da escola pÚblica paranaense 2009 · projeto político pedagógico no colégio estadual nossa...

37
O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 Produção Didático-Pedagógica Versão Online ISBN 978-85-8015-053-7 Cadernos PDE VOLUME I I

Upload: lynga

Post on 14-Feb-2019

213 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE

2009

Produção Didático-Pedagógica

Versão Online ISBN 978-85-8015-053-7Cadernos PDE

VOLU

ME I

I

SECRETARIA DE ESTADO DE EDUCAÇÃO DO PARANÁ

SUPERINTENDÊNCIA DE EDUCAÇÃO

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE PONTA GROSSA

PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL - PDE

GEANE APARECIDA ANDRADE

A CONSTRUÇÃO DO PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO NA ESCOLA: ABORDANDO A PROBLEMÁTICA DO FRACASSO ESCOLAR NA 5ª SÉRIE

DO ENSINO FUNDAMENTAL

PONTA GROSSA 2009

2

SECRETARIA DE ESTADO DE EDUCAÇÃO DO PARANÁ

SUPERINTENDÊNCIA DE EDUCAÇÃO

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE PONTA GROSSA

PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL - PDE

CADERNO TEMÁTICO

A CONSTRUÇÃO DO PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO NA ESCOLA: ABORDANDO A PROBLEMÁTICA DO FRACASSO ESCOLAR NA 5ª SÉRIE

DO ENSINO FUNDAMENTAL

PONTA GROSSA 2009

3

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO..................................................................................................04 UNIDADE 1: O PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO E A ARTICULAÇÃO COM A PRÁTICA PEDAGÓGICA.................................................................... 07 UNIDADE 2: A TRANSIÇÃO DA 4ª PARA A 5ª SÉRIE DO ENSINO FUNDAMENTAL, UM RITUAL DA PASSAGEM ............................................ 12 UNIDADE 3: FRACASSO ESCOLAR: CAUSAS, CONSEQÜÊNCIAS E POSSIBILIDADES........................................................................................... 19 UNIDADE 4: O PAPEL DO PROFESSOR E A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO DOCENTE.................................................................................. 24 REFERÊNCIAS.............................................................................................. 34

4

INTRODUÇÃO

Este caderno temático é resultado de um trabalho iniciado em

2009, enquanto integrante do Programa de Desenvolvimento Educacional da

SEED/PR – PDE, cuja participação nas atividades programadas no decorrer do

1º e 2º períodos, subsidiou a organização, distribuição e controle do

tempo/espaço para a constante ampliação de estudos para aprofundamento

teórico-científico, do tema apresentado a seguir.

A elaboração deste material constitui-se do resultado de estudos

a respeito da temática que envolve a elaboração, efetivação e avaliação do

Projeto Político Pedagógico no Colégio Estadual Nossa Senhora da Glória –

Ensino Fundamental e Médio. O Projeto Pedagógico tem que estar amparado

em uma construção sólida, na qual deve existir a formação e o

aperfeiçoamento constante de seus participantes, cabendo aos educadores a

reestruturação da proposta pedagógica, pensando não somente no ideal, mas

principalmente na realidade que se coloca a cada dia e nos problemas que a

escola enfrenta.

Pautada somente em teoria, a proposta não alcança a meta de refletir

sobre as reais dificuldades no seu âmbito escolar, que seriam ajustes

imprescindíveis para um clima de aprendizagem favorecedor ao sucesso

daqueles para os quais a escola existe. Deste modo, buscou-se compreender

os fatores que intervém e dificultam a elaboração coletiva e orgânica do projeto

da escola, com ênfase à problemática que envolve os alunos ingressantes na

5ª série. Os alunos, professores e pais serão o público alvo desse trabalho, que

se fará realizar através de encontros em reuniões pedagógicas, encontros de

conselho de classe, encontros em hora atividade previamente agendadas com

os professores, questionários para os pais e alunos em reuniões.

Os conteúdos indicados para a análise e reflexão, estão sendo

apresentados nesse caderno em quatro unidades, sendo a primeira intitulada

“O Projeto Político Pedagógico e a articulação com a prática pedagógica”, que

trata da importância da elaboração, das finalidades, objetivos, avaliação e

chama a responsabilidade todos os envolvidos no processo ensino-

5

aprendizagem. Neste contexto, busca-se analisar a relação do Projeto

Pedagógico com a autonomia e a gestão democrática da escola pública.

Na segunda unidade destaca-se o tema “A transição da 4ª para a 5ª

série do Ensino Fundamental, um ritual de passagem”, o qual discute a

responsabilidade de todos os envolvidos no processo de escolarização quanto

à temática da reprovação, evasão e por conseqüência o insucesso dos alunos

ingressos na 5ª série, buscando compreender as causas do fracasso escolar

sem a intenção de apontar apenas um culpado, mas sim com a

responsabilidade de perceber que a escola é parte integrante de um sistema

educacional.

Na terceira unidade que se intitula “Fracasso escolar: causas,

conseqüências e possibilidades”, é chamada a discussão da responsabilidade

de um ambiente escolar favorável para o desempenho dos alunos e que noção

de exclusão escolar ou fracasso escolar, desdobra-se em exclusão da escola,

representada pelo não-acesso à escola e pela evasão; e a exclusão na escola

provocada pelos mecanismos de reprovação e repetência.

Na quarta e última unidade que tem como tema “O papel do Professor

e a organização do trabalho docente”, o qual trata do papel do professor nesta

sociedade capitalista em que vivemos, passa por uma mudança bastante

complexa, pois além de ser agente de inovações, para atender os novos

paradigmas educacionais, com a inserção da tecnologia nos ambientes

escolares, deve estimular a aprendizagem dos alunos, sem esquecer-se de

que é um agente da memória e dos valores, uma vez que traz como

responsabilidade a aquisição e transmissão dos conhecimentos acumulados

pela humanidade, da cultura e também dos valores, uma vez que sua ação

influencia o modo de ser e agir de seus alunos.

Considerando o projeto político pedagógica da escola – PPP – como

processo e materialização documental das concepções, compromissos e

decisões coletivas, como instância aglutinadora de valores, conhecimentos e,

essencialmente ações, entendemos que os desafios que se apresentam ao

aproveitamento escolar, em especial de alunos que ingressam no segundo

segmento do ensino fundamental (na 5ª série), devem consistir-se num dos

grandes temas e eixos de reflexão da comunidade escolar a ser

sistematicamente tratado e enfrentado no âmbito do projeto da escola.

6

Tendo, por outro lado, a clareza de que toda proposta só se legitima e

concretiza mediante a participação (a qual traz a força para colocar o projeto

em ação), questionamo-nos sobre quais as ações e processos que se revelam

necessários a fim de sensibilizar a comunidade escolar para a reorganização

do projeto pedagógico da escola com vistas à inclusão da reflexão sobre o

fracasso escolar de alunos de 5ª série como temática premente.

Entendemos que há que se repensar a caminhada pedagógica da

escola, fazendo uma análise crítica das mazelas do ensino, tecendo assim

olhares para os problemas que a escola enfrenta, mas que, na maioria das

vezes, não elabora de modo lúcido e consciente.

7

UNIDADE 1

O PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO E A ARTICULAÇÃO COM A PRÁTICA PEDAGÓGICA

“Todo projeto supõe rupturas com o presente e promessas para o

futuro. Projetar significa tentar quebrar um estado confortável para arriscar-se, atravessar um período de instabilidade e buscar estabilidade em função da promessa que cada projeto contém de estado melhor do que o presente. Um projeto educativo pode ser tomado como promessa frente a determinadas rupturas. As promessas tornam visíveis os campos da ação possível, comprometendo seus atores e autores.”

Moacir Gadotti

A sociedade contemporânea tem passado por diversas transformações

de caráter político, cultural, social e econômico. É principalmente na escola

que essas transformações influenciaram, fazendo com que sejam repensadas

as questões referentes à maneira de educar e ensinar, pois segundo

Aristóteles, "o homem é um animal político", portanto, todas as suas ações se

dão de forma intencional e nas relações sociais.

Muitos são os conceitos e os possíveis fundamentos que caracterizam

a escola de hoje. Uma escola que sonha com sonhos possíveis, uma escola

que traça metas atingíveis, uma escola que está aberta, em busca de novos

autores e atores. Uma escola que busca o trabalho coletivo com a comunidade

escolar (pais, alunos, professores, funcionários, gestores), que luta pela

superação das dificuldades e dos conflitos.

A mediação existe não apenas na sala de aula, enquanto mediação

pedagógica, mas em todos os espaços de aprendizagem da/na escola. Pensar

no planejamento pedagógico da escola – Projeto político-pedagógico ou

proposta pedagógica – requer um trabalho coletivo, permanente, reflexivo com

toda a comunidade escolar e local. Não é apenas um momento de assegurar a

legislação vigente, mas, sobretudo, um momento privilegiado de construção,

organização, decisão.

Conforme Sousa (1998), o projeto político pedagógico deverá ser

construído com clareza no que se refere ao compromisso ético-pedagógico de

contribuir para a formação e educar o cidadão de hoje para se tornar crítico,

reflexivo e criativo. A abordagem do PPP fundamenta-se em alguns princípios

que norteiam a escola democrática, pública e gratuita: “igualdade” de

8

condições para acesso e permanência na escola; “qualidade” de ensino para

todos; “gestão democrática”, que inclui a ampla participação dos

representantes dos diferentes segmentos da escola nas decisões/ações

administrativo-pedagógicas. Pensar no processo de construção de um projeto

político-pedagógico requer uma reflexão inicial sobre seu significado e

importância. Para Machado e Silva (1998) a LDBEN ressalta a importância

desse instrumento em seus artigos:

No artigo 12, inciso I, que vem sendo chamado o “artigo da escola", a Lei dá aos estabelecimentos de ensino a incumbência de elaborar e executar sua proposta pedagógica. O artigo 12, inciso VII define como incumbência da escola informar os pais e responsáveis sobre a freqüência e o rendimento dos alunos, bem como sobre a execução de sua proposta pedagógica. No artigo 13, chamado o “artigo dos professores”, aparecem como incumbências desse segmento, entre outras, as de participar da elaboração da proposta pedagógica do estabelecimento de ensino (Inciso I) e elaborar e cumprir plano de trabalho, segundo a proposta pedagógica do estabelecimento de ensino (Inciso II). No artigo 14, em que são definidos os princípios da gestão democrática, o primeiro deles é a participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola.

Neste contexto, busca-se desvendar a relação entre o Projeto Político

Pedagógico e a construção da autonomia da escola, fazendo um interposto

entre as duas categorias, pois uma é mais prática (PPP) e outra mais abstrata

(autonomia). O projeto pedagógico está marcado por um cenário de

diversidade, cada escola é resultado de um processo de desenvolvimento das

suas próprias contradições, não existem duas escolas iguais, por isso não deve

existir um padrão único que oriente a escolha do projeto da escola. Não

entendemos então uma escola sem autonomia para estabelecer, executar e

avaliar seu projeto.

A autonomia e a gestão democrática unem-se num só objetivo que é a

mudança da mentalidade de todos os membros da comunidade escolar,

deixando de lado o velho preconceito da escola pública como um aparelho de

Estado que visa só o burocrático e sim uma conquista da comunidade pelo

propósito coletivo vinculado à decisão da maioria, tomada pela maioria em

benefício da maioria. Pois segundo Dinair Leal da Hora (1994, p.49)

9

A gestão democrática em educação está intimamente articulada ao compromisso sociopolítico com os interesses reais e coletivos, de classe, dos trabalhadores, extrapolando as batalhas internas da educação institucionalizada, e sua solução está condicionada à questão da distribuição e apropriação da riqueza e dos benefícios que transcendem os limites da ação da escola.

Segundo a autora, a escola tem contribuição indispensável e

insubstituível, embora limitada, para dar a afirmação histórica à classe

trabalhadora, favorecendo a compreensão de mundo, de si mesmo, dos outros

e das relações sociais, imprescindíveis ao exercício concreto da cidadania.

Faz-se necessário criar um clima de confiança no interior das escolas,

pois as relações interpessoais são decisivas para o sucesso de todo o

processo de construção e reconstrução do projeto político pedagógico. Pelo

caráter democrático, o PPP tenta instaurar uma forma de organização do

trabalho pedagógico em dois níveis: o da escola como um todo e o da sala de

aula, associando-o com o contexto social. Portanto, para que se possa

construir o PPP, a escola deve ter autonomia e se basear em um referencial

que tenha uma teoria pedagógica compromissada em solucionar problemas

educacionais e de ensino. O mais importante, para que o PPP seja possível é

propiciar situações que permitam que os professores, a equipe escolar e os

funcionários aprendam a pensar e a realizar o fazer pedagógico de modo

coerente. Assim, a construção do PPP é a própria organização do trabalho

pedagógico da escola, que é tida como espaço social marcado pela

manifestação de práticas contraditórias (luta ou acomodação) de todos os

envolvidos.

Para Vasconcellos (1995):

Projeto Pedagógico [...] é um instrumento teórico-metodológico que visa ajudar a enfrentar os desafios do cotidiano da escola, só que de uma forma refletida, consciente, sistematizada, orgânica e, o que é essencial, participativa. É uma metodologia de trabalho que possibilita re-significar a ação de todos os agentes da instituição. (p.143)

Concorda-se com Vasconcellos, quando aponta que o projeto implica

em novas práticas, novos desejos, desde que tenha a participação de todos, o

que permitirá refletir sobre o que se faz em sala de aula e realizar as mudanças

10

consideradas pertinentes. Projetar, inovar, requer disponibilidade, desejo de

mudança. Reformular o Projeto Político-Pedagógico - PPP não significa

atualizá-lo de acordo com as novas teorias educacionais. Implica em rever a

sala de aula, as características dos educandos, a influência da sociedade que

vai além dos muros da escola de maneira a antecipar o futuro. Neste sentido,

torna-se fundamental ter clara a importância do P.P.P. como um documento

norteador das práticas e ações realizadas na instituição escolar, tendo em vista

que possui uma intencionalidade, tornando-se a identidade das instituições de

ensino.

Conforme afirma Veiga (2004, p.12) “Ao construirmos os projetos de

nossas escolas, planejamos o que temos intenção de fazer, de realizar.

Lançamo-nos para diante, com base no que temos, buscamos o possível”. O

projeto político pedagógico não deve ser entendido como um documento que

após sua construção seja arquivado ou encaminhado às autoridades, núcleos

de educação para cumprir as tarefas burocráticas, pois envolve os indivíduos

presentes no processo educativo, de modo que subsidia a organização do

trabalho pedagógico da escola.

Para Veiga (2004, p.13):

O projeto busca um rumo, uma direção. É uma ação intencional, com um sentido explícito, com um compromisso definido coletivamente. Por isso, todo projeto pedagógico da escola é, também, um projeto político por estar intimamente articulado ao compromisso sociopolítico com os interesses reais e coletivos da população majoritária. É político no sentido de compromisso com a formação do cidadão para um tipo de sociedade. Na dimensão pedagógica reside à possibilidade da efetivação da intencionalidade da escola, que é a formação do cidadão participativo, responsável, compromissado, crítico e criativo. Pedagógico, no sentido de definir as ações educativas e as características necessárias às escolas de cumprirem seus propósitos e sua intencionalidade.

Assim, o político e o pedagógico são indissociáveis, de maneira que o

projeto político-pedagógico deve ser considerado um processo constante de

discussão e reflexão dos problemas vivenciados pelas instituições de ensino,

além de possibilitar a busca de alternativas para efetivar a sua real intenção.

O PPP é a expressão da cultura da escola, pois expressa as crenças,

valores, significados, modos de pensar e agir das pessoas que participaram da

sua elaboração. Dessa forma, o projeto orienta a prática de produzir uma

11

realidade. Para tanto, é preciso primeiro conhecer essa realidade, em seguida

reflete-se sobre ela, para só depois planejar as ações para a construção da

realidade desejada. É imprescindível que, nessas ações, estejam

contempladas as metodologias mais adequadas para atender às necessidades

sociais e individuais dos educandos.

Segundo Vasconcellos (2002), algumas características do Projeto

político pedagógico precisam ser evidenciadas, tais como:

1º Estabelecer diretrizes básicas de organização e funcionamento da escola, integradas às normas comuns do sistema nacional e do sistema ou rede ao qual ela pertence. 2º Definir coletivamente objetivos e metas comuns à escola como um todo. 3º Estimular o sentido de responsabilidade e de comprometimento da escola na direção do seu próprio crescimento. 4º Reconhecer e expressar a identidade da escola de acordo com sua realidade, características próprias e necessidades locais. 5º Estabelecer princípios orientadores do trabalho do coletivo da escola. 6º Possibilitar ao coletivo escolar a tomada de consciência dos principais problemas da escola e das possibilidades de solução, definindo as responsabilidades coletivas e pessoais. 7º Definir o conteúdo do trabalho escolar, tendo em vista as Diretrizes Curriculares Nacionais para ensino, os Parâmetros Curriculares Nacionais, os princípios orientadores da Secretaria de Educação, a realidade da escola e as características do cidadão que se quer formar. 8º Dar unidade ao processo de ensino, integrando as ações desenvolvidas seja na sala de aula ou na escola como um todo, seja em suas relações com a comunidade. 9º Criar parâmetros de acompanhamento e de avaliação do trabalho escolar. 10º Definir, de forma racional, os recursos matérias e financeiros necessários ao desenvolvimento da proposta.

A partir dessas finalidades, é preciso destacar que o projeto político-

pedagógico extrapola a dimensão pedagógica, englobando também a gestão

financeira e administrativa, ou seja, os recursos necessários à sua

implementação e as formas de gerenciamento.

Resumindo, construir o projeto político-pedagógico significa enfrentar o

desafio da transformação global da escola, tanto na dimensão pedagógica,

administrativa, como na sua dimensão política.

12

UNIDADE 2 A TRANSIÇÃO DA 4ª PARA A 5ª SÉRIE DO ENSINO FUNDAMENTAL: UM RITUAL DA PASSAGEM

“A escolarização repousa basicamente sobre interações cotidianas entre professores e os alunos. Sem essas interações a escola não é nada mais do que uma concha vazia. Mas essas interações não acontecem de qualquer forma: ao contrário, elas formam raízes e se estruturam no âmbito do processo do trabalho escolar e, principalmente, do trabalho dos professores sobre os alunos.”

Maurice Tardif

A escola é o lugar da concepção, realização e avaliação do projeto

educativo, uma vez que organiza seu trabalho pedagógico baseando-se em

sua realidade. Sendo assim, o Projeto Político-Pedagógico (PPP) é construído

e vivenciado por todos os envolvidos com o processo educativo da escola, com

uma ação intencional e um compromisso definido coletivamente, o qual se

articula o compromisso sócio-político e define as ações educativas, pois reside

na possibilidade de se efetivar a intenção escolar: a formação do cidadão.

O PPP é um processo permanente de reflexão e discussão de

problemas escolares, na busca de alternativas viáveis à efetivação de sua

intencionalidade, propiciando a vivência democrática necessária para a

participação de todos os membros da comunidade escolar.

A qualidade do ensino-aprendizagem decorrente deste Projeto

possibilita o desenvolvimento de uma nova forma de pensar, falar, agir que não

permite ao poder se ocultar em lugar algum, mas que se explicita nas relações

entre sujeitos e os objetos de apropriação (bens materiais e culturais) como

uma possibilidade real de construção da dignidade do cidadão.

A passagem dos alunos para os anos finais do Ensino Fundamental

cerca a escola de preocupações, queremos evidenciar que a repetência nas 5ª

séries tem sido elevada, por isso está a exigir intervenções que objetivem

mudanças nesse quadro. Portanto, esse contexto constitui-se um dos cenários

do fracasso escolar já estudado e interpretado pela psicologia e a sociologia,

conforme apontamentos de pesquisas etnográficas que se voltam para o

interior da escola. Nessa perspectiva, destacam-se os estudos de Patto:

A luta pela melhoria da qualidade do ensino público, que passa pela

necessidade de diagnosticar suas condições de funcionamento, foi

retomada, portanto, em novas bases filosóficas, a partir da segunda

metade dos anos setenta. (PATTO, 1996, p.119)

13

Sendo assim, urge no interior da escola questões desafiadoras que

propiciam estudos sobre e na realidade escola, pensando assim, uma das

mazelas impostas pelo sistema está no fracasso escolar dos alunos egressos

da 4ª série e ingressos da 5ª série do ensino fundamental.

A transposição da quarta para a quinta série se constitui numa

passagem da permanência do aluno na escola, num momento onde muito se

tem falado sobre a importância da universalização da educação, apresentando-

se como momentos onde novos elementos complexificam as práticas

vivenciadas por alunos e professores. Entretanto, sabe-se que não basta

promover o acesso de todos à educação. É preciso que se dêem condições

para aqueles que nela se inseriram, permaneçam usufruindo de seus

ensinamentos.

A passagem da quarta para a quinta série é apresentada, por diversos

autores, como um período de transformações e desafios para o aluno. Entre

elas, ocorre a mudança de ambiente, pois o sistema adotado para o ensino

fundamental, onde suas série iniciais (1ª a 5ª) são de competência do

Município, enquanto as finais (6ª a 9ª) competem ao Estado, predispõe a essa

ruptura física.

No município de Ponta Grossa - Pr, as organizações das séries se

fazem da seguinte maneira: nas escolas municipais o primeiro segmento do

ensino fundamental divide-se em dois ciclos: primeiro ciclo de três anos,

segundo ciclo de dois anos, já nas escolas estaduais o segundo segmento do

ensino fundamental ainda se faz por série, exemplo: quinta série, sexta série,

sétima série e oitava série. Porém, não ocorre apenas uma mudança físico-

espacial.

Segundo Bossa (2000) a entrada para a quinta série, representa o

desejo de crescer, a conquista de nova identidade e promessa social, como

também, promove a dor que esse crescimento traz ao aluno. O novo espaço ao

qual a criança necessita se adaptar é um ambiente onde uma profusão de

emoções, movimentos, sons se misturam, constituindo uma vida escolar

diferente da anterior.

A passagem da quarta para a quinta série é apresentada pela literatura

como um momento de transições e adaptações difíceis para o aluno. Essa

passagem, fruto da sociedade moderna, assemelha-se aos ritos de passagem

14

indígenas, ou seja, às cerimônias que marcam a passagem de um indivíduo de

uma fase do ciclo para outra.

Com esses rituais, esta transposição pressupõe a aplicação de maus

tratos, traduzida pela impaciência de muitos professores com seus alunos, de

dor e, naturalmente, temor e ansiedade aos envolvidos. Desta forma, nesta

passagem manifestam-se práticas promotoras do desenvolvimento de aspectos

pessoais até então desconhecidos. Além disso, ocorre a necessidade de

rearranjar os componentes antigos, agora associados a elementos novos na

constituição de um novo contexto escolar, um novo período, “um momento de

dificuldades, não alegrias, e fragilidade no desempenho escolar” (Rangel,

2001). Isto faz necessária a percepção dos elementos aí articulados, para se

propor novas atitudes de professores e direção escolar, pautadas em um novo

olhar que considera a sensação descrita por alunos, professores e pais de que

algo diferente acontecerá a partir da quinta série.

Até o final da 4ª série, geralmente, o aluno recebe mais atenção do

professor, porém quando chega à 5ª série do Ensino Fundamental é diferente,

pois os professores não conseguem dar a mesma atenção para todos os

alunos, isso pelo fato deles ministrarem aulas em diferentes turmas e diferentes

séries.

Além disso, o fato de os alunos possuírem um professor para cada

disciplina também dificulta, a princípio, o relacionamento entre professores e

alunos. Além disso, muitas vezes, do meu ponto de vista, os alunos se sentem

um pouco perdidos, levando-os a se sentirem desmotivados e a deixar de dar

importância ao ensino – aprendizagem.

Segundo Dorneles (1999), a causa do fracasso escolar não é única,

nem é só referente ao professor, nem aos métodos de ensino, nem a escola e

nem ao Sistema. A má formação do professor tem grande importância neste

contexto, só que esta questão, não pode ser pensando de forma isolada, até

porque está mais do que na hora de renovarmos os instrumentos de reflexão e

principalmente, a reflexão sobre a ação no processo ensino-aprendizagem na

escola.

A formação do professor, não resta dúvida que é muito importante

neste contexto, só que devemos discutir, pois, nesta busca podem aparecer

novas saídas no sentido de poder superar as concepções mais antigas,

15

deixando de procurar culpados. E não pensar que o fracasso escolar é

causado por um único fator, quando sabemos que a maioria dos nossos

alunos são de famílias carentes de recursos econômicos e que na escola o

aluno não encontra um ambiente efetivo de amizade e de carinho, para que

possa ver na escola, sua segunda casa, o que lhe proporcionaria melhores

resultados na aprendizagem, por não se sentirem excluídos, nem

diferenciados.

O aluno de classe média, desde pequenos é familiarizado com

equipamentos que ajudam em seu desenvolvimento cognitivo e social,

influenciando na aprendizagem, jogos educativos, calculadoras, computadores,

vídeos-game, entre outros; enquanto a criança de classe menos favorecidas,

por não disporem destes equipamentos em casa, verem na escola este espaço

de socialização e aprendizado, quando na maioria das vezes tem suas

expectativas frustradas, por a escola não ser o que eles tanto esperavam e

sonhavam, pois, além do mais, a própria escola ainda rotula as crianças como

aluno que não aprende, que não quer nada, parecendo que ali não é um

ambiente de educação para todos e sim um ambiente para alunos ideais, o que

não existe na educação, todos os alunos, sem exceção, são ideais para

aprender, independente de qualquer que seja a situação, com atitudes deste

tipo, a escola faz o aluno pensar que ali não é um espaço para ele, se sentindo

num espaço que não lhe dar gosto ou prazer.

Perrenoud (2000), diz que é a própria organização escolar do trabalho

pedagógico que gera o fracasso escolar, isto significa que o aluno encontra na

escola um ambiente bem diferente do que esperava, por este motivo, acaba

sendo reprovado ou se evadindo.

O modo de conceber o significado do fracasso escolar está

intimamente ligado à concepção de vida e de vida escolar de quem se propõe a

analisá-lo e entendê-lo. Deve-se ter uma concepção que segue o caminho que

desnaturaliza o fracasso escolar, vendo-o como uma produção a serviço da

exclusão e injustiças sociais.

A produtividade da escola reside em produzir fracasso escolar, já que

o "sucesso" escolar não é para todos. Se tomarmos, porém, valores como

direitos humanos, igualdade, democracia, diríamos que a escola, por não tratar

ou não saber tratar seus usuários com igualdade, fracassa nos seus objetivos.

16

De um jeito ou de outro, o fracasso escolar não é intrínseco aos seus usuários

(discentes), mas diz respeito às relações sociais. Ou seja, diz respeito a como

a comunidade escolar se constitui e se relaciona entre si, com a sociedade

mais ampla e com o Estado. Assim, às relações de poder entre grupos sociais.

Talvez a priori seja difícil imaginar soluções ou ações a respeito da

relação aluno e escola em contraponto com o fracasso escolar; entretanto,

Machado e Souza (1997) falam de certas atitudes que podem ser tomadas

perante a escola, o aluno e a família. Sugerem que ao invés de perguntar à

mãe a respeito de um dia na rotina da criança, é preciso conhecer como a

professora entende o problema de seu aluno, dando informações sobre o

contexto de sala de aula.

A superação da produção social e um conhecimento mais consistente

da realidade sobre o fracasso escolar deve, necessariamente, ser resultado de

um trabalho, de um esforço interdisciplinar que aproxime cada vez mais o

mundo acadêmico e as redes de ensino na perspectiva de um duplo

enriquecimento. Só assim pode-se contribuir para que a escola exerça seu

papel de transmissora de conhecimento, sem esquecer que deve atuar com

sujeitos do conhecimento coerente com o objetivo de desenvolver cidadãos

críticos, capazes de construir uma sociedade democrática. Destacamos aqui a

importância da formação continuada dos professores, como direito que os

mesmos tem que participar de cursos e encontros que lhes dê a possibilidade

de constante interlocução com seus pares, nesse sentido, destacamos as

palavras de Patto:

Dada a necessidade que de modo geral os educadores manifestam de um real interlocutor, e dada a natureza complexa da interlocução que possibilita a mudança do esquema conceitual que serve de referência à ação, fica a questão de se definir a natureza deste “interlocutor qualificado” que venha a colaborar com grupos de educadores na superação da maneira irrefletida, estereotipada, preconceituosa, pragmática e sem perspectivas humano-genérica com que lidam com a tarefa de ensinar. Em termos muito gerais, diríamos que este profissional deve estar capacitado para uma escuta que, criticamente, informada, leve em conta as fantasias, as angústias e defesas que acompanham qualquer processo de mudança. (PATTO, 1996, p.351-352)

Dessa maneira, tenta-se superar o distanciamento existente entre

pesquisa e prática de formação docente, que venha permitir que o professor

17

perceba que além do envolvimento com as questões teóricas, suscitadas pela

sua prática é necessário momentos de formação em serviço.

Kramer (2001) colabora com este tema dizendo que não se pode

tornar a formação continuada dos professores como uma questão prodigiosa,

ou seja, aquela atitude capaz de solucionar todos os problemas sociais, a

pesquisadora destaca que:

Na base do processo de transformação está, inegavelmente, a reorganização do trabalho pedagógico nos diferentes níveis, o que depende de decisão política. Há que se ter em vista que a formação do professor que está em serviço é feita na escola e a ela devem estar voltada as demais instâncias, a fim de que fortaleçam os professores em termos teórico-práticos, possibilitando-lhes uma reflexão constante sobre sua atuação e os problemas enfrentados, e uma instrumentalização naqueles conhecimentos imprescindíveis ao redimensionamento de suas práticas. (KRAMER, 2001, p.81)

Angústias e medos que os alunos da quarta série constroem sobre a

quinta série se alteram no momento em que se dão conta de que poderão ser

encontradas várias maneiras de viver nessa nova realidade escolar. Para

muitos alunos não significa a ruptura, pois muitos aspectos permanecem os

mesmos e os que se modificam são vistos como normais para o processo

nesse momento da escolaridade. A avaliação é vista como o processo pelo

qual o professor identifica as necessidades da turma, pois na maioria dos

casos não é possível que o professor sente ao lado do aluno para verificar o

seu nível de aprendizagem. Enfim, a avaliação se faz presente em todo o

percurso escolar apresentando-se de diversas formas, no entanto, a criança, o

adolescente e o adulto, na maioria dos casos não conseguem compreender o

processo de avaliação pelo qual são avaliados, pois os critérios utilizados não

possuem clareza, dando-se ênfase ao erro, como esclarece Luckesi em sua

afirmação:

O que ocorre na prática da avaliação educacional é que dificilmente os professores definem com clareza, no ato do planejamento do ensino, qual padrão de qualidade que se espera da conduta do aluno, após ser submetido a uma determinada aprendizagem. E, então, torna-se muito ampla a gama de possibilidades de julgamento. Como não há um padrão de qualidade estabelecido com certa clareza, a variabilidade de julgamento se dá conforme o estado de humor de quem está julgando; e, desse modo, a prática de avaliação se torna arbitrária, podendo, conforme interesses, tomar caracteres mais ou menos rigorosos. (LUCKESI, 1995, p.66-80)

18

Mais uma vez constata-se a complexidade do ambiente escolar, pois

sua diversidade de autores e atores torna-se objeto de vários estudos e

constatações, trazendo sempre renovadas possibilidades de investigação e

análise, proporcionando um melhor entendimento das situações vivenciadas

em seu contexto.

19

UNIDADE 3

FRACASSO ESCOLAR: CAUSAS, CONSEQUÊNCIAS E POSSIBILIDADES

“O fato de que o aluno não mostrou nenhum sinal de progresso ontem ou hoje é absolutamente compatível com um possível progresso na semana ou semestre seguinte. As sementes de fato germinam lentamente. Os músculos demoram para enrijecer. Você conseguiu nadar logo em sua primeira aula de natação? Caso você não o tenha conseguido, isso significa que você nada aprendeu nessa aula?”

Gilbert Ryle

O fracasso escolar, apesar de ser um tema bastante abordado por

estudiosos, ainda continua sendo um dos grandes entraves para que o sistema

educacional brasileiro atinja seu objetivo de promover a universalização da

educação, permitindo que todas as pessoas tenham acesso ao conhecimento

acumulado pela humanidade, preparando-se para o exercício da cidadania,

objetivo este tão citado nas políticas educacionais, nas propostas de governo e

projeto político pedagógico de nossas escolas.

Quando se fala em fracasso escolar, precisa-se ter clareza de seu

significado, suas causas e as implicações que este problema traz para a vida

do educando. Buscando seu significado no dicionário Aurélio (1998)

encontramos a expressão “fracasso” definida como desgraça; desastre; perda;

mau êxito.

Ao aplicar-se tal conceito na área educacional, o fracasso escolar

pode ser entendido como o mau êxito do educando, representado pela

reprovação e evasão escolar, incluindo-se aí também a aprovação com baixo

índice de aprendizagem.

De acordo com PERRENOUD (2000, p.18) "normalmente, define-se o

fracasso escolar como a simples consequência de dificuldades de

aprendizagem e como a expressão de uma falta "objetiva" de conhecimentos e

competências".

Para o aluno, o fracasso escolar transmite a idéia de que ele é uma

pessoa fracassada, pelo fato de não adquirir os conhecimentos e habilidades

necessários para desenvolver-se de forma satisfatória na vida pessoal, social e

20

profissional, ou mesmo para prosseguir nos estudos. Esta concepção negativa

sobre seu desempenho escolar afetará sua auto-estima, fazendo-o perder a

confiança na busca de um futuro melhor, evadindo-se do ambiente escolar e

ingressando na vida profissional sem a devida qualificação, transformando-se

em mão-de-obra barata.

Analisando-se o atual contexto educacional, verifica-se que a

educação vem passando por grandes avanços, recebendo mais investimentos

e utilização de novas tecnologias, os quais têm como principal objetivo

promover a melhoria da qualidade de ensino ofertada; proporcionar a

democratização da educação através do aumento das vagas e da criação de

novas escolas; maior tempo de permanência do educando na escola através

da obrigatoriedade da educação básica, contemplados na Lei de Diretrizes e

Bases da Educação Nacional, a LDB 9394/ 96.

Observa-se também maiores investimentos na infra-estrutura das

escolas, com a implantação de laboratórios, incluindo os laboratórios de

informática, promovendo a inclusão digital dos educadores e educandos; a

criação de bibliotecas e ampliação do acervo bibliográfico para enriquecimento

dos conteúdos e busca de novos conhecimentos; bem como a adaptação de

escolas para atendimento de alunos com necessidades educacionais

especiais.

Outro aspecto que merece ser destacado é a grande preocupação

com a formação dos profissionais da educação, seja ela inicial ou continuada,

onde para atender esta demanda, vários cursos foram criados, seja na

modalidade presencial ou à distância, oferecendo oportunidades de uma

melhor preparação e aperfeiçoamento para os profissionais da educação.

Mas apesar de todos estes esforços, nosso sistema educacional ainda

se depara com o grande desafio a ser enfrentado, o fracasso escolar,

representado pela reprovação ou evasão dos educandos. Este problema é

responsável pelo insucesso de um grande número de alunos, os quais vão à

escola em busca de formação, para ter uma vida mais digna e que, por

diversos fatores, acabam sendo excluídos do direito a uma educação pública,

gratuita e de qualidade.

Apesar deste direito estar garantido pela LBD 9394/96, em seu artigo

3º, dentre os princípios da educação onde cita a “igualdade de condições para

21

o acesso e permanência na escola”, percebemos que ainda existem muitos

obstáculos para que esta realidade de fato se concretize.

Não se pode esquecer de que a escola está inserida numa sociedade

capitalista, que busca o lucro e o sucesso a qualquer custo, exigindo um perfil

determinado de profissional, com competência para atuar num mundo

competitivo e em constante mudança. Portanto, como parte dessa sociedade,

muitas vezes a escola também acaba reproduzindo essa desigualdade em

suas ações educativas, contribuindo para a seleção daqueles mais capacitados

para atuar nesta sociedade.

Para Meszáros (2005) a educação deve qualificar para a vida, e não

para o mercado, como está impregnada na ideologia capitalista, como

mercadoria, um negócio. Para ele, a crise educacional não resulta apenas da

modificação política dos processos educacionais, mas da reprodução da

estrutura dos valores que perpetuam a ideologia da sociedade mercantil.

A escola precisa ter muita clareza de sua função, seu papel de

formação de sujeitos para a transformação social, não tornando-se apenas

uma mera formadora da mão-de-obra para o mercado de trabalho, colaborando

para a manutenção dos interesses das classe dominantes, mas sim formar

sujeitos conhecedores de seus direitos e deveres, capazes de contribuir para a

mudança social.

Para Nosella (2006)

Uma proposta educacional que contemple a formação dos trabalhadores e que possa acenar para a superação do fracasso escolar dos filhos destes seria, uma escola desinteressada, no sentido de não ser atrelada à formação de mão-de-obra para atender às necessidades do modo de produção capitalista, mas de formação plena do sujeito, “onilateral”, “uma instrução intelectual, física e tecnológica para todos [...] pública e gratuita [...] de união do ensino com a produção [...] livre de interferências políticas e ideológicas. (MARX apud MANACORDA, 2006)

Quando ouvimos falar em fracasso escolar, é comum atribuir a culpa

deste problema ao aluno que é indisciplinado, que não tem interesse ou a

família que não acompanha o desempenho de seus filhos e nem participa da

escola.

Porém, Patto (1999) aponta para a necessidade de se quebrar o estigma

de que o fracasso é culpa do aluno ou de sua família e alerta para a proporção

22

muito maior dos determinantes institucionais e sociais na produção do fracasso

escolar do que problemas emocionais, orgânicos e neurológicos, rompendo,

portanto, com as visões psicologizantes, da carência cultural e das dificuldades

de aprendizagem.

É fundamental perceber que o processo educativo é muito amplo,

envolvendo muitos aspectos que interferem no processo ensino-aprendizagem

e que merecem ser analisados como a realidade onde a escola está inserida,

sua organização escolar, o currículo escolar, a realidade do contexto familiar e

social dos educandos, a formação dos professores, a relação professor-aluno,

as metodologias utilizadas em sala de aula e os critérios de avaliação

adotados.

Para Ferraro (1999), a noção de exclusão escolar ou fracasso escolar,

desdobra-se em exclusão da escola, representada pelo não-acesso à escola e

pela evasão; e a exclusão na escola provocada pelos mecanismos de

reprovação e repetência.

O fracasso escolar representa, portanto, um fenômeno muito complexo,

que precisa envolver todos aqueles que são responsáveis pela educação, na

busca de soluções coletivas para o enfrentamento desta realidade.

Segundo Patto (1999, p. 69):

a superação desse desafio, o Fracasso Escolar, passa por um aprofundamento maior nas discussões coletivas desse tema a nível institucional, procurando identificar os condicionantes na comunidade escolar, as possibilidades de superação e o planejamento de ações, objetivando a construção do sucesso escolar nesta comunidade.

Para Cordié (1996) “o sistema escolar ampliou o número de vagas, mas

não desenvolveu uma ação que o tornasse eficiente e garantisse o

cumprimento daquilo que se propõe, ou seja, desse acesso à cidadania”.

Contudo, para se garantir o acesso e a permanência com sucesso do

aluno na escola, não basta apenas o aumento do número de vagas ou a

construção de novas escolas, mas sim a implementação de novas políticas

educacionais que venham atender de fato às necessidades e anseios da

população escolar e o comprometimento maior de toda a sociedade,

principalmente daqueles que atuam diretamente nas escolas, assumindo o

papel de verdadeiro educador, conhecedor de sua realidade e conscientes de

sua função de formador de cidadãos.

23

Sabendo-se que a escola não é a única instituição social responsável

pela educação das novas gerações, é necessário que haja a cooperação maior

da sociedade como um todo, pois não basta apenas conhecer as causas e

buscar os culpados pelo fracasso escolar.

Para Thomas (2000, p. 86), "há sempre um bode expiatório para o

problema do fracasso escolar: a família, o professor da série anterior, o

governo, a miséria, o desemprego, a fome, a desnutrição, os problemas de

saúde, a promoção automática".

Uma vez, detectado o problema, precisamos usar novas alternativas que

permitam ao educando a superação das dificuldades e obstáculos que o

impedem permanecer na escola, podendo desta forma concluir sua

escolarização de maneira que ela venha contribuir para sua formação pessoal

e profissional.

Tendo como função social a formação integral do educando, tornando-

o um cidadão que venha a colaborar com a transformação social, e tendo como

objetivo o processo ensino-aprendizagem, a escola não pode ser apenas mais

uma instituição que venha a contribuir para a reprodução, exclusão e a

desigualdade social, mas sim que venha a contribuir com o desenvolvimento do

aluno enquanto cidadão e ser humano, respeitando as diferenças existentes,

devendo ser vista como espaço de prazer, de trocas, de experiências, onde se

aprende a viver e a conviver.

O ponto de partida para a resolução deste problema, consiste no

trabalho integrado dos profissionais da educação, com a realização de um

diagnóstico, procurando conhecer a realidade da escola e de seus alunos,

identificando os problemas e dificuldades vivenciadas, bem como respeitando

as diferenças individuais.

Partindo dos subsídios levantados, é imprescindível que a comunidade

escolar assuma novas posturas, como mudanças nas práticas pedagógicas

adotadas e a proposição de ações no Projeto Político Pedagógico, que

contemplem às necessidades destes alunos, envolvendo o coletivo da escola,

impedindo que os mesmos acabem por evadir-se da escola, deixando de

cumprir com sua função e contribuindo para a desigualdade social.

24

UNIDADE 4

O PAPEL DO PROFESSOR E A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO DOCENTE

"Dar aula não é nada simples. Talvez seja a atividade mais sofisticada que a espécie humana já concebeu."

Fernando Haddad

Devido às mudanças sofridas pela nossa sociedade, principalmente

provocadas pelo avanço tecnológico, torna-se necessário refletir e repensar

sobre o papel a ser desempenhado pelo professor, tendo em vista o

atendimento das novas exigências das políticas educacionais e o

enfrentamento dos novos desafios impostos pela sociedade capitalista, movida

pelo consumismo e pelo lucro, que muito vem influenciando o trabalho

educativo e a formação dos educandos.

Masetto (2003), afirma que: “o professor ao entrar na sala de aula para

ensinar uma disciplina não deixa de ser cidadão, alguém que faz parte de um

povo, de uma nação, que se encontra em um processo histórico e dialético,

participando da vida e da história de seu povo.” Partindo desta afirmação,

percebe-se a dimensão do trabalho do docente, tratando-se de um ato político.

O professor precisa compreender seu papel de formador de opiniões e para

isso precisa estar bem preparado, consciente de que seu trabalho pedagógico

será refletido na atuação das futuras gerações.

Sabe-se que os professores atualmente vêm enfrentando muitos

obstáculos no desempenho de seu trabalho em sala de aula, mas é nas mãos

destes profissionais que está o poder de provocar as mudanças, uma vez que

são eles os formadores dos novos cidadãos que irão atuar e dirigir nossa

sociedade, sendo também os responsáveis pela oferta de uma educação de

qualidade, mediante um trabalho comprometido com o desenvolvimento

integral do aluno.

Durante um longo período, o professor foi considerado o detentor do

saber, aquele que sabia tudo e tinha como função transmitir os conhecimentos

acumulados aos seus alunos, sem reflexão ou questionamentos. Sua função

25

resumia-se num mero transmissor de conhecimentos e colaborador para a

reprodução social, mediante a prática de uma educação conservadora.

Atualmente esta função sofreu grandes mudanças, pois o professor além

de transmitir o conhecimento, deve levar o aluno a refletir sobre os problemas

sociais, construir novos conhecimentos, expor suas opiniões, tornando-se

críticos frente à realidade em que vivem conhecedores das diversas

tecnologias, passando a ser sujeitos da história e não simplesmente agentes

passivos e acomodados, nesta sociedade desigual e injusta em que estão

inseridos.

O papel do professor nesta sociedade capitalista em que vivemos,

passa por uma mudança bastante complexa, pois além de ser agente de

inovações, para atender os novos paradigmas educacionais, com a inserção da

tecnologia nos ambientes escolares, deve estimular a aprendizagem dos

alunos, sem esquecer-se de que é um agente da memória e dos valores, uma

vez que traz como responsabilidade a aquisição e transmissão dos

conhecimentos acumulados pela humanidade, da cultura e também dos

valores, uma vez que sua ação influencia o modo de ser e agir de seus alunos.

Para Kenski (1999)

Em um mundo que muda rapidamente, o professor deve estar

preparado para auxiliar seus alunos a lidarem com estas inovações,

a analisarem situações complexas e inesperadas; a desenvolverem

suas criatividades; a utilizarem outros tipos de racionalidades: a

imaginação criadora, a sensibilidade táctil, visual e auditiva.

Para atender a todas estas exigências, faz-se necessário repensar a

formação inicial dos professores, de modo que, ao assumirem suas funções

docentes, tenham o conhecimento necessário de sua disciplina, domínio sobre

os conteúdos e estejam de fato preparados para resolver as situações que se

apresentam no cotidiano, pois tem-se observado um grande distanciamento

entre a formação inicial recebida e a prática escolar onde estes docentes irão

atuar. Faz-se fundamental também preparar o professor para participar

ativamente das decisões a serem tomadas na escola, seja na elaboração do

Projeto Político Pedagógico, da Proposta Curricular, do Regimento Interno, das

26

reuniões de Conselho de Classe e reuniões pedagógicas, com a finalidade de

tornar-se um sujeito comprometido com o trabalho educativo.

Segundo Enguita (1998), abordar a política de formação, tendo como

eixo o enfoque do desenvolvimento profissional docente, traz consigo o enorme

desafio de situar com clareza o papel dos professores na sociedade atual, que

demanda cada vez mais uma grande capacidade de adaptação, flexibilidade,

atualização de conhecimentos, frente às exigências da docência.

Merece destaque também a formação continuada para que este

professor venha a desempenhar suas funções de modo satisfatório,

atualizando seus conhecimentos, trocando experiências com outros

profissionais de sua área de atuação, as quais possam enriquecer seu trabalho

junto aos alunos, uma vez que vivendo na sociedade do conhecimento, onde

tudo muda com muita rapidez, o profissional da educação, responsável pela

formação das novas gerações, não podendo ficar alienado frente aos novos

desafios sociais impostos.

Para possibilitar o atendimento desta necessidade voltada para o

aperfeiçoamento dos profissionais da educação, várias oportunidades de

formação continuada vêm sendo proporcionadas, promovidas pelo MEC e pela

SEED (semanas pedagógicas, grupos de estudo, reuniões de planejamento,

NRE Itinerante e o próprio PDE - Plano de Desenvolvimento Educacional),

além de diversos cursos à distância ofertados pelas Universidades.

Fusari (1997) destaca que a formação continuada se desenvolve,

sobretudo no local de trabalho e a partir dele, tendo como eixo central a

reflexão crítica na experiência profissional. Mostra-se infinita como

possibilidade de crescimento pessoal e profissional.

Com relação a sua prática docente, para que venha a desenvolver um

trabalho de qualidade, existe também a necessidade do conhecimento da

realidade onde atua; os alunos com os quais vai desenvolver o trabalho

pedagógico; conhecimento de teorias que possam fundamentar sua forma de

ensinar; adoção de metodologias diferenciadas para atender às

particularidades e necessidades dos alunos, tendo em vista o processo de

inclusão; propondo situações desafiadoras tornando os conteúdos significativos

para os alunos; refletir sobre os métodos de avaliação, tendo clareza dos

objetivos a serem atingidos. Tudo isso, deve estar presente em seu plano de

27

trabalho docente e em consonância com o Projeto Político Pedagógico da

escola.

Segundo Freire (1998)

A educação constitui-se em um ato coletivo, solidário, uma troca de experiências, em que cada envolvido discute suas idéias e concepções. A dialogicidade constitui-se no princípio fundamental da relação entre educador e educando. O que importa é que os professores e os alunos se assumam epistemologicamente curiosos.

Desta forma, não se pode esquecer da importância do trabalho integrado

que deve existir na escola, uma vez que todos trabalham pelo mesmo objetivo,

que é a formação integral do educando, para ser um sujeito de transformação

social. Cabe destacar aqui também, a importância da relação professor-aluno

que deve ser mediada pelo diálogo, sem esquecer-se de que o ato educativo

constitui-se numa troca de experiências, permitindo desta forma que

professores e alunos aprendem juntos, onde a afetividade tem um importante

papel de aproximar os sujeitos, criando a empatia necessária para o

desenvolvimento da aprendizagem.

Outra preocupação do professor deve ser com a aprendizagem de seus

alunos, pois não basta simplesmente “dar suas aulas”, é necessário verificar se

o conteúdo trabalhado foi apreendido pelos alunos, caso contrário, deverá ser

retomado, através de diferentes metodologias para que o aluno consiga chegar

a aquisição do mesmo, pois a o respeito ao ritmo de aprendizagem de cada

sujeito deve ser leva em consideração.

Cabe neste momento o professor fazer uma breve reflexão sobre sua

prática pedagógica, como por exemplo: Será que meus alunos estão

aprendendo o que eu ensino? Será que a metodologia que utilizo está

atendendo as necessidades dos alunos? De que maneira eu trabalho com

alunos que apresentam mais dificuldade? Os critérios de avaliação que adoto

estão colaborando para a verificação da aprendizagem e replanejamento de

minhas atividades, possibilitando a permanência com sucesso do aluno?

Diante disto, percebe-se a importância do trabalho realizado pelo

professor, como agente transformador da sociedade, merecendo ser tratado

com mais dignidade e respeito, resgatando a valorização de suas funções,

através da melhoria de sua condição de trabalho e a remuneração digna. Mas

28

para que isso ocorra de fato, o professor precisa rever sua prática,

desenvolvendo um trabalho de qualidade, atualizando seus conhecimentos,

comprometendo-se com os objetivos da escola e com a formação do alunos,

contribuindo desta maneira para a melhoria da qualidade do processo ensino-

aprendizagem, rompendo com as desigualdades sociais.

Percebemos que para o estudo das práticas de organização e de gestão

da escola é indispensável a construção de uma escola democrática e

participativa, que prepare os alunos para a cidadania. Bem como as formas de

gestão e de tomada de decisões, as competências e procedimentos

necessários à participação eficaz na vida da escola, incluindo a elaboração,

execução e a avaliação do projeto pedagógico. Uma escola democrática não é

aquela em que todos fazem o que querem, mas sim aquela em que todos

fazem o que é bom para todos, gerindo democraticamente uma sala de aula e

criando condições de respeito mútuo de aprendizagem para todos os alunos,

respeitando-lhes as diferenças e trabalhando-as em benefícios deles mesmos.

Cabe a escola colocar ao alcance de todos o patrimônio cultural da

humanidade, que é o conhecimento, uma escola democrática inclusiva que se

proponha formar cidadãos críticos, honestos, competentes, lúcidos de seus

direitos e seus deveres.

Sendo o ensino a razão de um projeto pedagógico em qualquer nível de

escolaridade, a sua função pode estar subjacente á proposta de

desenvolvimento de habilidades mentais, uma diretriz que tem seu objetivo

principal ensinar o homem a pensar, utilizando suas capacidades próprias.

Porém, como vivenciar esse ensino em sala de aula preparando o jovem no

seu dia a dia para aprender a pensar? Como preparar o estudante a tomar

decisões, tornando-se responsável pelas suas ações e pelas implicações em

decorrências delas? Como aproveitar momentos formais de ensino para

servindo-se de bases científicas providenciar futuras descobertas? Todas

estas questões devem estar remoendo na cabeça do professor quando o

mesmo for planejar com seus pares o seu projeto de trabalho, seja anual,

bimestral, semanal ou diário. O professor ao viabilizar o processo de

construção do conhecimento para si e para o aluno, numa prática de

autogestão e autoformação propicia, em sala de aula um clima pedagógico de

aprendizagem.

29

Se os alunos são sujeitos do saber, também o são os professores. E,

assim como seus alunos, constroem e adquirem saberes em diversos espaços

e tempos, especialmente no trabalho ou em eu espaço diário com a família. E

quanto a isso é preciso que o professor incorpore a necessidade da mudança

prática docente, senão continuará repetindo aquilo que julga eficaz e suficiente

para aprendizagem dos alunos. A questão do diálogo, do clima de troca e a

cumplicidade se fazem importante numa escola democrática. Reconhecer os

docentes como sujeitos do processo de ensino-aprendizagem, como

educadores em toda a dimensão do termo, é essencial, deve-se levar em conta

os saberes docentes, a sua experiência, inserí-los mesmo na gestão político-

pedagógica da escola é vital para uma organização mais dinâmica, mais rica

do trabalho escolar. O ponto central do trabalho pedagógico é o conteúdo

escolar e a organização central para trabalha-los é a sala de aula. Cada

docente é responsável por um conteúdo ou disciplina e os espaços de

interação interdisciplinares são escassos e empobrecidos, as transformações

decorrentes dos esforços de construção de um Projeto Político Pedagógico

para cada estabelecimento de ensino, são já bastante significativos, mas a sala

de aula ainda é uma célula cuja organização interna ainda é muito dependente

da competência (ou incompetência) do professor.

Quando os professores se queixam das dificuldades encontradas na

recuperação de sua autoridade frente aos alunos, não o fazem sem razão:

ninguém, concordaria que se pode fazer educação sem um mínimo de ordem e

harmonia dentro da sala de aula. O desafio é restaurar a autoridade do

professor, sem que recorra a métodos autoritários de condução do ensino e

que se considere a necessidade de bem gerenciar todos os conflitos que estão

instalados em qualquer instância de exercício de poder.

Resta ao professor exercer a sua liderança de forma democrática como

acontece em uma escola que se pretende democrática também. A liderança

democrática implica negociação, acordo, estabelecimento coletivo de normas,

regras, padrões. Implica delegação de responsabilidades e atribuição de

tarefas. Uma boa maneira de fazer educação é teorizar sua prática para

embasá-la nos estudiosos que deixaram marcas notáveis num campo do

saber.

30

Um grande auxiliar do professor na criação deste ambiente rico –

desafiador, desencadeador de aprendizagem, são os métodos e técnicas de

ensino. Técnicas como a exposição dialogada, a demonstração, a observação,

a experimentação, a entrevista, as excursões, o trabalho em grupos

homogêneos ou diversificados, o seminário, o painel são algumas das

inúmeras técnicas que podem tornar a sala de aula mais atraente, auxiliando o

professor na tarefa de conseguir o engajamento dos alunos em atividades

educativas.

Segundo Anastasiou e Alves (2003)

A compreensão do que é ensinar é um elemento fundamental nesse processo. O verbo ensinar, do latim, insignare, significa marcar com um sinal, que deveria ser de vida, busca e despertar para o conhecimento. Na realidade da sala de aula, pode ocorrer a compreensão, ou não, do conteúdo pretendido, a adesão, ou não, a formas de pensamento mais evoluídas, a mobilização, ou não, para outras ações de estudo e de aprendizagem.

Nesse caso o aluno está sujeito a memorização do que o professor

ensinou e não realmente a aprendizagem, por isso surgiu o termo ensinagem,

que indica a prática social complexa efetivada entre os sujeitos, professor e

aluno, englobando tanto a ação de ensinar quanto a de aprender, em parceria

consciente para o enfrentamento na construção do conhecimento escolar,

decorrente de ações efetivadas dentro e fora da salade aula.

Para Nadal, 2007:

É necessário, portanto, que a função docente de ensinar seja considerada como uma atividade sistemática, flexível, organizada, metodologicamente planejada, para a qual a atuação postura dos profissionais são de grande importância, pois podem favorecer a aprendizagem, a participação e o crescimento do aluno.

A sociedade em crise busca hoje nos espaços educativos, a

possibilidade de formação de indivíduos com uma nova mentalidade, que

enxerguem novas pistas que conduzam à superação dos dilemas sociais e à

construção de uma nova forma de gerenciar os recursos naturais e históricos

da humanidade; uma forma mais adequada socialmente, menos predatória, e

mais solidária nas relações entre os indivíduos e com o planeta. Nessa

perspectiva, o currículo escolar busca as suas fontes de inspiração no saber e

nas necessidades do contexto social.

31

É função da escola, hoje, entre outras, apresentar ao aluno, com os

instrumentos de cada disciplina, as possibilidades de leitura das dimensões do

todo, integrando-as interdisciplinarmente, para uma visão de complexidade da

realidade. A necessária superação da visão fragmentada de conhecimento

pode viabilizar-se no currículo, integrando as disciplinas para a compreensão

da realidade em suas dimensões. O sistema, o todo, é mais do que a soma das

partes, pois emergem características não contidas nas partes isoladamente; a

visão sistêmica passa a ser o "que rejunta o todo e impulsiona a razão aberta,

pois conhecer é sempre rejuntar uma informação a seu contexto e ao conjunto

ao qual pertence" (MORIN, 1989, p. 33). Ética e cidadania, trabalho e

consumo, desigualdades sociais, educação sexual, educação para a saúde,

educação ambiental, informática, tecnologias são realidades do mundo atual,

entre outras, que a escola deve trabalhar, de forma integrada e interdisciplinar,

como ponto de partida para a compreensão da complexidade dos fenômenos

sociais em suas contradições. O seu tratamento no currículo pode viabilizar um

novo rosto aos conteúdos escolares, tendo em vista a formação para a

cidadania.

No exercício da função social da escola, cabe a construção de um

projeto político-pedagógico, expresso no desenvolvimento de um currículo que

ajude a compreender a complexidade dos fenômenos da realidade, articulando-

os ao todo social de que faz parte. A trajetória de transformação da escola

historicamente conservadora e racional para uma escola reflexiva e

emancipadora (ALARCÃO, 2001) é um processo de mudança continuado, em

construção, em conflito permanente com a ordem vigente. Exige esforço

contínuo, racional, ético, coletivo e solidário; uma demonstração de que a

prática pedagógica é, também, um campo aberto à formação e (re)construção

da cidadania.

No desenvolvimento do currículo, formar alunos reflexivos implica em

uma prática docente reflexiva, de que as instituições escolares são também

responsáveis, pois a construção do projeto político-pedagógico das escolas

exige uma permanente avaliação e formação.

Outro fator intervém a despeito das novas tecnologias, da modernização

dos currículos, da renovação das idéias pedagógicas, o trabalho dos

professores evolui lentamente porque depende pouco do progresso técnico,

32

porque a relação educativa obedece a uma trama bastante estável e porque as

condições de trabalho e sua cultura profissional instalam os professores em

rotinas. É por isso que a evolução dos problemas e dos contextos sociais não

se traduz ipso facto por uma evolução de práticas pedagógicas.

(PERRENOUD, 1999, p. 12)

Um professor reflexivo trabalha com e sobre o pensar da e na prática

pedagógica, em processo continuamente repensado e reconstruído. Ao

profissional de educação, é necessário dar-se tempo e oportunidade de

familiarização com os eixos de uma renovação curricular e com as novas

tecnologias educativas; possibilitar-lhe condições de reflexão sobre o tipo de

educação e de currículo a ser desenvolvido, em função universo social de

alunos e professores. Sempre que pensamos criticamente nossa ação

educativa, entramos também no domínio da ética, além do domínio das

dimensões da ciência, da técnica e da política. Questionamentos poderão ser

levantados, como por exemplo: por que trabalhamos a nossa prática

pedagógica desta ou daquela maneira? Por que trabalhar novos eixos

paradigmáticos? Em que medida esses eixos instigam a uma prática

pedagógica inclusiva? Por que trabalhar a complexidade de fenômenos sociais

no desenvolvimento do currículo?

Essa reflexão no coletivo da escola pode fazer a diferença em relação a

possibilidades de educar para um novo modo de pensar, de construir e de

acessar conhecimento numa sociedade tecnológica.

A avaliação é parte integrante do processo ensino/aprendizagem e

ganhou na atualidade espaço muito amplo nos processos de ensino, requer

preparo técnico e grande capacidade de observação dos profissionais

envolvidos.

Segundo Perrenoud (1999), a avaliação da aprendizagem, no novo

paradigma, é um processo mediador na construção do currículo e se encontra

intimamente relacionada à gestão da aprendizagem dos alunos. Na avaliação

da aprendizagem, o professor não deve permitir que os resultados das provas

periódicas, geralmente de caráter classificatório, sejam supervalorizados em

detrimento de suas observações diárias, de caráter diagnóstico.

O professor, que trabalha numa dinâmica interativa, tem noção, ao longo

de todo o ano, da participação e produtividade de cada aluno. É preciso deixar

33

claro que a prova é somente uma formalidade do sistema escolar. Como, em

geral, a avaliação formal é datada e obrigatória, deve-se ter inúmeros cuidados

em sua elaboração e aplicação. A avaliação, tal como concebida e vivenciada

na maioria das escolas brasileiras, tem se constituído no principal mecanismo

de sustentação da lógica de organização do trabalho escolar e, portanto,

legitimador do fracasso, ocupando mesmo o papel central nas relações que

estabelecem entre si os profissionais da educação, alunos e pais.

Os métodos de avaliação ocupam, sem duvida espaço relevante no

conjunto das práticas pedagógicas aplicadas ao processo de ensino e

aprendizagem. Avaliar, neste contexto, não se resume à mecânica do conceito

formal e estatístico; não é simplesmente atribuir notas, obrigatórias à decisão

de avanço ou retenção em determinadas disciplinas.

Para Oliveira (2003) devem representar as avaliações aqueles

instrumentos imprescindíveis à verificação do aprendizado efetivamente

realizado pelo aluno, ao mesmo tempo que forneçam subsídios ao trabalho

docente, direcionando o esforço empreendido no processo de ensino e

aprendizagem de forma a contemplar a melhor abordagem pedagógica e o

mais pertinente método didático adequado à disciplina, mas não somente à

medida que consideram igualmente, o contexto sócio-político no qual o grupo

está inserido e as condições individuais do aluno, sempre que possível.

A avaliação é a parte mais importante de todo o processo de ensino-

aprendizagem. Bevenutti (2002) diz que avaliar é mediar o processo

ensino/aprendizagem, é oferecer recuperação imediata, é promover cada ser

humano, é vibrar junto a cada aluno em seus lentos ou rápidos progressos.

Acreditamos que o grande desafio para construir novos caminhos, segundo

Ramos (2001), é uma avaliação com critérios de entendimento reflexivo,

conectado, compartilhado e autonomizador no processo ensino/aprendizagem.

Desta forma, estaremos formando cidadãos conscientes, críticos, criativos,

solidários e autônomos.

34

REFERÊNCIAS

ALARCÃO, Isabel. Escola reflexiva e nova racionalidade. Porto Alegre: Artmed, 2001. ANASTASIOU, Lea das Graças Camargo; ALVES, Leonir Pessate. Processos de ensinagem na universidade. Pressupostos para as estratégias de trabalho em aula. Joinvile, SC: UNIVILLE, 2003 AQUINO, Julio Groppa. Erro e fracasso na escola: alternativas teóricas e práticas. São Paulo: Summus, 1997. BENVENUTTI, D. B. Avaliação, sua história e seus paradigmas educativos. Pedagogia: a Revista do Curso. Brasileira de Contabilidade. São Miguel do Oeste – SC: ano 1, n.01,p.47-51, jan.2002. BOSSA, Nadia A. Fracasso escolar: um olhar psicopedagógico. Porto Alegre: ARTMED, 2002.

BRASIL, Lei n.º9394 de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. CASTRO, Amélia Domingues de; CARVALHO, Anna Maria Pessoa de. (Orgs.). Ensinar a ensinar – didática para a escola fundamental e média. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2001. CORDIÉ, Any. Os atrasos não existem: psicanálise de crianças com fracasso escolar. Porto Alegre: Artmed, 1996.

ENGUITA, Mariano F. O magistério numa sociedade em mudança. IN:

VEIGA, Ilma Passos A. (org.). Caminhos da profissionalização do magistério.

Campinas-SP: Papirus, 1998.

FERRARO, Alceu Ravanello. Escolarização no Brasil na ótica da exclusão. In in Álvaro Marchesi e Carlos Hernandéz Gil, et. al., Fracasso Escolar… p. 49.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. 9. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1998.

FUSARI, José Cerchi. Formação contínua de educadores: um estudo de representações de Coordenadores Pedagógicos da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo (SMESP). São Paulo: FEUSP, 1997. (tese de doutorado).

GADOTTI. Moacir; ROMÃO, José E. (orgs.) Autonomia da escola: princípios e propostas. 3.ed., São Paulo: Cortez, 2000.

35

HORA, Dinair Leal da. Gestão Democrática na escola: Artes e ofícios da participação coletiva. Campinas: Papirus, 1994. KENSKI, Vânia Moreira. Repensando a aprendizagem. In: VEIGA, Ilma P.A. Repensando a didática. Campinas, SP: Papirus, 2004 MACHADO, L.M.; SILVA, C.S.B. da. Nova LDB. Trajetória para a cidadania? São Paulo: Arte & Ciência, 1998. MARCHESI, Álvaro; GIL, Carlos Hernández (orgs.) Fracasso escolar: uma perspectiva multicultural. Porto Alegre. ARTMED, 2004.

MASETTO, Marcos Tarcisio. Competência pedagógica do professor universitário. São Paulo: Summus, 2003.

MEDEL, Cássia Ravena Mulin de Assis. Projeto político pedagógico: construção e implementação na escola. Campinas: Autores Associados, 2008. NADAL, Beatriz Gomes. Práticas pedagógicas nos anos iniciais – concepção e ação. Ponta Grossa, PR: Ed. UEPG, 2007. OLIVEIRA, G. P. de. Avaliação formativa nos cursos superiores: verificações qualitativas no processo de ensino-aprendizagem e a autonomia dos educandos. www.campus.oei.org. Acesso em 13 de dez. de 2003.

PATTO, Maria Helena Souza. A produção do fracasso escolar: histórias de submissão e rebeldia. São Paulo: T.A. Queiroz, 1996.

PERRENOUD, Philippe Avaliação. Da Excelência à Regulação das Aprendizagens Porto Alegre: Artmed Editora, 1999.

PERRENOUD, Philippe. Dez Novas Competências para Ensinar. Porto Alegre: Artmed Editora, 2000

RAMOS, P. Os pilares para educação e avaliação. Blumenau, SC: Acadêmica, 2001

THOMAZ, S. B. O fracasso escolar no cotidiano da escola. Presença Pedagógica nº 45. maio/junho 2002

SAINT-ONGE, Michel. O ensino na escola: o que é, como se faz. São Paulo: Loyola, 1999.

SECRETARIA ESTADUAL DE EDUCAÇÃO. Educação profissional no Paraná: fundamentos políticos e pedagógicos. Curitiba, Paraná, 2005.

36

VASCONCELLOS, Celso S. Planejamento: projeto de ensino aprendizagem e político-pedagógico. São Paulo: Libertad, 2002.

VEIGA, Ilma P.A. Projeto Político Pedagógico da Escola: uma construção possível. Campinas, SP: Papirus, 2004.