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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação – CIP Roberta Amaral Sertório Gravina, CRB-8/9167

Conselho Editorial Científico

Dr. Sérgio Paulo Morais

Dr. Túlio Barbosa

Dr. Lucas Ferreira de Paula

Ms. Hélio de Oliveira Ferrari

Esp. Fernando Paulino de Oliveira

R576n Rocha, Rafael Correia

Narrativa da imaginação: proposta

pedagógica, metodologia role playing e

reflexões sobre educação / Rafael Correia

Rocha. – Uberlândia: [s.n.], 2014.

111 p. : 30 cm.

ISBN: 978-85-67860-00-8.

1. Pedagogia 2. Educação 3. Imaginação I.

Título

CDD 370

CDU 37

3

Sumário

AGRADECIMENTOS 4

PREFÁCIO 6

AQUI COMEÇA A HISTÓRIA 10

PENSAMENTOS E PENSADORES NA EDUCAÇÃO E NA VIDA 15

PROPOSTA PEDAGÓGICA 22

TEORIZANDO 26

DUALIDADE CONVERGENTE 46

METODOLOGIA ROLE PLAYING 64

ANÁLISE DE DADOS 75

CONSIDERAÇÕES FINAIS 88

REFERENCIA BIBLIOGRAFICAS 93

ANEXO 96

4

AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus, que me sustentou durante toda a jornada, nos períodos

mais improváveis.

Ao professor Raimundo Angel Dinello que por sua companhia, atenção, auxílio, intelecto e

idéias destemidas me fizeram refletir sobre o papel do pesquisador, promovendo muitos

conflitos pedagógicos. E com toda certeza sem ele não teria conseguido chegar até aqui.

A Dra. Marialva Moog Pinto, por aceitar orientar este trabalho, mesmo não conhecendo

profundamente o tema, e ainda assim mostrou-se muito sábia em sua habilidade única de

articulação e flexibilidade, dando esperança para este trabalho, me acalmando nas horas

de desespero.

A paciência amorosa da minha mãe e ao meu pai que sempre incentivou meus estudos

sendo “mestre” antes de mim sem terminar o 4° ano, fechando seus olhos azuis cheios de

mistérios, sua boca silenciosa de experiências, seus ouvidos cansados de oitavas e

deixando o coração aberto, pois viveu sabendo e fazendo muito bem o que amava.

Ao professor Sergio Paulo de Morais, por aceitar o desafio de coordenar o projeto de

extensão Narrativa da Imaginação, levando alguns de seus alunos para a linha de frente

desta proposta.

Aos alunos que ingressaram no curso e pelas histórias que contaram.

Aos amigos-pesquisadores-rpgistas Jaime Daniel Leandro Rodriguez Cancela, Maria do

Carmo Zanini, Wagner Luiz Schmit, Marcos Tanaka Riyis, Carlos Klimck, Luiz Falcão,

Matheus Viera entre outros, pelas incontáveis conversas virtuais.

A Universidad de La Empresa, por promover esta educação plural da América Latina, que

me fez conhecer muito mais sobre as necessidades humanas.

Ao Hostel Internacional, que me abrigou com uma manta de cultura e aconchego nas

noites frias de Montevideo, sendo para mim uma segunda casa.

Por fim, agradeço ao RPG, que me ensinou que durante a vida, jogamos muitos dados nos

quais independente de sucessos ou falhas, a história continua...

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O Professor Está Sempre Errado Quando...

É jovem, não tem experiência.

É velho, está superado.

Não tem automóvel, é um pobre coitado.

Tem automóvel, chora de „‟barriga cheia".

Fala em voz alta, vive gritando.

Fala em tom normal, ninguém escuta.

Não falta ao colégio, é um "caxias".

Precisa faltar, é um "turista".

Conversa com os outros professores, está "malhando" os alunos.

Não conversa, é um desligado.

Dá muita matéria, não tem dó do aluno.

Dá pouca matéria, não prepara os alunos.

Brinca com a turma, é metido a engraçado.

Não brinca com a turma, é um chato.

Chama a atenção, é um grosso.

Não chama a atenção, não sabe se impor.

A prova é longa, não dá tempo.

A prova é curta, tira as chances do aluno.

Escreve muito, não explica.

Explica muito, o caderno não tem nada.

Fala corretamente, ninguém entende.

Fala a "língua" do aluno, não tem vocabulário.

Exige, é rude.

Elogia, é debochado.

O aluno é reprovado, é perseguição.

O aluno é aprovado, deu "mole".

É...o professor está sempre errado, mas,

se conseguiu ler até aqui, agradeça a ele.

Águeda Maria Turatti

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Prefácio

Falar de Educação nos dias de hoje é muito complexo. Tenho sempre a impressão

que não há mais o que ser dito, que tudo é démodé. Livros, dissertações e teses são

anualmente publicados, mas parecem sempre falar mais do mesmo. E se não há mais

nada a ser dito, é possível supor que nossa educação está muito bem, que já não há o que

melhorar. Ledo engano.

A educação brasileira tem passado por uma crise profunda nos últimos anos. Se

antes a crise apontava que os alunos chegavam até o Ensino Fundamental, ou até mesmo

o Ensino Médio, sem uma leitura fluída, boa capacidade de raciocínio e argumentação

lógica, atualmente os alunos chegam até o Ensino Superior nessas condições - e muitas

vezes concluem o curso. Estamos com cada vez mais jovens nos bancos escolares, mas

isso não tem refletido na qualidade da educação que elas recebem. Estamos atendendo

em quantidade não em qualidade.

Com alguma frequência uma pergunta me vem a cabeça: porque nada muda na

Educação? Por que as mudanças são tão pequenas a ponto de serem imperceptíveis?

Porque ano após ano pesquisadores nos apontam os mesmos problemas e ninguém faz

nada para resolvê-los? São perguntas amplas, que remetem à várias instâncias da

sociedade.

Após reflexões e conversas com outros educadores, cheguei à conclusão que as

mudanças acontecem a passos de formiga porque pouca coisa se faz na prática. Concordo

que governos ou empresas tem o poder de auxiliar a qualidade do ensino. Mas acredito

também que não basta existir apoio externo se, na ponta, na sala de aula, o professor não

fizer sua parte.

Sabemos que é necessário inovar as aulas, mas não inovamos. Sabemos que

devemos compreender o aluno como sujeito protagonista do seu aprender, mas insistimos

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em ser aquele professor dono do saber que ensina. Sabemos que o aluno deve entender o

conteúdo, mas insistimos que ele apenas memorize e reproduza.

Nesse sentido, fico feliz toda vez que conheço algum professor que inova em suas

aulas, se valendo das chamadas “pedagogias ativas de aprendizagem”. Acredito que, ao

se práticar aquilo que as pesquisas postulam, entendendo o aluno como responsável pelo

seu aprendizado, o aprendizado se dá com mais qualidade. Fico mais feliz ainda, quando

encontro professores que, para fazer essa inovação em sala, utilizam o Role Playing Game

ou RPG – jogo que me diverte desde minha adolescência e faz parte da minha vida

profissional de psicólogo e educador há quase uma década.

Apesar de muitos ainda considerarem jogos e brincadeiras como algo infantil ou de

importância menor, é importante ressaltar que o lúdico faz parte de nossas vidas até nossa

morte. Mudam-se os sonhos, mas não o sonhar. Mudam-se os brinquedos, mas não o

brincar. Encontramos jogos de interpretações em várias profissões como na psicologia ou

em administração de empresas. Por se trabalhar com pessoas, todas dotadas de

pensamento e imaginação, o jogo de papéis se mostra muito rico. E assim acontece com a

Educação.

Em meados de 2012, meus interesses por RPG e sua aplicação na Educação

cruzaram com os mesmos interesses do Rafael. Um curso de formação de professores

para utilizar o jogo de RPG em suas aulas foi o motivador das nossas conversas iniciais.

Na época eu preparava o lançamento do meu livro e ele se preparava, cheio de desejos e

angústias, para sua pesquisa no mestrado.

Creio que a grande contribuição dessa obra seja a sensibilidade do autor. Sua

proposta é, antes de tudo, uma proposta de respeito, de amor. Quando ele vincula a má

qualidade da educação ao mau relacionamento entre professores e alunos, ele aponta

problemas de diálogo, respeito, entendimento, empatia e hierarquia - isso sem falar dos

problemas de aprendizagem. Ou seja, é importante que professores compreendam alunos

e vice-versa para que haja aprendizado.

À medida que lemos o trabalho, percebemos que não é só de sensibilidade que ele

é feito. Afirmações duras, mas necessárias, são feitas. A quebra da vitimização do

professorado (muito encontrada) é um ponto forte a ser ressaltado. É necessário que os

professores entendam que, mesmo sob circunstâncias adversas ainda é ele quem faz a

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educação acontecer. Mesmo que o governo não ajude, que a supervisão e direção da

escola não colaborem, ainda assim, o que determina a qualidade da educação ofertada é

sim do professor. Não estou querendo dizer que ele é o único responsável; mas que, para

que o aluno aprenda não é necessário aparelhos tecnológicos na sala, não é necessário os

melhores livros nem viagens diferenciadas – precisa, principalmente, de um professor

engajado que queira fazer a diferença.

Quando percebemos um cenário de fuga, de evasão tanto de alunos quanto de

professores e comparamos com a paixão que todo jogador de RPG tem em jogá-lo é

possível imaginar como seria se o sentimento do jogador de RPG pudesse ser transferido

para o aluno em relação às aulas. É comum encontrar jogadores que se lembram de

personagens e momentos heroicos de aventuras jogadas há anos atrás. Agrada-me muito

uma poetisa, minha conterrânea e do Rafael, a saudosa Adélia Prado que dizia: “o que a

memória ama, fica eterno”. Creio que essa eternidade que ela fala se aplica ao sentimento

que os jogadores de RPG tem por suas aventuras vividas em suas imaginações. E se o

jovem, por meio do RPG, amasse aprender? Imagine como seria: um aprendizado eterno!

Ao ler esse livro tive agradáveis surpresas como encontrar um breve resgate do que

já existe de produção nacional voltada para a aplicação do jogo de interpretação nas

escolas. Embora o Brasil ainda tenha muito que crescer em pesquisas nessa direção, não

somos novatos em buscar compreender as possibilidades que o RPG pode trazer à

Educação. Resgatar essas produções enriquece a obra, pois indica que muito já foi feito,

muitas pessoas jé se debruçaram para enriquecer os processos de ensino-aprendizagem,

mas que ainda precisamos de mais. (Quem sabe você, leitor?!)

Por último, e talvez minha maior satisfação, foi ter encontrado práticas com o RPG

em todos os níveis de Educação. Boa parte do que existe hoje de publicação sobre a

aplicação de RPG em sala de aula versa sobre Ensino Fundamental e Ensino Médio, além

de algumas poucas contribuições a respeito do Ensino Superior. Nesse livro encontrei um

compêndio de aplicações do RPG na Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio e no

Ensino Superior. Ou seja, sob a ótica do mesmo autor temos a possibilidade de ter uma

análise da aplicação em todos os níveis educacionais!

É uma grande honra para mim, ter participado do início de sua jornada e agora,

prefaciar a presente obra, fruto de sua dissertação. Ler cada página desse livro confirmou

meu desejo de disseminar cada vez mais a prática do RPG entre os professores e

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educadores. Os dados aqui apresentados permitem uma rica reflexão sobre nossa prática

como profissionais da educação e as possibilidades que o jogo de interpretação de papéis

pode trazer para ela.

Aos leitores, que a leitura desta obra seja tão agradável, motivadora e

enriquecedora quanto foi para mim. Que as ideias aqui expostas possam ser uma semente

a ser germinada na mente de cada um!

Ao autor, agradeço e parabenizo pelo texto e a oportunidade de prefacia-lo!

Matheus Vieira Silva - Psicólogo, Pedagogo, Mestre em

Educação, RPGista e Coordenador do curso de

Pedagogia da Faculdade da Industria - PR

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Aqui começa a história...

Começo este livro como um pedagogo não convencional, não tenho grande experiência

em sala de aula na educação básica, mas tive oportunidade de ficar observando e

intervindo de outra maneira, minha contribuição para a educação esta em um olhar crítico

sobre a postura docente no “o que se faz” e “como se faz” na sala de aula.

Por isso essa introdução é feita de histórias e perguntas.

Em 2009 estava cursando a especialização em Expressão Ludocriativa, vinda da proposta

de Pedagogia da Expressão do professor Raimundo Dinello e trabalhava junto a Secretaria

de Desenvolvimento social e Trabalho, em um núcleo voltado ao atendimento de jovens

entre 14 á 25 anos.

O professor Dinello sempre valorizou a experiência e aplicabilidade dos métodos para

comprovar sua eficácia, reforçando o caráter cientifico, que nem sempre é devidamente

explorado nas ciências humanas. Influenciando minha postura e percepção diante da

realidade. Assim, tive a oportunidade de interagir com algumas escolas que me

provocaram certos incômodos, assim como ambientes sócio-educativos abertos para o

atendimento da população.

Comecei a trabalhar com uma turma de alunos do ensino fundamental 2, com a proposta

da Pedagogia da Expressão, taxados de alunos-problemas, os quais tinham em comum à

desestruturação familiar, em maioria, evasão, filhos de pais separados, sem referência de

valores ou limite, muitos não conversavam com os pais, chegando a afirmar que os

odiavam, também ficavam muitas horas fora de casa com amigos, em festas ou pela rua,

admitindo o consumo de bebidas alcoólicas e agressão entre companheiros de sala.

A partir desses alunos, algumas histórias começaram a emergir.

Notei que um dos alunos não apresentava problemas de aprendizagem e era relativamente

comportado, ao questionar a direção me veio á resposta “ele é um aluno problema porque

demonstra tendência homossexual”.

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Em outro caso uma professora gritava com uma aluna e esta xingava a professora e desde

então as duas pararam de conversar, a mesma aluna batia nas demais alunas, chegou

certa vez a quebrar a janela da sala com a cabeça de uma colega.

Um aluno, foi proibido pela família de frequentar as aulas, pois começou a questionar as

decisões da mãe, depois da proibição aluno começou a fugir das aulas da grade curricular

para voltar a minha sala para conversar.

O que essas histórias tem em comum? Em comum com os professores?

Minhas primeiras impressões foram de insatisfação e de não saber o que fazer para

resolver o problema em questão, gerando um ciclo de frustrações. Professore(a)s e alunos,

estavam frustrados.

E por mais que apontassem uns para os outros como culpados, ou para a falta de

recursos, nada disso resolveria o problema. Era um problema de educação, não de

educação informação, mas de educação postura, comportamento. Uma obrigação em rude

de seguir estruturas que não são funcionais ao bem estar dos sujeitos. Cada escola por lei

tem autonomia de ação para gerir os próprios projetos e desenvolver um plano politico

pedagógico adequado porém a preocupação em seguir o currículo e aprovar alunos é

tamanha acabamos por ficar doentes.

De acordo com Krishnamurti, “não é sinal de saúde, estar ajustado a uma sociedade

doente profundamente doente” Essa doença não é só o mal estar docente, mas um mal

estar discente, aqui questionamos como é possível, não reverter, mas transformar esse

quadro, sem depender de políticos, recursos, governo, e afins, ou seja uma transformação

que não seja dependente.

Uma postura independente, não tem limites para crescer.

Há também em ambientes não formais oferecidos para atendimento a comunidade, que

tive acesso por meio de meu trabalho público, a alunos que reforçavam o pensamento

agressivo sobre os professores dizendo “eles não são nossos amigos, é só copiar e esta

bom” do outro lado aparecia a resposta de um professor de História “eu não quero que

você me ame, eu não sou doce para você gostar de mim, sou seu professor e você tem

que me respeitar”.

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Não conseguia enxergar quem era o adulto ou o certo nestes diálogos, não conseguia

inclusive, notar a existência de um diálogo coerente. Muitas vezes somos crianças

emocionais em corpos de adultos, quando é possível perceber isso, a maturidade cognitiva

se mostra sem grande relevância.

Essas aulas para alunos-problemas eram compreendidas por alguns professores como

perda de tempo, que o aluno estava perdendo conteúdo, pois os alunos eram liberados 1h

por semana, alguns educadores questionaram “vai você dar minha aula e eu fico lá

brincando com eles”. O que é neste caso o mais importante para o professor(a), acaba se

limitando em seguir o conteúdo mais do que ouvir o aluno. Visualizei alunos e professores

como forças opostas olhando para esse cenário.

A escola como um ambiente anti - aprendizagem, por meio desses conflitos, que

resinificaram o espaço de convivência. Não havia dialogo, comunicação talvez, porém

cheia de ruídos, e não se escutava quase nada.

Não existe aqui culpados, apenas estratégias educacionais que não são funcionais e ao

mesmo tempo são repetidas ciclicamente, por não se ter claro uma proposta pedagógica e

métodos que sejam do professor e não da escola ou do currículo.

E de maneira nenhum acredite, que aqui será excluído a responsabilidade da família e da

comunidade, porém aqui é um livro sobre educação para educadores, então vai a primeira

lição importante, professor(a) não direcione responsabilidade para outras pessoas,

psicólogos, assistentes sociais e afins, não como um processo mecânico e desgastante, e

também não se sobrecarregue de responsabilidade sendo assistente social, pai, mãe,

enfermeiro(a), etc, existem limites e distinções.

Lembro de uma amiga dava aula em uma escola que ela tinha que medir a temperatura de

um aluno de 5 em 5 minutos para evitar convulsões, nos formamos juntos e não tivemos

capacitação para isso.

Por isso professor(a), neste livro, lhe digo com a maior sinceridade, você é o ser mais

preciso do mundo, do seu mundo e de centenas de outros. Mas você faz a diferença

principalmente para você.

Professor(a) você é nosso foco, nossa mesa, nosso motivo maior.

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Aqui iremos tratar, antes de falar de aprendizagem, de pessoas e como elas se relacionam

em ambiente de aprendizagem. Assim levantamos perguntas anteriores a “o que o aluno

aprendeu” para dar atenção á “qual a qualidade das relações entre o aluno e o

professor(a)?”

Se até aqui, caro amigo(a) acredita que estou a falar de sonhos e vivendo em um mundo

utópico e fantasioso, alerto que tudo que lerá daqui para frente é o produto de aplicações

concretas, fatos registrados e pesquisa cientifica rigorosa.

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Ninguém pode educar alguém.

Alguém só pode educar-se a si mesmo.

A verdadeira educação é

essencialmente intransitiva, reflexiva e

subjetiva.

Huberto Rohden

15

PENSAMENTOS E PENSADORES NA EDUCAÇÃO E NA VIDA.

As relações humanas são promovidas em ambientes sociais, como escolas,

parques, universidades, centros de convivência em geral. Segundo Huizinga (2007), a

ludicidade disposta nos jogos se apresenta como canal de interação, construção e estimulo

na estrutura destas relações. Portanto, a postura docente necessita de uma dosagem de

ludicidade, curiosamente quanto mais o aluno avança do ensino fundamental, ao médio e

do médio a universidade, cada vez menores são as dosagens até o ponto de chegar a

inexistência.

A partir destas relações tive como proposta investigar os resultados de uma

pesquisa de campo a respeito do uso de elementos do Role playing game1 por docentes

como metodologia de ensino, por intermédio de um curso de formação, no intuito de

compreender se seria possível desenvolver uma metodologia quando usado

pedagogicamente pode permite qualificar a relação professor-aluno. Pensando que o

instrumento que o professor tem para dialogar com o aluno é sua metodologia.

Iniciei assim, em 2011, o desenvolvimento de minha dissertação de mestrado em

educação, intitulada “Narrativa da imaginação: a proposta de uma metodologia role playing

para a melhoria da qualidade nas relações professor-aluno, um estudo de caso no

município de Uberlândia (MG)” é um estudo que significativo como uma possibilidade a

mais de ofertar à comunidade educacional, uma alternativa para desenvolver melhorias

nos ambientes educacionais se pautando nas interações interpessoais entre educador e

educando.

Comecei a pesquisa por meio da visualização das escolas públicas de Uberlândia,

enquanto membro atuante do Conselho Municipal de Educação e Secretaria de

Desenvolvimento Social e Trabalho, onde pude notar que entre o professor e o aluno

haviam atritos, violência, rebeldia, aversão de maneira que a escola apresentava-se como

um ambiente insalubre e violento para ambos, onde não se valoriza a necessidade de

expressão e afetividade dos sujeitos inseridos neste meio, desta forma não sendo propicio

e convidativo a aprendizagem.

1 Jogo de Representação de Papéis

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Neste caso, a situação conflitante identificada, que me mobilizou, foi a lacuna de

comunicação entre os sujeitos inseridos dentro deste espaço, que acaba por gerar uma

ambientação desfavorável. Percebi uma ausência de uma linguagem comum em um

ambiente aparentemente não favorável as interações sociais e aprendizagem, tornam-se

impróprias para a finalidade da instituição educativa e dos papéis estabelecidos na mesma.

E neste quadro surge uma realidade preocupante onde o caráter afetivo-social e o bem

estar dos sujeitos são colocados de lado, para seguir padrões não funcionais estabelecidos

pelo currículo e posturas de gestão, de maneira engessada, mecânica e repetitiva.

Compreendendo que cada sujeito dentro do espaço de convivência escolar

representa um papel social com determinadas funções e responsabilidades, pré-

estabelecidas pelo imaginário da sociedade e aparentemente vinculadas ao eixo de

direitos e deveres segundo a Lei 9393/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação).

Restringindo estes papéis a professor e aluno, penso que com uma visão

tradicionalista que possivelmente o professor está em função de orientar, ensinar e instruir

os alunos enquanto, os alunos são visualizados em um papel de aprendizes curiosos e

questionadores, entretanto, estas imagens não estão realmente claras e distintas, nem

aceitas em homogeneidade.

Desta forma, os sujeitos inseridos nestes papéis teriam uma interpretação confusa,

desorientados na organização do meio, causando prejuízos para a função da instituição,

necessitando assim de diálogos constantes para reforçar estas figuras. Em resumo:

Sabem quem são, porque estão ali, mas se confundem sobre o como fazer, e

principalmente o determinante vontade nem sempre esta ativo.

Então como seria possível melhorar a qualidade das relações professor-aluno, a

comunicação e a identificação dos sujeitos junto a suas funções dentro do ambiente

escolar?

O ponto de partida para a compreensão da estratégia que proponho neste trabalho

inicia-se com o que é o Role playing game (RPG) e para tal conceituação se recorre a

alguns autores vinculados a este objeto como Hitchens e Drachen (2008), que ilustram o

RPG como uma atividade de expressão coletiva que emerge e atua em um mundo

imaginário, onde os jogadores têm a livre escolha em explorar, analisar, reconhecer e

interagir neste mundo. Os participantes são divididos em grupos de jogadores, que

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representam personagens individuais e o narrador ou mestre do Jogo é o responsável por

representar a estrutura do mundo imaginário, articulada as regras do jogo.

Ainda, se pode compreender o RPG como uma atividade com sentido e função

social, um jogo produtor de ficção coletiva por meio de narrativa, podendo transformar-se

no decorrer do jogo, todavia, os livros de RPG não contam histórias, mas fundamentam as

histórias para o seu desenvolvimento (RODRIGUES, 2004).

Todavia o conceito que mais se aproxima do eixo deste trabalho, está na

representação de uma contação de histórias interativa, quantificada, episódica e

participativa, com personagens atribuídos de características e um cenário onde existem

regras determinadas na resolução da interação entre os personagens, ou seja, uma

história que vai sendo construída espontaneamente constituída pela expressão coletiva

(SCHMIT, 2008).

Tendo especial atenção ao elemento narrativo deste jogo, com ênfase em

metodologia de ensino, pois se mostra como um canal de comunicação ou conexão em

sala de aula para educadores e educandos, quando aplicada adequadamente. O que

justifica neste trabalho, a seguinte hipótese de como pode ocorrer por meio de elementos

do RPG, no caso a narrativa em aspecto principal, articulados em formato de metodologia

pedagógica como proposta para melhorar a qualidade das relações professor e aluno.

As possibilidades que o RPG e seus elementos proporcionam diante da educação

como metodologia pedagógica para melhorar a relação educador/educando são muitas,

assim como os autores que a embasam, todavia, partindo de alguns olhares iniciais pode-

se compreender três pontos chaves relevantes para este trabalho.

Inicialmente, o jogo permite um exercício do hábito da pesquisa, juntamente a

alteridade entre os sujeitos, no caso entre professor e aluno assim como dá liberdade para

instigar a imaginação em múltiplas probabilidades, o que permite o educando explorar

melhor sua relação com os saberes escolares, assim como a produção coletiva dos

mesmos (VASQUES, 2008).

Além deste aspecto, o estimulo a leitura e escrita, amplia o glossário e articula

saberes diversos, promovendo a aquisição de maior capital cultural do sujeito, que vem por

meio do contato humano, do encontro com outros sujeitos no processo do jogo (PAVÃO,

2000).

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O RPG desenvolve um processo de estímulos das inteligências, propicia a

transcendência dos saberes e percepções onde o sujeito aprende por meio do imaginário,

pois conhece além do que lhe é oferecido, onde se estimula múltiplas experiências que

podem ajudar a enfrentar situações da vida cotidiana (BRAGA, 2000).

Organizei após esse levantamento conceitual, a iniciativa de uma experiência

realizar-se-á por meio de intervenções, relatórios, entrevistas, observações e coleta de

dados bibliográficos. Acredito que seria possível comprovar a eficácia e fluidez da

ludicidade na narrativa como elemento ausente na educação convencional podendo ser

um instrumento de conexão entre os sujeitos.

Gradativamente, uma mitologia comum é formada junto aos participantes, isto

permite a possibilidade de se identificarem, afeiçoarem-se ao meio e entenderem seus

papéis sociais neste contexto. Partindo do pressuposto apresentado com a pergunta e a

hipótese, se direciona o objetivo geral deste trabalho que está na investigação se o uso de

elementos do Role playing game articulados como metodologia de ensino, a fim de

compreender como se beneficiaria a relação professor-aluno.

Assim como compreender como alguns elementos do RPG podem ser utilizados

para envolver pedagogicamente o docente e o educando, contribuindo com o ambiente de

sala de aula, como espaço prazeroso. contribuir para um desenvolvimento metodológico,

que envolva ludicidade, comunicação, narrativa, críticidade e expressão. Propor

alternativas ao professor, visando o caráter de mediação em relação aos conflitos com

discentes em sala.

Ao reúnir vários símbolos de experiências individuais e compartilha-los, foi possível

promover uma linguagem de orientação coletiva, uma simbologia social, que se manifesta

na formação de mitologia em um caráter educativo para determinada estrutura social ou

microgrupo. Assim, a mitologia permeia o coletivo pelo individual, concedendo aos sujeitos

experiências de interpretação cognitiva, afetiva e imaginativa, sobre determinado tema,

facilitando sua aprendizagem, permitindo entender conceitos complexos por meio de

exemplos narrativos ao qual ocorre a identificação individual (CAMPBELL, 1990).

Outro olhar que estabelece os parâmetros relevante, estão na estrutura das

relações que ocorrem no espaço escolar convencional, em que o aluno é visto como

alguém que tem que ser vigiado para não fazer algo errado, sendo coagido pelo uso do

autoritarismo que o obriga a determinadas tarefas, que por consequência acaba por

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reproduzir regras, normas e comportamentos. A ausência de uma horizontalidade nas

relações professor-aluno promove em geral, um ambiente de carência afetiva, não

participação e conflito permanente, que impede o desenvolvimento da autonomia do

sujeito, em um sistema prisional onde o aluno deve sempre manter-se sob vigia do

professor (TRAGTENBERG, 1985).

E a partir desta verticalidade, se pode compreender a problemática persistente na

sala de aula, direcionada para o conflito na relação entre o educador e educando. Este

conflito prejudica o dialogo, assim como a boa relação entre eles. Um dos motivadores

desta situação, pode ocorrer pela imposição de valores do educador para o educando que

resiste, gerando conflito. Acreditei que isso ocorria também, porque os sujeitos envolvidos,

educador e educando, não partilhem de símbolos comuns, que os aproxime (CAMPBELL,

1990).

Partindo do diálogos destes autores e pesquisadores, se iniciou uma investigação

que busca compreender se “O uso de elementos do RPG quando articulado como

metodologia educacional, pode atuar na melhoraria da qualidade das relações professor e

aluno” ou como eu gosto de dizer “o RPG funciona na escola? Será?”

Desta forma, acredito que professores e alunos podem construir pontes em comum,

tendo ciência que atritos são naturais, e deles se pode tomar proveito com ações

adequadas, não se pode reforçar a postura de desistência diante deles, por falta de

preparação dos educadores ou resistência dos educandos.

Sendo assim, este trabalho abre portas a questionar a postura dos sujeitos por meio

da reflexão sobre os personagens representados no dia a dia. Compreendo a composição

da realidade, com a clareza de Paulo Freire, ao descrever que “o mundo não é, o mundo

esta sendo” assim como os sujeitos que nele habitam. Penso em como estamos neste

movimento do mundo e para educação neste mundo, pois logo após Freire reforça que “a

educação não transforma o mundo, a educação muda as pessoas, e as pessoas

transformam o mundo”.

Para essa mudança das pessoas, precisamos caminhar com consciência que,

segundo Anaïs Nin, “não vemos as coisas como são, mas como somos”.

Quem somos neste movimento?

20

O que representamos?

Para que a para quem representamos?

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Tabacaria

Não sou nada.

Nunca serei nada.

Não posso querer ser nada.

À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.

Janelas do meu quarto,

Do meu quarto de um dos milhões do mundo.

que ninguém sabe quem é

( E se soubessem quem é, o que saberiam?),

Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,

Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,

Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,

Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,

Com a morte a por umidade nas paredes

e cabelos brancos nos homens,

Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.

Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.

Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,

E não tivesse mais irmandade com as coisas

Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua

A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada

De dentro da minha cabeça,

E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.

Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu.

Estou hoje dividido entre a lealdade que devo

À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,

E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.

Falhei em tudo.

Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.

A aprendizagem que me deram,

Desci dela pela janela das traseiras da casa.

Fernando Pessoa

22

PROPOSTA PEDAGÓGICA

É interessante compreender o que é a tal narrativa da imaginação, o porquê desse

nome e sua função. Narrar nos remete a uma sequência que compõe um todo, narrar

cenas de um filme, fatos de uma história, se pode pensar que existe um único locutor, mas

na origem da palavra narratio também existe o significado “relação ou relacionar”, então a

ação de narrar pode ser individual e ao mesmo tempo coletiva, compartilhada. Posicionado

o regente da narrativa como a imaginação, uma força infinita de criação individual, mas

que também converge na sociabilidade, penso que esta interação produtiva age como um

processo significativo no fazer-se do sujeito, como uma referencia ao monomito ou jornada

do herói. Vamos entender mais sobre a jornada durante a leitura. Mas, mantenha esse

pensamento fixo, mais importante que entender a jornada é seguir por ela.

O levantamento de dados das iniciativas anteriores sobre RPG e educação, análises

de entrevistas de professores que tinham contado com RPG na sala de aula, e com

minhas ressalvas diante dos últimos anos de pesquisa, foi possível traçar um método que

atende as necessidades do(a) educador(a), utilizando a narrativa, expressão e a

ludicidade, além do uso de objetos de aleatoriedade (dados, roletas, etc).

Mas nada adianta falar disso agora, antes de se falar sobre qualquer “técnica” é

necessário conhecer seu contexto, sua proposta conceitual e seus objetivos para além do

resultado prático, este capitulo irá falar sobre a postura docente, e para isso temos que

conversar com atenção.

É importante compreender que esta metodologia não é pautada restritamente a

educação básica ou a algum conteúdo exclusivo, a plasticidade do elemento narrativo,

permite que o conteúdo seja conduzido de acordo com as necessidades etárias e locais.

Recursos como Data show, multimídia, objetos e equipamentos, são totalmente opcionais

podendo ser transformados ou resinificados. O proposito desta ação, serve para que o(a)

educador(a) não mantenha dependência de nada além dele mesmo, ele é o gestor do

recurso infinito da imaginação.

23

O objetivo desta proposta também não esta em prender o educador a normas

rígidas mas permitir que ele possa por meio de orientações iniciais, exercícios constantes e

constatações, criar sua maneira de lecionar com ludicidade.

Ler um texto diante de uma sala já alfabetizada é uma redundância, o educador

deve realizar algo único para o desfecho de sua história, todo educador deve procurar sua

singularidade, resgatar sua imaginação de criança maturada dela experiência dos anos.

Buscar a felicidade de ser humano antes de ser professor.

Existe a necessidade de compreender que qualquer docente pode gerar uma aula

narrativa, porém esta só será possível por meio da experiência pretérita, então digo vá

jogar RPG antes, para primeiro compreender a prática da narrativa, jogue por uns 3 meses

antes de atuar ou faça o curso de formação em metodologia role playing (dura 6 meses e

atendemos na sua cidade , ligue já!!! LIGUE, JÁ!!!).

E quando começar a experimentar o jogar, irão emergir suas percepções sobre o

campo da ludicidade, que não pode ser descrito em totalidade em nenhum livro ou vídeo,

necessita do contato com outros seres humanos, essa é uma tecnologia de ponta, um

instrumento que permite uma conexão com outro ser humano.

Essa fase é importante para saber distinguir o RPG da prática que fará em sala de

aula, compreender que o RPG em si é projetado para grupos pequenos como atividade

livre e descomprometida em uma realidade complemente distante da sala de aula

superlotada com tempo delimitado. Então ele deve ser reestruturado, veremos isso em

detalhes na metodologia. Dentro do RPG se encontra o elemento narrativo que iremos

explorar, pois ele permite a mediação sem oposição direta ao aluno.

É bom que um educador mantenha um hobby como jogador, tenha um momento de

ludicidade semanal ou quinzenal para instigar a imaginação de sua criança interior, que

possa jogar algo sem preocupação de perdas ou ganhos, sugiro o RPG e o LARP por não

serem voltados diretamente a competição, mas você pode jogar um jogo de tabuleiro ou de

cartas sem se preocupar em competir e ganhar, mas em estar lá, tudo que te satisfaça

FAÇA, jogue, brinque, eduque primeiro sua postura como ser humano, um ser humano

feliz.

Pois por meio desse jogo exercitará subjetivamente um olhar diferenciado do

mundo, compreendendo que o jogo faz pessoas se encontrarem não por interesses

24

exclusivos, mas pelo prazer de estarem lá, e quando estão não falam de problemas ou

delas mesmas, apenas jogam, e nos jogo se expressa quem realmente são.

Se sentir dificuldade, uma grande mestra já me disse, “não aprende, quem não se

permite aprender” você pode se permitir! Você quer se permitir? Sua permissão é

fundamental para encontrar sua identidade docente.

Estar acomodado e cansado de sala de aula, não é uma identidade docente, isso é

um sintoma de um docente doente, irritado e frustrado. Já questionou por que tem

dificuldade de conversar com alguns alunos? Porque perde paciência e grita? E por que

eles ainda não te ouvem e fazem o que querem?

Já questionou se existe um canal de comunicação entre vocês, não apenas

idiomático, mas existem símbolos comuns? Histórias em comum? Experiências em

comum?

Veja bem, o ser humano precisa de histórias para dar sentido a sua vida, senão

todos os carros que saem de uma linha de produção, com a mesma marca e cor, seriam o

mesmo carro, o que os diferencia? A história deles, a história do seu carro, que o faz seu

carro. Não é a documentação, não é a chave ou o IPVA. Isso são objetos que confirma sua

história.

Agora e sua história com os alunos?

Talvez você seja a pessoa de fala, grita, passa trabalho, isso são fatos, mas não

uma história exige uma linearidade e uma inter-relação entre essas linhas/personagens. E

a história não pode ser contada, pela contação de história tradicional, deve ser vivenciada,

percebida, experimentada, repensada, e se esta gerou um processo de aprendizagem,

acredito que se torna um mito, agrega-se uma mitologia comum a um grupo de pessoas,

uma cultura comum ao grupo.

Os jogadores de RPG que estão lendo aqui sabem do que estou falando, passam

anos e ainda lembram de suas histórias, não pelos personagens apenas, mas pelas

sensações produzidas no encontro com outras pessoas. Isso ocorre porque as histórias

fazem parte do que eles são agora, é uma memoria viva pela experiência que é resgatada

para ser contada de novo, e quanto mais e conta mais se reafirma a experiência.

Professor(a) não imagine que a história será a mesma porque o plano de aula

narrativa é o mesmo, que irá utiliza-la ano após ano sem aceitar as diferenças de cada

25

turma, essa proposta quer exprimir, expressar e emergir sujeitos, entre eles você. Cada

experiência será intensa, única e viva. Aceite que sim, no inicio terá muito trabalho. Pois

haverá uma reconfiguração na sua forma de pensar. Ou seja, se você agora é

acomodado(a), veja bem se começar essa história jamais será o(a) mesma.

O fim real desta proposta pedagógica está na melhoria constante das relações

professor-aluno (relações humanas) por meio da ludicidade e expressão, manifestada na

criação de diferentes formas do jogar de maneira a mobilizar os sujeitos envolvidos no

processo de ensino aprendizagem.

Pensando que existe um estágio de pré educação, um processo anterior a cognição

e ao entendimento formal, estruturas que movem a curiosidade e participação do sujeito, e

nelas que a educação deve começar.

No indireto, subjetivo e metafisico do sujeito, partindo inicialmente do(a) professor(a)

para o aluno, para que o educando possa ser devidamente orientado, o(a) orientador(a)

deve estar complementa ciente, pela própria vivencia, do processo a ser desenvolvido.

Tenha consciência que não haverá “controle” completo, prepare-se para bagunça as

vezes, pois quando se dá liberdade a pessoas que estão acostumadas a ser oprimidas,

pode ocorrer bagunça em dobro.

Mas tenha ciência que isso faz parte do processo natural de se expressar. O plano

de aula narrativa é apenas para noções, pois o que realmente faz a aula fluir é o exercício

de escolhas dos alunos, o(a) educador(a) proporciona a forma mais atrativa segundo sua

imaginação para os discentes se expressarem. Por fim, acredito ser importante uma

reflexão sobre a postura de paidagogo, recontando sua história, não como aquele(a) que

guia para o caminho saber segurando na mão da criança não permitindo a exploração do

caminho até a praça, mas aquele que abre a porta da casa e apresenta como cada sujeito

pode compreender e transformar o mundo conforme vai se constituindo e descobrindo.

26

Teorizando

*nota: não confundir com aterrorizando

Penso que é necessário conhecer o RPG em detalhes, antes de iniciar um discurso

sobre um método educativo, para poder diferenciá-lo, iniciamos um série de definições

detalhadas sobre o jogo exposta, inicialmente, por Hitchens e Drachen (2008) que

contemplam a visão científica auxiliadora no direcionamento deste trabalho:

Um role-playing game é um jogo situado num mundo imaginário. Os jogadores são livres para escolher como explorar o mundo do jogo, em termos do caminho escolhido através do mundo, e podem revisitar áreas previamente exploradas. O montante do mundo do jogo potencialmente disponível para a exploração é normalmente grande. Os participantes dos jogos estão divididos entre os jogadores, que controlam personagens individuais, e os mestres do jogo (que podem ser representados por software em exemplos digitais) que controlam o restante do mundo do jogo além das personagens dos jogadores. Jogadores afetam a evolução do mundo do jogo através das ações de seus personagens. As personagens controladas por jogadores podem ser definidas em termos quantitativos e/ou qualitativos e são indivíduos definidos no mundo do jogo, não identificados apenas como papéis ou funções. Essas personagens podem potencialmente se desenvolver, por exemplo, em matéria de competências, habilidades ou personalidade. A forma deste desenvolvimento está pelo menos parcialmente sob controle do jogador e o jogo é capaz de reagir a estas mudanças. Pelo menos um, mas não todos os participantes têm controle sobre o mundo do jogo além de um único personagem. Um termo comumente utilizado para esta função é mestre do jogo, embora existam muitos outros. O equilíbrio de poder entre os jogadores e mestres do jogo, e a atribuição dessas funções, pode variar, mesmo dentro de uma única sessão de jogo. Parte da função de mestre do jogo normalmente é para se pronunciar sobre as regras do jogo, embora essas regras não precisem ser quantitativas em qualquer forma ou se embasar em qualquer forma de resolução aleatória. Os jogadores têm uma ampla gama de opções configurativas para interagir com o mundo do jogo através das suas personagens, em geral, incluindo, pelo menos, o combate, o diálogo e a interação com objetos. Embora o leque de opções seja grande, muitas são tratadas de uma forma muito abstrata. O modo de interação entre o jogador e o jogo pode mudar de forma relativamente livre entre configurativas e interpretativas. Role-playing games retratam algumas sequências de eventos no mundo do jogo, o que dá ao jogo um elemento narrativo. No entanto, dada a natureza configurativa do envolvimento dos jogadores, estes elementos não podem ser chamados de narrativa de acordo com a teoria narrativa tradicional (HITCHENS; DRACHEN , 2008, p. 16).

Pode-se também perceber o jogo como uma contação de histórias interativa,

quantificada, episódica e participativa, atribuída de personagens com características

27

determinantes e um cenário com regras prefixadas na resolução da interação entre os

personagens (SCHMIT, 2008). E que se apresenta como linguagem autônoma ou mídia,

entendida como forma de arte coletiva e compartilhada, um território de autonomia e

desenvolvimento de autonomia (FALCÃO, 2012).

Outra gama de definições vindouras de pesquisadores de RPG nacionais se mostra

necessária para cercar as principais linhas de pensamento no universo deste tema, recorro

neste caso a citações de pesquisadores reunidas por FREITAS (2006):

[...] um jogo de criar e contar histórias, no qual cada ouvinte faz o papel de um personagem. O narrador desta história (chamado de mestre do jogo) descreve as situações, mas são os ouvintes que decidem o que seus personagens vão fazer (RICON, 1999, p. 60). RPG [...] é uma atividade lúdica na qual os participantes contam histórias e nelas tem um papel ativo ao interpretar personagens. É um ato coletivo de criação de narrativas orais; é a arte de contar histórias, recuperada, revisitada e adaptada ao gosto moderno. É o resgate da tradição oral e da troca espontânea de experiências. (LUDUS CULTURAIS). [...] um jogo de interpretação grupal desenvolvendo-se no plano da imaginação. [...] Um grupos de jovens reúne para se divertirem sem os aparatos da atual tecnologia, como instrumentos têm livros, blocos de anotações, lápis, canetas e sobretudo imaginação (BRAGA, 2000, p. 62 ). [...] é, ao mesmo tempo, um método e uma brincadeira em que os participantes, controlando as ações de suas personagens e cooperando entre si, criam histórias coletivamente (KLIMICK, 2003, p. 62). A principal diferença que existe entre o contar histórias tradicional e o RPG é que no primeiro caso o narrador conta uma história que ele já conhece e práticamente nada se altera [...]. Num RPG, por outro lado cada um dos ouvintes representa um personagem que faz parte da história que está sendo contada pelo narrador e interfere no seu desenvolvimento. Transformando-a em uma criação coletiva (JACKSON; REIS, 1999, p. 63). O narrador expõe uma situação e diz aos ouvintes o que seus personagens vêem e ouvem. Em seguida, os ouvintes descrevem o que seus personagens fazem naquela situação e o narrador, então, diz qual o resultado das ações dos personagens ouvintes [...] e assim por diante. A história vai sendo criada pelo narrador e pelos ouvintes á medida que ela é contada e vivenciada como uma aventura (JACKSON; REIS, 1999, p. 63).

Em seguida, Rodrigues (2004) representa este pensamento em sua tese como:

O Role playing Game é um jogo de produzir ficção. Uma aventura é proposta por um narrador principal – o mestre – e interpretada por um grupo de jogadores. A ação pode se passar em vários “mundos” de fantasia medieval, terror ou futurista. Pode também interagir com um universo ficcional preexistente. As regras do RPG são as da narrativa (RODRIGUES, 2004, p.18.).

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Logo após, a mesma autora endossa o elo entre a fantasia e o cognicível onde descreve:

Engana-se quem pensa que a arte da ficção nos coloca frente ao desconhecido. A

ficção nos leva a re-conhecer, a compreender o que já sabíamos, ou, pelo menos,

teríamos condições de saber. (...) O Leitor ou o espectador da obra de ficção

encontrará ali respostas que, individualmente, levaria muitas vidas para obter‟

(RODRIGUES, 2004, p. 41).

A partir destes esclarecimentos conceituais, posso entranhar no campo pedagógico

junto a suas relações entre a educação e os elementos deste jogo. Deixando claro que

definir RPG devido a sua propriedade plástica e interativa, sempre será a meu ver um

conceito em movimento de construção e reconstrução.

BREVE HISTÓRICO

Estes múltiplos olhares permitem ter uma concepção mais ampla sobre o que vem a

ser esse jogo, todavia, existe a necessidade de um conhecimento histórico, que permeia a

proximidade continuada deste jogo com a sala de aula.

Durante a década de 80 sem uma data específica encontrada em registro,

brasileiros que viajavam para os EUA, a turismo, trabalho, e intercâmbio, assim como

professores de cursos de inglês que tiveram contato com livros deste jogo (PAVÃO, 2000,

p. 74.) entre outros produtos relacionados (tabuleiros, mapas, cartas, entre outros) e os

trouxeram informalmente para o país, que até então eram catalogados como livros

didáticos infanto-juvenis pelas autoridades nacionais. Segundo Marcatto (1996), em 1985,

a série de livros “Aventuras fantásticas”, editada pela Editora Marques Saraiva, oficializou a

presença do jogo no país.

Logo após, a editora Devir, a maior editora latino americana a trabalhar com este

gênero literário, lança como produção nacional a série de livros com fim didático, Mini-

gurps, de Ricon (1999), que abordavam temas históricos como cruzadas, descoberta do

Brasil, escravidão e a ação dos retirantes no nordeste.

Na época realmente foi sensacional e até hoje se comenta sobre os livros

sagrados “mini-gurps” porém... no que se difere de um livro didático, com

instruções de uma dinâmica? Que pode deixar o docente dependente e

restrito a seguir sempre o mesmo plano de aula pronto, com falas pré

definidas? Ano após ano sem atualização. Os livros mini gurps para

professores que não tem contato com o RPG, podem agir da mesma

maneira que um computador para educadores avessos a tecnologia.

29

E iniciativas educacionais como a Ferramenta Lúdica para Ensino por

Representação (FLER), de Alessandro Viera dos Reis, o sistema SIMPLES, do professor

Marcos Tanaka Riyis, entre outros.

Durante a década de 90 e o início do século XXI, a produção e traduções de

materiais foram abundantes, inclusive no desenvolvimento de revistas especializadas

como Dragon Magazine, Dragão Brasil, Arkhan, Grimorium, Dragão dourado, Dragon

slayer, entre outras. Fatos esses reforçados abaixo:

[...] a partir do final da década de 90, começaram a se desenvolver no Brasil, os primeiros estudos sobre a aplicação dos RPGs – do inglês, Role Playing Game (jogos de interpretação) - na educação. O que inicialmente eram iniciativas isoladas, aos poucos se tornou uma verdadeira corrente de estudo, originando seminários especializados no assunto. O Brasil, inclusive, é hoje um dos países mais avançado nesta área (RIYIS, 2004, p. 7).

Contudo, em 2001 surge uma notícia significativa para todo país, uma jovem

assassinada em Ouro Preto/MG, coloca em réu o RPG como culpado, alertando a nação

sobre um “jogo satânico” que conduz as pessoas à morte, e a sombra deste incidente

abalou a trajetória de ascensão econômica e social até então definida deste jogo no Brasil,

entretanto, este fato não afetou o aspecto educacional por completo, e até deu estimulo

aos esforços dos educadores, como descrevo adiante.

Após esse incidente os livros começam a ser registrados como jogos, ganhando

classificação de faixa etária variada entre 12 a 18 anos, o que fez esfriar esse mercado de

jogos, porém, o mesmo não ocorreu na Educação, sendo comuns casos onde professores

que começaram a estudar o tema por causa de seus alunos que jogavam e mostram-se

mais ativos em aula, e jogadores de RPG (RPGistas) que ao ingressarem no Ensino

Superior investiram em pesquisa e produção de material educativo.

Neste ponto acredito que mais uma ramificação foi reforçada, o que hoje vem a ser

o RPG com fim educativo, incentivado pelas atividades da ONG Ludus Culturalis,

fomentando simpósios de RPG e Educação de 2002 até 2006, atualmente extinta.

Também a tese de doutorado de Sônia Rodrigues (2004), “O Role Playing Game e a

Pedagogia da imaginação no Brasil”, direcionou socialmente olhares de professores sobre

o RPG como jogo a ser estudado com atenção.

Os pesquisadores do tema RPG desenvolvem trabalhos com enfoque em educação

e cultura, de maneira isolada em cada município, pela distância geográfica dos demais

30

pesquisadores e desarticulação de encontros presenciais frequentes fora da esfera do

entretenimento após 2006.

Destaca-se assim, dificuldades na mobilização dos pesquisadores, e

consequentemente restrições para que instituições e governo financiem tais iniciativas

(FALCÃO, 2012).

JOGO DE AUTORES

Compreendo que meio pelo qual ocorre esta manifestação do sujeito vem, segundo

a estrutura narrativa presente no RPG, por intermédio do papel ou personagem (role), que

de acordo com a descrição de Moreno (1993):

[...] o termo inglês role (= papel), originário de uma antiga palavra francesa que

penetrou no Francês e Inglês medievais, deriva do latim rotula. Na Grécia e

também na Roma Antiga, as diversas partes da representação teatral eram escritas

em “rolos” e lidas pelos pontos aos atores que procuravam decorar seus

respectivos papéis; esta fixação da palavra role parece ter-se perdido nos períodos

mais incultos dos séculos iniciais e intermediários da idade média. Só nos séculos

XVI e XVII, com o surgimento do teatro moderno. É que as partes dos personagens

teatrais foram lidas em “rolos” ou fascículos de papel. Desta maneira, cada parte

cênica passou a ser designada como um papel ou role (MORENO, 1993, p. 27).

As artes cênicas, além de um canal de comunicação é uma ferramenta para

conhecer e reconhecer características comportamentais (condutas), fomentando diversas

percepções (BRAGA, 2000) aos envolvidos, recorda-se que nesta proposta não existem

sujeitos passivos, como uma plateia, todos são atores. Além disso, os Roles não são

decorados, mas abertos a interpretação de quem os assume, de acordo com as

percepções de cada sujeito.

Dentro da ação do Role, há de uma maneira sutil a formação de laços de conexão

entre pessoas, em um canal de “comunicação” palavra vinda também do latim

communicatio, (FERREIRA, 1983) “ação de repartir, de distribuir, comunhão”, como uma

das ações base do educador, conectar pessoas e mediar de acordo com que essa

substância interna vai se manifestando em uma comunhão de saberes. Que com auxilio de

31

outra palavra que lhe é semelhante em significado: expressão, que Dinello (2009) define

como:

Expressão: voz do latim (1360) expressio-exprimere, de: ex e premere (pressar) que dão lugar nas línguas vivas atuais a expressão (substantivo de expressar e expressar-se). „Tirar para fora‟. Expressar: é o fato de manifestar emoções, os sentimentos, uma parecer pelo comportamento exterior. Expressar-se: é a aptidão para manifestar vivamente o que se pensa ou o que se sente. Expressar: é fazer sensível ou comunicável por sinais (da linguagem, do pensamento, do comportamento, do gesto, na arte, pelos gestos,...) que dão um sentido – próprio ou figurado – a algo de si mesmo. É crescer desde dentro. Expressar-se: é manifestar uma sensibilidade, um fazer conhecer; é por onde passa a afirmação do ser; do contrário, seria utilizar os sinais e a linguagem para repetir um conteúdo ensinado (colocado em sinais pelo outro) (DINELLO, 2009, p. 13).

Há uma semelhança harmônica entre educação e expressão, já que ambas

requerem a necessidade de expor, apresentar, de tirar para fora algo, ou no caso alguém,

o próprio sujeito educando que aprende. Há nesse processo a expressão do educador, e

quando ambos se manifestam, reconhecem-se como sujeitos ativos de seus próprios

processos internos, de forma que durante uma partida um jogador reconhece a importância

do outro jogador (DINELLO, 2009), valorizando assim cada ação realizada neste campo,

de maneira a compreender a relevância do uso narrativa no ambiente educacional.

Complementando (FERREIRA, 1983), a analisar a raiz latina Relatio, partilha uma

dualidade de interpretação, ramificando tanto a palavra relação quanto narrativa, ou seja,

se pode fazer uma leitura atenciosa ao qual por meio da semântica a ação da narrativa

existe a possibilidade de permear diversas maneiras de interação entre seus interlocutores.

Ao aglutinar em sintetize todo esse glossário para uma única palavra, se pode optar

por: Jogo, (DINELLO, 2009) vinda da origem latina jocus, que descrimina uma atividade ou

momento destinado ao divertimento e lazer, também encontrado no grego Paidiá, como

uma referência a necessidade de pular dos animais enquanto filhotes, sendo que a

atividade lúdica vem como um movimento natural que mescla o agir com o aprender.

Na ação de jogar, os indivíduos se reconhecem em importância, e estabelecem

regras de convivência, ao ponto em que cada um pode se expressar e ao mesmo tempo

em que dão valor a todos os envolvidos, sem uma noção de derrota pois o jogo encontra

seu objetivo nele mesmo. Contribuindo para a formação intelectual do sujeito, ao mesmo

32

tempo em que, na infância descobre a afetividade por meio desta interação entre sujeitos e

objetos, realizada nos jogos (DINELLO, 2007). No caso do RPG como jogo tradicional,

existe somente a interação entre sujeitos no processo da narrativa. Nesta proposta de

RPG Acadêmico se apresenta liberdade na escolha do docente em transpor diferenças por

meio da própria criatividade e inserir novos esquemas, seja um jogo de peças de montar,

argila, papel e tinta para desenho, sejam objetos que possam ser experimentados e

transformados pelo aluno, afim de complementar a atividade.

Nesta estrutura, recorro ao historiador holandês Johan Huizinga (2007) que também

descreve com propriedade em sua obra “Homo Ludens”, a importância do jogo na

formação humana, sendo que por meio da ação de jogar os indivíduos se agrupam de

maneira funcional com naturalidade, como se fosse a chave para o nascimento das

sociedades, assim como seu desenvolvimento e criação de uma multiplicidade de outros

ambientes (campos de jogo).

Descreve dessa forma, que toda ação humana é organizada como um jogo

(relacionamentos, trabalho, religião, entre outros), que desperta no prazer (DINELLO,

2007) de jogar, e com isso o apreender na expressão do sujeito junto a imaginação,

desenvolvendo os primeiros impulsos de interações para a sociedade. O autor classifica o

ato de jogar quase como uma ação da imaginação coletiva, pois se diferencia firmemente a

realidade quotidiana. Huizinga (2007) nos auxilia definindo jogo como:

[...] uma atividade ou ocupação voluntária, exercida dentro de certos e

determinados limites de tempo e de espaço, segundo regras livremente

consentidas, mas absolutamente obrigatórias, dotado de um fim em si mesmo,

acompanhado de um sentimento de tensão e alegria e de uma consciência de ser

diferente da “vida quotidiana” (HUIZINGA, 2007, p. 33).

Com base nestas definições, concordo com o autor, ao compreender que o jogo é

caracterizado por estes quatro elementos fundamentais: a livre escolha, sendo a

participação não obrigatória, a não ser em casos específicos de ações culturais, exemplo:

seleção de futebol brasileira na copa do mundo; o descanso ou afastamento temporário da

vida cotidiana buscando maior satisfação pessoal; descriminação de um período delimitado

de tempo e espaço; e regras próprias, rígidas e claramente definidas.

33

No lúdico, o prazer de jogar apresenta-se como espontâneo e salutar, junto

desenvolvimento biológico, afetivo e intelectual do sujeito, conforme reforça Caillois(1990):

[...] em minha opinião, há que defini-lo como o vocábulo que abrange as

manifestações espontâneas do instinto do jogo: o gato aflito com o novelo de lã, o

cão sacudindo-se e o bebê que ri para a chupeta, representam os primeiros

exemplos identificáveis desse tipo de atividade [...]. Assim, K. Groos recorda o caso

de um macaco que adorava puxar a cauda de um cão que com ele coabitava,

sempre que este se preparava para dormir [...] (CAILLOIS, 1990, p. 48-49).

Outros autores, como Bartholo (2001), que concebe o lúdico (assim como a

criatividade que lhe é parceira), como um elemento chave na constituição do sujeito, sendo

inerente e fundamental para sua existência:

O lúdico e o criativo são elementos constituintes do homem que conduzem o viver

para formas mais plenas de realização; são, portanto, indispensáveis para uma vida

produtiva e saudável, do ponto de vista da auto afirmação do homem como sujeito,

ser único, singular, mas que prescinde dos outros homens para se realizar, como

ser social e cultural, formas imanentes à vida humana. (BARTHOLO, 2001, p. 89)

Dessa forma, compreendo que um ser humano só é autêntico quando se assume

Homo Ludens, como se nota nesta citação de Platão apud Pinto (2001, p. 5) “Você pode

aprender mais sobre uma pessoa em uma hora de brincadeira do que em uma vida inteira

de conversação”. Penso que a educação deve aproximar-se do caráter de jogo, para ser

funcional e natural aos educandos, dando-lhes sentido ao estarem inseridos na sala de

aula, proporcionando características de um campo de jogo.

Retorno ao caráter dos papéis, no intuito de compreender melhor que neste jogo de

expressões, existe uma apropriação do sujeito pelo sujeito, em seu processo de formação

como descreve Moreno (1991), abaixo:

[...] o teatro da espontaneidade foi o desencadeamento da ilusão. Mas essa ilusão,

passada ao ato pelas pessoas que a viveram na realidade, é o desencadeamento

da própria vida – das dingaussersich (a coisa fora de si). O teatro das coisas

últimas não é a repetição eterna do mesmo, por necessidade eterna (Nietzche),

mas o oposto disso. É a repetição autogerada de si mesmo. Prometeu apossou-se

de suas correntes, não para se conquistar nem para se destruir. Ele como criador,

34

produziu-se de novo e provou, [...] que sua existência agrilhoada foi obra de seu

próprio livre arbítrio (MORENO, 1991, p. 78).

Esta percepção de Moreno (1991) permite compreender a importante relação entre

a expressão que vem por espontaneidade com a ludicidade. Tais percepções são

características a serem relevadas na atuação do educador junto ao educando.

O RPG apresenta capacidade para estimular as múltiplas inteligências, (ANTUNES,

2000) sendo que competências e habilidades são trabalhadas coletivamente de acordo

com o decorrer da história e curiosidade do educando. Conduzido pela narrativa, o

estímulo pode trabalhar todas as faculdades mentais. É possível também, focar em

determinadas características que o educando tem dificuldade ou ainda, ressaltar as que

têm facilidade, devido à flexibilidade da ferramenta, que permite intervenções para auxílio

no processo de ensino-aprendizagem. O RPG como simulador de situações, pode

exercitar uma coletânea de inteligências, que se tornam presentes em estímulos e

percepções durante sua aplicação.

Compreende-se que cada personagem representa características distintas (sendo o

escravo, o navegador, o indígena, entre outros) mediado pelo educador, o que permite ao

aluno tomar consciência de alteridade e trabalho cooperativo, afetando a conduta social,

além da mera instrução.

Esse despertar da consciência social do sujeito se torna possível a partir do

momento em que o indivíduo se reconhece e identifica como sujeito sócio histórico em um

processo que está acontecendo continuo e coletivamente.

Entende-se que as ações do sujeito não são limitadas a determinados resultados,

embora necessitem de serem conhecidas na totalidade de sua abrangência, a fim de

atribuir ao educador a função de conscientizador em sala de aula para a reflexão dos

sujeitos, utilizando de diferentes personagens (roles) que interpretam saberes e

percepções da realidade.

O mito de determinado grupo (escola ou sala de aula) é gradativamente criado e vai

caracterizando a identidade dos sujeitos de acordo com as relações durante a narrativa.

Na relação entre sujeitos, Vigotsky (1988) apresenta a teoria da Zona de

Desenvolvimento Real (Intra-individual = reflexão interna do sujeito) que abarca funções

psíquicas adquiridas pelo indivíduo (o que foi aprendido), ou seja, sua aprendizagem

35

autônoma e a Zona de Desenvolvimento Proximal (Inter-coletiva = reflexão sofre o contato

social), que descreve o processo de aprendizagem com auxílio externo de alguém mais

experiente (educador) ou de um grupo de pessoas (sala de aula).

A partir da narrativa do RPG, o sujeito torna-se interativo, no processo de troca com

outros indivíduos e consigo mesmo. As informações, dados e características sociais se

internalizam, formando não apenas conhecimento mas, a própria consciência. Assim, o

professor-narrador, faz a mediação e estimula o processo de aprendizagem, fornecendo

elementos que o aluno poderá entrar em contato de acordo com as próprias escolhas (ex:

cabe ao professor-narrador, descrever a existência de uma porta, fica a critério do aluno-

jogador, abrir ou não).

Desta forma, para Vigotsky (1988), o processo de interação de indivíduos em

diferentes etapas de desenvolvimento necessita desta convivência em grupos, para que

por meio de conexões sociais, os mais experientes auxiliem no processo dos menos

experientes, facilitando a aprendizagem, fato que ocorre na prática da cooperação

apresentada no RPG.

Segundo o autor, a maneira que o ser humano aprende é caracterizada como

resultado de um decorrer sócio-histórico de agregação de conhecimentos através das

relações sociais. Ressalta-se que a compreensão do desenvolvimento humano está na

mediação do conhecimento, feita por meio de um a gente externo (professor-narrador), o

indivíduo como ponte de suas relações de forma construtivista, gerando a linguagem como

um sistema simbólico de organizações, de conceitos culturais, formando, assim, estruturas

mentais complexas que caracterizam a realidade do indivíduo. Vygotsky (1998) visualiza

uma conexão da aprendizagem e do desenvolvimento, destacado na citação abaixo:

A aprendizagem não é em si mesma desenvolvimento, mas uma conexão

organizada da aprendizagem da criança conduz ao desenvolvimento mental, ativa

todo um grupo de processos de desenvolvimento, e esta ativação não poderia

produzir-se sem a aprendizagem. Por isso, a aprendizagem é um momento

intrinsecamente necessário e universal para que se desenvolvam na criança essas

características humanas não naturais, mas formadas historicamente

(VYGOTSKY,1998, p. 47).

Os símbolos trazidos pela cultura são internalizados como ação fundamental para o

desenvolvimento humano, a partir de referenciais, iniciando do externo para o interno, do

36

interpessoal para que o intrapessoal se reconheça, a fim de originar as predisposições

internas como motivação, interesse, emoções e necessidade.

Narrativa que ocorre a saída do cotidiano e a entrada ao mundo de fantasia

(conforme foi visto nas características do jogo), deste modo, a mente assimila novas

experiências. Entretanto, dentro da sala de aula, não se pensa em um espaço próprio para

divagar, pensar no improvável. Devemos repensar isso. Pois a ação lúdica da fantasia é a

peça chave para o desenvolvimento do pensamento neste jogo e do relacionamento entre

o humano e a realidade.

Com base em Freud (1909), a fantasia surge na função de amenizar situações de

desprazer, e uma aula chata poderia sim, a meu ver, ser caracterizada como uma situação

de desprazer.

E quando o desenvolvimento do sujeito está na mediação entre esses mundos

(interno e externo), o professor-narrador pode auxilia-lo utilizando, além da narrativa,

objetos de probabilidade (dados, moedas, roletas, entre outros) como instrumentos lúdicos

neutros que permitem a aproximação entre os envolvidos na atividade.

Vejo como interessante entender a importância da probabilidade, no caso do dado

por exemplo, o pesquisador francês Jean-Marie Lhôte, descreve em um estudo etimológico

na Índia, encontrando uma relação semântica entre o radical div, “jogar dados”, e os

substantivos deva,“deus” e daiva (uma entidade celestial organizadora dos destinos),

sendo objetos desta categoria de incerteza, recorrem ao lado mágico, sagrado, mítico e até

de adivinhação (Jogo de Búzios) do ser humano, como uma subordinação e aceitação

perante o desconhecido, sendo o objeto dado encontrado na América, no Oriente médio

(jogo de Al´ Zahar, em que derivou a expressão “jogo de azar”), África, Ásia e Europa,

constituído de matérias, como ossos, barro, pedra, madeira e metal.

Também ao jogar ocorrem situações de choques, frustrações e descontentamentos,

sendo a fantasia mediadora dessas sensações, ao qual reagem de forma comparativa a

uma válvula de escape de um automóvel, em diversas formas de acordo com o indivíduo,

como por exemplo, pintura, desenho, escultura, escrita, sonhos e jogos. Freud (1909, p.

54) esclarece em sua obra Cinco Lições de Psicanálise “[...] o homem enérgico e bem-

sucedido é aquele que consegue transmutar as fantasias do desejo em realidades” (FREUD,

1909, p. 25).

37

Logo, a maturidade e a saúde mental de um indivíduo ficam intimamente

relacionadas com a administração da fantasia, organizando meios para expressar seus

desejos. Ou seja, jogar faz bem a saúde.

O jogo cria uma ponte de ligação entre o real e o imaginário, desenvolve habilidades

cognitivas e sociais, e trabalha como ferramenta facilitadora no processo de ensino-

aprendizagem. Neste contexto, permite uma reinterpretação das experiências vivenciadas:

As fantasias como os sonhos, também são realizações de desejos, também se

beneficiam de certo relaxamento da censura. Se examinarmos sua estrutura,

perceberemos a forma pela qual a finalidade impregnada de desejo, que atua em

sua produção, misturou o material do qual foram construídas; reformulou-o e o

constituiu num novo todo. (FREUD, 1976, p. 526).

A fantasia apresenta uma conexão com a presença do mito no cotidiano do

individuo, em que determinado saber toma molde de personagens fictícios com fins

pedagógicos. Desta forma, a formação do mito estabelece parâmetros sobre o olhar para o

mundo onde se torna fundamental abordar o trabalho de Campbell (1990) que ordena os

fundamentos da mitologia para a formação humana ao se referir a narrativa dos mitos.

Campbell (1990), cita que diante de diversas comparações entre mitos primitivos e

intercontinentais, foi possível observar um padrão entre eles, mostrando que todos os

mitos são um mesmo mito como um contínuo desejo do sujeito em se realizar, expressar-

se para descobrir quem é internalizado em seu mundo, dando sentido ao externo. Este

mito constitui-se como processo de aprendizado que possui símbolos contextualizados que

influenciam seu comportamento e desenvolve a compreensão de variados contextos

humanos.

O autor explica que o mito ajuda a colocar a mente do indivíduo em contato com

essa experiência de estar vivo, situando-o em seu contexto sócio-histórico. Os mitos

situam o indivíduo no mundo como uma bússola existencial. Acredito, de acordo com o

pensamento de Campbell (1990), que cada sujeito necessita de seu próprio mito ou sua

própria interpretação interpretação sobre o mito, durante a sua trajetória de vida, como

base mental e orientação moral ou conduta, concedendo identidade ao sujeito.

Segundo ele, o indivíduo encontra uma relação do mito com sua vida. O mito, em

sua complexidade é constituído de quatro funções distintas:

38

- Função mística ou sagrada: concede o aspecto misterioso do que existe além da

compreensão humana, o que transcende a consciência atual, deixando a mente aberta ao

novo;

- Função cosmológica ou científica: abre a compreensão de como a origem do

mundo e o funcionamento de seus fenômenos funciona, o princípio singular da lógica e

dedução;

- Função sociológica: organiza e determina o direcionamento de uma sociedade,

define certo e errado, e promove as noções sobre valores morais, direitos e deveres;

- Função pedagógica: educa sobre como o ser humano, independente das

interferências do ambiente externo e de qualquer circunstância, dispõe o modelo do vir a

ser homem e mulher durante todo o processo da vida com dignidade e respeito.

Um grande exemplo destas funções é esclarecido no depoimento histórico do nativo

norte americano, chefe Seattle, sobre a aquisição de regiões tribais para os imigrantes em

1952, cita:

O Presidente, em Washington, informa que deseja comprar nossa terra. Mas como

é possível comprar ou vender o céu, ou a terra? A ideia nos é estranha. Se não

possuímos o frescor do ar e a vivacidade da água, como vocês poderão comprá-

los? Cada parte desta terra é sagrada para meu povo. Cada arbusto brilhante do

pinheiro, cada porção de praia, cada bruma na floresta escura, cada campina, cada

inseto que zune. Todos são sagrados na memória e na experiência do meu povo

(CAMPBELL, 1990, p. 32).

Segue também que:

Conhecemos a seiva que circula nas árvores, como conhecemos o sangue que circula em nossas veias. Somos parte da terra, e ela é parte de nós. [...] Cada reflexo espectral nas claras águas dos lagos fala de eventos e memórias na vida do meu povo. O murmúrio da água é a voz do pai do meu pai. [...] O que sabemos é isto: a terra não pertence ao homem, o homem pertence à terra. Todas as coisas estão ligadas, assim como o sangue nos une a todos. O homem não teceu a rede da vida, é apenas um dos fios dela. O que quer que ele faça à rede, fará a si mesmo (CAMPBELL, 1990, p. 32).

Este pensamento promove a ideia de conscientização sobre a importância das

conexões entre os sujeitos a interpretação do meio. Retornando a falar sobre o ambiente

escolar, recordo que ao contemplar uma formação diferenciada do molde disposto pelas

instituições de ensino nos últimos séculos, com informações previamente determinadas,

39

observei agravantes singularidades, em uma estrutura de relações regida por ações

agravantes de vigiar e punir (TRAGTENBERG, 1985).

Tragtenberg questiona a ação de "conhecer como essas relações se processam e

qual o pano de fundo de ideias e conceitos que permitem que elas se realizem de fato".

Notei, neste caso, um processo que aproxima as relações, junto a necessidade e

propriedades do mito, com os aspectos funcionais da narrativa na articulação destas

relações.

Com essas funções, vejo que o mito tem como fundamento o amadurecimento

humano, assim como os antigos ritos, ele integra e interliga as pessoas, propiciando a

socialização. Os mitos primitivos, de acordo com Campbell (1990), auxiliam a mente a

chegar nesta comunhão.

Em outra obra do autor, O Herói de Mil Faces (1988), a ação das histórias geram

modelos que acompanham o desenvolvimento do jovem até a vida adulta de forma

interativa com a sociedade. Tal pensamento é expresso pela citação abaixo:

Além disso, não precisamos correr sozinhos o risco da aventura, pois os heróis de

todos os tempos a enfrentaram antes de nós. O labirinto é conhecido em toda a sua

extensão. Temos apenas de seguir a trilha do herói, e lá, onde temíamos encontrar

algo abominável, encontraremos um deus. E lá, onde esperávamos matar alguém,

mataremos a nós mesmos. Onde imaginávamos viajar para longe, iremos ter ao

centro da nossa própria existência. E lá, onde pensávamos estar sós, estaremos na

companhia do mundo todo (CAMPBELL, 1988, p. 34).

O modelo citado aplica-se ao RPG e sua formatação narrativa, pois cada história,

cada mito, tem um ou mais heróis e esses tem que seguir sua jornada, um caminho que é

descrito por Campbell (1988) em 12 estágios, todavia pode ser sintetizado em três grandes

atos.

Um modelo escolhido para análise apresenta-se na obra “Star Wars” (Guerra nas

estrelas), cujo autor George Lucas se inspirou nas teorias de Campbell.

1. Apresentação - Uma pessoa normal em um mundo comum até a chegada de um

acontecimento inusitado que conturba essa realidade pacata. Campbell (1988)

denomina este acontecimento de “o chamado para a aventura” e o indivíduo sente

se tentado a sair de seu cotidiano monótono. Assim, rompe fronteiras de sua

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realidade atual até um ponto sem retorno, iniciando uma jornada em busca de um

objetivo maior. Ex.: Luke Skywalker era fazendeiro junto com seus tios, quando

comprou um robô doméstico em que veio com holograma escondido da princesa

Léia pedindo ajuda, conhece Ben Kenobi, seu mentor sobrevivente da ordem Jedi.

Durante essa descoberta, seus tios são mortos e a fazenda destruída pelo Império,

perdendo sua ligação com seu mundo comum. Sem ter mais motivos para continuar

em Tatooine, seu planeta natal, ele inicia sua jornada.

2. O conflito - O indivíduo agora definido por Campbell como herói, encontra uma rica

diversidade de aliados, inimigos, mentores, testes, provações, desafios e adquire

saberes importantes para seu desenvolvimento pessoal. Exemplo: ao seguir sua

jornada, Luke Skywalker encontra o piloto Han Solo (aliado), Darth Vader (Inimigo) e

Mestre Yoda (mentor), passando por diversos desafios. Desta forma, aprende mais

sobre si mesmo, tornando-se um cavaleiro Jedi.

3. A resolução - O herói vence a suprema provação, soluciona a fonte do desequilíbrio

e retorna para seu mundo. Exemplo: Luke Skywalker encontra o grande antagonista

Darth Vader e durante uma difícil batalha, aprendizagem descobre que o vilão, na

verdade, é seu pai Anakin Skywalker que ele pensava estar morto. Mediante muito

esforço consegue trazer seu pai à lucidez e em seguida, derrota o traiçoeiro Darth

Sidious, vilão que levou seu pai a seguir pelo lado sombrio da força e destruir a

ordem Jedi, trazendo novamente o equilíbrio, a força.

É notório que o herói do início difere-se no fim. Ele agregou muitos conhecimentos,

vivenciou novas experiências, amadureceu conceitos para se tornar o grande campeão,

que segundo Campbell (1990, p. 86), "não haveria proeza heróica se não houvesse um ato

supremo de realização”.

Nesta articulação, a consciência do sujeito se transforma e amadurece devido a

provocações, desafios e revelações que por meio de experiências colocam a inteligência á

prova.

Esta será a jornada do educando com as vivências lúdicas. Toda essa bagagem

teórica me fez notar elementos que formam o jogo de RPG afetando aspectos de

sensibilidade (DINELLO, 2007) e sociabilidade (VYGOTSKY, 1998) de forma divertida, a

fim de auxiliar na construção de conhecimentos, relações sociais, gerar aprendizado com

41

liberdade, ressaltar características comportamentais como moralidade, liderança,

perseverança e cooperação, e contribuir para a qualidade de vida do educando.

O RPG original contém padrões de comportamento formatados como arquétipos

conceituais, abertos a interpretação de acordo com a percepção de cada participante,

porém sem falas pré-determinadas como ocorre no teatro convencional, assim, torna-se

bem similar com a técnica das artes cênicas, chamada teatro de improviso, todavia existe

uma ficha e regras que norteiam o jogador.

Esclareço que em um diálogo entre a história contada e os contadores, buscando

um equilíbrio conceitual é importante saber diferenciar a contação de história tradicional

utilizada em escolas para fins pedagógicos, da narrativa originada no RPG.

Segundo Chaves (1963) apresenta a seguinte definição:

A história é baseada em atos que têm seu fim imediato – sua ênfase é posta na

conduta dos personagens, e apela, especialmente, para imaginação e para o

sentimento [...]. O que caracteriza uma história é o fato de encerrar ela em uma

série de eventos que levam a um fim imediato, eventos que se completam, e que

fazem da história uma experiência que começou, se desenvolveu, chegou ao auge

e terminou (CHAVES, 1963, p.18).

A autora citada aponta funções e características salutares sobre a ação educativa

da contação de histórias:

- Física: Relaxamento e repouso após atividades exaustivas;

- Moral: Estimula sentimentos por meio de modelos de conduta e dá parâmetros de

discernimento entre o correto e incorreto;

- Intelectual: Melhoria e enriquecimento do glossário pessoal, expressão, linguagem,

simplificação de conceitos. “A média da intelectualidade humana não entende discursos

nem argumentações, porém compreende perfeitamente uma história.” (CHAVES, 1963, p.

22);

- Social: Expor as normas de convivência social, trato e relação;

- Religioso: Doutrinas como Cristianismo, Judaísmo, Islamismo, Hinduísmo, entre

outras, tem seus ensinamentos transmitidos por contação de histórias.

Há uma meticulosa sequência de passos para sua execução:

42

- Introdução: A apresentação dos fatos, em que ocorre a história e descrição de

personagens. “Há muitos anos, viveu, na Inglaterra, um rapaz chamado Robinson Crusoé

[...]” (CHAVES, 1963, p. 38);

- Enredo: Sucessão de eventos e desenrolar dos fatos;

- Clímax: Ponto chave que determina o objetivo maior da história, no qual converge

o enredo;

- Conclusão: Resultado final após o clímax com o intuito de satisfazer aos ouvintes.

Neste contexto a autora expõe a valorização da contação de histórias para o

desenvolvimento do sujeito:

Finos ornamentos, joias e ouro o príncipe receberá por profusão, portanto, de mim, ele receberá algo mais precioso que tudo isso. Cada dia de sua vida, desde o dia que tiver idade de entender até que entre na posse da sua maioridade, eu lhe contarei histórias que o farão sábio e justo. E, quando teus dias se findarem em Bagdad, ó Califa, e ele se assentar no trono para reger o seu povo, ele será justo e misericordioso, será rei de quem toda a Arábia se orgulhará (CHAVES, 1963, p. 26).

No RPG todas as atribuições dos participantes são valorizadas de forma que, ao

recorrer à dissertação de mestrado de Andréa Pavão (1999), concluo que a maioria das

ações na prática do jogo (sendo o jogo ou a prática educativa) é fruto de conhecimentos

anteriores, experiências trazidas pelo professor e os outros integrantes de livros, filmes,

vivências e toda a absorção da movimentação social latente em sua realidade:

Haveria uma proximidade entre o contador de historias, o narrador e o mestre de

RPG, pelo papel que assumem ao conduzir uma leitura, seja ela de um livro, de um

caso ou de uma aventura fantástica, para um ou mais ouvintes, que não mantém

uma postura passiva. À medida que o ouvinte interrompe, pergunta, crítica,

reconduz a narrativa em outra direção, o mestre vale-se de seu atributo „repentista‟,

como também de sua „bagagem pessoal‟, do repertorio acumulado pela vida

(PAVÃO, 1999, p. 34).

A autora ressalta figuras históricas que influenciaram a humanidade como Confúcio,

Sócrates, Platão, Jesus, entre outros, como contadores de histórias para que a população

comum compreendesse conceitos complexos e diferenciados. Devido a isso, Chaves

43

(1963) cita Platão quando afirma que para ensinar a verdade para uma criança é

necessário ensinar-lhe a ficção.

Estas características são básicas na contação de história tradicional, em um

processo em que um fala e muitos escutam, todavia quando ocorre um questionamento

entre esses sujeitos, a autora conflita-se:

Outra cousa que, às vezes redunda em fracasso é tentar conquistar a atenção,

fazendo perguntas às crianças, no meio da história. Começar a descrever certo

ambiente e perguntar: Qual de vocês gostaria de ser como aquele menino? [...] Em

geral leva os ouvintes a lançar ao da imaginação e as repostas mais

descontroladas podem surgir, impossibilitando o narrador de continuar a história

(CHAVES, 1963, p. 58).

Pelos elementos citados, noto que há diferenças marcantes entre o RPG da

contação de histórias convencional, já que no jogo ocorre ato de ouvir o outro e o que este

pode adicionar na história que também é dele. Promove-se uma multiplicidade de olhares e

percepções diante da mesma história que deixa de ser estático e pertencente somente ao

orador e passa a ser de um grupo, ao qual se identifica na relação entre as expressões.

Ressalto que com essas características dentro do campo educacional ainda não se

apresenta uma noção clara que diferencie o jogo do método educativo, visto que ele não

foi devidamente articulado como metodologia, portanto, neste trabalho será apresentado a

atuação do elemento narrativo presente no RPG, na escola, descrito como metodologia

role playing.

Uma metodologia pode ter compreendida como uma técnica com passos delimitados e

sequênciais para chegar a um determinado objetivo. Um bom exemplo disso seria o de

uma fábrica de chocolate, uma matéria prima entra (informação) esta é processada e

torna-se o produto final (exposição da informação). Mas quando o cliente compra e

“experimenta” o chocolate se pode dizer se este é bom ou não (Aprendizagem), se vai

compra-lo de novo ou não. Podemos chamar a aprendizagem de experiência prazerosa do

aluno. Mas retomando, veja que uma metodologia é um processamento de informações

que podem produzir vários efeitos devido as percepções das experiências individuais ou

seja, não é um sistema fechado. Quando falamos de atividades, dinâmicas, recursos ou

jogos didáticos, estamos determinando sistemas fechados, igualmente estes podem

permitir experiências mas em um campo restritivo, não existe como parar o jogo para

44

chamar atenção para algo que naquele momento foi interessante, estas ferramentas são

criadas para um fim especifico (como uma chave de fenda), enquanto a número de

pessoas, tempo, espaço, condições. Peguemos por exemplo o RPG, ele não encara uma

estrutura de 50 pessoas, pois se enquadra como um sistema fechado, caso tente vai

quebrar a ferramenta, ou se for utilizado deve ocorrer uma divisão em micro grupos, no

qual o professor teria dificuldade de auxilia-los sozinho.

Neste desfecho, separamos o que é jogo e o que é metodologia. Visto que o jogo

tem um fim nele mesmo, enquanto a metodologia é a estruturação de um caminho a ser

percorrido e transposto, agindo como recurso educacional ao docente, uma ferramenta de

trabalho, tão necessário quanto um estetoscópio para um médico. Sabe aqueles

professores que só falam, mas não “sabem ensinar” é porque lhes faltam ferramentas.

Não se classificando como um jogo didático, o qual infiltra o conteúdo programático

por meio de uma atividade lúdica pré montada, que segundo o professor Dinello “é uma

forma de enganar o aluno” prometendo um jogo que deveria ser divertido, mas acaba

sendo condicionado ao currículo, de forma a criar um caminho pré definido.

Assim reforço.

A metodologia role playing é destinada para pessoas que

buscam trabalhar seriamente, sinceramente e

apaixonadamente com educação, se identificando como

educadore(a)s.

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Multipliquei-me, para me sentir,

Para me sentir, precisei sentir tudo,

Transbordei, não fiz senão extravasar-me,

Despi-me, entreguei-me,

E há em cada canto da minha alma um altar

a um deus

diferente.

Fernando Pessoa

46

DUALIDADE

CONVERGENTE

Na minha busca para compreender o RPG na sala de aula, consegui encontrar

profissionais no município de Uberlândia que trabalhavam com RPG na educação, poderia

ter encontrado dezenas, mas estes no caso mostraram ser extremos opostos, fato que

instigou minha curiosidade.

Um jogador de RPG que se tornou professor e começou a adaptar o jogo como

atividade em sala de aula; e uma professora, que ao ter contato com alunos que jogavam,

fez uma breve pesquisa chegando à produção de um artigo na revista História e

Perspectiva (2003), nomeado de “O Jogo de RPG e o ensino de História: Criação de um

RPG sobre a revolução inglesa”.

Um dos entrevistados: Bacharel em Direito e História, professor há 15 anos e

jogador de RPG há 19 anos, descreve que suas experiências em relação ao RPG sempre

foram positivas. Este será descrito no texto como JOGADOR-PROFESSOR.

Outro indivíduo, também Bacharel em Direito, História e doutor em História, docente

há 20 anos, que nunca jogou RPG, será descrita como PROFESSORA-JOGADORA.

Professora-Jogadora

Em 2001, PROFESSORA-JOGADORA, observou que um de seus alunos que

apresentava distanciamento em aula, lia um determinado livro. Entretanto, o estudante

tinha um conhecimento avançado sobre o período da Idade Média, e quando questionado

disse ter aprendido tudo com um livro de RPG.

47

Este fato chamou a atenção da PROFESSORA-JOGADORA para conhecer sobre a

estrutura e conteúdo deste material. Ela descreveu sua experiência como docente da 8°

série de um colégio particular, onde encontrou este aluno.

Segundo a educadora o aluno “estava sempre lendo um livro grande, colorido, então

eu perguntei sobre o livro e ele respondeu que era um livro de RPG”.

Este educando surpreendeu a PROFESSORA-JOGADORA ao contextualizar todo

conteúdo da Idade Média, citando que aprendeu por meio do jogo. Neste contato a

PROFESSORA-JOGADORA, começou a explorar as possibilidades pedagógicas do jogo:

A partir disto eu marquei com ele para ensinar a mim e a alguns colegas a jogar. Eu sugeri a ele que fizesse sobre Revolução Inglesa e ele topou, achou que ia ser bacana, nos fizemos a ficha e montamos o jogo para poder aplicar em sala de aula....eu não trabalho com isso especificadamente, “o RPG” foi uma experiência que veio dos alunos até mim, e eu achei que era legal, achei isso interessante para o professor, ver o que a moçada esta fazendo, para vermos a importância disso e como se reflete na educação (PROFESSORA-JOGADORA).

O RPG foi utilizado como jogo-didático, sendo mais uma atividade lúdica

complementar que gerou exclusão do resto da sala, já que o jogo estava projetado para

poucos integrantes. A PROFESSORA-JOGADORA e a grande maioria dos alunos não se

envolveram diretamente com a atividade, responsabilizando um pequeno grupo de sete

alunos que realmente jogaram, e expuseram as experiências do jogo para uma sala de

trinta e três alunos, como segue a citação abaixo:

E ai foi que nos encontramos para fazer o joguinho do RPG, eu trabalhei com 7

alunos, com um grupo não com toda sala, depois foi apresentado para toda a sala.Na

época foram dois horários, fizemos o jogo e os meninos foram acompanhando, não

foi ruim não, teve alunos que participaram, foram acompanhando os personagens, na

época dividi a sala, peguei a turma e dividi em cada componente do grupo para

acompanhar o jogo. (PROFESSORA-JOGADORA, 2011).

Destaca-se um processo de aprendizagem restrita para os poucos educandos que

jogaram, o que não aplica ao resto da sala, restritos a observação. Acredito desta forma,

que o RPG no estado de jogo, não se apresenta como uma metodologia, mas um jogo

didático usado apenas em pequenos grupos.

Retomando a visão da entrevistada, é possível destacar uma frase interessante para

ser questionada:

[...] Eu tive adolescência nos anos 80, que vi muita televisão, pulei corda, andei de

patins de bicicleta, o videogame era aquele inicial, aquele bem simples, o Atari, bola

queimada, enfim, foi uma geração do computador, quando fui ter um computador já

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estava em faculdade, agora todos os meninos nascem com computador, com

Playstation e um monte de coisas e recursos lúdicos, que foi uma coisa que minha

geração não pegou, foi porque não era uma coisa que estava ali, naquele momento

na década de oitenta (PROFESSORA-JOGADORA, 2011).

A PROFESSORA-JOGADORA, sem contato prévio com RPG, durante a atividade

apenas observou e conversou com os alunos, mas não jogou, assim, não se inseriu no

contexto do aluno.

A educadora acreditou realmente que o aluno vivia em uma dimensão sócio-

histórica diferenciada, às quais não se encontravam com a realidade em que ela

vivenciava mesmo o jogo estando presente no Brasil na década de 80.

Durante a experiência da educadora, foi citado na escola o “caso Ouro Preto” que

conflitou com os diálogos entre ela e os alunos, descrevendo uma divergência com as

informações da mídia. Cita que “[...] enquanto eu estava com os garotos isso foi uma

experiência boa para mim como docente e para eles. E eu e o aluno conversamos sobre

isso na época ele disse: „não professora o jogo não é ruim que nem as pessoas falam‟ e

era algo que não podia ser ruim porque ele sabia tanto, aprenderam tanto.”

Para acentuar e costurar esta experiência da PROFESSORA-JOGADORA se faz

um recorte em sua fala, que sintetiza a importância da ludicidade e narrativa na sala de

aula, nesta caso, o uso do RPG:

[...] ele se sentiu o máximo porque estava ensinando a professora, e realmente ele estava fazendo isso, porque disse: -oh, você que vai conduzir o trabalho aqui pra gente. E ai eu senti que ele teve uma maior participação na minha aula, eu lembro que a relação foi melhor, que ele deu um salto qualitativo. O que me chamou atenção para o jogo, além do relacionamento com a turma, que claro melhora, aqueles sete aluninhos, além deles me ajudarem e melhoramos o relacionamento interpessoal eles também se tornaram lideres da turma, o que me chamou atenção no jogo, é que ao construir personagens ele coloca atributos, é uma coisa que eu vejo muito nesta nova geração como Harry Potter, esses personagens construídos [...] foi um achado, uma surpresa encontrar isso, que eles vivenciam (PROFESSORA-JOGADORA, 2011).

Essa experiência fez a PROFESSORA-JOGADORA se animar e trabalhar com

RPG. Conseqüentemente, a educadora divulgou para demais colegas docentes suas

experiências. Um artigo foi publicado sobre este caso na revista cientifica História &

Perspectiva (2001), e dispôs-se em 2003 a realizar nova atividade como um estágio em

uma escola pública, porém com uma equipe maior de 4 estagiários e cerca de 80 jovens

em uma quadra aberta, onde uma situação diferenciada surgiu:

49

[...] eu me lembrei agora dessa experiência foi frustrante conversei e depois avaliei

com os colegas, e a relação do aluno de escola pública com o docente é diferente,

então professor novato que vem para aplicar algo novo, não existe um vinculo, então

tem uma certa resistência por parte dos alunos (PROFESSORA-JOGADORA, 2011).

Esta fala descreve dois pontos importantes para esse trabalho, primeiro: o vinculo,

qual seu tipo e a qualidade dele; segundo: formar e alimentar esse vínculo. Essas

respostas estão contempladas no decorrer desta pesquisa.

Em seguida, a relação entre essas duas experiências (2001-2003) é importante para

revelar que o jogo de RPG foi desenvolvido para um pequeno número de integrantes não

sendo aplicado em escolas. O jogo aparenta não ser apropriado para uso em uma sala de

aula de quarenta alunos.

A PROFESSORA-JOGADORA inicialmente explicou as regras do jogo, ao invés de

ir direto a ação de jogar, o que gerou dispersão. O RPG como ferramenta pedagógica,

apresenta-se como derivação do jogo tradicional, pautando-se apenas em um caráter de

jogo didático.

O jogo não atendeu a demanda requerida entre o tempo, a quantidade de alunos, o

conteúdo e a atividade lúdica necessária em sala de aula. Contudo, essa experiência

enriqueceu o entrevistado, que descreve:

[...] se você pedir minha análise hoje olhando 10 anos depois, eu acho que foi um dos primeiros momentos que eu como professora, abandonei métodos e técnicas conhecidas e me deixei guiar pelos alunos, e deixei um aluno, um grupo, me mostrar uma técnica que é importante para a geração deles, que é uma coisa que vem de uma grupo mais jovem, que não me pertence, que estava ali aprendendo, fiquei muito insegura [...] eu não sei nada de RPG, o que eu sei foi essa experiência (PROFESSORA-JOGADORA, 2011).

Jogador-Professor

O entrevistado tinha mais experiência sobre o jogo, fazendo aplicações anuais

desde 1999, segundo o conteúdo programático estipulado para o ensino médio, em que

desenvolve uma determinada atividade articulação com vários elementos do RPG. Segue:

Você consegue sempre agregar mais conhecimento, você vai formando uma pluralidade de fontes de informação, porque ao mesmo tempo que você esta vivendo uma aventura, você precisa de conceitos de Física, noções de Biologia, História, das facetas antropológicas, que cada cenário é composto de uma arquitetura que tem um componente humano que enriquece uma cena que é narrada, então RPG me permite o que? Essa diversificação de conhecimentos (JOGADOR-PROFESSOR, 2011).

50

Percebi que o JOGADOR-PROFESSOR está inserido no contexto do jogo, e fala

com propriedade sabendo de suas possibilidades. Sem nenhum estudo científico ou

capacitação sobre a atividade, geram-se dúvidas:

[...] Eu tenho no caso, assim, alguns fascículos antigos de uma tentativa brasileira

que foi o sistema Gurps. O mini-gurps, que usava eventos da história eu tenho eles

ainda mas basicamente eu uso o que, meu conhecimento de RPG a minha

experiência em lidar já, como mestre, como jogador porque há realmente uma

ausência, existe essa lacuna de material didático vinculado ao RPG não houve

desenvolvimento deste material (JOGADOR-PROFESSOR, 2011).

A coleção mini-grups(1999) é formada por quatro exemplares de RPGs didáticos,

bem específicos, criados como um híbrido que inseria conteúdos comuns da grade

curricular aos jogos de RPG tradicionais, atraentes aos professores que buscam trabalhar

com ludicidade.

De tal modo, os jogadores de RPG ao ingressarem no Ensino Superior e na área de

docência, em alguns casos realizam experiências sobre o jogo, relacionam com os

resultados que percebem nele, e em seu processo sócio-cultural. Outras linhas

pedagógicas como a pedagogia espírita de Eurípedes Barsanufo e o sistema educacional

de Paramhansa Yogananda, os quais descrevem que qualquer método, experiência ou

conteúdo, antes de ser ensinado aos educandos deve ser vivenciado pelo docente.

O JOGADOR-PROFESSOR, por ausência de uma capacitação e estudo

direcionado passa por certa dificuldade na transição entre o conteúdo programático e a

estrutura do jogo, todavia, vê como vantajoso esse processo, ao qual notei diferenças

entre sua explanação comum e a vivência do cenário histórico pelos alunos. A perspectiva

(tanto do aluno quanto do professor) muda em relação ao conteúdo. Constata-se pela

citação de determinado conteúdo:

Então se eu estou falando de cruzadas, eu divido por exemplo a turma, uma parte muçulmana peço a eles que façam um background (histórico) do que seriam os muçulmanos, que colham informações sobre a pregação muçulmana, que levante o cotidiano muçulmano e do outro lado eu coloco o que? Uma turma de católicos, eu inicio então depois que eles fazem a coleta de dados, ai primeiro eles tem que fazer um debate, verbal evidentemente, sobre os temas ali abordados que eu vou mapear ao longo da aula sobre a presença de cristo entre eles, do porque a Terra Santa é importante, se ela é santa mesmo ou existe um cunho pecuniário, riqueza, monetário, vamos assim dizer depois eles simulam que seria uma tentativa de tomar uma posição resguardada, eu junto às cadeiras, ai é a parte que a coordenação adora que eu faço a bagunça inteira na sala, como se fosse uma fortificação e aí eles têm que fazer o que? A coisa que eles mais gostam que é a bolinha de papel tentando acertar pontos determinados nas cadeiras que seria parte onde romperia a barreira onde eles poderiam passar na área resguardada. (JOGADOR-PROFESSOR, 2011).

51

Neste ponto o JOGADOR-PROFESSOR, vai além do RPG e começa a utilizar

elementos de live action (ação ao vivo), outro estrutura de jogo que se assemelha ao RPG.

Esses instrumentos começam a ser reinterpretados pelos educandos reforçando o

significado do conteúdo, o que recorda a importante relação sujeito-objeto-sujeitos,

presente na obra de Dinello (2009), em um processo de transformação do ambiente.

Percebe-se a não utilização de toda a profundidade exposta pela Pedagogia da Expressão.

Seguindo os parâmetros definidos pelo JOGADOR-PROFESSOR, descreve-se:

[...] Então tem isso eu coloco uma galera defendendo as cadeiras, eles não podem atirar bolinha um no outro, somente nas cadeiras, então fica uma turma defendendo as cadeiras e uma turma atacando as cadeiras. Isso mostra o que? Que na guerra hoje, o conhecimento já determina uma posição resguardada, ela necessita de muito menos pessoas do que em relação a tropa atacante, se você pegar dados estatísticos hoje do exercito americano, que ataca com 20 soldados de ataque para 1 de defesa, o Brasil hoje tem uma estimativa de crescer para chegar há 7 para 1, então isso não justifica por exemplo, o efetivo militar norte americano extremamente elevado, o custo bélico dos Estados Unidos, porque menor que seja o inimigo os Estados Unidos tem essa consciência de ataque, por exemplo pego uma idéia do período medieval e consigo dar para o aluno uma noção , por exemplo a retirada do Iraque, então eu consigo trabalhar neste sentido, eu transito entre o espaço e o tempo com o RPG, entre um conhecimento e outro (JOGADOR-PROFESSOR, 2011).

Neste aspecto o JOGADOR-PROFESSOR faz um arranjo multidisciplinar que foge

ao currículo base, e atribui ao educando um pensamento crítico diferenciado. Observei que

ao sair deste padrão, professor e aluno jogam o mesmo jogo, do mesmo lado, e com isso

aproximam-se pelo vínculo da ludicidade.

Nestas experiências não ocorre a participação de 100% da sala, então, o modo de

cada aluno participar da atividade fortalece alguns vínculos enquanto enfraquece outros,

como observei na citação abaixo:

[...] A unanimidade de participação você não consegue quase em nada, mas assim

eu vejo principalmente por parte dos meninos mais ação enquanto das meninas eu

percebo mais questionamento, o aluno, o menino quer ir direto para execução

enquanto a menina, a garota, ela já questiona mais o contexto, o cenário, mas isso é

típico da própria questão biológica, a mulher é muito mais detalhista que o homem,

historicamente a mulher é mais detalhista que o homem, o pessoal costuma brincar

que o homem ia caçar e a mulher ficava na caverna, então ela tinha que reparar nas

coisas, o homem tinha que ir até as coisas. Então eu vejo muito isso, mas há uma

participação sim, em torno de 80%, uma participação efetiva (JOGADOR-

PROFESSOR, 2011).

52

É interessante perceber que neste tipo de atividade, é mais comum a participação

que a apatia, embora, o diálogo do professor se torne mais intenso e transformador, visto

que não fala apenas o conteúdo, mas também “para as percepções do aluno com o

conteúdo”. Desta forma ocorre um diálogo mais tênue entre os sujeitos, permitindo

compreender a visão de cada um diante da atividade:

[...] eu vou aplicar aquele exercício, eu tenho que respeitar evidentemente a

individualidade daquele aluno em não querer participar, lógico que eu o questiono

porque, se é uma questão religiosa, se é uma questão de falta de interesse, se é uma

dificuldade de interpretar o exercício. E com isso eu crio esse canal de conversação

também, que aí você aprende um pouco daquela pessoa, do aluno, você para de vê-

lo como um número de chamada e passa a ver como pessoa, você vai entender as

razões com aquilo que ele esteja travado, muitas vezes se é uma pessoa muito

tímida, né, introspectiva, tem a chance durante o jogo de se soltar, houve casos disso

acontecendo (JOGADOR-PROFESSOR, 2011).

Neste processo de aproximação com o aluno, indiretamente também ocorre a

aproximação com a sociedade e família, e por isso é interessante apresentar um caso em

que este JOGADOR-PROFESSOR, utilizando desta atividade diferenciada, teve um breve

conflito por preconceito, conforme comentado anteriormente pelo abalo que a sociedade

brasileira sofreu no caso Ouro Preto:

[...] Sim, teve aluno por exemplo, há meu pai ele é pastor e ele fala que RPG é do

capeta e que esse negócio mata as pessoas e não sei o que, relatando o caso Ouro

Preto, né! Daquele acidente, falei, primeiro eu tenho todo o processo deste caso, que

mostra que é uma questão de trafico de drogas e que não tem anda haver com o

RPG, a mídia noticiou o RPG, mas não noticiou a sentença, que mostrava que não

tinha coligação nenhuma com atos diabólicos nem nada. Então eu fui conversando

isso com ela, inclusive o pai dela veio pra conversar comigo, a gente trocou muita

idéia, mostrei até algumas linhas do RPG relacionados á espiritualidade, como anjos,

que é uma linha que se tem. Não houve problema, a menina participou da atividade,

não forcei ela, falei que só queria explicar e se o pai quiser falar comigo estava a

disposição, e isso foi até legal porque foi possível romper uma barreira dentro de sala

de aula e na sociedade, explicar para o pai que é um referencial na sociedade, um

formador de opinião, uma vez que ele é pastor (JOGADOR-PROFESSOR, 2011).

Na aula expositiva, o aluno questiona a utilização prática dos conhecimentos

apresentados em sala, enquanto como JOGADOR-PROFESSOR, a questão é respondida

53

diante de apresentação de situações-problema contextualizadas aos quais se relacione

com o conteúdo programático e a pesquisa feita pelo aluno.

Discutem-se alguns pontos do uso desta ferramenta RPG sem uma pesquisa

elaborada ou capacitação, em que ministrantes com hábitos de jogo, possam repeti-los em

sala de aula, sobressaindo do contexto original. Que destaco no trecho abaixo:

[...] então neste ponto se vê uma funcionalidade da teoria, muitas vezes eu vou em

uma teoria e ele (aluno) fala: vou usar isso para que? Eles simplesmente ignoram,

mesmo que eu use para o jogo, eu forcei ele a ter que trabalhar aquele conteúdo, e

eu tenho certeza que a partir do elemento lúdico ele vai guardar alguma informação e

isso é comprovado (JOGADOR-PROFESSOR, 2011).

Por mais divertido que a atividade seja, identifiquei nesta parte da entrevista, que

ainda se utiliza o RPG como jogo didático que conduz o aluno, consentindo a este, uma

expressão delimitada.

Notei uma flexibilidade apesar de haver a necessidade de mudanças (devido às

adaptações, como foi exposto anteriormente no uso das cadeiras), já que o jogo não se

aplica de forma homogênea para sala de aula.

O jogo, como ferramenta pedagógica, permitiu a ação do impulso lúdico em que os

alunos saiam de seu mundo comum de estudantes padronizados para brincar com o

conteúdo, sendo o professor um regente, mediador, e propiciador de um contato mais

salutar entre os envolvidos.

Percepções entre as entrevistas

Observando esses dois contextos que envolvem RPG na sala de aula, notei que o

JOGADOR-PROFESSOR parte da experiência do jogo para trabalhar o conteúdo por meio

de pesquisa com aplicação de situações problema.

A atividade então, se torna flexível e busca abarcar toda a sala, e por conseqüência

afeta a comunidade e utiliza como elementos o debate relacionado com a pesquisa. Para

elucidar as regras do “jogo” durante o processo, emprega objetos (cadeiras, bolinhas de

papel, etc) que envolvem atividades psicomotoras.

54

Nesta categoria, o JOGADOR-PROFESSOR, experiente em RPG e habituado a

articular múltiplos conteúdos e situações complexas durante o jogo, tem maior facilidade

com a narrativa. Contudo, muitas vezes se pode retornar o campo do jogo didático, quando

ocorre o ato de “forçar o aluno a trabalhar o conteúdo”, nas palavras do entrevistado:

[...] basicamente eu uso o que, meu conhecimento de RPG a minha experiência em

lidar já, como mestre, como jogador porque há realmente uma ausência, existe essa

lacuna de material didático vinculado ao RPG não houve desenvolvimento deste

material (JOGADOR-PROFESSOR, 2011).

O entrevistado engana-se, pois existe muitas pesquisas sobre RPG na educação,

todavia são experiências isoladas ou pouco divulgadas, focadas em conteúdos fechados e

pouco trabalhadas como mecanismo funcional ao professor.

Por sua vez, a PROFESSORA-JOGADORA apenas observa, parte do conteúdo

para o jogo, explica regras dele sem ter experiência, não se inclui no processo (utiliza

fichas e os demais elementos do RPG). Assim, a atividade cobre um pequeno grupo de

alunos e trabalha com exposição do que foi aprendido no jogo por este:

[...] E tudo foi muito interessante, eu acho que foi o caminho contrário, normalmente

os professores chegam e propõem para os alunos aceitarem a metodologia, e eu

aqui nesse caso, inverti o papel, os alunos que tinham a metodologia e me

ensinaram a o que eles queriam fazer, com aquele grupo que gostava de jogar

RPG (PROFESSORA-JOGADORA, 2011).

Percebi neste caso, que o docente convencional maravilha-se em primeiro

momento, mas pela ausência de materiais de referência e falta de experiência sobre a

mecânica do jogo, não sabe como agir em sala de aula, e ao permitia tanta liberdade aos

alunos, facilmente retoma a postura antiga a qual está condicionado. Apresenta o

questionamento a despeito da utilização do RPG de acordo com as experiências prévias

dos educadores que o utilizam.

INICIATIVAS DE DESTAQUE SOBRE RPG E EDUCAÇÃO, NO CENÁRIO NACIONAL

A partir deste breve histórico ressalto abaixo três iniciativas de projetos que

merecem destaque pela inovação e postura. Elas alicerçam a proposta tornando o estudo

mais contundente, diante da relação do jogo em processo de inserção na educação com

repercussão no campo acadêmico brasileiro:

55

TNI: Técnicas para Narrativas Interativas

De acordo com Klimick (2007) esta é uma proposta de estímulos para escrita e

leitura nas escolas: a TNI é apresentada como uma técnica que segue os padrões

estabelecidos no Jogo de RPG, sendo aplicada como suporte aos livros utilizados

(produzidos) em sala de aula e em leitura virtual (sites, blogs, fotologs, etc).

O objetivo é fomentar a construção do conhecimento enquanto técnica que é

sustentada por seguimentos pedagógicos (construtivismo/autoria) pela sua flexibilidade em

articular diversos conteúdos por meio de pesquisa, escrita criativa e expressão oral. Em

uma descrição detalhada compreende que:

[...] o método TNI (Técnicas para Narrativas Interativas) para utilização de histórias

interativas para fins didáticos. A trama da narrativa é alterada de acordo com as

ações das personagens, estimulando a criatividade e autonomia dos participantes,

cabendo a um coordenador, chamado de narrador, a interpretação das demais

personagens, a coordenação das ações e os ajustes narrativos (KLIMICK, 2007, p.

5).

Desta forma, permite-se aos participantes impregnar a individualidade de sua

localidade ao manual do jogo narrativo, criando novos agregados a formação da TNI, que

trabalha com publicações de materiais virtuais, junto a utilização de um kit e livros, assim

como, certas oficinas que são fornecidas a grupos de indivíduos, com livros e/ou o kit,

postagem de seu material virtual em blog, envio de links, enviar material para publicação

em um site e receber um DVD com todos os materias em PDF recompilados em nova

edição com seu material incluso. Para atender as necessidades sócio educacionais do

mundo contemporâneo, são utilizadas ferramentas tecnológicas como plataformas virtuais,

as redes sociais, os chats, blogs, fotologs, inúmeros softwares em constante produção,

enlaçada com a postura ativa de pesquisador no desenrolar de narrativas (RPG) que vão

constituindo saberes de maneira colaborativa.

A TNI utiliza as estruturas do RPG para a criação e o desenvolvimento de narrativas

coletivas para fins educacionais com dois propósitos bem definidos: a avaliação de

aprendizado, e a construção de conhecimento; por meio de debates e argumentações em

sala. Este método estrutura-se pelas experiências realizadas e publicação de materiais

(KLIMICK, 2006). A utilização da TNI envolve três fases: pré-sessão; sessão; pós-sessão.

56

> Pré-sessão: É a preparação e seleção conhecimentos (bibliografia utilizada), em

caráter interdisciplinar ou disciplina individual, a serem trabalhados em aula, além de qual

o tipo de TNI: Live-action, RPG “de mesa” e RPG Virtual.

> Sessão: É o ato da narrativa em si, o(s) narrador(es) sendo docentes ou alunos

coordenados por um professor, qualificado em TNI ou experiente de RPG.

> Pós-sessão: Este é o momento de avaliação, com um levantamento das

experiências de cada aluno e professor durante a atividade.

Crítica: As Técnicas para Narrativas Interativas, por mais satisfatórias que tenham

sido a educandos e professores, torna tanto docente, quanto a equipe especializada

dependentes do uso de recursos tecnológicos, o que pode dificultar o acesso em salas de

aula numerosas e de baixa renda. Para devida aplicação, o jogo utiliza vários narradores e

auxiliares (normalmente com experiência em RPG), embora se torne excelente como

atividade mobilizadora em escolas que docentes e coordenadores estejam pré-dispostos a

buscarem recursos da tecnologia atual.

FLER: ferramenta lúdica de ensino por representação

Outra sistematização do RPG para educação é o método FLER criado por

Alessandro Vieira dos Reis, publicado em 2002 (Módulo Básico FLER: Ferramenta Lúdica

de Ensino por Representação), na época, estudante de Psicologia pela Universidade

Federal de Santa Catarina (UFSC) e realizador deste estudo em escolas públicas de baixa

renda de Florianópolis.

O acesso ao módulo básico FLER era realizado por meio de download gratuito em

um site hospedado no portal da UFSC ou via e-mail direto com o autor que, com muita

perspicácia, levanta um ponto chave sobre o jogo de RPG no ambiente escolar.

Um dos grandes erros cometidos nas tentativas de se inserir o RPG na Escola é o usar na escola os sistemas disponíveis no mercado. Essas experiências sem dúvidas estarão fadadas ao fracasso, uma vez que esses sistemas foram feitos para diversão pura e simples, e não para a diversão aliada a educação. Outro erro é tentar jogar sem sistema, apoiar-se no „bom senso‟. Nesse caso o fracasso se dá por motivos diferentes do primeiro: as complexidades do ambiente escolar exigem mais do que um jogo sem sistema pode oferecer. Tendo em vista essas duas questões, e trabalhando com a certeza de que era possível usar o RPG na sala de aula com grande sucesso, após meses de pesquisa em escolas públicas de Florianópolis, foi desenvolvido um sistema de RPG para uso exclusivo em sala de aula (REIS, 2002, p. 7).

57

O autor descreve que a ferramenta estudada não substitui as aulas expositivas,

sendo utilizada como aporte que complementa os métodos já presentes na escola.

Contudo, não é estruturada para ser uma metodologia, pois não prevê a capacitação

docente. O “mestre de RPG”, somente ele, ministra o jogo com a sala, sendo este o único

com formação direcionada.

Ao redor desta estrutura, além dos jogadores e mestre, existem novos papéis: o do

consultor (que conecta o professor com a atividade fazendo-o participar da história), o do

ator (responsável pela dramatização da história) e o do auxiliar (que direciona os alunos

para que um grupo intérprete o mesmo personagem) fazendo com que todos participem

sem a utilização de uma ficha formal conforme ocorre no jogo tradicional.

Para compreender com maior profundidade a estrutura do FLER, recorremos a

SCHMIT, que fez um dos poucos trabalhos registrados sobre o Módulo Básico:

[...] para que todos possam participar da aula-jogo, uma adaptação do RPG de

mesa à sala de aula, os participantes são divididos em três categorias: O mestre

(deve saber jogar RPG e conhecer o conteúdo didático da aula), os jogadores

(estudantes que vão interpretar personagens no jogo), os auxiliares (auxiliam os

jogadores na tomada de decisão e no desenvolvimento da atividade), o consultor (o

professor, que pode interpretar um personagem, um NPC ou fornecer informações

aos jogadores) e o ator (estudantes que assumem NPCs previamente ensaiados e

que ajudam no desenvolvimento da narrativa e podem estar caracterizados).

Ocorrem duas ou mais mesas de jogo ao mesmo tempo na sala de aula (SCHMIT,

2008, p. 124).

Neste ponto torna-se similar a TNI que possui a necessidade de uma equipe para

execução da atividade. É interessante ressaltar que entre os estudos pesquisados de RPG

aplicados à educação, encontram-se em maior número àqueles na área da psicologia

educacional e pouquíssimos surgem de pedagogos.

Este fato pode auxiliar a compreensão já que as técnicas pesquisadas aparentam

ser desarticuladas da docência, em que não consta na bibliografia do Módulo Básico FLER

a utilização de obras vinculadas à educação ou metodologias, exceto em Filosofia,

Psicologia e Sociologia.

Aparentemente, os sistemas de RPG presentes no mercado não são viáveis em

escolas porque são desenvolvidos apenas para entreter, de forma que o FLER articula o

RPG e a educação como questões separadas, que se auxiliam por sinergia, não propondo

uma formação docente. Todavia, o professor possui assistência de a gentes externos, em

58

que o educador não é suficiente para realizar sua função. Com o reforço do pensamento

de Schmit (2008) podemos compreender que:

[...] o FLER foi o primeiro “material pedagógico” baseado em RPG que tive contato. O autor declara no texto que o FLER é resultado de meses de pesquisa, mas não apresenta os resultados desta pesquisa e também não foi encontrado nenhum artigo sobre esta. É um dos primeiros materiais a falar de maneira explicita como aplicar o RPG de mesa em sala de aula, e pode ter influenciado algumas intervenções em escolas. É um texto bem simples e curto, mas apresenta erros de digitação e diagramação. Não é um texto para educadores, mas para mestres de RPG que queiram levar o RPG para a sala de aula. Neste caso o professor é um coadjuvante caso ele próprio não seja um mestre de RPG (SCHMIT, 2008, p. 125).

Crítica: Esta proposta não se mostra uma metodologia acessível ao professor, é

antes, um meio para aplicação do “RPG de mesa” na sala de aula, nas palavras do autor

da FLER “Este livro é dedicado e feito para os Mestres de Role playing Game que desejam

explorar seu potencial pedagógico” (p. 5). Trabalhos atuais sobre a Ferramenta Lúdica de

Ensino Representação não foram encontrados, nem a disposição acessível de seu único

material.

Sistema Simples: sistema inicial para mestres-professores lecionarem através de

uma estratégia motivadora.

O SIMPLES é um sistema simplificado de RPG, criado em 2004, pelo professor

Marcos Tanaka Riyis, Licenciado em Educação física e graduado em Engenharia

Ambiental pela UNESP (Universidade Estadual de São Paulo) Sorocaba, foi desenvolvido

para professores que tem interesse em trabalhar com esse tipo de atividade como

estratégia motivadora de ensino para facilitar o trabalho do educador sendo apropriado

para a construção coletiva de saberes.

Segundo a descrição de regras, Riyis (2004, p. 22), denominou como “Manual para

o uso do RPG na educação” onde expõe os seguintes passos:

a) O professor prepara o cenário, a aventura e os personagens (o professor pode, ao

invés de preparar ele mesmo os personagens, deixar os alunos fazerem isso, o que

já é uma atividade muito interessante, de enorme potencial pedagógico);

b) O professor distribui os personagens entre os alunos, seja um para cada aluno, seja

agrupando-os, ou ainda designando as tarefas para cada membro do grupo.

59

Aconselhamos o professor a designar os grupos, pelo menos no início, para que o

processo-ensino aprendizagem ocorra da melhor maneira;

c) O professor explica o andamento e as regras do jogo para os alunos;

d) O professor, “vestindo a roupa” de Mestre do Jogo, introduz, então, os alunos ao

mundo preparado por ele, chamando-os a participar da história e mais ainda, a

conta-lá em conjunto;

e) Durante a aventura, o professor introduz elementos do conteúdo que pretende

desenvolver, mas na forma de situação-problema inserida no contexto da história-

jogo;

f) O desfecho da aventura é feito de modo a por um gosto de “quero mais”, ao mesmo

tempo em que permite ao professor utilizar os conceitos desenvolvidos em uma

situação de aprendizagem;

O professor Riyis (2004) descreve que a melhor solução é “treinar” alguns alunos,

que preferencialmente já tenha experiência com o jogo de RPG, para que sejam

narradores assistentes, sendo micro-narradores para pequenos grupos até seis

participantes enquanto o professor ficaria como coordenador da atividade. Desta forma, a

sala é composta de pequenos núcleos de jogo, e com o tempo o professor varia os

assistentes permitindo que todos tenham a experiência de ser aluno narrador, fato este

que faz o participante estudar muito o conteúdo do jogo.

Em entrevista com o criador do SIMPLES, professor Riyis (2011), foi questionado

motivo pelo qual o SIMPLES foi criado, o autor define de forma objetiva que surgiu como

uma oportunidade de contribuir com os professores que precisavam de uma metodologia

diferente, com ênfase no caráter cooperativo proposto pelo RPG com visão de Pedagogia

libertadora e transformação crítico-social.

Crítica: Acredito, segundo as percepções deste pesquisador sobre o SIMPLES no

decorrer deste trabalho, que este sistema e proposta possivelmente tenham sido o que

mais se aproximou de uma metodologia, ainda que o objetivo explicitado inicialmente seja

outro. O autor define o método como um sistema de RPG simplificado, único com a

intenção de promover transformações na educação junto a formação docente, permitindo

trabalhar com grandes grupos sem muitos recursos e com flexibilidade. Ou seja, em

60

nenhum momentos Riyis faz uma estrutura metodológica, mas sim uma instrumentalização

sobre o RPG. Porém o mesmo abre portas, descrevendo que (RIYIS, 2004, p. 83), “esse

livro não esgota o assunto, apenas pretende jogar uma luz sobre o tema que parece

obscuro e extremamente difícil para a maioria dos professores”.

Percepções entre as propostas

Em uma breve comparação entre estas três propostas, pude compreender que o TNI

e o FLER, tem a necessidade de estruturas pré-estabelecidas com o emprego de

tecnologia ou um grupo de pessoas adicional à equipe escolar em um processo

extraclasse, podendo criar dificuldades em sua aplicação.

O foco no educando existe na tentativa de encaixar o docente na atividade, não

obstante de uma capacitação continuada. Da mesma forma, o TNI se classifica como uma

técnica pedagógica, ao ponto que o FLER e o SIMPLES mantém a categoria de sistemas

de RPG voltados educação.

Destes, o único que dá ênfase a formação docente é o SIMPLES. Com estas

percepções pode-se analisar que não existe uma única forma de utilizar a narrativa em

sala de aula, e que as variações porém ser um padrão convergente nestas práticas, devido

ao elemento estimulante da abstração e imaginação.

Vejo que ainda se confunde muito a aplicação educativa com o RPG convencional e

um conteúdo delimitado, neste ponto não há questionamentos do RPG ser útil ao predispor

o sujeito para aprender, mas a sua estrutura necessita ser viável ao educador no cotidiano

da sala de aula.

Percepções de outros pesquisadores do tema, sobre a relação do RPG na educação

Ao questionar pesquisadores (jogadores que já haviam feitos experiências consideráveis e

significativas no meio acadêmico com RPG em campo escolar) identifiquei certas

similaridades, conforme visto abaixo na entrevista com o psicólogo Matheus Vieira:

61

Ao descrever sua experiência, o autor expõe que uma das grandes dificuldades está

nos professores que ainda têm medo do novo, compreendem o jogo, gostam do que

propõe, mas tem insegurança de colocar em prática, citando Vieira (2012) “se o professor

tiver a fim de fazer algo diferente, inovar sua aula, ele vai implantar o RPG [...] mas a

recíproca também é verdadeira [...] tanto faz o tempo de capacitação, se o professor

estiver muito enraizado no tradicional, ele não vai mudar.”.

Observando as experiências de Vieira (2012) e as propostas descritas

anteriormente, pode-se perceber um ponto significativo: o caráter de jogo ficou inalterado,

às vezes assumindo a postura comum de jogo didático, passando-se por uma

atividade/dinâmica na escola.

O professor, apesar de estimulado com as características ressaltadas do RPG sobre

o desenvolvimento dos conteúdos programáticos e interesse dos alunos, não consegue

assimilar inteira e funcionalmente estes fundamentos em sala de aula. Por conseguinte, os

jogos são caracterizados como um recurso pertencente exclusivamente á educação

infantil.

È compreensível que o educador tenha medo de mudanças sobre seu estilo de vida

profissional, entretanto, caso esta prática seja apresentada com abordagem diferente,

presume-se que haverá maior compreensão para constituir uma capacitação de práticas e

conceitos chave. Assim, se apresentou como uma atividade bem mais eficiente em período

de contra-turno.

No livro RPG e Educação: pensamentos soltos (VIEIRA, 2012), lançado no evento

WORLD RPG FEST, realizado em Curitiba nos dias 21 e 22 de julho onde se encontra a

descrição de suas experiências em aplicar o RPG nas escolas, não metodologicamente,

mas como jogo que estimula a aprendizagem, e que reforça a importância da atenção para

a capacitação docente, influenciou e estimulou esta pesquisa, com propostas de trabalhar

o RPG na educação analisadas, foram fontes importantes para o desenvolvimento deste

trabalho, embora o jogo fosse direcionado para suprir a hipótese em questão, sobre a

relação do professor com aluno, e recursos adicionais.

Ressalto que nem todas as escolas têm acesso em bom estado a computadores,

TV, internet, entre outros. Assim, primeiramente, houve a necessidade de equipes

especializadas, cabendo ao professor a responsabilidade de conviver com questões

cotidianas em sala de aula.

62

As descrições dos pesquisadores comprovaram que há funcionalidade no uso do

Role playing tendo um conhecimento prévio do jogo, fato esse que não se estende a todo

educador, e apenas em alguns casos há curiosidade do educador pela prática.

Em uma entrevista realizada em 23/01/2012 com o ex-presidente da ONG Ludus

Culturalis, Jaime Daniel Cancela, uma análise sobre a visão desta relação entre o RPG e a

Educação quando o questionei sobre a diferenciação entre o RPG em sala de aula e o

RPG entretenimento: ele esclarece que a Ludus Culturalis passou por este mesmo conflito,

sendo que para muitos jogadores de RPG a proposta era de apenas levar o jogo para a

escola para estimular a aprendizagem, não havendo uma padronização devido à

divergência entre as idéias de cada educador. Desta forma, fomentaram-se discussões,

sem haver um padrão pré-estabelecido e não se obteve um consenso.

Com base nos relatos, a definição de um método educacional de RPG ainda é vago,

aberto e indefinido, não descartando as propostas pretéritas visto que abriram caminho

para as presentes reflexões.

Logo, se compreendem alguns detalhes desta distinção. Acredito que a proximidade

entre professor e aluno seja o ponto chave a ser questionado, na busca de um método que

promova equilíbrio entre o jogo e o conteúdo.

63

Se o seu intimo ser não for

felicidade,

o seu dizer não convencerá o

educando.

Huberto Rohden

64

METODOLOGIA

ROLE PLAYING O desenvolvimento da metodologia role playing, esta estruturada em três fases ou

tipos de aula narrativa conforme os estudos de autores como Riyis (2004) e Campbell

(1990), junto as entrevistas e análises das práticas como FLER, TNI e SIMPLES, que

foram denominadas: Role Geral, Role coletivo e Role Individual.

FIGURA 01 – ETAPAS DE EVOLUÇÃO NA PROPOSTA DE AULA NARRATIVA 1.

FONTE: ACERVO DO PESQUISADOR

O método tem início com a postura ativa do professor que delimita quais conceitos

ou saberes quer trabalhar em aula. Posteriormente, selecionar os conceitos desestrutura

sua linearidade e reconstitui em formato de História segundo os parâmetros estabelecidos

por Campbell (2007) no livro “O Herói de Mil Faces”, em que resumidamente, o sujeito

parte em rumo a uma aventura para tentar solucionar um problema angustiante. Neste

processo, ele busca soluções, encontra aliados, mentores, vilões e diversidades que vão

agregando experiência. O seu plano de aula narrativa é criado, e então há o convite para

65

uma aula narrativa. Esses personagens externos carregam vertentes do conteúdo a serem

percebidos e deduzidos pelos educandos. Um bom exemplo está na descrição: “vocês vem

um animal quadrúpede pequeno, uns 30 cm de altura e 60 cm de comprimento, de cor

marron, pelo fino, parece um cachorro pequeno, esse animal não está sozinho, logo atrás

dele aparece um bando de mais quatro” agora veja vem, que animal é esse? Não se sabe,

apenas se tem características, cabe agora a dedução e experiência dos alunos diante do

animal para compreender o que é, e o que faz ali.

A partir da experiência dos alunos, o educador pode relacionar os conceitos chaves

propostos com as experiências durante a narrativa, sem rigidez, os alunos podem ir para

qualquer lugar para poder explorar o ambiente do jogo. E como mediador o educador pode

enviar personagens (aliados e mentores) que apresentem algumas pistas (Mestre dos

magos, Obi Wan, etc) e logo desaparecer. Focando a atenção sempre nas percepções dos

alunos, eles são os protagonistas da aula, na qual o educador após a mediação será

responsável por expor as consequências das ações realizadas. Em casos futuros e

interdisciplinares (como exemplo) vejo como necessário aulas graduais, educador(a) não

aplique em todas as aulas porque achou interessante, aplique devagar, tem que ser uma

aula que quebra a rotina. Podendo haver sim uma periodicidade, mas isso você vai decidir.

E com essas aulas, vai começar a criar e reforçar a mitologia comum que regem e

concedem identidade àquele grupo, compreendo mitologia comum, como uma sequência

de histórias que são comuns a todos e que por meio delas é possível desenvolver uma

linguagem e cultura respectiva que dá identidade a um grupo.

Mas calma, não vá pelo impulso querendo aplicar de uma vez, vou contar o que

acontece quando o educador pensa em atuar com esse método sem o devido preparo,

ocorre a perda de controle, a aula não funciona e você fica nervoso(a) com os alunos e

você mesmo(a) e quer desistir de tentar algo novo, dizendo que não funciona. Então para

não ocorrer isso, antes de tudo leia a proposta pedagógica.

Figura 02 – Esboço da primeira articulação sobre a metodologia role playing.

Fonte:

66

acervo do pesquisador

Estágio Descrição Exemplo

AMARELO Análise dos textos, aulas por semana, objetos da sala e do currículo

Delimitação do tema e conceitos chave.

Tema: Escravidão no Brasil

Conceitos chave: estilo de vida dos escravos, casa grande, senzala, senhor de engenho, casa grande, abolição da escravatura.

LARANJA Reestruturação em formato narrativo

Aliado: Zumba (escravo que conseguiu pegar a chave do cadeado que prende as correntes)

Inimigos: 4 capatazes (Joõa ligeiro, Zé, João Afonso, Onofre).

Mentor: Rui Barbosa (abolicionista, tem uma fazenda próxima)

Provação: Fugir da fazenda

VERMELHO O ato de narrar, descrever o ambiente a volta dos estudantes, sensações e saberes dos personagens naquele momento.

No sul de Minas Gerais, em uma pequena fazenda, vocês são os escravos do senhor Manoel Alcantarâ Salgado Nogueira Souza, agora é noite, vocês estão em uma senzala, por correntes, enferrujadas presa em um estaca no chão e fechada por um cadeado.

AZUL Debate sobre a experiência O que vocês acharam da vida de escravos?

O que sentiram?

O que vocês acham que acontece com

escravos que fogem?

ROXO Resgate da experiência debatendo e expondo situações que poderiam ter acontecido, usando o gancho das experiências e correlacionando com o conteúdo programático.

Lembram na aula passada? Sabe aquela casa que vocês entraram, lá tinha x coisas, que eram para tal coisa.

Ou

Então por causa disso, que o plano de fuga de vocês não deu certo.

Ou

Sabe o Doutor Barbosa que acolheu vocês, olha só a historia dele ...

67

Role geral

Inicialmente o professor narrador expõe uma história contextualizada, não se

preocupe em explicar as regras, faça um processo espontâneo explicando as regras

apenas quando é necessário serem usadas, dessa maneira os educandos vão pouco a

pouco co-criando as regras e limites do jogo.

Assim, se faz um convite para que os alunos participem normalmente com

indagações como “e agora, o que vocês fazem?” no qual todos os alunos utilizam uma

representação genérica, com breves características que aparecem durante a narrativa,

como por exemplo, “agora todos vocês são esses negros escravos”. Gradativamente,

ressaltam as características de cada um na resolução dos problemas apresentados,

dando-lhes liberdade de expressão para opinar sem receio, pois estavam se expondo por

meio do personagem. Enquanto representavam, compreendiam a dinâmica da aula.

O professor narra conceitos seguindo o exemplo utilizado no curso, em novembro

de 2011,

Brasil, século XIX, vocês não sabem bem o ano, pois vivem em uma pequena fazendo no sul de Minas Gerais, onde o tempo parece não passar, e que nada muda com facilidade, onde a escravidão existe a tanto tempo que as vezes se esquece como começou, mas vocês não esqueceram, pois vocês são os escravos. (Aula do dia 17/10, Grifo nosso).

Neste momento não existe

necessidade de fichas como no

jogo de RPG tradicional, pois todos

se vêem no papel, recordando

situações e seus conceitos sobre o

que é ser escravo.

68

Impera a necessidade do objeto gerador de probabilidade, em que normalmente usamos

um dado de pelúcia (é barato e fácil de encontrar, ou se for fazer um uma loja de estofados

monta tranquilamente depois vem a parte de silkar números ou costurá-los).

Tal elemento fascina e auxilia o educador no convite ao aluno para participar da

atividade, sem enfrenta-lo.

Quando alunos dispersos, ausentes mentalmente ou indisciplinados são convidados

pelo narrador que entrega a eles um dado dizendo algo mais ou menos assim: jogue e tire

menos que 3, para ver se você ouviu o que aconteceu com ele. Neste momento, todos

ficam atentos e pensativos sobre a pergunta: “ouviu?”, ele quem?

O que se esconde dentro da narrativa?

O que pode vir a ser descoberto?

A curiosidade da aprendizagem é estimulada continuamente na aula.

69

Somos feitos de átomos, dizem os

cientistas, mas um passarinho me

contou que também somos feitos de

histórias.

Eduardo Galeano

70

Role Coletivo

Neste ponto, após a sala compreender o mecanismo da aula-narrativa, pode-se dividir a

turma em grupos, que são responsabilizados pela administração e interpretação,

comportamento e características (vantagens e desvantagens) de um personagem. Isto

permite riqueza de detalhes e debates internos sobre a percepção de cada integrante do

grupo. Tem-se o exemplo dito pelo narrador:

Estamos todos perdidos na floresta após a queda de nosso pequeno avião de pesquisa, mas não se preocupem existe conosco um biólogo, ele é muito inteligente, alto, forte, o que facilita seus testes tanto em ações físicas quantos mentais. Ele não tem muito tato com humanos e acaba sendo grosseiro. Tem um quite de primeiros socorros, sabe muito sobre as propriedades medicinais das plantas e o comportamento dos animais, porém ele é mudo! Que grupo vai aceitar o desafio de hoje ser Bill, o biólogo Mudo?” (Aula do dia 03/11, Grifo nosso).

Os alunos administram as percepções e deduções sobre o conteúdo, que se diluem

na brincadeira, as relações entre eles tornam-se coesas com o trabalho em grupo,

argumentação e reflexão sobre suas percepções e atitudes. As escolhas, durante a

atividade, abrem múltiplas pontes que se conectam entre os grupos e sujeitos, sem ter em

nenhum momento, perdedores e ganhadores, mas posicionamentos diferentes em relação

à determinada situação.

Posteriormente, uma orientação (com poucas características, criadas pelo

educador) pode ficar em exposição no quadro para que toda a turma veja, conforme

exemplo:

“Bill, O Biólogo Mudo”

Atributos Físicos4

Atributos Mentais4

Atributos Sociais1

71

Características:

Conhecimento sobre plantas medicinais e comportamento animal;

Noções de primeiro socorros;

Grosseiro em relação a outras pessoas;

Mudo.

Equipamento:

Maleta de primeiros socorros

Equipe: Maria, João, Beatriz, Fábio, José

Nota: A descrição “atributos mentais 4” serve para esclarecer e afirmar a seguinte

característica: inteligência elevada (toda vez que Bill for pesquisar sobre uma planta

buscando um bálsamo para cicatrização de feridas, terá que tirar em um dado de 6 faces 4

ou menos), ou seja 2/3 de chance, pois em sua descrição está posto que ele é inteligente,

seguindo determinados conhecimentos.

72

Se o cérebro não

estiver harmonioso, a

inteligência pode

funcionar?

Jiddu Krishnamurti

73

Roles

individuais

Neste ponto, o método promove a alteridade entre professor-narrador e

alunos, neste momento os alunos, com auxílio do educador(a) podem ser

narradores de pequenos grupos. Neste caso, os alunos podem criar fichas

individuais e regras próprias que sejam funcionais em determinada situação.

Desta forma, além de aprender a coordenar, e promover o diálogo entre

os colegas da turma, eles percebem como é ser professor, podem se

enxergar como professores Essa oportunidade de compreender melhor o

papel do professor visando a mediação de conflitos, interação e orientação

junto ao grupo. Acredito que assim, o aluno pode aprender a respeitar o

professor, se colocando no lugar dele. Imaginem como é gratificante ao

educador(a) ter os próprios alunos opinando sobre como construir o plano de

aula, consegue imaginar isso?

Consegue?

74

E AGORA?

75

ANÁLISE DE DADOS

Realizei a análise das impressões de dez alunos que concluíram o curso,

categorizando-os de acordo ao ambiente de aplicação: Educação Infantil (EI), Ensino

Fundamental (EF), Ensino médio (EM) e Superior (ES).

EDUCAÇÃO INFANTIL

A aula contou com cerca de 30 alunos, sendo que a docente abordou a temática de

boa convivência e a atuação de certas palavras junto ao comportamento social como: Por

favor, desculpe, obrigado e com licença.

Nesta experiência (cerca de 30 indivíduos entre cinco a seis anos) foi necessário

utilizar elementos adicionais a fim de promover uma reestruturação do ambiente devido a

idade dos participantes.

A professora EI descreve que “As crianças se mostraram muito interessadas pelo

jogo, desde a construção do cenário até a finalização do jogo.“ Neste ponto, pude notar

que dentro do contexto visualizado da educação infantil, a educadora não enxergou

diferença entre um jogo como atividade e uma proposta de metodologia.

Ao desenvolver o método, observei a distinção da educadora, na fala “O RPG sem

dúvida é uma ferramenta poderosa de auxílio ao professor em suas aulas, mas exige muito

conhecimento e preparo técnico para a aplicação, e isto talvez seja um empecilho para

concretização da prática.”.

Afetando a postura do educador, em relação a acomodação, visto que

“conhecimento e preparo” são fundamentos para a postura ativa em sala de aula.

Resumidamente, esta prática retira o docente de sua comodidade, afetando por

conseguinte, a relação com a sala de aula. Entretanto, a educadora EI, ainda confunde o

que é método e o que é o jogo de RPG, visto que a distinção em termos acadêmicos não

está clara para muitos educadores.

76

Depois deste primeiro passo, ocorreu uma aproximação entre educador e educando

“Foi interessante notar que ao romper esta barreira e realizar a primeira experimentação do

jogo, tanto as crianças quanto eu (narrador), fomos envolvidos pelo poder do jogo que é

natural em cada ser humano.”

Segundo esta descrição, percebi um processo de rompimento de barreiras que

foram levantadas pelas posturas tomadas previamente entre os sujeitos.

Acredito assim, que a ação de jogar promove afinidade entre os participantes. Esta

característica aparece em

diversos momentos na fala da

professora EI como “Precisamos

investir na idéia de que a boa

convivência nos leva a caminhos

menos penosos em trajetória de

vida. Sabemos que nem todos

nós compartilhamos dos mesmos

valores, mas a ideia de valores

universais foi a pauta desse jogo

com as crianças.”

Por fim, visualizei um

reflexo da postura da professora

EI na escola, junto à fala “em

conversas isoladas com algumas

professoras que participaram

indiretamente da aplicação como

a outra professora dos alunos

que jogaram. Por meio dos

relatos da professora que fotografou, e da professora ajudante da turma foi possível

perceber que o jogo narrativo seria muito interessante, caso utilizado deste o início do ano,

especialmente aquele que trata da boa convivência.”

Ao analisar estas falas da equipe escolar, vejo que se trata inicialmente de um

processo de mudança na postura da educadora EI, diante dos educandos, saindo da

passividade para a interação com os alunos, concluindo assim, que as barreiras

77

interpessoais são formadas mecanicamente junto à determinada estrutura convencional da

instituição.

ENSINO FUNDAMENTAL

Neste campo de atuação foi selecionado o conteúdo de sustentabilidade, ministrada

por uma graduanda de Biologia (EF01) em seu estágio regular, que descreve o ciclo do lixo

no município por meio dos recicladores.

Partindo do pré suposto vindouro da Educação infantil, em que barreiras são

desenvolvidas entre educador e educando junto a estruturas institucionais, adiciona-se à

fala da aluna EF 01 “Minhas primeiras experiências didáticas, obtidas durante a graduação,

foram relativamente traumáticas, a ponto de trancar a licenciatura.”

Neste processo a EF01 observa para depois intervir, como educadora orientada por

um professor mais experiente, que transmite além do conhecimento sobre didática, suas

emoções e posturas.

Observei que os profissionais carregam internamente barreiras, e este fato foi

notório também no processo da aluna EF01 “experimentei os mesmos pré-conceitos,

anseios e temores antes de confrontar uma sala de aula, crendo que novamente teria

terríveis experiências com os alunos.”

Aparentando que já havia um mal estar, uma repudia que constitui esta barreira

educativa, carregada pelo próprio professor, entretanto, iniciando a proposta de método

narrativo foi possível perceber que a fala da aluna EF1 se altera “Foi uma surpresa quando

essa previsão não se confirmou. No lugar de alunos com problemas de comportamento e

desinteresse na aula, encontrei uma maioria participativa, interessada e compromissada”.

Identifiquei nesta fala, que o medo da aluna EF01, é destacado por desinteresse e

indisciplina, ambos elementos correlacionados, sendo que aluno que não tem afinidade

com a metodologia não irá por consequência prestar atenção ou se comportar.

Assim como na Educação infantil, alguns pontos se repetem como na fala “O uso do

RPG como ferramenta didática me proporcionou experimentar um ambiente mais

favorável, em sala de aula” onde a aluna EF01 ainda confunde o jogo com o método.

78

Retomando o foco para com as barreiras e as relações humanas entre os sujeitos a

aluna EF01 descreve: “O método possibilita também uma abordagem mais pontual do

conteúdo exposto, já que os alunos se identificam com a aula, interagindo com mais

frequência, disposição e uma maior atenção”.

Neste momento, identifica-se uma percepção do educador, além de um mero

recurso didático ou atividade de recreação. Ele aprecia e reconhece a utilidade da narrativa

como método por meio de sua utilidade, e resulta com a devolutiva dos educandos. Além

de jogo didático, ele inicia uma forma pelo olhar docente como método, isto se destaca na

fala da aluna EF01 “Ao final da narrativa os alunos foram questionados, respondendo

corretamente as perguntas relativas ao tema, fornecendo também relatos pessoais e

opiniões”. Essa fala apresenta a impressão de mecanização, em um olhar do educador

condicionado a avaliação, essa postura também precisa ser reavaliada. Pois é muito fácil

cair em padrões antigos em processos de mudança metodológica.

Neste passo, destaco a valorização docente, tanto pelos alunos quanto pelo próprio

docente, destacado na fala da aluna EF01 “Todos os objetivos propostos pela prática

foram atingidos, juntamente com uma desmistificação da sala de aula, que acabou

resultando na minha volta na licenciatura.”

Observei uma ruptura dos pré-conceitos, e uma auto valorização do docente devido

à satisfação em colher bons resultados, sem momento nenhum citar conflitos junto a sala.

Já para o aluno EF02, que era jogador de RPG e atuou junto ao conteúdo de

Astronomia tendo percepções diferenciadas, ao qual categorizou o método como uma

“prática facilitadora de ações mais dinâmicas e eficazes, na relação professor-aluno”,

pode-se perceber que não existe a confusão do jogo com o método, tendo experiência

tanto como docente quanto como jogador, o que permitiu maior clareza de discriminação.

Ele descreve a transformação da relação professor-aluno, gradativamente conforme

a narrativa se desenrola, de modo a valorizar o momento de cada sujeito, combatendo

assim, a ansiedade ao mesmo tempo em que a relação aluno-aluno foi afetada, como

descreve a fala do aluno EF02: “Foi notória a melhoria no tratamento aos colegas em sala

de aula e principalmente na relação professor-aluno, promovendo uma relação mais

dinâmica e respeitosa”.

É citado o caráter de transformação das relações entre os sujeitos, e não

simplesmente melhoria. É um ponto a se questionar.

79

Ao detalhar a fala do aluno EF02 apresentando uma ação em conjunto, que

promoveu a sincronia em sala de aula, além de ter o início na postura docente, foi

gradativamente interagindo, em um tipo de jogo de relações “onde tanto professor quanto

aluno fazem parte do processo de mudança.”

80

Olha na nave espacial!

Olha a criação de símbolos, a reinterpretação da realidade e dos objetos!

Olha a representação de papéis!

81

ENSINO MÉDIO

No Ensino médio foi selecionado o conteúdo de Sociologia para o 2° e 3° colegial

pela a aluna EM01. A aluna que atuava como docente na instituição conta: “fui tomada de

uma alegria e de uma insegurança, pois se tratava de algo novo para mim”. Ela tinha duas

turmas em questão: a primeira tinha boas relações estabelecidas, e a segunda, tinha um

ambiente em desordem.

Mediante a metodologia estabelecida, a primeira turma reforçou os laços entre

professor-aluno de acordo com a fala “Neste dia nos divertimos muito, tivemos um clima

bem descontraído”. Evidencia-se a expressão da aluna EM01, como coletiva, adicionando

o aluno como seu igual, questão essa que não fica explicita nas experiências previamente

descritas.

Na segunda turma, a aula-narrativa foi aplicada na primeira aula, após a greve que

se estendeu por três semanas; em uma turma de 2° colegial, a aluna EM01 apresentou a

proposta e fez o convite a aula narrativa, quando iniciou um atrito na sala com uma aluna

“E lá do fundo uma garota gritou: „Ficamos tanto tempo sem aula, e você já está inventado

moda!!!? Queremos aula de verdade‟.”

Neste ponto, vejo como necessário destacar a característica do jogo: uma atividade

voluntária em que o sujeito se permite participar, e neste contexto, não havia esta

predisposição, possivelmente, por condicionamento, e pelo fato da aluna EM ter apenas

uma aula por semana. A educadora, por receio também apresentou primeiro as regras ao

invés de iniciar diretamente o jogo, o que confundiu a sala.

Esta aplicação gerou um grande conflito interno da aluna EM “Quando o sinal bateu,

eu havia brigado comigo, dizendo que nunca mais aplicaria RPG na minha vida”. Entende-

se que neste processo emergiram desejos e necessidades internas docentes e discentes,

tendo a proposta como catalizadora neste meio. Há assim, segundo as experiências

anteriores, a difícil desassociarão entre o conceito de RPG e métodologia.

Após essas duas experiências, houve uma situação não esperada, descrita na fala

de aluna EM01 “Só que durante o recreio desse dia, os alunos do outro 2º ano vieram e já

me perguntaram entusiasmados quando que eu aplicaria o jogo na sala deles”. Os alunos

conversavam naturalmente no recreio sobre as experiências da aula-narrativa.

82

O interesse dos demais alunos para a proposta aconteceu no mesmo dia, o que deu

novo fôlego à aluna EM01, permitindo que a docente sentisse valorização e

reconhecimento. Houve o rompimento do desafeto anterior, tal romper propicia o objetivo

específico delimitado de

alternativa metodológica na

mediação de conflitos. A

professora cita: “fiquei feliz”.

Em outro momento, os

alunos EM02, tomaram o

desafio de lecionar Matemática.

Ressalta-se que eles tinham

experiência como jogadores de

RPG e isto promoveu mais

conforto.

Selecionaram para uma

turma de 2° colegial, sendo que

nas primeiras aplicações houve

uma situação que agrega a

experiência da turma dois

descrita anteriormente “mesmo

eles sendo um pouco

baderneiros a participação

deles nas aulas era melhor do

que nas outras turmas”.

Há uma discrepância, visto que a baderna neste caso foi favorável, tendo como

único aspecto que diferencia os alunos, a experiência sobre RPG.

Esta experiência foi continuamente criando pontes entre os saberes do educador e a

postura do educando além de despertar percepções sobre determinadas dificuldades

docentes, de acordo com a fala dos alunos EM02 “Este trabalho fez perceber que a atual

forma de ensino está afastando os alunos da matemática. O envolvimento dos alunos foi

algo surpreendente”.

83

Outra questão interessante se destaca na fala final dos alunos EM02 “Esta

infinidade de respostas ou soluções para a aplicação de um jogo só resulta em

amadurecimento no aluno”. Os alunos EM02 não confundem RPG com método, mas

similarizam o jogo como metodologia, colocando gradativamente em evidência o problema

da indefinição.

84

ENSINO SUPERIOR

Os alunos ES tiveram experiências práticamente sem resistência como descreve “uma

interação maior da sala em relação ao conteúdo, mesmo aqueles que nunca tiveram

contato com esse tipo de aula se mostram mais tendenciosos a participar”. Com

predisposição natural a aula-narrativa, presente também nas experiências anteriores,

igualando-se a fluidez da educação infantil.

No caso do aluno ES01 que já tinha

problemas de convivência com os

outros alunos de seu curso, viu-se um

processo de transformação, conforme

revelado durante o curso passou de

professor, expositor, para narrador,

contador de histórias” permitindo

perceber e atuar em um novo

contexto promovido em suas relações

junto a sala de aula como reforma a

fala abaixo:

“A narrativa se desenvolvia, e

concomitantemente percebia-se que

os jogadores participavam ativamente

de todas as etapas do jogo”. E o

docente revela: “Dessa forma a

atenção que obtive como narrador era

algo que todo o professor (a) almeja

adquirir do aluno”

Neste fragmento, além do

destaque para a alternativa mediadora do professor, creio, que este tipo de atenção em

sala é tratado como raro e desejado. Sua fala neste ponto está detalhando a qualidade das

relações entre professor-aluno, já que ambos se mostram predispostos em participar,

85

tornando a sala de aula um ambiente mais agradável e prazeroso, como destaca os

objetivos deste trabalho.

Nesta postura, destaca-se a promoção de uma educação aprofundada no sujeito e

na relação entre indivíduos, destacado na citação “os jogadores adquirem maior

sensibilidade social”. E cativo de sensibilidade agrega características de cidadania à classe

comum. Ao final, ainda repetiu-se o padrão de dificuldade em compreender o que

diferencia RPG da metodologia role playing. Mas afinal, não estamos todos tentando

descobrir isso nesse processo?

86

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Minha percepção inicial era sobre um problema de comunicação entre sujeitos.

Após as experiências, percebi um conflito ligado a falta de expressão do sujeito aluno no

ambiente escolar, seguido pela imposição da expressão do sujeito professor(a). Estes

posicionamentos acabam por desgastar as relações, e conseqüentemente, o ambiente de

aprendizagem fica defasado.

Quando optei pelo RPG, pensei em sua organização em caráter pedagógico,

entretanto esta ação pode promover um jogo didático facilmente, condicionando e

restringindo tanto o educador(a) quanto aluno.

Inúmeras são as aplicações de RPG na sala de aula, mas poucas tem um caráter

cientifico e pedagógico, levar livros de RPG para a sala de aula não é aplicar RPG na

educação. Temos que ter consciência de um desfecho conceitual e pratico para gerar

parâmetros norteadores. Não estou reinventando a roda (ou o dado), sobre o RPG na

educação, apenas propondo uma organização possível.

Levanto essa questão, preocupado com professore(a)s que facilmente levam o jogo

a este condicionamento e a jogadores de RPG que apenas promovem recreação. Como

disse Buda é necessário o “caminho do meio”. Com o objetivo que isto ocorra, vi como

necessário a delimitação no uso de alguns elementos plásticos que permitissem o

manuseio do(a) docente como uma metodologia, sendo neste caso, a narrativa

participativa com regras flexíveis e um objeto gerador de probabilidade, como um dado,

roleta, entre outros. Com esse trio de elementos podemos aplicar a Metodologia Role

Playing (MRP) em qualquer ambiente, como empresas, ongs, universidades, onde a

imaginação permitir.

Desta forma, surgiram percepções sobre outra categoria de relação entre os sujeitos

dentro da esfera da narrativa (aula-narrativa), em que não eram impostas as figuras

professor(a) e aluno. Nas experiências dos alunos em sala de aula, o processo se deu por

convites para atividade e não por meio de imposição a atividade.

Durante a aplicação, o caráter de diversão, típico das atividades lúdicas, nos

sujeitos envolvidos esta presente. Neste caso, o campo afetivo dos indivíduos era exposto

e interagia com os demais, promovendo a sensação de um ambiente seguro e agradável.

87

Tendo o foco principal da sala direcionada para o sujeito: sua experiência e bem estar, por

meio da interpretação, percepção e dedução sobre cada experiência.

O professor(a)-narrador, se oportuniza ao reavaliar suas perspectivas sobre

educação, métodos e conteúdos, pois isto faz parte do foco do preparo da aula-narrativa.

Acredito que se pode experimentar, relações que antecipam a aprendizagem, por meio de

uma postura docente pautada da ludicidade e expressão, compreendendo como se

beneficia a qualidade da relação professor(a)-aluno segundo o método proposto, podendo

este, ocorrer quando o(a) docente pré-disposto tem o conhecimento e experiência no uso

da metodologia, favorecendo a boa convivência, pela aproximação entre os sujeitos.

A interação no ambiente contextualizado de forma que a comunicação-expressão

possa se desenvolver naturalmente pela disposição singular de cada um. Então, a sala de

aula existiria em múltiplas linguagens individuais que iriam gradativamente buscar uma

convergência estruturada e mediada pelo educador como mitologia ou cultura comum.

88

Importante dica ao educador, registre tudo que puder e

apresente aos alunos, mostre o quanto é importante estar

ali, mostre os resultados. Publique artigos de suas

experiências, escreva projetos, crie com eles.

Agora vamos definir resumidamente

alguns parâmetros importantes.

89

Os elementos de RPG podem ser utilizados corretamente para envolver

pedagogicamente o docente e o educando, contribuindo com o ambiente

de sala de aula, como espaço prazeroso?

Há diferença entre o RPG usado em sala de aula, e os elementos do RPG

direcionados para sala de aula. O jogo, por sua estrutura de poucos participantes e regras

específicas, não comporta as necessidades do ambiente escolar, todavia, o uso de seus

elementos mensurados e adaptados pelo docente propicia o envolvimento do educador e

educando por meio da ludicidade e expressão, e isto ocasiona um espaço prazeroso para

aprendizagem. O que retoma:

Alternativas ao professor, visando o caráter de mediação em relação aos

conflitos com discentes em sala;

A utilização do método narrativo se pode transfigurar a imagem do docente, pois

segundo a coleta de dados não houve relato de alteração em tom de voz, stress ou

desrespeito ao professor, exceto no caso da aluna EM01 (devido a inexperiência com

narrativa), em que se percebeu a insegurança ao aplicar o método.

Para que isso ocorra, existe a necessidade de uma predisposição interna do

docente, junto a preparação e orientação, a fim de perceber a sala e fazer o convite para a

proposta, sem imposição. De maneira a perceber o conflito como mais um elemento

participante em sala de aula, podendo interagir positivamente entre o professor e o aluno.

Compreendo que, neste caso, a diferenciação entre narrativa e exposição oral de

fatos, sendo que sem a expressão do sujeito não é possível cruzar a ponte entre o

professor(a) tradicional e o professor(a) narrador.

90

Qual a contribuição de uma metodologia role playing ?

Pude perceber na fala dos alunos, reações diferentes ao convencional mal estar da

sala de aula. Sendo apropriados gradativamente por um interesse na docência, quando

esta dissipa seu caráter penoso, e torna-se divertida.

Neste processo, o(a)s educadore(a)s puderam observar em sala de aula interesse,

exposição de opiniões, motivos e realidades dos educandos. Isto permitiu que professor(a)

e aluno se conhecessem sócio-afetivamente.

Acredito que o objetivo inicial da formação de uma metodologia pedagógica que

incorpora determinados elementos do RPG se mostra possível e viável para as demandas

nacionais, tendo a clareza que existe necessidade de estudos mais aprofundados para

maior compreensão e consciência dos impactos dessas ações. Esclarecendo conceitos e

formulando novas questões.

Em certos casos, existia a dificuldade de compreensão da diferença entre narrar e

ler um texto, sendo narrar um processo de reconhecimento, descoberta, além de um

caminho possível, válido e igualmente singular ao ritmo de cada educador.

Ao vislumbrar determinados parâmetros da educação no campo de atuação desta

investigação identifiquei que a metodologia Role playing se alicerça na responsabilidade do

sujeito docente, para promover a transformação do mesmo e o ambiente de sala de aula.

Nesta prática é necessário que o(a) educador(a) deixe a postura comodista, para que junto

com seus alunos, reinterprete o conteúdo, criando histórias que promovam a

aprendizagem significativa, em um eixo de conhecimento comum.

Para isso pode utilizar dos livros convencionais exigidos pelo currículo base e qualquer

material que o(a) educador(a) ou alunos tenham acesso, para traçar os conceitos chaves

do plano de aula.

O(a) educado(a)r nesta atividade se torna colaborador(a) de um processo criativo, e com

um único plano de aula que pode se desenvolver de diferentes maneiras de acordo com a

variável de percepções dos alunos envolvidos.

Recordo que é uma prática realizada com baixa exigência financeira e se pode atuar em

qualquer espaço, requerendo apenas a ação do educador e materiais já presentes em sala

91

de aula, desvinculando a dependência de recursos dispendiosos que surgem como tema

conflitante em escolas públicas. Dispõe de estrutura convidativa aproxima os sujeitos pela

expressão, dedução e interação, propiciando um ambiente para representação de olhares

sobre determinados contextos disciplinares, que podem convergir em qualquer tema

descriminado. Com a criação de um ambiente mais pró ativo, o docente terá uma

retribuição afetiva em relação a afetividade desprendida, revigorando suas crenças em

relação a profissão e a si mesmo, gerando um estado de bem estar.

O Role playing se apresenta com uma prática educativa flexível que contribui para que

cada professor(a) tenha sua própria desenvoltura e originalidade no trato com os

educandos, desta forma não se compreende como um método desatualizado, ou alheio as

demandas sociais, mas um processo humano para significação a realidade.

O método se torna interessante para ser aplicado quando o(a) educador(a) considerar

conveniente, não sendo obrigatório como um substituto para aulas, mas um acréscimo

valioso para o bom relacionamento com a sala e o conteúdo.

Acredito que as ações derivadas desta prática afetam por consequência a sociedade,

contribuindo para a formação de um consciência do sujeito ampliada devido a

interpretação de saberes, e como estes são representados por outros olhares, exercitando

a alteridade e empatia.

Ao final destas percepções diante da proposta, reforço a crença em uma mudança nos

parâmetros de qualidade diante dos estudos já realizados sobre o tema, pois ao lançar um

olhar lúdico e crítico, sobre determinada carência comum ao professor, foi possível

promover princípios de autonomia aos sujeitos envolvidos.

Aos quais pode ser expressa com clareza pelo aluno ES01:

[...] O RPG é uma ferramenta indispensável para o(a) educador(a), pois permite ao estudante desenvolver suas potencialidades intelectivas, lúdicas, criativas e interativas [...] O professor que se sentir apto ou simpático para experimentar a utilização de narrativas de RPG no seu ato de ensinar tem o dever de escrever sobre suas experimentações a fim de deixar um legado público acerca do desenvolvimento desta e de outras ferramentas que agregam a prática docente (Aluno ES01).

92

Descrevo também certa similaridade entre os relatos dos estudantes que passaram

pelo curso, que se constata como grande satisfação diante do método, o enquadramento

de uma visão sobre as interações em sala de aula de um ambiente divertido que se

distancia do enfoque sofrido, o aluno e o(a) professor(a) se enquadram como participantes

de uma atividade coletiva e para tanto, precisam se comunicar e expressar cada vez

melhor. Desta forma, os dados obtidos pela comparação da coleta bibliográfica e

pesquisadores, vieram a complementar uma lacuna diante da relação metodológica do

Role Playing Game.

Este trabalho elucida, em seu direcionamento crítico interpretativo, certas noções e

necessidades sobre o estudo do jogo de representação junto a educação convencional,

por meio da compreensão da experiência dos sujeitos envolvidos, as quais creditam que o

elemento narrativo presente no RPG, e não propriamente apenas o jogo, poderia atuar,

quando devidamente orientado, atendendo às demandas sutis da natureza dos indivíduos

envolvidos na escola, sendo a gente transformador e emancipador para professore(a)s e

alunos.

93

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ANTUNES, Celso. Jogos para a estimulação das múltiplas inteligências. 6. ed. Petrópolis: Vozes, 2000. 300 p. BARTHOLO, Márcia Fernandes. O lazer numa perspectiva lúdica e criativa. Cinergis, Santa Cruz do Sul, v. 2, n.1, p. 89-99, jan/jun, 2001.

CAILLOIS, R. Os jogos e os homens. Lisboa: Portugal, 1990.

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96

Anexo

97

Entrevista completa com professora-jogadora

e jogador-professor.

Jogador-professor - Bacharel em direito e história

a) RELAÇÃO: RPG X JOGADORES X PROFESSORES

Sendo objetivo, o que você percebe sobre o RPG na sua vida, em benefícios

pessoais?

Você consegue sempre agregar mais conhecimento, você vai formando uma pluralidade

de fontes de informação, porque ao mesmo tempo em que você esta vivendo uma

aventura, você precisa de conceitos de Física, noções de Biologia, História, das facetas

antropológicas, que cada cenário é composto de uma arquitetura que tem um componente

humano que enriquece uma cena que é narrada, então RPG me permite o que? Essa

diversificação de conhecimentos.

Professor-jogador - Bacharel em Direito, História e doutora em História

Você citou que a mídia mostrou o RPG como um jogo assassino, mas teve a

experiência de ter contato com jogadores de RPG que inclusive auxiliaram seu

processo, qual sua percepção sobre esse jogo em relação do que a mídia diz?

Pois é, na época eu me lembro li algumas coisas, vi críticas inclusive de alguns

evangélicos falando, um monte de gente falando, um monte de coisas más, sobre RPG, aí

98

eu fui conversar com um colega professor e ele se reúne com colegas para jogar RPG aos

domingos, até mesmo me convidou. (...)

Mas eu me lembro de uma coisa que me chamou atenção, foi que existe um preconceito

pelo que as pessoas não conhecem, a minha geração não conhece, e as pessoas mais

velhas do que eu, que não conheciam, e é complicado falar do que não conhece. E

continuo com a mesma teoria que eu tive durante a vida eu acho que não é o jogo que é

prejudicial, porque como tudo na vida ele é um instrumento usado pelas pessoas e acho

que as pessoas têm essas coisas internas e isso despertada pelo jogo, mas o jogo não é

responsável por assassina-la, é como as pessoas usam, a menina podia ter morrido de

outra coisa de overdose, de drogas, enfim, isso seria uma desculpa, para dizer matou a

fulana, jogou RPG e morreu... Mas isso é coisa de pessoas desajustadas, de mente

doentia.

Enquanto eu estava com os garotos isso foi uma experiência boa para mim como docente

e para eles. E eu e o aluno conversamos sobre isso na época ele disse: “não professora o

jogo não é ruim que nem as pessoas falam” e era algo que não podia ser ruim porque ele

sabia tanto, aprenderam tanto. E veio na mídia só o ruim, ela não mostrou o lado bom, mas

é como tudo na vida um instrumento.

Você comentou sobre a relação das gerações, mas a sua geração é de qual década?

Eu tive adolescência nos anos 80, que vi muita televisão, pulei corda , andei de patins de

bicicleta, o videogame era aquele inicial, aquele bem simples, o Atari, bola queimada,

enfim, foi uma geração do computador, quando fui ter um computador já estava em

faculdade, agora todos os meninos nascem com computador, com Playstation e um monte

de coisas e recursos lúdicos, que foi uma coisa que minha geração não pegou, foi porque

não era uma coisa que estava ali, naquele momento na década de oitenta.

99

b) RELAÇÃO: RPG X PROFESSOR X ALUNOS

Jogador-professor - Bacharel em Direito e História

No caso, como fica a sua relação com seus alunos em sala de aula quando você

aplica RPG?

O que às vezes torna a coisa um pouco complicada, é até você transformar a teoria que

você esta aplicando no envolvimento deles no cenário que você pretende com o conjunto

de interpretação. Qual que é a vantagem? É você conseguir que eles vivenciem um

período da história que você esta relatando, você dá a teoria, você tem a teoria, a parte

didática emprega ali, e ao aplicar o RPG se cria um cenário no qual ele (o aluno) se insere

no contexto da teoria que eu passei pra ele.

Então se eu estou falando de cruzadas, eu divido por exemplo a turma, uma parte

muçulmana peço a eles que façam um background (histórico) do que seriam os

muçulmanos, que colham informações sobre a pregação muçulmana, que levante o

cotidiano muçulmano e do outro lado eu coloco o que? Uma turma de católicos, eu inicio

então depois que eles fazem a coleta de dados, ai primeiro eles tem que fazer um debate,

verbal evidentemente, sobre os temas ali abordados que eu vou mapear ao longo da aula

sobre a presença de cristo entre eles, do porque a Terra Santa é importante, se ela é santa

mesmo ou existe um cunho pecuniário, riqueza, monetário, vamos assim dizer depois eles

simulam que seria uma tentativa de tomar uma posição resguardada, eu junto às cadeiras,

ai é a parte que a coordenação adora que eu faço a bagunça inteira na sala, como se

fosse uma fortificação e aí eles têm que fazer o que? A coisa que eles mais gostam

que é a bolinha de papel tentando acertar pontos determinados nas cadeiras que

seria parte onde romperia a barreira onde eles poderiam passar na área resguardada.

Então tem isso eu coloco uma galera defendendo as cadeiras, eles não podem atirar

bolinha um no outro, somente nas cadeiras, então fica uma turma defendendo as cadeiras

e uma turma atacando as cadeiras.

Isso mostra o que? Que na guerra hoje, o conhecimento já determina uma posição

resguardada, ela necessita de muito menos pessoas do que em relação a tropa atacante,

100

se você pegar dados estatísticos hoje do exército americano, que ataca com 20 soldados

de ataque para 1 de defesa, o Brasil hoje tem uma estimativa de crescer para chegar há 7

para 1, então isso não justifica por exemplo, o efetivo militar norte americano

extremamente elevado, o custo bélico dos Estados Unidos, por que menor que seja o

inimigo os Estados Unidos tem essa consciência de ataque, por exemplo pego uma idéia

do período medieval e consigo dar para o aluno uma noção, por exemplo á retirada do

Iraque, então eu consigo trabalhar neste sentido, eu transito entre o espaço e o tempo com

o RPG, entre um conhecimento e outro.

Diga-me uma coisa, em relação da expressão do aluno em sala de aula, a posição

ativa dele, o que você pode dizer sobre isso?

A unanimidade de participação você não consegue quase em nada, mas assim eu vejo

principalmente por parte dos meninos mais ação enquanto das meninas eu percebo mais

questionamento, o aluno, o menino quer ir direto para execução enquanto a menina, a

garota, ela já questiona mais o contexto, o cenário, mas isso é típico da própria questão

biológica, a mulher é muito mais detalhista que o homem, historicamente a mulher é mais

detalhista que o homem, o pessoal costuma brincar que o homem ia caçar e a mulher

ficava na caverna, então ela tinha que reparar nas coisas, o homem tinha que ir até as

coisas. Então eu vejo muito isso, mas há uma participação sim, em torno de 80%, uma

participação efetiva.

Você já teve conflito com aluno, stress e irritação trabalhando RPG em sala de aula?

Ou o RPG permitiu um canal de comunicação mais funcional entre vocês?

Não, que stress eu nunca tive, eu sempre parti do principio que é uma atividade, do

mesmo jeito que eu posso passar uma tarefa para o aluno fazer em casa e ele não fazer, a

mesma coisa pode ocorrer em um exercício de RPG em sala de aula, eu vou aplicar

aquele exercício, eu tenho que respeitar evidentemente a individualidade daquele aluno

em não querer participar, lógico que eu o questiono porque, se é uma questão religiosa, se

101

é uma questão de falta de interesse, se é uma dificuldade de interpretar o exercício. E com

isso eu crio esse canal de conversação também, que aí você aprende um pouco daquela

pessoa, do aluno, você para de vê-lo como um número de chamada e passa a ver como

pessoa, você vai entender as razões com aquilo que ele esteja travado, muitas vezes se é

uma pessoa muito tímida né, introspectiva, tem a chance durante o jogo de se soltar,

houve casos disso acontecendo.

E no caso, você tem esse tempo de conversar com o aluno, também é uma chance

de poder ser inserido neste contexto (conteúdo curricular) de aula-jogo?

Com certeza.

Chegou a passar por isso?

Sim, teve aluno por exemplo, a meu pai ele é pastor e ele fala que RPG é do capeta e que

esse negócio mata as pessoas e não sei o que relatando o caso Ouro Preto, né daquele

acidente, falei, primeiro eu tenho todo o processo deste caso, que mostra que é uma

questão de tráfico de drogas e que não tem nada haver com o RPG, a mídia noticiou o

RPG, mas não noticiou a sentença, que mostrava que não tinha coligação nenhuma com

atos diabólicos nem nada. Então eu fui conversando isso com ela, inclusive o pai dela veio

pra conversar comigo, a gente trocou muito idéia, mostrei até algumas linhas do RPG

relacionados a espiritualidade, como anjos, que é uma linha que se tem. Não houve

problema, a menina participou da atividade, não forcei ela, falei que só queria explicar e se

o pai quiser falar comigo estava a disposição, e isso foi até legal porque foi possível

romper uma barreira dentro de sala de aula e na sociedade, explicar para o pai que é um

posicionador na sociedade, um formador de opinião, uma vez que ele é pastor.

102

Mas no caso, esta ferramenta pedagógica facilitou, além da relação com seus

alunos, dos alunos com o conteúdo e a sua relação com o conteúdo sabendo que

tudo é uma questão de percepção e interpretação?

Olha, eu acho fundamental, porque antes de você aplicar o jogo em si, você dá uma

pesquisa, estimula que cada um colha argumentos para aquele personagem ou situação,

então neste ponto se vê uma funcionalidade da teoria, muitas vezes eu vou em uma teoria

e ele (aluno) fala: vou usar isso para que? Eles simplesmente ignoram, mesmo que eu use

para o jogo, eu forcei ele a ter que trabalhar aquele conteúdo, e eu tenho certeza que a

partir do elemento lúdico ele vai guardar alguma informação e isso é comprovado e muitas

vezes aluno fala assim, mas no nosso exercício, que tivemos outro onde a gente simulou o

que, pegamos aquele filme “As Ultimas horas de Hitler”; “A queda” e misturou com a

operação Barbarossa. Então a gente montou uma linha de espionagem para tentar chegar

no Banker antes dos russos, então a gente tinha que atravessar a fronteira russa, chegar

em Berlin, conseguir entrar dentro do Banker, então o que eu fiz, dividi a sala em grupos,

uma galera foi pesquisar o Banker, outra galera foi pesquisar os números russos em Berlin,

ou foi pesquisar o que era a operação Barbarossa, então o que eu fiz, montei como se

fosse um QG, como se fosse uma central de inteligência para montar essa operação,

então o jogo foi justamente esse como nós poderíamos atacar o Hitler, como nós

capturaríamos o Hitler, movimentamos os terceiros colegiais inteiros nesse sentido.

Professor-jogador - Bacharel em Direito, História e doutora em História

...Então o que acontece, eu era professora nesta época lá no Colégio Ângulo, e eu

trabalhava com os alunos do noturno e com 8ª série também, e eu tinha um aluno que não

prestava atenção na minha aula, ele estava sempre lendo um livro grande assim colorido,

então eu ia lá e “fulano, o que é isso? A é um livro, eu to lendo um livro de RPG aqui” e aí

eu fui dar uma aula de Idade Média e quando eu fui dar essa aula, o menino sabia tudo,

tudo assim: “oh professor era isso e aquilo e tudo mais camponeses, senhor feudal”, ele

conseguiu contextualizar toda a Idade Média e eu falei assim, quando você estudou isso,

como você fez isso e tal? Não, é o livro colorido que estou lendo aqui e ele foi me mostrar,

na época que era um livro de RPG mas sobre Idade Média, foi aí que ele me chamou

103

muita atenção, aí eu marquei com ele e mais alguns colegas para ele me ensinar o jogo,

ele foi e me ensinou a mim e a alguns colegas, perguntei quem tinha interesse, na época

por Idade Média e aí eu sugeri a ele que fizesse sobre Revolução Inglesa, ai ele topou,

achou que ia ser bacana, ai nos fizemos a ficha e montamos o joguinho para poder aplicar

em sala de aula.

... Porque assim, eu não trabalho com isso especificadamente, “o RPG” foi uma

experiência que eu passei assim, que na verdade, veio dos alunos até mim, e eu achei que

era legal, achei isso interessante para o professor, ver o que a moçada esta fazendo, para

a gente ver a importância disso e como se reflete na educação, e foi quando fiz da

revolução inglesa e montei com eles as fichinhas.

Eu foquei muito a questão de história para construir os personagens, então achei que o

que os meninos estavam fazendo com a idade média, do RPG, era uma coisa que eu

podia fazer trabalhando com as histórias das mentalidades, pois eu vi que tinha

caracterização de cada grupo, cada personagem, então pensei que daria um teatro. Então

até esta aqui na ficha, o rei, o nobre feudal, o profeta, o camponês então eles colocaram as

características nas fichas, dos atributos físicos, sociais e mentais que na época eu lembro

que eles me ensinaram a montar para fazer a fichinha. E tudo foi muito interessante, eu

acho que foi o caminho contrario, normalmente os professores chegam e propõem para os

alunos aceitarem a metodologia, e eu aqui nesse caso, inverti o papel, os alunos que

tinham a metodologia e me ensinaram o que eles queriam fazer, com aquele grupo que

gostava de jogar RPG.

A sala que você aplicou, era uma sala de quantos alunos?

É uma sala de 40 alunos, mas quem de fato trabalhou, foi o colega que tinha os livros de

RPG Role Playing Idade Média, que orientou a gente, ai eu perguntei na sala e tivemos

uns 6 a 7 alunos que interessaram, por incrível que pareça eram todos meninos. E ai foi

que nos encontramos para fazer o joguinho do RPG, eu trabalhei com 7 alunos, com um

grupo não com toda sala, depois foi apresentado para toda a sala.

104

E o que aconteceu quando foi apresentado para toda sala?

Na época foram dois horários, fizemos o jogo e os meninos foram acompanhando, não foi

ruim não, tiveram alunos que participaram, foram acompanhando os personagens, na

época dividi a sala, peguei a turma e dividi em cada componente do grupo para

acompanhar o jogo.

No caso, você dividiu esse jogo com outros docentes? A realização desse jogo

melhorou sua relação com seus alunos, digo em caráter interpessoal?

Melhorou, eu senti assim, o jogo me levou a encontrá-los depois da escola, e senti que

principalmente o aluno que tinha lá o livro do RPG em feudalismo, ele se sentiu o máximo

porque estava ensinando a professora, e realmente ele estava fazendo isso, porque disse

“oh, você que vai conduzir o trabalho aqui pra gente” e ai eu senti que ele teve uma maior

participação na minha aula, eu lembro que a relação foi melhor, que ele deu um salto

qualitativo.

Qual era a idade dele nesta série?

Era 8ª série, ele devia ter uns 12 anos.

Como educadora, o que você pode observar nesta metodologia, quando realizamos

pesquisas aprofundadas sobre RPG falamos de características comuns como

ludicidade, expressão, mas na sua percepção nesta experiência o que vale ressaltar

do que foi trabalhado com os alunos em diferencial da aula expositiva?

105

Eu senti muito,... esse artigo foi uma surpresa, mais uma metodologia, eu conhecia

teatrinho, eu já tinha brincado, mas a minha geração não teve o RPG, chance de ver o

jogo, então foi muito novo pra mim como professora, e eu ficava me questionando porque

o povo fala que é um jogo assassino? Aí eu fui entender, que tem alguns grupos que

encenam, fazem teatro do jogo, representam o jogo teatralmente, é isso não é?

106

O RPG tem várias ramificações, uma delas é o live action ou hoje em dia descrito

como LARP (Live Action Role Playing) que é um jogo mais restrito como uma festa a

fantasia, mas isso não tem ligação nenhum com quaisquer noticias de violência,

todos os jogos são mediados, mas dentro das ramificações tem o RPG como

ferramenta pedagógica e linha de pesquisa, ao qual você experimentou, mesmo sem

saber que existia essas variedades.

O que me chamou atenção para o jogo, além do relacionamento com a turma, que claro

melhora, aqueles sete aluninhos, além deles me ajudarem e melhoramos o relacionamento

interpessoal eles também se tornaram lideres da turma, o que me chamou atenção no jogo

é que ao construir personagens ele coloca atributos, é uma coisa que eu vejo muito nesta

nova geração como Harry Potter, esses personagens construídos... Essa tarefa de

construir personagens é muito complexa, pois ele tem qualidades e defeitos, pois ele não é

bom em tudo, e para mim isso foi bacana, foi um achado, uma surpresa encontrar isso,

que eles vivenciam... As pessoas têm carisma, elas mentem, estava tudo ali presente no

jogo... Você trás humanidade para um personagem, eu achei que foi legal e me

surpreendeu, porque começamos a trabalhar filosofia, são valores.

Eu me lembro que quando estavam construindo esse personagem o camponês, eles

diziam “esse aí é camponês ele não pode ser muito inteligente, ele só tem força física” e aí

começou uma discussão, mas ai ele é burro? Mas ele sabe escrever? Aí pensei: - Isso leva

para o campo da filosofia e da ética, de entender um pouco dos nossos preconceitos

quando se constroem esses personagens, porque estamos atribuindo para um

personagem lá do passado, uma coisa que a gente sabe que existe hoje... O camponês

não sabe escrever então ele é burro, ele tem que ter força física porque ele é camponês...

E eu fiquei assistindo isso tudo, porque foi uma experiência nova para mim...

107

Você falou que trabalhou história, mas também apareceu filosofia e ética, você

percebe que essa ferramenta pedagógica é por natureza multidisciplinar?

Eu entendo que sim, porque você navega em vários campos, eu dei mais ênfase na

história no livro ética do antigo regime, mas ao me deparar com essa relação de condutas,

eu vejo como campo da filosofia, mas ao mesmo tempo está lidando com a literatura, pois

esse negócio de construir personagens e contar histórias está muito no campo da

literatura, essa interface passado e presente, eu acredito que sim que é uma ferramenta

interdisciplinar.

Eu quero especificar a seguinte pergunta, a relação do aluno com você melhorou a

relação sua com o aluno também, agora a sua percepção e interpretação sobre o

conteúdo da revolução inglesa sofreu alguma transformação, pois aplicando essa

ferramenta tem múltiplos olhares, como você começou a enxergar a revolução

inglesa depois desta experiência?

Na verdade, eu também não pesquiso revolução inglesa... Sou professora há muitos anos,

inicialmente com ensino infantil trabalhei muito com dinâmica, jogos. Eu sempre fui a

professora das dinâmicas, eu acho que levei um pouco disso para a faculdade de História,

que era muito teoria. (...) O que melhorou pra mim, eu não simplesmente li autores do

ensino superior, mas eu vi de fato como isso pode existir lá no ensino médio onde nós

trabalhamos.

c) TEMPO, APLICAÇÕES E EXPERIÊNCIAS.

Jogador-professor - Bacharel em Direito e História

No caso você faz essas aplicações há quantos anos?

108

A primeira vez foi em 99, em uma turma de primeiro colegial, que foi sobre cruzadas, foi

em 1999

E vem de 99 até hoje?

Até hoje, hoje são mais espaçadas, não consegui aplicar em todas as turmas, em todas as

series, 1°, 2° e 3° colegial, normalmente aplico em uma por ano, no caso ou no 1°, ou no

2° ou no 3°.

Porque não aplicar em todos?

O conteúdo programático que nos é imposto, por uma questão de cumprir conteúdo para

ENEM, outros limita o nosso tempo e hoje a disciplina conta com o que? Duas horas aula,

cinquenta minutos cada uma, e você tem no primeiro colegial que transitar da idade média

e vai até a idade moderna, então você vai de 400 até 1800, você tem que dar 1400 anos

de história olhando geral Brasil e Américas. Aí você pega, por exemplo, na parte de

segundo colegial você tem que fazer da idade moderna até a contemporânea, até o século

XX, depois você chega ao terceiro colegial você tem que terminar a contemporânea e fazer

o resgate da matéria do primeiro e segundo colegial.

Professor-jogador - Bacharel em Direito, História e doutora em História

Como ficou a sua relação com o conteúdo específico que trabalhou com eles,

porque o professor tende a fazer o plano de aula e repetidamente ano após ano

usando a mesma forma, agora como ficou a sua relação com o conteúdo?

Ficou engraçado, o que me motivou a esse trabalho foi o aluno que era terrível, porque ele

era um aluno relapso, ele não fazia nada, ele não era indisciplinado ele era apático. E ele

lendo alguma coisa, pensei, deve ser algo muito interessante para esse aluno estar lendo,

porque se ele esta lendo ele tem vontade, o que ele esta lendo? Então eu sinto que foi

uma melhora dele como pessoa, porque isso o socializou muito com a turma, foi um salto,

109

começamos em maio, em junho o aluno melhorou muito nas minhas aulas e alavancou ele

socialmente para dentro da turma, pelo fato de eu reconhecer ele. No meu caso, trabalhei

esse ano com esse jogo, no outro ano que fui trabalhar revolução inglesa, acho que por

questão de tempo, trabalhei com um filme, e não voltei a trabalhar com RPG, porque o que

me chamou atenção foi esse aluno, que era apático e o grande conhecimento que ele tinha

sobre idade média para um aluno de 8° série. E...

E não sentiu a necessidade?

Não é que eu não vi necessidade, eu não me motivei, até difícil de explicar, foi uma

experiência que eu tive, eu estava na segunda graduação, isso também me motivou, para

compartilhar na faculdade, na época estávamos estudando revolução inglesa, que é um

assunto que nem se comenta direito na escola, aí pensei que o jogo seria uma ótima

maneira de trabalhar isso, mas foi um momento, estava focada em outras coisas da minha

pesquisa... “se você pedir minha análise hoje olhando 10 anos depois, eu acho que foi um

dos primeiros momentos que eu como professora, abandonei métodos e técnicas

conhecidas e me deixei guiar pelos alunos, e deixei um aluno, um grupo, me mostrar uma

técnica que é importante para a geração deles, que é uma coisa que vem de uma grupo

mais jovem, que não me pertence, que estava ali aprendendo, fiquei muito insegura... eu

não sei nada de RPG, o que eu sei foi essa experiência”.

A sua experiência foi em que ano?

Acho que eu anotei aqui, essa experiência foi 2001, agora você me fez lembrar uma coisa

importante eu apliquei com os meninos, eu acho que em 2001, e depois em 2003 quando

teve um encontro de história, eu fui com uns colegas em uma escola estadual e a gente

tentou aplicar isso aqui lá, mas eu me lembro que dessa vez não foi bacana. Porque na

época os professores nos deram duas turmas foram uns oitenta meninos, e nós não

conseguimos fazer o trabalho. Porque fui eu e dois ou três outros colegas professores do

curso de história, e eu lembro que o meu sentimento nesta outra experiência, era aplicar a

mesma coisa que foi feito em uma escola na outra, eu não consegui. Eu não tive apoio, os

110

professores das duas turmas sumiram, nos deixando com 80 meninos em uma quadra,

para dividir os grupinhos, ai a coisa não funcionou, talvez pela quantidade de alunos e a

circunstância da época. Eu achei que faltou apoio neste dia.

E você acha que as suas dificuldades em aplicar em outro ambiente em 2003 foram

realmente por falta de apoio de outros docentes ou por falta de preparo e

experiência?

Não, eu acho que foi... É que nos tínhamos que explicar primeiro o jogo para os meninos, e

depois formar os grupos para jogar, e eu acho que o que fracassou foi levar duas turmas

de quase oitenta alunos para o mesmo espaço isso não permite o diálogo, ficou muita

conversa muita bagunça, não tinha microfone, e se já tem uma falha nesta comunicação

inicial aí acabou, não vai dar certo daí pra frente (...) “eu me lembrei agora dessa

experiência foi frustrante conversei e depois avaliei com os colegas, e a relação do aluno

de escola pública com o docente é diferente, então professor novato que vem para aplicar

algo novo, não existe um vínculo, então tem uma certa resistência por parte dos alunos, na

época pensei: abandonaram a gente aqui, foram fazer outra coisa, se vira com esses

meninos, e os colegas também compartilharam esse sentimento, e nos não conhecíamos a

turma e o que faz a educação funcionar se não a relação entre o professor e aluno, eu

conhecia meus alunos e os chamava pelo nome, agora quando se pega um grupo de

oitava serie onde você não conhece ninguém, não sabíamos como chamar atenção, faltou

preparo sim. Eu acho que duas turmas juntas foi algo absurdo”.

d) MATERIAL DE RPG E EDUCAÇÃO

Jogador-professor - Bacharel em Direito e História

Só para concluir, você já teve acesso a algum material de RPG aplicado a educação

de teóricos, pesquisadores, pessoas que trabalham já nessa linha? Ou você só usa

o material base de RPG que trás com sua experiência?

111

Eu tenho no caso, assim, alguns fascículos antigos de uma tentativa brasileira que foi o

sistema Gurps.

O mini-gurps?

O mini-gurps, que usava eventos da história eu tenho eles ainda mas basicamente eu uso

o que, meu conhecimento de RPG a minha experiência em lidar já, como mestre, como

jogador porque há realmente uma ausência, existe essa lacuna de material didático

vinculado ao RPG não houve desenvolvimento deste material.

Professor-jogador - Bacharel em Direito, História e doutora em História

Você encontrou algum livro de RPG específico criado por professores, ensinando

como trabalhar em sala de aula? Ou você utilizou apelas os livros convencionais de

jogo?

Não, eu só usei esses livros que o aluno tinha sobre Idade Média e trabalhei com os livros

e a temática da revolução inglesa eu não fui para esse lado, eu vi um artigo muito tempo

depois, não me lembro se foi na teve, que tinha como jogar o RPG, mais foi uns cinco ou

seis anos depois, muito tempo depois. (...) Entendo, nosso grupo era bem amador porque

nos não tínhamos leitura sobre o RPG, acho que nosso erro principal foi partir da ficha e

não do jogo. (...) “E quando eu queria ler mais coisas sobre o assunto, eu não encontrava,

não tinha nada”.

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