direito internacional privado eu

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1 Direito Internacional Privado - Objecto do Direito Internacional Privado; - Perspectiva histórica; - Âmbito do Direito Internacional Privado. Objecto Do DIP O Dip procura soluções jurídicas para as relações plurilocalizadas são aquelas relações que tocam vários ordenamentos jurídicos. Numa sociedade global cada vez mais as sociedades e as relações ultrapassam fronteiras no domínio do social, cultural e familiar, estas relações misturam vários elementos ou pela nacionalidade ou pela localização das coisas ou pelo lugar do cumprimento das obrigações . Isto é, são relações jurídicas que têm conexões com várias nacionalidades. Nesta situação haverá que saber qual a lei material aplicável. Não estaria certo aplicar sempre o direito local uma vez que estando estas relações em contacto com vários sistemas talvez o mais correcto seja aplicar aquela conexão que lhe esteja mais próxima, isto é, aplicar aquela lei que tenha com a relação jurídica uma conexão mais forte. Este problema de saber qual o direito aplicável não teria lugar se o direito estadual ou interno fosse igual em todos os estados, isto é, se fosse direito uniforme mas é patente exactamente o contrário é que na maioria das vezes cada estado apresenta uma solução jurídica diferente para o mesmo problema, ou seja, cada estado escolhe um caminho diverso para atingir uma solução que será diversa. A propósito destas matérias são conhecidos dois casos históricos considerados emblemáticos na discussão em torno da necessidade do Dip. O primeiro desses casos ficou conhecido pelo caso Kaufman. -Uma jovem A residente em Nova York foi numa excursão organizada por uma instituição de benemerência ao estado do Oregon.Aí a escalar um monte teve um acidente mortal o pai da vítima também residente em NY instaurou nesse estado uma acção por perdas e danos contra a instituição de benemerência. A ré defendeu-se argumentado que no estado de oregon onde a situação ocorreu a lei isenta de responsabilidades por se tratar de uma instituição sem fins lucrativos. Mas em NY onde a situação está a ser discutida a imunidade tinha sido abolida. Com o caso em mãos e sem existência de uma norma que indique ao juiz qual a lei aplicável esta actuou dentro do seu poder discricionário e acabou por considerar como aplicável a lei do oregon absolvendo a instituição. Considerando que esta lei deveria ser aplicável pois foi onde o facto gerador de responsabilidade havia ocorrido. O segundo ficou conhecido como Maldonado. A senhora Maldonado é de Santader e o caso passa-se em 1924 morrer intestada e sem herdeiros legítimos tem títulos depositados num banco londrino

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Direito Internacional Privado

- Objecto do Direito Internacional Privado; - Perspectiva histórica;

- Âmbito do Direito Internacional Privado. Objecto Do DIP O Dip procura soluções jurídicas para as relações plurilocalizadas são aquelas relações que tocam vários ordenamentos jurídicos. Numa sociedade global cada vez mais as sociedades e as relações ultrapassam fronteiras no domínio do social, cultural e familiar, estas relações misturam vários elementos ou pela nacionalidade ou pela localização das coisas ou pelo lugar do cumprimento das obrigações. Isto é, são relações jurídicas que têm conexões com várias nacionalidades. Nesta situação haverá que saber qual a lei material aplicável. Não estaria certo aplicar sempre o direito local uma vez que estando estas relações em contacto com vários sistemas talvez o mais correcto seja aplicar aquela conexão que lhe esteja mais próxima, isto é, aplicar aquela lei que tenha com a relação jurídica uma conexão mais forte. Este problema de saber qual o direito aplicável não teria lugar se o direito estadual ou interno fosse igual em todos os estados, isto é, se fosse direito uniforme mas é patente exactamente o contrário é que na maioria das vezes cada estado apresenta uma solução jurídica diferente para o mesmo problema, ou seja, cada estado escolhe um caminho diverso para atingir uma solução que será diversa. A propósito destas matérias são conhecidos dois casos históricos considerados emblemáticos na discussão em torno da necessidade do Dip. O primeiro desses casos ficou conhecido pelo caso Kaufman. -Uma jovem A residente em Nova York foi numa excursão organizada por uma instituição de benemerência ao estado do Oregon.Aí a escalar um monte teve um acidente mortal o pai da vítima também residente em NY instaurou nesse estado uma acção por perdas e danos contra a instituição de benemerência. A ré defendeu-se argumentado que no estado de oregon onde a situação ocorreu a lei isenta de responsabilidades por se tratar de uma instituição sem fins lucrativos. Mas em NY onde a situação está a ser discutida a imunidade tinha sido abolida. Com o caso em mãos e sem existência de uma norma que indique ao juiz qual a lei aplicável esta actuou dentro do seu poder discricionário e acabou por considerar como aplicável a lei do oregon absolvendo a instituição. Considerando que esta lei deveria ser aplicável pois foi onde o facto gerador de responsabilidade havia ocorrido. O segundo ficou conhecido como Maldonado. A senhora Maldonado é de Santader e o caso passa-se em 1924 morrer intestada e sem herdeiros legítimos tem títulos depositados num banco londrino

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segundo a lei espanhola nesta situação é o estado que se habilita como herdeiro como tal viria a ser o proprietário dos titulos mas para o direito britânico a coroa pode a penhorar-se das coisas hereditárias sem dano que se encontrem em território britânico. O estado espanhol intentou uma acção em Inglaterra onde reclamava a propriedade dos títulos colocava-se ao juiz o problema de saber qual lei a aplicar a de Inglaterra ou a de Espanha. Neste caso o juiz britânico decidiu que devia aplicar a lei da nacionalidade do de cujos e condenou o estado britânico a entregar os títulos ao estado espanhol. Dois casos e dois critérios que realçam a importância e a necessidade de um direito instrumental possa dar um seguimento as relações jurídicas e não fazer depender as soluções do poder discricionário dos magistrados. Fundamentos Gerais do Dip O fim do Dip é contribuir para a estabilidade e para a continuidade das relações jurídicas não basta contudo dizer que Dip deve indicar a lei aplicável é necessário acrescentar que a lei assim designada seja susceptível de reconhecimento universal. Porque a não ser assim, as decisões no estado do fórum (lex fori) podem não ser acatadas, reconhecidas pelos outros estados envolvidos e por isso não serem eficazes, por exemplo naquele estado onde os bens objecto de litígio se localizam. L1 (lex fori)----- L2 (lex patriae)-----L3 (Lex domicilii) É preciso que tenham a mesma conexão. Harmonia Jurídica Internacional É um dos principais princípios do Dip é um princípio que vem de Savigny e que se traduz no facto de ser desejável ao Dip que exista uma harmonia, uma uniformidade nos critérios definidores dos elementos de conexão deste ramo do direito e só assim é possível assegurar a uniformidade e a continuidade das relações jurídicas. Fórum shoping é a possibilidade de escolha da lei que serve melhor os interesses daqueles que intentam a acção. A única maneira de por fim ao fórum shoping é a existência de uma harmonia jurídica internacional independentemente do lugar onde a acção é intentada, a lei competente será sempre a mesma. Para que a harmonia jurídica internacional se mostre possível é necessária que todos os legisladores de Dip se esforcem por adoptar critérios que pela sua razoabilidade se imponham como universais. Harmonia Jurídica Material

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A harmonia jurídica material significa que os vários sistemas jurídicos têm nas suas leis materiais ou direito intern, soluções idênticas para casos idênticos isto, evita aquilo que no direito internacional se designa por relações de mútua exclusão, isto é, situações em que existindo relações jurídicas plurilocalizadas os direitos materiais dos estados envolvidos se excluem é o caso ocorrido antes da reforma do código alemão 1969 em que um grego residente em Atenas pretende ter o direito a visitar o seu filho menor que reside com a mãe em Hamburgo, a lei grega considera que a relação entre pais e filhos está sujeito a lei da nacionalidade do pai e filhos está sujeita a lei da nacionalidade do pai quando se trata da relação com o pai e da mãe quando se trata da relação com a mãe. Para a lei alemã a mãe tem o direito de se opor as visitas já o direito a visitar o filho a norma grega do Dip considera competente para regular a situação a lei material grega no entanto como a lei alemã material considera ser legitimo a mãe opor-se a estas visitas a situação é de mútua exclusão entre leis materiais e a eficácia de uma sentença obtida na Grécia é posta em causa. L1 L2 Lex Fori Alemanha Grécia Lexdomicilii Lexpatriae (pai) Lei material concede a pretensão Lei material nega a Pretensão A harmonia jurídica material só é possível se existir entre os vários sistemas envolvidos uma verdadeira harmonia nas soluções, não havendo, essa harmonia como é muito frequente para que não aconteçam situações de mútua exclusão como a situação descrita. Recorrendo-se para evitar este tipo de situações um único factor de conexão comum a todos os sistemas jurídicos para que por ex: todos os sistemas tenham no seu Dip uma norma que diga para as relações emergentes do direito da família a lei aplicável por exemplo é a lei da nacionalidade dos cônjuges. Estado Com Melhor Competência Este para fazer acatar uma determinada decisão é por exemplo no caso das coisas o estado onde essas coisas se encontram situadas. Por razões de eficácia em matéria por ex: de sucessão pode ser preferível aplicar a lei do lugar onde se encontram os imóveis do que a lei da nacionalidade do de cujus e sendo assim falamos de Lex Rei Citae (lei do lugar da coisa) Boa Administração Da Justiça

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Traduz-se no facto de ser desejável em princípio que os estados apliquem a sua própria lei material mas este principio não pode, sem mais informar todas as soluções do Dip porque aí teríamos em absoluto uma ausência de harmonia. Assim sendo há que ter em conta a chamada paridade de tratamento que refere que o Dip deve colocar os vários sistemas jurídicos legais em pé de igualdade de modo a que uma lei estrangeira deva ser aplicada pelo estado do fórum lex fori e sempre que nas mesmas circunstâncias essa acção fosse intentada nesse outro estado a lei considerada competente fosse a lei material do estado do fórum. Há princípio de paridade quando um francês intenta em Portugal uma acção para discutir a validade do seu casamento e Portugal aplica a lei francesa. Esta é a tendência que se verifica no direito português. Norma De Conflitos O corpo de normas do Dip tem a designação de normas de conflitos. Essas normas são constituídas por vários elementos e um dos elementos mais importante é o chamado elemento de conexão. Esse elemento de conexão deve prevalecer em determinado domínio jurídico e é o chamado elemento localizador da norma, porque vai localizar a relação jurídica plurilocalizada num determinado sistema jurídico material é o elemento de conexão que diz qual é a lei que vai ser aplicável e como a relação jurídica tem várias conexões, isto é, tem contactos com vários sistemas jurídicos a lei aplicável há-de ser aquela que tenha com a relação jurídica conexão mais forte. Na escolha do elemento de conexão mais forte o legislador de Dip terá que atender quer a interesses materiais quer a interesses colectivos. Relativamente aos sujeitos, as pessoas, o elemento conexão mais forte é a lex patriae, isto é, como regra porque é com este sistema de leis que o indivíduo mais se identifica, essa identidade tem factores importantes a nível social, cultural e até religioso. Por essa razão, nas matérias que tem a ver com as pessoas como as relações familiares, as relações mortis causis, de capacidade e as questões de estado, tem como elemento de conexão mais forte, a lex patriae que por vezes cede ao segundo elemento conexão que é o da lex domicilii. Relativamente a outro campo de incidência que se designa por comércio jurídico no que respeita as coisas, por uma questão que já vimos anteriormente de eficácia a lei aplicável é a lei do lugar onde as coisas se encontram logo o elemento de conexão mais forte é o da lex rei citae e para as questões de responsabilidade extracontratual o elemento conexão considerado mais forte é o do lugar onde ocorreu o facto gerador da responsabilidade e nesse caso estamos a falar do chamado locus delictii. Obs:esta solução para a responsabilidade é precisamente a solução adoptada pelo nosso legislador. Como já foi referido ao Dip não importa as questões de direito e justiça material, tão só a procura da lei próxima através de elementos de conexão

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mais forte por vezes esta lei mais próxima é afastada de forma excepcional por razões de ordem material. Excepção De Ordem Pública Internacional Este é um caso excepcional em que o sistema de leis material se intromete no Dip e impede que a lei que seria aplicável por força da norma de conflitos e do seu elemento de conexão mais forte ou venha a ser considerada competente por força de uma norma de conflitos não pode ser aplicada por violar princípios fundamentais do sistema jurídico da lex fori, neste caso o juiz do processo invoca a excepção de ordem pública internacional e recusa a aplicação dessa lei estrangeira. Domínios Afins Do Dip Para além do Dip existe outros direitos de conflitos e desde logo existe o chamado direito transitório, ambos são direito de 2º grau, isto é, é direito sobre direito. 1º O Direito Transitório é um ramo de direito que dirime conflitos de leis no tempo, enquanto Dip dirime conflitos de lei no espaço.(diferença) Ambos tratam com os limites de aplicação da lei, o problema de Dip decorrer da vigência simultânea em territórios diversos de leis que são distintas, o problema do direito transitório, decorre do fenómeno sucessão no tempo de normas distintas no mesmo sistema jurídico. O Dip tem a ver com a dinâmica das relações jurídicas, o direito transitório tem a ver com a dinâmica das leis, o que tem em comum é serem ambos um direito de carácter formal e como tal visam garantir a estabilidade e a continuidade das relações jurídicas e assim tutelam a confiança e a expectativa dos sujeitos. 2ºConflitos Internacionais e Conflitos Internos Como também já verificamos nem sempre os conflitos se põem entre diferentes países muitas vezes eles ocorrem dentro do mesmo estado, como foi o caso histórico Kaufman, neste caso são estados dentro do mesmo país porque tem leis diferentes de estado para estado faz com que possa ocorrer conflitos de competência relativamente a essas leis é o que acontece nos EUA e no Canada e relativamente a Espanha e ao Reino Unido, gere a par do direito civil como existe um direito foral em algumas províncias que já o tinham ao tempo da promulgação do código civil; Estas causas apresentam uma grande analogia com o Dip porque os critérios de resolução são idênticos, desde logo tem que existir o chamado elemento de conexão mais relevante, mas como é óbvio esse elemento de conexão não pode ser o da nacionalidade (lex patriae), sendo substituído pelo elemento de conexão (lex domicilii).

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Também não é possível invocar a excepção de ordem pública pois que uma sentença proferida num estado é exequível em todos os outros no entanto há excepções que se verificam em certos estados dos EUA onde já têm sido invocadas em questões de Dip excepções idênticas á excepção de ordem pública. Leis Interpessoais São leis para diferentes categorias de pessoas dentro do mesmo estado, esta situação ocorria nos países de expressão portuguesa antes da independência destes onde a par dos direitos dos colonos existiam sistemas de leis consuetudinárias para os naturais desses estados também aqui se colocavam problemas de conflitos de leis idênticas aos problemas de Dip. Direito Privado Uniforme Visa uniformizar leis materiais distintas enquanto que o Dip regula relações sujeitas a leis materiais distintas.(diferença). Se o direito uniforme fosse um direito universal,essa circunstância ditaria o fim do Dip, porque não mais se colocariam situações de conflito, assim podemos dizer que o Dip procura resolver conflitos de lei e o direito internacional uniforme procura eliminar esses conflitos suprimindo as distinções ou as diferenças entre os vários sistemas. Direito Comparado É o estudo de vários institutos jurídicos à luz dos vários sistemas onde os mesmos se encontram inserido, recolhendo semelhanças e diferenças. Como um dos objectivos do direito comparado é contribuir para a aproximação dos sistemas jurídicos há uma coincidência com os interesses do Dip que visa também a harmonia jurídica internacional, por um lado e, por outro lado, ao ter de aplicar lei estrangeira tem de a conhecer e, esse conhecimento pode ser feito por vias de estudo de direito comparado. Há quem defenda que o direito comparado deverá apreender os elementos ou direitos essenciais, isto é, o chamado núcleo duro dos direitos e sendo assim o Dip será o grande beneficiário dos estudos do direito comparado. Relações Entre O Direito Internacional Privado E O Direito Constitucional Colocam-se três perguntas relativamente a estas relações: 1-Se as regras de conflito colidir com o direito constitucional? 2-O direito estrangeiro considerado aplicável pode ser recusado pelos nossos tribunais por colidir com os direitos constitucionais e princípios fundamentais? 3-Se os tribunais portugueses podem recusar a aplicação de Dip estrangeiro por considerarem que este é inconstitucional no seu país de origem?

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1-Esta questão se podem as regras de conflito colidir com o direito constitucional foi levantada na Alemanha com o 3º parágrafo da constituição de Bona, que consagrava o princípio da Igualdade. A questão que se debateu foi saber, se deviam ser consideradas contrárias às direito constitucionais, aquelas normas de conflitos que tinham como elemento de conexão a nacionalidade do marido. Em torno desta discussão surgiram duas correntes: - a primeira corrente advogou que o Dip por ser um direito formal e instrumental é um direito neutral e como tal é um direito lateral a constituição e não pode colidir com ela, defendiam estes ideólogos que o legislador deveria contentar-se em dar abrigo ao princípio da igualdade no direito material, ou seja, no direito interno. -A segunda corrente defendeu a posição contrária que apesar de instrumental o Dip não é neutral e que o Dip não poderia levar sempre a aplicação da lei do marido porque a mulher também tem direito de ver aplicada a sua própria lei. Estas normas podem por isso ser objecto de inconstitucionalidade. E foi o que aconteceu em Portugal com o código civil de 1977 que baniu dos seus preceitos os dispositivos violadores da constituição de 76. 2-A resposta a esta pergunta está dada na excepção da ordem pública internacional e que só é necessário sublinhar que esta excepção só tem aplicação quando está em causa a violação de valores de máxima importância. 3-É negativa a resposta a esta questão porque no quadro de aplicação de uma lei estrangeira o julgador deve ater-se ao papel que essa lei desempenha no seu país de origem e tal seria um ingerência em termos de direito público que o legislador pudesse considerar inconstitucional no país uma lei que lá vigora. Âmbito Do Direito Internacional Privado Aspectos Históricos Da Evolução Deste Direito Até agora o âmbito do Dip tem sido restringido a problemática do chamado conflito de leis, mas será que o Dip apenas trata desta matéria e se esgota nela? 1-Doutrina Alemã também seguida pela escola Italiana, para o Dip nestes sistemas a matéria a que o mesmo se reconduz é efectivamente a do conflito de leis, sendo certo que os manuais destes dois países Alemanha e Itália também se ocupam das revisões das sentenças estrangeiras que é direito processual privado internacional. 2-Nos sistemas anglo-saxónico o Dip abarca o estudo de conflitos de leis, da jurisdição competente e do reconhecimento das sentenças. 3-Escola Francesa (sistema francês)

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Este sistema é o mais alargado do ponto de vista das matérias que se incluem no Dip e abarca as questões que tem haver com a nacionalidade, direitos dos estrangeiros, conflitos de lei e conflitos de jurisdição. Ainda na Escola Francesa o autor Pillet ,também acrescenta a estas matérias os direitos adquiridos em países estrangeiros e o reconhecimento destes. Entre nós Machado Vilela considerado o fundador do Dip imprimiu também esta orientação ao Dip. Há quem entenda que a questão dos “direitos adquiridos” deve ser colocada depois de determinada qual é a lei competente, isto porque é preciso saber se à luz de determinada lei, o direito existe. O primeiro passo numa acção interposta com o fim de reconhecer direitos adquiridos em país estrangeiro, a 1ª questão é saber em sede de conflitos de lei, qual é a lei competente. Segunda questão é avaliar se à luz dessa lei o direito é ou não é adquirido. Terceira questão para o caso da acção ser interposta em Portugal, é saber se o reconhecimento destes direitos colide com direitos fundamentais da nossa constituição. O problema dos direitos adquiridos não é autónomo do problema do conflito de leis, porque se põe com grande acuidade (pertinência) a questão de saber se perante a lex fori aquele direito deve ou não ser reconhecido. Qual destas concepções será a mais correcta para delimitar o âmbito do Dip? Já sabemos que em Portugal por intervenção do Prof. Machado Vilela o âmbito do Dip é o mais alargado. Diante deste problema da delimitação do Dip oferecem-se pelo menos dois caminhos: a)Fazer consistir o objecto do Dip numa matéria homogénea núcleo de questões de idêntica natureza a resolver por métodos também idênticos. De facto este é o pressuposto de toda a disciplina jurídica autónoma, seguindo este caminho o Dip, será conflito de leis e conflito de jurisdições e assim falaremos de normas de conflito Strictu sensu. Este tipo de normas dizem que a lei é que se aplica, mas não dizem o regime aplicável. b)Muitas diferenças destas regras, são as regras sobre a nacionalidade e sobre a condição jurídica dos estrangeiros. As primeiras são as que em cada estado enumeram os factores de aquisição e perda de cidadania, definindo portanto em sede de direito local quem é nacional e quem é nacional e que é estrangeiro. E não se vislumbra aqui um regime semelhante ao das normas de conflito. O estado diz quem são os seus nacionais e quem são os estrangeiros e não manda dizer isso por uma qualquer outra lei de um outro qualquer estado.

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Aliás as regras concernentes à atribuição da nacionalidade, são regras de direito material enquanto que as normas de conflitos, são norma de direito instrumental ou formal. E a questão tem tanto mais pertinência porque sendo certo que é adquirido que o Dip é um direito instrumental, ao admitir-mos incluir nele as normas atinente a aquisição e perda da nacionalidade estamos a incluir num direito instrumental normas de direito material. Por outro lado as normas relativas aos direitos dos estrangeiros são normas de capacidade e não tem haver também com as normas de conflito. Resta avaliar o conflito de jurisdições e estas limitam-se a indicar as hipóteses em que os tribunais do estado a que pertencem têm competência internacional. As normas de conflitos de direito privado e estas outras de conflito de jurisdição são direito processuais privados. Há portanto assim uma diferença de carácter formal. Se considerar-mos o Dip como um direito de conflitos, apenas conflitos de leis e conflitos de jurisdição integraram o seu âmbito mas é possível pôr as coisas de outra maneira é possível considerar que todas as matérias até agora enunciadas: conflitos de leis, conflito de jurisdições, aquisição e perda de nacionalidade, capacidade, direitos dos estrangeiros e reconhecimento de sentenças estrangeiras, tem em comum o facto de nascer das relações de comércio jurídico internacional. Muitas vezes para resolver estas relações do chamado comércio jurídico internacional é preciso começar por resolver os problemas da nacionalidade como há um grande interacção entre estas matérias é natural que se estudem de maneira unitária no Dip. Estas matérias prendem-se com politicas: um estado de imigração tenderá a adoptar o jus soli para as questões da nacionalidade e para o estatuto pessoal a lex domicilii. Esta é tradicionalmente a orientação do Dip em Portugal. Perspectiva Histórica O direito internacional Privado, não foi ao contrário da generalidade das normas de direito, legado pelos romanos, mas por juristas que viveram a partir do século XII não quer dizer que não se encontre no direito romano uma problemática idêntica ao Dip, no que toca ao conflito de leis mas a forma de resolver essas questões foi completamente distinta. Originariamente o jus civile é um direito exclusivo dos cidadãos de Roma. O peregrino não latino não tem acesso ao jus civile e mesmo quando Roma submeteu ao seu poder os povos vizinhos só os latinos puderam ficar sujeitos a este jus civile, assim torna-se necessário a criação de um direito que regule os casos mistos, ou seja, as relações entre romanos e peregrinos esse direito

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foi o jus genticio, um complexo de normas de direito material particular para os casos resultantes das relações mistas. Só que o “jus genticio” não era um direito completo não abarcava matérias como por exemplo o direito sucessório e assim as leis peregrinas acabaram por em certos casos ser reconhecidas. A competência para proceder a esse processo de reconhecimento ficou atribuída a figura do “pretor peregrino”. O “pretor peregrino” ao mesmo tempo que funcionava como juiz também funcionava como intérprete e legislador e tinha de aplicar leis de diferente proveniência. Ora aplicava lei romana ora aplicava lei peregrina. Esta forma de colocar a questão geraria inevitavelmente problema de conflitos de lei, mas esses problemas foram totalmente ignorados pelos romanos. Na alta idade média estas questões colocaram-se de uma outra maneira. De inicio quando um se deslocava com a sua própria lei, isto é, quando um vivia de acordo com a sua lei onde quer que se encontrasse. Mas pouco a pouco o princípio que é o da nacionalidade substitui o da territorialidade no sentido em que no âmbito dos hábitos e dos costumes é territorial. As populações tem tendência a fixar-se num determinado território e ao fim de algumas gerações as leis de origem vão se desvanecendo, perdendo importância ao mesmo tempo que as leis do território onde esses povos se fixaram vão ganhando essa importância. Num determinado período transitório subsiste uma pluralidade de leis e pratica-se o sistema “profecio júris” este sistema significa que cada um escolhe de entre as várias leis, aquela que pretende professar. Essa multiplicidade de leis tende contudo a desaparecer as leis antigas fundem-se com as leis novas e criam-se novas instituições o que significa que impera a territorialidade dentro de um território aplica-se a lei desse território, ou seja, a cada território uma lei. Quando este princípio da territorialidade passa a ser encarada de forma absoluta,temos o fenómeno do territorialismo como já dissemos o Dip moderno tem as suas origens na idade média em fins do século XIII princípio do século XVI por força das relações comerciais que dinamizam as cidades com portos marítimos (Madena, Bolonha, Pádua, Veneza…) cada uma destas cidades tem o seu próprio corpo de leis os seus estatutos que vão sendo reduzidos a escrito uma vez que são direito consuetudinário. Estes estatutos corpo de normas constituídos pelos usos e costumes de cada cidade diferem de cidade para cidade, são leis de direito privado que são uniformes. Os contactos comerciais originam uma multiplicidade de relações privadas entre vários povos como será fácil de imaginar surgiram casamentos, questões de filiação para não falar na óbvia compra e venda, contratos de mútuo que são já do âmbito do direito comercial.

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Quando existe conflito entre estes diferentes povos que lei aplicar? A primeira solução a mais fácil e óbvia é recorrer a lex fori mas esta solução começa a ser contestada e objecto de reflexão entre os jurisconsules surgem várias correntes doutrinárias conhecidas por escolas. A primeira ficou conhecida como escola de Bolonha. A escola de Bolonha vai reinterpretar os textos romanos e desta reinterpretação resultam teses mais ao menos audaciosas para a época. O direito local tem como limite as fronteiras do seu próprio estado mas então que direito aplicar aos estrangeiros? Nos séculos XII e XIII não houve uma resposta satisfatória para este problema. Mas visionário como Aldrico diziam que quando os litigantes pertencem a vários estados o juiz deve aplicar-lhes a lei que lhe parecer melhor. A forma como Aldrico resolveu esta questão mais não é que uma antecipação do que são hoje as normas de conflito abertas que permitem ao julgador um grande poder discricionário na escolha de lei competente. Dos séculos XIII até ao século XVII surgem várias teorias a propósito deste problema do qual a lei aplicável as leis mistas que ficaram conhecidas como teorias dos estatutos, no final do século XIII começa a fazer-se sentir uma forte elaboração doutrinária e passa a chamar-se estatutos ao conjunto de regras doutrinais que são elaboradas versando sobre quais os limites de aplicação dos diferentes estatutos das cidades. O que se discute é quais são os limites de aplicação de uma lei e que o que passa a verificar-se é que há uma tendência para reconhecer-se direito estrangeiro no estado local. Dos séculos XIII ao século XVII há um reconhecimento de que existe um conflito entre os estatutos, mas não é criada uma lei nova o problema é resolvido através das leis existentes. A escola Italiana domina o pensamento dos séculos XIV, XV e XVI. A escola Francesa domina dos séculos XVI a XVIII: A escola Holandesa atravessa o pensamento do século XVII. Debrucemo-nos então sobre o pensamento da Escola Italiana ,os doutrinadores desta escola reconhecem que o direito local não deve ser aplicado a estrangeiros,Bartolo admite que nestas relações mistas o juiz possa aplicar lei processual local mas que aos estrangeiros, isto é, ao fundo da causa deve ser aplicada lei estrangeira. Bartolo é acompanhado nas suas reflexões por um outro não menos ilustre jurista chamado Baldo são ambos professores em Peruza. Segundo Bartolo é preciso distinguir os estatutos que dizem respeito as coisas, dos estatutos que dizem respeito as pessoas, os primeiros que dizem respeito as coisas são territoriais, isto é, aplicam-se dentro dos limites do estado. Os segundos que respeitam as pessoas são extra territorial, isto é, aplica-se aos súbditos onde quer que eles se encontrem.

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Escola Francesa: Dumoulin e D’argentré são os dois juristas que iluminaram o pensamento da escola Francesa o grande contributo foi de Dumoulin com o chamado “princípio da autonomia da vontade” considerou Dumoulin que há um domínio onde as partes podem escolher livremente qual a lei que lhes é aplicável por exemplo no caso do regime de bens do casamento seria licito escolher se optavam pela lei do marido se pela lei da mulher. Numa linha diferente D’argentré defende a territorialidade considerando que a lei obriga quer nacionais quer estrangeiros dentro de determinado território e vem também dividir os estatutos: em estatutos territoriais para as questões que tenham haver com direitos reais e em estatutos extra territoriais para aqueles que tem haver com direitos pessoais. Escola Holandesa: Dominou o pensamento do século XVII a doutrina da territorialidade teve grande acolhimento na Holanda mas a par dela os autores holandeses defendiam que o estado podia aplicar lei estrangeira por uma espécie de conveniência com base no princípio da reciprocidade que se mantém válido até hoje. Pelo forte contributo das teorias dos estatutos o Dip foi ganhando forma e no século XIX podemos dizer que todos os códigos civis tinham normas de conflitos. Macini, Savigny e Pillet São os três autores que se distinguiram pelo forte contributo que deram ao Dip moderno o principal terá sido Savigny enquanto na teoria dos estatutos o ponto de partida era sempre quais os limites de aplicação da regra jurídica ,Savigny problematiza em torno da própria relação jurídica e este é um verdadeiro passo de gigante ,no que toca a aproximação do Dip da era moderna. Savigny considera que a lei mais adequada para regular cada relação jurídica é a lei onde a relação jurídica tem a sua sede e refere que assim como cada pessoa tem um domicilio, também a relação jurídica, tem uma sede. Mas quais os elementos que podem determinar onde se localiza a sede da relação jurídica? Esses elementos podem ser de natureza vária: - O domicilio dos sujeitos, -a situação das coisas, - o lugar da celebração dos actos. Estes elementos que visam determinar a sede da relação jurídica outra coisa não são, do que elementos de conexão. Macini o principio fundamental é o da nacionalidade porque diz ele que é nas relações jurídicas privadas que se revela o espírito e o carácter de cada povo, as questões de capacidades, as questões de capacidades, as questões de estado e as próprias relações familiares tem em cada povo haver com questões familiares, culturais, religiosas, geográficas e climáticas.

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Esta posição leva a que Macini considere que cada indivíduo fora do seu país pode em nome do princípio da nacionalidade reclamar o respeito e o reconhecimento do seu direito privado internacional ,por outro lado cada estado pode proibir violações a sua ordem pública e, Macini conclui que o direito privado é um direito pessoal e que o direito público é um direito territorial. Poderia caracterizar-se assim o sistema deste pensador: Os conflitos das leis resolvem-se pela aplicação da lei nacional das pessoas salvas as excepções da autonomia da vontade e da ordem pública internacional. Pillet ,as leis têm que sacrificar um de dois valores ou o valor da generalidade ou o valor da permanência. Elas têm quando comporá o atributo da generalidade uma aplicação a todos os habitantes do território ,quer sejam nacionais quer sejam estrangeiros, quando tem o atributo da permanência aplicam-se aos sujeitos onde quer que estes se encontrem. Para olhar o problema na perspectiva de saber que leis devem sacrificar uma ou outra qualidade (generalidade ou permanência), é preciso saber qual o fim da lei. -As leis que pretendem defender a ordem no sentido da propriedade, do crédito ou mesmo da falência devem ter um carácter de generalidade. -As leis que visam proteger os sujeitos devem ter um carácter de generalidade, -as leis que visam defender os sujeitos devem ter o carácter de permanência. Com estes três pensadores ilustramos a forma como o Dip de hoje teve as suas raízes, nas teorias dos estatutos e nos três autores que nelas mais se distinguiram. Teses Universalistas: Estas doutrinas que referimos têm todo um carácter universalista porque pretendem estender os seus princípios a todos os estados por isso para além da fronteira do próprio estado. Como são doutrinas que se mostraram pouco eficazes do ponto de vista da sua aplicação prática entraram em crise no século XX. Dissemos que os códigos do século XIX todos continham normas de Dip mas a verdade é que estas normas não estavam repassadas de um carácter universalista porque entre os vários sistemas legais verificava-se grandes divergências, por outro lado,os estados totalitários impunham as regras nacionalistas aos legisladores e afastavam-se dos fins do Dip, pois que para o Dip não importa apenas dizer qual a lei competente mas a lei designada deve ser reconhecida como uma boa escolha de forma universal. Doutrina Portuguesa Como já foi referido o fundador do Dip foi o professor Machado Vilela antes dele um outro autor em 1868 de nome Lucas Falcão publicou o primeiro volume

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de Dip, um estudo que representa a primeira tentativa registada no nosso país de uma exposição global das diferentes matérias de Dip. No século XX surgem algumas monografias sobre temas de Dip mas sem grande significado. Machado Vilela iniciou os seus trabalhos com estudos ligados ao direito brasileiro e só depois escreveu o “Tratado elementar teórico e prático de Dip” para este autor o Dip abrange todas as matérias para Machado Vilela a par de um direito de conflitos o Dip deve também tratar das matérias atinentes a nacionalidade e aos direitos dos estrangeiros. Percunizou este autor a Harmonia Jurídica Internacional como um ideal supremo do Dip. Esta harmonia jurídica internacional é um ideal universalista, mas a doutrina que mantém este ideal ao longo de todo o século XIX acaba por verificar que a sua concretização e evaiada de dificuldades e então no século XX as teses universalistas acabam por resvalar para teses racionalistas. O Dip seria assim a projecção do direito privado nacional no direito internacional. Assim, o Dip subordinar-se-ia ao direito interno e por consequência a falta de uniformidade ,no Dip mais não seria o reflexo da falta de uniformidade do direito interno ora um Dip assim concebido que passe a reflectir os interesses de cada estado e não os fins universalistas é um Dip antagónico aos fins do próprio Dip. Reacções contra o nacionalismo Embora toda a primeira metade do século XX tenha sido atravessada ou mesmo dominada por tendências nacionalistas logo por volta dos anos 30 começaram a surgir reacções a este estado de coisas era urgente emancipar o Dip do direito interno de forma a tornar possível o seu ideal universalista Machado Vilela influenciado pelos teóricos do seu tempo acaba por aderir a um certo nacionalismo considerando que o Dip se submete a um direito interno, mas por outro lado também nos seus escritos uma visão universalista ao tratar do problema da fundamentação do Dip. Método internacional do Dip orientação tradicional Já vimos que o Dip tem como fim assegurar a continuidade das relações jurídicas plurilocalizadas mas como deverá agir para atingir esse fim? Este é o problema relativo ao método do Dip desde logo foi com Savigny que surgiu o método da chamada conexão. Quando Savigny deslocalizou a discussão dos limites da competência da lei para a questão da relação jurídica ,a partir desse momento criou a lógica do que é hoje o elemento de conexão embora para Savigny a terminologia fosse a de sede da relação jurídica. A pergunta mantém-se como definir quais os elementos de conexão que devem estar presentes em cada norma de conflitos? A conexão deve ressaltar dos fins do Dip e não deve ser uma consequência lógica dedutiva.

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A conexão hoje é um elemento da factualidade concreta que pode ser a nacionalidade dos sujeitos, a residência destes, o lugar da situação da coisa, o lugar do facto gerador da responsabilidade para só referir alguns dos principais elementos de conexão, mas sempre o elemento conexão é um elemento concreto que se encontra presente na relação jurídica. O método tradicional designa-se assim método de conexão consiste na utilização de normas de conflitos. Estas normas de conflitos têm a função de indicar o elemento da factualidade concreta através do qual se há-de determinar qual é a lei aplicável. O elemento de conexão é um elemento localizador. Estas normas de conflitos que funcionam como elementos de conexão definidos são designados normas rígidas. O juiz sempre que se apresenta e a situação jurídica corresponde à previsão da norma tem de aplicar essa norma e em consequência a lei que seja aplicada em função do elemento da conexão da norma, não pode fugir então desta solução. Por isso tendo em conta esta inflexibilidade estas normas designam-se rígidas. A par destas normas rígidas há sistemas jurídicos que usam as designadas normas abertas “open ended roules” estas são usadas no sistema Americano e significam que o julgador tem uma grande liberdade para em cada caso fixar a conexão mais apropriada estas normas, têm geralmente vários elementos de conexão e o juiz tendo em conta a situação jurídica concreta escolhe de entre estes qual o elemento de conexão mais relevante de acordo com o seu critério de julgador. Outras normas estatuem um elemento de conexão como o mais relevante mas permitem a aplicação de um outro porque na situação concreta apresenta com o caso uma maior ligação é a chamada conexão mais estreita. Primeiro exemplo expresso na lei austríaca de 1978 que refere que as situações internacionais devem ser julgadas segundo o direito que tenha com estas a conexão mais forte. Outros sistemas como o sistema Alemão de 1886, o sistema Italiano de 1995, tem também em comum entre si o facto de proclamarem nas suas normas o elemento de conexão mais estreito geralmente como elemento subsidiário, significa isto que a norma contém um elemento de conexão e na ausência de pressupostos factuais que permitam aplica-lo um segundo elemento de conexão mais estreita que terá aplicação no caso concreto, por ex: nas relações entre os cônjuges a norma de conflitos refere como elemento de conexão principal a nacionalidade comum, mas na falta desta fixa um elemento subsidiário o da residência comum, este elemento subsidiário é o de conexão mais estreita com a situação concreta. As matérias relativamente as quais a lei aplicável pode resultar da vontade das partes, a convenção de Roma determina que relativamente aos contratos as partes podem designar qual a lei competente para os reger, mas na falta

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desta designação, o julgador deverá optar pela conexão mais estreita que será a lei da residência habitual da parte a quem incumbe a prestação contratual. Quando o contrato tiver como objecto um imóvel presume-se que a conexão mais forte ou mais estreita é a do país onde o imóvel se encontra (lex rei citae), este elemento de conexão é o elemento de conexão relevante sempre que se trata de coisas imóveis. Estas presunções podem ser afastadas da relação contratual em concreto naquilo que é o conjunto das suas circunstâncias apresentar uma ligação mais forte com um outro país. Clausula Geral de excepção (expressa na lei Suiça) O código suíço de 1982 tem a manifestação mais acabada do que é uma norma aberta e a esta manifestação deu-se a designação de cláusula geral de excepção: “Esta lei não é aplicável aqueles casos ou situações jurídicas em que olhando ao conjunto das circunstâncias é manifesto que a causa tem um contacto frouxo com esse direito”. Esta cláusula que é válida para todo o sistema jurídico suíço afasta qualquer preceito dessa lei tendo em conta as circunstâncias do caso concreto se verificar que as mesmas têm com o sistema jurídico uma ligação frágil. Criticas ao Método tradicional Estas ideias do Dip clássico têm sido muito contestadas principalmente nos EUA. Pois que se o sistema tradicional do Dip funciona com normas rígidas é natural que um sistema como o Americano que usa fundamentalmente normas abertas gera maior criticas ao primeiro. A primeira dessas criticas é a de que é muito difícil apurar na relação jurídica qual é que é a conexão dominante entre a nacionalidade, a residência e o domicílio é difícil estabelecer a partida na norma qual destas irá ter a ligação mais forte com o caso concreto. A segunda critica é de que o direito material não foi feito para conhecer relações jurídicas plurilocalizadas e que por vezes o simples atravessar de uma fronteira comporta grandes alterações em termos da lei material o que trás ao Dip uma grande insegurança, esta insegurança é extensível as partes que passam a viver na incerteza sem saber se entre as várias leis conectadas lhes irá ser aplicável a menos ou a mais favorável. A esta critica acresce ainda o argumento que a justiça formal do Dip impede que se vá ao encontro da lei mais justa e mais adequada as partes. Soluções alternativas. Orientação Substancialista A orientação substancialista percuniza a aplicação no campo do Dip de princípios e critérios da justiça material nos fins do século XIX, o holandês Jitt a considerou que deviam procurar-se as soluções dos problemas na própria relação jurídica plurilocalizada independentemente das leis que com elas estão conectadas.

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Nos anos 50 do século XX o alemão Steindart na esteia de Jitt vem defender o pensamento do chamado “direito livre” o direito livre mais não seria do que o conceder uma absoluta liberdade ao julgador para perante a relação jurídica concreta, criar a solução que lhe parecesse mais equilibrada também na mesma linha substancialista o americano Mehren advogou como solução para a resolução por conflito de leis o reconhecimento de todos os pontos de vista de todas as ordens jurídicas envolvidas no caso, isto é, perante um acidente de viação em que existe um transporte gratuito em viatura automóvel do proprietário da viatura a um amigo, sendo que resulta a morte deste entende este autor que se o direito do condutor o absolver do pagamento de qualquer indemnização por o transporte ser gratuito e o direito do transportado condenar o condutor ao pagamento de indemnização a família do falecido a solução deverá ser o pagamento de 50% da indemnização que seria atribuída caso ambos os sistemas previssem esta solução. Este sistema foi objecto de inúmeras criticas por se entender que quer para um quer para outro dos sistemas envolvidos a solução não era satisfatória principalmente para aquele que previa a absolvição e a quem repugnaria o pagamento de uma qualquer indemnização fosse qual fosse o montante. Logo esta solução Salomónica não foi bem aceite. A adopção de soluções materiais no âmbito do Dip deve ser de carácter absolutamente excepcional defende o autor Kegel que esta excepcionalidade deve prender-se com situações de cúmulo jurídico e de vácuo jurídico. Situações de cúmulo jurídico e de Vácuo jurídico As situações de cúmulo jurídico ocorrem quando duas ou mais leis aplicáveis a uma lei concreta são contraditórias entre si conforme já foi referido existe um cúmulo jurídico na situação relatada em que o cidadão italiano pretende exercer o seu direito de visitas ao filho residente com a mãe na Alemanha sendo que cada um dos sistemas materiais dos respectivos países se auto excluem pois que o sistema Italiano considera legitimo a pretensão do pai o sistema Alemão considerava igualmente legitima a recusa da mãe. Já as situações de vácuo jurídico são sistemas em que existem lacunas em todas as leis conectadas com o caso concreto, isto é, nenhum dos sistemas materiais das leis em conexão previu um tipo de situação que está a ser objecto de julgamento. Consideram alguns autores que alguns autores de cúmulo e de vácuo devem ser resolvidos por recurso a normas de segundo grau criadas especificadamente para situações de cúmulo jurídico e de vácuo jurídico que só na ausência destas normas é que poderá recorrer-se ao chamado sistema de adaptação que mais não é do que a combinação de várias normas dos sistemas conectados que resulta numa solução adaptada ao caso concreto. Esta adaptação tanto pode ser feita a partir dos sistemas materiais como a partir das normas de Dip. Um caso histórico que chamou a atenção para a necessidade de repensar este tipo de problemáticas ficou conhecido como o caso Chemooni nome do cidadão

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tunisino entretanto residente em França e naturalizado francês que foi objecto de uma acção jurídica movida pela sua segunda mulher também ela tunisina naturalizada francesa que face ao direito material Francês vem pedir alimentos ao marido no cour de cassatin français. Esta pretensão foi diferida e Chemooni foi condenado a pagar alimentos porque o casamento foi reconhecido em França á luz da lei do estatuto pessoal dos envolvidos a lei tunisina que permite a poligamia. No sistema Português actual esta situação nunca se colocaria porque a excepção de ordem pública impediria o reconhecimento do casamento. Rigaux a propósito de questão desta natureza considera que havendo dissonância entre a lei originária e a nova lei deve ser aplicada a lei do primeiro estatuto que foi o que aconteceu no caso Chemooni. Procura da melhor lei Uma outra corrente substancialista ficou conhecida como a da busca da melhor lei, esta corrente não repudia a conexão e considera que competente deverá ser aquela lei que de entre as várias leis conexionadas se mostre mais justa para a resolução do caso. Esta busca da melhor lei faz-se segundo critérios de justiça material e Cavers principal defensor desta teoria diz que para a escolha da melhor lei devem presidir dois critérios a da lei mais justa para as partes e a da conexão mais próxima. Estes dois critérios devem ser combinados e resultar assim na escolha da melhor lei. Esta doutrina combina um critério de justiça formal e um critério de justiça material. Lex Mercatoria Outra corrente que integra a tendência substancialista é a que advoga a existência de um corpo de normas de Dip especial que sirva para regular as relações internacionais, este Dip especial é constituído por direito material e costume ser designado por lex mercatoria integrando nesta um conjunto complexo de matérias a que alguns chamam direito mas Ferrer Correia considera duvidosa essa qualificação. A lex mercatoria conjuga usos do comércio internacional, contratos tipos, jurisprudência dos tribunais arbitrais e designa-se como mercatoria de mercadoria por ter haver com matérias do comércio internacional. Até que ponto é que os tribunais chamados a julgar situações jurídicas plurilocalizadas vão fundamentar as suas decisões neste complexo de matérias designada lex mercatoria vai depender de estado para estado e até de julgador para julgador pois que é possível imaginar situações em que o juiz pode assentar a sua decisão em jurisprudência dos tribunais arbitrais ou em usos e costumes

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do comércio internacional mas é também evidente que a lex mercatoria não pode ser de aplicação imperativa. Perspectiva do interesse do Estado (B.Currie) Segundo esta perspectiva quer o elemento de conexão quer o sistema de regra de conflitos deve ser completamente abandonado. A solução para o conflito de leis deve obter-se a partir da análise das politicas em que se inspiram as leis e onde para este autor reside o interesse do Estado , as criticas a esta corrente doutrinal é de que por um lado é difícil descortinar o interesse do estado e por outro lado os fins do Dip são a segurança e a continuidade das relações jurídicas plurilocalizadas. Na perspectiva dos sujeitos e não da perspectiva do Estado. Não deixa contudo de ser verdade que há interesses do estado que tem que ser salvaguardadas Esses interesses fundamentais levam a que existam regras de aplicação necessária é imediata e como tal obrigatória pelo tribunal, estas normas de aplicação obrigatória aplica-se quando há uma conexão específica entre a situação e a lei. Esta conexão específica não coincide com a conexão das normas de conflitos. É o caso dos tribunais franceses que aplicam sempre lex fori a todos os menores residentes em França quando se tratam de matérias de assistência a infância ,sem tomar em consideração o elemento de conexão da norma de conflitos que manda aplicar as matérias de estatuto pessoal a lex patriae. Esta defesa do fim do estado aparece não como um verdadeiro interesse do sujeito no caso os menores. Em conclusão as soluções metodológicas enumeradas e descritas enquanto alternativas do sistema tradicional não podem aceitar-se. Por outro lado, algumas destas soluções apenas pretendam complementar o método tradicional é o caso da tendência substancialista que manda aplicar ao caso concreto para além da lei mais próxima a lei mais favorável, apenas Currie prescinde no seu pensamento do requisito da conexão especial ao defender que o que tem de ser salvaguardado é o interesse do estado. Mas o certo é que cada uma das teses enunciadas tem alguma coisa de positivo e que hoje o Dip é cada vez mais uma disciplina aberta, pluralista, pluri-dimensional que conta com os contributos de todas as teses que vão sendo divulgadas. Teoria da Norma de Conflitos

• Regras de conflitos unilaterais e bilaterais A norma tradicional do Dip é a norma de conflitos bilateral esta norma diz-se bilateral porque prevê a aplicação de uma lei que tanto pode ser nacional como estrangeira. Por ex: no elemento de conexão lex rei sitae se o imóvel estiver em Portugal aplica-se lei portuguesa, se o imóvel estiver num outro Estado aplica-se lei estrangeira esta é a orientação que tem sido tradicionalmente seguida.

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Já as normas de conflitos unilaterais indicam sempre como lei aplicável apenas uma lei, a lex fori. Enunciam-se da seguinte maneira as questões de capacidade serão resolvidas pela lei francesa desde que se trate de cidadãos franceses mesmo que domiciliados em outro estado. São normas cujo o elemento de conexão prevê apenas e tão só a aplicação da lex fori das duas soluções, qual preferir a bilateralidade ou a unilateralidade? Por vezes as normas unilaterais são tidas como incompletas e como tal levam a que tenham de ser integradas analogicamente o que as torna forçosamente transforma em lei bilaterais. Esta é uma das críticas que é feita ao unilateralismo. O argumento de defesa é que o Estado não tem poderes para delimitar senão a competência das suas próprias leis. Este argumento de defesa parte de um pressuposto de confusão. Porque o Dip ao considerar competente uma lei estrangeira não está a interferir na soberania dessa lei mas antes está a acatar essa soberania ,porque a soberania de cada estado reside no poder que esse estado tem para fazer observar a lei, Roland Quadri um dos maiores defensores do unilateralismo defende que a aplicabilidade de uma norma sendo estrangeira só pode resultar de uma regra a que esse sistema pertence. O sistema unilateralista desdobra-se assim em duas proposições. 1ª Não estando em causa a competência do direito local deve aplicar-se a relação controvertida o direito que se julgue competente para o reger. 2ª Não deve decidir-se um caso pelas disposições de uma lei que não o inclua no seu campo de aplicação. A estrutura da regra de conflitos A norma bilateral obedece ao seguinte esquema as questões jurídicas pertencentes a categorias X serão resolvidas de acordo com a lei em que a situação em concreto estiver ligada através de uma conexão mais forte. Elementos constitutivos da norma de conflitos bilateral A norma de conflitos bilateral é composta por três elementos: 1º Elemento é objecto da conexão ou conceito quadro 2º Elemento é a conexão 3º Elemento é a consequência jurídica O objecto conexão é aquilo que vai ser referenciado é o chamado conceito quadro que é um elemento técnico-jurídico. Elemento de conexão é o elemento de ligação entre o objecto e a consequência jurídica e tem uma tarefa localizadora localiza o objecto de

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conexão num espaço concreto estabelece a ligação entre a situação jurídica em análise e a lei que irá ser aplicável. A consequência jurídica é uma declaração de aplicabilidade dos preceitos jurídica material. Não basta localizar ou concretizar o elemento nacionalidade ou residência mas é preciso faze-lo com relação a um determinado estado. Colocam-se aqui duas questões:

a) A questão do conflito de conexões. b) Qual é o critério que deve obedecer a escolha do factor de conexão ou

do elemento de conexão. Norma de conflito bilateral: Objecto de conexão +Elemento de Conexão + Consequência Jurídica Conceito quadro Localizador (Nacionalidade, Lei em concreto Domicilio, lugar da coisa) vai aplicar-se Técnico-jurídico Casamento Há dois sistemas quanto aos elementos: - os sistemas de conexão única e os sistemas de conexão plurima. Nos sistemas de conexão única aponta-se como elemento localizador apenas um único elemento por exemplo a nacionalidade, isto é, a norma de conflitos apenas contém um elemento de conexão. Embora o sistema de conexão única preveja como elemento de conexão apenas um elemento, por ex: a nacionalidade não significa que não possam ser aplicáveis duas leis, é o que acontece na situação do sujeito com dupla nacionalidade. E nesse caso como actuar? Nesse caso o julgador terá de optar pela nacionalidade mais efectiva. Conexão plurima ou múltipla No caso da conexão designada múltipla ou plurima a norma de conflitos contém vários elementos de conexão e cabe ao juiz optar aquela que é verdadeiramente a mais efectiva. Neste caso falamos de conexão ou competência alternativa. Nestas normas de conflitos de competência alternativa pode existir uma condição de o juiz ter de valorar os elementos de conexão, tendo em conta a garantia da validade do negócio ,assim será dada prevalência aquele elemento de conexão que localize o caso concreto numa lei material que o considere válido designa-se esta condição per favor negotii. Competência cumulativa Existe competência cumulativa quando a norma de conflitos faz depender a aplicação de uma lei do reconhecimento da situação por uma outra lei,por ex:

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pode fazer-se depender a constituição do vínculo de adopção do voto da conformidade de duas ou mais leis por exemplo da lei reguladora entre o adoptando e a família de origem e a lei do adoptante. Artigo 60º código civil nº4. Competência distributiva Existem casos em que a norma de conflitos distribui por dois sistemas jurídicos as condições de validade de uma determinada situação jurídica,por ex: relativamente a competência ou a capacidade dos sujeitos para contrair casamento a lei distribui essa avaliação em relação a cada um dos cônjuges a lei nacional de cada um deles. Conexões Subsidiarias A conexão subsidiária existe quando a norma de conflitos estabelece que a falta da chamada conexão primária,por ex: a nacionalidade comum se fixa uma conexão subsidiária ou secundária a residência comum. O problema da qualificação e o conceito quadro É por meio de conceitos técnico jurídicos que as normas de conflitos estabelecem o seu corpo de aplicação, entendendo-se por isto o espaço ou a área jurídica em que o elemento de conexão da norma é chamado a operar. Tais conceitos técnico jurídicos têm a característica de poder incorporar uma multiplicidade de conteúdo jurídico são o chamado conceito quadro. Estes conceitos porque não são conceitos de facto levantam o chamado problema de qualificação. Determinada regra de conflitos refere-se ao instituto de separação de pessoas e bens e também ao divórcio. Uma outra refere-se aos problemas na área dos efeitos do casamento ou na dos negócios jurídicos. A questão que aqui se coloca é a de saber o que é por exemplo o que é o divórcio para a norma que usa esse conceito. Vale como divórcio o chamado “talak” do direito muçulmano? Será que a união de facto admitido em certos sistemas de direito pode ser incluída na hipótese da regra de conflitos que se ocupa dos efeitos do casamento?

A) Perspectiva Tradicional A perspectiva tradicional é a teoria da qualificação pela lex fori a determinação dos conceitos obtém-se recorrendo a lei material da ordem local. A execução da aludida da tarefa interpretativa deverá ter em conta uma referência automática aos conceitos homólogos dos preceitos materiais da lex fori.

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Objecto da conexão Lex Fori Lei material do Foro B) Perspectiva de Rabel

Rabel advoga a necessidade de construir e interpretar o objecto de conexão da norma de conflitos em função dos vários sistemas jurídicos cuja aplicação ela é susceptível de desencadear. Entende este autor que não é com um recurso a um direito material que a norma de conflitos cumpre a vocação internacional para que foi criada? Na interpretação das normas jurídicas tem de haver pois o recurso ao direito comparado. Só pelo método da comparação se torna possível apurar o conteúdo dos conceitos utilizados pelas normas do Dip. A importância do direito comparado para este autor é enorme considera ele que os objectos de conexão não são moldes vazios mas formas elásticas e só o método comparativo permite captar nas instituições dos diversos países uma essência e um destino comum. Todo o conceito quadro deve ser tomado em sentido lato anda a poder abranger uma série indeterminada de conceitos e de institutos jurídicos. O conceito quadro tem de ter a elasticidade necessária para que se possa incluir nele todas as normas e todas as instituições seja qual for o seu nome e até mesmo o seu conteúdo desde que no seu ordenamento jurídico a que pertencem desempenhem uma função jurídica equivalente aquela que o legislador tinha em mente quando criou a norma de conflitos um determinado objecto de conexão. E chegamos aqui ao aspecto fundamental da questão que é a descoberta da razão ou do fundamento da própria norma de conflitos, no fundo a reconstituição do juízo de valor em que a mesma se baseia. Esse é o elemento capaz de determinar o âmbito da respectiva categoria jurídica expressa pelo conceito quadro. Como sabemos todo o sistema da regra de conflitos deve ser pré-ordenado a satisfação de determinados interesses. O legislador deve proceder a termos de cada matéria corresponder a conexão mais adequada em função de interesses que em cada um dos vários sectores devam considerar-se, o momento mais importante deste processo de qualificação é o de determinar para cada preceito de direito de conflitos o juízo valorativo que o informa, isto é, qual é o interesse ou o valor que o legislador quis promover com a feitura dessa norma.

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O que se sugere é uma interpretação teleológica. E o Dip tem a sua intencionalidade e a sua justiça própria pelo que a interpretação dos conceitos quadro tem de ser feita com uma certa autonomia. Há quem defenda que pertencendo a norma de conflitos a lex fori é esta a lei que deve caber a sua interpretação só aqui a lex fori não é direito material mas é direito internacional remeter assim o conceito quadro a lex fori e revela-se desajustado ao espírito do Dip. Um conceito quadro abrange todos os institutos ou conteúdos jurídicos quer de direito nacional quer de direito estrangeiro aos quais convenha segundo a Ratio leges o tipo de conexão adoptada pela regra de conflitos que utiliza o mesmo conceito. À lex fori compete decidir se os preceitos considerados correspondem ao tipo visado nas regras de conflitos. Mas é no quadro da lex causae que vão perspectivar-se as características das normas materiais aplicáveis ao caso concreto. O problema central da qualificação consiste em averiguar de entre os preceitos materiais do ordenamento designado por uma certa norma de conflitos, quais são os correspondentes a categoria definido pelo conceito quadro dessa norma e, por fim concluir se dado o preceito do ordenamento pode ser subsumido a tal categoria. É nessa avaliação que reside a verdadeira qualificação, a lex fori decide se os preceitos considerados correspondem ao tipo visado nas regras de conflito mas é no quadro da lex causae que vão calhar-se as características aplicáveis ao caso concreto. Doutrina Portuguesa A qualificação em Dip tem por objecto preceitos jurídico materiais. O problema da qualificação strictu sensu consiste em averiguar se uma tal norma um complexo de normas da lex causae atentas as características que essa norma ou essas normas revestem dessa lei onde emanam entram na categoria de conexão ou no conceito quadro na lex fori. No fundo cabe aqui apurar se é possível ou não aplicar aquele caso concreto aquela norma de conflitos da lex fori que contém aquele conceito quadro.

Norma de conflitos ─ ─ ↓ ↓ Elemento localizador: Lei em concreto Ex. Lex patriae; Lex domicilii; Lex sitae

Conceito quadro Objecto de conexão

Elemento de conexão

Consequência jurídica

Qualificação: temos de saber se o caso concreto cabe ou não nas normas.

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O artigo 15º do código civil trata do problema da qualificação em Portugal. Nos termos desta disposição lega a qualificação é feita dentro do sistema de duplicidade sendo que em sede da lex causae é preciso avaliar o conteúdo e a função de determinado normativo ou instituto e em sede de lex fori verificar se esse normativo ou esse instituto integra o regime visado na norma de conflitos, verificamos assim que o sistema do direito português se afasta de toda a teoria que percuniza o recurso ao ponto de vista do direito material. Direito material da lex for,evitando assim a referência automática o código civil português repudia o processo segundo o qual, para chegar a determinação da regra de conflitos aplicável há que começar por submeter a situação jurídica concreta as leis materiais do fórum a que caberia avaliar o caso se este fosse de origem local. Esta qualificação primária não foi a opção do nosso legislador nem dos legisladores na maioria dos sistemas europeus. Vejamos a seguinte situação prática: se a lei A regula a promessa de casamento como uma instituição familiar é preciso inclui-la para efeitos de aplicação dessa lei na categoria de conexão ou no conceito quadro do sistema de Dip do fórum indicado como direito da família não importa qualquer relevância jurídica a promessa de casamento pois o que interessa é que o sistema da lex causae o faz. O primeiro momento da qualificação faz-se em sede de direito material da lex causae ,o segundo momento da qualificação faz-se em sede de Dip da lex fori. É através da dupla qualificação que se chega ao respeito pelos sistemas estrangeiros (lex causae) e procedendo desta forma coloca-se em pé de igualdade a lex causae e a lex fori. Em suma deve-se evitar a qualificação primária através da lex fori porque ela significaria uma imposição grosseira dos nossos valores a situações e cidadãos provenientes de outras culturas jurídicas. Teoria de Robertson Robertson distingue o processo de qualificação em duas operações: 1ª é subsumir o caso concreto a uma norma de conflitos do fórum. 2ª operação é definir a partir das leis ou da lei causal, se a norma ou normas pertence á ordem de questões que a norma de conflitos definiu no seu conceito quadro. É um processo que não difere fortemente do nosso processo embora comece pela escolha da norma de conflitos partindo depois para a lex causae. Teoria de Anzelloti, Ago, Fedozi Defendem também uma dupla qualificação em dois momentos:

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1º Momento averiguar quais são as relações que a regra de conflitos da lex fori pretende designar através de um processo interpretativo. 2º Momento averiguar depois em sede da lei material da lex causae qual a regra que se aplica aquele caso concreto. Esta teoria não se preocupa com o segundo momento de qualificação a não ser para verificar se existe uma verdadeira identidade entre a norma da lex causae e a previsão da lex fori, verificando apenas se existe identidade do ponto de vista da forma e não do ponto de vista do fim. Esta concepção parece-nos errada e contrária a previsão do nosso 15º código civil porque não tem em conta a função que determinado preceito da lex fori, que se relacionem de modo essencial com os fins e com os conteúdos da lex causae. Rejeita contudo, a aplicação de uma norma de conflitos que não enquadre estes fins e estes conteúdos previstos na lex causae. Há no nosso sistema por conseguinte, uma verdadeira paridade de tratamento, os factores de aplicabilidade de leis estrangeiras são os mesmos dos factores de aplicabilidade da lei do fórum. A qualificação primária lesa ou viola, esta paridade, na medida em que manda aplicar à questão concreta, critérios das suas normas materiais para averiguar se de acordo com esses critérios essa situação deve ou não subsumir-se a uma determinada regra de conflitos. Conflitos negativos e conflitos positivos de qualificações A e B alemães, prometem-se mutuamente em casamento. Algum tempo depois B em França revoga a sua promessa. Em Portugal A procura fazer valer contra B os seus direitos. As disposições do direito alemão sobre esponsais, pertencem ao domínio do direito da família, em França não existe qualquer disposição sobre direito esponsalicio. Por conseguinte, à face da lei francesa, a ruptura da promessa do casamento, só pode ser relevante se encarada do ponto de vista do acto ilícito extracontratual. Temos aqui uma situação de concorrência de dois preceitos legais, em que leis materiais diferentes são convocadas para regular o mesmo caso. Mas que direito irá o Tribunal Português aplicar? Não que no direito Português norma de conflitos que nos permite de forma directa resolver a situação. O tribunal Português aplicaria lei alemã porque havendo uma situação de cúmulo jurídico, a lei especial Alemã, prevalece em sede da disposição sobre a lei Francesa. 1ª Distinga e dê exemplos de competência cumulativa e competência alternativa. 2ª Diga o que entende por harmonia de julgados e qual é a sua relevância para o Dip.

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3ª “A justiça formal do Dip cede por vezes perante a justiça material. As relações do Dip com o direito constitucional ilustram esta afirmação.” Conflitos positivos e Conflitos negativos de Sistemas Esta questão tem como ponto de partida o facto de muitas vezes os estados envolvidos nas relações jurídicas plurilocalizadas não se considerarem competentes para regular o caso quando assim é falamos de conflitos negativos que ocorre quando cada um dos estados conectados com a situação jurídica concreta declina a competência para a regular. Os conflitos positivos de sistemas ocorrem na situação inversa quando dois ou mais estados reclamam essa competência. Esta problemática que dá origem a questão que a seguir será tratada e que se designa por reenvio, assenta em situações concretas das quais a seguir se dará exemplo e levou a que os tribunais por via de jurisprudência tentassem resolver a situação quer de conflitos negativos quer de conflitos positivos através do recurso ao designado reenvio.

EX:Vejamos agora uma situação concreta e real ocorrido em França com uma cidadã Bávara que morre intestada deixando bens em território francês. Apresentam-se à herança parentes colaterais dessa cidadã. A lei francesa não lhes reconhece qualquer direito em termos sucessório e nesse caso não havendo herdeiros reconhecidos os bens considerar-se-iam perdidos face ao Estado francês.

A falecida, embora tivesse um longo período de permanência em França, continuava a ter o seu domicilio legal na Baviera. Em sede de 1ªinstância. O tribunal francês chamado a apreciar o caso, decidiu dar prevalência ao elemento de conexão lex patriae ou lex domicilii, que no caso era a Baviera e aplicar lei bávara o que tem como consequência reconhecer os parentes colaterais herdeiros.

Inconformado com esta decisão de 1ªinstância, o Estado francês interpôs recurso e nesta sede de recurso levantou-se a seguinte questão: Quando a lei francesa considerou competente a lei da nacionalidade ou do domicilio do de cujos, estava a fazê-lo tendo em conta a lei material bávara ou o DIP bávaro?

A resposta a esta pergunta foi dada pelo Cour de Cassatin Français, onde foi interposto o recurso, considerando que quando a lei francesa se referia à lei bávara está a referenciar-se ao DIP bávaro e não à sua lei material. E o DIP bávaro considerava competente a lei do domicilio de facto do de cujos que era, portanto, a lei francesa, sendo certo que neste caso acabou por ser aplicada lei francesa e considerar os bens perdidos a favor do Estado francês.

A jurisprudência francesa a partir deste caso deu origem a uma corrente doutrinária designada por reenvio, que vem abrir a possibilidade de sempre que uma lei considera competente uma outra, estar a referir-se não ao direito material dessa lei mas sim, ao seu direito formal, sito é, ao seu DIP.

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A propósito desta questão, estabeleceram-se três facções distintas: a) Aqueles que eram contrários ao reenvio e que consideravam que sempre

que uma lei se refere a uma lei estrangeira considerando-a competente estão a referir-se apenas aos preceitos jurídico materiais dessa lei.

Estes partidários da chamada referencia material designaram-se anti-devolucionistas e os argumentos com que sustentam a defesa da sua tese é de que o DIP da lex fori, porque está imbuído das características da universalidade é válido relativamente a todos os sistemas com ele conectados e que como tal não faz sentido abrir mão do elemento de conexão que se encontra presente na lex fori para acolher elementos de conexão das normas de conflitos das leis estrangeiras.

b) Aqueles que defendem como solução para o conflito de sistemas a

possibilidade de haver reenvio nas suas duas formas, retorno e transmissão, advogam que só por via do reenvio é possível que independentemente do Estado onde a acção é intentada a solução jurídica em sede de lei aplicável seja a mesma. Defendem estes teóricos que não considerar a possibilidade de aceitar o DIP dos outros estados envolvidos é negar um princípio de reconhecimento da reciprocidade e da igualdade entre os estados e é impor uma visão totalitária do DIP ,que é incompatível com os fins deste direito.

Assim, os partidários desta teoria da devolução ou do reenvio, aceitam-no como forma de obter a harmonia jurídica internacional nas suas duas manifestações:

Transmissão ou endosso L.1 →⇒ L.1 ⇒ L.3 → L.3 L.1 ⇒ L.2 → L.1 A principal critica à teoria devolucionista é que ela conduz a situações de

beco sem saída, isto é, a situações de círculo vicioso. Quando todos os estados envolvidos praticam o reenvio (usam a referencia

global). Por outro lado, o argumento favorável mais relevante é de que os diversos estados envolvidos poderão, adoptando o reenvio, obter harmonia jurídica, conseguir evitar o círculo vicioso e considerar que a ultima referencia é sempre referencia material.

c) Há uma corrente doutrinária que foi acolhida no nosso C.C. que

considera que a referencia material deve ser o ponto de partida, mas que admite excepções a esta regra, como forma de obter a harmonia jurídica internacional. Assim, acontece no nosso C.C., artigo 16º, que é considera que a regra para o direito português é a referencia material “sempre que a lei se refere a uma lei estrangeira, esta a referir-se aos preceitos materiais dessa

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lei, mas esta regra tem excepções nos art.17º, 18º e 19º à prática de referencia material aceitando o reenvio como uma forma de atingir a harmonia jurídica internacional ou a validade de um negocio jurídico que de outro modo seria inválido, é o chamado favor negotii.

Teoria da dupla devolução Dentro do reenvio, há várias teorias que têm sempre como ponto de

partida o recurso à referência global dentro estas destaca-se uma teoria que é seguida no direito britânico, de dupla devolução.

Enuncia-se da seguinte forma, sempre que uma lei é chamada a decidir um determinado caso, deverá fazê-lo, como se o caso fosse julgado no sistema para onde essa lei referencia, isto é, o juiz de L.1 deve julgar o caso como se ele fosse julgado pelo juiz de L.2, chama-se a esta corrente doutrinária, teoria de dupla devolução.

Em síntese, os sistemas de referencia material são sistemas que vigoram em estados como o Brasil, mas que no estado puro não poderão concluir é harmonia jurídica internacional, por seu lado, os adeptos do devolucionismo não conseguem resolver o problema do ciclo vicioso sem recurso à referencia material e temos por fim os sistemas, como o nosso português, que aceitam como regra a referencia material, mas abrem a porta ao reenvio como forma de obter quer harmonia jurídica internacional, quer outros resultados de que se deu o ex: do favor negotii.

O reenvio tem duas grandes correntes: - a devolução simples (transmissão ou endosso e retorno) -e a dupla devolução. Esta última, que vigora nos sistemas anglo-saxónico, privilegia o julgador

da lei referenciada de tal modo que tudo se passa como se o caso fosse decidido em L.2 limitando-se L.1 a aderir a esta posição.

Dupla devolução L.1 ⇒ L.2 (a l.1 vai decidir como se fosse L.2)

Sistema Misto: Doutrina Da Referência Material que aceita a devolução com alcance limitado o reenvio e harmonia jurídica internacional. Para esta doutrina como principio geral o reenvio é inaceitável seja qual for a sua modalidade o reenvio não é hoje aceite como um princípio do Dip mas sim como uma técnica para atingir determinados objectivos, esses objectivos são de vária ordem mas desde logo o principal de entre todos é a da harmonia jurídica internacional ,

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em que hipótese pode o reenvio contribuir para a harmonia jurídica internacional? 1-Retorno directo, neste caso de retorno directo só existe harmonia jurídica internacional se o L2 devolver a lex fori em referência material, ou seja, se o estado de L2 for anti-devolucionista. L1 L2

Os estados anti-devolucionistas são o brasileiro, o grego e o dinamarquês como se verifica nesta situação haverá harmonia jurídica internacional e como tal será inútil o recurso ao chamado fórum shopping. Já noutros dois casos possíveis não chegaremos ao mesmo resultado se a lei estrangeira, ou seja, L2 adoptar o princípio do reenvio integral nesse caso teremos uma situação de referência global que se for de dupla devolução L2 irá julgar o caso como este fosse julgado em L1. L1 L2 Dupla devolução Uma vez que todos os sistemas envolvem uma referência que é global. L1 a devolução simples, L2 o reenvio integral. O caso parece não ter aqui uma solução óbvia a menos que a jurisprudência considere e assim tem sido que a referência de L2 para L1 seja considerada uma referência com efeitos materiais e assim sendo a resolução do caso passaria por aplicar lei de L1. 2- Transmissão de competência O reenvio para um terceiro estado(L3) pode tornar viável a harmonia jurídica internacional ,desde logo na hipótese de L1 enviar para L2 em referência global, L2 enviar para L3 em referência global e L3 poder fazer duas coisas: ou retornar a L2 ou retornar a L1, se o fizer em referência global teremos o círculo vicioso mas se considerar-mos que o envio de L2 para L3 é um envio sobre a forma material e já não é global, teremos o problema resolvido em L3. L1 L2 L3 Podemos concluir assim que tanto nos casos de retorno como nos casos de transmissão de competência só o reenvio conjugado com a referência material poderá conduzir a uma solução de harmonia jurídica internacional e evitar o círculo vicioso.

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3-Reenvio Oculto Nas matérias de divórcio e de adopção não existe no direito britânico normas de conflito que possam designar quanto a estas matérias qual é a lei aplicável. Assim, se um casal britânico pretende divorciar-se em Portugal país onde tem o seu domicílio o tribunal português em princípio não poderá reportar-se ao direito inglês por não haver aí regra de conflitos que no seu conceito quadro preveja a situação, nem tão pouco poderá reportar-se ao direito português porque este não é o estado da nacionalidade dos sujeitos e como tal o direito português consideraria competente o estado da lei da nacionalidade. Acontece que o sistema britânico que nestas situações, ou seja, nas situações em que existe lacuna ou omissão no seu Dip quando a lex fori o considera a si sistema britânico lei competente, deverá haver um retorno a lex fori e deve ser esta a lei aplicável. O que se passa aqui é um verdadeiro reenvio do ponto de vista prático embora de forma oculta porque não é por meio de uma norma de conflitos que o retorno ou reenvio é feito mas sim através desta previsão de carácter geral que visa ultrapassar o problema das lacunas. Conclusão: Já vimos que o reenvio é apenas uma técnica para resolução de problemas que se colocam no Dip e como tal é hoje aceite apenas quando atinge determinados objectivos como iremos ver é o que se passa no sistema jurídico português. Lei Portuguesa Antes do código civil actual o sistema em Portugal era simplesmente contrário ao reenvio. Apenas as convenções de Genebra e Haia 1930,1902 o acolhiam, com o código civil de 1966 esta questão foi objecto de profunda revisão porque se considerou que o reenvio poderia naqueles casos que foram referidos no capítulo anterior ajudar a resolver determinadas questões e atingir objectivos de grande relevância para o Dip. A convenção de Haia de 1902 subscrita pelo estado português é uma das duas excepções anteriores a 1966 em que o estado Português aceitou o reenvio. No seu artigo 1º a convenção de Haia refere “ O direito de contrair casamento é regulado pela lei nacional de cada um dos cônjuges a não ser que uma disposição dessa lei se refira a outra lei”. Também na convenção de Genebra de 1930 que regula os conflitos de lei em matéria de letras e livranças artigo 2º “ A capacidade de uma pessoa se obrigar por letra e livrança é regulado pela lei nacional excepto se essa lei considerar competente a lei de um outro país e nesse caso será essa a lei aplicável”. E durante a primeira metade do século XX foram estas as duas únicas situações com carácter absolutamente excepcional em que os tribunais admitiram aceitar a aplicação do reenvio.

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Em 1966 o código civil vem com rigor definir o terreno em que o reenvio pode actuar. O ponto de partida do nosso legislador é a referência material consagrada no artigo 16º do nosso código. Este artigo enuncia como principio geral que a referência a uma lei estrangeira implica a aplicação do direito material dessa lei excepto se existir algum preceito no nosso código que seja contrário a aplicação desta referência material, o nosso legislador optou assim por uma via intermédia está expressa nos artigos 17º,18º, 19º pelo que iremos começar por analisar o artigo 18º da nossa lei. Artigo 18º nº1 CC L1 L2 Esta é a primeira situação de excepção prevista pelo nosso legislador relativamente ao artigo 16º (referência material). No reenvio de 1º grau ou de retorno a lei material da lex fori só é aplicável se a lei estrangeira para ela devolver, isto é, se a lei estrangeira devolver em referência material (ao direito interno Português). Artigo 16º L1 L2 Artigo 18º nº1 L1 L2 O reenvio não promove quando a referência da lei estrangeira a lei portuguesa for uma referência global ,nesse caso aplica-se lei material de L2, isto é, aplica-se o artigo 16º do código civil. Portanto se a referência de L1 para L2 for uma referência global mesmo na forma de reenvio integral ou dupla devolução aplica-mos de igual maneira a regra do artigo 16º. Numa situação de reenvio oculto de L2 para L1 se l2 for estado britânico onde este estado é adoptado temos o efeito de um verdadeiro retorno a referência material e logo deveremos aplicar a excepção do artigo 18º nº1. Casos práticos:

1- Discute-se perante os tribunais portugueses a sucessão imobiliária de A belga que morre com último domicílio em Lisboa deixando bens imóveis no Canadá.

A norma de conflitos portuguesa remete para a lei da situação dos bens praticando devolução simples. O direito canadiano é anti-devolucionista e também não se considera competente e remete para a lei do domicílio do de cujus. Qual a lei aplicável e porque?

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L.1 ⇒ L.2 ⇒ L.3 Lex fori Lex patriae Lex rei sitae

O artigo 18º nº1 funciona como uma excepção a aplicação da regra do artigo 16º (referência material) esta excepção implica a verificação de dois pressupostos cumulativamente: a) Que a lei designada directa ou indirectamente pela norma de conflitos portuguesa, esta lei designada pode ser L2, L3, L4……. No caso da transmissão de competência, tem de retornar a lei portuguesa.

b) Este retorno da lei estrangeira para a lei portuguesa tem de ser um retorno feito em referência material (anti-devolucionista). Não se verificando os dois requisitos cumulativamente não é possível aplicar a excepção do 18º nº1 e será forçoso aplicar a regra do artigo 16º, isto é, considerar que a referência de L1 (lei portuguesa) para L2 (lei estrangeira) é material.

2- Discute-se perante os tribunais portugueses uma questão relativa a uma pensão de alimentos pedida por uma cidadã Suiça ao seu cônjuge residem ambos em Portugal e o casamento foi celebrado em Paris. A norma de conflitos portuguesa considera competente para regular matérias emergentes das relações familiares a lei da nacionalidade dos cônjuges. A norma de conflitos Suíça considera competente a lei do lugar da celebração do casamento e faz a esta uma devolução simples. Por sua vez a lei francesa considera competente a lei do domicílio dos cônjuges e faz também para esta uma devolução simples. Quid iuris?

L.1 → L.2 ⇒ L.3 Lex fori Lex patriae Lex rei sitae Lex domicilii

Art16 lei L2

3- Discute-se nos tribunais portugueses uma questão relativa a adopção de um menor britânico domiciliado no Brasil cujos os adoptantes são portugueses. A norma de conflitos portuguesa considera competente para regular esta matéria a lei da nacionalidade do adoptado. Em

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matéria de adopção sabemos que o direito britânico não tem norma de conflitos. A lei brasileira é anti-devolucionista e considera a lei da nacionalidade dos adoptantes.

L.1 ⇒ L.2 Lex fori Lex patriae Reenvio oculto: como o estado britânico não tem norma de conflitos em matéria de adopção, existe um reenvio para lex fori, artigo 18º, n.1, C.C.

Transmissão de competência, artigo 17º, n.1, C.C. No artigo 17º, n.1, o legislador aceita o reenvio da lei designada pela norma de

conflitos portuguesa para outro sistema jurídico, desde que, este outro sistema se considere competente. A questão que se coloca é se o terceiro sistema, L.3, não se achar competente:

Numa primeira hipótese, imaginemos que L.1, lei portuguesa envia a sua competência para L.2. e este transmite para L.3 e L.3 retorna para L.2.

Neste caso, não se considera satisfeita a condição de onde dependia a aplicabilidade de L.3 e aceita-se que se aplique L.2 Pois que, ao aplicar L.2, estamos a contribuir para a harmonia jurídica internacional já que todos os sistemas aplicados consideram competente lei de L.2.

a) L.1 ⇒ L.2 ⇒ L.3

Se aplicássemos uma primeira interpretação meramente literal do art.17º, n.1 a hipótese da alínea a) levaria a que não fosse aceitável o reenvio e como tal não se aceitaria aplicar lei material de L.2. Contudo, e porque considerando que o principio que considera a aceitação do reenvio é o da harmonia jurídica internacional,

ao aceitarmos nesta hipótese de retorno de L.3 para L.2, o reenvio, estamos a obter harmonia jurídica internacional porque todos os Estados envolvidos irão aplicar lei material de L.3 e será por isso de aceitar a aplicação do artigo 17º, n.1 interpretando-o extensivamente, isto é, interpretando-o como se o artigo tivesse consagrado que quando L.3 se considera competente ou quando L.3 retorna a L.2.

E o que acontece quando L.3 não se considera competente e transmite a sua competência a uma L.4, ou seja, existe uma competência em cadeia?

b) L.1 ⇒ L.2 ⇒ L.3 ⇒ L.4

Considera-se neste caso, que será de aceitar a transmissão de competência em cadeia sendo possível, formular a seguinte máxima doutrinal: “Sempre que as diferentes leis em contacto com a situação a regular registem acordo quanto à competência de uma delas, será necessariamente essa a lei aplicável. Daí que se diga que a lei doutrinal portuguesa admite o reenvio quando ele se conforma com princípios altruístas, ao contrário da grande maioria dos outros sistemas favoráveis ao reenvio quando este serve interesses nacionalistas.”

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Hipóteses: Caso 1: A e B, tio e sobrinha, de nacionalidade Suiça, domiciliados na Rússia, celebram o seu

casamento em Moscovo. Discute-se nos tribunais portugueses a validade do acto invocando a disposição do código suíço que proíbe o casamento entre colaterais em 3ºgrau.

À face do direito interno Russo, o casamento seria válido. A norma de conflitos portuguesa, artigo 31º e 49º do C.C. remete para o direito suíço.

No direito suíço, a norma de conflitos considera válido o casamento celebrado por suíços no estrangeiro se, como tal o entender a lei do lugar da celebração do casamento.

O DIP russo considera a lei russa aplicável ao casamento de estrangeiros aí domiciliados.

Artigo 17º, n.1, C.C. L.1 ⇒ L.2 → L.3 Lex fori Lex patrie lex domicilii

Caso 2: Discute-se perante o Conservador do Registo Civil a capacidade matrimonial de A,

cidadão americano, domiciliado em Itália que pretende casar-se em Lisboa. A norma de conflitos portuguesa considera competente para regular o caso, a lei da nacionalidade do A, artigo 31º e 49º do C.C.

A lei nova-iorquina atribui competência à lei do lugar onde o acto vá ser celebrado. Diga se perante a situação concreta e tendo em conta que o Estado de Nova York é

anti-devolucionista, que lei, o Conservador português deverá aplicar. Artigo 18º, n.1 L.1 ⇒ L.2 Lex fori Lex patriae

Caso 3: A autora, cidadã alemã, com residência habitual em Espanha, pediu junto dos

tribunais portugueses, com fundamento em danos sofridos em acidente de viação ocorrido em Portugal, a correspondente indemnização à companhia de seguros responsável por esses danos, provocados por um cidadão espanhol residente também habitualmente em Espanha.

O tribunal português considerou competente a lei do estado da nacionalidade dos agentes intervenientes no acidente caso esta fosse comum e na falta desta, a lei do domicílio comum. A lei espanhola, atribuiu por seu lado, competência à lex loci delicti sendo que o fez praticando a devolução simples. Qual a lei aplicável pelos tribunais portugueses?

Artigo 16º L.1 → L.2 Lex fori Lex domicilii Lex loci delicti

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Caso 4: Por morte de A, de nacionalidade francesa, que teve o seu último domicílio em

Portugal, discute-se nos tribunais portugueses uma questão relativa à sucessão dos seus bens móveis.

A norma de conflitos portuguesa atribui competência à lei da nacionalidade do de cujos, os tribunais franceses, praticam a devolução simples e consideram competente a lei do domicilio do de cujos.

Quid iuris.

L.1 → L.2 Lex fori Lex Patrie (França)

Caso1 : Discute-se nos tribunais portugueses a sucessão imobiliária de um francês que morreu com último domicílio no Brasil e deixou imóveis na Dinamarca. A norma de conflitos portuguesa (artigos 62º e 31º nº1 do cc) considera competente a lei da nacionalidade do de cujus por sua vez o Dip Francês submete a sucessão imobiliária ao lugar dos imóveis. O direito de conflitos Brasileiro e Dinamarquês consideram aplicável a lei do último domicílio do de cujus e como sabemos são sistemas anti-devolucionistas. Os Tribunais franceses praticam a devolução simples. Quid Iuris?

L.1 ⇒ L.2 ⇒ L.3 → L.4 Lex Fori Lex Patriae Lex Rei Sitae Lex Domicilii (França) (Dinamarca) (Brasil) Caso 2:Discute-se nos tribunais portugueses a sucessão imobiliária de um argentino que morreu com último domicílio em França e deixou imóveis no Paraguai. A norma de conflitos portuguesa (artigos 62º e 31º nº1) considera competente a lei da nacionalidade do de cujus. O direito de conflitos Francês regula a sucessão imobiliária pela lei do lugar das coisas. Os tribunais argentinos, franceses e paraguaios praticam a devolução simples. Quid Iuris? Aqui é aplicado o artigo 17º nº1 L.1 ⇒ L.2 ⇒ L.3 ⇒ L.4 Lex fori Lex Patriae Lex domicilii Lex Rei sitae (Argentina) (França) (Paraguai)

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Caso3 :Discute-se a sucessão imobiliária de um brasileiro que morreu com último domicilio em França e deixou imóveis na Argentina. A norma de conflitos portuguesa remete para a lei da nacionalidade do de cujus. O Dip brasileiro e argentino submetem a sucessão a lei do último domicilio do de cujus. O direito de conflitos Francês regula a sucessão imobiliária pela lei do lugar das coisas. O direito de conflitos Brasileiro é anti-devolucionista. Os tribunais Franceses e Argentinos praticam a devolução simples. Quid Iuris? L.1 ⇒ L.2 → L.3 ⇒ L.4 Lex Fori Lex Patriae Lex domicilii Lex rei Sitae (Brasil) (França) (Argentina) Aplica-se o artigo 17º nº1 Limites a aplicação do reenvio em matéria do estatuto pessoal: Em matéria de estatuto pessoal o legislador entendeu que pela natureza destas matérias elas devem ser governadas por uma lei em que os interessados se revejam: Lei da nacionalidade ou lei da residência/domicilio. Nesse sentido o artigo 18ºnº2 cc prescreve que tratando-se de matérias do âmbito do estatuto pessoal o reenvio só será de admitir quando:

a) O interessado tiver a sua residência em território português. b) A lei da residência habitual do interessado remeter para o nosso direito interno.

Caso prático: A e B de nacionalidade Suiça celebram o seu casamento na Dinamarca e vem a regular o seu divórcio no Brasil. São ambos residentes na Dinamarca colocam em Portugal uma acção de revisão de sentença do divorcio a questão que se coloca é qual a lei aplicável para regular o caso. O direito português considera competente a lei da nacionalidade dos cônjuges. Já o direito suíço considera competente a lei do domicílio destes e faz desta uma devolução simples por sua vez o direito dinamarquês considera competente a lei do lugar onde o divórcio foi decretado e tal como a Suiça pratica a devolução simples. Por seu turno o direito brasileiro é antidevolucionista e considera competente a lei do lugar onde a acção foi interposta. Quid iuris? L.1 → L.2 ⇒ L.3 ⇒ L.4 Lex Fori Lex Patriae Lex domicilii Lex Situs (Suiça) (Dinamarca) (Brasil)

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Aplica-se o artigo 16º Caso prático: Discute-se nos tribunais portugueses a validade de uma adopção de um menor de nacionalidade francesa cujos os adoptantes tem nacionalidade belga sendo que o processo de adopção teve lugar em Itália onde os adoptantes estão domiciliados. A lei portuguesa considera competente a lei da nacionalidade do adoptado por sua vez a lei francesa considera competente a lei da nacionalidade dos adoptantes e faz a esta uma devolução simples a lei belga considera competente a lei do lugar onde a adopção ocorreu e pratica igualmente a devolução simples. Por seu turno a lei italiana considera competente a lei material do estado onde o caso for apreciado.

B) A solução do caso mudaria se os pais adoptivos fossem domiciliados em Lisboa? Porque?

L.1 ⇒ L.2 ⇒ L.3 ⇒ L.4 Lex Fori Lex Patriae Lex Patriae Lex Situs/lex domicilii

(França) (Bélgica) (Itália) Aqui aplicava-se o artigo 18º nº1/2

B)Se fosse o adoptado seria aplicado o 16º.

Caso prático: Discute-se nos tribunais portugueses a validade de um casamento celebrado entre A e B de nacionalidade espanhola que celebraram matrimónio na Venezuela e onde estão domiciliados. A lei portuguesa considera competente a lei da nacionalidade dos cônjuges. A lei espanhola considera competente a lei do domicílio dos cônjuges e faz a este uma devolução simples. Por sua vez a Venezuela considera competente a lei material do estado onde a lei material do estado onde o caso for apreciado. Quid iuris? L.1 ⇒ L.2 ⇒ L.3 Lex Fori Lex Patriae Lex Domicilii/Lex Situs (Espanha) (Venezuela) Aplica-se o artigo 18º nº1/2 Restrições no âmbito do reenvio das matérias de estatuto pessoal Artigo 17º No caso de transmissão de competência em matéria de estatuto pessoal L3 não será aplicável se: a) O interessado residir em Portugal.

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b) O interessado residir num país cujo o direito de conflitos devolve a lei interna do estado nacional.

Neste caso a razão de ser destas restrições é o facto do legislador entender que em matéria de estatuto pessoal é uma má escolha, a escolha de lei diferente da lex patriae e da lex domicilii. Em matéria de estatuto pessoal o único critério que parece razoável ao legislador é aplicar lex patriae ou a lex domicilii. Entende assim como solução afastar a aplicação do artigo 17º nº1 quando a lei de L2 for lei pessoal, isto é, Lex patriae e o interessado residir em território português ou na segunda hipótese afastar igualmente o 17º nº1 e a competência de L3 quando o interessado residir num país que considere competente o direito interno da sua nacionalidade. Caso prático: A e B tio e sobrinha de nacionalidade Suiça domiciliados na Alemanha celebraram o seu casamento em Munique. Discute-se nos tribunais portugueses a validade do casamento invocando-se disposição do código civil Suíço que proíbe o casamento entre colaterais do 3º grau a face do direito interno Alemão o casamento seria válido. A norma de conflitos portuguesa remete para a lei da nacionalidade dos nubentes. No direito Suíço a norma de conflitos considera válido o casamento celebrado entre suíços no estrangeiro se como tal o entender o lugar da celebração. Por seu lado o DIP alemão considera a lei do lugar da celebração do matrimónio a lei aplicável se nesse lugar se encontrem domiciliados os cônjuges.

L.1 ⇒ L.2 → L.3 Lex fori Lex Patriae Lex Domicilii/ Lex Situs (Suiça) (Alemanha) A lei aplicável é a Alemã aplicando-se o artigo 17º nº1 cc Caso prático: Discute-se nos tribunais portugueses a sucessão de um francês que deixou bens imóveis em Itália e que tinha o seu último domicilio em Espanha a lei portuguesa considera competente para regular o caso a lei da nacionalidade do de cujus. Por sua vez a lei francesa considera competente para regular o caso a lei do lugar dos bens. Quer a lei francesa quer a lei espanhola praticam a devolução simples. A lei italiana considera competente para regular o caso a lei do lugar dos bens e pratica igualmente devolução simples. L.1 ⇒ L.2 → L.3 ⇒ L.4 Lex Fori Lex Patriae Lex Domicilii Lex Rei citae (França) (Espanha) (Itália) Artigo 17ºnº1 Caso prático : Discute-se nos tribunais portugueses a validade de um contrato de arrendamento celebrado entre argentinos domiciliados em Lisboa e que versa um imóvel situado no Brasil. O contrato foi celebrado na Venezuela.

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A lei portuguesa considera competente para regular esta questão a lei da nacionalidade comum dos outorgantes ou na falta desta a lei do domicílio por sua vez a lei argentina considera competente a lei do lugar onde o contrato foi celebrado. Por seu lado a lei venezuelana considera competente a lei da nacionalidade do imóvel. A lei brasileira considera igualmente competente a lei do lugar do imóvel (lei anti-devolucionista) As leis venezuelana e argentina praticam a devolução simples. L.1 ⇒ L.2 ⇒ L.3 ⇒ L.4 Lex Fori Lex Patriae Lex Situs Lex Rei Citae Lex Domicilii (Argentina) (Venezuela) (Brasil) Aplica-se o artigo 17º nº1 Caso prático: Discute-se nos tribunais portugueses a validade de um casamento de dois franceses celebrado na Suíça e domiciliados em Roma a lei portuguesa considera competente a lei da nacionalidade dos cônjuges. A lei francesa considera competente a lei do domicílio dos cônjuges. A lei Italiana considera competente a lei do lugar da celebração do casamento e a lei suíça considera igualmente competente a lei do lugar da celebração do casamento. Todas as leis envolvidas praticam a devolução simples. L.1 ⇒ L.2 ⇒ L.3 ⇒ L.4 Lex Fori Lex Patriae Lex Domicilii Lex Situs (França) (Itália) (Suiça) Referência global Artigo17º/1 E se a Suiça considerasse competente a lei do domicilio dos cônjuges e fizesse a esta uma referência material. L.1 ⇒ L.2 ⇒ L.3 ⇒ L.4 Lex Fori Lex Patriae Lex Domicilii Lex Situs (França) (Itália) (Suiça) Referência material A doutrina entende que quando a lex patriae e a lex domicilii estejam de acordo quanto a aplicação de uma lei ainda que essa lei não se considere competente é essa a lei que deve ser aplicada. No caso em apreço será a L3.

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Caso prático: Discute-se perante os tribunais portugueses a validade de um casamento celebrado em Portugal entre A e B cidadãos canadianos com residência habitual na Bélgica pelo que tem de determinar-se qual a lei reguladora da capacidade para contrair casamento. Para o direito material português o casamento seria inválido mas seria válido para o direito material canadiano. O DIP canadiano submete a capacidade para casar a lei do lugar da celebração do casamento por sua vez o DIP belga considera aplicável a lei da nacionalidade dos nubentes. Os tribunais belgas praticam a devolução simples. L.1 ⇒ L.2 L.3 Lex fori Lex Patriae Lex Domicilii Lex Situs (canadá) (Bélgica) Aplica-se o artigo 18º nº2 Discute-se nos tribunais portugueses a sucessão imobiliária de um belga que morreu com último domicílio no Brasil e deixou bens imóveis na Dinamarca. A norma de conflitos portuguesa considera competente a lei da nacionalidade do de cujus. O DIP belga submete a sucessão imobiliária a lex rei citae. O DIP dinamarquês tal como o DIP brasileiro considera competente a lei do último domicílio do de cujus. Os tribunais belgas praticam a devolução simples e os brasileiros e dinamarquês a referência material. L.1 ⇒ L.2 ⇒ L.3 → L.4 Lex Fori Lex Patriae Lex Rei Citae Lex domicilii (Belgica) (Dinamarca) (Brasil) Referência material Aplica-se o artigo 17º nº1 aplicando a L4. Doutrina da competência mais próxima (artigo 17º nº3) Em homenagem a chamada competência mais próxima, isto é, competência da lei com maior proximidade ao caso concreto o legislador entendeu que nos casos de transmissão de competência e de manter o reenvio, isto é, é de manter a regra prevista no nº1 do artigo 17º do CC. Quando se trate das seguintes matérias: Tutela, curatela, relações patrimoniais entre os cônjuges, poder paternal, sucessão por morte, relações de adopção que envolvam imóveis quando a norma de conflitos indicar uma lei nacional que por sua vez transmite a competência a lei do lugar dos imóveis e esta lei se considerar competente. Discute-se nos tribunais portugueses a sucessão imobiliária de um espanhol domiciliado em Lisboa que morreu em Nova York onde deixou imóveis. A lei portuguesa considera competente para regular o caso a lei da nacionalidade do de cujus por seu lado quer a lei espanhola quer a lei Nova iorquina considera competente a lei do lugar dos bens sendo ambas nesta matéria anti-devolucionistas.

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L.1 ⇒ L.2 → L.3 Lex Fori Lex Patriae Lex Rei citae Lex Domicilii (Espanha) (N.Y.) Artigo 17º nº1/3 Discute-se perante os tribunais portugueses uma partilha de bens resultantes de um divórcio em que os ex cônjuges são de nacionalidade alemã tem o seu domicílio em Itália e bens imóveis em Cuba. A lei portuguesa considera competente para dirimir o conflito a lei da nacionalidade dos envolvidos. A lei alemã considera competente a lei do domicílio comum dos ex cônjuges e na sua falta a lei da nacionalidade destes por sua vez a lei italiana considera competente a lei do lugar dos bens o mesmo acontecendo com a lei cubana. Quer a Alemanha, quer a Itália praticam a devolução simples. Cuba é anti-devolucionista. L.1 ⇒ L.2 ⇒ L.3 ⇒ L.4 Lex Fori Lex Patriae Lex Domicilii Lex Rei Citae (Alemanha) (Itália) (Cuba) Artigo 17º nº1/3 Trata-se de uma situação de transmissão de competência face isso verificam-se os pressupostos do nº1. Caso pratico Discute-se nos tribunais portugueses a sucessão imobiliária de um francês com último domicilio em Florença e que morreu em Lisboa deixando imóveis na Alemanha. A lei portuguesa considera competente o estado da nacionalidade do de cujus. Por sua vez quer a lei italiana quer a lei francesa praticam a devolução simples e considera competente a lei do lugar dos bens e a lei alemã pratica igualmente a devolução simples e considera competente a lei do lugar dos bens.

a) Quid Iuris? b) Imagine que a lei alemã considerava competente a lei do último domicilio.

A) L.1 ⇒ L.2 ⇒ L.3 ⇒ L.4 Lex Fori Lex patriae Lex Domicilii Lex Rei Citae (França) (Itália) (Alemanha) Artigo 17º nº3 B) L.1 ⇒ L.2 L.3 → L.4 Lex Fori Lex patriae Lex Domicilii Lex Rei Citae (França) (Itália) (Alemanha)

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Aqui é aplicada a via doutrinal explicamos porque não cabe no artigo 17º nº 1/2/3 e explicar a via doutrinal (ver a lei da aplicação da 3ª lei) Discute-se nos tribunais portugueses a sucessão imobiliária de um francês que morreu com último domicílio no Brasil e deixou imóveis na Venezuela. A lei de conflitos portuguesa considera competente a lei da nacionalidade do de cujus por sua vez o DIP francês submete a sucessão imobiliária a lex rei citae. O DIP venezuelano e brasileiro consideram competente a lei do último domicílio do de cujus. Os tribunais franceses praticam a devolução simples. Os sistemas brasileiros e venezuelano são anti-devolucionistas. L.1 ⇒ L.2 ⇒ L.3 → L.4 Lex Fori Lex Patriae Lex Rei Citae Lex domicilii (França) (Venezuela) (Brasil) Aplica-se o artigo 17º nº1 Não é aplicável o nº3 porque L3 não se considera competente. Discute-se nos tribunais portugueses a sucessão imobiliária de um francês que deixa bens imóveis no Brasil e morre com último domicílio na Venezuela. A lei de conflitos portuguesa considera competente a lei da nacionalidade do de cujus. A lei francesa pratica a devolução simples e considera competente a lei do lugar dos bens. O Brasil é anti-devolucionista e considera igualmente competente a lei do lugar dos bens. A Venezuela pratica a referência material e considera competente a lei da nacionalidade do de cujus. L.1 ⇒ L.2 ⇒ L.3 L.4 Lex Fori Lex Patriae Lex Rei Citae Lex domicilii (França) (Venezuela) (Brasil) Artigo 17º nº1/3 Conexões favoráveis e conexões contrárias ao reenvio Nas matérias em que é lícito as partes acordar qual a lei aplicável por exemplo em matérias de natureza contratual não haverá reenvio se a lei designada pelas partes remeter para outra lei considerada competente não haverá lugar a aplicação dessa outra lei. Com efeito a vontade declarada das partes relativa a aplicação de uma lei estrangeira considera-se feita a lei material dessa lei e não ao seu Dip para que possa aplicar-se a lei em sentido global é necessário que as partes de forma expressa o declarem. (artigo 19º nº2 CC) “Favor negotii” como fundamento do reenvio O ponto de partida desta discussão é problematizar em que medida o “favor negotii” pode fundamentar o reenvio deverá o reenvio aceitar-se porque se apresenta como um meio necessário para assegurar a validade de um determinado negócio jurídico? Nada impede que o legislador adopte o reenvio como uma forma de promover a validade e a eficácia de um determinado negócio que de outro modo seria inválido ou ineficaz.

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Pode até prescrever-se que o reenvio funcione como uma espécie de último remédio para salvar o negócio de ineficácia. O código civil só aceita esta directiva na hipótese da invalidade do negócio resultar de um vício de forma. Nos termos do nº2 do artigo 36º se a forma da declaração negocial obedecer não a lei do país onde esta foi admitida mas a do estado que remete a norma de conflitos daquele sistema a declaração é válida. (artigo 36º nº2) “Favor negotii” como um limite ao reenvio Nos termos do artigo 19º nº1 se do reenvio resultar a invalidade de um negócio que seria válido ou eficaz em face da lei designada pelo Dip português é esta a lei que se aplica. A ratio leges deste preceito parece ser a seguinte se os interessados realizaram o negócio jurídico de conformidade com as disposições de um sistema de direito material que é o considerado competente pelo Dip do fórum não seria justo frustrar a confiança que depositaram na validade do acto. Considera a doutrina que para o artigo 19º nº1 possa ter aplicação, ou seja, para que o “favor negotii” funcione como um limite ao reenvio é necessário que a situação em causa tivesse ao tempo da sua constituição contacto com a lei portuguesa. Casos práticos: Discute-se nos tribunais portugueses a validade de um casamento celebrado em Portugal entre A e B cidadãos dos EUA com residência habitual em França pelo que tem que determinar-se qual a lei reguladora da capacidade para contrair casamento. A lei competente para regular a capacidade para contrair casamento é segundo a lei portuguesa a lei da nacionalidade dos nubentes o casamento é considerado válido face ao direito nova-iorquino mas é considerado inválido face ao direito material português. O Dip NY submete a capacidade para casar a lei do lugar da celebração e por sua vez o Dip francês considera aplicável a lei da nacionalidade. Os tribunais franceses praticam a devolução simples e o direito de NY não aceita o reenvio. O casamento é válido ou inválido face a lei portuguesa e porque? L.1 L.2 L.3 Lex fori Lex Patriae Lex Domicilii Lex situs (NY) (França) É aplicado a lei portuguesa pelo 18º nº2 mas o casamento é inválido artigo 19º nº1 L.1 → L.2 16º cc a lei aplicável seria L2

B)O estado francês a considerar competente a lei do lugar da celebração do casamento.

L.1 → L.2 L.3 Lex fori Lex Patriae Lex Domicilii Lex situs (NY) (França)

É aplicável o artigo 16º e assim o casamento é válido

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A e B tio e sobrinha de nacionalidade Suiça domiciliados na Alemanha celebram o seu casamento em Munique. Discute-se nos tribunais portugueses a validade do acto invocando a disposição legal do CC Suíço que proíbe o casamento entre colaterais de 2º grau. A face do direito interno Alemão o casamento seria válido. A norma de conflitos portuguesa remete para o direito Suíço. No direito suíço a norma de conflitos considera válido o casamento celebrado por suíços no estrangeiro se como tal o entender a lei do lugar da celebração. Por sua vez o Dip alemão considera a lei alemã aplicável ao casamento na Alemanha de estrangeiros ai domiciliados.

L.1 ⇒ L.2 → L.3 Lex fori Lex Patriae Lex Domicilii/Situs

(Suiça) (Alemanha) Aplicável o artigo 17º nº1 o negócio é válido

Casos práticos: Discute-se nos tribunais portugueses a validade de uma declaração de última vontade feita por A cidadão espanhol que deixou imóveis no Brasil e outorgou o testamento em França local do seu domicílio. Em Espanha o testamento é considerado válido. Em Portugal, França e no Brasil o testamento é considerado inválido. A França e a Espanha praticam a devolução simples já o Brasil é anti-devolucionista e considera competente para avaliar o caso a lei do lugar dos imóveis. A Espanha considera competente a lei do lugar da celebração. A França considera igualmente competente a lei do lugar dos imóveis. E Portugal considera competente a lei da nacionalidade do de cujus. L.1 ⇒ L.2 ⇒ L.3 ⇒ L.4 Lex Fori Lex Patriae Lex Situs Lex Rei Sitae (Espanha) Lex Domicilii (Brasil) Inválido Válido (França) inválido Inválido Era aplicável L4 pelo 17º nº1 Mas agora que se põe uma questão de validade há que analisar o 19º L.1 → L.2 Lex Fori Lex Patriae (Espanha) Artigo 19º nº1 com remissão para o 16º sendo assim o testamento é válido. Discute-se nos tribunais portugueses uma questão de pensão de alimentos de um cônjuge de nacionalidade alemã ao seu cônjuge da mesma nacionalidade em que se põe em causa se pode ou não ser atingido o património pessoal do cônjuge devedor que se situa na Dinamarca e é constituído por dois imóveis. Como questão prévia coloca-se a questão de saber se os dois imóveis foram legitimamente adquiridos pelo titular devedor da pensão uma vez que se encontram registados de forma irregular. Ambos os cônjuges residem em Portugal em todos os estados envolvidos este registo padece de vicio e é portanto irregular sendo os imóveis insusceptíveis de virem a ser executados.

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A lei portuguesa considera competente a lei da nacionalidade dos cônjuges se ela for comum e a lei do domicílio se não for. Por sua vez a lei dinamarquesa considera competente para regular o caso a lei do domicílio dos interessados e é anti-devolucionista. A lei alemã pratica a devolução simples e considera competente para regular o caso a lei do lugar dos imóveis. L.1 ⇒ L.2 ⇒ L.3 Lex Fori Lex Patriae Lex Rei Sitae Lex Domicilii (Alemanha) (Dinamarca) Aplicável o artigo 18º nº1/2 aqui não se põe a questão de validade

C) Imagine que o registo feito no lugar onde os bens se encontram Dinamarca padece de um vício de forma. Imagine ainda que a Dinamarca pratica a devolução simples. Imagine que em Portugal se o registo tivesse sido aqui feito seria formalmente válido

L.1 → L.2 ⇒ L.3 Lex Fori Lex Patriae Lex Rei Sitae Lex Domicilii (Alemanha) (Dinamarca) Válida Inválida Inválida

Nesta situação em princípio iria aplicar-se o 16º porque não cabe em nenhuma excepção do 17º/18º Artigo 36º nº 2 assim seria aplicável a L1 apesar de formalmente na Dinamarca ser inválido mas este remete para a lei portuguesa sendo assim é valido

Caso praticos Discute-se nos tribunais portugueses uma acção de divórcio entre A e B cidadãos franceses com residência habitual na Dinamarca, casamento esse que foi celebrado no Brasil.

A lei portuguesa considera competente a lei da nacionalidade dos cônjuges. A lei francesa considera competente a lei do lugar da celebração do casamento e faz uma devolução simples. A lei brasileira considera competente a lei do domicilio dos cônjuges. Por sua vez a lei da Dinamarca considera competente o direito interno português. A lei brasileira e dinamarquesa é antidevolucionista.

L1 ⇒ L2 ⇒ L.3 → L.4 Lex Fori Lex Patriae Lex Situs Lex domicilii (França) (Brasil) (Dinamarca)

Aplica-se o artigo 18º/1 por força do 18/2