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HIGHLIGHTS CONGRESSO BRASILEIRO DE OBESIDADE (ABESO 2019) DR. BRUNO HALPERN CRM: 124905/SP

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HIGHLIGHTS

CONGRESSO BRASILEIRODE OBESIDADE

(ABESO 2019)

DR. BRUNO HALPERNCRM: 124905/SP

O Congresso Brasileiro de Obesidade e Síndrome Metabólica foi realizado em abril/2019, em São Paulo e, como sempre, foi um evento de atualização de excelência, com os maiores pesquisadores da área de obesidade de nosso país. Discutirei brevemente alguns pontos altos do Congresso.

Dr. Bruno Halpern - CRM: 124905/SP

• Endocrinologia e Metabologia/Clínica Médica • Doutor em Ciências pela Faculdade de

Medicina da USP • Vice-Presidente da Federação Latino-Americana de Obesidade (FLASO)

• Membro do Departamento de Diabetes e Obesidade da Sociedade Brasileira de Diabetes

(SBD) • Membro do Departamento de Epidemologia e Prevenção da Associação Brasileira

para o Estuda da Obesidade (ABESO) • Chefe do Grupo de Controle de Peso do Hospital 9

de Julho • Membro da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia • Ex- Editor

chefe da Revista “Evidências em Obesidade e Síndrome Metabólica” - 2015-2018.

HIGHLIGHTS

CONGRESSO BRASILEIRODE OBESIDADE

(ABESO 2019)

Lorcasserina:muito além da perda de peso.

Um simpósio satélite discutiu os estudos clínicos com a Lorcasserina, a nova medicação para tratamento da obesidade, já aprovada para comercialização no Brasil.

A Lorcasserina é, basicamente, um agonista seletivo do receptor de serotonina 5HT2C, receptor este que se encontra presente no hipotálamo (1).

Já se conhece há décadas o papel do antagonismo do receptor de serotonina na redução do apetite, quando a fenfluramina mostrou bons resultados em estudos clínicos, e foi amplamente usada em combinação com a fentermina na década de 90 (2). O estímulo serotoninérgico ativa o sistema anorexigênico pró-opiomelanocortina, diminuindo a ingestão calórica e aumentando o catabolismo via efeitos de segunda ordem, como TRH, CRH e MC4R (1).

Há algumas evidências sugerindo que um aumento marginal do metabolismo também é responsável pela perda de peso observada drogas serotoninérgicas (1).

No entanto, a fenfluramina era um agonista não específico, que também agia sobre o receptor de serotonina 5HT2B, presente nas válvulas cardíacas e a medicação foi retirada do mercado após relatos de fibrose valvares por conta desse antagonismo (3).

Nesse sentido, passou-se a estudar agonistas mais seletivos, e assim, foi sintetizada a Lorcasserina, com uma seletividade 104 vezes maior para o receptor 5HT2C comparado ao 5HT2B (1).

Sua eficácia e segurança foram avaliadas em vários estudos e nos concentraremos nos resultados de Lorcasserina de 10 mg administrados duas vezes ao dia.

Um estudo randomizado, chamado BLOOM, avaliou 3.182 indivíduos obesos por 52 semanas (IMC 30 - 45 kg/m2 ou 27 - 30 kg/m2 com comorbidades relacionadas à obesidade) e a perda de peso subtraída com placebo foi de 3,6% (5,8 vs 2,2%). O número de indivíduos que atingiu a marca de 5% de perda de peso foi de 47% em comparação com 20% no placebo (4). Mais pacientes também perderam 10% ou mais de seu peso corporal basal no grupo de Lorcasserina do que no grupo placebo (22,6 vs 7,7%). Outro estudo, chamado BLOSSOM, avaliou a droga em conjunto com modificações de estilo de vida em 1 ano e encontrou resultados semelhantes, com uma perda de peso subtraída do placebo de 2,9% (5,8 contra 2,9%) e resultados quase idênticos para 5 ou 10% de perda de peso, conforme encontrado no BLOOM (5).

Já o estudo BLOOM-DM avaliou pacientes diabéticos por um ano e encontrou uma perda de peso subtraída de placebo de 3,1% (4,7 vs 1,6%) e porcentagens de 5 e 10% de perda de peso 37,5 e 16,3%, respectivamente (6). Nesse estudo,

se postulou a ideia de que a medicação poderia ter efeitos antidiabéticos que seriam independentes da perda de peso, uma ideia que permanece forte com a publicação do estudo CAMELLIA (8). Uma hipótese, já estudada em ratos, é que a Lorcasserina agiria sobre receptores de melanocortina cerebrais, que teriam efeito direto sobre o fígado (9).

Um grande ponto a favor do uso da Lorcasserina nesses estudos foi um excelente perfil de segurança, com poucos efeitos colaterais sérios. Os efeitos colaterais mais comuns foram cefaleia, tontura e boca seca (1). Todos os estudos fizeram análise de valvulopatias e não mostraram nenhuma espécie de diferença. Não há também muitas contraindicações a seu uso, com apenas o cuidado de usá-la com outras medicações de ação serotoninérgica.

Estudo CAMELLIA: segurança cardiovascular,prevenção e controle do DM2.

Como é praxe com medicações para tratamento de diabetes e obesidade, foi realizado um estudo, chamado CAMELLIA, para avaliar a segurança cardiovascular da Lorcasserina (8).

Esse estudo é considerado um marco no tratamento da obesidade, pois ao demonstrar neutralidade cardiovascular, foi o primeiro estudo com uma medicação antiobesidade que demonstrou segurança cardiovascular num estudo em população obesa (anteriormente, o estudo SCOUT, com sibutramina, demonstrou aumento de risco CV com a medicação em pacientes de alto risco; o estudo com bupropiona e naltrexona foi interrompido por quebra de protocolo, sem gerar resultados definitivos; os estudos com liraglutida foram apenas em população com diabetes; e as medicações mais antigas foram aprovadas antes da exigência de estudos como esse, e portanto, não foram testadas). Isso é importante porque o tratamento da obesidade ainda sofre enorme preconceito e estigma, e uma das razões é uma crença que medicações antiobesidade são inerentemente perigosas, o que é um contrassenso ao pensarmos que perdas de peso acima de 5% já são benéficas à saúde e perdas acima de 10% provavelmente reduzem risco cardiovascular (9).

O estudo, como dito, demonstrou neutralidade em uma população de alto risco cardiovascular, o que torna a medicação uma opção interessante para pacientes com esse perfil. Vale ressaltar que a perda de peso foi cerca de 3% maior que o grupo placebo, e acredita-se que essa perda não seria suficiente para reduzir eventos, principalmente pois é um estudo de duração curta (e o impacto da perda de peso sobre o risco CV podem necessitar mais anos para ser demonstrado). Seria interessante analisar se, entre aqueles pacientes que perderam mais peso (os respondedores), houve redução de eventos, porém ainda não temos esse dado (8).

O CAMELLIA também levou à publicação de outros dois estudos: um avaliando índices de incidência e remissão de diabetes e outro de desfechos renais com a Lorcasserina (10-11). O estudo demonstrou uma redução de 195 na incidência de

diabetes tipo 2 entre os participantes que usaram Lorcasserina e um aumento de 21% nos índices de remissão da hiperglicemia em pacientes que já possuíam diagnóstico de DM2. A redução média de HbA1c comparada ao grupo placebo foi de 0,33%, e é de se imaginar que, em pacientes com DM2 de início recente e que atinjam maiores perdas de peso, essa redução seja ainda maior (10). Assim, a Lorcasserina passa a ser uma estratégia interessante para pacientes com DM2 e obesidade, que necessitam emagrecer e ao mesmo tempo melhorar seu controle glicêmico.

Os efeitos se tornam ainda mais interessantes quando se observam os dados renais (11): uma redução de 13% de desfechos renais, sendo os efeitos carregados por uma redução de novos casos de albuminúria e redução de novos casos ou piora da doença renal crônica. Seriam efeitos fundamentalmente levados pela perda de peso ou haveriam mecanismos próprios? Considerando que a obesidade é um fator de risco para nefropatia, e outros estudos já demonstraram que a perda de peso é um fator importante para a redução de albuminúria, os autores acreditam num efeito peso-dependente, mas mais estudos são necessários.

Conclusão:Como conclusão desse interessante simpósio, pode-se dizer que a Lorcasserina é uma medicação antiobesidade com baixos índices de efeitos colaterais e poucas contraindicações e com efeitos adicionais sobre o controle glicêmico.

A publicação do estudo CAMELLIA e suas sub-análises faz com que a medicação já inicie sua comercialização no Brasil com segurança cardiovascular estabelecida (e, portanto, podendo ser indicada para pacientes de perfil CV mais alto) e uma opção interessante para a perda de peso adicional em pacientes com diabetes. Identificar os bons respondedores será fundamental para que possamos usar a medicação nos pacientes mais indicados, aumentando assim os benefícios a longo prazo.

Mecanismos adaptativos à perda de peso e o hipotálamo inflamado.

Um assunto bastante discutido no Congresso foi a dificuldade em se manter o peso perdido a longo prazo, devido aos mecanismos adaptativos usados pelo hipotálamo para “defender” o peso máximo.

Algumas das palestras mais interessantes do Congresso foi ministrada pelo Dr. Eric Ravussin, que também foi premiado com a Comenda Alfredo Halpern, prêmio concedido para pesquisadores que contribuíram com o estudo da obesidade no Brasil. Embora suíço e fazendo suas pesquisas nos EUA, a enorme interação que o Dr. Ravussin teve com pesquisadores brasileiros e o grande número de vezes que veio ao Brasil palestrar o levaram a receber essa honraria.

Em uma de suas palestras, Ravussin discutiu se aumentar a termogênese poderia ser uma estratégia interessante não para o emagrecimento, mas para a manutenção de peso após perda. Isto porque, como ele mostrou, ao emagrecermos, nosso corpo inicia um processo conhecido como “termogênese adaptativa”, em que existe uma redução do gasto energético tanto maior quanto maior a perda de peso. Uma das razões é a redução da leptina, hormônio produzido no tecido adiposo, que leva à redução de T3 e a uma economia no gasto energético muscular (12). A leptina baixa não apenas reduz a termogênese como também aumenta o apetite. Os dados mais impressionantes de redução do gasto energético mostrados pelo Dr. Ravussin vieram de um estudo com participantes do programa americano “The Biggest Loser”, uma competição de pacientes com obesidade grave que deveriam perder peso ao longo de várias semanas de programa na televisão (13). Embora os pesquisadores não tivessem relação com a organização, eles pediram para avaliar diversos parâmetros metabólicos desses indivíduos, que chegaram a perder mais de 50 kg em média, mas 6 anos depois, já haviam recuperado por volta de 40 kg. O mais interessante (e triste) foi que após os 6 anos, a despeito do ganho de 40 kg, o seu gasto metabólico estava mais baixo do que ao fim da dieta. Ou seja, aparentemente, ao menos em pacientes muito obesos, não só não existe uma redução da termogênese adaptativa, como ela parece se agravar (o gasto metabólico foi 500 kcal em média mais baixo do que o seria predito apenas pela massa muscular). Comparado os pacientes que conseguiram manter ao menos parte do peso perdido ao longo dos seis anos com os que tiveram resposta pior, sem dúvida, a grande diferença entre os grupos foi no nível de exercício físico, corroborando que esta é uma estratégia fundamental para manter o peso perdido (14).

Porém, fora o aumento do exercício, ainda há poucas maneiras de aumentar o gasto energético após dieta. A própria leptina foi tentada, mas os estudos não prosperaram, e hoje, uma estratégia interessante seria aumentar o tecido adiposo marrom (15). Na sua palestra, o Dr. Ravussin não acha que o tecido adiposo marrom seja tão importante do ponto de vista fisiológico para evitar o ganho de peso (há pesquisadores que advogam que uma maior quantidade de tecido adiposo marrom poderia levar a um maior gasto metabólico e “resistência” ao ganho de peso), mas eventuais estratégias farmacológicas que o ativem podem ser interessantes (15).

Uma pergunta que muitos podem fazer é: por que nosso hipotálamo “defende” o peso mais alto? Esse tema também foi abordado pelo Dr. Licio Velloso em sua aula sobre inflamação hipotalâmica. Em uma brilhante apresentação, o Dr. Licio mostrou dados que dietas ricas em gordura levam à inflamação do hipotálamo e gliose, que poderia comprometer a capacidade dessa região do cérebro de determinar qual peso seria adequado individualmente e, assim, alterar o “set-point” (16). Dessa forma, o hipotálamo inflamado poderia reconhecer o peso máximo como o bom e usar todas as suas estratégias para que o peso volte ao ponto de origem. Uma das partes mais impactantes de sua palestra foi quando demonstrou que crianças com obesidade já apresentam algum grau de alteração hipotalâmica e gliose, assim como adultos, o que mais uma vez reforça a importância de tratarmos a obesidade infantil com seriedade (17).

Referências bibliográficas1- Halpern B, Halpern A. Safety assessment of FDA-approved (orlistat and lorcaserin) anti-obesity medications. Exp Opin Drug Saf

2014

2- Halford JCG, Boyland EJ, Lawton CL, et al. Serotonergic anti-obesity agents: past experience and future prospects. Drugs 2011;71(17):2247-55

3- Connolly HM, Crary JL, McGoon MD. Valvular heart disease associated with fenfluramine-phentermine. N Engl J Med 1997;337(9):581-8

4- Smith SR, Weissman NJ, Anderson CM.Multicenter, placebo-controlled trial of lorcaserin for weight management. N Engl J Med 2010;363(3):245-56

5- Fidler MC, Sanchez M, Raether B, et al. A one-year randomized trial of lorcaserin for weight loss in obese and overweight adults: the blossom trial. J Clin Endocr Metab 2011;96(10):3067-77

6- O´Neil PM, Smith SR, Weissman NJ,et al. Randomized placebo-controlledclinical trial of lorcaserin for weight loss in type 2 diabetes mellitus: the BloomDM study. obesity (silver spring)2012;20(7):1426-36

7- Bohula EA, Wiviotta SD, McGuire DK, et al. Cardiovascular Safety of Lorcaserin in Overweight or Obese Patients. NEJM 2018

8- Burke LK, Ogunnowo-Bada E, Georgescu T, et al. Lorcaserin improves glycemic control via a melanocortin neurocircuit. Mol Metab 2017

9- Halpern B, Halpern A. Why are anti-obesity drugs stigmatized? Exp Opin Drug Saf 2014

10- Bohula EA, Scirica BM, Inzucchi S, et al. Effect of lorcaserin on prevention and remission of type 2 diabetes in overweight and obese patients (CAMELLIA-TIMI 61): a randomised, placebo-controlled trial. Lancet 2018

11- Scirica BM, Bohula EA, Dwyer JP, et al. Lorcaserin and Renal Outcomes in Obese and Overweight Patients in the CAMELLIA-TIMI 61 Trial. Circtulation 2019

12- Kissileff HR, Thornton JC, Torres MI, et al. Leptin reverses declines in satiation in weight-reduced obese humans. Am J Clin Nutr 2012

13- Fothergill E, Guo J, Howard L, et al. Persistent Metabolic Adaptation 6 Years After “The Biggest Loser” Competition. Obesity 2016

14- Kerns JC, Guo J, Fothergill E, et al. Increased Physical Activity Associated with Less Weight Regain Six Years After “The Biggest Loser” Competition. Obesity 2017

15- Mariatt KL, Chen KY, Ravussin E. Is activation of human brown adipose tissue a viable target for weight management? Am J Physiol Regul Integr Comp Physiol 2018; 315(3):R479-R483

16- Velloso LA, Araujo EP, de Souza CT. Diet-induced inflammation of the hypothalamus in obesity. Neuroimmunomodulation 2008

17- Sewaybricker LE, Schur EA, Melhorn SJ. Initial evidence for hypothalamic gliosis in children with obesityby quantitative T2 MRI and implications for blood oxygen‐level dependent response to glucose ingestion. Pediatric Obesity 2019

BELVIQ® (cloridrato de lorcasserina)

Indicações: adjuvante em controle de perda de peso. Contraindicações: hipersensibilidade, gestantes e lactantes.Reações adversas: cefaléia, boca seca, constipação, diarreia,nausea, vômito, infecções do trato respiratório superior, nasofaringite, infecções do trato urinário, hipoglicemia (população diabética), dor musculoesquelética dor nas costas, ansiedade (população diabética), depressão (população diabética). Cuidados e advertências:: atenção ao risco de síndrome serotoninérgica com uso concomitante de drogas serotoninérgicas; pacientes com histórico de transtornos psiquiátricos, hipertensão pulmonar, priapismo,

diminuição da frequência cardíaca, elevação da prolactina. Interações medicamentosas: inibidores da CYP2D6, triptanos, inibidores de monoamina oxidase (IMAOs), inibidores seletivos de recaptação de serotonina (ISRSs), inibidores seletivos de recaptação de serotonina-norepinefrina (ISRSNs) e outras drogas que possam afetar o sistema neurotransmissores serotonérgicos. Posologia: 1 comprimido de 10 mg duas vezes ao dia, uso oral. MS 1.7310.0006 VENDA SOB PRESCRIÇÃO MÉDICA. SE PERSISTIREM OS SINTOMAS, O MÉDICO DEVERÁ SER CONSULTADO. Material destinado exclusivamente aos profissionais habilitados a prescrever medicamentos. Para informações adicionais, consulte a bula completa. [email protected]

ALIADO NO COMBATE AO EFEITO SANFONA1-6