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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES / AVM PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU O CONSUMISMO HUMANO SOB A LUZ DA NEUROCIÊNCIA Dalton Henrique Thomaz Ferreira ORIENTADORA: Prof.ª Marta Relvas Rio de Janeiro 2018 DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEIDE DIREITO AUTORAL

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES / AVM

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

O CONSUMISMO HUMANO SOB A LUZ DA NEUROCIÊNCIA

Dalton Henrique Thomaz Ferreira

ORIENTADORA:

Prof.ª Marta Relvas

Rio de Janeiro

2018

DOCUMENTO P

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES / AVM

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

Apresentação de monografia à AVM como requisito

parcial para obtenção do grau de especialista em NEUROCIÊNCIA PEDAGÓGICA.

Por: Dalton Henrique Thomaz Ferreira

O CONSUMISMO HUMANO SOB A LUZ DA NEUROCIÊNCIA

Rio de Janeiro

2018

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AGRADECIMENTOS

Aos amigos pesquisadores do comportamento

humano, parentes, clientes, professores, alunos,

ao INAp e a AVM pelo constante aprendizado,

aos amigos de classe dessa jornada, ao quadro

de professores da AVM e em especial a

orientadora Marta Relvas.

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho à minha família, em especial a meu

filho Renato Ferreira e esposa Lucimeire Ferreira pela

compreensão das horas dedicadas ao estudo e pesquisa

e ao amigo Marcelo Felippe pela indicação do curso e

aconselhamentos.

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RESUMO

Esse trabalho visa compreender sob a luz da neurociência, o que leva as

pessoas a realizarem compras supérfluas de forma impulsiva e repetitiva.

Identificar quais são as substâncias químicas que são geradas no organismo

no momento do consumo. Esse estudo vai além, ele busca identificar como

essas ações de consumo impulsivo podem levar a compulsão e a perda de

controle sobre o próprio pensamento e consequentemente o comportamento.

Compreender como se dá a disputa entre razão e emoção no processo

decisório, quais estruturas do cérebro agem nesse processo e como o

processo cognitivo é afetado e “sedado” por processos emocionais. No

decorrer da pesquisa são mostradas as experiências que o marketing realiza

com uso de tecnologia para medir o cérebro, e a influência de cada um dos

sentidos no comportamento humano e como eles podem ser manipulados para

que as pessoas executem ações de forma inconsciente e prejudiciais aos

próprios interesses de longo prazo. São apresentados quais são os fatores que

levam a compulsão, como se dá a influência do meio, da genética e da falta de

autoconhecimento e ainda, como o estresse e ansiedade são determinantes

para que a ação seja consumada de forma automatizada. Finalmente é

apresentado através de estudos científicos, como as pessoas que agem de

forma impulsiva no consumo, podem fazer para inibir essa influência do

sistema e da propaganda, e gerarem por si mesmas, a química da satisfação e

do prazer, sem necessidade de encontrarem esse bem-estar através de

objetos. É abordado qual o papel dos lobos frontais no controle inibitório e

quais as soluções para recuperação desse cérebro.

Palavras-chave: consumo; neurociência; tomada de decisão; emoção;

compulsão; marketing.

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METODOLOGIA

Os métodos utilizados para pesquisa do tema proposto foram

baseados em quase sua totalidade na leitura de livros, complementado através

de pesquisa em sites, leitura de artigos e alguns vídeos na internet e a

resposta, após coleta de dados, pesquisa bibliográfica, nos autores e

pesquisadores do assunto, como a autora e médica Ana Beatriz, autor e

consultor em neuromarketing e biologia do comportamento do consumidor

Pedro de Camargo, autor e consultor e especialista em marketing Martin

Lindstrom e o autor e pesquisador de neuromarketing com diversos artigos em

revistas científicas, o Dr A.K.Pradeep. Foi utilizado também como fonte de

pesquisa a obra em coautoria com o professor Marcelo Felippe -

Transformando Dinheiro em Liberdade – Como Alcançar sua Autonomia e

Independência Pessoal - aonde foram realizadas diversas pesquisas sobre o

comportamento humano no que tange a dinheiro e consumo. Os estudos nessa

pesquisa contaram com a contribuição preciosa de Antônio E. Damásio,

sobretudo sua obra “O Erro de Descartes. Emoção, razão e o cérebro humano”

e as valiosas pesquisas de Richard Davidson em sua obra “O estilo emocional

do cérebro”, sobretudo em suas pesquisas de campo a respeito sobre a

meditação. Foram adicionadas durante o trabalho as pesquisas de Robert Lent

com a edição de “Cem bilhões de neurônios?”, Daniel Goleman, Ph.D. com sua

obra “Inteligência Emocional” e para estudo dos lobo frontais o professor e

pesquisador Elkhonon Goldberg com a obra “O Cérebro Executivo. Lobos

Frontais e Mentes Civilizadas”

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 08

CAPÍTULO I

O processo da tomada de decisão na hora das compras. 09

CAPÍTULO II

Como o cérebro é afetado no momento do consumo e a criação da

dependência. 27

CAPÍTULO III

Possibilidades de recuperação desse cérebro. 37

CONCLUSÃO 50

BIBLIOGRAFIA 51

ÍNDICE 53

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INTRODUÇÃO

Segundo dados do PEIC (pesquisa de endividamento e

inadimplência do consumidor) de janeiro de 2018, o percentual de famílias

brasileiras com dívidas ao final de 2017 é de 62,5%, um aumento em relação a

2016 que era de 59%. A inadimplência, ou seja, contas em atraso, fecharam

2017 com 25,7%, contra 24% ao final de 2016. O percentual de famílias que

afirmaram não ter condições de pagarem as suas dívidas subiram de 9,1%

para 9.7%.

Os estudos voltados para área financeira-comportamental e tomada

de decisão do consumidor são geralmente realizados por empresas para

entenderem seu mercado consumidor e fazer com que gastem mais,

manipulando os hábitos de consumo das pessoas e agindo em seu

inconsciente. Em nossa sociedade atual há uma valorização e culto do

supérfluo influenciando a coletividade a considerar importante o “Ter” sobre o

“Ser”.

Essa pesquisa é voltada a compreender sob a luz da neurociência,

quais áreas do cérebro são afetadas durante o consumo, quais substâncias

químicas são geradas nesse processo e compreender como ocorre o processo

de tomada de decisão na hora da compra e qual a influência das emoções

frente à razão nessa decisão.

Segundo Ana Maria Barbosa Silva, uma vez que esse cérebro é

influenciado externamente ao consumo para alimentar o sistema de produção,

em muitas pessoas gera uma dependência química, fazendo com que

precisem comprar cada vez mais, com duração mais curta entre uma compra e

outra, gerando pensamentos obsessivos (2014, p. 20).

Ao fim desse trabalho será pesquisado se há formas de acabar com

essa compulsão, e caso positivo, como será o funcionamento desse cérebro

após essa recuperação e se é possível retornar a uma vida social normal de

compras de forma consciente e saudável.

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CAPÍTULO I

O PROCESSO DE TOMADA DE DECISÃO NA HORA

DAS COMPRAS

Durante muitos anos acreditava-se que o processo de tomada de

decisão na hora de comprar um objeto de consumo poderia ser controlado por

processos cognitivos. Que a emoção poderia ser controlada pela razão. Com o

avanço da neurociência e de métodos científicos aliados a tecnologia, como

por exemplo, o uso do EEG (eletroencefalografia), passou-se a registrar e

identificar a importância e o peso das emoções no processo decisório. Com a

aquisição dessas tecnologias foram substituídas as pesquisas através das

entrevistas, aonde a resposta poderia ser influenciada pelo neocórtex e induzir

ao erro, passaram a utilizar aparelhos para o mapeamento cerebral e localizar

as áreas do cérebro e como a influência de estímulos externos podem

persuadir a decisão final do consumidor.

Segundo Dr A.K. Pradeep (2012, p.16) a principal descoberta pela

neurociência é que a maior parte processada pelo cérebro do ser humano

ocorre em nível subconsciente. Segundo citação do autor retirada do livro de

Timothy Wilson, “Strangers to ourselves: Discovering the Adaptive

Unconscious”, nossos sentidos recebem cerca de 11 milhões de informações

por segundo, mas nossa capacidade de processar esses estímulos se dá no

máximo de 40 bits por segundo, ou seja, a maior parte dos estímulos que são

captados fica no subconsciente.

Ana Barbosa (2014, p.110) aponta que o cérebro humano possui

uma serie de funcionamentos básicos a todos, como o circuito medo/estresse

que visa à proteção, e o sistema de recompensas que busca o prazer, entre

outros, mas existem áreas no cérebro que são individualizadas, relacionadas a

como cada indivíduo processa os sentidos, aprende, pensa, o meio em que

vive e associa uma informação a outra e essas associações realizadas pelo

cérebro em grande parte, são feitas involuntariamente e de maneira não

consciente. Dessa forma, percebe-se que o inconsciente é determinante na

tomada de decisão, ou seja, a razão que é um processo consciente é

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influenciada por processos inconscientes. A questão é: como ocorrem essas

ações no cérebro e como são utilizadas por “cegar” a razão frente a um

momento decisório no ato da compra.

1.1. Neuromarketing

É um campo recente de estudos que envolvem várias disciplinas,

como neurociência, marketing, biologia, psicologia, antropologia, por exemplo.

Sua finalidade é compreender como se dá o processo de compra do

consumidor, seus desejos, motivações, sentimentos e impulsos. Essa nova

ciência busca responder algumas premissas como:

- O consumidor toma suas decisões de compra a nível neurológico;

- A reação do cérebro do consumidor frente aos estímulos recebidos;

- Criar maior impacto no cérebro do consumidor;

- O que cria fidelização ao produto;

- O que faz o consumidor escolher o produto “A” ao invés do produto “B”.

1.1.1. Pesquisas realizadas

Em 2003, foi realizada uma experiência pelo Dr Read. Montague

utilizando um aparelho IRMf (Martim Lindstrom, 2009, p31-33) para verificar os

testes realizados décadas atrás sob a preferência entre Pepsi e Coca-Cola. Ao

servir as bebidas sem identificá-las, os participantes em sua maioria preferiram

a Pepsi. Ao se observar o cérebro dos voluntários, ele observou atividade no

putâmen ventral, região esta que é estimulada quando o sabor é apreciado. Em

seguida, o pesquisador informou aos voluntários qual seria a bebida oferecida

antes e o resultado mudou drasticamente. 75% dos pesquisados escolheram a

Coca-Cola. Foi observada mudança na localização da atividade cerebral, além

do putâmen ventral, havia registros no córtex pré-frontal (responsável pela

racionalidade). O Dr Montague identificou que as duas áreas do cérebro

estavam em disputa, emoção versus razão e que em um milésimo de segundo

de indecisão, as emoções ganharam e por isso a Coca-Cola venceu. Ou seja,

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as associações e lembranças positivas que essa marca trazia superaram a

preferência pelo sabor. Para Martin Lindstrom, isso ocorreu, pois o cérebro

identifica o que é valoroso através das emoções e assim os voluntários eram

cativados pela marca e o símbolo de sua representação, as emoções que ela

gerava, ao invés do sabor em si.

Outra experiência importante para compreender o processo de

tomada de decisão, no momento de se escolher algo, foi também citada na

obra de Martin Lindstrom (2009, p33) aonde quatro psicólogos da universidade

de Princeton fizeram a seguinte experiência: selecionaram alguns estudantes e

pediram que decidissem entre duas opções. Na primeira ganhariam um vale-

presente no valor de US$15,00 imediatamente para compras na Amazon. Na

segunda opção, os estudantes iriam aguardar por duas semanas e receberiam

uma vale-presente de U$20,00 para compras no mesmo local. As imagens

cerebrais detectaram que a opção de premiação imediata gerou uma descarga

nas áreas límbicas do cérebro na maioria dos estudantes, em uma área

responsável pelas emoções, assim como pela formação da memória. Essa

experiência foi importante por confrontar alguns pressupostos econômicos que

são baseados em que as pessoas se comportam de maneira racional e

previsível quando o assunto é dinheiro. Visão esta que já é confrontada pela

economia comportamental e pela neuroeconomia. (nova disciplina dentre as

quais, neurociência, biologia, estatística, matemática, psicologia, entre outras).

Outra pesquisa, realizada em 1972 pelo psicólogo Walter Mishel, na

Universidade de Stanford, com objetivo de medir o autocontrole e capacidade

de adiar a recompensa. Foi o famoso teste do marshmallow, aonde ele reuniu

crianças entre três e cinco anos de idade e passou a seguinte instrução: elas

ficariam sozinhas em uma sala por 15 minutos e teria um prato com

marshmallow à frente delas, caso elas não comessem o doce após esse

período, elas ganhariam um segundo marshmallow. Caso preferissem,

poderiam comer antes e não ganhariam a recompensa. Elas sem saberem

foram filmadas e foi observado que algumas dessas crianças conseguiram

resistir criando estratégias, desde fecharem os olhos, cantarem ou inventarem

uma brincadeira, de modo que tirassem o foco do doce. Essas crianças tiveram

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o acompanhamento realizado por Mishel, ao longo do tempo e foi observado

que as que conseguiram resistir à tentação e adiaram a recompensa,

cresceram de forma mais competentes cognitivamente e socialmente. Tiveram

melhor desenvolvimento escolar e lidavam melhor com a frustração e estresse,

obtendo melhores carreiras e vidas particulares mais satisfatórias, do que as

que não resistiram e anteciparam a recompensa.

Através das experiências citadas, percebe-se que as emoções

influenciam a razão, mas esta também pode influenciar as emoções, desde que

se tenham as estratégias corretas, ou seja, desenvolvam-se habilidades

cognitivas que possam ser utilizadas e treinadas antes da manifestação da

emoção. Fica o questionamento, como essas crianças de três a cinco anos

conseguiram elaborar estratégias para ganhos maiores no futuro, e lidaram

com suas emoções e o forte desejo de consumirem o doce imediatamente? O

que faltou para as crianças que comeram o doce imediatamente? Como o

ambiente e a educação podem influenciar nesse comportamento? E a

constatação do quanto à educação está focada nos processos cognitivos e

pouco interessada no desenvolvimento emocional, como um item importante na

formação desse ser humano.

O marketing está mais avançado nas pesquisas quanto ao

funcionamento do cérebro humano e como influenciá-lo no processo de tomada

de decisão. O marketing utiliza-se de vários artifícios para induzir e manipular o

comportamento das pessoas.

1.1.2. Descobertas utilizadas pelo marketing

As pesquisas documentais, através, sobretudo de entrevistas junto

ao consumidor, como eram utilizadas anteriormente pelo marketing, não trazia

exatidão para a produção das campanhas e muito dinheiro era gasto, sem o

retorno esperado. Para o Dr Pradeep, (Dr A. K.Pradeep, 2012, p22) isso ocorria

devido à dificuldade que os indivíduos possuem em traduzir o sentimento ou

emoção para as palavras, ou seja, traduzir em uma linguagem específica o que

vem do inconsciente para o consciente.

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Com a evolução da tecnologia foi possível verificar diretamente no

cérebro quais são as áreas afetadas quando expostas a um determinado

estímulo. Foram utilizados nas pesquisas aparelhos como o EEG, a

ressonância magnética funcional, e uso da biometria para mensurar as

respostas fisiológicas, como a frequência cardíaca e respiratória, o eye-

tracking, entre outras tecnologias.

Antes de chegar propriamente aos truques, que o marketing faz para

que desperte o desejo do consumidor, e a compra em si seja efetuada é

importante à compreensão dos neurônios-espelho, descoberto na década de

90. Eram realizadas experiências com macacos Rhesus e identificados que

neurônios eram ativados de acordo com a realização de uma atividade

específica, como o ato de pegar um alimento, por exemplo. Certo dia, os

pesquisadores perceberam que as áreas ativadas no cérebro de um macaco

eram a mesma ao observarem um pesquisador que executava aquela mesma

ação já aprendida por eles, ou seja, o simples fato dos macacos verem aquela

ação mesmo sem a executarem, disparava as conexões nas mesmas áreas

cerebrais. Após uma série de experimentos e estudos conduzidos por

Giancomo Rizzolatti (Dr A. K.Pradeep, 2012, p120-122), em macacos para

confirmarem essas revelações, foi verificado também nos seres humanos

através da neuroimagem, que ao observarem alguém realizando uma

determinada ação, ele automaticamente simula essa mesma ação em seu

cérebro. O que os neurônios-espelho fazem é a possibilidade de gerar a

empatia, ou seja, compreender o ponto de vista de outra pessoa e criar

conexão, além de possibilitar o aprendizado baseado na relação “o que vejo eu

faço”. O que foi utilizado pelas campanhas para aumentarem suas vendas a

partir da descoberta dos neurônios-espelho, foi despertar nos consumidores o

desejo, ao verem alguém se sentindo bem em realizar algo, a executarem a

mesma ação com intuito de obterem a mesma sensação.

A empresa norte-americana NeuroFocus retirou através dos estudos

da neurociência conhecimentos para aplicação no marketing. Ela identificou

como base primordial para as vendas a medição de três parâmetros: atenção,

envolvimento emocional e a retenção de memória.

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Com a evolução das tecnologias voltadas para a obtenção de

conteúdo, facilidade na comunicação e entretenimento, através de jogos,

vídeos, sites de relacionamento, entre outros, vem causando excesso de

informações e uma sobrecarga nos sentidos sensoriais das pessoas, o grande

obstáculo encontrado pela indústria é atrair e reter atenção do seu mercado

consumidor. Através do EEG, eles conseguem captar a frequência das

atividades elétricas e como essas atividades excitam outros neurônios, fazendo

com que o cérebro apresente padrões coordenados de ritmos elétricos para em

seguida serem decodificados por algoritmos analíticos e terem os componentes

fundamentais dos mecanismos cerebrais reveladas (Dr A. K.Pradeep, 2012,

p132-133). Segundo Pradeep “A atenção é uma função fundamental do

cérebro e produz um padrão distinto de ondas cerebrais”. Em outras palavras,

as empresas hoje sabem o que funciona e o que não funciona para atrair a

atenção do público alvo para seu produto e como operar ainda em nível

inconsciente, ou seja, antes de se ter a consciência que se está pensando

sobre algo, ocorrem estímulos para que influenciem na construção desse

pensamento.

Outro ponto fundamental para que a venda seja realizada e inserida

no contexto de tomada de decisão é o envolvimento emocional que está em um

processo automatizado, pois se fosse passar pelo processo consciente iria

demorar alguns segundos que colocariam a sobrevivência em risco, como

numa tomada de decisão de fuga ao ver um animal selvagem à espreita.

Quanto maior a emoção envolvida, menos o córtex frontal “assume” o controle

no processo decisório. Essa emoção é ativada através de estímulos que são

inseridos na propaganda para disparar com intensidade e ativar o cérebro e

sistema nervoso. E como citado anteriormente na pesquisa sobre Coca Cola e

Pepsi, criar um envolvimento entre o consumidor e a marca pelo que ela

representa. Segundo Ana Beatriz, o marketing não vende apenas o produto,

mas toda conotação sentimental que vem com ele, o status gerado pelo

produto. As propagandas vendem emoções, sonhos e desejos, o produto é o

meio de se chegar a essas emoções. As compras, segundo a autora, se

baseiam no fato de nosso sistema de recompensa, nem sempre identificado

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pela nossa consciência e baseado no cérebro primitivo (reptiliano),

automatizado e que não se tem controle, responsável, por exemplo, pela

regulação da temperatura do corpo ou pelo batimento cardíaco. Damásio

denomina essa área como circuitos neurais inatos (António R. Damásio, 2012,

p116). Ana Beatriz aponta para o vínculo emocional para o sucesso das

propagandas e que a falta dessa emoção que é provocada traz a razão para

tomada de decisão. Dessa forma, o marketing trabalha para afastar a razão e

criar uma vinculação afetiva entre o produto ofertado e o consumidor.

E o terceiro parâmetro primordial estudado e medido pela

NeuroFocus é a memória, pois é fundamental que a pessoa se lembre da

mensagem passada quando for realizar a compra, principalmente segundo

Pradeep (2012, p135) a memória implícita, aonde as recordações podem

influenciar decisões e comportamentos sem se ter consciência disso. Memória

esta que processa de forma inconsciente, sem esforço deliberado, como

escovar os dentes por exemplo. Aqui é aonde a publicidade procura atuar para

influenciar no processo decisório de compra.

1.1.3. Truques do marketing – usando seus sentidos

Como citado anteriormente sobre a dificuldade que a publicidade

tem de captar a atenção do público devido à sobrecarga de estímulos,

principalmente a saturação visual, Lindstrom (2009, p125-143) aponta que os

pesquisadores descobriram que essa saturação não levava a um aumento de

vendas e sim a um estresse visual fazendo com que as pessoas não

detectassem o que estava sendo mostrado. Dessa forma, as empresas

começaram a perceber que trabalhar estimulando outros sentidos seria mais

vantajoso para seus objetivos. Uma pesquisa desenvolvida pela Dra. Calvert

com fragrâncias e logomarcas mostrou que quanto os participantes

estimulados, ora pela imagem, ora pelo aroma, consideravam ambas

sedutoras, mas quando apresentadas juntas, tornavam-se bem mais atraentes

do que de forma separada. Essa pesquisa foi mais longe ainda, no caso, de

apresentar uma imagem incongruente com o cheiro, como por exemplo, ao

mostrar a logomarca de xampu para bebês Johnson & Johnson com aroma de

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cerveja ativava no cérebro (córtex orbifrontal lateral esquerdo) a aversão ao

que era mostrado causando repulsa. Ao contrário de quanto à associação

cheiro/imagem são congruentes aonde o córtex piriforme direito e a amígdala

cerebelar se ativam em conjunto ajudando a recordação daquela marca. Ainda

nessa pesquisa, há uma descoberta relevante utilizada pela propaganda, hoje

em dia, a Dra. Calvert descobriu que tanto o cheiro, quanto a visão daquele

produto ativa as mesmas regiões do cérebro, ou seja, se você sentir o cheiro

de um pão, provavelmente a imagem dele irá surgir na sua mente. A partir

dessas descobertas, as empresas começaram a utilizar o olfato e outros

estímulos cinestésicos para influenciar na tomada de decisão de compra pelo

consumidor. Essa descoberta de ativação das mesmas áreas cerebrais do odor

e da imagem foi atribuída aos neurônios-espelho.

Lindstrom conclui que quando o estímulo é olfativo, os receptores de

odores no nariz enviam diretamente ao sistema límbico, responsável pelas

emoções, causando uma reação instantânea, enquanto os outros sentidos o

caminho percorrido é maior e possibilitam ao cérebro um pensamento antes da

reação. Uma experiência realizada em uma loja de roupas (Lindstrom 2009,

p128-129) foi espalhada a fragrância de baunilha na sessão de roupas

femininas, por associar ao leite materno e a sensação de conforto de se estar

nos braços da mãe, e a vendas dobraram. Essa lembrança olfativa é a

memória episódica, que armazena memórias sobre “o que, quando e onde” (Dr

A. K.Pradeep, 2012, p64), ou seja, quando se dá o estimulo olfativo, vem uma

recordação de épocas, situações e locais específicos, como por exemplo, ao se

sentir um cheiro do bolo saindo do forno e vem à recordação do “bolo da vovó”

e traz toda a lembrança com as emoções que ela evoca. As empresas sabendo

disso procuram estimular essas sensações e colocar as pessoas numa

condição propícia para a compra criando uma associação positiva que ela

carrega dentro dela ao produto que está sendo ofertado.

Uma experiência realizada mostra como o olfato pode ser utilizado

de forma inconsciente influenciando no poder de decisão das pessoas. Em

2005, dois pesquisadores colocaram um aroma de limão bem fraco atrás de

uma parede de uma sala. Havia um grupo de pessoas nessa sala, e outro

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grupo com o mesmo número de pessoas em outra sala, sem estímulo de odor

algum. Após um tempo, ao serem perguntadas o que pretendiam realizar no

dia, 36% dos participantes que tiveram a influência quase imperceptível do

cheiro de limão apontaram atividades relacionadas à limpeza, contra 11% dos

que estavam na sala sem estímulo olfativo. Após essas respostas, um novo

grupo de voluntários foi distribuído nessas salas, que possuíam uma câmera

oculta e receberam um biscoito que se esfarelava facilmente ao comer. Os

voluntários que estavam sob a influência do aroma quase imperceptível de

detergente foram mais cuidadosos ao comer e fizeram menos sujeira dos que

não foram estimulados olfativamente, mostrando como o olfato pode influenciar

no comportamento. Com base nessas e outras pesquisas muitas empresas

atualmente, inserem aromas artificiais congruentes com o que se desejam,

como por exemplo, o supermercado que em muitas situações coloca a padaria

em local estratégico, para que o cheiro de pão possa influenciá-lo a comprar

mais.

Outro estímulo sensorial muito utilizado pelo marketing é através do

tato, como as concessionárias de carro, por exemplo, estimulam que o

pretendente entre no carro, sinta o conforto, o acolchoamento da poltrona,

pegue em várias partes do veículo. Outro exemplo são as lojas de roupa que

estimulam o cliente, para que se passe a mão no tecido, sintam as roupas sob

o corpo, avaliem a maciez, a textura, antes da tomada de decisão, que será

estimulada para uma possível compra. Lindstrom (2009, p133) cita o exemplo

de determinadas marcas de controle remoto, que possui bastante alumínio,

para dar mais peso ao objeto e passar a sensação de mais robustez, e dessa

forma criar a percepção que o produto vale mais, é de maior qualidade e

consequentemente possam colocar um preço maior, do que o mais leve, e

através dessa percepção tátil influenciar no processo de tomada de decisão do

consumidor. Pradeep (2012, p71) aponta que as áreas mais sensíveis ao

estímulo tátil são as mãos, pés, língua, pescoço e lábios e que qualquer

produto ao ser lançado deve estimular e convidar ao toque. Pedro de Camargo

(2013, p147-149) aponta uma pesquisa que mostrou que em um processo de

compra havia uma diferença relevante nas opiniões das pessoas de acordo

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com a cadeira que estavam sentadas. No caso dos compradores que estavam

sentados em uma poltrona macia, as ofertas foram 40% maiores do que os que

estavam acomodados em uma cadeira dura e desconfortável. Esses que

estavam desconfortáveis eram mais difíceis de serem convencidos. Outra

experiência interessante apontada pelo mesmo autor, realizada pelo

pesquisador, John Bargh da Universidade de Yale, foi em relação à diferença

que a temperatura da bebida influencia em como uma pessoa julga a outra.

Nessa experiência, o pesquisador ofereceu xícaras de café quente para um

grupo e outra de café gelado para outro grupo. Após tomarem a bebida, elas

foram solicitadas a avaliarem uma terceira pessoa baseado em informações

prévias passadas por eles, sem entrar em contato com esses terceiros. As que

estavam com a bebida quente julgaram a personalidade do terceiro como mais

quente e afável que os que tomaram a bebida gelada. Segundo Pedro de

Camargo, os estímulos relacionados à temperatura provocam atividades na

ínsula e que possivelmente essa melhor avaliação pelas pessoas que foram

influenciadas pela bebida quente, deve-se aos cuidados maternos na infância.

Ele mostra mais uma experiência com a temperatura aonde foram oferecidos

cupons de descontos que poderiam ser utilizados para si mesmo ou poderiam

dar para um amigo. Antes eles teriam que segura um pacote. Para metade do

grupo foi um pacote gelado e para outra metade foi fornecido um pacote quente

para manterem sob as mãos. No grupo dos que seguraram o pacote quente

houve um maior percentual que doaram o cupom para os amigos, mostrando

como questões como a temperatura, também pode influenciar no processo

decisório.

Outro sentido muito utilizado pela publicidade é o auditivo e que são

bem explorados pelas empresas. Como apontado por Pradeep (2012, p69-70),

sons como o barulho da batata crocante, o ruído provocado ao abrir um

refrigerante, ou da máquina tirando o café estimulam impulsos nervosos e

inserem um desejo de consumo instantâneo, atribuído também ao neurônios-

espelho. Os sons também trazem experiências passadas, como ao ouvir uma

música marcante na infância, essa canção traz outros tipos de recordações

associados à memória e influi no estado emocional presente. A música é

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apontada também por Pedro de Camargo (2013, p160), como estratégia dos

supermercados em que em um dia mais tranquilo, tocam músicas lentas para

influenciar no comportamento das pessoas para que fiquem mais tempo e

comprem mais, e ao contrário, nos dias mais cheios tocam músicas mais

agitadas para inserir uma velocidade maior no entra e sai de clientes para dar

vazão e manter o estabelecimento em constante movimento. Diversas

empresas trabalham de forma minuciosa a gerarem um som que crie uma

associação eficaz com seu produto. A Bahlsen, empresa alemã do ramo

alimentício, contratou mais de uma dezena de pesquisadores e utiliza

laboratório de pesquisa, para criar o barulho do crocante perfeito para seus

produtos, como salgados e biscoitos. A Taurus criou um som de cofre para

quando se trava as portas do seu carro. Um tubo de batatas Pringles ao ser

aberto gera um som para que seja associada na mente do cliente uma

sensação de frescor. E ainda há os jingles, para criar a associação do produto

e manter o chamado vivo na mente de seu consumidor, como o jingle do

Mcdonalds com seu Big Mac. Foi realizada uma experiência interessante com o

estímulo auditivo através da música. Dois pesquisadores da Universidade de

Leicester transmitiram canções francesas em um dia, e canções alemãs em

outro dia, dentro de um supermercado na seção de bebidas e identificaram que

os clientes tinham entre 3 a 4 vezes mais chance de comprar um vinho francês

no dia da música francesa, e que os consumidores iam para seção alemã no

dia que tocava canção alemã. Ao indagarem esses clientes, a maioria não

percebeu a influência da música como elemento no processo de escolha.

Pedro de Camargo (2013, p50) cita que a música afeta a percepção do tempo

e reduz a ansiedade das pessoas (dependendo do tipo de música) e que

pesquisadores descobriram que durante a audição da música, no pico do

envolvimento emocional, há a liberação de dopamina no sistema estriado,

causando a excitação do sistema nervoso. Dessa forma, através dessas

experiências percebe-se agora através de outro estímulo sensorial, o auditivo,

também a influência que possui sobre o comportamento humano de forma

inconsciente. (Lindstrom 2009, p136-138).

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Retornando para o estímulo visual, aonde a maior parte das

sinapses ocorre (córtex visual), em comparação, por exemplo, com as

cinestésicas e onde as pesquisas da neurociência estão mais avançadas é

interessante citar o trabalho de Lindstrom (2009, p134-135) com o uso das

cores como conexão entre uma marca e seus clientes. Ele realizou uma

experiência com cerca de 600 mulheres. Entregou a cada uma delas, uma

caixa azul da Tiffany’s, sem logomarca da empresa estampada, e que se

encontrava vazia, sem elas saberem. Ao medirem seus batimentos cardíacos,

observaram que os mesmos subiram 20%, quase que instantaneamente,

apenas por associarem a caixa com os produtos que a marca representa, como

lista para casamento, noivado e recém-nascidos. Foi realizada uma pesquisa a

respeito das cores com listas telefônicas e descobriram que listas coloridas

prendiam a atenção por dois segundos ou mais, enquanto as produzidas em

preto e branco não capturava a atenção nem por um segundo.

Através de um estudo produzido pela empresa NeuroFocus,

Pradeep (2012, p72-73) aponta um resumo no que tange o uso dos sentidos e

como as empresas podem fazer uso de uma forma mais assertiva para a venda

de seus produtos. O visual é apontado como o sentido mais importante e que

qualquer informação que leve ao consumo deve caprichar nos estímulos

visuais. O olfato é o caminho mais direto para as emoções e armazenamento

da memória, o tato deve ser excitado, principalmente pela forma das

embalagens, o auditivo é seletivo e descarta ruídos e o que não interessa e o

paladar ativa a área dos prazeres do cérebro e está estritamente relacionado

ao olfato.

1.1.4. Manipulação realizada pelo marketing

Para compreensão da tomada de decisão é necessário compreender

um elemento muito importante: como surgem os hábitos e como eles

influenciam a racionalidade no processo decisório.

Charles Duhigg, no livro “o poder do hábito” (2012, p30-p35) cita,

que segundo os cientistas, os hábitos surgem porque o cérebro procura meios

de economizar energia, para as atividades mais complexas como cálculos e

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invenções. O Cérebro procura automatizar uma sequência de ações e

transformá-las em rotinas, como por exemplo, ao dirigir um automóvel, quando

inicialmente, há uma série de ações complexas, como passar a marcha, olhar

para o retrovisor, calcular o espaço e tempo para manobras, manter o carro na

direção, etc. Por meio da repetição, o cérebro converte essa sequência de

ações e as automatiza, não sendo mais necessário o esforço consciente o

tempo todo, liberando esse cérebro para outros processos cognitivos.

Duhigg aponta que pesquisadores do MIT, na década de 90,

observaram através de experiências com ratos, a importância dos gânglios

basais na construção dos hábitos. Eles fizeram experiências com ratos sadios

e através da inserção de fios minúsculos no cérebro dos roedores, os

monitoravam em um teste, que consistiam em colocá-los em um labirinto com

um chocolate dentro, ao se retirar uma divisória que os mantinham afastados,

os ratos nesse labirinto farejavam em busca do alimento, muitas vezes indo

pelo caminho errado. Passavam a falsa impressão de que estavam passeando

pelo labirinto, mas a cada ação empreendida pelos ratos, seu cérebro explodia

de atividades elétricas, processando informações de cada estímulo, sobretudo

nos gânglios basais. Com a repetição desse teste, o camundongo cada vez

alcançava o alimento (recompensa) de forma mais rápida e precisa, e os

cientistas perceberam que esse “aprendizado” era oriundo dos gânglios basais

e seu cérebro para essa atividade em específico, trabalhava cada vez menos.

E quando esses roedores sofriam lesão nessa área, apresentavam dificuldades

como a realização de tarefas de atravessar labirintos e memorizar como abrir

os recipientes de comida.

Segundo os estudos de Duhigg (2012, p36-p39), há um processo

que mantém os hábitos em loop. Há três estágios: o primeiro é uma deixa, ou

seja, um estímulo que faz com que o cérebro entre em modo automático, em

seguida há uma rotina, que são as ações disparadas por esse estímulo, e

finalmente o terceiro que é a recompensa, que ajuda o cérebro, caso valha a

pena, manter esse loop no futuro. Uma vez que esse hábito surge, o cérebro

para de participar da tomada de decisões, tornando esse processo

inconsciente e automatizado. A grande questão é que muitas vezes os hábitos

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adquiridos são prejudiciais. O marketing conhecendo isso e sabendo como o

cérebro funciona cria uma série de ações para se criar hábitos nos

consumidores, através de uma deixa (estímulo) para uma ação já automática e

a consequente recompensa (emoção) que seu produto gera no consumidor.

O psicólogo e autor Robert Cialdini, em sua obra “As armas da

persuasão” (2012, p18-28) aponta que esses comportamentos automatizados

que são predominantes na maioria dos casos são a forma mais eficiente de

comportamento, pois devido à complexidade das interações que os seres

humanos passam a cada momento, não há como se analisar todas as

informações de maneira ágil, seja para uma simples tomada de decisão, como

a escolha de um café. Para isso, as pessoas utilizam-se de atalhos mentais

para tomada de decisão. Na definição do autor, atalhos mentais são estratégias

baseadas em um conjunto de informações específicas, que apontam para um

caminho correto utilizado na tomada rápida de decisões. Por exemplo, a

premissa de que se algo é caro, logo é bom, ou se um especialista declara

algo, logo é verdade. Para Lindstrom (2009, p115-116) esses atalhos mentais

são marcadores somáticos, que são lembranças ou experiências anteriores de

recompensa e punição, conectados a uma emoção específica, que criam

associações e ajudam as pessoas a tomarem uma decisão menos dolorosa ou

prazerosa. Um exemplo citado por Lindstrom é um marcador somático que

associa a Alemanha a excelência tecnológica e direciona a preferência em uma

decisão de compra de um produto relacionado a tecnologia para uma marca

desse país.

Existem diversas táticas utilizadas pelas empresas utilizando-se

desses atalhos através de gatilhos, ou seja, a capacidade de incutir na mente

das pessoas o seu consentimento para concordar em tomar uma decisão, em

outras palavras, influenciar e manipular a ação do consumidor. Existem

diversos gatilhos que influenciam o processo de compra, como o da

reciprocidade, aonde algo é oferecido a uma pessoa e ela se sente na

obrigação de retribuir o favor. Amostras grátis em supermercado, jornais ou

revistas gratuitas por um período, o uso gratuito de um serviço, ou um pequeno

presente criam essa sensação de dívida e existe uma pressão cultural para que

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se retribua um presente, mesmo quando não solicitado. (Robert B Cialdini,

2012,45). Outro gatilho muito utilizado pelo sistema é o da aprovação social,

esse princípio baseia-se em que uma pessoa acha correto baseado na opinião

do que é certo para outras pessoas. Por exemplo, uma pessoa pesquisa um

produto, como um livro, para se comprar online, tendo vários depoimentos

positivos quanto àquela leitura, ela se sente segura para a compra do produto.

Em 1934, Sylvan Goldman observou que os clientes paravam de comprar

quando suas cestas estavam pesadas. Assim criou o carrinho de compras, mas

como ninguém conhecia, achavam esse objeto estranho e não o utilizavam. Ele

estrategicamente contratou pessoas para andar com os carrinhos pela loja,

dessa forma os clientes que entravam na loja passaram a utilizar também e o

tornou rico (Robert B Cialdini, 2012, p132-133). Foi uma estratégia baseada no

gatilho da aprovação social.

Um dos gatilhos mais utilizados pela indústria é o da escassez.

Quando se coloca um produto como escasso, aumenta e percepção de valor e

gera uma ansiedade para que o mesmo seja adquirido. Expressões como

“últimas peças” criam psicologicamente uma sensação de perda e as pessoas

são mais motivadas a agir pela perda de algo, do que por ganharem alguma

coisa. Essa estratégia é muito utilizada junto a outro gatilho que é o da

urgência, quando, por exemplo, o preço está com desconto só por aquele dia.

Muito utilizada em lojas e supermercados.

Outro elemento muito importante para captar a atenção do

consumidor é a novidade, Segundo Russel Poldrack (Pedro de Camargo

2013,p151-153), neurocientista da Universidade do Texas, o cérebro é atraído

pelo novo e ignora o que já sabe. Uma teoria que justifica essa busca por

novidade é dada pela psicologia evolucionista, onde por questões de

sobrevivência, a espécie humana ficava atenta a novos tipos de alimentos e

recursos. Pradeep aponta ainda um segundo motivo (2012, p249) que é a

busca da evolução, descobrir novas coisas para melhoras em diversas áreas

da vida humana. Um estudo publicado pela revista Neuron, realizada por

pesquisadores da University College de Londres, concluíram que a atenção

voltada para novidade dispara atividade na região do estriado ventral,

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localizado no cérebro primitivo e a essa busca por recompensa foi um fator

importante para a adaptação a constantes mudanças de clima, moradia, etc.

Realizaram uma pesquisa aonde os cientistas aonde algumas fotos associadas

à recompensa seriam mostradas com conhecimento prévio dos participantes,

mas para surpresa dos pesquisadores, os voluntários escolhiam

sistematicamente a imagem desconhecida. Eles identificaram através de

equipamentos de imagem, a maior atividade do estriado ventral ao escolherem

a imagem nova. Isso explica as filas enormes quando a Apple lança um Iphone

novo. Muito do vício do consumo, surge devido ao uso desse gatilho, por

empresas interessadas em venderem seus produtos e alcançarem altas

margens de lucro, pois quando se encontra algo novo há a criação de novos

circuitos internos e ativa o sistema de recompensa e consequentemente a

atuação da dopamina. Um artigo publicado na revista American Scientist em

2006 (Pedro de Camargo 2013, p116) mostrou que quando há a compreensão

de algo novo pelo cérebro há uma inundação de substâncias químicas no

cérebro que promovem uma sensação de prazer, o que acontece também ao

se consumir um produto ou serviço, mas que à medida que o tempo passa,

essa recompensa diminui a cada repetição da experiência, necessitando de

doses cada vez maiores. Essa busca por novidade, segundo Pradeep (2012,

p195-201) é utilizada por empresas na forma de lançar seus produtos, aonde

há profissionais especializados em diversas características do que será

ofertado, como as imagens, a forma da embalagem, a fonte do texto,

disposição espacial, uso da cor, tamanho e aonde estrategicamente deve ser

colocada na loja.

Goldberg relata que pesquisadores através de tomografia por

emissão de pósitrons (TEP) fizeram um estudo para estabelecer a relação

entre novas tarefas e níveis de fluxo sanguíneo cerebral. Foi descoberto que a

novidade disparava o ápice de nível de fluxo sanguíneo e à medida que essa

tarefa era repetida, esse fluxo diminuía até quase desaparecer após tornar-se

rotineira. A incidência de fluxo sanguíneo era predominantemente no

hemisfério direito quando apresentado a novidade. À medida que se tornava

rotineira, as atividades no hemisfério esquerdo predominavam. Concluiu-se

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desse estudo, que com o aprendizado, o controle cognitivo é transferido do

hemisfério direito para o esquerdo e das partes frontais do córtex para as

posteriores (O Cérebro Executivo. Lobos Frontais e a Mente Civilizada. 2002,

p99).

Outro ponto estudado através das neurociências foi como o cérebro

toma decisões relacionadas ao preço. Através da monitoração por imagens,

eles detectaram que quando o consumidor é exposto a produtos de luxo sem

desconto há uma atividade gerada tanto no núcleo accumbens, quanto no

cingulado anterior, mostrando um conflito entre o prazer da recompensa com a

aflição em obter algo muito caro, mas quando os mesmos produtos são

oferecidos com ofertas relevantes, esse conflito se dissipa e predomina o

acionamento do circuito de recompensa. Dessa forma, muitas empresas

“criam” um valor imaginário e atribui o valor que se deseja obter através das

“promoções”. Quanto a construção do preço, foi realizado outro estudo por

pesquisadores da Universidade de Stanford, utilizando um equipamento de

IRMf em cerca de vinte voluntários. Foi perguntado a eles o prazer que

obtinham com vinhos de preços diferentes, mas havia uma pegadinha, foi

apresentado o mesmo vinho com dois preços diferentes, um bem mais caro do

que o outro. Quanto o vinho mais caro era apresentado, houve um aumento de

atividade no córtex orbifrontal medial dos voluntários indicando que maior

prazer era gerado no cérebro pelo produto com preço mais caro (Lindstrom

2009, p169).

Uma emoção primária que o sistema utiliza com base científica para

aumentar suas vendas é o medo. Quanto maior exposição às pessoas tiverem

a situações de risco, maior é o estresse gerado no organismo, liberando altas

doses de cortisol e consequentemente os indivíduos nessas condições buscam

por bases sólidas em busca de se sentirem seguras. Segundo Lindstrom (2009,

p171-172), essa procura leva a uma dependência de dopamina e a

necessidade de querer mais coisas para sentir esse efeito provocado por ela. A

indústria farmacêutica, por exemplo, utiliza muito do medo para venda de seus

produtos. As empresas já utilizam de forma massiva hoje, o discurso de que se

certos produtos não forem consumidos, o indivíduo não será bom o suficiente e

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poderá perder algo ou ter alguma imperfeição, como queda de cabelo, ou que

se não utilizar o creme “x” de antirrugas irá envelhecer precocemente e não

será mais atraente, por exemplo.

Em suma, a visão que se tinha no passado sobre decisões

econômicas eram baseadas no homo economicus que apontava que essas

decisões eram baseadas na racionalidade, visando à busca da maximização de

ganhos e minimização de perdas. Porém surgiu um novo conceito que é o

homo neuroeconomicus, aonde ao contrário, aponta que os indivíduos

possuem uma capacidade limitada para tomada de decisões econômicas, pois

sofrem influência de forma significativa da emoção nesse processo, de tal

forma, que na maior parte das vezes, as emoções prevalecem sobre a razão,

conforme demonstrado nas diversas pesquisas apontadas até aqui. (veja

Neuroeconomia – uma nova perspectiva sobre o processo de tomada de

decisões econômicas 2017, p40-41).

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CAPÍTULO II

COMO O CÉREBRO É AFETADO NO MOMENTO DO

CONSUMO E A CRIAÇÃO DA DEPENDÊNCIA

No capítulo I foi analisado através de diversos estudos e

pesquisas, por diversos autores, como a emoção participa e influencia de forma

significativa no processo de tomada de decisão realizado pelo consumidor.

Nesse segundo capítulo, será mostrado sob a luz da neurociência, como é o

funcionamento desse cérebro e como ele é afetado pelos estímulos

provocados pelo marketing para que o indivíduo decida pelo consumo, quais

são as substâncias químicas produzidas e como é criada a relação de

dependência e compulsão por compras.

2.1. Uma breve introdução ao cérebro

Para a compreensão sobre os hábitos de consumo dos seres

humanos faz-se necessário entender como o cérebro funciona, como ele é

estruturado e quais são as suas principais partes. Quais são as substâncias

produzidas nele, o que é e como se processa o funcionamento dos neurônios,

qual a importância dos neurotransmissores, em especial a dopamina. A

complexidade desse maravilhoso aparelho por si só, daria um glossário e não é

o intuito desse estudo detalhar como funciona cada componente isoladamente

ou de forma integrada com suas outras áreas, mas é primordial trazer a

essência de seu funcionamento para melhor entendimento sobre os

comportamentos dos seres humanos no ato do consumo.

De acordo com Goldberg, o diencéfalo é constituído pelo tálamo e

hipotálamo. O primeiro é responsável pelo controle do mundo exterior,

enquanto o segundo controla os estados internos do organismo e na

manutenção dos processos adaptativos e homeostáticos. Os gânglios basais

incluem os núcleos caudados, o putâmen e o globus pallidus. Eles estão sob o

comando dos lobos frontais (2002, p52).

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As amígdalas, para o autor, são consideradas como um dos gânglios

basais e regulam as interações do organismo com o meio externo que são

críticas à sobrevivência. Elas fornecem uma avaliação pré-cognitiva e

emocional da situação sempre ligada à sobrevivência. O cerebelo é de

fundamental importância no equilíbrio e nos movimentos, principalmente os

movimentos de coordenação finos. Novos estudos apontam que essa estrutura

também esteja ligada ao córtex frontal auxiliando na elaboração de

planejamentos complexos (2002, p52-53).

Segundo os apontamentos de Goldberg, o córtex apareceu mais

tarde na evolução do cérebro e eles incluem o hipocampo, responsável pela

memória e córtex cingulado, cuja função está relacionada às emoções, sendo

uma área do sistema límbico, juntamente com o hipocampo e amígdala (2002,

p53).

Finalmente dentro dessa apresentação bem resumida das estruturas

do cérebro há o neocórtex, que mudou a forma de processar do cérebro e

trouxe mais complexidade para esse aparelho e poder de cálculo e elaboração.

Ele consiste em quatro lobos principais: lobo Occipital, responsável pelo

processamento visual, o lobo temporal que lida com sons, lobo parietal

responsável pelas sensações táteis e o lobo frontal pelos movimentos (2002,

p55). O autor nomeia o córtex pré-frontal como o “regente da orquestra” devido

a essa estrutura possuir uma enorme rede de caminhos neurais, tornando o

lobo frontal o coordenador de todas as outras estruturas cerebrais (2002, p58).

2.1.1. Estados motivacionais

Robert Lent em sua obra Cem bilhões de Neurônios? Conceitos

Fundamentais de Neurociência (2010, p535-569) aponta que os estados

motivacionais geram uma tensão que ativa o estado de alerta do indivíduo e

cria um desconforto, e assim dispara uma sequência ordenada de

comportamentos com objetivo de gerar prazer ou eliminar o desconforto gerado

por essa tensão. Muitos estudiosos comportamentais, destaco aqui, Anthony

Robbins (Poder sem limites, o caminho do sucesso pessoal pela programação

neurolinguística, 2009, p236), de uma forma simplificada apontam que o

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comportamento humano segue um desses dois pressupostos: busca do prazer

ou fuga da dor. Robert Lent através da neurociência traz a estrutura que dá

embasamento a essa afirmação. Ele indica que há três classes de

comportamentos motivados: A primeira é formada por forças fisiológicas como

a sede que dispara uma vontade de se beber água, ou seja, uma resposta

fisiológica a uma necessidade do corpo, a segunda que são forças reguladoras

não tão bem definidas ainda, como as necessidades sexuais, por exemplo, pois

nos seres humanos a busca por sexo não é somente para fins de reprodução

da espécie, e sim busca de prazer, e principalmente a terceira que é o objetivo

desse estudo: comportamentos complexos subjetivos aonde não há uma

determinação biológica visível, como a busca por ascensão social, fazer mais

dinheiro, procura por atividades de lazer como ver um filme ou ler um livro, ou

seja, busca por prazer com um caráter puramente subjetivo e individualizado.

Lent observa que esses três tipos de comportamentos motivados geram dois

tipos de ações: apetitivos que são aprendidos, ou seja, são atos primários para

satisfação da necessidade que iniciou o processo e os consumatórios que são

automáticos e que são os atos propriamente executores. Por exemplo, um

indivíduo está com fome (motivação biológica) e procura alimento (ação

apetitiva) até encontrar e na sequência comer esse alimento (ato

consumatório). Duas forças atuam em cima dos comportamentos motivados,

segundo Lent: a busca do prazer e a homeostasia. O prazer tão importante na

vida humana como agente motivador, em desequilíbrio, pode causar a

compulsão, ou seja, a busca repetida e exagerada por uma ação consumatória,

a procura da geração dos estímulos positivos obtidos em uma experiência

anterior e assim pode causar a dependência física ou psicológica, como o

álcool, as drogas e também o consumo por roupas, sapatos, bolsas, que geram

esse mesmo estímulo. A homeostasia por sua vez é a busca do organismo em

manter uma constância no meio interno, seja a temperatura do corpo, seja

indicar a necessidade de repor líquido através da sede gerada, por exemplo. A

homeostasia é comandada pelo hipotálamo que é uma espécie de ordenador

dos comportamentos motivados atuando em conjuntos com outras áreas, como

as áreas corticais de controle, responsável pelos estados emocionais

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subjetivos, sistemas motores somáticos e os sistemas eferentes neurais e

humorais, esses últimos responsáveis pelas ações fisiológicas reguladoras.

2.1.2. O processo de dependência e compulsão

Exposto o funcionamento do estado motivacional, uma área

fundamental para a compreensão das motivações e comportamentos

positivamente reforçados é a via mesolímbica, também conhecida como via de

recompensa, que responde a esses estímulos positivos gerando um estado de

motivação complexa e o desejo por repetição para obtenção de mais prazer,

uma vez que libera o neurotransmissor dopamina. A liberação de dopamina da

via mesolímbica na área tegmental ventral para o corpo estriado ventral, que

inclui o núcleo accumbens e o tubérculo olfatório e regula a motivação e o

desejo levando a um estado de recompensa e percepção de prazer. Esse

processo quando desregulado leva a compulsão e dependência. (Fonte:

https://pt.wikipedia.org/wiki/Via_mesolímbica). Esse sistema denominado

mesolímbico tem como suas principais áreas: tegmentar ventral do

mesencéfalo, hipotálamo, córtex cingulado, córtex pré-frontal e o corpo estriado

ventral, principalmente o núcleo accumbens (Robert Lent, 2010, p567).

A via mesolímbica é considerada como uma coleção de neurônios

dopaminérgicos É importante salientar o papel dos neurônios, que pela

definição de Pradeep “são as unidades funcionais básicas do cérebro e do

sistema nervoso central que transmitem informações a outras células nervosas,

musculares e glandulares” (2012, p48). Ele é composto por corpo celular,

axônio e dendritos. Esses últimos comunicam-se com outros neurônios. Os

pontos de contato dessa comunicação entre neurônios são denominados de

sinapses. Quando é gerado um impulso nervoso ocorre à inversão do potencial

elétrico na membrana celular, ou seja, a carga no interior do neurônio passa de

negativa para positiva (potencial de ação) atingindo o axônio e liberando

neurotransmissores, que são mensageiros químicos do cérebro. Uma

substância química gerada nesse processo é a dopamina, como já citado é

ligada ao prazer subjetivo. É uma substância que é viciante pela sensação de

bem estar e felicidade que ela proporciona inundando o sistema límbico e está

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presente quando um indivíduo está no ato das compras. Muitas pessoas

compram não pelo objeto em si, ou para atender uma necessidade específica,

mas sim para obter essa sensação de prazer que o sistema dopaminérgico

propicia (Martin Lindstrom, 2009, p62). Com o passar do tempo, a duração

desse bem estar secretada pela dopamina possui uma duração cada vez

menor e cria-se de forma automatizada a repetição das mesmas experiências,

em busca dessa descarga de prazer, mas a cada repetição é necessária um

estímulo maior (mais compras) para se obter a mesma sensação, surgindo daí

o vício e posteriormente a compulsão. A dopamina também é gerada pela

expectativa do ato do consumo em si, antes que o mesmo seja de fato

realizado, criando a euforia e inundando o corpo com a química do prazer.

(Pedro Camargo 2013, p33).

Pedro de Camargo registra que o cérebro anseia por sentir essa

sensação novamente, o sistema límbico, aonde se encontra esse sistema de

recompensa, sequestra o córtex pré-frontal (responsável pelo planejamento e

pelo controle do comportamento compulsivo), e influencia fortemente na

execução da rotina de compras já instalada. O autor aponta que a ínsula

também participa nesse processo de vício por compras, uma vez que essa

área modula a resposta do organismo aos estímulos sensoriais, pois nela as

experiências são transformadas em sentimentos e as lojas estão prontas para

gerar os estímulos sensoriais que irão despertar a ansiedade que só as

compras poderão saciar (2013, p37-38).

O córtex pré-frontal é responsável por racionalizar a sensação de

prazer, por trazer o pensamento e frear os impulsos gerados pelo anseio que é

gerado pelo consumo. O hipocampo, que para alguns pesquisadores faz parte

desse sistema, é responsável por armazenar essas memórias carregadas de

emoção relacionada à satisfação, de uma forma que sejam acionados por

pensamentos e, sobretudo vistos pelas ações e comportamentos. Há ainda o

papel da amígdala que será descrita mais adiante.

Quando ocorre a dependência ou o vício, os indivíduos passam a

vivenciar pensamentos repetitivos obsessivos que os levam a executar as

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mesmas ações gravadas no hipocampo para obter as mesmas sensações

inebriantes criadas no passado. É o que leva muitas pessoas ao shopping para

procurar algo para comprar sem um objetivo específico. Termo conhecido hoje

como shopholics (termo em inglês criado para definir compradores compulsivos

que frequentam constantemente os shoppings com objetivos de compras sem

uma necessidade específica). Quando essas pessoas não atendem os apelos

desses pensamentos surgem os sintomas de irritabilidade, ansiedade, angústia

e insônia, entre outros. Além da dopamina que é a principal substância química

nesse processo de compulsão, há outras formas de se chegar a essa

substância que são a liberação de adrenalina e cortisol no corpo e

noradrenalina no cérebro, uma vez que essas substâncias aumentam o

metabolismo no corpo e são geradas por estresse. O cérebro entra em um

estado de estresse no momento em que se prepara para realizar alguma ação

difícil como é o processo de escolha do que comprar devido ao estímulo de

diversas opções e um limite financeiro que limita a opção do consumidor. No

caso das pessoas já compulsivas, esse ciclo de estresse, aonde é iniciado

primeiro cortisol, noradrenalina e adrenalina para posterior produção da

dopamina, levando ao indivíduo a mais compras, gerando ansiedade e

angústia e faz com que esse sistema sofra uma sobrecarga causando a

síndrome de abstinência que afeta a qualidade de vida, em termos gerais, uma

vez que influencia na vida profissional e pessoal de quem sofre com esse

problema. Outra substância química produzida nesse processo é a serotonina

que se altera aumentando a intensidade e o tempo dos efeitos do estresse.

(Ana Beatriz Barbosa, 2014, p148 – p153).

A neurociência ainda sabe muito pouco sobre as causas que levam

os indivíduos a dependência consumista, o que Lent definiu como motivações

de terceira classe, de caráter inteiramente subjetivo (Robert Lent, 2010, p536).

O começo do processo ocorre com a compra impulsiva e feita de forma casual

até chegar a uma frequência regular e depois constante e dominando as ações

do indivíduo. Ana Maria Beatriz traz uma contribuição, como médica e

psicóloga, sobre as possíveis origens e o porquê de algumas pessoas criarem

dependência e outras não. Em suas observações, há uma combinação

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maléfica entre fatores genéticos, o ambiente familiar e social, e fatores

psicológicos, como a falta de motivação e prazer com a rotina, a incapacidade

de sentir-se bem com as recompensas naturais da vida e de quadros como a

depressão. Seus atendimentos clínicos a fizeram supor que o comportamento

compulsivo traz mudanças bioquímicas no cérebro alterando os caminhos

sinápticos da dopamina, adrenalina e serotonina. Ela baseia sua opinião

através de observações nos exames de neuroimagem através do SPECT,

realizados em seus pacientes que sofrem com a compulsão por compras.

Esses exames apontaram que entre 65% a 80% dos casos, havia uma

acentuada diminuição da atividade nos lobos parietais e frontais, especialmente

no córtex pré-frontal. Dessa forma, conclui-se que o córtex pré-frontal que é

responsável pelo planejamento, pela análise racional no processo de tomada

de decisão, não possui a capacidade desse discernimento, uma vez que o

pensamento obsessivo cria e reforça novos caminhos neurológicos, mantendo

o córtex pré-frontal a margem desse processo, tornando a decisão pelo

consumo de forma automatizada. Há outras pesquisas realizadas pela

psiquiatra e neurologista Nora Volkow relacionadas às drogas que apontam

para esse mesmo caminho, aonde a atividade no córtex pré-frontal era

diminuída nos pacientes com vício (Ana Beatriz Barbosa, 2014, p154 – p156).

Ana Beatriz conclui que faz sentido essa diminuição do lobo parietal,

uma vez que nessa região há uma área chamada córtex somatossensorial, que

é responsável pela interpretação dos estímulos recebidos do ambiente externo,

pela percepção, e com essa área tendo sua atividade diminuída, os indivíduos

com esse problema ficam mais expostos as propagandas e ao marketing.

Concluindo, as percepções e tomada de decisão das pessoas com compulsão

são alteradas acarretando nos comportamentos nocivos para suas finanças

(2014, p156 – p157).

Lent diferencia o sentimento de prazer e o comportamento

consumatório induzido pelo prazer, dando o próprio comportamento compulsivo

como exemplo. O consumo por roupas e outros produtos em geral, inicia-se

com a sensação agradável obtida nas fases iniciais e quando se torna uma

compulsão causa uma degradação e prejuízo ao indivíduo, sendo assim os

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comportamentos consumatórios são diferentes da emoção que as provoca.

Para Lent a atuação da dopamina nas emoções positivas está mais

relacionada aos comportamentos consumatórios do que as vivências

emocionais que causam o sentimento de prazer e por isso ocorrem

comportamentos motivados de reforço. Os estudiosos comportamentais

financeiros traduzem esse apontamento como à busca por prazer através de

produtos e coisas ao invés de experiências e vivências, a busca do “TER” ao

invés de “FAZER” ou “SER”. (Transformando Dinheiro em Liberdade cap. XII).

2.1.3. Por que é difícil controlar os impulsos – o papel da

amígdala

Em sua obra, Inteligência emocional - A teoria revolucionária que

redefine o que é ser inteligente, Daniel Goleman aponta que as áreas

emocionais do cérebro entrelaçam-se com o neocórtex e que por isso, os

centros emocionais tem a capacidade de influenciar as demais áreas do

cérebro, incluindo pensamentos e consequentemente os comportamentos.

(2007, p38).

Uma área do cérebro de suma importância para compreender

porque em determinadas situações, os indivíduos agem primeiro e depois

tomam consciência do que foi feito, ocorrem devido à atuação da amígdala

cortical que é situada acima do tronco cerebral, próxima a parte inferior do anel

límbico. Há duas amígdalas, uma de cada lado do cérebro. Ela é responsável

por questões emocionais, por dar significado emocional à vida. Em

experiências com animais em que a amígdala foi removida, os mesmos

passaram a não sentir mais raiva, medo, impulsos de competição ou

cooperação e noção de sua posição hierárquica. Quando ativada por um

determinado estímulo, como por exemplo, o medo devido a um assalto

eminente, ela dispara informações a diversas áreas do cérebro. Dessa forma

são produzidos hormônios orgânicos que serão utilizados para luta ou fuga,

deixando o cérebro em estado de alerta e ativando o sistema cardiovascular e

os músculos. Ela varre em busca da memória cortical em busca de

conhecimento prévio relevante sobre essa situação e uma outra série de ações

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em diversos circuitos antes de chegar ao neocórtex e o pensamento racional. A

pesquisadora LeDoux explica que sinais sensoriais dos olhos ou do ouvido são

encaminhadas para o tálamo e depois por uma única sinapse para a amígdala,

enquanto um segundo sinal é enviado do tálamo para o neocórtex, mas esse

caminho passa antes por diversos circuitos neurais, realizando uma viagem

mais longa que a primeira que é direta, ou seja, um atalho, uma rota de

emergência, aonde há um pequeno feixe de neurônios que fazem com que a

amígdala responda antes de serem registrados pelo neocórtex. Nosso cérebro

na época primitiva dependida disso para sobreviver ou aproveitar uma

oportunidade de caça. A amígdala transforma em ação imediata sem

pensamento, enquanto o neocórtex responde de uma forma mais planejada

(Daniel Goleman 2007, p42-45).

Ainda em sua pesquisa, LeDoux aponta que a amígdala pode

guardar lembranças e impressões emocionais inconscientes, como por

exemplo, gostar ou não de algo em milésimos de segundos quando diante do

estímulo, ou seja, o inconsciente não traz apenas a informação, mais também

uma opinião sobre o que se está sendo submetido, antes de se tornar

consciente. Dessa forma, pode-se supor que as marcas aproveitam para

estimular uma resposta positiva no inconsciente do consumidor antes do

surgimento daquele pensamento.

Outra área importante do cérebro quando se trata da amígdala é o

hipocampo, pois é ele que associará a memória ao contexto, em outras

palavras, trará significado emocional. O hipocampo traz a recordação do fato,

enquanto a amígdala traz a emoção dessa lembrança. No caso do consumo, o

hipocampo reconhecerá aquele produto, mas é a amígdala que traz o

julgamento se esse produto é do gosto ou não do indivíduo. Quando mais

intenso o estímulo mais forte o registro da memória. Segundo Goleman, o

cérebro possui dois sistemas de memórias, um para fatos corriqueiros e outro

para momentos carregados de emoção, como o primeiro encontro, ou um dia

especial (Daniel Goleman 2007, p47).

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Em termos gerais, os estímulos sensoriais captados pelo tálamo são

encaminhados para a área do neocórtex, que dão sentido a percepção,

passando para a coordenação dos lobos pré-frontais, onde ocorrerá o

planejamento e um alinhamento entre emoção e razão. Quando uma emoção é

disparada, os lobos pré-frontais executam cálculos de qual a melhor reação a

ser executada dentro das que o indivíduo possui pelo aprendizado e vivências

anteriores, o que não ocorre com os cérebros que possuem compulsão ou

dependência, onde essa capacidade cognitiva de elaboração está prejudicada.

Nesse caso, além do disparo da amígdala quando exposto ao estímulo, ocorre

a não ativação dos processos cognitivos oriundos do neocórtex que buscam o

equilíbrio da resposta emocional, principalmente o lobo frontal esquerdo que é

responsável por “desligar” o processo desencadeado pela amígdala (Daniel

Goleman 2007, p47).

Uma vez que há processos que ocorrem de forma automática e

praticamente instantânea, antes da avaliação e análise racional do córtex pré-

frontal, como explicado nesse tópico, e a indústria conhece mais sobre o

funcionamento do cérebro e como ele pode ser influenciado, do que os próprios

indivíduos, donos desse cérebro, que estão imersos em uma série de estímulos

propiciados pela tecnologia da informação de forma a manter suas ações em

piloto automático, as questões a serem respondidas no próximo capítulo são:

quais são as estratégias de quem mantém o consumo de forma consciente e

disciplinada? Como uma pessoa impulsiva pode frear esses impulsos sem

sofrimento? E principalmente, como um indivíduo que já possui compulsão ou

dependência por compras pode voltar a ter comportamentos e ações normais

de consumo, ou se não há uma cura para esses casos.

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CAPÍTULO III

POSSIBILIDADES DE RECUPERAÇÃO DESSE

CÉREBRO

Para tratar das possibilidades de recuperação desse cérebro faz-se

necessário primeiro compreender o papel dos lobos frontais, pois é ali que se

encontra a estrutura do cérebro responsável pelo julgamento, análise,

planejamento e cognição, aonde é responsável por trazer racionalidade aos

comportamentos de consumo e pelo reaprendizado emocional.

3.1. O cérebro executivo e os hemisférios cerebrais

Segundo Elkhonon Goldberg em sua obra “O Cérebro Executivo.

Lobos Frontais e Mentes Civilizadas” que traz preciosos conhecimentos através

de uma pesquisa de mais de 30 anos sobre o papel dos lobos frontais e mostra

que os mesmos desempenham o papel de definir a identidade, a essência, a

personalidade, que controla os impulsos dos indivíduos. Segundo metáfora do

próprio autor, ele é o maestro que rege a orquestra (2002, p21).

Goldberg percebeu que a síndrome orbitofrontal deixava os

pacientes desinibidos e variando o comportamento entre euforia e raiva, e

controle impulsivo praticamente inexistente, sem capacidade de coibir o anseio

por gratificação imediata, mostrando a importância dessa área para a educação

e controle inibitório (2002, p173). Goldberg ainda menciona a importância do

controle volitivo “que implica a capacidade de antecipar as consequências de

uma ação, a capacidade de decidir se a ação deve ser realizada, e a

capacidade de escolher entre ação e inação” (2002, p175). Mais importante foi

a conclusão que o autor teve que esse controle volitivo não é inata e sim que

se desenvolve gradualmente dependendo da maturidade social a ser

desenvolvida. O autor ainda traz a importância do córtex cingulato anterior que

está ligado ao córtex pré-frontal. O córtex cingulato é vinculado à emoção, e

segundo Michael Posner, essa área também regula a aflição, ou seja, controla

a emoção negativa que aparece devido a uma impossibilidade de gratificação

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imediata, ajudando na contenção das respostas disparadas pelas amígdalas

(2002, p176-177).

Richard Davidson em sua obra O Estilo Emocional do Cérebro cita

várias pesquisas pessoais e de outros estudiosos, em que as pessoas que

possuem mais ativação elétrica no hemisfério direito do cérebro tem mais

emoções negativas, são mais pessimistas, com dificuldade de resiliência e

propensas a depressão enquanto as pessoas que possuem mais atividade no

hemisfério esquerdo têm mais emoções positivas e apresentam uma atitude

mais otimista e capacidade de se recuperar de traumas (2013, l. 791).

Gainotti apresentou estudos em que indivíduos que tiveram AVC

com lesão no hemisfério direito possuíam riso patológico, ou seja, em momento

em que não havia nada ocorrendo para gargalhar, enquanto pacientes com

lesão no lado esquerdo, mais precisamente na região frontal, apresentavam

quadro de choro patológico, ausência de motivação e incapacidade de definir

metas (Richard Davidson, 2013, l. 785-786). Essas pesquisas são de

fundamental importância, pois mostram que as emoções possuem um papel

preponderante no consumo, conforme desenvolvido no capítulo I, não estão

relacionadas apenas com o sistema límbico, mas também no córtex pré-frontal.

Desde os primeiros anos de vida ocorrem diversas impressões

emocionais no cérebro da criança, sobretudo em eventos carregados de forte

emoção, e tanto o neocórtex, quanto o hipocampo ainda não se desenvolveram

completamente. No cérebro, o hipocampo e a amígdala trabalham juntos de

forma independente, enquanto o primeiro armazena a informação, a amígdala,

que desenvolve mais rápido, determina se essa memória possui fator

emocional relevante (Daniel Goleman, 2007 p47). Dessa forma, as lembranças

e os significados que a criança, desde o primeiro contato dá ao dinheiro e as

questões que o permeiam, como o consumo, são depositadas em uma

memória nesse cérebro, que ainda não possui cognição e estruturas

elaboradas de compreensão.

No capítulo II foi mostrado o papel da amígdala e quando ela

sequestra o neocórtex, mas na maior parte das vezes, os estímulos são

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enviados para as áreas pré-frontais que interagem com as emoções, dando

sentido as informações e são coordenadas pelos lobos pré-frontais, aonde

serão organizadas para posteriormente entrar em ação. (Daniel Goleman, 2007

p50). O importante é a consciência para tratar esses estímulos e a resposta é

influenciada pela educação e o aprendizado das experiências vividas. Os lobos

frontais irão no disparo da emoção, realizar cálculos de custo-benefício frente

ao estímulo, como o de quando uma pessoa está na frente da vitrine de uma

loja sendo induzida a uma compra de algo que não precisa. Ela estará numa

batalha interna, em que o aprendizado prévio mais a parte cognitiva serão de

fundamental importância em sua decisão. A razão e emoção estarão juntas,

mas se a pessoa não tiver sido bem treinada ou educada antes, a tendência é

ela pensar algo como “é só dessa vez” ou “não posso perder essa promoção” e

realizar a compra. O papel do lobo pré-frontal é de tirar o peso e intensidade

dessa emoção e assim facilitar o processo cognitivo.

Richard Davidson descobriu que a tendência para um temperamento

como alegre ou melancólico surge nos primeiros doze meses de vida. Ele

mediu os lobos pré-frontais em bebês com dez meses. A pesquisa consistia em

medir os níveis de atividade cerebral enquanto deixava os bebês com as mães

no quarto, quando elas saíssem, iriam verificar a medição dos bebês que

choravam e dos que não choravam. Detectaram nessa experiência que 100%

das dezenas de bebês avaliados que choravam tinham mais atividade no lado

direito do cérebro, enquanto os que permaneciam sem chorar a atividade

cerebral eram mais acentuados no lado esquerdo. Dessa forma, percebeu-se

que essa tendência vem desde muito cedo. Kagan contribui com esse estudo

identificando que nem todos os bebês que apresentavam melancolia ou medo

na infância mantinham esse temperamento na fase adulta, concluindo que

temperamento não é destino. Pelas pesquisas realizadas pelo estudioso, as

crianças com a amígdala superexcitável apresentavam essa predisposição

maior ao medo ou timidez, mas que era possível educá-las com as

experiências adequadas. Para isso era de fundamental importância a forma

como os pais a criavam e lhe conduziam nos desafios. A conduta protetora

mantinha o medo presente, enquanto os que ajudavam as crianças a enfrentar

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as situações desafiadoras faziam com que elas fossem se adaptando a novos

contextos e sentindo-se mais seguras. Visto pela neurociência, as crianças ao

passarem por essas experiências possibilitam aos circuitos pré-frontais a

criarem alternativas e respostas ao medo, ou seja, as experiências moldam os

principais circuitos neurais. A conclusão que se pode tirar é que os genes

afetam, mas não determinam o comportamento por si só, que o ambiente, as

experiências e o aprendizado modificam uma predisposição natural. (Daniel

Goleman, 2007, p238-241). Essa pesquisa demonstra que mesmo que o

indivíduo possua predisposição genética para um comportamento compulsivo,

ele pode aprender novos comportamentos através da criação de novos

circuitos através de novas experiências e vivências. A infância é o momento

propício devido às modificações do cérebro nesse período, mas também com

mais persistência pode ser modificado na fase adulta.

Richard Davidson, em suas pesquisas e estudos aponta para uma

propriedade do cérebro denominada neuroplasticidade, ou seja, uma

capacidade de reorganização cerebral, aonde ele modifica sua estrutura e seus

padrões de atividade. Essas modificações podem ocorrer pelas experiências

vivenciadas ou através do pensamento direcionado. Com essa descoberta,

quebrou o mito do cérebro estagnado e imutável, aonde cada área era

responsável por uma função específica para sempre. Isso garante ao cérebro,

uma flexibilidade e maleabilidade de adaptação ao mundo. Em outras palavras,

a descoberta da neuroplasticidade mostra que o cérebro pode modificar a

função de determinadas estruturas em consequência das exigências motoras e

sensoriais às quais é submetido e que isso também pode ocorrer através de

ensaios mentais ou pela meditação. O pesquisador aponta que essa

remodelagem é feita de forma mais fácil na infância, mas também pode ser

realizada na fase adulta. Essa descoberta se deu através de uma experiência -

com objetivo de tratar AVCs - com macacos aonde os mesmos haviam

arrancado 39 dedos e descobriram que eles fizeram isso, pois não sentiam

mais esses membros, Os pesquisadores tinham cirurgicamente cortado os

nervos sensoriais que partiam do braço desses animais para saber se eles

perderiam os movimentos, o que não aconteceu, eles perderam foi a

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sensibilidade nesses membros. Após a morte desses animais, fizeram um

exame nesses cérebros e veio à descoberta: a região do córtex

somatossensorial que era a responsável por processar essas sensações

oriundas dos dedos e das mãos, sem receber esses sinais por longo período,

passou a processar sinais vindos da face, e mais, a região do cérebro que

agora recebia as sensações da face cresceu entre 10 e 14 milímetros,

comprovando a reorganização e criando a interrogação sobre o mito da

imutabilidade das estruturas do cérebro. (Richard Davidson,2013,l. 3241).

Dessa forma, através da neuroplasticidade percebe-se que os

comportamentos humanos relacionados ao consumo podem ser modificados

se estimulados corretamente para criação de novos circuitos cerebrais e

fortalecidos pela emoção ou repetição, utilizando o termo cunhado por Richard

Davidson, “o estilo emocional” não é fixo e imutável e dependente apenas dos

genes herdados, e sim uma mistura desses genes somados às experiências

vividas e o significado dado a essas experiências. E ainda que a

neuroplasticidade permite que o cérebro redistribua o trabalho do neurônios,

recrutando os saudáveis para substituir os lesionados.

3.2. Reaprendizado do cérebro em relação ao consumo

As compras também estão relacionadas à insatisfação que as

pessoas possuem com suas próprias vidas. Elas se preparam para a vida

acadêmica e são estimuladas ao desenvolvimento do QI como condição

necessária para terem sucesso na vida, mas como na obra de Daniel Goleman

mostra em uma pesquisa, o nível do QI não tem a ver com nível de sucesso de

trabalho ou financeiro. O que fez a diferença foi a capacidade adquirida na

infância de se relacionar com as pessoas, lidar com frustrações e administrar

as próprias emoções (2007, p59), o que é corroborado por Richard Davidson

em sua obra “O Estilo Emocional do Cérebro”. Essa insatisfação que é

provocada pela sociedade baseada no consumo e como forma de se obter

satisfação e realização através de objetos e compras.

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Como possibilidade de recuperação desse cérebro “treinado” para

consumir, e em muitos casos já dependentes dessa ação de forma compulsiva

é necessário em primeiro lugar a autoconsciência, que segundo Salovey e

John Mayer (Daniel Goleman, 2007 p66-67) é reconhecer o sentimento no

momento em que ele ocorre e a capacidade de geri-los. As pessoas com essa

capacidade são mais seguras no momento de tomarem decisões em relação

às finanças, questões profissionais e relacionamentos. Essa autoconsciência

caminha junto com o autoconhecimento, que é a capacidade do indivíduo saber

identificar quais gatilhos fazem disparar certos pensamentos, emoções ou

ações, que irão induzi-los a agirem de maneira impulsiva e prejudicial no futuro.

Outra possibilidade de recuperação desse cérebro apontada por

Daniel Goleman é a psicoterapia, aonde cita que “a experiência pode, ao

mesmo tempo, mudar padrões emocionais e moldar o cérebro”. Fizeram

estudos com pessoas com comportamentos obsessivo-compulsivas, que

tinham o hábito de lavar as mãos dezenas de vezes ao dia. Através de uma

varredura PET detectaram que esses pacientes compulsivos possuem uma

atividade maior nos lobos pré-frontais que as pessoas sem esse transtorno.

Pegaram esses pacientes e dividiram em dois grupos: metade foi tratada da

forma padrão com remédio – prozac; e o outro grupo através de terapia

comportamental. Durante essa experiência, aos poucos, os pacientes foram

sendo colocados à frente ao objeto de sua compulsão, mas sem realizá-las e

foram aprendendo a questionar os temores que os afligiam. Por exemplo, um

paciente com comportamento compulsivo, por lavar as mãos a todo o

momento, era colocado em frente a pia sem poder lavar as mãos e foi

verificado que o comportamento repetitivo tinha o significado e a intenção de

não ficar doente e morrer, eles mesmos foram questionando esse pensamento

e essa ação. Ao final da experiência, apoiado pela varredura PET, foi verificado

que os pacientes que tiveram essa abordagem tiveram o mesmo sucesso do

grupo que foi tratado através de remédios. A varredura apontava atividades no

lobo pré-frontal normalizadas e também do núcleo caudato (1995, p242-243).

Nessa pesquisa percebe-se que até mesmo os indivíduos compulsivos através

de práticas, sejam medicamentosas ou terapêuticas, conseguem lidar com

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comportamentos perturbadores e a controlar o impulso. A própria prática

terapêutica ajuda o paciente a trazer consciência sobre o seu comportamento e

o autoconhecimento a identificar qual a intenção positiva que essa ação

repetitiva propunha e qual era a sua necessidade. A cura em si passa pelo

reaprendizado. Segundo Goleman: “o que a terapia faz é ensinar-nos a

controlá-la: ensina nosso neocórtex a inibir nossa amígdala. A tendência à

impulsividade é suprimida, enquanto a emoção básica sobre ela continua sob

contenção” (2007, p231). Como o próprio Goleman define, mesmo com a

atenuação da amígdala pelo neocórtex e o enfraquecimento desse circuito, há

estímulos que podem impulsionar e disparar a amígdala, mas o neocórtex pode

controlar o tempo que esses arroubos duram, em outras palavras - adaptando

a questão para o tema desse estudo que é o comportamento em relação ao

consumo - trazer a consciência após o disparo do gatilho que enseja o desejo

de realizar a compra do objeto. Mais à frente serão abordados alguns truques

realizados pelos educadores financeiros comportamentais para trazer essa

consciência no momento da compra e a inibi-la. Richard Davidson mostra que

a terapia cognitivo-comportamental ajuda os pacientes ao ensiná-los a

responder as próprias emoções, comportamentos e pensamentos de forma

saudável, a vivenciar essa emoção, mas depois liberá-la sem aprofundá-las. A

terapia propicia o aumento de atividade no sistema límbico e reduz a atividade

no córtex frontal. Os pacientes diminuem o pensamento repetitivo e

estatisticamente a taxa de recaída é menor que os pacientes que utilizam

medicamentos. (2013, l. 3440)

Goldberg, ao ler a revista Life de 1994, descobriu pesquisas sobre a

prevenção do início da decadência mental relacionada ao envelhecimento e

que isso era possível através de exercícios cognitivos. Esses exercícios

poderiam restaurar esse cérebro através de reeducação do paciente formando

novas estratégias cognitivas para a mesma tarefa mental. Pesquisas com ratos

colocados em gaiolas com vários brinquedos deram a eles 15% mais células

neurais, do que os ratos inseridos em gaiolas comuns. E mais, detectaram que

os ratos que tiveram estímulos eram capazes de aprender mais rapidamente a

novos desafios, como labirintos. Com os humanos, eles perceberam que

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através de uma sequencia de treinamentos que envolvem diferentes exercícios

há influência em diversas partes do cérebro, e que cada área estimulada se

desenvolvia mais. Dessa forma, traçando um paralelo com os hábitos nocivos

de consumo, pode-se concluir que novos comportamentos e ações podem ser

estimulados com os exercícios e abordagens corretas.

Ana Beatriz indica que existem diversas causas que levam as

pessoas ao comportamento compulsivo, entre eles, fatores genéticos,

experiências pessoais, a relação pessoal com as emoções, valores

educacionais, cultura social e hábitos criados (2014, p163). O momento chave

para o começo da mudança para autora é a aceitação, uma vez que a maioria

das pessoas com esse problema prefere não buscar ajuda, devido ao vício, e a

sensação prazerosa ou de alívio que as compras lhe propiciam. A médica e

autora aponta como possíveis soluções para esse comportamento: informação,

terapia comportamental, medicação, grupos de ajuda, neuromodulação e

terapias complementares.

A informação traz consciência como já escrito anteriormente e pode

ser através de livros, filmes, entrevistas, sites ou palestras no que tange as

finanças comportamentais e a autoconhecimento (2014, p166).

Os remédios indicados pela médica e autora, entre eles a destacar:

são os inibidores de serotonina, como a fluoxetina, e os inibidores seletivos de

recaptação da noradrenalina, como a bupropiona. Ela destaca também a

naltrexona como medicação complementar, nos casos mais graves de

compulsão (2014, p166).

A terapia cognitiva comportamental, segundo a autora, permite a

mudança da forma de pensar e leva a adquirir novos hábitos e

comportamentos. Ela apresenta algumas sugestões, como aprender novas

atividades, identificar os gatilhos que a levam ao consumo, cancelar cartões de

crédito e não trabalhar com cheques, não realizar compras quando abaladas

emocionalmente, como após uma briga e fazer um diário de gastos (2014,

p168).

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Os grupos de apoio são uma sugestão da autora, para prevenir

recaídas. Já existe no Brasil o grupo Devedores Anônimos (DA), que acolhem

os compradores compulsivos e ajudam os endividados. Quanto à

neuromodulação ainda não existe comprovação científica para esse tipo de

problema apesar dela já ter observado melhoras em tratamento com TOC e

nos transtornos de ansiedade. Ele é realizado através de Estimulação

Magnética Transcraniana (EMT).

3.2.1. Sugestões de educadores financeiros e comportamentais

Pedro de Camargo aponta algumas sugestões para ajudar a inibir o

comportamento impulsivo voltado para o consumo, como repetir o novo

comportamento aprendido, como por exemplo, ir ao shopping e não comprar

nada, (2013, p44). Alguns educadores financeiros acrescentam a essa ideia de

ir ao Shopping, mas deixar o cartão de crédito e cheque em casa, ou pelo

menos no carro, pois nessa caminhada até o automóvel propiciará o tempo

necessário para o neocórtex entre em ação e baixar a emoção, além de sair do

ambiente desfavorável na loja que estimula todos os sentidos para o consumo.

O ideal é estar acompanhado por alguém de confiança, como ensina Ana

Beatriz (2014, p168). Outra sugestão apontada por Pedro de Camargo é

recompensar a si mesmo pelo tempo que se manteve firme. Nesse ponto,

Gustavo Cerbasi, conhecido educador financeiro, escritor do best-seller “Casais

Inteligentes Enriquecem Juntos”, em seus treinamentos orienta as pessoas a

separarem uma verba para gratificação imediata, ou seja, planejar aquela

satisfação, o que funciona se o caso não é de compulsão. Outra sugestão

indicada por Pedro de Camargo é controlar o nível de estresse, pois ele poderá

desencadear o hábito nocivo adquirido para se criar um tipo de compensação.

Algo ensinado em treinamentos ou por terapeutas financeiros

comportamentais é treinar seu cliente para que faça as seguintes perguntas a

si mesmo, quando estimulado a comprar algo: “Eu preciso disso?” “Eu tenho

condições de comprar?”, “Eu preciso disso agora?” “Existe algo que possa

substituir esse produto?” “O que pode acontecer de pior e melhor, caso não

faça essa compra?” Dessa forma, se educa e passa a aprender e trazer o

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neocórtex para participar da decisão. Como Goleman sugere, quando as

emoções são expressas em palavras ficam mais sob a influência do neocórtex

aonde se tornam processos mais conscientes e controláveis. (2007, p229).

Pedro sugere uma alternativa diferente para as pessoas que estão

sem limite com as compras: a procura de um endocrinologista para tratar o

equilíbrio hormonal e o neurologista para verificar os níveis dos

neurotransmissores, mostrando as forças internas que são processadas no

cérebro e corpo humano (2013, p32), mas como já escrito anteriormente, há

outras maneiras não medicamentosas que obtém o mesmo resultado.

Algo salientado por educadores financeiros e bem percebido por

Pedro de Camargo é que o pagamento em “dinheiro vivo” psicologicamente

causa mais dor no indivíduo, ativando a ínsula ou córtex insular cerebral o que

não acontece quando é utilizado cartão de plástico. Fizeram um estudo de

análise de compras de mil famílias durante seis meses. Um grupo pagava com

cartão de plástico e outro com dinheiro. O que descobriram é que o grupo que

pagava em dinheiro comprava menos supérfluos do que o grupo que comprava

com cartão. O próprio McDonald’s descobriu que as pessoas gastam 47% a

mais pagando com o cartão do que com o dinheiro (2013, p67-68).

Outro fator que dispara o gatilho das compras nos indivíduos é

quando a autoestima está baixa de acordo com estudo publicado na Social

Psychological and Personality Science. Segundo o estudo, as pessoas utilizam

cartão para compras de itens de luxo (Pedro de Camargo, 2013, p71). Marcelo

Felippe ensina que há uma confusão muito grande entre autoestima e

autoconfiança. A diferença está que a autoestima é incondicional, trata-se de

seu valor único como pessoa e a autoconfiança é a habilidade ou capacidade

de se fazer algo. Muitos abalos na autoconfiança são interpretados como

autoestima que está associada à identidade da pessoa, sua noção de valor, e

ela busca a obtenção desse valor nos objetos. (Transformando Dinheiro em

Liberdade: Como alcançar sua Autonomia e Independência Pessoal, 2017 p59-

61).

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Como na obra de Goleman, ele cita a importância do aprendizado na

infância devido o córtex pré-frontal estar em desenvolvimento e ainda não

acabado, os estudiosos e treinadores comportamentais Dalton Ferreira e

Marcelo Felippe, apontam que é fundamental a compreensão na relação que

os pais ou qualquer pessoa que representavam autoridade para essa criança

possuíam com o dinheiro e o significado e interpretação que essas crianças

deram baseado no que elas observavam e ouviam sobre essas questões. Há

uma tendência de essa criança repetir o comportamento de um dos pais ou

autoridade, ou de ser o extremo oposto, e a partir daí gerar crenças ou

convicções sobre o dinheiro e seu papel. Crenças como “o dinheiro é raiz de

todo mal”, “dinheiro não traz felicidade”, “é melhor ser feliz do que ter dinheiro”.

Se essa pessoa alimenta essas convicções, de forma inconsciente ela gastará

para se manter bem com ela mesma (2017, p19-20). Dessa forma, um

entendimento correto do papel do dinheiro e uma ressignificação quanto a ele

também contribuem para uma ação mais consciente e equilibrada quanto ao

consumo.

Outra abordagem eficaz para modificação comportamental e de

atitude, apontada por Richard Davidson é a meditação. Ele percebeu em suas

pesquisas, com uso de tecnologia para medição no cérebro dos participantes,

que a ansiedade era menor, e por sua vez a capacidade de atenção

aumentava. Ele estudou o cérebro de participantes da meditação experientes e

percebeu alteração nos circuitos cerebrais de forma duradoura, ou seja,

mesmo após a prática, ainda era perceptível essas alterações. Ele comprovou

através das medições e de um critério rigoroso científico, que os ensaios

puramente mentais ativavam a região correspondente da experiência, por

exemplo, ele solicitou a um estudante que pensasse em mexer os dedos, e o

córtex motor foi ativado, ou seja, apenas a visualização ou intenção gerava,

mesmo que com intensidade menor a atividade física idealizada. Outra

comprovação demonstrando a força da meditação foi à realização de um

exame de sangue nos voluntários que executaram a técnica de meditação, e

constataram que eles produziram níveis de anticorpos 5% maior, do que os

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participantes de um outro grupo que não praticou a meditação, mostrando a

atuação dessa prática no sistema imunológico (2013, l. 3793).

Davidson estudou quatro formas diferentes de meditação, mas para

esse estudo iremos abordar apenas na meditação da consciência plena,

justamente por trabalhar o aspecto da atitude e resiliência que influenciam no

comportamento de consumo. Ele concluiu que essa meditação era capaz de

modificar os hábitos de seus praticantes e na capacidade de lidar com o

estresse de forma eficaz, uma vez que o consumo exagerado também é uma

forma aprendida para buscar a compensação e diminuir o nível de estresse e

ansiedade do indivíduo. Davidson detectou que através da meditação da

consciência plena, os praticantes aumentam a probabilidade de utilizar uma

outra via neural, na qual a influência da amígdala e o peso emocional que ela

proporciona, gerando o estresse não seja mais interpretado dessa forma, e

consequentemente não produzisse mais ansiedade ou medo. Esse tipo de

meditação foi classificado pelo pesquisador como um retreinamento da mente,

de forma que a plasticidade cerebral era utilizada de forma a criar novas

conexões, fortalecê-las e enfraquecer as outras antigas (2013, l. 3810)

Davidson aconselha o exercício do córtex pré-frontal como se

exercita um músculo, dessa forma toda vez que sentir um impulso de uma ação

visando a recompensa imediata com algum tipo de perda futura, pare e se

concentre na recompensa futura. A sugestão do estudioso é procurar situações

na qual exista uma recompensa imediata e resistir a elas, como ir ao shopping,

sem cartão de crédito ou débito, com apenas alguns trocados, insuficientes

para a efetuação da compra. Entre na loja e resista ao que está sendo

oferecido, até porque não terá como comprar de forma impulsiva, com foco nos

benefícios de longo prazo, como uma viagem ou curso para o filho. Essa ação

irá fortalecer a resistência exercitando o córtex pré-frontal e o estriado ventral.

Ele sugere praticar por quinze minutos, todos os dias, visualizando a

recompensa futura. À medida que for se familiarizando com essa situação,

passe a ir com o cartão. Depois de economizado e vencido o desafio, gaste

com o objetivo de longo prazo, pré-determinado para mostrar ao cérebro que

esse dia chega e aí sim compre depois o item desejado que gerou o impulso

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inicial (2013, l. 4288). Os psicólogos financeiros Brad Klontz e Ted Klontz

reforçam essa sugestão fornecida por Richard Davidson, em sua obra “A mente

acima do dinheiro. O impacto das emoções em sua vida financeira”. Eles

apontam que o modo mais eficaz de conter o medo e a ansiedade é a

exposição controlada daquilo que causa o temor. Evitar apenas aumenta o

medo e impede as pessoas a superarem as suas limitações. (2011, p215). Eles

citam que a solução para boa parte das pessoas envolvidas em problemas

financeiros e de consumo, ocorrerá através de apoio especializado, através de

encorajamento, avaliação, apoio social e aconselhamentos (2011, p213).

Em suma, há diversas formas de recuperação desse cérebro,

habituado e condicionado ao consumo e gratificação imediata e

consequentemente a produção de todos os hormônios produzidos por essa

ação, seja através de práticas terapêuticas, medicamentosas, meditação ou

processos de treinamento, coaching, aconselhamento, entre outros, mas há

apenas uma pré-condição: o indivíduo de fato querer e se comprometer a uma

modificação em seu comportamento, aceitar que possui um problema, expandir

sua consciência e buscar ajuda profissional.

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CONCLUSÃO

O consumo é importante na economia e no atendimento das

necessidades humanas, mas em busca de interesses que visão o lucro em

detrimento da evolução do ser humano, são realizadas práticas que visam

automatizar de forma sutil comportamentos repetitivos para sustentar o sistema

vigente. A linha entre influência, persuasão e manipulação é muito tênue, assim

como o que é ou não ético.

O marketing utilizando-se de conhecimentos científicos está à frente

de como funciona o cérebro, e como ele pode ser estimulado para reagir de

acordo com a manipulação dos sentidos, uma vez que os sentidos são os

canais de entrada para a percepção de mundo e são predominantemente

inconscientes.

Com o estresse gerado pela sociedade moderna e o modo de vida

atual do ser humano, as pessoas buscam no meio externo, formas de

compensar a química ruim que é produzida no organismo, como consequência

desse estresse e pela ansiedade que também é provocada. Por outro lado, a

cultura e o meio social pregam uma filosofia de que você vale de acordo com o

quanto você possui.

Esse trabalho mostrou apoiado nos estudos da neurociência e

através de pesquisas científicas, realizadas por diversos cientistas e

pesquisadores, as etapas desse processo, as consequências para o ser

humano, e como ele pode sair desse ciclo, através da expansão da

consciência, ou seja, conhecer o que é realizado, como seus atos são

manipulados e automatizados, para dessa forma e com o uso dos seus

recursos cognitivos ou através de outras práticas, como as terapêuticas ou

através da meditação, possa ter uma melhor qualidade de vida e afastar a

gratificação imediata quando esta for prejudicial para os projetos de longo

prazo.

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BIBLIOGRAFIA

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CHAVAGLIA NETO, José. FILIPE; FILIPE, José Antônio; FERREIRA, Manuel

Alberto M. Neuroeconomia – Uma nova perspectiva sobre o processo de

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influenciar. Rio de Janeiro: Sextante, 2012.

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humano. 3ª. ed. São Paulo: Companhia das letras, 2012.

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Sextante, 2013. Formato ePub. ISBN 978-85-7542-915-0

DUHIGG, Charles. O poder do hábito: por que fazemos o que fazemos na vida

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FERREIRA, Dalton e FELIPPE, Marcelo. Transformando dinheiro em liberdade:

como alcançar sua autonomia e independência pessoal. 1ª. ed. Curitiba – PR:

Appris, 2017.

GOLEMAN, Daniel. Inteligência emocional: a teoria revolucionária que define o

que é ser inteligente. Rio de Janeiro: Objetiva, 2007.

GOLGBERG, Elkhonon. O cérebro executivo: lobos frontais e a mente

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KLONTZ, Brad e KLONTZ, Ted. A mente e o dinheiro: o impacto das emoções

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LENT, Roberto. Cem bilhões de neurônios?: conceitos fundamentais de

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ROBBINS, Anthony. Poder sem limites: o caminho do sucesso pessoal pela

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SILVA, Ana Beatriz B. Mentes consumistas: do consumismo à compulsão por

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ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 01 AGRADECIMENTOS 03

DEDICATÓRIA 04 RESUMO 05

METODOLOGIA 06 SUMÁRIO 07 INTRODUÇÃO 08

CAPÍTULO I

O processo da tomada de decisão na hora das compras 09

1.1. Neuromarketing 10

1.1.1 Pesquisas realizadas 10

1.1.2 Descobertas utilizadas pelo marketing 12

1.1.3 Truques do marketing – usando seus sentidos 15

1.1.4 Manipulação realizada pelo marketing 20

CAPÍTULO II

Como o cérebro é afetado no momento do consumo e criação da

dependência 27

2.1.1 Estados motivacionais 28

2.1.2 O processo de dependência e compulsão 30

2.1.3 Por que é difícil controlar os impulsos e o papel da amígdala 34

CAPÍTULO III

Possiblidade de recuperação desse cérebro 37

3.1. O cérebro executivo e os lobos frontais 37

3.2. Reaprendizado do cérebro em relação ao consumo 41

3.2.1 Sugestões de educadores financeiros e comportamentais 45

CONCLUSÃO 50

BIBLIOGRAFIA 51