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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE EJA E AUTO-ESTIMA Educação de Jovens e Adultos Transformando Vidas Por: Vanessa dos Santos Batista de Andrade Orientador: Professor Fernando Gouvêa Rio de Janeiro 2008 DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

EJA E AUTO-ESTIMA

Educação de Jovens e Adultos Transformando Vidas

Por: Vanessa dos Santos Batista de Andrade

Orientador: Professor Fernando Gouvêa

Rio de Janeiro

2008

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

EJA E AUTO-ESTIMA

Educação de Jovens e Adultos Transformando Vidas

Apresentação de monografia à Universidade

Candido Mendes como requisito parcial para

obtenção de grau em Pedagogia.

Por: Vanessa dos Santos Batista de Andrade

3

AGRADECIMENTOS

Aos meus familiares e amigos, que nas mais

diferentes circunstâncias sempre pude contar

com a presença solidária de pessoas, como

vocês. Agradeço pelo apoio e incentivo que

sempre me deram e em especial ao meu pai

Servilho e minha mãe Vilma que sempre me

apoiaram e mostraram o valor da educação. Ao

meu marido Adriano que não se importou com as

noites em claro para que eu pudesse concluir

este trabalho e me incentivou incansavelmente

todos os domingos de manhã para que eu

pudesse comparecer as aulas presenciais.

4

DEDICATÓRIA

Aos meus alunos, jovens e adultos, pela

força de vontade e esperança, por não

desistirem nunca. Por persistirem em um

sonho, por acreditarem.

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RESUMO

O presente trabalho é fruto de alguns meses de investigação onde

abordei o tema da Educação de Jovens e Adultos. Nas primeiras páginas relato

uma abordagem do histórico, dos fundamentos e tendências da Educação de

Jovens e Adultos. Trago presente no histórico às conferências que foram

realizadas a nível internacional desde o ano de 1949, onde procurava oferecer

uma resposta para o problema do analfabetismo e ao mesmo tempo resolver o

problema da mão de obra de algumas regiões do mundo. No Brasil falo do

Mobral, instituído pelo governo militar e da experiência de educação libertadora

de Paulo Freire. A fundamentação e conceito buscam valorizar os conceitos

que impulsionam o homem para algo mais. Fundamentei o conceito da

educação com pessoas que a meu ver possui um compromisso libertador do

homem. Uma sociedade desenvolvida e complexa como a atual não pode se

valer de uma forma única de ensinar. A escola, juntamente com os professores,

deve desenvolver habilidades e competências nas mais diferentes instâncias

intelectuais para que o educador possa inferir sentido, compreender e interferir

no ato de educar. Apropriar-se dessa competência não constitui fato banal.

Requer intencionalidade, comprometimento e sistematização adequada, pois, o

ensino para jovens e adultos requer uma didática diferente dos demais, pois

trata-se de pessoas que passaram longo tempo longe dos bancos das

escolas.O objetivo principal da escola é resgatar a cidadania dessas pessoas a

partir da Educação de jovens e Adultos. Contando com o compromisso de

socialização que a educação deve ter com a Educação de Jovens e Adultos. O

intuito não é só de encher suas cabeças de informação, mas também de

emoções, desejos, realizações, para que o sujeito se torne responsável pelos

seus atos e assim, possa atingir suas metas através de seus próprios

conhecimentos e esforços, e que possa buscar tudo aquilo que ele sonhou,

pois é somente através da busca do conhecimento que o sujeito faz as coisas

acontecerem e assim, podem ver seus sonhos realizados.

PALAVRAS-CHAVE: Educação de Jovens e adultos. História da educação.

Brasil.

6

METODOLOGIA

Tentando entender como a EJA influencia na auto-estima e na mudança

de vida de seus alunos este trabalho metodológico foi desenvolvido tendo

como base a pesquisa bibliográfica e consulta a internet. Realizou-se

inicialmente pesquisa em sites especializados na área para uma evidenciação

e delimitação do tema pesquisado. Como base teórica conceitual foram

utilizados livros e revistas com edições atualizadas.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO....................................................................................................8

CAPÍTULO I

EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E

ADULTOS..........................................................................................................11

CAPÍTULO II

ALFABETIZAÇÃO DE ADULTOS NA PAUTA DAS POLÍTICAS

EDUCACIONAIS...............................................................................................21

CAPÍTULO III

A FORMAÇÃO E O OLHAR DO PROFESSOR SOBRE O EJA.......................26

CONCLUSÃO....................................................................................................31

BIBLIOGRAFIA.................................................................................................32

8

INTRODUÇÃO

Há décadas, buscam-se métodos e práticas educativas adequadas à

realidade cultural e ao nível de subjetividade dos jovens e adultos. A busca

pelo conhecimento é um processo amplo de aprendizagem, que envolve

responsabilidades do educador e do educando. A escola é de suma

importância, uma vez que, é potencialmente um dos instrumentos a ser usado

na construção do aprendizado escolar. O educando é o sujeito principal, a

escola é o meio e o educador é o mediador de todo os conhecimentos

desenvolvidos dentro da escola. O domínio da leitura e da escrita está

diretamente relacionado à progressão da escolaridade que por sua vez, está

ligado á cidadania. Para o adulto que não sabe ler e escrever, o seu mundo é

pequeno, pois é impossibilitado de acesso a noticias e informações escritas e

até mesmo difícil interpretação de informações visuais e auditivas em

decorrência do seu baixo senso critico.

Na procura incansável pelo desejo de aprender a ler, dominar a escrita e

de calcular, muitos adultos matriculam-se nas séries iniciais da educação de

Jovens e Adultos da Escola, em busca de melhoria e qualidade de vida, pelo

domínio e utilização do seu espaço. "para ser alguém na vida" , e eles têm a

escola como uma possibilitadora de novas condições de vida pessoal e

profissional e humana.

Ao atrair o adulto para a escola, é preciso garantir que ele não a

abandone. As altas taxas de evasão (menos de 30% concluem os cursos) têm

origem no uso de material didático inadequado para a faixa etária, nos

conteúdos sem significado, nas metodologias infantilizadas aplicadas por

professores despreparados e em horários de aula que não respeitam a rotina

de quem estuda e trabalha.

A atividade que impulsiona o trabalhador a estudar também é a mesma

que o ajuda a desistir. A ânsia de exercer uma função mais remunerada e

respeitada faz a procura da escolarização, pois para eles, a dignidade como

trabalhador viria a partir de uma mudança concreta de vida, posta numa

sociedade que privilegia o letrado. A desvalorização social, que se acentua e

se estabelece o mundo do trabalho, por meio da desqualificação profissional

9dentro das instituições, poderia ser superada a partir do domínio de

determinadas capacidades. Desta forma, estes jovens e adultos buscam a

escola para ascender profissionalmente, serem reconhecidos socialmente e

melhorar a qualidade de vida. No entanto, as exigências do trabalho e a grande

carga horária associada a difíceis condições físicas e emocionais fazem com

que a freqüência, grande no inicio do ano diminua sensivelmente no decorrer

do período letivo, provocando altos índices de evasão escolar.

Em entrevistas e questionários realizados com os alunos que estão

freqüentando o EJA, ficaram claros os fatores que poderão levá-los hoje a

desistência; problemas familiares, de saúde e emocionais, no entanto, em

discussões em sala de aula não é raro ouvir outro aluno declarar que "só está

freqüentando por grande esforço, do contrario não teria condições, pois está

constantemente cansado em função de seu trabalho" ou as vezes declarações

como " o trabalho está me desgastando, se continuar assim terei que desistir

de estudar". Conforme o relato dos alunos ficou claro que, apesar do desejo de

aprender e das condições que impulsiona a procurar uma escola, ainda assim,

fatores como; o trabalho, problemas emocional e físico se sobrepõe

prejudicando-os levando ao desanimo e a desistência. A relação

professor/aluno foi também um dos fatores críticos levantados pelos alunos

como causador de evasão, justificando que, se o professor não é bom não tem

por que continuar estudando.

Trabalhar com a educação de Adultos significa conscientizar-se de que é

necessário utilizar-se de estratégias para que possa criar vínculos de amizade

e um respeito mútuo entre aluno e professor. É preciso ser possuidor de uma

consciência verdadeiramente critica, que não pretende se sobrepor ao

educando adulto, que se identifique com ele e utiliza um método adequado

onde seja bom para ambos. Melhorando a convivência dentro da sala de aula,

e fora dela também.

O educador adulto tem de admitir sempre que os indivíduos com os

quais atua são homens normais e realmente cidadãos úteis. Tem que

considerar o educando não como uma criança em fase de alfabetização, ou

como um sujeito marginalizado, e sim como um ser normal da sociedade em

10que vivemos, enfim, um ser pensante é um ser portador de idéias e um

produtor de idéias, que se revela espontaneamente em sua conversação, em

sua critica aos fatos, em sua literatura oral. O que ocorre é que, na presença do

professor que se Põe como possuidor de todo o conhecimento, inferioriza o

aluno, retraindo seu comportamento até provocar a desistência. Proporcionar

conhecimentos e métodos sobre as formas de aplicabilidade dos conteúdos

didáticos aos integrantes do processo educativo, mostrando a necessidade do

uso de instrumentos e procedimentos de métodos adequados proporcionando

aos educandos uma forma de aprendizagem coerente com as suas

necessidades e também, que seja compatível com suas diferenças de idade

que sempre haverá dentro da sala de aula.

111 - EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

Este capítulo traz uma visão panorâmica da Educação de Jovens e Adultos ao longo dos cinco séculos da história, posteriores à chegada dos portugueses às terras brasileiras, detendo o olhar, sobretudo, para a segunda metade do século XX, em que o pensamento pedagógico e as políticas públicas de educação escolar de Jovens e Adultos adquiriram identidade e feições próprias, a partir das quais é possível e necessário pensar seu desenvolvimento futuro.

Tanto no passado como no presente a Educação de Jovens e Adultos sempre compreendeu um conjunto de processos e práticas formais e informais relacionadas à aquisição ou ampliação de conhecimentos básicos, de competências técnicas e profissionais ou de habilidades socioculturais.

Muitos desses processos se desenvolveram de modo mais ou menos sistemático fora de ambientes escolares, realizando-se na família, nos locais de trabalho, nos espaços de convívio sociocultural e lazer, nas instituições religiosas e, nos dias atuais, também como o concurso dos meios de informações e comunicações à distância.

Mobral, Supletivo, Alfabetização Solidária. A profusão de nomes e iniciativas para alfabetizar adultos gera muitas confusões sobre o que é e o que não é Educação de Jovens e Adultos. Para isso, se faz necessário recuar no tempo, para entender como se processando essa modalidade de ensino. Haddad e Di Pierro (2000) destacam que qualquer tentativa de historiar um universo tão plural de práticas formativas implicaria sérios riscos de fracasso, pois a Educação de Jovens e Adultos, compreendida nessa acepção ampla, estende-se por quase todos os domínios da vida social.

A ação educativa junto aos Jovens e Adultos no Brasil, como se sabe não é nova. No período colonial os religiosos exerciam sua ação educativa missionária em grande parte com adultos. Além de difundir o evangelho, tais educadores transmitiam normas de comportamento e ensinavam ofícios necessários ao funcionamento da economia colonial, inicialmente aos indígenas e, posteriormente, aos escravos negros. Mais tarde, se encarregaram das escolas de humanidades para os colonizadores e seus filhos.

Paiva (2004) comenta que com a desorganização do sistema de ensino produzido pela expulsão dos jesuítas no Brasil em 1759, somente no império volta-se a encontrar informações sobre ações educativas no campo da educação de adultos. Nessa época, criam-se classes noturnas de ensino elementar para os adultos analfabetos. Contudo, pouco ou quase nada foi realizado neste sentido durante o império.

No campo dos direitos legais, a primeira constituição brasileira, de 1824, firmou, sob forte influencia européia, a garantia de uma "instrução primária e gratuita para todos os cidadãos", portanto, também para os adultos. Pouco ou quase nada foi realizado neste sentido durante todo período imperial, mas essa inspiração iluminista tornou-se semente e enraizou-se definitivamente na cultura jurídica, manifestando-se nas constituições brasileiras posteriores.

O direto que nasceu com a norma constitucional de 1824, estendendo a garantia de uma escolarização básica para todos, não passou da intenção

12legal. A implantação de uma escola de qualidade para todos avançou lentamente ao longo da história. É verdade, também, que tem sido interpretada como direito apenas para crianças.

Esta distância entre o proclamado e o realizado foi agravada por outros fatores. Em primeiro lugar, porque no período do império só possuía cidadania uma pequena parcela da população pertencente à elite econômica à qual se admitia administrar a educação primaria como direito, do qual ficaram excluídos os negros indígenas e, grande parte das mulheres (CUNHA, 1999).

Em segundo, porque o ato adicional de 1834, ao delegar a responsabilidade por essa educação básica às províncias, reservou ao governo imperial os direitos sobre a educação das elites, praticamente delegando a instancia administrativa com menores recursos o papel da educação a maioria mais carente. O pouco que foi realizado deve-se aos esforços de algumas províncias tanto no ensino de Jovens e Adultos como na educação das crianças e adolescentes (HADDAD e DI PIERRÔ, 2000),

Neste último caso, chegou-se em 1890 com o sistema de ensino atendendo apenas 250 mil crianças, em uma população total estimada em 14 milhões. Ao final do império, 82% da população com idade superior a cinco anos eram analfabetas. Desta forma, as preocupações liberais expressas na legislação desse período acabaram por não se consubstanciar, condicionadas pela estrutura social vigente (CUNHA, 1999).

A partir da República iniciam-se inúmeras campanhas, normalmente de curta duração, descontínuas, sem grande sistematização, buscando sempre o apoio e a parceria das diferentes instâncias da sociedade civil. Isto reflete a falta de compromisso do poder público em definir uma política de educação institucional, de forma que as práticas para a área fossem desenvolvidas de maneira sistemática através da rede de ensino regular, como acontece com os demais níveis de escolarização.

As primeiras iniciativas desse período se estendem até a revolução de 30, onde os formuladores de políticas responsáveis pelas ações tomam a alfabetização de adultos como aquisição de um sistema de código alfabético, tendo como único objetivo instrumentalizar a população com os rudimentos da leitura e da escrita (BRASIL, 2002). Na década de 30, outra idéia vem alimentar a educação: a de preparar os sujeitos para as responsabilidades da cidadania. O país, sob a ditadura de Vargas buscou, pela centralização das ações, a formação de um estado moderno nacional: exemplos são a constituição das leis trabalhistas, normatização dos sindicatos e a expansão de sistema educativo.

Ghiraldelli Jr. (1994, p.39) explicita que: Entre 1930 e 1937, o Brasil viveu um dos períodos de maior radicalização política de sua história. Essa época de efervescência ideológica foi substancialmente rica na diversidade de projetos distintos para a sociedade brasileira em cada um desses projetos não faltou a elaboração de uma nova política educacional para o país. Todo esse processo de desenvolvimento do Brasil foi acompanhado por uma verdadeira revolução no ensino. Essa década pode ser considerada como o grande marco na construção de um sistema político-educacional brasileiro. Abre-se espaço para as novas diretrizes educacionais traçadas pelo Governo Federal, determinando de maneira clara as esferas de competência da União, dos

13estados e municípios, incluindo os esforços articulados nacionalmente e a extensão do ensino elementar aos adultos, que estavam sendo chamados a compor, quantitativamente os quadros de trabalhadores para a Segunda República.

O processo de industrialização e a concentração populacional em centros urbanos ocasionaram grandes transformações. A oferta do ensino básico gratuito acolhia vários setores, sendo o Governo Federal o que impulsionava a ampliação da educação e traçava as diretrizes educacionais para todo o país, com responsabilidade dos estados e municípios.

Em 1938 foi criado o Instituto Nacional de Estados Pedagógicos (INEP), onde a EJA passa a ser reconhecida como modalidade de ensino. O que permitiu a instituição, em 1942, do Fundo Nacional do Ensino Primário, o qual deveria, com um programa de ampliação da educação primária, incluir o Ensino Supletivo para adultos e adolescentes (PILETTI e PILETTI, 2001). Após a Segunda Guerra, em 1945, a criação da Organização das Nações Unidas para a Educação e Cultura (UNESCO), divulgou e promoveu, em âmbito mundial, uma educação voltada para a paz dos povos e a educação de adultos como uma forma de contribuir com o desenvolvimento das nações "atrasadas". Com uma concepção funcional do processo educativo, defendia a educação com forma de integração social, de forma passiva e instrumental, sem visão crítica.

De qualquer forma, a criação da UNESCO e suas ações posteriores contribuíram decisivamente para a discussão e implementação de ações no que se refere ao analfabetismo, à educação de adultos e às desigualdades sociais mundiais especialmente em países do Terceiro Mundo. Conforme citam Haddad e Di Pierro (2000) esse período foi fortemente marcado por campanhas nacionais de alfabetização em massa realizadas pelo Governo Federal de forma centralizada, assistencialista e descontínua, visando atender, predominantemente, a população do meio rural. As demais ofertas de escolarização de Jovens e Adultos deste período limitaram-se apenas ao ensino primário.

Na década de 40, com o fim da ditadura de Vargas em 1945, e todo o clamor por redemocratização política, haja vista os números de analfabetismo em todo país, que segundo Paiva (2004, p, 14), ficou por volta de 55%, de acordo com o censo de 1940. A educação ganhava novos impulsos sob a crença de que seria necessário educar o povo para que o país se desenvolvesse. Os educadores da época estavam tão empolgados, que este período ficou conhecido como o do "entusiasmo pela educação”.

Esses fatos contribuíram para que a educação dos adultos começasse a figurar como a educação elementar comum, tendo em vista o interesse que as elites da época tinham de aumentar o número de votantes, que se daria por meio da incorporação da enorme massa de analfabetos. Com a finalidade de garantir no poder o governo central, unificar as massas populacionais de imigração recente no país e também aumentar a produção (PILETTI e PILETTI, 2001).

A ratificação desta afirmação pode ser vislumbrada nos dizeres de Cunha (1999, p. 25) ao relatar que “politicamente, era inegável a necessidade de se ampliar às bases eleitorais para a sustentação do Governo Central,

14integrar as massas populacionais de imigração recente e [...] incrementar a produção”.

De 1947 até hoje, o Brasil já teve oito programas federais de alfabetização de Jovens e Adultos. Basicamente, todos fizeram a mesma coisa, só mudaram o método e o nome. São eles: Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos (CEAA), lançada pelo o Governo Brasileiro entre 1947 e 1958, atendendo aos apelos da UNESCO. Junto com a idéia de redemocratização do país, a campanha cumpria os objetivos de preparar mão-de-obra, pois o país vivia um processo de crescente industrialização e urbanização; penetrar no campo e integrar os imigrantes dos Estados do Sul visava ainda, melhorar as estatísticas brasileiras em relação ao analfabetismo. Segundo Haddad (1992) tratava-se de uma campanha de âmbito nacional visando alfabetizar a população. Com essa campanha, pretendia-se numa 1ª etapa, uma ação extensiva que previa a alfabetização do curso primário em três meses, além de condensar o curso primário em dois períodos de sete meses.

Depois seguiria uma etapa de "ação em profundidade" voltada à capacitação profissional e ao desenvolvimento comunitário. Nos primeiros anos a campanha conseguiu resultados significativos, articulando e ampliando os serviços já existentes e estendendo-a as diversas regiões do país. Num curto período de tempo, foram criados vários supletivos, mobilizando esforços das diversas esferas administrativas, de profissionais e voluntários (CUNHA, 1999). A campanha extinguiu-se antes do final da década de 50, sobrevivendo à rede de Ensino Supletivo por meio dela implantada, assumida pelos estados e municípios. Tal campanha, no início, foi dirigida pelo professor Lourenço Filho, conseguindo resultados significativos com a articulação e a ampliação dos serviços já existentes. Várias escolas supletivas foram criadas, em pouco tempo mobilizando esforços das diversas esferas administrativas, profissionais e voluntários. Na década de 50, essa efervescência começou a diminuir e, nesse mesmo período essas escolas foram extintas, sobrevivendo à rede de Ensino Supletivo por meio dela implantada, assumida pelos estados e municípios (LIMA, 1991).

A Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos propiciou uma discussão no campo teórico-pedagógico acerca do analfabetismo e da educação de adultos no país. O analfabetismo, nesse período, era visto como causa e não efeito da situação econômica, social e cultural do país. Essa forma de enxergar o analfabetismo consolidava a concepção de adulto analfabeto como inabilitado e à margem da sociedade, sendo esse comparado, no que tange ao processo de aprendizagem a uma criança e por isso era, dependente do contato face a face para enriquecimento de sua experiência social, ele tem que, por força, sentir-se uma criança grande, irresponsável e ridícula “[...]. E, se tem as responsabilidades do adulto, manter uma família e uma profissão, ele o fará em plano deficiente [...]” (PAIVA, 2004, p. 20).

Com isso, o autor evidencia que o processo de ensino e aprendizagem do adulto, buscando restabelecer sua trajetória escolar de modo a readquirir a oportunidade de um ponto igualitário no jogo conflitual da sociedade. O analfabeto, mesmo sendo um adulto era considerado uma criança grande, que desempenhava suas responsabilidades de homem de família com deficiência,

15por não ser considerado apto a desempenhar as atividades do mundo adulto e, por não dominar o mundo das letras. Esse adulto era considerado, "Adulto-criança; como as crianças, ele tem que viver num mundo de egocentrismo que não lhe permite ocupar os planos em que as decisões comuns têm que ser tomadas" (PAIVA, 2004, p. 21).

Essa concepção, acerca do adulto analfabeto, foi se modificando durante a campanha, e o preconceito, conseqüentemente, começou a diminuir, uma vez que esse adulto analfabeto passou a ser visto como um ser produtivo, capaz de raciocinar e resolver seus problemas. E nessa mesma direção, as teorias mais modernas da psicologia, seguiram desmistificando essa concepção sobre o adulto analfabeto.

O Ministério da Educação e Cultura (MEC) começou a produzir pela primeira vez, no período Campanha de 47, material didático exclusivo para o ensino da leitura e da escrita de adultos, conhecido como Laubach, por confiar na capacidade de aprendizagem dos adultos. O Primeiro guia de leitura, distribuído pelo ministério para as escolas supletivas do país orientava o ensino pelo método silábico, que trabalhava com palavras-chave previamente escolhidas de acordo com suas características fonéticas, e em seguida eram remetidas aos padrões silábicos, foco do estudo (BRASIL, 2002). No final da década de 50, eram muitas as críticas feitas à Campanha de Educação de Adultos. Essas críticas, porém, apontavam para uma nova visão sobre o problema do analfabetismo e para a concretização de um novo modelo pedagógico para a educação de adultos, cuja menção principal seria o educador Paulo Freire. Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo (CNEA), criada entre 1958 e 1960, visando, além da expansão do contingente eleitoral, intensificar a preparação de mão-de-obra barata necessária à indústria. Essa campanha foi empreendida por intelectuais, dentre eles Paulo Freire, estudantes e católicos engajados numa ação política junto aos grupos populares.

Desenvolvendo e aplicando as novas diretrizes propostas por essa campanha, atuaram os educadores do Movimento de Educação de Base (MEB), ligado à Conferência Nacional de Bispos do Brasil (CNBB), dos Centros de Cultura Popular (CPC), organizados pela União Nacional dos Estudantes (UNE), dos Movimentos de Cultura Popular (CUNHA, 1999). Piletti e Piletti (2001) comentam que esses grupos de educadores foram se articulando e passaram a pressionar o Governo Federal para que os apoiasse e estabelecesse uma coordenação nacional das iniciativas de alfabetização de adultos com base nas idéias de Freire.

As iniciativas e ações que ocorrem nesse período passam à margem das reflexões e discussões sobre o analfabetismo e acerca de um referencial teórico próprio para a educação de adultos no Brasil e para a consolidação de um novo paradigma pedagógico cuja referência principal foi o pernambucano Paulo Freire.

Freire (1983), trazendo este novo espírito da época acabou por se tornar um marco teórico na Educação de Jovens e Adultos (EJA), desenvolvendo uma metodologia própria de trabalho, que unia pela primeira vez a especificidade dessa Educação em relação a quem educar, para que e como educar, a partir

16do princípio de que a educação era um ato político, podendo servir tanto para a submissão como para a libertação do povo.

Haddad e Di Pierro (2000) informam que o novo paradigma pedagógico baseava-se num novo entendimento de relação entre a problemática educacional e problemática social. Partindo das concepções do adulto educando sobre o mundo, através da reflexão e da ação, afirmava a relação dialógica educando/educador: os sujeitos se educavam por meio da problematização das situações concretas de vida de cada grupo de trabalho, desenvolvendo suas visões críticas, ampliando suas visões de mundo, descobrindo a palavra cheia de vida e da sua experiência, inserida num contexto cultural que faz do homem sua própria humanidade ou desumanidade. A grande preocupação de Freire (1983, p. 12) é "uma educação para a decisão, para a responsabilidade social e política." Freire inverteu a lógica das décadas anteriores ao trabalhar com a concepção de que o adulto analfabeto não era causa do subdesenvolvimento do país, mas sua conseqüência, ou melhor, vítima de uma sociedade injusta e desigual, de um sistema que buscava reproduzir, pela educação, o poder das elites políticas, econômicas e sociais do país.

Invertendo a visão do analfabeto com um sujeito sem cultura, sua metodologia consistia em trazer a discussão do que é cultura e fazer os sujeitos reconhecerem-se como produtores de cultura a partir de suas próprias situações cotidianas, na qual a alfabetização vem inserirem-se como mais um instrumento para a leitura do mundo. Nessa "sociedade em trânsito", Freire procurou mostrar o papel político que uma educação pode vir a desempenhar, e desempenha sempre – na construção de uma outra sociedade, a "sociedade aberta". Para Freire através da educação seria possível ampliar a participação consistente das massas e levar à sua organização crescente. Na sua concepção,

A construção de uma nova sociedade não poderá ser conduzida pelas elites dominantes, incapazes de oferecer as bases de uma política de reformas, mas apenas pelas massas populares que são a única forma capaz de operar a mudança (FREIRE, 1983, p. 34).

A educação popular foi sendo divulgada através de inúmeros agentes: intelectuais, artistas, estudantes, militantes da igreja, militantes políticos, enfim, de setores população que se sentiam comprometidos politicamente com as classes populares e buscava uma real transformação, construídas no respeito mútuo, na solidariedade humana, na reflexão coletiva, no compromisso de cada um com a aprendizagem de todo o grupo. Com a ditadura militar em 1964, os movimentos de conscientização popular são desativados e seus líderes punidos por serem considerados subversivos.

Programa Nacional de Educação (PNE), criado em 1964. Este foi o último dos programas de corte nacional desse ciclo organizado pelo Ministério da Educação, o que garantia a ampliação por todo Brasil de programas de alfabetização orientados pela proposta de Paulo Freire. Os ideais pedagógicos defendidos pelos programas de alfabetização, orientados por Freire tinham um forte componente ético, e defendia o comprometimento do educador com os educandos.

17Segundo Cunha (1999) os analfabetos deveriam ser reconhecidos como

homens e mulheres produtivos, que possuíam uma cultura. Freire criticava a educação bancária, e reconhecia o educando como sujeito de sua aprendizagem, defendia ainda, uma ação educativa que respeitasse a cultura do educando. Elaborou uma série de procedimentos pedagógicos que ficou conhecido como método Paulo Freire.

Essa e outras experiências acabaram por desaparecer ou desestruturar-se sob a violenta repressão dos governos do ciclo militar iniciado naquele mesmo ano. O exílio não impediria que o educador continuasse a desenvolver no exterior sua proposta de alfabetização de adultos conscientizadora, utilizando palavras geradoras que, antes de serem analisadas do ponto de vista gráfico e fonético, serviam para sugerir a reflexão sobre o contexto existencial dos Jovens e Adultos analfabetos, sobre as causas de seus problemas e as vias para sua superação (BRASIL, 2002).

Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL) que funcionou de 1967 a 1985. Este programa foi considerado como primeira iniciativa importante na educação de Jovens e Adultos. A própria estrutura do MOBRAL vinculou-se até meados de 1969 ao Departamento Nacional de Educação, bem com promoveu atividades de alfabetização e programas articulados nos campos de saúde, recreação e civismo, mediante convênios com entidades públicas e privadas.

Em 1970, o MOBRAL, atuou a partir de convênios estabelecidos com as Secretarias de Educação e Comissões Municipais, através do Programa de Alfabetização e do Programa de Educação Integrada (PEI) com versão compactada das 4ª séries iniciais do antigo ensino primário. Na década 80, com a abertura política e, conseqüentemente, a ascensão dos movimentos sociais, essas pequenas experiências foram se desenvolvendo e ganhando uma projeção muito maior, no que tange ao estabelecimento de troca de informação, reflexão e articulação. Os convênios se estenderam a outras entidades públicas e privadas.

O MOBRAL, assim como os demais também não obteve êxito. Nos entendimento de Haddad e Di Pierrô (2000) este movimento promovia uma educação mecânica e funcional utilizando-se de técnicas elementares de escrita, leitura, cálculo e o aperfeiçoamento para o trabalho, sem oportunizar a problematização e o pensamento crítico-reflexivo do sujeito. Em 1985, após a redemocratização do país, o MOBRAL não apresentou condições políticas para sua sobrevivência, sendo extinto e substituído pela Fundação Educar (CUNHA, 1999).

Fundação Nacional de Educação de Jovens e Adultos (FNEJA) a chamada Fundação Educar, desenvolvido de 1985 a 1990, cuja função era apoiar financeira e tecnicamente as iniciativas do governo, entidades civis e empresa a ela conveniada.

O projeto Educar criado pela Nova República funcionava em parceria com estados e municípios e, apesar de sua orientação político-pedagógica de educação funcional, a descentralização de suas ações possibilitou uma maior diversidade de orientações e práticas pedagógicas. Também trabalhava com alfabetização e pós-alfabetização, refletindo outras concepções acerca do processo. Uma delas é a de que havia necessidade de uma continuidade da

18educação básica, a fim de não ver reduzido o trabalho de alfabetização com o retorno dos sujeitos ao analfabetismo ou agora transformados em analfabetos funcionais (BRASIL, 2002).

A busca pela ampliação do atendimento à escolarização da população jovem e adulta pelos sistemas estaduais se vincula às conquistas legais referendadas pela Constituição Federal de 1988, e seus desdobramentos nas constituições estaduais e leis orgânicas municipais. A Constituição transformou em dever do Estado o Ensino Fundamental gratuito também para todos os que não tiveram acesso à educação na idade correta, nas quais a EJA passa a ser reconhecida enquanto modalidade específica no conjunto das políticas educacionais brasileiras, estabelecendo-se o direito à educação gratuita para todos os indivíduos, inclusive aos que não tiveram acesso na idade própria. Até então o governo era obrigado a atender apenas aos estudantes entre 7 e 14 anos. Aos adultos restavam cursos restritos de alfabetização, como o antigo Mobral, ou de aceleração de ensino, como os supletivos. Programa Nacional de Alfabetização e Cidadania (PNAC) que prevaleceu de 1990 a 1992, salvo algumas ações isoladas, não transpôs a fronteira das intenções. Tendo mobilizado representações da sociedade civil e instâncias subnacionais de governo em sua elaboração, o PNAC prometia, dentre outras medidas, substituir a atuação da extinta Fundação Educar por meio da transferência de recursos federais para que instituições públicas, privadas e comunitárias promovessem a alfabetização e a elevação dos níveis de escolaridade dos Jovens e Adultos. Desacreditado como o governo que propôs, o PNAC foi abandonado no mandato exercido pelo vice-presidente Itamar Franco. Nesta gestão, nada de inovador, concretizou-se na prática educacional pelo descomprometimento da União (HADDAD e DI PIERRO).

Programa Alfabetização Solidária, desenvolvido de 1997 e 2002. Esse Programa implantado pela primeira-dama da República, a antropóloga Ruth Cardoso. Foi um dos cursos mais importantes para a alfabetização de adultos, que em parceria com empresas, universidades e prefeituras, buscavam atender municípios do Norte e Nordeste com altíssimos índices de analfabetismo.

Tal programa atuou com base no ranking de analfabetismo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Segundo dados do censo de 2000 do IBGE, existem no Brasil cerca de 16,3 milhões de Jovens e Adultos analfabetos, com idade igual ou superior a 15 anos – o que representa 13,6% dos brasileiros nessa faixa etária ou 10% da população total. Nos grandes centros urbanos, apesar de baixos índices de analfabetismo, é significativo o número absoluto de pessoas que não tiveram acesso à educação (BRASIL, 2002).

Como sua proposta com o educando não ultrapassa cinco meses de trabalho em classes de alfabetização, dificilmente podem-se considerar esses cidadãos alfabetizados. Mas, se este esforço for articulado com os municípios para darem continuidade ao processo de alfabetização e escolarização, poder-se-á inclusive incorporá-lo ao ensino regular.

Programa Brasil Alfabetizado, uma nova proposta surgida em 2003. Tal proposta foi reeditada a partir do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), lançado em abril de 2007, mudando seu conceito. Neste novo formato,

19a alfabetização de Jovens e Adultos é feita prioritariamente por professores das redes públicas voluntários, no contra turno de sua atividade.

Para isso, eles receberão bolsas do MEC. No mínimo, 75% do quadro de alfabetizadores devem ser composto de docentes das redes públicas estaduais e municipais, de acordo com as Resoluções 12 e 13, de 24 de março de 2007, que definem as novas normas do programa. E para que Jovens e Adultos permaneçam nos cursos de alfabetização, o Governo Federal criou três incentivos: vai financiar o transporte, servir merenda e distribuir óculos para aqueles que precisam.

O programa Brasil Alfabetizado previa a responsabilidade solidária da União com estados e municípios. Cabe ao município mobilizar os analfabetos, selecionar e capacitar os professores; a União se encarrega de pagar bolsas aos professores e destinar recursos para material didático, merenda e transporte escolar dos alunos, para aquisição de óculos e supervisão das aulas (BRASIL, 2002).

O Brasil Alfabetizado abrange todo o país, mas são prioritários os 1.100 municípios com taxas de analfabetismo superiores a 35%. O Brasil Alfabetizado passou, ainda, a ter dois focos: o Nordeste, região que concentra 90% dos municípios com altos índices de analfabetismo, e os Jovens e Adultos de 15 a 29 anos.

A partir do exposto acima se pode afirma que apesar das inúmeras e caras campanhas/programas implementadas pelos governos brasileiros ao longo do século XX e inicio do século XXI não foram capazes de acabar com o analfabetismo, isso significa que o Brasil precisa de uma educação de adultos que não esteja sob os interesses de nenhum sistema ou grupo político. Não se pode conceber uma aprendizagem sob a tutela de uma classe dominante a fim de consolidar seus interesses sobre os analfabetos brasileiros. Não se pode também, pretender uma aprendizagem com finalidade de favorecer grupos econômicos, formando mão de obra barata para enriquecer, empresas transacionais, como se isso fosse trazer diversas para a educação nacional. O que se deve pretender é uma educação com orientação para a libertação. Educar para a consciência ativa, questionadora, sabedora de suas potencialidades. Educação que leve o adulto a ser o agente histórico, com vontade de participar da vida social, que questiona e modifica a realidade onde mora.

202 - ALFABETIZAÇÃO DE ADULTOS NA PAUTA DAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS A educação básica de adultos começou a delimitar seu lugar na história da educação no Brasil a partir da década de 30, quando finalmente começa a se consolidar um sistema público de educação elementar no país. Neste período, a sociedade brasileira passava por grandes transformações, associadas ao processo de industrialização e concentração populacional em centros urbanos. A oferta de ensino básico gratuito estendia-se consideravelmente, acolhendo setores sociais cada vez mais diversos. A ampliação da educação elementar foi impulsionada pelo governo federal, que traçava diretrizes educacionais para todo o país, determinando as responsabilidades dos estados e municípios. Tal movimento incluiu também esforços articulados nacionalmente de extensão do ensino elementar aos adultos, especialmente nos anos 40. Com o fim da ditadura de Vargas em 1945, o país vivia a efervescência política da redemocratização. A Segunda Guerra Mundial recém terminara e a ONU — Organização das Nações Unidas — alertava para a urgência de integrar os povos visando à paz e a democracia. Tudo isso contribuiu para que a educação dos adultos ganhasse destaque dentro da preocupação geral com a educação elementar comum. Era urgente a necessidade de aumentar as bases eleitorais para a sustentação do governo central, integrar as massas populacionais de imigração recente e também incrementar a produção. Nesse período, a educação de adultos define sua identidade tomando a forma de uma campanha nacional de massa, a Campanha de Educação de Adultos, lançada em 1947. Pretendia-se, numa primeira etapa, uma ação extensiva que previa a alfabetização em três meses, e mais a condensação do curso primário em dois períodos de sete meses. Depois, seguiria uma etapa de “ação em profundidade”, voltada à capacitação profissional e ao desenvolvimento comunitário. Nos primeiros anos, sob a direção do professor Lourenço Filho, a campanha conseguiu resultados significativos, articulando e ampliando os serviços já existentes e estendendo-os às diversas regiões do país. Num curto período de tempo, foram criadas várias escolas supletivas, mobilizando esforços das diversas esferas administrativas, de profissionais e voluntários. O clima de entusiasmo começou a diminuir na década de 50; iniciativas voltadas à ação comunitária em zonas rurais não tiveram o mesmo sucesso e a campanha se extinguiu antes do final da década. Ainda assim, sobreviveu a rede de ensino supletivo por meio dela implantada, assumida pelos estados e municípios. A instauração da Campanha de Educação de Adultos deu lugar também à conformação de um campo teórico-pedagógico orientado para a discussão sobre o analfabetismo e a educação de adultos no Brasil. Nesse momento, o analfabetismo era concebido como causa e não efeito da situação econômica, social e cultural do país. Essa concepção legitimava a visão do adulto analfabeto como incapaz e marginal, identificado psicológica e socialmente com a criança. Uma professora encarregada de formar os educadores da

21Campanha, num trabalho intitulado Fundamentos e metodologia do ensino supletivo, usava as seguintes palavras para descrever o adulto analfabeto: “Dependente do contacto face a face para enriquecimento de sua experiência social, ele tem que, por força, sentir-se uma criança grande, irresponsável e ridícula [...]”. E, se tem as responsabilidades do adulto, manter uma família e uma profissão, ele o fará em plano deficiente. [...] . O analfabeto, onde se encontre, será um problema de definição social quanto aos valores: aquilo que vale para ele é sem mais valia para os outros e se torna pueril para os que dominam o mundo das letras. [...] inadequadamente preparado para as atividades convenientes à vida adulta, [...] ele tem que ser posto à margem como elemento sem significação nos empreendimentos comuns. Adulto-criança, como as crianças ele tem que viver num mundo de egocentrismo que não lhe permite ocupar os planos em que as decisões comuns tem que ser tomadas. Durante a própria campanha, essa visão modificou-se; foram adensando-se as vozes dos que superavam esse preconceito, reconhecendo o adulto analfabeto como ser produtivo, capaz de raciocinar e resolver seus problemas. Para tanto contribuíram também teorias mais modernas da psicologia, que desmentiam postulados anteriores de que a capacidade de aprendizagem dos adultos seria menor do que a das crianças. Já em artigo de 1945, Lourenço Filho argumentara neste sentido, lançando mão de estudos de psicologia experimental realizados nos Estados Unidos nas décadas de 20 e 30. A confiança na capacidade de aprendizagem dos adultos e a difusão de um método de ensino de leitura para adultos conhecido como Laubach inspiraram a iniciativa do Ministério da Educação de produzir pela primeira vez, por ocasião da Campanha de 47, material didático específico para o ensino da leitura e da escrita para os adultos. O Primeiro guia de leitura, distribuído pelo ministério em larga escala para as escolas supletivas do país, orientava o ensino pelo método silábico. As lições partiam de palavras-chave selecionadas e organizadas segundo suas características fonéticas. A função dessas palavras era remeter aos padrões silábicos, estes sim o foco do estudo. As sílabas deveriam ser memorizadas e remontadas para formar outras palavras. As primeiras lições também continham pequenas frases montadas com as mesmas sílabas. Nas lições finais, as frases compunham pequenos textos contendo orientações sobre preservação da saúde, técnicas simples de trabalho e mensagens de moral e civismo. 2.1 - Alfabetização e conscientização No final da década de 50, as críticas à Campanha de Educação de Adultos dirigiam-se tanto às suas deficiências administrativas e financeiras quanto à sua orientação pedagógica. Denunciava-se o caráter superficial do aprendizado que se efetivava no curto período da alfabetização, a inadequação do método para a população adulta e para as diferentes regiões do país. Todas essas críticas convergiram para uma nova visão sobre o problema do analfabetismo e para a consolidação de um novo paradigma pedagógico para a educação de adultos, cuja referência principal foi o educador pernambucano Paulo Freire.

22 O pensamento pedagógico de Paulo Freire, assim como sua proposta para a alfabetização de adultos, inspiraram os principais programas de alfabetização e educação popular que se realizaram no país no início dos anos 60. Esses programas foram empreendidos por intelectuais, estudantes e católicos engajados numa ação política junto aos grupos populares. Desenvolvendo e aplicando essas novas diretrizes, atuaram os educadores do MEB — Movimento de Educação de Base, ligado à CNBB — Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, dos CPCs — Centros de Cultura Popular, organizados pela UNE — União Nacional dos Estudantes, dos Movimentos de Cultura Popular, que reuniam artistas e intelectuais e tinham apoio de administrações municipais. Esses diversos grupos de educadores foram se articulando e passaram a pressionar o governo federal para que os apoiasse e estabelecesse uma coordenação nacional das iniciativas. Em janeiro de 1964, foi aprovado o Plano Nacional de Alfabetização, que previa a disseminação por todo Brasil de programas de alfabetização orientados pela proposta de Paulo Freire. A preparação do plano, com forte engajamento de estudantes, sindicatos e diversos grupos estimulados pela efervescência política da época, seria interrompida alguns meses depois pelo golpe militar.

Paulo Freire elaborou uma proposta de alfabetização de adultos conscientizadora, cujo princípio básico era: “A leitura do mundo precede a leitura da palavra.” O paradigma pedagógico que se construiu nessas práticas baseava-se num novo entendimento da relação entre a problemática educacional e a problemática social. Antes apontado como causa da pobreza e da marginalização, o analfabetismo passou a ser interpretado como efeito da situação de pobreza gerada por uma estrutura social não igualitária. Era preciso, portanto, que o processo educativo interferisse na estrutura social que produzia o analfabetismo. A alfabetização e a educação de base de adultos deveriam partir sempre de um exame crítico da realidade existencial dos educandos, da identificação das origens de seus problemas e das possibilidades de superá-los. Além dessa dimensão social e política, os ideais pedagógicos que se difundiam tinham um forte componente ético, implicando um profundo comprometimento do educador com os educandos. Os analfabetos deveriam ser reconhecidos como homens e mulheres produtivos, que possuíam uma cultura. Dessa perspectiva, Paulo Freire criticou a chamada educação bancária, que considerava o analfabeto pária e ignorante, uma espécie de gaveta vazia onde o educador deveria depositar conhecimento. Tomando o educando como sujeito de sua aprendizagem, Freire propunha uma ação educativa que não negasse sua cultura mas que a fosse transformando através do diálogo. Na época, ele referia-se a uma consciência ingênua ou intransitiva, herança de uma sociedade fechada, agrária e oligárquica, que deveria ser transformada em consciência crítica, necessária ao engajamento ativo no desenvolvimento político e econômico da nação. Paulo Freire elaborou uma proposta de alfabetização de adultos conscientizadora, cujo princípio básico pode ser traduzido numa frase sua que ficou célebre: “A leitura do mundo precede a leitura da palavra”. Prescindindo

23da utilização de cartilhas, desenvolveu um conjunto de procedimentos pedagógicos que ficou conhecido como método Paulo Freire. Ele previa uma etapa preparatória, quando o alfabetizador deveria fazer uma pesquisa sobre a realidade existencial do grupo junto ao qual iria atuar. Concomitantemente, faria um levantamento de seu universo vocabular, ou seja, das palavras utilizadas pelo grupo para expressar essa realidade. Desse universo, o alfabetizador deveria selecionar as palavras com maior densidade de sentido, que expressassem as situações existenciais mais importantes. Depois, era necessário selecionar um conjunto que contivesse os diversos padrões silábicos da língua e organizá-lo segundo o grau de complexidade desses padrões. Essas seriam as palavras geradoras, a partir das quais se realizaria tanto o estudo da escrita e leitura como o da realidade. O objetivo era, antes mesmo de iniciar o aprendizado da escrita, levar o educando a assumir-se como sujeito de sua aprendizagem Os materiais didáticos produzidos nesse período referiam-se à realidade imediata dos adultos, problematizando-a. Antes de entrar no estudo dessas palavras geradoras, Paulo Freire propunha ainda um momento inicial em que o conteúdo do diálogo educativo girava em torno do conceito antropológico de cultura. Utilizando uma série de ilustrações (cartazes ou slides), o educador deveria dirigir uma discussão na qual fosse sendo evidenciado o papel ativo dos homens como produtores de cultura e as diferentes formas de cultura: a cultura letrada e a não letrada, o trabalho, a arte, a religião, os diferentes padrões de comportamento e a sociabilidade. O objetivo era, antes mesmo de iniciar o aprendizado da escrita, levar o educando a assumir-se como sujeito de sua aprendizagem, como ser capaz e responsável. Tratava-se também de ultrapassar uma compreensão mágica da realidade e desmistificar a cultura letrada, na qual o educando estaria se iniciando. Depois de cumprida essa etapa, iniciava-se o estudo das palavras geradoras, que também eram apresentadas junto com cartazes contendo imagens referentes às situações existenciais a elas relacionadas. Com cada gravura, desencadeava-se um debate em torno do tema e só então a palavra escrita era analisada em suas partes componentes: as sílabas. Enfim, era apresentado um quadro com as famílias silábicas com as quais os alfabetizandos deveriam montar novas palavras. Com um elenco de dez a vinte palavras geradoras, acreditava-se conseguir alfabetizar um educando em três meses, ainda que num nível rudimentar. Numa etapa posterior, as palavras geradoras seriam substituídas por temas geradores, a partir dos quais os alfabetizandos aprofundariam a análise de seus problemas, preferencialmente já se engajando em atividades comunitárias ou associativas. Nesse período, foram produzidos diversos materiais de alfabetização orientados por esses princípios. Normalmente elaborados regional ou localmente, procurando expressar o universo vivencial dos alfabetizandos, esses materiais continham palavras geradoras acompanhadas de imagens relacionadas a temas para debate, os quadros de descoberta com as sílabas derivadas das palavras, acrescidas de pequenas frases para leitura. O que

24caracterizava esses materiais era não apenas a referência à realidade imediata dos adultos, mas, principalmente, a intenção de problematizar essa realidade. 2. 2 - O Mobral e a educação popular Com o golpe militar de 1964, os programas de alfabetização e educação popular que se haviam multiplicado no período entre 1961 e 1964 foram vistos como uma grave ameaça à ordem e seus promotores duramente reprimidos. O governo só permitiu a realização de programas de alfabetização de adultos assistencialistas e conservadores, até que, em 1967, ele mesmo assumiu o controle dessa atividade lançando o Mobral — Movimento Brasileiro de Alfabetização. Era a resposta do regime militar à ainda grave situação do analfabetismo no país. O Mobral constitui-se como organização autônoma em relação ao Ministério da Educação, contando com um volume significativo de recursos. Em 1969 lançou-se numa Campanha massiva de alfabetização. Foram instaladas Comissões Municipais que se responsabilizavam pela execução das atividades, mas a orientação e supervisão pedagógica bem como a produção de materiais didáticos eram centralizadas. As orientações metodológicas e os materiais didáticos do Mobral reproduziram muitos procedimentos consagrados nas experiências de inícios dos anos 60, mas esvaziando-os de todo sentido crítico e problematizador. Propunha-se a alfabetização a partir de palavras-chave, retiradas “da vida simples do povo”, mas as mensagens a elas associadas apelavam sempre ao esforço individual dos adultos analfabetos para sua integração nos benefícios de uma sociedade moderna, pintada sempre de cor-de-rosa. Durante a década de 70, o Mobral expandiu-se por todo o território nacional, diversificando sua atuação. Das iniciativas que derivaram do Programa de Alfabetização, a mais importante foi o PEI — Programa de Educação Integrada, que correspondia a uma condensação do antigo curso primário. Este programa abria a possibilidade de continuidade de estudos para os recém-alfabetizados, assim como para como para os chamados analfabetos funcionais, pessoas que dominavam precariamente a leitura e a escrita. Paralelamente, grupos dedicados à educação popular continuaram a realizar experiências pequenas e isoladas de alfabetização de adultos com propostas mais críticas, desenvolvendo os postulados de Paulo Freire. Essas experiências eram vinculadas a movimentos populares que se organizavam em oposição à ditadura, comunidades religiosas de base, associações de moradores e oposições sindicais. Paulo Freire, que fora exilado, seguia trabalhando com educação de adultos no Chile e depois em países africanos. Com a emergência dos movimentos sociais e o início da abertura política na década de 80, essas pequenas experiências foram se ampliando, construindo canais de trocas de experiência, reflexão e articulação. Projetos de alfabetização se desdobraram em turmas de pós- alfabetização, onde se avançava no trabalho com a língua escrita, além das operações matemáticas básicas. Também as administrações de alguns estados e municípios maiores ganhavam autonomia com relação ao Mobral, acolhendo educadores que se esforçaram por reorientar seus programas de educação básica de adultos.

25Desacreditado nos meios políticos e educacionais, o Mobral foi extinto em 1985. Seu lugar foi ocupado pela Fundação Educar, que abriu mão de executar diretamente os programas, passando a apoiar financeira e tecnicamente as iniciativas de governos, entidades civis e empresas a ela conveniada. Nesse período de reconstrução democrática, muitas experiências de alfabetização ganharam consistência, desenvolvendo os postulados e enriquecendo o modelo da alfabetização conscientizadora dos anos 60. Dificuldades encontradas na prática geravam reflexão e apontavam novas pistas. Um avanço importante dessas experiências mais recentes é a incorporação de uma visão de alfabetização como processo que exige certo grau de continuidade e sedimentação. Desde os anos 50, eram recorrentes as críticas a campanhas que pretendiam alfabetizar em poucos meses, com perspectivas vagas de continuidade, depois das quais se constatavam altos índices de regressão ao analfabetismo. Os programas mais recentes prevêem um tempo maior, de um, dois ou até três anos dedicados à alfabetização e pós-alfabetização, de modo a garantir que o jovem ou adulto atinja maior domínio dos instrumentos da cultura letrada, para que possa utilizá-los na vida diária ou mesmo prosseguir seus estudos, completando sua escolarização. A alfabetização é crescentemente incorporada a programas mais extensivos de educação básica de jovens e adultos. Essa tendência se reflete nos materiais didáticos produzidos. Para a alfabetização inicial, as palavras geradoras com suas imagens codificadoras e quadros de famílias silábicas vêm em muitos casos acompanhadas de exercícios complementares; normalmente, exercícios de montar ou completar palavras com sílabas dadas, palavras e frases para ler e associar as imagens, bem como exercícios de coordenação motora. Alguns materiais partem de frases geradoras que, gradativamente, vão compondo pequenos textos. Revela-se uma preocupação crescente de ofertar materiais de leitura adaptados aos neo-leitores. Para os níveis de pós-alfabetização, os materiais são mais escassos. Os mais originais são aqueles que aproveitam textos escritos pelos próprios educandos como textos de leitura. A maioria, entretanto, reproduz os livros didáticos utilizados no ensino primário regular, adaptados para uma temática mais adulta. Os textos, sempre simplificados, referem-se ao mundo do trabalho, problemas urbanos, saúde e organização política como temas geradores ou tópicos curriculares de Estudos Sociais e Ciências. Entre as propostas de exercícios de escrita, aparecem os questionários nos quais se solicita a reprodução dos conteúdos dos textos ou se introduzem tópicos gramaticais. Outro indicador da ampliação da concepção de alfabetização no sentido de uma visão mais abrangente de educação básica é a crescente preocupação com relação à iniciação matemática. Muitas vezes, a preocupação foi posta pelos próprios educandos, que expressavam o desejo de aprender a “fazer contas”, certamente em razão da funcionalidade que tal habilidade tem para a resolução de problemas da vida diária. De fato, considerando-se a incidência das representações e operações numéricas nos mais diversos campos da cultura, é fundamental incluir sua aprendizagem numa concepção de alfabetização integral.

263 - A FORMAÇÃO E O OLHAR DO PROFESSOR SOBRE O EJA

A formação profissional no Brasil, ao longo da história, sempre sofreu a

influência do Projeto Histórico Capitalista e figura na política neoliberal,

promovendo uma orientação para a formação direcionada para o mercado de

trabalho.

Frigotto (1996), analisando os desafios no Plano da ação prática do

educador, salienta um fato importante na formação e profissionalização do

educador que é o "mundo de sua experiência cotidiana e prática", por ser nesta

experiência da prática cotidiana que se materializam as práticas educativas e

os processos de construção ou de bloqueio do conhecimento. Apesar das

condições adversas no plano de formação do educador, a qualificação técnica,

teórica e política se constituem, também, num desafio a ser enfrentado,

conforme preleciona Frigotto:

Creio que temos um acúmulo de experiências e de lutas concretas em

nossa história recente que nos mostram que esta qualificação, no plano do

cotidiano do chão da escola, ganha possibilidade efetiva na medida que

consigamos estruturar um projeto político pedagógico centrado em formas cada

vez mais coletivas de organização do conhecimento, do trabalho pedagógico e

da sua avaliação. Romper com a divisão disciplinar estanque e com as formas

individualistas e competitivas de conhecimentos e de ensino, sem dúvida é um

elemento crucial de qualificação do educador (FRIGOTTO, 1996, p. 402-403).

As condições concretas de vida, expectativas e necessidades dos

educandos devem constituir a referência principal para o trabalho dos

educadores. O ingresso de novos contingentes de jovens e adultos

trabalhadores em um sistema de ensino, que antes atendia quase que

exclusivamente crianças, deve processar-se de forma a favorecer o

questionamento e redimensionamento da prática educativa individual e

coletiva.

As estatísticas disponíveis sobre os educadores que atuam com jovens

e adultos cobrem apenas os serviços de ensino básico formal, compreendendo

os docentes que mantêm vínculo empregatício com escolas públicas ou

27privadas. Essas informações não compreendem o numeroso contingente de

educadores populares – mulheres, em sua esmagadora maioria – que atuam

voluntária ou profissionalmente em projetos desenvolvidos por igrejas,

movimentos e organizações sociais diversas, sobre os quais os estudos

disponíveis são escassos e pouco abrangentes (HADDAD, 2002).

O processo de formação dos educadores não pode ser imposto,

pressupõe adesão e confiança. Adotar o critério de adesão voluntária num

sistema de ensino viciado por práticas autoritárias e hierárquicas é algo

complexo e de difícil realização, mas ainda assim parece ser a única opção que

produz frutos.

Em vista do exposto, vale lembrar que de acordo com o Cadastro das

Instituições de Educação Superior organizado pelo INEP, dos 1.306 cursos de

Pedagogia existentes no Brasil em 2003, apenas 16 deles (1,22%) ofereciam

habilitação específica para a modalidade educação de jovens e adultos: sete

deles (43,75%) eram oferecidos por instituições de ensino superior localizadas

na Região Sul do Brasil; no Nordeste, havia 6 cursos (37,5%); 2 no Sudeste

(12,5%) e 1 no Centro Oeste (6,25%). Assim, há um enorme déficit de

profissionais da educação com formação inicial adequada para atuar junto a

jovens e adultos.

Vale, pois, o que diz o Parecer CEB 4/98 quando lembra a sensibilização

dos sistemas educacionais para reconhecer e acolher a riqueza da diversidade

humana. Mas, é preciso que a formação dos docentes voltados para EJA seja

completa nos estabelecimentos ofertantes através do curso normal médio ou

do curso normal superior ou de outros igualmente apropriados.

______________________________

Ver INEP www.educacaosuperior.inep.gov.br/funcional/ lista_cursos.asp

28Como diz o mesmo Parecer supracitado, é preciso que em qualquer

nível formativo se dêem correlações entre os conteúdos das áreas de

conhecimento e o universo de valores e modos de vida de seus alunos. O

Brasil tem uma experiência significativa na área e um acúmulo de

conhecimento voltado para métodos, técnicas alternativas de educação de

jovens e adultos.

Diante do exposto, cabe as instituições de nível superior, sobretudo as

universidades, intervir no resgate desta dívida social abrindo espaços para a

formação de professores, recuperando experiências significativas, produzindo

material didático e veiculando, em emissoras de rádio e de televisão,

programas que contemplem o disposto no art. 221 da Constituição Federal de

atendimento a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas. No

caso dos sistemas públicos, vale lembrar ainda, o art. 67 da LDB e, para todos

os estabelecimentos privados ou públicos, o princípio da valorização do

profissional da educação escolar posto na Constituição e na LDB.

Para qualquer profissional que se ocupe do magistério, a garantia de

padrão de qualidade é um princípio que cobre o espectro da cidadania

enquanto participação e enquanto exigência da clientela a que se destina. A

pior forma de presença é aquela que se situa nas antípodas da qualidade e que

atende pelo termo mediocridade, já expresso pelo cinismo da fórmula "qualquer

coisa serve" ou "antes isso do que nada".

A formação adequada e a ação integrada implicam a existência de um

espaço próprio, para os profissionais de EJA, nos sistemas, nas universidades

e em outras instituições formadoras.

Muitos educadores que acreditam estar trabalhando a prática de uma

maneira coerente surpreendem-se quando observam que, apesar do seu

discurso avançado mantêm-se numa prática absolutamente conservadora.

De acordo com Gadotti (2000, p. 8) não é por outra razão que todo

debate em torno da função do educador e do exercício da função educativa

tem "esbarrado na dificuldade da persistência de que os alunos adultos têm a

cultura de um fracasso escolar".

29

3.1 Auto-estima na EJA

Segundo BRANDEN (1999) a auto-estima é um sentimento desenvolvido

ao longo da vida de uma pessoa e decorrente da qualidade das relações

interpessoais a que ela está exposta. A maioria das queixas relacionadas às

dificuldades de aprendizagem está relacionada com a baixa estima. Muitos

educadores se esquecem do papel da auto-estima no movimento de aprender

e subestimam a sua importância.

Segundo Krogers e Kelly (apud Antunes, 2003, p. 23), a auto-estima de

um aluno não se deve a condição genética e, menos ainda, a resultado de

inteligência ou da personalidade; "mas vem da interiorização do quadro que os

pais e professores dela fazem". Acrescenta ainda, que:

Se aceitarmos e valorizarmos nossos alunos, se os considerarmos

capazes de desenvolver competências e habilidades necessárias para lidar

com os seus estudos e se os julgamos suficientemente importantes para

reservarmos tempo em ouvi-los, contribuiremos para que desenvolvam padrões

consistentes e realistas, sintam-se encorajados a não se intimidar com o

fracasso e aprendam a agir de forma independente e responsável (ANTUNES,

2003, p. 23-24).

Diante disso, pode-se dizer que uma pessoa desenvolve sua auto-

estima, a medida que é reconhecida como tal, única, singular, com

necessidades educacionais específicas. Nessa perspectiva, ajudar cada

aprendiz a descobrir-se, a aceitar-se, a compreender-se é instrumentalizá-lo a

se sentir confiante e apto a enfrentar as dificuldades e as complexidades do

aprender, deve se constituir num dos principais objetivos da EJA. O sentimento

de menos-valia impede uma pessoa de aventurar-se no processo da

aprendizagem, além de trazer conseqüências indesejáveis para o universo

relacional.

Isso de modo algum significa que o professor não deva criticar, desafiar

ou propor desafios aos seus alunos e que não corrija os seus erros. A esse

respeito Antunes (2003, p. 24) se pronuncia afirmando que "essa intervenção é

30imprescindível como o é separar o ato que desagrada da pessoa que o

cometeu: atribuir tarefas adequadas a competências; enfatizar sucessos

autênticos e salientar fracassos; desenvolver meios de encorajamento e ajudar

o aluno a tirar proveito de seus erros".

No contexto educacional, a valorização da auto-estima passou a ter uma

relevância maior, tendo em vista que a fragilidade, ou seja, a baixa estima

atrapalha a boa aprendizagem da pessoa, conseqüentemente, comprometendo

a sua sobrevivência em um mundo extremamente desafiador, complexo,

competitivo e diferente.

31CONCLUSÃO

A conquista dos objetivos propostos no presente Projeto Pedagógico, depende de uma prática educativa que tenha como eixo a formação de um cidadão autônomo e participativo. Essa prática pressupõe que os jovens sejam sujeitos do seu processo de aprendizagem e que construam significados para o que aprendem, por meio de múltiplas e complexas interações com os objetos de conhecimento, tendo para tanto, o educador como mediador. A intervenção dos jovens entre si é outro aspecto essencial nesse processo.

O mundo do jovem adulto que não teve acesso a educação é muito complexo. Existem situações quase que imagináveis. É perceptível a necessidade de se fazer alguma coisa para mudar a situação. Mas, como mudar, este é o problema.

Acontece que a educação funciona como único meio possível destas pessoas alcançarem um posto melhor no seu emprego. É a única chance de "ser alguém na vida". O jovem não está acostumado a dar a ele seu próprio valor a partir do lugar que ele ocupa na sociedade. O ser alguém na vida implica em valorizar-se a si mesmo e buscar modificar a realidade a partir daquilo que é e, não apenas ficar sonhando com um mundo que pode vir a ser, mas que parece ser tão distante que não valha a pena lutar por ele. A auto-estima desses jovens é muito baixa. Há um certo desanimo diante da vida.

As maiorias dos jovens que pratica a Educação de Jovens e Adultos vieram de famílias um tanto desestruturadas. São jovens que vivem somente com um dos pais, outros vivem com os avós, outros com os tios. Muitos vivem na cidade a fim de ganhar um dinheiro a mais para ajudar os pais que moram no interior. Esses jovens para sobreviverem são obrigados a se sujeitarem a todo e qualquer tipo de trabalho. Muitas vezes a jornada de trabalho é tão grande que impede até os estudos. Ou ainda o serviço exige muito esforço físico que à noite o jovem não tem animo para ir a escola estudar.

Fica difícil até de colocar este jovem como pede os princípios do construtivismo ou de outras correntes educacionais mais modernas, que exigem ser o aluno o motor móvel do ensino aprendizagem. Mas por outro lado, percebe-se que ainda a muita esperança na Educação de Jovens e Adultos. Existem muitos professores que doam seu tempo quase que integral para auxiliar e monitorar, monitorar e por que não dizer ensinar essa parcela de quase analfabetos intelectuais.

Para inserir esta população no exercício pleno da cidadania e ampliar sua colocação no mercado de trabalho, a alfabetização deve compreender a oferta de uma formação equivalente, pelo menos, que possibilite uma inserção digna e respeitosa com metodologia específica para esse segmento.

Considerando-se que grande parte da população ainda não chegou à sala de aula em nosso país, que a educação escolar pode ajudar a construir cidadãos, e que o desenvolvimento humano é questão de oportunidade. O professor tem um compromisso social de estudar e de apresentar alternativas para os problemas educacionais.

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