curso introdutÓrio sobre os universais na idade mÉdia 04 – aspectos introdutórios acerca do...

38
CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do problema dos universais na Idade Média Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 1

Upload: internet

Post on 22-Apr-2015

103 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 1

CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA

04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do problema dos universais na Idade Média

Page 2: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 2

Considerações Gerais

• Um aspecto unânime dentro das investigações medievas refere-se à aceitação de uma Renascença do século XII;

• Nela podemos notar a importância de Abelardo quando, especificamente, vários estudiosos, ao se referirem ao século XII, esse fica descrito como “o século de Abelardo e da Dialética”;

• Abelardo foi essencialmente um lógico, em suas próprias palavras:

Page 3: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 3

Considerações Gerais

• (...) RENUNCIEI COMPLETAMENTE A Corte de Marte para ser educado no regaço de Minerva. E, visto que eu preferi as armas dos argumentos dialéticos a todos os ensinamentos da filosofia, troquei as outras por essas e antepus os choques das discussões aos troféus das guerras. (ABELARDO, Pedro. História das minhas calamidades, Coleção pensadores, p.250)

Page 4: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 4

Considerações Gerais

• Que tipo de lógico ele era?• Ser lógico significava ser dialético;• Nesse contexto ser dialético é, segundo a

designação de João de Salisbury, ser Peripatético do Pallet;

• Nesse contexto devemos lembrar que o ensino da lógica era denominado de Dialética, mas na concepção geral a dialética era maior do que a lógica;

Page 5: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 5

Considerações Gerais

• Abelardo teve uma educação pautada nas chamadas artes liberais, as quais se dividiam em:– Artes reais (quadrivium), que era constituída pela

Música, Aritmética, Geometria e Astronomia;– Artes do Discurso (trivium), que era constituída

pela Gramática, Retórica e Dialética (ou lógica).

Page 6: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 6

Considerações Gerais

• O estudo da dialética no sistema medieval adquiriu pleno destaque frente ás demais áreas de pesquisa;

• Ela era o domínio do homem, o domínio do saber, portanto, o campo do racional por excelência, o local onde se tinha a possibilidade de discernir o discurso verdadeiro do falso;

• Sua importância também fica manifesta na medida em que se percebe que seu uso também era aplicado na interpretação de textos, principalmente os da Escritura;

Page 7: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 7

Considerações Gerais• Nesse sentido a dialética era empregada para a realização de

uma análise racional dos problemas, incluindo-se aí o âmbito da teologia;

• O saber dialético exprimia um certo racionalismo, e esse aspecto gerou uma reação, por parte da teologia, que ficou conhecida como a “querela entre dialéticos e antidialéticos);

• A briga foi grande e, dentre alguns nomes importante, podemos citar os esforços de mediação realizados por Santo Anselmo:– Ele assume uma posição de equilíbrio na discussão pois afirmará,

frente aos dialéticos, a primazia absoluta da fé, frente aos antidialéticos, sustentará a razão como meio para a compreensão da fé.

Page 8: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 8

Considerações Gerais

– Para Anselmo, a busca da verdade deve consistir em primeiro crer nos mistérios da fé antes de discutí-los pela razão; depois deve-se esforçar-se pela razão por compreender aquilo em que se crê;

– Não dar preferência à fé, como queriam os dialéticos é presunção; não apelar, em seguida, para a razão, como o faziam os antidialéticos, é negligência

• Mas qual seria o papel do lógico, do dialético?

Page 9: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 9

Page 10: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 10

Pars construens

• O momento construtivo é aquele onde Abelardo apresenta sua noção de universal e tenta responder às três questões apresentadas por Porfírio;

• Seu ponto de partida da parte construtiva é o produto obtido da conclusão negativa que o Magister chegou na parte destrutiva de sua reflexão:– Não há coisas universais, nem tomadas isoladamente,

nem coletivamente.

Page 11: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 11

Pars construens

• Ele parte da rejeição das teorias que atribuíam a universalidade às coisas e chega a uma afirmação:– A indicação de que a universalidade cabe somente

às palavras – o universal é palavra, vox.• Cabe, contudo, tecer algumas considerações

acerca do que seria a expressão vox:– No contexto abelardianao vox é uma expressão que

não se reduz ao mero sentido físico concebido por Roscelino;

Page 12: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 12

Pars construens

– “quer o som articulado ainda sem significado [palavra material], quer a palavra instituída pelo homem para a significação” (FUMAGALLI, PARODI, Storia della Filosofia Medievale. Laterza, 1998, p.170)

• A expressão vox assume em Abelardo o sentido de vox significativa;

• Disso resulta o uso dado em que a expressões mostram-se como sermo ou nomen– Na Lógica Nostrorum Abelardo introduz a diferença

entre vox e vox significativa

Page 13: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 13

Pars construens

• Vox = o som no sentido acústico – flactus vocis;• Vox significativa = a palavra = explica a origem dos

nomes (sermo sive nominum) e é eminentemente uma instituição humana.

• A distinção está no fato de que a primeira, vox, designa o aspecto físico da palavra, a segunda, vox significativa, designa a função signficativa das palavras.

Page 14: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 14

Pars construens

• O que está sendo estabelecido nessa distinção é o domínio semântico da significação (significatio);

• Nesse contexto, significação assume um sentido intencional, quer dizer, enquanto é geradora de um conceito na mente;

• Assim, uma palavra (nomen, sermo, vox significativa) é significativa, na medida em que tem a capacidade de gerar uma intelecção (intelectum constituere);

Page 15: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 15

Pars construens

• Seu objetivo na parte construtiva, portanto, é o de fornecer os fundamentos da atribuição da universalidade apenas às palavras;

• Sua tarefa, portanto, consiste em mostrar sobre que bases o universal atribuído somente às palavras pode ser significativo, ou seja, de que forma ele pode constituir uma intelecção na mente, na medida em que não há, na realidade, uma res universal que possa corresponder àquela intelecção.

Page 16: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 16

Pars construens

• Inicialmente ele apresenta, no âmbito da linguagem, uma diferença de vocabulário entre a gramática e a Dialética;– Os gramáticos utilizam certos nomes chamados

próprios e outros chamados apelativos;– O repertório dos dialéticos compreende

expressões simples, como palavras universais e palavras singulares;

• Essa diferença destaca dois pontos:

Page 17: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 17

Pars construens

– I) um universal pode ser um nome, todavia, nem todos os nomes (como nomes apelativos ou nomes próprios) podem ser universais. Isso ocorre tendo em vista que o universal é definido pela sua predicabilidade. Os nomes apelativos ou próprios não comportam os casos retos e nem os oblíquos, portanto, não podem ser tomados como predicados e, assim, estão fora da definição. Universal, portanto, poder ser colocado entre os nomes, porém não é equivalente aos nomes apelativos ou próprios.

Page 18: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 18

Pars construens

– II) nem todos os universais reduzem-se aos nomes, visto que os verbos são passíveis de serem incluídos entre os universais. Os verbos não estão contidos na definição dos nomes (no caso dos nomes) mas podem atuar como universais (predicado) em frases predicativas. • Ex.: “Manoel anda”. Nessa frase o verbo “anda” pode

ser concebido, entendido, como uma forma predicativa do tipo “Pedro é andante”.

Page 19: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 19

Pars construens

• Assim, temos uma nova definição abelardiana acerca do universal:– “Uma palavra universal é aquela que, por sua

descoberta, é apta para ser predicada de muitos tomados um a um, tal como este nome ‘homem’, que pode ser ligado com os nomes particulares dos homens segundo a natureza das coisas subordinadas ás quais foi imposto. Já o singular é aquele que é predicável de um só, como Sócrates, tomado como nome de um único.” (L I, 16, 25-30)

Page 20: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 20

Pars construens

• Existem algumas particularidades nessa definição de universal:– I) Abelardo utiliza a expressão “palavra universal”, portanto, toma

o universal como res se esse é considerado como vox;– II) o universal parece que é retirado do mundo da natureza (res) e

colocado no domínio de uma construção e instituição humana (vox);

– III) a definição insinua uma relação entre nomes, quando afirma que um nome universal é ligado aos nomes particulares dos indivíduos. Entretanto, a possibilidade de imposição (a impositio é um ato eminentemente humano) dos nomes universais parece estar vinculada à natureza das coisas, remetendo a um certo compromisso ontológico.

Page 21: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 21

Pars construens

• Para Bertelloni, a esse respeito:– “Devemos aqui chamar a atenção sobre a circunstância

de que, apesar da participação da natura rerum no processo que permite a imposição do nome universal, desde o princípio Abelardo coloca a questão como problema concernente a uma relação entre nomes e não uma relação entre nome universal e indivíduos ou coisas particulares. (...) percebemos de imediato a vontade abelardiana de colocar o problema em um terremo claramente semântico” (BERTELLONI, Pars construens..., p. 43-44)

Page 22: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 22

Pars construens

• A forma com que Abelardo encaminha suas reflexões parte para uma exaustiva análise dos termos da definição de predicado onde ele seria aquele que (quod) é predicado (praedicari) de vários (de pluribus);

• O foco de sua atenção nessa análise está no modo, os dois, como pode ocorrer uma ligação entre sujeito e predicado, e isso envolve pensar nas atribuições específicas entre o gramático e o dialético;

Page 23: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 23

Pars construens

• O tratamento da predicação, enquanto imposição dos nomes, diz mais respeito ao âmbito da Dialética do que ao âmbito da Gramática. A diferença entre elas está na forma com que cada uma estabelece a ligação da construção (Gramática) e a ligação de predicação (Dialética).

• Em suas palavras, uma boa ligação realizada por uma gramático dá-se quando:– “ (...) quanto a manifestar verdadeiramente uma intelecção,

mas não quanto a mostrar o estado da coisa. Assim, a ligação de construção é boa, todas as vezes que apresenta uma sentença correta, quer seja assim, quer não.” (L I, 17, 16-19)

Page 24: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 24

Pars construens

• O Gramático:– Examina se uma determinada frase predicativa está

corretamente construída. Ou seja, investiga uma frase que realiza a ligação de construção sujeito-predicado de modo correto e vincula um sentido que entendemos, embora não manifeste um estado de coisa.

• O Dialético:– Ocupa-se com a correção semântica (categorial) de uma frase

predicativa, ou seja, examina se a ligação de predicação que a frase estabelece respeita uma semântica correta. Uma frase predicativa é semanticamente correta se a ligação de predicação que ela expressa une um predicado a um sujeito, conforme a natureza desse sujeito, e mostra a verdade de seu estado.

Page 25: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 25

Pars construens

• Para atingir seu objetivo (uma frase semanticamente correta) o Dialético usa dois critérios:– A atribuição do predicado deve corresponder à

natureza da coisa predicada;– Deve mostrar a verdade do que é afirmado, isto é,

do estado de coisa (sattus rei)• Ver exemplos pg.63

Page 26: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 26

Pars construens

• Em sua concepção, Abelardo nega que o universal é uma coisa (res), tanto isolada quanto coletivamente.

• Ao realizar tal afirmação ele terá de localizar o universal em algum lugar;

• Sua localização será na palavra, ou melhor, naquilo que a palavra tem de próprio, a sua significação. Em suas palavras:– “(...) é próprio das palavras significar ou relevar, e das

coisas, o serem significadas” (L I, 10, 1-2)

Page 27: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 27

Pars construens

• A característica própria das palavras é a sua capacidade de significação;

• A capacidade significativa de uma palavra é dada em satisfação a duas condições:– I) quando gera uma intelecção na mente; e– II) quando se refere a alguma coisa.

• O problema que Abelardo enfrenta incide sobre a possibilidade de significação dos nomes universais, ou seja, às condições requeridas para a significação:– “Levantaram-se questões a propósito dessas palavras universais,

divida-se sobretudo de sua significação, uma vez que parecem não ter qualquer coisa subordinada nem fixar uma intelecção válida de algo” (L I, 18, 6-9)

Page 28: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 28

Pars construens

• Esse problema acerca da significação dos nomes universais pode desdobra-se em vários outros problemas, mas quero frisar dois muito importantes: a impotência significativa e a impotência cognoscitiva do universal:– A impotência significativa diz respeito ao fato de que os nomes

universais parecem não corresponder a alguma realidade, isto é, não têm qualquer coisa subordinada, não se aplicam ou não nomeiam nada;

– A impotência cognoscitiva incide sobre a impossibilidade de que as palavras universais possam oferecer algum conhecimento ou gerar uma intelecção válida de algo na mente.

Page 29: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 29

Pars construens

• Para que um nome universal possa ter significação, ele deve cumprir essas duas condições: constituir uma intelecção válida na mente e referir-se a alguma coisa subordinada na ordem do real.

• Mas o nome universal parece desprovido de significação. Diz Abelardo:– “Desse modo, parece que tanto homem como qualquer outro

vocábulo universal não significa coisa nenhuma, uma vez que não fixa a intelecção de coisa alguma. E nem parece que possa haver intelecção que não tenha uma coisa subordinada que conceba. (...) Em consequência disso, os universais parecem completamente desprovidos de significação” (L I, 18, 37-19,6)

Page 30: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 30

Pars construens

• Aprioristicamente parece que Abelardo nega a possibilidade de significação dos nomes universais, mas ele mesmo mostra que isso não procede e molda a forma com que as palavras universais podem ter significação:– “Mas não é assim. De fato elas significam, de certo modo,

coisas diversas por meio da denominação, não porém fixando uma intelecção procedente delas, mas pertinente a cada uma. Como esta palavra homem, tanto nomeia cada um deles por motivo de uma causa comum, isto é, que são homens, pelo que é denominada [a palavra] universal, como constitui uma certa intelecção comum, não própria, isto é, pertinente a cada um deles, dos quais concebe a semelhança comum.”

Page 31: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 31

Pars construens

• Para Abelardo as palavras universais são passíveis de nomear coisas diversas, e sua significação não deve ser buscada numa intelecção que proceda das coisas nomeadas, mas pertencente a cada uma delas, na medida em que, a partir de uma causa comum, concebe a semelhança comum entre elas.

Page 32: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 32

Pars construens

• Depois de investigado esse ponto, Abelardo incide sua investigação na significação intelectual do universal para responder á seguinte pergunta: qual é a concepção de intelecção da semelhança comum das coisas?

• Um nome pode ser dito comum devido:– A) à causa comum;– B) ou à concepção comum;– C) ou, ainda, a ambas simultaneamente.

Page 33: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 33

Pars construens

• Para Abelardo os homens individuais diferenciam-se uns dos outros tanto pelas suas essências como pelos seus acidentes;

• Essa diferenciação nos mostra que as coisas somente existem como individuais;

• Mas os homens individuais combinam (convêm) no ‘ser homem’ (in esse hominem), portanto, naquilo em que eles mesmos são, no fato de que todos são homens.

Page 34: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 34

Pars construens

• Para Abelardo:– “Cada um dos homens, distintos uns dos outros,

embora difiram tanto pelas próprias essências quanto pelas formas, se reúnem naquilo que são homens. Não digo no homem, já que nenhuma coisa é homem, exceto uma coisa distinta, mas no ser homem. Ora, ser homem não é homem ou coisa alguma (...)” (L I, 19, 20.26)

Page 35: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 35

Pars construens

• O que ele quer evidenciar é um “estado de homem”, ou seja, algo que indica o fato real de um home individual ser aquilo mesmo que é – homem, mas isso não é uma essência, não é algo na ordem do real. Para ele:– “(...) dizemos que este e aquele combinam no estado de

homem, ou seja, nisto que são homens. Mas não entendemos senão que eles são homens e, de acordo com isso, não diferem de modo algum; de acordo com isso, explico-me, que são homens, ainda que não apelemos para nenhuma essência.” (L I, 20, 3-6)

Page 36: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 36

Pars construens

• O fato de um indivíduo encontrar-se no ‘estado de homem’ não expressa algo diverso do homem individual, mas, simplesmente, que o homem individual é um homem. Para ele:– “Chamamos de estado de homem o próprio ser homem, que não é

uma coisa e que também denominamos causa comum da imposição do nome a cada um, conforme eles próprios se reúnem uns com os outros” (L I, 20, 7-9)

• Assim, essa doutrina coloca entre os indivíduos uma semelhança real, mas ela não se pode realizar de uma forma à parte, como uma essência. A natureza humana é tão somente uma espécie de concordância substancial de indivíduos, parte-se, portanto, do indivíduo.

Page 37: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 37

Pars construens

• O nome universal tem uma significação real; mas somente a partir das próprias coisas ele significa o status rei, isto é, as próprias coisas individuais enquanto combinam no serem tais coisas;

• Essa é a intelecção gerada pelos universais.• Essa intelecção não necessita de um órgão

corporal e prescinde de um objeto subordinado.• A noção de intelecção torna-se importante. Nas

palavras de Abelardo:

Page 38: CURSO INTRODUTÓRIO SOBRE OS UNIVERSAIS NA IDADE MÉDIA 04 – Aspectos introdutórios acerca do modelo e da estrutura conceptualista de Abelardo diante do

Prof. Dr. Anderson D'Arc Ferreira - UFPB 38

Pars construens

• “(...) assim como a sensação não é a coisa sentida, para qual se dirige, assim também a intelecção não é a forma a forma da coisa que ela concebe, mas a intelecção é uma certa ação da alma, pela qual é chamada de inteligente, e a forma para a qual se dirige é uma certa coisa imaginária e fictícia, que o espírito elabora para si quando quer e como quer, como são aquelas cidades imaginárias vistas durante o sono ou como aquela forma de um edifício a ser construído (...).” (L I, 20, 28-34)