cisto hep
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Relato de caso
Cisto Hepático Liver Cyst
Alexandre Lourenço de Andrade1,João Paulo Pinto Magalhães
1, Leonardo dos Santos Tavares de
Melo1, Leonardo Oliveira Neto
1, Lourival Dias Pereira Filho
1.
Resumo Lesões císticas do fígado são muito comuns, encontradas em cerca de 0,17 % das necrópsias e
exames de ultra-som. Costumam ter uma parede fina, fracamente celular e fibrosa, com um epitélio
cubóide simples, contendo líquido claro. Os cistos hepáticos simples são assintomáticos, a não ser
que sejam muito volumosos e comprimam outras estruturas, o que é muito incomum. Não há
qualquer necessidade de tratamento se não há complicação. Nesse trabalho é relatado o caso de
uma paciente simtomática com dor abdominal e massa palpável em região epigástrica, bem como,
diagnóstico e tratamento cirúrgico laparoscópico para extração do cisto hepático.
Descritores: Fígado, Cisto Hepático, Hepatopatia, Laparoscopia.
Abstract Cystic lesions of the liver are very common, found in about 0.17% of autopsies and examinations of
ultrasound. Usually have a thin wall, low cellular and fibrous, with a simple cuboidal epithelium,
containing clear liquid. Simple hepatic cysts are asymptomatic, unless they are very bulky and
compress other structures, which is very unusual. There is no need for treatment without
complications. In this paper we present a case of symptomatic patients with abdominal pain and
palpable mass in the epigastric region, as well as diagnosis and laparoscopic surgical treatment for
extraction of liver cyst.
Keywords: Liver, Liver cyst, Liver disease, Laparoscopy.
Introdução Lesões císticas do fígado são achados
frequentes na prática clínica, ocorre em
aproximadamente 4% dos indivíduos, há uma
predominância feminina de 4:1 e a
prevalência aumenta com a idade1.A grande
maioria dessas lesões, cujo diagnóstico
radiológico pode ser facilmente estabelecido,
são cistos simples, que cursam assintomáticos
e não necessitam de nenhum tipo de
tratamento. Porém cistos grandes podem
causar sintomas de compressão ou obstrução
biliar, dor ou sensação de massa abdominal, o
que determina o tipo de tratamento a ser
empregado1-3
. Hemorragia, infecção ou
rupturas de cistos são raros1.
Essas lesões podem ser divididas em
quatro grupos: Congênitas, parasitárias,
traumáticas e neoplásicas benignas ou
malignas3.
Os cistos hepáticos benignos são
revestidos por epitélio ductal biliar cubóide e
são cheios de líquido isotônico. O cisto
parasitário (hidático) é uma doença endêmica
em alguns países e muito rara em outros; em
nosso meio, pode ser encontrado na Região
Sual do país. Os cistos neoplásicos, como os
cistoadenomas e cistoadenocarcinomas, são
raramente encontrados. Os cistos traumáticos
decorrem da evolução de lesões que causam
hematoma subcapsular hepático ou ruptura de
ductos biliares. Os cistos congênitos são os
mais comuns e incluem os cistos simples e a
doença policística hepática3.
2
Os cistos simples representam as
lesões císticas mais comuns do fígado.
Geralmente são solitários, mas podem ser
múltiplos, apresentam distribuição difusa pelo
parênquima hepático, variando muito de
tamanho, desde de milímetros, chegando a
apresentar até mais de 30 cm de diâmetro. Em
geral, os cistos são achados incidentais
durante exames de imagem, a cerca de 10%
dos pacientes apresentam sintomatologia. Os
sintomas, quando aparecem, o fazem de
forma insidiosa, como conseuência do
aumento do tamanho do cisto ou em virtude
da compressão de òrgãos vizinhos3.
A doença policística hepática, de
herança autossômica dominate, caracteriza-se
por inúmeros cistos que acometem
praticamente todos os segmentos do fígado, e,
em 50 a 75% dos casos, ocorre associação
com a doença policística dos rins. Cerca de
10% desses pacientes desenvolvem uma
hepatomegalia de enormes proporções,
comprometendo a qualidade de vida, porém a
insuficiência hepática é achado muito raro3.
Com o advento e a popularização dos
exames de imagem, o diagnóstico dos cistos
hepáticos tornou-se muito comum, chegando
a ser encontrados em até 10% da população.
Os exames mais frequentemente utilizados
para o diagnóstico são a ultra-sonografia e a
tomografia computadorizada, que apresentam
sensibilidade de 98% 3.
Relato do Caso F.A.L., sexo feminino, 55 anos,
branca, filha adotiva, natural do Estado do
Ceara, moradora de Volta Redonda, casada,
do lar, duas filhas e um filho. O Paciente
procurou o hospital no dia 10/07/2006
apresentando pirose e forte dor epigástrica
9/10.
Na história patológica pregressa a
paciente nega ter diabetes, hipertensão e ter
alergias a qualquer medicamento. Na história
familiar desconhece a existência de alguma
doença. Em sua história social nega o
tabagismo e o etilismo.
Ao exame clínico na ectoscopia a paciente se
apresentava corada, hidratada, anictérica,
acianótica em bom estado geral.
Ap. Respiratório: Ausculta pulmonar com
MV presente universalmante audível, sem
ruídos adventícios, FR 17 i.p.m.
AP. Circulatório: RCR, BNF 2T SS ou EESS,
FC 106 b.p.m.
AP. Digestório: Abdome flácido, doloroso a
palpação, peristalse presente e presença de
massa abdominal em região epigástrica.
Ao Exame laboratorial: He – 4,44 milhões,
Hb – 13,6 g/dl, Ht – 40,5/100 , VCM – 91,2,
HCM – 30,6, CHCM – 33,6, Le – 5,00 mil
0/1/0/0/0/2/54/39/4, Gl – 91 mg/dl, Uréia – 39
mg/dl, Creatinina – 0,6 mg/100, tempo de
sangria – 1 min, tempo de coagulação –
8mim, retração do coágulo – completa, prova
do laço – negativa.
No Diagnóstico por imagem foi feito
em 10/05/2006 radiografia de torax que
apresentou transparência pulmonar normal,
seios costofrênicos permeáveis e mediastino
sem alterações. Em 28/06/2006 foi feito uma
ultrasonografia que observou-se volumosa
formação cística, de paredes finas e regulares
e conteúdo interno homogêneo e anecóico,
medindo 15,3 x 11,4 cm, identificada na
região epigástrica, tal formação estaria
comprimindo posteriormente as estruturas do
retroperitônio e é difícil definir sua origem.
Em 12/07/2006 foi realizado tomografia
computadorizada (figura1) helicoidal de
abdome e pelve.
Figura 1 – Tomografia computadorizada
Na tomografia computadorizada foi
observado fígado tópico, de forma e
dimensões normais, apresentando múltiplas
imagens hipodensas, de aspecto cístico,
disseminadas pelo parênquima; a maior
compromete a quase totalidade do lobo
esquerdo, abaula a cápsula hepática e mede
cerca de 14,5 cm no seu maior eixo. Baço
homogêneo, de volume normal. Diminuto
3
cisto no pólo superior do baço. Rins tópicos,
de forma e dimensões normais, apresentando
pequenos cistos corticais bilaterais. Imagem
de cálculo no terço médio do rim direito.
Divertículo no ceco. Cistos hepáticos, renais e
esplênico.
Foi utilizado o método de
Destelhamento Vídeo Laparoscópico com
objetivo de Ressecção vídeo laparoscópica do
maior cisto localizado no lobo hepático
esquerdo, visando a melhora dos sintomas da
paciente, causado pelo efeito compressivo
cístico. Método esse que foi realizado da
seguinte maneira: assepsia e anti-sepsia;
confecção do pneumoperitônio (figura 2 e 3);
colocação dos trocanteres; localização do
cisto; drenagem do conteúdo cístico (figura
4); ressecção de aderências cistogástricas
(figura 5) e cistoperitôneais; drenagem de
dois cistos menores; ressecção completa do
cisto principal (figura 6); cauterização da
cavidade cística remanescente no fígado;
sutura da gordura peritonial para tamponar a
cavidade cística (figura 7); revisão da
hemostasia e fechamento por planos.
Figura 2 - Confecção do pneumoperitônio
Figura 3 - Confecção do pneumoperitônio
Figura 4 - Drenagem do conteúdo cístico
Figura 5 - Ressecção de Aderências cistogástricas
Figura 6 - Ressecção completa do cisto principal
Figura 7 - Sutura da gordura peritonial para tamponar a
cavidade.
4
Figura 8 - Cisto principal ressecado
Discussão As lesões císticas podem ser divididas
em quatro grupos: Congênitas, parasitárias,
traumáticas e neoplásicas benignas ou
malignas3.
A freqüência precisa dos cistos
hepáticos não é conhecida porque a maioria
não causa sintomas. Mas, estima-se que
ocorram em cerca de 5 % da população e não
mais do que 10 a 15% destes pacientes
apresentarão sintomatologia suficiente para
procurar o serviço médico4.
Cistos sintomáticos são encontrados
mais comumente em mulheres com idade
acima de 50 anos. Estes sintomas são
relacionados ao tamanho e à localização do
cisto, ou são resultado de compressão de
estruturas adjacentes. Embora seja fácil
atribuir os sintomas do paciente à presença de
um grande cisto, a possibilidade de doença
coexistente deve ser afastada antes da
intervenção. Colecistopatias, doenças
pépticas, infecções e tumores devem ser
descartados antes dos sintomas serem
atribuidos ao cisto4-9
.
Geralmente os cistos hepáticos
apresentam sintomas vagos que consistem em
fadiga, inapetência, náusea, febre, dispepsia,
dor ou massa no abdome. Vômitos,
desconforto abdominal e obstrução venosa
cava podem ser observados. Da mesma forma
a ruptura de um cisto com sangramento,
infecção ou icterícia obstrutiva, quando
presentes, apresentam indicação cirúrgica de
urgência4-9
.
Outras situações são quando o
diagnóstico não é claro e a presença de
malignidade não pode ser descartada. Nestes
casos a exploração cirúrgica está indicada. Ao
exame físico, hepatomegalia e massa palpável
são os achados mais comuns. A icterícia pode
estar evidente devido à compressão biliar. A
investigação radiológica para diferenciar a
lesão cística inclui inicialmente a ultra-
sonografia e tomografia computadorizada de
abdome.
A ultra-sonografia é um procedimento
não invasivo, facilmente disponível, sensível
e de baixo custo, devendo ser o exame de
escolha inicial. É útil para definir o número e
localização dos cistos, bem como sua
estrutura interna. A tomografia
computadorizada de abdome confirma
informações diagnósticas equivalentes.
Entretanto proporciona informações mais
detalhadas sobre a localização e a
profundidade do cisto no parênquima
hepático, sendo essencial no planejamento
cirúrgico, em particular quando a abordagem
laparoscópica é utilizada. A ressonância
nuclear magnética é menos disponível, mas
pode ser usada para informações adicionais.
Entre as opções de tratamento que
podem ser aplicadas aos cistos hepáticos
incluem a simples aspiração do cisto,
escleroterapia percutânea, fenestração do cisto
por laparotomia, destelhamento por via
videolaparoscópica, enucleação, ressecção
hepática, cistojejunostomia e transplante de
fígado.
O objetivo do tratamento cirúrgico é a
descompressão do cisto e a prevenção da
recorrência. A natureza e origem do cisto
hepático são importantes fatores
determinantes na abordagem terapêutica.
Desde 1991, quando a primeira fenestração
laparoscópica de cisto hepático gigante
solitário, em um paciente de 73 anos foi
realizada, esta modalidade de tratamento
passou a ser largamente utilizado e tem sido
proposto mesmo para doença policística
hepática.
A recorrência das manifestações da
doença cística, causada pela regeneração dos
cistos hepáticos após o tratamento por
videolaparoscopia, tem sido o principal
obstáculo à aceitação desta técnica. A
fenestração laparoscópica reduz a pressão
intra-abdominal, causando regeneração do
cisto até que a pressão intraabdominal se
eleve novamente. Entretanto recentes
trabalhos têm registrado taxa total de
recorrência de somente 4 a 10,5% em
5
pacientes com um limitado número de cistos
congênitos. Em casos de cistos solitários não
têm sido registrada recorrência mesmo
durante seguimento em longo prazo. Isto tem
sido atribuido ao aumento da experiência com
a técnica laparoscópica, pois as recorrências
diagnosticadas estão geralmente relacionadas
aos pacientes com destelhamento incompleto
do cisto. Nestes casos pode ser observado até
40% de recorrência. As complicações
observadas na literatura resultante do
tratamento videolaparoscópico incluem ascite,
derrame pleural, íleo prolongado,
sangramento4-9
.
A doença hepática policística é uma
entidade clínica rara com uma prevalência de
0,05 a 0,13 em estudos de autópsia. Está mais
comumente associada com doença renal
policística autossômica dominante, onde o
desenvolvimento de cistos hepáticos ocorre
após o início dos cistos renais. A incidência
de cistos hepáticos na doença renal policística
varia de 29 a 48% dependendo da população
examinada e do método diagnóstico usado.
Outras causas genéticas tem sido associadas
que não os cistos renais. A maioria dos casos
de doença hepática policística tem
comportamento assintomático, porém pode
causar dor abdominal, distensão abdominal ou
saciedade precoce devido a hepatomegalia.
Mais raramente complicações do cisto podem
incluir a infecção, hemorragia, ruptura com
hemoperitôneo, torção, hipertensão porta ou
icterícia devido à compressão do ducto biliar 4-9
.
A opção cirúrgica foi o método de
escolha para o tratamento do cisto hepático
nesse caso, através do destelhamento vídeo
laparoscópico. O objetivo foi à ressecção
vídeo laparoscópica do maior cisto localizado
no lobo hepático esquerdo, visando à melhora
dos sintomas da paciente, causado pelo efeito
compressivo cístico. O procedimento
cirúrgico seguiu a seguinte descrição:
Assepsia e Anti-sepsia; Confecção do
pneumoperitônio; Colocação dos trocateres;
Localização do cisto; Drenagem do conteúdo
cístico; Ressecção de aderências
cistogástricas e cistoperitôneais; Drenagem de
dois cistos menores; Ressecção completa do
cisto principal; Cauterização da cavidade
cística remanescente no fígado; Sutura da
gordura peritonial para tamponar a cavidade
cística; Revisão da hemostasia e Fechamento
por planos.
Esse método foi utilizado devido ser um
procedimento efetivo, com baixa morbidade,
sendo incomum a recorrência.
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