cinco países, um futuro? megacidades criativas missão a marte

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Futuro Não esperamos o futuro acontecer! Edição 2016 magazine voestalpine www.voestalpine.com Cinco países, um futuro? Como novas tecnologias influem na vida de pessoas em diferentes culturas Megacidades criativas Como cidadãos podem participar ativamente do desenvolvimento da sua cidade Missão a Marte O sonho de viver em Marte poderia tornar-se realidade

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Page 1: Cinco países, um futuro? Megacidades criativas Missão a Marte

voestalpine AG voestalpine -Strasse 1 4020 Linz, Austria T. +43/50304/15-0 F. +43/50304/55-0 www.voestalpine.com

FuturoNão esperamos o futuro acontecer!

Edição 2016 magazine voestalpine

www.voestalpine.com

Cinco países, um futuro?Como novas tecnologias influem na vida de pessoas em diferentes culturas

Megacidades criativasComo cidadãos podem participar ativamente do  desenvolvimento da sua cidade

Missão a MarteO sonho de viver em Marte poderia tornar-se realidade

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Wolfgang Eder, CEO da voestalpine AG

“Não esperamos o futuro acontecer.”

Cara leitora, caro leitor!

Você provavelmente conhece esta sensação: com o ritmo sempre crescente de mudanças em nosso mundo, às vezes pode ficar um pouco difícil acompanhar sempre todos os temas. Mais do que nunca, o mundo se encontra em perma-nente transformação – e transformação sempre significa novos desafios. Na frase do natura-lista inglês Charles Darwin, que se dedicou ao estudo das mudanças nas espécies biológicas,

“nada na história da vida é tão constante como a mudança.” Com ela, Darwin chama a atenção para o que costumamos perder de vista, e mui-tos provavelmente prefeririam não ver: a mu-dança é uma das poucas constantes confiáveis. Para nós como grupo de empresas, mas também para cada indivíduo, isso significa que temos de enfrentar diariamente novos desafios – em termos econômicos, tecnológicos, mas também em termos sociais. Os artigos desta nossa edi-ção de Futuro mostram as diversas formas como esses desafios são enfrentados. Eles refletem como as tecnologias transformam nosso mundo e qual o papel desempenhado pelas diferenças culturais na propagação e aceitação de novas técnicas e tecnologias. Nossa autora Luciana Ferrando, por exemplo, fala do entusiasmo pelo progresso na Argentina. Nesse país, a tecno-logia é vista como motor de desenvolvimento cultural e tem uma influência positiva sobre a forma de pensar e agir da população, mesmo que em um ou outro canto do país recursos li-mitados dificultem o progresso. Na entrevista com nossa redação, Michael Lind, cofunda-dor da New America Foundation, se pergunta se tecnologia demais não iria até mesmo con-tra a natureza humana, mas chega à conclusão que, em princípio, depende do que fazemos dela. E em seu ensaio, Paul Sullivan indaga em que medida a transformação tecnológica determina a nossa vida, e como, adotando uma nova perspectiva, podemos entendê-la também como uma chance. Uma visão comum da base une os dois autores: mudanças sempre afetam

nossa sociedade como um todo. Trabalhando em conjunto, operamos a transformação juntos, a enfrentamos juntos. Ela nos faz até mesmo mirar as estrelas, no verdadeiro sentido da pala-vra, como descreve nossa autora Louisa Preston: toda uma série de missões internacionais está, neste momento, empenhada em enviar os pri-meiros seres humanos a Marte. E não são pou-cos os cientistas que não só sonham em pes-quisar o Planeta Vermelho, como também em colonizá-lo – são justamente perspectivas como essas que resultam de inovações tecnológicas contínuas e grandes visões. Esses são os temas com que nós, da voestalpine, estamos especial-mente comprometidos, que nos fascinam. De-vemos entender a força de inovação – ou, talvez melhor ainda, a vontade de inovar – das pessoas que apresentamos nesta edição como um con-vite a todos nós para nos unirmos a elas – por-que só o engajamento consciente de cada um de nós pode mudar este mundo para melhor.

Cordialmente

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12 O poder da mudança Como as mudanças influenciam nossa vida privada e profissional

16 “Uma vida sem risco não é possível” Entrevista com Wolfgang Eder

18 Nosso futuro Como pessoas da voestalpine veem o futuro

20 A indústria sob o signo da trans-formação digital Empresas tradicionais buscam a proximidade de jovens e dinâmicas oficinas de ideias

22 Ideias que nos fazem avançar Empreendedores criativos que querem mudar nosso mundo

Estar sempre presente Antecipar o futuro

30 Tecnologia Qual é o seu papel na solução de desafios globais?

38 Cinco países, um futuro? Como novas tecnologias influem na vida de pessoas em diferentes culturas

48 A todo vapor Como funcionarão as usinas do futuro

52 Megacidades criativas Como cidadãos podem participar ativamente do desenvolvimento da sua cidade

56 Especialistas são insubstituíveis Apresentamos quatro pessoas que trabalham em nossa empresa

Nunca perder a curiosidade

60 Missão a Marte O sonho de viver em Marte poderia tornar-se realidade

66 As luzes da Terra vistas do espaço Satélite Suomi NPP capta imagens espetacu-lares da Terra

70 Quando comer aumenta o desempenho O que comemos pode nos deixar mais inteli-gentes, saudáveis e bonitos?

74 Gigantes inteligentes Inovações em veículos utilitários

76 A individualização do cotidiano Quando a prestação de serviços se centra nas pessoas

Mudança: indispensável

para o progresso e

melhoramento

— Página 12

Tecnologia: três diferen­

tes abordagens

— Página 30

Especialistas: quatro

funcionários com habili­

dades especiais

— Página 56

6 Nosso mundo Como será nosso mundo amanhã?

8 Colaboradores As pessoas que fizeram esta revista

8 Expediente

ÍndiceEdição 2016

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Nosso mundoComo será nosso

mundo amanhã? Estes

são os lugares onde

procu ramos a resposta

nesta edição

Vale do Silício, EUA O modelo é o Vale do Silício: para possibi-litar inovações radicais, mais e mais empre-sas procuram a proximidade de startups A indústria sob o signo da transformação digital — Página 20

Washington, D.C., EUA Em Washington, falamos com o autor Michael Lind sobre a tecnologia e seu papel no presente e no futuro

“Não há volta” — Página 34

Americana, Brasil Lara Baralhas, de Americana, quer conhecer novos planetas Nosso futuro — Página 18

Argentina Na Argentina, robôs estão desempenhando um papel cada vez maior na educação Cinco países, um futuro? — Página 38

Islândia Nossa autora Louisa Preston caminha com o fundador do projeto Mars One pela paisagem da Islândia, que se assemelha à de Marte Missão a Marte — Página 60

Alemanha Usar o calor residual de usinas elétricas para gerar mais energia com combustíveis A todo vapor — Página 48

Quênia A gaseificação de combustíveis é interes-sante para países com redes elétricas rudi-mentares, como o Quênia A todo vapor — Página 48

Mumbai, Índia As tool houses oferecem espaço para mora-dia e pequenas fábricas Megacidades criativas — Página 52

Malásia Mohammad Asadullah quer gaseificar bio-massa, porque isso necessita de menos com-bustível do que usinas a vapor A todo vapor — Página 48

Japão Clichê ou realidade: coisas técnicas também podem possuir uma alma? Cinco países, um futuro? — Página 38

Melbourne, Austrália Habitantes tiveram a ideia de criar a Little Library, uma minibiblioteca organizada pelos próprios usuários Megacidades criativas — Página 52

Vale do Silício

Washington D.C.

Alemanha

Melbourne

Quênia Malásia

Mumbai

Americana

Japão

Islândia

Argentina

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Expediente Colaboradores

Luciana Ferrando Jornalista (Alemanha)

Para seu trabalho, Luciana Ferrando mergulha sempre em novos mundos – para Futuro, apro-

fundou-se no mundo da tecnologia: em um artigo, ela examina sua aceitação em seu país natal, a Argentina; em outro, como as pessoas

se  relacionam com a tecnologia.— Página 32 —

Björn Lüdtke Redator (Alemanha)

Desde o início, Björn Lüdtke é corresponsável pela concepção e redação da revista Futuro. O jornalista especializado freelance é expert em moda e marke-ting, mas para a voestalpine ele se dispôs de bom

grado a discorrer sobre mudança e tecnologia.— Página 38 —

Louisa Preston Astrobióloga e astrogeóloga (Grã-Bretanha)

Louisa Preston é astrobióloga e astrogeó-loga, bem como membro da comunidade dos

TED Fellows. Ela se ocupa da descoberta de vida em Marte e da colonização de outros planetas e luas pelo homem, e convida os leitores de Futuro

a  acompanhá-la em sua missão.— Página 60 —

Chris Schinke Jornalista (Alemanha)

Chris Schinke escreve principalmente sobre temas relacionados com tecnologia, cinema, literatura e

teatro. Ele vive e trabalha como jornalista freelance em Munique e contribuiu para esta edição com

um artigo sobre megacidades criativas.— Página 52 —

Pessoas por detrás de “Futuro”

A mudança faz parte de nossa vida – sem ela, não há progresso. Nesta revista, lançamos um olhar para o futuro e perguntamos: como nossa

vida vai mudar e qual o papel da tecnologia nessa mudança?

Da Argentina ao Japão e da Califórnia à Austrália: enviamos nossos repórteres aos

quatro cantos do planeta, para que nos fizessem um relato sobre as mudanças mais fascinantes.

Nestas páginas, queremos apresentar-lhes algumas das pessoas que contribuíram para

esta edição de Futuro.

Expediente

Proprietário e titular da mídia:voestalpine AG

voestalpine-Strasse 1 4020 Linz, Áustria

Editor:Peter Felsbach

Chefe de redação:Maria Reibenberger

T. +43/50304/15-5432 [email protected]

Concepção e redação:Barbara Ecker,

Anne Kammerzelt e Björn Lüdtke

Design:Sandra Stäbler

Impressão:Kontext Druckerei GmbH

Spaunstrasse 3 a 4020 Linz, Áustria

Colaboradores

Raouia Kheder Jornalista e apresentadora de rádio (Tunísia)As reportagens de Raouia Kheder versam

sobretudo sobre temas sociais e culturais de sua terra natal, a Tunísia, e do mundo árabe. Nesta

revista, ela analisa o papel que a tecnologia desempenha na cultura de seu país.

— Página 38 —

Paul Sullivan Autor e fotógrafo (Alemanha)

Paul Sullivan é britânico e vive em Berlim. Seu trabalho abrange principalmente os temas cultura,

lifestyle e viagem. No ensaio que escreveu para a edição deste ano de Futuro, ele se aproxima do

tema mudança e transformação.— Página 12 —

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Estar sempre presenteDar firmeza e segurança

Nossa estrutura descentralizada nos permite agir e reagir mais depressa. Assim,  estamos sempre presentes para todos os nossos stakeholders e  buscamos

atender suas necessidades com um máximo de flexibilidade e dinâmica.  Atacamos problemas pela raiz e não desistimos, porque vale a

pena lutar pelo futuro.

12 O poder da mudança

Como as mudanças influenciam nossa vida privada e profissional

16 “Uma vida sem risco não é possível”

Entrevista com Wolfgang Eder

18 Nosso futuro

Como pessoas da voestalpine veem o futuro

20 A indústria sob o signo da

transformação digital Empresas tradicionais buscam a proximidade de

jovens e dinâmicas oficinas de ideias

22 Ideias que nos fazem avançar

Empreendedores criativos que querem mudar nosso mundo

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Estar sempre presente Estar sempre presente

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O poder da mudança

Texto Paul Sullivan

Paul Sullivan sobre as mudanças e como

elas influen ciam nossa vida privada e profissional

“Nada é permanente, exceto a mudança.”

— Heráclito de Éfeso

A mudança também já não é mais o que era. Pelo menos, é o se pode-ria pensar quando se compara nossa geração com gerações anteriores. Estas certamente não viveram essa sucessão estonteantemente veloz de mudanças técnicas e tecnológicas radicais que hoje transformam nosso cotidiano. Em nenhuma cultura ante-rior se “surfou”, “escrolou” ou “ata-chou”, isto é certo, mas desde o início dos tempos quase todas as socieda-des passaram, em maior ou menor grau, por processos de mudança e transformação intensos. Até mesmo nas supostamente tão rígidas socie-dades pré-modernas houve aconte-cimentos que trouxeram mudanças radicais: disputas religiosas e guer-ras tribais, inundações e períodos de frio intenso, revoltas e epidemias e, não por último, todos os desenvolvi-mentos graduais que, lenta porém seguramente, determinaram a forma como vivemos no presente.Na verdade, a mudança é uma parte fundamental de nossa vida e da na-tureza humana, como já confirmou Heráclito, o filósofo grego contem-porâneo de Sócrates e um dos primei-ros a se ocupar do conceito de mu-dança, com seu famoso dito “Nada é permanente, exceto a mudança”. E para deixá-lo ainda mais claro, o sábio acrescentou: “Ninguém se ba-nha duas vezes no mesmo rio.”Gostemos ou não, mudanças acon-tecem todos os dias, sejam elas pe-quenos incidentes do cotidiano apa-rentemente insignificantes, como mudanças dos horários de ônibus, o fechamento de uma loja preferida, um pequeno prêmio na loteria, ou experiências e acontecimentos mar-cantes, como nascimento e morte, mudança de moradia ou de profissão, uma nova amizade ou se apaixonar.

Apaixonar-se, aliás, pode acontecer quase que de passagem e a qualquer momento e, no entanto, pode influen-ciar nossa vida de forma duradoura. Nós seres humanos tendemos a reagir a mudanças com um misto de temor e anseio. Mudanças são, por natureza, imprevisíveis e não raro compor-tam riscos. A mudança é uma força invisível, que influencia constante-mente nosso mundo. Com o tempo e engenho, aprendemos a nos ajeitar com mudanças – o que é fundamen-tal para uma visão proativa de futuro. Isto, por sua vez, é positivo para nós como indivíduos, mas também para o nosso comportamento profissional e para a sociedade como um todo.

“Devemos ser nós mes-mos a mudança que que-remos ver no mundo.”

— Mahatma Gandhi

A mudança está inseparavelmente ligada à noção de progresso e melho-ramento. Porque, afinal, progresso e melhoramento não são possíveis sem que haja um certo grau de mudança. Decerto não é nenhum exagero afir-mar que tanto a sociedade como cada indivíduo trazem dentro de si o de-sejo de se desenvolver e melhorar. É só olharmos ao nosso redor: os la-dos positivos de mudanças estão por toda parte.Hoje, não conseguimos mais ima-ginar um mundo sem smartphones, MP3 Players ou viagens de avião – no entanto, há apenas alguns anos ou décadas, era completamente nor-mal viver sem isso. E quem, naquele tempo, teria imaginado que impres-soras 3D, automóveis sem motorista ou inteligência artificial aplicada a diagnósticos médicos seriam coisas corriqueiras em 2016?O mesmo se aplica a desenvolvimen-tos sociais. Um dos fatores mais im-portantes em nossas sociedades em

mudança permanente é o poder das ideias, as quais, por sua vez, passam por mudanças no decorrer do tempo. Nossas atuais democracias, apesar de estarem longe de ser perfeitas, são altamente desenvolvidas, e elas o são devido a importantes mudanças so-ciais no passado: a abolição da escra-vatura, a extensão do direito de voto às mulheres, os movimentos pelos direitos civis e, não por último, o Ilu-minismo e a revolução industrial.Mudanças como essas ainda aconte-cem também nos dias de hoje. Duas ou três décadas atrás, a mudança climática, por exemplo, não passava de um tema marginal, que não era levado a sério por muitos governos ou grandes empresas. Hoje, a problemá-tica chegou ao meio da sociedade e medidas para enfrentá-la estão sendo tomadas em quase todos os níveis. A complicada situação de guerra na Síria e no Oriente Próximo desenca-deou uma das maiores crises huma-nitárias da História mais recente – pode ser que, ali, a História esteja apenas se repetindo, mas a situação também traz consigo desafios com-pletamente novos.Também o feminismo, que tem suas bases numa tradição centenária de luta pela liberação da mulher, ultima-mente vem ganhando novo impulso da internet e das mídias sociais, fa-zendo com que a superioridade mas-culina volte a ser colocada em ques-tão e pessoas em todos os níveis se engajem pela igualdade de direitos dos sexos. Todos esses temas, que também se encontram em perma-nente transformação, proporcionam a indivíduos e governos a oportuni-dade de, juntos, promover mudanças sociais positivas.Assim como no passado, a evolução tecnológica que experimentamos hoje também pode ser motor de transfor-mações sociais. A internet possibilitou um acesso nunca antes visto à infor-mação e ao conhecimento (Wiki pédia, YouTube, e-learning), e sempre novos

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Estar sempre presente Estar sempre presente

aplicativos fornecem, por exemplo, informações meteorológicas para agricultores africanos ou enviam um mapa com dados exatos que permi-tem localizar vítimas de terremotos. Plataformas digitais de mídia social como Twitter, WhatsApp e Facebook não só permitiram organizar rápida e eficientemente protestos ou ajuda em grande escala, como no caso da fuga em massa de refugiados, mas também ajudaram a superar distâncias e tor-naram o mundo mais próximo. Atra-vés dessas plataformas, estamos em contato direto com pessoas de todo o mundo e assim temos a impressão de que também lugares muito dis-tantes e longínquos fazem parte de nossa própria vizinhança global.

“Não é o mais forte que sobrevive, nem o mais inteligente, mas o que melhor se adapta às mudanças.”

— Charles Darwin

Ainda que esses temas pareçam ser universais, eles naturalmente têm um efeito diverso em lugares diferentes: na América do Sul, a crise dos refu-giados é percebida de forma dife-rente do que na Europa; a Europa sente as consequências diretas do aquecimento global de forma diversa do que, por exemplo, Bangladesh ou a Califórnia; o neofeminismo em sua expressão ocidental sofre fortes res-trições em muitos países do Oriente Próximo. A estrutura cultural, política e social prevalecente em uma socie-dade determina como ela é influen-ciada por mudanças.Não é por acaso que nos últimos anos o conceito – e a aceitação – de mudanças tem sido um tópico im-portante nas empresas. Elas estão sob uma permanente pressão para se manter no topo, seja com relação

à comunicação interna ou ao marke-ting externo. Ao mesmo tempo, o sur-gimento de novas tecnologias exige, diariamente, mudanças em muitos aspectos. O melhor exemplo disso são as mídias sociais: há dez anos, não tinham muita relevância; hoje, toda empresa tem de estar presente no Face book ou Twitter e precisa ter vi-sibilidade online.Com o advento da globalização, o mundo dos negócios tornou-se ainda mais aberto para mudanças. Quando os mercados se abriram com a in-ternet, trazendo todo um mundo de novas possibilidades e oportunidades, termos como “mobilidade” e “flexi-bilidade” se tornaram parte do vo-cabulário padrão. A ultraflexível cul-tura startup talvez seja o que melhor ilustra este fato: em 2001, um grupo de 17 desenvolvedores de software reconheceu a necessidade urgente de se adaptar à nova realidade e pu-blicou o chamado “Manifesto Ágil”. Um ponto central desse manifesto é a

“necessidade de responder a mudan-ças, mais do que seguir um plano”.Essa nova cultura da flexibilidade se mostra da forma mais evidente nos departamentos de relações públicas e

marketing. A imagem ou a marca de uma empresa é de enorme importân-cia, e para a maioria das empresas a sua definição e comunicação é um tema permanente e em contínuo de-senvolvimento. Para os usuários, uma página web obsoleta, que não é ami-gável, ou uma conta desatualizada no Facebook ou no Twitter pratica-mente não existem.

As regras para a sobrevivência são iguais em toda parte, também no mer-cado dos negócios. Quem não aceita e não se dispõe a enfrentar os desafios de um mundo em constante transfor-mação, está fadado a desaparecer – como os dinossauros. Para aceitar es-sas condições é preciso flexibilidade e a capacidade de compreender, ou até mesmo de prever, as necessidades e sensibilidades dos clientes.

“O pessimista vê a difi-culdade em cada opor-tunidade; o otimista vê a oportunidade em cada dificuldade.”

— Winston Churchill

Apesar da profusão de exemplos de como mudanças podem influenciar de forma positiva nossa vida profis-sional ou pessoal, a maioria de nós tem uma postura crítica em relação a elas. Em seu livro de 2007 com o dra-mático título Change or Die (“Mude ou Morra”), o autor estadunidense especialista em temas econômicos Alan Deutschman revela que a maio-ria das pessoas prefere permanecer dentro de seus limites pessoais, onde se sente à vontade, a expor-se ao desconhecido – mesmo quando um final feliz é provável. Lançando mão dos mais diferentes exemplos – do doente cardíaco até empresas que fi-caram para trás porque não consegui-ram acompanhar o ritmo das trans-formações – Deutschman demonstra o quanto relutamos em aceitar mu-danças e, ao mesmo tempo, somos dotados da capacidade inata de nos adaptar a elas.Em última análise, porém, não im-porta se tememos mudanças ou não. Nem o tempo vai parar, nem as mu-danças que ocorrem com o passar do tempo vão deixar de acontecer por causa desse nosso temor. Não

há como escaparmos do inevitável. Existe uma série de bons exemplos de como mudanças trazem novas possibilidades – sejam elas as novas tarefas no novo emprego, a satisfa-ção que sentimos quando redecora-mos a casa ou substituímos nossas roupas velhas por novas. Aprender a vencer o temor natural e aceitar mudanças, portanto, parece apenas sensato. Porque, no final das contas, as pessoas, empresas e governos dis-postos a assumir riscos têm maiores chances de êxito. Adaptar-se a novos

ambientes, novas pessoas e situações, significa evoluir – em termos da pró-pria personalidade, de renda, de sis-tema de valores. Existem diversos meios de se adaptar.Nenhum deles é difícil. Uma possi-bilidade é conscientizar-se dos signi-ficados positivos da palavra mudança. Se olharmos com atenção alguns de seus sinônimos – inovação, desenvol-

vimento, transformação, diversifica-ção, aperfeiçoamento, variedade – não tardaremos a reconhecer que se trata de uma palavra cheia de entu-siasmo e positividade.Uma outra possibilidade é recorrer a filosofias que veem mudanças com simpatia. Muitas filosofias orientais se ocupam do conceito de mudança. O I Ching ou Livro das Mutações, por exemplo, um texto chinês que conta 2.600 anos, nos ensina que as coisas boas em nossa vida são passageiras, mas as coisas ruins também o são.

O taoismo talvez seja, dentre as fi-losofias orientais, a filosofia máxima da efemeridade. Uma de suas pro-posições centrais é: “Nade com a corrente”. No encantador livro O Tao do Pooh, de Benjamin Hoff, o ursinho Pooh nos transmite, à sua maneira, princípios taoistas: “Tudo acontece da forma certa e na hora certa. Pelo me-nos é assim quando o permitimos e

aceitamos as coisas como elas são, em vez de dizer ‘isto não pode acontecer assim’, e nos esforçamos mais ainda para dar uma outra direção às coisas.”Uma outra estratégia poderia consis-tir em adotar uma nova perspectiva. Nem toda mudança é igual. Quando as pequenas mudanças se tornam demais, talvez valha a pena dar um passo para trás e contemplar as mu-danças maiores – que, muitas vezes, não têm tanto de mudança como pensávamos. Confuso? Um exemplo: quem se sente estressado pela tor-rente incessante de informações das mídias sociais, deveria lembrar-se de que os conteúdos que consome não são, em verdade, nada mais do que

histórias, que antes eram contadas e hoje são lidas. O meio de comunica-ção pode ser novo, mas no fundo é a mesma coisa.A paradoxa afirmação de Heráclito, que a mudança é algo permanente, pode igualmente servir de âncora. Ver o sol nascer todos os dias e ver as estrelas brilhar no céu todas as noites, ou presenciar as estações do ano em sua sucessão previsível, nos dá uma sensação de eternidade. As-sim como o famoso dito de Heráclito, o provérbio francês Plus ça change, plus c’est la même chose (“Quanto mais muda, mais é a mesma coisa”) nos faz lembrar o que, no fundo, to-dos sabem: que a mudança é antes a norma do que a exceção. Quem aceitar isto vai poder aproveitar mu-danças para seu próprio desenvol-vimento pessoal e profissional. Quem não se opuser ao inevitável e nadar com a corrente, vai se sentir melhor como uma pessoa dinâmica e cria-tiva do que como um triste e velho dinossauro. ©

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A mudança faz

parte de nossa vida

Evolução tecno­

lógica pode ser

motor de transfor­

mações sociais

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Estar sempre presente Estar sempre presente

“Uma vida sem risco não é possível”

Texto Paul Sullivan

Entrevista com Wolfgang Eder

O senhor tem uma filosofia pes­soal em relação a mudança e trans­formação?Mudança e transformação são in-dispensáveis para o progresso em todos os setores da vida. Em outras palavras: parar é retroceder – ou, dito de uma forma mais elegante: nada é permanente, exceto a mudança. Por isso, para mim mudança e trans-formação são a regra, e não a exce-ção. Basta olharmos para os últimos 20 anos e vermos o quanto a socie-dade e a economia mudaram nesse espaço de tempo comparativamente curto: nosso comportamento na co-municação, os processos de produção, a vida em casa – tudo está conectado em rede. Vejo muitas dessas coisas de uma forma bastante crítica, mas é precisamente por essa razão que devemos enfrentar esses desenvolvi-

mentos de uma forma ativa e procurar orientá-los para a direção certa.

Como isso influi em seu papel de presidente do Conselho de Adminis­tração, e em que relação estão o pes­soal e o profissional?Para mim, como para a maioria das pessoas, os papéis na vida profis-sional e na vida privada envolvem tarefas diferentes, desafios dife-ren tes. Contudo, é sempre uma e a mesma pessoa que tem que lidar com eles. Para dar conta das dife-rentes situações da vida, seja como presidente do Conselho de Adminis-tração ou como pessoa privada, são precisos – apesar de todas as dife-renças, que muitas vezes são apenas aparentes – os mesmos princípios e critérios, já por uma questão de credibi lidade pessoal.

Wolfgang EderWolfgang Eder é presidente e CEO da voestalpine AG

Como pessoa privada, o senhor lida com mudanças de forma diversa do que na sua posição de CEO?Para mim pessoalmente, disposição para mudanças significa enfrentar novos desafios com a mesma abertura e falta de preconceito tanto na vida privada como na profissional. É claro que as tarefas em um grupo interna-cional de empresas com quase 50.000 funcionários são outras do que as que se tem em uma família. Em ambos os casos, contudo, trata-se essencial-mente de assumir responsabilidade e conscientizar-se de que uma vida sem risco não é possível. No final das contas, assumir responsabilidade significa pesar um risco a ser assu-mido contra as oportunidades que ele abre – tanto na esfera privada como na profissional.

Existe algo como uma política cor­porativa oficial e objetiva com rela­ção a mudanças, para refrear o gosto excessivo pelo risco, por exemplo?Eu acredito que não é possível, de uma maneira geral, regulamentar a disposição para mudanças por meio de diretrizes, ou mesmo decretar que ela tenha um determinado grau. Tudo o que se pode fazer é procurar criar uma cultura empresarial na qual a transformação constante e a dispo-sição necessária para mudanças se-jam parte da identidade corporativa, isto é, sejam vividas conscientemente e com convicção. Mas uma condição imprescindível para que isso se dê é deixar claro para todos os que traba-lham na empresa que só se consegue obter excelência permanente e, com isso, também assegurar o melhor pos-sível o próprio futuro, através da dis-posição para mudança. Naturalmente, mudança sempre significa também

risco. O decisivo é que tais riscos se-jam sempre razoáveis, e portanto ma-nejáveis. Esses riscos são, em grande medida, calculáveis. Mas o maior risco, sem dúvida alguma, é parar de se desenvolver, opor-se a mudanças.

Como o senhor pode assegurar que suas decisões sejam, realmente, orientadas a longo prazo e susten­táveis, e não sejam sobrepostas por metas de curto prazo e, com isso, desvalorizadas?Essa é uma questão do estilo básico de gestão. Na voestalpine, por exem-plo, há muitos anos vimos seguindo, com uma consistência realmente inabalável, uma estratégia clara de longo prazo, nos afastando da ima-gem do clássico fabricante de aço para nos transformamos em um grupo de empresas que produz tecnologia baseada em metais. Essa orientação de longo prazo também norteia nossa atuação de curto prazo e seus res-pectivos objetivos. Ou seja, todas as

decisões empresariais têm de se nor-tear pela estratégia de longo prazo. Se estiverem em contradição com ela, não têm nenhuma chance de ser implementadas.

O que o senhor faz quando reco­nhece que uma decisão foi errada?Empresas bem-sucedidas se distin-guem pelo fato de viverem estraté-gias e modelos de negócios de uma forma consistente e, ao mesmo tempo, questionarem sempre de novo e, quando necessário, adaptarem essas estratégias e modelos de negócios a novos cenários futuros, sem, contudo, alterar seus princípios básicos. Uma das principais carac terísticas de uma cultura empresarial aberta é a capaci-dade de lidar perma nentemente com um ambiente econômico, político e social que muda a uma velocidade cada vez maior. Só assim poderemos melhorar sempre e continuar bem--sucedidos nesse ambiente em trans-formação constante.

Não há inovação sem mudança

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Estar sempre presente Estar sempre presente

Nosso futuroTexto Anne Kammerzelt

Como pessoas da voestalpine veem o futuro

1. Que mudança positiva o próximo ano vai trazer para você pessoalmente?2. Se você pudesse mudar uma coisa no mundo, o que mudaria?3. Que tecnologia você acha que precisa ser inventada sem falta nos próximos anos?4. O que você gostaria de perguntar a alguém que viesse do futuro?

LARS BECKER (43) Gerente de Conta-Chave

Löhne, Alemanha

“O que poderíamos fazer diferente?”

1) Vou poder voltar a fazer música com a minha banda com mais frequência. 2) Se eu pudesse, impediria que tantas pessoas sofressem diariamente, em todo o mundo, com guerras, pobreza e doenças. 3) Como alguém que anda muito de carro a trabalho: um meio de transporte individual que ande – ou, por mim, que voe – de forma completamente autônoma. 4) Vocês estão bem? – e, caso não estejam, o que poderíamos fazer diferente hoje para ajudar vocês no futuro? E: minha resposta à pergunta número 3 já se transformou em realidade?

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1) Vou ser mãe e ter de conciliar o trabalho com a mater-nidade. Com o apoio da minha família, espero poder aliar de forma equilibrada esses dois papéis. 2) Eu possibilitaria a todas crianças, no mundo inteiro, acesso livre e gratuito ao ensino. Quando crescemos em um país onde a escola é de graça e obrigatória para todas as crianças, às vezes esquecemos a sorte que temos e como somos privilegiados. 3) Sistemas de proteção contra emissões altamente desen-volvidos para todas as áreas, a começar pelos automóveis até grandes fábricas. 4) Eu perguntaria se viagens espa-ciais ou férias na Lua já se tornaram uma coisa corriqueira.

“Às vezes esquecemos a sorte que temos, que somos privilegiados”

OLESYA BONCHENKO (30) Gerente de Vendas

Dubai, Emirados Árabes Unidos

“Boa saúde e boa sorte”

HELMUT RASENBERGER (77) Consultor

Toronto (Ontário), Canadá

“Quero conhecer outros planetas”

LARA BARALHAS (5) Aluna da pré-escola

Americana, Brasil

1) No próximo ano eu quero ir para o ensino fundamen-tal e aprender a ler e escrever bem rápido. 2) As crianças pobres, que não têm brinquedos e chocolates. Gostaria que todo mundo pudesse brincar e comer coisas gostosas. 3) Carros que andam no céu, que voam com controle re-moto. 4) Se no futuro vamos andar de foguete igual anda-mos de avião hoje. Quero conhecer outros planetas.

1) Espero continuar tendo boa saúde e boa sorte. 2) Eu gostaria de poder parar o aquecimento global. 3) O apro-veitamento da energia geotérmica. 4) O que deveríamos ter feito para que vocês estivessem melhor?

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A indústria sob o signo da trans­formação digital

Texto Hans Schürmann

Empresas tradicionais buscam a proximidade

de jovens e dinâmicas oficinas de ideias

A digitalização está transfor-mando o mundo. Tecnolo-gias que permitem acessar

informações e dados a qualquer hora e num piscar de olhos conduzem a inovações que mudam não só a so-ciedade, como também empresas e mercados. Plataformas na internet que não só permitem às empresas fi-car conhecendo melhor seus clientes, como também colaborar mais rápida e estreitamente com fornecedores, bem como a tendência rumo à fá-brica conectada – essas são tendên-cias que oferecem novas oportunida-des, mas que são, ao mesmo tempo, um desafio para modelos usuais de negócio. Se até agora o foco estava principalmente nos produtos, no futuro ele estará mais em serviços inteligentes e individualizados.Em face da crescente digitalização, tanto conglomerados como médias empresas têm de se reinventar se

quiserem se manter competitivas no mercado global. Precisam se tornar mais inovadoras, adaptar velhos mé-todos de gestão e formas de organiza-ção em curto espaço de tempo. Mas isto não é tão simples. “Quando uma organização já existe há dezenas de anos, é difícil abandonar modos de pensar e agir estabelecidos e desen-volver ideias e modelos de negócio completamente novos”, diz Stephan Grabmeier. Durante vários anos, o consultor de empresas acompanhou a transformação digital na operadora alemã de telefonia Deutsche Telekom, e está apoiando duas startups não só financeiramente, como também com suas experiências práticas.Mas a transformação digital não é um problema que diz respeito apenas ao setor de telecomunicações, ela tam-bém afeta muitos setores do comércio e da indústria, como por exemplo o setor de construção de máquinas.

A produção conectada torna as em-presas mais flexíveis e lhes permite reagir com maior rapidez a desejos dos clientes, mas, ao mesmo tempo, os ciclos de inovação se tornam mais curtos e os mercados, mais globais. A consequência: as empresas se veem forçadas a desenvolver novos produ-tos e lançá-los no mercado muito mais depressa, para poder fazer face à concorrência. Assim, a necessidade de inovações radicais está levando um número crescente de empresas a buscar a proximidade de startups.Startups têm grandes vantagens quando se trata de inovações trans-formadoras de mercado. “Elas não têm que se preocupar com um core business de margem forte e, além disso, sua estrutura lhes permite agir de forma mais rápida e flexível do que grandes conglomerados de em-presas”, explica Markus Struppe, par-ceiro da empresa UnternehmerTUM

GmbH, o Centro de Inovação e Incu-bação de Startups da Universidade Técnica de Munique. As jovens em-presas focadas em novas tecnologias experimentam coisas novas, sem saber de antemão se estas serão bem sucedidas no mercado. Para lidar com essas incertezas, elas utilizam um pro-cedimento iterativo. Isto significa que não há um resultado final definitivo, e sim uma constante otimização dos resultados e adaptação das metas do projeto. Para isso, elas procuram sem-pre de novo o contato com clientes em potencial, elaboram protótipos e dis-cutem com os futuros usuários.Na opinião do consultor da Unter-nehmerTUM, essa é uma vantagem decisiva, sobretudo diante de ciclos de inovação cada vez mais curtos. Uma empresa estabelecida tem uma imagem a zelar e, por isso, não pode lançar no mercado produtos “inaca-bados” sob sua própria marca para que eles sejam testados por seus clientes. Struppe está convencido de que ambos os lados podem ganhar com uma cooperação logo no início.

Enquanto que startups são inovado-ras e flexíveis, grandes empresas dis-põem de uma rede forte de empresas do setor e de clientes, e de know-how na implementação e escalonamento de novos produtos.Entre os ligados na cena de startups estão também grupos internacio-nais. Há pouco, o grupo BMW fun-dou uma startup garage, com grande repercussão na mídia. Seu objetivo é fomentar jovens empresas com potencial em fase inicial e aprovei-tar tecnologias de startups nos seus próprios processos de inovação. Já outros gostam de trabalhar mais em surdina, como um fabricante de má-quinas de construção alemão, que coopera há anos com uma jovem empresa de software. Por trás dessa miniempresa estão engenheiros que têm vontade de experimentar e de-senvolvem programas que fazem com que sistemas de controle de má-quinas móveis fiquem cada vez mais inteligentes.Grupos energéticos também esperam que uma cooperação mais forte com

empresas jovens e ágeis lhes traga ideias frescas, que os ajudem a levar a transformação a bom cabo. Grupos como a EnBW andam de olho em startups que desenvolveram inova-ções para a smart home, ou casa in-teligente. Essas empresas poderiam, por exemplo, desenvolver soluções inteligentes que, em conexão com uma rede elétrica inteligente (smart grid), contribuam para que flutuações de tensão em uma rede alimentada por energias renováveis possam ser melhor compensadas.Já faz algum tempo que grandes empresas se interessam por startups. Seus motivos, porém, mudaram: “En-quanto que antes as grandes empre-sas estavam interessadas principal-mente em participações financeiras, hoje o foco está sobretudo na gestão de inovações”, diz o consultor de transformações Stephan Grabmeier. A tendência de digitalização fez com que os dois lados se aproximassem e mostrou que eles se complementam muito bem e podem beneficiar-se um do outro.

Transformação digital na prática

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Estar sempre presente Estar sempre presente

Ideias que nos fazem avançar

Texto André Uhl

Empreendedores criativos que querem mudar

nosso mundo

Blocos de montar para a era digitalBrinquedos são bons sobretudo quando estimulam a fantasia. E são melhores ainda quando as crianças se divertem ao montá-los e podem continuar a desenvolvê-los de acordo com suas próprias ideias. Os fundadores da empresa alemã

Kinematics deram vida aos blocos de montar com seus TinkerBots. A peça central é o chamado “Power Brain”, um cubo vermelho dotado de sensores que comandam articulações, garras e motores. Todos os módulos são conectados sem fio e simples de montar. Os robôs prontos aprendem a executar sempre novos movimentos, e as crianças se transformam

em pequenos pesquisadores curiosos. O brinquedo adequado para a geração digital de amanhã.Pág

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Brinquedo para a geração digital de amanhã: TinkerBots

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Estar sempre presente Estar sempre presente

Conferindo as vitaminasA falta de vitaminas nos deixa mais vulneráveis para doenças – isto todos nós sabemos. O que todo mundo também

sabe é que vitaminas em excesso podem ter efeitos negativos sobre a nossa saúde. Não seria prático, então, se pudés-semos avaliar nós mesmos nosso estado vitamínico? Graças aos inventores canadenses do Vitameter, isto já é possível.

Utilizando descobertas da nanotecnologia e com a ajuda de biosensores, o aparelho faz a avaliação do nível vitamínico do usuário em questão de poucos minutos, permitindo-lhe assim compreender melhor seu próprio organismo, revisar

seus hábitos alimentares e, no fim das contas, viver de uma forma mais saudável.

Juntos somos (mais) inteligentesCompartilhar ideias, trocar apontamentos, apoiar-se mutuamente – a maioria dos alunos sabe que estudar em conjunto

é mais eficaz do que ruminar sozinho entre quatro paredes. Os criadores do BrainShare, um aplicativo educacional da Uganda, transferem esse princípio para o mundo digital. Sua plataforma online de mídia social mostra que pode ser divertido estudar em grupo e possibilita um compartilhamento simples de conteúdos didáticos, quer se trate de apon-tamentos individuais, artigos ou vídeos. Quando alunos, professores e pais se encontram numa sala de aulas virtual,

ninguém fica sozinho – uma inovação social da qual todos podem se beneficiar. © V

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Estar sempre presente Estar sempre presente

Na rota certaMuitas vezes, as ideias mais simples são também as melhores. Como é possível desafogar o notoriamente sobrecar-regado sistema de transporte público urbano na metrópole indiana de Mumbai? Jerin Venad, especialista indiano

em TI e fundador da iniciativa Cityflo, tem a resposta: com miniônibus particulares que fazem os principais percursos, ofere cendo uma alternativa real para os que viajam regularmente de casa para o trabalho. Através de um aplicativo,

os passageiros podem reservar assentos e comprar passagens, e os percursos podem ser consultados no Google Maps. Com o que fica, mais uma vez, provado que não é preciso reinventar a roda, basta utilizá-la da forma certa. ©

City

floNovos conhecimentos em tempo recorde

Quem já não desejou alguma vez poder assimilar o conteúdo de livros inteiros no mais curto espaço de tempo? Os fundadores da startup berlinense Blinkist transformaram esse desejo numa brilhante ideia de negócios. Em vez de ter que passar horas a fio lendo centenas de páginas, as ideias centrais de mais de 1.000 livros técnicos podem ser lidas

comodamente em apenas poucos minutos nos intervalos livres, por meio de um aplicativo no smartphone, em um tablet ou em qualquer browser. Uma solução ideal para todos os que têm de adquirir rapidamente sempre novos conhecimen-

tos e querem aproveitar os muitos momentos livres enquanto estão indo de um lugar para outro. © iS

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Antecipar o futuroCriar movimento e fornecer energia

30 Tecnologia

Qual é o seu papel na solução de desafios globais?

38 Cinco países, um futuro?

Como novas tecnologias influem na vida de pessoas em diferentes culturas

48 A todo vapor

Como funcionarão as usinas do futuro

52 Megacidades criativas

Como cidadãos podem participar ativamente do desenvolvimento da sua cidade

56 Especialistas são insubstituíveis

Apresentamos quatro pessoas que trabalham em nossa empresa

Nós promovemos mudanças – abertos para o novo e com a  curiosidade do pesquisador, pensamos de forma visionária e muito além do  presente.

Riqueza de ideias caracteriza tanto nossos produtos e processos como o rela-cionamento com nossos semelhantes. Porque nada é tão bom

que não possa ser melhorado.

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Antecipar o futuro Antecipar o futuro

Tecnologia por dentro: sala de servidores

TecnologiaTexto Luciana Ferrando, Björn Lüdtke

Em todas as partes do nosso planeta, vemo­nos

confrontados com desafios que temos de enfrentar.

Que papel a tecnologia pode desempenhar na

sua solução? Ou compete a nós mesmos, ao fim e

ao cabo, superar esses desafios? Três diferentes

abordagens do tema

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Antecipar o futuro Antecipar o futuro

R esponder à voz suave do sistema de navegação, ficar zangado com o smartphone

ou confundir ruídos com toques de telefone – essas coisas não são mais vistas como comportamento estranho, e sim mostram como cresce nossa fa-miliarização com equipamentos técni-cos. A tecnologia se tornou algo tri-vial, que faz parte de nosso dia-a-dia. Máquinas assumem muitas de nossas tarefas e já tem gente com medo de que não demorará muito para o ser humano se tornar supérfluo. Será que isso realmente poderia ocorrer?Na era da digitalização, as pessoas muitas vezes se esquecem de que são elas mesmas que se encontram por trás desse desenvolvimento. Em mea-dos do século XVIII, “computador“ era uma pessoa que fazia cálculos e resolvia questões matemáticas com-plexas ou fazia análises numéricas.

“Sem pessoas como Alan Turing, que inventou o computador, ou Gottfried Wilhelm Leibniz, que criou o sistema de numeração binário, não teríamos hoje máquinas quase tão geniais como seus construtores”, diz Álvaro Villa-plana, filósofo da tecnologia nas uni-versidades de Madrid e Costa Rica.

Em sua opinião, o computador atual estaria sendo muito idealizado. Ele seria mais rápido e exato que o ser humano e nunca se cansaria. “Como se as máquinas fossem independen-tes e concorressem com os humanos”, complementa Villaplana. Entretanto, computadores têm desvantagens em relação ao homem: não possuem espontaneidade. Eles precisam de modelos e comandos claros, que de-terminam o caminho a ser seguido.

“Computadores são excelentes na hora de seguir instruções, mas são terríveis quando se trata de impro-visar”, constata Nicholas Carr em um artigo no jornal The New York Times. “Seus talentos terminam nos limites de seus programas. Já as ca-pacidades humanas não conhecem essa limitação”.Para a pesquisadora de design An-drea Augsten, o maior desafio é transferir do analógico para o digital aquilo que faz do ser humano um ser humano. “Quando trabalhamos juntos em um workshop, sorrindo e trocando ideias, essa energia está no ar. Mas ela se perde assim que cada um volta para seu computador”, diz a especialista. “Nós tentamos

preservar essa recordação de forma digital, mas ela só pode ser docu-mentada em um canal, com imagens, por exemplo”. Para ela, fatores como experiência de vida ou inteligência emocional têm um papel importante.

“O conhecimento tácito, aquilo que não sabemos expressar com palavras e que simplesmente carregamos den-tro de nós, não pode ser reproduzido de forma digital”.Na abordagem de pesquisa “Affec-tive Computing”, que se ocupa de computadores e emoções, houve re-sultados surpreendentes: emoções podem ser lidas nos rostos através de um software. Em 2013, um es-tudo da Universidade da Carolina do Norte mostrou como um software treinado foi capaz de reconhecer ex-pressões faciais e associá-las a termos como “frustração” ou “motivação”. Esse software deverá ajudar profes-sores em seu trabalho pedagógico. Para Álvaro Villaplana, todavia, apenas a combinação de capacida-des humanas e técnicas pode trazer um progresso real. Na área educa-cional, o homem, para ele, ainda se encontra no centro e a informática seria uma ferramenta para uma

melhor transmissão de conheci-mento. “ Porém, em áreas sensíveis, é uma vantagem quando máqui-nas agem de forma autônoma, por exemplo, em missões no espaço”. Mas, mesmo nesses casos, é neces-sária uma coope ração entre huma-nos e máquinas, pois os homens têm que interpretar os dados coletados por computadores no espaço. Nos FabLabs, por outro lado, o foco se encontra na curiosidade e na criatividade humana. Nas oficinas hightech espalhadas pelo mundo, todos podem experimentar os mais novos equipamentos, como impres-soras 3D ou cortadoras a laser. O ob-jetivo? Ter a tecnologia nas próprias mãos, entendê-la melhor e usá-la para as próprias finalidades. Outra vantagem tecnológica que já se tornou indispensável é a ajuda no

armazenamento de conhecimentos. Estudos comprovam que aqui o ho-mem e a máquina se complementam bem. “O que acontece com os re-cursos liberados no cérebro quando dados são salvos externamente?” foi o que questionaram, no final de 2014, Ben Storm e Sean Stone, do Memory Lab da Universidade da Califórnia.

“O armazenamento digital de dados que, de outro modo, teríamos que guardar na cabeça, facilita o apren-dizado de novas informações”, es-creveram os pesquisadores no jornal Psychological Science. As pessoas eram capazes de gravar melhor pala-vras de um arquivo PDF quando sa-biam que poderiam salvar o arquivo.Na opinião de Andrea Augsten, não haverá um futuro “em que seremos controlados por máquinas e não saberemos mais pensar por nós mes-

mos”. Pelo contrário. Segundo ela, os seres humanos devem continuar a almejar uma otimização de sua relação com a tecnologia. O desen-volvimento da robótica para os cui-dados de enfermos/idosos ou na in-dústria automobilística, por exemplo, mostraria claramente como máqui-nas podem facilitar nossa vida se fo-rem controladas por nós. Porque o homem pode reagir a imprevistos, enquanto as máquinas somente sa-bem seguir regras.Cotidiana, próxima e sempre in-tensa: a relação do homem com a tecnologia está hoje tão presente em sua vida como seus relaciona-mentos interpessoais. Entretanto, o homem é indispensável também para as máquinas, já que é ele que as cria, as programa ou, quando ne-cessário, puxa a sua tomada.

“O homem e a máquina” — quem precisa de quem?

Texto Luciana Ferrando

Impressoras 3D: em breve cotidianas?

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Antecipar o futuro Antecipar o futuro

“Não há volta” — uma entrevista sobre tecnologia com o autor Michael Lind

Texto Björn Lüdtke

mas não devemos sobrestimar o nú-mero de tecnologias transformadoras.

O senhor acha que, de um modo geral, colocamos esperanças demais em novas tecnologias?Sim, sobretudo nos Estados Unidos, não tanto em outros países como a Alemanha, por exemplo. Há um enfoque demasiado em tecnologias disruptivas. Dá-se muito pouca im-portância à utilização mais ampla de tecnologias já desenvolvidas – pelo menos no que toca as políticas públi-cas. E, no entanto, são precisamente elas que conduzem aos verdadeiros ganhos de produtividade e a uma melhora da nossa qualidade de vida.Vez por outra surgem setores que são de fato novos. Mas, na grande maioria das vezes, a tecnologia ape-nas transforma setores conhecidos há muito. Com o motor de combustão veio, por exemplo, a mecanização agrícola: o trator substitui o cavalo e o homem. Continua sendo agricul-tura, só que mais produtiva.

Existe um movimento chamado «Maker Movement», que propaga que as pessoas voltem a fazer elas mesmas muitas coisas. O senhor acredita que o faça você mesmo é uma possibilidade de solucionarmos alguns dos nossos problemas, como a subnutrição ou o suprimento de energias renováveis?Em uma palavra: não. Sou um grande entusiasta do Maker Movement, e creio que é bom para uma sociedade que as pessoas não comprem tudo simplesmente em lojas. Nos Estados Unidos, essa tradição já existe há muito: lojas de bricolagem oferecem ferramentas com as quais as pessoas constroem suas próprias estufas nos fins de semana. Isto é bom, e eu acre-dito que este processo será acelerado por máquinas para a produção rá-pida de elementos de construção pa-dronizados, o chamado Rapid Proto­typing. Porém, é utópico acreditar

que a eficiência econômica da produ-ção em massa possa ser substituída por impressoras 3D na garagem. Faz sentido, e continuará fazendo, fabri-car em massa produtos como automó-veis ou aviões.Desde os inícios da revolução in-dustrial existe a esperança de que possamos retornar a uma sociedade pré-urbana, rural, mas equipados com novas ferramentas. Não con-seguimos isso até agora, e eu pes-soalmente também creio que jamais conse guiremos.

No seu ver, a complexidade da vida atual causa apreensão às pessoas?Sim, penso que sim. No meu ver, existe aí uma discrepância: eu acre-dito que, tradicionalmente, o ser hu-mano funciona em pequenos grupos, que não exigem uma grande com-petência científica ou técnica. Mas a realidade é que vivemos em estados que têm fronteiras e em grandes co-munidades como a União Europeia.Isso não só é uma nova experiência para o ser humano, eu também acre-dito que, de uma certa forma, isso é contra a nossa natureza. Os seres humanos querem viver como vivem os chimpanzés, nas florestas, em pe-quenos grupos. No entanto, estamos rodeados de um bulício constante, como se vivêssemos num formigueiro. Isso tem, forçosamente, de gerar toda sorte de problemas sociais e políticos. Entretanto, chegamos a um ponto no qual não há mais volta. Não é possí-vel alimentar dez bilhões de pessoas com produtos produzidos localmente com a ajuda de energia elétrica solar. Os alemães estão tentando fazer isso no momento, mas não funciona.

Um dilema: a situação atual causa apreensão a muitas pessoas, e mesmo assim confiamos mais e mais na tecnologia – basta olhar os mer­cados financeiros, ou os pilotos auto­máticos em aeronaves, que assumem cada vez mais funções.

Eu diferenciaria entre tecnologia e técnica. A tecnologia é a máquina propriamente dita, a técnica é a uti-lização dessa máquina. A maioria desses exemplos de tecnologia são, na verdade, técnicas. Nos anos 90, antes dos Estados Unidos desregula-rem o setor financeiro, por exemplo, utilizava-se a mesma tecnologia que nos anos 2000, ou seja, depois da desregulação. O que mudou foram somente as condições legais.No fundo, temos completa liberdade quando se trata de estruturar as coisas. É como com as pessoas que pensam que rejeitam a tecnologia. Quando, na verdade, o que elas rejeitam são de-terminadas condições sociais, políticas e legais. Pouco importa que ferramen-tas usamos. Há custos e há benefícios, tudo é uma questão de ponderação – mas, no fim das contas, está em nossas mãos dar à sociedade a forma que queremos que ela tenha.Em todos os tempos, as pessoas

tiveram e têm determinadas concepções de como poderia

ser o futuro. Nos anos 60, por exem-plo, elas imaginavam que na segunda década de 2000 estaríamos voando para nossas colônias na Lua em naves espaciais.Como sabemos, esse não é o caso. Em compensação, carregamos no bolso ou na bolsa telefones celulares que são computadores com uma ca-pacidade de processamento comple-tamente utópica naquela época. De uma forma ou de outra, novas técni-cas e tecnologias desempenham um papel decisivo na maioria das visões do futuro.Procuramos descobrir qual é, exa-tamente, esse papel na entrevista a seguir com o autor Michael Lind. Além de autor, Lind é cofundador da “New America”, uma organização que se empenha junto a tomadores de decisão em prol, entre outras coi-sas, de uma reorientação da política dos Estados Unidos na era digital.

Hoje, novas tecnologias são frequen­temente chamadas de disruptivas, ou seja, elas provocam mudanças fun­damentais no mercado e no compor­tamento dos consumidores. Elas são mesmo tão inovadoras assim?Sim. Mas, em minha opinião, hoje em dia muitas tecnologias são fre-quentemente categorizadas de forma errônea. A grande maioria dessas chamadas inovações disruptivas são, na verdade, tecnologias revolucio-nárias que já foram desenvolvidas em meados do século 20 e hoje estão, em essência, apenas sendo aperfei-çoadas ou utilizadas de uma forma mais ampla.Tomemos, por exemplo, a automatiza-ção de automóveis, a utilização cres-cente de tecnologias da informação e comunicação nas mais diversas áreas, ou as mídias sociais – as técnicas em que se baseiam já foram em parte de-senvolvidas na década de 30.Muitas das atuais inovações não são tecnologias realmente transformado-ras, que provocam mudanças radicais. Um exemplo: a invenção do motor elétrico equivale ao desenvolvimento

do computador entre os anos 40 e 80. A eletrificação das cidades e áreas rurais equivale ao desenvolvimento da internet nos anos 90 e 2000. E os aplicativos de hoje equivalem aos programas de rádio e televisão, que só se tornaram possíveis com a ex-pansão da rede elétrica. Nem a rede televisiva e nem tampouco um apli-cativo nas mídias sociais são tecnolo-gias inovadoras – totalmente ao con-trário do motor elétrico.

Sendo assim, o senhor diria que existe de fato uma revolução digital? Existe, sim, porque os verdadeiros ganhos de produtividade e as mudan-ças reais na sociedade não resultam do desenvolvimento inicial de cha-madas tecnologias de base ou tecno-logias pioneiras como a máquina a vapor, o motor elétrico ou o computa-dor. A verdadeira transformação re-sulta da aplicação dessas tecnologias em vários setores que já existem.Esses setores são velhos conhecidos: a indústria, a agricultura, o comércio varejista, o setor de lazer, etc. A trans-formação em nossa sociedade existe,

Michael LindAutor estadunidense que já trabalhou para o jornal “The New Yorker”, en-tre outros. Lind é cofundador do think tank “New America”.

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Antecipar o futuro Antecipar o futuro

“Um empurrãozinho na direção certa” — nudging como alternativa para soluções técnicas?

Texto Björn Lüdtke

Nudging Network, fundada em 2010 pelo dinamarquês Pelle Guldborg Hansen, realizou o seguinte experi-mento: pequenas placas ao lado dos interruptores de luz de uma universi-dade chamavam a atenção para o fato de que 85 por cento dos estudantes apagavam a luz quando deixavam o recinto. Isto fez com que a luz perma-necesse acesa com menos frequência (uma redução de 20 a 26 por cento, no total) – resultando em economia efetiva de energia.Nos EUA também se usa o empur-rãozinho: na quente Califórnia, é natural que os cidadãos liguem seu ar condicionado quando há ondas de calor. Em resultado disso, os co-lapsos do suprimento de energia

elétrica se tornaram cada vez mais frequentes. Psicólogos tiveram a ideia de informar os habitantes qual o seu consumo de energia elétrica em comparação com seus vizinhos, e as contas de luz seguintes passaram a vir com smiley faces, conforme a quantidade de energia economizada. Segundo a Opower, a empresa de

energia responsável, foram economi-zados 2,8 terawatts-hora de energia elétrica desde 2007.Na frequentemente fria Grã-Breta-nha, o problema é precisamente o contrário. Lá, muito calor (e portanto energia) sai pelo telhado. Para fazer com que as pessoas baixem a tempe-ratura da calefação em suas casas – e, assim reduzir a emissão de CO2 –, o governo britânico tentou estimular os cidadãos a isolar seus telhados oferecendo-lhe subvenções. Mas o plano não funcionou, os pedidos de subvenção ficaram muito aquém das expectativas. Por quê? Acabaram descobrindo que as pessoas se es-quivavam de uma reforma porque a maioria dos sótãos estavam repletos

de tralhas. Passaram então a ofere-cer não só sub sídios financeiros ao isolamento, como também a remoção gratuita dos trastes. O resultado: os pedidos de subvenção triplicaram.A ideia de arrumar os sótãos partiu do primeiro “Behavioural Insigths Team” do mundo, um time de especialistas criado pelo governo britânico em

2010 para aplicar na prática os in-sights das ciências comportamentais em geral e a teoria dos nudges em especial. O objetivo do time é ajudar as pessoas a tomarem decisões que são melhores para elas.A primeira tarefa do time consistiu em aumentar a arrecadação de im-postos. Como? Em vez de avisar os contribuintes de que ainda estavam em dívida com o fisco, eles eram in-formados de que a maioria dos mo-radores de sua cidade já estava com seus impostos em dia. Uma simples reformulação do texto bastou para aumentar a arrecadação em 200 mi-lhões de libras esterlinas – e isso sem causar custos adicionais.Todos esses são pequenos estímu-los que podem ter um grande efeito. A intenção do nudging não é proibir, e sim permitir que a pessoa decida livremente – mas direcionando sua escolha. A linha que separa o nud-ging da manipulação, todavia, é tê-nue, e assim não surpreende que ele também seja objeto de críticas.De acordo com a teoria, um empurrão-zinho só é um nudge quando influen-cia o comportamento de pessoas de forma previsível, sem proibir a escolha de outras opções. Nem toda interven-ção que influencia alguém que decide livre e racionalmente é um nudge. Nudges não impõem incentivos – posi-tivos ou negativos. Se aproveitar-se de sentimentos de vergonha para dar um empurrãozinho ainda pode ser consi-derado neutro, certamente é um as-pecto merecedor de discussão. Outro ponto questionado é se a mudança de comportamento é duradoura.Apesar de todas as críticas, o nudging pode produzir mudanças positivas de comportamento em indivíduos e em grupos inteiros. Muitas vezes, nudges são alternativas baratas para soluções técnicas dispendiosas. Se forem utilizados com bom senso e tato, cada um de nós pode ser estimu-lado a mudar o mundo – empurrãozi-nho por empurrãozinho.

Em todas as partes do nosso planeta, vemo-nos confron-tados com inúmeros desafios:

agricultura não sustentável, mudança climática, alto consumo de energia, envelhecimento da população e au-mento dos custos no setor de saúde são apenas os mais urgentes. Com mais e mais frequência, as aborda-gens tradicionais falham na tentativa de solucionar esses complexos pro-blemas. Na maioria dos casos, instru-mentos estatais ou puras soluções de mercado não bastam. Por isso, inova-ções sociais são vistas, mais e mais, como complemento ou alternativa para soluções tradicionais e na maio-ria das vezes técnicas de problemas. E, no entanto, ainda não existe uma definição clara do que são inovações sociais. As discussões sobre esse conceito são longas e numerosas. No fundo, porém, trata-se simplesmente do seguinte: cada um faz a sua parte para produzir mudanças positivas para si próprio e seus semelhantes.O que mais distingue as inovações sociais das tecnológicas é que elas objetivam a mudança de determina-das práticas sociais e dão menos valor à introdução de novos produtos. Ino-

vações sociais são novas abordagens para satisfazer necessidades sociais. Exemplos conhecidos são comércio justo, microfinanciamentos, bancos de horas de trabalho, moedas comu-nitárias e apps móveis para a organi-zação de grupos de carona.

Uma nova abordagem em termos de inovação social é o chamado nudging, que em inglês significa “dar um em-purrãozinho”. Trata-se de uma abor-dagem que se ocupa da questão de como se pode estimular as pessoas a ter um comportamento mais social e produtivo, sem restringir sua liber-dade de escolha.A teoria dos nudges diz que um feed-back positivo ou estímulos indiretos –

em outras palavras, um toque ou um empurrãozinho – influenciam grupos ou indivíduos de forma tão ou mais efetiva do que instruções diretas, leis ou coerção.Os chamados nudges são frequen-temente utilizados como alternativa para soluções técnicas. Um hotel na Dinamarca, por exemplo, colocou maçãs na vitrine de um bufê sob um cartaz na parede com o velho ditado popular segundo o qual “uma maçã por dia mantém o médico longe” para estimular os participantes de um congresso a viver de forma mais salutar. Os hóspedes começaram a preferir o lanche saudável a um pe-daço de bolo ou um chocolate, e o hotel se viu obrigado a ampliar sua oferta de frutas. A alternativa téc-nica? Desenvolver mais produtos dietéticos ou gastar mais dinheiro no setor de saúde. Estimular as pes-soas a levar uma vida mais saudável da forma descrita acima, porém, é uma solução muito mais sustentável e econômica.Os nudges também podem ser um meio simples e proveitoso de estimu-lar as pessoas a economizar energia. A associação de pesquisa Danish

Como as pessoas

podem ser estimu­

ladas a ter um com­

portamento mais

social?

Clássico do nudging: um toque para apagar a luz

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Antecipar o futuro Antecipar o futuro

Cinco países, um futuro?

Texto Björn Lüdtke, Yuki Sato, Ellen Lee, Angela Gruber, Luciana Ferrando, Raouia Kheder

Como novas tecnologias influem na vida de pessoas

em diferentes culturas

C omo em todas as edições da revista Futuro, damos uma espiada em cinco paí-

ses do mundo. Queremos ver onde estão as diferenças, mas também os pontos comuns. Desta vez, foca-mos nos novos desenvolvimentos tecnológicos.Quais são as peculiaridades cultu-rais na proliferação e na aceitação da tecnologia na respectiva cultura? Qual a importância assumida por ela no Japão, nos EUA, na Alemanha, na Argentina e na Tunísia e qual seu lugar no cotidiano de cada um desses países?Começamos com nossa repórter Yuki Sato, no Japão. Os japoneses têm a fama de serem especialmente aber-tos para inovações técnicas. Isso é mesmo assim ou trata-se simples-mente de um clichê? E quais são as expectativas depositadas em robôs?Também os EUA estão sempre bem à frente quando se trata de novas apli-cações. Segundo Ellen Lee, isso po-deria ter a ver principalmente com o espírito pioneiro rebelde dos america-nos. Lá, ela encontra uma cultura que

“incentiva quem tem a coragem de enfrentar riscos e recompensa quem faz coisas inteligentes”.Já os alemães têm a imagem de céti-cos em relação a novas tecnologias – e isso apesar da Alemanha ser o país dos inventores e pensadores. Essa imagem é justificada? Angela Gruber busca responder essa pergunta.Luciana Ferrando dá uma olhada na situação na Argentina, onde as novas tecnologias têm um papel mais im-portante no dia-a-dia do que talvez possamos imaginar. Isso já começa na educação das crianças e se deve prin-cipalmente a um programa estatal.Raouia Kheder tenta esclarecer por-que que na Tunísia as novas tecnolo-gias – com exceção de tecnologias de informação e comunicação – têm tanta dificuldade de se estabelecer. E o motivo não parece se encontrar na população.

Japão— Robôs com alma

No verão de 2014, a companhia japonesa de telecomunicações Soft-Bank apresentou ao público o robô humanoide “Pepper”. Pepper tem um corpo similar ao humano, dois olhos que piscam para transmitir emoções e uma grande missão: ele deve fazer pessoas felizes através da “leitura” de suas emoções. Turistas podem ficar surpresos quando são atendidos por robôs humanoides em algumas lojas ou hotéis no Japão, mas para os japoneses isso tem se tornado algo cada vez mais trivial.É claro que aqui ainda não se vê ro-bôs andando pelas ruas – isso é mais um clichê. Mas, ainda assim, robôs com semelhança com os humanos pa-recem assumir cada vez mais tarefas. Por que essa tão grande abertura no Japão para esse tipo de tecnologia?Um motivo pode ser a alta impor-tân cia que se dá a valores seculares e racionais, ao contrário dos valores tradicionais relacionados à família, à comunidade local ou à religião. Em uma sociedade assim, prefere-se con-

fiar na técnica a pedir ajuda à famí-lia ou à comunidade.Segundo Shunsuke Aoki, CEO da Yukai Engineering, uma empresa de Tóquio que produz gadgets e brin-quedos digitais interativos, seus clientes dão preferência a produtos que apresentem a forma de bonecos ou figuras. Um de seus produtos é

“Bocco”, um robô para famílias, que cuida para que parentes que vivem distantes permaneçam sempre em contato. Ele tem a aparência de um yokai, uma figura sobrenatural fol-clórica japonesa.Aoki acredita que os yokais desem-penham um papel importante na postura dos japoneses em relação a robôs. “Desde a Idade Média, os japoneses creem que coisas muito utilizadas, como uma xícara ou um prato, também possuem uma alma e podem se transformar em um yokai. Essa cultura ainda continua a in-fluenciar a interação das pessoas com as coisas.”A expectativa de ter robôs como ajuda ativa no dia-a-dia parece fazer cada vez mais parte da sociedade ja-ponesa moderna. A empresa pública de pesquisa e desenvolvimento “New Energy and Industrial Technology Robôs jogando futebol

Robôs na recepção de um hotel

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Antecipar o futuro Antecipar o futuro

Engenheiros alemães em ação

Óculos de RV Oculus Rift

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Development Organization“ prevê para o mercado interno de robôs in-dustriais e privados um crescimento de 1,6 trilhões de ienes em 2015 para 9,7 trilhões de ienes em 2039.Essa tendência é reforçada em muitas cidades de pequeno e médio porte pelas mudanças demográficas. O ór-gão de gestão de saúde de Nanto, por exemplo, utiliza para fins tera-pêuticos um robô em forma de foca chamado Paro, que teria um efeito calmante sobre pacientes. Após uma fase de testes bem-sucedida, a admi-nistração municipal decidiu empregá--lo para ajudar famílias que precisam cuidar de membros idosos. A popula-ção de Nanto caiu nos últimos 25 anos em 20 por cento para 55.000 habitan-tes, sendo que as pessoas com mais de 65 anos representam 34 por cento, 30 por cento acima da média japonesa.A queda da população e o envelhe-

cimento da sociedade são desafios que estão sendo enfrentados por muitas cidades japonesas – o que faz crescer as expectativas depositadas nos robôs.

EUA— Abertos para o

novo

Uma máquina de lavar que avisa por SMS quando a roupa está pronta. Um carro que anda sem precisar de motorista. Óculos de realidade vir-tual, com os quais se pode jogar pingue-pongue sem raquete e bola. Na proliferação e na aceitação de novas tecnologias, os Estados Unidos sempre estabelecem novos padrões.

Mas de onde vem uma cultura tão aberta assim para o novo? Essa cul-tura se encontra profundamente an-corada em uma sociedade que ainda hoje admira os rebeldes e aventurei-ros. Vemos isso na cultura popular americana, do rock ’n’ roll a Holly-wood. Ou nas recordações do faroeste. Ou mesmo na história orgulhosa de imigrantes, entre eles grandes lumi-nares da técnica, como Elon Musk da Tesla ou Sergey Brin da Google.“Imagine como deve ter sido quando a América foi povoada por imigran-tes europeus. Eles tiveram que ser bastante criativos e aventureiros só para conseguirem chegar até aqui”, diz Lee Rainie, diretor de estudos de internet, ciência e tecnologia no Pew Research Center em Washington, D.C.

“Isso gerou uma certa cultura, que incentiva quem tem a coragem de en-frentar riscos e recompensa quem faz coisas inteligentes”.Segundo um relatório da “Infor-mation Technology and Innovation Foundation”, um think tank sem fins lucrativos em Washington, D.C., a inovação tecnológica americana ba-seia-se também em um interesse profundamente arraigado dos norte--americanos em fazer eles mesmos, inventar e aperfeiçoar coisas. “Em combinação com uma marcante cul-tura de individualismo, isso facilita o questionamento de práticas insti-tucionalizadas – tanto faz se se trata de Steve Jobs ou de um operário em uma fábrica”, constata o relatório.Mas há também os que alertam sobre uma cultura que só anda obcecada pela próxima inovação. O “Ameri-can Enterprise Institute”, outro think tank em Washington, D.C., chama a atenção dos norte-americanos para que não se percam na “fascinação da ideologia tecnológica”. Isso pre-judicaria a ética e as virtudes de uma sociedade. Pelo menos tem surgido ultimamente uma preocupação com a dependência da técnica – princi-palmente de smartphones – e com a

forma como ela interfere na intera-ção entre nós, seres humanos.Teme-se, além disso, que os EUA percam o fôlego na área de inova-ções. Por um lado, acusa-se as em-presas de desenvolverem apenas produtos para um pequeno grupo privilegiado de pessoas, ignorando problemas maiores e mais urgen-tes, como a pobreza e o aquecimento global. Por outro lado, Eamonn Fingle ton, por exemplo, o autor de In the Jaws of the Dragon: America’s Fate in the Coming Era of Chinese Dominance (Nas garras do dragão: o destino americano na futura era da dominância chinesa), adverte que empresas chinesas registraram nos últimos anos mais patentes técnicas do que empresas estadunidenses.Ainda assim, o desenvolvimento téc-nico no país continua a ser extrema-mente veloz. Um bom exemplo são os óculos de realidade virtual Ocu-lus Rift. O primeiro protótipo desses óculos foi criado em 2012 por um jo-vem de 20 anos de idade que era en-tusiasmado por games, gerando uma verdadeira corrida entre os gigantes tecnológicos Sony, Microsoft e Goo-gle: qual deles conseguiria lançar o primeiro produto de realidade virtual para o mercado de massa? No ano de 2014, Facebook comprou a empresa Oculus VR.A mais nova versão dos óculos foi apresentada no ano de 2015, junta-mente com um jogo de pingue--pongue virtual, que pode ser jogado por pessoas que se encontram até mesmo a milhares de quilômetros de distância uma da outra. “Acre-dito que vi em toda minha vida cinco ou seis demonstrações na área de computação, das quais pensei em seguida que elas iriam mudar o mundo”, diz Chris Dixon, um dos investidores do Oculus Rift, à re-vista Wired Magazine. “Apple II, Net scape, Google, iPhone – e agora Oculus, que faz parte da mesma in-crível categoria”.

Alemanha— Inventores e

pensadores

Quem chega à Alemanha e quer usar a internet, tem que começar pergun-tando por senhas. Enquanto que em outros países se pode entrar em uma rede WLAN aberta em qualquer café, as redes na Alemanha são protegidas.

O motivo é a legislação vigente: se uma pessoa abusar do acesso à rede, o proprietário da conexão pode ser responsabilizado por isso.Ao mesmo tempo, o país é pioneiro no que diz respeito à energia verde: em todos os cantos se vê turbinas eólicas e usinas hidrelétricas, carros elétricos não são mera utopia. Os alemães investem em tecnologia também dentro de suas casas. Em-presas de automação residencial bem-sucedidas são o melhor exemplo, como a Tado, uma startup de Muni-que, com seu sistema de aquecimento inteligente. Até na Ikea, a loja de móveis e decoração preferida no país,

pode-se comprar lâmpadas controla-das por um aplicativo. A digitaliza-ção chega cada vez mais ao centro da sociedade.Os alemães adoram a técnica, a efi-ciência e a utilidade dos aparelhos modernos. Ao mesmo tempo, eles questionam inovações como poucos de seus vizinhos. E isso não é uma contradição, por mais que pareça.

“Pelo fato do novo atrapalhar proces-sos com os quais já estamos familiari-zados, ele não só é visto muitas vezes

como inútil, mas também como incô-modo”, critica a autora Kathrin Passig em seu texto “Situações-padrão da crítica à tecnologia”. O exame crí-tico do que é novo antes de integrá-lo no cotidiano é algo típico especial-mente na Alemanha: um novo apare-lho ou uma nova técnica têm primeiro que provar seu valor agregado. Por-tanto, mesmo que os alemães sejam altamente exigentes com inovações técnicas, eles, no final das contas, cami nham em direção ao progresso de uma forma mais consequente que a maior parte das outras nações.Enquanto que em outras nações se aceita sem nenhuma preocupação

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42 43

Antecipar o futuro Antecipar o futuro

os termos e condições de empresas internacionais como Facebook ou Skype, uma pesquisa realizada pelo portal Statista no ano de 2014 mostra que os alemães também reconhecem o potencial de vigilância e espiona-gem representado pela técnica – as revelações do whistleblower Edward Snowden contribuíram para isso. E em nenhum outro país europeu elas causaram tanta indignação.Mas pesquisas indicam também que a imagem do alemão como avesso a novas técnicas não é de forma al-guma justificada. Numa pesquisa de 2014, um terço dos entrevista-dos disse não poder mais imaginar uma vida sem smartphones. E 47 por cento acham extremamente interes-sante como as possibilidades técni-

cas têm se multiplicado no âmbito da digitalização.Numa comparação com outros países da Europa, os alemães são mais críti-cos em relação a inovações técnicas que seus vizinhos e não partem logo cheios de entusiasmo para cima de no-vos “brinquedos tecnológicos”, afirma o tecnosociólogo Johannes Weyer, de Dortmund, em um estudo sobre o assunto. Mas, segundo ele, os dados mostram que os alemães se encontram bem próximos da média europeia.No setor de novas mídias, as grandes criações – como o novo smartphone ou o app mais quente – vêm mais da área anglo-saxônica. Mas isso não incomoda os alemães. Como país de tecnologia altamente avançada, a Alemanha é líder quando se trata de

engenharia e construção de máqui-nas. Nesses setores clássicos são mos-tradas sua superioridade tecnológica e a alta consciência no que diz res-peito à qualidade. Aqui a Alemanha se apresenta incontestadamente como a terra dos inventores e pensadores.O foco nessa área essencial faz do país o motor de inovação mais sus-tentável da Europa. Os alemães defenderam também em 2014 sua liderança no registro de patentes na União Europeia: foram registradas quase 32.000 patentes, a maioria de-las da indústria. Foram mais registros do que em qualquer outro país eu-ropeu. E talvez isso seja algo típico alemão: não falar muito sobre sua ca-pacidade inovadora, mas deixar que os números falem por si.

“Da Vinci”, o sistema de robôs cirúrgicos mais usado no mundo

Participante na Olimpíada Mundial de Robótica

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Argentina— O olhar voltado

o futuro

Excitação e entusiasmo reinaram na comunidade científica argentina quando Buenos Aires, a capital do país, sediou no final de julho de 2015 a Conferência Internacional Conjunta de Inteligência Artificial IJCAI. Com 1.200 participantes, a conferência mais importante do mundo na área de inteligência arti-ficial foi realizada pela primeira vez na América do Sul.A escolha da Argentina não foi mera coincidência. “É o reconhecimento e uma comprovação de que a Amé-rica Latina se encontra na vanguarda do avanço tecnológico”, afirma Pro-fessor Guillermo Simari, presidente do comitê local de organização da IJCAI. “Os argentinos se entusias-mam de imediato com novas ideias e veem tecnologia como impulsor do desenvolvimento cultural em to-dos os setores“, completa Guillermo Simari.O motivo para essa abertura é visto por Guillermo Simari, que também é diretor do Instituto de Ciência da Computação & Engenharia da Uni-versidad Nacional del Sur em Bahía Blanca, nas peculiaridades culturais dos argentinos. A frase do autor me-xicano Carlos Fuentes: “Os mexica-nos vêm dos astecas, os argentinos dos navios” é para ele mais do que uma citação espirituosa. “A onda de imigração europeia que chegou à Argentina no início do século XX ocasionou uma diferença clara para outros países latino-americanos”, constata Guillermo Simari. “Imigran-tes desejam que seus filhos recebam uma boa formação para conquistar uma melhor posição na sociedade. Esse impulso recebido de outras cul-turas nos influenciou positivamente

e é hoje parte de nosso modo de ser: caminhamos para a frente e temos o olhar voltado para o futuro.”Isso se reflete também no cresci-mento do uso de tecnologia e robó-tica na educação. Hoje em dia, temos tudo quanto é tipo de aplicações nas salas de aula. Crianças no ensino fundamental aprendem a programar, alunos constroem robôs, computa-dores fazem parte do equipamento básico. Tudo começou em 2010 com o programa estatal “Conectar Igual-dad”, que distribuiu 5,4 milhões de netbooks a estudantes e professores de nível médio em todo o país.Até então, netbooks eram um luxo exclusivo. “Conectar Igualdad abriu uma janela para o mundo e reduziu a desigualdade tecnológica na so-ciedade”, afirma Monika Paves, pro-fessora de física e gerente da Robot-Group Argentina. Sua empresa, que fabrica robôs para o setor educa-cional, oferece workshops (também para professores), atua em projetos pedagógicos do Ministério da Ciência e produz kits didáticos de robótica.

“Quando crianças programam, desen-

volvem ideias próprias e veem então os robôs funcionarem da forma espe-rada, sua motivação só aumenta”, diz Monika Paves.É o mesmo que diz Marcelo De Vin-cenzi, da Universidad Abierta In-teramericana (UAI): “Cada vez mais professores e pedagogos utilizam a robótica para explicar disciplinas científicas básicas. As crianças aprendem matemática ou física, por exemplo, enquanto jogam futebol de robôs”. Há 16 anos, a UAI organiza as “Olimpíadas Nacionales de Ro-bótica” com a participação de 250 ti-mes de escolas de todo o país.Ou os próprios alunos projetam pe-ças para os robôs e as imprimem em uma impressora 3D, como é feito pela professora de informática Ali-cia Siri com jovens de suas classes.Até mesmo em casa, Alicia Siri é fã da técnica. Ela tem um robô--aspirador e controla suas máquinas de lavar roupa e louça através do smartphone. As pessoas jovens à sua volta ficam fascinadas, mas “gente com idade acima de 45 não enxerga motivos para gastar dinheiro com

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44 45

Antecipar o futuro Antecipar o futuro

Japão

A. Mesmo antes dos

smartphones, os

celulares “normais”

já tinham função de

internet

B. Robôs devem ajudar

a cuidar de idosos

em uma sociedade

que envelhece cada

vez mais

C. A técnica também

pode ter uma alma

EUA

A. Existe uma preocu-

pação de que haja

uma dependência

dos smartphones

B. Nas ruas da Califór-

nia circulam os pri-

meiros carros sem

motorista

C. Os americanos são

muito abertos pa-

ra o novo e aventu-

reiros

Alemanha

A. Quase um terço dos

entrevistados em

uma pesquisa disse

não conseguir mais

imaginar uma vida

sem smartphones

B. Smart Homes ga-

nham uma aceita-

ção cada vez maior

C. O novo tem primeiro

que provar seu valor

Argentina

A. 71 % dos entrevista-

dos em uma pesqui-

sa não saem de ca-

sa sem seu smart-

phone

B. Robôs são usados

na educação

C. Os argentinos veem

a tecnologia como

impulsor do desen-

volvimento cultural

Tunísia

A. Dois de cada três

tunisianos gosta-

riam de ter um

smartphone

B. Novas tecnologias

são utilizadas prin-

cipalmente nas ci-

dades

C. As gerações mais

jovens estão se

abrindo para as no-

vas tecnologias

Novas formas de pagamento na Tunísia

Os cinco países em comparação

A. O uso do smartphone B. Tecnologia no dia-a-dia C. Peculiaridade cultural © iS

tock

isso”. Já ela mesma entende o uso de tecnologia como algo que traz uma melhoria de sua qualidade de vida. Também por essa razão ela se  deixou operar um rim por um robô no Hos-pital Italiano. Esse hospital, como também o Hospital El Cruce-Néstor

Kirchner, ambos em Buenos Aires, possuem “salas de operação inteli-gentes” da mais nova geração. “Há quarenta anos, meu pai ficou de cama por 15 dias por causa de uma opera-ção semelhante e tinha uma corte de 30 centímetros. O meu foi de somente três centímetros e já pude voltar à vida normal após quatro dias.”Outra possibilidade de aplicação de inteligência artificial, na qual uma câmera auxilia cuidadores de idosos em seu trabalho, foi desenvolvida por Ricardo Rodriguez. Porém, essa solução nunca foi utilizada na prá-tica. “Não houve investidores para o projeto. Esse é um problema infeliz-mente muito comum na Argentina, já que ainda somos um país em de-senvolvimento”. Mas os especialistas

são unânimes: talento, ideias cria-tivas e know-how é o que não falta na Argentina. E tendo em vista as novas gerações, que crescem com as novas tecnologias, eles estão conven-cidos de que vai ficar ainda melhor no futuro!

Tunísia— Com vontade de

mais

Com uma taxa de penetração de 53 por cento, a Tunísia ocupa o dé-cimo lugar na África no que diz res-peito ao uso da internet. Quase seis dos onze milhões de tunisianos a utilizam. Em número de usuários, o país se encontra até mesmo no 66o lugar no ranque mundial, segundo o instituto de pesquisas de mercado Tunisie Sondage. Isso é notável, mas não significa que a Tunísia faz jus à sua fama quando se trata de novas tecnologias em geral.

“Novas tecnologias” significa para a maioria dos tunisianos unicamente

“internet”. Adultos acima de 40 anos admitem usar somente aplicações básicas como e-mail ou Google e não possuir maiores conhecimentos em relação a aplicativos, streaming ou crowdsourcing.Abdullah, um vendedor de 35 anos, limita seu uso das novas tecnologias

a smartphone, internet e Facebook: “Isso é tudo que posso usar. No mais, nada é acessível e seguro. É claro que sei que há outras áreas nas quais se usam novas tecnologias. A auto-mação residencial é um bom exem-plo. E é claro também que essas tec-nologias existem na Tunísia, mas não me sinto bem ao imaginar minha casa inteira sendo vigiada à distância. E se alguém conseguir entrar em minha conta? Com certeza, algo assim pode funcionar em outros lugares, mas não na Tunísia”. Esse sentimento de desconfiança está profundamente enraizado e tem sua origem em expe-riências com corrupção – de sistemas de computadores, de empresas e até mesmo do governo. Muitos temem serem vítimas de fraudes ou ataques de hackers.Todavia, esse medo vem desapare-cendo aos poucos nas gerações mais jovens. Nas cidades, existem comunidades de geeks de compu-tador entre 20 e 30 anos de idade que experimentam de tudo: de cloud computing e streaming até sharing economy.Ramzi El Fekih, por exemplo, tentou provocar uma mudança na postura da sociedade em relação ao pagamento por celular com seu projeto “mdinar”.

“Nosso projeto estava à frente de seu tempo em muitos aspectos, e, sobre-tudo, estava mais avançado do que os regulamentos que teriam sido neces-sários para seu sucesso. Apesar das pessoas se preocuparem com a segu-rança, elas se mostraram bem abertas para o produto. Claro que me refiro aqui a pessoas abaixo de 35 anos. Nosso problema foram os regulamen-tos, que simplesmente não apresenta-ram a flexibilidade necessária para o produto que desenvolvemos.”Tirando esse ceticismo, que já está mesmo diminuindo, há poucas bar-reiras culturais – na verdade, so-mente aquelas relacionadas com áreas sensíveis como religião e tra-dição: jogos de azar ou negócios com ações são coisas malvistas em muitos países árabes.O maior obstáculo é o acesso às no-vas tecnologias. “Não consigo ima-ginar nenhuma invenção ou tecno-

logia em especial que não seria aceita”, diz Ramzi El Fekih. “Penso que na Tunísia as barreiras são mais de natureza econômica do que cul-tural. A taxa de câmbio e a falta de possibilidade de conversão do dinar bloqueiam bastante o caminho para o desenvol vimento e a aplicação de novas tecnologias. Creio que os tunisianos aceitariam qualquer tec-nologia nova se eles fossem bem informados e reconhecessem suas vantagens.”

Como acontece muitas vezes, a ima-gem que temos de outras culturas é impregnada por clichês. Pudemos esclarecer um ou outro desses clichês e ficamos sabendo que no Japão os robôs ainda não fazem parte da vida cotidiana, como imaginamos. Já na Argentina, eles já têm há alguns anos um grande papel na educação.

Os alemães pensam bem antes de adotar novas tecnologias, mas isso não significa que não sejam abertos para elas. Na Tunísia, até que se gos-taria de ter esses problemas. Lá, são circunstâncias externas que impedem que as novas tecnologias se estabele-çam mais rapidamente.Somente os americanos fazem jus à fama de desbravadores rebeldes – pelo menos em nossa pequena via-gem pelo globo – e são vistos com razão como pioneiros intrépidos no que se refere a novas tecnologias.Porém, uma coisa todas as culturas têm em comum: a técnica faz parte do dia-a-dia e sua importância cultural cristaliza-se cada vez mais. Em um país talvez mais rapidamente que em outro, mas com a tendência de que os hábitos quanto ao seu uso se igualem em todo o mundo. Saber usar a téc-nica para nosso próprio progresso é algo que está em nossas mãos.

“E se alguém con­

seguir entrar em

minha conta?”

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46 47

Antecipar o futuro Antecipar o futuro

Page 25: Cinco países, um futuro? Megacidades criativas Missão a Marte

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Antecipar o futuro Antecipar o futuro

Quando a União Europeia, há alguns anos, decidiu se despedir das lâmpadas

incandescentes, dois empresários da Região do Ruhr, na Alemanha, tiveram uma ideia engenhosa. Para driblar a proibição, simplesmente declararam as lâmpadas como mini--aquecedores, argumentando que elas forneceriam em primeira linha calor, e a luz seria apenas um pro-duto residual.De fato, a eficiência de uma lâm-pada incandescente não passa de cinco por cento – apenas um vigé-simo da corrente elétrica consu-mida é transformado em luz. Todo o resto é dissipado na forma de calor. Alto consumo, baixo rendi-mento: não é de se admirar que a UE tenha decidido banir essa tec-nologia das prateleiras das lojas. A proteção climática exige que ener-

gia seja utilizada da forma mais pro-dutiva possível.Eficiência é, portanto, a meta prin-cipal. Isso não vale, porém, somente

para o consumo, mas também para a geração de energia, pois quanto mais energia elétrica se consegue gerar com os recursos empregados nas usi-nas, melhor é o balanço climático da planta. A Agência Internacional de

Energia (AIE) estima que serão in-vestidos até 2035 em todo o mundo um total de 23 trilhões de dólares americanos em usinas elétricas con-vencionais – especialmente em usinas de carvão. Principalmente a China, a Índia e vários países do sudeste asiá-tico pretendem construir um grande número de usinas de carvão nos pró-ximos anos. Por esse motivo, qualquer ganho de eficiência, por menor que seja, resulta em um alívio significa-tivo para o clima.Usinas de carvão funcionam basica-mente como uma panela de pressão: a água é aquecida pela combustão de carvão até que ela vire vapor, provocando uma alta pressão den-tro do equipamento. O vapor é con-duzido para uma turbina, aliviando a alta pressão ao passar pelas pás – de forma semelhante ao que acon-tece quando a válvula da panela de

pressão se abre. Movida pelo vapor, a turbina gira com 3.000 ou mais rota-ções por minuto. Através de um eixo, essa energia mecânica é transferida ao gerador, cujo componente prin-cipal é um ímã, que, propulsionado pela turbina, move-se dentro de uma bobina e produz uma tensão que, por sua vez, gera a corrente elétrica.As usinas de carvão atualmente mais eficientes transformam aproximada-mente 46 por cento da energia con-tida no combustível em energia elé-trica. Porém, ainda não chegamos ao fim do desenvolvimento tecnológico, comenta o professor Alfons Kather, diretor do Instituto de Engenharia Energética da Universidade Téc-nica de Hamburgo-Harburg. “Seria possível, a médio prazo, uma efi-

ciência de 50 por cento”, explica o cientista. O aspecto mais importante: quanto maiores a temperatura e a pressão na caldeira, mais energia elé-trica se pode produzir com o carvão. Até agora, os limites se encontram em uma temperatura de aproxima-damente 600 graus e uma pressão de 300 bar, já que valores maiores pro-vocariam um desgaste muito rápido dos componentes do sistema. Por esse motivo, a indústria e a ciência estão desenvolvendo novos materiais mais resistentes à base de níquel, que de-verão suportar uma temperatura de 700 graus e uma pressão de 350 bar. Isso poderá elevar o grau de eficiên-cia em cerca de dois por cento.Também nas turbinas pode-se au-mentar o ganho, afirma Alfons Kather.

“A condução do fluxo de vapor pode ainda ser aperfeiçoada”, diz o pes-quisador. A formação de turbilhões ou desvios quando o vapor atravessa as turbinas provoca a perda de ener-gia. Cientistas da Rheinisch-West-fälische Technische Hochschule (RWTH) Aachen e da Universidade de Hanôver trabalham atualmente em um novo perfil para as pás, que deverá evitar o máximo possível es-sas perdas.Já o especialista da Siemens Stefan Lampenscherf quer aproveitar o calor residual das usinas para ge-rar mais energia elétrica. Ele e sua equipe estão desenvolvendo gerado-res termoelétricos, isto é, semicon-dutores especiais que geram uma tensão em sua superfície assim que

A todo vaporTexto Ralph Diermann Ilustração Jan Erlinghagen

Combustível transforma­se em calor, calor vira

movimento e movimento gera energia elétrica —

esse é o princípio de muitas usinas. Cientistas e

pesquisadores da indústria se esforçam para tornar

esse processo ainda mais eficiente

Barragem de uma hidrelétrica em Manitoba, Canadá

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tock

A proteção climá­

tica exige que ener­

gia seja utilizada

da forma mais pro­

dutiva possível

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50 51

Antecipar o futuro Antecipar o futuro

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tock

temperatura em torno de

600 graus – suficiente para

gerar vapor de água em uma

caldeira de recuperação de

calor, com o auxílio de um

permutador térmico. Em se­

guida, o vapor é direcionado

para uma turbina. Pressiona­

das pelo vapor, as pás da tur­

bina rodam e um eixo trans­

Gás natural é misturado

com ar quente comprimido

e  depois queimado. Isso re­

sulta em gases de combustão

com temperaturas acima de

1.000 graus, que, com alta

pressão, fazem as pás da

turbina girar. Esse movimento

rotatório aciona um gerador,

que produz energia elétrica.

Os gases de escape da

turbina têm ainda uma

4

2

1

6

9

10

5

7

8fere então esse movimento

a um segundo gerador.

Depois do vapor ter atraves­

sado a turbina, ele é resfriado

em um condensador, trans­

formando­se novamente em

água, que é bombeada de

volta para a caldeira, criando

assim um circuito fechado.

Um transformador eleva a

tensão da energia produzida

por ambos os geradores, de

forma que ela possa então

ser injetada na rede elétrica.

1 Alimentação de ar

2 Compressor

3 Alimentação de gás

4 Turbina a gás

5 Caldeira de recu pe­

ração de calor

— Usina a gás e

a vapor

3

6 Turbina a vapor

7 Condensador

8 Geradores

9 Transformador

10 Rede elétrica

nela ocorre uma diferença de tempe­ratura – por exemplo, quando uma metade é aquecida pelo fluxo de ca­lor e a outra metade fica exposta ao ar ambiente, que é muito mais frio. Quanto maior a diferença de tempe­

ratura, maior o efeito. “No momento, concentramos a pesquisa na área de trânsito, visando, por exemplo, a ge­ração de energia elétrica a partir do calor eliminado pelo motor de um veículo para aliviar o alternador”, ex­plica Stefan Lampenscherf . “Com o aperfeiçoamento da técnica, veremos no futuro também aplicações na in­dústria ou em usinas elétricas, sendo possível atingir potências na faixa dos quilowatts ou mesmo megawatts”.Vapor e pressão, turbina e gerador – esse princípio não funciona somente com carvão, mas também com com­bustíveis com balanço neutro de CO2, como madeira e outras biomassas. Do ponto de vista técnico, praticamente não faz quase nenhuma diferença qual o combustível usado para gerar o calor para a evaporação da água na caldeira da usina. Muito maior, entre­tanto, é o desafio logístico quando se quer usar biomassa, pois usinas a

vapor requerem uma quantidade gi­gantesca de combustível e em muitos lugares não há biomassa suficiente para cobrir a demanda.Professor Mohammad Asadullah, da Universidade Técnica MARA,

na Malásia, quer resolver esse pro­blema de uma maneira incomum: ele sugere não queimar a biomassa, mas sim transformá­la em gás. Esses sistemas, por serem bem menores, necessitam de muito menos combus­tível que usinas convencionais com turbina a vapor.Essa tecnologia de gaseificação não é nova. Mas agora a indústria e a ciên­cia conseguiram resolver o problema da formação de alcatrão, algo que impediu por muito tempo o uso comer­cial dessa técnica. “Os problemas fo­ram resolvidos”, diz Mohammad Asa­dullah. “A gaseificação de biomassa é realizável, tanto do ponto de vista técnico como econômico”. O charme especial dessa ideia está na diversi­dade de combustíveis que podem ser utilizados – bagaço de cana é tão ade­quado como palhas de arroz ou resí­duos da produção de óleo de coco. Isso faz com que ela seja especialmente

interessante para países com redes elétricas rudimentares (por exemplo, Vietnã, Nepal e Quênia) e que quei­ram expandir seu abastecimento de energia elétrica de forma descentrali­zada, com pequenas usinas.Usinas modulares descentralizadas, por exemplo, muitas vezes trabalham com turbinas a gás como as que são utilizadas também – em variantes bem mais potentes – em grandes usi­nas. Elas não são movidas por vapor comprimido, mas sim por uma mis­tura de gás e ar. Quando essa mistura é queimada, ela se expande e faz girar as turbinas.E por que não utilizar adicionalmente os gases de escape, que são cheios de energia, para gerar eletricidade? Essa ideia esteve presente no desenvolvi­mento das usinas de cogeração a gás e vapor, que combinam uma ou vá­rias turbinas a gás como uma turbina a vapor. Os gases de escape quentes da turbina a gás são utilizados para produzir vapor de água para a tur­bina a vapor. Com essa combinação, os sistemas atingem um grau de efi­ciência de até 60 por cento. Nenhuma outra tecnologia de usinas de gera­ção elétrica aproveita melhor a ener­gia contida nos combustíveis do que esses sistemas de cogeração. Além disso, eles são flexíveis – podem rea­gir rela tivamente rápido a oscilações na geração de energia eólica ou solar. Desse modo, ela apresenta os melho­res requisitos para ser precursora da transição energética global.

Turbina no interior de uma hidrelétrica

Rotações por minuto da turbina colocada em movimento:

3.000

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Antecipar o futuro Antecipar o futuro

Os números soam impres-sionantes. Segundo esti-mativas atuais das Nações

Unidas, até o ano de 2100 a popula-ção mundial poderia aumentar para 12,3 bilhões. De acordo com os pes-quisadores da ONU, não se deve con-tar, por ora, com uma atenuação do crescimento. Mas onde viverão todas essas pessoas? E sobretudo, em que condições?As cifras da ONU indicam igualmente que no futuro dois terços da popula-ção mundial viverão em metrópoles. Ou seja, a tendência à urbanização continua inabalada. Assim, cidades se transformam em mega cida des – que têm de enfrentar desafios comple-tamente novos e nunca imaginados. Esse crescimento exige planejamento e um montão de criatividade. Porque onde tanta gente tem de dividir o espaço, é preciso que a convivência

também seja organizada de forma que funcione. Essa é a tarefa de um plane-jamento urbano criativo e previdente.Além da administração pública, cada vez mais cidadãos criativos e enga-jados estão assumindo essa tarefa e

se unindo para formar iniciativas pri-vadas. Muitas vezes, essas pessoas trabalham em ateliês, laboratórios de design e estúdios de arquitetura arejados. Sob o conceito de urba­nismo tático, mentes criativas no

mundo inteiro estão reunindo ideias para o futuro planejamento de nos-sas cidades, mas também de mega-cidades como Mumbai, Hong Kong, Lagos ou Nova Iorque. Mas, quem são esses criativos? E como eles ima-ginam nossa convivência no futuro?Um deles é Pedro Gadanho, curador de arquitetura contemporânea do MoMa, o Museu de Arte Moderna de Nova Iorque. Recentemente, re-uniu times multidisciplinares para trabalhar em estudos de caso urbanos para diversos projetos. Um tema par-ticularmente importante para Pedro é o planejamento e futuro desenvol-vimento de nossa realidade arqui-tetônica. Em sua opinião, é preciso que – para além do planejamento por autoridades – os cidadãos tomem em suas próprias mãos parte dessa tarefa. Para isso, também terão de utilizar métodos pouco convencionais.

No futuro, dois

terços da população

mundial viverão

em metrópoles

Megacidades criativas

Texto Chris Schinke

Como cidadãos podem participar ativamente

do desenvolvimento da sua cidade

Arquétipo da cidade moderna: New York City, EUA © iS

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Antecipar o futuro Antecipar o futuro

Também as visões de Pedro Gada-nho se inspiram no conceito cada vez mais popular do urbanismo tá-tico. Perguntado como define esse termo para si próprio, Gadanho res-ponde: “Entendo o conceito como intervenções espontâneas bottom-up em cidades.” Essa ideia de inter-venções de baixo para cima prevê que os cidadãos lidem eles mesmos com os desafios do mundo real. “A implementação é feita por artistas, arquitetos e designers, em cola-boração com as administrações lo-cais. Mas inclui também iniciativas de particulares engajados, a cujas necessidades as autoridades nem sempre reagem.”Um exemplo de uma dessas inter-venções bottom-up encontra-se pra-ticamente às portas do MoMa: como se sabe, os preços das moradias em Nova Iorque são proibitivos. Os mo-vimentos globais de investimentos e tam bém a construção imobiliária orientada para o lucro alargaram imensamente o fosso social em Nova

Iorque nos últimos anos, levando ao desenvolvimento de um mercado informal de aluguéis na metrópole às margens do Rio Hudson.A partir do engajamento de iniciati-vas locais, foi possível aliar os inte-resses de inquilinos, representantes

dos interesses da administração pública, empresas sem fins lucra-tivos e autoridades municipais e criar um cooperative housing trust, um consórcio habitacional coopera-tivo que, no longo prazo, deverá ao mesmo tempo assegurar o acesso a

habitação a preços acessíveis e jus-tiça social. A ideia teve como ponto de partida a grande quantidade de imóveis habitacionais vagos em Nova Iorque e a sua aquisição pelo consórcio sem fins lucrativos. Desta forma, no decorrer dos últimos anos o consórcio logrou proporcionar moradias para quase 200.000 pes-soas. Os beneficia dos pela iniciativa foram famílias, idosos, pessoas de baixa renda e até mesmo sem-teto, que até então não tinham acesso ao mercado de locação. Mesmo que isto esteja longe de resolver o problema dos aluguéis proibitivos na metró-pole da Costa Leste, essa iniciativa mostra que existem alternativas reais para a aparentemente imutável situação atual.Vale a pena dar também uma olhada em outras regiões do mundo para encon trar exemplos de urbanismo tá-tico na prática, como na Índia. Na me-trópole de Mumbai, com 12,5 milhões de habitantes o motor econômico e cultural do país, desenvolveram-se nos últimos anos algumas táticas par-ticularmente criativas para conseguir acompanhar o crescimento vertigi-noso da cidade.Uma expressão dessa criatividade arquitetônica é um modelo promissor: as chamadas tool houses, que ofere-cem tanto espaço para moradia como para empresas economicamente efi-cientes e pequenas fábricas. Em um mínimo de espaço, elas reúnem áreas de convivência comunitária e familiar. Graças à sua construção compacta, elas se inserem perfeitamente nos conjuntos arquitetônicos existentes na cidade, podem ser erguidas num instante e ampliadas à vontade, in-clusive com mais um andar. Nos últi-mos tempos, a popularidade das tool houses de Mumbai aumentou de tal maneira, que até mesmo designers de moda, escritores e doutores estão se mudando para as robustas minicasas.Voltemos a Pedro Gadanho: no início de 2015, ele lançou uma convoca-

ção na plataforma online “uneven- growth.moma.org”, apelando a um amplo público para contribuir com seus próprios exemplos de táti-cas urbanas. A ação foi um grande sucesso. Centenas de respostas, que podem ser conferidas na página da Web, mostram que o conceito de ur-banismo tático está incitando a cria-tividade no mundo inteiro. Ativistas engajados de toda a Europa, América Latina, Sudeste da Ásia e EUA for-mam um movimento cujas futuras visões urbanas será interessante ver.Uma contribuição particularmente criativa veio da metrópole austra-liana de Melbourne. Habitantes da segunda maior cidade do continente tiveram a ideia de instalar esponta-neamente uma pequena biblioteca – chamada de Little Library – em um

antigo shopping, com um sistema de empréstimo gratuito de livros organi-zado pelos próprios utentes. O princí-pio é o mais simples possível: pegue um livro emprestado, leia-o, traga-o de volta ou, caso queira ficar com ele, traga um outro no lugar dele. Seus idealizadores conceberam a minibi-blioteca como projeto de desenvolvi-mento de comunidade – uma carac-terística comum a muitas abordagens da iniciativa Uneven Growth – e que, para além disso, visa a aproximar lei-tores entusiastas através do seu amor comum pela literatura. E, na agitada cidade de Melbourne, com seus qua-tro milhões de habitantes, ela oferece um lugar ideal para relaxar um pouco do estresse cotidiano.Como demonstram esses exemplos de urbanismo tático, a ideia no cen-

tro desse movimento é adquirir co-nhecimentos, compartilhar esses conhecimentos com a comunidade e possibilitar o acesso do maior nú-mero possível de indivíduos a eles. Esses conhecimentos não são um fim em si, e sim destinam-se sempre a fornecer à realidade existente novos impulsos para o futuro e transformar teoria em prática vivida. Uma prá-tica que tem por objetivo melhorar a vida do maior número possível de pessoas. Pedro Gadanho pensa da mesma forma. Como ele imagina a cidade ideal do futuro? “Ela é grande, vibrante, multifacetada, densa, extra-vagante e tem uma grande riqueza cultural – mas com um mínimo de trânsito e sem extremas desigualda-des sociais.” Em suma, soa como uma cidade na qual valeria a pena viver.

Onde tanta gente

divide o espaço,

é preciso organizar

a convivência de

forma que funcione

Estação em Mumbai, ÍndiaOrganizada pelos próprios usuários: a Little Library em Melbourne, Austrália

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Antecipar o futuro Antecipar o futuro

Especialistas são insubstituíveis

Texto Björn Lüdtke Ilustração Philipp Herrmann

Para que seja possível oferecer produtos da mais alta

qualidade, é preciso ter funcionários em todo mundo

com habilidades especiais na área em que atuam.

Queremos apresentar­lhes quatro deles.

O TÉCNICO ENGENHOSO

Tobias Hägele, voestalpine Polynorm GmbH & Co. KG

Schwäbisch Gmünd, Alemanha

O INVENTOR DE AÇOS

Sebastian Ejnermark, Uddeholms AB

Hagfors, Suécia

O DESCOBRIDOR DE TALENTOS

Harald Mühleder, voestalpine Stahl GmbH

Linz, Áustria

O ENCANTADOR DE ROLOS

Wolfgang Hochfellner, voestalpine Schienen GmbH

Leoben, Áustria

Wolfgang Hochfellner é mestre de laminação na voestalpine Schienen GmbH na Áustria e cuida, com sua equipe, para que tudo corra bem na laminação de trilhos de até 120 me-tros. O processo de laminação é complexo e o produto não pode apresentar qualquer erro. Para que isso funcione, são importantes os ajustes prévios, mas também uma reação rápida e controlada quando ocorre alguma irregularidade. Wolfgang Hochfellner reconhece nos ruídos quando alguma coisa está errada – o que mostra como ele conhece bem o equipamento.

Há pessoas com habilidades bastante especiais. No caso de Tobias Hägele, são o poder de imaginação, o instinto para o que é realizável e principalmente a persistência. O chefe de projetos de tecnologia de série e novas tecno-logias não só desenvolve processos nos mínimos deta-lhes, ele também os torna aptos para a produção em sé-rie, como, por exemplo, na produção de peças prensadas para automóveis. Ele e sua equipe unem genialidade a conhecimentos técnicos – o que termina resultando sem-pre em algo novo.

Harald Mühleder tem um olhar seguro para reconhecer talentos e contribui assim para nosso futuro. Ele estima o potencial que uma pessoa tem de progredir. Para isso, são necessários uma boa percepção para desenvolvimento técnico e humano, empatia e um olhar crítico sobre o progresso do talento encontrado. Se sua estimativa es-tava certa ou não, ele fica sabendo em competições para as quais os novos talentos são enviados. E ele é recom-pensado pelos diversos prêmios recebidos pelos talentos que ele tem descoberto e acompanhado.

Sebastian Ejnermark é a pessoa certa para quem ne-cessita de um novo tipo de aço. Ele é desenvolvedor de materiais e “o” especialista quando se trata de desco-brir novas combinações de liga para atender necessida-des individuais de nossos clientes. Sebastian Ejnermark sabe exatamente qual é o efeito de cada liga e qual a proporção correta para atingir a propriedade desejada do produto final – de altamente duro até extremamente resistente a corrosão.

Page 30: Cinco países, um futuro? Megacidades criativas Missão a Marte

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Nunca perder a curiosidadeTransformar ideias em realidade

Como rede global de especialistas independentes, agregamos as cabeças e competências certas para cada projeto e oferecemos um máximo de

experiência e know-how. Dessa forma, promovemos de várias maneiras a evolução e o progresso, e ao mesmo tempo asseguramos o sucesso

do nosso Grupo.

60 Missão a Marte

O sonho de viver em Marte poderia tornar-se realidade

66 As luzes da Terra vistas do espaço

Satélite Suomi NPP capta imagens espetaculares da Terra

70 Quando comer aumenta

o  desempenho O que comemos pode nos deixar

mais inteli gentes, saudáveis e bonitos?

74 Gigantes inteligentes

Inovações em veículos utilitários

76 A individualização do cotidiano

Quando a prestação de serviços se centra nas pessoas

Page 31: Cinco países, um futuro? Megacidades criativas Missão a Marte

60 61

Nunca perder a curiosidade Nunca perder a curiosidade

Colônia “Mars One”

Missão a Marte

Texto Louisa Preston

O sonho de viver em Marte poderia tornar­se

realidade

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Nunca perder a curiosidade Nunca perder a curiosidade

Já antes do século 19, havia a crença popular de que Marte era habitado e que lá existia

uma forma de vida avançada, que tinha coberto o planeta de canais de irrigação e talvez também estivesse prestes a colonizar a Terra. Quando então o avanço técnico o permitiu, foram desenvolvidos satélites com o objetivo de orbitar em torno de Marte e fazer as primeiras fotos em close-up da sua superfície. Muitas das pri-meiras missões terminaram de forma catastrófica antes ainda de sair da atmosfera terrestre. Foi só em março de 1965 que a sonda americana Ma-riner 4, depois de viajar 54,6 milhões de quilômetros pelo espaço durante sete meses e meio, conseguiu so-brevoar Marte e enviar as primeiras imagens do Planeta Vermelho. Mas esse sobrevoo, aguardado com tanta expectativa, destruiu toda e qualquer esperança de encontrar um mundo luxuriante, similar à Terra, com rios de água corrente e cidades habita-das por marcianos semelhantes ao homem. Ao invés disso, Marte reve-lou-se como um mundo coberto de pó, gélido e estéril, repleto de crate-ras e vales profundos. Um mundo que mais se assemelha à Lua, sem ar nem vida, do que à Terra. Hoje, sabemos

que em Marte a água é rara e o ar é tóxico, e que o planeta não tem mais um campo magnético. Sem esse es-cudo de proteção, grande parte da atmosfera do planeta se perdeu; a su-perfície de Marte ficou exposta à ra-diação solar e tornou-se praticamente inabitável. Mesmo assim, continuamos extre-mamente otimistas. Marte é, no mo-mento, o único mundo conhecido

por nós habitado exclusivamente por robôs: até hoje, 14 sondas e vários rovers (veículos de exploração) foram enviados para sua superfície, a fim de vasculhá-la à procura de indícios de vida baseada em carbono e outros sinais de vida.

Homens já pisaram na Lua e neste momento alguns estão até mesmo vivendo no espaço. Eles nos sobre-voam a uma velocidade de quase oito quilômetros por segundo e dão a volta à Terra 15,5 vezes por dia. O ob-jetivo último das agências espaciais, das organizações sem fins lucrativos e também do público, porém, é en-viar o homem a Marte. A questão é apenas quem chegará a Marte pri-meiro e se esses corajosos seres hu-manos vão poder, um dia, retornar à Terra. Diante do ambiente inóspito e essencialmente tóxico que reina no planeta, também se coloca a questão por que alguém haveria de querer ir para lá. Uma resposta poderia ser: por autoproteção, como uma espécie de seguro de vida, para preservar a vida terrestre, que poderia ser extinta por uma multitude de catástrofes natu-rais ou causadas pelo próprio homem. Visitar e investigar Marte, por outro lado, também nos pode ensinar muito sobre a nossa própria história e a da Terra. E afinal nós, seres humanos temos um instinto explorador inato. Descobrir e explorar outros mundos no cosmo é o maior desafio para a humanidade e será, ao mesmo tempo, uma das nossas mais esplêndidas realizações, mesmo que apenas um

punhado de seres humanos venha a pisar pessoalmente no solo de Marte.A parte mais complicada de uma mis-são a Marte não é chegar ao planeta, e sim regressar. A aterrissagem em um planeta estranho envolve muitos riscos. A taxa de sucesso para Marte é de 30 por cento – e partir de novo é mais difícil ainda. O lançamento de uma nave espacial na Terra já exige um esforço imenso de infraestrutura e pessoal, sem falar na quantidade de combustível necessária para su-perar a força da gravidade. Tudo isto não está disponível em Marte. Além disso, está longe de estar claro se os astronautas estariam realmente em condições físicas de retornar à Terra depois de terem vivido sob as con-dições de gravidade de Marte. Para a maior parte de nós, é moral e po-liticamente impensável deixar seres humanos em Marte para sempre,

sem possibilidade de volta. Agên-cias estatais como a Nasa ou a ESA não podem, e não vão, cogitar em fazê-lo. Mas existe uma iniciativa privada que não compartilha esses escrúpulos. A fundação de utilidade

pública Mars One quer estabelecer uma colônia humana permanente no planeta, e tornou-se conhecida com a ideia de uma missão sem volta a Marte. O presidente e cofundador da Mars One, Bas Lansdorp, pre-tende inicialmente enviar oito naves não tripuladas a Marte, com equi-

pamentos, materiais e robôs para a construção de uma estação de base com 200 metros quadrados, onde os primeiros colonos de Marte deverão viver e trabalhar. A partir de 2027, a Mars One pretende enviar para lá um grupo de quatro voluntários a cada dois anos. A uma convocação lançada por Lansdorp em 2013, res-ponderam impressionantes 202.000 voluntários de todo o mundo, que cumpriam o requisito de serem maio-res de 18 anos. Os primeiros 1.058 candidatos tiveram de submeter-se a um exame de rotina no seu médico. Das 660 pessoas que restaram foram selecionados os 100 finalistas, 50 ho-mens e 50 mulheres.Encontrei-me com Bas Landsdorp em 2015. Durante três dias, cami-nhei com ele pela paisagem desolada da Islândia, que se assemelha à de Marte, e pude me convencer de sua

Interior de uma cápsula “Mars One”

Sala de uma cápsula “Mars One” Horta em uma cápsula “Mars One”

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A questão é quem

chegará a Marte

primeiro e se esses

corajosos seres

humanos vão poder

retornar

O objetivo último

é enviar o homem

a Marte

Page 33: Cinco países, um futuro? Megacidades criativas Missão a Marte

64 65

Nunca perder a curiosidade Nunca perder a curiosidade

Módulo de pouso aterrisando

Módulo de pouso em Marte

paixão, dinamismo, persistência e determinação em fazer com que a Mars One “decole” no verdadeiro sentido da palavra. Se fosse possí-vel realizar um projeto como esse só pela vontade e pela fé, esse homem o conseguiria. Infelizmente, isso não é possível. No fim das contas, é sem-pre uma questão de custos e finan-ciamento. Lansdorp é reservado com relação à situação financeira da Mars One, que com certeza será decisiva para o êxito. A missão é totalmente financiada por meio de patrocinado-res, parceiros e uma fonte de recursos muito controvertida: um reality show

na televisão. A edição marciana do Big Brother com certeza será assis-tida por todo o mundo, mas o inte-resse provavelmente não durará. Por quê? Um bom reality show é movido a tensões, conflitos e dificuldades. Ou seja, precisamente o que que se quer evitar em Marte, para que a missão possa ser bem sucedida. Sim-plesmente assistir aos astronautas cuidando de seus afazeres diários não vai prender os espectadores por muito tempo e garantir altas receitas. Como, então, será financiada a sobre-vivência dos colonos em Marte?Quem são essas pessoas que querem passar o resto de seus dias em Marte?

“Tenho a oportunidade única de passar a metade de meus dias em um, e a outra metade em outro pla-neta – essa é a suprema aventura”, diz a finalista Clare Weedon, do Reino Unido. Quando mencionei a crítica e o ceticismo com que ela e os outros candidatos são vistos, ela

respondeu: “É uma missão muito ambiciosa e arriscada, mas estou ab-solutamente convencida de que che-gou a hora de a humanidade dar o passo seguinte.” E o que acham sua família e seus amigos de seu plano de passar o entardecer de sua vida em Marte? “Eles me apoiaram de uma forma fantástica. Eles me co-nhecem, e quando veem a paixão e o brilho nos meus olhos quando falo sobre a Mars One, não têm como não me apoiar.” Dizer que a mudança para Marte provavelmente implica mais desafios do que vantagens seria um eufemismo. “O que estou mais curiosa para saber é como vai ser estar exposta a um estresse e uma pressão extremos todos os dias, e ter de lutar diariamente pela sobre-vivência; ao mesmo tempo, é disto que eu tenho o maior medo”, afirma Clare. “Isolamento, alimentação ri-gidamente regulamentada, só sair com roupa espacial – tudo isso vai ser completamente novo para mim, e eu só vou saber como lidarei com essas situações me expondo a elas.” Esses são apenas alguns de inúmeros desa-fios que ela e seus companheiros de grupo vão enfrentar em seu caminho para Marte. Construir e manter aloja-mentos, produzir alimentos, água, ar e energia – estes esses são apenas os primeiros passos rumo a uma colô-nia autônoma em Marte. Numerosos críticos do empreendi-mento se perguntam por que o ho-mem tem de ir a Marte se na Terra ainda há tanto a fazer e consertar. É uma pergunta válida, mas para mim a resposta é clara: devemos pri-meiro mudar a humanidade e depois voar para Marte, não importa quando isso acontecer? Ou devemos mudar a humanidade voando para Marte? A exploração do cosmo e a conserva-ção de nosso planeta não têm de ser excluir mutuamente. Podemos e de-vemos fazer ambas as coisas. E atual-mente a Terra tem um número mais do que suficiente de habitantes para

que se possa seguir as duas aborda-gens. Mesmo que Mars One acabe não decolando, o projeto conferiu novos impulsos ao instinto explorador humano. Muitas crianças ainda so-nham em se tornar astronautas e visi-tar outros planetas quando crescerem. A geração atual pode fazer com que esse sonho se torne realidade.

Louisa Preston está escrevendo seu primeiro livro, Goldilocks and the Water Bears: The Search for Life in the Universe, que deverá ser pu bli­cado em julho de 2016 pela Blooms­bury Sigma

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Distância Terra–Marte em milhões de quilômetros:

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Descobrir outros

mundos no cosmo

é o maior desafio

para a humanidade

Page 34: Cinco países, um futuro? Megacidades criativas Missão a Marte

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Nunca perder a curiosidade Nunca perder a curiosidade

A Terra noturna vista através das lentes do satélite Suomi NPP

As luzes da Terra vistas do espaço

Texto André Uhl

A missão do Suomi NPP é observar as condições

climáticas e ambientais na Terra. Mas enquanto

orbita a Terra a uma altitude de mais de 800 quilô­

metros e desempenha sua tarefa, o satélite também

captura imagens particularmente deslumbrantes.

Quando se faz noite, as metrópoles desta Terra

reluzem em todo seu brilho — e, graças ao Suomi

NPP, podemos admirá­lo numa qualidade nunca

antes vista.

Page 35: Cinco países, um futuro? Megacidades criativas Missão a Marte

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Nunca perder a curiosidade Nunca perder a curiosidade

Europa, África do Norte e Oriente Médio

Austrália

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Page 36: Cinco países, um futuro? Megacidades criativas Missão a Marte

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Nunca perder a curiosidade Nunca perder a curiosidade

Segundo pesquisadores da Uni-versidade de Minnesota, man-dar fazer um perfil nutricional

individual custa 1.000 dólares. Trata--se de uma espécie de impressão di-gital do metabolismo atual do corpo. Quais são as vitaminas, nutrientes e minerais que faltam no organismo no momento e quais estão presentes em quantidades possivelmente altas demais? O perfil nutricional indivi-dual fornece um quadro completo do que estamos precisando e do que temos em excesso. Assemelha-se à determinação do nível de colesterol, que, na visita ao médico, é feita atra-vés do hemograma completo – com a diferença de que o perfil nutricional individual pode fornecer até várias dezenas de valores, da vitamina D até o magnésio.

O projeto ainda se encontra numa fase inicial, mas se for bem-sucedido provocará uma pequena revolução: o advento da nutrição personalizada. Em outras palavras, cada um teria

sua dieta ideal, sob medida para seu corpo – não haveria mais uma comida para todos, e sim uma comida para cada um. Isto levanta questões so-ciológicas: será que vamos continuar a comer juntos numa mesma mesa? Ou comer em companhia vai se tor-

nar mais importante se cada um de nós tiver uma dieta diferente? Além disso, uma nutrição personalizada tem consequências para o corpo e a mente. Conhecendo melhor nosso metabolismo individual, poderemos evitar dosagens insuficientes ou em excesso. Poderemos nos alimentar sistematicamente de forma a ficar-mos mais saudáveis, e, à medida que forem sendo acrescentadas ao perfil nutricional mais e mais informações sobre o metabolismo cerebral e o metabolismo dérmico, talvez até de forma a ficarmos mais inteligentes e mais bonitos.Uma olhada no laboratório de pes-quisas do gigante da alimentação Nestlé mostra que esses pensamen-tos não são mera fantasia; eles des-crevem uma futura realidade. No

Continuaremos a

comer juntos numa

mesma mesa?

Quando comer aumenta o desempenho

Texto Christian Heinrich

Laboratórios em todo o mundo estão trabalhando

na alimentação do futuro: uma dieta personalizada

para cada indivíduo, otimizada para a sua saúde e

desempenho. Como novas tecnologias podem ajudar?

A tendência: produtos orgânicos © iS

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Page 37: Cinco países, um futuro? Megacidades criativas Missão a Marte

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Nunca perder a curiosidade Nunca perder a curiosidade

Alimentos mais saudáveis

Instituto de Ciências da Saúde da Nestlé (NIHS) em Lausanne, Suíça, quinze cientistas que trabalham no chamado programa Iron Man es-tão empenhados em construir uma máquina que, ao pressionar de um botão, prepara um pó misturado in-dividualmente de acordo com o res-pectivo perfil metabólico. Os cien-tistas admitem que não é de esperar que a máquina seja lançada no mer-cado dentro dos próximos dez anos. Mas, quando este for o caso, “ela poderá ser o próximo micro-ondas nas cozinhas”, diz o diretor do NIHS Edward Baetge.Para Felix Tegeler, analista de ino-vações da agência de pesquisa de tendências TRENDONE, seria o es-tabelecimento definitivo de um pro-cesso que começou há muito tempo. Já hoje, camadas sociais se definem cada vez mais também pelo que co-mem e pelo que não comem. Uns – muitos deles vegetarianos – só con-somem alimentos com selo orgânico, ao passo que outros comem carne várias vezes por dia, contribuindo para que a demanda aumente. Todos eles têm algo em comum: até certo ponto, se definem pelo que comem

e como comem. “A alimentação está assumindo um caráter de lifestyle”, diz Tegeler. “A cada dia as pessoas estão exteriorizando mais seu estilo de alimentação; ele se torna, por as-sim dizer, parte de sua identidade.” E a identidade é hoje extremamente individual. Se, além disso, ainda hou-ver uma alimentação high-tech sob medida para o corpo de cada indiví-duo, isto também pode gerar confli-tos. Aqueles que apostam no cultivo próprio e em alimentos produzidos naturalmente dificilmente se entu-siasmarão com a nova ideia. Mas no gigantesco movimento rumo à cres-cente individualização certamente haverá lugar mais do que suficiente para ambas as tendências.O comércio e a tecnologia já aten-dem de forma crescente a necessi-dade de alimentação personalizada. Já é possível imprimir pasta e cho-colates de design personalizado em impressoras 3D. Alguns restaurantes já estão oferecendo comida persona-lizada: o Vista Kitchen em Bangkok, na Tailândia, por exemplo, oferece um cardápio diferente para cada grupo sanguíneo. Cientistas conside-ram esse procedimento pouco sério,

mas ele atrai uma verdadeira multi-dão de clientes curiosos.A IBM está desenvolvendo um com-putador que provavelmente tam-bém será útil para tendência rumo à nu trição personalizada. O usuário digita seus ingredientes predile-tos – ou, no caso, os ingredientes que melhor promovem seu desempenho – e o computador, excelentemente informado sobre cozinhas e sabores de todo o mundo, fornece as receitas adequadas.Também o chamado Prep Pad, da startup estadunidense Orange Chef, aborda o tema da perspectiva da co-mida, e não do corpo. O Prep Pad, que em poucos anos talvez já se en-contre na mesa da cozinha de muita gente, é uma espécie de tábua de cozinha que analisa a comida que a pessoa vai ingerir e, em seguida, faz recomendações personalizadas para o cardápio das próximas refeições. As duas abordagens – a análise do metabolismo e a análise dos alimen-tos – provavelmente vão se fundir cada vez mais no futuro. Pode ser que um dia a nossa própria mesa nos dê conselhos. Colocamos a mão sobre o tampo para um breve teste da si-tuação atual no organismo, e a mesa, que sabe o que comemos nos meses passados, faz sugestões para o jan-tar. E se calhar ainda se encarrega de criar o ambiente adequado, com ilu-minação e música combinando com o cardápio. Bom apetite!

High­tech na cozinha: o Prep Pad

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Custo de um perfil nutricional individual em dólares:

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Nunca perder a curiosidade Nunca perder a curiosidade

1

Gigantes inteligentes

Texto Jan Wilms Ilustração Philipp Herrmann

Inovações em veículos

utilitários

6 Condução autônomaA partir de 2020, caminhões deverão

poder andar de forma autônoma, ou

seja, sem intervenção do motorista.

Isso poupa combustível e evita aciden-

tes. O sistema será alimentado com

dados e sensores já hoje existentes,

como dados de GPS, mapas 3D, con-

trole de cruzeiro adaptativo e sistema

de frenagem de emergência.

2 NavegaçãoO planejamento exato do trajeto poupa

nervos e aumenta a eficiência e a segu-

rança. Caminhões vinculam os dados

de GPS do percurso com o controle do

motor, por exemplo, em aclives e de-

clives. Escavadeiras utilizam dados de

satélite ainda mais precisos: é possível

pré-programar até a posição exata e a

profundidade do buraco a ser escavado.

2

3

4

5

6

1 TraçãoA tração do futuro será elétrica: já hoje

circulam vans e veículos utilitários leves

movidos a eletricidade e, com isso, sem

emissões locais. Caminhões e escava-

deiras leves combinam motores diesel e

elétricos em seus sistemas híbridos. Em

breve, esses sistemas poderiam ser usa-

dos em todo o mundo também no trans-

porte pesado de longas distâncias em

“e-Highways”.

3 DigitalizaçãoTodos os dados de operação e localiza-

ção em autoestradas e obras podem ser

coletados digitalmente em uma big data

cloud e vinculados. Assim, a frota encon-

tra-se sempre sob controle, permitindo

reduzir viagens sem carga. Além disso,

os veículos podem ser diretamente inter-

ligados em rede através de comunicação

Car-to-X.

4 Construção leveCada vez mais leves e estáveis: aços de

alta resistência e ultrarresistência, além

de outros materiais como alumínio, por

exemplo, na suspensão de eixos de ca-

minhões, guindastes, betoneiras e outras

máquinas de construção, podem reduzir

o peso do veículo em até 70 por cento,

proporcionando maior desempenho de

transporte, mais eficiência e menos CO2.

5 SegurançaEm caminhões e ônibus, inúmeros

ajudantes garantem maior segurança:

assistentes de frenagem de emergên-

cia, mudança de faixa e prevenção de

colisões são alguns exemplos. Em es-

cavadeiras e guindastes, o perigo maior

é tombar ao elevar carga – por isso, as

cabines de segurança são construídas

de perfis especiais.

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Nunca perder a curiosidade Nunca perder a curiosidade

Aeroportos – lugares de trân-sito fascinantes, com grande fluxo de pessoas, onde to-

dos os dias circulam milhares de via jantes. Para muitos, não passam de uma escala necessária e, por ve-zes, bastante estressante, a cami-nho do destino final. Os visitantes de um aeroporto têm de se orien-tar, procurar informações, e alguns lutam com barreiras idiomáticas. Quando o tempo de espera por uma conexão é longo, o melhor é pro-curar aproveitá-lo da maneira mais eficiente possível. Quando o tempo é curto, o passageiro às vezes tem que suar para não perder a cone-xão, passar correndo pela alfândega e pela segurança e seguir rápido pelos saguões de espera à procura do portão de embarque certo. Mas viajar também pode ser uma expe-riência agradável e tranquila, como demonstra a operadora finlandesa de aeroportos Finavia no aeroporto de Helsinki. Seu projeto Travellab, ga-

nhador do Service Design Network Award, transformou um dos maiores centros de conexão para voos com destino à Ásia em um espaço quase contemplativo. Isto se deve sobretudo à oferta otimizada de serviços para

tornar a estadia dos hóspedes o mais agradável possível, como uma área de ioga, entretenimento para a famí-lia e uma grill station no portão de embarque. Para tanto, a Finavia utili-zou o método do design de serviços e atendeu diretamente as necessidades

dos clientes, com base em uma pes-quisa em larga escala sobre os dese-jos dos passageiros.O design de serviços é centrado nas pessoas. Não consiste em criar novos serviços a portas fechadas e apre-sentá-los ao usuário prontos e acaba-dos. Pelo contrário – designers e de-senvolvedores trocam ideias com os consumidores e, junto com eles, ela-boram a melhor solução possível. Essa área do design é hoje mais necessária do que nunca: para muitos, a tecnifi-cação e digitalização do cotidiano traz diversos percalços. Todos nós, porém, queremos nos sentir bem em um am-biente em mudança constante. Para isso é preciso que o design de serviços se estenda a todos os setores da vida cotidiana. Nos últimos anos, o con-ceito “design de serviços” se estabe-leceu através da oferta crescente de serviços digitais na internet e também para usuários finais móveis.

“O design de serviços como método e disciplina permeia todas as áreas

A individualização do cotidiano

Texto Verena Dauerer

Quando a prestação de serviços se centra

nas pessoas

Sentir­se como em casa: lounge no aeroporto de Helsinki, Finlândia

© F

inav

ia

Tudo tem que ser

descomplicado,

flexível e estar dis­

ponível em tempo

integral

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Nunca perder a curiosidade

do desenvolvimento de produtos e empresas, como uma questão trans-versal, por assim dizer “, refere Peter Bihr. O berlinense se ocupa dos te-mas design de serviços e experiência do usuário também como curador da conferência anual NEXT. “No design de serviços, o foco está nas necessidades dos usuários, ou seja, é um caminho confiável rumo a produtos e serviços fáceis de usar”, complementa.Um outro exemplo de design de ser-viços bem sucedido na área da mo-bilidade é o estudo de viagem reali-zado pela agência internacional de design edenspiekermann. O estudo examinou o percurso porta a porta percorrido por alguém que viaja de Tóquio até Amsterdã, analisando uma quantidade enorme de dados. O re-sultado é o sistema de informação Info Connectivity System (ICS), que reúne e processa a informação exis-tente em diferentes fontes ainda não conectadas entre si – como dados de diversos serviços de mobilidade e de transporte público urbano, informa-ções sobre voos, dados de operadoras de aeroportos, informações turísticas

e dados de hotéis. Assim, o sistema não só permitirá que o usuário seja conduzido confortavelmente ao seu destino pelo seu smartphone, como também que ele possa consultar as informações relevantes para a sua viagem a qualquer hora em displays de terminais de aeroportos, máqui-nas de bilhetes e até mesmo nas telas de entretenimento a bordo do avião. Uma abordagem holística e inovadora, que pega o usuário pela mão do começo ao fim da viagem, com transições fluidas. E este é pre-cisamente um critério para um bom design de serviços: quanto melhor, menos se percebe.Ao passo que a demanda por servi-ços digitais cresce cada vez mais, as necessidades e desejos dos con-sumidores foram se desenvolvendo constantemente. Thomas Schönweitz, fundador e diretor da rede de estra-tégia Whitespring Service Design, sediada em Munique, explica: “Ape-sar de serem vendidos milhões de iPhones idênticos, nenhum é igual ao outro. Cada um deles está configu-rado individualmente, porque cada usuário baixou seus próprios aplica-

tivos, toques ou papéis de parede.” Segundo Schönweitz, os usuários hoje esperam esse tipo de produto individualizado também em outros setores da vida. Tudo tem que ser descomplicado, flexível e estar dis-ponível em tempo integral – e sem risco algum, acrescenta. Um bom exemplo disto é o AirBnB, um serviço para reserva de alojamentos priva-dos. Viajantes podem fazer a reserva por um site ou um aplicativo móvel e recebem um mapa da acomodação com muitos detalhes e fotos da mo-bília, bem como o perfil do anfitrião. A reserva e o pagamento são feitos de forma simples e rápida.Mas o design de serviços pode muito mais do que proporcionar uma ex-periência agradável de reserva. Smartphones e tablets e até mesmo sensores em nosso ambiente já se comunicam há muito – para propor-cionar uma melhor oferta ao consu-midor. A agência Fjord identificou a comunicação de objetos inteligentes entre si como uma das principais ten-dências atuais no design de serviços. Quanto mais inteligentes os gadgets se tornam, tanto melhor eles intera-gem e se adaptam ao usuário. Mas isto também significa que novas for-mas de interação estão disponíveis para os usuários – basta pensar nos óculos inteligentes Google Glass, co-mandados pela voz de quem os usa. Naturalmente, esse desenvolvimento também tem consequências para o comportamento social das pessoas e para a maneira como elas se relacio-nam. E isto demonstra, mais uma vez, que o design de serviços tem efeitos de longo alcance sobre a sociedade e que pode prestar uma contribuição importante para uma mudança posi-tiva no setor de serviços. Uma coisa é certa: em dez anos, estaremos cerca-dos de mais técnica ainda. O design de serviços faz com que nos sinta-mos bem com ela. Porque a tecnifica-ção só nos traz vantagens enquanto o centro forem as pessoas.

Espera agradável no aeroporto de Helsinki, Finlândia

© F

inav

ia

Nossos suportes de turbinas forjados em ligas especiais resistem de forma cem por

cento confiável aos enormes esforços e variações de temperatura no transporte

aéreo moderno. Mesmo assim, continuamos a aperfeiçoá-los, junto com nossos

clientes – para mais liberdade e segurança. É essa confiabilidade, esse prazer em

enfrentar um desafio, que nos diferencia. Não esperamos o futuro acontecer.

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“Nossos suportes de turbinasproporcionam maior segurançapara viajar acima das nuvens.”Hans Freudenthaler, Chefe de Engenharia, Áustria

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FuturoNão esperamos o futuro acontecer!

Edição 2016 magazine voestalpine

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Cinco países, um futuro?Como novas tecnologias influem na vida de pessoas em diferentes culturas

Megacidades criativasComo cidadãos podem participar ativamente do  desenvolvimento da sua cidade

Missão a MarteO sonho de viver em Marte poderia tornar-se realidade