PUBLICAÇÕES SOBRE A AVALIAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO
BRASIL: DESTAQUE PARA OS EXAMES E RANKINGS
Ana Lúcia Marran
Marianne Pereira de Souza1
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como objetivo analisar as publicações dos grupos de
pesquisa cadastrados no Diretório do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico
e Tecnológico (CNPq) que têm como foco de estudo a avaliação da educação superior.
Para tanto, optou-se pela seleção dos trabalhos produzidos pelos líderes dos referidos
grupos e publicados na revista Avaliação: Revista da Avaliação da Educação.
A pesquisa acerca da temática em questão justifica-se uma vez que a avaliação
assumiu um papel de centralidade nas políticas para a educação superior brasileira,
tornando-se um dos eixos estruturantes das políticas educativas contemporâneas
vinculadas às mudanças econômicas e políticas mais amplas (CATANI; DOURADO;
OLIVEIRA, 2003; DIAS SOBRINHO, 2003).
A seleção dos artigos ocorreu por amostragem intencional baseada no critério
de visibilidade na área de estudo, o que justificou a escolha dos trabalhos desenvolvidos
por líderes de grupos de pesquisa do CNPq e publicados em uma revista científica de
circulação nacional e que trata especificamente da educação superior.
Durante a pesquisa, utilizou-se como critério inicial de seleção a palavra-chave
“avaliação da educação superior” para a busca no banco de dados do Diretório dos
Grupos de Pesquisa no Brasil do CNPq, realizada em outubro de 2010. Como resultados
da busca, foram encontrados os nomes de 34 grupos que pesquisavam esta temática. Em
seguida foram levantados os nomes dos líderes de cada grupo, bem como, os seus
1 Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) – Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul
(UEMS)
e-mail: [email protected]
2
currículos cadastrados na plataforma lattes, onde foram verificados os registros de suas
publicações na Revista citada.
A revista Avaliação é publicada desde 1996 pela Rede de Avaliação
Institucional da Educação Superior (RAIES) com o subtítulo Revista de Rede de
Avaliação da Educação Superior e, a partir de 2007, em parceria com a Universidade de
Sorocaba (UNISO), com alteração no subtítulo para Revista da Avaliação da Educação
Superior. Publica prioritariamente trabalhos relacionados aos temas da "avaliação da
educação superior", "avaliação" e "educação superior", em português ou em espanhol.
Considerando que, desde 2007, é possível acessar os artigos completos
publicados pela Revista no site de busca Scientific Electronic Library Online (Scielo), o
período privilegiado para este trabalho compreende junho de 2007 a junho de 2010.
Para a análise dos trabalhos foram utilizados tanto procedimentos quantitativos,
a partir da estatística descritiva, quanto qualitativos, pela análise global dos dados.
Este trabalho está organizado em 04 seções, a saber. A primeira seção se refere
ao Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES) e aos principais
documentos, em vigor, referentes a esta avaliação no Brasil. Para tanto, são
apresentadas algumas críticas da literatura da área sobre o assunto. Na segunda, são
apresentados os resultados das pesquisas com as principais características encontradas
na análise das publicações. A terceira seção destaca a temática com maior incidência de
discussão nos trabalhos, a presença dos exames e dos rankings no contexto do SINAES.
E finalmente nas conclusões são apontadas algumas reflexões acerca dos artigos
analisados.
O SISTEMA NACIONAL DE AVALIAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR
(SINAES)
A obrigatoriedade de um processo regular de avaliação para a educação superior
foi determinada pela Lei nº 9.394, aprovada em dezembro de 1996, que estabeleceu as
Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Assim, o art. 9º da referida lei definiu como
uma das incumbências da União “assegurar o processo nacional de avaliação das
instituições que oferecem esse nível de ensino”.
Nesse sentido, O SINAES, aprovado por meio da Lei nº 10.861, de 14 de abril
3
de 2004, foi criado com o objetivo de assegurar o processo de avaliação das instituições
de educação superior, dos cursos de graduação e do desempenho acadêmico de seus
estudantes (BRASIL, 2004a)
O documento referente ao SINAES enfatiza as ações combinadas de avaliação
interna e externa, propõe a integração entre diversos instrumentos e momentos de
aplicação, tendo como base e eixo estruturante uma concepção global de avaliação e de
Educação Superior. Para RISTOFF; GIOLO (2006), o SINAES apresenta uma
concepção que integra as metodologias, os momentos, os espaços e os instrumentos de
avaliação e de informação, o que o caracteriza como diferente das práticas
anteriormente existentes
O SINAES é composto por três processos de avaliação: a avaliação das
instituições, a avaliação dos cursos e a avaliação dos estudantes e, a sua
operacionalização está sob a responsabilidade do Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP).
A Portaria nº 2.051, de 9 de julho de 2004, regulamentou os procedimentos de
avaliação do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior definindo, entre
outras coisas, as competências da Comissão Nacional de Avaliação da Educação
Superior (CONAES), órgão colegiado de coordenação e supervisão. Em agosto do
mesmo ano, a CONAES publicou, as Diretrizes para a Avaliação das Instituições de
Educação Superior.
Posteriormente, foi divulgado um documento intitulado “Orientações Gerais
para o Roteiro da Auto-Avaliação das Instituições”, destinado às Comissões Próprias de
Avaliação (CPAs), focalizando as etapas de desenvolvimento da auto-avaliação das
instituições e oferecendo possibilidades e caminhos para a construção de processos
próprios de auto-avaliação institucional.
O desenvolvimento da avaliação das instituições de educação superior tem por
objetivo identificar o perfil e o significado de sua atuação, por meio de atividades,
cursos, programas, projetos e setores, considerando as diferentes dimensões
institucionais. Esta avaliação é desenvolvida em duas etapas: a auto-avaliação,
coordenada pela Comissão Própria de Avaliação (CPA) da instituição e a avaliação
externa (BRASIL, 2004a).
A CPA, constituída pelas instituições, tem como atribuições a condução dos
4
processos de avaliação internos da instituição, a sistematização e a prestação das
informações solicitadas pelo INEP. O seu caráter formativo deve permitir o
aperfeiçoamento, tanto pessoal (dos docentes, discentes e técnico-administrativos)
quanto institucional, pelo fato de colocar todos os atores em um processo de reflexão e
autoconsciência, devendo inclusive inserir a participação da comunidade externa
usuária. (CONAES, 2004b)
Os resultados da auto-avaliação são submetidos ao olhar externo de
especialistas de áreas/cursos, de planejamento e de gestão da educação superior, na
perspectiva de uma avaliação externa das propostas e das práticas desenvolvidas. A
avaliação externa é composta de duas etapas: a visita dos avaliadores à instituição e a
elaboração de relatório de avaliação institucional (CONAES, 2004b).
A avaliação dos cursos de graduação tem por objetivo identificar as condições
de ensino oferecidas aos estudantes, em especial as relativas ao perfil do corpo docente,
às instalações físicas e à organização didático-pedagógica. O período de realização desta
avaliação depende do processo de reconhecimento e da renovação desse
reconhecimento, a que estão sujeitos os cursos da instituição. Uma equipe
multidisciplinar de especialistas das respectivas áreas é responsável por avaliar os
cursos, juntamente com um avaliador institucional, que atribuirão conceitos ordenados
em uma escala com 5 (cinco) níveis.
Já a avaliação do desempenho dos estudantes é realizada pelo SINAES por
meio do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE).
No ano de 2005, foi criado o Indicador de Diferença entre os Desempenhos
Observado e Esperado (IDD), que tem como objetivo trazer às instituições informações
comparativas dos desempenhos de seus estudantes concluintes em relação aos
resultados obtidos, em média, pelas demais instituições cujos perfis de seus estudantes
ingressantes são semelhantes. Em relação ao referido indicador, Araújo (2009) destaca
que,
Embora gerado para verificar o conhecimento agregado pelo
curso de graduação, a aplicação do IDD, desconsidera
aspectos específicos da aprendizagem, pois o confronto entre
os resultados obtidos no início do curso não se dá,
necessariamente, com os resultados dos mesmos sujeitos, no
final do curso. (Araújo, 2009, p. 171)
5
Em 9 de maio de 2006, foi instituído o Decreto Federal n.º 5.773, que dispõe
sobre o exercício das funções de regulação, supervisão e avaliação de instituições de
educação superior e cursos superiores de graduação e seqüenciais no sistema federal de
ensino. Este documento, conhecido como “Decreto-Ponte”, define no art. 1º, parágrafo
3º, que “A avaliação realizada pelo Sistema Nacional de Avaliação da Educação
Superior - SINAES constituirá referencial básico para os processos de regulação e
supervisão da educação superior, a fim de promover a melhoria de sua qualidade”.
Em 2008, foram criados indicadores no contexto da educação superior brasileira,
com a pretensão de elaborar rankings das melhores Instituições de Ensino Superior
(IES) do país: o Conceito Preliminar de Curso (CPC)2 e o Índice Geral de Cursos da
Instituição de Educação Superior (IGC)3.
A inserção de índices e a supervalorização do ENADE na composição do
SINAES têm suscitado diversas críticas da literatura da área acerca das mudanças
ocorridas durante a implementação do Sistema.
Para Sguissardi (2008), a instalação de dois novos indicadores no contexto da
educação superior brasileira tem o objetivo de obter apenas um produto final. Desta
forma, o SINAES passou a conter a possibilidade de ranqueamentos diversos
(AMARAL, 2009), já que os conceitos obtidos pelo atual ENADE ganharam muito
mais notoriedade e centralidade do que a auto-avaliação.
Assim, conforme expõe Maués (2010), a avaliação apresentada como
democrática, formativa e emancipatória cedeu lugar a uma concepção de avaliação que
serve de instrumento de regulação e controle, para ajustar esse nível de ensino à lógica
do capital. Aquilo que deveria ser uma referência para a qualidade da educação superior
foi utilizado pelo mercado educacional como diferencial mercadológico (ABREU JR,
2009).
RESULTADOS
O levantamento realizado possibilitou o acesso a 18 artigos, publicados por
líderes de 11 grupos de pesquisa. Cabe mencionar que embora o site do Diretório do
2 Instituído pela Portaria Normativa nº 4 de 5 de agosto de 2008.
3 Instituído pela Portaria Normativa nº 12 de 5 de setembro de 2008.
6
CNPQ indique 34 grupos como resultantes da busca, 05 destes grupos não mencionaram
a avaliação como foco de suas pesquisas no formulário específico do Diretório.
Dos 18 trabalhos encontrados, 12 foram produzidos individualmente, enquanto
06 foram construídos em co-autoria. Dentre estes últimos, somente 01 contou com a
participação de três líderes de diferentes grupos de pesquisa em sua autoria.
Destaca-se que 61 % dos artigos foram publicados no ano de 2008, o que
corresponde a 11 de um total de 18 trabalhos. Em 2007, foram publicados 03 trabalhos e
nos anos de 2009 e 2010, dois em cada ano. A distribuição dos estudos de acordo com
os anos de publicação é apresentada no gráfico a seguir:
11%
11%
61%
17%
2010
2009
2008
2007
Gráfico 1- Distribuição dos artigos por anos de publicação.
É necessário ressaltar que, do total de trabalhos encontrados, 10 artigos foram
produzidos por pesquisadores da região sudeste, 07 da região sul e apenas 01 da região
centro-oeste. Observa-se a concentração de publicações na região sudeste e sul, o que é
coerente com a concentração de instituições que oferecem cursos de pós-graduação em
nível de mestrado e doutorado nessas regiões do Brasil.
Na leitura dos artigos foi possível identificar que 05 são frutos de pesquisas e 02
são relatos de experiência. Não foi possível identificar a metodologia utilizada por 11
desses trabalhos, ou seja, a maior parte deles.
Para a sistematização dos dados, os trabalhos foram divididos em três categorias:
Política de Educação Superior, Formação Universitária e Avaliação da Educação
Superior, na qual foram enquadrados 15 artigos. Dado o número de artigos presentes
7
nesta ultima categoria, optou-se em dividi-los em subcategorias, distribuídos conforme
a Tabela 1.
A partir dos dados da Tabela, observa-se que a primeira categoria apresentada,
“Política de Educação Superior”, apresenta apenas 01 trabalho publicado. Na discussão
sobre o tema o estudo aborda o panorama geral da educação brasileira destacando as
principais mudanças que ocorreram a partir de 1995, entre elas a nova LDB, a expansão
da educação superior por meio, principalmente, das instituições privadas e as políticas
de inclusão desenvolvidas no período.
Tabela 1 – Distribuição dos artigos por categoria e subcategorias
CATEGORIAS QUANTIDADE DE ARTIGOS
Política de Educação Superior 1
Formação Universitária e Oferta
de Cursos
2
Avaliação da Educação Superior 15
Subcategorias
História 2
Concepções da Avaliação 2
Auto-avaliação institucional 4
Avaliação institucional externa 1
Estudantes e a Avaliação 1
Exames e Rankings 5
Na segunda categoria, “Formação Universitária e Oferta de Cursos”, foram
enquadrados 02 trabalhos. Dentre os destaques dos trabalhos estão: as concepções e
influências na formação universitária no Brasil, com ênfase para a influência do
mercado; perfil de instituições, oferta de ensino, pesquisa e extensão; projetos, produtos
e tecnologias das IES com objetivo de subsidiar ações dos órgãos governamentais
responsáveis pela educação.
Na categoria “Avaliação da Educação Superior”, foco desta pesquisa, os
trabalhos, de uma forma geral, abordam as principais políticas de avaliação e as
transformações da educação superior brasileira por meio de um panorama histórico, da
descrição do processo de avaliação atual e da discussão acerca da implementação aos
8
SINAES. As evidências encontradas em cada subcategoria indicada na Tabela 1 são
apresentadas abaixo:
- História da Avaliação da Educação Superior: dois dos trabalhos publicados
descrevem aspectos históricos da avaliação da educação superior no Brasil. Em um
artigo, são apresentados e analisados os documentos do PARU4, CNRES
5, GERES
6 e
PAUIB7. Para isso são detectados os tópicos desses documentos que fazem parte da
avaliação nos anos 1990 e 2000.
Já no outro artigo são explicitados os avanços e retrocessos da avaliação desse
nível de ensino no Brasil nas políticas dos governos Fernando Henrique Cardoso e Luis
Inácio Lula da Silva. O trabalho indica uma série de mudanças ocorridas na educação
superior, dentre elas, a criação do SINAES que pretende articular a ação de regulação
com a dimensão de emancipação das IES.
- Auto-Avaliação Institucional: os 04 trabalhos classificados na subcategoria
enfatizam as experiências auto-avaliativas, principalmente, de instituições públicas.
Entretanto, um deles analisa a participação da comunidade acadêmica no processo de
auto-avaliação, a partir da proposta do SINAES, de uma IES privada. O trabalho busca
conhecer a importância deste processo para acadêmicos, professores e técnicos
administrativos e descobrir quais os meios de comunicação mais os sensibiliza.
O processo de auto-avaliação de uma IES estadual é relatado em um dos artigos
que destaca a importância da sensibilização da população universitária trazendo,
inclusive, algumas das estratégias utilizadas para isso, como a criação de grupos de
avaliação local nas unidades universitárias. Apresenta todas as etapas desta auto-
avaliação, desde a criação da CPA até a elaboração do primeiro relatório da auto-
avaliação, bem como, as reflexões provocadas por este.
Além desses, com o objetivo de avaliar o significado desse modelo de atividade
de avaliação, um dos estudos enfatiza, especificamente, as CPAs das universidades
federais brasileiras.
4 “Programa de Avaliação da Reforma Universitária” (1983),
5 “Relatório da Comissão Nacional de Reformulação da Educação Superior “Uma Nova Política para a
Educação Superior Brasileira” (1985) 6 “Relatório do Grupo Executivo para a Reformulação da Educação Superior” (1986)
7 Documento da Comissão Nacional de Avaliação do Ensino Superior “Programa de Avaliação
Institucional das Universidades Brasileiras” (1993).
9
- Avaliação Institucional Externa: o artigo expõe a temática contextualizando
o processo de avaliação com destaque para a avaliação externa e evidenciando a
importância da visita in loco prevista no SINAES e se referindo a esta fase como a de
maior relevância no processo de avaliação. O autor sustenta a necessidade e a
possibilidade de se organizar uma estrutura para avaliação da educação superior
utilizando o SINAES com mesmo rigor que a Capes tem com os cursos de pós-
graduação.
- Estudantes e a Avaliação: o único trabalho indicado nesta subcategoria avalia
a influência dos programas de avaliação expressos em resultados de exames nacionais
nos movimentos e nas ações estudantis. Para isso, aborda os conceitos e estudos sobre
estudante universitário e apresenta um histórico do movimento estudantil no Brasil.
Considerando que a subcategoria “Exames e Rankings” possui o maior número
de artigos, destaca-se a seguir o que estes trabalhos discutem acerca da temática.
OS EXAMES E O RANQUEAMENTO NA AVALIAÇÃO DA EDUCAÇÃO
SUPERIOR BRASILEIRA
Os 05 trabalhos classificados nesta subcategoria chamam a atenção para dois
elementos que compõem o SINAES: a avaliação do desempenho dos estudantes e a
avaliação de cursos.
Desta forma, um dos artigos expõe o trabalho da Comissão Assessora de
Avaliação da área de Pedagogia, no ano de 2005. Esta Comissão, composta por
representantes de instituições de educação superior, públicas e privadas, presentes nas
cinco regiões geográficas do país, foi incumbida de propor diretrizes, objetivos e outras
especificações para a construção dos instrumentos aplicados aos participantes do
ENADE do mesmo ano.
Após descrever as etapas do trabalho realizado pela referida Comissão, o artigo,
escrito em co-autoria no ano de 2008, avalia os instrumentos construídos para a prova e
discute o processo de avaliação. Ao fazer ponderações acerca do SINAES, os autores
apontam os avanços do ENADE em relação ao anterior – o Exame Nacional de Cursos
(ENC) - conhecido como “Provão”. Dentre esses avanços está a característica do
Sistema que congrega princípios como o diagnóstico, a auto-formação, a ênfase no
10
processo de construção da informação e na perspectiva de crescimento e transformação
institucional.
Embora o trabalho ressalte o caráter formativo da proposta contida nos
dispositivos legais que criam e regulamentam o SINAES, os autores apontam alguns
questionamentos que deveriam ser realizados pelas instituições em relação aos dados
indicados nos resultados, dentre eles: o que se fará com os diagnósticos desenvolvidos?
Quem será o responsável direto pelas alterações consideradas necessárias? Qual será o
lugar do governo no encaminhamento das melhorias necessárias, tanto no caso das IES
públicas quanto no caso das IES privadas?
Na discussão do surgimento dos IGC e do CPC, um dos trabalhos ressalta
negativamente o “super-dimensionamento” do ENADE nos referidos indicadores, uma
vez que entre as críticas ao “Provão” estava justamente o fato do mesmo considerar
apenas os resultados dos exames dos alunos.
No artigo, são assinalados os limites do ENADE, já que este Exame não permite
a comparabilidade dos resultados entre os avaliados em um mesmo ano e não permite,
ainda, a comparação entre o mesmo curso avaliado a cada três anos. Além disso, chama
a atenção para o terceiro elemento do SINAES – a avaliação de curso – que apareceria
de forma distorcia no CPC. Segundo a autora do trabalho,
Embora alguns estudos sobre o SINAES mostrem a evidência de um
modelo de avaliação em transformação e não definitivo, o novo
índice e seus conceitos preliminares parecem levar-nos novamente ao
tempo dos rankings, das avaliações mercadológicas e simplificações
midiáticas, mais próximos de uma visibilidade publicitária do que da
verdade da avaliação da qualidade. (Barreyro, 2008, p. 867)
Nesta mesma direção, outro trabalho, publicado em 2009, descreve os processos
de funcionamento do SINAES e faz críticas ao fato de se coletar a maioria dos dados
utilizados para avaliação das IES, no processo do ENADE.
O artigo destaca as mudanças ocorridas no Ministério da Educação a partir de
2005, dentre estas, a criação, em 2008, de indicadores que favorecem o ranqueamento
das IES no país. Essas mudanças representam um equívoco em termos de aplicabilidade
do SINAES, pois um único pilar do Sistema passa a ser utilizado como o definidor de
qualidade da educação superior oferecida pelas IES.
11
Assim, a utilização dos dados do ENADE com a finalidade de marketing e
disputas entre as IES transgrediram a implementação do SINAES, já que em uma
avaliação formativa, característica da avaliação institucional, “o produto passa a ser
apenas um componente do complexo processo da avaliação” (POLIDORI, 2009, p. 11).
Dois dos trabalhos pesquisados foram publicados pelo mesmo autor, um em
2008 e o outro em 2010. De uma forma geral os artigos, assim como os dois últimos
apresentados, fazem críticas à recente prática de avaliação adotada no Brasil,
desenvolvidas com ênfase na regulação, por meio da hegemonia dos exames nacionais e
pela influência dos interesses neoliberais na busca da eficiência e da eficácia.
O primeiro trabalho discute os conceitos de qualidade, avaliação e acreditação,
além de criticar as recentes práticas de avaliação adotadas pelo INEP no Brasil. O outro
artigo tem como objetivo estabelecer um eixo entre as principais políticas de avaliação e
as transformações da educação superior brasileira, concebidas e praticadas a partir de
1995, destacando alguns dos efeitos sobre o ensino de graduação. Sinaliza os principais
instrumentos de avaliação praticados no Brasil, com ênfase no Provão e no ENADE, e
faz considerações sobre os exames gerais ou de larga escala, com intuito também de
apontar suas interferências no ensino.
Para Dias Sobrinho (2010), o SINAES está reduzido a índices, processo que
possibilita a utilização dos dados obtidos para fins de marketing e ranking,
principalmente entre as IES privadas. As mudanças ocorridas na implementação do
SINAES significam uma alteração radical do paradigma de avaliação: da produção de
significados e reflexão sobre os valores do conhecimento e da formação, para o
controle, a seleção, a classificação em escalas numéricas. A qualidade, desta forma,
seria resultante do ENADE, mais o IDD e o índice de insumos (opinião dos alunos
sobre plano de curso e condições de infra-estrutura), cuja responsabilidade caberia
totalmente ao estudante.
CONCLUSÕES
A partir dos artigos publicados na Revista Avaliação, é possível perceber as
tendências das pesquisas realizadas pelos líderes dos grupos de pesquisa que enfocam a
avaliação da educação superior. No entanto, o pequeno número de publicações dos
12
líderes em co-autoria com outros membros, já que a maioria dos trabalhos foi publicada
por apenas um autor, não permite afirmar que os trabalhos são resultados de pesquisas
realizadas pelos grupos levantados.
Dentre as características apontadas, ressalta-se a escassez de informações sobre
a metodologia utilizada para a realização dos estudos, o que dificulta a classificação dos
trabalhos. Além disso, um grande número de artigos faz uma abordagem mais teórica
das temáticas.
Já, em relação às categorias e subcategorias elencadas percebe-se que a maior
parte dos trabalhos discute o processo de implementação do SINAES e os seus
desdobramentos, o que é justificável pelo período privilegiado pela pesquisa. Neste
sentido, é possível inferir que o ano de 2008 apresenta o maior número de publicações
em conseqüência dos relatórios das auto-avaliações institucionais realizadas e,
principalmente, da criação, no mesmo ano, dos indicadores IGC e CPC, conforme
abordado.
O conjunto de trabalhos analisados, corroborando com as publicações dos
demais autores da área, indicam a forte presença do mercado como elemento de
regulação nas políticas avaliativas brasileiras, em detrimento das necessidades ou
escolhas da comunidade acadêmica, inclusive no SINAES, caracterizado como diferente
das práticas anteriormente existentes. Assim, destacam que a falta de continuidade das
práticas e mecanismos avaliativos, a minimização do caráter formativo da auto-
avaliação institucional para a retomada da ênfase na avaliação do desempenho dos
estudantes e a ênfase na regulação surgem como determinantes das dificuldades
enfrentadas por parte do Estado brasileiro para a implementação do SINAES.
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