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ECONOMIA ANTIGA A PARTIR DE UM CENTRO DE CONSUMO LUSITANO Terra sigillata e cerâmica africana de cozinha em Chãos Salgados (Mirobriga?) José Carlos Quaresma ESTUDOS & MEMÓRIAS 4

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Page 1: ECONOMIA ANTIGA A PARTIR DE UM CENTRO DE … · Terra sigillata e cerâmica africana de cozinha em Chãos Salgados (Mirobriga?) 3. VIEGAS, C. (2011) – A ocupação romana do Algarve

estudos & memóriasSérie de publicações da UNIARQ (Centro de Arqueologia da Universidade de Lisboa)

Direcção: Victor S. Gonçalves

4.QUARESMA, J. C. (2012) – Economia antiga a partir de um centro de consumo lusitano. Terra sigillata e cerâmica africana de cozinha em Chãos Salgados (Mirobriga?)

3.VIEGAS, C. (2011) – A ocupação romana do Algarve. Estudo do povoamento e economia do Algarve central e oriental no período romano. Lisboa: UNIARQ.

ISBN: xxx-xxx-xxxxx-x-x

Depósito legal: xxxxxx/12

Design gráfico e composição: Rui Roberto de Almeida

Capa: desenho e fotografia de pormenor de um fragmento de terra sigillata foceense tardia (finais do séc. V)recolhido em Chãos Salgados, Santiago do Cacém (Mirobriga?). Foto de Victor S. Gonçalves.

Impressão: (500 exemplares) xxxxxxxxxxxxxxxx.

Apoio do xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx

Volumes anteriores de esta série:

1.LEISNER, G. e LEISNER, V. (1985) – Antas do Concelho de Reguengos de Monsaraz. Reimpressão do volume de 1951. Lisboa: UNIARQ.

2.GONÇALVES, V. S. (1989) – Megalitismo e metalurgia no Alto Algarve Oriental. Uma aproximação integrada. 2 vols. Lisboa: UNIARQ.

© do Autor

Toda e qualquer reprodução de texto e imagem é interdita, sem a autorização escrita do Autor, ou dos seus representantes legais, nos termos da lei vigente, nomeadamente o Código do Direito de Autor e Direitos Conexos. Em powerpoints ção de imagens ou de partes dotexto é permitida, com a condição de a origem e a autoria do texto edas imagens serem expressamente indicadas no diapositivo em que é feita a reprodução. Os direitos de autor da obra são extensíveis a todos osdocumentos, impressos ou manuscritos, com tratamento digital de imagem, nela publicados

PARA INTERCÂMBIO (ON PRIE L’ÉCHANGE, EXCHANGE ACCEPTED):CENTRO DE ARQUEOLOGIA DA UNIVERSIDADE DE LISBOAFACULDADE DE LETRAS P-1600-214 LISBOA PORTUGAL

ECONOMIA ANTIGA A PARTIR DE UM CENTRO DE CONSUMO LUSITANO

Terra sigillata e cerâmica africana de cozinhaem Chãos Salgados (Mirobriga?)

José Carlos Quaresma

ESTUDOS &MEMÓRIAS 4

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JOSÉ CARLOS QUARESMA nasceu em Lisboa e fez todos os seus estudos nesta cidade. Depois da Escola Secundária de Passos Manuel ingressou na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, onde obteve a licencia-tura em Arqueologia (1996), o mestrado em Arqueologia (2002) e o doutoramento em Arqueologia (2009).

Foi bolseiro de mestrado (2001) e de doutoramento (2006-2009) pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia, bem como bolseiro de investigação (2004-2005) pela Fundação Calouste Gulbenkian. É desde 2010 bolseiro de pós-doutoramento pela Fundação para a Ciência e a Tec-nologia.

É investigador integrado do Centro Interdisciplinar de História, Culturas e Sociedades da Universidade de Évora (CIDEHUS) e investigador colaborador da Unidade de Ar-queologia da Universidade de Lisboa (UNIARQ).

É igualmente membro de várias associações científi-cas: Rei Cretariae Romanae Fautorum, Société Française d’Étude de la Céramique Antique en Gaule e Sociedad de Estudios de la Cerámica Antigua en Hispania.

Desde 1997 publicou cerca de 30 trabalhos em Portu-gal, Espanha, Itália, França e Alemanha.

Entre 1995 e 2009 colaborou no estudo e valorização das Ruínas Romanas de Mirobriga, e com outras entidades como o Museu Municipal de Vila Franca de Xira ou sobretudo o Museu Municipal de Coruche, onde desde 1999 participa com Cristina Calais na elaboração da Carta Arqueológica do concelho.

Actualmente o seu projecto de investigação principal (bolsa de pós-doutoramento) centra-se na análise das cerâmicas finas da cidade romana da Ammaia.

É membro associado do projecto Céramopôle, coordenado por Michel Bonifay da Maison Médi-terranéenne des Sciences de l’Homme (Universidade de Aix en Provence).

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à memória da minha mãe

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Índice

Prólogo ................................................................................................................................................

Agradecimentos ..................................................................................................................................

1. Introdução. Trabalhos prévios e nota metodológica .....................................................................

2. O sítio ...............................................................................................................................................

2.1. Posição geográfica e sinopse da sua diacronia ...........................................................................................

2.2. A construção nº 2: um caso de adaptação cultural no século I (?) .............................................................2.2.1. Ambientes de escavação e planta .............................................................................................................2.2.2. Evolução crono-estratigráfica ...................................................................................................................2.2.3. Distribuição espacial de alguns dados ......................................................................................................2.2.4. Romanização – um conceito em revisão ..................................................................................................2.2.4.1. A origem da construção nº 2: uma reprodução romana imperial do chamado “templo céltico”? .....2.2.4.2. A transição da cultura material ao longo do século I d.C.: alguns casos peninsulares ........................

2.3. A construção nº 1: mudança ambiental durante o século III / inícios do IV (?) ...........................................2.3.1. Planta e principais atributos construtivos ................................................................................................2.3.2. Evolução crono-estratigráfica ...................................................................................................................2.3.3. Uma proposta de leitura paleo-climática para a remodelação da construção nº 1 ................................

2.4. O Sector da Ponte ........................................................................................................................................2.4.1. Resultados cronológicos ...........................................................................................................................2.4.1.1. Extremidade norte da ponte ..................................................................................................................2.4.1.2. Extremidade sul da ponte ......................................................................................................................2.4.2. Resultados arquitectónicos: extremidades norte e sul da ponte ...........................................................2.4.3. Os materiais datantes: evolução crono-estratigráfica ............................................................................2.4.3.1. Extremidade norte da ponte (Ponte-Norte) .........................................................................................2.4.3.2. Extremidade sul da ponte (Ponte-Sul) ..................................................................................................

3. Análise tipológica e estratigráfica da terra sigillata e da cerâmica africana de cozinha de Chãos Salgados ..........................................................................................................................

3.1. Terra sigillata itálica ......................................................................................................................................3.1.1. Caracterização ............................................................................................................................................3.1.2. Análise tipológica e estratigráfica .............................................................................................................3.1.3. Marcas ........................................................................................................................................................

3.2. Terra sigillata sudgálica (La Graufesenque) ................................................................................................3.2.1. Caracterização dos fabricos ......................................................................................................................3.2.2. Análise tipológica e estratigráfica ............................................................................................................3.2.3 Marcas ........................................................................................................................................................

3.3. Terra sigillata centro-gálica? ........................................................................................................................3.3.1. Análise tipológica e estratigráfica .............................................................................................................

3.4. Terra sigillata hispânica de tipo itálico (ou precoce), terra sigillata hispânica, terra sigillata hispânica intermédia e terra sigillata hispânica tardia .......................................................3.4.1. Terra sigillata hispânica de tipo itálico ou precoce (grupo 7) .................................................................3.4.1.1. Caracterização e conceptualização .......................................................................................................3.4.1.2. Análise tipológica e estratigráfica .........................................................................................................

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3.4.2. Terra sigillata hispânica ............................................................................................................................3.4.2.1. La Rioja (grupos 1 e 2) ............................................................................................................................3.4.2.1.1. Caracterização .....................................................................................................................................3.4.2.1.2. Sinopse da investigação sobre La Rioja ..............................................................................................3.4.2.1.3. Uma visão dos centros oleiros conhecidos: Tritium Magallum, Bezares e Arenzana de Arriba ......3.4.2.1.4. Análise tipológica e estratigráfica ......................................................................................................3.4.2.1.4.1. Grupo 1 ...............................................................................................................................................3.4.2.1.4.2. Grupo 2 ..............................................................................................................................................3.4.2.2. Andújar (grupos 3 e 4) ...........................................................................................................................3.4.2.2.1. Grupo 3 .................................................................................................................................................3.4.2.2.1.1. Caracterização ...................................................................................................................................3.4.2.2.1.2. Sinopse da investigação sobre Andújar ...........................................................................................3.4.2.2.1.3. A estratigrafia em Andújar ...............................................................................................................3.4.2.2.1.4. As propostas cronológicas ...............................................................................................................3.4.2.2.2. Grupo 4 (Andújar?) ..............................................................................................................................3.4.2.2.2.1. Descrição e interpretação ................................................................................................................3.4.2.2.2.2. O grupo 4 como um reflexo de alterações nos modos de produção? ...........................................3.4.2.2.3. Análise tipológica e estratigráfica .....................................................................................................3.4.2.2.3.1. Grupo 3 ..............................................................................................................................................3.4.2.2.3.2. Grupo 4 .............................................................................................................................................3.4.3. Terra sigillata hispânica intermédia (grupo 5) .........................................................................................3.4.3.1. Caracterização e conceptualização .......................................................................................................3.4.3.2. Análise tipológica e estratigráfica .........................................................................................................3.4.4. Terra sigillata hispânica tardia (grupo 6) .................................................................................................3.4.4.1. Caracterização e conceptualização .......................................................................................................3.4.4.2. Análise tipológica e estratigráfica .........................................................................................................3.4.5. Marcas hispânicas .....................................................................................................................................3.4.6. Análises de laboratório dos grupos 1 e 2 (La Rioja) de terra sigillata hispânica de Chãos Salgados .....

3.5. Terra sigillata africana ..................................................................................................................................3.5.1. Terra sigillata africana A ............................................................................................................................3.5.1.1. Origem e cronologia ...............................................................................................................................3.5.1.2. Caracterização dos fabricos ...................................................................................................................3.5.1.3. Análise tipológica e estratigráfica .........................................................................................................3.5.1.3.1. Terra sigillata africana A1 .....................................................................................................................3.5.1.3.2. Terra sigillata africana A2 ....................................................................................................................3.5.2. Terra sigillata africana A/D e afim a A/D ...................................................................................................3.5.2.1. Origem, cronologia e caracterização dos fabricos ...............................................................................3.5.2.2. Análise tipológica e estratigráfica .........................................................................................................3.5.2.2.1. Terra sigillata africana A/D ...................................................................................................................3.5.2.2.2. Terra sigillata africana afim a A/D .......................................................................................................3.5.3. Terra sigillata africana C ............................................................................................................................3.5.3.1. Terra sigillata africana C1/C2, C3, C4 .......................................................................................................3.5.3.1.1. Origem e cronologia ............................................................................................................................3.5.3.1.2. Caracterização dos fabricos ................................................................................................................3.5.3.1.3. Análise tipológica e estratigráfica ......................................................................................................3.5.3.1.3.1. Terra sigillata africana C1/C2 ..............................................................................................................3.5.3.1.3.2. Terra sigillata africana C3 ..................................................................................................................3.5.3.1.3.3. Terra sigillata africana C4 .................................................................................................................3.5.3.2. Terra sigillata africana C3 de Relevos Aplicados ...................................................................................3.5.3.2.1. Origem, cronologia e descrição dos fabricos .....................................................................................3.5.3.2.2. Análise tipológica e estratigráfica ......................................................................................................3.5.3.3. Terra sigillata africana C/E e E ................................................................................................................3.5.3.3.1. Origem, cronologia e descrição dos fabricos .....................................................................................3.5.3.3.2. Análise tipológica e estratigráfica ......................................................................................................3.5.3.3.2.1. Terra sigillata africana C/E ................................................................................................................3.5.3.3.2.2. Terra sigillata africana E ...................................................................................................................3.5.3.4. Terra sigillata africana C de outros centros de produção ....................................................................3.5.3.4.1. Origem, cronologia e descrição dos fabricos .....................................................................................

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3.5.3.4.2. Análise tipológica e estratigráfica ......................................................................................................3.5.3.4.2.1. Terra sigillata africana de Henchir es-Srira? .....................................................................................3.5.3.4.2.2. Terra sigillata africana de Sidi Aïch? .................................................................................................3.5.4. Terra sigillata africana D1 e D2 ..................................................................................................................3.5.4.1. Algumas considerações sobre a génese e organização da terra sigillata africana C e D ....................3.5.4.2. Origem e cronologia ..............................................................................................................................3.5.4.3. Descrição dos fabricos ...........................................................................................................................3.5.4.4. Análise tipológica e estratigráfica ........................................................................................................3.5.4.4.1. Terra sigillata africana D1 ....................................................................................................................3.5.4.4.2. Terra sigillata africana D2 ...................................................................................................................

3.6. Terra sigillata foceense tardia .....................................................................................................................3.6.1. Origem, cronologia e caracterização dos fabricos ..................................................................................3.6.2. Análise tipológica e estratigráfica ............................................................................................................

3.7. Cerâmica africana de cozinha ......................................................................................................................3.7.1. Origem, cronologia e descrição dos fabricos ...........................................................................................3.7.2. Análise tipológica e estratigráfica ............................................................................................................3.7.2.1. Norte da actual Tunísia ...........................................................................................................................3.7.2.1.1. Engobe ..................................................................................................................................................3.7.2.1.2. Patina cinzenta ....................................................................................................................................3.7.2.1.3. Patina branco-amarelada ....................................................................................................................3.7.2.2. Centro da actual Tunísia .........................................................................................................................3.7.2.2.1. Polimento/engobe ...............................................................................................................................3.7.2.2.2. Polimento / engobe interno / patina branco-amarelada ...................................................................3.7.2.2.3. Polimento / engobe interno / patina cinzenta ...................................................................................3.7.2.3. Afim a A/D ...............................................................................................................................................

3.8. Análise dos grafitos sobre terra sigillata ....................................................................................................

4. Para uma análise comercial comparada ........................................................................................

4.1. A evolução intra-sítio no quadro peninsular ...............................................................................................4.1.1. Terra sigillata itálica ...................................................................................................................................4.1.2. Terra sigillata sudgálica e centrogálica (?) ................................................................................................4.1.3. Terra sigillata hispânica, hispânica de tipo itálico (ou precoce) e hispânica tardia ...............................4.1.4. Terra sigillata africana, foceense tardia e cerâmica africana de cozinha ...............................................

4.2. Da segunda metade do século I à Antiguidade Tardia: a evolução do comércio da terra sigillata e da cerâmica africana de cozinha no contexto da economia antiga. Coerências e anomalias ..............4.2.1. c.50 a c.250 d.C.: o Alto Império e a sua transição ...................................................................................4.2.1.1. A Economia Romana: um regresso a Rostovtzeff? ...............................................................................4.2.1.2. O papel do século II d.C.: um regresso a Gibbon? .................................................................................4.2.1.3. Uma mise au point da segunda metade do século I, século II e época severa: os dados conhecidos pela História, Numismática e Arqueologia ........................................................4.2.1.3.1. Os dados económico-financeiros ........................................................................................................4.2.1.3.2. A restante base empírica: prova de um abrandamento da economia desde a primeira metade do século II? ............................................................................................................................4.2.1.4. O consumo na Hispania .........................................................................................................................4.2.1.4.1. A posição geo-económica da Hispania ...............................................................................................4.2.1.4.2. A base empírica hispânica. A transição da terra sigillata itálica, sudgálica e hispânica para a africana A ..................................................................................................................................4.2.2. O Baixo-Império e a Antiguidade Tardia ..................................................................................................4.2.2.1. A definição conceptual: estado da questão ..........................................................................................4.2.2.2. Os dados historiográficos: economia e finanças (c.200/250-c.450 d.C.) .............................................4.2.2.3. A posição geo-económica da Hispania .................................................................................................4.2.2.4. O comércio de terra sigillata .................................................................................................................4.2.2.4.1. c.200/250-300 d.C.: o comércio da terra sigillata africana A, C e A/D ...............................................4.2.2.4.2. c.275/300-450 d.C.: o comércio da terra sigillata africana C3 de relevos aplicados, C tardia, C/E, E, C5 e D1 ......................................................................................................................................

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4.2.2.4.3. c.350-500/550 d.C.: o comércio da terra sigillata hispânica tardia, DSP e terra sigillata luzente ....2.2.4.4. c.450/475 d.C.-século VI (e século VII): uma sinopse ...........................................................................4.2.2.5. O papel da Lusitania no comércio alimentar. Algumas leituras possíveis ..........................................4.2.2.6. O comércio de cerâmica africana de cozinha (séculos I-V d.C.) ..........................................................

5. Conclusões ...................................................................................................................................... Conclusions ......................................................................................................................................

Anexo 1. Tabelas de contextos e estatísticas de Chãos Salgados ...................................................................

Anexo 2. Tabelas sobre contextos e sítios ........................................................................................................

Anexo 3. Chãos Salgados. Estampas de materiais ............................................................................................

Anexo 4. Mapa da Península Ibérica com os sítios mencionados no texto .....................................................

Anexo 5. Fotos dos fabricos de terra sigillata e cerâmica africana de cozinha de Chãos Salgados .................

Anexo 6. Tabela de cores de A. Cailleux (s.d.), abreviaturas usadas no texto e valores de importação média anual (IMA) aplicados ..............................................................................................................

Anexo 7.Tabelas estatísticas de terra sigillata em sítios da Península Ibérica (Quantitativos, Importação média anual e quantitativos de oleiros) ........................................................................

Bibliografia ..........................................................................................................................................

Índice topográfico e de sitios arqueológicos ....................................................................................

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Prólogo

Prólogo

Um olhar sistemático sobre uma antiga cidade romana

O Castelo Velho de Santiago do Cacém leva já uma extensa e atribulada vida enquanto sítio arqueológico. Identificado e comentado por humanistas como André de Resende - ao que parece, o primeiro a associar o local à Merobriga pliniana (Nat. 4, 116) -, foi visitado por José Leite de Vasconcellos, no decurso de uma das suas frequentes “excursões arqueológicas”, que reconheceu a sua relevância e o interesse em dele levantar uma planta e ali realizar escavações metódicas (Vasconcellos, 1914, p. 315), embora se tivesse quedado por um mero esboço esquemático da dita, não tendo chegado a empreender qualquer outra acção. Na década de 40 do século XX, teve no advogado local Cruz e Silva um entusiasta, que empreendeu as primeiras escavações, sem todavia ter chegado a publicar extensamente os resultados. Foi parcialmente adquirido pelo Estado, classificado como Imóvel de Interesse Público, pelo Decreto 30762, de 26-9-1940 e 32973, de 18-8-1943 (com Zona Especial de Protecção definida na Portaria 1135/91) e, por isso mesmo, a Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais realizou ali as primeiras acções sob a égide da administração central, com Afonso do Paço e Maria de Lourdes Costa Artur como arqueólogos responsáveis, na realidade, mais a segunda do que o primeiro.

A partir de 1959, Fernando de Almeida assumiu a direcção dos trabalhos de campo, que tomaram então um novo fôlego. Foi este investigador que produziu as primeiras interpretações consistentes sobre o local, ainda que na esteira das sugestões já expressas por Cruz e Silva. No Castelo Velho existiria um santuário campestre de época romana, com templo, termas e circo (hipódromo) e “uma pequena área urbanizada”, que se instalara sobre um antigo aglomerado indígena. Estabelecia como melhor paralelo o sítio arqueológico de Munigua, cujas escavações sistemáticas se iniciavam então, sob a égide do Instituto Arqueológico Alemão de Madrid, com especial atenção ao seu monumental santuário de terraços (Schattner, 2003, p. 21-23).

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Economia antiga a partir de um centro de consumo lusitano

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Como era natural na época, as escavações realizadas consistiram mais no desaterro dos antigos edifícios, sua consolidação e restauro, com escassa atenção aos detalhes estratigráficos, daí que, ao longo de todo este ciclo, iniciado por um erudito local e continuado pelas autoridades da administração central, a leitura da dinâmica de ocupação do espaço fosse algo esquemática: da “aldeia fortificada dos celtici” até ao santuário romano, naturalmente, abandonado na sequência das invasões bárbaras. Não faltava mesmo a frequente notação de níveis de incêndio no local para documentar / atestar a suposta violenta destruição do sítio, definitivamente abandonado para dar lugar, mais tarde, ao novo aglomerado de Santiago do Cacém.

Na década de 70 do século XX, mercê do desenvolvimento das práticas arqueológicas e da notória renovação dos estudos de cerâmica antiga, começaram a surgir as publicações sobre os materiais recolhidos nas antigas escavações, desde os estudos sobre a terra sigillata, de Seomara Veiga Ferreira, Maria Garcia Pereira e de Luísa Ferrer Dias, aos de Jeannette Nolen (cerâmicas cinzentas e “paredes finas”), passando pelas referências de Manuela Delgado (cerâmica campaniense) e Adília Alarcão (sigillata de tipo itálico). Carlos Tavares da Silva e Joaquina Soares ocuparam-se das cerâmicas pré-romanas e Maria de Lourdes Costa Arthur acabou por publicar, já na década de 80, o relatório da sua intervenção (o leitor interessado poderá encontrar estas referências na bibliografia final, pelo que me dispenso de aqui as discriminar para não sobrecarregar excessivamente esta breve nota).

Finalmente, nos anos 80 do século passado, um ambicioso projecto internacional, que juntava as universidades de Missouri-Columbia (EUA) e de Évora aos Serviços Regionais de Arqueologia do Sul do Instituto Português do Património Cultural, investigou o local. Especial atenção foi dada ao espaço ocupado pela antiga cidade e à cronologia dos principais edifícios. As conclusões publicadas são: a existência de uma remota ocupação indígena que remontaria ao Bronze Final; a fundação de uma cidade romana no local, com o respectivo programa arquitectónico de construção datado dos finais da época Júlio-Cláudia (ou já Flávia), edificação do hipódromo nos fins do séc. I ou primeira metade do II e de um primeiro edifício termal, posteriormente ampliado. Assinalável prosperidade sob os Antoninos e Severos, com início de declínio na segunda metade do séc. III, com um primeiro abandono do edifício termal público, embora a cidade permanecesse ocupada até fins do IV (Biers, 1988, 140-141). Infelizmente, uma parte dos trabalhos realizados acabou por não ser objecto de publicação monográfica final, ficando-se a informação pelos relatórios preliminares, dados à estampa na revista Mvse – em outro local discuti mais longamente a história da investigação no local e os problemas suscitados por algumas das interpretações avançadas (Fabião, 1998: 232-254).

Após breve interrupção, de novo o Castelo Velho conheceu particular atenção, no âmbito do programa de criação de uma rede de sítios arqueológicos visitáveis e afectos à administração central no Sul de Portugal (Itinerários arqueológicos do Alentejo e Algarve) - o extenso e ambicioso plano então iniciado foi mesmo publicamente apresentado no lugar das ruínas. Foi neste novo contexto que se começou a cruzar a actividade de investigação do jovem José Carlos Quaresma com a velha cidade romana. Ali coordenou novos trabalhos pontuais de escavação, agora realizados com os procedimentos e critérios da arqueologia de hoje. Assim nasceram as primeiras observações estratigráficas de carácter sistemático no sítio do Castelo Velho (uma vez que as investigações luso-americanas se tinham limitado a pontuais intervenções ou deixado sem publicação as intervenções de mais largo fôlego).

Iniciou então José Carlos Quaresma um longo e paciente processo de estudo das realidades materiais do Castelo Velho de Santiago do Cacém que não se limitou às intervenções que directamente realizara, abrangendo também a informação anteriormente recolhida, correspondendo, diga-se, ao espírito e letra do preâmbulo do Decreto-Lei 270/99, de 15 de Julho, que regulamenta os trabalhos arqueológicos em Portugal e define o estudo de espólios de antiga recolha como tarefa relevante. Uma iniciativa deste teor impunha, porém, opções, uma vez que se não afigurava praticável (em vários aspectos, nem especialmente útil) o estudo da totalidade dos artefactos recolhidos desde a já longínqua década de 40 do século passado. A escolha natural seria seleccionar cerâmicas finas de grande circulação, por serem portadoras de atributos intrínsecos que possibilitam a sua datação. Definidas as categorias cerâmicas a tratar, foi estudada a totalidade dos fragmentos existentes de cada uma delas. Para o efeito, o autor deste volume iniciou um lento e metódico processo de aprendizagem, que o levou a trabalhar com um amplo escol de investigadores nacionais e internacionais. José Carlos Quaresma beneficiou de bolsas de investigação, da Fundação para a Ciência e Tecnologia (de que ainda usufrui) e da Fundação Calouste Gulbenkian. Pode dizer-se, pois, que teve os convenientes apoios, mas deve sublinhar-se também que deles soube fazer muito bom uso e proveito.

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Prólogo

A sua abordagem é clara, directa e clássica (no melhor sentido do termo). Em primeiro lugar, um rigoroso estudo dos diferentes fragmentos de cerâmica, para determinar fabrico, forma e âmbito cronológico, depois, uma criteriosa quantificação dos mesmos, de modo a definir padrões de consumo desta cidade do extremo ocidental do Império Romano. Esgotada esta fase de análise detalhada do sítio do Castelo Velho, José Carlos Quaresma alongou o olhar, buscando outros sítios similares e estabelecendo comparações. Assim chegou a algumas interessantes conclusões, que o leitor poderá ajuizar, desde logo, definindo uma outra história, mais rica e detalhada, para a dinâmica da ocupação, afinal, mais extensa do que anteriormente se supunha. Pela criteriosa observação, lançou também novas pistas (que não deixará de aprofundar em futuros estudos) sobre essa situação de “crise” da segunda metade do século II/inícios do III. Tudo isto fez com os artefactos e com o registo arqueológico, sem cair na tentação de pretender submeter uns e outro à sempre controversa lição dos textos; com uns e outro construiu e fundamentou um discurso que lança nova luz sobre a história de uma cidade romana, no contexto de uma província pertencente a um vasto Império. Realizou, por isso, uma excelente dissertação de Doutoramento de Arqueologia, sabendo usar com critério o rigor da análise e a ousadia sustentada da síntese. É o produto desse trabalho que aqui se apresenta.

É costume nestes textos preambulares rematar falando do promissor autor cujo estudo se apresenta. Se o fizesse, estaria a cometer uma injustiça. Na realidade pela sua já extensa obra, de apreciável projecção internacional, José Carlos Quaresma não é uma promessa, mas antes uma certeza, sólida e comprovada, é um autor de grande fôlego e de notáveis qualidades e capacidades aqui amplamente demonstradas, que sabe bem da necessidade de classificar com critério e rigor os seus artefactos, sem nunca descurar as coordenadas contextuais, mas sabe também, a partir deles, ensaiar leituras mais amplas e ricas. Em suma, fazer história com artefactos, sem descurar as outras fontes, e não ilustrar com artefactos histórias que com outras fontes se desenham.

Carlos FabiãoFaculdade de Letras da Universidade de Lisboa