curso heg 2011 aula 6 - história econômica geral - ufabc - prof ramón garcía fernández (o...

21
Aula 6 - Expansão ultramarina e Absolutismo 1 A expansão ultramarina e o surgimento do estado Absolutista. Bibliografia: O: Rosenberg & Birdzell (s/d), cap.3 A: Anderson (1985), p.15-57. C: Cameron & Neal (2003), caps. 5 e 6. AULA 6

Upload: julio-cezar-rodrigues-eloi

Post on 20-Jun-2015

166 views

Category:

Education


10 download

TRANSCRIPT

Page 1: Curso heg 2011   aula 6 -  História Econômica Geral - UFABC - Prof Ramón García Fernández (o Paranista)

Aula 6 - Expansão ultramarina e

Absolutismo

1

A expansão ultramarina e o

surgimento do estado

Absolutista.

Bibliografia:

O: Rosenberg & Birdzell (s/d), cap.3

A: Anderson (1985), p.15-57.

C: Cameron & Neal (2003), caps. 5 e 6.

AULA 6

Page 2: Curso heg 2011   aula 6 -  História Econômica Geral - UFABC - Prof Ramón García Fernández (o Paranista)

Aula 6 - Expansão ultramarina e

Absolutismo

2

0. A Logística do crescimento econômico.

Logística: curva que cresce inicialmente a

ritmo acelerado, chega num máximo e

começa a declinar até ficar assintótica com

o eixo horizontal.

Vários fenômenos econômicos e sociais são descritos por estas curvas,

entre eles o crescimento econômico. Se diz que houve três logísticas do

crescimento europeu: a) Primeira: do S. IX até meados do S. XIV (Peste

negra); b) Segunda: do S. XV até o S. XVII; c) Terceira: do S. XVIII até

meados do S. XX.; d) Quarta: hoje?

Uma inovação que marca época

(epochal innovation) “levanta o

teto”, i.e., permite novo

crescimento.

Page 3: Curso heg 2011   aula 6 -  História Econômica Geral - UFABC - Prof Ramón García Fernández (o Paranista)

Aula 6 - Expansão ultramarina e

Absolutismo

3

1. O marco geral da Segunda Logística - I

• Crescimento da população européia descreve uma

“segunda logística” entre 1450-1650 (aprox.).

• Pop. européia passa de 45-50 milhões (meados S.

XV, 2/3 pré-Peste) a 100 milhões (meados S. XVII),

podendo ter sido até maior em 1600.

• Diferenças básicas com a logística anterior:

– Expansão geográfica.

– Mudança dos centros de poder:

• Norte da Itália (1450).

• Espanha, Bélgica (1550).

• Holanda, França, Inglaterra (1650).

Page 4: Curso heg 2011   aula 6 -  História Econômica Geral - UFABC - Prof Ramón García Fernández (o Paranista)

Aula 6 - Expansão ultramarina e

Absolutismo

4

1. O marco geral da Segunda Logística - II

• Crescimento relativo da população urbana.

– Chega a ser 1/3 na Bélgica e a metade na

Holanda (S. XVI).

– Todavia, as cidades são mais administrativas e

comerciais do que industriais, o que leva a um

excesso relativo de população e queda de

salários nelas → surgimento de um

lumpemproletariado.

• Avanços na navegação, introdução de armas

de fogo, mas sem avanços tecnológicos na

agricultura, etc.

Page 5: Curso heg 2011   aula 6 -  História Econômica Geral - UFABC - Prof Ramón García Fernández (o Paranista)

Aula 6 - Expansão ultramarina e

Absolutismo

5

2. Exploração marítima e descobertas - I • Italianos continuaram com superioridade tecnológica

por muito tempo (avanços na cartografia), mas não no design, logo não se aventuraram nos mares abertos.

• O papel de Portugal: – Pioneirismo científico e tecnológico: Henrique o Navegador

e a Escola de Sagres.

– Ocupação de espaços “vazios” (Madeira, Açores) ou feitorias (costa da África).

– Portugal como estado moderno: unificação política, economia monetária, importância da burguesia comercial, nobreza “de serviço”.

– Comércio: especiarias, ouro, escravos • O comércio português na Ásia é também um comércio intra-asiático, além das exportações para a Metrópole.

Page 6: Curso heg 2011   aula 6 -  História Econômica Geral - UFABC - Prof Ramón García Fernández (o Paranista)

Aula 6 - Expansão ultramarina e

Absolutismo

6

2. Exploração marítima e descobertas - II

• Espanha e a descoberta da América:

– Ocupação do território: pilhagem inicial,

mineração posteriormente → isso leva à

colonização, com introdução alimentos e animais

domésticos (e doenças, etc.)

– “Revolução dos preços” causada pelo envio de

metais para a Europa.

• Preços triplicam (ou mais) no S. XVI.

• Esta “revolução” prejudica especialmente aqueles

que têm rendas fixas (assalariados, senhores com

renda em dinheiro) e favorece quem têm rendas

variáveis (comerciantes, produtores artesanais,

agricultores ou nobreza com renda em espécie).

Page 7: Curso heg 2011   aula 6 -  História Econômica Geral - UFABC - Prof Ramón García Fernández (o Paranista)

Aula 6 - Expansão ultramarina e

Absolutismo

7

3. A agricultura na época da expansão - I

• Problema “malthusiano” da Segunda Logística: crescimento da produção de alimentos é inferior ao da população.

• Declínio da produtividade por (re)incorporação de terras piores.

– Agricultura ocupa de 65% a 95% da PEA nos diferentes países.

– Variações regionais: Holanda e Bélgica →maior especialização leva a aumentos (a terras ganhas ao mar).

– Integração de produção de alimentos do Báltico impede perspectiva de fome que ameaçava Europa

Page 8: Curso heg 2011   aula 6 -  História Econômica Geral - UFABC - Prof Ramón García Fernández (o Paranista)

Aula 6 - Expansão ultramarina e

Absolutismo

8

3. A agricultura na época da expansão - II

• Relações de produção muito diversas:

– Enrijecimento da servidão no Leste

(conseqüência do aumento dos preços no

Oeste).

– Pequena propriedade agrícola é importante no

Piemonte e nas imediações das cidades

– Registram-se diferentes formas de parceria.

– Começa a generalizar-se a transferência da

propriedade.

• Conflitos entre produção de alimentos e de

matérias primas (tipicamente, ovelhas para

lã).

Page 9: Curso heg 2011   aula 6 -  História Econômica Geral - UFABC - Prof Ramón García Fernández (o Paranista)

Aula 6 - Expansão ultramarina e

Absolutismo

9

4. A indústria na época da expansão - I • As principais mudanças ocorrem mais na

organização do que na tecnologia. Já na Baixa Idade Média o comerciante subordina artesãos:

– Contato com os mercados.

– Empréstimos ou adiantamentos criam dependência.

• Inovações muitas vezes brecadas pelas regulamentações artesanais contra o desemprego → desenvolve-se o trabalho domiciliar (putting-out system).

– Tentativas subordinação levam a conflitos nas cidades.

– Muitas vezes, essas inovações acabam se impondo em lugares não regulamentados e acabam forçando sua aceitação.

– No fim do S. XV, esse sistema se generaliza para a produção de tecidos de qualidade na Bélgica, Holanda, Inglaterra e Oeste da França.

Page 10: Curso heg 2011   aula 6 -  História Econômica Geral - UFABC - Prof Ramón García Fernández (o Paranista)

Aula 6 - Expansão ultramarina e

Absolutismo

10

4. A indústria na época da expansão - II • Indústria têxtil continua sendo a mais importante.

– Inglaterra passa da exportação de lã para a de tecidos.

• Indústria naval desenvolve-se especialmente na

Holanda.

– Holanda não tinha madeira, mas consegue desenvolver a

indústria de “partes” (velas, cordas, etc.).

• Metalurgia desenvolve-se bastante:

– Armas de fogo e artilharia.

– Uso de carvão como fonte de energia (permite poupar

madeira).

– Inovações no sistema de bombeamento e ventilação

permitem avanços na mineração (esp. na Inglaterra).

Page 11: Curso heg 2011   aula 6 -  História Econômica Geral - UFABC - Prof Ramón García Fernández (o Paranista)

Aula 6 - Expansão ultramarina e

Absolutismo

11

5. O comércio na época da expansão - I • Mudança do centro de gravidade do comércio do

Mediterrâneo para o Atlântico Norte.

• Comércio organizado em diferentes níveis: – Mercados locais: cidade pequena e aldeias ao redor.

Troca de produtos agrícolas por bens artesanais e alguns importados.

– Feiras, que integram diversas cidades menores; importante presença de atacadistas, comércio de tecidos finos, jóias, etc.

– Grandes cidades e capitais: comércio de importação e exportação.

• Em termos de valor, comércio era essencialmente de tecidos e especiarias, mas em termos de volume predominam os grãos, o sal e as madeiras.

Page 12: Curso heg 2011   aula 6 -  História Econômica Geral - UFABC - Prof Ramón García Fernández (o Paranista)

Aula 6 - Expansão ultramarina e

Absolutismo

12

5. O comércio na época da expansão - II • Comércio envolve crescentemente bens “comuns”

(especialmente o intra-europeu): grãos, madeiras, carvão, metais, materiais têxteis e tecidos.

• Difusão de técnicas contábeis modernas, como as partidas dobradas.

• Crédito desenvolve-se: – Inicialmente o “Século dos Fuggers”, e importância de

Antuérpia.

– Depois Gênova passa a ser o grande centro financeiro (importância da Itália como centro financeiro continua depois do declínio da sua importância no comércio).

• Grande comércio de longa distância tende a ser organizado em monopólios.

• Companhias por ações (joint-stock) passam a ser utilizadas na organização das grandes companhias (especialmente das monopolistas na Inglaterra).

Page 13: Curso heg 2011   aula 6 -  História Econômica Geral - UFABC - Prof Ramón García Fernández (o Paranista)

Aula 6 - Expansão ultramarina e

Absolutismo

13

6. O fim da expansão: a crise do S. XVII • Crescimento populacional leva a outro período de

fome generalizada (mudança climática, más

colheitas, nova incidência peste)

• Guerras provocam enorme devastação,

especialmente em Europa Central (atuais

Alemanha, Rep. Tcheca, Polônia, etc.).

• Espanha e Itália perdem seu papel central na

economia européia.

• Amsterdã transforma-se na grande capital

comercial do S. XVII. Todavia, Holanda não tem

grande desenvolvimento industrial (exceções como

ind. naval).

Page 14: Curso heg 2011   aula 6 -  História Econômica Geral - UFABC - Prof Ramón García Fernández (o Paranista)

Aula 6 - Expansão ultramarina e

Absolutismo

14

7. Conceito de Estado Absolutista (EA).

• Aplicação do Conceito: diz respeito à Espanha, França, Inglaterra, nos séculos XVI, XVII, etc.

• Também se aplica a outros países: Rússia, Prússia, Áustria, Suécia, etc, além de outros que tentaram e não conseguiram criar tal estado (Curlândia).

• Outros países que não conseguiram fazer esse processo foram destruídos, o caso típico é a Polônia.

• Portugal não está no centro das discussões, mas certamente é um dos pioneiros nesse sentido.

• Nesta época, especialmente no começo deste período, os países não são bem “Estados” no sentido contemporâneo (lembrar do reino de Carlos V).

• O absolutismo pode ser interpretado como uma continuação da estrutura de poder da sociedade feudal, porém significativamente reformulada.

Page 15: Curso heg 2011   aula 6 -  História Econômica Geral - UFABC - Prof Ramón García Fernández (o Paranista)

Aula 6 - Expansão ultramarina e

Absolutismo

15

8. EA como reformulação do poder feudal - I

“Essencialmente, o absolutismo era apenas isto: um aparelho de dominação feudal recolocado e reforçado, destinado a sujeitar as massas

camponesas à sua posição social tradicional (....) Em outras palavras, o Estado Absolutista nunca foi

um árbitro entre a aristocracia e a burguesia, e menos ainda um instrumento da burguesia

nascente contra a aristocracia: ele era a nova carapaça política de uma nobreza atemorizada”

(Anderson, 1985, p.18).

• Lembrar que todos esses estados têm uma burguesia importante, mas que não dá para dizer, segundo Anderson, que há um equilíbrio Nobreza -Burguesia.

Page 16: Curso heg 2011   aula 6 -  História Econômica Geral - UFABC - Prof Ramón García Fernández (o Paranista)

Aula 6 - Expansão ultramarina e

Absolutismo

16

8. EA como reformulação do poder feudal - II • Grande parte da população é rural (grande número

de camponeses). Estes basicamente continuam pagando tributos a um senhor, dono ou possuidor da terra em que trabalham, mesmo que agora a renda não seja mais em trabalho.

• Coerção a nível local fica debilitada → se desloca a uma cúpula centralizada e militarizada (o próprio EA).

• Essa coerção também pode se voltar contra membros da Nobreza.

• A diminuição dos poderes político-legais da Nobreza foi compensada com um fortalecimento da propriedade (“...a intensificação da propriedade privada na base contrapôs-se ao incremento da autoridade pública no topo, corporificada no poder discricionário do Monarca”, Anderson, p. 27).

Page 17: Curso heg 2011   aula 6 -  História Econômica Geral - UFABC - Prof Ramón García Fernández (o Paranista)

Aula 6 - Expansão ultramarina e

Absolutismo

17

8. EA como reformulação do poder feudal - III

• Deve se destacar a existência de elementos “capitalistas” (ou simplesmente burgueses?) no EA.

• Introdução do exército regular (mercenários) e burocracia permanente.

• Criação de um sistema de tributação nacional (ainda não atinge todos, tipicamente, nobres, igreja, etc) e codificação das leis.

• Primórdios do Mercado nacional unificado (lembrar de Polanyi).

• Papel da burguesia no EA – Importância crescente da indústria urbana, e

envolvimento crescente da burguesia nisso (além das atividades comerciais às quais já se dedicava anteriormente).

– Burguesia incorpora-se ao estado através da compra de cargos.

Page 18: Curso heg 2011   aula 6 -  História Econômica Geral - UFABC - Prof Ramón García Fernández (o Paranista)

Aula 6 - Expansão ultramarina e

Absolutismo

18

8. EA como reformulação do poder feudal - IV

• EA teve uma construção lenta. • Na Baixa Idade Média, os estados (com suas variações

nacionais) eram freqüentemente convocados (especialmente para discutir tributação).

• O Absolutismo se consolida gradualmente a partir do século XVI (se reduz a dependência do rei em relação à nobreza para compor o exército e a burocracia).

• Nobreza vira mais administradora e menos guerreira. •“No curso desse processo a aristocracia do final do período feudal foi obrigada a abandonar antigas tradições e adquirir muitas aptidões novas. A história do absolutismo ocidental é ... a história da lenta reconversão da classe dominante fundiária .... contrariamente à maior parte de sua experiência e instintos anteriores”, Anderson, p. 47).

•“... a aristocracia que sobreviveu só conseguiu fazê-lo adotando papéis pós-feudais, cultura pós-feudal e estilo de vida pós-feudal (e, por conseguinte, burguês?).”(R&B, p.111)

Page 19: Curso heg 2011   aula 6 -  História Econômica Geral - UFABC - Prof Ramón García Fernández (o Paranista)

Aula 6 - Expansão ultramarina e

Absolutismo

19

9. Guerra como necessidade dos EAs. • Expansão feudal se dá através do aumento

dos territórios, e sendo a terra fixa, a expansão leva sempre à guerra (compare-se a concorrência inter-capitalista, que potencialmente pode trazer ganhos mútuos, coma rivalidade feudal, que é do tipo de um jogo de soma zero; o EA é uma máquina constituída basicamente para o campo de batalha).

• Todavia, o Estado Absolutista é também a origem da diplomacia (sistema de pressões e trocas entre os estados).

Page 20: Curso heg 2011   aula 6 -  História Econômica Geral - UFABC - Prof Ramón García Fernández (o Paranista)

Aula 6 - Expansão ultramarina e

Absolutismo

20

10. Mercantilismo como pol. econ. dos EAs - I • Estados precisam de economia forte para viabilizar

política de conquista (no mínimo, a sobrevivência).

– Encorajam exportações, mas proíbem ou dificultam a

saída de ouro e prata (comércio visto como jogo soma-

zero; Espanha acaba sendo uma exceção).

– Cria-se um sistema de reforço cumulativo entre o poder

do Estado e o crescimento da economia (“As políticas

econômicas dos estados nacionais no período da

segunda logística européia tinham um duplo propósito:

construir um poder econômico para fortalecer o estado, e

usar o poder do estado para promover o crescimento

econômico e enriquecer a nação” C&N, p.128).

– Necessidade de unificar mercados nacionais removendo

barreiras locais.

Page 21: Curso heg 2011   aula 6 -  História Econômica Geral - UFABC - Prof Ramón García Fernández (o Paranista)

Aula 6 - Expansão ultramarina e

Absolutismo

21

10. Mercantilismo como pol. econ. dos EAs - II • Elementos básicos do mercantilismo:

– Acumulação de metais preciosos, não como fim em si mesmo a la Tio Patinhas, mas porque se destina aos gastos importante nessa época.

– Fortalece indústria naval.

– Estimula produção artesanal (aumenta as exportações e reduz simultaneamente as necessidades de importações).

• Mercantilismo como extensão da política das cidades ao nível nacional.

– Ou seja, há uma redefinição do „nós‟ e do „eles‟.

– Lembrar que para C&N o mercantilismo é um “misnomer”; não há uma teoria nem uma política comum “...além da necessidade de receitas por governos muito pressionados em questões financeiras” (p.129).

• Protegendo os interesses da Nobreza e do Rei, o Estado também protege os interesses da burguesia comercial e industrial logo, ela ainda não precisa romper com a ordem feudal.