20º congresso brasileiro de sociologia

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20º Congresso Brasileiro de Sociologia 12 a 17 de julho de 2021 UFPA – Belém, PA GT 03 - Drogas, políticas e sociabilidades POLICY MAKERS E OS PROCESSOS LEGISLATIVOS SOBRE A CANNABIS PARA USO MEDICINAL NO BRASIL: Percursos, Discursos e Percalços na tramitação do Projeto de Lei N.º 399/2015. Braulio de Magalhães Santos Universidade Federal de Juiz de Fora – UFJF – Campus Governador Valadares Julho de 2021

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20º Congresso Brasileiro de Sociologia

12 a 17 de julho de 2021

UFPA – Belém, PA

GT 03 - Drogas, políticas e sociabilidades

POLICY MAKERS E OS PROCESSOS LEGISLATIVOS SOBRE A CANNABISPARA USO MEDICINAL NO BRASIL: Percursos, Discursos e Percalços natramitação do Projeto de Lei N.º 399/2015.

Braulio de Magalhães Santos

Universidade Federal de Juiz de Fora – UFJF – Campus Governador Valadares

Julho de 2021

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POLICY MAKERS E OS PROCESSOS LEGISLATIVOS SOBRE A CANNABISPARA USO MEDICINAL NO BRASIL: Percursos, Discursos e Percalços natramitação do Projeto de Lei N.º 0399/2015.

1. Intróito

A legislação vigente em um país reflete processos e dinâmicas que se expressam

por conjuntura afeta aos fatores e fenômenos político-institucionais, econômicos,

sócio-históricos e jurídico-políticos que configuram dado espaço-tempo social.

Relativo à política sobre drogas, no Brasil, trata-se de tema mobilizador que

demonstra arena reunida por forças diversas, com motivações políticas,

religiosas, ideológicas, éticas e morais também diversas, o que ilustra a própria

vida democrática, e expressa suas contradições, passando a exigir

aprimoramento das instituições democráticas. De maior aprofundamento nas

importantes discussões que decorrem da relação Executivo e Legislativo,

sobretudo quanto a governança e governabilidade no chamado presidencialismo

de coalização, aqui nos centramos objetivamente ao exercício da atividade

parlamentar ante a tramitação legislativa, de tema complexo, dependente da

atuação do produtor de leis, posto que há uma legislação vigente (Lei de Drogas),

que se apresenta a ser regulamenta, no caso, para permitir uso medicinal de

substâncias da planta cannabis sativa.

Falamos aqui de produção legislativa, e como nos referimos no título do trabalho,

policy makers, precisamente nos processos legislativos que geram políticas

públicas a partir da institucionalidade existente no país, aqui no Brasil com a

atividade parlamentar, isto é, com os decisores ou produtores de leis que

perfazem políticas públicas. Klaus Frey (2000) explica que policy se refere a uma

dimensão material da política pública, conteúdos concretos da ação política que

decorrem de problemas mais imediatos da sociedade. No caso da regulação do

uso da cannabis sativa, exatamente por se tratar de uma politica tida como

regulatória, e apresentam estes policy makers, e também a burocracia estatal,

processos e procedimentos formais que marcam a Administração Pública, além

dos grupos de interesses. Por isso, pontos de partida como leis, decretos,

regulamentos, resoluções, regimentos, com efeitos relativos aos custos e

benefícios determináveis com o transcurso pragmático da configuração dos

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espaços deliberativos, na conjuntura de equação de forças, além de

intervenientes como os interesses de grupos e setores da sociedade. Os

processos de conflito, de consenso e de coalizão podem se modificar conforme a

configuração específica das políticas. (FREY, 2000, p. 224).

E, na consideração de questão complexa como o que se coloca sobre os usos da

cannabis, a relevância desses atores parlamentares (decisores públicos) dado o

desenho institucional dos poderes públicos, as atribuições e competências legais

destes nos desfechos que alcançam muitos setores e campos sociais, o que

exige, sobretudo, racionalidade ampla, abertura democrática e profundidade.

Como sintetiza Morin (2007), para quem a complexidade surge quando o

pensamento simplificador falha, posto que este desintegra aquela do real e, de

outro lado, o pensamento complexo, além de integrar os modos simplificadores do

pensamento, recusa as mutilações, reduções, unidimensões, ilusões, considera

os pressupostos e suas consequências diversas, enfim permite a percepção pelos

sentidos exteriores, o que é fundamental. (MORIN, 2007, p. 8)

Relativo às políticas públicas que se apresentam como mais sensíveis no debate

da sociedade, alcançando setores diversos e trazidos com carga de relações

múltiplas, muito além de elementos científicos, cabe considerar a advertência de

Simon (1957), que acredita que [...] a limitação da racionalidade poderia ser

minimizada pelo conhecimento racional, posto que [...] a racionalidade dos

decisores públicos é sempre limitada por problemas tais como informação

incompleta ou imperfeita, tempo para a tomada de decisão, autointeresse dos

decisores, etc. (SIMON, 1957, p. 202)

Este cenário de incompletudes e imperfeições podem determinar avanços,

retrocessos ou estagnações fundamentais em agendas também fundamentais e

urgentes, por isso merece um centro de atenções.

Sobre o uso medicinal de substâncias extraídas a partir de plantas, tidas como

proibidas no país, como a cannabis sativa, em grande medida associada às

políticas de combate aos entorpecentes, evidenciam-se estas mais diversas

forças e motivações. Na produção legislativa, dado o espelho de sociedade

diversa, e que os parlamentos expressam, vê-se um espaço importante para

análise, crítica e compreensão de fenômenos sociais que, no caso, se mostram

com continuidades, interrupções, revisões e podem nos permitir previsões.

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O Projeto de Lei N.º 0399 foi apresentado pelo Deputado Fábio Mitidieri –

PSD/Sergipe, no dia 23 de fevereiro de 2015, e prevê a alteração do art. 2º da Lei

nº 11.343 – Lei de Drogas, de 23 de agosto de 2006, para viabilizar a

comercialização de medicamentos que contenham extratos, substratos ou partes

da planta Cannabis sativa em sua formulação. Embora o projeto de lei tenha

evidente direção à saúde, por inserir alteração na chamada Lei de Drogas – Lei

nº 11.343, considerando as peculiaridades no Brasil, a tramitação de tal projeto

não reflete, na medida necessária, a dimensão médico-farmacêutica, nem mesmo

o interesse científico das pesquisas necessárias à melhoria das condições de

saúde das pessoas que necessitam de tratamento a partir da planta Cannabis

Sativa.

Desde o início de sua tramitação, o PL 0399/2015 já foi objeto de dez (10)

Emendas ao Projeto, trinta e quatro (34) Emendas ao Substitutivo, cinquenta e

nove (59) mensagens, ofícios e requerimentos feitos por parlamentares de vários

partidos e de ideologias diversas, como também convidados para as audiências,

de vários campos (acadêmico, científico, político, religioso, governamental,

sociedade civil).1

Esse trabalho pretende descrever, analisar e discutir o Projeto de Lei e,

sobretudo, as proposições de alterações empreendidas pelas dez (10) Emendas

apresentadas, considerando as formulações das mudanças, os autores,

interesses e motivações extraídas, principalmente, as repercussões na redação

originária do projeto. Para isso, certamente, necessário contextualizar a legislação

matriz; objeto de alteração com esse projeto, a Lei de Drogas (Lei N.º

11.343/2006), e também inserir no debate as medidas administrativas adotadas

pela ANVISA com a edição das Resoluções da Diretoria Colegiada - RDC

327/2019 e a RDC 335/2020 – que, respectivamente, trataram da regulamentação

dos “produtos à base de cannabis” e sobre o “processo de importação do

canabidiol”. Se quer uma análise compreensiva centrada nos Policy Makers;

legisladores autores de Emendas, suas narrativas e seus textauais com

1 As considerações aqui feitas se dão por deliberações apresentadas até 08/06/2021 quando foiapresentado, votado e aprovado o Parecer do Relator Deputado Luciano Ducci (PSB/PR) em10/06/2021, sendo a última movimentação do projeto na Câmara de Deputados. Advertimosque ainda cabem recursos e outros expedientes poderão se dar na tramitação. As discussõese análises ora feitas nesse trabalho se limitam a esse último desfecho, com aprovação doParecer da Comissão Especial.

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repercussões na tramitação do PL N.º 0399/2015 e a (Re)(Des)(Con)figuração do

projeto originário. Objetiva também projetar e discutir sobre alguns cenários na

tramitação do projeto e nas propostas de alterações, avaliando possibilidades

cenários, conforme desenho político vigente no Legislativo e conexões. Adequa-

se a análise documental do texto legal, assim como as decorrentes discussões

geradas com as modificações textuais propostas a seguir, o que se complementa

com a análise compreensiva, pois esta permite apontar sobre o estado atual das

coisas, sobretudo, “admite nossa insatisfação em relação ao atual estado das

coisas mediante a ideia imperativa do desenvolvimento que é transformação e

transição para um outro estado das coisas.” (MENDES JÚNIOR; FERREIRA,

2010, p.33)

Consideramos a metodologia qualitativa para abordar o problema objeto de

análise, a partir do material discursivo e da análise qualitativa que melhor permite

compreender a dinâmica institucional, político-partidária, social e interacional,

como bem reflete o Parlamento. Utilizamos as fontes primárias, documentais

publicizados diretamente pelo Parlamento em canais e veículos próprios, em que

constam textos das Emendas e Justificativas/Motivações para alterações

propostas, ainda o inteiro teor (vídeos e registros das audiências públicas). Ainda,

fontes secundárias poderão dar suporte esse trabalho dado que há trabalhos

específicos e relevantes sobre o Parlamento no Brasil que se debruçam sobre o

tema em análise. Cremos que a análise temática permitirá uma avaliação

discursiva e compreensiva importante para o quê se objetiva nesse trabalho.

De um lado há proposições empreendidas por parlamentares tidas como

integrantes do campo progressista, alinhados com ideologia de partidos de

esquerda, que pugnam por ampliação do projeto, defendendo “o plantio, a cultura,

a colheita, a produção, o fornecimento, a industrialização e a comercialização de

Cannabis e de seus derivados para fins medicinais, e o seu uso sob prescrição

médica” Vê-se importante ampliação, considerando que, originariamente, o PL

0399/2015 previa “a comercialização no território nacional, desde que exista

comprovação de sua eficácia terapêutica, devidamente atestada mediante laudo

médico para todos os casos de indicação de seu uso”. Entretanto, há proposições

de emendas apresentadas por parlamentares tidos como conservadores, inclusive

de referências religiosas conservadoras que, a pretexto de figurarem em campo

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ideológico tidos como da direita, ainda assim se alinham em propostas

ampliativas, como “importação, produção e comercialização de medicamentos

derivados da planta cannabis sativa, como também o plantio, cultura, colheita,

exploração e a importação de vegetais e seus substratos”.

Vemos que ainda perduram limitações no debate sobre o uso medicinal da

cannabis, ora por sua associação com a Lei de Drogas, em especial pelo combate

ao tráfico e às políticas de segurança pública, encurtando a compreensão (ou

apoiando na confusão) de seu uso medicinal e para pesquisas.

Também, mesmo no debate científico, na academia e institutos de pesquisa,

ainda perdura certo ceticismo científico quanto às comprovações nos tratamentos

à base da planta cannabis, por desalinhos metodológicos, mas também por

intervenientes religiosos, ideológicos e morais, resultando certa lentidão ao

processo de discussões.

2. Reconstituição histórico-social e legal do uso da cannabis no Brasil.

De início, importante localizar o Brasil no alinhamento normativo referente às

drogas, o que inclui a cannabis sativa, posto que tal localização em grande

medida direciona o legislador nacional para, conforme alinhamentos políticos

internacionais também, empreender legislações e definir políticas públicas.

Desde 1912, antes mesmo da criação da Liga das Nações (1919), sucedida pela

Organização das Nações Unidas – ONU (1945), registram-se iniciativas voltadas

para o controle de drogas. Citamos a Convenção Internacional sobre o Ópio

(1912); a Segunda Convenção Internacional do Ópio 1925; a Convenção

referente à repressão do tráfico ilícito (1936), o Protocolo que submete a Controle

Internacional as descobertas recentes de substâncias sintéticas (1948) e o

Protocolo que regulamenta a cultura do Ópio (1953). Também, a Convenção

Única sobre Estupefacientes (1961 – ratificada em 1978), e também a nova

Convenção sobre as Substâncias Psicotrópicas (1971); estas duas (2) últimas

muito mais motivadas por questões políticas e econômicas, a despeito das

pretensões de segurança pública.

Na toada da “guerra às drogas” empreendida pelos Estados Unidos da América,

vemos um alinhamento integral de políticas pelo Brasil, direcionando,

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sobremaneira, as leis postas no país. No processo de implementação das

Convenções Internacionais, tanto de 1931 como de 1936, ambas mencionando

bastante sobre a cannabis, as pressões feitas pelo EUA, ao que o Brasil, surtiram

efeito e este se alinhou. O que se viu foi uma postura do Brasil, que antes

sustentava a cientificidade da discussão e nem mesmo a criminalização do uso da

planta, para uma postura de abandonando dos estudos científicos feitos,

pleiteando que a maconha constasse na mesma lista do ópio, levando à

proscrição no país e atuando para abolir tanto o cultivo como o consumo no país.2

Objetivamente, sobre as prescrições legislativas no Brasil3, em 1932, o Decreto

n.º 20.930 incluiu a maconha (cannabis indica) como produto proibido, sendo seu

uso restrito para doença de internação e notificação compulsória.

Com a Constituição de 1934, no período Vargas, houve a decretação da Lei de

Segurança Nacional, resultando no Decreto-lei nº 891, de 25 de novembro de

1938, que previa penas ainda mais severas para o comércio não autorizado e

punia, indiretamente, o ato de consumir as substâncias proscritas. Assim

permaneceu nas décadas seguintes, sem mudanças destacáveis.

Somente na década de 1970 houve novas alterações legislativas, sendo dedutível

que maior repressão marcou tal período, dada Ditadura Militar a partir de 1964.

Editou-se a Lei nº 6.368 em 21 de outubro de 1976 que tornaram mais graves as

penas tanto para as condutas interpretadas como de usuários (seis meses a dois

anos), como para aquelas entendidas como de traficantes (três a quinze anos),

incluindo penas para as condutas de apologia à quaisquer drogas.

Também demonstrando incongruências e desalinhos com as Convenções

Internacionais que estabeleciam o dever dos Estados-partes regularem o uso

médico e científico, coibindo a comercialização não autorizada, mas o Brasil

seguia na repressão das condutas, inclusive de consumo pessoal, na evidente

perspectiva repressivo-punitiva, em nada médico-terapêuticas. (VIDAL, 2009, p.

67-68).4

2 Com a Lei Seca nos EUA e o aumento gerado do consumo de cannabis, neste país difundiu-se o boato de que os crimes tinham relação com a planta, veja que coincide com a crise de1929, e o aumento da criminalidade. Lobby da indústria petroleira e de tecidos sintéticos, queutilizavam, respectivamente os combustíveis à base de óleo de maconha e o cânhamo agirampara a criminalização da planta. Evidentemente, o Brasil seguiu os EUA.

3 Para melhor compreensão do percurso histórico-social da maconha no Brasil, ver FRANÇA,Jean Marcel Carvalho. História da maconha no Brasil. Ed. Três Estrelas. 2018.

4 Para mais detalhes sobre prescrições dos textos internacionais que não obrigam a repressão epunição como única forma de atuação do Estado, veja VIDAL, S. A regulamentação do cultivo

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Em janeiro de 2002, no governo Fernando Henrique Cardoso veio a Lei n.º

10.409/2002, que estabelecia a prevenção, o tratamento, a fiscalização, o controle

e a repressão à produção, ao uso e ao tráfico ilícitos de produtos, substâncias ou

drogas ilícitas que causem dependência física ou psíquica. Convém registrar que

desde o final dos anos 1980 e início de 1990, as políticas de muitos países se

direcionavam de modo mais pragmático, ampliando a compreensão para além da

repressão, demonstrada a fragilidade e ineficiência da famigerada política

estadunidense de guerra às drogas.

Embora tardia, ainda pouco arrojada nas questões de enfrentamento mais amplo

às questões que compõem a temática das drogas, nos vários fatores e elementos

que se inserem, a Lei n.º 11.343, de 23 de agosto de 2006 – Lei de Drogas -

trouxe a principal regulação sobre drogas, após a Constituição Federal de 1988 e,

no caso da cannabis e seu uso, tendo regra geral a proibição, no parágrafo único

do artigo 2º dessa lei, houve a possibilidade de a União autorizar o plantio, a

cultura e a colheita dos vegetais referidos no caput deste artigo, exclusivamente

para fins medicinais ou científicos, em local e prazo predeterminados, mediante

fiscalização, respeitadas as ressalvas supramencionadas" (BRASIL, 2006)

Precisamente sobre o uso da cannabis para fins medicinais, somente em 2015

quando a ANVISA procedeu a edição da Resolução da Diretoria Colegiada–RDC

n°17, de 06 de maio de 2015, que passou a regulamentar a importação de

medicamentos à base da planta, é que se inseriu novamente o debate que

alcançava a Lei n.º 11.343/2006, por questões relativas ao acesso da população a

tais remédios, pois entram no mercado brasileiro com preços altíssimos, mas sem

alterações textuais, de fato.

Em seguida veio a Resolução de Diretoria Colegiada – RDC N.º 262 que facilitou

a importação de medicamentos à base de cannabis, pelo Sistema Único de

Saúde – SUS, em um processo mais ágil quanto às barreiras alfandegárias e

burocráticas para licenciamento de importação, ainda que os produtos ou bens

não estivessem regularizados pela ANVISA, e decorrentes de ações judiciais para

tratamento clínico de pacientes.

de maconha para consumo próprio: uma proposta de redução de danos. In: NERY FILHO, A.,et al. orgs. Toxicomanias: incidências clínicas e socioantropológicas. Salvador: EDUFBA;Salvador: CETAD, 2009.

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O cenário, então, fez com que da ANVISA fossem editadas as RDC 327/2019 e a

RDC 335/2020. A primeira tratou da regulamentação dos “produtos à base de

cannabis” e esta última sobre o “processo de importação do canabidiol”.

A RDC 327/2019 apresentou a categoria de “produtos à base de cannabis”, o que

facilitou o registro dos produtos no país, recebendo a autorização sanitária

necessária para serem vendidos em farmácias e drogarias. Em termos práticos, a

morosidade de três (3) meses ou mais, agora não se verifica, pois é possível que

o paciente saia da consulta médica e adquirir a medicação imediatamente.

A última regulação sobre o uso da cannabis no Brasil adveio da Resolução de

Diretoria Colegiada - RDC n.º 335, de 24 de janeiro de 2020, substituindo a RDC

n.º 17/2015, trazendo algumas modificações no processo de importação do

canabidiol: i) prazo ampliado de 1 (um) para 2 (dois) anos a validade dos

cadastros para importação; ii) criação do procurador legal, que fica autorizado a

realizar a importação em nome do paciente; iii) supressão de exigências

excessivas para o processo de importação (antes se exigia prescrição médica,

laudo, formulário, todos em separados) e, agora, basta a apresentação da

prescrição médica, contendo nome do paciente, do produto, posologia, data,

assinatura e dados do profissional, inclusive houve a unificação de sistema de

serviços no Governo Federal para recebimento on line de formulários iv)

desnecessidade de informar a quantidade de canabidiol, o que será detalhado

apenas quando da entrada no país.

Esta breve síntese das prescrições legais, convém dizer, por regulações

administrativas, se deram através de órgão de regulação, que é a Agência

Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA, de onde não se originam leis

(abstratas e gerais), mas somente sistematiza procedimentos administrativos sob

lei, necessariamente, preexistentes. Ou seja, não há inovação legislativa com a

atuação da ANVISA, pelo que concluímos que nenhuma segurança jurídico-legal

também exista, dado que os atos por elaa editados podem ser alterados

(revogados) com maior facilidade, a depender de fatores discricionários, inclusive,

não sendo o melhor cenário. Em outro trabalho Santos (2020), discutimos sobre a

regulamentação do uso da cannabis para fins medicinais e apontamos algumas

fragilidades em se constituir um ato administrativo precário, unilateral e revogável

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sem maiores formalidades, como é a autorização administrativa emitida pela

ANVISA.5

Porém, mesmo diante da inação sobre regulamentação legal melhor adequada a

realidade brasileira para uso medicinal da cannabis sativa, efetivamente, com

mobilização social através de movimentos sociais, familiares e parentes de

pessoas com doenças tratáveis por substâncias da planta, associações de

representantes, e também processos avançando em outros países sobre os usos

da maconha, repercutiram também no Congresso Nacional brasileiro e trouxe a

questão novamente ao debate, com iniciativas legislativas importantes a partir de

2015.

Aqui nos atemos ao Projeto de Lei (PL) 399/2015, por ter se constituído como

agenda, sendo designada Comissão Temporária (Especial) mas convém o

registro de que houve projetos apresentados antes: PL n.º 7.187/2014, de autoria

do Deputado Federal Eurico Junior (PV-RJ) e também o PL n.º 7.270/2014, do

Deputado Federal Jean Wyllys (PSOL-RJ) que preveem ferramentas para

organizar a produção, a industrialização e a comercialização de cannabis,

derivados e produtos, apontando alterações importantes à Lei de Drogas -Lei n.º

11.343/2006.

3. Tramas e tramitação do Projeto de Lei N.º 0399

Com acima relacionamos, o Projeto de Lei n.º 7.187/2014 apresentado pelo Dep.

Federal Eurico Júnior propunha tratar do controle, plantação, cultivo, colheita,

produção, a aquisição, o armazenamento, a comercialização e a distribuição de

maconha (cannabis sativa) e seus derivados. Com isso, a Mesa Diretora da

Câmara de Deputados, quando da apresentação do Projeto de Lei n. 399/2015,

pelo Deputado Fábio Mitidieri (PSD-SE), e, 23 de fevereiro de 2015, definiu pelo

apensamento deste projeto àquele, com base no Art. 142 do Regimento Interno

5 Ver SANTOS, B. M.. A regulação do uso da cannabis para fins medicinais no Brasil e emPortugal: análise compreensiva das estratégias jurídico-legais e repercussões. In: Anais do 44ºEncontro Anual da ANPOCS. De 01 a 11 de dezembro de 2020, na forma remota. ISSN 2177-3092. Acesso: http://anpocs.com/index.php/encontros/papers/44-encontro-anual-da-anpocs/gt-32/gt13-19

Page 11: 20º Congresso Brasileiro de Sociologia

que prevê o apensamento de proposições da mesma espécie, para tramitação

conjunta quando tais proposições “regulem matéria idêntica ou correlata”.

Mas, inconformado com a decisão, o Deputado Fábio Mitidieri recorreu da decisão

argumentando, em síntese, que esse projeto por ele apresentado (PL 399/2015)

não trata de matéria idêntica ou correlata com outro projeto, dado que pretende

regulamentar tão somente a comercialização de medicamentos que contenham

extratos, substratos ou partes da planta cannabis sativa em sua formulação. Esse

recurso não foi aceito e a Mesa Diretora da Câmara de Deputados, que manteve

a decisão de apensamento.

Em um salto de três (anos), em março de 2018, a Mesa Diretora da Câmara

revisou o ato de apensamento de julho de 2015, procedendo a desapensação e

determinando a criação de Comissão Especial, posto que o Regimento Interno da

Câmara de Deputados (RICD) assim dispõe em seu artigo 34, inciso II6, sendo tal

Comissão formada por 34 parlamentares com igual número de suplentes.7

Ocorreu que com o encerramento da legislatura8 de 2018, estabelece o RICD que

as proposições que não tenham sido submetidas à deliberação da Câmara de

Deputados e que sigam em tramitação, como se deu com esse PL 399/2015, são

arquivadas. Com isso, também se desfez a Comissão Temporária (Especial), que

são comissões criadas exclusivamente para apreciar determinado assunto e se

extinguem ao término da legislatura.

Todavia, iniciada a legislatura seguinte (2019), o Dep. Fábio Mitidieri requereu o

desarquivamento da proposição e isso trouxe à pauta o projeto novamente, para

6 Regimento InternoSubseção I - Das Comissões EspeciaisArt. 34. As Comissões Especiais serão constituídas para dar parecer sobre:

[...]II - proposições que versarem matéria de competência de mais de três Comissões

que devam pronunciar-se quanto ao mérito, por iniciativa do Presidente da Câmara, ou arequerimento de Líder ou de Presidente de Comissão interessada.

[...]7 Na exigência do Regimento Interno da Câmara de Deputados, o projeto foi distribuído para

exame do mérito às Comissões de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e DesenvolvimentoRural; de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Serviços; de Segurança Públicae Combate ao Crime Organizado; e de Seguridade Social e Família, além da Comissão deConstituição e Justiça e Cidadania. É o que se exige para formação de Comissão Especial epara definição de regime de prioridade. Em todas essas comissões o projeto foi aprovado naforma e no mérito.

8 Legislatura é o período de quatro (4) anos durante o qual se desenvolvem as atividadeslegislativas, no caso dos Deputados/as Federais, que coincide com a duração do mandato dosdeputados. Começa em 1º de fevereiro do ano seguinte à eleição e termina em 31 de janeiroapós a eleição seguinte. Nesse caso, se iniciou em 01/02/2018 e encerrou em 31/01/2019.

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tramitação regular, e se fez necessário constituir nova Comissão Especial, o que

se deu em junho de 2019, sendo a comissão constituída em agosto de 2019 com

as indicações de Lideranças, como define o RICD, e trabalhos iniciados em

outubro de 2019.

A partir de então, iniciou-se a tramitação pelas comissões parlamentares, como

exigido, constatando no decorrer dez (10) Emendas ao Projeto, trinta e quatro

(34) Emendas ao Substitutivo, cinquenta e nove (59) mensagens, ofício e

requerimentos, além de outros expedientes de impulso administrativo.

Aqui nos dedicaremos às decorrências materializadas no texto do Projeto

originário, e das de Emendas ao Projeto e Emendas de Substitutivo para localizar

e discutir conteúdos que repercutiram na finalização de uma proposta de Parecer

levada a votação na Comissão Especial, ou os desdobramentos e tendências na

sequência regular pela qual seguirá o projeto de lei.

O objeto do Projeto de Lei nº 399/2015 prevê a alteração da redação do art. 2º da

Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006, acrescentando-lhe um § 2º com a

seguinte redação:

§ 2º Os medicamentos que contenham extratos, substratos, ou partes da planta denominadaCannabis sativa, ou substâncias canabinoides, poderão ser comercializados no território nacional,desde que exista comprovação de sua eficácia terapêutica, devidamente atestada mediante laudomédico para todos os casos de indicação de seu uso. (BRASIL, 2015)Foram apresentadas dez (10) Emendas Aditivas ao projeto sendo nove (9) de

autoria da Deputada Federal Natália Bonavides (PT/RN) e 1 (uma) Emenda

Modificativa apresentadas pelos Deputados Federais Tiago Mitraud (Novo/RJ) e

Marcelo Calero (Cidadania/RJ), assim sistematizadas.

N.º Autor Objetivo

EMC 1/2019 NatáliaBonavides

Substituir a redação do projeto por: “§ 2º Ficampermitidos o plantio, a cultura, a colheita, a produção,o fornecimento, a industrialização e acomercialização de Cannabis e de seus derivadospara fins medicinais, e o seu uso sob prescriçãomédica.”

EMC 2/2019 NatáliaBonavides

Acrescentar novo dispositivo ao projeto:“Art. X Asassociações civis sem fins lucrativos com finalidadeespecífica de fornecimento de Cannabis medicinal eseus derivados poderão celebrar contrato, convênioou instrumento congênere com o gestor do SUS.

EMC 3/2019 NatáliaBonavides

Acrescentar novo dispositivo ao projeto:“Art. X Asassociações civis sem fins lucrativos com finalidadede específica de fornecimento de Cannabis medicinale seus derivados poderão firmar parcerias comuniversidades e institutos de pesquisa científica.”

Page 13: 20º Congresso Brasileiro de Sociologia

EMC 4/2019 NatáliaBonavides

Acrescentar novo dispositivo ao projeto:“Art. X Éassegurado o direito de qualquer pessoa ter acessoaotratamento com Cannabis medicinal e seusderivados quando houver prescrição médica.”

EMC 5/2019 NatáliaBonavides

Acrescentar novo dispositivo ao projeto:“Art. X AUnião deverá constituir e manter um banco desementes da planta Cannabis para fins medicinais ecientíficos.”

EMC 6/2019 NatáliaBonavides

Acrescentar novo dispositivo ao projeto:“Art. X Aprodução de Cannabis medicinal e seus derivadosdeverá ser autorizada pela ANVISA.

EMC 7/2019 NatáliaBonavides

Acrescentar novo dispositivo ao projeto:“Art. X AUnião, Estados, Distrito Federal e Municípiosdeverão garantir a qualificação permanente dosprofissionais de saúde sobre o tratamento comCannabis medicinal e seus derivados (NR)”

EMC 8/2019 NatáliaBonavides

Acrescentar novo dispositivo ao projeto:.“Art. X Osmedicamentos à base de Cannabis medicinal ederivados deverão ser fornecidos gratuitamente peloSUS, mediante prescrição médica. (NR)”

EMC 9/2019 Acrescentar novo dispositivo ao projeto:“Art. X Oplantio, o cultivo e a colheita de Cannabis medicinalpoderão ser realizados por pessoa física em âmbitodoméstico ou por pessoa jurídica. §1º O disposto nocaput deve abranger associação civil sem finslucrativos com finalidade específica defornecimentode Cannabis medicinal e seus derivados de formaexclusiva aos seus associados mediante prescriçãomédica. §2º Para o plantio, o cultivo e a colheitadomésticos de Cannabis medicinal é necessárioobter autorização da ANVISA e manter cadastro juntoà associação de que trata o §1º deste artigo. (NR)”

EMC 10/2019 Tiago Mitraud Substitui a nova redação do art. 2º do projetopor:“Art. 2º Ficam proibidas, em todo o territórionacional, as drogas,bem como o plantio, a cultura, acolheita e a exploração de vegetais e substratos dosquais possam ser extraídas ou produzidas drogas,ressalvadas as hipóteses de: I - importação,produção e comercialização de medicamentosderivados das substâncias descritas no caput bemcomo o plantio, cultura, colheita, exploração e aimportação de vegetais e substratos, em ambos oscasos, com objetivo exclusivo de formulação demedicamentos, desde que exista comprovação desua eficácia terapêutica, devidamente atestadamediante laudo médico ou existência de registro domedicamento em renomadas agências de regulaçãono exterior; II - plantio, cultura, colheita, produção,exploração, importação e comercialização comobjetivo exclusivo científico, mediante autorização daUnião; III - autorização legal ou regulamentar, bemcomo o que estabelece a Convenção de Viena, dasNações Unidas, sobre Substâncias Psicotrópicas, de1971, a respeito de plantas de uso estritamenteritualístico-religioso.”

Fonte: BRASIL, 2021, p. 6-6.

Page 14: 20º Congresso Brasileiro de Sociologia

Estas dez (10) emendas ao Projeto foram apresentadas logo na retomada dos

trabalhos da Comissão Especial, em outubro de 2019, em textos ampliativos e

modificativos a partir do projeto de lei 399/2015, sendo seguido por muitos

requerimentos para audiências públicas, com oitivas de especialistas,

pesquisadores, associações de apoio, pacientes e familiares interessados.

Notamos que esse Projeto de Lei 399/2015 foi aceito com menor resistência por

parte de alguns congressistas, sobretudo porque não os pareceu tão ousado,

para um parlamento de parte importante conservadora, pois de certo modo quis

aprofundar apenas no tocante ao uso da cannabis para fins medicinais, e no caso

do projeto fala da comercialização de medicamentos, como descrito no próprio

texto da Lei N.º 11.343/2006 – Lei de Drogas -, que previu a autorização da União

para muito mais além, já que diz da autorização para plantio, cultura, colheita,

desde que destinadas aos fins medicinais ou científicos.

Nessa mesma ideia, a proposição do projeto se restringe à “extratos, substratos,

ou partes apenas da planta cannabis sativa, ou substâncias canabinoides”, muito

mais restrito ao texto da Lei de Drogas, que no artigo 2º menciona drogas,

vegetais e substratos para extração ou produção, em sentido amplo.

Diferente, por exemplo, do Projeto de Lei N.º 7.270/2014, de autoria do então

Deputado Jean Wyllys PSOL-RJ, que regula a produção, a industrialização e a

comercialização de Cannabis, derivados e produtos de Cannabis, e também do

Projeto de Lei N.º 7.187/2014, sendo autor o Deputado Eurico Júnior (PV/RJ),

regulando a produção, a industrialização e a comercialização de Cannabis,

derivados e produtos de Cannabis. Vejamos que estas duas (2) proposições,

antes apresentadas foram apensadas, aguardando inserção em pauta, em

tramitação ordinária, portanto, sendo apensados a outras proposições, não se

constituindo Comissão Especial, portanto, não gozando de regime de tramitação

prioritária.

O que algumas dessas Emendas ao Projeto trouxeram também partiram da

mesma Lei de Drogas, e quiseram regulamentar não apenas o comércio no

território nacional. Talvez por isso, a proposta de texto originário ainda assim se

manteve como referência.

Page 15: 20º Congresso Brasileiro de Sociologia

Após, se seguiram doze (12) audiências públicas9, visitas técnicas a laboratórios e

instituições no Brasil e no exterior e numerosos contatos com especialistas e

representantes das partes interessadas”, segundo consta no Parecer apresentado

em 08 de junho de 2021, pelo relator Dep. Luciano Ducci (PSB/PR).

Em abril de 2021 foi lido e aprovado o Parecer no sentido de aprovação do projeto

de lei 399/2021, com definição de (cinco) sessões para apresentação de

emendas, sendo que tal aprovação se deu na forma de Substitutivo.10

Evidente aqui que houve ampliação o texto originário, em grande medida

incorporando as indicações apresentadas pelos Parlamentares, mas

considerando as Emendas superadas pelo novo texto (Substitutivo), que passou a

ser o objeto de apreciação.

Portanto, feitas as adequações legislativas e legais (constitucionais), nos

aspectos formais e materiais do texto originário, atendendo exigências do

Regimento Interno da Câmara de Deputados, houve abertura de prazo para

apresentação de Emendas ao Substitutivo, no total de trinta e quatro (34), que de

modo geral, ampliou sobremaneira a proposta do projeto originário.11

Foi apensado a este Substitutivo o Projeto de Lei nº 369, de 2021, do Deputado

Bacelar, que “dispõe sobre a aplicação de cannabis sativa e seus derivados na

medicina veterinária”.

A seguir analisamos e discutimos pontos fundamentais do projeto, em seu

conteúdo, ainda os possíveis cenários ante a votação do Parecer e encerramento

das atividades na Comissão Especial.

4. ANÁLISE CRÍTICA: (IN)DEFINIÇÕES E CENÁRIOS POSSÍVEIS.

9 REZENDE, Daniela; PEREIRA, Juliana (2020) traça perfil amplo (parlamentares querequereram, convidados, sexo, gênero, vínculo institucional, e discute detidamente asaudiências públicas realizadas em 2019 e 2020.

10 Segundo o Regimento Interno da Câmara de Deputados, em seu artigo 118, § 4º Emendasubstitutiva é a apresentada como sucedânea a parte de outra proposição, denominando-se"substitutivo" quando a alterar, substancial ou formalmente, em seu conjunto; considera-seformal a alteração que vise exclusivamente ao aperfeiçoamento da técnica legislativa.

11 Enquanto o projeto originário previa apenas a inclusão do § 2º artigo 2º ao texto da Lei11.343/2006, “para viabilizar a comercialização de medicamentos que contenham extratos,substratos ou partes da planta cannabis sativa em sua formulação”, o Substitutivo apresentatexto contendo 33 artigos que versam muito além da comercialização, dispondo em seu “Art.1º. As atividades de cultivo, processamento, pesquisa, armazenagem, transporte,produção, industrialização, manipulação, comercialização, importação e exportação deprodutos à base Cannabis spp.são permitidas nos termos desta Lei.” (BRASIL, 2021, p. 25)(grifos nossos)

Page 16: 20º Congresso Brasileiro de Sociologia

Com apresentação e votação do Parecer final da Comissão Especial, o cenário

esperado pelo rito de trabalho regimental seria o Parecer de caráter terminativo,

no caso com a redação aprovada em comissão, como se deu, com envio imediato

do projeto diretamente ao Senado para apreciação e deliberação.

Entretanto, dada a votação apertada, sendo resolvido pelo voto qualificado do

Relator, finalizando 18 votos favoráveis e 17 contrários, mostra-se quase certo

que haverá recurso por parte dos parlamentares contrários, para levar o projeto a

apreciação em Plenário, dada a previsão do artigo 132, § 2º do Regimento

Interno, bastando que tal recurso seja assinado por um décimo dos membros da

Casa (52 deputados), apresentado em sessão e provido por decisão do Plenário

da Câmara. Bem possível que isso ocorra, dado o perfil do Parlamento e

alinhamentos do Governo.

Até a aprovação do Parecer final importantes ocorrências ilustram os cenários

possíveis e desdobramentos práticos. Principalmente a partir do projeto

substitutivo e das emendas a este, ocorreram movimentos que de certa forma

permitem dizer que mesmo sendo um avanço, nos moldes apresentados, pelas

críticas levadas por parlamentares ditos conservadores e progressistas, parece

ter desagrado a todos.

Para compreender melhor passaremos agora às considerações que se deram da

apresentação do Substitutivo, ponderadas as trinta e quatro (34) Emendas

indicadas, até última movimentação no Congresso, com a votação parelha de 18

votos favoráveis e 17 votos contrários ao projeto substitutivo que se apresenta

como o marco regulatório da cannabis spp. no Brasil.

As Emendas ao Substitutivo apresentadas estão sintetizadas (e numeradas)

abaixo, para melhor compreensão e análise de conteúdos, embora não estejam

citadas integralmente.

De modo geral, avaliamos que o texto foi muito avançado (do Substitutivo), para o

ponto de partida dado pelo projeto originário (PL 399/2015), considerando as

circunstâncias atuais do perfil mais conservador do Governo (2018-2022) e do

Congresso Nacional; este mais renovado considerando os últimos 20 anos,

embora no espectro ideológico tenha apontado o crescimento da direita, com 209

Page 17: 20º Congresso Brasileiro de Sociologia

deputados, somados às demais forças de centro-direita, com 94 deputados e do

centro, com 75.

Evidentemente, o desenho da composição da Comissão Especial, com apenas 34

membros e com a proposta mais suave de discussão apenas para inserir texto

que permitisse apenas a comercialização da planta na condição de medicamento

com eficácia terapêutica comprovada, com controle estatal e atestado médico, em

grande medida facilitou a tramitação, dada a restrição do texto. Ainda, pela prática

configurada na ANVISA, com as medidas administrativas adotadas a partir da

edição das Resoluções da Diretoria Colegiada - RDC 327/2019 e a RDC

335/2020, também permitiram agir sobre resistências, sobretudo de cunho

ideológico e religioso.

Parte das Emendas ao Substitutivo se deram pelos elementos formais do projeto,

para reformulações pela inteligência legislativa, melhor adequação da redação

textual. Assim se deram com As emendas nº 1, 12, 27, 28 e 29, todas acatadas e

aportadas ao texto.

As emendas nº 5 e 17 forma parcialmente acatadas, aproveitando redação mais

adequada, mas em outra parte extrapolaram as prerrogativas legiferantes do

Congresso Nacional, invadindo competências do Executivo, sobretudo para definir

atuação de agências reguladoras, ministérios e secretarias com atuação relativa

ao tema.

A Emenda 33, proposta pelo Deputado Bacelar, quis também fixar cota para

cultivo, com cálculo no número de plantas, se para fins medicinais e por área

plantada, se para fins industriais. Nesse aspecto, a proposta não foi aceita,

mantendo o texto originário do Substitutivo que sendo o cultivo submetido a

controle e autorização de órgão estatal, seria previamente definida tal quantidade,

o “suficiente para atender demanda pré-contratada ou com finalidade pré-

determinada, que deverá constar do requerimento de autorização para o cultivo”.

Assim, não caberia fixar cotas matemáticas.

Também, com parcial indeferimento da emenda nº 21, que previa novos métodos

de produção de canabinoides ainda não existentes ou ainda não viáveis no país.

Reiteramos que algumas emendas que foram parcialmente consideradas, ou não

acatadas, referiam-se a conteúdos que, no entendimento do Relator,

Page 18: 20º Congresso Brasileiro de Sociologia

ultrapassavam mera adequação formal e textual do Substitutivo, como também

não ofereciam aperfeiçoamento em relação às condições projetadas.

Porém, registramos aqui a Emenda 3 (Emenda Substitutiva Global), de autoria do

Dep. Osmar Terra, que foi rejeitada sob o argumento de que restringia

severamente as possibilidades de uso terapêutico da planta. A proposta excluía o

cultivo, o uso veterinário e o uso industrial; os derivados seriam apenas de origem

vegetal ou fitofármacos; uso de produtos apenas pela via oral ou nasal; vedação à

produção ou processamento sintético ou semissintético das substâncias; vedada

a manipulação da planta para extração de produtos e derivados; permissão de

importação apenas de derivados da cannabis, vedada importação da planta ou

parte da planta in natura, prescrição do uso da medicação condicionada ao

Conselho Federal de Medicina – CFM.

Também rejeitada a emenda nº 7, que contraria os procedimentos do SUS e a Lei

nº 8.080, de 1990, para incorporação de novos medicamentos, que passam por

regulamentação própria e controle da ANVISA, o que de certo modo, também,

adentra competências e atribuições próprias da agência executiva.

Um ponto de bastante discussão se deu a partir da rejeição das emendas nº 8, 9,

10, 11 e 14, apresentadas por parlamentares do Partido dos trabalhadores, que,

em linha gerais, propunham a liberação do cultivo doméstico da planta ou o

consumo in natura da planta e suas partes, que para o Relator, comprometeriam

as medidas de segurança previstas no substitutivo, incluídas com o fim de

proteção da saúde pública.

A Deputada Natália Bonavides (PT/RN) apresentou o Voto em Separado n.º 5, ao

Substitutivo, quando da apresentação e votação do Parecer, em 08/06/2021, para

registrar inconformismo com a proibição às famílias de pacientes do cultivo

doméstico, considerando que uma das principais motivações ao projeto era

justamente garantir o, acesso ao tratamento, atualmente restrito a quem tem

condições de pagar por medicamentos de alto custo comercializado sem farmácia

ou importados do exterior.

A deputada acrescenta que se trata da defesa pela democratização da cannabis

medicinal que tem se dado de modo precário com as decisões judiciais a

insegurança de sua revisão, como diz respeito também a uma devida

regulamentação que garanta o funcionamento das associações civis existentes

Page 19: 20º Congresso Brasileiro de Sociologia

que produzem os medicamentos. A parlamentar também apresentou a emenda nº

16, que buscava simplificar as exigências e procedimentos para as associações

de pacientes. Segundo o Relator, essa flexibilização limitaria os controles de

qualidade e a segurança para os usuários, por isso não foi acatada. Na mesma

linha argumentativa se deram as vedações as Emendas ao Substitutivo nº 19, 20

22, 24, 25 e 26, inclusive quanto aos elementos de segurança e saúde pública.

Na prática, ocorre que com o Substitutivo aprovado foi inserido documento:

ANEXO - Regras para o cultivo, manejo e processamento de Cannabis por

associações de pacientes sem fins lucrativos, que passaria a exigir inúmeras e

rigorosas adequações legais, administrativas, metodológicas, operacionais, como

exigência de certificados de regularidade farmacêutica, manual de boas práticas,

procedimentos operacionais, Responsável Técnico encarregado do cultivo, plano

de gerenciamento de resíduos, composição de recursos humanos com

treinamentos periódicos, sistemas logísticos de controle de transporte e

estocagem, além de equipamentos e espaço físico adequado em cada etapa da

cadeia produtiva.

Estas exigências estão no parâmetro de produção de empresas e não para

associações civis cuja finalidade estatutária não prevê aparato industrial de

produção, sendo que os provimentos judiciais dados a algumas demandas d

associações de apoio aos pacientes, apenas cabem no atendimento restrito aos

associados, em escala pequena de produção, embora com cuidados mínimos na

qualidade da produção. Resulta que da forma regulamentada proposta beneficia

mais a indústria e grandes associações de cultivo. Ainda, cabe acrescentar que

no Substitutivo foi apresentado, e aprovado, a produção e comercialização

industrial do cânhamo (art. 23 e 24), o que de certo modo beneficia o setor do

agronegócio.

O controle estatal previsto, com a burocracia exigida, pode inviabilizar, inclusive, o

atendimento às demandas em curso, dado que possível implementação da lei, se

aprovada, levará tempo para adequações e pode interromper a produção atual,

também porque as associações teriam que investir na adequação que passaria a

ser exigida. Da mesma maneira, já que expressamente proíbe o cultivo por

pessoas físicas (art. 26), há riscos de comprometer o cenário atual, inclusive com

implicações da Resolução da Diretoria Colegiada–RDC n°17/2015 que autoriza a

Page 20: 20º Congresso Brasileiro de Sociologia

importação do produto, por pessoa física, para uso próprio, para tratamento de

saúde. Por se tratar de ato autorizativo e precário da ANVISA, com a aprovação

da legislação nova, poderia haver revogação dessa e de outras resoluções (RDC

15/2017, RDC 327/2019 e RDC 335/2020), comprometendo ainda mais a

condição das pessoas em tratamento, já que também a importação passa a ser

permitida apenas às pessoas jurídicas (art. 25).

Tentando responder a isso, o Relator reviu emenda e aprovou linha de crédito

especial às associações de pacientes sem fins lucrativos, por meio dos bancos

oficiais, para que no prazo de 24 meses possam se adequar às disposições dessa

lei nova. Mas, ao menos soa estranho essa pseudo-industrialização das

associações civis, com linhas de crédito bancário para “explorar” nichos de

mercado da planta.

Com a previsão de cinco (sessões) para que fosse apresentado Parecer, houve

muitas tentativas de impedir, adiar e embaraçar a votação do projeto, inclusive om

manobras e movimentos, por exemplo, de substituição de membros da Comissão

Especial. Viu-se um placar apertado pela aprovação somente com o voto de

minerva do Relator Dep. Luciano Ducci.

Como esperado, os discursos que atrelavam a discussão, restrita como é o uso

medicinal da cannabis, às políticas de drogas e questões de segurança pública,

proteção à família, viés religioso, foram marcantes por parte dos parlamentares

contrários ao projeto. Na mesma linha de tentativa de confusão foram os

apontamentos sobre o uso recreativo da planta, o que não foi objeto do projeto e

nem do Substitutivo. Mas, as narrativas e busca de apoio popular para, de certa

forma, pressionar os parlamentares a partir de suas bases eleitorais, foi um

recurso usado.

O deputado Diego Garcia (PODE/PR) apresentou Voto em Separado N.º 1, pela

rejeição integral do projeto (Substitutivo), em especial apontando o artigo 18, º

2§12 e artigo 2313, para qual a aprovação do projeto significava o uso irrestrito da

12 Texto com a seguinte redação: §2o. Não haverá restrição quanto aos critérios terapêuticos paraa prescrição de medicamentos ou de produtos de Cannabis medicinal de uso humano ouveterinário, desde que seja feita por profissional legalmente habilitado.13 Texto com a seguinte redação: Art. 23. É autorizada a produção e comercialização de produtos

fabricados a partir do cânhamo industrial, tais como cosméticos, produtos de higiene pessoal,celulose, fibras, produtos de uso veterinário sem fins medicinais, dentre outros, fabricados apartir do cânhamo industrial, desde que as suas formulações contenham apenas níveisresiduais de Δ9 –THC iguais ou inferiores a 0,3% (três décimos por cento).

Page 21: 20º Congresso Brasileiro de Sociologia

cannabis, segundo ele, de modo quase velado, e que os médicos receitariam o

uso em condições as mais diversas. Especificamente quanto ao artigo 23, o

parlamentar alega que as outras substâncias presentes na planta cannabis (mais

de 300), além do THC abaixo de 0,3% poderiam ser extraídas e como não

estariam sobre controle, poderiam ter destinação e processamento diferente,

inclusive para outros efeitos não terapêuticos.

Mas, ao contrário do que alega o parlamentar, o controle sobre a cultura da

planta, a partir do projeto (se aprovado), fica ainda mais rigoroso, com inspeções,

registros técnicos, e outros mecanismos fiscalizatórios em toda a cadeia

produtiva, sobretudo porque restringe produção apenas a pessoas jurídicas para

uso medicinal, como no caso da produção industrial (uso não medicinal) traz todo

o controle estatal da atividade econômica também.

A Deputada Dra. Soraya Manato (PSL/ES) apresentou Voto em Separado N.º 2,

sob argumento de que o projeto (Substitutivo) destoou do projeto originário, e “se

insere no contexto mundial que visa a promoção e expansão da indústria da

maconha, sob a falaciosa argumentação do uso medicinal.” Informa sobre lobby

da maconha que quer avançar sobre as crianças e jovens para forjar uma

clientela fiel e futura, introduzindo cannabis na indústria alimentícia. Que seria

pretexto a entrada no mercado como remédio, pois na verdade traria males

diversos, constando um disfarce sob o nome “maconha medicinal”.

A parlamentar completa dizendo se tratar de uma “pegadinha” a autorização da

produção por associações civis, pois na verdade a maioria das pessoas, jovens

espacialmente, se aproveitarão para obter e usar a maconha sem de fato

sofrerem de algum mal tratado com a substância.

Por fim, que a pretexto dos efeitos benéficos da dita maconha medicinal, se

transmitirá uma mensagem às crianças e jovens de que a maconha, como um

todo, não faz mal algum e, com isso, induzirá o uso indiscriminado resultando

problemas de saúde, segurança pública, desagregação familiar, aumentando a

violência, inclusive. Na busca de lucros, haverá investidas de empresas para

alcançar novos nichos de uso da maconha, como na produção de doces com

maconha, por exemplo. Começariam pelos medicamentos, como o projeto se

apresenta, e avançaria em todos os campos de atuação, em especial na

alimentação.

Page 22: 20º Congresso Brasileiro de Sociologia

Deputado Áureo Ribeiro (SOLIDARI/RJ) também apresentou o Voto em Separado

N.º 3 para rejeição do projeto considerando que o Substitutivo extrapolou o projeto

originário, sem regramento para plantação, inviabilizando o controle do Poder

Público, além de permitir a comercialização para além dos fins medicinais, como

cosméticos, alimentos e produtos com fins não especificados. Por fim, pediu a

aprovação do projeto na forma da Emenda ao Substitutivo N.º 3, de autoria do

Deputado Osmar Terra.

Nesse meio tempo, o Deputado Osmar Terra (MDB/RS) requereu retirada de

pauta e da votação do Parecer, evidentemente, tentando impedir a aprovação e

ganhando tempo para articulações de modo a derrubar o projeto. O mesmo com

pedido de vista para também ganhar tempo nas articulações e barganhas com

alterações de membros e negociações a fim de mudar votos ou compor

representação com maioria para derrotar o projeto.

De outra vertente compreensiva quanto ao projeto, as Deputadas Sâmia Bomfim

(PSOL/SP) e Talíria Petrone PSOL, apresentaram Voto em Separado n. 4,

especialmente questionando a forma de regulação do plantio dirigido às

associações civis que são tratadas como empresas de grande porte, pois “o

conjunto de regras de segurança e sanitárias presentes no substitutivo, que

remontam a uma estrutura farmacêutica e de grande vulto, acabando por impedir

a continuidade da operação destas Associações.” Para as parlamentares, as

associações civis passam a ser tratadas como “farmácias de manipulação”, sendo

que o entendimento das mesmas é que tais associações produzem remédio e não

medicamentos, como quer o projeto. Ainda, questionam o impedimento ao plantio

doméstico, inclusive citando várias decisões judiciárias que têm permitido às

pessoas físicas o plantio e uso doméstico.

Também em Voto em Separado n. 5, a Deputada Natália Bonavides (PT/RN)

rediscutiu o conteúdo de suas sete (7) Emendas ao Substitutivo que visavam

inserir o cultivo doméstico pelas famílias de pacientes e propondo regras

adequadas à realidade das associações de pacientes, todas estas não acatadas

pelo relator.

Ao final se constata certo desagrado tanto para ditos partidos e parlamentares

conservadores como também progressistas, com apontamentos diversos do

projeto. Algo que não pareceria tão evidente quando da apresentação do texto do

Page 23: 20º Congresso Brasileiro de Sociologia

projeto originário. O Substitutivo apresentado ampliou bastante o alcance do

projeto, já que além da comercialização, quis regular estabelecer verdadeiro

“marco regulatório” da cannabis, regulamentando o cultivo, processamento,

pesquisa, armazenagem, transporte, produção, industrialização, manipulação,

comercialização, importação e exportação de produtos à base da planta.

Pelos debates travados, sobretudo após a apresentação do Substitutivo, bem

como as movimentações dos parlamentares, conforme suas orientações e pleitos,

foram mais intensas e resistentes e, embora não se possa concluir pela

positividade de aprovação do Parecer, considerando as manifestações em tribuna

e nos votos em separado, houve certo descontentamento de todos os pólos,

evidentemente, por motivações diferentes, sendo que 17 (dezessete) votos de

parlamentares favoráveis se satisfizeram, mas registraram descontentamentos e

dúvidas pelos excessos de controle estatal sobre as associações civis e vedações

ao plantio doméstico. Os outros 17 (dezessete) votos dos parlamentares

contrários ao projeto seguiram insatisfeitos com a permissibilidade trazida pelo

projeto, que mais que permitir a comercialização, estendeu cultivo amplo e

manipulação da planta por associações e ainda permitiu a produção industrial de

cosméticos, produtos de higiene pessoal, celulose, fibras, produtos de uso

veterinário sem fins medicinais. Para esse grupo, nem mesmo o projeto originário

seria necessário, pois já há regulamentação permissiva pela ANVISA para acesso

aos pacientes em tratamento, bastando a oferta gratuita pelo SUS, o que não

exigira maiores formalidades legislativas.

O regular processo de tramitação legislativa indica recurso a ser apresentado

pelos parlamentares contrários ao projeto, e com isso o projeto deve ser inserido

como pauta deliberativa no Plenário, com todos os 513 Deputados, o que pode

demorar e ainda ser marcado por novas discussões e barganhas político-

partidárias, com participação ativa do Executivo e, com riscos de retrocessos.

Outro cenário seria não haver recursos e seguir ao Senado para apreciação.

Cremos que no trâmite legislativo, ainda haverá desdobramentos quaisquer que

sejam os encaminhamentos, com importantes repercussões.

Mais ainda, sobre o conteúdo do projeto e sua implementação, são muitos os

desafios impostos, pois outros provimentos legais serão necessários, além dos

aportes de recursos de toda ordem para viabilizar o novo cenário dessa política.

Page 24: 20º Congresso Brasileiro de Sociologia

Por se tratar de tema sensível, marcado por intervenientes nem sempre objetivos,

ainda ocorrerão dificuldades as mais diversas. De todo modo, a se confirmar esse

novo marco legislativo, apontam-se possibilidades importantes que concretizam

lutas históricas e, nessa direção, podem também repercutir em lutas ainda em

curso e necessárias, para outros usos da cannabis que refletem diretamente em

outros campos da vida social que carecem de políticas qualificadas, como o

encarceramento, criminalização da pobreza, da juventude e das periferias,

racismo, dentre outras.

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