desenvolvimento de produto orientado para o...

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DESENVOLVIMENTO DE PRODUTO ORIENTADO PARA O CLIENTE: APLICAÇÃO DO MÉTODO QFD EM UM PROJETO DE PESQUISA TECNOLÓGICA Adriana Ferreira de Faria (UFV) [email protected] Veronica Mariana Oliveira Soares (UFMG) [email protected] Camila Henriques de Paula (UFV) [email protected] Rafael Aquino Santiago (UFMG) [email protected] Jaqueline Akemi Suzuki (UFV) [email protected] Percebe-se a dificuldade dos pesquisadores de levar a tecnologia oriunda dos resultados das pesquisas para o mercado na forma de produtos ou processos inovadores que sejam plenamente aceitos pelo mercado. Supõe-se que essa dificuldade seja natural para o caso das spinn-off’s acadêmicas, ou ENBT´s, haja vista que a grande maioria dos pesquisadores das universidades inicia seus projetos de pesquisa sem uma aproximação do mercado. Assim, quando o resultado da pesquisa é uma tecnologia inovadora, a incorporação dessa em um produto ou processo inovador torna-se as vezes difícil, pois não se ouviu “a voz do cliente”. O sucesso comercial de um produto está fortemente relacionado à identificação correta das necessidades (qualidades exigidas) e a tradução dessas em dados técnicos (características da qualidade). Esse artigo teve por objetivo relatar o processo de intervenção e as mudanças realizadas no projeto acadêmico de pesquisa tecnológica para o desenvolvimento de uma derriçadora portátil de café utilizando o método Desdobramento da Função Qualidade (QFD). A aplicação do método permitiu que a equipe de desenvolvimento melhorasse as características técnicas do produto, considerando as qualidades exigidas pelos clientes. Palavras-chaves: Desdobramento da função qualidade, processo de desenvolvimento de produto, gestão de desenvolvimento de produto XXXI ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Inovação Tecnológica e Propriedade Intelectual: Desafios da Engenharia de Produção na Consolidação do Brasil no Cenário Econômico Mundial Belo Horizonte, MG, Brasil, 04 a 07 de outubro de 2011.

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DESENVOLVIMENTO DE PRODUTO

ORIENTADO PARA O CLIENTE:

APLICAÇÃO DO MÉTODO QFD EM UM

PROJETO DE PESQUISA

TECNOLÓGICA

Adriana Ferreira de Faria (UFV)

[email protected]

Veronica Mariana Oliveira Soares (UFMG)

[email protected]

Camila Henriques de Paula (UFV)

[email protected]

Rafael Aquino Santiago (UFMG)

[email protected]

Jaqueline Akemi Suzuki (UFV)

[email protected]

Percebe-se a dificuldade dos pesquisadores de levar a tecnologia

oriunda dos resultados das pesquisas para o mercado na forma de

produtos ou processos inovadores que sejam plenamente aceitos pelo

mercado. Supõe-se que essa dificuldade seja natural para o caso das

spinn-off’s acadêmicas, ou ENBT´s, haja vista que a grande maioria

dos pesquisadores das universidades inicia seus projetos de pesquisa

sem uma aproximação do mercado. Assim, quando o resultado da

pesquisa é uma tecnologia inovadora, a incorporação dessa em um

produto ou processo inovador torna-se as vezes difícil, pois não se

ouviu “a voz do cliente”. O sucesso comercial de um produto está

fortemente relacionado à identificação correta das necessidades

(qualidades exigidas) e a tradução dessas em dados técnicos

(características da qualidade). Esse artigo teve por objetivo relatar o

processo de intervenção e as mudanças realizadas no projeto

acadêmico de pesquisa tecnológica para o desenvolvimento de uma

derriçadora portátil de café utilizando o método Desdobramento da

Função Qualidade (QFD). A aplicação do método permitiu que a

equipe de desenvolvimento melhorasse as características técnicas do

produto, considerando as qualidades exigidas pelos clientes.

Palavras-chaves: Desdobramento da função qualidade, processo de

desenvolvimento de produto, gestão de desenvolvimento de produto

XXXI ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO Inovação Tecnológica e Propriedade Intelectual: Desafios da Engenharia de Produção na Consolidação do Brasil no

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1. Introdução

A capitalização de tecnologias oriundas de pesquisa tornou-se uma das grandes preocupações

das universidades e dos laboratórios de pesquisa públicos, assim como do ambiente dos

negócios, dos governos e da sociedade em geral. As descobertas científicas e tecnológicas

geram um potencial de criação, desenvolvimento e expansão de empresas. A criação de uma

empresa por pesquisadores e professores, baseada em um saber desenvolvido em ambiente

público e parapúblico, passa a ser uma nova forma de expressão e contribuição do mundo da

pesquisa (COZZI et al., 2008).

Os empreendimentos gerados a partir dos processos de transferência de tecnologia de

empreendedores que foram empregados de grandes corporações e estavam expostos às fontes

de tecnologias avançadas, e assim identificaram novas oportunidades de negócios, são

denominados spin-off’s empresariais. Quando a organização fonte da tecnologia é uma

empresa privada, com laboratórios de pesquisa e desenvolvimento (P&D) bem desenvolvidos,

os novos negócios são denominados de spin-off’s corporativas. Se a fonte de tecnologia do

empreendimento for proveniente das universidades, a partir dos diversos resultados

alcançados nos laboratórios acadêmicos, as Empresas Nascentes de Base Tecnológica

(ENBT’s) são denominadas spin-off’s acadêmicas (NDONZUAU et al., 2002 apud

DRUMMOND, 2005).

As redes institucionais presentes nos ambientes inovadores devem estar articuladas de forma a

permitir que o conhecimento gerado viabilize a inovação tecnológica em empresas existentes

e a criação de novas empresas de base tecnológica, haja vista que o processo de inovação,

importante para o desenvolvimento econômico e social, só completa o seu ciclo quando as

invenções e tecnologias geradas nas universidades e institutos de pesquisa transformam-se em

produtos e processos inovadores para a sociedade.

Na geração das spin-off’s acadêmicas, percebe-se uma grande dificuldade das equipes de

desenvolvimento em transpor as barreiras existentes entre a fase de ideação e o lançamento do

produto para o mercado. (FARIA et al.,2009). Segundo Nos países desenvolvidos, o processo

de incorporação tecnológica em produtos parece ser facilitado pela grande interação existente

entre universidades, laboratórios de pesquisa e setor produtivo. A grande maioria dos

profissionais qualificados para as atividades de desenvolvimento de novos produtos e

inovação (cientistas e engenheiros pós-graduados) está dentro das empresas. No Brasil, o

quadro é exatamente o inverso. Os profissionais capacitados para as atividades de inovação

estão nas universidades e nos institutos de pesquisa e, o mais grave: existe pouca ou nenhuma

interação destes com o setor produtivo. Assim, a produção de conhecimento no país é

satisfatória, mas na maioria das vezes não é aplicável ao contexto empresarial, o que dificulta

a geração de propriedade intelectual e, em última instância, a inovação e o desenvolvimento

do produto (DRUMMOND, 2005).

O Processo de Desenvolvimento de Produtos (PDP) e a sua gestão (Gestão de

Desenvolvimento de Produtos – GDP) encontram maiores dificuldades em spin-off´s

acadêmicas. Isso porque muitos pesquisadores-empreendedores estão distantes do mercado e

desenvolvem suas tecnologias sem um plano de vinculação aos produtos e sem traçar seu

lançamento no mercado (REIS et al., 2006). De acordo com Shane (2004), uma das

características de projetos acadêmicos é que sua equipe, geralmente, não tem contato direto

com seus potenciais clientes, e, fica restrita à dimensão técnica do desenvolvimento do

projeto. Para o autor, as equipes de projeto têm em frente o desafio de fazer com que suas

pesquisas se tornem produtos e serviços apropriados para o mercado, demonstrando sua

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aplicabilidade e manufaturabilidade. Para O’Shea (2008), o alto valor agregado de tais

produtos justifica a relevância dada ao tema em estudos de gestão e economia, principalmente

pela estimulação econômica que as empresas de base tecnológica promovem.

O conhecimento de informações de mercado é considerado fator chave para o sucesso dos

produtos advindos de pesquisas e para a criação de spin-off´s acadêmicas. Entretanto, as

necessidades do mercado nem sempre chegam à equipe de desenvolvimento, ou quando

chegam não é na forma de linguagem técnica e, portanto, é necessário saber interpretá-las.

Para auxiliar a tradução da voz do cliente em aspectos técnicos do produto pode ser utilizado

o método do Desdobramento da Função Qualidade (Quality Function Deployment - QFD).

Através de suas tabelas e operações, o método possibilita uma melhor caracterização dos

requisitos exigidos pelos consumidores e isso provoca grandes alterações no conceito e,

consequentemente, no projeto do produto.

Esse artigo tem por objetivo relatar o processo de intervenção e as mudanças realizadas no

projeto acadêmico de pesquisa tecnológica para o desenvolvimento de uma derriçadora

portátil de café utilizando o método QFD. O trabalho encontra-se dividido em quatro partes,

além dessa introdução. Na primeira, é apresentada a revisão da literatura de GDP e a

delimitação do escopo do desdobramento da qualidade na colaboração da definição e teste do

conceito de um produto. A segunda parte explana sobre a metodologia utilizada. Na terceira

são relatados os resultados e discussões do trabalho realizado. Por fim, é feita a conclusão,

refletindo sobre os resultados obtidos e as limitações encontradas.

2. Revisão Bibliográfica

Para Cheng & Filho (2007) o sistema de desenvolvimento de produtos pode ser compreendido

pelo esquema de entrada, processamento e saída, envolto pelo mercado e tecnologia e a gestão

desse sistema, denominada de Gestão de Desenvolvimento de Produto (GDP), refere-se ao

conjunto de processos, tarefas e atividades de planejamento, organização, decisão e ação

envolvidos para que o sistema considerado alcance os resultados de sucesso esperado. Cheng

(2000) esquematiza o tema através de um mapa (Figura 1) dividido em duas dimensões. Na

primeira dimensão (eixo vertical) encontra-se o horizonte de planejamento. Em um de seus

extremos tem-se o nível estratégico e no outro o nível operacional. Na outra dimensão (eixo

horizontal), tem-se o ciclo de desenvolvimento do produto, desde a etapa de geração de idéias

de produtos até seu lançamento, englobando todas as etapas do Processo de Desenvolvimento

de Produtos (PDP). Esse trabalho foca questões referentes ao nível operacional. Nesse recorte

estão contempladas as etapas do PDP no eixo horizontal.

O PDP é um conjunto de atividades por onde se busca chegar às especificações de projeto de

um produto e de seu processo de produção, de forma que a manufatura seja capaz de produzi-

lo. Esse processo envolve também as atividades de acompanhamento do produto após o

lançamento para serem realizadas as mudanças necessárias nessas especificações. Cabe,

também, ao PDP identificar as necessidades do mercado e dos clientes em todas as fases do

ciclo de vida do produto, além de identificar as possibilidades tecnológicas e desenvolver um

produto que atenda às expectativas em termo de qualidade total do produto. O

desenvolvimento de produtos é um processo de negócio cada vez mais crítico devido a

internacionalização dos mercados, o aumento da diversidade de produtos e a redução dos seus

ciclos de vida, sendo assim novos produtos buscam atender segmentos específicos de

mercado, incorporando novas tecnologias e se adequando a novos padrões e restrições legais

(ROZENFELD et al., 2006).

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Figura 1 – Representação de um Sistema de Desenvolvimento de Produtos.

Fonte: Cheng e Melo Filho (2007), p. 3.

Cheng & Melo Filho (2007) propõem então um PDP a partir da perspectiva da qualidade, que

tenha como principal objetivo atender às exigências de qualidade dos clientes por intermédio

do desdobramento da qualidade e do desdobramento das atividades voltadas para obtenção da

qualidade do produto. Tal processo foi denominado Processo de Desenvolvimento de Produto

Orientado para o Cliente (PDPOC). O Quadro 1 esquematiza suas etapas.

Quadro 1 – Processo de Desenvolvimento de Produto Orientado para o Cliente (PDPOC)

Fonte: Cheng e Melo Filho (2007), p. 81.

Macroetapas Etapas

Planejamento do Produto Identificação das necessisdades dos clientes P

roto

tip

agem

Definição e teste de conceito

Projetos Projeto básico

Projeto detalhado do produto

Projeto do processo de fabricação

Produção Prepação para produção

Produção inicial

Lançamento e monitoramento do

produto no mercado

Preparação de marketing e assistência técnica

Verificação do nível de satisafação do cliente

No transcorrer das etapas há o processo de prototipagem. Esse processo é caracterizado pelo

ciclo projeto-construção-teste. Este ciclo possibilita a definição de pontos de monitoramento e

validação do progresso do projeto, dispondo informações referentes à eficiência de suas ações

e oportunidades de melhoria. Ele engloba as etapas de conceito do produto e projetos do

produto e processo. O projeto objeto desse trabalho encontra-se, mais especificamente, na

etapa de definição e teste de conceito.

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O conceito do produto pode ser definido como uma descrição detalhada de suas características

na linguagem do cliente. Essa etapa pode ser subdividida em duas frentes de trabalho. Na

primeira, a definição e o teste do conceito são realizados a partir de uma descrição linguística,

com ou sem uma representação (física ou em papel) dos detalhes do produto. Na segunda, o

conceito pode ser testado por intermédio de avaliações dos protótipos. Nessa etapa também é

possível realizar análises de possibilidades de retorno financeiro do novo produto. O foco

dessa etapa é avaliar os conceitos alternativos e escolher o melhor conceito que atenda os

nichos e preços pretendidos. Ao seu término, as características do produto projetado devem

estar definidas, sejam soluções formais, materiais utilizados ou processos de fabricação

(CHENG & MELO FILHO, 2007).

A Gestão de Desenvolvimento do Produto (GDP) é uma área bastante desenvolvida na

literatura referente às grandes organizações. Passando pelo nível estratégico e operacional, e

permite a integração do trinômio tecnologia, produto e mercado (TPM), levando as

tecnologias e idéias geradas pelas empresas até o mercado. Os estágios iniciais dessa

caminhada contemplam, em geral, o binômio tecnologia e produto (T&P), definindo como as

tecnologias dominadas poderão gerar funcionalidade e características de produto desejadas

pelos consumidores. Os estágios finais, por sua vez, abrangem mais o binômio produto e

mercado (P&M), definindo como esses mecanismos poderão ser produzidos em escala

industrial e lançados com sucesso no mercado (DRUMMOND, 2005).

De acordo com Reis et al. (2006), para a GDP nas ENBT’s, pode-se recorrer às metodologias

utilizadas pelas grandes empresas, devendo-se, no entanto, proceder as adaptações necessárias

ao novo contexto. Na literatura de empreendedorismo tecnológico e de planos de negócio,

entretanto, não fica claro como os empreendedores podem orientar suas pesquisas nessa

direção, garantindo o alinhamento do trinômio TPM. A necessidade de orientação gira em

torno de como gerenciar o desenvolvimento de possíveis produtos, em laboratório e na

indústria, com foco nas melhores oportunidades tecnológicas e de mercado, ao longo dos

primeiros anos de vida do novo empreendimento (DRUMMOND, 2005).

Percebe-se a dificuldade dos pesquisadores de levar a tecnologia oriunda dos resultados das

pesquisas para o mercado na forma de produtos ou processos inovadores que sejam

plenamente aceitos pelo mercado. Supõe-se que essa dificuldade seja natural para o caso das

spinn-off’s acadêmicas, ou ENBT´s, haja vista que a grande maioria dos pesquisadores das

universidades inicia seus projetos de pesquisa sem uma aproximação do mercado. Assim,

quando o resultado da pesquisa é uma tecnologia inovadora, a incorporação dessa em um

produto ou processo inovador torna-se as vezes difícil, pois não se ouviu “a voz do cliente”.

Esse contexto é diferente do desenvolvimento de produtos em empresas inovadoras, já

consolidadas no mercado, onde o portfólio de produtos é definido a partir do planejamento

estratégico da organização, desenvolvido com informações provenientes de um amplo estudo

de mercado. Normalmente, o planejamento estratégico da empresa desdobra-se no

planejamento estratégico de produtos, que considera as expectativas dos clientes, as

qualidades exigidas pelos clientes, as oportunidades de mercado, os concorrentes e a

possibilidade de criação de novas demandas (FARIA et al., 2009).

De acordo com Drummond (2005) os métodos mais adequados da GDP para auxiliar no

preenchimento das lacunas teórica existentes no planejamento tecnológico de ENBT’s são:

em nível estratégico o Technology Roadmapping (TRM); e em nível operacional o

Technology Stage Gate (TSG) e o Processo de Desenvolvimento de Produto (PDP) tradicional

ou Stage-Gate (SG). Outros métodos podem ser utilizados segundo as contingências de cada

caso, como o Desdobramento da Função Qualidade (QFD), prototipagem rápida e técnicas

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estatísticas. O sucesso comercial de um produto está fortemente relacionado à identificação

correta das necessidades (definição do conceito) e a tradução dessas em dados técnicos

(projeto do produto). Para operacionalizar essa conversão o método do QFD é uma das

abordagens mais utilizadas (GOUVINHAS, 2001).

O método QFD vem sendo aplicado em grandes empresas desde o final da década de 60 e tem

se mostrado como uma potente abordagem no Desenvolvimento de Produtos com foco nos

clientes (HUNT & XAVIER, 2003). Seu propósito principal é assegurar que as verdadeiras

necessidades dos clientes sejam apropriadamente desdobradas por todo o processo de

desenvolvimento do produto (AKAO & MAZUR, 2003). No âmbito de ENBTs, entretanto, a

utilização desse método ainda é pouco explorada.

O QFD pode ser conceituado como uma forma de comunicar sistematicamente informação

relacionada com a qualidade e de explicitar ordenadamente o trabalho relacionado com a

obtenção da qualidade, tem como objetivo alcançar o enfoque da garantia da qualidade

durante o desenvolvimento de produto. O QFD possui um forte potencial inerente ao método

que é de ouvir, traduzir e transmitir de forma priorizada, a voz do cliente, bem como é um

método indutor da busca e da integração de conhecimentos das áreas funcionais da empresa,

sendo relevante para o processo de robustecimento do sistema de desenvolvimento de

produto. O método tem sido usado tanto para desenvolvimento de novos produtos quanto para

remodelagem ou melhoria de produtos existentes (CHENG & MELO FILHO, 2007).

3. Metodologia

A importância metodológica de um trabalho pode ser justificada pela necessidade de

embasamento científico adequado, geralmente caracterizado pela busca da melhor abordagem

de pesquisa a ser utilizada para endereçar as questões da pesquisa, bem como seus respectivos

métodos e técnicas para seu planejamento e condução. O resultado é o desenvolvimento de

trabalhos melhor estruturados que podem ser replicados e aperfeiçoados por outros

pesquisadores visando, acima de tudo, a busca do desenvolvimento da teoria, por meio de sua

extensão ou refinamento ou, em última instância, da proposição de novas teorias, contribuindo

assim para a geração de conhecimento (MIGUEL, 2007).

A estratégia de pesquisa utilizada nesse trabalho foi a pesquisa-ação, que tem como finalidade

o aprendizado por meio da combinação da ação participativa dos envolvidos e reflexão crítica

sobre as consequências de suas ações (BALLANTYNE, 2004). Por ser um método de

pesquisa aplicada, tem limitações quanto ao seu alcance. Vale ressaltar que a realização de

projetos, por si só, por meio da pesquisa-ação, não tem como objetivo imediato a

generalização do conhecimento. No entanto, a base teórica é incrementada em “passos curtos”

ao longo do tempo formando assim, uma base de conhecimento generalista (COUGHLAN e

COGHLAN, 2002; THIOLLENT, 1997).

De acordo com Coughlan & Coghlan (2002), a pesquisa-ação é uma abordagem científica

para estudar a resolução de importantes questões sociais e organizacionais, juntamente com

aqueles que vivenciam estas questões diretamente. Os membros do sistema que está sendo

estudado participam ativamente do processo, o que contrasta com a pesquisa tradicional, na

qual os pesquisadores devem se manter alheios a esse sistema. O método permite uma

investigação simultânea com a ação, possibilitando maior aprofundamento no objeto de

pesquisa e, ao mesmo tempo, a construção do corpo de conhecimento científico. Finalmente,

considera-se a Pesquisa-ação uma abordagem para a solução de problemas, pois envolve a

aplicação do método científico de ação em problemas práticos.

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O objeto de intervenção desse artigo é o projeto de pesquisa tecnológica, “derriçadora portátil

de café para região de montanha” participante do Programa de Incentivo à Inovação (PII). O

PII é uma iniciativa do Governo de Minas, por meio da Secretaria de Estado de Ciência,

Tecnologia e Ensino Superior (SECTES-MG), do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e

Pequenas Empresas do Estado (SEBRAE-MG) e de Centros de Inovação Tecnológica (ICT).

A essência do programa é investigar e qualificar tecnologias inovadoras geradas nos

laboratórios das ICT, com ênfase em suas aplicações práticas para a sociedade e o mercado. A

ação é integrante do Projeto Estruturador Rede de Inovação Tecnológica (RIT) e irá

proporcionar suporte técnico completo até inserção mercadológica das inovações, fruto dos

inúmeros projetos de pesquisa provenientes de universidades ou centros de pesquisa.

O PII tem como finalidade promover o desenvolvimento de tecnologias com potencial de

aplicação e comercialização, oportunidades de transferência de tecnologia ou geração de

empresas. Espera-se que as tecnologias selecionadas sejam objeto de novos investimentos

(prototipagem e desenvolvimento) e que, à medida que forem exploradas no mercado,

resultem em benefícios para a sociedade e novos conhecimentos para a comunidade

acadêmica, além do retorno em forma de royalties para essas instituições.

No ano de 2008, o programa foi implantado na Universidade Federal de Viçosa (UFV). O

mesmo foi estruturado em duas etapas. Na primeira foram selecionados 21 projetos e todos

foram contemplados com estudos de viabilidade técnica, econômica, comercial e de impacto

ambiental e social (EVTECIAS). Na segunda etapa, 10 projetos continuaram no programa,

recebendo aporte financeiro para atividades de GDP e prototipagem, dentre os quais se inclui

o da construção de uma derriçadora portátil para regiões de montanha. Durante essa etapa

vários métodos de GDP foram aplicados aos projetos, e, nesse caso específico, foi utilizado o

método do QFD.

O trabalho de intervenção teve duração de 14 meses e foi desenvolvido por um grupo de cinco

pessoas. Outros membros, em um total de nove, participaram das atividades de análise dos

dados. As principais fontes de informação utilizadas no decorrer deste projeto foram os dados

(qualitativos e quantitativos) obtidos pela realização de questionários com potenciais clientes.

4. Resultados

4.1 Projeto objeto da intervenção

Desde meados da década de 1990, a produção mundial de café apresenta aumentos

significativos, não acompanhados pela respectiva elevação do consumo. Tal fato gera uma

grande competição entre os mercados cafeeiros e tem motivado uma constante busca por

inovações tecnológicas na área, principalmente no que se refere à redução dos custos e ao

diferencial da qualidade. A forma como é realizada atualmente a colheita de café na região de

montanha ainda carrega fortes traços da época colonial. Segundo Silva et. al. (2001), a

colheita do café é vista pelos produtores como um ponto de estrangulamento na exploração da

cultura, mesmo considerando o atual uso de diferentes máquinas nas operações de colheita,

como ocorre em algumas propriedades mais tecnificadas; a mecanização ainda é modesta,

perante a área total cultivada.

Observa-se um grande avanço na tecnologia de colheita em regiões planas, mas o mesmo não

ocorreu para as regiões montanhosas. Os métodos tradicionais de mecanização só são

possíveis de serem aplicados em terrenos com até 20% de declividade. Isso, associado a

outras limitações de ordem operacional e econômica, mostra que a mecanização depende

sempre da complementação do serviço braçal. Além disso, as máquinas necessitam de

operadores, pessoal de manutenção, comercialização e assistência técnica, ou seja, mão-de-

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obra especializada. A colheita do café é comparativamente mais difícil de ser executada do

que a de outros produtos, em razão da altura e arquitetura da planta, da não uniformidade de

maturação e teor de umidade elevado.

Diante de tal situação o pesquisador, coordenador do projeto, idealizou um equipamento que

suprisse essa necessidade de mecanização e de maior volume de colheita para as plantações

de café em regiões montanhosas. A tecnologia desenvolvida permite a colheita de frutos

através de um equipamento que utiliza o método de vibração e esforço de tração

simultaneamente. O dispositivo é composto por (i) um sistema de vibração inercial acionado

por motor de combustão de quatro tempos (ou motor elétrico) que colhe toda a seção

transversal da planta de uma vez, derrubando os frutos por vibração e impacto; (ii) um sistema

de recolhimento dos frutos, que impede a dispersão dos frutos e evita o seu contato com o

solo; e (iii) um sistema de tração, que facilita o trabalho do operador ao fazer a passagem do

equipamento pela planta. O sistema de recolhimento dos frutos foi desenvolvido após a

aplicação do QFD. A retirada dos frutos da planta na derriça mecânica dá-se pela vibração de

varetas, dispostas em hastes, fabricadas de material resistente e leve, entre os ramos da planta.

4.2 Aplicação do QFD

O objetivo da intervenção foi agregar maior valor ao produto em desenvolvimento, com

potencial de criação de spin-off, identificando aqueles requisitos que os clientes atribuem

maior importância e, a partir disso, definir de forma mais assertiva seu conceito. O objetivo

final do trabalho de conversão da voz do cliente em linguagem de projeto deve ser a definição

das características técnicas do produto que atendam às exigências do mercado.

Na aplicação do QFD foi elaborada a matriz da qualidade, conforme metodologia apresentada

por Cheng & Melo Filho (2007) e com as características do projeto em estudo, objeto da

intervenção. Para tal seguiu-se as fases abaixo:

Elaboração da Tabela da Qualidade Exigida (TQE) – representação organizada e detalhada

das verdadeiras exigências dos clientes, na linguagem do grupo de desenvolvimento. Essas

exigências, obtidas das várias fontes de informação são resumidas em forma sistemática,

desdobradas do nível abstrato para concreto, do resumido para o detalhado. Para a

elaboração da tabela de qualidades exigidas, foram elaborados questionários que foram

aplicados aos potenciais clientes do equipamento em desenvolvimento.

Estabelecimento da Tabela de Qualidade Planejada – planejamento da melhoria de

desempenho do novo produto de acordo com as exigências dos clientes, considerando a

avaliação dos clientes com relação ao grau de importância a cada item da qualidade

exigida, a avaliação de desempenho do protótipo do produto e a comparação com produtos

substitutos ou similares.

Elaboração da Tabela das Características da Qualidade (TCQ) - Tabela construída pelo

processo de extração das qualidades exigidas e feita com o auxílio da equipe técnica do

projeto. Devem-se listar todas as características técnicas que podem interferir nas

qualidades desejadas e organizá-las em forma de tabela.

Estabelecimento da Tabela de Qualidade Projetada - Deve ser realizado após a correlação

entre as tabelas de qualidades exigidas e a tabela de características da qualidade. É feita a

partir do processo de conversão, o qual é utilizado para transmitir a importância dos itens

da qualidade de uma tabela (seus pesos relativos) para os itens de outra tabela, e é

realizado por meio das correlações identificadas.

Construção da Matriz da Qualidade - Matriz obtida a partir do cruzamento das Tabelas de

Qualidades Exigidas (TQE) e Características da Qualidade (TCQ). Deve ser feita a análise

de correlação e proporcionalidade entre as duas tabelas.

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A primeira etapa do método consiste na captação da "voz do consumidor", ou seja, identificar

os atributos que influenciam a percepção do consumidor para a qualidade do produto

(Qualidades Exigidas). Com isso, é possível focar as ações de melhoria no produto e a

definição de estratégias de marketing. Tal procedimento é essencial para o QFD, uma vez que

os demais estágios do método estarão traduzindo em linguagem técnica (Características da

Qualidade) as informações obtidas do consumidor e expressas em linguagem natural. Os

requisitos do consumidor podem ser obtidos de uma diversidade de fontes de informação,

dentre as quais a mais usual é a pesquisa de mercado. Essa etapa deve ser elaborada com

bastante cautela, uma vez que se estará tentando obter necessidades explícitas e implícitas dos

consumidores, através de questionários e entrevistas.

Para a identificação das Qualidades Exigidas foi realizada uma pesquisa de opinião junto aos

potenciais clientes para a derriçadora. A escolha da amostra se restringiu aos cafeicultores de

regiões acidentadas, apesar da possibilidade da tecnologia ser aplicada a cafeicultura em

regiões planas e a outras culturas, mas nesse ultimo caso são necessários novos estudos e

adaptação do produto proposto. Para a coleta dos dados foram elaboradas duas modalidades

de questionários: um para o cafeicultor e outro para o operador.

Através das informações provenientes da aplicação dos questionários e das entrevistas

realizadas, foi possível avaliar os principais requisitos de qualidades exigidos pelos

produtores de café e colhedores em relação a equipamentos para colheita deste grão. As

perguntas foram estruturadas de forma aberta para que, dessa forma, os entrevistados fossem

estimulados a refletir sobre as suas necessidades e principais problemas enfrentados. As

informações foram agrupadas por semelhança em tópicos mais abrangentes, e outras foram

extraídas ou desmembradas a partir das respostas dos entrevistados. O Quadro 2 resume esses

resultados.

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Quadro 2 – Tabela das Qualidades Exigidas para a derriçadora de café.

Com a TQE elaborada, seguiu-se para a extração das qualidades exigidas em características

da qualidade, ou seja, traduziu-se para a voz da engenharia, ou ainda buscou-se identificar as

especificações técnicas do produto. Através do processo de extração das qualidades exigidas,

a equipe de projeto elaborou a Tabela das Características da Qualidade (TCQ), constituída

pelas características técnicas do produto, que possuem relação com qualidade exigida. Para

cada qualidade exigida buscou-se identificar as características da qualidade que pudessem ser

medidas no produto final, que permitissem mensurar o atendimento ou não dos requisitos dos

clientes. Para isso fez-se o seguinte questionamento: quais são as características do produto

que medem tecnicamente tal item de qualidade exigida? O Quadro 3 apresenta a TCQ.

Quadro 3 – Tabela das Características da Qualidade para a derriçadora de café.

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Após definida a Tabela de Características da Qualidade foi realizada a correlação entre as

qualidades exigidas às características da qualidade. Para isso foram feitas perguntas ao

pesquisador do tipo, se a característica técnica x variar afeta qual qualidade exigida

(requisito)? Ou para atender o requisito y é preciso observar qual especificação técnica?

Estabeleceu-se para as correlações a seguinte escala: 9 – correlação forte; 3 – correlação

média; 1 – correlação fraca e 0 (vazio) – não há correlação.

A Tabela de Qualidade Planejada foi construída considerando: avaliação do Grau de

Importância (GI) de cada item da qualidade exigida, obtido nos questionários, avaliação do

desempenho do produto proposto e dos principais concorrentes com relação a cada item da

qualidade exigida, por meio de questionário quantitativo (mesmo do passo anterior), definição

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do plano de qualidade, ou seja, decisão estratégica da avaliação que se pretende obter do

cliente, após o lançamento do produto no mercado. A Figura 02 apresenta a Tabela de

Qualidade Planejada e o seu Gráfico de Pareto.

Para a Tabela de Qualidade Projetada, é feita a conversão do peso relativo dos itens da

qualidade exigida para os itens de características da qualidade. Este é um dos processos mais

importantes do QFD, pois por meio dele é que a importância atribuída pelos clientes a cada

item da qualidade exigida é transferida às características da qualidade, determinando as

prioridades do projeto. Assim, deve-se observar as características da qualidade que

apresentam maior peso relativo e caso o produto esteja com desempenho inferior ao

concorrente, deve-se estabelecer metas de melhoria de desempenho para a mesma. A Figura 3

apresenta a Tabela de Qualidade Planejada e o seu Gráfico de Pareto. A Figura 04 apresenta o

esboço da Matriz da Qualidade (já que não é possível adequar o tamanho da figura para uma

leitura apropriada).

Figura 02 - Tabela de Qualidade Planejada e o seu Gráfico de Pareto.

Figura 03 - Tabela de Qualidade Planejada e o seu Gráfico de Pareto.

Percebe-se a existência de uma interligação implícita entre a facilidade de manuseio do

equipamento e o acessório de recolhimento. Com essa observação foi proposta uma alteração

do projeto inicial. Antes da mudança no projeto, para realizar a passagem do equipamento

pela planta o operador deveria exercer força suficiente para alcançar o topo da mesma sem

apoio algum. Isso se tornava complicado à medida que o tamanho da planta aumentasse, já

que algumas chegam a 2 metros. No novo projeto, buscou-se aprimorar tal principio de forma

a automatizar essas atividades. A passagem é feita por um sistema de elevação e o operador

não tem mais que aturar o peso e a vibração do equipamento com a inclusão de um sistema de

sustentação no produto, resultando, assim, em melhorias ergonômicas do equipamento. Toda

essa estrutura foi projetada para proporcionar uma maior rapidez no processo de colheita.

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O principal impacto do uso da ferramenta do QFD no projeto foi a obtenção das necessidades

reais dos clientes. Nesse caso verificou-se que os cafeicultores estão preocupados com a

qualidade do produto, portanto dão importância ao acessório de recolhimento, para evitar a

dispersão dos grãos e o contato com o solo. Para adaptar o projeto anterior, foi preciso revisar

a estrutura física de suporte do equipamento, para recolher os frutos derriçados, dessa forma

houve a evolução de uma derriçadora portátil para uma colhedora semi-portátil, cuja chance

de sucesso e atratividade no mercado se mostram superiores a anterior.

Figura 3 – Matriz da Qualidade para a derriçadora de café.

Conclusão

Compreendendo que os produtos colocados no mercado que tenham sido criados num

processo de desenvolvimento de produto orientado para o cliente, tem muito mais chances de

sucesso, optou-se por aplicar o QFD, a fim de contribuir para a melhoria do desempenho do

produto proposto. Apesar da simplicidade da metodologia adotada nesse trabalho para a

elaboração da Matriz da Qualidade, essa mostrou-se bastante eficiente, pois de fato levou ao

conhecimento dos pesquisadores características da qualidade que não estavam sendo

adequadamente contempladas no projeto inicial do produto.

Com a aplicação dos questionários a equipe de projeto percebeu que o conceito inicial do

produto não era plenamente satisfatório. Percebeu-se que os frutos, ao serem derriçados,

poderiam se espalhar e entrar em contato com o chão (o que desvaloriza o preço da saca de

café), gerando um trabalho adicional de recolhimento desses. Após esse diagnóstico a equipe

de desenvolvimento realizou alterações no projeto. O conceito do produto foi alterado, ao

invés de uma derriçadora foi proposta uma colhedora semi-portátil. As principais mudanças

realizadas foram: a eliminação do contato entre operador/máquina e a inclusão do acessório

de recolhimento. Com a mudança os resultados obtidos na avaliação do conceito foram

positivos, o próximo passo no processo de desenvolvimento do produto é realizar os testes de

desempenho em situações reais de uso.

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