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    Quando o mundo estiver unido na busca do conhecimento,e no lutando pordinheiro e poder, ento nossa sociedade enfim evoluira a um novo nvel.

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    ISBN 978-85-02-17414-6

  • Caparroz, RobertoDireito internacionalpblico / RobertoCaparroz. SoPaulo : Saraiva, 2012. (Coleo saberes dodireito ; 55)1. Direito internacionalpblico. Brasil I. Ttulo.II. Srie

    ndice para catlogo sistemtico:1. Direito internacional pblico 341

    Diretor editorial Luiz Roberto CuriaDiretor de produo editorial Lgia Alves

  • Editor Roberto NavarroAssistente editorial Thiago Fraga

    Produtora editorial Clarissa Boraschi MariaPreparao de originais, arte, diagramao e reviso Know -how

    EditorialServios editoriais Kelli Priscila Pinto / Vinicius Asevedo Vieira

    Capa Aero ComunicaoProduo grfica Marli Rampim

    Produo eletrnica Ro Comunicao

    Data de fechamento daedio: 17-2-2012

    Dvidas?Acesse www.saraivajur.com.br

    Nenhuma parte desta publicao poder ser reproduzida por qualquermeio ou forma sem a prvia autorizao da Editora Saraiva.

    A violao dos direitos autorais crime estabelecido na Lei n. 9.610/98e punido pelo artigo 184 do Cdigo Penal.

  • Apresentao

    O futuro chegou.

    A Editora Saraiva e a LivroeNet, em parceria pioneira, somaram foraspara lanar um projeto inovador: a Coleo Saberes do Direito, uma novamaneira de aprender ou revisar as principais disciplinas do curso. So mais de 60volumes, elaborados pelos principais especialistas de cada rea com base emmetodologia diferenciada. Contedo consistente, produzido a partir da vivncia dasala de aula e baseado na melhor doutrina. Texto 100% em dia com a realidadelegislativa e jurisprudencial.

    Dilogo entre o livro e o 1

    A unio da tradio Saraiva com o novo conceito de livro vivo, traocaracterstico da LivroeNet, representa um marco divisrio na histria editorialdo nosso pas.

    O contedo impresso que est em suas mos foi muito bem elaborado e completo em si. Porm, como organismo vivo, o Direito est em constantemudana. Novos julgados, smulas, leis, tratados internacionais, revogaes,interpretaes, lacunas modificam seguidamente nossos conceitos eentendimentos (a ttulo de informao, somente entre outubro de 1988 enovembro de 2011 foram editadas 4.353.665 normas jurdicas no Brasil fonte:IBPT).

    Voc, leitor, tem sua disposio duas diferentes plataformas deinformao: uma impressa, de responsabilidade da Editora Saraiva (livro), eoutra disponibilizada na internet, que ficar por conta da LivroeNet (o que

    chamamos de )1 .

    No 1 voc poder assistir a vdeos e participar deatividades como simulados e enquetes. Fruns de discusso e leiturascomplementares sugeridas pelos autores dos livros, bem como comentrios snovas leis e jurisprudncia dos tribunais superiores, ajudaro a enriquecer o seurepertrio, mantendo-o sintonizado com a dinmica do nosso meio.

  • Voc poder ter acesso ao 1 do seu livro medianteassinatura. Todas as informaes esto disponveis em www.livroenet.com.br.

    Agradecemos Editora Saraiva, nas pessoas de Luiz Roberto Curia,Roberto Navarro e Lgia Alves, pela confiana depositada em nossa Coleo epelo apoio decisivo durante as etapas de edio dos livros.

    As mudanas mais importantes que atravessam a sociedade sorepresentadas por realizaes, no por ideais. O livro que voc tem nas mosretrata uma mudana de paradigma. Voc, caro leitor, passa a ser integrantedessa revoluo editorial, que constitui verdadeira inovao disruptiva.

    Alice Bianchini | Luiz Flvio GomesCoordenadores da Coleo Saberes do Direito

    Diretores da LivroeNet

    Saiba mais sobre a LivroeNet

    http://atualidadesdodireito.com.br/?video=livroenet-15-03-2012

    1 O deve ser adquirido separadamente. Para maisinformaes, acesse www.livroenet.com.br.

  • ROBERTO CAPARROZ

    Doutor em Direito do Estado pela PUCSP. Mestre emFilosofia do Direito pela Unimes. Ps- graduado emMarketing pela ESPM. Bacharel em Computao eDireito pela Universidade Mackenzie. Auditor Fiscal daReceita Federal do Brasil desde 1997. Representante dogoverno brasileiro em diversas reunies para discussode tratados internacionais nas reas tributria eaduaneira. Palestrante internacional em eventospatrocinados pela OCDE e CIAT. Vencedor do 2Prmio Microsoft de Direito (categoria mestrado edoutorado), promovido pela Faculdade de Direito daUSP. Autor de diversas publicaes nas reas de DireitoTributrio, Direito Internacional e comrcioInternacional. Professor de ps-graduao em DireitoTributrio e Internacional da FGV, PUC/COGEAE eIBET. Instrutor da ESAF. Professor das disciplinasDireito Tributrio, Comrcio Internacional e DireitoInternacional nos principais cursos preparatrios doPas. Coordenador para a rea fiscal da ColeoEsquematizado da Editora Saraiva.

  • Conhea o autor deste livro: Assista ao vdeo:http://atualidadesdodireito.com.br/conteudonet/?ISBN=16242-6

    COORDENADORES

    ALICE BIANCHINI

    Doutora em Direito Penal pela PUCSP. Mestre emDireito pela UFSC. Presidente do InstitutoPanamericano de Poltica Criminal IPAN. Diretora doInstituto LivroeNet.

    LUIZ FLVIO GOMES

    Jurista e cientista criminal. Fundador da Rede de EnsinoLFG. Diretor-presidente do Instituto de Pesquisa eCultura Luiz Flvio Gomes. Diretor do InstitutoLivroeNet. Foi Promotor de Justia (1980 a 1983), Juizde Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001).

    Conhea a LivroeNet: http://atualidadesdodireito.com.br/?video=livroenet-15-03-2012

  • E os homens se vo a contemplar os topos das montanhas,

    as vastas ondas do mar, as amplas correntes dos rios,

    a imensido do oceano, o curso dos astros,

    e no pensam em si mesmos.

    Santo Agostinho

  • Ao meu pai, Roberto de Almeida,a melhor pessoa que conheo e

    a quem devo, entre infinitas coisas,o amor pelo mundo da literatura.

  • Sinto-me muito honrado em participar da Coleo Saberes do Direito egostaria de agradecer a oportunidade na pessoa dos professores,

    Alice Bianchini e Luiz Flvio Gomes, que me convidaram para este vitorioso einovador projeto, bem como a todos

    os amigos do Instituto Livro e Net, com especial destaque para o seu editor, IvanLus Marques.

    Como sempre, um grande prazer lanar mais uma obra pela Saraiva,exemplo de excelncia editorial na rea jurdica.

    Ficam, portanto, os meus especiais agradecimentos aos amigos, Luiz RobertoCuria, Jnatas Mello e Roberto Navarro,

    em nome de todos os que integram essa prestigiosa empresa. No poderia deixarde homenagear a minha famlia, que h tempos

    convive com os livros e aceita o tempo que eles furtam danossa convivncia, com um beijo especial para a minha esposa, Patrcia,

    que sempre participa da reviso crtica dos contedos.Gu e Leo, este tambm para vocs!

    Por fim, meu agradecimento sincero a voc, leitor,que sempre foi muito generoso comigo e,

    mais uma vez, concede-me a honra de estar ao seu lado.

  • Sumrio

    Captulo 1 Teoria Geral do Direito Internacional1. Noes introdutrias2. Conceito e alcance do direito internacional3. Caractersticas do direito internacional4. Fontes do direito internacional

    4.1 O costume internacional4.2 Princpios gerais do direito4.3 Jurisprudncia internacional4.4 Doutrina4.5 Decises unilaterais4.6 Soft law

    Captulo 2 Direito dos Tratados1. Noes introdutrias2. Terminologia dos acordos internacionais

    2.1 Gentlemens agreement2.2 Modus vivendi2.3 Acordo executivo

    3. Classificao dos tratados3.1 Quanto ao nmero de partes3.2 Quanto matria3.3 Quanto aos efeitos jurdicos

    4. Outras denominaes4.1 Acordos de sede4.2 Concordata4.3 Clusulas especiais

    5. Personalidade jurdica

  • 6. Representatividade dos Estados7. O papel das delegaes8. Modalidades de negociao

    8.1 Negociao bilateral8.2 Negociao coletiva

    9. Estrutura dos tratados10. Manifestao do consentimento11. Reservas12. Vcios do consentimento13. Vigncia dos tratados14. Publicidade dos tratados15. Correo ao texto do tratado16. Efeitos dos tratados sobre terceiros17. Alterao dos tratados18. Interpretao dos dispositivos19. Suspenso, denncia e extino dos tratados20. Antinomia entre tratados21. Norma imperativa de direito internacional geral (jus cogens)22. Tratados e a teoria da impreviso23. Recepo dos tratados no Brasil24. Roteiro legislativo25. Direito internacional x direito interno26. Hierarquia das normas internacionais27. Tratados em matria tributria28. Tratados sobre direitos humanos29. Conveno de Viena sobre Direito dos Tratados (1969)30. Conveno de Viena sobre o Direito dos Tratados entre Estados

    e Organizaes Internacionais ou entre OrganizaesInternacionais (1986)

    Captulo 3 Sujeitos do Direito Internacional

  • 1. Personalidade jurdica2. O Estado

    2.1 Territrio2.1.1 A poro terrestre2.1.2 Mar territorial e outros conceitos2.1.3 Direito de acesso ao mar e liberdade

    de navegao2.1.4 Jurisdio a bordo de navios e

    embarcaes2.1.5 Breves reflexes sobre o conceito de

    espao areo2.1.6 Territrios neutros2.1.7 Expanso territorial

    2.2 O elemento humano2.2.1 Nacionalidade brasileira

    3. Tratamento jurdico dos estrangeiros3.1 Direitos e deveres do estrangeiro3.2 Utilizao de identidade para viajantes do

    MERCOSUL e pases associados3.3 Retirada compulsria do estrangeiro do territrio

    nacional3.3.1 Deportao3.3.2 Expulso3.3.3 Extradio

    3.4 Asilo poltico4. Soberania

    4.1 Reconhecimento de Estado4.2 Reconhecimento de governo4.3 A diviso poltica dos Estados4.4 A questo dos microestados4.5 A Santa S e o Vaticano

  • 4.6 Territrios administrados4.7 Sucesso entre Estados

    5. Direito diplomtico5.1 Apresentao do tema5.2 Imunidades diplomticas5.3 Imunidades consulares5.4 Imunidade de jurisdio e imunidade de execuo

    Captulo 4 Organizaes Internacionais1. Noes introdutrias2. Estrutura e funcionamento3. Organizao das Naes Unidas (ONU)

    3.1 Assembleia Geral3.2 Conselho de Segurana3.3 Conselho Econmico e Social3.4 Conselho de Tutela3.5 Secretariado

    4. A Organizao Mundial do Comrcio (OMC)4.1 Caractersticas4.2 Mecanismo de soluo de controvrsias

    5. A Conferncia das Naes Unidas sobre Comrcio eDesenvolvimento (UNCTAD)

    6. A Comisso das Naes Unidas para o Direito ComercialInternacional (UNCITRAL)

    7. Fundo Monetrio Internacional (FMI)8. Banco Mundial

    Captulo 5 Responsabilidade Internacional e Soluo de Controvrsias1. Noes introdutrias2. Atos passveis de responsabilizao3. A questo do dano e do nexo causal4. Dever de reparao

  • 5. Proteo diplomtica6. Soluo pacfica de conflitos

    6.1 Instrumentos de soluo no jurisdicional6.2 Instrumentos de soluo jurisdicional

    6.2.1 Arbitragem6.2.2 Tribunais internacionais6.2.3 A Corte Internacional de Justia (CIJ)6.2.4 Tribunal Penal Internacional (TPI)6.2.5 Tribunais penais ad hoc6.2.6 Litgios entre indivduos e Estados

    7. Uso da fora pelos Estados7.1 Retorso7.2 Represlia7.3 Legtima defesa7.4 A Guerra e suas consequncias jurdicas7.5 Conveno da Cruz Vermelha Internacional

    Captulo 6 Direito de Integrao1. Noes introdutrias2. Estgios de integrao econmica

    2.1 Zona de preferncia tarifria2.2 Zona de livre-comrcio2.3 Unio aduaneira2.4 Mercado comum2.5 Unio econmica2.6 Unio poltica

    3. Unio Europeia3.1 Breves anotaes histricas3.2 Estrutura e funcionamento

    3.2.1 O Parlamento Europeu

  • 3.2.2 O Conselho Europeu3.2.3 O Conselho3.2.4 A Comisso Europeia3.2.5 O Sistema do Tribunal de Justia3.2.6 O Banco Central Europeu3.2.7 O Tribunal de Contas

    3.3 A criao do euro4. Integrao na Amrica Latina

    4.1 A Associao Latino-Americana de Integrao4.2 Acordo de Livre-Comrcio da Amrica do Norte

    (NAFTA)4.3 Comunidade Andina (CAN)4.4 Unio das Naes Sul-Americanas (UNASUL)4.5 MERCOSUL

    4.5.1 Breves antecedentes histricos4.5.2 Tratados e protocolos adicionais4.5.3 A questo da Venezuela4.5.4 Objetivos do MERCOSUL4.5.5 A estrutura institucional do

    MERCOSUL4.5.6 Personalidade e fontes jurdicas do

    MERCOSUL4.5.7 O mecanismo de soluo de

    controvrsias4.5.8 O Protocolo de Olivos

    Captulo 7 Diviso Temtica do Direito Internacional1. Noes introdutrias2. Proteo internacional dos direitos humanos3. Tutela internacional ao meio ambiente4. Direito internacional do trabalho

  • Referncias

  • Captulo 1

    Teoria Geral do Direito Internacional

    1. Noes introdutrias

    O direito internacional tem como premissa bsica a soberania dosEstados, o que implica maior dificuldade na aplicao das regras jurdicas.

    Ao contrrio do que ocorre no ordenamento interno dos pases, nos quaisos indivduos esto subordinados a regras constitucionais e ao poder de jurisdiodo Estado, na ordem internacional no h fora superior, capaz de determinarcondutas.

    Podemos dizer que os Estados soberanos se encontram no mesmo nvelhierrquico e que as relaes entre eles se manifestam mediante coordenao,oriunda de acordos de vontade.

    No existe um poder supranacional dotado de poder para definir regrasou aplicar sanes sem a concordncia dos envolvidos. Essa caracterstica dodireito internacional tem sido, ao longo dos anos, objeto de diversas crticas, nosentido de que a ausncia de normas abrangentes e coercitivas poderia invalidarou at mesmo tornar desnecessrio o estudo da matria.

    O grande desafio do direito internacional diz respeito eficcia dasregras jurdicas.

    Os Estados soberanos submetem-se apenas s obrigaes que tiveremassumido, dentro de parmetros que considerem razoveis.

    A ausncia de uma fora externa e superior exige que o direitointernacional tenha algum elemento de vinculao entre as partes, capaz deatribuir obrigaes e conferir direitos recprocos.

    O princpio que garante a coerncia do tecido normativo internacional conhecido como pacta sunt servanda, que pode ser traduzido como o que foipactuado deve ser obedecido.

    Tambm denominado fora obrigatria, o pacta sunt servanda estdiretamente relacionado boa-f, mediante a qual uma parte se compromete acumprir as regras que aceitou, ante a expectativa de que a outra parte proceda da

  • mesma forma.

    O vnculo formado entre os Estados normalmente se consolida com acelebrao de um tratado, documento que representa o acordo de vontadessoberanas destinado a estabelecer normas recprocas e obrigatrias para ossignatrios.

    Existe, ainda, a possibilidade de comprometimento mediante a aceitaode costumes, prticas reiteradas e dotadas de validade jurdica, que possuemgrande relevncia, em razo do baixo nvel de codificao do direitointernacional.

    2. Conceito e alcance do direito internacional

    A existncia de uma sociedade formada por diversos atores emcondies de igualdade soberana reclama a presena de normas capazes deestabelecer critrios de convivncia pacfica entre as partes.

    O direito internacional pode, portanto, ser definido como o conjunto deprincpios e regras jurdicas, escritas e no escritas, destinado a regular asrelaes entre Estados soberanos e organismos internacionais.

    O chamado direito internacional pblico ou direito das gentes (jusgentium) baseia-se na ideia de consentimento, pela qual os Estados apenas seobrigam quanto a regras que livremente aderiram ou, ainda, na hiptese de t-lasproduzido em conjunto com outras vontades soberanas.

    Essa caracterstica essencial do direito internacional tem como suportedois princpios fundamentais para a compreenso da matria e suasparticularidades, ambos expressamente consagrados pela Constituio Brasileira:

    a) soberania (art. 1, I);

    b) autodeterminao dos povos (art. 4, III).

    A soberania representa o poder supremo das sociedades polticas, no quetange organizao interna do Estado e possibilidade de conformar a vontadedos indivduos a ele subordinados. Relaciona-se, portanto, com a ideia dejurisdio, ou seja, o conjunto de competncias e atribuies exercidas peloEstado no seu territrio.

    No mbito internacional, a soberania implica a existncia de poderesequivalentes entre os Estados, independentemente de seu tamanho, capacidadeeconmica ou fora poltica. Os poderes so mutuamente limitados e no

  • encontram ordem superior que os condicione.

    O princpio da autodeterminao dos povos garante que as comunidadesnacionais podem dispor livremente acerca dos assuntos de seu interesse (comoescolher a forma de governo, por exemplo), sem se submeter vontade de outroEstado.

    Como o direito internacional bastante amplo e abrangente, existe outrosistema jurdico dedicado a regular as relaes entre particulares, pessoas fsicasou jurdicas, decorrentes de contratos e outras obrigaes de natureza civil.Cuida-se, nesse caso, do Direito Internacional Privado, que se caracterizajustamente pela ausncia de participao estatal.

    3. Caractersticas do direito internacional

    Embora o direito deva ser entendido como um sistema uno e coerente,as relaes internacionais possuem algumas peculiaridades que as distinguem dasregras tpicas do direito interno dos pases.

    Os principais traos caractersticos do direito internacional so:

    a) inexistncia de rgos centrais no DIP no h um poder legislativo apto acriar regras supranacionais e aplicveis a todos os Estados. Tambm noexistem tribunais com jurisdio absoluta e obrigatria;

    b) baixo nvel de codificao existem menos tratados do que leis internas, e odireito internacional possui normas abertas interpretao, como oscostumes, que precisam ser reconhecidas pelos Estados;

    c) escassez de sujeitos apenas os estados soberanos e as organizaesinternacionais possuem personalidade jurdica de direito internacionalpblico;

    d) responsabilidade coletiva quando necessrio, as sanes devem ser aplicadasde modo coletivo (como no caso das Resolues do Conselho deSegurana das Naes Unidas);

    e) boa-f premissa maior do sistema, manifestada pelo princpio do pacta suntservanda e pela transparncia nas relaes entre as partes;

    f) igualdade soberana os Estados se encontram no mesmo nvel e assumemcompromissos na ordem internacional mediante consentimento;

    g ) proteo aos direitos humanos embora regule relaes entre Estados e/ouorganizaes internacionais, a finalidade derradeira do direito

  • internacional promover a tutela dos direitos fundamentais dosindivduos.

    4. Fontes do direito internacional

    Os instrumentos aptos a criar normas jurdicas no direito internacionalesto previstos no artigo 38 do Estatuto da Corte Internacional de Justia:

    a) as convenes internacionais, gerais ou particulares, que estabelecem regrasexpressamente reconhecidas pelos Estados litigantes;

    b) o costume internacional, como prova de uma prtica geralmente aceita comodireito;

    c) os princpios gerais do direito reconhecidos pelas naes civilizadas;

    d) a doutrina e a jurisprudncia, como meios auxiliares de interpretao.

    O dispositivo prev, ainda, que a Corte Internacional de Justia, aodecidir sobre casos concretos, poder aplicar a clusula ex aequo et bono(princpio da equidade) desde que as partes assim concordem.

    4.1 O costume internacional

    Ao contrrio do que ocorre no direito brasileiro, cuja legislao abordapraticamente todos os assuntos de interesse da coletividade, o costume, na esferainternacional, possui grande relevncia, justamente em funo do baixo ndice decodificao.

    Os costumes so fontes importantssimas para o direito internacionalpblico e se manifestam como as prticas aceitas pelos Estados como normasaplicveis, durante um perodo razovel de tempo (noo de estabilidade).

    Convm destacar que no existe hierarquia entre costumes e tratados, desorte que um eventual conflito entre ambos deve ser resolvido a partir da anlisehermenutica, sendo teoricamente possvel que um prevalea sobre o outro.

    Embora o costume reflita condutas consagradas ao longo do tempo, essacaracterstica, isoladamente, no suficiente para a sua confirmao.

    Podemos dizer que o costume, juridicamente vlido, possui doiselementos fundamentais:

    a) objetivo ou material a percepo da prtica como habitual e reiterada,porque vigente durante certo perodo de tempo (anos, dcadas ou

  • sculos);

    b) subjetivo decorre da aceitao pelos Estados (opinio juris), que oconvencimento acerca da conduta, sem resistncia. A opinio jurisimplica o reconhecimento de que o costume jurdico e necessrio.

    Alguns autores tambm analisam os costumes a partir do alcancegeogrfico (elemento espacial), dividindo-os em regionais e universais. Emboratal classificao seja possvel, pensamos tratar-se de uma consequncia e no deelemento constitutivo do costume.

    Excepcionalmente, considera-se que os costumes possam surgir demodo repentino, sem a necessria estabilidade conferida pelo fator tempo(denominados costumes selvagens). Como exemplo, poderamos citar o caso dotoque de recolher em tempos de guerra, que seria uma prtica juridicamentevlida em situaes de emergncia e, portanto, obrigatria.

    4.2 Princpios gerais do direito

    Os princpios gerais do direito so as regras fundamentais normalmenteaceitas e respeitadas pelos estados soberanos.

    Podem ser expressamente veiculados pelas leis ou se manifestar pormeio de prticas costumeiras.

    No Brasil, os princpios fundamentais relativos ordem internacionalesto presentes no artigo 4 da Carta Poltica:

    a) independncia nacional;

    b) prevalncia dos direitos humanos;

    c) autodeterminao dos povos;

    d) no interveno;

    e) igualdade entre os Estados;

    f) defesa da paz;

    g) soluo pacfica dos conflitos;

    h) repdio ao terrorismo e ao racismo;

    i) cooperao entre os povos para o progresso da humanidade;

    j) concesso de asilo poltico.

    O constituinte tambm determinou que o Brasil deve empreender

  • esforos para a integrao econmica, poltica, social e cultural dos povos daAmrica Latina, visando formao de uma comunidade latino-americana denaes. O primeiro passo, nesse sentido, foi dado com a criao do MERCOSUL,bloco regional formado por Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai.

    4.3 Jurisprudncia internacional

    A jurisprudncia internacional representa o conjunto de decisesproferidas acerca de controvrsias entre Estados e/ou organizaes internacionaise serve como ponto de referncia para a interpretao de novos casos concretos.

    Os tribunais desempenham importante papel na construo doentendimento e da interpretao das normas internacionais, especialmente apartir do sculo XX, quando a jurisprudncia ganhou fora e consistncia com acriao do primeiro tribunal em Haia.

    4.4 Doutrina

    A doutrina revela a produo acadmica dos autores voltados ao direitointernacional e confere suporte terico s decises dos tribunais.

    Os juzes utilizam como fundamento para suas decises os argumentos eteses defendidos pelos especialistas. Assim, a doutrina pode ser consideradacomo meio auxiliar para a construo de normas concretas e a interpretao dodireito codificado.

    4.5 Decises unilaterais

    Apesar de no expressamente mencionados pelo artigo 38 do Estatuto daCorte Internacional de Justia, os atos unilaterais dos Estados e as decises dosorganismos internacionais possuem inegvel natureza jurdica, e tero efeitosquando compatveis com o sistema de regras do direito internacional.

    As decises juridicamente vlidas devem ser:

    a) oriundas de sujeito competente (Estado ou organismo internacional);

    b) manifestaes de vontade dentro do mbito de competncia do sujeito;

    c) comunicadas ou publicadas de forma adequada.

    Os Estados manifestam unilateralmente sua vontade por meio de atosinequvocos, como protestos, notificaes ou denncia a tratados, enquanto asorganizaes internacionais normalmente produzem recomendaes, resolues

  • ou pareceres consultivos.

    O princpio da boa-f tambm justifica a figura do estoppel, assimentendida a ideia de que um Estado se obriga por seus atos, ou seja, no podealegar ou negar um direito em prejuzo de condutas ou manifestaes anteriores.

    Embora seja ambguo e de difcil aplicao prtica, o compromissoterico representado pelo estoppel tem o objetivo de preservar as relaesestatais, conferindo-lhes certa previsibilidade ao longo do tempo.

    4.6 Soft law

    Soft law o conjunto de disposies genricas destinadas a criar regrasde conduta desejveis e no propriamente obrigaes jurdicas.

    Trata-se do contedo no exigvel disposto em tratados, representado porconceitos ainda no vinculantes como guidelines (princpios) ou prticasrecomendadas; no possui, portanto, regras sancionatrias ou mecanismos decoercibilidade.

    As prticas facultativas previstas pelo soft law constam de instrumentosflexveis que podero, no futuro, se tornar normas jurdicas concretas,obrigatrias para as partes (hard law), da porque a doutrina denomin-lo comoum direito em gestao.

    Exemplo de soft law seria a disposio em um tratado sobre transporteareo que recomendasse o uso de aparelhos de scanner para a verificao debagagens dos passageiros. Na medida em que a maioria dos pases passasse autilizar os equipamentos, o tratado poderia, de comum acordo, ser alterado nosentido de conferir obrigatoriedade ao procedimento para todos os signatrios.

  • Captulo 2

    Direito dos Tratados

    1. Noes introdutrias

    Os tratados so acordos internacionais escritos e concludos, firmadospor pessoas dotadas de personalidade jurdica internacional (Estados eOrganizaes) e compostos de um ou mais instrumentos, independentemente desua denominao especfica.

    O principal instrumento para a criao e a interpretao dos tratados aConveno de Viena sobre Direito dos Tratados (1969), ratificada pelo CongressoNacional por meio do Decreto Legislativo n. 496/2009 e promulgada peloDecreto n. 7.030/2009.

    A Conveno de Viena declara que o nome do instrumento utilizado irrelevante para sua qualificao jurdica, de sorte que os tratados representam avontade soberana dos signatrios qualquer que seja a designao adotada.

    Nesse sentido, as expresses acordo, tratado, conveno, protocolo ecompromisso, entre tantas outras, devem ser consideradas como equivalentes equalquer distino entre elas tem apenas funo didtica ou acadmica.

    Entretanto, existem alguns tipos de acordo no direito internacional quepossuem caractersticas peculiares, razo pela qual apresentaremos a seguir umarelao baseada na doutrina majoritria e na jurisprudncia dos tribunaisbrasileiros.

    2. Terminologia dos acordos internacionais

    Em primeiro lugar, ressaltamos que no direito internacional existemacordos celebrados entre pessoas competentes que, muito embora estabeleamalgum tipo de compromisso, no podem ser considerados como tratados.

    2.1 Gentlemens agreement

    Os chamados acordos de cavalheiros no possuem natureza de

  • tratados. So, na verdade, manifestaes de cunho poltico, por meio das quaisChefes de Estado ou plenipotencirios assumem compromissos morais perante acoletividade, sem a fora vinculante e coercitiva dos acordos internacionais.

    O exemplo clssico de gentlemens agreement a Carta do Atlntico,assinada pelo Presidente norte-americano Franklin Roosevelt e pelo primeiro-ministro britnico Winston Churchill a bordo do navio USS Augusta, em 1941.

    Embora desprovida de fora jurdica, a histria demonstra que asintenes manifestadas na Carta do Atlntico tiveram profunda influncia noseventos subsequentes, como a Conferncia de Bretton Woods (1944),especialmente a partir da aceitao de seus princpios por outros pases, alm deEstados Unidos e Inglaterra.

    2.2 Modus vivendi

    So acordos temporrios, destinados a regular certas situaesemergenciais ou, ainda, compromissos preparatrios para outros tratados, muitasvezes no intuito de evitar conflitos.

    O conceito de modus vivendi ultrapassa as fronteiras do direito enormalmente empregado quando arranjos temporrios so celebrados nointuito de possibilitar a convivncia pacfica entre grupos antagnicos ou restauraro equilbrio alterado por situaes de confronto.

    Um exemplo de modus vivendi seria a declarao bilateral de cessarfogo, por meio da qual dois pases em guerra proporiam um pacto provisrio deno agresso, como preldio para um posterior acordo de paz.

    2.3 Acordo executivo

    Os acordos executivos so figuras utilizadas nos Estados Unidos, em queo Presidente recebe autorizao especial para concluir o tratado sem anecessidade de manifestao e concordncia do Senado.

    No Brasil, por expressa determinao constitucional, os acordosexecutivos no podem prescindir da participao do legislativo.

    Existem, entretanto, algumas condutas praticadas pelo poder executivobrasileiro, de carter regulamentar, que poderiam ser consideradas comovariantes do modelo, respeitados os limites constitucionais, tais como:

    a) acordos para a interpretao de clusulas de tratados em vigor;

  • b) acordos complementares, de natureza procedimental e sem impactoeconmico;

    c ) acordos de ndole diplomtica, como o modus vivendi, que normalmenteservem como atos preparatrios para futuros tratados.

    3. Classificao dos tratados

    Os tratados podem ser classificados em razo de diversos atributos,como o nmero de partes, a matria veiculada ou os efeitos jurdicospretendidos.

    Apresentamos, a seguir, as modalidades mais importantes.

    3.1 Quanto ao nmero de partes

    Os tratados podem ser bilaterais, quando compreendem a manifestaode vontade de apenas dois pases e/ou organizaes internacionais, oumultilaterais, em que diversos Estados assumem reciprocamente oscompromissos firmados pelo instrumento.

    No mbito do direito do comrcio internacional, especialmente entre osmembros de entidades (como a Organizao Mundial do Comrcio), existe umaimportante distino entre tratados plurilaterais e multilaterais. Os primeirosseriam obrigatrios apenas para os signatrios, enquanto os tratados multilateraisalcanariam todos os integrantes da organizao, sem possibilidade de recusa aosseus efeitos jurdicos.

    O objetivo da diferena reside na tentativa de que os grandes acordoscomerciais, com relevante impacto para os pases e suas economias, sejamnegociados mediante consenso e, uma vez aprovados, se tornemautomaticamente vinculantes e aplicveis para todos os envolvidos.

    J os tratados plurilaterais cuidariam de assuntos de menor relevncia eseriam empregados mediante adeso aos termos fixados, em carter facultativo,de forma que determinado Estado pudesse integrar a organizao sem, noentanto, assumir os compromissos nele firmados.

    3.2 Quanto matria

    A grande distino em relao matria veiculada pelos tratadosdecorre da novidade promovida pela Emenda Constitucional n. 45/2004, que

  • alterou a forma de ingresso no ordenamento ptrio dos acordos que disponhamsobre direitos humanos.

    Assim, tratados que consagrem direitos humanos ainda no previstospelo Brasil podem ser trazidos para o altiplano da Constituio, desde queaprovados mediante maioria qualificada de 3/5 dos membros do CongressoNacional, idntico ao previsto para as emendas constitucionais.

    Os demais tratados ingressam no direito brasileiro, luz do entendimentoclssico do Supremo Tribunal Federal, como equivalentes s leis ordinrias,exceto na hiptese de acordos relativos matria tributria, que, em respeito aodisposto no artigo 98 do Cdigo Tributrio Nacional, prevalecem sobre as normasinternas.

    3.3 Quanto aos efeitos jurdicos

    O Supremo Tribunal Federal j adotou a distino entre tratados-normae tratados-contrato, embora a doutrina seja quase unnime em afirmar que aclassificao encontra-se obsoleta.

    Conforme a viso esposada pelo STF, os tratados-norma seriam aquelesaptos a criar regras jurdicas, em geral comuns s partes, sem contraprestaoespecfica pelos Estados, enquanto os tratados-contrato representariam acordoscom benefcios recprocos, de cunho comercial, econmico ou financeiro.

    4. Outras denominaes

    Alguns tipos de tratados possuem caractersticas especiais, embora nosejam, em termos formais, diferentes das demais figuras. No mesmo sentido,alguns acordos possuem clusulas especficas, em razo do alcance docompromisso firmado entre as partes.

    Apresentamos, a seguir, os principais conceitos sobre o tema, conformeapontados pela doutrina.

    4.1 Acordos de sede

    So tratados bilaterais em que uma das partes uma organizaointernacional e a outra, um Estado soberano.

    Tm por objetivo estabelecer as regras jurdicas relativas instalaofsica de uma organizao no territrio do Estado cedente (a exemplo do

  • MERCOSUL, que possui sede na cidade de Montevidu, no Uruguai), mediantedeciso comum entre as partes.

    4.2 Concordata

    a denominao conferida aos tratados de natureza religiosa,celebrados entre a Santa S (rgo mximo da Igreja Catlica) e os Estados,cujos temas incluem a organizao da atividade, a estrutura eclesistica e asrelaes de representao entre as partes.

    4.3 Clusulas especiais

    Algumas clusulas estabelecem condies especficas ou mecanismosespeciais de interpretao e soluo de conflitos nos tratados internacionais, taiscomo:

    a) Clusula federal determina que todas as unidades componentes de umafederao se obrigam quando o Estado celebra acordos com outrossujeitos do direito internacional. No Brasil, a clusula desnecessriadevido unidade institucional da Repblica, prevista no artigo 1 daConstituio (unio indissolvel dos entes polticos).

    b) Si omnes previso surgida nos tratados de paz, por meio da qual um Estado sse obrigaria a determinadas regras se todos os outros assumissem omesmo nvel de compromisso. Modernamente, a clusula estabeleceobrigaes apenas entre as partes (nesse sentido, seria o contrrio daclusula erga omnes aplicvel contra todos).

    c) Clusula colonial disposio contida nos antigos tratados firmados pelospases europeus, que fixava a no aplicao dos termos s colnias outerritrios de ultramar, especialmente sobre temas ligados a direitoshumanos, sociais e econmicos.

    d) Compromisso arbitral a clusula mediante a qual Estados em divergnciasubmetem a matria do tratado ao procedimento de arbitragem.

    5. Personalidade jurdica

    Somente Estados soberanos e organizaes internacionais possuemcompetncia para a celebrao de tratados. Excepcionalmente, reconhece-se apossibilidade de a Santa S firmar concordatas com os demais sujeitos de direito

  • internacional pblico.

    Ressalte-se que as Organizaes No Governamentais (ONGs),empresas e indivduos no possuem personalidade jurdica de direitointernacional, razo pela qual no podem participar de tratados.

    6. Representatividade dos Estados

    Os Chefes de Estado e de Governo possuem a chamada competnciaoriginria para a concluso de tratados, em razo dos poderes conferidos pelasrespectivas constituies, conforme adotem o regime presidencialista ouparlamentarista.

    Na prtica, o Presidente sempre tem competncia para a celebrao detratados, embora no modelo parlamentarista essa atividade normalmente sejadesempenhada pelo primeiro-ministro, responsvel pelos atos de governo.

    A chamada capacidade representativa do Estado tambm alcana, nostermos do artigo 7 da Conveno de Viena, o ministro de relaes exteriores,tambm conhecido como chanceler, qualquer que seja o regime de governo.

    Os titulares dos cargos supracitados no precisam apresentar credenciaisou quaisquer documentos para assinar tratados. Tambm esto dispensados dacomprovao de plenos poderes os chefes de misses diplomticas(embaixadores), mas apenas em relao a tratados bilaterais firmados entre oEstado acreditante (local onde exercem suas atividades) e o Estado acreditado.

    Todas as outras autoridades de governo (como ministros das maisdiversas pastas) precisam apresentar uma carta de plenos poderes a fim derepresentar os respectivos Estados nas discusses ou concluso de um tratado.Nesse caso, exercero a chamada competncia derivada, na qualidade deplenipotencirios (figura semelhante ao mandatrio do direito civil).

    Esto dispensados da apresentao da carta de plenos poderes osrepresentantes oficiais das organizaes internacionais, em relao aos atospraticados dentro da sua esfera de competncia.

    As regras de direito internacional tambm aceitam que esto investidosde poderes todos aqueles cujo costume indique que possam ser consideradoscomo representantes, restando dispensada a comprovao (teoria da aparncia).

    Caso no existam fundamentos jurdicos para a representao, o atopraticado pelo agente incompetente ser considerado nulo, salvo seposteriormente confirmado pelo Estado interessado.

  • 7. O papel das delegaes

    Durante a fase de negociaes, em que so discutidos os aspectostcnicos e a redao jurdica dos acordos, a representao dos Estados fica acargo dos funcionrios diplomticos e dos demais servidores especializados noassunto em debate.

    Os representantes de cada Estado, devidamente habilitados, compem asrespectivas delegaes, que normalmente participam das confernciasinternacionais.

    O chefe da delegao possui plenos poderes, conforme outorgaespecfica, sendo que os demais atuam na qualidade de consultores, assessores ousuplentes. O titular no precisa ser um funcionrio de carreira, contanto que adelegao tenha, ao menos, um representante do corpo diplomtico.

    8. Modalidades de negociao

    Conforme o nmero de partes envolvidas e os objetivos do tratado,podemos ter diferentes formas de negociao.

    8.1 Negociao bilateral

    Quando a negociao de um tratado se d apenas entre dois Estados normal que as reunies ocorram no territrio de um deles, geralmente emreunies alternadas. Igual raciocnio se aplica negociao entre organismosinternacionais, sendo que, neste caso, as reunies sero no local das respectivassedes.

    possvel, ainda, que dois Estados discutam tratados mesmo que nomantenham relaes diplomticas regulares, desde que enviem misses ad hocpara a negociao.

    Em relao ao idioma utilizado para os trabalhos, normalmente seemprega o ingls ou o francs, salvo se as duas partes possurem uma lnguacomum.

    O documento final poder ser escrito em uma ou mais verses, todasautnticas e de igual valor, desde que devidamente assinadas pelosrepresentantes.

    A assinatura no gera, de imediato, obrigaes jurdicas, mas conferevalidade e autenticidade aos textos elaborados, de sorte que as partes devero

  • empreender esforos posteriores para a confirmao do acordo, nos termos decada ordenamento interno.

    8.2 Negociao coletiva

    Os tratados decorrentes de negociao coletiva so discutidos duranteconferncias internacionais, geralmente com a presena de todos os interessados.

    O costume internacional reza que as conferncias sero realizadas noterritrio de um dos interessados, que ser responsvel pela recepo dasdelegaes. Em contrapartida, os acordos concludos em geral recebem o nomeda cidade ou do pas em que se realizou a reunio, como forma de homenagem hospitalidade recebida (por fora disso existem diversas Convenes de Viena,de Genebra e assim por diante).

    Caso o texto no seja finalizado numa conferncia, outras reunies seroagendadas, em pases diferentes, at que se alcance um resultado satisfatrio.

    comum que as negociaes de tratados se estendam por anos, emrazo da necessria busca por consenso. Somente em situaes excepcionais asdecises podero ser tomadas por voto, ainda assim com elevado ndice deaprovao (mnimo de 2/3 dos presentes, nos termos da Conveno de Viena,salvo se as partes, mediante a mesma maioria, decidirem adotar regra distinta).

    As negociaes multilaterais que seguem o padro das Naes Unidasso conduzidas, durante as conferncias, nos cinco idiomas oficiais da entidade:ingls, francs, chins, espanhol e russo, com traduo simultnea recproca. Emalgumas ocasies utiliza-se tambm o rabe.

    Os textos elaborados nos cinco idiomas da ONU so consideradosautnticos e suas tradues para as demais lnguas so chamadas de oficiais,como acontece no caso do portugus.

    A autenticao se d pelo processo previsto no prprio acordo ou, naausncia de disposio expressa, pela assinatura dos representantes dos Estadosou organizaes.

    A escolha do idioma tambm pode decorrer de tratados mais amplos eaplicveis ao caso concreto, como ocorre no mbito do MERCOSUL, no qualtodos os trabalhos e textos autnticos so realizados em portugus e espanhol.

    9. Estrutura dos tratados

  • Os tratados normalmente possuem trs partes:

    a) Prembulo a introduo ao tratado, na qual so enumerados osparticipantes e apresentados os motivos, os objetivos e as circunstnciasque ensejaram o acordo, sem fora vinculante (embora possa serutilizado como fonte para interpretao em caso de dvida).

    b) Dispositivo parte principal do tratado que encerra as normas jurdicas,escritas em linguagem tcnica e formatada em artigos ou clusulas, comas obrigaes assumidas pelas partes.

    c) Anexos indicam as informaes de carter tcnico do acordo, comoprocedimentos, especificaes, tabelas etc., que devem ser obedecidaspelos signatrios. Normalmente os anexos so alterados na medida emque a tecnologia e os recursos se modernizam, ao contrrio da partedispositiva, que prima pela estabilidade.

    10. Manifestao do consentimento

    A manifestao do consentimento sobre o texto final do tratado constituio ato mais importante do direito internacional.

    O consentimento pode ocorrer por meio de assinatura, troca dosinstrumentos constitutivos do tratado, ratificao, aceitao, aprovao ouadeso, ou, ainda, por quaisquer outros meios decididos pelas partes.

    A assinatura do texto pelo representante competente tem o condo deproduzir os efeitos jurdicos desejados, alm de conferir validade e autenticidadeao tratado.

    Trata-se de ato de Estado, mediante o qual fica atestada a concordnciadefinitiva com o contedo pactuado e os exatos limites desse comprometimento.

    O consentimento pode tambm se manifestar a partir da troca dosrespectivos instrumentos constitutivos, quando assim dispuser o acordo.

    Conforme o sistema constitucional de cada Estado (ou a vontademanifesta no texto), o consentimento pode se sujeitar a posterior ratificao paraadquirir eficcia jurdica.

    Entende-se que o consentimento, embora sujeito ao procedimento deintroduo no sistema jurdico de cada pas, tem carter irretratvel, mesmoantes entrada em vigor do compromisso, em razo do princpio pacta suntservanda.

  • No Brasil, a ratificao cabe ao Presidente da Repblica, por fora doartigo 84 da Constituio, pois a competncia para a assinatura do documentoimplica o direito de confirm-lo, sem prejuzo da aprovao do texto peloCongresso Nacional (art. 49, I, CF).

    A ratificao ato de governo, formal, unilateral e de alcanceinternacional, em que o pas exprime definitivamente a vontade de obrigar-se(consentimento).

    A deciso poltica de ratificar o tratado possui natureza discricionria,pois no h prazo mximo (ou qualquer tipo de sano) para a manifestaodefinitiva, que pode, inclusive, no ocorrer (lembramos que a Conveno deViena ficou 17 anos em trmite no Congresso Nacional, at ser finalmenteaprovada, em 2009).

    Nada impede que o acordo estabelea critrios especficos deratificao, como prazo certo ou nmero mnimo de adeses, especialmente nostratados multilaterais.

    Existem, portanto, trs situaes possveis para a ratificao:

    a) ausncia de prazo entre a assinatura e a ratificao, que fica a critrio de cadaEstado;

    b) previso, no prprio tratado, de prazo para ratificao;

    c) fixao de nmero mnimo de adeses, hiptese em que o tratado passa avaler quando atingido o qurum mnimo.

    A Conveno de Viena tambm prev como modalidades deconsentimento a aceitao ou aprovao (com caractersticas e efeitossemelhantes ratificao) e, ainda, a figura da adeso (quando um Estadomanifesta concordncia a texto previamente elaborado por terceiros).

    Os instrumentos de ratificao, aceitao, aprovao ou adeso devemser objeto de troca entre os Estados contratantes ou depositados no organismointernacional competente, na hiptese de tratados multilaterais (princpio dapublicidade).

    No intervalo entre a assinatura e a ratificao as partes assumem ocompromisso de no frustrar o objeto ou a finalidade do tratado, vale dizer, nodevem praticar quaisquer atos destinados a prejudicar o compromisso pactuado,sob pena de responsabilizao.

  • 11. Reservas

    As reservas so manifestaes unilaterais do Estado, no sentido de negara eficcia jurdica de determinados dispositivos do tratado.

    O interessado pode exercer o direito de reserva ao assinar, ratificar,aceitar, aprovar ou aderir a um tratado, desde que no exista vedao expressaem sentido contrrio (o acordo tambm pode limitar o alcance das reservas adeterminados comandos).

    As reservas podero ser objeto de aceitao ou objeo por parte dosoutros signatrios e quaisquer divergncias quanto sua validade jurdica seroresolvidas nos termos previstos pelo prprio acordo.

    Em regra, os tratados de adeso ou constituio de organismosinternacionais no aceitam reservas, em homenagem noo de igualdadesoberana que tais entidades buscam preservar.

    A reserva e as suas eventuais manifestaes de aceitao ou objeodevem ser comunicadas por escrito aos demais Estados, a fim de produzirem osefeitos desejados, especialmente quanto desincumbncia de obrigaes.

    Os Estados podem, a qualquer tempo, retirar as reservas formuladas,mediante notificao s partes ou ao organismo internacional que administra otratado.

    Como variante ao mecanismo das reservas encontramos, no direitointernacional, a figura das declaraes interpretativas, que so manifestaesunilaterais do Estado ou da organizao, nas quais o consentimento ao tratado ficacondicionado ao fato de que determinada parte do texto (artigo ou clusula) sejainterpretada de modo especfico e previamente determinado.

    12. Vcios do consentimento

    Os vcios do consentimento so os fatores de presso, coao ou errorelacionados manifestao soberana dos Estados.

    Tradicionalmente, o problema decorre de quatro cenrios hipotticos:

    a) Consentimento incompatvel com o direito interno do Estado ocorre quando orepresentante no se encontra constitucionalmente habilitado paraexprimir o consentimento.

    b) Erro hiptese rara, com alguns precedentes histricos, que s se aplica aoserros de fato (situao que o Estado imaginava existir ao tempo do

  • consentimento).

    c) Dolo, corrupo ou coao sobre o negociador quando circunstnciasfraudulentas ou juridicamente inadmissveis maculam, de modoinexorvel, a manifestao do consentimento pelo representante doEstado.

    d) Coao sobre o Estado de acordo com a Conveno de Viena, a coaotorna nulo o tratado, caso este decorra de ameaa ou emprego de fora.No se considera coao (e, portanto, so aceitos como vlidos) acelebrao de tratados de paz, embora normalmente ocorra aprevalncia do interesse do vencedor do conflito em detrimento doEstado derrotado.

    13. Vigncia dos tratados

    O termo vigncia costuma ser utilizado de forma ambgua, tanto pelolegislador como pela doutrina.

    A acepo mais comum aponta a vigncia como o momento de ingressoda norma no ordenamento (critrio temporal).

    Contudo, muitas vezes a palavra vigncia empregada no sentido deeficcia, embora sejam conceitos distintos. A eficcia implica a possibilidade dea norma produzir efeitos jurdicos, o que normalmente ocorre aps a sua entradaem vigor.

    A Conveno de Viena estabelece que o tratado entre em vigor naforma e na data nele previstas ou, na ausncia de disposio expressa, quandohouver a manifestao de consentimento de todos os Estados envolvidos.

    Existem, portanto, duas possibilidades para o incio da vigncia dostratados:

    a) vigncia contempornea ao consentimento (sem vacatio), com a troca denotas, como ocorre nos tratados bilaterais;

    b) vigncia diferida, a qual permite que o tratado e a ordem interna produzamefeitos simultaneamente (questo de eficcia), situao bastante comumnos acordos multilaterais, em que a vacatio decorre de prazo fixado noprprio instrumento (normalmente 30 dias) ou, ainda, de se atingir oqurum mnimo de ratificaes.

    Em regra, os tratados vigem por tempo indeterminado, salvo expressa

  • manifestao em contrrio, e sua entrada em vigor enseja diversas situaes, taiscomo:

    a) a adeso de novos membros aos seus termos (juridicamente, no h diferenaentre ratificao e adeso, mas apenas a constatao de que o Estadoaderente no participou da negociao original);

    b) possibilidade de alteraes no texto mediante emendas, revises ou reformas;

    c) o direito parte que se sentir prejudicada pelo descumprimento de qualquerobrigao de consider-lo extinto, mediante denncia ou suspenso dosefeitos, at que o litgio seja solucionado.

    Conquanto a Conveno de Viena preveja a possibilidade de aplicaoprovisria dos tratados (antes da ratificao), tal norma no aplicvel ao Brasil,que exerceu o direito de reserva em relao ao artigo 25, por consider-loincompatvel com a nossa Constituio.

    Da mesma forma que no direito interno, os tratados em geral respeitamo princpio da irretroatividade, no sentido de que no podem produzir efeitos antesda efetiva entrada em vigor.

    Em relao ao alcance geogrfico, os tratados vinculam todo o territriodo Estado signatrio, independentemente de sua diviso poltica interna (princpiodo pacto federativo).

    14. Publicidade dos tratados

    Todas as normas jurdicas exigem publicidade para a produo dosefeitos almejados, o que, obviamente, tambm se aplica aos tratados.

    A publicidade pode ocorrer mediante comunicao s demais partesinteressadas ou pelo depsito do instrumento no organismo internacionalcompetente.

    A notificao deve ser transmitida por escrito e ser efetivada quando dorecebimento pelas demais partes negociantes.

    O depsito normalmente utilizado nos tratados multilaterais, nos quaisuma organizao fica responsvel pelo recebimento dos instrumentos e pelaposterior comunicao s partes. O depositrio ser escolhido de comum acordopelos signatrios e nada impede que seja um dos Estados interessados, naausncia de uma organizao.

    Em regra, o depositrio fica encarregado de guardar os instrumentos,

  • preparar cpias autenticadas para envio aos Estados, acompanhar o recebimentodas assinaturas, informar todos os interessados acerca do andamento dosprocessos de ratificao, aceitao, aprovao ou adeso, e providenciar oregistro do tratado nas Naes Unidas, caso esta no tenha sido escolhida comodepositria.

    Isso porque a Carta de So Francisco, que criou as Naes Unidas, exigeque todos os tratados sejam registrados e publicados pela entidade, tarefa sobresponsabilidade do secretrio-geral.

    Os Estados no podero exercer direitos oriundos de tratados enquantono ocorrerem o depsito e o respectivo registro na ONU.

    Alm do modelo previsto pelas Naes Unidas, os tratados tambmpodero ser registrados em organizaes especficas ou regionais, como no casoda Organizao Internacional do Trabalho (OIT) ou do MERCOSUL.

    15. Correo ao texto do tratado

    Na hiptese de os Estados perceberem erro no texto do tratado aps asassinaturas, a correo ser realizada de comum acordo e convalidada a partirda manifestao de consentimento dos respectivos representantes ou, ainda, pormeio da troca de instrumentos.

    Caso o tratado tenha sido entregue a um depositrio, caber a ele anotificao s partes acerca do erro detectado, juntamente com a proposta decorreo. Se no houver objeo dos interessados, o prprio depositrio realizara alterao, com a substituio do texto defeituoso e posterior comunicao aossignatrios.

    16. Efeitos dos tratados sobre terceiros

    O princpio da soberania garante que nenhum Estado se submete aosefeitos de um tratado sem o seu consentimento.

    Igual raciocnio se aplica a terceiros, que s podero assumircompromissos ou usufruir de benefcios mediante expressa aceitao dos termosde um tratado do qual no faa parte.

    Quanto aos efeitos dos tratados em relao a terceiros, temos quatrosituaes:

    a) efeitos difusos aqueles que devem automaticamente ser reconhecidos por

  • terceiros, como na hiptese de dois pases que fixam seus limitesterritoriais;

    b) efeitos aparentes quando um Estado que no faz parte do acordo bilateral,por exemplo, pode pleitear direitos em funo de um tratado maisamplo, como no caso da clusula da nao mais favorecida (princpiofundamental do GATT, no mbito do comrcio internacional), quedetermina a extenso a terceiros de qualquer benefcio concedido a dadoEstado;

    c) direitos previstos no prprio tratado aqueles concedidos a um Estado que nofaz parte do acordo;

    d) obrigaes previstas no prprio tratado quando duas ou mais partes fixamdeveres para terceiros, que s estaro obrigados aps a efetiva aceitaodas condies.

    17. Alterao dos tratados

    O texto final de um tratado pode ser objeto de alteraes, por meio deemendas, cuja proposta compete a qualquer das partes. A maioria exigida para aaprovao de emendas costuma ser elevada, em regra superior a 2/3 dossignatrios, especialmente nos tratados multilaterais.

    A proposta de emenda nos tratados multilaterais deve ser formulada porum Estado e notificada aos demais, de forma que todos possam participar doprocesso de negociao e deciso acerca das alteraes.

    A Conveno de Viena permite que apenas alguns dos signatriosalterem os efeitos de um tratado mutuamente, desde que tal possibilidade constedo instrumento (ou no esteja expressamente vedada) e, por bvio, o resultado danegociao no prejudique qualquer direito das demais partes (trata-se deexemplo de acordo plurilateral, conforme vimos no item 3.1 do Captulo 2).

    Quando os Estados objetivam promover alteraes mais amplas eprofundas no texto aprovado, a doutrina costuma denominar o procedimento dereviso ou reforma.

    Seguindo a lgica de introduo dos tratados prevista na Constituio, asemendas ao acordo original, no Brasil, tambm devero ser aprovadas pordecreto legislativo, com a posterior promulgao do texto alterado mediantepublicao do decreto presidencial no Dirio Oficial da Unio, a fim de que asnovas regras possam produzir efeitos.

  • 18. Interpretao dos dispositivos

    Os tratados podem ser interpretados luz das regras internacionais ouconforme o direito interno de cada Estado.

    O processo de interpretao deve sempre se pautar pelo princpio daboa-f e tomar como referncia os objetivos ou as finalidades do acordo.

    A anlise deve ser empreendida de forma contextual, ou seja, levandoem considerao todos os compromissos, instrumentos ou prticas relacionadoscom o tratado, especialmente aqueles adotados pelos pases aps a assinatura.

    A Conveno de Viena permite a utilizao de meios suplementares deinterpretao, como os trabalhos preparatrios e as circunstncias de conclusodo acordo, para ajudar a estabelecer o sentido de conceitos ambguos, obscurosou vagos.

    Na hiptese de tratados celebrados em mais de um idioma autntico,presume-se que os termos sejam equivalentes e que as concluses possam seradotadas a partir de qualquer dos textos, salvo se ficar estipulado que ainterpretao ocorra em idioma diverso dos originais.

    De acordo com a fonte, a interpretao pode ser autntica (quandooriginria das partes) ou jurisdicional (quando exarada por organismosinternacionais).

    No Brasil, a interpretao normalmente ocorre na esfera do poderjudicirio federal e a manifestao derradeira, quando necessrio, compete aoSupremo Tribunal Federal, a quem cabe processar e julgar, originariamente, aextradio solicitada por Estado estrangeiro (art. 102, I, g, da CF), alm dedeclarar a inconstitucionalidade dos tratados (art. 102, III, b, da CF).

    19. Suspenso, denncia e extino dos tratados

    A suspenso da execuo de um tratado em relao a uma ou todas aspartes pode decorrer das prprias disposies do acordo ou mediante consenso,desde que realizada consulta com os Estados contratantes.

    Nos tratados bilaterais o descumprimento do compromisso por uma daspartes autoriza a outra a suspender, total ou parcialmente, os efeitos do acordo.

    J nos tratados multilaterais a suspenso advm das seguintes condies:

    a) previso no prprio texto (ou ausncia de vedao), desde que as partesinteressadas na suspenso dos efeitos resguardem os direitos dos demais

  • Estados;

    b) quando houver violao substancial ao texto do acordo, assim entendido odesrespeito disposio essencial para os objetivos do que foi pactuado.Neste caso, os demais interessados podero, por deciso unnime,suspender a execuo do tratado em relao ao Estado infrator oumesmo a todos os signatrios.

    Em qualquer hiptese, se a violao for suficientemente grave, qualquerdos prejudicados poder pleitear a extino do tratado, medida certamente maisdrstica do que a suspenso, que normalmente tem o objetivo de pressionar aparte infratora e possibilitar a retomada do equilbrio original.

    Os Estados tambm podem exercer o direito de retirada, conformeprocedimento fixado pelo tratado ou, a qualquer momento, mediante oconsentimento de todas as partes.

    Ressalte-se que um tratado multilateral no ser extinto pela retirada deum Estado, ainda que, em razo disso, o nmero de signatrios se torne inferiorao qurum mnimo exigido para a sua entrada em vigor.

    Caso no exista previso no texto do acordo para a retirada de qualquerEstado, o interessado dever comunicar sua deciso aos demais ou ao organismointernacional responsvel, com pelo menos doze meses de antecedncia, perodoem que continuar obrigado aos compromissos pactuados.

    O direito de suspenso ou retirada, em regra, s pode ser exercido emrelao totalidade do acordo. Caso a insatisfao decorra de clusulasespecficas, a suspenso ou negao parcial dos efeitos s ser possvel se a partecontestada for destacvel, ou seja, desde que no fique prejudicado ocumprimento das demais obrigaes (circunstncia conhecida comodivisibilidade das disposies).

    Os Estados no podem exercer os direitos de suspenso, retirada ouextino se reconheceram, poca em que tomaram conhecimento dos fatoscontestados, que o tratado era vlido ou permanecia em vigor.

    Os tratados podem ser extintos pela vontade posterior das partes, querevelam a falta de interesse na continuidade do acordo ou, ainda, a partir deprazo fixado no prprio instrumento, como ocorre nos tratados com vignciapredeterminada.

    A partir dessa premissa podemos identificar trs situaes queacarretam a extino dos tratados:

  • a) Previso ab-rogatria para os acordos que estabelecem, desde o incio, seuprazo de vigncia. Atingida a data prevista, cessam os efeitos pactuados,a exemplo do que ocorreu com o tratado entre Gr-Bretanha e Chinasobre a posse de Hong Kong, extinto em 1997.

    b) Deciso posterior quando os signatrios resolvem extinguir os efeitos de umtratado em vigor. A medida pode ser tomada, nos acordos multilaterais,por maioria de votos, conforme regras fixadas no prprio instrumento.

    c) Novo tratado quando as partes conclurem um novo tratado sobre o mesmotema, com clusula expressa de revogao, ou quando as novasdisposies forem totalmente incompatveis com o acordo anterior.

    Outra forma de extino do vnculo entre Estados a denncia, quecorresponde manifestao da vontade unilateral daquele que deseja abandonaro compromisso assumido no tratado.

    A maioria dos tratados prev uma clusula de denncia, que estabeleceprazos e condies para a sua efetividade.

    O Estado denunciante deve informar os demais, com antecedncia, eobservar o perodo de carncia previsto no acordo a fim de se desincumbir dasobrigaes (nos termos da Conveno de Viena o prazo de doze meses,contados do recebimento da notificao).

    A extino de um tratado, por qualquer motivo, normalmente libera aspartes de qualquer obrigao, mas no prejudica atos ou direitos relativos aoperodo anterior deciso.

    Os tratados tambm podem ser objeto de nulidade, decorrente dequalquer vcio grave detectado aps a concluso, ou, ainda, de ofensa normaimperativa de direito internacional (vide item 21 do Captulo 2).

    A declarao de nulidade do tratado exige que as partes adotem medidascapazes de eliminar os efeitos indesejados, especialmente quanto alterao dasnormas de direito interno, porventura produzidas em razo do acordo.

    Presentes os efeitos da nulidade, os Estados se desobrigam dos termospactuados, mas devem respeitar as situaes jurdicas consumadas antes daextino, especialmente em relao aos atos praticados de boa-f e sob oprimado da reciprocidade.

    Na hiptese de suspenso da execuo de um tratado, as partes estaroliberadas durante o perodo de anlise, mas devero abster-se de praticarqualquer ato que prejudique a eventual retomada dos efeitos consagrados pelo

  • instrumento.

    20. Antinomia entre tratados

    O possvel conflito entre as disposies de tratados diferentesnormalmente se resolve com a aplicao dos princpios clssicos deinterpretao (do mesmo modo que nas normas internas):

    a) Lei posterior derroga lei anterior (Lex posterior derogat priori).

    b) Lei especfica derroga lei geral (Lex specialis derogat generali).

    Portanto, na hiptese de dois ou mais tratados cuidarem do mesmoassunto, de maneira conflitante, a soluo jurdica poder advir da aplicao dosdispositivos do tratado mais recente ou daquele que melhor descreve o tema, emtermos de especificidade.

    O raciocnio pode ser facilmente aplicado quando as regras decorrem damesma fonte de produo, vale dizer, quando as partes dos tratados soexatamente as mesmas ou, ainda, em tratados multilaterais depositados emorganizaes internacionais.

    A questo se torna mais complexa ante a existncia de fontes normativasdistintas, sem identidade entre as partes. Como no existe, em tese, hierarquiaentre regras no direito internacional, deve-se aceitar que todas possuem validadee que a soluo dever ser negociada, de comum acordo, entre os interessados.

    possvel, contudo, que um tratado mais amplo estabelea suaprecedncia sobre tratados regionais ou parciais. o que ocorre com a previsocontida no artigo 103 da Carta das Naes Unidas, ao determinar que no caso deconflito os preceitos da Carta prevalecem sobre quaisquer obrigaes assumidasem outros tratados internacionais.

    Existe, tambm, o entendimento de que os compromissos assumidos emtratados multilaterais no podem ser alterados mediante acordos parciais entre ossignatrios, a exemplo do que ocorre com as disposies do GATT e daOrganizao Mundial do Comrcio.

    21. Norma imperativa de direito internacional geral (jus cogens)

    As chamadas regras imperativas (jus cogens) so as normas queimpem aos Estados obrigaes objetivas, que prevalecem sobre quaisqueroutras.

  • O jus cogens compreende o conjunto de normas aceitas e reconhecidaspela comunidade internacional, que no podem ser objeto de derrogao pelavontade individual dos Estados. O conceito prev a estabilidade do sistema, deforma que essas regras gerais s podem ser modificadas por outras de mesmanatureza.

    Nesse sentido, so nulos os tratados que conflitarem com as normasimperativas gerais. Para os tratados em vigor, a supervenincia de uma normageral imperativa posterior e contrria aos seus dispositivos tambm tem o condode torn-los nulos e extintos por incompatibilidade.

    22. Tratados e a teoria da impreviso

    Todos os compromissos internacionais, firmados sob o primado dasoberania, partem da premissa de que os Estados, ao celebrarem o acordo, ofazem em razo de interesses recprocos e benficos, em razo dascircunstncias presentes no momento da concluso.

    Por fora da dinmica das relaes no mundo contemporneo, achamada teoria da impreviso busca analisar as consequncias jurdicasdecorrentes de alteraes posteriores, que modifiquem significativamente oequilbrio existente ao tempo do acordo (clusula rebus sic stantibus se ascondies permanecerem iguais).

    Portanto, a ocorrncia de situaes excepcionais e imprevistas poderliberar as partes do compromisso ou ensejar a reviso do acordo, quando:

    a) o objeto se tornar impossvel em razo de circunstncias alheias vontadedas partes, o acordo no poder mais ser cumprido, com a consequenteextino do tratado; se a impossibilidade for temporria, as partesdevero suspender a execuo dos efeitos at a regularizao dasituao;

    b) houver mudana fundamental nas circunstncias (alterao da clusula rebussic stantibus) a quebra do equilbrio original do acordo normalmenteimplica onerosidade excessiva para uma das partes, que poder, a partirda devida comprovao, pleitear a extino do tratado.

    Caso o tratado estabelea limites ou margens de segurana para suaaplicao, ou quando houver violao dos dispositivos, a alterao fundamentaldas circunstncias no poder ser utilizada como justificativa para a extino docompromisso.

  • O eventual rompimento de relaes diplomticas ou consulares entre aspartes no impede o exerccio das obrigaes jurdicas previstas pelo tratadonem extingue ou suspende automaticamente sua eficcia, salvo se a participaodos representantes for essencial para a aplicao dos respectivos dispositivos.

    23. Recepo dos tratados no Brasil

    O modelo republicano adotado pela Constituio Brasileira, com aclssica diviso dos poderes intuda, h sculos, por Montesquieu, pressupe,invariavelmente, a participao do Legislativo e do Executivo na produo denormas jurdicas.

    No caso de introduo dos tratados no ordenamento brasileiro, oprocedimento inicia-se com a celebrao do acordo pelo Presidente daRepblica (art. 84, VIII, CF) e posterior encaminhamento para referendo doCongresso Nacional (art. 49, I, CF).

    O compartilhamento de atribuies entre os poderes Legislativo eExecutivo, previsto pela Constituio, conhecido no direito internacional comotreaty making power, expresso que podemos traduzir livremente comocompetncia para dispor sobre tratados.

    Vejamos, a seguir, as etapas necessrias para a recepo do texto dostratados no direito brasileiro.

    24. Roteiro legislativo

    a) O Presidente da Repblica, como Chefe de Estado e de governo, assina otratado e manifesta o compromisso do Brasil no mbito do direitointernacional.

    b) O ministro das Relaes Exteriores traduz o texto negociado para o portugus(se for o caso), prepara a minuta da mensagem presidencial e faz aanlise jurdica dos dispositivos.

    c) A Casa Civil verifica a legalidade e o mrito do tratado, bem como prope oencaminhamento do texto integral ao Congresso Nacional.

    d) O Presidente da Repblica envia o texto revisado e a mensagem para oCongresso Nacional.

    e) O texto do acordo tramita inicialmente pela Cmara dos Deputados.

    f ) Caso aprovado, segue para o Senado Federal; se recusado, extingue o

  • procedimento, sem necessidade de encaminhamento ao Senado.

    g) Faz-se a leitura em plenrio e o texto submetido s comisses pertinentes,especialmente a comisso de relaes exteriores e a comisso deconstituio e justia.

    h) A aprovao do texto, na redao final, exige votao em plenrio commaioria simples dos deputados e senadores.

    i) Com a aprovao, o Presidente do Senado promulga o decreto legislativocorrespondente, que ser numerado e publicado no Dirio Oficial daUnio; possvel que dois ou mais tratados sejam promulgados pelomesmo decreto legislativo.

    j) O Presidente da Repblica exara um decreto executivo que conferepublicidade ao acordo, tornando-o obrigatrio para todas as pessoas apsa devida publicao no Dirio Oficial da Unio.

    Como se pode observar, o rito inicia-se como ato de governo, decompetncia do Presidente da Repblica, passa pelo crivo democrtico(participao popular e dos estados federados) no Congresso Nacional e retornaao Executivo para confirmao.

    Somente com a publicao do decreto presidencial o texto se tornacogente, ou seja, norma obrigatria para todos os brasileiros e pessoas residentesno pas.

    Ressalte-se que no h prazo para promulgao do tratado peloPresidente aps a publicao do decreto legislativo, razo pela qual entendemosse tratar de ato discricionrio.

    Na verdade, pensamos que o decreto legislativo e o decreto presidencialensejam efeitos jurdicos distintos.

    A publicao do decreto legislativo revela o comprometimento do Brasilno plano internacional, perante os demais Estados ou organismos. Podemoscomprovar a afirmao sob o argumento de que, na prtica, aps a publicaodo decreto legislativo o pas deposita o instrumento de ratificao na secretariadas Naes Unidas, dando publicidade ao compromisso.

    Posteriormente, o Presidente decidir sobre a convenincia, aoportunidade e a eficincia do decreto executivo, que, acaso publicado, servirpara promulgar o texto aprovado e introduzi-lo, com fora vinculante, noordenamento nacional.

  • Vejamos o seguinte exemplo concreto, utilizado para a promulgao dotexto da Conveno de Viena no pas:

    a) a Conveno de Viena foi concluda em 23 de maio de 1969;

    b) somente depois de 40 anos o Congresso Nacional ratificou o texto, por meio doDecreto Legislativo n. 496, de 17 de julho de 2009;

    c) o Brasil efetuou o depsito do instrumento de ratificao na ONU em 25 desetembro de 2009;

    d) em 14 de dezembro de 2009, o Presidente da Repblica promulgou aConveno, pelo Decreto n. 7.030, tornando-a obrigatria para todosaqueles sujeitos jurisdio nacional.

    De se notar que a competncia do Presidente da Repblica para apromulgao de tratados por meio de decreto deriva do artigo 84, IV, daConstituio, que lhe confere poderes para sancionar, promulgar e fazer publicaras leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execuo (e nodo artigo 84, VIII, que lhe outorga competncia para celebrar tratados).

    Com efeito, a partir do regramento constitucional podemos afirmar queos atos jurdicos mencionados so distintos, independentes e destinados a produzirefeitos especficos.

    Questo interessante diz respeito possibilidade de o Congresso Nacionalproduzir o decreto legislativo, mas o Presidente no promulgar o tratado.

    Nessa hiptese, o Brasil estaria comprometido na esfera internacionalsem que o acordo trouxesse qualquer obrigao no mbito interno, situaojurdica peculiar e que deve ser evitada, sempre que possvel, por meio deconcerto poltico entre os Poderes. Sob tais circunstncias, o pas poderia serresponsabilizado na ordem internacional.

    25. Direito internacional x direito interno

    Questo bastante complexa e de grande relevncia prtica diz respeitoao conflito entre normas internacionais e o direito interno de cada Estado.

    Historicamente, o debate se divide entre as posies monista e dualista.

    A corrente monista defende que o direito internacional e o direito internoso manifestaes do mesmo sistema jurdico, portanto pertencentes a ummodelo unificado, no qual o conflito de normas deve ser resolvido com aaplicao das regras interpretativas clssicas.

  • Esse raciocnio nos conduziria a trs possibilidades:

    a) prevalncia do direito internacional sobre o direito interno (monismo radical) a posio adotada pela Conveno de Viena, ao estabelecer, no artigo27, que um pas no poder invocar as disposies de seu direito internopara justificar o inadimplemento de um tratado. Igual interpretao foiadotada, reiteradas vezes, pela antiga Corte Permanente de JustiaInternacional;

    b) primado do direito interno sobre o internacional: posio minoritria,diametralmente oposta anterior e que, de modo paradoxal, seaproxima do dualismo, pois reconhece que as normas internacionais sesubmeteriam fora do direito nacional, o que seria equivalente areconhecer, na prtica, duas ordens jurdicas distintas;

    c) equivalncia entre as normas internas e internacionais (monismo moderado ouestruturado): posio j adotada pelo STF, a exemplo do que foi decididono RE 80.004 (1977). Nessa hiptese, a soluo para o conflito entrenormas seria utilizar o velho princpio lei posterior revoga lei anterior,ou seja, uma norma interna superveniente poderia revogar tratado emvigor, salvo em matria tributria.

    A doutrina dualista (ou pluralista) pressupe a existncia de duas esferasjurdicas distintas, de forma que haveria um processo de transformao do textodo tratado em lei interna, para que os comandos pudessem ser incorporados aodireito nacional.

    Parece-nos que, sob tal ponto de vista, existiriam, de fato, dois momentosdistintos: a) o processo de introduo e converso do tratado ao direito interno eb) a anlise sobre a posio hierrquica da norma interna produzida em relaos demais pertencentes ao sistema.

    O Supremo Tribunal Federal j teve a oportunidade de se manifestaracerca do acalorado debate entre monistas e dualistas, destacando que adiscusso acadmica revela-se incua e que a soluo para o problema devebuscar fundamento na Constituio.

    poca, o Ministro Celso de Mello defendeu a existncia no pas de umdualismo moderado, com consequente paridade normativa entre atosinternacionais e normas internas (ADIN 1480-3).

    A posio do STF, embora represente o entendimento jurisprudencialcorrente, tem sido motivo de diversas crticas, tanto pela doutrina como da parte

  • de magistrados da prpria Corte.

    Os problemas decorrem da possibilidade de um tratado ser revogado porlei posterior superveniente, o que certamente levaria responsabilizao do pasna ordem internacional, em razo das disposies da Conveno de Viena e dapostura consagrada pela jurisprudncia dos tribunais internacionais.

    Reclama-se, nesse contexto, a reviso da orientao jurisprudencialbrasileira, no intuito de refletir o entendimento internacional e evitar que o paspossa ser objeto de sanes e questionamentos por outros Estados.

    A questo permanece em aberto e deve ser objeto de reflexes nosprximos anos, especialmente em razo das alteraes promovidas pela EmendaConstitucional n. 45/2004.

    26. Hierarquia das normas internacionais

    As regras introduzidas a partir de tratados normalmente ingressam noBrasil no mbito de normas infraconstitucionais.

    Com efeito, o Supremo Tribunal Federal j manifestou o entendimentode que os tratados, depois de incorporados ao direito interno, situar-se-iam noplano normativo das leis ordinrias, a exemplo da deciso exarada na ADIN1480-3, que versa sobre matria trabalhista.

    Alguns autores defendem a construo do STF, sob o argumento de queo qurum de aprovao dos decretos legislativos de maioria simples, o queimpediria, por conseguinte, a recepo de tratados no mbito das leiscomplementares, que exigem, como se sabe, maioria absoluta.

    Discordamos.

    Parece-nos que o sistema constitucional vigente ressalta que a foranormativa das regras que o tratado introduziu no ordenamento depende docontedo (ratione materiae) veiculado.

    Assim, sempre entendemos ser possvel que uma norma internacionalpudesse ter o status de lei complementar, desde que a matria veiculadacorrespondesse a temas cuja competncia a Constituio atribusse a tal tipo denormas.

    O Supremo Tribunal Federal, por exemplo, j reconheceu essapossibilidade em alguns julgados, especialmente em relao matria tributria,mantendo o entendimento de que para os demais ncleos temticos do direito as

  • normas oriundas dos tratados teriam natureza ordinria.

    Embora consideremos que o entendimento do STF ainda carece deconsolidao, no sentido de efetivamente afirmar o plano jurdico das normasque recepcionam tratados ou o eventual critrio de enquadramento como uma ououtra figura normativa, temos a convico de que o tema pode ser resolvido peladoutrina, a partir de interpretao sistemtica da prpria Constituio.

    A questo parece residir na anlise de dois momentos distintos: a) orelativo ao procedimento de elaborao da norma no ordenamento e b) oenquadramento jurdico conferido ao texto positivado.

    Uma rpida verificao da Constituio confirmar que os tratados, deper si, no so considerados instrumentos aptos introduo de regras no Brasil, luz do que se pode concluir a partir das disposies previstas nos artigos 59 eseguintes da Carta, nos quais, ao cuidar do processo legislativo, restou evidenteque o constituinte originrio no considerou os tratados como fontes normativasnacionais.

    A seo inaugurada pelo artigo 59 da Constituio explicita o rito internonecessrio para a produo de normas capazes de condicionar as condutasintersubjetivas, em respeito ao princpio da legalidade (ningum ser obrigado afazer ou deixar de fazer alguma coisa seno em virtude de lei art. 5, II, CF).

    Com efeito, podemos afirmar que os nicos veculos aptos para aintroduo de regras no direito brasileiro, porque preenchem o conceito de lei emsentido estrito (formal e material), so:

    a) Emendas Constituio.

    b) Leis complementares.

    c) Leis ordinrias.

    d) Leis delegadas.

    e) Medidas provisrias.

    f) Decretos legislativos.

    g) Resolues.

    Entre os instrumentos citados, o decreto legislativo foi eleito como oveculo responsvel pela manifestao de concordncia parlamentar acerca dotexto assinado pelo Presidente da Repblica, no mbito do direito internacional.

    Por fora desse necessrio processo de recepo, previsto no TextoMaior, os tratados devero ser introduzidos mediante participao do Congresso

  • Nacional, responsvel pela promulgao do respectivo decreto legislativo(instrumento jurdico hbil e de sua competncia), sem prejuzo de posteriorpublicidade, conferida pelo decreto presidencial.

    Embora os tratados no integrem o rol de normas jurdicas brasileirascapazes de preencher os conceitos de lei em sentido formal e material, inegvel que, aps a sua introduo no ordenamento, os comandos veiculadosgozam de fora e eficcia jurdica, da porque submetidos, automaticamente, aocontrole de constitucionalidade a cargo do Supremo Tribunal Federal (art. 102, I,a, da CF).

    No mesmo sentido, em diversas oportunidades a Constituio refora aimportncia dos tratados para o direito brasileiro (de que so exemplos ospreceitos contidos no art. 5, 2, 3 e 4).

    Com o advento da Emenda Constitucional n. 45/2004, os direitoshumanos previstos em tratados podem integrar o altiplano das normasconstitucionais, desde que aprovados pelo rito tpico das emendas (qurumespecial de 3/5 e votao em dois turnos no Congresso).

    Adentramos, portanto, no segundo momento de anlise dos tratados,quando as normas j se encontram positivadas no pas e precisam ser cotejadascom o restante do ordenamento.

    O enquadramento jurdico das normas resultantes da aprovao do textode um tratado pode variar de acordo com a matria e ensejar, segundopensamos, as situaes descritas a seguir (vale lembrar o entendimento do STF,no sentido de que tais normas, em geral, possuem status de lei ordinria).

    27. Tratados em matria tributria

    O Cdigo Tributrio Nacional estabelece, no artigo 98, que os tratados eas convenes internacionais revogam ou modificam a legislao tributriainterna, e sero observados pela que lhes sobrevenha.

    O Supremo Tribunal Federal tem reconhecido a competncia do CTNpara regular o tema, em razo do poder que lhe foi conferido para dispor acercade normas gerais em matria tributria (o Cdigo Tributrio Nacional foirecepcionado pela Constituio como lei complementar em termos materiais e,nesse sentido, preenche os requisitos previstos no art. 146, III, da Carta Magna).

    Assim, no campo tributrio no se aplica o princpio de revogao por leiposterior, pois o CTN determina que, aps a introduo do tratado no direito

  • brasileiro, as leis nacionais devero respeitar as suas disposies, mantendo-secompatveis com as obrigaes assumidas no plano internacional.

    Na hiptese de conflito, a lei ordinria interna restar prejudicada, poisno pode inovar o sistema em detrimento do texto aprovado nos tratados. O STFtem se manifestado nesse sentido, inclusive ressaltando a necessidade deobedincia ao tratado pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municpios, poisa norma introduzida tem fora de lei nacional e no pode ser contrariada pelosentes federados.

    28. Tratados sobre direitos humanos

    Com o advento da Emenda Constitucional n. 45/2004, que introduziu o 3 ao artigo 5 da Constituio, quis o constituinte derivado que os tratadosfirmados pelo Brasil em matria de direitos humanos, desde que aprovadosmediante o rito de emendas constitucionais, passassem a integrar o altiplano dasnormas fundamentais.

    Assim, as normas previstas em tratados sobre direitos humanos queforem aprovadas em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por 3/5dos votos dos respectivos membros, tero o status de emenda constitucional epassaro a integrar o rol de garantias fundamentais.

    Percebe-se que o constituinte derivado mais uma vez privilegiou oaspecto formal de elaborao do processo legislativo, conferindo aos tratadosinternacionais o mesmo nvel hierrquico das emendas constitucionais, desde querespeitados os requisitos de produo.

    Trata-se de comando salutar e extremamente bem-vindo, pois permite aconstante atualizao do suporte s garantias fundamentais, na medida em que oreconhecimento de novos direitos se consolide no mbito internacional.

    Como exemplo de tratado introduzido nos moldes da nova sistemtica,temos a Conveno Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficinciae seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 2007, e promulgadospelo Decreto n. 6.949, de 25 de agosto de 2009.

    Questo interessante diz respeito possibilidade ou no de revogao dosdireitos introduzidos sob tais condies.

    Entendemos ser impossvel qualquer tentativa de denncia ou extinoao tratado original, com efeitos no pas (independentemente de quem a fizesse,executivo ou legislativo).

  • Ademais, parece-nos que a situao se torna irreversvel, no podendosequer ser alterada pelo rito de emenda constitucional, pois os direitosfundamentais so considerados clusula ptrea, conforme se depreende daredao do artigo 60, 4, da prpria Constituio (que impede a abolio dedireitos e garantias individuais).

    29. Conveno de Viena sobre Direito dos Tratados (1969)

    A Conveno de Viena sobre o Direito dos Tratados o principalinstrumento de regulamentao para os acordos internacionais e foi concludaem 23 de maio de 1969, com 31 signatrios originais.

    A entrada em vigor da Conveno de Viena ocorreu em 27 de janeirode 1980, quando foi atingido o qurum mnimo de adeses (30 dias aps a

    ratificao do 35o Estado).

    Atualmente, a Conveno alcana mais de 100 pases, inclusive o Brasil,que a introduziu no nosso ordenamento, depois de anos de trmite no CongressoNacional, por meio do Decreto n. 7.030/2009.

    A adeso brasileira ao tratado ocorreu com duas reservas, relativas aosartigos 25 e 66, que tratam de aplicao provisria dos tratados (antes da entradaem vigor) e possibilidade de arbitragem automtica na Corte Internacional deJustia (quando no houver acordo entre os Estados), preceitos incompatveiscom o direito ptrio.

    As verses autnticas da Conveno de Viena foram produzidas noscinco idiomas oficiais da ONU: ingls, francs, espanhol, chins e russo.

    30. Conveno de Viena sobre o Direito dos Tratados entreEstados e Organizaes Internacionais ou entreOrganizaes Internacionais (1986)

    As organizaes internacionais, nas ltimas dcadas, passaram a ocuparposio de destaque no cenrio internacional, especialmente diante do fenmenoda globalizao e da consequente necessidade de entendimento multilateral.

    Como a Conveno de Viena de 1969 no mencionava expressamente apossibilidade de as organizaes celebrarem tratados (exceo feita s agnciasda ONU), em 21 de maro de 1986 foi assinada uma nova Conveno,complementar primeira, no intuito de regular a matria.

    A Conveno de 1986 praticamente reproduz o texto do documento

  • anterior, com pequenas adaptaes, no sentido de contemplar a possibilidade decelebrao de acordos entre Estados e organizaes ou, ainda, somente entreorganizaes (destacamos que as duas Convenes so independentes eproduzem efeitos paralelos).

    A Conveno de Viena ainda no entrou em vigor (at o momento depublicao desta edio incio de 2012), pois no foi atingido o qurum mnimode ratificaes (35 Estados).

  • Captulo 3

    Sujeitos do Direito Internacional

    1. Personalidade jurdica

    Somente os Estados soberanos e as organizaes internacionais possuempersonalidade jurdica de direito internacional pblico.

    A personalidade implica a capacidade de ser parte em acordosinternacionais, bem como exercer direitos e assumir obrigaes em relao aosdemais sujeitos.

    Dizemos que a personalidade dos Estados, decorrente da soberania, originria, enquanto a das organizaes internacionais seria derivada, poisdecorre da manifestao de vontade dos seus instituidores.

    Excepcionalmente, atribui-se Santa S, representao da IgrejaCatlica, personalidade de direito internacional, limitada ao exerccio dasatividades religiosas.

    Ressalte-se que no direito internacional pblico os indivduos, asempresas e as organizaes da sociedade civil no possuem personalidadejurdica, embora se reconhea, modernamente, que o ser humano seja odestinatrio efetivo de todas as normas jurdicas.

    O raciocnio toma como referncia a tutela dos direitos humanosfundamentais, ou seja, o conjunto de garantias mnimas e essenciais para umavida digna. Nesse sentido, podemos dizer que os indivduos so sujeitos mediatosdo direito internacional, apesar de no terem capacidade para demandar ouexercer direitos nos tribunais internacionais.

    Toda e qualquer representao jurdica de direitos individuais serexercida pelos Estados, normalmente em razo do vnculo de nacionalidade.

    No devemos confundir a ausncia de personalidade (capacidadejurdica) com a possibilidade de que indivduos sejam levados a julgamento emtribunais internacionais, especialmente para responder sobre crimes de grandemagnitude.

    Com efeito, a histria recente do direito internacional contempla vrios

  • casos emblemticos de julgamento de criminosos, a exemplo do Tribunal deNuremberg, que condenou diversos membros do alto comando nazista aps otrmino da Segunda Guerra Mundial e do Tribunal de Tquio, instaurado namesma poca para julgar crimes de guerra e contra a humanidade perpetradospor militares japoneses durante o conflito.

    Mais recentemente (dcada de 1990), foram constitudos, por resoluoda ONU, tribunais ad hoc para o julgamento de crimes cometidos durante aGuerra dos Balcs, que fragmentou a antiga Iugoslvia, e o Tribunal de Arusha(Tanznia), instalado para julgar o genocdio praticado d