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Dilemas Urbanos: A Produção do Espaço do Cidadão, Sob a Ótica da Política e da Legislação. Selma Batista (Dinter USP/UEA) Geógrafa, Professora da UEA [email protected] RESUMO Ao definir como objeto, o Programa Social e Ambiental dos Igarapés de Manaus PROSAMIM, na Bacia Hidrográfica do Educandos, pautado em uma abordagem socioambiental, com contribuições de Sacks (2008), Santos (2000), e Sen & Kliksberg (2010), se propõe neste artigo, refletir os dilemas urbanos, com foco na legislação que viabilizou a intervenção e nos critérios de indenizações propostas pelo PROSAMIM, no processo de remanejamento da população residente em áreas de vulnerabilidade a alagamentos. Programa de intervenção urbanística e habitacional, promovido pelo Governo do Estado do Amazonas com recursos do Banco Interamericano de Desenvolvimento BID sob fiança da República Federativa do Brasil. Como fontes secundárias, se utilizou a Lei Municipal 788 de 15 de julho de 2004 que instituiu a poligonal de intervenção para a Bacia do Educandos como Área de Especial Interesse Social; o Plano Diretor da Reposição de Moradias, Remanejamento de População e Reinstalação de Atividades Econômicas das Áreas Requeridas para Implantação do PROSAMIM (2005); Plano de Ações para Reposição de Moradia, Remanejamento e Inclusão Social para o Igarapé do Quarenta (2004); a política operativa do BID para reassentamento involuntários - OP 710; e, o Comentário Geral nº 4 (ONU, 1991) sobre os indicadores para análise da “Moradia Adequada” do Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. Entre as fontes primárias os resultados obtidos em oficinas diagnósticas junto aos moradores, associado à observação direta estruturada, deram suporte para a análise dos mecanismos de produção do espaço do cidadão, sob a ótica da política e da legislação.

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Dilemas Urbanos: A Produção do Espaço do Cidadão, Sob a Ótica da Política e da Legislação.

Selma Batista (Dinter USP/UEA) Geógrafa, Professora da UEA

[email protected]

RESUMO

Ao definir como objeto, o Programa Social e Ambiental dos Igarapés de Manaus – PROSAMIM, na

Bacia Hidrográfica do Educandos, pautado em uma abordagem socioambiental, com contribuições

de Sacks (2008), Santos (2000), e Sen & Kliksberg (2010), se propõe neste artigo, refletir os

dilemas urbanos, com foco na legislação que viabilizou a intervenção e nos critérios de

indenizações propostas pelo PROSAMIM, no processo de remanejamento da população residente

em áreas de vulnerabilidade a alagamentos. Programa de intervenção urbanística e habitacional,

promovido pelo Governo do Estado do Amazonas com recursos do Banco Interamericano de

Desenvolvimento – BID sob fiança da República Federativa do Brasil. Como fontes secundárias,

se utilizou a Lei Municipal 788 de 15 de julho de 2004 que instituiu a poligonal de intervenção para

a Bacia do Educandos como Área de Especial Interesse Social; o Plano Diretor da Reposição de

Moradias, Remanejamento de População e Reinstalação de Atividades Econômicas das Áreas

Requeridas para Implantação do PROSAMIM (2005); Plano de Ações para Reposição de Moradia,

Remanejamento e Inclusão Social para o Igarapé do Quarenta (2004); a política operativa do BID

para reassentamento involuntários - OP 710; e, o Comentário Geral nº 4 (ONU, 1991) sobre os

indicadores para análise da “Moradia Adequada” do Pacto Internacional sobre Direitos

Econômicos, Sociais e Culturais. Entre as fontes primárias os resultados obtidos em oficinas

diagnósticas junto aos moradores, associado à observação direta estruturada, deram suporte para

a análise dos mecanismos de produção do espaço do cidadão, sob a ótica da política e da

legislação.

Introdução

A Bacia Hidrográfica do Educandos, ainda que protegida pela Lei 4771/65 como Área de Proteção

Permanente - APP foi, na década de 1970, densamente ocupada com o boom populacional,

ocasionado pela Zona Franca de Manaus. Época em que a prioridade no processo de ocupação

da Amazônia fez com que ali permanecessem ocultos à lei.

Passadas quatro décadas, a degradação da área central da cidade de Manaus, capital do

Amazonas, estado de destaque nas relações internacionais, leva o Governo do Estado a implantar

o Programa Social e Ambiental dos Igarapés de Manaus – PROSAMIM. Com respaldo jurídico, o

Programa propõe um reordenamento territorial e torna fragmentos da Bacia Hidrográfica do

Educandos em Área de Especial Interesse – AIE e, em solo criado, sobre os igarapés de Manaus,

Bittencourt, Mestre Chico, Cachoeirinha e Quarenta reassenta parte da população em moradias

consolidadas em Parques Residenciais.

Intervenções positivas no que diz respeito à retirada de famílias das áreas de vulnerabilidade

sazonal, cuja dinâmica das águas, na subida do Rio Negro, provocava alagamentos, com perda

de móveis, eletrodomésticos e eletrônicos, entre outros pertences de uma família. E na vazante, a

vulnerabilidade estava na exposição do morador, as condições do ambiente favorável, às

enfermidades por veiculação hídrica.

O aglomerado de casas de padrão construtivo precário, assentadas às margens e leito dos

igarapés, associado: a falta de um sistema de coleta de esgoto; de vias de circulação para a

coleta de lixo, entre outras limitações típicas de um processo de ocupação irregular. Cenário

característico de cidades que, normalmente, se organizam para bem receber as indústrias que se

instalam, mas, pouco, ou quase nada, para abrigar a mão de obra necessária que para a cidade

migra.

Com base neste cenário, o artigo, apoiado na documentação que legitima a ação do Governo do

Estado para implementar o PROSAMIM, busca ampliar a reflexão sobre os dilemas urbanos na

produção do espaço do cidadão, com foco na análise do reassentamento de moradores em solo

criado na área de intervenção e de moradores remanejados para casas populares no Conjunto

Habitacional Nova Cidade, zona norte da capital.

O artigo, dividido em três fragmentos, no primeiro fundamenta a abordagem socioambiental,

referenciando alternativas de arranjos institucionais através de modelos que promovam a

distribuição equitativa dos benefícios, a inclusão justa, e a incorporação sobre a necessidade de

conservação dos ambientes apropriados seja, para fins de abrigo ou recurso. Na segunda,

apresenta o PROSAMIM, trata da legislação que legitima a proposta de intervenção e os critérios

de indenização assumidos pelo Governo do Estado com recurso, parcial, do Banco

Interamericano de Desenvolvimento. Na terceira parte, fundamentado nos indicadores da

“Moradia Adequada” do qual trata o Comentário Geral nº4 do Pacto Internacional dos Direitos,

Sociais, Econômico e Cultural, apresenta um comparativo entre dois critérios de indenização,

qualificando os indicadores. Ao final, as considerações com a síntese sobre o tema proposto.

Mecanismos de Produção do Espaço do Cidadão

De acordo com o geógrafo Milton Santos (2000) “o espaço do cidadão” materializado como um

território da cidadania requer, além do direito a bens e serviços mínimos a serem priorizados via

gestão pública, que suas especificidades sejam mantidas sob pena de perda da identidade e com

ela a perda do território. Para o autor, cultura e território, são os principais componentes para a

conquista de um modelo cívico autônomo, não subordinado ao modelo econômico concentrador

de renda e exclusão social.

Posto que a produção do espaço do cidadão propõe a inclusão justa, se fundamenta este

processo em três componentes: o território, como a base do existir, onde a infraestrutura básica

se materializa; a cultura, como o meio ao qual o homem se adapta as condições do ambiente

para dele fazer seu abrigo e recurso; e o direito constituído enquanto produto da convivência

social, necessária à produção do espaço geográfico por meio da apropriação dos seus recursos.

Juntos determinam o patrimônio de uma civilização, responsáveis pela produção do espaço do

cidadão. Lócus da produção de capital social, que deveria fundamentar qualquer plano, programa

ou projeto público, como forma de garantir, como cita o autor “[...] uma política efetivamente

redistributiva, isto é, tendente à atribuição de justiça social para a totalidade da população, não

importa onde esteja cada indivíduo” (SANTOS, 2000:6).

À proposta de modelo cívico, se associa a reflexão dos economistas Sen & Kliksberg (2010) ao

abordarem a ideia de uma economia globalizada como meio de inclusão justa. Para os autores,

não há “prosperidade econômica” sem uso extensivo das

[...] oportunidades de intercâmbio e de especialização que as relações de mercado oferecem. Mesmo que a operação de uma economia de mercado específica seja significativamente defeituosa, não há como abrir mão da instituição dos mercados de modo geral como poderoso motor de progresso econômico. (op.cit, p.27)

Sendo a economia globalizada um meio de acesso aos recursos para o desenvolvimento, um

arranjo institucional global, se apresenta como uma alternativa possível com intuito de garantir

melhor distribuição dos benefícios. Como citam os autores:

O capitalismo global está muito mais preocupado em expandir o domínio das relações de mercado do que, por exemplo, em estabelecer

a democracia, expandir a educação elementar, ou incrementar as oportunidades sociais para os pobres do mundo. (op.cit, p.28)

Eventos como o Fórum Mundial Global, a Conferência das Nações Unidas para os Assentamentos

Humanos, a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Humano,

se apresentam como opções para estreitar as relações entre instituições locais e globais, com

intuito de, em consenso, legitimarem normas e estabelecerem procedimentos que garantam a

distribuição equitativa da riqueza produzida pelo mercado, como forma de inclusão justa na escala

do planeta.

Se tais eventos, junto à sociedade civil organizada, avançassem na legitimação das propostas, se

alcançaria, efetivamente, os pressupostos do desenvolvimento sustentável alicerçados no pilar do

ecologicamente correto, socialmente justo e economicamente viável.

Na RIO+20, Navi Pillay, a Alta Comissária da ONU para os direitos humanos, ao declarar que

“nenhum direito humano está mais perto de um componente essencial do desenvolvimento

sustentável do que o direito à saúde e um ambiente saudável”, ratifica a relevância da política e,

sobretudo, dos instrumentos de monitoramento que permitam mensurar as formas de inclusão,

como exemplo do Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais1. Elaborado

com foco na desenvolvimento includente e sustentado. Conforme pronunciamento,

[...] o desenvolvimento humano sustentável é facilitado por um Estado de Direito forte. As Nações Unidas .... apoia o desenvolvimento de uma agenda de desenvolvimento humano sustentável holística que aborda os desafios relacionados com o crescimento inclusivo, a proteção social e o meio ambiente. Em tal agenda, o Estado de Direito deve desempenhar um papel crítico em assegurar igual proteção e acesso a oportunidades"2.

O alerta remete ao conceito de ecodesenvolvimento cunhado por Ignacy Sachs, quando articula

sustentabilidade social, sustentabilidade econômica e sustentabilidade política, como meios de

proteção dos recursos do planeta para as gerações futuras. De acordo como o autor:

A sustentabilidade social vem na frente, por se destacar como a própria finalidade do desenvolvimento, sem contar com a probabilidade de que um colapso social ocorra antes da catástrofe ambiental; - um corolário: a sustentabilidade cultural; a sustentabilidade do meio ambiente vem em decorrência; - outro corolário: distribuição territorial equilibrada de assentamentos humanos e atividades; - a sustentabilidade econômica

1 Adotado pela Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas – ONU em 1966. O Brasil como signatário, ratificou o pacto no

ano de 1992. 2 Declaração do Alto Comissariado para Direitos Humanos Navi Pillay no Mundial UNEP Congresso sobre Justiça, Governança e

Sustentabilidade Ambiental para a Lei, na RIO+ 20, em 20 de junho de 2012. Texto original em inglês, transcrito de acordo com a

fonte. http://www.ohchr.org/en/NewsEvents/Pages/DisplayNews.aspx?NewsID=12263&LangID< acesso em 16 de junho de 2012>

aparece como uma necessidade, mas em hipótese alguma é condição prévia para as anteriores, uma vez que, por seu lado, obstrui a sustentabilidade ambiental; - o mesmo pode ser dito quanto à fala de governabilidade política, e por esta razão é soberana a importância da sustentabilidade política. Na pilotagem do processo de reconciliação do desenvolvimento com a conservação da biodiversidade (SACHS, 2008, p.72).

Agregando ao fundamento dos demais autores, se destaca Sacks com o modelo sustentável, que

também chama atenção para a necessidade de uma articulação internacional associada à prática

de um planejamento local e participativo que incorpore a preocupação com a questão ambiental.

Com maior ênfase para a valorização da diversidade cultural do que, efetivamente, a valorização

da variável meio ambiente. Isso porque cada território, por sua diversidade ambiental, legitima as

formas de uso dos recursos de acordo com uma legislação especifica, que no momento de uma

transação internacional, segundo o autor,

[...] pode, por assim dizer, ser colocada fora desses parênteses. O que permanece dentro de parênteses é a diversidade cultural. Desse modo, as pesquisas sobre biodiversidade e sobre diversidade cultural apresentam-se intimamente articuladas. É de se esperar que tal programa possa ser reproduzido em outros ecossistemas, algum dia, de modo a explorar mais sistematicamente a matriz ecossistemas/culturas. Lida horizontamente, essa matriz mostra a diversidade cultural nas respostas a desafios ambientais similares. Lida verticalmente, fornece-nos um insight da adaptabilidade de uma cultura a diferentes condições naturais [...]”. (op.cit, p.74)

Com esta abordagem, se afirma a indissociabilidade entre a cultura, o direito e o território. E com

ela, se propõe uma análise socioambiental a partir de dois critérios de reassentamentos

propostos pelo Programa Social e Ambiental dos Igarapés de Manaus – PROSAMIM.

O Programa Social e Ambiental dos Igarapés de Manaus – PROSAMIM: a Política e a Lei

Como um programa do Governo do Estado do Amazonas, o PROSAMIM, contou com

financiamento do Banco Interamericano de Desenvolvimento, sendo a República Federativa do

Brasil fiadora de três contratos: 1692/OC-BR, 2006/OC-BR, 2165/OC-BR, que juntos, somam

US$ 371.000.000,00 com contrapartidas do Governo do Estado de US$ 159.000.000,00.

Recursos direcionados a projetos de revitalização e recuperação dos principais afluentes da Bacia

Hidrográfica do Educandos, como estratégia para o reordenamento da área central da cidade de

Manaus, com destaque para o reassentamento, de parte, das famílias em modelos de unidades

habitacionais edificadas em solo criado, com espaços públicos de lazer e abertura de vias

públicas de acesso. Área antes, densamente ocupada por edificações de padrão construtivo

subnormal, às margens e leito dos principais igarapés da Bacia. Ocupações irregulares que

associadas à falta de um sistema de esgotamento sanitário, resultavam em uma paisagem de

degradação ambiental com elevado coeficiente de vulnerabilidade ao risco socioambiental.

FIGURA 1: CENÁRIO PRÉ INTERVENÇÃO

Fonte: Arquivo PROSAMIM (2004)

FIGURA 2: CENÁRIO PÓS INTERVENÇÃO

Fonte: Selma Batista (2012)

A Transformação de um Igarapé: de Recurso Hídrico à Solo Criado

No limite da Bacia o igarapé de Manaus, foi o primeiro impactado com as obras executadas pelo

PROSAMIM que nos anos de 2007 e 2008, entregou com o Parque Residencial de Manaus, 819

unidades habitacionais edificadas em solo criado. De acordo com a legislação federal, Lei

10.257/2001 – Estatuto da Cidade, artigo 28, entende-se por solo criado, um instrumento jurídico

por meio do qual, “o plano diretor poderá fixar áreas nas quais o direito de construir poderá ser

exercido acima do coeficiente de aproveitamento básico adotado, mediante contrapartida a ser

prestada pelo beneficiário”.

ANO 2004

ANO 2012

FIGURA 3: ÁREA DE INTERVENÇÃO DO PROSAMIM COM PRODUÇÃO DE SOLO CRIADO

Fonte: Google Earth (2004 - 2011)

Adaptação: Selma Batista

Segundo Grau (1983 p.57) a ideia de solo criado

desenvolveu-se inicialmente a partir da observação da possibilidade de criação artificial de área horizontal, mediante a sua construção sobre ou sob o solo natural. Compreendia-se assim o solo criado como o resultado da criação de áreas adicionais utilizáveis, não apoiadas diretamente sobre o solo natural.

De acordo com o Plano de Ações para Reposição de Moradias, Remanejamento e Inclusão Social

– PDR (2004), o solo criado seria uma das alternativas para manter os moradores residindo no

mesmo território em melhores condições de moradia. A engenharia consistia em canalizar, com

galerias, o igarapé e sobre ele edificar as unidades habitacionais.

Juridicamente amparada pela Constituição Federal artigos 182 e 183, ao qual se aplica o Estatuto

da Cidade, cujas diretrizes visam a ordem pública e o interesse social da propriedade urbana em

prol do bem coletivo, a ideia do programa do Governo Estadual, por meio da Lei Municipal 788 de

15 de junho de 2005, se materializa em ação da política urbana, quando institucionaliza como

Área de Especial Interesse a Bacia Hidrográfica do Educandos. De acordo com o artigo 1º:

Esta Lei, fundamentada no interesse público, institui Área de Especial Interesse no perímetro de abrangência da bacia hidrográfica dos Educandos, que tem por objetivos basilares a melhoria da qualidade de vida da população residente no local, através do melhoramento das condições urbanísticas, habitacionais, ambientais, de saneamento, saúde e mobilidade urbana.

Igarapé de

MANAUS

Igarapé

BITTENCOURT

Igarapé

MESTRE CHICO

Igarapé do

QUARENTA

Igarapé

MESTRE CHICO Igarapé do

QUARENTA

Igarapé de

MANAUS

Igarapé

BITTENCOURT

Legalmente instituído, no que diz respeito ao ordenamento do território, ao desenvolvimento das

funções sociais da cidade e à garantia do bem-estar de seus habitantes, as intervenções do

Programa Social e Ambiental dos Igarapés de Manaus, iniciadas no ano de 2005, quanto ao

componente ambiental avançou sobre os igarapés, canalizou os cursos d’água e aterrou suas

margens. E ao componente social, do total de 3701 famílias remanejadas, reassentou em solo

criado, em modelo construtivo de padrão condominal, 1829 famílias, cujo Título Provisório de

Propriedade foi atribuído às mulheres.

Inclusão social, norteada pelo Plano Diretor da Reposição de Moradias, Remanejamento de

População e Reinstalação de Atividades Econômicas das Áreas Requeridas para Implantação do

PROSAMIM – PDDR (2005), elaborado com base na política operativa para reassentamento

involuntário – OP 710, aprovada pela Diretória Executiva do Banco Interamericano de

Desenvolvimento no dia 22 de Julho 19983. Segundo o documento, a política operacional abrange

qualquer deslocamento físico involuntário de pessoas4 causado por um projeto do Banco e tem

como objetivo.

Minimizar a perturbação do meio em que vivem as pessoas na área de influência do projeto, evitando ou minimizando a necessidade de deslocamento físico, assegurando que, quando as pessoas forem deslocadas, sejam tratadas equitativamente e, sempre que possível, possam compartilhar dos benefícios do projeto que requer o seu reassentamento. (BID, 1998, p.2)

Objetivo respaldado em dois princípios fundamentais, de acordo com a OP 710, no quadro

abaixo, sistematizados (BID, 1998 p.2):

3 Antes da política ter sido posta à consideração do Comitê de Políticas da Diretória, em Julho de 1996, versões preliminares deste

documento foram discutidas com organizações não governamentais por ocasião da Sexta Reunião Consultiva BID-ONG sobre o Meio Ambiente nos dias 27 a 30 de Novembro em Curitiba, Brasil e várias reuniões subsequentes na sede do Banco e via Internet. (BID, 1998) 4 Exceto esquemas de colonização e o reassentamento de refugiados ou vítimas de desastres naturais.

QUADRO 1

PRINCÍPIOS DA OP 710 – BID

SERÁ ENVIDADO TODO ESFORÇO

PARA EVITAR OU MINIMIZAR A NECESSIDADE DE REASSENTAMENTO

INVOLUNTÁRIO.

QUANDO O DESLOCAMENTO FOR INEVITÁVEL, UM PLANO DE

REASSENTAMENTO DEVE SER ELABORADO A FIM DE

ASSEGURAR QUE AS PESSOAS AFETADAS RECEBAM COMPENSAÇÃO

E REABILITAÇÃO ADEQUADAS

Uma análise completa das alternativas do projeto deve ser realizada a fim de identificar soluções que sejam econômica e tecnicamente viáveis, ao mesmo tempo em que se elimina ou minimiza a necessidade de reassentamento involuntário. Ao examinar as vantagens relativas das opções, é importante dispor de uma estimativa razoável do número de pessoas com probabilidade de serem afetadas e uma estimativa dos custos do reassentamento. Deve-se dispensar atenção especial às considerações socioculturais, tais como o significado cultural ou religioso da terra, a vulnerabilidade da população afetada ou a disponibilidade de substituição em espécie de bens, especialmente quando têm implicações tangíveis importantes. Quando um grande número de pessoas ou uma parte substancial da comunidade afetada sujeita ao reassentamento ou as seus impactos incluir bens e valores que sejam difíceis de quantificar ou de compensar,

A alternativa de não empreender o projeto deve ser seriamente considerado.

A compensação e a reabilitação são consideradas justas e adequadas quando puderem assegurar que, no mais breve período possível, as populações reassentada e anfitriã: - Conseguirão um padrão mínimo de vida e acesso à terra, aos recursos naturais e aos serviços (tais como água potável, saneamento, infra-estrutura comunitária e títulos de propriedade da terra) pelo menos equivalente aos níveis anteriores ao reassentamento; - Recuperar-se-ão de todas as perdas causadas pelas dificuldades de transição; - Sofrerão perturbação tão limitada quanto possível das suas redes sociais, oportunidades de emprego e produção e acesso aos recursos naturais e instalações públicas; - Terão acesso às oportunidades de desenvolvimento econômico e social.

Fonte: OP 710 – Reassentamento Involuntário (BID, 1998)

Os Critérios de Indenização e as Alternativas de Reassentamento Para atender os objetivos do BID, de tratar os envolvidos no projeto equitativamente e, sempre

que possível, garantir para que possam compartilhar dos benefícios da intervenção, o PDDR

como instrumento legal para desapropriação e reassentamento da população, em condição de

vulnerabilidade ao risco, mapeou, no ano de 2004, a área da poligonal da Bacia Hidrográfica do

Educandos cadastrando os imóveis necessários de remoção, nos Igarapés de Manaus,

Bittencourt e Mestre Chico. Cujas famílias residentes, em diferentes condições de posse ou uso

da propriedade, para fins de indenização, conforme Decreto Lei 24.841, publicada pelo Governo

do Estado em 04 de março de 2005, se enquadrariam em algum dos conceitos: 1) Proprietário5:

todo aquele que tem o direito de gozar e dispor das coisas de modo pleno e exclusivo, nos limites

e com observância das obrigações estabelecidas na ordem jurídica. Fundamentação legal:

Art.1228 do Código Civil; 2) Inquilino6: todo aquele que mora em imóvel cedido mediante

locação. Lei do Inquilinato nº 8.245/91; 3) Possuidor7: todo aquele que tem de fato o exercício,

pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade. Fundamentação Legal: Art.226§4º

da Constituição Federal; 4) Cedido: todo aquele residente num imóvel, membro ou não da célula

familiar, cujo proprietário não resida no mesmo imóvel, à exceção daquele com o qual o

proprietário/possuidor do referido bem mantenha relação de parentesco em linha de 1º grau.

O morador, ao enquadrar-se em um dos perfis, junto à equipe técnica da UGPI e

Superintendência Nacional da Habitação - SUHAB, com apoio das lideranças comunitárias8,

estudava a melhor solução de reassentamento, pautado nos critérios de indenização sugeridos

pelo PROSAMIM, a saber:

1) UNIDADE HABITACIONAL. Habitações edificadas em Área de Especial Interesse em solo

criado sobre afluentes da Bacia Hidrográfica do Educandos, zona sul, com: sala, 2

quartos, cozinha, 1 banheiro, área de serviço e varanda, dispostos em 50 m2 construídas

em bloco cerâmico estrutural, com instalação de água encanada, energia elétrica, sistema

de coleta de esgoto, de lixo, de águas servidas e pluviais. Com espaços de convivência e

equipamentos de lazer. Até o ano de 2007, inquilino e cedido podiam optar por esta

alternativa. Após esta data, apenas morador proprietário teria a opção dessa escolha.

2) CONJUNTO HABITACIONAL. Habitações edificadas em Conjuntos Habitacionais,

localizados na zona norte da cidade de Manaus, em programas de moradia popular do

Governo do Estado, com: dois quartos, sala-copa e banheiro, dispostos em 38 m2 , em

lotes de 128 m2 , construídas em alvenaria, com sistema de água encanada, energia

elétrica, sistema de coleta de lixo, sistema de fossa. Sem espaços de convivência e

equipamentos de lazer. Tem direito o morador proprietário, cedido ou inquilino.

3) INDENIZAÇÃO. Modalidade de reassentamento, com compensação em dinheiro aplicável

aos proprietários em condições para conduzir seu próprio processo de relocação.

5 Amparado na Lei do Código Civil 10406/02, no artigo 1228, do direito à propriedade. Os moradores que comprovavam por meio de

documentos a posse do imóvel, se classificavam nesta modalidade. 6 Fundamentação amparada na Lei do Inquilinato nº 8.245/91; 3.

7 Fundamentação amparada na Constituição Federal, no artigo 226§4º .

8 As lideranças comunitárias das áreas de intervenção consolidaram o Comitê Representativo da Comunidade – CRC.

4) BÔNUS MORADIA. Modalidade de reassentamento que consistiu em subsidiar e

apoiar o reassentamento de famílias em moradias existentes no mercado local e

regional através do repasse do valor de R$21.000,00 (vinte e um mil reais), para a

compra de uma nova moradia, em área fora de zonas não edificandis. A compra

monitorada pela SUHAB, resultava em negociação, desde, que, a casa fosse de

alvenaria, com instalações sanitárias, ligações regulares de água e luz e

documentação básica de titularidade.

Segundo o PDDR (2005 p.9), de acordo com a política operativa do BID (1998), dentre as

alternativas de indenização ao menos uma deveria contemplar a permanência do

beneficiário no limite do seu local de origem. Conforme cita o documento,

É necessário não perder de vista, para correta observância desta diretriz, que a mesma se aplica a alternativa de remanejar população para Conjuntos Habitacionais construídos pelo Governo do Estado do Amazonas e/ou Municipalidade de Manaus. Isso porque as outras opções de remanejamento apresentadas no presente documento, garantem a permanência das famílias praticamente no mesmo local onde atualmente vivem (construção de Quadras Bairro em terrenos situados a 1,5 km do local original e construção de moradias em Solo Criado, nas margens dos Igarapés). Outra parte das famílias decidirá por si mesma a localização de sua nova residência, visto que as mesmas serão adquiridas por elas através do sistema de Bônus Moradia, não se aplicando, nestes casos, a observância da presente diretriz. Para os casos da transferência de famílias de Conjuntos Habitacionais esgotadas as possibilidades de localização dos mesmos no entorno imediato de origem das famílias, serão realizados os ajustes para compensar e ou minimizar eventuais efeitos da localização sobre a renda familiar, em especifico com relação ao prosseguimento das ocupações remuneradas dos chefes de família, para os casos em que o provedor da subsistência familiar tenha efetivamente dependência locacional do entorno imediato para desenvolvimento de atividades remuneradas. Na perspectiva do anteriormente dito, a alternativa de remanejamento para Conjuntos Habitacionais aplica-se com mais propriedade para aquelas famílias cujo Provedor principal não dependa do entrono imediato para formação da Renda Familiar.

Sobre o mesmo tema, a OP 710 (BID, 1998, p.21), ao analisar alguns procedimentos e

resultados de projetos não satisfatórios, recomenda como “princípio fundamental que a

população deslocada não seja forçada a subsidiar um projeto”. A análise do quadro 2,

fundamentada nas diretrizes estabelecidas pelo PDDR e OP 710, sinaliza que do total de

3701 famílias cadastradas, 1839, permaneceram no mesmo local, residindo em unidades

habitacionais edificadas em solo criado. Os demais, 1862, mediante opção pelas demais

alternativas de indenização, migraram para outras localidades. Salvo os que conseguiram

A figura 5, representada a partir da percepção de um mototáxi10, como resposta ao pesquisador,

permitiu delimitar a área de reassentamento dos moradores, estigmatizada como “novos

alagados”.

- Como motoqueiro, você sabe onde mora o pessoal que veio prá cá pelo PROSAMIM?

- Daqui (Avenida Nepal), a partir da quadra 67 à esquerda é o pessoal da Cachoeirinha e, da quadra

64 prá cá (direita) é o pessoal do Quarenta11

.

FIGURA 5: ÁREA DE REASSENTAMENTO NO CONJUNTO NOVA CIDADE

FIGURA 4: DISTÂNCIA ENTRE A ÁREA DA REMOÇÃO E DO REASSENTAMENTO

Fonte: Imagem Ortofoto,ano 2010/ Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Sustentabilidade Adaptação: Selma Batista

O reassentamento em casa própria, para um universo de inquilinos e cedidos, sem dúvida

representou um impacto positivo no que tange os objetivos da política urbana de garantir o pleno

desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana. No entanto, sendo este

um direito do cidadão, a casa não deve se resumir apenas, a um abrigo. Para além de abrigo, a

casa deve garantir também o direito à terra urbana como recurso, em condições de uso.

De acordo com a OP 710 do BID, quanto uma comunidade anfitriã, como o bairro Nova Cidade,

passa a abrigar novos moradores de uma área de intervenção do qual o banco é parceiro, se

recomenda que associado ao deslocamento, o ordenamento do território com infraestrutura e

10

Devido a carência em transporte público, o território da Nova Cidade foi tomado por cooperativas que oferecem o serviço. 11

Trabalho de Campo, 17 de abril de 2012.

equipamentos urbanos básicos seja providenciado com intenção de atender o pleno

estabelecimento de um espaço cidadão. O que incide a oferta de saneamento ambiental, sob

pena de contaminação dos ambientes hídricos, terrestres e do ar; a oferta de educação para todas

as séries escolares, sob pena de privar o cidadão do direito à educação; a oferta de transporte

público urbano com regularidade, pontualidade e alternativas de acesso, sob pena de impedir a

mobilidade do cidadão; a oferta de postos de saúde e primeiro socorros em um raio de distância

mínima que permita acessibilidade ao cidadão; a oferta de equipamentos de lazer que garanta a

qualidade de vida e o direito à cidade para a geração presente e, sobretudo, a sustentabilidade do

ambiente para as gerações que estão por vir.

De acordo com a fala de um morador, reassentado em solo criado, no Parque Residencial

Manaus, “a casa não é apenas o teto, ela é muito mais do que isso, é a nossa dignidade”12.

Definição no senso comum, que encontra respaldo nos resultados do General Comment nº4,

sobre “On the Right to Adequate Housing” realizado em 13 de dezembro de 1991, pelo Comitê da

ONU para o Pacto Internacional dos Direitos Sociais, Econômicos e Cultural (PIDESC)13, onde

sete componentes básicos são considerados para uma moradia minimamente adequada.

QUADRO 3

INDICADORES DA MORADIA ADEQUADA – PIDESC

INDICADOR FINALIDADE

SEGURANÇA NOS DIREITOS DE PROPRIEDADE

Que garanta a proteção legal contra os despejos forçados e outras ameaças

DISPONIBILIDADE DE SERVIÇOS, EQUIPAMENTOS E INFRA-ESTRUTURA

Tais como água, esgoto, coleta de resíduos sólidos, energia, iluminação, dentre outros

DISPONIBILIDADE A PREÇOS ACESSÍVEIS

Para que o preço da moradia seja compatível com o nível de renda da população e não comprometa a satisfação de outras necessidades básicas das famílias

HABITABILIDADE, Uma habitação condigna deve ser habitável, em termos de proporcionar aos habitantes um espaço adequado, protegendo-os do frio, calor úmido, chuva, vento ou outras ameaças para a saúde, riscos estruturais, e vetores de doenças.

ACESSIBILIDADE A todos os grupos sociais, levando em conta as necessidades habitacionais específicas de idosos, crianças, deficientes físicos, moradores de rua, população de baixa renda etc.

LOCALIZAÇÃO Que possibilite o acesso ao emprego, a serviços de saúde e outros equipamentos sociais.

ADEQUAÇÃO CULTURAL De modo a permitir a expressão das identidades culturais.

Fonte: General Comment nº4 (1991) e MORAES (2006)

12

Fala de liderança comunitária em 27 de abril de 2012. 13

http://www.unhchr.ch/tbs/doc.nsf/0/469f4d91a9378221c12563ed0053547e <acessado em 25 de maio de 2012>

Tomando como referencia o conjunto de indicadores do General Comment nº4, sobre “a moradia

adequada”, com base nos resultados obtidos com três oficinas diagnósticas realizadas com

moradores do Parque Residencial Manaus e lideranças comunitárias dos Conjuntos Habitacionais

no bairro Nova Cidade se sinaliza no quadro 4, um comparativo entre os dois critérios de

indenização.

QUADRO 4

QUADRO COMPARATIVO DOS INDICADORES:

Moradores em casas populares na zona norte - SUHAB X

Moradores em apartamento em solo criado - PROSAMIM

INDICADORES

CONJUNTO NOVA CIDADE

PARQUE RESIDENCIAL

MANAUS

SEGURANÇA NOS DIREITOS DE PROPRIEDADE SIM SIM

DISPONIBILIDADE DE SERVIÇOS, EQUIPAMENTOS E INFRAESTRUTURA

E/P SIM

DISPONIBILIDADE A PREÇOS ACESSÍVEIS SIM SIM

HABITABILIDADE NÃO E/P

ACESSIBILIDADE NÃO SIM

LOCALIZAÇÃO NÃO SIM

ADEQUAÇÃO CULTURAL NÃO NÃO

Fonte: Observação estruturada e oficina diagnóstica realizada no Parque Residencial Manaus e Conjuntos Habitacionais, Nova Cidade – área 13 e 14; Cidadão V; João Paulo e Buriti no mês de abril de 2012.

E/P = em parte

De acordo como quadro acima, se infere que 80% dos indicadores do PIDESC, estão

contemplados no modelo habitacional do Parque Residencial Manaus. Ao indicador

“habitabilidade”, a resposta em parte, deve-se a problemas estruturais, como: a) fragilidade do

material do sistema de coleta das águas servidas gerar odor excessivo e risco de rompimento da

tubulação; b) falta de ventilação, devido o formato das janelas; c) incidência de rachaduras e

vazamentos; d) dependência do abastecimento d‘água gerado por uma caixa d’água coletiva; d)

perda da função social da moradia, com o uso indevido do comércio no espaço do habitar; e) falta

de internet, telefone fixo e entrega de correspondências nas moradias pelo serviço dos Correios.

Ao indicador “adequação cultural”, a resposta não se atribui a três fatores integrados: a) não

valorização de elementos que constituem o padrão construtivo característico da Amazônia, entre

os quais a palafita, para áreas ribeirinhas; b) inadequação do modelo habitacional às

características do clima amazônico. Manaus esta localizada a 3,08º de latitude sul, extremamente

próxima à Linha do Equador, apresenta um clima quente úmido com amplitude térmica de 20º a

40º C; c) desvalorização do recurso natural do igarapé como fonte para o conforto térmico, para

abastecimento local e como recurso para criação de alimento.

Em relação ao Conjunto Nova Cidade, apenas a segurança no direito a propriedade e

disponibilidade a preços acessíveis foram indicadores aprovados no que tange o principio da

moradia adequada. Quanto à “segurança nos direitos da propriedade”, sem dúvida este é um

indicador que sinaliza o pleno gozo da cidadania por meio do acesso a propriedade como abrigo e

recurso. E “disponibilidade a preços acessíveis”, no contexto deste artigo fundamentado na

análise do processo de intervenção do PROSAMIM no limite da Bacia Hidrográfica do Educandos,

os imóveis destinados a moradores, anteriormente, residentes em área de vulnerabilidade,

garante ao Estado, o mérito pelo cumprimento dos pressupostos da política urbana contidos na

Constituição Federal. Em que pese o comprometimento do mérito, visto para os moradores do

Igarapé do Quarenta e Cachoeirinha, esta alternativa de reassentamento estar associada à

contrapartida do Estado em relação ao contrato de empréstimo com o BID, para fins habitacionais,

urbanísticos e de recuperação do recurso hídrico.

Quanto ao indicador “disponibilidade de serviços, equipamentos e infraestrutura”, o conceito

em parte, deve-se a carência, do bairro, na oferta de hospitais, escolas, transporte coletivo,

equipamentos de lazer e cultura. Ao indicador “habitabilidade”, o não, diz respeito, sobretudo, ao

fato do reassentamento dos moradores ter se dado em área endêmica do vetor da malária, zona

de transição entre o urbano e o rural. Não para “acessibilidade”, se deve ao fato da: a)

inadequação do modelo habitacional para cidadãos com limitações; b) dificuldade de acesso à

escassa oferta de transporte coletivo; c) limitação dos itinerários dos ônibus. Atualmente o

Governo do Estado, com o projeto “Viver Melhor”, atua adaptando a moradia às necessidades da

pessoa com deficiência e, como cidade sede da Copa de 2014, para atender a demanda imposta

pela FIFA, constrói vias expressas de acesso e amplia a oferta em meios de transporte coletivo. O

conceito não ao indicador “localização” leva em conta os argumentos manifestados para os

indicadores anteriores, somados a distância média de 15 (quinze) quilômetros, em relação ao

local da moradia anterior. Mudança que ocasionou transtorno no cotidiano das pessoas, que

mantinham na dimensão do espaço pretérito relações sociais que rompidas, em alguns casos,

afetaram o emocional levando a frequentes episódios de depressão, muitas vezes resultando na

venda do imóvel com propósito de retorno ao centro da cidade. Ao indicador “adequação

cultural”, o não diz respeito aos modelos construtivos de casas populares que padronizados, não

valorizam a diversidade cultura, nem tão pouco leva em conta a diversidade do clima.

Inadequadas em relação aos paradigmas da sustentabilidade, não contribuem para que se elevem

os indicadores que, efetivamente, estão relacionados à qualidade de vida.

Com a proposta do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC, a SUHAB do Amazonas,

para atender a demanda por habitação popular produz por dia 32 apartamentos em áreas

destinadas ao Programa Minha Casa Minha Vida. Avanço em quantidade, que, sinalizam distância

com relação aos indicadores da “moradia adequada” de acordo com o Comentário Geral nº 4, do

Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.

Considerações

Ao concluir este artigo com respaldo na política e na legislação, em diferentes escalas, foi possível

constatar o quão complexo são os dilemas urbanos responsáveis pelo processo de produção do

espaço do cidadão. Compreendido, segundo o referencial adotado, como um espaço de inclusão

justa, com distribuição equitativa dos benefícios e valorização dos elementos identitários como

forma de garantir a sustentabilidade do território no qual se materializa.

Propor procedimentos e instrumentos que auxiliem o processo de consolidação dos planos,

programas e projetos, destinados ao planejamento urbano, requer mais do que o respaldo político

na legislação, a efetiva participação dos envolvidos. Não apenas como figurantes nas etapas do

processo, mas, como cidadãos que para atuarem em um planejamento participativo, necessitam

de um mínimo de capacitação, para agregar ao aguçado senso comum, a lógica da lei, da técnica

e do direito do cidadão, sobre as intervenções sobre a qual participará.

A proposta do Programa Social e Ambiental dos Igarapés de Manaus, de reassentar em solo

criado moradores antes residentes em áreas de vulnerabilidade a alagamentos, sinaliza uma

efetiva conquista do direito do cidadão, por meio do reassentamento em moradias dignas, com

infraestrutura e, quase todos, os serviços urbanos. Em que pese, para alguns aspectos, o padrão

construtivo, inadequado com relação às características culturais e ambientais da cidade de

Manaus.

Entretanto, se na área da poligonal da Bacia Hidrográfica do Educandos, quase tudo, sob a ótica

da política e da legislação, esta de acordo com os objetivos propostos pelo Governo do Estado

para o PROSAMIM. Em outras localidades da cidade, o adensamento populacional gerado, em

parte, pelos critérios de indenização do Programa, sinaliza um processo contraditório. Neste

sentido é preciso que a política habitacional avance, efetivamente, transformando ideias em ação

e não, apenas, articulando arranjos institucionais. Mudar o modelo contribuirá para além do direito

a moradia adequada, a construção de um espaço do cidadão, onde quer que esteja o indivíduo

assentado.

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Garamond. 2004.

SANTOS, Milton. O espaço do Cidadão. São Paulo. Ed. Nobel, 2000.

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e os problemas do mundo globalizado.São Paulo. Companhia das Letras, 2010.

GRAU, Eros Roberto. Direito Urbano. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1983.

MORAIS, Maria da Piedade; GUIA, George Alex; PAULA, Rubem. MONITORANDO O DIREITO À MORADIA NO BRASIL (1992-2004). Políticas Sociais. Acompanhamento e Análise. IPEA, 12 de fevereiro de 2006. p.230-241. http://www.ipea.gov.br/sites/000/2/publicacoes/bpsociais/bps_12/ensaio4_monitorando.pdf <acesso em 24 de junho de 2012>

ONU. CESCR 4. O direito à moradia adequada (artigo 11º (1)). Genebra, 1991.

http://www.unhchr.ch/tbs/doc.nsf/0/469f4d91a9378221c12563ed0053547e <acessado em 15 de

maio de 2012>

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Reinstalação de Atividades Econômicas das Áreas Requeridas para Implantação do PROSAMIM

– PDDR. Manaus. Fevereiro de 2005.

PLANO DE AÇÕES PARA REPOSIÇÃO DE MORADIA, REMANEJAMENTO E INCLUSÃO SOCIAL. PDR-40. Manaus. Agosto de 2004. BID. Reassentamento involuntário. Política operacional e documento de antecedentes. Washington, D.C.Outubro de 1998.

BANCO INTERAMERICANO DE DESENVOLVIMENTO

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AMAZONAS (Manaus) Lei Estadual no 671/2002

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BRASIL Decreto nº 591 de 06 de Julho de 1992

BRASIL. Lei no 10.257 de 10 de julho de 2001. Estatuto da Cidade