direito administrativo descomplicado - vicente paulo e marcelo alexandrino 17ª p 18ª ed 2010

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Atualização Direito Administrativo Descomplicado Autores: Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo 17.ª para 18.ª edição NOTA À 18ª EDIÇÃO Desta feita, concentramos nossos esforços principalmente em registrar e comentar todas as alterações legislativas e orientações jurisprudenciais pertinentes ao direito administrativo surgidas no Brasil desde a última edição, bem como em aperfeiçoar ou aprofundar alguns pontos doutrinários, sobretudo nos capítulos sobre servidores públicos, poderes administrativos, licitações públicas e contratos administrativos – a este último, acrescentamos o assunto “convênios administrativos”, incluindo a análise do Decreto 6.170/2007, freqüentemente exigido em concursos públicos na esfera federal. Das novidades inseridas em nosso ordenamento positivo e trazidas à obra, merecem menção, especialmente, as seguintes: a) a Emenda Constitucional 62/2009, que alterou o art. 100 da Constituição Federal, modificando a disciplina do regime dos precatórios judiciários; b) a Lei 11.941/2009, no ponto em que alterou a Lei 9.873/1999, concernente à prescrição de ações relacionadas ao poder de polícia; c) a Lei 11.952/2009, que alterou pontos específicos da Lei 8.666/1993, relativos a hipóteses de licitação dispensada; d) a Lei 12.008/2009, que acrescentou dispositivos à Lei 9.784/1999, acerca do processo administrativo federal; e) a Lei 12.016/2009, que passou a regular o mandado de segurança individual e coletivo; f) a Lei 12.120/2009, que alterou dispositivos específicos da Lei 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa); g) a Lei 12.126/2009, que conferiu legitimidade ativa perante os juizados especiais cíveis às OSCIP; h) a Lei 12.188/2010, no ponto em que acrescentou hipótese de licitação dispensável ao art. 24 da Lei 8.666/1993; i) a Medida Provisória 479/2009, que alterou dispositivos da Lei 8.112/1990 (Estatuto dos Servidores Públicos Federais); j) o Decreto 6.932/2009, que estabeleceu normas a serem observadas pela administração federal no atendimento público prestado aos administrados em geral; k) o Decreto 6.944/2009, que veiculou importantes normas regulamentares aplicáveis aos concursos públicos no âmbito do Poder Executivo federal. No que respeita à jurisprudência, anotamos e comentamos, nos capítulos correspondentes, inúmeros julgados do Supremo Tribunal Federal relevantes para o

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Atualização Direito Administrativo Descomplicado

Autores: Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo

17.ª para 18.ª edição

NOTA À 18ª EDIÇÃO

Desta feita, concentramos nossos esforços principalmente em registrar e comentar todas as alterações legislativas e orientações jurisprudenciais pertinentes ao direito administrativo surgidas no Brasil desde a última edição, bem como em aperfeiçoar ou aprofundar alguns pontos doutrinários, sobretudo nos capítulos sobre servidores públicos, poderes administrativos, licitações públicas e contratos administrativos – a este último, acrescentamos o assunto “convênios administrativos”, incluindo a análise do Decreto 6.170/2007, freqüentemente exigido em concursos públicos na esfera federal.

Das novidades inseridas em nosso ordenamento positivo e trazidas à obra, merecem menção, especialmente, as seguintes:

a) a Emenda Constitucional 62/2009, que alterou o art. 100 da Constituição Federal, modificando a disciplina do regime dos precatórios judiciários;

b) a Lei 11.941/2009, no ponto em que alterou a Lei 9.873/1999, concernente à prescrição de ações relacionadas ao poder de polícia;

c) a Lei 11.952/2009, que alterou pontos específicos da Lei 8.666/1993, relativos a hipóteses de licitação dispensada;

d) a Lei 12.008/2009, que acrescentou dispositivos à Lei 9.784/1999, acerca do processo administrativo federal;

e) a Lei 12.016/2009, que passou a regular o mandado de segurança individual e coletivo;

f) a Lei 12.120/2009, que alterou dispositivos específicos da Lei 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa);

g) a Lei 12.126/2009, que conferiu legitimidade ativa perante os juizados especiais cíveis às OSCIP;

h) a Lei 12.188/2010, no ponto em que acrescentou hipótese de licitação dispensável ao art. 24 da Lei 8.666/1993;

i) a Medida Provisória 479/2009, que alterou dispositivos da Lei 8.112/1990 (Estatuto dos Servidores Públicos Federais);

j) o Decreto 6.932/2009, que estabeleceu normas a serem observadas pela administração federal no atendimento público prestado aos administrados em geral;

k) o Decreto 6.944/2009, que veiculou importantes normas regulamentares aplicáveis aos concursos públicos no âmbito do Poder Executivo federal.

No que respeita à jurisprudência, anotamos e comentamos, nos capítulos correspondentes, inúmeros julgados do Supremo Tribunal Federal relevantes para o

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direito administrativo, cabendo mencionar, em especial, a mudança de entendimento dessa Corte acerca da responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público perante terceiros não usuários do serviço. Também registramos e comentamos detalhadamente as súmulas vinculantes de interesse para a nossa disciplina até agora editadas. Coligimos, ainda, algumas orientações jurisprudenciais do Superior Tribunal de Justiça que pensamos já estarem consolidadas no seu âmbito, sendo particularmente relevante o entendimento referente ao prazo de prescrição das ações cíveis de indenização por danos ocasionados por agentes de pessoas jurídicas de direito público e de pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público.

Por fim, atualizamos amplamente o “Caderno de Questões”, acrescentando questões dos principais concursos públicos ocorridos em 2009 e suprimindo aquelas que consideramos ultrapassadas.

Os Autores.

PONTOS DO LIVRO “DIREITO ADMINISTRATIVO DESCOMPLICA DO” QUE, EM VIRTUDE DE ALTERAÇÕES LEGISLATIVAS OU JURISPRUDENCI AIS OCORRIDAS DESDE A 17ª EDIÇÃO, FORAM OBJETO DE ATUALIZAÇÃO NA 18ª EDIÇÃO DA OBRA.

CAPITULO 2

1) No item 4.6.3.5.11, substituir o parágrafo abaixo, em vermelho, pelo parágrafo em azul:

4.6.3.5.11. Dirigentes

..............

Os dirigentes das empresas públicas e das sociedades de economia mista estão sujeitos ao mandado de segurança caso exerçam funções delegadas do Poder Público (CF, art.

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5º, LXIX), à ação popular (CF, art. 5º, LXXIII), à ação de improbidade administrativa (Lei 8.429, arts. 1º e 2º) e à ação penal por crimes praticados contra a administração pública (Código Penal, art. 327).

Os dirigentes das empresas públicas e das sociedades de economia mista estão sujeitos à ação popular, à ação de improbidade administrativa, a ações penais por crimes praticados contra a administração pública e, quando estiverem exercendo atribuições do Poder Público (excluídos atos de gestão comercial), ao mandado de segurança.

.................

CAPITULO 4

1) Ao final do item 3.3.3 foi acrescentado o parágrafo abaixo:

3.3.3. Áreas de atuação das organizações da sociedade civil de interesse público

............

Convém registrar que as organizações da sociedade civil de interesse público têm legitimidade ativa para propor ações perante os Juizados Especiais Cíveis (Lei 9.099/1995, art. 8º, § 1º, III, com a redação dada pela Lei 12.126/2009).

CAPITULO 6

1) O item 3.6.6. passou a ter a seguinte redação (reprodução integral do item):

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3.6.6. Prescrição

A Lei 9.873/1999, especificamente aplicável à esfera federal, estabelece em cinco anos o prazo prescricional das ações punitivas decorrentes do exercício do poder de polícia. É o que consta do caput do seu art. 1º, abaixo transcrito:

“Art. 1º Prescreve em cinco anos a ação punitiva da Administração Pública Federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia, objetivando apurar infração à legislação em vigor, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado.”

É importante observar, entretanto, que, na hipótese de o fato objeto da ação punitiva da administração também constituir crime , serão aplicáveis os prazos de prescrição previstos na lei penal (art. 1º, § 2º).

A mesma lei prevê, ainda, uma importante hipótese de prescrição intercorrente (prescrição que ocorre no curso do processo, isto é, mesmo depois de o processo já ter sido instaurado ou iniciado). Trata-se da regra vazada no § 1º de seu art. 1º, nos termos da qual “incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por mais de três anos , pendente de julgamento ou despacho”. O processo será arquivado, e será apurada a responsabilidade funcional decorrente da paralisação, se for o caso.

A lei estabelece hipóteses de interrupção e de suspensão da prescrição da ação punitiva. Conforme o seu art. 2º, interrompe-se a prescrição da ação punitiva:

“I – pela notificação ou citação do indiciado ou acusado, inclusive por meio de edital;

II – por qualquer ato inequívoco, que importe apuração do fato;

III – pela decisão condenatória recorrível;

IV – por qualquer ato inequívoco que importe em manifestação expressa de tentativa de solução conciliatória no âmbito interno da administração pública federal.”

Já a suspensão da prescrição está prevista em hipóteses bastante específicas. Ela ocorrerá (art. 3º):

I – durante a vigência dos compromissos de cessação ou de desempenho, assumidos perante o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), previstos na Lei 8.884/1994 (que, entre outras coisas, “dispõe sobre a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem econômica”);

II – durante a vigência do termo de compromisso firmado com a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), previsto na Lei 6.385/1976 (que “dispõe sobre o mercado de valores mobiliários e cria a Comissão de Valores Mobiliários”).

Além de estabelecer o prazo de prescrição do direito de a administração pública aplicar uma punição administrativa baseada no poder de polícia, a Lei 9.873/1999, a partir de

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maio de 2009, passou a fixar, também, um prazo de prescrição especificamente aplicável à ação judicial de cobrança de multas administrativas que não tenham natureza tributária (denomina-se “execução fiscal de crédito não-tributário” a referida ação judicial). Com efeito, a Lei 11.941/2009 acrescentou à Lei 9.873/1999 o art. 1º-A, com a seguinte redação:

“Art. 1º-A. Constituído definitivamente o crédito não tributário, após o término regular do processo administrativo, prescreve em 5 (cinco) anos a ação de execução da administração pública federal relativa a crédito decorrente da aplicação de multa por infração à legislação em vigor.”

A redação do novo preceito não foi das mais felizes. De todo modo, a regra que dele se extrai é que a administração pública tem o prazo prescricional de cinco anos para ajuizar a ação de cobrança (execução fiscal ) de créditos não-tributários decorrentes de multas administrativas por infração à legislação (o que inclui as multas não-tributárias aplicadas no exercício do poder de polícia). Esse prazo é contado a partir da data de constituição definitiva do crédito , a qual se considera ocorrida após o término regular do processo administrativo em que ele tenha sido apurado.

Exemplificando, se a administração federal verifica que determinada pessoa jurídica adotou práticas contrárias à livre concorrência e, sob esse fundamento, aplica à empresa infratora uma multa prevista na legislação pertinente, essa autuação dará origem a um processo administrativo. A empresa será notificada da multa e terá um prazo para pagá-la ou apresentar recurso mediante o qual manifeste sua discordância. Se a pessoa jurídica apresentar a impugnação e todos os recursos administrativos cabíveis, somente depois de exauridas as instâncias administrativas previstas no rito a que esteja sujeito esse processo será considerado definitivamente constituído o crédito correspondente à multa. É a partir dessa data que serão contados os cinco anos para que ocorra a prescrição da ação judicial de cobrança, ou seja, para que seja extinto o direito da administração de ajuizar a execução fiscal do crédito não-tributário.

A Lei 11.941/2009 estabeleceu, também, as hipóteses de interrupção da prescrição da referida ação judicial de cobrança, acrescentando o art. 2º-A à Lei 9.873/1999, abaixo transcrito:

“Art. 2º-A. Interrompe-se o prazo prescricional da ação executória:

I – pelo despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal;

II – pelo protesto judicial;

III – por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor;

IV – por qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial, que importe em reconhecimento do débito pelo devedor;

V – por qualquer ato inequívoco que importe em manifestação expressa de tentativa de solução conciliatória no âmbito interno da administração pública federal.”

Embora não tenha ficado claro na atual configuração da Lei 9.873/1999, é nossa opinião

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que as hipóteses de suspensão previstas no seu art. 3º, anteriormente expostas, também suspendem a prescrição da ação judicial de cobrança (execução fiscal) das multas não-tributárias de que trata o acrescentado art. 1º-A.

Por fim, ressalve-se que as disposições da Lei 9.873/1999 não se aplicam às infrações de natureza funcional e aos processos e procedimentos de natureza tributária (art. 5º).

CAPITULO 7

1) O item 1.1.4 passou a ter a seguinte redação (reprodução integral do item):

1.1.4. Exigência de concurso público

A Constituição de 1988 tornou obrigatória a aprovação prévia em concurso público para o provimento de quaisquer cargos ou empregos na administração direta e indireta, inclusive para o preenchimento de empregos nas empresas públicas e sociedades de economia mista, pessoas jurídicas de direito privado integrantes da administração indireta.

Como ensina o Prof. Hely Lopes Meirelles, o concurso público é o meio técnico posto à disposição da administração para obter-se moralidade, eficiência e aperfeiçoamento do serviço público e, ao mesmo tempo, atender ao princípio da isonomia, uma vez que propicia igual oportunidade de acesso aos cargos e empregos públicos a todos os que atendam aos requisitos estabelecidos de forma geral e abstrata em lei.

É o seguinte o teor do art. 37, inciso II, da Constituição:

“II – a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;”

Diversas observações decorrem da leitura desse inciso.

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A exigência de concurso público aplica-se à nomeação para cargos ou empregos de provimento efetivo . Não abrange a nomeação para cargos em comissão, os quais, por definição, são de livre nomeação e exoneração com base em critérios subjetivos da autoridade competente. Não se aplica, tampouco, à contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público, hipótese prevista no inciso IX do mesmo art. 37 da Carta da República.

Cabe mencionar que a EC 51/2006 acrescentou três parágrafos ao art. 198 da Constituição (artigo que trata do Sistema Único de Saúde), com vistas a disciplinar a contratação de agentes comunitários de saúde e agentes de combate às endemias, e estabeleceu que esses profissionais devem ser admitidos por meio de “processo seletivo público, de acordo com a natureza e complexidade de suas atribuições e requisitos específicos para sua atuação” (art. 198, § 4º). O regime jurídico desse pessoal e a regulamentação de suas atividades devem ser feitos por lei ordinária federal (art. 198, § 5º).

Como se vê, essa contratação de agentes comunitários de saúde e agentes de combate às endemias mediante “processo seletivo público” configura mais uma possibilidade de exceção à exigência de concurso público para o acesso a cargos e empregos públicos. Com efeito, embora a EC 51/2006 não tenha explicitado o que seria esse “processo seletivo público”, certamente ele não é o mesmo que concurso público de provas ou de provas e títulos. Tudo indica que o constituinte derivado pretendeu que o “processo seletivo público” seja algo mais singelo, menos complexo, do que o concurso público previsto no inciso II do art. 37 da Constituição, que neste tópico está sendo analisado.

A contratação desses agentes está disciplinada na Lei 11.350/2006. Quanto ao “processo seletivo público”, a que se refere o § 4º do art. 198 da Constituição, a Lei 11.350/2006 apenas explicita que “a contratação de Agentes Comunitários de Saúde e de Agentes de Combate às Endemias deverá ser precedida de processo seletivo público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade de suas atribuições e requisitos específicos para o exercício das atividades, que atenda aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência”. Como se pode constatar, pelo menos em sua definição legal, esses “processos seletivos públicos” não diferem substancialmente dos concursos públicos.

Voltando ao inciso II do art. 37 da Constituição, é importante frisar que o concurso público de que ele trata deverá ser de provas ou de provas e títulos. Fica, assim, proibida a realização de contratações para cargos ou empregos efetivos com base em análise exclusiva de títulos ou currículos ou quaisquer outros procedimentos que não incluam a realização de provas. Embora não esteja escrito na Constituição, é evidente, como decorrência, entre outros, do princípio da moralidade, que a exigência de títulos em concursos públicos somente se justifica para os cargos ou empregos cujas atribuições dependam de especial conhecimento técnico ou científico, por exemplo, cargos de pesquisador ou professor em universidades públicas, cargos privativos de médico, engenheiro, advogado etc. Nada justifica a exigência de títulos em cargos de atribuições genéricas cujo desempenho não se relacione a qualquer área específica de formação, nem exija maiores habilidades ou aprofundamentos técnicos, científicos ou acadêmicos.

Cabe mencionar que o inciso V do art. 206 da Constituição, desde a sua redação original,

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exige concurso público de provas e títulos para ingresso no magistério público (esse dispositivo já foi alterado pela EC 19/1998 e pela EC 53/2006; ambas mantiveram a exigência do concurso de provas e títulos; com a EC 53/2006, o dispositivo não mais menciona “magistério público”, mas sim “profissionais da educação escolar das redes públicas”, conceito que, embora dependa de regulamentação legal, é evidentemente mais amplo).

A Constituição não estabeleceu para os concursos públicos forma ou procedimento determinados. A EC 19/1998 alterou o art. 37, II, para afirmar que os concursos públicos poderão apresentar diferentes formas, desde que previstas em lei, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego. Não se sabe ao certo o que pretendeu a EC 19/1998 com esse acréscimo à redação original do inciso. Talvez autorizar a lei a estabelecer procedimentos seletivos mais singelos para preenchimento de cargos ou empregos de menor complexidade, ou ainda permitir a realização de processos seletivos mais flexíveis para a admissão a empregos nas empresas públicas e sociedades de economia mista. Seja como for, o concurso sempre terá que ser ou de provas ou de provas e títulos, não podendo a lei estabelecer para o provimento efetivo de cargos ou empregos públicos processos seletivos com base somente em entrevistas, análise curricular, testes psicotécnicos etc.

Quanto a esses últimos – os testes psicotécnicos – o Supremo Tribunal Federal já decidiu sobre a possibilidade de que eles sejam exigidos em concursos públicos, desde que haja previsão legal (evidentemente, o concurso será de provas, ou de provas e títulos, e, além disso , poderá haver teste psicotécnico, se previsto em lei , não apenas no edital).

Segundo orientação do Pretório Excelso, “o exame psicotécnico pode ser estabelecido para concurso público, desde que seja feito por lei, e que tenha por base critérios objetivos de reconhecido caráter científico, devendo existir, inclusive, a possibilidade de reexame” (RE 188.234/DF, rel. Min. Néri da Silveira, 19.03.2002).

Em suma, para que o exame psicotécnico seja exigido em concurso público é necessário o cumprimento dos seguintes pressupostos, cumulativamente :1

a) previsão em lei (não basta a simples exigência no edital do concurso);

b) estabelecimento de critérios objetivos de reconhecido caráter científico para a avaliação dos candidatos;

c) possibilidade de recurso.

Essa matéria encontra-se, hoje, tratada na Súmula 686 do STF, cuja redação, de clareza

1 É oportuno, registrar, a esse respeito, o enunciado da Súmula Administrativa AGU 35/2008: “35 – O exame psicotécnico a ser aplicado em concurso público deverá observar critérios objetivos, previstos no edital, e estará sujeito a recurso administrativo.”

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incontornável, é a seguinte:

“686 – Só por lei se pode sujeitar a exame psicotécnico a habilitação de candidato a cargo público.”

É oportuno, ainda, registrar que, no âmbito da administração direta do Poder Executivo federal, bem como das autarquias e fundações públicas a ele vinculadas, os concursos públicos sujeitam-se à disciplina estabelecida no Decreto 6.944/2009. Dentre outras disposições, esse ato normativo estatui que a realização de exame psicotécnico está condicionada à existência de previsão legal expressa específica , devendo constar explicitamente do edital (art. 14). Estabelece, ademais, que o exame psicotécnico deve se limitar à detecção de problemas psicológicos que possam vir a comprometer o exercício das atividades inerentes ao cargo disputado no concurso e que “é vedada a realização de exame psicotécnico em concurso público para aferição de perfil profissiográfico, avaliação vocacional ou avaliação de quociente de inteligência” (art. 14, §§ 1º e 2º).

Aliás, aproveita-se a menção ao Decreto 6.944/2009 para registrar que ele traz a exigência de que o edital do concurso público seja publicado integralmente no Diário Oficial da União, com antecedência mínima de sessenta dias da realização da primeira prova (art. 18, I).

Trata-se de medida moralizadora tendente a impedir que, mediante a fixação de prazos excessivamente exíguos, a administração acabe promovendo o “direcionamento” do concurso à aprovação de pessoas que lograssem, com antecedência, obter informações privilegiadas (ilegais!) sobre o certame (conteúdo programático, data e condições de aplicação das provas, natureza das questões etc.).

Infelizmente, o § 2º do art. 18 do mesmo decreto fragiliza sobremaneira a garantia, ao possibilitar que o citado prazo seja “reduzido mediante ato motivado do Ministro de Estado sob cuja subordinação ou supervisão se encontrar o órgão ou entidade responsável pela realização do concurso público”.

Cumpre mencionar que o Supremo Tribunal Federal entende não violar o princípio da isonomia a realização de concurso público em que a classificação seja feita por regiões, ou por áreas de especialização, mesmo que para o mesmo cargo.

Segundo orientação da Corte Máxima, “em edital de concurso público, é válida a fixação de critérios de concorrência em caráter regional e em área de especialização” (RMS 23.259/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 25.03.2003).

Com base nesse entendimento, o STF negou provimento a recurso de candidatos que não foram classificados na primeira fase de concurso para o cargo de Auditor-Fiscal da Receita Federal em que sustentavam a ilegalidade da ordem de classificação, efetuada de acordo com a região e a especialização em que se inscreveram os candidatos.

Outra importante orientação jurisprudencial de nossos tribunais diz respeito à

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impossibilidade de impedir a participação em concurso, ou mesmo a nomeação de candidato aprovado, com base em alegação de “inidoneidade moral”, ou “não atendimento a requisito de bons antecedentes”, ou “ausência de capacitação moral” fundada exclusivamente no fato de o candidato estar respondendo a ação penal, ainda não transitada em julgado.

Entendem o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça que esse procedimento da administração pública fere o princípio da presunção de inocência ou presunção da não-culpabilidade (“ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória” – CF, art. 5º, LVII), o qual não se restringe ao âmbito exclusivamente penal, devendo também ser observado na esfera administrativa.2

Conforme nossa jurisprudência, os candidatos inscritos em concurso público não têm direito adquirido à sua realização, ou seja, a administração pode publicar edital prevendo a realização de concurso, inclusive marcando a data, e deixar de realizá-lo, ou cancelá-lo, mesmo que não haja verificado qualquer irregularidade. Basta que exista fato superveniente que tenha tornado inoportuna, inconveniente ou desnecessária a realização do concurso. Os candidatos inscritos têm apenas expectativa de direito.

Evidentemente, se tiverem pagado taxa de inscrição e o concurso não vier a ser realizado, terão direito a pleitear a restituição da quantia paga.

Deve a administração, ainda, invalidar o concurso público, antes, durante ou depois de sua realização, se constatar a ocorrência de irregularidade. Nesse caso, a hipótese é de anulação, obrigatória quando que se constate ilegalidade insanável em alguma etapa do certame. A anulação poderá ser realizada pelo Poder Judiciário, no âmbito do controle de legalidade, desde que seja provocado.

Uma questão importante concerne à possibilidade de apreciação, pelo Poder Judiciário, do conteúdo das questões do concurso em comparação com os respectivos gabaritos divulgados pela administração, dos critérios de correção, bem como da correspondência entre o programa constante do edital e as matérias abordadas nas questões.

O Supremo Tribunal Federal, tradicionalmente, entende que esse tipo de análise implicaria controle do mérito administrativo e não controle de legalidade. Por isso, segundo sua jurisprudência, seria incabível a verificação, pelo Judiciário, dos gabaritos apresentados, comparados com o conteúdo das questões formuladas, bem como de seus critérios de correção (na reiterada dicção da Corte Suprema, não pode o Judiciário substituir-se à banca examinadora do concurso nos critérios de correção de provas e de atribuição de notas a elas).

Em alguns julgados, o STF já entendeu inadmissível, também, por considerar igualmente mérito administrativo, a verificação de adequação entre o conteúdo das questões e os programas das disciplinas constantes do edital do concurso (RE 315.007/CE, rel. Min. Moreira Alves, 1ª Turma, 26.03.2002).

2 STF, RE 194.872/RS, rel. Min. Marco Aurélio, 07.11.2000; STF, RE-AgR 487.398/MS, rel. Min. Gilmar Mendes, 06.06.2006; STJ, RMS 11.396/PR, rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 12.11.2007; STJ, RMS 13.546/MA, rel. Min. Og Fernandes, 10.11.2009.

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É muito relevante frisar, entretanto, que o entendimento acerca desse último ponto – possibilidade de controle judicial da compatibilidade entre o conteúdo das questões e os programas das disciplinas constantes do edital – foi modificado em 2005, pela mesma Primeira Turma, no julgamento do RE 434.708/RS, rel. Min. Sepúlveda Pertence, em 21.06.2005.

Nessa ação, o STF manteve acórdão do TJ do Rio Grande do Sul, que anulara duas questões de um concurso público por entender que elas cobravam assunto não incluído no edital . Considerou-se que esse fato, qual seja, a pertinência das questões ao programa previsto no edital, consiste em aspecto atinente à legalidade (e não a mérito administrativo), passível, portanto, de controle judicial (CF, art. 5º, XXXV). Na oportunidade, asseverou o STF que o edital, nele incluído o programa, é a “lei do concurso” e, por isso, suas cláusulas obrigam os candidatos e a administração pública. Transcreve-se a ementa do RE 434.708/RS:

“Concurso público: controle jurisdicional admissível, quando não se cuida de aferir da correção dos critérios da banca examinadora, na formulação das questões ou na avaliação das respostas, mas apenas de verificar que as questões formuladas não se continham no programa do certame, dado que o edital – nele incluído o programa – é a lei do concurso.”

Por outro lado, o Supremo Tribunal Federal já deixou assente, mais de uma vez, que, embora o edital seja a “lei do concurso”, é legítimo que a administração pública modifique condições de um concurso que estivessem originalmente previstas no respectivo edital, quando isso for necessário para adequação a eventuais novidades surgidas na legislação posteriormente à publicação do edital, contanto que o concurso público ainda não esteja concluído e homologado.3

Exemplificando, imagine-se um concurso público para o cargo “W” em que houvesse uma segunda etapa consistente em um “curso de formação”, meramente classificatório, com duração, prevista originalmente no edital, de dois meses. Suponha-se que, logo depois de realizada a primeira etapa, sobreviesse lei exigindo que, para o cargo “W”, o concurso público fosse integrado por uma etapa de “curso de formação”, eliminatório, com duração mínima de três meses. Nessa hipótese, a administração pública teria que modificar o edital para adaptá-lo à nova lei (porque o concurso ainda não estava concluído e homologado) e todos os candidatos que tivessem passado pela primeira etapa estariam sujeitos ao “curso de formação”, eliminatório, com duração de três meses.

Cumpre enfatizar, todavia, que é bastante restrito o motivo que autoriza (ou determina) a modificação das regras do concurso pela administração, depois de publicado o edital e já iniciado o certame: a superveniência de alteração na legislação pertinente. Deveras, consoante literal orientação do Supremo Tribunal Federal, “após a publicação do edital e no curso do certame, só se admite a alteração das regras do concurso se houver 3 RE 318.106/RN, rel. Min. Ellen Gracie, 18.10.2005; MS 26.668/DF, 26.673/DF e 26.810/DF, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 15.04.2009.

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modificação na legislação que disciplina a respectiva carreira”.4

A Lei 8.112/1990, que estabelece o regime jurídico a ser observado pela administração direta, autarquias e fundações públicas federais para o provimento de cargos públicos (regime estatutário), traz as seguintes regras relativas à exigência de concurso público:

“Art. 10. A nomeação para cargo de carreira ou cargo isolado de provimento efetivo depende de prévia habilitação em concurso público de provas ou de provas e títulos, obedecidos a ordem de classificação e o prazo de validade.

(...)

Art. 11. O concurso será de provas ou de provas e títulos, podendo ser realizado em 2 (duas) etapas, conforme dispuserem a lei e o regulamento do respectivo plano de carreira, condicionada a inscrição do candidato ao pagamento do valor fixado no edital, quando indispensável ao seu custeio, e ressalvadas as hipóteses de isenção nele expressamente previstas.5”

Vale registrar que o Decreto 6.944/2009, aplicável à administração direta do Poder Executivo federal e às autarquias e fundações públicas a ele vinculadas, estabelece que, no caso da realização do concurso em duas etapas, a segunda será constituída de curso ou programa de formação , de caráter eliminatório e classificatório , ressalvada disposição diversa em lei específica.

A Lei 9.962/2000, que possibilitava a contratação de empregados públicos (celetistas) no âmbito da administração direta, autarquias e fundações públicas federais, reproduz o texto do inciso II do art. 37 da Constituição, determinando, em seu art. 2º, que “a contratação de pessoal para emprego público deverá ser precedida de concurso público de provas ou de provas e títulos, conforme a natureza e a complexidade do emprego”. Deve-se anotar que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI 2.135/DF, em 02.08.2007, decidiu que, a partir dessa data (ex nunc), ficou restabelecida a exigência de adoção de regime jurídico único na administração direta, autarquias e fundações públicas de cada um dos entes federados, restaurando a redação original do caput do art. 39 da Constituição. Na esfera federal, esse regime único é o estatutário, ou seja, embora permaneçam válidas eventuais contratações de empregados públicos para a administração direta, autarquias e fundações públicas federais, realizadas antes de 02.08.2007, o pessoal admitido para esses órgãos e entidades depois dessa data deve ser todo estatutário, sujeito, assim, à Lei 8.112/1990, e não à Lei 9.962/2000.

Vale acrescentar que o § 2º do art. 37 da Carta Magna estabelece claramente que o 4 MS 27.160/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 18.12.2008. 5 O art. 11 da Lei 8.112/1990 está regulamentado pelo Decreto 6.593/2008, o qual contém as regras relativas à isenção de

pagamento de taxa de inscrição em concursos públicos realizados no âmbito do Poder Executivo federal, inclusive as hipóteses em que o edital do concurso deverá prever a referida isenção. É interessante observar que esse decreto também se aplica aos processos seletivos simplificados realizados no âmbito do Poder Executivo federal para a contratação de pessoal por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público, prevista no art. 37, IX, da Constituição.

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desrespeito à exigência de concurso público ou ao seu prazo de validade implicará a nulidade do ato (o ato de nomeação, no caso de cargos públicos, ou a celebração do contrato de trabalho, quando se tratar de empregos públicos) e a punição da autoridade responsável, nos termos da lei.

Quanto a esse último ponto, é importante fazer uma observação a respeito das situações em que a administração pública promove o denominado “desvio de função ”, vale dizer, o dirigente da unidade administrativa de lotação do servidor impõe a este o exercício de atribuições de outro cargo, diversas daquelas que correspondem ao cargo para o qual ele foi nomeado e empossado.

Nessas circunstâncias, em virtude da exigência constitucional de aprovação em concurso público específico para cada cargo, não pode o servidor, depois da Constituição de 1988, ser “reenquadrado” no cargo cujas atribuições está indevidamente sendo obrigado a exercer. O que acontece é surgir para esse servidor o direito a receber as diferenças de remuneração pelo período em que exerceu, de fato , as funções do cargo estranho ao seu. Além disso, é claro que, constatado o desvio, deve a administração adotar as providências necessárias à imediata cessação dessa anomalia (e responsabilizar quem a ocasionou).

Clara a respeito é a ementa do RE 486.184 AgR/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 12.12.2006, abaixo transcrita:

“O servidor público desviado de suas funções, após a promulgação da Constituição, não pode ser reenquadrado, mas tem direito ao recebimento, como indenização, da diferença remuneratória entre os vencimentos do cargo efetivo e os daquele exercido de fato.”

A matéria é abordada, também, na Súmula 378 do Superior Tribunal de Justiça , nos termos seguintes:

“378 – Reconhecido o desvio de função, o servidor faz jus às diferenças salariais decorrentes.”

2) O item 1.1.5 passou a ter a seguinte redação em sua parte final:

1.1.5. Prazo de validade do concurso

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...............

Em síntese, a orientação hoje existente no âmbito do Supremo Tribunal Federal, segundo nos parece, é que a aprovação em concurso público dentro do número de vagas fixado no edital cria para o candidato direito adquirido à nomeação – e não mera expectativa de direito –, obedecida, evidentemente, a ordem de classificação. Pensamos ser prudente aguardar a confirmação desse entendimento em decisões posteriores, de preferência do Plenário do Tribunal.

De toda sorte, o intuito moralizador dessa nova orientação, caso ela venha a se consagrar, poderá ser facilmente frustrado pela administração – em muitos órgãos e entidades, infelizmente, é provável que o seja. Com efeito, basta que o órgão ou a entidade que promova o concurso elabore um edital em que não seja determinado número certo de vagas. Esse modelo de edital, aliás, é bastante usual – e a verdade é que ele não surgiu com o objetivo de burlar orientação jurisprudencial alguma –, sendo geralmente utilizado quando o órgão ou a entidade administrativa deseja apenas formar os denominados “cadastros de reserva” para futuras e eventuais nomeações, caso venham a ser necessárias.

Quanto a esse ponto, é oportuno registrar que o Decreto 6.944/2009, aplicável à administração direta do Poder Executivo federal e às autarquias e fundações públicas a ele vinculadas, contém regra salutar que confere à realização de concurso público para a formação de “cadastro de reserva” a condição de medida excepcional aplicável a hipóteses restritas, conforme deflui de seu art. 12, abaixo reproduzido:

“Art. 12. Excepcionalmente o Ministro de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão poderá autorizar a realização de concurso público para formação de cadastro reserva para provimento futuro, de acordo com a necessidade, de cargos efetivos destinados a atividades de natureza administrativa, ou de apoio técnico ou operacional dos planos de cargos e carreiras do Poder Executivo federal.”

Cabe anotar que o fato de o edital prever número determinado de vagas a serem preenchidas não impede a administração de nomear um número de candidatos maior do que o número de vagas fixado no edital, contanto que os nomeados sejam considerados aprovados, nos termos do edital, ou de legislação específica, se houver.

Ilustra essa afirmação o Decreto 6.944/2009, aplicável, no âmbito do Poder Executivo federal, à administração direta, às autarquias e às fundações públicas, cujo art. 11 prevê a possibilidade de serem nomeados, durante o período de validade do concurso, candidatos aprovados e não convocados, podendo ultrapassar em até cinqüenta por cento o quantitativo original de vagas , desde que o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão assim decida, motivando expressamente.

Por fim, não se questiona, ao que saibamos, o direito de a administração efetuar parceladamente as nomeações, dentro do prazo de validade do concurso. Ainda que prevaleça o entendimento de que é compulsória a nomeação de todos os candidatos aprovados e classificados dentro do número de vagas que o edital estabeleça , certo é que a administração não está obrigada a nomear todos eles de uma só vez, podendo fazê-lo, dentro do prazo de validade do concurso, em tantas parcelas quantas julgue

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oportuno e conveniente ao interesse público.

3) O item 1.1.7 passou a ter a seguinte redação em sua parte final:

1.1.7. Reserva de percentual de cargos e empregos aos portadores de deficiências

.................

Evidentemente, os critérios adotados pela junta médica para opinar pela incompatibilidade entre a deficiência e as atribuições do cargo e para determinar a inexistência de deficiência que justifique o candidato haver concorrido às vagas reservadas são inesgotável fonte de litígios administrativos e judiciais. É desnecessário comentar que jamais seria possível que o legislador elaborasse uma lista taxativa de alterações efetivamente consideradas deficiência para efeito de concurso público e enumerasse os cargos compatíveis com cada uma delas.

Não obstante a dificuldade de apontar quando uma alteração orgânica passa a ser considerada deficiência para efeito de participação em concurso público, é mister anotar que o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 377 , explicitando que deve ser considerada deficiência uma condição específica – a ausência de visão em um dos olhos –, conforme abaixo se lê:

“377 – O portador de visão monocular tem direito de concorrer, em concurso público, às vagas reservadas aos deficientes.”6

Por último, é oportuno registrar o disposto no Enunciado Administrativo 12/CNJ (Publicado no DJ-Eletrônico, Edição nº 16/2009, de 29.01.2009), do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), abaixo transcrito:

“Em todos os concursos públicos para provimento de cargos do Poder Judiciário, inclusive para ingresso na atividade notarial e de registro, será assegurada reserva de vagas a

6 Idêntica orientação encontra-se na Súmula Administrativa AGU 45/2009.

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candidatos com deficiência, em percentual não inferior a 5% (cinco por cento), nem superior a 20% (vinte por cento) do total de vagas oferecidas no concurso, vedada a incidência de “nota de corte” decorrente da limitação numérica de aprovados e observando-se a compatibilidade entre as funções a serem desempenhadas e a deficiência do candidato. As listas de classificação, em todas as etapas, devem ser separadas, mantendo-se uma com classificação geral, incluídos os candidatos com deficiência e outra exclusivamente composta por estes.”

4) Foi acrescentado o parágrafo abaixo ao item 1.1.8:

1.1.8. Cargos em comissão e funções de confiança

....................

A nomeação para cargo de provimento em comissão – nomeação ad nutum – não pode, em regra, ser substituída por outra sistemática de escolha do agente a ser nomeado. Com base nesse entendimento, o Supremo Tribunal Federal já declarou inconstitucionais normas estaduais de iniciativa do Poder Legislativo que previam a eleição como forma de escolha de dirigentes de escolas públicas. Deixou assente o Pretório Excelso que a competência para essa nomeação é privativa do Chefe do Poder Executivo, uma vez que o cargo de diretor de escola pública é um cargo em comissão e, como tal, de confiança da citada autoridade, a quem o ordenamento confere as prerrogativas de livre nomeação e exoneração, incompatíveis com o sistema de eleições.7

...................

5) O item 1.1.9 passou a ter a seguinte redação (reprodução integral do item):

7 ADI 2.997/RJ, rel. Min. Cezar Peluso, 12.08.2009, entre muitos outros julgados no mesmo sentido; vide Informativo 555 do STF.

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1.1.9. Contratação por tempo determinado

O inciso IX do art. 37 da Constituição de 1988 prevê uma outra forma de admissão de agentes públicos pela administração pública, diversa do provimento de cargos efetivos e do preenchimento de empregos públicos mediante concurso público e diversa da nomeação para cargos em comissão. Trata-se da contratação por tempo determinado, para atender necessidade temporária de excepcional interesse público. É a seguinte a redação do citado dispositivo:

“IX – a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público;”

O pessoal admitido com base no inciso IX do art. 37 do Texto Magno não ocupa cargo público. Eles não estão sujeitos ao regime estatutário a que se submetem os servidores públicos titulares de cargos efetivos e os servidores públicos ocupantes de cargos em comissão.

Embora os agentes públicos temporários tenham um contrato com o Poder Público, não se trata do “contrato de trabalho” propriamente dito, previsto na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Aliás, o pessoal temporário da administração pública, em qualquer esfera da Federação, somente se sujeita à CLT nos termos em que determine a lei específica que os reja – caso tal lei o faça.

De toda sorte, frise-se, o regime jurídico dos agentes públicos contratados por tempo determinado não é trabalhista, isto é, não são eles empregados celetistas, mas sim agentes públicos estatutários, embora tenham o seu próprio estatuto de regência (isto é, a lei que determina o seu regime jurídico), diferente do estatuto que regula as relações entre a administração pública e os servidores públicos titulares de cargos efetivos e comissionados.

Podemos dizer que os agentes públicos contratados por tempo determinado exercem função pública remunerada temporária, tendo o seu vínculo funcional com a administração pública caráter jurídico-administrativo, e não trabalhista . Eles não têm um “contrato de trabalho” em sentido próprio; o contrato que firmam com a administração é um contrato de direito público, que não descaracteriza a sua condição de agentes públicos estatutários.

O regime de previdência social a que estão sujeitos os agentes públicos contratados por tempo determinado é o regime geral (RGPS), aplicável a todos os trabalhadores civis, com exceção dos ocupantes de cargos públicos efetivos.

É relevante registrar que o Supremo Tribunal Federal, em inúmeros julgados, envolvendo diversos entes federados, firmou a orientação de que as lides entre o Poder Público contratante e os agentes públicos temporários contratados com base no inciso IX do art. 37 da Constituição da República não são da competência da Justiça do Trabalho , e

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sim da Justiça Comum, federal ou estadual (ou do Distrito Federal), conforme o caso.8 Por outras palavras, os agentes públicos temporários federais, quanto às causas relacionadas à sua relação funcional com a administração pública federal, têm foro na Justiça Federal; os agentes públicos temporários estaduais, municipais ou distritais, quanto às lides atinentes à sua relação funcional com a administração pública do respectivo ente federado, têm foro na Justiça Estadual (ou do Distrito Federal).

Na esfera federal, a contratação por prazo determinado encontra-se disciplinada na Lei 8.745/1993, bastante alterada por diversas leis posteriores. O âmbito de aplicação dessa lei restringe-se aos órgãos da administração direta federal, às autarquias e às fundações públicas federais.

A Lei 8.745/1993 estabelece, como determina a Constituição, as situações que podem ser consideradas como necessidade temporária de excepcional interesse público, aptas a ensejar a contratação de pessoal por tempo determinado. Não poderia ser deixado o estabelecimento dessas situações a critério do administrador, pois se estaria frustrando o dispositivo constitucional.

Dentre as muitas hipóteses estabelecidas na Lei 8.745/1993, enumeramos algumas, que pensamos estarem entre as mais comuns ou mais importantes:

a) assistência a situações de calamidade pública;

b) combate a surtos endêmicos;

c) realização de recenseamentos e outras pesquisas de natureza estatística efetuadas pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE;

d) admissão de pesquisador, nacional ou estrangeiro, para projeto de pesquisa com prazo determinado, em instituição destinada à pesquisa;

e) combate a emergências ambientais, na hipótese de declaração, pelo Ministro de Estado do Meio Ambiente, da existência de emergência ambiental na região específica.

A contratação temporária na esfera federal não é feita mediante concurso público, mas sim por meio de processo seletivo simplificado sujeito a ampla divulgação, inclusive no Diário Oficial da União.

É dispensado processo seletivo na hipótese de contratação para atender às necessidades decorrentes de calamidade pública e de emergência ambiental .

Em alguns casos, como no de contratação de professor e pesquisador visitante 8 Vide, entre outros, RE 573.202/AM, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 21.08.2008; CC 7.201/AM, rel. orig. Min. Marco Aurélio, rel. p/ o

acórdão Min. Ricardo Lewandowski, 29.10.2008; Rcl 4.489 AgR/PA, rel. orig. Min. Marco Aurélio, rel. p/ o acórdão Min. Cármen Lúcia, 21.08.2008; Rcl 6.667/RO, rel. Min. Cármen Lúcia, 05.12.2008; Rcl 4.464/GO, rel. orig. Min. Carlos Britto, red. p/ o acórdão Min. Cármen Lúcia, 20.05.2009.

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estrangeiro, a Lei 8.745/1993 permite a seleção baseada somente em análise de currículo que demonstre notória capacidade técnica ou científica do profissional. Essa regra permite concluirmos, contrario sensu, que nos demais casos em que seja exigido o processo seletivo simplificado não será admitido como critério exclusivo a análise curricular, sendo necessária a realização, pelos candidatos, de algum tipo de prova que permita a seleção com base em critérios objetivos.

Os prazos máximos de duração dos contratos são estabelecidos na Lei 8.745/1993, de acordo com a hipótese de contratação. A regra geral é serem os contratos improrrogáveis ou serem admitidas prorrogações até um limite máximo, a fim de evitar que se perpetuem as contratações, o que afrontaria o princípio constitucional do concurso público – que é a regra geral para a admissão de pessoal pelo poder público – bem como outros postulados constitucionais administrativos, a exemplo dos princípios da moralidade e da impessoalidade.

A extinção do contrato temporário pode ocorrer a pedido do contratado ou, de pleno direito, pelo simples término do prazo determinado. Nessas duas hipóteses não assiste ao contratado qualquer direito a indenização.

Pode, ainda, o contrato ser extinto por iniciativa do órgão ou entidade contratante, decorrente de conveniência administrativa. Neste caso, o contratado fará jus a indenização correspondente à metade do que lhe caberia referente ao restante do contrato (por exemplo, se a remuneração era de R$ 4.000,00 por mês e o contrato é extinto pela administração cinco meses antes do término originalmente previsto, o contratado terá direito a uma indenização de R$ 10.000,00).

Em diversos julgados, o Supremo Tribunal Federal tem afirmado que o inciso IX do art. 37 da Constituição deve ser interpretado restritivamente, porque configura exceção à regra geral que estabelece o concurso público como o meio idôneo à admissão de pessoal no serviço público, verdadeiro corolário do princípio republicano.9 Conforme deixou assente em mais de uma oportunidade, a observância cumulativa de quatro requisitos é necessária para que se considere legítima essa contratação temporária, em todos os níveis da Federação, a saber: a) os casos excepcionais devem estar previstos em lei ; b) o prazo de contratação deve ser predeterminado; c) a necessidade deve ser temporária; e d) o interesse público deve ser excepcional.10

Pacífico é o entendimento de nossa Corte Suprema segundo o qual não cabe a contratação temporária de que trata o inciso IX do art. 37 da Carta de 1988 para a execução de serviços meramente burocráticos , porque, nesses casos, não haveria como defender que pudesse estar presente o “excepcional interesse público” a que se refere o texto constitucional.11

Quanto à previsão legal de contratação temporária de agentes para desempenhar serviços que, embora não sejam meramente burocráticos, representam função

9 ADI 1500/ES, rel. Min. Carlos Velloso, 19.06.2002; ADI 890/DF, rel. Min. Maurício Corrêa, 11.09.2003. 10 ADI 2.229/ES, rel. Min. Carlos Velloso, 09.06.2004, unânime; ADI 3.210/PR, rel. Min. Carlos Velloso, 11.11.2004, unânime; ADI 3.430/ES, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 12.08.2009, unânime; vide Informativo 555 do STF. 11 ADI 2.987/SC, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 19.02.2004, unânime; ADI 3.430/ES, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 12.08.2009, unânime.

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permanente do órgão ou entidade contratante, existe alguma controvérsia. A grande maioria dos julgados do Supremo Tribunal Federal de que temos notícia, inclusive os mais recentes, exige que a própria função a ser desempenhada seja temporária (e não só a necessidade), vale dizer, tais julgados consideram inconstitucional a previsão legal de contratação com base no inciso IX do art. 37 para o exercício de funções permanentes, ordinárias, regulares do órgão ou entidade contratante, para a execução de atividades permanentes, essenciais, de que seja incumbido o Estado.12

A exceção relevante – embora, até onde saibamos, seja uma decisão isolada e aprovada por apertada maioria – foi a orientação perfilhada no julgamento da ADI 3.068/DF.13 Nesse aresto, o Supremo Tribunal Federal, literalmente, afirmou que “o art. 37, IX, da Constituição do Brasil autoriza contratações, sem concurso público, desde que indispensáveis ao atendimento de necessidade temporária de excepcional interesse público, quer para o desempenho das atividades de caráter eventual, temporário ou excepcional, quer para o desempenho das atividades de caráter re gular e permanente ” (grifamos).

Não obstante, vale repetir, pensamos que a jurisprudência prevalente hoje no âmbito do Supremo Tribunal Federal é pela inconstitucionalidade de disposições legais que prevejam e autorizem a contratação por prazo determinado, prevista no inciso IX do art. 37 da Carta Política, para o exercício de funções permanentes , regulares, ordinárias da administração pública, inclusive as que não se enquadrem como “serviços meramente burocráticos”.

5) O item 3.4 passou a ter a seguinte redação em sua parte final:

3.4. Direitos e garantias dos trabalhadores em gera l aplicáveis aos servidores públicos

........................

O item “a”, acima, merece um comentário. O Supremo Tribunal Federal já afirmou que a Constituição garante ao servidor público o direito ao salário mínimo, nacionalmente unificado, conforme assegurado aos trabalhadores da iniciativa privada (CF, art. 39, § 3º), mas que, para o fim de obediência ao postulado constitucional, há que se observar a remuneração do servidor, e não o seu vencimento básico . Vale dizer, não há necessidade de que o vencimento básico corresponda ao salário mínimo; basta que a

12 ADI 890/DF, rel. Min. Maurício Corrêa, 11.09.2003; ADI 2.229/ES, rel. Min. Carlos Velloso, 09.06.2004; ADI 3.210/PR, rel. Min. Carlos Velloso, 11.11.2004; ADI 3.700/RN, rel. Min. Carlos Britto, 15.10.2008; ADI 3.430/ES, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 12.08.2009. 13 ADI 3.068/DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, rel. p/acórdão Min. Eros Grau, 25.08.2004.

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17.ª para 18.ª edição

remuneração do servidor (vencimento básico + vantagens pecuniárias permanentes) perfaça o valor do salário mínimo.

Essa orientação está, hoje, sedimentada na Súmula Vinculante 16 , cuja redação segue transcrita:

“16 – Os artigos 7º, IV, e 39, § 3º (redação da EC 19/98), da Constituição, referem-se ao total da remuneração percebida pelo servidor público.”

Assunto relacionado ao que acabamos de expor, a merecer breve análise, é abordado na Súmula Vinculante 15 . É o seguinte o seu enunciado:

“15 – O cálculo de gratificações e outras vantagens do servidor público não incide sobre o abono utilizado para se atingir o salário mínimo.”

As situações que deram origem à Súmula Vinculante 15, em linhas gerais, podem ser assim descritas: determinados entes federados têm leis que garantem que, na hipótese de o vencimento básico de algum de seus cargos públicos ser inferior ao salário mínimo a que se refere o inciso IV do art. 7º da Constituição do Brasil, será devido um abono que complementará o valor desse vencimento básico, de tal forma que o somatório do abono com o vencimento básico seja igual ao valor do referido salário mínimo. Essas mesmas leis, usualmente, proíbem que gratificações e outras vantagens pecuniárias integrantes da remuneração total sejam calculadas sobre o valor desse somatório – “vencimento básico + abono”. Vale dizer, essas leis normalmente determinam que as gratificações e outras vantagens pecuniárias incidam unicamente sobre o valor do vencimento básico.

Diversos servidores, então, ajuizaram ações questionando essa exclusão do abono no cálculo das gratificações e outras vantagens integrantes de suas remunerações totais, alegando que o abono, uma vez recebido, passaria a integrar o próprio vencimento básico e, por isso, não faria sentido calcular os adicionais sobre um valor que não mais existiria (o valor do vencimento básico sem o abono).

Pois bem, o Supremo Tribunal Federal decidiu que seria inconstitucional a incidência das gratificações e outras vantagens pecuniárias sobre o valor representado pelo somatório “vencimento básico + abono”.

Isso porque, sendo esse valor (“vencimento básico + abono”) igual ao do salário mínimo, a incidência dos adicionais sobre ele acarretaria, no fim das contas, vinculação do valor das gratificações e outras vantagens ao valor do salário mínimo (toda vez que o salário mínimo aumentasse, as gratificações e vantagens pecuniárias aumentariam também, automaticamente). Ocorre, porém, que qualquer vinculação de valores ao valor do salário mínimo é expressamente proibida pelo art. 7º, IV, da Carta Política.

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Em suma, o raciocínio desenvolvido pelo STF foi o seguinte: toda vez que o salário mínimo for reajustado, o valor do abono também será alterado, a fim de que o binômio “vencimento básico + abono” iguale o salário mínimo; assim sendo, se as gratificações e vantagens fossem calculadas sobre o valor do conjunto “vencimento básico + abono”, o reajuste do salário mínimo acarretaria, automaticamente, também, a alteração do valor das gratificações e vantagens.

Por isso, conforme o literal entendimento do STF, “a incidência de gratificações e outras vantagens sobre o resultado da soma do vencimento com o abono – este utilizado para se atingir o salário mínimo – contraria o art. 7º, IV, da CF, por implicar vinculação nele vedada” (ver Informativo 528).

Por último, consideramos oportuno registrar que a Lei 8.112/1990, no parágrafo único do seu art. 40, originalmente, continha regra segundo a qual o vencimento básico dos servidores públicos federais por ela regidos não poderia ser inferior ao salário mínimo. Esse dispositivo, entretanto, foi revogado pela Lei 11.784/2008.

A mesma lei acrescentou o § 5º ao art. 41 da Lei 8.112/1990, determinando que “nenhum servidor receberá remuneração inferior ao salário mínimo”. Portanto, hoje em dia, na esfera federal, é possível, sim, um servidor público estatutário ter o vencimento básico previsto em lei em valor inferior ao do salário mínimo. É necessário, tão-somente, que esse vencimento básico, acrescido das vantagens pecuniárias permanentes, atinja o valor do salário mínimo.

Anote-se que não existe, na esfera federal, previsão de “abono” destinado a complementar o vencimento básico, a fim de que este alcance o valor do salário mínimo. O vencimento básico de cargos federais, cumpre repetir, pode perfeitamente ser menor do que o salário mínimo; o que não pode ser menor do que o salário mínimo, em nenhum ente federado, é a remuneração do servidor público (vencimento básico + vantagens pecuniárias permanentes).

6) O item 5.4 passou a ter a seguinte redação (reprodução integral do item):

5.4. Posse

O art. 7º da Lei 8.112/1990 estabelece que a investidura no cargo público ocorre com a posse .

Somente há posse nos casos de provimento de cargo por nomeação .

Enquanto a nomeação é um ato unilateral da autoridade competente, mediante o qual é dado provimento a um cargo público, sem que haja qualquer participação ou necessidade de anuência do nomeado, a posse é um ato bilateral por meio do qual o servidor é investido nas atribuições e responsabilidades inerentes a seu cargo.

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17.ª para 18.ª edição

Observe-se que, embora seja usual afirmar que a posse é um ato jurídico bilateral – porque é imprescindível a participação da administração pública e do agente que assinará o termo de posse –, ela não é um contrato em sentido próprio. Cumpre frisar que o servidor público estatutário não tem um contrato de trabalho – o ato de posse não se equipara à assinatura de um contrato de trabalho –, estando sujeito, isso sim, a um regime jurídico de natureza legal (não-contratual), passível de ser alterado unilateralmente, sempre que a lei de regência for modificada, sem que se possa invocar direito adquirido à manutenção do regime jurídico inicial.

O ato de posse enquadra-se naquilo que Léon Duguit chama de “ato-condição”, isto é, um ato no qual a manifestação do agente é necessária unicamente para que ele se insira em um regime jurídico preestabelecido e não passível de modificação pela vontade dele.

O art. 13 da Lei 8.112/1990 explicita a natureza de ato bilateral da posse, nos termos que acabamos de expor, ao estatuir:

“Art. 13. A posse dar-se-á pela assinatura do respectivo termo, no qual deverão constar as atribuições, os deveres, as responsabilidades e os direitos inerentes ao cargo ocupado, que não poderão ser alterados unilateralmente, por qualquer das partes, ressalvados os atos de ofício previstos em lei.”

Antes da posse, o nomeado ainda não é um servidor público , pois ainda não se aperfeiçoou o vínculo jurídico funcional entre ele e a administração pública. Esse vínculo é formado justamente por meio da posse. Com a posse, o nomeado torna-se servidor público, aceitando as regras legais de regência de sua relação jurídica com a administração, decorrente do cargo que passará a exercer.

Nos termos do art. 5º da Lei 8.112/1990, são requisitos para posse, sem prejuízo de outras exigências específicas que, em razão das atribuições do cargo, sejam estabelecidas em lei: (a) nacionalidade brasileira; (b) gozo dos direitos políticos; (c) quitação com as obrigações militares e eleitorais; (d) nível de escolaridade exigido para o exercício do cargo; (e) idade mínima de dezoito anos; (f) aptidão física e mental.

É oportuno registrar que o Decreto 6.944/2009, aplicável à administração direta do Poder Executivo federal e às autarquias e fundações públicas a ele vinculadas, estabelece que somente no ato da posse deverão ser comprovadas escolaridade mínima e experiência profissional (quando exigida), expressamente vedando que tal comprovação seja imposta no ato de inscrição no concurso público ou em qualquer de suas etapas, ressalvado o disposto em legislação específica (art. 19, parágrafo único).

A posse poderá dar-se mediante procuração específica (art. 13, § 3º). No ato da posse, o servidor deve apresentar declaração de bens e valores que constituem seu patrimônio e declaração quanto ao exercício ou não de outro cargo, emprego ou função pública (art. 13, § 5º).

O prazo para o nomeado tomar posse é de trinta dias, improrrogáveis, contados da nomeação ou, no caso de servidor que se encontre em licença nesta data, do término de seu impedimento. Se o nomeado não tomar posse no prazo previsto, não chega a completar-se o vínculo jurídico funcional entre ele a administração. Não há, portanto,

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como se falar em exoneração. A hipótese será simplesmente de tornar sem efeito o ato de nomeação (art. 13, § 6º).

7) Sobre a duração do estágio probatório, passou a constar o texto abaixo (item 5.6):

5.6. Estágio probatório

......................

Após a EC 19/1998, o período necessário para a aquisição da estabilidade passou a ser de três anos. Entretanto, o caput do art. 20 da Lei 8.112/1990 não foi expressamente revogado, nem expressamente alterado. A bem da verdade, a Medida Provisória 431/2008 pretendeu modificar a redação desse dispositivo, estabelecendo em trinta e seis meses a duração do estágio probatório de que ele trata, mas essa alteração foi rejeitada por ocasião da conversão da MP 431/2008 na Lei 11.784/2008. Em suma, o texto hoje vigente do caput do art. 20 da Lei 8.112/1990 fixa em vinte e quatro meses a duração do estágio probatório.

A questão acerca da duração do estágio probatório tem suscitado controvérsia na administração pública federal. Não obstante, atualmente, no âmbito do Poder Executivo federal , deve ser observado o disposto no Parecer AGU/MC-01/04/2004, que foi adotado pelo Parecer AC-17/2004, do Advogado-Geral da União, e aprovado pelo Presidente da República. O entendimento decorrente desses atos é de que o estágio probatório tem duração de três anos , porque essa duração seria a única logicamente compatível com o prazo de três anos para a aquisição da estabilidade, fixado pela EC 19/1998. Essa orientação – de que a duração do estágio probatório é de três anos – é vinculante para o Poder Executivo federal (LC 73, art. 40).

Cumpre anotar, ademais, que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (vide, por exemplo, SS 3.957/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 17.09.2009) e a do Superior Tribunal de Justiça (vide, por exemplo, MS 12.523/DF, rel. Min. Felix Fischer, 22.04.2009) têm apontado igualmente para o entendimento de que o prazo de três anos para aquisição da estabilidade fixado na EC 19/1998 é de aplicação imediata e teria afastado as regras legais que previam outro prazo para o estágio probatório. Embora os dois tribunais reconheçam expressamente que o estágio probatório e a estabilidade são institutos distintos, com finalidades diversas, ambos afirmam que não há como dissociar, na prática e no plano lógico, o prazo de um e de outro.

....................

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8) O item 5.10.1 passou a ter a seguinte redação em sua parte final:

5.10.1. Vencimento e remuneração

....................

A Lei 8.112/1990 confere grande proteção à remuneração (e aos proventos), em razão do caráter alimentício que esta possui. Por esse motivo, veda a incidência de quaisquer descontos sobre a remuneração, a menos que estejam previstos em lei ou decorram de mandado judicial (art. 45).

Além dessa garantia, a Lei 8.112/1990 assegura que a remuneração e o provento não serão objeto de arresto, seqüestro ou penhora, exceto nos casos de prestação de alimentos resultante de decisão judicial (art. 48). Portanto, se um servidor público estiver sofrendo execução judicial em razão de inadimplemento de dívida não-alimentícia, deverá ser efetuada a penhora, ou outros procedimentos assecuratórios da execução, sobre seus bens penhoráveis e, se o servidor não possuir bens penhoráveis, a execução será frustrada, uma vez que sua remuneração está protegida pela lei.

O art. 46 da Lei 8.112/1990 estatui que as reposições e indenizações ao erário devem ser previamente comunicadas ao servidor ativo, aposentado ou ao pensionista, para pagamento, no prazo máximo de trinta dias , podendo ser parceladas , a pedido do interessado. Se o interessado optar pelo parcelamento, o valor de cada parcela não pode ser inferior ao correspondente a dez por cento da remuneração, provento ou pensão. Entretanto, se o pagamento indevido houver ocorrido no mês anterior ao do processamento da folha, a reposição será feita imediatamente, em uma única parcela.

A respeito desse tema – restituição (repetição) de valores indevidamente recebidos pelo servidor ou aposentado –, é importante registrar que nossa jurisprudência fixou o entendimento de que, em razão da natureza alimentícia da remuneração e dos proventos, o recebimento, de boa-fé , de valores indevidamente pagos pela administração resultantes de erro dela na interpretação da lei não acarreta para o servidor ou aposentado a obrigação de restituir (repetir). Tal orientação deu origem à Súmula Administrativa AGU 34/2008, cujo enunciado segue transcrito:

“34 – Não estão sujeitos à repetição os valores recebidos de boa-fé pelo servidor público, em decorrência de errônea ou inadequada interpretação da lei por parte da Administração Pública.”

9) O item 5.10.3 passou a ter a seguinte redação em sua parte final:

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5.10.3. Férias

......................

O pagamento da remuneração das férias será efetuado até 2 dias antes do início do respectivo período (art. 78).

Caso o servidor seja exonerado do cargo efetivo, ou em comissão, fará jus à percepção de indenização relativa ao período das férias a que tiver direito (férias vencidas) e ao incompleto (férias proporcionais), na proporção de um doze avos por mês de efetivo exercício, ou fração superior a quatorze dias. Essa indenização será calculada com base na remuneração do mês em que for publicado o ato exoneratório.

O Supremo Tribunal Federal já decidiu que o servidor público, quando exonerado, tem direito a receber o valor referente às férias não usufruídas, acrescido de um terço , por aplicação direta do art. 7º, XVII, da Constituição da República, que não pode ser restringido pelo legislador dos diversos entes federados.14

Tal decisão, com repercussão geral, foi proferida para afastar a interpretação que vinha sendo perfilhada por alguns entes federados segundo a qual o adicional de férias a ser pago a seus servidores só seria devido se o servidor efetivamente gozasse as férias. Por outras palavras, consoante essa interpretação, o fato gerador do adicional de férias seria o efetivo gozo das férias, e não o simples direito às férias. Assim, por exemplo, se o servidor por algum motivo fosse exonerado do cargo sem ter gozado as férias a que fizesse jus, no cálculo das verbas devidas pela exoneração seria computada a remuneração das férias não gozadas, mas não o adicional que teria sido pago se essas férias tivessem sido usufruídas.

Ao declarar inválida essa interpretação, deixou assente o Supremo Tribunal Federal que “não é o gozo de férias que garante o adicional de, pelo menos, um terço a mais, e sim o próprio direito às férias constitucionalmente assegurado (CF, art. 7º, XVII)”.

Em síntese, o entendimento sedimentado de nossa Corte Suprema é que independe do efetivo gozo das férias o direito ao pagamento do adicional de um terço à respectiva remuneração, conforme assegurado na Constituição Federal, significa dizer, o direito a um terço a mais na remuneração das férias surge com o próprio direito às férias, mesmo que estas venham a não ser usufruídas. Não pode a lei afastar o pagamento do terço constitucional de férias no cálculo das verbas devidas ao servidor público como decorrência de sua exoneração.

Por fim, decorre do art. 80 da Lei 8.112/1990 que a regra geral é a impossibilidade de interrupção das férias do servidor. Com efeito, nos termos desse dispositivo legal, as férias somente poderão ser interrompidas por motivo de calamidade pública, comoção interna, convocação para júri, serviço militar ou eleitoral, ou por necessidade do serviço declarada pela autoridade máxima do órgão ou entidade.

14 RE 570.908/RN, rel. Min. Cármen Lúcia, 16.09.2009; vide Informativo 559 do STF.

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10) No item 5.10.4, os textos sobre a licença por motivo de doença em pessoa da família e sobre a licença para tratamento de saúde passaram a ter a seguinte redação (reprodução integral de cada tópico):

5.10.4. Licenças

a) licença por motivo de doença em pessoa da famíli a;

Consoante o art. 83, caput, da Lei 8.112/1990, poderá ser concedida licença ao servidor por motivo de doença do cônjuge ou companheiro, dos pais, dos filhos, do padrasto ou madrasta e enteado, ou dependente que viva às suas expensas e conste do seu assentamento funcional, mediante comprovação por perícia médica oficial.

Embora o caput do art. 83 afirme que a licença “poderá ser concedida”, pensamos ser francamente majoritário, inclusive no âmbito da própria administração pública federal, o entendimento de que a concessão dessa licença é ato vinculado, vale dizer, uma vez cumpridas todas as exigências legais, o servidor tem direito subjetivo à obtenção da licença, que deverá ser gozada em conformidade com os termos da lei.

A concessão dessa licença, e cada uma de suas prorrogações, serão precedidas de exame por perícia médica oficial. Poderá, entretanto, ser dispensada a perícia oficial, na forma definida em regulamento, se a licença for inferior a quinze dias, dentro de um ano (art. 81, § 1º, combinado com o art. 204).

A licença somente será concedida se o servidor comprovar ser indispensável sua assistência direta e esta não puder ser prestada simultaneamente com o exercício do cargo ou mediante compensação de horário. É vedado ao servidor o exercício de atividade remunerada durante o período da licença (art. 81, § 3º).

A licença, incluídas as prorrogações, poderá ser concedida a cada período de doze meses nas seguintes condições: (a) por até sessenta dias, consecutivos ou não, mantida a remuneração do servidor; e (b) por até noventa dias, consecutivos ou não, sem remuneração.15 A soma das licenças remuneradas e das licenças não remuneradas, incluídas as respectivas prorrogações, concedidas em um mesmo período de doze meses, não poderá ultrapassar esses limites.16 O início do interstício de doze meses aqui referido será contado a partir da data do deferimento da primeira licença concedida.17

O tempo de licença, com remuneração, que exceder a trinta dias em período de doze meses é contado apenas para efeito de aposentadoria e disponibilidade.18 O tempo de licença não remunerada não é contado para nenhum efeito.

.......................... 15 Art. 83, § 2º, com a redação dada pela MP 479/2009. 16 Art. 83, § 4º, com a redação dada pela MP 479/2009. 17 Art. 83, § 3º, com a redação dada pela MP 479/2009. 18 Art. 103, II, com a redação dada pela MP 479/2009.

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h) licença para tratamento de saúde;

Será concedida ao servidor licença para tratamento de saúde, a pedido ou de ofício, com base em perícia médica, sem prejuízo da remuneração a que fizer jus (art. 202).

Essa licença será concedida com base em perícia oficial. A perícia oficial para concessão da licença (bem como nos demais casos de perícia oficial previstos na Lei 8.112/1990) será efetuada por cirurgiões-dentistas, nas hipóteses em que abranger o campo de atuação da odontologia.

Sempre que necessário, a inspeção médica será realizada na residência do servidor ou no estabelecimento hospitalar onde se encontrar internado. Em hipóteses excepcionais, previstas no art. 203, § 2º, da Lei 8.112/1990, será aceito atestado passado por médico particular, o qual somente produzirá efeitos depois de recepcionado pela unidade de recursos humanos do órgão ou entidade.

A licença que exceder o prazo de cento e vinte dias no período de doze meses a contar do primeiro dia de afastamento será concedida mediante avaliação por junta médica oficial .

A licença para tratamento de saúde inferior a quinze dias, dentro de um ano, poderá ser dispensada de perícia oficial, na forma definida em regulamento.

O servidor será submetido a exames médicos periódicos, nos termos e condições definidos em regulamento (art. 206-A). A regulamentação desse dispositivo está no Decreto 6.856/2009. Explicita o art. 10 do decreto que as despesas com os exames nele referidos serão custeadas pela União. É ainda relevante registrar que o art. 12 do ato regulamentar em tela esclarece que o servidor pode se recusar a realizar os exames, mas a recusa deverá ser por ele consignada formalmente ou reduzida a termo (passada a escrito) pelo órgão ou entidade.

O prazo máximo contínuo de licença para tratamento de saúde é de 24 meses. Ao fim de 24 meses de licença, se o servidor não estiver em condições de reassumir o cargo ou de ser readaptado, será aposentado por invalidez permanente, desde que a licença tenha sido motivada pela enfermidade ensejadora da invalidez, ou por doenças correlacionadas.

Caso o servidor deva ser aposentado por invalidez, o lapso de tempo compreendido entre o término da licença e a publicação do ato da aposentadoria será considerado como de prorrogação da licença (art. 188, § 3º).

A critério da administração, o servidor em licença para tratamento de saúde ou aposentado por invalidez poderá ser convocado a qualquer momento, para avaliação das condições que ensejaram o afastamento ou a aposentadoria.

O período de licença é computado como tempo de efetivo exercício até o limite de vinte e quatro meses, cumulativos ao longo do tempo de serviço público prestado à União, em cargo de provimento efetivo (art. 102, VIII, “b”).

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A partir de 24 meses, cumulativos ao longo de todo o tempo de serviço público prestado à União, em cargo de provimento efetivo, o período de licença será considerado como tempo de serviço apenas para efeito de aposentadoria e disponibilidade (art. 103, VII).

Vale registrar que essa licença está regulamentada pelo Decreto 7.003/2009.

CAPÍTULO 9

1) O item 4.4 passou a ter a seguinte redação (reprodução integral do item):

4.4. Aplicação direta de sanções

A aplicação de sanções administrativas pela administração pública, em caso de irregularidades do particular na execução do contrato, independe de prévia manifestação do Poder Judiciário. As sanções administrativas previstas na Lei 8.666/1993 são as seguintes:

a) multa de mora, por atraso na execução do contrato (art. 86);

b) advertência (art. 87, I);

c) multa, na forma prevista no instrumento convocatório ou no contrato, por inexecução total ou parcial do contrato (art. 87, II);

d) suspensão temporária da possibilidade de participação em licitação e impedimento de contratar com a administração, por prazo não superior a dois anos (art. 87, III);

e) declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a administração pública (art. 87, IV).

Tanto a multa de mora quanto a multa aplicada em decorrência da inexecução total ou parcial do contrato podem ser aplicadas cumulativamente entre si e cumulativamente com as demais sanções administrativas acima enumeradas (art. 86, § 1º, e art. 87, § 2º).

As multas aplicadas pela administração podem ser diretamente descontadas da garantia prestada pelo contratado, quando houver. Ademais, se a multa aplicada for superior ao valor da garantia prestada, além da perda desta, responderá o contratado pela diferença, que será descontada, pela própria administração, dos pagamentos por ela eventualmente devidos ao contratado (art. 86, §§ 2º e 3º, e art. 87, § 1º). Conforme se constata, a exigência das multas, nessas hipóteses, reveste-se de auto-executoriedade. Entretanto,

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se não houver pagamentos devidos pela administração ao contratado, ou se o valor deles for inferior à diferença entre as multas e a garantia prestada, a parcela remanescente das multas terá que ser cobrada judicialmente, vale dizer, a exigência dessa parcela das multas, em tal hipótese, não será auto-executória.

Ao aplicar a penalidade de suspensão temporária de participação em licitações e contratações, a administração deve estipular a duração da medida no caso concreto, tendo em conta a gravidade das infrações comprovadas no processo administrativo correspondente, não podendo a restrição ultrapassar o prazo de dois anos .

A declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a administração pública é sanção de competência exclusiva de ministro de Estado, de secretário estadual ou de secretário municipal, conforme o caso (art. 87, § 3º). O impedimento de licitar ou contratar com a administração permanecerá enquanto perdurarem os motivos determinantes da punição, ou até que seja promovida a reabilitação perante a própria autoridade que aplicou a penalidade. A reabilitação somente pode ser requerida após dois anos da aplicação dessa sanção (art. 87, § 3º) e será concedida sempre que o contratado ressarcir a administração pelos prejuízos resultantes da inexecução total ou parcial do contrato.

Existe muita controvérsia na doutrina acerca da abrangência das penalidades de suspensão do direito de licitar e contratar e de declaração de inidoneidade.

Sobre esse ponto, cumpre, de início, anotar que a Lei 8.666/1993, nos incisos XI e XII do seu art. 6º, apresenta, expressamente, as seguintes definições:

“Art. 6º Para os fins desta Lei, considera-se:

(...)

XI – Administração Pública: a administração direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, abrangendo inclusive as entidades com personalidade jurídica de direito privado sob controle do poder público e das fundações por ele instituídas ou mantidas;

XII – Administração: órgão, entidade ou unidade administrativa pela qual a Administração Pública opera e atua concretamente;”

O inciso III do art. 87 da Lei 8.666/1993 textualmente fala em suspensão do direito de licitar e contratar com a “administração”. Diversamente, o inciso IV do mesmo artigo se refere a declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a “administração pública”.

Em razão dessa diferença literal nas expressões empregadas pelo legislador, parte da doutrina entende que a suspensão só alcançaria os órgãos e entidades administrativos do próprio ente federado que aplicou a sanção, ao passo que a declaração de inidoneidade

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abrangeria toda a administração pública brasileira, em todos os níveis.

Em que pese a plausibilidade do argumento, parece-nos que é majoritário na doutrina e, sobretudo, na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, o entendimento de que tanto a penalidade de suspensão quanto a penalidade de declaração de inidoneidade aplicada por um ente federado produz efeitos perante todos os demais, vale dizer, abrange a administração pública da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios.19

Alertamos, todavia, que a matéria não está pacificada, existindo, até mesmo, importantes autores que defendem a impossibilidade de ambas as penalidades produzirem efeitos além da administração pública do próprio ente federado que aplicou a sanção, apontando como fundamento dessa orientação o princípio federativo e a necessidade de conferir interpretação restritiva a normas sancionatórias ou restritivas de direitos.

A aplicação de sanções pela administração pública não impede que ela, cumulativamente, decrete a rescisão unilateral do contrato. Evidentemente, qualquer aplicação de sanção, bem como a rescisão unilateral ocasionada por irregularidades imputadas ao contratado, devem ser precedidas de processo administrativo em que se assegure ao contratado o direito ao contraditório e à ampla defesa.

É relevante observar que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou-se pela inexistência de efeito rescisório automático como decorrência da aplicação das sanções de declaração de inidoneidade e de suspensão do direito de contratar e licitar. Significa dizer que essas penalidades só têm efeitos prospectivos (ex nunc), obstando, enquanto a sanção durar, a celebração de futuros contratos. Elas não autorizam que se considerem automaticamente rescindidos os contratos administrativos já aperfeiçoados juridicamente e em curso de execução.20 Frise-se, entretanto, que a falta de efeito rescisório automático não impede a administração de promover as medidas administrativas específicas necessárias para rescindir os contratos, nos casos que se enquadrem nas hipóteses legais de rescisão, sempre observado o contraditório e a ampla defesa.

CAPÍTULO 10

1) Foi acrescentada a hipótese abaixo à lista de hipóteses de licitação dispensável do item 4.2.1:

19 REsp 151.567/RJ, 25.02.2003; REsp 174.274/SP, 19.10.2004; REsp 520.553/RJ, 03.11.2009. 20 STJ, MS 14.002/DF, rel. Min. Teori Zavascki, 28.10.2009.

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4.2.1. Licitação dispensável

........................

30) na contratação de instituição ou organização, pública ou privada, com ou sem fins lucrativos, para a prestação de serviços de assistência técnica e extensão rural no âmbito do Programa Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural na Agricultura Familiar e na Reforma Agrária, instituído por lei federal.

.........................

2) O item 4.2.2 passou a ter a seguinte redação (reprodução integral do item):

4.2.2. Licitação dispensada

Ao lado das situações descritas como de licitação dispensável, a lei relaciona outras em que a licitação, embora seja juridicamente possível, não será realizada porque a própria lei, diretamente, dispensa sua realização. Portanto, enquanto nas hipóteses de licitação dispensável o procedimento licitatório poderá, ou não, ocorrer, a critério do administrador, em face do caso concreto, nas situações descritas como de licitação dispensada não poderá a Administração realizar a licitação, uma vez que a lei afasta a possibilidade de realização do procedimento.

A Lei 8.666/1993 enumera no seu art. 17 as hipóteses de licitação dispensada. Como regra, as situações de licitação dispensada referem-se à alienação de bens e direitos pela Administração. As alíneas do inciso I do art. 17 trazem a lista de hipóteses de dispensa de licitação em operações relativas a bens imóveis da Administração, enquanto as alíneas do inciso II do art. 17 enumeram os casos de licitação dispensada para a alienação de bens móveis .

É dispensada a licitação para a alienação de bens imóveis nas seguintes situações:

a) dação em pagamento;

b) doação, permitida exclusivamente para outro órgão ou entidade da administração pública, de qualquer esfera de governo, ressalvado o disposto nas letras “f”, “h” e “i”, abaixo. Cessadas as razões que justificaram a doação do imóvel, ele reverterá ao patrimônio da pessoa jurídica doadora, vedada a sua alienação pelo beneficiário (art. 17, § 1º);

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c) permuta, por outro imóvel destinado ao atendimento das finalidades precípuas da Administração, cujas necessidades de instalação e localização condicionem a sua escolha;

d) investidura;

A lei define investidura como (a) a alienação aos proprietários de imóveis lindeiros (fronteiriços) de área remanescente ou resultante de obra pública, área esta que se tornar inaproveitável isoladamente, por preço nunca inferior ao da avaliação e desde que esse não ultrapasse a R$ 40.000,00 (quarenta mil reais); ou (b) a alienação, aos legítimos possuidores diretos ou, na falta destes, ao Poder Público, de imóveis para fins residenciais construídos em núcleos urbanos anexos a usinas hidrelétricas, desde que considerados dispensáveis na fase de operação dessas unidades e não integrem a categoria de bens reversíveis ao final da concessão.

e) venda a outro órgão ou entidade da Administração Pública, de qualquer esfera de governo;

f) alienação gratuita ou onerosa, aforamento, concessão de direito real de uso, locação ou permissão de uso de bens imóveis residenciais construídos, destinados ou efetivamente utilizados no âmbito de programas habitacionais ou de regularização fundiária de interesse social desenvolvidos por órgãos ou entidades da administração pública;21

g) procedimentos de legitimação de posse de que trata o art. 29 da Lei 6.383/1976, mediante iniciativa e deliberação dos órgãos da Administração Pública em cuja competência legal inclua-se tal atribuição;22

h) alienação gratuita ou onerosa, aforamento, concessão de direito real de uso, locação ou permissão de uso de bens imóveis de uso comercial de âmbito local com área de até 250 m² (duzentos e cinqüenta metros quadrados) e inseridos no âmbito de

21 Redação dada pela Lei 11.481, de 31.05.2007. 22 A Lei 6.383/1976 “dispõe sobre o processo discriminatório de terras devolutas da União, e dá outras providências”. É a seguinte a

redação do seu art. 29: “Art. 29. O ocupante de terras públicas, que as tenha tornado produtivas com o seu trabalho e o de sua família, fará jus à legitimação da posse de área contínua até 100 (cem) hectares, desde que preencha os seguintes requisitos: I – não seja proprietário de imóvel rural; II – comprove a morada permanente e cultura efetiva, pelo prazo mínimo de 1 (um) ano. § 1º A legitimação da posse de que trata o presente artigo consistirá no fornecimento de uma Licença de Ocupação, pelo prazo mínimo de mais 4 (quatro) anos, findo o qual o ocupante terá a preferência para aquisição do lote, pelo valor histórico da terra nua, satisfeitos os requisitos de morada permanente e cultura efetiva e comprovada a sua capacidade para desenvolver a área ocupada.A regularização da ocupação de que trata este artigo consistirá no fornecimento de uma Licença de Ocupação, pelo prazo mínimo de mais quatro anos, findo o qual o ocupante terá a preferência para aquisição do lote pelo valor mínimo estabelecido em planilha referencial de preços, a ser periodicamente atualizada pelo INCRA, utilizando-se dos critérios relativos à ancianidade da ocupação, às diversificações das regiões em que se situar a respectiva ocupação e à dimensão de área (MP 458/2009). § 2º Aos portadores de Licenças de Ocupação, concedidas na forma da legislação anterior, será assegurada a preferência para aquisição de área até 100 (cem) hectares, nas condições do parágrafo anterior, e, o que exceder esse limite, pelo valor atual da terra nua. § 3º A Licença de Ocupação será intransferível inter vivos e inegociável, não podendo ser objeto de penhora e arresto.”

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programas de regularização fundiária de interesse social desenvolvidos por órgãos ou entidades da administração pública;

i) alienação e concessão de direito real de uso, gratuita ou onerosa, de terras públicas rurais da União na Amazônia Legal onde incidam ocupações até o limite de quinze módulos fiscais ou mil e quinhentos hectares, para fins de regularização fundiária, atendidos os requisitos legais.

A Administração também poderá conceder título de propriedade ou de direito real de uso de imóveis, dispensada licitação , quando o uso destinar-se (Lei 8.666/1993, art. 17, §§ 2º, 2º-A e 2º-B):

a) a outro órgão ou entidade da Administração Pública, qualquer que seja a localização do imóvel (art. 17, § 2º, I);

b) a pessoa natural que, nos termos da lei, regulamento ou ato normativo do órgão competente, haja implementado os requisitos mínimos de cultura, ocupação mansa e pacífica e exploração direta sobre área rural situada na Amazônia Legal, superior a um módulo fiscal e limitada a quinze módulos fiscais, desde que não exceda mil e quinhentos hectares, vedada a dispensa de licitação para áreas superiores a esse limite. , Essa hipótese de licitação dispensada, desde que atendidas as condições legais, não necessita de autorização legislativa . Essa hipótese pode ser cumulada com o procedimento de regularização fundiária referido na letra “g”, acima, quando o total das áreas fique limitado a até quinze módulos fiscais, desde que não exceda mil e quinhentos hectares (art. 17, §§ 2º, II, 2º-A e 2º-B).

É dispensada a licitação para a alienação de bens móveis nas seguintes situações:

a) doação, permitida exclusivamente para fins e uso de interesse social, após avaliação de sua oportunidade e conveniência sócio-econômica, relativamente à escolha de outra forma de alienação;

b) permuta, permitida exclusivamente entre órgãos ou entidades da Administração Pública;

c) venda de ações, que poderão ser negociadas em bolsa, observada a legislação específica;

d) venda de títulos, na forma da legislação pertinente;

e) venda de bens produzidos ou comercializados por órgãos ou entidades da Administração Pública, em virtude de suas finalidades;

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f) venda de materiais e equipamentos para outros órgãos ou entidades da Administração Pública, sem utilização previsível por quem deles dispõe.

É oportuno registrar, ainda, que a Lei 11.952/2009, em seu art. 38, autoriza a União e as entidades da administração indireta federal a efetuarem a venda direta (isto é, sem licitação) de imóveis nas condições que especifica, conforme abaixo se lê:

“Art. 38. A União e suas entidades da administração indireta ficam autorizadas a proceder a venda direta de imóveis residenciais de sua propriedade situados na Amazônia Legal aos respectivos ocupantes que possam comprovar o período de ocupação efetiva e regular por período igual ou superior a 5 (cinco) anos, excluídos:

I – os imóveis residenciais administrados pelas Forças Armadas, destinados à ocupação por militares;

II – os imóveis considerados indispensáveis ao serviço público.”

Trata-se de hipótese de licitação dispensada. Isso porque a faculdade conferida pelo dispositivo legal à administração pública consiste na possibilidade de alienar, ou não, o bem imóvel que se enquadre nas condições ali especificadas. Caso a administração pública decida exercer tal faculdade, a própria lei, desde logo, dispensa a licitação (a rigor, quando for utilizada a hipótese de alienação prevista no art. 38 da Lei 11.952/2009, a licitação sequer será viável, porque a venda direta a que ele se refere só pode mesmo ser feita ao respectivo ocupante do imóvel).

Ao lado das hipóteses de licitação dispensada previstas na Lei 8.666/1993, cabe mencionar também a dispensa estabelecida no art. 2º, § 1º, III, da Lei 11.107/2005.

Esse dispositivo estatui que o consórcio público celebrado entre União, estados, Distrito Federal e municípios para a realização de objetivos de interesse comum poderá, para o cumprimento desses objetivos, “ser contratado pela administração direta ou indireta dos entes da Federação consorciados, dispensada a licitação”.

Por fim, é mister registrar que a Lei 11.908/2009 estabelece como hipótese de licitação dispensada a venda para o Banco do Brasil S.A. ou para a Caixa Econômica Federal de participação acionária em instituições financeiras públicas (art. 5º).

3) Na primeira enumeração do tópico 4.2.3, o segundo item passou a ter a redação abaixo:

4.2.3. Motivação e ratificação dos atos de dispensa ou inexigibilidade de licitação

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.....................

2) licitação dispensada na concessão de título de propriedade ou de direito real de uso de imóveis quando o uso se destinar a pessoa natural que, nos termos da lei, regulamento ou ato normativo do órgão competente, haja implementado os requisitos mínimos de cultura, ocupação mansa e pacífica e exploração direta sobre área rural situada na Amazônia Legal, superior a um módulo fiscal e limitada a quinze módulos fiscais, desde que não exceda mil e quinhentos hectares (art. 17, § 2º, II);

....................

CAPÍTULO 12

1) O item 4 passou a ter a seguinte redação:

4. O ART. 37, § 6º, DA CF: RESPONSABILIDADE OBJETIVA

.....................

(2º) a expressão “agente” não se restringe aos servidores públicos, agentes das pessoas jurídicas de direito público, mas também aos empregados das entidades de direito privado prestadoras de serviços públicos, integrantes ou não da Administração Pública;

A responsabilidade civil objetiva aplica-se, como já dissemos, a todas as pessoas jurídicas de direito público – não importa a sua área de atuação – e às pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos, o que inclui tanto as empresas públicas e as sociedades de economia mista prestadoras de serviços públicos (mas não as empresas públicas e as sociedades de economia mista exploradoras de atividades econômicas), quanto as pessoas privadas delegatárias de serviços públicos (concessionárias, permissionárias e autorizadas).

Quanto a esse último ponto – responsabilidade objetiva das concessionárias, permissionárias e autorizadas de serviços públicos –, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 262.651/SP (rel. Min. Carlos Velloso, 16.11.2004), havia decidido que “a responsabilidade objetiva das prestadoras de serviço público não se

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estende a terceiros não-usuários, já que somente o usuário é detentor do direito subjetivo de receber um serviço público ideal, não cabendo ao mesmo, por essa razão, o ônus de provar a culpa do prestador do serviço na causação do dano.”

Embora essa interpretação do § 6º do art. 37 da Constituição fosse bastante criticada pela doutrina, e não existisse orientação do Pleno da Corte sobre a matéria, tal era o entendimento que existia até recentemente, no que concerne à jurisprudência do Pretório Excelso.

Entretanto, em 26 de agosto de 2009, o Plenário do Supremo Tribunal Federal – com reconhecimento de repercussão geral –, suplantou aquele entendimento exarado pela sua Segunda Turma e asseverou que há responsabilidade civil objetiva das empresas que prestam serviço público mesmo em relação aos danos que sua atuação cause a terceiros não-usuários do serviço público (RE 591.874/MS, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 26.08.2009).

Asseverou-se nesse julgamento que não se pode interpretar restritivamente o alcance do § 6º do art. 37 da Carta da República, sobretudo porque o texto do dispositivo constitucional, examinado à luz do princípio da isonomia, não permite que se faça qualquer distinção entre os “terceiros” a que ele se refere, ou seja, o preceito em foco não autoriza, para os seus efeitos, que se distinga usuários de não-usuários do serviço público, haja vista que todos eles, de igual modo, podem sofrer dano em razão da ação administrativa do Estado, seja ela realizada diretamente, seja por meio de pessoa jurídica de direito privado delegatária de serviço público (prestação indireta).

Observou o Tribunal Maior, ainda, que o entendimento de que apenas os terceiros usuários do serviço público gozariam da proteção constitucional traduzida na responsabilidade objetiva do Estado, por terem o direito subjetivo de receber um serviço adequado, seria contraditório com a própria noção de serviço público, que, por definição, tem caráter geral, alcançando, indistintamente, todos os indivíduos, beneficiários diretos ou indiretos da ação estatal.

Consoante sintetizou o Ministro Ricardo Lewandowski, relator no RE 591.874, a Constituição Federal não faz qualquer distinção sobre a qualificação do sujeito passivo do dano, ou seja, não exige que a pessoa atingida pela lesão ostente a condição de usuário do serviço. Assim, salientou o eminente magistrado, onde a lei não distingue, não cabe ao interprete distinguir (ubi lex non distinguit, nec nos distinguere debemos).

Portanto, é irrelevante perquirir se a vítima de dano causado por prestador de serviço público é, ou não, usuária do serviço, bastando que o dano seja produzido pelo sujeito na qualidade de prestador de serviço público.

Em suma, restou superada a orientação que anteriormente existia no âmbito do STF, segundo a qual a responsabilidade objetiva das concessionárias e permissionárias de serviços públicos somente abrangeria as relações jurídicas travadas entre elas e os usuários do serviços público, não se aplicando a terceiros não-usuários.

Atualmente, está pacificado que a responsabilidade civil objetiva (CF, art. 37, § 6º) das prestadoras de serviço público abrange os danos causados aos usuários do serviço

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público e também a terceiros não-usuários do serviç o público .

Portanto, exemplificando, em um acidente de trânsito entre um automóvel particular e um ônibus de permissionária de serviço público, a responsabilidade civil será objetiva, regida pelo art. 37, § 6º, da Constituição, vale dizer, a permissionária responderá mesmo que nenhuma culpa de seu agente seja provada, somente podendo se eximir da obrigação de indenizar se ela, permissionária, conseguir provar a presença de alguma excludente, a exemplo da culpa exclusiva da vítima ou da força maior.

.........................

2) Foi acrescentada uma nota de rodapé ao item 5, conforme abaixo:

.....................

Em suma, para ensejar a responsabilização, a pessoa que sofreu o dano deve provar que houve falta no serviço que o Estado deveria ter prestado (nas modalidades omissivas inexistência do serviço, deficiência do serviço ou atraso na prestação do serviço). Isso porque, nessas hipóteses de danos decorrentes de atos de terceiros ou de fenômenos da natureza, para se configurar a obrigação estatal de indenizar, há necessidade de comprovação de que concorreu para o resultado danoso determinada omissão culposa da Administração Pública. É necessário, também, que a pessoa que sofreu o dano demonstre existir nexo causal entre a falta ou deficiência na prestação do serviço e o dano por ela sofrido. O ônus da prova de todos esses elementos é da pessoa que sofreu o dano.

Essa tem sido a posição adotada pelo Supremo Tribunal Federal, perfilhando a doutrina, entre outros, do ilustre administrativista Celso Antônio Bandeira de Mello.23

Com efeito, do voto vencedor do Min. Sepúlveda Pertence, no julgamento do RE 237.536, em que ele foi relator, extrai-se a seguinte passagem:

.......................

23 Consideramos importante registrar que a orientação exposta no presente tópico – segundo a qual a responsabilidade civil do Estado por danos decorrentes de omissão da sua administração pública é, em regra, do tipo subjetiva, na modalidade culpa administrativa – é a que pensamos ser majoritária na doutrina e na jurisprudência brasileiras. Porém, certo é que não se trata de entendimento consensual entre os administrativistas pátrios, tampouco de posição inteiramente pacífica no âmbito do Supremo Tribunal Federal. Para uma parte respeitável da doutrina, a responsabilidade do Estado é do tipo objetiva, na modalidade risco administrativo, ainda que diante de dano decorrente de ausência ou deficiência na prestação de serviço público que devesse ter sido executado pela administração pública. Essa doutrina, a nosso ver minoritária, já foi citada de passagem em votos proferidos em alguns julgados específicos de nossa Corte Suprema, embora não se tratasse de situações em que o dano tivesse decorrido propriamente de alguma omissão administrativa (vejam-se, por exemplo, o RE 385.943/SP, rel. Min. Celso de Mello, 05.10.2009, e o AI 299125/SP, rel. Min. Celso de Mello, 05.10.2009).

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3) O item 10 passou a ter a seguinte redação, em sua parte final.

10. A AÇÃO DE REPARAÇÃO DO DANO: PARTICULAR X ADMINISTRAÇÃO

....................

O art. 1º-C da Lei 9.494/1997, incluído pela MP 2.180-35/2001, estabelecia em cinco anos o prazo de prescrição da ação de reparação , ou seja, o prazo que o particular tem para ajuizar a ação contra a pessoa jurídica de direito público ou a pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviços públicos, visando a obter a indenização dos danos causados pela atuação dos agentes dessas pessoas jurídicas. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, entretanto, firmou a orientação de que o prazo prescricional de cinco anos para ajuizamento da ação de reparação civil deixou de ser aplicável com a superveniência Código Civil de 2002 , passando a incidir, nessas hipóteses, o prazo de três anos que o seu art. 206, § 3º, V, estabelece.24 Trata-se, como se vê, de prazo mais favorável à pessoa jurídica causadora do dano.

Enfim, com o advento do Código Civil de 2002 passou a ser de três anos o prazo prescricional para a pessoa que tenha sofrido um dano decorrente de atuação de agente de pessoa jurídica de direito público ou de pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público (inclusive de delegatárias de serviços públicos) ajuizar a ação de indenização contra essa pessoa jurídica.

CAPÍTULO 13

1) O item 4.2.2 passou a ter a seguinte redação (reprodução integral do item):

4.2.2. Recursos administrativos

A expressão “recurso administrativo ”, em um sentido restrito, é usualmente empregada para designar a petição apresentada pelo administrado que já obteve uma decisão em um processo administrativo em que figura como parte, mas não concorda com ela e deseja submeter a matéria à reapreciação de uma outra autoridade ou órgão, competente para emitir uma nova decisão. 24 REsp 982.811/RR, rel. Min. Francisco Falcão, 1ª T., 02.10.2008 (DJe 16.10.2008); REsp 1.137.354/RJ, rel. Min. Castro Meira, 2ª T., 08.09.2009 (DJe 18.09.2009).

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Quando não há um rito processual específico, essa autoridade que analisará o recurso é a primeira hierarquicamente superior à que proferiu a decisão recorrida (recurso hierárquico).

Em processos com rito específico, pode ocorrer de o recurso previsto ser endereçado a um órgão especializado, fora da linha hierárquica da autoridade ou órgão recorrido, ou mesmo a um órgão integrante de entidade diversa da que proferiu a decisão. Nesses casos, temos os denominados recursos hierárquicos impróprios, que serão vistos com mais detalhe, adiante.

Ao lado dos recursos interpostos pelos administrados, existem, ainda, recursos administrativos que são apresentados pela própria administração pública que editou a decisão recorrida. Esses recursos interpostos pela própria administração, da decisão dela mesma, são denominados especificamente “recursos de ofício ”, expressão bastante consagrada, e são cabíveis, em regra, somente nos casos em que haja expressa previsão legal. Dependendo da previsão legal, os recursos de ofício podem ocorrer na linha hierárquica ou fora dela (recursos hierárquicos impróprios).

Abrimos um parêntese para alertar que a expressão “recurso administrativo” é freqüentemente usada em um sentido genérico, como sinônimo de qualquer ato do administrado mediante o qual ele deflagre um processo administrativo em que figurará como parte interessada, visando a modificar um ato administrativo, ainda que esse ato tenha sido praticado de ofício, sem que houvesse processo previamente instaurado.

Ainda a título de observação, é conveniente registrar que os textos doutrinários e mesmo as leis, de um modo geral, quando empregam a expressão “recurso administrativo” estão se reportando ao recurso apresentado pelo administrado; o recurso que a própria administração interpõe da decisão dela mesma quase sempre é designado pelo termo específico “recurso de ofício”, e não genericamente como “recurso administrativo”.

Durante muito tempo, houve grande controvérsia doutrinária a respeito da possibilidade de exigência de garantia (caução) pela administração pública como condição de admissibilidade de recursos administrativos interpostos pelos administrados. Algumas leis previam a obrigatoriedade de o administrado recorrente oferecer garantia, normalmente depósito prévio, para que seu recurso fosse admitido e apreciado.

Em 2007, o Supremo Tribunal Federal decidiu que é inconstitucional a exigência, mesmo quando estabelecida em lei, de depósito prévio, arrolamento de bens e qualquer outra imposição onerosa, ou que implique constrição patrimonial, como condição de admissibilidade de recursos em processos administrativos concernentes a tributos.25

Embora seja certo que a referida orientação foi inicialmente firmada pela nossa Corte Suprema em julgados que diziam respeito especificamente a processos administrativos tributários, é importante frisar que, nos fundamentos das respectivas decisões, sempre foi explicitado que leis administrativas que contenham exigências dessa natureza – cauções, arrolamentos, depósitos, enfim, garantias de instância de um modo geral – ferem o art.

25 RREE 388.359/PE, 389.383/SP, 390.513/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 28.03.2007; AI-AgR 398.933/RJ e AI-AgR 408.914/RJ, rel.

Min. Sepúlveda Pertence, 28.03.2007; ADI 1.922/DF e ADI 1.976/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 28.03.2007.

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5º, LV, da Constituição (princípios do contraditório e da ampla defesa ), bem como o seu art. 5º, XXXIV, “a”, em que é assegurado o direito de petição (direito fundamental amplo, que abrange as reclamações, impugnações, representações e recursos administrativos genericamente considerados).

Tendo em conta o fato de que os princípios constitucionais invocados nos fundamentos das aludidas decisões do Tribunal Excelso têm aplicação abrangente – não limitada, de forma alguma, a processos administrativos tributários –, a própria Corte, mais tarde, no julgamento do AI 698.626/SP, rel. Min. Ellen Gracie (02.10.2008), reconheceu a existência de repercussão geral da matéria em questão – exigência de garantia de instância como requisito de admissibilidade de recursos administrativos – e consignou, de forma ampla, que a orientação do Pretório Excelso é de que “a garantia constitucional da ampla defesa afasta a exigência do depósito como pressuposto de admissibilidade de recurso administrativo”, seja qual for a matéria em exame.

Finalmente, em 2009, esse entendimento foi cristalizado na Súmula Vinculante 21 , cujo enunciado reproduzimos abaixo:

“21 – É inconstitucional a exigência de depósito ou arrolamento prévios de dinheiro ou bens para admissibilidade de recurso administrativo.”

Em síntese, a Súmula Vinculante 21 veio explicitar que, segundo o entendimento consolidado do Supremo Tribunal Federal, são inconstitucionais preceitos legais que exijam garantias de instância – tais quais depósitos ou arrolamentos de bens – como condição para a interposição de recursos em processos administrativos de qualquer espécie.

Os recursos administrativos, regra geral, possuem tão-somente efeito devolutivo, que é um efeito inerente a qualquer recurso, e significa simplesmente que a matéria recorrida é submetida a nova apreciação e decisão pelo órgão com competência recursal. Como decorrência do princípio da verdade material, que será analisado à frente, o efeito devolutivo nos recursos administrativos é amplo: em regra, toda a matéria tratada no processo em que foi prolatada a decisão recorrida é submetida a nova apreciação pela instância competente para decidir o recurso.

Vale repetir, a regra geral é os recursos administrativos somente revestirem efeito devolutivo. Dessarte, para que um recurso administrativo tenha efeito suspensivo – isto é, suste a eficácia do ato que esteja sendo questionado no processo, ou, conforme o caso, impeça a produção de efeitos da decisão recorrida – é necessária expressa previsão legal . No silêncio da lei, o efeito do recurso administrativo é apenas devolutivo, ou seja, o recurso interposto não afeta a eficácia, seja do ato cuja impugnação originou o processo, seja da decisão já prolatada no processo por determinada instância e questionada no recurso.

2) Os tópicos do Capítulo 13 acerca do mandado de segurança foram inteiramente reescritos. Segue a reprodução integral desses tópicos, abaixo:

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17.ª para 18.ª edição

6.2.1. Mandado de segurança

6.2.1.1. Introdução

Estabelece a Constituição de 1988, em seu art. 5º, LXIX:

“LXIX – conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público;”

O mandado de segurança é ação judicial de rito sumário especial, passível de ser utilizada quando direito líquido e certo de pessoa física ou jurídica for violado (ou sofrer ameaça de lesão) por um ato ilegal (ou omissão ilegal) de autoridade administrativa, ou de agente de pessoa jurídica privada que esteja exercendo atribuição do Poder Público. É sempre uma ação de natureza civil .

Por mais de meio século o mandado de segurança esteve regulamentado, no Brasil, pela vetusta Lei 1.533/1951. Como seria de imaginar, essa lei sofreu diversas alterações ao longo de sua existência. Além disso, muitas regras legais pertinentes ao mandado de segurança foram veiculadas em outras leis, em complementação à Lei 1.533/1951, porém sem modificação do seu texto. Ainda mais importante para a configuração do perfil dessa nobre ação – verdadeira garantia constitucional fundamental – foi (e ainda é) o caudaloso labor jurisprudencial de nossas cortes judiciais, sobretudo do Supremo Tribunal Federal.

Pois bem, em agosto de 2009, o Congresso Nacional editou a Lei 12.016/2009, a qual passou a ser o diploma disciplinador do mandado de segurança individual e coletivo, revogando a Lei 1.533/1951, bem como diversas outras leis e dispositivos legais que tratavam da matéria. Pode-se afirmar – e essa conclusão tem sido apontada consensualmente pelos autores que já examinaram a nova lei – que a Lei 12.016/2009 teve o principal intuito de consolidar as regras legais dispersas que existiam sobre o mandado de segurança, atualizar uns poucos pontos e incorporar ao nosso direito legislado algumas orientações já consagradas pela jurisprudência. Não introduziu nenhuma alteração drástica na disciplina da ação. Além disso, o legislador regulamentou, embora sem maior riqueza de detalhes, o mandado de segurança coletivo, criado pela Constituição de 1988 e que, desde então, até antes Lei 12.016/2009, vinha sendo manejado com base nas leis pertinentes ao mandado de segurança individual, em leis processuais sobre outras ações coletivas, bem como em construções jurisprudenciais.

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17.ª para 18.ª edição

O estudo do mandado de segurança apresentado neste tópico e nos seguintes tem por base, essencialmente, a disciplina estabelecida na Lei 12.016/2009 e a jurisprudência ainda aplicável. Na medida do possível, não nos deteremos em comparações entre a Lei 1.533/1951 e a Lei 12.016/2009, porque essa abordagem fugiria ao escopo desta obra. Ao longo do texto, toda vez que for feita uma referência a artigo de lei, sem explicitação do diploma respectivo, estaremos nos reportando a dispositivo da Lei 12.016/2009.

6.2.1.2. Bem jurídico tutelado

Assim dispõe o art. 1º da Lei 12.016/2009:

“Art. 1º Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça.”

O bem jurídico a ser protegido por meio do mandado de segurança é o próprio direito subjetivo líquido e certo que esteja sendo violado ou ameaçado de lesão por um ato (ou omissão) de autoridade praticado com ilegalidade.

O pressuposto “ilegalidade” deve ser tomado na acepção mais abrangente possível, vale dizer, qualquer ato (ou omissão) de autoridade que, de algum modo, seja contrário ao ordenamento jurídico configura “ilegalidade” para efeito de impetração de mandado de segurança. Constata-se, dessarte, que, embora seja mencionado nos textos constitucional e legal o “abuso de poder”, qual fora um pressuposto distinto da “ilegalidade”, ele está, na verdade, incluído nesta, ou seja, é suficiente a referência genérica e ampla à “ilegalidade” como pressuposto da ação de mandado de segurança.

Considera-se direito líquido e certo aquele passível de ser comprovado de plano, no momento de apresentação da petição inicial, sem necessidade de instrução processual visando à produção de provas (não existe uma fase destinada à produção de provas no processo de mandado de segurança).

Ressalte-se que é a matéria de fato que deve se provada de pronto pelo impetrante, já na apresentação da petição inicial. Por outras palavras, os fatos que comprovam a liquidez e a certeza do direito alegado e os fatos dos quais decorre a alegada lesão, ou ameaça de lesão, ao direito líquido e certo do impetrante devem ser comprovados de forma cabal, em regra por meio de documentos, apresentados juntamente com a petição inicial, não sendo admitidas no mandado de segurança dilações probatórias, a exemplo de tomada de depoimentos, realização de diligências, acareações e outras que tais.

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17.ª para 18.ª edição

Segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a liquidez e a certeza exigidas não dizem respeito à matéria de direito , isto é, podem ser discutidas quaisquer questões concernentes a interpretação de leis, revogação, recepção, vigência, eficácia, conflitos de normas, ponderação de princípios etc. (Súmula 625 do STF). Significa que, por mais complexas que sejam as teses jurídicas em discussão, poderão elas ser apreciadas em sede de mandado de segurança, desde que os fatos alegados pelo impetrante estejam, desde logo, devidamente comprovados, como líquidos e certos, na petição inicial. Até mesmo a inconstitucionalidade de uma lei pode ser reconhecida no âmbito de um processo de mandado de segurança, desde que se trate de declaração incidental de inconstitucionalidade, no caso concreto.

Por fim, cumpre registrar que há uma exceção à exigência de que todos os documentos comprobatórios do direito do impetrante sejam apresentados já na petição inicial. Com efeito, estabelece o § 1º do art. 6º da Lei 12.016/2009:

“§ 1º No caso em que o documento necessário à prova do alegado se ache em repartição ou estabelecimento público ou em poder de autoridade que se recuse a fornecê-lo por certidão ou de terceiro, o juiz ordenará, preliminarmente, por ofício, a exibição desse documento em original ou em cópia autêntica e marcará, para o cumprimento da ordem, o prazo de 10 (dez) dias. O escrivão extrairá cópias do documento para juntá-las à segunda via da petição.”

6.2.1.3. Objeto

O mandado de segurança pode ser repressivo – visando a obstar ou a reparar uma lesão já ocorrida – ou preventivo – visando a afastar uma ameaça de lesão ao direito líquido e certo do impetrante.

O mandado de segurança preventivo visa a evitar que determinada atuação ocorra concretamente. Para ser impetrado, deve ser possível comprovar que o ato de autoridade tem possibilidade concreta de ser praticado e que, se for praticado, acarretará lesão a direito líquido e certo do impetrante – ou seja, deve ser comprovada a existência de uma efetiva ameaça de lesão a direito líquido e certo do impetrante.

As situações mais comuns em que se utiliza o mandado de segurança preventivo são aquelas em que determinado ato administrativo vinculado é previsto em lei como conseqüência obrigatória de uma dada situação concreta.

Por exemplo, uma lei tributária estabelece que, praticada a operação “X”, será devido o tributo “Y”. Imagine-se que um indivíduo pratique a operação “X”, mas considere que a referida lei tributária é inconstitucional. Nessa situação, pode esse indivíduo impetrar um mandado de segurança preventivo, pedindo que o juiz conceda ordem para que a autoridade fiscal se abstenha de cobrar dele o tributo “Y”.

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Note-se que ele impetra o mandado de segurança contra o ato administrativo concreto de cobrança do tributo (ainda não praticado); apenas incidentalmente deve ser argüida a inconstitucionalidade da lei que ensejaria a cobrança preventivamente impugnada.

Como ocorreu a operação “X”, e a cobrança do tributo “Y” é um ato vinculado, há uma ameaça efetiva de ser concretamente praticado o ato administrativo de cobrança. O sujeito passivo entende que a cobrança é ilegítima porque considera inconstitucional a lei que a prevê. Logo, ele pode impetrar um mandado de segurança preventivo, apresentando como fundamento do pedido, como causa da alegada ilegitimidade da cobrança que fatalmente ocorreria, justamente a inconstitucionalidade da lei que determina a prática daquele ato administrativo vinculado.

Vale repetir: o pedido principal não pode ser a inconstitucionalidade, em tese, da lei tributária. O pedido principal é a prolação de sentença que determine a abstenção de cobrança do tributo “Y” pela autoridade fiscal. Apenas incidentalmente, como fundamento do pedido principal, é que se alega a inconstitucionalidade da lei que implicaria a prática do ato concreto preventivamente impugnado.

O mandado de segurança repressivo pode atacar uma atuação lesiva ou uma omissão do Poder Público que ocasione lesão a direito líquido e certo do impetrante.

Em síntese, portanto, o objeto da ação de mandado de segurança pode ser:

a) a anulação de um ato lesivo ou a cessação de determinada conduta, quando se tratar de mandado de segurança repressivo contra um ato ou uma atuação;

b) a determinação de que seja praticado um ato ou adotada uma dada conduta, quando se tratar de mandado de segurança repressivo contra uma omissão;

c) a exigência de abstenção de praticar um ato ou de adotar uma dada conduta, quando se tratar de mandado de segurança preventivo.

A tutela requerida tem conteúdo mandamental, ou seja, a pretensão do impetrante é obter uma decisão judicial, endereçada à autoridade responsável pela ilegalidade (chamada de autoridade coatora ), que determine a anulação de um ato, ou a cessação de uma conduta já adotada, ou exija uma dada atuação, ou, ainda, imponha uma abstenção (um não-fazer). Se a autoridade descumprir a ordem judicial incorrerá no crime de desobediência (art. 26).

6.2.1.4. Restrições

Estabelece a Lei 12.016/2009 que não se concederá mandado de segurança quando se

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tratar (art. 5º):

“I – de ato do qual caiba recurso administrativo com efeito suspensivo, independentemente de caução;

II – de decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspensivo;

III – de decisão judicial transitada em julgado.”

A respeito do inciso I (que já constava da Lei 1.533/1951), preleciona a Profª Maria Sylvia Di Pietro que “a jurisprudência evoluiu para admitir o mandado de segurança, mesmo que seja cabível o recurso administrativo com efeito suspensivo, desde que o interessado tenha deixado escoar o prazo, sem recorrer”. Reproduzimos a lição da autora:

“Assim, se o interessado não quiser recorrer administrativamente, poderá deixar escoar o prazo ou renunciar ao recurso administrativo e impetrar a segurança; o que não pode é propor a ação enquanto pendente de decisão o recurso com efeito suspensivo.”

É interessante observar que, na hipótese de o mandado de segurança ser impetrado contra uma omissão ilegal, descabe por completo a aplicação da restrição vazada nesse inciso, uma vez que não pode ser cogitada a existência de um recurso administrativo com “efeito suspensivo” de um ato que justamente deixou de ser praticado.

Quanto ao inciso III, é oportuno registrar que a impossibilidade de ajuizar mandado de segurança contra decisão judicial com trânsito em julgado já era ponto há muito consagrado pela jurisprudência (Súmula 268 do STF). Decisões judiciais transitadas em julgado, na esfera cível, devem ser atacadas, se for o caso, mediante ação própria: a ação rescisória (CPC, art. 485). Já na esfera penal, a ação adequada para desfazer uma decisão transitada em julgado, se for o caso, é a revisão criminal (CPP, art. 621).

É mister, ainda, frisar: o mandado de segurança sempre mantém sua natureza de ação cível , mesmo que seja utilizado contra decisão proferida em processo criminal, trabalhista, eleitoral, ou qualquer outro.

Para mais das restrições explicitadas no art. 5º da Lei 12.016/2009, impende mencionar que não cabe mandado de segurança contra lei em tese , salvo se produtora de efeitos concretos (Súmula 266 do STF). Somente as leis de efeitos concretos são passíveis de impugnação mediante mandado de segurança, pois estas equivalem a atos administrativos, e, por terem destinatários certos, podem violar, diretamente, direitos individuais. Para a fiscalização da constitucionalidade das “leis em tese” existe a via própria – ação direta de inconstitucionalidade –, no âmbito do nosso sistema de controle abstrato de normas.

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O mandado de segurança não pode ser impetrado como ação substitutiva da ação de cobrança (Súmula 269 do STF). Significa dizer que a concessão de mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais em relação a período pretérito, os quais deverão ser reclamados administrativamente, ou pela via judicial própria.

Exemplificando: imagine-se que Fulano ingresse no serviço público federal em janeiro de 2009 e ajuíze um mandado de segurança, em 1º de outubro de 2009, pleiteando reconhecimento de alegado direito líquido e certo a receber adicional de periculosidade, tendo em conta as características de sua atividade. Imagine-se que, em junho de 2010, seja prolatada a sentença, acolhendo o pedido.

Nessa situação, embora a sentença tenha reconhecido o direito líquido e certo ao adicional de periculosidade e, portanto, a ilegalidade da omissão do Poder Público em pagar essa vantagem a Fulano, a ordem mandamental, quanto aos efeitos pecuniários (pagamento do adicional), somente alcançará as prestações relativas ao período posterior à impetração (a partir de outubro de 2009).

Os adicionais relativos ao período de janeiro de 2009 a setembro de 2009 não serão pagos por força da sentença mandamental; deverão ser reclamados na via própria, judicial ou administrativa (Súmula 271 do STF).

Essa regra, há muito estabelecida pela jurisprudência, está hoje, especificamente no que respeita a pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias assegurados em sentença concessiva de mandado de segurança a servidores públicos, explicitada no § 4º do art. 14 da Lei 12.016/2009, abaixo transcrito:

“§ 4º O pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias assegurados em sentença concessiva de mandado de segurança a servidor público da administração direta ou autárquica federal, estadual e municipal somente será efetuado relativamente às prestações que se vencerem a contar da data do ajuizamento da inicial.”

Não pode, tampouco, ser o mandado de segurança utilizado com o escopo de substituir a ação popular (Súmula 101 do STF). A natureza da tutela requerida é diferente: na ação popular pretende-se obter uma sentença desconstitutiva (anulação de um ato administrativo) e, acessoriamente, condenatória (responsabilização do agente que praticou o ato); no mandado de segurança, a pretensão é obter uma sentença de conteúdo mandamental, uma ordem para que a autoridade coatora faça ou se abstenha de fazer alguma coisa. Ademais, no mandado de segurança individual o autor age em nome próprio, postulando direito próprio, ao passo que na ação popular o autor age como substituto processual, defendendo, em nome próprio, direito ou interesse de toda a coletividade.

Além de todas essas restrições, decorre do próprio texto constitucional que o mandado de segurança não pode ser utilizado para proteger direito amparado pelo habeas corpus (liberdade de locomoção) ou para proteger direito amparado pelo habeas data (conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros

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ou bancos de dados de caráter público, ou retificação dessas informações).

Essa especificidade de objeto das ações de habeas corpus e habeas data, em comparação como o objeto do mandado de segurança, leva alguns autores a afirmar que o mandado de segurança tem “natureza residual ”. Tencionam com essa expressão traduzir a idéia de que o mandado de segurança protege contra ilegalidade, genericamente, todos os direitos subjetivos líquidos e certos, excetuados apenas aqueles que especificamente são amparados pelo habeas corpus e pelo habeas data.

6.2.1.5. Sujeitos

Têm legitimidade ativa para impetrar mandado de segurança individual (impetrantes):

a) as pessoas físicas ou jurídicas, nacionais ou estrangeiras, domiciliadas ou não no Brasil;

b) as universalidades reconhecidas por lei, que, embora sem personalidade jurídica, possuem capacidade processual para defesa de seus direitos (o espólio, a massa falida, o condomínio de apartamentos, a sociedade de fato etc.);

c) os órgãos públicos de alta hierarquia, na defesa de suas prerrogativas e atribuições;

d) o Ministério Público, competindo a impetração, perante os tribunais locais, ao promotor de justiça, quando o ato atacado emanar de juiz de primeiro grau de jurisdição (Lei 8.625/1993, art. 32);

e) os agentes políticos (governador de estado, prefeito municipal, magistrados, deputados, senadores, vereadores, membros do Ministério Público, membros dos tribunais de contas, ministros de Estado, secretários de estado etc.), na defesa de suas atribuições e prerrogativas.

Quando o direito ameaçado ou violado couber a várias pessoas, qualquer delas poderá requerer o mandado de segurança (art. 1º, § 3º). A formação de litisconsórcio ativo (mais de um impetrante no mesmo mandado de segurança individual) é possível, mas o ingresso de litisconsorte ativo não será admitido depois do despacho da petição inicial (art. 10, § 2º).

Têm legitimidade passiva em mandado de segurança (impetrados):

a) autoridades públicas de quaisquer dos Poderes da União, dos estados, do Distrito

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Federal e dos municípios, sejam de que categoria forem e sejam quais forem as funções que exerçam;

b) os representantes ou órgãos de partidos políticos e os administradores de entidades autárquicas (incluídas as fundações governamentais com personalidade jurídica de direito público);

c) os dirigentes de pessoas jurídicas de direito privado, integrantes ou não da administração pública formal, e as pessoas naturais, desde que eles estejam no exercício de atribuições do Poder Público, e somente no que disser respeito a essas atribuições.

Não cabe mandado de segurança contra os atos de gestão comercial praticados pelos administradores de empresas públicas, de sociedade de economia mista e de concessionárias de serviço público (art. 1º, § 2º).

Enquadra-se como autoridade coatora aquela que tenha praticado o ato impugnado ou da qual emane a ordem para a sua prática (art. 6º, § 3º).

Quando o agente atua mediante delegação de competência, que lhe confira poder decisório para praticar ato de autoridade, é ele quem deve ser apontado como autoridade coatora, e não a autoridade delegante. A Súmula 510 do STF é expressa quanto a esse ponto:

“510 – Praticado o ato por autoridade, no exercício de competência delegada, contra ela cabe o mandado de segurança ou a medida judicial.”

No caso de impetração de mandado de segurança que vise a impugnar um ato complexo, todos os agentes cuja manifestação de vontade integrou a formação do ato devem ser apontados como autoridades coatoras, em litisconsórcio passivo. Quando se trata de impetração contra decisão adotada por um órgão colegiado, deve ser indicado como autoridade coatora o seu presidente.

Considera-se federal a autoridade coatora se as con seqüências de ordem patrimonial do ato contra o qual se requer o mandad o tiverem de ser suportadas pela União ou entidade por ela controlada (art. 2º). Nesses casos, a competência para o julgamento é da Justiça Federal.

O mandado de segurança é impetrado contra a autoridade coatora, pessoa física, e não contra a pessoa jurídica a que aquela se vincula. Embora o legitimado passivo – o impetrado – no mandado de segurança seja a autoridade coatora, quem suporta o ônus da decisão final é a pessoa jurídica a que o impetrado está vinculado.

Por essa razão, já na petição inicial o impetrante deve indicar, “além da autoridade coatora, a pessoa jurídica que esta integra, à qual se acha vinculada ou da qual exerce

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atribuições” (art. 6º, caput).

Ainda, ao despachar a inicial, o juiz ordena que se notifique a autoridade coatora a fim de que ela, no prazo de dez dias , preste as informações que entender pertinentes acerca do ato (ou da omissão) impugnado e, concomitantemente, ordena “que se dê ciência do feito ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada, enviando-lhe cópia da inicial sem documentos, para que, querendo, ingresse no feito” (art. 7º, II).

Ademais, é a pessoa jurídica quem deve apresentar recursos no âmbito do processo do mandado de segurança, muito embora a Lei 12.016/2009 estenda também à autoridade coatora o direito de recorrer (art. 14, § 2º).

Em razão das peculiaridades apontadas no parágrafo precedente, parcela importante de nossa doutrina entende que o verdadeiro réu no mandado de segurança é a pessoa jurídica, e não a pessoa física impetrada, isto é, apontada como autoridade coatora. A nosso ver, as disposições atualmente constantes da Lei 12.016/2009, sobretudo o caput do art. 6º e o inciso II do art. 7º, reforçam essa orientação, a qual adotamos.

O mandado de segurança poderá ser individual (para proteger o direito líquido e certo do impetrante ou, no caso de litisconsórcio ativo, dos impetrantes) ou coletivo . Frise-se que mesmo no caso de haver diversos impetrantes diferentes, defendendo direito próprio, em litisconsórcio ativo, tem-se mandado de segurança individual. Só é coletivo o mandado de segurança quando o seu impetrante defende interesse alheio, na qualidade de substituto processual, conforme será detalhado adiante.

6.2.1.6. Liminar

Medida liminar é uma ordem judicial proferida prontamente, mediante um juízo sumário, porém precário (ou seja, não definitivo), de plausibilidade das alegações e de risco de que a demora na prestação jurisdicional ocasione dano de difícil reparação.

Os pressupostos de uma liminar, portanto, são a plausibilidade jurídica do pedido (fumus boni juris) e o risco de dano irreparável ou de difícil reparação em decorrência da demora na prestação jurisdicional definitiva (periculum in mora).

Presentes esses pressupostos, a medida liminar deve ser concedida, mas isso não impede, de maneira nenhuma, que a decisão judicial definitiva (decisão de mérito), ainda que prolatada pelo mesmo juiz que antes concedeu a liminar, seja contrária ao impetrante, isto é, seja pela improcedência do pedido (ou mesmo que a liminar seja revogada ou cassada ainda antes de ser julgado o mérito da causa).

A Lei 12.016/2009 admite expressamente a concessão de medida liminar no mandado de segurança, prescrevendo que, ao despachar a inicial, o juiz ordenará “que se suspenda o ato que deu motivo ao pedido, quando houver fundamento relevante e do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida” (art. 7º, III).

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17.ª para 18.ª edição

Conforme se constata, estão mencionados nesse dispositivo os dois requisitos que devem ser atendidos simultaneamente para a concessão da liminar: a plausibilidade jurídica do pedido (fumus boni juris) e o risco de dano irreparável pela demora na prestação jurisdicional (periculum in mora).

O juiz pode conceder a liminar imediatamente, ao despachar a inicial, ou seja, antes mesmo de receber as informações que serão prestadas pela autoridade impetrada. Tem-se, nessa hipótese, a denominada concessão inaudita altera parte (sem oitiva da outra parte). É evidente que, se o juiz tiver dúvida acerca da plausibilidade jurídica do pedido, ele pode – e é prudente que o faça – aguardar as informações da autoridade impetrada para formar a sua convicção sobre o cabimento, ou não, da medida.

É importante observar que, no mandado de segurança coletivo , a liminar só poderá ser concedida após a audiência do representante judicial da pessoa jurídica de direito público, que deverá se pronunciar no prazo de setenta e duas horas (art. 22, § 2º). Portanto, no caso do mandado de segurança coletivo impetrado contra agente de pessoa jurídica de direito público , a lei expressamente veda a concessão de liminar inaudita altera parte.

O deferimento da medida liminar não implica prejulgamento; apenas suspende o ato impugnado, para evitar, temporariamente, lesão irreparável a eventual direito do impetrante.

É interessante notar que, por outro lado, a concessão da liminar pode acarretar prejuízos para a pessoa jurídica que deverá suportar os efeitos dela. Por essa razão, a Lei 12.016/2009 expressamente faculta ao juiz “exigir do impetrante caução , fiança ou depósito , com o objetivo de assegurar o ressarcimento à pessoa jurídica” (art. 7º, III). Isso, evidentemente, para a eventualidade de a segurança vir a ser denegada quando for proferida a decisão definitiva.

Os efeitos da medida liminar persistirão até a prolação da sentença, salvo se, antes disso, a liminar for revogada ou cassada (art. 7º, § 3º). É claro que, se a sentença deferir a segurança, o impetrante permanecerá amparado pela tutela jurisdicional por ele requerida, porém, agora, por efeito da sentença, e não mais da liminar.

Deferida a medida liminar, o processo terá prioridade para julgamento (art. 7º, § 4º).

Da decisão do juiz de primeiro grau que conceder ou denegar a liminar caberá agravo de instrumento, observado o disposto no Código de Processo Civil (art. 7º, § 1º).

É vedada a concessão de medida liminar que tenha por objeto (art. 7º, § 2º):

a) a compensação de créditos tributários;

b) a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior;

c) a reclassificação ou equiparação de servidores públicos;

d) a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer

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natureza.

Essas vedações à concessão de liminares se estendem à tutela antecipada, disciplinada nos arts. 273 e 461 do Código de Processo Civil (art. 7º, § 5º).

Será decretada a perempção ou caducidade da liminar ex officio ou a requerimento do Ministério Público quando, concedida a medida, o impetrante criar obstáculo ao normal andamento do processo ou deixar de promover, por mais de três dias úteis , os atos e as diligências que lhe cumprirem (art. 8º).

A liminar concedida (e mesmo a decisão concessiva da segurança) pode ter suspensa a sua execução pelo presidente do tribunal competente para conhecer o recurso, em despacho fundamentado, a requerimento da pessoa jurídica de direito público interessada ou do Ministério Público, para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à seguran ça e à economia públicas (art. 15).

Por fim, quanto à duração dos efeitos dessa suspensão da liminar em mandado de segurança, cumpre conhecer o teor da Súmula 626 do STF – não prejudicada pela superveniência da Lei 12.016/2009 –, cujo enunciado segue transcrito:

“626 – A suspensão da liminar em mandado de segurança, salvo determinação em contrário da decisão que a deferir, vigorará até o trânsito em julgado da decisão definitiva de concessão da segurança ou, havendo recurso, até a sua manutenção pelo Supremo Tribunal Federal, desde que o objeto da liminar deferida coincida, total ou parcialmente, com o da impetração.”

6.2.1.7. Aspectos processuais, sentença e coisa jul gada

A competência para julgar mandado de segurança é definida pela categoria da autoridade coatora e pela sua sede funcional. É irrelevante , para a fixação da competência, a matéria a ser discutida em mandado de segurança. O juízo a que deve ser submetida a ação é determinado em razão da autoridade coatora, isto é, do agente que praticou o ato dito lesivo ou ao qual é imputada a omissão ilegal.

A Constituição da República prevê, desde logo, hipóteses de competência originária de tribunais. Por exemplo, a do Supremo Tribunal Federal para processar e julgar, originariamente, o mandado de segurança contra atos do Presidente da República, das Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, do Tribunal de Contas da União, do Procurador-Geral da República e do próprio Supremo Tribunal Federal (CF, art. 102, I, “d”). Ainda como exemplo, fixa a Carta de 1988 competência originária para o Superior Tribunal de Justiça processar e julgar os mandados de segurança contra ato de ministro de Estado, dos comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica ou do próprio

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Superior Tribunal de Justiça (CF, art. 105, I, “b”).

Segundo o Supremo Tribunal Federal, todos os tribunais têm competência para julgar, originariamente, os mandados de segurança contra os seus atos, os dos respectivos presidentes e os de suas câmaras, turmas ou seções. Assim, mandado de segurança contra ato do STJ, do presidente do STJ ou de uma turma do STJ será julgado pelo próprio STJ; se o mandado de segurança é contra ato do TST, do seu presidente ou de suas turmas, a competência para o julgamento será do próprio TST, e assim sucessivamente.

À Justiça Federal de primeira instância compete processar e julgar os mandados de segurança impetrados contra autoridades federais que não tenham foro originário em tribunal, determinado pela Constituição Federal.

Vale lembrar que a Lei 12.016/2009 expressamente estabelece que se considera federal a autoridade coatora caso as conseqüências de ordem patrimonial do ato contra o qual se requer o mandado devam ser suportadas pela União ou entidade por ela controlada (art. 2º).

No âmbito da Justiça estadual, caberá aos próprios estados-membros cuidar da competência para a apreciação do mandado de segurança contra atos de suas autoridades, por força do art. 125 da Constituição da República.

O mandado de segurança admite desistência em qualquer tempo e grau de jurisdição, independentemente do consentimento do impetrado, mesmo que já tenha sido proferida decisão de mérito, desde que, evidentemente, ainda não tenha ocorrido o trânsito em julgado.26

A participação do Ministério Público no processo está prevista no art. 12 da Lei 12.016/2009. Nos termos desse dispositivo, findo o prazo para a autoridade coatora prestar as suas informações sobre o ato impugnado (que é de dez dias), deve o juiz ouvir “o representante do Ministério Público, que opinará, dentro do prazo improrrogável de 10 (dez) dias”.

O Ministério público, ao emitir o parecer a que se refere o preceito legal em comento, atua na defesa da integridade da ordem jurídica (atua como custos legis), de forma imparcial, como fiscal da aplicação da lei (em sentido amplo), podendo opinar pelo cabimento ou descabimento da ação.

Embora o juiz deva obrigatoriamente submeter os autos do mandado de segurança ao Ministério Público, para que este emita a sua opinião, a lei determina que, com ou sem o parecer do Ministério Público , os autos sejam conclusos ao juiz, para a decisão, a qual deverá ser necessariamente proferida em trinta dias (art. 12, parágrafo único).

Em caso de urgência, é permitido, observados os requisitos legais, impetrar mandado de segurança por telegrama, radiograma, fax ou outro meio eletrônico de autenticidade comprovada (art. 4º). Poderá o juiz, em caso de urgência, notificar a autoridade por

26 RE 231.509 AgR-AgR/SP, rel. Min. Cármen Lúcia, 13.10.2009; RE 231.671 AgR-AgR/DF, rel. Min. Ellen Gracie, 28.04.2009; MS 24.584 AgR/DF, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão, Min. Ricardo Lewandowski, 09.08.2007.

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telegrama, radiograma ou outro meio que assegure a autenticidade do documento e a imediata ciência pela autoridade (art. 4º, § 1º). O uso de documentos eletrônicos deve observar as regras da Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICP-Brasil (art. 4º, § 3º).

Da sentença, denegando ou concedendo o mandado, cabe apelação (art. 14, caput). A sentença que conceder o mandado está sujeita obrigatoriamente ao duplo grau de jurisdição (art. 14, § 1º). Significa que, no mandado de segurança, a decisão concessiva da ordem está sujeita a reexame obrigatório pelo tribunal ao qual caiba apreciar o recurso. Se a pessoa jurídica não apelar, ou se o seu recurso não for admissível, porque intempestivo, ou por não atender a qualquer formalidade, haverá a remessa dos autos, de ofício, para o tribunal, a fim de que este prolate um acórdão confirmando ou reformando a sentença.

A obrigatoriedade de duplo grau de jurisdição, todavia, não impede que a sentença seja executada provisoriamente, salvo nos casos em que for vedada a concessão da medida liminar (art. 14, § 3º).

Ademais, não há duplo grau de jurisdição obrigatório se a decisão foi proferida por tribunal do Poder Judiciário, no uso de competência originária (o duplo grau de jurisdição só é obrigatório diante de decisões concessivas da segurança proferidas por juízo de primeiro grau).

A sentença proferida no mandado de segurança pode acolher o pedido do impetrante ou negar a segurança.

A sentença desfavorável (denegatória da segurança) pode resultar de análise do mérito ou simplesmente extinguir o processo sem análise do mérito, isto é, sem apreciação do direito alegado.

A sentença que acolha o pedido ou que negue a segurança, com resolução do mérito , faz coisa julgada material e, por isso, a matéria não pode novamente ser suscitada, em qualquer outra ação judicial.

Diferentemente, se a decisão no mandado de segurança não apreciou o mérito, a matéria pode ser novamente discutida mediante outro mandado de segurança – desde que ainda não tenha escoado o prazo decadencial de 120 dias –, ou mediante outras ações judiciais. É o que acontece, por exemplo, quando a sentença extingue o processo porque seriam necessárias dilações probatórias para demonstração do direito alegado (falta liquidez e certeza ao direito), ou porque foi apontada autoridade coatora incorreta e o juiz entendeu que esse defeito seria insanável, entre outras hipóteses.

Em suma, uma decisão extingue o processo sem resolução do mérito sempre que o processo seja finalizado em razão de desatendimento a formalidades essenciais, a pressupostos ou a condições da ação. Nesses casos, a decisão não faz coisa julgada material e o direito alegado pode ser pleiteado em outra ação, até mesmo em outro mandado de segurança, se não tiver ocorrido a decadência.

Explicitam o que acabamos de afirmar o § 6º do art. 6º da Lei 12.016/2009 – “O pedido de mandado de segurança poderá ser renovado dentro do prazo decadencial, se a decisão

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denegatória não lhe houver apreciado o mérito.” –, bem como o seu art. 19, abaixo transcrito:

“Art. 19. A sentença ou o acórdão que denegar mandado de segurança, sem decidir o mérito, não impedirá que o requerente, por ação própria, pleiteie os seus direitos e os respectivos efeitos patrimoniais.”

Nas decisões proferidas em mandado de segurança e nos respectivos recursos, o acórdão, quando não publicado no prazo de trinta dias , contados da data do julgamento, será substituído pelas respectivas notas taquigráficas, independentemente de revisão (art. 17).

Das decisões em mandado de segurança proferidas em única instância pelos tribunais cabe recurso especial e extraordinário, n os casos legalmente previstos, e recurso ordinário, quando a ordem for denegada (art . 18).

Os processos de mandado de segurança e os respectivos recursos terão prioridade sobre todos os atos judiciais, salvo habeas corpus (art. 20).

Não cabe , no processo de mandado de segurança, a condenação ao pagamento de honorários advocatícios , sem prejuízo da aplicação de sanções no caso de litigância de má-fé (art. 25). Esse entendimento já estava, há muito, consagrado pela jurisprudência (Súmula 512 do STF).

6.2.1.8. Prazo

O prazo para impetração do mandado de segurança é de cento e vinte dias , contados da ciência, pelo interessado, do ato impugnado (art. 23). Trata-se, conforme orientação do Supremo Tribunal Federal, de prazo decadencial , não passível de suspensão ou interrupção.

Observe-se que a lei estabelece como termo inicial da contagem do prazo, literalmente, a “ciência, pelo interessado, do ato impugnado”. Decorrem dessa disposição relevantes conclusões, que abaixo sintetizamos, baseados na precisa lição da Profª Maria Sylvia Di Pietro:

a) se o mandado de segurança será impetrado contra um ato já praticado, conta-se o prazo a partir da ciência oficial do ato, mesmo que tenha sido apresentado recurso administrativo sem efeito suspensivo contra o mesmo ato;

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b) se o mandado de segurança será impetrado contra um ato lesivo já praticado, que, todavia, foi impugnado mediante recurso administrativo com e feito suspensivo , o prazo começa a correr da data em que terminar a discussão administrativa (enquanto pendente o recurso, nem mesmo poderia ter sido impetrado o mandado de segurança);

c) se o mandado de segurança será impetrado contra uma omissão , e há um prazo legal expresso para a administração praticar o ato cuja não-edição está ocasionando a lesão ao direito do impetrante, os 120 dias começarão a correr da data em que se esgotar o prazo fixado para a administração editar o ato;

d) se o mandado de segurança será impetrado contra uma omissão, e não há um prazo legal expresso previsto para a atuação da administração, não cabe falar em decadência ; enquanto persistir a omissão, pode ser ajuizado o mandado de segurança;

e) quando se trata de mandado de segurança preventivo , não cabe falar em decadência ; enquanto persistir a ameaça de lesão, pode ser impetrado o mandado de segurança.

É importante notar que, ocorrida a decadência do direito de impetrar o mandado de segurança, o indivíduo que tenha sofrido uma violação a direito seu não fica impedido de buscar a tutela desse direito por meio de outras ações judiciais.

6.2.1.9. Mandado de segurança coletivo

6.2.1.9.1. Introdução

O mandado de segurança coletivo surgiu no Brasil com a Carta Política de 1988, arrolado entre as garantias constitucionais fundamentais, no art. 5º, LXX. O texto constitucional limita-se a estabelecer a existência do mandado de segurança coletivo e a discriminar os legitimados à impetração. Nos termos da Constituição Federal, o mandado de segurança coletivo só pode ser impetrado por:

a) partido político com representação no Congresso Nacional; ou

b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano , em defesa dos interesses de seus membros ou associados.

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O mandado de segurança coletivo permaneceu sem regulamentação legal até a edição da Lei 12.016/2009. Não obstante, desde o início, a doutrina e a jurisprudência entenderam que a norma constitucional que o prevê deveria ter eficácia imediata. Por essa razão, ao longo de todos esses anos – 1988 a 2009 –, o mandado de segurança coletivo tem sido impetrado, processado e julgado com base nas leis pertinentes ao mandado de segurança individual, aplicando-se subsidiariamente o Código de Processo Civil, ou, por analogia, leis processuais sobre outras ações coletivas, sendo utilizadas, ainda, as construções jurisprudenciais lavradas no interregno.

6.2.1.9.2. Objeto e sujeitos

Com a edição da Lei 12.016/2009 restou claro que a disciplina processual do mandado de segurança coletivo é essencialmente a mesma aplicável ao mandado de segurança individual, com muito poucas diferenças, estabelecidas em regras específicas da própria Lei 12.016/2009, ou na jurisprudência.

A rigor, apenas dois artigos da Lei 12.016/2009 – os arts. 21 e 22 – versam especificamente sobre o mandado de segurança coletivo. O primeiro deles, sem dúvida o mais importante, tem a seguinte redação:

“Art. 21. O mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por partido político com representação no Congresso Nacional, na defesa de seus interesses legítimos relativos a seus integrantes ou à finalidade partidária, ou por organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há, pelo menos, 1 (um) ano, em defesa de direitos líquidos e certos da totalidade, ou de parte, dos seus membros ou associados, na forma dos seus estatutos e desde que pertinentes às suas finalidades, dispensada, para tanto, autorização especial.

Parágrafo único. Os direitos protegidos pelo mandado de segurança coletivo podem ser:

I – coletivos, assim entendidos, para efeito desta Lei, os transindividuais, de natureza indivisível, de que seja titular grupo ou categoria de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica básica;

II – individuais homogêneos, assim entendidos, para efeito desta Lei, os decorrentes de origem comum e da atividade ou situação específica da totalidade ou de parte dos associados ou membros do impetrante.”

Embora se trate de um único artigo, inúmeras regras podem ser dele extraídas. A partir do texto do dispositivo e dos pontos que já estão sedimentados em nossa jurisprudência (que não tenham sido prejudicados pela sobrevinda da regulamentação legal), as seguintes observações merecem destaque:

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a) a exigência de um ano de constituição e funcionamento destina-se apenas às associações , não se aplicando às entidades sindicais e às entidades de classe;

b) para que se considere que um partido político satisfaz a exigência de estar representado no Congresso Nacional basta que ele tenha um deputado federal ou um senador, em efetivo exercício do mandato, na data da impetração do mandado de segurança coletivo;

c) as entidades que podem impetrar o mandado de segurança coletivo têm legitimação extraordinária , vale dizer, ocorre a denominada substituição processual (nas hipóteses de substituição processual, o autor postula, em nome próprio , direito de terceiros);

d) como se trata de hipótese de substituição processual, não se exige a autorização expressa dos titulares do direito, diferentemente do que acontece, por exemplo, no caso do inciso XXI do art. 5º da Carta Política, o qual contempla hipótese de representação (e não de substituição).27 A desnecessidade de autorização expressa dos titulares do direito para a entidade legitimada impetrar o mandado de segurança coletivo está explícita na parte final do caput do art. 21 da Lei 12.016/2009 e já estava consagrada pela jurisprudência (Súmula 629 do STF);

e) os partidos políticos podem defender, mediante mandado de segurança coletivo, direitos relativos a seus integrantes ou direitos relacionados à finalidade partidária ; a legitimação das demais entidades é mais restrita, uma vez que elas só podem defender direitos dos seus membros ou associados – e desde que esses direitos sejam pertinentes às finalidades da entidade (exigência esta introduzida pela lei, não expressa no texto constitucional);

f) é importante frisar que os direitos defendidos por organização sindical, entidade de classe ou associação não precisa ser um direito de todos os seus membros; pode ser um direito de apenas parte dos membros da entidade (tal orientação já estava consagrada na Súmula 630 do STF);28

g) assim como o mandado de segurança individual, o mandado de segurança coletivo tem como pressuposto a existência de direito líquido e certo que esteja sendo violado ou ameaçado de lesão por um ato ilegal de uma autoridade coatora;29

27 CF, art. 5º, XXI – “as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados

judicial ou extrajudicialmente;” 28 Sobre esse ponto, é oportuno transcrever a preclara lição do Prof. Humberto Theodoro Júnior, em comentário à Lei 12.016/2009: “Não é, contudo, ação que o ente coletivo possa utilizar para demandar na defesa de um ou outro membro ou associado. O objeto de mandado de segurança coletivo deve corresponder a direito que pertença a uma coletividade ou categoria representada por partido político, por organização sindical, por entidade de classe ou por associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano (CF, art 5º, LXX, a e b), embora não se exija que a tutela envolva sempre a totalidade da categoria ou do grupo.” 29 Merece transcrição esta precisa passagem, de lavra do Prof. Humberto Theodoro Júnior, em análise à Lei 12.016/2009, acerca do objeto do mandado de segurança coletivo:

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h) a lei expressamente afirma que os direitos passíveis de tutela por meio do mandado de segurança coletivo são os direitos coletivos e os direitos individuais homogêneos. Não foram incluídos os direitos difusos , decerto porque estes, tendo por titulares indivíduos indeterminados, não são conciliáveis com a exigência de liquidez e certeza;

i) as autoridades coatoras contra as quais pode ser impetrado o mandado de segurança coletivo são exatamente as mesmas contra as quais pode ser impetrado o mandado de segurança individual, vale dizer, deve ser a autoridade que tenha praticado o ato impugnado ou da qual tenha emanado a ordem para a sua prática (art. 6º, § 3º).

6.2.1.9.3. Aspectos processuais e coisa julgada

O art. 22 da Lei 12.016/2009 traz importantes regras sobre aspectos processuais concernentes ao mandado de segurança coletivo, a saber:

“Art. 22. No mandado de segurança coletivo, a sentença fará coisa julgada limitadamente aos membros do grupo ou categoria substituídos pelo impetrante.

§ 1º O mandado de segurança coletivo não induz litispendência para as ações individuais, mas os efeitos da coisa julgada não beneficiarão o impetrante a título individual se não requerer a desistência de seu mandado de segurança no prazo de 30 (trinta) dias a contar da ciência comprovada da impetração da segurança coletiva.

§ 2º No mandado de segurança coletivo, a liminar só poderá ser concedida após a audiência do representante judicial da pessoa jurídica de direito público, que deverá se pronunciar no prazo de 72 (setenta e duas) horas.”

A regra acerca da liminar havia sido mencionada anteriormente. É importante enfatizar que a exigência da oitiva prévia estabelecida pelo § 2º do art. 22 só se aplica às pessoas jurídicas de direito público . Nas hipóteses em que o impetrado esteja vinculado a pessoa jurídica de direito privado não há óbice legal à concessão de liminar inaudita altera parte.

Interessante é, ainda, observar que a intimação para se manifestar acerca do pedido de liminar deve ser feita ao representante judicial da pessoa jurídica de direito público, e não à autoridade coatora . Portanto, quando se tratar de pessoa jurídica de direito público, havendo pedido de liminar, o juiz, ao despachar a inicial no mandado de “Não se trata, porém, de simples remédio para defesa de interesses coletivos. Baseando-se na liquidez e certeza do direito ofendido pelo abuso de autoridade, é preciso que o writ coletivo se volte para a tutela de concretos direitos subjetivos, demonstráveis por prova pré-constituída, ainda que pertençam a grupos ou categorias de pessoas e se apresentem como transindividuais e indivisíveis.”

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segurança coletivo, deverá: (a) notificar a autoridade coatora para prestar informações no prazo de dez dias; e (b) intimar o representante judicial da pessoa jurídica de direito público para que se manifeste acerca do pedido de liminar no prazo de setenta e duas horas.

A coisa julgada no mandado de segurança coletivo só alcança os membros do grupo ou categoria substituídos pelo impetrante. É importante destacar que o mandado de segurança coletivo não induz litispendência para as ações individuais (art. 22, § 1º). Nos termos do Código de Processo Civil, a litispendência é configurada quando estão em curso, simultaneamente, duas ações idênticas, assim entendidas as que têm as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido (CPC, art. 301, §§ 1º a 3º). A litispendência é causa de extinção da ação sem resolução de mérito (CPC, 267, V).

Dizer que o mandado de segurança coletivo não induz litispendência para as ações individuais significa, por exemplo, que não obstante tenha uma entidade de classe impetrado um mandado de segurança coletivo em defesa de um direito de seus membros, qualquer dos membros da entidade pode pleitear idêntico direito em ação individual, sem que se configure a litispendência (o que implicaria extinção da ação individual sem resolução de mérito).

Note-se que, a rigor, um mandado de segurança coletivo não teria mesmo como ser idêntico a um mandado de segurança individual, porque, ainda que possam ser iguais o pólo passivo, a causa de pedir e o pedido, o pólo ativo (o impetrante) não o será.

Em suma, o ajuizamento de mandado de segurança coletivo não prejudica ações individuais em que se pleiteie o mesmo direito, seja a ação individual anterior ou posterior à impetração da segurança coletiva. Uma importante restrição, contudo, é feita na parte final do § 1º do art. 22: os efeitos da coisa julgada do mandado coletivo não beneficiarão o impetrante de mandado de segurança individual que tenha o mesmo objeto se ele não requerer a desistência deste no prazo de trinta dias , contados da ciência comprovada da impetração da segurança coletiva.

Por outras palavras, qualquer pessoa pode optar por defender o seu direito mediante mandado de segurança individual, sem que a impetração de mandado de segurança coletivo com o mesmo objeto, antes ou depois, prejudique a ação individual. Entretanto, quem quiser ser beneficiado pela coisa julgada no mandado coletivo terá que desistir do mandado de segurança individual que tenha impetrado, no prazo de trinta dias, depois de cientificado da impetração da segurança coletiva.

Por fim, as competências para julgamento, os recursos cabíveis, a participação do Ministério Público, enfim, todas as matérias que não sejam objeto de disciplina específica quanto ao mandado de segurança coletivo, seguem as mesmas regras aplicáveis ao mandado de segurança individual, a menos que se verifique manifesta incompatibilidade com as características da ação coletiva.

6.2.1.9.4. Distinção entre mandado de segurança col etivo e ação popular

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O mandado de segurança coletivo não é sucedâneo da ação popular.

Além da já mencionada diferença quanto à tutela requerida, os direitos protegidos são de natureza distinta (não obstante ocorra substituição processual em ambas as ações).

Com efeito, o mandado de segurança coletivo deve defender direito subjetivo, líquido e certo, que, embora seja tutelado coletivamente, é de titularidade definida – o direito tutelado, seja um direito coletivo, seja um direito individual homogêneo, é de titularidade dos substituídos processuais, significa dizer, das pessoas determinadas cujos interesses o autor da ação, na qualidade de substituto processual, está defendendo.

A ação popular, diversamente, visa a anular ato administrativo lesivo ao patrimônio público, à moralidade administrativa, ao meio ambiente ou ao patrimônio histórico e cultural, independentemente de o ato impugnado ocasionar lesão direta a quem quer que seja. Os direitos defendidos mediante ação popular pertencem, em regra, a titulares indeterminados, isto é, são direitos difusos, os quais, conforme visto, não foram contemplados na Lei 12.016/2009 para tutela mediante mandado de segurança coletivo.

3) O item 7.2.passou a ter a redação abaixo (reprodução integral do item):

7.2. Descrição legal dos atos de improbidade admini strativa e sanções aplicáveis

A Lei 8.429/1992 classifica os atos de improbidade administrativa em três grandes grupos (a rigor, nem sempre se trata de atos administrativos, propriamente ditos, porquanto alguns correspondem a meras condutas, inclusive omissivas):

a) atos de improbidade administrativa que importam em enriquecimento ilícito;

b) atos de improbidade administrativa que causam prejuízo ao erário;

c) atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípios da administração pública.

É considerado ato de improbidade administrativa que importa em en riquecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade públicos (art. 9º).

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Independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica, a prática de atos dessa natureza sujeita o responsável às seguintes cominações , que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente , de acordo com a gravidade do fato (art. 12, I): (a) perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao seu patrimônio; (b) obrigação de ressarcimento integral do dano, quando houver; (c) perda da função pública; (d) suspensão dos direitos políticos durante oito a dez anos ; (e) pagamento de multa civil de até três vezes o valor do acréscimo patrimonial; e (f) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos .

É considerado ato de improbidade administrativa que causa lesão a o erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres do Poder Público (art. 10).

Independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica, a prática de atos classificados nesse grupo sujeita o responsável às seguintes cominações , que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente , de acordo com a gravidade do fato (art. 12, II): (a) obrigação de ressarcimento integral do dano; (b) perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer essa circunstância; (c) perda da função pública; (d) suspensão dos direitos políticos por cinco a oito anos ; (e) pagamento de multa civil de até duas vezes o valor do dano; e (f) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos .

Por último, é considerado ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições (art. 11).

Independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica, a prática de atos dessa categoria sujeita o responsável às seguintes cominações , que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente , de acordo com a gravidade do fato (art. 12, III): (a) obrigação de ressarcimento integral do dano, se houver; (b) perda da função pública; (c) suspensão dos direitos políticos por um período de três a cinco anos ; (d) pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente; e (e) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos .

É fácil perceber que a lei estabeleceu uma idéia de hierarquia entre os grupos de atos de improbidade administrativa no que se refere a sua gravidade e lesividade social. Os atos do primeiro grupo – os que importam enriquecimento ilícito – são os mais lesivos e juridicamente reprováveis, os atos enquadrados na segunda categoria – os que causam lesão ao erário, sem importar enriquecimento ilícito do agente – ocupam uma posição intermediária e os atos pertencentes ao terceiro grupo – os que atentam contra os princípios da administração pública – são considerados menos graves do que os demais.

É muito relevante enfatizar, seja qual for o ato de improbidade administrativa praticado,

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17.ª para 18.ª edição

que a aplicação das sanções previstas na Lei 8.429/1992 (art. 21):

a) independe da efetiva ocorrência de dano ao patrimônio público (em sentido econômico), salvo quanto à pena de ressarcimento; e

b) independe da aprovação ou rejeição das contas pelo órgão de controle interno ou pelo tribunal ou conselho de contas.

A ressalva constante da parte final da letra “a” foi acrescentada pela Lei 12.120/2009, mas, por ser óbvia, já era há muito apontada de forma consensual pela doutrina. Com efeito, somente se pode cogitar de ressarcimento ao erário se algum dano ao patrimônio público econômico tiver decorrido do ato de improbidade.

Feita essa ressalva, não é excessivo frisar que todas as demais cominações estabelecidas na Lei 8.429/1992 podem ser aplicadas mesmo que nenhum dano econômico tenha resultado do ato de improbidade para o erário. É de bom alvitre repisar também que as cominações previstas na Lei 8.429/1992 para cada categoria de atos de improbidade administrativa podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente , de acordo com a gravidade do fato (redação dada pela Lei 12.120/2009), sem prejuízo das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica.

Para a fixação das penas a serem concretamente aplicadas, determina o parágrafo único do art. 12 da Lei 8.429/1992 que “o juiz levará em conta a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente”. Comentando essa regra de gradação das penalidades no caso concreto, a Profª. Maria Sylvia Di Pietro assinala que “a expressão extensão do dano causado tem que ser entendida em sentido amplo, de modo que abranja não só o dano ao erário, ao patrimônio público em sentido econômico, mas também ao patrimônio moral do Estado e da sociedade”.

CAPÍTULO 14

1) Foi acrescentado o seguinte item (reprodução integral do item):

4.1. DIREITO A REGIME DE TRAMITAÇÃO PRIORITÁRIA

A Lei 12.008/2009 acrescentou o art. 69-A à Lei 9.784/1999, estabelecendo hipóteses em que os processos administrativos tramitarão com prioridade. Embora o novo preceito tenha sido inserido no Capítulo XVIII da Lei 9.784/1999, intitulado “Das Disposições

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17.ª para 18.ª edição

Finais”, a verdade é que ele se refere a um direito ou benefício conferido a determinados administrados, em atenção a situações pessoais que justificam o tratamento diferenciado. Essa a razão de fazermos alusão às novas regras neste subitem.

Nos termos do art. 69-A da Lei 9.784/1999, terão prioridade na tramitação, em qualquer órgão ou instância, os procedimentos administrativos em que figure como parte ou interessado:

a) pessoa com idade igual ou superior a sessenta anos ;

b) pessoa portadora de deficiência , física ou mental;

c) pessoa portadora de doença grave .

Acerca da última hipótese, o dispositivo legal ora em comento lista, exemplificativamente, as seguintes patologias: tuberculose ativa, esclerose múltipla, neoplasia maligna, hanseníase, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, hepatopatia grave, estados avançados da doença de Paget (osteíte deformante), contaminação por radiação e síndrome de imunodeficiência adquirida (AIDS). Após essa enumeração, a norma legal, genericamente, assegura o mesmo benefício à pessoa portadora de “outra doença grave, com base em conclusão da medicina especializada”. Convém observar que o direito à prioridade é expressamente assegurado mesmo que a doença seja adquirida depois do início do processo.

A pessoa interessada na obtenção do benefício, juntando prova de sua condição, deverá requerê-lo à autoridade administrativa competente, que determinará as providências a serem cumpridas (art. 69-A, § 1º). Deferida a prioridade, os autos do processo administrativo receberão identificação própria que evidencie que ele está sujeito ao regime de tramitação prioritária (art. 69-A, § 2º).

2) O item 11 passou a ter a seguinte redação:

11. RECURSO ADMINISTRATIVO

...................

Se o administrado entender que houve violação a enunciado de súmula vinculante , poderá ajuizar reclamação perante o Supremo Tribunal Federal, desde que, antes, tenha esgotado as vias administrativas (Lei 11.417/2006, art. 7º). Acolhida a reclamação, o STF anulará a decisão administrativa e dará ciência à autoridade prolatora e ao órgão competente para o julgamento do recurso, que deverão adequar as futuras decisões administrativas em casos semelhantes, sob pena de responsabilização pessoal nas esferas cível, administrativa e penal (Lei 9.784/1999, art. 64-B).

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17.ª para 18.ª edição

O § 2º do art. 56 da Lei 9.784/1999 estabelece, como regra geral, a inexigibilidade de garantia de instância (caução) para a interposição de recursos administrativos. Decorre desse dispositivo que, salvo exigência legal , não é necessário depositar valores ou oferecer bens em garantia como condição para que o recurso seja admitido.

Apesar de ser esta a leitura do dispositivo em apreço (§ 2º do art. 56), nossa opinião é que a edição da Súmula Vinculante 21 eliminou a possibilidade de se considerar mera regra geral a vedação à exigência de garantia de instância para a interposição de recursos administrativos. É a seguinte a redação da citada súmula:

“21 – É inconstitucional a exigência de depósito ou arrolamento prévios de dinheiro ou bens para admissibilidade de recurso administrativo.”

A Súmula Vinculante 21 veio explicitar que, segundo o entendimento consolidado do Supremo Tribunal Federal, são inconstitucionais preceitos legais que exijam garantias de instância – tais quais depósitos ou arrolamentos de bens – como condição para a interposição de recursos em processos administrativos de qualquer espécie. Em conseqüência, não se pode admitir que alguma lei venha a prever a exigência de caução para a interposição de recursos administrativos (e as leis que eventualmente o façam são inconstitucionais nessa parte).

Em síntese, pensamos que resultou afastada pela jurisprudência do STF a parte inicial do § 2º do art. 56 da Lei 9.784/1999 – “salvo exigência legal” –, permanecendo, tão-somente, sem ressalva, a regra segundo a qual “a interposição de recurso administrativo independe de caução”.

Importante regra encontra-se no art. 61 da Lei 9.784/1999, nos termos do qual o recurso, salvo disposição legal em contrário, não tem efeito suspensivo (somente possui, portanto, o denominado efeito devolutivo). Significa que a administração não fica impedida de praticar o ato que esteja sendo alvo de impugnação administrativa pelo particular, nem os efeitos desse ato são sustados pela instauração ou pelo curso do processo administrativo, vale dizer, as impugnações e recursos administrativos, como regra, não suspendem a executoriedade do ato contra o qual se dirigem.

.......................

CAPÍTULO 15

1) O item 3.2 passou a ter a redação abaixo (reprodução integral do item):

3.2. Impenhorabilidade

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17.ª para 18.ª edição

A penhora é instituto de natureza constritiva que recai sobre o patrimônio do devedor para propiciar a satisfação do credor na hipótese de não pagamento da obrigação. O bem penhorado pode ser compulsoriamente alienado a terceiros para que o produto da alienação satisfaça o débito do credor.

Os bens públicos são impenhoráveis , vale dizer, não se sujeitam ao regime de penhora.

A Constituição Federal estabeleceu regra diferenciada para a satisfação dos créditos de terceiros contra a Fazenda Pública. Eles serão pagos segundo o denominado regime de precatórios , nos termos do caput do art. 100 da Carta Política, abaixo transcrito (redação dada pela EC 62/2009):

“Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim.”

Embora essa redação do caput do art. 100 da Constituição Federal afirme que o pagamento ocorrerá exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios, o § 1º do mesmo artigo determina que os débitos de natureza alimentícia têm preferência. Além disso, há uma outra regra de prioridade no pagamento, constante do § 2º do art. 100, para os débitos até determinado valor que devam ser pagos às pessoas que tenham sessenta anos de idade ou mais na data de expedição do precatório, ou que sejam portadoras de doença grave, definidas na forma da lei. Merecem transcrição os referidos parágrafos do art. 100, ambos com a redação dada pela EC 62/2009:

“§ 1º Os débitos de natureza alimentícia compreendem aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou por invalidez, fundadas em responsabilidade civil, em virtude de sentença judicial transitada em julgado, e serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, exceto sobre aqueles referidos no § 2º deste artigo.

§ 2º Os débitos de natureza alimentícia cujos titulares tenham 60 (sessenta) anos de idade ou mais na data de expedição do precatório, ou sejam portadores de doença grave, definidos na forma da lei, serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, até o valor equivalente ao triplo do fixado em lei para os fins do disposto no § 3º deste artigo, admitido o fracionamento para essa finalidade, sendo que o restante será pago na ordem cronológica de apresentação do precatório.”

É muito importante registrar que existe uma única hipótese em que deve ser feito

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pagamento direto pela Fazenda, sem seguir a sistemática de precatórios: trata-se das obrigações de pequeno valor , definidas em lei. Essa única exceção ao regime dos precatórios no pagamento de dívidas das pessoas jurídicas de direito público está no § 3º do art. 100 da Carta Política, incluído pela EC 20/1998 e alterado, sem modificação relevante de seu conteúdo, pela EC 30/2000 e pela EC 62/2009. A redação atual desse dispositivo, dada pela EC 62/2009, é a seguinte:

“§ 3º O disposto no caput deste artigo relativamente à expedição de precatórios não se aplica aos pagamentos de obrigações definidas em leis como de pequeno valor que as Fazendas referidas devam fazer em virtude de sentença judicial transitada em julgado.”

As obrigações de pequeno valor não sujeitas ao regime de precatórios poderão ter valores distintos para as entidades de direito público, segundo as diferentes capacidades econômicas, devendo ser fixados por lei própria da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios. Esses valores, entretanto, devem corresponder, no mínimo, ao valor do maior benefício do regime geral de previdência social, isto é, ao teto do RGPS (art. 100, § 4º).

Se a lei a que se refere o parágrafo anterior não estiver publicada em até cento e oitenta dias, contados da data de publicação da EC 62/2009 (10.12.2009), serão consideradas obrigações de pequeno valor não sujeitas ao regime de precatórios, em relação aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios omissos na regulamentação, as que correspondam ao valor de (ADCT, art. 97):

a) quarenta salários mínimos para estados e para o Distrito Federal;

b) trinta salários mínimos para municípios.

As dotações orçamentárias e os créditos abertos serão consignados diretamente ao Poder Judiciário, cabendo ao presidente do tribunal que proferir a decisão exeqüenda determinar o pagamento integral e autorizar o seqüestro da quantia respectiva, a requerimento do credor, exclusivamente para os casos de (art. 100, § 6º):

a) preterição de seu direito de precedência ; e

b) não alocação orçamentária do valor necessário à satisfação do seu débito.

Observa-se, portanto, que, embora os bens públicos realmente sejam impenhoráveis (não sujeitos a penhora), é possível, nas restritas hipóteses constitucionalmente previstas, ocorrer o seqüestro de valores (dinheiro público) necessários à satisfação de dívidas constantes de precatórios judiciais.

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CAPÍTULO 16

1) Foram acrescentados os parágrafos abaixo ao final do item 5.7.11:

5.7.11. Desapropriação confiscatória

....................

Por fim, é oportuno registrar que o Supremo Tribunal Federal já decidiu que a desapropriação confiscatória deve recair sobre a totalidade da área do imóvel , mesmo que a cultura ilegal ocupe apenas uma pequena parte da área dele (RE 543.974/MG, rel. Min. Eros Grau, 26.03.2009; vide Informativo 540 do STF). Asseverou a Corte Suprema que a palavra “gleba”, utilizada no texto constitucional, só pode ser entendida como “propriedade”, na sua totalidade, e não como parcela de um imóvel. Por outras palavras, a expropriação de glebas a que se refere o art. 243 da Constituição deve abranger toda a propriedade, e não apenas a área efetivamente cultivada .

Cabe anotar que, por se tratar de determinação expressa do constituinte originário, entendeu nossa Corte Máxima que não é cabível, na hipótese do art. 243 da Constituição Federal, cogitar desporporcionalidade, como se o elaborador soberano de nossa Carta Política tivesse se “equivocado”. Assim, mesmo que se encontre, por exemplo, uma plantação de maconha em poucos metros quadrados de uma grande propriedade rural, a totalidade da área do imóvel deve ser objeto da desapropriação confiscatória, sem que se possa, nesse caso, alegar ofensa ao princípio da proporcionalidade (porque se trata de disposição originária do texto constitucional, repita-se).

FIM

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