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Módulo III – Funções biológicas Problema 4: O André de Alina “Por vergonha do namorado André, Alina, 17 anos, procurou a UBS do seu bairro pois apresentava hirsutismo, além de estar com amenorreia primária. Os exames evidenciaram níveis elevados de 17-hidroxiprogesterona (17-OHP) e aumento do volume da suprarrenal direita com perda de sua morfologia na tomografia computadorizada (TC), confirmando o diagnóstico de hiperplasia congênita das suprarrenais (HCSR) parcial. Alina, que já andava estressada, perguntou se seu problema era grave. O médico respondeu: ‘- Alina, a alostase e homeostase são importantes para adequar o organismo às mudanças naturais durante as fases da vida. No seu caso HCSR é um erro inato do metabolismo dos esteroides, principalmente o cortisol. Vamos ajustar sua medicação e tudo voltará ao normal. Ainda bem que você procurou logo ajuda e não esperou a fase adulta, onde poderia ganhar peso e adquirir acne!’ Alina falou: ‘- Senti um frio na barriga só de pensar! Livre-me dessa, doutor!’, ‘Isso é adrenalina, Alina’, respondeu o médico! Objetivos de estudo: I. Definir e compreender alostase, homeostase e estresse; II. Sobre o cortisol: a) Sua produção; b) Mecanismo de ação (relação com o metabolismo dos esteroides); III. Definir Hiperplasia Congênita das Suprarrenais e compreender sua relação com o metabolismo dos esteroides; IV. Relacionar o cortisol com 17-hidroxiprogesterona, testosterona e adrenalina (catecolaminas); V. Relacionar o estresse com a produção de adrenalina e cortisol. OBJ 1: Alostase, homeostase e estresse. Homeostase: Historicamente, o termo homeostase foi usado para definir a “estabilidade do sistema fisiológico que mantém a vida”. A temperatura corporal é um exemplo: é mantida em seus níveis estreitos, mesmo com flutuações térmicas externas. É um sistema de ações que estabiliza o meio interno do organismo. O termo,

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Resumo estresse e cortisol

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Page 1: Cortisol

Módulo III – Funções biológicas

Problema 4: O André de Alina

“Por vergonha do namorado André, Alina, 17 anos, procurou a UBS do seu bairro pois apresentava hirsutismo, além de estar com amenorreia primária. Os exames evidenciaram níveis elevados de 17-hidroxiprogesterona (17-OHP) e aumento do volume da suprarrenal direita com perda de sua morfologia na tomografia computadorizada (TC), confirmando o diagnóstico de hiperplasia congênita das suprarrenais (HCSR) parcial. Alina, que já andava estressada, perguntou se seu problema era grave. O médico respondeu: ‘- Alina, a alostase e homeostase são importantes para adequar o organismo às mudanças naturais durante as fases da vida. No seu caso HCSR é um erro inato do metabolismo dos esteroides, principalmente o cortisol. Vamos ajustar sua medicação e tudo voltará ao normal. Ainda bem que você procurou logo ajuda e não esperou a fase adulta, onde poderia ganhar peso e adquirir acne!’ Alina falou: ‘- Senti um frio na barriga só de pensar! Livre-me dessa, doutor!’, ‘Isso é adrenalina, Alina’, respondeu o médico!

Objetivos de estudo:

I. Definir e compreender alostase, homeostase e estresse;II. Sobre o cortisol:

a) Sua produção;b) Mecanismo de ação (relação com o metabolismo dos esteroides);

III. Definir Hiperplasia Congênita das Suprarrenais e compreender sua relação com o metabolismo dos esteroides;

IV. Relacionar o cortisol com 17-hidroxiprogesterona, testosterona e adrenalina (catecolaminas);

V. Relacionar o estresse com a produção de adrenalina e cortisol.

OBJ 1: Alostase, homeostase e estresse.

Homeostase:

Historicamente, o termo homeostase foi usado para definir a “estabilidade do sistema fisiológico que mantém a vida”. A temperatura corporal é um exemplo: é mantida em seus níveis estreitos, mesmo com flutuações térmicas externas. É um sistema de ações que estabiliza o meio interno do organismo. O termo, então, define um processo que se mantém rígido, dentro de pequena amplitude, cujos limites, quando ultrapassados, provocam o rompimento do equilíbrio, levando à incompatibilidade com a vida. É, portanto, um conceito que beira a estática e que postula um funcionamento ideal para a manutenção do meio interno.

Alostase:

A concepção de alostase agrega a flexibilização, rompendo com a estática adaptativa, tornando essa necessidade um ato mais bem sucedido. Este conceito foi concebido por Peter Sterling e Joseph Eyer, tendo como propósito caracterizar a estabilidade na mudança. A partir dele, o foco se volta para uma dinâmica da adaptação interna.

Alostase, então, difere do conceito de homeostase, não na essência, mas em termos dinâmicos: é o momento que se alcança a estabilidade no processo de mudança; é o ajuste

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orgânico aos eventos previsíveis e imprevisíveis. A mobilidade do sistema interno do organismo ocorre à medida que, submetido a um estímulo do meio ambiente, os sistemas fisiológicos reguladores exibem níveis flutuantes de respostas e, como produto final, geram a adaptação às demandas. Define-se uma faixa ótima de operação fisiológica – e não um ponto ótimo – demonstrado por um estado ativo e adaptativo que mantém a estabilidade integrando os elementos sob comando da homeostase.

Esse processo adaptativo conduz a um relacionamento cambiante entre saúde e doença. Uma alteração fisiológica adaptativa (alostática) que dure um pequeno intervalo de tempo é um modo adequado de resposta a um estímulo ambiental. Esta mesma resposta mantendo-se por longo prazo ou de modo frequente ultrapassa a adaptação e a saúde, podendo gerar desequilíbrio e doença.

O exemplo clássico de alostase citado por Sterling e Eyer é o da pressão sanguínea: ela sobe quando nos levantamos da cama e o fluxo sanguíneo é mantido para o cérebro quando nos colocamos em pé para mantermos a consciência. Este tipo de adaptação ajuda a manter a tensão de oxigênio no cérebro.

Toda resposta é fruto de um estímulo. No caso de uma ação sobre o indivíduo, seja ela de origem psicológica ou física, a resposta será o desvio da homeostase e a consequente reação alostática na busca do equilíbrio. O estímulo é o fator que gera a ruptura da homeostase.

Os mediadores da resposta ao estresse apresentam efeito protetor e lesivo sobre o corpo. Quando liberados em curtos períodos de tempo são essenciais para a adaptação, porém quando por algum motivo permanecem atuando por períodos longos de tempo acarretam processos patológicos.

Os quatro mediadores principais da alostase são os glicocorticóides, as catecolaminas e deidroepiandrosterona como mediadores neuroendócrinos e as citocinas como imunológico. As ações destes mediadores no organismo são múltiplas e estão interligadas.

Iniciando pelos glicocorticóides, praticamente todos os tecidos têm receptores para este hormônio. Suas ações na alostase são múltiplas e estão relacionadas ao sistema cardiovascular onde aumenta a sensibilidade às catecolaminas, ao volume de líquido e na reprodução, que é retardada em momentos de tensão poupando assim energia.

Atua também suprimindo a inflamação e a fase aguda de uma resposta a infecção mantendo sob controle as respostas visando minimizar o dano, mobilizam células de defesa para o local da infecção e moldam a resposta imune, podendo suprimi-la também.

Em relação ao sistema nervoso central, como promovem o efeito cardiovascular das catecolaminas, aumentam o fluxo sanguíneo cerebral. Em níveis basais atuam na memória aumentando a formação de recordações de eventos emocionalmente carregados e em níveis de estresse, suprimem a memória.

No tocante ao metabolismo, promove o apetite, a glicólise, proteólise e gliconeogênese, em oposição à insulina. Funciona como a insulina quando em estado de elevação crônica: deposição hepática de glicogênio, lipogênese (especialmente com deposição de gordura no abdome, como na síndrome de Cushing, às expensas de perda protéica muscular), promovendo concomitante liberação de insulina ao

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mesmo tempo em que impede a ação dela nos receptores. A consequência extrema é a progressão para o diabetes tipo 2 com exaustão da produção de insulina.

Desde modo, a elevação crônica dos glicocorticóides gera hipertensão, obesidade abdominal, perda mineral óssea, perda de massa muscular, supressão de respostas imunes, perda da memória e atrofia de estruturas cerebrais como o hipocampo.

Como era de se esperar, a ausência de glicocorticóides pode provocar o aumento das respostas inflamatórias e autoimunes, assim como para o desequilíbrio da citocinas.

As catecolaminas são outros mediadores maiores, ao lado dos glicocorticóides. A norepinefrina é importante para a regulação discreta da constrição dos vasos sanguíneos e redistribuição do fluxo sanguíneo (importante para o coração, pâncreas e baço). Nos músculos esqueléticos, a epinefrina retarda o consumo protéico atuando de modo contrário ao glicocorticóides.

A liberação da epinefrina está mais relacionada ao estresse emocional, enquanto a norepinefrina se relaciona mais ao esforço físico (McEwen, 2003a). No sistema cardiovascular as catecolaminas mantêm o fluxo sanguíneo cerebral quando ocorrem mudanças posturais. Na liberação durante a atividade física, regula a queima das proteínas musculares e dos estoques de glicogênio do músculo. Atua na regulação da temperatura corporal, promove o mecanismo de atenção, vigilância e estimulação do sistema nervoso central, além da formação de lembranças relacionadas a grandes emoções.

Quanto à retenção de líquido, a hipernatremia inibe a atividade simpática levando a natriurese, e a hiponatremia promove a ativação da vasopressina e do sistema renina-angiotensina, além da secreção de aldosterona (que aumenta a retenção de sódio e água).

Na inflamação e imunidade, promove a redistribuição de células imunes durante o estresse e após desafios imunes específicos (por exemplo, hipersensibilidade tardia). Com o aumento da ação simpática, há queda na função das células T e natural killer mas não na proliferação de células B. A simpatectomia química parece piorar o quadro das doenças autoimunes.

Finalmente, no metabolismo, mobilizam estoques energéticos, atuando sinergicamente com os glicocorticóides: aumento da gliconeogênese, glicogenólise e lipólise, mas de forma contrária no metabolismo protéico, isto é, inibindo a proteólise. A liberação de noradrenalina aumenta os níveis de insulina parecendo que posteriormente a insulina aumenta os níveis de atividade simpática criando assim um círculo vicioso.

A deidroepiandrosterona (DHEA) é um esteroide adrenal com antagonismo funcional aos glicocorticóides, já que não interage com receptores celulares deles. Ela inibe a ação de indução de ganho ponderal e a memória. No uso de glicocorticóides, a perda mineral óssea se relaciona à baixa produção de DHEA. Também é antagônico funcional em algumas ações imunes.

Pode diminuir a sintomatologia da depressão (principalmente no idoso) em sua ação no sistema nervoso e ser um possível agente neuroprotetor no envelhecimento.

As citocinas participam da resposta de fase aguda e como ativador da resposta imune. São produzidas localmente por células imunes e à distância por órgãos como fígado e cérebro (McEwen, 2003a). O sistema imune influencia o sistema nervoso central através das citocinas (Wrona, 2006), contribuem para a sensação de mal-estar geral

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que as doenças provocam, indução da febre e regulação do sono (Kapsimalis et al., 2005), e têm efeito este direto sobre o sistema nervoso central.

São descritos dois tipos de citocinas: inflamatórias (interleucinas (IL)-1, IL-2, IL-6, fator de necrose tumoral (TNFs), fator de crescimento dos fibroblastos, e interferons) e antinflamatórias (que incluem a IL-4 e IL-10) que inibem a produção de citocinas inflamatórias.

Estresse:

O termo estresse engloba uma gama de definições e usos que variam desde um evento ou sucessão de eventos que geram angústia - como percebido no senso comum – até fatos desencadeantes de sentimentos de alegria (estresse “bom”). Pode ter um sentido mórbido em sua definição, uma doença oriunda de fatores externos ao organismo, independente do caráter emocional (angústia ou alegria). Pode ainda ser usado como sinônimo do estímulo desencadeante da ruptura da homeostase, ou até mesmo como equivalente da resposta ao estímulo.

Aqui, a palavra estresse descreverá “eventos ameaçadores para o indivíduo e que extraiam respostas fisiológicas e comportamentais como parte da alostase em adição àquelas impostas pelo ciclo de vida normal”.

Os sistemas de resposta ao estresse mais estudados são o eixo hipotálamo-hipofisário-adrenal e o sistema nervoso autônomo, em particular o simpático. Os sistemas de resposta geram mediadores que irão atuar nos órgão e tecidos dos indivíduos.

Os mediadores são as substâncias que em última análise desempenham a ação na tentativa de retorno ao equilíbrio, isto é, a alostase. Em geral os mediadores são neurotransmissores, hormônios e agentes imunológicos, sendo os mais citados os glicocorticóides, as citocinas, as catecolaminas e a deidroepiandrosterona. Eles são liberados visando a períodos curtos de ação, o que nem sempre acontece.

Na presença de vários estímulos ambientais ou psicológicos, o sistema nervoso central seleciona quais eventos são estressantes, o que funciona como um alarme, determinando respostas comportamentais e fisiológicas ao evento. Assim, por exemplo, há alternância da pressão sanguínea, que sobe e desce de acordo com a demanda física, visando manter o fluxo sanguíneo adequado aos órgãos.

O “termo carga alostática” foi cunhado por McEwen e Stellar (1993) com um sentido de acumulação das diversas tentativas de adaptação. Neste conceito se observa a inserção do risco de doença, já que o efeito protetor da ação de curto prazo dos mediadores é substituído pelo efeito deletério quando estes atuam em período prolongado de tempo.

Os sistemas de resposta fisiológica são rapidamente ativados e desativados, mantendo uma sincronia entre resposta e duração do estresse, desta forma limitando o tempo de exposição do organismo e a probabilidade de dano. Quando este sistema adaptativo é rompido, a carga alostática (adaptação não realizada ou parcialmente realizada) gera desequilíbrio e doença. Aqui agem também outros fatores como os genéticos, experiências prévias de vida, fatores cognitivos e suporte ambiental, não apenas os mediadores da alostase.

O que é estresse?

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Segundo Selye (1965) o termo estresse significa reação inespecífica do organismo frente a qualquer exigência. Quando um organismo é submetido a estímulos que ameacem a sua homeostasia, ele tende a reagir com um conjunto de respostas específicas, que constituem uma síndrome, desencadeada independentemente da natureza do estímulo, caracterizando o estresse.

Para Rossi (1994) o estresse é uma palavra derivada do latim, que foi popularmente usada durante o século XVII para representar “adversidade” ou “aflição”. Em fins do século XVIII, seu uso evoluiu para denotar “força”, “pressão” ou “esforço”, exercida primeiramente pela própria pessoa, seu organismo e mente.

França & Rodrigues (1997) dizem que o termo estresse vem da física, tendo como sentido o grau de deformidade que uma estrutura sofre quando é submetida a um esforço. Esta deformidade pode ser de menor ou maior grau, conforme a dureza deste, e o esforço a que está submetido.

Para McGrath (1970) o estresse é um desequilíbrio substancial entre a capacidade de demanda (física ou psicológica) e a capacidade de resposta, condições em que o fracasso e a satisfação de uma certa demanda tem consequências importantes.

Tipos de estresse

Segundo Rio (1995) são vários os tipos de estresse: o estresse físico; o estresse psíquico; o estresse por sobrecarga; o estresse por monotonia; o estresse crônico, que persiste por mais tempo, sem encontrar meios que o desativem eficientemente e o estresse agudo que dura alguns momentos, horas ou dias e depois se dissipa, este estresse prepara o organismo para a luta ou fuga, através da ativação do sistema endócrino.

Para Selye (1956), o estímulo estressor pode desencadear diferentes respostas em diferentes organismos e dependendo da forma com que o indivíduo responde a este estímulo, pode se transformar num estresse positivo ou negativo. Se a pessoa reage bem, ou seja, apresenta resposta positiva, aparece o eustresse, por exemplo, o coração dispara e a respiração fica ofegante quando encontra o namorado, a explosão de alegria ao comemorar um gol, o prazer na relação sexual. Se a resposta for negativa, desencadeia uma resposta adaptativa inadequada, podendo gerar derrota, medo, angústia, insegurança, não-criatividade, doença e morte, que é chamada de distresse (Selye, 1956).

No eustresse, o esforço de adaptação gera sensação de realização pessoal, bem-estar e satisfação das necessidades, mesmo que decorrente de esforços inesperados, é um esforço sadio na garantia da sobrevivência. Se ocorrer o contrário onde o esforço de adaptação não traz realização pessoal, bem-estar e nem satisfação, gera-se um distresse (França & Rodrigues, 1997). De acordo com Rio (1995), no eustresse, predomina a emoção da alegria, há um aumento da capacidade de concentração, da agilidade mental, as emoções musculares são harmoniosas e bem coordenadas, há sentimento de vitalização de prazer e confiança. Já no distresse, predomina as emoções de ansiedade destrutiva, do medo, da tristeza, da raiva, a capacidade de concentração é diminuída e o funcionamento mental se torna confuso, ações musculares são descoordenadas e desarmônicas, predomina o desprazer e a insegurança e aumenta a probabilidade de acidentes.

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O estressor pode ser um fator externo como, o frio, o calor, as condições de insalubridade ou ainda do ambiente social e interno, o mundo que temos dentro de nós, como os pensamentos e as emoções (Rio, 1995).

Nos extremos é fácil distinguir o eustresse do distresse, por exemplo, uma relação sexual prazerosa é claramente diferente da perda de um filho. Mas em muitas situações não é tão fácil essa distinção, pois a experiência vivida pode ser confusa, ambígua, tornando difícil qualquer conclusão. Os efeitos variam de indivíduo para indivíduo, dependendo da forma com que enxerga o mundo (Rio, 1995).

Estresse e o corpo

Segundo Samulski, Chagas & Nitsch (1996) a reação fisiológica do estresse está ligada a dois sistemas: O sistema nervoso e o sistema de glândulas endócrinas. O caminho neural inicia com os receptores do sentido, abrangendo diversas áreas do cérebro acopladas umas as outras através de mecanismos de feedback e termina junto aos efetores da periferia do corpo. O sistema das glândulas endócrinas influencia os órgãos efetores, pela corrente sanguínea, através dos hormônios. A produção hormonal é regulada e estimulada por áreas importantes do cérebro, mostrando a dependência entre o sistema nervoso e sistema endócrino. Estes sistemas apresentam formas diferentes de adaptação, o sistema nervoso depende de uma rápida e objetiva estimulação e o processo hormonal depende de uma ação global e de efeito duradouro. No centro do mecanismo do estresse aparecem os hormônios, os quais são classificados por Mason em Samulski (1996), de acordo com o tipo de ação. Estes podem ser de ação catabólica ou ação anabólica do mecanismo energético. Em relação as funções hormonais, destaca-se o hormônio como mensageiro de informações e como regulador dos processos orgânicos.

Segundo Nitsch em Samulski (1996), existem duas possíveis reações fisiológicas do estresse no organismo: eixo hipotálamo-hipófise-córtex da supra-renal e o eixo hipotálamo – medula suprarenal.

Para Selye (1965), a reação hormonal do estresse é acentuada, sobretudo no eixo hipotálamohipófise-córtex da supra-renal. Um grupo de células do hipotálamo libera uma substância denominada fator, que é um hormônio de liberação ou inibição, este é transportado para o lobo anterior da hipófise. O fator que irá estimular adeno-hipófise, será o hormônio de liberação da corticotropina (CRF). O CRF induzirá a adenohipófise a liberação do hormônio adrenocorticotropina (ACTH) e este estimula a liberação de hormônios pelo córtex da supra-renal em especial os glicocorticóides, dentre esses se acentua o cortisol.

Segundo Guyton (1988), 95% de toda a atividade glicocorticoide é representada pelo cortisol, sendo um indicador de estresse, que pode ser verificado através do sangue ou urina.

De acordo com estudos realizados por Levi em Samulski (1996), a medula supra-renal está relacionada ao sistema nervoso simpático (SNS) e secreta os hormônios adrenalina e noradrenalina em resposta a estimulação simpática.

O organismo ao receber um estímulo (estressor), reage imediatamente, disparando uma série de reações via sistema nervoso, sistema endócrino e sistema imunológico, através da estimulação do hipotálamo e do sistema límbico. Estas estruturas compõem o sistema nervoso central (SNC) relacionadas com o funcionamento dos órgãos e regulação das emoções (Samulski, 1996). Uma das funções básicas do SNC

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é a regulação, mantendo a estabilidade do organismo por meio de diversas funções, sendo uma delas as funções vegetativas que asseguram sua organização e funcionamento (Guyton,1989).

O estresse por si só não é o suficiente para desencadear uma enfermidade orgânica ou para provocar uma disfunção significativa na vida da pessoa. Para que isso ocorra é necessário que outras condições sejam satisfeitas, como uma vulnerabilidade orgânica ou uma forma inadequada de avaliar e enfrentar a situação estressante (França & Rodrigues, 1997).

Segundo os mesmos autores, o conceito de estresse deve ser repensado, ele não pode mais ser definido apenas como estímulo ou resposta e sim como a pessoa avalia e enfrenta este estímulo, levando em consideração o tipo de pessoa e o tipo de ambiente no qual a mesma se encontra. Desta forma o estresse é uma relação particular entre uma pessoa, seu ambiente e as circunstâncias as quais está submetida, que é avaliado como uma ameaça ou algo que exige dela mais que suas próprias habilidades ou recursos e que põe em perigo o seu bem-estar (França & Rodrigues, 1997).

OBJ 2:

As duas glândulas adrenais, cada uma pesando aproximadamente 4 gramas, localizam-se nos polos superiores dos rins. Cada uma é composta de duas partes distintas:

• A medula adrenal, que consiste nos 20% centrais da glândula, está funcionalmente relacionada com o sistema nervoso simpático e secreta os hormônios epinefrina e norepinefrina em resposta ao estímulo simpático.

• O córtex adrenal secreta um grupo inteiramente diferente de hormônios, chamados corticosteroides que são sintetizados a partir do colesterol esteroide, e apresentam fórmulas químicas semelhantes.

Os dois principais tipos de hormônios adrenocorticais, os mineralcorticoides (aldosterona) e os glicocorticoides (cortisol) que têm este nome porque exercem importantes efeitos que aumentam a concentração sanguínea de glicose. Apresentam efeitos adicionais sobre os metabolismos proteico e lipídico, que são tão importantes para a função corporal quanto seus efeitos sobre o metabolismo de carboidratos.

O córtex adrenal possui três camadas distintas:

1- A zona glomerulosa, uma fina camada de células localizadas imediatamente abaixo da cápsula, constitui cerca de 15% do córtex adrenal. Estas células são as únicas na glândula adrenal capazes de secretar uma quantidade significativa de aldosterona.

2- A zona fasciculada, a camada do meio e a mais larga, constitui cerca de 75% do córtex adrenal e secreta os glicocorticoides cortisol e corticosterona, assim como uma pequena quantidade de androgênios e estrogênios adrenais. A secreção dessas células é controlada, em grande parte, pelo eixo hipotalâmico-hipofisário através do hormônio adrenocorticotrófico (ACTH).

3- A zona reticular, a camada profunda do córtex, secreta os androgênios adrenais desidroepiandrosterona (DHEA) e androstenediona, assim como uma pequena quantidade de estrogênios e alguns glicocorticoides. O ACTH regula a secreção dessas células, embora outros fatores, tais como o hormônio estimulante do androgênio cortical, liberado pela hipófise, também possam estar envolvidos.

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*O ACTH aumenta a secreção de cortisol e androgênios adrenais e provocam hipertrofia da zona fasciculada e zona reticular.

Todos os hormônios esteroides humanos, incluindo os produzidos pelo córtex adrenal, são sintetizados a partir do colesterol.

Pelo menos 95% da atividade glicocorticoide das secreções adrenocorticais resultam da secreção de cortisol, também chamado de hidrocortisona. Além disso, uma pequena atividade glicocorticoide é gerada pela corticosterona.

Efeitos do cortisol sobre o metabolismo de carboidratos:

Estímulo da gliconeogênese. O cortisol e outros glicocorticoides são capazes de estimular a gliconeogênese (formação de carboidratos a partir de proteínas e de algumas outras substâncias) pelo fígado, cuja atividade frequentemente aumenta de 6 a 10 vezes. Isso resulta principalmente de dois efeitos do cortisol:

1- O cortisol aumenta as enzimas necessárias para a conversão de aminoácidos em glicose pelas células hepáticas. Isto resulta do efeito dos glicocorticoides sobre a ativação da transcrição de DNA nos núcleos das células hepáticas, com a formação de RNAs mensageiros que, por sua vez, geram o conjunto de enzimas necessárias para a gliconeogênese.

2- O cortisol provoca a mobilização de aminoácidos a partir dos tecidos extra-hepáticos, principalmente dos músculos. Como resultado, mais aminoácidos são disponibilizados no plasma para entrar no processo de gliconeogênese pelo fígado, promovendo a formação de glicose.

Um dos efeitos da maior gliconeogênese é um acentuado aumento nas reservas de glicogênio pelas células hepáticas. Este efeito do cortisol permite que outros hormônios glicolíticos, tais como epinefrina e glucagon mobilizem glicose em momentos de necessidade, como entre as refeições.

Mecanismo de ação celular do cortisol

O cortisol exerce seus efeitos por interagir com receptores intracelulares nas células-alvo. Por ser lipossolúvel, pode se difundir facilmente através da membrana celular. No interior da célula, o cortisol se liga a seu receptor proteico no citoplasma, e o complexo hormônio-receptor interage então com sequências regulatórias específicas do DNA, chamadas de elementos de resposta a glicocorticoides, induzindo ou reprimindo a transcrição gênica. Outras proteínas celulares, chamadas de fatores de transcrição, também são necessárias para que o complexo hormônio-receptor interaja apropriadamente com os elementos de resposta aos glicocorticoides.

Os glicocorticoides aumentam ou diminuem a transcrição de muitos genes, alterando a síntese de RNAm que gera as proteínas que medeiam seus múltiplos efeitos fisiológicos. Assim, a maior parte dos efeitos metabólicos do cortisol não é imediata, mas precisa de 45 a 60 minutos para que as proteínas sejam sintetizadas e de até muitas horas ou dias para que se desenvolvam plenamente. Evidências recentes sugerem que os glicocorticoides, especialmente em altas concentrações, também podem exercer alguns efeitos rápidos não-genômicos sobre o transporte de íons através da membrana celular, contribuindo para seus efeitos terapêuticos.

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Regulação da secreção de cortisol pelo hormônio adrenocorticotrópico da hipófise

A secreção de cortisol é controlada quase inteiramente pelo ACTH secretado pela hipófise anterior. Esse hormônio, também chamado de corticotropina ou adrenocorticotropina, estimula a produção de androgênios adrenais.

A secreção de ACTH é controlada pelo fator liberador de corticotropina do hipotálamo. Assim como outros hormônios hipofisários são controlados por fatores liberadores do hipotálamo, um importante fator liberador controla a secreção de ACTH. Este é chamado de fator liberador de corticotropina (CRF).

OBJ 3: Hiperplasia Congênita das Suprarrenais e a sua relação com o metabolismo dos esteroides.

A hiperplasia congênita da supra-renal devido à deficiência da 21-hidroxilase é uma desordem comum, e é caracterizada por um defeito na biossíntese do cortisol acompanhando ou não um defeito na síntese da aldosterona e excesso de androgênio. 

A hiperplasia congênita das supra-renais (HCSR) representa um grupo de doenças genéticas que comprometem a síntese de cortisol devida à deficiência em uma das enzimas responsáveis pela esteroidogênese supra-renal. Na deficiência da 21-hidroxilase (D21OH), responsável por mais de 90% dos casos de HCSR, a secreção androgênica supra-renal está aumentada. A forma clássica de D21OH é tratada com glicocorticóide, repondo-se mineralocorticóide quando necessário.

Hiperplasia congênita das suprarrenais (HCSR) é um erro inato do metabolismo dos esteroides, transmitido geneticamente e de caráter autossômico recessivo. As baixas concentrações de cortisol plasmático levam ao aumento da secreção de hormônio adrenocorticotrófico (ACTH), estimulando cronicamente as suprarrenais, provocando hiperplasia funcional com consequente desvio da produção hormonal. A maioria dos pacientes com HCSR apresenta defeito na 21-hidroxilação.

Há duas formas principais de HCSR: a) forma clássica, que envolve bloqueio da atividade enzimática total ou parcial e está presente ao nascer; b) forma não-clássica, ou forma tardia, que aparece em qualquer idade, manifestando-se como puberdade precoce, clitoromegalia, hirsutismo, acne e perturbações menstruais; é uma forma mais suave de deficiência e envolve somente o bloqueio parcial da atividade enzimática.

DEFICIÊNCIA DA 21-HIDROXILASE

É a forma mais comum, responsável por 90% a 95% dos casos de HCSR(28). A deficiência da 21-hidroxilase (21-OH) resulta na conversão diminuída de 17-hidroxiprogesterona (17-OHP) e 11-deoxi-cortisol (composto S) e da progesterona e 11-deoxi-corticosterona. A deficiência leve ou parcial dessa enzima afeta a hidroxilação na camada fasciculada, com produção moderada de cortisol, normal de aldosterona e aumentada de andrógenos (deidroepiandrosterona [DHEA] e seu sulfato [DHEA-S] e testosterona) e de substâncias intermediárias 17-OHP(8, 16).

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