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CAMPANHA NACIONAL DE ESCOLAS DA COMUNIDADE
FACULDADE CENECISTA DE CAPIVARI – FACECAP
- PEDAGOGIA -
CRIANÇAS COM NECESSIDADES ESPECIAS: DA EXCLUSÃO À INCLUSÃO
ESCOLAR
KÁRITA RAIGANE PEREIRA NEVES MENDES
Capivari, SP
2011
CAMPANHA NACIONAL DAS ESCOLAS DA COMUNIDADE
FACULDADE CENECISTA DE CAPIVARI – FACECAP
- PEDAGOGIA -
CRIANÇAS COM NECESSIDADES ESPECIAS: DA EXCLUSÃO À INCLUSÃO
ESCOLAR
Monografia apresentada ao Curso de Pedagogia da FACECAP/CNEC Capivari, para obtenção do título de Pedagogo, sob a orientação da Profa. Dra. Maria de Lourdes Pinheiro.
KÁRITA RAIGANE PEREIRA NEVES MENDES
Capivari, SP
2011
FICHA CATALOGRÁFICA
Mendes, Kárita Raigane Pereira Neves Crianças com necessidades especiais: Da exclusão à inclusão escolar / Kárita Raigane Pereira Neves Mendes. Capivari- SP: CNEC, 2011. 38p. Orientadora: Profª Dra. Maria de Lourdes Pinheiro Monografia apresentada ao curso de Pedagogia. 1. Educação Especial. 2. Inclusão. 3. Exclusão. 4. Aprendizagem. I. Título CDD 371.9
Dedico este trabalho aos meus familiares, em especial meu
marido Flávio, por toda a paciência que teve nas longas
horas de concretização deste projeto e a todas as pessoas
para mim especiais.
“(...) Cada criança é um ser único, diferente de qualquer outra, que experimenta ritmo de evolução próprio, tem os seus interesses e provém de um universo cultural, econômico e familiar específico; cada um é um caso, uma personalidade que desabrocha de modo diverso.”
Joaquim Azevedo (1994)
MENDES, Kárita Raigane Pereira Neves. Crianças com necessidades especiais: da exclusão à inclusão escolar. Monografia de Conclusão de Curso. Curso de Pedagogia. Faculdade Cenecista de Capivari – CNEC. 38p., 2011.
RESUMO Neste trabalho abordamos o direito das crianças com necessidades especiais de serem incluídas na sociedade e nas escolas regulares. Para tanto, são objetivos identificar os avanços em relação à educação das crianças com necessidades especiais no Brasil, a necessidade da formação de professores especializados e a necessidade da adaptação curricular do sistema escolar regular. A retrospectiva histórica da educação especial em nosso país aponta que o atendimento dos alunos com necessidades especiais acompanha o desenvolvimento dos direitos humanos conquistados. Através da história podemos perceber que o portador de necessidades ganhou distintos nomes, tratamentos e exposições, sempre relacionadas aos valores sociais, filosóficos, éticos e religiosos de cada momento, nas diferentes civilizações. A inclusão de alunos com necessidades especiais no sistema regular de ensino tem sido um contexto bastante debatido, tanto na parte educacional como na parte social. Assim, várias leis garantem a entrada e a estabilidade do aluno com necessidade especial no sistema regular de ensino, entretanto, ainda nos deparamos com dificuldades que impedem que estas políticas de inclusão sejam verdadeiramente concretizadas. Palavras-chave: 1. Educação Especial. 2. Inclusão. 3. Exclusão. 4. Aprendizagem.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 8
CAPÍTULO 1 – EDUCAÇÃO ESPECIAL NO BRASIL: DA EXCLUSÃO À
INCLUSÃO ......................................................................................................................... 10
1.1 Em direção à inclusão escolar .............................................................................. 13
1.2 A Declaração de Salamanca ................................................................................. 14
CAPÍTULO 2 – DIFERENTES SIM, INCAPAZES NÃO ................................................. 18
2.1 A importância da família e da escola no processo da inclusão escolar ................ 19
2.2 Dificuldades na construção de espaços inclusivos ............................................... 22
CAPÍTULO 3 – OS DESAFIOS DA INCLUSÃO ESCOLAR .......................................... 26
3.1 A formação de professores especializados ........................................................... 27
3.2 A adaptação do currículo da escola regular ......................................................... 31
CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................. 34
REFERÊNCIAS .................................................................................................................. 36
8
INTRODUÇÃO
O presente trabalho apresenta uma discussão sobre a inclusão das crianças com
necessidades especiais no sistema regular de ensino no Brasil. O propósito é despertar o
interesse dos professores em relação aos alunos com necessidades especiais, uma vez que
necessitam de um pouco de atenção a mais dentro da sala de aula, pois, segundo Baptista
(2006, p.12), “é necessário que os técnicos, professores e a própria sociedade se destitua do
lugar de saber absoluto e dividam esse com as pessoas com deficiência e isso muitas pessoas
não aceitam”.
Em função disso, o estudo tem como objetivos identificar os avanços em relação à
educação das crianças com necessidades especiais no Brasil; verificar quais as dificuldades
para a implantação de uma educação inclusiva; e discutir sobre a necessidade da formação de
professores especializados, bem como a necessidade da adaptação curricular do sistema
escolar regular.
Para tanto, a pesquisa terá como principal instrumento metodológico a pesquisa
bibliográfica, buscando aproximar os estudos de diferentes autores e diferentes concepções
sobre o tema, comparando e analisando seus estudos a propósito da inclusão das crianças com
necessidades especiais no sistema regular das escolas brasileiras.
Atualmente, no Brasil, presenciamos uma política pedagógica teoricamente
estruturada, mas que nem sempre funciona como gostaríamos. No entanto, temos um sistema
de ensino com mudanças que poderão alterar a história educacional da separação das crianças
ditas “normais” em relação aos portadores de necessidades especiais.
Nesse sentido, percebemos que foi ao longo da década de 1960 que aconteceu a maior
extensão no número de escolas de ensino especial já visto no país. Em 1969, o Brasil possuía
mais de 800 estabelecimentos de ensino especial para deficientes mentais, por exemplo, cerca
de quatro vezes mais do que a quantidade existente no ano de 1960.
Na década de 1970 nota-se nos países desenvolvidos amplas discussões e
questionamentos sobre a integração dos portadores de necessidades especiais na sociedade e,
no Brasil, ocorre nesse período a institucionalização da Educação Especial em termos de
planejamento de políticas públicas com a criação do Centro Nacional de Educação Especial
(CENESP), em 1973.
Basicamente na intenção de reforçar o comprometimento do país em promover a
educação, é divulgada em dezembro de 1996 a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
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Nacional (Lei nº. 9.394/96). Essa lei propaga em seu conteúdo alguns avanços expressivos,
tais como a extensão da oferta da educação especial na faixa etária de zero a seis anos; a ideia
de progresso da qualidade dos serviços educacionais para os alunos e a necessidade do
professor estar preparado e com recursos adaptados de forma a envolver e entender a
diversidade dos alunos.
Ainda no sentido de garantir a inclusão dos indivíduos com necessidades especiais, o
Parecer CNE/CEB 017/2001 estabelece as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na
Educação Básica. De acordo como o documento, “igualdade de oportunidades e valorização
da diversidade no processo educativo e nas relações sociais são direitos dessas crianças,
jovens e adultos. Tornar a escola e a sociedade inclusivas é uma tarefa de todos” (BRASIL,
2001a, p.29)1.
Observa-se, em relação à Educação Especial no Brasil, que, do fim do século XVIII
até o século XXI, os avanços vêm sendo significativos, tanto na sala de aula quanto na
sociedade, e isso só pode acontecer devido a pessoas que acreditaram no potencial das
crianças com algum tipo de necessidade especial.
No entanto, para que a aprendizagem e a inclusão aconteçam de fato é essencial
refletir, debater e reformular, se necessário, de modo consciente, a prática educativa, criando
experiências a fim de colaborar significativamente para o desenvolvimento e a aprendizagem
dos portadores de necessidades especiais, permitindo amplamente a comunicação e sua
inserção ativa na sociedade.
Em função disso, o Capítulo 1 deste trabalho aborda o processo para a inclusão escolar
dos portadores de necessidades especiais na escola regular no Brasil e suas dificuldades. Por
sua vez, o Capítulo 2 traz uma discussão sobre a importância da participação dos pais e da
escola, bem como as barreiras encontradas para a construção de espaços inclusivos. Por fim, o
Capítulo 3 discute o problema da formação de professores para uma escola inclusiva e as
adaptações curriculares para a inclusão dos portadores de necessidades especiais na escola
regular.
1 O Parecer serviu de fundamento para a Resolução CNE/CEB nº. 02/2001, de 11 de setembro de 2011, que instituiu Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica.
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CAPÍTULO 1 – EDUCAÇÃO ESPECIAL NO BRASIL: DA EXCLUS ÃO À INCLUSÃO
No Brasil, até o processo de democratização da escola, que ocorreu na segunda metade
do século XX, não havia muita oportunidade de acesso à educação para as crianças das
classes populares. Neste cenário, os alunos com necessidades especiais, durante muito tempo,
foram considerados como “aleijados”, ainda que iniciativas de educação especial tenham já
acontecido no Brasil-Império, conforme o documento “Política Nacional de Educação
Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva”, elaborado pelo MEC/SEESP (BRASIL,
2008).
No Brasil, o atendimento às pessoas com deficiência teve início na época do Império, com a criação de duas instituições: o Imperial Instituto dos Meninos Cegos, em 1854, atual Instituto Benjamin Constant – IBC, e o Instituto dos Surdos Mudos, em 1857, hoje denominado Instituto Nacional da Educação dos Surdos – INES, ambos no Rio de Janeiro. No início do século XX é fundado o Instituto Pestalozzi (1926), instituição especializada no atendimento às pessoas com deficiência mental; em 1954, é fundada a primeira Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais – APAE; e, em 1945, é criado o primeiro atendimento educacional especializado às pessoas com superdotação na Sociedade Pestalozzi, por Helena Antipoff. (BRASIL, 2008, p.02).
Entretanto, antes da criação desses dois institutos referidos acima (INES e Pestalozzi),
os indivíduos com necessidades especiais eram isolados da sociedade, muitas vezes sendo
considerados como pessoas possuídas pelo demônio. Acreditava-se que tais pessoas não
podiam ser educadas, pois eram consideradas como aberração da natureza. Por muito tempo
elas foram rotuladas como incapazes e, assim, não podiam participar ou ter uma vida
“normal” e em comunidade.
Essa forma de tratamento dada às pessoas com necessidades especiais não aconteceu
somente no Brasil. Se voltarmos à história, na Antiguidade sabe-se que era muito comum
aniquilar as crianças que nasciam “deficientes”. Constam ainda relatos que não havia
nenhuma preocupação com a educação ou a socialização dessas pessoas.
As leis romanas da Antiguidade não eram favoráveis às pessoas que nasciam com deficiência. Aos pais era permitido matar as crianças com deformidades físicas, pela prática do afogamento. Relatos nos dão conta, no entanto, que os pais abandonavam seus filhos em cestos no Rio Tibre, ou em outros lugares sagrados. Os sobreviventes eram explorados nas cidades por “esmoladores”, ou passavam a fazer parte de circos para o entretenimento dos abastados. (GUGEL, [s.d.]).
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Em relação à Idade Média, considerada como a idade da escuridão para a ciência
ocidental, pois tinham fé na crença do sobrenatural, pensava-se que a união da mulher e do
demônio resultava no portador de “deficiência”. Os “deficientes visuais”, por exemplo, eram
vistos como videntes, mas os psicóticos e epiléticos eram julgados como possuídos pelo
demônio.
Os deficientes eram abandonados, perseguidos e eliminados devido às suas condições atípicas, e a sociedade legitimava essas ações como sendo normais. Na era cristã, segundo Pessotti (1984), o tratamento variava segundo as concepções de caridade ou castigo predominantes na comunidade em que o deficiente estava inserido. (MIRANDA, 2003, p.02).
De acordo com Miranda (2003), entre os séculos XVIII e XIX os indivíduos que
apresentavam “deficiência” continuaram sendo segregados e foi somente no século XX que
houve um desenvolvimento de escolas (ou classes especiais em escolas públicas) que ofereciam
uma “educação à parte” para os portadores de necessidades especiais. A partir da década de 1970,
porém, há um avanço em direção a uma “integração social dos indivíduos que apresentavam
deficiência, cujo objetivo era integrá-los em ambientes escolares, o mais próximo possível
daqueles oferecidos à pessoa normal” (MIRANDA, 2003, p.02).
Hoje, temos diversos estudos que apontam não somente o que é a educação especial
como também quem são os portadores de necessidades especiais e que necessidades são essas.
Entretanto, Kassar (1995) alerta que:
A educação especial tem sido vista como qualitativamente diferente da educação. Podemos mesmo dizer que parecem existir dois tipos de educação: a educação e a educação especial. Essa distinção parece tão óbvia que podemos percebê-la simplesmente observando alguns aspectos, como por exemplo, a existência de cursos específicos para a formação de professores, ou curso em nível de pós-graduação que tratam especificamente da questão educação especial. (KASSAR, 1995, p.15).
Por sua vez, a Organização das Nações Unidas (ONU), no documento “Declaração dos
Direitos das Pessoas Portadoras de Deficiências”, de 09 de dezembro de 1975, ressalta que:
O termo “pessoas deficientes” refere-se a qualquer pessoa incapaz de assegurar por si mesma, total ou parcialmente, as necessidades de uma vida individual ou social normal, em decorrência de uma deficiência congênita ou não, em suas capacidades físicas ou mentais. (ONU, 1975, p.01)
Lima (2001) também observa que é necessário definir a “deficiência” e seus
respectivos níveis de manifestações, conforme citado abaixo:
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Define-se como deficiência toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica que gere incapacidade para o desempenho de atividade, dentro do padrão considerado normal para o ser humano. A deficiência permanente é aquela que ocorreu ou se estabilizou durante um período de tempo suficiente para não permitir recuperação ou ter probabilidade de que se altere, apesar de novos tratamentos. Incapacidade é uma redução efetiva e acentuada a capacidade de integração social, com necessidade de equipamentos adaptados, meios ou recursos especiais para que a pessoa portadora de deficiência possa receber ou transmitir informações necessárias ao seu bem-estar pessoal e ao desempenho de função ou atividade a ser exercida. (LIMA, 2001, p.40-41).
Assim, de acordo com o autor, algumas necessidades especiais têm sido caracterizadas
da seguinte forma:
• DEFICIÊNCIA FÍSICA - é uma alteração completa ou parcial de um ou mais
segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física, exceto
as deformidades estéticas e as que não produzem dificuldades para o desempenho de
funções.
• DEFICIÊNCIA AUDITIVA - lesão parcial ou total das possibilidades auditivas
sonoras, alterando graus e níveis como: (25 a 40 db- surdez leve, 41 a 55 db- surdez
moderada, 56 a 70 db – surdez acentuada, 71 a 90 db- surdez severa, acima de 91 db-
surdez profunda e Anacusia2.
• DEFICIÊNCIA VISUAL - intensidade visual igual ou menor que 20/200 no menor
olho, após a melhor correção, ou campo visual inferior a 20º.
• DEFICIÊNCIA MENTAL - funcionamento cerebral significativo inferior à média,
com manifestação antes dos 18 anos e barreiras associadas a duas ou mais áreas de
habilidades ajustadas.
• DEFICIÊNCIA MÚLTIPLA - é aquela na qual se tem a agregação de duas ou mais
deficiências.
Portanto, como vimos, a exclusão encontra-se presente em todas as sociedades, que ao
longo do tempo produziram e produzem uma visão unificada que considera as pessoas de
2 Anacusia: conforme Lima (2001) significa surdez total, perda total da capacidade auditiva.
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acordo com esta visão, escolhendo um modelo de normalidade e se esquecem, no entanto, de
que ela é formada e construída na diversidade. Devido a essa visão unificada, os portadores de
necessidades especiais são discriminados e excluídos socialmente pelo fato de possuírem
quaisquer barreiras, sejam elas físicas, mentais ou sensoriais.
1.1 Em direção à inclusão escolar
O processo histórico da educação dos portadores de necessidades especiais possui
várias etapas, uma delas como vimos é a etapa da exclusão, anterior ao século XX, quando
essas pessoas eram impedidas de conviver, não somente na sociedade mas também nas
escolas. Nesse sentindo, entende-se que houve um avanço na história da educação especial; no
entanto, apesar dos avanços, ainda nos deparamos com muitas barreiras que impedem a
entrada, a estabilidade e o atendimento destas pessoas de forma efetiva no ambiente escolar,
como ainda em toda a sociedade.
Maria Montessori (1870-1952) “acreditava que a educação é uma conquista da
criança, pois percebeu que já nascemos com capacidade de ensinar a nós mesmos se nos
forem dadas as condições”, diz a presidente da Associação Brasileira de Educação
Montessoriana, Talita de Oliveira Almeida (NOVA ESCOLA, 2008, p.01).
Porém, era cada vez maior o número dos alunos que, não sendo bem sucedidos na
escola, eram erroneamente rotulados, classificados como “deficientes” e encaminhados a
conviver em classes ou escolas especiais.
Em cada época, as percepções de “deficiência” cogitavam as expectativas sociais
daquele momento histórico. Nesta situação, a compreensão de “deficiência” passou a englobar
diferentes tipos de crianças que tinham em comum o fato de apresentarem condutas que
discordavam daquelas acreditadas pela sociedade e, consequentemente, pela escola. Sob o
rótulo de “deficientes” permaneciam os alunos indisciplinados, com a aprendizagem lenta,
desamparados pela família, portadores de lesões orgânicas, com distúrbios mentais graves,
enfim, todas as crianças analisadas fora dos modelos ditados pela sociedade como “normais”.
Assim, os indivíduos portadores de necessidades especiais sofreram diversas
perseguições, sendo vítimas de preconceitos na sociedade a qual estavam inseridos, que
chegaram a tomar “medidas estratégicas” para isolar os portadores de “deficiência” do meio
social, como por exemplo, internando-os em orfanatos, manicômios, prisões etc.
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O portador de necessidades especiais, no entanto, é uma pessoa com direitos. Vive,
sente, raciocina e cria. Tem obstáculos corporais ou mentais que podem comprometer
aspectos do comportamento, mas sua educação é uma tarefa a ser dividida entre pais e
profissionais especializados (educadores, psicólogos, fonoaudiólogos, dentre outros).
Apesar disso, porém, durante muito tempo, o direito conquistado pelos portadores de
necessidades especiais era de caráter apenas assistencialista.
[...] Sobre o tipo de assistência prestada, há, no entanto, informações insuficientes para sua caracterização como educacional. Poderia tratar-se de assistência médica a crianças deficientes mentais e não propriamente atendimento educacional; ou ainda atendimento médico-pedagógico. (MAZZOTA, 2001, p.30).
A educação especial, em meados do século XX, vai deixando de ter o caráter
assistencialista e busca medidas com a preocupação de implantar práticas educativas para os
portadores de necessidades especiais no sentido de sua integração, pois:
A integração é um fator predominante na relação desenvolvimento/aprendizagem. É através de suas inter-relações sociais com as outras crianças que se desenvolve culturalmente e individualmente. Por ser basicamente um ser social, a criança necessita do outro para o seu desenvolvimento e aprendizagem. (GARCIA, 1997, p.89).
1.2 A Declaração de Salamanca
Considerada um dos principais documentos mundiais que visam proteger os direitos
das pessoas com necessidades educacionais especiais, a Declaração de Salamanca tem como
objetivo fornecer diretrizes básicas para a formulação e reforma de políticas e sistemas
educacionais, de acordo com o movimento de inclusão social.
A Declaração de Salamanca foi elaborada em 1994 na Conferência Mundial sobre
Educação Especial, na cidade de Salamanca, na Espanha, e tem sua origem atribuída aos
movimentos de direitos humanos e contra as entidades segregacionistas que surgiram a partir
das décadas de 1960 e 1970.
A Declaração de Salamanca sustenta que a inclusão de portadores de necessidades
educacionais especiais nas escolas regulares representa o meio mais eficaz de combater
atitudes discriminatórias e proporcionar uma educação de qualidade à maioria das crianças.
7. O princípio fundamental da escola inclusiva é o de que todas as crianças deveriam aprender juntas, independentemente de quaisquer dificuldades ou diferenças que
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possam ter. Escolas inclusivas devem reconhecer e responder às necessidades diversas de seus alunos, acomodando tanto estilos e ritmos de aprendizagem e assegurando uma educação de qualidade a todos através de currículo apropriado, arranjos organizacionais, estratégias de ensino, uso de recursos e parcerias com a comunidade (...) 8. Dentro das escolas inclusivas, as crianças com necessidades educacionais especiais deveriam receber qualquer suporte extra requerido para assegurar uma educação efetiva (...) (DECLARAÇÃO DE SALAMANCA, 1994, p.05).
Antes de Declaração de Salamanca, no Brasil havia sido estabelecido o Programa
Educação para Todos (1990), que tratava da garantia, do acesso à escolaridade, ao saber
culturalmente construído, ao processo de produção e de difusão do conhecimento e,
principalmente, à sua utilização na vivência da cidadania.
A influência do documento elaborado em Salamanca e também do Programa
Educação para Todos promovem grandes reflexões em nosso país a respeito do tratamento
destinado aos portadores de necessidades especiais e o Brasil firma o compromisso de
promover uma educação igualitária, respeitando as individualidades. Os pressupostos
principais que fizeram o Brasil assumir esta postura inclusiva foram:
• Todos somos diferentes uns dos outros, o que vem a ser o aspecto central da diversidade que constitui qualquer sociedade; • Não há diferença que faça de uma pessoa um cidadão de menor valia: todos são iguais perante a lei; • A pessoa com deficiência é cidadã como qualquer outra pessoa e, como tal, tem o direito de receber os serviços de que necessita, sem que, para tanto, necessite permanecer segregada; • Assim, tem imediatamente o direito ao acesso e à permanência no ambiente comum, independentemente do tipo de deficiência que tiver e de seu grau de comprometimento; • Para que isso aconteça, a sociedade tem de se reajustar de forma a se tornar acolhedora para todos; • Isso deverá acontecer em cada comunidade, em todos os níveis de ação pública, em todos os ambientes, em todas as instâncias. (BRASIL, 2005b, p.08).
Porém, o cumprimento de tais objetivos requer a existência de sistemas educacionais
planejados e organizados, pois as particularidades de cada um devem ser respeitadas:
Algumas pessoas aprendem melhor por via visual, ou seja, lendo textos, assistindo cenas; outras aprendem melhor por via auditiva, ou seja, ouvindo o professor, ou lendo em voz alta; algumas pessoas compreendem melhor um fato ou um fenômeno qualquer se puderem lidar com ele concretamente; outras pessoas já têm facilidade para compreender o mesmo fenômeno, ainda que dele se trate abstratamente, ou seja, no nível da imaginação, da elaboração de idéias. (BRASIL, 2005b, p.10-11).
Para Mazzotta (1999), se a Declaração de Salamanca for seguida corretamente
contribuirá muito para um ensino de qualidade para as pessoas portadoras de necessidades
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especiais. As crianças com necessidades especiais têm direito à educação em comunidades
escolares inclusivas, beneficiando-se do apoio necessário ao seu desenvolvimento possível.
De acordo com a autora, a Declaração de Salamanca, por ser um documento claro e
exigente quanto aos deveres de uma escola inclusiva, ampliou o conceito de necessidades
educacionais especiais, incluindo todas as crianças que não estejam conseguindo se beneficiar
com a escola, seja qual for o motivo.
Porém, muitos mitos comportamentais foram criados ao longo da história. Dentre eles
podemos destacar:
• O surdo é agressivo e atrapalha o andamento da aula; • O deficiente mental não aprende e atrapalha o andamento da aula; • O deficiente mental é chato, pegajoso, não respeita limites; • O cego é meio por fora e “molão”, de forma que nem aproveita muito das aulas; • A criança que tem paralisia cerebral é perigosa, agressiva, não dá para conviver com outras crianças; • A criança que tem paralisia cerebral é retardada, nunca vai aproveitar nada do ensino em uma classe regular; • As crianças com deficiência têm inúmeros problemas de comportamento; • As crianças com deficiência têm problemas e necessitam de cuidados que só os educadores especiais são capazes de dar; • As crianças com deficiência são dependentes e incapazes de fazer qualquer coisa sozinhas. (BRASIL, 2005b, p.13).
A análise das características dos portadores de necessidades especiais, no entanto,
revela peculiaridades comportamentais, por exemplo, afirmar que o surdo é agressivo e
atrapalha o andamento da aula é errôneo e generalista, pois há também surdos que aprenderam
a leitura labial, os que estão oralizados (falam), os que se utilizam da língua brasileira de
sinais para se comunicar, os que emitem sons estridentes, os mais tímidos que se fecham em
seu silêncio, os que são mais agitados, bem como os mais tranquilos, os que já foram
alfabetizados e os ainda não alfabetizados.
Do mesmo modo, o deficiente mental, enquanto for oferecida a oportunidade, ele
aprenderá. “Há que se elaborar um plano de ensino que atenda a diversidade de todos os
alunos, inclusive os que apresentam dificuldades cognitivas, seja associada à deficiência
mental ou não” (BRASIL, 2005b, p.16).
As características expostas acima, muitas vezes, remetem a atitudes excludentes.
Porém, é função do professor levar em consideração as necessidades educacionais específicas
de cada educando. Assim, para a elaboração de um projeto pedagógico é necessário,
primeiramente:
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• Identificar o perfil de seu alunado; • Identificar o conjunto das necessidades educacionais especiais nele presentes; • Desenvolver estudos-pilotos que possam resultar em conhecimento acerca de que práticas e procedimentos melhor atenderão às suas peculiaridades, necessidades e possibilidades; • Desenvolver um projeto pedagógico consistente com os dados acima mencionados, delineados a atender e a acolher a todos no sistema educacional. (BRASIL, 2005b, p.16).
Além das ações acima é imprescindível também:
• Estudo crítico cuidadoso sobre a realidade no qual ele estará inserido (necessidades, desejos, objetivos, metas, problemas existentes, desvantagens, vantagens, fatores favoráveis, etc.); • Identificação de procedimentos que resolvam os problemas e aumentem os fatores que contribuam para o alcance de seus objetivos e metas; • Elaboração de cronograma realista e viável de implementação do processo; • Caracterização do sistema e dos procedimentos de suporte que serão necessários para garantir o sucesso do processo; • Elaboração e planejamento do sistema de avaliação do programa que permita acompanhar continuamente o cotidiano de sua implementação, permitindo também identificar as intervenções que se mostrem necessárias para garantir seu sucesso, materializado no alcance dos objetivos. (BRASIL, 2005b, p.17).
No que diz respeito à inclusão escolar, portanto, o papel do professor é fundamental
“para responder e atender às necessidades educacionais de todos os alunos” (BRASIL, 2005b,
p.19), inclusive às dos alunos com necessidades especiais, garantindo-lhes o acesso e a
permanência na escola regular.
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CAPÍTULO 2 – DIFERENTES SIM, INCAPAZES NÃO
No decorrer da história, os indivíduos portadores de necessidades especiais, definidos
apenas como viventes e considerados ineducavéis, eram sumarimente excluídos do convívio
social e educacional (MENDES, 2006, p. 387).
As primeiras tentativas de educar crianças consideradas ineducáveis foram
desenvolvidas pelo médico Jean Marc Itard (1774-1838), no início do século XIX, de acordo
com Miranda (2003, p.01).
Para a autora, outros importantes representantes que, influenciados por Itard,
contribuíram para a evolução da educação especial foram o também médico Edward Seguin
(1812-1880), que criou o método fisiológico de treinamento, que consistia em estimular o
cérebro por meio de atividades físicas e sensoriais, além da educadora Maria Montessori
(1870-1952), que desenvolveu um programa de treinamento para crianças deficientes mentais,
baseado no uso sistemático e manipulação de objetos concretos.
Ainda de acordo com Miranda (2003), as metodologias desenvolvidas por estes
estudiosos na tentativa de educabilidade das crianças denominadas “idiotas” e que se
encontravam em instituições eram realizadas tendo em vista a cura ou eliminação da
deficiência através da educação.
Apesar de algumas escassas experiências inovadoras desde o século XVI, o cuidado foi meramente custodial, e a institucionalização em asilos e manicômios foi a principal resposta social para tratamento dos considerados desviantes. Foi uma fase de segregação, justificada pela crença de que a pessoa diferente seria mais bem cuidada e protegida se confinada em ambiente separado, também para proteger a sociedade dos “anormais”. (MENDES, 2006, p. 387).
Assim, segundo Mendes (2006), a educação especial foi constituindo-se como um
sistema paralelo ao sistema educacional geral, até o surgimento das propostas de unificação
reforçadas pelos movimentos sociais pelos direitos humanos, intensificados basicamente na
década de 1960.
Os movimentos sociais pelos direitos humanos, conscientizaram e sensibilizaram a sociedade sobre os prejuízos da segregação e da marginalização de indivíduos de grupos com status minoritários, tornando a segregação sistemática de qualquer grupo ou criança uma prática intolerável. Tal contexto alicerçou uma espécie de base moral para a proposta de integração escolar, sob o argumento irrefutável de que todas as crianças com deficiências teriam o direito inalienável de participar de todos os programas e atividades cotidianas que eram acessíveis para as demais crianças. (MENDES, 2006, p 388).
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Neste contexto, inicia-se na década de 1970, o movimento de integração, com o
objetivo de normalização, visando oferecer às pessoas com necessidades especiais condições
semelhantes às oferecidas na sociedade em que ela está inserida, “até que emergiu o discurso
em defesa da ‘educação inclusiva’, a partir de meados da década de 1990” (MENDES, 2006,
p.397).
Neste sentido, percebemos um avanço na história dos portadores de necessidades
especiais, pois trouxe expectativas para a família e a escola, sendo fundamental trabalhar
todos juntos para que o desenvolvimento das crianças fosse maior.
2.1 A importância da família e da escola no processo da inclusão escolar
A família é a fundamental fonte de conhecimento das crianças especiais no que diz
respeito à aprendizagem das questões sociais básicas. No início da infância, as interações
ocorridas exercem uma ação importante no desenvolvimento social das crianças, estudos
divulgam que a voz dos pais é capaz de ser compensada com outros estímulos: como o
sorriso, demonstrações de carinho, carícias.
Em relação à interação dos pais de crianças portadoras de necessidades especiais no
sentido de promover a inclusão, a Declaração de Salamanca é bem clara: “58. Pais constituem
parceiros privilegiados no que concerne as necessidades especiais de suas crianças, e desta
maneira eles deveriam, o máximo possível, ter a chance de poder escolher o tipo de provisão
educacional que eles desejam para suas crianças” (DECLARAÇÃO DE SALAMANCA,
1994, p.14).
Possivelmente, é da família a formação educacional mais importante. Os pais estão
presentes na maior parte dos anos referentes ao desenvolvimento dos traços de personalidade,
atitude e valores na criança. Depois da família, porém, a instituição mais relevante é a escola,
ao rever e ampliar o conjunto de informações culturais, estimular a necessidade de efetivação,
oferecer oportunidades.
Assim, na medida em que os anos vão passando, as crianças vão convivendo cada vez
mais com pessoas fora do ambiente familiar, pessoas essas que passam a ter participação
ligada à socialização das crianças.
Nesse sentido, a escola tem grande importância, pois possibilita à criança a
oportunidade de estar em um grupo mais amplo, para que cada uma perceba as diferenças
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entre culturas em um mesmo ambiente escolar, e aprenda que os colegas não são iguais uns
com os outros, aproveitando ainda os benefícios do convívio com outras crianças.
Na escola, o aluno com necessidades especiais é de responsabilidade de toda a unidade
escolar, ao contrário do que muitos pensam, de que esta responsabilidade é só do professor.
Muitos alunos estão entrando nas escolas e tem de haver compreensão da mesma sobre o que
é ensinar. Carvalho (1997) afirma:
Todas as escolas deveriam acomodar todas as crianças independentemente de suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais, linguísticas ou outras. Deveriam incluir crianças deficientes e superdotadas, crianças de rua e que trabalham, crianças de origem remota ou de população nômade, crianças pertencentes à minorias linguísticas, étnicas ou culturais e crianças de outros grupos em desvantagem ou marginalizados [...] No contexto destas Linhas de Ação o termo “necessidades educacionais especiais” refere-se a todas aquelas crianças ou jovens cujas necessidades se originam em função de deficiências ou dificuldades de aprendizagem. (CARVALHO, 1997, p.56).
No entanto, de acordo com Fávero (2006, p.255), apesar de a educação ser um direito
humano, fundamental, e ter a escola como via principal, é comum a recusa de alunos pelos
mais diferentes motivos, que vão desde uma pequena dificuldade de aprendizado, até uma
deficiência grave, mas que não impede o aluno de uma interação, ainda que pequena, com os
demais.
Dessa forma, no sentido de reforçar a obrigação do país em prover a educação, é
publicada, em dezembro de 1996, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº.
9.394/96. Esta lei, em seu capítulo V, trata especificamente da Educação Especial e expressa
no artigo 58: “Entende-se por educação especial, para os efeitos desta lei, a modalidade de
educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos
portadores de necessidades especiais” (BRASIL, 1996, Art.58).
Contudo, a efetivação de uma prática educacional inclusiva não será garantida
somente por meio de leis, decretos ou portarias, ou seja, é necessário que a escola esteja
preparada para trabalhar com os alunos com necessidades educacionais especiais,
independentemente de suas diferenças ou características individuais.
Em lei, muitas conquistas foram alcançadas. Entretanto, precisamos garantir que essas conquistas, expressas nas leis, realmente possam ser efetivadas na prática do cotidiano escolar, pois o governo não tem conseguido garantir a democratização do ensino, permitindo o acesso, a permanência e o sucesso de todos os alunos do ensino especial na escola. (MIRANDA, 2003, p.06).
21
A inclusão, assim, é vista como um processo que tem como objetivo que todos os
alunos fiquem juntos na mesma escola, em contato com colegas da mesma faixa etária, para
que favoreça o aluno com necessidades educacionais especiais para um melhor
desenvolvimento e uma socialização mais completa e para os demais alunos um contato com
metodologias mais individualizadas e atitudes de respeito e solidariedade. Para o sistema
educacional como um todo, acredita-se que a inclusão amplia a competência profissional dos
docentes.
Com a inclusão, a preocupação é de preparar a criança para estar na escola, ajudando-a
a adquirir as habilidades que precisa. Não há preocupação de mudanças na escola. Prepara-se
a criança para estar na escola, como ela é (MARTINO, 1999).
Porém, segundo Mantoan (2006, p.205), pais de crianças com necessidades especiais e
alguns educadores brasileiros não são favoráveis à educação inclusiva, chegando ao ponto de
sugerirem que se faça a “inclusão às avessas”, trazendo crianças sem “deficiência” para
estudarem nos institutos que promovem educação especial. “O desafio maior que temos hoje é
convencer os pais, especialmente os que têm filhos excluídos das escolas comuns, de que
precisam fazer cumprir o que nosso ordenamento jurídico prescreve quando se trata do direito
à educação” (MANTOAN, 2006, p.206).
A autora destaca três formas de encaminhamento escolar para alunos portadores de
necessidades especiais: os que são dirigidos unicamente ao ensino especial; os inseridos
parcialmente, ou melhor, integrados em salas de aula de escolas comuns, mas na condição de
estarem preparados e aptos a frequentá-las; e os que determinam a inclusão total e
incondicional de todos os alunos com “deficiência” no ensino regular, provocando a
transformação das escolas para atender às suas diferenças e às dos demais colegas, que não
possuem necessidades especiais.
Para Mantoan (2006, p.207), a diferenciação por “deficiência” promove falsas
soluções, dificulta a real inclusão e incita ainda mais os debates a respeito da inserção de
alunos com necessidades especiais nas escolas comuns, além de descumprir a legislação
pertinente.
A condição primeira para que a inclusão deixe de ser uma ameaça ao que hoje a escola defende e adota habitualmente como prática pedagógica é abandonar tudo o que a leva a tolerar as pessoas com deficiência nas turmas comuns, por meio de arranjos criados para manter as aparências de “bem intencionada”, sempre atribuindo a esses alunos o fracasso, a incapacidade de acompanhar o ensino comum. Para reverter esse sentimento de superioridade em relação ao outro, especialmente quando se trata de alunos com deficiência, a escola terá de enfrentar a si mesma, reconhecendo o modo como produz as diferenças nas salas de aula:
22
agrupando-as por categorias ou considerando cada aluno o resultado da multiplicação infinita das manifestações da natureza humana e, portanto, sem condições de ser encaixado em nenhuma classificação artificialmente atribuída, como prescreve a inclusão. (MANTOAN, 2006, p.207-208).
Ainda sobre barreiras inclusivas, Baptista (2006, p.231) diz ser fundamental para o
sucesso de qualquer projeto educativo a boa relação escola-família, uma vez que:
A criança chega à escola depois de anos de convívio no ambiente familiar e tem um cotidiano que se completa, atualiza-se, modifica-se nas relações externas aos limites da escola. A escola pode ter um importante papel no sentido de auxiliar os pais a conhecerem melhor os filhos e a contribuírem com suas aprendizagens que muitas vezes parecem estagnadas. (BAPTISTA, 2006, p.231).
Com relação à pessoa do educador e as práticas pedagógicas, o autor considera o
autoconhecimento e a busca de referenciais os passos primordiais para a concretização da
inclusão. “É preciso ter como referência a história da educação e atualizar um debate que
confira sentido a um plano educativo que esteja pautado em uma discussão ético-político-
pedagógica” (BAPTISTA, 2002b, p.164 apud BAPTISTA, 2006, p.230).
No que diz respeito aos direitos humanos, Castilho (2006, p.250) é categórica, ao dizer
que a escola possui papel essencial no sentido de garantir o direito à igualdade e à
diversidade, pois é um espaço sociocultural. “Se as diferentes presenças forem asseguradas
aumenta a potencialidade da escola para a construção de uma sociedade mais igualitária, sem
preconceito nem discriminação ou outras formas correlatas de intolerância”. Está nas mãos
dos gestores e educadores destruir ou perpetuar os preconceitos.
No documento gerado a partir do III Seminário Nacional de Formação de Gestores e
Educadores (BRASIL, 2006, p.195), “a inclusão social e educacional só se efetiva quando a
escola abre suas portas a todos, sem discriminação, permitindo o acesso ao conhecimento com
igualdade de oportunidade”.
2.2 Dificuldades na construção de espaços inclusivos
A construção de sistemas educacionais inclusivos implica em mudanças estruturais e
culturais da escola para que todos os alunos tenham suas especificidades atendidas. Neste
sentido, não basta matricular alunos com necessidades educacionais nas classes de ensino
comum, é essencial que se observe as possibilidades de permanência.
23
A escola como espaço inclusivo deve considerar como seu principal desafio o sucesso
de todos os seus alunos, sem exceção.
Os sistemas escolares deverão assegurar a matrícula de todo e qualquer aluno, organizando-se para o atendimento aos educandos com necessidades educacionais especiais nas classes comuns. Isto requer ações em todas as instâncias, concernentes à garantia de vagas no ensino regular para a diversidade dos alunos, independentemente das necessidades especiais que apresentem; a elaboração de projetos pedagógicos que se orientem pela política de inclusão e pelo compromisso com a educação escolar desses alunos; o provimento, nos sistemas locais de ensino, dos necessários recursos pedagógicos especiais, para apoio aos programas educativos e ações destinadas à capacitação de recursos humanos para atender às demandas desses alunos. (BRASIL, 2001a, p.12).
O processo de inclusão não é simples, requer disposição tanto por parte da escola
(educadores e gestores), como envolvimento total dos pais, no sentido de inserir a pessoa
portadora de necessidades especiais na sociedade em que vive.
A família dos discentes que apresentam necessidades educacionais especiais, muitas
vezes, são os primeiros a promoverem a exclusão quando permitem que seus filhos sejam
atendidos em entidades segregacionistas, afastando-os do convívio familiar.
É inegável, porém, o fato de muitas escolas precisarem de reformas e reformulações
tanto em relação ao acesso executando mudanças na estrutura física, como adaptações na
política educacional. Assim, o esforço coletivo demonstra que a inclusão é possível.
A escolarização dos portadores de necessidade especiais no ensino regular está
previsto em leis, porém admite quando necessário apoio especializado, sugerindo, portanto,
junção da educação especial com a educação inclusiva.
A Lei n°. 9.394/96 estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. De acordo
com o artigo 59:
Art. 59. Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com necessidades especiais: I – currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específicos, para atender às suas necessidades; II – terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir o nível exigido para a conclusão do ensino fundamental, em virtude de suas deficiências, e aceleração para concluir em menor tempo o programa escolar para os superdotados; III – professores com especialização adequada em nível médio ou superior, para atendimento especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns; IV – educação especial para o trabalho, visando a sua efetiva integração na vida em sociedade, inclusive condições adequadas para os que não revelarem capacidade de inserção no trabalho competitivo, mediante articulação com os órgãos oficiais afins, bem como para aqueles que apresentam uma habilidade superior nas áreas artística, intelectual ou psicomotora; V – acesso igualitário aos benefícios dos programas sociais suplementares disponíveis para o respectivo nível do ensino regular.
24
Neste contexto, deve ser levada em consideração, por exemplo, a importância da
Língua Brasileira de Sinais como meio de comunicação para os surdos, o sistema Braille para
os cegos e o uso da informática para o paralisado cerebral.
No entanto, mesmo a maioria dos educadores sendo favorável às práticas inclusivas,
muitos admitem terem dificuldades para lidar com o acesso das pessoas com necessidades
educacionais especiais no ensino regular e veem a inclusão como imposição do sistema
educacional.
Apesar de educadores e gestores serem conscientes do papel da escola, das disposições
legais e, principalmente, dos benefícios que a implementação dos processos inclusivos trará
para a sociedade, ainda assim apontam barreiras:
As escolas, de modo geral, têm conhecimento da existência das leis acerca da inclusão de pessoas com necessidades educacionais especiais no ambiente escolar e da obrigatoriedade da garantia de vaga para estas. As equipes diretivas respeitam e garantem a entrada destes alunos, mostrando-se favoráveis à política de inclusão, mas apontam alguns entraves pelo fato de não haver a sustentação necessária como por exemplo, a ausência de definições mais estruturais acerca da educação especial e dos suportes necessários a sua implementação. (BRASIL, 2005a, p.25).
A transformação do espaço escolar para atendimento dos educandos portadores de
necessidades especiais ainda provoca certa resistência, uma vez que tal reformulação implica
em adaptação do currículo, com modificação das formas de ensinar, avaliar, trabalhar com
grupos em sala de aula e a adequação das estruturas físicas para ingresso e circulação de todas
as pessoas.
A educação inclusiva implica na implementação de políticas públicas, na compreensão da inclusão como processo que não se restringe à relação professor-aluno, mas que seja concebido como um princípio de educação para todos e valorização das diferenças, que envolve toda a comunidade escolar. (BRASIL, 2005a, p.26).
A família do aluno com necessidades educacionais especiais, também, deveria ser a
primeira facilitadora da inclusão, no entanto, por não reconhecer as reais possibilidades da
criança é apontada muitas vezes como um entrave do processo de inclusão educacional.
A escola, sendo um lugar de socialização, deve ter a função de orientar pais que são
desfavoráveis à inclusão de que o convívio com a diversidade é essencial para o
desenvolvimento educacional dos discentes portadores de deficiências.
Mas, “o despreparo dos professores figura entre os obstáculos mais citados para a
educação inclusiva, o qual tem como efeito o estranhamento do educador com aquele sujeito
25
que não está de acordo com os padrões de ensino e aprendizagem da escola” (MEC/SEE,
BRASIL, 2005a, p.28).
Além da formação profissional, a falta de recursos e materiais para atender a demanda
grande de alunos em sala de aula representa outra barreira para o processo de inclusão. Muitos
educadores, ”consideram que classes com menor número de alunos seriam mais acolhedoras e
possibilitariam um trabalho mais cuidadoso” (MEC/SEE, BRASIL, 2005a, p.28).
26
CAPÍTULO 3 – OS DESAFIOS DA INCLUSÃO ESCOLAR
A inclusão de alunos com necessidades especiais no sistema regular de ensino tem
sido um contexto bastante debatido, tanto na parte educacional como na parte social.
A idéia de incorporar crianças com necessidades educacionais especiais na escola
comum, não é nova, pois está presente desde o movimento pela integração escolar, que,
entretanto, centrava o problema na criança. A inclusão, por outro lado, estabelece que as
diferenças humanas são normais, mas ao mesmo tempo reconhece que a escola, de certa
forma, provoca uma acentuação nas desigualdades associadas à existência das diferenças de
origem pessoal, social, cultural e política, e, por isso, necessita de reforma educacional para
prover uma educação de qualidade para todas as crianças (MENDES, 2006).
[...] Operacionalizar a inclusão escolar – de modo que todos os alunos, independentemente de classe, raça, gênero, sexo, características individuais ou necessidades educacionais especiais, possam aprender juntos em uma escola de qualidade – é o grande desafio a ser enfrentado, numa clara demonstração de respeito à diferença e compromisso com a promoção dos direitos humanos. (BRASIL, 2001a, p.11).
Os desafios no sentido de promover uma educação que não exclui pelas limitações tem
sido o foco de diversos debates e a alternativa legal mais viável é a educação inclusiva no
sistema regular em todos os níveis e modalidades.
As instituições segregacionistas foram, por um longo período da história, as únicas
entidades a promoverem as práticas educacionais direcionadas a alunos com necessidades
especiais. Tal modelo de escolarização provocou a existência de um sistema paralelo, que se-
gregava e impedia a inclusão escolar dos alunos nas escolas da rede regular de ensino.
Porém, a Resolução CNE/CEB nº. 02/2001 institui as Diretrizes Nacionais para a
Educação Especial na Educação Básica, com base na LDB, orientando os sistemas tanto para
a prática da inclusão, quanto para o atendimento educacional especializado, implicando na
obrigatoriedade do atendimento educacional de alunos com necessidades educacionais
especiais no sistema regular de ensino.
No entanto, a inclusão escolar dos educandos portadores de necessidades especiais não
representa tarefa fácil. Muitos aspectos precisam ser revistos. A ênfase maior está na
problemática da formação de professores especializados e na adaptação curricular do sistema
escolar regular.
27
É imprescindível, portanto, investir na criação de uma política de formação continuada para os profissionais da educação. A partir dessa, seria possível a abertura de espaços de reflexão e escuta sistemática entre grupos interdisciplinares e interinstitucionais, dispostos a acompanhar, sustentar e interagir com o corpo docente. (BRASIL, 2005a, p.22).
3.1 A formação de professores especializados
A formação dos professores
para o ensino na diversidade, bem como para o
desenvolvimento de trabalho em equipe são essenciais para a efetivação da inclusão.
Para formar educadores que atendam as exigências deste novo paradigma educacional
faz-se necessário reformulações na estrutura curricular dos cursos de nível superior,
atualmente oferecidos nas instituições educacionais.
Outras dificuldades encontradas na formação dos educadores, que atendam alunos
com necessidades educacionais especiais, são as diferenças sócio-culturais existentes em
nosso país. Para atender esta diversidade, a utilização de uma linguagem acessível a todos é
recomendada nos materiais dirigidos à formação de educadores, além do que, a simplificação
e a superficialidade dos conteúdos propostos se distanciam das situações problemáticas
concretas de cada realidade.
A formação do professor deve ser um processo contínuo, que perpassa sua prática com os alunos, a partir do trabalho transdisciplinar com uma equipe permanente de apoio. É fundamental considerar e valorizar o saber de todos os profissionais da educação no processo de inclusão. Não se trata apenas de incluir um aluno, mas de repensar os contornos da escola e a que tipo de Educação estes profissionais têm se dedicado. Trata-se de desencadear um processo coletivo que busque compreender os motivos pelos quais muitas crianças e adolescentes também não conseguem encontrar um “lugar” na escola. (BRASIL, 2005a, p.21).
A Resolução CNE/CEB nº. 02/2001 estabelece que todos os professores de educação
especial e os que atuam em classes comuns deverão ter formação para as respectivas funções,
principalmente os que atuam em serviços de apoio pedagógico especializado.
A inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais em classes comuns do
ensino regular, como meta das políticas de educação, exige interação constante entre
professor da classe comum e os dos serviços de apoio pedagógico especializado, sob pena de
alguns educandos não atingirem rendimento escolar satisfatório.
Os serviços de apoio pedagógico especializado, ou outras alternativas encontradas pela
escola, devem ser organizados e garantidos nos projetos pedagógicos e regimentos escolares,
desde que devidamente regulamentados pelos competentes Conselhos de Educação.
28
Segundo Goffredo (1999), o funcionamento de uma escola depende de uma política
educacional que atenda a todos e de professores capazes de identificar e atender as
necessidades especiais de aprendizagem de pessoas deficientes ou não.
Assim, os cursos de formação de professores devem ter como finalidade, no que se refere aos futuros professores, a criação de uma consciência crítica sobre a realidade que eles vão trabalhar e o oferecimento de uma fundamentação teórica que lhes possibilite uma ação pedagógica eficaz. (GOFFREDO, 1999, p.68).
Para tanto, a autora aponta alguns conhecimentos que devem ser construídos pelos
educadores para promover a aprendizagem dos alunos portadores de necessidades especiais
durante os cursos de formação inicial e continuada. Entre eles estão:
• Mecanismos funcionais de cognição das pessoas com deficiência; • Consciência das suas próprias condições, conhecimentos pedagógicos e metacognitivos; • Desenvolvimento da capacidade de auto-regular e de tomar consciência das etapas do processo de ensino e aprendizagem; • Coerência entre sua maneira de ser e ensinar, entre teoria e prática; • Capacidade de ministrar aulas sobre um mesmo conteúdo curricular a alunos que têm níveis diferentes de compreensão e de desempenho acadêmico; • Respeito ao ritmo de aprendizagem de cada aluno; • Utilização flexível dos instrumentos de avaliação de desempenho escolar, adequando-os às necessidades dos alunos. (GOFFREDO, 1999, p.69).
No que diz respeito à formação do educador, as recomendações feitas pela Associação
Nacional pela Formação de Profissionais da Educação (ANFOPE), em 1980, devem ser
acrescentadas:
• Ter a docência como base da sua identidade profissional; • Dominar o conhecimento específico de sua área, articulado ao conhecimento pedagógico, numa perspectiva de totalidade de conhecimento socialmente produzido, que lhe permite perceber as relações existentes entre as atividades educacionais e a totalidade das relações sociais em que o processo educacional ocorre; • Ser capaz de atuar como agente de transformação da realidade na qual se insere. (GOFFREDO, 1999, p.69-70).
A escola tem papel fundamental para a aprendizagem e facilitação da inclusão, quer
fornecendo material didático adaptados, quer oferecendo cursos aos educadores com a
finalidade de conhecer novas práticas de ensino e adaptando o currículo escolar para atender a
individualidade de cada educando.
29
Na perspectiva da educação inclusiva, a Resolução CNE/CP nº 1/2002, que estabelece as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica, define que as instituições de ensino superior devem prever, em sua organização curricular, formação docente voltada para a atenção à diversidade e que contemple conhecimentos sobre as especificidades dos alunos com necessidades educacionais especiais. (BRASIL, 2005a, p.27).
Considerando ainda a formação do professor para a educação inclusiva é essencial que
nos cursos sejam trabalhados conteúdos referentes à conceituação dos diferentes tipos de
deficiências, bem como a adaptação das práticas pedagógicas para atender esses educandos
(GOFFREDO, 1999).
Assim, de acordo com Goffredo (1999), é muito importante que os futuros professores
tenham sensibilidade para lidar com as novas situações que surgirão no interior da sala de aula
e percepção suficiente para avaliar a eficácia da prática pedagógica aplicada no processo de
ensino aprendizagem.
É necessário também, que a formação de profissionais da educação esteja de acordo
com os fundamentos previstos no capítulo VI da Lei Nacional de Diretrizes e Bases da
Educação (Lei nº. 9.394/96), que prevê que os alunos com deficiências sejam atendidos por
professores especializados e capacitados para a integração desses educandos nas classes
comuns, aponta Goffredo (1999).
Cabe aqui ressaltar algumas habilidades e atribuições do professor para o trabalho com
educandos portadores de necessidades especiais:
• Atuar, como docente, nas atividades de complementação ou suplementação curricular específica que constituem o atendimento educacional especializado dos alunos com necessidades educacionais especiais; • Atuar de forma colaborativa com o professor da classe comum para a definição de estratégias pedagógicas que favoreçam o acesso do aluno ao currículo e a sua interação no grupo; • Promover as condições para a inclusão dos alunos com necessidades educacionais especiais em todas as atividades da escola; • Orientar as famílias para o seu desenvolvimento e a sua participação no processo educacional; • Informar a comunidade escolar acerca da legislação e normas educacionais vigentes que asseguram a inclusão educacional; • Participar do processo de identificação e tomada de decisões acerca do atendimento às necessidades educacionais especiais dos alunos; • Preparar material específico para uso dos alunos na sala de recursos; • Orientar a elaboração de materiais didático-pedagógicos que possam ser utilizados pelos alunos nas classes comuns do ensino regular; • Indicar e orientar o uso de equipamentos e materiais específicos e de outros recursos existentes na família e na comunidade; • Articular com gestores e professores, para que o projeto pedagógico da instituição de ensino se organize coletivamente numa perspectiva de educação inclusiva;
30
• Participar das reuniões técnico-pedagógicas, do planejamento, dos conselhos de classe, da elaboração do projeto pedagógico, desenvolvendo ação conjunta com os professores da classe comum e demais profissionais da escola para a promoção da inclusão escolar. (ALVES; GOTTI, 2006, p.269-270).
Frente ao exposto, para Goffredo (1999) é fundamental ressaltar que o modelo
brasileiro de educação profissional está longe de atender o paradigma da inclusão. Portanto,
ações como adaptações curriculares e formação continuada dos professores são
imprescindíveis para concretizar a educação inclusiva.
Uma política efetivamente inclusiva deve ocupar-se com a desinstitucionalização da exclusão, seja ela no espaço da escola ou em outras estruturas sociais. Assim, a implementação de políticas inclusivas que pretendam ser efetivas e duradouras devem incidir sobre a rede de relações que se materializam através das instituições já que as práticas discriminatórias que elas produzem extrapolam, em muito, os muros e regulamentos dos territórios organizacionais que as evidenciam. (BRASIL, 2005a, p.08).
Ainda para o sucesso do sistema inclusivo, segundo Ferreira (2006, p.317) é
necessário: garantir o acesso à educação de qualidade em qualquer nível educacional, preparar
todos os docentes brasileiros para ensinar usando didáticas inovadoras que promovam a
inclusão e formar docentes capazes de educar na diversidade. Para o autor:
Desenvolver qualidade educacional e promover o desenvolvimento profissional de docentes para educar na diversidade, em um país com dimensões territoriais e pluralidade cultural significativas, como é o caso do Brasil, não é tarefa para poucos ou de curto prazo. Todos devemos estar conscientes de que o processo de mudança acarretará turbulências, temor, desacordos entre áreas de conhecimentos, dúvidas e inseguranças que podem nos imobilizar. Contudo, as mudanças são necessárias e urgentes, e, para alcançá-las é preciso estabelecer alianças e parcerias, realizar trocas e compartilhar experiências de sucesso ou de fracasso. Somente assim, superando as barreiras que nos imobilizam e atemorizam, seremos capazes de construir sistemas educacionais mais justos e igualitários, mais humanizados e humanizadores para educador e para cada criança, jovem e adulto que representam a diversidade existente no país. (FERREIRA 2006, p.322).
Além disso, conforme o documento “Política Nacional de Educação Especial na
Perspectiva da Educação Inclusiva”, elaborado pelo MEC/SEESP:
Para atuar na educação especial, o professor deve ter como base da sua formação, inicial e continuada, conhecimentos gerais para o exercício da docência e conhecimentos específicos da área. Essa formação possibilita a sua atuação no atendimento educacional especializado e deve aprofundar o caráter interativo e interdisciplinar da atuação nas salas comuns do ensino regular, nas salas de recursos, nos centros de atendimento educacional especializado, nos núcleos de acessibilidade das instituições de educação superior, nas classes hospitalares e nos ambientes domiciliares, para a oferta dos serviços e recursos de educação especial. (BRASIL, 2008, p.17-18).
31
3.2 A adaptação do currículo da escola regular
Trabalhar com pessoas que possuem habilidades e competências diferentes, que
possuem expressões culturais e marcas sociais próprias requer certas modificações ou
adaptações no programa educacional.
A questão da adaptação do currículo educacional da escola regular tem despertado
grandes reflexões no que diz respeito ao sucesso da inclusão, uma vez que:
A política de inclusão de alunos que apresentam necessidades educacionais especiais na rede regular de ensino não consiste apenas na permanência física desses alunos junto aos demais educandos, mas representa a ousadia de rever concepções e paradigmas, bem como desenvolver o potencial dessas pessoas, respeitando suas diferenças e atendendo suas necessidades (BRASIL, 2001a, p.12).
Neste sentido, o atual currículo educacional da escola regular representa um grande
desafio para os alunos com necessidades especiais, por não levar em conta as particularidades
dos discentes, sendo a prática pedagógica trabalhada de forma uniforme.
De acordo com Carvalho (1999),
A prática da inclusão na realidade brasileira revela algumas dificuldades: despreparo do sistema regular de ensino para atuar no processo; resistência da comunidade escolar na aceitação dos alunos (cf. Carvalho & Monte, 1994); e fatores diversos de natureza familiar, institucional e sociocultural. (CARVALHO, 1999, p.52).
Entretanto, conforme Carvalho (1999), a vivência escolar demonstra que a inclusão é
possível quando se observam providências como preparação e dedicação dos professores,
apoio especializado para os que necessitam e a realização de adaptações curriculares e de
acesso ao currículo, se necessários.
Para a autora, a adaptação do currículo é uma alternativa para o sucesso da
aprendizagem dos portadores de necessidade especial. Esta adaptação inclui modificações nos
conteúdos trabalhados, na forma de avaliação, na metodologia e organização didática, na
temporalidade e na organização curricular.
Conforme o Parecer CNE/CEB nº. 17/2001:
O currículo, em qualquer processo de escolarização, transforma-se na síntese básica da educação. Isto nos possibilita afirmar que a busca da construção curricular deve ser entendida como aquela garantida na própria LDBEN, complementada, quando necessário, com atividades que possibilitem ao aluno que apresenta necessidades educacionais especiais ter acesso ao ensino, à cultura, ao exercício da cidadania e à inserção social produtiva. (BRASIL, 2001a, p.27).
32
Conforme determinam os Artigos 26, 27 e 32 da LDB, os currículos devem ter uma
base nacional comum, a ser complementada por uma parte diversificada, o que é uma
exigência, tendo em vista as características dos alunos.
Em casos muito singulares, em que o educando com graves comprometimentos mentais e/ou múltiplos não possa beneficiar-se do currículo da base nacional comum, deverá ser proporcionado um currículo funcional para atender às necessidades práticas da vida. (BRASIL, 2001a, p.27).
Neste sentido, conforme observa Carvalho (1999), as adaptações organizacionais
dizem respeito ao tipo de agrupamento de alunos para realizar atividades de ensino e
aprendizagem, à organização didática da aula e à organização dos períodos definidos para o
desenvolvimento das atividades previstas.
Por sua vez, as adaptações relativas aos objetivos e conteúdos referem-se à seleção,
priorização e sequenciamento de áreas ou unidades de conteúdos que garantam funcionalidade
e sejam essenciais e instrumentais para as aprendizagens posteriores, à seleção, inclusão e
priorização de objetivos e à eliminação e ao acréscimo de conteúdos, quando for necessário.
Quanto às adaptações avaliativas, estas dizem respeito à variação de critérios,
procedimentos, técnicas e instrumentos de ensino e aprendizagem, à variação nos critérios de
promoção.
Em relação às adaptações nos procedimentos didáticos e nas atividades de ensino e
aprendizagem são necessários: alteração nos métodos adotados para o ensino dos conteúdos
curriculares; introdução de atividades complementares ou alternativas, além das planejadas
para a turma; alteração do nível de abstração e de complexidade das atividades, oferecendo
recursos e apoio; e seleção de materiais e sua adaptação.
Já as adaptações na temporalidade dizem respeito à alteração no tempo previsto para a
realização das atividades ou conteúdos, ao período para alcançar determinados objetivos, ao
prolongamento ou redução no tempo de permanência do aluno na série, fase, ciclo ou etapa.
Por fim, as adaptações de acesso ao currículo incluem providências ou recursos muitas
vezes necessários aos alunos, tais como: mobiliários adequados; equipamentos específicos;
recursos materiais adaptados; formas alternativas e ampliadas de comunicação; modalidades
variadas de apoio para as atividades escolares; promoção de situações educacionais
diferenciadas; recursos humanos especializados ou de apoio; e adaptação espacial.
Portanto, para o sucesso da educação inclusiva é necessário maior disponibilidade de
material didático, adequação física dos edifícios escolares para receberem alunos com
necessidades especiais, preparação profissional dos professores para elaboração de um projeto
33
educativo que atenda às novas necessidades através de adaptações curriculares, dos materiais
pedagógicos e do sistema de avaliação e apoio psicopedagógico.
34
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Fundamentado no trabalho exposto, observa-se que, no decorrer da história, inúmeras
ações foram desenvolvidas no sentido de inserir pessoas portadoras de necessidades especiais,
seja no âmbito escolar ou social.
Os movimentos pela luta dos direitos humanos foram essenciais para amparar
legalmente esses indivíduos e conscientizar a sociedade que todos somos iguais perante a lei.
A inclusão, no entanto, não representa tarefa fácil. Vimos com Carvalho (1999) que a
prática da inclusão no contexto brasileiro revela dificuldades como o despreparo do sistema
regular de ensino para atuar no processo; a resistência da comunidade escolar na aceitação dos
alunos, além de fatores diversos de natureza familiar, institucional e sociocultural.
Todavia, a legislação vigente é muito clara quando estabelece no capítulo V, Artigo 58
da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº. 9.394/96), que a educação especial
deve ser oferecida preferencialmente na rede regular de ensino.
Cabe aqui destacar que a escola tem papel fundamental na facilitação da inclusão
educacional por ser um espaço sócio-cultural e por ser a via principal de aprendizagem.
Assim, é de extrema importância a criação de um projeto pedagógico que contemple a prática
docente inclusiva.
Mas, vimos também com Goffredo (1999) e Carvalho (1999) que o modelo brasileiro
de educação profissional está longe de atender ao paradigma da inclusão e que para o sucesso
da educação inclusiva ações como adaptações curriculares e formação continuada dos
professores são imprescindíveis.
Além disso, para Goffredo (1999), os cursos de formação de professores devem ter
como finalidade, a criação de uma consciência crítica sobre a realidade em que eles vão
trabalhar e o oferecimento de uma fundamentação teórica que lhes possibilite uma ação
pedagógica eficaz.
Dessa forma, é necessário ressaltar que a vivência escolar demonstra que a inclusão é
possível, porém requer maior preparo e dedicação dos professores, além de apoio
especializado quando necessário.
Para que a aprendizagem e a inclusão aconteçam de fato é essencial refletir, debater e
reformular, de modo consciente, a prática educativa, criando experiências a fim de colaborar
significativamente para o desenvolvimento e a aprendizagem dos portadores de necessidades
especiais, permitindo amplamente a comunicação e sua inserção ativa na sociedade.
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Com base no que foi discutido neste trabalho sugere-se, que todos, educadores,
gestores e sociedade, trabalhem juntos em prol de um objetivo comum: a educação inclusiva
na escola regular, uma vez que os benefícios do convívio com a diversidade serão
imensuráveis para o desenvolvimento de todos, especialmente dos educandos portadores de
necessidades especiais.
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REFERÊNCIAS
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