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O Deputado Walter Feldman – PSB /SP, pronuncia o seguinte discurso: Senhor Presidente, Sras. e Srs. Deputados apresento formalmente a esta Casa o texto que seria apresentado como RELATÓRIO FINAL DA COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO destinada a investigar a exploração do trabalho escravo ou análogo ao de escravo, em atividades rurais e urbanas, de todo território nacional – CPITRAES: PROPOSTA DE RELATÓRIO FINAL (Criada mediante o Requerimento nº 5, de 2011, de autoria do Deputado Cláudio Puty com o objetivo de investigar a exploração do trabalho escravo ou análogo ao de escravo, em atividades rurais e urbanas, de todo o território nacional.) "Sou escravo do dever por amor à liberdade," (Cícero) A presente proposta de Relatório não chegou a ser apreciada na Comissão, que se encerrou dado o decurso de seu prazo regimental, sem renovação, não se tendo chegado a consenso sobre o conteúdo do Relatório. Não obstante, cremos ser de valor inestimável a compilação dos resultados obtidos, que estão à disposição de todo cidadão brasileiro nos autos da CPI. Oferecemos, pois, no exercício de nossa função Parlamentar e como cidadãos, este texto, a fim de que os brasileiros possam conhecer o que estudamos do fenômeno, e

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Page 1: COMISSÃO · Web viewTambém segundo o art. 203 está sujeito a pena de detenção de 1 ano a 2s anos, e multa, além da pena correspondente à violência quem frustrar, mediante

O Deputado Walter Feldman – PSB /SP, pronuncia o seguinte discurso:

Senhor Presidente, Sras. e Srs. Deputados apresento formalmente a esta Casa o texto que seria apresentado como RELATÓRIO FINAL DA COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO destinada a investigar a exploração do trabalho escravo ou análogo ao de escravo, em atividades rurais e urbanas, de todo território nacional – CPITRAES:

PROPOSTA DE RELATÓRIO FINAL

(Criada mediante o Requerimento nº 5, de 2011, de autoria do Deputado Cláudio Puty com o objetivo de investigar a exploração do trabalho escravo ou análogo ao de escravo, em atividades rurais e urbanas, de todo o território nacional.)

"Sou escravo do dever por amor à liberdade,"(Cícero)

A presente proposta de Relatório não chegou a ser apreciada na Comissão, que se encerrou dado o decurso de seu prazo regimental, sem renovação, não se tendo chegado a consenso sobre o conteúdo do Relatório. Não obstante, cremos ser de valor inestimável a compilação dos resultados obtidos, que estão à disposição de todo cidadão brasileiro nos autos da CPI.

Oferecemos, pois, no exercício de nossa função Parlamentar e como cidadãos, este texto, a fim de que os brasileiros possam conhecer o que estudamos do fenômeno, e ofertamos, a final, por nossa iniciativa pessoal, as proposições e recomendações que a CPI deveria ter encaminhado como colegiado.

Não obstante questões políticas muitas vezes transcendam as exigências da realidade social, não podemos deixar de lado nosso dever parlamentar de accountability, ou seja, de prestar contas de nossa responsabilidade política, que toda e qualquer CPI impõe àqueles que dela participam.

Deputado WALTER FELDMAN Deputado CLAUDIO PUTY

Relator da CPI Presidente da CPI

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SUMÁRIO

RELATÓRIO FINAL DA COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO..Erro! Indicador não definido.Requerimento de criação e ato de constituição.........................................................................5

Composição da CPI...................................................................................................................6

Reuniões realizadas..................................................................................................................7

Depoimentos em Brasília...........................................................................................................9

TRABALHO ESCRAVO: CARACTERIZAÇÃO DO TEMA.........................................................1

Aspectos históricos............................................................................................................1

Proteção jurídica........................................................................................................................3

Legislação..........................................................................................................................3

Trabalhista..........................................................................................................................3

Instrução Normativa nº 911 de 5 de outubro de 2011, do Ministério do Trabalho e Emprego...........................................................................................................................................5

Penal..................................................................................................................................9

Normas internacionais......................................................................................................10

Jurisprudência..................................................................................................................19

Planos e programas.................................................................................................................19

Nacionais..........................................................................................................................19

Grupos Especiais de Fiscalização...................................................................................23

Compete aos GEFM:........................................................................................................23

Internacionais...................................................................................................................35

Análise dos Dados...................................................................................................................35

RESUMO DOS DEPOIMENTOS.............................................................................................45

Audiência pública realizada no dia 18 de abril de 2012...................................................45

José de Souza Martins.....................................................................................................45

Walter Darelli....................................................................................................................50

José Armando Fraga Diniz Guerra -................................................................................54

Vera Lúcia Ribeiro de Albuquerque.................................................................................56

Alexandre Rodrigo Teixeira da Cunha Lyra.....................................................................59

Audiência pública realizada no dia 25 de abril de 2012...................................................62

Caio Luiz Carneiro Magri..................................................................................................62

Roberto de Figueiredo Caldas.........................................................................................66

Luís Antônio Camargo de Melo........................................................................................69

OFICINA DE FORMAÇÃO PARA JORNALISTAS..................................................................72

Audiência Pública realizada no dia 5 de maio de 2012....................................................72

Frei Dominicano Xavier Jean Marie Plassat coordenador da campanha de combate ao trabalho escravo da comissão pastoral da terra...............................................................72

Renato Bignami - Auditor Fiscal do Trabalho e Secretário de Inspeção do Trabalho, especialista em trabalho escravo do Ministério do Trabalho e Emprego.........................77

Audiência Pública realizada no dia 8 de maio de 2012 no Auditório Nereu Ramos................85

Mauro Mamede................................................................................................................85

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Paulo Vanucchi................................................................................................................86

Maria do Rosário..............................................................................................................86

Audiência pública realizada no dia 16 maio 2012....................................................................87

Renato Santana...............................................................................................................87

André Luis Grandizoli.......................................................................................................87

Sebastião Caixeta............................................................................................................88

Audiência pública realizada em 23 de maio de 2012...............................................................88

Pedro Armengol...............................................................................................................88

Rosângela Silva Rassy....................................................................................................89

Antônio José Ferreira Filho..............................................................................................92

Laís Wendel Abramo........................................................................................................95

Andrea Duca..................................................................................................................101

Eduardo Cidade da Silva................................................................................................103

Elio França.....................................................................................................................105

Roberto Sampaio...........................................................................................................108

João Pedro Fernandes de Castro Braga........................................................................110

A audiência realizada no dia 11 de julho de 2012.................................................................113

Luis Alexandre Faria......................................................................................................113

Juliana Armede..............................................................................................................114

Luis Carlos Michele Fabre..............................................................................................114

Oriana Isabel Jara Maculet............................................................................................114

Roque Renato Pattussi..................................................................................................115

Audiência da CPI de 08/08/2012...........................................................................................115

Sr. EDUARDO CORRÊA RIEDEL.................................................................................115

Audiência da CPI de 21/11/2012...........................................................................................117

Sr. NEY FERNANDO PERRACINI DE AZEVEDO..............Erro! Indicador não definido.Sr. MURILO CELSO DE CAMPOS PINHEIRO...................Erro! Indicador não definido.

Audiência da CPI em 27 de novembro de 2012....................................................................118

Sr. Carlos Eduardo Polo Sartor......................................................................................118

Sr. ANTÔNIO VALDECIR SPACIARI.............................................................................118

Sr. Henrique Córdova Produtor de Maçã no Município de São Joaquim no Estado de Santa Catarina..........................................................................................................................119

RELATÓRIO DAS DILIGÊNCIAS..........................................................................................120

CPI destinada a investigar o Trabalho Escravo - Diligência de SP junho de 2012................120

CPI destinada a investigar o Trabalho Escravo - Diligência de Marabá - Pará Período 21 a 23 de agosto de 2012......................................................................................................................138

CPI destinada a investigar o Trabalho Escravo - Diligência à Bolívia - março de 2013......................113

CONCLUSÃO........................................................................................................................147

PROVIDÊNCIAS....................................................................................................................155

RECOMENDAÇÕES .....................................................................................................155

PROPOSTAS LEGISLATIVAS.......................................................................................156

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REQUERIMENTO DE CRIAÇÃO E ATO DE CONSTITUIÇÃO

Esta Comissão foi criada em decorrência do Requerimento nº 5, de 2011, de autoria do Deputado Cláudio Puty (PT/PA), que, em 7 de abril de 2011, solicitou a sua criação, nos termos do art. 58, §3° da Constituição Federal e dos arts. 35, 36 e 37 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados, alegando que a exploração do trabalho escravo ou análogo a de escravo, em atividades rurais e urbanas, por todo o território nacional, representa uma grave afronta à ordem constitucional, legal e ao desenvolvimento econômico e social do país, tendo sido constatadas algumas ocorrências pelo Grupo Especial de Fiscalização Móvel da Secretaria de Inspeção do Trabalho - SIT do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), resultando no Cadastro de Empregadores flagrados explorando mão de obra escrava no país, cuja atualização foi divulgada no último dia 3 de janeiro de 2011 pelo próprio MTE.

O Requerimento foi deferido no dia 9 de fevereiro de 2012, e publicado no Diário da Câmara dos Deputados no dia 10 de fevereiro de 2012. Em 28 de março de 2012, a Comissão foi constituída por ato da Presidência.

Inicialmente o prazo de funcionamento da Comissão ficou estabelecido de 29 de março de 2012 a 3 de agosto de 2012. Porém, em 3 de julho de 2012, foi aprovada pelo Plenário da Câmara dos Deputados, a primeira prorrogação de funcionamento de 10 de agosto de 2012 a 8 de outubro de 2012.

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COMPOSIÇÃO DA CPI

Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a investigar a exploração do trabalho escravo ou análogo ao de escravo, em atividades rurais e

urbanas, de todo o território nacional. - CPITRAES

Presidente: Cláudio Puty (PT/PA) 1º Vice-Presidente: Júnior Coimbra (PMDB/TO) 2º Vice-Presidente: Homero Pereira (PSD/MT)

3º Vice-Presidente: Bernardo Santana de Vasconcellos (PR/MG) Relator: Walter Feldman (PSB/SP)

TITULARES SUPLENTESPT

Amauri Teixeira PT/BA (Gab. 237-IV) Domingos Dutra PT/MA (Gab. 806-IV)

Cláudio Puty PT/PA (Gab. 480-III) Marcon PT/RS (Gab. 569-III)

Valmir Assunção PT/BA (Gab. 739-IV) Miriquinho Batista PT/PA (Gab. 435-IV)

Vicentinho PT/SP (Gab. 740-IV) 1 vagaPMDB

Darcísio Perondi PMDB/RS (Gab. 518-IV) Alceu Moreira PMDB/RS (Gab. 445-IV)

Júnior Coimbra PMDB/TO (Gab. 274-III) André Zacharow PMDB/PR (Gab. 238-IV)

Sandro Mabel PMDB/GO (Gab. 443-IV) Asdrubal Bentes PMDB/PA (Gab. 410-IV)

Valdir Colatto PMDB/SC (Gab. 708-IV) Marçal Filho PMDB/MS (Gab. 448-IV)

PSDBReinaldo Azambuja PSDB/MS (Gab. 572-III) Domingos Sávio PSDB/MG (Gab. 271-III)

Walter Feldman PSB/SP (Gab. 242-IV) Duarte Nogueira PSDB/SP (Gab. 525-IV)

William Dib PSDB/SP (Gab. 304-IV) Nilson Leitão PSDB/MT (Gab. 825-IV)

PPCarlos Magno PP/RO (Gab. 213-IV) Lázaro Botelho (*) PP/TO (Gab. 478-III) *

Luis Carlos Heinze PP/RS (Gab. 526-IV) Roberto Balestra PP/GO (Gab. 219-IV)

DEMJairo Ataíde DEM/MG (Gab. 809-IV) Mandetta DEM/MS (Gab. 577-III)

Lira Maia DEM/PA (Gab. 516-IV) 1 vaga

PRBernardo Santana de Vasconcellos PR/MG (Gab. 854-IV) Aelton Freitas PR/MG (Gab. 204-IV)

Lúcio Vale PR/PA (Gab. 822-IV) Laercio Oliveira PR/SE (Gab. 629-IV)

PSBGonzaga Patriota PSB/PE (Gab. 430-IV) Valtenir Pereira PSB/MT (Gab. 913-IV)

Isaias Silvestre PSB/MG (Gab. 475-III) 1 vagaPDT

Giovanni Queiroz PDT/PA (Gab. 618-IV) Oziel Oliveira PDT/BA (Gab. 635-IV)

Bloco PV, PPS

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1 vaga 1 vagaPTB

Nelson Marquezelli PTB/SP (Gab. 920-IV) Josué Bengtson PTB/PA (Gab. 505-IV)

PSCZequinha Marinho PSC/PA (Gab. 823-IV) (Deputado do PSOL ocupa a vaga)

PCdoBAssis Melo PCdoB/RS (Gab. 605-IV) 1 vaga

PRB1 vaga 1 vaga

PTdoB1 vaga 1 vaga

PSDHomero Pereira PSD/MT (Gab. 960-IV) Junji Abe PSD/SP (Gab. 340-IV)

Marcos Montes PSD/MG (Gab. 334-IV) Moreira Mendes PSD/RO (Gab. 943-IV)

PSOL

Ivan Valente PSOL/SP (Gab. 716-IV) - vaga do PSC

REUNIÕES REALIZADAS

Nº DATA OBJETIVO1 28/03/12 Reunião ordinária de instalação e eleição

2 11/04/12Reunião ordinária deliberativa com a seguinte pautaa) apresentação do roteiro dos trabalhosb) deliberação de requerimento

3 18/04/12Reunião ordinária com a seguinte pauta:a) audiência públicab) deliberação de requerimentos

4 25/04/12 Reunião ordinária de audiência pública:

5 07/05/12 Reunião extraordinária de oficina de formação para jornalistas

6 08/05/12 Reunião ordinária audiência pública7 16/05/12 Reunião ordinária de audiência pública8 23/05/23 Reunião ordinária de audiência pública9 04/06/12 Reunião extraordinária de audiência pública10 13/06/12 Reunião ordinária deliberativa11 20/06/12 Reunião ordinária de audiência pública12 27/06/12 Reunião deliberativa: a) tomada de depoimentos

13 11/07/12Reunião deliberativa: a) tomada de depoimentos:b) deliberação de requerimentos

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DEPOIMENTOS EM BRASÍLIA

N° DATA NOME REPRESENTAÇÃO

1 18/4/2012 José de Souza Martins

Sociólogo e professor emérito da Universidade de São Paulo

2 18/4/2012 Walter Barelli Ex-ministro do Trabalho e Emprego e professor do Instituto de Economia da Unicamp

3 18/4/2012José Armando

Fraga Diniz Guerra

Coordenador Geral da Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho escravo

4 18/4/2012Vera Lúcia Ribeiro de

AlbuquerqueSecretária Nacional de Inspeção do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego

5 18/4/2012Alexandre

Rodrigo Teixeira da Cunha Lyra

Chefe da divisão de fiscalização para erradicação do trabalho escravo do ministério do trabalho e emprego

6 25/4/2012 Luís Antônio Camargo

Procurador-Geral do Ministério Público do Trabalho

7 25/4/2012 Caio Luiz Carneiro Magri

Gerente executivo de políticas públicas do Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social

8 25/4/2012Roberto de Figueiredo

Caldas

Coordenador da coordenação de combate ao trabalho escravo do conselho federal da ordem dos advogados do Brasil; membro da comissão de ética pública da presidência da república; e, candidato do Brasil à Corte Interamericana de Direitos Humanos na Costa Rica

9 7/5/2012 Leonardo Sakamoto Presidente da ONG Repórter Brasil

10 7/5/2012Frei dominicano

Xavier Jean Plassat

Coordenador da campanha de combate do trabalho escravo da comissão pastoral da terra

11 7/5/2012 Renato BignamiAuditor Fiscal do Trabalho, Secretário de Inspeção do Trabalho e especialista em trabalho escravo urbano do Ministério do Trabalho e Emprego

12 7/5/2012 Jonas Ratier Moreno

Coordenador da Coordenadoria Nacional de Combate ao trabalho escravo do Ministério Público do Trabalho

13 8/5/2012 Nilmário de Miranda

Presidente da Fundação Perseu Abramo, conselheiro da comissão de anistia do Ministério da Justiça e ex-ministro de estado chefe da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República

14 8/5/2012 Mário Mamede Filho

Superintendente do Instituto de Previdência do Município de Fortaleza, e ex-ministro de estado chefe da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República

15 08/05/12 Paulo de Tarso Vannuchi

Diretor do Instituto Lula e ex-ministro de estado chefe da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República

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16 08/05/12 Maria do Rosario Nunes

Ministra de Estado Chefe da Secretaria de Direitos Humanos

17 16/05/12 Renato Henry Sant’anna

Presidente da associação nacional dos magistrados da justiça do trabalho

18 16/05/12 Sebastião Vieira Caixeta

Presidente da Associação Nacional Procuradores do Trabalho

19 16/05/12 André Luís Grandizoli

Secretário-adjunto da Secretaria Relações de Trabalho do Trabalho e Emprego.

20 23/05/12 Laís Wendel Abramo

Diretora do escritório brasileiro da Organização Internacional do Trabalho

21 23/05/12 Pedro Armengol Diretor da Executiva Nacional da Central Única dos Trabalhadores -CUT

22 23/05/12 Rosângela Silva Rassy

Presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho

23 23/05/12Antônio José Ferreira Lima

FilhoCoordenador do Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos de Açailândia/MA

24 27/06/12 Andréa Duca Diretora de marketing da Gregory

25 27/06/12 Eduardo cidade da silva Diretor jurídico das Lojas Pernambucanas

26 27/06/12 Elio França Diretor de marketing da C&A

27 27/06/12 Roberto Sampaio Diretor comercial das Lojas Marisa

28 27/06/12João Pedro

Fernandes de Castro Braga

Administrador da Sociedade Zara

29 11/07/12 Juliana Armede Membro Titular da Comissão Estadual de Combate ao Trabalho Escravo - COETRAE/SP.

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30 11/07/12 Luís Alexandre Faria

Coordenador do Grupo de Combate ao Trabalho Escravo Urbano da SRTE/SP

31 11/07/12 Luiz Carlos Michele Fabre

Procurador do Trabalho da Procuradoria Regional do Trabalho de OSASCO-SP

32 11/07/12 Oriana Isabel Jara Maculet Presidente da ONG - Presença da América Latina

33 11/07/12 Padre Roque Renato Pattussi

Coordenador do Centro de Apoio ao Migrante (Cami)

TRABALHO ESCRAVO: CARACTERIZAÇÃO DO TEMA

“A educação faz com que as pessoas sejam fáceis de guiar, mas

difíceis de arrastar; fáceis de governar, mas impossíveis de escravizar”

Henry Peter

Aspectos históricos

Embora o trabalho escravo tenha sido formalmente extinto em 13 de maio de 1888, com a edição da Lei Áurea, ainda hoje, em pleno Século XXI, persiste a existência dessa forma de exploração da mão de obra.

A escravidão da mão de obra dos tempos atuais teve início com a expansão agrícola do começo da década de 1950 e acentuada na década de 1960, por meio dos incentivos creditícios do Governo às grandes empresas que exploravam a agropecuária.

Quando surgiram as primeiras denúncias dessa prática no Brasil1 pouco se deu atenção a elas na medida em que as precárias condições de trabalho eram consideradas normais para a época. Além disso, tinha-se como exageros e ficção os relatos feitos pelos trabalhadores e pelas poucas entidades que lutavam pelos direitos humanos dos trabalhadores rurais àquela época. Também entendiam as autoridades que se tratava de casos isolados e não de uma prática disseminada como estava realmente acontecendo desde então.

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Depois de anos dessa prática desumana, em 1971, D. Pedro Casaldáliga, Bispo da Prelazia de São Félix do Araguaia, no Estado do Mato Grosso, na Carta Pastoral - "Uma Igreja da Amazônia em Conflito com o Latifúndio e a Marginalização Social" expôs publicamente o problema Relatou, com coragem e precisão, a escassez da mão de obra enfrentada pelos grandes empreendimentos agropecuários financiados com recursos da Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia - SUDAM. Além do reduzido número da população, os trabalhadores locais se recusavam a trabalhar nessas empresas porque conheciam o tratamento desumano dispensado aos empregados. Assim, os empresários eram obrigados a recrutar mão de obra de outras localidades, como de Goiás, inclusive Goiânia, e o Nordeste. Para tanto prometiam bons salários, excelentes condições de trabalho, assistência médica e transporte gratuitos. Os trabalhadores assim recrutados (porem empreiteiros, muitos deles pistoleiros e jagunços) eram transportados de avião, barco ou pau de marara. Na chegada, recebiam a comunicaçãode que teriam que arcar com os gastos da viagem e que teriam que pagar pelos suprimentos (alimentos e ferramentas) nos armazéns das fazendas que praticavam preços exorbitantes. A moradia era construída pelos próprios trabalhadores e as condições de trabalho precárias, como o caso daqueles que trabalhavam em locais com água pela cintura onde contraiam malária, sendo atendidos às suas expensas, quando a doença já estava avançada levando ao óbito. Muitos trabalhadores nessas condições tinham 13, 14, 15, 17 anos de idade. Não havia contratação formal, pois tudo era "simples combinação oral com o empreiteiro. Muitas vezes o esquema era não pagar, ou pagar com vales, ou só no fim de todo o trabalho realizado, para poder reter os peões. Bem poucos recebem qualquer dinheiro". Esses homens após meses trabalhando em lugares ermos e em condições desumanas chegavam à cidade e gastavam tudo o que recebiam em bebedeiras e prostituição, além de serem "roubados" por comerciantes inescrupulosos.

O documento ainda afirmava que quando a denúncia chegava a mobilizar a opinião pública, os empreendedores alegavam que desconheciam que se passava nas fazendas, responsabilizando os gerentes e empreiteiros. Esse comportamento se repete até hoje quando é detectado o uso de mão de obra escrava em algum ponto da cadeia produtiva, a exemplo das grandes marcas de vestuário varejista que se eximem da responsabilidade por seus fornecedores utilizarem do trabalho degradante dos trabalhadores bolivianos.

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Essa Carta representou um marco na luta pela erradicação do trabalho escravo no Brasil. Entretanto somente a partir de 1985, a Coordenadoria de Conflitos Agrários do Ministério da Reforma e Desenvolvimento Agrário (MIRAD) apresentou relatórios defendendo a desapropriação de imóveis rurais onde houvesse trabalho escravo, enviando também denúncias ao Anti-Slavery Intemational.

Com a Constituição Federal de 1988 foi introduzido o conceito de "função social da propriedade" em seu artigo 5°, inciso XXIII e artigos 170 e 186, o qual exige necessariamente dos proprietários "a observância das disposições que regulam as relações de trabalho" e a utilização de um modelo de "exploração que lhe favoreça o seu bem-estar, bem como dos trabalhadores"

Em 1991, foi instituída uma Comissão Especial de Inquérito no âmbito do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH), do Ministério da Justiça, com o objetivo de apurar os casos de violência no campo e as denúncias de trabalho escravo.

Em seguida, precisamente em 1992, foi instituído o Fórum Nacional Permanente contra a Violência no Campo, que elegeu o tema do trabalho escravo como prioridade nas discussões sobre aspectos jurídicos processuais e de competência para julgamento dos crimes relacionados ao tema. Nessa oportunidade iniciou-se a discussão da proposta da emenda constitucional que trata da expropriação de terras pelo uso da mão de obra escrava, hoje tramitando como PEC nº 438/2001, já aprovada e enviada ao Senado Federal, casa de origem, por ter seu texto modificado pela Câmara dos Deputados.

PROTEÇÃO JURÍDICA

Legislação

Trabalhista

Lei nº 10.608. de 20 de dezembro de 2002

Essa lei alterou a Lei nº 7.998, de 11 de janeiro de 1990, para assegurar o pagamento do benefício do seguro-desemprego ao trabalhador resgatado da condição análoga à de escravo. Para tanto, determina a lei alterada que:

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O Programa de Seguro-Desemprego também tem por finalidade prover assistência financeira temporária ao trabalhador comprovadamente resgatado de regime de trabalho forçado ou da condição análoga à de escravo (art. 2°, I); O trabalhador que vier a ser identificado como submetido a regime de trabalho forçado ou reduzido a condição análoga à de escravo, em decorrência de ação de fiscalização do MTE, será dessa situação resgatado e terá direito à percepção de três parcelas de seguro-desemprego no valor de um salário-mínimo cada (art. 2°-C);

• O trabalhador resgatado será encaminhado, pelo MTE, para qualificação profissional e recolocação no mercado de trabalho, por meio do Sistema Nacional de Emprego (SINE), na forma estabelecida pelo Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat) (art. 2°-C, § 1°);

• Caberá ao Codefat por proposta do Ministro de Estado do Trabalho e Emprego, estabelecer os procedimentos necessários ao recebimento do benefício, observados os respectivos limites de comprometimento dos recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), ficando vedado ao mesmo trabalhador o recebimento do benefício, em circunstâncias similares, nos doze meses seguintes à percepção da última parcela (art. 2°-C, § 2°).

Portaria Interministerial nº 2, de 12 de maio de 2011, do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República (SEDH) Essa portaria revoga a Portaria MTE nº 540, de 19 de outubro de 2004, que criou o Cadastro de Empregadores que tenham

submetido trabalhadores a condições análogas à de escravo.

Eis o que dispõe a Portaria:

1) A inclusão do nome do infrator no Cadastro ocorrerá após decisão administrativa final relativa ao auto de infração, lavrado em decorrência de ação fiscal, em que tenha havido a identificação de trabalhadores submetidos a condições análogas à de escravo;

2) O MTE atualizará, semestralmente, o Cadastro e dele dará conhecimento aos seguintes órgãos: Ministério do Meio Ambiente; Ministério do Desenvolvimento Agrário; Ministério da Integração Nacional;

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Ministério da Fazenda; Ministério Público do Trabalho; Ministério Público Federal; Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República; Banco Central do Brasil; Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES); Banco do Brasil S/A; Caixa Econômica Federal; Banco da Amazônia S/A; e Banco do Nordeste do Brasil S/A;

3) Os referidos órgãos poderão solicitar informações complementares ou copias de documentos relacionados à ação fiscal que deu origem à inclusão do infrator no Cadastro;

4) À Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República competirá acompanhar, por intermédio da Comissão Nacional Para a Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae), os procedimentos para inclusão e exclusão de nomes do cadastro de empregadores, bem como fornecer informações à Advocacia-Geral da União nas ações referentes ao cadastro;

5) A Fiscalização do Trabalho realizará monitoramento pelo período de 2 anos da data da inclusão do nome do infrator no Cadastro, a fim de verificar a regularidade das condições de trabalho. Uma vez expirado esse tempo, e não ocorrendo reincidência, a Fiscalização do Trabalho procederá à exclusão do nome do infrator do Cadastro;

6) A exclusão ficará condicionada ao pagamento das multas resultantes da ação fiscal, bem como da comprovação da quitação de eventuais débitos trabalhistas e previdenciários.

Instrução Normativa nº 911 de 5 de outubro de 2011, do Ministério do Trabalho e Emprego

A instrução normativa dispõe sobre procedimentos que deverão ser adotados em relação à fiscalização para a erradicação do trabalho em condição análoga à de escravo, nos seguintes termos:

O trabalho realizado em condição análoga à de escravo, sob todas as formas, constitui atentado aos direitos humanos fundamentais e fere a dignidade humana, sendo dever do Auditor-Fiscal do Trabalho colaborar para a sua erradicação (art. 1°);

Considera-se trabalho realizado em condição análoga à de escravo o que resulte das seguintes situações, quer em conjunto, quer isoladamente: a submissão de trabalhador a trabalhos forçados; a submissão

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de trabalhador a jornada exaustiva; a sujeição de trabalhador a condições degradantes de trabalho; a restrição da locomoção do trabalhador, seja em razão de dívida contraída, seja por meio do cerceamento do uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, ou por qualquer outro meio com o fim de retê-lo no local de trabalho; a vigilância ostensiva no local de trabalho por parte do empregador ou seu preposto, com o fim de retê-lo no local de trabalho; a posse de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, por parte do empregador ou seu preposto, com o fim de retê-lo no local de trabalho (art. 3°);

• Consideram-se: "trabalhos forçados" - todas as formas de trabalho ou de serviço exigidas de uma pessoa sob a ameaça de sanção e para o qual não se tenha oferecido espontaneamente, assim como aquele exigido como medida de coerção, de educação política, de punição por ter ou expressar opiniões políticas ou pontos de vista ideologicamente opostos ao sistema político, social e econômico vigente, como método de mobilização e de utilização da mão de obra para fins de desenvolvimento econômico, como meio para disciplinar a mão de obra, como punição por participação em greves ou como medida de discriminação racial, social, nacional ou religiosa.

"Jornada exaustiva" - toda jornada de trabalho de natureza física ou mental que, por sua extensão ou intensidade, cause esgotamento das capacidades corpóreas e produtivas da pessoa do trabalhador, ainda que transitória e temporalmente, acarretando, em consequência, riscos a sua segurança e/ou a sua saúde. "Condições degradantes de trabalho" - todas as formas de desrespeito à dignidade humana pelo descumprimento aos direitos fundamentais da pessoa do trabalhador, notadamente em matéria de segurança e saúde e que, em virtude do trabalho, venha a ser tratada pelo empregador, por preposto ou mesmo por terceiros, como coisa e não como pessoa. "Restrição da locomoção do trabalhador" - todo tipo de limitação imposta ao trabalhador a seu direito fundamental de ir e vir ou de dispor de sua força de trabalho, inclusive o de encerrar a prestação do trabalho, em razão de dívida, por meios diretos ou indiretos, por meio de e coerção física ou moral, fraude ou outro meio ilícito de submissão. "Cerceamento do uso de qualquer meio de transporte com o objetivo de reter o trabalhador" - toda forma de limitação do uso de transporte, particular ou público, utilizado pelo trabalhador para se locomover do trabalho para outros

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locais situados fora dos domínios patronais, incluindo sua residência, e vice-versa.

"Vigilância ostensiva no local de trabalho" – todo tipo ou medida de controle empresarial exercida sobre a pessoa do trabalhador, com o objetivo de retê-lo no local de trabalho. "Posse de documentos ou objetos pessoais do trabalhador" - toda forma de apoderamento ilícito de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, com o objetivo de retê-lo no local de trabalho (§ 1° do art. 3°);

• A constatação administrativa de trabalho em condição análoga à de escravo realizada pelo Auditor-Fiscal do Trabalho, bem como os atos administrativos dela decorrentes, independem do reconhecimento no âmbito criminal (art. 4°) Considera-se tráfico de pessoas para fins de exploração de trabalho em condição análoga à de escravo, conforme definido no Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em especial Mulheres e Crianças, promulgado por meio do Decreto nº 5.017, de 12 de Março de 2004, "o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração que incluirá, no mínimo, a exploração do trabalho ou serviços forçados, escravatura ou práticas similares à escravatura ou a servidão". Os casos de tráfico de trabalhadores estrangeiros em situação migratória irregular para fins de exploração de trabalho em condição análoga à de escravo que venham a ser identificados pelos Auditores-Fiscais do Trabalho deverão ser encaminhados para concessão do visto permanente ou permanência no Brasil, de acordo com o que determina a Resolução Normativa nº 93, de 21 de dezembro de 2010, do Conselho Nacional de Imigração (CNlG), além de todos os demais procedimentos previstos nos arts. 13 e 14, desta Instrução Normativa. O referido encaminhamento referido será efetuado mediante oficio da chefia superior, nos termos do art. 18, 11, da Portaria nº 546, de 11 de março de 2010, com a indicação dos trabalhadores estrangeiros irregulares, endereçado ao Ministério da Justiça e devidamente instruído com parecer técnico de um dos seguintes órgãos, de acordo com sua competência: Secretaria Nacional de

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Justiça do Ministério da Justiça; Núcleos de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas; Postos Avançados de serviços de recepção a brasileiros deportados e não admitidos nos principais pontos de entrada e saída do País; Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República; e Serviços que prestem atendimento a vítimas de violência e de tráfico de pessoas (§§ 1° a 3° do art. 6°);

• As ações fiscais para erradicação do trabalho em condição análoga à de escravo serão coordenadas pela Secretaria de Inspeção do Trabalho, que poderá realiza-Ias diretamente, por intermédio das equipes do grupo especial de fiscalização móvel, ou por intermédio de grupos/equipes de fiscalização organizados no âmbito das Superintendências Regionais do Trabalho e Emprego (SRTE) por meio da chefia superior (art. 7°);

• Sempre que a SRTE, por meio da chefia superior receber denúncia que relate a existência de trabalhadores reduzidos à condição análoga à de escravo e decidir pela realização de ação fiscal local para a apuração dos fatos, deverá antes de iniciar a inspeção comunicar à Secretaria de Inspeção do Trabalho (art. 8°);

• As ações fiscais deverão contar com a participação de representantes da Polícia Federal, ou Polícia Rodoviária Federal, ou Polícia Militar, ou Polícia Civil, ou outra autoridade policial. A chefia superior, nos termos do art. 18, 11, da Portaria nº 546, de 11 de Março de 2010, deverá oficiar, visando à participação de membros de um dos órgãos mencionados no caput, bem como enviar Advocacia Geral da União (AGU), ao Ministério Público Federal (MPF), ao Ministério Público do Trabalho (MPT) e à Defensoria Pública da União (OPU) comunicação prévia sobre a operação, para que essas instituições avaliem a conveniência de integrá-Ia. Caso o coordenador da operação entenda prescindível o auxílio da força policial poderá ser dispensada a participação das referidas autoridades mencionadas, desde que haja a anuência da chefia superior (art. 12);

• A constatação de trabalho em condição análoga à de escravo ensejará a adoção dos procedimentos previstos na lei que regulamenta o benefício do seguro-desemprego, devendo o Auditor-Fiscal do Trabalho resgatar o trabalhador que estiver submetido a essa condição e emitir o Requerimento do Seguro-Desemprego do Trabalhador Resgatado (art. 13);

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• O Auditor-Fiscal do Trabalho, ao concluir pela constatação de trabalho em condição análoga à de escravo, determinará que o empregador ou preposto tome as seguintes providências: a imediata paralisação das atividades dos empregados encontrados em condição análoga à de escravo; a regularização dos contratos de trabalho; o pagamento dos créditos trabalhistas por meio dos competentes Termos de Rescisões de Contrato de Trabalho; o recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e da Contribuição Social; o cumprimento das obrigações acessórias ao contrato de trabalho, bem como tome as providências para o retorno dos trabalhadores aos locais de origem ou para rede hoteleira, abrigo público ou similar, quando for o caso. Os autos de infração lavrados em decorrência desta ação descreverão minuciosamente os fatos e serão conclusivos a respeito da existência de trabalho em condição análoga à de escravo. Em caso de não recolhimento do FGTS e Contribuição Social, deverão ser lavradas as competentes Notificações para Recolhimento (NFGC e NRFC). Em caso de descumprimento dessas determinações o Auditor Fiscal do Trabalho relatará o fato imediatamente à Chefia da Fiscalização para que informe a Advocacia-Geral da União (AGU), o Ministério

Público do Trabalho (MPT) ou a Defensoria Pública da União (OPU), a fim de que tomem as medidas judiciais cabíveis. Caso seja constatada situação de grave e iminente risco à segurança elou à saúde do trabalhador, serão tomadas as medidas previstas em lei (art. 14);

• Os critérios para a inclusão de infrator no Cadastro de Empregadores que tenham mantido Trabalhadores em Condições Análogas à de Escravo são de natureza técnico-administrativa e vinculados ao cumprimento dos requisitos contidos na Portaria Interministerial n° 2, de 12 de Maio de 2011 (art. 19);

• A inclusão do nome do infrator no Cadastro ocorrerá após decisão administrativa final relativa ao auto de infração lavrado em decorrência de ação fiscal em que tenha havido a identificação de trabalhadores submetidos à condição análoga à de escravo (art. 20);

• A Fiscalização do Trabalho monitorará pelo período de dois anos após a inclusão do nome do infrator no Cadastro para verificação da regularidade das condições de trabalho, devendo, após esse período, caso não haja reincidência, proceder sua exclusão do Cadastro. A exclusão do nome do

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infrator do Cadastro ficará condicionada ao pagamento das multas resultantes da ação fiscal, bem como, da comprovação da quitação de eventuais débitos trabalhistas e previdenciários, sem prejuízo do referido decurso de prazo (art. 21).

Penal

Código Penal Brasileiro - Decreto-lei nº 2.848. de 7 de dezembro de 1940 o art. 149 determina que está sujeito a pena de reclusão, de 2 a 8 anos, e multa, além da pena correspondente à violência, quem reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto. O § 1° estabelece que nas mesmas penas incorre quem: cerceia o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho e mantém vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apodera de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho. Já o § 2º do mesmo artigo dispõe que a pena é aumentada de metade, se o crime é cometido contra criança ou adolescente, por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem.

o art. 132 estabelece pena de detenção de 3 meses a 1 ano, se o fato não constitui crime mais grave, quem expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente. A pena é aumentada de um 1/6 a um 1/3 se a exposição da vida ou da saúde de outrem a perigo decorre do transporte de pessoas para a prestação de serviços em estabelecimentos de qualquer natureza, em desacordo com as normas legais.

Também segundo o art. 203 está sujeito a pena de detenção de 1 ano a 2s anos, e multa, além da pena correspondente à violência quem frustrar, mediante fraude ou violência, direito assegurado pela legislação do trabalho. Na mesma pena incorre quem obriga ou coage alguém a usar mercadorias de determinado estabelecimento, para impossibilitar o desligamento do serviço em virtude de dívida; impede alguém de se desligar de serviços de qualquer natureza, mediante coação ou por meio da retenção de seus documentos pessoais ou contratuais.

o art. 207 determina que aliciar trabalhadores, com o fim de levá-los de uma para outra localidade do território nacional sujeita o infrator

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a pena de detenção de 1 a 3 anos, e multa. Incorre na mesma pena quem recrutar trabalhadores fora da localidade de execução do trabalho, dentro do território nacional, mediante fraude ou cobrança de qualquer quantia do trabalhador, ou, ainda, não assegurar condições do seu retorno ao local de origem. A pena é aumentada de um sexto a um terço se a vítima é menor de dezoito anos, idosa, gestante, indígena ou portadora de deficiência física ou mental.

Normas internacionais

Convenção nº 29 da Organização Internacional do Trabalho - OIT

Estabelece a Convenção que:

• Todo País-membro da Organização Internacional do Trabalho que ratifica-Ia compromete-se a abolir a utilização do trabalho forçado ou obrigatório, em todas as suas formas, no mais breve espaço de tempo possível. Com vista a essa abolição total, só se admite o recurso a trabalho forçado ou obrigatório, no período de transição, unicamente para fins públicos e como medida excepcional, nas condições e garantias providas na Convenção (art. 1°);

• A expressão "trabalho forçado ou obrigatório" compreenderá todo trabalho ou serviço exigido de uma pessoa sob a ameaça de sanção e para o qual não se tenha oferecido espontaneamente. A expressão "trabalho forçado ou obrigatório" não compreenderá: qualquer trabalho ou serviço exigido em virtude de leis do serviço militar obrigatório com referência a trabalhos de natureza puramente militar; qualquer trabalho ou serviço que faça parte das obrigações cívicas comuns de cidadãos de um pais soberano; qualquer trabalho ou serviço exigido de uma pessoa em decorrência de condenação judiciária, contanto que o mesmo trabalho ou serviço seja executado sob fiscalização e o controle de uma autoridade pública e que a pessoa não seja contratada por particulares, por empresas ou associações, ou posta á sua disposição; qualquer trabalho ou serviço exigido em situações de emergência, ou seja, em caso de guerra ou de calamidade ou de ameaça de calamidade, como incêndio, inundação, fome, tremor de terra, doenças epidêmicas ou epizoóticas, invasões de animais, insetos ou de pragas vegetais, e em qualquer circunstância, em geral, que ponha em risco a vida ou o bem-estar de toda ou parte da população; pequenos serviços comunitários

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que, por serem executados por membros da comunidade, no seu interesse direto, podem ser, por isso, considerados como obrigações cívicas comuns de seus membros, desde que esses membros ou seus representantes diretos tenham o direito de ser consultados com referência á necessidade desses serviços (art. 2°);

• Nenhuma concessão feita a particulares, empresas ou associações implicará qualquer forma de trabalho forçado ou obrigatório para a produção ou coleta de produto que esses particulares, empresas ou associações utilizam ou negociam.

Onde existirem concessões que contenham disposições que envolvam essa espécie de trabalho forçado ou obrigatório, essas disposições serão rescindidas, tão logo quanto possível, para dar cumprimento ao art 1° da Convenção (art. 5°);

• Funcionários da administração, mesmo quando tenham o dever de estimular as populações sob sua responsabilidade a se engajarem em alguma forma de trabalho, não as pressionarão ou a qualquer um de seus membros a trabalhar para particulares, companhias ou associações (art. 6°);

• Toda legislação ou regulamento referente a indenização por acidente ou doença resultante do emprego do trabalhador e toda legislação ou regulamento que prevejam indenizações para os dependentes de trabalhadores falecidos ou inválidos, que estejam ou estarão em vigor no território interessado serão igualmente aplicáveis às pessoas submetidas a trabalho forçado ou obrigatório e a trabalhadores voluntários.

Incumbirá, em qualquer circunstância, a toda autoridade empregadora de trabalhador em trabalho forçado ou obrigatório, lhe assegurar a subsistência se, por acidente ou doenças resultante de seu emprego, tomar-se total ou parcialmente incapaz de prover suas necessidades, e tomar providências para assegurar a manutenção de todas as pessoas efetivamente dependentes desse trabalhador no caso de morte ou invalidez resultante do trabalho (art. 15);

• As pessoas submetidas a trabalho forçado ou obrigatório não serão transferidas, salvo em caso de real necessidade, para regiões onde a alimentação e o clima forem tão diferentes daqueles a que estão acostumadas a que possam por em risco sua saúde. Em nenhum caso

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será permitida a transferência desses trabalhadores antes de se poder aplicar rigorosamente todas as medidas de higiene e de habitação necessárias para adaptá-los ás novas condições e proteger sua saúde. Quando for inevitável a transferência, serão adotadas medidas que assegurem a adaptação progressiva dos trabalhadores ás novas condições de alimentação e de clima, sob competente orientação médica. No caso de serem os trabalhadores obrigados a executar trabalho regular com o qual não estão acostumados, medidas serão tomadas para assegurar sua adaptação a essa espécie de trabalho, em particular no tocante a treinamento progressivo, ás horas de trabalho, aos intervalos de repouso e á melhoria ou ao aumento da dieta que possa ser necessário (art. 16).

• Leis de sanções coletivas, segundo as quais uma comunidade pode ser punida por crimes cometidos por qualquer de seus membros, não conterão disposições de trabalho forçado ou obrigatório pela comunidade como um dos meios de punição (art.20);

• O trabalho forçado ou obrigatório não será utilizado para trabalho subterrâneo em minas (art. 21);

• A imposição ilegal de trabalho forçado ou obrigatório será passível de sanções penais e todo País-membro que ratificar esta Convenção terá a obrigação de assegurar que as sanções impostas por lei sejam realmente adequadas e rigorosamente cumpridas (art. 25);

Convenção nº 105 da OIT

Essa convenção complementa a de nº 29, determinado as situações onde seria permitidas a utilização do trabalho forçado, em vista de sua edição, em 1957, em plena reestruturação das Nações envolvidas na Segunda Guerra Mundial, visando a total abolição do trabalho forçado e da servidão por dívida.

São disposições desta Comissão:

• Qualquer membro da Organização Internacional do Trabalho que ratifica a presente convenção se compromete a suprimir o trabalho forçado ou obrigatório, e a não recorrer ao mesmo sob forma alguma: a) como medida de coerção, ou de educação política ou como sanção dirigida a pessoas que tenham ou exprimam certas opiniões políticas, ou manifestam sua oposição ideologia à ordem política, social ou econômica estabelecida;

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b) como método de mobilização e de utilização da mão-de-obra para fins de desenvolvimento econômico; c) como medida de disciplina de trabalho; d) como punição por participação de greves; e) como medida de discriminação racial, social, nacional ou religiosa (art. 1°);

• Qualquer Membro da Organização Internacional do Trabalho que ratifique a presente convenção se compromete a adotar medidas eficazes, no sentido da abolição imediata e completa do trabalho forçado ou obrigatório (art. 2°).

Protocolo de Palermo - Decreto nº 5.017, de 12 de marco de 2004

Esse decreto promulga o Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianças. Nesse sentido, o decreto determina que o Protocolo, adotado em Nova York, em 15 de novembro de 2000, será executado e cumprido tão inteiramente como nele se contém.

São determinações do Protocolo:

• A expressão "tráfico de pessoas" significa o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração. A exploração incluirá, no mínimo, a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, escravatura ou práticas similares à escravatura, a servidão ou a remoção de órgãos (grifos nossos) (art. 1°);

• Os objetivos do presente Protocolo são prevenir e combater o tráfico de pessoas, prestando uma atenção especial às mulheres e às crianças; proteger e ajudar as vítimas desse tráfico, respeitando plenamente os seus direitos humanos; e promover a cooperação entre os Estados Partes de forma a atingir esses objetivos (art. 2°);

• As definições: a) a expressão "tráfico de pessoas" significa o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o

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acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração. A exploração incluirá, no mínimo, a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, escravatura ou práticas similares à escravatura, a servidão ou a remoção de órgãos; b) O consentimento dado pela vítima de tráfico de pessoas tendo em vista qualquer tipo de exploração descrito na alínea a) do presente Artigo será considerado irrelevante se tiver sido utilizado qualquer um dos meios referidos na alínea a; c) O recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de uma criança para fins de exploração serão considerados "tráfico de pessoas" mesmo que não envolvam nenhum dos meios referidos da alínea a; d) O termo "criança" significa qualquer pessoa com idade inferior a dezoito anos (art. 3°);

• Quanto ao âmbito de aplicação, o Protocolo aplicar-se-á, salvo disposição em contrário, à prevenção, investigação e repressão das infrações, quando essas infrações forem de natureza transnacional e envolverem grupo criminoso organizado, bem como à proteção das vítimas dessas infrações (art. 4°);

• Quanto à criminalização, cada Estado Parte adotará as medidas legislativas e outras que considere necessárias de forma a estabelecer como infrações penais os atos descritos no art. 3°, quando tenham sido praticados intencionalmente.

Cada Estado Parte adotará igualmente as medidas legislativas e outras que considere necessárias para estabelecer como infrações penais a tentativa, a participação e a organização da prática de uma infração. As partes também providenciarão a proteção de vítimas de tráfico de pessoas (art. 5°);

• Quanto à assistência e proteção às vítimas de tráfico de pessoas, caberá ao Estado Parte: 1) proteger a privacidade e a identidade das vítimas de tráfico de pessoas, incluindo, entre outras, a confidencialidade dos procedimentos judiciais relativos a esse tráfico; 2) assegurar que o seu sistema jurídico ou administrativo contenha medidas que forneçam às vítimas de tráfico de pessoas, quando necessário, informação sobre procedimentos judiciais e

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administrativos aplicáveis e assistência para permitir que as suas opiniões e preocupações sejam apresentadas e tomadas em conta em fases adequadas do processo penal instaurado contra os autores das infrações, sem prejuízo dos direitos da defesa; 3) adotar medidas que permitam a recuperação física, psicológica e social das vítimas de tráfico de pessoas, incluindo, se for caso disso, em cooperação com organizações não-governamentais, outras organizações competentes e outros elementos de sociedade civil e, em especial, o fornecimento de alojamento adequado, o aconselhamento e informação, especialmente quanto aos direitos que a lei lhes reconhece, numa língua que compreendam, a assistência médica, psicológica e material e as oportunidades de emprego, educação e formação; 4) adotar medidas relativas a idade, o sexo e as necessidades específicas das vítimas de tráfico de pessoas, designadamente as necessidades específicas das crianças, incluindo o alojamento, a educação e cuidados adequados; 5) garantir a segurança física das vítimas de tráfico de pessoas enquanto estas se encontrarem no seu território; 6) assegurar que o seu sistema jurídico contenha medidas que ofereçam às vítimas de tráfico de pessoas a possibilidade de obterem indenização pelos danos sofridos (art. 6°) • Quanto às normas de proteção às vítimas de tráfico de pessoas nos Estados de acolhimento, cada Estado considerará a possibilidade de adotar medidas legislativas ou outras medidas adequadas que permitam às vítimas de tráfico de pessoas permanecerem no seu território a título temporário ou permanente, se for caso disso, tendo em conta fatores humanitários e pessoais (art. 7°); • Quanto ao repatriamento das vítimas de tráfico de pessoas, o Estado Parte do qual a vítima é nacional ou no qual a pessoa tinha direito de residência permanente, no momento de entrada no território do Estado Parte de acolhimento, facilitará e aceitará, sem demora indevida ou injustificada, o regresso dessa pessoa, tendo devidamente em conta a segurança da mesma. Quando um Estado Parte retornar uma vítima a um Estado Parte do qual essa pessoa seja nacional ou no qual tinha direito de residência permanente no momento de entrada no território do Estado Parte de acolhimento, esse regresso levará devidamente em conta a segurança da pessoa bem como a situação de qualquer processo judicial relacionado ao fato de tal pessoa ser uma vítima de tráfico, preferencialmente de forma voluntária. A pedido do Estado Parte de acolhimento, um Estado Parte requerido verificará, sem demora indevida ou injustificada, se uma vítima é sua nacional ou se tinha direito de residência permanente no seu território no momento de entrada no território do Estado Parte de acolhimento. De forma a facilitar o regresso de uma vítima que não possua os documentos devidos, o Estado

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Parte do qual essa pessoa é nacional ou no qual tinha direito de residência permanente no momento de entrada no território do Estado Parte de acolhimento aceitará emitir, a pedido do Estado Parte de acolhimento, os documentos de viagem ou outro tipo de autorização necessária que permita à pessoa viajar e ser readmitida no seu território. Não serão prejudicados os direitos reconhecidos às vítimas de tráfico de pessoas por força de qualquer disposição do direito interno do Estado Parte de acolhimento. Não será prejudicado qualquer acordo ou compromisso bilateral ou multilateral aplicável que regule, no todo ou em parte, o regresso de vítimas de tráfico de pessoas (art. 8°);

• Quanto à prevenção, cooperação e outras medidas, os Estados Partes: 1) estabelecerão políticas abrangentes, programas e outras medidas para prevenir e combater o tráfico de pessoas; e proteger as vítimas de tráfico de pessoas, especialmente as mulheres e as crianças, de nova vitimação; 2) envidarão esforços para tomarem medidas tais como pesquisas, campanhas de informação e de difusão através dos órgãos de comunicação, bem como iniciativas sociais e econômicas de forma a prevenir e combater o tráfico de pessoas. 3) incluirão nas políticas, programas e outras medidas, se necessário, a cooperação com organizações não governamentais, outras organizações relevantes e outros elementos da sociedade civil; 4) tomarão ou reforçarão as medidas, inclusive mediante a cooperação bilateral ou multilateral, para reduzir os fatores como a pobreza, o subdesenvolvimento e a desigualdade de oportunidades que tornam as pessoas, especialmente as mulheres e as crianças, vulneráveis ao tráfico; 5) adotarão ou reforçarão as medidas legislativas ou outras, tais como medidas educacionais, sociais ou culturais, inclusive mediante a cooperação bilateral ou multilateral, a fim de desencorajar a procura que fomenta todo o tipo de exploração de pessoas, especialmente de mulheres e crianças, conducentes ao tráfico (art. 9°);

• Quanto ao intercâmbio de informações e formação, as autoridades competentes para a aplicação da lei, os serviços de imigração ou outros serviços competentes dos Estados Partes, cooperarão entre si, na medida do possível, mediante troca de informações em conformidade com o respectivo direito interno, com vistas a determinar: a) se as pessoas que atravessam ou tentam atravessar uma fronteira internacional com documentos de viagem pertencentes a terceiros ou sem documentos de viagem são autores ou vítimas de tráfico de pessoas; b) os tipos de documentos de viagem que as

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pessoas têm utilizado ou tentado utilizar para atravessar uma fronteira internacional com o objetivo de tráfico de pessoas; e c) os meios e métodos utilizados por grupos criminosos organizados com o objetivo de tráfico de pessoas, incluindo o recrutamento e o transporte de vítimas, os itinerários e as ligações entre as pessoas e os grupos envolvidos no referido tráfico, bem como as medidas adequadas à sua detecção. Os Estados Partes assegurarão ou reforçarão a formação dos agentes dos serviços competentes para a aplicação da lei, dos serviços de imigração ou de outros serviços competentes na prevenção do tráfico de pessoas. A formação deve incidir sobre os métodos utilizados na prevenção do referido tráfico, na ação penal contra os traficantes e na proteção das vítimas, inclusive protegendo-as dos traficantes. A formação deverá também ter em conta a necessidade de considerar os direitos humanos e os problemas específicos das mulheres e das crianças bem como encorajar a cooperação com organizações não-governamentais, outras organizações relevantes e outros elementos da sociedade civil. Um Estado Parte que receba informações respeitará qualquer pedido do Estado Parte que transmitiu essas informações, no sentido de restringir sua utilização (art. 10);

• Sobre as medidas nas fronteiras, cada Estado Parte: 1) sem prejuízo dos compromissos internacionais relativos à livre circulação de pessoas, reforçará, na medida do possível, os controles fronteiriços necessários para prevenir e detectar o tráfico de pessoas; 2) adotará medidas legislativas ou outras medidas apropriadas para prevenir, na medida do possível, a utilização de meios de transporte explorados por transportadores comerciais na prática de infrações;

3) quando for apropriado, e sem prejuízo das convenções internacionais aplicáveis, as medidas determinarão o estabelecimento da obrigação para os transportadores comerciais, incluindo qualquer empresa de transporte, proprietário ou operador de qualquer meio de transporte, de certificar-se de que todos os passageiros sejam portadores dos documentos de viagem exigidos para a entrada no Estado de acolhimento; 4) tomará as medidas necessárias, em conformidade com o seu direito interno, para aplicar sanções em caso de descumprimento da obrigação constante do item 3;

5) considerará a possibilidade de tomar medidas que permitam, em conformidade com o direito interno, recusar a entrada ou anular os vistos de pessoas envolvidas na prática de infrações estabelecidas em conformidade com o presente Protocolo; 6) procurará intensificar a cooperação

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entre os serviços de controle de fronteiras, mediante, entre outros, o estabelecimento e a manutenção de canais de comunicação diretos (art. 11);

• Sobre a segurança e controle dos documentos, cada Estado Parte assegurará: 1) a qualidade dos documentos de viagem ou de identidade que emitir, para que não sejam indevidamente utilizados nem facilmente falsificados ou modificados, reproduzidos ou emitidos de forma ilícita; e 2) a integridade e a segurança dos documentos de viagem ou de identidade por si ou em seu nome emitidos e impedir a sua criação, emissão e utilização ilícitas (art. 12);

• Sobre a legitimidade e validade dos documentos, a pedido de outro Estado Parte, um Estado Parte verificará, em conformidade com o seu direito interno e dentro de um prazo razoável, a legitimidade e validade dos documentos de viagem ou de identidade emitidos ou supostamente emitidos em seu nome e de que se suspeita terem sido utilizados para o tráfico de pessoas (art. 13);

• Nenhuma disposição do presente Protocolo prejudicará os direitos, obrigações e responsabilidades dos Estados e das pessoas por força do direito internacional, incluindo o direito internacional humanitário e o direito internacional relativo aos direitos humanos e, especificamente, na medida em que sejam aplicáveis, a Convenção de 1951 e o Protocolo de 1967 relativos ao Estatuto dos Refugiados e ao princípio do nonrefoulement neles enunciado. As medidas constantes do presente Protocolo serão interpretadas e aplicadas de forma a que as pessoas que foram vítimas de tráfico não sejam discriminadas. A interpretação e aplicação das referidas medidas estarão em conformidade com os princípios de não-discriminação internacionalmente reconhecidos (art. 14);

Jurisprudência

No HC 134788 / RJ-HABEAS CORPUS 2009/0077485-0 ficou pacífico o entendimento de que compete à Justiça Federal processar e julgar os autores do delito previsto no art. 149 do Código Penal, haja vista a violação aos direitos humanos e à organização do trabalho.

No Acórdão n° 2005.43.00.001350-5 de Tribunal Regional Federal da 1a Região, Quarta Turma, 19 de Maio de 2009, decidiu-se que para a configuração de redução de trabalhador à condição análoga à de escravo

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"faz-se necessária a completa sujeição da pessoa que tenha relação de trabalho ao poder do sujeito ativo do crime, não bastando a submissão do trabalhador a condições precárias de acomodações. Tal situação é censurável, mas não configura o crime do art. 149 do Código Penal".

PLANOS E PROGRAMAS

Nacionais

Plano Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo o Plano tem os seguintes objetivos:

• Declarar a erradicação e a repressão ao trabalho escravo contemporâneo como prioridades do Estado brasileiro;

• Adotar o Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo, objetivando fazer cumprir as metas definidas no Programa Nacional de Direitos Humanos (Pndh 11);

• Estabelecer estratégias de atuação operacional integrada em relação às ações preventivas e repressivas dos órgãos do Executivo, do Judiciário e do Ministério Público, da sociedade civil com vistas a erradicar o trabalho escravo;

• Inserir no Programa Fome Zero municípios dos Estados do Maranhão, Mato Grosso, Pará, Piauí, Tocantins e outros, identificados como focos de recrutamento ilegal de trabalhadores utilizados como mão-de-obra escrava;

• Priorizar processos e medidas referentes a trabalho escravo nos seguintes órgãos: SRTE, MTE, Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT)/MTE, Ministério Público do Trabalho (MPT), Justiça do Trabalho, Gerências do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Delegacia da Polícia Federal (DPF), Ministério Público Federal (MPF) e Justiça Federal;

• Incluir os crimes de sujeição de alguém à condição análoga à de escravo e de aliciamento na Lei dos Crimes Hediondos, alterar as respectivas penas e, alterar a Lei nº 5.889, de 8 de junho de 1973, por meio de Projeto de Lei ou Medida Provisória, conforme propostas anexas;

• Aprovar a PEC 438/2001, de autoria do Senador Ademir Andrade, com a redação da PEC 232/1995, de autoria do Deputado Paulo

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Rocha, apensada à primeira, que altera o art. 243 da Constituição Federal e dispõe sobre a expropriação de terras onde forem encontrados trabalhadores submetidos a condições análogas à de escravo.

• Aprovar o Projeto de Lei nº 2.022/1996, de autoria do Deputado Eduardo Jorge, que dispõe sobre as "vedações à formalização de contratos com órgãos e entidades da administração pública e à participação em licitações por eles promovidas às empresas que, direta ou indiretamente, utilizem trabalho escravo na produção de bens e serviços";

• Inserir cláusulas contratuais impeditivas para obtenção e manutenção de crédito rural e de incentivos fiscais nos contratos das agências de financiamento, quando comprovada a existência de trabalho escravo ou degradante;

• Criar e manter uma base de dados integrados de forma a reunir as diversas informações dos principais agentes envolvidos no combate ao trabalho escravo; identificar empregadores e empregados, locais de aliciamento e ocorrência do crime; tornar possível a identificação da natureza dos imóveis (se área pública ou particular e se produtiva ou improdutiva); acompanhar os casos em andamento, os resultados das autuações por parte do MTE, do IBAMA, da SRF e, ainda, os inquéritos, ações e respectivas decisões judiciais no âmbito trabalhista e penal;

• Encaminhar à Associação dos Juízes Federais (Ajufe) e Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra) relação de processos que versam sobre a utilização de trabalho escravo, os quais se encontram tramitando no Poder Judiciário, de modo a facilitar a ação de sensibilização dos Juízes Federais e Juízes do Trabalho diretamente envolvidos;

• Sistematizar a troca de informações relevantes no tocante ao trabalho escravo;

• Criar o Conatrae vinculado à Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República;

• Criar um Grupo Executivo de Erradicação do Trabalho Escravo, como órgão operacional vinculado ao Conatrae, para garantir uma ação conjunta e articulada nas operações de fiscalização entre as Equipes Móveis, MPT, Justiça do Trabalho, MPF, Justiça Federal, MF/SRF,

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MMA/IBAMA e MPS/INSS, e nas demais ações que visem a Erradicação do Trabalho Escravo;

• Comprometer as entidades parceiras envolvidas na erradicação do trabalho escravo a aderir ao Sistema de Proteção da Amazônia (Sipam) e utilizar-se do mesmo para potencializar a ação fiscal e repressiva.

Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae) A Comissão foi criada pelo Decreto nº 9.943, de 31 de julho de 2003, vinculada à Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República. Compete à Conatrae acompanhar:

• O cumprimento das ações constantes do Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo, propondo as adaptações que se fizerem necessárias;

• A tramitação de projetos de lei relacionados com o combate e erradicação do trabalho escravo no Congresso Nacional, bem como propor atos normativos que se fizerem necessários à implementação do Plano;

• E avaliar os projetos de cooperação técnica firmados entre o Governo brasileiro e os organismos internacionais.

Compete ainda a Comissão propor a elaboração de estudos e pesquisas e incentivar a realização de campanhas relacionadas à erradicação do trabalho escravo.

A Conatrae será integrada pelo Secretário Especial dos Direitos Humanos, que a presidirá; pelos Ministros de Estado da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, da Defesa, do Desenvolvimento Agrário, do Meio Ambiente, da Previdência Social e do Trabalho e Emprego; por 2 representantes do Ministério da Justiça, sendo um do Departamento de Polícia Federal e outro do Departamento de Polícia Rodoviária Federal; e por até 9 representantes de entidades privadas não-governamentais, reconhecidas nacionalmente, e que possuam atividades relevantes relacionadas ao combate ao trabalho escravo.

Poderão ser convidados a integrar a Comissão, na qualidade de observadores, representantes de instituições públicas ou privadas, que possuam notórias atividades no combate ao trabalho escravo.

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O decreto que criou a Comissão também instituiu o Grupo Executivo de Trabalho que toma as providências necessárias para a atuação integrada da fiscalização e repressão ao trabalho escravo, constituído pelos Secretários-Executivos ou ocupante de cargo equivalente dos Ministérios da Defesa, do Desenvolvimento Agrário, da Justiça, do Meio Ambiente, da Previdência Social e do Trabalho e Emprego. O Grupo Executivo de Trabalho será coordenado pelo Secretário Especial Adjunto dos Direitos Humanos.

Grupos Especiais de Fiscalização

Existem dois grupos especiais de fiscalização. o GEFM e o GMAI Os Grupos Especiais de Fiscalização Móvel - GEFM, criados pelas Portarias nº 549 e 550, de 2005, do TEM, e hoje regulamentados pela Portaria nº 265, de 2002, são compostos por Auditores Fiscais do Trabalho e têm por finalidade o combate ao trabalho escravo, forçado e infantil e têm atuação em todo o território nacional.

A atuação dos GEFM poderá ser desenvolvida em conjunto com representantes do Grupo Executivo de Repressão ao Trabalho Forçado - GERTRAF, criado pelo Decreto n° 1.538, de 27 de junho de 1995, e por membros do Ministério Público Federal, do Ministério Público do Trabalho e do Departamento de Polícia Federal.

As ações dos GEFM serão planejadas e coordenadas por: 1 Coordenação Nacional, exercida pelo Secretário de Inspeção do Trabalho e 6 Coordenações Operacionais. Quando necessário garantir a proteção das fontes de informação, a segurança dos integrantes e a sua eficácia, a ação fiscal revestir-se-á de caráter sigiloso.

Compete aos GEFM:

• Participar do planejamento, da execução das ações fiscais e das reuniões regionais de avaliação;

• Atender à convocação da Coordenação Operacional;

• Exercer a mediação para solução dos conflitos coletivos decorrentes de cada operação;

• Elaborar relatório conjunto sob orientação do Coordenador ou do Subcoordenador Operacional.

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A Autoridade Regional, da localidade onde estiver ocorrendo a ação fiscal móvel, dispensará ao GEFM o apoio necessário ao desenvolvimento de suas tarefas externas e internas.

Os coordenadores dos GEFM encaminharão ao Coordenador Nacional relatório circunstanciado, acompanhado de cópias dos autos de infração e notificações de débito lavrados, de fotografias e respectivos negativos, filmes e outros documentos resultantes da ação, no prazo máximo de 7 dias úteis contados da conclusão das ações.

Quando houver indício de crime, o Secretário de Inspeção do Trabalho enviará cópia do relatório mencionado neste artigo MPF, MPT, DPF, SRTE com circunscrição no Estado onde foi realizada a ação fiscal e o INCRA.

Recentemente foi criado, por meio da Portaria nº 195, de 2012, o Grupo Móvel de Auditoria de Condições de Trabalho em Obras de Infraestrutura (GMAI), que tem por objetivo é aumentar a cobertura e eficácia das fiscalizações das condições de trabalho em obras de infraestrutura energética, logística e urbana. Para 2012 já foram planejadas 30 operações e vão priorizar as atuais fronteiras de desenvolvimento. As ações irão priorizar as regiões que representam as atuais fronteiras de desenvolvimento, tais como o Norte e parte das regiões Nordeste e Centro-Oeste. Compete ao GMAI inspecionar as obras de infraestrutura em todo território nacional, objetivando promover condições de trabalho adequadas e prevenir infrações à legislação trabalhista em todas as fases do processo de construção desses empreendimentos. Também visa à melhoria das condições de segurança e saúde no trabalho, mitigando ou neutralizando fatores que desencadeiam acidentes de trabalho nas diversas fases da obra.

Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo

O Comitê de Coordenação e Monitoramento do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo é composto pelo Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, pelo Instituto Observatório Social, pela ONG Repórter Brasil e pela OIT e tem por missão implementar ferramentas para que o setor empresarial e a sociedade brasileira não comercializem produtos de fornecedores que usaram trabalho escravo. A Repórter Brasil e a Organização Internacional do Trabalho são membros da Comissão Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo, que envolve

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governo federal e a sociedade civil. Outros membros da Comissão também contribuem com o Pacto Nacional, como a Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, o Ministério do Trabalho e Emprego, o Ministério Público do Trabalho e o Ministério Público Federal.

São signatárias do Pacto:

Número Empresa/Sociedade Civil Data da adesão

1 Ação Local Ladeira da Memória 19105/2005

2 ABIEC - Associação Brasileira da Indústria Exportadora de Came 27112/2005

3 ABIOVE - Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais 26/04/2006

4 ABIT Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção 19/05/2005

5 ADM do Brasil Lida 30/10/2007

6 Advance Sistemas de Segurança Lida 11/03/2011

7 AES Brasil Lida 22/09/2010

8 Agência Envolverde 29/08/2008

9 Agência Repórter Social 19/05/2005

10 Agra Industrial de Alimentos 01/09/2008

11 AAMAE - Apoio à mulher, criança e ao adolescente 21/06/2007

12 Ampla Energia e Serviços S/A 29/04/2008

13 APOENA Economia e Finanças e Empresas Sociais 19/07/2007

14 ARC Consultoria em Recursos Humanos 11/03/2011

15 Arcelor Mittal Aços Longos 03/03/2009

16 Arcelor Mittal BioFlorestas Lida 07/09/2011

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17 Amo S/A (Grupo Seb do Brasil) 15/06/2008

http://porta1.mte.gov.br/imprensa/mte-cria-grupo-movel-para-fiscalizar-obras-de-infraestrutura.htm

Número Empresa/Sociedade Civil Data da adesão

18 Banco da Amazônia 10/06/2005

19 Banco do Brasil 19/05/2005

20 Banco Santander / Real 19/05/2005

21 Bianchessi Têxtil Ltda Me 28111/2005

22 BM&F BOVESPA S/A - Bolsa de Valores, Mercadorias e Futuros 19/05/2005

23 BP Biofuels 18/08/2010

24 BRF - Brasil Foods S.A 28/02/2011

25 Bunge Alimentos S. A. 24/04/2006

26 C F Rocha Textil LTOA 29/03/2012

27 C&A Modas Ltda 08/12/2010

28 Caixa Econômica Federal 19/05/2005

29 Caramuru Alimentos Ltda 20/02/2006

30 Carbono Química 10/05/2006

31 Cargill Agrícola S.A 27/06/2006

32 Carnes Boi Branco Ltda (2) 14/04/2008

33 Carrefour Indústria e Comércio Ltda 19/05/2005

34 Catholic Relief Service 19/05/2005

35 Centrais Elétricas de Santa Catarina S/A 21/09/2006

36 Centrais Elétricas do Norte do Brasil S/A- Eletronorte 19/05/2005

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37 Chemtech - Software para empresas Petroquímicas e de Papel e 10/11/2006

Celulose

38 Chesf - Companhia Hidro Elétrica do São Francisco 10/06/2005

39 CIVES - Associação Brasileira de Empresários pela Cidadania 19/05/2005

40 Coca-Cola Brasil 10/02/2009

41 Coelce - Companhia Energética do Ceará 28/01/2008

42 Coimex - Cia. Importadora e Exportadora 04/03/2008

43 Companhia de Seguros Aliança do Brasil 11/12/2009

44 Companhia Paranaense de Energia 10/02/2011

45 Companhia Siderúrgica Vale do Pindaré 19/05/2005

46 Companhia Suzano de Papel e Celulose 19/05/2005

47 Confecções Kokulle Ltda 11/03/2011

48 Confecções Oneda Ltda 09/02/2011

49 Confecções Rosa Choque Ltda 11/03/2011

50 Confecções T Christina Ltda 11/03/2011

51 Confecções V-2 Indústria e Comércio Ltda 28/11/2011

52 Copagaz 07/11/2007

53 Cordeiro Fios e Cabos Elétricos 28/11/2011

54 Cosima - Siderúrgica do Maranhão LTOA 19/05/2005

55 Coteminas - Companhia de Tecidos Norte de Minas 19/05/2005

56 Cotton Star Confecções Ltda 11/03/2011

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57 Currupiu Industria e Comercio de Roupas Ltda 28/11/2011

58 D.R. Lingerie Industria e Comercio S.A. 28/11/2011

59 DAMA Transportadora Ltda 11/03/2011

60 Delui Confecções Ltda-EPPP 22/12/2011

61 DIEESE -Departamento Intersindical de Estatística e Estúdos 19/05/2005

Número Empresa/Sociedade Civil Data da adesão Socioecônomicos

62 Domarra Calçados Ltda Me 22/12/2011

63 Dow Brasil SA 09/06/2011

64 Dudalina S/A 17/07/2007

65 EDP do Brasil 29/09/2009

66 Ekobé Educação e Consultoria 10/06/200S

67 Emphasis Ind e Com Votorantim Ltda 11/03/2011

68 Enesa Engenharia 04/03/2008

69 Everblue Confecções Ltda 11/03/2011

70 Evidência Brindes Ltda 08/09/2010

71 Federação das Indústrias de Minas Gerais 19/0S/200S

72 Federação dos Trabahadores na Agricultura do Estado da Bahia 21/10/2008

(Fetag-BA)

73 FENAE - Corretora de Seguros 19/0S/200S

74 Fergumar - Ferro Gusa do Maranhão LTDA 19/0S/200S

7S Fersol Indústria e Comércio S/A 19/05/2005

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76 Fibria Celulose SA 24/05/2007

77 Floraterra Botica Farmácia de Manipulação 01/01/2006

78 Forall.net Informática Ltda. 18/05/2009

79 Fortiori Confecções Ltda 28/11/2011

80 Frigorífico Astra do Paraná (1) 1S/0S/2009

81 Frigorifico Margen (1) 09/04/2008

82 Frigorífico Mataboi S/A (2) 09/04/2008

83 Frigorífico Mercosul (1) 05/04/2008

84 Frigorífico Silva Indústria e Comércio 12/05/2009

8S Frigorífico Vale do Sapucaí Ltda (Frivasa) (1) 20/0S/2009

86 Frigorífico Vangélio Mondelli Ltda 20/05/2009

87 Fundacentro - Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e 19/0S/200S

Medicina no Trabalho

88 Gelita do Brasil 22/05/2006

89 Generale Comércio e Confecções de Roupas Ltda 11/03/2011

90 Grupo André Maggi 16/12/200S

91 Grupo Pão de Açúcar 19/0S/200S

92 H8 Brands Comércio do Vestuário Ltda 22/12/2011

93 HangarS7 Confecções Ltda 22/12/2011

94 Heil Malhas Ltda 28/11/2011

95 Helli Brasil Ind. Do Vestuário Ltda 11/03/2011

96 HSBC Bank Brasil 18/03/2010

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97 Indústria e Comércio Leal Ltda 09/04/2012

98 Infraero - Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária 19/05/2005

99 Inovar Ar Condicionado Ltda 11/03/2011

100 Instituto Akatu pelo consumo Consciente 19/05/2005

101 Instituto Algodão Social 11/08/2008

102 Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás 19/05/2005

103 Instituto Carvão Cidadão 19/05/2005

Número Empresa/Sociedade Civil Data da adesão

104 Instituto Controle Público 19/05/2005

105 Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social 19/05/2005

106 Instituto Museu da Pessoa 19/05/2005

107 Instituto Observatório Social 19/05/2005

108 Instituto Polis 19/05/2005

109 Inter Têxtil Ltda 11/03/2011

110 Ipiranga Produtos de Petróleo S/A 19/05/2005

111 IPO Instituto de Psico Orgs 11/03/2011

112 Itaipu Binacional 22/06/2009

113 Itaú Unibanco Holding S.A 18/09/2008

114 J. Shayeb & Cia Ltda 11/03/2011

115 JBS-Friboi / Bertin 21/05/2007

116 JC Bumlai Empreendimentos 19/05/2005

117 Karsten S.A 22/12/2011

118 Keepers Logística ATS Ltda 11/03/2011

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119 LATEC Desenvolvimento para a Sustentabilidade / Universidade 10/06/2005 Federal Fluminense

120 L'ORSA Modas e Confecções Ltda 11/03/2011

121 LOBO Indústria e Comércio Ltda 11/03/2011

122 Lutestillnd. e Com. de Roupas Ltda 11/03/2011

123 Maeda S/A 09/09/2006

124 Mafari Ltda 11/03/2011

125 MAHLE Componentes Motores Ltda 17/09/2007

126 MAHLE Metal Leve Miba Sinterizados Ltda 17/09/2007

127 MAHLE Metal Leve SA 17/09/2007

128 Mak Len Confecções Ltda 11/03/2011

129 Marfrig Alimentos S/A 23/09/2009

130 Margusa - Maranhão Gusa LTOA 19/05/2005

131 McDonald's 21/05/2009

132 Minerva S.A 19/05/2009

133 Moda Officina Confecções Ltda ME 22/12/2011

134 Movimento Humanos Direitos 19/05/2005

135 Navi Carnes Indústria e Comércio Ltda (1) 15105/2009

136 New Magic Confecções Ltda 1110312011

137 Odontoprev SA 22/06/2009

138 ONG Repórter Brasil 19/05/2005

139 Opetra Indústria e Comércio de Travesseiros Ltda 28/11/2011

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140 PATRI- Políticas Públicas, Relações Governamentais e Institucionais 10/04/2008

141 Perdigão Agroindustrial S/A 10/04/2008

142 Petersen Têxtil Ltda 11/03/2011

143 Petrobras Distribuidora S.A 1910512005

144 Petróleo Brasileiro S.A. - PETROBRAS 19/05/2005

145 Phael Confecções de Auriflama Ltda 1110312011

146 Pillar Indústria e Com. De Calçados 11/03/2011

147 Ponto de Leitura Vila Mara 17/03/2009

Número Empresa/Sociedade Civil Data da adesão

148 Pólo Sindical da Chapada 17/10/2008

149 Projeto Social Las Hermanas 28/09/2007

150 Promon S/A 10/08/2007

151 PROVIDER Itda - Tecnologia da Informática 28/08/2007

152 Queiroz Galvão Exploração e Produção SA 03/11/2010

153 Química Amparo 18/04/2008

154 Rafer Transportes 11/03/2011

155 Resgate Treinamento Ltda 22/10/2007

156 Sadia S/A 23/05/2007

157 Safhire Fabricação Bruto em Strass Ltda - ME 11/03/2011

158 São Paulo Alpargatas S/A 11/03/2011

159 Semp Toshiba 02/03/2011

160 Serasa 20/10/2008

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161 Sete Estradas Logística Ltda 11/03/2011

162 Shell Brasil Ltda 19/05/2005

163 Sidepar Siderúrgica do Pará S/A 19/05/2005

164 Simasa - Siderurgica do Maranhão Ltda 19/05/2005

165 SIMPI - Sindicato da Micro e Pequena Indústria do Estado de São Paulo

166 SINAIT- Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho 19/05/2005

167 Sindicato dos Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais (STTR) de Abaíra 20/10/2008

168 Sindicato dos Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais (STTR) de 17/10;2008 Lajedinho - Bahia

169 SINDICOM - Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de 19/05/2005 Combustíveis e Lubrificantes

170 Sinditêxtil - SP 17/04/2007

171 SINDIVEST -Sindicato dos Trabalhadores da Indústria Vestuário da 19/05/2005

Baixada Santista

172 Sinobrás - Siderúrgica Norte Brasil (antiga Simara) 19/05/2005

173 SLC Agrícola 25/04/2007

174 Space One Confecções Ltda 11/02/2011

175 Statoil do Brasil Óleo e Gás Ltda 19/05/2005

176 Sucess Factors do Brasil 11/03/2011

177 SulAmérica Seguros e Previdência 19/07/2011

178 Tabelionato Fischer 19/07/2011

179 TAM Linhas Aéreas 24/03/2009

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180 Tapajos Têxtil Ltda 11/03/2011

181 Techint Engenharia e Construção S.A (antiga Techint S/A) 09/01/2008

182 Texaco Brasil Ltda (1 ) 19/05/2005

183 Têxtil Água Verde Ltda 28/11/2011

184 Tiroleza Alimentos Ltda (antigo Comércio de Carnes Tiroleza) 19/05/2009

185 TN Projetos Sociais 10/06/2005

186 Tom Pastel Confecções Ltda 11/03/2011

187 Tombini e Cia Ltda 22/12/2011

188 Trigueiro Fontes Advogados 11/03/2011

189 Turma da Criança Industria e Comercio de Roupas Ltda - EPP 22/12/2011

Número Empresa/Sociedade Civil Data da adesão

190 União Sul-Americana de Ensino Superior 12/04/2008

191 Unimed Cuiaba 04/11/2010

192 Unimed Paulistana 23/01/2009

193 Unimed Vitória Coop. Trabalho Médico 08/08/2008

194 UniEthos - Educação para a Responsabilidade Social e o 19/05/2005

Desenvolvimento Sustentável

195 Vale 10/06/2005

196 Vale Grande Ind. e Com. de Alimentos Ltda (2) 09/04/2008

197 Valisére Indústria e Comércio Ltda 19/05/2005

198 Via Mundo Ltda 11/03/2011

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199 Vicunha Têxtil 24/05/2007

200 Viena Siderúrgica S/A 19/05/2005

201 Villa Confecções Ltda 28/11/2011

202 Wal Mart Brasil 19/05/2005

203 Warusky Comércio Industria e Representações Ltda 22/12/2011

204 Ybra Jeans S/A 11/03/2011

205 Zapelini Instalações e Comércio Ltda 11/03/2011

206 Zara Brasil LTDA 10/11/2011

(1) Empresa suspensa do pacto (2) Como parte do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC)

(2) Fonte: http://www.pactonacional.com.br/

Internacionais

O programa da ONU "Aliança Global contra o Trabalho Forçado" foi lançado em 2005 pela OIT para erradicar todas as formas de trabalho escravo até 2015. Há plena convicção de que, com comprometimento e vontade política dos Estados Membros, esse objetivo pode ser atingido. Para a consecução desses objetivos deve-se aprimorar a legislação e sua aplicação, a prevenção e a reinserção das vítimas.

ANÁLISE DOS DADOS

Infelizmente, o que se tem apurado nos depoimentos dados à Comissão confirma o que há muito a inspeção do trabalho e a imprensa têm constatado desde as denúncias feitas por D. Pedro Casaldáliga, Bispo da Prelazia de São Félix do Araguaia, no Estado do Mato Grosso, em 1971, na Carta Pastoral - "Uma Igreja da Amazônia em Conflito com o Latifúndio e a Marginalização Social".

O Grupo Móvel de Fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego, ao longo de 15 anos, vem, a duras penas, fazendo um magnífico trabalho de combate ao trabalho escravo que resultou na seguinte situação:

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Quadro geral das operações realizadas pela fiscalização para erradicação do trabalho escravo - SIT/SRTE -1995-2010Ano N° N° de Trabalhadores cujos Trabalhadores· Pagamento de Autos de estabelecimentos contratos foram indenização infração operecimen- formalizados no curso res lavrados atos da ação fiscal resgatações inspecionados

2010 143 309 2.745 2.628 8.786.424,89 3.9822009 256 350 3.412 3.769 5.908.897,07 4.5352008 158 301 3.021 5.016 9.011.762,84 4.8922007 116 206 3.637 5.999 9.914.276,59 3.1392006 109 209 3.454 3.417 6.299.650,53 2.7722005 85 189 4.271 4.348 7.820.211,26 2.2862004 72 276 3.643 2.887 4.905.613,13 2.4652003 67 188 6.137 5.223 6.085.918,49 1.4332002 30 85 2.805 2.285 2.084.406,41 6212001 29 149 2.164 1.305 957.936,46 7962000 25 88 1.130 516 472.849,69 5221999 19 56 725 4111998 17 47 159 2821997 20 95 394 7961996 26 219 425 1.7511995 11 77 84 906TOTAL 1083 2.844 36.419 39.180 62.247.947,36 31.589Fonte: reprodução do quadro divulgado na página da Internet do MTE.

Em 2011, o Grupo Móvel realizou 158 ações em 320 estabelecimentos, nas quais foram resgatados 2.271 trabalhadores, que trabalham e vivam em condições subumanas, sem alojamento, comida, água ou condições de asseio dignas, além de jornadas exaustivas de até 18 horas diárias de trabalho, além do endividamento com os empregadores.

A fiscalização de combate ao trabalho escravo mantém atualmente 5 Grupos Móveis de Fiscalização, que realizam diariamente operações especiais, além do trabalho rotineiro feito nas 27 Superintendências Regionais espalhadas por todo Brasil.

Recentemente, segundo a pagina na Internet do Ministério do Trabalho e Emprego, em ação conjunta realizada pelo Grupo Especial de Fiscal Móvel da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego e Ministério Público do Trabalho com apoio de policiais do Grupo de 3

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http://portal.mte.gov.br/imprensa/resgatados-quatro-trabalhadores-em condições-analogas-as-de escravo

Operações Especiais da Polícia Civil de Mato Grosso, foram resgatados quatro trabalhadores que estavam submetidos a condições análogas as de escravo, em condições degradantes de trabalho, de saúde e de vida.Os trabalhadores foram encontrados em uma fazenda de pecuária na zona rural de Nova Monte Verde (MT), situada a aproximadamente 950 km da capital. Segundo o coordenador do grupo de fiscalização a fazenda possui área total de 14.557 hectares, com aproximadamente 5.000 cabeças de gado, e os empregados foram contratados no escritório da fazenda localizado em Alta Floresta-MT para a aplicação de veneno (agrotóxico) nas pastagens, sob a fiscalização do capataz da fazenda. Tal atividade era desenvolvida pelos obreiros sem capacitação e sem os EPl's adequados.Os trabalhadores estavam abrigados em um alojamento de madeira que não oferecia as condições mínimas de habitabilidade. O banho era tomado no córrego e, como o sanitário estava desativado, os trabalhadores eram obrigados a realizarem suas necessidades fisiológicas no mato.O empregador não fornecia alimentação, obrigando os trabalhadores a adquirirem com recursos próprios. A água utilizada, tanto para consumo quantopara o preparo das refeições, não passava por qualquer tratamento e eraretirada de um poço a céu aberto localizado ao lado de um córrego próximo,onde os trabalhadores também lavavam suas roupas contaminadas com agrotóxico. Os trabalhadores estavam sem carteiras anotadas e não foram submetidos a exames médicos admissionais. Também foram constatadas outras irregularidades objeto de autuações.A ação foi Coordenada pelo Auditor-Fiscal do Trabalho João Evaristo Pereira Neto, com apoio do Procurador do Trabalho Jefferson Luiz Maciel Rodrigues. O pagamento das verbas rescisórias totalizou um valor aproximado de 11.300 reais. Além disso, foram lavrados 20 autos de infração.Ao final, após a regularização dos direitos trabalhistas, os trabalhadores foramabordados e cadastrados no Projeto Ação Integrada, desenvolvido pela Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de Mato Grosso em parceria com outros órgãos (Ministério Público do Trabalho e Universidade Federal de Mato Grosso), e que visa a qualificação e reinserção, no mercado de trabalho formal, de trabalhadores egressos do Trabalho Análogo ao de Escravo.

Numero de condenações? A consequência é clara e óbvia - temos um alto índice nos autos de infração e baixo índice de condenação penal. Menos de 10% dos envolvidos em trabalho escravo no sul

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sudeste do Pará, entre 1996 e 2003, foram denunciados por esse crime, de acordo com a Pastoral da Terra.

Recentemente a Justiça Federal condenou dois indivíduos a pena de aproximadamente três anos e a pagamento de 20 dias multa por submeter onze trabalhadores rurais a condições análogas à de escravo. A pena restritiva de liberdade de ambos condenados foi substituída pela prestação pecuniária de um salário mínimo a ser paga em favor da Sociedade São Vicente de Paulo, em Palmas, além de prestação de serviços à comunidade a ser definida em audiência o Cadastro de Empregados, conhecido como "lista suja", segunda a última atualização semestral em julho de 2012, continha 398 nomes, assim distribuídos pelas Unidades da Federação:

Pará 72Mato Grosso 61Goiás 41Maranhão 29Minas Gerais 26Santa Catarina 24Tocantins 21Mato Grosso do Sul 20Paraná 20Rondônia 18Piauí 13Amazonas 12Bahia 9Rio Grande do Sul 9Espirito Santo 6São Paulo 6Ceará 4Pernambuco 24 http://www.prto.mpf.gov.br/news/aliciadores-sao-condenados-por-reducao-de-trabalhadores-acondicao-analoga-a-de-escravoRio Grande do Norte 2Alagoas 1Paraiba 1Rio de Janeiro 1

TRABALHO ESCRAVO: O CENÁRIO INTERNACIONAL

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1) LEGISLAÇÃO INTERNACIONAL E COMPARADA

O trabalho forçado é um ato criminoso. O art. 25 da Convenção n° 29 contra o Trabalho Forçado da OIT esclarece que “a demanda ilegal de trabalho forçado ou compulsório tem de ser punida como ofensa penal e será uma obrigação de cada Estado Membro que ratificar essa convenção assegurar que as penalidades impostas por lei sejam realmente proporcionais à severidade da ofensa e devidamente aplicadas”.

Todos os países se preocupam em mostrar à comunidade internacional que não têm ou toleram, em seu território, trabalho escravo ou análogo à de escravo. Se, entretanto, algum trabalho desse tipo for detectado, todas as medidas possíveis serão tomadas. É este o compromisso internacional assumido.

É claro que quando se observa essa comunidade, tem-se de olhar com uma perspectiva diferenciada, já que as condições econômicas vão do desenvolvimento pleno aos menos desenvolvidos. Os salários comumente atrasados em certos países da África poderiam, em teoria, caracterizar trabalho análogo ao de escravo, pois, às vezes, os funcionários públicos trabalham seis meses sem percepção de salário. Há também situações tão esdrúxulas que o salário percebido pelos funcionários, ou mesmos juízes, sejam tão baixos que se equiparam ao trabalho escravo, gerando inclusive oportunidades de corrupção, sob a escusa de que têm de “receber por fora”, pois é o único modo de sobreviver. Pode-se argumentar, entretanto, que, pelo fato de toda a população se encontrar no mesmo estado de precariedade, não se configuraria trabalho escravo, pois não se trata de um segmento mais favorecido explorando outra camada de pessoas mais pobres.

De qualquer maneira, independentemente da desigualdade econômica dos diversos países, todos encontraram alguma forma de proclamar a total intolerância com o trabalho escravo, seja em nível político com declarações genéricas nas suas próprias constituições, ou por meio de legislação detalhada e específica que regula a matéria e faz punir os infratores.É de se ressaltar também que os diversos Estados agem de maneira distinta ao legislar e punir o trabalho escravo. Os Estados Unidos não ratificaram a Convenção n° 29, a despeito de ela ter aceitação quase universal, pois foi ratificada por 171 dos 182 Estados membros da ONU. É a política dos países de tradição anglo saxônica (“common law”) só ratificarem um instrumento internacional se constatarem que realmente podem cumprir aquela obrigação internacional, objeto do tratado.

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Por outro lado, nos países de tradição jurídica romano-germânica, como Itália e Portugal, em geral as normas são abertas e programáticas. Podem ratificar as convenções para só depois elaborarem suas leis internas. Ademais, nessa tradição jurídica a tendência é eleger um critério bastante subjetivo, dando ao juiz ampla liberdade na formação de seu convencimento. No Código Penal Italiano, por exemplo, constata-se um tipo penal bem aberto culminando pena de cinco a quinze anos a quem reduzir uma pessoa à escravidão ou a uma condição análoga à de escravidão1.

Na mesma linha, define a escravidão o Código Penal Português quando estabelece em seu art. 159 que é punido com pena de 5 a 15 anos de prisão quem:

“a) Reduzir outra pessoa ao estado ou à condição de escravo; ou

b) Alienar, ceder ou adquirir pessoa ou dela se apossar com a intenção de a manter na situação prevista na alínea anterior”

O certo é que trabalho forçado é uma prática criminal proibida em legislações nacionais e internacional. De fato, é a única matéria das quase 190 Convenções da OIT que dispõem de assunto de matéria penal e sua execução.

Segundo Roger Plant2, , a despeito de não ter ratificado a Convenção 26 da OIT, “os Estados Unidos têm uma legislação bem desenvolvida sobre trabalho forçado, servidão involuntária, peonagem e tráfico, bem como um compromisso crescente em combater trabalho forçado e tráfico de pessoas e é uma questão que as empresas consideram incluir em seus treinamentos e práticas de gerência de riscos. Ademais, uma empresa que tenha alegações sérias de exploração de trabalho escravo terá sua reputação manchada e pode até ter de enfrentar, ainda que em raras circunstâncias, ações de alto custo e persecução criminal”.

O que importa é que o interesse e a preocupação por esse tema continue a existir, pois trabalho escravo é prática tão velha quanto a humanidade e a exploração do homem pelo homem nunca vai desaparecer. É

1 Art. 600 do CP “Chiunque riduce una persona un schiavitù, o un una condizione analoga alla schiavitù, è punito con la reclusione da cinque a quindici anni.

2Estudo preparado para a Conferência sobre o Engajamento do Setor Privado na Luta contra o Trabalho Forçado: (‘Addressing Forced Labor'), realizada em Atlanta, Georgia, em fevereiro de 2008. http://www.ilo.org/empent/areas/business-helpdesk/WCMS_092176/lang--es/index.htm

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uma questão de minimizar as oportunidades e maximizar a punição dos culpados.

O trabalho forçado no campo ou na cidade é um fenômeno que não se pode negar, mas certamente que empresa alguma pode se dar ao luxo de sofrer as consequências negativas decorrentes da associação de seu nome com o trabalho escravo ou existente na sua cadeia de produção.

Muitas vezes, o trabalho forçado vai além da responsabilidade social corporativa no sentido de que empresas passam a assumir um compromisso voluntário para melhorar suas práticas gerenciais3.

Na Austrália a definição de trabalho forçado está no art. 73.2 do Código Penal de 1995 e estabelece ser a condição de uma pessoa que presta trabalho ou serviços (que não sejam serviços de ordem sexual) e que por causa do uso da força ou ameaça a)não é livre para deixar de prestar o seu trabalho ou serviço ou b) não é livre para sair do lugar ou da área em que presta seus trabalhos ou serviços.

Na Inglaterra, só recentemente em 2009, o trabalho forçado tornou-se uma ofensa criminal, por meio do art. 71 da Lei “Coroners and Justice Act”. Como já se comentou acima tal comportamento é típico dos países de common law.

Há uma pesquisa feita na Inglaterra para ver a que tipo de exploração os migrantes estavam se submetendo. Os poloneses, chineses, letões e lituanos, que trabalhavam na indústria da alimentação, pagavam grandes quantias para entrar no Reino Unido, criando, assim, uma dívida e total dependência dos empregadores. Os pesquisadores chegaram à conclusão de que não é fácil dizer se a exploração denunciada era suficiente para constituir trabalho forçado. Ficou claro, entretanto, pela prova existente que os empregadores estavam infringindo uma série de direitos. Nesse caso, porém, não se tratava de migrantes irregulares, mas de trabalhadores que tinham seu visto de trabalho ligado a um especifico empregador. Embora em teoria não se exija que aquele trabalhador trabalhe somente para aquele empregador, na realidade há a exigência de que haja um empregador que apoie o visto, tornando difícil a mudança de emprego no país. Essas circunstâncias acabam facilmente se transformando em situações de abuso, 3 http://www.antislavery.org.au/home/what-is-force-labour.html

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que facilmente podem vir a configurar trabalho análogo ao de escravo, se não houver fiscalização adequada e sistemática4.

James L. Bischoff, em seu extenso artigo sobre o fracasso do Brasil nos seus esforços de assegurar cumprimento das convenções internacionais contra o trabalho escravo e das convenções de direitos humanos, sustenta que trabalho forçado constitui crime internacional que clamaria até por jurisdição universal do mesmo jeito que se procede nos crimes de pirataria de mar. Cita ele como exemplo a pirataria que é hoje combatida com eficácia pelos vários países afetados, como é o caso dos Estados Unidos e da Inglaterra que têm julgado e condenado piratas de várias nacionalidades, independente dos critérios de territorialidade ou nacionalidade, mas sim baseados no princípio da jurisdição universal que abaixo abordaremos com mais detalhe.

Embora Bischoff veja mérito nas ações dos grupos móveis do MTE, ele diz que dos 16.600 casos de trabalho forçado verificados nessas ações, só houve três casos de condenações e nenhum dos condenados passou um dia sequer na prisão. As reclusões foram convertidas em pagamento de cestas básicas. Advoga ainda o autor pelo aumento da pena mínima para quatro anos, o que impossibilitaria a conversão da reclusão em penas alternativas. No final, Bischoff critica o governo daquela época por não aceitar responsabilidade de não ter sido capaz de prevenir abusos a direitos humanos cometidos no Brasil. E finaliza afirmando que “para combater o trabalho forçado eficazmente, o governo brasileiro precisa, no mínimo, encontrar os trabalhadores, liberá-los, prender os responsáveis, promover a ação penal, colocá-los na prisão e impor multas pesadas”5.

Já o Ministro João Oreste Dalazen, Presidente do Tribunal Superior do Trabalho, considera que a impunidade dos ofensores existe porque a lei penal brasileira é inadequada para a responsabilização dos infratores. Alega que falta clareza ao qualificar como crime de condição análoga à escravidão a submissão do empregado a uma jornada exaustiva ou em situação degradante. Diz também desconhecer um caso de condenação criminal por trabalho forçado no Brasil6.

4 http://www.jrf.org.uk/publications/forced-labour-uk-food-industry

5 http://www.oit.org.br/sites/all/forced_labour/brasil/documentos/bischoff_brazilian_forced_labour_ljil_mar_2006.pdf

6 http://www.conjur.com.br/2012-jul-15/tudo-mudou-exceto-legislacao-trabalhista-presidente-tst

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JURISDIÇAO INTERNACIONAL

Há uma teoria jurídica que vem ganhado relevo que dispõe sobre a jurisdição internacional. Nesse sentido, tem-se que quando um país não é capaz de resolver e julgar no seu próprio território os casos relativos a trabalho forçado, arriscar-se a sofrer interveniência externa, com considerável repercussão internacional negativa de sua incompetência de suas instituições, de seus poderes constituídos: Executivo, Legislativo e Judiciário.

Esse foi o caso ocorrido com José Pereira Ferreira, conhecido como o “caso Pereira”. José Pereira tinha só 17 anos, em 1989, quando fugiu dos maus tratos no seu trabalho, mas foi pego pelos empregados da propriedade rural em que trabalhava no sul do Pará, atingindo seu rosto. Como as autoridades brasileiras não deram uma solução satisfatória para o caso, ele foi referido à Organização dos Estados Americanos (OEA). No entanto, o governo brasileiro encontrou uma solução política para evitar uma condenação, assumindo uma série de compromissos para combater o trabalho escravo. O Brasil só aderiu à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em 1992 e só se submeteu à jurisdição da competência da Corte Interamericana em 1998. Isso significa que casos anteriores a essa época não podem ali ser julgados.

De qualquer forma, do mesmo modo que um caso foi referido à OEA, o Tribunal Penal Internacional pode também ter jurisdição sobre um caso de escravidão ocorrido em quaisquer dos países signatários do Estatuto de Roma.

Esse estatuto define os crimes contra a humanidade, dentre os quais se insere a escravidão, nos seguintes termos :

“Crimes contra a Humanidade

        1. Para os efeitos do presente Estatuto, entende-se por "crime contra a humanidade", qualquer um dos atos seguintes, quando cometido no quadro de um ataque, generalizado ou sistemático, contra qualquer população civil, havendo conhecimento desse ataque:

        a) Homicídio;

        b) Extermínio;

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        c) Escravidão; (grifo nosso)

        d) Deportação ou transferência forçada de uma população;

        e) Prisão ou outra forma de privação da liberdade física grave, em violação das normas fundamentais de direito internacional;

        f) Tortura;

        g) Agressão sexual, escravatura sexual, prostituição forçada, gravidez forçada, esterilização forçada ou qualquer outra forma de violência no campo sexual de gravidade comparável;

        h) Perseguição de um grupo ou coletividade que possa ser identificado, por motivos políticos, raciais, nacionais, étnicos, culturais, religiosos ou de gênero, tal como definido no parágrafo 3o, ou em função de outros critérios universalmente reconhecidos como inaceitáveis no direito internacional, relacionados com qualquer ato referido neste parágrafo ou com qualquer crime da competência do Tribunal;

        i) Desaparecimento forçado de pessoas;

        j) Crime de apartheid;

        k) Outros atos desumanos de caráter semelhante, que causem intencionalmente grande sofrimento, ou afetem gravemente a integridade física ou a saúde física ou mental.

        2. Para efeitos do parágrafo 1o:

........................................................................

c) Por "escravidão" entende-se o exercício, relativamente a uma pessoa, de um poder ou de um conjunto de poderes que traduzam

um direito de propriedade sobre uma pessoa, incluindo o exercício desse poder no âmbito do tráfico de pessoas, em particular mulheres e crianças........................................................................................”

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Essa teoria vem sido adotada por Bassiouni, Bischoff e tantos outros que defendem a responsabilidade dos Estados em condenar os responsáveis por tais atrocidades.

RESUMO DOS DEPOIMENTOS COLHIDOS NA CPI

Audiência pública realizada no dia 18 de abril de 2012

José de Souza Martins - sociólogo e professor emérito da Universidade de São Paulo – USP

O depoente afirmou que a compreensão da ocorrência de formas servis de trabalho no Brasil de hoje não prescinde da referência às conexões e articulações das formas sucessivas de escravidão. Não se trata de distrair os que se preocupam com o problema, mas, sim, de não escamotear as estruturas profundas que dão sentido a essa persistência. Ainda que constitua uma notória anomalia em relação às conquistas sociais e aos valores do mundo moderno, é preciso considerar, para compreendê-Ia, que esse mesmo mundo moderno se constituiu com base na imensa acumulação primitiva de capital, com base na escravidão moderna, que criou os fundamentos econômicos do capitalismo, e criou, portanto, as condições para que uma nova economia, baseada na reprodução propriamente capitalista do capital, a sua reprodução ampliada, se propusesse como fundamento material da modernidade. O caso brasileiro não nega essa tendência geral. Dela discrepa porém, na persistente permanência de mecanismos de cumulação primitiva de capital, quando a economia já é predominantemente moderna, baseada na racionalidade do lucro, que é só possível se se apoiar no trabalho livre, igualitário e contratual. Essa acumulação primitiva está essencialmente no uso inaugural, em momentos decisivos da economia brasileira, de diferentes formas de trabalho escravo. Seria um engano, no entanto, supor que a escravidão contemporânea, que nega essas três características do trabalho moderno, é mera sobrevivência de arcaísmos sociais.

Histórica e estruturalmente, a sociedade brasileira paga o tributo de suas origens coloniais, atualizando esses arcaísmos como elementos constitutivos da própria economia moderna que a caracteriza, numa pós modernidade antecipada. Afirmou que se entendermos que a pós-modernidade

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latino-americana é combinação funcional e articulada do moderno e do arcaico, e não propriamente do supra moderno, podemos dizer, com o antropólogo argentino Néstor García Canclini, que nós somos pós-modernos desde sempre.

As três escravidões de nossa história econômica e social, que inclui a atual, são expressões de momentos históricos, em que o advento de um novo momento da economia, de sua expansão, pede a reinstauração atualizada de formas violentas de extração de excedentes para uma nova fase de acumulação de riqueza. E cada fase declinou não como expressão de um progresso social disseminado, que estendesse a todos que o possibilitaram os devidos frutos colhidos.

Quando a escravidão indígena foi extinta formalmente, mas não de fato, em 1755, numa época em que havia duas colônias portuguesas na América - o Brasil, cujo limite norte era o Piauí, e o Estado do Maranhão e Grão-Pará, com o Diretório do Grão-Pará e Maranhão -, ela o foi para modernizar a sociedade, levantando as interdições estamentais que pesavam sobre índios e mestiços. Mas o foi também para disseminar e fortalecer uma forma mais moderna de escravidão, mais eficaz do ponto de vista da gestação e ampliação da riqueza: a escravidão negra.

Quando a escravidão negra entrou em crise, poucos anos depois da Independência, em decorrência do tratado anglo-brasileiro de 1826, que tornou ilegal o tráfico negreiro, ainda assim encontrou mecanismos de ilegalidade consentida e de protelação que a arrastaram até 1850, quando o tráfico foi efetivamente proibido.

Mas aí o tráfico interprovincial de escravos, exportados do Nordeste canavieiro para o Sudeste cafeeiro, deu uma sobrevida à escravidão negra até 1888.

Os fazendeiros do Nordeste puderam incorporar à economia do açúcar a massa dos moradores de favor das fazendas, os antigos índios administrados da escravidão indígena e seus mestiços, teoricamente sujeitos ao pagamento da renda da terra em trabalho.

A intuição de que havia um cativeiro embutido nessa relação de trabalho persistiria até o surgimento das ligas camponesas, nos anos 1950, 200 anos depois da abolição da escravidão indígena, no chamado "Cambão", título, aliás, de um livro de seu líder, Francisco Julião.

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A escravidão negra cessaria em 1888, não por iniciativa dos Parlamentares liberais que a advogavam, mas por iniciativa do Partido Conservador, que representava os interesses dos grandes proprietários de terras e de escravos. Euclides da Cunha observaria, no começo do século 20, que, entre nós, as reformas sociais são propostas pelos liberais, mas concretizadas pelos conservadores. A República foi proposta pelos republicanos, mas concretizada por meio de um golpe de Estado, pelos principais herdeiros das tendências absolutistas da Monarquia: os militares. Foi assim, aliás, na reforma agrária, relativamente recente, proposta pelas esquerdas antes do Golpe de 1964, mas concretizada pela direita, pelo regime militar, em 1965. Estruturalmente, a escravidão negra entrou em crise em boa parte por conta da escassez de escravos e por conta da significativa elevação do preço do escravo, que ameaçava a economia da grande lavoura. A escravidão terminou basicamente em consequência de um cálculo de custo; tornava-se um mau negócio. Mas, no plano político, o fim da escravidão negra só foi possível porque o conservador Antonio da Silva Prado, Ministro do Império e Senador, um dos maiores fazendeiros e empresários do Brasil de então, um dos mais modernos e lúcidos, negociou politicamente a supressão do veto dos que, entre os fazendeiros, relutavam, especialmente os paulistas, e resistiam à abolição da escravatura, o que se fez, dando conteúdo ao previsto na Lei de Terras de 1850, que instituiu no Brasil o moderno regime de propriedade fundiária, em conexão com a abolição do tráfico negreiro.

A Lei de Terras previu a imigração estrangeira, com base numa legislação fundiária, que, em oposição ao antigo regime sesmarial, criava uma escassez artificial de terras para cultivo e forçava o trabalhador imigrante, migrante ou escravo a trabalhar na grande lavoura, para, como ressaltou Prado num memorável discurso no Senado do Império, "formar um pecúlio, se for morigerado, sóbrio e laborioso". Com esse pecúlio, poderia comprar terra e tornar-se proprietário, mesmo nos núcleos coloniais oficiais. O Brasil optou pelo modelo fundiário oposto ao modelo norte-americano, o da Lei de Colonização, posta em prática poucos anos depois da lei brasileira. O Brasil optava contra as vozes que, no Parlamento, propunham o que modernamente se chama de reforma agrária. Optava por um modelo concentracionista e rentista de propriedade da terra, como fundamento de um extenso e relativamente rápido processo de acumulação de capital e para o salto histórico em direção à economia moderna que aqui se deu num curto período de 40 anos.

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Nem por isso, o regime de trabalho livre no Brasil foi instituído para ser um regime de trabalho assalariado, se não apenas potencialmente. O regime do morador, nos canaviais do Nordeste, e do colono, nos cafezais do Sudeste, era a forma não capitalista de trabalho e de reprodução agrícola do capital, baseada numa combinação sui generis de renda e trabalho, produção direta dos meios de vida e um complemento salarial que cobria apenas parcialmente o custo de reprodução da força de trabalho.

Nessa peculiaridade do caso brasileiro já estavam as bases da Terceira Escravidão, que vem até nossos dias. O trabalho verdadeiramente assalariado, igualitário e contratual, mesmo quando dominante, como nos dias de hoje, é estruturalmente um resíduo de uma relação capitalista inacabada e imperfeita.

A sempre comentada "abolição antecipada da escravatura" no Ceará e no Amazonas, em 1884, é uma boa indicação de mudança social na permanência típica do modelo brasileiro. Não se explica apenas por um ímpeto liberal e libertário, mas também pela articulação demográfica que entre as duas Províncias se estabelecera, em decorrência da seca de 1877 e da maciça imigração de cearenses para outras regiões do Brasil, em especial o Amazonas da borracha, cuja relativamente curta prosperidade tinha início. Os cearenses iam trabalhar nos seringais sob o chamado "regime de barracão" ou "peonagem", o regime da escravidão por dívida, o mesmo que chegou até nós. Euclides da Cunha trata desse assunto em À Margem da História, um livro do começo do século 20, que descreve em minúcias as técnicas das dívidas adotadas para subjugar o seringueiro, que já saía do Ceará endividado e, portanto, escravizado pela dívida.

A peonagem, ou escravidão por dívida, ganhou entre nós extraordinária importância, sobretudo nos anos 1970/80, com a expansão territorial do grande capital, apoiada nos incentivos fiscais e na renúncia fiscal do Estado em favor de empresas privadas. Era um modo de ocupar o território com a rapidez correspondente às carências de uma nova geopolítica do poder e do capital.

As britânicas Sue Branford e Oriel Glock, jornalistas e estudantes no Brasil, que aqui viveram, autoras do lhe Last Frontier, estimam que, nessa fase de ocupação da Amazônia brasileira, ao menos 200 mil peões escravizados foram empregados na derrubada da mata e na abertura das

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novas fazendas. Elas desenvolveram um método para chegar a esses números, o número de peões necessários para derrubar um hectare de mata multiplicado pela área desmatada no período. As características da peonagem estão ressaltadas nesse período nas denúncias feitas pela CONTAG e pela Pastoral da Terra e, não raro, sua violência está indicada nas constatações da Polícia Federal, divulgadas pelos jornais, mesmo pela imprensa censurada do período da ditadura.

Em 13% das fazendas em que houve trabalho escravo, entre 1970 e 2002, houve assassinato de trabalhadores que tentaram fugir. Os que sobreviveram foram submetidos a torturas e humilhações para exemplo dos demais. Em 1986, numa fazenda de Rondônia, trabalhadores eram surrados com vergalhos de bois, tinham pedras amarradas nos testículos, eram amarrados a troncos de árvores, tinham as mãos sangrando mergulhadas em rios que tinham piranhas. Em 1987, um jovem trabalhador foi queimado vivo num canavial do Mato Grosso do Sul. Em 1988, numa fazenda do Pará trabalhadores eram forçados a abraçar casa de marimbondos, como forma de punição pela tentativa de fuga. Em 1989, em Rondônia, um casal de trabalhadores foi amarrado à cauda de um cavalo, arrastado na disparada e morto. Em 1994, no Maranhão, o próprio fazendeiro decepou com facão a mão de um dos seus escravos. Em 1990, numa fazenda do Pará, a polícia encontrou no cocho do chiqueiro, em uma fazenda com escravos, o corpo carbonizado de um trabalhador servido como ração aos porcos. Em relação aos números dos anos de 1970/80, as indicações que se tem, especialmente as reunidas pela Comissão Pastoral da Terra, que faz um trabalho sistemático de monitoramento dessas ocorrências, indicam um quadro em declínio, embora relutante, o que se deve à atenuação da expansão da fronteira econômica.

Se há 30 anos o trabalho escravo era empregado sobretudo na derrubada da mata, hoje é muito mais em roçagem de pasto, carvoarias, reflorestamento e agricultura. E este é um dado que preocupa: a escravidão combinou-se com a terceirização das relações de trabalho e disseminou-se pelo território.

A escravidão contemporânea no Brasil está à procura de Seu Marquês de Pombal, que aboliu a escravidão indígena, e de Seu Antônio da Silva Prado, que viabilizou a Lei Áurea. Um passo foi dado pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso, em 1995. Ele próprio, internacionalmente reconhecido como um teórico da escravidão, quando criou o GERTRAF Grupo

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Executivo de Repressão Contra as Formas Contemporâneas de Escravidão. A ação do grupo móvel de fiscalização, na referência dessa orientação política do Estado, foi corajosa e tem sido decisiva para assegurar a presença do Estado nos lugares de emprego do trabalho escravo, que se julgam enclaves territoriais, regulados por leis próprias, imunes às leis da República e aos direitos trabalhistas reconhecidos em lei. Essa medida foi completada no mesmo governo, em 2002, com a preparação, na Secretaria dos Direitos Humanos do Ministério da Justiça, por uma Comissão Federal Interministerial, do Plano Nacional da Erradicação do Trabalho Escravo, comissão que eu coordenei, entregue ao novo Presidente da República no início do Governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Desde então, as medidas ali propostas esperam a implementação e o aperfeiçoamento, o que só ocorrerá se as forças conservadoras do Parlamento reconhecerem que a prática da escravidão não é própria dos verdadeiras empresários é crime, pura e simplesmente.

Disse ainda o depoente que é espantoso que a proporção de estabelecimentos rurais, que a proporção de trabalhadores escravizados seja inferior a 1% do total do respectivo número absoluto. No entanto, a imensa maioria reluta em pôr fim a essa covardia trabalhista.

Walter Darelli - Ex-ministro do Trabalho e Professor de Economia da Unicamp

O depoente disse que é com tristeza que vê, ainda no século 21, o Brasil ser um país que ainda não aboliu definitivamente o trabalho análogo à escravidão. Louva, no entanto, a presente Legislatura por propor esta CPI, para realçar o comprometimento dos seus membros com a solução dessa manifestação de subdesenvolvimento e atraso de um país que caminha para ser a sexta maior economia do mundo, ainda se valendo da máxima exploração ao trabalhador. É digna de nota também a iniciativa de começar os trabalhos conhecendo a experiência de estudiosos do tema e acolhendo sugestões sobre o que ainda precisa ser feito, denunciado ou normatizado.

Falou um pouco do Governo Itamar Franco. Assumindo a Presidência, através de um processo constitucional, sancionado pela presença do povo nas ruas exigindo ética na política, coerentemente, o Governo Itamar Franco foi ético não só na política, como na economia e na administração pública. Como titular do Ministério do Trabalho, essa foi a orientação recebida. E, ao defender um sistema democrático de relações de trabalho, sempre se

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referiam que, ao buscar instrumentos modernos de negociação, não poderiam ignorar a existência de formas anacrônicas de exploração, como o trabalho forçado e o trabalho infantil. Uma das características do trabalho análogo à escravidão é sua quase perfeita invisibilidade. Acontece nas fronteiras agrícolas, em pontos inacessíveis, e, agora, nos porões dos centros urbanos, nas prisões modernas de imigrantes. Onde inexiste governo ou sociedade organizada, onde a regra é a anomia, é possível escravizar pessoas humanas que não têm como exigir seus direitos, seja por ignorância ou medo. A retenção dos documentos ou a pressão das dívidas impagáveis e, em certos casos, a ameaça por capangas armados impedem que os trabalhadores se libertem de condições desumanas de trabalho. Quando há visibilidade, práticas ilegais são mais facilmente combatidas. É só verificar as mudanças ocorridas no mundo do trabalho, a partir dos anos imediatamente anteriores à atual Constituição, graças à organização da sociedade civil.

Afirmou que ainda há problemas, mas tem crescido, por exemplo, o número de trabalhadores legalizados com carteira de trabalho e os diretos dela decorrentes. No campo, há menor organização sindical e mais dificuldades de comunicação. Nos anos de chumbo, a CPT (Comissão Pastoral da Terra), presente nos rincões distantes do Brasil, foi a voz em defesa desses brasileiros, divulgando interna e externamente as ocorrências de trabalho forçado. Esse foi o quadro que foi encontrado no início do Governo Itamar Franco. A Secretaria de Fiscalização do Trabalho, embora com um quadro reduzido de profissionais, envolveu-se para identificar e solucionar o problema.

Todas as equipes estaduais foram mobilizadas, pois os problemas eram diversos em cada região. No final de 1993, o Ministério apresentou um mapa das denúncias fiscalizadas em 17 Estados: 23,7% no Norte; 13,6% no Nordeste; 32,2% no Sudeste; 18,6% no Centro-Oeste; e 11,9% no Sul. Por setores, as ocorrências investigadas representavam as seguintes origens por números de ocorrências: em primeiro lugar, o setor sucroalcooleiro; depois, a agricultura; e, em seguida, a pecuária, o carvoejamento, o setor madeireiro e o desmatamento. Em 1994, a área urbana também foi contemplada, devido a denúncias de confecções que empregavam imigrantes de países vizinhos, indocumentados e submetidos a condições ilegais quanto à moradia e o trabalho. O projeto do Ministério era estabelecer o sistema democrático de relações do trabalho em lugar do sistema autoritário e corporativista, que vinha desde os anos 1940. Inspirado no modelo tripartite da

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OIT – Organização Internacional do Trabalho, foi criado o Conselho Nacional do Trabalho, com representação paritária do Governo, do setor empresarial e centrais sindicais, visando a reunir no Conselho as entidades que participavam do Movimento Ética na Política. Tinham assento no Conselho o PNBE (Pensamento Nacional das Bases Empresariais), organizado fora do sindicalismo patronal, e, representando os desempregados e os excluídos, a Ordem dos Advogados do Brasil) e a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. Não apareciam como entidades, mas alguém precisaria representar aqueles que não eram representados na sociedade brasileira. O Conselho Nacional do Trabalho, além das reuniões gerais, poderia constituir comissões auxiliares, sendo criada, em setembro de 1993, a Comissão para Eliminação do Trabalho Forçado, com a CPT como um dos seus membros. Um dos compromissos então assumidos foi concentrar no Ministério todas as denúncias de trabalho análogo à escravidão.

Era feita, então, sigilosamente, a fiscalização. Se confirmada a transgressão, era feita a sua divulgação ampla, já com os trabalhadores libertados. Evitava-se, com esse procedimento, o que aconteceu em uma grande operação feita na região de Carajás, com a presença da Polícia Federal e da Aeronáutica e com apoio do Governo do Pará e de sua Polícia Militar, que não encontrou nem os capatazes nem os trabalhadores, que desapareceram na floresta. É importante essa observação porque era comum denunciar: "Olha, há trabalho escravo em tal lugar". Mas, quando você chegava lá, normalmente não havia mais como comprovar essa ocorrência. Então, os membros do Conselho Nacional do Trabalho assim deliberaram: "Vamos manter as denúncias sigilosamente, verificar e, aí sim, mostrar que estamos agindo para eliminar o trabalho escravo". Em 24 de março de 1994, foi editada a Instrução Normativa nº 24, que é a primeira instrução normativa sobre fiscalização no meio rural. Sua elaboração contou com a participação das entidades do Fórum Nacional Permanente contra a Violência no Campo. Também em 1994 foi assinado um termo de cooperação entre o Ministério do Trabalho, o Ministério Público Federal e o Ministério Público do Trabalho e a Polícia Federal, conjugando esforços para garantir a prevenção, a repressão e a erradicação do trabalho escravo. Mencionou a tragédia de Unaí, relativamente recente, em que auditores foram assassinados - até hoje o crime não foi punido exemplarmente. Na época, todos os nossos fiscais e delegados do trabalho em regiões onde as denúncias eram feitas eram ameaçados de morte. Tanto era assim, que, na estratégia do Ministério, o auditor - que na

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época se chamava fiscal; fiscal do trabalho de uma região - não fazia fiscalização na sua região; vinham pessoas de outras delegacias, de outras regiões, ou de Brasília, cada vez mais acompanhados da Polícia Federal, porque era uma ação muito perigosa, e as pessoas que ficavam marcadas tinham esta possibilidade, a de serem assassinadas. Esse trabalho conjunto continuou no Governo Fernando Henrique, com a criação do Grupo Interministerial para Erradicação do Trabalho Forçado (GERTRAF), e, no Governo Luiz Inácio Lula da Silva, com a Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (CONATRAE).

Chamou à atenção para a importância da repercussão internacional. A opinião pública internacional foi importante, e é importante quando se trata de combater denúncias no mundo do trabalho ou no mundo das privações, principalmente quando há problemas de restrições ou censura à imprensa, que foi o que aconteceu no Brasil. Em 1992, a CPT levou seu depoimento à Subcomissão de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas. Nesse mesmo ano, a OIT, em sua Conferência anual, cobrou explicações do Governo brasileiro a partir de várias denúncias encaminhadas desde 1985. O Governo da época se esquivou e contestou os dados oferecidos pelos denunciantes. Mas não foi essa a atitude do Governo Itamar Franco. Seguinte à Conferência Internacional do Trabalho, da OIT, em 1993, no ano seguinte, o Governo brasileiro se manifestou com estas palavras no discurso do Ministro do Trabalho, no tempo que lhe é concedido na Conferência Internacional:

"(. ..) nosso veemente repúdio a qualquer indício de existência de trabalho forçado. O Governo tem realizado ações de envergadura, inclusive nas áreas longínquas, para mostrar nossa presença e exercer a justiça em favor dos explorados e dos princípios da OIT e pôr fim à impunidade. Ao mesmo tempo, é na cidadania em que confiamos para resolver os problemas da modernidade e do atraso. Ao Conselho do Trabalho, em seu caráter triparte, incumbe agora criar uma opinião pública nacional que ponha fim às práticas ilegais e desumanas. " É de justiça mencionar que, nessa mesma Conferência, a defesa da posição brasileira na Comissão de Normas da OIT foi feita pelo eminente jurista paraense Dr. Roberto Santos, ex-juiz do Tribunal da 88 Região, do Pará, e Consultor Jurídico, na época, do Ministério do Trabalho. Para terminar, o depoente afirmou que a história do trabalho comporta vários episódios desde a Idade Antiga até hoje. Na História do Brasil vemos que este País foi um dos últimos a abolir o trabalho escravo por lei. E, enquanto houver ocorrência de trabalhos assemelhado à escravidão, não poderemos nos acomodar. É certo

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que estamos aperfeiçoando nossas instituições. Para isso, tem contribuído o movimento sindical, que teve sua época áurea na década de 1980, ajudando o Brasil a reconquistar a democracia e ter uma Constituição batizada de Cidadã.A existência desta CPI nos alerta que esse processo não está terminado. Ainda há o que fazer para que a máxima exploração do trabalhador não ocorra por desconhecimento dos seus direitos ou por abuso daqueles que se valem do seu trabalho. As leis sempre podem ser aperfeiçoadas, mas nem sempre são cumpridas, como esta Comissão Parlamentar de Inquérito vai investigar.Alegou que a proposta do Ministério à época foi a de um sistema democrático de relações de trabalho. Ele foi pensado no espírito que norteou o processo de redemocratização e o movimento pela ética na política.Vemos o processo civilizatório com a busca dos ideais de liberdade, igualdade e fraternidade. Esses não podem ser apenas declarações retóricas. Construídos é atribuição da sociedade organizada, dos governos, do Parlamento e da Justiça.

José Armando Fraga Diniz Guerra - Coordenador Geral da Comissão Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo – CONATRAE

Disse que estava muito feliz de falar depois da aprovação de todos esses requerimentos que convidavam pessoas que poderão criar um panorama completo do fenômeno do trabalho escravo no Brasil. Além de tudo, liberam-no um pouco, já que haverá esse debate mais aprofundado, de exaurir a discussão conceitual principalmente sobre a questão do trabalho escravo no Brasil. O conceito de trabalho análogo ao de escravo no Brasil é um conceito que avança em relação ao conceito da Organização Internacional do Trabalho, que fala de trabalho forçado. Acredita que isso seja, na verdade, muito proveitoso, porque, devido ao sistema internacional, à discussão necessária do sistema internacional de criação de mínimos civilizatórios, a própria OIT recomenda que os Estados nacionais avancem nos conceitos colocados em suas convenções, em seus tratados. E o Brasil, como referência mundial que é no combate ao trabalho análogo ao de escravo, avançou nesse conceito de trabalho forçado ao criar no seu Código Penal, a partir da Lei nº 10.803, de 2003, o conceito de trabalho análogo ao de escravo. O art. 149, antes da Lei nº 10.803, dizia apenas "reduzir alguém à condição análoga à de escravo." A Lei nº 10.803 avança ao tipificar de forma mais completa o crime de trabalho análogo ao de escravo. O Prof. Martins mencionou a questão do sistema de barracão, do sistema de aliciamento para migração, em que a pessoa já chega em dívida e fica, na verdade, com seu direito de ir e vir restrito. Crê que os

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próximos palestrantes conseguirão aprofundar mais no referido conceito. Ressaltou que o avanço do Código Penal, com a Lei nº 10.803, modifica qual é o bem jurídico tutelado no crime de redução ao trabalho análogo ao de escravo. Antigamente havia o bem liberdade, e hoje, com o avanço da legislação brasileira, felizmente há também o da dignidade da pessoa humana, que está exposto na questão das condições degradantes de trabalho, que, no seu entender, os próximos palestrantes, a Ora. Vera e o Dr. Alexandre, abordarão de forma mais profunda, devido ao fato de serem os técnicos responsáveis pelo tema no Governo Federal. Quanto às características do trabalho escravo, tem-se, primeiramente, que é verificado em todos os Estados, na cidade e no campo. Infelizmente, ocorre no Brasil a incidência de trabalho análogo ao de escravo nessas condições do tipo penal, não apenas em Estados de frente quanto ao avanço econômico, mas em todos os Estados da Federação. Existe tanto na cidade quanto no campo. Inclusive, nos últimos anos; houve um avanço muito grande na libertação de trabalhadores em oficinas de costura e também na construção civil. Outra característica é que o trabalho escravo interage com outros setores da economia. Não está limitado apenas ao local onde é explorado esse trabalho. Tem-se também que o trabalho escravo está vinculado a atividades que demandam mão de obra intensiva e pouco qualificada. O perfil do libertado do trabalho análogo ao de escravo é geralmente homens, entre 18 e 44 anos, com muito pouca educação formal. Só têm a vender a sua força de trabalho. Por fim, há interação com outros tipos de infração. Verifica-se trabalho escravo também onde há disputas fundiárias, irregularidades ambientais e não apenas trabalhistas. Nesse caso dá o exemplo de fazendas que vendem para frades, que ou exportam ou vendem para empresas de transformação, o produto do trabalho escravo vai parar na mesa, na roupa, nas cidades também, mesmo onde há trabalho escravo rural. Disse que o fenômeno do trabalho escravo insere-se bem claramente com a economia brasileira e não fica restrito ao local onde há a libertação. A grande maioria dos empreendimentos onde houve libertação de trabalhadores explora a pecuária. Duas ressalvas devem ser feitas a respeito disso. Em primeiro lugar, de 2009 para cá, houve um aumento significativo das libertações e das operações no meio urbano. Então, esse dado agora já é diferente. Outra coisa, isso diz respeito ao número de propriedades, não diz respeito ao número de trabalhadores libertados. Devido às características de cada empreendimento, há libertações de mais pessoas ou menos pessoas, a partir de cada operação. Em seguida, faz um histórico sobre o combate ao trabalho escravo, realizado pelo Estado e pela sociedade civil, com o advento

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de legislação punitiva do crime. Relatou que nesse ano de 2012, pela primeira vez, foi realmente realizada uma Semana Nacional de Combate ao Trabalho Escravo. Foram feitos atos em 13 Estados. A semana e o dia foram criados pela Lei nº 12.064, de 2009, o dia 28 de janeiro, data da chacina de Unaí. Foram também organizadas oficinas em parceria com os Tribunais Regionais do Trabalho sobre trabalho escravo e prevenção, atuação jurisdicional.

Vera Lúcia Ribeiro de Albuquerque - Secretária Nacional de Inspeção do Trabalho

Disse a depoente que a responsabilidade pela fiscalização do trabalho escravo não é só do Grupo Móvel, ela é da fiscalização do trabalho como um todo, como o Ministro Barelli já havia comentado. Pediu a compreensão de todos acerca do funcionamento da Inspeção do Trabalho. Ela precisa atuar onde há infração. Para tanto, enfrenta vários problemas. A maior dificuldade é como atender à sociedade brasileira. Há quase pleno emprego no Brasil. Há uma grande dificuldade de inspecionar todos os estabelecimentos com o número existente de Auditores Fiscais do Trabalho. O último grande concurso que houve foi o de 1994, que o Ministro Walter Barelli organizou. O fato é que se precisa, na Inspeção do Trabalho, fazer mais com menos. Houve necessidade de se mudar a forma de trabalhar da Inspeção do Trabalho, porque, mesmo tendo a oportunidade de ter mais auditores, muitos se aposentam. Ou seja, há uma diminuição constante de auditores. Isso faz com que se precise trabalhar em inovação de gestão, mudando-se a forma de atuar.

Cada vez mais se trabalha de forma planejada. Mudou-se a metodologia a partir de 2010. O novo modelo tem prevalência da fiscalização planejada, do trabalho em equipe e da atuação baseada no diálogo social com a representação de trabalhadores, de empregadores, com os parceiros sociais e institucionais. Todos esses parceiros sociais e institucionais, em relação ao combate ao trabalho escravo, estão personificados, consolidados na Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo - CONATRAE. Ela funciona extraordinariamente bem. Dá-se prioridade aos projetos na Inspeção do Trabalho. Porém existem quatro casos em que se faz o atendimento imediato: denúncia de trabalho escravo e de trabalho infantil, atraso de salário e grave e iminente risco. Para poder atender ao crescimento enorme do trabalho e do emprego no Brasil, faz-se uma triagem rigorosa das denúncias. Há a Comissão de Colaboração com a Inspeção do Trabalho, em que os sindicatos participam do planejamento de cada ala. Porém, a estratégia do combate ao trabalho

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análogo ao escravo tem dois vetores. Um deles é a atuação contínua de cinco Grupos Móveis Nacionais, que são compostos, em geral, de auditores de outros Estados que vão atender às denúncias. Cada saída do Grupo Móvel é uma ação fiscal do trabalho muito planejada e muito complicada. Muitas vezes tem-se que que fazer um reconhecimento do local, que precede a ação propriamente dita. Na ação é convidada sempre uma pessoa do Ministério Público do Trabalho. Muitas vezes vai um Juiz do Trabalho, conforme a necessidade. Sempre vão pelo menos seis oficiais, ou delegados, ou agentes da Polícia Federal, ou da Polícia Rodoviária Federal. Aí esclarece aos empregadores, representantes de empregadores que estiverem na CPI, que muitas vezes dizem: A equipe do Ministério do Trabalho chegou lá de arma em punho". O auditor fiscal do trabalho não usa armas; a Polícia Federal as usa. E é necessário, a exemplo do que houve em Unai. Foi numa fiscalização de trabalho rural em que não havia o acompanhamento da polícia. Então, é um risco que não se pode correr. Não se pode minimizar o risco. Mas há a inspeção sem acompanhamento policial, porque, quando se encontra o trabalhador em situação análoga à escrava, é impossível que o Estado saiba e permita que a situação perdure. Então, exige-se que sejam pagos ao trabalhador todos os valores relativos aos direitos que ele não recebeu: salários atrasados e direitos trabalhistas. E são pagos in cash, valor financeiro, em nota. Então, a Polícia é essencial nessa atuação. É essa é a estratégia da inspeção: atuação contínua dos cinco Grupos Móveis e das equipes das 27 Regionais. Onde se vê que a denúncia não é tão perigosa, não há necessidade de o Grupo Móvel se deslocar com uma segurança mais completa, o grupo regional atende. E mais: há denúncias da Comissão Pastoral da Terra - CPT.

No combate ao trabalho análogo ao escravo atua-se com as definições do Código Penal, prevista no art. 148. Há o cuidado de explicar, de uniformizar para todos os auditores fiscais do trabalho qual é a definição, que não pode ser subjetiva jamais. Trabalho análogo ao escravo é um assunto muito sério.

Trabalha-se com muito rigor, mas com muito cuidado também para não penalizar o pobre dono da vídeo locadora, que foi denunciado por um trabalhador que ele teve que demitir por justa causa. Esse tipo de coisa acontece, mas não se pode deixar de atender também às denúncias, daí por que se faz esse reconhecimento e se elabora vários manuais, varias explicações. O manual, por exemplo, que foi distribuído para

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toda a Comissão, que está na Internet, no site do Ministério do Trabalho, ele é exclusivamente para uso interno, mas, por questão de transparência, de mostrar o que a inspeção do trabalho faz, ele pode ser acessado por qualquer pessoa e ele traz as definições de como o auditor do trabalho deve analisar cada situação que encontra. Ele foi elaborado não só de forma tripartite, com consulta interna com todos os auditores fiscais do trabalho, mas também com a cooperação do Ministério Público do Trabalho e de todos os que foram identificados como interessados. Também no site do Ministério do Trabalho há outro texto muito interessante, que é uma retrospectiva do trabalho escravo no Brasil.

A depoente mostrou, de modo geral, fotos de onde foi encontrado o trabalho análogo ao escravo. Disse ainda que em 2011, foram realizadas 158 ações fiscais em 328 estabelecimentos. Em cada ação, o Grupo Móvel verifica todas as denúncias daquela área, denúncias que foram qualificadas como razoáveis.

E, para a Organização Internacional do Trabalho, o Brasil é referência mundial.

Os auditores fiscais têm ido aos países explicar como tem sido esse combate, essa repressão, mesmo nos países que não reconhecem que possuem trabalho escravo. Até nos Estados Unidos o ex-Coordenador de Combate ao Trabalho Escravo foi dar palestras, mostrar como o Brasil atua nessa área. Falou ainda do Cadastro de Empregadores, conhecido como Lista Suja. Explicou que após terminada a ação fiscal é feito o relatório de inspeção, que é muito cuidadoso. O relatório às vezes tem 5 centímetros de altura. Em seguida, todos os Autos de Infração são lavrados e analisados.

Recebida a defesa ou o recurso, se for o caso, há duas instâncias administrativas para analisa-los. Para se inscrito no Cadastro o empregador já deve ter recebido as multas, mas, para sair, ele vai precisar pagar as multas impostas pelo Ministério do Trabalho e Emprego. Mas não é só isso. Ele tem que também esperar um período de 2 anos, que é o prazo em que, não havendo reincidência, tendo todas as multas quitadas, pagamento de déficit de FGTS, o nome do infrator é retirado desse Cadastro de Empregadores, que na sua opinião, é o mais forte instrumento de que dispõe a fiscalização do trabalho. A OIT e a OEA têm falado da necessidade do Brasil

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ser mais atento com a punição dos empregadores encontrados explorando trabalho escravo.

Não há um empregador de trabalho escravo punido com prisão. Quando houve pena, ela foi transmutada em pagamento de cesta básica.

Para a depoente os principais desafios para o futuro com relação ao combate ao trabalho escravo são a ação de prevenção e a punição real dos empregadores. Isso é pedido pela OEA e pela 01T. Pensa que a PEC438 é uma excelente forma de prevenção. Ela vai fazer os empregadores ficarem mais atentos para a perda da propriedade. É um risco que nenhum empregador urbano ou rural vai querer correr. Por isso, confia no Congresso, na Câmara dos Deputados que a aprovará.

Alexandre Rodrigo Teixeira da Cunha Lyra - Chefe da Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo do Ministério do Trabalho e Emprego.

Tratou o depoente, efetivamente, da prática da fiscalização, da ação fiscal. Antes disse que o art. 149 do Código Penal, na redação antiga, datada de 1940, se limitava a conceituar trabalho análogo ao de escravo e punir os empregadores que o mantém. Durante muito tempo, a Constituição doutrinária e de jurisdição foi relacionar trabalho análogo a de escravo à supressão de liberdade. Graças a esta Casa houve uma redação nova do art. 149, redação esta que possibilitou ampliar o alcance da inspeção do trabalho. O auditor fiscal do trabalho é um cumpridor da legislação, é um fiscal da lei. Ele não vai nem além, nem menos. Então, a redação antiga o deixava desconfortável, porque já vinha percebendo, até 2003, que supressão de liberdade não era tão somente o foco do trabalho análogo ao escravo. Já havia a jornada exaustiva, uma condição degradante, o direito de ir e vir por outras formas. Então, os empregadores estavam mascarando a situação. Recentemente, o Supremo Tribunal Federal, interpretando o art. 149 do Código Penal, por 6 votos a 4,recebeu denúncia contra dois empregadores - a notícia é de 18 de abril e foi publicada no site do Supremo Tribunal Federal -, e considerou que no art. 149, o bem tutelado, não é a liberdade e, sim, a dignidade da pessoa humana. Não somente a liberdade, como muitos, equivocadamente, constroem o raciocínio. O Supremo deu os seguintes exemplos: "condições desumanas, com alojamentos precários, sem a devida

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ventilação; ademais, as condições sanitárias do local de trabalho... não teriam banheiros; também estariam sujeitos ao consumo de água não filtrada; e, no campo, matavam a sede com gelo, sem qualquer cuidado de higiene".

Em seguida, o depoente passou a explicar a ação fiscal. As denúncias são feitas, as vezes, pela Comissão Pastoral da Terra; pelo Ministério Público do Trabalho; pela Polícia Federal, principalmente em Redenção, que colhe muita denúncia. Após chegarem à DETRAE, as denúncias são filtradas. São recusadas denúncias de meras irregularidades, que são repassadas às Superintendências Regionais do Trabalho. Elas não são desmerecidas, mas serão investigadas pelos órgãos regionais. Há trabalhadores que vêm à Brasília reclamar. A Detrae, com a verba assistencial, os envia novamente para seus municípios, após serem informados de que seus casos não constituem trabalho escravo. O Ministério do Trabalho não cria denúncias, não as inventa. Ele é provocado pelos parceiros no combate ao trabalho escravo, como a Polícia Federal que é oficiada. O Ministério do Trabalho não tem qualquer ingerência sobre a Polícia Federal ou a Polícia Rodoviária Federal. A equipe que integra o grupo de fiscalização móvel é composta por um coordenador, um subcoordenador e três auditores. O contraditório já se estabelece na própria composição da equipe, porque o coordenador e o sub já têm uma rotina de convivência. Podem ter o mesmo entendimento, mas já ocorreram casos em que divergência houve entre a posição do coordenador e a do sub. Chegando ao local abordado, a Polícia Federal ou Rodoviária Federal explica o empregador ou seu representante que ali está uma equipe do Ministério do Trabalho e Emprego para fazer uma inspeção, e a fiscalização tem essa competência legal de entrar onde os trabalhadores estão sendo mantidos escravos. Quando se tem o contato com o empregador, em um primeiro momento, explica-se que a fiscalização está ali justamente para verificar as condições de trabalho. Não se procura criminosos. Disse que integrou uma equipe de Grupo Especial de Fiscalização por 1 e nunca tive problema com empregadores. Isso é uma rotina. De 1995 até 2011, 3.182 estabelecimentos foram inspecionados com empregadores abordados. Relatos de divergência ou de abuso são insignificantes em relação ao número de operações. Tudo é feito com diálogo. Às vezes, o empregador pode se assustar com a presença da força policial. Então, não é uma situação ostensiva. Visto nesse cenário, entrevistado o empregador, colhe-se as declarações dos trabalhadores, forma-se o contraditório e, até se chegar à conclusão de que é há ou não trabalho em condição análoga a de escravo.

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Então, feito isso, conversa-se e chegando-se a conclusão de que há trabalho escravo, afasta-se os trabalhadores daquele ambiente, porque não é possível que o poder público, o Estado, permita que aquela situação continue. Negociasse empregador a fim de ele pague as verbas rescisórias, porque os trabalhadores não deram causa àquela situação. Emite-se a guia de seguro desemprego para o trabalhador resgatado. É uma guia especial, só o Ministério do Trabalho e Emprego tem essa competência. Então, se o empregador não for encontrado pelo menos essa ajuda financeira terá o trabalhador sem a presença do empregador. E lavrar-se tantos autos quantos forem necessários.

A atuação do Ministério do Trabalho e Emprego, como se referiu a Ora. Vera, não é subjetiva. O manual da fiscalização comprova isso. São várias as rotinas que devem ser seguida, sob pena de responsabilização inclusive criminal do auditor fiscal. A ação fiscal se encerra com a produção, a reunião de todas essas informações em intitulado relatório. Esse documento é encaminhado ao Ministério Público Federal e ao Ministério Público do Trabalho, os quais vão dar encaminhamento judicial necessário. As autuações correm. E, após todo o trânsito em julgado, o empregador está apto ou não a ser inserido no Cadastro de Empregadores.

Alertou o depoente que, mesmo com vários instrumentos, como a autuação, as indenizações, as ações civis públicas que correm por conta do Ministério Público do Trabalho, as multas, os empregadores não se intimidam. Estão preocupados apenas com Cadastro de Empregadores. Então, ficarão muito mais preocupados se esta Casa aprovar a PEC 438, que vai desapropriar a terra de quem pratica trabalho análogo ao de escravo.

Audiência pública realizada no dia 25 de abril de 2012

Caio Luiz Carneiro Magri - Gerente Executivo de Políticas Públicas do Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social.

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O depoente iniciou sua fala dizendo que esta é uma oportunidade bastante significativa para a sociedade brasileira, especialmente os cidadãos, cidadãs e organizações que lutam pelos direitos humanos no Brasil e no mundo, fazer avançar as agendas, as pautas e a promoção dos direitos humanos no País. O Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social é uma organização da sociedade civil criada por empresas, em 1998.

Desde a sua fundação, tem procurado mobilizar o setor empresarial na perspectiva da sua contribuição, da sua parceria para a construção de uma sociedade mais justa e sustentável. A agenda do trabalho escravo é uma agenda histórica do Movimento de Responsabilidade Social e Empresarial. Se forem consideradas algumas situações, inclusive na década de 90, quando, a partir do momento em que o Brasil reconheceu formalmente, perante a Organização Internacional do Trabalho, a existência do trabalho análogo ao trabalho escravo, trabalho forçado, trabalho escravo, seja qual for a caracterização final que se faça, ou seja, a mais grave violação dos direitos e das relações de trabalho, o Instituto Ethos passou a atuar nessa agenda buscando, especialmente, na construção dos seus indicadores de responsabilidade social, apontar a importância da agenda do trabalho decente, a importância da promoção de equidade de gênero, de raça no local de trabalho, a inclusão de pessoas com deficiência e a absoluta restrição do uso de mão de obra infantil ou análoga ao trabalho escravo. Entretanto, somente a partir de 2004 - e aí a história do pacto nacional pela erradicação do trabalho escravo, que acredita seja a contribuição do instituo nesse processo -, quando duas organizações absolutamente fundamentais nesse processo, a organização não governamental Repórter Brasil e o Instituto Observatório Social, desenvolveram pesquisas apontando as relações perversas do processo que se estabelece nos negócios e no mercado a partir das empresas e dos empregadores que utilizam mão de obra escrava e, portanto, estão inscritos no cadastro do Ministério do Trabalho e a sua sequente e progressiva passagem, como mão de obra e trabalho, a um conjunto de produtos e processos que a economia brasileira utiliza em larga escala. Não foi o primeiro estudo que apontou essas questões. Na década de 90, foram muito importantes os estudos que levantavam a relação entre o trabalho infantil e a produção de automóveis, de calçados, de suco de laranja, de etanol, de açúcar, comprovadamente existente a partir da utilização de mão de obra infantil na produção básica desses produtos. Portanto, o conceito que está aqui colocado é o de que a responsabilidade social das empresas implica

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corresponsabilidade, com todas as suas relações econômicas e de negócios e com os todos os públicos com os quais ela interage. Há responsabilidade com os fornecedores, com os clientes, com os consumidores, com os trabalhadores e com a comunidade. Apesar de o Brasil ter assumido, em 1995, perante o mundo e a sociedade a existência do trabalho escravo, em 2003 surgiu um instrumento absolutamente fundamental para as empresas: o Cadastro de Empregadores é uma ferramenta fundamental de precaução, de utilização das empresas para poder identificar com quem fazer e com quem não fazer negócios. Assim, a partir de 2003, tem-se a possibilidade de construir a rastreabilidade, sequencialmente, num processo produtivo. Utilizar o exemplo do carvão produzido com o trabalho escravo que se transforma em automóvel, em geladeira, em bens duráveis. O álcool se transforma em combustível. O algodão se transforma em todas as roupas vestem os presentes na audiência.

A partir do Cadastro houve a possibilidade de se construir relações de negócios, comerciais e de mercado que revelaram, pela primeira vez, a um conjunto de empresas que desconheciam esse processo que, de alguma forma, elas precisavam construir mecanismos de controle, de fiscalização interna, para poderem ser, efetiva e socialmente, responsáveis do ponto de vista da sua ação, da sua perspectiva de negócios. Foram feitas dezenas de reuniões com empresas, empresas importantes, grandes, que disseram o seguinte: "Ainda bem que agora nós estamos sabendo disso, porque agora nós temos como tomar providências. Não podíamos fazer nada antes de saber'.

Mas, ao saber, o que vão fazer? Foi a partir daí que surgiu a ideia do pacto, ou seja, um conjunto de compromissos que são ferramentas para a gestão do processo interno das empresas para precaução e prevenção dos riscos de utilização de mão de obra escrava. O pacto é um documento, um acordo que, além de ser voluntário, é construído com as empresas. Nesse processo, a Organização Internacional do Trabalho, a organização Repórter Brasil, o Instituto Observatório Social e o Ethos coordenam o diálogo com esse conjunto de empresas. O pacto foi lançado no dia 19 de maio de 2005. Inicialmente, com 30, 40 adesões. Hoje há no pacto quase 240 empresas que assumiram voluntariamente o compromisso, na perspectiva de controlar a sua cadeia produtiva, na perspectiva de criar mecanismos e ferramentas de orientação aos seus fornecedores, de criar políticas de comunicação para explicar à sociedade e aos seus parceiros

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comerciais qual era o compromisso que estava assumindo, e o compromisso, também, de inserir no mercado de trabalho, de forma regular, de forma correta, trabalhadores egressos do trabalho escravo, das autuações por trabalho escravo. Essas 250 empresas são monitorada anualmente. Algumas delas já deixaram o pacto por falta de informações sobre o seu monitoramento. O monitoramento é realizado pelo Instituto Observatório Social, por meio de um processo que verifica o cumprimento e as evidências em cada um dos dez compromissos. Os dez compromissos são o seguinte: os signatários acordam definir metas específicas para a regularização das relações de trabalho nas cadeias produtivas, definir restrições comerciais às empresas ou pessoas identificadas na cadeia produtiva que se utiliza de condições degradantes de trabalho, associadas a práticas que caracterizam a escravidão; apoiar ações de reintegração social e produtiva dos trabalhadores que ainda se encontrem em relações de trabalho degradantes ou indignas; apoiar ações de informação aos trabalhadores vulneráveis de aliciamento de mão de obra escrava; apoiar ações de parceria com entidades públicas e privadas no sentido de propiciar o treinamento e aperfeiçoamento profissional; apoiar ações de combate à sonegação de impostos e à pirataria; apoiar e debater propostas que subsidiem e demandem a implementação, pelo poder público, das ações previstas no Plano Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo; monitorar a implementação das ações descritas acima; sistematizar e divulgar a experiência de forma a promover a multiplicação de ações que possam contribuir para o fim da exploração do trabalho degradante, do trabalho escravo em todas as suas formas no Brasil e em outros países; e avaliar permanentemente os resultados e a implementação das políticas previstas no pacto. Esse é o conjunto de compromissos assumido por cerca de 250 empresas que representam hoje, do ponto de vista da economia brasileira, cerca de 30% do PIB, ou seja, empresas com capacidade política e econômica extremamente poderosa para poder fazer valer esse processo de indução de um aperfeiçoamento nas relações de trabalho, na sua cadeia produtiva; são os principais bancos do País, que criaram setores especializados para a análise de riscos socioambientais nas suas operações de financiamento e que, portanto, hoje têm a possibilidade de não realizar financiamentos e não se associar a empreendimentos, a empreendedores, a empresas ou exploradores de mão de obra escrava no Brasil. São empresas que estão hoje nos setores mais críticos. Se for considerada a origem, a base de informações fornecidas pelo cadastro do Ministério do Trabalho, vê-se que há alguns setores críticos do processo produtivo e da economia brasileira com um crescente risco de

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trabalho escravo em ambiente urbano. Esse é um dado novo na realidade brasileira, que já está sendo trabalhado com o pacto. O pacto tem hoje o acordo e o compromisso das principais empresas do varejo têxtil no Brasil para atuação na sua cadeia produtiva. E não só eles, também os seus fornecedores. Todos os fornecedores da Marisa, da Zara, da C&A aderiram ao pacto e são portanto, submetidos a um monitoramento para regularização das suas condições de trabalho e de produção. Portanto, os setores críticos são esses que tem-se procurado permanentemente para aderir ao processo. São as cadeias importantes do agronegócio, dos setores financeiro e industrial. O pacto passou, depois de algum tempo - em 2008, 2009 -, a figurar como política pública. Ao ser incluído no Plano Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo, o pacto, além de dar uma contribuição do ponto de vista das ações que as empresas podem desenvolver na perspectiva do combate ao trabalho escravo, passou a ser uma referencia e um instrumento de política pública. Há hoje referencias importantes do pacto em âmbito internacional. O Brasil, além de utilizar no processo de produção interno, continua exportando mão de obra escrava. Um conjunto de produtos brasileiros continua a ser exportado com essa marca. O pacto funciona exatamente para possibilitar a identificação das empresas, de como elas podem atuar e se proteger nesse processo e quebrar a lógica de que não são os produtos brasileiros, mas na verdade, algumas empresas que estão atuando de forma irregular, de forma a violar os direitos humanos no Brasil. Busca o pacto construir, com compradores, com empresas que compram produtos brasileiros, o mesmo compromisso que as empresas no Brasil têm assumido. Os resultados até o momento que julga importante serem compartilhados na Comissão: o pacto é um instrumento importante, uma ferramenta de capacitação, de qualificação da gestão das empresas na possibilidade de estarem vivenciando riscos de utilização de mão de obra análoga ao trabalho escravo, de trabalho escravo. Segundo: o pacto tem permitido diferenciar as empresas que estão comprometidas com o enfrentamento das questões que envolvem as suas relações de negócios com seus fornecedores, com seus clientes, das que não estão dispostas a fazer isso. O pacto, apesar de ser um processo voluntário, demonstra claramente quem está ou não está comprometido com essa agenda. Terceiro: o pacto tem demonstrado a possibilidade efetiva de monitoramento da evolução da qualidade da gestão das empresas em torno da agenda do trabalho escravo. Portanto, é de novo uma forma que pode ser acompanhada, publicizada de maneira transparente. As empresas têm no pacto um aliado, um instrumento, uma ferramenta de transparência de suas

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ações de responsabilidade social empresarial. Esses três resultados, que acredita serem importantes, não poderiam, de forma alguma, ser suficientes se nós não houvesse bastante comprometimento. Ressalta o depoente que se deve buscar o aperfeiçoamento do processo de fiscalização, de seus mecanismos legais. E esta CPI, este espaço legislativo de discussão, de reflexão, de investigação que certamente poderá propor o aperfeiçoamento do processo legislativo e do marco regulatório brasileiro para combater de forma radical e definitiva a violação dos direitos humanos que se consolida na exploração do trabalho escravo no Brasil, a exemplo da aprovação da PEC 438.

Roberto de Figueiredo Caldas - Coordenador da Coordenação de Combate ao Trabalho Escravo do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.

O depoente disse que este é um importante momento da audiência pública para tratar de questão que o Brasil tem enfrentado, por um lado, no aspecto social, uma vergonha nacional, por outro, o enfrentamento feito pelo Estado, de maneira honesta transparente, e pelas entidades da sociedade civil que compõem a CONATRAE, o que trouxe para o nosso País o reconhecimento pela OIT. Não podemos, no entanto, nos contentar com um plano, com letras frias. Nós temos que de fato colocar em prática toda esta nossa afirmada intolerância ao crime contra a humanidade que consiste no trabalho escravo. O depoente conceitua o trabalho escravo como crime contra a humanidade. Devemos no enveredar na busca de um suporte de normativas internacionais para mostrar que o Brasil hoje está obrigado a mais que aplicar nosso Código Penal. Nós estamos obrigados a julgar estes crimes pela Justiça Federal, embora ainda o Supremo Tribunal Federal guarde uma certa vacilação na jurisprudência. Vinha consistente, mas agora há um processo, ao qual iremos nos referir, pendente de julgamento, que em tese poderia decidir em sentido contrário. É bom lembrar, que em 1888, o Brasil já enfrentou na forma legislativa a proibição ao trabalho escravo e ao tráfico de escravos, proibindo terminantemente a prática da escravidão no País. Chegamos nesse momento, século XXI, ainda concluindo que temos trabalhadores escravizados. Daí a necessidade de enfrentarmos alguns diplomas internacionais que reafirmam essa proibição. Em primeiro lugar, há a convenção das Nações Unidas sobre a escravatura, de 1926, que o Brasil ratificou; a importante Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, que, com todas as letras, proíbe também a

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escravidão e o tráfico de escravo em todas as suas formas, garante que ninguém será mantido em escravidão ou servidão. Mas a Declaração Universal afirma que todos têm direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e favoráveis do trabalho e à proteção contra o desemprego. Este é um documento de referência, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, que, embora tenha uma natureza de declaração, e, a princípio, se poderia imaginar que não é compulsória, o fato é que hoje a legislação já abrange todos os seus termos. De modo que é obrigatória, vindo a ser repetida no Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos das Nações Unidas, de 1966,e também pela Convenção Americana de Direitos Humanos. Há o nosso chamado Pacto de São José da Costa Rica, que é uma espécie de constituição dos direitos humanos do nosso continente. É com base na Convenção Americana que a Corte Interamericana de Direitos Humanos e a Comissão Interamericana de Direitos Humanos atuam rigorosamente para punir os diversos crimes e as práticas contra os direitos humanos. Esclarece que, ao contrário do que alguns ainda imaginam, os tribunais internacionais têm hoje a característica que é a compulsoriedade, a obrigatoriedade das suas decisões.

E mais, os seus termos não são apenas programáticos. São de uma típica sentença judicial, com imposição de responsabilidade, inclusive financeira, do Estado em que ocorrem as várias práticas. O Brasil já tem recebido essas sentenças e tem cumprido, tem pago as indenizações. De maneira que é um tribunal, hoje, plenamente atuante no nosso País. Depois da Convenção Americana, há os documentos da OIT. A Convenção n° 29, da OIT, já de 1957; a Convenção nº 105, de 1966; e, finalmente, agora, de 1998, o importantíssimo documento que é a Declaração da OIT sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho. A OIT considera quatro eixos, entre eles o trabalho escravo, como direitos e princípios fundamentais. De 4 em 4 anos os países são averiguados a respeito das normativas da OIT, do respeito a essas normas internacionais. Em resumo, vê-se que a intolerância ao trabalho escravo faz parte do que se chama de consciência jurídica internacional. É uma consciência que não é apenas dos juristas, mas de todas as nações, de todas as sociedades, de todos os indivíduos que ninguém pode ser submetido à realização de um trabalho, não pode ser forçado a uma prática, muito menos em situações degradantes. Daí que, respeitando esses princípios, o Constituinte de 1988 foi absolutamente rigoroso e sábio ao estabelecer, já no art. 1°, como um fundamento da nossa República, a dignidade da pessoa humana. A partir desses conceitos, tem-se toda a certeza e garantia de que a

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Nação brasileira não tolera esse tipo de prática e que nós temos que aprovar a PEC 438, de expropriação de propriedades onde ocorra esse gravíssimo crime.

Um compromisso internacional muito importante também foi firmado pelo Brasil, em 2003, com a Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Foi o caso do José Pereira, que foi escravizado, submetido a maus-tratos e, durante a fuga, foi gravemente ferido, e o seu companheiro de fuga foi assassinado. Naquele momento, em 2003, perante a Comissão Interamericana, o Brasil firmou, entre outras coisas, o pacto de que os crimes de trabalho escravo, os crimes de reduzir alguém à condição de trabalhador escravo seriam julgados pela Justiça Federal, e não pela Justiça Estadual - a prática universal vê alguns problemas pela proximidade dos costumes, às vezes maus costumes, infelizmente, locais. Esse foi um compromisso, e nós tivemos realmente uma evolução na jurisprudência, avançando. O Supremo chegou a julgar um processo afirmando que a competência era da Justiça Federal, o Recurso Extraordinário nº 398.041, de relatoria do Ministro Joaquim Barbosa. Porém, mais recentemente, um processo da relatoria do Ministro Cezar Peluso recolocou a questão em discussão, para nossa apreensão. De fato, o Ministro Peluso, em um julgamento de Turma que afetou o Plenário, entendeu que a competência seria da Justiça Estadual. Crê-se que, os compromissos assumidos pelo Executivo brasileiro obriga todas as instancias judiciais e administrativas do Brasil. Com isso, tem-se o Supremo voltará à boa tendência jurisprudencial que já vinha trilhando. Finalmente aponta o depoente o fato de que os crimes de redução de alguém a trabalhador escravo, hoje já é imprescritível para os padrões internacionais, e o Brasil tem a obrigação de internalizar essa normatização, na medida em que ratificou o Estatuto do Tribunal Penal Internacional, pelo Decreto nº 4.338, de 2003, o qual classifica a escravidão como crime contra a humanidade e estabelece, portanto, a imprescritibilidade de sua competência. Os crimes da competência do Tribunal Penal Internacional são imprescritíveis e se o Estado Brasileiro não punir os criminosos, a qualquer tempo, o Tribunal Penal Internacional poderá suplementarmente fazê-lo. Então, esse é um alerta importante, crê que é um instrumento extremamente válido na luta em prol da erradicação do trabalho escravo. Aqui nós temos apenas de implementar a lei. Aliás, o Brasil tem que aprovar a lei de implementação desse tratado. Já havia um prazo e este prazo se esgotou. Ainda há em tramitação, aqui no Congresso Nacional, o projeto de implementação do Estatuto do Tribunal Penal Internacional. O fato de a lei de implementação não estar ainda aprovada no Brasil não implica que não

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tenhamos aquela responsabilidade internacional. A responsabilidade internacional é diferente, já é cobrada do País essa aplicação.

Luís Antônio Camargo de Melo - Procurador-Geral do Ministério Público do Trabalho.

O depoente inicia suas considerações dizendo que o Ministério Público do Trabalho quer dar uma contribuição efetiva aos debates na CPI que discute o trabalho escravo contemporâneo. Antes, quer deixar absolutamente claro que o Ministério Público do Trabalho tem absoluto respeito pelo Parlamento brasileiro. É, sem dúvida alguma, a instituição que mais se beneficiou do trabalho desenvolvido pelo Legislador Constituinte de 1988. E,em nome do Ministério Público do Trabalho, faz uma homenagem sincera ao Legislador Constituinte de 1988, ao Legislador brasileiro, ao Congresso Nacional, porque entregou ao Ministério Público do Trabalho uma grande missão nessa área do Direito do Trabalho, do Direito Social, de representar os anseios, defender os anseios da sociedade, representar e defender os anseios da sociedade. Antes de 1988, o Ministério Público era uma Procuradoria da Justiça do Trabalho. A partir da nova Constituição, passou a ser o Ministério Público do Trabalho. Desde então, tem trabalhado intensamente, cotidianamente, para fazer cumprir a missão que lhe foi legada pelo Congresso Nacional, em missão constituinte.

O depoente se preocupa bastante com essa discussão sobre o estabelecimento de alguns padrões conceituais em vista de sua prática, ao longo de quase 23 anos de Ministério Público do Trabalho, depois de ser advogado trabalhista no Rio de Janeiro, advogado de sindicatos de trabalhadores, no enfrentamento do trabalho escravo, do trabalho infantil, das questões que envolvem a discriminação e das questões que envolvem a defesa da liberdade sindical e do direito de negociação coletiva. Não à toa, são os princípios definidos pela Organização Internacional do Trabalho como direitos fundamentais do trabalhador. Mas a questão conceitua lhe aflige por conta de inverdades que são apresentadas à sociedade e até mesmo por conta de matérias veiculadas na imprensa, que divulgam situações que não são absolutamente verdadeiras, a exemplo do que se tem publicado na imprensa de que "Aprovada em primeiro turno pela Câmara, a PEC estabelece a expropriação sumária, imediata e sem direito à indenização da propriedade onde for constatado o trabalho escravo". Isso não é verdade, haverá a necessidade do devido processo legal para que isso ocorra. Essas notícias

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prejudicam o trabalho desenvolvido para erradicar o trabalho escravo. Houvesse dizer que o Auditor do Trabalho vai "tomar a fazenda do proprietário", de que o Ministério Público abusa do direito outorgado pelo Legislador Constituinte de 1988. Isso não é verdade. É verdade que há problemas, que serão resolvidos. Não é com divulgação de matéria absolutamente falaciosa e fantasiosa que o País vai avançar. Há muita coisa importante para fazer, não dá para ficar perdendo tempo com coisas desse tipo. Essa preocupação em relação ao conceito se dá em virtude de que se fala que o Ministério Público combate meras irregularidades trabalhistas, de que haverá condenação de ordem criminal, uma persecução criminal, que o proprietário vai perder a propriedade apenas porque o trabalhador fez meia dúzia de horas extras e não recebeu ou porque o trabalhador está sem carteira assinada. Mas isso não tem cabimento.

O Ministério não lida com meras irregularidades trabalhistas. Elas existem sim, mas é óbvio, porque o desrespeito à Consolidação das Leis do Trabalho, repito, é gritante, é cotidiano. Mas não é isso que movimenta O Ministério Público do Trabalho, não é isso que movimenta toda a sociedade brasileira para erradicar o trabalho escravo no Brasil. Essa é matéria do Estado brasileiro, responsabilidade do Estado brasileiro, desde o início de 2003, quando o Presidente Lula apresentou, depois que o Ministério passou 2 anos escrevendo, no Governo Fernando Henrique Cardoso, o primeiro Plano Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo. Plano que foi, diga-se de passagem, 75% cumprido. O seguro-desemprego assegurado aos trabalhadores resgatados é proposta do primeiro plano nacional. Já se está no segundo. Voltando à questão do conceito, o depoente alega que ouve-se dizer que a normativa nacional fere frontalmente a normativa internacional. Outro absurdo. O Brasil assinou e ratificou todos os documentos internacionais e assim, tem que respeitá-los, mas há um diploma internacional que nos toca de muito perto nesse aspecto: é a Convenção nº 29 da Organização Internacional do Trabalho no seu art. 2.°, a Convenção que define o trabalho forçado obrigatório. E lá, no art. 2.°, algumas pessoas desavisadas vêm apontando que a legislação brasileira fere esse dispositivo da Organização Internacional do Trabalho. É absolutamente inverídica essa informação. Esse artigo dispõe que a expressão 'trabalho forçado ou obrigatório' designará todo o trabalho ou serviço exigido de um indivíduo sob ameaça de qualquer penalidade... " Até aí nenhum problema. É fácil de observar isso. A parte final é que traz alguma confusão, a saber: ". ..e para o

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qual ele não se ofereceu de espontânea vontade." A situação que se encontra no Brasil, quando o trabalhador vai, efetivamente, de livre e espontânea vontade, porque ele é enganado pelo "gato", porque são falsas promessas. E é assim que o trabalhador sai de Estados como o Piauí, como o Maranhão, como a Bahia, como o próprio Mato Grosso, Rondônia, enfim, Bahia, Deputado Amauri, e vai para outros Estados e outros municípios trabalhar em outros Estados, em outros Municípios, mas vai enganado. A própria Organização Internacional do Trabalho já esclareceu ao comitê de peritos que essa parte final não pode eliminar a incidência do trabalho forçado obrigatório se houver fraude. E é assim que acontece no Brasil, principalmente mediante fraude. A própria servidão por dívida já é uma forma de enganar o trabalhador. O trabalhador recebe um abono, o trabalhador recebe uma cesta básica para deixar com a família e já se inicia ali a dívida. Houve-se dizer que a definição de trabalho escravo prevista no art. 149 do Código Penal afronta a Convenção 29. Bobagem! O artigo traz quatro condições: o trabalho forçado, objeto da Convenção 29 da OIT; a jornada exaustiva. E nesse ponto, admite, há algumas dificuldades ao observar a jornada exaustiva; a condição degradante - e admite que há má vontade em relação à condição degradante - e a servidão por dívida. O art. 149 do Código Penal não fere, de forma alguma, o dispositivo do art. 2° da Convenção 29 da OIT. O Ministério Público não pretende continuar enchendo o sistema carcerário de gente. Não é o seu propósito. Busca-se uma outra linha de enfrentamento tão eficaz quanto se ameaçar com a prisão, que é a responsabilidade civil. O Ministério está às vésperas do trânsito em julgado da maior condenação que a Justiça do Trabalho já decretou em relação à observação de manutenção de trabalhadores em condições análogas às de escravos. O processo é público. Trata-se do caso Lima Araújo Agropecuária. Esse grupo foi condenado, lá no Pará, a uma indenização de dano real, uma indenização de dano moral coletivo no valor de 5 milhões de reais. Esse valor foi determinado no Tribunal Regional do Trabalho da a8 Região e foi confirmado aqui em Brasília, no Tribunal Superior do Trabalho. É um processo 77 muito antigo, os advogados estão "empurrando" essa questão já há alguns anos. Mas já não há muito mais para recorrer. Há um último recurso em apreciação no Tribunal Superior do Trabalho nos próximos dias, talvez dentro de alguns meses. Esses autos estarão de volta ao Pará para uma execução no valor de 5 milhões de reais, com trânsito em julgado. É a maior condenação que o Ministério Público já obteve. Trata-se de uma ação civil pública apresentada pelo Ministério Público do Trabalho no Pará, na Justiça do Trabalho do Pará.

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Reafirma o depoente que sua preocupação com a questão da conceituação é real, porque há muitas informações desencontradas, e, às vezes, essas informações desencontradas são assim propositadamente, para confundir, para se tenha enorme dificuldade de explicar os conceitos sobre um crime de lesa-humanidade, um crime contra os direitos humanos. O trabalhador não pode ser "coisificado". Na semana passada, assumindo a Presidência do Supremo Tribunal Federal, o Ministro Carlos Ayres Britto, no seu discurso, pontuou: "Nunca, jamais coisificar as pessoas." Nós estamos coisificando os trabalhadores no Brasil. Como ensinou Kant, estamos retirando a dignidade dessas pessoas, transformando-as em coisas. Nós estamos retirando a dignidade e pondo preço nas pessoas. O sociólogo dos Estados Unidos, chamado Kevin Bales escreveu uma obra chocante, intitulada Disposable People. Ele aponta que as pessoas submetidas à condição análoga à de escravo no Brasil são absolutamente descartáveis. Estávamos ali diante de um grave crime contra a humanidade: de manter trabalhadores em condição análoga à de escravo, de retirar dos trabalhadores a dignidade, de pôr preço nesses trabalhadores, de coisificar esses trabalhadores.

Audiência de 07/05/2012

OFICINA DE FORMAÇÃO PARA JORNALISTAS

Tema: Divulgar o tema Trabalho Escravo com a Mídia.

Audiência Pública realizada no dia 5 de maio de 2012

Frei Dominicano Xavier Jean Marie Plassat coordenador da campanha de combate ao trabalho escravo da comissão pastoral da terra.

O depoente disse que como membro da Comissão 78 Pastoral da Terra, vê-se com certa legitimidade para falar do assunto. O ano 70 marcou as primeiras denúncias, promovidas por um bispo que viria a ser o fundador da Comissão Pastoral da Terra, junto com D. Tomás Balduíno, que é Pedro Casaldáliga. Eles vinham do Mato Grosso. As denúncias surtiram na época o mesmo efeito de incredibilidade que hoje parece afetar alguns políticos, e alguns magistrados, e alguns setores da opinião pública, e alguns empregadores. Durante quase 20 anos, 25 anos, exatamente, o Estado brasileiro negou a existência do trabalho escravo. Até 2005, quando aceitaram a ideia de que, sim, o trabalho escravo existe. É a partir daí que nós temos

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realmente uma ação visível de combate ao trabalho escravo. Até então era necessário agir por meio de pressões inclusive de organizações internacionais. E hoje estamos numa situação na qual o trabalho escravo não dá mais para escapar, para dizer "não é". Porque a coisa se tornou visível. Inclusive foi o nome da campanha que durante todos esses anos nós realizamos: De Olho Aberto para não Virar Escravo. A questão é realmente de cegueira, ou de abrir o olho, de se deixar convencer pela realidade e de dar nome aos bois.

Mostrou imagens que, só de início, revelam que essa realidade é atual, presente e impressionante, de norte a sul. São imagens recentes, dos últimos 18 meses, que mostram situações de trabalho escravo em vários cantos do País. No Maranhão, na fazenda do filho do ex-Prefeito de Codó, onde o depoente se encontrava até ontem. Esteve recentemente em Santa Inês, onde eu fez um seminário com lideranças e agentes de pastorais locais de cinco dioceses do Maranhão sobre o combate ao trabalho escravo.

Presenciou o depoente as condições nas quais essas crianças no Maranhão eram tratadas e foi logo para Santa Catarina, onde, na mesma época, no mesmo mês, os fiscais encontraram debaixo de lona preta esses trabalhadores.

Diz que no seu Estado, Tocantins, onde eu mora, nos últimos 12 dias foram libertados 118 trabalhadores em 12 carvoarias espalhadas por vários os cantos do Estado. Essa situação foi encontrada perto de Colinas do Tocantins, a uns 80 quilômetros da Belém-Brasília, trabalhadores no mesmo esquema, de norte a sul, de leste a oeste, aliciados por gato, vindos de bolsões de pobreza do seu próprio Estado ou de Estados remotos.

Enquanto isso, em Tocantins há Parlamentares, ou ex-Parlamentares, tecendo dúvidas sobre o que é e o que não é, se a realidade 79 que é mostrada pela imprensa é a realidade mesmo, sob o pretexto de que ela está se prejudicando a imagem do Brasil. Não deveria ser mostrada, portanto, e não deveria ser qualificada assim.

Essa situação mostra também a diversidade, além de regional, dos setores onde o trabalho escravo é encontrado. Há trabalho escravo na carvoaria, um esquema já muito clássico, na cana-de-açúcar, na pecuária. Na realidade, em todos esses setores, e nas lavouras modernas do agronegócio. Nos dados de 2003 a 2011, verifica-se que a mesma quantidade de trabalhadores foram libertados na pecuária: 10.900 pessoas; na cana-de-

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açúcar, 10.500, o que representa quase um em cada três dos libertados no período. E os outros mais. Foram praticamente 7 mil em outras lavouras e 2.600 no carvão e outras atividades. Por último, o que é revelador é que se encontra o trabalho escravo em novas atividades, em novas regiões. A questão é que o trabalho escravo está pipocando, está renascendo? Pensa o depoente que estamos, na realidade, ainda na fase de descoberta. Se, por exemplo, foi encontrado nas oficinas da Zara, este ano de 2011, muito provavelmente é porque se intensificou a fiscalização a partir de 2009, 2010, com a criação de grupos especializados em São Paulo. E o mesmo pode se dizer de Santa Catarina e Paraná. É muito provável que, se olhar de perto a situação em muitas dessas grandes fazendas, ou em vários Estados onde a fiscalização ainda não se aprofundou, encontram-se situações bem deploráveis.

Então, de norte a sul, em setores variados, a situação é uma realidade incontornável. Há trabalho degradante, embora contornado por alguns que também teriam responsabilidade pelo crime. Por exemplo, o Senador do Tocantins se manifestou contra a dureza dos fiscais. O motivo é que um de seus colegas fazendeiros havia cometido suicídio, por motivos que continuam misteriosos, embora ele mesmo estivesse, todo mundo sabe, numa situação crítica a respeito das condições de trabalho oferecidas a seus próprios empregados.

Então há uma mesma situação sendo vista de forma contraditória. Na verdade, é porque estamos num Brasil esquizofrênico, porque essas situações são encontradas em empreendimentos às vezes moderníssimos. Mas, lá nos bastidores, nos fundos das fazendas, encontram se esses trabalhadores. É em nome desses trabalhadores que o depoente esta na CPI, para defender o direito à dignidade e à liberdade e afirmar que dignidade e liberdade são preceitos constitucionais que nenhum outro pode 80 superar. Nem o da propriedade. É esse o sentido último, profundo, da PEC do confisco da terra.

A informação que eu depoente passou em primeira mão é que, na assembleia dos bispos que se concluiu em Aparecida há alguns dias, 99 bispos assinaram uma petição, do apelo escrito por 18 bispos do Centro Oeste, Goiás, Tocantins e Distrito Federal. Ou seja, 117 bispos, 1 em cada 3, está pedindo a aprovação da PEC do confisco da terra. Trata-se de uma notícia interessante.

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Disse ainda o depoente que há um círculo vicioso, uma coisa que traz questionamentos. Foram libertados praticamente 43 mil trabalhadores desde 1995, quando o Grupo Móvel foi criado; 38 mil desde que o Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo, em 2003, foi lançado - 38 mil escravos. Fala-se que no Brasil há em torno de 25 mil, 40 mil, 60 mil, 100 mil escravos, talvez. Não se sabe. Não há censo para dizer isso. Por que, tendo libertado tantos escravos, não acabamos com o problema? Essa é uma questão séria. Uma parte da resposta está nesta pesquisa. Trabalhadores libertados do trabalho escravo foram interrogados: "Você já passou por essa experiência antes?" Eles responderam, na proporção de 60%, "Sim, eu já passei por essa experiência", Depois foi perguntado: "Naquela vez anterior, você chegou a ser libertado?" Eles responderam "não" em 87% dos casos. O que significa isso? Significa que a vida comum, corriqueira, desse tipo de trabalhador que são chamados de peões, trabalhadores que nem têm nome, é de ir de fazenda em fazenda, de empreita em empreita, é ser submetido a essas situações. Daí também o sentimento de normalidade que perpassa na cabeça de muitos, não somente de seus empregadores, mas também deles mesmos.

E por fim a ideia, que é muito séria, de ver que a chance, a probabilidade de um trabalhador ser libertado talvez seja de uma entre seis ou sete vezes. Portanto, o que se enxerga é a ponta de um iceberg.

Portanto tem-se uma situação que é complexa. Colocou a imagem da Hidra de Lema, animal mitológico que tinha tantas cabeças, que nem um fiscal do trabalho, um procurador do Trabalho, um jornalista guerreiro teriam condições, sozinhos, de acabar com ele, se não houvesse um trabalho conjugado, combinado, integrado, de todos, para acabar com as raízes do problema. E essas raízes é que fazem com que nós estejamos num círculo 81 VICIOSO que vai se reproduzindo sempre. Se não forem tratados depois de libertados esses trabalhadores, nada irá mudar. Esses trabalhadores vão voltar à mesma situação, sem terra, sem educação, sem condição de acesso a trabalhos decentes. E os seus empregadores vão voltar a seus empreendimentos sem punição, sem perder a terra, pagando somente o que eles deveriam ter pago se tivessem obedecido a lei. A ganância, a miséria, a impunidade são justamente as raízes que continuam a promover o trabalho escravo entre nós.

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Recentemente, num encontro da CONATRAE, para planejar, estudou-se quais seriam as condições para se sair do círculo vicioso. Sair do círculo vicioso exige que cada um cumpra o seu papel. Que o Grupo Móvel cumpra o seu papel de forma admirável, a Polícia Federal, os fiscais do Trabalho, os procuradores do Trabalho. Claro se pode fazer sempre mais. Mas depois, o que acontece com esses trabalhadores? Quais são as políticas públicas que os acolhem e aos seus semelhantes, para criar um universo diferente, um horizonte diferente? O que é feito da reforma agrária? E seus empregadores? O que é que vai tirar-lhes definitivamente o gosto de recomeçar?

Esses são justamente os gargalos que são detectamos na situação, que pedem uma ação conjugada. Ações e metas do Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo.

Então chega-se assim a um círculo virtuoso, e esse círculo virtuoso é resultado de políticas públicas e de um empenho coletivo.

Para terminar, disse o depoente que ele não havia falado de coisas impossíveis. Coisas impossíveis seriam quando se encontra, como ele encontrou 2 anos atrás, visitando o norte da índia com organizações parceiras da CPT, combatendo o trabalho escravo, um Estado do tamanho do Piauí com a população do Brasil. Aí sim é complicado. Uttar Pradesh tem 2,5% do tamanho do Brasil e 190 milhões de habitantes, com 2 milhões de escravos. Aí sim erradicar o trabalho escravo é um desafio complexo. Por sinal, as leis de lá que pretendia limitar o tamanho da propriedade falavam em 6 hectares para o tamanho máximo da propriedade.

No Brasil há todas as condições favoráveis para se erradicar o trabalho escravo. É possível, sim. Cada um deve fazer a sua parte. Agora, se empregadores que sabem que há essa situação continuam negando, 82 e se organizações profissionais e políticos que os representem continuam negando, aí sim ela vai continuar por muito tempo.

Renato Bignami - Auditor Fiscal do Trabalho e Secretário de Inspeção do Trabalho, especialista em trabalho escravo do Ministério do Trabalho e Emprego

O depoente lembrou-se de Evaristo de Moraes, jornalista e jurista, o primeiro consultor jurídico do Ministério do Trabalho, na década de 30. Evaristo de Moraes já percorria os ambientes de trabalho da Capital

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Federal, então o Rio de Janeiro, e observava a precarização crescente nos ambientes de trabalhos. Evaristo de Moraes deixou uma obra que é conhecida, que é tida como uma das primeiras obras do Direito Trabalhista brasileiro. Apontamentos de Direito Operário se chama essa obra. Ela é muito interessante, bem curtinha, e é uma compilação de textos jornalísticos. Evaristo acompanhava, ia aos ambientes de trabalho e observava, como jornalista mesmo, o que era a precarização num ambiente de trabalho em que, enfim, formalmente havia acabado a escravidão, mas na prática ainda muitas daquelas relações existiam. Os senhores vão ficar abismados com a atualidade do texto do Evaristo de Moraes. É um texto de 100 anos, de mais de 100 anos, ainda muito atual. Recomendo essa leitura, que é bastante interessante.

O depoente trouxe para a CPI um pequeno kit, um manual de combate ao trabalho escravo, a Instrução Normativa n° 91 e uma publicação conjunta da Secretaria de Inspeção do Trabalho e da Organização Internacional do Trabalho aqui no Brasil sobre a atuação dos auditores-fiscais do Trabalho. Nessa publicação, um dos itens é o combate ao trabalho forçado, o trabalho escravo. A OIT tem reiteradamente elogiado e incentivado o Estado brasileiro em sua atuação no combate ao trabalho escravo.

Lembrou aos parlamentares que toda atividade dos auditores-fiscais do trabalho é completamente vinculada à lei. O auditor não pode fazer nenhum tipo de interpretação subjetiva, ou algo do gênero, e isso várias vezes é mencionado no que tange ao combate ao trabalho escravo, de forma equivocada. O auditor só faz o que a lei determina e o que a lei autoriza que ele faça. Lembra também que toda atividade do Estado brasileiro está baseada na Constituição Federal e que a Constituição Federal traz um tripé de atuação logo no começo, no art. 10 da Constituição Federal, o artigo de entrada, a porta de entrada da Constituição: a República Federativa do Brasil constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos 83 dignidade da pessoa humana, livre iniciativa e trabalho. Esse é o tripé que sustenta o Estado brasileiro, é o tripé que, enfim, norteia toda a atividade dos brasileiros e das brasileiras. Sem esse tripé, fica algo manco, fica falho mesmo, e o Estado Democrático de Direito estaria ameaçado. Então, dignidade humana, trabalho e livre iniciativa, este é o tripé que baseia toda a atividade nossa, do Estado brasileiro.

Lembra ainda o art. 5°: todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se o direito à vida, à liberdade,

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à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes. Destaca que o principal para o trabalho de combate ao trabalho escravo é que "ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante". Então são esses os princípios que norteiam a atividade dos auditores-fiscais do Trabalho sempre que eles estão no ambiente de trabalho e se deparam com o tratamento que é dado ao trabalhador.

Disse que existem diversos instrumentos internacionais que foram ratificados pelo Estado brasileiro. O Brasil, portanto, tem uma responsabilidade, além daquela responsabilidade com os seus cidadãos e com os residentes no território nacional, também uma responsabilidade na comunidade internacional. E é isso o que também norteia OIT, OEA, todas essas instituições e organizações internacionais. E todas observam o Brasil, cada vez mais porque está bastante inserido no ambiente internacional. Aqui haverá Copa do Mundo e Olimpíadas. Ademais, o Brasil é um país que segue crescendo a ritmo acelerado, então chama muita atenção na comunidade internacional. Isso causa uma preocupação muito grande com a comunidade internacional. No momento em que o Brasil ratifica os instrumentos legais internacionais, ele precisa cumprí-Ios.

Em seguida, faz breve citação do Código Penal e seu artigo famoso, o art. 149, com a conceituação mais completa do que seria realmente a redução de um trabalhador à condição análoga de escravo. Mas além do art. 149 há o art. 203, que fala sobre frustração mediante fraude de direitos trabalhistas, e o art. 207, sobre aliciamento do trabalhador. E mais ainda, na sequência, o comando direto que existe dentro do ordenamento jurídico brasileiro para o auditor-fiscal do Trabalho, na Lei nº 7.998, de 11 de janeiro de 1990, a lei do seguro-desemprego. Essa lei determina que aquele trabalhador que vier a ser identificado produzindo, trabalhando sob condições análogas à de escravo deverá ser resgatado dessa situação pelo auditor-fiscal 84 do Trabalho.

Então o auditor-fiscal do Trabalho, sempre que constatar no ambiente de trabalho uma situação de trabalho escravo, tem a obrigação de resgatar esse trabalhador do ambiente de trabalho. Então está completamente vinculada a atividade do auditor-fiscal do Trabalho ao que determina a lei. E o trabalhador resgatado terá então direito a três parcelas do seguro-desemprego e será encaminhado para a requalificação profissional.

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Na sequência, com a finalidade de melhor normatizar essa atividade do auditor-fiscal do Trabalho, a Secretaria de Inspeção do Trabalho editou no ano passado, no dia 5 de outubro de 2011, a Instrução Normativa n° 91. A instrução é bastante clara. Logo em seu art. 1°, diz que "o trabalho realizado em condição análoga à de escravo, sob todas as formas, constitui atentado aos direitos humanos fundamentais e fere a dignidade humana" - lembrem-se de que é um dos pilares da Constituição Federal a dignidade humana - "sendo dever do Auditor-Fiscal do Trabalho colaborar para a sua erradicação". Na sequência: "Serão observados pelos Auditores Fiscais do Trabalho, na fiscalização para a erradicação do trabalho em condição análoga à de escravo, em qualquer atividade econômica urbana, rural ou marítima, e para qualquer trabalhador, nacional ou estrangeiro, os procedimentos previstos na presente Instrução Normativa".

Lembrou que a instrução normativa é um ato administrativo e foi publicada no Diário Oficial e vincula a atividade dos auditores-fiscais do Trabalho. O grande objetivo da instrução normativa é nortear, normatizar, regular e orientar a atividade do auditor-fiscal do Trabalho.

A instrução normativa deixa bastante claro "qualquer atividade" e ''para qualquer trabalhador". Porque se trata de uma questão de direitos humanos, e direitos humanos não têm bandeira, não têm pátria, não têm setor econômico, não têm idade. Qualquer ser humano, todo e qualquer ser humano é sujeito da proteção máxima dos seu direitos humanos fundamentais.

O art. 3° já tem a oportunidade de esclarecer melhor a que o auditor-fiscal do Trabalho precisa atentar no sentido de verificar a ocorrência ou não de trabalho análogo ao de escravo. Basicamente, a grande inspiração é o art. 149 do Código Penal. A instrução normativa não inova, ela apenas esclarece ao auditor-fiscal do Trabalho quais são as hipóteses em que 85 se conclui por trabalho análogo ao de escravo.

No art. 6° tem-se que "O disposto nesta Instrução Normativa é aplicável aos casos nos quais o Auditor-Fiscal do Trabalho identifique tráfico de pessoas para fins de trabalho em condição análoga à de escravo, uma vez presente qualquer das hipóteses previstas nos incisos I a VI do Art.3°, desta Instrução Normativa". Ou seja, tráfico de pessoas para fins de trabalho escravo deve ter o mesmo tratamento pelo auditor-fiscal do Trabalho.

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Na sequência, ainda: "A constatação de trabalho em condição análoga à de escravo ensejará a adoção dos procedimentos previstos no art. 2°-C, §§ 1° e 2°, da Lei n° 7.998 ( ..)",ou seja, resgate e emissão da guia do seguro-desemprego do trabalhador resgatado. E mais. O auditor-fiscal do Trabalho determinará que o empregador ou preposto tome as seguintes providências: a imediata paralisação das atividades, a regularização dos contratos de trabalho, o pagamento dos créditos trabalhistas, o recolhimento de Fundo de Garantia e da Contribuição Social e o cumprimento das obrigações acessórias ao contrato de trabalho - anotação na carteira, emissão de, enfim, alguma comunicação de contratação... E "os autos de infração lavrados em decorrência desta ação descreverão minuciosamente os fatos e serão conclusivos a respeito da existência de trabalho em condição análoga à de escravo ( ..)".

O auditor-fiscal do Trabalho, obviamente, verifica no ambiente de trabalho uma série de infrações que, no seu conjunto, o levam a concluir pela existência de trabalho escravo.

Cada uma dessas infrações deve ser descrita num auto de infração correspondente. É esse o comando da instrução normativa. Em caso de não recolhimento do Fundo de Garantia, deverão ser lavradas as notificações para recolhimento. E em caso de descumprimento das determinações contidas nesses incisos, o auditor-fiscal do Trabalho relatará o fato imediatamente à Chefia da Fiscalização, para que informe a Advocacia-Geral da União, o Ministério Público do Trabalho ou a Defensoria Pública da União, a fim de que tomem as medidas judiciais cabíveis.

O auditor-fiscal do Trabalho não pode tomar medidas judiciais. As medidas do auditor-fiscal do Trabalho são sempre de natureza administrativa. Só esses parceiros podem tomar medidas judiciais, caso haja o descumprimento.

E se houver grave e iminente risco à segurança e saúde do trabalhador deve haver a paralisação desse trabalho.

Mostrar rapidamente algumas fotos que contêm trabalhadores em condições extremamente precárias, indignas, de trabalho, dormindo ao relento, se alimentando de comida podre, bebendo água de gado, sem EPI. Tratado como se fosse uma coisa. Esse é o princípio do trabalho escravo: a degradação, ou seja, tratar esse trabalhador 1 grau a menos do que você trataria o seu semelhante.

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As fotos mostram mais situações bastante precárias de alojamento, instalações sanitárias extremamente precárias. Trabalhador completamente machucado e trabalhando. Falta refeição, lugar para refeição. Agrotóxicos sendo fornecidos sem treinamento, sem equipamentos de proteção. Esse trabalhador pode morrer envenenado, inclusive. Motosserra que não possui freio, que pode provocar a perda da mão do trabalhador.

Mostrou fotos de trabalho escravo urbano, na periferia de São Paulo. É nesses locais que se encontra parte da produção de empresas grandes. Trabalhadoras amamentando e trabalhando por cerca de 18 horas, uma jornada exaustiva, muitas vezes em péssimas condições. Comida mal armazenada, completamente apodrecida. Chuveiro com água fria. Banhos de 2 minutos. Trabalhadores maltratados, ameaçados o tempo todo. Nos famosos caderninhos é encontrada a contabilidade informal dessas empresas, e nessa contabilidade fica bastante esclarecida toda a situação de servidão por dívida. Todas as dívidas que esse trabalhador contrai são descontadas do seu salário, de modo que ele receba pouco mais de 100 reais por mês, no final do mês.

São diversas as situações a mostrar o que é o trabalho escravo contemporâneo. Fiação elétrica completamente exposta, com risco de incêndio. Existem já diversos casos relatados na indústria têxtil de incêndios e morte de trabalhadores queimados trabalhando, produzindo.

Jonas Ratier Moreno - Representante da Coordenadoria Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, do Ministério Público do Trabalho.

Para o depoente, o tema Trabalho Escravo realmente é palpitante. Num dos seus primeiros contatos com esse tema, ainda não acreditava que isso ainda acontecia no nosso País. Mas, depois de assumir as minhas funções, um dos seus primeiros trabalhos foi no front, onde realmente 87 eu pode constatar que o Brasil que nós estávamos pretendendo construir ainda tinha problemas, problemas sérios, com relação ao ponto que o legislador Constituinte elegeu, que é o princípio da dignidade da pessoa humana.

Sobre a conceituação e seus marcos, tem medo do "juridiquês" porque realmente, às vezes, foge à compreensão. O marco internacional é a Convenção nO 29, que trata do trabalho forçado ou obrigatório. O § 2° da Convenção da OIT, trata exatamente do tema: 'Trabalho forçado ou obrigatório"; todo aquele que é exigido do indivíduo sob ameaça de

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qualquer penalidade ou quando ele não se ofereceu de forma espontânea, de espontânea vontade.

E a Convenção 29 é da década de 30, ou seja, ela é já é a Convenção mais antiga. A mais recente, que é a de 1958, a Convenção nº 105, fala que "qualquer membro da Organização Internacional do Trabalho "inclusive o Brasil - "que ratifique a presente Convenção se compromete a suprimir o trabalho forçado ou obrigatório, e a não recorrer ao mesmo sob forma alguma". Esse é um compromisso dos Estados signatários, de tomar ações internas para realmente erradicar o trabalho escravo. É um compromisso do Brasil.

Ainda fala no § 1°: "Como medida de coerção, ou de educação política, ou como sanção dirigida a pessoas que tenham ou exprimam certas opiniões políticas, ou manifestem sua oposição ideológica à ordem política, social ou econômica estabelecida."

Mas o marco nacional de conceituação está hoje no art. 149 do Código Penal, sobre a redução a condição análoga à de escravo, mas há outras duas normas de capital importância também que são os arts. 203, que trata da frustração de direitos trabalhistas assegurados por lei, e 207, que trata do aliciamento, ou seja, daquela falsa promessa da arregimentação do trabalhador, nos Estados de origem, para levá-los ao espaço da exploração, às fazendas, para serem explorados.

O que se prega atualmente é que há uma negação da existência do trabalho escravo no Brasil. E essa negação também de que não existe marco conceitual do que é trabalho escravo no Brasil.

Antes de 2003, a norma legal tratava do seguinte: reduzir alguém a condição análoga à de escravo; pena. Mas não explicava quais eram 88 as condições. Foi uma polêmica a atuação do Grupo Móvel. Os inquéritos policiais ficavam travados exatamente em razão de não se trabalhar numa conceituação mais objetiva.

Em 2003, com a Lei n° 10.803, a conceituação passou a ser muito clara. "Reduzir alguém a condição análoga à de escravo". Aí é que vêm os pontos importantes. Eles não são cumulativos, eles são independentes.

Outro ponto muito importante para pensarmos é que os quatro tipos são independentes e não cumulativos. O primeiro deles é o que

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submete a trabalhos forçados: é o que estabelece a Convenção 29 da OIT. "Ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes". E o último tipo é a questão da liberdade, do direito de ir e vir: "quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída".

Depois, no parágrafo seguinte, estabelece ainda a retenção de documentos: "(.. .)cerceia o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho."

Para aqueles que negam a conceituação, o art. 149 do Código Penal é muito claro. O único ponto que muitos criticam é a inclusão da jornada exaustiva. Mas como jornada exaustiva podemos entender também aquela elástica, que realmente é extenuante, mencionada aqui, de até 18 horas. Mas não precisa ser também aquela jornada elástica, em razão da própria condição de trabalho do trabalhador.

No corte de cana. É um trabalho absolutamente extenuante. O trabalhador que começa o corte às 6 horas da manhã, às 14 horas já não tem mais condições. Condições degradantes significa submeter um trabalhador a morar naqueles barracos, naquelas condições, bebendo da mesma água do gado. A coloração daquela água, até com cor de Coca-Cola, sem qualquer tratamento. Sempre se exige do empregador que ele apresente o certificado de potabilidade da água. E nenhum apresenta. Quer dizer, não há como não entender como condição degradante uma situação dessas. Esse é um ponto que muitos negam: "Mas não. O Brasil foi formado desse jeito. Levas e levas de trabalhadores ajudaram a construir este País nessa situação"

Não se justifica a continuidade dessas condições no mundo de hoje, no Brasil que se pretende no Primeiro Mundo.

Restrição de liberdade por qualquer meio: é outro ponto 89 sobre o qual não se tem dúvida. A retenção daquele trabalhador naqueles locais de difícil acesso, seja pelo documento, seja pela dívida. No caso do urbano, no caso que utilizam com os estrangeiros: "Se o senhor sair, será entregue às autoridades policiais". É uma forma de coerção, para reter aquele trabalhador naquele espaço de exploração.

Então, quando se trata da conceituação, o legislador, ou seja, esta Casa, o Congresso Nacional, deixa muito clara a conceituação de trabalho escravo, fora a conceituação internacional, nas normas da OIT.

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Então, não há dúvida, para aqueles que negam a existência do trabalho escravo, que o legislador brasileiro pátrio consagrou no art. 149 do Código Penal.

Cita um conceito do seu colega do Pará José Claudio Monteiro de Brito Filho: "Podemos definir trabalho em condições análogas à de escravo como o exercício do trabalho humano em que há restrição, em qualquer forma, à liberdade do trabalhador, e/ou quando não são respeitados os direitos mínimos para o resguardo da dignidade do trabalhador".

Aí volta para o primado constitucional do art. 1°, inciso 11\: o princípio da proteção da dignidade da pessoa humana. Quando se submete o trabalhador a uma jornada extenuante, exaustiva, a condições degradantes, não há que se falar que o primado da dignidade da pessoa humana esteja sendo observado pelo explorador.

Aí a atuação do Ministério Público, para a reparação esbara no conflito dignidade/coisificação, o trabalho decente e o contrato de trabalho.

Recentemente, o Ministro Carlos Ayres Britto, no seu discurso de posse, deu a pedra de toque: "Nunca, jamais coisificar as pessoas" - agora, no seu discurso de posse. Então, essa é a pedra de toque hoje do Estado brasileiro, de seus agentes e da sociedade brasileira: pensar num país diferente, construir um país diferente.

E aí o papel dos senhores jornalistas, da imprensa: levar essa informação ao cidadão, de que o Brasil precisa caminhar por novos patamares.

AUDIÊNCIA PÚBLICA REALIZADA NO DIA 8 DE MAIO DE 2012 NO AUDITÓRIO NEREU RAMOS

Nilmário Miranda - Representante da Fundação Perseu Abramo

Segundo o depoente, quando o governo Lula instalou a Secretaria de Direitos Humanos deu continuidade ao plano criado no governo anterior, que já tinha sido amplamente debatido.

O grupo móvel de fiscalização foi fortalecido e criou-se a o cadastro de empregadores, conhecida como "lista suja". Criou-se uma

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articulação com o Instituto ETHOS para que não fossem comercializados produtos das empresas que utilizassem trabalho escravo. Disse que olhando para trás se vê que as multas não foram suficientes para coibir esse tipo de trabalho. Desde o seu primeiro dia na Secretaria, defendeu a adoção da PEC 438/2001 que dispõe sobre a expropriação de terras e propriedades onde forem encontradas pessoas em condições análogas a de escravo. A Constituição Federal já prevê essa possibilidade em caso de cultivo de drogas e foi uma questão de estender essa expropriação a quem utilizasse essa propriedade para trabalho escravo. Esse perdimento do bem é importante e a defesa de direitos humanos vai além da plataforma político-partidária.

Mauro Mamede - Superintendente do Instituto de Previdência do Município de Fortaleza e ex- Ministro de Estado Chefe da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República

O Ministro foi secretário adjunto do Nilmário Miranda e disse que o plano previsto no CONATRAE teve interlocutores importantes e que o MTE e a Polícia Federal fizeram um trabalho muito eficaz na erradicação do trabalho escravo ao resgatar cerca de 25 mil trabalhadores nessa situação. No final de 2005, ao cabo de 10 anos, foram libertados mais de 17 mil trabalhadores. Informou, ainda, que há pessoas poderosas que estão envolvidas nesse crime, tornando-o difícil de combatê-lo. Esse tipo de trabalhador fica também alienado e longe de qualquer tipo de comunicação, além de ficar completamente endividado, não só pela compra de comida, mas também da própria ferramenta de trabalho. Às vezes, o trabalhador não pode sequer sair do local de trabalho, pois os capatazes vigiam em tempo integral o seu movimento. Advogou pela imediata aprovação da PEC

Paulo Vanucchi - Diretor do Instituto Lula e ex-Ministro de Estado Chefe da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República

O Ministro enfatizou a necessidade de votar com urgência a PEC 438/2001. Afirmou que esse tema tende a dividir muito mais do que unir as opiniões. Disse que a Comissão Pastoral da Terra, instituto ETHaS, a aNG Brasil fizeram inúmeras caravanas para chamar atenção da sociedade sobre o trabalho escravo. Durante 500 anos de politica excludente, Ulisses Guimaraes batizou a nossa Constituição Federal de constituição cidadã. Ela foi feita por constituintes comprometidos com causas de direitos humanos. Quem viajava

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para o exterior e viaja hoje sabe a diferença. a Brasil se desenvolve como uma sociedade pluralista e democrática. Espera que se aprove a PEC nesse mês ainda para coincidir com a data da aprovação da Lei Áurea. Ao presidir a CaNATRAE e realizando sessões itinerantes, inclusive com aviões da Força Área Brasileira, fez um trabalho incansável com inúmeras ações bem sucedidas. Elogiou o trabalho da Polícia Federal e da Policia Rodoviária Federal também. Defendeu a ideia de que a CNA deveria ser a primeira a defender o fim do trabalho escravo.

Maria do Rosário - Ministra da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República

A Ministra elogiou o livro publicado pela Secretaria de Direitos Humanos e falou sobre a capacidade do Brasil de planejar o seu próprio futuro. a combate à tortura e a lei de acesso à informação formam parte desse combate ao abuso de direitos humanos. Garantir que o estrangeiro não esteja sujeito ao trabalho escravo é outra iniciativa louvável. Alegou a ministra que o atual Plano de Ação de Direitos Humanos tem dado continuidade aos planos passados.

AUDIÊNCIA PÚBLICA REALIZADA NO DIA 16 MAIO 2012.

Renato Santana - Presidente da Associação dos Magistrados do Trabalho

O depoente disse que o Congresso Nacional é o consultório do povo brasileiro e que toda solução de problema passa pelo 92 estágio da aceitação. A PEC 438 abre uma boa frente de solução do problema. Essa punição com a perda da propriedade já ocorre quando há cultivo de droga. Disse que o Código Penal também tem sido muito criticado com a sua nova redação, a de 2003, em tese, por colocar o nosso sistema jurídico como uma norma penal aberta. Rejeita essa observação. Pelo contrário, pensa que o nosso Código Penal andou bem ao aproximar a jornada excessiva e as condições degradantes também como caracterizadoras do trabalho escravo. Não é uma observação subjetiva, por exemplo, a jornada exaustiva. A CLT traz alguns parâmetros, quando diz que um trabalhador tem direito a uma jornada de 8 horas, podendo ser prorrogada por mais duas e em algumas

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pouquíssimas exceções prorrogadas por mais duas. Ou seja, uma jornada pode alcançar, no máximo, em casos extremos, 12 horas. A partir disso, no meu modo de ver, está caracterizada a jornada exaustiva. Há criticismo de que essa proposta é muito severa. A Constituição Federal diz que a propriedade privada deve cumprir seu papel social. Claro que se há trabalho escravo ela não está cumprindo seu papel social se abriga trabalho escravo. O MTE não tem com fazer todas as fiscalizações for falta de efetivo. Criticam alguns que código penal tem uma norma muito subjetiva, o que não é verdade, pois já existe parâmetro para julgar o que é jornada exaustiva na Instrução Normativa n° 91. Para ANAMATRA há uma PEC 327/2009 que poderia evitar a situação que temos hoje. A punição pelo caminho penal não é a ideal. O juiz do trabalho é quem está mais habilitado as julgar as causas trabalhistas. Hoje existem formas modernas que vão além da clássica imagem de bolas no pé, mas que são tão repulsivas como qualquer outra forma de escravidão.

André Luis Grandizoli - Secretário Adjunto da Secretaria de Relações do Trabalho do MTE

O depoente disse que a secretaria é responsável pela ligação do MTE com os organismos internacionais. Além da legislação nacional, há o quadro legal internacional. A Constituição Federal já tem uma definição para o trabalho em condição análoga ao trabalho escravo quando o alojamento é inadequado, falta de água potável, liberdade de ir e vir, endividamento do trabalhador etc. No Código Penal não ha regra obscura tampouco. O Pacto de San Jose de Costa Rica (convenção de direitos humanos) dá ao Poder Executivo o poder de editar normas repressivas, o que ocorreu com a edição da Instrução Normativa nO 91. A ação fiscal decorre de uma denúncia. Todo auto de infração representa uma infração trabalhista, mas 93 nem sempre caracteriza o trabalho escravo. Disse que essa é a análise do quadro legal. Diante de tudo fora dito, não via mais necessidade de nova legislação além da aprovação da PEC 438/2001.

Sebastião Caixeta - Presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho

Declarou o depoente que o conceito do trabalho escravo tem gerado discussão, mas que gostaria de chamar atenção para a jurisprudência existente. Disse ainda que os compromissos internacionais são importantes, inclusive os decorrentes da convenção de Palermo, que trata da

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criminalidade organizada e do tráfico de pessoas. Há recomendações da relatora da ONU para modificar a competência para dar competência à Polícia Federal para combater o trabalho escravo porque há falta de condenações criminais em comparação à fiscalização trabalhista. Hoje quem tem atribuição em material penal é a justiça federal. A situação do trabalho escravo fica atrás de outras questões como o combate à corrupção. O arcabouço jurídico se completa quando se define o trabalho escravo com a jornada exaustiva e condições degradantes. Os Auditores Fiscais do Trabalho agem dentro do estrito comando da lei, sob pena de o auto de infração ser invalidado, inclusive com o acompanhamento pelo Ministério Público. O perdimento de bens só se dará dentro do devido processo legal e ampla garantia de defesa. As convenções da OIT estabelecem apenas o mínimo. A legislação deve ir além desse mínimo.

AUDIÊNCIA PÚBLICA REALIZADA EM 23 DE MAIO DE 2012.

Pedro Armengol - Diretor da Executiva Nacional da Central Única dos Trabalhadores – CUT

O depoente disse que pretendia abrir o debate do ponto de vista psicológico e questionou: existe no Brasil trabalho escravo ou não? Disse que há gente que ainda dúvida. Situações registradas hoje comprovam que existe. Não propõe um debate maniqueísta. Em todos os setores da sociedade há sempre os bons e os maus e isso ocorre também no mundo empresarial. Os bons empresários não devem se preocupar com a aprovação da PECo Destacar a ausência do estado do ponto de vista da punição, na medida em que foram resgatados inúmeros trabalhadores, mas a única punição foi a multa, que sempre foi menosprezada pelos empresários. Isso não 94 é problema para eles. Aduziu ainda que o problema é hoje predominante na área rural. Na área urbana, os bolivianos configuram o problema maior e já foram encontrados em condição análoga ao trabalho escravo no setor têxtil no Estado de São Paulo. Alegou que os auditores-fiscais do trabalho são heróis e heroínas. O MTE é um dos Ministérios mais sucateados, pois apenas faz de conta que fiscaliza e a culpa não é de seus servidores. Defendeu também que a responsabilização criminal deve ser usada para quem comete esse tipo de crime. Em suas considerações finais, e respondendo aos parlamentares, o depoente disse que lhe preocupava muita a relativização dos números e das situações da existência do trabalho escravo. O número de trabalhadores

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resgatados, 42 mil está muito aquém do que de fato existe, pois foi o que a fiscalização, dentro de suas inúmeras limitações pode constatar. Também não dá para comparar os níveis de renda entre os países em desenvolvimento e os desenvolvidos, como alguns países da Europa. Sobre a questão das condições de trabalho, de críticas à NR 31. Acredita que ela poderá ser aprimorada, sem ser simplificada, a ponto de prescindir das condições mínimas de higiene cotidiana. Cita o caso das usinas de cana de açúcar, de situações no Piauí em que um copo é usado por duzentos trabalhadores. Disse o Depoente: "Isso não é condição análoga à escravidão? Isso é uma sujeira!"

Rosângela Silva Rassy - Presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho.

A Presidente do Sindicato Nacional dos Auditores do Trabalho afirmou que a aprovação da PEC 438/2001 pode influenciar na diminuição do trabalho escravo. Afirmou que o primeiro desafio já foi vencido pelo Governo brasileiro, com o reconhecimento da existência de trabalho escravo no País. Superada essa fase, hoje o desafio é a estruturação dos meios e mecanismos de Estado na prevenção e erradicação do trabalho escravo. Alegou que essa prática de fato existe e os auditores-fiscais do trabalho, junto com os representantes do Ministério Público, são os que primeiro constatam essa triste realidade em nosso País. Dados do Ministério do Trabalho e Emprego revelam que, desde 1995, foram libertados mais de 42 mil trabalhadores no País. Insistiu que a falta da punição criminal, ou seja, a certeza da impunidade só agrava a situação. Para ela, é importante que haja a lista suja na qual se garante o contraditório. O Judiciário faz sempre o controle 95 dos atos antes de o nome constar da lista. Disse que a Justiça Federal é responsável pela parte criminal. Alegou que a terceirização é um problema e quase sempre fraudulenta. Os trabalhadores em geral são contratados pelos gatos ou por empresas sem idoneidade e respaldo econômico e financeiro. As empresas tomadoras de serviço subcontratam para evitar os encargos trabalhistas. Abordou ainda a questão da falta de estrutura para fiscalizar. É preciso aumentar o número de auditores-fiscais, pois hoje há menos de 3 mil fiscais. Já houve 9 equipes móveis e hoje há só 5. Defendeu a atualização das multas trabalhistas, mas deve-se ter em mente que elas não são inibidoras, pois há mais de 12 anos não são atualizadas. Assim, a insuficiência do número de auditores no País, combinada com a falta de punição na esfera penal e os baixos valores das multas trabalhistas, favorece que os maus empresários, os

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mal intencionados fiquem impunes, livres para a prática do trabalho escravo contemporâneo e a consolidação da concorrência desleal. Disse outro problema no combate ao trabalho escravo é a falta de segurança dos auditores fiscais do trabalho, que, além disso, necessitam de condições de trabalho satisfatórias: o aporte com carros, com rádios comunicadores, máquinas fotográficas e filmadoras, equipamentos de informática a fim de que os autos de infração lavrados e as provas apensadas não sejam objeto de qualquer dúvida. É inaceitável que auditores fiscais do trabalho, no desempenho de suas obrigações institucionais, sejam ameaçados frequentemente, corram riscos de morte, sejam assassinados, como já ocorreu com os mártires de Unaí, em 2004, sem que haja punição dos assassinos. Destacou ainda a alegação de insegurança jurídica nos conceitos de trabalho degradante e jornada exaustiva. Muitos criticam o tipo penal aberto adotado pelo Código Penal brasileiro, no art. 149. Para ela, o tipo penal é aberto para alcançar todos os fatos e todas as circunstâncias que agridem, de maneira profunda, a vida, a dignidade do trabalhador nos vários setores da economia nacional. O Estado brasileiro avançou - e muito - ao imputar responsabilidade penal a quem submete trabalhador a jornada de trabalho exaustiva e a condições degradantes. Ou seja, o Estado brasileiro, atendendo à ordem constitucional vigente, aprovada nesta Casa, condena não somente quem cerceia o direito de liberdade, o direito de ir e vir, mas também quem fere a dignidade da pessoa humana. A "coisificação" do trabalhador é condenada no Brasil e deve ser reprimida e punida pelas autoridades. Disse também que as competências dos auditores se restringem à esfera administrativa. As repercussões penais, civis, tributárias competem a outras autoridades, tal qual compete a elas avaliar a relevância e a gravidade do ilícito. Entende que a retirada da jornada exaustiva e das 96 condições de trabalho degradantes do art. 149 do Código Penal implica um retrocesso perverso e perigoso, desfavorável para a classe trabalhadora no País e contrária à própria Constituição brasileira. A proposta do novel Projeto de Lei 3.842/2012 vai contra o objetivo maior que permeia a nossa Constituição Federal, de promoção de justiça social. O Estado brasileiro tem compromisso assumido na esfera internacional para erradicar o trabalho escravo contemporâneo, o trabalho infantil e todas as formas ilícitas de exploração de mão de obra. O direito de propriedade e da livre iniciativa devem desenvolver-se para realizar a justiça social de maneira a garantir a existência digna para todos. O Estado brasileiro condena o trabalho escravo urbano nas confecções, na indústria da construção civil, no transporte; também condena o trabalho escravo rural nas carvoarias, na pecuária, envolvendo trabalhadores

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brasileiros, estrangeiros e indígenas. Reforçou a consistência dos relatórios fiscais da inspeção do trabalho, bem como o contraditório que existe em todo e qualquer ato administrativo. Os procedimentos desenvolvidos pelos auditores fiscais do trabalho são acompanhados de perto por membros do Ministério Público do Trabalho, ressaltando que todos esses procedimentos podem ser submetidos à apreciação do Poder Judiciário, a quem compete garantir a justiça, o equilíbrio no Estado Democrático de Direito. Solicitou que fizesse parte dos documentos desta CPI, um vídeo, que é o relato de uma ação fiscal de combate ao trabalho escravo, que, para ela, é um verdadeiro documento no qual se tem a oportunidade de realmente verificar o que é o trabalho escravo. Nas suas considerações finais, após as falas dos deputados a depoente disse que se observa hoje, infelizmente, a banalização do trabalho escravo. Aquele trabalho escravo que se originou - ou pelo menos foi detectado pela primeira vez - na zona rural hoje está sendo banalizado na área urbana, na construção civil, na área dos transportes, na área das confecções. O trabalho escravo na área urbana sempre existiu, mas agora talvez esteja aparecendo mais. Sobre a definição de trabalho escravo, para a Auditoria Fiscal do Trabalho, essa discussão em nada muda o trabalho atual, tampouco a aprovação da PEC na medida em que há um arcabouço jurídico suficiente para execução das tarefas da fiscalização: a cada infração constatada corresponde a lavratura de um auto de infração. O auditor é um executor. Ele constata a situação irregular, desfavorável para o trabalhador e lavra o auto de infração; e, daí, desencadeia todo o processo. Achou lamentável que se possa fazer algum tipo de comparação entre o trabalho degradante e desemprego, Quando é que um trabalhador vai preferir trabalhar numa situação degradante a ficar desempregado? Os auditores têm condições de afirmar que muitas vezes ele prefere a segunda alternativa. É lamentável que se possa ainda hoje utilizar esse tipo de argumento. Quanto à NR 31, assim como todas as normas regulamentadoras, são amplamente discutidas num debate tripartite. É aberta a consulta pública. São muitas discussões até que seja expedida uma norma.

Em relação ao Estado estar cumprindo o seu papel. Fez uma indagação: Qual a inspeção do trabalho ideal para o Brasil? Há poucos auditores para fiscalizar o cumprimento das normas. Os órgãos do Ministério do Trabalho e Emprego estão sucateados. Foram retiradas as atribuições tradicionalmente exercidas pelo MTE.

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Antônio José Ferreira Filho - Coordenador do Centro de Defesa da Vida e dos Direitos

Disse que o Centro de Defesa tem participado pouco dessas discussões em Brasília, porque atua mais no atendimento às vítimas de trabalho escravo por meio de encaminhamentos, análise dos trabalhadores e das histórias que contam, das fiscalizações, das articulações in loco, das visitas aos Municípios que mais aparecem como locais de aliciamento de trabalhadores no Maranhão. Esse Estado tem a particularidade de ser um dos que mais se fala quando se trata de trabalho escravo, porque é um dos Estados que mais fornece trabalhadores e tem uma grande mão de obra desqualificada diante dos baixos índices de desenvolvimento e também por ser um local de grande criminalidade. Durante esses 15 anos de militância na causa de erradicação do trabalho escravo, o Centro tem identificado situações que deixam seus membros espantados, indignados e assustados. O Maranhão já lançou três planos para erradicar e para combater o trabalho escravo. O Centro já acompanhou o lançamento de dois planos nacionais para erradicação do trabalho escravo, além de dezenas de fóruns de debates sobre o tema. Disse que, em 1996, quando o Sr. Miguel de Souza Rezende, em Imperatriz, escravizou mais de 80 trabalhadores em sua propriedade, se o Governo brasileiro tivesse expropriado ou desapropriado essas terras, não teria havia a reincidência por mais quatro vezes. Em 2001, ele conseguiu se livrar de um dos processos. Se em 2004, o Estado também tivesse expropriado as terras ou desapropriado ou, no mínimo, colocado na cadeia o Sr. Adaílton Dantas de Cerqueira, em Santa Luzia, no Maranhão, ele não teria submetido pela segunda vez um grupo de 48 trabalhadores ao trabalho escravo em sua propriedade, o qual foi condenado recentemente a 14 anos de reclusão. E essa decisão está sendo recorrida. O depoente disse que são muitos os que estão à beira de cometer o crime de trabalho escravo, porque, quando se fala da PEC, há uma rejeição grande com relação à sua efetividade. Ou, então, não conhecem, ou não sabem, efetivamente, da dor, do sofrimento e do que é na prática, realmente, essas condições degradantes e essa jornada exaustiva. Em 2007, o Juiz de Direito do Maranhão, Marcelo Testa Baldochi, submeteu 25 pessoas ao trabalho escravo em sua propriedade, Fazenda Pôr do Sol, sendo que uma delas um adolescente de 15 anos. Ele dizia assim aos trabalhadores: "Quando a fiscalização chegar, se chegar, vocês digam que são posseiros. " Se naquele momento, pelo menos, o Tribunal de Justiça do Maranhão tivesse recebido a denúncia feita pelo Ministério Público Estadual contra o juiz, no

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mínimo não teria ele cometido o crime pela segunda vez, agora em 2011. Esses dados indicam a urgência para se punir as pessoas que cometem esse crime. Entende que a lista suja seja um dos elementos mais efetivos até hoje criado pelo Estado brasileiro para a erradicação do trabalho escravo porque ela trouxe os nomes, os endereços, a feição e o rosto dessas pessoas que cometem esse crime. Entende e espera que a PEC tenha a mesma efetividade que a Lista Suja do Trabalho Escravo. Disse ainda que diminuiu o número de denúncia e é claro que diminuiu a incidência, mas o crime persiste porque as pessoas continuam a escravizar trabalhadores. No Maranhão, o centro identificou 23 Municípios sem políticas públicas para impedir que esses trabalhadores deixem suas cidades, suas famílias e sejam escravizados no Estado do Pará ou do Mato Grosso ou do Tocantins ou mesmo no Estado do Maranhão. Há delegacias da Polícia Federal em Imperatriz e em São Luís. Careceria ter em Buriticupu, em Bacabal, Balsas e em outras regiões do Estado. Nos últimos 15 anos, no Estado do Maranhão, já aconteceram mais de 200 flagrantes do crime de trabalho escravo. Dentro da esfera da Justiça Federal, apenas 20% dessas fiscalizações e desses relatórios conseguem efetivamente se transformar numa ação penal. Hoje hám apenas 70 ações penais que tramitam na Justiça Federal e algumas na Justiça Estadual, no Estado do Maranhão - isso é pouco, diante da quantidade de denúncias e apenas quatro sentenças condenatórias, e algumas sentenças deram pela prescrição do crime. A unidade do INCRA no Maranhão iniciou 60 procedimentos administrativos para analisar a cadeia dominial dessas fazendas, cujos proprietários estão na lista suja. Seria interessante que a CPI pudesse oficiar o INCRA no sentido de saber a conclusão desses procedimentos que foram aberto contra 70 propriedades. Ainda não houve nenhuma que tenha parecer conclusivo para a desapropriação para a reforma agrária. Informou ainda que no Maranhão, de acordo com a Comissão Pastoral 99 da Terra, Movimento dos Sem Terra e FETAEMA, 4.500 famílias estavam acampadas. São bolsões de miséria, cujos trabalhadores acabam sendo alvo fácil dos aliciadores. Na Reserva de Gurupi, que pelo nome já está dizendo que a presença de seres humanos é proibida, é onde acontece o maior foco de trabalho escravo no Maranhão. Gilberto Andrade, que faleceu no ano passado, Sidney Rosa (Secretário do Estado do Pará), Chico do Rádio, Adelson Veras Araújo, todos têm propriedades dentro da Reserva do Gurupi e estão envolvidos com o trabalho escravo, inseridos na Lista Suja. Dentro da Reserva do Gurupi aconteceram os homicídios de Antônio José, Zé Motoqueiro, Negão Maranhense e Piauí. Até hoje as famílias desses trabalhadores aguardam uma

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conclusão desse inquérito que tramita na Polícia Federal, no Maranhão, para que possam saber o que aconteceu e seemr indenizadas. Hoje o maior foco de conflito está dentro dessa reserva. Como é que essas pessoas grilaram essas terras dentro da Reserva do Gurupi? O Sr. Adelson Veras Araújo, em 1991, era "gato" do Gilberto Andrade. Na época ele trazia trabalhadores do Piauí para o Maranhão. Na cidade de Buriticupu, ele, pessoalmente, matou um dos seus trabalhadores porque cobrava uma dívida trabalhista. Em 1995, dentro da sua propriedade, também na reserva, um dos seus trabalhadores também foi assassinado. Agora, em 2008, recente, ele ordenou e mandou matar mais dois trabalhadores dentro da sua fazenda, por conta de cobrança de dívidas. O processo de 1991 prescreveu em junho do ano passado. Então, se o Estado estivesse presente com sua estrutura de repressão nos primeiros crimes que ocorreram, os outros não teriam acontecido. É a ausência do Estado no sentido de reprimir e punir quem comete esse crime, bastante verificada no Estado do Maranhão. Disse que muita coisa mudou no combate ao trabalho escravo, mas é preciso que a PEC seja aprovada e se torne efetiva, como é a lista suja. O Centro recebe ameaças e sofre perseguições e seus membros não querem entrar na lista que, de acordo com a CPT, no Maranhão, já chega a 224 mártires por conflito de terra e outros. Em suas considerações finais, o depoente disse que não podia afirmar se havia uma articulação no Maranhão para que os empregadores utilizem e façam a prática do trabalho escravo. Mas podia afirmar que é visível uma articulação para fugir dessa repressão, da fiscalização. Há uma comunicação entre os empregadores, sejam da indústria do carvão seja da pecuária, que são as duas atividades econômicas no Maranhão em que ainda se registra trabalho escravo. O próprio grupo móvel, quando vai fazer operações na região, seus membros já não mais se instalam em algum hotel da cidade, pois quando se chega no local, não encontram mais trabalhadores, porque foram retirados diante da informação dada aos 100 empregadores nesse sentido. Há também articulação da própria categoria, do sindicato que representa esses empregadores, no sentido de negar a existência do problema, em vez de buscar soluções para resolvê-lo. O Centro é acusado pelo sindicato rural de que não faz uma campanha de conscientização desses empregadores, que não é seu papel.

Laís Wendel Abramo - Diretora do Escritório Brasileiro da Organização Internacional do Trabalho

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Para ela, a OIT considera o trabalho escravo a antítese mais clara da noção de trabalho decente e constitui uma grave violação dos direitos humanos e dos direitos fundamentais no trabalho. É um crime que está previsto na normativa internacional desde e 1930, quando foi adotada a Convenção da OIT sobre trabalho forçado ou obrigatório, a Convenção de nO 29. Essa Convenção define o trabalho forçado como todo trabalho ou serviço exigido de uma pessoa sob a ameaça de sanção e para o qual essa pessoa não se tenha oferecido voluntariamente. A convenção também estabelece que o trabalho forçado deve ser punido como um crime. Não se trata aqui apenas de uma infração à legislação trabalhista. Define também que os Estados Membros da OIT que a ratificarem se comprometem a abolir a utilização do trabalho forçado ou obrigatório, em todas as suas formas, no mais breve espaço de tempo possível. E também que eles assumem a obrigação de assegurar que as sanções impostas pela lei sejam adequadas e rigorosamente aplicadas. A Convenção n° 29 foi ratificada pelo Brasil em 1957, meados do século passado. A definição ampla sobre o trabalho forçado busca abarcar a abrangência mundial do fenômeno, que não se restringe a determinadas regiões, podendo ocorrer em países em desenvolvimento e industrializados, em diferentes tipos de economia, bem como podendo ser imposto por agentes públicos, estatais ou privados. A definição sobre trabalho forçado tem dois elementos fundamentais: primeiro, ameaça de uma pena ou punição, ou seja, a ideia da coação, e, a segunda, ausência de consentimento, a ideia de que o trabalhador não se ofereceu voluntariamente para esse trabalho. Ao serem reunidos, a coação e ausência de consentimento, eles tipificam as diferentes situações de trabalho forçado abrangidas pela convenção. A ideia era justamente ter uma definição ampla que pudesse abarcar as diferentes formas de trabalho forçado, como as formas antigas, como a escravidão colonial ou contemporâneas, como a servidão por dívida e o tráfico de seres humanos. Diante dessa abrangência, cabe a cada país que enfrenta situações 101 específicas de trabalho forçado adotar uma legislação particular que tipifique essa prática, a fim de que ela possa ser penalmente sancionada. É uma questão que está sendo muito discutida nesta Comissão, que é justamente a sanção penal e da impunidade. É necessário assinalar ainda que o elemento de punição que caracteriza o trabalho forçado, segundo a Convenção 29 da OIT, não precisa necessariamente ser uma sanção penal. Pode também representar a perda de direitos e privilégios. E a ameaça, que está prevista na convenção, também pode assumir diferentes formas, como ameaças de morte, violência, confinamento da vítima ou de seus familiares e também punições

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financeiras, como o não pagamento dos salários. São definições amplas. Alegou que, além disso, é necessário entender melhor a questão do consentimento, ou da ausência de consentimento, que seria a outra característica da definição de trabalho forçado na Convenção 29. A Comissão de Peritos da OIT, reunida em 2007, definiu o seguinte: ainda que um trabalho resulte de um acordo livremente estabelecido, as circunstâncias que envolvem esse trabalho podem invalidar o consentimento. O que quer dizer isso? No Brasil, por exemplo, o consentimento é característica especialmente constitutiva do trabalho forçado, uma vez que na maior parte das vezes o trabalhador escravizado segue voluntariamente para o trabalho, o que não o impede de acabar submetido à prática de trabalho forçado. O trabalhador consente porque foi enganado, com falsas promessas. Para que a leis internacionais contemplem essa especificidade, os órgãos supervisores da OIT, como a Comissão de Peritos, têm abordado aspectos ligados à liberdade de escolha, segundo os quais "o consentimento inicial pode ser considerado irrelevante quando obtido por engano ou fraude". O outro instrumento normativo da OIT relativo ao tema é a Convenção sobre a Abolição do Trabalho Forçado nO 105, que foi adotada em 1957 e ratificada pelo Brasil em 1965. A Convenção n° 105 é complementar à 29 e contém a mesma definição essencial de trabalho forçado. Enquanto a Convenção 29 estabelece a proibição geral de incorrer no trabalho forçado em todas as suas formas, a Convenção 105 se preocupa em analisar cinco casos específicos ligados a situações econômicas e políticas vigentes no período em que ela foi adotada (o contexto pós-Segunda Guerra Mundial). Essas formas são o trabalho forçado ou obrigatório como forma de coerção ou educação política, castigo por expressar determinadas opiniões políticas ou por manifestar oposição ideológica à ordem social, política ou econômica vigente; para alegados fins de desenvolvimento econômico; como meio de disciplina no trabalho; como castigo por haver participado em greve e como forma de discriminação racial, 102 social, nacional ou religiosa. É disso que trata a Convenção 105 e ela é complementar à 29. Em 1998, ambas as convenções, foram definidas como fundamentais na Declaração sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho e seu Seguimento, adotada pela OIT naquela ocasião, que também incorpora o tema da eliminação do trabalho infantil, a garantia efetiva da liberdade sindical e de negociação coletiva e a eliminação de todas as formas de discriminação no emprego e na ocupação como direitos e princípios fundamentais no trabalho, estabelecendo que todas os Estados Membros da OIT, havendo ou não ratificado essas convenções e pelo simples fato de serem

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membros da OIT, são obrigados a cumpri-Ia. As Convenções 29 e 105, ou seja, as relativas ao trabalho forçado, são as convenções de mais ampla ratificação de toda as convenções da OIT, que atualmente já são 189. Elas foram ratificadas respectivamente por 175, a Convenção 29, e 172, a Convenção 105, dos 183 Estados Membros da OIT. Ou seja, existe uma ampla adesão internacional a essa normativa. A depoente disse que o papel das legislações nacionais é adequar à legislação internacional às circunstâncias da prática de trabalho forçado presentes no seu território. As legislações nacionais devem tipificar a prática, levando em conta as particularidades econômicas, sociais e culturais do contexto em que ela se insere. Isso é que tornaria essa prática passível de sanção penal, que é algo que está estabelecido na própria Convenção 29. São os estados nacionais, portanto, os responsáveis pelas estruturas jurídica e política contra o trabalho forçado e pela aplicação de leis e a elaboração de mecanismos de coordenação das ações de combate. No entanto, esse tema, como muitos outros relativos ao mundo do trabalho, para que o espírito das convenções seja efetivamente aplicado, precisa do concurso de muitos outros atores da sociedade para que justamente se consiga ter uma resposta que seja ao mesmo tempo preventiva da ocorrência da violação e repressiva e que também seja capaz de processar os criminosos e proteger as vítimas atuais ou potenciais desse crime. A outra questão é a análise que a OIT faz hoje de duas questões básicas. Primeira, que o trabalho forçado é hoje um fenômeno generalizado no mundo. Em vez de ter sido exterminado, erradicado, ele tem crescido no contexto da globalização. E a segunda questão importante é que o Brasil, apesar de todos os problemas que estavam sendo colocados na Comissão, tem sido reconhecido pela OIT como um exemplo mundial de combate ao trabalho escravo. Em 2005, o Diretor-Geral da OIT lançou um relatório global com provas convincentes de que o trabalho forçado é um problema global, que continua afetando quase todos os países e economias. Nesse relatório, a OIT calculou que pelo menos 12,3 milhões de pessoas são 103 vítimas de trabalho forçado no mundo, anualmente. Desses, 9,8 milhões são explorados por agente privados, entre os quais 2,4 milhões são resultado do tráfico de seres humanos. Os 2,5 milhões restantes são trabalhadores forçados a trabalhar para o Estado ou para grupos militares rebeldes. Na América Latina e no Caribe existiriam, segundo essa estimativa, 1 milhão e 320 mil vítimas dos trabalho forçado, dos quais 75% são resultado da exploração econômica dos atores privados; 16%, de trabalho forçado imposto pelo Estado; e 9%, de exploração sexual comercial. Também esse relatório faz um cálculo dos lucros obtidos internacionalmente com a prática desse crime, que

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chegariam a 32 bilhões de dólares por ano. Em 2009, 4 anos depois, o novo relatório global da OIT repete um pouco essa análise, mostrando que o crescimento do trabalho forçado no mundo tinha a ver com o processo de uma globalização "inequitativa", da desregulamentação das instituições do mundo do trabalho e alertando para o perigo de que essa situação aumentasse de intensidade com a eclosão da crise econômica e financeira internacional. O relatório também evidencia que esse crime está presente não apenas nos setores mais atrasados e informais das economias em desenvolvimento, mas também nas cadeias produtivas de grandes e modernas empresas multinacionais, que têm presença no mercado internacional. O relatório diz que, apesar disso, o trabalho forçado pode ser erradicado no mundo. Está no nosso horizonte histórico a erradicação do trabalho forçado no mundo, desde que haja um compromisso sustentado da comunidade internacional, trabalhando em conjunto governos, organizações de empregadores, trabalhadores e outras instituições, e que sejam enfrentadas tanto as suas manifestações mais evidentes quanto as suas causas mais sistêmicas. Nesse ponto, a OIT faz um outro cálculo, que é o chamado custo da coerção, ou seja, quanto os trabalhadores deixam de receber ou até são obrigados a pagar em situações de trabalho forçado. Deixam de receber, porque simplesmente não recebem o salário, quando existe a servidão por dívida, por exemplo, ou recebem salários totalmente insuficientes, abaixo de qualquer mínimo condizente com uma mínima condição de dignidade; ou, inclusive, em situações de tráfico, pagam pelo recrutamento, pelo passaporte, que depois vão fazer com que ele fique numa situação de trabalho forçado. O cálculo é que esse custo da coerção atingiria a cifra de 21 bilhões de dólares ao ano. Outra coisa que a depoente assinalou é que ambos os relatórios globais da OIT enfatizam a importância da inspeção do trabalho nas ações contra o trabalho forçado, ao mesmo tempo em que chama a atenção para as dificuldades que existem na maioria dos países para que a inspeção no trabalho cumpra eficazmente esse papel. E 104 ressaltam a inspeção de trabalho brasileira e os grupos móveis de fiscalização como uma boa prática de combate ao trabalho escravo. A depoente se justificou sobre o que havia dito sobre o Brasil ser reconhecido - apesar de todos esses problemas, inclusive, as denúncias feitas à Comissão - como um exemplo internacional. Primeiro, porque ele reconheceu a existência do problema. Em muitos países isso não acontece e o Brasil, em 1995, reconheceu oficialmente a existência do trabalho escravo ou em condições análogas à escravidão, como é definido pela legislação brasileira, no seu território e começou a desenvolver um trabalho muito importante de

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enfrentamento do problema. Então, esse é o primeiro fato que torna o Brasil uma referência internacional no combate ao trabalho escravo. O segundo aspecto é exatamente o esforço nacional que vem sendo desenvolvido em muitos âmbitos, dirigido ao seu combate efetivo, um esforço que envolve o Governo, outros agentes do Estado, como o Ministério Público, o Ministério Público do Trabalho, a Justiça, no qual o Poder Legislativo tem um papel importantíssimo também, no sentido de um aperfeiçoamento permanente da legislação, que conta com a participação importante de diversas organizações da sociedade civil, inclusive do setor privado. Em seguida falou sobre o Plano Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, da Lista Suja, da CONATRAE. O Pacto Nacional de Combate ao Trabalho Escravo mostra o compromisso do setor privado brasileiro com o combate ao trabalho escravo. São mais de 230 empresas, que representam uma parte importante do PIB brasileiro, que se comprometeram ativamente com a vigilância, com a prevenção e com a erradicação desse problema, não apenas nas suas empresas, mas nas suas cadeias produtivas. Essa também é uma boa prática reconhecida pelos relatórios da OIT. Isso mostra que, realmente, a ocorrência do crime se restringe a um número muito pequeno de maus empregadores e mostra o potencial desses acordos e dessas alianças no sentido da erradicação definitiva do problema. Isso é tão importante que o Brasil, a própria Inspeção do Trabalho e outras instituições brasileiras vêm sendo consideradas e têm sido solicitadas a cooperar, através dos mecanismos de cooperação Sul-Sul, para a disseminação e o compartilhamento dessa prática com outros países da América Latina e de outras regiões do mundo. Em suas considerações finais, rebatendo as críticas de que o número de trabalhadores escravizados no Brasil é baixo, a depoente esclareceu que se o Brasil é comprometido com as questões de direitos humanos, a existência de apenas uma pessoa em condições análogas à escravidão não poderia ser aceita. Então, quando se fala de crimes contra a liberdade e a dignidade, as estatísticas são muito relativas. 105 E inaceitável que haja uma única pessoa no nosso País nessa situação. O trabalho escravo é crime muito difícil de ser mostrado nas estatísticas. Faz-se uma estimativa conservadora. Dentro do conceito de trabalho forçado, está o tráfico de pessoas para exploração sexual comercial, que aqui no Brasil é chamado de trabalho em condições análogas à escravidão - no meio rural e agora aparecendo no meio urbano. Essa situação se refere aos 12,3 milhões de pessoas no mundo e 1,3 milhão na América Latina. Então, não são apenas as pessoas que estão sendo resgatadas pela ação da inspeção do trabalho. O relatório da OIT apresenta cifras relativas. Disse que há países que têm

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problema de trabalho escravo, mas não reconhecem, a exemplo dos Estados Unidos, que não ratificaram a Convenção 29. O papel da OIT é definir normas mínimas para impedir o dumping social não apenas por meio de convenções, mas também mediante a assistência técnica, de fortalecimento dos países, para elevar esse patamar mínimo. O que se quer não é a competição por baixo, é elevar o patamar de todos. Essa é a missão da OIT. As convenções são patamares mínimos e os Estados-Membros, como diz a própria Convenção da OIT, a 29, têm que desenvolver as suas legislações que tornem possível, no caso, tipificar o crime e agir contra o crime. A legislação nacional avança em relação a uma convenção da OIT, e isso em todos os campos. Por exemplo, o trabalho infantil, a idade mínima definida no Brasil vai além do mínimo previsto na Convenção 138; a questão da proteção à maternidade. Então, portanto, não vê contradição entre o Código Penal Brasileiro e as convenções da OIT. Sobre se o Brasil está cumprindo as convenções que ratificou. Existe uma instância na OIT, que é a Comissão de Peritos, na aplicação das normas e recomendações. Periodicamente, o Governo brasileiro é obrigado a enviar relatórios a essa Comissão sobre o estado de implementação das normas. O Governo envia; as organizações de empregadores e trabalhadores também podem enviar; a Comissão de Peritos analisa isso; e verifica se o País está ou não está cumprindo o estabelecido nas recomendações. Então, faz uma sugestão à Comissão: examinar o que a Comissão de Peritos tem dito sobre o Brasil em relação a essas convenções. Essa é a maneira mais institucional de analisar essa questão. Nos relatórios globais do Diretor-Geral da OIT, alguns elementos são colocados como muito positivos, mas existem, por exemplo, duas questões que são colocadas como em que o Brasil precisaria avançar. Uma: em 2005, o relatório do Diretor-Geral reconhece que a aprovação da PEC 438 significaria um avanço legislativo no País. Outro ponto a se avançar seria o combate a impunidade, o que passa pela resolução do conflito de quem é que julga os crimes de trabalho escravo, se é a Justiça Federal ou se é a Justiça 106 Estadual; a questão da prescnçao. E, sem dúvida, há recomendação permanente de fortalecimento da administração do trabalho e dos serviços de inspeção do trabalho. 4. Audiência pública realizada no dia 27 de junho de 2012

Andrea Duca - Diretora de Marketing da Gregory

A depoente disse que a Gregory é uma empresa brasileira de controle familiar dedicada ao comércio de roupas femininas.

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Fundada em 1981 como uma pequena loja, a empresa, graças ao sucesso que fez junto às suas clientes, expandiu suas atividades e hoje conta com uma rede de 83 lojas espalhadas por todo o País, sendo 44 lojas próprias e 43 franqueadas, o que gera hoje mais de mil empregos diretos e indiretos. A empresa, hoje, dedica-se ao comércio varejista; não produz nenhuma peça de roupa. Opera basicamente na compra de coleções, por meio de peças aprovadas, pilotos, pelo departamento de estilo, que interage com os fornecedores e dá algumas sugestões acerca do que espera a respeito dessas peças acabadas. No entanto, todas as etapas de produção são de responsabilidade exclusiva dos fornecedores. A Gregory não compra tecido, aviamento, linha etc. Todo esse processo é de responsabilidade dos fornecedores. Alegou que, no que diz respeito à questão do trabalho irregular, no início do ano passado, a empresa ouviu dizer, pela imprensa, que teriam sido encontradas, pelo Ministério do Trabalho, etiquetas da marca em uma oficina que não fazia parte do quadro de fornecedores. Tomando ciência desse fato por meio da imprensa, a empresa suspeitou de falsificação e ficou no aguardo de alguma comunicação oficial do Ministério do Trabalho, o que não aconteceu. No início desse ano, a empresa recebeu a visita de um auditor fiscal do trabalho, que solicitou à empresa uma lista dos fornecedores, que foi imediatamente fornecida. Parecia que estava tudo correto, até que em março deste ano, a empresa recebeu em sua sede a visita de uma força-tarefa querendo notificar a diretoria a respeito das irregularidades envolvendo trabalho em situação precária. Como os diretores estavam viajando, a notificação foi recebida pela assistente de diretoria, que se comprometeu a comparecer no dia seguinte à Superintendência Regional do Trabalho de São Paulo. Acompanhada de um advogado a assistente compareceu à Superintendência onde foram recebidos por um grupo de auditores-fiscais, uma jornalista, uma procuradora do trabalho e duas defensoras públicas. O grupo 107 havia interditado duas oficinas que estariam utilizando mão de obra boliviana de maneira irregular. A empresa, então, imediatamente informou que não tinha oficina sob sua responsabilidade e que não produzia nenhuma peça que vende. Se havia irregularidade, seria de responsabilidade de um fornecedor, que não estava presente. Nesse momento, a Procuradoria do Trabalho apresentou a empresa um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), que continha diversas exigências, dentre as quais a de providenciar alojamento e retorno dos trabalhadores bolivianos ao seu país. A empresa, entendendo que essas obrigações não lhe cabiam e, orientada pelo advogado, recusou-se a assinar o TAC e se propôs a indicar o fornecedor, que então foi identificado,

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para que solucionasse os problemas apontados pela fiscalização. Na mesma oportunidade, a Gregory propôs assinar um outro TAC, em que se obrigava a adotar maior rigor na seleção dos fornecedores. Os auditores fiscais aceitaram a apresentação do fornecedor, mas recusaram os termos propostos do novo TAC, tendo sido marcada uma reunião para o dia seguinte. No dia seguinte, a Gregory retornou à Superintendência com o fornecedor que havia contratado as oficinas visitadas, o qual assumiu a responsabilidade pelo ocorrido e aceitou a proposta da fiscalização de registrar os trabalhadores encontrados e de reincidir, no mesmo ato, seus contratos de trabalho, pagando a ele todas as verbas rescisórias. Nova reunião, então, foi marcada. O fornecedor compareceu à Superintendência do Trabalho e, na semana seguinte, com os registros de todos os trabalhadores bolivianos indicados pela fiscalização. Após 2 ou 3 semanas desse episódio, apesar de tudo ter sido feito pelo fornecedor, a fiscalização lavrou contra a Gregory 25 autos de infração. No entanto, nenhum auto foi lavrado contra o fornecedor ou contra o dono da oficina. Além disso, no mesmo dia em que foi autuada, a empresa foi procurada por diversos veículos da imprensa, em busca de informações sobre o ocorrido. A Gregory apresentou defesa contra todos os autos de infração, e agora está aguardando o julgamento da defesa, na qual a empresa alegou que era contra qualquer tipo de trabalho em situação precária e que não participava da produção, apenas comercializa as peças produzidas por fornecedores, que contratam as oficinas e dirigem todo o processo produzido. Em resposta às indagações do Deputado Poty a depoente disse que fazia dela as palavras do Deputado Giovanni Queiroz, que abominava qualquer tipo de trabalho precário e que não era do conhecimento da empresa as denúncias de trabalho escravo contra ela relatado pelo deputado. Sobre a pergunta do desconto pelas peças fabricadas com defeito, caso haja falha no fornecimento, a empesa paga os preços de mercado por peça pronta. Não existe hoje na empresa nenhum tipo de multa. 108 Disse que nunca ouviu falar e desconhece qualquer empresa do ramo que trabalha com esse tipo de desconto. Perguntada sobre quais medidas tomou após as autuações, disse que assim que tudo isso ocorreu, a empresa entrou em contrato com todos os fornecedores comunicando-os que não poderiam subcontratar nenhuma outra empresa ou oficina para fazer qualquer tipo de peça encomendada pela Gregory, porque hoje os fornecedores contratados têm suas empresas estabelecidas. Sobre as sugestões da empresa para erradicar o trabalho precário na cadeia de fornecedores, disse que como a empresa compra os produtos, não se vê como pode sugerir algo nesse sentido aos fornecedores, a não ser proibi-los de subcontratar a produção. Sobre o

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TAC que obrigou a empresa de pagar os custos do retorno dos bolivianos, a depoente disse que ele não foi assinado porque não era da responsabilidade da empresa essa oficina. Esse problema foi resolvido pelo fornecedor.

Eduardo Cidade da Silva - Diretor jurídico das Lojas Pernambucanas

Disse o depoente que as Pernambucanas é uma empresa que teve a sua primeira loja inaugurada em 1908, dedicada, naquela ocasião, exclusivamente à venda de tecidos produzidos na cidade de Paulista, no Estado de Pernambuco. Em 1937, foi registrada definitivamente no INPI a marca Casas Pernambucanas, que é hoje uma marca notória. A razão social da empresa, que hoje é Arthur Lundgren Tecidos S.A. - Casas Pernambucanas, se reporta aos fundadores da empresa e é adotada desde 1949. Hoje, com 104 anos de existência, a Pernambucanas tem 283 lojas que estão localizadas nos Estados de Goiás, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Minas Gerais, Paraná, Santa Catarina e São Paulo. A atividade da empresa está voltada para a venda de artigos de cama, mesa e banho, de vestuário, de artigos eletroeletrônicos, eletrodomésticos e utilidades para o lar. Basicamente, a empresa atua hoje na venda de artigos para o lar, envolvendo decoração, tapetes, cortinas e outros artigos semelhantes. Possui hoje aproximadamente 16.500 empregados. Esse quadro varia entre 16.500 e 17 mil empregados. A empresa se orgulha de dizer que parte de seus empregados contam com mais de 25 anos de trabalho na empresa, dentre eles, o depoente. A empresa, normalmente, provê o primeiro emprego e possui uma universidade corporativa, na cidade de São Paulo, pela qual todos esses 16 mil empregados já passaram ou passarão. Em relação à questão que é objeto de investigação da CPI, ao fazer um rápido histórico da sua existência, disse que a Pernambucanas é uma empresa que tem um cuidado muito grande com o 109 trabalho escravo. Por conta disso, há muito tempo, faz constar nos contratos registrados em cartório de títulos e documentos, que é um contrato de adesão, que todos os fornecedores são obrigados a cumprir uma cláusula em que, textualmente, diz que "O fornecedor não poderá se envolver com, ou apoiar, a utilização de trabalho infantil, trabalho forçado ou quaisquer outras formas de exploração ilícita de mão de obra ou, ainda, outras atividades que, de maneira direta ou indireta, atinjam os princípios básicos da dignidade humana, devendo observar todas as normas jurídicas internas e as convenções internacionais que tratam da matéria, em especial as Convenções o/r 29 e 105 - trabalho forçado e trabalho escravo -, Convenção o/r 182 - as piores formas de trabalho

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infantil - e a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, procurando sempre exigir de seus fornecedores a observação desses mesmos princípios." A empresa também é associada da Associação Brasileira do Varejo Têxtil (ABVTEX). E hoje há a exigência de que qualquer fornecedor que queira fornecer para a Pernambucanas se qualifique no Programa de Qualificação de Fornecedores da ABVTEX. Além disso, a empresa tem uma equipe de auditores internos que faz trabalhos de inspeção, dentro de uma determinada programação, de surpresa, em fornecedores. E contrata também trabalhos de certificadores de nível internacional, como a SGS do Brasil e a ABNT. Nos últimos 2 anos, a empresa fez internamente, aproximadamente, 700 trabalhos de auditoria em fornecedores. Apesar de todos esses cuidados, em abril de 2011, a empresa recebeu a notícia de que o MTE havia encontrado, em uma oficina na Zona Norte de São Paulo, trabalhadores em condições degradantes, que estavam costurando roupas que eram identificadas por marcas da empresa, que pensou se tratar de pirataria, que é outro seu problema. Mas, com a sequência dessa situação, a empresa descobriu, através da declaração desses trabalhadores ao MTE, quem era o fornecedor envolvido e notificou imediatamente esse fornecedor, que compareceu ao Ministério, reconheceu essa situação, registrou os trabalhadores e promoveu a rescisão indireta dos seus contratos. Disse afirmar que isso só ocorreu por muita insistência da Pernambucanas. Apesar disso, a empresa foi surpreendida por 43 autos de infração, que dispõem sobre todas as irregularidades que, certamente, aconteciam naquela oficina. A empresa está se defendendo desses autos de infração. Essa denúncia foi levada ao Público do Trabalho e foi proposto a empresa um TAC que exigia que ela reconhecesse a prática desses atos ilícitos que não cometeu. E, por esse motivo, decidiu a empresa não assiná-lo, propondo outro documento ao Ministério Público do Trabalho, que traduz exatamente a postura da empresa 110 em relação a isso, que é a de colaboração com as autoridades no combate dessa situação. O Ministério Público não aceitou, exigindo, efetivamente, que, para que houvesse um acordo, a empresa reconhecesse a prática do ilícito, que ela não faz. Dessa forma, por acreditar nas instituições, a empresa optou por deixar para discutir essa questão no Poder Judiciário. E hoje está respondendo a uma ação civil pública relacionada com essa questão. Alegou que por mais sério, por melhor que seja feito o trabalho de auditoria, de inspeção, por parte de um varejista, de um comerciante, esse trabalho jamais garantirá, por si só, que situações como essa não venham a se repetir. A empresa leva muito a sério esse trabalho, são reuniões semanais, reuniões de avaliação do trabalho dos auditores, reuniões

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das constatações desses auditores, e, diariamente, convoca os fornecedores para conversar e pedir a eles que mudem essa postura. Mas não pode garantir nada, porque lhe falta algo muito importante, que é o poder de entrar nessas empresas e auditar efetivamente toda a sua documentação e constatar a veracidade de todas aquelas informações. A empresa só conta com os documentos que lhes são entregues, com as informações que lhes são repassadas e com a crença na boa-fé desses fornecedores, que nem sempre existe. Conclui que a empresa continua com todos esses trabalhos, voltados para o aperfeiçoamento desse controle. Convidou recentemente 200 fornecedores, selecionados, para que participassem com ela da assinatura do pacto do Instituto Ethos, do pacto contra o trabalho escravo. Foram poucos os que se dispuseram a assinar esse pacto, 17 ou 18 -, mas, durante o mês de agosto, já estão marcadas duas reuniões de esclarecimento, com todos os fornecedores, para que esse pacto seja firmado pelos fornecedores selecionados.

Elio França - Diretor de marketing da C&A

Disse o depoente que a C&A exerce um importante papel para o aprimoramento da cadeia de fornecimento do varejo de moda brasileiro, buscando parceiros mais responsáveis e conscientes. Expôs algumas das experiências da empresa em prol da promoção de boas condições de trabalho na rede de fornecimento. É compromisso da C&A oferecer aos clientes produtos íntegros que são aqueles fabricados de acordo com condições justas e favoráveis de trabalho e respeitadas as questões de saúde, segurança e meio ambiente. Nesse sentido, a empresa tem um rigoroso Código de Conduta para Fornecimento de Mercadorias, que descreve os padrões éticos de conduta comercial, que a empresa entende como fundamentais nas 111 negociações com os fornecedores. Esse código prevê que o fornecedor atenda a requisitos relativos a condições adequadas de trabalho, com base no respeito aos direitos humanos; liberdade de associação de seus empregados; cumprimento de obrigações visando à proteção ambiental; completa divulgação de informações referentes ao processo de produção e unidades subcontratadas; e autorização para a realização de inspeções e monitoramento na sua unidade e de seus subcontratados. O Código de Conduta da C&A é válido no Brasil e nos países onde a empresa tem relações comerciais. O Código é extensivo a todos aqueles com os quais fornecedores da empresa mantenham relacionamento, incluindo empregados, subcontratados e demais

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terceiros. Apesar disso, em 2006, a C&A foi notificada de que um subcontratado de seus fornecedores estava atuando com trabalhadores estrangeiros em situação irregular no País. Na ocasião, a empresa prestou todos os esclarecimentos necessários, bem como colaborou com os órgãos responsáveis, cumprindo até hoje o que lhe foi solicitado. O assunto foi arquivado, e não há mais nenhuma pendência a esse respeito. Em função desse fato, a empresa debruça novamente sobre o tema e trouxe para o Brasil, em 2006, a SOCAM, empresa de auditoria do Grupo C&A, especializada no monitoramento das condições de trabalho da sua rede de fornecimento, implementando um processo inédito e pioneiro no setor de varejo de moda brasileiro, de mapeamento e acompanhamento de toda a cadeia de seus fornecedores de mercadorias, para que os fornecedores de vestuário, calçados e acessórios que abastecem a rede, diretos ou subcontratados, nacionais ou internacionais, sejam monitorados e regularmente auditados, segundo o que está previsto em nosso Código de Conduta. Desde 2006, foram feitas mais de 9.500 inspeções em fornecedores e unidades subcontratadas -oficinas de costura, estamparias, lavanderias, entre outros. Nas visitas, os auditores da SOCAM verificam itens relativos à saúde e à segurança dos trabalhadores, pagamento de salários e jornada de trabalho de acordo com a legislação trabalhista ou a convenção coletiva, ausência de trabalho infantil ou análogo ao escravo, liberdade de associação, não discriminação e não existência de situações de abuso ou assédio no local de trabalho. No total, foi observada uma lista com mais de 110 itens. Ao final das visitas, sempre conduzidas com a orientação de melhorar as práticas, o auditor detalha com o proprietário do local os pontos a serem corrigidos. O não cumprimento das cláusulas do Código de Conduta pode implicar desde um plano de ação corretivo até o cancelamento imediato do contrato de fornecimento. Todas as informações coletadas pelos auditores durante as visitas, que acontecem sem prévio aviso, 112 são registradas em um sistema que permite o acompanhamento da evolução das auditorias. O trabalho da C&A, entretanto, não se resume às auditorias. A empresa vai além: conscientiza, orienta e capacita as empresas fornecedoras. Procura ressaltar a corresponsabilidade de cada fornecedor no processo de melhorar as condições de trabalho no setor e contribuir para eliminar práticas irregulares. Nesse sentido, realiza eventos de conscientização e a capacitação dos fornecedores; desenvolve materiais didáticos com orientação sobre como manter um ambiente de trabalho saudável, e capacita os auditores da SOCAM para que também exerçam esse papel, de agentes de transformação. A experiência com as boas práticas na cadeia produtiva

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permitiu à C&A exercer um importante papel na criação do Programa de Qualificação de Fornecedores para o Varejo da ABVTEX. A C&A tem um treinamento interno voltado à área comercial, responsável pelo desenvolvimento de produtos e negociação comercial, que inclui eventos para discutir o fornecimento responsável e a sustentabilidade. Em 2010, a C&A foi a pioneira mais uma vez e assumiu publicamente, com a assinatura do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo, compromissos com a promoção do trabalho decente. O Pacto é uma iniciativa da sociedade civil, criado com o objetivo de mobilizar o meio empresarial e a sociedade para não comercializar produtos de fornecedores que usem trabalho análogo ao escravo. As ações do Pacto são coordenadas por um Comitê de Monitoramento, formado pelo Instituto ETHOS, Instituto Observatório Social, Repórter Brasil e pela OIT. Disse o depoente que além da decisão da C&A em se tornar signatária do Pacto, a empresa também mobilizou fornecedores para o tema, o que resultou, no primeiro momento, na adesão voluntária de 40 de seus parceiros ao Pacto. O trabalho de sensibilização e formação para o tema é contínuo e permanentemente trata a empresa do assunto com seus fornecedores. Alegou que uma outra frente de atuação da C&A, por meio do Instituto C&A, é a colaboração com a Pastoral do Migrante, com apoio financeiro e técnico, de acordo com a identificação conjunta das principais demandas para o acolhimento e a regularização dos imigrantes no País. Afirmou que é importante ainda ressaltar que a C&A foi, em 2009, a primeira empresa do setor de moda a produzir no Brasil um relatório com base nas diretrizes da transparência da organização internacional Global Reporling Initiative (GRI). Em 2012, lançou o segundo relatório com informações relativas aos anos de 2010 e 2011. Nessa publicação, além do relatório das atividades realizadas, detalhado em mais de 60 indicadores, são destacados os planos de metas da empresa para os próximos anos, nos aspectos de gestão, expansão, recursos humanos, meio ambiente e 113 responsabilidade na cadeia de fornecimento. O detalhamento dessas ações pode ser encontrado no seu Segundo Relatório de Sustentabilidade, disponível no site da C&A. disse que caso fosse do interesse dos membros da CPI, o relatório também estaria disponível ao término da reunião. Por fim, reforçou que tinha certeza de que o aprimoramento na cadeia de fornecimento passa pela atuação conjunta de diversos atores sociais e de outras empresas do setor têxtil e de confecções. Apesar de a C&A fazer parte de um setor extremamente pulverizado e competitivo, está consciente de seu papel e engajada na promoção de boas condições de trabalho na cadeia têxtil. Alinhada com seus valores e crenças,

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está agindo de maneira firme e tomando todas as decisões possíveis para prevenir a ocorrência de trabalho irregular em sua rede de fornecimento. Espera o depoente que as práticas da C&A inspirem o setor para o processo de contínuo aprimoramento das relações de trabalho no Brasil e agradece a oportunidade de apresentar à Comissão as ações que a empresa tem empreendido nessa direção.

Roberto Sampaio - Diretor Comercial das Lojas Marisa

Disse o depoente que a Marisa é uma empresa brasileira que está há mais de 60 anos no mercado. É uma das maiores redes de lojas de vestuário do Brasil. Conta com mais de 340 lojas em todos os Estados do País. Nos últimos dois anos, mais de 3 mil jovens tiveram seu primeiro emprego na Marisa. Emprega mais de 15 mil colaboradores e contribui de forma sólida com o desenvolvimento da economia brasileira e principalmente de algumas regiões afastadas dos grandes centros, pois ao inaugurar uma nova loja, impacta de forma positiva no dia a dia da cidade, trazendo mais postos de emprego e ajudando a aquecer a economia local. Acredita que a empresa construiu ao longo dessa trajetória uma relação de confiança com a sociedade brasileira, com base em princípios éticos e de transparência. Por essa razão, em 2010, quando a empresa foi informada pelo MTE, que um de seus fornecedores estava utilizando oficinas de costura que mantinha estrangeiros em regime irregular de trabalho, ficou surpresa e preocupada, já que esse fato não condiz com a história e compromissos da Marisa, que não endossa qualquer prática trabalhista irregular e repudia relações de trabalho em condições degradantes. Quando ficou sabendo desse fato, a empresa imediatamente começou a aprimorar seus processos de auditorias de fornecedores. No mesmo ano, assinou um TAC se comprometendo publicamente a realizar auditorias mais rigorosas em seus fornecedores, não 114 com o intuito de penas punir, mas também de incentivar nas confecções fornecedoras normas mais profissionais e compatíveis com os valores da Marisa. O resultado desse trabalho está disponível no MTE A Marisa também criou um departamento para realizar auditorias e rastreabilidade dos pedidos enviados aos seus fornecedores. Esse trabalho verifica se o fornecedor, durante a confecção das peças, está utilizando realmente as empresas que foram listadas por ele para realização das auditorias. Ou seja, a Marisa percorreu o caminho das peças para se certificar de que as oficinas contratadas pelos fornecedores mantêm relações de trabalho e emprego de

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acordo com a legislação. Além disso, a Marisa é uma das idealizadoras e fundadoras do programa de qualificação de fornecedores da ABVTEX. Tem orgulho desse projeto, pois considera que ele é um marco no segmento do varejo têxtil no que diz respeito ao monitoramento da origem dos produtos que as empresas do setor comercializam. O programa deu início a um importante processo para a profissionalização da cadeia produtiva têxtil. A iniciativa significa a abertura de novas e boas oportunidades de negócios para quem tiver a qualificação, já que apenas empresas qualificadas pelo programa podem manter contratos com as varejistas que fazem parte da associação. Além disso, a Marisa realiza, desde 2010, mais de 2 mil auditorias em seus fornecedores e seus subcontratados. Disse que ia deixar claro também que a Marisa é uma empresa de capital aberto e está no mais alto nível de governança corporativa na BM&F Bovespa, que corresponde ao Novo Mercado, o que implica um grau elevado de exigências quanto à transparência na gestão da companhia. No início desse ano, a Marisa e um grupo de fornecedores assinaram o Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo, programa que tem como missão implementar ações para que o setor empresarial e a sociedade brasileira não comercializem produtos de fornecedores que usem trabalho em condições degradantes. Acredita que as ações que foram implementadas na Marisa demonstram que a empresa amadureceu muito nesse tema nos últimos anos e é de todo seu interesse contribuir com o trabalho da Comissão, que considera de extrema importância.

João Pedro Fernandes de Castro Braga - administrador da Sociedade Zara

Iniciou seu depoimento dizendo que a participação da Zara do Brasil na CPI, além de cumprir com sua obrigação de transparência, é uma grande oportunidade de contribuir com experiência e soluções para erradicar as práticas trabalhistas que negam aos trabalhadores os seus direitos 115 mais básicos. A empresa tem uma atitude muito clara a este respeito, baseada em três princípios fundamentais de sua política de responsabilidade social: a tolerância zero frente a essas situações, a adoção de planos corretivos imediatos que garantam soluções duradouras e, por fim, o diálogo com os diferentes atores sociais para colocar em prática medidas concretas de melhoria. Em setembro e novembro do ano passado, a empresa teve a honra de participar das audiências das Comissões de Direitos Humanos e de

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Trabalho desta Casa. Nessas ocasiões, pode explicar esses princípios básicos de atuação e o trabalho que está realizando. A empresa entregou a esta Comissão o relatório detalhado com toda a documentação requerida. A Zara Brasil é uma empresa da INDITEX, grupo empresarial internacional que realiza importantes esforços pela melhoria das condições de trabalho de seus fornecedores em todo o mundo. Uma peça-chave desse esforço é o sistema de auditoria e controle das condições de trabalho que monitora regularmente os fornecedores, exigindo o cumprimento do Código de Conduta da INDITEX. As graves irregularidades cometidas por um de seus fornecedores no Brasil, no ano passado, que, lamentavelmente, não foram detectadas a tempo por este sistema de auditoria, exigiram de parte da Zara uma reação imediata. Primeiramente, exigiu do fornecedor que havia burlado os seus controles, de forma consciente e voluntária, a responsabilidade pela reparação urgente dos danos causados às vitimas, e, com isso, seguir o que prevê a legislação brasileira e os seus princípios de responsabilidade social. Também realizou auditorias em todos os seus fornecedores diretos e em suas oficinas de costura com o objetivo de descartar a existência de situações similares. Os resultados foram positivos, reafirmando a confiança da Zara neste conjunto de empresas de confecção com as quais trabalha no Brasil. Disse que, como prova do compromisso coletivo com as boas práticas em matéria trabalhista, em 10 de novembro de 2011, a Zara Brasil e todos os seus fornecedores assinaram o Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo com a presença e apoio da OIT. Os planos de ações corretivos que garantem a extinção de qualquer prática irregular têm destaque entre as premissas da filosofia de Responsabilidade Social da INDITEX e da Zara Brasil. Esse não é o caminho mais simples, mas acredita o depoente, sinceramente, que é o mais correto e o que melhor defende os direitos dos trabalhadores. O compromisso com a melhoria a longo prazo das condições de trabalho envolve a dedicação para encontrar soluções realistas e duradouras. A análise das irregularidades encontradas neste fornecedor e o diálogo com diferentes e diversas instituições relacionadas a este problema levaram a empresa a identificar claramente três 116 âmbitos em que devíamos concentrar a nossa atuação. O primeiro refere-se ao aperfeiçoamento e fortalecimento do sistema de auditoria da sua cadeia de fornecimento, para reduzir ao máximo o risco de um novo caso de violação dos direitos dos trabalhadores. O segundo âmbito da empresa de atuação diz respeito ao conjunto de oficinas de costura que trabalham no setor têxtil. Identificou fragilidades que somente poderão ser superadas com a capacitação desses pequenos empresários, que contribuirá para a erradicação de práticas

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trabalhistas inaceitáveis. E, finalmente, o da integração social e trabalhista dos imigrantes, fazendo com que essa comunidade conheça seus direitos, auxiliando-a, quando necessário, em casos de situação de precariedade. Com esta filosofia e, com base neste plano de ação, estabeleceu a empresa um diálogo com o Ministério Público do Trabalho e com o MTE, que concretizou em ações, em 19 de dezembro de 2011, por meio de assinatura de um TAC cujo conteúdo a empresa se orgulha e acredita ser uma iniciativa inovadora. O TAC é um detalhado plano de ação preciso, realista, mas também comprometido e ambicioso. Em primeiro lugar, o acordo abrange o reforço do controle da nossa cadeia de fornecimento. Aumenta a frequência das nossas auditorias realizadas por auditores independentes e de prestígio, tanto nos fornecedores diretos como nas oficinas de costura. Esse processo permite a empresa identificar com precisão os principais problemas e imediatamente traçar planos de correção, além de dar transparência do trabalho às autoridades. Desde o início da sua aplicação, há somente 6 meses, já foram realizadas 260 auditorias completas, abrangendo 100% da cadeia de fornecedores. Em segundo lugar, quanto à melhoria das condições de trabalho no setor da confecção, a empresa está desenvolvendo um programa piloto de capacitação de oficinas de costura em parceria com a UniEthos, do Instituto Ethos. Para esse programa foi selecionada uma amostra de 10 fornecedores com 100 oficinas, que cria a imagem de 2 mil trabalhadores. Conta a empresa também com a colaboração do SEBRAE na melhoria da gestão do desempenho econômico, garantindo a viabilidade dessas oficinas a longo prazo. O objetivo desse projeto é consolidar uma metodologia de trabalho aplicável a todo o setor e que possa também beneficiar outras empresas. Para complementar esta atuação, iniciou a empresa um programa informativo voltado aos trabalhadores das oficinas de costura com três organizações não governamentais de referência no trato com os imigrantes: a Pastoral, o CAMI e o CDHIC. Até o momento, já foram realizadas mais de 400 visitas informativas às oficinas e 365 pessoas receberam inserção trabalhista. Essas três organizações estão com a Zara também no desenvolvimento das ações de 117 integração trabalhista e social dos imigrantes. Em função disso, a empresa coloca em prática um conjunto de projetos que tem como denominador comum a promoção dos direitos humanos. Tratam-se de ações efetivas, com resultados claros e a curto prazo. Espera também que proporcionem resultados sólidos e duradouros. Entre elas, a criação de um fundo de emergência que já beneficiou mais de 16 mil pessoas com atendimentos das necessidades básicas e atenção jurídica aos imigrantes. Mais de 8 mil imigrantes já se

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beneficiaram de um projeto de auxílio para a regularização migratória; mais de 1.600 pessoas já participaram de outros programas dirigidos à formação da cidadania, formação profissional e a promoção cultural das comunidades imigrantes. Foram também desenvolvidas ações de divulgação e comunicação, como o lançamento de diversas publicações, entre elas o manual sobre a legislação migratória no Brasil e um site informativo. Para o desenvolvimento dessas ações, serão destinados, em 2012 e 2013, mais de 3 milhões e 400 mil reais, dos quais 1 milhão e 300 mil reais já foram investidos nos primeiros 6 meses deste ano. Acredita que esses projetos irão gerar frutos muito positivos. No entanto, a empresa tem um compromisso a longo prazo com a sociedade brasileira. Por isso, continua a desenvolver projetos consistentes para a superação do problema do trabalho precário. Desta forma, já está trabalhando com a Secretaria de Justiça do Estado de São Paulo, no projeto do Poupatempo do Imigrante. Além disso, como parte da colaboração internacional da empresa com a OIT, está trabalhando no desenvolvimento de um programa de promoção do trabalho decente no setor têxtil. Disse ainda que a Zara compra produto de mais de 60 países no mundo. Possui mais de 1.400 fornecedores pelo mundo, e tem essa metodologia de auditoria e de controle em todos os países. Perante o caso detectado pela fiscalização, obriga-se a reforçar e aperfeiçoar esse sistema, com aumento de frequência, com controle preventivo de determinar e validar previamente esse mesmos frutos hoje. Essas boas práticas que a empresa teve no Brasil foram replicadas no exterior.

A AUDIÊNCIA REALIZADA NO DIA 11 DE JULHO DE 2012.

Nessa ocasião, foi designado relator ad hoc o deputado Junior Coimbra.

Luis Alexandre Faria - coordenador do Grupo de Combate ao Trabalho Escravo Urbano, SRTE/SP

O depoente apresentou o relatório de 2008 da Comissão Parlamentar de Inquérito para apurar a exploração de trabalho análogo ao de escravo, dissertando sobre os benefícios trazidos pela Comissão. Àquela época, sua relatora já dizia que fazer aquele trabalho era como "enxugar gelo", Em 2010, finalmente o SRTE conseguiu responsabilizar as Lojas Mariza e houve inúmeras adesões ao Pacto, em que se comprometeram e cumpriram maior fiscalização nas empresas e oficinas de costura, parte da cadeia

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produtiva da empresa. Se antes havia 600 fornecedoras, hoje são muito menos e, portanto, torna-se mais fácil fiscalizar as condições de trabalho. Se as Pernambucanas tivessem feito uma auditagem com deveria ter sido feita, certamente teriam visto as condições subumanas de trabalho. "Não fossem as etiquetas da loja coladas aos casacos, seria difícil acreditar que a empresa, cujo faturamento foi de R$ 4,1 bilhões em 2009, pagava 20 centavos por peça a imigrantes bolivianos que costuravam das 8 da manhã às 10 da noite. Para abastecer a terceira maior rede varejista em vestuário do país, os 16 trabalhadores suavam em dois cômodos sem janelas de 6 metros quadrados cada um". Se a Zara tivesse feito uma auditagem séria, também teria visto as condições de trabalho análogo ao de escravo. Em um dos documentos encontrados, havia a prova de que um trabalhador ganhava R$ 274,00 por mês para trabalhar 15 horas por dia. A Gregory também não fez auditoria como deveria. Um caso horrível relatado foi o de uma mulher que ficou ali trabalhando grávida até o dia do parto e, quando o filho nasceu, ele teve de ficar 10 dias na UTI. A mãe que teve de acompanhar o filho, nada ganhou nesses dias. Há casos muito emocionantes do trabalho feito. Por exemplo, o primeiro documento válido que um boliviano teve foi uma carteira de trabalho brasileira porque desde os 14 anos quando foi traficado para o Brasil, ele sempre viveu com documentos falsos.

Juliana Armede - Membro Titular da Comissão Estadual de Combate ao Trabalho Escravo - COETRAE/SP

Informou a depoente que os trabalhadores são principalmente bolivianos, paraguaios e peruanos. Um dos maiores desafios que tem o COETRAE é o de integrar todos os atores e segmentos envolvidos, o que vai além da fiscalização do MTE. A Secretaria de Justiça do Estado de São Paulo tem um projeto importante em parceria com os consulados dos países de origem dos trabalhadores supracitados que poupa o tempo do imigrante com informações relevantes para o trabalho regular no Brasil.

Luis Carlos Michele Fabre - Procurador do Trabalho da Procuradoria Regional do Trabalho de Osasco/SP

O depoente ressaltou inúmeros problemas de fiscalização das fronteiras brasileiras, aduzindo ainda que não existe orçamento para prover a deportação dos imigrantes irregulares. O que se faz com o imigrante

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irregular? Ele pode sofrer um breve encarceramento, mas vai sair e viver na sociedade como clandestino e sempre com medo. Portanto, a única solução é a regularização migratória. Com essa medida haverá menos lugar e uma demanda reduzida para o trabalho do coiote, do traficante que vive do lucro desse tráfico. O princípio do non-refoulement utilizado nos casos de refúgio está sendo incorporado ao sistema brasileiro como no caso da edição da Instrução Normativa 93 do Conselho Nacional de Imigração (CNI) que prevê a permanecia no País quando o trabalhador é encontrado em trabalho análogo ao de escravo. Recomendou ainda uma ação no sentido de conscientizar a Policia Federal que dê tratamento especial aos trabalhadores encontrados nessa situação. Esses casos não são de simples terceirização, mas de terceirização predatória. Chamou atenção também para a necessidade de haver maiores investimentos na fiscalização trabalhista que tem sido extremamente negligenciada.

Oriana Isabel Jara Maculet - Presidente da ONG Presença da América Latina

O depoente propôs imediatamente a questão de qual o Brasil que queremos ser? Chamou a atenção para o fato de a lei de imigração ser do tempo da ditatura e afirmou que quando há uma boa lei de migração, tem-se uma boa forma de fomentar excelentes relações do trabalho e respeito aos direitos humanos.

Roque Renato Pattussi - coordenador do Centro de Apoio ao Migrante (Cami)

Informou o depoente à CPI que tem quatro visitadores bolivianos, um técnico em segurança do trabalho e outro em regularização migratória. Promovem cursos profissionalizantes para empoderamento das pessoas e de língua portuguesa. Há médicos e cientistas políticos que estão na costura porque não encontram empregos na sua área de formação.

AUDIÊNCIA DA CPI DE 08/08/2012

Dra. Maria Cristina Mattioli Desembargadora do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região

Na audiência pública de 08 de agosto de 2102, a Ora. Maria Cristina Mattioli – Desembargadora do Tribunal Regional do Trabalho da

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15ª Região disse ser muito ligada a essa área temática e ter formação acadêmica, inclusive em Harvard onde aprendeu que se tem de "pensar globalmente e de agir localmente". Insiste a desembargadora que trabalho escravo é uma questão social, em que há o problema de falta de poder de sanção. A Organização Mundial do Comércio (OMC) só sanciona países. A OIT não tem poder de sanção tampouco. Como é uma questão social, tem-se o "dumping social" crescendo como teoria na justiça do trabalho. Alega que o que diferencia o trabalho escravo do passado do de hoje é o contrato de trabalho. Outro problema debatido é o da competência. A desembargadora é a favor de trazer a competência penal para a Justiça do trabalho O outro problema apontado pela expositora é o cultural - o que é degradante aqui não é na índia. Deu como exemplo os tapetes mais caros que são feitos por crianças na índia. Recomendou, ainda, que se deve aclarar a lei de modo a torná-Ia mais objetiva.

Sr. EDUARDO CORRÊA RIEDEL - Presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Mato Grosso do Sul - FAMASUL.

O Depoente fez uma exaustiva análise do Art. 149 do CP que apresenta em suas características básicas as seguintes condutas:

a) A submissão a trabalhos forçados;

b) A restrição de locomoção por meio de dívidas contraídas com o empregador ou preposto;

c) A submissão do trabalhador a jornada exaustiva; e

d) A sujeição do trabalhador a condições degradantes.

Alega que o relatório do Alto Comissariado da ONU para Direitos Humanos sobre as Formas Contemporâneas de Escravidão, suas Causas e Consequências fez críticas ao sistema brasileiro. A sua Relatora Guinara Shahinian disse que a lei brasileira não define trabalho escravo com critérios claros, o que dificulta o trabalho da Polícia Federal em sua investigação, recomendando ao governo brasileiro que se promova uma tipificação penal mais objetiva para se instaurar processos criminais contras os autores desse tipo de crime.

Ressaltou que os autos de infração da IN 91 serão conclusivos, o que preocupa a federação, mas ressalte-se o fato de que há sempre a possibilidade do controle jurisdicional. Chamou atenção, ainda, para

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a fala do presidente do TST que diz que a definição do Código Penal deve ser mais clara. Informou que a Senadora Katia Abreu agendou um encontro com o Presidente do TST depois dessa declaração para que haja um conceito mais objetivo do que seria "trabalho exaustivo e degradante"

O Presidente disse que há diferenças culturais, mas que não se devem aceitar situações absurdas que ofendam a dignidade humana, como é o caso de mulheres que ganham 30 centavos e a roupa é vendida na loja por 90 reais.

O presidente perguntou a opinião dos panelistas sobre a responsabilidade das empresas na cadeia produtiva. A desembargadora Maria Cristina é a favor da responsabilidade do tomador de serviço. Penalizar a empresa que pediu o serviço. Boicote às marcas de Seattle. Isso é uma questão cultural. O tomador do serviço tem de fiscalizar de onde está vindo o seu produto. Como conceituar o trabalho escravo "numerus clausus ou apertus"? A interpretação é natural, mas não pode haver ativismo judicial e jogo de empurra entre o judiciário e o legislativo. Já o Sr. Eduardo Riedel disse que há uma linha muito tênue entre a objetividade e a interpretação Afirmou que a penalização de cadeia produtiva depende sempre do elemento doloso. A percepção do consumidor é muito importante e o boicote faz diferença Ele também é a favor da responsabilidade das empresas e fez ainda as seguintes recomendações:

I - Regulamentação do tema de modo que o trabalho análogo ao de escravo esteja relacionado com o trabalho forçado e com a restrição dolosa da liberdade do trabalhador.

II - Criação de um conceito objetivo do que seria "trabalho exaustivo" e "trabalho degradante", caracterizando-o como outros ilícitos, mas não como trabalho análogo ao escravo. Ex. Inserção desses tipos penais no art. 203 do Código Penal.

AUDIÊNCIA DA CPI DE 21/11/2012

Sr. EDSON KIYOSHI SHIMABUKURO – Representante da Federação Nacional dos Engenheiros

O depoente narrou questões relativas à exploração de trabalhadores em

diversas partes do país, que varia conforme o perfil de atividades de cada

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região, e a atuação dos Engenheiros de Segurança do Trabalho na avaliação

e apuração dessas situações. Afirmou: “Para que a engenharia de segurança

seja realmente atuante é necessária também uma parceria muito grande com o

Ministério do Trabalho e Emprego. O que sempre nos traz dificuldade é a

questão da fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego nesses locais

onde existe trabalho escravo. Muitas vezes, só após as denúncias de

acontecimentos de acidente de trabalho chegarem ao Ministério do Trabalho e

Emprego é que se forma uma comissão para ir lá averiguar as condições.

Então, é questão de que nós e esta Comissão formada, aqui e agora, também

cobremos do Ministério do Trabalho e Emprego uma estrutura com uma

presença constante, com uma fiscalização periódica e muito constante, nesses

lugares onde é denunciado o trabalho escravo. Essa medida de fiscalização

ostensiva, periódica e presencial é muito importante.”

AUDIÊNCIA DA CPI EM 27 DE NOVEMBRO DE 2012

Sr. Carlos Eduardo Polo Sartor - Presidente da Cooperativa dos Produtores Rurais de Vilhena – COOPERVIL

Disse preferir falar na condição de testemunha. Prestou juramento perante a mesa. Depõe na condição de produtor rural. Ele foi fiscalizado na Amazônia. Embora não houvesse ali ótimas condições de trabalho, foram os trabalhadores que escolheram como iriam se alojar. Passará ao presidente cópia da decisão que acreditou nessa versão dos fatos inocentando-o. Os fiscais prejulgaram e atrapalharam a minha vida. Vi meu nome jogado na imprensa como escravagista. Houve desvios sim, mas poucos para servir de base para esse tipo de condenação prévia, manipulada por pessoas que estão no poder. O próprio delegado de polícia que acompanhou os fiscais também disse que não havia entendido bem o código que se aplicava ao senhor. "Estavam tratando o senhor como traficante de droga". Ao perceber que havia essas alegadas ilegalidades, ele indenizou todas as pessoas. Arranjou dinheiro nessa mesma noite para pagar as indenizações. Foi chamado à noite para assinar um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) sem saber do que se tratava. Foi inocentado, julgando improcedente a ação. Disponibilizou, então, cópia do processo criminal para a CPI.

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O Presidente propôs uma breve interrupção para votar os requerimentos. Os requerimentos foram transformados em convocação ao invés de convite.

Requerimentos de quebra de sigilo com informação ao Banco Central do Brasil sobre a lista Suja do Ministério do Trabalho e Emprego foram todos rejeitados.

Sr. ANTÔNIO VALDECIR SPACIARI • Proprietário do Frigorífico NOSTRA no município de Cambira- PR

O Depoente narrou a atuação do grupo de combate ao trabalho escravo do Ministério do Trabalho, que o obrigou a assinar um TAC sobre a presença de trabalhadores paraguaios em situação irregular em seu estabelecimento. Declarou que houve autuações excessivas, como aquela em que os fiscais discutiam o tamanho do vão do beliche ou a falta de bebedouros no local, ou a qualidade da comida, declarando que agua e comida eram as mesmas que ele usava em sua própria casa. Mas o Depoente não criticou a atuação em si dos auditores, porque reconheceu que estava com trabalhadores irregulares com seus documentos de estrangeiro. A reclamação sobre a autuação se focou o fato de ter sido feito alarde na imprensa sobre ele ser autor do crime de redução á condição análoga à de escravo, inclusive se citando para telejornais inverdades, como que havia pessoas trabalhando a 47 centavos a hora. O Depoente se propôs a comprovar perante a CPI todas as declarações e disse que hoje todos os trabalhadores que estavam irregulares já estão regularizados e optaram por continuar trabalhando em sua empresa.

Sr. Henrique Córdova Produtor de Maçã no Município de São Joaquim no Estado de Santa Catarina

Em 2010, precisamente a partir de 12 de abril, quando na minha cidade natal se realizava um evento, inscrito no calendário oficial, o local onde ainda hoje presido, foi visitado por um grupo de fiscais do trabalho. Eles queriam verificar se as condições oferecidas pela empresa não feriam as normas de direito do trabalho.

Como tinha conhecimento de que essas inspeções eram normais, coloquei-me à disposição desses auditores para prestar quaisquer esclarecimentos. Daí começou uma série de atos que feriam os mais básicos elementos de convivência - atiravam pela janela, travesseiros, colchões e até armários. A inspetora disse que não precisava mais de esclarecimento e que

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estava cumprindo seu dever e que iria ate as ultimas consequências. Nesse dia a auditora determinou que a empresa, no prazo de 40 horas, deveria substituir todos os colchões. O empreendimento dista de 30 km de São Joaquim que não dispõe de um comércio capaz de atender tais requisitos. Tentou-se ir até Lages, sem sucesso.

Havia trabalhadores da fronteira com o Uruguai. Os alojamentos de alvenaria deveriam ser ocupados e os trabalhadores procederam como de costume todos os dias.

Os auditores prosseguiam seu trabalho e lavraram 24 autos de infração para enquadrar os requisitos do Código Penal em seu art. 149, além do art. 221 por aliciamento de pessoas para o tráfico de migrantes. A fiscalização culminou com o que a auditora denominou de "resgate dos trabalhadores", determinando, ainda, a vultosa quantia para pagar os empregados. Ofereceu ainda três meses de salário de desemprego. A empresa entrou com um mandado de segurança. Foi concedida a liminar que circula até hoje pela Internet. O Juiz federal mandou arquivar. Mesmo arquivado o inquérito, continuaram circulando as notícias. Depois de 25 anos de atividade politica aqui e como governador de SC nunca sofri tanto constrangimento. Segundo o Depoente "houve abuso de poder por parte dos fiscais e eles marcaram indelevelmente a minha vida profissional".

RELATÓRIO DAS DILIGÊNCIAS

CPI DESTINADA A INVESTIGAR O TRABALHO ESCRAVO – DILIGÊNCIA DILIGÊNCIA SÃO PAULO 19/06/12

A CPI deslocou-se a São Paulo em 19/06/2012 para acompanhar a ação da equipe multidisciplinar de Auditores Fiscais do Trabalho da SRTE/SP, do programa de Erradicação do Trabalho Escravo Urbano chefiada pelo Auditor-Fiscal do Trabalho Luis Alexandre de Faria, Coordenador.

A equipe era integrada pelos seguintes especialistas:

- Auditora-Fiscal do Trabalho Teresinha Aparecida Dias Ramos, Médica do Trabalho;

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- Auditora-Fiscal do Trabalho Sueko Cecilia Uski – legislação do trabalho

- Auditora-Fiscal do Trabalho Carolina Vanderlei Castro de Almeida – legislação do trabalho

- Auditora-Fiscal do Trabalho Letícia Emanuele Bil – legislação do trabalho

Polícia Federal

- Delegado de Polícia Federal Aldo Ayi

- Agentes de Polícia Federal da Superintendência da Polícia Federal em São Paulo

Ministério Público do Trabalho

- Procuradora do Trabalho Célia Regina Stander

- Procuradora do Trabalho Priscila Cavalieri

Secretaria de Estado da Justiça e Defesa da Cidadania de São Paulo – Núcleo de Enfrentamento e Prevenção ao Tráfico de Pessoas e Comissão Estadual para Erradicação do Trabalho Escravo – COETRAE/SP

- Juliana Felicidade Armede – Coordenadora

- Adriana Aparecida Mazagão – Assistente Técnica

Ministério Público do Estado de São Paulo

- Promotora Maria Gabriela Ahualli Steinberg

- Promotor Alexandre Marcos Pereira

Defensoria Pública da União

- Defensora Pública Federal Daniela Muscari Scacchetti

A CPI acompanhou in loco a visita a endereços da cidade de São Paulo, objetos de denúncias a serem apuradas pela equipe.

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No primeiro local visitado, habitação do tipo cortiço ( diversas casa interligadas e com moradores que as dividem coletivamente), a CPI encontrou dezenas de trabalhadores bolivianos, vivendo dentro das oficinas de costura, com instalações elétricas perigosíssimas e precárias. As refeições controladas pelo proprietário, também boliviano, eram feitas ao lado das próprias maquinas de costura, onde também, dormiam os trabalhadores, seus filhos de idades variadas entre 2 e 15 anos, bem como diversos cães. Não havia alojamentos, nem camas, somente colchões no chão.

A equipe começou a buscar provas que caracterizassem a exploração de trabalho escravo por algum empresário, mas logo se constatou que a oficina trabalhava com mercadoria destinada a feiras de marcas falsas, ou seja, o dono trabalhava por conta própria. Foram feitas todas as apurações necessárias, mas não se caracterizou o trabalho escravo, somente irregularidades trabalhistas. O dono foi notificado conforme a lei e a equipe passou a outra denúncia.

Acreditamos ser de suma importância tal registro pela CPI, porque por essa situação se desmentem as críticas infundadas a essas equipes que cuidam do tema do trabalho escravo. O que os Deputados puderam observar é que há um extremo cuidado dos Auditores Fiscais do Trabalho, MP doTrabalho e todos os demais participantes em jamais qualificar como trabalho escravo qualquer atividade que não o seja. Todos são rigorosíssimos em distinguir perfeitamente as simples irregularidades trabalhistas das verdadeiras situações de exploração do trabalho escravo.

A equipe dirigiu-se a seguir a outro endereço, onde se constatou a situação de exploração do trabalho escravo, conforme consta do relatório, de que reproduzimos alguns trechos:

“DADOS GERAIS DA OPERAÇÃO

Período da ação: 12 de junho de 2012 a 05 de julho de 2012

Empregados alcançados:

Homem: 6

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Mulher: 2

Adolescente menor de 16 anos: 0

Adolescente de 16 a 18 anos: 1

Empregados registrados sob ação fiscal:

Homem: 6

Mulher: 2

Adolescente: menor de 16 anos: 0

De 16 a 18 anos: 1

Empregados resgatados:

Homem: 6

Mulher: 2

Adolescente: menor de 16 anos: 0

De 16 a 18 anos: 1

Valor bruto da rescisão: R$ 40.366,91 (Quarenta mil, trezentos e sessenta e seis reais e noventa e um centavos)

(Valor apresentado como devido pela Inspeção do Trabalho):

Valor líquido recebido: R$ 37.379,07 (trinta e sete mil, trezentos e setenta e nove reais e sete centavos)

(Valor efetivamente pago aos trabalhadores)

Contribuições Previdenciárias sonegadas: R$ - Valor recuperado

Contribuições Sociais e ao FGTS sonegadas: R$ - Valor recuperado

Número de Autos de Infração lavrados: 42

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Requerimentos de seguro-desemprego especial emitidos: 8

Número de CTPS emitidas: 8

Termos de Apreensão e Guarda: 1

Termo de Interdição: 2

Número de CAT emitidas: 0

DO PACTO CONTRA A PRECARIZAÇÃO E PELO EMPREGO E TRABALHO DECENTES EM SÃO PAULO-CADEIA PRODUTIVA DAS CONFECÇÕES

Com a finalidade de erradicar toda forma de trabalho precário do setor produtivo têxtil, prestado em condições de servidão ou de degradação do meio ambiente, a Inspeção do Trabalho no Estado de São Paulo vem liderando um processo de diálogo social desde 2007 no qual os diversos agentes sociais relacionados com esse tema tem a oportunidade de expressar seus pontos de vista, influenciando na tomada de decisões por parte das autoridades e também se comprometendo com a erradicação do trabalho precário em uma grande rede social. Esse processo de diálogo social culminou, em julho de 2009, com a ratificação do Pacto Contra a Precarização e Pelo Emprego e Trabalho Decentes em São Paulo – Cadeia Produtiva das Confecções, no qual onze das entidades participantes do processo de diálogo social comprometeram-se a, dentro de suas respectivas áreas de atuação, intensificar as ações no sentido de aumentar a proteção ao trabalhador migrante, dentro do princípio da igualdade consubstanciada na Constituição Federal.

Com o pacto, a Superintendência Regional do Trabalho e Emprego em São Paulo assumiu o compromisso de intensificar as fiscalizações com o objetivo de identificar fraudes ao contrato de trabalho e buscar a sua regularização nos termos da legislação. A Fiscalização do Trabalho de São Paulo exercita, dessa maneira, seu papel de principal articular social e garantidor dos direitos fundamentais do trabalhador, sem deixar de lado sua função orientadora e educadora. Busca-se, assim, aplicar os princípios do Trabalho Decente a um meio ambiente tradicionalmente exposto às mais rígidas e injustas condições impostas por um mercado completamente livre, desregulado, e no qual a informalidade é a principal característica e a desinformação, a principal ameaça aos direitos dos trabalhadores.

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No decorrer do processo de diálogo social, por diversas vezes as comunidades de migrantes sul-americanos denunciaram a presença de trabalho análogo ao de escravo na cadeia produtiva das grandes magazines, pleiteando a sua inclusão no processo de concertação social. As grandes empresas varejistas foram convidadas a aderir ao Pacto no decorrer do primeiro semestre de 2009, por meio de sua associação ABVTEX – Associação Brasileira do Varejo Têxtil. As empresas compareceram na Superintendência Regional do Trabalho e Emprego em São Paulo, apresentaram termos de ajustamentos de conduta firmados com a Procuradoria Regional do Trabalho da 2ª Região, no sentido de monitorarem sua cadeia produtiva de fornecedores, dentro do princípio da Responsabilidade Social Corporativa, mas, no entanto, se negaram a ratificar os termos do Pacto, por meio da ABVTEX. A comunidade de migrantes de ascendência coreana, que possui importante participação na atividade econômica de confecções, é signatária do Pacto, representada pela Associação Brasileira dos Coreanos.

A Operação ora relatada foi realizada no âmbito do Pacto Contra a Precarização pelo Emprego e Trabalho Decentes em São Paulo – Cadeia Produtiva das Confecções. As instituições públicas e da sociedade civil que acompanharam os trabalhos da inspeção do trabalho são membros do Comitê Interinstitucional de Prevenção e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas – CIPETP/SP e da Comissão Estadual para Erradicação do Trabalho Escravo (Coetrae/SP).

Foram cumpridos integralmente os procedimentos contidos na Portaria Mte n. 1153, de 13/10/2003. Portaria Mte n. 1, de 28/01/1997, IN n. 76 de 15/05/2009 e Resolução Condefat n. 306 de 06/11002, e Instrução Normativa SIT-TEM n. 91, de 5 de outubro de 2011. Durante a operação, foram realizadas a interdição da oficina e o resgate dos trabalhadores. As situações encontradas enquadram-se nas hipóteses de degradação do ambiente de trabalho e alojamento, de jornada de trabalho exaustiva, restrição à locomoção dos trabalhadores, servidão por dívida e retenção de salários e tráfico de pessoas para fins de exploração de mão-de-obra, configurando trabalho análogo ao de escravo.

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A auditoria se iniciou com diligência coordenada por auditores-fiscais do trabalho do Grupo de Combate ao Trabalho Escravo Urbano da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego em São Paulo, em 19/06/2012, em imóvel localizado na Av. Sanatório nº 1589 – Jardim Modelo, São Paulo/SP, local destinado a oficina de costura sob gerenciamento de R. P. M., que confeccionava peças de vestuário, para a marca TALITA KUME, de propriedade da empresa Confecções Talita Kume Ltda. Constatou-se que a TALITA KUME utilizou-se de intermediação ilícita de mão-de-obra, mediante “contratação informal” de oficina de costura clandestina para atender à sua demanda de peças de vestuário em número, especificações e prazo de entrega por ela definidos. A Fiscalização constatou que a mencionada confecção é abastecida por peças de vestuário costuradas em oficinas de costura, muitas nem ao menos registradas nos órgãos públicos competentes, cuja aparência externa não denota o funcionamento de estabelecimentos fabris, situadas em áreas residenciais da região metropolitana de São Paulo. Mencionadas oficinas, por sua vez, utilizam-se de mão-de-obra de trabalhadores estrangeiros em situação social vulnerável, muitos deles indocumentados, aliciados em seu país de origem (Bolívia), mantidos em situações de servidão em virtude das dívidas contraídas para custear sua entrada e manutenção no Brasil, submetidos a condições degradantes e jornadas exaustivas, como no caso do local descrito neste Relatório de Fiscalização. Restou claro que a “terceirização” para essa oficina prestou-se exclusivamente a dissimular e encobrir o verdadeiro empregador – CONFEÇÕES TALITA KUME LTDA. – mediante simulação de fornecimento de produtos (roupas), para alocar trabalhadores em atividades permanentes e essenciais ao objeto de seu negócio de forma contínua, mediante dependência econômica, com pessoalidade e subordinação. Afastada licitude do contrato de fornecimento praticado pela autuada, por aplicação dos artigos 2º, 3º e 9º da CLT. A autuada beneficiou-se diretamente da mão-de-obra desses trabalhadores, em atividade inerentes e essenciais ao seu negócio (CONFECÇÃO DE PEÇAS DE VESTUÁRIO). Os 8 trabalhadores diretamente prejudicados exerciam atividade de costura, em condições descritas minuciosamente a seguir, que configuram trabalho análogo ao de escravo, nos termos do artigo 149 do Código Penal Brasileiro e da Convenção nº 29 da Organização Internacional do Trabalho – OIT, ratificada pelo Decreto Legislativo nº 41.721/1957.

DAS CONDIÇÕES DEGRADANTES DE SEGURANÇA E

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SAÚDE DO MEIO AMBIENTE DE TRABALHO

Na oficina de costura inspecionada é possível afirmar que as condições de segurança e saúde são inexistentes, indicando extrema precariedade e sujidade nos locais de trabalho e moradia, que se confundem. As instalações sanitárias são precárias e coletivas, as instalações elétricas estão sobrecarregadas e foram feitas de forma irregular (gatos), os quartos são de tamanho diminuto, sobrecarregados com diversos trabalhadores e seus filhos, mais seus pertences pessoais, alguns colchões encontravam-se rasgados e mofados, e não havia fornecimento de roupas de cama ou de banho, não foi encontrado nenhum extintor de incêndio, as cadeiras são improvisadas, as máquinas de costura não possuem aterramento elétrico e possuem partes móveis, expostas, expondo trabalhadores e principalmente crianças que circulam no ambiente e graves riscos, não há refeitórios, a ventilação e a iluminação são insuficientes e causam grande desconforto aos trabalhadores.

INSTALAÇÕES ELÉTRICAS IRREGULARES

Durante a ação fiscal, os auditores constataram as instalações elétricas do local inspecionados estavam completamente irregulares. A distribuição de tomadas elétricas para a alimentação das máquinas de costura era feita por “varais” de rede elétrica, com a utilização de derivações irregulares de tomadas por meio de dispositivos denominados “benjamim”. Não havia o aterramento elétrico das máquinas de costura, os quadros de distribuição de energia elétrica estavam inadequados para a carga instalada e havia diversas conexões de cabos irregulares feitas por fita isolante ou mesmo fitas adesivas comuns, material inadequado para este tipo de instalação.

Assim, tais instalações estavam em desconformidade com a Norma Regulamentadora 10 – Segurança em Instalações e Serviços em Eletricidade e com a Norma Brasileira NBR 5410/1995 – Instalações Elétricas de Baixa Tensão, gerando risco grave e iminente de incêndio e á segurança e saúde dos trabalhadores, razão pela qual a equipe lavrou termo de interdição do ambiente de trabalho.

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DA FALTA DE PROTEÇÃO DE MÁQUINAS

A Fiscalização constatou a falta de proteção das partes móveis das máquinas de costura, que os trabalhadores realizavam suas atividades próximas de polias e correias das máquinas de costura com risco de amputação de membros, inclusive das diversas crianças que se encontravam no local de trabalho.

DAS CONDIÇÕES DE REFEIÇÃO, ARMAZENAMENTO DE ALIMENTOS, DE HIGIENE E SEGURANÇA DA COZINHA/LOCAL DE REFEIÇÃO

A Fiscalização constatou por toda a área da oficina e locais de alojamento, alimentos deteriorados, alguns vencidos, além de diversos alimentos que deveriam ser guardados em temperatura refrigerada que estavam armazenados fora da geladeira. Os alimentos eram manipulados sem qualquer higiene, o fogão, doméstico, insuficiente para dar conta da quantidade de trabalhadores alojados. O acesso à alimentação era controlado pelo gerente da oficina e sua esposa. A alimentação era pouco variada, consistindo em sopa, arroz, batata e frango.

DAS CRIANÇAS ENCONTRADAS EM SITUAÇÃO DE RISCO

Foram encontradas crianças nos ambientes de trabalho e alojamento. Nenhuma delas foi flagrada trabalhando. Encontravam-se, porém, expostas aos mesmos riscos à saúde e segurança sofridos por pais, agravados pela maior vulnerabilidade das crianças aos agentes físicos, químicos e biológicos abundantes nesse ambiente insalubre e perigoso...

DO ALICIAMENTO – TRÁFICO DE PESSOAS E ESCRAVIDÃO POR DÍVIDA

O aliciamento ocorreu com traços de logro, simulação, fraude e outros artifícios para movimentar mão-de-obra de um lugar para o outro na América do Sul, com o objetivo único de lucro, conseguindo em cima do engano do trabalhador e de sua utilização como mão-de-obra escrava em alguma parte do ciclo produtivo da empresa autuada. Como ponto diferencial desse processo está o “ser” estrangeiro e, consequentemente, mais vulnerável a todo tipo de sujeição, em troca de uma vida minimamente melhor em outra

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parte.

Restou claro o papel do oficinista, R. P. M. como a pessoa responsável pelo financiamento das passagens de alguns deles, vindos da Bolívia. O pagamento da “dívida” para com o oficinista era feito mediante desconto das peças trabalhadas.

Também foi identificada a limitação de sair das oficinas. Essa restrição à liberdade, ainda quando não explícita, mostrou-se efetiva dado o nível de dependência das vítimas para com a figura do oficinista. Todos os aspectos de suas vidas privadas eram controlados pelo oficinista.

Mesmo sendo informados, em idioma espanhol, de que o motivo da inspeção era a regularização de sua situação trabalhista e previdenciária, os trabalhadores aparentavam temor reverencial diante do oficinista, e apreensão: poucos foram os que subsidiaram esta Auditoria com mais informações.

DA TERCEIRIZAÇÃO ILEGAL – RESPONSABILIDADE DO TOMADOR DE SERVIÇOS

“Por primera vez em la historia, la unidad básica de la organización económica no es um sujeto, sea individual (como el empresário o la família empresarial) o colectivo (como la classe capitalista, la empresa, el Estado). Como he tratado de exponer, la unidad es la red, compuesto por diversos sujetos y organizaciones, que se modifica constantemente a medida que se adapta a los entornos que la respaldan y a las estructuras del mercado. Qué une a esas redes? Son alianzas puramente instrumentales y accidentales? Puede ser el cso de redes particulares, pero la forma organizativa de su funcionamento há de tener su propia dimensión. Si no fuera así, la actividad económica se realizaria em um vacío cultural/social, afirmación que pueden sostener algunos economistas ultrarracionalistas, pero plenamente rechazada por los datos históricos.”7

7 CASTELLS, Manuel. La empresa red: cultura, instituciones y organizaciones de la economia informacional. In: CASTELLS, Manuel. La era de la información. Economía, sociedade y cultura. Vol. I: La sociedade red. 6ª edición em español. México, D.F.: Siglo xxi editores, s.a. de c.v., 2005. Pág. 226.

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A empresa autuada é inteiramente responsável pela situada encontrada. O emaranhado de oficinas envolvidas na cadeia produtiva é dirigido pela empresa autuada. A empresa autuada CONFECÇÕES TALITA KUME LTDA. É, na verdade, uma confecção que comanda e exerce seu poder de direção e ingerência de diversas formas sempre no sentido de adequar a produção de peças de vestuário à sua demanda, a seu preço e à sua clientela. Investe em uma marca forte, de grande valor comercial, indicando um fundo de comércio baseado na marca e no estilo que vende. Impõe esse estilo às oficinas responsáveis pela costura, que são, na verdade, meros intermediadores de mão de obra barata e precarizada.

Tais oficinas” sweatshops” funcionam, na realidade, como verdadeiras células de produção da empresa CONFECÇÕES TALITA KUME LTDA., todas interligadas em rede, simulando relação de fornecimento, mas que, na realidade, encobertam nítida relação de emprego entre outros obreiros das oficinas e a empresa autuada. O nível de dependência da CONFECÇÕES TALITA KUME LTDA. Com as oficinas é tão elevado que exige forte gestão de fornecedores (definição de peças, qualidade, preço, logística, etc.)

A CONFECÇÕES TALITA KUME LTDA. Controla toda a definição estilística; sua única costureira remanescente apenas materializa as peças-piloto., e toda a costura é “terceirizada” para oficinas de costura, empregando imigrantes indocumentados, em situação vulnerável e mantidos em condições degradantes. Apesar de ser uma confecção, a CONFECÇÕES TALITA KUME LTDA. não possui nos seus estabelecimentos a capacidade produtiva (máquinas de costura e costureiros) para a produção de suas peças todas as funções realizadas internamente por seus funcionários dizem respeito à atividade de CRIAÇÃO (MODELISTA E ESTILISTA) VENDA (ATACADO) LOGÍSTICA (embalador, motorista, carregador, etc.) e ADMINISTRATIVAS. A única costureira é responsável pela materialização de peças-piloto que vão ser copiadas e reproduzidas pelas oficinas.

Além dos aspectos relacionados à TERCEIRIZAÇÃO ILEGAL DE SUA ATIVIDADE-FIM, ficou evidente o exercício, por prepostos da CONFECÇÕES TALITA KUME LTDA., tanto do gerenciamento da produção quanto de atos típicos de poder diretivo, mediante ordens verbais, fiscalização, controle, adequação das peças, controle de qualidade, cobrança de prazos de

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entrega, etc.

As investigações levadas a efeito na oficina de ROLANDO POMA MENDONÇA apontaram um total dirigismo da CONFECÇÕES TALITA KUME LTDA. sobre todos os aspectos relevantes da produção das peças de vestuário que recebem a marca de propriedade da CONFECÇÕES TALITA KUME LTDA., e que serão, ao final, “compradas” por ela, de seus “fornecedores”, para remessa por atacado, para outros varejistas espalhados pelo país. Esta distorção do contrato de fornecimento, por si só, não representaria a retirada de direitos sociais (precarização trabalhista) ou fraudes a direitos econômicos (concorrência desleal), ajustando-se ao processo de produção da cadeia de vestuário que se convencionou nominar de fast fashion, no qual redes varejistas e atacadistas de roupas fracionam suas plantas produtivas por diversos fornecedores, para flexibilizar e agilizar seu processo produtivo. Contudo, as conclusões da Auditoria apontaram a ocorrência de um padrão de conduta produtiva, controlado pela própria CONFECÇÕES TALITA KUME LTDA., quanto ao abastecimento de suas peças de vestuário, que consistiria na manutenção de várias oficinas de costura que não dispunham de lastro trabalhista, idoneidade econômica ou mesmo constituição formal perante os órgãos públicos. Restou clara a responsabilidade da atacadista CONFECÇÕES TALITA KUME LTDA. na adoção desse padrão produtivo, e prática de dumping social.

A Auditoria verificou que são determinados pela empresa CONFECÇÕES TALIA KUME LTDA., na produção de sua marca própria TALITA KUME, o desenho da peça, as cores, as medidas, o modelo, o material a ser utilizado, a quantidade a ser produzida, o preço de cada peça e o prazo de entrega, sob pena de descredenciamento. A ingerência sobre a produção da oficina é total.

As operações fiscais (industrialização por conta de terceiros) praticadas pela CONFECÇÕES TALITA KUME LTDA. estão totalmente à margem da legislação brasileira, servindo apenas para mascarar a subordinação a que os seus COSTUREIROS estão submetidos. Tal subordinação reticular espelha o contrato-realidade que é o de emprego.

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Da análise da situação trabalhista dessa oficina, responsáveis pela confecção das roupas que, ao final do processo produtivo, serão comercializadas pela varejista/atacadista CONFECÇÕES TALITA KUME LTDA., identificamos que a mão-de-obra utilizada na costura, encontra-se em absoluta INFORMALIDADE e submetida a DEGRADAÇÃO desses ambientes de trabalho.

Percebe-se que a pulverização da produção das peças de vestuário, por diversas oficinas, constituídas formalmente ou não, em processo produtivo que, conforme se demonstra no presente relatório, é controlado em todas as suas fases pela empresa CONFECÇÕES TALITA KUME LTDA.., visa a dificultar o controle e a fiscalização dessa atividade pelos órgãos públicos. A dificuldade de rastreamento contábil da produção facilita, assim, o mascaramento da teia de sub-contratações que leva à precarização das relações de trabalho.

Para se dar um verniz de legalidade a esse processo de precarização da mão-de-obra responsável pela costura, é utilizado o expediente de emissão de Notas Fiscais – Industrialização por Conta de Terceiros, entre a CONFECÇÕES TALITA KUME LTDA. e suas oficinas de costura. No caso da oficina flagrada mantendo trabalhadores imigrantes bolivianos em condições análogas às de escravos, sob gerenciamento do também boliviano R. P. M., as Notas Fiscais eram emitidas em nome do CPF da filha do oficinista.

Em verdade, dada a ausência de movimentação trabalhista e tributária, verificou-se que este expediente visa a mascarar contabilmente a conduta da CONFECÇÕES TALITA KUME LTDA., que se vale de trabalhadores indocumentados e submetidos a condições degradantes de trabalho, resultando no desrespeito aos mais básicos e elementares direitos fundamentais da pessoa do trabalhador contidos no art. 7º da Constituição Federal Brasileira.

A empresa auditada, CONFECÇÕES TALITA KUME LTDA., é inteiramente responsável pela situação encontrada. O emaranhado em rede das oficinas informais, e pessoas físicas envolvidas na cadeia

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produtiva é de inteiro conhecimento e aprovação da empresa autuada. A empresa autuada, na verdade, comanda esse emaranhado, exercendo sobre essas oficinas seu poder de direção e ingerência, de diversas formas sempre no sentido de adequar a produção de peças de vestuário à sua demanda, a seu preço e à sua clientela. Investe em uma marca forte, de grande valor comercial, indicando um fundo de comércio baseado na marca e no estilo que vende. Impõe esse estilo a seus fornecedores, que são totalmente dependentes economicamente dela, constituindo-se, na verdade, em meros intermediadores de mão de obra barata e precarizada.

Tais oficinas são células de produção de uma mesma unidade produtiva, todas interligadas em rede, e sob a direção e controle da CONFECÇÕES TALITA KUME LTDA..

DEPENDÊNCIA ECONÔMICA DA OFICINA EM RELAÇÃO À CONFECÇÕES TALITA KUME LTDA.

Restou claro que a oficina de ROLANDO POMA MENDONÇA não possui a idoneidade empresarial, autonomia e livre iniciativa para figurar como FORNECEDOR INDEPENDENTE DA CONFECÇÕES TALITA KUME LTDA. A TALITA KUME figura como seu “cliente” exclusivo, o que, se não estivéssemos lidando com uma fraude evidente, configuraria monopsônio.

Também ficou evidente que a CONFECÇÕES TALITA KUME LTDA. não é mera COMPRADORA DE ROUPAS NO ATACADO, peças estas pretensamente produzidas de maneira autônoma por seus FORNECEDORES. Tudo o que diz respeito ao processo de criação e produção das peças da marca própria TALITA KUME é ditado pela CONFEÇÕES TALITA KUME LTDA., que não esconde que é uma confecção que define e comercializa um estilo de moda.

Após toda a análise dos locais de trabalho, das entrevistas realizadas e dos documentos auditados, concluímos que a oficina de costura gerenciada por R. P. M. presta serviços de costura, com mão-de-obra submetida a condições semelhantes às de escravos, para a marca TALITA KUME/CONFECÇÕES TALITA KUME LTDA.

Nesse sentido tem-se orientado a jurisprudência dos tribunais especializados ao tratar da subordinação reticular, existente entre

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empregados de empresas “terceiras” e as tomadoras principais dos serviços daquelas:

TRIBUNAL: 3ª Região

DECISÃO: 15 10 2008

TIPO: RO NUM: 01770 ANO: 2007

NÚMERO ÚNICO PROC: RO – 01770-2007-044-03-00-2

TURMA: Quarta Turma

Inteiro Teor

FONTE

DJMG DATA: 25-10-2008 PG: 16

PARTES

RECORRENTE (S): Bruno Cesar de Carvalho

RECORRIDO (S): Rede Eletrosom Ltda.

RELATOR

Convodado José Eduardo de Resende Chaves Júnior

EMENTA

EMENTA: MONTAGEM DE MÓVEIS – VÍNCULO DE EMPREGO – SUBORDINAÇÃO RETICULAR – EXTERNALIZAÇÃO DAS ATIVIDADES ESSENCIAIS EMPREENDIDAS – REESTRUTURAÇÃO DA PRODUÇÃO E PODER EMRPEGATÍCIO – A nova organização produtiva concebeu a empresa-rede que se irradia por meio de um processo aparentemente paradoxal, de expansão e fragmentação, que, por seu turno, tem necessidade de desenvolver uma nova forma correlata de subordinação reticular. O poder de organização dos fatores da produção é, sobretudo, poder, e inclusive poder empregatício de ordenação do fator-trabalho. E a todo poder corresponde uma antítese necessária de subordinação, já que não existe poder, enquanto tal, sem uma contrapartida de sujeição. Daí que é decorrência lógica concluir que o primado da realidade produtiva contemporânea impõe reconhecer a latência e o diferimento da subordinação direta, notadamente quando emerge do processado, tal qual in casu, a inserção do trabalhador na realidade produtiva do empregador, impondo o reconhecimento da existência do liame empregatício havido entre as partes quando imprescindível o mister

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desenvolvido à consecução dos objetivos econômicos empresários

DECISÃO

DECISÃO: A Turma, à unanimidade, conheceu do recurso interposto pelo reclamante, bem como das contra-razões empresárias; no mérito, sem divergência, deu-lhe provimento para, reconhecendo a existência do vínculo compreendido entre as partes no período compreendido entre 17.04.2006 a 25.10.2007, determinar o retorno dos autos à origem para julgamento dos pedidos consectários formulados, como se entender de direito.

DUMPING SOCIAL

O enunciado nº 4, aprovado na 1ª Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho da Anamatra – Associação dos Magistrados Trabalhistas define a expressão americana “dumping social” da seguinte maneira: “As agressões reincidentes e inescusáveis aos direitos trabalhistas geram um dano à sociedade, pois com tal prática desconsidera-se, propositalmente, a estrutura do Estado social e do próprio modelo capitalista com a obtenção de vantagem indevida perante a concorrência. A prática, portanto, reflete o conhecido “dumping social”, motivando a necessária reação do Judiciário trabalhista para corrigi-la. O dano à sociedade configura ato ilícito, por exercício abusivo do direito, já que extrapola limites econômicos e sociais, nos exatos termos dos arts. 186, 187 e 927 do Código Civil. Encontra-se no art. 404, parágrafo único do Código Civil, o fundamento de ordem positiva para impingir ao agressor contumaz uma indenização suplementar, como, aliás, já previam os artigos 652, “d”, e 832, § 1º, da CLT”.

No caso da inspeção fiscal da CONFECÇÕES TALITA KUME LTDA., verifica-se que a empresa resiste ao cumprimento dos seus deveres mínimos em relação aos trabalhadores que subcontrata, excluindo-os do mercado formal de trabalho, frustrando-lhes, através da utilização do SWEATING SYSTEM, os direitos trabalhistas e previdenciários, entregando-os à própria sorte, após explorar cotidianamente a sua força de trabalho.

Esta forma de super-exploração da força de trabalho, negando aos trabalhadores direitos laborais e previdenciários mínimos, dá-se com intuito de maximizar os lucros, atingindo uma redução do preço dos produtos, caracterizando o dumping social e uma vantagem indevida no mercado e levando à concorrência desleal.

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Essa conduta, que objetiva a redução dos custos de produção, acaba desestimulando o cumprimento das normas trabalhistas, gerando um círculo vicioso de desrespeito aos direitos sociais, constitucionalmente garantidos.

Além do mais, práticas como essas geram dano à sociedade, configurando exercício abusivo do direito, uma vez que extrapolam os limites econômicos e sociais.

DAS PROVIDÊNCIAS ADOTADAS PELA EQUIPE DE AUDITORES FISCAIS DO TRABALHO DA SRTE/SP

No mesmo dia da diligência, a equipe responsável pela operação dirigiu-se à sede da CONFECÇÕES TALITA KUME LTDA., no Bom Retiro, para dar continuidade às investigações e exigir formalmente dos responsáveis a tomada de medidas para atendimento emergencial aos trabalhadores. A fiscalização entregou aos responsáveis a Notificação formal das medidas que deveriam ser imediatamente tomadas:

Esta equipe promoveu o resgate dos trabalhadores da condição em que se encontravam, determinando a rescisão indireta dos contratos de trabalho (por justa causa, por culpa do empregador), expedição, anotação e devolução das Carteiras de Trabalho, e pagamentos das verbas de natureza rescisória, bem como emissão dos requerimentos de Seguro-Desemprego do Trabalhador Resgatado.

Alertamos às demais autoridades que receberem o presente relatório, notadamente as que compõem o Comitê de Prevenção e Enfrentamento ao Trafico de Pessoas e Comissão Estadual de Erradicação do Trabalho Escravo, quanto à necessidade de acompanhamento do presente caso, no sentido de prevenir e revitimização dos trabalhadores. Para isso, entendemos como essencial a sua documentação e reinserção formal no mercado de trabalho.

CONCLUSÕES:

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1 – A situação constatada in loco na oficina de costura inspecionada configura trabalho análogo ao de es cravo, conforme preceituado no artigo 149 do Código Penal Brasileiro e da Convenção nº 29 da Organização Internacional do Trabalho – OIT, ratificada pelo Decreto Legislativo nº 41.721/1957, e Instrução Normativa SIT/TEM nº 91 de 05/10/2011, em virtude da servidão por dívida, da jornada de trabalho exaustiva e das condições degradantes do meio ambiente de trabalho;

2 – A oficina inspecionada é apenas uma das 17 (dezessete) oficinas inidôneas (sem empregados registrados) mantidas pela CONFECÇÕES TALITA KUME LTDA. para executar integralmente a atividade de costura – essencial ao desenvolvimento do seu negócio – das peças de roupas produzidas por sua marca. Constatou-se que a oficina efetivamente prestou serviços de costura para a autuada, pelo menos a partir de agosto de 2005, de forma exclusiva. Importante ressaltar a falta de idoneidade econômico-financeira das oficinas de costura, que não possuem nenhum empregado registrado nem tampouco capacidade econômica que possam justificar a viabilidade empresarial das mesmas;

3 – A terceirização da “facção” das atividades de costura contratadas pela CONFECÇÕES TALITA KUME LTDA., principalmente de t trabalhadores de nacionalidade boliviana, se dá mediante a terceirização, que culmina na utilização fraudulenta de operações de “industrialização por conta de terceiros nos moldes do ICMS”, visando a ocultar a subordinação ensejadora do vínculo empregatício com os costureiros que assim têm seus direitos trabalhistas frustrados, acarretando ainda a sonegação do FGTS e do INSS.

4 – Conforme demonstrado, os 8 trabalhadores prejudicados foram empregados da empresa CONFECÇÕES TALITA KUME LTDA.. Não obstante, somente tiveram seu registro do contrato formalizado pela empresa após a fiscalização. De acordo com o relatado, a autuada utilizou-se de intermediação ilícita de mão-de-obra, para alocar trabalhadores em atividades permanentes e essenciais ao seu funcionamento, de forma contínua, com pessoalidade e subordinação. Afastada a licitude da “terceirização”, por aplicação dos artigos 2º, 3º e 9º da CLT;

5 – O baixo valor pago pela CONFECÇÕES TALITA KUME LTDA., que é repassado aos oficinistas para a costura das roupas de

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sua marca é causa direta para a perpetuação das condições degradantes e análogas às de escravo a que estão submetidos os trabalhadores ocupados nessas oficinas, notadamente os de nacionalidade boliviana;

Concluímos o presente relatório constatando a ocorrência de trabalho análogo ao de escravo, sob responsabilidade e em benefício da empresa autuada, nos termos exatos dos autos de infração lavrados e dos fundamentos enumerados no presente relatório.”

CPI DESTINADA A INVESTIGAR O TRABALHO ESCRAVO - DILIGÊNCIA DE MARABÁ - PARÁ PERÍODO 21 A 23 DE AGOSTO DE 2012

A CPI chegou a Marabá no dia 21/08/12 para acompanhar a fiscalização do grupo de trabalho contra o trabalho escravo, formado por auditores fiscais do trabalho, membros do ministério público do trabalho e policiais federais. Houve reunião a noite, para preparação da diligência de verificação de denúncia de trabalho escravo em fazenda de gado, distante 150 Km, por estrada de terra, dentro do mesmo município. No dia 22/08/12 às 4 h da manhã, iniciou-se o deslocamento, na companhia dos Deputados Claudio Puty Presidente, Walter Feldman - Relator, Giovanni Queiroz e Ivan Valente. O Grupo de trabalho libertou 11 trabalhadores escravizados que viviam em condições sub- humanas e eram impedidos de deixar o local de trabalho. Após as atividades houve reunião de avaliação.

Os Deputados puderam testemunhar as condições sub-humanas oferecidas aos trabalhadores, especialmente o alojamento sem nenhuma condição mínima de habitabilidade, uma simples lona na beira do rio e comida toda deteriorada, carne podre e coberta de vermes, que é usava na alimentação, pois é a única coisa fornecida pelo empregador... nenhum local para higiene pessoal, total promiscuidade e falta de privacidade. No alojamento do peão que cuida do gado, simples barraco com tabuas espaçadas, a comida fica ao lado de recipientes de agrotóxico e fertilizantes, sem nenhum respeito à saúde do trabalhador. Não há equipamentos de segurança, nem a mínima

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orientação sobre os perigos de uso dos materiais químicos. A situação deprimente e degradante foi testemunhada por todos.

A CPI recebeu do Grupo móvel o seguinte relato a seguir sobre a atividade.

“Flagrante de Trabalho Escravo no Pará

Deputados da CPI do Trabalho Escravo acompanham uma diligência do Grupo Móvel do Ministério do Trabalho e Emprego de Combate ao Trabalho Escravo no Pará. A missão resgatou oito trabalhadores rurais em condições precárias de trabalho na fazenda “Alô Brasil” no Distrito Capistrano de Abreu, a 170 km

de Marabá.

 

"Estamos aqui desde junho, uns chegaram em maio, e não recebemos,

como foi prometido por quinzena de roçado. Comemos e bebemos aqui a água

na boca do córrego, e no mesmo local fazemos nossas necessidades e os

animais também bebem a mesma água, porque não tem banheiro não. E

ficamos sábado e domingo também nesse local, porque não temos dinheiro

nem pra sair para a vila. Onde a gente dorme chove, faz muito frio à noite. Já

ficamos doentes aqui sem ajuda, e já não agüentamos mais isso. Essa terra

tem mais ou menos 800 cabeças de boi e nós estamos nessa situação".

Diligência no Pará- Essa é parte da história de R.C.S., um dos trabalhadores

que foi resgatado pelo grupo móvel do Ministério do Trabalho e Emprego de

Combate ao Trabalho Escravo, em parceria com o Ministério Público do

Trabalho e Polícia Federal. Junto com R.C.S. , mais sete trabalhadores rurais,

incluindo um idoso, foram encontrados em situações precárias e degradantes

de trabalho na propriedade “Alô Brasil”. O delegado de polícia, Antônio Carlos

Cunha Sá, que comandava o grupo de policiais, não pode efetuar o flagrante,

pois o proprietário da fazenda não reside no local. Apenas o agenciador, que

recrutou os trabalhadores, o senhor A. G. N, estava no local, para vistoriar os

empregados nas tarefas diárias de roçado e escavações, para instalação das

cercas da propriedade.

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Trabalho Degradante - Os trabalhadores afirmam que foram

contratados para receber cento e trinta reais por alqueire roçado, e mais dois

reais por estaca produzida e fincada. Mas, desde junho, os trabalhadores

dizem que receberam apenas cinqüenta reais. Entre eles, estava uma mulher,

MC C, que era cozinheira no acampamento, contratada para receber duzentos

e cinqüenta reais mensais, mas que há uma semana resolveu abandonar o

local, recebendo apenas cento e trinta reais e alguns mantimentos, porque ela

teria dois filhos que estavam numa Vila próxima à propriedade.

Os trabalhadores contam que nem em caso de doença recebem ajuda

do patrão. R.C. S diz: “sofri um acidente de trabalho, machuquei o braço

esquerdo e meu pé direito há uns 30 dias atrás. A minha companheira trouxe

um gel para eu passar e foi o irmão de um amigo que apareceu por aqui e me

levou de moto até o posto de saúde, sem eu receber nem o dinheiro do

transporte”, concluiu o trabalhador. O grupo móvel ainda percebeu que os

trabalhadores vão para campo e levam água para beber do córrego dentro de

um recipiente que antes concentrava um produto químico que é conhecido

como “FARMARIN”, o que pode ser mais um agravante à saúde dos

trabalhadores.

Aviamento - O aviamento, termo cunhado na Amazônia, é um sistema

de adiantamento de mercadorias a crédito. Começou a ser usado na região no

período colonial, mas foi no ciclo da borracha que se firmou como sistema de

comercialização, uma espécie de identidade nas relações de trabalho informais

na Região.

No sistema de aviamento, o comerciante ou aviador adianta bens de

consumo e alguns equipamentos de trabalho ao trabalhador, e este paga a

dívida contraída com o próprio trabalho, com tarefas de extração, na época,

passando seu próprio salário ao empregador.

Aviamento na fazenda "Alô Brasil"

Na propriedade em Marabá foram encontrados cadernos com dívidas

dos trabalhadores, que são tipos de créditos para aquisição de produtos de

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consumo, higiene e até equipamentos de trabalho. As dívidas são nominais e

caracterizam uma espécie de aviamento moderno.

“Tudo aqui a gente compra: barbeador, caderno, short, bota, sandália

pra trabalhar e o gato – agenciador – vai anotando no caderno a dívida”, diz o

trabalhador, o que para o Procurador do Trabalho, Allan de Miranda Bruno, que

acompanhou a missão, caracteriza uma forma de endividamento, a longo

prazo, do empregado, comprovando que não se trata de serviço por

empreitada, mas de vínculos de trabalho que estão irregulares.

Providências Legais- As evidências levaram o grupo, por meio do MTE

e MPT, a concluir e encaminhar a abertura imediata de processo de resgate

físico e tomar providências, para que todas as garantias relativas às questões

trabalhistas sejam garantidas, como pagamento imediato dos dias de trabalho,

que já são mais de dois meses; seguro-desemprego; aviso prévio; assim como

aplicação das multas cabíveis ao empregador por não cumprir todas as

determinações da legislação trabalhista quanto à contratação e vínculos de

trabalho; assim como o MTE tem a prerrogativa de emitir novas carteiras de

trabalho para os "empregados".

O Procurador do Trabalho, Allan de Miranda Bruno, dentro de suas

atribuições, vai também determinar os procedimentos cabíveis aos danos

morais e desrespeito aos direitos humanos  e dignidade, ali observados, com

as máximas infrações.

O Grupo Móvel de Combate ao Trabalho Escravo foi criado em 1995,

pela Portaria nº 550 de 14 de junho de 1995, e, ao longo destes anos tem

alcançado excelentes resultados. No grupo de resgate em Marabá participaram

cerca de 20 homens na operação, que uniu MTE, MPT e PF. E foi a primeira

vez que quatro deputados, presidente, relator e membros da CPI do Trabalho

Escravo participaram de uma diligência no meio rural. Outras incursões já

foram feitas no meio urbano.

CPI- Os deputados da CPI do Trabalho Escravo, deputado Cláudio Puty

(Presidente); deputado Walter Feldman (Relator); deputado Giovanni Queiroz

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(Membro); deputado Ivan Valente (Membro); Drª Márcia Maria Bianchi Prates

(Consultora) participaram da fase de coleta de depoimentos de alguns

trabalhadores, assim como assinaram os termos que oficializam a presença da

CPI, como uma instância do estado, que tem a prerrogativa de levantar

situações que ajudem a esclarecer as conceituações do trabalho análogo ao

escravo; assim como avançar na questão da legislação trabalhista e

fiscalizadora do trabalho no país.

O deputado Puty, presidente da Comissão, adiantou aos trabalhadores:

"A comissão vai chamar o empregador, no sentido de esclarecer a situação

encontrada nessa propriedade, e também avançar nos debates na Câmara e

na sociedade sobre as caracterizações do trabalho análogo ao escravo,

buscando aperfeiçoar os instrumentos da legislação e fiscalizações

trabalhistas, as questões das garantias dos direitos humanos. A aprovação da

PEC já foi um avanço, que apontou as lutas de combate ao trabalho escravo,

assim como o Pacto Nacional de Combate ao Trabalho Escravo. E o trabalho

do grupo móvel do Ministério do Trabalho, a lista suja são avanços efetivos, e

nós precisamos continuar o trabalho para erradicar essas práticas, que no caso

da Amazônia, assume conotações modernas degradantes mais evidentes".

O Grupo Móvel deve, em breve, divulgar o balanço dos resultados das diligências na Região.  Outras ações foram realizadas em municípios do Pará, como em Rondon do Pará e Xinguara.”

RELATÓRIO DE VIAGEM À BOLIVIA - PERÍODO 7 A 9 DE MARÇO DE 2013

RELATÓRIO DE VIAGEM DA CPI DO TRABALHO ESCRAVO À BOLIVIA PERÍODO: 7 A 9 DE MARÇO DE 2013

A delegação da CPI foi composta pelos Deputados Claudio Puty (Presidente), Walter Feldman (Relator) e três outros membros: Deputados Amauri Teixeira, Ivan Valente e Oziel de Oliveira.

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A viagem à Bolívia teve como objetivo conhecer mais a fundo o problema da imigração irregular boliviana para o Brasil de modo a combater o trabalho análogo ao de escravo em que, muitas vezes, são encontrados os bolivianos, especialmente no Estado de São Paulo.

Os compromissos da viagem tiveram início no Congresso Nacional da Bolívia em um encontro com a Senadora Centa Rek Lopez. O embaixador brasileiro apresentou os integrantes da delegação e explicou o que é a CPI e o objetivo da viagem, que tinha como finalidade obter dados e informações mais fidedignas. Justificou a necessidade de os parlamentares se informarem para melhor analisarem e proporem políticas públicas para combater o problema. O embaixador boliviano, também presente, explicou que a CPI encontrou bolivianos em condições análogas à de trabalho escravo e que convidou a comissão para mostrar o que fazia o vice-consulado em São Paulo para regularizar os emigrantes bolivianos. Disse, ainda, que os bolivianos não podiam prescindir do apoio do governo brasileiro.

A estimativa é de que haja hoje 1 milhão de bolivianos na Argentina, 200 mil na Espanha e 300 mil no Brasil (200 mil em São Paulo, dos quais 50 mil sem documentos). Disse, ainda, o embaixador boliviano que, com a crise da Espanha os bolivianos estão procurando emigrar-se de lá para o Brasil.

O Presidente da CPI informou sobre a evolução dos trabalhos da Comissão, da aprovação da mudança constitucional, das visitas de inspeção do grupo móvel, dentre outros assuntos. Disse ter encontrado, em São Paulo, muitos bolivianos trabalhando na indústria têxtil, em condições análogas à de trabalho escravo. Insistiu que não se pretende combater a imigração, mas promover uma integração regional, com o devido respeito aos direitos humanos.

A senadora boliviana disse que a viagem da CPI é o início de uma parceria para a solução de vários problemas. A senadora disse que vai investigar mais a fundo a questão e levantar dados concretos para aprofundar uma discussão mais produtiva. Informou que os emigrantes são enganados e iludidos de que terão trabalho com bons salários. Eles são principalmente do meio rural e muitos não falam sequer, com fluência, o espanhol. Quando chegam ao Brasil, são imediatamente ameaçados e depois passam a ser controlados pelos “oficinistas”.

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Esse procedimento, sem dúvida, caracteriza tráfico internacional de pessoas com objetivo de lucro. Os parlamentares dos dois países concordaram que precisam de uma política estratégica de combate a esse tráfico que vá além da geração de informação.

Outro fator importante é a necessidade de os países honrarem seus compromissos internacionais com a ratificação da Convenção contra o Crime Transnacional Organizado e seus Protocolos complementares, nos quais se incluem os Protocolos contra o Tráfico Ilícito de Pessoas e o de Trafico Ilícito de Migrantes.

Houve também a reunião com a Deputada Betty Tejada, Presidente da Câmara dos Deputados da Bolívia, que abriu os trabalhos alegando que o que está acontecendo é tráfico de pessoas e desrespeito aos direitos humanos. Estava presente também a Deputada Erika Claure, Presidente da Comissão de Política Internacional da Câmara dos Deputados, que afirmou haver uma máfia que também explora o tráfico de pessoas, financiando a saída de menores com documentos falsos. Foi relembrado também que o tráfico de pessoas gera o terceiro maior lucro depois do tráfico de drogas e de armas. Foi enfatizado que este circuito do tráfico é complexo e tem a ver com exploração do ser humano, que não respeita a ética ou moral. O tráfico internacional de pessoas e de migrantes tem por objetivo o lucro com a utilização da mão de obra barata e a facilitação da entrada ilegal em outro país. O tráfico pode ser para exploração sexual ou para trabalho forçado.

A delegação brasileira se reuniu com o Padre Aldo Pasqualotto da Pastoral da Mobilidade Humana, que recebe vítimas de tráfico em um abrigo. O padre afirmou que não há tráfico compulsório – é sempre voluntário e calcula que 50% das vítimas acabam ficando no Brasil.

No dia seguinte, dia 8 de março de 2013, a delegação brasileira fez uma visita de surpresa a várias agências de emprego em El Alto. Lá se constatou que a maioria das ofertas de emprego em São Paulo incluía o pagamento das passagens, o que já começa a criar o débito, difícil de ser quitado, colocando os trabalhadores à mercê de seus desejos. Em média, 15 pessoas por dia procuram as agências de emprego para encontrar oportunidades no Brasil. Este ano essa procura tornou-se mais atrativa ainda por causa da Copa do Mundo a ser realizada no Brasil, o que demandará confecção de camisas e uniformes em número muito maior.

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A delegação brasileira também visitou a polícia boliviana especializada no combate ao tráfico de pessoas. Todos os equipamentos dessa unidade da polícia, tais como, computadores, fax e impressoras foram doados pelos Estados Unidos. Segundo dados da Força Especial de Luta Contra o Crime de El Alto, na Bolívia, em 2012, dos 136 casos relatados de tráfico de pessoas, somente 17 casos foram esclarecidos, 50 arquivados e 69 somente tiveram investigação preliminar. Nessa oportunidade falou-se ainda da aprovação, em 2012, da lei específica para reprimir o tráfico de pessoas. Trata-se de uma lei bem feita que prevê até a possibilidade de contratar agente encoberto, já que toda a polícia local é conhecida por todos em El Alto. De qualquer forma, essa modalidade de investigação não foi utilizada ainda por falta de orçamento para esse fim.

Importante enfatizar de que há a percepção de o problema ser eminentemente econômico. Há várias denúncias de desaparecidos que são jovens e que vão para o Brasil, sem comunicarem para os pais. No primeiro momento, são dados como desaparecidos. Só em fevereiro de 2013, houve denúncia de 40 pessoas traficadas, sendo 5 menores de idade. Receberam ainda em fevereiro cerca de 20 reclamações de pessoas que retornaram, queixando-se de ganhar menos do que o prometido.

Em 2012, conseguiram desbaratar agências de recrutamento para trabalhar no exterior. Essa atividade é ilegal e há até recrutamento de mulheres grávidas, com ajuda financeira, para cobrir os gastos de estada hospitalar e dos partos, anunciados em jornais. Há também anúncios de outras ajudas econômicas e especificações no sentido de que a mulher deve ter até 27 anos, com gravidez de 2 a 6 meses. Pode se presumir que essas crianças sejam alvo de adoção internacional, o que clama por mais investigação por parte da polícia federal brasileira, em estreita colaboração com a polícia boliviana.

No encontro com setores sociais e microempresários do setor têxtil – a maioria deles de El Alto -, foram relatadas as dificuldades apresentadas pela Receita Federal, descritas como “barreiras comerciais”, que inibem a exportação de produtos bolivianos para o Brasil e teriam o efeito perverso de induzir a migração, particularmente para São Paulo, de mão-de-obra qualificada, para além de perdas vultosas para os empresários, entre os quais se citou, especificamente, o custo de treinamento dessa mão-de-obra. Em particular, causou espécie aos Deputados presentes, que não tenha sido

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possível aos bolivianos aproveitar sequer a cota de importações livres de imposto, de mais de US$ 20 milhões, oferecida pelo então Presidente Lula ao Presidente Morales. Como se recorda, o efeito dessa liberalidade seria compensar a exclusão da Bolívia de programa norte-americano de compras de produtos têxteis da região andina (ATPDEA), decorrente da “descertificação” - agora no seu quarto ano consecutivo – dos esforços do Governo Morales para reprimir o narcotráfico. Reconhecendo ser comum o recurso ao contrabando para superar as barreiras da Receita Federal, os produtores bolivianos reivindicaram a flexibilização de requisitos a fim de tornar transparente a questão, além de formalizar as exportações bolivianas de têxteis ao Brasil, bem como investimentos brasileiros que viabilizem a fabricação de pano na Bolívia a partir de insumos brasileiros.

 O governo boliviano organizou também um encontro da

delegação brasileira com pequenos empresários da indústria têxtil, que ficaram muito satisfeitos com a visita e disseram querer aprender com a experiência do micro crédito brasileiro. . O deputado Walter Feldman propôs ainda uma espécie de joint venture numa parceria dos dois países cujo financiamento poderia ser dado pelo BNDES. A delegação informou que o Brasil criou recentemente o Ministério da Micro e pequena empresa.

Houve uma reunião no Ministério das Relações Exteriores da Bolívia, na qual estavam presentes a Vice-Ministra de Justiça e vários outros funcionários do Executivo boliviano. Nessa oportunidade, os deputados brasileiros disseram que visitaram El Alto e viram muitas ofertas de emprego e um intenso processo de recrutamento. Pediram mais informações sobre quais medidas operacionais que o governo vem tomando. Os bolivianos informaram haver um programa com a Argentina. Explicaram que a Bolívia tem unidades autônomas municipais e departamentais e que o projeto com a Argentina prevê proteção, prevenção e persecução penal e que pode ser replicado em outras fronteiras.

Disseram que os imigrantes desejam não somente sair da pobreza, mas viver fora da Bolívia. Isso ocorre pela falta de conhecimento das condições de vida e de trabalho que podem encontrar no exterior. Por isso, uma campanha de conscientização seria uma boa iniciativa a ser tomada em conjunto pelos dois Países.

Deputado Ivan Valente disse que o problema da

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terceirização no Brasil foi agravado pela migração que é um fenômeno complexo. Nesse ponto, há que se buscar um equilíbrio. O Brasil quer deixar claro que os bolivianos são bem vindos, mas não quer ver situações de abuso e violação de direitos humanos. Já o Deputado Walter Feldman informou que se está também pensando na elaboração de uma lista limpa que consistiria na responsabilidade da empresa em fiscalizar a sua linha de produção e garantir que a produção não permita a utilização de trabalho escravo

Dos encontros com parlamentares e executivos da Bolívia, ficou claro que devem constar do relatório de viagem, recomendações para que haja troca de informações relativas a dados estáticos e legislação, bem como possibilidades para facilitação do microcrédito naquele País, que propicie melhores condições de vida aos bolivianos em seu próprio território de modo a desestimular a imigração.

Cerca de 860 mil bolivianos trabalham fora. Para o Brasil saem 40 mil anualmente. A causa do desejo de sair não é só a pobreza, mas também viver fora. A falta de conhecimento das condições que podem encontrar é o grande problema. Campanha de conscientização seria uma boa iniciativa em conjunto.

Os deputados brasileiros discutiram a possibilidade da organização de um evento de combate ao trabalho escravo que concluísse com recomendações objetivas, com um plano de ação e recursos por parte de cada país.

CONCLUSÃO

"As pessoas transformam-se em máquinas de ganhar dinheiro. Ou de

tentar ganhar dinheiro.“

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José Saramago

O Brasil tem sido reconhecido internacionalmente como referência internacional principalmente pelo trabalho de combate feito na área rural.

O Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo, adotado em 2003, constitui importante marco legal. O Grupo Móvel de Fiscalização do Trabalho conseguiu resgatar mais de 22 mil trabalhadores da situação de trabalho escravo entre 1995 e 2006.

Segundo um estudo da OIT intitulado "Trabalho Escravo no Brasil do Século XXI", a despeito de o Brasil ter lutado contra esse problema por mais de uma década, há ainda vários aspectos que precisam ser atacados.

Um desses problemas é a falta de conhecimento da relação entre o fenômeno do trabalho escravo e a questão do tráfico de seres humanos6 • É importante identificar as rotas utilizadas pelos aliciadores. No Brasil, conseguiu-se identificá-Ias, mas só para o trabalho rural. Constatou-se também que o binômio do "baixo risco e impunidade" ainda prevalece.

Os principais desafios são a reinserção das vitimas e a criação de novos mecanismos que rompam o ciclo da impunidade. Como resposta, o supracitado estudo propõe a criação de oportunidades de geração de renda e trabalho decente e a rigorosa aplicação da lei no combate à impunidade.

As Convenções da OIT nº 29 e 105, ratificadas pelo Brasil, e já integradas ao nosso sistema jurídico, propõem aos países signatários que tomem medidas eficazes para coibir qualquer forma de trabalho que reduza o trabalhador à condição análoga à de escravo.

Em 2004, o Brasil incorporou ao seu ordenamento jurídico, por meio do Decreto n° 5.017, o Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional relativo à Prevenção, Repressão e Punição ao Tráfico de Pessoas, em especial Mulheres e Crianças, É importante destacar, ainda, o outro protocolo, também adicional à Convenção

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das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional relativo ao Combate ao Tráfico de Migrantes por Via Terrestre, Marítima e Aérea, também afeto à matéria alvo da CPI. O Decreto nº 5.016, de 2004 promoveu a sua promulgação no território brasileiro. Ambos os protocolos estão sob custódia do Escritório das Nações Unidas contra Drogas e Crime (UNODC).

A principal diferença entre esses dois protocolos é que no protocolo de tráfico de pessoas, elas são consideradas vítimas e o Estado deve promover sua proteção e defesa enquanto que no protocolo de tráfico de migrantes, eles não são considerados vítimas. A razão que levou os especialistas internacionais a adotarem essa posição se deve ao fato de que no caso do tráfico de pessoas, o traficante exerce controle sobre a vítima mesmo depois de ter alcançado o país de destino. Já no outro protocolo, em geral há o pagamento para fazê-lo entrar no outro país, mas uma vez acabada a viagem, não há controle algum sobre a vida do migrante. Um crime pode ou não se transformar no outro tipo penal que é o de trafico de pessoas.

A OIT e o UNODC trabalham em estreita parceria e, quando solicitados, prestam assessoria e assistência técnica, provendo capacitação e assistindo na elaboração de leis, dentre outras atividades conjuntas.

A despeito de o Brasil, mais precisamente o Ministério da Justiça, ter um projeto em parceria com o UNODC visando a combater o tráfico de pessoa para fins de exploração sexual, a lei brasileira não dá tratamento específico às diversas condutas previstas nos protocolos supracitados. O art. 231 do Código Penal, que aborda o tráfico internacional de seres humanos cobre apenas a hipótese de tráfico de pessoas para fins de exploração sexual. O protocolo adicional, contudo, prevê a necessidade de criminalização do tráfico voltado a qualquer forma de exploração seja sexual ou de trabalho forçado além da remoção de órgãos.

Já o protocolo relativo ao combate ao tráfico de migrantes, também conhecido como o de "contrabando" de pessoas pelo seu original em inglês, estipula a criminalização dessa modalidade sempre que for verificada a finalidade de obtenção de vantagem financeira ou material. No entanto, o Código Penal somente prevê a caracterização de crime se o recrutamento de trabalhadores for realizado "mediante fraude", confundindo-o com o crime de tráfico de pessoas.

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O novo projeto de Lei do Estrangeiro - PL n° 5655/2009 prevê a criminalização do tráfico de migrantes. A proposta foi encaminhada pelo governo federal ao Congresso em abril de 2008 e prevê inclusive visto de permanência para a vítima do tráfico de pessoas que colaborar com a justiça.

A proposta está prevista no art. 157 do supracitado Projeto de Lei que dispõe "O Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, passa a vigorar acrescido do seguinte art. 149-A:

"Art. 149-A. Promover, intermediar ou facilitar a entrada irregular de estrangeiro ou viabilizar sua estada no território nacional, com a finalidade de auferir, direta ou indiretamente, vantagem indevida. Pena: reclusão de dois a cinco anos, e multa." (NR)

A seriedade do problema se evidencia pela magnitude do lucro obtido pela organização criminosa com a exploração desse tipo de atividade. Segundo estudo publicado pela OIT, intitulado "O Custo da Coerção", o tráfico de pessoas, para exploração sexual ou trabalho forçado, gera um lucro anual de 32 bilhões de dólares. Esse lucro ilícito só fica atrás do obtido pelos tráficos de drogas e de armas. Nesse mesmo relatório concluiu-se que a "aplicação da lei laboral poderá funcionar como complemento da aplicação da lei penal ou como um canal alternativo de se procurar a justiça", sendo particularmente relevante assegurar a compensação financeira dos trabalhadores que, de outra forma, não poderiam receber indenização em virtude da lei criminal, seja contra o trabalho forçado ou contra o tráfico de pessoas.

Um dos grandes problemas reiteradamente detectados pela CPI por meio da oitiva de depoimentos e material consultado é a impunidade.

Como vimos poderá existir três tipos penais no trabalho escravo ou análogo a de escravo, em atividades rurais e urbanas, por todo o território nacional:

• Tráfico de pessoas para exploração sexual,

• Tráfico de pessoas para trabalho forçado e

• Tráfico de migrantes

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A legislação penal tem sido criticada por ser extremamente vaga. Os parâmetros estabelecidos pelo MTE na elaboração de instruções normativas também têm sofrido criticismo na medida em que são meras decisões administrativas com sérias consequências, inclusive de privação de liberdade.

A definição de jornada exaustiva e condições degradantes aplicadas pelos auditores fiscais do MTE têm a sua base legal na Instrução Normativa n° 91 de 201. Assim, "jornada exaustiva" é toda jornada de trabalho de natureza física ou mental que, por sua extensão ou intensidade, cause esgotamento das capacidades corpóreas e produtivas da pessoa do trabalhador, ainda que transitória e temporalmente, acarretando, em consequência, riscos a sua segurança e/ou a sua saúde e "condições degradantes de trabalho" são todas as formas de desrespeito à dignidade humana pelo descumprimento aos direitos fundamentais da pessoa do trabalhador, notadamente em matéria de segurança e saúde e que, em virtude do trabalho, venha a ser tratada pelo empregador, por preposto ou mesmo por terceiros, como coisa e não como pessoa.

O problema, porém, está longe de ser resolvido. Além de não haver um numero suficiente de auditores para levar a cabo tal fiscalização, eles são ainda extremamente criticados, principalmente no trabalho rural onde os proprietários alegam que o parâmetro não pode ser o mesmo da cidade e nem as condições as mesmas dos centros urbanos mais desenvolvidos.

A competência jurisdicional tem recaído na justiça federal e na trabalhista, mas há também projeto de lei em tramitação que propõe a transferência da capacidade punitiva da lei penal para a justiça trabalhista..... n°

Sobre a polêmica e as críticas feitas ao texto do Art. 149 do Código Penal, esta CPI vislumbrou a seguinte situação: o fato de o tipo penal ser “em branco” ou seja, deixar ao alvedrio de outros parâmetros que não o texto da lei penal a conclusão da materialidade ou não do crime, é um tanto paradoxal. Os críticos apontam que o texto como está hoje permite confundir o crime com meras irregularidades trabalhistas, ou seja, ilícitos civis ou administrativos, e por seu conteúdo altamente infamante acaba, quando chega à mídia, condenando o empregador a uma pena ainda mais grave do que a privação da liberdade, qual seja, a execração pública e o comprometimento de seu trabalho e empresa.

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Ainda, alguns operadores que trabalham na aplicação do instituto, como Delegados de Polícia Federal ou Magistrados e membros do MP, creem que o texto da lei tal como está acaba por impedir a aplicação efetiva, haja vista que quase não há registro jurisprudencial de condenações por esse crime, na imensa maioria dos casos denunciados.

De outro lado, os defensores do texto tal como se apresenta hoje na lei repudiam veementemente a idéia de que o texto deva se restringir apenas à caracterização do trabalho escravo quando há castigos corporais ou limitação do direito de ir e vir. Tal definição, em seu sentir, traria o caos de volta às relações de trabalho, comprometendo conquistas históricas acerca da definição de trabalho digno. Para estes, toda e qualquer tentativa de elencar numerus causus as hipóteses em que se definiria o trabalho escravo são reducionistas e colocam em risco todo o combate a esse gravíssimo ilícito.

Esta CPI ouviu ambos os lados da questão, sopesou argumentos e os contrastou com a realidade consubstanciada no acompanhamento das diligências do Grupo de Combate do Trabalho Escravo do MTE.

Concluímos, dessa situação que razão assiste aos que desejam manter o texto da lei tal como está, cabendo para que se torne efetivo que a Justiça Federal Criminal firme entendimento sobre o que seja a "jornada exaustiva" ou as "condições degradantes" que constam do caput do tipo. Ora, é justamente essa a função de uma lei penal (em branco) – deixar que a experiência do magistrado defina a ocorrência ou não do crime. Tal técnica de redação de leis penais longe de causar problemas para a sociedade é a melhor política criminal a ser adotada quando estamos diante de fenômeno social complexo e repleto de nuances. Não há porque acreditar que tal norma em branco será utilizada para prejudicar os acusados, como também não há nenhum motivo - a não ser uma omissão injustificada de nossa magistratura - que determine que apenas por não conter enumeração exaustiva de casos a lei seja inaplicável.

Cabe a nós, enquanto condutores de um Inquérito Parlamentar, buscar problemas legislativos e propor sua solução, quando for o caso. Mas no presente tema, o problema não é da lei, que é considerada uma das mais perfeitas do mundo. O problema está em sua aplicação no âmbito do poder judiciário. Que os juízes sejam menos legalistas e mais

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atentos ao espírito da lei quando forem avaliar o tema. Que não mais culpados sejam liberados por tecnicalidades e filigranas, mas sim que todos os que mantém trabalhadores em condições sub-humanas tirando deles o lucro sejam punidos na forma da Constituição e da lei.

Sobre o conteúdo infamante da condenação, temos a observar que todo e qualquer réu criminal está sujeito a algum tipo de exposição pública. No mundo da internet e da mídia digital tal coisa é praticamente impossível de coibir. Que se deve fazer? Impedir o acesso da população à informação? Obviamente isso seria inconstitucional e beiraria a censura.

O que se impõe é que todos os agentes públicos envolvidos na apuração e repressão a esse crime sejam cuidadosos ao máximo, preservando todos, especialmente os explorados, mas também os acusados que podem ser mesmo inocentes. A bem da verdade o Poder Judiciário está suficientemente maduro para garantir o direito de defesa. São as responsabilidades do sistema, que ele mesmo já resolve e define, não havendo, pois, nada mais a corrigir.

Apresentamos a final uma Indicação ao Poder Judiciário sobre a importância de debater e formar juízes afetos ao tema, levando à criação de uma jurisprudência sólida, que possa orientar a sociedade brasileira e aprimorar as relações de trabalho.

Cremos que na essência do combate a esse crime têm que estar as políticas públicas que não permitam que haja pessoas em condições de miséria tal que aceitem se submeter a condições de trabalho análogas às de escravo. Esse é o lado mais revoltante desta questão. Como tivemos oportunidade de ouvir dos trabalhadores bolivianos escravizados em São Paulo, que ganhavam menos de um real por uma jornada de 16 horas: "Mesmo assim aqui é melhor do que a miséria de onde eu morava."

Essa é a chave para combater e erradicar o problema: que não mais haja pessoas que tenham ou creiam que tenham que se submeter a essas condições para sobreviver e, por outro lado, tornar essa exploração abjeta tão onerosa para as empresas e empregadores que não haja vantagem financeira alguma em manter pessoas escravizadas. Sobre isso, acrescentamos algumas recomendações e

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sugestões ao Poder Executivo, especialmente criando uma divisão da Defensoria Pública destinada a dar consultas e orientação trabalhista a migrantes e trabalhadores em geral. Somente o acesso ao conhecimento sobre os direitos acabará com a ignorância, que é a origem dos verdadeiros escravos.

Também é mister que a ignorância dos empregadores seja combatida. Que então o MTE mantenha curso permanente de orientação e informação aos empregadores sobre condições mínimas de trabalho e sugestão sobre alojamentos, banheiros, fornecimento de água potável em trabalhos nos campos, condições mínimas de conservação de alimentos, impossibilidade de utilizar o mesmo local para moradia e armazenamento de defensivos agrícolas ou outros que afetem a saúde, impossibilidade de utilização de mesmo local para moradia e trabalho das pessoas. Cremos que com informações básicas muitos empregadores que hoje constam da chamada Lista lá não estariam, uma vez que há requisitos muito simples a cumprir para evitá-la.

Quem não é capaz de compreender a linguagem da dignidade e dos direitos humanos, quem cede à lógica do dinheiro, então que aprenda sendo atingido no mesmo lugar onde dói: no bolso. Para isso, propomos a final algumas medidas legislativas que reputamos bem eficazes:

1) A responsabilização, cível e criminal, do empresário e empregador por toda a cadeia produtiva, ou seja, que o empresário consumidor final de qualquer bem ou serviço seja responsabilizado pela fiscalização e certeza de que nenhum de seus contratados ou terceirizados explora trabalho escravo. Esta norma constitui uma verdadeira parceria público-privada, porque obriga o empresário e o empregador a colaborarem com a fiscalização do próprio MTE. Cremos que somente uma parceria estreita entre esses dois segmentos será suficiente para resolvermos de uma vez a questão aqui investigada;

2) A declaração de extinção da pessoa jurídica no interesse da qual se apurar a ocorrência de trabalho análogo ao de escravo, com a declaração de incapacidade para o comércio de todos os seus sócios ou titulares por 8 anos. Pela dificuldade e problema que acarretaria, inclusive oneroso economicamente, tal medida será extremamente educativa e intimidatória. O empregador tentado a utilizar o trabalho escravo porque é

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lucrativo se deparará com a seguinte questão: "Vale a pena arriscar perder tudo e ter que recomeçar? Ou ficar impedido de comerciar?".

3) Aumento de multas para quem for flagrado utilizando trabalho escravo, sendo seu montante apurado de acordo com o faturamento do empregador.

4) Exigência de certidão de "nada consta", referente à Lista de Infratores do MTE para que novas empresas sejam registradas mas Juntas Comerciais e nos Registros Civis de Pessoas Jurídicas. Tal medida será moralizadora e eficaz na medida em que restará bem claro para toda a sociedade que utilizar trabalho escravo jamais poderá trazer qualquer benefício a um cidadão, somente desvantagens. Atualização de registros atuais Sistema produtivo de auto-fisc.

PROVIDÊNCIAS

RECOMENDAÇÕES AO PODER EXECUTIVO

PROPOSTAS LEGISLATIVAS

PROJETO DE LEI N° , DE 2013(Dos Srs. Walter Feldman e Claudio Puty)

Amplia o rol dos crimes hediondos.

O Congresso Nacional decreta:

Art. 1° Esta Lei torna hediondos os crimes de tráfico de pessoas e redução a condição análoga à de escravo.

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Art. 2° O Art. 1°, da Lei nº 8.072, de 25de julho de 1990, passa a vigorar acrescido dos seguintes incisos:

"Art. 1° ..............................................................I a VII B ..........................................................VIII - os crimes de redução a condição análoga à de escravo e tráfico de pessoas. (NR)"

Art. 3° Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

JUSTIFICAÇÃO

A gravidade das condutas típicas da redução a condição análoga à de escravo e tráfico de pessoas, que atentam contra a dignidade da pessoa humana, vulnerando direitos fundamentais, exige maior rigor na aplicação das penas do que vem tendo em nossa legislação.

Tornar tais condutas em crimes hediondos, notadamente porque não há como excluir a hediondez de tratar seres humanos como mercadoria, trará maiores benefícios à sociedade, em termos de aplicação de uma política criminal de tolerância zero.

Apenas a certeza da punição traz efetiva carga inibidora à norma penal, evitando a conduta delituosa.

Pelo exposto, e como fruto da investigação Parlamentar levada a cabo por pela CPI de que fomos Presidente e Relator, conclamamos os Nobres Pares a apoiarem este Projeto.

Sala das Sessões, em ..........de ............de 2013.

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DEPUTADO WALTER FELDMAN DEPUTADO CLAUDIO PUTY

PROJETO DE LEI N° , DE 2012((Dos Srs. Walter Feldman e Claudio Puty)

Dispõe sobre os crimes contra a dignidade da pessoa.

O Congresso Nacional decreta:

Art. 1° Esta Lei dispõe sobre os crimes contra a dignidade da pessoa.

Art. 2° O Decreto-Lei N° 2.848, de 7 de dezembro de 1940- Código Penal, passa a vigorar acrescido do seguinte Capítulo IV A - DOS CRIMES CONTRA A DIGNIDADE, a ser inserido no Título I - DOS CRIMES CONTRA A PESSOA:

"Capítulo IV ADOS CRIMES CONTRA A DIGNIDADEArt. 137 A Redução a condição análoga à de escravo (...) Tráfico de pessoas

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Art. 137 B. Agenciar, aliciar, recrutar, transportar, transferir, alojar ou acolher pessoa, por meio de ameaça, uso de força ou outras formas de coação ou violência, inclusive sequestro, rapto ou cárcere privado, fraude, engano, abuso de poder ou qualquer outro meio para fins de exploração.PENA: reclusão de 8 (oito) a 20 (vinte) anos e multa§ 1° A exploração referida no caput pode ser da prostituição ou outras formas de servidão sexual, trabalho em condições análogas a de escravo, servidão por dívida, mendicância, casamento servil, adoção irregular e remoção de órgãos, tecidos ou partes do corpo.§ 2° O consentimento da vítima de tráfico não exclui a ilicitude.§ 3° O recrutamento inclui qualquer meio, também se feito por meio eletrônico, sistema de informática ou telemático, fotografia, vídeo ou outro registro, inclusive salas de bate papo e programas de conversação pela internet.§ 4° O caput compreende a intenção de realizar qualquer movimentação territorial de pessoas, seja dentro do país ou internacional.Aumento de pena§ 4° A pena é aumentada de 1 (um) a 2 (dois) terços se:I - o agente é funcionário público;II - a vítima é menor de 18 ( dezoito) anos, gestante, idosa, indígena ou portadora de necessidades especiais;III - cometido por quadrilha ou bando;IV - cometido por responsável legal ou parente até terceiro grau.V- se o crime é transnacional.Redução de pena§ 5° A pena é reduzida de 1 (um) a 2 (dois) terços se houver delação que leve a extinção de grupo organizado que tenha praticado o crime.TentativaArt. 137 C A tentativa do crime do artigo anterior é punível com dois terços da pena.Art. 137 D Aplicam-se ao presente crime as disposições dos Arts. 223 e 224 deste Código.

Contrabando de Migrantes

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Art. 137 E Promoção, com o objetivo de obter direta ou indiretamente, benefício financeiro ou material, da entrada ilegal de uma pessoa no território nacional ou sua saída.

Pena: Reclusão de 6(seis) a 12(dez) anos e multa."

Art. 137 F São puníveis com as mesmas penas do artigo anterior as seguintes ações conexas com o contrabando de migrantes:

I – Elaboração de documento de viagem ou de identidade fraudulento;

II – Obtenção, fornecimento ou posse de tal documento;

III – Facilitação da permanência em território nacional de pessoa que não seja nacional ou residente permanente, que não preencha os requisitos necessários para permanecer legalmente no país.”

Art. 3° O Capítulo V do Título IV do Decreto-Lei n° 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal passa a se denominar "Do Lenocínio".

Art. 4° Revogam-se os Arts. 230 e 231 do Decreto-Lei N° 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal.

Art. 5° Renumera-se para Art. 237 A o crime do Art. 149 do Decreto-Lei 2.848, de 7 de dezembro de 1940.

Art. 6° Para evitar a vitimização secundária nos crimes desta Lei, o Juiz deve realizar sempre que possível a produção antecipada de provas e assegurar que não ocorram:

I - repetições desnecessárias de entrevistas durante a investigação e ação penal;

II - contato visual presencial de vítimas e réus, podendo ser utilizados meios eletrônicos que garantam a segurança das vítimas;

III- questionamentos desnecessários sobre a vida privada das vítimas.

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Art.7° Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

JUSTIFICAÇÃO

A CPI de que fomos Presidente e Relator debruçou-se sobre o fenômeno do trabalho escravo o Brasil, tema indelevelmente ligado ao do tráfico de pessoas, seja no âmbito interno ou externo. Unanimemente, as testemunhas de diversas áreas afetas ao tema apontaram a urgente necessidade de criar uma tipificação específica no Código Penal Brasileiro, que concretizasse a definição de crime de tráfico preconizada pelo Protocolo de Palermo, do qual nosso país é signatário.

Esta é a medida legislativa reclamada por todos os que aqui vieram trazer suas contribuições.

Na definição do tipo penal do tráfico, nossa primeira preocupação foi definir em que parte do Código Penal tal medida deveria ser incluída, porque, por certo, não poderia permanecer junto aos crimes de exploração do lenocínio, uma vez que o fenômeno do tráfico não abarca somente condutas de exploração sexual, mas sim também de trabalho escravo, adoções ilícitas, tráfico de partes do corpo humano, e outras, elencadas no Protocolo de Palermo.

Criamos, assim, um novo capítulo no Título I do Código Penal, porque, certamente tanto a redução a condição análoga à de escravo não é mero crime contra a liberdade individual (onde antes se inseria) como também evidentemente trata-se de CRIME CONTRA A PESSOA, mais especificamente, CRIME CONTRA A DIGNIDADE DA PESSOA.

Para consolidar o novo Capítulo renumeramos o tipo penal da redução à condição análoga à de escravo e acrescentamos o novo tipo do Tráfico de Pessoas.

Na nova redação que ora propomos, definimos o tráfico como qualquer movimentação territorial de pessoas (ingresso ou saída, internamente no território nacional, ou internacionalmente) que se destine à exploração. A fim de não criar norma penal em branco, definimos no parágrafo

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10 quais as modalidades de exploração que ensejam tráfico, englobando tudo que o protocolo de Palermo preconiza.

Assim, há tráfico se a pessoa comete algum dos atos elencados no caput a fim de mover pessoa com a finalidade da exploração sexual, do trabalho, da mendicância, casamento servil, adoção ilegal ou remoção de partes do corpo ou órgãos e tecidos. Não é necessário que a exploração se consume, pois e trata de crime de mera conduta: o aliciamento por todas as formas ou sua facilitação já implica nas penas cominadas.

Essas penas, aliás, são muito pesadas, e acrescidas de multa, o que pode adquirir significativo valor intimidatório especialmente no caso de empresários que podem estar se beneficiando desse tipo de conduta criminal.

Para adequação da técnica legislativa revogamos os atuais Arts 230 e 231 do Código Penal, cujas condutas já estão contidas no tipo novo que propomos.

Para garantir, ainda, que não haja a chamada vitimização secundária no caso do tráfico, considerando a vulnerabilidade das vitimas, acrescentamos medidas garantidoras de maior agilidade na investigação e no procedimento penal, a fim de proteger as vítimas quando tiverem que depor.

Por todo o exposto, e sendo um dos frutos principais de toda a investigação da CPI do Trabalho Escravo, conclamamos os Nobres Pares a aprovarem esta proposição.

Sala das Sessões, em de de 2013.

DEPUTADO WALTER FELDMAN DEPUTADO CLAUDIO PUTY

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PROJETO DE LEI N° , de 2013(Dos Srs. Walter Feldman e Claudio Puty)

Dispõe sobre a concessão de visto de residência temporária ao estrangeiro encontrado em território nacional executando trabalho escravo ou análogo ao de escravo.

Art. 1º Considera-se estrangeiro todo aquele que não possui a nacionalidade brasileira, originária ou adquirida.

Art. 2º O Ministério da Justiça poderá conceder visto de residência temporária ao estrangeiro que se encontre trabalhando em condições análogas à de trabalho escravo, independentemente de sua situação migratória.

Art. 3º A residência temporária será concedida por até um ano.

§ 1º No caso de a vítima querer colaborar, efetiva e voluntariamente, com a investigação ou o processo criminal, a residência temporária poderá ser prorrogada, por igual período, enquanto durar o feito, podendo até mesmo ser transformada em permanente.

§ 2º A colaboração de que trata o § 10 será formalizada pela autoridade policial, judicial ou pelo Ministério Público, de ofício ou a pedido do Ministério da Justiça.

Art. 4º O estrangeiro de que trata o art. 2º, em situação migratória irregular, não responderá pelas infrações previstas na Lei nº 6.815,

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de 19 de agosto de 1980, relativas ao fato de se encontrar no Brasil em situação irregular, nem será deportado ou repatriado.

Art. 5° Esta lei entra em vigor na data da sua publicação.

JUSTIFICAÇÃO

O trabalho escravo ou análogo ao de escravo é uma realidade em todo o mundo. Para preveni-lo e combatê-lo, cada País se responsabiliza por uma séria de inciativas legais e administrativas, devendo relatar todos esses avanços à Organização Internacional do Trabalho – OIT que é responsável pela coordenação regional e mundial do fiel cumprimento e observância das Convenções nº 29 e 105.

Essas convenções já foram ratificadas pelo Brasil, e integradas ao nosso sistema jurídico, além de ter elaborado lei ordinária que disciplinam o trabalho escravo na área penal, merecendo destaque os Artigos 149, 203 e 207 do Código Penal, que dispõem, respectivamente, sobre as seguintes condutas criminais: reduzir alguém à condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto; frustrar, mediante fraude ou violência, direito assegurado pela legislação do trabalho; aliciar trabalhadores, com o fim de levá-los de uma para outra localidade do território nacional.

Importante mencionar que um dos principais fatores que incentivam a continuidade da exploração do trabalho humano é a impunidade, pois a prestação jurisdicional no Brasil é, em geral, lenta, o que acaba resultando na impunidade. Ademais, as penas de reclusão e multa previstas no Código Penal, além de pequenas, são raramente aplicadas e insuficientes para servir de obstáculo ou empecilho a essa atividade ilícita, ilegal e imoral.

Também não são raros os casos em que a atuação da fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego é demorada ou tardia, o que contribui para que os empregadores eliminem as provas que poderiam

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confirmar o trabalho escravo, em vista do reduzido número de auditores-fiscais para o tamanho do Brasil.

Nessa mesma linha de raciocínio de combate à impunidade e fortalecimento da entrega da prestação jurisdicional, é que se propõe com esta iniciativa a possibilidade de concessão de visto temporário para que a vítima possa testemunhar em processo contra aquele que o fez trabalhar em condições análogas à de escravo.

Essa medida já vem sendo tomada, nos casos de tráfico de pessoas, pelo Conselho Nacional de Imigração, por meio da Resolução Normativa 93/2010 que "Dispõe sobre a concessão de visto permanente ou permanência no Brasil a estrangeiro considerado vítima do tráfico de pessoas".

Assim, nada mais justo que se beneficie da mesma proteção aquele empregado que for vítima de exploração do trabalho escravo. Ao apresentar essa proposta, pedimos, pois, apoio para a sua aprovação, como medida de direito.

Sala da Comissão, em de de 2013.

DEPUTADO WALTER FELDMAN DEPUTADO CLAUDIO PUTY

PROJETO DE LEI N° , DE 2011(Dos Srs. Walter Feldman e Claudio Puty)

Dispõe sobre a o crime de redução a condição análoga à de escravo

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O Congresso Nacional decreta:

Art. 1° Esta lei amplia a autoria do crime de redução a condição análoga à de escravo.

Art. 2° O Art. 149 do Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal passa a vigorar acrescido do seguinte inciso 111, do § 1°:

"Art. 149 ..............................................................................§ 1° ...................................................................................I - . ....................................................................................II - ....................................................................................III - é sócio, titular ou administrador de empresa, regular ou irregular, que se beneficie de qualquer forma dos serviços de pessoa reduzida à condição análoga à de escravo, em qualquer parte de sua cadeia produtiva, incluindo qualquer forma direta ou indireta de colaboração, parceria, terceirização, prestação de serviços ou atividade análoga. (NR)"

Art. 3° As pessoas elencadas no Artigo anterior terão responsabilidade civil objetiva pelos lucros cessantes, dano emergente e dano moral decorrente da exploração do trabalho em condições análogas ao de escravo, bastando para sua caracterização que haja a comprovação do benefício por qualquer forma dessa modalidade de ilícito.

Art. 4° Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

JUSTIFICAÇÃO

A presente medida é moralizadora e educativa, deixando bem claro que somente com uma repartição de responsabilidades entre a esfera privada - que se auto-regule e auto-fiscalize para não se beneficiar de crime hediondo, e a esfera pública - com melhor e mais eficiente e precisa fiscalização teremos a erradicação completa da escravidão no Brasil.

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Por todo o exposto nas Conclusões de nosso relatório pessoal sobre os trabalhos da CPI do trabalho escravo, conclamamos os Nobres Pares a aprovarem esta proposição.

Sala da Comissão, em de de 2013.

DEPUTADO WALTER FELDMAN DEPUTADO CLAUDIO PUTY