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A TROPA DE CHO QUE e as manifestações de rua STEEVAN OLIVEIRA

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A TROPA DECHOQUE e as manifestações

de rua

STEEVAN OLIVEIRA“A obra de Steevan Oliveira demonstra essa outra face que se deve dar ao exercício do poder de polícia pelas tropas de choque. A tensão entre princípios e entre interesses legitimamente protegidos (a liberdade de expressão e o direito de ir e vir, por exemplo) não se resolve por uma fórmula predefi nida. A legalidade não é uma equação aritmética. Ao contrário, defi nir a melhor forma de aplicar o direito em cada manifestação nas ruas exige habilidade, imaginação, sensibilidade e criatividade para deixar falar todas as vozes, para permitir a livre movimentação na cidade, para tornar audíveis todas as perspectivas de compreensão do direito essencial de expor ideias na esfera pública e para evitar danos de toda ordem.”

Mônica Sette Lopes

A partir das narrativas de casos concretos ocorridos no Brasil e em outros países, busca-se ao longo do trabalho identifi car o ponto de contato entre o direito de reunião e os vários outros direitos fundamentais que com ele podem colidir ou concorrer. Nesse esforço, observa-se que intervir para a efetividade dos direitos fundamentais é mais complexo do que a leitura do texto distante da realidade sugere. No encadeamento para a concreção, entendida nos termos de Karl Engisch como acomodação do direito à realidade, descortinam-se aspectos da aplicação do Direito pela polícia, sua imediatidade, seus confl itos, suas tensões, e os riscos de uma decisão que envolve a vida de várias pessoas.

editora

ISBN 978-85-8425-558-0

STEEVAN OLIVEIRAMestre e Bacharel em Direito pela UFMG. Pós-graduado em Psicanálise e Ciências Criminais. Pós-graduado em Direito Militar. Bacharel em Ciências Militares. Ofi cial da Polícia Militar de Minas Gerais e professor da Academia de Polícia Militar. Representante do Brasil indicado pelo Conselho Nacio-nal de Comandantes Gerais Policiais Militares e Corpos de Bombeiros Mili-tares na FIEP (Association of European and Mediterranean gendarmeries and police forces with military status).

A TROPA DE

CHOQUE

e as manifestações de rua

STEEVAN OLIVEIRA

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A TROPA DE CHOQUE E AS MANIFESTAÇÕES DE RUA

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editora

A TROPA DE CHOQUE E AS MANIFESTAÇÕES DE RUA

STEEVAN OLIVEIRA

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Catalogação na Publicação (CIP)Ficha catalográfi ca

OLIVEIRA, Steevan.A Tropa de choque e as manifestações de rua -- Belo Horizonte: Editora D’Plácido, 2017.

Bibliografi a.ISBN: 978-85-8425-558-0

1. Direito Constitucional. 2. Direitos Humanos. I. Título. II. Autor

CDU342+342.7 CDD341.2

Copyright © 2017, D'Plácido Editora.Copyright © 2017, Steevan Oliveira.

Editor ChefePlácido Arraes

Produtor EditorialTales Leon de Marco

Capa, projeto grá� coLetícia Robini de Souza(Sob imagem de Nicolas Alejandro via Flickr.com)

DiagramaçãoBárbara Rodrigues da SilvaChistiane Morais

Editora D’PlácidoAv. Brasil, 1843, Savassi

Belo Horizonte – MGTel.: 31 3261 2801

CEP 30140-007

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida,

por quaisquer meios, sem a autorização prévia do Grupo D’Plácido.

W W W . E D I T O R A D P L A C I D O . C O M . B R

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“Como eu não sei rezar, só queria mostrar meu olhar, meu olhar, meu olhar...”

Renato Teixeira

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Dedico esta obra a Tadeu e Marlene,por renunciarem à própria vida para

proporcionar vida mais digna aos filhos...

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AGRADECIMENTOS

Este trabalho é fruto de um longo período de estudos, investiga-ções e amadurecimento: em bibliotecas, nas salas de aula, em conversas com amigos e, sobretudo, nas ruas. Uma empreitada na tentativa de estabelecer pontos de contatos entre a vida acadêmica no Mestrado em Direito na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e minha prática profissional no Batalhão de Choque da Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG). No transcurso dos dias, pude contar com a colaboração de muitas pessoas e, por isso, seria inviável mencionar todos. Mesmo reconhecendo essa impossibilidade, não posso deixar de dizer alguns nomes.

Mônica Sette Lopes, por abraçar uma angústia que era inicial-mente minha, pelos diálogos fundamentais na transformação de um amontoado de dúvidas neste texto, por ter me dado voz e me mostrar que o importante era contar as histórias. Márcio Luís de Oliveira, pela amizade, estímulo e apoio nos primeiros passos quando nem eu mesmo fazia ideia de qual caminho seguir. Daniela de Freitas Marques, pelas aulas e conversas, e por fazer com que o prazer pela literatura virasse alguma coisa maior e inexplicável. Cel Helbert, pelas aulas sobre polícia e sobre vida, e por ministra-las em um ambiente leve e de amizade. Cel Carvalho, pela confiança, pelas oportunidades e pela forja. Ten-Cel Ederson Ataíde, uma mistura de pai, amigo e chefe, pelo apoio e leitura empolgada dos fragmentos durante a escrita. Aos professores Miracy Barbosa de Sousa Gustin, Fabiana de Menezes Soares e Gláucio Fer-reira Maciel Gonçalves, que participaram das bancas de qualificação e avaliação do texto e, portanto, contribuíram com a escrita deste livro.

À Turma da Mônica, junção improvável de onde surgiram amiza-des preciosas, na qual encontrei os interlocutores Eder Santana e Luana

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Magalhães. Aos amigos do Grupo de Estudos em Direito Internacional dos Direitos Humanos da UFMG, em especial aos amparos de sempre, Bruno Soares, Daniel Cerqueira, Diego Valadares, Fabrício Prado, Henrique Napoleão, Isabel Machado, Juliana Alcântara, Guilherme Vinseiro, Rafael Dilly, Thiago Noce e Lívia Lages. No Programa de Pós-Graduação em Direito da UFMG, aos amigos que fiz durante o curso, como Luiz Fernando e Caio Cordeiro, e também à equipe da Secretaria, sobretudo Wellerson, sempre paciente e atencioso. A Patrícia e Lília Finelli, pelo apoio na organização do trabalho na corrida contra o tempo. A todos os irmãos de farda da Polícia Militar, com os quais pude contar durante dificuldades e contratempos quando o mundo da vida colocava à prova os caminhos teóricos, especialmente aos militares que integram a Equipe de Instrução do Batalhão de Choque, que têm dado continuidade e desenvolvido a missão de aproximar a polícia da comunidade. A FAPEMIG, pelo auxílio financeiro que contribui com a aquisição de muitos dos livros utilizados. Do perí-odo em Belfast, no qual algumas convicções encontraram suporte, mesmo em uma cultura diferente e com tensões mais agudas, gostaria de agradecer a Neil Jarman, Dominic Bryan, Nigel Grimshaw e aos funcionários do Parades Commission, pelos diálogos prazerosos e enriquecedores. Aos familiares e amigos, por entenderem as ausências durante um longo período. Por último e mais importante, meus pais Tadeu e Marlene, Nathália Marteletto, e também Sandra e Arlom, por serem os mais próximos em um momento difícil que coincidiu com a escrita deste texto.

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LISTAS

LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

ADI – Ação Direta de Inconstitucionalidade

AIB – Ação Integralista Brasileira

ALERJ – Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro

ANL – Aliança Nacional Libertadora

APM – Academia de Polícia Militar

CIDH – Comissão Interamericana de Direitos Humanos

CMBH – Câmara Municipal de Belo Horizonte

CPE – Comando de Policiamento Especializado

CRFB/88 – Constituição da República Federativa do Brasil de 1988

CTB – Código de Trânsito Brasileiro

CUT – Central Única dos Trabalhadores

IAB – Instituto dos Advogados Brasileiros

MP – Medida Provisória

OAB – Ordem dos Advogados do Brasil

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OAB-RJ – Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional do Rio de Janeiro

OSCIP – Organização da Sociedade Civil de Interesse Público

PL – Projeto de Lei

PM – Polícia Militar

PMMG – Polícia Militar de Minas Gerais

STF – Supremo Tribunal Federal

TJ – Tribunal de Justiça

UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Charge de Henfil: soberania popular e as manifestações 45

Figura 2 – Passageiros vão a pé para Aeroporto de Viracopos 50

Figura 3 – Marcha simbólica de sapatos em Paris 60

Figura 4 – Divergência entre socialistas e anarquistas em manifestação na Praça da Liberdade (BH – 7/9/2013) 63

Figura 5 – Os conflitos nas Charges: PM – Polícia Militante 66

Figura 6 – Os Conflitos nas Ruas: confronto entre manifestantes em Brasília 2015 67

Figura 7 – Planta da capital mineira de 1895: destaque para as formas geográficas da nova capital 82

Figura 8 – Protestródomo e a medição das re-voltas 87

Figura 9 – Protestródomo e o descontrole no chão de Brasília 88

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Figura 10 – Taxistas em manifestações contra o Uber paralisando ruas do Rio de Janeiro: multados em Medida Provisória declarada inconstitucional pela autoridade que editou a norma 95

Figura 11 - Resistência Popular à Vacinação Obrigatória nas Charges dos Jornais 109

Figura 12 - Capa do Jornal Folha de São Paulo de 12 de junho de 2013 118

Quadro 1 – Normas antimáscaras em Porto Alegre e Santa Maria 128

Gráfico 1 - Quantidade Mensal de Proposições Legislativas sobre Violência em Manifestações, de julho 2013 a março 2015, na Câmara dos Deputados 143

Figura 13 - Protesto com pessoas com rostos tampados no Rio de Janeiro, um mês após a proibição da conduta 148

Figura 14 – Manifestação estudantil em Abril de 2016 pelas ruas de São Paulo, destaque para as pessoas com rostos tampados mesmo vigendo proibição legal 148

Figura 15 – Coronel da Polícia Militar é agredido por manifestantes em 25 de outubro de 2013 149

Figura 16 – Polícia garantindo o direito de manifestação dos neonazistas 154

Figura 17 - Tropa de Choque da Brigada Militar do Rio Grande do Sul garantindo o Direito de ir e vir, segundo o TJ-RS 172

Figura 18 – Protesto do Movimento 15-M 182

Figura 19 - Grito Mudo dos Manifestantes em Madrid 199

Figura 20 – Uso diferenciado da força 203

Figura 21 - Foto do trânsito desviado e proteção policial a abraço simbólico na Praça Sete 220

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SUMÁRIO

PREFÁCIO: A DECISÃO NA CONTINGÊNCIA: A LIBERDADE DE EXPRESSÃO E A TROPA DE CHOQUE 19

1. INTRODUÇÃO 23

2. SITUANDO O DIREITO DE REUNIÃO NO MUNDO DA VIDA 332.1. Dificuldades na aplicação do direito nas ruas 33

2.2 Anverso e reverso do direito de reunião 38

2.2.1 Relevância do direito de reunião em contextos democráticos 38

2.2.1.1 Para uma política de baixo para cima 38

2.2.1.2 As múltiplas faces do direito de reunião 44

2.2.2 O “Lado B” 49

2.2.2.1 Quando o exercício do meu direito afeta o do outro 49

2.2.2.2 Direito e divergências no tempo e no espaço 55

2.3 A metáfora da guerra de todos contra todos e o direito como decidibilidade 63

3. OS CONFLITOS E A LEI: POSSIBILIDADES E IMPOSSIBILIDADES 733.1. Pode uma lei regulamentar o direito de reunião? 73

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3.2. Quem pode regulamentar o direito de reunião? 803.3. Concorrência de direitos fundamentais 893.4. A participação da polícia na construção

do sentido normativo 98

4. OS CONFLITOS E A LEI: LEGISPRUDÊNCIA E A APLICAÇÃO DA LEI PELA POLÍCIA 101

4.1. Legisprudência no passado e a Revolta da Vacina: o que a lei e a polícia conseguem controlar? 101

4.2. Legisprudência no presente e junho de 2013: o que a lei e a polícia conseguem controlar? 1144.2.1. A proibição das máscaras e a produção legislativa nas

Câmaras Municipais e nas Assembleias Legislativas 1234.2.2. As manifestações e a retórica da criminalização no

Congresso Nacional 1414.3. As leis e as ruas 150

5. OS CONFLITOS E A DECISÃO JUDICIAL 1515.1. A Doutrina do Fórum Público na

Suprema Corte dos Estados Unidos 1565.2. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal 1615.3. Jurisprudência nos Tribunais de Justiça 1715.4. Uma resposta que se dá no caso concreto 179

6. OS CONFLITOS E A POLÍCIA 1896.1 Escrito e espada 1896.2 Uma polícia do Estado 1906.3 Solução que não soluciona 1926.4 Força policial: entre a estrita

legalidade e a legitimidade 1996.5 Uma polícia para aplicação do Direito 2116.6 Os protestos e a normatividade

de tessitura aberta 2166.7. A sombra do Leviathan 222

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7. CONSIDERAÇÕES FINAIS 231

REFERÊNCIAS 235

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PREFÁCIOA DECISÃO NA CONTINGÊNCIA:

A LIBERDADE DE EXPRESSÃO E A TROPA DE CHOQUE

Desde que comecei a acompanhar a pesquisa de Steevan Oliveira, ver/ouvir o noticiário televisivo sobre manifestações de rua passou a ser um exercício doloroso. Normalmente, há um jornalista com um microfone na mão que atrai a programação toda vez que a agressividade recrudesce. A câmera transita entre ele e as bombas, os manifestantes, o movimento da tropa de choque. Expande-se o lugar comum da mo-bilização que começou pacífica e depois desaguou na destruição do patrimônio público e/ou privado e na exacerbação das ações e reações recíprocas. Ao final de horas da repetição de imagens do movimento dos manifestantes e da polícia pelas ruas, o jornalista volta à cena para dizer que tudo se acalmou. Os comentários restringem-se ao superficial do ir e vir das pessoas e grupos e despreza uma faixa de relações humanas (e jurídicas) relevantes, as quais constituem o centro de interesse deste livro: a possibilidade da comunicação e do acerto das diferenças de mo-mento entre todos os envolvidos (manifestantes, pedestres, motoristas, passageiros de ônibus e veículos, comerciantes, consumidores, polícia etc.) e as decisões sobre o confronto entre vários princípios jurídicos e direitos vivenciados na concretude e tomadas entre ações e reações recíprocas. Essa tensão não se deixa ver no raso da notícia. Tampouco ela penetra a análise jurídica da ação da tropa de choque na vitalidade com que ela dá significado ao exercício do poder de polícia. Em se tratando manifestações para a expressão de direitos ou de interesses e necessidades, esses antecedentes da consolidação daqueles, é preciso dar vasão a todas as formas de composição as quais exigem mais do que ataque e defesa. E a isso só se chegará pela apropriação compreensiva das experiências e pela formação adequada dos agentes públicos. Essa é a tônica do livro que ora se apresenta.

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Havia, nos meus tempos de aluna, um excepcional professor de direito administrativo, que explicava dramaticamente o que era o poder de polícia. O Professor Paulo Neves de Carvalho, na exposição aguda da pedagogia, descrevia a carne estragada que o fiscal encontrava num açougue, exaltando-lhe a cor anômala, o cheiro insuportável, a textura inconsistente. Em seguida, ele focava no poder que o fiscal tinha de queimar a carne, de destruí-la. Era uma conduta de efeitos imediatos que pode ser comparada à ação da tropa de choque. Uma ordem mal dada ou mal compreendida, a conduta isolada de um agente ou de um grupo deles que agride alguém, uma reação emo-cional ou impensada podem trazer danos materiais, físicos e morais que caberá ao Estado reparar, mas terão, sobretudo, desvirtuado ou comprometido a liberdade de expressão ou o direito de manifesta-ção. À polícia não cabe destruir a manifestação, mas ir fomentando uma cultura que a torne visível e sem perturbação desagregadora do exercício concomitante de outros direitos.

A decisão de avançar, de se defender ou de atacar de determi-nada forma é tomada de chofre, sem fundamentação, sem espaço para impugnação. É a imediatidade do corpo a corpo que carrega todo o aprendizado sobre como agir daqueles que constituem, ali, a representação mais crucial do Estado e cuja ação deve consignar a apreensão plena da legalidade e da responsabilidade, afastando sempre o risco do dano causado às pessoas e ao exercício dos direitos. Por isso, a decisão tomada, qualquer que seja ela, é sempre um ponto na dialética de comunicação entre os participantes daquele momento na rua. Ainda que não haja a fala, como canal primaz para mediar as instâncias problemáticas, o silêncio e o gesto têm a loquacidade de tornar factível um desfecho indesejado ou perigoso.

No trato das questões ligadas à vivência do direito de manifes-tação, não basta dizer em abstrato. As manchetes não são suficientes para produzir a compreensão ampliada dos acontecimentos. As fotos apenas congelam a imagem da multiplicidade dos entraves enfrentados de parte a parte. A cenas filmadas são desconexas. É preciso, então, ir a fundo na narrativa das histórias, no confronto delas, na compreensão de um fenômeno que é complexo, especialmente porque se passa no contexto multidimensional das cidades em que todos os interesses e todas as tramas se justapõem e/ou se contrapõem.

Não se admite que a ação da tropa de choque possa, por qual-quer modo, reprimir o direito de manifestação, como um dos canais

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de exercício da liberdade de expressão na democracia. No entanto, o envolvimento de outros direitos-interesses, no percurso das ruas, exige que se componham espaços de diálogo e de interação que vão muito além das balas de borracha, das armas de efeito moral, dos gases de pimenta e lacrimogêneo. E essa é uma construção a ser continuamente discutida no âmbito da cultura para a reflexão crítica do saber sobre o papel que a ela se reserva na proteção dos direitos e das pessoas.

A obra de Steevan Oliveira demonstra essa outra face que se deve dar ao exercício do poder de polícia pelas tropas de choque. A tensão entre princípios e entre interesses legitimamente protegidos (a liberdade de expressão e o direito de ir e vir, por exemplo) não se resolve por uma fórmula predefinida. A legalidade não é uma equação aritmética. Ao contrário, definir a melhor forma de aplicar o direito em cada manifestação nas ruas exige habilidade, imagina-ção, sensibilidade e criatividade para deixar falar todas as vozes, para permitir a livre movimentação na cidade, para tornar audíveis todas as perspectivas de compreensão do direito essencial de expor ideias na esfera pública e para evitar danos de toda ordem.

A alegria imensa de dar a conhecer esse A Tropa de Choque e as Manifestações de Rua torna-se ainda maior quando se antecipa a expressão que ele possa ter para o entendimento crítico das ruas como lugar multiplicador do debate em torno de ideias, interesses e necessidades, bem como do papel daqueles que, coordenando essas manifestações, possam evitar o desvirtuamento de seus objetivos e possibilitar a mais densa convivência de diferenças.

Belo Horizonte, janeiro de 2017.

Mônica Sette Lopes Professora-Associada da Faculdade de Direito da UFMG

Desembargadora do Trabalho no TRT da 3ª RegiãoDoutora em Filosofia do Direito

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1INTRODUÇÃO

Em Londres, no dia seguinte à votação popular que levou à saída do Reino Unido da União Europeia, pessoas marchavam pelas ruas do centro da cidade contra o resultado do referendo.1 Nos Estados Unidos, as noites seguintes a vitória de Donald Trump para a Casa Branca foram marcadas por protestos de pessoas que rejeitavam o resultado das eleições em diversas cidades do país.2 Se em algum momento da história da humanidade os meios ins-titucionalizados foram suficientes para garantir legitimidade e a aceitação do sistema eleitoral-formal, protestos como os narrados acima evidenciam que, hodiernamente, mesmo as eleições diretas asseguram muito pouco.

Assiste-se à mudanças nos padrões de participação social nos governos em diversos lugares do mundo: manifestações estudantis no Canadá e no Chile; o movimento dos Indignados na Espanha; a Primavera Árabe nos países do norte da África e no Oriente Médio; o Occupy Wall Street em Nova Iorque. Pessoas nas ruas exigindo mudanças parecem ser cada vez mais regra do que a exceção. Em praticamente todos esses eventos uma instituição pública se mos-trou crucial para estabilizar ou solapar as democracias: as forças policiais. E é dessa atividade cada vez mais comum que parece surgir as maiores e mais severas críticas às polícias.

1 IT’S our future: Youg protesters march against EU referendum result. Metro, 24 jun. 2016. Disponível em: <http://metro.co.uk>. Acesso em: 4 jul. 2016.

2 PROTESTO contra Trump no Oregon termina em violência. Carta Capital, 11 nov. 2016. Disponível em: <http://www.cartacapital.com.br>. Acesso 11 nov. 2016.

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A dificuldade em construir consensos é, com efeito, um dos fatores que mais desafiam a atividade policial. Exemplo retirado dos protestos no Brasil em junho de 2013 ilustram os desacordos e suas consequências: um canal de televisão filmava o protesto com pessoas dispersas pela rua; um grupo de aproximadamente oito se aglomerava na tentativa de impedir que um dos motoristas arrancasse com o carro que até então estava parado no semáforo.3 Acreditavam que a força do conjunto seria maior do que a do motorista sozinho. Ao perceber que os manifestantes se juntavam para ocupar o caminho pelo qual passaria, o motorista acelerou e os atropelou. A força do motorista no carro foi maior do que a dos oito manifestantes justapostos. Sobre os fatos, apenas dois comentários no site, mas suficientes para se perceber paixões e desencontros. Enquanto o primeiro dizia que “a polícia tinha que prender esses manifestantes que depredam a cidade”4, o seguinte afirmava: “tem que prender esse motorista irresponsável [...]”5.

Quem está mais errado: os que se unem no intuito de forçar outros a permanecerem parados ou aquele que também pela força tenta fazer valer seu direito? É justo uma pessoa ficar paralisada em razão de um protesto que não quer participar? Seria efetiva uma manifestação sem transtornos para as demais pessoas? A Constitui-ção da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88) prevê o direito de se manifestar e também o de ir e vir, mas onde está a linha entre um e outro? Qual o papel da polícia nesse contexto? Foi a partir de perguntas como essas que surgiram as angústias do autor, policial-militar lotado na tropa de choque, que se propõe a observar a atividade que exerce pelas lentes da Teoria do Direito e a analisar os conceitos jurídicos a partir de casos concretos.

Dois personagens da obra O visconde partido ao meio, de Ítalo Calvino6, talvez possam servir de mote a esta dissertação. Um deles é o Dr. Trelawney, um inglês que fora médico a bordo de um navio toda a vida, fez expedições grandes e perigosas, mas do mundo jamais viu nada, pois ficava jogando vinte-e-um trancado em uma sala da

3 MOTORISTA se irrita com manifestação na Av. Paulista. BOL vídeos, 12 jun. 2013. Disponível em: <http://videos.bol.uol.com.br>. Acesso em: 4 jul. 2016.

4 Ibid.5 Ibid.6 CALVINO, Ítalo. O visconde partido ao meio. São Paulo: Companhia das Letras,

1996.

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embarcação. Quando o navio em que estava naufragou, tornou-se médico em Terralba, mas preocupava-se somente com suas descobertas científicas. Tinha aversão a sangue e não se importava com os doentes; enquanto buscava uma forma de agarrar e conservar fogos-fátuos, demonstrava sua ojeriza às pessoas, correndo dos leprosos ou tocando os doentes com a ponta dos dedos. O outro personagem é Pedroprego, sério mestre carpinteiro que construía as mais belas, engenhosas e perfeitas forcas sem pensar a que se prestavam todo ofício e diligência empenhados na precisão científico-matemática das engrenagens que criava e fazia funcionar. Entre o médico contemplativo e o artesão que age de forma tão mecânica como os cadafalsos que cria; entre o pensamento sem compromisso com a prática e a prática desligada do pensamento, tenta-se um encontro na boa e velha mediania aristotélica.

O relato acima do motorista que atropela os manifestantes revela os riscos de se conceder a defesa das próprias liberdades exclusivamente aos interessados. A combinação de elementos como a falta de alteridade, as emoções humanas, o calor dos acontecimentos e o desejo obstinado pode levar a condutas inconsequentes ou a juízos sinceros, mas par-ciais. Talvez notando isso, os revolucionários franceses do século XVIII fizeram constar no artigo 12 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 que “a garantia dos direitos do homem e do cidadão necessita de uma força pública [...]”7. Assim, reconheceram que os direitos escritos na Declaração dependiam de uma força pública para não serem palavras ao vento, somente texto sem reflexo na realidade ou ao alvedrio de quem circunstancialmente pudesse ser mais forte.

Portanto, o que diziam era que a efetividade dos direitos depen-dia dessa força pública. Todavia, há, de modo geral, certa negligência. Conforme pontua Cláudia Mauch, “apesar de ser uma das instituições do Estado mais presentes na vida social brasileira, a polícia continua a ser, no entanto, provavelmente a menos conhecida”8. Recente flo-rescer nos últimos 20 anos, na avaliação de Elizabeth Leeds9, como

7 FRANÇA. Embaixada da França no Brasil. A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. Disponível em: <http://www.ambafrance-br.org/A-Declaracao--dos-Direitos-do-Homem>. Acesso em: 4 jul. 2016.

8 MAUCH, Cláudia. Ordem pública e moralidade: imprensa e policiamento urbano em Porto Alegre na década de 1890. Santa Cruz do Sul: EDUNISC/ANPUH--RS, 2004. p. 22.

9 LEEDS, Elizabeth. Prefácio. In: LIMA, Renato Sérgio; RATTON, José Luiz (Orgs.). As Ciências Sociais e os pioneiros nos estudos sobre crime, violência e direitos

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objeto de estudo na História e na Sociologia, ainda não encontrou eco equivalente nas ciências jurídicas: o momento no qual o Direito realiza-se por intermédio da instituição policial ainda é bastante des-conhecido. Segundo Ferrajoli, uma das razões para isso seria:

[...] uma bizarra hierarquia nobiliárquica estabelecida a partir do direito romano entre as diversas ordens e ramos dos estudos jurídicos: antes de todos o direito civil, depois o direito público, depois o penal e apenas por último o direito e a praxe de polícia, quase a dizer que, quanto mais o direito é contaminado pela violência e nele é difícil e incerta a legitimação, tanto menos será meritório de estudo e de reflexão teórica e axiológica.10

Assim, força ou coerção seriam apenas sinais gráficos ou fonemas, sem muita relação com a realidade extratextual, como se o fenômeno jurídico se reduzisse apenas a sua face formal, escrita. Sua tradução para a vida, seus desdobramentos ou a preocupação sobre como elementos da realidade podem lhe condicionar de maneira decisiva, seria qualquer outra coisa que não o Direito. Dessa forma, o Direito parece acontecer somente nas salas fechadas, nos livros, nos autos, nos tribunais, abstratamente, longe da vida das pessoas, do mundo; como um jogo de baralho, no qual os argumentos são as cartas com as quais os jogadores disputam a vitória em uma brincadeira para o autoentretenimento, à maneira do médico-cientista de Calvino, a brincar de vinte-e-um enquanto a vida acontece lá fora.

Nesse contexto, os fatos não formalizados seriam não direito ou sequer existiriam; como se ensina nas faculdades: “quod non est in actis non est in mundo” – o que não está nos autos não existe11. As ações policiais não sintetizadas em processos criminais apenas excepcional-mente encontram lugar nas salas de aula ou nas pesquisas jurídicas. E isso tem reflexos: a visão bipartida e assistemática que geralmente se ensina nas faculdades de Direito, de que existiriam no Brasil duas instituições policiais, uma administrativa e outra processual penal, só

humanos no Brasil. São Paulo: Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Urbania, ANPOCS, 2011. p. 7.

10 FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. 4. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014. p. 708.

11 DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. v. 4. p. 25.

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muito remotamente encontra eco na realidade: na realidade do direito brasileiro, durante os protestos a Polícia Militar (PM) acompanha as manifestações com a missão de garantir os direitos constitucionais envolvidos no cenário a partir do texto da Constituição e do enten-dimento dos tribunais; podendo se deparar com situações nas quais lavra um auto de infração de trânsito de natureza administrativa; realiza uma prisão com base nos Códigos Penal e de Processo Penal, arrola testemunhas, faz o enquadramento preliminar fato-tipo; podendo lhe ser apresentada uma liminar judicial de natureza cível; tendo que lidar com legislação federal, estadual e municipal que se contradizem; e, se utilizar força, ter como parâmetro o Direito Internacional12 e os próprios manuais. Todo esse cipoal, muitas das vezes interpretado no instante da decisão, no calor ou no frio das ruas e das paixões huma-nas, com o risco do erro, sem chance de recurso ou efeito suspensivo para a ação desencadeada.

Esse é o tema da investigação. O recorte temático é, portanto, o direito de reunião.13 A análise está no âmbito da efetividade ou eficácia social, que opera na relação entre a norma escrita e o fato; na materialização dos preceitos normativos.14 Dessa forma, trata--se de um enfoque na realização do texto constitucional na vida das pessoas, de como o direito escrito funciona ou não funciona, consciente de que pode haver uma distância entre o texto e o que empiricamente se vê nas ruas para, assim, tentar desvendar alguns

12 OLIVEIRA, Steevan Tadeu Soares de. O uso da força pela Tropa de Choque sob o prisma do Direito Internacional dos Direitos Humanos. In: CAPUCIO, Camilla et al. (Orgs.). A proteção do indivíduo e da coletividade. Belo Horizonte: Arraes Editores, 2013. (Direito Internacional no Nosso Tempo, v. 2). p. 137-151.

13 Também denominado direito de protesto ou de manifestação, tomados aqui como sinônimos, dá-se preferência a direito de reunião, tendo em vista que a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88) o esco-lhe: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabi-lidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: […] XVI - todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente;” (BRASIL, 1988)

14 FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do Direito. 8. ed. rev. ampl. São Paulo: Atlas, 2015, p. 159-160. BARROSO, Luís Roberto. O Direito Constitucional e a Efetividade de suas normas: limites e possibilidades da Constiuição Brasileira. 8. ed. atual. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 82-83.

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possíveis entraves na conformação do jurídico na realidade social. Consequentemente, a vertente teórico-metodológica empregada é a jurídico-sociológica, que se preocupa com a facticidade do Direito e suas relações contraditórias.15

Nesse recorte dos protestos populares, a noção de Direito da qual se vale é de António Manuel Hespanha16, que o apresenta em uma perspectiva realista. Parte-se da premissa de que o direito de reunião não se resume ao texto constitucional, mas pode ser observado calei-doscopicamente, “[...] de mais sítios e de sítios mais improváveis que o habitual”17. Assim, foi utilizada documentação indireta e direta para levantamento dos dados18: além da leitura da Constituição de 1988, buscou-se o que é o direito de reunião nas leis infraconstitucionais, nas discussões legislativas, na jurisprudência dos tribunais, nos feitos do Ministério Público, nos manuais da polícia e nas condutas humanas por meio de notícias de jornais, boletins de ocorrência e relatos de pesquisa-participante, sobretudo tendo por referência a concreção do direito na prática policial, um lugar ainda inusitado na Academia como ponto de observação do fenômeno jurídico.

Portanto, tenta-se ir além de algumas leituras que, ao (não) explicarem o que é o direito de reunião, apenas repetem a previsão constitucional e não percebem o descompasso entre uma escolha pela interpretação literal do texto e o contexto que o envolve, presente nos julgados, nas leis e nas ruas. Dessa forma, assim como pouco se conhece sobre a instituição policial, são também escassas a pesquisa e a jurisprudência sobre o direito de reunião. Não se pode afirmar que essa dupla omissão seja a causa dos diversos problemas que surgem nas ruas, entretanto é certo que sinaliza o potencial ainda desperdi-çado da contribuição que investigações acadêmicas podem ensejar à concreção do direito na prática policial.

Trata-se de tema delicado, seja no Brasil ou em outros países, tanto que o Police Executive Research Forum reconhece que talvez

15 GUSTIN, Miracy Barbosa de Sousa; DIAS, Maria Tereza Fonseca. (Re)Pensando a pesquisa jurídica. 4. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2013. p. 22.

16 HESPANHA, António Manuel. O caleidoscópio do direito – o direito e a justiça nos dias e no mundo de hoje. 2. ed. Coimbra: Almedina, 2009.

17 Ibid., p. 918 MARCONI, Marina de Andrade; LAKATOS, Eva Maria. Fundamentos de Me-

todologia Científica. 5a. ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 174-196.

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não exista desafio maior para policiais em contextos democráticos do que atuar em manifestações públicas.19 Não obstante, cada vez mais a polícia é chamada a simultaneamente garantir o direito de reunião e prevenir ações violentas que possam ocorrer durante os protestos. Para se ter uma ideia, em Portugal no ano de 2009 as forças de segu-rança realizaram 167 operações para garantir o exercício do direito de reunião; em 2012, esse número ultrapassou a barreira de três mil operações anuais e desde então nunca mais retornou aos padrões anteriores20, tendo o cenário se tornado uma das principais preocu-pações das polícias lusitanas em 2015, em virtude de manifestações de extrema-direita.21

Para explorar o tema, a estratégia metodológica principal foi a pesquisa-participante, na qual o pesquisador integra o campo in-vestigado.22 O autor é, desde 2002, integrante da Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG), e, durante cinco anos, entre dezembro de 2009 e dezembro de 2014, trabalhou no Comando de Policiamento Especializado (CPE)23. Nesse período, desenvolveu diversas atividades

19 WEXLER, Chuck. Foreword. NARR, Tony et al. Police Management of Mass Demonstrations: Identifying Issues and Successful Approaches. Washington: Police Executive Research Forum, 2006. p. i.

20 PORTUGAL. Relatório Anual de Segurança Interna 2009. Lisboa: Sistema de Se-gurança Interna, 2010; PORTUGAL. Relatório Anual de Segurança Interna 2010. Lisboa: Sistema de Segurança Interna, 2011; PORTUGAL. Relatório Anual de Segurança Interna 2011. Lisboa: Sistema de Segurança Interna, 2012; PORTUGAL. Relatório Anual de Segurança Interna 2012. Lisboa: Sistema de Segurança Interna, 2013; PORTUGAL. Relatório Anual de Segurança Interna 2013. Lisboa: Sistema de Segurança Interna, 2014; PORTUGAL. Relatório Anual de Segurança Interna 2014. Lisboa: Sistema de Segurança Interna, 2015; PORTUGAL. Relatório Anual de Segurança Interna 2015. Lisboa: Sistema de Segurança Interna, 2016.

21 PORTUGAL. op. cit., 2016, p. 77; 81.22 GUSTIN; DIAS. op. cit., p. 90.23 Em Minas Gerais, a concepção operacional da polícia é pautada pela divisão

territorial do Estado em Regiões de Polícia Militar (RPM). De modo geral, cada Região subdivide-se em Batalhões, que são numerados cronologicamente de acordo com sua criação e, por sua vez, subdivididos em Companhias. As-sim, o espaço geográfico é fragmentado nas RPMs, que têm como atribuição as atividades policiais-militares. Em recobrimento a todas as demais regiões, existe o Comando de Policiamento Especializado (CPE), que, não tendo uma área específica para atuar, apoia os demais comandos, sobretudo em ocorrêcias típicas de unidades especiais, como Batalhão de Radiopatrulhamento Aéreo (Btl RpAer), Batalhão de Operações Policiais Especiais (BOPE) e Batalhão de Choque (BPChoque).

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A TROPA DECHOQUE e as manifestações

de rua

STEEVAN OLIVEIRA“A obra de Steevan Oliveira demonstra essa outra face que se deve dar ao exercício do poder de polícia pelas tropas de choque. A tensão entre princípios e entre interesses legitimamente protegidos (a liberdade de expressão e o direito de ir e vir, por exemplo) não se resolve por uma fórmula predefi nida. A legalidade não é uma equação aritmética. Ao contrário, defi nir a melhor forma de aplicar o direito em cada manifestação nas ruas exige habilidade, imaginação, sensibilidade e criatividade para deixar falar todas as vozes, para permitir a livre movimentação na cidade, para tornar audíveis todas as perspectivas de compreensão do direito essencial de expor ideias na esfera pública e para evitar danos de toda ordem.”

Mônica Sette Lopes

A partir das narrativas de casos concretos ocorridos no Brasil e em outros países, busca-se ao longo do trabalho identifi car o ponto de contato entre o direito de reunião e os vários outros direitos fundamentais que com ele podem colidir ou concorrer. Nesse esforço, observa-se que intervir para a efetividade dos direitos fundamentais é mais complexo do que a leitura do texto distante da realidade sugere. No encadeamento para a concreção, entendida nos termos de Karl Engisch como acomodação do direito à realidade, descortinam-se aspectos da aplicação do Direito pela polícia, sua imediatidade, seus confl itos, suas tensões, e os riscos de uma decisão que envolve a vida de várias pessoas.

editora

ISBN 978-85-8425-558-0

STEEVAN OLIVEIRAMestre e Bacharel em Direito pela UFMG. Pós-graduado em Psicanálise e Ciências Criminais. Pós-graduado em Direito Militar. Bacharel em Ciências Militares. Ofi cial da Polícia Militar de Minas Gerais e professor da Academia de Polícia Militar. Representante do Brasil indicado pelo Conselho Nacio-nal de Comandantes Gerais Policiais Militares e Corpos de Bombeiros Mili-tares na FIEP (Association of European and Mediterranean gendarmeries and police forces with military status).

A TROPA DE

CHOQUE

e as manifestações de rua

STEEVAN OLIVEIRA

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