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Comunicado Técnico 93 ISSN 0101-5605 Novembro, 2004 Sete Lagoas, MG Introdução Um dos grandes problemas enfrentados pela agricultura mundial diz respeito ao uso cons- tante e muitas vezes indiscriminado dos agrotóxicos, causando, em muitos casos, resistência dos insetos aos inseticidas e a redução ou eliminação da população de inimigos naturais de pragas, a contaminação ambiental, além do aumento de custo de produção. Pesticidas não são tóxicos só para as pragas, mas também para os homens, os animais domésticos e silvestres e para a natu- reza como um todo, podendo deixar resíduos nos alimentos e/ou na água. Portanto, para evitar os problemas acarretados pelos agrotóxicos, torna-se imperativa a busca de medidas alternativas para o controle de pragas (Valicente e Cruz, 1991). Uma das alternativas é baseada no controle biológico, uma vez que vários agentes de Caracterização Molecular de Fungos Entomopatogênicos Utilizados no Controle Biológico de Pragas do Milho - Beauveria bassiana versus Spodoptera frugiperda Andréa Almeida Carneiro 1 Eliane Aparecida Gomes 2 Luciane Francisca Vieira Nonato 3 Wellerson M.A.Britto 3 Fernando Tavares Fernandes 1 Newton Portilho Carneiro 1 Claudia Texeira Guimarães 1 Ivan Cruz 1 1 Pesquisadores da Embrapa Milho e Sorgo, CP 151 - 35701-970 Sete Lagoas-MG, [email protected], [email protected], [email protected], [email protected], [email protected] 2 Técnico de Nível Superior. Embrapa Milho e Sorgo. [email protected] 3 Estudantes de Graduação Ciências Biológicas – Centro Universitário Izabela Hendrix – Rua da Bahia – Lourdes, 2020 Belo Horizonte – MG. [email protected], [email protected] controle natural de insetos já foram identificados, seja dentro da classe Insecta ou dentre os microrganismos. O controle biológico, em sua essência, pode ser considerado como o uso de organismos vivos para manter a população de determinada praga em equilíbrio no agrossistema, de modo a não ocasionar danos econômicos ao produtor. Existem na natureza vários organismos que utilizam, para sua sobrevivência, como alimento, os insetos-praga. Pássaros, aves, aranhas, vários tipos de insetos, fungos, bactérias, vírus e muitos outros organismos têm papel importante no controle de pragas (Valicente e Cruz, 1991). O controle biológico feito por microrganismos entomopatógenos, como vírus, bactérias, fungos, protozoários e nematóides, exerce papel importante na regulação do número de insetos. Um grande

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ComunicadoTécnico

93ISSN 0101-5605Novembro, 2004Sete Lagoas, MG

Introdução

Um dos grandes problemas enfrentados pelaagricultura mundial diz respeito ao uso cons-tante e muitas vezes indiscriminado dosagrotóxicos, causando, em muitos casos,resistência dos insetos aos inseticidas e aredução ou eliminação da população deinimigos naturais de pragas, a contaminaçãoambiental, além do aumento de custo deprodução. Pesticidas não são tóxicos só paraas pragas, mas também para os homens, osanimais domésticos e silvestres e para a natu-reza como um todo, podendo deixar resíduosnos alimentos e/ou na água. Portanto, paraevitar os problemas acarretados pelosagrotóxicos, torna-se imperativa a busca demedidas alternativas para o controle de pragas(Valicente e Cruz, 1991).

Uma das alternativas é baseada no controlebiológico, uma vez que vários agentes de

Caracterização Molecular deFungos EntomopatogênicosUtilizados no Controle Biológicode Pragas do Milho - Beauveriabassiana versus Spodopterafrugiperda

Andréa Almeida Carneiro1

Eliane Aparecida Gomes2

Luciane Francisca Vieira Nonato 3

Wellerson M.A.Britto3

Fernando Tavares Fernandes1

Newton Portilho Carneiro1

Claudia Texeira Guimarães1

Ivan Cruz1

1Pesquisadores da Embrapa Milho e Sorgo, CP 151 - 35701-970 Sete Lagoas-MG, [email protected],

[email protected], [email protected], [email protected], [email protected]écnico de Nível Superior. Embrapa Milho e Sorgo. [email protected] de Graduação Ciências Biológicas – Centro Universitário Izabela Hendrix – Rua da Bahia – Lourdes, 2020 Belo

Horizonte – MG. [email protected], [email protected]

controle natural de insetos já foramidentificados, seja dentro da classe Insectaou dentre os microrganismos. O controlebiológico, em sua essência, pode serconsiderado como o uso de organismosvivos para manter a população dedeterminada praga em equilíbrio noagrossistema, de modo a não ocasionardanos econômicos ao produtor. Existem nanatureza vários organismos que utilizam,para sua sobrevivência, como alimento, osinsetos-praga. Pássaros, aves, aranhas,vários tipos de insetos, fungos, bactérias,vírus e muitos outros organismos têm papelimportante no controle de pragas (Valicentee Cruz, 1991).

O controle biológico feito pormicrorganismos entomopatógenos, comovírus, bactérias, fungos, protozoários enematóides, exerce papel importante naregulação do número de insetos. Um grande

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2 Caracterização Molecular de Fungos Entomopatogênicos...

número de espécies de pragas é afetadopelas doenças microbianas, que podemreduzir ou até mesmo eliminar a capacidadede provocar danos à planta hospedeira.

Entre os agentes causais de doençasinfecciosas em insetos, os fungos ocupamum lugar de destaque, sendo os primeirosagentes de infecção de naturezamicrobiana identificados em insetos. Entreos fungos entomopatogênicos maisconhecidos e estudados estão os dosgêneros Entomophthora, Cordyceps,Aschersonia, Metarhyzium, Beauveria eNomuraea.

A lagarta-do-cartucho na cultura do milho

A lagarta-do-cartucho, Spodopterafrugiperda (Smith) é a principal praga dacultura do milho, no Brasil (Figura 1), e, nosúltimos anos, sua incidência e severidadevêm aumentando em várias áreascultivadas (Cruz, 1995; Cruz et al., 1999).O inseto também ataca e causa danos avárias outras culturas de importânciaeconômica, como o sorgo, trigo, arroz,alfafa, feijão, amendoim, tomate, batata,repolho, espinafre, abóbora e couve (Cruzet al., 1999). Em anos recentes, tem-setornado também uma praga ameaçadora aocultivo de algodão (Cruz et al., 1999).Quando infestando o milho, alimenta-se emtodas as fases de crescimento da planta,mas tem preferência por cartuchos e podecausar perdas de até 37% da produção, senão controlada.

A lagarta-do-cartucho do milho foi descritacomo praga, em 1797, na Geórgia, EstadosUnidos. O inseto pode ser encontrado nasAméricas e em algumas ilhas a oeste daÍndia (Cruz, 1995). Nos Estados Unidos, osinsetos sobrevivem, no inverno, nas regiõestropicais do sul da Flórida e no Texas, deonde as mariposas migram durante aprimavera, verão e outono, podendo sedeslocar a grandes distâncias, atingindo asregiões ao norte do país, chegando até o

Canadá. No Brasil, em função daalimentação diversificada e disponível o anotodo e das condições de clima favoráveisao inseto, a sua distribuição é geral emtodas as regiões do território nacional(Cruz, 1995).

O primeiro grande surto registrado nahistória ocorreu em 1899, quando umagrande parte dos Estados Unidos, a lestedas Montanhas Rochosas, foi invadida pelalagarta-do-cartucho, causando severosdanos em milho, feijão, arroz, sorgo e trigo.

Figura 1. Spodoptera frugiperda (Lagarta-do-cartucho) e acultura do milho. (A) Danos típicos causados pela lagarta-do-cartucho na cultura do milho; (B) Lagarta-do-cartuchocompletamente desenvolvida (tamanho real igual a 4,5 cm);(C) Danos severos provocados pela lagarta-do-cartucho emplantações de milho; (D) Campo de cultivo de milho sem oataque da lagarta-do-cartucho; (E e F) Danos causados pelalagarta-do-cartucho na ponta da espiga de milho.

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3Caracterização Molecular de Fungos Entomopatogênicos...

Em 1902, cerca de 40.000 acres depastagens foram severamente danificadospelo inseto, no Texas. Também nos EstadosUnidos, ataques intensos foram verificadosem aveia, algodão e pastagens. Tem sidoconsiderada a principal praga de milho,pastagem e amendoim nos estadosamericanos do Sudeste. No Brasil, um surtofoi relatado em 1964, com enormes danosem milho, arroz e pastagens. O inseto étambém considerado uma das pragas maisimportantes do milho na Colômbia,Venezuela, Guatemala, México, Peru eChile (Cruz, 1995).

A fêmea coloca seus ovos nas folhas domilho (Figura 2). As larvas de primeiroínstar geralmente iniciam sua alimentaçãonos tecidos verdes de um lado da folha,deixando a epiderme membranosa do outrolado intacta, causando o sintoma conhecidocomo “folhas raspadas”. Larvas maiorescomeçam a fazer buracos na folha e,quando estão entre o quarto e o sextoínstares (oito a 14 dias), podem destruircompletamente pequenas plantas ou causarseveros danos em plantas maiores. O maiordano é feito por larvas de quinto e sextoínstares. A lagarta pode também sealimentar na base do colmo, causando osintoma conhecido como “coração morto”,podendo causar a morte ou o perfilhamentoda planta. Muitas vezes, especialmentequando o milho é muito precoce e/ou asinfestações ocorrem mais tarde, a larva jábem desenvolvida dirige-se para a região daespiga, atacando o pedúnculo e impedindoa formação dos grãos.

No Brasil, reduções no rendimento do milhodevido ao ataque da lagarta-do-cartuchochegam a 37%. Esse percentual de danosdepende da fase de desenvolvimento daplanta em que ocorre o ataque, sendo asplantas no estádio de oito a dez folhas asmais sensíveis. As perdas econômicascausadas pela lagarta-do-cartucho nacultura do milho são estimadas em mais de400 milhões de dólares (Cruz, 1995).

O controle de S. frugiperda no milho é feitoutilizando-se produtos químicos, que sãoaplicados com o aparecimento dosprimeiros sintomas de danos na cultura.Entretanto, o uso constante dessesprodutos tem gerado problemas, como odesenvolvimento de resistência e a reduçãoda população de inimigos naturais. Assim, odesenvolvimento de medidas de controlecom menor impacto ambiental tende amanter o sistema de produção maissustentável.

Controle biológico de S. frugiperda utilizandoo fungo entomopatogênico Beauveriabassiana

Beauveria bassiana é um deuteromicetocosmopolita, com alta patogenicidade egrande abrangência entomopatogênica(Figura 3). Atualmente, esse fungo vemsendo estudado em todo o mundo como ummicoinseticida (Riba e Silvy, 1989), sendojá comercializado como pó solúvel deconídios para uso agrícola e doméstico.Muitos estudos têm mostrado que certosisolados de B. bassiana são eficazes nocontrole de lepidópteros, como a lagarta-do-cartucho, (Cruz, 1995).

Figura 2. Fases de desenvolvimento da Spodoptera frugiperda.(A) Posturas de S. frugiperda em folhas de milho; (B) Lagartasde S. frugiperda de diferentes idades; (C) Mariposa fêmea (noalto) e macho (embaixo) de S. frugiperda.

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4 Caracterização Molecular de Fungos Entomopatogênicos...

O mecanismo de infecção de B. bassiana éo mesmo para todos os insetos. O fungopenetra na cutícula, através de uma combi-nação de pressão e degradação enzimática(Ferron 1978). Após atravessar ointegumento, o patógeno atinge os tecidosinternos e as hifas proliferam, até a mortedo inseto, que ocorre entre três e sete diasapós a infecção (Figura 4). A morte dosinsetos é devido à digestão dos tecidosinternos e à ação de micotoxina, que élançada na hemolinfa (Hajek e St. Leger,1994). Diferenças quanto à virulência estãoassociadas à eficiência na infecção, quedepende da dureza (determinada pelo graude esclerotização) e das diferenças estrutu-rais da cutícula (Hajek e St. Leger, 1994).Vários trabalhos descrevem diferençasquanto à patogenicidade entre isolados deB. bassiana. Entretanto, poucos estudosforam realizados para determinar variabili-dade genética entre isolados. Portanto, parase avaliar o potencial dos inóculos encon-trados no Brasil, no controle de pragas taiscomo a S. frugiperda, é necessária a carac-terização dos isolados a serem estudados.

O Laboratório de Criação de Insetos daEmbrapa Milho e Sorgo vem realizandobioensaios para avaliar a virulência deisolados de B. bassiana contra a S.frugiperda. Basicamente, os bioensaiosconsistem da contaminação de lagartas pormeio de suspensões de conídios dos fungos,em água destilada, e avaliação das taxasde mortalidade das mesmas. Discos foliaresde milho são imersos nas suspensões deconídios e oferecidos para as lagartas de S.frugiperda. Após 24 h, os discos foliaressão substituídos por dieta artificial. Osexperimentos são mantidos em salas decrescimento à temperatura constante de25oC. As avaliações são realizadas diaria-mente, por um período de dez dias, tendocomo base a mortalidade dos insetos.Figura 3. Aspectos morfológicos de Beauveria bassiana. (A)

Fiálide com conídeos agrupados em ziguezague; (B) Grupo defiálides com conidíos formando um conidióforo; (C) Aspectomacroscópico de uma colônia de B. bassiana crescendo emmeio de cultivo BDA.

Figura 4. Spodoptera frugiperda infectada pelo fungoentomopatogênico Beauveria bassiana.

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5Caracterização Molecular de Fungos Entomopatogênicos...

Utilização da biologia molecular na caracte-rização da diversidade genética de isoladosde Beauveria bassiana

Os métodos fenotípicos (morfologia, testesbioquímicos e sorológicos), associados àstécnicas de biologia molecular, apresentam-se como uma estratégia importante para acaracterização e identificação dogermoplasma microbiano (Ferreira eGrattapaglia, 1996; Nour et al., 1995;Oliveira et al., 1999).

A técnica de RAPD (Random AmplifiedPolymorphic DNA) é uma variação da técni-ca de PCR, que utiliza um únicooligonucleotídeo iniciador de deznucleotídeos com seqüência arbitrária. Comisso, são amplificados fragmentos de DNAdistribuídos ao acaso no genoma, sem anecessidade do conhecimento prévio daseqüência do DNA. Marcadores RAPD sãoaltamente sensíveis a diferenças denucleotídeos entre DNA molde e osoligonucleotídeos iniciadores, permitindo adetecção de mudanças em um úniconucleotídeo. Tais características tornam osmarcadores RAPD ideais para a detecçãode diferenças em indivíduos relacionados eem espécies pouco polimórficas (Williamset al., 1990). A técnica de RAPD tem sidoutilizada na análise da variabilidade genéti-ca de isolados de B. bassiana, por ser defácil execução, de custo relativamentereduzido e eficiente na detecção depolimorfismo (Castrillo et al., 1999;Castrillo e Brooks, 1998; Berretta et al.,1998; Bidochka et al., 1994).

Outra técnica que vem sendo muito aplica-da na caracterização molecular de micror-ganismos é o seqüenciamento e compara-ção de subunidades do DNA ribossômico.Os genes codificadores das subunidadesribossômicas estão dispostos em repeti-ções, em um único cromossoma. Pelo fatode apresentar-se em repetições, o rDNAtorna-se um alvo de recombinações nãohomólogas, ocasionando inserções ou

deleções nucleotídicas. As diferentes regi-ões do rDNA apresentam diferentes taxasde mutação, o que permite um estudo com-parativo em níveis taxonômicos, que variamde famílias até populações isoladas de umamesma espécie. A subunidade pequena dorDNA sofre mutações ou evolui vagarosa-mente e é útil para estudar as distânciasentre os organismos, enquanto que os ITS(Internal Transcribed Spacer) desenvolvem-se mais rapidamente e podem variar entreas espécies, sendo utilizados para a carac-terização de diferentes isolados (White etal, 1997).

A Embrapa Milho e Sorgo vem procurandonovas alternativas de controle da lagarta-do-cartucho. Em campos cultivados demilho, foram coletadas diversas lagartasinfectadas por fungos entomopatogênicos.Esses fungos, além de não prejudicarem aslavouras, reduzem o desenvolvimento epodem até causar a morte dos insetos-praga, constituindo-se em seus inimigosnaturais. Dentre as colônias isoladas dosdiversos fungos coletados em campo, algu-mas mostraram-se morfologicamente idênti-cas, enquanto outras apresentaram umfenótipo distinto. As variações fenotípicasfreqüentemente estão correlacionadas comas variações genotípicas, exceto em casosquando o fenótipo é determinado por condi-ções ambientais. Variações genotípicaspodem ser acessadas usando váriosmarcadores genéticos; esses marcadores,por sua vez, podem ser utilizados comoetiquetas para os isolados selecionados.

Neste trabalho, objetivou-se estudar asvariações dentre populações de Beauveriabassiana associadas à S. frugiperda. Para aidentificação de microrganismos com po-tencial de uso como agentes para o contro-le biológico da lagarta-do-cartucho, fungosisolados de lagartas mortas coletadas nocampo foram avaliados utilizandomarcadores RAPD e seqüenciamento deregiões ITS de genes que codificam para orDNA.

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6 Caracterização Molecular de Fungos Entomopatogênicos...

Foram utilizados isolados de B. bassiana dacoleção de fungos da Embrapa Milho eSorgo, coletados nos campos experimentaisde milho, em Sete Lagoas. Culturasmonospóricas dos isolados foram mantidasem meio batata dextrosado líquido (Wagnere Lewis, 2000) a 25ºC, por cinco dias, paraa obtenção de micélio e extração de DNA.

DNA foi extraído de 0,5 g de micélio frescode fungos, de acordo com o protocolo des-crito por Lee e Taylor (1990). O DNA dosisolados de B. bassiana foi amplificado porPCR, utilizando-se os seguintesoligonucleotídeos iniciadorescomercializados pela Operon TechnologiesInc. (Alameda, Califórnia, USA): OPB1,OPB8, OPC4, OPE6, OPE8, OPE9, OPQ4,OPZ12, OPZ13, OPZ19, OPO2 e OPO12. Asreações foram feitas com umadesnaturação inicial de 1 min a 94oC, segui-do de 35 ciclos de amplificação (30”- 94oC,1’- 36oC, 2’- 72oC), e uma extensão final a72ºC por 7 min. Os produtos de amplifica-ção foram separados por eletroforese emgel de agarose 1,5% utilizando tampãoTAE. Os géis foram tratados com brometode etídeo, visualizados sob luz ultravioleta eas imagens capturadas e estocadas em umsistema de fotodocumentação (Eagle Eye II,Stratagene). Os produtos de amplificaçãoforam avaliados com presença (1) e ausên-cia (0), utilizando o complemento do índicede similaridade de Jaccard para calcular adistância genética, entre os pares de isola-dos. A análise de agrupamento foi feitabaseada na matriz de distância genética,utilizando o método UPGMA, disponível noprograma Statistica, versão 4.2.

A amplificação da região ITS (InternalTranscribed Sequence) do rDNA deBeauveria bassiana foi feita utilizando osprimers ITS1 5’TCC GTA GGT GAA CCTGCG G 3’ e ITS4 5’TCC TCC GCT TAT TGATAT GC 3’. DNA foi amplificado após 40ciclos, cada um consistindo de umadesnaturação a 94°C por 60 seg, umanelamento a 50°C por 60 seg e uma ex-tensão a 72°C por 90 Seg, seguido de uma

extensão final a 72°C por 7 min. Oseqüenciamento dos fragmentos amplifica-dos foi feito em um Seqüenciador Automáti-co ABI 3100. As seqüências obtidas foramanalisadas e comparadas com seqüênciasdepositadas no GenBank NucleotideDatabase, utilizando os programas BLAST eClustal 1.6.

Diferenciação de estirpes de Beauveriabassiana utilizando RAPD e seqüenciamentode regiões ITS

O gênero Beauveria é um patógeno degrande número de artrópodos, ocorrendoem mais de 200 espécies de inseto eácaros, incluindo carrapatos. Isolados deBeauveria bassiana foram obtidos de lagar-tas mortas de Spodoptera frugiperda comaspecto cotonoso, em diferentes camposde cultivo de milho de Sete Lagoas. Obser-vação dos microcultivos, originados deculturas monospóricas, dos diversos isola-dos, revelou a presença de micélio abun-dante, septado e de cor branca, conídiosovóides suportados por fiálides, com aporção terminal em zigue-zague. DNAsisolados de três fungos diferentes foramamplificados pela técnica de PCR, utilizandoprimers para a região ITS do rDNA. Oseqüenciamento da banda de 600 bpamplificada revelou uma homologia de maisde 97,0% com seqüências do rDNA de B.bassiana depositadas no GenBankNucleotide Database (Figura 5). O DNA dosfungos, morfológica e molecularmenteidentificados como B. bassiana, foi analisa-do por técnicas de RAPD, com o objetivo deacessar as variações dentre populações dofungo associadas com o mesmo insetohospedeiro, S. frugiperda.

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7Caracterização Molecular de Fungos Entomopatogênicos...

Figura 5. Homologia entre seqüências ITS de Beauveria bassiana. Sequências 1, 2, e 3 foram retiradas do GenBank NucleotideDatabase com os números de acesso AF 291871, AF 291872, e AF 347611, respectivamente. Seqüências 4, 5, e 6 foramprovenientes de DNA extraído de fungos isolados de lagartas S. frugiperda mortas, coletadas nos campos de cultivo de milho daEmbrapa Milho e Sorgo.

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8 Caracterização Molecular de Fungos Entomopatogênicos...

Nas análises de RAPD, dez oligonucleo-tídeos iniciadores foram selecionados eamplificaram 53 bandas, das quais 33 fo-ram polimórficas entre os isolados. O núme-ro de fragmentos amplificados variou de 3(OPB8) a 7 (OPO2 e OPO12), com umamédia de 5,3 bandas por oligonucleotídeo,não sendo verificada nenhuma banda nocontrole negativo. O tamanho das bandasficou entre 300 (OPZ19) e 3.800 (OPE9)pares de bases. Na Figura 6, está apresen-tado, como exemplo, o padrão de amplifica-ção obtido com o oligonucleotídeo OPQ4.

causa da ausência da fase perfeita. Essefungo se reproduz preferencialmente viaassexual e é predominantemente haplóide.Fungos que se reproduzem via assexual sãogeralmente menos diversos que os micror-ganismos que possuem reprodução sexual,devido à ausência de recombinação genéti-ca, exceto em casos de hibridizaçãosomática e/ou ciclo parassexual, que po-dem compensar a ausência de reproduçãosexual (Burdon, 1993). Na maioria doscasos, as variações genéticas desses mi-crorganismos são devido às mutações.

Figura 6. RAPD utilizando DNA total de Beauveria bassiana e o oligonucleotídeo iniciador OPQ4. Os números 7, 8, 10, 11, 12, 21,22, 48, 49 e 50 correspondem aos diferentes isolados de B. bassiana.

A técnica de RAPD, como pode ser obser-vado no dendrograma apresentado na Figu-ra 7, foi capaz de diferenciar os isolados deB. bassiana obtidos numa mesma localida-de, mostrando-se eficiente para a caracteri-zação da variabilidade genética. Portanto,diferentes estirpes de B. bassiana podemser caracterizadas por essa técnica antesde serem liberadas em um agroecossistemacomo agentes de controle biológico, garan-tindo a possibilidade de detectar o patógenointroduzido “versus” a estirpe nativa domesmo fungo.

B. bassiana é classificado entre os fungosimperfeitos da classe deuteromicetos, por

Apesar de a reprodução ser assexual, aespécie B. bassiana apresentou uma consi-derável variabilidade genética, devido à suaubiqüidade, ampla distribuição geográfica elarga faixa de hospedeiros. Essepolimorfismo genético pode conferir aomicrorganismo uma plasticidade para seadaptar e sobreviver em ambientes hetero-gêneos. Mesmo considerando que todos osisolados analisados foram coletados domesmo hospedeiro (S. frugiperda), parte dociclo de vida do fungo ocorre no solo, com-petindo com outros microrganismos einteragindo com vários fatores abióticos.

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9Caracterização Molecular de Fungos Entomopatogênicos...

O uso de B. bassiana no biocontrole dalagarta-do-cartucho terá efeitos positivospara o aumento da produtividade do milho epossibilitará a redução no uso deagrotóxicos. A diminuição da aplicação deinseticidas irá melhorar a qualidade dosalimentos e reduzirá o impacto nocivo dosagroquímicos no ambiente, na saúde huma-na e animal. Em conjunto, esses procedi-mentos possibilitarão reduzir os custos deprodução, promoverão o uso e a conserva-ção de recursos naturais e irão melhorar aqualidade de vida humana, na medida quepreservarem e melhorarem as condiçõesambientais. Como conseqüência, prevêem-se efeitos de redução nos custos de produ-ção, aumento da produtividade e melhoriana sustentabilidade dos processos produti-vos. Esse estudo resultará em benefíciosdiretos ao pequeno produtor brasileiro, pelafacilidade de utilização e pelo menor custodas tecnologias geradas, que disponibiliza-rão fungos entomopatogênicos eficazes nocontrole de doenças e pragas.

Figura 7. Análise de agrupamento entre 12 isolados de B. bassiana baseados em dados de RAPD, utilizando a técnica de UPGMA. Adistância genética entre os isolados variou de 0% a 54%. As maiores distâncias genéticas foram verificadas entre o isolado 15 e osdemais fungos. Isolados 7, 8, 10, 11, 12, 21 e 22 não apresentaram nenhuma diferença entre os oligonucleotídeos utilizados.

Referências bibliográficas

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Comitê dePublicações

Presidente: Jamilton Pereira dos SantosSecretário-Executivo: Paulo César MagalhãesMembros: Camilo de Lélis Teixeira de Andrade, CláudiaTeixeira Guimarães, Carlos Roberto Casela, José CarlosCruz e Márcio Antônio Rezende Monteiro

Expediente Revisão de texto: Dilermando Lúcio de OliveiraEditoração eletrôncia: Tânia Mara Assunção Barbosa

ComunicadoTécnico, 93

Exemplares desta edição podem ser adquiridos na:Embrapa Milho e SorgoCaixa Postal 151 CEP 35701-970 Sete Lagoas, MGFone: 0xx31 3779 1000Fax: 0xx31 3779 1088E-mail: [email protected]

1ª edição1ª impressão (2004) Tiragem: 200

p. 190-196, 1998.

CASTRILLO, L. A.; WIEGMANN, B. M.; BROOKS,W. M. Genetic variation in Beauveria bassianapopulations associated with the darkling beetle,Alphitobius diaperinus. Journal of InvertebratePathology, New York, v. 73, n. 3, p. 269-275,1999.

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