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e) Residência Holzmeister. Rio de Janeiro, 1955. Firma Pires & Santos

Projetada pela Firma Pires & Santos31 em 1955, quinze anos depois da

primeira obra estudada, a Residência Holzmeister representa a arquitetura de uma

dezena de profissionais que, em virtude de questões práticas, não pôde ser aqui

analisada, embora suas contribuições quanto ao assunto sejam inestimáveis. Os

nomes dos principais deles e algumas dessas obras podem ser vistas em uma linha

cronológica feita para os anos de 1930 a 1955, presente nos anexos.

Ilustração 110. Residência Holzmeister. Rio de Janeiro 1955. Firma Pires & Santos.

Fonte: MINDLIN (2000, p. 101).

A ênfase nesse período deu-se em função da quantidade de obras realizadas,

mas o assunto não se encerra aí, pois a relação modernidade versus tradição é

capítulo importante da arquitetura brasileira na inteireza de sua história. A distância

31 A Firma Pires & Santos era formada pelos arquitetos Paulo Everard Nunes Pires, Paulo Ferreira dos Santos e

Paulo de Tarso Ferreira dos Santos.

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temporal entre o Grande Hotel de Ouro Preto e a Residência Holzmeister só vem a

validar tal afirmação, assim como todos os projetos realizados após ela. Vejamos,

por exemplo, as residências de Zanine Caldas feitas durante a década de 1960 e as

de Lucio Costa durante os anos de 1980.

Ilustração 111. Alguns projetos do arquiteto Alcides Rocha Miranda. Residência do arquiteto, Rio de Janeiro 1942; Casa do Diretor da Cia. Telefônica, Ouro Preto 1940 (dir. sup.) e Casa Celso da Rocha Miranda,

Petrópolis-RJ 1942 (dir. inf.).

Fonte: HECK (2005, pp. 154, 142 e 156).

Sabendo da dívida contraída com a escolha das obras analisadas, o trabalho

não poderia deixar de falar em arquitetos como Alcides Rocha Miranda, Carlos Leão,

Francisco Bolonha, Aldary Henrique Toledo, Renato Soeiro, Henrique Mindlin, Paulo

Antunes Ribeiro, Vital Brazil, Affonso Eduardo Reidy, Jorge Ferreira, Gregori

Warchavchik, entre outros. Os primeiros são, evidentemente, mais importantes para

o tema, na medida em que empreenderam mais obras e, também, porque parte

deles esteve, em algum momento de suas trajetórias profissionais, envolvida com a

causa do Patrimônio. Os últimos estão aí para comprovar a amplitude do assunto e

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do espectro de sua atuação como parte do “discurso” da arquitetura brasileira do

século XX, elaborado, sobretudo, por Lucio Costa.

Ilustração 112. Alguns projetos do arquiteto Carlos Leão. Residência Hélio Fraga, Rio de Janeiro 1951; Residência Cândido Guinle de Paula Machado, 1959 (dir. sup.) e Residência Homero Souza e Silva, Cabo Frio-

RJ 1961 (dir. inf.).

Fonte: foto do autor (maior) e CZAJKOSWKI (1993, pp. 76 e 79).

Ilustração 113. Alguns projetos do arquiteto Francisco Bolonha. Residência Accioly, Petrópolis-RJ 1949; Residência Israel Klabin, Rio de Janeiro 1952 (dir. sup.) e Residência Adolpho Bloch, Teresópolis-RJ 1955 (dir.

inf.).

Fonte: BRUAND (2003, p. 141) e HECK (2005, pp. 290 e 354).

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Dos arquitetos citados como integrantes da Firma Pires e Santos, o mais

conhecido deles é Paulo Santos, professor e intelectual carioca, grande pensador da

arquitetura brasileira. Também profissional do Patrimônio, no período compreendido

entre os anos de 1955 a 1980 (HECK, 2005, p. 339), escreveu, entre outras, as

seguintes publicações: “O barroco e o jesuítico na arquitetura do Brasil”, de 1951, “A

arquitetura da sociedade industrial”, de 1960, “A formação de cidades no Brasil

Colonial”, de 1963, “Constantes de sensibilidade do brasileiro: paralelo com as do

português”, mimeo de 1975 e “Quatro séculos de arquitetura”, de 1977. Dentre

essas, as duas últimas representam a parte mais importante de sua teoria a respeito

da evolução da arquitetura moderna brasileira a partir da colonial, cujo sentido de

permanência em muito se aproxima daquele de Lucio Costa.

Ilustração 114. Implantação da Residência Holzmeister. Rio de Janeiro 1955. Firma Pires & Santos.

Fonte: MINDLIN (2000, p. 100).

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Construída para Martin Holzmeister, “sobrinho do famoso arquiteto vienense

Clemens Holzmeister” (MINDLIN, 2000, p. 100), a casa no bairro carioca de São

Conrado é, “sem dúvida, o melhor projeto de Paulo Santos e uma das mais refinadas

casas brasileiras dos anos (19!)50” (NOBRE, 2001).

Implantada nos fundos de um amplo e plano terreno de esquina, a casa

apresenta volumetria trabalhada em dois blocos: um principal, de dois pavimentos,

que se destaca pela pureza do volume e um segundo, anexo ao primeiro, de apenas

um pavimento, cuja planta em L forma um recuo que nos faz pensar tratar-se de

outra edificação.

O bloco principal é uma peça trabalhada simetricamente na planta e nas

fachadas, sendo a principal desenhada para parecer o mais uniforme possível. No

térreo, vencida a varanda retilínea, a planta é montada a partir de três partes

retangulares: um salão central de largas proporções que organiza a composição e

distribui os fluxos de circulação, um setor que abriga sala e escritório à esquerda e

outro que reúne jantar e serviços à direita, esse conectado ao bloco anexo.

Relativamente unidas na proximidade da fachada principal, através de largas

esquadrias que uniformizam os espaços, as três alas podem vir a funcionar como

área única. A escada social, destacada visualmente no espaço por seu desenho

arrojado e pela presença de ampla esquadria de vidro que a ilumina, é também

posicionada simetricamente em relação à entrada. Aos fundos do salão central há

um pequeno pátio externo, acessado lateralmente à escada.

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Ilustração 115. Plantas do pavimento inferior e superior da Res. Holzmeister. Rio de Janeiro 1955. Firma Pires & Santos. Legenda: 1. Hall de entrada, 2. Living, 3. Escritório, 4. Chapelaria, 5. Sala de Jantar, 6. Copa, 7. Copa-

cozinha, 8. Material de Limpeza, 9. Despensa, 10. Adega, 11. Depósito, 12. Lavanderia, 13. Quarto de empregada, 14. Sala de Jogos, 15. Quarto, 16. Quarto de vestir, 17. Saleta, 18. Varanda, 19. Quarto de

hóspedes, 20. Armário, 21. Quarto da governanta, 22. Rouparia, 23. Garagem.

Fonte: MINDLIN (2000, p. 101) (desenho corrigido por nós).

O pavimento superior é um bloco que se projeta sobre o térreo em um

balanço de aproximadamente 3 metros, sombreando a varanda que acompanha

toda a fachada principal. Organizado também com bastante simetria, não apresenta

a mesma fluidez espacial que o setor social de baixo, pois há demasiada

compartimentação. A circulação criada no perímetro da escada social, bastante

ampla e iluminada, por sua vez, acaba sendo o espaço mais interessante.

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Ilustração 116. Eixos de simetria e de circulação da Residência Holzmeister.

Fonte: desenho do autor.

Ilustração 117. Trechos das plantas do pavimento superior das residências: Ernesto Fontes. Rio de Janeiro 1930. Lucio Costa; Hungria Machado. Rio de Janeiro, 1941. Lucio Costa; e Hélio Fraga. Rio de Janeiro, 1951. Carlos

Leão.

Fonte: COSTA (1995, p. 56) e WISNIK (2001, p. 69) e CZAJKOWSKI (1993, p. 75) (recortes).

Nas fachadas é nítida a predominância formal daquela voltada para o jardim,

marcada pela sucessão rítmica dos apoios e tratada com sucessivos avanços de laje

e fechamentos adequados a uma maior proteção solar. A dos fundos é vedada por

painéis de venezianas e contém recuo com grande esquadria de vidro, em

composição simétrica. As laterais são mais simples: uma possui aplicação de

azulejos na base e pequeno muxarabi central sobre o plano branco, sendo a outra

totalmente cega.

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Ilustração 118. Fachada principal e lateral da Res. Holzmeister. Rio de Janeiro 1955. Firma Pires & Santos.

Fonte: fotos do autor.

Ilustração 119. Fachada principal (esq.) e de fundos da Res. Holzmeister. Rio de Janeiro 1955. Firma Pires & Santos.

Fonte: fotos do autor.

Quanto à estrutura, a edificação pouco a exibe, o que a difere das obras

analisadas até agora. “Cuidadosamente modulada em vigas e colunas de aço (10

por 10 cm32)” (MINDLIN, 2000, p. 100), ela aparece apenas na varanda, onde

adquire dupla altura, e na parte interior ao fechamento do térreo no lado que esse se

volta para o jardim. A adoção de peças metálicas levíssimas também é nota de

32 O dimensionamento da estrutura em secção quadrada pode também cumprir função estética bastante

específica, na medida em que não descartamos a possibilidade de aproximação formal entre esses finos pilares e os esteios de madeira característicos da arquitetura antiga.

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diferenciação dessa residência dentro do panorama que traçamos, pois comum foi

executar o sistema portante em concreto ou madeira, ou, quando não, utilizar misto

de ambos. Outro detalhe moderno é o grande balanço que possibilita o avanço do

pavimento superior sobre o térreo, criando a varanda que lhe é característica.

Do vocabulário modernista, a obra exibe ainda: a fluidez espacial do setor

social, a transparência e a mobilidade dos vedos que compõe toda a fachada

principal, a leveza e arrojo do desenho da escada e de seu guarda-corpo, que se

prolonga como proteção da circulação superior; a grande esquadria de iluminação

do salão central, o jardim projetado por Roberto Burle Marx.

Ilustração 120. Escada da Residência Holzmeister. Rio de Janeiro 1955. Firma Pires & Santos.

Fonte: foto do autor (maior) e MINDLIN (2000, p. 100).

Do passado, a residência “tudo evoca” (ibidem): a simetria e a unidade do

volume principal, ligadas tanto a uma tradição acadêmica quanto colonial; as amplas

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dimensões dos espaços sociais, a cobertura em telhas cerâmicas, os forros em saia-

e-camisa, as treliças, muxarabis e venezianas que proliferam por todas as fachadas,

inclusive pelo bloco anexo; os azulejos executados nos lados menores do volume, o

pequeno pátio externo nos fundos do terreno, o já referido bloco anexo em L.

Ilustração 121. Interiores e pátio externo da Res. Holzmeister. Rio de Janeiro 1955. Firma Pires & Santos.

Fonte: fotos do autor e MINDLIN (2000, p. 100) (dir. abaixo).

Ilustração 122. Bloco anexo da Residência Holzmeister. Rio de Janeiro 1955. Firma Pires & Santos.

Fonte: fotos do autor.

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O bloco principal da residência Holzmeister encontra-se em bom estado de

conservação. Talvez em virtude do programa escolar que hoje abriga, não

vislumbramos mais a referida fluidez espacial, ou mesmo a transparência dos

elementos de vedação que separam o setor social da varanda. O guarda-corpo em

vidro do pavimento superior foi retirado e substituído por um de treliças em madeira.

A parte do bloco anexo colada nos fundos do terreno, no entanto, está bastante

modificada, tanto em termos volumétricos quanto nos materiais.

Ilustração 123. Fazenda Bela Aliança. Piraí – RJ.

Fonte: PIRES (1980, p. 64).

Sobre a presença de uma tradição que não evoca apenas o passado colonial,

mas também se afirma no sentido de vislumbrar outras referências, sobretudo

ligadas ao neoclassicismo, gostaríamos de lembrar a quantidade de exemplares

belíssimos que esse período produziu no Rio de Janeiro e nas suas imediações.

Tendo os arquitetos ligados ao Patrimônio muito visto e, por vezes, reconhecido o

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valor tanto das casas de chácara que se implantaram no subúrbio quanto das

fazendas de café do interior, nada impede que tenham, em parte, nelas se inspirado.

Ilustração 124. Fazenda Boa União – RJ e Casa Levinsohn 1955, projeto de Richard Neutra.

Fonte: GOODWIN (1943, p. 19) e HECK (2005, p. 251).

3.3 Conclusões parciais

A quantidade de obras analisadas aqui é muito pequena para que possamos

alcançar conclusões mais gerais a respeito do posicionamento dos arquitetos frente

à questão da tradição e da incorporação de parte de seu léxico formal ao conjunto

das realizações modernistas brasileiras. No entanto, se examinada a linha

cronológica elaborada, constante nos anexos, e observada a inserção dos

exemplares analisados, podemos vislumbrar algumas considerações que nos parece

fazer certo sentido.

A primeira delas é a de que talvez tenham existido, naquele período, duas

linhas de projeto, não tão isoladas, na medida em que realizam trocas constantes,

dentro da chamada “vertente nativista” (CZAJKOWSKI, 1988, p. 141) da arquitetura

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moderna brasileira. Uma das linhas teria na pequena produção realizada de Oscar

Niemeyer o maior referencial. Menos tradicional, o raciocínio que se inicia com o

Grande Hotel de Ouro Preto seria mais “moderno”, desenvolvendo pouco o

repertório formal do passado e podendo ser assim chamada de linha abstrata. O

segundo posicionamento tem na produção construída de Lucio Costa o principal

referencial e caracteriza-se como sendo mais tradicional, é figurativa, utilizando-se

em maior quantidade dos elementos dos passado, sendo esses, por vezes, até

transplantados para a obra moderna, sob sua forma passada, como citação ou até

mesmo como ornamento. O início dessa linha pode ser verificado na Residência

Roberto Marinho, de 1937, mas só é aprofundada nos anos de 1941 e 1942, com

dois exemplos do mesmo programa: a Residência Hungria Machado e a Residência

Saavedra, respectivamente.

Se, por um lado, podemos identificar tais sutilezas, não devemos esquecer

que ambas tem o mesmo referencial teórico, a teoria de arte de Lucio Costa,

entendida em sua evolução, e a idéia de cultura formulada por Mário de Andrade

como alicerce do programa do Patrimônio.

No intento de filiar cada obra a uma dessas linhas, vimos que a Colônia de

Férias do IRB é mais próxima do Grande Hotel de Ouro Preto, assim como o Park

Hotel e Residência Holzmeister o são da Residência Saavedra. Porém, como

afirmado, tais linhas não seguiram paralelas. Antes; tocaram-se. E, por vezes, suas

influências geraram objetos híbridos. Não bastasse, outras influências também as

cercaram, caso, por exemplo, do citado organicismo, que poderia ter dado origem a

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uma terceira corrente, chamada rústica (BRUAND, 2003, p. 143), que migrava

dentro das outras duas, de acordo com a situação.

Para demonstrar que o raciocínio não é linear e que se trata de trocas

complexas, fizemos notar que existiram obras que optaram por ser exclusivamente

abstratas (o Grande Hotel), outras figurativas (Saavedra) e outras figurativas e

rústicas ao mesmo tempo (Park Hotel).

Quanto às plantas das cinco edificações, é visível um certo alongamento que

origina volumes prismáticos lineares; ora em apenas um sentido, ora em dois, como

no caso da Residência Saavedra. Outra é que todas optaram pela planta livre

corbusieriana, embora na Residência Holzmeister esse fato seja de mais difícil

percepção. Também foi comum enxergar plantas onde as lajes foram recortadas de

forma a criar alguns vazios na fachada, cujo objetivo pareceu ser o de valorizar o

que poderíamos chamar de “pilotis parcial”, porque mesmo adotando a doutrina de

Le Corbusier, nenhuma das obras analisadas optou por manter todo o pavimento

térreo livre. A obra mais próxima de tal intenção foi a Residência Saavedra.

Ilustração 125. Perfis laterais, na seqüência: Grande Hotel de Ouro Preto, Residência Saavedra, Colônia de Férias do IRB e Park Hotel São Clemente.

Fonte: fotos do autor.

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Quanto às fachadas, verificamos que todas têm uma clara intenção de ritmo,

que é acentuado, quase sempre, ou pela modulação da estrutura – quando esta é

expressa na volumetria, ou pela repetição de alguns elementos arquitetônicos, como

esquadrias ou treliças. Também foi comum observar um perfil transversal mais ou

menos parecido, de forma trapezoidal, a qual é desenhada por um pavimento

superior (ou conjunto deles) arrematado por cobertura de uma única água, sobre um

pavimento inferior recuado em pelo menos uma das faces. Nas fachadas que se

definem no sentido longitudinal das plantas, a baixa altura geral das edificações

confere horizontalidade constante.

Quanto aos materiais utilizados, estes variaram mais ou menos em função

dos seus sítios. As obras inseridas em lugares de vegetação densa, como a Colônia

de Férias e o Park Hotel, optaram por uma maior quantidade de materiais naturais e

de texturas, utilizando em abundância de madeira e pedra, por exemplo. No caso do

Park Hotel, a adoção da madeira chega a direcionar o desenvolvimento do sistema

estrutural, construtivo e estético. A Colônia de Férias também usa desses dois

materiais, mas sua proposta foi tratá-los com vistas a uma maior

contemporaneidade, vislumbrando menos ao artesanato a que veio o Park Hotel. As

obras situadas em terrenos mais urbanos ou convencionais optaram por materiais

mais artificiais, como aço, vidro, azulejo e tijolo. Nas duas situações os elementos

antigos foram inseridos com sucesso, podendo esses ser enxergados tanto junto dos

materiais produzidos através da técnica moderna como daqueles provenientes da

natureza.

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Sobre o uso de elementos do vocabulário da arquitetura antiga, já citamos as

posições que foram tomadas, para mais perto ou mais longe da linguagem moderna.

Independente disso, a essência do “empréstimo” esteve condicionada a reproduzir

essencialmente: as coberturas de telhas cerâmicas, quase sempre com

madeiramento aparente; as peças de proteção ou controle climático como as

venezianas, treliças, ripados e muxarabis; os grandes avarandados, a azulejaria, as

alvenarias em pedra.

Nas duas obras de Lucio, esse repertório aumenta, abrangendo também

balaustradas, luminárias, forros de taquara e os mais diferentes tipos de esquadrias.

Apego que proporciona um parentesco de “espírito” com as edificações do passado

que só foi “sentido” nelas, e, em especial, na Residência Saavedra. Nas outras

propostas sobressaiu o impacto do “novo”, embora fundido em termos formais com

os velhos objetos.