 Gerentes 7.953 1.782 22,4

Total 8.240 1.905 23,1Fonte: Base de Gestão IMO/CSINE/CGER/DES/SPPE/MTE.

(Continuação)

Page 331: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

331

O GG2, formado por profissionais das ciências e das artes, reúne as vagas que exigem os maiores níveis de competência dos candidatos (nível 4), mas com índice de aproveitamento geral (32,0%) no mesmo patamar da maioria dos demais GGs. A maior demanda por trabalhadores qualificados pelos estabelecimentos/instituições está concentrada no subgrupo 25, de profissionais das áreas das ciên-cias sociais e humanas. (Tabela 9).

O melhor aproveitamento das vagas oferecidas foi registrado para os pesqui-sadores e profissionais policientíficos (SG 20), 47,4%, entretanto representando um número muito pequeno de profissionais. As piores performances foram obti-das pelos profissionais das ciências exatas, físicas e de engenharia (20,5%) e pelos profissionais das ciências jurídicas (20,6%).

Tabela 9 – Vagas do SINE do GG2 – Profissionais das Ciências e das Artes – Subgrupos principais - 2008

SG Descrição Vagas oferecidas

Vagas preenchidas

Aproveitamento das vagas (%)

20 Pesquisadores e profissionais policientíficos 152 72 47,4

21 Profissionais das ciências exatas, físicas e de engenharia 4.673 956 20,5

22 Profissionais de ciências biológicas e de saúde 6.229 1.875 30,1

23 Profissionais do ensino 6.548 2.934 44,8

24 Profissionais das ciências jurídicas 1.026 211 20,6

25 Profissionais das ciências sociais e humanas 8.388 2.649 31,6

26 Comunicadores, artistas e religiosos 2.411 725 30,1

Total 29.427 9.422 32,0Fonte: Base de Gestão IMO/CSINE/CGER/DES/SPPE/MTE.

Na Tabela 10 constam as vagas de ocupações técnicas de nível médio, com exigência do nível 3 de competência, cujo aproveitamento total foi de 27,1%, patamar semelhante ao dos demais GGs. Ressalta-se a grande oferta de vagas em ocupações técnicas na área administrativa, 38.622 no total, com destaque para as ocupações da área comercial (SG 354 – A.3 - Anexo). Os maiores índices de aproveitamento foram do SG 33, de professores leigos e de ensino médio (58,2%) e do SG 39, de técnicos de nível médio de diversas especialidades (48,9%).

Page 332: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

332

Tabela 10 – Vagas do SINE do GG3 – Técnicos de Nível Médio – Subgrupos Principais - 2008

SG Descrição Vagas oferecidas

Vagas preenchidas

Aproveitamento das vagas (%)

30 Técnicos polivalentes 1.054 236 22,4

31 Técnicos de nível médio das ciências físicas, químicas, engenharia e afins 24.703 5.305 21,5

32 Técnicos de nível médio das ciências biológicas, bioquímicas, saúde e afins 8.350 3.421 41,0

33 Professores leigos e de ensino médio 4.494 2.617 58,2

34 Técnicos de nível médio em serviços de transporte 1.470 288 19,6

35 Técnicos de nível médio das ciências administrativas 38.622 7.797 20,2

37 Técnicos de nível médio dos serviços culturais, das comunicações e dos desportos 6.413 2.159 33,7

39 Outros técnicos de nível médio 5.485 2.682 48,9

Total 90.591 24.505 27,1Fonte: Base de Gestão IMO/CSINE/CGER/DES/SPPE/MTE.

Os trabalhadores dos serviços administrativos (nível 2 de competência) são apresentados na Tabela 11, com índice de aproveitamento de 37,8%. O SG 42 é volumoso e agrega os trabalhadores de atendimento ao público, que incorpora os operadores de telemarketing e recepcionistas, cujo índice de aproveitamento das vagas fica pouco abaixo de 40%. Também há um grande número de vagas para escriturários (SG 41) com nível semelhante de aproveitamento.

Tabela 11 – Vagas do SINE do GG4 – Trabalhadores de Serviços Administrativos – Subgrupos Principais - 2008

SG Descrição Vagas oferecidas

Vagas preenchidas

Aproveitamento das vagas (%)

41 Escriturários 132.075 48.871 37,0

42 Trabalhadores de atendimento ao público 236.181 90.477 38,3

Total 368.256 139.348 37,8Fonte: Base de Gestão IMO/CSINE/CGER/DES/SPPE/MTE.

O GG5 é o mais volumoso, com cerca de 660 mil vagas oferecidas e 235 mil preenchidas. Este grupo incorpora os trabalhadores de serviços em geral e do comércio, setores que mais empregam mão-de-obra. A maior demanda ocorre no

Page 333: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

333

SG 51 (cerca de 453 mil) por trabalhadores do setor de serviços. As taxas de apro-veitamento do GG5 são semelhantes à média geral, próximas a 35%. (Tabela 12).

Tabela 12 – Vagas do SINE do GG5 – Trabalhadores do Comércio e Outros Serviços – Subgrupos Principais - 2008

SG Descrição Vagas oferecidas

Vagas preenchidas

Aproveitamento das vagas (%)

51 Trabalhadores dos serviços 453.233 164.898 36,4

52 Vendedores e prestadores de serviços do comércio 209.704 70.585 33,7

Total 662.937 235.483 35,5Fonte: Base de Gestão IMO/CSINE/CGER/DES/SPPE/MTE.

Conforme já citado, o GG6 é o que apresenta a melhor relação entre vagas preenchidas e vagas oferecidas: 76%. Os SGs são formados por ocupações que exigem pouca competência, voltadas para a agropecuária e o extrativismo, que usualmente pagam ínfimos salários. Na Tabela 13 destaca-se o aproveitamento de 84% das vagas do SG 63, formado por pescadores e extrativistas florestais, muito provavelmente oferecidas em regiões mais pobres e com maior atuação da intermediação do SINE local. Destaca-se ainda o alto aproveitamento do SG 62, correspondente aos trabalhadores da exploração agropecuária em geral.

Tabela 13 – Vagas do SINE do GG6 – Trabalhadores Agropecuários, Florestais, Caça e Pesca - Subgrupos Principais - 2008

SG Descrição Vagas oferecidas

Vagas preenchidas

Aproveitamento das vagas (%)

61 Produtores na exploração agropecuária 802 466 58,1

62 Trabalhadores na exploração agropecuária 81.621 63.142 77,4

63 Pescadores e extrativistas florestais 5.832 4.898 84,0

64 Trabalhadores na mecanização agropecuária e florestal 5.627 2.817 50,1

Total 93.882 71323 76,0Fonte: Base de Gestão IMO/CSINE/CGER/DES/SPPE/MTE.

O GG7 é o segundo mais volumoso, constituído principalmente por traba-lhadores da indústria extrativa, construção civil e funções transversais (ajudantes e operadores em geral, empacotadores, manobristas e motoristas), com 38,1% de aproveitamento na área de trabalhadores industriais de processos discretos. (Tabela 14). As ocupações de trabalhadores transversais (SG 78) são, justamente, aquelas em que o SINE realiza o maior volume de intermediação, com índice de aproveitamento de 47,6%.

Page 334: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

334

Tabela 14 – Vagas do SINE do GG7 – Trabalhadores Industriais de Processos Discretos – Subgrupos Principais - 2008

SG Descrição Vagas oferecidas

Vagas preenchidas

Aproveitamento das vagas (%)

71 Trabalhadores da indústria extrativa e da construção civil 219.717 78.653 35,8

72 Trabalhadores da transformação de metais e de compósitos 74.206 16.488 22,2

73 Trabalhadores da fabricação e da instalação eletroeletrônica 4.414 1.010 22,9

74 Montadores de aparelhos e instrumentos de precisão e musicais 435 64 14,7

75 Joalheiros, vidreiros, ceramistas e afins 801 436 54,4

76 Trabalhadores nas indústrias têxteis, do curtimento, do vestuário e das artes gráficas 46.214 16.720 36,2

77 Trabalhadores das indústrias da madeira e do mobiliário 9.039 1.960 21,7

78 Trabalhadores de funções transversais 209.687 99.728 47,6

Total 564.513 215.059 38,1Fonte: Base de Gestão IMO/CSINE/CGER/DES/SPPE/MTE.

Na Tabela 15 são apresentadas as vagas oferecidas pelo SINE na área de processos contínuos na indústria. No GG8 há relativamente pouca oferta de va-gas, cerca de 35 mil, e índice de aproveitamento de 34,9%. O SG 84 – trabalhado-res da fabricação de bebidas, fumos e alimentos – representa quase 70% das vagas oferecidas neste GG, com 33,5% de aproveitamento.

Tabela 15 – Vagas do SINE do GG8 – Trabalhadores Industriais de Processos Contínuos – 2008

SG Descrição Vagas oferecidas

Vagas preenchidas

Aproveitamento das vagas (%)

81 Trabalhadores em indústrias de processos contínuos e outras indústrias 5.836 2.292 39,3

82 Trabalhadores de instalações siderúrgicas e de materiais de construção 2.522 1.113 44,1

83 Trabalhadores de instalações e máquinas de fabricação de celulose e papel 295 118 40,0

84 Trabalhadores da fabricação de alimentos, bebidas e fumos 22.956 7.691 33,5

86Operadores de produção, captação, tratamento e distribuição de energia, água e utilidades

4.058 1.220 30,1

Total 35.667 12.434 34,9Fonte: Base de Gestão IMO/CSINE/CGER/DES/SPPE/MTE.

Page 335: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

335

O GG9 é constituído por profissionais da área de manutenção e reparação e possui o mais baixo índice de aproveitamento: 20,7%. (Tabela 16). O GG9 é formado basicamente por trabalhadores em serviços de reparação e manutenção mecânica e polimantenedores (qualificados para operar com circuitos eletromecânicos, como de alarme). Embora exigindo um nível de competência relativamente baixo, o SINE tem dificuldades em encontrar trabalhadores com a especialização correspondente.

Tabela 16 – Vagas do SINE do GG9 – Trabalhadores de Reparação e Manutenção – Subgrupos Principais - 2008

SG Descrição Vagas oferecidas

Vagas preenchidas

Aproveitamento das vagas (%)

91 Trabalhadores em serviços de reparação e manutenção mecânica 25.614 5.176 20,2

95 Polimantenedores 21.332 4.498 21,1

99 Outros trabalhadores da conservação, manutenção e reparação 5.232 1.148 21,9

Total 52.178 10.822 20,7Fonte: Base de Gestão IMO/CSINE/CGER/DES/SPPE/MTE.

Após a análise detalhada do perfil das ocupações intermediadas pelo SINE, pode-se ponderar que a competência e a especialização do trabalhador em determinada fun-ção pode representar apenas metade do que é considerado por ocasião da demanda por mão-de-obra no mercado. De acordo com especialistas do SINE, a outra metade corresponde a quesitos como índole (análise psicológica, antecedentes criminais e refe-rências de empregadores anteriores); escolaridade; tempo de desemprego (não se admite se está há mais de um ano desempregado); registro em carteira (dificuldade de ser admi-tido quem não tiver nenhum registro em carteira); ou recursos para investimento inicial, como no caso dos vendedores pracistas (exigência da compra do KIT de venda).

Ao ser atendido no posto de intermediação do SINE o trabalhador passa por um processo de pré-seleção para verificar a área de atuação e as vagas disponí-veis a que pode se candidatar. Nesse processo são analisadas características como perfil psicológico, habilidades e experiências do trabalhador. Caso a intermedia-ção não traga resultados, o trabalhador é encaminhado a um programa de qualifi-cação profissional. Deste modo, o aproveitamento das vagas depende do preparo do atendente, assim como o acesso a procedimento informatizado e integrado.

Na próxima seção é feita uma comparação entre as performances da atuação do SINE no Nordeste e no Sudeste a partir das taxas de aproveitamento de vagas disponibilizadas. Tal comparação se justifica pelo fato de que as duas regiões são

Page 336: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

336

aquelas com maior número de vagas disponibilizadas pelo SINE e aproveitadas pelo mercado. Além disso, ilustram duas situações extremamente distintas.

11.3 – Comparação do Desempenho do SINE no Nordeste e no Sudeste

As análises das seções 1 e 2 fornecem um panorama geral da atuação do SINE nacional nos últimos anos. No entanto, a comparação do desempenho re-gional da instituição, com destaque para o Sudeste e para o Nordeste, compostos por mercados de trabalho de dinâmicas muito distintas, define um painel mais detalhado da intermediação pública no País.

No Sudeste, as vagas oferecidas e as preenchidas estão fortemente concentra-das em três GGs: trabalhadores de serviços administrativos (GG4), trabalhadores do comércio e outros serviços (GG5) e trabalhadores industriais e serviços discre-tos (GG7). A Tabela 18 também mostra que apesar de ser baixa a oferta de vagas no GG6 – trabalhadores agropecuários, florestais, da caça e da pesca – apresenta o maior índice de “sucesso”: 71,1% das vagas oferecidas em 2008. Os GGs 2 e 3, grupos que apresentam os maiores níveis de competência, respectivamente 3 e 2, têm índices de aproveitamento, respectivamente, de 27,1% e de 24,8%, semelhantes aos da maioria dos GGs no Sudeste.

Tabela 17 – Sudeste: Vagas do SINE segundo os GGs da CBO – 2008

Grandes grupos (GCs) Vagas Oferecidas % Vagas

Preenchidas % Aproveitamento das vagas (%)

1 – Dirigentes 4.315 0,4 892 0,3 20,7

2 - Profissionais das Ciências e das artes 16.069 1,5 4.347 1,3 27,1

3 - Técnicos de nível médio 50.672 4,6 12.553 3,6 24,8

4 - Trabalhadores de serviços administrativos 309.849 28,0 102.200 29,4 33,0

5 - Trabalhadores do comércio e outros serviços 390.473 35,2 121.089 34,8 31,0

6 - Trabalhadores agropecuários, florestais, caça e pesca 23.907 2,2 16.990 4,9 71,1

7 - Trabalhadores industriais de processos discretos 264.732 23,9 79.145 22,8 29,9

8 - Trabalhadores industriais de processos contínuos 16.582 1,5 4.253 1,2 25,6

Continua

Page 337: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

337

Tabela 17 – Sudeste: Vagas do SINE segundo os GGs da CBO – 2008

Grandes grupos (GCs) Vagas Oferecidas % Vagas

Preenchidas % Aproveitamento das vagas (%)

9 - Trabalhadores de reparação e manutenção 31.399 2,8 6.025 1,7 19,2

Total 1.107.998 100,0 347.494 100,0 31,4Fonte: Base de Gestão IMO/CSINE/CGER/DES/SPPE/MTE.

Comparando-se os dados das Tabelas 17 e 18 nota-se, primeiramente, que o índice geral de aproveitamento das vagas no Nordeste, de 53,2%, é muito superior ao do Sudeste, de 31,4%. Este indicador reflete o melhor desempenho do SI-NE-NE na intermediação de trabalhadores em todos os GGs, inclusive no GG2 (40,8%) e no GG 3 (35,5%), que exigem maior nível de qualificação profissional.

Como esperado, diante do elevado peso do trabalho agrícola no mercado de tra-balho nordestino, a participação relativa do GG6 é superior, tanto em termos de vagas oferecidas quanto preenchidas, além do índice de aproveitamento ser de 87,2% em 2008, muito superior ao dos demais grupos. Por outro lado, no SINE-NE há grande participação das vagas oferecidas/preenchidas voltadas para a indústria de processos discretos do GG7, com 55,3% de aproveitamento das vagas, complementando o es-forço realizado por alguns estados no sentido de desenvolver a indústria local.

Tabela 18 – Nordeste: Vagas do SINE segundo os GGs da CBO – 2008

Grandes grupos (GCs) Vagas Oferecidas % Vagas

Preenchidas % Aproveitamento das vagas (%)

1 – Dirigentes 3.989 1,1 1.699 0,9 42,6

2 - Profissionais das Ciências e das artes 9.911 2,8 4.039 2,2 40,8

3 - Técnicos de nível médio 18.798 5,3 6.682 3,6 35,5

4 - Trabalhadores de serviços administrativos 60.528 17,1 28.462 15,2 47,0

5 - Trabalhadores do comércio e outros serviços 87.058 24,7 41.966 22,4 48,2

6 - Trabalhadores agropecuários, florestais, caça e pesca 43.442 12,3 37.880 20,2 87,2

7 - Trabalhadores industriais de processos discretos 113.258 32,1 62.612 33,4 55,3

8 - Trabalhadores industriais de processos contínuos 6.163 1,7 2.108 1,1 34,2

9 - Trabalhadores de reparação e manutenção 9.878 2,8 2.228 1,2 22,6

Total* 353.025 100,0 187.676 100,0 53,2

Fonte: Base de Gestão IMO/CSINE/CGER/DES/SPPE/MTE.

(Continuação)

Page 338: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

338

No grupo dos dirigentes o SG 13, formado por diretores e gerentes em empresas de serviços de saúde, educação ou serviços culturais, tem o maior índice de aproveitamento das vagas nas duas regiões. Destaca-se a grande diferença no índice de aproveitamento no SG12 (dirigentes de empresas e organizações) e no SG14 (Gerentes), muito superior no Nordeste.

Tabela 19 - Sudeste e Nordeste: Aproveitamento das Vagas do SINE do GG1 - Dirigentes - 2008

SG Descrição Sudeste Nordeste

11 Membros superiores e dirigentes do poder público 14,8 34,3

12 Dirigentes de empresas e organizações 31,7 38,5

13Diretores e gerentes em empresa de serviço de saúde, educação ou de serviços culturais, pessoais ou sociais

46,6 50,0

14 Gerentes 20,2 43,1

Total 20,7 42,6Fonte: Base de Gestão IMO/CSINE/CGER/DES/SPPE/MTE.

O desempenho da intermediação do GG2, formado por profissionais qua-lificados das ciências e das artes, é muito superior no Nordeste em relação ao Su-deste. Os índices dos pesquisadores e dos profissionais policientíficos, por exem-plo, eram de 93,4% no Nordeste e de 17,6% no Sudeste em 2008. (Tabela 20).

Tabela 20 – Sudeste e Nordeste: Aproveitamento das Vagas do SINE do GG2 – Profissionais das Ciências e das Artes - 2008

SG Descrição Sudeste Nordeste

20 Pesquisadores e profissionais policientíficos 17,6 93,4

21 Profissionais das ciências exatas, físicas e de engenharia 12,8 41,2

22 Profissionais de ciências biológicas e de saúde 29,8 38,2

23 Profissionais do ensino 40,3 51,3

24 Profissionais das ciências jurídicas 9,5 28,9

25 Profissionais das ciências sociais e humanas 27,0 47,1

26 Comunicadores, artistas e religiosos 27,9 37,5

Total 27,1 40,8Fonte: Base de Gestão IMO/CSINE/CGER/DES/SPPE/MTE.

O GG3 é formado por técnicos com competência equivalente ao nível mé-dio, grupo ocupacional no qual o SINE-NE possui desempenho melhor, com exceção do SG30, de técnicos polivalentes, o que pode ser conferido na Tabela 21.

Page 339: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

339

Destaca-se a intermediação de professores leigos e de ensino médio, que apesar da restrição legal ainda estão muito presentes no sistema educacional nacional, inclusive no Sudeste. Podem-se, ainda, mencionar os técnicos das ciências bioló-gicas, bioquímicas e da saúde com aproveitamento de 63,3% das vagas no Nor-deste, muito acima dos 36,5% encontrados no Sudeste.

Tabela 21 – Sudeste e Nordeste: Aproveitamento das Vagas do SINE do GG3 – Técnicos de Nível Médio – 2008

SG Descrição Sudeste Nordeste

30 Técnicos polivalentes 26,4 19,5

31 Técnicos de nível médio das ciências físicas, químicas, engenharia e afins 19,9 23,7

32 Técnicos de nível médio das ciências biológicas, bioquímicas, saúde e afins 36,5 63,3

33 Professores leigos e de ensino médio 56,7 70,8

34 Técnicos de nível médio em serviços de transporte 17,1 28,7

35 Técnicos de nível médio das ciências administrativas 18,2 27,3

37 Técnicos de nível médio dos serviços culturais, das comunicações e dos desportos 24,5 43,3

39 Outros técnicos de nível médio 54,7 61,1

Total 24,8 35,5Fonte: Base de Gestão IMO/CSINE/CGER/DES/SPPE/MTE.

O GG4, formado por um grupo de escriturários e de atendentes públicos, em-bora exija competência inferior, tem índices de aproveitamento superiores ao dos GGs anteriores nas duas regiões, nos dois casos bem superior na região Sudeste.

Tabela 22 – Sudeste e Nordeste: Aproveitamento das Vagas do SINE do GG4 – Trabalhadores de Serviços Administrativos – 2008

SG Descrição Sudeste Nordeste

41 Escriturários 31,9 45,0

42 Trabalhadores de atendimento ao público 33,3 48,8

Total 33,0 47,0Fonte: Base de Gestão IMO/CSINE/CGER/DES/SPPE/MTE.

O GG5 é o grupo mais importante no SINE-SE, constituído por trabalhadores do setor de serviço e do comércio, com grande quantidade de intermediações, embora o indicador de desempenho oscile próximo a 30%. O desempenho no Nordeste é bem superior, próximo a 50%, conforme Tabela 23. Para o SG 52 de vendedores e presta-dores de serviços do comércio, a taxa de aproveitamento no Nordeste atinge 42,9%.

Page 340: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

340

Tabela 23 – Sudeste e Nordeste: Aproveitamento das Vagas do SINE do GG5 – Trabalhadores do Comércio e Outros Serviços – 2008

SG Descrição Sudeste Nordeste

51 Trabalhadores dos serviços 31,3 50,5

52 Vendedores e prestadores de serviços do comércio 30,4 42,9

Total 31,0 48,2Fonte: Base de Gestão IMO/CSINE/CGER/DES/SPPE/MTE.

O GG6 é um dos grupos mais importantes no Nordeste por intermediar uma grande massa desqualificada de trabalhadores, voltados principalmente à agropecuária. No entanto, a Tabela 24 aponta que o percentual de aproveitamento das vagas é igualmente alto nas duas regiões, principalmente no subgrupo de pes-cadores e extrativistas florestais, com percentual próximo a 95,2% no Nordeste em 2008. As taxas de aproveitamento de vagas nordestinas são também bastante elevadas para os produtores e trabalhadores na exploração agropecuária.

Tabela 24 – Sudeste e Nordeste: Aproveitamento das Vagas do SINE do GG6 – Trabalhadores Agropecuários, Florestais, Caça e Pesca - 2008

SG Descrição Sudeste Nordeste

61 Produtores na exploração agropecuária 53,4 83,6

62 Trabalhadores na exploração agropecuária 73,0 87,1

63 Pescadores e extrativistas florestais 75,9 95,2

64 Trabalhadores na mecanização agropecuária e florestal 37,6 59,7

Total 71,1 87,2Fonte: Base de Gestão IMO/CSINE/CGER/DES/SPPE/MTE.

Os processos industriais discretos agregam atividades econômicas muito distintas, o que pode ser constatado na descrição do GG7 na Tabela 25. Cerca de um terço das vagas oferecidas e preenchidas no Nordeste ocorre neste GG. É importante destacar o SG71 e o SG76, que incorporam os trabalhadores da cons-trução civil, da indústria têxtil e do vestuário. Apesar da importante participação destes setores na economia e na absorção de trabalhadores do Sudeste, os índices de aproveitamento das vagas são, respectivamente, de 30,3% e de 21,5%, muito inferio-res aos 54,1% e 53,5% do Nordeste. Este quadro sugere que os setores utilizam ou-tros meios de recrutamento de trabalhadores naquela região, enquanto no Nordeste o SINE cumpre um papel mais destacado para a indústria têxtil e a construção civil.

Page 341: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

341

Tabela 25 – Sudeste e Nordeste: Vagas do SINE do GG7 – Trabalhadores Industriais de Processos Discretos – 2008

SG Descrição Sudeste Nordeste

71 Trabalhadores da indústria extrativa e da construção civil 30,3 54,1

72 Trabalhadores da transformação de metais e de compósitos 21,3 26,7

73 Trabalhadores da fabricação e da instalação eletroeletrônica 20,5 37,9

74 Montadores de aparelhos e instrumentos de precisão e musicais 14,0 28,6

75 Joalheiros, vidreiros, ceramistas e afins 48,9 48,8

76 Trabalhadores nas indústrias têxteis, do curtimento, do vestuário e das artes gráficas 21,5 53,5

77 Trabalhadores das indústrias da madeira e do mobiliário 16,8 27,9

78 Trabalhadores de funções transversais 35,6 63,8

Total 29,9 55,3Fonte: Base de Gestão IMO/CSINE/CGER/DES/SPPE/MTE.

O GG8 incorpora majoritariamente trabalhadores voltados à produção in-dustrial de processos contínuos, no qual as duas regiões apresentam percentuais de aproveitamento intermediários. São exceções o SG82, de trabalhadores dedi-cados a instalações siderúrgicas e materiais de construção, e o SG 83, de traba-lhadores de instalações e máquinas de fabricação de celulose e papel, nos quais o desempenho na ocupação das vagas ofertadas ultrapassou os 50% na região Nordeste em 2008. (Tabela 26).

Tabela 26 – Sudeste e Nordeste: Aproveitamento das Vagas do SINE do GG8 – Trabalhadores Industriais de Processos Contínuos – 2008

SG Descrição Sudeste Nordeste

81 Trabalhadores em indústrias de processos contínuos e outras indústrias 37,3 40,3

82 Trabalhadores de instalações siderúrgicas e de materiais de construção 50,5 57,2

83 Trabalhadores de instalações e máquinas de fabricação de celulose e papel 41,3 53,6

84 Trabalhadores da fabricação de alimentos, bebidas e fumos 22,2 28,1

86 Operadores de produção, captação, tratamento e distribuição de energia, água e utilidades 20,0 37,1

Total 25,6 34,2Fonte: Base de Gestão IMO/CSINE/CGER/DES/SPPE/MTE.

Page 342: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

342

Por fim, a Tabela 27 apresenta o desempenho do SINE na intermediação de trabalhadores de manutenção e de reparação. Nota-se que nas duas regiões o percentual de aproveitamento é muito baixo, próximo a 20%, o que pode ser justificado pelo perfil muitas vezes autônomo dessas ocupações, profissionais que em sua maioria não recorrem ao SINE.

Tabela 27 – Sudeste e Nordeste: Vagas do SINE do GG9 – Trabalhadores de Reparação e Manutenção - 2008

SG Descrição Sudeste Nordeste

91 Trabalhadores em serviços de reparação e manutenção mecânica 19,9 21,2

95 Polimantenedores 18,8 24,0

99 Outros trabalhadores de conservação, manutenção e reparação 17,7 21,9

Total 19,2 22,6Fonte: Base de Gestão IMO/CSINE/CGER/DES/SPPE/MTE.

Ao se comparar o desempenho do SINE no Sudeste e no Nordeste con-firma-se a observação realizada no início do texto: devido à menor dinâmica do mercado de trabalho nordestino, nesta região é melhor o desempenho da institui-ção em termos de aproveitamento das vagas e de preenchimento das ocupações que exigem maior nível de competência. Os índices de aproveitamento das vagas do SINE-SE no GG2 e no GG3 são comparativamente menores, o que torna compreensível certa descrença do mercado de trabalho do Sudeste na intermedia-ção de vagas que demandem certa qualificação.

11.4 – Conclusão

Das informações apresentadas podem-se traçar algumas conclusões gerais acerca do principal sistema público brasileiro de intermediação. Primeiramente, o SINE melhorou o desempenho no período 2003/2008, tanto com o aumento do número de colocados quanto na agilidade da inserção de trabalhadores no mer-cado de trabalho. No entanto, há grande diferença no desempenho da instituição entre as regiões, notando-se maiores índices de aproveitamento das vagas nos mercados de trabalhos menos dinâmicos, o que demonstra a desigual estruturação da instituição.

Quanto à qualificação exigida pelas vagas disponibilizadas e preenchidas pelo SINE, com o auxílio da noção do nível de competência relacionado a Gran-

Page 343: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

343

des Grupos (GGs) e a Subgrupos (SGs) de ocupações, constatou-se que há pouca oferta de vagas nas ocupações correspondentes aos GGs 2 e 3, que exigem os maiores patamares de competência. E, ainda, que em todos os GGs as taxas de aproveitamento são semelhantes, por volta de 30%. A exceção é o GG6, com taxa de desempenho de 76%, formado por trabalhadores agropecuários e pescadores que possuem pouca competência.

No decorrer do texto nota-se a necessidade de aprimoramento das atividades de intermediação, tanto pelo lado da prospecção de vagas quanto no cadastramento de candidatos mais adequados às especificações das vagas ofertadas, ou melhor, deve-se aprimorar a capacidade do sistema em facilitar o funcionamento do mer-cado de trabalho e encurtar a distância entre o trabalhador e as empresas. Especia-listas afirmam que somente o aperfeiçoamento da gestão do SINE não é suficiente para ampliar seu papel. Há necessidade de integrá-lo a outras políticas públicas de trabalho, visando a aumentar as chances dos trabalhadores que possuem maiores dificuldades de se inserir em postos de trabalho assalariados e formais.

Finalmente, a comparação entre as performances em termos de aproveita-mento de vagas disponibilizadas no Nordeste e no Sudeste é francamente favo-rável ao Nordeste, onde a competição com outras instituições de colocação de mão-de-obra no mercado tende a ser menor. De qualquer forma, seria desejável um aprofundamento do estudo nas duas regiões para verificar se as práticas de intermediação utilizadas pelo SINE nos estados do Nordeste e do Sudeste se diferenciam a ponto de justificar os melhores resultados na primeira.

Page 344: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

344

Referências

BORGES, M. Uma contribuição ao debate das políticas públicas de em-prego: o sistema público de emprego. Brasília, DF: Ministério do Trabalho e Emprego, 2002. Mimeografado.

MORETTO, A. Mercado de trabalho e políticas de emprego no Brasil. 2001. 146 f. Dissertação (Mestrado) - Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2001.

______. O sistema público de emprego no Brasil: uma construção inacabada. 2007. 304 f. Tese (Doutorado) - Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2007.

SABOIA, J. (Coord.). Tendências da qualificação da força de trabalho: estu-do transversal 4: projeto perspectivas de investimento no Brasil. Rio de Janeiro: UFRJ, 2009.

SALM, C. Estagnação econômica, desemprego e exclusão social. In: SICSÚ, J. et al. (Org.). Novo desenvolvimentismo: um projeto nacional de crescimento com equidade social. Barueri: Manoli, 2005.

Page 345: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

12CAPÍTULO

AS POLÍTICAS DE MERCADO DE TRABALHO E A CRISE DE 2008

Amilton Moretto1

O período que se inicia com a desvalorização cambial no Brasil marca uma inflexão importante para o mercado de trabalho. Depois de longo período com baixo desempenho o mercado de trabalho voltou a apresentar crescimento do emprego assalariado formal (aquele com vínculo de trabalho reconhecido com registro na carteira de trabalho). Isso ocorreu, principalmente, porque os grandes estabelecimentos do setor industrial voltaram a contratar, mas também porque se ampliaram os mecanismos de regulação e fiscalização sobre o trabalho. O signifi-cado dessa mudança foi a retomada da trajetória de estruturação do mercado de trabalho. (BALTAR; MORETTO; KREIN, 2006).

A crise mundial de 2008 interrompeu esse movimento virtuoso do mercado de trabalho e, apesar dos efeitos da crise não terem a dimensão observada nas economias desenvolvidas, eles atingiram fortemente o emprego industrial. A taxa desemprego2 em setembro de 2008, que estava em 7,7% da população ativa e se-guia uma trajetória de queda, atingiu o pico de 9,0% em março de 2009, recuando para 7,7% em setembro de 2009. Quando se observa o desemprego da indústria 3constata-se seu valor mais elevado: de 3,4% da população ativa, em setembro de 2008, elevou-se para 6,1%, em março de 2009, para chegar, em setembro de 2009, a 4,3%, quase um ponto percentual acima do valor do ano anterior. Ou seja, a crise paralisou o ritmo de redução do desemprego. Com isso, perdeu-se um ano sem avanço na melhoria das condições de absorção de mão-de-obra.

A retomada do dinamismo econômico faz com que as empresas voltem a abrir os postos de trabalho eliminados nos fins de 2008 e início de 2009. Com isso, recoloca-se a questão do preenchimento dessas vagas de emprego. A grande 1 Professor e pesquisador Instituto de Economia (IE)/Centro de Estudos Sindicais e de Economia do

Trabalho (Cesit)/Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).

2 Dados da PME/IBGE para as seis regiões metropolitanas pesquisadas.

3 Inclui a extrativa, de transformação e produção e distribuição de gás, eletricidade e água.

Page 346: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

346

oferta de mão-de-obra permite que as empresas tenham condições de selecionar os trabalhadores com melhor perfil, geralmente com maior escolaridade. Por ou-tro lado, o maior dinamismo do mercado de emprego4 possibilita maior eficácia das ações das Políticas de Mercado de Trabalho (PMT), o que se reflete na estru-turação do mercado de trabalho.

O objetivo deste artigo é discutir o papel que as PMTs podem ter a partir da recuperação econômica brasileira em meados de 2009. Tem-se como pressu-posto que essas políticas possuem um caráter tanto de apoio na estruturação do mercado de trabalho quanto de proteção social, mas que o bom desempenho do conjunto de seus instrumentos depende do crescimento adequado do produto para gerar as oportunidades ocupacionais necessárias para incorporar o conjunto da população ativa.

Neste sentido, o esforço concentra-se sobre três aspectos dessas políticas. O primeiro diz respeito à proteção da renda do desempregado. O segundo dis-cute a questão da capacidade de inserção do trabalhador em uma ocupação. E o terceiro aspecto foca a questão da qualificação profissional como instrumento de intervenção. Esses aspectos organizam as seções em que o artigo está estruturado, seguindo, ao final, algumas considerações.

12.1 – A Proteção da Renda do(a) Trabalhador(a) Desempregado(a)

O Seguro-Desemprego (SD) se constitui no principal instrumento de prote-ção à renda do trabalhador desempregado. Assim, nos momentos de baixo dina-mismo econômico ou em momentos de recessão o número de beneficiários e o volume de gastos com essa política tendem a aumentar, ocorrendo o inverso nos momentos de crescimento do produto.

No caso brasileiro, desde 1992 o SD apresenta uma estabilidade na sua co-bertura, em torno de 2/3 dos trabalhadores demitidos sem justa causa. Contu-do, essa proporção se ampliou nos últimos anos e, contrariamente ao que seria esperado, o crescimento ocorreu num momento de retomada do dinamismo da economia, especialmente a partir de 2005. Os dados do Gráfico 1 mostram a evo-

4 Define-se mercado de emprego como aquele cuja inserção a uma ocupação se dá por meio do assalariamento com registro em carteira de trabalho, distinguindo-se das demais formas de inserção presentes no mercado de trabalho brasileiro.

Page 347: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

347

lução do total de trabalhadores dispensados sem justa causa, dos trabalhadores que foram segurados e a taxa de cobertura do Seguro-Desemprego (segurados/dispensados sem justa causa) de janeiro de 2000 até novembro de 2009.

Constata-se que o comportamento dos trabalhadores dispensados e segura-dos, entre janeiro de 2000 e dezembro de 2004, mantém-se próximo, resultando na estabilidade da taxa de cobertura em torno de 70% do total de dispensados sem justa causa. Esse comportamento se altera a partir de 2005, observando-se um deslocamento entre a trajetória da curva de trabalhadores dispensados sem justa causa e da curva de segurados, com ampliação desta última em relação à primeira. Como resultado, a taxa de cobertura muda de patamar, elevando-se para em torno de 80% dos trabalhadores dispensados sem justa causa.

Gráfico 1 - Evolução do Total de Trabalhadores Dispensados sem Justa Causa, de Segurados e da Taxa de Cobertura

Fonte: Seguro-Desemprego/Ministério do Trabalho e Emprego (MTE)/SAEGnet. Nota: Dados dos trabalhadores dispensados e segurados, base média de 2000 = 100.

Essa modificação, ocorrida a partir de 2005, contraria as expectativas de que a melhora das condições do mercado de emprego, com ampliação do total de em-pregados, levaria à redução do número de beneficiários do seguro-desemprego e também do gasto com seu pagamento. Contudo, dada a especificidade do merca-do de emprego no Brasil, no qual há um grande fluxo de admissões e dispensas de trabalhadores a cada mês, a ampliação do número de trabalhadores empregados se deu com o aumento do número de beneficiários do seguro-desemprego. O

Page 348: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

348

aspecto positivo desse aumento é que devido ao bom desempenho da econo-mia desde 2005, um maior contingente de trabalhadores conseguiu um emprego formal e permaneceu nele, no mínimo seis meses antes de ser dispensado, o que garantiu que os trabalhadores pudessem ser habilitados a receber o seguro-desem-prego no momento em que perderam o emprego.

No momento da crise de 2008, verifica-se o aumento do número de traba-lhadores demitidos e segurados. Mas, a partir de meados de 2009, há reversão desse movimento com a recuperação da economia brasileira e a retomada das contratações, observando-se queda do número de trabalhadores dispensados, se-gurados e, também, da taxa de cobertura.

De forma geral, pode-se dizer que o seguro-desemprego cumpre o papel de proteção da renda do trabalhador no momento do desemprego. Ressalte-se que aprimoramentos foram feitos com a criação do seguro para o pescador artesanal (durante o período de defeso), para o trabalhador resgatado em situação equi-parada à de escravidão, e para a trabalhadora doméstica. De toda forma, novos avanços podem ser feitos, especialmente para ampliar o tempo do benefício para os trabalhadores com maior probabilidade de pertencerem ao grupo que mais participa do fluxo de admitidos e desligados. Neste aspecto, o maior tempo de recebimento do seguro-desemprego deve estar associado a políticas que possam ajudar o trabalhador a ampliar o tempo de permanência no emprego, especial-mente por meio de ações de qualificação socioprofissional.

Aprimorar o seguro-desemprego para os trabalhadores mais vulneráveis no mercado de emprego exige, também, aprimorar outras políticas como aquelas dirigidas à inserção do trabalhador em um emprego e à capacidade de detectar o trabalhador vulnerável por meio de estudos desenvolvidos pelos observatórios do trabalho. Estas questões serão discutidas na próxima seção.

Um último aspecto com relação à proteção da renda do trabalhador diz res-peito ao desenvolvimento de um seguro para cobrir o trabalhador ocupado por conta própria, ou seja, aquele trabalhador que está fora do mercado de emprego por opção ou por enfrentar dificuldades para se inserir em um emprego. Esta não é uma questão trivial. A criação do instituto do Micro Empreendedor Individual (MEI), em 2009, caminha na direção de “formalizar” a inserção dos trabalhadores nessa situação, abrindo espaço para a proteção da renda desse trabalhador nos momentos em que o mesmo for obrigado a se afastar de suas tarefas por motivo de doença, acidentes, entre outros, inclusive falta de trabalho.

Page 349: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

349

12.2 – Políticas de Mercado de Trabalho para Inserção Ocupacional

Discutem-se, nesta seção, as políticas de apoio à inserção ocupacional dos trabalhadores. Primeiramente, focalizam-se as políticas para inserir o trabalhador em um emprego, basicamente as atividades do serviço de intermediação de mão-de-obra. Num segundo momento discutem-se as iniciativas para a inserção em uma ocupação por conta própria de forma individual ou coletiva.

Como apontado na seção anterior, um aspecto importante para o bom de-sempenho do seguro desemprego é o correto funcionamento das ações de inser-ção do trabalhador em um emprego. A atividade de intermediação de mão-de-obra é realizada pelo setor público por meio dos centros públicos de atendimento ao trabalhador – cujo nome varia de acordo com cada unidade da federação ou municípios – que oferecem um serviço básico de intermediação5, e por empresas privadas de intermediação e de trabalho temporário. O setor privado concentra-se especialmente na intermediação dos trabalhadores mais qualificados e de maior escolaridade ou, no caso das empresas de emprego temporário, faz a triagem dos trabalhadores com menor qualificação para as atividades de fácil substituição do trabalhador que as empresas utilizam conforme a demanda. Neste último caso, as empresas que utilizam essa mão-de-obra visam a reduzir os custos envolvidos na contratação e na demissão dos trabalhadores.

No caso da intermediação propriamente dita, as empresas privadas, dado que têm a finalidade de lucro, focam os trabalhadores com maiores chances de serem contratados pelas empresas. Dessa forma, para o serviço público de inter-mediação encaminham-se aqueles trabalhadores menos qualificados e com menor escolaridade e, portanto, com maiores dificuldades de conseguir a inserção em um emprego. Isso ocorre mais frequentemente nos estados do Centro-Sul do Brasil, onde é maior o número de agências de emprego privadas. O resultado desse fato é a baixa participação do serviço público de emprego no total de trabalhadores admitidos, que é cobrado para melhorar esse indicador. Contudo, para atingir o objetivo de melhorar sua participação, o serviço público de emprego terá de fazer significativo esforço, tanto para atrair aqueles trabalhadores com maior escolari-dade e qualificação e com maiores chances de ser contratado, e que atualmente 5 Cada unidade pode oferecer diversos serviços, mas todas fazem a intermediação de mão-de-obra,

procurando aproximar o trabalhador do empregador. Incluem-se, neste grupo, as entidades sindicais que realizam essa atividade.

Page 350: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

350

buscam as agências privadas, como melhorar sua atuação junto aos trabalhadores com maiores dificuldades de se inserirem no mercado de emprego.

A melhoria da inserção do trabalhador menos qualificado exigirá a capaci-dade de se dar um atendimento diferenciado capaz de encontrar uma alternati-va de emprego adequada ao perfil desse trabalhador. Isso implica diagnosticar as principais deficiências e os aspectos positivos do indivíduo, permitindo-lhe construir uma trajetória de trabalho mais duradoura dentro da empresa. Neste sentido, há necessidade de se desenvolverem as ações de orientação profissional do serviço de emprego, associando-as às ações de qualificação profissional. Ao mesmo tempo, a prospecção de novas vagas de emprego junto às empresas deve ter uma equipe capaz de detectar as vagas que atendem a esse determinado perfil de trabalhador, exigindo um trabalho articulado entre o setor de atendimento ao trabalhador e o setor de captação de vagas.

Ampliar a participação desse grupo de trabalhadores no total de trabalha-dores admitidos, além de significar maior eficácia do serviço público de empre-go levará ao aumento da cobertura do SD e também a uma redução do gasto com esse benefício, na medida em que ao encontrar uma vaga de emprego mais adequada ao perfil desse trabalhador, deve aumentar a probabilidade de o mes-mo permanecer por um período mais longo no emprego. Ou seja, mais do que fazer a intermediação entre o trabalhador desempregado e a empresa que busca o trabalhador, é preciso aprimorar o encaminhamento, procurando averiguar as necessidades da empresa que abriu um posto de trabalho para além das caracte-rísticas para o preenchimento da vaga. Isso significa verificar a possibilidade de o trabalhador ser aproveitado em outras tarefas, ampliando as suas chances de permanência na empresa.

Por outro lado, há que se fazer um esforço para atrair os trabalhadores mais qualificados para o serviço público de emprego, mostrando-lhes que não se trata de um serviço para trabalhadores de baixa qualificação. Neste aspecto o desen-volvimento de novas técnicas de intermediação e a utilização dos recursos da internet, com autosserviço e maior agilidade na divulgação e na intermediação, são fundamentais para atender esse público mais qualificado.

Melhorar a atividade de identificação do candidato e da vaga que tenha maior afinidade significa reduzir o tempo de intermediação do trabalhador entre um emprego e outro. Se aprimorar essa atividade exige ampliar os gastos do ser-viço de imediato, no longo prazo isso implicará maior eficiência e terá impactos positivos sobre os custos de intermediação e também para o seguro-desemprego, compensando os investimentos.

Page 351: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

351

A segunda forma de inserção produtiva dos trabalhadores é a via do trabalho por conta própria. O mercado de trabalho brasileiro sempre se caracterizou por uma grande oferta de força de trabalho que não é absorvida pelo mercado de em-prego, isto é, não são trabalhadores assalariados nem estão desempregados. Esse contingente de trabalhadores, em busca de sua sobrevivência, oferece seu traba-lho, sobretudo, na prestação de serviços às pessoas e famílias, ou no comércio de mercadorias como trabalhadores ambulantes. A característica predominante dessa forma de inserção é a pouca estruturação do negócio, a baixa produtividade e, consequentemente, a baixa remuneração. Distingue-se, portanto, das ocupações liberais que caracterizam essa forma de inserção, tais como advogados, cirurgiões-dentistas, entre outros profissionais6.

As PMT direcionadas para a inserção ocupacional em atividades por con-ta própria procuram fornecer crédito para o estabelecimento de trabalhadores de baixa remuneração de forma autônoma, como o Programa de Geração de Emprego, Trabalho e Renda (Proger) Empreendedor Popular. Deve-se ressaltar que alguns desses programas fornecem crédito para micro e pequenos negócios (Proger Urbano) e também para projetos específicos de infraestrutura, como o PRÓ-EMPREGO, que financia investimento de médio e grande porte com vistas a ampliar a oferta de emprego. A essa iniciativa do Programa de Geração de Em-prego e Renda somam-se as iniciativas de Microcrédito Produtivo e da Economia Solidária, que também atuam para criar alternativas de inserção produtiva para as populações excluídas do mercado de emprego com a geração de renda.

Essas iniciativas são importantes na medida em que, mesmo admitindo-se que a retomada da economia gere um crescimento sustentado da economia bra-sileira com novos postos de trabalho, uma parcela da população ativa não deverá ser absorvida pelos empregos gerados. Isso decorre tanto do grande número de trabalhadores que precisam ser incorporados a um emprego quanto do fato de que alguns trabalhadores, dado seu perfil de menor qualificação e de escolaridade ou outras características pessoais que dificultem sua contratação, serem preteri-dos e necessitarem de apoio para exercer uma atividade produtiva que gere renda suficiente para sua manutenção.

Particularmente neste caso, será necessário, como dito anteriormente, de-senvolver novos instrumentos de proteção social que garantam um rendimento

6 Não usamos, aqui, o termo mercado informal de trabalho, pois nosso objetivo é destacar as ações das políticas de mercado de trabalho que visam a oferecer uma alternativa ao trabalhador que está fora do mercado de emprego de auferir uma renda monetária suficiente para o seu sustento. Para os leitores interessados em uma discussão mais aprofundada da questão da informalidade ver os trabalhos da professora Cacciamalli (1992, 2003).

Page 352: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

352

ao trabalhador nos momentos em que o mesmo não possa executar sua atividade. Além disso, outras políticas de apoio devem ser associadas, como a qualificação profissional, o que exige que o serviço público de emprego articule essas ações de forma eficaz, isto é, identifique o perfil do trabalhador com maior proba-bilidade de pertencer a esse grupo e as melhores alternativas para sua inserção produtiva. Portanto, não basta oferecer diversos cursos e priorizar a participação desses trabalhadores. Mesmo considerando-se a necessidade de que o trabalhador escolha a atividade em que quer se inserir, é preciso orientação para a escolha da melhor trajetória a ser seguida. Além disso, nesses casos, parece ser importante o acompanhamento por um período de tempo até que o trabalhador consolide sua atuação ocupacional.

É preciso, no entanto, ter a dimensão dos limites das ações dos programas destinados à inserção produtiva do trabalhador em uma atividade por conta pró-pria, haja vista que muitos não têm perfil para tanto ou exigirão maior tempo de acompanhamento, o que implica maiores custos e a necessidade de estabeleci-mento de articulação com os programas de assistência social.

12.3 – Limites para a inserção de beneficiários de programas de transferência de renda

A constituição do Sistema Público de Emprego, Trabalho e Renda (SPE-TR), além de integrar e articular as várias PMTs, também tem como objetivo articular essas políticas com outros programas sociais, em especial o Programa Bolsa Família (PBF). A ideia dessa articulação é propiciar mecanismos de inser-ção produtiva de beneficiários do PBF, de forma a permitir a emancipação desses beneficiários da necessidade de ter o apoio de uma política de transferência de renda. A relevância de tal iniciativa não deve, contudo, nublar a visão dos limites das PMTs para atingir tal objetivo.

Dois aspectos podem ser apontados. O primeiro diz respeito à forma de inserção do beneficiário em um programa de transferência de renda. Nem todo beneficiário está no programa porque não possui uma ocupação remunerada, mas sim porque a renda auferida por essa ocupação é insuficiente para cobrir todas as suas necessidades básicas e da sua família.

Page 353: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

353

Neste caso, cabe verificar se as PMT são capazes de interferir junto ao be-neficiário para ajudá-lo a melhorar a sua inserção ocupacional. Há limites claros no caso de o beneficiário estar empregado com carteira assinada. Isso porque sua remuneração, uma vez respeitado o limite do salário mínimo, não poderá sofrer a interferência pública. Ou seja, a melhoria da remuneração desse beneficiário dependerá de uma política de recuperação consistente do salário mínimo e da capacidade do sindicato da categoria intervir e garantir um piso salarial acima do estipulado para o salário mínimo.

O segundo aspecto diz respeito aos beneficiários que estejam fora do mer-cado de emprego, isto é, aqueles indivíduos que se inserem de forma precária no mercado de trabalho, em ocupações que não possuem nenhuma proteção nos momentos de doença, velhice, acidentes etc., sobretudo, ocupações de baixa pro-dutividade e baixa remuneração. Há espaço para a ação das políticas públicas. Não há, contudo, capacidade de as atuais PMTs identificar e coordenar iniciativas que deem suporte aos beneficiários para elevar seus rendimentos e, assim, superar a necessidade de apoio financeiro assistencial.

Aqui, a contribuição das PMTs à emancipação dos beneficiários do PBF está em identificar as suas possibilidades de melhoria no desempenho ocupacional por meio de capacitação técnica, de gestão, de apoio financeiro para o início de uma atividade por conta própria individual ou coletiva. Entre as políticas incluem-se os programas de geração de emprego e renda voltados para essas iniciativas, de qualificação profissional, de microcrédito e as iniciativas da economia solidária.

Os dados do Proger (Tabela 1) mostram que cerca de um em cada três reais dos recursos do Proger dirigem-se para o financiamento de pequenos empreendi-mentos. Porém, como o valor médio do empréstimo para esses negócios é baixo – em torno de R$ 4 mil – este conjunto de empreendimentos concentra a maior parte das operações, 86% do total. Os empreendimentos da área rural respondem pela segunda maior proporção de operações (8,4%) e 12% dos recursos aplicados. Verifica-se que os maiores recursos foram destinados para a área de infraestrutura e para a política industrial, respectivamente 24% e 21% do total dos recursos apli-cados, apesar do baixo percentual de operações. Essa distribuição de operações e recursos deve-se às características do segmento para os quais os recursos foram destinados. No caso do financiamento de obras de infraestrutura e de exporta-ções, registra-se um valor médio por operação elevado. No caso do financiamento de pequenos empreendimentos, como o valor médio é baixo, um grande número de operações – ou de empreendimentos – pode ser financiado.

Page 354: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

354

Tabela 1 - Proger - Distribuição das Operações e Valores por Pro-gramas e Linhas. Brasil, 2007

Programa/Linhas Número de Operações Valor Valor Médio (R$ mil)

Área rural 8,4 11,7 13,67

Construção civil 4,3 1,1 2,49

Difusão tecnológica 0,6 1,3 21,4

Exportação 0,0 7,1 4.113,36

Infraestrutura 0,1 24,0 2.087,01

Pequenos empreendimentos 85,6 33,5 3,85

Política industrial 1,0 21,4 211,38

TOTAL 100 100 9,84Fonte: DIEESE (2010) e MTE/SPPE/DES/CGER/CPROGER.

O mais importante dos dados anteriores é verificar que os programas de geração de emprego e renda destinam-se ao financiamento de empreendimentos que possam criar novas oportunidades de emprego. E, como se viu, em 2007 buscou-se apoiar os pequenos negócios, que tendem a gerar um número maior de oportunidades ocupacionais a partir de um volume relativamente menor que empreendimentos de maior porte e tecnologicamente mais avançados. Todavia, verifica-se que estes últimos tipos de atividade não foram esquecidos, mesmo porque não se pode avançar sem possibilitar o desenvolvimento tecnológico e o aumento da produtividade, o que permite ganhos de competitividade.

Não se faz aqui uma apreciação mais refinada do tipo de atividade finan-ciada em cada programa ou linha de crédito, nem é objetivo avaliar a efetividade dessa política. No entanto, alguns aspectos podem ser destacados. O primeiro refere-se à importância dessa política num momento de retomada do cresci-mento para financiar, sobretudo, as menores empresas, aquelas que geralmente têm mais dificuldade para obter crédito junto ao setor bancário comercial e, mais importante ainda, com taxas menores que as praticadas pelo mercado. O segundo aspecto diz respeito à possibilidade de agregar outras políticas de apoio a esse segmento, tal como o acesso a técnicas de gestão modernas, melho-ria do ambiente de trabalho por meio de informações sobre saúde e segurança no trabalho e capacitação dos trabalhadores, entre outras medidas. Um terceiro aspecto está relacionado à articulação dessas ações com o serviço de emprego, como uma instituição de apoio e de assessoramento aos pequenos empreendi-mentos no que se refere aos recursos humanos.

Page 355: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

355

Em síntese, ao lado da política de microcrédito e da economia solidária, o Proger é uma iniciativa que visa a dar condições para que os trabalhadores que es-tão fora do mercado de emprego tenham condições financeiras para buscar uma alternativa ocupacional por meio de um empreendimento, individual ou coletivo, que gere renda para sua sobrevivência e de sua família.

12.4 – Qualificação Profissional e Educação. O que deve ser priorizado?

A educação básica, o ensino profissionalizante e a qualificação profissional têm sido tratados de forma desvinculada, como se o inter-relacionamento e a hie-rarquia entre eles fossem de pouca importância. A evidência que a política de qua-lificação profissional ganhou desde meados dos anos noventa, diante do elevado desemprego e do movimento de reestruturação produtiva, tornou-a quase uma política de passagem obrigatória para quem busca um emprego remunerado. Essa importância reforçou a ideia de que o trabalhador, para ter chances de conquistar um posto de trabalho, deveria ampliar sua qualificação sistematicamente. Como resultante dessa ideia, todo trabalhador que permanecia desempregado tornava-se responsável pelo desemprego por não ter se qualificado o bastante para ser selecionado, ficando em segundo plano a capacidade do mercado em oferecer a quantidade de empregos suficientes para incorporar todos os que estavam em busca de uma vaga de trabalho.

Entende-se que os cursos de qualificação profissional são importantes para a inserção do trabalhador no mercado de emprego. Não possuem a dimensão do ensino profissionalizante, ou seja, de formação profissional, pois devem ter curta duração, já que visam a oferecer uma atualização ou uma capacitação complemen-tar para o trabalhador manter suas habilidades profissionais no momento de de-semprego e retornar com rapidez a um posto de trabalho. Nessa direção, a política de qualificação profissional deve estar integrada ao ensino regular (fundamental e médio) e ao ensino técnico profissionalizante. A capacitação ou habilidade adi-cional fornecida pela qualificação profissional deve, portanto, complementar ou suplementar o ensino regular ou profissionalizante para preparar ou readequar o trabalhador para o ingresso em um emprego. Essa integração, todavia, não existe. Em alguns casos, cursos de qualificação são voltados para a alfabetização, o que seria de responsabilidade da educação regular, deficiência que o Ensino de Jovens e Adultos (EJA) busca suprir.

Page 356: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

356

O que se quer, ao distinguir o entendimento que se tem da qualificação profissional, é delimitar sua efetividade em colocar o trabalhador em um posto de trabalho, especialmente porque se criou no imaginário social que vivemos num mundo cuja exigência de qualificação é permanente para conseguir e manter um emprego. Ainda que um trabalhador com maior escolaridade e maior qualificação seja requerido em alguns setores e em funções específicas, este representa uma proporção pequena do total de trabalhadores. Considerando-se que grande parte dos postos de trabalho abertos nos últimos anos ocorreu no setor de serviços – atendimento ao público, telemarketing etc.7 – onde o conteúdo exigido para exer-cer a atividade é baixo, desmistifica-se a tese colocando a qualificação profissional no patamar no qual podemos exigir mais de suas ações.

A crise de 2008-2009 não alterou as necessidades do mercado de emprego brasileiro. A retomada do crescimento vai exigir profissionais com maior especia-lização em determinados segmentos de atividade econômica. Vai gerar, também, uma demanda por profissionais sem uma especialização. Porém, vai buscar dentre esses trabalhadores disponíveis aqueles com melhor qualificação e escolaridade, o que facilita a seleção e diminui os custos de recrutamento e de treinamento do trabalhador dentro da empresa.

Assim sendo, cumpre à política de qualificação profissional detectar as ha-bilidades e os conhecimentos que os trabalhadores deverão ter para atender a demanda das empresas que abrirão novos postos de trabalho. Dadas as caracterís-ticas geográficas, econômicas e sociais do Brasil, é muito provável que as deman-das por trabalhadores com determinadas qualificações varie de uma região para outra, o que dificulta a identificação das necessidades de qualificação e amplia a importância da articulação entre as PMT.

Pode-se olhar esse problema por dois ângulos diferentes. Primeiramente, pelo lado da demanda de trabalhadores. Por esse lado do problema, torna-se cada vez mais importante a articulação entre os observatórios regionais do trabalho, a área responsável pela captação de vagas do Serviço de Emprego e Qualifica-ção Profissional. O intercâmbio de informações entre esses setores do SPETR é fundamental para se desenhar a política de qualificação profissional ao integrar o estudo do mercado de trabalho, as informações sobre as demandas das empresas e o conhecimento técnico do setor de qualificação profissional. Isso permitirá que a ação de qualificação caminhe adiante reduzindo o tempo entre a abertura da vaga e o seu preenchimento.

7 Ver, por exemplo, os dados do Anuário da Qualificação Profissional 2007, a Tabela 10. (DIEESE, 2010).

Page 357: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

357

Pelo ângulo da oferta de mão-de-obra é preciso articular o serviço de em-prego com a qualificação profissional para otimizar as ações de qualificação. O desenvolvimento da atividade de orientação profissional é fundamental para se aprimorar o conhecimento das potencialidades e necessidades de qualificação profissional do trabalhador. Isso possibilitaria direcionar para as ações de qua-lificação aqueles trabalhadores com maiores chances de adquirir uma habilidade e/ou conhecimento que amplie sua capacitação profissional de acordo com seu histórico profissional e seus anseios. Evitar-se-ia, dessa forma, o desperdício de recursos ao se fornecer cursos abertos que nem sempre acrescentam algo na ca-pacitação profissional do educando.

A articulação das várias políticas exige capacidade de planejamento dos ope-radores locais das PMTs, aprimorando a gestão e a interação com as comissões de emprego, fortalecendo estas para que tenham uma efetiva contribuição para a definição das necessidades de cada local/região. Essa capacidade de definir as prioridades no plano local deve ser complementada com o aprimoramento da capacidade de coordenação do Ministério do Trabalho e Emprego no plano na-cional. Isso significa o acompanhamento e a avaliação da execução das PMTs à luz da evolução do mercado de emprego local/regional, procurando verificar modificações em decorrência das ações das políticas.

Essa coordenação, no plano da qualificação profissional, implica concentrar esforços na execução do Convênio Plurianual Único (CPU), instrumento criado para operacionalizar o SPETR. Contudo, ao se observar as informações sobre os recursos e metas do PNQ para o ano de 2008 (Tabela 2), verifica-se maior ênfase nas ações do Programa Setorial de Qualificação (ProSeQs) operados por entida-des sem ou com fins lucrativos (ONGs, entidades sindicais, empresas de educação profissional etc).

De fato, do total de recursos previstos para o PNQ, assim como das metas, 4/5 destinam-se ao PlanSeQ, que na sua quase totalidade é executado à margem do Serviço de Emprego. O problema não se deve ao fato de os cursos serem exe-cutados por entidades privadas (com ou sem fins lucrativos), mas sim por estar fora do planejamento das ações do CPU, que considera na sua elaboração – ou pelo menos deveria considerar – a estratégia de desenvolvimento local/regional. Ao se passar ao largo desse planejamento elimina-se a possibilidade de articular as várias políticas de mercado de trabalho e de desenvolvimento visando aos efeitos sinérgicos dessa articulação.

Page 358: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

358

Tabela 2 - Plano Nacional de Qualificação: Recursos e Metas de Educandos por Tipo de Convênio. Brasil, 2008

Tipo Convênio

Recursos (R$) Metas

UF/Municípios Entidades Total UF/

Municípios Entidades Total

CPU-PlanTeQs 40.350.958 2.746.040 43.096.998 49.421 1.738 51.159

PlanSeQs 50.169.870 123.110.825 173.280.695 63.518 156.324 219.842

Total 90.520.828 125.856.865 216.377.692 112.939 158.062 271.001

CPU-PlanTeQs 18,6 1,3 19,9 18,2 0,6 18,9

PlanSeQs 23,2 56,9 80,1 23,4 57,7 81,1

Total 41,8 58,2 100,0 41,7 58,3 100,0

Fonte: Elaboração Própria do Autor Baseada nos Dados do Brasil (2010).

Não se trata, porém, de menosprezar a importância que as ações definidas têm para os PlanSeQs. No caso em questão, a maior parte dos cursos é dirigida para a qualificação de beneficiários do PBF no setor da construção civil. A ideia é aproveitar o bom momento desse setor, impulsionado pelo Programa de Acelera-ção do Crescimento (PAC) do Governo federal para gerar oportunidades àqueles beneficiários que não tenham uma ocupação ou tenham uma ocupação irregular. Contudo, ao se definir o setor de atividade e o público-alvo da ação de qualifica-ção, exclui-se a possibilidade de encaminhar para esses cursos aqueles indivíduos com perfil mais adequado. Para que isso ocorresse seria preciso deixar em aberto a definição de quem encaminhar para o curso de qualificação, garantindo-se a prioridade para o beneficiário do PBF em caso de oferta menor que a demanda pelo curso.

Outro aspecto importante para que a definição dos cursos seja prevista nos CPU, inclusive com a definição do público a ser atendido prioritariamente, como é o caso dos beneficiários do PBF, é estimular a integração das políticas de assis-tência social e as PMTs no plano local/regional. A execução dessas políticas nem sempre é de responsabilidade da mesma secretaria, o que exige articulação entre suas ações para cumprirem com seus objetivos.

Não obstante a preocupação com a articulação das várias ações das polí-ticas de mercado de trabalho para se obter maior efetividade no que respeita a qualificação profissional e a formação profissional de uma forma mais ampla, precisaria ser abordada sob uma nova perspectiva. As ações do PNQ não podem suprir o papel de formação geral de responsabilidade do ensino formal. Se for

Page 359: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

359

considerado que as exigências de contratação das empresas são cada vez maiores, há de se garantir que todo jovem conclua o ensino médio para então pensar em ingressar na força de trabalho. E para esse ingresso é preciso traçar uma estratégia que inclua a formação profissional associada ao seu treinamento no ambiente de trabalho. Nessa direção parece ser importante a constituição de uma instância ca-paz de construir essa estratégia, que não deve se confundir com o ensino formal – seja ele propedêutico ou técnico – mas que defina uma política de inserção para o jovem que terminou o ensino médio numa ocupação.

Ampliar essa discussão está fora dos propósitos do presente artigo. Mas, dentro de uma visão otimista que considere um crescimento econômico susten-tado e do emprego para os próximos anos, não se pode deixar de considerar a importância crescente da questão da formação e atualização ocupacional. Nessa perspectiva, ganha importância a política de qualificação para o grupo mais vul-nerável no mercado de trabalho, isto é, o conjunto de trabalhadores de baixa escolaridade e qualificação e de mais idade. Assim, é preciso avançar na questão da certificação, o que também exigirá a integração das ações do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e do Ministério da Educação.

12.5 – Considerações Finais

A expectativa de retomada do crescimento econômico a partir de meados de 2009 e de sua manutenção por um período mais prolongado permite otimismo em relação à geração de emprego em decorrência do observado no período re-cente. A ampliação da criação de novos postos de trabalho abre a possibilidade de estruturação do mercado de trabalho com maior participação do assalariamento formal, garantindo melhores condições de trabalho e rendimento, além de pro-teção social.

Mesmo com estimativas otimistas de crescimento sustentado, é certo que par-cela dos trabalhadores permanecerá na situação de desemprego ou continuará em atividades por conta própria, devido ao elevado número de desempregados e ao crescimento da população ativa. Diante desse quadro, alternativas deverão ser cria-das para ocupar aqueles trabalhadores com maiores dificuldades de conseguir um emprego. Por outro lado, o preenchimento das vagas de trabalho abertas deverá ser feito com a maior rapidez possível. Assim, as PMT poderão ter um papel im-portante, tanto para reduzir o tempo entre a abertura da vaga e seu preenchimento quanto para melhorar a condição de trabalho dos trabalhadores por conta própria, contribuindo, assim, para melhor estruturar o mercado de trabalho brasileiro.

Page 360: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

360

Ao longo deste artigo procurou-se mostrar que a contribuição das PMTs de-pendem, em parte, da articulação entre as várias PMTs de forma que suas ações se complementem, criando sinergias que melhorem o resultado final, isto é, garan-tam a inserção do trabalhador em um posto de trabalho com registro em carteira. Essa boa articulação necessita também da consolidação de alguns serviços como a orientação profissional, para ajudar o trabalhador a ter maior conhecimento de suas potencialidades e das alternativas para aprimorar suas habilidades e qualificação.

Outro ponto a ser aprimorado está relacionado à proteção de renda do tra-balhador desempregado, sobretudo ampliando o tempo do seguro-desemprego para os trabalhadores cujo perfil apresente maiores dificuldades para a reinserção no emprego, associando este maior tempo de benefício a ações de busca de em-prego, qualificação profissional ou, se for o caso, o encaminhamento e o apoio para o trabalhador ocupar-se por conta própria.

Com relação aos trabalhadores por conta própria, o apoio ocorre por meio da oferta de crédito para investimento e capital de giro, principalmente para viabilizar o empreendimento. O apoio do crédito desenvolveu-se bastante nos últimos anos com a formação de grupos solidários e fundos de fiança, que ampliaram o número de trabalhadores com acesso ao crédito. Um ponto a ser desenvolvido é a garantia de renda nos momentos em que o trabalhador não puder exercer sua atividade, seja por motivo de doença, falta de trabalho ou outro motivo qualquer e, portanto, não terá a renda de sua ocupação para seu sustento. Tal instrumento deverá ter a carac-terística de um seguro, porém, em alguns casos, será necessária a participação de um fundo público, especialmente para os trabalhadores de baixa renda.

Um último aspecto a ser destacado: é preciso fortalecer o SPETR no que se refere ao planejamento e à articulação das várias PMTs. Neste sentido, as comis-sões de emprego ganham importância na discussão e decisão das linhas mestras da política de mercado de trabalho local que respeitem as características e também se alinhem ao modelo de desenvolvimento de cada região. Dessa forma, parece ser importante privilegiar as ações previstas no Convênio Plurianual Único, refor-çando a coordenação no âmbito nacional.

Em suma, a crise econômica internacional não colocou dificuldades adicio-nais para as políticas de mercado de trabalho. Os desafios continuam os mesmos de quando se instituiu o Sistema Público de Emprego, Trabalho e Renda, no final de 2005. É preciso avaliar o que avançou nesses anos e o que pode ser melhorado para se aproveitar o bom momento por que passam a economia brasileira e o mercado de trabalho.

Page 361: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do

361

Referências

BALTAR, P.; MORETTO, A.; KREIN, J. D. O emprego formal no Brasil: início do século XXI. In: KREIN, J. D. et al. (Org.). As transformações no mundo do trabalho e os direitos dos trabalhadores. São Paulo: LTr, 2006. p. 15-35.

BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. Qualificação profissional. Brasília, DF, 2010. Disponível em: <http://www.mte.gov.br/pnq/default.asp>. Acesso em: 2010.

CACCIAMALI, M. C. A desfiliação do estatuto do trabalho na década de 1990 e a inserção dos ocupados que compõem as famílias de menor renda relativa. In: CHAHAD, J. P. Z.; PICHETTI, P. (Org.). Mercado de trabalho no Brasil: padrões de comportamento e transformações institucionais. São Paulo: Ltr, 2003. p. 247-284.

______. A economia informal 20 anos depois. Indicadores Econômicos, Porto Alegre, v. 21, n. 4, p. 217-234, 1992.

DIEESE. Anuário da qualificação social e profissional: 2007. São Paulo, 2007. Disponível em <http://www.mte.gov.br/dados_estatisticos/Anuario_qualificacao_profissional_2007.pdf>. Acesso em: 25 jan. 2010.

Page 362: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do
Page 363: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do
Page 364: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do
Page 365: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do
Page 366: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do
Page 367: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do
Page 368: Economia, Desenvolvimento Regional e Mercado de Trabalho do