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8/17/2019 Coleção Filosofia - Livro 14 http://slidepdf.com/reader/full/colecao-filosofia-livro-14 1/212 COLEÇÃO EXPLORANDO O ENSINO FILOSOFIA  VOLUME 14 ENSINO MÉDIO

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COLEÇÃO EXPLORANDO O ENSINO

FILOSOFIA 

 VOLUME 14

ENSINO MÉDIO

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COLEÇÃO EXPLORANDO O ENSINO

 Vol. 1 – Matemática Vol. 2 – Matemática

 Vol. 3 – Matemática Vol. 4 – Química Vol. 5 – Química Vol. 6 – Biologia Vol. 7 – Física Vol. 8 – Geograa Vol. 9 – Antártica Vol. 10 – O Brasil e o Meio Ambiente Antártico Vol. 11 – Astronomia

 Vol. 12 – Astronáutica Vol. 13 – Mudanças Climáticas

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Centro de Informação e Biblioteca em Educação (CIBEC)

  Filosoa: ensino médio / Coordenação, Gabriele Cornelli,

Marcelo Carvalho e Márcio Danelon . - Brasília :

Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2010.

  212 p. : il. (Coleção Explorando o Ensino ; v. 14)

  ISBN 978-85-7783-038-1

  1. Filosoa. 2. EnsinoMédio. I. Cornelli, Gabriele. (Coord.) II. Carvalho,

Marcelo. (Coord.) III. Danelon, Márcio. (Coord.) IV. Brasil. Ministério da Educação.

Secretaria de Educação Básica. V. Série.

  CDU 1:373.5

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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃOSECRETARIA DE EDUCAÇÃO BÁSICA 

FILOSOFIA 

Ensino Médio

Brasília2010

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Coordenação da obra

Gabriele CornelliMarcelo CarvalhoMárcio Danelon

 Autores

Filipe CeppasGabriele CornelliJoão Carlos SallesJuvenal Savian FilhoMarcelo CarvalhoMarcelo GuimarãesMárcio Danelon

Marilena ChauiOlgaria MatosPlínio Junqueira SmithPriscila Rossinetti RunoniSilvio Gallo

 Walter Omar Kohan

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO

PAULO – UNIFESPInstituição responsável pelo processode elaboração dos volumes

Secretaria de Educação Básica

Diretoria de Políticas de

Formação, Materiais Didáticos e

de Tecnologias paraEducação Básica

Coordenação-Geral de Materiais

Didáticos

Equipe Técnico-Pedagógica

 Andréa Kluge PereiraCecília Correia Lima

Elizangela Carvalho dos SantosJane Cristina da SilvaJosé Ricardo Albernás LimaLucineide Bezerra DantasLunalva da Conceição GomesMaria Marismene Gonzaga

Equipe de Apoio Administrativo

Gabriela Brito de AraújoGislenilson Silva de MatosNeiliane Caixeta GuimarãesPaulo Roberto Gonçalves da Cunha

Tiragem 27.934 exemplaresMINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

SECRETARIA DE EDUCAÇÃO BÁSICA Esplanada dos Ministérios, Bloco L, Sala 500

CEP: 70047-900

Tel: (61) 2022 8419

1) As opiniões, indicações e referências são de responsabilidade dos autorescujos textos foram publicados neste volume.

2) Em todas as citações foi mantida a ortograa das edições consultadas.

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Sumário

 APRESENTAÇÃO .................................................................................................7

INTRODUÇÃO .....................................................................................................9G ABRIELE CORNELLI

M ARCELO C ARVALHO

M ÁRCIO D ANELON

PRIMEIRA PARTE

O ENSINO DE FILOSOFIA NO BRASIL: TRÊS GERAÇÕES

Capítulo 1Debate com Marilena Chauí, João Carlos Salles e Marcelo Guimarães ...........13M ARCELO C ARVALHO

M ARLI DOS S ANTOS

SEGUNDA PARTE

DIDÁTICA DA FILOSOFIA: A PRÁTICA DO ENSINO DA FILOSOFIA ATRAVÉS DE SEUS TEMAS

Capítulo 2

História da losoa antiga: começar pelo diálogo .............................................45G ABRIELE CORNELLI

Capítulo 3

História da losoa medieval: um mosaico de culturas e pensamentos...........59JUVENAL S AVIAN FILHO

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Capítulo 4

Ética e losoa política: o pensamento de Walter Benjamin ........................... 85OLGÁRIA  M ATOS

Capítulo 5 Lógica e linguagem. O que se diz e o que se cala: Wittgenstein e os limites dalinguagemM ARCELO C ARVALHO ............................................................................................. 101

Capítulo 6

Filosoa da arte e estética: um caminho e muitos desvios ...............................117PRISCILA  R OSSINETTI R UFINONI

Capítulo 7 

Teoria do conhecimento e losoa da ciência: conhecimento como crença verdadeira justicada  .......................................................................................143PLÍNIO JUNQUEIRA  SMITH

TERCEIRA PARTE

FILOSOFIA DO ENSINO DE FILOSOFIA: QUESTÕES TEÓRICAS DA

PRÁTICA DO ENSINO

Capítulo 8

Ensino de losoa: avaliação e materiais didáticos.........................................159SÍLVIO G ALLO

Capítulo 9

 Anotações sobre a história do ensino de losoa no Brasil .............................171FILIPE CEPPAS

Capítulo 10

Em torno da especicidade da losoa: uma leitura das orientaçõescurriculares nacionais de losoa para o ensino Ensino Médio .....................185M ÁRCIO D ANELON

Capítulo 11

O ensino de losoa e a questão da emancipação .......................................... 203

 W  ALTER 

 OMAR 

 K OHAN

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 Apresentação

A Coleção Explorando o Ensino tem por objetivo apoiar o tra-

 balho do professor em sala de aula, oferecendo-lhe um materialcientífico-pedagógico que contemple a fundamentação teórica e

metodológica e proponha reexões nas áreas de conhecimento das

etapas de ensino da educação básica e, ainda, sugerir novas formas

de abordar o conhecimento em sala de aula, contribuindo para a

formação continuada e permanente do professor.

Planejada em 2004, no âmbito da Secretaria de Educação Básicado Ministério da Educação, a Coleção foi direcionada aos professores

dos anos nais do ensino fundamental e ensino médio e encaminha-

da às escolas públicas municipais, estaduais, federais e do Distrito

Federal e às Secretarias de Estado da Educação. Entre 2004 e 2006

foram encaminhados volumes de Matemática, Química, Biologia,Física e Geograa: O Mar no Espaço Geográco Brasileiro. Em 2009,

foram cinco volumes – Antártica, O Brasil e o Meio Ambiente An-

tártico, Astronomia, Astronáutica e Mudanças Climáticas.

Agora, essa Coleção tem novo direcionamento. Sua abran-gência foi ampliada para toda a educação básica, privilegiando

os professores dos anos iniciais do ensino fundamental com seisvolumes – Língua Portuguesa, Literatura, Matemática, Ciências,

Geografia e História – além da sequência ao atendimento a pro-

fessores do Ensino Médio, com os volumes de Sociologia, Filosofia

e Espanhol. Em cada volume, os autores tiveram a liberdade de

apresentar a linha de pesquisa que vêm desenvolvendo, colocando

seus comentários e opiniões.

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A expectativa do Ministério da Educação é a de que a Coleção

Explorando o Ensino seja um instrumento de apoio ao professor,

contribuindo para seu processo de formação, de modo a auxiliar na

reexão coletiva do processo pedagógico da escola, na apreensão

das relações entre o campo do conhecimento especíco e a propostapedagógica; no diálogo com os programas do livro Programa Na-cional do Livro Didático (PNLD) e Programa Nacional Biblioteca

da Escola (PNBE), com a legislação educacional, com os programas

voltados para o currículo e formação de professores; e na apro-

priação de informações, conhecimentos e conceitos que possam ser

compartilhados com os alunos.

 Ministério da Educação

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Introdução

No inferno no qual vivemos todos os dias [...] existem duas ma-neiras de não sofrer. A primeira é fácil para a maioria das pessoas:aceitar o inferno e tornar-se parte deste até o ponto de deixar depercebê-lo. A segunda é arriscada e exige atenção e aprendizagemcontínuas: tentar saber reconhecer quem e o que, no meio do in-ferno, não é inferno, e preservá-lo, e abrir espaço.1

É comum ouvir relatos de professores que atuam diariamente

em sala de aula com relação ao verdadeiro inferno em que a práticadocente se transformou. Não é o caso aqui de enfrentar os moti-s das dicudades, sejam reais, cm percebidas, d sistema deensino brasileiro. Há certamente importantes análises e políticaspúblicas dedicadas a desvendar e corrigir os motivos profundosdestes desacertos.

* É prfessr adjunt d Departament de Fisa da Uniersidade de Brasíia.Pós-dutr em Fisa Antiga pea UNICAMP e pea Uniersità degi Studidi Napi, dutr em sa pea USP, é atuamente Presidente da SciedadeBrasieira de Patnistas, Crdenadr d Grup Archai e Editr da ReistaArchai: as origens do pensamento ocidental.

** Dutr em Fisa pea Uniersidade de Sã Pau, pssui Mestrad e Gra-duaçã em Fisa pea mesma Uniersidade. Atuamente é prfessr da Uni-ersidade Federa de Sã Pau e Crdenadr d Prgrama de Pós-Graduaçãem Fisa desta uniersidade.

***  Dutr em educaçã sa da educaçã. Prfessr na Facudade de Educaçãda Uniersidade Federa de Uberndia.

1

  CAlvINo, Ita.  As cidades invisíveis . Sã Pau: o Gb, 2003. p. 158.

Gabriele Cornelli* 

 Marcelo Carvalho** 

 Márcio Danelon*** 

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o que ns preme assinaar é que a sa, que ta agra aestar presente no ensino, o faz em anos de profunda crise do sistemaescar. Dramaticamente, céebre na, acima citad, das CidadesInvisíveis d escritr Íta Cain é aqui prpst cm uma metá-

fra ds prbemas que s prfessres de sa estã encntrandnesta ta. Mas quer ser também um mapa cnceitua para enfren-tament destas dicudades, sugerind que a presença da sa nensino possa se constituir como um elemento que permita o contínuorecnheciment ds desas d ensin-aprendizagem, e nã maisuma tentativa de varrê-los para baixo do tapete, de esconder a crise.

Fisa e crise se frequentam há muit temp, a mens desdea Atenas cássica: prfessr de sa é certamente chamad aser protagonista desta crise, em busca de novas oportunidades deestruturação do saber e de seu ensino formal.

Cm bjeti de ferecer materia de aprfundament daprática didática e de auxíi à frmaçã cntinuada para prfessresde sa d Ensin Básic, presente ume da Coleção Explo-rando o Ensino reúne cntribuições de aguns ds mais signicatisespeciaistas na área de sa e seu ensin n País.

o ir é diidid em três partes, send a primeira parte de-

dicada à ediçã de uma entreista que, articuand as faas e a his-tória de três gerações de prfessres de sa, se prpõe a traçar per, em terms cmparatis, de três mments d ensin dasa n Brasi.

A segunda parte é estruturada em diversos textos que apresen-tam cada um uma diferente área de trabah em sa, de mda tanto subsidiar o professor do ensino médio em suas propostasde aua cm mesm a cnsidar sua frmaçã n tema especíc.Gabriele Cornelli enfrenta a prbemática de se estudar sa

antiga n Brasi e da reencia deste estud num País situad naoutra margem do pensamento ocidental. Aborda a questão como umaprtunidade/desa enquant discute que seja sa antigae cm buscar caminhs para ensiná-a, especicamente atraésdos diálogos de Platão. Juvenal Savian Filho trata da pertinênciae d sentid históric-sóc d term mediea, assim cmdas imitações impstas pr esse cnceit. Faz cnsiderações s-

 bre os mal-entendidos e clichês a respeito do pensamento medieval,

abordando a questão da continuidade com o período antigo e a

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mdernidade e da reencia d estud da sa mediea. Ol-

gária Matos apresenta pensament de Water Benjamin inscritna história da sa cm uma reexã sbre mund cuturae históric, em particuar a partir d sécu XIX. A imprtncia da

memória e do passado, das experiências de vida e de pensamentoque os indivíduos desenvolvem em suas relações com seus con-temprnes e cm s ares herdads da tradiçã sã s temascentrais de sua abordagem. Marcelo Carvalho abrda as dicudadesde se trabahar cm sa da ógica e da inguagem n cntextescolar. A partir disso, tece uma exposição sobre a principal obrade Wigenstein, Tractatus logico-philosophicus , sublinhando sua im-prtncia n debate cntemprne e expnd de frma sintéticaa discussão contida neste volume sobre as possibilidades e limites

da linguagem. Priscila Runoni inicia sua contribuição explorando signicad d term estétic e pntuand- cm uma frma dcnhecer em gera. Sugere, em seguida, caminhs de abrdagemtemática: a estética cm experiência sensria, cm sa daarte e como experiência existencial, histórica e política, sugerindoestratégias de abordagem para cada uma destas veredas. Plínio Smith anota que, desde o surgimento da ciência, o homem concebeu váriasmudanças no seu lugar na natureza e em sua visão a respeito desta.

N entant, arma ser precis perguntar se a ciência cumpriu cma expectatia gerada pr sua euçã. N mbit dessa discussã,aborda o surgimento da teoria do conhecimento na antiguidadeclássica e helenística, seus desenvolvimentos na modernidade e suaimprtncia na cntempraneidade. Também eenca distinções nasdiersas denições de cnheciment e sbre questões fundamentaiscm crença, erdade e justicaçã.

A terceira parte é dedicada mais precisamente à abrdagem dasquestões teóricas inerentes a ensin de sa hje n Brasi. Silvio

Gallo abre esta parte discutind as justicatias que defenderam ata da sa as currícus e reaçand a pssibiidade de umasustentaçã destas justicatias ns cntexts da prmçã de umavisão crítica do mundo, da cidadania, ou da interdisciplinaridade.Filipe Ceppas faz uma anáise da história d ensin de sa nBrasi, tentand exprar, a partir de uma perspectia histórica e umpequen cnjunt de referências, a pergunta sbre a relevância ou ossentidos d ensin de sa em níe secundári. Acrescenta a esta

exploração a indicação de algumas consequências para a formação

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de prfessres de sa, prduzidas pr três frmas distintas dese responder a esta pergunta: a forma da educação, da história e dasa. Márcio Danelon enfrenta, cm base nas rientações ciais,a imprtncia de uma discussã erdadeiramente sóca sbre

que é a filosofia e as consequências que surgem a partir de comoessa discussã é eada a cab. Também discute a especicidade dasa enquant reexã e ds pssíeis uss que a sa pdeter dentro do ambiente escolar, assim como os compromissos quecada um destes uss assume na prática educatia. o text refere-seà questã da emancipaçã d indiídu, de cm ta exigência deemancipação, característica do ideal democrático, cria exigências para ensin de sa. Walter Omar Kohan aprofunda a compreen-são de emancipação, apresentando as teses principais de Adorno a

respeito da relação entre educação e emancipação. Além disso, colocaem questã pensar a emancipaçã n cntext da bra de J. Ran-cière, tirando algumas consequências destas análises, para pensar ougar da emancipaçã n camp d ensin de sa n Brasi.

A articulação das três partes resulta numa proposta de leituraque permita a prfessr de sa n ensin médi anar seupsicinament prssina e inteectua em temps de redeniçãd ugar da sa enquant discipina curricuar brigatória. A

intenção dos organizadores é que este livro possa suscitar no pro-fessr desej de seguir pensand a sa e sua atiidade deensin cm uma prática em cntinua mudança. E que faça surgir,portanto, a necessidade de um movimento pessoal de atualização ereisã cnstantes. Pis a respnsabiidade da sa na sciedadee na escola permanece a mesma desde suas origens: contribuir como processo de construção da autonomia crítica dos cidadãos, ensi-nand às nas gerações a repensar cntinuamente mund cmsuas próprias cabeças, a abrir espaços para sair de todas as cavernas,

de tds s entraes à apreensã ire e crítica d ier.

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Capítulo 1

O Ensino de Filosoa

no Brasil: três gerações

Breve panorama da trajetória do ensino de losoanos últimos 50 anos

Uma missã francesa cnstituída de prfessres de renmedaquee país d eh cntinente chegu a Brasi na década de1940 para criar e desener ensin de sa na recém-criadaUniersidade de Sã Pau, fundada em 1934, atendend às de-

mandas de formação intelectual da burguesia paulistana. A ênfaseera um ensin humanístic e reexi, até prque a referência deeducaçã n Brasi era mde eurpeu. o acess à uniersidadese restringia às eites sciais.

Fi durante Estad N (1937-1945), de Getúi vargas, quese criu Ministéri da Educaçã e Saúde Púbica e se estabeeceramalgumas diretrizes para o sistema educacional, abrangendo parcelasmais ampas da ppuaçã. As mudanças crreram n bj de um

miment para renar a educaçã n Brasi, qua defendia aeducação pública e gratuita, laica e obrigatória, uma Escola Nova. o Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova produzido pelos intelectuais

 Marcelo Carvalho* 

 Marli dos Santos** 

* Dutr em Fisa pea Uniersidade de Sã Pau, pssui Mestrad e Gra-duaçã em Fisa pea mesma Uniersidade. Atuamente é prfessr da Uni-ersidade Federa de Sã Pau e Crdenadr d Prgrama de Pós-Graduaçãem Fisa desta uniersidade.

** Dutra em Ciências da Cmunicaçã da USP. É prfessra tituar d Curs de Jrnaism d Prgrama de Pós-Graduaçã lat Sensu da Uniersidade Met-

dista de Sã Pau.

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participantes desse movimento pode ser considerado um dos primei-ros documentos de expressão ideológica na educação brasileira.

Para atender às demandas das camadas mais ppuares, ass-ciu-se entã Ensin Primári, equiaente a Ensin Básic de 1ª

a 4ª séries, a ensin cmercia, que tinha cm ênfase aprendiza-d técnic. As eites sciais tinham acess a Ensin Secundári eSuperir. o Ensin Secundári ferecia cutura gera e humanística,cm duas pções de curss, Cássic e Cientíc.

N na da década de 1950, bsera-se a gestaçã de uma mu-dança signicatia na educaçã n Brasi, especiamente n EnsinMédi. o desenimentism tmu cnta d País, cm a aberturado mercado para empresas multinacionais, a instalação de indús-trias autmbiísticas, de cigarr, farmacêuticas e de mecnica. Issprovocou crescente desnacionalização da economia e coincidiu com períd de frte cresciment d pós-guerra. Grande parte dsinvestimentos feitos na educação durante esse período foram dire-cinads à frmaçã técnica, ferecend-se quaicaçã de mã debra às empresas que entã se instaaam n Brasi.

A lei de Diretrizes e Bases da Educaçã Nacina (lDB), pre-ista na Cnstituiçã de 1946, só fi ccada em prática n nade 1961, durante gern de Jã Guart. A lei 4024/61 tinhacomo uma de suas orientações a não obrigatoriedade do ensino desa e scigia.

Puc mais de dis ans depis, em març de 1964, gpemilitar e a ditadura provocaram novas mudanças. As escolas públi-cas de ensino médio foram sendo levadas em direção a um modeloinstrumental de ensino, no qual o resultado e o pragmatismo eram fc. Em 1968, a sa fi retirada de tds s estibuares dpaís e, em 1971, a lei 5692/71 eimina de ez sa e scigia dagrade curricuar d Ensin Médi, substituind-as pr rganizaçã

scia e pítica brasieira (oSPB).As nas rientações curricuares, smadas à pítica ecnô-mica e à idegia d regime miitar, que persistiu de 1964 a 1985,afetaram a quaidade d ensin, pea carência crônica de cutu-ra humanística e de frmaçã crítica. Nesse períd, a sa semantee n exíi d Ensin Médi púbic. Seu retrn crre, aprincípi, cm discipina ptatia, a ng ds ans de 1980. Em1996, cm a lDB nº 9394/96, a situaçã se mantém. o artig 36, pa-rágraf 1º, recmenda “dmíni ds cnheciments de Fisa

e de Scigia necessáris a exercíci da cidadania”, mas nã a

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sua presença cm discipina escar. Essa situaçã só é de fat a-terada quand, em 2008, a lei 11.684/08 reê artig 36 da lDB eestabeece a brigatriedade da inserçã da sa e da scigians currícus d Ensin Médi.

Nesses puc mais de 50 ans, ensin de sa causu dier-sas pêmicas. N períd da ditadura, fi jugad nefast à frmaçãds jens, prque pderia ear a pensament crític, este assciada cmunism pes miitares. Em seguida, s debates que retmarama discussã sbre sua inserçã brigatória n Ensin Médi truxeramà baia a isã de inteectuais que defendiam a nã brigatriedaded ensin de sa. o argument essencia: a sa nã é disci-plina e nem pode ser, pois é uma atitude crítica ao pensamento, e nãohá modelo pedagógico que dê conta de sua natureza, ou que possa

estabelecer limites didáticos para o seu ensino.o que se espera da sa nesse cntext de sua reinserçã?Qual a identidade desse saber e dessa atividade docente que agorase faz presente em tdas as saas de aua d País? Há muit a ama-durecer e a se cnstruir n ng caminh que ns eará à cns-idaçã da reaçã da sa cm a frmaçã da cutura e cm ensin brasieirs. Esse debate se faz cm um har atent para aprópria sa, para que ea se recnheça nessas práticas dcentes,mas que nunca descuida de se debruçar sobre a experiência dos

docentes que no cotidiano das escolas são chamados continuamentea se posicionar sobre todos esses temas.

Três gerações, três histórias

N bree e resumid recrte n temp sbre ensin de s-a que cnsiderams aqui, há três mments imprtantes a seremdestacads: a presença da sa cm discipina acadêmica emuma cnjuntura histórica na qua a cutura gera e humanística eram

a tônica, que caracteriza períd anterir a regime miitar e quepersiste, em grande medida, até 1968; um segund períd em queo regime militar prioriza a formação técnica e que se elimina o lugarque seria destinad à sa n Ensin Médi, e que se estendepara aém da década de 1990; e um terceir mment, n qua secnstrói retrn d ensin de sa e se debate sua cntribui-çã para a frmaçã crítica d jem n Ensin Médi. Questõesideógicas, píticas e ecnômicas permeiam a trajetória d ensinde sa n Ensin Médi a ng d temp.

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Esses três mments pdem ser representads pr três ósfs brasileiros de gerações diferentes, que expressam a sua visão sobre ensin de sa n Ensin Médi púbic: Mariena Chaui, JãCars Saes e Marce Sena Guimarães. Apresentams a seguir

resultado de entrevistas e debates em que se pretende explicitar oscontrastes de perspectivas e experiências associadas a esses diferen-tes mments d debate sbre ensin de sa. Em primeirugar, esbçams per de cada um ds entreistads e sua reaçãcm a sa e cm seu ensin. Em seguida, ccams em debateessas diferentes perspectivas e esses diferentes percursos.

Marilena de Souza Chaui

Quatr décadas de sa. Mariena Chaui é respeitada cmintelectual e militante política. Participou ativamente da criação doPartid ds Trabahadres – PT, em 1980. ocupu carg de se-cretária da cutura da cidade de Sã Pau n gern de luizaErundina, de 1989 a 1992, à épca eeita pe PT.

Agumas de suas bras a zeram extrapar cntext acadê-mico e atingir os leigos, como em O que é Ideologia , que compõe aCeçã Primeirs Passs da editra Brasiiense, e Convite à Filosoa ,da editora Ática.

É professora doutora honoris causa , título concedido por duasinstituições estrangeiras – Uniersidade de Paris 8, França, e Uni-ersidade de Córdba, Argentina. Pssui centenas de artigs pubi-cads em periódics de grande circuaçã e cientícs, dezenas detextos, entre livros e artigos publicados em obras de outros autores,em prtuguês e francês. Tem se dedicad, principamente, à histó-ria da sa cntemprnea, cm fc em Baruch de Espinsa eMereau-Pnty. É prfessra tituar d Departament de Fisa daFacudade de Fisa, letras e Ciências Humanas da Uniersidade

de Sã Pau (USP), desde 1986.Nascida na cidade de Sã Pau, a ósfa estudu Primári, e

grande parte d Ginási em Catandua, n interir pauista. vtua Sã Pau em 1956 para terminar Ginási e cursar CegiaCássic (Ensin Médi) n Cégi Estadua Presidente Rseet,

 bairr da liberdade, para depis fazer graduaçã e icenciatura emsa na Uniersidade de Sã Pau (1960-65), em seguida mes-trad (1966-67), apresentand a dissertaçã Merleau-Ponty e a críticado humanismo. Em 1971, defende dutrad cm a tese Introdução

à leitura de Espinosa. Em 1977, cncui trabah de ire-dcência,

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 A nervura do Real: Espinosa e a questão da liberdade , na mesma uni-ersidade. Reaizu pós-dutrad na Bibitéque Natinae deParis (BNP), cncuíd em 1987.

Encontro com a losoao pai da ósfa, Nicau Chaui, era jrnaista. A mãe, laura

de Suza Chaui, prfessra, trnu-se indiretamente respnsáepe primeir encntr da ha cm a sa. “Eu me encntreicm ea [a sa] muit ced. Quand tinha 12 ans, i um irde minha mãe sbre sa da educaçã e quei desumbrada cmum sujeit chamad Sócrates. Ach que nã entendi quase nada dir, mas a gura de Sócrates cu graada em minha memória

pr causa de uma cisa fantástica chamada maiêutica!”.Mas fi na esca que cnheceu mehr a sa, estimua -da por professores, por autores clássicos e disciplinas voltadas aoestud de idimas. “N meu temp haia, após s quatr ans deGinási (n qua se aprendia atim, ingês e francês), chamadCegia (diidid em Cássic e Cientíc), que duraa três anse ns preparaa para a uniersidade. Durante s três ans de C-egia Cássic (n qua se aprendia atim, greg, espanh, ingêse francês) tie auas de sa, que era uma discipina brigatória

– eram cinc auas semanais, ist é, cm exceçã d sábad, haiasa tds s dias.”A ênfase dada à sa (e utras discipinas das humanidades)

naquele momento era um dos caminhos para valorizar a formaçãohumanística e crítica ds auns. A ósfa cnta que n cégi Pre-sidente Rseet haia estímu à eitura, a debate, à participaçã,a deseniment de prpstas, às nas ideias, à participaçãpítica pr mei d grêmi estudanti. “Para se ter uma ideia decm era ensin, embr que íams Cai Prad Júnir nas auas

de história d Brasi; César, Cícer e virgíi, nas auas de atim;trechs de Hmer, Sófces e Patã, nas auas de greg; Racine,Crneie e Mière, nas auas de francês; Shakespeare e Mitn, nasauas de ingês; Cerantes e Machad, nas de espanh; tds spetas e neistas rmntics, simbistas e mdernistas, nas deiteratura prtuguesa e brasieira.”

Em mei as cássics da fisfia e da iteratura, MarienaChaui descree a aua inaugura de sa na esca: “A primeiraaula teve início com o professor dizendo o seguinte: ‘Palamede da

Esca Eeata, Zenã de Eéia...’. Era uma casse de jens cm 15

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ans de idade, que nunca tinham uid faar de sa, muitmens de Zenã de Eéia e mens ainda de quem pderia ser umta de Paamede! o curs era de ógica e as primeiras auas framsbre Parmênides, Zenã, Herácit e Górgias e efeit sbre mim

foi fulminante: descobri que era possível o pensamento pensar sobreo pensamento, a linguagem falar sobre a linguagem e que haviauma grande distncia entre perceber e cnhecer.”

Entre bns prfessres as quais atribui sua frmaçã, destacaum. “Tie um prfessr extrardinári, Jã Eduard viabs,pessa muit cuta, irônica e crtante, que nã fazia quaquer cn-cessã à nssa ignrncia, mas ns trataa cm capazes de entenderas auas, pesquisar na Bibiteca Municipa, escreer razaemente.N meu cas, viabs era, a mesm temp, a iniciaçã a pen-

samento e o desafio de tomar conhecimento de um universo atéentã descnhecid e sem m. Muitas ezes, fram suas ‘tiradas’sbre agum fat crriqueir d ctidian que me zeram har ascoisas e as pessoas de uma maneira nova, problemática, instigante.Fui fazer sa na uniersidade pr causa dee, sem dúida. Mastambém pr causa de aguns utrs prfessres.”

 Vocação

A icenciatura em sa só cnrmu que Mariena Chaui já sabia. “Sempre me i cm prfessra e, na épca em que fiza faculdade, éramos preparados para o ensino, pois além do ba-charelado, a licenciatura fazia parte de nosso currículo, visto quea sa era discipina brigatória n que hje se chama ensinmédi. Quase ninguém imaginaa dar aua em uniersidades (issera para muit pucs), mas tds se destinaam espntaneamentepara ensin médi.”

Apesar da caçã e prepar para a dcência n Ensin Médi,

a iência cm prfessra nessa etapa de frmaçã fi curta. “Deiaua n Cégi Estadua Prf. Abert ley, prtant, numa escapúbica e, diga-se de passagem, das mehres. Fi uma experiênciamuit graticante, pis ensin médi (ist é, curs Cegia)nã tinha passad peas sucessias refrmas que iriam desgurá-e mantinha a frmaçã que eu haia cnhecid n Cégi Estadu-a Presidente Rseet, cm ótims auns, muit diág entres prfessres, tds exigentes quant à quaidade d ensin e adesempenho dos alunos, e boa infraestrutura de trabalho, parti-

cularmente, a biblioteca. Havia ciclos de debates e palestras sobre

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assunts ariads da cutura cntemprnea cm s prfessresda casa e com convidados especiais. No início de cada semestre, osprfessres se reuniam pr anidade de suas matérias e prpunhamtrabahar junts determinads assunts, mas ninguém usaa jargã

da interdiscipinaridade; era óbi para muits que suas matérias etemas se entrecruzaam e que aia a pena um trabah cnjunt.os auns eram receptis e interessads e áris dees fram fazersa na uniersidade, segund ees, estimuads peas auas.”

Para as auas, s prfessres d Abert ley usaam a z emsaa de aua e s irs dispníeis em bibitecas. “o prfessr prepa-raa suas auas cm materia pesquisad na Bibiteca Municipa e,n cas ds auns, cm eram puquíssims s irs de sa emprtuguês (taez uns 10 u 15 títus), cnsutaam irs em ingês,

francês e espanh (pis estudaam essas ínguas n Cegia). Pensque o mesmo se dava com as outras disciplinas, embora algumas, comoas de ciências e as de línguas contassem com livros didáticos, isto é,destinads especicamente a prgrama de cada an escar.”

A professora valoriza a indicação de livros de autores de refe-rência em cada área, como uma ação comum dos professores nas“grandes escas púbicas” na década de 1960, incusie n Cé-gi Abert ley. “A útima cisa em que aguém pensaria seriaem livros com ilustrações, pouco texto e quase nenhuma formação!

Também nunca passaria pea cabeça de ninguém, em quaquer dasdiscipinas, em dar pras na frma de testes de mútipa escha. Eum professor se sentiria ofendido se recebesse um livro denominado‘ir (u exempar) d prfessr’, ensinand- a dar auas, fazerpras e crrigir trabahs!”

lg que defendeu a dissertaçã de mestrad n recém-criadprgrama de pós-graduaçã da USP, em 1967, fi cnidada a eci-nar n Departament de Fisa da Facudade de Fisa, letrase Ciências Humanas, da mesma Uniersidade.

Em tempos de ditadura

Enquant Mariena Chaui cursaa graduaçã e icenciaturade sa na USP, ienciu um mment cnturbad da histó-ria pítica brasieira. De 1960 a 1965, iu quatr presidentes daRepúbica, uma renúncia presidencia e um gpe miitar, que mu-daram os rumos do País. A ditadura instaurada quando os milita-res tmam pder nã afetu iniciamente a educaçã (até 1968);somente as universidades sofriam com as constantes perseguiçõesa professores e alunos. 

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”Piticamente, a ditadura estaa impantada, prém ainda nãhaiam chegad s ans de chumb d AI-5 e a educaçã ainda nãera a da Segurança Nacina nem estaa encarregada de frmarquadrs para ‘Brasi Grande’ de Dem Net e Gbery d Cut

e Sia. As perseguições haiam sid imitadas às uniersidades e,nestas, a professores individualmente visados por suas ligações com Partid Cmunista u cm s grups que haiam apiad de-senimentism de Juscein Kubitschek u as Refrmas de Base,prpstas pr Jang Guart. ou seja, ataque ainda nã isaa(cm acnteceria a partir de 1969) à instituiçã uniersitária nemàs instituições d ensin médi, mas a indiídus”.

A mesm temp, ensin de sa n Ensin Médi buscuum caminh para nã car à margem das questões essenciais naquee

mment, de frma mais indireta. As fntes de inspiraçã e reexãpara professores e estudantes eram o existencialismo do francês JeanPau Sartre e engajad miment cinematgrác Nouvelle Vague (Na onda), reembra a ósfa, que também destaca as priridadesda escola naquele momento: prezar e valorizar a cultura e respeitara ciência. o cima nas escas também era diferente:

“D pnt de ista scia e ecnômic, a casse média ainda estaalonge da indústria do vestibular, da competição desvairada e dosucesso a qualquer preço, de maneira que, na escola pública, haviauma atmosfera de camaradagem e cooperação tanto entre os alunoscm entre s prfessres.”

A fazer uma retrspectia sbre ensin de sa ns úti-ms 50 ans, Mariena Chaui acredita nã ser pssíe uma anáisesem reacinar a discipina cm as demais matérias d Ensin Médi,ainda que a excusã da mesma pes miitares tenha sid justicadapr mtis de subersã, a ad da pedaggia de Pau Freire e dahistória d Brasi, apresentada pr Cai Prad Júnir, exemps que

cita. “Pens que é precis inserir a sa n mesm cntext emque se encntraram as demais discipinas de humanidades – histó-ria, gegraa, ínguas e iteratura brasieira e estrangeira. Fisa,história e gegraa fram, de iníci, submetidas à ideia de educaçãmra e cíica; em seguida, suprimid ensin de sa, surgiua discipina estuds sciais, reunind história e gegraa; e a disci-plina expressão e comunicação substituiu o ensino das línguas, alémde suprimir ensin de atim, greg, francês e espanh.”

As refrmas crridas n Ensin Médi brasieir sã resutadda rientaçã pític-ecnômica n País, segund Mariena Chaui.

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Nas mudanças, diz ela, a lógica do mercado prevaleceu em detrimentodos valores anteriormente cultivados e preservados na escola:

”o primeir mment da refrma d ensin médi fi feit sb aégide d ‘Brasi Grande’, da Segurança Nacina e das recmen -dações d Departament de Estad nrte-american ( chamadacrd MEC-Usaid) cm ênfase ns cnheciments técnic-cientí-cs e desinteresse peas humanidades, puc signicatias para ‘miagre brasieir’. o ensin médi passu a ser ist de maneirapuramente instrumenta (e nã mais cm períd frmadr), ist é,como etapa preparatória para a universidade e esta, como garantiade ascensão social para uma classe média que, desprovida de poderecnômic e pític, daa sustentaçã ideógica à ditadura e pre-cisaa ser recmpensada. Tem iníci ensin de massa. A chegadade grande cntingente de jens as estibuares eu à institui-çã d estibuar rganizad fra das próprias uniersidades, àsprovas sob a forma de testes de múltipla escolha e ao surgimentoda indústria d estibuar.”

Para a pensadora, a privatização da escola pública, a redução daatuaçã d Estad na educaçã, a adequaçã d ensin às exigênciasdo mercado e o controle ideológico da classe média pelo diplomauniversitário são aspectos essenciais a serem considerados para com-preender a euçã d Ensin Médi nesse recrte históric.

João Carlos Salles Pires da Silva

Nã fi apenas um encntr que Jã Cars Saes Pires da Si-a tee cm a sa. Nas paaras dee, fram árias aproximações dentr e fra d ambiente acadêmic. Iss he permitiu cntatcom diversos  pers da losoa , a partir da adolescência.

Cm nã haia sa n Ensin Médi durante a sua fr-mação, as aproximações ocorreram por meio de docentes de outrasdiscipinas naquee mment. “Tie exceentes prfessres de itera-tura e de história. Cm a prfessra de iteratura, Sônia Brba, tiea inquietação do texto, o exercício de exegese, a paixão pela palavra.Fram dses extremas de pesia e bastante prsa, transitand deMachad de Assis a Kaa. Cm prfessr de história, Fábi Paes,tive a pergunta pelo sentido dos fatos, através de leitura bastantepróxima a marxism.”

As inuências na esca estimuaram às buscas, prém cn-

text pític eara a utrs ugares. Eram s ans de chumb d

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períd miitar. “Essas inuências pderiam decert dar em qua-quer cisa. Entretant, em cntext marcad pea ditadura, passeia frequentar, pr ta ds 14 ans, Institut Cutura Brasi-Ae-manha, e utrs ambientes cuturais da cidade de Saadr, e tud

se transfrmu em miitncia pítica frte.”Fisfia e marxism passaram a ser a mesma cisa, segun -d Jã Cars. o futur ósf, entã miitante da Açã PpuarMarxista-leninista (APMl), tratu de ampiar seus cnhecimentsteórics, dedicand-se durante cinc ans. “Se bem me embr, de1976 a 1981. Nesse mment, a prpsta da APMl ajudu minhaformação teórica, inclusive por ela vir de cisões diversas e por elaprcurar dar cnta da especíca reaidade brasieira.”

A busca pea frmaçã inteectua tinha um bjeti, de nã

ser “mer tarefeir da reuçã”. o empenh teóric indiiduae ceti na rganizaçã em que atuaa inuenciu na eschad primeir curs superir: ecnmia. “Esse empenh me euprimeiro ao curso de economia, no qual logo descobri não estarexatamente em meu eement.” As pucs migru para sa.Em 1985, cncuiu a graduaçã e icenciatura em sa na Uni-ersidade Federa da Bahia.

 A experiência na universidade

Fi pr causa da miitncia que fiósf se aprximu dprfessr d Departament de Fisa da UFBA e futur rienta-dr Ubirajara Rebuças. “o curs de ecnmia e marxism meaprximaram de Ubirajara Rebuças, de quem me trnei amig, umtant discípu e, enm, rientand. Era um inteectua autêntic eengajad, cm frmaçã renada e ampa em história da sa,frte miitncia marxista e especiaizaçã em ógica, atraés de ngtrabah na França junt a Rbert Banché.”

o amig e prfessr he permitiu um cntat intens cm impr-tante bibigraa. “Bira me abriu, genersamente, sua bibiteca, naqual pude encontrar, ao lado de obras clássicas do marxismo, o melhorrepertóri da ógica, da sa anaítica e, é car, Wigenstein.”

outrs prfessres fram fundamentais à sua frmaçã em -sa. “Esse é especiamente cas de Fernand Reg, que, em priscaseras, fra fazer mestrad na USP, e muit me ajudu a recuperar cuidad cm text e a paara, que antes tant prezara. De aindamencinar a imprtncia para minha frmaçã d har estruturaista

de Áar Menezes e incuir na ista de inuências imprtantes nme

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de um prfessr de scigia, Cars Csta, cuja sóida frmaçãfenmenógica husseriana, ej hje, deixu marcas que nã desejapagar. Crei que, de aguma frma, a trama dessas aprximações àsa reinentu cntext pe qua, deixand a miitncia rga-

nizada, mas não a esquerda, reencontrei um lugar para um exercíciosóc especíc e, se quiserem, para uma caçã.”

O ensino de losoa

lg após a frmatura, cmeçu a ecinar n Ensin Supe-rir, n mesm departament em que atuara cm estudante. Eeatribui esse iníci à dedicaçã ns temps da facudade. Durante agraduação, fazia todos os cursos extras ao currículo obrigatório e

rganizaa eents. “Tie agum destaque entre s auns. Taezaté por antiga paixão militante, sempre gostei de animar grupos deestudos e procurava fazer todo curso adicional que então estivessedispníe. Ainda fazend ecnmia, fiz curs cm Pau Singer emesm rganizei eents [...]. E, já n curs de fisfia, partici-pei com entusiasmo de cursos oferecidos por vários professoresna Bahia, a exemp de Jsé Arthur Gianntti e Cars AbertRibeir de Mura. Taez pr esse empenh, em um mmentem que a UFBA nã estaa fazend cntratações, fui cnidad a

permanecer cm prfessr. Assim, pr gestões píticas de Bira,estand tad n Estad, fui ccad à dispsiçã d Departa-ment de Fisfia cm dcente em setembr de 1985, g apósminha frmatura.” Essa trajetória impeiu a Ensin Superir,nã tend experiência prfissina n Ensin Médi.

 Jã Cars Saes Pires da Sia é um ds crdenadres d pr- jet de impantaçã da discipina sa n Ensin Médi, nanciadpea Fundaçã de Ampar à Pesquisa d Estad da Bahia (Fapesb).Participu intensamente das discussões das orientações Curricuares

Nacinais (oCNs) e cnsidera que as discipinas que cmpõem agrade curricuar d Ensin Médi hje sã faráeis à integraçã.

O acadêmico

Após a graduação, elaborou dissertação de mestrado em ci-ências sciais pea Uniersidade Federa da Bahia, apresentadaem 1992, cm títu O Tempo Lógico da Sociologia Geral: Pressu-

 postos Filosóficos da Sociologia de Émile Durkheim. Dutru-se em

fisfia pea Uniersidade Estadua de Campinas, em 1999, a

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defender a tese  A Gramática das Cores em Wittgenstein. Atualmenteé prfessr assciad da Uniersidade Federa da Bahia (UFBA),exercend carg de Diretr da Facudade de Fisfia e CiênciasHumanas, e prfessr cabradr da Uniersidade Federa da

Paraíba (UFPB).Produziu vários artigos ao longo de sua carreira acadêmica.Dentre s irs de sua autria, destacam-se  A Gramática das Coresem Wigenstein , editra ClE/Unicamp, em 2002, e O Retrato do Ver-melho e Outros Ensaios , editra Quartet, em 2006.

Seu fc na sa abrange a história da sa mderna ecntemprnea, especicamente empirism cássic e a experiênciaem Wigenstein.

Marcelo Senna Guimarães

o prfessr d Ensin Médi, Marce Senna Guimarães, c-meçu a ecinar em esca particuar, em 1994, em Brasíia. Masa experiência sofreu breve interrupção, para dar lugar aos estudosde mestrad. vei para Ri, para a Uniersidade Federa d Ride Janeir (UFRJ). Fram dis ans que earam a buscar maisconhecimentos para o exercício da docência.

A na d mestrad, em 2002, apresentu a dissertaçã O prag-

matismo tem uma ética? O pensamento moral de John Dewey , continuidadeds estuds reaizads na graduaçã, na mngraa As transformaçõesda moral na reconstrução em losoa de John Dewey , em 1995.

Para atingir seus bjetis na dcência, ósf também fezespecialização em Fundamentos de uma educação para o pensar , na Pon-tifícia Uniersidade Catóica de Sã Pau (PUC/SP), períd de 1995a 1997, nde prduziu a mngraa Educação moral e educação para o

 pensar. Graduu-se também em história pea Uniersidade FederaFuminense (UFF), cm estud tad à sa e à esca: Silvio

Romero, a losoa e a escola no Brasil , em 2008. N an seguinte, 2009,iniciu dutrament na área da educaçã na Uniersidade dEstad d Ri de Janeir (UERJ). A trajetória inteectua d ósfune a sa à educaçã. A sua atuaçã dcente também.

Na escola

Desde que cmeçu a ecinar, ósf busca aternatias paradespertar interesse ds auns. “Tenh prcurad aprender ma-neiras de prmer ‘experiências sócas’ que sejam signicatias

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para os estudantes, o que é um trabalho árduo, mas também muitoestimuante [...] Cm fazer as teses sócas fazerem sentid eterem aguma reencia diante da urgência ita da juentude e dasquestões atentes na ida scia brasieira?” N dia a dia em saa

de aua n Cégi D. Pedr II, esca púbica federa de EducaçãBásica n Ri de Janeir, tenta dar cnta dessa tarefa.“Minha estratégia básica é a apresentaçã de um tema, atraés

de um text, para discussã. Esse text pde ser sóc, de umautr cássic da história da sa u um text preparad para aaua; pde estar assciad a texts de utras rigens, jrnaístics,cientícs, artístics. Daí prcede-se à eitura e discussã d text.Nesse momento, pode-se fazer um trabalho de aprendizado da lei-tura, de atençã a rigr cnceitua, às precupações sócas em

trn, à inestigaçã de um tema. Prcura-se fazer cm que textproduza um questionamento real para os alunos, e não meramenteum ‘questinament inteectua’ u ‘escar’.”

Para desenvolver sua estratégia didático-pedagógica, há o es-forço individual e também a interação com os demais colegas daárea. N departament de sa, criad em irtude de a escater diversas unidades, turmas e equipes de professores, os encontrosentre professores facilitam a troca de experiências.

Encontros losócos

“Pr ta da 6ª u 7ª série, ach, escrei um pema sbre pensament – na erdade, aguns pucs erss (se pdem serchamads erss!), ma naizads: ‘pens em pensar sem estar pen-sand, pensand em pensar. Mas, antes que pense, já pensei naquique pens [...]’. lembr que, cm uma certa usadia, cquei pema n mura da saa de aua, e a prfessra de prtuguês, vani(ótima prfessra), fez um cmentári: ‘Bem pensad’.”

Quand iss acnteceu, Marce Senna Guimarães tinha emtrn de 12 ans e cu estimuad cm cmentári da prfes-sra. Mesm sem cntat discipinar cm a sa na esca, pensament já chamaa a sua atençã. Aiaa a iss interesse prciências, especialmente sobre animais, depois por física e matemá-tica, e a leitura da revista Ciência Ilustrada (pubicada pea editraAbri na década de 1980), a qua cecinaa. “Prcurar cmpreendermais amplamente as ciências, questionando sobre o que seria seubjet própri, seu md de prceder, a reaçã entre a matemática

e a natureza, as reações das ciências entre si – haia agum encant

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niss, que a esca de cert md desperdiçaa –, que me pareciapder ser encntrad cm um har sóc sbre cnhecimen-t. o cntat cm bras cuturais, em particuar, músicas e mes,também cabraram para despertar questões éticas e píticas.”

Ainda nã haia a brigatriedade da sa n Ensin Médins ans de 1980, mas desempenh indiidua ds prfessres deárias discipinas ajudu a desener um pensament crític.“Aguns prfessres, de diersas discipinas, prmiam agum tipde questionamento, ou procuravam ensinar de modos mais próximosa nós, mais claros, relacionados a experiências demonstradas ouiidas. lembr particuarmente, já n 2º grau, d prfessr luiz,de física, que apresentava desde experimentos físicos em sala atéquestinaments mais existenciais; Jã, de gegraa; Emersn e

 Jui, de matemática; Jã, de iteratura; lacerda, de iteratura; ediversos outros, de história, biologia, entre outras disciplinas, comquem, de diversos modos, aprendi a ampliar e aprofundar o pensa-ment e a desener perspectias críticas sbre a reaidade.”

Fra a esca, espehaa-se na mãe, que buscaa respstas paraquestionamentos existenciais em religiões diferentes para além desua frmaçã catóica, cm na Krishnamurti e Seich-n-Ie. “Essesquestinaments sem dúida me eantaram questões sócas –cm as armações da Seich-n-Ie de que ‘a matéria nã existe’,

‘tud é prjeçã de nssa mente’ – que eu tentaa pensar cm srecurss da ciência aprendida na esca e ida nas reistas.”Na casa de uma amiga durante Ensin Médi, cnheceu Mari

Baentura, mãe da garta, que também eu à sa. Fi aprimeira ósfa que cnheceu, que marcu sua aprximaçã dasa de frma afetia.

Depis, prestu estibuar para ciências da cmputaçã naUnB, mas cm expectatias de transferir-se para fisfia, que ain-da não existia naquele momento na universidade. Na graduação,

enfatiza a formação ampla e o contato com autores e períodoshistóricos diversos.

Redemocratização

Quand cursaa ensin médi, entre 1984 e 1986, País ini-ciaa prcess de redemcratizaçã. Marce pôde perceber mu-danças n ensin de sa que fram se cncretizand entamentea ng da década de 1980 e 1990, cm estudante e dcente. A

presença gradual da disciplina nas escolas públicas e, principal-

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mente, o aumento do número de publicações acadêmicas e não aca-dêmicas. “Esse é períd de expansã e cnsidaçã ds curssde graduaçã e pós-graduaçã em sa nas uniersidades bra-sieiras, que ns permite hje faar da pssibiidade de frmaçã

de um grande númer de prfessres de sa para a educaçã básica, formados em grande parte por universidades públicas, oque também é um fat n na história da sa n Brasi, ndea frmaçã sóca sempre estee incuada à frmaçã reigisae, a partir de cert períd, a engajament pític.”

 Já ecinand n Ri de Janeir, embra que nã haia uma eifedera que estabeecesse a sa cm discipina brigatória, ape-nas “cnteúds de sa e scigia necessáris para exercícida cidadania”, cnfrme a lei de Diretrizes e Bases (lDB) de 1996.

A inclusão nas escolas públicas dependia das decisões estaduais.“o Cégi Pedr II estaa prestes a ingressar em um períd desete ou oito anos sem concurso para professores, sendo efetivadoo contrato temporário de trabalho, que chegou a constituir metadeda equipe de prfessres de sa n cégi.”

Ao reacinar a abrdagem adtada n ensin da sa cm cntext scia daquee mment, ósf mencina que haiainsatisfação com o processo e os resultados na escola. As consequên-cias fram as experimentações (apesar de imitações institucinais),

 buscas pr estratégias didáticas que pudessem incuir a sacomo experiência importante para os alunos.

Heranças

A ausência d ensin da sa n períd da ditadura mii-tar pde ter cntribuíd para gerar diersas atitudes em reaçã àmesma, na piniã de Marce Senna Guimarães. “Eu perceb que,ainda hje, na esca e mesm na sciedade, há diersas atitudes

em reaçã à sa que pdem ter reaçã cm a ditadura, mesmque nã excusiamente cm ea. A Fisa é ista cm cnersasque não levam a lugar algum, como conhecimento pouco rigoroso(e, prtant, impssibiitad de trnar-se uma discipina escar, quedeeria ser mais bjetia), cm fadada a reatiism (eu respeit asua piniã, cê respeita a minha, e cams tds na mesma), aémde ser inúti, sem serentia para a ida prática u prssina.”

Se de um ad há isões equicadas sbre pape da fis-fia na formação do pensamento crítico, de outro, há os que atri-

 buem excess de respnsabiidade à discipina. “As expectatias

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que pesam sbre ea [fisfia] nem sempre sã justificadas, cma capacidade de realizar uma educação moral e política dos estu-dantes (muitas ezes se quer que s auns bedeçam u assumamcerts ares, e se pretende dar à fisfia pape de reaizar esse

bjeti; utras ezes, a fisfia é acusada de ser dutrinaçãideógica); u mesm a capacidade de ensinar a pensar, ógica eracinamente. Também parece se esperar da fisfia a capacidadede responder a questões últimas, questões abrangentes, ou mesmode ter resposta para todos os problemas. Algumas expectativaspdem ser justificáeis, utras taez nã.”

Marce anaisa que a resistência à inserçã da sa na escaé resutad de uma isã eitista, que quaica a ppuaçã cmincapacitada e desinteressada.

Três professores, três momentos, três olhares:debate entre Marilena Chaui, João Carlos Sallese Marcelo Guimarães

A presença brigatória d ensin de sa e da scigia emtdas as séries d Ensin Médi crreu a partir da lei 11.684/08,de 3 de junh de 2008, gerand muitas expectatias e esfrçs dgern, das uniersidades, d Ensin Médi púbic e da sciedade

 brasileira. É um processo complexo no qual há diversas demandasdas partes envolvidas, tornando o debate imprescindível.

Apresentams aqui um diág entre Mariena Chaui, JãCars Saes Pires da Sia, e Marce Senna Guimarães, que, emvirtude das suas experiências profissionais e de relação com a fi-sfia em cntexts histórics diferenciads ns útims 50 ans,abordam temas essenciais ao ensino de filosofia nas escolas darede púbica. A mediaçã é de Marce Carah, prfessr d

Departament de Fisfia da Uniersidade Federa de Sã Pau(Unifesp). Serã anaisads a seguir s impacts da reinserçãbrigatória da fisfia n Ensin Médi e ns departaments defilosofia das universidades, a formação dos docentes, as práticasem saa de aua, a reaçã cm aun, as orientações Curricu-ares Nacinais (oCNs), a integraçã cm utras discipinas; adisseminaçã da fisfia em espaçs infrmais e na mídia. Framreaizadas entreistas e encntrs cm s fiósfs, cuj cnteúdfoi organizado em tópicos, de acordo com as questões colocadas

e as reflexões apresentadas pelos participantes.

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Dados da Capes de 2009 indicam que há pouco mais de 31mil professores de losoa atuando no País. Destes, apenas 25%têm formação especíca. Portanto, segundo a instituição, atual-mente seriam necessários quase 110 mil professores para atender

à demanda das escolas públicas. Como analisam o impacto dareintrodução da losoa no Ensino Médio (EM) público?

Marilena Chauí (MC) – Essa meta é impssíe. Taez ps-sams acançá-a até 2020. Há duas cisas a eitar e uma que seriarecmendáe. A eitar: distribuir as auas de sa as nã gra-duads em sa; intrduzir ensin à distncia para suprir afata de prfessres. Recmendáe: admitir cm prfessres aunsque estão concluindo a graduação, isto é, que estão no último ano

ou no último semestre do curso, com o compromisso de supervisãode algum docente universitário. Quando eu era estudante de gra-duação, isso era muito comum.

João Carlos Salles Pires da Silva (JC) – vej que estams en-frentand um grande desa, u seja, a impantaçã é uma itória,uma cnquista, mas cm ist cmeçam s prbemas. Em primeirlugar, o centro da questão é a formação do professor. Na univer-sidade, há um ambiente que nã pensaa a educaçã d EM, um

ambiente que se fortaleceu pensando a pesquisa, inclusive a própriaausência d ensin de sa n EM fez cm que s nsss expe-dientes, nossa maneira de formação, se voltasse para pensar aqueleprodutor de textos, produtor de  papers, pesquisador do programade pós-graduaçã, e nã aguém reetind sbre a especicidaded ensin. Ist cria certa cisã que pde ser reertida agra, masaí, por exemplo, nós precisamos ter uma forma de avaliação daqualidade do trabalho do docente nas graduações e pós-graduaçõesfortes do País, que valorizem também a preparação de professores

e nã apenas a preparaçã de pesquisadres. Esta é uma cisã quevamos ter de enfrentar.

Marcelo Senna Guimarães (MG) – Sem dúida é um desaimens. Um prbema em questã é fat de que n EM tems quedar aua para auns que nã ã seguir a carreira de prssinaem sa. os prfessres ã ter que encntrar maneiras de fazera sa ter sentid para este púbic, que nã ai necessariamenteestar interessad em aprfundar aquee cnteúd sóc para

além do que vai ser dado na escola. Penso que principalmente nos

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primeirs ans de impantaçã da sa na esca será interessanteestar atent à diersidade, às frmas encntradas pes prfessrespara levar a disciplina até os alunos.

Quais os desdobramentos da presença da losoa no EnsinoMédio para os departamentos de losoa das universidades?

MC – A retmada da icenciatura e empenh na frmaçã deprfessres, assim cm a prduçã de uma bibigraa adequadaàs cndições d Ensin Médi. o fundamenta é nã diidir s es-tudantes em duas categrias, a ds prfessres d Ensin Médi e ads pós-graduands candidats a Ensin Superir: tant a icencia-tura quanto a pós-graduação devem alcançar todos os estudantes de

sa e dar-hes a mesma frmaçã. Aém diss, s departamentsde sa nã pderã furtar-se à tarefa de infrmar-se sbre ascndições materiais e inteectuais d Ensin Médi e cabrar cmos professores que pretendam transformá-las ou melhorá-las.

JC – Essa na tarefa sóca nã pderá car isada em umcompartimento, como se não fosse nos afetar em nossos interessesde pesquisa supostamente mais elevados. A comunidade inteiradeve estar atenta, sabendo, por exemplo, fornecer bons textos, boas

edições, quer reproduzindo obras clássicas, quer produzindo bonsmateriais didátics, quer enm ferecend as prfessres suprteparadidático, que tanto favoreça seu trabalho em sala de aula, comoainda refrce seu cntat cm mehr da prduçã sóca atua,estimulando-o inclusive a continuar sua formação acadêmica. Nessesentid, a impantaçã da discipina n Ensin Médi mdica, am-plia e, queiram ou não, enriquece a pauta dos cursos de graduaçãoe pós-graduaçã em sa. Nã cria apenas um mercad n,a demandar utrs itens. Mais que iss, briga-ns a uma na

atençã, a ns desas, cm é, pr exemp, de cnciiarprofundidade e clareza, na forma e no conteúdo.

MG – Penso que seria bom se os departamentos de filosofia dasuniversidades brasileiras se sensibilizassem para a necessidade defrmar s prfessres de fisfia para a Educaçã Básica, e paraisso adotassem procedimentos de formação que fossem relevantes eeficazes. A formação do professor não deve ser tarefa exclusiva dosdepartamentos de educação, mas deve-se buscar integrar, de algum

modo, a formação acadêmica/disciplinar com as necessidades de

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frmaçã d prfessr. Iss já crre, em parte, cm as experiênciasde estágio realizadas como requisito de obtenção da licenciatura.É preciso aprofundar essa experiência para que ela se torne maisefetia tant para s icenciands quant para s prfessres já

em exercíci e para as escas nde trabaham. os departamentsuniversitários de filosofia podem realizar um importante papel,ao acolher e cultivar a discussão e a produção de alternativas emcnjunt cm s prfessres das escas e cm md de frmaçãds icenciands. Seria um md de ccar em questã e encntrarcaminhos para responder ao que pode significar currículo rigoroso,de ar fisófic e de reencia para a frmaçã ds jens – deque md a fisfia interessa à juentude e à sciedade brasieira?Essa questã é um md de entender significad da brigatrieda-

de d ensin de fisfia nas escas – é precis que s prfissinaisda filosofia tornem-se capazes de responder a ela, de modo coletivo.Parece-me imprtante que haja interaçã entre s departaments defilosofia e os professores de prática de ensino de filosofia, que atu-am geramente ns departaments de educaçã. Nte-se que GTda Anpof Filosofar e ensinar a filosofar , que tem promovido a pesquisae discussão do ensino de filosofia, entre outros temas, é constituídoem grande parte por professores que atuam nos departamentosde educaçã. Esse caráter híbrido  institucinamente (um GT da

associação de pesquisa em filosofia, formado por profissionais quetrabaham ns departaments de educaçã) tende a gerar dificu-dades de financiamento para eventos, por exemplo. Não obstante,parece ser importante que os departamentos de filosofia acolhampesquisas sobre o ensino de filosofia, ou que se articulem de modomais produtivo com os professores que realizam essa pesquisa.

Houve acomodação na estrutura das universidades por causada herança do regime militar, que denitivamente expurgou a -

losoa do EM? Se isto for realidade, o processo de transformaçãoda universidade será mais traumático?

JC  – Traumátic, nã sei. vai ser difíci. Primeir, ach quefizems mehr pssíe, u seja, nós fazems pesquisa de qua-idade n País. Tems hje uma cmunidade fisófica nacinaque envolve vários programas de pós-graduação, onde professoresestã prduzind texts de quaidade cmparáeis às mehresuniersidades d mund. Entã, certamente, hue sucess; nã

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houve uma acomodação. Há o pesquisador que se torna especialistaem, ams dizer, Wittgenstein, e que acntece? Este pesquisadré solicitado a escrever de maneira cada vez mais pontual, fazendoum recrte que às ezes só é cmpreendid pr um especiaista.

Agora, começamos a ser demandados a escrever sobre outros as-suntos, a traduzir textos visando a um público mais amplo e assimpr diante, u seja, esta demanda já está atingind pesquisadrque anterirmente só se taria à prduçã de artigs e periódicse a aimentar própri sistema de pós-graduaçã. Existe um mi-mento que nos agarra um pouco e nos coloca a obrigação de produ-zir bas traduções, bns materiais tads também a EM, textstads à frmaçã de prfessres. Este miment taez sejatraumático em alguns lugares, mas ele conta com uma base sólida

da pós-graduaçã para que a transiçã seja de quaidade também.

Os departamentos de losoa focaram seus conteúdos na for-mação de pesquisadores. No que essa característica favorece osdepartamentos de losoa das universidades, tendo em vista odesao do EM?

JC – A mudança radica ns departaments de sa d País.Sem esta mudança, taez, hje, fsse temerári aprar uma intr-

duçã da sa n EM. E esta mudança ene uma prssinai-zaçã, uma quaicaçã ds departaments que nã necessariamentens cass indiiduais signicaram uma mehria na quaidade, masem linhas gerais, uma mudança na composição docente dos depar-taments. A cmparar departament de sa hje, pensandna dimensã d País, cm s ans de 1970, 1980, ericams quehaia pucas pessas cm tituaçã [especíca], até mesm de gra-duaçã. Eram médics, adgads, ex-padres, muits ex-padres. Nãhaia uma prática de frmaçã marcada pr critéris própris. Estatransformação não pode ser desdenhada para entender as condiçõeshje para trabah sóc, prque ea tem a er também cm prcess de ampiaçã da pós-graduaçã n País. Hje nós temsuma composição dos departamentos, basicamente, de doutores emsa em quase tds s cants d País. Ist é uma situaçã quereete um padrã de quaidade. Se hue certa exprpriaçã dnosso território, o vício da ausência se transformou em virtude: atransfrmaçã ds departaments de sa paraeamente à au-

sência da discipina n EM.

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Então, é possível dizer que as graduações e licenciaturas delosoa nas universidades estão preparadas para formar profes-sores para o Ensino Médio?

MG – os icenciands chegam cm uma frmaçã já muitespecializada. A graduação tende a fazer com que o estudante vá seespeciaizand num autr, u numa épca, u num períd etc. E,n EM, a demanda, até ds própris auns, é de um cnhecimentmais gera. Muitas ezes se abrda um tema em Patã, pr exem-plo, e os alunos fazem perguntas que demandam outras posições.Perguntam que se diz hje sbre a sa, que deriu daqueepensador. Parece-me que os cursos de graduação vão ter que pensarem como oferecer para os estudantes uma formação geral que não

seja supercia, que tenha agum astr, aguma prfundidade. Estaé uma questão que parece importante.JC – Há também risc de gerar um utr aun, um aun da

generaidade, de um cnheciment supercia, da frase de efeit,das gtas de sabedria. Este risc é muit séri prque um grandemercad [de trabah] se abre; s númers sã assustadres. Cmeste mercado, certamente, muitos produtos vão ser oferecidos e aquestã é cm ams aaiar a quaidade destes prduts. Cmvamos poder fazer um agenciamento perfeito entre profundidade

e generaidade? Neste sentid, ach que até própri EM fereceagumas respstas; u seja, que estági é este? Que mment é estede frmaçã? Que tip de demanda aun apresenta? Pde seruma pnte para esta transiçã da sa mais prssina, maisvoltada para a pesquisa, para atender este contexto, esta sensibili-zaçã d aun d EM.

MC – Escrei um ir para EM. o que pens está á. É bbagem querer dar um curs que seja uma ersã preparatória

para a graduaçã de sa u que seja uma ersã diminuídada graduaçã. Aém diss, a reaçã da sa cm a sciedade ecutura cntemprneas pde ser um bm caminh para mstraraos alunos a antiguidade e sistematicidades de certas questões quepercrrem a história da sa e chegam até nós; u, a cntrári,para lhes mostrar as novas exigências a que o pensamento é levadope mund cntemprne. Basta que s auns nã imaginemque estã inentand a rda u que a sa é achism (“eu achque”, “eu gst de”, “eu nã gst de”) para que a escha d tema

seja frmadra.

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MG – N cégi D. Pedr II, a gente adtu uma frma deestági na qua icenciand ca um an inteir acmpanhandtdas, u quase tdas, as atiidades d prfessr. E nã só bser-vando, mas na medida do possível também participando, sem fa-

zer dele mão de obra barata. Que ele tenha participação efetiva nopanejament, na discussã, na apicaçã, na reaizaçã de auas,apicaçã de exercícis. Este cntat diret cm a prática taez sejaa maneira mais cncreta de dar a dimensã d necessári n EM.

JC – A gente ai precisar de muit trabah para frmar bnsquadrs para este EM. Eu estu dizend uma cisa particuar: fr-mar um pesquisador de pós-graduação é mais fácil do que formarum prfessr para desa d EM nesta extensã, na extensã d

desa que se cca para País.Como aliar a leitura dos textos clássicos, o debate de grandes

questões de sua tradição, a um olhar atento e crítico com relação

à atualidade e seus problemas?

MG – Eu ach que a ênfase n text sóc é muit impr -tante, mas às ezes prfessr se ê atrapahad, digams assim,cm a turma de adescentes que ee encntra à frente. Sem negara imprtncia d text sóc, é cm prfessr [Jã Cars]

disse, taez a frmaçã d dcente de EM seja até mais difíci quea formação do pesquisador. Porque ele precisa ser capaz de realizaresta pnte, digams, entre esta tradiçã, na qua se espera que sejao mais bem formado possível, que ele tenha condições de continuarse formando, mas fazer a ponte desta tradição com a experiência,as questões, as ansiedades, as angústias dos adolescentes, que sãoo seu público, não é fácil, de fato.

JC – Às ezes tems a ideia de que ams atingir mais um es-

tudante cm um pema d que cm um text sóc, e fazemspouca coisa diferente que um professor de literatura, um bom pro-fessor de literatura. É o risco que corremos, de fazer algo que nãose distingue, u que nã traz a marca própria da sa. Estams,entã, dand empreg a um prssina e nã fazend cm que asa chegue a EM.

MG – Mas há texts sócs estimuantes e maraihss paratrabahar n EM. o prfessr reamente tem de cnseguir escher.Texts curts já geram efeits muit interessantes...

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MC – É uma questão de dosagem e de kairós. Dsagem: é re-comendável que os alunos leiam pelo menos três textos clássicos(pr exemp:  Menon, Discurso do Método  Parte 1, Discurso sobre aorigem das desigualdades) e aprendam a fazer anáise de text prque

ist s ajudará nã só em fisfia, mas em tdas as utras maté-rias e, futuramente, em cursos de graduação que não de filosofia.Penso que não é recomendável estruturar o curso por leitura detextos, pois isso requer técnica, interesse, paciência e tempo queos adolescentes não têm. Kairós : depois de conhecer a classe eperceber quais as inquietações ds auns – em gera, existenciaise reigisas – prfessr pde escher s texts para seminárisde leitura de texto.

MG – N cégi D. Pedr II, a gente tenta adtar esta pers-

pectia de que text sóc é fundamenta, entã, tentamstrabahar sempre tend cm referência um text sóc paracada unidade d prgrama. lá, atuamente, sã trimestres. Em cadatrimestre tems um u mais texts sócs e desenems tra-

 bahs reacinads cm ee: mes, debates, prduçã de text, eros textos com os próprios alunos, o professor produzir textos, usar,prduzir expressões teatrais etc. Cada turma, cada saa de aua éum desa n, nã tem uma receita para tud.

Se não há receitas, além da formação sólida em losoa, o quemais é preciso para um bom professor de losoa?

MG – A sensibiidade para púbic cm qua se está tratand,para que o professor não se coloque numa posição de apenas enunciar,fazer uma expsiçã sóca sem que s auns, de fat, estejamapreitand. Ist pde acntecer em agumas situações: prfessrfaz uma bela exposição, mas os alunos estão completamente distantesdaquilo que está sendo falado, respondem um pouco ao modo do queacontece muitas vezes na escola, um pouco mecanicamente. Pode secriar ai um ambiente um puc articia. o tip de trabah que professor desenvolve, o tipo de instrumento que vai criando paraaproximar os conceitos, para fazer o tratamento dos conceitos, é muitoimportante, mas isto, de fato, se desenvolve em cada situação.

JC – Em um pnt há razã: uma certa sensibiidade d pr-fessor ao específico da situação em que ele vai precisar mostrarcmpetência fisófica. Uma cisa é a aua, utra é a cmunicaçã,

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uma paestra. o prfessr bem infrmad é capaz de idar cmáris instruments e muit distints. Td um repertóri. Ee nãé apenas aquele que escreve  papers , ou faz prestação de contas,ou relatórios para as agências de fomento, ou solicita bolsas para

auns de iniciaçã científica. Tem que ser capaz de fazer aua,e aqui, só um detalhe: boa aula não é a utilização de um montede manuais. É claro que vão se produzir muitos manuais, livrosdidátics ã ser adquirids as mntes, incusie pe MEC. oque significa ist? Significa que prfessr que estier bitadao manual está na contramão das orientações curriculares. Quandocolocamos conteúdos nas orientações curriculares, não pensamosque estes seriam resolvidos em vários capítulos num manual, ondeo professor começa no primeiro ano dando aqueles assuntos, vai

seguind e assim pr diante. A ideia é que ee seja capaz, cm a suafrmaçã, de fazer um prjet própri, prque smente assim airealizar em sala de aula uma experiência filosófica autêntica, semprediferente de sala para sala, diferente de professor para professor.Seria uma tragédia imaginarms que, n País inteir, árias pessasestiessem ministrand s mesms cnteúds. Imagine só se tdstivessem uma mesma didática: não importa a sala onde se entra,nã imprta se prfessr fi frmad end Sartre, Wittgenstein,Marx etc., ist seria taez um infern tta, um desastre fisófic.

Porque aí a filosofia, ao invés de ser um processo de formação, derefexã, seria smente mais uma ceta de infrmações. E estacoleta de informações seria decorar certos argumentos e ser capazde reprduzi-s. Ist nã é essencia d trabah fisófic.

MC – Cncrd cm Jã Cars. Um prfessr bem frmad écapaz de criar interesse da casse. Frmaçã: cnheciment apr-fundad da história da sa; cnheciment das questões cássicas

da sa em tdas as suas áreas; cnheciment ds principaisautores e textos clássicos de cada uma das disciplinas que com-põem a sa; cnheciment de pe mens uma íngua, aém dprtuguês, que permita er um ósf n rigina; percepçã dasreações entre temas cássics e cntemprnes, seja n camp daestética, da ética, da política ou da lógica.

Em virtude da falta de cultura do ensino losóco, é preciso

pensar as diculdades do professor de EM no futuro próximo.

Como é hoje a relação com o aluno em sala de aula?

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MG – A experiência é sempre diersa. Às ezes de uma turmapara utra já tem diferenças imensas. É precis chegar pert dsauns, se aprximar, trazer a sa, fazer cnite para se aprxi-marem da discipina. N cégi D. Pedr II, a gente tem uma média

de 15 prfessres trabahand td an, que dá pssibiidade deabordar e de trabalhar de diversas maneiras. Agora, outra coisa inte-ressante é que, em geral, em todas as turmas se encontra pelo menosum grup de auns que está interessad já quase espntaneamentenas questões que a sa cca. É bem curis. Quand se chegacm questões sbre cnheciment, a erdade, às ezes sbre ser, ag muit abstrat, s auns cam intrigads, participam dasquestões, ds debates. Cnduzir um debate, um prcess de ensinomais cuidads, mais rigrs, gera uma série de dicudades que

cada professor deve resolver em cada sala de aula.

MG – Eu estaa pensand que, muitas ezes, adescente érude. Quand se faz uma apresentaçã sóca, se prfessr nãestiver muito seguro, não preparou bem a sua aula, digamos assim,o adolescente pega muito facilmente os seus pontos fracos, as suasfahas. Dar aua para s jens é um bm teste para prfessr, paraer se discurs é reamente cnincente e bem cnstruíd. os j-ens, em gera, rejeitam muit rapidamente uma apresentaçã que nã

tenha consistência. Já na universidade, há certo espaço de proteção dasa, prque as pessas estã interessadas, escheram, estã cm ba ntade. Nas escas [EM], iss, às ezes, nã acntece. Quandse começa a apresentar um tema ou um autor, se não mostrar a per-tinência daquee tema a aun, ees rapidamente rejeitam. Muitasezes, aun cca uma questã diretamente d tip: “Ana, quaé a sua psiçã, prfessr?”, “o que cê acha?”, “vcê está faanddos racionalistas e dos empiristas em conhecimento, mas o que vocêacha ana?”, “o que é cnheciment?”. Sempre cca um desa

para prfessr. Eu estaa, utr dia, cnersand cm um cegaprfessr que se frmu recentemente na UFRJ [Uniersidade Fede-ra d Ri de Janeir]. Estaa dand aua n cégi e ee fau: “osauns me perguntam cisas que eu nã sei. Eu nã sei respnder,mas ees exigem que eu manifeste aguma psiçã sbre ist e...”.

JC – Ees sempre perguntam cisas que nós nã sabems...

MG – É imprtante ccar para aun: “oha, esta questãeu reamente nã tenh cm respnder”, u, é imprtante expicar

para aun aguma direçã daquea questã. Eu ach que é ist.

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A saa de aua é um desa, sem querer desquaicar a saa de auade níe superir em reaçã a níe médi. Sã cntexts bastantediferentes. É precis fazer a sa diagar cm este púbic ecm as suas expectatias e precupações. Esta pde ser uma tarefa

muito interessante, tornando-a mais disseminada na própria cultu-ra brasieira. Esta presença disseminada se cnsidará de agumafrma, sms empurrads a ea peas circunstncias, para bem upara ma. Esperams que para bem.

A presença do diálogo losóco, da formação em losoa,é adequada no momento especíco da adolescência? Este é umpúblico interessante para a losoa?

MG – Eu ach que é um púbic muit interessante, apesar deque Aristótees já tinha percebid que s adescentes se deixamear peas suas paixões. De fat, às ezes, é difíci cnseguir fa-zer um debate, ou seguir uma linha argumentativa mais densa porum tempo muito longo, mas é um público que também está muitointeressado em discutir o que está colocado no mundo, em pensara própria ida. A sa apresentada nã cm uma teria, mascom uma espécie de sabedoria prática envolvida na disciplina, ten-de a ser muito rica e estimulante para os adolescentes. Acho que éum mment em que jem está muit abert para experimentardiferentes posições, por isso é interessante ele ter contato com dife-rentes perspectias sócas, para ser capaz de perceber que existea pluralidade de formas de pensar o mundo, de pensar a existência,de pensar cnheciment, de pensar a ciência. Muitas ezes háuma espécie de uniformidade do pensamento e o trabalho do pro-fessr de sa é mstrar aém daquea maneira únic de pensar.

JC – É ist que Marce fau. Às ezes, aun tem questões

próprias sobre o ser, a existência, que podem evocar temas naturaisde sa, mas ee também tem questões de ciências que pdem sera pnte para um diág cm a sa [...]. Uma cisa fundamentaé que o professor não pareça um mago que vai chegar levando umsaber, u um cert pensament crític que ninguém mais tem. Eenã pde ser aquee prfessr isad diante d prjet pedagógi-co da escola. É neste sentido que há um certo caminho para fazeresta transiçã que é recnhecer que é EM, qua a característicafundamental. Aí, sim, fazer o diálogo da filosofia com os outros

prfessres, cm s utrs cnteúds que estã desaand a cabeça

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d aun. Tems uma ideia um puc tsca de que que interessapara aun d EM é smente a sua frmaçã pessa, psicógica,sexua e assim pr diante. o aun é mais, aun tem desafi.

Tendo em vista a necessidade de integração do professor delosoa ao projeto pedagógico da escola, em linhas gerais, qualé a concepção do trabalho docente, quais são os problemas queas Orientações Curriculares Nacionais (OCNs) de losoa tentamresponder?

JC – As oCNs surgiram de um prcess muit interessante daSecretaria de Educaçã Básica d MEC, que chamu as sciedadescientícas para diagar, reaizu fóruns, e neste sentid fez uma

pnte entre mehr da frmaçã prssina das diersas áreas,cm eabraçã de texts para EM. Antes nã era bem assim, haiaaguns cnsutres eeits que faziam suas redações. Mas desta eznão, foi um processo de consulta ampla, de reuniões pelo país intei-r que traçaram um n per para eas [oCNs] e aprximaram cnteúd d EM daqui que estaa send reaizad cm mehrda frmaçã prssina nas diersas áreas. Fi interessante perceberprimeir que as diersas áreas apresentaam questões sócas nasua eabraçã, tinham demandas sócas, mas que resiam à

uz de seus cnteúds. Em sa, hue uma atençã especia empensar um sistema único, digamos assim, um sistema que associassedesde EM até a frmaçã de dutrad, já que a chae é prfes-sor e o como vai estar bem informado para dar conta do conteúdoda sa. É imprtante er em que cnteúds s prfessres es-tavam sendo formados efetivamente e traduzir isto nos temas quenaturamente deeriam gerar prduts para EM. Esta fi a chae

 básica. Eu ach que é este diferencia. As oCNs fram eabradastend em cnta efeti da frmaçã de sa, de maneira séria,

de qualidade no País. É desta maneira que elas podem fazer, diga-mos assim, uma diferença na passagem daquilo que é a formação dolicenciando e o controle dos materiais que são utilizados.

As OCNs dão ênfase muito forte ao debate com a leitura detextos losócos e à especicidade da losoa...

JC – Sim, sem dúida. É car que egad da história da -sa nã pderia estar desencihad daqui que tratams, masnã é uma reprduçã d curs de graduaçã n EM que está send

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prpst. o resutad seria um trabah de péssima quaidade, aémde ser enfadonho e de afastar completamente os alunos. A ideia foitraduzir, criar mecanisms (que dee ener um esfrç da Se-cretaria de Educaçã, ds departaments, ds curss de sa),

criar cndições para ter materia, um bm materia à dispsiçã dacmunidade acadêmica, de ta srte que s cnteúds de saestiessem acessíeis para prfessr, que usaria este materia àuz de sua frmaçã também. Entã, s cnteúds que fram pas-sads [nas oCNs] nã sã excusis, nã sã únics, mas sugeremesta passagem, desde a leitura do texto clássico até a utilização demateriais que não são estritamente de filosofia. Não se descartaque se use um me, mas a aua nã é para passar um me sim-pesmente; nã se descarta um pema, mas a aua de sa nã é

simplesmente de literatura, e assim por diante. Ao mesmo tempo, éimprtante recmendar fntes. Eu recmendaria para um prfessrque está numa esca afastada (às ezes isad, brigand para termais hras de aua, prque nã é brincadeira) estar inserid nprjet pedagógic. É muit interessante que ee cnsiga encntrarpontes com outras disciplinas.

A generalidade do discurso losóco dialoga com contextosespecícos em que está colocado. De que maneira a losoa deve

ser permeável ao ambiente e como isto provoca o próprio debateque se apresenta na sala de aula?

JC – Taez nã cm a ideia de que uma cr ca se im-ponha sempre, porque há um processo de formação que é co-mum, universal. Nem sempre tem que se fazer concessão a umainfrmaçã que daria um crid própri. Ist em naturamente,até prque n EM árias escas estã eschend seu acer decnteúds. Pr exemp, na Bahia existe história da África que está

send ccada n EM, que faz parte da nssa... É um pnt impr-tante para a nssa armaçã cutura. Ist ai ter seu impact nareexã sóca...

Há perspectivas de integração da losoa com outras disci-plinas colocadas pelas OCNs?

JC – Sim, sem dúida. É car que nã se pde ir a EM sem nss egad. Eu su cntra a ideia de que simpesmente deems

privilegiar somente temas, como se não houvesse um legado próprio

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da história da sa, texts de história da sa, as quais sestudantes nã estariam preparads para este acess. Ist é fas.Um bm prfessr, bem preparad, pde traduzir estes texts, pdefazer cm que este seja um instrument didátic extrardinári.

MG – [na prática] É um ambiente de tensã. o espaç da -sa na esca é um espaç disputad. Iss pea experiência dD. Pedr II, que na mair parte ds ans inseriu a discipina emduas séries, cm dis temps semanais. Em aguns ans ea este-ve reduzida a uma série apenas, por questões internas do colégio.Percebe-se a pressão de outras disciplinas para ter aquele espaço nagrade hrária, que é muit disputada. Tem a questã d estibuartambém que cnstrange muit EM, nã é só dentr da esca,

mas as próprias uniersidades exercem uma pressã sbre EM adenir prgramas de estibuares muit extenss das discipinas,incusie de sa, em aguns cass. Aguns estibuares prpõemuma tarefa talvez impossível para o professor, que é cumprir umprgrama extensíssim de história da sa.

JC – Se nós harms as rientações curricuares nacinais dasdiersas discipinas, tdas eas têm cmpnentes cm apes só-cs muit frtes. Um exemp: bigia – eucinism. o debate

evolucionismo/criacionismo faz com que se possa valer de textos dahistória da sa. Um text de Daid Hume, Diálogo sobre a religiãonatural , n qua Daid discute a pra teógica da existência de Deus,pde ajudar a discutir a teria da seeçã natura. Um tema que seestá aprendendo em biologia, com uma certa narrativa da causalidade,uma narrativa de como se pode mostrar que a experiência se ordenanão por mero acaso, que tem explicações para aquilo que pareciafugir a quaquer rdem, a quaquer reguaridade. Este cnhecimentespecíc em bigia pde ser trazid para debate sóc. Aí a

sa nã se trna um crp estranh, nã surge d nada, pde atétrnar mais instigante a aua de bigia, e ice-ersa. o cnteúd de

 bigia pde despertar interesse sóc. É só um exemp.

MG – [a integraçã] Depende muit da equipe, das pessas, daabertura e do modo de se integrarem, mas o diálogo é possível. Éclaro que existem muitas escolas em situação muito precária, mas,nesse cas, a dicudade já é de utra rdem. onde há uma cndiçãmínima para se trabalhar, acho que é um campo de oportunidades

e possibilidades muito grande.

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JC – [...] nã sei se a sa é transfrmadra d EM. Achque seria pensá-la como uma  panaceia que vai resolver toda a indi-gência de reexã crítica. A cntrári, ach que há uma mudançana própria cncepçã d EM e as diersas discipinas estã trazen-

d questões que fazem cm que a presença da sa seja maisnatural e necessária.

MG – o EM está em questã reamente e, de fat, a ta dafilosofia e da sociologia pode gerar alguma mudança neste debate,no sentido de introduzir outras perspectivas que não as que estãomais, como as disciplinas de ciências, das ciências naturais, da ma-temática; eas cupam grande parte d currícu. Sem desarizá-as, é precis que haja espaç para utras perspectias, aém d

diálogo com a área das ciências naturais, matemáticas. A filosofiapode ter diálogos muito interessantes, muito ricos, por exemplo,com a área de linguagens, com as disciplinas de língua portugue-sa, de iteratura, e eu pens até (é um puc um prjet) que asdiscipinas de artes, se huesse mais presença de artes n EM,seriam muito interessantes para enriquecer até a própria formaçãodos alunos. Propor aos alunos que apresentem trabalhos de síntesedo conteúdo discutido na forma de apresentações artísticas tendea motivar muito. Parece-me que a relação dos adolescentes com o

campo das artes e da comunicação é muito importante.

O trabalho filosófico com o texto tem certa especificidade.Muitas vezes se confunde a aula de losoa com um espaço dedebate solto, de sobreposição de opiniões. Como se lida com istono contexto da sala de aula?

MG – É sempre um prcess n qua se tenta sempre aprfun-dar e tornar mais rigoroso o trabalho com o conceito, o trabalhocom os argumentos, a compreensão das perspectivas filosóficasque sã enunciadas em cada text. Mas nã pss dizer que hágarantia de que se deem grandes passs cm uma turma de EM,independentemente das condições que se tem. Acho que é umatentativa mesmo, cada professor tem de experimentar com suaturma maneiras de ir desenvolvendo o trabalho especificamentefilosófico, para não ficar apenas uma noção vaga de crítica, semser capaz de especificar o que significa uma perspectiva crítica,

uma certa perspectiva crítica em filosofia.

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JC – Eu ach que desafi d EM é dad também para amatemática, é dado para a história, é dado para a biologia, para afísica... É muito difícil concentrar a atenção, atrair para o debate.E, pr utr ad, nã é só na idade própria para EM que as

pessas pdem ser dadas a banaidades; a cntrári, a banaidade,a futilidade, a dispersão, ser guiado por paixões , no mau sentido dotermo, tudo isto pode acontecer em qualquer época [...] ou somoscatiads pea pidez d espírit u pea rudeza. Eu ach que estedesafi se dá para ehs marmanjs e nã apenas para adescen-tes. o adescente, em gera, pde ser agarrad cm muit maisincência, taez seja mais facimente dutrináe num mmentem que está formando a sua personalidade. A aula de filosofiapode virar uma espécie de catecismo religioso. É perigoso o pro-

fessor se valer disso, se impor com verdade, trazendo verdades, aoinés de trazer a nssa tradicina prcura de erdades, u seja,renovar este gesto de procura. É muito mais fácil para o professorsupstamente despejar sabedria e ist é fáci para a autridadedele e um desastre [para os alunos].

Para nalizar, como veem a presença da losoa em espaçosinformais e na mídia?

JC – Esses ns espaçs nã pdem ser ignrads, nem des-denhads. Sã instigantes, sbretud para a reaizaçã pessa deintelectuais naturalmente talhados para o domínio da expressão,embora tenham tudo para serem frustrantes, se temos em contaautêntics ganhs sócs. Sabems que a cmunidade, em seusambientes mais próprios, tem mecanismos para separar qualidadereexia de prestidigitaçã erba, mas até nesse espaç íntim ea seiude muitas ezes. Imaginem entã em espaçs que, pr deniçã,escapam a nossos mecanismos de controle, a nossas medidas.

É cert que, de temps em temps, a sa se ê brigada adefender seus padrões na praça u n mercad. Iss já faz parte denssa tradiçã, send um de nsss eements. Cm s ns meise a multiplicação de espaços informais, a tarefa de separação entre ji e trig se rena. Pr iss, é instigante. Em td cas, emmments de regressã da audiçã, de perda da atençã à paara,em momentos de pressa e em nome da compreensão de um públicomais amp, prssina da sa taez esteja em agrantedesvantagem, sendo esse terreno mais propício ao taumaturgo.

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MG – Parece-me ba para a frmaçã escar, pis dá um senti-d da reencia scia da sa. Sabe-se, prém, que há dierssgraus de quaidade da sa apresentada nesses espaçs. Masentendo que se pode considerar um processo de familiarização da

sciedade brasieira cm questões sócas, que se efetua a partirdessa maior presença na mídia e em espaços informais, e tambémpea presença da sa nas escas. Taez sejams capazes detrnar sens cmum brasieir mais sóc, quem sabe? o queiss signicará dependerá da atuaçã de prfessres, estudantes e

 losofantes pr td Brasi.MC – N cas da mídia, essa presença é ambígua. Pr um ad,

passa a fazer parte da indústria cultural e, portanto, do entretenimen-t – para nem mencinarms risc permanente de se transfrmar

em discurs de autajuda e em pura idegia; pr utr, suscita aparecimento de um público que poderia interessar-se pelas questõessócas, sbre as quais nunca haia uid faar. N cas ds espa-çs infrmais (centrs cuturais, cics de paestras, cafés sócs),a sa tende, pr um ad, a preencher a acuna deixada pr suaausência n Ensin Médi ( que signica que, sb este aspect, eadeixará de ter ta pape assim que sua presença se cnsidar n En-sin Médi), assim cm a cmpementar a frmaçã de estudantesuniersitáris de sa (em gera, s que nã têm cndições para

cursar uniersidades púbicas); pr utr, ea tende a prprcinarreexões sbre a cutura e a pítica cntemprneas para um pú- bic de frmaçã uniersitária nã sóca, mas interessad peque espera seja a sa – frequentemente, esse púbic ea umsust diante da cmpexidade e pacidade ds cnceits sócs,susto que pode ou afastá-lo ou aproximá-lo das exigências do pensa-ment. Mas ns dis cass, ist é, tant na mídia cm ns espaçsinformais, é uma presença sempre ambígua e arriscada porque tudo(TUDo!) n capitaism se transfrma em barbárie e a sa nã

pssui quaquer garantia de que iss nã he acnteça, seja irandpur rnament cutura (uma grie a mais), seja trazend graticaçãimediata ou ilusão de conhecimento.

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Uns quinhentos anos antes da era cristã aconteceu na MagnaGrécia a melhor coisa registrada na história universal: a descober-ta do diálogo. A fé, a certeza, os dogmas, os anátemas, as preces,as proibições, as ordens, os tabus, as tiranias, as guerras e as glo-rias assediavam o orbe; alguns gregos contraíram, nunca sabemoscomo, o singular costume de conversar. Duvidaram, persuadiram,discordaram, mudaram de opinião, adiaram. Quiçá foram ajudados

 por sua mitologia, que era, como o Shinto, um conjunto de fábulasimprecisas e de cosmogonias variáveis. Essas dispersas conjecturas

 foram a primeira raiz do que hoje chamamos, não sem pompa, demetafísica. Sem esses poucos gregos conversadores, a cultura oci-dental é inconcebível (BORGES, 1985, p. 27).

1. Porque losoa antiga?

Um ds maires cmpsitres da música mderna, grande in-

adr, Igr Strainsky, cstumaa armar que ag “smente é fértiquand caminha de mãs dadas cm a tradiçã” (apud KNoX, 1994,p. 15). Crei ser este sentid mais precis da presença d ensinda sa antiga, e da própria sa, pr estes trópics: cnectar

Gabriele Cornelli* 

* É prfessr adjunt d Departament de Fisa da Uniersidade de Brasíia.Pós-dutr em Fisa Antiga pea UNICAMP e pea Uniersità degi Studidi Napi, dutr em sa pea USP, é atuamente Presidente da SciedadeBrasieira de Patnistas, Crdenadr d Grup Archai e Editr da Reista

Archai: as origens do pensamento ocidental.

Capítulo 2

História da losoa antiga:

começar pelo diálogo

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as nas gerações, irremediaemente prjetadas para futur peaideologia progressista e pelas exigências, sempre maiores, de ummund gbaizad, cm seu passad. Um passad que preferims,aqui, chamar de tradiçã, para eidenciar percurs dinmic de

sua construção até nossos dias.Ainda que a tese possa parecer desprovida de qualquer novida-de, as modalidades dessa tradição para o ensino, isto é, trazer esseenrme bj de uma tradiçã de mais de dis mi ans de históriapara a saa de aua, merecem uma reexã mais cuidadsa.

Antes de mais nada, a reexã precisa se cncentrar na reen-cia que a tradiçã da sa antiga, frtemente marcada pea sua

 grecidade e romanidade , pde ter para a frmaçã de nsss jensn sécu XXI. A sa antiga carrega cnsig incômd pape

de constituir o berço da cultura ocidental desde sempre, com todasas pretensões universalizantes e colonialistas que o termo indica.Assim, a pergunta pea pertinência da sa antiga à frma-

ção escolar brasileira assume contornos, a um só tempo, dramáticose esfumados: qual é o sentido de falar de Platão para nossos alunosnesta “utra margem d ocidente”, que é Brasi?1 

Enquant cidenta, prtant, mas, na outra margem , a san Brasi encntra-se em um nã ugar gesóc.2 Proponho que,a inés de amentar esse nã ugar (e quiçá querer passar a adtar

utrs staques), a sa antiga n Brasi, assim cm seu ensin,possa perceber o kairós – cm diziam s antigs gregs –, ist é, aocasião/possibilidade de certa forma única que esta sua marginalidade lhe proporciona.

Diferentes gerações brasieiras recdicaram cntinuamente,por meio de variadas manifestações culturais, a diversidade de le-gados ocidentais, isto é, de matriz europeia, que constituem, a estaaltura, componentes irrenunciáveis de nossa identidade cultural.Basta prestar atençã, desde s nuances d idima até s sistemas da

culinária, nos traços de matriz europeia que marcam nossa cultura.Tdaia, patrimôni cutura brasieir ache, de maneira bastanteúnica, cm mdaidades que já fram exaustiamente descritas prnossos antropólogos como sincréticas , releituras e recriações dessepassado, elaboradas na convivência com tradições principalmente

1  A expressão é o título de uma importante obra organizada por Adauto Novaese pubicada em casiã ds 500 ans d Brasi (NovAES, 1999).

2  Cf., para esta expressã, que indica a necessária inuência d ugar sbre

desenvolvimento do pensamento, a obra de Massimo Cacciari (1994).

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indígenas e africanas, quando não mesmo com outras tradições maisrecentemente incorporadas.

De certa frma, a prpsta é a de prestarms atençã às fr-mas de composição dessa cultura, para podermos aprender a fazer

filosofia não apesar dessa diversidade, mas exatamente a partirdesta outra margem da tradição ocidental.o estranhament cm reaçã à sa antiga, express pr

trinta adolescentes que, em sala de aula, e pela primeira vez, ouvemfaar em Taes de Miet – assciad a uma armaçã incmum daunidade d td – briga a pensar estratégias de ensin da sagrega clássica em nosso sistema escolar.3 Senã pr utrs mtis,exatamente prque está em jg a própria sbreiência d ensinde sa, sempre ameaçad pr fertas didáticas e ns portfolios 

marcadamente tecnicistas e imediatistas.Nesse sentido, me permito, aqui, fazer referência a uma expe-riência que acnteceu cmig, cm a qua desej mstrar as anta-gens de se fazer sa desta utra margem e em regime de umacontínua prova da pertinência de seus temas e autores no contextodo ensino. Na primeira aula de minha primeira disciplina de históriade losoa antiga , lá se vão alguns anos, ministrada para uma turmade caurs de graduaçã em sa, deparei cm uma situaçãinédita para mim: muitos dos alunos presentes ouviam falar de

fisfia antiga pea primeira ez (à épca, Ensin Médi nãhavia ainda integralizado de forma sistemática o ensino de filo-sa). Cm dcente de rigem eurpeia e de frmaçã cássica,a necessidade de começar do zero, isto é, o kairós , de não poderprescindir de um conhecimento relativamente amplo e, mais ain-da, de um cnsens estabeecid em reaçã à reencia indiscu-tível de autores e temas como aqueles desenvolvidos ao longo dasa grega antiga, trnu-se um desa. Precisar dar conta deminha fé  , isto é, provar no campo a pertinência da concepção onto-

epistemógica de um pensadr que ieu há mais de 2.500 ansatrás, chamado Parmênides, ou a compreensão físico-antropológicad nã mens antig Empédces, fi – e cntinua send – umadas sortes maiores que tirei na vida. Pois me impede de tratar,cm ag já dad, a tradiçã sóca cidenta em seu nascimen-to, em seus passos incertos e maravilhosamente entusiasmantes,e me briga, a cada dia, a repensar sua reencia e pertinência.

3  A Taes de Miet, tradicinamente cnsiderad primeir ósf, fi assciada,

pea tradiçã, a tese de que “tud é um”.

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Neste abratóri brasieir da sa antiga, em sinergia cns-tante cm utras tradições (nã útimas, recém-chegadas, aqueas deuma imprecisa, mas fortemente presente, tradição, assim chamada,rienta), pde assim acntecer que primeir fragment da s-

a, fragment 1 de Anaximandr, seja cmpreendid nã smenteà uz das tradições miésias, ist é, ds primeirs siógs jônics,e sim à uz de isões de mund sem cupa indígenas e africanas.4 

Descar ugar a partir d qua se faz sa antiga n Brasi,ou melhor, assumir o kairós desta marginalidade é provavelmente amehr respsta às dúidas sbre a pertinência dea para a cutura e ensin d País. o caminh a ser percrrid é aquee da destroniza-ção da sa antiga cm saber a priori universalmente relevante,para que esta nã se trne, mais uma ez, cúmpice de um prjet

de cnizaçã inteectua (e mesm pedagógica), que excua a dife-rença, para celebrar o esplendor do mesmo, do igual, do universal,d pensament únic, que é sempre, ana, histricamente eurcên-trico e atualmente global, mas por exclusão e não por inclusão doutr. Assim, em sua beeza e riginaidade, a sa, que nascegrega, poderá seguir, perdendo-se no diálogo com outras tradiçõesde sabedria, para, em seguida, reencntrar-se na e rejuenescida;e, ainda assim, continuar antiga, marcada pela preciosidade indis-cutíe das cisas mais queridas, cm a ds bjets ngamente

usados. Antiga por ter sido longamente manuseada, e não guardadaatrás de um vidro, para que não quebre ou não tome pó.Aqui vai, então, uma dieta para ensin da sa antiga em

tds s níeis, frmais e nã: que a sa antiga tme pó, que sejaexposta a todos os ventos, que encontre seu lugar nas encruzilhadasdas cuturas de nss temp. Se ea aer mesm tud iss que acre-ditamos que vale, não quebrará, muito pelo contrário.

2. O que é losoa antiga?

Após a bree discussã acima, reatia à pertinência d ensi-no dos clássicos do pensamento ocidental, e a proposição de um

4 o fragment 1 de Anaximandr refere-se, indenidamente, a uma “expiaçãda cupa pea injustiça que as cisas que sã cmetem umas às utras”, cmcara referência à csmgia órca, que articua arguments físic-ntógicsa uma ideia mra igada à cupa para estruturar miment circuar de mrtee renasciment, tant para csm cm para ser human. Essa cncepçãde uma culpa cósmica e humana não é necessariamente compreendida como

pssíe em utrs mbits cuturais que nã greg.

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caminho de resgate destes clássicos com modalidades marginais ,é o caso de perguntar, mais precisamente, o que é, afinal, filo-sfia antiga e que a diferencia neste recrte tempra (antiga)da filosofia, como foi pensada em outros períodos. A pergunta

cincide cm títu de uma recente e já céebre bra de Hadt(1999), da qua se acnseha iamente a eitura: O que é filoso- a antiga? A resposta simples e ao mesmo tempo revolucionária,d pnt de ista da história da hermenêutica que Hadt ensejanas páginas de seu texto, é que a filosofia dos primeiros filóso-fos é fundamentalmente pensada como um estilo de vida , em gre-go bíos , antes d que uma dutrina, ist é, um cnjunt mais umenos coerente de teorias sobre a física, a ética, a linguagem etc.

Essa armaçã é um cnite a entrar n abirint da questã

histrigráca da sa, ist é, ds prbemas sbre quem e cma história da sa (nã smente antiga) é cntada, e a enfrentara problemática dos motivos que endereçam as seleções de temas ede problemas, assim como as exclusões de outros. Pois a história dasa nã se escreeu szinha; pe cntrári, fi resutad deintenções e eschas bem precisas, já desde as primeiras “históriasda sa” cmpiadas na Antiguidade.5 A economia dessas páginasnã ns permite passar da prta de entrada d prbema. Cntud,a perspectiva traçada por Hadot obriga a readequar profundamen-

te o testemunho fundamental de Aristóteles sobre as origens dopensamento, isto é, sobre as teorias dos primeiros filósofos que eleenfileira no célebre primeiro livro de sua  Metafísica. Um exempda decisã aristtéica pde ser ntad n tratament reserad àampla tradição itálica da filosofia pré-socrática, da qual acabou porignorar exatamente toda sua dimensão de bíos , reduzindo eleatas

5  As aspas são necessárias, pois, a bem ver, a preocupação com a resenha exaustivada história d pensament sóc, que se cnencinu chamar de historia philosophica , surge smente cm s humanistas d sécu XIII. Essa na abr-

dagem do pensamento clássico diferia profundamente da medieval, enquantoesta útima, que certamente cnhecia a sa cássica, nã se precupaa emdeterminar se um conceito era próprio de Platão ou de Aristóteles, mas simples-mente assimilá-lo, metabolizando-o, por vezes sumariamente, no interior de seusistema; a na abrdagem histórica da Renascença recupera cássic cmmodelo de vida, de estilo, de moral. Por esse motivo, empreende um enormeesfrç de pesquisa ógica e histórica, que prprcinu grande parte dacess às fntes da iteratura sóca antiga que até hje pssuíms. As duasprimeiras histórias mdernas da sa fram pubicadas em 1655: a Historyof Philosophy , de Thmas Staney, em lndres, e a Historia Philosophica , de GergHrn, em leiden. Ambas cm cnsequência dessa na abrdagem ógica

e histórica da sa antiga.

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e pitagóricos aos mínimos termos de suas doutrinas ontonuméricas ,contudo desligadas de toda dimensão comunitária, política e atémística impícitas nestas. (CoRNEllI, 2005, 2007).

Pensar a grande cntribuiçã da sa antiga cm um cha-

mado a viver a sa é uma necessária crreçã de rta histri-gráca; esta, ainda, é mais uma casiã ímpar para prfessr desa, que, dessa frma, n espeh ds antigs, é chamad atransformar o baú do tesouro da tradiçã sóca cidenta em agi e que fae, hje, às eschas e as estis de ida cntemp-rnes de seus auns. A içã ds cássics na saa de aua é, emsua própria intençã, uma içã de ida. E, para iss, para aémdas rigens pré-scráticas, mesm as sas e s ósfs maistardios, isto é, pós-aristotélicos, podem desempenhar também um

papel muito importante. Pense-se, por exemplo, na discussão dastecngias de cnstruçã da indiiduaidade (a termingia é deFucaut) articuadas pes cínics, estóics e epicuristas.

Estu, de fat, há muit temp, cnencid de que a sa ps-sui sua própria prpedêutica e que esta esteja, em grande parte, sabia-mente escrita nas entrelinhas de sua tradição histórica. Nesse sentido, trabah cm s primeirs fragments ds ósfs pré-scrátics,em busca dessa sa que é ida, é, pr si mesm, uma intrduçãmuit didática àquea que é a própria sa, assim cm a utiizaçã

de Homero e Hesíodo, ou das tragédias antigas, como espelhos diretosdas prbemáticas cm as quais s primeirs ósfs se cnfrntaamem seu contexto cultural. A perspectiva embrionária do pensamentoque nasce e se arrasta pelas areias incertas dos problemas primeiros éa mehr içã de sa para iniciantes. Tdaia, exatamente peafragmentariedade das fontes pré-socráticas, assim como por certa di-cudade em cnseguirms edições cnáeis dessas bras em ínguaportuguesa, muitos professores acabam por desistir de propor umpercurs didátic que se inicie dessa primeira parte da sa antiga.

Nã é cas de censurá-s, ainda que – é precis antar – cm issperca-se aquela propedêutica quase que natural a pensar sócque esses começos proporcionam tão generosamente.

Por esses motivos, ainda que com as ressalvas acima apontadas,um ugar mais cnfrtáe e já tradicina para cmeçar a fazer saem sala de aula é, provavelmente, a obra de Platão.6 Não tanto pela cé-ebre expressã de Whitehead (1978), pea qua “a maneira mais segurade denir a tradiçã sóca eurpéia é armar que ea cnsiste numa

6

  Para uma recente e exaustia intrduçã à sa de Patã, . Trabani (2010).

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série de ntas-de-rdapé a Patã”, mas prque sua bra pssui duasantagens cmparatias absutamente inejáeis: a primeira deas éa de tratar-se de uma obra escrita quase que inteiramente em formade diág; a segunda é a ausência de Patã: autr nã é uma das

personagens dos diálogos.7

 Ambas as características convidam o leitor,de forma imediatamente didática, a um trabalho de recepção do textosóc que nã ise excusiamente à apreensã ds cnteúds deuma determinada teria (cm seria cas, se text fsse um trata-d), mas sim que pssa se cncentrar antes de tud na frma, ist é,nas mdaidades, n chã da fábrica de se fazer sa.

Mais d que cncentrar-se n cmentári ds cnteúds tradici-namente mais marcantes da bra patônica (teria das ideias, a justiçana ama e na cidade etc.), prfessr pde utiizar a bra de Patã

como um laboratório, uma academia d fazer sa, especiamentepor ser exatamente essa a intenção originária do mesmo Platão, que,a ng de sua bra, parece querer representar (pis, ana, trata-sede um theatrum) as discussões traadas a ng ds ans em suaAcademia. De fat, a bra de Patã mdua-se, bem nge d prce-der magistral dos tratados aristotélicos, ou da parenética ierática, istoé, do estilo oracular e revelador do poema inspirado  parmenideo ouempedocleo. A construção dialógica, muitas vezes travada nos espaçosdo cotidiano ateniense, é seu principal estilo literário.

3. Como ler um diálogo platônico?

A eitura da sa em frma de diág inspira aguns cui-dads especícs. o primeir é certamente aquee de nã pderretirar d diág – cm é íci cmum na literatura de autajudasóca, infeizmente príca  –  algumas frases consideradas rele-vantes, ainda que irremediavelmente fora de seu contexto, pois

[...] os diálogos de Platão se desenrolam em situações dramá-ticas muito precisas, e o cenário é absolutamente indispen-sável para a compreensão do que acontece em cada diálogo.Um diág, cm uma peça de teatr, aança, pass a pass,e deve ser lido sequencialmente, na ordem em que ele se de-senrola a nossa frente. [...] num diálogo, como na vida real,as paaras nã mantêm seu sentid de um sujeit a utr.(SColNICov, 2000, p. 127).

7  Cm a excusã de dis céebres passs ( Apologia 38b e Fedon 59b), ns quais,

de toda forma, a presença do autor não é a de protagonista do diálogo.

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o diág pderá, prtant, ser id d cmeç a fim, cmo desenrolar-se de um instante de vida filosófica, com um breveclipe do bíos.8 

Será precis ainda criar uma estratégia de eitura ds diágs

de Platão que marque a ausência de Platão acima apontada, nãosmente pe respeit à ba prática hermenêutica de nã cnfundir-ms Patã cm Sócrates (resutand na inquietante gura híbridado Socratão , cm a deniu jcsamente Water Khan), mas espe-ciamente prque Patã – cm apntáams acima – nã parecenos autorizar a isso. Não o faz pelos motivos fundamentalmentepedagógics que erems g mais. (KoHAN, 2003, p. 22).

É fat que Patã cncebe diág cm ugar da saem construção, e não confia ao monólogo do tratado seu pensa-

mento. Por consequência, a pergunta onde está Platão nos diálogos ,isto é, quem fala por ele, é certamente uma das grandes questõesde interpretaçã de sua bra. Sócrates nã está sempre presente nsdiálogos: está, por exemplo, ausente nas Leis; está presente, mas emposição secundária, em diálogos como Parmênides , Político, Sosta ,Timeu.9 Mesm sua persnagem nã é sempre cerente a ng dabra. Em diágs cm Carmides, Laques, Protágoras, Teeteto , Sócratesarma não saber e seu estilo é prevalentemente confutativo e aporé-tic, sem que diág chegue a aguma cncusã denitia cm

reaçã a tema em debate. Exemp diss é Epílogo do Teeteto, cm a referência à maiêutica, à famsa arte das parteiras cm a quaSócrates aprxima sua  paideia. Por outro lado, diálogos como Fédon,República, Filebo revelam um estilo bem mais assertivo, com umasegurança que aguns cmentadres deniram – sem meis terms– dgmática. Certamente, s diágs acançam teses cncusias,ou ao menos teses de consenso no interior da economia de cada

8  Exempares, nesse sentid, sã as primeiras páginas ds diágs Teeteto e Sim-

 pósio. o próg d Teetet (142a-143d) é quase arquegia da cncepçã dia-ógica patônica: Eucides tma ntas para pder perpetuar s cnteúds de umdiág rea; mas, n ugar de prduzir uma síntese teórica ds cnteúds deste,reconstrói, com suas anotações, um diálogo em forma direta, com a intençãodeclarada de não perder o contexto vital que as originou.

9  A prbemática d ugar de Sócrates ns diágs nã é, cntud, smentecntemprnea. A cntrári, é uma questã ampamente debatida desde aAntiguidade. Enquant Gaen (De Placitis IX, 7) armaa que as utras pers-nagens ds diágs teriam um pape de cadjuantes retórics e nã teriam aespessura sóca de Sócrates, Diógenes laérci (Vidas III, 52) recnheceria, acontrário, que as outras personagens seriam também legítimas representantes

d pensament patônic.

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diág. Mesm cm reaçã a cnteúd das faas scráticas, asideias expressas pr Sócrates nã sã facimente cumuáeis: há pemenos duas teorias da alma, se considerarmos Fédon de um lado eRepública de utr (sem faar d Timeu). Sócrates arma sua incapa-

cidade de tratar de certos temas em alguns diálogos, mas acaba porcupar-se dees em utrs: é cas da ideia d “bm” (u d bem)n ir vI da República u da “diaética” n ir vII, que, prém,acaba por tratar longamente no Filebo e no Fedro e Sosta.

Se nã quiserms remeter essas incerências a uma esquiz-frenia de Patã – até hue quem pensasse iss, acusand Patãde ser um fanático escandaloso, mas não é certamente o insulto amehr maneira de reser s debates sócs, nã é? –, será ne-cessário perguntar idealmente a Platão, ele que está ausente de sua

bra, prquê diss, ist é, qua seria a intençã didátic-sócaque subjaz a essa ausência e a essa incerência de Sócrates, suapersonagem quase-principal.10

A melhor solução para a problemática de como ler os diálogos épraemente em cntinuidade cm a tese acima da sa antigacomo bíos , aquela de levar extremamente a sério a intenção dialógi-ca de Platão, passando a considerar Platão, tanto do ponto de vistateorético como do ponto de vista didático, como autor de um gestofundadr, de um md de fazer sa que, pea primeira ez, reta-

ha para si um mbit didátic-prcessua: denind um ugar paraiss (a Academia), um métd ( diág) e um esti de ida.A estratégia diaógica da cnstruçã d cnheciment só-

c acaba pr denir-se, a mens geneagicamente (ainda que amáxima parte da prduçã sóca cntinue send em frma detratad), cm a mdaidade a ser preferida, de maneira especiaem mbit prpedêutic. o diág cnstitui quase que mitgi-camente ugar idea d ósf.

Nã pr acas, um ds mais interessantes ósfs cntem-

prnes da ciência, Pau Feyerabend (2001), recnheceu a frçapedagógica dessa modalidade, reconstruindo dramaticamente, emseus Diálogos sobre o Conhecimento , a Academia de Platão na sala deaua de uma uniersidade cntemprnea, e para discutir questõesde física teórica e epistemologia!

10  É cas d céebre histriadr uteran Brucker, que, em 1742, em sua HistoriaCritica Philosophiae , etiquetaa a Repúbica cm cta, inentada pe  fanatis-cismus escandaloso e quimérico do cérebro de Platão, único lugar onde esta

Repúbica pderia existir (. I, 726-727). Cf. Brucker (1966).

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Tdaia, Patã cntinua imbatíe em sua maestria diaógica.É cm autr d diág que reea seu psicinament sóc,pis: a) indiidua e deimita um camp da pesquisa (erdade, jus-tiça); b) desenha a história e a gegraa d prbema, apresentand

seus predecessres e psicinand-se cm reaçã a seus riais (pita-górics, sstas); c) estabeece as regras d jg, ist é, as inguagense métds a este pertinentes (diaética).

Assim, fugindo ao mesmo tempo tanto do dogmatismo comoda armadilha do niilismo cético, Platão, e com ele o professor desa, antes de se precuparem em frnecer as respstas, receitasde cmprimids de sabedria sóca, mntaram, a cntrári, umpac para que diág – que é a sa – acnteça. o ósfopera uma intervenção pedagógica orientada por seus conhecimen-

ts e sua isã de mund na deniçã das regras d jg, mas cma intenção de garantir que todos possam ter voz.A busca pea puricidade briga prfessr de sa, ime-

diatamente após ter preparado o palco, a desenhar uma estratégiade fuga para sua margem, marcando as formas de sua ausência,ainda que não real e sim dramática e didática.11

A bra patônica, prtant, despnta nesse hriznte cm agrande mestra da sa cm ida em diág. A presença dereferências, nela, continua a ser a sabedoria popular, o mundo das

crenças reigisas, a pesia, a pítica. Iss a trna efetiamente espelho de um diálogo, maior e mais profundo do que aquele tra-ad peas próprias persnagens, entre a sa e sua cutura.

Mas cm apresentar, cncretamente, um diág patônic emsaa de aua?

Pra d que se armaa, ist é, que a tradiçã sóca cntémem si mesma suas próprias estratégias propedêuticas, são certamenteas antações didáticas que Prc, céebre prfessr de sa daEscola de Atenas n v sécu EN, eabra nas primeiras páginas de

seu Comentário à República de Platão (Dissertação I, 5 e 6):

[...] não é oportuno arrumar, nas análises introdutórias aotexto propriamente dito, questões peregrinas e sem algumareaçã cm que se tem à frente, cm sei que aguns u-tros amigos de Platão fazem; estes intrduzem uma enrmequantidade de discursos despropositais para contradizer os

11  Sbre a teatraidade da sa de Patã muit fi escrit. Na estreita reaçã dasa cm teatr, residem praemente s mtis centrais da pçã de Patã

pea frma iterária diaógica. Cf. Cornelli (apud FUNARI; SILVA, 2009, p. 73-86).

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heterodoxos. Ao contrário, é preciso, após ter colocado de baixo dos olhos dos condiscípulos exclusivamente o textoque se tem em mãos, fazer que os examinem, de modo aanalisarem atentamente a intenção de cada parte do texto:sua forma, a trama narrativa, as concepções ali expressas, emais em gera signicad de fund que permeia escrittd. Desta frma, de fat, pde car mais car as uinteso desenho global do diálogo.12

As auns, aqui chamads de cndiscípus (pis prfessrque ensina Patã está sempre ccad n ugar de aprendiz), épst de baix ds hs “excusiamente text” sóc, semaquea “enrme quantidade de discurss desprpsitais”, que, desdea época de Proclo, deviam substituir a leitura dos textos clássicos

em si. Há indicações de um roteiro de leitura bem preciso, queconsidera o texto em toda sua construção dramática.

A este primeiro roteiro de leitura, todavia, segue-se um maisprecis – agra dedicad especicamente à República , mas cuj es-quema de fundo pode ser utilizado também para outros diálogos.É certamente o caso de seguir a indicação acima de Proclo e deixarseu texto simplesmente de baixo dos olhos do leitor:

Prssigams. ora, cm disse, iustrarei pass a pass esquemade fundo que seguirei, baseando-me em República. Arm, prtant,

que, antes da eitura de Repúbica, será necessári, para quem desejartratar dela apropriadamente, ter individuado estes sete pontos:

Primeiro ponto: qual é o escopo do diálogo, que deverá serrmemente denid a partir daquees que, muitas ezes, npassad, deni cm ferramentas para indiiduar s escpsds diágs patônics.Segundo ponto: qual é a forma dos discursos pela qual o au-tr cmpôs República. Namente, ea cará eidente para s

que lembram quais e quantas são as formas dos discursos.Terceiro ponto: analisar a trama narrativa em si mesma dosdiscursos contidos em República. Trama que fi pssíe bser-ar nas persnagens, ns ugares e nas especícas circunstn-cias narradas. De tda frma, sei ter já tratad n passad decomo se deva demonstrar que cada elemento está relacionadocom o escopo de cada diálogo.Quarto ponto: por serem a maior parte dos conteúdos da obradedicads à frma de gern, distinguir as frmas de gern

12

  Para esta e as outras citações de Proclo, v. Michele Abbate (2004, a tradução é minha).

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segundo Platão, da maneira como foram, por ele, distintas,aqui e em outro lugar, e dizer para qual forma ele opta.Quinto ponto: após ter assumido a única forma de governofundada na razão, em si e por si, distinta das formas de go-verno fundadas nas paixões, examinar se são somente umau muitas, e se muitas, quantas e quais, e, tend rmemen-te estabelecido estes aspectos por meio de argumentaçõesapropriadas, compreender através de um raciocínio sistemáti-co sobre qual forma de governo, entre as muitas consideradas,erterá principamente a reexã.Sexto ponto: examinar novamente a forma de governo, porele escolhida, e individuar em quantas maneiras o mesmoPatã cnsidere prtun que a cnsiderássems; aém diss,se na especulação teorética sobre ela não tenha deixado de

lado algumas destas maneiras.Sétimo ponto: fazer que analisem a concatenação das con-cepções que permeiam todo o diálogo e mostrar, como elemesm arma n Fedro [264c2-3], que tda a bra, pr suaatenta eabraçã, frma uma ttaidade harmônica cm emum ser vivente, onde as partes e membros estão em perfeitoacordo entre eles.

Para aém das pré-cmpreensões de matriz nepatônica queaqui e ali o texto de Proclo deixa transparecer, os sete pontos aci-ma constituem, de fato, uma ferramenta didática bastante agudade penetraçã n diág patônic, eabrada há mais de quinzesécus atrás. Basta ccá-a à pra e se erá. Ees indicam umaprecupaçã, já antiga, que isa a frnecer instruments aprpriadspara a eitura ds diágs patônics.

Dessa frma, aprender a er um diág patônic requer ana-mento de ferramentas hermenêuticas que permitam compreendê-loem sua estrutura dialógica e em seu contínuo apontar para a vida,

para aém de uma estratégia didática para iniciantes na sa; pr-tant, pde signicar um pass decidid em direçã à deniçã deuma maneira de fazer sa nesta outra margem que se encontre nodiálogo com as outras tradições constitutivas de suas identidades.

4. Na estante do professor (algumas sugestões bibliográcas)

Aguns materiais bibigrács pdem ser úteis para uma intr-

duçã históric-terética as autres e temas principais da sa

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antiga. Há ainda uma grae deciência n que diz respeit à tradu-çã para a íngua prtuguesa de grande parte da iteratura sócaantiga, ainda que nos últimos anos um grande esforço tenha sidofeito no sentido de oferecer ao público brasileiro os clássicos do pen-

sament cidenta. Essa deciência é smente parciamente supridapela tradução de manuais e obras de grande relevo internacional.Entre s manuais mais utiizads, despntam s umes dedicadsà sa antiga peas duas Histórias da Filosoa , de Reae-Antiseri(. 1, editad pea Pauus) e de Abbagnan (. 1 e 2, editads peaPresença). Ainda que pensads riginariamente para Ensin Mé-dio italiano, requerem certamente uma ampla mediação didática doprfessr, pis a cncepçã d ensin de sa ns dis paísesdifere sensiemente. o ume primeir (e até este mment úni-

c) da Introdução à História da Filosoa , de Mariena Chauí, edit-ra Cmpanhia das letras, é dedicad à primeira parte da saantiga e apresenta-se como uma opção acessível aos estudantes deEnsin Médi. A Iniciação à História da Filosoa: dos Pré-Socráticos aWigenstein , de Dani Marcndes, editra Jrge Zahar, pde sertambém usado como livro de apoio, pois contém breves e elucida-tias infrmações sbre aguns autres de sa antiga, seguidsde textos parciais destes. A presença dos textos originais de cadaautr é certamente uma antagem da pubicaçã. o primeir -

ume d manua de Anthny Kenny, Uma Nova História da FilosoaOcidental (. 1: Fisa Antiga, editad pea lya), é certamentemuito útil para utilização em trabalhos de pesquisa ou confecçãode planos de ensino que trabalhem tematicamente, pois o livro érganizad pr assunt, e nã pr autres. o acima citad O que é

 losoa antiga? , de Hadot, é certamente uma leitura imprescindívelpara o professor, ainda que pouco acessível, por estrutura e lingua-gem, a aun de níe médi. Da mesma frma, s cinc umesda História da Filosoa Antiga , de Reae, editra lya, cnstituem

uma fonte inesgotável de problemáticas e informações, ainda quese acnsehe a eitura smente ns ans nais d Ensin Médi.

Enfim, uma bra única, indispensáe para que prfessrpossa compreender o léxico próprio e as formas de transmissão dasa antiga, é a Introdução à Filosoa Antiga: premissas lológicase outras “ferramentas de trabalho” , de lii Rssei, editra Pauus.o materia dispníe na internet é irtuamente infinit. Tda-via, algumas das páginas ali colocadas são de duvidosa procedên-cia e escassa cnfiabiidade. De grande interesse é, certamente, a

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cnsuta das sugestões de percurss didátics de ensin de sadisponíveis na sessão Sugestões de Aulas , no Portal do Professor , doMEC (hp://prtadprfessr.mec.g.br). o materia ai cntid éprduzid e dispnibiizad pr prfessres de sa atuantes na

rede. Td prfessr pde cntribuir, cmpartihand seus percursse estratégias. Agumas reistas – cm a Revista de Filosoa Antiga (www.saantiga.cm), pubicada pea USP; s Anais de FilosoaClássica  (hp://www.ifcs.ufrj.br/~afc), pubicads pea UFRJ; a reis-ta  Antiguidade (www.antiguidade.org ), pubicada pea Unicamp eUnB; a Revista Archai: as origens do pensamento ocidental (www.archai.unb.br/revista), pubicada pea UnB – sã acessíeis gratuitamentee constituem uma excelente fonte de atualização para o professorde sa. 

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1. O que é a losoa “medieval”?

Chama-se, geramente, de losoa medieval à prduçã -sóca cmpreendida entre s sécus v e Xv d.C., u seja, a cn-

 junt das frmas de pensament sóc prduzidas n perídcnhecid cm Idade “Média”.

Alguns historiadores do pensamento incluem, ainda, na rubrica

da sa “mediea”, a reexã ds autres cristãs ds sécusII-Iv, períd também cnhecid cm Patrística , ou era dos Paisda Igreja Cristã.

Essa peridizaçã, que cnsidera em bc a sa “medie-a”, decrre de uma histrigraa cujas raízes remntam as tem-ps d Renasciment e que cncebe s sécus v-Xv cm um pe-ríd “intermediári” (medievalis), interpst entre períd áureda Antiguidade e s temps autintituads “mderns”. A nmen-catura crrespndente fi criada pe pedagg aemã Christph

Keer, n sécu XvII, cnsagrand a isã da Idade “Média” cmtempo intermediário.

A prduçã sóca “mediea”, nesse sentid, também seria“intermediária”, e, mesm, sem interesse para s mderns, pis,segundo a imagem cristalizada por Keller, o pensamento havia

Capítulo 3

Filosoa medieval

 Juvenal Savian Filho* 

* Dutr em Fisa pea Uniersidade de Sã Pau. Prfessr da Graduaçã

e Pós-Graduaçã em Fisa na Uniersidade Federa de Sã Pau.

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permanecid em estagnaçã na Idade Média, tad apenas paraos temas da fé, da religião e da teologia, sem apresentar nada deimprtante para pensament racina u cientíc.

Essa é uma das razões pr que uims, ainda hje, cichê

(repetid quase sempre ingenuamente) segund qua a sa“mediea” teria reaizad uma “cnciiaçã entre fé e razã”; ana,cm se diz, ea seria “tecêntrica”.

 1.1. Nas origens de um preconceito historiográco-losóco

Para iniciar, entã, um estud sbre a fisfia “mediea”,cném anaisar se a imagem de um pensament “tecêntric” éapropriada.

Numa primeira camada de signicaçã, essa imagem pretende

simpesmente mstrar a imprtncia capita dada pes pensadres“medieais” a tema da existência de Deus e utrs crreats. Essaimprtncia, cm efeit, é histricamente inegáe.

Entretant, se aprfundarms a anáise dessa imagem “tecên-trica”, erems que intuit de aguns estudiss, a apresentar aatiidade sóca “mediea” cm ag feit “a partir da perspec-tia de Deus” u “sempre em reaçã a Deus”, cnsiste, na erdade,em tmá-a cm um pensament nã racina, nã cientíc, e,mesmo, ilusório.

Pr iss, embra aparentemente neutra, a imagem “tecêntrica”da Idade “Média” – diugada pr renascentistas e pr mderns, erepetida ainda em nsss dias – pde cutar um precnceit hist-rigrác-sóc grae. Ana, cm está cmprad d pntde ista históric e sóc, nã é cerente armar que s pensa-dres “medieais” tinham um pensament nã racina, u que suasreexões “tecêntricas” eram iusórias. A cntrári, hue mesmcasos de pensadores considerados excessivamente racionalistas.

Ta precnceit nasceu certamente da assciaçã mderna entrereigiã e ingenuidade, chegand-se mesm a fazer, na Mdernidadee em nsss dias, um us ideógic da imagem “tecêntrica” daIdade “Média”, a m de atingir a reigiã.

Esse precnceit está na base, incusie, de agumas isões daHistória humana segundo as quais o desenvolvimento histórico dahumanidade poderia ser dividido em estágios. Nesses estágios, as fasesmarcadas por contribuições religiosas seriam menos evoluídas do queaqueas marcadas pr eabrações metafísicas; e, estas, pr sua ez,seriam menos evoluídas do que aquelas caracterizadas pela ciência.

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o estági “mediea”, assim, teria sid uma épca de subjetiis-mo, falta de autonomia da razão, misticismo etc., como se pode notar,em mair u menr grau, n pensament de autres inuentes cmKant, Hege, Auguste Cmte, Nietzsche, Marx, Freud, entre utrs.

Immanue Kant (1724-1804), n prefáci à 2ª ediçã de sua Crítica darazão pura , cnsagru essa imagem, retratand a pesquisa sóca dssécus anterires a seu cm uma pesquisa mípe, um “tateamentaeatóri”, pis, n seu dizer, apenas a ciência mderna e sua sacrítica fariam o pensamento entrar no caminho seguro da ciência.

 1.2. Compondo o mosaico da losoa “medieval”.

Hje, prém, está ampamente estabeecida uma na isãhistrigráca da Idade “Média” e d pensament “mediea”.

Seria mais crret dizer simpesmente que nã hue Idade“Média”, nem sa “mediea” cm um bc. o que hue fium grande msaic, cm peças ariadas e autônmas. Cm efeit,a metáfora do mosaico, aqui, é bastante útil, pois essa expressãoartística fi herdada da Antiguidade, cm muit apreç, pes “me-dieais”, e argamente empregada pr ees, n intuit de exprar apicrmia e buscar, a mesm temp, unidade guratia.

Assim, se quiserms ns referir, unitariamente, a cnjunt

das mútipas frmas cuturais desenidas na Idade “Média” –e, entre eas, à sa “mediea” – terems de fazer jus à imensavariedade que a compõe.

Um primeir md de apntar para esse msaic, restringind-ns a camp d pensament sóc, cnsiste em nã pretenderhmgeneizar s pensadres. Um simpes exercíci menta ajuda-ria nessa tarefa: imaginemos que, daqui a duzentos anos, ao falarde pensadres “cntemprnes”, s estudiss mencinem cmexemp Hege (1770-1831), Wigenstein (1889-1951) e Jacques Der-

rida (1930-2004). Iss quererá dizer que ees pdem ser mencinadsem bc, pr terem eabrad sas hmgêneas e unitárias?Certamente nã. Bastaria er agumas páginas de cada um dees paraer cm suas sas sã radicamente diferentes.

Anagamente, pensand ns autres “medieais”, nã p-dems dizer que, pr exemp, Béci (475-525) u Ansem deCantuária (1033-1109) sã hmgênes a Aicena (980-1037), Mai-mônides (1138-1204), Tmás de Aquin (1224-1274) u Duns Esc-

t (1266-1308). Já a separaçã gegráfica e histórica impediria de

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tratá-s de maneira hmgênea. Entã, na cmpsiçã d msaicdas fisfias “medieais”, iss dee ser respeitad.

outr eement imprtante, na cmpsiçã desse msaic, se-ria, já de saída, escareciment da reaçã entre s “medieais”

e a pstura cientíca que exige a experiência empírica cm pntde partida para cnheciment. A imprtncia desse eement sedee a fat de ee cmpr núce d precnceit histrigrác-sóc descrit acima.

Cm esse precnceit insiste numa imagem “tecêntrica” dassas “medieais”, um bm exemp para iustrar a reaçã cm aexperiência empírica seriam as pras da existência de Deus, tã ca-racterísticas ds autres da Idade “Média”. E um autr especiamenterepresentati, nesse sentid, fi Tmás de Aquin, que eabru cincracicínis (também cnhecids cm “cinc ias”). Tmand cmexemplo o primeiro raciocínio, podemos resumi-lo como segue:

a) tda a nssa atiidade de cnheciment cmeça pea sensaçãfísica (que é uma percepçã menta, cm base nas infrmaçõesferecidas pes sentids);

 b) pes nsss sentids, cnstatams que a Natureza é um grandecnjunt de seres is e nã-is;

c) também pes sentids, cnstatams que esses seres, is u

nã-is, estã inserids numa série u um cnjunt, n quahá um dinamismo que faz cada ser existir e deixar de existir in-dependentemente de sua decisã;

d) em terms gregs, iss equiae a dizer que tud que existe estáem “miment” (passa a existir e deixa de existir, seguind “miment” da Natureza);

e) ainda pes sentids, cnstatams também que esse dinamismé cmunicad de um ser para utr, u seja, que cada ser recebede utr a existência;

f) iss equiae a dizer que nenhum ser, na Natureza, se prduziua si mesm;

g) cnrmams que está dit na etra (f) também pe seguinteraciocínio: se alguma coisa, na Natureza, se produzisse a si mes-ma, teria de existir antes de se causar, u seja, antes de receber dinamism da existência, que é um cntra-sens;

h) se iss ns é ensinad pe nss cnheciment físic da Natureza,temos base para dizer que o princípio da Natureza, ou a fonte deonde iniciou o dinamismo, está fora dela, num ser transcendente

(diferente da Natureza);

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i) esse ser, pr sua ez, nã pde ter recebid a existência de umoutro ser, mas tem de ser a fonte de sua própria existência, pois,se dissermos que ele foi produzido por outro, nada garantirá quehue um primeir ser, e nssa pesquisa nã terá m;

 j) mas, se nssa pesquisa nã chegar a um primeir ser, nã p-deremos mais afirmar que há um início para o dinamismo daNatureza, e sequer pderems faar de uma série, cm zemsna etra (c);

k) entã, para respeitarms a cerência de nssa sensaçã física,precisams armar que a série da Natureza fi prduzida prum ser exterior a ela, do qual procede todo o dinamismo presentenela, e que esse ser é fonte de sua própria existência. A esse sercstumams dar nme “Deus”.

Esse racicíni, cm pdems er, chega a uma cncusãsbre a existência de Deus, que, sem dúida, é transcendente ànossa experiência empírica, mas está fundamentado nessa mesmaexperiência. Assim, embra seja pssíe chamá- de “tecêntric”(pis tema centra é Deus), nã pdems negar que, a mesmtemp, ee é “antrpcêntric”, u seja, centrad na experiênciahumana concreta e construído a partir dela.

o eitr cnsutará cm grande preit própri text de T-

más de Aquino: Suma de teologia , Primeira Parte, questã 2, artig3. Permitim-ns também remeter a nss estud, registrad ncapítu 2, “A Reaidade Primeira a que tds denminam Deus”,do livro Fé e razão: uma questão atual? (2005), citad na Bibigraa.Para uma reexã mais aprfundada, remetems à bra de FranciscCatã, Para falar de Deus (2001), também citad na Bibigraa.

A cnstataçã de um “antrpcentrism mediea” permite-ns, prtant, reatiizar a isã “tecêntrica”. Pdems faar, nmínim, de um “dup centr”, cnstituíd, a mesm temp, pr

Deus e ser human.Ta “antrpcentrism” pde ser ericad, ainda, pea prática

cientíca da Idade “Média”, pis é atuamente inquestináe cará-ter experimenta da atiidade de muits pensadres “medieais”.

os autres muçumans, de md gera, sã testemunhs his-tórics desse caráter. A-Tusi (1201-1274), pr exemp, chegu afaar da astrnmia cm uma ciência dependente de “pras dfat”, as quais nasceriam da bseraçã empírica e de perações

matemáticas. Também autres atins e judeus, cm Abert Magn

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(1206-1280) e Maimônides (1138-1204), entre utrs, deseneramtrabahs cientícs signicatis, principamente na área da As-tronomia/Astrologia, obtendo não apenas conclusões físicas, mastambém intuições sócas bastante sóidas.

Nã se pde, certamente, pretender que a prática cientíca “me-diea” bedecesse a mde da ciência mderna, cncretizadpea matematizaçã de Gaieu, Keper u Cpérnic. Mas, iss nãquer dizer que nã huesse, na Idade “Média”, uma abrdagemracina e já matematizante da Natureza; nem que a experimentaçãempírica não fosse tomada como fonte de conhecimento.

Hje também está demnstrad que a ciência mderna pssuiigações densas cm as práticas científicas “medieais”, e que aeabraçã sóc-cnceitua ds autres mderns tem muitsprecedentes “medieais”. o exemp de Gaieu, nesse sentid, émuito eloquente, pois, apesar de ele criticar a cosmologia e a me-cnica de Aristótees, cntinua nitidamente aristtéic-tmasiand pnt de ista metafísic e epistemógic. Iss reea que asdiscrdncias pdiam dar-se n níe da expicaçã das bseraçõesempíricas, mas nã quant à maneira racina de prceder e pensar.Uma ba expsiçã d tema é feita n capítu 7 d ir Filosoamedieval , de A. S. MCGRADE (2008).

Tend, entã, apntad para a ariedade que cmpõe msaicdas sas “medieais” e estabeecid seu caráter também raci-nal e empírico, podemos retratar melhor esse mosaico sintetizandosuas várias tradições no esquema abaixo:

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Seria iniáe, aqui, resumir cada uma dessas tradições, pis, unão conseguiríamos dizer, num espaço curto, o essencial sobre cadauma delas, ou apenas repetiríamos informações que o leitor podefacimente encntrar ns irs indicads na Bibigraa. Recmen-

dams, especiamente, s irs de Aain de libera (1998) e EtienneGisn (2001). Para uma abrdagem inicia, recmendams s irsde C. A. Ribeir d Nasciment (2004) e de A. Strck (2003).

Assim, em vez de apresentarmos um resumo das tradições ouda obra dos pensadores, preferimos responder a duas perguntas:

é pssíe faar de uma mentaidade cmum às sas1.“medieais”?;pr que ainda ae a pena estudar as sas medieais?2.

2. É possível falar de uma mentalidade comum àslosoas “medievais”?

Cm ims acima, a diersidade de frmas sócas “me-dieais” dicuta faarms de pensament “mediea” em bc.Tdaia, aguns estudiss, sbretud na primeira metade d sécuXX, prcuraram identicar uma mentaidade “mediea” cmum àssas, uma semehança de metdgia, temas etc.

o mehr exemp dessa tentatia em d pensadr francêsEtienne Gisn (1884-1978), e eitr pderá er cm muit preitsuas bras indicadas na Bibigraa, principamente O espírito da

 losoa medieval (2006).A tese de Etienne Gisn cnsistia em dizer que a reexã -

sóca, na Idade “Média”, haia sid fecundada pea experiênciareigisa, de maneira que s dads prenientes da tradiçã judai-c-cristã (armações bíbicas, rituais itúrgics, experiências éticase espirituais etc.) haiam frnecid ns temas para a reexã,

escarecend, ainda, temas herdads da sa antiga.Em utras paaras, segund Gisn, s fiósfs, szinhs,

não teriam podido pensar em certos temas, pois nossa inteligêncianatura nã estaria capacitada para descbri-s. Mas a reeaçã

 bíblica os teria introduzido no horizonte humano. Na contrapartida,a reexã sóca, cm sua metdgia e seus cnceits, teriacontribuído para o aprofundamento da experiência de fé e para aexpressão teológica dessa experiência.

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Nesse sentid, pderíams identicar, na Idade “Média”, umafecundaçã mútua entre as tradições de fé (reigiões e tegias) ea reexã sóca. Nã se trata de dizer que as tegias instru-mentaizaram as sas, mas, antes, de pensar numa fecundaçã

mútua u numa simbise entre sa e experiência reigisa.É muito ilustrativo o exemplo vindo de alguns autores do séculoIv, que ieram na Capadócia, cm Gregóri de Nazianz (330-390), Basíi Magn (u Basíi de Cesareia – 331-379) e Gregóri deNissa (335-395). Segund pesquisas recentes, esses pensadres fram“essenciamente” patônics, aém de cristãs. Assim, pr exemp,quando falam sobre a natureza da alma, do corpo, das essências, domiment, da inguagem, da natureza da sa, da imagem, darazão, do reto agir etc., não instrumentalizam o platonismo, mas o

seguem pr cnicçã. os dads cristãs iriam cm cmpemen-to, oferecendo interpretações, por exemplo, da vida da alma após amorte, do movimento do cosmo como resultado de um ato criador,da pessa de Crist cm reeadr da verdade etc.

Curisamente, esses autres eram patônics mesm quand cha-maam a sa pura de “estranha”, u seja, de exterir à “erdadei-ra sa”, a qua teria a fé cristã pr acabament e cmpetude.

o exemp ds padres capadócis também mstraria a ince-

rência da psiçã histrigráca que interpreta em terms pítics interesse ds cristãs pea sa. Segund essa interpretaçã, spensadres cristãs só teriam passad a dedicar-se a estud sócprque, quand cristianism fi ciamente aceit pe ImpériRman (ns temps de Cnstantin, séc. Iv), s seus adepts teriamsentid a necessidade de cnerter as pessas mais cutas e inuentes,frmadas na sa grega, isand a acess d pder.

Essa é uma interpretaçã já superada, principamente prquehá testemunhs, anterires a sécu Iv, da existência de ósfs

convertidos ao cristianismo por convicção espiritual. Assim, em vezde s cristãs terem catequizad ósfs pagãs, que parece tercrrid é cntrári: ósfs pagãs interessaram-se pea fé cristã ecnerteram-se a ea. Daí iriam as raízes da fecundaçã mútua entrefé cristã e sa. Justin de Rma (nascid na Paestina e martiri-zad em Rma, pr ta de 165) é um exemp nítid desse cas.

É também muit difundida a armaçã de Tmás de Aquin,segund a qua a sa seria “sera da tegia”, ancilla theologiae ,

mas, ao dizer isso, ele pensava no serviço prestado pela metodologia

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sóca e pes cnceits sócs à expressã teógica da experi-ência de fé. Ee nunca pensu numa atiidade sóca manipuadapea tegia. Aiás, na segunda parte da Segunda Parte da Suma deteologia (questã 167, artig 1), ee ariza estud da sa pr

si mesma, u seja, independentemente da tegia. N seu dizer,esse estud é uáe em irtude da erdade pea qua s ósfsfram tcads. Quaquer utra cntaçã dada à sua frase dee-sea um uso ideológico.

Tdaia, a tese de Etienne Gisn, referida acima, cntém umafragiidade, a de assciar excessiamente pensament “mediea”cm pensament “cristã”. Cm efeit, embra Gisn demnstrea existência de muitos elementos comuns aos pensadores medie-ais, ee nã dá a deida ênfase as autres muçumans e judeusda Idade “Média”. Aém diss, unifrmiza demais certs temas emétodos, mesmo no tocante a pensadores cristãos.

Na erdade, s trabahs de Gisn fram infuenciads prum debate mais amp, crrid ns ans de 1930-40, em trn dapssibiidade em gera de uma fisfia “cristã”. Buscaa-se saberse, ao fazer filosofia, um cristão deveria respeitar certos elementos

 básics (a existência de Deus, a existência de uma ama espiritua, asaaçã d gêner human, a centraidade de Crist etc.). E, cas

houvesse tais elementos, se isso não representaria um atentadocntra a autnmia da razã fisófica. o eitr pde encntrar umaexpsiçã desse debate n ir de M. Nédncee (1958), citadna Bibigrafia.

Gisn fi capaz de demnstrar, cm acert e beeza, a exis-tência de métodos e temas comuns aos autores cristãos, desde,pr exemp, Justin de Rma, até Henri Bergsn (1859-1941) eGabrie Marce (1889-1973), passand pr Pasca (1623-1662) e lei-

 bniz (1646-1716), entre utrs. Demnstru, também, cm muitas

ideias de Descartes, Kant, Marx, Feuerbach, Nietzsche, e muitsoutros, reproduziam maneiras medievais de pensar ou fundavam-se num err de interpretaçã. Tud iss está expst em O espíritoda filosofia medieval.

Mas, a fazer esse trabah históric-teóric, Gisn terá supstuma homogeneidade excessiva entre os pensadores cristãos.

Recentemente, s trabahs d pensadr francês Aain de liberatêm feit justiça a uma abrdagem mais próxima ds dads histó-

rics. Sua pçã cnsiste em mstrar cm s autres que ieram

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na Idade “Média” sã cntinuadres direts da tradiçã só-ca grec-rmana. Iss desia a atençã das sínteses cristãs para afruticaçã da atiidade sóca cássica em mei às diferentescuturas “medieais” (cristã, muçumana e judaica).

A fisfia, n dizer de Aain de libera, teria assumid dier-sas direções, inclusive geográficas, não se concentrando em Atenas,Paris, Rma u lndres. A cmpex cnjunt dessas direçõesdá-se o nome de translatio studiorum – iteramente, “transmissãds estuds”, u, traduzid de maneira mais ire, “transmissãda tradiçã”.

o que permitiria, entã, faar da Idade “Média” cm umcnjunt nã seria nenhum cnceit pré-frmuad que se pr-curaria identificar ns medieais (ag cm uma “mentaidademediea”), mas cnjunt de tds esses prcesss ns quais atradição antiga foi continuada, refeita, repetida ou renovada. Alémdas cidades eurpeias já bem cnhecidas cm centrs de frmaçãfisófica (Atenas, Paris, Rma, lndres etc.), a translatio passariatambém pr cidades bizantinas e árabes. Um desses prcesss detransmissã iria de Atenas para a Pérsia, e da Pérsia para Harran;utr, de Aexandria para s msteirs síris; utr, de Aexandriapara Bagdá; utr, de Bagdá para Córdba, e de Córdba para

Ted; da Andauzia à Prença; de Ted a Paris etc.A abrdagem de Aain de libera tem ainda mérit de enfa-

tizar a imprtncia capita, para as frmas cuturais “medieais”,das escolas dos tradutores cristãos nestorianos, com os quais osmuçulmanos teriam conhecido o pensamento grego, sobretudoo de Aristóteles, permitindo, posteriormente, a redescoberta dasbras d Estagirita n ocidente. o eitr cnsutará cm grandeproveito a obra  A filosofia medieval , de Aain de libera (1998). Para

questões metodológicas, recomendamos também Pensar na Idade Média (1999), d mesm autr.Nada nos obriga, porém, a descartar a unidade postulada por

Etienne Gisn quant a certas metdgias e a certs temas “me-dieais”. Aiás, é histricamente inegáe fat de a tradiçã bíbicater fecundad para sempre a reexã sóca.

Exprems, aqui, um exemp que une as três cuturas rei-gisas predminantes na Idade “Média” (cristianism, isamism e

 judaísm): a tese bíbica da criaçã d mund.

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 2.1. O exemplo da tese da criação do mundo “a partir de

nada”.

Usand uma expressã de Mircea Eiade (1907-1986), pdemsdizer que a Natureza, na Idade “Média”, era encarada cm uma

“hierfania”, u seja, cm uma manifestaçã d Sagrad. Assim, spensadres “medieais”, geramente aimentads pr uma tradiçãreigisa, aceitaam que mund fi criad pr Deus.

Essa armaçã reigisa pde ser entendida em dis passs:o universo é resultado da obra de um ser inteligente e trans-1.cendente, que pensou o mundo e o criou porque quis demaneira inteiramente livre. A esse ser criador chama-se, ge-ramente, “Deus”. A nidade ds “medieais” nã estaaem faar de um deus, pis iss já haia sid feit tambémpr ósfs nã crentes, cm Patã e Aristótees. A ni-dade estava em ver o mundo como algo que só existe por-que Deus assim quis, ana, Deus bíbic é apresentadcomo um ser consciente, livre e agente na História humana.o mund, entã, diferentemente d que fi pensad pesósfs antigs, passaa a ser ist cm ag pensad edesejad pr Deus;a criar mund, Deus nã se baseu em nada, mas prdu-2.

ziu simpesmente tud, num at únic e absut. Em utraspaaras, Deus nã se seriu de ag que já existisse, parafazer mund. Nã haia nada; apenas Deus. E ee decidiuproduzir um ato de criação. Para exprimir esse conteúdo, osósfs “medieais” passaram a faar de “criaçã a partirde nada”, u, em atim, creatio ex nihilo.

Essa armaçã reigisa (cmpsta de 1 e 2), segund s medie-ais, pdia ser cnrmada pea razã sóca, pis nada n mund

mstra prduzir-se a si mesm, remetend à necessidade de umacausa suprema e transcendente. Além disso, essa causa supremanã pde ter agid a partir de ag já existente, pis: u terá feitesse ag, e nada se atera na armaçã; u esse ag existirá pr simesmo, mas, então, a causa suprema não será divina, dado haverag que ea nã prduziu (impicand uma cntradiçã).

Tdaia, armar a necessidade de uma causa suprema u de umcriadr nã signica, necessariamente, dizer que mund nã exis-

tiu desde sempre e foi produzido pelo ser divino num determinado

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rigrsamente impssíe demnstrar (c.2), pis iss equiaeria aprovar o começo do mundo olhando para o próprio mundo, o quenã frnece base de demnstraçã. Tdaia, se a reeaçã bíbicaarma a criaçã d mund, teríams um mti atamente razáe

para nã permanecer n impasse, e ptar pr (c.2).A partir daí, trabah d ósf seria de inestigar a cerênciadessa opção e as suas consequências para o pensamento humano.

 2.2. Consequências éticas da tese da criação.

Um exemp car de cnsequência ética, nesse cntext, emda valorização incondicional da pessoa humana, ou, em termosmodernos, da afirmação da dignidade humana. Aprendemos, demd gera, cm as fisfias “medieais”, que só é pssíe jus-

tificar racionalmente a dignidade humana caso se recorra a umfundamento divino.

Para melhor avaliar o teor desse exemplo, comparemo-lo coma dicudade, sentida n mund atua, a pretender fundamentarscamente ag cm ar incndicina de cada indiíduhuman. Muits ósfs, cnsiderand-se “pós-metafísics”, ju-gam como pré-crítico ou mesmo ingênuo qualquer pensamento éticoque recorra a um fundamento transcendente para os valores, como

pretendiam s “medieais”. Pr iss, tentam defender a dignidadehumana com base em acordos, convenções, ou bases naturais toma-das pr si mesmas. Mas dispersam-se, quase sempre, em piniõesdiferentes e contraditórias.

viems, assim, um diema, pis nã hesitams em cnside-rar a dignidade humana como um valor universal, mas, ao mesmotemp, nã sms capazes de dar uma justicatia racina que nspermita aplicá-la a todos os indivíduos.

A angústia pr fundar um humanism ateu, u seja, uma ari-

zação incondicional do ser humano sem referência a nenhum ser di-vino, foi vivida por muitos pensadores modernos, e ecoou fortementeem dis escritres bastante cnhecids, Nietzsche e Dstiesky. oeitr erá cm preit e prazer a bra de Henri de lubac, O dramado humanismo ateu (2008). Para estuds mais aprfundads, eitrterá grande preit a er a bra d ósf brasieir Henrique C.lima vaz (1999), Escritos de losoa IV – Introdução à ética losóca 1.

Sem pretender chegar a uma h mgeneizaçã artificia,

podemos, no entanto, dizer que, geralmente, entre os autores

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“medieais”, assim se extraía a afirmaçã da dignidade humanacom base na tese da criação:

(e) uniers fi pensad e desejad pr um ser diin;(f) cada indiídu, de quaquer espécie, é pensad e desejad

pr si mesm;(g) ser human, ainda mais d que s exempares das utrasespécies, é desejad pr si mesm, pis é dtad de uma di-mensã que trna semehante àquee que criu, u seja,a dimensão da vida interior, composta do pensamento e dodesej – ser human, assim, seria um micrcsm, dentrd macrcsm;

(h) pr iss, ar de cada ser human seria determinad peseu criadr, e nã pderia ser bjet de debate entre pareshumans. Em utrs terms, ar human iria de fra dmbit human, e nenhum indiídu estaria apt a decidirsobre o valor de outro.

N imite, smente a passagem de (g) a (h), segund s “medie-ais”, frneceria uma justicatia sóida para a ética. D cntrári,defenderíamos posições éticas apenas como uma opinião, expondo-ns às ariações d pder de cnenciment.

D pnt de ista históric, essa armaçã da dignidade huma-na pode ser observada concretamente pelo desenvolvimento dadopelos primeiros cristãos, no contexto do mundo helênico, a duasinstituições muito familiares a nós, mas revolucionárias para a época:os orfanatos e os asilos de velhos.

No caso dos orfanatos, isso é ainda mais visível, pois eles se de-seneram cm a achida a recém-nascids prtadres de deciên-cias físicas u mentais, ana, n mund antig, haia a prerrgatiapaterna de se desfazer de tais bebês. os cristãs s recebiam e criaam,

pois estavam convencidos, mesmo contra as aparências físicas, de quecada um daqueles indivíduos tinha uma dignidade própria.

Certamente, exemp históric da Inquisiçã pderia mancharesse dad cristã, seja d ad catóic, seja d ad prtestante. Mas,se embrarms que esse fenômen históric nã fi hmgêne emtda a Eurpa (nem nas Américas), e que hue zes frtementedissidentes, só cnrmarems a defesa da dignidade humana. oexemp d frei Bartmeu de as Casas (1474-1566), entre muits

utrs, seria suciente aqui.

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 2.3. Consequências metafísicas da tese da criação.

Pdems entrar mais fund n tratament “mediea” da teseda criaçã, e extrair cnsequências metafísicas dee. Iss ns fr-necerá mais um exemplo concreto daquilo que acima designamos

cm uma mútua fecundaçã entre a fé e a sa.A expraçã metafísica da criaçã remnta à tradiçã judaic-cristã nepatônica ds primeirs sécus da nssa era, cm nmescm s de Fín de Aexandria (que ieu, aprximadamente, entre30 a.C. e 40 d.C.), orígenes (186-254), Sant Agstinh (354-430),entre muitos outros.

Aqui, prcurarems sintetizar trabah de dis ósfs cen-trais para Idade “Média”: muçuman Aicena e cristã Tmásde Aquin. o eitr cnsutará cm grande preit a bra de Ai-cena,  A origem e o retorno , e a questã 46 da Primeira Parte da Sumade Teologia , junt cm púscu O ente e a essência , de Tmás.

Essa síntese pde ser assim expsta:(1) assume-se cm hipótese a armaçã bíbica da criaçã, ta

cm express em (c.2);(2) se hue criaçã, entã ser diin pensu cada criatura

antes de produzi-la. Assim, em tudo o que foi criado, é pos-sível distinguir:

(2.1) pensament diin crrespndente (também chamadde frma u essência), que é cmum para tds s exem-plares de uma mesma espécie, e é o que dá a identidadede cada espécie; ana, quand ser diin quis prduzirum caa, pensu na essência de caa, u na “caaida-de”, e nã na de uma árre u “arreidade”, pis, caspensasse na essência de uma árvore, teria produzido umaárre, nã um caa;

(2.2) at criadr de cada indiídu, desejad pe ser diin e

acrescentad a seu pensament gera. Esse at faria a frmasair de seu nível de generalidade e tornar-se a forma de cadaindiídu, “deste”, “daquee”, e assim pr diante. Ana,se o ser divino quer sair da generalidade da essência, paraobter indivíduos, deve, então, acrescentar ao pensamento daessência um at de existência indiidua;

(3) em utras paaras, quand ser diin prduz um ser, eepensa esse ser e dá existência a ee. Entã, tud que existe

teria dois elementos:

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(3.1) um eement X – sua essência, u seja, sua identidade,cmum a tds s utrs indiídus da mesma espécie;

(3.2) um eement Y – sua existência indiidua, u seja, a suamaneira indiidua de cncretizar a essência (pderíams

chamar a existência também de ato ou dinamismo atual,ida etc.);(4) uma ez feita essa distinçã, pdems erificar indícis,

nas coisas, de que, de fato, elas possuem uma identidadecomum, distinguindo-se apenas por suas características in-diiduais. Mas:(4.1) essa diferença entre essência e existência nã crrespn-

deria simpesmente à distinçã aristtéica entre, de umad, a substncia u ente, e, de utr, a sua frma uessência. Para Aicena, nã basta faar que “este” caa,chamad Pégas, pssui uma essência (a “caaidade”),a qual é por ele partilhada com todos os outros cavalos.Dizer apenas iss signicaria cnceber a Natureza cmum grande depósito de formas eternas que se manifestameternamente, numa matéria uniersa;

(4.2) prém, essa armaçã cntradiria nssa experiência em-pírica, pois não vemos nada, na Natureza, que se produza

a si mesm; nada cntém princípi de seu própri ser;(4.3) entã, nã teríams dads para armar que a Naturezaresuta de um miment etern de autprduçã. Isstambém impicaria que tdas as essências já estiessemreaizadas, que nã ems acntecer;

(4.4) tampuc seria cas de dizer que a Natureza é um úni-co ser, como se os indivíduos das espécies fossem modosde ser da Natureza, pis iss, para s medieais, earia àcntradiçã cm (4.3);

(5) entã, se há indícis empírics de que a distinçã entreessência e existência é defensável, e de que não podemostomar a Natureza como causa de si mesma, podemos dizerque a Natureza u cnjunt de tds s indiídus de tdasas espécies nã frmam um cnjunt autprdutr; tdsmostram que recebem sua existência de fora. Assim, a sériemesma dos indivíduos passa a ser vista como dependente deuma causa externa, pois:

(5.1) se indiiduamente nada pde autprduzir-se;

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(5.2) também nã há base para dizer que cnjunt da Na-tureza se autprduz;

(5.3) nesse cntext, afirmar a existência de um princípicriadr transcendente parece mais práe;

(6) esse ser suprem, pr sua ez, dee ter uma essência queincua existência, pis, d cntrári, eará à armaçã deum utr ser, respnsáe pea junçã de sua essência cmsua existência. Cairíams numa reduçã a innit (reductioad innitum), que é um err de racicíni;

(7) mas, para dizer que a Natureza dee ter um criadr, e que at da criaçã cnsiste na daçã de existência à essência,é precis armar, a mesm temp, que criadr é um serinteligente e escolhe produzir os indivíduos, pois ele deve

“pensar” cada um e “desejá-”.

Essa estratégia argumentatia, que resume,  grosso modo , o tra- bah de Aicena e de Tmás de Aquin, prcura mstrar cm aadçã da tese reigisa da criaçã ea a cnsequências sócascnsistentes ericáeis na Natureza, a mesm temp em que, cm

 base na ericaçã dessas cnsequências, ferecem-se razões paraa aceitação do princípio religioso.

Iss equiae a dizer que, acima, mment (4), referente àdistinção entre essência e existência, só pode ser pensado caso seadte a tese (1). Mas, uma ez enunciadas, as cncusões apresen-tadas em (4) ganham autnmia cm reaçã as passs (1)-(3), useja, hand para a Natureza, pde-se cnrmar aqui que se dizem (4), independentemente de se aceitar u nã (1)-(3). Dada essaautnmia de (4), e dada sua ericaçã nas cisas, pde-se tmar(4) cm base para fundamentar a argumentaçã cntida em (5)-(6),que pra a necessidade de existir um criadr. Pr m, mment

(7) cmbina (4) e (6), cnstituind uma cnrmaçã racina de (1)-(3) e frnecend uma razã para aceitar (1).

o que garante a aidade dessa argumentaçã, eitand que easeja um círcu icis, é fundament encntrad pr (4), u seja,um princípi extern à Natureza, independentemente de (1)-(3).

Uma questã imprtante, aqui, seria reacinada à inguagemhumana para faar de Deus. os medieais nã acreditaam que seusterms pudessem apicar-se diretamente a Deus (terms cm “pen-

sament”, “desej” etc.). Mas, a mesm temp, cm nã dispmos

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de outra linguagem, a não ser a humana, dependemos desses termospara faar de Deus.

Aguém pderia dizer que iss é um antrpmrsm, masum pensadr “mediea”, certamente cm uma pequena dse de

ironia, perguntaria pelo quê, em nossa atividade de conhecimento,sb suas mais diersas frmas, nã seria antrpmórc. Tdas asconexões que estabelecemos entre as palavras, ideias, coisas, pessoas,eents etc., sã antrpmórcas, pis prjetams na reaidade nosso mundo interior, com suas conexões, separações etc. A cons-ciência dessa cndiçã eu s “medieais” a justicar caráteranalógico ou mesmo equívoco da linguagem, quando se refere aDeus. Mesm autres que defenderam uma unicidade de termscncrdaam que a reaizaçã desses terms diferia para Deus e

para as criaturas. Uma ba anáise d tema d antrpmrsm denss pensament e nssa inguagem é feita n capítu v d irO espírito da losoa medieval , de E. Gisn (2006) e n capítu 6 dlivro Filosoa medieval , de A. S. MCGRADE (2008).

Resta-ns abrdar a segunda pergunta feita n iníci de nssarefexã, qua seja, a d sentid de estudar, ainda hje, as fisfias“medieais”.

3. Por que estudar as losoas medievais?

A leitura atenta do que expusemos acima, sobretudo consideran-do o exemplo das consequências éticas da tese da criação, bastariampara mstrar a utiidade d estud das sas “medieais”.

Além disso, se concordarmos que a elaboração do passadopermite uma compreensão mais madura do presente, também nãoduidarems da utiidade de estudar as sas “medieais” aindahje. Principamente prque muitas das ideias cnsideradas “pas-sadas” cntinuam ias.

Mas a pergunta sbre sentid de estudar, “ainda hje”, assas “medieais” cuta um pressupst nci: a piniã deque as sas cnstruídas n passad já fram superadas, e que seu interesse, n máxim, seria um interesse histrigrác (par-tind também d pressupst questináe de que a histrigraanã se cupa d presente).

Esse debate é muit dens para que tmems psiçã aqui.Cm indicaçã de uma respsta, e cnand a eitr trabah decntinuar a reexã, citaríams uma armaçã de Wigenstein:

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“oue-se cntinuamente dizer que a sa nã prgride (...).Mas quem diz iss nã sabe pr que tem de ser assim. A razã é quenossa linguagem não mudou, e que continuamos fazendo as mesmasperguntas. Enquant existir erb ‘ser’, que parece funcinar d

mesm md cm s erbs ‘cmer’ e ‘beber’; enquant hueradjetis cm ‘idêntic’, ‘erdadeir’, ‘fas’, ‘pssíe’; enquantcontinuarmos falando do passar do tempo, da extensão do espaçoetc., tparems sempre cm as mesmas dicudades e inquietações,e cntinuarems isand ag que nã parece ter expicaçã” (citadpr A. KENNY, 2000, p. 14).

4. Estratégias de abordagem do pensamentomedieval

Indicams agra aguns temas, cm sugestã de texts só-cos, que o leitor poderá seguir para estudar o pensamento medieval.A rdem ds texts equiae à rdem que sugerims para eitr.

 A – Deus:

(a) pde-se cmeçar cm s capítus I-Iv d  Monologion e II-Iv d Proslogion , de Ansem de Cantuária (ume “Sant

Ansem”, ceçã “os Pensadres”, Abri Cutura);(b) pde-se cmparar cm a crítica feita pr Tmás de Aquina Anselmo, e com o modo tomasiano de proceder: questão2 da Primeira Parte da Suma teológica  (Edições lya, -ume 1);

(c) para um cntrapnt cm ambs, principamente cm T-más, er a pra da existência de Deus feita pr Duns Escta partir da ideia de ser innit: questões 1-2 da parte 1 daOrdinatio (ume “Duns Sct”, ceçã “os Pensadres”, sb

títu “A existência de Deus”).

 B – O conhecimento humano sobre Deus:

(a) um ds texts fundadres é Teologia mística , de Dinísi, Pseud-Arepagita (Editra Fissus, 2005);

(b) n artig 7 da questã 1, e n artig 2 da questã 2, daSuma de teologia de Tmás de Aquin (lya, . 1), eitrencontrará a síntese do autor sobre o tema, numa combinação

de eements nepatônics e aristtéics;

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(c) a tradiçã nepatônica chega a seu ápice cm MestreEckhart: text “o mistéri insndáe de Deus” (cetnearganizada pr DE BoNI, 2005, pp. 310-323);

(d) um cntrapnt, pea pssibiidade de eabrar um cncei-

t de Deus, é dad pr Duns Sct: text “o cnhecimentnatura d hmem a respeit de Deus”, parte 1, questã 1,distinçã 3 d Opus oxoniense (ceçã “os Pensadres);

C – O autoconhecimento humano (interioridade/subjeti-

vidade):

(a) uma referência indispensáe é ir X da bra A Trindade ,de Sant Agstinh (cetnea de DE BoNI, 2005, pp. 35-47);

(b) para text base que cntém “cgit” agstinian, er

ir II da bra O livre-arbítrio , de Sant Agstinh (EditraPauus);

(c) questã 87 da Primeira Parte da Suma de teologia , de Tmásde Aquin (a mehr traduçã é a de C. A. Ribeir d Nas-ciment, EDUFU);

(d) eitr tirará grande preit da eitura da bra de E. GIl-SoN 2007 e de A. KENNY 2000.

 D – A concepção de ser:

(a) um bm iníci é text Septenários , de Béci (Escritos -Opuscula sacra , Martins Fntes, 2005);

(b) n text O livro das letras (cetnea de DE BoNI 2005, pp. 80-97), encntra-se pensament de A-Farabi sbre existente;

(c) Aicena,  A origem e o retorno (Martins Fntes);(d) n text O ente e a essência , de Tmás de Aquin (Editra

vzes), encntra-se a síntese tmasiana entre patnism earistteism, seguind a tradiçã de Aicena;

(e) text “Ser, essência e existência” ferece cntrapntde Guiherme de ockham (ume “ockham”, ceçã “osPensadres”).

(d) capítu 6 d ir Filosoa Medieval , de MCGRADE (2008),é de muito proveito.

 E – A natureza dos termos universais:

(a) a mehr maneira de cmeçar a abrdagem d prbema danatureza dos universais é lendo a Isagoge , de Prfíri (Aar

Editria);

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(b) em seguida, na fata de uma traduçã brasieira d cmentá-ri de Béci à Isagoge , pode-se ver, indiretamente, indicaçõesde sua posição no tratado Contra Êutiques e Nestório (Escritos- Opuscula sacra , Martins Fntes). É de alguma utilidade o

estud da nta 127, apsta pe tradutr a text;(c) referência brigatória é text de Pedr Abeard, intituadLógica para principiantes (Editra da UNESP);

(d) eitr pde er também, de Pedr Abeard, a História dasminhas calamidades (ume “Abeard”, ceçã “os Pensa-dres”);

(e) capítu 3 da bra O ente e a essência , de Tmás de Aquin,cntém uma síntese d pensament d autr;

(f) um cntrapnt igrs é dad n text “Prbemas epis-

temógics”, de Guiherme de ockham (ume “ockham”,ceçã “os Pensadres”);(g) dis texts pdem ser de grande preit para esse estud:

capítu 8 d ir Filosoa Medieval de MCGRADE (2008),e o livro O problema dos universais – A perspectiva de Boécio,

 Abelardo e Ockham , de Pedr leite Júnir (Prt Aegre, EDI-PUCRS, 2001).

 F – A felicidade e as virtudes:

(a) ir III de  A consolação da losoa , de Béci, será tmadcm mde de reexã sbre a feicidade na Idade “Média”(Editra Martins Fntes; cetnea de DE BoNI 2005);

(b) text de Aerróis, Exposição da República de Platão , distin-gue o caráter individual e social da realização humana pelasirtudes (cetnea de DE BoNI, pp. 141-156);

(c) na questã 1 da primeira parte da Segunda Parte da Sumade teologia de Tmás de Aquin (Edições lya, ume 3), eitr encntra a reexã tmasiana sbre pape d bjet

da feicidade na btençã da mesma;(d) de grande preit sã capítu 3, “A ética mediea: T-

más de Aquin”, de lIMA vAZ (1999), e púscu de M.-D.Chenu, O despertar da consciência na civilização medieval , SãPau: lya, 2006.

G – A liberdade humana

(a) referência brigatória é ir III d Livre-arbítrio , de SantAgstinh (Editra Pauus);

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(b) numa perspectia cm ênfase ógic-metafísica, utr text- base para a isã “mediea” da iberdade humana é ir A consolação da losoa , de Béci, especiamente ir v(Martins Fntes);

(c) er também as questões 82 e 88 da Primeira Parte da Suma deteologia de Tmás de Aquin (lya, . 2), aém da questã6 da primeira parte da Segunda Parte (lya, . 1);

(d) um cntrapnt indispensáe é dad pes texts “Causai-dade de Deus e presciência” e “Física e Ética”, de Guihermede ockham (ume “ockham”, ceçã “os Pensadres”).

 H – Pensamento político:

(a) cntrariamente a que muitas ezes se arma, hue, sim,

pítica na Idade Média. E ea nã fi essenciamente te-crática. Um exemp diss está ns texts Tmás de Aquin,traduzidos e publicados em português com o título Escritos

 políticos (Editra vzes, 1995);(b) um cássic d pensament pític “mediea” é Marsíi

de Pádua. o eitr encntrará sua reexã sbre pder e alei no Defensor da paz  (Editra vzes, 1997);

(c) para a psiçã ckhamista em defesa da separaçã entre poder espiritual e o poder temporal, ver o Brevilóquio sobre o

 principado tirânico  (Editra vzes, 1988).

 I –  Sobre as relações entre fé e razão:

(a) Justin de Rma, Diálogo com Trifão (Pauus, XXX);(b) Sant Agstinh, Conssões (ir vII);(c) Sant Tmás, Suma de teologia , segunda parte da Segunda

Parte, q. 2, artigs 1-2 (lya, ume );(d) Guiherme de ockham, text “Pssibiidade de uma tegia

natura” (ume “ockham”, ceçã “os Pensadres”).

  J – Sobre a classicação das ciências teoréticas:

(a) Béci,  A santa Trindade (Escritos , Martins Fntes), capítuII – cassicaçã das ciências chamadas pr Aristótees deteréticas;

(b) Aicena, O livro da ciência (cetnea de DE BoNI, 2005, pp.108-113);

(c) Tmás de Aquin, Comentário ao Tratado da Trindade de Boécio – questões 5 e 6 , Editra da UNESP.

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5. Bibliograa introdutória comentada

Estã citadas aqui apenas as bras secundárias, que pdem cm-provar o conteúdo apresentado por este capítulo, além de orientar o

leitor para pesquisas mais avançadas. No item 4, damos indicaçõesds texts ds própris ósfs “medieais”.

 Nos títulos seguintes encontra-se rico material para uma revisão

da imagem tradicional da Idade Média:

ANDERSoN, P. (1980). Passagens da Antiguidade ao Feudalismo. lisba: Afrnta-mento.

BloCH, M. (1979).  A sociedade feudal. lisba: Edições 70.

DUBY, G. (1979). O tempo das catedrais. lisba: Estampa.

________. (1980). Guerreiros e camponeses. lisba: Estampa.

lE GoFF, J. (1980). Para um novo conceito de Idade Média. lisba: Estampa.

Um resumo didático de introdução à historiograa da Idade

 Média é dado por:

FRANCo JÚNIoR, H. (1992).  A Idade Média: nascimento do Ocidente. Sã Pau:Brasiiense.

FRANCo JÚNIoR, H. & ANDRADE FIlHo, R. (1985). O Império Bizantino. Sã

Pau: Brasiiense.

 Para iniciar os estudos de losoa “medieval”, é muito útil a

leitura do capítulo “Filosoa medieval”, escrito por C. Martin,

na coletânea:

BUNNIN, N. & TSUI-JAMES, E. P. (2002). Compêndio de losoa. Sã Pau: lya.

 Dois pequenos livros introdutórios, com abordagens comple-

mentares, são:

RIBEIRo Do NASCIMENTo, C. A. (2004). O que é losoa medieval. Sã Pau:Brasiiense.

SToRCK, A. (2003). Filosoa medieval. Sã Pau: Jrge Zahar.

 Em português, dispomos de algumas obras de referência para

a historiograa losóca medieval:

DE lIBERA, A. (1998).  A losoa medieval. Sã Pau: lya.

_____________. (1989). Filosoa medieval. Sã Pau: Zahar.

_____________. (1999). Pensar na Idade Média. Sã Pau: Editra 34.

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GIlSoN, E. (2001).  A losoa na Idade Média. Sã Pau: Martins Fntes.

KENNY, A. (2008). Nova história da losoa. Vol. 2 – Filosoa Medieval. Sã Pau:lya.

SARANYANA, J.-I. (2006). Filosoa medieval. Sã Pau: Institut Raimund lúi.

 Se o leitor desejar uma abordagem por temas ou por pensadores, consul-

tará com muito proveito:

BIBlIoTECA ENTRE lIvRoS, Nº 7.  A santa Filosoa. Sã Pau: Due.

DE BoNI, l. A. (1995). Lógica e linguagem na Idade Média. Prt Aegre: EDIPUCRS.

GIlSoN, E. (2006). O espírito da losoa medieval. Sã Pau: Martins Fntes.

_________. (2007). Introdução ao estudo de Santo Agostinho. Sã Pau: Pauus &Discurs.

KENNY, A. (2000). Tomás de Aquino y la mente. Barcena: Herder.

KoBUSH, T. (2003). Filósofos da Idade Média. Sã lepd: UNISINoS.MCGRADE, A. S. (2008). Filosoa medieval. Aparecida: Ideias e letras.

 Para estudar o pensamento patrístico, há duas obras excelentes traduzi-

das em português:

MoRESCHINI, C. (2008). História da losoa patrística. Sã Pau: lya.

voN CAMPENHAUSEN, H. (2005). Os Pais da Igreja. Sã Pau: CPAD.

 Alguns títulos voltados para o estudo específco do pensamento árabe e judaico medievais:

ATTIE FIlHo, M. (2002). Falsafa – a losoa entre os árabes. Sã Pau; Paas Athena.

BIBlIoTECA ENTRE lIvRoS, Nº 3. Para entender o mundo árabe. Sã Pau: Due.

GUTTMANN, J. (2003).  A losoa do judaísmo. Sã Pau: Perspectia.

SoUZA PEREIRA, R. H. (2007). O Islã clássico – itinerários de uma cultura. Sã Pau:Perspectiva.

GUINSBURG, J. (1968). Do estudo e da oração. Sã Pau: Perspectia.

Uma introdução ao estudo do pensamento patrístico-medieval, feita sob

inspiração do pensamento hermenêutico contemporâneo, sobretudo de

matriz heideggeriana, pode ser encontrada na seguinte obra:

SHUBACK, M. S. C. (2000). Para ler os medievais – ensaio de hermenêutica imaginativa .Petrópis: vzes.

Volumes com textos de pensadores patrísticos e medievais:

DE BoNI, l. A. (2005). Filosoa Medieval – textos. Prt Aegre: EDIPUCRS.

HAMMAN, A. (2002). Para ler os Padres da Igreja. Sã Pau: Pauinas.

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FolCH GoMES, C. (1973).  Antologia dos santos Padres. Páginas seletas dos antigosescritores eclesiásticos. Sã Pau: Pauinas.

 Para estudos histórico- teóricos do encontro entre o cristianismo

e o pensamento losóco, sugerimos:DE lUBAC, H. (2008). El drama del humanismo ateo. Madri: Encuentr.

CATÃo, F. (2001). Falar de Deus – Considerações sobre os fundamentos da reexão cristã.  Sã Pau: Pauinas.

DUPRoNT, A. (1995).  A rel igião católica. Possibilidades e perspectivas. Sã Pau:lya, 1995.

 JAEGER, W. (1993). Cristianismo primitivo y paideia griega. Méxic: FCE.

lAFoNT, G. (2000). História teológica da Igreja Católica – Itinerário e formas da teologia.Sã Pau: Pauinas.

lIMA vAZ, H. C. (2002). Escritos de losoa VII – Raízes da modernidade. Sã Pau:lya.

MARRoU, H.-I. (1990). História da Educação na Antigüidade. Brasíia: UNB.

NEDoNCEllE, M. (1958). Existe uma losoa cristã? Sã Pau: Fambyant.

SAvIAN FIlHo, J. (2005). Fé e razão: uma questão atual? Sã Pau: lya.

 Para um estudo de elementos medievais de reexão sobre o Belo, suge-

rimos:

PANoFSKY, E. (2001).  Arquitetura gótica e escolástica. Sobre a analogia entre arte, losoa e teologia na Idade Média. Sã Pau: Martins Fntes.

 Para temas éticos, sugerimos:

lIMA vAZ, H. C. (1999). Escritos de losoa IV – Introdução à Ética losóca 1. SãPau: lya.

CHENU, M.-D. (2005). O despertar da consciência na civilização medieval.  Sã Pau:lya.

 Para estudar a relação da ciência moderna com a prática cien-

tífica “medieval”, sugerimos dois estudos: o de E. Grant (mais

recente e mais científico), e o de A. Koyré (mais clássico, e

mais filosófico). Sugerimos também o artigo escrito por E. D.

 Sylla:

GRANT, E. (2004). Os fundamentos da ciência moderna na Idade Média. Porto: PortoEditra.

KoYRÉ, A. (2006). Do mundo fechado ao universo innito. Sã Pau: Frense.

SYllA, E. D. “Criaçã e natureza”. In: MCGRADE, A. S. (2008). Filosoa medieval. 

Aparecida: Ideias e letras.

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 Para estudos sobre a lógica medieval, sugerimos o clássico livro

de Kneale & Kneale, além do capítulo escrito por Ashworth:

ASHWoRTH, E. J. “linguagem e ógica”. In: MCGRADE, A. S. (2008). Filosoamedieval. Aparecida: Ideias e letras.

KNEAlE, M. & KNEAlE, W. (1980). O desenvolvimento da lógica. lisba: FundaçãCauste Gubenkian.

 Para estudar o modo como os próprios “medievais” conceberam

a história da losoa, sugerimos:

PIAIA, G. (2006). Entre história e imaginário. O passado da losoa na Idade Média. Prt Aegre: EDIPUCRS.

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 Apresentação

Trata-se de apresentar pensament de Water Benjamin ins-crito na história da filosofia como uma reflexão sobre o mundocutura e históric, em particuar a partir d sécu XIX, à uz daimprtncia da memória e d passad, das experiências de ida ede pensamento que os indivíduos desenvolvem em suas relaçõescm seus cntemprnes e cm s ares herdads da tradiçã.Pis se “s hmens se reúnem em cidades para ier bem e cadaez mehr”, é precis reetir sbre s bstácus que criam ma-estar na civilização.

Da póis grega à metrópe cntemprnea, Benjamin indica asmetamorfoses da ideia de indivíduo e de individualidade, de espaçopúblico e esfera privada, bem como dos valores que constituíam osentiment de pertencer a um mund cmum cmpartihad. Daskolé clássica e seu cultivo dos saberes especulativos ao pragmatismo

e a cut da ecácia e ds resutads, da atençã e cncentraçãpara a mderna dispersã, Benjamin é crnista d m da tradiçãfundada na imprtncia existencia da sa e da “cutura teó-rica”, que preseraa a autnmia da facudade de jugar que, namdernidade, cede as fenômens de massa, à distraçã e à disper-sã. Uma de suas expressões mais signicatias é, para Benjamin, cinema, que se afasta da ideia de iniciaçã artística, “fazend recuar

Capítulo 4

Ética e losoa

política: o pensamentode Walter Benjamin

Olgária Matos* 

* É dutra em Fisa pea Uniersidade de Sã Pau é prfessra Tituar daUniersidade de Sã Pau e atuamente prfessra d Curs de Fisa da

Uniersidade Federa de Sã Pau.

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o valor de culto, não apenas porque transforma cada expectador emexpert, mas porque a atitude deste expert no cinema não exige delenenhuma atençã”. Sua sa, que nã se fez em cmpêndis -umss mas pr ensais, já se cntrapõe à isã d cnheciment

pr sistemas prque “da ida nã há sistema.”A mdernidade é, para ósf, a d capitaism d cnsum,da sciedade de massa e d espetácu em que se dá a “desariza-çã de tds s ares”. Water Benjamin indica as cnsequênciasmrais e sciais d m da tradiçã, de suas frmas de rganizaçãpítica e de sua utiizaçã d temp scia. D mund greg ahumanism cíic da Renascença, d Iuminism eurpeu d sécuXvIII até a Primeira Guerra Mundia, a sa pítica criu umideári que iria cnsidar a “dignidade d hmem” n desen-

iment das “artes iberais” e ds cnheciments que se adquirematraés ds irs – em particuar atraés d estud da íngua e daiteratura grega e atina – e da Weltliteratur (iteratura uniersa).Este idea humanista de educaçã e de cutura se desfaz n mmentem que todas as esferas da vida passam a ser determinadas pelofatr ecnômic, seand m d pape sóc e existencia dacutura. Mais que iss, depis d traumatism da Primeira GuerraMundia (1914-1918) e da ascensã d Nazism na Aemanha em1933, Water Benjamin mstra de que maneira esses acnteciments

nã deixaram intacta nem mesm a nçã de cutura que ósfvê comprometida com a barbárie. A modernidade se caracteriza pelauniersaizaçã ds ares da cutura capitaista, que Benjamin cn-sidera a partir das transfrmações na cidade de Paris, “a capita dsécu XIX”, a capita d Capita. Entre Berim e lndres, entre umpaís predminantemente agrári e “retardatári” e um capitaismdas reuções industriais, Paris cntém, em cnit, mdern e tradicina, n mment em que a “ida d espírit” será preteridapela sedução das mercadorias e do modo de viver que elas impõem.A produção em série e a obsolescência permanente das mercadoriasse revelam também na moda que não deixa intactos os bens culturaisque passam pela mesma lógica do descartável.

A sa de Water Benjamin ferece um quadr cnceituaque permite reetir sbre as cndições que afastam s indiídusuns dos outros em vez de aproximá-los, a lógica da concorrênciaque pode melhorar as mercadorias, mas que necessariamente pio-ra s hmens, s fenômens da excusã e das diersas frmas derivalidade que o vazio de valores e de um mundo ético determina.

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Estas questões nã se encntram apenas na sa cntemprnea,mas foram herdadas do diálogo que o pensamento estabelece comsua história e cm a história de seus prbemas. Razã pea qua,Benjamin se refere a Patã, Mntaigne, à Bíbia, a Baudeaire, He-

ge e Marx, entre utrs, bem cm à iteratura e à antrpgia, àsa da inguagem e a teatr, a cinema e à arquitetura. É degrande imprtncia, ainda, a anáise da ciência mderna, seus mét-ds e bjetis, cujs efeits anti-humans encntram-se na genea-gia da razã cientíca e tema d “desencantament d mund”.Benjamin reete, pis, acerca d que signica uma ciiizaçã quenão se funda em nenhum valor transcendente, que aboliu a aura danatureza, d csms, ds indiídus e da arte. Em 1925, tend suatese de lire-Dcência (Habilitation) recusada pea Uniersidade de

Frankfurt e n pós-Primeira Guerra Mundia, que anuncia a hiper-infaçã e desempreg em massa, Benjamin passa a ear umavida precária, tornando-se tradutor, resenhista e locutor de rádio.Assim, frequentou praticamente todos os ramos do conhecimento,da sa à iteratura, da antrpgia à história, da medicina an-tiga às idegias reucinárias, d jrnaism a cinema e rádi,de ta md que é pssíe apresentar as estudantes, na sade Benjamin, muit da história da sa e da crítica da cuturano presente.

Prque ensin da sa n Ensin Médi dee prer estudante de um repertório teórico que o habilite a estabelecer re-lações com os demais pensadores e com os diversos ramos do co-nhecimento, deve também iniciá-lo em uma disciplina que o retireds precnceits d sens cmum e d ctidian imediat. E, nacntramã d cut da faciidade, a sa é uma ciência arquitetô-nica porque ciência do rigor. Para isso, é preciso que se compreenda que ósf pensu, cm fez, quais fram seus intercu-tres, suas intenções subjacentes e manifestas, uniers cuturaem que desenvolveu seu pensamento e a história que nele habita.É imprtante preenir a tendência a er na sa um reex dasnecessidades materiais da sciedade. A sa capta, em teria, acomplexidade do que vivemos no cotidiano, as diferentes tempo-raidades que nee agem, seus cnits e acrds.

Cm td cnheciment, a fisfia é um gêner iterári,ist é, frmaçã discursia, cm regras próprias, cujs meis sãs cnceits que permitem eabrar prbemas e escarecê-s. Seu

hermetismo só o é enquanto não conhecemos o

modo de produção do

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pensamento de um autor, o que o leva a atribuir um sentido inéditoa paaras utiizadas n ctidian, bem cm à inençã de utras.Assim, por exemplo, o  Jetztzeit  benjaminian, que ósf cns-trói com o advérbio  Jetzt (agra) e substanti Zeit  (temp) para

reetir sbre a natureza d temp que pssa rmper cm a ógicada prduçã e d cnsum, iberand bjets e acnteciments dacorveia de serem úteis, de violência e terror da história, que façaadvir suas esperanças decepcionadas. Heterodoxo pelo método e porseus bjets de reexã, Benjamin ta-se para que, ns grandessistemas sócs, cu preterid à nta de rdapé u que, re-duzid à marginaidade n prcess prduti d capitaism, fiesquecid. E na cntramã d precnceit antibigrác da históriada sa cntemprnea, Benjamin escree Rua de Mão Única, em

que s instantnes captads em suas perambuações pea cidadede Berim, expressam, em cartazes, sinais uminss, tabuetas e“sinais fantasmátics” ctidian em que se recnhece a ascensãd Nazism. Esta pubicaçã é seguida pr Infância Berlinense porvolta de 1900, a cidade agra subterrnea, a da memória infantie burguesa, n bairr este de Berim, nde a ida transcrre nsentimento ilusório de segurança nos interiores burgueses e sua de-craçã. Pr iss, a funçã d ósf é a d cecinadr que, embjets esparss, em fragments, pratica uma radigraa d uniers

scia: “para erdadeir cecinadr cada cisa singuar trna-seuma enciclopédia de todas as ciências da época, da paisagem, daindústria, d prprietári de que prém”. (BENJAMIN, 2006).

Explicação geral do tema e bibliograa básica parans de uso docente

Water Benjamin eabra seu pensament entre s ans de 1914e 1940, períd herdeir da unicaçã aemã de 1871, em um paísque até 1789, an da Reuçã Francesa, cntaa 1.789 unidadesterritriais, marcad pr frte particuarism. Sb a hegemnia daPrússia, da burcracia e d miitarism, Bismarck cnquista umaidentidade nacina tardia, cuj pder cncentra-se na famíia H-henzern que se frma na Prússia a partir d sécu XII e quepermanece n pder até sécu XX. Dizia-se na épca: “A Aema-nha não é um país que possui um exército, mas um exército quepssui um país”. Na unicaçã, a sciedade cii se miitariza,

que nã será sem cnsequências para a Primeira Guerra Mundia

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(1914-1918), a m da qua se prcama a Repúbica na Aemanha.Simutaneamente às questões internas d país, a cnjuntura históricaabrange a Reuçã Russa de 1917, a expectatia de uma reuçãsocialista na Alemanha, a ascensão do Nazismo, a preparação para a

Segunda Guerra Mundia (1939-1945), a ditadura na Uniã Siéticasb Stain (1928-1953). Em 1928, Benjamin, apaixnad pea ituanadiretra de um teatr infanti em Mscu, isita a cidade e anta:

A transformação de todo um sistema de poder torna aqui avida extraordinariamente rica, fechada sobre si mesma e cheiade eventos, pobre e ao mesmo tempo carregada de perspectivascm a ida ds caçadres de ur d Kndyké. Da manhã à nitecaa-se na busca d pder. Td um cnjunt de cmbinações davida de um intelectual europeu é bem pouca coisa para comparar

cm a innidade de experiências que aqui assediam indiídu aterm de um só mês. (Diário de Moscou). o períd em que Benjamin escree uma das bras mais sig-

nicatias d sécu XX assiste às esperanças reucinárias e àsdecepções históricas, campos de concentração na Alemanha nazista ens países cupads durante a guerra, a exíi d ósf, a partirde 1933, quand Partid Nacina-Sciaista e Hiter ascendem apder na Aemanha. Tem iníci a perseguiçã a judeus, cmunistas ehomossexuais, bem como a política eugenista de sobrevivência do mais

apto , extermíni de dentes mentais e prtadres de deciências ea política do solo e sangue, a pureza da raça ariana , a identidade alemãigada à cnsanguinidade, a s e a suas tradições ancestrais.

Entre 1916 e 1940, Water Benjamin desene seu pensamen-t que pde ser rganizad em três períds (apesar de s temasdo  primeiro período nã estarem ausentes ds demais). Entre 1916 e1924, precupa-se cm questões de sa da inguagem e messia-nismo, analisando-a a partir da tragédia clássica grega e da teoriada nmeaçã adamítica, em que a Bíbia e Patã se reacinam,mit e gs cmbinads, u tegia e sa ( que também seidenticará ns útims escrits, as teses Sobre o Conceito de História ,de 1940). Em um períd intermediário , entre 1924 e 1938, ta-separa questões d pder pític, reetind, simutaneamente, sbrea gênese da cultura política na Alemanha em suas relações com ocapitaism, cuj epicentro encontra-se em Paris, a capital do séculoXIX. Sã desse períd as bras Origem do Drama Barroco Alemãodo Século XVII  (apresentada cm tese acadêmica em 1924 e pubi-

cada em 1928), Rua de Mão Únicae

Infância Berlinense por volta de

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1900 (1928) até a ceçã de fragments e citações sbre a históriaoriginária d sécu XIX e d capitaism que seriam as PassagensParisienses , cnsiderada pr aguns autres, cm Rf Tiedmann(respnsáe pea pubicaçã d ir em 1978), cm inacabada,

de que fazem parte ensaios sobre a crise da tradição e a perda dasreferências e valores do passado, em função dos desenvolvimentosda ciência e da técnica, a reprduçã mecnica na prduçã emsérie de mercadorias, na economia, e a reprodutibilidade técnica dasbras de arte, na cutura. o ensai O Narrador é de 1936 e  A obrade Arte na Época de sua Reprodutibilidade Técnica tem uma primeiraersã em 1935 e mais duas reisões, send a útima de 1936. Emum terceir mment, entre 1938 e 1940 escrits sbre Brecht e asteses Sobre o Conceito de História.

Fragments e ensais curts escrits entre 1916 e 1924 prepa-raram, segund Benjamin, seu ir sbre drama barrc aemã,seu Trauerspiel. A palavra compõe-se de Trauer (tristeza, ut) e Spiel (jg e representaçã teatra), de maneira que Benjamin apresentaa relação entre o luto e o lúdico, a história dos dramas barrocoscompreendidos como o palco em que as personagens encenam opder e a frça das paixões na pítica. Water Benjamin recnhe-ce surpreendentes anagias entre sécu XvII e a mdernidadeds ans de 1920, pis s temas desses dramas eram assassinats,

corrupção, pestes, guerras, seu duplo sendo o século XX e, em par-ticuar, assassinat de Rsa luxemburg em 1919. Nesse períd,reaiza a crítica a cnceit de história que ósf denmina de“História Natura”, indicand paradx d capitaism que tudreduz à cndiçã de passiidade. Se a natureza é “pré-dad” ea história é cnstruída pea açã ds hmens, a justapsiçã dstermos atesta que a história recaiu em natureza, é governada porprcesss que s hmens nã dminam. Assim, se sécu XvII eraregido pelo determinismo da ciência mecanicista e pela metáforad “Deus rejeir” que tud determinu desde a eternidade einterém peridicamente n mund cm “deus cartesian” ua “pridência diina” d prtestantism, sécu XX é seu dup,a história é produzida pelo mercado mundial, a forma moderna dafatalidade do destino.

Não por acaso, os textos preparatórios do Drama Barroco Ale-mão referem-se a heróis da epopeia mítica e do teatro trágico deSófces, Ésqui e Eurípides, a m de reetir sbre a origem (Urs-

 prung) da cultura política alemã e seu culto do heroísmo guerreiro.

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Desde iníci d sécu XIX, a Aemanha se tu para questõesde identidade nacina, buscand suas raízes na Grécia d sécuv a.C., cm Nietzsche que, em sua bra O Nascimento da Tragédia,encontra em Wagner o renascimento do trágico. Ao mesmo tempo,

a recente unicaçã aemã se fez cntra a França, dada a pregnnciatant pítica quant cutura da França na Aemanha, períd quese estende pe mens desde sécu XvII até sécu XIX, épcaem que a Europa falava francês. Estado Cultural e República das Letras fram cncebids pr luís XIv, send que prestígi de Paris resu-taa da fundaçã da Academia Francesa de letras quand a ínguae a literatura francesa foram decretadas bem de utilidade pública eParis deveria ser uma nova Atenas, uma nova Alexandria, uma novaRoma. Este períd eabra as regras de cniência na Crte, as

boas maneiras , a etiqueta , o vivere civile , o modo da vida  polida , quelevava em consideração a arte da conversação e da retórica na vidapúbica. Em seguida, a Reuçã Francesa, em 1789 – que inaugurauma na história, em ruptura cm Absutism mnárquic –,funda os valores republicanos e a ideia do povo legislador , politizadoe intervindo diretamente nos assuntos da cidade.

o cassicism aemã de Winckemann é uma das reações deidentidade nacina que exata uma Grécia a ser imitada, mas paraque os alemães se tornem inimitáveis. A Primeira Guerra Mundia,

eada a term pr Guiherme II fi uma uta da Kultur (aemã)contra a Zivilisation (francesa), a Kultur sendo a portadora dosmais altos valores alemães. A civilização é o superficial , cut àsconvenções, enquanto que a cultura são as artes. A cultura alemãé aquea que resistiu à rmanizaçã e que reaê – para aém daciiizaçã atina e neatina – a cutura grega. Desde Nascimen-to da Tragédia , Nietzsche fizera do trágico um traço característicoda Grécia antiga e seu ressurgiment seria uma tarefa d espíritalemão que deve libertar-se da romanische Zivilisation (ciiizaçãatina), ista cm pressra d espírit aemã. o que aparece nsanos de preparação da guerra encontra-se nas palavras tambémde Thmas Mann:

[...] a diferença entre espírito e política contém a diferença entrecultura e civilização, entre alma e sociedade, entre liberdade e di-reit de t, entre arte e iteratura; e a germanidade é a cutura, aarte, a ama, a iberdade – e nã a ciiizaçã, a sciedade, direitde voto, a literatura.

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Aemanha e França, entã. As frças ds aiads cntra a Ae-manha são as  forças da civilização , pr iss Thmas Mann apra aguerra de Guiherme II, cm defesa d espírit aemã cntra aciiizaçã d ocidente eurpeu. Esta especicidade da Aemanha n

interir da Eurpa cidenta romanizada ou civilizada permanece naAemanha até a Segunda Guerra Mundia. A ideia de uma “tragédiada cutura” – em mei à instaaçã d dinheir e ds ares a eeassciads – cntra a “ida d espírit” é um tema que Benjamimache na anáise da “tragédia da ciiizaçã”; ambas as tragédiassão Trauerspiele.

Ns ans de 1920, em mei às cnsequências da derrta daAemanha na Primeira Guerra Mundia, d desempreg à hiperina-çã, Benjamin dirige-se para sécu XvII, desiand-se d sécu

XX para, n entant, tratar dee. o que s une é uma dimensã dahistória, indicando a queda da história no registro da repetição e dodestin. os dramas barrcs se aem de uma inguagem “à aturada iência ds acnteciments histórics” em que metáfras deuma natureza desregrada faam da ida histórica que tma a gurada predestinaçã: “ sberan d sécu XvII, cume das criaturas,é tomado por uma loucura furiosa, como um vulcão, destruindo-sea si mesm e a tda sua crte”. Benjamin nã deixa de ntar queos dramaturgos alemães eram luteranos , neoestoicos , atentos para o

que há de extemporâneo e malogrado nos acontecimentos, a naturezaem sua caducidade é a mesma da natureza humana decaída e dahistória vazia e repetitiva, feita de tédio e luto. A ideia da vanitas eda inutilidade dos esforços humanos diante das violências da his-tória prescreve a aceitação de uma rigorosa observância do dever. Nopalco barroco, o reino é dominado pela intriga, pelo cálculo e pelaconspiração. A concepção de história barroca encontra seu emblemanas reviravoltas inexoráveis da roda da fortuna, em que se sucedems pderss d mund n pac: príncipes, pntíces, imperatrizesem suas vestimentas suntuosas, cortesãos e personagens mascaradasque evoluem em meio a traições e desgraças, envenenamentos, todosigualmente enredados em uma dança mortífera, conduzida com aeegncia ds triunfs renascentistas:

[...] a aparência física ds atres, principamente d Rei, que seexibe em roupas de aparato, devia ter um aspecto rígido, como de um fantche: “s Príncipes, nascids para a púrpura, camenferms quand estã sem cetr [...]”. Dai-ns eud ermeh

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e essa este rida, e negr cetim, para que em nssas rupastranspareça tant que aegra s sentids cm que aige cr-p; ede quem fms nesta peça, na qua a íida mrte cstura estuári na. (DBA, p. 148).

Para Benjamin, as persnagens inestidas de magnicência epoder são máscaras mortuárias de rigidez cadavérica, como mane-quins e fantches, sujeits à caducidade da natureza e fugacidade dtemp. Sã dupas em si mesmas, tiran é mártir, e mártir, tiran,melancólico, dilacerado entre seus plenos poderes como déspota esua cndiçã de criatura, sujeit à decmpsiçã e à mrte.

o temp históric nã é senã um transcrrer mecnic priadde qualquer desenvolvimento ou novidade, percurso tomado do

sentiment meancóic de sujeiçã a destin. A ideia de histórianatural resulta da queda e do  pecado original , época captada em seusmomentos de corrupção e decadência, produzidas por uma infraçãooriginária responsável pelo ciclo de catástrofes e violência em que oshmens se debatem, sem saída, sem uma naidade útima u saa-çã que as transcendam. Se Benjamin enfatiza que s dramaturgsaemães d barrc eram uterans – cm que signica a ausênciade redenção e não está prevista sequer a harmonia da predestinaçãocainista que dasse signicad à cadeia insensata em que cnsiste

a ida da épca. o tiran nã age, habitad pea dúida que é, tãsmente, ausência de cnicções. Quant a crtesã – súdit – suaúnica atitude é a traiçã. Mas nã trai mid pr aguma idegia,mas pr tédi. Sua dupicidade se expressa n intrigante e n sant.Assim como a história no capitalismo é a história do capital e nãoprpriamente história ds hmens, n sécu XvII, s ats nã têmar de desenace: “paixã sem erdades, erdades sem paixã;heróis sem herísm, história sem acnteciments”, dirá Marx. Eassim como o drama barroco vê o cadáver de fora , como cenário de

ruínas, a metrópe será sua guraçã mderna, cm seus heróissem missão heroica, os marginalizados: o dândi , o  âneur, o velho, ascocoes , o poeta, o trapeiro, o colecionador, a criança. Personagensque fazem história a partir do lixo da história , são também as quereconhecem nos monumentos da burguesia e da cultura capitalistaruínas antes de seu desmoronamento. Antes e independentemente deseu desmoronamento. As ruínas não são materiais e externas apenas,mas mrais e internas. Razã pea qua Benjamin escree: “ barrciu cadáer de fra, Baudeaire ê de dentr”. 

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Essas ruínas existenciais marcam a mdernidade que rmpeucm tds s ares transcendentes, da metafísica à reigiã, nadesvalorização de todos os valores, salvo o valor fetiche da merca-dria, eement de cut da fé capitaista. Eis pr que as passagens

de Paris, construções do luxo industrial em ferro e vidro, são otemplo das mercadorias onde o próprio flanar se torna lugar deconsumo e consumo do lugar. Nelas a desvalorização dos valores éperda da aura, do elemento de distância , de transcendência, o haloque ene s bjets e que faz dees um acnteciment únic.Pr sua singuaridade e raridade, bjet artístic tinha aura quelhe conferia identidade. A dissolução da aura não deixou intactaa arte, cujs bjets perderam, pea reprdutibiidade técnica, suaunicidade , sua autenticidade que cnstituíam sua inscriçã n mbit

da tradiçã, a ta pnt de ser impráe faar em arte autôn-ma quando ela também é determinada pelas leis do mercado. Nomercad capitaista nada mais escapa à ei d ar e tud tem umpreç. Na mdernidade, desaparece a nçã de indiídu autônm,heterodeterminado por forças que ele não domina: não é o homemque escolhe o que produzir, como produzir e o que consumir, massim mercad mundia, a frma mderna d destin. Fataizadspelas leis da economia, os indivíduos são mais agidos que agentes,como na tragédia antiga ou na barroca.

Acrescente-se o sentimento de vertigem e de desestruturaçãoque inauguram os tempos modernos na meditação da personagemHamet de Shakespeare: “Ser u nã Ser” é uma pergunta sbre lugar que o homem ocupa no universo do qual o divino se retirou ouos valores eternos desapareceram. A síndrome histórica e cultural daépca barrca, cuj sentiment dminante é desesper, se expressana meancia que se transmite às ações d gernante, mas tambémàs ds súdits. Ea é um narcótic da psique e, simutaneamente,respsta à história cm ruína. Sua indência e indecisã reeamque a crte (a sciedade barrca) se encntra sb sign de Saturnque torna as pessoas apáticas, indecisas, lentas. Daí também caráterutuante ds  parasitas e cortesãos que o cercam, sempre dispostosà deseadade e à traiçã.

Nesse universo, o mito e a história se confundem. Por isso, nosécu XIX, Benjamin identica um sono letárgico: “um sn mític seabateu sbre a Eurpa”. Essa snência é a da uniersaizaçã dfenômen d fetichism, da adraçã de cisas mrtas, entrniza-das como se fossem vivas, e da guerra imperialista. Nas passagens

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de Paris – precursras ds atuais shopping-centers – é a mercadriaque tma a paara e “dá piscadeas a passante”, já imaginandem que parte ds saões ea se instaará, eand cnsumidr àruína. A guerra imperialista, além de guerra do capital é também

a da técnica. A Primeira Guerra Mundia – a que resutu em ques cmbatentes “taam muds ds camps de bataha, nã maisrics, mas empbrecids de experiências transmissíeis” – é a daafasia e d trauma. Fi a primeira ez em que uma guerra nãrespeitou um campo de batalha, assassinando populações civis de-sarmadas. Em seu ensai Experiência e Pobreza , Benjamin se refere àguerra de trincheira e seu amntad de cadáeres; ea fi estadode exceção que suspendeu os direitos positivos em nome do bem-estare da paz, prduzind a idegia da guerra justa – que se trnu

permanente, uma ez que hje mund td se cnerteu em znade risco e em trincheira.N sécu XvII, a natureza d hmem se exprime n desen -

cadeamento de paixões devastadoras e a natureza das coisas ma-nifesta-se ns bjets inanimads que adquirem pder sbre shmens; e a fisfia da história que he crrespnde é a d desprezodo mundo , o contemptus mundi , que faz da história um labirinto semsaídas. o sberan e s súdits iem tmads pr frças que nãcntram – as paixões na ama e a frtuna na história. Nesta ins-

tabilidade de todas as coisas, o Príncipe deverá fabricar a duraçãono que, por natureza, é inconstante e impermanente, e por isso,desde iníci, está inestid de pderes ditatriais. o cnceit deTrauerspiel , deduzid da isã de história que Benjamin recnhecens dramas barrcs d sécu XvII, apica-se iguamente a sécuXIX e Segund Impéri, gern de Napeã III na França.Cm sécu XvII, XIX é também uma épca de restauraçã– nã períd da Refrma e da Cntrarrefrma reigisa, masda contrarrevolução, marcada entre os dominantes pelo medo dascatástrofes que seria a revolução. A filosofia política que se ex-prime encntra-se em Car Schmitt, teóric d estad de exceçã,decrrente da teria da sberania d sécu XvII. À meanciad drama barrc se substitui tédi das passagens de Paris: “tédi ideógic das casses superires”, escree Benjamin, “temseu fundament ecnômic n trabah da fábrica”. A teria dtédi, que Benjamin cnstrói a partir de pensadres e petas cmBaudeaire, Nietzsche e Banqui, adquire, ns sécus seguintes, a

figura da mntnia – daLangeweile. Nesta percepção do tempo,

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“ dia é pr demais ng e a ida pr demais bree”. É tempazi da mecnica e da física, reguar e sempre igua.

Se a prduçã em série de mercadrias determina a eterna voltado mesmo sob o disfarce da novidade , é porque a acumulação primitiva

do capital, no capitalismo, é permanente, recomeça-se sempre dozer, cm jgadr. Este azi de signicad d etern recme-ço é o do gesto sem história, como é a vida sem experiência e semmemória da modernidade, é a fantasmagoria dos tempos modernos.Mercadrias e fantasmagrias se trnam agentes das reações entres hmens reduzids à passiidade, sã as alegorias do moderno e,cm estas, nã pssuem a eidência d símb, sã antinômicas,contraditórias, construídas de elementos heterogêneos e sem sentidoúnico inteligível. A alegoria condensa o consciente e o inconsciente

da história, ist é, mit. Pr iss, Benjamin cncui:

A reaçã que iga mit à erdade é de excusã recíprca. Am- bígu pr natureza, mit nã cede à erdade, nem, cnseqüente-mente, a err. Mas, cm tampuc se pde faar de uma erdadedo mito, só pode haver, no que diz respeito ao espírito do mito, umpuro e simples conhecimento deste espírito. Para que se instaurea verdade, é preciso antes saber o que é o mito, que se o conheçacomo realidade indiferente ao verdadeiro e destruidora do verda-

deir. (As Anidades Eetias de Gethe).

Bibliograa comentada, a mais relevante e a maisacessível, perl da bibliograa e sua utilização

A puraidade de temas percrrids pe autr – iteratura, tea-tr, cinema, rádi, jrnaism, história da sa, antrpgia, fábu-las, pintura, história, bem como a tematização da política como teatroe a metrópole e seu cenário, encontram-se em ensaios e fragmentosreunids em cetneas. A bra centra, que cntém a quase ttaida-de dos temas trabalhados pelo autor, é Origem do Drama Barroco Ale-mão do Século XVII. Nela, a política é tratada como teatro, encenaçãopública de interesses particulares, onde se discutem questões deteoria da história e crítica do conhecimento. Quanto a seu duplo,a metrópole moderna, ela se encontra analisada em particular nasPassagens , bra de Benjamin que beneficia s estudiss de fi-sofia, historiadores das ideias e da cultura, estudiosos das artes e

da caricatura como expressão da vida urbana e, em particular, a

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guerra, analisando as mutações intelectuais da modernidade quetransfrmaram a ciência em infraestrutura assciada à ecnmiae à guerra, pr um ad, a transfrmaçã d inteectua em pes-quisadr, de utr. Sã as questões éticas e a impssibiidade de

a ciência lidar com seus extraordinários recursos de poder sobrecriar processos na natureza ou dominá-los, o eixo de suas análises.os deseniments da ciência e da técnica e “a escassez ds re-curss mrais para idar cm eas” e fazer da “técnica órgã dasciedade” sã questões assciadas a períd inaugurad peaPrimeira Guerra Mundia que fi uma guerra da técnica em que hmem se transfrmu em um “a abstrat em uma área detir”. Esta circunstncia fi preparada pes prcesss de cisifi-cação, formalização e despersonalização no capitalismo moderno,

em que tud se trna bjet de manipuaçã e dminaçã de umaracionalidade que quer exercer poder sobre todas as coisas e domi-nar riscos. Nesta bibliografia, pode-se compreender de que modoa ciência produz os riscos que ela não controla, dada a perda damedida humana para as decisões políticas que se querem decisõestécnicas. os escrits em trn da História Cultural do Brinquedo reconstituem o tempo do lúdico, do mágico e do fantástico, domundo das fábulas, apontando para um princípio de realidadediverso daquele do mundo adulto , racina e sem metafísica. Cm

respeit a iss, Water Benjamin cnsidera que a maneira de acriança quebrar seus brinqueds é querer “er as cisas em simesmas”, em sua “essência”; pr iss as crianças sã “metafísicsespntnes”. Em Sobre o Conceito de História são desenvolvidas asquestões de filosofia da história e teoria política na modernidade.o mnumenta Passagens, disponível em edição comentada, é umacolagem de citações sobre a cidade de Paris, compreendida como oparadigma da mdernidade. Esta bra cntém a hermenêutica damodernidade, um caleidoscópio das construções, ruas, publicidadee sinais fantasmáticos d mund cntemprne.

A Bibigraa pderá ser utiizada eegend-se eixs apresen-tados acima para cada um deles, como teoria do conhecimento,teria da arte, teria da história, teria da inguagem. Caberia aprofessor a leitura completa do texto a ser estudado em sala deaula, não sendo necessário que os estudantes leiam todos os textosna integralidade, bastando a seleção de dois ou três parágrafos maissignicatis d que trabah cmpet prpõe. Se, nesta mdai-dade, perde-se, de início, a totalidade do pensamento do autor, em

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contrapartida, ganha-se em compreensão, cuidando-se dos passosda cnstruçã d bjet de cada ensai. outra pssibiidade é a de prfessr er um só ds texts em tda sua extensã em cnjuntcom os estudantes.

Referências básicas

Obras de Walter Benjamin:

“Terias d Fascism Aemã”, “Pequena História da ftgra-fia”, “Experiência e Pbreza”, “A obra de Arte na Épca de suaReprdutibiidade Técnica”, “o Narradr”, “História Cutura d

 brinqued” e “Sbre Cnceit de História”. Estas bras pdemser encontradas em:

BENJAMIN, W. Obras Escolhidas I : Magia e Técnica, Arte e Pítica. Traduçã SérgiPau Ruanet. Sã Pau: Brasiiense, 1996.______. Obras Escolhidas II : Rua de Mã Única. Traduçã R. R. Trres F. e J. C. M.Barbsa. Sã Pau: Brasiiense, 1987.______. Charles Baudelaire, um Lírico no Auge do Capitalismo. Traduçã J. C. M. Bar- bsa e H. A. Baptista. Sã Pau: Brasiiense, 1989.______. Passagens. Traduçã Irene Arn e Cenice Murã. Be Hriznte: Ed.UFMG, 2006.

Referências auxiliaresAGAMBEN, G. Infância e História: Destruiçã da Experiência e rigem da História.Traduçã Henrique Burig. Be Hriznte: Ed. UFMG, 2005.BRETAS , A.  A Constelação do Sonho em Walter Benjamin. Sã Pau: Humanitas/Fapesp, 2008.CAllADo, T. de C. Walter Benjamin: a Experiência da rigem. Frtaeza: UECE, 2006.CoHEN, M. Profane Illuminations: Water Benjamin and the Paris rg surreaistreutin. Berkeey: Uniersity f Caifrnia Press, 1995.DUARTE, R.; FIGUEIREDo, v.; FREITAS, v.; KANGUSSU. Kátharsis: reexões de

um cnceit estétic. Be Hriznte: Ed. C/Arte, 2002.GAGNEBIN, J. M. Walter Benjamin e os cacos da História. 2. ed. Sã Pau: Brasiiense,1993. (Encant radica).______. História e Narração em Walter Benjamin. Sã Pau: Perspectia, 1994.KoHAN , W. Zona Urbana: ensay de lectura sbre Water Benjamin. Madrid: Trt-ta, 2007.löWY, M. Walter Benjamin: Ais de Incêndi. Sã Pau: Bitemp, 2005.______.  A Estrela da Manhã : Surreaism e Marxism. Ri de Janeir: CiiizaçãBrasieira, 2002.MAToS, o. Os Arcanos do inteiramente Outro: a esca de Frankfurt, a meancia,

a reuçã. Sã Pau: Brasiiense, 1995.

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 Apresentação

Ainda que a sa da ógica e da inguagem cupe um ugarcentra na história da sa, e em particuar na sa cntemp-rnea, sua apresentaçã a um púbic mais amp e sua presença ncntext escar apresenta dicudades reeantes. Iss é prcad,ao menos em parte, por um vocabulário marcado pela abstração,pela ausência de uma vinculação clara com a experiência cotidiana,e peas dicudades apresentadas pr uma inestigaçã técnica eextremamente exigente quant a rigr. Entretant, a cmpreensãdesses prbemas e a deniçã de estratégias adequadas pssibii-tam não apenas a apresentação desses temas em contextos menostécnics, mas mesm a intrduçã à sa a partir da inestigaçãda linguagem e do pensamento.

Uma das aternatias mais interessantes na apresentaçã dugar centra da reexã sbre a inguagem e a ógica, em especiana sa cntemprnea, é acmpanhar a inha básica de argu-

mentaçã de Wigenstein n Tractatus Logico-Philosophicus , um dosprincipais irs de sa d sécu XX. N trabah de Wigens-tein, na medida em que ee se apresenta cm uma reexã sbre cnjunt ds dmínis de que trataria a sa, da ntgia àreigiã, à ética e à estética, encntrams também uma aternatia

Capítulo 5 

Lógica e linguagem.O que se diz e o que se cala: Wittgenstein

e os limites da linguagem

 Marcelo Carvalho* 

* Dutr em Fisa pea Uniersidade de Sã Pau, pssui Mestrad e Gra-duaçã em Fisa pea mesma Uniersidade. Atuamente é prfessr da Uni-ersidade Federa de Sã Pau e Crdenadr d Prgrama de Pós-Graduaçã

em Fisa desta uniersidade.

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interessante de apresentaçã da sa, expicitand a reaçã entreseus diversos temas.

Filosoa e linguagem

A reexã sbre a inguagem se situa n centr da sa cn-temprnea. Mas pr que a inguagem interessaria de md tã centraà sa? De uma perspectia mais gera, a inestigaçã ds cnceitsde erdade, necessidade e signicaçã, núce de uma reexã sbrea inguagem, se apresenta cm cntrapartida d exercíci sócdesde seu iníci. Mais d que um tema n ast eenc da sa, emais do que uma ferramenta para a abordagem de outros assuntos,a lógica, como investigação da estrutura e essência da linguagem, dodiscurs e da argumentaçã, se situaria n núce da prática sócae da identidade especíca que caracteriza esse tip de reexã. E cma reexã sóca sbre a inguagem se reacina cm a ógica e asa da ógica? É a estruturaçã de cnceits, cm necessidade einferência, de erdade, ds uss da negaçã e da ttaidade, de sujeite predicad, que deimitam ba parte da história da sa.

Mas a centraidade que a reexã sóca sbre a inguagemcupa na sa antiga só seria retmada n debate cntemprne,ausência provocada em grande medida pela consolidação e naturaliza-ção das cncepções de Patã e Aristótees sbre a ógica, identicadas

as leis do pensamento, como a geometria euclidiana apresentaria aessência d espaç. Também pr iss, a sa cntemprnea, namedida em que trata da linguagem, encontra no período clássico gregoseu principa intercutr. Já n sécu XIX, cm ideaism aemãe, em particuar cm Nietzsche e Frege, apesar da enrme distnciaque separa esses dis ósfs, a inguagem retma uma psiçã dedestaque n trabah sóc. A partir daí, de Wigenstein a Hei-degger, de Mereau-Pnty a Rrty, de Carnap a Derrida, a inguagemnã deixaria de estar presente n debate cntemprne.

o Tractatus de Wigenstein cupa um ugar de destaque nessedebate, na medida em que explicita a centralidade e a radicalida-de da inestigaçã sóca da inguagem. Ee deixa car que alinguagem, ou linguagens, não podem ser utilizadas de maneirainocente, como se fossem ferramentas por meio das quais se poderiadizer u fazer quaquer cisa – ferramentas que nã afetariam sresutads daqui que se faz pr mei deas, cm eas. o us dalinguagem pressuporia uma crítica , cm a que a sa mderna

 já haia cnstruíd em reaçã a cnheciment sensíe e à qua

Kant submete a razão.

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A perda da incência em reaçã à inguagem expicita que, posta a inguagem, já se dã pressupsts a tda reexã que secnstrua a partir dea, pr mei dea. Cca-se, assim, cm tema aexplicitação dos limites da linguagem, ou dos limites que ela coloca

a quaquer utra inestigaçã que a tenha cm pressupst. E, namedida em que pensament seja, cm diz Patã n Sosta , odiscurso silencioso da alma, trata-se de explicitar os próprios limi-tes d pensament, cm tdas as dicudades e cntradições que

 já essa bree descriçã d prbema cca, pis se há um imiteda linguagem, dele não se poderia falar, e se há um limite do pen-samento, não se pode pensá-lo.

Para além disso, a atração provocada pelo Tractatus é indissociá-vel do caráter aforístico e fortemente estetizado de sua investigaçãods imites da inguagem, expicitand em sua frma cnit entrea concepção que elabora e sua apresentação por meio da linguagem.o resutad é um text eegante e sintétic, auster cm quemisumbra a cada mment a impssibiidade de seu prjet. Umir cmpst pr fragments numerads, que se inicia armanddizer tud que haia para ser dit e que termina armand quesobre o que não se pode falar, deve-se calar. A isto se associa uma

 bigraa intrigante de seu autr e, segund a descriçã cmumenteapresentada, intimamente igada à sa – cm parecia haerdeixad de acntecer já há muits sécus: abandn da sa

após a publicação do Tractatus , como quem supõe que de fato nãohá mais nada a falar, o retorno alguns anos depois, a elaboração denas cncepções sócas e a miitante psiçã às cncepçõescentrais do livro que o havia tornado um dos principais nomes dasa eurpeia, sem faar na recusa em receber a miinária he-rança da família e a tentativa de ser professor de crianças no interiorda Áustria, durante s ans de 1920.

Mas, cm se eidencia aqui, há muits utrs mtis paraincômd e interesse: a traçar um imite para a inguagem e para

o pensamento, o Tractatus pretende mostrar o que não pode serdito e se desdobra em uma análise lógica da linguagem que recu-sa verdades a priori e arma a inefabiidade da ética e da estética,além de apresentar uma intrigante perspectiva sobre o solipcismoe, a na, recnhecer a si mesm cm um cntrassens. Sua n-vidade se apresenta, antes de mais nada, pela forma extremamenteengenhosa como transita, em poucas dezenas de páginas, por boaparte ds temas da sa, refrmuand-s e denind seu esta-tuto sem nunca deixar de tratar da estrutura lógica da linguagem.

É interessante pensar esse cnjunt de debates sócs cm a

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compreensão de que a estruturação de uma linguagem, ou da lin-guagem em geral, como considera o Tractatus , se faz acompanhar detd um cnjunt de desdbraments e imitações para tratamentds temas da sa.

Os limites da linguagem

 Já em seu prefácio, o Tractatus explicita sua dificuldade e oque taez seja sua mair prcaçã, prjet de traçar de dentro o limite do pensamento e da linguagem:

[...] o livro pretende, pois, traçar um limite para o pensar, ou me-hr – nã para pensar, mas para a expressã ds pensaments:a m de traçar um imite para pensar deeríams pder pensar

s dis ads desse imite (deeríams, prtant, pder pensar que nã pde ser pensad).

A ideia de que há um limite da linguagem não é óbvia, e não éfácil de assimilar. Antes de mais nada, por certamente não haver sen-tido em falar, como se faz nesse trecho do prefácio, de um limite dopensamento: para se pensar o limite seria necessário pensar o que nãopde ser pensad; faar d imite pressupria faar d que nã pde serfaad. Mas que é isso que nã pde ser dit u pensad? Na exata

medida em que não poderia ser pensado, não se poderia respondera essa pergunta – e nem sequer fazê-a cm sentid. Entretant, nnúce d prjet d Tractatus está a concepção de que há um limitepara o que pode ser dito com sentido e para o que pode ser pensado,ainda que se pssa faar indenidamente e sempre se pssa cnstruirnovas proposições, ainda que não se possa pensar esse limite, pois, écar, nã se pde pensar que nã se pde pensar... Cm faar deimite, entã? o que está para aém d imite? Certamente nada quese possa dizer, ainda que o Tractatus pretenda mostrar que em meio

àqui de que nã se pde faar esteja que supúnhams ehs c-nhecids, cm a mra e a estética. Mas qua us que se faz, entã,aqui, dessa palavra limite? Cm própri text se apressa em expi-citar, a armaçã desse imite só pde ser um cntrassens. o que sepderia dizer sbre um imite que nã pde ser traçad?

Ainda que o Tractatus pareça nos colocar diante de um novotip de prbema sóc, a deimitaçã d pensament, da in-guagem e do ser está no centro da filosofia de Parmênides, e seapresenta de forma vigorosa, e que se desdobrará em uma longa erelevante tradição na qual se inclui Plotino, no Parmênides e também

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no Sosta de Platão, para restringir as referências a esse contextoantig. Faz-se presente já aí esse inefável cm qua a sa temque se er. Pr utr ad, prjet de deimitaçã, nã da ingua-gem, mas da razão e do conhecimento, está também no núcleo da

sa kantiana e, a partir dea, da sa cntemprnea.o Tractatus se situa no desdobramento dessas tradições1 , reco-cand a reexã sbre a estrutura ógica da inguagem e sbre arelação entre linguagem, pensamento e mundo no foco principal dodebate sóc e expicitand caráter centra da reexã sbrelinguagem e lógica por meio de seu desdobramento  para a ética, aciência, a estética. De sua perspectia, a sa (a inestigaçã ó-gica da inguagem) deimita campo disputável da ciência e o estatutoe limite de todo discurso, o limite de todo sentido.

Através dos contrassensos que o próprio autor se atribui aofinal do livro, o Tractatus arma que a reaçã entre uma prpsiçãe fat pr ea gurad nã pde ser dita, e se situa para aém dsimites da inguagem. Cm ea estariam também sujeit (transcen-denta), a ética, a estética, o Altíssimo , entre utrs. Essa maneira dese expressar pr mei d que, a na, se reeam cntrassenss sesustenta sobre a distinção entre dizer e mostrar que atravessa todoo texto. A ética, por exemplo, como a relação entre a proposição e fat pr ea gurad, ainda que inefáeis, pdem ser mstradas,estão aí  , ainda que nã cm bjets e fats, ainda que nã de uma

frma que pssa ser pensada, ainda que, entã, nã sejam nada nmund. Segund cabuári d text, sã dadas pea própriaideia de imite. A na, bjeti express pe Tractatus é descritocomo a explicitação de uma outra forma de ver o mundo, e não umaoutra teoria sobre a linguagem, o que não se poderia fazer com sen-tid segund a própria cncepçã apresentada pr Wigenstein.

Uma utra perspectia das cncepções d Tractatus é apresen-tada pr Wigenstein, em uma carta eniada a n Ficker em 1919,na qua defende a pubicaçã d ir; diz que ee é cmpst de

duas partes, a segunda delas, a mais importante, é aquela que nãofoi escrita, e que trata da ética:

o ir nã he será estranh, dad que sua temática é ética. Eupretendia incluir algumas palavras a respeito no prefácio que nãoforam incluídas, mas que transcrevo em seguida porque talvez pos-sam he frnecer uma chae. Eu pretendia escreer seguinte: minha

1  Sbre essa cnuência da tradição lógica e da tradição crítica no Tractatus , ejao ensaio  A essência da proposição e a essência do mundo , de luiz Henrique lpes

ds Sants, parte I.

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limite da linguagem tal qual apresentado no texto e como se devecmpreender esse cnceit e a armaçã de que “há inefáe”.

Linguagem como guração

o Tractatus cncebe a inguagem cm uma frma de “gura-çã”. Para ser mais precis, usams fats para gurar fats: naquique é chamad de guraçã, em um mapa, pr exemp, substitu-íms bjet a ser gurad pr um eement da guraçã, quaé, também, um bjet. Cm nssa experiência gera da inguagemexpicita, entretant, a nmeaçã, íncu de um bjet a um ee-ment da guraçã é estabeecid de frma cnencina. Assim,posso nomear três diferentes cidades por meio de três desenhos,“A”, “B” e “C”, pr exemp, u pes sns que assciams a esses

desenhs. Se esse íncu entre a inguagem e aqui de que eatrata é convencional, o que faz com que uma certa proposição tratede um fat em particuar? ou mehr, que é cmum à prpsiçãe àqui de que ea faa para que se pssa dizer que essa proposiçãogura de md adequad esse fato3? Segund Wigenstein, a reaçãentre um fat e uma prpsiçã que gure esse fat se estabeecepor estarem os elementos da figuração na mesma relação que osbjets que guram. Assim, direms que

A -------- B -------- Cé uma guraçã adequada da reaçã entre três cidades brasieiras(pr exemp, Sã Pau, Itatiaia e Ri de Janeir, respectiamen-te), pr estarem s eements da guraçã em reaçã equiaenteàquea que s eements que ea representa mantêm n mund (useja, pr Itatiaia estar entre Sã Pau e Ri de Janeir).

Assim, para que uma guraçã seja guraçã de um fat, agdeve ser comum a ambas, algo para além da convencionalidade darepresentaçã ds bjets pr um sina quaquer: a  forma lógica daguraçã e d fat gurad dee ser a mesma. o cnceit de frmaógica é centra para Wigenstein na medida em que a ntgia dTractatus nã incui nada que nã sejam bjets que se reacinamentre si. Essa reaçã, entretant, nã é, ea própria, um bjet. As-sim, ea só pde ser gurada na medida em que s eements daguraçã mantenham entre si a mesma reaçã, u tenham a mesmafrma ógica que s bjets gurads.

4.0311 Um nme tma ugar de uma cisa, um utr, de umautra cisa, e estã igads entre si, e assim td representa –cm um quadr i – estad de cisas.

3

  Esse prbema já aparecia n Crátilo e no Sosta de Platão.

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 Já desde iníci da anáise da guraçã se cca a caracteri-zaçã ds imites da inguagem. Pis a guraçã só se faz guraçãde ag na medida em que seus eements substituem bjets e emque esses eements mantêm entre si a mesma reaçã que s bjets

n fat gurad.2.161 Na guraçã e n agurad dee haer ag de idêntic, am de que pssa ser, de md gera, uma guraçã d utr.

Assim, sendo a figuração o que é, cabe perguntar: o que podeser figurad? A respsta é simpes e imediata: na medida em que sónão é convencional a relação entre os elementos da figuração, nãose pde figurar nada que nã seja um fat, uma reaçã entre bje-ts. ou seja, só se pde faar cm sentid de fats (entendend-se

cm fat a reaçã entre bjets). A inguagem é capaz de figurarfatos e nada além disso.É nesse sentido que a forma lógica, não sendo ela própria um

objeto (afina, cm insiste Wittgenstein, nã há objetos lógicos),nã pde ser figurada. Ist quer dizer que já na caracterizaçãda relação entre linguagem e mundo, da relação de figuração,nos deparamos com algo que se situaria para além dos limites dalinguagem: a  forma lógica  é um pressuposto da relação afigurati-va entre um fato e uma proposição, mas ela própria não é uma

reaçã entre bjets, se situand para aém da pssibiidade dafiguração e, portanto, da própria linguagem e do pensamento.Sbre essa frma, pressupsta à reaçã de afiguraçã entre umaproposição e um fato, Wittgenstein dirá que só se pode mostrá-la, inaugurando a distinção entre dizer (figurar) e mostrar queatravessa o Tractatus:

2.172 Sua frma de aguraçã, prém, a guraçã nã pde a-gurar; ea a exibe.

Da mesma frma, pdems faar de bjets, das reações ques bjets mantêm entre si. Mas nã se pde pensar u faar de umbjet isad, de um bjet simpes, na medida em que ee nã éuma reaçã. Cm nme é puramente cnencina, pde-se faarsbre as reações que s bjets mantêm entre si, mas nã sbre própri bjet.

3.221 os bjets, só pss nomeá-los. Sinais substituem-ns. Só pssfalar sobre ees, nã pss enunciá-s. Uma prpsiçã só pdedizer como uma coisa é, não o que ela é.

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As prpsições, na medida em que sã gurações de fat, só p-dem representar fats, reações entre bjets, e nada d que nã sejaum fat pde ser dit u pensad, na medida em que “ pensament éa prpsiçã cm sentid” (TLP , 4). Nem mesm s bjets pdem ser

pensados fora dos fatos de que participam, pois se não estiverem emreaçã cm utrs bjets nã pdem ser gurads (TLP , 3.221).o cnceit de “imite da inguagem” de Wigenstein apresenta-se,

de maneira bastante clara e palpável, como um resultado necessário dainestigaçã da estrutura signicatia da inguagem. Ee se desdbraem um prjet de reisã de nss discurs sbre a experiência e sbres temas da sa cuj principa bjeti será eliminar os  pseudopro-blemas , mostrando que sua origem era uma compreensão equivocadada estrutura ógica da inguagem. Dessa perspectia a prximidaded prjet d Tractatus cm a sa crítica kantiana é eidente.

o percurs d Tractatus parte da caracterizaçã da reaçã agu-rativa, que analisamos de maneira breve até aqui, por meio da qualum fat se cnstitui cm guraçã de utr fat. A partir daí, carac-teriza pensament cm guraçã ógica ds fats e a prpsiçãcomo expressão sensível do pensamento. Assim, toda linguagem e todopensament se estruturam cm guraçã, ainda que iss nã sejaclaro em nosso uso cotidiano da linguagem. A linguagem cotidiana édescrita pelo Tractatus cm uma “rupa arga” que cuta a frma dpensamento. A análise é o procedimento através do qual se explicita a

forma lógica de uma proposição e as proposições básicas a partir dasquais se cnstitui, e, prtant, s fats de que é guraçã.

4.112 o m da sa é escareciment ógic ds pensaments.Fisa nã é uma teria, mas uma atiidade. Uma bra sócacnsiste essenciamente em eucidações. o resutad da sa nãsã “prpsições sócas”, mas trnar prpsições caras. Cumpreà sa trnar cars e deimitar precisamente s pensaments,antes como que turvos e indistintos.

Mas cm, entretant, Tractatus pode apresentar a relaçãoaguratia da prpsiçã cm s fats gurads, se essa reaçãnã pde, ea própria, ser gurada? A pssibiidade de se apresentaressa articuaçã atraés da qua se estabeece a reaçã guratiapõe-se a partir da distinção entre dizer e mostrar.

Dizer e mostrar

A distinçã entre dizer e mstrar se cca, prtant, já desde

iníci d ir, na caracterizaçã da reaçã aguratia, muit antes

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das prpsições que tratam da mra e da estética, a na d Trac-tatus. Cm ims n cntext da anáise da guraçã, Wigensteinpretende identicar s imites daqui que se pde dizer, deimitara linguagem  por dentro. Segund ee, tda guraçã é guraçã de

um fat, da reaçã entre bjets, de md que nada que nã sejaum fat pde ser gurad. A inguagem só cmprta fats.

4.021 A prpsiçã é uma figuraçã da reaidade: pis sei qua é asituaçã pr ea representada se entend a prpsiçã. E entenda proposição sem que seu sentido me tenha sido explicado.

Dessa frma, nada de misterioso é comportado pela linguagem,na medida em que apenas fats pdem ser dits cm sentid. Esseé sentid de sua armaçã de que para quaquer pergunta que sefaça com sentido, há necessariamente uma resposta.

4.116 Tud que pde ser em gera pensad pde ser pensad cara-mente. Tud que se pde enunciar, pde-se enunciar caramente.

Mas é imprtante ntarms que essa anáise da reaçã agura-tia pr mei da qua se caracteriza tda guraçã, tda inguagem,aponta, necessariamente, para algo que não é um fato, mas que épressupst à guraçã: que uma dada guraçã é guraçã deum certo fato, que tem a mesma forma lógica, isso é algo que se vê  ,mas que não se pode dizer, na medida em que não é, ela própria,uma relação entre fatos.

4.12 A prpsiçã pde representar tda a reaidade, mas nã pderepresentar o que deve ter em comum com a realidade para poderrepresentá-a – a frma ógica. Para pderms representar a frmalógica, deveríamos poder-nos instalar com a proposição fora dalógica, quer dizer, fora do mundo.

ou seja, quand se faa ds imites da inguagem, nã se trata

apenas de apontar para algo que não poderia ser dito ou pensado,mas de mostrar que isso que não pode ser dito ou pensado é um pressuposto a tda inguagem, à cnstituiçã de tda signicaçã. Emcerto sentido, na medida em que se possa manter essas metáforasespaciais, que falam de limites, dentro, fora etc., a investigação dalinguagem nunca deixa de se situar dentro dela, e, por isso, não écapaz de tratar de seus pressupostos senão de forma negativa. Parapoder representar sua relação com o mundo, a linguagem teria quepoder dar um passo atrás e colocar-se, segundo a metáfora do texto,

 fora do mundo,  fora da própria linguagem.

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Frente a essa impssibiidade, a ideia de que há ag que aproposição mostra mas que não pode ser dito passa a ocupar umlugar central:

4.121 A prpsiçã nã pde representar a frma ógica, esta frmase espeha na prpsiçã. o que se espeha na inguagem, esta nãpde representar. o que se exprime na inguagem, nós nã pde -mos exprimir por meio dela. A proposição mostra a forma lógicada reaidade. Ea a exibe.

Pdem-se er as pressupsições da reaçã guratia da prpsiçãcom o mundo, pode-se ver os pressupostos da linguagem, ainda que aprópria linguagem não possa tratar disso sem dizer coisas sem sentido.o que a inguagem mstra é sua reaçã cm mund, seu sentid,

como será o mundo no caso de uma proposição ser verdadeira:4.022 A prpsiçã mostra seu sentido. A proposição mostra comoestão as coisas, se fr erdadeira. E diz que estão assim.

Também s objetos (esse é um term cm sentid muit espe-cíc n Tractatus) que cmpõem s fats gurads. Ees própris,isoladamente, não podem ser pensados, na medida em que o quese pde gurar é a reaçã entre bjets. Ds bjets só pdemsdizer as reações que mantêm cm utrs bjets. Assim, mais dque uma simples delimitação ou contraposição entre o que se diz eo que não se diz, mas se mostra , o Tractatus apresenta esse inefável,esse dmíni d que se excui à inguagem, cm ag que “há”(TLP , 6.522), ainda que seja impensáe e inefáe, e é pressupstpor todo pensamento e por toda linguagem.

A maior parte do Tractatus se situaria, entã, em mei àqui quese mstra, mas que nã se pde dizer cm sentid. Esse inefáe é maispresente d que se pderia supr a princípi. o estatut desse domínio émuito peculiar: segundo o Tractatus , vemos o que não pode ser pensado.ou, inersamente, aqui que nã se pde dizer cm sentid ainda pde

ser mstrad. Mas nã parece nada simpes, e nem mesm pausíe,que se fae de cnheciment daqui que nã pde ser pensad. o queé, então, o místico , como o Tractatus nomeia isso que há, mas de quenã se pde faar? o que é essa reaçã caracterizada pe Tractatus pormeio da metáfora de um olhar que ai para aém d pensar?

Mas retmems argument. Se só se pde dizer cm sentidas reações entre bjets, pensament se imita a mers fats deigua ar, pis a própria armaçã de que ag é de ar nã éuma descrição de fato e se exclui aos limites da linguagem. Por-

tanto, nada de valor pode ser dito na linguagem, que descobrimos

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imitada à apresentaçã d mund, à apresentaçã ds fats. Aquio Tractatus explicita o que seria o grande limite da linguagem e aconsequência mais surpreendente de sua estratégia de investigar anatureza de tda guraçã e a essência de tda inguagem: nã se

pode pensar o valor, não se pode pensar nada de valor, e, então, aética, a estética, o sentido da vida , o  Altíssimo , tudo o que não é fatocomo qualquer outro fato, não pode ser dito ou pensado.

Iss pde ser escarecid pe deseniment de uma me-táfra usada pr Wigenstein n Tractatus , como ele faz em umacnferência apresentada em 1929 em Cambridge, imaginar um irem que todos os fatos, e, portanto, tudo o que pode ser dito comsentid, estiesse escrit – uma descriçã cmpeta d mund:

[...] em nosso livro do mundo lemos a descrição de um assassinato

com todos os detalhes físicos e psicológicos e a mera descriçãonada cnterá que pssams chamar de uma prpsiçã Ética. oassassinato estará exatamente no mesmo nível que qualquer outroacnteciment cm, pr exemp, a queda de uma pedra. Cer -tamente a leitura dessa descrição poderá causar-nos dor ou raivaou qualquer outra emoção, ou poderíamos ler acerca da dor ou daraiva que esse assassino suscitou em outras pessoas que tiveramconhecimento dele, mas seriam simplesmente fatos, fatos e fatos enã Ética. (WITTGENSTEIN, 1999, p. 39-40).

ou seja, nã encntrams entre s fats nenhum  juízo ético ,

nenhuma armaçã sbre ar de uma açã. o mesm se dá emreaçã à estética e a Deus. Na medida em que nã sã prpriamentefatos, não constam da descrição completa do mundo.

Nada dizer sbre a ética nã signica abrir mã de cuidar dascoisas da vida, ainda que tudo aquilo que se poderia dizer impor-tante, “a maneira crreta de ier”, não está nos livros , como dizCars Drummnd de Andrade4. Não se trata aqui de acompanhara frma cm Wigenstein ida cm tema. Já ims que em suacarta a vn Ficker ee expicita suas precupações cm a ética, e

nesse sentido o Tractatus – ainda que cque as cisas em seu ugare mostre o equívoco dos livros sobre ética , que se revelam, então,uma ceçã de cntrassenss – aparecerá para nós cm em certsentido trágico. Namente, a cnferência sbre ética de 1929 é maisclara nessa caracterização:

Este jgar-se cntra as paredes de nssa prisã é perfeitamente,absolutamente, sem esperança. A Ética, na medida em que resultad desej de dizer ag sbre signicad útim da ida, bem

4

  “Resídus”, pubicad em A rosa do povo (Ri de Janeir: Recrd, 1997. p. 92-95).

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absut, ar absut, nã pde ser ciência. o que ea diz nãacrescenta a nss cnheciment em nenhum sentid. Mas é umdocumento de uma tendência na mente humana que eu, pessoal-mente, não posso deixar de respeitar profundamente e que nunca emminha ida cnsiderarei ridícua. (WITTGENSTEIN, 1999, p. 44).

É como se a ética se apresentasse como uma prática, um exer-cíci de ascese pr mei desse estranh jg de  jogar-se contra as

 grades da linguagem , que pretende nos transformar, nos fazer olharo mundo de uma outra forma. Assim, como diz o Tractatus sobre antade (e, cm ea, sbre a ética):

Se a ba u má içã atera mund, só pde aterar simites d mund, nã s fats; nã que pde ser express peainguagem. Em suma, mund dee entã, cm iss, trnar-se a

rigr um utr mund. Dee, pr assim dizer, minguar u crescercm um td. o mund d feiz é um mund diferente d mundd infeiz. (WITTGENSTEIN, 1999, p. 43).

Wigenstein parece pretender dizer que muda mund, aindaque não mudem os fatos no mundo:

o mund d feiz é um mund feiz. / Mas iss é reamente emcerto sentido profundamente misterioso! É claro que a ética nãopode ser expressa!5

O valor do Tractatus

Qual é, então, o valor do Tractatus? A pergunta, ccada peprópri autr n prefáci d ir, ene uma certa irnia, anatodo valor seria inefável e não se poderia dizer nada sobre isso. Aresposta dialoga com essa ironia.

Se esta bra tem agum ar, ee cnsiste em duas cisas. Primei-ramente, em que nela estão expressos pensamentos, e esse valorserá maior quanto melhor expressos estiverem os pensamentos.

Pde um ir que arma ter resid de frma na tds sprbemas da sa dizer que seu únic ar é sua careza? Nãse poderá esperar que o Tractatus apresente verdades, nem mesmoproposições com sentido, na medida em que essas proposições tra-tam, segund ee, apenas de fats. E cm a inguagem nã tem umlado de fora , qua pape da sa?

5

  WITTGENSTEIN, l. Notebooks 1914-1916. oxfrd: Backwe, 1961. p. 78.

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A na, própri empreendiment prpst pe Tractatus é submetid à crítica, que ns cnduz à famsa autrrecusa dtext, que caracteriza a si mesm cm sem-sentid e arma quequem o compreende o deixa de lado, mas ao fazê-lo verá o mundo

de uma utra maneira. o própri Tractatus teria transitado todo otempo  para além dos limites da linguagem , pretendendo dizer o quenã se pderia. A aceitaçã de seu cntrassens pr Wigenstein,entretanto, só se faz na medida em que se indica que, ainda quenada tenha sido dito com sentido, algo foi mostrado, algo se fez, eseu resultado é uma outra forma de ver o mundo e a linguagem.

Expicita-se de maneira cara cm se dee entender a armaçãpr parte de Wigenstein, de que a sa nã é uma teria, mas umaterapia. A sa se apresenta cm atiidade pr mei da qua sepassaria a ver o mundo da maneira correta. Propõe-se a uma transfor-mação da maneira de vê-lo, não a elaborar uma teoria qualquer, quepderia ser erdadeira u fasa, a respeit das cisas. A sa nãse confunde com a ciência. Para o Tractatus , ela está antes ou depois daciência, não ao lado6. Essa sua frma de prceder, cm escarecimentda linguagem e do pensamento, sem dizer nada de verdadeiro, sematerar mund, é aprximada pr Wigenstein de uma terapia , umexercício que não apresenta nada de novo, mas que coloca as coisasem seu lugar e nos mostra o mundo de uma outra maneira.

Estratégias e bibliograaAs ideias de limite da linguagem, de que a ética é inefável, de

que há algo que não pode ser pensado, assim como a distinção entredizer e mostrar , são temas instigantes e certamente se apresentamcomo boas alternativas não apenas para a apresentação do Tractatus u da sa da inguagem, mas da própria sa em gera. Aabordagem da distinção entre dizer e mostrar pode ser apresentada

 juntamente cm uma reexã sbre diersas frmas de expressã,

inclusive sobre as diferenças entre a apresentação de algo por meioda arte e de um discurs enunciati sbre fats. Também a armaçãde que toda linguagem, na medida em que é linguagem, apresentaag em cmum, e também ag em cmum cm aqui que gura, asaber, a forma lógica , indica alternativas interessantes de debate sobre anatureza da inguagem e a frma sóca de abrdagem d tema.

Quant à cncepçã de sa d Tractatus , sua demarcaçãorígida entre o discurso da ciência, que trata de fatos, e a atividade6  A sa é tematizada expicitamente em duas passagens d Tractatus , 4.002-

4.0031 e 4.111-4.115.

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sóca, cmparada à terapia, pssibiita debate sbre ugar dasa n cntext da demarcaçã das áreas d cnheciment e acaracterizaçã da singuaridade dessa cncepçã de Wigenstein,que se encontra também em Kant e em boa parte da tradição.

Também rigr dessa inestigaçã, que cnsidera cm extremrigor as características da linguagem, tirando de sua investigação umacaracterização ampla e articulada do conhecimento, da estrutura lógicado mundo, do místico, apresenta-se como exemplo tanto da fecundida-de da reexã rigrsa quant d interesse de uma inestigaçã sbreos pressupostos daquilo que se apresenta para nós no contexto daexperiência ctidiana (nesse cas, da signicaçã e da inguagem).

o caráter cntemprne d Tractatus aparece em um trata-mento do conhecimento, da ética e de outros temas que não tomacomo ponto de partida a epistemologia e a reflexão, em última

instncia, sbre sujeito do conhecimento ou das representações,cm crre em gera na tradiçã mderna que se estende de Des-cartes e lcke a Kant.

A descoberta de que a linguagem não se apresenta como umaferramenta imparcial, por meio da qual se pode apresentar qualquercoisa, e que precisa ser tematizada e ter seus limites e impactosexpicitads e aaiads cupa um ugar centra na sa cntem-prnea e é um tema interessante em sua apresentaçã.

N cnjunt das prpsições d Tractatus , as proposições que seiniciam em 2.1, as de númer 4, as de númer 6, cupam um ugar

destacado em uma apresentação geral de suas concepções. A partirda prpsiçã 2.1, inicia-se uma inestigaçã da  figuração , que sedesdobra em uma investigação do pensamento, na medida em que pensament é cncebid cm guraçã ógica d mund (a fr-ma mais gera de tda guraçã, na medida em que tda guraçã– espacia, snra etc. – é também guraçã ógica). o text que seinicia com a proposição de número 4 é central no livro, pois ali seapresenta, após td percurs que remete à cmpreensã d pen-sament e da prpsiçã à inestigaçã da guraçã, uma descriçã

da inguagem, cncebida em sua reaçã aguratia cm mund.Nas prpsições de númer 6, encntrams núce d prjet deexplicitação do estatuto de todo discurso e de delimitação do campodo sentido e dos limites da linguagem a que o Tractatus se propõe.Assim, o texto revisa, sucessivamente, a partir de seus resultados,qua estatut d discurs sbre a ógica (6.1), sbre a matemática(6.2), sbre as ciências empíricas (6.3), sbre a ética, a estética, a sub-

 jetiidade e sbre deus (6.4 e 6.5).A Conferência sobre ética , de Wigenstein, fi traduzida e pubi-

cada cm apêndice d ir de Darei Da’Agn, Ética e linguagem , 

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e pode ser de grande utilidade na apresentação do debate sobreética no Tractatus e dos desdobramentos de sua caracterização daessência da linguagem.

o materia bibigrác reeante sbre Wigenstein e Tracta-

tus disponível em português não é muito amplo. Para uma apresen-tação sólida e estruturada do Tractatus , ainda que em um registro emgera excessiamente eabrad para cntext d Ensin Médi, éfundamenta a apresentaçã de luiz Henrique lpes ds Sants emsua excelente tradução do Tractatus , editad pea Edusp, intituada

 A essência da proposição e a essência do mundo.Também de grande interesse é ir de Siia Faustin,  A Ex-

 periência Indizível , em que se apresenta o Tractatus a partir da investi-gação de sua concepção da relação entre a lógica e sua aplicação.

Apresentações mais didáticas e certamente bastante úteis dasa da inguagem de Wigenstein pdem ser encntradas emWigenstein , de A. C. Graying, e em Wigenstein: os Labirintos daLinguagem: Ensaio Introdutório , de Arey Mren.

Uma ediçã antiga, mas pssiemente presente em bibitecas,de  As Idéias de Wigenstein , de D. Pears, é uma ótima aternatiade apresentação dos temas centrais do Tractatus e das InvestigaçõesFilosócas , apesar de uma traduçã puc uente.

No caso de se buscar uma boa apresentação de temas centraisdas Investigações Filosócas , há a tradução de um pequeno livro de

P. M. S. Hacker, um de seus mais reeantes cmentadres, Wi- genstein – A natureza humana.

Referências

DAll’AGNol, D. Ética e linguagem. Frianópis: Ed. UFSC/Unisins, 2005.FAUSTINo, S. Experiência Indizível. Sã Pau: Ed. Unesp, 2006.GRAYlING, A. C. Wigenstein. Sã Pau: lya, 2002.HACKER, P. M. S. Wigenstein: A natureza humana. Sã Pau: Ed. Unesp, 1997.MoRENo, A. Wigenstein: s labirints da linguagem: Ensai Intrdutóri. SãPau: Mderna, 2006.PEARS, D.  As Idéias de Wigenstein . Sã Pau: Cutrix, 1973.PlATÃo. Parmênides. Ri de Janeir: Ed. lya / PUC-Ri, 2005.______. Sosta. Sã Pau: Editra Abri, 1975.SANToS, l. H. l. A essência da prpsiçã e a essência d mund (Ensai Intr-dutóri). In: WITTGENSTEIN, l. Tractatus Logico-Philosophicus. 3. ed. Sã Pau:Edusp, 2001.WITTGENSTEIN, l. Investigações Filosócas. Sã Pau: Abri, 1973.______. Philosophical Occasions: 1912-1951. USA: Hacke, 1999.______. Tractatus logico-philosophicus. Sã Pau: Edusp, 1995.

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1. Apresentação

Praemente, uma enquete em saa de aua sbre signicaddo termo estética traria para a discussã nã só ausões à arte e a

 belo, mas também referências mais gerais como nomes de atorese cantres e temas reatis à cutura d crp, as prcedimen-tos cosméticos e cirúrgicos, ao universo atual dos cuidados de si.Diante de manifestações dessa natureza, cm carrear para debatetantas referências díspares, muitas vezes deslocadas do contextoprpriamente sóc a que querems ns ater, sem, n entant,deixar de lado as reais inquietações dos alunos, fugindo para umespaç distante e etére d be e da arte? Pr utr ad, cmnão se deixar levar por um debate marcado pelo lugar-comum,cuj perig centra seria rearmar a frça das referências cuturaisem circuaçã? Sem escamtear a dicudade, este nss pan detrabalho investe nas veredas que, partindo do grande campo cha-mad estética, ns eam a árias direções, para, enm, retrnarem

ao cerne da disciplina.Estética , sem dúvida, é uma palavra que evoca encantamento,

seduçã, sejam quais frem s referenciais audids para expicá-a.

* Pssui graduaçã em Fisfia pea Uniersidade de Sã Pau (2002) e emArtes pea Unicamp (1991), mestrad em Artes pea Uniersidade de Sã Pau(2000) e dutrad em Fisfia pea Uniersidade de Sã Pau (2007). Pr-

fessra da UnB.

Capítulo 6

Filosoa da arte e estética:

um caminho e muitos desvios

 Priscila Rossinetti Rufnoni* 

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Este encantament pde ser uma ba maneira de isar mundcntemprne, em seus aspects científics, histórics e artístics.E, da eitura d mund cntemprne, própri encantament,pr sua ez, pde trnar-se bjet de refexã.

Se frms à rigem d term, uma terceira ia sma-se a estado encantamento: a da sensibilidade.  Aísthesis , em grego, é uma pa-lavra que remete aos sentidos, ao que conhecemos por meio dossentids, s cinc sentids, u seja, sensibiidade em uma acepçã

 bastante restrita, referente àqui que ns chega a partir d crp,das sensações. Rars seriam s auns que, diante da pergunta sbreo que é estética, chegariam a uma resposta tão empírica, relacionan-d-a a sensações crprais. Iss se dá, cm erems, pe caminhhistóric e fisófic que term percrreu, caminh que ns aju -dará a compreender, também, a transformação de nossas noções dearte, artesanato, trabalho, ou mesmo de belo e beleza.

Reend as nções que ieram à baia até aqui, pdems cir-cunscreer três dmínis distints. Faams iniciamente em be e

 beeza, um ds temas sócs trabahads pea discipina. Mas termo estética , propriamente, vai além da nossa percepção do belo,abarca nossas percepções em geral e as relações que mantemos com mund a partir ds sentids. Entre estas percepções, aqueas quese relacionam com a beleza, mas também as que se relacionam como espaço, o tempo, a experiência. Platão, quando pergunta pelo

estatut das imagens, u Daid Hume, quand abrda gst, aimaginação e a percepção, estão pensando nessa forma de conheci-mento , u de apreensã, próprias à sensaçã. Nesta acepçã, estéticase aproxima dos domínios do método científico, das origens dateoria do conhecimento humano, da epistemologia.

Quand pensams n hmem em reaçã à prduçã de per-cepções especícas, de efeits, sejam efeits de beeza u de feiú-ra, de comicidade ou tragicidade, aproximamo-nos de um campocrreat a estud das sensações; mas um camp que pensa tam-

 bém a ação do trabalho humano, pensa a tékne grega, pensa o quechamamos de arte e, mesmo, o que chamamos de linguagem. A estecampo, Aristóteles, em seu estudo das criações humanas que afetamnossas sensações, deu o nome de  poética , [do grego  poiésis , fazer,criar]. E nme de retórica ao estudo da oratória, da linguagemargumentatia e persuasia. outrs autres – cm renascentistalen Baista Aberti, dramaturg e peta Schier u s semiógscntemprnes – pensam ns própris meis artístics enquantformas de exposição ou de produção de efeitos e de sentidos. Um ds

nomes que podemos dar a este novo campo de estudos dos produtos

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humans em reaçã à nssa percepçã e a nss cnheciment éa  losoa da arte.

Cm escree Benedit Nunes (1989, p. 16), se sa da artee estética são campos que se interceptam:

A Fisa da Arte, que nã dispensa pressupsts estétics, uma ezque estabelece um diálogo com aquelas produções artísticas estetica-mente áidas, nã só tem na Arte seu bjet de inestigaçã, cmtambém aquee primeir dad, de cuja existência se ae, para eantarprbemas de índe gera, requerids pe dinamism da reexãsóca. Iss quer dizer que a Fisa da Arte não é uma disciplinaespecial, senão no sentido que considera, antes de tudo, a própria Arte .

Car que, entre sensações e prduçã de artefats existe umhiat. Se é eidente que uma pintura u escutura ns pega primei-ramente pelo olhar e a música ou poesia pelos ouvidos, o encantomimétic, cm já ntara Patã em  A República , reverbera paraalém dos cinco sentidos, produz encantamento, sedução ou mesmo...engd! ou seja, a estética e a sa da arte remetem a questõesacerca do que apreendemos do mundo e dos códigos miméticoscriads pe hmem; mas remetem, psterirmente, a um psici-nament em reaçã a mund e as códigs. Chamams Patãpara o debate exatamente por ser ele que abarca o álgama [em gre-g, maraiha, bjet espetacuar, artístic] n dmíni mair das

relações do homem com o mundo e com os outros homens, dentrode uma pólis, de uma cidade  [lembremos,  A República , em grego, Po-litéia]. o mesm fará Aristótees, a pensar ns efeits prduzidspor tragédias e comédias não só nos indivíduos, mas também noshomens como partícipes do todo político.

Entrams em utr camp, d hmem cm ser que juga,cm dirá muit temp depis utr pensadr fundamenta, Imma-nue Kant. Este hmem prdutr de maraihas, que juga segundsuas sensações e segundo suas relações com o mundo, está imerso

na história, na experiência em um sentido não apenas epistemoló-gic, mas também pític e existencia. váris autres ajudam apensar a estética cm próxima à histria e à pítica, entre ees F.W. Hege, Kar Marx, Water Benjamin e Thedr Adrn. Deriadada pergunta pelo homem no mundo, a arte pode ser, ainda, vistapr um enfque existencia, para autres cm Martin Heidegger,

 Jean Pau Sartre e Maurice Mereau-Pnty. Este camp, que pensahomem, mundo e existência, podemos nomear como crítica da cul-tura, no caso dos desdobramentos da primeira vertente citada, ou

 losoa da existência , no segundo caso.

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Estas serã, entã, as três eredas que prpms para s tra- balhos em sala de aula, cada uma delas permitindo interfaces comoutras áreas do conhecimento:

a) estética como experiência sensorial do sujeito no mundo ,

abordagem aberta a questionamentos sobre como conhecemos,como apreendemos, como formamos imagens, como atuam anssa imaginaçã e a nssa memória. Uma abrdagem nestenível abre portas para relacionar conteúdos como arte e ma-temática, estética e ciência. Nesta acepção, a estética pode,ainda, ser uma maneira de abrdar reexões sócas que sevoltam para os códigos linguísticos e formais que constituems enunciads e as reações humanas;

b) estética como losoa da arte , quando visamos os produtoshumans, as prduções artísticas, sujeit cm ser que seexpressa em suas criações materiais, em sua tékne , em suaarte, em sua inguagem u em seus trabahs;

c) estética e arte como experiência existencial, histórica e po-lítica, enfque em que as bras humanas e sujeit d c-nhecimento aparecem imersos em uma comunidade, em umahistoricidade, cuja circunscriçã pde ser agra ampiada parao domínio maior da cultura. Este útim tema põe s questi-namentos estéticos na arena social, existencial e política dodebate cntemprne, pis pdems pensar nssa própria

cultura, nossas relações com os produtos culturais e artísticose suas reerberações para aém d sujeit, d indiídu, sejaapntand para mbit da existência u da sciedade.

Fica car que um mesm autr pde abrdar tema de fr-mas diferentes, como nos casos de Platão e Aristóteles citados. Nãoprpms diisões u cassicações, apenas mds de reacinartemas própris à arte u à estética entre si e cm utras áreas. Des-ta grande área – a estética – partem eidentemente muitas utras

veredas que o professor pode explorar. As três vias que escolhemospermitem,  grosso modo , uma isã gera da estética, e da sa,em suas acepções epistemológica , artística e ético-política.

Pdems tar agra àqueas respstas hiptéticas da saa deaula em torno do termo estética , citadas no primeiro parágrafo. Asrelações entre uma vaga alusão ao belo e a citação bastante real dasreferências cuturais em trn d cut a crp e às ceebridades jánão seriam tão obscuras. As percepções do belo podem ser aborda-das cm funções epistemógicas d sujeit que cnhece, pdem ser

istas cm efeit artístic e, pr m, cm códig prduzid pr

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um feixe de condições estruturais, sociais e históricas. Ao longo daexposição geral do tema , sugeriremos vários textos-base para cadauma das abordagens que, longe de caminharem em uníssono parauma respsta única, exempicam cm se deimitam, cnstituem-se

e formulam-se questões estéticas e como elas se relacionam entre sie cm utrs camps d saber. o que ns interessa nã é prpr umcompêndio de clássicos indispensáveis em uma noção geral de todasas correntes de pensamento estético, mas possibilitar a experiênciade uma eitura sóca. os texts pdem ser, assim, substituídspr utrs crreats, cas prfessr prera uma ertente sócaespecíca u um utr autr.

2. Exposição geral do tema

o tema prpst – abrdar a estética pr três ias distintas ecmpementares – será expst de md sucint, a partir de agunstexts sócs eschids e cmentads. os irs citads reapa-recerã na bibigraa na.

 2.1. Estética como experiência sensorial do sujeitono mundo

No diálogo Hípias maior de Patã, Sócrates interrga sstaHípias sbre que é be, pr mei de um artifíci. Sócrates diz

que a pergunta vem de um amigo ausente, bastante grosseiro. Poresse jg de máscaras, Sócrates enreda Hípias em suas respstas eexpõe as tentatias de fuga da questã que ssta intenta a partirde artifícios de retórica. Arranca-lhe a máscara até que o próprioHípias assume-se impotente, sem disfarces e sem belos discursos , cujaessência, própri be, ee sequer, dmina. Mas este be sem ade-reços externos, que não pode ser captado a partir das coisas belas,este be em si, be, e nã as árias beezas das cisas – das m-ças, das éguas e das paneas, s exemps usads pr Hípias –, nã

se desenda nem depis ds desmascaraments: “ be é difíci”,dizem pr m ambs s cntendres (PlATÃo, 2007).A suçã patônica é bem cnhecida, embra gere muitas cn-

trérsias interpretatias. Em utrs texts, cm em  A República , o belo das coisas participa do belo em si, do belo-ideia, forma intelec-tua e nã sensíe. Mas n Hípias maior ainda não há resposta e estans interessa mens que a pergunta: que é be? ou seja, qua aessência do que consideramos belo no mundo, nas múltiplas coisasque assim quaicams. Refrmuand a questã, haerá mesm

esta essência? Há, prtant, um saber que nã pde ser deduzid

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das experiências no mundo, da experiência de belo que advém daapreensã das cisas que cnsiderams beas? Há, entã, um cnhe-cimento inteligível que escapa ao ser sensível, esse ser que conhecepelos cinco sentidos, esse ser estético? A separaçã entre ser sensíe

(aquee crpra, que sente, que ie mund) e um ser que c -nhece, que apreende inteectuamente as essências (que ascende àsideias, em um inguajar patônic), está psta.

Ta pensament que insere hmem n mund cm ser dii-dido entre sensações apreendidas nas aparências e conhecimento es-sencial, entre um ser que é sensível e estético [de aísthesis , sensação]e um que é inteligível e epistemológico [de epísteme , conhecimento],cnstituirá um ds prbemas centrais para s ósfs. N sécu- XvIII, pr exemp, pensadr esccês Daid Hume escreeuum texto no qual tenta entender de onde vêm nossos padrões degst, u seja, um text n qua repõe, ns terms d seu temp, apergunta “ que é Be” (HUME, 1978). Em um caminh psta de Patã, jugament d be, para Hume, é prdut da expe-riência humana, é produto de regras gerais apreendidas nas váriasexperiências estéticas que hmem cutiu em sua ida. Daí Humerecnhecer que há pemas que agradam mais a ímpet jem eoutros que soam melhor aos ouvidos adultos. Não há, para o autor,portanto, um belo único, pois também não há um espectador único,há espectadres jens u ehs, prtestantes u catóics.

Nte-se que Hume está em tud pst a Patã: Sócrates ddiág patônic nge que as perguntas êm de um tip rústic,para assim pder desmascarar seu adersári. Mas espera de Hípiasrespostas que sirvam para todos os homens, rústicos ou cultos, poisalude a um belo que está fora das coisas vivenciadas pelos indiví-dus. Se pdems dizer que, pe mens n Hípias maior , Platãoquer uma ideia de belo, ele é, neste sentido bastante restrito, umidealista. Hume, por sua vez, parte da experiência concreta, tantoque cu cnhecid pr empirista , aquele que se relaciona com a

empiria, cm a experiência. Nã deems ns ar demais em p-sições u cassicações tã estanques, mas nesse cas,  grosso modo ,a distinção é válida.

Perguntas sbre que é be, u que ns faz jugar umaobra de arte bela ou não, podem nos parecer distantes dos questio-naments de hje. Mas muits crítics de arte atuais pensam quefaz de um bjet bra de arte, u se há padrões uniersais para se

 jugar se uma bra é autêntica u nã. Estas perguntas que para Pa-tão e Hume apontavam para o cerne do conhecimento, atualmente

habitam o interior da teoria das artes. A especialização dos campos

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de saber que se intensicu a ng d sécu XIX e XX afastuum tanto epistemólogos, cientistas e teóricos das artes, mas em cadaum destes campos se reconhecem ecos do mesmo problema.

Nas artes, camp que hje chamams de estético , autores como

Cement Greenberg ns ans de 1950 e, atuamente, Artur Dant,tentam captar, cada um a seu md, que transgura uma cisae a trna bra de arte digna de nss interesse. Para Greenberg, apergunta centra era que fazia de uma bra autenticamente “deanguarda”. ou seja, a pergunta era cm jugar, na mutipicidadede estis, tendências e perspectias cntraditórias d sécu XX –lembremos algumas: realismo, dadaísmo, surrealismo, modernismo,entre tantas utras crrentes –, aqueas que eram as mais imprtan-tes e constituíam, assim, exemplos de belo universalmente aceitos.

 Já Dant tem de se haer cm bras de arte que em quase nadadiferem ds bjets cmuns d dia a dia, tais cm as caixas depaha de aç Bri que artista Andy Warh criu, em tud (isuae, prtant, esteticamente) iguais às embaagens d supermercad.Dant tenta sucinar a questã apeand nã mais para a sensa-çã, já que, a har e à percepçã, s bjets se ns apresentamindiscerníeis, mas para s jgs de inguagem que cnstituem asfrnteiras entre ida e arte, retmand prcediments d ósfWigenstein; Greenberg, pr sua ez, ai buscar um cntemprnede Hume, Immanue Kant, para estabeecer padrões de gst a priori ,

u seja, anterires à experiência. Cmparems as duas perspectiase cará car que prbema sbre “ que é be”, se jugamssegundo categorias ideais ou empíricas, continua reverberando.

Cement Greenberg (2002, p. 47) eabra uma teria apiadaem juízs ideais, nã na experiência, e escree:

Kant fi, pe que sei, primeir a decarar (em sua Crítica da facul-dade do juízo) que s juízs estétics de ar nã sã suscetíeis depra nem de demnstraçã, e até hje nã hue quem pudesse

refutá-, seja pea prática u pea argumentaçã. Cntud, sem-pre há aqueles que pouco sabem e insistem em acreditar que os

 juízs estétics pssam ser cmprads de maneira semehanteàs armações d fat.

Cm erems cm mais cuidad a seguir, a tratar ds juízsestétics de Kant n tópic 3, s jugaments nã dependem do

 fato , mas sim de uma disposição de nossas faculdades, sendo assimuma forma a priori e universal de relação com as obras. Não há

demonstração ou prova que possa ser arrolada de fora, do mundo

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sensíe, para cmprar um juíz que se refere às capacidadesepistemógicas d sujeit.

Dant, cntra uma arte  platônica que depende de juízs unier-sais e não do mundo , pensa que artista Andy Warh

[...] transformou o mundo que nós compartilhamos em arte, e setrnu parte desse mund. E prque sms as imagens que cm-partilhamos com todas as outras pessoas, ele se tornou parte denós. Por isso ele deve ter dito que se você quiser saber quem éAndy Warh, he para dentr. ou mehr, he para fra. vcê,eu, o mundo que compartilhamos, somos todos da mesma matriz(DANTo, 2004, p. 115).

outra questã que pde ser tratada a partir das artes já fi e-antada e apnta namente para a epistemgia. Faams em Wit-tgenstein e em jgs de inguagem; faams, prtant, em um campde inestigaçã muit fecund n sécu XX: a sa da inguagem.Dant pensa Warh nessa intersecçã entre arte e epistemgia, enã mais entre arte e jugament estético. As caixas de Warhol não sãointeressantes do ponto de vista sensorial, mas são uma elaboraçãosóca na qua artista expõe s enigmas da inguagem cmum eseus jgs de interpretaçã nem sempre passíeis de demnstraçõescaras e eidentes. ou seja, a descar as caixas d supermercad

para o museu, o artista mostra como arte é algo contextual, que depen-de da relação lúdica entre os espectadores e os códigos linguísticos.Este é um prbema que a ógica cntemprnea também trabaha,na tentativa de chegar a uma linguagem menos contaminada pelosens cmum e mais precisa cm instrumenta cientíc.

Nã seria muit difíci tar a iníci, a jg entre sstaHípias e irônic Sócrates que se passa pr um hmem rústic.Platão, neste diálogo, busca o belo, desconstruindo por argumentoslógicos (muit embra us d term se cm um anacrnism) as

respstas fáceis de Hípias. N na, se nã chegams a uma suçãsobre o que é o belo, chegamos a uma depuração da linguagem bela ,pis cheia de jgs retórics, usada pe ssta.

 2.2. Estética como losoa da artePatã acusa Hípias de jgs retórics (s bes discurss) e

mnemônics (ist é, de se utiizar da memória), mas demnstraque ssta sequer sabe que é be, que este discurs adrna-d de imagens rememradas é chei de guras agas, fantasmas

e aparências. As mesmas aparências que os homens acorrentados

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na caerna eem desar nas smbras, na famsa aegria d irvII de A República. Também é bem cnhecida a nçã de mimese , deimitação, tal qual aparece no livro X de  A República:

[...] quant a pintr, respnde mais à seguinte pergunta: és deparecer que o que ele se propõe a imitar é aquele conceito únicoda natureza u as bras ds artistas?As obras dos artistas, respondeu.Cm reamente sã, u cm parecem ser? Terás de escareceresse ponto.Que queres dizer cm iss? perguntu.É o seguinte: um leito, quando o contemplas de lado ou de frente,u cm quer que seja, cará diferente de si mesm, u nã diferenada, parecend apenas que difere? E cm tud mais da mesmafrma?É isso mesmo, parece diferir, porém de fato não difere.Cnsidera agra seguinte: a que m se prpõe pintr em cadacaso particular: imitar as coisas como são em si mesmas, ou suaaparência, que se he agura? Trata-se da imitaçã da aparênciau da reaidade?Da aparência.lg, a arte de imitar está muit afastada da erdade, send quepor isso mesmo dá a impressão de poder fazer tudo, por só atin-

gir parte mínima de cada cisa, simpes simuacr [...] (PlATÃo,2000, ir X).

Para Aristóteles, entretanto, a imitação não aparece mais comoum erro, ou engano epistemológico, mas como forma de conhecerprópria ao homem, da qual se origina a poesia:

Parece haer duas causas, e ambas deid à nssa natureza, quederam rigem à pesia. A tendência para a imitaçã é instintia

n hmem, desde a infncia. Neste pnt distingue-se de tds sseres, por sua aptidão muito desenvolvida para a imitação. Pelaimitação adquire seus primeiros conhecimentos, por ela todos ex-perimentam prazer. A prova é-nos visivelmente fornecida pelosfats: bjets reais que nã cnseguims har sem cust, cntem-pam-s cm satisfaçã em suas imagens mais exatas; é casdos mais repugnantes animais ferozes e dos cadáveres. A causa éque a aquisiçã de cnheciment arrebata nã só ósf, mastodos os seres humanos, mesmo que não saboreiem durante muito

temp essa satisfaçã. Sentem prazer em har essas imagens, cuja

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vista os instrui e os induz a discorrer sobre cada uma e a discerniraí fuan u sicran. Se acntece aguém nã ter ist ainda ri-ginal, não é a imitação que produz prazer, mas a perfeita execução,u a cr u utra causa d gêner. Cm ns é natura a tendên-cia à imitaçã, bem cm gst da harmnia e d ritm [...], naorigem, os homens mais aptos por natureza para estes exercíciosas pucs fram dand rigem à pesia pr suas imprisações.(ARISTÓTElES, 1964, Iv).

lend atentamente trech acima, perceberems também queimitar não é fazer uma imagem igual ao mundo, como podemos depre-ender de Platão, que chega a comparar o pintor a um homem com umespeh às cstas (em A República). Nã é um espelho , mas um arranjde cores, palavras ou formas que produz prazer, quando apreendemosa técnica, a arte d artista a imitar. o prazer, prtant, nã pertence aengd, mas à admiraçã pes efeitos que artíce, peta, músiccriam. E a apreensã nã é engansa, pis nã captams simuacrsde coisas, leitos pintados no lugar de leitos reais, mas apreendemos aprópria arte, a tékne , a pintura em si mesma, a composição musical oupética. Mesm cisas repugnantes, cm animais ferzes e cadáeres,podem ser belos e prazerosos de se ver, se na sua imitação vemos ahabilidade quase demiúrgica do próprio homem.

Percebemos, assim, como Aristóteles desloca a questão para

utr pan, que nã é mais apenas epistemógic, igad às dis-tinções entre percepçã e ideia, aparência e essência. o pan deAristótees é intern à própria bra de arte, é  poético.

A partir deste deslocamento de sentidos, Aristóteles não precisamais condenar s bes discurss u a bea pesia. o artista, paraAristóteles, pode escolher aspectos grandiosos do homem e criartragédias nas quais todas as personagens são superiores a nós emhonra, heroísmo, ou mesmo na sua relação com os deuses que lhesenredam nas teias do destino, o grande motor das composições trá-

gicas. Édipo Rei , por exemplo, encena a grande dor de um homem,um rei, que sem o saber mata seu próprio pai e desposa sua mãe.Sófces, autr da tragédia, escheu aguns aspects humanspara compor seu rei, aspectos que fazem dele honrado, astuto e atémesm desmedid (tmad de hybris , cm escreeriam s gregs),mas sempre eead. Se Sófces tiesse, pr utr ad, eschidaspectos comuns, tolos, se tivesse escolhido para sua personagem oque de pir marca a natureza humana – preguiça, gudice, aareza,feiúra etc. – teria, sem dúida, imitado também, mas imitado pelo

gênero baixo, pelo cômico.

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Assim, tragédia e comédia são imitações , mas não são espelhosd mund. Sã eeições péticas que cmpõem cenas determinadas,para atingir efeits determinads ns espectadres. E esses espec-tadores, antes de se deixarem enganar pelo que é mostrado, admi-

ram a capacidade do autor de eleger aspectos naturais, momentose paaras capazes de prcar nim gera da pateia. A beeza,a imagem poética que cria admiração, não é algo que está fora daprópria obra de arte, mas é um produto da habilidade artística doscriadres. Daí pderms dizer que esse descament das nçõesde belo, beleza e de imitação propostos por Aristóteles, desloca aomesmo tempo a noção de arte e artista e abre um novo campo deinvestigação que analisa as obras de arte em si mesmas e em suasrelações com os efeitos que produzem.

Sécus depis, n Renasciment Itaian, pensadr e arquitetrentin len Baista Aberti faz referência a uma tópica antiga(já citada pe autr rman Píni, eh, que ieu entre 23-79d.C.), agra em reaçã à arte d pintr. Na anedta, reaparece anoção de que o artista elege o que imita e é esta a sua sabedoria:

Zêuxis, mais iustre e cmpetente de tds s pintres, para fa-zer um quadr que s cidadãs ccaram n temp de lucina,pert de Crtna, nã cnu imprudentemente em seu própri

engenh, cm fazem hje s pintres. Cm pensaa ee nã serpssíe encntrar em um só crp tda a beeza que prcuraa –cisa que a natureza nã deu a uma só pessa –, escheu as cincmças mais beas de tda a juentude daquea terra, para deas tirartda a beeza que se aprecie em uma muher. Esse pintr agiu cmsabedria. (AlBERTI, 1989, p. 133).

De dentr da cnstruçã das bras, hand a mimese a partirde seus próprios artifícios, a noção de uma mimese única, u seja,

a noção de  Arte com  A maiúsculo, deixa de fazer sentido, pois háformas várias de imitar, a do pintor diversa daquela do músico, porexemp. Aristótees ainda cmpara petas (que eram também mú-sics, na Antiguidade) a pintres, mas a teria da arte ai cada ezmais se trnand uma teria das artes. E cada uma dessas bras dearte específicas – pintura, escutura, iteratura, música, dança uteatr – isa a espectadr/uinte/eitr de um md, buscandcriar não imagens enganadoras, simulacros do mundo, mas redesde sentids. Da perspectia aberta pr Patã, nã há significado 

nas imagens: elas são simulacros. Já para Aristóteles, cada eleição

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específica de dados a serem imitados cria uma rede de efeitos e designificações, cm trágic u cômic, pr exemp.

os rmntics, n sécu XIX, farã, em arga medida, a críticaas gêners (trágic, cômic, épic etc.), apntand para uma rigi-

naidade em reaçã a essas frmas fechadas. Sem essas referênciasa códigos e regras reconhecidos pela comunidade, a obra de artecada vez mais passa a ser poesia da poesia, obra que remete ape-nas à própria bra autônoma. Mas esse círcu nã fecha uniersartístic em si mesm. Para um ds precursres d Rmantism, ósf, dramaturg e peta Friedrich Schier, já ns ans de 1800,a pesia “expõe” a iberdade, em cert jg entre sensibiidade erazã. Escree Schier: “mstrarei que para reser prbemapolítico é necessário caminhar através do estético, pois é pela belezaque se ai à iberdade”. Nã à ta, ba parte da bra sóca dprópri Schier fi escrita em frma de peças e pemas. A intuir be, Schier pensa que espírit encntra um mei term entrea razã frma e a matéria sensíe: “Cm, entretant, a beezapode existir e como uma humanidade é possível, isso nem razãonem experiência pde ensinar-ns” (SCHIllER, 2002, p. 77).

É n jg entre frmaism da razã e a sensibiidade que homem intui a forma viva do belo:

A razão, entretanto, diz: o belo não deve ser mera vida ou mera

frma, mas frma ia, ist é, dee ser beeza à medida que ditaa hmem a dupa ei da frmaidade e reaidade absuta. [...] ohmem dee smente jgar cm a beeza e smente cm a beeza

 jgar. (SCHIllER, 2002, p. 80).

Cm hmem nã é apenas matéria e também nã é purintelecto, o belo não é apenas vida ou abstração, mas tensão entrefrma e experiência. o jg, própri a be e à bra de arte, é que faz d hmem um hmem. E ire jg d be é, assim, a

pssibiidade de se pensar a humanidade. Deste pnt de ista,para s ósfs rmntics, a arte cria imagens que sã expsiçõesdaquilo que não pode ser exposto de forma mais direta pela racio-naidade. Assim, mesm send bra que remete à própria bra,

 jg estétic abre-se, namente, a hmem e às redes simbóicas,históricas e culturais que lhe constituem.

Schier tee um de seus pemas musicad pr Beethen. Apassagem de um meio a outro, do escrito para o musical, altera osentid de uma bra? ou uma mesma obra , vista por meios diversos e

pr púbics e épcas diersas pssui, também, diersas apreensões?

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Em reaçã à música, Gin Stefani, autr igad à semigia cn-temprnea, u seja, a estud d sema, d sign, prpõe a seguintereexã em trn da Quinta sinfnia de Beethen:

Tmems um mti bem simpes, de quatr ntas: fams “tá-tá-táá” da Quinta sinfnia de Beethen. Fi um erdadeir chquepara primeir púbic que uiu, em 1808, e que esperaa uminíci mais sóbri u uma bea media, cm se usaa entã. Tantque perguntaram para autr que signicaa aquee iníci e eerespndeu cm a céebre frase: “Assim destin bate à prta”. Prque respndeu assim? Ist é, de que md Beethen entendia suamúsica? E nós, cm a entendems? Nssa respsta é: em dierssníeis de sentid. (STEFANI, 1987, p. 17).

Dierss níeis de sentid, nenhum dees necessariamenterelacionado a algo como uma realidade exterior , ou a uma verdade como certeza epistemológica. Nenhum deles necessariamente donível do simulacro. Níveis de sentido que podem pressupor, tam-

 bém, espectadores diversos, com diversos níveis de decodificaçãosemntica. Beethen eidentemente nã copia uma batida à prta,mas recria, a partir dessa apreensão sensorial, uma imagem queretumba em gpes snrs. Estams dentr de um jg, nã emfrente a um espelho.

Sem tentar cncuir, pdems trazer essas questões em abertpara mund cntemprne. o cinema, pr exemp, ta qua apesia n sécu XIX, parece ser a imagem pr exceência na qua secndensa pensament cntemprne. Pr exemp, mes cmCentral do Brasil (diretr Water Saes, 1998) u Cidade de Deus (di-retr Fernand Meirees, 2002) fram tmads, muitas ezes, cmmeios de expor uma realidade como nenhum outro meio o poderia,nem mesm a sa tradicina. Mas, diriam Aristótees e depisSchier, expr em um determinad níe eeti e em um determi-

nad jg entre sensibiidade e razã, expr nã cm espeh, mascm bra de arte. Assim, s níeis semntics, s efeits eschi-ds, s jgs entre imagem e ideia cnstituem as bras enquantbras. Se estes cmpnentes cmpsitis, se esses jgs iuminam“e muit dã a pensar”1 , como escreve Kant, não explicam da mesmafrma que um text argumentati, nem reetem imediatamente1  A imagem estética é “representaçã da facudade da imaginaçã, que muit dá

a pensar, sem que contudo qualquer pensamento determinado, isto é, conceito,pssa ser-he adequad, que cnseqüentemente nenhuma inguagem acança

inteiramente nem pde trnar cmpreensíe”. (KANT, 2008, § 49).

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cm recrtes da reaidade. o jg artístic nã precisa, assim, serarad pr regras externas à arte, sejam eas as d rea, as daverdade ou mesmo as das convenções sociais.

Pde parecer um truísm dizer que a arte nã é um espeh. Mas,

a se discutir cm as cenas de um me fram construídas , comoas imagens foram eleitas para se criar determinado efeito, estaremosdiscutind nções caras à arte mderna e cntemprnea, cm a derealismo em reaçã à autonomia d be. E nã estarems discutinda questão de fora, fornecendo ao aluno noções ou conceitos prontos.Estarems discutind de dentr da própria cnstruçã artística.

2.3. Estética e arte como experiência existencial,histórica e política

Quaquer tip de mimese, cm ims a faar ds mes quecriam imagens d Brasi, é escha, seeçã de efeits, u mesm desentidos, como preferem os semiólogos. Nesta acepção, toda obra éfeita segundo a liberdade do autor, visando um outro homem, tambémlivre para interpretar. A formulação destas questões é de Jean-PaulSartre, em um text escrit depis da Segunda Guerra Mundia, Oque é a Literatura?. Em reaçã a autr e a sua bra, Sartre põe trêsperguntas: Por que se escreve? O que se escreve? e Para quem se escreve?As três questões visam apenas ao escritor, e, ainda, apenas o escritor

de prsa, que para Sartre é diferente d peta. Mas, um puc à re-eia d autr – cuj ir busca descaracterizar exatamente a ideiaabstrata de Arte com A maiúscu –, pdems expandir as perguntas: Por que se faz arte? O que se faz na arte? Para quem se faz arte?

A própria busca de Schier pr uma “educaçã estética” d h-mem quer pensar a arte cm e scia. o autr está muit próxima pensament de Immanue Kant. Kant é um cntemprne deDaid Hume, mas, a cntrári d esccês, nã he basta que nsss

 juízs estétics se em em regras gerais adindas da experiência.

Para Kant, em sua Crítica da Faculdade do Juízo , hmem juga ascisas cm beas partind da experiência, mas a rigem de tais juízsnã é externa à razã, nã é a posteriori , nã é psterir à percepçãdos fatos, mas a priori. ou seja, td hmem pssui uma facudadede jugar cujas frmas de apreensã, pr uma autrreexã d pró-pri sujeit, fazem cm que s fenômens d mund apareçam cm

 bes. o juíz d be, entretant, nã é cm um juíz de cnheci-ment que determina ag, mas apenas uma frma de reetir, quenão acrescenta nada ao que apreende: o belo não tem um  m , mas

apenas uma naidade que nã sabems determinar a cert.

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Assim, tds nós, a jugar ag be, precisams pensar defrma aargada, tmand ugar d utr, que também dee reetirda mesma frma que nós, u seja, dee perceber esta mesma nai-dade nã determinada. Diferentemente ds juízs de cnheciment

que tds aceitam pr serem determinads, s juízs que fazemssbre a arte, para Kant, sã juízs cmunitáris, que criam açsalargados de sociabilidade.

Car que Kant está muit distante de Sartre, até prque seu juíz nã está dad na história, é uma frma das nssas facudadessubjetias. As críticas a esse frmaism de Kant earã s rmn-tics e psterirmente Friedrich Hege a pensar a bra de arte cmum desenvolvimento do pensamento humano na história. Para He-gel, as obras fazem parte de uma determinada concepção-de-mundo ,elas o expõem. Não seria possível aqui refazer todo o percurso datradiçã estética deriada de Hege; pdems apenas embrar queKar Marx trata das reações entre a arte e a sociabilidade , mas umasciabiidade que nã é apenas aquea frma ds hmens que ju-gam segundo suas faculdades. É uma sociabilidade historicamenteconstruída, uma estrutura social.

A arte aparece, entã, em reaçã às estruturas históricas, emrelação ao tempo que se põe inexoravelmente, este tempo que é o doagora. Para esse temp d agra que emerge cm frça de cngura-çã de munds e de bras, peta Chares Baudeaire cunhu um

term n: “mdernidade”. Está abert caminh que eará tanta Sartre, quant as autres a quem chamams críticos da cultura.

Esse temp mdern para qua imprta presente, agora ,é também o tempo da novidade, do eterno novo, da mercadoria.Era de se esperar que a arte se trnasse endáe, circuáe e, cn-sequentemente, perdesse a unidade de sua presença, para ser coisaentre cisas. Water Benjamin, pensand na reprduçã desenfreadadas imagens, n cinema e na ftgraa, entende que a bra perdeusua aura; ag parecid escreerá Thedr Adrn em reaçã à

música e à quaidade de sua audiçã, cuja perda é ineitáe, hajaista a reprduçã simpicadra a que a indústria reduziu sm deuma rquestra, cndensada em um disc. Para Benjamin, entretant,taez essa perda nã seja apenas uma regressã, já que cinemaé imagem sem original, é pura reprodução... Não haveria aí umanova forma de  presença?

Para Adorno, os sentidos formais da obra e a estrutura socialnão são distintos, são polos interdependentes. Nesta acepção é queAdorno pode ser dito um crítico da cultura. o autr, cm Hrkhei-

mer, criará um term que ns ajuda a pensar a bra de arte e seus

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sentidos quando estes entram na lógica da mercadoria: indústria cul-tural. Segund s autres, a indústria cutura:

[...] desenvolveu-se com o predomínio que o efeito, a performance tangível e o detalhe técnico alcançaram sobre a obra, que outroraera eícu da Ideia e cm essa fi iquidada [...] s prduts daindústria cultural podem ter a certeza de que até mesmo os dis-traíds ã cnsumi-s aertamente. (ADoRNo; HoRKHEIMER,1985, p. 118-119).

ou seja, é na cnstataçã daquees efeits própris à arte, ee-ads à ptência de indústria, que a bra de arte, aquea mesmaque era capaz de dar crp à iberdade de que ns faaa Schier,perde-se cm Ideia. Sbra apenas uma máquina de prduzir efeitsde interesse magnético. Aliás, o que é fácil de se ver, quando pen-samos nos produtos culturais que nos circundam. Adorno separadesse artifício instrumentalizado pela indústria, a arte nova , aquelaque consegue ter um polo de negatividade que rompe com o encantodos efeitos, o encanto da mercadoria.

A arte, assim, é sempre aberta a n e à pergunta pe que éarte, nã se prduz a partir de um cnceit, mas em uma reexã,em uma  nalidade sem m cm prpusera Kant. Taez pssamspensar que a arte erdadeira é um e de sciabiidade reexi,

diverso daquela sociabilidade fácil imposta pela indústria cultural.Em sa, sabems quã difíci é aprximar dis pensadres.

Mesm que as questões sejam pstas de utra frma pr Adrn, demaneira gera, as perguntas de Sartre ecam. Sartre nã cstuma serchamado de crítico da cultura , mas se pensava como um intelectual , ouseja, cm aquee hmem que nã é só um especiaista em sa,mas alguém que atua em seu meio e em sua época histórica.

Um artista – n cas de Sartre, um escritr – dee estar cns-ciente de sua tomada de posição frente aos artifícios que a técnica

artística lhe permite, deve fazer escolhas que o aproximarão ou nãodaquee cerne ptenciamente reucinári própri à arte. Umartista pde escher caminhs fáceis que agradem a púbic (e àindústria cutura, dirá Adrn), u caminhs árids e inadres,nem sempre cmpreendids pr tds. o artista mdern, a quema ruptura das tradições permite uma originalidade de criação cadavez maior, é também alguém que exerce em alto grau sua liberdade (SARTRE, 1989).

Por fim, vários outros autores veem a arte como uma força

volitiva e vitalista e não necessariamente como uma presa das

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estruturas; sã zes dissnantes em certa medida, aqueas zesque deriam de Friedrich Nietzsche, entre eas as de Heideggeru as de aguns fiósfs franceses, cm Deeuze. Nã preten -demos aqui esgotar as possibilidades, elas se abrem em vários

utrs caminhs. Mas, se há uma técnica artística regressia, quesere apenas cm máscara para med (u cm ferment paraa indústria), Nietzsche isumbru ainda utra ertente, a de umaarte que quer mais vida, uma pulsão dionisíaca, ligada ao deus doinh, Dinísi (NIETZSCHE, 1978).

Nietzsche não é um autor que podemos relacionar facilmente aoscrítics da cutura citads. Mas, de utra perspectia, de utra margemd ri, aquea sedimentada pr Marx, tant Benjamin quant Adrn,u mesm Sartre, em aguns mments, isumbraram a ptenciai-dade da forma artística para romper com um estado de coisas.

3. Estratégias de abordagem

A seguir, sugerims atiidades que pdem ajudar na cmpreen-são dos temas propostos. Nenhuma atividade, entretanto, substituia eitura cuidadsa ds texts, mesm que estes nã sejam ids naíntegra, mas em fragmentos selecionados.

As atividades e leituras foram pensadas para que as noções ecnceits nã enham prnts a aun e nã sejam nunca uní-

cos, mas sempre provocativos e produzidos a partir do contrastede textos, imagens e outros materiais.

os exemps e materiais citads sã smente referências; apenaso professor pode saber quais são as melhores obras a serem abor-dadas cm seus auns. o imprtante é sempre tentar dsar brasppuares e cnhecidas ds jens cm utras adindas de registrshistóricos e eruditos, sem, contudo, nivelá-las.

 3.1. Estética como experiência sensorial do

sujeito no mundoNeste primeiro momento, queremos:a) pensar o homem como sujeito sensível e construir, em vez

de enunciar, a distinção entre estético e inteligívelPara dar conta deste primeiro tópico, sugerimos a leitura de

trechos dos textos de Platão e Hume citados, ambos devidamentecontextualizados em suas épocas, e a partir deles levantar os ques-tionamentos.

o text de Patã pde ser encenad pr aguns auns, pis

se trata de um diág; já de Hume pde ser abrdad a partir

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ds trechs eschids e ids estruturamente – ist é, em suaspassagens ógicas – em uma aua expsitia.

b) pensar a arte como juízo estético ou como linguagem con -

textualPara tanto, sugerimos, além da leitura de trechos pré-seleciona-ds de Greenberg e Dant, que prfessr ee para a saa de auareproduções de obras tradicionais , reproduções de readymade de Du-champ e de bras de Andy Warh, e sugira que s auns, diididsem grupos, montem uma exposição com esse material, ordenando-osnas paredes cnfrme anidades, cnjunts de semehanças etc.o prfessr precisará pridenciar um jg de reprduções paracada grupo.

A na da atiidade, prfessr pde retmar tema d juízestétic de Greenberg, igad a uma facudade humana de jugar,e cmpará- à nçã de arte cm jg de inguagem de Dant.Cada grup de auns será cnidad a expicitar prquê de seucnjunt de bras, se eas fram seecinadas para estarem juntaspor  gosto , e se este critéri de gst fi cnsensua entre ees; use elas foram agrupadas por proximidade de elementos plásticos,de inguagem; se as bras de Andy Warh e Duchamp sã arte domesmo modo que as outras, ou se são obras dependend de um jgde linguagem entre o público e a instituição arte.

Se prfessr preferir, na atiidade, pde recrrer a pemasmdernistas cm s de Manue Bandeira em cmparaçã a textsde circuaçã ctidiana. Cand-se à usa reprduções de pemase manchetes de jrna, é pssíe cmparar s materiais e debatersobre o contexto de cada um e o que transforma um em arte e o ou-tr nã. Dee-se enfatizar us de inguagem cquia pe peta,quase próxima à inguagem das ruas e d dia a dia. A antagemdesta atividade é a interface com a disciplina de literatura.

Unind s dis mments – que pdem se dar em duas auas

encadeadas –, prfessr irá retmar as distinções entre um beessencial e uma beleza apreendida por experiências e tentar enten-der as seleções de obras ou as poesias a partir desses dois modelosepistemológicos diversos.

Para pensar hmem cm ser sensíe, um me que pde-rá ser de grande auxílio é  A Festa de Babee (diretr Gabrie Axe,França/Dinamarca, 1987), n qua sentid d paadar ( gosto emsua acepçã mais restrita) permite a reuniã de pessas em trnde uma mesa e a suspensã mmentnea ds prbemas racinais

e religiosos que envolvem cada um deles.

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outr me que pde ser trabahad é O Violinista (diretr Char-es an Damme, França, 1994) n qua um músic fams abandnasua prssã para tcar seu instrument, um iin, n metrô dacidade. o prfessr pde eantar questões em trn de se músic

seria compreendido fora de seu meio, a orquestra, se a apreciaçãodos transeuntes é imediata ou apreendida por experiência.

 3.2. Estética como losoa da arteNeste segundo momento pretendemos abordar:

a) Os vários sentidos de mimese, elaborados a partir dos textosSugerims a eitura cmparada ds trechs de A República (ir

X), ds trechs de Aristótees e de len Baista Aberti. A partirdessas leituras, é possível construir com os alunos noções variadasde mimese. É importante, ainda, que se retome o que foi discutidoanteriormente sobre sensibilidade, para entender qual o desloca-mento da noção de mimese e quais seus efeitos.

Cm atiidade cmpementar, prfessr pderá cmpararformas de mimese a partir de obras de arte com um mesmo tema(pinturas, escuturas, expstas em reprduçã, em transparência uprjetadas); de pemas cm um mesm tema, que também pdem serprjetads em transparência u utr sistema de prjeçã, para quesua forma nã se perca na eitura. Sugerims s seguintes pemas:

Cidadezinha qualquer

Casas entre bananeirasmuheres entre aranjeiraspomar amor cantar.Um hmem ai deagar.Um cachrr ai deagar.Um burr ai deagar.Deagar... as janeas ham.

Eta ida besta, meu Deus.(Cars Drummnd de Andrade, 1993). de cimacidade acuadade costas para o marum armazém de cada ladodo amplo-úmido estuárioentrepst que ca entre

Sã vicente e Sant Amar

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cidade esboçada a esmolitoral inacabado.(Abert Martins, 2002).

o prfessr dee enfatizar nã só a seeçã de imagens de cadaum ds autres a recriarem uma cidade, mas também as inexõesformais como escolha dos vocábulos e dos efeitos, o efeito de ironiaque rmpe a expectatia primeira em Drummnd e efeit de breemeancia que fecha pema de Martins. As paaras que ecamumidade em Martins, as que ecam entidã em Drummnd. Essespemas sã apenas exemps; pdem ser substituíds pr utrs.

outra sugestã seria cmparar uma frma de mimese mderna,Guernica de Picasso, por exemplo, a uma forma clássica de represen-tar, cm a de Jacques-luis Daid em O Rapto das Sabinas. Pode-sebserar as guras da mãe cm suas crianças em ambas as teas ecomo cada artista apresenta nestas imagens o desespero.

Seria interessante, também, sugerir descrições de  paisagens depinturas cntemprneas tais cm as de Ansem Kiefer u d ar-tista brasieir Nun Rams (FABRINI, 2002).

b) Os efeitos da arte e as suas possibilidades expressivas esemânticas

leitura de trechs seecinads d text de Schier, A Educação

Estética do Homem (pr exemp, trechs da Carta Xv, já cmentads) , e debate sbre as reações entre arte autônma e iberdade pítica. Apesia pde expr cnteúds sócs, a sa pde ser pética?o prfessr deerá retmar, aqui, a história da sa e mstrarque, antes de Patã, haia autres de sa que usaam ers,como Parmênides. É possível, ainda, trazer questões sobre a literatura

 brasieira e mstrar cm, n Brasi, pensament mdernista tran-sitava do romance e da poesia para o texto crítico e argumentativo,em autres cm oswad de Andrade e Mári de Andrade.

Essa eitura já prepara a próxima etapa de abrdagem, arte emreaçã à sciedade.Cm atiidade údica, prfessr pderá prpr que s au-

ns criem uma imagem pética (pde ser em text, em teatr, emdesenh) que expicite ideias sócas cm liberdade , verdade , ale-

 gria , medo.Pde-se, ainda, sugerir que s auns captem imagens (pr

ceuares, na internet etc.) para dar cnta de cnceits abstratsatuais como igualdade , diferença etc. Ao final da atividade, uma

pequena exposição dos trabalhos seria uma forma de animar o

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debate em torno da relação entre arte e filosofia. Neste sentido, odebate pode versar sobre a comparação entre como os espectadorescaptaram as imagens, como as  julgaram , e como o autor as concebeua seeciná-as u prduzi-as. Esse exercíci pde ser retmad

quand prfessr trabahar a nçã de juíz cmunitári uaargad, tratada n tópic 3. É pssíe, incusie, intrduzir apartir desse debate a eitura d § 40 da Crítica da faculdade do Juí-z de Immanue Kant, preparand a abrdagem cmunitária, u

 política, da estética.Pr m, cm já fi sugerid que estams próxim a imagi-

nári da Reuçã Francesa que animaa muits texts de Schier,um fecho para a atividade poderia ser uma apresentação da Ode à

 Alegria de Schier e sua recriaçã na Nona sinfonia de Beethen,tentando debater como esses dois criadores aproximaram-se da ex-psiçã de ideias sócas a partir da arte.

outra pssibiidade é cmentar pemas (u mesm músicasppuares) que buscam caminhs de acess à erdade. Usams pema de Emiy Dickinsn cm exemp pssíe:

Mrri pea Beeza e ma estaaA túmu ajustadAlguém veio habitar a sepultura ao lado(Defendera a erdade.)

Baixinh perguntu: “Pr que mrreste?”“Pea Beeza”, respndi.“E eu pea verdade. Sã ambas uma só.Sms irmãs”, me disse.

E assim cm parente que à nite se encntramEntre jazigs cnersams,Até que o musgo alcançou nossos lábiosE cbriu nsss nmes.

(Emiy Dickinsn, 1992)

Para voltar ao início do tema, o professor comentará as pro-duções dos alunos, retornando ao tema da mimese e dos efeitosproduzidos pelas obras.

o prfessr pde se aer de mes e dcumentáris ns quaisse enfoque a produção artística, tais como o documentário sobre opianista Nelson Freire (diretr Jã Saes, Brasi, 2003); fams d-cumentário que mostra Picasso em processo de criação, O Mistério de

Picasso (diretr Henry-Gerges Cuzt, França, 1955), entre utrs.

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Nesses documentários, o interessante seria enfocar não a genialidadedo artista, mas sim o processo de criação, a arte como processo.

os cnts de Machad de Assis, Um Homem Célebre , e o de Ho-nré de Bazac, A Obra Prima Ignorada , são boas leituras, pois ambos

tematizam processos de criação: o primeiro, em tom melancólico eirônic, trata de um músic ppuar que ameja a gória erudita; segundo, em chave trágica, mostra a derrocada de um pintor antea impossibilidade da verdadeira mimese.

Se prfessr preferir a frma teatra para tratar da questã, text de Antn Tchekh,  A Gaivota , fala da criação literária, desua tendência a destruir a vida, ao empalhá-la, como acontece coma ave do título.

os mes Cidade de Deus e Central do Brasil , citados, tambémpodem ser exemplos de obras de arte que não são recortes do real ,mas relacionam-se com uma imagem de mundo que o diretor quercriar, a partir de efeitos e seleções.

Tais questões pdem ser expandidas para músicas u mesmprogramas como telenovelas e reality shows. As questões seriam: que é rea e que é mimese e cm essas duas instncias, umapética e utra existencia, se encntram? Um reality show é real?Pr quê? Em que níe?

vae enfatizar que tais questões nã têm uma única respsta,são, na verdade, problemas que remontam, em seus fundamentos,

as primeirs espants sócs. vtams à imprtncia da eiturados textos.

 3.3. Estética e arte como experiência existencial, históricae política

a) Arte e historicidadeleitura de trechs eschids ds texts de Baudeaire, Escritos

sobre arte  (BAUDElAIRE, 2008), e deniçã em grup de termscomo moderno , modernidade em conexão com outros correlatos como

moda e novidade.Para trabalhar a noção de arte como concepção-de-mundo , o profes-sor poderá trazer para a sala grupos de imagens não só de obras dearte de tempos diversos, mas também imagens da moda e do mobili-ário de épocas distintas e pedir que os alunos montem uma linha dotemp. Para simpicar, sugerims escher imagens da Antiguidade,da épca de Baudeaire, u seja, sécu XIX, e da nssa épca. A partirdas ideias apreendidas n text de Baudeaire e fazend referência atext de Hege (se pssíe, própri Hege pde ser id em trechs

eschids, apesar de sua dicudade. Uma suçã pde ser utiizar

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materia de api, cm, pr exemp, ir de Benedit Nunes,Introdução à Filosoa da Arte), prfessr dee expicar cm cadaobra de arte se relaciona, segundo os autores, com um mundo depensament própri. Cada épca marca uma concepção-de-mundo. A

de Baudeaire é a da modernidade. E a nssa? N que se parece cm ade Baudeaire, nessa nçã de temp d agra, e n que se distancia?

b) Arte e indústria culturalSe prfessr preferir nã mutipicar as mediações, pderá

recrrer namente às imagens de Warh já trabahadas e temati-zar a questã da mutipicidade de imagens (as árias garrafas decca-ca, as árias faces das atrizes). Pderá, ainda, retmar mesu músicas já ists e tratá-s pr essa utra abrdagem.

Seria interessante er trechs de Adrn u de Benjamin, mas

são autores bastante herméticos. Para abordá-los, o professor poderárecrrer namente à expicaçã de Benedit Nunes em sua Intro-dução á Filosoa da Arte , end-a cm s auns. outr materia deapi a ser utiizad é ir de veraine Freitas,  Adorno & a artecontemporânea , pis se trata de um cmentári didátic da saadorniana que traz alguns trechos selecionados da obra do autor.

Mas só dcente cnhece a dinmica de sua saa de aua. Sefor possível, em trechos ou recortes, ler os autores mesmos seria

 bastante recomendável.

Cm materia audiisua, pdems sugerir cássic brasiei-ro O Bandido da luz vermelha (diretr Rgéri Sganzera, Brasi, 1968),cuja narratia aucinatória e fragmentária, pautada pe nticiáride rádio e pelos letreiros de rua, critica a percepção de mundo deuma determinada classe social urbana.

Se, pr m, prfessr quiser trazer utras abrdagens, rec-mendams a eitura d § 370 de A Gaia Ciência de Nietzsche (NIET-ZSCHE, 1978, p. 220-222), n qua autr trata de respnder àpergunta: o que é rmantism?, e neste sentid faz uma crítica à

arte como fuga da vida e uma exaltação das possibilidades vitalistasda obra artística.

Referências

a) Referências citadas no texto

A seguir as edições dos textos sugeridos nas análises. Cada umdestes já fi cmentad anterirmente, a ng da expsiçã. Cmno caso de todo clássico, existe mais de uma tradução de várias dasobras citadas, e múltiplas edições. Procuramos citar as traduções de

fácil acesso e conceituadas.

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No caso das edições da coleção Os Pensadores , indispensávelpara nós, citams a ds ans de 1970, mas há árias utras maisrecentes.

ADoRNo, T. Indústria Cultural e sociedade. Traduçã Júia Eisabeth ley et a.Sã Pau: Paz e Terra, 2002.

______; HoRKHEIMER, M. Dialética do esclarecimento. Traduçã Guid Antni

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ARISTÓTElES. Arte Retórica e Arte Poética. Traduçã Antni Pint de Carah.

Sã Pau: Difusã Eurpéia d lir, 1964.

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S

Ainda hje, mehr resum gera ds aspects estétics e sócs é de: 

NUNES, B. Introdução à Filosoa da Arte. Sã Pau: Ática, 1989.

Há muits materiais de api, cm s da ceçã pass-a-pass da Zahar. Citamsno texto o de:

FREITAS, v. Adorno & a arte contemporânea. Ri de Janeir: Zahar, 2003.

Este ir já dá utras indicações sbre iteratura de api e traz uma pequenaseleção de textos.

S

Seguem abaix aguns irs que nã sã exatamente de estética , já que s textsprpriamente sócs fram cmentads durante a Exposição geral , achamos

que seria de interesse complementar as informações apontando para outros cami-nhos interdisciplinares.

N Brasi, é impssíe esquecer a imprtncia da música ppuar cm aguti-nadra de sentids; pr iss, indicams as prfessres aguns títus tant sbremúsica erudita, quanto sobre música popular brasileira.

BENNETT, R. Uma breve história da música. Traduçã Teresa Resende Csta. Ride Janeir: Zahar, 1986.

CARPEAUX, o. M. Uma Nova História da Música. 2. ed. Sã Pau: Ediur, 1968.

FAvARETTo, C. Tropicália. Alegoria, alegria. 4. ed. Sã Pau: Ateiê, 2007.

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WISNIK, J. M. O som e o sentido: uma utra história da música. Sã Pau: Ciadas letras, 2006.

Para cnsuta cm reaçã às artes isuais, indicams:

ARGAN, G. C. Arte Moderna: d Iuminism as miments cntemprnes.Traduçã Denise Bmann e Frederic Cari. Sã Pau: Cmpanhia das letras,1992.

BÜRGER, P. Teoria da vanguarda. Traduçã Jsé Pedr Antunes. Sã Pau: Csac& Naify, 2008.

CHIPP, H. B. et al. Teorias da Arte Moderna. Traduçã Watensir Dutra. Sã Pau:Martins Fntes, 1988.

FABRINI, R. A. A arte depois das vanguardas. Campinas: Unicamp, 2002.

Sugerims também as cetneas:

lICHTENSTEIN, J. (org). A Pintura. Texts essenciais. Sã Pau: Editra 34,

2004. 14 .os umes trazem áris excerts eschids de texts que ã da tradiçã só-ca a críticas cntemprneas. os temas tratads ersam sbre mimese, be, entreutrs. Cm s texts sã curts, pdem ser usads em saa de aua.

Para pensar a literatura universal, o professor pode recorrer a:

AUERBACH, E. Mimeses: A representação da realidade na literatura ocidental.Traduçã Gerge Sperber. 2. ed. Sã Pau: Perspectia, 1987.

N cas da iteratura brasieira (e em certa medida, também d teatr) sugerims:

BoSI, A. História Concisa da Literatura Brasileira. 42. ed. Sã Pau: Cutrix, 2001.

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 Apresentação do tema e de sua pertinência

o cnheciment cientíc, sbretud a partir d sécu XvII, mu-du radicamente nssa cncepçã d mund. Durante muit temp, hmem supôs estar n centr de um mund nit e reatiamentepequeno, mas o avanço da física e da astronomia deu-nos consciênciada vastidão do universo e do rincão remoto em que se localiza o pla-neta Terra. Aém diss, hmem supunha ser uma criatura de pucmais de quatro mil anos, que não havia evoluído historicamente, quenã pertencia integramente à natureza e que esta tinha sid feitapara ee. Mas deseniment da bigia e da genética permitiuentender a evolução da vida, bem como a seleção e transmissão dascaracterísticas das espécies, o que nos possibilitou entender melhornossa origem e lugar no mundo natural. A antropologia e a histó-ria também ns ajudaram a dimensinar mehr nssa sciedade ncontexto das formas humanas de vida e a psicanálise mostrou demaneira ainda mais evidente a complexidade de nossas vidas mentais

e a fragilidade do controle que temos sobre nós mesmos.A ciência moderna também alterou nossas próprias vidas, pois,

diferentemente da antiga, não se propunha apenas a contemplar ecmpreender a natureza, mas também pretendia interir nea a mde melhorar nossa condição de vida, isto é, o conhecimento deveria

Capítulo 7 

Teoria do conhecimento

e losoa da ciência:conhecimento como crença verdadeira

 justicada Plínio Junqueira Smith* 

* Pssui graduaçã em Fisa pea Uniersidade de Sã Pau (1986), dut-rad em Fisa pea Uniersidade de Sã Pau (1991) e pós-dutrad naUniersidade de oxfrd (1997). Prfessr adjunt da Uniersidade Federa deSã Pau (UNIFESP).

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gerar a capacidade de cntrar s fenômens naturais prduzind benefícis. Uma das principais razões para esse prjet era a mrteprematura pr denças. o deseniment da medicina, em par-ticular a descoberta de vacinas e antibióticos, de fato permitiu que

a expectativa de vida aumentasse muito. Assim, a ciência modernafoi concebida como uma forma de dominação da natureza. Por isso,seu desenvolvimento foi acompanhado da produção de tecnologias,cuj impact sbre a sciedade é gigantesc. Basta pensar n usde computadores, da internet e o que a eletricidade, de um modogeral, nos permitiu fazer, como preservar alimentos na geladeira etda a ida nturna cm sua iuminaçã articia. Nã é exagerdizer que praticamente tudo o que fazemos depende de produtostecnógics e cientícs.

No entanto, cabe perguntar até que ponto as ciências cumprem prmetid. Uma cisa é dizer que nssas idas fram radicamentetransformadas pela ciência e tecnologia e outra muito diferente é dizerque por causa delas vivemos melhor. Alguns exemplos triviais, comoa fabricação de bombas e armamentos militares, mostram que elaspdem ser muit ncias. A tecngia prduziu carrs, ônibus e ca-minhões, os quais, embora tenham facilitado o transporte e diminuídoas distncias, prduzem muita puiçã n ar e causam muitas mrtesem acidentes. Nem mesmo a medicina sempre trouxe benefícios. Háquem pense que us de antibiótics cause dans a rganism (que

deveria aprender a reagir sozinho em muitos casos ou deveríamosrecrrer a utr tip de medicina) e que abus desses remédis temcausado um fortalecimento desnecessário e maior resistência das bac-térias a trataments. o que aguns argumentam, entã, é que prjetde dominar a natureza acabou por produzir uma natureza ainda maishostil ao homem, como se esta se vingasse do homem.

A situaçã taez seja pir d que parece. A tentatia de d-minação da natureza pode resultar na sua destruição, o que seriauma catástrofe, pois nossas vidas somente podem transcorrer em

seu mei. Uma ba quaidade de ida pressupõe uma integraçãadequada a mei ambiente. A deastaçã das restas é cas maisóbi da agressã humana. Um exemp decrrente ds aançstecnógics é das energias puentes. Em pequena escaa, umaenergia poluente, como o carvão e o petróleo, parece trazer maisantagens. N entant, em arga escaa, taez crra iners. ocresciment ecnômic impusinad pea descberta dessas ener-gias sujas eu a uma mair demanda de energia. Assim, prbe-ma energético é fruto, ao menos em parte, da sociedade baseada na

ciência. os efeits pererss e inesperads ds aançs tecnógics

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põem em xeque a capacidade de a ciência cumprir o que prometia.Se, n curt praz, trazem inegáeis antagens, n ng praz aciência e a tecngia taez sejam prejudiciais.

A integraçã da ciência cm a sciedade cntemprnea é tã

íntima que não se pode pensá-la como se fosse algo neutro e indepen-dente. Ao contrário, para avaliar adequadamente seu papel, é precisoear em cnta s ares que nrteiam nssas idas. vejams maisum exemp. Graças as cnheciments cientícs, deseneu-seuma técnica para produzir alimentos transgênicos, permitindo au-mentar a prduçã de aiments e cmbater a fme. De utr ad,a puiçã d camp gerada pes agrtóxics (prduts da ciência)exige us de transgênics, já que pantas nã mdicadas nã têmfrça para resistir a pragas mais frtes (subprduts da ciência, piss agrtóxics eiminaram as mais fracas, seecinand-as). Aém dis-so, não se sabe bem qual é o impacto dos transgênicos no meio am-

 biente. o que signica uma ida (geneticamente mdicada) que nãé capaz de se reprduzir? Qua impact para pequen agricutrque não pode mais reproduzir uma espécie e precisa comprar semen-tes geneticamente mdicadas tds s ans? Dee um mnpóideter cntre de espécies mdicadas? A ciência, entã, é cupadae deeria ser abandnada? Essa cncusã parece precipitada, piscabe à própria ciência dimensinar impact ds transgênics nmeio ambiente e somente quem entende de genética poderá avaliar

aspects cruciais d prbema. Mas nã cabe smente à ciência decidir que fazer. Muits interesses estã em jg, nã smente ecnômics,mas também cm desejams rganizar nssa sciedade e que tipde alimento queremos produzir e consumir.

A inseparabilidade da ciência e dos valores se revela em outrasquestões que nos tocam de perto e surgiram mais recentemente,graças à ciência e tecngia, cm reprduçã assistida e us decélulas-tronco para desenvolver novas técnicas de cura. Algumasquestões mais antigas, como aborto e eutanásia, ganham nova di-

mensã à uz das técnicas mais recentes, pr exemp, em funçãd diagnóstic de denças graíssimas já n fet e de prgnósticsmais seguros de certas enfermidades que nos acometem.

Em suma, a ciência e a tecngia permeiam tda a nssa s-ciedade, mas seus benefícios e malefícios não estão inteiramenteclaros. Ao mesmo tempo em que resolvem alguns problemas, elasccam-ns utrs, cujas suções dependem, a mens em parte,de mais cnheciments cientícs e de uma crreta aaiaçã dpapel que a ciência exerce em nossa sociedade. A esse respeito,

a ciência nã é neutra, já que muits interesses estã em jg. A

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discussão sobre ciências e valores é muito complexa, mas dela nãopodemos nos esquivar.

De fat, a precupaçã fisófica cm cnheciment é tãantiga quant a própria sa e, desde ced, cupu um ugar

de destaque. A sa nasceu, em parte, da busca de um cnheci-ment mais rigrs sbre as cisas. Enquant certas artes, cma agricutura e naegaçã, tinham uma naidade mais prática use imitaam a cnhecer agumas cisas particuares, a sa seprpunha um cnheciment mais gera e que dissesse respeit àessência das cisas. Assim, s ósfs distinguiram, desde Patã,entre a mera piniã u crença, que estaria sujeita a err, e c-nheciment prpriamente dit, que seria etern. Prtant, prjetda sa fi prduzir um cnheciment uniersa e infaíe.

Essas reexões sbre cnheciment integraam-se num cn- junt mais amp d pensament de um autr. Fiósfs cm Patãe Aristótees egaram para a tradiçã uma rigrsa deniçã. Umadeniçã que deeria expicitar a essência d própri cnhecimente da ciência. o cnheciment deeria partir de princípis que fs-sem evidentes por si mesmos, impondo-se a nós somente pela suaconsideração, e deveria proceder de modo dedutivo, para não darmargem a err. Smente que entrasse nesse esquema dedutiseria cnsiderad um cnheciment genuín. Generaizações ucnjecturas nã passariam de piniões sujeitas a err e, prtant,

seriam meras crenças.Psterirmente, quand se acirru debate entre duas sas

helenísticas, o estoicismo e o ceticismo, a teoria do conhecimentoganhu autnmia, cnstituind-se cm uma área bem denidae atamente especiaizada da sa. o debate giru em trn dcritério de verdade. Um critéri de erdade é que permite separar,com segurança, a verdade da falsidade. Por que o debate acercadesse critéri ccu a teria d cnheciment n centr da -sa? Nesta, sempre há piniões diferentes e é precis ptar pr

uma deas cm a erdadeira, é precis que sejams capazes deseparar a sa erdadeira das fasas. ora, a parte da sa quediscute qua é esse critéri é justamente a teria d cnheciment.Portanto, se primeiro precisamos dispor de um critério de verdadepara depis apicá- nas demais áreas da sa, entã a sadeve começar pela teoria do conhecimento.

N cmeç da sa mderna, graças a desenimentda ciência experimenta e à retmada das sas heenísticas, ateria d cnheciment tu a cupar um ugar centra na sa.

Fiósfs cm Bacn, Descartes e lcke, entre utrs, entenderam

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que se fazia necessária uma crítica da concepção aristotélica de ciên-cia, que dominava em sua época, e encontraram no ceticismo armasprecisas para a demiçã d aristteism. Aém diss, esses ó-sfs jugaram que surgiment da ciência mderna exigia nsmétodos e outra concepção de saber. Propuseram, então, cada umà sua maneira, terias sbre a natureza, rigem e acance d cnhe-ciment. Um aspect crucia fi ugar atribuíd à experimentaçãe pape da reexã n edifíci da ciência.

Desde entã, a teria d cnheciment e a sa da ciência jamais perderam sua especicidade e seu ugar destacad na s-a. Dada a imprtncia histórica da ciência mderna e impact daciência e tecnologia em nossas vidas, é natural que isso tenha ocor-rid. Assim, na frmaçã sóca, um bm dmíni da teria dcnheciment e da sa da ciência é ag indispensáe. Mesm

para quem nã pretende seguir a carreira de sa, mas se inte-ressa pelas ciências em geral ou por muitas das questões atuais denossa sociedade que envolvem as ciências, o estudo dessa parte dasa é atamente desejáe. Uma ba frmaçã d Ensin Médiexige que o aluno tenha uma noção razoável do que é conhecimento,em particuar cnheciment cientíc, de sua dimensã históricae de sua imprtncia na sciedade cntemprnea.

Exposição geral do tema

Supms, naturamente, que tems uma série de cnheciments,não somente aqueles conhecimentos da vida cotidiana, mas tambémaquees cntids nas mais ariadas ciências. Mas que é cnheci-ment? Ninguém tem prbemas em usar crretamente as paarasconhecimento ou saber , mas, quand tentams deni-as, caíms numasérie de dicudades. Uma das tarefas d epistemóg é, justamen-te, denir cnheciment, indicar sua natureza, traçar seus imites.Desde Sócrates, s ósfs buscam denir certs cnceits básics e,no diálogo Teeteto , Platão formula explicitamente a pergunta O que é

conhecimento?. Recentemente, um métd para escarecer signicaddesses cnceits, defendid pr ósfs cm Wigenstein, Rye eAustin, é examinar seus usos na linguagem ordinária.

Eis aguns uss de saber ou conhecer: saber o melhor caminhopara a A. Pauista, saber jgar tênis, saber que hue entre Pau eHelena, saber o resultado de 37 vezes 56 , conhecer a cidade, conhecerParis, saber que Paris é a capita da França, saber que a frase “Paris éa capita da França” é erdadeira, saber que átm é cmpst deeétrns, prótns e nêutrns. Esses pucs exemps já mstram que

não temos um único sentido em que falamos usualmente de saber.

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Uma tentatia de simpicar esses dierss uss é a seguinte. Háum uso de saber que corresponde a uma capacidade ou habilidade(“Sei jgar tênis”, “Sei tcar pian”). Trata-se de um saber fazer. Umsegundo uso é quando o verbo conhecer pede um bjet diret cm

cmpement (“Cnheç Pau”, “Cnheç Paris”). Cnhecems agquand tiems cntat cm que é cnhecid. Um terceir us, epara nós o mais importante, ocorre quando o verbo pede uma oraçãosubrdinada: “vcê sabia que Paulo se casou com Helena?” “Eu sei queParis é a capital da França”. Trata-se de um cnheciment prpsicina:o que é conhecido está expresso numa frase ou proposição.

Quando está interessado em entender o conhecimento, o epis-temólogo tem em vista o terceiro sentido de conhecimento mencio-nad acima. Se ns restringirms a esse us de conhecer , taez sejamens difíci aançar na direçã de uma deniçã satisfatória deconhecimento. Algumas observações simples podem nos levar a umadeniçã bastante razáe e ampamente difundida de cnheci-ment, que identica três eements fundamentais. Segund essadeniçã, cnheciment é uma crença verdadeira justicada. Antesde examinarms cada parte dessa deniçã, cabe entender pr queessa deniçã fi prpsta pr muits ósfs.

Primeiro, é preciso que a pessoa creia naquilo que ela diz oupensa. Pr exemp, se aguém diz que “A bataha de Hastingscrreu em 1066”, nós smente direms que ea sabe que arma

se ela acreditar n que está dizend. Supnha, pr exemp, que eaesteja smente end essa frase num text para uma peça de teatr,mas ela não tem nenhum conhecimento de história e pense que essa

 batalha é pura invenção do autor da peça. Nesse caso, não diremosque ea sabe quand crreu a bataha de Hastings. Crer n que estásendo expresso pela frase é uma condição necessária para atribuir aalguém um conhecimento.

Naturalmente, não basta que alguém creia no que diz para quesaiba ag. Ana, nssas crenças pdem ser fasas e uma crença fasa

nunca é cnheciment. De fat, aguém pde crer que Estcmé a capita da Suíça, mas nã se segue que essa pessa saiba iss,pea única razã de que Estcm nã é a capita da Suíça, masda Suécia. Para que pssams atribuir cnheciment a aguém, éprecis que a crença dessa pessa seja verdadeira.

Essas duas cndições ainda nã sã sucientes para denir co-nhecimento. E a razã para iss é a de que uma pessa pde armaruma erdade pr acas. Supnha que uma pessa creia que existeida em Marte e que, de fat, existam marcians. Ainda assim, nã

direms que ea sabe que há ida em Marte, pis é precis que

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entre sua crença e o fato que a torna verdadeira se estabeleça umvínculo seguro. A maneira tradicional de entender esse vínculo éque a pessoa que tem a crença deve ser capaz de dar uma boa razão para ela, deve ser capaz de justicá-la adequadamente.

Portanto, dizemos que uma pessoa sabe alguma coisa quandoea cumpre essas três cndições: a) ea precisa crer n que diz (upensa); b) sua crença tem que ser erdadeira; c) ea precisa ser capazde dar uma ba razã u de justicar a sua crença. Assim, chega-ms à deniçã d tip de cnheciment em que epistemógestá interessad: cnheciment é crença erdadeira justicada. Adeniçã parece satisfatória, pis enumera cndições necessárias esucientes para atribuir cnheciment e nã repete, na deniçã, term a ser denid.

N entant, ns desas sã intrduzids pr ea, pis agratemos de entender três outros termos: crença , verdade e  justicação.Aém diss, é precis examinar se a deniçã é ba. Patã, n diá-logo citado, considerou uma resposta similar a essa. Numa certaatura desse diág, Teetet diz que cnheciment é “percepçãerdadeira acmpanhada de um discurs”. Esse discurs é, natu-ramente, uma justicaçã; e a percepçã, embra nã seja prpria-mente uma crença, cupa um pape simiar a da crença. Mas Patãrejeita essa deniçã. Prcedams, pis, a uma anáise e discussãde cada um desses elementos.

o que é crença? Muitas denições fram prpstas. Duas abr-dagens são mais comuns. Primeiro, uma abordagem mentalista: acrença seria uma atitude menta diante de uma prpsiçã. Dadauma proposição p, a mente poderia adotar posturas muito diferentes,cm duidar de p, armar p, supr p, desejar u temer que p crrae assim por diante. A mente também pode crer que p é verdadeira.Segund, uma abrdagem cmprtamentaista. Crer que p é erda-deira equiaeria a armar p u, mais precisamente, estar dispst aassentir a p quand perguntad se p é erdadeira. o cmprtament

de uma pessa reearia quais sã suas crenças. Crer seria uma dis-posição da pessoa a se comportar de certas maneiras.Aguns ósfs, n entant, questinaram a ideia de que c-

nheciment seria um tip de crença. Duas sã as razões para rejeitaressa ideia. Primeir, cnheciment nã é subjeti, mas bjeti.Aguns ósfs criticaram que se chamu de cncepçã subjetiad cnheciment. o cnheciment seria, de acrd cm a cncep-çã subjetia, um estad menta (u dispsicina) das pessas. Aessa isã, Ppper põe uma cncepçã bjetia d cnheciment.

Para esta visão, o conhecimento deve ser analisado em termos dos

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enunciads em que as terias e as hipóteses sã frmuadas. Um ir,n qua se expõe uma teria cientíca, cntém cnheciments; se tdaa humanidade morresse, mas as bibliotecas continuassem a existir, ocnheciment cntinuaria a existir. o cnheciment cntid em uma

 bibiteca nã depende de sujeits que creiam n que está cntidns irs. Haeria, assim, uma bjetiidade d cnheciment.Cnheciment e crença, prtant, seriam categrias distintas. A-

gumas diferenças entre conhecimento e crença podem ser apontadas.Enquant saber depende de um fat bjeti, a crença dependede um estad intern. A erdade de “Fuan crê que p” dependesmente d que essa pessa pensa u está dispsta a armar, masa erdade de “Fuan sabe que p” depende da erdade de p. ora, aerdade de p é ag bjeti, e nã subjeti. Sua armaçã é irre-eante e é precis estabeecer bjetiamente a erdade de p. Aémdisso, parece uma condição inevitável para atribuir a alguém que elesabe aguma cisa, que ee nã pssa estar errad. E essencia danoção de crença é precisamente o reconhecimento da possibilidadede se estar errad. Crer em aguma cisa impica admitir que erré pssíe. Mas, quand sabems aguma cisa, err nã pdesurgir. É por isso que, quanto ao futuro, nada podemos saber, poissempre pdems estar errads a seu respeit. Mas, cm reaçã apresente e a passad, às ezes err acha-se excuíd.

Este útim pnt eu s ósfs a distinguirem, desde Pa-

tã, entre cnheciment (epistéme) e crença (dóxa). A sa sempre buscu erdades seguras e eternas que nã estiessem sujeitas àreisã. As crenças, pr sua ez, sempre estariam sujeitas à crre-ção e melhoria, não sendo, propriamente falando, conhecimento.Percebe-se uma das razões peas quais Patã nã aceitu a deniçãde conhecimento como uma espécie de percepção: pertencendo aodomínio do mundo sensível e mutável, a percepção, no melhor doscass, permitiria uma crença sbre mund, jamais um cnheci-mento. Para Platão, o conhecimento pertence ao domínio da razão

(lógos). Se aceitarms, prtant, que cnheciment é um tip decrença, entã terems abandnad a pretensã tradicina da -sa. É que ach que se prpõe quand se dene cnhecimentcm um tip de crença. Existem erdades eternas?

Passems, entã, a cnceit de erdade. Sã ntórias as cntr-érsias acerca da mehr deniçã de erdade. Primeir, a erdadefoi definida como correspondência entre o que dizemos e comoas cisas sã. Aristótees já indicu caramente que seria essacorrespondência: verdadeiro é dizer, das coisas que são, que são,

e das que nã sã, que nã sã; fas é dizer, das que sã, que nã

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sã, e das que nã sã, que sã. Assim: dizer “ ir é branc”, deum ir branc, é erdadeir; dizer “ ir nã é branc”, de umir que nã é branc, também é erdadeir. E dizer “ ir nã é

 branc”, de um ir branc, é fas; e “ ir é azu”, de um ir

que não é azul, é falso.Uma dicudade dessa cncepçã da erdade é a cmparaçã en-tre um fat e uma prpsiçã. Cm um fat pderia crrespnder auma prpsiçã? As respstas tendem a eabrar uma isã metafísicad mund. Pr exemp, fazems crrespnder à nçã gramaticade sujeit a nçã metafísica de substncia, e à nçã gramaticade predicado a noção metafísica de propriedade, como se houvesseuma mesma estrutura entre nssa inguagem e mund. Supr esseismrsm estrutura, prssegue a crítica, nada mais seria d que aprjeçã da gramática sbre mund. outra dicudade é a de que fat deeria serir de justicaçã para a erdade da armaçã, masuma razão para aceitar uma proposição é sempre outra proposição,nunca um fato. Nesta concepção da verdade, haveria como que umerr sbre tip de cisa que sere para justicar uma prpsiçã.

Esta útima crítica mtiu uma segunda cncepçã de erdade.A erdade seria a cerência d cnjunt de nssas crenças, e nã acorrespondência delas com o mundo. Quanto mais abrangente e co-erente for o nosso sistema de crenças, tanto melhor conheceremos omund. Uma dicudade óbia é que sistemas cerentes de crenças

podem ser contraditórios entre si, mas não podem ser ambos verda-deirs a mesm temp, já que a erdade de um impica a fasidaded utr. (Para defender a teria cerentista, seria precis mstrar quedis sistemas abrangentes de crenças sã cmpatíeis entre si.) Aémdisso, nesta concepção, a experiência seria somente a causa de nossascrenças, mas nã sua justicaçã. Mas é car que a experiência parecedesempenhar um papel mais importante para nossas crenças do que de causa. Reduzir a reaçã da experiência cm nssas crenças er-dadeiras a uma relação causal parece retirar da experiência o controle

racional de nossas crenças que a experiência inegavelmente tem.Uma terceira cncepçã de erdade é a pragmática. Em inhasgerais, seria verdadeiro aquilo que tende a promover nossa sobre-iência n mund. Essa cncepçã fi criticada pr árias razões,cm a de que uma crença fasa pde ser úti. Também se ntuque essa cncepçã nã apresenta prpriamente uma deniçã deerdade, mas smente ressata seu pape em nssas idas. Umaquarta ertente para denir a erdade é chamada de deacinista.Uma ersã é a teria da redundncia: dizer que “p é erdadeira” é

a mesma cisa que armar p; prtant, predicad “é erdadeir”

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   C   o    l   e   ç    ã   o   E

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nã acrescenta nada. outra ersã é a teria de que predicad “éerdadeir” é smente um expediente para tirar as aspas que encer-ram uma prpsiçã: a prpsiçã “a nee é branca” é erdadeira see smente se a nee é branca. A meu er, estas terias deacinistas

sã equiaentes à teria crrespndenciaista sem a expicaçã me-tafísica adicional de como ocorreria a correspondência.vims que a funçã da justicaçã na deniçã de cnheciment é

frnecer um íncu entre a crença subjetia e fat bjeti que a tr-na erdadeira. Uma justicaçã, pr sua ez, é ag intersubjeti. Seuma pessa arma p e perguntams pr que ea arma p, ea dee nsferecer uma ba razã para armar p. o que cnta cm uma “barazã” depende ds intercutres e d cntext da discussã. o ques ósfs querem, quand tentam entender pape da justicaçãn cnheciment, é uma justicaçã que garanta infaiemente a er-dade da crença. Ana, “se sei, nã pss estar errad” e a justicaçãteria precisamente pape de garantir que “nã pss estar errad”.A “ba razã”, n entender desses ósfs, dee ser cncusia, isté, dee afastar denitiamente a pssibiidade d err.

Mas há dicudades para estabeecer esse íncu infaíe entrenossas crenças e o mundo. Há casos em que podemos ter uma crençaverdadeira e, mesmo baseando-nos num discurso convincente, nãodizems que tems cnheciment. Iss se dee a fat de que as in-frmações dispníeis, embra ns eem à cncusã certa a respeit

de uma dada situaçã, eam-ns pr acas à cncusã certa. Patã já tinha eantad esse pnt, a imaginar uma situaçã jurídica, naqua adgad cnence júri da erdade de uma piniã e júriaceita a cncusã; adgad cnence júri pr razões que nãsão conclusivas, mas, dotado de uma retórica brilhante, acaba porimpr sua piniã. Nesse cas, júri chegu a uma crença erdadeira,acompanhada de um discurso convincente, mas que, de fato, não es-tabeecia a sua erdade. Nem sempre nssas justicatias garantirãdenitiamente que ta cisa de fat crre; entre que cnsiderams

uma pra e fat bjeti pde haer um hiat.Se quiserms uma justicatia absuta, que garanta infaie-mente a erdade de uma crença, entã taez nã pssams justicarnenhuma crença. E se nã pdems justicar nada, entã nã temscnheciment agum. leantu-se, há muit temp, um pdersdesa para uma justicatia desse tip. Supnha que tenhamsuma crença C. Essa crença pde ser bjet de cntrérsia, ist é,aguém pderia negar C. Na medida em que há cntrérsia, é pre-cis que se justique a aceitaçã de C. Pdems justicar C, a partir

de utra crença, digams D. Mas pde-se perguntar, namente: pr

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que armar, e nã negar, D? Pde-se, entã, respnder que se aceitaD pr causa de E. ora, mas namente se cca a questã: pr queaceitar, e nã negar, E? Percebe-se facimente que esse prcess nãtem m e, prtant, a crença inicia C nã está justicada.

Uma aparente suçã é parar em agum ugar e dizer que tacrença (digams, a crença E) é eidente pr si mesma e nã precisaser justicada. Adta-se, assim, sem justicaçã a crença E cmpnt de partida para a justicaçã de D e C. N entant, esse é umprcediment arbitrári: pr que aceitar E sem justicaçã? Aguémpderia negar E e, cas he pedíssems uma justicaçã, ee pde-ria iguamente recusar-se a dar essa justicaçã, aegand que ~E éevidente. É, portanto, inteiramente arbitrário e fortuito aceitar ounegar E. Ademais, se aceitarms arbitrariamente uma crença, paraserir de base para td edifíci das justicações, pr que já nãaceitar arbitrariamente, desde princípi, C?

outra tentatia seria, pr exemp, justicar E a partir de C. Nes-se cas, nã cairíams numa regressã a innit, nem aceitaríamsarbitrariamente uma crença. Entretant, justicar C a partir de D,D a partir de E e E a partir de D é um racicíni circuar. ora, uma

 justicaçã circuar nã é, prpriamente faand, uma justicaçã. Nna das cntas, tud que se cnsegue cm esse racicíni circuar ésupr C para justicar C. Mas C era justamente que estaa em ques-tã! Nã se pde supr pnt em cntrérsia para justicá-.

Parece, entretant, que tda justicaçã que pretenda garantirinfalivelmente a verdade de uma crença ou leva a uma regressãoa innit, u a uma adçã arbitrária de uma hipótese, u a umracicíni circuar. Se esse é cas, entã nã há nenhuma justi-cação no sentido pretendido. A conclusão se impõe por si mesma:se pretendems que a justicaçã dea ser absuta e garantir demaneira infalível o vínculo entre a crença verdadeira e a realidade,entã nã tems nenhum cnheciment. Enfrentar esse desa éuma das tarefas dos epistemólogos.

Estratégias de abordagem

Há diversas maneiras para tratar de alguns dos principais te-mas de teria d cnheciment e sa da ciência. Crei que uma

 boa maneira de começar, para envolver os alunos e para que elespercebam sentid e a dicudade da sa, é dar-hes a tarefade denir e expicar aguns cnceits básics, cm conhecimento everdade. Em ez de deixá-s passiamente receber infrmações para

smente depis pensarem pr cnta própria, taez seja mehr partir

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imediatamente de uma reexã dirigida, prpnd-hes questões ediscutind suas respstas. Pr exemp, prpõe-se a questã “o queé cnheciment?”. Após dar um temp para s auns respnderem,o professor escreve algumas de suas respostas na lousa, pedindo queees expiquem e justiquem suas prpstas, passand a discuti-ase, namente, apresentand agumas respstas dadas pr ósfs.Se a estratégia der bm resutad, pde ser repetida mais uma ezcm “o que é erdade?” u “o que é justicaçã?”. A naidadedesse tipo de atividade é a de fazer o aluno pensar, isto é, conceberuma ideia, ser capaz de explicá-la, defendê-la argumentativamente,e entender e discutir ideias diferentes. outr bjeti é mstraruma parte imprtante da sa: a anáise cnceitua; esta incui exame ds uss das paaras e a busca de uma deniçã adequada.o aun dee perceber que é indispensáe ter careza n discurs e

que a sa se dedica a escarecer certs cnceits fundamentais.Essa atiidade sere também para mtiar aun a er um textsóc e perceber de maneira mais cara sentid da precupaçãsóca cm tema d cnheciment e suas ramicações.

Uma segunda estratégia é trabahar cm agum text curt, mas bem escolhido, e analisá-lo lenta e minuciosamente com o aluno. Pri-meir, prfessr dee enfatizar a especicidade d text sóc.Cada tip de text exige d eitr um tip de eitura, prque cada tipde texto é composto de uma maneira particular e, para compreender

o que o texto diz, o leitor deve saber como foi composto. Assim, porexemp, um text de jrna tem manchete, subtítu, ft cm egen-da e a informação propriamente dita, que deve começar com as ideiasmais imprtantes até as mens imprtantes (car, prque ninguémê tdas as ntícias até na; entã, é precis faciitar para eitr erganizar as ideias em funçã de sua imprtncia). Um pema be-dece outra forma de composição: métrica, rima, aliteração e outrosrecurss estétics cm metáfra e metnímia. Um text cientícterá ainda outras regras que dirigem sua composição: uma revisão da

 bibigraa, a indicaçã de uma hipótese de trabah, a descriçã deum experiment e de estatísticas, uma cncusã, bibigraa na.Também text sóc tem suas regras. Em gera, um text só-c defende uma tese (e critica utras teses) pr mei de arguments.o prfessr dee fcaizar esses dis aspects de um text sóc: aidenticaçã da psiçã defendida (e da psiçã criticada) pe autre a correta compreensão dos argumentos a favor e contra.

Pode-se propor um trabalho interdisciplinar com o profes-sor de literatura, tratando de gêneros literários. Nesse sentido,ae a pena mstrar a aun que s ósfs eschem diferentes

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gêneros literários para expor e defender suas ideias, como a formad diág, tratad, ensais, autbigraas, afrisms e, mesm,a poesia e a literatura.

Em seguida, prfessr dee passar à prática da anáise de umtext sóc. Num primeir mment, é precis deixar aunenfrentar text e tentar entendê- szinh. Ee naturamente sentirádicudades em identicar a ideia principa d text e praementenã cmpreenderá argument. Cabe, entã, a prfessr ajudá- aentender text. Mas, antes de dar sua expicaçã a aun, cnémfazer aun tentar expicá-. Uma estratégia é a seguinte. Pedir aaun que enumere s parágrafs e diida text em partes (se texto for muito curto, pedir ao aluno para enumerar as frases e dividir parágraf em partes); para cada parte, ee deerá dar um títu queexpresse a ideia principa daquea parte. Cm na estratégia anterir,

o professor deverá colocar na lousa algumas das análises propos-tas pelos alunos e, discutindo seus méritos e problemas, avançar nadireçã de uma crreta cmpreensã d text. o prfessr deeráconcluir com uma explicação adequada do texto. Nesta explicação, oprofessor deverá mostrar como a ideia principal é desenvolvida pelasvárias partes e como as várias partes se articulam para sustentar aideia principa. Finamente, s auns deerã reer text mais umavez, com o intuito de sentir que o exercício de leitura e a estratégia deanálise de um texto aumentam a sua capacidade de compreensão.

Também é interessante, cm estratégia aternatia, trabaharcom alguns textos de literatura. Por exemplo, para discutir o papel daexperiência n cnheciment, irs piciais sã muit bns. Cmum detetie chega à cncusã de que fuan é crimins? Hádeteties que buscam muitas pras e indícis antes de terizarem;para esses detetives, a experiência vem antes do conhecimento e teo-rias prematuras mais atrapaham d que ajudam. outrs, entretant,reetem muit antes de inestigarem e agirem, pis a bseraçãdesorientada por uma teoria é perda de tempo e não leva a nada.

Uma quarta estratégia é estudar um puc da história da ci-ência, pois a filosofia da ciência pressupõe o conhecimento dasciências. Essa estratégia tem a antagem de permitir um trabahinterdisciplinar. Por exemplo, com o professor de física, quando esteestier ensinand mecnica cássica. o prfessr de fisfia pdetrabahar aguns trechs das bras de Gaieu e de Descartes, prexemp. Pde-se ainda recrrer à famsa peça de Bertd Brecht,grande dramaturg aemã, sbre a ida de Gaieu, u a fimede Rsseini sbre Descartes u a fime sbre Girdan Brun.Esse trabah interdiscipinar ajuda a trnar a física ainda mais

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interessante, pis mstra seus pressupsts e cnsequências sócas,assim cm a dicudade que histricamente se tee para que certaconcepção de ciência se impusesse ao pensamento ocidental.

outra estratégia pssíe que permite a interdiscipinaridade, destaez cm a bigia, é a ciência cntemprnea e s aançs tecnógi-cs. Um tópic muit imprtante é a reaçã entre ciência e ares. P-de-se discutir, por exemplo, a questão dos transgênicos e a reproduçãoassistida. Artigs de jrna discutind esses assunts, ns quais existauma argumentaçã a far (e cntra) as psições enidas sã mui-t úteis. Também se pde recrrer as irs de Putnam e lacey, quetratam desses assuntos. Pode-se optar, ainda, por uma discussão maisampa sbre dmíni da natureza prprcinad pea ciência. obrascássicas de cçã cientíca sã ótimas para discutir esse tema.

Finamente, um tema cássic da teria d cnheciment é

assim chamad prbema d mund exterir. Esse é um tema quecstuma fascinar muits auns. Trata-se d prbema da percep-çã e de cm cnhecems mund à nssa ta. Neste cas, épssíe cmbinar a eitura de texts sócs u iteráris cmmes recentes muit cnhecids e de fáci acess, cm  Matrix eO vingador do futuro.

Bibliograa comentada

A rdem da bibigraa segue aprximadamente a rdem dsassuntos anteriormente tratados.

A primeira formulação da ideia de que a ciência deve dominara natureza e produzir tecnologia que melhore as condições da vidahumana está em, F. Bacn, Novum Organum (2. ed. Sã Pau: Abri,1980). Sugir ainda agumas bras cássicas de cçã cientíca, cmM. Sheey, Frankenstein  (Sã Pau: Cmpanhia das letras, 1994).Infeizmente, H. G. Wes,  A ilha do dr. Moreau , está esgotada, masae a pena buscá-a em sebs. Essas duas bras fram madas.Para o contraste entre uma visão racionalista e uma empirista da

ciência moderna, o melhor é apresentar duas obras clássicas e in-dispensáeis: R. Descartes,  Meditações Metafísicas (2. ed. Sã Pau:Abri, 1980), e D. Hume, Investigação sobre o entendimento humano (2.ed. Sã Pau: Abri, 1980).

Para discutir a questão de ciência e valores, ver H. Putnam,O colapso da verdade (Sã Pau: Idéias e letras, 2008), e H. Hacey,Valores e atividade cientíca 1. (Sã Pau: Editra 34 e Scientia Stu-diae, 2008).

Para a filosofia da ciência, continuam indispensáveis a obra

de Karl Popper,  A lógica da pesquisa cientíca (Sã Pau: Cutrix,

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2000), sbretud a primeira parte, e a de Thmas Kuhn,  A estruturadas revoluções cientícas (Sã Pau: Perspectia, 2003). D primeir,também vale a pena ler Conhecimento objetivo (Sã Pau: Itatiaia,1975), e Conjecturas e refutações  (Brasíia: UnB, 2008). Cm estesirs sã cmpsts de artigs, taez seja mehr usar um u disartigs cm intrduçã a seu pensament. Um ir mais recentee iguamente indispensáe é de Bas an Fraassen,  A imagem cien-tíca (Sã Pau: Unesp, 2007). Também se pde er cm preit cássic de Feyerabend, Contra o método (Sã Pau: Unesp, 2007).

Agumas sugestões para a história da ciência: A. Kyré, Domundo fechado ao universo innito (Ed. Frense Uniersitária, 2006).Para uma ba intrduçã a pensament de Gaieu, er P. R. Mari-cnda e J. vascnces, Galileu e a nova Física (Sã Pau: odysseus,2006). o grande dramaturg Bertd Brecht escreeu A vida de Galileu 

(Sã Pau: Abri, 1977). Um bm ir de sa da bigia é D.Denne,  A idéia perigosa de Darwin (Ri de Janeir: Rcc, 1998).

A mehr intrduçã gera à epistemgia em prtuguês é a de Jnathan Dancy, Epistemologia contemporânea (Prtuga: Edições 70,1990). Nessa intrduçã, aguns trechs pdem ser seecinads paraaprfundar a discussã da deniçã de cnheciment. Para a primeiradeniçã de cnheciment e uma ssticada discussã, er Patã, Te-eteto (Prtuga: Causte Gubenkian, 2005). oswad Prchat reuniuquase tds s seus artigs na cetnea Rumo ao ceticismo (Sã Pau:

Unesp, 2007). os artigs sã independentes entre si e sã escrits demaneira cara, eegante e acessíe. Trata-se de um ir indispensáepara as discussões brasileiras sobre teoria do conhecimento.

o mehr text em prtuguês para a nçã de erdade é irde Richard Kirkham, Teorias da verdade (Ri Grande d Su: Unisins,2004). Mas também se pde cnsutar ir de luiz Henrique deAraúj Dutra, Verdade e investigação (Sã Pau: EPU, 2001). Agunsartigos importantes também podem ser utilizados. Os fundamentos doconhecimento , de Mritz Schick, é interessante para discutir a reaçã

da teoria com a observação e as teorias correspondencialista e coeren-tista da erdade, bem cm a ideia de justicaçã. Pseudo-problemasda losoa , de Rudf Carnap, apresenta utra isã de cnhecimentd empirism ógic. vae a pena er Outras mentes , de Jhn l. Austin,para uma anáise d cnheciment d pnt de ista da sa dainguagem rdinária. o cássic Epistemologia naturalizada , de WillardQuine, é indispensável. Quine apresenta uma concepção muito origi-na de epistemgia que causu enrme impact na sa anaítica.Também ae a pena er utrs de seus artigs, cm Dois dogmas doempirismo , para sua crítica da distinção analítico-sintético, e Espécies

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naturais , para sua concepção de ciência, indução e modelo hipotético-deduti. Tds esses artigs se encntram em dis umes da c-eçã os Pensadres (2. ed. Sã Pau: Abri, 1980): um é dedicad aSchlick e Carnap , outro a Ryle, Austin, Strawson e Quine. os capítus5 a 7 de Peter Strawsn, Análise e metafísica (Sã Pau: Discurs Edi-tria, 2002), aem a pena serem ids cm cuidad.

Um bm text para cmparar prcediment estétic-metafóri-c da pesia e prcediment cnceitua-argumentati da saé o capítulo  A Metáfora , em Jrge luis Brges, Esse Ofício do Verso (Sã Pau: Cmpanhia das letras, 2000).

Para o exercício de análise minuciosa de texto, sugiro a Primeira Meditação de Descartes. Nesta, há um diág argumentati impícitentre duas psições que dee ser identicad pe aun. Uma dica échamar a atençã para tds s “mas”, “prém” e “prtant” que es-

truturam a ógica e s arguments d text. outr text interessante eque catia s auns é de Friedrich Nietzsche, Sobre a verdade e a mentirano sentido extra-moral (2. ed. Sã Pau: Abri, 1980. os pensadres).

Entre s cnts piciais para exibir frmas de inferência e ra-cicíni, recmend aguns. o cas mais extrem de detetie quese apia excusiamente n racicíni é Dn Isidr Pardi, que estápres e desenda crimes sem pder sair de sua cea: J. l. Brges e A.B. Casares, Seis problemas para Don Isidro Parodi (Ri de Janeir: Gb,2008). outr detetie brihante é Padre Brwn, d escritr ingês,

G. K. Chestertn, A sabedoria do padre Brown (Graa, 1986). É um irntáe. Neas de Sherck Hmes também sã ótima indicaçã.Um ds mais cnhecids é Cnan Dye, O cão dos Baskervilles (SãPau: Sinergia, 2009).

Para o problema do mundo exterior, o aluno pode ler o contode Phiip K. Dick, Você pode se lembrar por um bom preço , publicadoem  Minority Report: A Nova Lei (Ri de Janeir e Sã Pau: Recrd,2002). o me O vingador do futuro é uma adaptação muito bem feita.o capítu 1 d imprtante ir de Hiary Putnam, Razão, história,

verdade (lisba: Dm Quixte, 1992), em que ee supõe a pssibiidadede que sejams um cérebr num bade igads a um supercmputadre manipuads pr um cientista deu rigem a utr me fams:

 Matrix. outrs texts que pdem ser cnsutads a esse respeit sã:P. J. Smith, Ceticismo (Ri de Janeir: Zahar, 2004); P. J. Smith, Umasolução cética para o problema do mundo exterior , na sua obra Do começoda losoa e outros ensaios (Sã Pau: Discurs Editria, 2005) (dis-ponível on-line na revista Sképsis); e artig de oswad Prchat,

 Mundo exterior e ceticismo , na obra Rumo ao ceticismo , já citada.

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* Dutr em Educaçã pea Uniersidade Estadua de Campinas e ire dcênciapea Uniersidade Estadua de Campinas. Prfessr assciad (MS-5) da Uni-ersidade Estadua de Campinas.

Capítulo 8

Ensino de losoa: avaliação

e materiais didáticos

 Silvio Gallo* 

O ensino de losoa e suas justicativas

Depis de muits ans de ausência ns currícus da educaçãmédia brasieira, s prfessres de sa eem-se cnfrntadscom o retorno de sua disciplina aos currículos e perguntam-se: oque fazer? Cm fazer? Mas, também: pr que fazê-?

Sabems que fram ngs s ans de espera pea intrduçã dasa ns currícus e que fram intenss e carss s debates e

lutas para que isso fosse possível. Nesta luta, foram sendo produzidasagumas justicações para ensin da sa, que seriam justa-mente como argumentos para defender seu retorno aos currículos.

Na década de 1980, fram duas as principais justicatias. Prum ad, dizia-se que a presença da sa na educaçã ds jens

 justicaa-se pea necessidade de um deseniment da cnsciênciacrítica ds estudantes. lembrems que a uta pe retrn da saas currícus amagamaa-se e cnfundia-se cm a uta pe m dregime miitar instaad em 1964. Cm a retirada da sa ds

currículos havia sido obra da reforma de cunho tecnicista da edu-caçã básica ead a cab pr aquee regime n na ds ans de1960 e iníci da década de 1970, atribuía-se à excusã da sa ede outras disciplinas de humanidades a falta de criticidade e o ex-cess de tecnicism na frmaçã de nsss jens. E, neste quadr,a sa aparecia cm antídt necessári e aprpriad a umprocesso de redemocratização da sociedade brasileira.

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Pr utr ad, às ezes articuad cm este primeir aspec-t, utras ezes nã, aparecia uma segunda justicaçã: caráterinterdiscipinar da sa. Ea seria eement necessári parapromover o diálogo e a integração entre as diferentes disciplinas

do currículo, apresentadas aos estudantes de modo completamentedesarticulado e fragmentado, causando uma compreensão equivo-cada d cnjunt d cnheciment human.

Em ambs s cass, ej um prbema. Nenhum dees arma asa pr ea mesma, mas pr um pape que ea dee desempe-nhar. A sa era justicada pr ag que ea deseneria nsestudantes, ag este ahei a ea mesma. Em utras paaras, ambasas justicatias impõem à sa um caráter instrumental. Mas háainda um utr prbema a ser apntad. Em ambs s cass, a

 justicaçã para ensin da sa cnfere a esta discipina umpape que nã é e nã pde ser excusi dea. Ist é, se desejamsuma educaçã que frme a criticidade ds jens, a sa pde serum dos elementos desta formação, mas certamente não é e não podeser únic. A criticidade nã é excusia da sa e nã pde sercreditada excusiamente a ea. ou as demais discipinas tambémsão formadoras da consciência crítica ou esta formação é impossível.E mesm racicíni é áid para a interdiscipinaridade.

Para aém destas duas justicações, a armaçã da imprtncia

da sa ns currícus, que aparece na lei de Diretrizes e Basesda Educaçã Nacina (lei nº 9.394/96) também apresenta um caráterinstrumenta: pape da sa seria de aprtar as jens certscnheciments sócs necessáris a pen exercíci da cidadania.Esta justicaçã nã deixa de estar reacinada cm as duas anterires,na medida em que a lDB agutinu s anseis da uta antiditadura, jáeidenciads na Cnstituiçã Federa de 1988. Mas, em que pese a n-

 breza da armaçã da sa cm base da frmaçã para a cidadania,isto não diminui o fato de que lhe é atribuído um caráter instrumental.

ora, desde Aristótees que a sa se dene cm um m emsi mesma, e nã cm um mei para atingir a um bjeti determina-do.1 Justicar um espaç para a sa ns currícus da educaçã

1  Por exemplo, em seu Protrepticus , n qua cnida um rei a exercíci da -sa, ósf escreeu: “Pr cnseguinte, entre s pensaments, s digns deescha deid à cntempaçã pura sã mais hnrss e superires àquees quesã úteis a utras cisas. Mas as cntempações sã hnrsas em si mesmas e,entre elas, é o saber da inteligência que é digno de escolha, enquanto os pensa-ments reatis à sabedria sã hnrss graças às ações [decrrentes dees].

Assim sendo, o bom e honroso estão nas atividades contemplativas referentes

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 básica apenas de md instrumenta – ist é, a sa a seriç deag, cm a cidadania – é essenciamente antisóc, prtant.Ind mais para cntext da argumentaçã presente ns PCNEM,2 de er na sa uma preparaçã abrangente d indiídu, fazend

parte de sua introdução ao universo da cultura e das técnicas paranee habitar, prer apstar n ensin da sa cm um m emsi mesm, para aém de quaquer tutea, seja ea cidadã u mra.

Quando pensamos na educação como amplo processo de formaçãohumana e, sbretud n Ensin Médi, cm um níe prpedêuticà uniersidade u entã cm etapa na da frmaçã de um grandenúmer de jens que nã ã para Ensin Superir, pdems faarem três grandes áreas do conhecimento humano fundamentais, que de-vem estar presentes nessa formação: as ciências , as artes e as losoas.

Partind daqui que Deeuze e Guaari prduziram em O que éa losoa? (Ri de Janeir: Ed. 34, 1992), pdems dizer que as ciên-cias, na sua relação com o mundo, produzem funções , que organizam

ao saber, e com certeza não, repitamos, em quaisquer atividades contemplati-as.” (ARISTÓTElES. Da Geração e da Corrupção, seguido de Convite à Filosoa.Sã Pau: landy, 2001. p. 157).

  Páginas adiante, ems: “Efetiamente, entre as cisas sem as quais é impssíeviver, aquelas que amamos por outras coisas devem ser chamadas de coisas ne-cessárias e causas auxiliares, ao passo que aquelas que amamos por si mesmas,quando realmente nada mais delas sairiam, é preciso chamar de coisas sobe-ranamente boas. [...] É, portanto, de todo ridículo procurar em toda coisa algoaém da cisa em si, u seja, um ucr, e perguntar: ‘Pis entã, que ucramscm iss?’, ‘Que utiidade tem?’. Prque reamente, repetims iss, um indií-duo que age assim não se parece em nada com aquele que sabe o que é belo e bm, tampuc cm aquee que faz a distinçã entre causa e causa auxiiar.”(ARISTÓTElES, 2001, p. 160-161).

2  os Parmetrs Curricuares Nacinais para Ensin Médi apntam para asa cm um dmíni crític da cutura cidenta. Ist ca eidenciadquand dcument expõe as “cmpetências e habiidades a serem desen-idas em Fisa”:

  “ler texts sócs de md signicati.”  “ler, de md sóc, texts de diferentes estruturas e registrs.”  “Eabrar pr escrit que fi aprpriad de md reexi.”  “Debater, tmand psiçã, defendend-a argumentatiamente e mudand de

psiçã face a arguments mais cnsistentes.”  “Articuar cnheciments sócs e diferentes cnteúds e mds discursis

nas Ciências Naturais e Humanas, nas Artes e em utras prduções cuturais.”  “Cntextuaizar cnheciments sócs, tant n pan de sua rigem espe-

cíca, quant em utrs pans: pessa-bigrác; entrn sóci-pític,históric e cutura; hriznte da sciedade cientíc-tecnógica.”(BRASIl. Ministéri da Educaçã. Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Mé-

dio: Ciências Humanas e suas Tecngias. Brasíia, DF: MEC/SEMT, 1999. p. 125).

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s fats bserads atraés de reações de causa-efeit; as artes, prsua vez, produzem  perceptos e afectos , formas de compreensão domund numa perspectia estética; as sas, pr m, prduzemconceitos , uma forma racional de equacionamento dos problemas vi-

ids n mund. Cada uma dessas frmas de cnheciment human,prtant, é irredutíe à utra e sã tdas mutuamente cmpemen-tares. Dizend de utr md, nenhuma ciência é capaz de fazer prmim aqui que a sa faz, assim cm nenhuma sa pdesubstituir s afets estétics, pr exemp. o que equiae a dizerque, se procuramos um processo educativo como formação humana,minimamente precisamos garantir a todos os estudantes o acesso aestas três instncias de prduçã de saberes sbre mund.

Pens que reside aí a justicatia para a necessidade da presença

da sa ns currícus d Ensin Médi. As diersas ciências áestã; a experiência estética u artística, de um utr md também(na erdade, pens que deeríams ter muit mais arte ns currícu-s, mas a mens já tems aguma cisa). Mas e quant às sas?os estudantes têm acess às funções cientícas, as percepts e afetsartístics, mas e as cnceits sócs? Sem ees, nã terems umconhecimento abrangente, uma formação abrangente.

Repit: nã pens que a sa se justique ns currícus daeducação média por promover uma forma de visão crítica do mundo 

(utras discipinas também pdem e deem fazer iss), nem pr ps-sibilitar uma visão interdisciplinar (utras discipinas também pdeme deem fazer iss), muit mens pr trabahar cm conhecimentos

 fundamentais ao exercício da cidadania (n imite, a açã cidadã nãreside na sa, mas taez mesm nge dea). Pr utr ad, aausência da sa ns currícus signica nã cntat ds estu-dantes com essa importante construção humana, que é o conceito.Iss, sim, a sa pde ferecer. E apenas ea pde ferecer.

 Sugestões de estudos e aprofundamentoPara aprofundar as questões aqui desenvolvidas, sugiro a lei-

tura de:

CERlETTI, Aejandr. O Ensino de Filosoa como problema losóco. Be Hriznte:Autêntica, 2009.

KoHAN, Water omar. Filosoa: paradx de aprender e ensinar. Be Hriznte:Autêntica, 2009.

oBIolS, Guierm. Uma Introdução ao Ensino da Filosoa. Ijuí: Ed. Unuí, 2002.

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SIlvEIRA, René Jsé; GoTo, Rbert (org.). Filosoa no Ensino Médio: temas, pro- bemas e prpstas. Sã Pau: lya, 2007.

 Sugestões de atividades práticas

Cnstrua sua própria justicatia para ensin da sa nnível médio, a partir das seguintes questões:Cm cê se rienta na sa? Ist é: a partir de que•crrentes e u autres cê pensa a sa?o que cê pensa sbre a capacidade da sa interferir•n exercíci da criticidade pes estudantes? E sbre seucaráter interdiscipinar?Para cê, mais imprtante n Ensin Médi é a prática•sóca, exercíci d pensament, u cnheciment

sistematizad prduzid pea humanidade? Pr quê?Objetivos do ensino de losoa e a organização dos conteúdos

de estudo

Se ns ccams de acrd cm a justicatia acima apresenta-da para a presença da sa ns currícus d Ensin Médi, en-tã nã pdems admitir que a presença desta discipina signiqueapenas mais um espaç de transmissã de cnteúds. Se a sa

 justica-se pr prtunizar as estudantes a experiência do conceito , a

possibilidade de exercício do pensamento conceitual, então ela nãopde ser apenas mais um dese daqui que s ósfs pensarampelos séculos afora.

Caminhand nesta direçã, pens que pdems fazer das auasde sa abratóris de experiências de pensament, que gstde chamar de ocinas de conceito. Um ensin ati da sa, quecque s jens estudantes em cntat cm a própria atiidade -sóca: a criaçã cnceitua, mais d que cm sua história, u cm stemas dminantes nessa história, u cm s temas hje imprtantes.Car que tud iss está subentendid e articuad, mas prpnhfocarmos o ensino no conceito e em sua produção, no ponto de par-tida do pensamento, isto é, nos problemas que os motivam.

Trata-se, entã, de reaizar cm s estudantes miment depensament própri da atiidade sóca, a criaçã cnceitua. Umprfessr de sa que faça esse miment precisa assumir-se, eemesm, cm ósf. Cm ee pderia cnidar s auns a fazer miment, mediá-s nesse prcess, se ee mesm nã zer?

Parece-me muito interessante, para pensar um ensino ativoda fisfia, a psiçã apresentada pr Sthèphane Duaier, de

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tmar a fisfia cm um “pder de cmeç”. Na cnferência queprferiu na abertura d Cngress Brasieir de Prfessres de Fi-sfia (Uniersidade Metdista de Piracicaba, nembr de 2000),Duaier defendeu que td fisfar é um n cmeç, pssíe

apenas pea superaçã d mestre. Cita cm exemp Patã, quesó cmeça efetiamente a fisfar após a mrte de Sócrates, cmesfrç de ear adiante egad d mestre, mas já prduzindum novo começo, uma nova filosofia.3 

o prfessr de sa, entã, é aquee que faz a mediaçã deuma primeira reaçã cm a sa, que instaura um n cmeç,para então sair de cena e deixar que os alunos sigam suas própriastrihas. Sem Sócrates, Patã nã teria se iniciad em sa; massem desapareciment (a mrte) de Sócrates, Patã nã teria feit miment de um n cmeç, prduzind, ee mesm, sa.o prfessr de sa é aquee persnagem que, a um só temp,sabe e ignra; cm iss, nã expica, mas media a reaçã ds aunscom os conceitos, saindo de cena em seguida para que a relação coms cnceits seja feita pr cada um e pr tds.

Impõe-se entã a pergunta: cm rganizar s cnteúds dasa n currícu deste níe de ensin?

Tems a mens três eixs em trn ds quais pdems cns-truir um currícu de sa: um eixo histórico , um eixo temático eum eixo problemático.

No primeiro, organizamos os conteúdos a serem ensinados se-guind uma crngia histórica. o prbema, nesse mde, é quea chance de cair num ensin encicpédic, apresentand um desede nmes de ósfs, pensaments e datas, é muit grande. E, ncntext de um currícu já muit cnteudista, a sa é istacomo apenas um conteúdo a mais.

N segund, eegems temas de natureza sóca, cm a iber-dade, a morte ou outro qualquer, sendo que podemos ou não tratarestes temas em uma abrdagem histórica. De quaquer frma, s

conteúdos são apresentados de forma temática, em uma tentativa detrná-s mais próxims da reaidade iida pes jens. Em termsde organização didática dos conteúdos a serem trabalhados no nívelmédio, essa abordagem parece-me mais apropriada que a anterior.

3  o text da cnferência de Duaier, intituad A losoa que começa: desaos parao ensino da losoa no próximo milênio , fi pubicad em GAllo, S.; CoRNEllI,G.; DANEloN, M. (org.). Filosoa do Ensino de Filosoa. Petrópis: vzes, 2003.As teses de Duaier estã amparadas em um be ir de Jacques Rancière,

O Mestre Ignorante (Be Hriznte: Autêntica, 2002).

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Por fim, na terceira alternativa, os conteúdos são organiza-dos em torno dos problemas tratados pela filosofia, que por suavez se recortam em temas e podem ser abordados historicamente.Em minha isã, essa abrdagem abarca as duas anterires, na

medida em que permite tanto o acesso aos temas filosóficos maisreeantes quant à história da fisfia. Mas também aança paraalém delas, pois toma a filosofia como uma ação, uma atividade,posto que se organiza em torno daquilo que motiva e impulsionao filosofar, isso é, o problema.

Esta terceira frma de rganizaçã curricuar ds cnteúdsde sa parece ser a mais aprpriada se nss bjeti é deoportunizar a experiência do pensamento conceitual, uma vez ques cnceits sã prduzids a partir de prbemas. Se apresentarms

s cnteúds da sa em uma abrdagem histórica, dicimenteteremos condições de mobilizar nos estudantes o trato com os con-ceitos, tendendo a um ensino mais conteudista e enciclopédico, emens experimenta; pr utr ad, se utiizarms uma abrdagemtemática, temos mais chances de escapar do enciclopedismo, masnem por isso garantimos visibilidade aos  problemas losócos quemobilizam o pensamento.

É evidente, por outro lado, que centrar o currículo no eixo pro- bemátic nã pde signicar desprez pea história da sa. A

história deve estar lá, sempre presente como o pano de fundo, comoa fnte na qua buscams saber sóc sistematizad. Se ensi-n de sa dee exprar aquee “pder de cmeç” d qua faaSthèphane Duaier, pr utr ad, cmeç só pde existir peasuperaçã; ist é, nã cmeçams d zer, nã desprezams a história.É justamente a história que ns garante a pssibiidade de estabee-cermos, sempre, um novo começo, que não é nenhuma reinvenção daroda , mas o exercício de cada um fazer por si mesmo o movimentode pensament que zeram s ósfs a ng da história.

 Sugestões de estudos e aprofundamento

Para aprofundar as questões aqui desenvolvidas, sugiro a lei-tura de:

ASPIS, Renata lima; GAllo, Síi. Ensinar Filosoa: um livro para professores.Sã Pau: Aa, 2009.

DoUAIllER, Sthèphane. A sa que cmeça: desas para ensin da san próxim miêni. In: GAllo, S.; CoRNEllI, G.; DANEloN, M. (org.). Filosoa

do Ensino de Filosoa. Petrópis: vzes, 2003.

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RANCIÈRE, Jacques. O Mestre Ignorante: cinco lições de emancipação intelectual.Be Hriznte: Autêntica, 2002.

 Sugestões de atividades práticas

Dena uma ista de seus bjetis a ensinar sa n níe médi;• Faça uma ista ds cnteúds, temas e prbemas sócs que cê juga•que sejam imprtantes para atingir estes bjetis;Escha s principais ósfs e/u crrentes sócas que pdem auxiiar a•pensar estes cnteúds;Faça exercíci de rganizar um currícu de sa cm estes cnteúds•e autores, segundo:a) uma rientaçã histórica; b) uma rientaçã temática;

c) uma rientaçã prbemática.

 Metodologia do ensino de losoa: os materiais didáticos

Desde a década de 1980, cm retrn parcia da sa ascurrícus d Ensin Médi, entã na cndiçã de discipina pta-tia, fram send pubicads irs didátics para seu ensin. Emprincípi de md mais tímid, depis de frma mais arrjada, aseditoras foram se preocupando com este  lão do mercado editorial.De md que hje tems, seguramente, mais de inte manuais pre-

parads para ensin da sa n níe médi.vaend-me aqui de um extens estud feit pr Améric Gri-s, prfessr de sa e dutrand na Facudade de Educaçãda Unicamp, cit aguns destes manuais, que cnsider dentre sprincipais. o pesquisadr deseneu um mapeament ds irsdispníeis hje n mercad editria brasieir que se destinam atrabah cm ensin de sa n níe médi e chegu a maisde trinta títulos, dentre aqueles de produção brasileira e algumaspucas traduções de bras estrangeiras. organizu s áris irs

didátics para sa em duas categrias: aquees que tmam ahistória da sa cm centr e aquees que tmam a história dasa cm referencia. Em utras paaras, na primeira categriatemos livros que consideram a abordagem histórica no ensino dasa; enquant que na segunda categria trata-se de bras queprivilegiam a abordagem temática.

Na primeira categoria, podemos destacar:Vivendo a Filosoa•  , de Gabrie Chaita, Editra Atua.

 Aprendendo losoa•  , de César Aparecid Nunes, Editra Pa-

pirus.

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Introdução ao Estudo da Filosoa•  , de Antni Xaier Tees,Editra Ática.Filosoa•  , de Antôni Jaquim Seerin, Editra Crtez.Pensando para viver: alguns caminhos da filosofia•  , de Mauri

luiz Heerdt, Editra Sphs.Dentre aquees manuais que ptam pr uma rganizaçã te -mática, destaco:

Filosofando: introdução à losoa•  , de Maria lúcia de ArrudaAranha e Maria Heena Pires Martins, Editra Mderna.Temas de Filosoa•  , também de Maria lúcia de Arruda Aranhae Maria Heena Pires Martins, Editra Mderna.Convite à Filosoa•  , de Mariena Chauí, Editra Ática.Filosoa: ensino médio•  , de Mariena Chauí, Editra Ática.

Fundamentos da Filosoa: história e grandes temas•  , de GibertCtrim, Editra Saraia.Introdução à Filosofia: aprendendo a pensar•  , de Ciprian C.luckesi e Eizete S. Passs, Editra Crtez.Um outro olhar•  , de Snia Maria Ribeir de Suza, Editra FTD.Iniciação ao losofar: pensando melhor•  , de Angéica Sátir eAna Miriam Wuensch, Editra Saraia.Para losofar•  , de Cassian Crdi, Antni Raimund dsSants, Eizabeth Maria Bóri, Aein Antôni Crrea,

Neusa vendramin vpe, Ana Maria laprte, Síia Mariade Araúj, Anita Heena Scheesener, luiz Cars Ribeir,Dimas Friani e Maria Jsé Justin, Editra Scipine.Filosofia – Iniciação à Investigação Filosófica•  , de José AuriCunha, Editra Atua.Explicando a Filosoa com Arte•  , de Chares Feitsa, EditraEdiur.Ética e cidadania: caminhos da losoa•  , prduzid pe Grupde Estuds sbre Ensin de Fisa – Unimep (tend cm

autres Síi Ga, que crdenu a ediçã, mais Márci Ma-riguea, Pau Rbert Brancai, Márci Danen, luís CarsGnçaes, Cars Henrique Cyprian), Editra Papirus.

Fica eidente que, dentre s irs didátics dispníeis atua-mente n mercad editria brasieir, há uma cara predminnciadaqueles que optam por uma abordagem temática. Para cada umadestas obras, poderíamos destacar pontos fortes e pontos frágeis, masnã é este nss bjeti aqui. Destac, apenas, que, se ptams pr

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uma abrdagem prbemática d ensin de sa, muitas destasobras podem servir de apoio ao trabalho do professor, mas nenhumadelas daria conta, de modo exclusivo, de permitir este trabalho.

Em uma abrdagem prbemática, aém de pssíeis manuais

para ensin de sa, prfessr precisa aer-se de texts dsprópris ósfs em traduções cnáeis, texts nã sócs quepermitam uma aproximação aos temas e problemas trabalhados,

 bem cm utrs materiais, cm mes, dcumentáris, músicas,poesias, obras de arte, que permitam sensibilizar os estudantes paras prbemas sócs a serem abrdads.

 Sugestões de estudos e aprofundamento

Para aprofundar as questões aqui desenvolvidas, sugiro a lei-tura de:

KoHAN, Water omar; XAvIER, Ingrid Muer (org.). ABeCedário de Criação Filo-sóca. Be Hriznte: Autêntica, 2009.

RoCHA, Rani Pires da. Ensino de Filosoa e Currículo. Petrópis: vzes, 2008.

 Sugestões de at ividades práticas

Anaise s irs didátics que cê tenha dispníeis, eri-cando se propõem uma abordagem temática ou histórica.

Faça cmparações entre s manuais que cê cnhece, estabe-

lecendo seus pontos positivos para sua atividade no ensino e seuspontos frágeis.

Cnstrua uma espécie de midiateca para ensin de sa,cm mes, trechs de mes, bras de arte, pesias, músicas etc.

Prduza texts auxiiares para suas auas de sa, cm basena opção curricular adotada.

 A avaliação no ensino de losoa

Chegams a mais cmpex e espinhoso dos temas quandotratams d ensin de fisfia: a aaiaçã. Se ptarms pr umensino conteudista e enciclopédico, o problema não é tão grande:

 basta que verifiquemos se os estudantes assimilaram os conteúdostransmitids. Mas risc, aí, é aquee que já apntaa Nietzscheno ensaio Schopenhauer Educador ,4 ao tratar do ensino da filosofiapara jens na Aemanha de seu temp: trataa-se de decrar 50

4  Atualmente temos disponível uma tradução para o português deste ensaio: NIET-ZSCHE, Friedrich, Escritos sobre Educação. Traduçã, apresentaçã e ntas de

Néi C. M. Sbrinh. Ri de Janeir: : Ed. PUC-Ri; Sã Pau: lya, 2003.

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sistemas fisófics e as 50 refutações a estes sistemas para esquecertudo imediatamente, no dia seguinte aos exames...

Por outro lado, quando optamos por um ensino ativo da s-a, centrad n exercíci d pensament cnceitua, a pergunta se

impõe: quê e cm aaiar?Neste cas, deems ns ater mens àqui que estudanteeventualmente assimilou dos conteúdos que foram transmitidos,mas precisamos nos preocupar em avaliar em que medida ele foiou não capaz de aproximar-se da experiência do pensamento con-ceitua. o esfrç aaiati d prfessr dee cncentrar-se emperceber coisas como:

Dad um determinad tema sóc, estudante fi capaz•

de identicar prbema que está pr trás dee?Dad deseniment de um tema pr um determinad•ósf, estudante fi capaz de identicar prbema ucnjunt de prbemas que mbiizaram seu pensament?lend um text sóc a partir de um determinad pr-•

 bema mbiizadr, estudante fi capaz de identicar cnceit u cnceits prduzids pe ósf para enfrentareste prbema? o estudante fi capaz de recriar o conceitod ósf, refazend miment de pensament? o es-

tudante foi capaz de deslocar este conceito para um outrocntext u um utr prbema?o estudante fi capaz de cmunicar seu miment de pen-•sament atraés de um text de natureza sóca?Cm se pde perceber, estas questões sã cmpexas e•de forma alguma direcionam para qualquer receituário decm aaiar em fisfia. Cada prfessr, n cntext deseu trabalho, precisa criar os mecanismos próprios quelhe permitam perceber o desenvolvimento dos estudan-

tes, podendo intervir para seu aprimoramento, uma vezque este é o único sentido aceitável para um processo deavaliação.

 Sugestões de estudos e aprofundamento

Para aprofundar as questões aqui desenvolvidas, sugiro a lei-tura de:

ESTEBAN, Maria Teresa. Avaliação: uma prática em busca de ns sentids. Ri

de Janeir: DP&A, 1999.

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RoDRIGo, lida Maria. Filosoa em sala de aula: teoria e prática para o ensino médio.Campinas: Autres Assciads, 2009.

 Sugestões de atividades práticas

Cm cê aaia seu percurs de estuds na sa? Faça• uma lista dos mecanismos de avaliação que você vivencioudurante seu trajet cm estudante de sa. Faça umaanálise crítica destes mecanismos, avaliando em seguida suaprpriedade u nã para s estudantes d Ensin Médi.Desena distints mecanisms aaiatis para as auas•de sa, de acrd cm a sua pçã curricuar.Se cê estier interessad em experimentar ensin de•sa, centrad em prbemas, faça exercíci de cm

você avalia a sua própria leitura de textos dos filósofos,prcurand identicar s prbemas e s cnceits, cmforma de preparar futuros instrumentos avaliativos paraos estudantes.

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Capítulo 9

 Anotações sobre a

história do ensinode losoa no Brasil

 Filipe Ceppas* 

 Apresentação

o ensin de sa n Brasi, n níe secundári, hje cha-mad Ensin Médi, tem uma história rica e mutifacetada. Seustraços mais marcantes estão detalhados ou resumidos em trabalhos

 já cássics sbre tema 1 e é preciso analisar seus pressupostose implicações, aparentemente convergentes, sobretudo em relação

à egitimidade e imprtncia da sa na frmaçã ds jens.Passada a fase de uta pea reinserçã da sa cm discipinabrigatória n Ensin Médi, interesse pea história d ensinde sa intensica-se na direçã de uma inestigaçã acerca detradições puc reisitadas, seus métds, bjets, pressupsts enaidades, em cntraste cm s sentids que hje atribuíms aensin de sa na esca.

Da década de 1970 (quand a sa paru de ser ensinadana mairia ds cégis de níe secundári d país) a 2008 (an

em que foi aprovada a lei que estabelece a obrigatoriedade do en-sin discipinar da sa em td territóri nacina), Brasipassou por um processo de modernização das frças prdutias – dmilagre brasileiro à  globalização da economia  – que transfrmu demodo radical nossa sociedade, a cultura e a educação. No intuitode recrtar aquees aspects que, ds jesuítas as dias de hje, ns

* Dutr em Educaçã pea PUC-Ri (2003). É prfessr adjunt da Facudade deEducaçã da UFRJ.

1  ver, pr exemp, Macie (1959), Cartan (1985), Suza (1992), Eiterer (1996)

e Hrn (2000).

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parecem mais signicatis para repensar ensin de sa esuas naidades n Ensin Médi, precisams indicar eix prbe-mátic que ns sere de pan de fund, qua seja: fat de que aestabiidade ecnômica e a quase uniersaizaçã d Ensin Funda-

mental, recentemente alcançadas, convivem com níveis inaceitáveisde desigualdade social, condições de vida e aproveitamento escolar.Apesar de tdas as cnquistas demcráticas, ecnômicas e sciais, écomo se mudássemos tudo para tudo continuar como estava.

Para a história d ensin de sa n Brasi, é precis earem conta, sobretudo, as profundas transformações do campo deestuds em educaçã, que impicam a cmpexicaçã das abr-dagens capazes de ns ajudar a cmpreender s desas da -sa enquant disciplina escolar. Cm anaisar hje ensin da

sa sem s aprtes, pr exemp, das terias d currícu eda história das disciplinas escolares, para mencionar apenas duasáreas fundamentais?2 Há muito o que fazer, portanto, a partir dodeineament de um camp de estuds mais amp n mbit dahistória d ensin de sa. Prém, atread a essas perspectiasacima citadas, mais importante e urgente é o trabalho, mais modes-to e braçal , de retirar da poeira dos arquivos a matéria-prima paraquaquer reexã prpriamente histórica sbre ensin da sa:o levantamento daquelas tradições a partir da pesquisa nas fontes

primárias. Apesar ds esfrçs de aguns ósfs que se interes-sam pea questã d sentid d exercíci da sa ns trópicse sua história (er referências), há puquíssims estuds históricsacerca da prática dcente de sa n magistéri. Esse é um tra-

 balho que demanda competências na fronteira entre a educação, ahistória e a sa, capaz de jgar uz sbre práticas escares eminstituições secuares cm Cégi Pedr II, pr exemp, e dedeinear, sbretud, a trama das reações entre a sa que sefazia (u se reproduzia) n Brasi e sua prjeçã na praça púbica,

atraés d resgate de texts e práticas daquees prfessres e ó-sfs engajads n ensin secundári.3

2  Para as terias d currícu, er Sants & oieira (1998), Yung (1971) e lpes(1997). Para a história das discipinas escares, Chere (1990).

3  A bibigraa da história da sa n Brasi, às ezes cncebida cm históriada  losoa brasileira , é extensa, embora pouco prestigiada, com fontes primáriasfora de catálogo e de difícil acesso. É sobretudo nestas fontes e nos textos dahistória da educação brasileira e portuguesa que encontramos, de fato, subsídiosindispensáeis para uma história d ensin da sa, eand em cnta asdistncias e mediações que a distinguem de uma história da sa tout court.

ver referências e anex.

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Este text nã pretende nem pderia dar cnta dessas dier-sas frentes de trabah. Tent exprar, de md mais circunscrit,a partir de uma perspectia histórica e um pequen cnjunt dereferências, a pergunta sobre a relevância ou os sentidos do ensino

de sa em níe secundári, que aqui cmeçu já cm a açãds jesuítas, prcurand respnder a esta questã de três mdsdistints. Em seguida, prcur indicar agumas cnsequências queesses três mds de respnder à questã pdem ter para a frmaçãds prfessres de sa.

Perspectivas históricas

o ensin n Brasi, da cônia à Primeira Repúbica, atendia,

sbretud, as interesses pítics, sejam s da metrópe, sejam sde nossa emergente classe dominante, dos proprietários de terra esenhres de engenh que aqui se instaaram. Dit de md esquemá-tic, a educaçã jesuítica na cônia estaa tada para a catequeseds índis e para as primeiras etras ds hs de senhres de ter-ra, que cntinuaam seus estuds na Eurpa. A educaçã jesuítica,atraés das escas e missões da Cmpanhia de Jesus, fi a base daeducaçã n Brasi cônia, até a expusã da ordem, em 1759. Atese de que seu pan de estuds cia, Ratio Studiorum , embora

inuente até cmeç d sécu XX, fi incapaz de cmpr a basepara a constituição de uma cultura letrada entre nós, para além daretórica e de uma erudição livresca, resume, na verdade, um grandecamp de pesquisas, nde está em jg a aaiaçã da história denssa prduçã iterária até períd da Primeira Repúbica.4 

Se assumims esta tese, em tda a sua simpicaçã, desde ponto de vista da instituição das bases para a instrução de parcelasexpressias da naçã brasieira, ensin de sa é em grandemedida insignicante , assim como o é todo o precário sistema de

ensin entã existente. o Brasi chega a sécu XX cm um paísde anafabets (RoMANEllI, 1998). A fragiidade da sa entre

4  Dentre s texts indispensáeis para pensar prbema, er Cndid (1981,1989), Bsi (1998), Cutinh (2000), Camps (1989) e Pizarr (1993). Na intrdu-çã a ir de Cards (2002), encntrams um exceente resum das principaisreferências sobre o tema, desde o ponto de vista da história da educação e dacutura brasieira. Em Ceppas (2004), reaizei uma pequena e primeira incursã nacmparaçã entre a frmaçã sóca e a história d nss sistema inteectuadesde a perspectia iterária. o presente text é uma reisã e deseniment

de algumas ideias ali expostas.

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nós, ao menos do ponto de vista de seu ensino, deveria ser pensa-da, portanto, em termos da fragilidade histórica de nosso sistemaintelectual, e em especial de nosso sistema educacional, e o divisorde águas parece ser as transformações que ocorreram a partir dos

ans de 1920 e 1930, quand, dentre utrs aspects, iniciu-se aedicaçã de um sistema de ensin dign deste nme.Dis curts e necessáris adends: a) eitism nã é excu-

sividade brasileira5 e nã impediu prgresss em diersas áreas; b) s debates sbre acance da refrma pmbaina na cônia eda inda da famíia rea para Brasi sã fundamentais para umavisão mais ampla sobre as bases da cultura letrada, da ciência e datecngia n na d sécu XvIII e a ng d sécu XIX.6 Masparece difíci discrdar das anáises de Antni Cndid e utrs

que ressaltam o divisor de águas representado pelas primeiras dé-cadas do século XX, mesmo levando-se em conta a excelência deexemplares avulsos do passado.7

Indicad marc crnógic, a prpsta de tecer uma históriad ensin de sa anterir à instaaçã de um sistema de ensinnacina seria equiaente a buscar em nssa frági prduçã só-ca passada as raízes de uma  losoa brasileira futura, prjet queBent Prad Jr. criticaa em seu mestre, Cruz Csta, cm senduma ilusão prospectiva:

[...] a consciência do vazio cultural faz com que até mesmo o histo-riador das idéias tenha uma preocupação essencialmente prospecti-va: o que ele busca no passado são os germes do que acredita quea sa deve ser no futuro. É como se tentássemos, na inspecçãode um passad nã-sóc, adinhar s traçs de uma saque está pr ir (apud ARANTES, 1996, p. 26).8

5  ver Hébrard (1986) para uma anáise da duaidade d sistema educacina fran-cês, por exemplo.

6  ver, em especia, Cards (2002) e vargas (1994).7  ver, pr exemp, Candid (1989, p. 154-155): “A partir ds miments estétics

d decêni de 1920; da intensa cnsciência estétic-scia ds ans 1930-1940;da crise de deseniment ecnômic e d experimentaism técnic ds ansrecentes [1950-1960], cmeçams a sentir que a dependência se encaminha parauma interdependência cutura […].”

8  o própri Cruz Csta, entretant, nã se recnhecia nessa busca pr uma losoa

brasileira. ver Csta (1959, p. 9).

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Mas, para pensar ns sentids da frmaçã fisófica entre nós,deveria isso nos levar a fazer tábula rasa do passado  pré-moderno ,isto é,  pré-uspiano , anterir à cnstituiçã de uma cmpetência fi-sófica acadêmica? Seriam, entã, tds s esfrçs histrigrá-

fics de Cruz Csta, Washingtn vita, Antni Paim, Jrge Jaime,e muitos outros que procuraram resgatar e analisar esse passado,apenas um exercício de história das ideias, erudito e ornamental,que puc ns ajuda a pensar nossos atuais desafios filosóficos? ora, prbema taez nã esteja na reisã ds imites de nssas tra-dições, mas nos limites das perspectivas com que as reavaliamos:o que procuramos nessas fontes poderia ser diverso, começandopr rejeitar um cert ufanism dutrinári em trn de nsssantecessores, e por relativizar o peso por vezes dado a sínteses

totalizantes e cartográficas do saber, que encontramos em algunstexts sbre história da fisfia n Brasi. o que, aternatiamente,podemos aí encontrar seriam, por exemplo, formas diferenciadasde compreensão das relações entre nossos ensaios de exercício darazão nos trópicos e suas dimensões estéticas, linguísticas, políticas,científicas, cuturais; u ainda qua sentid de se pensar em umaoutra razão… na esteira, por exemplo, dos trabalhos da filosofiada ibertaçã (SIDEKUM, 1994), u de uma recnsideraçã dascsmisões ameríndias (vIvEIRoS DE CASTRo, 2002).

Assim, em segundo lugar, o ensino catequista, base para a cons-tituição de uma erudição livresca e retórica das classes dominantes,revela, por essas suas próprias funções, um sentido importante emnossa formação cultural e intelectual, e não apenas em seus aspec-tos negativos mais evidentes. Para formular de modo resumido oprbema, digams que s texts de Padre Antni vieira, TmásAntni Gnzaga, Nísia Fresta, Guedes Cabra, Tbias Barretu Sii Rmer sã expressões imprtantes da acimataçã (uda transformação e reinvenção) de uma razão europeia em uma região

a ea supstamente refratária. Daqui, também, é necessári ir aémde uma história das ideias , no simples sentido de exposição e contex-tuaizaçã de discurss sócs que taez nada acrescentariamaos estudos tradicionais da sa eurpeia.

Tmems cas d Padre Antni vieira. objet de inúmerasinestigações prpriamente sócas, é necessári recnhecer emvieira um terren férti para se pensar tant interpretações cni-tantes acerca das relações entre fé, razão e nosso passado colonial,quanto as questões ontológicas, éticas e epistemológicas que aí se

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instanciam, em diág cm texts sócs canônics da tradiçãeuropeia.9 Mas, sbretud, é precis frisar que estams diante de umtext de sa (u losóco , se se preferir) escrito em português , istoé, um texto que não conseguiria dizer o que diz tivesse sido escrito

em íngua diferente. Um text barroco , que  força a frmuaçã só-ca do pensamento na fronteira de sua expressão literária , da potênciaplástica de sua língua e de suas condições próprias de produção.10 

os faares e mds de pensar sã transfrmads diante da es-pecicidade da ida n novo mundo , que já se reea n diári deCmb, cm ns mstra Martin lienhard: “Escrit aparentemen-te segund s cnnes d diári náutic, gêner tradicinamentetécnico, este texto [Diario del primer viaje], na raiz de uma série de‘inações’, rmpe na reaidade cm seu mde para cnerter-senum discurs autenticamente iterári’” (lIENHARD, 1993, p. 46).Esse rmpiment de mdes, cm indica também Déci de A-meida Prad (1993), dá-se já n teatr de Anchieta, cujs registrstransfrmam-se em erdadeirs reats etngrács, reeand tantaspectos da vida indígena quanto elementos para a compreensãoda mente missionária. E aqui isumbrams terceir md de idarcom esse  passado renegado de nssa cutura sóca e sua transmis-sã: que há de scamente fundamenta neste embate entre arazão europeia , seus modelos de pensamento e a experiência tropicalé também o absolutamente outro que nee se prjeta.

Taez tenha sid oswad de Andrade quem mehr e maisbstinadamente quis enfrentar a natureza antinômica ds nsssembates entre o próprio e o alheio, a partir do mote incontornávelda antropofagia. Esse escritr que desrespeitu tdas as regras dsgêners discursis, cmbinand-s de md prgramátic – tam-

 bém ele autor de uma tese filosófica acadêmica , em 1950, O futuroda filosofia messiânica , sem dúida “simpificadra” e “carente demair aprfundament teóric”, mas nem pr iss mens genia,na aaiaçã de Fnseca (1990, p. 254) e de Benedit Nunes (1972)

9 Cmpare-se, pr exemp, a centraidade d pragmatism e da persuasã queAfred Bsi (1993) e Jrge Jaime (1997) recnhecem ns Sermões cm arist-teism d jesuíta que luiz Abert Cerqueira (2000) ressata e reisa sb a óticad cuturaism. Dentre s trabahs histórics recentes sbre Brasi cniaem que a bra de vieira cumpre funçã estratégica, ae destacar mnumentair de Aencastr (2000).

10  ver erbete “Prtugais”, d Vocabulaire europeen des philosophies: Dictionnairedes intraduisibles (CASSIN, 2004), escrit pr Fernand Santr. Para teses maiscríticas acerca da prepnderncia da expressã iterária na tradiçã sóca

 brasieira, er s texts de Margui Pint (2000, 2003).

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–, idu de md prismátic e recrrente cm as antinmias ge-radas pelo embate entre o que nos seria supostamente  próprio (aaegria, seagem, matriarcad, a crdiaidade etc.) e que nsseria alheio (a razã identificada cm a razão europeia , patriarcal,

da rdem d adrihadr, da abstraçã, da discipina etc.). Tant abra de oswad quant ir Raízes do Brasil , de Sérgi Buarquede Holanda, continuam a nos oferecer chaves mestras para quepossamos situar de modo crítico todo o esforço dessa aclimatação darazão nos trópicos , sem o que não saberíamos pensar sua transmissãopara além do círculo dos especialistas, ou de um sempre redivivoentusiasmo pedagógico , populista, nacionalista e rastaquera.

A glorificação do  primitivo tecnicizado e a crítica ao egotismo domund cntemprne nã sã meras boutades literárias. A antro-

pfagia mantém aces eix dinmic que dá sentid a tda espe-rança de cmpreensã d que significa um prjet ciiizatóri nstrópicos: o imponderável em que se confrontam e se confundem– u s imites de traduçã entre – s esquemas cnceituais cientí-fico-filosóficos ocidentais e as cosmovisões ameríndias e africanas.o ensin de fisfia n níe médi fi quase sempre pensadem nossa cultura, do Ratio Studiorum as Parmetrs CurricuaresNacinais, passand pr Rui Barbsa e Sii Rmer, cm partede um prjet mair de desasnar as crianças , elevando-as ao nível da

cutura etrada e preparand-as para exercíci da cidadania. Sãrars aquees que, cm vieira e oswad, tematizaram as armadi-has que se escndem nesse prjet chei de bas intenções.

 A formação do professor de losoa

Essas cnsiderações históricas taez siram para repensarmsaspects imprtantes de nssa prática dcente em sa n En-sin Médi, muitas ezes refém de discurss ideógics acerca de

uma quase mítica  formação do cidadão crítico. Já virou moda criticara identicaçã da naidade d ensin de sa cm a formaçãocrítica dos jovens , até pouquíssimo tempo predominante na literaturaespecializada, e alguns senões neste sentido são encontrados inclusi-e em texts ciais, cm as Orientações Curriculares para o Ensino

 Médio (BRASIl, 2006).11 Mas é também erdade que a nçã de crítica tem sentids muit preciss na sa, fundamentais n que diz

11  Análises bem diferentes a esse respeito podem ser encontradas em Nielsen Neto

(1986), Ceppas (2007) e Rancière (1986).

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respeit a seu ensin, e seria um rednd equíc jgá-a fra,enquant permanecems cm a água suja d discurs saíc.

Nã há nada de errad cm a especicidade daquea frmaçãcrítica que é tarefa excusia da sa: nenhuma utra discipi-

na n Ensin Médi tem cm naidade e cnteúds própris contato, ainda que rudimentar, e de preferência não meramenteenciclopédico, com as críticas socrática, cartesiana, empiristas, ilu-ministas, kantiana, marxista, nietzscheana, anaítica etc. Em trndesses aportes críticos , com sentidos e alcances diversos, giram im-portantes problemas acerca da razão, da política, das noções deautnmia, cidadania etc. E, prtant, a sa parece ter, sim,um papel especial quando se fala em  formação crítica. o que pre-cisamos superar a todo custo é antes a concepção salvíca do papel

da educaçã na sciedade, que a nçã de crítica cstuma ensejar,cncepçã demagógica, meda crrente na pítica e ns jrnais,histricamente entranhada em tendências à esquerda e à direita,inacinadas n mbit d ensin da sa.

Esse discurs saíc está histricamente igad a uma cmpexae em muitos aspectos nefasta oposição entre a academia e a vida. 12 Muits discurss em pr de uma frmaçã crítica, liberais ou mar-xistas , fazem a transformação social depender da elevação do graude instrução do povo, e acrescentam que o conteúdo dessa instrução

deve, obviamente, estar livre das amarras de perspectivas pedagógicase ideógicas que hes sã cntrárias, ia de regra identicadas cmum discurso liberal reacionário , ou esquerdista ultrapassado , ou aindauniversitário academicista. Por um lado, poderíamos argumentar comRancière (2002) que s discurss crítics da educaçã raramente es-capam da redupicaçã da desiguadade que desejam aparentementesuperar, na medida em que instauram uma nova desigualdade, entrequem sabe e quem não sabe ou, antes, entre quem sabe o que se deveu nã saber e aquee que nã sabe. Gsand Kant, é precis cntes-

tar essa pretensão: nada mais vão e infrutífero do que tutelar a razãoda juentude e assim querer guiá-a pe caminho adequado.13

A vanguarda educacional salvíca é o resquício de uma postu-ra nã de td utrapassada n mbit da cutura, histricamente

12  As teses ds ósfs sbre a psiçã entre dcência, sa e ida encntram-se resumidas em obis (2002, p. 73ss.) e Kfman (2006).

13  ver Kant (1987, p. 200-201, Krv 782-3) e, para uma apresentaçã de suas ideias

acerca d ensin de sa, Ceppas (2002).

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identicada cm que Antni Cndid chamu de “inteectuaisda idegia iustrada”, de uma fase anterir à ruptura representadape m da hegemnia da eite agrária, na ecnmia e na pítica, epea ecsã d mdernism n mbit da cutura. Na medida em

que os supostos frutos dos esforços de universalização do acessoao saber são frustrados pelos mais diversos motivos, o discursocrítico parece ganhar ainda mais força, reforçando simultaneamentea debilidade cultural reinante:

A amentar a ignrncia d p e desejar que ea desapare-cesse, a m de que a pátria subisse autmaticamente as seus atsdestinos, [os intelectuais da ideologia ilustrada] se excluíam do con-text e se cnsideraam grup à parte, reamente “utuante” […].Futuaam, cm u sem cnsciência de cupa, acima da incutura

e do atraso, certos de que estes não os poderiam contaminar, nemafetar a quaidade d que faziam. (CâNDIDo, 1989, p. 147-148).Ag semehante acntece quand prfessr se põe à margem

do status quo social e acadêmico do qual denuncia a alienação , o radi-calismo ultrapassado ou o exílio na torre de marm , prjetand-se cmseus pares e amigos em uma cruzada quixotesca contra a inculturacircundante, u eeand-se às aturas d desprez ímpic. Semquerer defender uma visão idílica da cultura, o sentido de uma críticaà ideia mesma de quaquer vanguardismo ilustrado salvíco talvez

que mais car a partir da anáise de Cndid (1989, p. 148):

[…] a incultura geral produzia e produz uma debilidade muito maispenetrante, que interfere em toda a cultura e na própria qualidadedas bras. vista de hje a situaçã de ntem parece diersa daiusã que entã reinaa, pis hje pdems anaisá-a mais bje-tiamente, deid à açã reguadra d temp e a nss própriesforço de desmascaramento.

Acrescentemos: esforço de autodesmascaramento. Necessidade co-letiva de superar oposições esquemáticas entre o culto e o inculto,entre a academia e o mundo lá fora.

D pnt de ista mais especíc da frmaçã ds prfessresde sa, ae identicar prbema n interir mesm da acade-mia, recrdand a reprimenda de Héi Jaguaribe a Tbias Barret,reprimenda que tants ósfs zeram e fazem a antecessres ecntemprnes, cm se a razã de ser da sa fsse, acima detudo, a premiação competitiva do mais inteligente e melhor prepa-

rado academicamente:

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Uma rápida apreciaçã de Tbias Barret seria demasiadamenteincmpeta se nã se [destacasse sua] deciente infrmaçã […]sbre a história da sa. Ta deciência – regra gera ds pensa-dres brasieirs – nã se caduna bem cm a intensa curisidade

inteectua de Tbias, hmem de eituras abundantes e ariadas.Mas a erdade é que a precária infrmaçã de Tbias, quant apassad e à euçã da sa, assume prprções dramáticasem suas primeiras obras e, minorada embora pelos estudos pos-terires, marca, até m, uma das imitações de seu pensament.(JAGUARIBE, 1957, p. 37).

Se essa reprimenda pde ser meda crrente na meritcraciauniversitária, com todas as perversões e luta fratricida que alimenta,

ea é absurda quand dicuta a superaçã d fss existente entre apesquisa e o ensino, entre uma cultura do bacharel e uma cultura doicenciand. D nss ad, defendems que prfessr de sad Ensin Médi precisaria ter uma cutura sóca tã asta quan-to a do bacharel, do mestre e do doutor, na medida em que precisatrabalhar com precisão as mais diversas referências da história dasa, e reagir cm rapidez às mais diersas reações ds auns.Prém, antes de tud, é precis negar a ógica que subjaz a essacmparaçã. Nã estams numa gincana. os saberes estã cada ez

mais dispníeis. o não saber não é um erro ou uma falta, e o erronã é prbema, cm bem disse Deeuze: grande prbema éa bbagem, cm, pr exemp, a bbagem de achar que td -sfar tem que bedecer a um parmetr x quaquer da atiidadesóca  prossional , como o comentário erudito do texto.

Reers da mesma meda: a crítica generaizada à imptênciacriatia e à hiperespeciaizaçã histórica ds prfessres uniersi-tários, que raramente têm a coragem de se autointitular  lósofos.Quanto a isto, é leitura obrigatória o Discurso aos estudantes sobre a

 pesquisa em losoa de oswad Prchat Pereira (2005, p. 113):

[…] o temor que me assalta é o de que, levados pela nossa seguracnsciência de que a Fisfia se aimenta cntinuamente de suahistória, tenhamos ido longe demais na prática da orientação his-toriográfica. Que, no louvável intuito de assegurarmos a nossosestudantes uma sólida base de conhecimentos historiográficos, deos afastarmos de um achismo incnseqüente própri ds que nuncafreqüentaram de pert pensament ds grandes fiósfs nem

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aprenderam a dura disciplina das lógicas internas aos grandes em-preendimentos filosóficos, tenhamos perdido de vista a meta quemuits desses estudantes – e de nós também – tinham – tínhams– em nsss hrizntes: a eabraçã de uma refexã fisófica,

a compreensão filosófica de nós mesmos e do mundo.

Esta rápida incursã na história d ensin de fisfia n Brasiquis indicar três eements que taez pssam ns ajudar a superaralguns dos pontos cegos de nossa formação filosófica. A reconside-ração desta história poderia contribuir para superarmos os víciosde nossa formação acadêmica e o fosso entre ela e a difícil tarefade exercitar a razão  junt as auns d Ensin Médi, na medidaem que frms capazes de dar cnta (1) d que significa fisfar

ns trópics; (2) daqui que, cm tds s seus imites, nssstrabalhos, acadêmicos ou não, mais profissionais ou mais literários ,ns infrmam a esse respeit; e (3) de escapar às amarras de umarígida separação entre as razões da filosofia europeia e tudo aquiloque nos trópicos lhes é de algum modo refratário ou indiferente.

 AnexoCaminhos para a pesquisa da históriado ensino de losoa no Brasil

Indic mais uma referência fundamenta para a pesquisa dscurrícus ciais de sa ds ans de 1850 a 1951, nã citadaa ng d text, que é ir rganizad pr Aricê vechia e KarMichae lrenz: Programa de Ensino da escola secundária brasileira,1850-1951 (Curitiba: Ed. d autr, 1998). Este ir nã despertu interesse das editoras, e acabou sendo publicado às próprias custas.Não é facilmente encontrável, mas pode ser consultado na bibliotecad Cégi Pedr II, n Ri de Janeir e, praemente, em agumas

 bibliotecas universitárias do País.

Dentre bases de dads e texts acessíeis on line:Base de dads bibigrács sbre ensin da sahp://www.educ.rg/base /Centr de Dcumentaçã d Pensament Brasieirhp://www.cdpb.rg.br/htm/estuds_destacads.htmlTexts de sa brasieirahp://textsdesabrasieira.bgspt.cm/

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Centr de sa brasieirahp://sabrasieiraceb.bgspt.cm/Institut de Humanidadeshp://www.institutdehumanidades.cm.br/cnseh_academi-

co/obras_obrass.phpBibiteca Digita NUPIllhp://www.iteraturabrasieira.ufsc.br/

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Capítulo 10

Em torno da

especicidade da losoa:uma leitura das Orientações Curriculares

Nacionais de losoa para o Ensino Médio

 Márcio Danelon* 

Introdução

Quand eegems cm bjet de reexã ensin de sa,estamos adentrando um universo por si só bastante denso na medidaem que prescree a cnuência de duas áreas distintas de saber: aeducaçã que tem n ensin um de seus bjets priiegiads deinestigaçã, e a sa que tem nea mesma, u seja, na própriasa, um tema prfícu de reexã e prduçã de saber. Nesse

cas, enfrentament da questã “ que é sa?” é, cm certeza,um ds primeirs prbemas sócs.1 Pr utr ad, a reexã

*  Dutr em educaçã – sa da educaçã. Prfessr na Facudade de Educaçãda Uniersidade Federa de Uberndia.

1  É interessante observar que a interrogação sobre si mesma é um posicionamentotipicamente sóc que, taez, nã encntrems em utras áreas de saber.Nesse sentid, ns Parmetrs Curricuares Nacinais d Ensin Médi/CiênciasHumanas e suas Tecngias, encntrams esta tese: “Nã pr acas, cm seapntu n iníci, aun d Ensin Médi faz perguntas a respeit da ‘utiidade’

da sa. Aquém diss, n entant, a questã mais eementar e a qua retrnacm particuar insistência (taez prque a mais intrigante) é: ‘ que é Fisa?’Naturamente que também nã é mer acas que prfessr de Fisa tenha,em gera, dicudades em respndê-a satisfatriamente, supst que ee nã seimite a repetir essa u aquea deniçã mais u mens cássica. Na erdade, que é Fisa cnstitui-se, hje, mais d que nunca, num prbema sóc”(BRASIl, 2000, p. 46). Sbre iss, na parte Cnheciments de Fisa das orien-tações Curricuares Nacinais para Ensin Médi, encntrams um retrn aesta mesma prbemática, em si, sóca: “Se a questã ‘ que é Física?’ nã éexatamente um prbema físic, a questã ‘ que é Fisa?’ é taez um primeir

e recrrente prbema sóc, e a ea cada ósf sempre prcurará respnder

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sbre ensin de sa remete a duas dimensões imítrfes daida humana, u seja, a dimensã da açã d dcente em saem apresentar e discutir a sa e a dimensã da teria e da ree-xã sbre a sa. o ensin de sa requer enfrentament da

atiidade prática d prfessr de sa, bem cm da atiidadeteórica, pis ensin de sa nã dee prescindir d psicina-ment cnceitua diante da questã “ que é sa?”. Dependen-d da frma cm se abrde a questã, ensin de sa pdeener áreas distintas d saber. Pde cnstituir-se em bjet depesquisa tanto para aqueles que trabalham com o saber pedagógicocm para aquees que trabaham cm a sa u cm a sada educação. Nesse aspecto, acreditamos ser importante pensar oensin de sa desde um har da própria sa. Em utras

paaras, pensar scamente ensin de sa2

 é pensar coma sa, cm saber sóc, prbema de seu ensin. Embraena discussões de cunh especíc da educaçã, pr exemp,metodologias3 para ensin de sa, didática teórica e prática, ensin requer reexã sbre esses temas a partir da sa e cm asa. Iss signica descnstruir a cmpartimentaizaçã d sabercom a qual, numa cultura positivista que entorna nosso cotidiano,estams habituads. É scamente que prfessr de sadee enfrentar a questã “ que é sa?”, questã cardea para

ensin de fisfia. Assumir um psicinament sbre “ queé fisfia?” é adentrar n terren da especificidade da fisfia,

 basead ns cnceits pes quais eabra seu pensament” (BRASIl, 2008b, p.21). Nã bstante s dcuments ciais, a pergunta “ que é sa ?”, u seja,a especicidade da sa fi enfrentada pes ósfs cm um prbemasóc. Encntrams, de fat, na histrigraa sóca, prfícuas reexõessobre esse problema, a qual voltaremos mais adiante.

2  Cnfrme Cerei (2003, p. 61-62). A mesma tese de se tmar ensin de -sa cm um prbema de cunh sóc, é encntrad em obis (2002, p.

100), quand arma: “Deems ajustar cntas cm as psições que menspre-zaram ensin de sa. Nã há mti agum para desprezar a prática densin de sa nem para cnsiderá-a cm ‘ma menr’. Pe cntrári, ensin de sa pde ser um at de prduçã sóca. Ensinar sa nãé apenas ‘faar’, nem n ensin de sa faa apenas prfessr, senã quehá um diág cm s estudantes e cm a sa mesma”.

3  Sbre iss, as orientações Curricuares para Ensin Médi/Fisa sinai-zam, muito brevemente e sem o aprofundamento que a questão requer, que ametdgia para ensin de sa tenha sua especicidade à uz da especi -cidade da sa: “Assim, uma metdgia para ensin da Fisa deecnsiderar iguamente aqui que é pecuiar a ea e cnteúd especíc que

estará send trabahad”. (BRASIl, 2008b, p. 36).

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u seja, que caracteriza a sa, dand a ea hmgeneidadeinterna e, também, a diferenciá-a de utrs saberes, denindsua hetergeneidade. Em utras paaras, ter cnceit frmad s-

 bre “ que é sa?” é reetir e estabeecer um psicinament

pausíe sbre a identidade e a diferença da sa.Nesse cenári, eement indispensáe para se pensar -scamente ensin de sa é própri cnceit de sa.Que sa, u quais sas querems ensinar? Que cnceitde sa prfessr assume para si em sua prática pedagógica?Denir cnceit de sa é pass fundante e, prtant, fun-damenta d prcess de se ensinar sa; signica dizer, desdeo início, com qual autor, com qual referencial teórico irá trabalharna saa de aua; é assumir, enm, uma pstura sóca em trn

ds prbemas sócs emergids n prcess de ensin. Nsdcuments ciais prduzids n mbit d Ministéri da Educa-çã, em especíc s Parmetrs Curricuares Nacinais d EnsinMédi/Ciências Humanas e suas Tecngias (1999), draante PCN/Fisa e, psterirmente, as orientações Curricuares Nacinaispara Ensin Médi/Fisa (2008), draante oCN/Fisa, aárea de sa apnta, acertadamente nesses dcuments, a ne-cessidade e a imprtncia de prfessr de sa cntempar, nacnstruçã de sua identidade cm dcente de sa, e em sua

prática junt as seus auns, uma reexã em trn d prbemasóc “ que é sa?”. De fat, ems:

Em suma, a respsta que cada prfessr de fisfia d EnsinMédi dá à pergunta (b) “que sa?” decrre, naturamente,da pçã pr um md determinad de sfar que ee cnsidera

 justicad. Aiás, é fundamenta para esta prpsta que ee tenhafeito sua escolha categorial e axiológica, a partir da qual lê e enten-de mund, pensa e ensina. Cas cntrári, aém de esaziar suacredibilidade como professor de Filosoa , faltar-lhe-á um padrão,um fundamento, a partir do qual possa encetar qualquer esboço decrítica (BRASIl, 2000, p. 48. Em negrit n rigina).

A mesma tese é encntrada nas oCN/Fisa:

Em suma, a respsta de cada prfessr de Fisa d ensin médià pergunta “que Fisa” sempre dependerá da pçã pr ummd determinad de sfar que cnsidere justicad. Aiás, érelevante que ele tenha feito uma escolha categorial e axiológica a

partir da qua ê mund, pensa e ensina (BRASIl, 2008b, p. 24).

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Sinaiza-se, nesses dcuments ciais, a necessidade bjetiade prfessr de sa cnstruir sua identidade enquant agenteque porta e atua dentro de um saber sistematizado historicamente,ta qua a sa se cnstitui. Nesse cas, a identidade da sa

ca atreada à própria cnstruçã da identidade d prfessr desa, na medida em que s dcuments ciais apntam paraessa tarefa. Para além disso, a tomada de posição do professor diantedessa questã nã signica simpesmente ee denir que entendepr sa, mas trata-se de um psicinament pític, diante deseu trabah cm a sa. É essa transcendência de entendimentda tarefa d prfessr de sa que, de frma prfícua, obisapresenta em Uma Introdução ao Ensino da Filosoa , particularmentena terceira parte dessa obra em que discorre sobre uma concepção

crítica e sóca em trn d pape d prfessr de sa. Cn-trariando a formação e atuação técnica4 d prfessr de sa, autr prpõe a identidade d prfessr de sa cm aqueeque, aém d ensin de sa, prduz sa cm atiidadeintrínseca ao de ser professor:

o enfque prátic e a cncepçã que faz d prfessr nã umsimples instrutor, mas um pesquisador ou um produtor em suadisciplina, ao contrário, é compatível com as melhores tradiçõesda educaçã sóca, aqueas que nã separam prfessr dósf [...]. (oBIolS, 2002, p. 117).

De fat, aceitams esse entendiment da atuaçã d prfessrde sa cm aquee que ensina e prduz sa numa reaçãdialética, como também, acreditamos que o espírito dos documentosciais respada e incentia esse mesm entendiment em trn dque se cnstitui a atuaçã d dcente em sa.

Para aém d text instituíd n mbit das píticas púbicaspara a educação, também, e de forma bastante profícua, na históriada sa, encntrams inúmeras denições de sa, cada quapensada num cntext particuar, para ns particuares. Pr exem-p, a sa cm cntempaçã da ideia perfeita, em Patã; asa cm caminh para cnheciment d diin, na sa

4 “Em cnseqüência, prfessr nã pde ser treinad em uma série de destrezasou habilidades para o ensino de uma matéria que apenas conhece, senão que temque ser alguém capaz de realizar alguma produção ou prática em sua disciplina,e deve ser formado em princípios que lhe permitam enfrentar criticamente sua

própria prática dcente” (oBIolS, 2002, p. 116).

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cristã; a deniçã pr Mereau-Pnty de que a sa é reapreen-der a er mund; u, ainda, a deniçã deeuz-guatarriana dasa cm a arte de criar u fabricar cnceits. Nesse mesmcaminh, muitas bras de sa prcuram enfrentar e se psi-

cinar diante da pergunta “ que é sa?”, numa cara acepçãde que esta pergunta é pr si só, sóca e requer um tratamentsóc.5 ora, independentemente da deniçã de sa, cadaqua irá reetir, de frma bastante imprtante, cm se trabahar ensin de sa, u seja, deerá cnter em si reex d autr ed cnceit de sa que se tenha cm cenári. Em útima ins-tncia, signica deixar às caras s referenciais teórics imanentesa ensin de sa.

 A especicidade da losoa nas Orientações Curri-culares para o Ensino Médio/Filosoa

Uma prpsta de especicidade da Fisa é apresentada nsPCN/Fisa e nas oCN/Fisa para Ensin Médi. Em ambss dcuments, a perspectia de demarcaçã da especicidade dasa remete as mesms arguments, u seja, é especíc dasa a reexã. vejams s arguments ds dcuments. A teseda especicidade reexia da razã é apresentada ns PCN/Fisa

atraés d argument de que discurs sóc é caracterizadpelo logos:

E embra seja eidente que hje ninguém tem priiégi parti -cular de poder indicar qual é o critério correto e adequado para arazã u erdade, é também crret que nenhuma sa pdesignicatiamente abandnar a pretensã de razã cm a qua eamesma veio ao mundo se, ao mesmo tempo, contradizer exatamenteaquilo que faz, a saber, tentar, com os meios de que dispõe, lançar

luz onde a compreensão não parece alcançar, enxergar para alémdas aparências... (BRASIl, 2000, p. 47).

Mais adiante, cncui argument:

5 Sbre iss, indic, pr exemp, a cnferência prnunciada pr Heidegger em1955, intituada “o que é ist – a Fisa?”, em que tratarems de frma maisamiúde adiante; a bra O que é a Filosoa? de Deeuze e Guatarri; e Que Filoso- a? de Jse ortega e Gasset. Nesses texts, entre utrs que pderíams citar,encntrams reexões sócas, de prfundidade singuar, que enfrentam e

prcuram respnder a prbema acerca da identidade da sa.

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À mutipicidade rea de inhas e rientações sócas e a grandenúmer de prbemas herdads da grande tradiçã cutura só-ca smam-se temas e prbemas ns e cada ez mais cmpexsem seus programas de pesquisa, produzindo em resposta a isso um

uniers sempre crescente de nas terias e psições sócas.No entanto, é também verdade que essa dispersão discreta de umsfar que se me, pr cert, n ritm ng da academia, masque certamente não se esgota nela e que, num outro ritmo, chegamesm a ensaiar um retrn à praça púbica, nã pde ns impedirde recnhecer que há de cmum em nss trabah: a especi -cidade da atiidade sóca cnsiste, em primeir ugar, em suanatureza reexiva. (BRASIl, 2000, p. 47).

Nesse cas, é especíc da sa a reexã cm atiidade,sine qua non nã há fisfia, já que ea nasceu cm refexã. Éiss que a marcu, diga-se de passagem, cm um saber na Gréciacássica. A reexã, segund text ds PCN/Fisa abarca duasdimensões distintas, mas que se confundem, sendo a primeira

A reconstrução (racina), quand exame anaític se ta para ascndições de pssibiidade de cmpetências cgnitias, ingüísticas ede açã. É nesse sentid que pde(m) ser entendida(s) a(s) ógica(s),a(s) teria(s) d cnheciment, a(s) epistemgia(s), [seguida da]crítica , quand a reexã se ta para s mdes de percepçã eação compulsivamente restritos, pelos quais, em nossos processosde formação individual ou coletiva, nos iludimos a nós mesmos e,pr um esfrç de anáise, cnsegue agrá- em sua parciaidade,vale dizer, seu caráter propriamente ilusório. É nesse sentido quepodemos compreender as tradições de pesquisa do tipo crítica daidegia, das geneagias, da psicanáise, da crítica scia... (BRA-SIl, 2000, p. 47, 48. Em negrit n rigina)

Nas oCN/Fisa, argument da especicidade da saiguamente ersa sbre a reexã. Arma-se:

Ademais, se descrevemos alguns procedimentos característicos dosfar, nã imprtand tema a que se ta nem a matriz teóricaem que se reaiza, pdems caizar que caracteriza sfar.Afinal, é sempre distintivo do trabalho dos filósofos sopesar osconceitos, solicitar considerandos, mesmo diante de lugares-comunsque aceitaríams sem reexã (pr exemp, mund existe?) u

de questões bem mais intricadas, como a que opõe o determinismo

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de nssas ações a ire arbítri. Cm iss, a Fisfia cstumaquebrar a naturalidade com que usamos as palavras tornando-sereexã. (BRASIl, 2008b, p. 22).

Mais adiante, cntinua a cnstruçã d argument sbre “aespecicidade da atiidade sóca enquant expressa, sbretud,em sua atiidade reexia” (BRASIl, 2008b, p. 23). Pr m, armao documento que cabe

[...] especicamente à sa a capacidade de anáise, de recns-trução racional e de crítica, a partir da compreensão de que tomarpsições diante de texts prpsts de quaquer tip (tant textssócs quant texts nã sócs e frmações discursias

nã expicitadas em texts) e emitir piniões acerca dees é um dspressupsts indispensáeis para exercíci da cidadania. (BRASIl,2008b, p. 26).

Demarcada a especificidade da fisfia cm atiidade re-flexiva, emergido desses documentos oficiais, a congruência des-sa especificidade com o ensino de filosofia acontece em práticaspedagógicas que sinaliza para a produção de habilidades e com-petências. Nesse caso, o ensino de filosofia, como prática dessa

especificidade da filosofia, configura-se com o propósito de pro-duzir no educando as competências da leitura, escrita e discussão“igadas à natureza argumentatia da Fisfia e à sua tradiçãhistórica” (BRASIl, 2008b, p. 26). A atiidade refexia se manifes-taria nas aulas de filosofia durante a leitura de textos filosóficos,na formulação de argumentos e no debate de ideias filosóficas ena produção de textos de cunho filosófico, de forma que os textosde fisfia sejam s subsidiadres e a atiidade refexia sejao específico do filósofo no enfrentamento do texto de filosofia.

Cnstitui-se um cntrapnt a esta especificidade da fisfia aspráticas pedagógicas que versam sobre a transmissão de infor-maçã, u seja, egisa cntra a atiidade refexia da fisfiao professor de filosofia que transmite passivamente informaçõesconceituais da história da filosofia, como se a filosofia fosse ca-

 beda de nmes, datas, cnceits e ideias que aun d EnsinMédi dee memrizar para adquirir cnheciments de fisfia.Ao contrário disso, a filosofia é tensional, pois nos tira do lugarcmum num chamament para a inquietude. Em utras paaras,

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a filosofia, por ser diversa e plural, não se encontra no lugar daverdade universal e inquestionável, ou de conceitos que se bastama si mesm. Ea é tensina prque text fisófic ns tira dterritório da certeza, lançando-nos na desconfortável inquietude.

Assim, text fisófic jga estudante n ugar da inquietudesbre certezas até entã imunes à atiidade refexia cm, prexemplo, o que é o bem e o mal, o mundo existe, o que é a verda-de, que é a iberdade e determinism, que é be. Dada apluralidade de filosofias que tratam dessas questões, o aluno se vê

 jgad n ugar da inquietaçã em nã ter respstas definitias,obrigando-o a produzir argumentos, falas e textos como produtode sua reflexão filosófica. É nessa inquietude que a filosofia noslança, que a torna vivente, tensional, e que nos movimenta para

lugares sempre diferentes daquele nos quais nos encontrávamos. Éneste foco que a aula de filosofia não é passiva, não é transmissãode infrmaçã, mas é prduçã, é atiidade fisófica. Deemssalientar o avanço desses documentos, na medida em que visamir de encntr à tradiçã escar que tma a experiência educatiacomo domínio de informação, como memorização e como a repro-duçã d discurs instituíd. Nesse cas, esses dcuments bjetama prática do ensino de filosofia como memorização e reproduçãode datas, nomes e principais ideias de filósofos seguidos a partir

da história da fisfia absutamente inear. Essa anáise smentefaz sentido se a especificidade da filosofia, enquanto atividaderefexia, estier cnstituída numa ia de mã dupa, u seja, arefexã fisófica seja da cmpetência prática d prfessr e daun. Nesse cenári, as oCN/Fisfia demarcam que

[...] a metdgia mais utiizada nas auas de sa é, de n-ge, a aula expositiva, muitas vezes com o apoio do debate ou detrabahs em grup [...] [mas que] Em funçã de aguns eements

preponderantes, como o uso do manual e a aula expositiva, é pos-síe dizer que a metdgia mais empregada n ensin de Fi -sa desta da cncepçã de ensin de Fisa que se pretende.(BRASIl, 2008b, p. 36).

Iss demarcad, a especicidade da sa, enquant práticareexia, é materiaizada n ensin de sa, na medida em que “prfessr dee cnidar s auns à prática reexia” (BRASIl,2008b, p. 37).

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Diante dessa apresentaçã da especificidade da fisfia, cmatividade reflexiva, presente nesses documentos oficiais, podemosinferir uma digressão em torno dessa concepção. A afirmação deque é específico da filosofia a reflexão remete, na verdade, a uma

atividade da filosofia6

. Em utras paaras, a refexã marca aação específica da filosofia. Nesse caso, como uma ação, a refle-xão é específica da atividade do filósofo, de forma que é a açãodo filósofo em refletir que o diferencia e diferencia a filosofia deoutras áreas de saber. Porém, a reflexão é, de fato, uma atividadepertencente a gêner human. o hmem é um anima capaz derefletir sobre si mesmo, sobre o outro e sobre as coisas do mun-do. Nesse caso, a atividade reflexiva não diferencia, mas, pelocntrári, iguaa s hmens em seres pensantes. Ist pst, a de-

finição da especificidade da filosofia nos permite remeter a outrasinterrogações, a saber, qual é a natureza da reflexão filosófica quea diferencia de utras frmas de refexã? Seria a capacidade ar-gumentatia? A rigrsidade na eabraçã das definições e dscnceits? o enfrentament na natureza da refexã fisófica quepoderia demarcar a diferença da reflexão do filósofo e do soció-logo ou do psicólogo, por exemplo, não encontra moradia nes-ses documentos oficiais, de forma que fica estabelecido um hiatoconceitual acerca do que é, especificamente, a reflexão filosófica.

Sbre a especicidade da sa, pdems, pr m, eantarutra questã em trn da demarcaçã da atiidade reexia cm especíc da sa. Cnfrme armams acima, enquant ree-xã, a especicidade da sa está n camp da açã. Assim, hámargem para interrgarms sbre a especicidade da sa emsi mesma, u seja, que é especíc da sa em si mesma e nãem uma atiidade sóca? A tentatia de eabrar uma respstaplausível a esta questão implica num debruçar-se, não na atividaded ósf, mas n interir da sa, pis é n interir dea que

esta pergunta pderá ser respndida. Um exemp de enfrentamentfrontal dessa questão encontra-se na obra de Heidegger O que é isto –

6 Mari Arie G. Prta, em  A losoa a partir de seus problemas , caminha nessamesma direçã, atribuind a especicidade da sa à sua atiidade racina:“A sa nã é utra cisa que a cnsumaçã pena da racinaidade. Umarazã que nã cumine em sa é uma razã mutiada; um discurs sócirracina, uma cntradiçã em terms” (PoRTA, 2002, p. 42). A partir dessaarmaçã, irá caracterizar as especicidades da sa a partir d exercíciracina cm escareciment, intersubjetiidade, agritm e reexiidade

(PoRTA, 2002, p. 44-49).

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a Filosoa?. A fazer a interrgaçã pe que é  a sa, a decinaçãd erb “ser” remete à pergunta pe que é especíc u aqui queé essencial7 à sa e sem a qua ea deixa de ser sa. Nessecas, a especicidade da sa denta aqui que faz dea ser

que é – u seja, sua identidade – prém que a diferencia – a mesmtemp que a identica cm ea mesma – das utras frmas de saber.Buscar ser da sa ns ança na tensinaidade da identidade eateridade da sa. Para Heidegger, trata-se da grande perguntapelo ser; esta, de fat, uma pergunta estritamente sóca. E é aquique encontramos, nesta obra, o posicionamento heideggeriano paraa pergunta “ que é a sa?”. Trata-se, de fat, de uma respstaque remete à metafísica a essenciaidade da sa. Assim, é espe-cíc da sa a busca pe ser d ente: “A sa prcura que

é ente enquant é. A sa está a caminh d ser d ente, querdizer, a caminh d ente sb pnt de ista d ser” (HEIDEGGER,1974, p. 216). Nã bstante tmarms Heidegger cm cntrapntà prpsta ds dcuments ciais, pderíams fazer essa cntra-posição a partir de Nietzsche, por exemplo, em que emerge comoespecíc da sa prcediment geneaógic8 , ou a proposta deDeeuze e Guatarri, da especicidade da sa enquant prduçãde conceito9 , ou ainda a proposição marxista10 da sa cm meide mudança da realidade material do homem.

7  Cnfrme armaçã de Heidegger: “A questã de nss encntr (a cnferênciaintituada o que é ist – a sa?) refere-se à essência da sa” (1974, p.214. Entre parênteses é meu).

8  Essa especicidade da sa é manifestada pr Nietzsche numa nta à Gene-agia da Mra (1988, p. 55), em que arma: “Tend em ista ta pssibiidade,prpõe-se a questã seguinte; ea merece a atençã ds ógs e histriadres,tant quant a ds prssinais da sa. Que indicação fornece a ciência dalinguagem, em especial a pesquisa etimológica, para a história da evolução dos conceitos

morais?”. Essa incuaçã da atiidade sóca cm a inguagem defendidapr Nietzsche é esmiuçada pr Fucaut em  As palavras e as coisas (1990), bemcm a estreita reaçã entre a sa e geneagia é discutida pr Fucautno texto Nietzsche, a genealogia e a história, em  Microfísica do poder (1995) e prEric Bnde em  As aspas de Nietzsche: lologia e genealogia.

9  É a tese principa densamente argumentada pr Deeuze e Guatarri na bra Oque é Filosoa?. A partir da deniçã de que apenas a Fisa prduz cncei-ts, esses autres denem a especicidade da sa cm a arte de criar efabricar cnceits. N bj dessa tese, prfessr Síi Ga apresenta, emasta prduçã bibigráca, um ensin de sa cm prduçã cnceitua.Trata-se, entã, de utr registr em trn da especicidade da sa.

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  Particularmente em  A ideologia alemã  e  Manifesto do partido comunista.

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outra digressã emerge cm necessária nessa anáise da especi-cidade da sa a partir das oCN/Fisa. A deniçã prpstanas oCN/Fisa, à uz, de fat, ds PCN/Fisa, da especicidadeda sa enquant atiidade reexia é criticáe e emerge cmuma, dentre muitas pssibiidades de deniçã da especicidade dasa, prém, iss dee ser registrad, demarca um camp cncei-tual, com o qual nos opomos, aceitamos ou propomos alternativas.De tda frma, a marcar um camp cnceitua, trna a discussãda especicidade da sa pssíe dentr deste dcument. osenã que querems reetir nã é cm esse camp cnceitua, masa intrduçã feita nas oCN/Fisa d tema da cidadania n cam-p cnceitua da especicidade da sa. o dcument nã faz exercício de argumentar conceitualmente em que registro a cidadaniafaz parte da especicidade da sa. Ea até pderia emergir cm

especíc da sa – há eements na histrigraa sócapara iss – tarefa decinada nesse dcument, uma ez que fecha especíc da sa na atiidade reexia. Na erdade, as oCN/Fisa, a trazer tema da cidadania, bjetiam respnder asdis dcuments nrmatis da educaçã brasieira. Na lDB, a ci-dadania aparece cm naidade síntese da educaçã média11. Porutr, nas Diretrizes Curricuares Nacinais para Ensin Médi,à uz da lDB, é namente ccada a cidadania cm ar para arganizaçã curricuar d Ensin Médi12. Caramente, text das

oCN/Fisa intrduz essa discussã da cidadania na tentatia deestabelecer uma resposta e fazer referências a estes dois documentosnrmatis, demarcand de que frma a sa pde, a cntent,cntribuir cm a frmaçã para exercíci da cidadania. Iss ca carna seguinte indagaçã das oCN/Fisa: “A pergunta que se ccaé: qua a cntribuiçã especíca da Fisa em reaçã a exercícida cidadania para essa etapa da frmaçã?” (BRASIl, 2008b, p. 26).A suçã prpsta nas oCN/Fisa ersa para as cmpetências daeducação, o que também me parece, particularmente, problemático.

11  Art. 35. o ensin médi, etapa na da educaçã básica, cm duraçãmínima de três ans, terá cm naidades: [...] II - a preparaçã básicapara o trabalho e a cidadania do educando, para continuar aprendendo,de md a ser capaz de se adaptar cm exibiidade a nas cndiçõesde cupaçã u aperfeiçament psterires; [...].

12  Art. 2º. A rganizaçã curricuar de cada esca será rientada pes aresapresentads na lei 9.394, a saber:I - s fundamentais a interesse scia, as direits e deeres ds cidadãs, derespeit a bem cmum e à rdem demcrática.

  II - s quem frtaeçam s íncus da famíia, s açs de sidariedade humana

e s de terncia recíprca.

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Arma-se: “A respsta a esta questã destaca pape pecuiar daFisa n deseniment da cmpetência gera da faa, eitura eescrita – cmpetência aqui cmpreendida de um md bastante es-pecia e igada à natureza argumentatia da Fisa e à sua tradiçãhistórica” (BRASIl, 2008b, p. 26). A respsta é cerente, já que a cida-dania é um exercíci, a Fisa pde cntribuir cm esse exercícina medida em que desenvolve competências de exercício da fala, daeitura e da escrita. ou seja, essa me parece a argumentaçã, quand aun exercita bem a faa – enquant expressã ra de sua reexãsóca –, a escrita – enquant prduçã materia de sua reexãsóca – e a eitura – enquant subsídi para a reexã sóca –,essas competências devem contribuir no exercício geral da cidadania.Iss é cerente. o prbema se instaura em utr registr. Quand asoCN/Fisa fram escritas, ainda rezaa na lDB fams artig

36: “Dmíni ds cnheciments de Fisa e Scigia necessárisa exercíci da cidadania”.13 obserems que a lDB faz referênciaa cnheciments de sa necessáris a exercíci da cidadania enã em cmpetências necessárias a exercíci da cidadania, u seja,quais cnceits, ideias, sistemas da sa pdem cntribuir para exercíci da cidadania? Aqui deems apntar que a lDB emergede frma absutamente diretia naqui que se esperaa da s-a. Na erdade, este artig 36 jgaa para s prfessres de sarespnderem a seguinte pergunta: “Quais cnheciments e cnte-

úds cê pde ministrar para cabrar cm nsss jens para exercíci da cidadania?” Essa era, de fat, a demanda sicitada àsa cm sua tarefa na educaçã de níe médi. Nã bstantea regaçã desse artig, fat de a sa ter a cnguraçã de

13 Regad pea lei nº 11.684, de 2008, que institui a brigatriedade da discipinade sa e scigia n Ensin Médi.

14 A lei 11.684 atera art. 36 da lei no 9.394, de 20 de dezembr de 1996, queestabelece as diretrizes e bases da educação nacional instituindo a obrigatorie-

dade da discipina de sa e scigia ns currícus das escas de níemédi, atraés d incis Iv que reza: “serã incuídas a Fisa e a Scigiacm discipinas brigatórias em tdas as séries d ensin médi.” Cnfrmeims, a lei 11.684 institui frmat discipinar para ensin de sa. Essefrmat dee se cnstituir num bjet de anáise bastante interessante para spesquisadres d ensin de sa, particuarmente numa reexã que ersasbre a teria d currícu em sua cnguraçã discipinar. Nã há espaç parafazerms essa reexã neste text, mas, nã bstante iss, gstaria de sinaizaralgumas ideias sobre essa temática, particularmente quanto ao entendimento docurrícu cm territóri de exercíci de erdades cuja naidade é prcessare cntrar pessas. Nesse iés, currícu é um instrument para “panejar

cienticamente as atiidades pedagógicas e cntrá-s de md a eitar que

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disciplina14 a partir da lei 11.684, ea ainda respnde à lDB e às Di-retrizes Curricuares Nacinais para Ensin Médi que, cnfrmeims, cca exercíci da cidadania cm naidade da educaçãmédia. Nesse cas, a discipina de sa tem seu cmprmiss, taqua tdas as discipinas, cm essa naidade da lDB, aém de res-pnder as ares prpsts nas Diretrizes Curricuares Nacinaispara Ensin Médi. Eidente que a sa, nesse cas, nã estáimune às perspectias que, de uma frma u de utra, acabam prdireciná-a em determinad sentid, seja ee mraizante u nã.

A este respeit, resgat text de Pedr Gntij e Erasm B.vaadã, Ensino de filosofia no ensino médio nas escolas públicas doDistrito Federal (CADERNoS CEDES, 2004), escrit a partir dasrespectias pesquisas de mestrad defendid junt a Prgra-ma de Pós-Graduaçã em Educaçã da Uniersidade de Brasíia.Nesse texto, os autores, a partir de entrevistas com os professoresde fisfia d Distrit Federa, estabeecem três sentids que sprofessores de filosofia atribuem para o ensino de filosofia nasescas: a) a fisfia cm espaç em que se frnecem as aunsinstrumentos e técnicas para os ensinarem a pensar, estudar eescreer; b) a fisfia cm instrument de dutrinaçã píticae ideógica; a partir da percepçã da situaçã de aienaçã ds

o comportamento e o pensamento do aluno se desviasse das metas e padrões

estabeecids” (SIlvA; MoREIRA, 1995, p. 7). As discipinas, pr sua ez, quecompõem o currículo das escolas não desempenham um papel neutro. É, defato, através das disciplinas que determinados valores, ideologias e visões demundo são apresentados aos alunos. Por trás do currículo sempre há interesses:“o currícu nã é um eement incente e neutr de transmissã desinteressa-da d cnheciment scia. o currícu está impicad em reações de pder, currícu transmite isões sciais particuares e interessadas. o currícu prduzidentidades indiiduais e sciais particuares” (SIlvA; MoREIRA, 1995, p. 8).o cnheciment incuad nas discipinas curricuares desempenha pape defrmar pessas, prduzir subjetiidades e sidicar identidades, frmand cn-ceits, ares, idegias e isã de mund. Segund Tmás Tadeu, “na esca,

considerou-se os componentes curriculares como o instrumento por excelênciade cntre scia que se pretendia estabeecer. Cube, assim, à esca incucar sares, as cndutas e s hábits ‘adequads’.” (SIlvA; MoREIRA, 1995, p. 10).A partir desse pressuposto de análise do currículo, se torna imperativo indagar quant a sa, cm cmpnente curricuar sb frmat de discipina,iguamente exerce ta tarefa? Cm se administra a eminente tensã da saentre essa tarefa de inculcar valores e procedimentos e sua tradição histórica emienar de iberdade e autnmia de saber? Cm garantir iberdade para que asauas de sa se cnstituam cm territóris da diersidade e mutipicidadede sas mais distintas pssíeis? Essas indagações merecem uma reexãapurada e densa a qua s estudiss d ensin de sa deem enfrentar.

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alunos, configura-se como a tarefa da filosofia libertá-los dessaaienaçã; c) ensin de fisfia cm instrument de dutrina-ment mra (GoNTIJo; vAlADÃo, 2004, p. 296). Particuarmenteeste terceiro sentido, que é o que nos interessa, reflete, segundo

s autres, entendiment dad à fisfia nas escas de Ensi-n Médi presente nas Diretrizes Curricuares da Secretaria deEducaçã d Distrit Federa. Em utr dcument nrmati,mais recente, os mesmos valores éticos e sociais são reafirmados,particularmente na parte que trata dos fins e princípios nortea-dres: “os princípis étics da autnmia, da respnsabiidade,da solidariedade e do respeito ao bem comum são valorizadosna prática pedagógica cm nrteadres que sã da ida cidadã”(DISTRITo FEDERAl, 2008, p. 16). Ainda segund s autres, nas

Diretrizes Curricuares d Distrit Federa, a estipuar s aresde “respnsabiidade pe bem cmum” e “recnhecer s direitshumans e utar pr ees” (GoNTIJo; vAlADÃo, 2004, p. 297), aSecretaria de Educaçã manifesta, na etra da ei, desej

[...] cm a sa n ensin médi seja, de cert md, puc -sóc e mais um prcess de dutrinament étic. Quand enfatizatanto o reconhecer, o valorizar e optar os aspectos acima citados,parece haver toda uma visão de mundo, de sociedade e de ser hu-

man que cca pape da sa cm aquea que pssibiitaráchegar a que é bem e que é cert. Expressads pr certa isãde bem cmum, de direits humans, de indiídu autônm, dedeseniment e de reexã ética, puc sbra espaç para umacrítica a estas cncepções. (GoNTo; vAlADÃo, 2004, p. 297).

Esses autres manifestam precupaçã cm a incuaçã dafilosofia ao instituído político, com documentos normativos, poisapontam a real possibilidade de direcionamento político e ideo-

lógico da filosofia, comprometendo aquilo que ela tem de maisvalioso, sua diversidade conceitual e autonomia reflexiva. Paraaém d Distrit Federa, a lei de Diretrizes e Base da EducaçãNacina e as Diretrizes Curricuares Nacinais definem arese princípios que sustentam a educação nacional. Nesse caso, asDiretrizes, inspiradas na lDB, definem s ares nrteadres daeducação nacional:

Art. 2º A rganizaçã curricuar de cada esca será rientada pes

ares apresentads na lei 9.394, a saber:

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I - s fundamentais a interesse scia, as direits e deeres dscidadãs, de respeit a bem cmum e à rdem demcrática;II - s que frtaeçam s íncus de famíia, s açs de sidarie -dade humana e de terncia recíprca. (BRASIl, 1998, art. 2°).

Notemos uma singular afinidade de discurso e de valores entres dcuments nrmatis da educaçã d Distrit Federa e sdocumentos normativos de cunho nacional. Há, de fato, estreitacnsnncia aratia, mesm prque a egisaçã estadua nãpde sbrepr-se à federa. o que crre, entã, é a rganizaçãda educaçã, seja em níe federa, estadua u municipa, a partirdesses princípios e valores que vinculam determinado discursoaaiati. ora, na medida em que a lDB apnta a necessidade

de conhecimentos de filosofia para o exercício da cidadania, oudefine a filosofia como disciplina obrigatória, o ensino de filoso-fia não está descolado desses documentos normativos, como umaiha. Cm ea está n aparat escar na frma de uma discipi-na, a filosofia responde também a esses documentos oficiais queregulam e organizam a educação nacional. A constatação, a partirda faa ds prfessres d Distrit Federa apntadas peas pes-quisas de Gntij e vaadã, da prximidade da fisfia cm sdocumentos oficiais e, portanto, apresenta o sentido da filosofia

como doutrinação moral, é revelador desse direcionamento ques dcuments ficiais pstuam à fisfia. Iss prcede prqueos documentos não são neutros e desinteressados. Pelo contrário,postulam valores de interesse do legislador, estando a filosofia,como disciplina, inserida nesses discursos.

À guisa de cncusã, remet-me à igrsa reexã de Niet-zsche sbre s perigs da sa ser institucinaizada n inte-rir d Estad, particuarmente desenida na quinta parte deSchopenhauer como educador.15 Cnfrme apntad acima, a sa

foi acolhida como um saber importante na formação para a cida-dania, estand, prtant, achida n interir d prjet educaci-na prpst pe Estad na etra ds dcuments ciais – lei deDiretrizes e Bases da Educaçã Nacina, Diretrizes Curricuares

15 A referência dessa crítica de Nietzsche direciona-se para a universidadeaemã, particuarmente a prjet de uniersidade, tad para a frma-çã d técnic, instituíd pr Bismarck, prém, aerta cabe, acreditams,de frma cntundente para prcess de institucinaizaçã da sa

n Ensin Médi atraés ds dcuments ciais pr nós discutids.

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Nacinais para Ensin Médi e orientações Curricuares para Ensin Médi/Fisa. Textuamente, recnheciment da im-prtncia da sa para prjet educacina estata é encn-trad, aém de ns dcuments citads, n Parecer 38/2006 d

Cnseh Nacina de Educaçã/Cmara de Educaçã Básica emsua anáise d mérit da sa cm discipina a partir de re-ferenciais éticos, e de seu compromisso na formação humanística:

[...] reitera-se a imprtncia e ar da Fisa e da Scigiapara um processo educacional consistente e de qualidade na for-maçã humanística de jens que se deseja sejam cidadãs étics,crítics, sujeits e prtagnistas (BRASIl, 1998).

Recnhece-se, entã, a institucinaizaçã da sa cm umsaber inserido numa macropolítica educacional. É aqui que reme-tems nssa atençã a igrs aerta de Nietzsche (2003, p. 210)as perigs duma sa institucinaizada, pis a sa deeriarecnhecer “também, a mesm temp, tud aqui que Estadexige no seu próprio interesse: por exemplo, uma forma determina-da de reigiã (mra), de rdem scia”. Numa passagem psterircntinua seu aerta: “Em primeir ugar, Estad esche para siseus seridres ósfs e, para dizer a erdade, s esche na me-

dida em que tem necessidade dees para suas instituições [...]. Emsegundo lugar, ele obriga aqueles que escolhe a permanecer numlugar determinado, entre homens determinados, a aí exercerem umaatiidade determinada” (NIETZSCHE, 2003, p. 211). Pr m,

o Estad jamais se imprta cm a erdade, sa cm aqueaque he é úti – mais exatamente, ee se cupa em gera cm tud que he é úti [...] Aiança d Estad cm a sa nã tem prtantsentid, senã quand a sa pde prmeter ser incndicina-mente úti a Estad... (NIETZSCHE, 2003, p. 217).

Nã querems defender a retirada da sa cm discipinaobrigatória dos currículos, tal qual o estatuto que atualmente elagoza. Queremos, não obstante, fazer um alerta para as possíveis im-picações píticas e ideógicas que a institucinaizaçã da sapde trazer em seu bj. Trata-se d fat de a esca nã ser umespaç neutr e de nã estar imune as dcuments ciais nr-matizadres, bem cm de discurss hegemônics que estabeecemisadas interpretações. Saientams, utrssim, a imprtncia de asa estar na esca até para, se assim prfessr estipuar em

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seu cenári, incuar discurss questinadres d própri Estad udescnstruçã discursia de discurss ideógics, mrais, cientícse reigiss. Trata-se, para nós, da esca cm um espaç para dese, nã de sa, u de  A Filosoa , mas de sas em sua

mais ampla diversidade conceitual e heterogeneidade discursiva.É precis, para tant, a sa resguardar aqui que ea tem demais precioso, a saber, sua liberdade, autonomia e independência dequaquer frma de pder hegemônic, de quaquer discurs institu-íd, de quaquer erdade uniersaizada. É esse estatut da sacm autarquia, cm prjet sempre abert e em cnstruçã, cmmetamrfse cnceitua que desejams que ea faça parte, de frmaefetiva, do cotidiano da escola.

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Capítulo 11

O ensino de losoa e a

questão da emancipação

* Pós-Dutr em sa pea Uniersidade de Paris vIII. Atuamente é prfessrtituar da Uniersidade d Estad d Ri de Janeir e Pesquisadr d CnsehNacina de Deseniment Cientíc e Tecnógic (CNPq) e d Prciência(UERJ/FAPERJ).

Walter Omar Kohan* 

“A exigência de emancipaçã parece ser eidente numa demcra-cia”. Assim cmeça uma céebre interençã púbica de Th. Adrn(1995, p. 169). Adrn tem razã: é eidente que nã há demcraciasem pessas emancipadas. Prém, se derms mais atençã à frase, aeidência se trna mais difusa: qua demcracia? Cm entender aemancipaçã? Pr que ea se cca cm uma exigência? Para quemé exigida a emancipaçã? Quem é sujeit que exige a emancipaçã?Qua pape d ensin de sa em reaçã cm a emancipaçã?

As perguntas pderiam cntinuar. De tã diáfana, a armaçãtorna-se extremamente enigmática e suspeitosa. Não pode ser deutra maneira quand um ósf apea à eidência. É precis as-culhar nas evidências, encontrar seu sentido, elucidar suas aberturas,desandar suas clausuras. A questão é ainda mais complexa quandoa própria sa e seu ensin sã ccads cm um caminh quecnduz à emancipaçã numa sciedade demcrática. De fat esse é caminh mais trihad para justicar a brigatriedade da san atua Ensin Médi n Brasi. Mas será que é um bm caminh?

É uma psiçã interessante para a sa? ou entã, cm pensare se psicinar perante esse caminh sugerid?É preciso aprofundar a busca. É necessário considerar mais

ampamente sentid que Adrn cnfere à exigência da emanci-paçã. É desejáe entender a frça que cnceit de emancipaçã

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tem tericamente e n mbit d ensin de fisfia n Brasi.Cm estratégia argumentatia, num primeir mment (“Adrn,Kant e a educaçã para a emancipaçã”), tentarems aprfundara compreensão da citada frase apresentando as teses principaisde Th. Adrn a respeit da reaçã entre educaçã e emancipa-çã. Num segund mment, (“Rancière, Jactt e a emancipaçãinteectua”), darems ugar a uma z crítica e dissnante cmreaçã a esse md de pensar a emancipaçã: a de J. Rancière emO mestre ignorante. Finamente, numa terceira seçã (“o ensin defisfia entre escareciment e desencntr”), buscarems tiraralgumas consequências das análises precedentes para pensar ougar da emancipaçã n camp d ensin de fisfia n Brasi.

 Adorno, Kant e a educação para a emancipação

Desde a mdernidade, a emancipaçã tem sid um mte para aeducação, em diversos contornos teóricos. Na tradição crítica, é bemcnhecid n Brasi um ir de Th. Adrn rganizad a partir depaestras e interenções radiais e pubicad justamente sb títude Educação e Emancipação (ADoRNo, 1995). Nee, ósf fazcnferências e entreistas cm Hemut Becker e Gerd Kadebachna década de 1960, nas quais se manifesta pubicamente sbre seumodo de entender as relações entre educação e política.

Nessas interenções, bjeti é iguamente armati e nega-tivo: pensar como a educação pode contribuir para a formação deuma erdadeira demcracia; e cm ea pde ajudar a desterrar nazismo da sociedade alemã. Para isso, Adorno remonta até Kant oape pr uma educaçã emancipadra. Certamente, Kant nã utii-za a palavra emancipação e sim “escareciment”. Emprega tambémpaaras assciadas à ideia de emancipaçã, cm menridade e tu-tea. Cm assinaa Adrn, Kant, n seu céebre ensai “o que é Escareciment?”, dene justamente escareciment cm a “saída

ds hmens de sua aut-incupáe menridade”. Para Adrn, esseprograma deve estar associado a toda democracia que se preze detal, na medida em que uma democracia se sustenta no exercício dopensamento pela livre vontade dos cidadãos. É o pensar livre e ri-goroso que permite alguém determinar o que é ou não é correto deser feit em determinada situaçã (1995, p. 174). Quand iss nãacontece, quando os habitantes de uma democracia não se servem deseu próprio entendimento, quando estão sob a tutela de outrem, elapde cnduzir à barbárie, a hcaust, cm na própria históriada Alemanha. Por isso, uma educação para a emancipação é tambémuma educação contra a barbárie.

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Nesse sentido, é também conhecida a exigência primeira da edu-caçã para Adrn: “A exigência de que Auschwitz nã se repita é aprimeira de tdas para a educaçã” (1995, p. 119). Na perspectia deAdorno, foi pela falta de consciência, pela ausência do uso pleno deseu entendimento, que milhares de cidadãos alemães participaramd massacre d p judeu. Pr iss é necessári que a educaçãse te para a frmaçã da “aut-reexã crítica” (1995, p. 121).Adorno entende assim a educação para a emancipação como umaeducaçã para a autnmia, para a reexã, a resistência e a autde-terminaçã: cna em que us ire e sberan d pensar pr partede cada indivíduo seria uma ferramenta adequada para combater airracionalidade que tomou conta da história europeia no século XX.Se a Aemanha caiu na barbárie, se s aemães participaram de umprocesso histórico monstruoso e irracional foi porque não tinham

consciência dele, porque não podiam perceber aonde levaria tudoaquilo do qual tomavam parte sem ter plena consciência.

Adorno mostra, de modo interessante, como a emancipação éag dinmic, em prcess. Para iss, também se apia em Kant, quediferenciou entre duas formas da palavra  Aulärung para referir-se aseu mment históric. Cm efeit, Kant armaa que nã iia numaépca escarecida (aufgeklärten), mas de escareciment ( Aulärung),isto é, habitava um tempo que iria gerar esclarecimento, que permi-tiria ao gênero humano, gradativamente, sair dessa incapacidade de

fazer us de seu própri entendiment (KANT, 1985, p. 112). CmAdorno percebeu claramente, mal se pode dizer que a sociedade con-temprnea tenha reaizad prjet kantian, sequer aprendid aiçã de Auschwitz. Muit pe cntrári, sã tants e tais s fatresque se põem à emancipaçã ds indiídus, na épca da “indústriacutura”, segund s deseniments da Dialética do Esclarecimento ,que “nenhuma pessa pde existir na sciedade atua reamente cn-frme as suas próprias determinações” (ADoRNo, 1995, p. 181). Acntrári, há nea ssticads dispsitis de frmaçã na hetern-

mia. Dai a imprtncia singuar da educaçã em gera e d ensin desa em particuar: é só atraés de um ng e trabahs prcessde formação que se pode reverter essas tendências. Por isso também aurgência de uma verdadeira formação na autonomia e a sua impossi-

 bilidade política de ser postergada: não há emancipação política semuma educaçã pítica cnsistente cm seus ns e princípis.

Adorno é sensível a uma das mais transitadas respostas frentea esse panrama: perigs caminh da “cnscientizaçã”. Mesm

 bem intencinada, ea mantém – e até mesm pde aprfundar – afonte do problema: a falta de uma consciência esclarecida por simesma em tds s habitantes de uma demcracia. o prbema

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não é menor: trata-se de formar uma consciência para que ela re-conheça este ou aquele conteúdo de verdade ou de formar umacnsciência que erdadeiramente pssa se exercer pr si própria?Adorno reconhece a complexidade do problema, seu caráter para-doxal, e vê nessa oposição um falso problema na medida em quea consciência não se exerce no abstrato e é preciso fornecer os ele-ments e as cndições para seu ire exercíci. Ist é, a educaçãseria imptente se ea nã pudesse: a) mstrar que, n capitaismcntemprne, a rganizaçã d mund cnerteu-se a si mesmaem idegia; b) afirmar bm us da capacidade de jugar de cadaum ds participantes de uma demcracia. De md ta que umverdadeiro processo de formação precisa fornecer tanto os elemen-tos necessários para um exercício soberano e livre da consciênciaquanto as condições para sua prática.

É nesse sentido, interpreto, que deve ser entendido o chamado deAdrn (1995, p. 141) à “prduçã de uma cnsciência erdadeira”:uma cnsciência que seja frmada para pder se exercer erdadeira-mente cm ta, enquant cnsciência crítica e sberana. Em utraspalavras, é necessário que um sistema educacional crie as condiçõespara exercíci da cnsciência, que, na Indústria Cutura, passampela desconstrução dos mecanismos hostis a um uso livre e soberanoda consciência e, a uma só vez, pela disseminação das técnicas e dis-psitis necessáris para seu ire exercíci. Uma ez emancipada,

Adrn cna que a cnsciência erdadeira nã pderia eschero que ela tem escolhido sob as formas da alienação: o massacre, ohorror, o holocausto, a própria ausência de razão.

Assim, o problema da formação reveste uma forma inevitavel-mente ambígua e paradxa: é precis abastecer à cnsciência de umaverdade para que a faculdade de pensar possa exercer-se sem as con-dições que lhe impõe, em nossos dias, a verdade do capital, e paradesterrar tda pssibiidade da erdade sem razã. Também pr iss,e na medida em que pensar é a capacidade de se fazer experiências

inteectuais (ADoRNo, 1995, p. 151), uma educaçã para a emanci-pação é a uma só vez uma educação para a experiência e, ao mesmotempo, fornece as condições que tornam possível essa experiência.Uma pergunta que parece ineitáe é: qua é a reaçã e imiteentre as cndições da experiência e a própria experiência? Em utraspalavras e sob a forma de outras perguntas que se desdobram daprimeira: Quais sã as cndições para uma “erdadeira” experiênciade pensament? Desde qua erdade u razã se instaura a cndiçãe pssibiidade das erdades e ds uss da razã? Cm se egitima ugar desde nde se juga erdadeira a cnsciência (u que ea estáem cndições de se exercer erdadeiramente)?

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Em td cas, Adrn sintetiza um md de pensar as reaçõesentre educaçã (ensin de sa) e emancipaçã, estabeecendum nex que ea da primeira à segunda: a educaçã é um caminhnecessário, imprescindível, para a emancipação individual e social.Sem educaçã crítica – que, segund ims, n seu cas, signicasem uma formação política e cultural que crie as condições paraum exercíci autônm, ire e sberan da cnsciência – nã háemancipaçã pssíe. Em cert sentid, a educaçã é também espaço de encontro do indivíduo com a sociedade: uma educaçãoque permita a emancipação individual, através da formação crítica, éa cndiçã e caminh mais sóid para a emancipaçã scia. Semeducação crítica não há emancipação possível, em qualquer sentidointeressante da palavra, nem dos indivíduos nem dos coletivos.

Rancière, Jacotot e a emancipação intelectual

A emancipaçã fi também tema centra de um cntempr-neo de Kant, figura menor da história das ideias, o professor deliteratura francesa, Joseph Jacotot, que o filósofo francês contem-prne J. Rancière recupera e recnfigura num ir já bastantecnhecid n Brasi, intituad O mestre ignorante. Cinco lições sobrea emancipação intelectual (Be Hriznte: Autêntica, 2002). Jacttse apresenta como uma figura singular para pensar a emancipação

indiidua, que Rancière cnsidera cm um mment essencia daemancipaçã scia (RANCIÈRE, 2003, p. 186). Trata-se certamentede uma visão da emancipação muito distante daquela oferecidapr Adrn. Se fiósf frankfurtian cnsidera a educaçã in-dispensáe para acançar a emancipaçã, para Rancière, a eman-cipaçã nã é de md agum institucinaizáe. Se a educaçã

 bem entendida ea, para Adrn, à emancipaçã, para Rancièrenão há ordem pedagógica que emancipe na medida em que todaordem pedagógica nega o que a emancipação exige.

Taez seja prtun embrar a estratégia argumentatia de Omestre ignorante , que se resumiria assim: a) Tud está em tud: numapaara estã tdas as paaras; em cada uma de suas manifestaçõesestá inteiramente a ptência da inteigência humana; b) tdas as in-teigências sã iguais; hmem é uma ntade serida pr umainteigência; há desiguadade nas manifestações da inteigência hu-mana, mas nã na capacidade inteectua; c) emancipar é reear umainteigência a ea mesma; uma ntade pde bedecer utra ntade,mas uma inteigência só dee se bedecer a si mesma; d) embrutecer ésubmeter uma inteigência a utra inteigência; e) a rdem expicadra

que domina a instituição pedagógica é essencialmente embrutecedora,

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na medida em que pressupõe uma hierarquia das inteigências; nãhá rdem pedagógica sem hierarquia das inteigências; f) um mestreemancipador é aquele que ignora a desigualdade intelectual institu-ída e, a partir da igualdade das inteligências, mantém o que buscaem seu caminh; g) a iguadade das inteigências é um princípi uaxima pític: uma piniã a ser ericada e nã uma erdade a serdemnstrada; h) há duas mentiras fundamentais circuand na rdemscia, inimigas da emancipaçã inteectua: 1) eu dig a erdade; 2)eu nã pss dizer; i) só há iguadade entre hmens u indiídusrazoáveis, mas não entre cidadãos: toda ordem social pressupõe adesiguadade; j) nã há instituiçã pssíe da emancipaçã; tdainstituiçã é uma encenaçã da desiguadade; a ideia de um prfes-sr emancipadr é cntraditória; prfessr e emancipadr seguemógicas desencntradas; k) prém, sempre é pssíe mstrar pder

da razã, mesm n rein da desrazã (RANCIÈRE, 2002).Poderíamos então tirar algumas consequências desta argumenta-

çã. Cm Adrn, Rancière é crític d estad de cisas capitaista,mas a diferença de Adorno, não propõe um papel positivo para aeducação institucionalizada. Ao contrário, na medida em que paraRancière tda rdem scia pressupõe a desiguadade das inteigên-cias, nã há instituiçã justa u utpia pr impantar; assim, mesmque a emancipaçã armada pr Rancière é apenas uma dimensãda emancipaçã pstuada pr Adrn, nã há cm reaizá-a; nã

há saber que emancipe; nã há rdem scia que instaure a igua -dade das inteigências; a iguadade só pde ser um princípi a serericad e nã um bjeti a ser atingid; quem busca instituir aigualdade legitima a desigualdade que seu próprio saber pressu-põe e da qual esse programa se alimenta. Não há progresso socialnem ordem institucional. A igualdade só poderia ser um axiomaou princípio de uma emancipação de indivíduo a indivíduo, deinteligência a inteligência.

Um mestre ignrante, diz Rancière (2003, p. 188), é um mestre

que é puramente ntade; ee nã se ferece cm guia d aun,mas apenas busca que outra vontade, distraída, exerça sua própriainteligência sem seguir a nenhuma outra inteligência mais do quea si mesma. Não há conteúdo de consciência na emancipação, nemum saber emancipador: há uma relação de igualdade a partir da qualpode se expressar a potência da inteligência humana. É a percepçãoda igualdade das inteligências que emancipa e da desigualdadeque embrutece. o mestre emancipadr é ignrante prque ignraaquilo que ensina mas, sobretudo, porque ignora a desigualdadedas inteigências dminante em tda rdem scia. Ee nada quersaber e nada tem a ver com essa desigualdade.

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Assim, O mestre ignorante recoloca as condições para pensar ovalor e o sentido das práticas educacionais, entre a igualdade e a eman-cipaçã. A reaçã é circuar: parte-se de uma para chegar à utra, aqua, pr sua ez, erica a primeira. o prbema é que ambas nuncase encntram de fat numa frma scia: “ ensin uniersa nã é enã pde ser um métd scia; nã se pde estender nas e peasinstituições da sciedade” (RANCIÈRE, 2002, p. 135). A aternatia éexcudente: “é necessári escher entre fazer uma sciedade desiguacm hmens iguais u uma sciedade igua cm hmens desiguais”(RANCIÈRE, 2002, p. 171). A emancipaçã nã ai aém de uma re-lação de indivíduo a indivíduo: não há nem pode haver em O mestreignorante um prjet educati emancipadr: “nunca agum partid ualgum governo, algum exército, alguma escola ou alguma instituiçãoemancipará uma única pessa” (RANCIÈRE, 2002, p. 132).

Assim, gest sóc dá ugar a uma pítica da quimera;smente há pítica ns snhs: “snhar uma sciedade de emanci-pads que seria uma sciedade de artistas” (RANCIÈRE, 2002, p. 95).o gest sóc dá ugar a uma pítica da distncia: “o hmempde ser razáe, cidadã nã pde ser” (RANCIÈRE, 2002, p.112). Nã há margem para superar a irracinaidade dminante: “ohmem cidadã cnhece a razã da fata de razã cidadã. Mas, amesm temp, cnhece-a cm insuperáe” (RANCIÈRE, 2002, p.117). É cert que s emancipads nã se entregam à rdem scia:

“é tud que he cncedem, e nenhuma instituiçã pde se satis-fazer cm este mínim” (RANCIÈRE, 2002, p. 117); mas tampuca ameaçam: “ee sabe que pde esperar da rdem scia e nãprcará grandes transtrns” (RANCIÈRE, 2002, p. 141). Cntud,mesmo irrealizável, a emancipação é também impostergável: sem-pre é mment para a emancipaçã inteectua, para armar utrarazão que a dominante, uma lógica do pensamento que não é a dadesiguadade (RANCIÈRE, 2003, p. 201). Eis efeit paradxa de Omestre ignorante: a emancipaçã é tã impssíe quant necessária;

tã intempestia quant atua; tã inúti quant prfícua.O ensino de losoa entre o esclarecimento e o de-sencontro

Para Rancière, emancipar-se é ag aparentemente tã simpesquanto mudar de opinião: se desfazer da opinião da desigualdadepara se fazer da piniã da iguadade e ier a partir dea. Cer-tamente, Adorno ponderaria ingênuo um pensamento como o domestre ignrante; nas redes da indústria cutura, nada é tã simpes.É pssíe que, pr razões diersas, Rancière aceite a imptência d

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   C   o    l   e   ç    ã   o   E

  x   p    l   o   r   a   n    d   o   o   E   n   s    i   n   o

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mestre ignrante: nã há, nee, nenhum prgrama de emancipaçã;trata-se de algo mais modesto: provar a alguém que é capaz desuperar sua dependência com relação a outras inteligências.

Sabems que, em cert sentid, nã há diálogo ou composição pssíe entre Adrn e Rancière: um parece cmeçar nde utrparu; um exige que utr descnsidera. Mais cncretamente,embra a iguadade das inteigências seja necessária em mimen-tos de emancipação política que pretendam romper com a lógicainstituída na sociedade do capital, nada mais afastado do mestreignorante que um método para a conscientização scia. Trata-se demds cntrastantes de pensar a pítica que, para Rancière, deriad axima da iguadade, e é excepcina na história. Segund ee,não há de fato política na democracia representativa, apenas polí-cia, a administração dos interesses do capital. A democracia não é

para Rancière uma frma institucina, ea é sinônima da píticaiguaitária; ea é a ruptura da ógica da desiguadade: a demcraciaé pder ds incmpetentes (RANCIÈRE, 2003, p. 201). Nã hádemocracia nas democracias, pois ela só seria possível sob a basede uma emancipação intelectual que elas negam.

Para Adrn, a cntrári, a educaçã pde ser justamente um atpític emancipatóri, sua reaizaçã. Se, para Rancière, as guras dprofessor e do emancipador não se confundem e obedecem a lógicasdissciadas. “Ser um emancipadr é sempre pssíe, se nã se cn-

fundir a função do emancipador intelectual com a função do professor[...] é necessário separar as razões [...] pode-se ser ao mesmo tempoprofessor, cidadão e emancipador, mas não é possível sê-lo numa lógicaúnica” (RANCIÈRE, 2003, p. 201) para Adrn; a cntrári, eas nãse poderiam separar e o imperativo por excelência de todo educadoré fazer da relação pedagógica um motivo para a emancipação.

Não há revolução cultural ou emancipação social a partir domestre ignrante. Nã há sequer uma pedaggia da ignrncia;porém, há um impacto ao nível das condições de qualquer progra-

ma ou pensamento da emancipação social. Nesse sentido, sua vozdissonante aponta os limites e condições de toda aventura pedagó-gica, incusie em nme d ensin de sa: na base ds maisssticads e nbres prjets de emancipaçã sóca nã estariauma opinião ou princípio que torna toda e qualquer emancipaçãouma quimera? As frmas dminantes de pensar s acances píticsd ensin de sa nã estariam cmprmetidas pea reprduçãda desiguadade que carregariam na ógica da instituiçã escar?

A questã principa é: que se ensina (transmite) quand se ensi-na? Para Rancière, um emancipadr nã teria utra cisa a transmitirdo que a igualdade das inteligências. Por isso, embora muitos leitores

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deste text tenham pensad em Sócrates cm um mestre ignrantee emancipadr, para Rancière, Sócrates é embrutecedr mais pe-rigs, prque aparenta ser um emancipadr. Sb a frma de ummestre na arte de perguntar, Sócrates nã ensinaria para que utrse torne mais independente, mas para manter a inteligência do outrosubmetida à sua própria inteigência. Ee cnersa cm um pastr,de superior a inferior, e pretende que seus interlocutores reconheçamque ee, cm armu rácu, é mais sábi ds atenienses, queninguém está a sua atura, que mais sabi é, cm Sócrates, quemnada sabe. Eis seu caráter iusóri e perigs: Sócrates nã ensinanenhum saber de conteúdos, mas a reconhecer a sua posição de su-periridade em reaçã cm ees e seu própri saber. Se antes seusinterlocutores eram escravos de uma relação acrítica com o conteúdod seu saber, depis de cnersar cm Sócrates sã escras de uma

na reaçã: nada sabem a nã ser que Sócrates é mais sábi e que,quem quer saber, deve segui-lo no caminho do saber.

Alguns diálogos de Patã parecem dar razã a Rancière. Prexemplo, nas conversas do Eutífron, Alcibíades I e Cármides, de fato,Sócrates nã deixa a inteigência ds utrs trabahar pr si mesmaaté nã cnrmar que Sócrates parece saber de antemã, mesm quenã seja um saber de cnteúds. Em utrs diágs, pr exemp,o Laques e o Lísis, Sócrates parece prcar ag mais interessante e,talvez, emancipador: seus interlocutores mudam a relação que têm

com o saber e um novo mundo parece abrir-se para eles no campo dopensament. Eidentemente, egad de Sócrates para pensar a rea-çã entre ensin de sa e emancipaçã é cmpex e pissêmice a crítica d Rancière apenas abre um prbema que a desbrda.

Ao analisar a atualidade de O mestre ignorante , Rancière apntaduas direções. A primeira tem a ver com a maneira em que a escolaé usada atualmente como metáfora para explicar a sociedade ou asreações internacinais. Cm efeit, pretende-se que funcinamentsocial ou internacional siga a lógica da instituição escolar, dividindo

os cidadãos e as nações, como na escola, entre os mais aplicados e osmais bagunceirs da turma, cm se “ exercíci d pder é exer-cíci natura e únic da desiguadade das inteigências” (RANCIÈRE ,2003, p. 200). As mehres píticas ecnômicas, se arma, sã as dsque “fazem s deeres”; as pires, ds que nã querem se rdenar edisciplinar. Nesse dispositivo discursivo, se aplaca a desigualdade, queé reduzida apenas ao seu aspecto intelectual. A segunda atualidade deO mestre ignorante , segund Rancière, diz respeit a md em que ir utrga pder as que supstamente nada sabem, à maneira emque ele problematiza qualquer forma de distinção entre doutores eleigos, sábios e ignorantes, incluídos e excluídos do mundo do saber.

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A pertinência dessa atuaidade para ensin de sa nBrasi é difíci de desdenhar. Pr um ad, pea sua psiçã emer-gente em um campo político e educacional de crescentes embates.Nesse sentid, é imprtante reetir sbre md em que discurssbre ensin de sa se insere ns camps mais amps quehe utrgam ar e sentid; em que medida ee é capaz de c-car em questão as relações dominantes entre escola e sociedade eos modos de relacionar certa distribuição do saber com os modosinstituíds de exercer pder. Pr utr, prque pde ajudar auma prbematizaçã a interir d própri camp. Cm efeit,taez nós, s prfessres de sa, deam-ns emancipar hje,em primeir ugar, de nós mesms, d md em que amams; emnme da sa, cnstruir prpstas pedagógicas, fundamentarprogramas de emancipação humana e traçar caminhos para que