diretrizes de intervenÇÃo no bairro mariano … · diretamente na formação da cidade como...
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4O COLÓQUIO IBERO-AMERICANO PAISAGEM CULTURAL, PATRIMÔNIO E PROJETO Belo Horizonte, de 26 a 28 de setembro de 2016
DIRETRIZES DE INTERVENÇÃO NO BAIRRO MARIANO PROCOPIO E A CONTRIBUIÇÃO DE ALDO ROSSI PARA A COMPREENSÃO E
IDENTIFICAÇÃO DA PAISAFEM CULTURAL DA ÁREA
MARQUES, CLARA (1); GONZAGA, LUIZ (2); ALVES, HELENA (3); MENDONÇA, CAIO (4); BARBOSA, ANA (5); TASCA, LUCIANE (6); REZENDE, DANIELE (7);
HERCULANO JUNIOR, FRANCISCO (8); BASILIO, CAROLINA (9).
1. Universidade Federal de Juiz de Fora. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Departamento de Projeto História e Teoria da Arquitetura e do Urbanismo.
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RESUMO Na cidade há elementos diversos, que em conjunto possibilitam diversas leituras para a compreensão de sua formação, inclusive a história. A análise dessa formação nos permite entender o que ocorreu em determinado lugar e criar premissas que resultem em ações para um adequado planejamento urbano. Incluir novos elementos ou retirar os que já existem na cidade é uma decisão que envolve grandes desafios, mas que pode ser facilitada pelo entendimento da área, ou região em que se pretende intervir. Nesse sentido, entender o espaço urbano é crucial para que uma intervenção arquitetônica e da paisagem tenha êxito na sua relação com o espaço em questão, para uma adequada troca simbiótica de conceito, programa e implantação entre a construção e o local onde essa se insere. Este trabalho teve como objetivo realizar um estudo que contemple a noção de paisagem a partir da morfologia do objeto de estudo, a região que envolve o Museu Mariano Procópio, no bairro homônimo, na cidade de Juiz de Fora/MG. Para a escolha do objeto, foi levado em consideração a importância histórica da área, que contribuiu diretamente na formação da cidade como conhecemos hoje, tanto relacionado ao desenvolvimento cultural, quanto espacial e econômico. O trabalho foi baseado nas aulas, orientações e textos indicados na disciplina de Projeto de Arquitetura e Urbanismo VII da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFJF. Como metodologia, foi realizado, inicialmente, pesquisa documental, iconográfica e cartográfica, para se compreender a trajetória de transformação da região ao longo da história. Buscando-se sempre entender a origem de ocupação da região, sua transformação, e sua condição atual. A partir dessa compreensão, recorreu-se ao estudo bibliográfico do teórico Aldo Rossi, em especial a obra L´Architettura della citá, (1966). A obra trata das ideias enunciadas pelo grupo La Tendenza, da Escola Italiana, e pelo autor, relacionando o projeto arquitetônico com tais pensamentos. Nele, Rossi aborda os fatos urbanos ao mesmo tempo em que cria conceitos fundamentais para compreender a cidade, com o entendimento que esta é constituída ao longo do tempo, reforçando que a arquitetura é inseparável da sociedade, sendo por sua natureza, uma expressão do coletivo. A escolha da área de recorte do objeto de estudo baseou-se nos conceitos de Aldo Rossi, pautada no reconhecimento da importância histórica econômica e social do lugar, assim como dos problemas históricos da região ligados a ela. Mesmo com a importância histórica da área de estudo, não se vê atualmente respeito efetivo em relação à paisagem do local. Nota-se apenas uma
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descaracterização assombrosa da mesma, por meio de ações de planejamento urbano descompromissadas com a preservação da área e região, que geram expressiva descaracterização paisagem com danos irreversíveis para a manutenção da ambiência do conjunto arquitetônico e paisagístico tombado pelo IPHAN. Portanto, ao fim do trabalho, é possível compreender o espaço urbano em sua essência desde a formação, transformação ao longo do tempo e condições atuais e assim ter condições técnicas para inferir ações que possam contribuir para uma adequada preservação do lugar e de sua memória. Palavras-chave: Paisagem Cultural; Planejamento Urbano; Aldo Rossi
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INTRODUÇÃO
O presente artigo é o resultado de estudos realizados durante a disciplina de Projeto de
Arquitetura e Urbanismo VII, ministrada na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da
Universidade Federal de Juiz de Fora. O estudo referido buscou compreender os elementos
formadores do espaço urbano, tendo em vista a origem de ocupação da área de estudo (bairro
Mariano Procópio), sua transformação e sua condição atual, utilizando os conceitos de Aldo
Rossi, abordados na obra L´Architettura della citá, (1966). A importância deste estudo se torna
clara, uma vez que ela nos permite entender o que ocorreu neste local e criar premissas que
resultem em ações para um adequado planejamento urbano.
O objeto de estudo, o Bairro Mariano Procópio localizado no município de Juiz de Fora/MG, foi
escolhido por sua relevância histórica, uma vez que seu desenvolvimento contribuiu
diretamente na formação da cidade como conhecemos hoje, tanto relacionado à construção
cultural, quanto espacial e econômica. Também foram levados em consideração os conceitos
de Aldo Rossi, pautados no reconhecimento da importância histórica do lugar, assim como
dos problemas históricos ligados a ela. A partir dos ideais e conceitos enunciados pelo autor,
em especial o de fatos urbanos e de tipos, procura-se, portanto, compreender e identificar a
paisagem cultural da área de estudo.
Como metodologia para a produção do trabalho, foi realizado inicialmente um levantamento
do histórico da área. Uma vez constatada a importância e caráter único do local em aspectos
históricos, culturais, arquitetônicos, urbanos e sociais, recorreu-se ao estudo bibliográfico do
teórico Aldo Rossi e as premissas da Escola Italiana e do grupo La Tendenza, do qual fazia
parte. Nesse momento, buscou-se não somente compreender a cidade a partir da constituição
de sua memória coletiva, mas também os elementos formadores do espaço físico. O tema
abordado pelo autor nos ajuda a criar uma melhor imagem sobre o que realmente é a cidade
através de seus fatos constituintes e assim facilitar o entendimento da paisagem cultural. Com
esta compreensão, a pesquisa se propõe a desenvolver diretrizes que possam contribuir para
a valorização e, portanto, conservação da área de estudo, medida de extrema importância
tendo em vista o rápido processo de modificação urbana impulsionada pelos interesses
econômicos que atinge a região e consequente descaso com os suportes da memória coletiva
do local.
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HISTÓRICO DA ÁREA
A história de Juiz de Fora sempre esteve ligada a ciclos econômicos atrelados aos principais
eixos da cidade. Podemos dividir sua formação em três principais passagens: a primeira
concerne ao Caminho Novo, importante rota do ciclo econômico do ouro no Brasil que se
configurou como o ponto de partida do povoamento da cidade (início do século XVIII); a
segunda desenvolve-se a partir da Expansão Cafeeira e a construção da Estrada do
Paraibuna, que surge como alternativa ao já caduco Caminho Novo. Enfim, a terceira remete
ao processo de intensa industrialização do município (início no final do século XIX) associado
à Rodovia União Indústria.
A exploração da área onde se implantou Juiz de Fora tem como principal referência o
Caminho Novo, que surge para facilitar a comunicação e transporte do ouro entre Vila Velha e
o Rio de Janeiro. Em todo seu trajeto, logo surgiram pontos de apoio ao tráfego dos viajantes
e comerciantes que utilizavam a rota, como armazéns, hospedarias e postos de fiscalização e
registro de ouro. Foram no entorno destes que ergueram-se os primeiros povoamentos da
região. A Fazenda da Tapera, antiga alcaidemoria de Juiz de Fora, foi um desses edifícios
construídos ao longo do Caminho. É considerada a mais antiga repartição pública da cidade.
Ainda no século XVIII, com o declínio da produção aurífera, o caminho passa a ser utilizado
como via transitória, em especial para mercadorias destinadas ao consumo interno da atual
região sudeste, em especial do Rio de Janeiro. Diante da necessidade de uma melhoria do
trajeto, o engenheiro alemão Henrique Guilherme Fernando Halfeld foi contratado pelo
governo e logo decidiu por construir um novo percurso, a Estrada do Paraibuna, atual Avenida
Rio Branco. A partir do traçado deste novo caminho, o núcleo original do povoamento na outra
margem do rio foi desviado, configurando o novo cerne político da localidade. Nas margens
deste eixo, logo foram construídos os principais centros de poder, como Igreja e Repartições
Públicas, além disso, o local era escolhido pelos grandes barões de café para a construção de
seus sobrados. Tanto estas construções imponentes quanto a passagem de figuras de
importância no local afirmavam o poder econômico daqueles que se residiam ali, “tornando-o
visível e palpável a todos” (Genovez, 1998, p. 16).
Vale ressaltar que houve uma preocupação com uma urbanização disciplinada desde o
momento em que Halfeld traçou a Estrada do Paraibuna até a abertura de ruas na sua
extensão, configurando o centro da localidade.
Em 1850, a localidade até então conhecida como paróquia de Santo Antônio de Juiz de Fora
foi elevada à categoria de vila, passando a ser chamada de Santo Antônio do Paraibuna. E
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nesta mesma década, chegava à cidade Mariano Procópio Ferreira Lage a serviço da
Companhia União e Indústria. Impelido pela construção da Rodovia União Indústria, percurso
que ligaria a vila a Petrópolis, prontamente iniciou uma política de incentivo de imigração
alemã para formar uma colônia agrícola e reunir trabalhadores para a construção da nova
estrada. A área de estudo, atuais bairros Mariano Procópio e Fábrica, antigo Villagem, tiveram
sua origem marcada por tais ações. Também surgiram outros bairros com a chegada dos
imigrantes, como o São Pedro e o Morro da Glória. O último, que era conhecido como Morro
da Gratidão, foi onde os imigrados foram inicialmente instalados. Porém, com a insalubridade
da área, logo foram assentados na região norte da cidade, formando a Colônia Dom Pedro II
(São Pedro). O Villagem, que se encontrava mais próximo ao centro político de Santo Antônio
do Paraibuna, se tornaria, posteriormente, em um polo atrativo para a elite juizforana por
abrigar marcos importante para a cidade, como a estação Mariano Procópio e a Cervejaria
José Weiss. Com estas novas aglomerações, foi criado um novo centro populacional e
econômico. Assim, a construção da Rodovia, inaugurada em 1961, alterou a organização
espacial da localidade.
Apesar do avolumamento de investimentos no Villagem, a Colônia Dom Pedro II não
conseguiu se manter por muito tempo. Além das dificuldades impostas pela cultura, religião e
língua diferente, a ausência de mercado para os produtos plantados se associava à falta de
incentivos. Consequentemente, muitos colonos foram abandonando suas terras e se fixando
na cidade, somando-se àqueles trabalhadores braçais, operários, ligados à Companhia União
e Indústria.
Mesmo com o fim da companhia, o imigrante alemão desempenhou um papel fundamental no
processo de crescimento econômico, industrial e até mesmo político do município. Seu perfil
empreendedor e trabalho qualificado contribuíram para o surgimento de diversas manufaturas
na área, que posteriormente se desenvolveriam e formariam indústrias de pequeno e médio
porte.
Tais ações e acontecimentos fizeram do bairro Mariano Procópio um pioneiro no
desenvolvimento da Manchester Mineira, como a construção da Villa Ferreira Laje (1861), que
posteriormente se transformou em Museu Mariano Procópio (1915) por intermédio do filho de
Mariano Procópio, Alfredo Ferreira Laje; da implantação da fábrica de tecidos Ferreira
Guimarães, que pertencia aos ingleses; a cervejaria, já mencionada, José Weiss e a
Cervejaria Germânica, entre outros empreendimentos. Juiz de Fora, no final do século XIX,
possuía um sistema de transporte moderno, que incluía, além dos caminhos já citados, a
Estrada de Ferro D. Pedro II, que chegou à localidade em 1875, e a Estrada da Leopoldina.
Era um cenário de industrialização precoce quando comparado com outras cidades mineiras.
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Assim, no final do século XIX, Juiz de Fora contava com uma infra-estrutura moderna
relacionada principalmente ao sistema de transporte, como a Rodovia União e Indústria,
Estrada de Ferro D. Pedro II - que chegara a Juiz de Fora em 1875 e passava a ser a principal
via de trânsito de trabalhadores e carga na região - e Estrada da Leopoldina. O setor
energético também deve ser destacado, já que a cidade possuía a Companhia Mineira de
Eletricidade – pioneira na América Latina com a construção da Usina Hidrelétrica de
Marmelos – além de um sistema de comunicação que era capaz de atender as demandas do
crescimento e um sistema financeiro em ascensão.
É clara a importância do bairro Mariano Procópio. Tanto a imigração quanto a mudança na
ocupação urbana então “ligadas no processo de formação espacial, social e cultural de Juiz
de Fora” (Genovez, 1998, p. 14).
ESCOLA ITALIANA E O GRUPO LA TENDENZA
A Escola de Veneza, também conhecida pelo nome La Tendenza, fazia parte do movimento
neorracionalista italiano (Escola Italiana), que revia tópicos anteriormente banidos da corrente
modernista, como aqueles relacionados a tradição e história, em especial à perda da
identidade. Aldo Rossi foi um dos fundadores deste grupo da década de 1960, cujo principal
eixo de pensamento era o estudo da tipologia arquitetônica e sua relação com a forma urbana,
tendo a memória, expressão coletiva e individual, como elemento formador desta estrutura.
O começo destes estudos foi com Saverio Muratori, que os iniciou junto de seus alunos na
Faculdade de Arquitetura de Veneza, no início da década 1950. Seu trabalho ficou conhecido
como Revolução Muratoriana e indicava para a existência de um “Tipo Morfológico”, baseado
no estudo do tipo. Muratori reconhece a arquitetura como um território modificado e o território
como pré-condição do ambiente arquitetônico. Para a Escola Italiana, este entendimento é a
chave para que se possa compreender a relação entre os componentes da configuração
urbana.
Outro estudioso ligado a escola italiana foi Giuseppe Strappa, que assumiu os estudos do seu
ex-professor, Saverio Muratori em Veneza, os chamando de “processual tipológica” devido ao
enfoque nos tipos edificados enquanto raiz elementar da forma urbana. A partir desses
estudos surgiram conceitos como os de tipo e tipologia, e sua influência nas formações
urbanas.
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Quanto às contribuições de Aldo Rossi para estes estudos, destaca-se principalmente
perspectiva histórica/evolutiva das suas análises. O autor afirma que a valorização dos
aspectos históricos, como monumentos e outros elementos constantes no tempo, é
fundamental para que a profundidade arquitetônica das cidades seja recuperada, isto é, seja
valorizada. Isso significa identificar e recuperar o inconsciente coletivo expresso na
arquitetura urbana.
PAISAGEM URBANA E O BAIRRO MARIANO PROCOPIO
A paisagem urbana até meados do século XX compreendia o plano de fundo da arquitetura
onde não se questionava seu papel e interferência nas relações humanas e na conformação
das cidades. Somente a partir desse período estudos como os de Aldo Rossi passaram a
integrar na paisagem urbana conceitos como fatos históricos e culturais, as relações humanas
e a arquitetura que fazem dessas áreas locais únicos. Esses elementos conjugados moldam a
paisagem urbana e dessa maneira torna indissociável a relação entre a produção
arquitetônica e a área onde ela irá se inserir.
Em sua obra, Rossi (2001) relaciona a ideia de lugar à conceitos como o de genius loci e
destaca a necessidade de identificarmos a essência desses espaços, sua tradição histórica e
as qualidades intrínsecas que conferem individualidade a essas áreas. Dessa forma, a análise
proposta pelo autor é pautada no reconhecimento dos elementos urbanos do passado, ou
fatos urbanos, ainda presentes na atualidade, elementos esses chamados de permanências e
descritos por ele como o “passado que ainda experimentamos” (ROSSI, 2001 p. 52). A
identificação de tais elementos se baseia na análise dos mesmos, levanto em consideração a
individualidade e valor de cada um e a forma como são examinados, visto que essa
conceituação pode diferir devido a percepção individual de quem a analisa.
Ainda sobre os fatos urbanos Rossi destaca a necessidade de desassociar conceitos como
forma e função, levando em consideração o fato de que a função do objeto arquitetônico do
período em que esse foi projetado e implantado até o dado presente nem sempre prevalece,
portanto devemos considerar a função como aspecto secundário e insuficiente para a
compreensão e conformação da arquitetura enquanto fato urbano entendendo ainda que, por
vezes, o funcionalismo coloca a arquitetura e a cidade como produto de consumo: “Se os fatos
urbanos são um mero problema de organização, eles não podem apresentar nem
continuidade, nem individualidade, os monumentos e a arquitetura não tem razão de ser, não
nos dizem nada.” (Rossi, 2001, p.32)
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A partir do entendimento desses conceitos iniciamos nossos estudos com a identificação dos
fatos urbanos no Bairro Mariano Procópio, analisando os elementos que se mantiveram ao
longo dos anos e que pelo valor histórico, arquitetônico e cultural a esses atribuídos fazem
dessa área um local único apresentado pelo autor como “aquela relação singular, mas
universal que existe entre certa situação local e as construções que se encontram naquele
lugar” (Rossi, 2001, p.147) e que fizeram dessas áreas sedes de acontecimentos antigos e
novos que fazem parte da memória da cidade e por isso devem ser considerados e analisados
antes de qualquer intervenção.
A compreensão da cidade como história contrapõe-se à retórica racionalista-funcionalista do
modernismo e coloca a memória como o elo condutor da estrutura urbana e da consciência da
cidade: “Assim, a união entre o passado e o futuro está na própria ideia da cidade, que a
percorre tal como a memória percorre a vida de uma pessoa e que, para concretizar-se, deve
conformar a realidade, mas também conformar-se nela. ” (Rossi, 2001, p.200)
A partir desse estudo, foi proposta a análise do Bairro Mariano Procópio baseados nos
conceitos de Aldo Rossi, considerando as características dos fatos urbanos da região e
identificando áreas singulares por meio de mapas conceituais, onde através das semelhanças
e diferenças encontradas foi possível caracterizar a área. Essas informações aliadas aos
registros históricos da região permitiram um conhecimento abrangente sobre a maneira como
o bairro se formou e transformou com o passar do tempo.
O Mapa apresentado a seguir é um recorte geral da área estudada. Ele engloba os bairros
Fábrica, Mariano Procópio, Borboleta, Morro da Glória, Santa Terezinha, Democrata, Vale do
Ipê, Centenário e parte do Centro. É importante ressaltar que os bairros supra citados são
regiões administrativas definidas pela prefeitura de Juiz de Fora, não tem relação direta com o
conceito de bairro proposto por Aldo Rossi em que este é definido por critérios sociais
baseado em um principio de divisão de classes e de funções econômicas. As regiões foram
escolhidas para a análise de acordo com sua relevância histórica para a formação urbana da
área.
De acordo com Rossi, trabalhar a forma urbana é determinar tipologias. A tipologia em
associação com a morfologia urbana constitui um método de análise da morfologia da
paisagem urbana. O tipo é, para o aurtor “uma constante que recebe influência da técnica, da
função, da estética, do caráter coletivo e do momento individual do fato arquitetônico” (Rossi,
2001, p. 24.). Estudos de tipologia arquitetônica são como uma analogia formal e funcional da
contrução histórica e cultural, posto que a arquitetura é composta de formas carregadas de
simbolismos que se construiram através dos anos.
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A análise tipológica se deu através de algumas categorias elencadas por Rossi, como
qualidade, gabarito, uso do solo e granulometria. A qualidade diz respeito à configuração
arquitetônica do fato urbano, tomando como parâmetros os materias e a arquitetura em sí
(forma, implantação, jardins) além do estado de conservação; A análise do gabarito diz
respeito à dimensão vertical dos edifícios, fator que influencia diretamente e fortemente na
constituição da paisagem; A definição do uso diz respeito à função exercida pela edificação no
espaço social, sendo definida nesse trabalho nas seguintes categorias: residencial, serviço,
comercial e institucional. A análise de granulometria baseia-se em como a implantação e a
dimensão dos fatos urbanos configuram a paisagem, sendo que regiões mais adensadas e
com edificações de prqueno porte configura uma região de granulado fino, enquanto regiões
menos andesadas e com edificações de grande porte configuram um granulado grosso. As
regiões podem ainda apresentar-se com maior ou menor homogeneidade em relação à
granulometria, definido-se granulados regulares (mais homogêneos) ou irregulares (menos
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Ilustração 01: Recorte geral da área de estudo subdividido em regiões de análise.
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REGIÃO VERDE ESCURO
Ilustração 02: Região Verde Escuro – Parte do bairro Mariano Prcópio.
Essa região pode ser subdividida em duas novas regiões, uma localizada à Oeste e outra à
Leste. A primeira caracteriza-se pela existência de edificação com maior altura de gabaritos,
de granulado médio, quanto ao uso das edificações existe uma maior predominância de
galpões destinados a atividades comerciais e de serviços. A segunda área à Oeste possui um
caráter mais local, com edificações de gabarito mais baixo e predomínio de residências
unifamiliares, além de um granulado fino.
Toda essa região pode ser classificada como possuindo uma qualidade média, e uma
tipologia onde estão sempre presentes casas unifamiliares, com relação direta com a rua,
havendo poucos jardins. No entanto, ao longo dos anos, principalmente nos eixos da Av. Rui
Barbosa e da Rua Cel. Vidal, essa tipologia vem sendo substituída por construções como
galpões e edifícios com maior número de pavimentos.
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REGIÃO LILAS
Ilustração 03: Região Lilas – Parte do bairro Morro da Glória.
A Avenida dos Andradas, caracteriza-se hoje por ser um importante eixo viário na cidade, e
pode ser lida em dois trechos. A parte mais alta, próxima à Igreja, e a parte próxima ao centro.
No alto, há a Igreja da Glória, o Colégio Santa Catarina e a Antiga Fábrica onde hoje situa-se
a UNIVERSO (Universidade Salgado de Oliveira). Esse trecho é caracterizado por uma
granulometria média, com algumas exceções, tanto de pequenas casas unifamiliares quanto
alguns edifícios de gabarito mais alto. A tipologia predominante é de residências
multifamiliares com lojas embaixo, como padarias, mercearia, bares e serviços em geral.
No trecho do centro, há uma maior verticalização e uma grande presença também de edifícios
multifamiliares, de maior gabarito, entretanto, e uma forte presença de comércio mais voltado
ao centro, como lojas varejistas e serviços.
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REGIÃO AZUL
Ilustração 04: Região Azul – Bairro Borboleta.
A região do Bairro Borboleta, criado para receber famílias de imigrantes por Mariano Procópio,
continua mantendo esse caráter residencial, com predomínio de granulado fino, residências
unifamiliares e de média/boa qualidade, que se torna irregular no eixo da Rua Irmão Menrado,
onde se localizam a Igreja e a maior parte dos serviços comerciais encontrados no bairro, e há
um número maior de edifícios multifamiliares.
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REGIÃO CINZA
Ilustração 05: Região Cinza – Bairro Fábrica (Rua Bernardo Mascarenhas).
A Região da Rua Bernardo Mascarenhas, possui um predomínio de atividades comerciais em
todo seu eixo, com um granulado médio irregular, também possui algumas construções da
época de Mariano Procópio, principalmente galpões, tipologia essa que se mantém hoje em
dia. A área em seu aspecto geral possui uma qualidade média, com exceção de alguns locais
onde pode se observar uma qualidade ruim.
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REGIÕES AMARELO E LARANJA
Ilustração 06: Região Amarela – Parque do Museu Mariano Procópio e conjunto da vila militar
Ilustração 07: Região Laranja – Praça Agassis.
A região da praça Agassis, contigua ao museu, abriga um importante casario na Rua Mariano
Procópio, em estado ruim de conservação, que contrasta com as construções do outro lado da
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rua, que dão fundos para a linha férrea, e possuem uma tipologia mais verticalizada e
adensada, e uma qualidade média.
Nos outros trechos, nota-se uma ocupação mais voltada ao comércio, principalmente galpões
voltados aos serviços ligados a automóveis.
REGIÃO VERDE CLARO
Ilustração 08: Região Laranja – Rua Benjamin Guimarães.
A região da R. Benjamin Guimarães, é caracterizada principalmente pelo conjunto da antiga
fábrica Ferreira Guimarães, e pelas novas construções, em um trecho de uma tipologia típica
residencial, à beira da rua, e na região próxima à Av. Dos Andradas, por um crescimento e
verticalização recentes. Em geral as construções possuem uma qualidade média/boa, e há
grandes vazios no trecho próximo ao Vale do Ipê.
A partir das análises podemos perceber a forte presença de fatos urbanos que nos remetem à
história de colonização industrial da região. Galpões industriais antigos, vilas operárias,
formações urbanas homogêneas que se estendem ao longo da via férrea, construções com
gabaritos predominantemente baixo e grandes chaminés de tijolos das antigas industrias que
se destacam na paisagem. Toda essa configuração urbana e arquitetônica consolidam a
formação da paisagem industrial da região.
Porém, vemos também que as modificações recentes identificadas contribuem para uma
descaracterização da área. A construção de prédios com gabaritos maiores que disputam o
skyline com as chaminés, o desleixo com os fatos urbanos históricos, o crescimento da malha
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viária, o adensamento das massas edificadas e modificações intensa nos usos das
edificações. O descaso como é tratado a forma como a região está sendo alterada coloca em
risco sua potencialidade como paisagem e documentação histórica. A possibilidade de se
aprender e apreender o contexto da região a partir da observação da paisagem torna-se frágil
a partir da desfragmentação das informações, que se dá pelas inserções e alterações de fatos
urbanos que quebram a continuidade e a ligação dos fatos anteriormente consolidados e que
configuravam a paisagem e o espirito do lugar.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir das análises apresentadas, pode-se diagnosticar a existência de um conjunto de
elementos que fazem parte da formação do município e até hoje perpetuam na região, que
passaram por constantes transformações ao longo do tempo, porém ainda assim conferem à
região do Bairro Mariano Procópio seu caráter único em aspectos históricos, culturais,
arquitetônicos, urbanos e sociais. Com o diagnóstico das análises apresentadas, verificamos
a indissociável relação entre tipologia, o uso, o granulado e a conformação urbana da área,
elementos que em conjunto formaram e hoje caracterizam o bairro e sua paisagem.
Ao observar e analisar a ocupação atual da área e ao compará-la com a do século XVIII,
quando se iniciou a apropriação do local, nota-se uma semelhança quanto ao uso, que de
certa forma se manteve o mesmo durante estes anos. Contudo, foi atentado para
significativas mudanças no fluxo e densidade demográfica da região, que vêm sido
intensificadas principalmente pela legislação de parcelamento de solo atual, que permite uma
ocupação que varia entre os modelos M3 e M3a. O primeiro permite uma taxa de ocupação de
0,6 e coeficiente de aproveitamento de 1,8. Já o segundo permite 100% no primeiro e no
segundo pavimentos e 0,6 nos demais e coeficiente de aproveitamento de 2,2. Essa situação
é preocupante, uma vez que já há grande interesse do mercado imobiliário no local, que vem
se apossando da região de forma acelerada. Nos últimos anos, o número de
empreendimentos na área de estudo vem crescendo e descaracterizando o conjunto e
dificultando a leitura da área como um todo. Recentemente, um conjunto de torres
residenciais de grande escala foi construído no local, gerando uma maior circulação de
veículos e discrepância com o restante do conjunto. Essa situação acaba por mudar a
dinâmica do local, que passa a abrigar outras funções e, portanto, altera a rotina dos
residentes e frequentadores da área.
Conclui-se, por conseguinte, que esse tipo de ocupação atual, aliado a grandes terrenos,
permite uma verticalização que não condiz com a paisagem urbana do bairro em sua
4O COLÓQUIO IBERO-AMERICANO PAISAGEM CULTURAL, PATRIMÔNIO E PROJETO Belo Horizonte, de 26 a 28 de setembro de 2016
ocupação inicial, contribuindo negativamente para a leitura e entendimento do conjunto e de
sua ambiência. Por isso é imprescindível à criação de diretrizes e propostas que busquem
resgatar uma integração visual e espacial de todo o conjunto, contextualizadas às
necessidades atuais da região, de forma que se reduza o impacto causado por futuras
edificações.
Para facilitar a leitura do conjunto, propõe-se aumentar as calçadas e alcançar a
acessibilidade, facilitando o percurso no conjunto e tornando-o prazeroso. Ao favorecer o
percurso a pé, dando preferência ao pedestre e diminuindo a circulação de veículos
motorizados no local, possibilita o usuário de vivenciar a sensação do espaço urbano,
fortalecendo a identidade local e potencializando as perspectivas do conjunto. Outra medida é
a alteração na legislação e apresentar novos parâmetros construtivos que possibilitem edificar
e ocupar sem causar danos para o local, respeitando sua reminiscência. Estas são apenas
algumas soluções entre várias que podem auxiliar na manutenção do fato material e do locus
da memória coletiva.
REFERENCIAS
ESTEVES, Albino. Álbum do Município de Juiz de Fora. 3. es Juiz de Fora: FUNALFA, 2008.
GENOVEZ, Patrícia Falco. Nucleo histórico da Avenida dos Andradas e Mariano Procópio. Nota prévia de pesquisa. Juiz de Fora: DIPAC/ Prefeitura Municipal de Juiz de Fora, 1998.
ROSSI, Aldo. A arquitetura da cidade. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
STEHLING, Luiz José. Juiz de Fora - A Companhia União e Indústria e os alemães. Edição da Prefeitura Municipal de Juiz de Fora. Juiz de Fora: FUNALFA, 1979.