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CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 02 - LINGUAGEM E PENSAMENTO NA FILOSOFIA GREGA - Traços mais significativos para uma melhor compreensão do Problema dos Universais na Idade Média Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 1

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Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 1

CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA

02 - LINGUAGEM E PENSAMENTO NA FILOSOFIA GREGA - Traços mais significativos para uma melhor compreensão do Problema dos Universais na Idade Média

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Parmênides

• Inicialmente temos de ter em mente que o problema das relações entre a Linguagem e o Pensamento estão presentes em todo o modelo grego;

• Contudo, somente na obra de Parmênides teremos o protagonismo que nos interessa estudar a esse respeito.

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Parmênides• No poema acerca da Natureza o Eleata coloca na

boca da Deusa um argumento complexo:– Ressalta a unidade lógica, epistemológica e ontológica

de uma entidade que ele chama de “o ser”;– Essa entidade proporciona a fundação de uma única

realidade/verdade (alêtheia) que corresponde a um único pensamento (noein, nôema) ou a uma única “coisa” pensada e dita: o ser

• Essa noção entre unidade e identidade é expressa pela frase do fragmento 3 do Poema: – “O mesmo é pensar e ser”

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Parmênides

• O argumento não é difícil de se mapear, embora sua interpretação seja controversa:– Só se pode pensar (2.2): “é” e “não é”;– Ao negar um se chega ao outro e negando este se

regressa àquele (2.3b, 5b);– Mas o “não é” não pode ser pensado, nem apontado (2.7-

8), pelo fato de que não é informativo (2.6), conclui-se que “ser” e “pensar” são o mesmo (3);

– Dessa visão segue ser necessário que “ser”, “dizer” e “pensar” sejam (6.1a), pelo fato de serem possíveis (6.1b); mas, ao contrário, o nada não é (6.2a)

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Parmênides• Os mortais ignoram essa posição e confundem “ser” e “não ser” pelos hábitos

dos sentidos;• Mas para acabar com essa confusão devemos ter em mente que o “ser”:1) É ingênito e indestrutível (8.3), compacto, inabalável, sem fim (8.4), eternamente

presente, homogêneo, uno, contínuo (8.5-6a), pois não tem origem, nem razão de ser (8.9-10) no nada (8.6b-10);

2) A) é único (8-11-13a), não cresce, nem morre (8.13b-14), é ou não é; B) pois “não é” é impensável e inexprimível (8.17-18), enquanto “é” é autêntico (8.19): não nasce, nem morre (8.19); não era nem vem a ser, pois “é” (8.20);

3) É indivisível (8.22a), homogêneo, contínuo, cheio, consigo (22b-25);4) É imóvel/imutável (8.26), sem princípio nem fim (8.27), pois é ingênito e indestrutível

(8.27b-28): o mesmo, imóvel e firme (8.29);5) É completo (8.32), pois de nada carece, enquanto o nada de tudo carece (8.33), sendo

limitado, logo, completo (8.42), equilibrado como uma esfera (8.43-45), invariável, inviolável, igualmente nos limites (8.46-49)

6) Arremate do argumento: O mesmo é o pensamento e a “causa-fim” (houneken) do pensamento [o ser] (8.34), pois sem o ser não há pensar (8.35-36); só o ser é: inteiro e imóvel (8.36-38a) e a ele se referem os vários nomes postos pelos mortais, iludidos (8.38b-41).

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Parmênides

• Tal argumentação nos leva a levantar duas observações:– Na Via da Verdade Parmênides não presta atenção

à observação do mundo exterior (como era feito por seus antecessores que explicavam a gênese do cosmo mediante a emergência dos contrários que derivavam de uma natureza substancial original);

– Seu ponto de partida é exclusivamente a experiência humana do pensamento e da linguagem.

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Parmênides• O que significa pensar: “é”?– Significa primeiramente afirmar;– A alternativa para isso – “não é” – significa negar.

• Mas o que é negado ou afirmado?– A resposta será exposta no fragmento 8:• Teremos a noção que nos permitirá, explicitamente, identificar “o

Ser” como o sujeito da afirmação.

• A resposta já se prefigura no frag. 2 que coloca o ponto de partida de todo o argumento na afirmação “é”, aspecto que postula não somente o cancelamento do caminho do “não ser”, como a identidade do pensamento com a identidade pensada e dita (fragm. 3)

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Parmênides

• O que o movimento anterior proporciona é a eliminação do acesso do não ser à identidade.

• Essa será uma marca que dará a Parmênides uma gama de influências na tradição reflexiva grega, sobremaneira nas obras epistemológicas e ontológicas de Platão e, em menos grau, de Aristóteles.

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Parmênides• Se focarmos o olhar exclusivamente na Via da Verdade (fragms.

2-8.49) teremos um argumento dividido em três momentos:1. (fragms. 2 e 3) Denúncia da inviabilidade onto-epistemológica da

via negativa (2.5-8), que resulta na afirmação da identidade do ser com o pensar;

2. (fragms. 6 e 7) Mostra a finalidade programática do Poema. O “pensamento” dos mortais é “errante” (6.4-5) pois confunde ser e não ser e ignora a disjunção que os opõe (6.1-2a). A causa do erro é a confiança na percepção sensível (7.3-5) e o remédio o debate argumentativo (7.5)

3. O argumento expõe as conseqüências da aceitação da premissa “é” mediante a enumeração dos “sinais” do ser (8.1-49). Essa visão nos expõe uma metafísica que será contundente para a posteridade. Sua metafísica parte do pensamento e somente poderá ser realizada através do estudo da evidência lingüística.

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Parmênides

• O que essa estrutura pode nos revelar?• Uma entidade cuja natureza reflete ou é refletida

pela gama dos sentidos do termo a que se refere.• O modo constitutivo do ser como uma entidade

una, imutável, perfeita e eterna pode ser explicada pela reificação dos sentidos presentes no verbo grego “ser”, que estão fundidos na referência a um significante abrangente.

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Parmênides

• Afirmar “é” equivale a fazer convergir no ser a multiplicidade de sentidos que o verbo condensa;

• A consideração de algo que “não é” evidencia a insanável contradição decorrente da incognoscibilidade (2.5-8, 8.8-9, 8.16b-18a, 8.34-36a);

• Essa noção da pluralidade de einai será atacada por Platão, no Sofista, e rejeitada por Aristóteles, (Met. D7, 1017a22-35).

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Parmênides

• Toda essa argumentação nos estabelece a cisão entre a linguagem/pensamento e a sensibilidade– Essa linha contrasta o caminho dos sentidos

(costume muito experimentado) (7.3-5a) com a prova do logos (muito disputada) (7.5b) e nos conduz ao caminho daquilo que é (8.1-2a)

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Parmênides

• A afirmação “é” funde os sentidos identitativo e veritativo, mas não nos oferece uma possibilidade de leitura predicativa de “ser” (8.38-39; 19.3).

• A questão abordada nos coloca que se “todos os nomes que os mortais instituíram” são “acerca do ser” (8.37-39), tal instituição virá somente da opinião/crença (19.1-3), pois, partindo de “é” para “o ser é”, só podemos chegar a “o ser é ser” e, por isso, confirmar a noção de identidade.

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Parmênides

• Fica claro, portanto, que o modelo desenhado identifica pensamento e ser (aqui temos o ponto pacífico da tese);

• O problema é que no meio desses dois pólos temos a aparência sensível.

• Já que a tarefa da filosofia é explicar também a aparência, como podemos eliminar a dicotomia e a distância desses dois pólos e explicar a aparência, o sensível?

• A resposta, dada por Platão, postula a hipótese das formas.

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Platão

• Todo o percurso platônico está em tentar solucionar essa cisão, herdada de Parmênides, entre a realidade inteligível e a aparência sensível (Fédon 72e-76a; República 506d-535a, 476a-480a; Timeu 27d ss).

• O problema expresso em todo o percurso do dualismo platônico pode ser condensado na briga entre duas dimensões: uma ética e antropológica; outra ontológica, epistemológica e lógica.

• Nessa última está inserido nosso interesse frente á predicação.

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Platão• Nos diálogos onde temos expressa a hipótese platônica das

Formas (Fédon 100a), vemos as estruturas onto-epistemológicas do Ser eleático caracterizadas ora como sujeitos, ora como predicados perfeitos, únicos, eternos, imutáveis.

• As formas atomizam o ser eleático e expressam a convergência de cada entidade para a plenitude de sentidos do verbo ‘ser’.

• O que temos, portanto, é a instauração, pela teoria platônica, de uma natureza una e inseparável do ser eleático, manifesta em várias formulações, caracterizando a teoria das Formas (como a acumulação de sentidos, fundidos e inseparáveis, ao mesmo tempo, entre o “ser” e o “verbo ser”).

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Platão• A pluralidade de termos famosos (“ser”, “essência”,

“entidade”, “existência”, etc.) mostram a forma com que ocorre a acumulação narrada anteriormente.

• Mas qual o problema: essa pluralidade é reconhecida por Platão mas ele mesmo se reconhece incapaz de as separar ou mesmo distingüí-las.

• O problema também deve-se à preferência platônica pela linguagem poética, no uso de metáforas e analogias e a intercalação de tudo com as ditas “manifestações da verdade”– Essa manifestação mostrará a presença do sentido veritativo do

verbo ser na identificação automática realizada entre o ser e as Formas;

– Isso vem expresso na analogia do Sol, na República VI 508e-509b.

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Platão

• O que temos, portanto, é uma tentativa de unificar todas as noções e sentidos que o verbo ser assumiu dentro da tradição grega e, na Teoria das Formas, desambiguar esses usos.

• Mas se o sentido fica resolvido, o problema lógico e epistemológico, provocado pelo dualismo, fica em aberto, a saber:– Mostrar como as Formas Inteligíveis e as instâncias sensíveis

podem ser relacionadas pela predicação, e,– Não somente caracterizando o poder causativo das teorias das

Formas, mas chegar a uma descrição efetiva da aparência sensível.

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Platão

• A investigação do mundo da aparência passa pela resolução de duas questões prévias:– A necessidade de definir o lugar da sensibilidade

na cognição,• Recebe um primeiro tratamento nas teorias da

anamnese e da participação.

– A possibilidade de articular o sensível e o inteligível numa investigação unitária.

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Platão

• A anamnese (Ménon, Fédon e Fedro), no aspecto da cognição, que é o que queremos investigar aqui, pode ser focada no Ménon e no Fédon.– Ménon: em todas as pessoas há opiniões verdadeiras,

acerca daquilo que ignoram, possíveis de se despertarem por interrogatório (85a, 86a) – nos leva ao raciocínio explicativo (97d-98a).

– Fédon: o argumento dos iguais (72e-77a), descartando o aspecto mítico, salienta-se no interlocutor a convicção da anterioridade e superioridade da Forma inteligível sobre quaisquer instâncias sensíveis.

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Platão

• O argumento anterior (Fédon) estabelece um dualismo epistemológico, depois ontológico (78b-79e), que separa o ser da Forma (una e idêntica) da percepção da multiplicidade mutável das suas instâncias sensíveis;

• Essa construção demonstra que a possibilidade de representação do sensível repousa sobre a sua capacidade de previamente referir a representação à Forma inteligível (75b-76d);

• O processo guarda uma reciprocidade psíquica: a percepção somente “evoca” a Forma porque ele está a priori, por “contiguidade” ou “associação” (75b-76a).

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Platão

• Esse processo tem duas vantagens e uma justificação:– 1ª) explicar o “encadeamento” das noções

inteligíveis na alma, instauração de uma investigação gradual

– 2ª) tal aspecto dá acesso a uma espécie de outro “anterior”, metacognitivo que se obtém no método de pergunta e resposta (Fédon 78d)

– Justificação: crítica ao reducionismo empirístico dos “filodoxos” (República V 480a).

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Platão

• Na dialética a questão passa a ser tratada como a teoria da participação mostrando que somente as Formas são dotadas de poder para causar/explicar o sensível e as suas variações.

• Assim, os predicados são vistos como “proto-propriedades” (Fédon 102d,e) cuja “entrada” e “saída” nos sensíveis é explicada pela constante variação relacional a que se encontram submetidos.

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Platão

• Essa visão nos possibilita entender uma variante do problema: nas abordagens da anamnese e da participação se complementam na definição das relações entre pensamento e linguagem.

• Temos duas condições:– 1ª. A linguagem é encarada como pressuposto no qual repousa

toda a análise do real,– 2ª. São definidas as condições mediante as quais ela pode ser

usada como instrumento dessa análise,– Um problema: o modelo não consegue explicar a

interdependência dos processos senso-perceptivo e epistêmico.

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Platão• No Fédon, Platão apresenta fortes argumentos para negar a

possibilidade de uma investigação da natureza sensível, criticando explicitamente os “naturalistas”:– Para ele todos os fenômenos “vitais” são inacessíveis a uma

abordagem mecanicista que tenta apenas apresentar uma mera descrição dos fenômenos visíveis (o estudo da alma é teleológico);

– No Timeu, ele postula que existe no sensível uma resistência puramente mecânica ao funcionamento da ação inteligente (48a ss);

– Esse confronto dessas duas instâncias, que têm modos de funcionamento opostos, exige a intermediação de paradigmas reguladores da natureza sensível (tempo, espaço e devir) os quais irão regulá-los em prol do inteligível

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Platão

• Essa dinâmica levada á perspectiva psíquica será abordada no Teeteto:– A senso percepção (184b-187a) é vista como um processo

puramente analítico e passivo;– Caberá à alma, doravante encarada como mente, poder

converter em conceito a informação recebida, depois que a senso-percepção for elaborada pelo pensamento;

– Somente a linguagem é capaz de justificar a presença, na mente, de conceitos, tanto os originários da senso-percepção (som, cor, dureza/moleza – 185a-c, 186b-c), quanto os dela independentes (Formas como o Belo, a verdade e a existência – 185c-186c);

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Platão

– Na dinâmica, para que a mente possa se utilizar desses conceitos e passar a operá-los numa análise do sensível, ela terá de recorrer ao pensamento (diálogo interior da mente), o qual chega a conclusões que serão expressas em formas de opiniões (189e-190a; Sofista 263e);

– Esses elementos nos mostram um sujeito cognitivo capaz de usar a linguagem para analisar e descrever o real, fazendo com que a hipótese de um discurso explicativo seja ampliada.

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Platão• Mas o problema somente poderá ser resolvido com a junção das

duas perspectivas tomadas de forma complementar (tarefa realizada no Sofista):– Instaura-se, pela definição, o regime de relações entre os cinco “sumos

gêneros”, pela qual os vários sentidos do Ser serão separados em cada um dos sentidos do verbo ‘ser’;

– Instaura-se, assim, a dificuldade de delimitação do sentido da predicação, simultaneamente, tanto inteligível quanto sensível (251e ss);

– A argumentação (251e), primeiramente, mostra que o Movimento e o Repouso no Ser são exigidos pelo fato deles se excluírem mutuamente (252d), obrigando-os a “participarem da entidade” (251e) para poderem ser (252a);

– O segundo passo a afirmação de que o Não-ser é (254c-d) torna possível a predicação pois nos coloca diante da natureza do Outro (255c-d) – cada gênero ou entidade é o mesmo em relação a si e o Outro em relação a outro (256a-b) – é assim que o predicado passa a ser visto como outro em relação ao sujeito sem que ele tenha que deixar de ser ele mesmo

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Platão

• A argumentação anterior viabiliza a leitura separada de cada um dos sentidos de ‘ser’:– A identidade é expressa pelo Mesmo,– A predicação pelo Outro,– A existência pelo Ser.

• Assim, verdade e falsidade perdem a sua relação direta como Ser e tornam-se função da proposição (263b-c, d).

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Platão

• Esse estabelecimento da verdade como uma função proposicional resolve o problema do acesso ao conhecimento infalível, descartando a existência de infalibilidade do saber;

• Mas um problema fica em aberto: no âmbito do ser, como esse poderá ser investigado através de uma linguagem proposicional?

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Aristóteles• Aristóteles toma a possibilidade de resolução de seus

problemas mediante a resolução do problema da predicação;• A pergunta no modelo platônico: como as muitas coisas podem

ser semelhantes e dissemelhantes? (Parmênides 127e)• Aristóteles denuncia a falácia, no pensamento acima, que é

“dizer o ser de uma só maneira” (Física A185a20-32, 186a22-b35):– O ser caracteriza os entes individuais, como sujeitos de predicação, e

não pode ser encarado como a classe definida pela posse do predicado comum a todos;

– Por isso o ser não pode ser gênero (Categorias 5, 3a-10-24), ele somente pode ser sujeito (substância primeira dotada de existência – Categorias 5, 2b1-6) ou predicado (substância segunda, privada de existência – Categorias 5, 3a7-21), podendo ser dito pela categoria.

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Aristóteles

• Essa limitação da existência às substâncias primeiras e ao que nelas existe nos leva a um problema: – como explicar a possibilidade de acesso às substâncias

segundas e às essências;• Caberá à evidência lingüística mostrar que elas

devem ser encaradas como objetos cognitivos, produzidos pela experiência individual, e necessários para a compreensão do real, que seriam assim expresso:

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Aristóteles

• “... O universal fixado na alma, o um que corresponde aos muitos, a unidade identicamente presente em todos eles, como ponto de partida da arte e da ciência...” (Segundos Analíticos B19, 110a6-9; Cf., também, Metafísica A1, 980b29-981a1)

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Aristóteles

• Aqui, contrariamente a Platão, o universal exibe a sua vocação predicativa, começando por se manifestar como um ente mental;

• Como resultado de uma experiência individual, ele jamais poderá assumir o estatuto de um paradigma ideal, pelo simples fato de refletir a flutuação processual da opinião;

• Contudo, sua relação com as substâncias permite que a alma, gradualmente, lhe tenha acesso, e o reconstrua, através da definição, num longo processo de “definição das essências” (Tópicos A1, 101b38-102a18);

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Aristóteles

• Tal modelo nos configura mais uma inovação conceitual: a idéia de que o ser pode ser captado pelo pensamento;

• Essa captação o fixa e “significa” pela palavra dita e escrita, produzindo verdade ou falsidade (Da Interpretação 1, 16a1-19);

• Para que isso ocorra é necessário, de um lado, que o pensamento (mente), tal como a percepção, seja “assemelhado” ao objeto, de modo que venha a “ficar como ele” (Da alma B5, 41a3-6);

• Do outro lado, é necessário combinar nomes e verbos, dotados de significação convencional, numa proposição, a qual, enquanto uma afirmação ou negação, é portadora de verdade ou falsidade (Da alma B5, 16a20-17a8).

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Aristóteles

• O paralelismo entre as duas vias converge num programa de investigação no qual a definição e a explicação se co-determinam uma à outra;– definição das essências – através dos universais,– sua explicação – através do discurso.

• Assim os nomes podem significar independentemente da existência das entidades nomeadas;

• Mas somente a cooperação poderá estabelecer uma explicação que diga “o que é” e “por que é” a essência nomeada (Segundos Analíticos B8-10, B16-18) por meio de uma teoria unificada da definição (Segundos Analíticos B13-15).

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Aristóteles

• O complexo doutrinal aristotélico critica e reforma integralmente o platonismo, dispensando a necessidade de recorrer a um mundo inteligível para conferir à mudança um mínimo de estabilidade que a torne pensável:– Metafísica A6, 987a30-b10;– Categorias 5, 4a10-4b19.

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Aristóteles

• A crítica aristotélica ao monismo de Parmênides e Platão distingue um sujeito de um predicado, tanto lógica quanto ontologicamente, de forma independente frente à função gramatical que desempenham na proposição, aspecto que permite formalizá-la através de uma relação entre os indivíduos, classes e propriedades (Tópicos A5, 102a18-31)

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Aristóteles

• A concepção do universal a partir da experiência será central na sua visão:– Ao dotar o sujeito da capacidade de criar objetos

cognitivos, Aristóteles os liberta da necessidade de referir-se a toda experiência de paradigmas ideais, a priori, aspecto que dispensa o dualismo platônico;

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Aristóteles

• A noção de que o pensamento e o discurso ‘significam’ o real liberta a linguagem da contaminação pelo ser– Esse elemento possibilita à linguagem a sua utilização como

um instrumento de exploração da realidade;– A inovação reside no fato de se associar a capacidade de

afirmar ou negar, presente na proposição, ao poder significativo do nome e da proposição, como condição de verdade e de falsidade;

– De outro lado, a co-determinação da definição e da explicação permitem, pela primeira vez, uma investigação sistemática da realidade.

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Resumo

• Em Parmênides o pensamento, associado à linguagem, mostra o ser único como meio de acesso à entidade englobante (ser)com a qual se identifica. De forma oposta a ele, a sensibilidade é rejeitada pelo fato de oscilar entre a afirmação e a negação, aspecto que impede a compreensão da Unidade, Identidade e Perfeição do Ser.

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Resumo

• O modelo de Platão visa dirimir a cisão implantada por Parmênides, estabelecendo que a Teoria das Formas, embora aceite o ser eleático em sua plenitude de atributos, atomize-o numa infinidade de estruturas onto-epistemológicas, que são organizadoras da aparência, as quais, no contexto do dualismo estrito, separam o saber da opinião, mediando-os pela senso-percepção.– Mas existe um atenuante nessa posição, dentro da noção da

geometria, que mostra que é possível passar do sensível para o inteligível;

– A desconstrução do eleatismo é finalizada com a dissolução da unidade polissêmica do ser nos quatro sentidos de einai: predicativo, identitativo, veritativo e existencial (somente de forma incompleta).

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Resumo

• Aristóteles, com sua concepção de substância, distingue o ser, como sujeito e substância primeira, do ser, como predicado e substância segunda;

• Assim, a concepção do universal caracteriza o predicado como um objeto cognitivo, definido pelo pensamento num processo de infinita aproximação das essências;

• Em sua teoria da significação, o pensamento é investido da capacidade de significar o ser através do discurso;

• Na realização da cooperação entre definição e explicação, abre-se a possibilidade de uma investigação sistemática do real.