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    CRÔNICA e não HISTÓRIA de Ilhéus.

    Atente bem o leitor nesta advertência, para desculpar-me as minúcias, aparenteinsignificância e iteração dos assuntos tratados. Este livro não pretende ser mais que umacervo de material para o vindouro historiador da velha Capitania com que “o gotoso esoros D. João III”, presenteou o escrivão da sua real fazenda, Jorge de FigueiredoCorreia, gleba que se inscreve hoje no rol das mais futurosas, adiantadas e ricas denossa terra.

    Dr. João da Silva Campos

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    Ilhéus

    Ilhéus é uma esperança permanenteVoltada para o azul sem fim dos mares.È a Princesa do Sul, proclama, crente,Quem lhe sabe a doçura dos seus lares.

    Ilhéus é uma certeza que o Presente,Sacerdote do tempo --em seus altaresOferece ao futuro onipotente,Visão maravilhosa dos palmares!

    Ah! Quantas seduções Ilhéus encerra!E o peregrino, seduzido, anseia.Desvendar-lhe os encantos da cidade...

    E antes que o peregrino alcance a terra,

    Unhão...Pontal... A terra amiga o enleiaNum amplo abraço de hospitalidade!

    MELO BARRETO FILHO

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    Teobroma

    Cacaueiros do Sul atua espessa câmara.Polícroma, tem uns rótulos luzentes.Cor de gema,Cor de bronze,Cor de tâmara,Que avisa ao mundo essas forças dormentes!...Na dança eterna das tuas folhasBamboleia, entre a esmeralda, e o bístre, o teu ouro de lei:O teu pomo-moeda,Fruto que és teia,Onde a Pátria urdirá as bandeiras da grei!...—Teus troncos caprichosos,Tatuados e tortosComo a sucuri

    Que dorme na folhagem seca,Junta à fruta pecaQue eu vi, são os esteios mortos.Desse docel,Dessa onda verde de riquezaQue cresce. . .E cresce. . . e cobre a redondeza. . .e avassala os ilhéus! . . .—Cacau, tu que alimentas os deuses. . .recebe, sim, Cacau,os meus adeuses! . .Enchendo a concha das mãos,dos teus grãos,tenho a fé e o prazer

    de saber,Cacau,que não és só a opulência dos grandes. . .pois que não és mau. .pois que também expandescom o teu valor,

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    I

    O BRASIL ABANDONADO. RESOLVE-SE A SUA COLONIZAÇÃO.QUINHÕES EM QUE FOI DIVIDIDA A COSTA. A CAPITANIA DE JORGEFIGUEIREDO CORREIA. RESUMO DOS TERMOS DA DOAÇÃO. LIMITES.EXPLORAÇÃO DO LITORAL. TOPONÍMIA PRIMITIVA. EXCELÊNCIAS DATERRA.

    O abandono votado pela coroa lusitana às terras da Santa Cruz nos tempos quese seguiram de perto ao descobrimento de Cabral é de uma só maneira explicado portodos os historiadores: Portugal achava-se deslumbrado pelas riquezas das Índias, pelaopulência dos seus reinos, pela magnificência das suas cidades, pela abundância dosseus ótimos produtos cuja exploração prometia lucros incalculáveis ao erário real.

    Depois de ouvir as informações que sobre a presumida ilha lhe trouxera ocapitão da esquadrilha exploradora de 1501, el-rei Dom Manoel concluiu pela nãoconveniência de distrair recursos aplicáveis na conquista e ocupação das maravilhosaspargens do oriente remoto para colonizá-la. Mas não era somente, não lhe covir. Era-lhetambém dificílimo fazê-lo, pois a conservação das terras indostâncias estavam a exigir-lhe esforços ingentes e contínuos, tendo nelas empenhados quase todos os seus navios ecopiosa gente de guerra, além de numeroso funcionalismo e clerezia, quedemasiadamente pesavam sobre sua fazenda (1).

    Chegavam as frotas da Índia e Lisboa pojadas de pimenta, cravo, canela,sândalo, âmbar, anil, peles, tapetes, sedas, cambraias e outros panos de preço, marfim,porcelanas, gemas, ouro, pérolas, ébano, cânfora, bórax, almíscar, cera, laca, elefantes,cavalos, árabes, e o mais. O que tudo prontamente e por altíssimo preços. Que lheoferecia o descoberto cabralino? Pau-brasil, canafístula e papagaios (2).

    Logo a partir de 1501 sucederam-se viagens oficiais de reconhecimento da costabrasílica, assim como perlustraram-na expedições particulares em busca de especiarias,

    e na indagação de metais finos. bem depressa, porém, verificou-se que até hoje ignoradocabo da primeira exploração fora verídico nas suas informações. Então se arrefeceu emPortugal o entusiasmo despertado pela notícia do feliz sucesso do senhor de Belmonte.

    Quatro ou cinco anos depois, resolveu a coroa arrendar a terra a cristãos-novos.E, sem demora, armadores não autorizados partiram do reino a competirclandestinamente com os concessionários do tráfico do lenho vermelho.

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    pela corte lusitana a Francisco I, nem a pertinaz e impiedosa caça que lhes davam asarmadas de guarda-costa, notadamente a de Cristóvam Jacques, nem as severíssimas

    lições que lhes ministravam Martim Afonso de Souza e seu irmão Pedro Lopes, foi estaobstinada freqüência a causa do rei Venturoso convir em que o único meio de tornarefetivo e exclusivo o domínio lusitano no Brasil, ocupando e povoando a terra,simplificando assim a tarefa de afugentar os intrusos no arquipélago dos Açores. Conta-se mais que, sabendo el-rei por uma carta vinda de Espanha em 1530, do regresso deSebastião Caboto à Península com a novidade do descobrimento do Rio da Prata, emcujo curso superior se propalava existirem inexauríveis riquezas minerais, decidiu-sefinalmente a por em prática a medida.

    Cumpre lembrar que Martim Afonso de Souza já viera investido da dupla oabandono do Brasil por Dom Manoel -ele próprio vai contraditar o que escreveraanteriormente a tal respeito na sua História dos Brasil, apresenta nas Notas de umestudante, capítulo em que estuda “o primeiro povoamento do Brasil”, uma novaexplicação ou interpretação do procedimento do felizardo monarca: parecia-lheimprudente ou precipitado lançar-se à empresa de colonizar a sua possessão americanasem ser resolvida primeiramente a questão aberta com o meridiano de Tordesilhas, e

    “logo que foi resolvida a pendência a colonização começou com as primeirascapitanias” Segundo se vê, é tese original e plausibílissima, que vem por abaixo quantose há dito até hoje sobre a matéria.

    A primeira vez que, em escrito, manifestou el-rei Dom João III a resolução dedividir o Brasil em capitanias, a fim de povoá-lo mais fácil e rapidamente, foi quandotraçou a carta dirigida, em 28 de setembro de 1532, a Martim Afonso de Souza. Esta, desua vez, inspirada em outra que lhe escrevera de Ruão, nas calendas de março domesmo ano, seu arguto embaixador em Paris, o doutor Diogo de Gouveia, que desde1527 vinha-lhe martelando o ânimo para pôr o plano em execução. Alarmadoencontrava-se o operoso diplomata com a disposição dos armadores franceses,encorajados pela tácita aquiescência d'el-rei cristianíssimo de não interromperem assuas inconcessas excursões aos domínios de Portugal nesta banda do Atlântico (3).

    Eis o trecho mais expressivo de tal carta:

    – “A verdade era dar, Senhor, as terras a vossos vassalos,

    “que três anos há que si V.A. (4) as dera aos dois de que vos falei: a saber“o irmão do capitão da Ilha de São Miguel, que queria ir com dois mil“moradores lá a povoar, e de Cristóvam Jacques com mil, já agora hou-

    “vera quatro ou cinco mil crianças nascidas, e outros moradores da terra“casados com os nossos, e é certo Qua ápos estes houveram de ir outros “moradores, esi, Senhor, vos estrovaram por dizerem que enriqueceriam muito...Quando os vossos

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    donatários, indivíduos da Segunda nobreza do reino. Alguns deles já haviam militado naÍndia em, pois, eram veteranos da arriscada e afanosa vida das conquistas.

    Interessa a esta crônica tratar somente do quinhão que denominou Capitania dosIlhéus, doado pelo tenebroso Zelator Fidei a Jorge de Figueiredo Correia (6), fidalgo decasa real, escrivão da sua fazenda e seu historiógrafo, dos Figueredos chamados “doescrivão da fazenda”, - portanto herdou o oficio, - sendo a carta de doação assinada emÉvora a 26 de junho de 1534, e o floral, fixando “os direitos, foros e tributos e cousasque na dita terra haviam os colonos de pagar”, de acordo com os termos sacramentaisdo documentos, em 11 de março do milésimo seguinte, firmando também naquelacidade (7).

    Baltasar da Silva Lisboa, na sua Memória sobre a Capitania dos Ilhéus (8),compendia assim a carta de doação do feudo de Jorge de Figueiredo, a este expedidapor desejar el-rei premiar-lhe os serviços à coroa:

    “fez-lhe doação para sempre de juro e herdade, e para seus filhos, netos,“herdeiros e sucessores assim descendentes, como tranversaes e colaterais“de cincoenta léguas de terra... chamando-lhe governador e capitão

    “delas, com faculdade de por ouvidores e justiças com alçada até morte“natural nos peões, pessoas de baixa condição e índios, e pessoas graves“a dez anos de degredo, com mui amplíassimos privilégios conteúdos no“floral que lhe concedeu, assim para o governo econômico e político, como“para a cultura, e aumento da Capitania e sólidos interesses do doado,“com as rendas estabelecidas na metade da dízima do pescado, e redízima“do que à Ordem de Cristo e ao soberano tocasse, vintena do pau brasil“que fôsse para o reino, e vinte e quatro escravos que permita poder

    “anualmente remeter em seus navios ao porto de Lisboa, por marinheiros“e grumentes todos os escravos que bem quizesse, contato que estes índios“haviam de voltar para a Capitania, dando-lhe outrossim as rendas das“alcaidarias, e dos substabelecimentos de moedas privativas para engenhos“de açúcar, salinas, aforamentos nas dez léguas, que além da doação da“Capitania se lhe concedeu, sendo isentos assim elas, como os moradores“de pagarem quaisquer tributos, fintas, saboarias, sisas, ou outros alguns

    “direitos, à exceção dos estabelecimentos no foral.”Outras minudêncais que merecem conhecidas. Eram-lhe facultados poderes de

    fundar vilas, não distando estas menos de seis léguas entre si. As justiças d'el-rei nãoteriam alçada de espécie alguma dentro do feudo. Reservava o monarca para si todo opau-brasil que se tirasse, e que devia ser levado à casa da Mina, em Lisboa. Além disso,

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    Por sua vez, a carta régia de 7 de outubro de 1534, fazendo doação da capitania ePorto Seguro a Pero do Campo Tourinho, estatuiu apenas que o quinhão começaria ao

    norte, onde acabasse as cinqüenta léguas de que el-rei tinha feito mercê a Jorge deFigueiredo Correia. De tal sorte nenhuma balisa natural, nenhum limite preciso ficouestabelecido entre os dois senhorios. Isso quanto ao linde meridional. No que tange aosetentrional, aquela “ponta da bahia de Todos os Santos, da banda do sul”, também nãofoi extrema claramente definida.

    Governador Mem de Sá, houve relativamente ao ponto exato onde se deveriaconsiderar terminada a extinta donatária d'“O Rustição”, e começaria a do historiógrafod'el-rei Dom João III. Isso provocado pela cobrança dos dízimos do pescado que secolhia naquelas águas. Então Braz Fragoso, ouvidor geral e provedor-mor da fazendareal do Estado do Brasil, lavrou sentença, confirmada pelo governador, determinandoque a Capitania dos Ilhéus começaria do extremo norte da ilha de Tinharé, por ser aí olimite meridional da bahia de Todos os Santos (11). Decisão que nem sempre foiacatada. Tanto que alguns donatários concederam sesmarias na costa ao norte daquelailha, depois de tal sentença. Ao passo que outras eram concedidas no mesmo litoral pelogovernador geral. Em 1675, por exemplo, certo Amaro da Cruz possuindo uma légua de

    terra da barra do Jaguaripe para o sul, pediu ao visconde de Barbacena que lh'aconfirmasse (12). Contrariamente, dez anos antes era feita aí cessão duma sesmaria pelodonatário. E já em 1600, Paulo de Argolo obtivera uma sesmaria de poder real no rioJequiriçá, declarando-se que este rio pertencia à capitania dos Ilhéus (13). Finalmenteuma provisão de 1969 determinou que o dito rio fosse considerado raia de Ilhéus com aBahia.

    O Livro que dá razão do Estado do Brasil, escrito em 1612, menciona “a pontada Barra do Jaguaripe”, que é a atual Ponta do Garcez, como tal limite (14). Na opinião

    de Vilhena (15) devia ser mesmo tal apófise da costa a bilisa norte da donatária. E Brazdo Amaral assim o afirma em uma das suas preciosas anotações à obra de Accioli (16).Não é de parecer diferente Aires de Cazal escrevendo que o limite em apreço era a“embocadura de rio Jaguaripe, fronteiro à ponta meridional da ilha de “Itaparica” (17).

    No que tange à divisa com a capitania de Porto seguro há o seguinte. Em suaCrônica (18), publicada em 1663, diz o padre Simão de Vasconcelos que ainda nãoestava demarcada a linha de confinação das duas capitanias, asseverando entretanto, que

    ambas se encontravam no porto e rio de Santa Cruz, cerca de três léguas ao norte da vilade Porto Seguro. Tal rio não é outro senão o Sernambitiba, que também tem sidodenominado João da Tiba, com semelhante extrema o porto de Poxim, um pouco aonorte da embocadura do, rio Padro. repete assim Felisberto Freire (20), segundo o qualas terras de Pedro do Campo Tourinho vinham “até a barra do rio Poxim, na altura de15°”. Labora o historiógrafo sergipano em erro que o historiador paranaense endossou.

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    “de Belmonte, sendo hoje este lugar conhecido por --barra “velha”.“Desta questão voltar-se-á a tratar na presente crônica.

    Felisbelo Freire, além da opinião que expendeu sobre o assunto, transcreve noseu livro (23) um manuscrito do Instituto Histórico, no qual se lê que o território deIlhéus ia até o Peso. Neste papel se inspirou o escrito do dr. Salustiano Viana. Já em1612 consignava o Livro da Razão do Estado o contérmino pelo “rio Grande junto aorio Patipe” (24) Frei Vicente do Salvador, na sua História (25), concluída em 1627,aponta a mesma fronteira: - “no rio Grande, onde parte com a Capitania dos “Ilhéus”.Aires de Cazal repete esta opinião (26).

    As denominações primeiramente aplicadas aos maiores rios, do litoral da Terrade Vera Cruz, assinaladas no mapa do genovês Canerio (1502) e reproduzidasintegralmente na carta marinha do alemão Martim Waldezeemueller (1516) são devidasa viajantes desconhecidos, conforme opinião do douto jesuíta padre J.B. Halfemeyer(27).

    Reconstituindo a toponímia da costa entre a bahia de Todos os Santos e o Rio deJaneiro, até 1535, diz Eugênio de Castro (28) que o dr. Duarte Leite (29), de acordo

    com os portulanos de Canerio e Ruysch, que estudara profundamente, - só nosinteressará a parte referente à Capitania dos Ilhéus -interpreta assim a onomástica dosrios seguintes, assinalados nos ditos mapas: “rio Santiago”, o Una de Valença ou oJequiricá, ou o Camamú; “Rio S. Agostinho”, o de Contas (30); “rio Santa Helena”, oComandatuba, ou Poxim, ou Una; “rio (dos) Sexmos” ou “dos Cosmos”, o Pardo; “riodas Virgens”, o Jequitinhonha, Orville Derby, continua Eugenio de Castro, outro grandee sábio perito da nossa cartografia antiga, identificou-os assim em Os Mais AntigosMapas do Brasil: “rio S. Helena”, o dos Ilhéus (Cachoeira); “rio de Cosmos”, o Una

    Mirim; “rio das Virgens”, o Padro; “Rio S. Joham”, o Jequitinhonha.Agora, a opinião do erudito comentador e interpretador do Diário de Navegação:

    “julgamos que em 1531, quando Martins Afonso por ali passava e pouco“depois pela carta de Viegas, se poderia obter o seguinte quadro de iden-“tificação dessa costa: “rio de Joham Guyo”; o Jaguaripe, o Jequiricá,“ou o Una, sendo que este deverá ser o Tynhaarea, de Pero Lopes; “rio

    “da Praya”; o Serinhanheen ou o Acaraí; rio Santagostinho; o de“Contas; “serra alta” “: a Serra Grande;” g. da praya”, (Reinel) ou“Abahia” (Viegas): rio S. Jorge dos Ilhéus, ou foz do rio Cachoeira;““rio das Ostras”: ou “Sta. Lena” (Carnerio): o Comandatuba, ou o Po-“xim; “rio dos Cosmos”; rio Padro; “rio das Virgens” “(reinel)”, “rio“das Voltas”(Viegas): “rio Jequitinhonha”(31).

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    Atlântico, à parte o São Francisco. Clima propício. Águas copiosamente abastadas desaboroso pescado. Mangues profusamente habitados de mariscos “Terra fértil, amena,

    regadia, capaz de grandes canviais, de “paus preciosos, brais, jacarandás e saçafrás”,proclamaria mais tarde Simão de Vasconcelos (33). O gênio que povoava a região, ostupiniquins, ramo da grandes nação tupi, era dócil e bom.

    Eis as características naturais da porção do solo brasileiro, cujo esboçocronológico se pretende fazer neste trabalho.

    _________________________________

    (1) – Do Brasil, apenas descoberto, ninguém cura: são demais as terras para tãopouca gente, e o minotauro da Índia devora todas as forças e absorve todas as cobiças.(Oliveira Martins. O Brasil e as colonias, p. 15).

    (2) – Cabral descobriu o Brasil, e as narrativas do seu emissário levaram DomManoel a enviar uma expedição exploradora. Esta não encontrou o que esperava etronando ao reino, falou desdenhosamente de uma terra de brasil, de canafistula e depapagaios. Por esse tempo chegou João da Nova a Portugal, contando maravilhosas demalaca, a terra da especiaria. (Capistrano, O Brasil no século XVI, p.60).

    Pau de tinta, papagaios e bugios, era tudo que se podia trazer da terra de gentenua, misérrima, e uma costa aparcelada, de correntezas e ventanias abertas,grandemente difícil de navegar; o sertão guardado por hordas de selvagens, de feras e debicharia sem conta. E a Índia a desfazer-se em especiarias caras, em jóias e pedrarias,alfaias e relíquias de civilização velhas e adiantadas.! (Zeferino Candido, Brazil, p. 323)

    ...sendo então a principal ocupação dos Portuguêses as cousas da Índia, pela suagrande importância, tinham-se as do Brasil em nenhuma consideração, porque o seuproveiro se esperava da grangearia da terra, que do comercio da gente, por der bárbara,

    inconstante e pobre. (Francisco de Andrade, Chronica d’El-Rei D. João III nasanotações do Braz do Amaral às Memórias, de Accioli, I, p. 245).

    (3) – Diz Varnhagen (Hist. do Br., p.154) que pelo menos desde 1516, haviamsido dadas algumas providencias em favor da colonização e cultura do Brasil.

    (4) – O soberanos de Portugal, só tiveram o tratamento de majestade a partird'el-rei Dom Sebastião, que tomou para si. Tinham até então o de alteza. E, em temposmais recuados, o de mercê, primeiro, o de senhoria posteriormente.

    (5) – Rio Branco Ephemerides, p.154.(6) – Lê-se em Vilhena (II, p. 511) o acréscimo e Alarcão feito ao seu nome.Não é exato. O filho terceiro de Jorge era quem usava tal apelido. Possui-a, porém, porvia materna: sua mãe, natural de Castela, chamava-se Catarina de Alçarcão (Hist. daCol. Port. do Brasil, 3°, p. 105). Foi doméstica da rainha Dona Catarina, que a criou.

    (7) – Borges de Barros insere as datas e do foral no seu livro À margem da

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    Col. Port. (III, p. 174, nota 20) se disse constar do livro da chancelaria de D. João IIITer sido aquele documento firmado a 1° de abril do ano em questão.

    (8) – Castro e Almeida, Inventário, V, p. 5 sqs.(9) – Compêndio, p. 32.(10) – Varnhagen calculou a área da Capitania em 7.000 léguas quadradas.Antigamente pertencia a Ilha de Itaparica à Capitania dos Ilhéus, a qual por

    casamento passou dos Ataides em dote para casa de Cascaes e desta para a de Louriçal(Vilhena, II, p. 520). É que, nota B. do Amaral, nas Mem. de Accioli (I, p. 356), DomJeronimo de Ataíde, conde de Castanheira, donatário de Itaparica, falecido em 1669, foicasado com a donatária dos Ilhéus. Com que fundamento se escreveu que a Capitania doParaguassú, doada a Dom Álvaro da Costa, entrava pela terra de Ilhéus?

    (11) –...porque, diz Gabriel Soares, (Tratado, Rio, p. 127), pelas disputas, que dedavam entre os rendeiros das duas capitanias sobre a quem pertenciam os dízimos dopescado, que se deram Mem de Sá e Braz Fragoso quando ouvidor geral e provedor-mórdo Brasil, mandado dar o dito dizimo ao rendeiro da Bahia, por se averiguar estender-seBahia do Morro para dentro.

    (12) – Francisco Vicente Viana, A Bahia Colonial, in Ver. Inst. Geogr. e Hist. da

    Bahia, ns 35-39, p. 24.(13) – Felisbelo Freire, p.25(14) – Anot. de B. do Amaral, cits., II, p. 428.(15) – Cartas, II, p. 511.(16) – O.c., i, pp. 211 e 221(17) – Corografia, II, p. 86(18) – Liv. III, n° 48.(19) – Hist. do Brasil, III, p. 129

    (20) – O. c., p. 175.(21) – Francisco V. Viana, Memória, p. 44(22) – Belmonte e a sua história, p. 57(23) – O. c., p. 175(24) – Anot. de B. do Amral, cits., I, p. 428(25) – Hist. do Brasil, p. 99(26) – O. c., II p. 86

    (27) – As principais representações cartográficas da costa brasileira, p. 303(28) – Diário de Navegação, pp. 165-167(29) – Hist. da Col. Port. II, pp. 432-433(30) – Rio de Contas ou das Contas? Aristides Milton, nas Efemérides

    Cachoeiranas, p. 159, diz em nota: – Digo Rio das Contas e não Rio de Contas, como noentanto é de uso quase geral. O rio aludido não é cheio de contas, nem poderia ser

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    companheiro, aludindo à possibilidade de serem massacrados: – Hoje, meu irmão,iremos a contas.

    (31) – Não deve ser destituída de interesse a apresentação da grafia desses riosnos três mais antigos mapas da costa brasileira, exclusão feita do de Cantino: o deCanerio, e os dopis de Waldezeemuller (1507 e 1516): rio de Sam Jacomo (Canerio), rioS. Jacob ( Wald. 1507), rio de S. Jacob ( Wald, 1516), rio de stº Agustino (Can.), rio S.Augustini (Wald. 1507), rio S. Augustino (Wald. 1516), rio de sta. Lena (Can), rio deS.Lucia (Wald). 1507), rio de S. Lena ( Wald. 1516), rio de sta. Lena (Can), rio deVergine (Can), rio de Virgine (Wald), rio de Sam Ioam (Can.), rio de S. Ionham (Wald.1507), rio de S. Ioa (Wald. 1516)

    (32) – O sul da Bahia, in Ver. do Inst. Geogr e Hist. da Bahia, n° 52, p. 21(33) – O. c., liv. 3°, n° 48.

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    II

    MANDA JORGE DE FIGUEIREDO POVOAR A CAPITANIA. FRANCISCOROMERO E A EXPEDIÇÃO COLONIZADORA. QUANDO FOI A CHEGADA DOFEUDO? O NAUFRÁGIO DA PONTA DOS CASTELHANOS. FUNDAÇÃO DAVILA DE SÃO JORGE. SUA TRASLADAÇÃO PARA A FOZ DO RIO DOSILHÉUS. RELAÇÕES ENTRE OS COLONOS E OS TUPINIQUINS. NOTÍCIASDESTES ÍNDIOS.

    Graças á sua situação privilegiada na corte, não foi difícil ao donatário levantarvultuoso capital para realizar a empresa do povoamento e exploração do feudo que tãobem escolhera, pois estaria mais que qualquer outro candidato senhor das informaçõestrazidas ao reino pelos viajantes, exploradores da costa, e traficantes de brasil (34).

    Na impossibilidade de por-se em pessoa à testa de empreendimento, dado oimportante posto que ocupava, ou, mais acertadamente, não lhe parecendo nemprudente nem necessário abandonar os certos e lucrativos proventos do munus, bemcomo a comodidade da vida cortesã pelos resultados aleatórios dum cometimento árduoem tão remotas e bravias paragens, deu procuração para tomar posse da capitania emseu nome, povoá-la e explorá-la com os títulos e poderes de loco-tenente e ouvidor (35)a certo Francisco Romero (36), castelhano (37),– “muito esforçado, experimentado eprudente”, escreveu Gabriel Soares; “grande cavalheiro, homem de esforço e

    experiência”, assevera frei Vicente; “homem prudente e animoso”, conforme Simão deVasconcelos; “tido por homem bravo, e que lhe parecia completamente circunspecto”,assegura Varnhagen, – o qual embarcando-se com muita gente em forte e bemaprovisionada armada, os homens engajados e as naus afretadas sem que se lheantepusessem dificuldades, graças ao valimento e às relações do donatário (38), veiocolonizar o feudo em 1535, ou 1536. Não se sabe com exatidão.

    Assevera Accioli (39) que Romero saiu da foz do Tejo em 1535. Que foi isso

    por meado do dito ano parece a Rocha Pombo (40). Conforme Galanti (41), nestemesmo ano teve início a fundação da vila de São Jorge. Diz Borges de Barros (42)haver a povoação começado no rio dos Ilhéus em 1535 ou 1536. Conforme se vê, nadahá de positivo a semelhante respeito, patinhando esses autores, como os demais que dofato se ocuparam, no terreno hábil das conjeturas.

    A frota não poderia Ter largado de Lisboa em época anterior à assinatura do

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    antes de fins de setembro, ou começo de outubro de 1535. Na melhor das hipóteses(44).

    Surgindo a expedição colonizadora no lagamar de Todos os Santos, velejou aseguir para o sul, e provavelmente por indicação de Diogo Álvares, foi dar fundo nabahia existente ao norte da ilha de Tinharé.

    Pouco tempo de tal evento, na extremidade oposta da referida ilha desenrolara-seuma tragédia que não deixar de figurar nesta crônica. Em 20 de setembro de 1534partiram de San Lucar de Barrameda duas naus castelhanas, Capitanea e San Pedro, sobcomando de Dom Simão d’Alcaçova e Soutomaior, fidalgo português, gentilhomemacontiado e de boca do imperador Carlos V. Tinha por fim a pequena expedição, quenumerava apenas 250 marinheiros e soldados, transpor o estreito de Magalhães, eexplorar e povoar duzentas léguas de costa ao sul do Peru, até o extremo do continente,que com o título de Província de Novo Leão lhe foram doadas por Isabel de Espanha(45).

    Tanta oposição sofreu a esquadrilha dos elementos, ao penetrar no estreito, queAlcaçova se viu forçado a tornar atrás, refugiando-se no porto da ilha de Lobos, onde astripulações se revoltaram, decapitando-o, bem como os capitães (46). Resolvendo subir

    em busca de São João de Porto Rico, velejaram então dois navios no rumo do norte,perdendo-se em breve de vista. Porque faltassem mantimentos, a tripulação daCapitanea alvorotou-se mais uma vez forçando o capitão aproar para a costa, do queresultou a nau enxorrar nos baixios da ponta da ilha de Boipeba até hoje, por este fato,denominada dos Castelhanos. Era dia de São Felipe e Santiago, 1° de maio de 1535.Escapou-se a gente para a terra nas embarcações de bordo. Bem acolhidos pelos índios,estes, dias depois agrediram-nos à tradição, trucidando-os em mor parte. Apenasdezessete dos náufragos, quais todos flechados, conseguiram escapar-se numa chalupa,

    indo alcançar a bahia de Todos os Santos, onde os agasalhou Caramuru, que se dirigiulogo ao teatro do sinistro drama, topando ainda ali quatro castelhanos vivos. Noventacadáveres jaziam insepultos na praia.

    A 28 de julho seguinte entrava na Bahia a outra nau da esquadrilha, sob ocomando do piloto Juan de Mori. Levou este consigo quatro de seis ou sete dossobreviventes d Capitanea, que se encontravam com Diogo Álvares. Aquele piloto, quedeixou escrita a relação da viagem da esquadrilha do malogrado Simão d’Alcaçova,

    nele registrando preciosas noticias do Caramuru e do que dele ouvira nos vinte e doisdias que permaneceu aqui fundeado, zarpando a 18 de agosto, certamente dariainformação da passagem de Romero para a capitania de Jorge de Figueiredo, se tal játivesse ocorrido, o que não poderia ser senão em data mui recente.

    Prende-se ao naufrágio da nau castelhana é por demais sabido a tradição doSonho de Paraguassu, conseqüente lenda da construção da igreja da graça. Conforme

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    costume usualíssimo entre os navegantes coetâneos, por haver chegado ali em diasconsagrados pelo hemorológio católico ao Apóstolo das Gentes. Em tal condição

    existem dois no ano? 25 de janeiro e 29 de julho. Comemora-se naquele a conversão dosanto, e neste o seu transito. Mas tenha-se em mente que ainda há na folhinha dos outrossantos homônimos de grande vulto do cristianismo, que vem a ser São Paulo, primeiroeremita, em 15 de janeiro, e São Paulo, bispo de Constantinopla, em 7 de junho. Festasantigas estas duas, da mesma maneira que aquelas.

    Se a presunção do cronista é verdadeira Romero deve haver chegado à bahia doMorro de São Paulo num dos dias 15 ou 25 de janeiro, ou 7 de junho. Se a 29 deste,sendo na mesma data comemorando São Pedro, santo popularíssimo, preferi-lo ao

    Oráculo do Mundo para dar nome ao monte. Opine-se pela chegada em janeiro de 1536.Porque não em junho ou do milésimo anterior? Dificilmente podia Ter sido neste mês,afigura-se ao cronista. Para tanto a armada deveria largar do reino já passada a monção,dado que, segundo é lícito admitir-se, só se verificaria a sua partida algum tempo depoisda assinatura do foral, a 11 de março. Então podia ter sido em junho de 1536? Nestecaso a armada abriu as velas ao vento um ano depois de tal assinatura. O que não écrível ter acontecido.

    Repita-se que quanto acaba de ser aventado sobre o assunto não vai além demera suposição. Para se ter base firme seria necessária, antes de tudo, saber quandoapareceu o topônimo nos roteiros, relações e portulanos. No Diário de Navegação, dePero Lopes de Souza, por exemplo, só há referencia á ilha de Tinharé.

    Por lhe parecer adequado o sítio, Romero lançou junto ao morro, ou ainda noteso da elevação, os fundamentos de bem proporcionada vila, a que deu o titulo de SãoJorge, em honra do santo do nome do donatário, metendo ombros á empresa comdecisão, e fatigante labor da gente que o acompanhava.

    Mas, já em andamento a obra, por qualquer motivo se lhe afiguro serinconveniente a situação escolhida, mandando explorar a costa do continente, ao sul dailha, por ver se encontra ponto melhormente apropriado. Então lhe chegaraminformações de como, mais ou menos no centro da orla marítima da capitania, oferecia-se um local que apresentava excelentes condições estratégicas e para o comercio, numpromontório formado pelo mar e por um rio navegável, apresentado pelagoso e abrigadofundeadouro, vigiados os dois pontais da sua barra por sendo morros. Além disso, a

    região circunjante dava aparências de grande fertilidade, tanta a exuberância davegetação que a revestia, sendo ao mesmo tempo abundante de águas correntes. Assimficaria magnificamente ubicada a vila (49).

    Apressou-se Romero em transladar-se para ali, a povoação no cimo dummorrete, – o hodierno morro se S. Sebastião, – alçado á esquerda da barra do rio deIlhéus, na bahia do mesmo nome, de quatro deles, Grande, Itapitanga, Rapa e Itaipins,

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    O loco-tenente de Jorge de Figueiredo tratou imediatamente de construirfortificações para impedir os assaltos dos índios. Teriam sido, por certo, simples

    estacadas ou paliçadas (54). Bem como de fabricar paralelamente habitações pra oscolonos “de madeira cortada a dois passos” e cobertos de folhas de palmeira brava e desapé, ou de palmas, “das muitas que bordavam” (55).

    “A construção era feita em desordem... com o aumento das casas formavam-seruas tortuosas, becos e vielas, que demonstravam, e ainda hoje” demonstram em todopaís o pouco caso dos que só se preocupavam ‘com a fortuna rápida, que devia sergozada mais tarde em Portugal, em quintas e castelos’ (56).

    No centro da povoação, uma capelinha (57) do santo epônimo da vila, que não

    poderia ter a mesma ubicação da atual igreja catedral provisória, se o primitivo sítio donúcleo estava sobre o morro de s. Sebastião.

    Definitivamente instalada a sede da capitania, que ficou desde então conhecidapor são Jorge dos Ilhéus (58), Romero, depois de remover com perseverança e valorobstáculos mui grandes e multiplicados, dentre os quais avultou a oposição dostupininquins, com os quais acabou fazendo boa e duradoura amizade, pode, enfim, dar-se ativamente e sem mais apreensões á tarefa de distribuir terras aos colonos, nas

    proximidades da vila, animando o estabelecimento de lavouras, e de outros grangeiros.As relações entre o lugar-tenente de Jorge de Figueiredo e os aborígenes sãoexpostas da maneira seguinte pelos autores.

    Rocha Pita (59) afirma que Romero teve de vence a hostilidade dos naturaisantes de fundar a vila”e superadas muitas dificuldades novas resistências

    “daqueles bárbaros, com os quaes depois assentado pazes, a aumentou“em todo o gênero de fábricas do Brasil.”

    Segundo o autor da Corografia Brasílica (60), Romero viveu em guerra com osindígenas nos primeiros anos. Mas, porque fossem eles de índole branda, ao contráriodos outros da costa, passados tempos se tornaram amigos.

    Pensa Accioli (61) que um espanhol era pessoa inidônea para colonizar trrashabitadas por índios, pondo logo em prática o regime das violências, sem ter o cuidadode alicerçar a existência e o progresso da colônia sobre fundamentos sólidos, que lhe

    garantissem promitente futuro. O exemplo dos bons costumes, a prática de uma políticacapaz de impor-se a simpatia dos aborígenes foram relegados ao esquecimento,dominados por europeus pela ambição de enriquecer com a menor soma de esforçospossível. Semelhante atitude impedia-os ao “emprego de todas as vexações conta osnaturaes, que lançando mão do direito natural repeliram corajosamente os seusopressores”, Os tupininquins, especialmente, porque poderosos em arcos e dotados de

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    espaço de tempo. Transformaram-se então os aborígenes em elemento de inestimáveleficácia para os colonizadores, quer, dando-lhes o auxílio do seu braço na feitura de

    casas, abertura de roças, e construção de engenhos, quer prestando-lhes o concurso dassuas armas para a defesa do incipiente núcleo de civilização.Carlos Malheiros Dias, traçando um formoso capítulo da História da

    Colonização Portuguesa do Brasil (64), frisa que em todas as partes do país deram-selutas entre os europeus e os naturais, oriundas as desavenças da imperiosa necessidadepor aqueles experimentada de se utilizarem dos braços destes. E o índio não eraamoldável á sujeição e a disciplina que os intrusos lhe impunham. Mas aqui tais lutasnão tiveram o acirramento e a diuturnidade que se verificaram outras capitanias, o ponto

    de lhes impedir a colonização. Os tupiniquins, – o articulista só se refere a estesameríndios, e à Capitania de Ilhéus, – acabaram por se conformar com a instalação dosbrancos nas suas terras, e por apoiá-los semelhante resultado teria contribuídoporventura”o critério utilitário, aplicado

    “ao estabelecimento de uma colônia que não era senão uma grande feitoria“comercial.Que estes brasis, após haverem guerreado os primeiros colonos com os quais se

    acamaradaram posteriormente, sem violarem jamais as suas relações amistosas, até que,sob a pressão dos tupinambás e dos aimorés, largaram a região que habitavam para seacolher sob a proteção dos jesuítas, assevera Alberto Lamego (65).

    Resumindo informações acima transcritas, e de outros escritores que seria ociosoconsignar aqui, por não conterem matéria nova, escreveu Borges de Barros (66) que osbrandos e domáveis tupiniquins viveram sempre em harmonia com Romero, ajudando-oem todos os trabalhos da fundação da colônia.E persistiram nas mesmas relações pelotempo adiante, do que resultou o progresso da capitania.

    Conforme Gabriel Soares, o rio Jaguaripe, a ilha de Tinharé, e a Costa daCapitania dos Ilhéus estariam povoados á época da colonização por uma horda detupinambás que, habitando primitivamente as bordas orientais do golfão de Todos osSantos, haviam-se malquistado rancorosamente com outra cabilda da mesma nação porcausa de uma mulher, segundo uma tradição que conservaram (67), pelo que emigrarampara Itaparica, de onde moviam crua e porfiada guerra dos novos inimigos.Foram estesdois adversos ramos da grande família tupi que os tripulantes da armada de MartimAfonso de Souza fundeada na bahia, proporcionaram o espetáculo, raríssimo de sertestemunhado por civilizados, duma batalha naval travada entre as suas esguias eligeiras ubás, elevando-se a meia dúzia de milhares de combatentes de ambos os lados.

    Mas a afirmativa de Gabriel Soares é erroneamente contraditada por outroautores. Os tupinambás, dizem, estendiam-se somente até cerca da bahia de Camamu.Daí para o sul, até Caravelas, dominavam os tupuniquins. Esta explicação de

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    (35) – “O ofício, que servia, lhe tolhia ir em pessoa tomar posse da suaconcessão Southey, I, p.72 –”... não podendo vir em pessoa povoá-la, impedindo da

    ocupação que tinha no serviço real “(Rocha Pita, Liv. 3, 76). –”O opulento senhor dosIlhéus não pensara em trocar o seu cargo de escrivão da Fazenda e as comodidades dacorte pelos azares e trabalhos do governo de sua remota capitania. Era um homempratico, habituado a lidar com as realidades, e que tinha experimentada fé no poderdinheiro. De certo acreditou que faria mais e melhor do que seus consortes heréos elavradores. (C.. Malheiros Dias, supra). – Entre os aquinhoados na partilha da AméricaPortuguesa era talvez o único homem que não tinha espírito para empreendimentos detal ordem. Não era homem do mar, nem provável que conhecesse a vida fora do reino.

    Estimado na corte, e sobretudo nos círculos burocráticos, foi-lhe fácil conseguir avaliosa mercê... Não parece, aliás, que fosse um erro confiar-se a alta missão de povoarterras e dirigir populações a um homem que se sentia vinculado à Corte por inestimávelprebenda, ou por dever de ofício. Como escrivão da fazenda real, Jorge Figueiredodispunha, não só de recursos muito importantes, como de grande valimento na corte,condições que o habilitavam a defender lá eficazmente os interesses do vastopatrimônio. Talvez mesmo que este processo de constituir aqui um preposto, ficando o

    próprio donatário lá na metrópole a tomar as providências que erma indispensáveis aodesenvolvimento da colônia, talvez que fosse o meio mais seguro de garantir a sorte dacapitania, desde que o donatário pudesse contar aqui com o concursos de agentes muitocônscios da sua tarefa. Tudo dependia de semelhante fortuna (R. Pombo, III, p. 244,nota 2).

    (36) – Gândavo (História, p. 89), muito mais perto dos fatos que qualquer outroautor, funcionário da Torre do Pombo, tendo portanto facilidade de examinar osdocumentos referentes ao assunto, diz haver Jorge Figueiredo dado semelhante

    incumbência a um João d’ Almeida. Pode-se, pois, admitir com o certo que este foiantecessor de Romero na fundação e direção da capitania. Há ainda outra hipótese aadmitir-se: João d’ Almeida veio comandado a armada, somente. Assim parece a CarlosMalheiros Dias (º C., III, 246).

    (37) –...não repugnando ao donatário a estirpe deste, pois ele próprio casado comuma castelhana e castelhanos haviam em Portugal exercendo as mais elevadas funções;como também em Espanha fizeram carreira portugueses como Príncipe de Eboli e oMarquês de Castello Rodrigo (Pedro Azevedo, in Hist. Da Col. Port., III, p. 206).

    (38) –...com uma frota, provida de aprestos, e moradores necessários para a novapovoação; tudo à custa do senhor da terra (S. de Vasconcelos, Liv. 3º, 53). — fazendogrande despesa de naus, soldados, caes e aprestos (Brito Freire, LIV. 10, nº 822). —Francisco Romero... prepara com o com certo aparato e a sua expedição e parte paraAmérica. Além de abastecida de tudo, trazendo consideráveis provisões de guerra, de

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    aportar ao teatro dos seus infortúnios em 23 de maio do ano que se seguiu (MisaelFerreira Penna, História da Província do Espírito Santo, p.23). Finalmente Dom João III

    assinou o foral da Capitania de Porto Seguro a 23 de setembro de 1534 e seu donatário,Pero do Campo Tourinho, partiu de Viena em fins de dezembro do mesmo ano, ou emJaneiro de 35 (R. Pombo, III, p. 238, nota 4, e p. 239. Nota 1).

    (45) – Francisco de Assis carvalho Franco, Origem dos Camargos de São Paulo,in Ver. Do Inst. De estudos Genealógicos, S. Paulo, nº 1, p7.

    (46) –...o mataram a punhaladas, dez ou doze dos seus, no cabo de S. Domingos,que é antes de chegar ao estreito..., diz Lopez de Gomara (apud Franciso de A. C.Franco, supra)

    (47) – Hist. Da Col. Port. III, p. 246.(48) – A Capitania dos Ilhéus, p. 10.(49) – Quer Rocha Pombo (III, p. 245) que Romero tivesse mandando explorar a

    costa levantando-lhe um esboço de planta com todas as indicações úteis, como estavanos interesses da capitania. Onde o A. leu isso, que parece mera fantasia? O castelhanoignorante e inculto poderia, há em quatrocentos anos atrás, ter um expediente que talveza muito indivíduo culto, hoje, em condições semelhante não ocorresse?

    A bahia que se chamou dos Ilhéus, tanto pela sua amplitude, como pelacircunstancia de estar situada em paragem mais central da capitania, e ainda pelaexcelência de terras que se encontravam naquela parte do continente, ofereceucondições que não se podiam comparar com aquela estreiteza de Tinharé (R. Pombo,III, p. 245).

    (50) – Expressa-se mal o poeta Santa Rita Durão dizendo no seu poemaCaramurú, III, LXXVII):

    A quinze graus ao sul na foz extensa

    De um vasto rio, por ilhéus cortado,Outra província de cultura imensaTem dos próprios nome tomado.O rio não é cortado por ilhéus, que se erguem fora da barra, em pleno oceano.(51) – No mesmo porto, da banda do Sul, se mete no ancorado um rio navegável,

    que hoje se diz cachoeira, depois de dar uma grande volta, deixando formada penínsulaelevada, que remata num pontal mui propriamente denominado Focinho de Cão. Foi nachapada desta península banhada pelo um lado pela ondas do porto e pelo outro pelaságuas do rio, que, q alguma distancia ao Norte do mesmo pontal e do morro que lhe ficaa cavaleiro, Romero e os seus companheiros assentaram a nova capital (Varnhagen,Hist. Ger., p; 257). Em nota (mesma pag), diz o visconde de Porto Seguro que aquelemorro se denominava da Matriz Velha. Este nome faz supor que aí se teria chegado afazer algum primeiro ensaio de povoação; bem que as igrejas de São Jorge e de São

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    (55) – B. de Barros, Memória, p. 86.(56) – A. e o cits., p. 87. O historiógrafo bahiano não está com a razão. Os

    portugueses que construíram vilas e cidades no Brasil não fizeram mais que edificá-las àimagem e semelhança das do seu país, com exceções raríssimas. Não se pode exigir deum povo que transporte consigo para terras estranhas senão os seus costumestradicionais. Não foi por outro motivo que os espanhóis construíram na América suasaglomerações. Não foi por outro motivo que os espanhóis construíram na América suasaglomerações urbanas com as ruas cortadas em xadrez. Porque assim se usava na pátria.

    (57) – Diz Southey (I., p. 72): – Deve a capitania das Ilhas o seu inaplicávelnome... O cônego Fernandes Pinheiro, anotador da obra, traduzida pelo Dr. Luiz de

    Castro, observa em nota: – Nunca se chamou esta Capitania das Ilhas, e sim de SãoJorge dos Ilhéus. Porque Southey avançou semelhante afirmativa? Confiado emBarleus: In praefecturam Insularum... (Revrm., p.52); e em Uakluyt: The Bay of theIslands. (The principal navigations, III, p. 721) e ... as ilhas, The Iles (it, it, p. 787)

    (59) – O. c., liv. 3°, 76.(60) – A. de Cazal, III, p. 87.(61) – O. c., I, p. 162.

    (62) – Inventário, V. p. 4.(63) – O. c. III, p. 246.(64) – Vol. III, p. 246(65) – A Terra Goytacá, p. 17.(66) – Memória, pp. 81 e 86(67) – Anot. Cits. De B. de Amaral, I, p. 168.(68) – O. c., p. 50.

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    III

    INFLUENCIA DA SUBMISSÃO DOSM TUPINIQUIS. PROGRESSO DACAPITANIA. CANA DE AÇUCAR. A SESMARIA DE MEM DE SÁ. LUTAS DEROMERO COM OS COLONOS. BOM SOLDADO E MAU ADMINISTRADOR.DACADENCIA DA CAPITANIA. SUAS CAUSAS. DÚVIDAS DO AUTOR. OSSELVAGENS RETOMAM A OFENSIVA

    Vejo a ser importância marcante para a obra da colonização da donatária deJorge Figueiredo a submissão dos tupiniquins. Auxiliaram-na estes de maneira tãoeficaz, que dentro de pouco tempo era aquele senhorio um dos mais florescentes dacosta brasílica(69), contando já com alguns engenhos de açúcar, pois Romero, mal sevira livre de cuidados, iniciara a cultura da cana, localizando-a na gleba feracíssima das

    margens do rio Cachoeira, onde a gramínea produziu admiralvemente. De tal sorte, foiIlhéus, no Brasil, um dos mais antigos centros desta lavoura. Gabriel Soares escreveumesmo no seu Tratado descriptivo(70) que ali se cultivou primeiramente na colônia,trazida da iha da madeira, ou de Cabo Verde. O que não é verdade, pois desde 1526 jáse expostava açúcar de Itamaracá, em Pernanbuco, para o reino. E desde 1516 el-reiDom Manouel cogitara do estabelecimento dum engenho no Brasil (71). PretendeSouthey (72) que os canaviais do Recôncavo tenham-se originado de mudas trazidas davila de São Jorge.

    A destacada prosperidade da capitania polarizou então as atenções doscolonos das outras donatárias, ao mesmo tempo que, na corte, Jorge Figueiredo semultiplicavam em quanta providência se lhe antolhava útil ao desenvolvimento das suasterras. Não tardou em repercutir nos portos marítimos daEuropa, e particulamente dapenísula ibérica, o feliz sucesso dos portugueses na conquista e exploração daquelaparte do continente americano. Muitos povoadores, — não somente do reino, como dasoutras colônias do litoral brasileiro, e mais que de outras partes, da Bahia (73), —vieram engrossar a população da vila de São Jorge, e dos seus estabelecimentos rurais.Capitalistas e negociantes de Lisboa mandaram fabricar engenhos de açúcar na terra,estabelecendo-se ativo comércio entre a corte e a Capitania (74), ”com o que muito seenpobreceu esta”. Isso é sinoptizado de Rocha Pombo (75) que, segundo a expressãopopular, carregou a mão no desenvolvimento do assunto, dando largas á fantasia. Porexemplo, todos os engenhos que existiam áquela época no distrito da vila de São Jorge,

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    empossar da herança de Mem de Sá, aqui na Bahia, encntrou notícia da concessão feitapor Jorge de Figueiredo, no ano de 1537, — isto é que se ignorava, — ao futuro

    governador e capitão-geral do Estado do Brasil, ”como conta do escrito raso da ditadoação, por virtude da”qual Mem de Sá se meteu logo de posse dele posto que, depoisdo ano de 1544, lhe fez o dito Jorge de Figueiredo a escritura pública.”

    Em nota ao texto, observa Malheiros dias: —”Trata-se evidentementedas”terras de Caramuru, que o Roteiro Geral menciona terem sido doadas por Mem deSá aos padres da Companhia, que as começaram a povoar, despejando-as por ocasiãodos ataques assoladores dos Aimorés”. —”É assim que muito antes de ser chamado àgovernança do brasil, já o desembargador Mem de Sá, amigo do escrivão da Fazenda e

    donatário dos Ilhéus, lá possuía terras: facto até agora pouco divulgado”.Ocupando-se da matéria, diz Baltasar da Silva Lisboa (76) que Jorge de

    Figueiredo, na impossibilidade de obter os lucros esperados de sua capitania, repartiualgumas datas de terra em sesmaria. Mas, note o leitor que a concessão de Mem de Sá éde 1537, quando a colonização do fuedo mal teria contado um ano. Seria possível que odonatário já estivesse desanimado? Esclarece Baltasar Lisboa que a escritura pública dadoação feita ao futuro governador do Brasil tem a data de 19 de março de 1544. Eram

    doados conjuntamente Mem de Sá e Francisco de Betencourt, fidalgo da casa real, aquem sucedeu, por morte, sua viúva, dona Maria da Costa. Esta, por instrumentolavrado na ilha da Madeira, a 9 de fevereiro de 1547, desistiu da parte que lhe tocava nadoação em favor do codonatário. Dezesseis anos depois Mem de Sá, que sempredispensou aos jesuítas quantos favores poude, porque estes religiosos não dispusessemde meios suficientes para a sua manutenção, transferiu-lhe tal sesmaria.

    Fernand’Álvares, o outro sesmeiro, também não veio explorar a dataalcançada. Mas instituiu para semelhante fim um procurador certo Antonio Vaz, que lhe

    proporcionou pingues lucros (77). Do mencionado sesmeiro fala este trecho duma cartade Tomé de Souza a el-rei ecrita da Bahia, em 1551(78): —

    “Fernand’Álvares escrivão da casa da India em tempos passados ajudou“muito a soster esta terra como huma fazenda que cá fez e .. he nisto“gastando muita parte da sua fazenda e sem duvida ...Jorge e toda a“capitania de Jorge de Figueiredo ... se ele nom fôra e no ano tras do“que eu vim gastou muito em mandar esperar a armada de Vossa Alteza“por um seu sobrinho, toda a honra e merecê que lhe Vossa Alteza fizer“nesta terra em verdade que merece, que eu sou testemunha de vista que“em a armada em que eu vim fretou duas naus que vieram armadas em“minha companhia para irem carregadas de brazil, de lincenças que ele tem e“foram de vasio e perdeu nisso dois mil cruzados e além de tudo isso he“homeme da melhor edição que eu vi ante Vossa Alteza: deve de valer

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    raros, era paralelemente como poucos áspero, e supinamente ignorante em matéria degoverno político. Bruto, como se queria um soldado daqueles tempos. Entendia ser a

    colônia um acampamento militar, que se devia dirigir arbitrariamente. Não lhe fossemalegar as ordenações do reino, nem foros, nem privilégios, nem direitos, ou coisassemelhantes, que pouco se lhe dava estarem em uso na monarquia. Sua vontade é que,acreditava, vinha a ser a lei única da colônia. E os moradores não se quiserem submeterpassivamente ao duto jugo do loco-tenente ouvidor, contra foi-se condensado umaatmosfera de animosidade, cada vez mais pesada, até que a tempestade deflagro. Odesastrado homem ficou sozinho. Nem um partidário do seu desgoverno! Motivo estepor que a luta, embora porfiada, foi incruenta.

    Parece a rocha Pombo Ter sido o capitão dos Ilhéus homem digno,circunspecto e honesto. Entretanto os colonos tinha-no por improbo, conforme o leitorverificará adiante. Bastaria a sua qualidade de estrangeiro, observa o historiadorsupracitado(80), para incompatibilizá-lo com os colonos.”Pode-se fazer idéia de comoseria visto pelos portugueses em chefe castelahnos de certo valor e com presunções dehomem poderoso”, — verificar-se-á mais para a frente, segundo carta do ouvidor geralPero Borges, que não passava dum pobre diabo, —”muito amigo e talvez sócio do

    próprio donatário”.”Há de estar sem dúvida por aqui a explicação do desastre”.Outro autor (81) vê no dissídio entre o romero e os moradores um fatousual em todas as capitanias, inferente da falta de respeito à autoridade que nãodispunha de força nem de prestígio para se impor. Exatamente como se passava aomesmo tempo na Ìndia.

    Tanto pesou sobre os habitantes da vila de São Jorge a tirania docastelhano que um belo dia, transbordante a medida dos agravos recebidos, seamotínaram, depuzaram-no e recambiaram-no a bordo duma caravela para o donatário,

    em Lisboa, —”a paixão da liberdade amanhecia cedo no Brasil”! exclama C. MalheirosDias (82), — onde, sob o carregume das acusações dos colonos por falta cometidas nodesempenho do seu ofíco, houve por algum tempo no cárcere.

    Ignoram-se as causa que preciptaram a insurreição do povo da vila de são Jorgecontra donatário (8). Este pouco inteligente como o seu preposto, caprichoso ouorgulhoso, ou ainda, quem sabe, por imposição da corte a fim de não animar outrosprocedimentos iguais no brasil, em vez de consertar meios de por termo aoextraordina´rio grau de desmoralização a que descera a colônia, dando provimento àsrazões dos seus feudatários, entendeu de desprezá-las e prestigiar o seu despóticoprocurador, tornando-o para a donatária. Sucedeu assim quanto ra de esperar de tãodesatinada e impolítica resolução: as dissensões reacenderam-se : desobedeceram osmoradores ás determinações dos ex-hóspedes do limoeiro: retrucou este com abusos eviolências. Eis pertubada de novo a vida da colônia. È agora mais grave a crise, pois já

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    o florentino Lucas Giraldes, que terminou por comprar o feudo. Bem se sabe que Perode Goes, Vasco Fernandes Coutinho e Pero do Campo Tourinho vieram à encontrar-se

    em desoladora a fim de poderem explorar as suas donatárias. Pois justamente ocontrário se verificara em relação à Capitania dos Ilhéus . Mas aqui, no momento maisprecioso, na fase mais delicada da sua Colonização, faltou-lhe um administrador aaltura. Toda a sua prosperidade, decorrente das circunstâncias favoráveis apontadas,desmoronou-se celeremente quando se declarou em crise o prestígio da autoridade, aomesmo tempo incapacitada de reprimir a indisciplina dos colonos, e de conter emrespeito os aborígenes Em tal hora da sua existência, donatária reclamava era um chefeque encarnasse a prevalência e os poderes quase majestáticos da pessoa do donatário,

    simultaneamente exornado dos dotes de administrador e de soldado. Outra conclusãonão se pode tirar dos fatos. Não bastava o critério capitalista que o escrivão da fazendadel-rei Dom Joaõ III aplicara à exploração do seu feudo, desde o momento em que esteprecisava de governo.

    Quem escrever a história de Ilhéus terá de esmerilhar com muita atençãoeste assunto, assaz baralhado pelos autores das relações entre Francisco Romero e oscolonos, e da brevidade do período de florescimentos da Capitania, por culpa do loco-tenente interrompido. È um capítulo que merece inteiramente refundido. Qunato vemsendo relatado nesta crõnica a tal respeito não vai além dum transunto de opiniões naleitura de varhagen, C. Malheiros Dias e Rocha Pombo(84). O cronista, porém, acreditainseguras muitas dessas afirmativas, indumentadas de farto verbalismo e alicerçadassobre escassa documentações, ou meras deduções. Se atender a que, em 1550, conformese vai ver. Romero ainda era loc-tenente ouvidor de Ilhéus, devendo durar mais doisanos o seu governo, já tendo àquela data voltado do reino, — entretando em historiadorde nota, o padre Galanti (85),, escreveu que os moradores tinham-se recusado a aceitá-

    lo de novo: — conclui-se que, fundando a vila em 1535 ou 1536, governou-a por unsdezesseis ou dezessete anos, incluido neste cômputo o espaço de tempo certamentepouco estirado, em que ausente na metrópole. Onde, portanto, a certeza da suaadministração? Será crível que tenha mesmo vivido todos esses anos desavindo com acolônia inteira? Ainda em 1549, ler-se-à adiante, era a vila de Ilhéus terra abastada demantimentos. Em junho de 1553 dizia Tomé de Souza dessa Capitania, em carta a el-rei,que ela era”a melhor cousa desta costa para fazendas e que mas agora rende para siAlteza”(86). Como, pois, a tão propalada desarmonia entre o capitão e os moradoresimportara na morte da sua lavoura?

    O seguinte parágrafo é também compendiado dos autores supracitados.Viviam os aborígenes indomados contidos à distância por temos de

    Francisco Romero que, graças à disciplina militar que fazia imperar na colôniaoferecera sempre inquebrável resistência às algaras dos selvagens. Desde, porém, que os

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    (73) —Só podia ser a Bahia do tempo de Francisco Pereira Coutinho...(74) —As Capitanias de Porto Seguro e Ilhéus estabeleceram comércio regular

    com a Bahia e com a praça de Lisboa. ( B. de Barros, À Marg. Da Hist. da Bahia, 1934,p. 234). Tem cabimento aqui, também, a observação contida na nota anterior.(75) — O. c., III, pp. 104.(76) — Inventário, v. p. 104(77) — Varnhagen, o. c.., p. 257(78) —Anot. Cits. de B. do Amaral, I, p. 316(79) — S. de Vasconcelos, o. c., liv. 3°, 53.(80) — O.c., III, p. 244.

    (81) —Pedro de Azevedo (Hist. da Col. Port. III, p. 206).(82) —O. c., III, p. 248.(83) —Não se sabe quais teriam sido os motivos reais dessa dos colonos contra o

    representante do donatário. (R. Pombo, III, p. 247).(84) —Varnhagen (p. 256), C . Malheiros Dias, (pp. 246, 247-248), R. Pombo

    (iii, p. 244).(85) — Hist. p. 161.(86) — Hist. da Col. Port., III, p. 365.

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    IV

    ESCRAVIZADORES DE ÍNDIOS. BERÇO DE UM DOS MAIS ANTIGOSHERÓIS BRASILEIROS. O DONATÁRIO DA BAHIA. CARAMURU EM ILHÉUS.OS TUPINAMBÁS. MANTIMENTOS PARA A FUNDAÇÃO CIDADE DOSALVADOR. RUMORES DE OURO. FELIPE DE GUILLEM.

    Terra sem rei nem roque a Capitania dos Ilhéus por aqueles évos. Até em ninhode aventureiros e piratas viu-se transformada a vila de São Jorge. No ano de 1548, certoMartim Vaz, nela morador, aprestou um navio que, em companhia de outro aparelhadoem São Vicente, dum Pascoal Fernandes (87), foi a Jurumerim, ou Jurerêmirim, comoentão se denominava a Ilha de Santa Catarina, onde os dois aprisionaram e escravizaramcento e tantos aborígenes dos dois sexos, que estavam sendo catequisados por um fradecastelhano, a fim de vendê-los nas capitanias da costa (88).

    Cerca de três anos antes (89), Henrique Luiz, que foi senhor de engenhoem Ilhéus (90), empareceirado com outros individuos, saiu do Espiríto Santo numcaravalão para fazer resgates no litoral da capitania da Paraíba do Sul, de Pero de Goes.Não se limitando a contravir de semelhante modo as ordens d’el-rei, atraiu perfidamentea bordo um índio principal, de grande reputação na comarca, e o mairo amigo doscristãos que residiam no feusdo, exigindo dos seus, para libertá-lo, avultada remissão.Uma vez alcançado tudo quanto exigiu, ao invés de cumprir a palavra empenhada, foi

    entregá-lo a uma tribo inimiga, que o devorou, só por obter desta bom negócio. Osaborígenes, como perdesem o seu cacique de maneira tão vil, levantaram-se frementesde justa indignação, e arremeteram contra a inicipiente Vila da Rainha, sede dadonatária de Goes, matando três homens, e obrigando os demais moradores a fugirem,abandonando a povoação. Destruíram os engenhos, queimaram as roças e os canaviais,e apossaram-se de toda a artilharia. Numa palavra, deram fim à colônia. (91).

    O desalmado autor dessa felonia e causador do aniquilamento da vila dePero de Goes Henrique Luiz de Espinha, feitor dum engenho do donatário (92), e depoisproprietário talvez do mesmo estabelecimentos, tendo chegado a ser capitão-mor dacapitania. Foi pai de Luiz Álvares de espinha, que levou, uma bandeira ao sertão paracativar índios, e avô de Manoel de Souza d’ Eça, herói da jornada da restauração doMaranhão, tendo batalhado rijamente com os franceses em Guaxenduba. Figura deinconfundível destaque na conquista da Amazônia, este esforçado ilheense pelejou no

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    colonos, indispondo o ânimo dos naturais contra os colonizadores, e que foi uma dasmais fortes razões da criação do governo geral, com assento nas ribas do golfo de Todos

    os Santos. A desmoralização dos costumes dos europeus que, sem feios àssolicitações dos seus instintos, viviam então por estas bandas, ocasionou ainda aperdição do malaventurado donatário da Bahia, Francisco Pereira Coutinho, intrépidocompanheiro de Vasco da Gama, de D. Francisco de Almeida e do grande Afonso deAlbuquerque nas proezas da Índia. Um dos passos deste triste drama desenrolou-se nascapitanias dos Ilhéus e de Porto Seguro, pois nelas se asilou em 1545 (94) odesditoso”Rustição”, seguido da família e dos moradores da povoação do Pereira,

    assento do seu feudo, que se lhe haviam conservado fiéis, além dos do Rêconcavospróximo, onde imprudentemente se haviam estabelecido á mercê dos tupinambás. Pornão poderem mais resistir aos selvagens revoltados, ou melhor, criminosamenteinstigados pelos cristãos gentilizados que entre aqueles andavam, viram-se todos nacontigência de abandonar a terra, fugindo para a vila de São Jorge, onde uns sedeixaram ficar, enquanto outros, inclusive Coutinho, passaram à sede da capitania dePero do Campo Tourinho.

    Havia sete ou oito anos que, depois de Ter queimado dois ou trêsengenhos dos colonos, o gentio os mantinha refugiados na colina de Santo Antonio daBarra”ora cercados ora em tréguas, passando grandes fomes, doenças e milinfortúnios”(95), faltando-lhes até água potável, de que se supriam, bem como demantimentos, na vila de São Jorge, para onde trafegavam continuadamente diascaravelas, em semelhante ocupação.

    Contudo, não foi somente o aperto em que o tinhma os índios econsequente falta de recursos que sofria, a causa de se afungentar Coutinho para as

    capitanias de baixo. Contribui igualmente para tal a maquinação diabólica dum clérigoda missa, fulano Bezerra, —”grão ribaldo”chamou-o Duarte Coelho em carta a el-rei(96), — que havia abandonado a colônia meses antes, com outros descontentes, eaparecia agora numa caravela, dizendo-se vindo do reino, portador dum alvará régioordenado a destituição do donátario. Cumpriada a fala ordem pelas autoridadessubalternas da colônia, importou isso na sua dissolução, tresmalhando-se os moradores,dos quais muitos já se vinham ausentado, desde o momento em que se viramlançamentos em apuros com a ofensiva dos tupinambás, e a desorientada resistência deCoutinho (97).

    Teria Diogo Álvares acompanhado o donatário da Bahia a Porto Seguro?Escreveu-se até que este o levara preso consigo (98). Segundo Varnhagen (99),Caramuru não lhe fez companhia, e qunado o gentio, bem como aqueles depravados edegenerados cristãos que haviam para o afastamento de Coutinho, ou melhor, que

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    (102). Foi quando Caramuru se lhe apresentou como portador do convite dos seusinfiéis feudatários para retornar à Bahia (103). Então, passando na vila de São Jorge dos

    Ilhéus, coutinho deixou aí ficar a família, que, de acordo com a afirmativa do Pe.Galanti (104) caiu”em tão grande pobreza, que teve de recolher-se ao hospital.”. Oepílogo da trágica história de Francisco Pereira Coutinho não tem interesse para estacrônica.

    Depois da morte do”Rustição”, havendo Diogo Álvares consertado pazescom o gentio do Recôncavo, não somente aqueles que emigraram da bahia para Ilhéus ePorto Seguro, como vários colonos descontentes destas duas capitanias, além de outrosaventureiros que perambulavam pela costa, detritos da sociedade ao léo das vagas da

    sorte, afluíram para as ribas do lagamar de Todos os Santos (105).Conclue-se da leitura do décimo-sétimo capítulo do regimento de tomé

    de Souza, ordenadopor Dom João III, que os índios que por aquele tempo inquietavamIlhéus eram tupinanbás, e não os tupiniquins, amigos e aliados dos portugueses. Eis ostermos do mencionado capítulo (106).”Eu sou informado

    “que os gentios que habitam ao longo da costa Capitania de Jorge de“Figueiredo, da Vila de São Jorge até a dita Bahia de Todos os Santos são“de linhagem dos Tupinambás e se alevantaram já por vezes contra os“Cirstãos e lhe fizeram muitos danos e que ora estão alevantados e fazem“guerra e que será muito serviço de Deus e meu serem lançados fora dessa“terra para se poder assim de Critãos como os gentios da linhagem“dos Tupiniquins que dizem que é gente pacífica e que se oferecem a os“ajudar a lancar fora e povoar e defender terra pelo que vos mando que“escrevaes a lançar fora e povoar e defender terra pelo que vos mando que“Figueiredo e a Afonso Álvares, provedor da minha fazenda nela (107) e

    “algumas outras pessoa que vos bem parecer, que venham á dita Bahia,“e tanto que nela fôrem praticareis com eles e com quasquer outras pes-“soas que nisso bem entendam a maneira que se terá para os ditos gentros“serem lançados da dita btrra. E o que sobre isso assentardes;poreis em“obra tanto que o tempo vos der lugar para o pderedes fazer.”Já se viu que tupinambá e tupiniquim eram denominações relativas dum mesmo

    ramo de ameríndio.Apesar da guerra que os tupinambás moviam a Ilhéus, atera ainda assim

    produzia assaz mantimentos; e os que a gente vind com Tomé de Souza, mil e tantoshomens, consumiu nos primeiros tempos a fundação da cidade do Salvador foram poraquela capitania fornecidos, conforme se vê da seguinte carta dirigida por Dom João IIIa Diogo Álvares, da qual foi portador Gramatão Teles, capitaão duma caravela saída doreino para a baía de Todos os Santos., antes de partir de lá, para dar cumprimento á

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    “o cumprimento e tempo de sua chegada, ache abastada de amntimentos“da terra, para provimento da gente que com êle vae, escrevo sobre isso

    “a Paulo Dias, vosso genro, procure se haverem, e os vá buscar pelos“portos dessa Capitania de Jorge Figueiredo, sendo necessario vossa“companhia e ajuda, encomendo-vos que o ajudeis, nos que virdes que“cumpre, como creio que o fareis(109).

    Quando Tomé de Souza chegou à Bahia, viviam os colonos de Ilhéus tãoamedrontados dos índios que nem ao menos lhe infundira alento para romper o cercoem que se encontravam a nova espalhada ao tempo, ali e em Porto Seguro, de como nas

    montanhas próximas havia ouro, o tônico da coragem por excelência, naquelas eras.Comprovavam a veracidade da notícia amostras trazidas à costa por um pugilo deresolutos aventureiros que haviam tido as sua pesquisas embargadas por tenacíssimaoposiçao dos naturais.

    Morador da vil de São Jorge era então um indivíduo de história mui curiosa, quefoi incansásel propagandista das riquezas minerais da capitania, e da de Porto Seguro.Tratava-se daquele célebre Felipe de Guillem, cujo nome aparece nos versos de GilVicente. Guillem viveu no feudo de Jorge de Figueiredo por espaço de dez anos, de1539 a 1549, ”ajudando a sustentar e governar”a capitania, não deixando jamais deservir os cargos de juiz ordinário e vereador da câmara, e”assim outros ofícios pela qualrazão muito pobre, e não tive

    “lugar para fazer uma roça de mantimentos que me sustentasse”, segundo disse ael em carta da Bahia, de 20 de julho de 1550 (110).

    A vida deste indivíduo, que veio a se finar em Porto Seguro de amis de stenta ecinco anos de idade, havendo nascido na Andaluzia em 1487, tem muito daquelas

    personagens dos romance picarescos. Boticário no Porto de Santa Maria, cerca deCadiz, er”grande lógico e muito eloquente, de muito“boa prática, que entre muitos sabedores o folgavam de ouvir, ”conforme

    palavras de Gil Vicente(111). Douto nas matemáticas, inculcava-se astrólogo, químico,entendido em geologia, em explorações de terrenos auríferos e jacências de pedraspreciosas. Além de todas essas prendas, era troveiro e grande jogador de xadrez. Deacordo com Gil Vicente(112), Guillem chegou à corte de Portugal em 1519. Mas,observa Souza Viterbo, só se encontra menção do seu nome em 1527, quando, a 18 de

     junho, Dom João III nomeou-o para o ofício de vedor e avalidor de drogas das Casas daÌndia e da Mina, ”cargoimportante,

    “para o qual eram requeridas habilitações especiaes, com o vencimento“anual de 23$000, em paga de certos instrumentos a que inventara para“tomar o sol de todas as horas e a altura do polo. Ficava-lhe imposta a

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    lhe mostraria então coisas que nunca haviam sido vistas (115). Seu aparecimento nosversos de Gil Vicente tem por motivo a referida trapaça.

    Oito anos depois, tendo estado todo este tempo a servir na casa de VascoFernandesCesar, - ou teria sido isso de 1519 a 1527? – chegava ele do reino á Bahia,onde se demorou em companhia do donatário Francisco Pereira Coutinho> Daquitransladou-se a Porto Seguro, araído pelas notícias de existência de ouro naquelaCapitania, onde conviveu com o senhorio da terra. Mas pouco se demorou ali, uma vezque em 1539 passava a residir na vila de São Jorge dos Ilhéus.

    Logo que soube haver-se estabelecido Tomé de Souza na Bahia, escreveu-lhetransmitindo a informações que tinha obtido em Porto Seguro, bem como na vila que

    ora habitava, sobre as jazidas auríferas existentes no interior cuja exploração sepropunha a fazer, caso lhe fossem fornecidos os elementos indispensáveis. Segundo osfundamentos que expunha, acreditava serem elas muito abundantes (116). Para RochaPombo (117) o fato não se passou assim. Tomé de Souza, porque trouxesse do reinopara se estender com o andaluz, fê-lo vir dos Ilhéus no mesmo ano de 49. Foi comindescritível júbilo que o pouco venturoso e muito imaginoso homem recebeu aquelaordem do governador. Até que finalmente, chegara a oportunidade, escoados eram-lhedoze longos anos em baldados apelos, de ver positivados os sonhos que lhe vinhamalentando a fé e a coragem. Não atendeu um instante sequer a conveniências nemobrigações e, abandonando os parcos haveres de que dispunha em São Jorge dos Ilhéus,rumou sem tardança para a cidade de Salvador.

    Acolheu-o Tomé de Sousa mui cordialmente, e Guillem”sentiu logo mudada atriste sorte que andava curtindo”. Tomada que fora a resolução de organizar umaentrada para explorar o sertão, pensou o governador, porque para isto se lhe insunuara oantigo boticário, em confiar-lhe a direção da empresa. Mas logo se evidenciou que,

    além de já contar passante de sessenta anos, o inigitado chefe da bandeira era sujeito apertinaz efermidade dos olhos. Por isso veio a ser confiada tal missão, mais tarde, aoutro espanhol. Francisco Bruzza de Espinosa.

    Conservou-o Tomé de Sousa junto a si. Além de ouvir-lhe os conselhos porassuntos pertinentes á direção d república, encarregou-o de abrir a ladeira da Conceiçãoda Praia. Fê-lo juiz ordinário e vereador da câmara da nascente cidade, assim como deu-lhe outros cargos de justiça”por ser mais o velhoe experimentado”. Neste meio tempo,morreram-lhe a esposa e o filho. Daqui escreveu a Dom João III dando-lhe notícia do

    que afirmavam os índios de Porto Seguro sobre Itaberabussu ou Sol da Terra, amisteriosa e jamais encontrada Serra Resplandescente. Assim se propagou a lenda doreino. É opinião de alguns autores Ter essa carta acendido a cobiça do monarca, dando-lhe aso a que recomendasse a Tomé de Sousa a organização da bandeira a cuja frente foiposto Espinosa. Na dita missiva pediu também a el-rei o pagamento de tenças atrasadas

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    filhas, contando a caçula dezessete anos. Atraí-lo-ia, ainda, a miragem das divícias noseio das serras longínquias, dasquais estaria assim mais perto? De Porto Seguro vgoltou

    a escrever ao soberano, insistindo sobre os pretensos tesouros da Capitania.A mercê que lhe fez Tomé de Sousa confirmaram-na Dom João III em 1557, eDom sebastião em 1561. No ano de 63 um alvará régio mandava que o ordenado do seucargo fosse pago no almoxarifado da Capitania, e não tesouraria da cidade de Salvador.

    O nome de Felipe de Guillem andfou invocado numa das denunciações levadasem 1591 ao visitador o Santo Ofício, Heitor Furtado de Mendonça, nesta cidade. Assimé que, no dia 16 de agosto do referido ano, o padre Antônio Dias, da Companhia deJesus, denunciando disse”que no dito tempo

    ‘ ( averá vinte anos) mesmo em Porto Seguro ouviu dizer segundo lhe“parece a outro padre da Companhia Brás Lourenço que Felipe Guillem“cavalheiro do abito do Nosso Senhor Jesus Cristo segundo dezião cristão“novo provedor que foi da fazenda del-rei em Porto Seguro, quando se“benzia se benzia com huã figa e que dava por descupa que tinha o dedo“polegar comprido e que por isso lhe fazia na mão figa e que elçe mesmo“Phelipe Guillem castelhano de nação tinha onde se assentava huã taboa“no chão sobre que punha os pés na qual estava huã cruz, assinada na“parte debaixo”(118).

    (87) — Residia em Santos. Mercador de escravos índios, mandava naviosaquelas paragens para trazê-los, vendendo-os até as embarcações que escalavam noporto da vila em que residia (Francisco de A. C. Franco, Origem dos Camargos, p. 14).

    (88) — C. de Abreu, prolegômenos ao liv. II, da Hist. de Frei Vicente, p. 80.(89) — Antes de 12 de agosto de 1545. Nota de C. de Abreu a Varnhagem, Hist.,

    p. 272. (90) — Rocha Pombo, III, p. 292. Devia ser então feitor dum engenho dodonatário. Cf. adiante.

    (91) — Eis como Pero Goes narra o sucesso, em carta el-rei, datada de 29 deabril de 1546: Saiu da terra de Vasco Fernandes Coutinho um homem por nomeHenrique Luiz, com outros em um caravelão, sem ser eu o sabedor, e se foi a um portod’esta minha capitania, e contar a lei do foral de V. A., resgatou o que diz; e nãocontente com amigo dos Cristãos, e o prendeu no navio, pedindo por ele muito resgate,

    o qual depois de por ele lhe darem o que pediu, por se congraçar com outros índioscontrários deste, que prendeu, lh’o levou e entregou preso, até lh’o deu a comer contratoda a verdade e não fiassem em nós, que não mantínhamos a verdade, e se vieram logoa uma povoação minha pequena, que eu tinha mais feita, e estando a gente segura,fazendo suas fazendas deram neles, e mataram três homens, e outros fugiram e

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    (98) — Accioli, o. c., p. 159.(99) — O. c., p. 280.(100) — R. Pombo, o. c., III, p. 262.(101) — Frei Vicente (p. 105) afirmou que Coutinho e os seus colonos

    acolheram-se a Ilhéus. Acha Eugenio de castro (A Capitania dos Ilhéus, p. 12) que odonatário da bahia não ficou em Ilhéus porque já o indígena se levantava em assaltosconstantes, devastavam lavouras de cana e os primeiros engenhos de colonizar na vilade São Jorge.

    (102) — Sobre a verdadeira causa da volta de Coutinho à Bahia, veja-se a carta,citada, Pero Tourinho, in R. Pombo, o. c., III, p. 263.

    (103) — R. Pombo, o. c., III, p. 263.(104) — O. c., p. 163.(105) — R. Pombo, o. c., III, p. 314, nota.(106) — Anots. Cits. De B. do Amaral, I, p. 267.(107) v Outros funcionários régios da capitania, por esses tempos: Francisco

    Gomes, escudeiro, nomeado escrivão da feitoria e almoxarifado, em 2 de setembro1534; Bartolobmeu Godinho Machado, cavalheiro da casa de sua alteza, nomeadoprovedor da fazenda real em 1o de agosto de 1548 (Hist. da Col. Port., III, p. 206),cargo que renunciou em mãos d’el-rei, pra este dele fazer mercê a Antonio Alves, moçoda sua câmara, nomeado a 14 de dezembro do mesmo ano; a Pero Garcia, criado dainfanta Dona Isabel, a pedido de quem foi nomeado almoxarife e feitor da Capitania, em21 de outubro de 1549.

    (108) — Vem, por exemplo, na Hist. Ger., de Varnhagem, pp. 320-321.(109) — Se Diogo Álvares não se tivesse portado lealmente com Francisco

    Coutinho, de certo el-rei não lhe teria escrito em semelhantes termos.

    (110) — R. Pombo, o. c., p. 710.(111) — Apud Souza Viterbo, Trab. Naut., I, p. 140.(112) — Idem.(113) — Souza Viterbo, o. c., p. 140.(114) — Pelo seu invento, diz Gil Vicente, (S. Viterbo, p. 140) obteve mercê

    100$000 de tença, com hábito e corretagem da casa da índia, que valia muito.(115) — Sousa Viterbo, o. c., pp. 140-141.(116) — Varnhagen, o. c., p. 355 e outros autores assim o afirmam.

    (117) — As informações que se seguem sobre o assunto são baseadas em R.pombo, o. c., III, pp. 707-710.

    (118) — Denunciações, p. 338.

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    V

    OS JESUÍTAS. VISITAS DE PRIMADO. A CORREIÇÃO DE PEROBORGES; INFORMAÇOES MUI CURIOSAS. NAVEGAÇÃO PARA A BAHIA.FUGA DE PRESOS. PREGAÇÃO DO Pe. NÓBREGA. VISITA DO Pe.ASPILCUETA NAVARRO. COMÉRCIO COM A BAHIA. MORTE DO PRIMEIRODONATÁRIO. SUA SUCESSÃO.

    Não tardaram os intrépidos milicianos da Sociedade de Jesus, chegados noséquito do governador geral, a correr em busca de atribulados moradores da Vila de SãoJorge, para levar-lhes o socorro da palavra Divina, pois, mal se acomodaram, seusuperior, padre Manoel de Nóbrega, enviou o padre Leonardo Nunes”aos Ilhéus dePorto Seguro a”confessar aquela gente que tem nome de Cristãos”, — segundo carta aopadre-mestre Simão Rodrigues de Azevedo, provincial no reino, escrita entre 31 demarço e 15 de abril de 1549 (119), —

    “porque me disseram de lá muitas misérias, assim a fazer o quer não“terra se pode fazer. Ele escreverá a Vossa Reverendíssima de lá largo.“Leva por companheiro a Diogo Jacome, para ensinar a doutrina aos me-“ninos, o que ele sabe bem fazer”.Em outra missiva, datada de 9 de agosto seguinte, endereçada ainda ao padre

    provincial, informa Nóbrega (120): —”Leonardo Nunes mandei a Ilhéus,“uma povoação daqui, perto,, onde dá muito exemplo de si e faz muito“fruto, e todos se espatem de sua vida e doutrina; fi com êle Diogo“Jacome, que fez muito fruto em ensinar os moços e escravos”. Às quartas e ás

    sextas-feiras aqueles dois primeiros obreiros da Companhia que calcaram terras daCapitania dos Ilhéus, — dois nomes muito conhecidos e dignos de memórias na crônicados primeiros tempos da colonização do brasil: o primeiro é o lendário”Abarê-bebê”datradição paulistana, e o segundo foi o número dos fundadores de São Paulo de

    Piratininga, — saíam a percorrer as ruas do vilarejo tangendo uma campainha, edisciplinando-se pelos que estavam em pecado mortal, pela conversão dos índios, epelas almas do Purgatório, conforme publicavam no seu biedomadário e cruento passeioexpiatório.

    No dia do Anjo Custódio de Portugal, terceira dominga de julho, estavam já de

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    Concluída a fábrica da cidade do Salvador, determinou Tomé de Sousa enviar oouvidor geral e provedor-mor da fazenda em viagem de correição ás capitanias do sul,até São Vicente, a fim de porem em ordem, nas ditas partes os negócios da republica, osquais sabia carecentes de imediato remédio. Bem quisera ir em pessoa examinar asnecessidades daqueles povos. Mas não lho permitia o momento. Partiram as duas altasautoridades no”dia de pão por Deus”, 1° de novembro da era I da fundação da cidade.Acompanhavam-nos funcionários da coroa e suficiente gente de armas, seguindo aexpedição em duas carvelas e um bergantim, ao mando do capitão-mor da costa, PeroGóes, malogrado donatário d Paraíba do Sul.

    Assim como aqueles capitanias reclamavam providências de ordem material,

    porque entrassem em regular estado de funcionamento, entendeu o padre Manoel daNóbrega que do mesmo gerito os cristãos que as habitavam não podem prescindir doremédio espiritual, tão malbaratos andavam entre eles os mandamentos da lei de Deus.Nem era possível diferir por mais tempo a propagação da doutrina no seio dagentilidade vegetante por aqueles paragens. Deliberou, pois, incorporar-se à expedição,levando consigo doze meninos catecúmenos.

    De tal maneira, na vila de São Jorge aportaram pela vez primeira as maiselevadas personalidades da colônia, abaixo do governador geral.

    Em Ilhéus, Nóbrega tomou os dois sócios que aí estavam, para deixa-los emPorto Seguro, ficando a vila sem padre, e, chegando ao feudo de Tourinho, escreveu em6 de janeiro de 1550 (123) ao padre provincial, em Lisboa, dizendo que entre ostupininquins desta Capitania e da dos Ilhéus já existiam vinte ou trinta cristãos. Algunsdestes haviam sido batizados ainda por certos padres que el-rei Dom Manoel enviaria aoBrasil (124). Por sua vez Pero Borges, em missiva a el-rei, firmada no dia 7 defevereiro, pintou icasticamente o estado atual das duas capitanias. É documento de

    inestimável valor pelas palpitantes informações que dá daquelas donatárias no momentoem que a coroa organizava a administração do Brasil (125).Viera, confessa ao seu rei e amo, por mandado de Tomé de Souza, ”ao socorro

    dos Ilhéus”. Em quatro dias foram feitas aí as pazes. — Entre Romero e os colonos, ouentre estes e os índios? — E sobrando-lhe tempo, pôz-se a examinar as coisas atinentesà justiça da capitania. Tanta irregularidade topou, que lhe pareceu terra aquela onde nãohavia lei. (126)

    Capitão e ouvidor era um Francisco Romer, que anteriormente ali estivera com

    os mesmos cargos, e fora preso no Limoeiro por muitos dias, expiando faltas cometidasno exercício de sua judicatura. Bom sujeito, pórem, não para de distribuir justiça, porser ignorante e muito pobre, ”o que muitas vezes faz fazer aos homens o que nãodevem”. No que cocernia á arte militar; segundo lhe informaram, ”acordado,experimentando e de bom conselho”. De como governava aterra expressou-o nestas

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    “homem com quem êle estava diferente disse: tenho ódio aquele crucifixo“porque o trouxe Fuão, que era dito homem com quem estava deferente.”Parece, pelos termos da denúncia, ”já defunto”; que Romero faleceu em Ilhéus.Em caso contrário, com se lê em outras denúncias, ter-se-ia limitando o

    denunciante a dizer”que se retirou”(127).Prosseguindo na sua carta, o ouvidor geral declarou que não investigara mais

    coisas em relação aos desacertos de Romero porque este, acabados os três anos de sua judicatura, teria que dar residência, e, então, lhe tomaria contas. Não fizera agoracorreção em Ilhéus, pretendendo fazê-laquando se tornasse de São Vicente. Quanto deinteressante não se conteria nos autos de semelhante devassa!

    O magistrado propunha a el-rei que mandasse Jorge Figueiredo, como tambémos outros donatários, nomear ouvidores homens entendidos pois nas Capitanias dosIlhéus e de Porto Seguro estavam investidos do cargo indivíduos que não sabiam lernem escrever, -analfabeto, Francisco Romero! – e que suas disparatadas sentenças,quando se executavam, eram fontes das maiores desordens. Ao menos para Ilhéus, eranecessária ouvidor nas condições propostas . Nas ditas Capitanias havia incrívil númerode tabeliães e inquiridores, juízes e escrivães de órfãos. De sorte que não sobravamhomens capazes de ser juízes ordinários e vereadores investindo-se de taisofícios”degradados por culpas de muita infâmia e desorelhados”. Abuso este que elecortou, suprimindo também os juízes e escrivães de órfãos, de acordo com asordenações do reino, dado o número exíguo de mopradores de cada uma das duas vilasatingidas pela medida.

    Conta mais Pero Borges que, por lhe haver dito o governador ser isto serviço desua alteza, tomou o conhecimento de algumas coisas passadas, e uma delas foi oseguinte, Sete ou oito anos antes, homens desnaturados que tripulavam um navio saído

    do reino transportando para o Brasil muitos colonos dos dois sexos, adultos e menores,levantaram-se puzeram malvadamente os desgraçados nas praias da terra dospotiguaras, que os devoraram, e cujos haveres, roupas, e utilidades outras foram venderna Bahia. Então, sabendo que dois dos implicados no hediondo crime se achavam emIlhéus, conseguiu prendê-los com grande trabalho, ”em serras e brenhas de noite”, ondese acoitavam, em companhia daquele clérigo das Arábias, causador indireto dodesgraçado fim d”“O Rusticão”, ao qual não deteve graças a sua condiçaõ desarcedote.ste padre continuava a proceder mal.

    Os tabeliães de Ilhéus, e alguns de Porto seguro não tinham carta de ofício,porém tão somente alvarás dos capitães da srespectivas donatárias. Igualmente nãopossuiam livros de querelas, que registravam em folhas avulsas de papel. Nemregimento extorquindo às partes o que bem entendiam. Alguns serviam sem juramento.Achava Pero Borges ser isso”uma pública ladroeira e malícia”, procedendo contra eles.

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    Seguro, bem como destas povoações para lá iam.”Ás vezes se vê mais cedo navios dePortugal que das capitanias”, dizia em 1552 o jesuíta Francisco Pires em carta da Bahiapara seus sócios na corte (129).

    No meio do ano de 50, voltaram de São Vicente o ouvidor geral, e provedor dafazenda e o capitão-mor da costa, depois de terem providenciado e agido com lhescompetia nas Capitanias visitadas, ficando o primeiro em Ilhéus, e por em ordem osassuntos que lhe estavam afetos. Não está especificado se isto passou-se antes ou depoisde haver Pero Borges voltado ao sul: fugiram da cadeia da vila de São Jorge os presosali recolhidos por sua ordem, em tal número incluídos aqueles dois malfeitores, citados,e um francês, que viera degradado do reino para sempre”por ladrão do mar cossairo”,

    indo-se homiziar a bordo dum navio, fundeado no porto da vila de Santa Cruz de Portoseguro, em que o donatário do Espírito Santo, Vasco Fernandes Coutinho, viajava paraPernambuco. Acolhera estes os criminosos despeitado com a ingerência do ouvidorgeral nos negócios do seu feudo, recusando-se a entregá-los á justiça d’el-rei. (130)

    Que fundamento tem a seguinte informação de Borges de Barros (131)-“Em 1550, Dom Jorge de Menezes, o das proezas das Molucas e do“descobrimento da Guiné e su companheiro Dom Simão de Castel Bran-“co, ambos fidalgos, foram condenados a degredo pelos crimes cometidos“em Ilhéus, de cujas cadeias se evadiram, refugiando-se em Porto Se-“guro”.

    Em companhia de Pero Borges voltara a Ilhéus o padre Manoel da Nóbrega, queexecitou aí o seu ministério por algum tempo. Neste mesmo ano, mal chegara dePortugal, eis o padre Manoel de Paiva enviado a vila de São Jorge, pra continuar a obrainterrompida de Leornado Nunes e de Nóbrega. Pouco depois, ainda em 50, foi-lhe

    fazer companhia o padre Afonso Braz. Se é que este, outro dos fundadores do Colégiode Piratininga, já não se encontrava ali. No milésimo seguinte o padre Paiva, -um dosgrandes vultos da Companhia de Jesus no Brasil, aquele que Nóbrega mandou venderem hasta pública, como escravo, nas ruas da Bahia, a fim de experimentar a suahumildade, pois sabia o oriundo de família de alta fidalguia, -deixando os moradoresmui saudosos, recolheu-se á capital da colônia para assumir a direção do Colégio daCompanhia, na ausência de Nóbrega, que iam em visita a Pernambuco. Antes de suapartida para a Bahia, o padre Afonso Braz já havia seguido em companhia de dois

    irmãos com destino a Porto Seguro. Não tiveram substitutos. Uma carta do padreFrancisco Pires para o reino, em 52, dizia que Ilhéus não esta