cyntia_estratégias de internacionalização

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UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS - UNISINOS UNIDADE ACADÊMICA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO NÍVEL MESTRADO CYNTIA VILASBOAS CALIXTO ESTRATÉGIAS DE INTERNACIONALIZAÇÃO DAS EMPRESAS CALÇADISTAS BRASILEIRAS: UMA ANÁLISE SOB AS PERPECTIVAS DA INDÚSTRIA, RECURSOS E INSTITUIÇÕES. São Leopoldo 2013

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  • UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS - UNISINOS

    UNIDADE ACADMICA DE PESQUISA E PS-GRADUAO

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM ADMINISTRAO

    NVEL MESTRADO

    CYNTIA VILASBOAS CALIXTO

    ESTRATGIAS DE INTERNACIONALIZAO DAS EMPRESAS CALADISTAS BRASILEIRAS: UMA ANLISE SOB AS PERPECTIVAS DA INDSTRIA,

    RECURSOS E INSTITUIES.

    So Leopoldo 2013

  • CYNTIA VILASBOAS CALIXTO

    ESTRATGIAS DE INTERNACIONALIZAO DAS EMPRESAS CALADISTAS BRASILEIRAS: UMA ANLISE SOB AS PERPECTIVAS DA INDSTRIA,

    RECURSOS E INSTITUIES.

    Dissertao apresentada como requisito parcial para a obteno do ttulo de Mestre pelo Programa de Ps-Graduao em Administrao da Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS.

    Orientador: Prof. Dr. Ivan Lapuente Garrido

    So Leopoldo 2013

  • CYNTIA VILASBOAS CALIXTO

    ESTRATGIAS DE INTERNACIONALIZAO DAS EMPRESAS CALADISTAS BRASILEIRAS: UMA ANLISE SOB AS PERPECTIVAS DA INDSTRIA,

    RECURSOS E INSTITUIES.

    Dissertao apresentada como requisito parcial para a obteno do ttulo de Mestre pelo Programa de Ps-Graduao em Administrao da Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS.

    Orientador: Prof. Dr. Ivan Lapuente Garrido

    Aprovada em 27 de fevereiro de 2013

    BANCA EXAMINADORA

    Dr. Mohamed Ahmal FURB

    __________________________________________________________________________________________

    Dr. Luiz Paulo Bignetti UNISINOS

    __________________________________________________________________________________________

    Dra. Cludia Cristina Bitencourt UNISINOS

    __________________________________________________________________________________________

    Dra. Luciana Marques Vieira - UNISINOS

    So Leopoldo 2013

  • Ficha catalogrfica

    Catalogao na Fonte: Bibliotecria Vanessa Borges Nunes - CRB 10/1556

    C154e Calixto, Cyntia Vilasboas Estratgias de internacionalizao das empresas caladistas

    brasileiras : uma anlise sob as perspectivas da indstria, recursos e instituies / por Cyntia Vilasboas Calixto. 2013.

    138 f. : il., 30cm.

    Dissertao (mestrado) Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Programa de Ps-Graduao em Administrao, 2013.

    Orientao: Prof. Dr. Ivan Lapuente Garrido.

    1. Negcios internacionais. 2. Estratgia. 3. Viso baseada em

    instituies. I. Ttulo.

  • AGRADECIMENTOS

    Agradeo a Deus, por iluminar meus caminhos e colocar pessoas especiais em minha vida;

    minha me, por acreditar em mim e oferecer todo o suporte necessrio, tanto emocional quanto financeiro, para conquistar meus objetivos. Serei eternamente grata pelo carinho e ensinamentos de vida, como tica, integridade e carter;

    Ao meu orientador Ivan Lapuente Garrido, pela dedicao e empenho ao longo destes dois anos. Seu companheirismo, humildade e parceria fizeram uma grande diferena para que eu me desenvolvesse como pesquisadora;

    Aos meus familiares e amigos, pelo carinho e pela compreenso da minha, mesmo que justificada, ausncia aos jantares, aniversrios e happy hours;

    Aos parceiros desta caminhada, Silvio e Jefferson. Sem vocs no seria to proveitoso e divertido. Muito obrigada pelo apoio e pelas publicaes que conquistamos juntos;

    Aos professores Amarolinda Klein, Rafael Teixeira e Claudio Gonalo, pelo coaching acadmico;

    Aos professores Yeda Swirski de Souza e Celso Augusto Matos, pelo compartilhamento de conhecimento e pelas publicaes conjuntas;

    Aos professores Cludia Bitencourt, Luiz Paulo Bignetti, Iuri Gavronski, Marcelo Machado e Luciana Vieira, pelas excelentes aulas, conversas e aconselhamentos na Unisinos;

    Ao professor Junico, que intermediou os contatos com instituies estaduais, por acreditar na relevncia do meu trabalho;

    incansvel Ana Zilles, sempre com uma palavra amiga e muita proatividade para nos auxiliar;

    Aos entrevistados, pela ateno e informaes fornecidas durante as entrevistas, sem as quais este estudo no seria vivel;

    Aos colegas de mestrado, em especial, Juliana Durayski, Lisiane Machado, Ingridi Bortolaso, Simoni Rohden e Jaqueline Nascimento, que se tornaram grandes amigas e companheiras de cafs nos bares da Unisinos;

    Aos meus scios Fbio e Paloma, com quem compartilho o desafio de trabalhar na busca constante de conectar o comrcio entre pases. Sou grata pela compreenso neste perodo em que dei prioridade ao mestrado e pelo apoio de vocs.

    CAPES, pela bolsa de estudos concedida, e ao CNPq, por financiar parte deste projeto.

  • We have many paths to track with endless possibilities. Fields, beaches, cities and architecture. Even the sky itself. There is no limit. Brazil fits the world (Brazilian Footwear 2012).

  • RESUMO

    A indstria caladista brasileira tem perdido sua competitividade no mercado internacional em funo da concorrncia com as empresas asiticas. Sendo assim, muitas empresas precisaram avaliar formas sustentar-se neste e/ou repensar seu posicionamento. Para tanto, formularam suas estratgias de internacionalizao atendendo este contexto. Esta dissertao visa a analisar a configurao das estratgias de internacionalizao de diferentes empresas caladistas brasileiras, com base na anlise da influncia da indstria, das capacidades organizacionais e das instituies - os trs elementos do trip estratgico. Assim, a anlise deste trabalho foi direcionada na compreenso de cada elemento do trip e sua relao na configurao estratgica das empresas caladistas ao buscar o mercado externo. Para isso, desenvolveu um estudo de caso incorporado, entrevistando executivos de quadro empresas caladistas brasileiras. De forma complementar, entrevistaram-se cinco instituies, para ampliar o conhecimento sobre estas entidades e sua atuao em relao s empresas. No intuito de atender o objetivo central deste estudo, desenvolveu-se um instrumento para avaliar a possvel influncia dos elementos do trip estratgico na formulao da estratgia empresarial. Esse artefato auxiliou na compreenso da influncia de cada um dos elementos, e os resultados demonstraram que as categorias selecionadas encontraram verificao emprica, em sua grande maioria. O estudo ainda contribuiu ao identificar a interao entre os trs elementos do trip na formulao da estratgia, que no apresentado no modelo original. Ou seja, um componente do elemento do trip pode refletir na ao de outro elemento, sugerindo a interao entre os mesmos. Durante a anlise dos dados verificou-se que existem fatos ou aes que podem ser explicados por diferentes elementos do trip, dependendo do interesse do estudo.

    Palavras-chave: Negcios Internacionais. Estratgia. Viso Baseada em Instituies.

  • ABSTRACT

    The Brazilian footwear industry has decreasing its competitiveness recently mainly due to the emerging of the Asian related industry. Thus, many companies need to find ways to sustain themselves in the market, as well as re-evaluate their positioning. In order to do so, these companies have planned their internationalization embracing this new process. This dissertation intends to analyze the internationalization strategy configuration of different Brazilian footwear companies, based on the analysis of the influence in the industry, on the organizational capabilities and the institutions perspectives. Therefore, this study was directed to comprehend each of the elements of the strategic tripod and its relation to strategy configuration of the footwear industry when seeking overseas markets. It then developed an incorporated case study, interviewing executives of four Brazilian companies. Complementary, five institutions related to the sector were interviewed, in order to widen the knowledge about these entities and how they interact with the industry. With the intention to fulfill the goal of this study, we created an instrument entitled to evaluate the possible influence of the elements of the strategy tripod in the forming of the entrepreneurial strategy. This tool has helped to understand the influence of each of the elements, and the results have demonstrated that the selected categories met empirical verification, in its majority. The study also contributed to the literature on identifying the interaction among the tripods elements in the strategic configuration, aspect that was not covered in the original model. This interaction means that the component of one element from the tripod could reflect in other elements action, suggesting their interaction. During the data analysis, it as verified that some actions could be explained by more than one tripods element, depending on the study interest.

    Key-words and expressions: International Trade. Strategy. Institution based view.

  • LISTA DE FIGURAS

    FIGURA 1: TRIP ESTRATGICO ................................................................................................. 23 FIGURA 2: DIAMANTE DE PORTER ............................................................................................. 26 FIGURA 3: RECURSOS, CAPACIDADES E VANTAGEM COMPETITIVA: AS RELAES BSICAS ....... 29 FIGURA 4: CAPACIDADES DINMICAS E PROCESSOS ORGANIZACIONAIS .................................... 32 FIGURA 5: INSTITUIES, ORGANIZAES E ESCOLHAS ESTRATGICAS ................................... 35 FIGURA 6: AMBIENTES INSTITUCIONAIS, ORGANIZAES E INOVAO ..................................... 36 FIGURA 7: MODELO DE ENTRADA EM MERCADOS EXTERNOS ..................................................... 44

    FIGURA 8: CARACTERSTICAS-CHAVE DAS ALTERNATIVAS DE MODO DE ENTRADA: RECURSOS E CONTROLE ........................................................................................................................... 46

    FIGURA 9: PROPOSTA DE MODELO TERICO ............................................................................... 48 FIGURA 10: ETAPAS DA PESQUISA ............................................................................................. 52 FIGURA 11: CADEIA PRODUTIVA DO CALADO .......................................................................... 61 FIGURA 12: COEFICIENTE DE EXPORTAO E PENETRAO DAS IMPORTAES ....................... 67 FIGURA 13: TRIP ESTRATGICO INTEGRADO .......................................................................... 111 FIGURA 14: MODELO TERICO PROPOSTO ............................................................................... 113 FIGURA 15: CARACTERSTICAS-CHAVE DAS ALTERNATIVAS DE MODO DE ENTRADA: RECURSOS E

    CONTROLE DAS EMPRESAS ENTREVISTADAS ...................................................................... 115 FIGURA 16: MODELO TERICO REVISTO .................................................................................. 119

  • LISTA DE QUADROS

    QUADRO 1: A EVOLUO DA GESTO ESTRATGICA ................................................................. 22 QUADRO 2: O MODELO ESTRUTURA-CONDUTA-DESEMPENHO.................................................. 25 QUADRO 3: DIMENSES DAS INSTITUIES ............................................................................... 34 QUADRO 4: COMPONENTES DE ANLISE INSTITUCIONAL ........................................................... 36 QUADRO 5: COMPARAO DOS MODOS DE ENTRADA EM MERCADOS INTERNACIONAIS ............. 46 QUADRO 6: INFLUNCIA DA INDSTRIA, CAPACIDADES ORGANIZACIONAIS E INSTITUIES NAS

    ESTRATGIAS DE INTERNACIONALIZAO .......................................................................... 50 QUADRO 7: LISTA DOS ENTREVISTADOS .................................................................................... 55 QUADRO 8: CATEGORIAS DE ANLISE ....................................................................................... 57 QUADRO 9: ACONTECIMENTOS AO LONGO DA TRAJETRIA DA INDSTRIA CALADISTA

    VOLTADOS AO MERCADO EXTERNO ..................................................................................... 62 QUADRO 10: CATEGORIAS DE ANLISE ...................................................................................... 95 QUADRO 11: SNTESE DOS ELEMENTOS DA INDSTRIA NO CAMPO ............................................. 99 QUADRO 12: SNTESE DOS ELEMENTOS DAS CAPACIDADES ORGANIZACIONAIS NO CAMPO ...... 105 QUADRO 13: SNTESE DOS ELEMENTOS DAS INSTITUIES NO CAMPO ..................................... 110

  • LISTA DE TABELAS

    TABELA 1: EXPORTAO DE CALADOS POR REGIO ................................................................ 64

  • LISTA DE SIGLAS

    ABICALADOS - Associao Brasileira de Calados ACINH - Associao Comercial, Industrial e de Servios de Novo Hamburgo AGDI - Agncia Gacha de Desenvolvimento e Promoo do Investimento APEX - Agncia Brasileira de Promoo de Exportaes e Investimentos BADESUL - Banco de Desenvolvimento do Sul BRDE - Banco Regional de Desenvolvimento Econmico e Social CIERGS - Centro das Indstrias do Rio Grande do Sul CINRS - Centro Internacional de Negcios do Rio Grande do Sul CONCEX - Conselho de Relaes Internacionais e Comrcio Exterior FIERGS - Federao das Indstrias do Rio Grande do Sul GEREX - Gerncia de Relaes Internacionais e de Comrcio Exterior IBTEC - Instituto Brasileiro de Tecnologia do Couro, Calados e Artefatos IEL/RS - Instituto Euvaldo Lodi OLI - Ownership, Location and Internalization PEIEX - Projeto Extenso Industrial Exportadora PIMS - Profit Impact of Market Strategy

    PLI - Propriedade, Localizao e Internalizao RBV Resource-Based View SBU - Strategic Business Unit SCP - Structure-Conduct-Performance SDPIRS - Secretaria de Desenvolvimento e Promoo do Investimento do Rio Grande do Sul SDRS - Sistema de Desenvolvimento do Estado do Rio Grande do Sul SEBRAE - Servio Brasileiro de Apoio s Micro e Pequenas Empresas SESI/RS - Servio Social da Indstria do Rio Grande do Sul SENAI/RS - Servio Nacional de Aprendizagem Industrial do Rio Grande do Sul

  • 13

    SUMRIO

    1 Introduo ........................................................................................................... 15 1.1 Definio Do Problema ..................................................................................... 16 1.2 Objetivos ............................................................................................................ 18 1.2.1 Objetivo Geral .............................................................................................. 18 1.2.2 Objetivos Especficos .................................................................................... 18 1.3 Justificativa ........................................................................................................ 18

    2 Fundamentao Terica..................................................................................... 21 2.1 Estratgia ........................................................................................................... 21 2.1.1 Do Paradigma Estrutura-Conduta-Desempenho Ao Modelo Diamante . 24 2.1.2 Conhecendo A Organizao: Recursos E Capacidades Organizacionais. . 27 2.1.3 A Influncia Das Instituies ....................................................................... 33 2.2 Negcios Internacionais .................................................................................... 38 2.2.1 Abordagem Econmica ................................................................................ 39 2.2.2 Abordagem Comportamental ...................................................................... 41 2.3 Estratgia De Entrada Em Mercados Externos.................................................. 43 2.4 Proposies De Modelo E Quadro Terico ....................................................... 47

    3 Mtodos E Procedimentos ................................................................................. 51 3.1 Estratgia De Pesquisa Delineamento Geral .................................................. 51 3.2 Etapas Preparatria E Investigativa ................................................................... 52 3.3 Coleta De Dados ................................................................................................ 54 3.4 Anlise Dos Dados ............................................................................................ 56

    4 A Indstria Caladista Brasileira ..................................................................... 59 4.1 Principais Fatos Da Histria E Eo Desenvolvimento Ea Produo De Calados No Brasil ................................................................................................................................. 59 4.2 O Projeto Brazilian Footwear E A Atuao Recente Das Empresas No Mercado Externo ................................................................................................................................. 65

    5 Os Casos Estudados ............................................................................................ 68 5.1 Grupo Priority .................................................................................................... 69 5.2 Grupo Paquet Caso Dumond ........................................................................ 73 5.3 Calados Bibi ..................................................................................................... 75 5.4 Grendene ............................................................................................................ 78

    6 A Atuao Das Instituies No Rumo Ao Mercado Externo .......................... 84 6.1 Agncia Brasileira De Promoo De Exportaes E Investimentos (Apex) ..... 84 6.2 Associao Brasileira Das Indstrias De Calados (Abicalados) .................... 86 6.3 Federao Das Indstrias Do Rio Grande Do Sul (Fiergs) ............................... 89 6.4 Secretaria De Desenvolvimento E Promoo Do Investimento Do Rio Grande Do Sul (Sdpi-Rs) .................................................................................................................. 91 6.5 Banco De Desenvolvimento Do Sul (Badesul) ................................................. 93

    7 Anlise Dos Dados .............................................................................................. 95 7.1 Elementos da Indstria ...................................................................................... 95 7.2 Elementos das Capacidades Organizacionais .................................................... 100

  • 7.3 Elementos das Instituies................................................................................. 106 7.4 Integrando os Diferentes Elementos do Trip Estratgico e Verificando as Influncias na Determinao das Estratgias de Internacionalizao ............................................. 111

    8 CONSIDERAES FINAIS ............................................................................. 118 8.1 Contribuies Acadmicas ................................................................................ 122 8.2 Contribuies Gerenciais ................................................................................... 123 8.3 Limitaes do Estudo e Indicaes Para Pesquisas Futuras .............................. 125

    REFERNCIAS .................................................................................................... 127 APNDICE A - PROTOCOLO DO CASO ....................................................... 134 APNDICE B - ROTEIRO DE ENTREVISTA COM EMPRESAS ............... 136 APNDICE C - ROTEIRO DE ENTREVISTA COM INSTITUIES ........ 138

  • 1 INTRODUO

    Estudos acerca da estratgia vm se consolidando como de extrema relevncia para as organizaes tanto para o seu posicionamento quanto para seu desempenho. Em 1950, o planejamento financeiro era foco de anlise dos pesquisadores, direcionando a estratgia para o controle e gesto financeira. No decorrer da dcada de 60 e 70, estes expandiram seus escopos, e o planejamento passou a englobar toda a organizao, e no apenas o setor financeiro. Com isso, planejava-se o crescimento da organizao, sua ampliao de mercados e portflio, direcionando as anlises para a curva de experincia e o retorno sobre participao do mercado. (GRANT, 1995).

    Henry Mintzberg via a estratgia como um padro numa corrente de decises. Para ele, a estratgia seria resultado de uma srie de aes da empresa, que poderiam ser previamente determinadas (pretendidas) ou ocorrer ao longo do processo, em funo de modificaes do contexto previamente analisados (emergentes). (MINTZBERG, 1977, 1978). J a dcada de 80 foi caracterizada pela anlise da indstria e a competio entre as empresas inseridas neste setor, focando a estratgia ao encontro de uma posio dentro da indstria em que a empresa pudesse se defender contra as foras competitivas ou influenci-las em seu favor. (PORTER, 2004).

    O final da dcada de 80 e incio dos anos 90 foram caracterizados pela emergncia da anlise interna da organizao, tendo como ncora o estudo de Penrose (1959). Wernerfelt (1984), Rumelt (1984) e Barney (1991) desenvolveram a Viso Baseada em Recursos (Resource-Based View- RBV) e direcionaram o estudo da estratgia para a anlise de recursos, capacidades e competncias na tentativa de buscar a vantagem competitiva da empresa. Em 1996, Mike Peng e Peggy Heath comearam a analisar a importncia das instituies, por meio do Estado e da sociedade na determinao da estratgia.

    Em 2001, Mike Peng rastreou a evoluo da RBV associada a negcios internacionais. O autor relatou a convergncia dos estudos em estratgia e negcios internacionais e destacou a ascenso das economias emergentes no contexto dos negcios. Ainda, enfatizou que, devido s diferenas institucionais entre as economias emergentes e as desenvolvidas, seria necessrio desvendar os meandros da concorrncia nas economias emergentes.

    Aproximaes dos estudos sobre negcios internacionais e estratgia so decorrentes da busca pela insero das empresas no contexto internacional. As estratgias de entrada em

  • 16

    mercados externos so um plano de ao que envolve objetivos, recursos e polticas de atuao, que guiaro o processo de internacionalizao das empresas. (ROOT, 1994). Assim, a anlise dos modos de entrada bem como do grau do envolvimento das empresas no processo de internacionalizao de grande valia para compreender a estratgia adotada pelas empresas no mercado externo.

    Na busca de compreender o porqu das diferenas entre as estratgias empresariais por organizaes de pases e regies distintas, Mike Peng (2002) argumenta que essa diversidade seria resultado de vrias foras internas e externas s empresas. O autor afirma que alm das condies da indstria e dos recursos, devem-se avaliar tambm as influncias do Estado e da sociedade, criando o termo Institution-Based View para esta perspectiva da estratgia. Ao longo da ltima dcada, Mike Peng dedicou-se a ampliar os estudos sobre Institution-Based View e, em 2007, comeou a integrar as trs perspectivas na determinao da estratgia (YAMAKAWA; PENG; DEEDS, 2007).

    Em 2008, Peng, Wang e Jiang apresentaram o trip estratgico (p.922, traduo nossa), onde os autores afirmaram que a estratgia seria oriunda de elementos da indstria, dos recursos internos organizao e das instituies. No estudo, enfatizam a importncia da Institution-Based View nas economias emergentes, onde as instituies diferem-se significativamente daquelas das economias desenvolvidas.

    O presente estudo buscou trabalhar as diferentes perspectivas da estratgia no processo de internacionalizao das empresas caladistas brasileiras. Para tanto, utilizou como diretriz o trip estratgico desenvolvido por Peng (2008). Assim, a anlise deste trabalho foi direcionada na compreenso de cada elemento do trip e sua relao na configurao estratgica das empresas caladistas ao buscar o mercado externo. Para isso, precisou explorar a literatura que formou cada um dos elementos e buscar artefatos para avaliar a possvel influncia na formulao da estratgia empresarial.

    1.1 Definio do Problema

    A produo de calados uma das atividades tradicionais da economia brasileira, tendo iniciado seus feitos com a chegada dos imigrantes alemes no Rio Grande do Sul, em 1824

  • 17

    (COSTA; PASSOS, 2004). Segundo os dados da Brazilian Footwear1, o Brasil o 3 maior produtor de calados e 8 maior exportador, tendo enviado aproximadamente 113 milhes de pares de calados para mais de 150 pases, em 2011. O setor emprega mais de 348 mil pessoas e est presente em todo o territrio nacional. No entanto, a indstria caladista tem perdido competitividade em relao aos pases asiticos nas ltimas dcadas e precisa avaliar as formas de sustentar-se neste mercado e/ou repensar seu posicionamento (COSTA, 2002).

    Algumas empresas de calados no conseguiram enfrentar a competio internacional e encerraram suas atividades. Em contrapartida, outras empresas mantiveram suas operaes voltando-se ao mercado interno e reformulando suas estratgias de atuao internacional. Devido aos incentivos fiscais proporcionados pelos estados da regio Nordeste na dcada de 90, especialmente Bahia e Cear, muitas empresas da regio Sul deslocaram suas operaes para outra regio, buscando redues de custos da cadeia produtiva. (COSTA, 2002).

    Apesar dos numerosos estudos envolvendo internacionalizao de empresas caladistas brasileiras (como por exemplo, COSTA, 2002; COSTA; PASSOS, 2004; FROEHLICH, 2006; SMANIOTTO, 2006; VASCONCELLOS, 2012), poucos trabalham a questo da reestruturao das estratgias para o desenvolvimento ou manuteno deste processo. Tendo em vista que a indstria caladista sofre influncias do prprio setor e de seus polos produtivos, a anlise da indstria faz-se necessria para compreender a reformulao da estratgia visando ao mercado externo. Com a consolidao da Resource Based View (RBV) como tema de pesquisa, a anlise dos recursos da empresa, aliada ao desenvolvimento de capacidades agregam no entendimento dos elementos internos organizao que podem ser considerados essenciais para a definio da estratgia. Por fim, uma vez que nenhuma empresa est isenta das influncias do ambiente em que est inserida (PENG, 2002), aliada ao fato de que governos estaduais influenciaram na formao de novos polos produtores de calado no Brasil na dcada de 90, torna-se relevante analisar a influncia das instituies nas estratgias de internacionalizao.

    Com base neste contexto, formulou-se a seguinte questo de pesquisa: Quais elementos da indstria, da organizao e das instituies contriburam para configurao das estratgias de internacionalizao de diferentes empresas caladistas?

    1 Disponvel em: http://www.brazilianfootwear.com.br/sobre-o-brasil/industria/ - Acesso em 09/01/2013.

  • 18

    1.2 Objetivos

    1.2.1 Objetivo Geral

    Para atender esse questionamento, estabeleceu-se o objetivo geral de analisar a configurao das estratgias de internacionalizao de diferentes empresas caladistas brasileiras, com base na anlise da influncia da indstria, das capacidades organizacionais e das instituies.

    1.2.2 Objetivos Especficos

    a) Desenvolver, com base na literatura, um modelo terico para a avaliao da influncia da indstria, capacidades organizacionais e instituies nas estratgias de internacionalizao de empresas;

    b) Analisar os elementos da indstria caladista que afetam o processo de internacionalizao;

    c) Identificar a mobilizao de recursos e capacidades dinmicas no contexto de mudana do setor caladista brasileiro;

    d) Compreender as mudanas do setor caladista brasileiro pela influncia das instituies ao longo das ltimas duas dcadas (1990-2011);

    1.3 Justificativa

    No mbito acadmico, este estudo relevante por aprofundar as pesquisas sobre o trip estratgico, proposto por Peng (2008), em pases emergentes. O prprio autor salienta a necessidade de mais estudos em pases latino-americanos em relao influncia das instituies no campo da estratgia. A maioria dos estudos sobre economias emergentes realizados pelo autor est inserida no contexto asitico ou leste-europeu (PENG; WANG;

  • 19

    JIANG, 2008; PENG et al., 2009). Assim, o estudo visa a expandir a compreenso sobre o tema no contexto brasileiro, que possui instituies bastante diferentes dos pases previamente analisados, devido influncia da colonizao portuguesa, e ainda analisar a internacionalizao das empresas brasileiras.

    A escolha do setor caladista est relacionada importncia desta indstria para o Brasil, em funo do nmero de empresas que a constitui e de funcionrios empregados, bem como a sua representatividade ao longo de diversos polos produtivos e, principalmente, pelas em funo das mudanas ocorridas nas ltimas dcadas, no contexto mundial da produo de calados. A anlise das exportaes brasileiras ocorrer a partir da dcada de 90, em funo da disponibilidade de dados consolidados da indstria, mas tambm em razo de a formao dos polos caladistas do Nordeste ter ocorrido neste perodo, o que mudou consideravelmente a dinmica do setor.

    O estudo justifica-se pelo aspecto analtico de avaliar sob as diferentes perspectivas da indstria, capacidades organizacionais e instituies, a configurao das estratgias de internacionalizao das empresas caladistas brasileiras, proporcionando compreender quais estratgias foram desenvolvidas a partir da articulao de quais recursos e capacidades, assim como os resultados das aes desenvolvidas pelas instituies. Uma vez que este setor sofreu forte influncia de diferentes governos estaduais a partir de 1990, o estudo poder servir tambm como elemento de anlise das consequncias de medidas governamentais na determinao da estratgia, podendo contribuir aplicao de novas aes em outras indstrias brasileiras.

    Apesar do grande volume de citaes sobre o trip estratgico (154 resultados encontrados na plataforma Web of Knowledge2), poucos estudos analisaram empiricamente os trs elementos do trip ao mesmo tempo (AHN; YORK, 2011; LUO; SUO; WANG, 2011; MEYER et al. 2009; GAO et al., 2010). Ao expandir a compreenso sobre o tema no contexto brasileiro, este estudo procura evidenciar a fora do trip estratgico na configurao do interesse e envolvimento nos mercados externos. Portanto, esta pesquisa visa a contribuir no entendimento de diferentes elementos na configurao da estratgia de internacionalizao das empresas caladistas brasileiras. Depois, poder auxiliar na compreenso das estratgias de internacionalizao de outras empresas no Brasil.

    2 Plataforma de Pesquisa disponvel em: Acesso em: 12 agosto de 2012.

  • 20

    Segundo Ambrosini e Bowman (2009), a pesquisa inicia com o desenvolvimento de teoria, seguida pela formulao de algumas hipteses e proposies. Posteriormente, a teoria testada empiricamente e desenvolvem-se sugestes para gestores. Seguindo a lgica destes autores, o estudo prope um modelo terico com base na teoria previamente desenvolvida sobre o trip estratgico, seguido de um instrumento de avaliao de cada um dos elementos do modelo. Uma vez validado empiricamente neste estudo, esse artefato poder servir como ferramenta de anlise dos gestores de empresas brasileiras, que necessitam configurar ou reconfigurar suas estratgias para competir no mercado internacional.

  • 21

    2 FUNDAMENTAO TERICA

    Nesta seo, apresenta-se uma sntese dos temas abordados para a construo terica deste estudo. Tendo em vista a sobreposio de escolas tericas no campo da administrao, acredita-se que a estratgia, fundamentada pelo trip de anlise da indstria, recursos e instituio, possa contribuir de forma mais significativa para o desenvolvimento deste estudo. Considerando o vis internacional da anlise, o trabalho busca apoio em negcios internacionais.

    2.1 Estratgia

    O interesse sobre o campo da estratgia floresceu no final da dcada de 50 e incio da dcada de 60, nos Estados Unidos, com o objetivo de compreender a gesto das grandes e complexas corporaes. J nas dcadas de 70 e 80, as atenes se voltam para o ambiente externo, onde o principal foco era a gesto estratgica para a anlise da indstria e a competio; nos anos 80 e 90, o foco de interesse se desloca para os aspectos internos da empresa. (GRANT, 1995). O quadro 1 (abaixo) sintetiza o desenvolvimento da anlise da gesto estratgica ao longo do tempo.

    Conforme Barney e Hesterly (2011), o processo de administrao estratgica envolve um conjunto de anlises e escolhas capazes de aumentar a probabilidade de uma empresa escolher uma estratgia que gere vantagens competitivas. Para isso, a empresa deve realizar anlises tanto internas quanto externas, a fim de identificar as foras e as fraquezas da organizao, assim como oportunidades e ameaas do ambiente competitivo. Estas anlises remetem compreenso do modelo estrutura-conduta-desempenho (structure-conduct-performance ou SCP) e viso baseada em recursos (resource-based view ou RBV), que sero apresentados a seguir.

  • 22

    Quadro 1: A evoluo da gesto estratgica

    Perodo 1950s 1960s 1970s Final da dc. 70 e incio da dc. 80

    Final da dc. 80 e incio da dc. 90

    Tema dominante Planejamento financeiro e controle

    Planejamento corporativo

    Estratgia corporativa

    Anlise da indstria e competio

    A busca da vantagem competitiva

    Foco central Controle financeiro atravs de oramentos operacionais.

    Planejar o crescimento

    Planejar o portflio

    Escolha de indstrias, mercados e segmentos e o posicionamento deles.

    Fontes de vantagem competitiva dentro da empresa. Aspectos dinmicos da estratgia.

    Principal conceito e tcnicas

    Oramento financeiro, planejamento financeiro e avaliao de projetos.

    Previso de mercado, diversificao e anlise da sinergia.

    SBU3 como unidade de anlise, matrizes de planejamento de portflio, anlises de curva de experincia e retorno sobre participao do mercado.

    Anlise da estrutura da indstria. Anlise da competio e anlise PIMS4.

    Anlise de recursos. Anlise de competncias organizacionais e capacidades. Anlise dinmica: anlise da velocidade, capacidade de resposta e vantagem do pioneiro.

    Implicaes organizacionais

    Gesto financeira como funo fundamental da empresa.

    Desenvolvimento de departamento de planejamento. Aumento dos conglomerados; Difuso da estrutura multidivisional.

    Integrao do controle financeiro e estratgico. Planejamento estratgico como intermedirio da sede e filiais.

    Desinvestimento em unidades de negcio no atrativas. Gesto de ativos.

    Reestruturao corporativa e processo de reengenharia. Desenvolvimento de capacidades atravs da gesto de recursos humanos, alianas estratgicas e novas formas organizacionais.

    Fonte: Grant (1995, p. 17, traduo nossa).

    Considerando que nenhuma empresa est imune s influncias do ambiente institucional em que est inserida, Peng (2002) afirma que necessrio incluir as influncias do estado e da sociedade na implementao de estratgias. Posteriormente, o autor inclui a viso baseada nas instituies como o terceiro elemento do trip estratgico, conforme figura abaixo. (PENG, 2002; PENG, WANG; JIANG, 2008; PENG; SU; PINKHAM; CHEN, 2009; YAMAKAWA, PENG; DEEDS, 2007).

    3 SBU = Strategic Business Unit

    4 PIMS = Profit Impact of Market Strategy

  • 23

    Figura 1: Trip estratgico

    Fonte: Peng, Wang e Jiang (2008, p.923, traduo nossa).

    Tendo em vista a relao de alguns trabalhos sobre a viso baseada nas instituies, com foco em mercados emergentes5 (PENG, WANG; JIANG, 2008; YAMAKAWA, PENG; DEEDS, 2007), este estudo tambm a contempla em sua anlise. Destaca-se que este trabalho analisa a influncia de cada um dos elementos do trip na determinao da estratgia, tangenciando o tema do desempenho.

    Ainda, atividades no contexto nacional e internacional apresentam similaridades, entretanto a maior diferena est no fato de que transaes ocorrem em mais de um pas e ambiente. Por ambiente compreende-se: estrutura de mercado, foras econmico-poltico-legais, canais de distribuio, caractersticas culturais e sociais. (CAVUSGIL; GHAURI; AGARWAL, 2003). Segundo Cateora e Ghauri (2000), citados por Cavusgil, Ghauri e Agarwal (2003), o desafio do gestor est em ajustar e controlar os elementos controlveis do ambiente de negcios sua estratgia, por meio de polticas de produto, distribuio, preo e estratgias de promoo. Os fatores externos empresa auxiliaro a determinao das decises da estratgia e no modo de entrada escolhido para atender o mercado-alvo. Por fim, as estratgias de internacionalizao, assim como os modos de entrada em mercados externos, so desenvolvidos no decorrer do trabalho.

    5 Nem todos os pases em desenvolvimento podem ser considerados economias emergentes. Para isso,

    necessrio estar comprometido com reformas econmicas a fim de aliviar problemas econmico-sociais, como pobreza e falta de infraestrutura. Ainda, necessrio atingir um PIB per capita em crescimento (CAVUSGIL; GHAURI; AGARWAL, 2003).

  • 24

    A seguir, apresenta-se o Paradigma Estrutura-Conduta-Desempenho que foi base para a construo da anlise da indstria; posteriormente, a anlise interna das organizaes, ancorada na Viso Baseada em Recursos, e o ambiente institucional, tendo como base a Viso Baseada em Instituies. Tendo em vista o objetivo de compreender as estratgias de internacionalizao das empresas caladistas brasileiras, so expostas as Escolas de Internacionalizao e as Estratgias de Entrada em Mercados Externos. Ao fim, busca-se consolidar o contedo por meio de um quadro terico e de um modelo que serve para analisar as estratgias de internacionalizao das empresas caladistas brasileiras.

    2.1.1 Do Paradigma Estrutura-Conduta-Desempenho ao Modelo Diamante

    O ambiente externo capaz de influenciar o desempenho da empresa por meio de diversos fatores, entre eles: econmico, social, poltico e tecnolgico. No entanto, a maioria das decises estratgicas analisada pelo contexto da indstria em que a empresa est inserida, e as caractersticas estruturais desta determinam a natureza e intensidade da competio do setor. (GRANT, 1995).

    Em 1981 Porter constatou que os estudos econmicos da rea de Organizao Industrial poderiam contribuir para a anlise de gesto estratgica. O framework seminal de Learned, Christensen, Andrews, and Guth, elaborado em 19696, apresenta os elementos que as empresas devem considerar para a formulao de sua estratgia: (i) foras e fraquezas da empresa; (ii) oportunidades e ameaas da indstria (econmicas e tcnicas); (iii) valores pessoais dos implementadores da estratgia e (iv) expectativas mais amplas da sociedade. (PORTER, 1981).

    Os trabalhos de Bain (1956) e Mason (1959), citados por Barney e Hesterly (2011), tinham como objetivo inicial identificar os setores menos competitivos e auxiliar organismos reguladores para aumentar o nvel de competio e bem-estar social, mas acabaram sendo utilizados para assessorar as empresas a conduzir estratgias que reduzissem a competio. De acordo com este modelo, a heterogeneidade do desempenho das empresas se daria em funo da estrutura do ramo de atuao, como: concentrao do ramo (economias de escala), nvel de diferenciao dos produtos e barreiras entrada. (BARNEY; HESTERLY, 2011).

    6 Learned, E.P.; Christensen, C.R.; Andrews, K.R.; e Guth, W. Business policy. Homewood.: Irwin, 1969.

  • 25

    A essncia do trabalho de Bain e Mason, segundo Porter (1981), que o desempenho de uma empresa no mercado dependeria das caractersticas do ambiente da indstria em que ela compete. Logo, a estrutura determinaria o comportamento ou a conduta das empresas e levaria ao desempenho coletivo das empresas no mercado. Ainda, os reflexos da estratgia tambm podem conduzir determinao da estrutura, e os desempenhos passados podero influenciar na formulao de novas estratgias. (PORTER, 1981). Os principais termos que compem este paradigma esto sintetizados no quadro 2:

    Quadro 2: O modelo Estrutura-Conduta-Desempenho

    Estrutura do setor Conduta da empresa (Estratgia) Desempenho Nmero de empresas concorrentes; Homogeneidade dos produtos; Custos de entrada e sada.

    Estratgias que a empresa busca ganhar; Vantagem Competitiva.

    Nvel de empresa: desvantagem competitiva, paridade, vantagem competitiva temporria ou sustentada;

    Sociedade: eficincia produtiva e alocativa, nvel de emprego e progresso.

    Fonte: adaptado de Barney e Hesterly (2011, p.28) e Porter (1981, p. 616, traduo nossa).

    Os estudos em gesto estratgica tendo como base o modelo Estrutura-Conduta-Desempenho ganharam destaque com o modelo das cinco foras, desenvolvido por Porter (2004). O modelo das cinco foras uma tcnica de anlise da indstria como um todo, visando a compreender a concorrncia entre as empresas que fazem parte desta indstria, assim como a posio da empresa dentro desse ramo de negcio. Assim, verifica-se o grau de ameaa de novos entrantes, bem como de produtos e servios substitutos; o poder de negociao com fornecedores e compradores; alm da rivalidade entre os atuais concorrentes do mercado. Esse modelo visava a auxiliar a empresa a conquistar um desempenho acima da mdia com base na anlise do ambiente competitivo que est inserida. (BARNEY; HESTERLY, 2011).

    Em 1990, Porter desenvolve os atributos (figura 2) que modelam o ambiente onde as empresas esto inseridas, os quais influenciam a sua competitividade internacional. Esses determinantes (tambm chamados de determinantes de vantagem nacional que formam o modelo diamante) atuariam tanto individualmente como em sistema, pois podem influenciar os demais elementos do ambiente empresarial. (PORTER, 1990).

  • 26

    Figura 2: Diamante de Porter

    Fonte: Porter (1990, p. 146).

    A condio de fatores est baseada nos fatores de produo, ou seja, na composio dos recursos humanos e fsicos, do conhecimento, do capital e da infraestrutura. Esses elementos so explorados na seo seguinte, como parte da Viso Baseada em Recursos. J a condio de demanda relacionada demanda interna dos produtos ou servios; logo, influencia a economia de escala, podendo determinar a melhoria e inovao dos produtos. (PORTER, 1990).

    Segundo o autor, as indstrias correlatas ou de apoio podem auxiliar no processo de inovao e aperfeioamento dos produtos, uma vez que h oportunidades de trocas de informao e intercmbio tcnico entre as empresas. Ainda, as empresas podem influenciar o esforo tcnico dos fornecedores, servindo como local para testes de novos produtos e desenvolvendo uma soluo interessante a ambos. No tocante a presses sobre aumento da qualidade dos produtos, a rivalidade entre as empresas atuantes tambm cria uma presso ativa por inovao e reduo de custos. Caso as empresas estejam concentradas geograficamente, h oportunidades de troca de informaes (capital social) e obteno de apoio governamental para a regio.

    O governo no um determinante do modelo: ele um influenciador dos quatro determinantes, por meio da criao e aperfeioamento de fatores (polticas de educao,

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    regras e regulamentos de produo, investimentos em infraestrutura), da concesso de subsdios, e de polticas fiscais e monetrias que podem incentivar o investimento em determinadas regies. Ainda, ele influencia via taxa de cmbio e fomento exportao das empresas, alm de ser um grande comprador de muitas indstrias. No entanto, a poltica governamental tambm influenciada pelos quatro elementos do diamante, o que acaba direcionando sua atuao. (PORTER, 1990).

    Por ltimo, de acordo com o autor, o acaso tambm pode atuar no ambiente de competio da indstria, criando mudanas na posio competitiva das empresas atuantes e possibilitando que novas empresas se desenvolvam. Em geral, esses acontecimentos esto fora do controle da empresa e do governo.

    2.1.2 Conhecendo a organizao: recursos e capacidades organizacionais.

    Embora a ateno dos pesquisadores estivesse voltada para o ambiente externo, Andrews, em The concept of corporate strategy (1980)7, afirmava que a principal atividade da formulao estratgica era identificar as oportunidades e ameaas do ambiente em que a empresa estava inserida. No entanto, antes de tomar qualquer deciso, deveriam ser avaliadas as foras e as fraquezas da organizao, assim como os recursos disponveis.

    2.1.2.1 Recursos

    A abordagem da relevncia dos recursos para a organizao ganha destaque nos estudos de Birger Wernerfelt (1984) e Richard R. Rumelt (1984), apresentando grande influncia dos trabalhos de Selznick (1957), Penrose (1959), Chandler (1962) e Nelson e Winter (1982) (FOSS, 1997). Wernerfelt (1984) j traz no ttulo de seu artigo a nova abordagem estratgica: A Resource-based View of the Firm. Para o autor, recursos so tudo aquilo que pode ser pensado como fora ou fraqueza da empresa. Formalmente, os recursos da empresa em um determinado momento podem ser definidos como aqueles (tangveis e intangveis) ativos que esto atados de forma semipermanente empresa (p.172). J o trabalho de Rumelt (1984)

    7 ANDREWS, K. The concept of corporate strategy. Homewood, Irwin, 1980.

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    apresenta a questo da heterogeneidade das empresas de uma mesma indstria, o que vai de encontro ao paradigma SCP. Ainda, o autor afirma que a posio competitiva da firma seria definida pelo conjunto de recursos e relacionamentos. (RUMELT, 1984).

    Posteriormente, Barney (1991), ao considerar as anlises que j haviam sido realizadas, percebe que os atributos idiossincrticos da empresa eram pouco estudados. Assim, a viso baseada em recursos assume que as empresas so heterogneas em relao aos recursos estratgicos que controlam. Ainda, esses recursos podem no ser perfeitamente mveis entre as empresas, o que garantiria a heterogeneidade por mais tempo.

    Para Barney (1991, p.101, traduo nossa) os recursos da empresa so todos os ativos, capacidades, processos organizacionais, competncias, informaes, conhecimento e demais habilidades controladas pela empresa e que lhe permitam conceber e implementar estratgias que melhorem a eficincia e eficcia. A fim de delinear a sua anlise, o autor atribui trs diferentes categorias para os recursos, ampliando a definio de Penrose (1959), em que recursos eram separados entre fsico e humano:

    I. Capital Fsico: composto por tecnologias, equipamentos, localizao geogrfica e o acesso matria prima;

    II. Capital Humano: incluindo treinamento, experincia, inteligncia e relacionamentos e;

    III. Capital Organizacional: reunindo estrutura, planejamento formal e informal, controle e as relaes entre os grupos da empresa e seu ambiente.

    Outro elemento importante do estudo de Barney (1991) a definio de vantagem competitiva. De acordo com o autor, a vantagem competitiva ocorre quando a empresa cria valor ao implementar uma estratgia diferente dos concorrentes. Essa vantagem pode ser considerada sustentvel caso os concorrentes no consigam duplica-la (pelo menos por um perodo de tempo). Tendo em vista a heterogeneidade de recursos e seu potencial de imobilidade, a vantagem competitiva sustentvel pode ser criada com base na articulao dos recursos. (BARNEY, 1991). Assim, para que um recurso tenha potencial para proporcionar a vantagem competitiva sustentvel, ele deve possuir os seguintes atributos:

    I. Valor - o recurso deve ser capaz de explorar oportunidades e amenizar ameaas do ambiente externo;

    II. Raridade em relao aos concorrentes e potenciais competidores; III. Imitabilidade imperfeita e;

  • 29

    IV. Insubstituibilidade por equivalentes estratgicos.

    Em seguida, Grant (1995) cria novas categorias para os recursos: tangveis, intangveis e recursos humanos. O interessante dessa diviso que pessoas so tangveis se forem avaliadas como mo de obra disponvel, mas os recursos que elas oferecem organizao so habilidades, conhecimento e capacidade de tomada de deciso. Tendo em vista que as pessoas trabalham em equipe, outros elementos alm das suas habilidades individuais devem ser considerados como: entusiasmo, motivao, interao com os demais colegas. A cultura da empresa seria ento resultado do relacionamento dos indivduos que a compe e um recurso intangvel.

    Este trabalho aborda o conceito de recurso dentro da perspectiva de Grant (1995), categorizando-os dentro das esferas tangvel, intangvel e humana. Portanto, leva em considerao os aspectos fsicos e financeiros disponveis pela empresa, mas tambm a tecnologia em questo, o conhecimento e habilidades interativas (tcitas) de seus colaboradores.

    Figura 3: Recursos, capacidades e vantagem competitiva: as relaes bsicas

    Fonte: Grant (1995, p.121, traduo nossa).

    O autor desenvolve um modelo de relacionamento entre recursos e capacidades visando vantagem competitiva (figura 3). Este framework apresenta a estratgia oriunda tanto das

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    capacidades organizacionais como das influncias da indstria. Grant (1995) compreende capacidades organizacionais como a capacidade da empresa de realizar uma atividade especfica.

    Penrose (1959) enfatizava que a criao de valor no estava na posse dos recursos, mas sim no seu uso. O valor dependeria de como os recursos so articulados e combinados pela empresa (AMBROSINI; BOWMAN, 2009), o que seria influenciado pela atuao do gestor, por meio das rotinas e processos. (AUGIER; TEECE, 2007).

    De acordo com Sirmon, Hitt, Ireland e Gilbert (2011) a orquestrao de recursos oriunda da pesquisa em capacidades dinmicas e consiste basicamente em duas dimenses: (i) busca ou seleo e (ii) configurao ou desenvolvimento. O processo de busca ou seleo consistiria na identificao de ativos, na realizao de investimentos neles e no desenvolvimento de modelos de negcios. J a configurao ou desenvolvimento requer a coordenao dos ativos. Para os autores, a ao dos gestores est na estruturao, articulao e influncia dos recursos da empresa. Logo, eles posicionam os gestores para alm de meros recursos humanos, como responsveis pelo processo de orquestrao dos recursos.

    2.1.2.2 Capacidades Organizacionais

    As capacidades dinmicas, apesar de estarem na discusso acadmica desde 1997, com o estudo de Teece, Pisano e Schuen, provocam discusses quanto a sua definio, uma vez que os autores que esto realizando pesquisas possuem diferentes experincias tericas (EASTERBY-SMITH; LYLES; PETERAF, 2009). Zollo e Winter (2002) definem capacidades dinmicas como base nas rotinas, um elemento central dos estudos de Winter. No entanto, Eisenhard e Martin (2000) as definem como processos em que a natureza varia com o grau de dinamismo do mercado.

    Para Teece, Pisano e Schuen, (1997), as capacidades especficas de uma empresa e o seu dinamismo de propag-las para gerar novas competncias esto vinculados sua capacidade de explor-las a fim de manter sustentabilidade de suas vantagens competitivas. De acordo com os autores, o termo capacidade est associado gesto estratgica de adaptar, integrar e reconfigurar habilidades internas e externas. J o termo dinmica refere-se capacidade de renovar competncias e alcanar congruncia com o ambiente de negcios

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    em mudana. Essa capacidade de mudana est associada aos processos e s rotinas da empresa, assim como influncia do gestor na tomada de deciso de como alocar estes recursos. Alm disso, est vinculada postura estratgica da empresa com base nos ativos tecnolgicos, financeiros, infraestrutura e reputao. Por ltimo, tambm influenciada pela trajetria da organizao.

    Conforme Helfat et al. (2007a), as capacidades dinmicas so aquelas capazes de propositalmente criar, ampliar e modificar sua base de recursos. Para Dunning e Lundan (2010), as capacidades dinmicas seriam relacionadas com criar novos produtos ou servios e reestruturar suas atividades para melhor adaptar-se o ambiente competitivo (pg.13). Essa capacidade de reconfigurar-se seria uma habilidade de aprendizagem da organizao. (TEECE; PISANO; SCHUEN, 1997).

    Apesar de Teece, Pisano e Schuen (1997) indicarem processo, posio e trajetria como dimenses estratgicas para o entendimento das capacidades dinmicas, este trabalho d nfase na anlise das capacidades dinmicas pela perspectiva de processos. (TEECE; PISANO; SCHUEN, 1997). Busca compreender os processos gerenciais e organizacionais, que so compostos por rotinas e por alocao dos recursos, no intuito de verificar as possveis reconfigurao e ampliao das atividades da empresa.

    Bownan e Ambrosini (2003) afirmam que as capacidades dinmicas poderiam ser classificadas em quatros grandes processos:

    I. Reconfigurao: transformao e gesto de recursos; II. Ampliao: replicao de processos e sistemas;

    III. Aprendizagem: aumento da eficincia por meio da experimentao; e IV. Integrao criativa: habilidade da empresa de integrar seus ativos gerando numa

    nova reconfigurao de recursos. (AMBROSINI; BOWMAN, 2009).

    Teece (2007) apoia parte dessa classificao, ao associar as capacidades dinmicas aos processos organizacionais voltados para a aprendizagem e a inovao. Helfat et al. (2007b) tambm foca nos processos organizacionais como mecanismos que podem desenvolver e colocar as capacidades dinmicas em prtica (figura 4). Para a autora, difcil observar uma capacidade dinmica possuda pela empresa, a no ser quando essa capacidade est relacionada aos processos que a fazem existir.

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    Figura 4: Capacidades Dinmicas e processos organizacionais

    Fonte: Helfat et al. (2007b, p. 31, traduo nossa).

    J Prange e Vendier (2011) analisam a perspectiva das capacidades dinmicas com o processo de internacionalizao da firma. Segundo as autoras, ao expandir suas atividades internacionalmente, as empresas acumulam capacidades, como aprendizagem, adaptao cultural e receptividade mudana (pg. 126). Assim, elas sugerem que h diferentes capacidades para dar suporte a processos de internacionalizao distintos (prospectivo ou exploratrio), com base nas ideias de March (1991) sobre exploitation versus exploration.

    De acordo com Augier e Teece (2007), as capacidades dinmicas estariam relacionadas habilidade proativa da empresa em se adaptar para gerar e explorar competncias especficas da empresa, tanto internas como externas. No entanto, Aragon-Correa e Sharma (2003), postulam que as empresas, mesmo apresentando caractersticas semelhantes, utilizam de forma diferente suas capacidades, em funo da percepo do gestor. (AMBROSINI; BOWMAN, 2009).

    Por fim, Helfat et al. (2007a) afirma que o benefcio que as empresas podem obter por meio das capacidades dinmicas no depende apenas dos recursos e da capacidade de gesto, mas tambm do contexto em que as capacidades esto sendo operadas. Portanto, faz-se necessrio compreender o ambiente onde as empresas esto inseridas.

    O Journal of Management fez uma edio especial sobre a Resource-based Theory em setembro de 20118, em funo dos vinte anos do desenvolvimento desta linha de pesquisa (a contar do artigo seminal de Barney, em 1991). Essa edio tambm indicou que a RBV j atingiu um estgio maduro, com a consolidao dos estudos relacionando a RBV com empreendedorismo, estratgia, recursos humanos e desempenho. No entanto, Barney, Ketchen e Wright (2011) apontam que os pesquisadores de RBV devem-se revitalizar, ou inovar, para

    8 Disponvel em: http://jom.sagepub.com/content/37/5.toc - acesso em: 01/04/2012.

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    no correr o risco de entrar em declnio. (BARNEY; KETCHEN; WRIGHT, 2011). Peng (2009) sugeriu alguns debates acerca da RBV que podem vir a estender as pesquisas no tema: (i) a natureza esttica dos recursos versus as capacidades dinmicas, (ii) offshoring versus produo local e (iii) recursos domsticos versus capacidades transfronteirias. Este trabalho visa a contribuir na extenso da pesquisa das capacidades dinmicas no contexto internacional, ou transfronteirio.

    2.1.3 A influncia das instituies

    Historicamente, as instituies tm sido objeto de estudo tanto no contexto sociolgico (DIMAGGIO; POWELL, 1983; SCOTT, 1995) quanto na literatura econmica (NORTH, 1990). DiMaggio e Powell (1983) tentam explicar o porqu da homogeneidade de prticas e formas organizacionais. Os autores concluem que grande parte da homogeneidade ocorria em funo da fora da burocracia.

    A contribuio-chave do estudo est no detalhamento dos diferentes tipos de isomorfismos institucionais que so relevantes na compreenso da poltica e cerimonial da vida organizacional:

    I. Isomorfismo Coercitivo: ordens governamentais, presses formais e informais de outras organizaes;

    II. Isomorfismo Mimtico: repostas padronizadas incerteza, aplicao das melhores prticas;

    III. Isomorfismo Normativo: associado profissionalizao, ou seja, padres estabelecidos por membros de uma profisso a fim de definir mtodos de trabalho. (DIMAGGIO; POWELL, 1983).

    Verifica-se que esses processos de isomorfismo tendem a uniformizar as organizaes, j que elas buscam compreender o que o mercado solicita (via isomorfismo coercitivo e normativo) aliado ao que h de melhor (isomorfismo mimtico). Logo, essa semelhana pode acontecer naturalmente, com o objetivo de aumentar a legitimidade da empresa. Entretanto, no h evidncia de que essas prticas tenham relao com eficincia organizacional.

    Ainda na perspectiva sociolgica, Scott (1995) define instituies como estruturas regulativas, normativas e cognitivas que fornecem estabilidade e sentido ao comportamento

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    social (p. 33). Logo, o autor v o ambiente institucional de acordo com os seguintes pilares, que reprimem e direcionam o comportamento social:

    I. Elementos Regulativos: regras e regulamentos formais, como constituio, leis e

    propriedade intelectual; II. Elementos Normativos: regras informais como valores, padres, convenes,

    tradies, e cdigos de conduta, os quais guiam o comportamento e decises; III. Elementos Cognitivos: crenas compartilhadas, esquemas, scripts e modelos

    mentais. (SCOTT, 1995).

    J North (1990) v as instituies como as regras do jogo em uma sociedade ou, formalmente, so as restries humanamente inventadas para moldar a interao humana (p. 3). Para o autor, as instituies serviriam para reduzir a incerteza por guiar as interaes humanas, limitando as escolhas dos indivduos. Logo, as instituies podem ser tanto formais (composta por leis, regulamentaes e regras) como informais (normas, cultura e valores), ambas analisadas no estudo, pois so capazes de alterar o desempenho da economia ao afetar os custos de troca e produo.

    Peng e Heath (1996), ao tentar compreender a influncia das instituies na estratgia das empresas no mercado internacional, sentiram-se influenciados pelos dois vieses de anlise, pois acreditavam que eles se complementariam e viam a combinao como algo natural. Em funo das crticas recebidas ao seu trabalho por revisores de ambas as lentes tericas, decidiram estabelecer uma nova terminologia: a viso baseada em instituies (Institutional based-view), utilizando os elementos-chave dos conhecimentos disponveis sobre instituies, independente da origem do estudo, conforme quadro abaixo (PENG, WANG; JIANG, 2008; PENG, 2009):

    Quadro 3: Dimenses das instituies

    Grau de formalidade (North, 1990)

    Exemplos Pilares de apoio (Scott, 1995)

    Instituies formais Leis; Regulamentos; Regras

    Regulatrio (coercitivo)

    Instituies informais Normas; Culturas; tica

    Normativo Cognitivo

    Fonte: Peng (2009, p. 93, traduo nossa).

    Considerando que nenhuma empresa est imune ao ambiente institucional em que est inserida, dificilmente se pode argumentar que as instituies no interagem com as

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    organizaes ao sinalizar quais escolhas so aceitveis. (PENG, 2002). Hoskisson, Eden, Lau e Wright (2000) afirmam que as instituies podem facilitar a estratgia das empresas ao permitir que elas ajam ou reajam mais ativamente no ambiente institucional de que fazem parte, uma vez que elas tenham a capacidade de contornar as restries apresentadas.

    De acordo com Peng (2002), difcil separar os efeitos das instituies das estruturas sociais e do comportamento. Logo, em qualquer escolha estratgica que a organizao faa, haver influncia do ambiente institucional, seja nas restries formais ou informais. Ainda segundo o autor, ao tratar as instituies como variveis independentes, a viso baseada em instituies foca na interao dinmica entre instituies e organizaes (figura 5). As escolhas estratgicas seriam resultado destas interaes, refletindo as restries formais e informais que a estratgia possa confrontar.

    Figura 5: Instituies, Organizaes e Escolhas Estratgicas

    Fonte: Peng (2002, p. 253, traduo nossa).

    J Hollingsworth (2000) compartilha das ideias de Peng e Heath (1996) de que necessrio dedicar mais esforos para compreender o ambiente institucional. O autor analisa a relao das instituies com inovao, na tentativa de entender como a composio institucional de uma sociedade impacta na sua capacidade de inovao. Logo, apresenta uma trade diferente da proposta por Peng (figura 6), composta pelos seguintes elementos: ambientes institucionais, capacidades organizacionais e inovao. O autor acredita que as instituies, ao darem suporte ao comportamento dos membros da sociedade, afetam a inovao do pas.

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    Figura 6: Ambientes Institucionais, organizaes e inovao

    Fonte: Hollingsworth (2000, p. 598, traduo nossa).

    Segundo Hollingsworth (2000), a fim de desenvolver uma teoria slida sobre instituies, necessrio promover um trabalho colaborativo entre os pesquisadores e estabelecer parmetros de anlise institucional. O autor ressalta a relevncia de mapear os mltiplos nveis em que as instituies tm sido analisadas, incorporando os pesquisadores de cada temtica. No primeiro nvel, constariam as propriedades fundamentais das instituies que no so facilmente perecveis e servem de base para qualquer anlise institucional. J os arranjos institucionais envolvem a coordenao de diversos atores econmicos. O prximo nvel, o de setores institucionais, incluem todas as organizaes da sociedade que fornecem um servio ou produto. Por fim, os ltimos dois nveis referem-se a organizaes e aos resultados dos componentes institucionais. (HOLLINGSWORTH, 2000). Os componentes de anlise institucional so sintetizados a seguir, com base na sua permanncia e estabilidade:

    Quadro 4: Componentes de anlise institucional

    Instituies: normas, regras, convenes, hbitos e valores (North,1990; Burns e Flam, 1987). Arranjos institucionais: mercados, estados, hierarquias corporativas, redes, associaes, comunidades (Hollingsworth e Lindberg, 1985; Campbell et al., 1991; Hollingsworth et al., 1994; Hollingsworth e Boyer, 1997). Setores institucionais: sistema financeiro, sistema de educao, sistema de negcios, sistema de pesquisa (Hollingsworth, 1997). Organizaes: (Powell e DiMaggio, 1991). Resultados e desempenho: estatutos; decises administrativas, natureza, quantidade e qualidade dos produtos industriais (Hollingsworth, 1991, 1997); desempenho setorial e da sociedade (Hollingsworth e Streeck, 1994; Hollingsworth et al., 1990; Hollingsworth e Hanneman, 1982).

    Fonte: Hollingsworth (2000, p. 601, traduo nossa).

    Considerando que a Viso Baseada em Instituies desenvolvida por Peng (2002) trabalha com instituies formais e informais e que Hollingsworth (2000) classifica o quadro institucional como uma forma de avaliar diferentes nveis de instituio, este trabalho utiliza

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    apenas os dois primeiros nveis (Instituies, Arranjos Institucionais) do trabalho de Hollingsworth (2000). Portanto, ao considerar a influncia das instituies no desenvolvimento da estratgia de internacionalizao das empresas brasileiras, analisa as normas, regras das instituies formais para o fomento internacionalizao (Governo Federal, Estadual e Municipal), bem como a influncia da Associao de Classe.

    De acordo com Peng, Wang e Jiang (2008), os pesquisadores raramente buscaram compreender e explorar a interao entre instituies e organizaes nas escolhas estratgicas, pois partiam do princpio que esses elementos eram condies em segundo plano. No entanto, essas situaes tidas como certas (taken for granted) so insuficientes para compreender o desempenho das empresas em ambientes dinmicos, principalmente de economias emergentes. Logo, os autores afirmam que, em se tratando de economias emergentes, a viso baseada em instituies deveria ser considerada como o terceiro pilar da estratgia, em paralelo viso baseada na indstria e viso baseada em recursos, representados pela figura 3 deste estudo. (PENG; WANG; JIANG, 2008).

    Em continuidade, Peng et al. (2009) trabalham na consolidao do trip estratgico ao revisar a formao do conceito da viso baseada em instituies. Ainda, os autores afirmam que em situaes onde as restries formais no esto claras, as restries informais iro desempenhar um papel maior na reduo da incerteza, fornecendo orientaes, e conferindo legitimidade e recompensas para os gestores e as empresas (p. 68). Tratando-se de economias emergentes, quando h mudanas no ambiente institucional, as estruturas informais podero auxiliar na identificao e explorao de oportunidades.

    Peng, Wang e Jiang (2008) reforam a relevncia da viso baseada em instituies como perspectiva de anlise em estratgia. Juntamente com a slida viso baseada na indstria (defendida por Porter) e a viso baseada em recursos (ancorada nos estudos Barney e Wernerfelt), a abordagem institucional auxiliaria a compreender os negcios internacionais nos pases emergentes, uma vez que, nestas regies, as diferenas institucionais so mais salientes. Em consonncia, Mais e Amal (2009) salientam a importncia do reconhecimento dos aspectos extra-firma como sistemas econmicos e sociais, quadro institucional, processos polticos e culturais nos estudos acerca de negcios internacionais. (MAIS; AMAL, 2009).

    Segundo Wang, Hong, Kafouros e Wright (2012), o efeito da atuao governamental no processo de internacionalizao das empresas varia conforme os recursos e capacidades prprios, uma vez que as empresas possuem habilidades distintas na internalizao de vantagens oriundas de foras institucionais. Fleury e Fleury (2011), sob uma perspectiva das

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    competncias organizacionais, afirmam que as dimenses sociopolticas e culturais, alinhadas dotao de fatores do pas, moldam o estilo de gesto. Por isso, diversas empresas podem estar inseridas numa estrutura institucional bastante similar, mas, em funo das caractersticas de gesto de cada uma, podem apresentar resultados diferentes da influncia institucional. (MUDAMBI; NAVARRA, 2002).

    Portanto, a questo no mais se as instituies importam para internacionalizao das empresas, mas sim como elas importam. (WANG et al., 2012). Conforme Dunning e Lundan (2008), as instituies no nvel nacional afetam a atratividade tanto para o pas de origem como para o receptor das atividades da multinacional.

    2.2 Negcios Internacionais

    Segundo Welch e Luorasterinen (1988), a internacionalizao um processo de crescente envolvimento com operaes internacionais. Os autores dividem as operaes em internacionalizao para dentro (inward), caracterizada pelos processos de importao, obteno de licenas ou contratos de franquias de empresas estrangeiras, ou internacionalizao para fora (outward), que ocorre por meio dos processos de exportao, participao em joint-ventures, investimento direto no exterior. Este trabalho busca compreender a internacionalizao para fora (outward) das empresas caladistas brasileiras. No entanto, podero surgir elementos da cadeia caladistas oriundos da internacionalizao para dentro (inward), especialmente na importao de matrias-primas.

    Tratando-se dos estudos sobre negcios internacionais, duas grandes abordagens se consolidaram: uma de vis mais econmico, ancorada nos estudos de Williamson (1975), Dunning (1980; 1988) e Anderson e Gatignon (1986); e outra, de cunho comportamental, baseada em estudos da Escola de Uppsala. ( JOHANSON; WIEDERSHEIM-PAUL, 1975); JOHANSON; VAHLNE, 1977, 1990, 2003) . Este estudo apresenta brevemente cada uma destas abordagens e suas principais contribuies.

    At o momento, cr-se que os clssicos paradigmas e teorias que sustentam os estudos de internacionalizao podem ser utilizados para estudar as empresas oriundas de pases emergentes, necessitando ajustes em relao ao dinmico contexto econmico e o ambiente

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    institucional em que esto inseridas. (FLEURY; FLEURY, 2011; RUGMAN; VERBEKE; NGUYEN, 2011).

    2.2.1 Abordagem Econmica

    Para Ronald Coase (1937), diferentemente da proposio de Adam Smith (1776) de que os agentes econmicos deveriam atuar livremente em busca da eficincia (livre mercado) e de que o mercado se autorregularia, os mercados falham, sendo necessria, ento, a atuao de outras instituies para regul-los. De acordo com o autor, a competio imperfeita, a assimetria de informaes e as externalidades contradizem a teoria neoclssica esttica de mercado eficiente. (COASE, 1937). Ainda, os custos da empresa no se resumem a custos de produo, existindo tambm os custos de transao, os quais podem ser exemplificados pelos custos da criao dos contratos, negociao e obteno de informao.

    Williamson (1975), a partir do trabalho de Coase (1937), analisou o ambiente econmico e suas diferentes estruturas de governana: mercados (contratao externa de atividades), hierarquias (utilizao de sua prpria estrutura para realizar as atividades) ou estruturas mistas. O autor ainda indicou que as variveis do ambiente (incerteza e complexidade) e as variveis do comportamento humano (racionalidade limitada e oportunismo) seriam os aspectos fundamentais envolvidos nos custos de transao. De acordo com Barretto (2002), as empresas organizariam suas atividades conforme a alternativa que apresentasse o custo de transao mais favorvel, e a escolha das atividades dependeria dos atributos (frequncia, especificidade e incerteza) das transaes.

    A teoria da Internalizao analisa os custos de transao em negcios internacionais, pois as falhas de mercado levariam as empresas multinacionais a escolher determinado modo de entrada no pas estrangeiro em que desejasse negociar seus produtos. De acordo com Buckley e Casson (1976), o efeito localizao explicaria onde seriam realizadas as operaes de produo, j o efeito propriedade determinaria a questo do controle das atividades.

    Dunning (1980; 1988) formula o Paradigma Ecltico da Produo a partir dos estudos sobre os custos de transao e da teoria de internalizao de mercados para explicar a motivao da internacionalizao. Segundo o autor, a empresa decidir seu ingresso no mercado internacional a partir dos seguintes elementos:

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    I. Avaliao de seus ativos e capacidades da organizao, o que o autor denomina como propriedade, que pode ter carter estrutural ou pela administrao de seus recursos;

    II. Vantagens provenientes da localizao de seus empreendimentos, o que o autor denomina localizao, que determinaria a posio geogrfica onde ocorreria a produo; e

    III. Capacidade de absorver ativos e transferi-los ou no para outros pases, que o autor denomina como internalizao, que avalia a possibilidade de transferir ativos alm das fronteiras nacionais.

    Logo, para o autor, a produo no exterior seria decorrente da anlise criteriosa desses trs elementos: Propriedade, Localizao e Internalizao (PLI ou OLI, do original Ownership, Location and Internalization). (DUNNING, 1980, 1988). Em 1997, Dunning incluiu no Paradigma Ecltico de Produo alguns elementos relacionados com a globalizao dos mercados, tais como alianas estratgicas e networks, que alterariam a dinmica da vantagem propriedade, uma vez que as empresas atuariam em rede. Ainda, avaliava a ao das autoridades nacionais ao influenciar na formao de centros de excelncia, o que j remete ao papel das instituies no desenvolvimento econmico. (BARRETTO, 2002).

    Anos depois, Dunning e Lundan (2008) examinaram a incorporao da dimenso institucional no Paradigma OLI como um determinante do comportamento das multinacionais e seus efeitos nos pases de origem e hospedeiros. Alm disso, analisaram como as atitudes e aes das multinacionais afetariam o contedo e o significado dessas instituies ao longo do tempo. Os autores afirmam que a teoria de custos de transao pode ser utilizada para explicar o que pode ser internalizado e de que forma, mas, para elucidar o crescimento dinmico das empresas, necessrio analisar a dependncia de trajetria de recursos e as capacidades especficas das empresas.

    Em continuidade reviso do Paradigma, Dunning e Lundan (2010) incluem as capacidades dinmicas associadas ao contexto institucional. Segundo os autores, as empresas multinacionais exercem um papel fundamental ao gerar inovao institucional combinada com capacidades local que podem ser transferidas para outros locais.

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    2.2.2 Abordagem Comportamental

    A perspectiva comportamental de negcios internacionais, assim como a Viso Baseada em Recursos, apresenta em seu desenvolvimento influncia dos estudos de Penrose (1959), em que o crescimento da firma estaria ligado sua aquisio de conhecimento, por meio da experincia coletiva da empresa, e influncia do trabalho de Cyert e March (1963), na questo dos limites da racionalidade e da aprendizagem organizacional. (BJRKMAN; FORSGREN, 2000).

    Os primeiros estudos dessa linha de pesquisa surgiram na Escandinvia, mais precisamente na Escola de Uppsala (Sucia), local que, posteriormente, se tornou referncia de estudos em negcios internacionais. Sune Carlson criou um grupo de pesquisa para compreender o processo de internacionalizao das empresas suecas, uma vez que ele acreditava que as empresas exportavam ou investiam no exterior quase sem conhecimentos sobre mercados externos, alm de terem alto grau de incerteza das operaes. (BJRKMAN; FORSGREN, 2000; FORSGREN, 2002). Em 1975, Johanson e Wiedersheim-Paul fizeram uma anlise do processo de internacionalizao de empresas suecas (composto por quatro casos) e concluram que a internacionalizao seria consequncia de uma srie de decises incrementais da empresa. Para os autores, os maiores obstculos para a internacionalizao so a falta de conhecimento e de recursos, que poderia ser reduzida por meio da aprendizagem sobre mercados externos e operaes.

    Os autores propuseram um processo de internacionalizao em quatro estgios: I. exportao no-regular;

    II. exportao via representantes;

    III. estabelecimento de subsidiria de vendas; e IV. produo e manufatura no local.

    Os estgios envolvem diferentes nveis de comprometimento de recursos e de informao, o que foi denominada cadeia de estabelecimento (establishment chain). (JOHANSON; WIEDERSHEIM-PAUL, 1975). Em seguida, Johanson e Vahlne (1977) desenvolveram um modelo de internacionalizao da firma que previa a aquisio gradual, integrao e uso do conhecimento sobre mercados externos e operaes.

    A partir da dcada de 90, os pesquisadores nrdicos comearam a perceber a importncia das redes de relacionamento (networks) para o processo de internacionalizao da

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    empresa. Assim, a experincia internacional poderia advir de empresas conectadas na rede, e no somente da experincia da prpria empresa. (JOHANSON; VAHLNE, 1990, 2003). De acordo com Johanson e Vahlne (2003), por meio da rede, as empresas podem aprender com as demais empresas envolvidas na rede sobre as necessidades, recursos, estratgias e contextos de negcios internacionais.

    Em funo das crticas recebidas ao longo das ltimas dcadas, aliadas s mudanas das prticas comerciais e avanos tecnolgicos, Johanson e Vahlne (2009) fazem uma releitura do modelo dos processos de internacionalizao, enfatizando a importncia das redes de relacionamento. Dentre as principais mudanas no modelo, destacam-se: (i) extenso do conceito de conhecimento para necessidades, capacidades e estratgias; (ii) a importncia da posio dos atores na rede; (iii) alterao do conceito atividades atuais para aprendizagem, criao e construo da confiana. (JOHANSON; VAHLNE, 2009). Por fim, Schweizer, Vahlne e Johanson (2010) do continuidade na releitura apresentada em 2009 e incluem o elemento empreendedorismo no modelo, por meio dos elementos capacidades empreendedoras e explorao das contingncias.

    Figura 7: Internacionalizao como um processo empreendedor

    Fonte: Adaptado de Schweizer, Vahlne e Johanson (2010, p. 365, traduo nossa).

    A seguir, so analisadas as estratgias de entrada em mercados externos que envolvem o processo de internacionalizao de empresa, apresentando autores que complementam os estgios de envolvimento desenvolvidos por Johanson e Wiedersheim-Paul (1975) e que tambm incluem outras variveis alm de comprometimento de recursos na deciso de ingressar no mercado externo.

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    2.3 Estratgia de Entrada em Mercados Externos

    Segundo Cavusgil, Knight e Rieberger (2008) a estratgia no contexto internacional um plano do posicionamento da empresa diante dos competidores e a configurao de atividades capazes de gerar valor numa escala global. Isso pode ocorrer por meio da alocao de recursos escassos em nvel mundial, desenvolvimento de parcerias globais, criao de escala global de produo e participao em diversos mercados.

    Para Cavusgil, Ghauri e Agarwal (2003), a maior diferena nas transaes entre o contexto nacional e internacional que as operaes internacionais ocorrem em mais de um pas e em ambientes mercadolgicos distintos, o que amplia a complexidade dessas operaes. Para o autor, o termo ambiente inclui: estrutura de mercado, foras econmico-poltico-legais, canais de distribuio, caractersticas culturais e sociais. Esses elementos so bastante dinmicos e mutveis. Logo, as empresas devem analis-los constantemente a fim de reduzir a incerteza sobre variveis incontrolveis no mercado externo, como restries comerciais, regras governamentais, infraestrutura e cultura. O principal desafio do gestor est em moldar as variveis controlveis, ou seja, seu marketing mix (produto, praa, preo e promoo) em funo das variveis incontrolveis do ambiente externo. (CAVUSGIL; GHAURI; AGARWAL, 2003).

    Ao decidir ingressar no mercado internacional, os empresrios devem estar cientes de uma srie de decises que devero ser tomadas, as quais envolvero consideraes estratgicas em funo do local (onde), tempo (quando) e modo de entrada (como) (PENG, 2009). Segundo Osland, Taylor e Zou (2001), uma vez decidido entrar ou expandir a atuao em mercados estrangeiros, a empresa dever determinar a sua estrutura de operao no local, chamado de arranjo institucional.

    Considerando que o mercado externo apresenta um ambiente institucional diferente do pas de origem, bem como que as caractersticas da indstria no exterior podem proporcionar diferentes nveis de competio e possveis barreiras de entrada para empresas estrangeiras, torna-se necessrio analisar o potencial de entrada em cada mercado alvo. Peng (2009) desenvolve um modelo integrador que visa a apresentar as principais consideraes em cada um dos elementos do trip estratgico para o ingresso no mercado externo:

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    Figura 8: Modelo de entrada em mercados externos

    Fonte: Peng (2009, p.34, traduo nossa).

    Percebe-se que consideraes acerca da indstria so compostas pelos mesmos elementos da anlise proposta por Porter (2004) no Modelo das Cinco Foras, previamente trabalhado neste estudo. J as consideraes baseadas nos recursos, ou RBV, so focadas nos elementos de vantagem competitiva sustentvel, desenvolvido por Barney (1991). No entanto, a anlise das capacidades organizacionais da firma para o processo de internacionalizao tambm foi indicada por Cavusgil, Ghauri e Agarwal (2003, p.51, traduo nossa):

    sempre que uma empresa decide internacionalizar o seu negcio, ela deve reavaliar as suas capacidades ou pontos fortes e fracos para tentar encontrar um ajuste entre as suas capacidades e o processo de internacionalizao. Isto pode envolver uma avaliao dos recursos das empresas, tecnologia, processos e produtos ou servios que a empresa pretende vender a partir da perspectiva do mercado-alvo estrangeiro.

    O autor reconhece que apenas identificar as capacidades da empresa pode no ser o suficiente para o processo de internacionalizao, sendo necessrias adaptaes conforme a regulamentao e a cultura do pas alvo.

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    Em relao s consideraes acerca das instituies, h grandes riscos associados ao pas-alvo em termos regulatrios, de barreiras comerciais explcitas (tarifrias, no tarifrias e necessidade de contedo local), e de restrio a determinados modos de entrada. Ainda, os riscos cambiais e a distncia cultural tambm podero afetar os negcios da empresa no exterior. (PENG, 2009).

    Aps a anlise dos elementos Indstria, Recursos e Intuies, as empresas podero ter mais clareza na determinao dos modos de entrada nos mercados externos de interesse. Root (1994) afirma que as estratgias de entrada esto associadas a cinco grandes decises:

    I. Escolha do produto/mercado alvo; II. Objetivos e metas para o mercado alvo;

    III. Escolha do modo de entrada para penetrar este mercado; IV. Plano de marketing para penetrar este mercado e V. Sistema de controle para monitorar o desempenho.

    De acordo com o autor, os modos de entrada podem ser classificados em: exportao, modos contratuais (licenciamento e franquias) e modos de investimento (joint ventures e subsidirias). Osland, Taylor e Zou (2001) afirmam que os modos de entrada sero determinados conforme a necessidade de recursos disponveis, o controle desejado nas operaes e o nvel de risco tecnolgico envolvido. As figuras abaixo apresentaro as caractersticas de cada alternativa conforme estas variveis.

    A figura 9 demonstra a evoluo dos recursos requeridos da exportao para o estabelecimento de uma subsidiria, em que so necessrios investimentos elevados de capital e recursos humanos. Embora os recursos sejam importantes para a definio do modo de entrada, ele no o nico aspecto a ser considerado. Percebe-se tambm a elevao do controle dessas operaes pela empresa nos diferentes modos de entrada. Segundo os autores, o controle a habilidade da empresa para influenciar as decises relativas s operaes em mercados externos.

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    Figura 9: Caractersticas-chave das alternativas de modo de entrada: recursos e controle

    Fonte: Osland, Taylor e Zou (2001, p. 155, traduo nossa).

    Garrido, Vieira, Slongo e Larentis (2009) desenvolveram um quadro comparativo dos diferentes modos de entrada em mercados internacionais. Os autores categorizaram os modos de entrada conforme a sua complexidade, avaliando o nvel de controle, necessidade de recursos/investimentos e transferncia de tecnologia, elementos que foram previamente estudados por Osland, Taylor e Zou (2001).

    Quadro 5: Comparao dos modos de entrada em mercados internacionais

    Modos de Entrada em Mercado Internacionais Baixa Complexidade Alta Complexidade

    Exportao Direta e Exportao Indireta.

    Franquias, Licenciamentos e Contratos de Produo.

    Joint Ventures; Divises no Exterior e Aquisies.

    Pouco ou nenhum controle sobre as atividades de marketing internacional.

    Grande controle sobre as atividades de marketing internacional.

    Total controle sobre as atividades de marketing internacional.

    Uso de intermedirios no processo de internacionalizao.

    Uso de parceiros ou scios internacionais no processo de internacionalizao.

    Inexistncia de intermedirios ou parceiros no processo de internacionalizao (atuao direta).

    Maior dificuldade para acesso e seleo de informaes.

    Bom acesso a informaes. Maior acesso a informaes.

    Menor necessidade de recursos e investimentos.

    Mdia necessidade de investimentos e recursos.

    Grande necessidade de investimentos e recursos.

    Mdia possibilidade de transferncia de tecnologias.

    Maior possibilidade de transferncia de tecnologias.

    Menor possibilidade de transferncia de tecnologia.

    Pouco contato com o cliente/consumidor, concorrente internacional e ambiente externo.

    Mdio contato com o cliente/consumidor, concorrente internacional e ambiente externo.

    Elevado contato com o cliente/consumidor, concorrente internacional e ambiente externo.

    Menor risco na operao. Mdio risco na operao. Maior risco na operao.

    Fonte: Adaptado de Garrido et al. (2009, p.324).

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    No entanto, os autores ainda consideraram a necessidade do uso de intermedirios no processo de internacionalizao, alm do acesso informao, do contato com o cliente, concorrente e dos riscos da operao em si. (GARRIDO et al., 2009). Pode-se perceber que as categorias analisadas possuem sinergia com o trip estratgico, pois abordam elementos da indstria, da organizao e de seu ambiente externo.

    A fim de analisar as estratgias de internacionalizao das empresas caladistas, alm dos modos de entrada selecionados para atuar internacionalmente, este estudo considera tambm:

    I. Recursos e capacidades organizacionais desenvolvidos para atender as atividades com o mercado externo;

    II. Os graus de controle e envolvimento (utilizao de intermedirios e contato com o cliente) da empresa nas operaes internacionais;

    III. O processo de aprendizagem e os conhecimentos adquiridos pela participao em redes (networks) e pelo prprio processo de internacionalizao, e

    IV. As adaptaes de produtos/servios em funo de regras formais e informais (cultura).

    A seguir, apresenta-se um quadro terico que sintetiza os contedos trabalhados ao longo do captulo 2. Ainda, desenvolve-se uma proposta de modelo terico com base na literatura em questo.

    2.4 Proposies de Modelo e Quadro Terico

    Tendo em vista que o foco de pesquisa deste trabalho so as estratgias de internacionalizao, prope-se aproximar os modelos tericos previamente apresentados (HOLLINGSWORTH, 2000; PENG, 2002; PENG; WANG; JIANG, 2008; PORTER, 1990). Assim, busca-se compreender a relao das capacidades organizacionais (por meio da anlise dos recursos e capacidades dinmicas), das indstrias de apoio, das instituies governamentais e da associao de classe, alm da influncia do acaso na configurao das estratgias de internacionalizao das empresas brasileiras (figura 9).

    O modelo apresentado compila as principais contribuies dos autores e refora a relao entre as variveis (indicando sua origem terica) no desenvolvimento e reformulao

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    das estratgias de internacionalizao. Os estudos anteriores indicam uma relao bidirecional entre a maioria das variveis. No entanto, uma vez que o objeto de estudo so as estratgias de internacionalizao, o modelo proposto visa a analisar de que forma cada elemento do trip influencia na tomada de deciso da empresa ao atuar no mercado externo. Ainda, avaliar tambm a interao entre os elementos do trip na determinao da estratgia (ex. a influncia do governo e das indstrias de apoio nos recursos da firma). Destaca-se que os modelos anteriores foram de extrema valia para a compreenso de cada elemento do trip estratgico. Contudo, no estavam direcionados especificamente para a compreenso do fenmeno internacionalizao.

    Do modelo de Porter (1980) foi retirado atributo de condies de demanda, pois acredita-se que a contribuio da demanda brasileira s empresas estaria relacionada basicamente com a economia de escala. J do modelo de Hollingsworth (2000) foi retirado o elemento inovao e enfatizado as capacidades organizacionais. De Peng (2002) consideram-se escolhas estratgicas como internacionalizao. Por ltimo, de Peng (2008), alm de apresentar os trs elementos do trip influenciando a estratgia, prope-se que eles interajam entre si.

    Figura 10: Proposta de modelo terico

    Fonte: Elaborado pela autora com base em Hollingsworth (2000), Porter (1990), Peng (2002) e Peng (2008).

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    Por capacidades organizacionais, so considerados recursos e capacidades dinmicas da empresa. J por estratgia, o foco deste estudo na internacionalizao de empresas, ancorado pelas teorias de internacionalizao. No entanto, tambm sero analisadas a estrutura e a rivalidade entre os concorrentes para a iniciativa de atuar internacionalmente. Por Instituies, so avaliadas instituies governamentais em nvel federal, estadual e municipal no fomento da internacionalizao de empresas, alm da associao de classe da indstria em questo, representando os arranjos institucionais. O papel do cluster na determinao da estratgia avaliado pelas indstrias de apoio. J a influncia do acaso pode ser avaliada em casos inesperados que alteraram o contexto econmico do pas e vieram a refletir na estratgia da empresa.

    A fim de auxiliar na avaliao emprica dos elementos do modelo, desenvolveu-se um instrumento de pesquisa (quadro 6), com categorias de anlise relativas a cada um dos elementos propostos no modelo. Salienta-se que no a inteno deste estudo desenvolver tipologias acerca de estratgia, mas otimizar uma futura coleta de dados e determinar parmetros de avaliao e comparao entre empresas brasileiras.

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    Quadro 6: Influncia da Inds