composições líricas de sabedoria: provérbios, máximas...

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Composições Líricas De sabedoria: Provérbios, máximas, sentenças… Muito me conta bomessê! Mas não são libras p’r’ó meu bolso! Maria Jesus Martins, 83 anos, Póvoa DW_D0259 No Agosto toda a fruta tem gosto. Emília Teixeira Alves Rodrigues, 58 anos, Salvador DW_C0335 Guarda palha p’ra Maio porque o que não beio está p’ra vir. Emília Teixeira Alves Rodrigues, 58 anos, Salvador DW_C0336 Março marçagão De manhã cara de cão Ao meio-dia de rainha À noite de fuinha Joaquina Monteiro (“Joaquina da Casinha”), 67 anos, Daivões DW_C0355 Quem em Maio não merenda, aos finados se encomenda. Joaquina Monteiro (“Joaquina da Casinha”), 67 anos, Daivões DW_C0356 Trinta dias tem Nobembro, Abril, Junho e Setembro De vinte e oito há só um, Os demais são de trinta e um. Domingos Silva, 63 anos, Daivões DW_C0383 - 1 -

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Composições Líricas

De sabedoria: Provérbios, máximas, sentenças…

Muito me conta bomessê! Mas não são libras p’r’ó meu bolso!

Maria Jesus Martins, 83 anos, PóvoaDW_D0259

No Agosto toda a fruta tem gosto.

Emília Teixeira Alves Rodrigues, 58 anos, SalvadorDW_C0335

Guarda palha p’ra Maio porque o que não beio está p’ra vir.

Emília Teixeira Alves Rodrigues, 58 anos, SalvadorDW_C0336

Março marçagão

De manhã cara de cão

Ao meio-dia de rainha

À noite de fuinha

Joaquina Monteiro (“Joaquina da Casinha”), 67 anos, DaivõesDW_C0355

Quem em Maio não merenda, aos finados se encomenda.

Joaquina Monteiro (“Joaquina da Casinha”), 67 anos, DaivõesDW_C0356

Trinta dias tem Nobembro,

Abril, Junho e Setembro

De vinte e oito há só um,

Os demais são de trinta e um.

Domingos Silva, 63 anos, DaivõesDW_C0383

- 1 -

Debaixo da água há lodo

Debaixo do lodo há areia

Debaixo de uma amizade

É que o amor falseia.

Maria Pereira (“Maria Carpinteira”), 62 anos, Daivões

DW_C0389

Enquanto o pau ergue e desce, folgam-se as costas!

Maria Pereira (“Maria Carpinteira”), 62 anos, Daivões

DW_C0379

- 2 -

Composições LíricasLúdicas: Cantigas

Marcha de Ribeira de Pena

Não há terra tão bonita

Não há rosa tão catita

No jardim de Portugal

Oh não, não há.

Ah, minha terra amada,

Esta Ribeira adorada.

Rico meu, terra natal.

Oh não, não há

Mocidade Ribeirense

C’o trabalho tudo vence.

Dá-lhe todo o seu ardor.

Oh não, não há.

Amanhã terás a dita

Desta terra tão bonita

Ser um jardim todo em flor.

Oh não, não há.

Oh raparigas, cantai, cantai.

Vossas cantigas são orações.

Dai à Ribeira como oferenda

A rica prenda, os corações.

Fátima Meireles, Salvador

DW_C0396

DW_C0398

- 3 -

Nossa Senhora da Guia

Está birada p’r’á Ribeira

Para botar a bênção

À mocidade solteira.

Maria Jesus Martins, 83 anos, PóvoaDW_D0280

Senhora Santa Marinha

Não me percas o amor

Sou de bossa freguesia

Bou p’r’á de São Salbador

Maria Jesus Martins, 83 anos, PóvoaDW_D0281

Nossa Senhora é minha

Eu sou de Nossa Senhora

Ela se alembre de mim

Qu’eu também sou pecadora

Maria Jesus Martins, 83 anos, PóvoaDW_D0283

Nossa Senhora m’ajude

E ela me queira ajudar

É luvar a minha bida

Que eu não posso luvar

Maria Jesus Martins, 83 anos, PóvoaDW_D0284

Ai tiroliro já cá …Ai ai ai

Ai tiroliro já cá bai

Ai tiroliro cabeça de grilo

- 4 -

Quem te mandou bulir naquilo

Aquilo que estaba quieto

E não bulia ó comprido

Cármen do Céu, 88 anos, Balteiro

DW_D0170

Sou do Minho, sou minhota

De alma e coração.

A minha bila minhota

A bila de Monção.

É a vila de Monção

Freguesia é Acegude

A minha terra é tão linda

Parece que tem birtude

Maria das Dores Sousa Vieira, 84 anos, Salvador, (natural de Monção)DW_D0171

Fui à festa a Bila Pouca

Chora a Lídia, chora

Numa pedra m’assentei

Chora a Lídia, chora

C’o sentido no amor

Chora a Lídia, chora

Nem a esmola à Santa dei

Volta a chorar

Qu’eu bou-me embora.

Dei um ai dei um suspiro

Chora a Lídia, chora

Dei uma bolta na cama

Chora a Lídia, chora

Quando eu julguei que tinha

- 5 -

Chora a Lídia chora

Meu amor da outra banda

Bolta a chorar, qu’eu bou-me embora

Maria Rosa, 88 anos, SalvadorDW_D0176DW_D0177

Ó que lindo paralelo

Aqui à minha direita

Aqui à minha direita

Oh que linda rosa branca

Que tão lindo cheiro deita

Antónia Reis Alves Gomes, 90 anos, SalvadorDW_D0179

Como tem de embarcações

Se o mar tibesse barandas

Como tem de embarcações

Como tem de embarcações

Também quer’ir ó Brasil

Em certas ocasiões

Ana Ferreira, 86 anos, SalvadorDW_D0180

Anel das sete pedras

Anel das sete pedras

Anel da pedreiria

Anel da pedreiria

Eu q’anto mais te quero

Parece ser feitiçaria

Ana Ferreira, 86 anos, Salvador

- 6 -

DW_D0181

Se o meu amor fosse António

Se o meu amor fosse António

Eu mandabo inbidraçar

Mandabo inbidraçar

E assim como é José

E José eu hei-de amar

Ana Ferreira, 86 anos, SalvadorDW_D0182

Olha assim o quis

Sejas feliz

Como mereces

Porque o rancor como o amor

Também se esquece.

Maldita a hora qu’eu esqueci

Por seres angrato

Deitei fora as cinzas do teu retrato

Mas nesse dia, fui feliz

Sinceramente.

Eu canto com alegria

A cantar e estar contente

Emília Teixeira Alves Rodrigues, 58 anos, Salvador DW_D0234

No monte nasce a giesta

Simples, modesta, amarelinha

Fica toda a serra em festa

Colada à testa é uma rainha

E perfuma tudo em roda

Giesta, giesta, perfumadinha

- 7 -

Giesta, giesta, giesta, giesta, giesta amarelinha.

Por entre louras espigas

Oiço cantigas a rebolar

São alegres raparigas

Todas amigas lá bão ceifar

E nessa seara está

O pão nosso que Deus dá

Trigo, trigo, trigo, loiro trigo

Trigo és um tesoiro

Hoje o mar furiosamente

Beija contente o areal

E se acalma de repente

Diz contente o bendabal.

Para salvar do mar gigante

Mar de sonhos importantes

Mar gigante, mar salgado

Mar de sonhos encantados

Altina Teixeira, 66 anos, SalvadorDW_D0245

Tomara eu que biesse

O tempo que há-de bir

O tempo das esfolhadas

Para eu m’adbertir.

Tomara eu que biesse

O tempo das esfolhadas

P’ra comer a gosto

Quatro castanhas assadas.

Maria Jesus Martins, 83 anos, PóvoaDW_D0260

- 8 -

O pai da Rosinha era tamanqueiro

Fazia soquinhas de pau de milheiro

Ai larai, larai, lai lai

Ai larai, larai, lai larai

Rosinha, Rosinha, Rosinha meu bem

Morreu a Rosinha, fiquei sem ninguém

Ai larai, larai, lai larai

Ai larai, larai, lai larai

Maria Jesus Martins, 83 anos, PóvoaDW_D0269

Cegadinha, cegadoira

Samos da Ribeiradoira

Bate a mulher no marido

Co’ as costas da ceitoira

Maria Jesus Martins, 83 anos, PóvoaDW_D0273

Eu hei-de escreber ua carta

Ó ai, a Bila Real

Sem pôr a mão no papel

Ó Bila Real, ai ai (bis)

Ai eu hei-de cortar uma rosa

Ai, ai a Bila Real

Sem pôr a mão na roseira

Ai, ai

Ó Bila Real, ai, ai (bis)

Maria Jesus Martins, 83 anos, Póvoa

- 9 -

DW_D0270

Bamos lá cima ó Barroso

Qu’é terra de muito pão

Mais bale morrer à fome

Do que casar com um barrosão.

Maria Jesus Martins, 83 anos, PóvoaDW_D0271

Indorinhas nobas

Porque mal andais?

Bós que tindes asas

Porque não boais?

Maria Jesus Martins, 83 anos, PóvoaDW_D0274

Minha mãe, minha mãezinha

Não se pode ser mulher

Se é bonita agrada a todos

S’ é feia ninguém a quer

Maria Jesus Martins, 83 anos, PóvoaDW_D0286

O meu amor e o teu

Ó Rosa,

Foram ambos à Ribeira

Ò Rosa, ó linda Rosinha

Ó Rosa, ó linda menina

O teu anda à erba doce

- 10 -

Ó Rosa,

E ó meu à erba cidreira.

Ò Rosa, ó linda Rosinha

Ó Rosa, ó linda menina

Maria Jesus Martins, 83 anos, PóvoaDW_D0287

Os sete estrelos ao alto

Menina bá-se deitar

Eu também tenho d’ir

Qu’eu tenho de madrugar.

Maria Jesus Martins, 83 anos, PóvoaDW_D0277

A lua anda ao luar

E a lua anda ao luar

No campo da sua amada

Ai ela chora a coitadinha

Por se ber ali sozinha

Naquela triste morada

Ai ela chora a coitadinha

Por se ber ali sozinha

Naquela triste morada

Maria Jesus Martins, 83 anos, PóvoaDW_D0278

Ai a moda do sapateiro

Quem não habia de inbentar

Foram os presos da cadeia

Quem não habia d’indagar

Sapateiro que bate sola

- 11 -

Ai pum ai pum ai pum

Ai pum catrapum pum pum

Maria Jesus Martins, 83 anos, PóvoaDW_D0285

Fui ao Doiro às Vendimas

Eu não tenho que vendimar

Bendimaram-m’ as costelas

Foi o que eu lá fui ganhar

(bis)

Ora deixa-te estar aqui, aqui, aqui.

Ora deixa-te estar amor ao pé de mim

(bis)

Emília Teixeira Alves Rodrigues, 58 anos, SalvadorDW_C0332

Minha mãe q’ando me ralha

Bate o pé no tabuado.

Minha mãe q’ando me ralha

Bate o pé no tabuado.

Ela julga que m’a prega,

Eu já la tenho pregado.

Ela julga que m’a prega,

Eu já la tenho pregado.

Emília Teixeira Alves Rodrigues, 58 anos, SalvadorDW_C0332

Ó marinheiro que bais p’á marinha

Toma cautela não caias ao mar

(bis)

Olha que a bida do mar é só uma

- 12 -

Olha que eu passo a bida a chorar

(bis)

Emília Teixeira Alves Rodrigues, 58 anos, SalvadorDW_C0333

Os Reis

O Senhor por ser Senhor

Nasceu num triste palheiro

Deixou crabos, deixou rosas

Deixou lindos trabesseiros.

Também deixou’abelhinha

P’ra fabricar o mel

Para fazer um docinho

Ao dibino Manuel (bis)

É nosso manso cordeiro

Está na hóstia consagrada

Como no céu berdadeiro.

E os três reis d’Oriente

Marcharam p’ra Belém

Besitar o Deus Menino

Qu’a Nossa Senhora tem.

Bisitar o Deus Menino

Qu’a Nossa Senhora tem.

Boas Festas nos darão os reis?

Emília Teixeira Alves Rodrigues, 58 anos, SalvadorDW_C0334

Nossa Senhora da Guia

Mandai barrer as areias

Qu’eu já rompi os sapatos

Não quero romper as meias.

- 13 -

Eu já rompi os sapatos

Eu não quero romper as meias.

Nossa Senhora da Guia

Mandai fazer um combento

Nossa Senhora da Guia

Mandai fazer um combento

(incompleta)

Emília Teixeira Alves Rodrigues, 58 anos, SalvadorDW_C0337

Hoje sou pequenino

Botões em’ abrir em flor

Sou pequeno, pequenino

Mas é grande o meu amor

Sou pequeno, pequenino

Mas é grande o meu amor

Joaquina Monteiro (Joaquina “da casinha”), 67 anos, DaivõesDW_C0345

Mariazinha é tecedeira

Mariazinha tem um tear

Mariazinha foi p’ó estrangeiro

Ganhar dinheiro

P’ra se casar

Maria Mendes, SalvadorDW_C0391

Eu bi, eu bi passarinhos a boar

S’eu agora não namoro

Quando hei-de namorar?

Maria Mendes, Salvador

- 14 -

DW_C0392

Oh minha mãe deixe, deixe

Oh minha mãe deixe-m’ir

Ao arraial a Boticas

Qu’eu bou e torno a bir!

Fátima Borges, SalvadorDW_C0393

Gloriosa Santa Marinha,

És a nossa padroeira

Ampara, pois, a tua gente

E por ela roga ó Senhor.

Balei-nos ó padroeira

Dos perigos da tentação

E lebai-nos desta bida

Ao porto da salvação.

E lebai-nos desta bida

Ao porto da salvação.

Ao porto da salvação.

Fátima Borges, Salvador DW_C0394

Ai a moda do sapateiro

Quem n’ habia d’imbentar

Foram n’os presos da cadeia

Quem n’habia d’indagar

Sapateiro que bate sola

Ai pum, ai pum, ai pum,

Sapateiro que bate sola

Ai pum catrapum pum pum

- 15 -

Maria Jesus Martins, 83 anos, PóvoaDW_D0285

Muito lindo é o céu

Todo é cheio d’ alegria

Lá num há noite nem sombra

Tudo é quelaro dia

Lá num há noite nem sombra

Tudo é quelaro dia.

Maria Monteiro, 66 anos, Bacelar

DW_C0338

Coração Berginal de Maria

S’ele nos erguia [Sede luz e guia]

Do pobre mortal

Ao chegar minha última hora (bis)

Binde sem demora (3 vezes)

A lebar-me ó céu.

Maria Monteiro, 65 anos, BacelarDW_C0339

Canto e danço mui contente

Ó chula bamos dançar

No meio da chula noba

Mil abraços te bou dar

Cármen do Céu, 88 anos, BalteiroDW_D0174

Ó amor de tão longe

Põe um dia e bem me ber

As cartas num balem nada

- 16 -

Para mim qu’eu num sei ler.

Cármen do Céu, 88 anos, BalteiroDW_D0175

- 17 -

Composições Líricas

Lúdicas: Adivinhas

Grande foi meu nascimento

E de luto me besti

Para dar luzes ao mundo

Mil tromentos padeci.

R: Azeitona

Margarida da Glória Pacheco e Sousa (D. Guidinha), 79 anos, Salvador

DW_D0183

Lindos palácios, lindas janelas

Abrem-se e fecham e ninguém manda nelas.

R: Os olhos

Margarida da Glória Pacheco e Sousa (D. Guidinha), 79 anos, Salvador

DW_D0184

Empresta-me a tua nicanica

Para eu inicar o meu

Quando o meu estiber inicado

Já podes inicar o teu.

R: O fermento

Margarida da Glória Pacheco e Sousa (D. Guidinha), 79 anos, Salvador

DW_D0185

Cal é coisa qual é ela, qu’inda agora falei nela?

R: A cal

- 18 -

Margarida da Glória Pacheco e Sousa (D. Guidinha), 79 anos, Salvador

DW_D0186

Uma coisinha do tamanho duma aresta faz dançar o rei da festa.

R: A vassoura

Margarida da Glória Pacheco e Sousa (D. Guidinha), 79 anos, Salvador

DW_D0189

Pêlo com pêlo e o pelado está no meio. O que é?

R: O olho

Glória Carreira, 52 anos, Salvador

DW_D0231

Pêlo por dentro, pêlo por fora, alça a perna e mete p’a dentro.

R: A meia

Glória Carreira, 52 anos, Salvador

DW_D0231

Tenho armas, tenho fogo

Delas pouco m’aproveito

De mim saiu uma donzela

Mais bonita do que eu

Ela bai com quem a leba

E eu fico com quem me deu.

O que é?

R: A castanha

- 19 -

Altina Teixeira, 66 anos, Salvador

DW_D0242

O que é que é uma capelinha branca sem porta nem tranca?

R: O ovo.

Altina Teixeira, 66 anos, Salvador

DW_D0243

Uma mãozinha, uma lambedela, uma trecedela, abre o cu que aqui bai ela.

R: É o fio na agulha

Altina Teixeira, 66 anos, SalvadorDW_D0244

O que é uma coisinha que se põe em tudo?

R: O nome.

Margarida da Glória Pacheco e Sousa (D. Guidinha), 79 anos, Salvador

DW_D0187

Cresço rentinho ó chão

Porque o meu pai é baixinho

Por dentro tenho doçura

Por fora sou bermelhinho

R: O morango.

Maria Pereira (“Maria Carpinteira”), 62 anos, Daivões

DW_C0357

Há uma mãe que é tão querida

- 20 -

É tão querida, é um amor.

Tem uns filhos caladinhos

Tem um neto falador.

R: A videira, as uvas e ó binho

Maria Pereira (“Maria Carpinteira”), 62 anos, Daivões

DW_C0359

Uma belha muito belha

Só ranço na garganta

Sete filhas que tinha

Só uma saiu santa

R: A Quaresma.

Maria Pereira (“Maria Carpinteira”), 62 anos, Daivões

DW_C0361

Eu no campo me criei

Entre lindos e verdes laços

Os que mais choram por mim

É o que me partem aos pedaços.

R: A cebola.

Maria Pereira (“Maria Carpinteira”), 62 anos, Daivões

DW_C0363

Estudantes que estudais

No libro da meteorologia

Dizei-me qual é o ‘secto

Que não tem peito mas cria

Que aos bibos dá alento

E aos mortos alumia.

R: Abelha (mel e a cera).

- 21 -

Maria Pereira (“Maria Carpinteira”), 62 anos, Daivões

DW_C0366

Há um pai que tem doze filhos

Cada filho tem trinta netos

Metade brancos e metade pretos.

R: Ano, mês, dia/noite.

Maria Pereira (“Maria Carpinteira”), 62 anos, Daivões

DW_C0371

Um casal de patas quantas patas tem?

R: Tem cinco patas, a pata já tem duas patas!

Maria Pereira (“Maria Carpinteira”), 62 anos, Daivões

DW_C0375

Que é uma coisa que tem rabo de gato

Orelhas de gato, e não é gato?

Patas de gato e não é gato?

R: Se não é gato é gata!

Maria Pereira (“Maria Carpinteira”), 62 anos, Daivões

DW_C0374

Bão três grilos p’la estrada fora.

Vem um carro mata um.

Quantos ficam?

R: Ficou aquele que morreu. Os outros andaram sempre.

Maria Pereira (“Maria Carpinteira”), 62 anos, Daivões

DW_C0376

- 22 -

O que é que faz seis pardais em cima de um telhado?

R: Faz meia dúzia.

Maria Pereira (“Maria Carpinteira”), 62 anos, Daivões

DW_C0390

Alto está, alto mora

Todos o vêm

Ninguém no adora.

R: O sino.

Maria Rosa, 79 anos, Escarei

DW_C0404

São muitas meninas

Numa baranda

Todas a chorar

P’ra mesma banda.

R: As telhas

Maria Rosa, 79 anos, Escarei

DW_C0405

- 23 -

Composições LíricasMágicas e Religiosas: Orações e Responsos

Não me confesso ó cura

Nem também ó curial

Confesso m’a Bós Jesus Sacramentado

Perdoai meus pecados

Bem sabeis quantos são

Dai-me neste mundo a graça

E no outro a salvação

D. Lurdes da Praça, 58 anos, SalvadorDW_D0232

Anjo da guarda

Minha companhia

Guardai a minha alma

De noite e de dia

Maria de Friúme, 65 anos, FriúmeDW_D0233

Santo Anjo do Senhor

Meu zeloso e guardador

Se a Ti me confiou

Piedade Divina

Sempre que me rezo e guardo

Governo e alumina [?]

Maria Idalina Monteiro (D. Bia), 63 anos, SalvadorDW_D0236

A Santa Bárbara

Santa Bárbara se bestiu e se calçou

E o Senhor lhe perguntou

- 24 -

- Bárbara, tu ondes bais?

- Senhor, bou ao céu!

- Tu ao céu não irás, tu na terra ficarás

Para lhe espalhares os trovões

P’r’ó monte rosmaninho

Onde não haja pão nem binho

Nem bafio de menino

Nem areia de sal

Nem coisa que faça mal.

Altina Teixeira, 66 anos, SalvadorDW_D0241

Santa Bárbara

Santa Bárbara s’ergueu, s’alebantou,

Seu caminho andou.

Jesus Cristo encontrou.

- Bárbara, tu donde bais?

- Senhor, eu combosco bou.

- Tu comigo não virás.

Tu na terra ficarás

A espalhar as trovoadas

Lá p’ó monte maninho,

P’ra onde não haja pão nem binho,

Nem bafo de menino pequenino.

P’lo poder de Deus, da Birgem Maria

Um Pai-Nosso e uma Abé-Maria

Maria Pereira (“Maria Carpinteira”), 62 anos, Daivões

DW_C0382

A Santa Bárbara

- 25 -

Jesus se bestiu e se calçou

Na sua cajadinha pegou

Bárbara encontrou e le perguntou

- Onde bais Bárbara?

- Bou p’r’ó céu.

- P’r’ó céu num irás, no mundo ficarás

A librar raios e coriscos

Lá p’r’ó monte maninho

Onde não haja pão nem binho

Nem bafo de menino

Nem de boi e canino.

Joaquina “da Casinha”, 67 anos, Daivões (Lugar de Baixo)

DW_C0352

A Santo António

Santo António se bestiu e se calçou

Suas santas mãos labou

Para o caminho marchou.

Encontrou Nossa Senhora

C’ um raminho d’oiro na mão

Eu pedi-lhe um bocadinho

E ela disse-me que não.

Eu tornei-lo a pedir

E ela deu-me o seu cordão.

Disse que le desse duas boltas

Ao redor do coração.

Binde, minha mãe, binde

Que eu por bós estou esperando.

Meu coração se está rindo

E a minha alma está chorando

- 26 -

Rosalina Reis Alves, 87 anos, SalvadorDW_A0309

Senhora Santa Luzia

Nos dê bista

No corpo e na alma.

Senhora Santa Luzia

Nos guie o caminho do bem,

O caminho da salvação. Amén

Rosalina Reis Alves, 87 anos, SalvadorDW_A0311

Nesta cama me deitei

Para dromir, descansar

Se a morte me bier chamar

E eu não puder falar

Encosto-me aos crabos,

Abraço-me à cruz.

Entrego a minha alma

Ao doce coração de Jesus

E de Maria.

Rosalina Reis Alves, 87 anos, SalvadorDW_A0305

(+DW_A0314)

Senhor, eu me deito

Senhor, eu deitar me quero

Se eu dormir, acordai-me.

Se eu morrer, alumiai-me

Com as três belas da Santíssima Trindade.

Amén.

- 27 -

Rosalina Reis Alves, 87 anos, SalvadorDW_A0312

Jesus e Maria e José

A nossa alminha

P’r’a bós é

Ela é e há-de ser

Quero-bos amar até morrer

Rosalina Reis Alves, 87 anos, SalvadorDW_A0307

Padre-Nosso da palma

Quer na bida quer na alma

Quer no céu quer nas terras

Quer no mar quer n’areia

Detrás daquela pedrinha

Está uma linda pombinha

No bico leba o dote

Nas asas leba a cria

P’ra crismar o filho da Birgem Maria

Nossa Senhora me disse

Quem esta oração disser

Três bezes ao dia

Quatro almas salbaria

À Primeira seja a minha

A segunda de minha mãe

A terceira de meu pai

Quarto de quem me quiser bem

Rosalina Reis Alves, 87 anos, SalvadorDW_A0306

Com Deus me deito

- 28 -

Com Deus m’alebanto

Com a graça de Jasus

E ó Dibino Espírito Santo.

Rosalina Reis Alves, 87 anos, SalvadorDW_A0304

Dibino Salbador

Salbaste o mundo para quê?

Para nos librar das penas

Do fogo do Inferno

Deus nos libre do mau

Até ao maior inimigo que temos

Dai-nos o céu por esmola

Que é o que a gente mais deseja.

[…]Rosalina Reis Alves, 87 anos, Salvador

DW_A0303

Para crescer o pão no forno

Cresça o pão no forno

E a graça de Deus pelo mundo todo.

(Três vezes antes de levar o pão ao forno)

Maria Rosa, 88 anos, SalvadorDW_D0192

Para crescer o pão no forno

O senhor t’acrescente

O senhor primeiramente.

Cármen do Céu, 88 anos, SalvadorDW_D0191

- 29 -

São Vecente t’acrescente

São João te faça pão

Como te ponho a minha mão

P’lo poder de Deus e Virgem Maria

Um Pai-Nosso e um Abé-Maria.

Cármen do Céu, 88 anos, SalvadorDW_D0193

São Miguel t’alebede

São Vicente t’acrescente

P’lo poder de Deus e da Birgem Maria

Um Pai-Nosso e uma Abé-Maria

Maria Pereira (“Maria Carpinteira”), 62 anos, Daivões

DW_C0380

- 30 -

Composições Líricas

Mágicas e religiosas: Ensalmos

Para a zipela

Pegava num raminho d’água numa tigela:

- Botava-le um bocadinho de azeite, uma pedrinha de sal

Água da fonte, erba do monte, óleo d’olibeira

Depois pegava c’um raminho

E dizia-se:

- Zipela sai-te daqui que anda um bicho do monte atrás de ti.

Maria Jesus Martins, 83 anos, PóvoaDW_D0276

Eu te talho sapo, sapão

Faca que cortas o pão

Corta esta peçonha, peçonhão

Eu te talho cobra, cobrão

Aranha, aranhão

Sapo, sapão

Bicho de toda a nação

Em loubor de São Silbrestre

Faça a mãezinha que preste.

Amén.

Rosalina Reis Alves, 87 anos, SalvadorDW_A0297

Talhar o bicho

Faca que cortas carne

Cortas coíbes

- 31 -

Cortas pão

Gipela, gipelão

Bicho de toda a nação

Em loubor à Birgem Maria

Um Pai-Nosso e com um’ Abé-Maria

Joaquina Monteiro (“Joaquina da Casinha”), 67 anos, DaivõesDW_C0347

Sapo sapão

Cobra cobrão

Largato largatão

Do bicho que anda de rastos

P’lo tchão

Em loubor à Birgem Maria

Um Pai-Nosso e uma Abé-Maria

Joaquina Monteiro (“Joaquina da Casinha”), 67 anos, DaivõesDW_C0348

Talhar o pé com uma maçaroca ou com agulha ou novelo durante três dias:

Eu te coso

Carne aberta fio torto

É isso mesmo que eu coso

Eu te coso

Carne aberta fio torto

É isso mesmo que eu coso

(cf. registo áudio para mais detalhes)

Joaquina Monteiro (“Joaquina da Casinha”), 67 anos, DaivõesDW_C0350

Empigem rabija

Sai-te daqui

Que a seda do lar

- 32 -

Anda atrás de ti

Nem comi nem bubi

Nem passei na ponte de Mondim

(Se já passaste, dizes o contrário.)

Joaquina Monteiro (“Joaquina da Casinha”), 67 anos, DaivõesDW_C0351

- 33 -

Composições LíricasMágicas e Religiosas: Cantigas de embalar

Está no berço coberto com o cobertor

Os anjos bão cantando

Loubado seja o Senhor.

Maria Jesus Martins, 83 anos, PóvoaDW_D0267

Dorme, dorme meu menino

Que a mãezinha logo vem

Foi lavar os cueirinhos

Ao chafariz de Belém

Altina Teixeira, 66 anos, SalvadorDW_D0240

A roca parou e largou-se a chorar.

Teus olhos bão já fechar.

Anjo meu faz ó-ó

Qu’ eu belo por ti.

Só aos anjos a lua sorri.

D. Lurdes da Praça, 58 anos, Salvador

DW_D0230

A lua nasceu e cresceu no além

A noite chegou também

Meu bebé vai dormir

Vai dormir e sonhar

Deixa a lua subir lá no ar

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A Ronca passou e largou sem parar

Teus olhos vais já fechar

Meu bebé, ai, faz ó-ó

Vai dormir e sonhar

Deixa a lua subir lá no ar

Ó ó ó ó ó ó ó ó ó ó

Ó ó ó ó ó ó ó ó ó ó

Ó ó ó ó ó ó ó ó ó ó

Ó ó ó ó ó ó ó ó ó ó

Meu bebé vai dormir

Vai dormir e sonhar

Deixa a lua subir lá no ar

Srª Fátima Borges, 75 anos, Salvador

DW_D0227

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Composições LíricasSatíricas

A Filhagoza

Era uma mãe que tinha uma filha muito baidosa e a mãe dizia-le:

- Ó minha filha… goza! Já que tu és baidosa, goza enquanto tens tempo.

A filha lá andaba toda satisfeita. Tanto gozou que até ficou com o nome de Filhagoza.

Rosalina Reis Alves, 87 anos, SalvadorDW_A0302

A mulher p’ra ser birtosa [virtuosa]

Tem de ser alta

Com a anca apertadinha

P’ra aguentar com a flauta

AntónioFerreira, 90 anos, Daivões (Lugar de Baixo)DW_C0343

A mulher p’ra ser birtosa

Debe ter o cu redondinho

O homem olha p’ó traseiro

E lembra-se do passarinho

António Ferreira, 90 anos, Daivões (Lugar de Baixo)DW_C0344

A mulher p’ra ser bela

Tem de ter cu de pau

A barriga de manteiga

E as mamas de bacalhau

A barriga de manteiga

E as mamas de bacalhau

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Joaquina Monteiro (“Joaquina da Casinha”), 67 anos, DaivõesDW_C0349

Chamaste-me pito riço

Por eu nascer no Janeiro

Deixa-me crescer a crista

Eu hei-de ir ao teu poleiro.

Domingos da Silva, 64 anos, DaivõesDW_C0384

Há dias fui passear

Mas bim muito ‘comodado

Encontrei uma miúda

Com o corpo destapado

Tinha um bicho que metia medo

Parecia um gato assanhado.

Domingos da Silva, 64 anos, DaivõesDW_C0385

Quem quiser a salsa berde

Vá ao adro da igreja

Qu’ela está muito fresquinha

Donde o nosso cura meija

Maria Jesus Martins, 83 anos, PóvoaDW_D0279

Habia um belho abarento

Lebou uma pedrada num olho

Pôs-se-le num instante

Tamanho com’um repolho

Certo doutor não das dúzias

Mas sim médico perfeito

Dez moedas le pediu

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P’ra o librar do defeito

Dez moedas? Diz o avaro

Meu sangue não desperdiço

Dez moedas por um olho

O outro dou-o por isso

Maria Pereira (“Maria Carpinteira”), 62 anos, Daivões

DW_C0360

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Composições LíricasOutros: Rimas Várias

Sacheideiras dão ó milho

Sachai o meu milho bem

Não olheis par’ó caminho

Que a Marianda logo bem

Maria Rosa, 88 anos, SalvadorDW_D0178

O loureiro bate bate

Quem bem l’oiço bater

Com a rama no telhado

Para o amor entender

Alzira Teixeira Pimenta, 76 anos, Agunhos

DW_A0291 (=DW_D00210 Rosalina Reis Alves, 87 anos, Salvador)

Eu num canto por cantar

Nem por boa fala ter

Canto p’ra fazer inbeja

A quem num me pode ber.

Joaquina Teixeira Pimenta, 58 anos, AgunchosDW_D0212

Da minha janela à tua

Bai um salto de uma cobra

Quem me dera a mim chamar

Um dia a tua mãe, sogra!

Joaquim Pimenta, 53 anos, Agunhos

- 39 -

DW_D0211

Quatro terras tem o Doiro

Que se pode passear

É o Peso e a Régua

Lamego e Bila Real.

Maria Jesus Martins, 83 anos, PóvoaDW_D0257

Nas Rogas

Senhores ricos do Douro

Com que fazeis a vindima

Com abóbra e cebola

E a lagarta da sardinha

(cf. Registo áudio com mais informações)

Maria Jesus Martins, 83 anos, PóvoaDW_D0265

Eu bou-me bestir de preto

Ou de penas de andorinha

Que as moças já não me querem

Que desgracia a minha!

Domingos da Silva, 67 anos, DaivõesDW_C0386

No Alentejo não há sombra

Senão a que bem do céu

Assenta-te aqui, meu amor,

À sombra do meu chapéu.

Maria Pereira (“Maria Carpinteira”), 62 anos, DaivõesDW_C0387

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Silba verde não me prendas

Olha que me não não seguras

Qu’eu já tenho rebentado

Outras correntes mais duras.

Maria Pereira (“Maria Carpinteira”), 62 anos, Daivões

DW_C0364

Não há estrelas no céu

Só há três lá num cantinho

Onde passa o meu amor

Que não tem outro caminho

Maria Pereira (“Maria Carpinteira”), 62 anos, Daivões

DW_C0365

Assenta-te aqui António

Menino que estás cansado

Nesta cadeirinha noba

Feita da raiz de um crabo.

Maria Pereira (“Maria Carpinteira”), 62 anos, Daivões

DW_C0372

Cantigas são meninices

São falas levas (z)-as o bento

Quem reparar em cantigas

É falta de entendimento!

- 41 -

Maria Pereira (“Maria Carpinteira”), 62 anos, Daivões

DW_C0378

Cantigas que me cantares

Num m’as cantes duas bezes

Qu’a semana tem seis dias

E o ano tem doze meses.

Maria Pereira (“Maria Carpinteira”), 62 anos, Daivões

DW_C0381

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Composições Narrativas

Rimances

(Segundo D. Rosa, o rimance era cantado por cegos nas feiras.)

Aparecem crimes na rua

Que fazem estremecer

Como há corações crus

Que assim os possam fazer.

Todos os leitores debem ler

O crime d’uma perdida

Uma criança de quatro meses

Por sua mãe foi comida.

Na panela a cozinhou

Desfeita aos bocadinhos

Daí por alguns dias

Preguntaram-lhe os bizinhos

- Adonde pára a criança

Que estaba sempre a chorar?

Há dias que se não oube

Tu tens de a apresentar!

Ela toda satisfeita

Com um sorriso no rosto

- Comi-a, soube-me bem

E tinha um lindo gosto!

O juiz le repetiu

Outra bez debagarinho

Tu tibestes a coragem

- 43 -

De comer o teu filhinho?

Ela toda satisfeita

Quando foi interrogada

- Comi-a, soube-me bem

Fiquei toda consolada!

- Cala-te, oh mulher malbada

Oh infama criatura,

Debias de ser queimada

Com gás em plena rua!

Foi então que s’ela mostrou

Um pouco arrependida

Fitou os olhos ao céu:

- Oh meu Deus, tirai-me a vida!

Maria Rosa, 79 anos, EscareiDW_C0399

Foi em Balenças do Minho

Que um crime se apraticou

Foi o malbado de um filho

Que seu querido pai matou

Estando o seu pai já na cama

O filho ao quarto entrou

Disse o filho p’r’ó pai:

- P’ró matar aqui estou!

O pai olhou p’ró filho

Ficou sem respiração

- Não me mates, querido filho

Tem de teu pai compaixão

- 44 -

O filho que aquilo oubiu

Ainda mais se apressou

Foi tamanha a crueldade

Que até os olhos le arrancou

Sete facadas le deu

Oh que dor no coração

Quem assim faz a um pai

Nunca debe ter perdão

Nunca debe ter perdão

Nem debe ser perdoado

Quem assim faz a um pai

Debia ser condanado

Na mão em que tinha a faca

Assanguentada ficou

Por muito que a labasse

Nunca a mancha se le tirou.

Maria Rosa, 79 anos, EscareiDW_C0400

Minha mãe que estaba a dromir

Oubira ao cego tocar e pedir:

S’ele toca e pede

Dá-lhe pão e vinho

Pera o triste cego

Seguir o caminho

Não quero o seu pão

Nem quero o seu vinho

Qu’eu só quero qu’Aninhas

- 45 -

Me ensine o caminho

Carrega a roca e anda

Estica o cabelinho

Ensina o caminho

Ao triste ceguinho

Espinhou-se me a roca

Acabou-se m’ o linho

Adiante segue

Lá bai o caminho

Venha Aninhas, venha

Mais um bocadinho

Sou curto da bista

Não vejo o caminho

Oh valha-me Deus

E à Birgem Maria

Ui o que lá bem

De cavelaria

Escuita ‘ninha, escuita

Qu’há-des escuitar

Qu’ aqueles cabaleiros

Bem p’ra nos lebar

Adeus minhas casas

Adeus minhas terras

Adeus minha mãe

Que tão falsa me eras

Adeus minhas terras

Adeus meus quintais

- 46 -

Adeus minha mãe

Pera nunca mais

Maria Rosa, 79 anos, EscareiDW_C0403

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Composições NarrativasAnedotas e Histórias Jocosas

A outra metade do mundo

-O senhor de donde é?

Diz ele assim:

- Ai o senhor não me conhece, que eu sou de muito longe. O senhor não conhece.

- Conheço, conheço! Conheço metade do mundo!

Diz ele assim:

- Ah! Mas eu sou da outra metade que o senhor não conhece!

Maria Pereira (“Maria Carpinteira”), 62 anos, Daivões

DW_C0367

A porca

Uma bez um senhor foi ao médico, e depois o médico disse-le assim:

- Olhe, bocê está muito doente, não pode comer carne de porco!

- Ai não?...

Foi p’ra casa, disse à mulher e a mulher disse-le assim:

- Olha, matamos essa porca que aí está…

Prontos… Lá comeu a porca e foi outra bez ao médico e o médico disse-le assim:

- Ah! Bocê agora está muito melhor.

E ele:

- Pois estou que a minha mulher matou uma porca. Porca já não é porco!

Maria Pereira (“Maria Carpinteira”), 62 anos, Daivões

DW_C0373

A manta

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Era um pai que tinha três filhos, e era muito pobrezinho. Só tinha uma

mantinha p’ra dibidir por eles os três. E o que fizeram? Um disse aos outros:

- Comprai a minha parte e deixais-me dormir no meio.

E eles concordaram.

E ó depois foram p’r’á cama e a manta não chega p’ra todos eles os três. Um puxaba

p’r’ó outro, outro puxaba p’r’ó outro, o do meio disse-les assim:

- Coitadinho de quem bende que não puxa nem estende. (Ainda a fazer pouco dele que

era quem estaba melhor!)

Maria Pereira (“Maria Carpinteira”), 62 anos, Daivões

DW_C0377

O belho

Era um belhote que andaba a pedir, e estaba ali algumas semanas connosco no

tempo das esfolhadas e depois o meu tio era assim:

- Ó senhor Balé, conte lá dos Seixinhos!

- Ó senhor Francisquinho, se le contasse sabia tanto como eu!

Maria de Jesus Martins, 83 anos, Póvoa

DW_D0258

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Composições NarrativasContos populares

O meu irmão binha da escola, ‘tábamos em Santo Aleixo. A minha mãe taba lá a

dar aulas e nós ‘tábamos em Santo Aleixo. Ele era pequenino e passaba no cemitério ao

lado da igreja.

Ele passou lá e era tamanho reboliço atrás dele, parecia que o lebabam p’lo ar. E

ele:

- Oh minha mãe, oh minha mãe, oh minha mãe!

Era uma nubem de bento que o queria lebar. Era o Diabo!

E ele depois fugiu, a minha mãe foi atrás dele, apanhou-o e trouxe-o p’ra casa.

Sucedeu com o meu irmão!

Margarida da Glória Pacheco e Sousa (D. Guidinha), 79 anos, Salvador

DW_D0190

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Tradições

Serrada da belha

A serragem da belha era o carro-de-bois, pagabam nele aqui ao fundo de Santo

Aleixo e lebabam p’ó cimo Sete. E depois a puxar…aquilo binha de rastos, mas berraba.

Fazia um berradeiro do caraças, aquilo. Atarrachaba-se a fundo e depois a puxar aquilo

binha de rastos, mas berraba, fazia um berradeiro do caraças, aquilo. E a gente roubaba

uma facha da merouca de palha p’r’ó gado e chegaba-le fogo, binha a palha a arder… e

a berrar “Ai a minha belhinha”. Era engraçado naquela altura!

Augusto Dias, 65 anos, Salvador

DW_D0246

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