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CURSO DE TUPI

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Page 1: Curso de Tupi

CURSODE

TUPI

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Entrada

Curso de Tupi

Certificado

Contato

Artigos

Vocabulário

 Índios na caravela de Pedro Álvares Cabral

   CURSO ELABORADO PELO    PROF. EDUARDO NAVARRO   Presidente da ONG Tupi Aqui

   Vice-presidente da Associação Internacional “Anchieta”

Ministrou cursos e palestras sobre Tupi Antigo nas Universidades de Coimbra (Portugal), Munique (Alemanha), Genebra (Suíça), autor de vários livros sobre o assunto e dez anos de ensino de Tupi Antigo na Universidade de São Paulo

INFORMAÇÕES PARA CONTATO

Rua Antonio Tomaz, 7Paranapiacaba - Santo André – SPCep: 09150-150Telefone: (0xx11) 3091-4841E-mail: [email protected]

Saiba como obter o certificado de conclusão  Artigo 1 - A língua dos índios está de volta

 Artigo 2 - Um homem branco ensina Tupi aos índios do Brasil  

ABÁ NHE’ENGA OÎEBYR - TRADUÇÃO: A LÍNGUA DOS ÍNDIOS ESTÁ DE VOLTA

O tupi ressurge em páginas de livros, telas de cinema e pode chegar às salas de aula

Por: Suzel Tunes

Na medida em que se aproximam as comemorações dos 500 anos de Descobrimento do Brasil, o país volta-se às suas raízes mais profundas e redescobre, entre curioso e encantado, o seu primeiro idioma nacional: o tupi. Livros de tupi estão chegando às livrarias, cursos atraem cada vez mais estudantes. Uma recém-fundada organização não governamental, a Tupi Aqui, já propõe a inclusão do idioma no currículo do segundo grau. E, no ano que vem, o público brasileiro poderá assistir a um

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filme todo falado em tupi, o Hans Staden, com a participação de atores famosos como Stênio Garcia, Sérgio Mamberti e Cláudia Liz.

Boa parte desses projetos deve-se ao esforço pioneiro de Eduardo de Almeida Navarro, professor da Faculdade de Letras da Universidade de São Paulo, a única em todo o país que oferece curso de tupi antigo, também chamado tupi clássico. Em sua cadeira universitária, Navarro também está sozinho. Ele é o último dos tupinistas, solitário especialista de uma língua que, até o século 18, era falada por todos os habitantes do país, incluindo portugueses e africanos.

Por conta do sonho de manter viva a cultura tupi, o professor Navarro, fundador da ONG Tupi Aqui, já foi apelidado até de Policarpo Quaresma, nome do idealista personagem criado pelo escritor Lima Barreto. No livro de Barreto, Quaresma chegou a ser internado em um hospício, ao tentar fazer do tupi a “língua oficial e nacional do povo brasileiro”. Navarro diverte-se com a comparação: “Não sou tão utópico assim”, garante. Sua modesta proposta é de que, até o ano 2005, o idioma seja incluído inicialmente nos currículos das escolas de São Paulo. E, para essa empreitada, ele já tem seguidores: seu discípulo mais fiel é o jovem professor Hélder Perri Ferreira, um ex-aluno que agora participa dos projetos do mestre. Foi ele o revisor do livro que Eduardo Navarro acabou de lançar, o Método Moderno de Tupi Antigo — A Língua do Brasil dos Primeiros Séculos. Concebido como um manual didático para leigos, o livro ensina tanto a escrita quanto a fala tupi, por meio de notações fonéticas simples, que praticamente dispensam a presença do professor. “No futuro, pretendo preparar uma fita cassete com a leitura dos textos de todas as lições”, promete Navarro. Hélder também participou da organização de outro livro recente de Navarro, o Poesias — Lírica Portuguesa e Tupi, com traduções dos poemas escritos na língua indígena pelo padre José de Anchieta.

Para difundir a língua e cultura tupi, Navarro e Hélder também estão organizando cursos livres, com duração de seis meses, extensíveis a um ano e meio. No ano passado, Hélder já ministrou esse curso a uma turma de 120 alunos de diferentes idades e formações escolares que se reuniam no Páteo do Colégio, no centro de São Paulo, o mesmo lugar onde, entre 1554 e 1562, o padre José de Anchieta ensinava as crianças indígenas em seu próprio idioma. Agora, o curso está sendo realizado no Instituto Cultural Itaú, nome que, aliás, é de origem tupi: significa pedra preta — itá (pedra) mais un (preto). O engenheiro Franklin Evrard, aluno da primeira turma, prossegue no estudo da língua até hoje. “Comecei por curiosidade e interesse por toponímia, o estudo da origem dos nomes dos locais. Entusiasmei-me com o estudo e pretendo colaborar para que essa herança cultural não desapareça. No futuro, quando me aposentar, pretendo dar aulas de tupi”, diz ele.

Além dessas iniciativas dos professores da USP, pipocam (que é outra palavra de origem tupi) outros projetos. Recentemente, a editora Melhoramentos, junto com a editora da Universidade de Brasília, lançou o livro Dicionário Histórico das Palavras Portuguesas de Origem Tupi, do lingüista Antônio Geraldo da Cunha. Outros dicionários, pelo menos um de tupi-português e outro de toponímia (origem de nomes geográficos) estão vindo por aí

A quem pergunta que interesse teria o estudo de uma língua morta, uma vez que o tupi clássico não é falado mais nem pelos índios, o professor Eduardo Navarro explica: “O estudo do tupi antigo tem interesse histórico, geográfico e literário. Nenhuma outra língua indígena foi tão importante para a constituição de um Estado nacional. Estudar o tapirapé ou xavante, bororo ou kamayurá atuais não explicariam nomes como Pernambuco ou Sergipe. Assim como em Portugal o adstrato, ou seja, a língua que coexistiu com o português e influenciou-a, foi o árabe, no Brasil foi o tupi”. Segundo ele, em nosso idioma, existem mais de 10 mil tupinismos, ou seja, palavras de origem tupi (leia quadro ao lado).

Língua geral

Navarro esclarece que o termo tupi, embora popular, não é estritamente correto. O idioma que ele ensina, falado nos dois primeiros séculos de colonização do Brasil, é, na realidade, conhecido pelos especialistas como língua brasílica, da qual o tupi era um de seus dialetos. Já no século 16, a língua brasílica começou a ser aprendida pelos portugueses que, de início, eram minoria entre os índios, numa proporção de 10 para 1. “Como grande parte dos colonos vinham para o Brasil sem mulheres, os portugueses passaram a viver com mulheres indígenas”, explica o professor. “Assim, a língua brasílica passou a ser a língua materna de seus filhos, especialmente nas áreas mais afastadas do centro administrativo da Colônia, que era a Bahia. Era língua comum entre os portugueses, descendentes, e também seus escravos, inclusive os africanos” Mas é claro que a influência da cultura européia e africana seria logo sentida pela língua indígena. De fato, a partir da segunda metade do século 17, a língua brasílica sofreu várias modificações, passando a ser chamada de língua geral, que foi falada até 1758. Considera-se este ano como o da morte do tupi no Brasil. Foi

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quando o Marquês de Pombal, em nome do rei Dom José I, proibiu o ensino e o uso do tupi em todo o território nacional, instituindo o português como única língua do Brasil.

Seu objetivo era puramente político: esvaziar o poder dos padres jesuítas, que se aproximavam cada vez mais dos índios, aprendendo e ensinando no idioma nativo. “Até Pombal, de cada três habitantes, dois só sabiam língua geral e um era bilíngüe, falando também o português. Em 50 anos de proibição, o efeito destruidor foi notável”, lamenta Navarro.

Dois idiomas

Não fosse o decreto de Pombal, o Brasil hoje seria, provavelmente, como o Paraguai, em que coexistem dois idiomas. “Lá o processo histórico foi diferente”, esclarece o professor. “Não houve esse rompimento tão abrupto com a Igreja Católica e as missões jesuítas conservaram o guarani.” Exatos 240 anos após o fatídico decreto de Pombal, quem sabe não se verá agora o renascimento da língua que unificou o povo brasileiro até o século 18 Tupã, deus do raio e do trovão, diria, certamente: Ko’yr xe r-oryb-amo. ”Agora eu estou feliz.”

Anote

Dicionário Histórico das Palavras Portuguesas de Origem Tupi, de Antônio Geraldo da Cunha, com prefácio de Antônio Houaiss, Editora Melhoramentos/UnB

Método Moderno de Tupi Antigo — A Língua do Brasil dos Primeiros Séculos, de Eduardo Navarro, Editora Vozes

Poesias — Lírica Portuguesa e Tupi, tradução de Eduardo Navarro e organização de Hélder Perri, Editora Martins Fontes.

Curso de tupi. Informações com Hélder Perri, pelo (011) 818-4841.

O alemão e os índios no cinema

Quem quiser ouvir como se fala o tupi antigo terá essa oportunidade no ano que vem, quando chegar às telas de cinema o filme Hans Staden, do diretor Luiz Alberto Pereira. Todo falado em tupi, o filme conta a emocionante — e verídica! — história do marinheiro alemão que naufragou na costa brasileira, na altura de São Vicente, São Paulo, em meados do século 16. Salvo do naufrágio, Hans Staden passou a viver com os portugueses habitantes da região, até ser aprisionado pelos tupinambás de Bertioga, em 1554. Para seu azar, os tupinambás eram inimigos dos portugueses e pensaram que Staden também fosse português. Por conta dessa confusão, ele quase foi morto em um ritual antropofágico. O alemão sobreviveu, mas, durante os meses em que esteve cativo, pôde presenciar o tratamento que os ferozes tupinambás reservavam aos inimigos: eles eram esquartejados e devorados pelos membros da tribo.

Hans Staden acabaria sendo salvo pelos franceses, com os quais os tupinambás tinham firmado aliança. Resgatado pelo navio francês Catherine de Vetteville, ele partiu de volta para sua pátria e, em 1557, publicou um livro sobre suas aventuras no Brasil.

Para filmar essa história, os atores Carlos Evelyn (no papel de Staden), Sérgio Mamberti, Stênio Garcia, Cláudia Liz, Beto Simas, Darci Figueiredo, Milton de Almeida, Ariana Messias e Carol Li, entre outros, tiveram que aprender a falar tupi em tempo recorde: cerca de três meses.

O desafio foi dado a Hélder Perri, aluno de Eduardo Navarro na Universidade de São Paulo que agora dá aulas do idioma.É claro que os atores não chegaram a aprender tupi, esclarece Hélder. Eles apenas aprenderam o necessário para interpretar seus papéis. Para isso, o professor traduziu as falas dos personagens, mandou uma fita para que os atores pudessem assimilar a sonoridade da língua e, durante as gravações, ficava no set, uma aldeia tupinambá montada na cidade de Ubatuba, corrigindo a pronúncia. “O professor foi muito objetivo, o que acelerou nosso trabalho”, elogia o ator Sérgio Mamberti, a quem a façanha de falar um tupi com sotaque afrancesado, no papel de um mercador francês. Ele diz que ficou empolgado com a experiência: “O tupi tem um r gutural e um ritmo de língua oriental intercalada por palavras que para nós, brasileiros, são bastante comuns, como mirim,

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guaçu, ou mingau. Assim, ao falar tupi, eu me sentia às vezes como um japonês que, no meio de seu discurso, falasse algumas palavras em português”.

O tupi que o Brasil fala hoje

Assim como o latim e o grego, o tupi antigo participou decisivamente do português que é falado no Brasil. Assim, mesmo sem saber, não existe brasileiro que não conheça alguma palavra desse idioma. Que não saboreie abacaxi, pitanga, caju, jaboticaba, sapoti, gravatá ou pequi, frutas que conservaram seus nomes nativos. Ou que jamais tenha ouvido cantigas folclóricas como “Eu fui no itororó beber água e não achei. Achei bela morena, que no itororó deixei” —, mesmo desconhecendo que itororó é uma palavra indígena que significa bica d’água. Leia a seguir mais alguns exemplos, extraídos do Método Moderno de Tupi Antigo, livro do professor Eduardo Navarro:

“Reparando bem, todo mundo tem pereba, só a bailarina que não tem”, diz uma música de Chico Buarque de Holanda. Pereba, do tupi, significa ferida.

 Pare com este nhen-nhen-nhen. A expressão vem do verbo nhe’eng (falar, piar) e significa pare de ficar falando, de falar sem parar.  O velho jogo de peteca, que é um pequeno saco cheio de areia ou serragem sobre o qual se prendem penas de aves, tem este nome devido ao verbo petek — golpear ou bater com a mão espalmada. É com a palma da mão que se joga o brinquedo.  Velha coroca é uma velha resmungona. O termo nasceu do verbo kuruk, que significa resmungar.

 O verbo cutucar, em português, origina-se do tupi kutuk, cujo significado original — furar, espetar — modificou-se ligeiramente. Em português, cutucar é tocar com a mão ou com o pé.  Estar jururu é estar melancólico, tristonho, cabisbaixo. O termo indígena aruru, de onde surgiu a palavra, tem o mesmo sentido.  Várias palavras mantiveram pronúncia e significado praticamente originais: mingau (papa preparada geralmente com farinha de mandioca), capim, mirim (que significa pequeno) e socar (do verbo sok, com o mesmo significado).  A expressão estar na pindaíba muito brasileiro conhece: significa estar em graves dificuldades financeiras.É uma expressão que vem das palavras pinda’yba — vara de pescar (pindá, isoladamente, significa anzol). Antigamente, quando a pobreza abatia as populações ribeirinhas, era comum se tentar tirar a subsistência do rio, pescando para comer ou para vender o pescado. Segundo os pesquisadores, a expressão nasceu no período colonial brasileiro, em que o tupi em sua forma evoluída conhecida como “língua geral” era falado pela maioria dos brasileiros.  A perereca recebe esse nome simplesmente porque ela pula. Vem do verbo pererek, pular, que é também a origem do Saci-Pererê que, por não ter uma perna, anda aos pulos.

Um "homem branco" ensina Tupi aos índios do Brasil

O pedido partiu dos próprios índios Potiguar, da Paraíba, que ouviram o professor Eduardo Navarro falar na língua de seus antepassados em uma palestra. O programa está sendo agora elaborado.

Professor de tupi da USP, Eduardo Navarro vai realizar um trabalho inédito no Brasil: ensinar os índios Potiguar da Paraíba a falar a língua de seus antepassados, o tupi. Isso será feito por meio da formação de professores indígenas, criação de material didático para as crianças e resgate de obras escritas a partir do século 16 – incluindo-se aí o teatro, as poesias e a liturgia do Padre Anchieta.

“O pedido partiu dos próprios índios, que têm como maior sonho falar a língua de seus antepassados, que está morta hoje em dia”, explica Navarro. Ele aprendeu o tupi clássico sozinho, com documentos do século 16 e 17, que traduziu e publicou. “Faço isso para resgatar essa cultura que é o que temos de mais autenticamente brasileiro”.

O trabalho de difusão do tupi realizado por Navarro é feito em várias frentes. Ele criou a ONG Tupi Aqui, para ser um centro de referência e difusão da língua e da cultura indígenas; está concluindo o Dicionário da Língua Brasílica – O Tupi Antigo das Origens do Brasil, prefaciado por Ariano Suassuna, com cerca de oito mil termos, que será lançado no próximo ano pela Editora Vozes. Além disso, prepara a criação de uma rádio comunitária que transmitirá programas sobre tupi. “Todo brasileiro fala tupi, mesmo sem saber”, garante Navarro. “Isso porque a língua está entranhada no português de maneira irrevogável”.

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O interesse do professor pela cultura indígena parece estar no sangue. Navarro é neto de Belisário de Almeida, sertanista desbravador do Oeste brasileiro, que participou da expedição de Cândido Rondon. “Isso foi muito importante para minha formação”, garante. O resultado de seus estudos foi uma tese de doutorado concluída em 1995 sobre as gramáticas tupis, de Padre Anchieta e do missionário jesuíta Luís Figueira. A de Anchieta, de 1595, chama-se A Arte de Gramática da Língua Mais Usada na Costa do Brasil, e a de Figueira, de 1621, chama-se A Arte da Língua Brasílica.

“Graças a esses trabalhos, o tupi é a língua indígena mais bem-documentada e preservada que temos”, diz Navarro. Não é para menos. Até o século 17, o tupi era falado por todo o território nacional, até que foi proibido pelo Marquês de Pombal. “Mas essa é a nossa língua original, foi o que Cabral ouviu quando chegou ao Brasil”, lembra o professor. “Foi a língua dos bandeirantes, de Tibiriçá, do cacique Araribóia. Foi a língua da construção espiritual e política do Brasil”. Nesta entrevista ao JT, Navarro fala desse seu trabalho inédito e da importância do tupi na cultura nacional.

Por que é importante estudar o tupi hoje em dia?

O tupi é importante para se entender a cultura brasileira. O brasileiro já nasce falando tupi, mesmo sem saber. O português falado em Portugal diferencia-se do nosso principalmente por causa das expressões em tupi que incorporamos. Essa incorporação é tão profunda que nem nos damos conta dela. Mas é isso o que faz a nossa identidade nacional. Depois do português, o tupi é a segunda língua a nomear lugares no País. São milhares de nomes, que continuam aumentando. Além disso, a literatura brasileira não é só em português, é em tupi também. Um exemplo são as obras do padre Anchieta, que escreveu teatro, poesia lírica, músicas, catequese, tudo em tupi. Gonçalves Dias quis recuperar isso com suas obras, como I Juca Pirama – que significa “o que vai ser morto” –, assim como José de Alencar que, ao escrever Ubirajara, Iracema e tantos outros livros, buscava encontrar o rosto do Brasil. A importância do tupi se faz notar em cada fala nossa.

Cite alguns exemplos do tupi que usamos correntemente sem perceber.

Há milhares de expressões, como “ficar com nhenhenhém” – que quer dizer falando sem parar, pois nhe’eng é falar em tupi Chorar as pitangas – pitanga é vermelho em tupi; então, a expressão significa chorar lágrimas de sangue. Cair um toró – tororó é jorro d’água em tupi, daí a música popular “Eu fui no Itororó, beber água e não achei”. Ir para a cucuia significa entrar em decadência, pois cucuia é decadência em tupi. Velha coroca é velha resmungona – kuruk é resmungar em tupi. Dos verbos que nós temos, grande parte é tupi. Socar – soc é bater com mão fechada. Bater com a mão aberta é petec, daí vem peteca. Espetar é cutuc, daí cutucar; chamuscar é sapec, daí sapecar e sapeca. Nomes de doenças, como catapora – marca de fogo, tatá em tupi é fogo. O significado de grande parte dos nomes de lugares só se sabe com o tupi. Como nomes de bairros da cidade de São Paulo: Pari é canal em que os índios pescavam, Mooca é casa de parentes, Ibirapuera é árvore antiga, Jabaquara é toca dos índios fugidos, Mococa é casa de bocós – bocó é tupi. Na nossa fauna e flora, o tupi aparece massivamente: tatu, tamanduá, jacaré. Até nas artes ele é encontrado – como o famoso quadro de Tarsila do Amaral, o Abaporu, que quer dizer antropófago em tupi.

Com essa importância tão grande para a nossa cultura, por que o tupi desapareceu?

O tupi foi a língua mais falada do Brasil até o século 18 e foi a segunda língua oficial do Brasil junto com o português até o século 18. E só deixou de ser falado porque o Marquês de Pombal, em 1758, proibiu o ensino do tupi. O tupi antigo era conhecido até o século 16 como língua brasílica. No século 17, ele passou a ser chamado de língua geral, pois incorporou termos do português e das línguas africanas. Mas continuava sendo uma língua indígena, assim como é até hoje o guarani no Paraguai, falado por 95% da população. Nas relações formais, é o castelhano que se fala, mas em casa é só o guarani. A dissolução do tupi foi rápida porque a perseguição foi muito violenta. Mesmo assim, até o século 19 ainda havia muitos falantes do tupi. Hoje, a língua geral só é falada no Amazonas, no alto Rio Negro – chama-se nheengatu e tem milhares de falantes entre os caboclos, índios e as populações ribeirinhas.

Por que a língua geral se manteve nessa região?

Porque lá o Estado não se fazia sentir. Na Amazônia, o português só se tornou língua dominante no final do século 19. E isso porque, em 1877, houve uma seca terrível no Nordeste, o que ocasionou a saída de 500 mil nordestinos da região, que foram para a Amazônia levando o português. Mas o tupi que eu ensino é o antigo, falado até o século 19. Hoje, ela é uma língua morta, não há mais falantes do tupi. Apesar de ser morta, é também uma língua clássica, pois foi fundamental para a formação

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de uma civilização, assim como o foram o latim, o sânscrito e o grego, que é uma língua clássica ainda falada. O tupi foi fundamental também para a unidade política do Brasil. Havia outras línguas indígenas que não tinham relação com o tupi, como a dos índios Guaianazes e Goitacazes. Mas eram línguas regionais. O tupi evoluiu para outras línguas além da geral. No Xingu, há línguas que vêm do tupi antigo e são faladas até hoje. Mas o desconhecimento sobre o assunto é tão grande que ainda é comum ouvirmos o termo “língua tupi-guarani”, que é na verdade uma família de 20 línguas, não uma língua única.

Como será feito este resgate de uma língua morta há quase dois séculos?

Meu projeto é permitir o fácil acesso ao conhecimento dessa língua. Para isso, escrevi o manual Método Moderno de Tupi Antigo: A Língua do Brasil dos Primeiros Séculos, publicado em 1998 pela editora Vozes, patrocinado pela FIESP, que já está na terceira edição. Eu ensino o tupi como uma língua viva, preparando lições com textos e diálogos baseados nos documentos dos séculos 16 e 17, mostrando situações concretas da vida nessa época, como caçadas e pescarias. São 36 lições. O manual está sendo publicado em alemão, pois há um grande interesse por esse assunto no mundo todo. Tenho dado palestras sobre tupi e sobre o Brasil do século 16 em muitos lugares da Europa e até em campos de refugiados na Palestina, onde estive em março passado.

A que você credita esse interesse estrangeiro pelo tupi?

Um estrangeiro que se interesse pela cultura brasileira acaba se voltando para a cultura indígena e, portanto, para o tupi. Pois é o que há de autenticamente brasileiro. Claro que a cultura africana é importante, mas não é originalmente nossa. Os estrangeiros vêm aprender tupi também porque já estão fartos do american way of life. Por isso já dei aulas para alunos norte-americanos, europeus, japoneses e africanos. Queremos ampliar o curso da USP, que foi fundado em 1935 pelo professor Plínio Airosa e é o único dessa língua em todo o Brasil. Ele tem duração de um ano e a procura é muito grande – em cada semestre há 200 alunos. Queremos ampliar para dois anos. Tudo isso em sintonia com a nossa ONG Tupi Aqui, fundada em 1998, que quer estender o conhecimento da língua.

Que trabalho é realizado pela ONG Tupi Aqui?

Nosso principal intuito é a formação de professores e de novos cursos de tupi. Isso será feito no ano que vem na UniGran Rio, universidade do Rio de Janeiro. Estamos criando também a rádio comunitária Vila Formosa, em São Paulo, que vai veicular programas semanais sobre tupi. Temos um projeto pronto para que o tupi seja adotado como matéria optativa nas escolas públicas. E, há alguns meses, recebemos a nossa mais importante missão: ensinar o tupi aos índios Potiguar da Paraíba. Isso aconteceu porque fui dar uma palestra na Assembléia Legislativa da Paraíba e os índios estavam presentes. Fiz o discurso em português e em tupi antigo e fiz referências aos antepassados deles, como Pedro Poti e Felipe Camarão, índios que lutaram na guerra contra a Holanda, no século 17. Nessa ocasião, os próprios índios me disseram que o maior sonho que têm é voltar a falar a língua de seus antepassados, pois hoje falam só o português. Eles choraram quando comecei a ler em tupi, foi emocionante. Naquele momento surgiu o sonho de falar sua antiga língua. E ele vai começar a ser realizado.

Como a língua tupi será ensinada para os índios Potiguar?

Termos da modernidade serão criados. Geladeira é “mba’é moruissara” – aquilo que esfria as coisas; avião é “guyraguaçu”, e assim por diante. Formaremos inicialmente 60 professores indígenas. Serão feitas cartilhas para as crianças que vão aprender o tupi antigo junto com o português. Faremos também um centro cultural de documentação da língua tupi. Além disso, enxertaremos o tupi em todas as manifestações sociais deles. Faremos grupo de teatro e de música, resgatando os textos do século 16. O padre Anchieta musicou seus próprios poemas com canções populares de Portugal e da Espanha. Com os índios que forem católicos, e a maioria o é, vamos introduzir os textos antigos na liturgia da missa. E, mesmo em atividades típicas deles, como a dança chamada toré, vamos introduzir o tupi, traduzindo as letras das músicas. Esse trabalho durará alguns anos, e haverá alunos da ONG fazendo estágio lá.

Não é utopia imaginar que os índios podem voltar a falar uma língua morta há tanto tempo?

Não, mesmo porque isso já foi feito no século 20 com o hebraico, que desapareceu durante séculos. Depois que os judeus foram expulsos da Palestina, no século primeiro depois de Cristo, os judeus passaram a falar línguas como iídiche e ladino. Só os rabinos falavam hebraico em seus cultos. No

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começo deste século, o hebraico voltou a ser falado, mas voltou com força depois da criação do Estado de Israel, por meio dos kibutz. Hoje, é uma língua viva novamente, falada por cinco milhões de habitantes. No nosso caso, tudo depende da vontade dos índios, que parece ser bem grande. São cerca de oito mil índios, distribuídos em 22 aldeias. Há alguns Potiguar no Ceará, que vamos procurar reunir também. É a primeira vez que uma língua indígena será recuperada no Brasil. O financiamento é da FUNAI e do MEC. Mas haverá necessidade de uma grande mudança na vida desses índios, que terão de trabalhar menos para assistir às aulas. E isso exigirá recursos que a nossa ONG está tentando conseguir.

Se os Potiguar não são os únicos índios descendentes de falantes do tupi antigo, esse trabalho não poderia ser ampliado para outras tribos?

A maioria dos índios que falavam tupi antigo desapareceu. Os Tupinambás, que eram os mais populosos, desapareceram há séculos, e os Tamoios, no século 16. Sobraram dois grupos, os Potiguar da Paraíba e os Tupiniquins do Espírito Santo. Mas, dos 40 grupos existentes no Nordeste hoje, só os Fulniô falam a língua indígena. Esse é um trabalho muito importante e urgente, pois as línguas indígenas são muito pouco estudadas. A mais estudada é o tupi antigo, que tem dicionário, gramática e textos literários. Isso acontece com poucas, como o Uaiampi do Amapá e o Cariri do Ceará, que foi estudada no século 16 pelo padre Mamiani, que fez a sua gramática. Se os índios Cariri quiserem, podem voltar a falar sua língua. E existem línguas indígenas que estão sendo descobertas agora, pois há ainda índios sem contato. Esse trabalho deverá servir de exemplo para outras tribos, que ainda podem recuperar sua língua. Há também o problema das línguas que estão em vias de desaparecer, como o xetá, que é falado por quatro índios. Há essa situação emergencial de estudo dessas línguas.

Há trabalhos como esse feito em outros países?

Nós vamos nos associar a movimentos europeus que visam preservar a diversidade cultural. Trabalho como esse eu não conheço, mas a Nova Zelândia nos convidou para um trabalho conjunto. Lá se mantém o maori, língua dos índios e língua da Austrália e da Nova Zelândia até hoje. Inclusive, há documentos oficiais, canais de televisão e universidade, feitos só em maori. Esse seria o sonho dos nossos índios Potiguar – integrarem-se sem desaparecer. Claro que eles não vão ficar eternamente isolados, mas têm de se integrar mantendo sua cultura. Porque, sem isso, não são só os índios que perdem, é a humanidade inteira. Quando uma língua indígena deixa de ser falada, é a humanidade que está se empobrecendo. Pois o que dá beleza à humanidade é a diversidade de culturas. Já pensou que triste será o mundo se todos falarmos inglês? Eu, sinceramente, não quero viver em um mundo assim.

Paula Chagas, especial para o Jornal da Tarde, 12 de novembro de 2000.

Lição 1

Introdução ao Tupi Antigo

Nós nos propomos, aqui, a ensinar-lhe, de modo correto, o Tupi Antigo, a língua indígena clássica do Brasil, a velha língua brasílica dos primeiros dois séculos de colonização do nosso país. Você aprenderá os fundamentos da língua Tupi e conhecerá onde ele está presente na língua portuguesa e na geografia do Brasil.

Infelizmente há cursos sem a mínima seriedade, que ensinam Nheengatu da Amazônia como se fosse Tupi Antigo, de envolta com o Guarani paraguaio. Tudo isso mais confunde os alunos que os ensina. Ora, estudar Tupi Antigo exige a mesma seriedade científica que exige o estudo de qualquer outro idioma. Assim, antes de tudo, é importante que certos conceitos fiquem bem claros para quem começa a estudar essa língua.

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Conceitos Importantes

TUPI ANTIGO - Essa foi a língua que os marinheiros da armada de Cabral ouviram quando aqui chegaram em 1500 e que ajudou na construção espiritual do Brasil. Naquela época, essa língua era falada em toda a costa do Brasil por muitos grupos indígenas: os Potiguaras, os Caetés, os Tupinambás, os Temiminós, os Tabajaras, etc. Seu primeiro gramático foi o Padre José de Anchieta, que publicou sua Arte de Gramática da Língua mais Usada na Costa do Brasil, em 1595.

Chegou a ser, por séculos, a língua da maioria dos membros do sistema colonial brasileiro, de índios, negros africanos e europeus, contribuindo para a unidade política do Brasil. Forneceu milhares de termos para a língua portuguesa do Brasil, nomeou milhares de lugares no nosso país (sendo, depois do português, a língua que mais produziu nomes geográficos em nosso território), esteve presente em nossa literatura colonial, no Romantismo, no Modernismo, foi a referência fundamental de todos os que quiseram afirmar a identidade cultural do Brasil. “Falada na catequese e nas bandeiras, instrumento das conquistas espirituais e territoriais da nossa história, o seu conhecimento, sequer superficial, faz parte da cultura nacional” (Lemos Barbosa, 1956).

LÍNGUA GERAL – Foi uma língua surgida da evolução do Tupi Antigo, a partir da segunda metade do século XVII, quando, então, era falada por todos os membros do sistema colonial brasileiro: negros, brancos, índios tupis e não tupis, mestiços.

TUPI-GUARANI – não é uma língua, mas uma família de mais de vinte línguas. Inclui o Tapirapé, o Wayampi, o Kamayurá, o Guarani (com seus dialetos), o Parintintin, o Xetá, o Tupi Antigo, etc. Existem línguas Tupi-Guarani, não o Tupi-Guarani. Dessas, o Tupi Antigo é a que foi estudada primeiro e a que mais influenciou a formação da cultura brasileira.

NHEENGATU – é uma língua da Amazônia, uma evolução da língua geral, falada por caboclos no vale do Rio Negro, na Amazônia. É uma fase atual do desenvolvimento histórico do Tupi Antigo, mas não é o Tupi Antigo.

TUPI MODERNO – é o nome que alguns dão ao Nheengatu da Amazônia ou, ainda, a certas línguas faladas da família Tupi-Guarani. Não é a língua que Anchieta estudou, mas uma evolução dela.

Chave da pronúncia do tupi antigo

VOGAIS:

A: ka’a - mata; a-karu - (eu) como; taba - aldeiaE: ere-ker - (tu) dormes; ixé - eu; pereba - feridaI: itá - pedra; pirá - peixe; maíra - francêsO: "a-só" (leia assó) - (eu) vou; oka - (leia "óca") - casa U: upaba - lago; sumarã - inimigo; puká - rir

Y: fonema que não existe no português, mas existe no russo e no romeno. É uma vogal média, intermediária entre u e i, com a língua na posição para u e os lábios estendidos para i. (Sugestão prática: diga u e vá abrindo os lábios até chegar à posição em que você pronuncia i.)

Todas as vogais acima têm suas correspondentes nasais.

Consoantes e Semivogais

‘ - representa a consoante oclusiva glotal, que não existe em português. Tal fonema realiza-se com uma pequena interrupção da corrente de ar, seguida por um súbito relaxamento da glote: emba’e - coisa, so´o - caça

B - Pronuncia-se como o v do castelhano em huevo. É um b fricativo e não oclusivo, isto é, para pronunciá-lo, os lábios não se fecham, apenas friccionam-se: abá - homem; ybyrá - árvore; t-obá - rosto

Page 10: Curso de Tupi

Î - Como a semivogal i do português, em vai, falai, caiar, bóia, lei, dói: îuká - matar; îase’o - chorar; îakaré - jacaré

NH - É um alofone (i.e., uma outra forma) de î e pronuncia-se como no português ganhar, banha, rainha: kunhã - mulher; nhan - correr; nharõ - raiva, ferocidade; nhandu-’i - aranha.

K - Como o q ou o c do português antes de a, o ou u, como em casa, colo, querer: ker - dormir; îuká - matar; paka - paca; ybaka - céu.

M (ou MB) - Como em português mar, mel, manto, ambos, samba: momorang - embelezar; mokaba - arma de fogo; moasy - arrepender-se. Às vezes o m muda-se em mb, que é um alofone. Em mb, o b é oclusivo, devendo-se encostar os lábios para pronunciá-lo.

O m final deve ser sempre pronunciado, isto é, devem-se fechar os lábios no final da pronúncia da palavra, como no inglês “room” : a-sem - (eu) saio.

N (ou ND) - Como no português nada, nicho, nódoa, andar, indo: nupã - castigar; nem - fedorento; nong - pôr, colocar. Às vezes o n muda-se em nd, que é seu alofone.

Ex.: ne ou nde - tu; amã’-ndykyra - gotas de chuva

O n final deve ser sempre pronunciado: você deverá estar com a língua nos dentes incisivos superiores ao finalizar a pronúncia da palavra: nhan - correr; momaran - fazer brigar.

NG - Como no inglês “thing” - coisa ou “sing” - cantar. monhang - fazer; nhe’eng - falar

P - Como no português pé, porta, pedra: potim - camarão; potar - querer; pepó - asa.

R - É sempre brando, como no português aranha, Maria, arado, mesmo no início dos vocábulos: ro’y - frio; aruru - tristonho; paranã - mar; ryryî - tremer.

S - Sempre soa como no português Sara, assunto, semana, pedaço (nunca tem som de z): a-só (leia: assó) - vou; sema - saída. Às vezes, após i e î o s realiza-se como x (seu alofone): i xy - mãe dele; su’u - morder, a-î-xu’u - mordo-o.

T - Como em antena, matar, tato: tutyra - tio; taba - aldeia; tukura - gafanhoto.

Û - Como a semivogal u do português em água, mau, nau, audácia, igual. Em início de sílaba pode ser pronunciado como gû: ûyrá ou gûyrá - pássaro; ûi-tu ou gûi-tu - vindo eu; ûatá ou gûatá - caminhar.

X - Como o ch ou o x do português em chácara, chapéu, xereta, feixe: ixé - eu; t-aîxó - sogra; i xy - sua mãe.

Exercício 01

Leia as seguintes palavras tupis (ouvindo-as depois):

A-morubixaba (cacique)ygara (canoa)syk (chegar)kûá (enseada)nhe’eng (falar) pytá (ficar) gûyratinga (garça)abá (índio) îakaré (jacaré)ygarusu (navio)paka (paca)

Page 11: Curso de Tupi

peró (português)ybyrá (árvore)tendy (luz)‘aka (chifre)moti’a (peito)ybytyra (monte, montanha)

Lição 2

 “Vamos parar de nhen nhen nhen... ”Que significa "nhen nhen nhen"?

     Ixé         a-nhe’eng.

                         Eu           falo

Américo Vespúcio em contato com os índios

Os verbos da primeira classe

Falar, em Tupi antigo, é nhe’eng. Em Tupi antigo os verbos flexionam-se à esquerda, i.e., no começo, e não à direita como acontece em português (p.ex., falo, falas, fala, etc.):

Verbo falar (nhe’eng), no modo indicativo - presente ou pretérito:

ixé a-nhe’eng eu falo; eu faleiendé ere-nhe’eng tu falas; tu falastea’e o-nhe’eng ele fala oré oro-nhe’eng nós falamos (exclusivo)îandé îa-nhe’eng nós falamos (inclusivo)pee pe-nhe’eng vós falais; vós falastesa’e o-nhe’eng eles falam

Os verbos da primeira classe recebem prefixos número-pessoais, como você pode ver acima (a- ere-, o-, oro-, îa-, pe-, o-). A 3ª pessoa do singular e a 3ª pessoa do plural não se diferenciam.

Você deve ter percebido que há duas formas que traduzem nós. Existe o nós inclusivo e o nós exclusivo. Isso acontece em muitas línguas indígenas, até mesmo nas do Peru e do México.

INCLUSIVO: INCLUI O OUVINTE

Page 12: Curso de Tupi

EXCLUSIVO: EXCLUI O OUVINTE

Se dissermos, em Tupi, para um grupo de índios: - “Nós somos portugueses” ou - “Nós viemos de Portugal”, devemos usar o “nós” exclusivo (ORÉ), pois os índios não se incluem nesse “nós”. Se dissermos, porém, “Nós morreremos um dia”, incluem-se, aí, aqueles com quem falamos. Usa-se, então, a forma inclusiva (ÎANDÉ), que inclui a 1a e a 2a pessoas. Há também a forma ASÉ, que significa “a gente”, eu, tu e ele, que leva sempre o verbo para a 3ª pessoa, também equivalente ao se, como índice de indeterminação do sujeito, em Bebe-se aqui, come-se bem ali.

Observações importantes

Todo infinitivo de verbo tupi sempre termina em vogal. Se o verbo tiver o tema terminado em consoante, no infinitivo ele recebe o sufixo -A.

Ex.-

só..............infinitivo: só

sykyîé........infinitivo: sykyîé

syk............infinitivo: syk-a

nhe’eng.....infinitivo: nhe’eng-a

sem...........infinitivo: sem-a

O infinitivo verbal em tupi é um perfeito substantivo.

Assim:

só - o ir, a ida

sykyîé - o temer, o medo

syk-a - o chegar, a chegada

nhe’eng-a - o falar, a fala

sem-a - o sair, a saída

EXERCÍCIO 1:

Conjugue os seguintes verbos em todas as pessoas, usando os pronomes pessoais (eu, tu, ele, etc.), conforme o modelo.

Continue agora:

SÓ   (ir)

ixé a-só   eu vou; eu fui

endé ere-só   tu vais; tu foste

a’e o-só   ele vai; ele foi

asé o-só   a gente vai

oré oro-só  nós vamos, nós fomos (excl.)

îandé îa-só   nós vamos, nós fomos (incl.)

pee pe-só   vós ides; vós fostes

a’e o-só   eles vão; eles foram

Page 13: Curso de Tupi

1) KOPIR - (carpir)2) PYTÁ - (ficar)3) SYKYÎÉ - (temer, ter medo)4) IKÓ - (estar, morar)*5) SEM - (sair) - donde "piracema" - saída dos peixes6) SYK - (chegar) - donde Piracicaba - chegada dos peixes7) ‘YTAB – nadar

*A vogal i , átona, após uma outra vogal, forma ditongo, tornando-se î (semivogal).O- + ikó > o-îkó (forme um ditongo no oi)

EXERCÍCIO 2

Verta para o Tupi as frases abaixo com base no vocabulário mnemônico que apresentamos a seguir:

1) Sorocaba: sorok - rasgar-se + -aba - sufixo substantivador, podendo também significar "lugar da rasgadura" da terra2) ir para a cucuia: de kukuî - ficar caindo, ficar-se desprendendo (o fruto, o cabelo, etc.), reduplicação de kuî - cair, desprender-se: ir para a decadência3) maracujá – murukuîá4) aoba – roupa5) sapo cururu na beira do rio (cantiga folclórica brasileira): de kururu – sapo6) Avanhandava - abá - homem, pessoa, índio + nhan - correr + aba - lugar: lugar da corrida dos homens)7) Jaci (nome próprio) - de îasy – lua8) Itaberaba (município de Minas Gerais): de itá - pedra + berab - brilhante: pedra brilhante)

1 - A roupa rasgou-se.2 - O maracujá caiu.3 - O sapo dormiu.4 - O homem correu.5 - A lua brilhou.

EXERCÍCIO 3

Traduza:

1 - Abá o-kopir.2 - Itá o-berab.3 - Kururu o-‘ytab.4 - Abá o-sykyîé.5 - Îasy o-sem.

Lição 3

Por que Iguape, Cotegipe e Sergipe terminam em -pe?

"Eu fui ao Itororó beber água e não achei"... Que quer dizer Itororó?

Ele estava numa pindaíba... Até fome passava?

Donde vem tal expressão?

Ixé   a-ker    ka’a-pe.

            Eu durmo          no mato.

A posposição em Tupi

Page 14: Curso de Tupi

As preposições do português correspondem, em tupi, a posposições, porque aparecem depois dos termos que regem. Há posposições átonas, que aparecem ligadas por hífen, mas a maior parte delas é tônica, vindo separadas dos termos que regem.

Ex.-

-PE - em, para (geralmente locativo). É posposição átona:

siri ‘y-pe (donde Sergipe - estado brasileiro) - no rio dos siris, para o rio dos sirisakuti îy*-pe (donde Cotegipe) - no rio das cotias ‘y kûá-pe (donde Iguape) - na enseada do rioiperu ‘y-pe (donde Peruíbe - município paulista) - no rio dos tubarões (*água, rio, em Tupi Antigo, é ‘y ou îy, tendo sido usada esta última forma principalmente na porção nordeste do Brasil)SUPÉ - para (pessoas ou coisas) - só para a 3a pessoaabá supé - para o índiomorubixaba supé - para o caciqueMaria supé - para MariaSUÍ - de (proveniência, causa)îakaré ‘y suí - do rio dos jacaréstatu ‘y suí - do rio dos tatusPiratininga suí - de Piratininga (antigo nome de São Paulo)PUPÉ - dentro dearará kûara pupé - dentro do buraco das ararás (var. de formiga)oka pupé - dentro da casa

A RELAÇÃO GENITIVA EM TUPI

Em tupi não existe posposição correspondente à preposição DE do português, que exprime uma relação de posse como “casa de Pedro”, ou outras relações como “faca de prata” (relação de matéria), etc. Basta, para exprimi-las em tupi, juntar os dois substantivos em ordem inversa à do português, como faz o inglês, por exemplo, em “Peter’s house” (“casa de Pedro”) ou como faz o alemão em ‘‘Volkswagen’’ (“carro do povo”). Tal relação que leva, em português, a preposição DE e que exprime posse, pertença, origem, qualidade, atribuição de algo a alguém, etc. , é a que chamaremos “relação genitiva”. Chamaremos o primeiro termo da relação genitiva de genitivo ou determinante.

Ex.-

mãe de Pindobuçu Pindobusu syrio do tatu tatu ‘yrio do jacaré îakaré ‘yenseada do rio ‘y kûánavio dos portugueses peró ygar-usulíngua dos índios abá nhe’engajorro d´água ‘y tororomaplanta de anzol (vara de pescar) pindá ‘yba

Outros exemplos:

menino de pedra  itá kunumim - (itá = pedra) (kunumim = menino)

farinha de milho  abati u’i - (u’i = farinha) (abati = milho)prato de pedra  itá nha’em - (nha’em = prato) (itá = pedra)

EXERCÍCIO 4

Traduza:

01 - A-sem Nhoesembé suí.02 - Ere-só îakaré ‘y-pe.03 - Oro-pytá siri ‘y-pe.04 - A-nhe’eng peró supé.

Page 15: Curso de Tupi

05 - Ere-nhe’eng abá supé.06 - Pe-îkó ‘y pupé.07 - Morubixaba supé pe-nhe'eng.08 - Îakaré o-sem ‘y suí.09 - Pe-sem tatu kûara suí.10 - Ka'a-pe ere-só.

EXERCÍCIO 5

Verta para o Tupi:

01 - Fico em Nhoesembé.02 - Ficamos (incl.) no rio.03 - Moramos (excl.) em Nhoesembé.04 - Ficas dentro do navio.05 - Saímos (incl.) da canoa.06 - Falaste aos índios.07 - Os índios falam a Maria.08 - Ficamos (incl.) dentro do navio.09 - Pedro está dentro do navio.10 - Saio da mata.11 - As favas estouraram.12 - O tucano dormiu.13 - A casa de carijós queimou.14 - Escorreguei dentro do rio das pedras.

EXERCÍCIO 6

Traduza as frases abaixo com base no vocabulário mnemônico dado abaixo:

- Avaré (município de São Paulo): abaré – padre- Velha coroca: kuruk - resmungar, resmungão - Itabira (cidade de Minas Gerais) - de itá - pedra + byr - levantar-se, erguer-se:  pedra   levantada- Itapecirica (cidade de São Paulo): itá - pedra + peb - achatado + syryk - escorregar: pedra achatada escorregadia- Comandacaia (localidade da Bahia): komandá - fava + kaî - queimar: favas  queimadas- Pirabebé (nome de um peixe): pirá - peixe + bebé - voar: peixe voador- Pipoca: pira - pele + pok - estourar: pele estourada- Voçoroca (tipo de erosão da terra) - de yby - terra + sorok - rasgar: terra rasgada- Boiçucanga (município de São Paulo) - de mboia - cobra + usu - sufixo de aumentativo +   kanga -   esqueleto, osso- Tocantins (estado brasileiro) - de tukana - tucano + tim - bico, nariz, saliência:  bico de   tucano

01 - O tucano ergueu-se da terra. Voou para a mata.02 - O padre escorregou na pedra. Resmungou, ergueu-se, foi para o rio.03 - O esqueleto do tucano está na terra.04 - A pele da cobra estourou.05 - O nariz do padre é achatado.06 - A casa queimou.07 - As favas estouraram.08 - O tucano dormiu.09 - A casa de carijós queimou.10 - Escorreguei dentro do rio das pedras.

EXERCÍCIO 7

01 - A mãe de Pedro é bonita.02 - A toca da onça é comprida.03 - O filho de Maria é bom.04 - Nadei no rio dos peixes.05 - Pedro nadou no rio dos gravatás.06 - Dormi na toca das araras.07 - Maria ficou no rio dos tatus.08 - Vou para a enseada de pedra.09 - Maria mora dentro da casa de pedra.

Page 16: Curso de Tupi

10 - O rio dos siris é bonito.

EXERCÍCIO 8

Traduza para o Tupi com base no vocabulário mnemônico dado abaixo:

- Pari (nome de bairro de São Paulo): pari - canal para apanhar peixes- Itaquera (bairro de São Paulo): itá - pedra + ker - dormir: pedra dormente- Capibaribe (nome de rio de Pernambuco) - kapibara - capivara + ‘y - rio + -pe  (posposição) – em- Itapororoca (município da Paraíba) - itá - pedra + pororok - explodir: pedras explodidas ou explosão das pedras- Pirapora (município da Bahia) - pirá - peixe + por - pular: pulo dos peixes ou  peixes que pulam- Iquiririm (rua de São Paulo) - ‘y - rio + kyririm – silencioso- carioca (nome de quem nasce na cidade do Rio de Janeiro) - de kariîó - carijó - nome de grupo indígena + oka - casa: casa de carijós

01 - A capivara saiu do pari.02 - O carijó pulou dentro do rio.03 - O carijó silencioso dormiu dentro da casa.04 - A casa explodiu.05 - A capivara dormiu no rio das pedras.

Anchieta escrevendo na praia

Que significa Etá em Guaratinguetá e Paquetá?

ETÁ (muitos, muitas) vem sempre posposto ao substantivo, formando uma composição com ele. O sufixo -A final, se existir, cai. (Usaremos sempre o hífen com as composições)

Ex.-

pak(a)-etá (donde Paquetá - ilha do Rio de Janeiro) - muitas pacasperó-etá - muitos portuguesesitá-etá (donde Itaetá, nome de arroio do Rio Grande do Sul) - muitas pedrasabá-etá - muitos índiosygarusu-etá - muitos naviosgûyrá-ting(a)-etá - muitas aves brancas, muitas garças (donde Guaratinguetá – município paulista)

Exercício 9

Traduza:

01 - Muitos índios vão para o rio. 02 - Muitos índios saem da canoa.03 - Muitos navios estão na enseada. 04 - Muitos portugueses falam aos índios.05 - Muitas pacas ficam dentro da mata.06 - Muitas garças saem do rio.07 - Muitos índios moram em Nhoesembé.

Page 17: Curso de Tupi

08 - Muitos tatus vão para a mata. 09 - Muitos meninos estão dentro do navio.10 - Muitas pacas moram na mata.

Os Pronomes Pessoais - (Continuação)Itaporanga, Iporanga, Botucatu, Ibicatu... Que significam poranga e catu?

Os pronomes pessoais em tupi são divididos em duas séries:

Primeira série   Segunda sérieixé - eu xe- euendé - tu nde ou ne - tua’e - ele, ela (aquele,-a)   i - ele, elaoré - nós (excl.)   oré - nós (excl.)îandé - nós (incl.)   îandé - nós (incl.)pee - vós   pe - vósa'e - eles, elas   i - eles, elasasé - a gente; nós todos    

Com verbos, usam-se preferencialmente os pronomes pessoais da primeira série, conforme o que você já viu na lição 1. Com adjetivos, usam-se preferencialmente os da segunda série.

Os adjetivos qualificativos e predicativos

Os adjetivos podem ser qualificativos ou predicativos.

Ex.

Qualificativos Predicativosta(ba)-porang-a -  aldeia bonita taba i porang  -  a aldeia, ela (é) bonita taba i porang  -  a aldeia, ela (é) bonita

x  ‘y i pyrang      -  o rio, ele (é) vermelho

Quando dizemos casa bonita, usamos um adjetivo qualificativo, porque ele se prende diretamente ao substantivo. Se dizemos a casa é bonita, usamos um adjetivo predicativo, porque ele se prende ao substantivo por meio de verbo de ligação. Neste último caso, nós afirmamos alguma coisa da casa (que ela é bonita). Na predicação, assim, usamos, em português, um verbo de ligação, que no exemplo acima é o verbo ser. Porém, em tupi não existe o verbo ser.

Se queremos dizer menino bonito, basta justapor porang ao substantivo, acrescentando o sufixo -A à composição formada. Dizemos pois kunumim-porang-a. Se quisermos dizer “o menino é bonito” teremos de usar o pronome pessoal de 3ª pessoa, I, dizendo assim: kunumim i porang. (Literalmente isso significa “o menino, ele (é) bonito.)” Subentendemos o verbo ser, que em tupi não tem correspondente. Se quisermos dizer “eu sou bonito”, dizemos xe porang. Veja, assim, que com adjetivos predicativos usamos os pronomes pessoais da segunda série. O pronome I de 3a pessoa só se usa com eles:

Condução de prisioneiros

xe porang eu (sou) bonitonde porang tu (és) bonitoi porang ele (é) bonitooré porang nós (somos) bonitos (excl.)

Page 18: Curso de Tupi

îandé porang nós (somos) bonitos (incl.)pe porang vós (sois) bonitosi porang eles (são) bonitos

Outros exemplos:

nde katu tu (és) bom (com adjetivos não se usa comumente endé)pe katu vós (sois) bons (com adjetivos não se usa comumente pee)i katu ele (é) bom (com adjetivos não se usa nunca a’e)oré katu nós (somos) bons

Com substantivos servem as duas séries, menos o pronome I, que, na função de sujeito, só se usa com adjetivos. Podem vir antes ou depois do substantivo.

Ex.-  xe morubixaba eu (sou) o caciqueixé morubixaba eu (sou) o caciquemorubixaba ixé o cacique (sou) eu

Se o sujeito for substantivo, o adjetivo predicativo deverá vir sempre antecedido do pronome pessoal I, que é um sujeito pleonástico.

Ex.-Kunhã i katu. - A mulher, ela (é) bondosa. Kunhã i porang. - A mulher, ela (é) bonita. O adjetivo que qualifica um substantivo está sempre em composição com ele e é invariável em número. Também a composição de substantivo + adjetivo deve terminar sempre em vogal. Acrescentamos -A se o segundo termo da composição terminar em consoante. Esse -A refere-se não ao adjetivo, mas à composição formada pelo substantivo e pelo adjetivo. O adjetivo qualificativo sempre está em composição com o substantivo.

Ex.-Bonito em tupi é porang. Agora: kunhã-porang-a - mulher bonita, (ou mulheres bonitas) - Acrescentamos um A porque o adjetivo termina em consoante. Bom em tupi é katu. Então: Abá-katu - homem bom (ou homens bons) - A composição termina em vogal (u). Assim, não acrescentamos o sufixo -A final.

Ex.-    taba + porang tá’-porang-a aldeia bonitaupaba + nem upá’-nem-a lago fedorento‘y + pyrang ‘y-pyrang-a rio vermelho

Exercício 10

Com base no vocabulário dado abaixo, traduza para o tupi as frases seguintes:

Adjetivosalto - pukubom - katubonito - porangfedorento - nempequeno - mirimsujo - ky’avermelho - pyrang

Substantivosaldeia - tabaárvore - ybyráCunhambebe - Kunhambebahomem - abámenino - kunumimmulher - kunhãpadre - abaré

Page 19: Curso de Tupi

Potira - PotyraReritiba - Reritybario - ‘y

01 - O homem bom é fedorento.02 - O homem fedorento é bom.03 - O menino pequeno é bonito.04 - O menino bonito é pequeno.05 - O rio vermelho é sujo.06 - O rio sujo é vermelho.07 - O homem bonito é alto.08 - O homem alto é bonito.09 - A árvore pequena é vermelha.10 - A árvore vermelha é pequena.

EXERCÍCIO 11

Traduza as frases abaixo com base no vocabulário mnemônico apresentado:

- Potengi (rio do Rio Grande do Norte) - de potim - camarão + îy – rio*: rio dos camarões

- Tietê (rio de São Paulo) - de ty- rio, água* + eté - muito bom, verdadeiro, genuíno: rio muito bom, rio verdadeiro

- Tijuca (nome de rio do Rio de Janeiro) - de ty - rio, água + îuk - podre:  rio podre,  água podre

- Paraíba (estado brasileiro e nome de rio que banha sua capital) - de pará - rio grande ou mar* + aíb

- ruim, mau: rio ruim

- Paranapanema (nome de rio que separa os estados de São Paulo e Paraná) - de paranã - mar ou rio   grande* + panem - imprestável: rio imprestável

- Bauru (nome de município de São Paulo) - de ‘ybá - fruta + uru - vasilha: vasilha de frutas

- Peruíbe (nome de município de São Paulo) - de iperu - tubarão + ‘y - rio + -pe - em: no rio dos tubarões

*Atenção!Rio, em Tupi Antigo pode ser ‘y ou ty. No Nordeste, achamos também a forma îy. Rio grande, rio de grande volume d´água, pode ser paranã (que também significa mar) ou pará.

01 - Potim i pyrang. Potim o-‘ytab ty-îuka pupé.02 - ‘Ybá o-kuî ybyrá suí. ‘Ybá i îuk. 03 - Kunumim-aíb-a o-só pará-gûasu-pe.04 - Abá-panema o-ker pirá-îy-pe.05 - Iperu o-sem paranã suí.06 - ‘Ybá-îuka o-îkó uru pupé.07 - Kunhã-aíba o-nhe’eng abá-panema supé.08 - Iperu-panema o-‘ytab pirá-îy-pe.

Lição 6

Taquarenduva, Mantiqueira, Itaipu, Pindamonhangaba, Pernambuco, Catanduva, Nuporanga, Garanhuns...Depois de ler esta lição, você saberá o que esses nomes significam.

Algumas transformações fonéticas

Quando uma consoante surda (K, T, P, S) vier depois de um fonema nasal numa composição ou numa afixação, ela se nasaliza, a não ser que já exista outro fonema nasal no vocábulo onde aparece a consoante surda. Mesmo caindo o fonema nasal, a vogal anterior continua nasal. Assim:

Page 20: Curso de Tupi

Ataque a corsário francês

K torna-se NG  T torna-se ND  P torna-se MB ou M  S torna-se ND  

Ex.-kunumim + katu - kunumim-ngatu - menino bomnhum + -pe - nhum-me - no campomena + sy - men(a)-ndy - mendy - mãe de marido, sogra

Agora veja:

kunumim-porang-a - menino bonito - Em porang já existe um fonema nasal (ng). Sendo assim, o p não se nasaliza diante do fonema nasal final de kunumim.Tupã sy - a mãe de Deus - Não há composição aqui. Assim, o s não se nasaliza (v. §58).kunhã-kane’õ - mulher cansada - O k de kane’õ não se nasaliza porque já existe outro fonema nasal no vocábulo.nhe’enga + katu - nhe’e(nga)-ngatu - nhe’e -ngatu - língua boa, fala boatetama + -pe - teta(ma)-me - tetã-me - na região, na terra

EXERCÍCIO 12

Para praticar a aplicação das regras de transformação fonética, verta para o tupi as composições acima e aprenda o significado do nome de muitas localidades brasileiras e de muitos termos de origem tupi.

01 - mulher cansada02 - camarão vermelho03 - enseada de mar (cidade do Paraná)04 - mata branca (nome de vegetação do sertão nordestino)05 - na rede (de dormir)06 - barulho de passarinhos07 - lugar de fazer anzóis08 - dança de mulher09 - fenda de mar (nome de estado brasileiro)10 - ossos de passarinho11 - pião de menino12 - ajuntamento de passarinhos13 - ajuntamento de cerrado (nome de município de São Paulo)14 - prato comprido15 - campo silencioso

Page 21: Curso de Tupi

16 - campo dos guarás (nome de município de Pernambuco)17 - na bica d’água 18 - gotas de chuva (nome de serra de Minas Gerais)

VOCABULÁRIO ajuntamento - tybabarulho - pubica d’água - ‘y - tororomabranco - tingcamarão - potimcampo - nhumcana-de-açúcar - takûar-e’emcansado - kane’õcerrado (tipo de vegetação do Brasil) - ka’a-atãchuva - amanacomprido - pukudança - poraseîaenseada - kûáfenda - pukagota – tykyraguará - gûarálugar de fazer anzóis - pindá-monhang-abamar – paranãmata – ka’amenino - kunumimmulher - kunhãosso - kangapassarinho - gûyrá-’impião - pyryrymaprato - nha’emrede (de dormir) - inimsilencioso - kyririmvermelho - pyrang

Cena da fundação de São Paulo       

Lição 7

Os verbos transitivos

KUNUMIM O-Î-KUTUK O PEREBA PINDA´YBA PUPÉ PINDAMONHANGA-PE.

O curumim cutucou sua pereba com a pindaíba no lugar de fazer anzóis...

Os verbos transitivos

Todo verbo transitivo em tupi pode levar o objeto direto a três posições diferentes:

a - Antes do verboPindá a-î-monhang - Anzol faço. É a colocação mais comum do objeto direto em tupi.

b - Incorporado no verboA-pindá-monhang. - Faço anzol - O objeto direto, nesse caso, fica entre o prefixo a-, ere-, o-, etc. e o tema verbal. É o que chamaremos de objeto incorporado (que é uma forma de composição em tupi). Aplica-se, aí, então, a regra fonológica 3 (lição 3):

c - Depois do verboA-î-monhang anzol. - Faço anzol.

Page 22: Curso de Tupi

Se o substantivo objeto direto não ficar incorporado no verbo, aí ficará o pronome objetivo da 3ª pessoa -Î-, mesmo que o substantivo correspondente ao objeto direto esteja presente na oração.

Ex.-MONHANG (fazer)a-î-monhang pindá faço; fiz anzolere-î-monhang pindá fazes; fizeste anzolo-î-monhang pindá faz; fez anzoloro-î-monhang pindá fazemos; fizemos anzol (excl.)îa-î-monhang pindá fazemos; fizemos anzol (incl.)pe-î-monhang pindá fazeis; fizestes anzolo-î-monhang pindá fazem; fizeram anzol

Veja bem! Literalmente A-î-monhang pindá significa Faço-o o anzol, com um objeto pleonástico.

Outro exemplo: KUTUK (espetar, furar)a-î-kutuk pereba espeto; espetei a feridaere-î-kutuk pereba espetas; espetaste a feridao-î-kutuk pereba espeta; espetou a feridaoro-î-kutuk pereba espetamos a ferida (excl.)îa-î-kutuk pereba espetamos a ferida (incl.)pe-î-kutuk pereba espetais, espetastes a feridao-î-kutuk pereba espetam, espetaram a ferida

Diz-se em português: Faço a comida, ou então: Faço-a; Conheço os meninos ou então: Conheço-os. Em tupi, porém, se o substantivo objeto não estiver incorporado no verbo, dir-se-ia algo correspondente a faço-a a comida ou conheço-os os meninos, isto é, usa-se um objeto direto pleonástico.

Observação importante:Com os verbos monossilábicos usa-se -îo- (ou -nho-, antes de nasais).

Ex.-SOK (socar, pilar)a-îo-sok akaîu soco o caju ere-îo-sok akaîu socas o cajuo-îo-sok akaîu soca o caju, etc

Quando Î ficar junto de um outro Î ou I, há, geralmente, a fusão dos dois num único Î.

Ex.-a-î-îuká a-îuká mato-o o-î-îuká o-îuká mata-oa-î-ityk a-îtyk atiro-o o-î-ityk o-îtyk atira-o

Cena de antropofagia entre os índios tupinambá

Page 23: Curso de Tupi

Lição 8

Pôr que a índia Iracema de José de Alencar chamou seu filho, o primeiro cearense, de MOACYR?

A voz causativa

Veja estas duas frases:a - Gûarinim o-sem o taba suí.O guerreiro saiu de sua aldeia.

b - Gûarinim o-î-mo-sem gûaîbim o taba suí.O guerreiro fez a velha sair da sua aldeia.

Como você pode perceber, na frase b o sujeito (gûarinim) faz alguém praticar uma ação, em vez de ele mesmo praticá-la, como na frase a. Na frase b, o guerreiro fez a velha sair. A velha é o agente imediato e o guerreiro é o agente mediato. Isso é o que chamamos de voz causativa, ou seja, aquela em que alguém causa uma ação ou um processo, mas não os realiza. Quem os realiza é outra pessoa.

Em tupi, a voz causativa é formada antepondo-se o prefixo MO- a verbos intransitivos, substantivos, adjetivos, partículas, etc.

sem - sair mo-sem - fazer sairîebyr - voltar mo-îebyr - fazer voltareté - verdadeiro; honrado; legítimo.........mo-eté - honrar; legitimar, louvarakub - quente........................................mo-akub - esquentarabaré - padre.......................................mo-abaré - tornar padre, fazer padre:A-î-mo-abaré Pedro.Faço Pedro ser padre. (Anch., Arte, 48v)

paîé - curandeiro......mo-paîé - tornar pajé, fazer ser pajéendy (t-) - luz............mo-endy - iluminar, acenderOro-î-mo-endy t-atá.Acendemos o fogo.

Transformações fonéticas com mo-

MO- é sílaba nasal. Produz nasalização das consoantes K, T, P e S (regra fonológica 6, § 78).

Ex.-mo- + pak (acordar) > mo-mbak - fazer acordarmo- + ker (dormir) > mo-nger - fazer dormirmo- + tykyra (gota) > mo-ndykyr - fazer gotejar, destilarmo- + só (ir) > mo-ndó - fazer ir

Em mo- + tym > motym, não há nasalização porque já há uma nasal no tema verbal (regra fonológica 6, § 78).

EXERCÍCIO 14

Verta para o Tupi com base no vocabulário mnemônico apresentado abaixo e no que já conhece:

- Guataporanga (município de São Paulo) - de guatá - caminhar, caminhada + porang - bonito: caminhada bonita- Jaguatirica: îagûara - onça + tyryk - escapulir: onça que escapule, onça arisca- graúna - nome de pássaro: gûyrá - pássaro + un - preto, escuro: pássaro preto- Tucuruvi (nome de bairro de São Paulo) - tukura - gafanhoto + oby – verde

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- Tapirapé - nome de grupo indígena - de tapi’ira - anta + (a)pé - caminho - caminho de antas: (Era o nome que os antigos índios da costa do Brasil davam à Via Láctea.)- Itaipu (nome de usina hidrelétrica do Paraná): itá - pedra + ‘y - rio + pu - barulho, ruído: barulho do rio das pedras- Ajuruoca (localidade de Minas Gerais) - aîuru - variedade de papagaio + oka - casa, reduto: casa de papagaios- Ipiranga (nome de bairro de São Paulo) - ‘y - rio, água + pyrang - vermelho: rio vermelho, água vermelho- Iraci (nome de mulher) - eíra - mel + sy - mãe: mãe do mel, abelha- Ipanema (nome de bairro do Rio de Janeiro) - upaba - árvore + nem – fedorento- Urucu - uruku - nome de planta que fornece tinta vermelha para tingir o corpo.- Bartira (nome de mulher) - mbotyra – flor- Taquarenduva (município de São Paulo) - takûara - taquara, variedade de bambu + e’em - doce + tyba – ajuntamento- Tiquinho (como um tiquinho de café...) - de tykyra - gota, pingo- Mantiqueira (nome de serra de Minas Gerais) - de amana - chuva + tykyra - gota: gotas de chuva- Ibiara (nome de localidade da Paraíba) - de yby - terra + ‘ar - cair: terra caída- Ubaporanga (localidade de Minas Gerais) - de ybaka - céu + porang - bonito: céu bonito

01 - O menino fez feder a casa.02 - A onça fez escapulir o menino.03 - Avermelhei a mãe de Pedro com urucu.04 - O barulho das antas fez escapulir os pássaros verdes.05 - Embelezei a casa com as flores vermelhas.06 - Pretejei o menino com a água escura.07 - As flores esverdeiam o lago bonito.08 - As flores embelezam o caminho das onças.09 - O barulho das antas faz andar o menino.10 - O mel adoça a água.11 - A gota de chuva caiu do céu.12 - O pássaro bonito caminha na terra.13 - A nuvem escureceu a terra.14 - O pássaro caiu dentro do rio.

O substantivo tyba

O substantivo Tyba, do tupi, forma muitos topônimos no Brasil. Ele significa “reunião’’, ‘‘ajuntamento’’, ‘‘multidão”. Tal coletivo realiza-se, em português, de várias maneiras: -tiba, -tuba, -nduva, -ndiva, -tuva, -tiva.

EXERCÍCIO 15

Para conhecer topônimos com tal forma, complete as palavras cruzadas. (Certos nomes de plantas são tomados do tupi sem alterações fonéticas.)

01 - Cidade paulista cujo nome, em tupi, significa “ajuntamento de sal” (sal: îukyra)02 - Cidade paulista cujo nome, em tupi, significa “ajuntamento de cobras” (cobra: mboîa)03 - Nome de cidade paulista que significa “ajuntamento de araçás”04 - Nome de cidade paulista que significa “ajuntamento de mata dura”, ou seja, de cerrado (duro: atã)05 - Nome de localidade de Minas Gerais que significa “reunião de emas” (ema: nhandu)06 - Nome de estrada do município de São Bernardo do Campo, SP, que significa “ajuntamento de taquara-faca” (faca: kysé)07 - Nome de rua de São Paulo que significa “ajuntamento de sapé”08 - Nome de serra do Rio de Janeiro que significa “ajuntamento de palmeiras” (palmeira: pindoba)09 - Nome de cidade paulista que significa “reunião de caraguatás”10 - Nome de vila de São Paulo que significa “reunião de andorinhas” (andorinha: taperá)

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Fundação de São Vicente por Martim Afonso

Lição 9

IbirapueraAnhanguera

CapoeiraPariquera...

Que significa -uera?

O tempo nominal em tupi

Em tupi existe o tempo do substantivo. Para tanto, usam-se os adjetivos RAM (futuro, promissor, que vai ser), e PÛER (passado, velho, superado, que já foi), que recebem, na composição, o sufixo -A: RAM-A, PÛER-A. Eles são tratados, também, como se fossem sufixos, apresentando, então, as formas -ÛAM-A (-AM-A) e -ÛER-A (-ER-A).

Ex.-ybyrá – árvoreybyrá-ram-a - a futura árvore ou o que será árvore (Diz-se, por exemplo, de uma muda ou de um arbusto.)ybyrá-pûer-a - a ex-árvore ou a árvore caída (Diz-se, por exemplo, de um tronco seco caído ou de uma árvore morta.)A-î-monhang xe r-embi-’u-rama. - Faço minha comida (que ainda não está pronta).A-î-monhang xe r-embi-’u-pûera. - Fiz minha comida (que já foi deglutida).

Com substantivos oxítonos, RAM(A) e PÛER(A) mantêm as consoantes R- e P-, respectivamente.

Ex.-xe só-rama - minha futura ida xe só-pûera - minha passada ida

Com substantivos paroxítonos, RAM(A) e PÛER(A) assumem formas com ditongo ou vogal iniciais: ÛAM(A), AM(A); ÛER(A), ER(A), respectivamente. Em regra geral, os substantivos paroxítonos perdem o sufixo -A e juntam -ÛAM(A) ou -ÛER(A).

Ex.-Anhanga - diabo - Anhang-ûama - futuro diabo e Anhang-ûera - o que foi diabo ou diabo velhooka - casa ok-ûama - futura casa

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A labial B cai diante de -ÛAM(A) e -ÛER(A). Antes da semivogal, nos ditongos -ÛA e -ÛE, aparece freqüentemente G (v. a regra fonológica 2, lição 3, § 48)

Ex.-peasaba - porto peasa-(g)ûama - futuro portopeasa-(g)ûera - o que foi porto; porto velho

EXERCÍCIO 16

Relacione as colunas para saber a origem e o significado dos seguintes nomes:

01 - Ibirapuera (   ) aldeia extinta02 - Tabatingüera (   ) ossada, osso fora do corpo03 - Anhangüera (   ) mata extinta04 - Piaçagüera (   ) diabo velho05 - tapera (   ) barreira branca esgotada06 - capoeira (   ) rio extinto07 - quirera (   ) porto extinto08 - Pariqüera (   ) árvore caída, árvore velha09 - Tipuera (   ) o que foi grão, grânulo10 - Cangüera (   ) barragem extinta

VOCABULÁRIO: eíra - mel; tobatinga - barro branco como cal, barreira branca; peasaba - porto, embarcadouro; kuruba - bolota, grão, caroço; pari - canal para apanhar peixes; ty - rio, líquido; kanga - osso (enquanto está no corpo)

Os substantivos pluriformes

A maior parte dos substantivos, adjetivos, verbos e posposições tupis têm uma só forma de se expressar. Essas palavras se chamam UNIFORMES.

Ex.-AOBA - roupa PINDÁ - anzol ITÁ - pedra

Existem, porém, palavras que apresentam várias formas de se expressar, recebendo diferentes prefixos de relação (T-, R-, S-): são os PLURIFORMES. Tratamos aqui dos substantivos pluriformes.

Ex.-ERA, T-ERA, R-ERA, S-ERA - nome

A forma ERA, acima, é o tema. A forma em T- (p.ex. T-ERA) se chama forma absoluta. Ela é usada quando a palavra é independente, como sujeito ou como objeto, sem exigir outra palavra para completar-lhe o sentido.

Ex.-O nome é bonito! - T-era i porang! (Léry, Histoire, 341). Se quisermos dizer, em tupi, nome bonito, de forma absoluta, sem relacionarmos o termo nome a algum substantivo ou possessivo, diremos t-e(ra)-poranga. Agora, se quisermos relacionar a palavra com um possessivo e dizer meu nome, diremos, em tupi, xe r-era. Se quisermos dizer nome do menino, verteremos por kunumim r-era. Se quisermos dizer nome dele, diremos s-era. As formas em R- e S- (p.ex. R-ERA e S-ERA) se chamam formas relacionadas ou formas construtas.

A forma relacionada em R- é usada quando o vocábulo pluriforme é imediatamente precedido por um possessivo de 1a ou 2a pessoas (singular ou plural) ou por um substantivo com o qual ele esteja em relação genitiva ou do qual ele dependa gramaticalmente.

Ex.-t-emimotara                 xe r-emimotara              xe r-uba r-emimotara

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vontade                          minha vontade                  a vontade de meu pai

t-ugûy – sanguepe r-ugûy - vosso sanguepaka r-ugûy - o sangue da pacat-eté – corponde r-eté - teu corpo abá r-eté - o corpo do índio

A forma relacionada em S- é usada quando se refere à terceira pessoa sem substantivo. O S- é pronome de 3a pessoa e equivale ao pronome I (usado com os substantivos uniformes) e significando ele(s), ela(s), seu(s), sua(s).

Ex.-com substantivo: kunumim r-era - o nome do menino (Anch., Arte, 9v)com o pronome: Santa Maria s-era (...) - Santa Maria é o nome dela. (Anch., Poemas, 88)

Assim:o corpo dele: s-eté, mas Pedro r-eté - o corpo de Pedro (Anch., Arte, 12v)o sangue dele: s-ugûy, mas mba’e r-ugûy - o sangue do ser bruto (VLB, II, 112) Na relação genitiva com composição, caem os prefixos de relação na fronteira entre as palavras (ver o §54 e o §58), além de caírem também os sufixos da palavra anterior (a que chamamos determinante ou genitivo).

Ex.- Tupã r-oka - a casa de Deus Agora: Tupã-oka - casa de Deus, igreja (em sentido genérico - veja que cai o prefixo r-)tatu r-apé - o caminho do tatu Agora: tatu-apé - caminho de tatus (em sentido genérico - cai o prefixo r-)îagûar-a r-a’yra - o filhote da onça (isto é, de uma determinada onça)îagûar-a’yra - filhote de onça (isto é, de onças em geral - Caem o prefixo r- e o sufixo -a na fronteira entre as palavras)

Alguns substantivos pluriformes irregulares

oka - casa - Na forma absoluta não recebe t-. Indicaremos oka (r-s-)oka - casa (forma absoluta)xe r-oka - minha casas-oka - casa dele

apé - caminho - Na forma absoluta perde a vogal a e não leva t-.           Indicaremos (a)pé (r-s-)pé -caminhoxe r-apé - meu caminhos-apé - caminho dele

apó - raiz - Na forma absoluta recebe s-. Indicaremos apó (s-r-s-)s-apó - raiz (absoluto)ybyrá r-apó - raiz da árvores-apó - suas raízes

Há muitos substantivos uniformes começados por t. O t, nesse caso, não é prefixo, mas faz parte do tema do substantivo. Os nomes de animais, plantas e frutas que começam por t são sempre uniformes.

Ex.-Tupã - Deus taba - aldeiatatu - tatu tapiti - coelhotapi’ira - anta

EXERCÍCIO 17

Page 28: Curso de Tupi

Verta para o Tupi com base no vocabulário mnemônico apresentado abaixo e no que já conhece. Indicaremos os substantivos pluriformes com t- ou r- prefixados ou (t-, r-, s-) entre parênteses: Boitatá (nome de entidade mítica dos antigos índios tupis da costa) - de mba`e - coisa     + t-atá - fogo (veja que este termo é pluriforme): a coisa-fogoCarioca (o natural da cidade do Rio de Janeiro) - de kariîó - carijó , índio guarani + oka     (r-, s-): casa de carijósTatuapé (nome de bairro de São Paulo) - tatu - tatu + (a)pé (r-, s-): caminho de tatusItaici (nome de bairro de Indaiatuba, SP) - de itá - pedra e ysy (t-,r-,s-) - fila, fileira:     fila de pedrasXará (o que tem o mesmo nome de alguém - de xe -meu + r-era – nome [era (t-, r-, s-)] - nome: meu nomeTupãciretama (nome de localidade de Pernambuco) - de Tupã - Deus+sy - mãe + etama (t-, r-, s-) - terra, região: terra da mãe de DeusPiranha (nome de um peixe) - de pirá - peixe + ãîa (t-, r-, s-) - dente: peixe dentadoSapopemba (nome da maior avenida de São Paulo) – de apó (s-, r-, s-) + pem –     anguloso: raízes angulosas

01 - Os carijós fizeram fogo dentro da casa. O fogo deles é pequeno.02 - O caminho dos carijós é bonito.03 - Conheço o nome de tua mãe.04 - Os dentes de tua mãe são pequenos.05 - A fila dos peixes é comprida.06 - Conheço a região do chefe.07 - As raízes da árvore são angulosas.

Lição 10

Guarda-mirim, Estrada do Mboi-mirim, Cataratas do Iguaçu...Que significam mirim e guaçu?

“A mulher sapeca o porco...”Donde vem sapecar?

Os graus do substantivo (aumentativo e diminutivo)

Em tupi, o grau aumentativo faz-se com os sufixos -ÛASU (-GÛASU) ou -USU. -ÛASU (-GÛASU) é usado quando o substantivo é oxítono e -USU quando é paroxítono. Este perde o sufixo -A, quando o tiver.

Ex.-pará mar pará-gûasu mar grande, oceanokunumim menino kunumim-ûasu moçoybytyra montanha ybytyr-usu montanhão, serramboîa cobra mboî-usu cobra grandepindoba palmeira pindob-usu palmeira grande, palmeirão

O grau diminutivo faz-se com os sufixos -’IM e -’I ou com o adjetivo MIRIM. Cai o sufixo -A do substantivo, se ele existir.

Ex.-itá pedra itá-’im pedrinhapitanga criança pitang-im criancinhagûyrá pássaro gûyrá-’im passarinhomboîa cobra mboî-mirim cobrinha; cobra pequena‘y rio ‘y-mirim riozinho; rio pequeno

A oclusiva glotal cai se seguir uma consoante numa composição ou sufixação.

Ex.-pitang(a) + ‘im pitang-im nenenzinho

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a-petym(a) + ‘u A-petymb-u Fumotapi’ir(a) + ‘y tapi’ir-y rio de antas

EXERCÍCIO 18

Traduza:1. Kunumim-gûasu pirá-’im o-îuká ‘y-mirim pupé.2. Morubixaba mboî-mirim o-îuká, nd’o-îuká-î-te mboî-usu.3. Kunhã-muku-’im peró o-î-kutuk.4. Oro-gûeîyb ybytyr-usu suí.5. Itá-’im-etá oro-î-pysyk ‘y-mirim pupé.6. Kunhã-etá îakaré-gûasu o-î-pysyk.

Vocabulárioîuká – matarmorubixaba - chefemboîa – cobrakunhã-muku-'im - mocinhaperó – portuguêsgûeîyb – descerybytyra – montanhapysyk – pegar, apanharîakaré - jacaré;

EXERCÍCIO 19

Os sufixos -gûasu (aumentativo), -’im (diminutivo) e o adjetivo mirim aparecem em grande número de topônimos no Brasil e até em substantivos comuns. Procure dar os significados dos nomes abaixo:

a) Cataratas do Iguaçub) Itaimc) Tijucuçu (tyîuka – pântano, lodo) d) Itapemirim (peb – achatado; syryk - escorregadio) e) Igaraçu (ygara – canoa) f) Itaguaçug) guarda-mirimh) oficial-mirimi) Mboi-mirimj) Imirim

Os verbos pluriformes

Os verbos pluriformes recebem pronome objetivo -S- Ex.- APEK - sapecar, chamuscar, queimar ligeiramente

INDICATIVOA-s-apek kunhã - sapeco a mulherEre-s-apek kunhã - sapecas a mulherO-s-apek kunhã - sapeca a mulherOro-s-apek kunhã - sapecamos a mulher (excl.) Îa-s-apek kunhã - sapecamos a mulher (incl.) Pe-s-apek kunhã - sapecais a mulherO-s-apek kunhã - sapecam a mulher

Indicaremos os verbos pluriformes com (S):Ex.aûsub (s) - amar epîak (s) - ver apek (s) – sapecar

Page 30: Curso de Tupi

EXERCÍCIO 20

Verta para o Tupi com base no vocabulário mnemônico apresentado abaixo e no que já conhece:

- Paranapiacaba (nome de serra do Sudeste) - de paranã - mar + epîak (s) - ver + -aba - lugar: lugar de ver o mar.- Caçapava (município de São Paulo) - de ka’a - mata + asab (s) - atravessar, cruzar + -aba lugar: lugar de atravessar a mata.- Cunhaú (município do Rio Grande do Norte) - de kunhã -mulher + ‘y - rio: rio das mulheres.- Ibitipoca (localidade de Minas Gerais) - de ybytyra - montanha + pok - estourar: montanha estourada (i.e., com grutas).- Maíra (nome próprio de mulher) - de maíra - nome de entidade mitológica dos antigos índios da costa que serviu para designar os franceses, que os índios supunham ser criaturas sobrenaturais. Significa, assim, francês.- Jaguaquara (localidade da Bahia) - de îagûara - onça + kûara - toca: toca das onças.- Taiaçutuba (nome de ilha do Amazonas) - de taîasu - porco (do mato) + tyba - ajuntamento, grande número: ajuntamento de porcos.- Guaibim (localidade da Bahia) - de gûaîbim - velha.- Tatajuba (localidade do Ceará) - de tatá - fogo + îub - amarelo: fogo amarelo.- Itacolomi (formação rochosa de Minas Gerais) - de itá - pedra + kunumim - menino: menino de pedra.

01 - A mulher vê o céu azul.02 - O menino atravessa a montanha amarela.03 - A mulher má atravessa o mar dentro do navio do francês.04 - O francês viu a mulher dentro da toca da onça.05 - A velha sapecou o porco dentro de sua casa. 06 - A mulher bonita sapecou o francês dentro do fogo.07 - O menino ama a velha.08 - Amo as mulheres. As mulheres amam o francês.

Fonte: http://www.fflch.usp.br/dlcv/tupi/index.html, acesso em 26-2-12.

Edição em txt: Ricardo Farias Oliveira