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CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO
LIDIANE PINHEIRO DA SILVA
INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇAO DA PERSONALIDADE JURÍDICA E SUA NÃO APLICAÇÃO NOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS
MANAUS 2017
CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO
LIDIANE PINHEIRO DA SILVA
INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇAO DA PERSONALIDADE JURÍDICA E SUA NÃO APLICAÇÃO NOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado para obtenção do título de Bacharel em Direito do Centro Universitário Luterano de Manaus – CEULM / ULBRA. Orientador: Armando Souza Negrão
MANAUS 2017
LIDIANE PINHEIRO DA SILVA
INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇAO DA PERSONALIDADE JURÍDICA E SUA NÃO APLICAÇÃO NOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS
TERMO DE APROVAÇÃO
Este Trabalho tem como objetivo a Conclusão de Curso, submetido a
julgamento e posterior aprovação para obtenção do título de Bacharel
no Curso de Direito do Centro Universitário Luterano de Manaus.
Banca Examinadora:
____________________________________ Orientador
CEULM
____________________________________ Prof. (a) CEULM
___________________________________ Prof. (a) CEULM
Manaus: _____/_____/_____.
“A nosso ver, princípios gerais do direito são
enunciações normativas de valor genérico,
que condicionam e orientam a compreensão
do ordenamento jurídico, quer para a sua
aplicação e integração, que para a
elaboração de novas normas.”
(Miguel Reale)
AGRADECIMENTO
Agradeço primeiramente a Deus que se faz presente no meu ser em todos os
momentos de minha vida, sempre me fortalecendo, me orientando espiritualmente, e
me proporcionando sua sabedoria divina.
Agradecer minha mãe, Maria Francisca Ramos Pinheiro, pelo carinho,
dedicação, atenção e compreensão, como sempre, me apoiou em busca de vitorias,
obrigada mãe.
Agradeço também a meu pai, Antônio Hermeto da Silva, por ter se doado em
todos os momentos de sua vida, objetivando sempre o nosso bem estar e nossa
educação.
Agradeço ainda ao Flávio Carvalho Farias, meu namorado, amigo,
companheiro de todos os momentos, pelo carinho e dedicação ao longo dessa
jornada.
A minha família, todos os irmãos, sobrinhos e amigos, que sempre me
apoiaram ao longo da minha caminhada.
Aos professores Armando Negrão, Ingo, Rubens, André Dias , Myriam
Benarros e meus colegas do Curso de Graduação que no decorrer do curso deram-
me apoio, muitíssimo obrigada.
Aos amigos e amigas, que tiveram paciência comigo, por ter que agregar
tempo à faculdade, e ter tido que me ausentar um pouco de seus convívios.
Pessoas do meu ambiente de trabalho, os quais contribuíram, para a
elaboração do presente estudo. Não correrei risco de esquecê-los, para tal não
nominarei mais especialmente, muitíssimo obrigada.
RESUMO
O presente trabalho tem como objeto de análise o reconhecido instituto da
desconsideração da personalidade jurídica (disregard doctrine) no novo Código de
Processo Civil, dando ênfase a possibilidade de aplicação nos juizados especiais
cíveis, a possível violação ao princípio da celeridade processual.
O presente estudo trará ainda uma viagem para a origem e história do
instituto da desconsideração da personalidade jurídica, as principais normas que
regem o instituto no direito brasileiro. Trará também quais as formas de aplicação
nos Tribunais Pátrios, mostrando como está o entendimento acerca do instituto.
No final será feito uma análise quanto a aplicação do instituto e suas
principais consequências nos juizados especiais cíveis.
Palavras-chave: Desconsideração da Personalidade Jurídica, Aplicação,
Celeridade, Especialidade.
ABSTRACT
The presente academic work has as object of analysis or recognized
institute of the disregard of legal personality (doctrine disrespected) in the new Code
of Civil Procedure, emphasizing the possibility of application in the special civil
courts, the possible return to the principle of celerity.
The present study will also present a trip to the origin and the history of the
institute of the disregard of legal personality, as the main norms the
government the institute in Brazilian law. It will also bring you as forms of application
in the Court of Law, show how is the understanding about the institute.
And finally, do the analysis of an application of the institute and its main
consequences in special civil courts.
Key words: Disregard of Legal Personality, Application, Celerity, Specialty
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 9
2 O INSTIRUTO DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADEJURÍDICA ..... 11
2.1 Origem histórica ................................................................................................... 9
3 O SURGIMENTO DO INSTITUTO NO ORDENAMENTO JURIDICO BRASILEIRO
………………………………………………………………………………………………..16
3.1 Teoria adotada pelo código civil brasileiro........................................................... 17
3.2 Da desconsideração inversa da personalidade jurídica ...................................... 20
3.3 Desconsideração da personalidade jurídica x despersonalização ...................... 21
3.4 Da aplicabilidade no ordenamento jurídico ......................................................... 21
4 O INCIDENTE DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA .... 25
4.1 Da aplicação do incidente de desconsideração da personalidade jurídica trazida
pelo Código de processo civil/2015 .................. …………………………………………26
4.2 Julgados com aplicação do incidente de desconsideração da personalidade
jurídica ...................................................................................................................... 29
5 INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇAO DA PERSONALIDADE JURÍDICA E SUA
NÃO APLICAÇÃO NOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS ....................................... 32
6 CONCLUSÃO ....................................................................................................... 39
9
1 INTRODUÇÃO
A presente monografia trará uma discussão acerca do novo instituto
trazido pelo código de processo civil, sendo umas das novas modalidades de
intervenção de terceiros, que é o Incidente da desconsideração da personalidade
jurídica.
O incidente de desconsideração da personalidade jurídica/disregard
doctrine, teve como principal intenção garantir a segurança jurídica, uma vez que
passou com a existência da pessoa jurídica passou a existir um véu que separava o
patrimônio da pessoa física do patrimônio da pessoa jurídica. O véu que separava o
patrimônio, surgiu para proteger os a atividade de comercio, que por não existir
ainda tal proteção, chegaram a abandonar suas atividade, pois existia um risco
muito grande de perder o patrimônio não só do comércio como também de sua
família.
Apesar da criação da pessoa jurídica ter sido criada para proteger e
tutelar bens, alguns empresários passaram a usá-la como mecanismo para
cometerem suas fraudes, vindo a causar danos patrimoniais a terceiros e a toda a
sociedade. Tendo o legislador percebido o uso irregular da separação do patrimônio,
passou a aplicar a teoria da desconsideração da personalidade jurídica, rasgando o
véu que separava o patrimônio da pessoa física do d pessoa jurídica. Trazendo a
possibilidade de adentrar no patrimônio da pessoa física, afim de que fosse suprido
todo o prejuízo dos credores, sendo possível também a aplicação inversa do
instiruto.
É um instituto que não tem como primazia desconstituir a pessoa jurídica,
mas apenas fazer com que o patrimônio dos sócios ou da pessoa jurídica responda
pelos prejuízos causados a terceiros em decorrência de praticas abusivas e
fraudulentas. O instituto passou a ser introduzido no Código de processo Civil de
2015, passando a ter sua legislação processual própria.
O instituto surgiu como uma das modalidades de intervenção de terceiros.
A intervenção de terceiros é a possibilidade que o terceiro pode fazer parte do
processo, podendo figurar como autores ou réus, no caso do incidente de
desconsideração da personalidade jurídica, há a possibilidade de figurar apenas
como réu (requerido) é contra quem poderá recair o ônus de arcar com
10
responsabilidade patrimonial. Acaba por criar uma relação jurídica nova, pois uma
vez que é julgado procedente a aplicação da desconsideração da personalidade
jurídica, é como se não mais existisse o requerente originário, passando a figurar
como parte, os sócio ou a pessoa jurídica no caso de desconsideração inversa.
O incidente de desconsideração da personalidade jurídica tinha previsão
legal no direito material, sendo previsto no artigo 50 do Código Civil de 2002, não
existindo ainda no ordenamento brasileiro sua legislação quanto a aplicabilidade no
direito processual, passando a ter tal previsibilidade a partir do Código de Processo
Civil de 2015, sendo regulado no artigo 133 à 137.
Dando grande ênfase ao artigo 1.069 do Código de Processo Civil atual,
que prevê a aplicação da intervenção de terceiros nos juizados especiais cíveis, indo
de encontro com o artigo 10 da lei que regula o juizado, a lei 9.099 de 1995. Tal
previsibilidade de aplicação vai também contra um dos princípios basilares do
juizado, o principio da Celeridade processual, que tem como fundamento fazer com
que os processos sejam julgados com uma certa agilidade, e aplicação do incidente
traria uma demora no andamento da demanda, pois o incidente requer a suspensão
da demanda principal, oportunizando ao terceiro o direito ao contraditório e ampla
defesa, produção de provas, tudo isso demanda tempo, trazendo morosidade ao
procedimento.
Levando-se em conta também que, o Código processual é uma norma de
caráter geral, e a lei 9.099/95 é norma especial, devendo esta ultima prevalecer
sobre normas gerais.
11
2 O INSTITUTO DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA
Para fazermos uma análise sobre a desconsideração da personalidade
jurídica, é importante falarmos primeiramente sobre pessoa natural e pessoa
jurídica.
A pessoa natural já nasce com direitos e deveres, o nascituro já é
protegido pelo ordenamento jurídico brasileiro, sua personalidade se dá com o
nascimento com vida.
O professor Flávio Tartuce discorre:
A respeito do início da personalidade, enuncia o art. 2.º do atual Código Civil que “A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”. A norma praticamente repete o já reticente art. 4.º do CC/1916.1
Apesar de termos hoje em nosso ordenamento, a certeza de que todos
possuem direitos e deveres, devemos nos recordar que nem sempre foi assim, no
tempo da escravidão, nem todos detinham essa garantia. Hoje a Constituição
Federal de 1988 assegura tais garantias.2
Pessoa jurídica é um sujeito com personalidade, que está revestido de
personalidade jurídica, detentora de direitos e obrigações, sendo-lhe facultado a
pratica de atos em geral da vida civil. A luz do Código Civil, a pessoa jurídica se
subdivide em duas categorias, sendo elas em direito público interno ou externo e
direito privado.
Pessoa jurídica é o sujeito de direito personificado não humano. É também chamado de pessoa moral. Por ser personificada, está autorizada a praticar os atos em geral da vida civil – comprar, vender, tomar emprestado, dar em locação, etc. -, independentemente de específicas autorizações da lei.3
O incidente de desconsideração da personalidade jurídica, também
conhecido originariamente como disregard doctrine, passou a existir para que
1 TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil: volume único. 3. ed. Rio de Janeiro: Método 2013, p. 69. 2 Art. 5º, da Constituição Federal/1988, caput- “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguinte: [...] 3 COELHO, Fábio Ulhoa, Manual de Direito Comercial: direito de empresa. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 251.
12
ocorresse segurança jurídica, visto que com a existência de relações comerciais
complexas, que geraram diversas relações jurídicas, houvesse um responsável
pelos riscos patrimoniais advindos da atividade empresarial.
É um instituto que tem como primazia direcionar a quem será atribuído a
responsabilidade patrimonial, com principal enfoque de coibir atitudes abusivas ou
fraudulentas do uso da pessoa jurídica. Não tem a finalidade de ir contra a à
personalização das sociedades empresarias e à autonomia societária, como
defende o doutrinador Fabio Ulhôa Coelho a seguir:
(...) A teoria da desconsideração da personalidade jurídica não é uma teoria contrária à personalização das sociedades empresárias e à sua autonomia em relação aos sócios. Ao contrário, seu objetivo é preservar o instituto, coibindo práticas fraudulentas e abusivas que dele se utilizam.4
O instituto da desconsideração da personalidade jurídica visa remover a
barreira que separa o patrimônio da pessoa jurídica do da pessoa física, fazendo
com que ocorra a “retirada do véu” que os separam, permitindo a atribuição da
responsabilidade jurídica dos sócios passe para a empresa, sendo possível ainda a
desconsideração da personalidade jurídica de forma inversa. Essa possibilidade tem
como enfoque, tutelar o interesse público.
Assim dispõe o Código Civil de 2002 em seu artigo 50:
Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.5
O legislador atentou-se para uma prática não muito rara, onde as pessoas
jurídicas estavam sendo usadas com o propósito de fraudar a função social, a boa
fé, a segurança jurídica nas relações empresariais, á ordem econômica, o
consumidor e mais.
Desse modo resta à desconsideração da personalidade jurídica fazer com
que haja um freio nesses atos atentatórios a sociedade, que possibilita a esfera
4 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial, volume 2: direito de empresa. 17 ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 61. 5 Site do Planalto. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm> Acesso em 25 de setembro de 2017.
13
jurídica atingir os bens pessoais dos sócios, usando como viés principal a
responsabilização, que em tese afetaria somente os bens da pessoa jurídica.
Logo, conclui-se que desconsideração da personalidade jurídica, é
método processual garantido ao credor, uma vez que haja um obstáculo para que
obtenha a satisfação do seu crédito, possa ele dispor dos bens particulares de todos
os sócios da sociedade devedora, se assim for necessário. Tendo ocorrido nesse
caso, desvio de finalidade e ou confusão patrimonial.
Conceituando o desvio de finalidade, pelos doutrinadores Nelson Nery e
Rosa Maria de Andrade Nery:
[...] constatação da efetiva desenvoltura com que a pessoa jurídica produz a circulação de serviços ou de mercadorias por atividade lícita, cumprindo ou não o seu papel social, nos termos dos traços de sua personalidade jurídica. Se a pessoa jurídica se põe a praticar atos ilícitos ou incompatíveis com sua atividade autorizada, bem como se com sua atividade favorece o enriquecimento de seus sócios e sua derrocada administrativa e econômica, dá-se ocasião de o sistema de direito desconsidera sua personalidade sua personalidade e alcançar o patrimônio das pessoa que se ocultam por detrás de sua existência jurídica.6
Conceituando também confusão patrimonial, a seguir:
[...] confusão entre o patrimônio dos sócios e da pessoa jurídica. Essa situação decorre da não separação do patrimônio do sócio e da pessoa jurídica por conveniência da entidade moral. Neste caso, o sócio responde com seu patrimônio para evitar prejuízos aos credores, ressalvada a impenhorabilidade do bem de família e os limites do patrimônio da família.7
Para o professor Gilberto Bruschi, salienta que, desprendendo-se do que
dispõe o C.C de 2002, para que que seja possível adentrar na esfera do patrimônio
dos sócios, é necessário que ocorra apenas, a comprovação da fraude, conforme
demonstra-se a seguir:
O disposto no artigo 50 do Código Civil faz referência ao abuso da personalidade jurídica, ao desvio de finalidade e à confusão patrimonial, não abordando de maneira explícita a prática do ato fraudulento.
6 NERY JUNIOR, Nelson, NERY, Rosa Maria de Andrade. Código Civil Comentado, 6ª ed. Revista dos Tribunais: 2008, p. 249. 7 NERY JUNIOR, Nelson, NERY, Rosa Maria de Andrade. Código Civil Comentado, 6ª ed. Revista dos Tribunais: 2008, p. 249.
14
Devemos pensar que os três requisitos relacionados no novo códex abrangem implicitamente a fraude praticada em detrimento dos credores. Na pior das hipóteses, no desvio de finalidade está implícita a noção de que a prática de fraude consiste numa das várias espécies caracterizadoras desse referido desvio, já que é indispensável imaginar que a pessoa jurídica venha a constituir-se para, entre as suas finalidade, poder praticar atos fraudulentos em detrimento dos seus credores. Como não há autorização para tal prática em seu objeto social, constitui-se em razão pela qual tal fraude se configura em desvio de finalidade.8
O Código de Processo Civil, “atual”, traz em seu bojo o que antes estava
apenas regulamentado pelo C.C 2002, o incidente da desconsideração da
personalidade jurídica, na modalidade de intervenção de terceiro, tal instituto tinha
previsão em diversas normas do nosso ordenamento pátrio, sendo regulado
processualmente a partir do artigo 1062 do referido código.
Contata-se tal observação na obra do doutrinador Daniel Amorim
Assumpção Neves:
O novo código de Processo Civil prevê um incidente processual para a desconsideração da personalidade jurídica, finalmente regulamentando seu procedimento. Tendo seus requisitos previstos em diversas normas legais (art. 50, CC; art. 28, CDC; artigo 2º, § 2º, da CLT, art. 135, CTN, art. 4º da lei 9.605/98; art. 18, § 3º, da lei 9.847/99; art. 34, da lei 12.529/2009, art. 117, 158. 245 e 246 da lei 6.404/76), faltava uma previsão processual a respeito do fenômeno jurídico, devendo ser saudada tal tentativa. 9
Dispositivo que prevê a aplicabilidade do instituto da desconsideração da
personalidade jurídica, com previsão também nos juizados especiais:
Art. 1.062. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica aplica-se ao processo de competência dos juizados especiais.10
E assim acarretando muitas mudanças no ordenamento Brasileiro, como
será demonstrado no decorrer do presente estudo.
8 BRUSCH, Gilberto Gomes, Aspectos Processuais da Desconsideração da Personalidade Jurídica, 2ªed. Saraiva, 2009. 9 NEVES, Daniel Amorim Assumpção, Manual de Direito Processual Civil – volume único. 8ª. ed. Salvador: Jus Podium, 2016, p. 428. 10 Site do Planalto. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm> Acesso em 25 de setembro de 2017.
15
2.1 Origem histórica
A teoria da desconsideração da personalidade jurídica é também
conhecida como disregard doctrine, teve origem a partir das jurisprudência do
estados Unidos da América, no século XIX, servia de mecanismo usado para coibir
praticas fraudulentas ou abuso de direitos.
Teve como um de seus casos pioneiros, o caso Bank of United States.
juntamente com Deveaux, no ano de 1809. Sendo o caso principal em sua origem,
porém o caso mais conhecido é o de Salomon versos Salomon & Co., ocorrido em
1897, na Inglaterra.
Um dos principais casos que deram ensejo a desconsideração da
personalidade jurídica é o caso inglês Salomon v. A. Salomon & Co. Ltda,
envolvendo a Disregard Doctrine, sendo até hoje usada, deixando de ser apenas
uma teoria no ordenamento Brasileiro, pois passou a ser normatizada no C.C de
2002, em seu artigo 50.
O instituto advém do sistema jurídico Common Law, que é o Inglês, tendo
como fundamento o direito baseado nos costumes, que são práticas reiteradas por
tradição de uma sociedade, são adotadas como leis por todos os seus membros.
No ano de 1892 a sociedade por ações (company), foi criada pelo
empresário Aaron, tendo ele decidido distribuir suas ações para seus familiares,
ficando apenas com 20.000 (vinte mil) ações consigo.
O Doutrinador Alexandre Couto Silva aprofunda mais sobre o caso:
Trata-se de um caso de um comerciante de couros e caçados, Aaron Salomon, que fundou, em 1892, a Salomon & Co. Ltd., tendo como sócios fundadores, ele mesmo, sua mulher, sua filha e seus quatro filhos. A sociedade foi constituída com 20.007 ações, sendo que a mulher a mulher e os cinco filhos tornaram-se proprietários de uma ação cada um, e as restantes 20.000, foram atribuídas a Aaron Salomon, das quais 20.000 foram integralizadas com a transferência, para a sociedade, do fundo de comércio que Aaron já possuía, como detentor único, a título individual.11
Aaron passou a praticar atos que o privilegiaram, constitui um crédito que
lhe garantia o valor de dez mil libras esterlinas e com isso tornou a companhia
insolvente. Desse modo tornou-se credor privilegiado, vindo a receber primeiro que
11 SILVA, Alexandre Couto. Aplicação da Desconsideração da Personalidade Jurídica no Direito Brasileiro. São Paulo: LTR, 1999. p. 30.
16
os demais credores, uma vez que era credor real, e sem que houvesse restado nada
aos demais credores, a solução foi acioná-lo judicialmente, afim de que fosse feito
algo para que tamanha fraude fosse desfeita.
O juízo de primeiro grau aplicando com maestria o instituto concedeu
decisão favorável, tendo aceitado a tese que previa a possibilidade de aplicar a
desconsideração da personalidade jurídica, entendendo que Aaron cometeu fraude,
devendo a decisão atingir seu patrimônio como pessoa física. Tal decisão foi
reformada posteriormente pela corte superior, a House of Lords, que fundamentou
sua decisão, afirmando que a constituição da sociedade foi válida, ausente qualquer
vício previsto naquela sociedade.
A decisão reformada teve grande peso naquela época, servindo de freio
para o desenvolvimento acerca do instituto pelos doutrinares, sendo posteriormente
revista e aplicada de forma diversa.
3 O SUGIMENTO DO INSTITUTO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
A teoria da desconsideração da personalidade jurídica passou a ser
aplicada no ordenamento pátrio a partir de 1960, não existindo previsão legal na
época que regulasse a sua aplicabilidade, passou a ser aplicada a partir dos estudos
do doutrinador Rubens Requião, usando como parâmetro legal o artigo 135 do CTN.
Podemos reiterar o disposto acima com os escrito do professor Marcus
Vinicius Rios Gonçalves:
[...] A teoria da desconsideração da personalidade jurídica (disregard doctrine), que autoriza o juiz a estender, em determinadas, a responsabilidade patrimonial pelos débitos da empresa aos sócios, sem que haja a dissolução ou desconstituição da personalidade jurídica, vem sendo acolhida em nossa doutrina desde 1960, sobretudo a partir dos estudos de Rubens Requião. Como não havia previsão legal para aplicá-la no âmbito do direito privado, de início os tribunais se valeram do art. 135 do Código Tributário Nacional.12
O doutrinador defendia a tese de que a pessoa jurídica não pode ser
confundida com a pessoa física, de tal modo que sua distinção está completamente
afastada, é necessário que haja uma separação dos patrimônios da PJ e da PF. O
12 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito Processual Civil. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 259.
17
doutrinador salienta ainda a não possibilidade de impenhorabilidade de suas cotas
no caso de dividas decorrentes da pessoa física individual, como vemos a seguir:
Se a pessoa jurídica não se confunde com as pessoas físicas que a compõem, pois são personalidades radicalmente distintas, se o patrimônio da sociedade personalizada é autônomo, não se identificando com o dos sócios, tanto que a cota social de cada um deles não pode ser penhorada em execução por dívidas pessoais, seria então fácil burlar o direito dos credores, transferindo previamente para a sociedade comercial todos os seus bens. Desde que a sociedade permanecesse sob o controle desse sócio, não haveria inconveniente ou prejuízo para ele que o seu patrimônio fosse administrado pela sociedade, que assim estaria imune às investidas judiciais de seus credores.13
O primeiro caso em que foi aplicada a desconsideração da personalidade
jurídica no Brasil foi uma decisão em que tinha como relator o Desembargador
Edgard de Moura Bittencourt.
O Doutrinador que mais se aprofundou foi Lamartine Correa, que
acreditava que a desconsideração da personalidade jurídica era decorrência lógica
do desvio de finalidade da pessoa jurídica, vejamos a seguir:
[...] é a conseqüência de uma disfunção da personalidade jurídica. A aplicação da prática de desconsideração é um sintoma de uma crise na função da pessoa jurídica.14
3.1 Teoria Adotada pelo Código Civil Brasileiro
Atualmente o Ordenamento Jurídico Brasileiro dispõe de duas teorias,
sendo elas:
a) Teoria Maior da desconsideração da personalidade Jurídica;
Essa teoria é uma teoria defendida principalmente por Serick, juntamente
com Rubens Requião, a partir 1960 no país, considerada por muitos como a mais
consistente, ela autoriza a desconsideração da personalidade, colocando de lado a
autonomia patrimonial da sociedade, uma vez que esteja configurada a prática de
fraude, abuso de direitos ou confusão patrimonial. São abusos praticados pelos
13 REQUIÃO, Rubens, Abuso de Direito de Fraude Através da Personalidade Jurídica. Revistas dos Tribunais. São Paulo, 410:12-24, Dez. 1969. 14 BIANQUI, Pedro Henrique Torres. Desconsideração da Personalidade Jurídica no Processo Civil. São Paulo: Saraiva 2011. p. 41.
18
sócios, que ocasionem um desvio de finalidade, capazes de frustrar interesses
legítimos dos credores.
Salienta-se que a mera insatisfação de créditos não é capaz de ensejar a
aplicação do instituto em análise, haja vista a necessidade de preservação da
autonomia patrimonial dentro do que for possível.
Logo segundo essa teoria, só é possível aplicação deste instituto uma vez
que cumprido dois requisitos, objetivo: que consiste na insuficiência patrimonial do
devedor, e o subjetivo: que consiste no desvio de finalidade ou confusão patrimonial,
ensejado por fraude ou abuso de direito, sendo corroborado pelo artigo 50 do C.C.
de 2002.
Explica Elpídio Donizetti em seus escritos:
De acordo com o art.50 Do código Civil, para a desconsideração da personalidade jurídica são necessários: a) o requisitos objetivo, que consiste na insuficiência patrimonial do devedor; e b) o requisito subjetivo, consistente no desvio de finalidade ou confusão patrimonial por meio da fraude ou do abuso de direito. Para a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade não basta estar presente apenas o primeiro requisito. Deve, pois, também estar demonstrada, no caso concreto, a existência de uma conduta culposa do sócio ou a sua intenção abusiva ou fraudulenta de utilizar os bens da sociedade para fins diversos daqueles permitidos em lei (requisito subjetivo).15
Corroborando o que já foi dito, vejamos o disposto no artigo 50 do Código
Civil:
Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.16
b) Teoria Menor da Desconsideração da Personalidade Jurídica;
A teoria menor, também adotada pelo ordenamento pátrio adota um modo
mais simples de aplicação do instituto em questão, bastando apenas que haja
insolvência e em decorrência a confirmação de que existe prejuízo aos credores.
Logo a constatação de danos financeiros a credores autoriza a extensão dos efeitos
da execução ao patrimônio da sociedade.
15 DONIZETTI, Elpídio. Curso Didático de Direito Processual Civil. 19. ed. São Paulo: Atlas. 2016. p. 329. 16 Site Planalto. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm> Acesso em 26 de setembro de 2017.
19
Salienta sobre esta teoria Elpídio Donizetti, dando ênfase no Código de
Defesa do Consumidor e a lei número 9.605/1988, lei de crimes ambientais, que tem
como premissa a teoria menor:
Por outro lado o Código de Defesa do Consumidor e a Lei nº 9.605/1988, que trata dos crimes ambientais, adotaram a “Teoria Menor da Desconsideração”, que se justifica pela simples comprovação do estado de insolvência. Nos temas referente a Direito Ambiental e à Direito do Consumidor, os prejuízos eventualmente causados pela pessoa jurídica ao consumidor ou ao meio ambiente serão suportados pelos sócios, não se exigindo qualquer comprovação quanto à existência de dolo ou culpa.17
Neste mesmo entendimento se posiciona o Professor Marcus Vinicius
Rios Gonçalves:
Posteriormente o Código de Defesa do Consumidor passou a autorizá-la expressamente no are. 28 e seu parágrafos quando “em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contratos”, bem como nos casos de “falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração” ou ainda “sempre que a sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade aos consumidores”. [...].18
Importante destacar a Teoria Maior, pois no âmbito Cível, é a que
predomina, tendo sido adotada como observância para sua aplicação, umas vez que
tem que zelar pela autonomia patrimonial, haja vista que não tem intenção de ser
contrário a personalização das sociedades empresárias e à sua autonomia em
relação aos sócios.
Há a necessidade de apurar a existência de desvio de finalidade daquela
sociedade, a fim de fraudar e lesar direito de terceiro. Busca-se mais solidez na
aplicação desse instituto, ainda nesse mesmo aspecto Elpídio Donizetti salienta:
Ressalte-se que o Código Civil adotou o que chamamos de “Teoria Maior da Desconsideração”, vez que exige a configuração objetiva de tais requisitos para sua aplicação. Assim, não basta apenas a comprovação do estado de insolvência da pessoa jurídica para que os sócios e administradores sejam responsabilizados; é preciso que se comprove a ocorrência do desvio de finalidade ou de confusão patrimonial.19
17 DONIZETTI, Elpídio. Curso Didático de Direito Processual Civil. 19. ed. São Paulo: Atlas. 2016. p. 329. 18 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito Processual Civil. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 259. 19 DONIZETTI, Elpídio. Curso Didático de Direito Processual Civil. 19. ed. São Paulo: Atlas. 2016. p. 329.
20
3.2 Da desconsideração inversa da personalidade jurídica
Importante destacar que além de haver uma preocupação em adentrar na
esfera patrimonial da pessoa física dos sócios, afim de combater os prejuízos
causados pelo desvio de finalidade, fraude, cometido pelos sócios, devendo
estender a responsabilidade da empresa a eles. Houve uma preocupação com a
aplicação inversa da teoria inversa, prevendo a possibilidade da pessoa jurídica
tentar fraudar terceiros desvinculando os bens de seu patrimônio para os da
empresa, ficando clara que age de má-fé. Desse modo aplica-se de forma inversa,
fazendo com que o patrimônio da PJ, responda por dívidas oriundas da pessoa
física.
Elpídio Donizetti trata sobre tal possibilidade:
A desconsideração inversa da personalidade jurídica consiste no “afastamento da autonomia patrimonial da sociedade, para, contrariamente do que ocorre na desconsideração da personalidade propriamente dita, atingir o ente coletivo e seu patrimônio social, de modo a responsabilizar a pessoa jurídica por obrigações do sócio controlador” (STJ, REsp 948.117/MS, Rel. Min. Nancy Andrighi). Assim, em vez de “levantar o véu” da personalidade jurídica para que eventual constrição de bens atinja o patrimônio dos sócios, a desconsideração inversa objetiva atingir os bens da própria sociedade em razão das obrigações contraídas pelo sócio, desde que, da mesma forma que a desconsideração tradicional, sejam preenchidos os requisitos legais. 20
Nesse mesmo contexto dispõe Marcus Vinicius Rios Gonçalves:
Além da desconsideração comum, há ainda a inversa. Na comum, a responsabilidade patrimonial pelas dívidas da empresa é estendida aos sócios; na inversa, a responsabilidade pelas dívidas dos sócios é estendida à empresa. No primeiro caso embora a dívida seja da pessoa jurídica, o sócio passa a responder judicialmente pelo débito com seu patrimônio pessoal; no segundo, conquanto o débito seja do sócio, será possível alcançar bens da empresa, a quem a responsabilidade é estendida.21
Importante destacar que tal possibilidade não tinha previsão legal, sendo
reconhecida e aplicada a partir de doutrina e jurisprudências, sendo aceita de forma
majoritária pelos tribunais pátrios.
20 DONIZETTI, Elpídio. Curso Didático de Direito Processual Civil. 19. ed. São Paulo: Atlas. 2016. p. 331. 21 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito Processual Civil. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 259.
21
Atualmente o instituto que inverte a desconsideração da pessoa jurídica,
passou ter previsão legal com o advento da reforma do Código de Processo Civil de
2015, estando disposto no artigo 133, § 2º, do referido Código.
Como observamos no trecho da obra de Elpídio Donizetti, a seguir:
O § 2º do art. 133 do CPC/2015 consolida o entendimento jurisprudencial ao permitir que as disposições relativas ao incidente também sejam aplicadas à hipótese de desconsideração inversa da personalidade jurídica.22
É possível constatar a preocupação dos doutrinadores e dos legisladores
ao prevê e positivar tal instituto, tendo como principal intenção evitar prejuízo a
sociedade como todo.
3.3 Desconsideração da personalidade jurídica X Despersonalização
É importante destacar que existe uma diferença entre despersonalização
e desconsideração, o primeiro trata da anulação da personalidade jurídica,
possibilitando a extinção da pessoa jurídica por inexistirem os pressuposto de
existência, no que tange o segundo é a possibilidade de “retirar o véu”, fazendo que
o patrimônio da sociedade seja atingindo, uma vez que caracterizado a fraude,
desvio de finalidade, nessa não se tem o interesse de extinguir a sociedade.
Salienta desse modo Comparato:
Na primeira, visa-se à anulação da personalidade jurídica, fazendo-se desaparecer a pessoa jurídica como sujeito autônomo por lhe faltarem condições de existência, como nos casos de invalidade do contrato social ou de dissolução de sociedades. Na segunda, o que se pretende é desconsiderar a forma da pessoa jurídica, no caso particular, em negar sua personalidade de maneira gera.23
3.4 Da aplicabilidade no ordenamento jurídico
O ordenamento jurídico prevê vários campos de incidência do instituto, ou
seja, várias vertentes acerca da aplicação da desconsideração da personalidade
jurídica.
22 DONIZETTI, Elpídio. Curso Didático de Direito Processual Civil. 19. ed. São Paulo: Atlas. 2016. p. 331. 23 COMPARATO, Fábio Konder. O Poder de Controle na Sociedade Anônima. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1983.
22
a) Código Tributário Nacional
O CTN foi uma das primeiras legislações a inserir em seu bojo jurídico a
possibilidade de aplicação o instituto, dispondo no artigo 135, da Lei nº 5.172/66,
onde prevê a possibilidade de responsabilizar diretores gerentes e representantes
das pessoas jurídicas de direito privado, em caso de atos em desacordo com a
finalidade. Adotou a teoria maior, para a aplicabilidade da desconsideração da
personalidade jurídica.
Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: I - as pessoas referidas no artigo anterior; II - os mandatários, prepostos e empregados; III - os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.24
b) Do Código de Defesa do Consumidor
O CDC também prevê a possibilidade de aplicação, tendo adotado a
teoria menor, que autoriza a aplicação ainda que não haja fraude ou abuso de direito
entre a empresa e seus sócios. Permite a aplicação uma vez que houver a
obstrução de ressarcimento ao consumidor.
Desse modo dispõe o artigo 28, do CDC:
Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração. § 1° (Vetado). § 2° As sociedades integrantes dos grupos societários e as sociedades controladas, são subsidiariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste código. § 3° As sociedades consorciadas são solidariamente responsáveis pelas obrigações decorrentes deste código. § 4° As sociedades coligadas só responderão por culpa. § 5° Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo
24 Site Planalto. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5172.htm> Acesso em 02 de outubro de 2017.
23
ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores.25 (g.n.)
Dá-se ênfase ao parágrafo 5°, que prevê a possibilidade de aplicação da
desconsideração da personalidade jurídica, uma vez que haja qualquer obstáculo no
ressarcimento do consumidor, abrindo assim, um leque de possibilidades para seu
uso.
Nesse contexto dispõe Paulo R. Roque A. Khouri:
A respeito da desconsideração da personalidade jurídica no CDC, é importante registrar que tal instituto se encontra regulamentando justamente no capítulo IV, que cuida da qualidade dos produtos e serviços e da reparação de danos ao consumidor. Isto demonstra a intenção clara do legislador em dar efetividade aos direitos do consumidor, quando tenha seus direitos violados por conta de um acidente de consumo ou vício do produto. Não basta dar-lhe sentença de mérito favorável, reconhecendo seus direitos; o importante é que o consumidor tenha seu eventual crédito totalmente recebido, seja da pessoa jurídica ou da pessoa física do sócio. [...]26
Carlos Roberto Gonçalves corrobora também em sua obra:
[...] E o primeiro diploma a referir a ela é o Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078, de 11-9-1990) que, no art. 28 e seus parágrafos, autoriza o juiz a desconsiderar a personalidade a personalidade jurídica da sociedade quando, “em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social”, bem como nos casos de “falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração”. E ainda, “sempre que sua personalidade for de alguma forma obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores”.27
c) Previsão do instituto na Lei de Crimes Ambientais
Neste caso só será possível aplicação desse instituto, quando for
reconhecida a responsabilidade civil, ou seja, uma vez que for atribuído ao réu
somente pena de caráter pecuniário, não poderá aplicar a desconsideração da
personalidade jurídica. A sua aplicação se dá em caráter de reparação civil.
25 Site Planalto. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8078.htm> Acesso em 02 de Outubro de 2017. 26 KHOURI, Paulo Roberto Roque Antonio. Direito do Consumidor: contratos, responsabilidade civil e defesa do consumidor em juízo, 4. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 203/205. 27 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil Brasileiro, volume 1: parte geral. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 255.
24
Art. 4º Poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio ambiente.28
d) Do Código Civil
Com a personalidade jurídica vem a autonomia patrimonial,
desvinculando assim o patrimônio dos sócios dos daquela, trazendo uma proteção
para empresário e um fomento na atividade comercial, econômica e trazendo
também a geração de emprego para a sociedade. Logo fica a preocupação de não
blindar tal instituto a ponto de deixar impune quem se aproveita dele para obter
proveitos de forma ilícita, desviando a sua finalidade.
Desde então há a previsibilidade de aplicação dessa teoria, uma vez que
pessoa passam a agir ilicitamente, valendo-se do “véu” que reveste a pessoa
jurídica.
Carlos Roberto Gonçalves discorre desse mesmo modo:
Pessoas inescrupulosas têm-se aproveitado desse princípio, com a intenção de se locupletarem em detrimento de terceiros, utilizando a pessoa jurídica como uma espécie de “capa” ou “véu” para proteger os seus negócios escusos.29
O Código Civil é claro ao enfatizar que a aplicação da desconsideração
da personalidade jurídica só se dará a partir do preenchimento dos requisitos
subjetivo e objetivo, entendendo pela aplicação da teoria Maior.
Carlos Roberto Gonçalves dispõe em seus escritos tal exigência:
Efetivamente, a desconsideração da pessoa jurídica exige comprovação de fraude, abuso de direito, desvio de finalidade ou confusão patrimonial para que se aplique a mencionada teoria, não se podendo aceitar como tal a mera insolvência da pessoa jurídica ou dissolução irregular da empresa. A propósito, proclamou o Superior Tribunal de Justiça que o fato de o credor não ter recebido seu crédito frente à sociedade, em decorrência de insuficiência do patrimônio social, não é requisito bastante para autorizar a desconsideração da
pessoa jurídica.30
28 Site Planalto. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9605.htm> Acesso em 02 de Outubro de 2017. 29 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil Brasileiro, volume 1: parte geral. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 255. 30 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil Brasileiro, volume 1: parte geral. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 259.
25
e) No Direito Administrativo
Podemos constatar também a figura do instituto, na Lei (anticorrupção) de
n° 12.846/2013, que dispões sobre Responsabilidade Administrativa e Civil das
pessoas jurídicas que praticam atos ilícitos contra a Administração Pública.
A Lei prevê a possibilidade da Administração Pública promova na seara
Administrativa, ou seja, sem que haja a necessidade de acionar o poder judiciário, a
utilização do instituto da desconsideração da personalidade jurídica.
Art. 14. A personalidade jurídica poderá ser desconsiderada sempre que utilizada com abuso do direito para facilitar, encobrir ou dissimular a prática dos atos ilícitos previstos nesta Lei ou para provocar confusão patrimonial, sendo estendidos todos os efeitos das sanções aplicadas à pessoa jurídica aos seus administradores e sócios com poderes de administração, observados o contraditório e a ampla defesa.31
31 Site Planalto. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12846.htm> Acesso em 25 de Outubro de 2017.
26
4. O INCIDENTE DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA
O incidente da desconsideração da personalidade deixou de ser apenas
uma teoria para o Código de Processo Civil de 2015, passando a fazer parte da
norma, tendo desde então um previsão procedimental, uma vez que ele só existia no
Código Civil, não havendo sua regularização em sede processual.
O Código de Processo Civil atual passou a prevê o incidente, como uma
das novas modalidades de intervenção de terceiro, sendo disposto nos artigos 133 a
137, sendo obrigatória sua aplicação nos juizados especiais cíveis, conforme dispõe
o artigo 1.062 do Código Processual Civil.
O incidente de desconsideração da personalidade jurídica hoje é uma
modalidade de intervenção de terceiros, sendo possível ocorrer à mudança no pólo
passivo da lide.
A lei material previa sua aplicação, estando pendente a processual, sendo
suprida pelo atual Código de Processo Civil. Passou-se então a existir um
regramento no que diz respeito ao processamento do incidente de desconsideração
da personalidade jurídica.
O atual Código de Processo Civil tem como principal finalidade garantir o
direito aos princípios do contraditório e da ampla defesa, que estão também
positivados na lei processual civil. Permitindo apurar se o possível executado é
responsável pela fraude, ressaltando-se sua previsibilidade na Constituição Federal
de 88, conforme veremos a seguir:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;32
4.1 Da aplicação do incidente de desconsideração da personalidade jurídica
trazidas pelo Código de Processo Civil/2015
Sendo apresentado como uma da modalidade de Intervenção de
Terceiros, e não sendo mais necessário o ajuizamento de ação autônoma para
32 Site Planalto. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm> Acesso em 31 de Outubro de 2017
27
responsabilizar os sócios pelos danos patrimoniais. O atual Código de Processo Civil
prevê a possibilidade de instauração de Incidente Processual, em qualquer fase,
ficando a demanda principal suspensa, até que se resolva a questão incidental.
O novo CPC, seguindo o entendimento jurisprudencial, criou um capítulo específico para tratar do “Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica” (Título III, Capítulo IV), elencando-o como uma nova modalidade de intervenção de terceiros e pacificando a desnecessidade da propositura de ação judicial própria para a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica.33
Assim também dispõe o caput do artigo 134 do Código de Processo Civil:
Art. 134. O incidente de desconsideração é cabível em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução fundada em título executivo extrajudicial. 34
O incidente da desconsideração da personalidade jurídica poderá ser
instaurado a pedido da parte ou do Parquet (Ministério Público), se assim tiver
interesse. Devendo obedecer aos requisitos para sua propositura, tais pressupostos
previsto na lei material, no artigo 50 do Código Civil, que prevê a aplicação da teoria
no Ordenamento Brasileiro.
Ressalta-se a falta de legitimidade do juiz para requerer a propositura do
incidente, sendo expresso no artigo 133, caput do Código de Processo Civil a
necessidade ser requerido pelas partes ou pelo Órgão Ministerial; nesse sentido
discorre o renomado Elpídio Donizetti:
Como se vê, não há possibilidade de atuação jurisdicional sem o requerimento da parte ou do Ministério Público; ou seja, é vedado ao juiz, de ofício, determinar a inclusão do sócio ou do administrador no pólo passivo da demanda, para fins de desconsideração da personalidade jurídica. O art. 133 do CPC está em consonância com o art. 50 do CC, que também prevê o expresso requerimento do interessado ou do Ministério Público, não se podendo cogitar de atuação ex officio.35 Art. 133. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica será instaurado a pedido da parte ou do Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo.36
33 DONIZETTI, Elpídio. Curso Didático de Direito Processual Civil. 19. ed. São Paulo: Atlas. 2016. p. 330. 34 Site Planalto. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm> Acesso em 3 de Novembro de 2017. 35DONIZETTI, Elpídio. Curso Didático de Direito Processual Civil. 19. ed. São Paulo: Atlas. 2016. p. 331 36 Site Planalto. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm> Acesso em 3 de Novembro de 2017
28
Como já demonstrado no capítulo anterior, é também possível a aplicação
do incidente de forma inversa, assim é a previsibilidade do parágrafo 2º do artigo
133 do Código de Processo Civil, a fim de atingir o patrimônio da empresa, uma vez
que restar claro que o sócio desvio bens do patrimônio pessoal para o patrimônio da
sociedade, como o intuito de fraudar credores. Assim dispõe Elpídio Donizetti:
A desconsideração inversa da personalidade jurídica consiste no “afastamento da autonomia patrimonial da sociedade, para, contrariamente do que ocorre na desconsideração da personalidade propriamente dita, atingir o ente coletivo e seu patrimônio social, de modo a responsabilizar a pessoa jurídica por obrigações do sócio controlador” (STJ, REsp 948.117/MS, Rel. Min. Nancy Andrighi).[...]37 Art. 133. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica será instaurado a pedido da parte ou do Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo.
§ 1o O pedido de desconsideração da personalidade jurídica
observará os pressupostos previstos em lei. § 2o Aplica-se o disposto neste Capítulo à hipótese de desconsideração inversa da personalidade jurídica.(g.n.)38
Fica dispensada o incidente se ocorrer o pedido de desconsideração da
personalidade jurídica já na inicial, não sendo necessária a suspensão do processo.
Sendo assim a previsão legal é de que existem duas possibilidades de requerer a
aplicação do instituto em analise, que é o primeiro mencionado anteriormente, e no
curso do processo, como incidente, e nesse caso é necessária a suspensão da
demanda principal. Devem estar preenchidos os pressupostos para legais para o
incidente.
Assim dispõe o artigo 134, em seu parágrafo 2º, do Código Processual
Civil:
Art. 134. O incidente de desconsideração é cabível em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução fundada em título executivo extrajudicial. § 1o A instauração do incidente será imediatamente comunicada ao distribuidor para as anotações devidas. § 2o Dispensa-se a instauração do incidente se a desconsideração da personalidade jurídica for requerida na petição inicial, hipótese em que será citado o sócio ou a pessoa jurídica.(g.n) 39
37 DONIZETTI, Elpídio. Curso Didático de Direito Processual Civil. 19. ed. São Paulo: Atlas. 2016. p. 331. 38 Site Planalto. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm> Acesso em 3 de Novembro de 2017. 39 Site Planalto. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm> Acesso em 3 de Novembro de 2017.
29
Após a instauração do incidente, é obrigatória a citação dos sócios ou da
pessoa jurídica, no prazo de 15 dias, a fim de que seja exercido o princípio do
contraditório e ampla defesa, ou seja, a produção de todas as provas legais e de
direito, quando será oportunizado aos sócio demonstrarem que não fazem parte do
ato ilícito, fraude, praticado eventualmente por outro sócio, e assim restando claro
que não podem ser responsabilizados patrimonialmente pelos danos causados por
outrem. Assim está garantido no artigo 135 da Lei Processual:
Art. 135. Instaurado o incidente, o sócio ou a pessoa jurídica será citado para manifestar-se e requerer as provas cabíveis no prazo de 15 (quinze) dias.40
Quando tratar-se de aplicação da desconsideração da personalidade
jurídica já na inicial, a figura do contraditório será exercida na contestação.
Fica evidente que existe uma preocupação do legislador em proporcionar
o direito de defesa dos sócios ou da pessoa jurídica, uma vez que a prática anterior
ao atual Código Processual Civil era a de não oportunizar a manifestação daqueles,
ou seja, havia uma violação constitucional, visto que o contraditório e ampla defesa
são garantias dadas pela Constituição Federal de 1988.
No mesmo sentido dispõe Elpídio Donizetti:
O que a nova legislação pretende é evitar a constrição judicial dos bens do sócio (ou da pessoa jurídica, na hipótese de
desconsideração inversa) sem qualquer possibilidade de defesa.41
Após estar conclusa a instrução, poderá o magistrado proferir sua seu
julgado por decisão interlocutória. Salienta ainda Fábio Tartuce:
Concluída a instrução, se necessária, o incidente será resolvido por decisão interlocutória, e não por sentença se a decisão for proferida pelo relator, caberá agravo interno.42
40 Site Planalto. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm> Acesso em 3 de Novembro de 2017. 41 DONIZETTI, Elpídio. Curso Didático de Direito Processual Civil. 19. ed. São Paulo: Atlas. 2016. p. 333 42 TARTUCE, Flávio. Impactos do novo CPC no direito civil. São Paulo: Método, 2015. p. 87.
30
Uma vez que for acolhido o pedido de desconsideração da personalidade
jurídica, os sócios ou a pessoa jurídica, será parte definitiva da relação processual,
vindo a responder patrimonialmente frente aos seus credores.
4.2 Julgados com a aplicação do incidente de desconsideração da
personalidade jurídica
A seguir, julgado do STJ do ano de 2014, que já vinha admintindo a
aplicação da desconsideração da personalidade jurídica, seguindo a disposição do
artigo 50 do Código Civil, desde que adotasse a Teoria Maior, trata-se de recurso
Especial da Terceira Turma, tendo como Relator a Ministra Nancy Andrighi:
PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. VIABILIDADE. ARTS. ANALISADO: 50 DO CC/02 E 238 DO CPC. 1. Ação de cobrança ajuizada em 9/5/2002. Recurso especial concluso ao Gabinete em 9/2/2012. 2. Demanda em que se pretende o cumprimento de obrigação de pagar de corrente de negócio de compra e venda, inadimplido pela recorrente. 3. A desconsideração da personalidade jurídica é admitida em situações excepcionais, devendo as instâncias ordinárias, fundamentadamente, concluir pela ocorrência do desvio de sua finalidade ou confusão patrimonial desta com a de seus sócios, requisitos sem os quais a medida torna-se incabível. 4. A alteração de endereço de empresa, em regra, não é suficiente para demonstrar qualquer dos pressupostos, ainda que conjugada à ausência de bens. 5. A inexistência de indicação de novo endereço, mesmo na interposição do agravo de instrumento na origem, em que se declinou o mesmo endereço no qual desde 2009 não se encontra, conforme certidão de oficial de justiça, faz presumir o abuso da personalidade jurídica, apto a embasar o deferimento da desconsideração da personalidade jurídica da empresa, para se buscar o patrimônio individual de seu sócio. 6. Recurso especial não provido. (REsp 1311857/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 13/05/2014, DJe 02/06/2014)(g.n)43
O julgado a seguir traz a aplicação da desconsideração inversa da
personalidade jurídica, trata-se de um Agravo Interno em Recurso Especial, tendo
como Relator o Ministro Luiz Felipe Salomão, da Quarta Turma do Superior Tribunal
43Site Superior Tribunal de Justiça. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=desconsideracao+da+personalidade+juridica+novo+cpc&b=ACOR&p=true&l=10&i=10> Acesso em 03 de Novembro de 2017
31
de Justiça, o julgado já dispõe do entendimento disposto no Código Processual
Civil de 2015:
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA AOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO PROFERIDA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. INSUFICIÊNCIA DE ALEGAÇÃO GENÉRICA. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. DESCONSIDERAÇÃO INVERSA DA PERSONALIDADE JURÍDICA. POSSIBILIDADE. REVISÃO. SÚMULA 7/STJ. PENHORA. 30% SOBRE RECEBÍVEIS DE CARTÁO DE CRÉDITO. REVISÃO. ONEROSIDADE EXCESSIVA. INVIABILIDADE. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. O agravo que objetiva conferir trânsito ao recurso especial obstado na origem reclama, como requisito objetivo de admissibilidade, a impugnação específica aos fundamentos utilizados para a negativa de seguimento do apelo extremo, consoante expressa previsão contida no art. 932, III, do CPC/2015 (art. 544, § 4º, inc. I, do CPC/1973) e art. 253, parágrafo único, I, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça - RISTJ, ônus da qual não se desincumbiu a parte insurgente, sendo insuficiente alegações genéricas de não aplicabilidade do óbice invocado. Precedentes. 2. A apontada violação a dispositivos constitucionais pelo acórdão do Tribunal de origem não pode ser examinada em sede de recurso especial porquanto refoge à missão creditada ao Superior Tribunal de Justiça, pelo artigo 105, inciso III, da Carta Magna, qual seja, a de unificar o direito infraconstitucional. 3. Não se viabiliza o recurso especial pela indicada violação do art. 1.022 do CPC/2015. Isso porque, embora rejeitados os embargos de declaração, todas as matérias foram devidamente enfrentada pelo Tribunal de origem, que emitiu pronunciamento de forma fundamentada, ainda que em sentido contrário à pretensão da parte recorrente. 4. Também não merece ser conhecido o recurso especial no tocante à apontada perda de objeto do agravo de instrumento, decorrente da superveniência de sentença nos embargos à execução que acolheu a alegação de prescrição intercorrente e teria julgado extinta a execução. Isso porque, naqueles autos (1086461-27.2015.8.26.0100) foi interposta apelação a que o Tribunal de origem deu provimento, a fim de afastar a alegada ocorrência de prescrição intercorrente, amparando-se em entendimento do Superior Tribunal de Justiça. 5. A ocorrência de prescrição intercorrente, conforme alegado pela própria recorrente, já foi levado a julgamento nos autos da apelação em embargos à execução n. 1086461-27.2015.8.26.0100, havendo prelusão pro iudicato quanto a esse tema, de forma a inviabilizar a sua análise nestes autos. 6. "A superação da pessoa jurídica afirma-se como um incidente processual, razão pela qual pode ser deferida nos próprios autos, dispensando-se também a citação dos sócios, em desfavor de quem foi superada a pessoa jurídica, bastando a defesa apresentada a posteriori, mediante embargos, impugnação ao cumprimento de sentença ou exceção de pré-executividade" (REsp 1.414.997/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, DJe de 26/10/2015). 6. O Tribunal de origem, analisando pormenorizadamente a prova dos autos concluiu por manter a desconsideração inversa da personalidade jurídica para atingir as empresas ora recorrente em virtude de que um dos seus sócios, filho do executado, era
32
sócio também da sociedade empresária que passou por diversas alterações contratuais na qual os executados mantinham a administração e foi procurador das duas Offshores em que o executado também foi procurador. Assentou, também, o Tribunal de origem, que o outro sócio é genro dos executados pessoas físicas e foi antigo diretor comercial da executada pessoa jurídica, tendo essa empresa o mesmo objeto, qual seja, o estacionamento de veículos. Dessa forma, observa-se que o Tribunal de origem analisou a prova dos autos para concluir acerca da intrínseca relação entre as empresas, caracterizada pelos sócios e diretores em comum, bem como mesmas atividades a se caracterizarem como componentes de um grupo econômico familiar, com desvio de finalidade e confusão patrimonial para o mau uso das empresas criadas. Nesse contexto, o acolhimento da pretensão recursal exigiria a alteração das premissas fático-probatórias estabelecidas pelo acórdão recorrido, com o revolvimento das provas carreadas aos autos, atraindo o óbice da Súmula 7 do STJ. 7. Para afastar o entendimento a que chegou a Corte a quo, de modo a analisar as peculiaridades do caso e verificar a existência de onerosidade excessiva para as recorrentes enseja o revolvimento do acervo fático-probatório dos autos, o que se mostra inviável em recurso especial, por óbice da Súmula 7/STJ: "A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial." 8. Agravo interno não provido. (AgInt no AREsp 1043928/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 21/09/2017, DJe 29/09/2017)(g.n.) 44
Nesse julgado veremos a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica Código de Processo Civil 2015, o Acórdão proferido pelo Relator Ministro Lázaro Guimarães, da Quarta Turma, reafirmando a aplicação do incidente, tomando como base o convencimento do Juízo de piso, tendo ocorrido, conforme consta nos autos, conduta fraudulenta:
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. VIOLAÇÃO A ENUNCIADO DE SÚMULA. DESCABIMENTO. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. REQUISITOS. CONDUTA FRAUDULENTA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. PRECEDENTES. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. Não compete ao Superior Tribunal de Justiça analisar violação a súmula em sede de recurso especial, por não estar inserida no conceito de norma infraconstitucional, nos termos do art. 105, III, da Constituição Federal. 2. A convicção formada pelo Tribunal de origem acerca da presença dos requisitos necessários para ensejar a desconsideração da personalidade jurídica, ante a ocorrência de indícios de fraude, para impossibilitar o cumprimento das obrigações firmadas, decorreu dos elementos existentes nos autos, de forma que rever o acórdão objurgado, no caso, importaria, necessariamente, o reexame de provas, o que é vedado em sede de recurso especial, nos termos da Súmula 7 do STJ.
44 Site Superior Tribunal de Justiça. Disponível em: < https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1320404&num_registro=201102352227&data=20140602&formato=PDF > Acesso em 03 de Novembro de 2017
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3. A incidência da Súmula 7 do STJ é óbice também para a análise do dissídio jurisprudencial, o que impede o conhecimento do recurso pela alínea "c" do permissivo constitucional. 4. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp 172.426/SP, Rel. Ministro LÁZARO GUIMARÃES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 5ª REGIÃO), QUARTA TURMA, julgado em 19/10/2017, DJe 25/10/2017)(g.n.) 45
45 Site Superior Tribunal de Justiça. Disponível em: < https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1575925&num_registro=201200866358&data=20171025&formato=PDF> Acesso em 03 de Novembro de 2017
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5 INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇAO DA PERSONALIDADE JURÍDICA E SUA NÃO APLICAÇÃO NOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS.
Uma importante inovação trazida pelo Código de Processo Civil foi quanto
a possibilidade de aplicação do incidente de desconsideração da personalidade jurídica no âmbito dos juizados especiais cíveis, como dispõe o artigo 1.062 do referido código.
Art. 1.062. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica aplica-se ao processo de competência dos juizados especiais.46
Tal previsão legal acarretou grandes discussões, principalmente quando
traz desconformidade entre as normas, sendo capaz de causar divergência entre
duas ou mais leis. É o caso do capítulo em questão, pois o artigo anteriormente
citado, vai de encontro com a lei que regula os Juizados Especiais Cíveis, quais
sejam, a Lei 9.099/1995, em seu artigo 10, dispõe que não será possível a
intervenção de terceiros nos Juizados Especiais Cíveis, logo, sendo o incidente em
analise, umas das formas de intervenção de terceiros, fica claro a divergência da
aplicação do artigo 1.062, da norma processual civil, causando uma antinomia
jurídica.
Cabe salientar que os Juizados Especiais Cíveis tem suas peculiaridades
e princípios, tendo como principal enfoque o da Celeridade Processual, que tem
como finalidade o andamento rápido de suas demandas. Ocorre que com o
surgimento da aplicação nos Juizados Especiais Cíveis, fica evidente haverá uma
quebra de uma das principais funções do procedimento sumário, pois o novo Código
de Processo Civil prevê que quando houver a necessidade de aplicação da
desconsideração da personalidade jurídica, deverá ocorrer a suspensão do processo
principal, a fim de que ocorra o julgamento do incidente processual, para então
solucionar a principal demanda, o que ocasionará uma demora demasiada.
A Celeridade nos juizados especiais cíveis “As causas submetidas aos juizados especiais de menor complexidade (art. 98, I, da CF) exigem solução célere. Na verdade, o legislador está obrigado a instituir um procedimento que confira ao cidadão uma resposta tempestiva, já que o direito de acesso à justiça, albergado no art. 5.º, XXXV, da CF, decorre do princípio de que todos têm direito a uma
46 Site Planalto. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm> Acesso em 05 de Novembro de 2017.
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resposta tempestiva ao direito de ir ao juiz para buscar a realização de seus direitos [...] 47
Nesse contexto observamos no artigo escrito pelo Procurador Federal
Ricardo Sampaio tal entendimento:
A restrição procede e vem ao encontro dos princípios do Juizado. O objetivo não é outro que evitar a proliferação de pretensões dentro de um mesmo processo, com o aumento da complexidade da lide e a morosidade do processo, exatamente o que o Juizado pretende evitar.48
Para corroborar a impossibilidade de aplicação, trazemos o entedimento
do professor e advogado Fernando Augusto Sales, autor de vários livros publicados
no Brasil, vejamos:
O ingresso de terceiros nos autos, por meio de intervenção, cria um complicador para o processo, ao estabelecer, dentro dele, uma outra relação jurídica e, como isso, atrasa-se a prestação jurisdicional. Daí o porquê da proibição. Fredie Didier Jr (2007.a: 301) ressalta que “no procedimento dos Juizados Especiais Cíveis, de acordo com o art. 10, LF 9.099/95, não se admite intervenção de terceiro no juizado especial cível”, em razão de que, se admitida, comprometeria a celeridade do rito, da mesma forma que Cândido Rangel Dinamarco (2003.c: 786), ao esclarecer que “integra o modelo diferenciado do processo dos juizados cíveis a exclusão de qualquer modalidade de intervenção de terceiro, quer voluntária, quer provocada”.49
O Magistrado fica obrigado a conceder o contraditório e ampla defesa
para a parte requerida, neste caso concedendo ao sócio o direito de produzir provas
e argumentos a seu favor, buscando demonstrar que não ocorreu a fraude ou abuso
de direito. Demando assim a demora indesejada no procedimento sumaríssimo.
[...] o terceiro só poderá ser alcançado pela eficácia da decisão judicial se regularmente desconsiderada a personalidade jurídica mediante incidente de desconsideração, que demanda contraditório específico e prova igualmente específica sobre a ocorrência dos pressupostos legais que a autorizam.50
47 MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de Processo Civil, volume II. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2015. p. 296. 48 SAMAPAIO, Ricardo Ramos. A Impossibilidade de Intervenção de Terceiro Nos Juizados Especiais. Conteúdo Jurídico, Disponível em < http://www.conteudojuridico.com.br/artigo,a-impossibilidade> Acesso em 07 de Novembro de 2017. 49 SALES, Fernando Augusto. O Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica e os Processos do JEC. Jus.com. Disponível em < https://jus.com.br/artigos/45192/o-incidente-de-desconsideracao-da-personalidade-juridica-e-os-processos-do-jec> Acesso em 7 de Novembro de 2017. 50 MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de Processo Civil, volume II. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2015. p. 106.
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Quando duas normas se contradizem, como é o caso do artigo 1.062 do
Código de Processo Civil de 2015, que de um lado autoriza a aplicação do incidente
da desconsideração da personalidade jurídica nos juizados especiais cíveis, e do
outro lado, o artigo 10, da Lei 9.099 de 1995, que não admite a intervenção de
terceiros em seu procedimento, e assim não admitindo a aplicação do incidente, por
ser uma modalidade de intervenção de terceiro. Uma forma de conciliar essa
divergência, é aplicando as regras de hermenêutica.
Neste caso podemos aplicar também a teoria da hierarquia normativa,
que se dá quando organizamos as normas em níveis, ordenando-as de forma
hierárquica dentro do sistema normativo, fazendo com haja harmonia entre as
normas.
Dentro dessa teoria encontramos a famosa pirâmide de Hans Kelsen,
trazendo no topo da pirâmide a norma fundamental, que serve como norteadora de
todas as outras normas usa-se uma escala onde as normas inferiores depedem das
normas superiores, até que chegue a norma suprema, que não depende de
nenhuma outra norma.
Assim confirma Noberto Bobbio:
Há normas superiores e normas inferiores. As inferiores dependem das superiores. Subindo das normas inferiores àquelas que se encontram mais acima, chega-se a uma norma suprema, que não depende de nenhuma outra norma superior, e sobre a qual repousa a unidade do ordenamento. Essa norma suprema é a norma fundamental.51
Pela teoria da hierarquia das normas, todas as normas estão
completamente ligadas dentro de sistema jurídico, sua organização se dá através da
hierarquia entre elas. As normas superiores regulam assuntos de caráter geral, que
é o caso do Código de Processo Civil, enquanto que as inferiores regulam as
questões especificas sem contradizer as superiores, que é o caso da Lei 9.099/95.
Fica evidente a aplicação da Lei 9.009/1995, uma vez que é lei especial,
que se sobrepõe à lei geral, que é o novo CPC. Além do mais, aquela lei disciplina o
próprio procedimento do juizado especial cível, só se utilizando as regras do
processo comum naquilo em que ela for omissa e não for com ela incompatível.
51 BOBBIO, Noberto. Teoria do Ordenamento Jurídico. Apresentação Tercio Sampaio Ferraz Junior. Trad. Maria Celeste C. J. Santos; ver. Téc. Claudio de Cicco. Brasília. Universidade Brasília, 6ª ed. 1995. p. 49.
37
Como podemos observar o entendimento de nosso ordenamento pátrio, é
que a norma especial prevaleça sobre a norma geral:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE PARCELAS PAGAS. ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. RELAÇÃO DE CONSUMO. PRAZO PRESCRICIONAL. ANTINOMIA. CRITÉRIO DA ESPECIALIDADE. NORMA ESPECIAL PREVALECE SOBRE NORMA GERAL. APLICAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL PREVISTO NO CÓDIGO CIVIL. OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO. DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. 1. Ainda que no caso em tela se verifique uma relação de consumo que possibilita a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, a legislação consumerista dispõe de maneira genérica sobre o tema, ao passo que o Código Civil possui uma norma que determina de modo específico sobre a prescrição em casos de ressarcimento por enriquecimento ilícito, restando claro, pelos critérios de solução de conflitos de normas, que o prazo a ser aplicado é o do Código Civil. (TJ-PR - AC: 6382421 PR 0638242-1, Relator: Denise Hammerschmidt, Data de Julgamento: 06/07/2010, 7ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ: 445) (g.n.)52 APELAÇÃO CÍVEL. SUCESSÕES. INVENTÁRIO. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE RECURSAL DA FAZENDA PÚBLICA. FISCAL DA LEI. REJEIÇÃO. MÉRITO: INÉRCIA DO INVENTARIANTE. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO COM FUNDAMENTO NO ARTIGO 267, INCISO VI, CPC. INADMISSIBILIDADE. REMOÇÃO DO INVENTARIANTE. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 995, INCISO II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. NORMA ESPECIAL PREVALECE SOBRE NORMA GERAL. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA. PRECEDENTES. CONHECIMENTO E PARCIAL PROVIMENTO. - Na qualidade de fiscal da lei a Fazenda Pública possui legitimidade para recorrer nos autos de inventário. - Quando o inventariante não der regular andamento ao processo de inventário, deve ser este removido e substituído, em observância ao artigo 995, inciso II, do Código de Processo Civil, preponderando esta norma especial sobre a geral do artigo 267 do CPC. (TJ-RN - AC: 8423 RN 2010.000842-3, Relator: Des. Amílcar Maia, Data de Julgamento: 10/08/2010, 1ª Câmara Cível)(g.n.)53
Partindo dessa premissa, pelo critério da especialidade das normas, deve
prevalecer o dispositivo para aplicação da Lei 9.099/1995, que não permite a
aplicação de Intervenção de Terceiros nos Juizados Especiais Cíveis, devendo
prevalecer sobre o artigo 1.062 do Código de Processo Civil de 2015, uma vez que a
lei que regula os juizados especiais é de caráter especial.
52 Site Jus Brasil. Disponível em: < https://tj-pr.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/19482104/apelacao-civel-ac-6382421-pr-0638242-1> Acesso em 05 de Novembro de 2017. 53 Site Jus Brasil. Disponível em: < https://tj-pr.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/19482104/apelacao-civel-ac-6382421-pr-0638242-1> Acesso em 05 de Novembro de 2017.
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Devendo ressaltar ainda, que os princípios norteiam o Ordenamento
Jurídico Brasileiro, tendo essa afirmação como verdadeira, e trazendo para
aplicação nesse contexto, salientamos a necessidade de prevalecer o princípio da
Celeridade Processual, uma vez que é um dos princípios basilares dos Juizados
Especiais Cíveis. Vejamos julgados a seguir com tal entendimento:
JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS. PROCESSUAL CIVIL. HOMOLOGAÇÃO DO PEDIDO DE DESISTÊNCIA ANTES DO OFERECIMENTO DA CONTESTAÇÃO. COMPATIBILIDADE COM O PROCEDIMENTO ESPECIAL DOS JUIZADOS CÍVEIS ONDE PREVALECE OS PRINCÍPIOS DA SIMPLICIDADE, INFORMALIDADE, ECONOMIA PROCESSUAL E DA CELERIDADE. ENUNCIADO Nº 90 FONAJE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. 1.Mostra-se correta a sentença do julgador que, após ver frustrada a tentativa de conciliação, na audiência de instrução, defere pedido do autor e extingue a ação, sem ouvir a parte contrária, já que isto só se faria necessário se já apresentada resposta, o que ainda não se dera, sendo o pedido de desistência formulado antes do momento de exibição da resposta, o que é feito em sessão de instrução e julgamento, a qual sequer iniciou. 2.Ainda que houvesse necessidade de ser ouvida, nenhum prejuízo teve o recorrente com a decisão, uma vez que mesmo que fosse vencedor não poderia postular honorários, custas e pena por litigância de má-fé, por não ter direito a nenhuma destas rubricas. Ademais o pedido contraposto pode ser apresentado em ação autônoma. 3.Sobre o tema, outro não é o entendimento cristalizado no enunciado nº 90 do Fórum Nacional dos Juizados Especiais Cíveis - FONAJE: "A desistência do autor, mesmo sem anuência do réu já citado, implicará na extinção do processo sem julgamento do mérito, ainda que tal ato se dê em audiência de instrução e julgamento". 4.Inadmissível, assim, que o réu queira prosseguir na demanda, ante pedido de desistência do autor, sendo certo que tal não aproveita ao réu sequer no tocante a verbas sucumbenciais, que inexistem nos Juizados Especiais, exceto em sede de recurso inominado (Lei nº 9.099/95, arts. 54 e 55). 5.A extinção do processo antes do oferecimento da contestação, mediante homologação de pedido de desistência do autor, é plenamente compatível com os princípios da simplicidade, informalidade, economia processual e da celeridade que orientam os processos nos Juizados Cíveis (Lei nº 9.099/95, art. 2º), eis que o fim colimado em tais processos, também nos termos da lei, é a conciliação ou a transação sempre que possível. 6.Ademais, a jurisprudência entende que o rito processual aplicado aos Juizados Especiais é o sumaríssimo, o que descarta a aplicação subsidiária do art. 267, § 4º, do CPC, que diz respeito ao rito ordinário. 7.Recurso conhecido e desprovido. Sentença confirmada pelos seus próprios fundamentos. 8.Condeno a parte recorrente ao pagamento das custas processuais adicionais, se houver, e deixo de arbitrar honorários advocatícios, ante a ausência de contrarrazões. 9.. A súmula de julgamento servirá como acórdão, conforme regra do artigo 46 da Lei dos Juizados Especiais Estaduais Cíveis e ainda por força dos artigos 12, inciso IX, 98, parágrafo único e 99, do Regimento Interno das Turmas Recursais. (TJ-DF - ACJ: 20150310060405, Relator: ROBSON BARBOSA DE AZEVEDO, Data de Julgamento: 21/07/2015, 3ª Turma Recursal dos
39
Juizados Especiais do Distrito Federal, Data de Publicação: Publicado no DJE : 01/09/2015 . Pág.: 518)(g.n.)54 RECORRENTE: PEDRO RIBEIRO DA SILVA FILHO RECORRIDO: SULAMERICA SAÚDE VOTO EMENTA NA FORMA DO ART. 46 DA LEI 9.099/95: PROCESSO CIVIL - AUSÊNCIA DO AUTOR NA AUDIÊNCIA INAUGURAL - PATRONO QUE, NA OCASIÃO, TROUXE AOS AUTOS JUSTIFICATIVA MÉDICA PARA SUA AUSÊNCIA (FLS. 63), EMBORA NÃO TENHA REQUERIDO A REDESIGNAÇÃO DO ATO (FLS. 45) - SENTENÇA DE EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO - RECURSO DO AUTOR A ALMEJAR O PROSSEGUIMENTO DO FEITO E SEU JULGAMENTO NO MÉRITO - PRINCÍPIOS DA SIMPLICIDADE, INFORMALIDADE, CELERIDADE E ECONOMIA PROCESSUAL A REGEREM O PROCESSO NO SISTEMA DOS JUIZADOS ESPECIAIS (ART. 2º) - RECURSO A DEIXAR EVIDENCIADO O DESEJO DO AUTOR EM PROSSEGUIR COM A DEMANDA APROVEITAMENTO DOS ATOS JÁ PRATICADOS, MOSTRANDO-SE CONTRAPRODUCENTE A INSTAURAÇÃO DE UM NOVO PROCESSO - CAUSA AINDA NÃO MADURA PARA JULGAMENTO EM SEGUNDO GRAU DE JURISDIÇÃO - PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO PARA DETERMINAR A RENOVAÇÃO DA AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO, INSTRUÇÃO E JULGAMENTO E, DAÍ, O REGULAR PROCESSAMENTO E JULGAMENTO DO FEITO EM PRIMEIRA GRAU. V O T O Nos termos da fundamentação contida da ementa supra e na sentença recorrida, voto pelo conhecimento e provimento parcial do recurso para determinar a renovação da audiência de conciliação, instrução e julgamento e, daí, o regular processamento e julgamento do feito. Rio de Janeiro, 2 de dezembro de 2013. JOÃO LUIZ FERRAZ DE OLIVEIRA LIMA JUIZ RELATOR (TJ-RJ - RI: 00046278920128190206 RJ 0004627-89.2012.8.19.0206, Relator: MARCIA MACIEL QUARESMA, Segunda Turma Recursal, Data de Publicação: 11/04/2013 14:20)
Dessa forma, quanto ao conflito na aplicação das normas sendo eles, o
art. 1.062 do novo CPC e o art. 10 da Lei 9.099/1995, deve prevalecer a lei especial,
razão pela qual se pode garantir a impossibilidade de aplicação do incidente de
desconsideração da personalidade jurídica não poderá ser utilizado no procedimento
do Juizado Especial Cível.
54 Site Jus Brasil. Disponível em: < https://tj-df.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/226713467/apelacao-civel-do-juizado-especial-acj-20150310060405> Acesso em 05 de Novembro de 2017.
40
CONCLUSÂO
O presente trabalho teve como intenção, demonstrar a evolução da teoria
da desconsideração da personalidade jurídica, demonstrando sua aplicação nos
primeiros casos e sua evolução no decorrer do tempo, deixando de ser apenas uma
teoria e passando ser regulada pelo ordenamento jurídico brasileiro a partir do artigo
50 do Código Civil. Traz também o surgimento da teoria no Brasil, e seus primeiros
adeptos, seus primeiros julgados, e como foi importante a aceitação da teoria.
Demonstrando também sua aplicabilidade no direito processual como
modalidade de intervenção de terceiros, incidente processual, estando disposto nos
artigos 133, 134, 135, 137, entre outros
Apresentou como ficou sua aplicação, visto que anteriormente só era
possível via jurisprudência. Demonstrou ainda as teorias defendidas pelos
doutrinadores, seus posicionamentos quanto a sua aplicação e como deveria ser
seu processamento, uns defendiam a necessidade de haver o ajuizamento de uma
demanda independente, outros defendiam o contrário, ou seja, devendo ser aplicado
como incidente processual. Sendo essa última a adotada pelo atual Código de
Processo Cilvil, devendo ser aplicada de forma incidental no processo, possibilitando
a suspensão da demanda principal, sendo fortemente defendido o direito ao
contraditório e ampla defesa, sendo ainda possível aplicar a desconsideração da
personalidade jurídica desde a petição inicial.
Demonstrada a importância do instituto, passou-se a analisar uma de
suas principais conseqüências de sua aplicação, destacando a o artigo 1.062 do
código de Processo Civil, que salienta a necessidade de aplicação de intervenção de
terceiros nos juizados especiais cíveis, indo de encontro com a lei 9.099/1995, que
regula os juizados e o princípio da celeridade Processual.
O incidente de desconsideração da personalidade jurídica, tal como
previsto no novo CPC, é uma modalidade de intervenção de terceiros, e como tal,
tem sua utilização vedada nos processo submetidos ao procedimento do JEC, por
expressa disposição legal. Muito embora o novo CPC dispor, no art. 1.062, que o
indigitado incidente tem aplicação no JEC, a proibição contida no art. 10 da Lei
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9.099/1995, que é lei especial e prevalece à norma geral do CPC, constitui uma
barreira intransponível para sua aplicação.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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