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DESIGN, CULTURA E SEMIÓTICA: EM DIREÇÃO A UM MODELO PARA ANÁLISE DE VARIÁVEIS SEMÂNTICO-CULTURAIS

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DESIGN, CULTURA E SEMIÓTICA: EM DIREÇÃO A UM MODELO PARA ANÁLISE

DE VARIÁVEIS SEMÂNTICO-CULTURAIS

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FELIPE DOMINGUES MACHADO MELO

DESIGN, CULTURA E SEMIÓTICA: EM DIREÇÃO A UM MODELO PARA ANÁLISE

DE VARIÁVEIS SEMÂNTICO-CULTURAIS

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Design da

Universidade do Estado de Minas Gerais como requisito para a obtenção do título

de Mestre em Design, na área de concentração em Design, Inovação e

Sustentabilidade.

Orientador(a):

Prof. Dijon De Moraes Junior, Ph.D.

Co-orientador(a):

Profª. Maria Regina Álvares Correia Dias, Drª

Belo Horizonte 2011

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AUTORIZO A REPRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO TOTAL OU PARCIAL DESTE

TRABALHO, POR QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRÔNICO, PARA

FINS DE ESTUDO E PESQUISA, DESDE QUE CITADA A FONTE.

M528d Domingues, Felipe Design, cultura e semiótica : em direção a um modelo para análise das variáveis semântico-culturais/ Felipe Domingues Machado Melo. - - Belo Horizonte, 2011. 124 f. (enc.) : il. p&b. tabs. ; 31 cm. Orientador: Dijon De Moraes Coorientadora: Maria Regina Álvares Correia Dias Dissertação ( Mestrado) – Universidade do Estado de Minas Gerais / Escola de Design / Mestrado em Design, 2011.

1. Desenho (Projeto) – Teses. 2. Desenho Industrial – Teses. 3. Semiótica – Aspectos culturais. I. Moraes, Dijon de. II. Dias, Maria Regina Alvares Correia. III. Universidade do Estado de Minas Gerais. IV. Título. CDU: 7.05:003

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Às minhas sobrinhas, gêmeas, que iniciam sua jornada semântica.

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AGRADECIMENTOS

Aos meus pais, pelo exemplo de pessoas humanas que são.

Ao meu pai que, com sua simplicidade, é o meu norte ético e criativo.

À minha mãe, pelas inúmeras conversas, suporte e posição ética e firme, meu sul.

À Marina Ulhôa Carvalho, mais uma vez, pela paciência, postura e dedicação incondicional.

Ao Professor Dijon De Moraes, por me receber, apostar em mim e no meu projeto de pesquisa e, acima de tudo, pela postura e orientações.

Ao Antônio Jorge Pietruza pelas conversas, incentivo e carinho.

Ao Professor Antônio Artur de Souza e à Mariana Guerra pela generosidade, pelos exemplos de disponibilidade e de compartilhamento do conhecimento.

Ao Professor José Edson Lara pela imagem sempre presente.

À tia Lila pelas conversas, apoio, incentivo e por não deixar que a luz se apague.

Aos tios e padrinhos Paulo e Ilza pelas conversas e dizeres sábios, do início ao fim destes últimos dois anos e meio.

Ao Sérgio Luciano da Silva por passar a existir, pelas reflexões e por sempre me fazer acreditar que ainda há esperança.

Ao Pedro Campos pela postura e pelas perspectivas de trabalho conjunto que se abrem.

Ao Professor Uajará Pessoa Araújo pelas instruções e reflexões.

À Professora Rita Aparecida da Conceição Ribeiro pela postura e receptividade.

Ao Professor Sérgio Antônio Silva pela referência de simplicidade e humildade docente.

Às Professoras Lia Krucken e Maria Regina Álvares Correia Dias pelos apontamentos.

À Professora Sebastiana Luiza Bragança Lana pelo apoio.

Ao Professor Itiro Iida pela postura, serenidade e carinho.

Ao Rodrigo Stenner e à Maryvana Monteiro pela disponibilidade incondicional.

À Nadja Mourão pela postura e exemplo de pessoa.

Aos colegas da primeira turma de mestrado do PPGD/ED/UEMG pelo sincretismo.

Aos pesquisados que fizeram parte desta primeira amostra sem os quais e sem sua colaboração voluntária este estudo piloto não seria possível.

Aos membros das duas bancas de seleção deste mestrado por aprovarem meu projeto.

À Valquíria Moraes e à Francislene Pereira pela atenção, presteza e carinho.

À Escola de Design pela oportunidade de realização do curso de mestrado.

À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais e à Whirlpool Latin America pelo incentivo à pesquisa, pela concessão da bolsa de pesquisador e apoio financeiro para a realização desta fase da investigação.

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In another moment down went Alice, deeper and again, after it [the rabbit],

never once considering how in the world she was to get out again.

–– Lewis Carroll

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RESUMO

DOMINGUES, Felipe. Design, Cultura e Semiótica: em direção a um modelo para análise de aspectos semântico-culturais, 2011. 124 p. Dissertação (Mestrado em Design) – Universidade do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG.* Presente em diversos aspectos da vida dos seres humanos, o design, através da sua manifestação em objetos, contribui para que os indivíduos se definam como grupos sociais, comuniquem-se e experimentem a realidade. Por conseguinte, as relações estabelecidas entre indivíduos e objetos vão além de questões econômicas e materiais, podendo ser entendidas como fenômenos sociais complexos, nos quais os aspectos intangíveis ganham relevância. Nesse contexto, faz-se necessário o melhor entendimento das possibilidades de associação entre aspectos físicos e culturais simbólicos e sua inserção em processos de desenvolvimento e de adaptação de produtos destinados ao mercado global. Baseada nessa premissa, esta pesquisa piloto buscou, empiricamente, avançar no que tange à verificação da adequação metodológica e desenvolvimento de um modelo para a análise de dados relacionados a aspectos semântico-culturais. Assim, lançou-se mão de técnicas etnográficas de pesquisa – observações participante e não participante, registros fotográficos e entrevistas em profundidade – e do programa de computador Pajek como instrumento de suporte à interpretação das informações coletadas. Como resultado deste processo investigativo, foram extraídos três pontos principais pertinentes para o desenvolvimento da pesquisa definitiva. Primeiro, pôde-se avaliar a adequação das técnicas de amostragem e de coleta e análise dos dados, o que permitirá refinar os procedimentos metodológicos para que sejam utilizados, posteriormente, na pesquisa de campo definitiva. Segundo, foi possível inferir sobre a possibilidade de apresentação de um modelo para análise de aspectos semântico-culturais. Terceiro, confirmou-se que a tentativa de associação de métodos de investigação etnográfica a processos de configuração de produtos destinados ao mercado internacional é válida. Tal afirmação faz-se pertinente, uma vez que a introdução de um modelo para análise e discussão de tal questão chama a atenção para a necessidade de verticalização de estudos, tanto em temas associados aos aspectos culturais simbólicos quanto aos existentes na relação estabelecida entre usuários e produtos globais. Palavras-chave: Design. Semiótica. Cultura. Etnografia. Produtos Globais. Linha Branca.

* Comitê orientador: Prof. Dijon De Moraes, Dr. (UEMG) e Profa. Regina Álvares Dias, Dr. (UEMG)

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ABSTRACT

DOMINGUES, Felipe. Design, Culture and Semiotics: towards a model to analyze semantic-cultural features. 2011. 124 p. MA Thesis – Universidade do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG. Inherent to several aspects of peoples’ lives, the design and its manifestation through objects support individuals to define themselves as social groups, communicate with each other and experience reality. This means that individuals’ relationships with objects correspond not only to economic and material phenomena, but also and most importantly to complex social phenomena featuring intangible issues. Nevertheless, little is known about the possibilities of associating physical and symbolic cultural features and applying this knowledge to product development and global market-oriented adaptation processes. Building on ethnographic research techniques (i.e. participant and non-participant observation, photographic records, and in-depth interviews) and using the computer software Pajek as a support tool for information interpretation, this pilot research aims to empirically investigate methodological adaptation avenues and develop a model for semantic-cultural data analyses. The results point to three complementary perspectives for the future investigation. First, assessing the adequacy of sampling, data collection and data analysis techniques will ultimately refine the methodological procedures to be applied to the final field research. Second, the investigation proved the possibility of introducing a model to analyze semantic-cultural features. Third, this preliminary research proved the reliability of adopting ethnographic techniques to develop processes aiming to design products for the international market. This last result is important, as the introduction of such a model calls for further studies, both those focusing on themes associated to symbolic cultural features and those concerned with the relationships between users and global products. Keywords: Design. Semiotics. Culture. Ethnography. Global Products. Household Appliances.

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LISTA DE FIGURAS

Página

FIGURA 1. Modelo das articulações dos significados funcionais e simbólicos 22 

FIGURA 2. Capacidade de migração: novas atividades de design 35 

FIGURA 3. Capacidades sustentáveis do design e a incerteza ambiental 42 

FIGURA 4. Inter-relação entre categorias de valor, fatores culturais e propriedades de

produtos 44 

FIGURA 5. Definição gráfica de signo 72 

FIGURA 6. Triângulo semiótico de Peirce 73 

FIGURA 7. Cadeia semiológica do mito 79 

FIGURA 8. Dupla articulação do sistema semiológico no mito 80 

FIGURA 9. Definição gráfica da articulação mítica 80 

FIGURA 10. Triângulo de Ogden & Richards 86 

FIGURA 11. Rede de contatos gerados a partir da técnica Bola de Neve 91 

FIGURA 12. Exemplos de registros fotográficos gerados durante a coleta de dados 96 

FIGURA 13. Cruzamento das categorias preliminares 105 

FIGURA 14. Cruzamento das categorias semântico funcionais 106 

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LISTA DE QUADROS

Página

QUADRO 1 – Ampliação das atividades associadas ao design 34 

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LISTA DE TABELAS

Página

Tabela 1 – Falas dos pesquisados e possíveis categorias preliminares de análise 94 

Tabela 2 – Falas dos pesquisados e possíveis categorias preliminares de análise 95 

Tabela 3 – Listagem filtrada correspondente às interferências na parte superior 96 

Tabela 4 – Listagem filtrada correspondente às interferências na parte frontal 97 

Tabela 5 – Listagem filtrada correspondente às interferências nas partes laterais 97 

Tabela 6 – Microcategorias referentes aos itens imantados aderidos à parte frontal 98 

Tabela 7 – Microcategorias referentes aos itens imantados aderidos à parte lateral 98 

Tabela 8 – Categorias preliminares de análise geradas a partir da Coleta de Dados 1 98 

Tabela 9 – Dados gerais referentes à amostra pesquisada 99 

Tabela 10 – Dados gerais referentes à amostra pesquisada 100 

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LISTA DE ABREVIATURAS

Cf. Confrontar, referir-se a, ver também.

s.d. Sem data

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 14

1.1 Preâmbulo 14 1.2 Questões preliminares 18

1.2.1 Design, produtos globais e competitividade 18 1.2.2 Objetos de uso e semiótica 20

1.3 Objetivos 24 1.3.1 Objetivo Geral 24 1.3.2 Objetivos Específicos 24

1.4 Metodologia 25

2 REVISÃO DA LITERATURA 30

2.1 DESIGN 30 2.1.1 Design e sua evolução conceitual 30 2.1.2 Design e processo de desenvolvimento de novos produtos 32 2.1.3 Design e produtos globais 37 2.1.4 Design orientado para ao usuário 40 2.1.5 Mercado internacional e design sustentável 41 2.1.6 Modelos culturais e produtos globais 45

2.2 CULTURA 48 2.2.1 Origem do conceito cultura 48 2.2.2 O conceito de homem e sua relação com a cultura 49 2.2.3 Concepções do termo cultura 50 2.2.4 Abordagens culturais 55 2.2.5 Cultura e visão de mundo 56 2.2.6 Affordances, cultura material e identidade 58 2.2.7 Manifestação cultural simbólica através do Mito 60 2.2.8 Caracterização das formas simbólicas e sua valorização em objetos de uso 62 2.2.9 Análise cultural 66

2.3 SEMIÓTICA 69 2.3.1 O termo semiótica 69 2.3.2 A conceituação lógica do signo 71 2.3.3 Semiótica e objetos de uso 74 2.3.4 Denotação e conotação 76 2.3.5 Mito e semiologia: articulações simbólicas 77 2.3.6 Signos e objetos de uso 82 2.3.7 Análise semiótica 87

3 ESTUDO EXPERIMENTAL 89

3.1 Pesquisa de campo 89 3.2 Acesso à amostra 89 3.3 Coleta e análise de dados 1: observações e registros fotográficos 92 3.4 Categorias preliminares de análise 94 3.5 Coleta e análise de dados 2: entrevistas em profundidade 99 3.6 Pajek: processamento e análise dos dados 104

4 RESULTADOS E CONCLUSÕES 108

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS 112

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1 INTRODUÇÃO

1.1 Preâmbulo

Esta pesquisa1 fez parte de uma investigação maior e tem por objetivo principal verificar a

adequação, eficiência e eficácia metodológica do projeto ora proposto e gerar inferências

preliminares relacionadas ao modelo para análise em desenvolvimento. Especificamente,

buscou verificar: a adequação das técnicas e procedimentos destinados à coleta de dados, a

eficácia e a eficiência da forma de acesso à amostra definida para a pesquisa, a eficácia do

programa de computador Pajek quanto à sua capacidade de apoiar esta investigação no que

tange à geração de categorias de análise relevantes e, por último, analisar os dados

pesquisados com objetivo de gerar inferências preliminares pertinentes à investigação.

Com sentido de não só avançar em questões relacionadas ao desenvolvimento e

posicionamento de produtos destinados ao mercado global, mas também nos progressos atuais

pertinentes ao assunto, este estudo avança e busca o estabelecimento empírico da relação

entre design, cultura, semiótica e produtos globais com vistas a proporcionar sua

aplicabilidade no setor produtivo. Isto é, está focado tanto em encontrar formas de acesso a

informações relacionadas aos aspectos culturais simbólicos quanto ao modo de sua

transferência aos sistemas de configuração de produtos destinados ao mercado global.

Na tentativa de responder a esta questão direcionadora, além da pesquisa de campo2,

será realizado o levantamento da literatura relevante sobre design, cultura, semiótica e

produtos globais. Isto é, às contribuições obtidas anteriormente por Domingues (2008) a partir

principalmente do escrutínio das obras de Charles Sanders Pierce, Cliffort Geertz, Roland

Barthes e Umberto Eco – as quais, através de uma perspectiva lógico-dedutiva,

proporcionaram a fundamentação e o estabelecimento da inter-relação entre os temas design,

1 Este estudo conta com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG)

em parceria com a Whirlpool Latin America – Processo número TEC-APQ-00997-10. Além disso, é considerado como a segunda etapa (pesquisa aplicada) de dissertação de mestrado desenvolvida e defendida junto ao Programa de Pós-Graduação em Administração do Departamento de Administração e Economia (PPGA/DAE) da Universidade Federal de Lavras (UFLA) no ano de 2008. DOMINGUES, Felipe. Design e cultura em produtos globais: a semiótica como ponto de convergência. 2008. 150 p. Dissertação (Mestrado em Administração) – Universidade Federal de Lavras, Lavras, MG.

2 Cf. Seção1.4.

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cultura, semiótica e produtos globais naquele estudo –, serão somados os avanços científicos

recentes relacionados aos temas ora propostos.

A pesquisa prévia da literatura sobre design, cultura, semiótica e produtos globais

possibilitou que fossem identificadas as relações entre os aspectos culturais simbólicos e a

configuração de produtos.

No que tange ao design, sua relevância para o posicionamento de produtos globais é

reconhecida, porém negligenciada tanto pela disciplina da administração quanto no próprio

campo de estudos do design (SIEGAL, 1982; RONKAINEM, 1983; KOTLER; RATH, 1984;

VERYZER; BORJA DE MOZOTA, 2005; BOZTEPE, 2007). Para a primeira, o design é tido

como um subitem do mix de marketing e, no caso do segundo, grande parte das publicações se

volta a questões relacionadas à configuração de objetos, isto é, a aspectos relacionados à

ergonomia, à forma e à usabilidade e, como afirmado por Günter & Triska (2011), o design

enquanto disciplina acadêmica tende a firmar-se área de conhecimento científico. Os estudos

relacionados a aspectos culturais são considerados pela própria literatura formal como

superficiais, fazendo com que profissionais de design realizem seus projetos de forma

emergencial, superficial e intuitiva, o que se torna arriscado quando levados em consideração

os substanciais investimentos e esforços para a inserção de produtos em ambientes

internacionais.

Com base nos postulados acerca da cultura, sendo o ser humano carente de orientação

simbólica, isto é, dependente de códigos que lhe possibilitem existir como indivíduo inserido

em sociedades estruturadas, faz-se desejável a atribuição ou materialização de formas

simbólicas para que os objetos tenham fruição. Ora, se o indivíduo necessita de referenciais

locais para sua própria orientação e é inerente ao ser humano afastar-se ante o desconhecido,

então torna-se relevante a busca de aspectos culturais específicos, sobretudo indicadores de

formas simbólicas que façam parte do nexus social e que possibilitem a indicação e

referenciação de códigos existentes no próprio contexto do indivíduo (DOMINGUES, 2008).

Portanto, pode-se afirmar que as formas simbólicas que permeiam o mundo dos códigos

existentes em universos culturais distintos não devem ser analisadas a partir de metodologias

de cunho positivista, as quais dificilmente conseguem detectar padrões culturais que orientam,

referenciam e conduzem o comportamento dos indivíduos através das crenças, dos rituais e

dos mitos, por exemplo. Aqui, vale inclusive destacar o papel do mito, como descrito por

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Barthes (1999), como veículo de institucionalização de formas simbólicas, transformando em

natural o não natural concebido pelo próprio homem e traduzido em signos e significações.

Diante disso, pode haver convergência entre as formas como os indivíduos experimentam e

entendem os objetos nas etapas de geração de signos e de significações, isso quando

considerados indivíduos pertencentes a diferentes contextos culturais; isto é, a consonância

pode ocorrer em partes específicas do processo de conceituação mental. Tal suposição, se

verificada empiricamente, pode contribuir para o processo de configuração de produtos

globais, vez que pode facilitar o alinhamento e reduzir ou até mesmo eliminar a necessidade

de adaptações em determinados produtos.

Desde o ponto de vista da semiótica, em Domingues (2008), foram especificados os

pontos-chave para o entendimento do processo de concepção dos signos e sua importância

para os indivíduos em seus próprios ambientes culturais. Em outras palavras, foram

identificados os subprocessos da criação dos signos, a qual ocorre de forma inconsciente na

mente do indivíduo quando este experimenta os objetos de uso em contextos específicos.

Decorrentes de tais subprocessos, as múltiplas articulações dos significantes, dos significados

e dos próprios signos e das significações3, demonstram como tais processos podem ocorrer,

internamente, na mente do indivíduo.

Quanto aos produtos globais, especificamente com relação à sua configuração, a

literatura descreve duas correntes que foram e são, aqui, entendidas como antagônicas e

complementares: padronização e adaptação. No primeiro caso, tem-se a estandardização de

produtos, em que os ganhos se dão na produção em escala, mas com perdas em diferenciação.

O segundo caso provê melhores níveis de diferenciação e maiores chances de se alcançarem

os desejos e interesses dos usuários, o que, consequentemente, eleva os fatores de

competitividade e beneficiam tanto os usuários quanto o próprio mercado. Adaptação e

padronização podem ser entendidas como complementares na medida em que, atualmente, os

avanços tecnológicos, como os descritos por Swan, Kotabe e Allred (2005), permitem rápidas

alterações em produtos para o seu melhor posicionamento, maior eficiência e rápida resposta

ao mercado, não desconsiderando a produção em escala. No entanto, cabe sublinhar que a

diferenciação não mais se alicerça nas características físicas dos produtos, e sim também na

3 Figura 1. Seção 1.2.2.

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capacidade de transferência, geralmente através do processo de design, de aspectos culturais

intangíveis, ou em outros termos simbólicos, aos objetos de uso. Colocação esta reforçada por

De Moraes (1999, p. 56): “o design se aproxima mais neste final de século das ciências

sociais, da sociologia, da antropologia e da filosofia em busca de antecipar as necessidades

reais dos usuários do futuro”.

Não obstante, como já apontado, são raros os estudos que realmente se aprofundem em

questões culturais (i.e., aspectos culturais simbólicos) para os processos de adaptação de

produtos globais (SIEGAL, 1982; RONKAINEM, 1983; KOTLER; RATH, 1984;

VERYZER; BORJA DE MOZOTA, 2005; BOZTEPE, 2007). O que constitui, de fato, uma

lacuna nos estudos relacionados ao tema. Quando encontrados, apresentam a simples

comparação entre culturas, limitam-se a generalidades, esquivam-se de aspectos específicos

locais ou apenas enaltecem a importância da relação entre design e cultura evitando, assim, a

real aproximação com o principal objeto a ser estudado (i.e., o indivíduo em seu próprio

contexto), vez que é o indivíduo quem experimenta, em sentido antropológico, os objetos. É

provável que tal fato possa ser explicado pelo elevado nível de complexidade e/ou pelos altos

custos de pesquisas em âmbito internacional (MALHOTRA, 2006). Contudo, pode-se afirmar

que, no presente, com o advento dos avanços tecnológicos no âmbito da comunicação, torna-

se possível a criação de uma rede internacional para a realização de pesquisas direcionadas à

investigação de aspectos culturais locais que apoiem os estudos para a configuração de

produtos globais.

Ante o exposto, verifica-se que, a despeito da relevância do tema desta investigação

(design como determinante estratégico), aspectos de design (i.e., design como meio para a

incorporação de aspectos culturais simbólicos) têm sido negligenciados pela literatura tanto

das ciências administrativas quanto do próprio design. Dado que a realidade apresenta

nuanças pouco conhecidas de pesquisadores acadêmicos, especialmente no que se refere ao

posicionamento de produtos globais, este estudo envida esforços na análise de aspectos

culturais simbólicos relacionados a produtos (ou, em outros termos, objetos de uso). Vale

ressaltar que, ao ser considerado o design como um modo, ou processo, para a materialização

de aspectos simbólicos em objetos de uso, nesta etapa da pesquisa (verificação metodológica),

é defendida a tese de que a associação entre semiótica e pesquisa etnográfica – através das

quais se acredita residirem as formas ideais para o entendimento da relação semântica entre

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indivíduos e objetos de uso – é não apenas possível alcançar um melhor entendimento dos

processos de produção cultural simbólica (signos e significações), mas também tornar factível

a aplicação desse entendimento a produtos já integrados a processos produtivos que visam,

principalmente, o ambiente internacional.

Dito isso, espera-se que esta investigação contribua no sentido de dar sequência e

suporte a estudos avançados, tanto teóricos quanto empíricos, sobre as inter-relações entre os

aspectos culturais simbólicos e a configuração de produtos globais. Dessa forma, o

desenvolvimento de metodologias para coleta, comparação e análise de dados que ampliem e

complementem as informações acerca da relação entre design, aspectos culturais simbólicos e

produtos globais se fazem relevantes e justificáveis.

1.2 Questões preliminares

1.2.1 Design, produtos globais e competitividade

O acelerado ritmo de atualização e o surgimento de novas formas de uso de tecnologias,

especialmente nos campos da comunicação e do transporte, têm eliminado as barreiras e os

obstáculos à expansão de mercados. Assim, indústrias, consumidores e usuários vêm

ampliando seus horizontes para uma perspectiva global em que produtos e serviços, ainda que

não tenham sido concebidos com tal finalidade, passem a ter como ambiente de negócios todo

o planeta. Nessas circunstâncias, a volatilidade e a concorrência entre marcas e produtos têm

aumentado de forma expressiva e vêm impelindo empresas a realizarem adaptações em seus

produtos, com o objetivo de sobreviverem e permanecerem competitivas em mercados cada

vez mais integrados. Nesse contexto, o design tem sido considerado um dos principais

determinantes para a diferenciação e para o posicionamento estratégico de produtos em

ambientes internacionais.

Embora estudos se atenham especificamente aos atributos físicos do design, à sua

funcionalidade e à sua capacidade de reduzir custos, pesquisas apontam os aspectos

intangíveis do processo de design como uma questão imprescindível para a competitividade,

especialmente em um momento como o atual, onde indústrias têm de encontrar novas formas

para diferenciarem seus produtos (TRUEMAN; JOBBER, 1998; MYNOTT, 2001; WHITE et

al., 2003; BOZTEPE, 2007). Apesar de diversas empresas de fato obterem vantagens

competitivas através do investimento na capacidade de produção em escala

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(independentemente dos gostos, preferências e interesses de seus clientes), é importante

ressaltar que os usuários, ante a grande variedade de produtos, serviços e processos,

constantemente demandam novas opções de consumo e apontam, também, para práticas de

consumo mais conscientes e sustentáveis.

Tem-se, de um lado, que a redução de custos de produção nem sempre constitui a

forma mais eficiente para a obtenção de vantagens competitivas e, de outro, que o design

contribui para a sustentabilidade das vantagens competitivas (WHITE et al., 2003). Nesses

casos, a adaptabilidade e a força de penetração dependem de fatores ambientais, econômicos,

estruturais, legais, tecnológicos, sociais e culturais. Especificamente sobre os aspectos

culturais, Hwang (2004) e Boztepe (2007) apontam que a análise e a aplicação de traços

culturais podem, através do design, ser determinantes para a competitividade quando produtos

são lançados em mercados internacionais4.

O design, concebido como uma nova forma de se vislumbrarem experiências

(CNI, 1996), é tido como um dos principais instrumentos para a inovação e a geração de

conceitos determinantes para o sucesso de produtos globais, como aponta a Confederação

Nacional da Indústria. Além disso, segundo a mesma entidade, design, em outras palavras,

pode ser considerado um instrumento de inovação e de aumento da capacidade competitiva

nos negócios, gerando associações capazes de facilitar e melhorar o posicionamento das

atividades relacionadas às práticas mercadológicas.

É sabido que características básicas como segurança, durabilidade e qualidade podem

ser entendidas como commodities e, portanto, não constituem fatores de diferenciação. Nesse

contexto, o design passa a ser considerado uma etapa fundamental para a certificação de que o

produto a ser disponibilizado ao usuário é aquilo que ele de fato deseja

(ENGELBREKTSSON; SÖDERMAN, 2004). Tal necessidade de foco no usuário se

confirma nos estudos de White et al. (2003) e Boztepe (2007), segundo os quais o aumento da

competitividade e a abundância de produtos contribuem para que os usuários sejam mais

seletivos, imponham elevados níveis de exigência, escolham e se relacionem com os objetos

de acordo com seus desejos, necessidades e interesses.

4 Vale ressaltar que, neste estudo, será atribuída especial atenção aos fatores referentes aos aspectos culturais simbólicos

(especificamente, a como tais características podem, sobretudo na etapa do design, interferir nos processos de desenvolvimento de produtos globais).

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1.2.2 Objetos de uso e semiótica

A semiótica pode ser entendida como uma ferramenta importante para o entendimento de

questões como a visibilidade, a criação de metáforas e a geração de identidades em artefatos

(ou, em outros termos, objetos de uso), especialmente no que tange à relação entre a forma

física e o significado. Segundo Hjelm (2002), de acordo com a corrente teórica modernista do

design, a utilização da semiótica em design visa possibilitar a melhor compreensão de como

um produto deve ser entendido e utilizado, isto é, como um produto deve comunicar

corretamente a sua função e o modo adequado para sua utilização. No entanto, o próprio

termo produto se mostra em mutação, ou seja, o objeto em si não mais pode ser isolado do

conceito que está em torno dele mesmo, dependendo este das configurações determinadas

pelo designer (BÜRDEK, 2006).

Como aponta Chandler (2007), estudos contemporâneos que envolvem semiótica têm-

se movido para longe da classificação dos sistemas de signos e vêm investigando como os

significados são criados, considerando não apenas os aspectos comunicacionais, mas também

como a própria realidade é mantida e criada. Dessa forma, estudos que lançam mão da

semiótica como lente epistemológica podem fundamentar o entendimento da realidade como

ambiente construído e dos próprios papéis dos seres humanos como criadores da realidade.

As investigações ligadas à semiótica não tem como objeto principal apenas os signos

que estão relacionados a alguma coisa na vida diária dos indivíduos, elas abordam,

concomitantemente, a cultura material dos indivíduos, o que inclui edifícios, móveis e objetos

de uso (HJELM, 2002). Usualmente, o objeto de análise da semiótica é o texto, que, por sua

vez, se refere a uma mensagem gravada, a qual independe (ao menos a princípio) do seu

receptor e é constituída por uma montagem de signos (i.e., imagens, livros, sons, gestos e

objetos), que são os elementos centrais para os estudos em semiótica e são construídos e

interpretados pelos indivíduos com base em convenções pré-estabelecidas (HJELM, 2002;

ECO, 2004, 2005a, 2005c; BARTHES, 2006; CHANDLER, 2007). Ora, se os signos são o

objeto central para os estudos em semiótica, os artefatos podem ser assumidos como

significantes da cadeia semiológica como descrito por Hjelm (2002), então os processos de

configuração de produtos podem ser entendidos como a operação de atribuição de possíveis

significados e sentidos a objetos de uso com vistas a transferir aos mesmos determinados

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códigos estabelecidos culturalmente; ou seja, trata-se da configuração de objetos que denotam

tanto funções primeiras quanto segundas predeterminadas e que, outrossim, permitam a

possibilidade de atribuição de novas funções em ambos os níveis (DOMINGUES, 2008).

Ainda que Eco (2005a) tenha afirmado que ao profissional de design cabe a manipulação de

funções primeiras variáveis e funções segundas abertas, acredita-se que de acordo com

Domingues (2008), no âmbito desta pesquisa, também seja possível – para além do que

postula Eco (2005a) – a atribuição de funções segundas igualmente variáveis. Tal afirmação

tem base nas evidências empíricas apresentadas por Boztepe (2007), segundo as quais é

possível, por meio de pesquisa etnográfica, a criação de modelos de investigação e de análise

de categorias culturais que apoiem o desenvolvimento de produtos globais.

Desde as primeiras fases da concepção de produtos, são atribuídas aos mesmos

informações simbólicas que permitem o seu entendimento e a aferição de valores, o que, por

sua vez, geram sistemas complexos de significação. Considerando que o ser humano

dependente de sistemas de significação para existir enquanto ser humano e experimentar o

mundo, pode-se afirmar que o ato de conferir aos objetos possibilidades para o seu próprio

entendimento em contextos específicos é algo essencial (DOMINGUES, 2008). Embora o

indivíduo exista em determinado macroambiente cultural, os ruídos na decodificação dos

signos relacionados aos artefatos ocorrem em nível micro, isto é, na relação entre indivíduo e

objeto e, mesmo que determinadas atribuições de significado ocorram em nível macro, como

no caso das valorizações simbólicas com características míticas de articulação, é o indivíduo,

como intérprete, quem designa os signos e as significações aos objetos de uso. Assim, tanto

nas articulações semióticas do primeiro nível quanto nas do segundo, é na relação estrita entre

o indivíduo e o objeto (nível micro) onde se dão as articulações entre signos e significações.

Entende-se por articulação semiótica os desdobramentos informacionais oriundos da interação

entre indivíduo e objeto. A FIGURA 1 ilustra as articulações entre os signos (fx) e as

significações (fsx) em objetos de uso.

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FIGURA 1. Modelo das articulações dos significados funcionais e simbólicos Fonte: Domingues (2008)

As atribuições de sentido e significado dependem da existência de um intérprete, isto é,

de um indivíduo que transforme o objeto em um veículo para a geração de signos. É por essa

razão que, no vértice esquerdo da primeira articulação, ou linguagem-objeto, na qual se

apresenta o objeto de uso (significante) que, enquanto significante, o mesmo ainda não tem

representatividade, ao representar algo, atribui-se um significado ao objeto. Segundo a teoria

semiótica, somente no terceiro momento (signo), resultante dos dois primeiros, é atribuído ao

objeto de uso o signo da primeira articulação, a qual, no caso dos objetos de uso, concretiza-se

em uma função5: fn.

Na primeira articulação (linguagem-objeto) são denotadas as formas de uso do produto

e conotadas suas possíveis funções – f1, f2, f3, fn –, as quais são preconcebidas e reconhecidas

pelos indivíduos. Na segunda articulação (metalinguagem) são retraídos os primeiros signos

atribuídos ao produto, e é dado lugar à forma simbólica, definida aqui como mítica. Em outros

termos, as formas simbólicas das quais os indivíduos se apropriam naturalmente, ainda que

construídas socialmente, permitem a atribuição de novas significações aos objetos. Assim,

5 Vale ressaltar que o termo função, aqui, não remete ao sentido matemático, mas sim como aspectos

funcionais (i.e., função estética e simbólica) dos objetos de uso.

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como na articulação mítica (metalinguagem) de Barthes (1999), são conferidas aos objetos

outras funções – fs1, fs2, fsn – que correspondem a valores simbólicos institucionalizados, ou

seja, valores criados pelas próprias sociedades e aceitos pelos indivíduos como naturais.

Dessa forma, as funções primeiras dão, na meta-articulação, lugar às valorizações ou

representações sociais simbólicas, isto é, ao objeto são atribuídos valores de significação

social, e não valores funcionais, no estrito sentido da palavra. Desse modo, no nível

simbólico, o significante, signo da primeira articulação, converte-se em forma, a qual é, pela

própria característica da fala mítica, retraída, esmaecida, permitindo a atribuição de novas

conotações ao objeto.

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1.3 Objetivos

1.3.1 Objetivo Geral

Desenvolver um modelo preliminar para análise e avaliação semântica de objetos em

seus contextos culturais de uso, com o propósito de apoiar o desenvolvimento, a

adaptação ou o posicionamento de produtos globais; e realizar um estudo piloto para

testar e avaliar o modelo preliminar em desenvolvimento.

1.3.2 Objetivos Específicos

1. Verificar a eficácia e a eficiência da seleção e forma de acesso à amostra definida

para a pesquisa.

2. Verificar a adequação das técnicas e procedimentos destinados à coleta de dados.

3. Verificar a eficácia do programa de computador Pajek quanto à sua capacidade de

apoiar a pesquisa no que tange à geração de categorias de análise relevantes.

4. Analisar os dados pesquisados e gerar inferências preliminares pertinentes à

investigação.

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1.4 Metodologia

Para alcançar os objetivos deste trabalho, foi realizada uma pesquisa exploratória que buscou,

à luz da semiótica, mesclar a prática do design à análise sistemática de aspectos culturais

simbólicos referentes à imagem e à forma de produtos da linha branca6, neste caso, da

categoria refrigeradores. É importante sublinhar que, esta pesquisa é parte integrante de uma

pesquisa maior7 e se refere, principalmente, às etapas de revisão de literatura e de realização

do pré-teste da investigação para análise e adequação metodológica. Não obstante, percorreu

as mesmas etapas e o rigor do método científico para estudos em ciências sociais (CERVO;

BERVIAN, 2002), isto é, analisou variáveis, observou fatos e leis estabelecidas e examinou

conhecimentos prévios obtidos (MEDEIROS, 1991). Por pré-teste, pesquisa piloto, entende-se

o processo de averiguação da validade dos procedimentos de pesquisa vez elaborados. Dessa

forma, o teste-preliminar constitui na apuração dos instrumentos de pesquisa sobre uma

amostra reduzida da população a ser pesquisada, isso com o objetivo de verificar as reais

condições dos instrumentos ora propostos apresentarem resultados com o mínimo possível de

erros (MARCONI; LAKATOS, 2003).

Segundo Malhotra (2006), uma pesquisa exploratória busca maior aproximação com o

tema, o levantamento e análise de variáveis e a verificação das possíveis relações entre

mesmas. Com base no mesmo autor, o presente estudo pode ser caracterizado, ainda, como

uma pesquisa qualitativa, o que permite seu desenvolvimento através de uma abordagem

metodológica de cunho, além de exploratório, não-estruturado. Em tal abordagem

metodológica, as amostras podem ser reduzidas e não-estatísticas e, ainda assim, permitem o

alcance de percepções e a compreensão qualitativa das razões e motivações subjacentes ao

contexto do objeto. Além disso, pesquisas qualitativas favorecem o entendimento de questões

importantes relacionadas ao objeto estudado e revelam áreas de consenso tanto positiva

quanto negativamente a partir das respostas obtidas. As investigações qualitativas, por sua

flexibilidade e diversidade, não aceitam as regras exatas aplicáveis a um grande número de

6 Por linha branca entende-se a categoria de bens de consumo composta por produtos como refrigeradores,

freezers verticais e horizontais, condicionadores de ar, lavadoras de louças, lavadoras de roupas, secadoras, fornos de micro-ondas e fogões. Como características principais dessa categoria de produtos, podem ser citadas a elevada demanda reprimida, a forte influência da expansão do nível de renda e de políticas governamentais e concentração da oferta em poucos fabricantes (BNDES, s.d.).

7 Projeto de pesquisa FAPEMIG / Whirlpool Latin America: processo número TEC-APQ-00997-10.

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casos, o que não as isenta do rigor científico. Essas pesquisas diferem quanto ao grau de

estruturação prévia, ou seja, quanto aos aspectos que podem ser definidos já no projeto

(ALVES-MAZZOTTI; GEWANDSZNAJDER, 2001). Segundo os mesmos autores, uma

característica que marca as pesquisas qualitativas é a presença da multimetodologia, isto é, a

utilização de uma grande variedade de procedimentos e instrumentos de coleta de dados.

Nesse sentido, é possível considerar que, dentre outras técnicas para coleta de dados, a

observação direta não-participante e a entrevista em profundidade são as mais utilizadas, mas

podem ser complementadas por outras técnicas provenientes de diversas áreas do

conhecimento. Este tipo de pesquisa apresenta foco na interpretação, enfatiza a subjetividade,

é flexível no modo de condução de seus processos e dá especial atenção ao contexto do objeto

em estudo (CASSELL; SYMON, 1994).

Dito isso, como instrumentos para coleta de dados, recorreu-se a métodos da pesquisa

etnográfica como a observação direta não-participante e participante, os registros fotográficos

e as entrevistas em profundidade, nessa ordem. Tanto as observações diretas não-participante

e participante quanto os registros fotográficos se justificam pelo fato de possibilitarem a

retenção de comportamentos não verbalizados ou verbalizáveis e de imagens que podem

fornecer subsídios para que o pesquisador possa gerar questões pertinentes aos objetivos

propostos para esta pesquisa (ver item 1.3). Quanto às entrevistas em profundidade, elas têm a

finalidade de aprofundar, confirmar e proporcionar o aumento do nível de detalhe nas

possíveis inferências a serem realizadas com base nos dados da pesquisa.

Como afirmado, a observação direta não-participante se justifica pelo fato de

possibilitar o registro de comportamentos. Durante a observação direta não-participante o

pesquisador esteve fisicamente presente, mas não participou das atividades, atuando apenas

como observador presenciando os fatos (MARCONI; LAKATOS, 2003). Nessa condição,

apenas registrou os fatos na medida em que eles aconteceram, não interferindo, assim, no

meio observado. Ademais, como participante externo, o observador tem uma visão mais

objetiva e crítica sobre o ambiente. Como limitação, a percepção do observador pode diminuir

quando os fatos ocorrem rapidamente (COOPER; SCHINDLER, 2003; FLICK, 2004; HAIR

et al., 2005). É mister destacar que tal limitação não acarretou problemas a esta fase da

pesquisa devido aos seus propósitos de análise do próprio método de coleta de dados ora em

etapa de desenvolvimento e confirmação (pré-teste). A observação participante possui por

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característica a integração real do pesquisador à comunidade ou grupo pesquisado e, dessa

forma, participa de suas atividades cotidianas (MARCONI; LAKATOS, 2003).

Quanto às entrevistas em profundidade, as mesmas são caracterizadas por serem

diretas e permitirem a obtenção de informações referentes a temas específicos e subjacentes

relacionados ao entrevistado e ao seu contexto (MALHOTRA, 2006). As entrevistas podem

ser entendidas como uma técnica a ser utilizada para a compreensão das informações e

opiniões dos indivíduos pesquisados. A utilização de entrevistas com os usuários buscou, por

meio da análise das práticas discursivas, viabilizar a interpretação dos sentidos atribuídos ao

objeto [refrigeradores8] em uso e, ainda, no entendimento da relação estabelecida entre

usuários e tal produto em seu contexto específico. A adequação das entrevistas a esta pesquisa

relaciona-se à alta flexibilidade do método, à possibilidade de ser utilizada em diversos

lugares e à capacidade de gerar dados consistentes (CASSELL; SYMON, 1994). Assim, a

realização de entrevistas possibilitou que pesquisadores e pesquisados interagissem e que

ambos fossem flexíveis tanto em suas perguntas quanto em suas respostas. Esse tipo de

entrevista ofereceu a possibilidade de serem levantadas informações não apenas através das

questões feitas aos entrevistados, mas também através de palavras, frases, imagens ou temas

relacionados ao objeto pesquisado. Vale ressaltar que, especificamente, o tipo de entrevista

utilizado foi o roteiro semi-estruturado por ser menos rígido e apresentar questões

previamente estabelecidas que norteassem o processo de pesquisa.

Com relação à amostragem, com base em Marconi & Lakatos (2003) e por se tratar de,

neste caso, uma pesquisa piloto, a amostra9 não-probabilística deste estudo foi fixada em 10%

da amostra da pesquisa definitiva (60 indivíduos); ou seja, 6 (seis) indivíduos. Ao se definir a

amostra por não probabilística, assumiu-se que a técnica de amostragem não fizesse uso de

8 Categoria de produtos definida em reunião com a coordenação acadêmica do projeto, Professor Dijon De

Moraes, em 12/08/2010 e confirmada junto à coordenação de design avançado da Whirlpool Latin America, Jorge Antônio Pietruza – Gerente da área –, em visita no período de 30/03/2011 a 01/04/2011.

9 De acordo com o parecer da banca de qualificação do projeto em 25/11/2010 e em reunião junto à coordenação da Whirlpool Latin América, Jorge Antônio Pietruza – Gerente de Design Avançado –, em visita à empresa no período de 30/03/2011 a 01/04/2011, foi estabelecido que, como um dos critérios de seleção da amostra, sejam pesquisados indivíduos pertencentes à classe C. Com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) e na Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), ambas realizadas regularmente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), por Classe C entende-se a camada social composta por indivíduos cuja renda domiciliar esteja entre R$ 1.530,00 a R$ 5.100,00. Por renda domiciliar (rendimento mensal domiciliar) entende-se "a soma dos rendimentos mensais dos moradores do domicílio, excluindo pensionista, empregado doméstico ou parente do empregado doméstico” (IBGE, 2004, p. 391).

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seleção aleatória, isto é, foram considerados, ao menos em parte, os critérios de julgamento

prévio e pessoal da equipe de pesquisa ou do pesquisador no campo (MATTAR, 2005). Dessa

forma, neste estudo, para acesso e adequação da amostra aos interesses da pesquisa, foi

utilizada a técnica de amostragem bola de neve. Na técnica de amostragem bola de neve é

escolhido um grupo aleatório de indivíduos a serem pesquisados. Após ser dado início à

coleta de dados, pede-se aos pesquisados que indiquem outros indivíduos que pertençam à

população-alvo de interesse e assim sucessivamente. Por conseguinte, com base em

referências, acreditou-se que os indivíduos indicados tivessem características demográficas e

psicográficas semelhantes, o que não ocorreria se os mesmos fossem selecionados ao acaso

(MALHOTRA, 2006). Ainda segundo o mesmo autor, as principais vantagens da amostragem

bola de neve estão relacionadas à acurácia da amostra selecionada, o que eleva a possibilidade

de localização de características desejadas na população-alvo e os custos relativamente baixos

quanto à técnica utilizada para acesso à amostra.

No que tange à análise semiótica e ao tratamento dos dados, foi utilizado o programa

livre de computador Pajek (versão 1.18). O Pajek, de origem eslovena, é gratuito e seu

manual – Exploraty Social Network Analysis with Pajek – foi gerado e disponibilizado pela

Cambridge University Press. Projetado para análises estruturais exploratórias em ciências

sociais é recorrentemente utilizado para a construção de modelos para visualização e análise

de grandes redes como: redes sociais, redes moleculares em estruturas químicas, redes de

internet entre outras. Para esta pesquisa o Pajek foi utilizado com o objetivo específico de

visualização das articulações simbólicas e suas possíveis conexões, isso para a análise dos

significados da imagem/forma de produtos em uso e em seus contextos. É importante destacar

que tal análise, dentro de suas premissas básicas visa fomentar práticas sustentáveis, vez que

pode gerar economia de recursos, insumos e tempo nos próprios processos de design e

produtivos. Assim, esperou-se gerar um suporte teórico-metodológico à pesquisa que

permitisse a análise dos dados de modo a viabilizar a devida interpretação das informações

coletadas na ocasião da pesquisa de campo definitiva a ser realizada de acordo com o

cronograma estabelecido na proposta integral da investigação10.

10 Projeto de pesquisa FAPEMIG / Whirlpool Latin America: processo número TEC-APQ-00997-10.

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Quanto ao tratamento dos dados coletados nesse estudo, os mesmos serão analisados

por meio da técnica de triangulação e da análise das práticas discursivas.

A Triangulação pode ser entendida como um método, ou conceito, central para a

integração metodológica e não constitui apenas uma das formas para combinação de vários

métodos qualitativos entre si (FLICK, 2005a; 2005b), mas também pode ser considerada

como uma forma de elevar a significância e a confiabilidade dos dados coletados em

determinada pesquisa. O método de triangulação pode ser classificado em quatro tipos: (i)

triangulação de dados, que se destina ao uso de diferentes fontes de dados; (ii) triangulação

pelo número de investigadores, onde há o emprego de diferentes observadores ou

entrevistadores; (iii) triangulação baseada na teoria que se estabelece a partir da hipótese de

múltiplos pontos de vista teóricos; e, (iv) triangulação metodológica, na qual são combinados

diferentes métodos e instrumentos de pesquisa (FLICK, 2004). É importante destacar aqui

que, para este estudo, optou-se pela quarta classificação. Isto é, para que a triangulação dos

dados neste estudo fosse possível, foi necessário que, como proposto – observação direta não-

participante e participante, registros fotográficos e as entrevistas em profundidade –, os dados

fossem provenientes de diversos instrumentos de coleta e que eles fossem analisados em

conjunto e de maneira integrada (POZZEBON; FREITAS, 1998). Nos dizeres de Flick (2004,

p. 274), “nesse caso, as diferentes perspectivas metodológicas complementam-se no estudo do

assunto, um processo que é entendido como a compensação complementar das deficiências e

dos pontos obscuros de cada método isoladamente”. Dessa forma, foi esperado que o método

de triangulação permitisse a obtenção de dados sem que prevalecesse a superioridade

metodológica de uma técnica em relação à outra.

Quanto à análise das práticas discursivas, em acordo com Spink (2004), ela partiu do

pressuposto que não existe cisão entre o sujeito e o objeto da pesquisa e trata-se de uma

abordagem científica que se atém à compreensão dos sentidos atribuídos pelos indivíduos aos

seus contextos específicos, neste caso aos objetos de uso.

A última fase – tratamento dos resultados obtidos e interpretação dos mesmos –

consistiu em processar os dados brutos de modo a torná-los significativos e válidos. Obtidos

os resultados, baseado em Bardin (1977), foi possível a proposição de inferências

correlacionadas aos objetivos deste trabalho, ou acerca de descobertas não esperadas.

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2 REVISÃO DA LITERATURA

2.1 DESIGN

Esta seção visa apresentar a evolução conceitual do design, sua importância tanto em relação

aos processos de desenvolvimento de produtos globais quanto ao seu uso e sua prática no

sentido de transpor aspectos relacionados aos usuários a tal processo. Isso com objetivo de

entrelaçar as relações existentes entre o próprio conceito de design, o processo de

desenvolvimento de novos produtos e de produtos globais, bem como a prática do design

sustentável de produtos, sua orientação aos usuários e para o mercado internacional. Além

disso, ao final, apresenta modelos culturais relacionados a produtos globais.

2.1.1 Design e sua evolução conceitual

O termo design pode ser entendido como um processo criativo, inovador e provedor de

soluções a problemas que é de importância fundamental não apenas para as esferas produtiva,

tecnológica e econômica, mas também para as dimensões cultural, ambiental e social (CNI,

1996).

No século XX, Siegfried Giedeon descreveu a introdução do designer industrial: “ele

formava a carcaça, cuidava do desaparecimento dos mecanismos (da máquina de lavar) e dava

a tudo formas aerodinâmicas como as de um trem ou automóvel” (BÜRDEK, 2006, p. 15).

Desenvolveu-se, assim, nos Estados Unidos, o formalismo, styling, ou seja, a separação

explícita entre o trabalho técnico e a configuração de produto e de novos materiais.

As discussões mais intensas sobre a conceituação do termo design se deram na antiga

República Democrática Alemã, onde o termo era compreendido como parte da política social,

econômica e cultural. Foi também na mesma região onde Horst Oelke chamou a atenção para

o fato de que a configuração formal deveria também se voltar para a vida social ou individual,

e não apenas para os aspectos sensoriais e perceptivos dos objetos.

Em 1979, foi elaborada pelo Internationales Design Zentrum (Centro Internacional de

Design) de Berlim a seguinte descrição, que destaca, dentre outros, os aspectos funcionais e

ecológicos do design:

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O bom design não se limita a uma técnica de empacotamento. Ele precisa expressar as particularidades de cada produto por meio de uma configuração própria; ele deve tornar visível a função do produto, seu manejo, para ensejar uma clara leitura do usuário; deve tornar transparente o estado mais atual do desenvolvimento da técnica; não deve se ater apenas ao produto em si, mas deve responder a questões de meio ambiente, de economia de energia, de reutilização, de duração e de ergonomia; deve fazer da relação do homem e do objeto o ponto de partida da configuração, especialmente nos aspectos da medicina do trabalho e da percepção. (BÜRDEK, 2006, p. 15)

Na mesma direção, Michael Erlhoff deixa registrada sua definição: “O design, que –

diferentemente da arte – precisa de fundamentação prática, acha-se principalmente em quatro

afirmações: como ser social, funcional, significativo e objetivo” (BÜRDEK, 2006, p. 16).

A despeito da diversidade de conceitos, tem-se atualmente que o design é uma

atividade crucial no processo de inovação, pois se refere ao campo da criatividade no qual as

ideias são geradas e no qual é realizada a união entre as possibilidades técnicas e as

exigências/oportunidades de mercado e entre a produção e o consumo. Mesmo a mais

inusitada invenção precisa ser materializada em uma forma utilizável, e isso se dá através do

processo de design (CNI, 1996).

As vastas e dinâmicas dimensões das funções e atributos do design são responsáveis

pelas diferentes perspectivas encontradas tanto dentro quanto fora das empresas. Dentre essas

dimensões, destacam-se: a criatividade; a capacidade de resolução de problemas; a criação de

novos estilos; a diminuição de custos de produção; a melhoria da qualidade, desempenho,

funcionalidade, segurança e facilidade de uso e descarte de produtos; a diferenciação, o

aumento da atratividade estética e a agregação de valor aos produtos; o aumento da

produtividade, lucratividade e competitividade; e, ainda, a melhoria da imagem dos bens e

serviços, assim como das empresas e países responsáveis por sua produção (CICs, 2005).

A convergência das funções e atributos supracitados ao processo de design demanda

conhecimentos que vão desde a etapa de concepção, desenvolvimento, produção e marketing

de um novo produto até o descarte do mesmo. Adicionalmente, ao se analisar um determinado

produto, pode-se notar que a diferença do design não está só em sua forma de apresentação e

utilização, mas também na embalagem, no manual de uso, nos impressos e materiais

promocionais, na forma de venda do produto, na marca e na logomarca (CICs, 2005). Desse

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modo, enquanto prática, o design permeia todo o processo de desenvolvimento de novos

produtos.

2.1.2 Design e processo de desenvolvimento de novos produtos

Estudos têm demonstrado que as atividades de design podem ser determinantes no

desempenho corporativo e nos processos de inovação, além disso, demonstram que as

atividades de design e de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) dificilmente podem ser

realizadas isoladamente (WALSH, 1996; ROY; RIEDEL, 1997; WHITE et al., 2003,

BOZTEPE, 2007). Portanto, faz-se necessária a maior atribuição de importância aos

processos de Desenvolvimento de Novos Produtos (DNP).

O processo de DNP tem sido descrito como uma difícil integração entre dois

segmentos: o técnico e o comercial. Durante o processo de DNP, há interação de um número

enorme de disciplinas, como P&D, engenharia, design industrial, pesquisa de marketing e

produção. Em geral, atividades como P&D, engenharia e produção estão associadas

primeiramente a questões técnicas de produtos, enquanto outras, como design industrial e

marketing, estão focadas, com base nas necessidades dos usuários, na transferência de funções

tecnológicas a um produto utilizável (VERYZER; BORJA DE MOZOTA, 2005).

A identificação e implementação das necessidades de consumidores nos estágios

iniciais de desenvolvimento de produtos são questões significativas para o processo de DNP

(WHITE et al., 2003; ENGELBREKTSSON; SÖDERMAN, 2004). Nesse contexto, dois

fatores merecem destaque: a utilização de métodos para identificação das necessidades dos

usuários e a utilização de representações do produto para embasar a comunicação com os

usuários nos processos iniciais do desenvolvimento de produtos (WHITE et al., 2003;

ENGELBREKTSSON; SÖDERMAN, 2004). De modo semelhante, o lançamento de

produtos no mercado global passa pelo mesmo processo em estágio mais avançado: o produto

deve ser reavaliado de acordo com as necessidades do mercado para que decisões referentes

ao processo de DNP possam ser tomadas. De acordo com Engelbrektsson & Söderman

(2004), há um consenso de que as necessidades dos usuários são importantes no

desenvolvimento de produtos; porém, os diferentes métodos para tal empreendimento apenas

descrevem vagamente como eleger suas necessidades (WHITE et al., 2003;

ENGELBREKTSSON; SÖDERMAN, 2004; BOZTEPE, 2007). Com a proeminência do

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design como um fator determinante para o posicionamento, diferenciação e aumento do valor

de marcas, a prática do design tem ganhado importância no processo de DNP em empresas

líderes.

Com base em um estudo na Inglaterra, White et al. (2003), afirmam que inúmeras

empresas não conseguem sobreviver comercializando seus produtos apenas em seus países de

origem e, portanto, vêm utilizando o design para desenvolver produtos capazes de competir

em mercados externos. As empresas estão integrando e combinando novas capacidades a

forças já existentes no design industrial tradicional, estão associando o design aos diferentes

níveis de processos, isto é, às atividades de marketing, branding e desenho industrial. Tal

comportamento visa, principalmente, a ampliação da capacidade de migração das empresas.

Dentre as novas atividades, estão inclusos mecanismos de obtenção de retorno dos usuários,

websites interativos, uso de redes sociais da Internet e atividades diretas e intensivas de

branding e marketing. O Quadro 1 provê uma lista resumida das novas atividades que as

firmas têm adotado para se tornarem competitivas, principalmente, no mercado global.

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ATIVIDADE DESCRIÇÃO Branding - Venda direta de produtos de marca própria.

- Desenvolvimento da própria marca. - Elevação da importância da marca.

Marketing Websites interativos

- Elevação de informações em mercado exportadores.

- Negociação direta com os consumidores. - Utilização de websites para promover e

gerenciar as vendas. Obtenção de retroalimentação de consumidores e empregados

- Consideração de ideias de design de qualquer indivíduo dentro da empresa.

- Estabelecimento de diferentes exigências. - Implementação de variações internacionais. - Contatos informais com fornecedores e

consumidores importantes. Integração do design com as vendas - Criação de design coerente e estratégia de

branding. - Integração do design como processo de

produção. - Elaboração do design e dos produtos pela

própria firma. Customização dos produtos - Customização de softwares e documentação.

- Diferenciação de produtos. - Customização dos produtos em acordo com

exigências particulares de compradores. - Customização de produtos para mercados

específicos. Trabalho em equipe - Equipe forte para design e desenvolvimento.

- Equipe de design. - Equipe para o desenvolvimento de novos

produtos. - Equipes multidisciplinares trabalhando com o

departamento de P&D. Administração de colaboradores externos (Terceirização)

- Trabalho com empresas especializadas em design.

- Trabalho com empresas internacionais. - Adequação da qualidade às exigências dos

mercados. - Estabelecimento de alianças com outras

empresas. - Importação de partes de produtos.

QUADRO 1 – Ampliação das atividades associadas ao design Fonte: adaptado de White et al. (2003).

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Segundo White et al. (2003), principalmente as atividades centradas na coleta de

respostas dos usuários têm contribuído de forma substancial para o processo de aprendizado

das empresas, especialmente no que tange ao design, permitindo que as mesmas possam

melhorar seus produtos e implementar customizações futuras. A FIGURA 2 mostra, o

posicionamento das atividades centrais e das atividades complementares que contribuem para

o processo de design.

FIGURA 2. Capacidade de migração: novas atividades de design Fonte: adaptado de White et al. (2003).

Ao redor do núcleo de atividades tradicionais das firmas estão as complementares; no

entanto, as fronteiras entre ambas não estão delimitadas. O processo de desenvolvimento de

tais atividades pode ser visto de forma não linear, como um ciclo: ao desenvolver um novo

conjunto de atividades, uma empresa amplia suas capacidades. Muitas dessas atividades estão

inter-relacionadas, cumprindo destacar que essa integração exerce um papel fundamental na

criação de vantagem competitiva e na aprendizagem organizacional (WHITE et al., 2003).

Com relação aos processos de DNP, Hwang (2004) afirma que o aprendizado

constante é a chave para a inovação. A abertura para testes e experimentações pode garantir a

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forma mais apropriada para a adequação do processo de DNP. O autor ressalta a importância

da existência de um desenho apropriado para a estrutura organizacional junto aos processos de

inovação, de processos e de recursos humanos voltados para a pesquisa.

Desta forma, constata-se que há discussões acerca do processo de desenvolvimento de

produto como um todo e há relatos referentes à necessidade de estudos aprofundados em

certas etapas do processo, como na etapa do design, visando construir um modelo

internacional formalizado que introduza uma base inovadora para análise das variáveis

globais para fins de desenvolvimento e lançamento de novos produtos (RONKAINEN, 1983).

Consoante Yorio (1983), novos produtos deveriam ser desenvolvidos para servir,

simultaneamente, mercados domésticos e internacionais. No entanto, essa observação

contrapõe-se às colocações de outros autores como Davidson & Harrigan (1977), os quais

afirmam que produtos a serem internacionalizados devem sofrer apenas pequenas alterações e

que seu desenvolvimento normalmente parte apenas de análises de mercados domésticos.

Há relatos de altos executivos, encarregados de produtos internacionais, sobre a

negligência das corporações no que diz respeito à necessidade de adaptação de produtos

voltados para o mercado externo (RONKAINEN, 1983), embora atualmente se possam notar

mudanças nesse quadro em indústrias de alimentos, laboratoriais e têxteis, dentre outras.

Como justificativas para tal comportamento seriam: (i) a crença dos gerentes de produto na

impossibilidade de se considerarem os frequentes conflitos e as necessidades dos vários

mercados onde determinados produtos estão inseridos (RONKAINEN, 1983); e (ii) a

considerável atenção dos profissionais de marketing a aspectos como funcionamento do

produto, preço, distribuição, vendas e propaganda, negligenciando-se o contexto onde o

mesmo está inserido, os diversos aspectos informacionais e até mesmo identidade visual das

corporações (KOTLER; RATH, 1984; BOZTEPE, 2007). No mesmo sentido, Siegal (1982)

ressalta que as indústrias têm sido dirigidas por administradores, cujo aprendizado nas escolas

de negócios tem sido voltado aos números, à minimização de riscos e ao uso de planos

fragmentados; enfim, são profissionais cujo trabalho é dirigido para ganhos em curto prazo, e

não para o desenvolvimento de projetos visando a médios e longos prazos.

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2.1.3 Design e produtos globais

Empresas, quando desenvolvem produtos a serem utilizados em mercados internacionais,

têm-se deparado com problemas complexos. Nesse contexto, McCracken (1988) atribui ao

design a responsabilidade de adequar produtos às esferas de uso e produção e até mesmo o

sucesso ou não de empresas em ambientes internacionais (LORENZ, 1986 apud BOZTEPE,

2007). Contudo, ainda que o uso do design seja reconhecido como fator-chave para o sucesso

em negócios globais (KOTLER; RATH, 1984; WHITE et al., 2003; DAVIS et al., 2004), no

próprio âmbito da disciplina poucas pesquisas têm sido realizadas para entendimento e

utilização do design no desenvolvimento de produtos globais e, quando realizadas, as

pesquisas tratam de modelos conceituais ou apenas de casos de empresas isoladas

(BOZTEPE, 2007).

Portanto, há um amplo debate sobre produtos de empresas que competem em âmbito

internacional. De acordo com Calantone et al. (2004) e White et al. (2003), tal questão vem

sendo discutida nas últimas décadas, sendo os debates marcados por duas estratégias de

marketing internacional divergentes: a padronização e a adaptação. A primeira, baseada na

comercialização do mesmo produto em todos os mercados, tem como vantagem baixos custos

e provém de economias de escala que se destinam a desenvolver, produzir e distribuir

produtos idênticos em diversos países. No entanto, pode ser indesejável oferecer o mesmo

produto em localidades que se diferenciam em termos de ambiente legal, canais de

distribuição, topografia, clima, níveis de desenvolvimento tecnológico e de mercado, bem

como fatores de competitividade e culturais. Assumindo-se que consumidores pertencentes a

culturas distintas podem ter necessidades diferentes, a estandardização pode não satisfazer aos

usuários em um novo mercado. Nesse caso, realiza-se a adaptação, isto é, o estabelecimento

do nível de diferenciação que os atributos físicos do produto e sua embalagem devem ter em

mercados distintos (CALANTONE et al., 2004). Ainda que a adaptação de produtos para

mercados distintos possa elevar os custos de desenvolvimento e produção, produtos adaptados

podem atender melhor às necessidades dos usuários e aumentar as margens de lucro.

Na literatura, nota-se um aprimoramento nas estratégias de posicionamento e nas

formas de se enxergarem mercados potenciais e suas características (CALANTONE et al.,

2004). Toda essa discussão sobre o tema culmina na necessidade de aprofundamento em

determinados aspectos do processo de desenvolvimento de produtos, especialmente no de

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design (no qual é factível a aplicação de estratégias com foco no usuário). Calantone et al.

(2004) e Boztepe (2007), ao tratarem de assuntos como modificações em propaganda e

comunicação de mercado, observam que empresas que competem em ambientes

internacionais podem decidir por realizar pouca ou nenhuma adaptação tanto física e/ou

tangível em seus produtos. Não obstante, considerando os avanços recentes em tecnologia que

vêm possibilitando a produção de pequenas quantidades de maneira eficiente, Cantalone et al.

(2004) reiteram que os administradores deveriam avaliar cuidadosamente as diferenças entre

os usuários, desenvolvendo apropriadamente design, quantidade, componentes e outras

características de seus produtos.

Ao expandirem seus mercados, as empresas tendem a exportar seus produtos para

países com culturas e condições econômicas similares (DAVIDSON; HARRIGAN, 1977) e,

nesse sentido, as determinantes identificadas para o DNP tem sido as proficiências em

marketing e a diferenciação dos próprios produtos (COOPER, 1979). Maidique & Zirger

(1984) separam a coordenação, o planejamento eficiente, a sinergia entre o marketing e a

tecnologia no DNP e, ainda, a interação do usuário como facilitadores do sucesso entre

públicos-alvo análogos. Cooper & Kleinschmidt (1995) destacam a importância de

investimentos em processos de P&D e do direcionamento de novos produtos a mercados

similares. Darling & Postnikoff (1985) sublinham que tamanho e composição do mercado,

níveis de competitividade, embalagem, promoção, canais de distribuição, características

culturais, ambientes sociais e políticos são fatores que devem ser analisados para a maioria

dos produtos. Hwang (2004) apresenta, no caso do mercado de cosméticos local sul-coreano,

inundado por produtos internacionais, a importância da análise de mercado e da cultura local

para associação de conceitos e enseja, ainda, a ênfase no design como diferencial para o

lançamento de produtos de fato competitivos e adequados.

Ao serem relacionados os estudos de Davidson & Harrison (1977) e Hwang (2004),

percebe-se uma mudança na estruturação dos mercados e na forma de as empresas se

posicionarem bem como seus próprios produtos, vez que o segundo trabalho, mais recente,

descreve uma situação oposta à do primeiro. No caso de Hwang (2004), os cosméticos devem

competir com produtos provenientes de culturas não similares, o que comprova a competição

entre produtos globais e a necessidade de consideração de aspectos culturais locais, ou seja,

mercados locais competem em nível global dentro de seu próprio contexto.

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Ainda assim, a questão da utilização do design vem sendo debatida apenas como um

subitem dentro da corrente clássica do mix de marketing (BUZZELL, 1968; QUELCH;

HOFF, 1986), haja vista que as pesquisas acerca de adaptação e padronização de produtos

vêm sendo orientadas, ainda hoje, pela óptica da propaganda e da administração tradicional

(BOZTEPE, 2007). Quando realizadas, as decisões sobre adaptar ou não produtos de

empresas globais normalmente são realizadas pelos próprios designers, que o fazem de forma

intuitiva ou através da reação a uma abordagem de marketing, isto é, as adaptações ocorrem

em momentos nos quais emergem as necessidades, e não em antecipação a elas

(APPLBAUM, 2000; VERYZER; BORJA DE MOZOTA, 2005).

Estudos apontam que as adaptações, quando realizadas antecipadamente, referem-se a

aspectos regulatórios governamentais e industriais (PORTER, 1986), o que torna a natureza

do produto mais bem entendida e mais rapidamente absorvida pelos mercados. Entretanto, os

casos de falha nos negócios apontam que a orientação para o consumidor na adaptação de

produtos é mais que opcional, é necessária (BOZTEPE, 2007). Como exemplo, a “a

Whirlpool, para sobreviver no mercado indiano, adaptou a sua Lavadora Mundial, uma

lavadora padrão planejada para países em desenvolvimento, com o objetivo de não embolar os

saris de 5,58 m usados pelas mulheres indianas”11 (BOZTEPE, 2007, p. 514). Portanto, o

design orientado para os usuários é necessário para integrar produtos a mercados locais de

forma a não causar ruídos e introduzir, por vezes, novas formas de realização de tarefas

referentes ao uso dos objetos. Todavia, compete ressaltar que, embora reconhecida, a

utilização da adaptação de produtos orientada aos usuários não tem sido considerada

prioridade para as pesquisas em design (BOZTEPE, 2007).

Em suma, o design orientado para o consumidor, associado a aspectos culturais locais,

foi identificado como um dos instrumentos determinantes para o posicionamento adequado de

produtos, garantindo diferenciação e competitividade.

11 Tradução do autor para: “Whirlpool’s World Washer, a standard washing machine intended for developing

countries, had to be modified in order not to tangle the 18-foot saris worn by Indian women to survive in this market”.

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2.1.4 Design orientado para ao usuário

O reconhecimento do design orientado para os consumidores tem crescido tanto no campo de

pesquisas em design quanto no dos negócios, devido ao fato de o mesmo proporcionar

experiências superiores e maior valor para os usuários (KOTLER; RATH, 1984; BOZTEPE,

2007). Kim & Mauborgne (2005) afirmam que o foco na mudança dos valores dos usuários e

a consequente criação de novos nichos ou novos mercados podem tornar a competitividade

irrelevante. Além disso, estudos empíricos na área de posicionamento de produtos apontam

que a orientação para o usuário em mercados internacionais provê melhores resultados no que

se refere ao alcance dos objetivos, vendas e rentabilidade (CAVUSGIL; ZOU, 1994;

CANTALONE et al., 2004). Entretanto, continuam inexploradas as questões referentes a que

fatores devem ser integrados (e de que forma e em que momento) ao processo de design com

o objetivo de agregar valor aos usuários (BOZTEPE, 2007).

A orientação do design para os usuários consiste no profundo entendimento e na

materialização de suas necessidades, transformando quantidades significativas de tecnologia e

informação em algo tangível com a habilidade de prover funcionalidades mais acuradas a um

produto, o que viabiliza aos usuários maior interação com esse produto e obtenção dos

benefícios a ele inerentes. Ainda que haja tamanha significação e reconhecimento para o

design orientado para o consumidor, sua relação com os processos de DNP permanece em

estágio inicial de aplicação (VERYZER; BORJA DE MOZOTA, 2005). O design oferece um

grande potencial para posicionamento e diferenciação de produtos e pode atuar como

determinante do sucesso de um bem. Um dos objetivos do design é criar altos níveis de

satisfação no consumidor e elevar os ganhos em empreendimentos a partir da união do mix de

design: desempenho, qualidade, durabilidade, aparência e custos. Através do design, usuários

formam a imagem do valor agregado ao produto, o que eleva o valor pago pelo bem

(KOTLER; RATH, 1984).

A possibilidade de diferenciação e melhor posicionamento de produtos oferecidos pelo

design industrial, associado ao aumento da complexidade de produtos e do esteticismo atual,

tem feito com que o design se torne um instrumento relevante no processo de DNP

(VERYZER; BORJA DE MOZOTA, 2005). Assim, estudiosos do marketing têm proclamado

o design como fator limite para o incremento da competitividade empresarial (KOTLER,

2003). Mesmo com o reconhecimento do design como uma importante variável estratégica,

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poucos avanços têm sido obtidos no sentido de ampliar o entendimento do DNP em relação ao

potencial do design como variável de marketing.

São complexas as relações entre design, marketing e outras disciplinas envolvidas no

processo de DNP, e a integração desses fatores é fundamental para o sucesso ou o fracasso de

um produto em última instância. Normalmente, as perspectivas dos consumidores, quando

aplicadas no DNP, são provenientes das disciplinas do marketing e do design industrial, não

sendo a última explorada de forma exclusiva (VERYZER; BORJA DE MOZOTA, 2005).

Embora as relações entre o design orientado para o consumidor e a sua contribuição

para os processos de DNP ainda não sejam consistentes, há traços de emprego intuitivo do

design na prática (VERYZER; BORJA DE MOZOTA, 2005; BOZTEPE, 2007). Devido à

ausência de pesquisas formais sobre a interação e a forma como o design orientado para o

consumidor é difundido entre as disciplinas de marketing e design industrial, tem crescido a

importância de estudos sobre o design como fator crítico e estratégico no processo de decisão

do usuário (VERYZER; BORJA DE MOZOTA, 2005), especialmente quando o assunto em

questão é o mercado internacional.

2.1.5 Mercado internacional e design sustentável

Por design sustentável entende-se a exploração da prática do design visando ao

aprimoramento de atributos funcionais, estéticos, tecnológicos e de qualidade do produto, o

que, em última instância, implica o aumento do desempenho mercadológico e da velocidade

de resposta em contextos específicos. Indústrias e inovadores vêm cada vez mais buscando os

benefícios da utilização do design sustentável, que abrangem a influência nas preferências do

usuário, no estabelecimento de marcas globais, na antecipação do surgimento de novos

segmentos, na ampliação dos conhecimentos atuais e na melhoria do desempenho nas

empresas (KOTABE; HELSEN, 2003).

Swan, Kotabe e Allred (2005) expõem a influência da implementação consistente do

design sustentável em ambientes incertos e apontam as variáveis da aplicação do design em

resposta às rápidas mudanças tecnológicas e à incapacidade de previsão das alterações

relacionadas aos mercados. Em outras palavras, associando as necessidades dos usuários às

dinâmicas competitivas, o design sustentável é capaz de prever as possíveis variações a serem

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aplicadas em produtos através de mercados distintos, o que pode ser considerado um fator

relevante para a manutenção e sustentabilidade de produtos globais.

A proposta fundamental do estudo realizado por Swan, Kotabe e Allred (2005) foi

relacionar as quatro capacidades do design sustentável – funcional, estética, tecnológica e

qualidade – com o desempenho das empresas em ambientes incertos (FIGURA 3), que são

moderados pelas preferências dos usuários, pelas necessidades relacionadas aos produtos e

pelos padrões tecnológicos.

FIGURA 3. Capacidades sustentáveis do design e a incerteza ambiental Fonte: adaptado de Swan, Kotabe e Allred (2005, p. 148).

Por definição, segundo Swan, Kotabe e Allred (2005). as quatro capacidades do design

sustentável são: (i) capacidade de expansão funcional sustentável do produto, que consiste no

desenvolvimento de produtos com tecnologias similares, possibilitando versatilidade ou

adaptabilidade que permitam o desenvolvimento de uma família de bens aplicáveis ou

facilmente adaptáveis aos mercados domésticos e internacionais; (ii) capacidade estética

funcional do produto, que torna o bem visualmente atraente em ambientes locais e externos;

(iii) capacidade tecnológica sustentável do produto, definida pela utilização de uma base

tecnológica e de materiais que satisfaçam as exigências técnicas e dos usuários para as

gerações presente e futura do objeto; e (iv) qualidade sustentável do produto, que garante a

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eliminação de desvios das características e dos conceitos preestabelecidos em múltiplos

contextos, ou seja, a tentativa de eliminação dos possíveis ruídos presentes no objeto.

As contribuições do estudo de Swan, Kotabe e Allred (2005) são significativas no que

diz respeito ao processo de DNP e às estratégias de marketing. Em primeiro lugar, dá-se início

ao delineamento de um modelo sobre os determinantes das capacidades do design. Essas

capacidades podem auxiliar nos processos decisórios, equilibrando as duas correntes citadas

anteriormente, estandardização e adaptação12, para uma melhor adequação de produtos às

necessidades de segmentos menores, às características ambientais e às mudanças

tecnológicas. Em segundo lugar, esse modelo dá suporte para o entendimento gerencial de

insucessos, de altos custos de desenvolvimento, da velocidade de resposta do mercado e dos

níveis de incerteza, além de permitir que, por meio do desenvolvimento das capacidades

sustentáveis do design, como defendido pelos autores, empresas repartam seus elevados

custos com design de produtos ou componentes em vários contextos e ofereçam produtos

atraentes em diversos países. Finalmente, o estudo de Swan, Kotabe e Allred (2005) mostra

que as capacidades sustentáveis do design afetam o desempenho das empresas, bem como a

velocidade de resposta ao mercado e a própria resposta ao mercado. Portanto, empresas, ou

produtos, podem elevar seus níveis de sustentabilidade não apenas reduzindo a quantidade de

possíveis adaptações no futuro, mas também garantindo feedbacks mais rápidos que otimizem

seu tempo de resposta em relação ao de seus concorrentes. Dessa forma, as empresas não

arriscariam a realizar gastos com desenvolvimento de capacidades desnecessárias e tampouco

a não contar com as devidas capacidades quando elas se mostrarem necessárias.

Por outro lado, Boztepe (2007) defende a utilização de um modelo13 – FIGURA 4 –

para adaptação de produtos internacionais com base em informações etnográficas detalhadas

obtidas diretamente dos usuários em seus contextos culturais. Seu modelo permite a

variação/combinação de qualquer produto com as suas características dependendo do contexto

de uso.

12 Cf. Seção 1.1. (estandardização e adaptação) 13 Modelo esse que pode ser entendido como complemento do modelo apresentado por Swan, Kotabe e Allred

(2005).

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FIGURA 4. Inter-relação entre categorias de valor, fatores culturais e propriedades de produtos Fonte: traduzido de Boztepe (2007, p. 529).

O modelo proposto pela autora pode ser trabalhado do centro para fora e vice-versa,

dependendo do contexto de sua aplicação. Tal abordagem, baseada nos valores dos usuários14,

pode auxiliar os profissionais de design a (i) avaliar produtos existentes em novos contextos,

(ii) planejar pesquisas etnográficas e (iii) determinar processos de tomada de decisão com

relação à adaptação ou estandardização de produtos. Portanto, pode-se, com a utilização de

tais informações, reduzir o índice de falhas no processo de introdução de produtos em novos

contextos; sugerir o emprego de um banco de dados de informações dos próprios usuários e

esperar que os designers sejam capazes de relacionar as informações aos produtos; aplicar tais

informações na fase de design e implementação, de modo a ajudar na identificação das

14 Cf. Seções 2.2.8 e 2.2.9.

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adaptações necessárias e na definição das características dos produtos em termos do nível de

especificidade das interferências em design voltadas a atender aos valores atribuídos pelos

usuários15 (BOZTEPE, 2007).

A questão central do modelo16 desenvolvido por Boztepe (2007) é o levantamento de

quais fatores devem ser considerados quando se fizer uso do design para adequação de

produtos para mercados específicos e para geração de valor para os usuários. Em vez de

estabelecer relações genéricas universais, o modelo propõe o foco nos benefícios que os

usuários obtêm a partir da sua relação com os produtos. Dada a complexidade e natureza

evasiva da questão, é difícil propor uma aplicabilidade universal. No entanto, a introdução de

métodos etnográficos no conceito de valor do usuário pode prover informações relevantes

para futuros avanços teóricos sobre o tema bem como apoiar a criação e o desenvolvimento de

novos modelos.

2.1.6 Modelos culturais e produtos globais

Segundo Boztepe (2007), houve inúmeras tentativas de desenvolvimento de modelos que

definissem as variáveis culturais. Contudo, ainda não se conseguiu definir quais atributos, ou

variáveis culturais, devem realmente ser sublinhados. Embora alguns modelos tenham sido

concebidos com o objetivo de apoiar a atividade de design e decisões de marketing para a

adaptação de produtos, eles buscam apenas a possibilidade de comparação genérica entre

aspectos de diferentes culturas e em certas dimensões.

Dentre os modelos mais conhecidos, está o de Hall (1990a; 1990b), no qual foram

propostas duas dimensões clássicas de cultura. A primeira se refere às informações, como são

comunicadas, e propõe que a cultura seja dividida em altamente e pouco contextualizada

(high-context e low-context): as informações e comportamentos não são comunicados

explicitamente17 no primeiro caso, mas o são no segundo. A outra dimensão está relacionada à

noção de tempo (i.e., orientação de passado e futuro, ou seja, como as atividades estão

diacronicamente organizadas), este sendo divido em monocrônico (no qual os fatos ocorrem

de modo linear) e policrônico (no qual os fatos ocorrem simultaneamente ou de modo não

15 Cf. 2.2.9. 16 O modelo de Boztepe (2007) é entendido, aqui, como resposta ao modelo de Swan, Kotabe e Allred (2005). 17 Veja, por exemplo: Geertz (1989, p. 185-213).

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linear). Na visão da autora, tais dimensões, embora não adequadas para a identificação de

informações refinadas sobre determinadas culturas em um dado espaço temporal, podem, sim,

auxiliar os designers na ordenação de tarefas e disposição de informações.

Boztepe (2007) ainda faz breve descrição dos trabalhos de Hofstede (1981) e

Trompenaars & Hampden-Turner (1997). O primeiro, baseado em estudos empíricos em 50

países, identificou, ranqueou e classificou cinco dimensões culturais: (i) distância de poder,

(ii) individualismo x coletivismo, (iii) masculinidade x feminilidade, (iv) medo da incerteza e

(v) orientação em curto prazo x orientação em longo prazo. Já os últimos alegam que

dimensões referentes ao modo como as pessoas se relacionam com a natureza e com o tempo

incluem: (i) universalismo x particularismo, (ii) individualismo x coletivismo, (iii) tempo

específico x tempo difuso, (iv) realização x fracasso, (v) indivíduo cético x indivíduo

emotivo, (vi) orientação temporal e (vii) orientação natural.

Conforme defende Boztepe (2007), as colocações de Hall (1990a; 1990b), Hofsted

(1981) e Trompenaars & Hampden-Turner (1997) podem servir como orientação geral, ou

ponto inicial, para a avaliação de produtos globais e para o entendimento cultural. Entretanto,

o dimensionamento (HALL, 1990a; 1990b; TROMPENAARS; HAMPDEN-TURNER, 1997)

e o ranqueamento cultural (HOFSTED, 1981) não incluem as mudanças que, inevitavelmente,

ocorrem em processos culturais, isto é, a cultura não pode ser tida como estática18. Assim, a

tentativa de realizar design com base em informações de diversos países pode induzir a

generalizações equivocadas por parte dos designers. As informações das quais necessitam os

designers se referem especificamente à relação de uso dos objetos in loco. Como o

conhecimento de informações detalhadas torna mais precisa a prática do design e as respostas

dos profissionais da área, tais modelos necessitam de informações complementares com maior

especificidade acerca das similaridades culturais e da maneira como os usuários interagem

com os produtos e suas formas características de uso em contextos distintos.

Uma vez que a etnografia possibilita o profundo entendimento dos valores19 em

diferentes localidades, Boztepe (2007) propõe o uso de técnicas etnográficas para a coleta de

informações específicas que deem suporte às equipes de design para o desenvolvimento de

produtos globais. Atualmente, todavia, a utilização de informações etnográficas pelos

18 Cf. Geertz (1989, p. 94-101). 19 Cf. Seção 2.2.8.

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designers se limita ao alinhamento de formas, funções, materiais, texturas etc., sendo a

tendência o uso de informações específicas para o desenvolvimento de produtos (BAILETTI;

LITVA, 1995). Em outros termos, pode-se dizer que a incorporação total de estudos em

ciências sociais para o desenvolvimento de produtos permanece em estágios iniciais

(BOZTEPE, 2007), mas seria um suporte indispensável para evitar a simplificação ou falta de

sensibilidade a conteúdos de fato relevantes. Portanto, é necessário o desenvolvimento de

modelos e ferramentas que deem suporte de planejamento a pesquisadores em design para o

entendimento e organização das informações, especialmente no que tange à cobertura de

informações relevantes ao direcionamento dos processos de pesquisa na área e à

sistematização e interpretação de dados de pesquisa.

Vale ainda ressaltar que as categorias simbólicas descritas por Boztepe (2007) – valor

de identidade e significância social, valor emocional e valor espiritual (cf. FIGURA 4) – não

são mutuamente excludentes e podem ser entrelaçadas e interdependentes. Na prática, tais

categorias servem como referência para a adaptação de produtos e, ao definirem adaptação em

termos dos benefícios e resultados finais que os usuários podem obter através da própria

experiência com os objetos, tornam claros para os negócios os motivos pelos quais os

processos adaptativos são necessários.

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2.2 CULTURA

Os estudos das formas simbólicas em disciplinas e na literatura das ciências sociais têm sido

feitos frequentemente sob a subscrição do conceito de cultura. Salvo a raridade consensual

sobre o tema, é notória a relevância dos estudos dos fenômenos culturais para as ciências

sociais (THOMPSON, 1995). Tal importância se explica pelo fato da vida social não ser,

basicamente, uma questão de fatos e de objetos que ocorrem como fenômenos do mundo

natural, e sim uma relação de movimentos simbólicos de ações e expressões significativas

realizadas entre indivíduos que procuram entender uns aos outros através da interpretação de

sinais, ou símbolos (GEERTZ, 1989; THOMPSON, 1995). De forma mais ampla, os estudos

dos fenômenos culturais podem ser pensados como o estudo do mundo sócio-histórico

composto por um campo de significados. Contudo, o conceito de Cultura não tem sido sempre

usado de tal forma e possui, desde sua origem, uma longa história, que culmina nas atuais

utilizações do termo nas diversas disciplinas e literatura das ciências sociais. Dessa forma, o

conceito de cultura se aproxima mais de uma ideia a ser sustentada que uma concepção

estática (GEERTZ, 1989).

Portanto, esta seção foca o conceito de cultura sobre suas relações com os processos de

produção simbólica. Isto através de uma visão geral sobre o termo e seus desdobramentos ao

longo da história, tendo seu ápice em sua definição mais adequada para este estudo. Assim,

oferece as bases para o entendimento da sua relação com os processos de manifestação

simbólica em contextos sociais estruturados.

2.2.1 Origem do conceito cultura

Com o surgimento da visão estereoscópica combinada à capacidade de utilização das mãos,

foi aberto aos primatas um mundo tridimensional. A realidade de tocar e examinar um objeto

atribuindo-lhe um significado único forneceu ao homem uma nova percepção do seu habitat

(LARAIA, 2007).

Na perspectiva do antropólogo francês, Claude Lévi-Strauss, o surgimento da cultura

ocorre no momento em que é convencionada a primeira regra (ou norma). Por outro lado,

Leslie White, antropólogo norte-americano, afirma que a transição do estado animal para o

humano ocorre no momento em que o cérebro humano se torna apto a criar símbolos.

Segundo White (apud LARAIA, 2007, p. 55),

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todo comportamento humano se origina no uso de símbolos. Foi o símbolo que transformou nossos ancestrais antropóides em homens e fê-los humanos. Todas as civilizações se espalharam e perpetuaram somente pelo uso de símbolos... Toda cultura depende de símbolos. É o exercício da faculdade de simbolização que cria a cultura e o uso de símbolos que torna possível a sua perpetuação. Sem o símbolo não haveria cultura, e o homem seria apenas animal, não um ser humano... O comportamento humano é o comportamento simbólico. Uma criança do gênero Homo torna-se humana somente quando é introduzida e participa da ordem de fenômenos superorgânicos que é a cultura. E a chave deste mundo, e o meio de participação nele, é o símbolo.

Assim, todos os símbolos devem ter uma forma física, pois, do contrário, não podem

penetrar em nossa experiência e o seu significado não pode ser percebido pelos sentidos.

2.2.2 O conceito de homem e sua relação com a cultura

Para o entendimento cultural do conceito de homem, Geertz (1989) propõe duas ideias.

Primeiramente, a cultura deve ser entendida não como complexos de padrões concretos de

comportamento – costumes, usos, tradições etc. –, mas sim como um agrupamento de

mecanismos de controle – planos, regras, instruções etc. – com o objetivo de governar o

comportamento. O homem depende, mais que qualquer outro animal, de tais mecanismos de

controle extragenéticos (i.e., culturais) para ordenar sua própria existência. O entendimento

dessa dependência dá origem a uma nova concepção do ser humano, a qual lança luz sobre as

formas pelas quais suas capacidades inerentes são gerenciadas.

Tal visão da cultura como mecanismo de controle contempla o pensamento humano

como algo social e público. Portanto, o ato de pensar não consiste apenas nas ocorrências

oriundas da mente, mas também naquilo que transita como símbolos significantes através de

palavras, artefatos ou qualquer outra coisa que esteja distante da realidade e que tome forma

para dar significado à experiência. Do ponto de vista do indivíduo que recebe os significantes

com que convive, tais significados estão em uso desde quando ele nasce e continuarão

existindo mesmo quando da sua morte; porém, os objetos, durante sua existência, podem

sofrer modificações, independentemente da participação do indivíduo. Assim, os símbolos,

durante a vida do homem, são por ele utilizados deliberada e descompromissadamente, com o

objetivo, sempre, de orientação, fazendo parte da construção da realidade individual de cada

sujeito (GEERTZ, 1989).

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Devido à ausência precisão das qualidades não simbólicas, o ser humano precisa de

sistemas simbólicos para sua própria orientação – o que não ocorre no mundo dos animais

ditos inferiores (na maioria dos casos), os quais são programados fisicamente e contam com

fontes genéticas de informação que lhes garantem a experiência. Quanto ao homem, suas

atividades menos programadas (ou melhor, menos programáveis) conferem-lhe, de forma

inata, possibilidades de respostas gerais mais complexas e, contraditoriamente, menos

precisas, tornando o comportamento humano, na ausência de padrões culturais, ingovernável.

Na contramão dessa experiência disforme, “a cultura, a totalidade acumulada de tais padrões,

não é apenas um ornamento da existência humana, mas uma condição essencial para ela, a

principal base de sua especificidade” (GEERTZ, 1989, p. 33).

Em síntese, tendo em vista o conjunto de mecanismos simbólicos para controle do

comportamento e as fontes de informação extrassomáticas, são claros os reflexos do conceito

de cultura para o conceito de homem. A cultura estabelece o vínculo entre o que o ser humano

pode se tornar e o que realmente é. O homem é desenvolvido através de padrões culturais,

sistemas de significados simbólicos, que são criados historicamente e possibilitam o diálogo

do ser humano com sua realidade e orienta tanto o seu comportamento quanto a sua

experiência no meio em que vive.

2.2.3 Concepções do termo cultura

O conceito da palavra latina cultura obteve presença significativa em diversos idiomas

europeus no início do período moderno. Seus primeiros usos mantiveram parte do seu sentido

original, que se referia, essencialmente, ao cultivo ou ao cuidado de algo, como grãos e/ou

animais. A partir do século XVI, a utilização da palavra é ampliada para o processo de

desenvolvimento humano, isto é, para o cultivo da mente. Contudo, a aplicação do termo de

forma independente de associações com a concepção original do termo se dá apenas no fim do

século XVIII, com a palavra francesa Cultur, incorporada ao alemão como Kultur

(THOMPSON, 1995).

No início do século XIX, a palavra cultura é utilizada de forma ambígua, possuindo,

também, o sentido de civilização. Proveniente da palavra latina civilis, referindo-se a

cidadãos, o termo civilização é inicialmente usado na França e na Inglaterra ao final do século

XVIII com o objetivo de descrever o processo de desenvolvimento humano em direção ao

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polimento e à ordem social, em contraste à barbárie e à selvageria. Diferentemente da forma

de adoção do termo na França e na Inglaterra no referido período, o termo Zivilisation, na

Alemanha, opõe-se negativamente ao termo Kultur: aquele se relaciona diretamente com

polimento e refinamento das maneiras, dos modos, enquanto este se refere a produtos

intelectuais, artísticos e espirituais nos quais se expressam a individualidade e a criatividade

das pessoas. Expressando de outra maneira, o termo Kultur é então utilizado para simbolizar

todos os aspectos espirituais de uma comunidade, enquanto a palavra Zivilization refere-se às

realizações materiais (THOMPSON, 1995).

A oposição dos termos na Alemanha está ligada a padrões de estratificação social do

início da Europa moderna. Na nação alemã, o francês é, à época, falado pela corte

nobiliárquica e pela classe alta da burguesia, sendo visto como símbolo de status entre as

classes superiores. Diferente de tais classes existia também na Alemanha um extrato de

intelectuais denominado intelligentsia, desenvolvia as próprias atividades artísticas e

intelectuais e zombava das outras classes que nada faziam nesse sentido, pois empregavam

suas energias no refinamento de suas maneiras à moda dos franceses. Em um movimento

distinto daquele dos grupos de intelectuais emergentes franceses, que foram absorvidos pela

grande sociedade cortesã de Paris, os intelectuais alemães foram excluídos da vida na corte e

buscaram sua realização no campo da academia, da ciência, da filosofia e da arte

(THOMPSON, 1995).

Ao final do século XVIII e início do XIX, o termo cultura é, não raramente, utilizado

em publicações que têm por objetivo apresentar histórias universais da humanidade. No seu

uso, o termo tem o sentido de cultivo, aprimoramento e enobrecimento das qualidades físicas

e intelectuais de um indivíduo ou de um povo. Essa apresentação de cultura está intimamente

associada à crença iluminista no caráter progressista da nova era.

O conceito de cultura que emerge no final do século XVIII e início do XIX,

desenvolvido principalmente pelos filósofos alemães, pode ser definido como concepção

clássica do termo:

Cultura é o processo de desenvolvimento e enobrecimento das faculdades humanas, um processo facilitado pela assimilação de trabalhos acadêmicos e artísticos e ligado ao caráter progressista da era moderna (THOMPSON, 1995, p. 170).

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A concepção clássica de cultura privilegia e favorece alguns trabalhos e valores em

detrimento de outros (favorecimento este ligado à intelligentsia alemã e, de forma genérica, à

crença no progresso encontrada no Iluminismo europeu). Não obstante, tais pressupostos não

são mantidos por muito tempo, sendo alterados com o surgimento da antropologia cultural, a

partir da qual o conceito é despojado de conotações etnocêntricas e moldado para atender aos

objetivos da descrição etnográfica. Assim, o estudo da cultura altera seu foco para o

esclarecimento dos costumes, práticas e crenças de outras sociedades e abandona sua estreita

ligação com o enobrecimento da mente e do espírito do núcleo europeu.

Edward Tylor (1832-1917) sintetiza o conceito no termo inglês Culture, o qual, por sua

vez, corresponde às complexas relações entre os conhecimentos, crenças, costumes, artes, leis,

moral, capacidades e hábitos – isto é, aspectos sociais – da espécie humana. Todavia, em

1973, Cliffort Geertz propõe uma condensação conceitual do termo, afirmando que o tema

mais importante da antropologia moderna seria reduzir a amplitude do conceito de cultura,

tornando-o um instrumento especializado e mais forte teoricamente.

Em Primitive Culture, Edward Tylor (1871 apud LARAIA, 2007) é o primeiro a

formular o conceito de cultura do ponto de vista antropológico. É também o precursor do

entendimento de cultura como um objeto de estudo sistemático por consistir em um fenômeno

natural possuidor de causas e regularidades e, portanto, passível de estudo objetivo e análises

capazes de proporcionar a formulação de leis sobre o processo cultural e a evolução. No

entanto, influenciada por Charles Darwin, a visão evolucionista de cultura defendida por

Tylor e outros pensadores contempla o desenvolvimento humano de forma exclusivamente

unilinear e etnocêntrica.

Contestando o evolucionismo, Franz Boas (1859-1949) dá início ao chamado método

comparativo. Seus estudos e crítica atribuem à antropologia duas tarefas: “a reconstituição da

história de povos ou regiões particulares e a comparação da vida social de diferentes povos,

cujo desenvolvimento segue as mesmas leis” (LARAIA, 2007, p. 35). Com isso, Franz Boas

desenvolve o particularismo histórico, ou Escola Americana, segundo a qual os eventos

históricos determinam os caminhos de cada cultura.

Por sua vez, Alfred Kroeber (1876-1960) demonstra, em seu trabalho, o Superorgânico

(1917), que a principal influência da cultura sobre os seres humanos reside no seu potencial

de possibilitar-lhes ir além de suas capacidades orgânicas, o que essencialmente os distancia

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do mundo animal e os “liberta” da sua natureza biológica. O autor, ao estabelecer a

diferenciação entre orgânico e cultural, promove o rompimento entre a relação biológica e

cultural e afasta, assim, o domínio cultural da esfera natural: as qualidades de comunicação

oral e a capacidade de produzir suas próprias ferramentas extracorpóreas diferenciam o ser

humano dos animais, sendo o homem possuidor de cultura. As principais contribuições de

Kroeber correspondem aos seguintes apontamentos: (i) o comportamento humano como

sendo determinado pela cultura; (ii) a existência de padrões culturais; (iii) a adaptação aos

meios ecológicos através da cultura, possibilitando ao homem romper as barreiras ambientais

e ampliar o seu habitat; (iv) a dependência do aprendizado para garantir a própria existência;

(v) o processo de aprendizagem (socialização e endoculturação) como determinante do

comportamento e da capacidade artística ou profissional; e (vi) a cultura como processo

cumulativo que limita ou estimula a prática criativa do ser humano, permitindo a indivíduos

mais bem dotados intelectualmente utilizar o conhecimento já existente para gerar novos

objetos ou novas técnicas.

De acordo com Thompson (1995), podem-se identificar quatro momentos históricos

principais referentes às seguintes concepções de cultura: clássica, descritiva, simbólica e

estrutural. Sob a denominação de concepção clássica, o termo cultura surge entre os filósofos

e historiadores alemães nos séculos XVIII e XIX; a sua utilização se refere ao processo de

desenvolvimento intelectual ou espiritual, que é distinto de processos civilizatórios. Com o

advento da antropologia cultural ao final do século XIX, o conceito clássico dá lugar a novas

concepções antropológicas, as quais podem ser apresentadas como concepção descritiva e

concepção simbólica. A descritiva refere-se ao variado conjunto de valores, costumes,

crenças, convenções, hábitos e práticas características de uma sociedade específica ou de um

recorte histórico determinado. Em outras palavras, a concepção descritiva pode ser definida

como:

O conjunto de crenças, costumes, ideias e valores, bem como os artefatos, objetos e instrumentos materiais, que são adquiridos pelos indivíduos enquanto membros de um grupo ou sociedade. (THOMPSON, 1995, p. 173)

Contudo, tal conceituação do termo perde sua validade e utilidade devido à

necessidade de focar-se na definição de uma série de fenômenos sociais que possam ser

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analisados de forma sistemática. Desse modo, tal conceituação torna-se vaga e sem o rigor da

análise científica.

É no trabalho de Jacques Turgot (1727-1781) em que se encontra a primeira menção à

relação entre cultura e aspectos simbólicos e também se assevera que o homem faz uso de

signos com a propriedade de multiplicar infinitamente suas ideias, o que possibilita a retenção

e perpetuação de suas premissas. No mesmo sentido, em 1951, Lévi-Strauss afirma que a

cultura pode ser tida como um conjunto de sistemas simbólicos no qual estão inseridas as

artes, a religião, as ciências, as relações econômicas etc., as quais, por sua vez, buscam

demonstrar determinados aspectos da realidade física e da realidade social, as relações entre

essas duas, bem como com outros sistemas simbólicos (ROCHA, 1995). Dessa forma, o foco

de interesse é deslocado para o simbolismo e para os fenômenos culturais, que são, por

natureza, fenômenos simbólicos e devem ser estudados a partir da interpretação dos símbolos

e das ações simbólicas.

A concepção simbólica de cultura tem sua atenção voltada para a característica única

dos seres humanos: a capacidade de desenvolvimento de linguagens pelas quais expressões

significativas podem ser elaboradas e convertidas pelos indivíduos. Além disso, os seres

humanos têm a habilidade de atribuir significado a construções não linguísticas, como ações,

obras de arte e objetos materiais.

Grosso modo, a concepção simbólica de cultura pode ser descrita como:

O padrão de significados incorporados nas formas simbólicas, que inclui ações, manifestações verbais e objetos significativos de vários tipos, em virtude dos quais os indivíduos comunicam-se entre si [sic] e partilham suas experiências, concepções e crenças. (THOMPSON, 1995, p. 176, grifo do autor)

Embora seja apropriada para o desenvolvimento de uma abordagem construtiva para os

estudos dos fenômenos culturais, essa concepção simbólica tem como debilidade a ausência

de atenção suficiente às relações sociais estruturadas nas quais os símbolos e as ações sociais

estão inseridos. Por essa razão, Thompson (1995) desenvolve o que chama de concepção

estrutural da cultura, de acordo com a qual os fenômenos culturais podem ser entendidos

como formas simbólicas em contextos estruturados e sua análise pode ser entendida como o

estudo da constituição significativa e da contextualização social das formas simbólicas.

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Baseado na concepção cultural de Geertz (1989), Thompson (1995) propõe a análise

estrutural da cultura, que busca relacionar o caráter simbólico a contextos socialmente

estruturados. O autor conceitua essa análise da seguinte forma:

O estudo das formas simbólicas – isto é, ações, objetos e expressões significativas de vários tipos – em relação a contextos e processos historicamente específicos e socialmente estruturados dentro dos quais, e por meio dos quais, essas formas simbólicas são produzidas, transmitidas e recebidas. (THOMPSON, 1995, p. 181)

Na mesma linha, Geertz (1989) sugere que o conceito de cultura é essencialmente

semiótico, isto é, o homem é um animal preso a uma trama de significados elaborada por ele

mesmo. Portanto, o conceito de cultura é um emaranhado de significados que

denota um padrão de significados transmitidos historicamente, incorporado em símbolos; um sistema de concepções herdadas expressas em formas simbólicas por meio das quais os homens comunicam, perpetuam e desenvolvem seu conhecimento e suas atividades em relação à vida. (GEERTZ, 1989, p. 66)

Enfim, para a compreensão do conceito de cultura sob o viés estruturalista, tem-se não uma

ciência positiva, mas sim interpretativa, em busca de significados.

2.2.4 Abordagens culturais

Uma das principais tarefas da antropologia moderna é a reconstrução do conceito de cultura,

uma vez que este, como visto (Cf. Seção 2.2.4), tem sido formulado de maneira fragmentada.

Em 1974, Roger Keesing classifica as tentativas modernas de definição conceitual de cultura

e aponta, em seu trabalho Theories of Culture, duas linhas teóricas que visam definir o termo:

sistema adaptativo e teorias idealistas de cultura. No sistema adaptativo, culturas são sistemas

utilizados para adaptar as sociedades humanas aos seus pressupostos biológicos, sendo a

mudança cultural essencialmente um modo de seleção natural. Sob essa perspectiva, a

tecnologia, a economia de subsistência e os elementos da organização social constituem uma

forma adaptativa da cultura. Por outro lado, a teoria idealista de cultura é subdividida em

sistemas cognitivos, sistemas estruturais e sistemas simbólicos. A teoria baseada em sistemas

cognitivos se diferencia pela “análise dos modelos construídos pelos membros da comunidade

a respeito de seu próprio universo” (LARAIA, 2007, p. 61) e entende cultura como um

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sistema de conhecimento, ou melhor, como tudo que um indivíduo deve saber ou acreditar

para coexistir dentro da sua sociedade. Já a teoria que toma cultura como sistemas estruturais,

de Claude Lévi-Strauss, define o termo como um sistema simbólico proveniente da criação

acumulativa de informações na mente humana e busca descobrir na estruturação dos domínios

culturais (mito, arte, parentesco e linguagem) os princípios da mente que geram essas

elaborações culturais. Por sua vez, a teoria que considera cultura como sistemas simbólicos,

desenvolvida principalmente nos Estados Unidos, tem como um dos principais precursores o

antropólogo Clifford Geertz. Segundo o autor, os significados e os símbolos e seus

significados são fruídos pelos indivíduos inseridos em um sistema cultural, isto é, são

públicos e não privados, estão fora da mente do ser humano e interferem, quase que

diretamente, na visão de mundo (GEERTZ, 1989).

2.2.5 Cultura e visão de mundo

Até o presente, não são raras as menções de determinismos culturais com base em aspectos

genéticos e geográficos. Haja vista as manifestações de pequenos grupos pulverizados no

globo que julgam diferenciar-se dos demais exatamente pela sua posição geográfica e

características genéticas.

Do ponto de vista genético, a diferenciação humana se dá através do dismorfismo sexual,

o que não interfere no comportamento da espécie. Portanto, os aspectos comportamentais são

definidos pela endoculturação, isto é, a conduta de um indivíduo é determinada pela

aprendizagem, ideia previamente demonstrada por John Locke (1978 apud LARAIA, 2007),

através de suas postulações em Ensaio acerca do entendimento humano, no qual o pensador

afirma que a mente humana possui uma capacidade ilimitada de absorção de conhecimento

desde o seu nascimento20. Por outro lado, geograficamente, as diferenças do ambiente físico

especificariam as distintas qualidades entres os indivíduos; contudo, a partir de 1920, estudos

demonstraram que diferenças culturais podem coexistir dentro de um mesmo espaço

geográfico e, atualmente, é correto afirmar que tais determinismos não possuem relação direta

20 Tais colocações sobre diferenciação humana tornam-se mais consistentes através de três inferências de

estudos recentes: (i) o descarte do ponto de vista sequencial da relação entre evolução física e cultural do ser humano em favor de uma perspectiva interativa; (ii) a descoberta de que as principais mudanças que geraram o homem moderno ocorreram em nível cerebral; e (iii) o entendimento de que o homem é fisicamente incompleto, isto é, necessita aprender para poder funcionar.

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com o comportamento dos indivíduos da raça humana. Em outras palavras, as diferenças entre

os homens não podem ser interpretadas com base nas limitações impostas biológica ou

geograficamente, mas sim com base nas suas formas de apreender e enxergar o mundo, o que

é entendido pela antropologia cultural como visão de mundo: “Homens de culturas diferentes

usam lentes diversas e, portanto, têm visões desencontradas das coisas” (LARAIA, 2007, p. 67).

Por visão de mundo entendem-se os aspectos cognitivos e existenciais de determinada

cultura. É a forma como os indivíduos de determinado povo, ou sociedade, enxergam as

coisas através de seu conceito de natureza, de si mesmas e da própria sociedade como um

todo. É através da visão de mundo que indivíduos tornam admissível seu ambiente natural,

que então passa a se apresentar como um reflexo de um verdadeiro estado das coisas. Assim,

as formas como os indivíduos percebem e coexistem no mundo, bem como as avaliações de

ordem moral e valorativa, são fruto de um passado cultural.

Os indivíduos enxergam a realidade através de sua cultura e, portanto, tendem a

considerar seu próprio modo de vida como o mais adequado e natural. Esse comportamento,

considerado um fenômeno universal, pode ser denominado etnocentrismo e tem por ponto

fundamental de referência o próprio grupo. Em outras palavras, sistemas culturais possuem

lógica de funcionamento própria, e a tentativa de transferi-la ou considerar o outro irracional é

um comportamento inerente aos indivíduos. Desse modo, tem-se que a coerência só pode ser

encontrada dentro do mesmo sistema. Como exemplo,

um amontoado de árvores e arbustos só pode ser ordenado quando é classificado através de uma taxonomia. Esta, contudo, não é uma propriedade da botânica ocidental, pois muitas sociedades tribais construíram sistemas de classificação bastante sofisticados para o mundo vegetal que as envolvem. (LARAIA, 2007, p. 92)21

Portanto, o entendimento da lógica de um sistema cultural depende da compreensão de

categorias geradas por esse próprio sistema. Por categorias são entendidos os

21 Com base nos dizeres de Laraia (2007), pode-se entender como indivíduos pertencentes a determinado

sistema cultural o percebem de forma complexa, atribuindo-lhe significados imperceptíveis e estranhos a outros indivíduos.

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princípios de juízo e raciocínios ... constantemente presentes na linguagem, os quais, sem que sejam necessariamente explícitos, existem ordinariamente, sobretudo sob a forma de hábitos e diretrizes da consciência, estas próprias inconscientes. (LARAIA, 2007, p. 93 – fragmento adaptado)

Todavia, vale ressaltar que sistemas culturais são passíveis de mudança e estão em

constante processo de modificação22. Tais alterações devem ser buscadas nas experiências dos

indivíduos e de seus grupos, os quais, governados por símbolos, percebem, sentem, julgam,

raciocinam, agem e expressam ou materializam aspectos culturais simbólicos através de

affordances, de sua cultura material e onde são refletidas suas identidades.

2.2.6 Affordances, cultura material e identidade

Por affordances podem ser entendidas as possibilidades de ações disponíveis em determinado

contexto por determinado agente, ou seja, o modo pelo qual o sujeito percebe o ambiente e o

mesmo [ambiente] possibilita a realização de ações que interfiram sobre o próprio ambiente

(GIBSON, 1986a, 1986b). Assim, affordances estão diretamente ligadas à percepção, vez que

podem ser percebidas pelos indivíduos em determinados ambientes. As affordances descritas

por Gibson não são necessariamente percebidas ou conhecidas, elas apenas existem e estão à

disposição dos indivíduos; tais affordances, na concepção de Norman (s.d), por fazerem parte

do ambiente, podem ser entendidas como affordances reais. Dessa forma, são captadas pelo

sujeito as possibilidades de ação, não as qualidades ou as propriedades de ambientes ou de

objetos (GIBSON, 1982), ou seja, o foco está na possibilidade de realização de um ato, não

nas propriedades específicas de um objeto ou de um ambiente. Ainda no sentido de realização

de possíveis ações, Zingale (2008, p. 62) afirma que affordances são “as guias, as passagens

que permitem a superação de obstáculos”23. Ao ser transposto o conceito de affordance para a

disciplina do design, segundo Lidwell et al.º(2010), determinados objetos e ambientes podem

ser considerados como mais ou menos adequados que outros à funções específicas (i.e., rodas

para girar e salas para lecionar), e o que lhes garante a adequação para a realização de tarefas

22 Na concepção de Laraia (2007), tais processos de mudança podem ser classificados em dois grupos: (i)

mudanças culturais internas e (ii) mudanças provenientes do contato com outros sistemas culturais. As primeiras ocorrem de forma lenta e são consequência dos movimentos do próprio sistema cultural. No segundo caso, considerado o mais atuante nas sociedades humanas por ser considerado um processo de aculturação, tem-se que as alterações podem ser bruscas, mas nem sempre traumáticas.

23 Tradução e plural nosso para: “... il guado, il passaggio che permette di superare un impedimento.”.

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são, normalmente, suas características físicas. Consoante, como acrescenta Krippendorff

(2006), designers que realizam projetos centrados nos usuários desenham produtos

direcionados ao entendimento, mais que dando relevância a aspectos técnicos. Assim, tanto

objetos quanto ambientes, ao apresentarem relação direta às suas funções através de seu

design, têm suas formas de utilização e eficiência melhoradas. No entanto, em design,

Norman (s.d.) destaca a necessidade de se tornar o termo mais preciso: affordance percebida24

ou sugerida. Isso devido à necessidade de preocupação com o que o usuário realmente

percebe acerca da possibilidade de realização de uma determinada ação. Especificamente no

caso do design de produtos, onde são tratados objetos físicos, segundo Norman (s.d.), as

affordances podem ser tanto reais quanto percebidas, ainda que sejam diferentes. Dessa

forma, deve-se ressaltar as interferências diretas provenientes de convenções culturais

compartilhadas dentro de determinados grupos sociais nas affordances reais; ou seja, as

affordances percebidas podem interferir diretamente nas possíveis finalidades de ações

realizadas por parte dos indivíduos.

As finalidades atribuídas aos objetos são provenientes de processos culturais e,

portanto, além de considerações econômicas, também devem ser observados os aspectos

simbólicos intrínsecos à produção material. Segundo Barthes (2006), o objeto é o elemento

mediador entre o homem e sua própria ação no mundo; funciona como ferramenta de

intervenção e de modificação, possibilitando a interferência humana sobre o ambiente, o qual

apenas surge no momento em que o ser humano atribui significados a elementos da natureza e

a artefatos concebidos para a própria superação humana.

Como assevera Sahlins (2003, p. 179), “nenhum objeto, nenhuma coisa é ou tem

movimento na sociedade humana, exceto pela significação que os homens lhe atribuem”.

Destarte, Santos (1994) afirma que o objeto emerge de dois aspectos principais: (i)

intencionalidade humana, isto é, surge como uma representação da extensão dos órgãos dos

sentidos humanos, permitindo o prolongamento dos seus atos25; e (2) materialização de

valores estéticos, funcionais etc., ligados estruturalmente ao contexto, à sociedade,

transformando o concreto em simbólico. É por meio da produção de bens e valores que se

24 Tradução do autor para o termo original cunhado por Norman em inglês: perceived affordance. 25 Em estudos culturais, tal visão dos objetos como extensão da capacidade do homem foi primeiramente

descrita por Alfred Kroeber. KROEBER, A. L. The Superorganic. American Anthropologist, v. 19, n. 2, april/june, 1917.

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constitui e se reflete a identidade cultural de uma sociedade (BOMFIM, 1999) e é possível

afirmar que o indivíduo não possui identidades coerentes, haja vista que elas se modificam de

acordo com as circunstâncias (HALL, 1990b), o que conduz os objetos a uma alternância de

sentidos e significados de acordo com o contexto (DENIS, 1998). Ainda sobre o termo

identidade, Bonsiepe (2011), afirma que, no discurso atual do design, o termo ganha

relevância e assume papel central26.

A manifestação de identidade em produtos ocorre principalmente em três aspectos

informacionais: (i) existência propriamente dita do produto (i.e., condição fenomênica), (ii)

origem do produto (i.e., sistema cultural ao qual pertence) e qualidade do produto (i.e.,

função) (Niemeyer, 2003. Por outro lado, Celaschi (2010) delineia a existência de várias

identidades existentes ou agregadas a produtos (i.e., identidade do designer, do material, do

território, identidade própria e, dentre outras, do próprio consumidor) e além disso, desloca a

nomenclatura objeto para mercadoria contemporânea, onde produtos contém e são

determinados por fatores como forma, função e significado.

Como exposto, tais informações são comunicadas através de elementos da

configuração, materiais utilizados, procedimentos de produção e acabamento, organização das

partes, esquema de cores, odores e possíveis sons produzidos. Assim, desde sua concepção,

são atribuídos significados simbólicos aos objetos e nestes se veiculam informações primárias

e sistemas complexos de signos (BARTHES, 2006). Por conseguinte, o desenvolvimento e a

produção de objetos vão além da concepção lógica e da eficiência material (SAHLINS, 2003).

Tais sistemas complexos podem ser observados, por exemplo, em manifestações culturais

(i.e., as crenças, os mitos27 e os rituais), nas quais os objetos se convertem em representações

simbólicas e terminam por ter suas propriedades materiais enfraquecidas.

2.2.7 Manifestação cultural simbólica através do Mito

O mito pode ser definido como um fenômeno básico da cultura humana e, dada a sua

relevância para os estudos das ciências humanas, tem sido tomado como objeto de pesquisas 26 Bonsiepe (2011) em Design, Cultura e Sociedade, desenvolve, verticalmente, o termo identidade. No entanto,

não cabe, nesta investigação, a ampliação teórica do mesmo. Aqui, tal ampliação poderia ser entendida como uma digressão, vez que, apesar da relevância do conceito de identidade para o discurso contemporâneo do design, nessa fase do estudo, não é tema central .

27 Vale frisar que, neste estudo, somente o mito será abordado (cf. Seção 2.2.7), haja vista a sua estreita relação com os sistemas semiológicos e as formas simbólicas.

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interdisciplinares (NÖTH, 1995). Na concepção de Barthes (1999), o mito é um fenômeno

semiótico cultural, e não uma forma de narrativa: o mito é uma fala, um sistema de

comunicação, uma mensagem não material que pode não ser oral. Portanto, o mito não é um

conceito, um objeto ou até mesmo uma ideia: ele é uma forma, um modo de significação e

possui condições de funcionamento próprias (destarte, qualquer coisa que possa ser julgada

por um discurso pode constituir um mito). É através dos mitos culturais que os indivíduos dão

sentido à sua existência dentro da própria cultura: os mitos culturais expressam e organizam

as formas compartilhadas de conceituação das coisas em sistemas culturais (LAKOFF;

JOHNSON, 1980).

O mito não é definido pelo artefato, mas sim pela mensagem que profere: é uma fala

definida por sua intenção (BARTHES, 1999). Assim, os objetos transitam de uma forma

muda e aberta à apropriação da sociedade, viabilizando um discurso social, não natural e

tampouco material. O que viabiliza essa não materialidade da fala mítica é a pressuposição de

uma consciência significante, isto é, uma imagem é criada tendo em vista determinada

significação – fato esse que transforma uma imagem em uma escrita no momento em que a

primeira se torna tão significativa quanto a segunda. Por conseguinte, objetos se transformam

em fala ao significarem alguma outra coisa.

Isso posto, o mito, como uma fala, um sistema comunicacional, torna-se dependente da

semiologia28, vez que trata do problema da significação. O mito é um valor que não permite

julgamentos, pois em seu significante há ambiguidade que sempre permite uma visão por

outro lado; nele o sentido apresenta a forma e esta, por sua vez, o distancia. No mito, não

ocorrem contradições; forma e sentido nunca estão no mesmo lugar (BARTHES, 1999).

Como surge de conceitos históricos e contingentes, sua natureza é interpretativa; dirige-se ao

indivíduo impondo sua força intencional, obrigando-o a absorver a duplicidade proposital da

sua fala (BARTHES, 1999). A fala mítica é instigante, perturbadora e, simultaneamente,

paralisante: no momento em que atinge o indivíduo, eleva-se e recupera generalidade,

permitindo que o conceito afaste o sentido físico do significante, falsificando-o. “É esse breve

roubo, esse momento furtivo de falsificação, que constitui o aspecto transitório da fala mítica”

(BARTHES, 1999, p. 147), permitindo sua inserção em processos comunicacionais como

28 Cf. Seção 2.3.1.

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formas simbólicas de existência que, por sua vez, possuem características específicas de

funcionamento.

2.2.8 Caracterização das formas simbólicas e sua valorização em objetos de uso

Uma vez inseridas no processo de comunicação em determinados contextos, de acordo com

Thompson (1995) as formas simbólicas podem ser caracterizadas de acordo com seu processo

de concepção, emissão e recepção, podendo-se remeter aos aspectos: intencionais,

convencionais, estruturais, referenciais e contextuais.

Por aspectos intencionais entende-se que as formas simbólicas de expressões são

veiculadas de um sujeito para outro sujeito (ou sujeitos). Em outras palavras, determinadas

formas simbólicas são produzidas e empregadas com o objetivo de expressar aquilo que

determinado indivíduo quer dizer ou tenciona. Para produzir mensagens em códigos para cuja

interpretação se acredita que os receptores tenham a chave, parte-se de dois pressupostos

básicos. Primeiramente, assume-se que objetos enquanto formas simbólicas significativas são

produzidos, construídos ou empregados por um sujeito que deseja agir intencionalmente ou

que esses são percebidos como produzidos intencionalmente por determinado indivíduo. O

segundo pressuposto está relacionado ao fato de que o verdadeiro significado da forma

simbólica nem sempre corresponde àquilo que o sujeito-produtor deseja ou tenciona dizer,

sobretudo quando não há uma relação dialógica entre as formas simbólicas. Em outros termos,

o significado de uma forma simbólica pode depender de uma enorme gama de fatores e a real

intenção do sujeito-produtor pode ser um desses fatores, mas não o único.

O aspecto convencional consiste no fato de que a construção, produção e emprego das

formas simbólicas, assim como sua interpretação pelos receptores, são processos que

envolvem a aplicação das mais variadas regras, códigos e convenções, os quais se alteram de

acordo com as formas que são empregadas, variando desde aspectos gramaticais e estilos de

expressão a convenções que governam a ação e interação entre indivíduos que desejam tanto

se expressar como compreender as expressões de outrem. Contudo, a utilização de regras e

convenções na produção e interpretação das formas simbólicas não significa o completo

entendimento ou a ausência de ruídos no processo de troca de informações ou expressões29.

29 Cf. Seção 2.2.5.

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Na realidade, sua aplicação ocorre em situações práticas, e sua interpretação é realizada com

base em conhecimentos tácitos30 que os indivíduos empregam no dia a dia, criando

significado e dando sentido a expressões alheias. Conhecimentos tácitos são compartilhados

socialmente, o que possibilita correções e aprovação por parte de outros indivíduos e, além

disso, demanda a aplicação de regras, códigos e convenções para a interpretação das formas

simbólicas. Dessa forma, é importante que seja feita a distinção dos processos de codificação

e decodificação de mensagens simbólicas, o que não exige a coexistência de ambas: de um

lado, tem-se por codificação a produção e emprego de formas simbólicas; de outro, a

decodificação consiste na interpretação pelos receptores dessas formas.

O aspecto estrutural estabelece que formas simbólicas possuem, em suas construções,

estruturas articuladas. Nelas podem ser observadas estruturas de elementos que as compõem,

isto é, elementos que permitem que a estrutura simbólica seja analisada formalmente. Por

conseguinte, deve-se realizar uma distinção entre a estrutura e o sistema que está solidificado

em uma determinada forma simbólica. Analisar a forma estrutural é analisar os elementos

específicos e suas inter-relações passíveis de discernimento na própria forma simbólica, na

qual a estrutura é um padrão de elementos que podem ser identificados em casos factuais de

expressão, em efetivas manifestações verbais, em expressões ou em textos. A análise de um

sistema solidificado exige a abstração da forma simbólica em questão e a reconstituição geral

de seus elementos e suas inter-relações, isto é, um sistema simbólico pode ser descrito como

elementos sistêmicos que existem de forma independente de qualquer forma simbólica

determinada e constituem, por si sós, formas simbólicas particulares.

A análise do aspecto estrutural é importante devido aos sentidos dados às formas

simbólicas, os quais, constituídos de traços estruturais e elementos sistêmicos, permitem a

compreensão aprofundada dos significados. Não obstante, tal análise é limitada, pois exaurir

os traços estruturais e sistêmicos é uma tarefa praticamente impossível ante a complexidade

de suas inter-relações e a dificuldade de atribuição “correta” de significado ao que pode

significar algo sobre alguma coisa. Ademais, a análise estrutural limita-se à focalização na

composição interna dos traços estruturais e dos elementos sistêmicos das formas simbólicas,

30 Cf. Nonaka & Konno (1998).

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negligenciando, assim, aspectos referenciais, contextuais e sócio-históricos em que tais

fenômenos simbólicos estão inseridos.

Por aspecto referencial entende-se que as formas simbólicas são construções que

tipicamente representam algo, referem-se a algo e dizem algo sobre alguma coisa. Tal aspecto

abrange o modo geral pelo qual a forma simbólica, em determinado contexto, pode substituir

ou representar um objeto, indivíduo ou situação ou, ainda, em sentido mais específico, referir-

se a um objeto singular; cabe destacar que as formas simbólicas dizem, afirmam ou declaram,

projetam ou retratam algo sobre o indivíduo (THOMPSON, 1995; SANTAELLA, 2007).

No quinto aspecto das formas simbólicas, o aspecto contextual, “as formas simbólicas

estão sempre inseridas em processos e contextos sócio-históricos específicos dentro dos quais

e por meio dos quais elas são produzidas, transmitidas e recebidas” (THOMPSON, 1995, p.

192). Desse modo, expressões corriqueiras empregadas por indivíduos em contextos

estruturados socialmente podem carregar traços das relações sociais referentes a esses

contextos. Portanto, formas simbólicas complexas, como discursos, obras de arte, objetos etc.,

e os modos como são interpretadas e valorizadas pelos indivíduos estão estreitamente

relacionados com os meios pelos quais essas formas são produzidas e transmitidas em

determinado contexto.

Uma vez contextualizadas as formas simbólicas, elas passam, não raramente, por

processos de valorização, avaliação e conflito. Tornam-se objeto do que Thompson (1995)

denomina de processos de valorização, isto é, processos através dos quais são atribuídos

determinados tipos de valor às formas simbólicas.

Não há um consenso acerca do conceito de valor na disciplina do design e tampouco

em outras onde ele é largamente utilizado (BOZTEPE, 2007). Aqui, a especificidade do termo

reside no valor de troca31. Tal abordagem se opõe às correntes objetivistas, em razão da visão

de valor como significado, isto é, os indivíduos não valorizam os produtos pelo que fazem ou

pelo que se propõem a fazer, mas sim pelo que estes significam ante os sistemas de símbolos

conhecidos e compartilhados nas sociedades que os constroem (BAUDRILLARD, 2005, 2007).

Para Moles (1981), valor é a propriedade qualificável associada ao objeto em seu

contato com o indivíduo, formando, assim, um ponto de atração variável de acordo com o

31 Cf. Lourenço (2006).

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contexto cultural. Por conseguinte, há uma infindável possibilidade de variações de valores (e

de formas de valorização) a serem associados aos objetos. Holbrook (1999) define o termo

como experiência, isto é, “o valor não reside no produto comprado, nem na marca escolhida

e, tampouco, no objeto possuído, mas sim nas experiências de consumo provenientes dele,

do produto”32. Segundo Boztepe (2007), valor pode ser definido como prática ou resultado

simbólico gerado pela interação entre o produto e o usuário; logo, também está estreitamente

relacionado à experiência.

Moles (1981), que conta com o respaldo de Thompson (1995), estabelece a distinção

entre valorização econômica e simbólica. A primeira33 é o processo pelo qual é dado valor

econômico às formas simbólicas para que possam ser trocadas em um ambiente de comércio.

Por valorização simbólica tem-se o processo pelo qual os indivíduos que as produzem e as

recebem atribuem um determinado valor às formas simbólicas. Nesses termos, ao criarem

uma relação de estima com determinados objetos, os indivíduos que os produzem ou os

recebem atribuem-lhes valores simbólicos, ou seja, aprovam-nos ou condenam-nos, apreciam-

nos ou desprezam-nos. No entanto, às formas simbólicas podem ser atribuídos vários níveis

de valor, isto é, um mesmo objeto, dependendo do contexto, pode ser admirado por uns e

desprezado por outros. Tal fenômeno pode ser descrito como um conflito de valorização

simbólica, o que ocorre em contextos socialmente estruturados caracterizados por assimetrias

de vários tipos, o que garante variação no status de significação das formas simbólicas.

O valor para o usuário é proveniente da combinação entre as propriedades dos

produtos e a forma específica como cada usuário, em seu contexto, relaciona-se com eles. Em

estudo recente, o compartilhamento social e cultural de significados (i.e., símbolos, rituais,

mitos e tradições) foi identificado como fundamental na experiência de uso de produtos e

como categorias de valor simbólico identificadas foram relacionadas, dentre outras: valor de

significância social, valor emocional e valor espiritual34 (BOZTEPE, 2007).

32 Tradução do autor para: “[…] value resides not in the product purchased, not in the brand chosen, not in the

object possessed, but rather in the consumption experience(s) derived therefrom” (grifos no original). 33 Não cabem aqui detalhamentos sobre os aspectos da valorização econômica; embora sejam também

relevantes, foi dada ênfase apenas às formas de valorização simbólica. Ademais, os conflitos que surgem em circunstâncias reais entre ambos os tipos de valorização se sobrepõem de formas complexas (Thompson, 1995), não sendo cabíveis digressões neste momento.

34 Neste estudo, não cabem digressões sobre todos os aspectos relacionados às categorias gerais e específicas tratadas pela autora. Cf. Boztepe (2007).

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Apoiando-se na mesma autora e retomando a Seção 2.2.6 deste trabalho, pode-se dizer

que o valor de significância social se refere aos benefícios relacionados à construção – através

da posse de produtos e da experiência com eles – de reputação individual entre sujeitos

pertencentes ao mesmo grupo. Veblen35 (1899 apud BOZTEPE, 2007) afirma que os

indivíduos utilizam artefatos como veículo de afirmação dentro do nexus social, do que se

pode depreender que o simples fato de possuir um objeto da moda é fato suficiente para se

demonstrar determinada imagem. Goffman (2004) dá a esse valor de utilização de objetos

como veículo para a obtenção de distinção da imagem individual a denominação de

administração da imagem, a qual depende não apenas da imagem estática do objeto, mas,

sobretudo, da sua forma de utilização e dos resultados obtidos com o seu emprego. Em outros

termos, um indivíduo utiliza uma série de “coreografias” com o objetivo de controlar

impressões formadas a seu respeito pelos demais integrantes do grupo.

O valor emocional está relacionado com os benefícios efetivos do objeto, como prazer

e diversão, proporcionados aos indivíduos – benefícios esses correspondentes a prazeres

estimulados pelas sensações provocadas pelo produto. Como descrito por Norman (2003,

2004), valores emocionais são considerados um fenômeno psicológico. Como exemplo, tem-

se que a percepção local de estético pode afetar o que os indivíduos consideram prazeroso, e o

que é considerado moda também pode variar dependendo do contexto.

Finalmente, por valor espiritual entendem-se as crenças no sobrenatural, ou seja, a

apreciação de produtos pela boa sorte. Contudo, nesse aspecto não foram encontradas

aplicações ou evidências empíricas relevantes.

Isso posto, mostram-se pertinentes a identificação e a análise de padrões culturais que

permeiam a relação dos indivíduos em seus próprios contextos.

2.2.9 Análise cultural

Os padrões culturais são programas que fornecem um gabarito ou diagrama para a

organização dos processos sociais e psicológicos, o que pode ser considerado análogo aos

sistemas genéticos, os quais fornecem um modelo para a organização dos processos orgânicos

(GEERTZ, 1989). Tais padrões culturais são importantes devido à necessidade do ser humano

35 VEBLEN, T. The theory of the leisure class. Nova Iorque: The Modern Library, 1899.

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em ser guiado de alguma forma: como seu comportamento não é programado

fisiologicamente, a grande generalidade, disseminação e variabilidade da capacidade de

resposta do homem é conduzida por tais padrões. Ademais, o homem é um ser que se

completa, é agente da própria construção e, através de sua capacidade específica, cria modelos

simbólicos. Esses símbolos, ou códigos culturais, podem ser entendidos como mapas para o

posicionamento do homem diante do não familiar, isto é, diante de circunstâncias em que as

guias de comportamento, pensamento ou sentimento institucionalizado são fracas ou

inexistentes.

Estudar os códigos simbólicos partilhados em determinada estrutura social consiste em

investigar a cultura dessa estrutura. Como assevera Schneider°(1968),

cultura é um sistema de símbolos e significados. Compreende categorias ou unidades e regras sobre as relações e modos de comportamento. O status epistemológico das unidades ou ‘coisas’ culturais não depende da sua observabilidade: mesmo fantasmas e pessoas mortas podem ser categorias culturais. (apud LARAIA, 2007, p. 63)

Sendo assim, a investigação da cultura, a totalidade de tais padrões, pode ser entendido

como o estudo da maquinaria que os indivíduos ou grupos de indivíduos empregam para

orientar a si mesmos em um mundo que, de outra forma, seria obscuro.

A análise cultural é a definição de estruturas de significação e a determinação de sua

base social e de sua importância. A questão reside, pois, em “uma multiplicidade de estruturas

conceituais complexas, muitas delas sobrepostas ou amarradas umas às outras, que são

simultaneamente estranhas, irregulares e inexplícitas” (GEERTZ, 1989, p. 7). Contudo, deve

ser tomada com ressalvas a proposta de análise cultural partindo dos próprios sistemas

simbólicos, pelo isolamento dos seus elementos, especificando as relações internas entre eles

mesmos e passando a caracterizar todo o sistema geral. O comportamento deve ser observado

com primazia, uma vez que é através dele – ou da ação social em artefatos e em estados de

consciência – que as formas culturais encontram articulação. Enfim, é através das práticas

comportamentais que é possível ter acesso empírico aos sistemas simbólicos.

Assim, a análise cultural torna-se “uma adivinhação dos significados, uma avaliação

das conjecturas, um traçar de conclusões explanatórias a partir das melhores conjeturas, e não

a descoberta do Continente dos Significados e o mapeamento da sua paisagem incorpórea”

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(GEERTZ, 1989, p. 14). Portanto, o objetivo geral da análise simbólica, ou em outros termos,

análise semiótica da cultura é possibilitar o diálogo entre a ciência e o objeto de estudo, o ser

humano. Em estudos culturais, cujo objetivo é a análise do discurso social, os significantes

são ações simbólicas ou um grupo de ações simbólicas. Disso depreende-se que a análise

cultural possui bases trêmulas e quanto mais profunda mais incerta e incompleta ela é;

destarte, a adoção de um conceito semiótico de cultura e uma abordagem interpretativista da

mesma implicam na aceitação da contestabilidade de tal análise.

A análise cultural corresponde ao estudo da constituição significativa e da

contextualização social das formas simbólicas. As ligações entre os sistemas culturais e os

modos de experimentação não devem ser simplesmente presumidas. A dificuldade da análise

cultural reside na forma de se determinar tanto as independências como as interligações de

tais sistemas e, além disso, descobrir como determiná-las. Dessa forma, tal análise diz respeito

a uma pesquisa dos símbolos significantes em vários níveis de ligação entre si – níveis esses

que são os veículos materiais da percepção, da emoção e da compreensão. Disso, tem-se que

as formas simbólicas não podem ser entendidas como material de análise cultural com fins

positivistas; o caráter semiótico não é intrínseco aos objetos, dentre outras formas de

manifestações simbólicas que o possuem, mas sim imposto a essas formas.

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2.3 SEMIÓTICA

Esta seção36 apresenta uma visão geral sobre o conceito de semiótica e expõe as bases para o

entendimento das articulações dos processos de atribuição sígnica e significativa aos objetos

de uso (em outras palavras, descreve os processos de constituição dos signos e das

significações interna e externamente ao indivíduo) e, além disso, explicita os fundamentos

relacionados à semiótica a serem aplicados no projeto ora proposto.

2.3.1 O termo semiótica

A etimologia do termo semiótica tem suas origens no grego semeîon, que significa signo, e

sêma, que pode ser traduzido por “sinal” ou também “signo”. Semio- é uma latinização do

termo original grego e os radicais parentes, sema(t)- e seman-, são ocupados como bases

morfológicas para várias derivações de vocábulos que designam as ciências semióticas.

Do ponto de vista histórico, o termo semiótica vem convivendo com rivais e

precursores terminológicos, tais como semeiologia, semassiologia, semologia etc. Destarte,

dentre essas, a terminologia mais expressiva tem sido semiologia, utilizada em 1659 pelo

filósofo alemão Johannes Schulteus para tratar de uma doutrina geral do signo e do

significado – intitulada Semeilogia Metaphysiké – e, ainda hoje, empregado

indiscriminadamente pela literatura sobre o tema.

De forma pluralista, o termo semiótica pode ser entendido como a ciência dos signos e

dos processos significativos na natureza e na cultura, a ciência que investiga todas as

linguagens possíveis ou, ainda, a ciência que busca analisar as formas de constituição de todos

e quaisquer fenômenos como fenômenos de produção de significação e de sentido. Tais

definições, a despeito das semelhanças, não são aceitas por todas as escolas interessadas no

termo, muitas das quais buscam restringir a utilização do termo apenas ao âmbito da

comunicação humana.

No século XX, a semiologia se restringe à tradição dos estudos linguísticos de

Ferdinand de Saussure e de semioticistas como Louis Hjemslev ou Roland Barthes. Ainda

assim, os semioticistas elaboraram distinções conceituais entre ambos os termos: semiótica e

36 Cumpre sublinhar que as Seções 2.3.1 a 2.3.2 se pautam basicamente nas obras de Nöth (2003) e Santaella

(2007). Para evitar repetição excessiva, limita-se, nessas seções, à explicitação das referidas fontes apenas nas circunstâncias estritamente necessárias, como no caso de citações diretas.

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semiologia. O primeiro designa uma ciência mais geral dos signos, incluindo os signos

animais da natureza, enquanto o segundo refere-se a uma teoria dos signos humanos, culturais

e, especialmente, textuais. De acordo com Santaella (2007), o termo semiologia está

diretamente ligado a aspectos linguísticos e caracteriza-se pela apropriação de concepções

pressupostas à linguagem verbal articulada para o domínio de todos os outros processos de

linguagens não verbais, o que explica por que não raramente a semiologia é preenchida por

aspectos teóricos provenientes de áreas como a teoria da comunicação e informação, a

semântica, a antropologia, o estudo dos mitos e a simbologia.

De forma sucinta, Eco (2005a) define semiologia como uma teoria geral dos

fenômenos de comunicação, entendidos como elaboração de mensagens com base em códigos

convencionados como sistemas de signos formalizados; ao passo que as semióticas

correspondem a tais sistemas de signos formalizados ou formalizáveis. Hjelmslev37 (1961

apud NÖTH, 2003), por sua vez, assume a semiótica como um sistema de signos com

estruturas hierárquicas análogas à linguagem – língua, sinais de trânsito, arte, música ou

literatura –, e a semiologia como a metassemiótica de tais sistemas, tratando dos aspectos

semióticos comuns a todos os sistemas semióticos.

Consoante Nöth (2003), é ainda mister fazer uma distinção entre o desenvolvimento da

semiótica propriamente dita e os estudos semióticos avançados. Os estudos semióticos, que

coincidem com a origem da filosofia, especialmente em Platão e Aristóteles, tiveram seu

início com Johann Heinrich Lambert (1728-1777), que publicou um tratado filosófico

específico intitulado Semiotik, e com John Locke (1632-1704), que lançou o Essay on Human

Understanding (1690) postulando uma doutrina dos signos com o nome de semeiotiké. Essa

doutrina pode ser entendida como semiótica avant la lettre, abarcando todas as investigações

sobre a natureza dos signos, da significação e da comunicação na história das ciências.

A semiótica propriamente dita tem suas raízes na história da medicina, entendida como

estudos diagnósticos dos signos das doenças e utilizada pelo médico Galeno de Pérgamo

(139-199 d.C.) para inserir a diagnóstica como a parte semiótica da medicina. Atualmente, o

termo, na medicina, foi abandonado ou restrito à sintomatologia.

37 HJELMSLEV, L. Prolegomena to a theory of language. Madison: University of Wisconsin Press, 1961.

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71

Em 1969, a Associação Internacional de Semiótica, por iniciativa de Roman Jakobson,

determinou a utilização da semiótica como termo geral do território de investigações tanto no

âmbito da semiologia quanto da semiótica geral.

2.3.2 A conceituação lógica do signo

Para a compreensão e o conhecimento de qualquer fenômeno, a consciência produz um signo,

sendo que tal acontecimento está situado no nível da percepção, isto é, consiste na

interposição de uma camada interpretativa entre a consciência e o que é percebido. Dessa

forma, é estabelecida a relação do homem com o mundo: ele o interpreta através de uma

representação de outra representação, o que Peirce definiria como Interpretante da inicial.

Assim, há uma relação de dependência de conhecimento na representação entre os dois

signos. Para se conhecer e conhecer, o homem traduz signos em signos. Em síntese, um signo

está em uma relação de três elementos envolvidos em uma ação bilateral ad infinitum: de um

lado, ele representa o que está fora dele, o objeto; do outro, ele se dirige a um indivíduo, que,

por sua vez, processa-o, traduzindo-o em um novo signo que possa ser entendido. Enfim, o

significado é algo que se move e se furta incessantemente, garantindo ao ser humano o que se

pode chamar de consciência interpretativa.

Na obra de Peirce38, existem múltiplas conceituações para o termo signo. Dentre elas,

Santaella (2007, p. 58) destaca:

Um signo intenta representar, em parte pelo menos, um objeto[,] que é, portanto, num certo sentido, a causa ou determinante do signo, mesmo se o signo representar seu objeto falsamente. Mas dizer que ele representa seu objeto implica que ele afete uma mente, de tal modo que, de certa maneira, determine naquela mente algo que é mediatamente devido ao objeto. Essa determinação da qual a causa imediata ou determinante é o signo, e da qual a causa mediata é o objeto, pode ser chamada o Interpretante.

Em outras palavras, o signo é algo que representa algo: seu objeto. Portanto, o signo só

pode existir na condição de representar outra coisa diferente dele mesmo. Ele não é o objeto

em si, mas sim o que está no lugar dele, independente da natureza desse objeto, como uma

imagem mental ou palpável, uma ação ou mera reação gestual etc. Assim, ele só pode 38 Charles Sanders Peirce (1839-1914) é considerado o precursor mais importante da semiótica moderna e pode-se dizer que

seu objeto de estudo é a semiose.

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representar o objeto de certa forma e em uma determinada capacidade. Contudo, vale reter a

conceituação de Interpretante, que não está vinculada o intérprete do signo, mas sim com o

processo relacional que se cria na mente do intérprete. A partir da relação de representação

signo-objeto, é gerado na mente do intérprete outro signo, traduzindo-se, desse modo, o

primeiro.

Uma representação gráfica, como a da FIGURA 5, é válida para o melhor

entendimento das relações entre os signos, objetos e interpretantes.

FIGURA 5. Definição gráfica de signo Fonte: Santaella (2007, p. 59).

Na terminologia adotada por Peirce e demonstrada na FIGURA 6 a seguir, o

representamen é tomado como o primeiro elemento que se relaciona com o objeto (segundo),

habilitado a determinar um terceiro, o Interpretante (NÖTH, 2003). O representamen é a

denominação dada por Peirce ao objeto perceptível (CP, 2.230)39 utilizado como signo para o

receptor e é considerado como o veículo do objeto à mente do próprio receptor, ou o signo em

si mesmo.

39 Nas citações referentes ao trabalho de Charles Sanders Peirce, Collected Papers (CP), os números se referem aos volumes e aos seus respectivos parágrafos: p. ex. (CP, 2.308).

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FIGURA 6. Triângulo semiótico de Peirce Fonte: adaptado de Chandler (2007, p. 30)

O objeto, segundo elemento do signo, corresponde ao referente, à coisa em uma

relação que tem por função apenas aproximar o intérprete do representamen. Os objetos

podem ser uma coisa material do mundo do qual há um conhecimento perceptivo (CP, 2.230)

ou uma entidade mental ou imaginária de um pensamento ou signo (CP, 1.538). No entanto,

Peirce ainda delimita uma terceira possibilidade de existência do objeto além das

supracitadas: uma coisa que é inimaginável em determinado sentido.

Peirce reconhece dois tipos de objetos: imediato e mediato. O primeiro é uma

representação mental do objeto, quer ele exista ou não. É o objeto dentro do signo; é o objeto

“como o signo mesmo o representa e cujo ser depende, portanto, da representação dele no

signo” (CP, 3.536); o objeto imediato refere-se à forma enquanto objeto dinâmico, aquilo que

o signo substitui, e está representado no signo. O objeto mediato, real ou dinâmico é “o objeto

fora do signo”; é a “realidade que, de determinada maneira, realiza a atribuição do signo à sua

representação” (CP, 4.536). É, pois, aquilo que só pode ser indicado, cumprindo sublinhar que

o signo não pode se expressar por si só, mas sim a partir de algo que o intérprete define por

experiência própria (CP, 8.314).

O terceiro elemento constituinte do signo é a significação desse signo, ou Interpretante

(NÖTH, 2003), definido por Peirce como o próprio resultado significante, isto é, o efeito do

signo (CP, 5.474). De acordo com a teoria peirceana das ideias e com seu conceito de

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semiose, “um signo dirige-se a alguém, isto é, cria na mente dessa pessoa um signo

equivalente, ou talvez um signo mais desenvolvido. [...] o signo assim criado [é] o

interpretante do primeiro signo” (CP, 2.228). Dessa forma, percebe-se a noção de semiose

ilimitada definida por Peirce, por meio da qual um signo cria um interpretante que pode ser

considerado um representamen de outro signo e assim ad infinitum (CP, 2.92, 2.303).

Destarte, há uma geração sucessiva de signos, não sendo apresentados nem o primeiro nem o

último. Tal processo de semiose, apesar de sempre se dirigir a outro como uma espiral

ilimitada, pode ser suspenso, interrompido, mas não finalizado (CP, 5.284).

Como no caso dos objetos, Peirce também classifica o interpretante em classes de

forma triádica, subdividindo o efeito do signo sobre a mente do intérprete e descrevendo três

categorias maiores de interpretantes: o imediato, o dinâmico e o final. A primeira categoria, o

interpretante imediato, está relacionada com a qualidade natural da impressão, isto é, com a

potencialidade de representação não reflexiva, a qual um signo é capaz de produzir sem uma

reação real (CP, 8.315). O interpretante dinâmico, considerado a segunda categoria, está

relacionado com o resultado direto gerado no intérprete por um signo; é a coisa

experimentada individualmente e que se distingue em cada caso de interpretação; é cada

efeito que qualquer indivíduo pode produzir; tal experiência depende da natureza do signo e

do seu potencial como signo.40 A última categoria definida por Peirce, a do interpretante final,

está ligada ao hábito e à lei, ou à interpretação final decisiva a que cada intérprete pode chegar

(CP, 8.184). Caso o signo seja convencional ou de lei, o interpretante é um signo que retorna

ao signo anterior e o traduz em um signo de igual natureza, e assim infinitamente, o que é

denominado por Peirce como interpretante em si, haja vista que, nesse caso, há uma

generalidade de respostas com relação ao signo em determinadas condições.

2.3.3 Semiótica e objetos de uso

Entendida a semiótica não apenas como a ciência dos sistemas de signos propriamente ditos,

reconhecidos e reconhecíveis, mas como a ciência que analisa todos os fenômenos culturais

como sistemas de signos e de comunicação, pode-se dizer que é nos objetos de uso onde

40 De acordo com Santaella (2007), há, ainda, o interpretante dinâmico energético, que pode ser caracterizado

por uma influência externa, uma ação concreta, que altera a resposta do interpretante dinâmico, sendo o interpretante dinâmico energético considerado o segundo nível do interpretante dinâmico.

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reside o maior desafio da realidade a ser explicada. Tal provocação se explica pelo fato de os

objetos de uso, a princípio, não comunicarem, mas sim funcionarem. Sendo assim, o primeiro

problema que se apresenta para a semiótica no momento em que deseja desvendar os

fenômenos culturais é saber se funções podem ser também interpretadas sob o aspecto

comunicacional e se a observação dessas funções sob esse ângulo impediria sua compreensão

e definição exatamente como funções, permitindo outros tipos de funcionalidade, também

essenciais (ECO, 2005a).

Na perspectiva de Barthes (2006), uma vez caracterizada a existência de um grupo

social, qualquer forma de utilização é convertida em um signo dela mesma. Assim, um objeto

de uso que executa determinada função, não só a possibilita, como também a promove.

Porém, afirmar que um artefato promove determinada função aponta, da mesma forma, que

ele assume uma função comunicacional, informando a função a ser executada; e, em um

contexto social, veicula a adequação de suas formas de uso. Em outros termos, um artefato

promove determinada função e significa o modo como tal função deve ser executada (ECO,

2005a).

Entretanto, Eco (2005a) levanta a questão de se o que vem sendo entendido agora

como comunicação não seria apenas estimulação, sendo o estímulo um emaranhado de

acontecimentos sensoriais que conduzem a determinada resposta, que pode ser imediata ou

mediata. Respostas imediatas advêm de estímulos sensoriais que não são resolvidos com a

percepção, não fazendo parte, portanto, da inteligência e não transpondo apenas uma resposta

motriz. Por outro lado, as respostas mediatas dependem do reconhecimento da relação entre

objetos, o que pode ser considerado uma situação além de uma pura relação estímulo-

resposta, conduzindo a um procedimento intelectivo que sofre intervenções de processos

sígnicos. A identificação dos signos relacionados a tais processos é realizada com base no

reconhecimento de informações passadas, apreendidas; o indivíduo, tendo reconhecido os

signos, ou signo, torna-se capaz de perceber o estímulo proposto e a possibilidade de uma

função realizável. Desse modo, a utilização dos objetos de uso se estende para além das

funções possíveis, abrangendo os significados associados que dispõem ao indivíduo usos

funcionais. Destarte, objetos podem denotar e conotar funções específicas de acordo com o

sistema cultural em que estão inseridos.

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2.3.4 Denotação e conotação

Denotação e conotação são conceitos importantes e úteis que estabelecem distintas relações

entre significante e significado. Esses termos permitem a descrição de dois significados

(conotativo e denotativo), ambos relacionados ao repertório cultural dos indivíduos

(CHANDLER, 2007).

Por denotação entende-se o literal, o sentido atual do signo ou ao significado comum e

opera no nível do significante (HJELM, 2002, CHANDLER, 2007); em objetos de uso,

refere-se ao que um produto é: um sofá, um refrigerador, uma joia etc. Pode ser adicionada,

no caso dos objetos de uso, a função básica de um produto ou o modo de utilização desse

objeto: um sofá para assentar-se, um refrigerador para conservar alimentos, uma joia para

adornar e assim analogamente em outros objetos. Segundo a mesma autora, tais conceitos

parecem ser bastante óbvios; no entanto, no mundo contemporâneo, saber o que é um produto

e como utilizá-lo pode constituir uma atividade um tanto quanto difícil; mas essa é exatamente

uma das tarefas de que se incumbe a semiótica de produtos. Produtos devem ser ambíguos e

de fácil uso e, ainda, ter suas funções claramente comunicadas, não necessitando

(preferencialmente) de manuais de instrução.

Sabe-se que, além dos sentidos literais, outras concepções, ou conceitos, podem ser

atribuídas aos objetos, o que ocorre no nível do significado e é definido como conotação

(HJELM, 2002). O termo conotação é utilizado como referência a associações específicas,

isto é, atribuições de sentido socialmente construídas, ou personalizadas, no objeto. Assim, a

conotação é dependente do contexto, fazendo com que os signos sejam mais abertos a uma

maior gama de interpretações.

A denotação e a conotação são usualmente apresentadas como níveis diferentes de

sentidos e Barthes (1999) introduz a ideia de novas ordens de significação. A primeira ordem

de significação é a própria denotação, isto é, o signo consiste em significante e significado41.

A segunda ordem, ou conotação, consiste no uso do signo denotativo como significante,

sendo a ele é atribuído novo significado.

41 Cf. Seção 2.3.5: FIGURA 7, p. 79.

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Não obstante, a separação entre a primeira e a segunda ordem de significação é difícil,

o que gerou, conforme aponta Barthes (1999), a terceira ordem de significação: o mito42.

Trata-se de ideologias dominantes que sofrem mudanças ao longo da história, isto é, “o mito

tem efetivamente uma dupla função: designa e notifica, faz compreender e impõe [...];

transforma história em natureza” (BARTHES, 1999, p. 139). Para sua manutenção, os mitos

geram seus signos e códigos e podem ser entendidos de forma estendida como metáforas que

auxiliam os indivíduos a dar sentido às suas experiências dentro de suas respectivas culturas

(LAKKOF; JOHNSON, 1980). Portanto, os mitos têm por função tornar naturais formas

ideológicas, fazendo com que valores históricos e culturais, atitudes e crenças se tornem

“naturais” e façam, assim, parte do senso comum (BARTHES, 1999). Vale aqui ressaltar que

a conversão de formas artificiais a naturais se dá, não raramente, através do design e, nos

dizeres de Forty (1986 apud HJELM, 2002, p. 6): “diferentemente da mídia mais ou menos

efêmera, o design tem a capacidade de lançar mitos em formas duradouras, sólidas e

tangíveis, parecendo, assim, eles mesmos a própria realidade”43. Tais conversões, quando

tratadas de modo contextualizado, isto é, quando similares e consideradas em ambientes

culturais distintos, podem apresentar, ainda, diferentes formas de articulação.

2.3.5 Mito e semiologia: articulações simbólicas

No âmbito da semiótica, os mitos são interpretados como discursos culturais que consistem

em significados conotativos impressos em níveis denotativos (CHANDLER, 2007; NÖTH,

1995).

Portanto, a semiologia, ou semiótica como aqui entendida44, estuda a relação entre dois

termos, o significante e o significado, estabelecendo uma relação de equivalência entre dois

elementos. Entretanto, vale ressaltar que em um sistema semiológico, diferentemente da

linguagem comum, devem ser considerados três termos: o significante, o significado e o

signo, que é a resultante associativa dos dois primeiros e exemplificado por Barthes:

42 Cf. Seções 2.2.7 e 2.3.5. 43 Tradução do autor para: “unlike the more or less ephemeral media, design has the capacity to cast myths into

enduring, solid and tangible form, so that they seem to be reality itself ”. 44 Cf. Seção 2.3.1.

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Temos um ramo de rosas: faço-o significar a minha paixão. Não só existem rosas “passionalizadas”. Mas, no plano da análise, estamos perante três termos; pois estas rosas carregadas de paixão deixam-se perfeita e adequadamente decompor em rosas e em paixão: esta e aquelas existiam antes de se juntarem e formarem este terceiro objeto, que é o signo. (BARTHES, 1999, p. 135, grifo no original)

Com esse exemplo, o autor deixa claro como um signo é composto e decomposto.

Nesse caso, após a formação do terceiro elemento [paixão], o significante [rosas] esvazia-se,

dando espaço à plenitude do signo e à formação de um sentido. No plano da experiência, não

é possível a dissociação entre as rosas e a mensagem e, no plano da análise, não se pode

confundir o significante “rosas” com o signo “rosas”45.

O mesmo sistema semiológico [o significante, o significado e o signo] pode ser

encontrado no mito, o qual, porém, apresenta uma particularidade: a existência de um

segundo sistema semiológico, como mostrado na FIGURA 8. O que no primeiro sistema é

tido como signo é, no sistema mítico, caracterizado como significante, valendo aqui sublinhar

que as matérias-primas para a fala mítica (i.e., linguagem, fotografias, pinturas, ritos e

objetos) se reduzem simplesmente à função significante. O mito considera apenas a resultante

global da primeira cadeia semiológica: um signo global. É esse signo global que dá início ao

sistema aumentado pelo mito construído.

45 Tal distinção entre os três elementos constituintes do signo torna-se importante para o entendimento do mito

como sistema semiológico, vez que este é construído e historicamente mutável.

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FIGURA 7. Cadeia semiológica do mito Fonte: adaptado de Barthes (1999, p. 137).

Com base na FIGURA 7, no mito se apresentam dois sistemas semiológicos: a

linguagem, ou modos de representação que lhe valem, e seu próprio sistema. Barthes (1999)

preferiu denominar esses sistemas respectivamente de linguagem-objeto e metalinguagem,

como se pode observar na FIGURA 8. Todavia, a primeira cadeia, no caso do mito, não deve

ser considerada além do seu respectivo signo global, que lhe atribui sentido, resultante da

interação entre os outros elementos do signo, o qual, por sua vez, passa a exercer função

significante; e é, por isso, que as outras linguagens, como a escrita ou a imagem, vistas como

linguagem-objeto, podem ser tratadas da mesma forma.

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FIGURA 8. Dupla articulação do sistema semiológico no mito Fonte: elaborada pelo autor com base em Barthes (1999)

Ao avançar em direção ao mito, cabe especificar seus elementos, sua terminologia. No

mito, o significante pode ser visto de modo ambíguo: é denominado sentido no âmbito da

língua e forma nele mesmo. O significado continua sendo denominado como conceito. Já o

terceiro termo, o signo, no mito se apresenta como significação, dada a sua dupla função:

“designa e notifica, faz compreender e impõe” (BARTHES, 1999, p. 139), como mostra a

FIGURA 9.

FIGURA 9. Definição gráfica da articulação mítica Fonte: elaborada pelo autor com base em Barthes (1999)

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Sentido e forma se apresentam de modo concomitante no mito, vazio de um lado e

pleno de outro. Como sentido, o mito já prende a leitura e tem uma realidade sensorial, possui

uma história e uma significação, pressupõe “um saber, um passado, uma memória, uma ordem

comparativa de fatos, de ideias, de decisões” (BARTHES, 1999, p. 139). Segundo o mesmo

autor, ao transformar-se em forma, o mito tem seu sentido enfraquecido e é, paradoxalmente,

forçado a fazer com que seu significante busque significado próprio. Contudo, o principal

aspecto dessa relação é que a forma não anula o sentido; ela apenas o enfraquece, deixando-o

à sua disposição e transformando-o em uma reserva histórica. A forma precisa da relação

“parasitária” estabelecida com o sentido, isto é, precisa se apoiar nele, voltar às raízes e por

vezes ali se alimentar; e, acima de tudo, a forma precisa se esconder no sentido.

“O conceito restabelece uma cadeia de causas e efeitos, de motivações e de intenções”

(BARTHES, 1999, p. 140). Através dele é implantada, no mito, uma nova história, ou melhor,

ao passar de sentido a forma, o mito perde seu passado tornando-se disponível para o saber do

conceito, o qual, por sua vez, é um saber confuso, composto por relações esmaecidas,

ilimitadas, de cuja função dependem a unidade e a coerência (BARTHES, 1999). Assim, a

principal característica do conceito mítico é a possibilidade de apropriação, isto é, o conceito

permite diferentes entendimentos ou percepções acerca da mesma forma. Em outras palavras,

o significado, no conceito mítico, pode ter inúmeros significantes. Os conceitos míticos

podem se construir, se alterar, se desfazer e desaparecer completamente e, por serem

históricos, podem pela própria história ser eliminados.

Em semiologia, a resultante entre dois elementos é denominada significação, e o mito é

justamente essa significação. No mito, os dois primeiros elementos – forma e conceito – estão

presentes; o mito não tem por função esconder, mas sim deformar. “Não há nenhuma latência

do conceito em relação à forma: não é absolutamente necessário um inconsciente para

explicar o mito” (BARTHES, 1999, p. 143). A presença da forma é literal e estende-se, o que

se deve à natureza já constituída do significante mítico, que só pode oferecer-se através da

matéria – diferentemente do significante linguístico, que se apresenta de forma psíquica. No

mito visual, a extensão é multidimensional: os elementos da forma, espacial, estabelecem

relação de lugar, ao passo que o conceito é disforme, fluido. Assim, o que liga o conceito à

forma no mito é uma relação de deformação, que só é possível devido ao fato de a

constituição da forma no mito já ser previamente concebida por um sistema de significação

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anterior, cultural. No mito, o significante possui duas faces: uma tomada pelo sentido, plena, e

outra vazia, a forma; sendo a primeira deformada pelo conceito.

A significação, resultante da relação entre forma e conceito, é sempre motivada. O

mito precisa da duplicidade da forma para que possa existir, isto é, a analogia entre forma e

sentido dá sentido à linguagem mítica, motivando o mito. Barthes (1999, p. 149) exemplifica:

Tenho diante de mim uma coleção de objetos, tão desordenada que não consigo descobrir-lhe nenhum sentido; poderia parecer que neste caso, privada de sentido prévio, a forma não pudesse enraizar em nenhum lugar a sua analogia e que o mito fosse impossível. Mas o que a forma pode sempre, pelo menos, oferecer à interpretação é a própria desordem: pode conferir uma significação ao absurdo, fazer do absurdo um mito.

As analogias atribuídas às formas são geradas através da história, mas a analogia entre

forma e conceito nunca é completa. Destarte, a linguagem mítica prefere se apropriar de

figuras enfraquecidas, pobres, incompletas, nas quais o sentido está aberto para diversas

significações e a motivação é passível de ser escolhida entre diversas possibilidades.

2.3.6 Signos e objetos de uso

Os signos dos objetos de uso devem ser caracterizados “apenas com base num significado

codificado que um dado contexto cultural atribui a um significante” (ECO, 2005a, p. 196).

Dessa forma, os códigos são construídos como modelos estruturais postulados com hipóteses

teóricas, ainda que embasadas em constâncias inferidas pela observação dos usos

comunicacionais. Tal imposição semiótica admite, no signo dos objetos de uso, a existência

de um significante, cujo significado é a função por ele possibilitada.

Diante desse ponto de vista semiológico – fazendo diferenciação entre significantes e

significados, sendo os primeiros observáveis e descritíveis, prescindindo dos significados que

lhes são atribuídos, e os segundos variáveis de acordo com os códigos traduzidos a partir dos

significantes –, torna-se possível o reconhecimento de significantes descritíveis e catalogáveis

nos signos dos objetos de uso. Esse reconhecimento conta com a possibilidade de denotação

de funções precisas de acordo com determinados códigos, que, por sua vez, podem ser

preenchidos de significados sucessivos denotativa e conotativamente com base em outros

códigos.

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Deve-se aqui delimitar o que se entende por funções primeiras e funções segundas.

Funções primeiras (denotadas) são aquelas de tradição funcionalista, isto é, funções

propriamente ditas, como descer, comer e viver junto. Por funções segundas (conotadas) têm-

se as classificadas como valores simbólicos (ECO, 2004).

Denotativamente, sob o aspecto comunicacional, “o objeto de uso é o significante

daquele significado exata e convencionalmente denotado que é a sua função” (ECO, 2005a, p.

198); ademais, esse objeto significa uma concepção ou forma de uso, ainda que não utilizada.

Todavia, determinadas formas podem não ser reconhecidas como determinantes de certas

funções, exigindo, para sua fruição, o conhecimento prévio de um código específico para sua

utilização. Assim, sob a óptica comunicacional dos objetos de uso,

o princípio de que a forma segue a função significa que a forma do objeto não só deve possibilitar a função, mas denotá-la tão claramente que a torne, além de manejável, desejável, orientando para os movimentos mais adequados à sua execução. (ECO, 2005a, p. 200)

Portanto, a habilidade de um designer não é capaz de tornar funcional uma nova forma

sem o apoio em processos de codificação já existentes. A função é denotada pela forma

apenas com base em um sistema de expectativas e hábitos adquiridos. Não obstante, a

instituição de novas funções não deve se apoiar exclusivamente em sistemas de significados

construídos e conhecidos; pode, sim, basear-se em funções estéticas da mensagem artística.

Disso depreende-se que um objeto de uso cujo objetivo é promover uma nova função primeira

pode conter em sua forma as pistas para a decodificação da função inédita somente quando se

apoia em elementos de códigos precedentes, ou melhor, somente quando deforma

gradualmente funções conhecidas.

Por outro lado, os objetos de uso conotam determinadas ideologias das funções e

podem, ainda, conotar outras coisas. Destarte, a atribuição de funções passa a englobar a

gama de todas as atribuições comunicacionais de um objeto, uma vez que, em uma sociedade,

as conotações simbólicas (segundas) de um artefato não são menos úteis que suas denotações

funcionais (primeiras); e vale ressaltar que tanto as conotações simbólicas como funcionais,

além de seus sentidos metafóricos, comunicam uma utilidade social do artefato que não se

identifica imediatamente com a função primeira (ECO, 2004, 2005a). Portanto, as funções

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significadas pelos objetos de uso são classes de funções possíveis; não são funções

executáveis nem executadas; são unidades culturais antes mesmo de se tornarem atos práticos

(ECO, 2004).

Porém, deve-se sublinhar que os códigos dos objetos de uso são voltados para

transmitir soluções já elaboradas. Assim, cabe aos mesmos apresentar aos seus contextos

aquilo que seus próprios fruídos lhes indicam, e não o contrário. Sendo realizada a análise sob

esse ponto de vista, os objetos de uso são um serviço que provê soluções técnicas mais

elaboradas de uma demanda pré-constituída. Por conseguinte, a linguagem dos objetos de uso

pode ser definida como uma linguagem retórica que deposita técnicas argumentativas já

provadas, codificadas e interiorizadas pelo corpo social no qual se apoia.

Uma vez considerada a linguagem dos objetos de uso como retórica, pode-se

estabelecer estreita ligação dessa linguagem com a comunicação de massa. Essa ligação pode

ser encontrada quando se especifica o discurso dos objetos de uso no que diz respeito: à

persuasão, na qual as premissas adquiridas são mescladas a argumentos conhecidos e aceitos,

induzindo a determinado tipo de consenso; ao discurso dos objetos de uso, no qual o

indivíduo é desapercebidamente violentado e conduzido a seguir as instruções do designer,

que significa funções e, ainda, promove e induz à fruição desatenta da “fala”; à existência de

significados aberrantes, movendo-se entre o máximo de coerção e o máximo de

irresponsabilidade; à obsolescência dos objetos de uso; e à sua relação com a sociedade de

consumo, em cujo ambiente tecnológico e econômico o designer deve penetrar, buscando

absorver suas razões, ideias e movimentos, mesmo que para contestá-los (ECO, 2005a).

Contudo, ainda que se assemelhe às linguagens atribuídas à comunicação de massa, a

linguagem dos objetos de uso vai além dos limites daquelas. Esses objetos possuem

características heurísticas e inventivas, trazem algo de novo; não apenas conotam

determinadas ideologias de funcionamento e podem, ao subsistir, criticar os modos e as

ideologias funcionais precedentes.

As técnicas suasórias empregadas na concepção de objetos de uso fazem com que

funções sejam denotadas e, no ponto em que as formas são identificadas com os materiais que

as sustentam, esses objetos se autossignificam. Nos dizeres de Eco (2005a, p. 227) “[O

objeto,] autossignificando-se, informa, ao mesmo tempo, não só sobre as funções que

promove e denota, mas também sobre o MODO como decidiu promovê-las e denotá-las”.

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Desse ponto de vista, segundo o mesmo autor, surge a noção de styling, em que há

justaposição de novas funções segundas a funções primeiras invariadas; fingidamente aquelas

informam (na realidade, confirmam), utilizando novas estratégias suasórias, o que o usuário

desejava, fazia e sabia. Entretanto, a ressemantização de objetos através do styling pode

aparecer como tentativa de conotar – com o uso de novas funções – uma distinta forma de

determinado objeto. Enquanto os modos de vida cotidiana são alterados, a função primeira

permanece inalterada, mas as atribuições de novas conotações permitem uma revisão da

maneira como são vislumbrados os objetos (isso no sistema de outros objetos em contextos

específicos e na relação estabelecida entre todos no seu conjunto).

Dito isso, tem-se que o designer deve articular os significantes dos objetos de uso

buscando denotar funções, as quais, por sua vez, são os significados de tais significantes.

Todavia, o sistema funcional pertence, sim, ao âmbito de outros setores da cultura; é também

fato da cultura, mas é fundado por outros sistemas de comunicação que informam a realidade

com outros instrumentos provenientes da sociologia e da antropologia cultural, dentre outras

áreas do conhecimento. Portanto, os objetos de uso informam o que na realidade não lhes

pertence – isso por poderem ser nomeados mesmo se não existissem, dessa forma, residem na

antropologia cultural os códigos para a concepção dos objetos de uso (ECO, 2005a).

Ao ser tratada a narrativa semiológica com base em sistemas de comunicação, a

mesma deve ser elaborada do lado esquerdo do triângulo de Ogden & Richards46 (1966 apud

ECO, 2005a) – FIGURA 10 – devido ao fato de que a semiologia estuda os códigos como

fenômenos de cultura e – insensível às realidades verificáveis a que os signos se referem –

somente deve examinar como se fixaram regras de equivalência entre um significante e um

significado, através de um interpretante que signifique tais códigos a partir de outros

significados e a partir de regras de articulação entre os elementos do repertório paradigmático.

46 OGDEN, I. A.; RICHARDS, I. A. Il significato del significato. Milão: Saggiatore, 1966.

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FIGURA 10. Triângulo de Ogden & Richards Fonte: Ogden & Richards (1966 apud ECO, 2005a, p. 21)

Tal fato não implica afirmar que o referente não exista, mas sim que ele constitui

elementos de outras ciências, ao passo que o estudo do sistema de signos pode e deve

desenvolver-se no universo das convenções culturais regulatórias do intercâmbio

comunicacional. Como afirma Eco (2005a, p. 234):

As regras que governam o mundo dos signos dizem respeito ao mundo dos signos: dependem de convenções comunicacionais postuladas como tais [...] ou, dentro de uma perspectiva ontológica, dependem de uma eventual estrutura universal da mente humana segundo a qual somos falados pelas próprias leis de toda linguagem possível.

Por essa razão, fala-se em código antropológico, ou seja, em fatos relacionados ao

universo das relações sociais e das determinações ambientais, porém vistos somente enquanto

já codificados, isto é, reduzidos a sistemas culturalizados. Dessa forma, a questão da

utilização de códigos externos levantada por Eco permanece do lado esquerdo do triângulo de

Ogden & Richards – FIGURA 10 – e, do ponto de vista do design, o referente físico aparece

já mediado por um sistema de convenções, que permite a sua tradução em um código

comunicativo, apresentando não seu referente físico, mas um significado cultural. Portanto, o

signo gerado através do design se converte no significante, que denota uma função ou

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possibilidade de uma função, a qual, por sua vez, torna-se o significante que conota um

significado simbólico com valor social.

Na visão de Eco (2005a), a linguagem do design poderia ser considerada parasitária,

como o mito47 de Barthes (1999), uma vez que carece de outras linguagens para se exprimir.

Porém, tal afirmação em nada reduziria a importância do código pertencente às regras do

design, pois há outros códigos desenvolvidos para expressar em seus termos os significantes

de outras linguagens e pois, na verdade, até mesmo a linguagem verbal interfere em processos

de comunicação ao se apropriar de outras linguagens.

Deve-se ainda admitir a possibilidade de os códigos do design serem considerados

fracos sob vários aspectos e serem sujeitos a reestruturações constantes. Tal possibilidade se

deve à existência de uma sequência não catalogada de códigos antropológicos em contínua

mutação e variação de uma sociedade para outra. Destarte, os códigos do design precisam

rever suas regras constantemente de modo a se adequarem à função de significação de

significantes de outros códigos. Ao extremo, tais códigos devem não somente reestruturar

suas regras com vistas à possibilidade de adequação aos códigos antropológicos aos quais se

refere, mas também desenvolver modelos gerativos que permitam a previsão de códigos

futuros não percebidos no contexto atual (ECO, 2005a).

Resta, pois, ao designer viver em um mundo de construção e de desconstrução de si

mesmo para que possa prestar seu serviço. Esse profissional vê-se forçado a se converter em

sociólogo, antropólogo, político, semiólogo etc. Compelido a buscar maneiras que informem

sistemas de exigências sobre as quais não tem poder e obrigado a manipular uma linguagem,

como a do design, que constantemente deve falar algo distinto de si mesmo, o designer é

coagido a pensar a totalidade e “projetar funções primeiras variáveis e funções segundas

abertas” (ECO, 2005a, p. 243).

2.3.7 Análise semiótica

Dá-se o nome de análise semiótica ao estudo das relações existentes entre os elementos

constitutivos das formas simbólicas, ou dos signos, e das relações entre tais elementos e os do

sistema mais amplo, do qual as formas simbólicas, ou os signos, podem fazer parte

47 Cf. Seção 2.3.5.

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(THOMPSON, 1995). A análise semiótica exige uma abstração metodológica dos contextos

sócio-históricos de produção e recepção das formas simbólicas, focando, assim, nas próprias

formas simbólicas. Em outros termos, tem como foco os elementos constitutivos, suas inter-

relações e as características estruturais internas dos símbolos, interligando-as aos sistemas de

códigos dos quais os signos, ou formas simbólicas, fazem parte. Por conseguinte, a

contribuição da análise semiótica consiste na sua capacidade de desvendar, ao menos em

parte, as maneiras pelas quais produtos são construídos através de formas simbólicas. Tal

desvendamento é possível por meio da identificação dos elementos constitutivos das formas

simbólicas e suas inter-relações, através das quais uma mensagem é construída e transmitida.

Entretanto, a utilização da análise semiótica não pode ser enxergada como autossuficiente

para o estudo das formas simbólicas. Tal sistema de investigação é, de certo modo, parcial, o

que gera limitações na compreensão das maneiras como se dá a combinação dos elementos

para que tais formas simbólicas digam algo de algo.

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3 ESTUDO EXPERIMENTAL

3.1 Pesquisa de campo

Este estudo foi realizado na cidade de Belo Horizonte, estado de Minas Gerais, no período

que compreende ao segundo semestre do ano de 2011. Para a realização da investigação a

amostra contou com a participação voluntária de dez indivíduos pesquisados. O acesso aos

pesquisados (Pn) que deram início ao processo de investigação (P1, P2, P7, P8, P9 e P10) foi por

conveniência, porém, foi respeitado o critério Classe C48 para a seleção dos mesmos. Além

disso, ainda que tenha sido estipulado, com base em Marconi & Lakatos (2003), o percentual

de 10% da amostra da pesquisa49, ou seja, um total de seis pesquisados para este estudo piloto,

é importante ressaltar que foram, a estes e por segurança, somados quatro indivíduos em caso

de desligamento de algum participante, vez que o Termo de Consentimento Livre e

Esclarecido (Apêndice 1) garante aos pesquisados o direito de desistência de participação

durante o processo de investigação mesmo que em andamento. Destaca-se que, no caso do P2,

foram utilizadas as duas técnicas de pesquisa definidas na metodologia da investigação50:

observação participante e não-participante. Para a observação participante foram realizados os

mesmos procedimentos de coleta de dados, no entanto e diferentemente do Pesquisador

Voluntário (PR), o Pesquisador Responsávelº(PR)51 residiu por um período de 15 dias no

domicílio do referido pesquisado. Dessa forma, foi possível fazer uso, observar, realizar os

registros fotográficos e tomar notas sobre as formas de utilização do objeto de pesquisa em

questão [refrigerador] in loco. As impressões acerca de todo o processo referente à coleta de

dados da pesquisa encontram-se nos tópicos a seguir e ressalta-se, ainda, que tal processo foi

subdividido em duas fases principais, nomeados como Coleta de Dados 1 e 2.

3.2 Acesso à amostra

Nos primeiros contatos com a finalidade de ter acesso a indivíduos a serem pesquisados, por

se tratar de uma amostra que devesse atender principalmente ao critério Classe C, foi possível

48 Cf. nota 9, p. 27. 49 Cf. nota 7, p. 25. 50 Cf. 1.4, p. 25. 51 Felipe Domingues (Pesquisador responsável) e Pedro Henrique dos Santos Campos (Pesquisador voluntário).

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perceber certa resistência no que se refere à explicitação da renda domiciliar52 por parte de

alguns pesquisados e também com relação à participação na pesquisa. Tal afirmação está

baseada em questionamentos, comentários e comportamentos de Possíveis Pesquisados (PP)

como: “... para quê você precisa saber isso?” [PP1 em tom ríspido]; “... hmmmm... preciso

comprovar?” [PP2 em tom de quem não se sente confortável com a indagação]. Além disso,

nos casos do PP4 e do PP5, mesmo após terem agendado a visita com o Pesquisador

Voluntário (PV) via conversa telefônica, ao se aproximar a data do encontro, ambos

desmarcaram seus apontamentos bem como justificaram, direta ou subjetivamente, suas

respectivas indisponibilidades para participarem da pesquisa: “... tenho que desmarcar por que

tenho outro compromisso.” [PP4], dessa forma o PV tentou, na mesma conversa remarcar a

visita e, mais uma vez, o PP4 apresentou justificativa para não participar do estudo: “... tenho

que verificar... nunca paro em casa.” [Pelas impressões do PV sobre a fala de PP4 não valeria a

pena continuar insistindo com o mesmo]. No caso do PP5, da mesma forma, foi agendada

visita por telefone e, no ato da confirmação, via Microsoft MSN®, segundo o PP5, o mesmo

tinha outro compromisso e não sabia se teria como providenciar os documentos que

comprovassem a renda domiciliar dentro do prazo estipulado; as impressões do PV foram que

o PP5 realmente justificava sua indisposição em participar da pesquisa ao colocar barreiras

para a realização da visita, PV optou por também não insistir com o possível pesquisado. Por

outro lado, no caso do PP3, houve abertura com relação à questão financeira e, após o

primeiro contato e com base na técnica de coleta de dados bola de neve53, o mesmo foi

indagado sobre a possibilidade de indicação de pessoas que atendessem ao critério Classe C.

De imediato, PP3, agora Pesquisado 1 (P1), iniciou uma listagem de possíveis participantes

para a investigação. Ao ser feita a checagem com relação à renda domiciliar54 junto aos

indicados, a resistência quanto à renda domiciliar permaneceu, ainda que de modo menos

direto e perceptível: “... a senhora Aparecida55, brigou comigo, disse que não recebe pesquisa,

que já perdeu bolsa família por que um moço de pesquisa visitou”; não obstante, parte dos

indivíduos, devido à indicação, se mostrou menos resistente, mas não menos desconfortáveis,

quanto à menção e/ou apresentação de documentos que comprovassem a renda domiciliar.

52 Cf. nota 9, p. 27. 53 Cf. 1.4, p. 25. 54 Cf. nota 9, p. 27. 55 Pseudônimo.

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Haja vista o comportamento do P4 que, ao ser apresentado ao PR, portava um envelope que

continha documentos, no entanto, o mesmo foi colocado pelo pesquisado cuidadosamente

entre ele mesmo e o apoio de braço de um sofá [como alguém que discretamente esconde algo

que não quer mostrar]. Por outro lado, P8 e P9 não demonstraram nenhuma espécie de

resistência quanto à comprovação de renda. Ao ser realizada a visita ao domicílio do P8, o

mesmo já havia deixado os documentos separados e disponíveis e quando informado sobre a

necessidade de confirmação da renda domiciliar, prontamente disponibilizou os documentos

para comprovação; quanto ao P9, os documentos foram deixados à disposição do PV. Por

conseguinte, pode-se afirmar que o acesso a outros indivíduos bem como às suas informações

pessoais referentes à renda domiciliar foram facilitados mediante a indicação e constatou-se

que, como demonstrado na FIGURA 11, tal procedimento viabilizou o contato direto com

indivíduos, a princípio desconhecidos, que atendessem ao critério de seleção da amostra.

FIGURA 11. Rede de contatos gerados a partir da técnica Bola de Neve Fonte: dados da pesquisa

No entanto, diante dos fatos relatados, com o objetivo de não inviabilizar o acesso à

amostra piloto e não criar antipatia entre pesquisadores e pesquisados, optou-se pela não

exigência de comprovantes de renda; o que não significa que o referido documento não tenha

sido solicitado, mas sim que se optou pelo respeito, pelo conforto e pela preservação da

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vontade dos pesquisados voluntários com a finalidade de não criar constrangimentos aos

mesmos e tampouco invadir sua privacidade de forma agressiva. Além disso, como a

participação dos pesquisados foi pautada pelo voluntariado e não lhes foi oferecida nenhuma

contrapartida, financeira ou material, entendeu-se como aceitável a confiança na palavra dos

indivíduos quando a restrição relacionada à comprovação da renda domiciliar se colocou

presente de forma verbal, subjetiva ou mesmo comportamental. Vale destacar que, com base

em comentários de pesquisados, para eles a renda informal é considerada importante para a

composição da renda domiciliar e a mesma [renda informal] eleva a entrada de recursos

financeiros nos domicílios e o poder de consumo nos lares, poder este refletido nos bens de

consumo dispostos nos lares visitados. Salvo a mudança de posicionamento com relação ao

acesso à amostra (não exigência estrita de comprovação de renda), o processo de coleta de

dados foi desenvolvido como planejado e sem contratempos.

3.3 Coleta e análise de dados 1: observações e registros fotográficos

Os pesquisados foram contatados, foram agendados os encontros em horários adequados à

visitação aos seus respectivos domicílios e realizadas as visitas. Nos primeiros encontros

foram apresentados tanto os pesquisadores responsável e voluntário quanto a proposta de

investigação em si, isso com base no Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Apêndice

1). Vale sublinhar que na primeira visita foram, como previsto, realizados registros

fotográficos e anotações com base nas falas dos usuários bem como nas suas próprias

impressões sobre as observações e seus próprios aparelhos.

No que se refere à observação participante, a mesma foi realizada por um período de

15 dias no domicílio do P2. Durante a estadia no domicílio do pesquisado, o PR observou e

compartilhou o objeto em análise [refrigerador] utilizado pelos dois residentes e por ele

mesmo. No período de observação, foram registradas duas manifestações verbais por parte de

P2, através de comentários, entendidos aqui como pertinentes aos objetivos desta pesquisa:

“... tem que ser frost free56” [P2 com sorriso no rosto] e “... o congelador é poderoso” [P2 com

sorriso no rosto em tom de satisfação]. Além disso, em 11 dos 15 dias de estadia, foram

56 Termo do inglês que, traduzido para o português, significa “sem gelo” [Tradução nossa]. Frost free se refere,

especificamente, ao modo de funcionamento do compartimento destinado ao congelamento de alimentos no refrigerador que não permite a formação de camadas de gelo na parte interna do referido local.

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gerados registros fotográficos com objetivo de documentar possíveis mudanças no objeto em

estudo. Não foram detectadas interferências no objeto além das alterações cotidianas advindas

do uso e movimentação dos alimentos no espaço interno do refrigerador, no entanto, na parte

externa, embora os itens imantados57 não tenham sofrido alterações, houve o acréscimo de um

item [calendário] na lateral esquerda do objeto, o que caracteriza o uso cotidiano das faces

externas do objeto.

Quanto à observação não-participante, diante das impressões provenientes da

observação participante, a mesma se restringiu a três visitas aos domicílios dos pesquisados

com o intuito de captar possíveis alterações que caracterizassem interferências nos

refrigeradores. De modo similar ao ocorrido em P2, as manifestações verbais acerca do objeto

em estudo se mostraram presentes: “... não arrumei nada, não repare...” [P1]; “... ai, não repare

na bagunça.” [P3]; “... vem cá [pesquisado conduzindo PR], ela [geladeira] está ali. Está

desorganizada... estou querendo comprar outra” [P4]; “...ºestá suja e bagunçada, mas está ali.”

[P5]; “... meu Deus! Nem tive tempo de organizar a geladeira!” [P6 disse assentado, sorrindo e

com as mãos no rosto, encolhendo-se e colocando a cabeça praticamente entre seus joelhos];

“... está tudo sujo aí, não tive tempo de arrumar.” [P7]; “... mas é claro que você irá tratar

[pesquisado referindo-se ao uso do programa de computador Adobe Photoshop®] as manchas

e sujeiras do meu refrigerador, não é?”; “... espero que você não repare a bagunça, ok?”; e,

“... eu gosto bastante de iogurte e prefiro manter o produto organizado na caixa” [P8].

Quanto aos registros fotográficos, os domicílios foram visitados por três ocasiões e,

durante as visitas, registros fotográficos foram realizados. Das 277 imagens geradas, 78

correspondem aos registros obtidos durante o período da observação participante e as demais

são provenientes do processo de observação não-participante.

Com base nas impressões obtidas através das técnicas de observação participante, não-

participante e dos registros fotográficos, foi possível a análise dos dados e a geração de

categorias preliminares de análise que dessem subsídio à geração do roteiro de entrevistas em

profundidade.

57 Grosso modo: ímãs de geladeira.

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3.4 Categorias preliminares de análise

Para a geração de categorias preliminares que apoiassem a elaboração do roteiro de

entrevistas, foram relacionados e analisados (i) todos os aspetos contidos nas falas dos

indivíduos entendidos como relevantes bem como (ii) todos os itens que caracterizassem

interferências dos usuários no objeto.

Os aspectos contidos nas falas dos indivíduos e entendidos como relevantes foram

identificados através da análise comparativa entre os discursos dos indivíduos registrados ao

longo da pesquisa de campo; ou seja, durante os dois processos de observação, as falas dos

indivíduos, quando consideradas relevantes e pertinentes aos objetivos da pesquisa, foram

registradas. Tais registros encontram-se dispostos na Tabela 1, onde também são apresentadas

as possíveis categorias preliminares de análise relacionadas aos discursos dos pesquisados.

Tabela 1 – Falas dos pesquisados e possíveis categorias preliminares de análise

Pesquisado Falas Categoria preliminar

P1 “... não arrumei58 nada, não repare...” Organização

P2 “... tem que ser frost free” [P2 com sorriso no rosto]

“... o congelador é poderoso” [P2 com sorriso no rosto em tom de satisfação]

Condição

Eficiência

P3 “... ai, não repare na bagunça.” Organização

P4 “... vem cá, ela está ali. Está desorganizada... estou querendo comprar outra”

Organização

P5 “... está suja e bagunçada, mas está ali.” Organização

Limpeza

P6 “... meu Deus! Nem tive tempo de organizar a geladeira!” [P6 sorrindo com as mãos na cabeça, encolhendo-se e colocando-a praticamente entre seus joelhos]

Organização

P7 “... está tudo sujo aí, não tive tempo de arrumar.”

“... mas é claro que você irá tratar as manchas [fazer uso do Adobe Photoshop®] e sujeiras do meu refrigerador, não é?”

Organização

Limpeza

Continua

58 Grifos nossos.

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Conclusão

Pesquisado Falas Categoria preliminar

P8 “... espero que você não repare a bagunça, ok?”

“... eu gosto bastante de iogurte e prefiro manter o produto organizado na caixa”

Organização

P9 Não realizou comentários -

P10 “Não repare... não tive tempo de arrumar nada...” Organização

Fonte: dados da pesquisa

Quanto às interferências realizadas pelos usuários, as mesmas foram identificadas

através dos processos de observação não-participante e participante59 e gravadas por meio dos

registros fotográficos. Com fins de viabilizar a identificação de itens relevantes para análise e

também com vistas a apoiar a construção de categorias de análise que subsidiassem a

elaboração do roteiro de entrevistas, o objeto [refrigerador] foi dividido em quatro partes:

superior, frontal, laterais, internas (Congelador e refrigerador). Para este estudo piloto, como

critérios de relevância que justificassem a análise foram consideradas as partes nas quais ao

menos 60% dos indivíduos da amostra realizaram uma ou mais interferências no objeto, bem

como a identificação de interferências que pudessem ser consideradas de caráter semântico.

Com base em tais critérios, constatou-se que interferências foram identificadas em

praticamente todas as partes – Tabela 2.

Tabela 2 – Falas dos pesquisados e possíveis categorias preliminares de análise

Parte principal Percentual de indivíduos (%)

Superior 66,7

Frontal 100

Laterais 77,8

Internas 100

Fonte: dados da pesquisa

59 Apenas no caso do P2.

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Com relação às partes internas, ainda que nelas tenham ocorrido interferências pela

totalidade dos indivíduos pesquisados, nesta pesquisa optou-se por não considerar tais

interferências, vez que as mesmas se mostraram estar relacionadas, principalmente, ao uso,

manuseio e movimento natural de alimentos e recipientes entre outros itens comuns no

interior de refrigeradores localizados em domicílios brasileiros; ou seja, devido à sua não

relação direta com o objeto de estudo principal (análise semântica), a parte interna foi

excluída da análise.

Feito isso, com base nos registros fotográficos (i.e., FIGURA 12) foram relacionados

os itens observados e considerados como interferência dos usuários pesquisados no objeto nas

três partes (superior, frontal e laterais) assumidas como principais para o estudo.

FIGURA 12. Exemplos de registros fotográficos gerados durante a coleta de dados Fonte: dados da pesquisa

A partir da relação dos itens, foram geradas listas filtradas para análise – Tabelas 3, 4 e

5 – com objetivo de subsidiarem a criação das categorias preliminares a serem incorporadas

ao roteiro de entrevistas.

Tabela 3 – Listagem filtrada correspondente às interferências na parte superior

Listagem filtrada Percentual de indivíduos (%)

Eletrodomésticos 66,7

Recipientes 83,3

Forros em tecido 66,7

Continua

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Conclusão

Listagem filtrada Percentual de indivíduos (%)

Alimentos 50

Cestas 33,3

Outros 16,7

Fonte: dados da pesquisa

Tabela 4 – Listagem filtrada correspondente às interferências na parte frontal

Listagem filtrada Percentual de indivíduos (%)

Ímãs de geladeira 100

Adesivos 11,11

Fonte: dados da pesquisa

Tabela 5 – Listagem filtrada correspondente às interferências nas partes laterais

Listagem filtrada Percentual de indivíduos (%)

Ímãs de geladeira 85,71

Panos 28,57

Fonte: dados da pesquisa

As informações apresentadas nas Tabelas 1, 3, 4 e 5, foram traduzidas em macro e

microcategorias. Como macrocategorias de análise: condição, eficiência, organização,

limpeza, suporte (parte superior) e painel (partes laterais); e, devido à elevada ocorrência de

ímãs de geladeira como forma de interferência nos refrigeradores localizados nos domicílios

dos pesquisados, como disposto nas Tabelas 4 e 5, entendeu-se como pertinente a criação das

Tabelas 6 e 7, onde foram criadas subcategorias, aqui compreendidas como microcategorias

de análise, para a identificação e provável incorporação de possíveis categorias de análise ao

roteiro de entrevistas.

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Tabela 6 – Microcategorias referentes aos itens imantados aderidos à parte frontal

Microcategorias de análise Percentual de indivíduos (%)

Adorno 89

Informativo 44,44

Religioso 22,22

Fonte: dados da pesquisa

Tabela 7 – Microcategorias referentes aos itens imantados aderidos à parte lateral

Microcategorias de análise Percentual de indivíduos (%)

Adorno 14,3

Informativo 71,43

Religioso 14,28

Fonte: dados da pesquisa

A Tabela 8 apresenta, de forma sintetizada, as categorias preliminares de análise micro

e macro60 geradas na Coleta de Dados 1, onde, a partir das informações obtidas na primeira

coleta de dados através das técnicas de observações participante e não-participante e de

registros fotográficos, pôde-se identificar possíveis categorias preliminares divididas em

macro e microcategorias.

Tabela 8 – Categorias preliminares de análise geradas a partir da Coleta de Dados 1

Técnica de coleta de dados Categorias preliminares de análise Índice de Ocorrência (%)

Macro

Observação participante e Condição 11,11

Observação não-participante Eficiência 11,11

Organização 63

Continua

60 As categorias macro se referem às categorias preliminares geradas a partir das partes consideradas como

principais dos refrigeradores (Superior, frontal e laterais) e as categorias micro se referem às geradas com base na classificação dos itens imantados.

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Conclusão

Técnica de coleta de dados Categorias preliminares de análise Índice de Ocorrência (%)

Limpeza 22,22

Registros fotográficos Suporte 66,7

Painel 100

Micro Frontal Lateral

Registros fotográficos Adorno 89 14,3

Informativo 44,44 71,43

Religioso 22,22 14,28

Fonte: dados da pesquisa

Tais categorias subsidiaram a elaboração dos roteiros de entrevistas e foram

incorporadas direta ou indiretamente na Coleta de Dados 2.

3.5 Coleta e análise de dados 2: entrevistas em profundidade

Os procedimentos de abordagem com os pesquisados seguiu a mesma rotina utilizada para a

Coleta de Dados 1. Isto é, os indivíduos foram contatados, foram agendados os encontros em

horários adequados à visitação aos seus respectivos domicílios e realizadas as entrevistas.

Nos encontros foram feitas as anotações referentes aos dados gerais dos pesquisados,

sintetizados na Tabela 9, bem como a aplicação do roteiro de entrevistas.

Tabela 9 – Dados gerais referentes à amostra pesquisada

Idade Sexo Localização Nível de Instrução

Estado Civil

Pessoas/Domicílio Tempo /

Entrevista

P1.1 53 M Belo

Horizonte Alfabetizado Casado 2 21min

P1.2 59 F Belo

Horizonte Alfabetizado Casado 2 23min

P2 30 F Belo

Horizonte Superior Solteiro 2 20min

P3

Usuários que desistiram ou se ausentaram durante a fase de coleta de dados. P4 P5 P6

Continua

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Conclusão

Idade Sexo Localização Nível de Instrução

Estado Civil

Pessoas/Domicílio Tempo /

Entrevista

P7 44 F Belo

Horizonte Superior Solteiro 2 16min

P8 34 M Belo

Horizonte Superior Casado 2 19min

P9 29 F Ribeirão das

Neves Superior Casado 5 19min

P10 32 F Belo

Horizonte Ensino Médio

Solteiro 2 22min

Fonte: dados da pesquisa

Quanto ao roteiro de entrevistas, o mesmo foi elaborado com base nas categorias

preliminares macro e micro de análise geradas na Coleta de Dados 161 e divido em duas partes

principais: (i) checagem de conceitos / categorias e (ii) questões funcionais e semânticas. Com

base nas respostas dos pesquisados frente aos questionamentos, foram geradas novas

categorias de análise, aqui entendidas como semânticas, dispostas na Tabela 10. Vale ressaltar

que, na Tabela 10, estão descritas tanto as categorias preliminares macro e micro quanto às

categorias geradas62 a partir das preliminares com base nos questionamentos, divididos nas

duas etapas da aplicação do roteiro de entrevistas, descritos anteriormente.

Tabela 10 – Dados gerais referentes à amostra pesquisada

PARTE 1 – Checagem de conceitos / Categorias preliminares Categoria preliminar (conceito) Categorias de análise semântica 1. Geladeira C1

C2 C3 C4 C5 C6 C7 C8

Continua

61 Cf. Tabela 8, p. 97. 62 Às categorias semânticas geradas foi atribuída a letra “C” acrescida de numeração de 1 a 118, isso com o

objetivo de preservar as informações resultantes da análise dos dados da investigação.

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Continuação

PARTE 1 – Checagem de conceitos / Categorias preliminares Categoria preliminar (conceito) Categorias de análise semântica 2. Organização C9

C10 C11 C12 C13 C14 C15 C16 C17 C18

3. Limpeza C19 C20 C21 C22 C23 C24 C25 C26 C27 C28

4. Suporte C29 C30 C31 C33 C34 C35

5. Prateleira C36 C37 C38 C39 C40 C41

6. Painel C42 C43 C44 C45 C46 C47

7. Adorno C48 C49 C50 C51 C52

Continua

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Continuação

PARTE 1 – Checagem de conceitos / Categorias preliminares Categoria preliminar (conceito) Categorias de análise semântica 8. Enfeite C53

C54 C55 C56 C57

9. Informativo C58 C59 C60

10. Religioso C61 C62 C63 C64

11. Religião C65 C66 C67 C68 C69 C70

PARTE 2 – Categorias geradas a partir de aspectos semânticos Categorias preliminares Categorias associadas ao uso 1. Geladeira C71

C72 C73 C74

2. Funcionalidade adequada C75 C76 C77 C78 C79 C80 C81 C82 C83 C84 C85 C86 C87 C88 C89

Continua

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Conclusão

PARTE 2 – Categorias geradas a partir de aspectos semânticos Categorias preliminares Categorias associadas ao uso 3. Organização C90

C91 C92 C93 C94 C95 C96 C97

4. Limpeza C98 C99 C100 C101 C102 C103

5. Suporte C104 C105 C106

6. Painel C107 C108 C109 C110 C111 C112 C113 C114 C115 C116 C117

7. Itens adicionais C118 Fonte: dados da pesquisa

Com o objetivo de elencar e diferenciar os graus de relevância das categorias criadas,

como previsto, foi utilizado o programa de computador Pajek e, com base nas informações

processadas e apresentadas pelo programa foram geradas as inferências finais sobre o método

de pesquisa descritas nos tópicos resultados e conclusões e considerações finais, 4 e 5,

respectivamente.

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3.6 Pajek: processamento e análise dos dados

A partir dos dados provenientes da coleta e análise de dados 263, através do programa de

computador Pajek (Mode 1 Network)64, as informações foram processadas e analisadas. Vale

ressaltar que os dados foram processados em duas etapas: cruzamento das categorias

preliminares e cruzamento das categorias entendidas como semânticas. Dispostos nas Figuras

13 e 14.

63 Cf. 3.5, Tabela 10, p. 99. 64 Mode 1 Network refere-se ao modo de processamento de informações que relaciona, neste caso e em casos

análogos, informações de mesma ordem. Neste caso, relaciona categorias com sentido de determinar a centralidade existente entre elas.

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FIG

UR

A 1

3. C

ruza

men

to d

as c

ateg

oria

s pr

elim

inar

es

Fon

te: d

ados

da

pesq

uisa

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FIG

UR

A 1

4. C

ruza

men

to d

as c

ateg

oria

s se

mân

tico

fun

cion

ais

Fon

te: d

ados

da

pesq

uisa

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Com base na FIGURA 13, é possível afirmar que, dentre as categorias relacionadas

provenientes da primeira parte da pesquisa – observações participante e não-participante e

registros fotográficos – quatro categorias podem ser assumidas como centrais: C20, C31, C27

e C40. Além disso, ainda sobre a FIGURA 13, foram identificados quatro clusters, ou

agrupamentos, de categorias: (i) C10, C36, C5, C26, C8, C17 e C47; (ii) C66, C21, C37, C6,

C45, C57 e C41; (iii) C48, C54, C65, C55, C68, C3, C69, C24, C52, C13, C70 e C18; (iv)

C43, C62, C30, C22, C23, C38, C14, C34 e C35. Como categorias que possuem ligações

fortes com as quatro centrais, podem ser especificadas: C9, C29, C1, C51, C25, C63, C64 e

C28. Por outro lado, a partir da FIGURA 14, que foi criada a partir das categorias geradas nas

entrevistas em profundidade, é possível a extração de principalmente categorias centrais, ou

seja, pode-se afirmar que, no segundo momento, as categorias se apresentaram de forma mais

consistente, palpável, e menos pulverizadas como as dispostas na FIGURA 13. Dessa forma,

por apresentarem ligações mais fortes e estarem posicionadas no centro da rede de

centralidade semântica, podem ser listadas como categorias centrais: C90/104/107, C93, C94,

C95/98, C99, C112 e C101. É importante ressaltar aqui, que a preservação e lançamento de

todas as categorias no programa de computador Pajek se justifica pelo fato de estar sendo

testada a viabilidade de uso do programa como instrumento que subsidie análises posteriores

referentes à semântica de produtos. A avaliação realizada do conjunto de técnicas de coleta de

dados foi apresentada no tópico resultados e conclusões.

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4 RESULTADOS E CONCLUSÕES

Esta pesquisa piloto logrou atingir satisfatoriamente todos os objetivos, geral e específicos,

definidos no escopo desta investigação. Assim, no que se refere ao objetivo geral foi possível

a verificação quanto à adequação, eficiência e eficácia metodológica do projeto ora proposto e

gerar inferências preliminares relacionadas ao modelo para análise em desenvolvimento.

Quanto aos específicos, ainda que existam observações que possam modificar a estrutura do

método de pesquisa proposto, do mesmo modo foi possível a verificação tanto da eficácia

quanto da eficiência da forma de acesso à amostra definida para a pesquisa; da adequação das

técnicas e procedimentos destinados à coleta de dados; da eficácia do programa de

computador Pajek quanto à sua capacidade de apoiar a pesquisa no que se refere à geração de

categorias de análise relevantes; e, quanto à análise dos dados pesquisados e a geração de

inferências preliminares pertinentes à investigação. Diante disso, seguem os resultados e as

conclusões referentes a cada uma das etapas da pesquisa como previstas e descritas na

metodologia do projeto65.

Com relação ao acesso à amostra, foi seguido o critério Classe C e fez-se uso da

técnica bola de neve. Pôde-se concluir que o critério Classe C não configura um problema

para acesso à amostra, porém, a solicitação da comprovação da renda domiciliar se mostrou

um fator complicador ao serem estabelecidos os contatos com os pesquisados, vez que parte

dos mesmos não se mostrou, comportamental ou verbalmente, confortável com a solicitação.

Dessa forma, acredita-se que a oferta de uma contrapartida, financeira ou material, aos

pesquisados amenize a relação entre pesquisador e pesquisados. Além disso, a proposição de

uma contrapartida aos pesquisados pode aumentar os níveis de tolerância dos pesquisados

com relação ao acesso e ao número de visitas aos seus domicílios; ou seja, os critérios da

pesquisa não podem ser alterados com base na vontade dos indivíduos pesquisados. Pode-se

argumentar com relação à interferência na opinião dos indivíduos, a favor ou contra, nos

resultados da investigação devido ao tipo de contrapartida; entretanto, vale aqui ressaltar que

as informações às quais objetiva esta investigação, a princípio, não estão estreitamente ligadas

a questionamentos relacionados diretamente a nenhuma marca ou tipo de objeto, mas sim a

questões subjetivas, abstratas, ligadas à relação entre indivíduo [usuário] e o objeto

65 Cf. 1.4, p. 25.

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[refrigerador]. Dito isso, pode-se afirmar que, mesmo que determinado pesquisado deseje

alterar seu comportamento ou fala com fins de se beneficiar, tais alterações de conduta podem

ser detectadas e não configurarão interferências nos resultados da pesquisa. Com relação ao

uso da técnica bola de neve, a mesma se mostrou eficiente e eficaz no que se refere ao quesito

facilitar o acesso à amostra, vez que, em média, para cada indivíduo pesquisado da amostra

foram indicados 1,7 outros possíveis pesquisados, isto é, pode-se afirmar que, com base em

indicações, há probabilidade da amostra ser aumentada exponencialmente.

Quanto à adequação das técnicas – observações participante e não-participante,

registros fotográficos e entrevistas em profundidade – e procedimentos destinados à coleta de

dados, todos apresentaram aspectos válidos para a investigação, salvo a observação

participante, que merece considerações especiais.

Os apontamentos acerca da observação participante restringem-se a três aspectos

principais: amostra reduzida, tempo de permanência no domicílio e olhar do pesquisador; tais

considerações procuram defender o uso da técnica enquanto opção válida para o estudo

proposto, vez que a mesma não se mostrou, nesta fase, como técnica relevante para o acesso e

coleta de dados pertinentes à investigação. Devido à amostra reduzida (um indivíduo), pode-

se afirmar que a observação participante não tenha atendido às necessidades da pesquisa,

porém, é possível que uma amostragem maior com o mesmo tempo de permanência, ou o

aumento do período (>15 dias), elevem a probabilidade de detecção de aspectos semântico-

culturais. Vale ainda ressaltar que existe a possibilidade de fatos relacionados a tais aspectos

não terem sido detectados no período de permanência, ou até mesmo não tenham ocorrido ou

sido citados pelo pesquisado naquele espaço de tempo, considerado aqui como curto para a

coleta de informações provenientes de observações participantes. Independente do tempo de

permanência e da amostragem reduzida é possível que o olhar comum, “viciado”

culturalmente, do pesquisador responsável não tenha percebido informações semântico-

culturais válidas à pesquisa. As observações não-participantes permitiram o acesso aos

refrigeradores nos domicílios e a identificação de aspectos relacionados aos mesmos in locu,

especialmente no que se refere às formas de uso e às interferências realizadas pelos usuários

em suas geladeiras. Porém, os dados gerados através das observações não-participantes se

referem a informações relacionadas às funções intrínsecas a partes dos refrigeradores (i.e.,

funções abrir e fechar), funções estas que não fazem parte dos pressupostos básicos desta

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110

investigação. No entanto, somados a estas observações foram realizados os registros

fotográficos que possibilitaram a retenção de informações tanto básicas quanto relevantes

acerca dos refrigeradores. Os registros fotográficos como técnica de coleta e retenção de

informações para posterior análise funcionaram como esperado. Com base nas imagens

geradas em momentos distintos da coleta de dados nos domicílios, foi possível identificar as

categorias preliminares de análise extraídas dos sinais deixados pelos próprios usuários em

seus refrigeradores e, além disso, tais registros permitiram que aspectos não percebidos no

momento das visitas fossem identificados posteriormente, o que levou ao enriquecimento dos

dados coletados e das categorias preliminares de análise e, além disso, economia de tempo

nos domicílios pesquisados, o que garante, de certa forma, conforto aos indivíduos

participantes da investigação. Tais categorias foram traduzidas em questões e tópicos

incorporados aos roteiros a serem explorados durante as entrevistas em profundidade. Quanto

às entrevistas em profundidade, as mesmas permitiram à pesquisa piloto o acesso a aspectos

semânticos da relação estabelecida entre os indivíduos [usuários] e seus respectivos objetos

[refrigeradores]. No entanto, são necessárias adequações em sua estrutura para que, por parte

dos pesquisados, fiquem claros alguns aspectos relacionados ao entendimento das questões

propostas (i.e., forma de questionamento, adequação de conceitos e questões listadas). Diante

disso, pode-se afirmar que, embora os dados lançados no programa de computador Pajek

estejam corretos e o programa tenha funcionado positivamente em termos de verificação

metodológica, a validade das informações precisa ser verificada com objetivo de elevar o

nível de confiabilidade dos resultados gerados. Vale ressaltar aqui que, para esta fase da

investigação, a validade, ou não, das informações não deve ser entendida como essencial, isso

pelo fato de se tratar de uma pesquisa piloto.

Com relação à eficácia do programa de computador Pajek quanto à sua capacidade de

apoiar a pesquisa no que se refere à geração de categorias de análise relevantes, pode-se

afirmar que o programa atende às necessidades da investigação. No entanto, julga-se

necessária a adequação do termo categorias de análise relevantes para categorias de análise

centrais ou centralidade das categorias de análise. Isto é, o programa pode auxiliar a

pesquisa na geração das conexões entre as categorias e no delineamento da centralidade entre

as mesmas, mas não na determinação de relevância das categorias. É mister destacar que a

determinação da centralidade só pode ser obtida através do uso do Pajek, vez que ela não é

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atingida pela mera contagem da ocorrência de categorias e/ou sua relação com os indivíduos.

Quanto à atribuição de relevância ou não, essa deve ser realizada pela equipe de pesquisa e,

preferencialmente, em conjunto com equipes de designers, vez que as mesmas são

responsáveis pela transferência de aspectos semânticos encontrados a objetos.

Quanto à análise dos dados pesquisados e à geração de inferências preliminares

pertinentes à investigação, pode-se afirmar que, do ponto de vista teórico, os dados

apresentaram articulações semântico funcionais, ou seja, além das funções básicas esperadas

do objeto [refrigerador], ao mesmo são atribuídas, pelos indivíduos desta amostra, novas

funções, aqui entendidas como semântico culturais de primeiro nível (i.e., comunicação,

suporte, decoração etc.), ou semântico funcionais. Por funções semântico culturais de

primeiro nível, entendem-se aqui, novas funções atribuídas ao objeto que estejam relacionadas

estritamente ao uso do mesmo, isto é, sem propósitos de posicionamento social. É válido

ressaltar que, dentro do escopo desta pesquisa piloto, não foram detectadas funções com

propósitos sociais.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com vistas a identificar, relacionar e analisar empiricamente as relações teóricas existentes

entre design, cultura e semiótica inerentes à relação estabelecida entre indivíduos [usuário] e

objetos [refrigeradores], esta pesquisa piloto teve por objetivo geral (i) verificar e analisar os

níveis de eficácia e eficiência das técnicas de pesquisa – observação participante e não-

participante, registros fotográficos e dos roteiros de entrevistas – quanto à sua adequação para

a coleta de dados bem como da utilização do programa de computador Pajek e da análise das

práticas discursivas definidas, no escopo desta investigação, como instrumentos adequados à

análise de dados relacionados aos aspectos semânticos existentes na relação estabelecida entre

indivíduo e objeto. Isso com fins de gerar inferências preliminares relacionadas ao modelo

para análise de aspectos semântico-culturais em desenvolvimento. Buscou-se,

especificamente, verificar tanto a eficácia quanto a eficiência da forma de acesso à amostra

definida para a pesquisa; verificar a adequação das técnicas e procedimentos destinados à

coleta de dados; verificar a eficácia do programa de computador Pajek quanto à sua

capacidade de apoiar a pesquisa no que tange à geração de categorias de análise que tenham

relevância para o estudo ora proposto; e, por último, gerar inferências preliminares pertinentes

à investigação.

No que tange aos aspectos teóricos da pesquisa, foram possíveis tanto a aproximação

lógica quanto o estabelecimento das ligações entre os temas em questão – Design de produtos

globais, Cultura e Semiótica. Ainda no âmbito da teoria relacionada aos temas, mesmo que

Gibson e Norman tenham, de fato, deixado clara a existência das affordances, permanecem

como contribuições mais relevantes as obras de Pierce, Eco, Barthes e Geertz, que

possibilitaram a fundamentação teórica e o avanço para a realização da investigação empírica

ora proposta. Quanto às constatações empíricas, ainda que a amostra para esta pesquisa possa

ser considerada pequena, foi possível a verificação, no campo, de interferências semânticas na

relação dos indivíduos com seus respectivos objetos. Como previamente exposto66, a

experiência no campo se mostrou válida e permitiu aos pesquisadores gerar hipóteses de

pesquisa que, se confirmadas podem dar sequência a estudos avançados no âmbito do uso da

66 Cf. Tópico 4, Resultados e Conclusões.

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semiótica para análise de produtos globais o que, no médio e longo prazo, pode permitir a

verticalização das investigações acerca da semântica de produtos.

Dessa forma, como hipóteses (Hn) relevantes podem ser consideradas as seguintes

premissas e suas respectivas justificativas.

H1: O envolvimento de pesquisadores estrangeiros no processo de coleta e análise de dados etnográficos referentes a investigações relacionadas a produtos globais permite o melhor aprofundamento e a melhor identificação de aspectos semântico-culturais.

Com base em experiências prévias de pesquisa informal do Pesquisador Responsável

em ambiente internacional, é pertinente afirmar que a presença de indivíduos provenientes de

outros contextos culturais pode facilitar a identificação de aspectos semântico-culturais à

medida que seu olhar, estranho, ao se deparar com aspectos ou comportamentos culturais

diversos aos de sua origem coloca-se, naturalmente, em estado de alerta e, por conseguinte,

aqui é entendido como um instrumento válido para o trabalho em nível semântico-cultural. No

entanto, com base em aspectos antropológicos, indivíduos tendem a considerar sua própria

cultura como referência para nortear tanto seu próprio comportamento quanto sua própria

leitura da realidade; logo, é necessário que o pesquisador estrangeiro tenha plena consciência

da sua qualidade de indivíduo externo67 ao meio de inserção. Isto é, na posição de

investigador, o estrangeiro deve abster-se de toda e qualquer pré-concepção advinda de suas

raízes ou, ao menos, ter consciência de seu status de pesquisador, com objetivo de gerar

registros formais acerca da investigação. Ainda no âmbito da melhor apreensão e refinamento

das informações de campo, com fins de permitir sua transferência de modo o menos genérico

e o mais eficiente possível aos objetos, pode-se considerar uma segunda hipótese:

H2: O trabalho conjunto e a troca de informações entre pesquisadores, inclusive de outras áreas do conhecimento científico, e designers elevam o nível de validade dos dados, a precisão e o refinamento das informações coletadas na pesquisa de campo em processo de desenvolvimento.

67 Do inglês outsider.

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Devido à complexidade e ao nível de abstração dos dados provenientes desta

investigação, entendida como de cunho etnográfico e que esta relacionada a aspectos

semântico-culturais, o contato direto entre pesquisadores e equipes de design experientes pode

ser assumido como fundamental. Isso devido à estreita relação dos dados coletados com o

próprio processo de transferência de informações culturais ou semântico-culturais a objetos de

uso. Isto é, a apresentação de relatórios de pesquisa às equipes de designers pode

comprometer a qualidade dos resultados da investigação quando o oposto é pensado e

realizado, ou seja, a discussão é relevante. Dessa forma, pode-se afirmar, através da terceira

hipótese de pesquisa, que:

H3: Equipes de designers experientes são capazes de transferir adequadamente, a partir do seu próprio repertório cultural coletivo e com base em informações geradas e fundamentadas por pesquisas etnográficas, as informações obtidas e sintetizadas na forma de categorias de análise pelo processo de pesquisa em andamento a produtos em fase de desenvolvimento ou gerar adaptações em produtos já em linha de produção.

A partir da H2, ao terem acesso ao processo de pesquisa e aos dados, ainda que o

mesmo esteja em andamento e os dados sejam parciais, equipes de design que trabalham em

projetos de médio e longo prazos, como, por exemplo, as que desenvolvem produtos conceito

ou novos produtos planejados a serem introduzidos ao fim do ciclo de vida de um anterior,

teriam as mentes de seus integrantes sensibilizadas para as possibilidades inerentes ao

processo de pesquisa em andamento, vez que investigações qualitativas não visam a

generalização de informações, mas sim a verticalização das mesmas e, normalmente, não

apresentam dados conclusivos. Isto é, com base na H3, o próprio fato do processo de pesquisa

etnográfica, qualitativa, ter como característica própria a necessidade de amadurecimento das

informações para que a mesma avance, o compartilhamento das informações da pesquisa,

através de um processo colaborativo entre pesquisadores e equipes de designers, pode acelerar

o processo de desenvolvimento de determinados conceitos e propiciar ações que favoreçam a

inovação atendendo, assim, às necessidades da própria indústria no que tange ao

desenvolvimento e à adaptação de produtos bem como o aumento da velocidade de resposta

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ao mercado. Além disso, face aos dados provenientes desta pesquisa piloto, é pertinente a

elaboração da hipótese quatro:

H4: A transferência de informações geradas a partir de pesquisas etnográficas com foco em aspectos semântico-culturais, traduzidas em categorias de análise, só faz sentido quando trabalhadas em parceria com equipes de designers experientes.

Pesquisadores não são, necessariamente, designers e a premissa contrária também é

verdadeira. Dessa forma, o compartilhamento de informações associado à experiência

individual prática de cada uma das partes envolvidas na investigação torna a compreensão do

produto em questão completa, ou próxima à sua completude. Tal envolvimento pode ampliar

a visão dos indivíduos participantes do processo de pesquisa, vez que a troca de saberes é

intensificada com a comunicação entre as partes e as relações entre os profissionais tende a se

estreitar, o que pode gerar interferências positivas em ambos os campos de trabalho ao longo

do tempo. Ao se considerar a possibilidade da incorporação de investigações etnográficas com

períodos de duração de médio e longo prazo à estrutura de design, permite, ainda, a

proposição da quinta hipótese de pesquisa:

H5: É possível a concepção de métricas semânticas a partir deste modelo investigativo para análise de aspectos semântico-culturais de modo contínuo e em diferentes contextos.

Partindo do pressuposto que, com base na antropologia social, sistemas culturais são

passíveis de mudanças, e as mesmas devem ser buscadas nas experiências dos indivíduos e

nos grupos aos quais pertencem e, ainda, não raramente estão diretamente relacionadas às

formas de produção de sentido em níveis individual (micro) e macro sociais, o monitoramento

cultural estritamente relacionado ao uso de determinado(s) produto(s), ao longo do tempo,

pode alavancar processos que gerem inovações associadas a aspectos culturais semânticos

ainda em concepção, isto é, projetos de design podem antecipar tendências com base em

informações etnográficas provenientes de investigações contínuas.

Face ao exposto, à complexidade do tema em questão e ao se considerar que esta é

uma pesquisa piloto – parte de uma investigação maior – e, portanto, em andamento, não se

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faz pertinente o apontamento para estudos futuros que contribuam para o desenvolvimento de

metodologias para a coleta, comparação e análise de dados que ampliem as informações

acerca de processos de investigação etnográfica especialmente focados em aspectos

semântico-culturais. Não obstante, pode-se afirmar que contínuas pesquisas sobre o tema

serão essenciais não apenas para complementar e validar a metodologia ora proposta, mas

também para ampliar o entendimento acerca das complexidades envolvidas nos processos de

atribuição de signos e de significações a objetos de uso, especialmente quando os mesmos se

tratarem de produtos globais.

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APÊNDICE 1

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO68 Prezado(a) Senhor(a), Você está sendo convidado(a) para participar, como voluntário(a), em uma pesquisa para um trabalho de mestrado. Após ser esclarecido(a) sobre as informações a seguir, no caso de aceitar fazer parte do estudo, assine ao final deste documento. Em caso de recusa o(a) Senhor(a) não participará da pesquisa e não será penalizado(a) de forma alguma. Título da dissertação: Design, Cultura e Semiótica: em direção a um modelo para análise de variáveis semântico-culturais Pesquisador responsável: Felipe Domingues (mestrando) Matrícula: MES2010-3 – PPGD/ED/UEMG / RG M-6.278.877 – SSP/MG Telefone para contato: (31) 9767-8166 Coordenador/Orientador: Professor Dijon De Moraes Junior, Dr. Co-orientador: Professora Regina Álvares Dias, Dr. OBJETIVO E ESCLARECIMENTO DA PESQUISA

Este estudo busca entender como aspectos semântico-culturais estão relacionados às formas de uso de aparelhos como fogões, geladeiras, lavadoras de roupa que utilizamos em nosso dia a dia. Os dados da pesquisa são importantes para a elaboração de um método de pesquisa, que em uma segunda etapa, será ampliado para um número maior de usuários. O propósito do projeto é obter informações que possam colaborar para o aprimoramento de produtos, em especial dos refrigeradores domésticos. Para participar desta pesquisa, solicitamos a sua especial colaboração no sentido de permitir que, com o seu consentimento, o pesquisador responsável obtenha todas as informações relacionadas ao objeto desse estudo que julgar necessárias.

A pesquisa está dividida em duas partes: observação da sua geladeira e entrevista com os usuários em sua residência. Para isso, será necessário que o pesquisador tenha acesso à geladeira do seu domicílio, em horários previamente acordados com o Senhor(a), sempre que necessário para realizar as seguintes ações: (1) observar a geladeira, seu local de instalação, sua forma de uso (interna e externa); (2) tomar notas e tirar fotografias; e (3) ao final do período de observações (2 semanas), realizar uma entrevista com um ou mais moradores do domicílio. As perguntas da entrevista serão relacionadas à como o(a) Senhor(a) e os demais residentes interagem e usam a geladeira. Durante as visitas, será feito uso de câmera fotográfica e gravador de áudio (voz). Garantimos resguardar suas informações pessoais, não as divulgando de nenhuma forma. Quanto às imagens, as utilizaremos para fins acadêmicos, ou seja, para ilustrar a pesquisa no documento da dissertação de mestrado, do relatório final da pesquisa e em artigos acadêmicos. Entretanto, a identificação pessoal dos participantes será preservada. Sua participação neste estudo é muito importante, esperamos contar com sua colaboração. Eu,______________________________________, RG nº _______________________, abaixo assinado, concordo voluntariamente em participar do estudo acima descrito. Declaro ter sido devidamente informado(a) e esclarecido(a) pelo pesquisador responsável sobre os objetivos e procedimentos da pesquisa. Foi-me garantido que não sou obrigado(a) a participar da pesquisa e posso desistir a qualquer momento, sem qualquer penalidade. Belo Horizonte, _____ de setembro de 2011. ___________________________________ Participante voluntário(a)

68 Registro número 0001 junto ao Conselho de Ética em Pesquisa da Universidade do Estado de Minas Gerais.