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CENTRO UNIVERSITÁRIO SALESIANO DE SÃO PAULO
UNISAL – CAMPUS MARIA AUXILIADORA
Anderson Bizarria da Costa
A RESSIGNIFICAÇÃO DO DISCURSO OFICIAL DA PASTORAL DA
JUVENTUDE NA VIVÊNCIA SOCIOCOMUNITÁRIA DE SEUS
MEMBROS
Americana
2017
Anderson Bizarria da Costa
A RESSIGNIFICAÇÃO DO DISCURSO OFICIAL DA PASTORAL DA JUVENTUDE
NA VIVÊNCIA SOCIOCOMUNITÁRIA DE SEUS MEMBROS
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu Mestrado em Educação, do Centro Universitário Salesiano de São Paulo - UNISAL, Campus-Maria Auxiliadora, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Educação, sob a orientação da Prof.ª Dr.ª Maria Luisa Amorim Costa Bissoto.
Americana
2017
ANDERSON BIZARRIA DA COSTA
A RESSIGNIFICAÇÃO DO DISCURSO OFICIAL DA PASTORAL DA JUVENTUDE
NA VIVÊNCIA SOCIOCOMUNITÁRIA DE SEUS MEMBROS.
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu do Centro Universitário Salesiano de São Paulo, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Educação – área de concentração: Educação Sociocomunitária. Linha de pesquisa: A intervenção educativa sociocomunitária: linguagem, intersubjetividade e práxis. Orientadora: Profa. Dra. Maria Luisa Amorim Costa Bissoto
Dissertação defendida e aprovada em 31 de maio de 2017, pela comissão julgadora: __________________________________________ Prof. Dr. Edson Donizetti Castilho – Membro Externo
Chanceler - Centro Universitário Salesiano de São Paulo – UNISAL
__________________________________________
Profa. Dra. Lívia Morais Garcia Lima – Membro Interno Centro Universitário Salesiano de São Paulo – UNISAL __________________________________________ Profa. Dra. Maria Luisa Amorim Costa Bissoto – Orientadora Centro Universitário Salesiano de São Paulo – UNISAL
A todos que acreditam na pessoa humana e lutam pelo seu primado frente a
qualquer outra realidade e especialmente aos grupos juvenis da Pastoral da
Juventude que se esforçam para contribuir com uma ruptura e reviravolta da, e na
realidade contemporânea, em favor da vida.
“A transcendência da pessoa implica que a pessoa não pertença a mais ninguém
senão a ela própria”.
(MOUNIER, 2004, p. 133)
RESUMO
A presente dissertação tem por objetivo problematizar a ressignificação do discurso
oficial da Pastoral da Juventude (PJ), explorando elementos documentais e da
vivência de seus membros, discutindo como a PJ pode promover a realização da
tríade mounieriana (discurso, qualidade de pessoa e ação) ensejando o engajamento
dos sujeitos. Pretendemos também compreender a influência do discurso acima
referido sobre as práticas e as ideologias que perpassam a PJ, se e como essa
influência se traduz na manutenção de espaços de autonomia e de diálogo,
favorecendo a emersão da pessoa humana. Consideramos que toda a associação
humana possui um discurso explícito, mais ou menos incisivo, que passa por
processos de recepção, releitura e interpretação. Analisar tais discursos se constitui,
dessa forma, num exercício de hermenêutica, que nos possibilita acompanhar os
movimentos e tensões de um dado fenômeno; no nosso caso, a Pastoral da
Juventude. Metodologicamente, é uma pesquisa de cunho qualitativo, conceitual, e
optou-se como referencial teórico pelo pensamento de Emmanuel Mounier, filósofo
francês, pai do Personalismo, que defende o primado da pessoa sobre toda e qualquer
realidade. De seu pensamento se extraem as categorias de análise da pesquisa, a
saber: o engajamento, o acontecimento, a historicidade, a comunidade e os atos
criadores. A Pastoral da Juventude à luz do aggiornamento proposto pelo Concílio
Ecumênico Vaticano II e pela sua interpretação e recepção continental, animada pelas
Conferências Episcopais Latino-Americanas, busca associar-se à luta diária das
pessoas, especialmente dos jovens, pela busca de seus direitos e para a consolidação
de uma sociedade mais justa e mais fraterna. É justamente a vivência
sociocomunitária desse compromisso que será analisado nessa pesquisa. Como
instrumento de coleta de dados empregaremos a análise documental (documentos da
PJ e da Igreja, as contribuições do CELAM e da CNBB), a escuta de alguns jovens
engajados nos grupos de PJ pelo país e de alguns de seus assessores, por meio de
questionário semiestruturado on line e entrevistas. Compõem-se, assim, uma
estrutura para a triangulação dos dados: o Personalismo de Mounier, a Caminhada
da Igreja e da PJ e, por fim a análise dos dados a partir das categorias oferecidas pelo
Personalismo. Espera-se, com esse trabalho, elucidar a. a pertinência do pensamento
Mounieriano como contribuição para a reflexão e efetivação do estado de pessoa na
vivência sociocomunitária dos membros da PJ; b. identificar elementos do processo
de ressignificação do discurso oficial da PJ, no âmbito do pensamento Mounieriano e
c. contribuir academicamente com a oferta de categorias de interpretação da dinâmica
vivida pelos grupos de jovens da PJ no Brasil.
Palavras-chave: A Pessoa; Pastoral da Juventude; Discurso; Ressignificação;
Educação Sociocomunitária.
ABSTRACT
The purpose of this dissertation is to re-characterize the official discourse of the
Pastoral of Youth (PJ), exploring documentary elements and the experience of its
members, discussing how the PJ can promote the realization of the Mounierian triad
(discourse, quality of person and action) Encouraging the engagement of the subjects.
We also intend to understand the influence of the aforementioned discourse on the
practices and ideologies that permeate the PJ, if and how this influence is translated
into the maintenance of spaces of autonomy and dialogue, favoring the emergence of
the human person. We consider that all human association has an explicit, more or
less incisive discourse that goes through processes of reception, re-reading and
interpretation. Analyzing such discourses constitutes, therefore, an exercise of
hermeneutics, which enables us to follow the movements and tensions of a given
phenomenon; In our case, the Youth Ministry. Methodologically, it is a qualitative,
conceptual research, and it was chosen as a theoretical reference by the thought of
Emmanuel Mounier, French philosopher, father of Personalism, who defends the
primacy of the person over any and all reality. From his thought the categories of
analysis of the research are extracted, namely: the engagement, the event, the
historicity, the community and the creative acts. The Youth Ministry in the light of the
aggiornamento proposed by the Second Vatican Ecumenical Council and its
continental interpretation and reception, animated by the Latin American Episcopal
Conferences, seeks to associate the daily struggle of people, especially young people,
with the search for their rights and For the consolidation of a more just and fraternal
society. It is precisely the socio-communitarian experience of this commitment that will
be analyzed in this research. As an instrument of data collection we will use
documentary analysis (documents of the PJ and the Church, the contributions of
CELAM and the CNBB), listening to some young people engaged in PJ groups across
the country and some of their advisors, through a questionnaire Semistructured online
and interviews. A structure for the triangulation of data is thus composed: Mounier's
Personalism, the Church Walk and the PJ, and finally the analysis of the data from the
categories offered by Personalism. It is hoped, with this work, to elucidate the. The
relevance of Mounierian thought as a contribution to the reflection and effectiveness
of the state of person in the socio-community experience of the members of the PJ; B.
To identify elements of the process of re-signification of the official discourse of the PJ,
within the framework of Mounierian and c. Contribute academically with the offer of
categories of interpretation of the dynamics experienced by the youth groups of PJ in
Brazil.
Keywords: The person; Pastoral of Youth; discourse, redetermination;
Sociocommunitarian Education
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LISTA DE FIGURAS E GRÁFICOS
Figura 1 – Esquema da organização da Comissão Episcopal para a Juventude .....76
Figura 2 – Organograma da Coordenação da Pastoral da Juventude ......................77
Gráfico 1 – Gênero .....................................................................................................89
Gráfico 2 – Histograma etário .....................................................................................89
Gráfico 3 – Questão 1.1 ..............................................................................................91
Gráfico 4 – Questão 1.2 ..............................................................................................92
Gráfico 5 – Questão 1.3 ..............................................................................................92
Gráfico 6 – Questão 1.4 ..............................................................................................93
Gráfico 7 – Questão 1.5 ..............................................................................................93
Gráfico 8 – Questão 1.6 .............................................................................................94
Gráfico 9 – Questão 1.7 .............................................................................................94
Gráfico 10 – Questão 2.1 ............................................................................................95
Gráfico 11– Questão 2.2 ............................................................................................96
Gráfico 12 – Questão 2.3 ............................................................................................96
Gráfico 13 – Questão 2.4 ............................................................................................97
Gráfico 14 – Questão 2.5 ............................................................................................97
Gráfico 15 – Questão 2.6 ............................................................................................98
Gráfico 16 – Questão 2.7 ............................................................................................98
Gráfico 17 – Questão 3.1 ............................................................................................99
Gráfico 18 – Questão 3.2 ..........................................................................................100
Gráfico 19 – Questão 3.3 ..........................................................................................100
Gráfico 20 – Questão 3.4 ..........................................................................................101
Gráfico 21 – Questão 3.5 ..........................................................................................101
Gráfico 22 – Questão 3.6 ..........................................................................................102
Gráfico 23 – Questão 3.7 .........................................................................................102
Gráfico 24 – Questão 1 – Motivo do ingresso ...........................................................103
Gráfico 25 – Questão 2 – Motivo da permanência ...................................................104
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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AL – Exortação Apostólica Pós-Sinodal Amoris Laetitia
ANPJ – Assembleia Nacional da Pastoral da Juventude
At – Atos dos Apóstolos
CEBs – Comunidades Eclesiais de Base
CELAM – Conselho Episcopal Latino Americano
CEPJ – Conferência Episcopal Pastoral para a Juventude
CF – Campanha da Fraternidade
CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
DNJ – Dia Nacional da Juventude
DF – Dei Filius
DV - Dei Verbum
DOC – Documentos da CNBB ou de algum outro órgão da Igreja Romana
EM - Evangelli Nuntiandi
GS – Gaudium et Spes
HS - Humanae Salutis
JAC – Juventude Agrária Católica
JEC – Juventude Estudantil Católica
JIC – Juventude Independente Católica
JOC – Juventude Operária Católica
Jo – Evangelho de São João
LG – Lumem Gentium
Lc – Evangelho de São Lucas
MC - Mystici Corporis
Mc – Evangelho de São Marcos
Mt – Evangelho de São Mateus
PJ – Pastoral da Juventude
PJB – Pastoral da Juventude do Brasil
PJE – Pastoral da Juventude Estudantil
PJR – Pastoral da Juventude Rural
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PJMP – Pastoral da Juventude do Meio Popular
PJs – Pastorais de Juventudes
Vat. – Concílio Ecumênico Vaticano II
1 Cor – Primeira Carta de São Paulo aos Coríntios
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SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO ....................................................................................................15
INTRODUÇÃO ..........................................................................................................19
PARTE I
O PERSONALISMO DE EMMANUEL MOUNIER ....................................................22
1.1 A NOÇÃO DE NATUREZA HUMANA E DE CONDIÇÃO HUMANA ...................28
1.2 A PESSOA E O INDIVÍDUO ................................................................................30
PARTE II
A PASTORAL DA JUVENTUDE E A IGREJA .........................................................45
2.1 O CONCÍLIO VATICANO II ..................................................................................45
2.1.1 O Concílio Ecumênico Vaticano II (1962 – 1965) ..........................................45
2.1.2 O compromisso com o ser humano ............................................................. 49
2.1.3 A eclesiologia do Concílio Vaticano II ..........................................................50
2.1.4 A Igreja povo de Deus ....................................................................................56
2.2 CONSELHO EPISCOPAL LATINO-AMERICANO ..............................................59
2.3 A JUVENTUDE ....................................................................................................63
2.4 A PASTORAL DA JUVENTUDE ..........................................................................67
PARTE III
DA ANÁLISE DE DADOS .........................................................................................72
3.1 DADOS DA PARTORAL DA JUVENTUDE (PJ) NA ATUALIDADE ....................72
3.1.1 O Setor Juventude ..........................................................................................74
3.2 DAS ESTRUTURAS DE COLETA DE DADOS ...................................................77
3.2.1 Análise documental ........................................................................................77
3.2.2 Dos Questionários...........................................................................................83
3.2.3 As entrevistas..................................................................................................86
3.3 Da análise de dados ..........................................................................................88
3.3.1 O perfil dos respondentes dos questionários .............................................88
3.3.2 Da análise de dados das diversas fases da pesquisa.................................90
3.3.3 Das entrevistas ..............................................................................................104
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CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................111
REFERÊNCIAS .......................................................................................................117
ANEXO I ..................................................................................................................121
ANEXO II .................................................................................................................128
ANEXO III ................................................................................................................130
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APRESENTAÇÃO
“Falar de modo impróprio, não é apenas cometer uma falta no que se diz, mas
também causar um mal nas almas." (Platão)
A todos nós, seres humanos é oferecida a oportunidade e a responsabilidade
de viver e contribuir para o desenvolvimento de toda a humanidade. Esse imperativo
da existência tem caráter performativo, não há realização humana no fechamento em
si mesmo. Com esse pressuposto inicio meu memorial.
Em 2004 entrei pela primeira vez em uma sala de aula de nível superior, com
23 anos, experiência um tanto tardia, frente às oportunidades disponibilizadas,
contemporaneamente, para o acesso a esse nível de ensino. Mesmo que tardiamente
aproveitei e me permiti ser interpelado pelos questionamentos filosóficos.
Impulsionado pelo desejo de conhecer mais profundamente a realidade que nos
circunda, não somente em seus aspectos aparentes, deparei-me com a apresentação
dos pré-socráticos, filósofos da natureza, desejosos do conhecimento da verdade por
meio do conhecimento da essência das coisas.
Depois Sócrates, tido como o mais sábio de todos os homens, pois afirmara
que o único conhecimento que possuía era uma espécie de consciência de nada
conhecer. Platão, em seu mundo das ideias, propunha a ruptura com a vida na
caverna, Aristóteles mais sistemático que seu mestre propunha uma vida ética
alicerçada na realidade racional, mas sem negar o contributo dos sentidos.
Estava dado o início da inquietação cada vez mais fundamentada para a busca
do saber. Dos clássicos gregos aos modernos, passando pelos escolásticos. Da
síntese kantiana do acesso aos fenômenos e somente a eles e não a realidade como
tal aos filósofos contemporâneos. Um mais sedutor que o outro e a necessidade de
uma síntese, de uma escolha, de uma tomada de decisão.
Quase que inesperadamente, depois de alguns anos no mergulho de tantas
páginas e em tantas descobertas e vislumbres filosóficos, o professor Dr. José Marcos
Miné Vanzella, então, coordenador do curso de Filosofia do Unisal campus Lorena,
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observando meu anseio em denunciar um contexto de instrumentalização do ser
humano, apresenta-me Emmanuel Mounier, pai do Personalismo.
Autor fora de “moda”, desconhecido, de pouca importância ou pouco falado.
Mas que ao começar a ler demonstrou-me uma crítica bastante incisiva da realidade
contemporânea, embora com tão poucos anos de vida e produção filosófica. O
primado da pessoa, centro de seu pensamento, provocou-me bem para a reflexão
filosófica que pretendia.
Nesse momento de síntese filosófica, inicialmente apressada e forçada pelas
exigências formais da academia, forjava-se, aos poucos, minha percepção da
realidade, minha cosmovisão. Nela, a pessoa humana tinha lugar especial. Ao estilo
personalista, aberto aos acontecimentos, segui meus estudos já como salesiano
professo há 2 anos.
Em 2008 trabalhei na formação de noviços, revisitei os principais textos
teológicos, históricos e de espiritualidade que fundamentam o estilo de vida religiosa
consagrada. No ano seguinte, Pindamonhangaba era meu novo endereço. Das 26
aulas semanais como professor à escuta dos dilemas humanos senti a necessidade
de retornar a academia.
Ainda preocupado com a pessoa humana em seu anseio de síntese e unidade,
como propusera Mounier, mas também preocupado com os aspectos psicológicos de
seu desenvolvimento, simultaneamente ao início da graduação em teologia cursei
uma especialização, lato sensu, em Counseling1.
Devagar, ia agregando a minha interpretação acerca do ser humano facetas
que iam além das filosóficas e daquelas que adquirira na minha formação nuclear de
família e vivência cristã. A psicologia oferecia novos contornos a esse ser humano,
objeto de admiração e em construção em mim mesmo.
Nesse percurso até aqui uma pergunta de fundo persistia. Ela sempre esteve,
ela era fundamental. Como discípulo de Cristo afirmo e acredito que essa pessoa
humana, maravilhosa e contraditória em seu desenvolvimento, é destinatária da
1 Termo em língua inglesa que significa em tradução livre “aconselhando”. Aqui faz referência
a um curso de especialização Lato Sensu em aconselhamento psicológico oferecido pelo Instituto IATES (Instituto de Terapia e Sentido do Ser) com sede em Curitiba.
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salvação operada por Jesus. Mas do que Jesus salvou essa humanidade? Do que ele
me salvou e continua salvando?
É nesse instante, diante da reafirmação dessa questão fundamental, que esses
saberes se encontram. Mounier evoca a necessidade de unidade, a integridade do ser
humano para que se torne pessoa. Perls2, na sua proposta de Gestalt-terapia evoca
a condição holística do ser humano, seu caráter orgânico. O cristianismo, por meio
das práticas religiosas e pela reflexão teológica, afirma sua inerente necessidade de
comunhão.
Três campos do saber, três esforços humanos de significação da realidade e,
acima de todas elas, a de si mesmos, convergindo para uma percepção comum, a
necessidade humana de integração de todas as dimensões constituintes do seu ser
como condição sine qua non para sua felicidade.
Esse percurso em torno do conhecimento do ser humano e em serviço a ele,
no serviço a Deus pelo ministério presbiteral a que fui chamado, na particularidade da
predileção pelos jovens, especialmente os mais necessitados, me trouxe uma nova
questão, a saber: como nossa evangelização atinge os corações humanos?
Ela se revestiu de uma preocupação pastoral em torno de uma prática de
formação humana datada praticamente da fundação da congregação salesiana, o
conhecido “Bom dia”, “Boa tarde” e “Boa noite”. Ela se encaixava na proposta do
programa de pós graduação stricto sensu em Educação sociocomunitária do Unisal.
Fiz a inscrição no processo seletivo do programa, apresentei o projeto de
pesquisa na banca avaliadora e com contestações pertinentes passei, com o auxílio
da professora Dra. Maria Luisa Bissoto, a repensá-lo. Mas era apenas o início desse
processo.
Antes de iniciar os créditos obrigatórios fui transferido para outra comunidade
salesiana, onde permaneci até meados do ano de 2015, quando então, pedi licença
do exercício ministerial. Mudei muito em pouco tempo, consequentemente, o projeto
2 Friederich Salomon Perls, nasceu em Berlim em 8 de julho de 1893. Faleceu em Chicago em
14 de março de 1970. Foi um psicoterapeuta e psiquiatra que desenvolveu a abordagem psicoterapeuta que chamou de Gestalt-terapia.
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de pesquisa também mudou. De uma preocupação outrora pedagógico-pastoral agora
minha nova condição evocava um caráter mais laico para o projeto.
Os jovens permaneciam como sujeitos, e agregava-se a sua análise um bom
amigo de reflexão, Emmanuel Mounier. Ele assume o lugar de fundamento teórico
para a pesquisa com os sujeitos, inicialmente sem pertença institucional, apenas como
“jovens”, mas a prática pastoral profundamente arraigada em minha vida, suscitou o
retorno às suas fontes, e elegi a Pastoral da Juventude como objeto de pesquisa.
Minha questão primeira, o conhecimento da realidade, que ganhou contornos
humanos, pela busca do conhecimento da pessoa humana, permanece, agora com
contornos humanos juvenis de ressignificação em uma vivência sociocomunitária
específica.
Anseio que esse empenho de aproximação possa conduzir-me cada vez mais
à profundidade necessária para do ser humano falar, não com pretensão de
conhecimento total, no entanto, mais próximo e mais cuidadoso no exercício desse
falar, de mim mesmo, de nós todos, para que a palavra seja usada, por mim, com
mais sabedoria e menos devaneio.
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INTRODUÇÃO
A sociedade contemporânea assiste à acentuação de contextos de
instrumentalização da pessoa humana. O Personalismo, de Emmanuel Mounier, por
ocupar-se do primado da pessoa frente a qualquer realidade, se apresenta como uma
contraposição a esse contexto:
A pessoa não é o mais maravilhoso objeto do mundo, objeto que
conhecêssemos de fora, como todos os outros. É a única realidade que
conhecemos e que, simultaneamente, construímos de dentro. Sempre que
presente, nunca se nos oferece (MOUNIER, 2004, p. 15).
A Pastoral da Juventude à luz das concepções teológicas do Concílio Vaticano
II, aplicadas pelo CELAM, sempre carregou a bandeira da crítica à desigualdade
social, e a qualquer tipo de sanção à liberdade, bem como do necessário serviço aos
mais pobres e aos jovens. De acordo com Silva:
Sonhamos com uma sociedade que tenha como prioridade a pessoa humana
(o ser), um projeto social claro, com condições e oportunidade para todos,
sem preconceitos, com a vivência e testemunho dos valores evangélicos,
valorizando a diversidade e riquezas da pessoa e da juventude (SILVA, 2009,
p. 9).
A defesa do ser humano é uma linha comum entre essas duas experiências de
engajamento social de inspiração cristã, o Personalismo de Emmanuel Mounier e a
Pastoral da Juventude, em sua atuação no Brasil. O debate entre tais perspectivas
pode contribuir para a preservação dos processos de valorização da humanização
hodierna.
O Personalismo e a Pastoral da Juventude também têm em comum um anseio
de transformação da realidade. Não a fazem pelo isolamento, mas evocam a
participação da comunidade por um processo de convocação, conscientização e
construção da emancipação daqueles que se engajam às proposições enunciadas.
Tal postura é correspondente com a prática da educação sociocomunitária, como
defendida por Gomes (2008).
Na valorização desses encontros conceituais e partindo do Personalismo
Mounieriano pretende-se, nesta pesquisa, em primeiro lugar, problematizar a
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experiência sociocomunitária e de formação da consciência e da assimilação ético-
moral dos membros da Pastoral da Juventude.
E ainda, evidenciar a interpretação feita por seus membros quanto ao discurso
oficial, estabelecido por orientações da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do
Brasil), Encíclicas e Constituições Dogmáticas e Pastorais oriundas do Vaticano II,
bem como das Conclusões CELAM (Conselho Episcopal Latino-Americano) e, como
carta magna, o próprio Evangelho.
O trabalho possui uma estrutura tripartida. A primeira apresenta os
fundamentos teóricos extraídos da filosofia personalista de Emmanuel Mounier e as
categorias de análise dos sujeitos, a saber: o engajamento, o acontecimento, a
historicidade, a comunidade e atos criadores.
A segunda apresenta um panorama das principais contribuições do Concílio
Vaticano II, numa perspectiva de abertura ao mundo moderno. Depois, o processo de
recepção dessas concepções teológicas e seus desdobramentos pastorais forjados
no CELAM, uma conceituação de juventude e a história da Pastoral da Juventude no
Brasil, sua identidade e seus valores, como expressão juvenil dos apelos de
renovação da Igreja em vistas da transformação da realidade.
Por fim, a terceira parte apresenta o confronto entre a fundamentação teórica
oferecida pela leitura do Personalismo de Mounier, as bases documentais da Pastoral
da Juventude, os dados levantados em pesquisa de caráter exploratório e a
perspectiva sociocomunitária de educação.
Para o levantamento de dados da pesquisa, de caráter qualitativo, optou-se
pelos seguintes instrumentos de coleta de dados: a elaboração e aplicação de dois
questionários on line via Google Docs, aplicados em duas fases. Primeiro para todos
os jovens membros da PJ, em todo o Brasil. E, posteirormente, aplicados a
assessores, ex-assessores e personagens considerados importantes para a história
da PJ no Brasil. A descrição detalhada da metodologia da pesquisa será feita na
terceira parte dessa dissertação.
A valorização do ser humano, reconhecido como pessoa, e da expressão de
seu primado ocorre para o Personalismo mesmo frente a instituições e categorizações
sociais reconhecidamente fundamentais como: família, Estado, nação, classe,
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política, economia, humanidade etc., a pessoa conserva seu valor absoluto. Elas não
podem promover-se em detrimento da pessoa (MOUNIER, 1967, p.85).
Para evidenciação e vivência do estado de pessoa Mounier postula como
critério a integração entre discurso, qualidade de homem e ação, uma vez que a
pessoa é um ser uno, não disperso, íntegro. O fator, mais ligado à ação, que evidencia
essa integração, é o engajamento sócio-político da pessoa.
A Pastoral da Juventude é um movimento que desde os anos de 1970
apresenta-se como uma proposta de realização do jovem cristão. Também se
caracteriza por seu engajamento social, político e comunitário. Sua própria história e
a diversidade de contextos de sua atuação problematizaram-na, nesse sentido, ao
longo dessas décadas, até os dias atuais.
No esforço do conhecimento de seu objeto o Personalismo entende realizar
como um processo de humanização da humanidade. Sem estabelecer uma
contradição, mas visando observar o que mais imediatamente se manifesta no ser
humano, busca-se apreender o ser humano em suas atividades globais, a saber:
econômicas, políticas, biológicas, espirituais, valorativas, educacionais etc.
(MOUNIER, 2004).
A Pastoral da juventude assume uma postura profética e algo soterológica,
frente aos acontecimentos sociais, especialmente ante os que estabelecem a
marginalização do ser humano, em suas diversas expressões.
Sonhamos com um país liberto das estruturas de corrupção, injustiça,
consumismo exacerbado, com uma terra sem males, sem discriminação de
raça, classe social, ou qualquer forma de exclusão; que respeite as diferenças
culturais e históricas; que incentive o protagonismo juvenil através das Políticas
Públicas de Juventude, possibilitando ao jovem acesso à educação, moradia e
emprego (SILVA, 2009, p.10).
Do encontro entre tais perspectivas e vivências, uma filosófica e outra teológico-
pastoral, pode surgir uma síntese em torno de uma associação de seres humanos que
constantemente, por seus empenhos, visa forjar a integração de seu próprio ser e a
aquisição do estado de pessoa, contribuindo assim organicamente para a
transformação da realidade onde vivem.
22
PARTE I
O PERSONALISMO DE EMMANUEL MOUNIER
A primeira parte dessa pesquisa visa apresentar aspectos fundamentais do
pensamento de Emmanuel Mounier como referencial teórico base para as categorias
de análise para essa pesquisa. Mounier foi um filósofo francês, nascido em Grenoble,
cidade situada a 580 km da capital francesa, no dia 1º de abril de 19053 e em uma
família de condição modesta e camponesa (MOIX, 1968).
Seus pais ansiavam vê-lo médico e aos poucos vão conduzindo-o aos estudos
científicos. Na esteira do atendimento dessas expectativas inicia tais estudos com
certo desprezo e ao final de um ano orienta-se para a filosofia. Cursa três anos à
sombra do mestre Jacques Chevalier4. Após a agregação filosófica, espécie de
licenciatura ou bacharelado (Paris, 1927), aos poucos aproxima-se do mundo da "alta
cultura" filosófica francesa, na qual lerá pela primeira vez Charles Péguy, que será
tema de sua primeira publicação, em 1931. Nesse período conhece também Jacques
Maritain e o padre lazarista Pouget (COQ, 2012).
Da relação com Chevalier desenvolveu o gosto por uma verdade não abstrata,
mas relacionada com a vida, concreta, profundamente humana. E no caminho de
amadurecimento recebeu repreensões acerca de sua falta de simplicidade e
tendência à sistematização exagerada, ao ponto de ansiar por fórmulas brilhantes
(MOIX, 1968). Essa particularidade influenciará Mounier na construção do
Personalismo, enfatizando-se o termo construção, pois é o que sempre foi: nada de
formulações absolutas, precipitadas e rígidas.
No início da década de 1930 pensa no projeto da Revista Esprit, abandonando
seu futuro universitário. Não se caracteriza como uma revista apenas, mas também
como expressão de um movimento reflexivo, que amadurecerá ao longo dos anos, até
3 Mounier morre no final de março de 1950 abatido por uma infarto de miocárdio em Chârenay. 4Jacques Chevalier (13/03/1882 – 19/04/1962) foi um filósofo francês. Nasceu em Cérilly,
formou-se na Ecole Normale Superieure e em Oxford University e ensinou na Faculdade de Letras de Grenoble. Ele era um especialista de Platão e autor de vários livros, principalmente sobre a história da filosofia.
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se caracterizar como contestador do que o próprio Mounier chamara de “desordem
estabelecida”5, bem como de significação filosófica (DOMENACH, 1969).
Antes de tudo, Mounier era um cristão de comprovada virtude. Visou ao longo
de toda sua vida viver sua fé de maneira esclarecida, lançando mão da filosofia como
autêntica “ferramenta” para o amadurecimento de seu pensamento e razões de sua
fé. Conforme Severino,
É em sua vida religiosa que se vai encontrar a razão do caráter persuasivo
de suas obras, ‘da densidade espiritual que aflora sob os debates mais
profanos na aparência, do apetite do verdadeiro que aí se encontra e,
sobretudo, se deixa entorpecer pelos hábitos sociais, enfim, do calor fraterno
que Mounier quer introduzir no diálogo com os homens (SEVERINO,1974,
p.9).
Da relação entre a vivência da fé cristã católica, e dos embates sociais, Mounier
forjará a linha de diálogo com a humanidade, em sua filosofia. Os acontecimentos da
Primeira e Segunda Grandes Guerras, as especulações econômicas e políticas do
início do século XIX, reverberaram na vivência concreta do seu ser cristão em
sociedade.
Resposta imediata a essa perspectiva inquietante e dialógica entre fé e vida é
a fundação da Revista Esprit, datada de 16-23 de agosto de 1932, em Font-Romeu.
A idealização da revista acontece por meio de uma comunicação de Mounier com
suas perspectivas sobre esse projeto num texto intitulado: “As direções espirituais do
movimento Esprit”, que posteriormente seria publicado como editorial do primeiro
número da Revista com o título: “Refazer a renascença” (COQ, 2012, p.24).
Três são as razões para a fundação de Revista Esprit. Primeiro: Mounier
observa uma espécie de fechamento no ciclo de criação do pensamento francês.
Havia questões a se pensar que não se poderia escrever em outro espaço e dizia: “a
nós jovens pianistas de 25 anos, faltava piano” (COQ, 2012, p. 23). Nessa primeira
razão observar-se a capacidade criadora, que tanto será evocada por Mounier, como
sendo constituinte e característica da pessoa humana. Não lamentar a ausência do
5 Essa elaboração surge da análise da realidade sócio-político-econômica de seu tempo.
Retomar-se-á essa elaboração associada a experiência de engajamento vivida por Mounier e pelos personalistas.
24
“piano”, construí-lo, isto é, criá-lo para poder tocar a música livremente a expressa
bem.
A segunda razão para a fundação de Esprit é o estado do cristianismo, que ele
percebe associar-se à “desordem estabelecida” e, frente a isso, pretende estabelecer
uma ruptura. E a terceira razão está relacionada `a crise econômica que, para ele, é
sinal de uma crise da civilização, pois mais do que uma crise na mediação das
relações humanas é uma crise na mentalidade que conduz essas relações, portanto,
uma crise humana (DOMENACH, 1969).
Ao olhar para experiência da fundação e manutenção da Revista Esprit, a qual
Mounier associa seu destino, pois sua animação e os contatos decorrentes dela,
revelarão seu estilo pessoal. Guy Coq afirmará que poucos intelectuais do século XX
evocam a figura de Sócrates como Mounier, por meio de sua perspectiva e prática do
diálogo. Tal diálogo visa a aproximação entre o ser, o pensamento e a ação, esforço
realizado por Sócrates anteriormente:
Esprit é a condição de uma abertura aos outros, e antes do mais ao coletivo
da redação; é também o desafio de uma inscrição do pensamento na vida
pública, atribuindo sempre prioridade ao diálogo. A tal ponto que os amigos
recordarão uma característica sua: a presença (COQ, 2012, p. 20).
Observa-se que não se fala de uma Revista simplesmente, mas de um
movimento, não de caráter partidário político e nem mesmo como revista de inspiração
católica, mas um espaço onde cruzam-se valores e para o qual o plano espiritual
converge. A Revista não tem importância em si, mas caracteriza-se como um
empenho, esforço de veiculação das reflexões do movimento e uma via de
engajamento social.
Mesmo com o movimento desenvolvido com Esprit, de forte identidade política,
e com a aproximação da chamada “Terceira força”, liderada por Georges Izard,
Mounier nunca permitiu que os mais altos valores espirituais fossem apagados.
Quando existia uma tendência de suas associações tornarem-se desprovidas dessa
perspectiva, ele estabelecia a ruptura.
Mounier expressa sua lúcida consciência acerca desse postulado de seu
movimento, a presença do espiritual, num texto escrito em setembro de 1933
intitulado, “Mounier e sua geração”, no qual afirma: “Uma ação que não se alimenta a
25
si mesma continuamente, na substância desta meditação, que é uma vida interior,
perde sua alma e a dos outros” (MOIX, 1968, p.15).
Nos anos entre 1936 e 1939 Esprit tecerá duras críticas às agressões feitas
pela política hitleriana, veladas por meio da solicitação de revisão do Tratado de
Versalhes, bem como ao totalitarismo que se espalha pela Europa. Somado ao
esforço de Esprit, um periódico bimenstral “Le Voltiguer” (animado por Jacques
Madaule), são instrumentos de incidência sobre a opinião pública. Denunciam
especialmente o racismo e o antissemitismo, assim como o pré-facismo francês
(COQ, 2012).
Na sequência das críticas ao totalitarismo presentes em Esprit tem-se mais sete
números publicados, até a invasão de Hitler na União Soviética. Nesses números
denuncia-se e condena-se a colaboração de Pétian e o estabelecimento da França de
Vichy6 e a perseguição aos judeus. Mas acredita na continuidade de Revista, mesmo
sob sua censura, o que de fato ocorre.
Publicam-se outros dez números da Revista entre novembro de 1940 e agosto
de 1941. Seu limite se dá quando Mounier publica, sob a aparência de um conto para
crianças, em julho de 1941, um texto de Marc Beigbeder intitulado: “Suplemento às
Memórias de um Burro”. O “Burro” era Pétian submetido a Hitler, e a revista foi
interditada no mês seguinte (MOIX, 1968).
O breve aceno realizado sobre traços biográficos de Mounier, especialmente
no que diz respeito a seus empenhos junto a Esprit7, e os que serão verificados
posteriormente, fazem sentido, pois assim se observa que a história do personalismo
não se ateve às reflexões em âmbito estritamente teórico-racional, mas direcionou-se
à realidade existencial, engajada.
Sua abertura ao ser humano foi acompanhada de sua abertura aos eventos
históricos, marcados por aspectos sócio-político-econômico-cultural. Torna-se um
equívoco tratar de Mounier e do Personalismo prescindindo do seu envolvimento com
6 Título dado ao governo francês do período 1940-1944, acusado de ser governo submetido ao nazismo de Hitler. Tinha por Primeiro Ministro Phillippe Pétian e depois chefe de Estado. Recebe esse nome por Vichy ter sido estabelecida como capital do Estado Frnacês durante a dominação nazista. 7 A Revista Esprit, com Mounier ainda em vida, alcançara a tiragem de quinze a dezenove mil exemplares. Circulando em muitas cidade e Universidades da França, bem como em países como: Bélgica, Itália, Espanha e Portugal, assim como nas Américas, Norte e Sul. A revista e o movimento intelectual em torno do personalismo influenciou muitas democracias populares.
26
a realidade que o circundava (SEVERINO, 1974). E é também considerando a
realidade que circunda o ser humano que Mounier proporá um caminho de
interpretação da pessoa humana.
De antemão, este aspecto já se caracteriza como uma primeira contribuição do
pensamento personalista de Mounier, emergente de sua história pessoal, e para as
pretensões dessa pesquisa, a saber: problematizar ou sintetizar a reflexão teórica, a
prática e a qualidade daquele que a vive. Tal afirmação só é possível, do ponto de
vista da sistematização teórica, por encontrar-se no engajamento de vida do próprio
Mounier a sensibilidade e a vivência do drama humano.
Considerando o caráter filosófico, que procura respostas à busca incessante do
ser humano em dar sentido à sua existência, vê-se no personalismo uma reflexão,
que visa esclarecer o destino do ser humano e também sua situação real, com o fim
de orientá-lo para novas perspectivas e juízos normativos, caracterizando-se assim,
como pensamento filosófico (SEVERINO, 1974).
Mounier, como observado por João Bernard da Costa, no prefácio da primeira
edição de “O Personalismo”, não hesitou em sacrificar a filosofia a uma obra que será
construída e na própria ação dessa construção se perfaz continuamente. O pensador
que vai ao fundo da ação para vinculá-la à meditação, cujas reflexões particularmente
expressam-se em seus empenhos de organização e produção da Revista Esprit
(MOUNIER, 2004).
A pessoa, a comunidade, a encarnação, o engajamento (compromisso), o outro,
são os principais temas do empenho personalista de Emmanuel Mounier. Embora
provando de um sentido de inacabada, sua obra tem nessas questões as bases para
uma elaboração filosófica consistente. Paul Ricoeur, após a morte de Mounier, em
uma publicação de dezembro de 1950 na Revista Esprit com o título “Mounier
Filósofo”, afirma: “Matriz filosófica” ao se referir às suas primeiras contribuições em
relação as da maturidade de seu pensamento (COQ, 2012).
Metodologicamente, a sua filosofia nunca foi ponto de chegada, isto é, nunca
pretendeu esgotar-se em si. A filosofia personalista, como entendera e vivenciara seu
fundador, sempre foi ponto de partida e é no encontro com o ser humano, na escrita
de sua própria história e na fidelidade `a sua vocação. Como homem da praxis, e, só
assim, é que se pode apreendê-lo (MOUNIER, 2004).
27
No entanto, mesmo que se caracterize como uma proposta à realização do ser
humano enquanto pessoa, tais orientações, perspectivas e juízos normativos não
ganham estatutos rígidos e importantes por si mesmos, sempre, antes de tudo, afirma-
se o primado da pessoa como centro dessa reflexão e engajamento:
Chamamos personalista a toda a doutrina, a toda a civilização que afirme o
primado da pessoa humana sobre as necessidades materiais e sobre os
sistemas coletivos que sustentam o seu desenvolvimento (MOUNIER, 1967, p.
9).
Mounier não pretendera constituir uma escola filosófica ou de outro
ordenamento, nem mesmo um sistema fechado, que se arrogasse o direito de definir
a pessoa humana. Ele esteve sempre interessado em questionar e refletir sobre as
condições básicas necessárias para sua manifestação e, por conseguinte, a
realização do ser humano em seu universo pessoal.
Assumir qualquer tipo de “bandeira” ou ideologia e não torná-la concreta no
cotidiano é enfraquecê-la e enfraquecer-se, pois o engajamento cotidiano das ações
também fortalece o vivente e a proposta outrora assumida como ideal de vida
qualificando dessa forma ambos:
Quando já não tivermos possibilidades de sucesso, resta-nos testemunhar.
Não se perde a vida daqueles que souberam dar largo testemunho.
Conhecemos a fragilidade de nossas forças e do sucesso, mas conhecemos
também a grandeza do nosso testemunho. Eis porque conduzimos sem
hesitação a nossa tarefa na certeza da nossa juventude (MOUNIER, 2004, p.
12).
A tensão abordada em torno da elaboração de Mounier é correspondente a uma
determinada crítica realizada à sua abordagem filosófica, bastante distinta da
chamada filosofia tradicional e muito mais inclinada a uma perspectiva existencialista.
Portanto, muito mais voltada ao ser humano em si. Os princípios fundamentais do
Personalismo são correspondentes às do universo pessoal (SEVERINO, 1974). Para
Moix,
O Personalismo é uma filosofia da existência, antes de ser uma filosofia da
essência. Personalismo e existencialismo não começam por uma teoria do
conhecimento que trataria do homem como um ser impessoal. Um e outro
pensam que para conhecer o homem é preciso antes de tudo existir
plenamente (MOIX, 1968, p. 199).
28
A terminologia universo pessoal é bastante valiosa. Ao usar a analogia do
universo para expressar o desenvolvimento do ser humano em seu ápice, a saber, a
pessoa, Mounier evidencia a complexidade da emersão desse estado, bem como a
ideia da diversidade de elementos que a constituem. Para aprofundar tal acepção
mounieriana torna-se oportuno apresentar nesse momento o seu olhar acerca da
natureza e condição humana.
1.1 A NOÇÃO DE NATUREZA HUMANA E DE CONDIÇÃO HUMANA
A noção de Natureza humana é a mais comum entre as tentativas de definição
e entendimento sobre o fundamento ou o que é mais elementar ao ser humano.
Carrega consigo a marca do “essencialismo”, própria do período pré-socrático, da
filosofia grega clássica, da patrística e de representantes do período escolástico.
Compreende que há no ser a presença de algo permanente, imutável em sua
constituição, sugerindo assim, uma experiência fixista, pré-determinada da vida
humana (REALE, 1990).
Emmanuel Mounier prefere tratar aquilo que seria o mais genuíno no ser
humano, o mais característico de si, como “condição humana”, à terminologia
natureza humana. Indubitavelmente essa proposição sugere o estabelecimento de um
paradigma diferente acerca de sua percepção sobre o ser humano (MOUNIER, 1967).
A interpretação de Mounier sobre a condição humana oferece menos rigidez,
maior flexibilidade para a realização de uma aproximação do que se pode entender
do ser humano. Não se pretende assim o estabelecimento de uma definição rígida,
imutável, pois o mesmo ser humano não abriga em si tal condição.
Porém, não é possível ignorar que haja entre os seres humanos algo que nos
aproxima de tal modo que se pressuponha a existência de um elemento universal,
comumente conceituado como natureza. Novamente em Severino,
Por natureza, Mounier entende todos os elementos de condicionamento que
confinam o modo de existência da corporeidade: natureza material,
inconsciente psicológico, participações sociais não personalizadas [...] o
homem não é um espírito caído no mundo, não está aqui preso ou exilado,
como num túmulo provisório, tal como a ressonância platônica da consciência
humana ecoa através dos tempos (SEVERINO, 1974, p. 46).
29
A crítica de Mounier, como bem observa Severino, não está relacionada à
natureza ontológica, mas à tentativa de limitar a meras expressões do seu ser as
possibilidades de realização do ser humano, que constantemente se reinventa:
sua crítica não é contra o fundamento ontológico da natureza humana [...] no
entanto, não sendo a pessoa um objeto bem circunscrito que se possa
facilmente apreender, e sobretudo sendo o homem um ser que é também
aquilo que ele próprio se faz, uma noção fixista e estética da natureza humana
negligência os mais ricos elementos constitutivos da pessoa. Ademais, o que
Mounier visa é ‘o modo propriamente humano de existência’. Mas a realidade
desta existência é um equilíbrio a ser constantemente readquirido, a ser
sempre formado durante a experiência da vida. O que se constrói dificilmente
se define estaticamente (SEVERINO, 1974, pp. 32-33).
O esforço personalista de interpretação do ser humano, prevendo o estado de
indivíduo e de pessoa, direciona-se mais a evidenciar os elementos de sua
manifestação, emersão, do que em adquirir uma definição de pessoa, pois, como é
constituinte de si mesma, a contenção de sua realização a parâmetros inflexíveis
deporia contra sua própria liberdade de emersão, reduzindo-a.
O termo reduzir, em relação a limitar, apresenta-se mais didático para o melhor
entendimento da dinâmica da emersão da pessoa. Dizer que a rigidez limita sua
manifestação seria ignorar que realmente há limitações. As limitações existem e estão
relacionadas às condições sociais, históricas, da própria condição humana. Porém,
não a reduz, não sintetiza sua potencialidade de manifestação.
A emersão da pessoa se dá por um exercício dialético, numa constante
conversão do interior para o exterior e vice-versa. Pela aceitação do real e pelo
empenho em atos criadores, que evocam o sentido de transcendência presente em
todo existente humano:
Mobilidade e permanência, unidade virtual do tempo e do espaço,
determinação e finalidade, tais as condições mais gerais que têm igual direito
no interior de uma noção mais completa do ser humano. Nem pura
espontaneidade, nem pura imobilidade. O homem não se constitui tal qual um
bloco pré-formado que apenas desenvolveria suas potencialidades
predeterminadas no decorrer de sua existência; contudo não é também pura
autodeterminabilidade, simples criatividade delirante. ‘o absoluto humano é a
totalidade da história do homem’ (SEVERINO, 1974, p. 33).
30
Inicialmente, as considerações de Mounier sobre a condição humana parecem
contraditórias, pois acaba sendo predominante a tendência a demasiadas
polarizações. A perspectiva personalista não é de polarização, mas de integração dos
elementos constituintes do ser humano. Nesse caso, deve-se admitir algo de
permanente e impermanente a ser integrados como esforço primeiro de realização
humana.
Isso expressa-se bem na circunscrição mounieriana acerca da distinção entre
indivíduo e pessoa, dispersão e unidade, isolamento e abertura, passividade e atos
criadores, respectivamente atribuídos.
1.2. A PESSOA E O INDIVÍDUO
Mounier, no início de sua obra O Personalismo, faz uma leitura acerca da
evolução da noção de pessoa para depois apresentar a construção de sua própria
concepção. Optou-se nesse subtítulo, em primeiro lugar, tecer um comentário acerca
do “não ser”, isto é, a contrapartida mais direta do estado de Pessoa, para depois
evidenciá-la. Tal opção relaciona-se com uma metodologia de caráter maiêutico8
como tentativa de despertar o questionamento no lugar da leitura passiva e irreflexa.
De modo geral, atitudes individualistas são reconhecidamente ações de
fechamento. As pessoas, mais comumente, esperam encontrar abertura,
receptividade no outro. Estar fechado em si não sugere algo equivalente ao
desenvolvimento do ser humano, mas próprio daquele que está estagnado, que optou
por isolar-se, romper com o todo.
Contudo, se a realidade não se mostra caracterizada por atos criadores e de
desenvolvimento do ser humano, como parece ser aquela contemporânea, como
podem estar em voga e serem praticado por pessoas e mesmo instituições? A que
apelo respondem? São oriundos de que mentalidade e ideologia? Respondem a quais
pretensões? Mounier localiza no ideal burguês o berço de tal mentalidade:
O individualismo é um sistema de costumes, de sentimentos, de ideais e de
instituições que organiza o indivíduo partindo de atitudes de isolamento e de
defesa. Foi a ideologia e a estrutura dominante da sociedade burguesa
8 A arte da parteira. Em Teeteto de Platão, Sócrates, o protagonista dos diálogos de Platão, compara
seus ensinamentos a essa arte, pois consiste em dar à luz conhecimentos que se formam na mente de seus discípulos. (ABBGNANNO, 2007. p. 637).
31
ocidental entre o século XVIII e o século XIX. Homem abstrato, sem vínculos
nem comunidades naturais, deus supremo no centro de uma liberdade sem
direção nem medida, sempre pronto ao olhar os outros com desconfiança,
cálculo ou reivindicações; instituições reduzidas a assegurar a instalação de
todos estes egoísmos, ou o seu melhor rendimento pelas associações viradas
para o lucro; eis a forma de civilização que vemos agonizar, sem dúvida uma
das mais pobres que a história jamais conheceu. É a própria antítese do
personalismo e o seu mais direto adversário (MOUNIER, 2004, pp. 44).
O que Mounier chama de homem abstrato está relacionado ao homem
desencarnado, distantes da luta solidária dos dramas humanos, fechado em si,
desprovido do sentido e vivência da alteridade, preocupado em assegurar o
atendimento de suas próprias necessidades, portanto, anticomunitário.
A perspectiva e efetivação de uma vida marcada pelo individualismo, pelo
fechamento de si é uma possibilidade do indivíduo. Tal perspectiva está presente na
vida humana e sua contraposição está diretamente relacionada ao processo de
personalização, isto é, de humanização da humanidade: “A pessoa é domínio e
escolha, é generosidade” (MOUNIER, 1967, p. 88). O esforço personalista está em
promover uma luta contra a experiência humana de fechamento em si mesmo.
Personalismo e individualismo estão em contraposição direta. Lançar-se nas largas
perspectivas abertas da existência humana, eis a dinâmica proposta pelo
Personalismo (MOUNIER, 2004).
A contraposição anunciada entre o indivíduo e a pessoa, não é, porém
simplesmente negação do primeiro. Há uma tensão estabelecida entre ambos estados
da existência humana, que a dinamiza e a lança à frente, ou a estagna a depender da
escolha feita. O estado de pessoa não se alcança em definitivo, de uma vez por todas.
Pode-se entender como um movimento de superação de si, no sentido de si mesmo,
num esforço de unificação nunca acabado, sempre em pauta, sempre em questão, de
inconformidade, de superação de si mesmo em direção ao outro, na constituição de
pessoa pela relação constante com o outro. Superação, transcendência de si para si,
isto é, unificação de si (COQ, 2012).
Mounier em momento algum pretendeu apresentar uma definição para pessoa.
Negou-se a isso por sua contraposição à rigidez e aos determinismos. Esforçar-se-á
para oferecer parâmetros para sua emersão, concretização. Sem desconsiderar esse
32
esforço elabora um apanhado de elementos que contempla sua acepção sobre a
pessoa:
Uma pessoa é um ser espiritual constituído como tal por um modo de
subsistência e de independência no seu ser; ela alimenta essa subsistência por
uma adesão a uma hierarquia de valores livremente adaptados, assimilados e
vividos por uma tomada de posição responsável e uma constante conversão;
deste modo unifica ela toda a sua atividade na liberdade e desenvolve, por
acréscimo, mediante atos criadores, a singularidade da sua vocação (...)
revela-se, no entanto, através de uma experiência decisiva, proposta à
liberdade de cada um, não da experiência imediata de uma subsistência, mas
da experiência progressiva de uma vida, a vida pessoal (MOUNIER, 1967, p.
84).
O primeiro aspecto a ser explorado na acepção de pessoa proposta por Mounier
é a independência presente na pessoa. Independente no seu ser, e nessa
independência livremente estabelece, assume e vive uma hierarquia de valores. A
adesão a essa hierarquia não tem caráter rígido, pois em constante conversão. A
tomada de decisão livre é pressuposto sem o qual não pode existir a realização da
pessoa humana. Na liberdade o ser se manifesta: "A pessoa se faz livre depois de ter
escolhido ser livre" (COQ, 2012, p. 43), trata-se do modo mais genuíno de ser pessoa.
Da escolha em ser livre emana a exigência do engajamento, da ação.
Nestes termos, a liberdade da pessoa transcende até mesmo as suas
condições imanentes, transcende até mesmo a sujeição ao espaço e ao tempo: "A
liberdade não é o ser da pessoa, mas o modo como a pessoa é tudo o que é, e o é
mais em plenitude do que por necessidade" (COQ, 2012, p.43). A liberdade anuncia-
se como necessidade, e decisão universal em relação aos seres humanos. No
entanto, não se realiza univocamente, numa experiência de uniformização,
universalmente da mesma maneira, respeitando como que uma predestinação, uma
programação estabelecida previamente. O único estabelecimento prévio nesse
contexto é a necessidade da própria liberdade. A cada pessoa é dada, por sua
condição humana, o imperativo de ser e constituir-se livre. O ato de ser livre é
longitudinal, não é imediato, não se adquire da noite para o dia, mas ao longo da vida
corroborado pela ação, pela vivência dos valores assumidos. Trata-se da vida em
conformidade com seus apelos mais genuínos (COQ, 2012).
Comentando a obra de Mounier, intitulada "O Personalismo", Severino Antônio
afirma: "a pessoa revelar-se-á então como ‘uma atividade vivida de autocriação, de
33
comunicação e de adesão, que se apreende e se conhece em seu ato, como
movimento de personalização" (SEVERINO, 1974, p. 35). Eis assim a constatação da
exigência de conversão constante observada na pessoa.
O questionamento acerca de uma espécie de anarquia da e na realização
humana pode parecer legítimo nesse momento, ao ponto de que os parâmetros para
a realização da pessoa humana, segundo Mounier, poderiam restringirem-se à
elaboração e adesão `a sua própria hierarquia de valores, sugerindo até mesmo a
negação do outro. Mas, como visto anteriormente, a singularidade da realização da
pessoa nada tem a ver com o individualismo. O individualismo é próprio do indivíduo.
Como o próprio Mounier afirma, a necessidade de alteridade e de comunicação
estabelece-se como um imperativo da própria realização do eu, portanto da pessoa:
A experiência primitiva da pessoa é a experiência da segunda pessoa. O tu e, adentro dele, o nós, precede o eu, ou pelo menos acompanha-o. (...) Do mesmo modo que o filósofo que começa por se encerrar no pensamento nunca encontrará uma saída para o ser, assim aquele que começa por se encerrar no eu nunca encontrará o caminho para os outros. Quando a comunicação enfraquece ou se corrompe perco-me profundamente eu próprio (MOUNIER, 2014, p. 46).
O comentário de Mounier sobre a comunicação, referenciando as perspectivas
de Martin Buber e Gabriel Marcel, que foram seus contemporâneos, explicita a
necessidade que a pessoa tem do outro para a realização de si mesma. Não como
numa instrumentalização, mas como reconhecimento da contribuição do outro na
constituição de si mesmo. Receber e ofertar-se é saudável e reconhecido caminho de
realização da pessoa. Consequentemente, pode-se entender que a qualidade de uma
pessoa também pode ser mensurada e percebida pela qualidade da relação que ela
estabelece com os outros. Da relação de aversão à de autêntica comunicação
observa-se e qualifica-se a realização da pessoa. Quanto mais fechado em si, mais
disperso, incompleto. Quanto mais aberto mais integrado, realizado.
A relação interpessoal é entendida por Mounier como que um Cógito relativo,
isto é, um Cógito gerado da relação entre o eu e o tu que torna cada vez mais cônscios
de si os envolvidos na relação. É a relação entre dois sujeitos de significação e não
simplesmente entre um sujeito e um objeto. É a atitude de disponibilidade, de abertura
de si, de confiança e de acolhida do outro (MOUNIER, 1963). A autêntica comunicação
é condição sine qua non para a emersão da pessoa humana. Ela provoca em cada
34
ser humano o esforço de sair de si próprio, lutar contra o egocentrismo e o narcisismo.
Para tanto, provoca o indivíduo a abrir-se à acolhida de pontos de vista diferentes dos
seus, oportunizando a experiência de empatia, esforçando-se assim para a vivência
da generosidade, da gratuidade em seus atos (MOUNIER, 2004)
Afirma-se aqui a capacidade humana de comprometer-se com os outros, com
demandas que vão para além de si e evocam um despojamento de si em favor dos
outros. É um ato de empenhar-se, engajar-se, acessa-se ao estado nuclear de si
mesmo, uno, pois destinado a comunhão consigo e com o outro.
O primeiro movimento que, na primeira infância, revela o ser humano é o movimento para outrem [...] pela experiência interior a pessoa surge-nos como uma presença voltada para o mundo e para as outras pessoas, sem limites, misturadas com elas uma perspectiva de universalidade. As outras pessoas não a limitam, fazem-na ser e crescer (MOUNIER, 2004, p. 46).
No lançar-se e empenhar-se em causas externas a si, em benefício do outro,
a pessoa emerge. Mounier, opondo-se ao homem burguês, seguro e entregue ao
bem-estar, afirma: "que o homem do conforto é o animal doméstico, dos objetos do
seu conforto, o homem reduzido à sua função produtora ou social é uma peça numa
engrenagem" (MOUNIER, 2004, p. 37). A crítica mounieriana está intimamente
relacionada à vida individualista própria do modo de vida capitalista, reduzido, muitas
vezes, ao anseio de consumo e ao cumprimento de ditames da indústria cultural, da
moda, do mercado, desengajado e alheio a dedicação ao outro e, quiçá, de questões
relacionadas ao bem comum.
A dedicação em evidenciar os elementos que constituem a pessoa humana sob
o ponto de vista personalista demonstram a dificuldade de abarcá-la e defini-la,
pretensão que, como já afirmado, Mounier nunca se arrogou o direito. Essa dificuldade
se dá pelo fato da pessoa ser, antes de tudo presença, presença ativa e de profunda
extensão. A presença ativa e extensa incorre novamente no apelo de engajamento do
ser humano, em hipótese alguma como uma fuga, de uma experiência de retirada da
realidade, pelo contrário, é na historicidade da vida em suas atividades que se
oportunizará a síntese expressiva do universo pessoal.
Como observado, no início da primeira parte desse trabalho, os diversos
empenhos e diálogos criados por Mounier para a fundação e manutenção da Revista
Esprit, bem como em manter vivo o movimento decorrente dessa fundação, não pelo
35
valor em si de ambos, mas obrigado pelo imperativo do dever de anunciar o primado
da pessoa sobre todas as coisas, fazem parte, na pessoa dele da síntese e
manifestação de seu universo pessoal. Ao desenvolver a conceituação de universo
pessoal Mounier recordará que “sendo a existência de pessoas livres e criadoras sua
afirmação central [...] a um dado de imprevisibilidade [...] a pessoa não é objeto [...]
antes, é exatamente aquilo que em cada homem não é passível de ser tratado como
objeto” (MOUNIER, 2004, p.15).
Mais uma vez recorda-se aqui a dificuldade e a resistência de Mounier em
relação a definições. Do universo pessoal pode-se falar inicialmente de sua grande
extensão pela analogia no uso do termo “universo”, bem como a diversidade de
expressões, nele inserido, e, ainda, a especificidade de ser pessoal. O
enquadramento, a especialização, a mecanização, o individualismo, uma espécie de
totalitarismo moderno, é a própria antítese do Universo Pessoal, pois nele “tudo é
regulado, nada se cria, nada corre aí o risco de uma liberdade responsável. Faz da
humanidade uma imensa e perfeita casa de bonecas” (MOUNIER, 2004, p.15).
Decorrente dessas afirmações, metodologicamente apofáticas, pois partem do
que não é para afirmar o que é o universo pessoal, extrai-se elementos indispensáveis
para seu entendimento. Há nele: um dado de imprevisibilidade; a liberdade; a
capacidade criadora; a adesão; a comunicação; o engajamento; a historicidade:
Sendo os recursos da pessoa indefinidos, nada do que a exprime a esgota,
nada do que a condiciona a escraviza [...] é uma atividade vivida de auto-
criação, de comunicação e de adesão, que em ato, como movimento de
personalização, alcançamos e conhecemos. A uma tal experiência ninguém
pode ser condicionado, nem constrangido. Aqueles que mais integralmente a
realiza vão atraindo outros à sua roda, despertam os que dormem, e assim, de
apelo em apelo, a humanidade vai-se libertando do pesado sono em que
vegetava e que ainda a amortece (MOUNIER, 2004, p.16).
Nesse movimento de personalização o ser humano é chamado a assumir sua
existência incorporada, transcender sua natureza, viver de maneira encarnada, a
transformar a natureza personalizando-a, estabelecer comunidade, colocar-se em
estado de constante conversão, viver a dialética da interioridade e objetividade, viver
o engajamento, a ruptura e a reviravolta, tudo na liberdade e adesão aos valores
assumidos (MOUNIER, 2004).
36
A corporeidade humana, realidade constituinte do seu ser, está intimamente
ligada à historicidade, que por sua vez também não esgota o ser da pessoa. Nela e
em suas outras dimensões a pessoa não pode ser apreendida, constatada, mas
simplesmente reconhecida, ou mesmo ainda saudada (MOUNIER, 2004). Em
Severino, encontramos que: “O destino da pessoa é um destino espacial e temporal.
Nem um só de seus atos é talhado fora deste estofo extenso e durável, do qual o
pensamento moderno é levado a pensar ser o único tecido de nossa existência”
(SEVERINO, 1974, p.50).
O cultivo da interioridade, pela meditação, pelo estudo, por exemplo,
dificilmente pode ser mensurado se não há uma expressão externa dele. A
exteriorização, mesmo que por meio de atos de comprometimento com o outro,
acabam, e são também limitados para expressar a totalidade desse mesmo cultivo.
Por isso, faz todo sentido não reduzir aos atos exteriores ou à historicidade, muito
afirmada pelos marxistas, os dados suficientes para interpretar a pessoa humana. A
existência humana e a emersão da pessoa são forjadas na história, mas não
exclusivamente nela. Resgata-se aqui o potencial de transcendência, também
elemento constituinte do ser humano, como outrora observado. Não se nega a
pertença e indispensabilidade do mundo concreto, histórico, mas sua evidenciação da
pessoa não se constitui apenas dele. A pessoa é dotada do potencial de
transcendência do natural e cultural. O ato transcendental da pessoa é a capacidade
de captar e vivenciar valores que rompem até mesmo com os valores de sua época,
não como simples negação deles, mas como atos criadores de consciência e
liberdade fundamentais para sua realização (SEVERINO, 1974).
Em relação a essa oposição aos valores vigentes de determinada época, pode-
se usar a contraposição concreta ao estilo de vida burguês capitalista realizada por
Mounier ao longo da sua vida. Pela vida simples e pelo empenho em manter viva
Esprit, em seu teor filosófico, político e cristão, que em nada comungavam com tal
perspectiva de vida, se tem bem um ato de transcendência. A vida, do ponto de vista
personalista, para ele, precisa estar como que atravessada na garganta da
mentalidade capitalista, como espinho na carne. Estabelecer-se como resistência, que
anime associações, amizades, e estabeleça uma sociedade na sociedade, isto é, um
modo de vida evidentemente regido por outros valores em relação aos vigentes,
37
valores esses sempre pautados no primado da pessoa (DOMENACH, 1969).
Acompanhando Severino,
O ambiente familiar exerce considerável papel no emaranhado dos pontos de encarnação da pessoa no natural e no cultural. A família ‘é mesmo o dado social mais inelutável’. Igualmente é ‘o meio mais permanente de todos’. Nada mais importante na história do aparecer e do desenvolver humano do que estas confluências de relações intersubjetivas nucleares (...) alargando as zonas da intersubjetividade, novas camadas sociais surgem no acontecer da existência pessoal. Destes meios sociais alargados também se oriundam poderosas influências que atuam sobre a ‘qualidade’ do ser pessoal” (SEVERINO, 1974, p. 53).
Eis aqui um ponto bastante problemático para o contexto social
contemporâneo: a crise da família. A voz do Personalismo mais uma vez se anuncia
profética, pois afirma a importância das relações nucleares primeiras, que, por sua
herança e posicionamento nos fundamentos cristãos, desenvolvem-se na família.
Essa valorização da família também se torna um valor diferenciado aos vigentes na
contemporaneidade, valor e experiência da qual o personalista não deixará de afirmar
como indispensável para uma encarnação autêntica. Apesar de não ser objeto direto
dessa pesquisa, mas por estar relacionado ao desenvolvimento dos jovens, sujeitos
mais diretos dessa pesquisa, alguns elementos mais contemporâneos da crise familiar
podem ser observados. A exortação Apostólica Pós-Sinodal Amoris Laetitia (AL), do
Papa Francisco, que recolhe as contribuições do primeiro e do segundo Sínodo da
família, realizados no Vaticano em outubro de 2014 e de 2015 com os temas: “Os
desafios pastorais sobre a família no contexto de evangelização” e “A vocação e a
missão da família na Igreja e no mundo contemporâneo”, respectivamente.
Inicialmente os temas apresentados sugerem um olhar para o interior das
famílias num contexto de Igreja. Contrariamente, as contribuições são bastante
pertinentes, especialmente em apontar elementos que constituem a dinâmica da vida
familiar contemporânea em suas particularidades, características e desafios.
No capítulo II da Exortação encontram-se elencados fenômenos antropológico-
culturais que ajudam a retratar com um pouco mais de precisão a experiência das
famílias no mundo hodierno e tais fenômenos se contrapõe a perspectiva e prática da
aquisição do estado de pessoa proposto pelo Personalismo de Mounier. Destacar-se-
ão alguns, abaixo:
38
- As tensões provocadas por uma cultura exageradamente individualista e a
fruição acabam por gerar experiência de impaciência e agressividade (AL n.32).
- As relações do tipo passageiras, pautadas numa perspectiva narcisista, que
buscam ocupar o tempo livre e não fomentam o compromisso acabam por promover
a solidão (AL n.39).
- A promoção e acentuação de uma mentalidade anti-natalista, o avanço das
biotecnologias, muitas vezes seletivas, o estilo de vida do “bem estar” são elementos
que dissuadiram as pessoas a terem filhos como forma de afirmação de sua liberdade
(AL n. 42).
- A dificuldade do ponto de vista da organização social, da crise demográfica às
dificuldades educativas, da fadiga frente a vida nova ao peso do idoso (AL n. 43)
- A falta de habitação e condições mais estáveis de desenvolvimento da vida
como fator de adiamento da formalização de uniões duradouras. “A família tem direito
a uma habitação condigna, apropriada para a vida familiar e proporcional ao número
dos seus membros, num ambiente fisicamente sadio que proporcione os serviços
básicos para a vida da família e da comunidade” (AL n.44).
- As guerras, o terrorismo, o crime organizado, o crescente número de meninos
de rua, abuso sexual de menores, são fatores de deterioração da família (AL n.45).
- O machismo, propulsor de inúmeros tipos de violência contra a mulher e a
família e negadora da verdade sobre a igual dignidade que o homem e a mulher
possuem e, ainda o fato de que a mulher impele a alegrar um estilo familiar mais
democrático, mais participativo, que respeita e contempla as diferenças (AL n.54).
Os fatores apresentados não expressam todas as questões que influenciam e
envolve a crise contemporânea da família, mas são expressão de um agir humano
promotor de desintegração de si, portanto, alinhado com a perspectiva do indivíduo,
disperso, confuso, individualista, egocêntrico.
Na crítica Personalista sobre a fragilidade dessa experiência humana não se
pretende, porém, fazer nenhum tipo de enquadramento a qualquer que seja o modelo
de família estabelecido a partir de elementos socioculturais contemporâneos. As
considerações acima mencionadas têm relação direta ao contexto sócio-cultural-
religioso, que Mounier sempre defendeu e relidos no hoje da história evocam o desafio
39
de manter viva a dinâmica de ampliação da fronteira da intersubjetividade. Com seu
pensamento, nunca desejou absolutizar uma verdade que fosse universal, se o fizesse
negaria o respeito às especificidades do universo pessoal humano. O que se
pretende, portanto, é evidenciar a necessidade de relações nucleares minimamente
saudáveis e correspondentes à hierarquia de valores forjada por cada pessoa, desde
que respeite o primado da pessoa, a dimensão da alteridade e do compromisso com
o outro.
Mas como o pensamento personalista entende a dinâmica da relação com os
valores? Quais são os caminhos objetivados com sua vivência? Como a adesão aos
valores alimenta a subsistência da pessoa humana? As respostas a tais questões
podem evidenciar concretamente a importância dos valores para a filosofia de
Mounier.
Diferentemente de Max Scheler, Mounier acredita que os valores não são
realidades absolutas e abstratas. O contrário disso seria um completo contrassenso a
sua vivência concreta e profundamente marcada pelos acontecimentos de seu tempo,
não determinada por eles, mas em atenção a eles, para ser minimamente pertinente
em sua contribuição. Para ele:
Os valores são fonte inesgotável e viva de determinações, exuberância, apelo
irradiante: como tal revelam como que uma singularidade expansiva em uma
proximidade com o ser pessoal, mais primitiva do que deslizar para a
generalidade (...) tendem à incorporação num sujeito concreto, individual ou
coletivo (MOUNIER, 2004, p.88).
A vivência dos valores conduz o ser humano para a aproximação de sua
condição mais genuína, mais original, o estado de pessoa. Não o faz por meio de uma
“desencarnação”, “desconcretização”, desmaterialização da realidade na qual estão
envolvidos os seres humanos. Sua vivência não é abstrata, evoca mais uma vez o
pertencimento humano à historicidade e permanecendo também via de
transcendência dela. Mounier não aceita a apressada compreensão de que os valores
fazem parte de um mundo todo feito, já dado, realizado automaticamente na história.
Na coerente preocupação de preservação da liberdade humana, entende que os
valores são amadurecidos num ato pessoal. Dessa forma, é o ato de liberdade que os
revela (COQ, 2012). Nas palavras de Mounier:
40
Não se aplicam à realidade como princípios constituídos. Revelam-se nas
profundezas da liberdade, amadurecendo com o ato que os elege, aceitando
muitas vezes a humanidade de uma baixa origem – um interesse, até um
contra-senso – que, com o tempo, vai sendo purificada (...) daqui se infere
quanto é ambíguo afirmar ou negar a ‘subjetividade’ dos valores (MOUNIER,
2004, p. 89).
Respeitando a coerência interna em seu pensamento, que não tende a
absolutizar suas percepções, mas deixá-las abertas, não por ato de
irresponsabilidade, mas por respeito à capacidade humana dinamicamente criadora,
Mounier observa a ambiguidade presente na tentativa de enrijecimento da
conceituação acerca da subjetividade ou não dos valores. Os valores, continua:
Não podem, pois, ser confundidos com projeções do eu, que cedo se
esgotassem a sua modesta origem. São, ao contrário, o sinal de que a pessoa
não é realidade local e separada, amarrada à sua condição como cavalo na
cavalariça, mas pode dos limites da sua condição abarcar o universo e
indefinidamente aligeirar a laço que a ele a une. A pessoa é, pois,
definitivamente, movimento para um transpessoal, simultaneamente
anunciado pela existência da comunhão e da valorização (MOUNIER, 2004,
pp. 89-90).
Trata-se aqui do correto esforço de evidenciar o processo de personalização
dos valores. Ela acontece quando cada pessoa realiza a hierarquização dos valores,
livremente assumidos, vividos por uma tomada de decisão responsável. Observe-se
que tal hierarquização, mesmo que contenha elementos do contexto onde vive a
pessoa, deve ser realizada por ela mesma, livremente, para que seja possível o ato
de assumi-los responsavelmente para deles alimentar sua condição pessoal.
No entanto, a subjetividade dos valores na concepção mounieriana é uma
subjetividade dotada de intersubjetividade. A pessoal, em sua constituição
transpessoal, lança-se para fora de si em direção ao outro e ao ambiente onde vive.
Os valores mediatizam assim as relações intersubjetivas arrancado as pessoas da
solidão e abrindo-a a comunicação autêntica via do universal (COQ, 2012).
Não se pretende aqui fazer uma discussão sobre a natureza dos valores, mas
essa breve reflexão acerca deles pretender esclarecer que a dinâmica de sua
composição na vida concreta da pessoa deve respeitar, como outrora observado,
primado da pessoa, a dimensão da alteridade e do compromisso com o outro que
oportuniza a pessoa a experiência da renovação e fortalecimento de si e do outro pela
41
comunicação. Na abertura de si ao universal, pela comunicação, “a pessoa humana,
através de sua corporeidade e, com esta, em sua totalidade, acha-se em sintonia
profunda com esta natureza que a cerca misteriosamente” (SEVERINO, 1974, p. 50).
A comunicação, do ponto de vista de Mounier não se dá simplesmente entre duas
pessoas, mas também com tudo o que é criado e faz parte da natureza.
O ser humano em sua existência também é natureza, faz parte dela, dela
depende e a influencia. Tantos são os apelos contemporâneos para uma consciência
de relação respeitosa e durável no uso dos bens naturais que a contribuição
mounieriana torna-se bastante atual. Sua perspectiva de comunicação pode evocar
um sentido de pertencimento muito maior do que aquele de simples manutenção e
preservação. Essa atualização, que vai além das pretensões primeiras dessa
pesquisa, mas se presta bem para o entendimento do conceito, recupera a força da
historicidade como locus da descoberta dos valores, isto é, os valores só são
descobertos na vivência dos acontecimentos. Todos os seres humanos reagem aos
acontecimentos conforme seus valores, não se trata de reações automáticas, mas
elaboradas pelo menos dos pontos de vista racional, psíquica, social e
espiritualmente. Em Coq,
Os valores são, assim, sempre implicados na história, não é possível opor os
valores intemporais puros a uma realidade detestável e degradada [...] os
valores não existem como suplemento da história, mas sempre tomados
pelas amálgamas históricas; é na história que é preciso detectá-los e purifica-
los porque se encontram em estado puro, mas sempre ‘comprometidos’,
‘misturados’, ‘já alterados’. Só o engajamento pessoal poderá descobri-los
(COQ, 2012, p.69).
O relevo dado por Mounier e pelos personalistas à história tem aproximação
com o valor dado a ela pelos marxistas. Todavia, como observado anteriormente, a
pessoa não se encerra na história, se manifesta também por ela, mas não
exclusivamente por ela. Dessa forma, enquanto para o marxismo a história é
fundamento, para o personalismo ela é apenas mais um elemento constituinte da
síntese que todo ser humano é chamado a fazer para alcançar o estado de pessoa.
À pessoa, para que realize a unidade dos elementos de sua constituição, exige-
se uma atitude, eis, pois a principal atitude vivida e provocada por Mounier em todos
aqueles que com ele conviveram e colaboraram em seus empenhos, o engajamento,
também reconhecido como enfrentamento, compromisso (DOMENACH, 1969). Mais
42
uma vez propõe-se o retorno a elementos da história da Revista Esprit para melhor
entender ao menos dois elementos agentes no desenvolvimento da história da
pessoa, a saber: a constante conversão e o engajamento. O que a constante
conversão tem a ver com o engajamento? A primeira atitude proporcionou a Mounier
e a seu movimento viverem a segunda. Numa análise feita pelo próprio Mounier,
acerca desenvolvimento de Esprit, ele a observa tendo vivido cinco fases. A primeira
entre 1932-1934, classificada como doutrinária, a segunda entre 1934-1939, avaliada
como momento de engajamento, uma terceira, durante os meses de guerra, a quarta
um período de clandestinidade até 1944, a quinta, como naturalmente seria, pós-
guerra (COQ, 2012).
A avaliação realizada por Mounier demonstra bem o processo de conversão
elucidada na transição entre a primeira e a segunda fase da Revista. De dogmática
para engajada. E como visto anteriormente, nessa dissertação, seu engajamento foi
tal que provocou interdição e clandestinidade, pois de enfrentamento. Enfrentamento
que não pretende simplesmente convencer, mas contestar, não doutrinário,
portanto.O engajamento será para Mounier e seu movimento uma descoberta, não
algo dado, mas forjado pelo acontecimento. Trata-se de uma viragem filosófica, da
pretensão doutrinal do espiritual à resistência e contestação da “desordem
estabelecida”. Externamente os acontecimentos provocam a mudança e no interior do
movimento Landsberg será sua influência. Essa dupla perspectiva demonstra a
sempre deseja integridade em seus movimentos pessoais, sociais, comunitários
(MOIX, 1968).
Esse engajamento é vivido pela pessoa na sociedade. Mounier sempre
reconheceu e vivenciou a necessidade de ruptura para estabelecer uma dinâmica de
reviravolta em seu contexto social. Isso fora possível por meio de sua concepção
acerca da associação de pessoas, isto é, a partir de sua concepção sobre a
comunidade. Diferentemente da sociedade, a comunidade é entendida por ele como
uma pessoa de pessoas. A expressão “pessoa de pessoas” demonstra que nela todas
as condições necessária para a realização da pessoa estarão contempladas:
É na comunidade que a pessoa se afirma e se torna verdadeiramente ela
mesma. Ao mesmo tempo, a união entre pessoas nunca é uniformizadora,
negação de um ou de outro; a distância mantém-se, distância mais do que
43
exterioridade, distância que se torna possível a união. Já não se trata de uma
projeção do outro, de uma exterioridade infinita (COQ, 2012, p. 58).
Em total contraposição à dinâmica de individualismo, a comunidade por
definição e natureza, oferece as condições de realização da vocação de cada pessoa
e a comunhão entre as pessoas, condição de sua existência, e é resultante do sucesso
singular de cada um que a compõe. O contrário disso, o que comumente se observa
nas diversas associações na sociedade contemporânea e na do período de vida de
Mounier, ele chama de sociedades vitais. O adjetivo utilizado para nomeá-la deseja
expressar algo a que todos os indivíduos são vinculados, pelo anseio de
sobrevivência, não importando qual meio e a modalidade utilizados para isso:
economia, mercado, a tecnologia, o totalitarismo etc.
A ordem da pessoa surge-nos em sua tensão fundamental. É constituída por
um duplo movimento, aparentemente contraditório, e realmente dialético,
para uma afirmação de um absoluto pessoal que resiste a qualquer redução,
e para a edificação de uma unidade universal no mundo das pessoas [...] há
um mundo de pessoas (...) é preciso que entre elas haja uma qualquer
medida comum. Ao nosso tempo repugna a idéia de uma natureza humana
permanente, exatamente porque tomou consciência das possibilidades ainda
inexploradas da nossa condição (MOUNIER, 2004, p. 54)
A pessoa não se realiza fora da comunidade, por isso o constante apelo de
engajamento para o estabelecimento de uma ruptura, que oportunize uma
transformação da realidade, a fim de favorecer a realização da singularidade de cada
pessoa. A pessoa não é um ser de conformação. Dinâmica em sua condição sempre
buscará as condições ideais para sua realização. A realização do outro é, porém,
baliza de contenção de um suposto crescimento individualista.
A efetiva realização da comunidade é algo um tanto quanto restrito na
concepção de Mounier: “Desta (a plena comunidade pessoal), pelo menos na fase
atual de nossa experiência, só nos podemos aproximar, a dois, ou em reduzido grupo
de pessoas: casal, amizade, pequeno grupo de fiéis, de militantes” (MOUNIER, 2004,
p.54). Essa restrição anunciada parece estabelecer a inviabilidade desse projeto
frente a uma sociedade tão complexa como a contemporânea e mesmo a da primeira
metade do século XX, na qual vivera Mounier. Mas a comunidade é “pessoa de
pessoas”, isso garante-lhe a presença dos potenciais necessário para não ser
44
sectária, pois exige dela abertura, transcendência de si em direção ao outro como
condição para sua própria realização.
A exigência aqui é de abertura às especificidades dos outros. Esse é o único
espaço saudável para a realização do universo pessoal. A comunidade deve esforça-
se para estar aberta a humanidade inteira, a todo ser humano, a toda pessoa, pois,
“se cada homem não é o que a si próprio se faz, então não há humanidade, nem
história, nem comunidade” (MOUNIER, 2004, p. 51). A comunidade apresenta-se
como uma categoria de análise acerca da validade e empenho de diversas
associações humanas, que se arrogam o compromisso de favorecer o
desenvolvimento de ambientes onde o primado da pessoa possa ser contemplado e
vivenciado.
Será que a Igreja Católica Apostólica Romana na expressão da diversidade de
seus grupos é capaz de realizar a comunidade, ou é apenas mais um nicho de
sociedade vital? Com o objetivo de seguir com os caminhos dessa pesquisa e o
esforço de construção de uma resposta razoável a tal questionamento apresentar-se-
á agora algumas contribuições da Concílio Vaticano II, sua recepção na América
Latina e a concepção de Pastoral da Juventude com uma de suas expressões
ressignificadas.
45
PARTE II
A PASTORAL DA JUVENTUDE E A IGREJA
2.1 O CONCÍLIO ECUMÊNICO VATICANO II
A tradução brasileira das mensagens, discursos e decretos do Concílio
Vaticano II, apresenta uma inferência bastante interessante sobre esse evento
afirmando que ele ficaria marcado na história da Igreja e da sociedade, quer pelo
otimismo demonstrado em relação ao mundo, algo novo em matéria de Igreja, quer
pela visão de que a mudança nas expressões da fé se tornava uma urgência pastoral
(VATICANO II, 2007). Os elementos desenvolvidos nesse acontecimento, mais do que
uma simples página da história da Igreja, influenciaria e modificaria a maneira dela
pensar e se posicionar diante da pessoa humana e do mundo.
Torna-se necessário, para compreender melhor sua significatividade e alcance,
apresentar alguns desses elementos que conduziram a constatação do imperativo e
importância dele para a Igreja e para o mundo. Elencar-se-ão, de forma geral, algumas
contribuições de ordem histórico-sociológico-espiritual que influenciaram e
impulsionaram expressivamente a realização do Concílio.
2.1.1 O Concílio Ecumênico Vaticano II (1962-1965)
O período que antecede esse Concílio é marcado por grandes transformações
que afetaram a humanidade. A Revolução Industrial continuava a trazer inovações
que exigiam novas abordagens para sua compreensão. O modo capitalista de
produção, sustentado pela industrialização, se afirmava cada vez mais. Por meio
desse mesmo sistema criou-se um mercado mundial favorecendo a penetração
europeia em todos os países do mundo.
O regime democrático demonstrou-se incapaz tanto de integrar os
trabalhadores como de garantir-lhes seus direitos. Em decorrência disso surgem
diversas revoltas operárias e a revolução bolchevista e, com essa última, a União
Soviética (SOUZA, 2004; ALBERIGO, 1995). Em sequência histórica, depois da II
Grande Guerra, estabelece-se a mudança de paradigma de eurocêntrico a
policêntrico, isto é, mais global. Frente a esse contexto, o anúncio e a realização do
46
Concílio Vaticano II, foi expressão de um movimento de renovação entusiasmante. E
como observa Karl Rahner, foi o encontro de uma comunidade organizada, movida
por um só e mesmo intento, respeitada pelo seu chefe supremo, que agiu em
colaboração com os demais membros da hierarquia, configurando uma autêntica
colaboração mútua, entre o Sumo Pontífice e o colégio dos bispos. Por fim, realizado
na liberdade, na unidade e sob a assistência do Santo Espírito (RAHNER, 1966).
Essas se tornaram marcas importantes para a renovação proposta e promovida pelo
Concílio.
A Constituição Apostólica Humanae Salutis (HS) dada a 25 de dezembro de
1961 e pela qual se convoca oficialmente o Concílio lança as sementes e as
expectativas, bem como sugere o clima desse grande evento da Igreja no século XX:
Há quem não veja senão trevas envolvendo este mundo. Nós, pelo contrário, colocamos inteira e inabalável confiança no Salvador do gênero humano, que de maneira nenhuma abandona os seres humanos mortais por ele remidos. Preferimos ouvir Cristo nos chamar a atenção para (...) “os sinais dos tempos” (Mt 16,3), que em meio à escuridão deixam transparecer indícios inequívocos de uma era mais auspiciosa a Igreja e para o gênero humano (HS, 2007, p. 12).
Trata-se da tentativa de uma nova conscientização da Igreja acerca da
realidade que a circunda. E sob essa perspectiva o estabelecimento de uma nova
postura diante da humanidade e da sociedade moderna. Nesse impulso de renovação
não se admitiria mais espaço, na Igreja, para a condenação do desenvolvimento
social, científico e tecnológico. Haveria, pelo contrário, espaço para o diálogo com
todos os segmentos sociais no reconhecimento de que ela, “unida a Cristo é como
que o sacramento ou sinal e instrumento da união com Deus e da unidade de todo o
gênero humano.” (LG n. 1).
Os elementos aqui apresentados, de ordem histórico-sociais, têm por objetivo
situar a realização do Concílio como uma resposta, também às realidades sociais, se
contrapondo, assim, a uma perspectiva dual entre vida espiritual e vida material. Deve-
se dar relevância à ação do Espírito Santo nessa página da história da Igreja e da
humanidade. Há de se reconhecer nesse evento um fenômeno de caráter histórico-
espiritual, que não encontra explicação apenas em pressupostos “ideológicos” e
“sociológicos” da Igreja ou mesmo do mundo. Ele demonstrou que a fidelidade da
Igreja à sua própria história não está presa a um imobilismo (RAHNER, 1966).
47
Em definitivo, se lança na Igreja, pela força e a coragem de Ângelo Rocalli
(Papa João XXIII), a semente de seu aggiornamento, isto é, sua atualização, sua
inserção do mundo moderno, onde o cristianismo deveria se fazer presente e atuante
no lugar de uma postura equivocada e fechada frente à realidade social (SOUZA,
2004). Como forma de compreender as contribuições oferecidas pelo Concílio
Vaticano II realizar-se-á uma nota sobre a mentalidade presente em sua realização e
que o serviu como seu pano de fundo. Ela está expressa de maneira privilegiada nos
elementos teológicos influentes e decorrentes em sua realização. Para tanto, torna-se
de grande importância situar o Concílio em meio a tendências que influenciavam a
sociedade no período de sua convocação e realização.
O Concílio estava imerso num contexto teológico que abrigava a afirmação da
relação entre fé e razão, bem como a crise modernista, a emergência das teologias
protestantes do profundo, da palavra, do querigma e da história, o desenvolvimento
da teologia oriental, o forte desenvolvimento da doutrina social da Igreja e, por fim, a
tendência de uma posição dogmática mais situada no tempo e no espaço
(GONÇALVES, 2004). Existia, nesse contexto, um grande influxo de ideologias e
estruturas de pensamentos filosóficas, psicológicas, sociológicas e políticas, que
sugeriram, ao menos de início, um esforço de abertura e de diálogo interno e externo
na Igreja.
A insistência sobre a experiência de abertura, que fora se configurando ao longo
da realização do Concílio, está relacionada à compreensão de que sem essa postura
tornar-se-ia impossível desenvolver e afirmar uma atividade evangelizadora, que
tivesse caráter universal e anterior a ela, afirmar uma salvação destinada a todos.
Visando desenvolver os pressupostos contextuais apresentados e buscando entendê-
los, em suas decorrências, como contribuições do Concílio para a história e
mentalidade da Igreja constata-se que a renovação proposta pelo Vaticano II se
processa a partir de dois elementos fundamentais: a articulação entre fé e razão e o
desenvolvimento da categoria história em perspectiva antropológica (GONÇALVES,
2004).
Sobre o primeiro elemento verifica-se uma espécie de primórdio da superação
das dissociações entre fé e razão, especialmente, na Constituição Dogmática sobre a
revelação divina Dei Filius, (DF) fruto do Concílio Vaticano I. Há aqui um inicial
reconhecimento do valor da razão (DENZINGER, 2007). Lançam-se as sementes para
48
a postura assumida posteriormente pelo Vaticano II, na qual se estimulou a abertura
à compreensão da história e, por conseguinte, do método histórico-crítico, por
exemplo, no estudo da Sagrada Escritura. Tal acolhida se explicita, entre outros
textos, na Constituição Dogmática Dei Verbum (DV) sobre a revelação divina (DV
n.12).
Sem dúvida essa será uma das grandes contribuições do Concílio Vaticano II
para a Igreja, pois o estímulo para a ruptura da mentalidade de visão entre fé e razão
será propulsora do aggiornamento, tão instigado por João XXIII nessa que foi uma
das mais belas páginas da história da Igreja. No reconhecimento da abertura para o
mundo, vivida pelo Vaticano II, Rahner chega a justificar seu título de “ecumênico”
destacando categorias dessa abertura, a saber: foi além do diálogo com outros
cristãos e igrejas e se expressa na coragem de discutir temas como a doutrina sobre
a colegialidade; comunidades locais como igreja; a possibilidade de salvação para não
cristãos; diversidade hierárquica de valores, mesmo entre verdades de fé já
instituídas; sobre a Escritura; sobre o sacerdócio comum dos leigos; sobre o
pluralismo das teologias na mesma Igreja; sobre a liberdade de crença; e sobre a
importância da liturgia da Palavra (RAHNER, 1966).
O primeiro elemento apontado, o diálogo entre fé e razão, não se apresenta
dissociado do segundo, a história em perspectiva antropológica. Juntos estabelecerão
uma novidade que condicionará todas as contribuições desse Concílio e consolidarão
uma nova postura e visão da Igreja com relação a si mesma, ao mundo e,
especialmente, a humanidade. O desenvolvimento da categoria de história em
perspectiva antropológica e a partir da categoria de mistério, implicou levar em
consideração a história humana em seu potencial transformador colocando o homem
no centro dessa reflexão e compreendendo-o como espírito finito, portador, a priori,
do infinito transcendental (GONÇALVES, 2004).
Passou-se a iluminar a partir dos dramas humanos, dos anseios e da busca de
sentido para sua existência, a pastoral, a teologia e a espiritualidade. A peregrinação
humana assume-se de vez como peregrinação também da Igreja (VATICANO II,
2007). Dessas duas primeiras intuições teológicas decorre a afirmação de outros
quatros elementos teológicos principais, o primado da Palavra de Deus, reafirmado,
pois já vigente na Igreja; a nova compreensão de Igreja; a nova compreensão de
49
homem; e, por fim, uma inteligência teológica, marcada pela dialética entre história e
mistério (GONÇALVES, 2004).
Reconhece-se que há uma mudança de postura interna na Igreja que abre mão
de uma apologética e instaura uma postura de diálogo com a humanidade e o mundo
contemporâneos. A abertura ao diálogo fora muito bem recepcionada pela Igreja na
América Latina e será vivenciada pelo comprometimento a transformação social em
favor dos mais marginalizados.
2.1.2 O compromisso com o ser humano
Ao olhar de forma diferente para o mundo contemporâneo a Igreja passa a
afirmar sua associação com os anseios de toda a humanidade. Pretende, à luz do
Evangelho, dialogar com a humanidade sobre seus problemas comuns. E, para tanto,
apresenta-se a serviço do gênero humano. Por se tratar do gênero humano não há
acepção de pessoa. É o desafio de anunciar sua novidade de salvação para todos os
viventes e não apenas para seus filhos. No número 10 e apoiada em 2 Cor 5,15,
verifica-se explicitamente a fé da Igreja sobre toda a humanidade como destinatária
da obra salvífica de Cristo, “A Igreja crê que Cristo morreu e ressuscitou por todos e,
por seu Espírito, dá aos seres humanos luz e forças, para que possam corresponder
à sua vocação suprema” (GS n. 10).
Esse número expressa além da compreensão universal da salvação a
afirmação de sua vocação suprema que está em consonância direta com a realização
plena do ser humano em Cristo, reconhecendo Nele o protótipo de humanidade
perfeita (GS n. 22). Nessa linha e sob a perspectiva de uma virada antropológica, pois
parte da própria realidade humana, constata-se a afirmação da necessidade da
comunhão com Deus: “A expressão máxima da dignidade humana é a vocação à
comunhão com Deus [...] Não viverá, pois plenamente, segundo a verdade, se não
reconhecer livremente esse amor e confiar no seu Criador” (GS n.19).
Como se pode ver, a Igreja acredita e anuncia a realização do ser humano em
Deus pela constatação da busca realizada por ele mesmo (ser humano) ao longo da
história. Tal realização é um chamado que Deus faz a todos e não só àqueles que
creem em Cristo e pertencem ao seu redil, entendido pelo decorrer da história como
50
sendo as igrejas cristãs e, especialmente a Católica Apostólica Romana. Um elemento
que merece destaque aqui é que a resposta deve ser dada a Deus na liberdade, pois
é nessa liberdade que também Cristo concretizou a Revelação e a redenção do
gênero humano. “Cordeiro inocente, tendo derramado livremente o seu sangue, nos
mereceu a vida. Nele, Deus se reconciliou conosco (...)” (GS n.22). E essa verdade,
da liberdade e capacidade do homem de chegar a Deus, não vale apenas para os
fiéis, mas destina-se a toda a humanidade “em cujos corações atua a graça, de
maneira invisível” (GS n.22).
Observa-se nessa última afirmação uma abertura que se contrapõe diretamente
à afirmação de que fora da Igreja Católica não há salvação. Afirmação essa que
remonta o século V e presente na Statuta Ecclesiae Antiqua de Leão I, bem como
Eugênio IV na Bula Cantante Domino do Concílio de Florença, século XV e que
persistiu até o Vaticano II, não sem resistências hodiernamente (DENZINGER, 2007).
E ainda: “Deve-se, pois admitir que o Espírito Santo oferece absolutamente a todos
os seres humanos a possibilidade de se associar ao mistério pascal, de maneira
conhecida somente por Deus.” (GS n.22). Essa citação não deixa dúvidas sobre a
abertura que o Vaticano II traz em matéria da universalidade da salvação operada por
Cristo.
Observa-se com o desenvolvimento histórico, político, econômico, social,
antropológico e filosófico, especialmente da passagem dos séculos XIX para o XX,
uma exigência dialógica, isto é, não há mais espaço para afirmações inflexíveis e
inquestionáveis. E é diante desse contexto que o Vaticano II se apresenta como
expressão privilegiada da tentativa de diálogo da Igreja com o mundo.
2.1.3 A eclesiologia do Concílio Vaticano II
Na leitura da Lumen Gentium (LG) e da Gaudium et spes (GS) tem-se contato
com o espírito intentado pelo Papa João XXIII ao convocar o Vaticano II, isto é,
provocar na Igreja um esforço de diálogo com o mundo de maneira autêntica e realista.
Esses documentos se expressam, ainda, como veículo desse mesmo diálogo e lócus
de ensinamento da Igreja sobre esse tema. Essa última afirmação se fundamenta na
qualidade de Constituição que ambos os documentos recebem, ou seja, não é uma
51
simples admoestação, mas ensinamento sobre o assunto abordado (HACKMANN,
2005).
A Constituição Dogmática Lumen Gentium possui basicamente três elementos
eclesiológicos, a saber: sua dimensão trinitária, sua compreensão como Povo de Deus
em busca de santidade e sua dimensão Mariológica. O primeiro ponto, dimensão
trinitária, estabelece uma nova consciência de Igreja. Promotora da superação da
imagem e compreensão de uma Igreja autossuficiente. Inicia-se, com ela, a passagem
de uma Igreja entendida como fim em si mesma, para uma Igreja de Deus, sacramento
de salvação para o mundo (LG n.1). Essa passagem é realizada na afirmação da
origem da Igreja em Deus, isto é, pela sua dimensão trinitária, que se origina em Deus
e deve testemunhá-lo ao mundo (HACKMANN, 2005).
Trata-se da aproximação entre o mistério da Igreja e o mistério de Deus, sendo
que o primeiro encontra no segundo a sua fonte. Como afirma o então Cardeal Joseph
Ratzinger, o Concílio pretendia inserir o discurso sobre a Igreja no discurso sobre
Deus e visava com isso propor uma eclesiologia propriamente teológica (HACKMANN,
2005). Esse esforço de inserção tem como consequência a conhecidíssima afirmação
da Igreja como sacramento de salvação. Por conseguinte, ao ser entendida como
sacramento, encontra-se nela o mistério do desígnio de salvação de Deus para a
humanidade. E ela passa a se reconhecer como sinal incondicional do amor de Deus
pelas pessoas e como expressão visível da benevolência do seu dom.
Dessa forma, a Lumen Gentuim estabelece o sentido, a consciência, de que a
Igreja existe a partir de Cristo e em Cristo. Esse cristocentrismo eclesiológico, que vê
sua culminação nessa Constituição, encontra seus primórdios magisterais na encíclica
Mystici Corporis (MC) de Paulo VI (HERNÁNDEZ, 1965). Esse cristocentrismo, porém,
não é contraposição à dinâmica trinitária, pois a dimensão pneumatológica está
presente. O que em sua missão específica realiza uma das pessoas da trindade as
outras também realizam (LADARIA, 2005).
Portanto, da consciência dessa dimensão trinitária oferecida pela Lumen
Gentium além de se verificar a passagem de uma Igreja jurídica para uma nova
relação entre Igreja e Reino de Deus, Igreja de comunhão, reforça-se a primeira
passagem apontada aqui, isto é, a Igreja não existe em si mesma, pois é o próprio
Deus que a origina, anima, conduz. Ela deve ser instrumento de Deus, para reunir
52
todas as pessoas nele e preparar o momento em que “Deus será tudo em todos”,
como afirma o apóstolo Paulo na primeira carta aos Coríntios (1 Cor 15,28).
Ainda sobre a passagem de uma Igreja jurídica para uma Igreja que se
relaciona, de maneira nova e ao mesmo tempo antiga, com o Reino de Deus, pode-
se destacar que ela deixa de se identificar diretamente como o Reino para ser seu
sinal e instrumento dele, deixa de se entender seu germe e início e passa a
reconhecer-se como sua anunciadora (HACKMANN, 2005): “A Igreja de Cristo
subsiste na Igreja Católica, governada pelo sucessor de Pedro e pelos Bispos em
comunhão com ele. Todavia, fora de sua realidade visível, encontram-se muitos
elementos de santidade e de verdade” (LG n.8).
Tal afirmação constitucional não diminui a importância da Igreja na história da
mediação da salvação de Deus, mas aponta o seu verdadeiro lugar nesse plano se
salvação, como afirmado, sacramento e instrumento de salvação para a humanidade,
pois sinal e instrumento de unidade do gênero humano em Deus. Verifica-se a
importância, pela discussão realizada até aqui, dessa primeira dimensão eclesiológica
presente na Lumen Gentium. Tal importância se dá, sobretudo, pela guinada
hermenêutica sobre a identidade e missão da Igreja.
O segundo elemento na construção de uma identidade eclesiológica na Lumen
Gentium é a identificação da Igreja como Povo de Deus em busca de santidade. Aqui
se estabelece uma nova passagem, isto é, estabelece-se a preferência da imagem de
Povo de Deus à Corpo de Cristo. Com essa passagem ressalta-se a dimensão
histórica da Igreja. Esse destaque histórico aponta, também, a abertura da Igreja à
história da humanidade. Pois, “a Igreja avança em direção à casa do Pai no mundo e
não fora dele” (HACKMANN, 2005, p. 666). Pela sua condição de Povo de Deus em
busca de santidade aponta-se, ainda, sua postura de peregrina em busca de
perfeição. Ela caminha nas estradas da história e está em constante purificação e
renovação como afirma o penúltimo parágrafo do n.8 da mesma Constituição (LG n.
8).
Respondendo `a vocação própria de cada cristão, a Igreja também, é chamada
a conformar-se a Cristo, para assim tornar-se instrumento crível de Deus no mundo.
Só dessa maneira é que ela poderá ser autêntico sinal de Deus, clamando a
53
humanidade para que dê espaço a Deus, a fim de que habite no mundo, fazendo dele
sua morada (HACKMANN, 2005).
O terceiro elemento da identidade eclesiológica presente na Lumen Gentium é
a dimensão mariológica presente na última parte do documento. Essa dimensão
associa a Igreja a Maria, mãe e virgem. Dessa forma, a Igreja, igualmente, virgem e
mãe, concebida sem pecado, pois concebida em Deus, é chamada a carregar o peso
da história, mesmo possuindo uma dimensão escatológica (HACKMANN, 2005). A
Gaudim et Spes é uma Constituição Pastoral. Essa classificação expressa dois
objetivos, doutrinal, por ser uma Constituição, que implica uma postural de
ensinamento, magisterial e a preocupação pastoral, não só pelo título de Constituição
pastoral, mas, especialmente por sua postura dialogal. (HACKMANN, 2005). Ela é
formada por duas partes, mas que constituem um todo. Sua classificação como
Constituição Pastoral, abriga a postura doutrinal e pastoral em suas duas partes. Na
primeira têm-se a apresentação da doutrina da Igreja sobre o homem, o mundo e da
relação da Igreja com os dois (GS n.40). Aborda-se, por exemplo, os temas, a
dignidade da pessoa humana, o valor da liberdade, o ateísmo, a promoção do bem
comum, a justiça social, o auxílio da Igreja ao homem e a sociedade (GS nn. 1-45), o
auxílio do mundo a Igreja, esse último de caráter bastante original em termos de
história da Igreja (GS n. 44).
A segunda parte (GS nn. 45-90) considera mais os vários aspectos da vida e
da sociedade contemporâneas e, especialmente, as questões e os problemas que
neles têm maior relevância e urgência, como, por exemplo, o matrimônio e a família,
o progresso cultural e os deveres dos cristãos diante dele, a vida econômica e social,
a política e a promoção da paz entre os povos. Todos esses temas são tratados à luz
dos princípios doutrinais de caráter imutáveis, mas também transitórios, visando
responder às exigências do tempo.
Portanto, há o desejo de falar a toda a humanidade, enfrentando,
especialmente, os problemas da relação com a modernidade e da delicada relação
entre Jesus Cristo, verdade absoluta e universal, e a liberdade de cada pessoa
(HACKMANN, 2005).
Os elementos da eclesiologia da Gaudim et Spes estão em consonância com
os da Lumen Gentium. O primeiro elemento que trabalha a questão da identidade da
54
Igreja, à luz da discussão presente nos dois primeiros capítulos da Lumen Gentium, é
fundamental para a postura dialógica entre a Igreja e a história, elemento presente na
introdução da Gaudium et spes, isto é, as alegrias e as esperanças, as tristezas e as
angústias dos homens e mulheres de hoje, são também as alegrias e as esperanças,
as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo (GS n. 40). Em consonância com
esse primeiro elemento apresenta-se o segundo, isto é, a relação entre a história da
salvação e a história humana. Não bastava apenas anunciar a relação e consonância
entre as alegrias e angústias da humanidade e as da Igreja. Era necessário que isso
tudo fosse entendido à luz da vocação do Povo de Deus peregrino. Isso a partir da
consciência da Igreja de ser, ela, sinal do trabalho misterioso da graça de Deus e
instrumento de salvação para essa mesma humanidade (HACKMANN, 2005).
Ao tomar consciência de sua pertença a história da humanidade, com papel
específico, a Igreja realiza a associação entre a história da salvação e a história da
humanidade. A principal decorrência dessa tomada de consciência é a superação do
sentido de competição entre Igreja e mundo, estabelecendo entre ambos um sentido
de cooperação e solidariedade (GS n.53). É também sob esse ponto de vista que há
uma correspondência entre a eclesiologia da Gaudium et spes e, de certa forma
também na Lumen Gentium, presente já na Doutrina Social da Igreja, isto é, a luta da
humanidade em busca de maior dignidade é também a luta da Igreja.
O terceiro elemento eclesiológico presente nessa Constituição Pastoral é a
missão da Igreja no mundo de hoje. É sobre esse elemento que a Igreja lança as
bases para um diálogo com o mundo contemporâneo, sob um pano de fundo de
transformação interna da concepção de Igreja. Aqui, se encontra o que se pode
chamar de terceira passagem na concepção de Igreja, a saber, de uma Igreja antes
jurídica para uma Igreja de comunhão, disposta a debater sobre os problemas
concretos da vida humana dando atenção especial as mudas de época (HACKMANN,
2005).
O número 9 da Gaudium et spes expressa os diversos antônimos e
distanciamentos presentes na experiência humana no hoje da história, por exemplo,
a interpelação dos pobres aos ricos, a luta por igualdade por parte das mulheres, a
tensão entre operários e camponeses (GS n.9). Tais elementos expressam o
reconhecimento do direito humano universal de acesso a todos os bens conquistados
pelo progresso humano. O bem comum torna-se pauta e expressão mais adequada
55
para a realização humana mais justa, isto é, o anseio de felicidade nas mais diversas
esferas sociais e culturais: “Essas exigências encobrem uma aspiração mais profunda
e universal: as pessoas individualmente e os grupos humanos têm sede de uma vida
plenamente livre, digna do ser humano” (GS n.9). Tal aspiração encontra-se em
correspondência com os valores do Evangelho e sua força humanizadora.
A Igreja é chamada a auxiliar as pessoas a responder a tal contexto e a apontar
as riquezas e as fragilidades da realidade contemporânea com a luz do Cristo, capaz
de orientar suas conquistas para autêntica liberdade. E reencontra, ao encontrar-se
novamente com a humanidade, sua via de ação. Ao se associar às alegrias e
esperanças, às tristezas e angústias dos seres humanos, constituintes da realidade
eclesial, pois composta pelo ser humano (MANZATO, 2009). A Igreja reencontra-se
destinada ao benefício, à salvação dessa mesma humanidade.
Para tanto, ela não pode ignorar o anseio de felicidade presente no coração
humano e deve dele se ocupar. Deve iluminá-lo com o Evangelho, consciente que ele
é capaz de estabelecer sentido para existência humana, por que primeiro o estabelece
em sua dinâmica e existência (LG n. 20, 46), pois, também ela se reconhece discípula
de Cristo. O serviço à humanidade, a Igreja o faz em Cristo, e não simplesmente para
Cristo ou somente em seu seguimento. Isso é totalmente correspondente ao seu
sentido e reconhecimento de sua fonte na trindade (HACKMANN, 2005).
Trata-se de uma identificação ontológica. O ser da Igreja nasce do ser de Deus,
emana de Deus. Portanto, servir a humanidade é responder fielmente a sua natureza.
A questão é da ordem do ser e não simplesmente do fazer. A Igreja deve servir a
humanidade, o mundo, por um apelo natural de sua identidade arraigada no próprio
Deus, distribuidor dos dons necessários para a realização humana. Caso a Igreja
negue seu chamado ao serviço da humanidade, estará negando-se a si mesma. E é
somente em atenção à realidade dinâmica da sociedade hodierna que a Igreja poderá
ser fiel aos impulsos do Espírito que a rege.
Com a Gaudium et spes, a Igreja, sem deixar de ser fiel à tradição, a qual
também oferece-lhe elementos de fidelidade à sua identidade, proporciona o encontro
da afirmação tradicional da fé cristã com os fatos, acontecimentos e situações das
pessoas humanas na contemporaneidade, a fim de que essa afirmação de fé possa
iluminar a vida de cada uma delas. Sobre a tensão entre a afirmação da fé oriunda da
56
grande tradição da Igreja, e a sua necessária atualização, deve-se observar que essa
boa tradição é viva e, por isso, exige progresso. Dessa forma, entre a tradição e o
progresso, seu esforço de atualização, com a finalidade de oferecer a humanidade e
ao mundo contemporâneo sentido, pode haver tensão, mas não oposição
(KLOPPENBURG, 1971).
Portanto, esse é o grande desafio, e, ao mesmo tempo, o fundamento teológico
basilar da Gaudium et Spes, proposto pelo Concílio em termos de resposta à
necessidade humana de felicidade, isto é, à possibilidade de promover um encontro
salutar entre a tradição da profissão de fé e a atual situação da humanidade. Retorna-
se aqui ao encontro entre duas categorias fundamentais para compreensão desse
novo tipo de postura eclesiológica, a saber: a profunda relação entre o mistério e a
história. A ação de Deus nunca foi a-histórica, basta se observar a afirmação do
prólogo joanino, “o Verbo divino se fez carne e habitou entre nós” (JO 1,14).
Dessa forma, a Gaudium et spes afirma a história humana não como simples
exílio, mas como lugar da construção do humano, matéria prima do Reino de Deus
(MANZATO, 2009), à luz, fundamentalmente, do Evangelho, seu grande ponto basilar
de referência. A atuação dos cristãos na história, pelo testemunho de vida, é fator que
promoverá, cada vez mais, o ser humano com as sementes do Evangelho, que
derramam luz, vida e liberdade, em proveito de todos. A Igreja está certa de que sua
mensagem, o Evangelho, corresponde aos mais profundos anseios do coração
humano, proclama sua dignidade e restitui-lhe a esperança de encontrar respostas
para seus questionamentos mais profundos (GS n. 21).
A associação entre a história da Salvação, da Igreja e da humanidade geraram
a mais rica imagem da Igreja como fruto da eclesiologia do Vaticano II, isto é, Igreja
Povo de Deus. Trata-se de uma novidade na compreensão da Igreja sobre si.
Novidade que estabelecerá uma ruptura e uma reviravolta.
2.1.4 A Igreja Povo de Deus
O segundo capítulo da Lumen Gentium aborda de forma privilegiada a temática
do Povo de Deus. E o inicia com a seguinte citação bíblica, “Todo aquele que pratica
a justiça é acolhido por Deus” (At 10,35). Essa referência conduz o leitor a uma
perspectiva de abertura, de universalidade da parte de Deus em relação à experiência
57
humana. E aprofunda: “Deus quis, entretanto, santificar e salvar os homens não como
simples pessoas, independentemente dos laços sociais que os unem, mas constituiu
um povo para reconhecê-lo na verdade e servi-lo na santidade” (LG n.9).
A escolha de um povo eleito, como apresenta na sequência o mesmo número
da Lumen Gentium, é parte da preparação, por meio da primeira Aliança para a vinda
do Cristo e o estabelecimento da Nova e eterna Aliança, onde não haverá mais judeus
e nem pagãos, não mais segundo a raça, mas segundo o Espírito: o Povo de Deus
(LG n. 9). Isso pode ser assegurado, especialmente, a partir da compreensão de que
a pertença a Cristo não se dá mais pelo nascimento em um espaço geográfico
definido, ou uma raça específica. Aqueles que pertencem a Cristo estarão
determinados em sua pertença pelo renascimento no Espírito, como afirma o quarto
evangelho, “Em verdade, em verdade, te digo: se alguém não nascer da água e do
Espírito, não poderá entrar no Reino de Deus. O que nasceu da carne é carne; o que
nasceu do Espírito é espírito” (Jo 3,5-6).
A condição desse povo é a dignidade e a liberdade dos filhos de Deus,
conquistas pelo próprio Cristo. Nesse povo habita o Espírito, sua lei é o amor à medida
de Cristo, sua meta o Reino de Deus, iniciado por ele mesmo e destinado a crescer
até o fim dos séculos. É verdade que esse povo não reúne todas as nações, mas
nem por isso deixa de ser sinal de comunhão de vida, amor e da verdade. Ele tornou-
se instrumento de redenção universal, estabelecido como sal da terra e luz do mundo
(cf. Mt 5,13-16), (LG n.9). A associação do Povo de Israel ao Povo da nova aliança
não é indevida e não se sustenta apenas pela perspectiva de preparação para a vinda
do Cristo e o estabelecimento da Nova Aliança. Pedagogicamente, a caminhada
desse primeiro Povo anuncia a caminhada constante do Povo vindouro, isto é, os
seguidores do Cristo. Essa associação é garantia de continuidade histórica da ação
de Deus na vida humana. Do Povo de Israel à Igreja, mesmo Povo de Deus, agora
reunido em torno de Cristo.
Atualmente pode-se definir a Igreja, Povo de Deus, como a reunião de todos os
que reconhecem Jesus como autor da salvação, princípio de unidade e de paz,
destinada a todos e a cada pessoa em particular (LG n.11). A dignidade desse povo
é oriunda da sua pertença ao sacerdócio de Cristo. Esse sacerdócio comum respeita,
no entanto, a especificidade de dons emanados do Espírito. É exercido e alimentado
pela vida sacramental, especialmente pela eucaristia, e pela prática cristã (LG n. 10).
58
Pela eucaristia, de maneira privilegiada, os fiéis se associam ao sacrifício de Cristo e
se oferecem as demais pessoas como sinais da ação de Deus na história.
Tal feito é realizado por meio de um constante devir, isto é, pela constância na
caminhada de conversão e perseverança na vivência dos valores evangélicos nos
mais variados contextos onde vive cada fiel. E isso independente de seu estado de
vida, leigos, casados ou solteiros, religiosos ou religiosas, bispos, padres ou diáconos.
Assim, como se verifica no número 13 da Lumen Gentium, “formam-se entre as partes
da Igreja inúmeros laços de comunhão íntima, tanto no que toca os bens espirituais,
como no que concerne à colaboração apostólica e até os auxílios temporais.” E como
síntese dessa compreensão de comunhão o último parágrafo desse mesmo número
conclui,
Todos os humanos são chamados à unidade católica do povo de Deus,
prenúncio da paz universal. Pertencem ou pertencerão a esta unidade os fiéis
católicos, todos os que creem em Cristo e, até mesmo, todos os homens, pois
são chamados à salvação, pela graça de Deus (LG n. 13).
Como afirma a mesma Constituição, agora no número 16, que discute a postura
da Igreja na relação com os nãos cristãos,
Deus também não está longe daqueles que o buscam como a um desconhecido, através de suas sombras e imagens, pois a todos dá vida, inspiração e tudo mais (...) Todos os que buscam a Deus sinceramente, procuram cumprir a sua vontade, conhecida através da consciência, e agem sob o influxo íntimo da graça, podem obter a salvação (LG n. 16).
Portanto, o constante devir vivenciado pelo Povo de Deus, é também
experiência de anúncio da salvação que já o atingiu, mas que não estará completa
enquanto todos os povos não tomarem consciência dessa salvação, que também a
eles toca pela simples condição de criatura humana recapitulada pelo Cristo. O grande
desafio que persiste é uma resposta ao questionamento sobre como atualizar esse
anúncio de tal forma que ele se apresente eloquente a todos ouvintes, a todas as
culturas, a todos os contextos onde se encontram os seres humanos. É exatamente
nesse ponto que se pode afirmar o desafio da atualização da ação da Igreja no mundo.
Todo o apelo de aggiornamento presente na elaboração do Concílio Vaticano II
encontrará no contexto de América Latina sua recepção, aplicação, enculturação
pelas reflexões e inciativas provocadas pelo Celam (Conselho Episcopal Latino-
Americano).
59
2.2 CONSELHO EPISCOPAL LATINO-AMERICANO
Cinco foram as conferências dos Conselhos Episcopais Latino-Americanos,
realizadas nas seguintes cidades e anos: Rio de Janeiro (1955), Medellin (1968),
Puebla (1979), Santo Domingo (1992) e Aparecida (2007). Respondendo aos anseios
dessa pesquisa, que estão diretamente relacionados à Pastoral da Juventude,
escolheu-se discorrer sobre as Conferências de Medellin, Pueblas e Aparecida, por
estarem mais relacionadas aos sujeitos a serem analisados nessa investigação.
A Conferência de Medellín é reconhecida como a recepção criativa e seletiva
do Concílio Vaticano II. Realizou-se de 24 de agosto a 6 de setembro de 1968, na
cidade de Medellín, na Colômbia. O Concílio Vaticano II legitimou a renovação que já
se esperava no seio da Igreja, permitindo que se tomasse força uma “recepção
criativa” a partir de uma ótica, agora, em favor dos pobres. A preparação dessa
conferência teve seu início no próprio Concílio. Como continuidade dessa preparação
destaca-se a 10ª reunião realizada em Mar del Plata, Argentina, marcada pelo
manifesto evangélico lançado por Dom Helder Câmara, a partir do qual começou-se
a falar abertamente de libertação de um subdesenvolvimento, entendido como
“pecado coletivo”. Na 11ª reunião, realizada em Lima, Peru, os bispos assumem uma
postura mais libertadora menos ligada ao desenvolvimentismo e elaboram o tema
central da Conferência de Medellín: “A Igreja na atual transformação da América
Latina à luz do Concílio”.
O documento de preparação atesta uma clara tomada de consciência por parte
do episcopado, apontando para um movimento de grandes proporções. Assim, de 21
a 27 de abril de 1968, o Departamento das missões do CELAM reunia 60 antropólogos
para estudar a realidade missionária do continente. Esse encontro apontou para a
necessidade de conhecer melhor os valores e aspirações das culturas autóctones e
da mestiçagem cultural por parte da cultura dominante, de raiz europeia e fundada no
mundo greco-latino. Desse encontro origina-se a proposta de uma renovação
missionária da Igreja, especialmente no que tange à promoção humana e ao
progresso das culturas, ao despertar da fé e à educação na fé, à formação da
comunidade eclesial e ao diálogo ecumênico. Assim, ganhava forma uma recepção
particular, original, isto é, local do Concílio Vat. II.
60
Dentro dessa criatividade e seletividade destacam-se: o esforço de encanar a
evangelização na história, assumindo a realidade latino-americana, em que se chega
ao discernimento acerca dos valores e dos pecados desse contexto histórico; a leitura
dos sinais do tempo, onde os próprios epíscopos reconhecem-se latino-americanos e
pastores responsáveis pela vida de todos os povos frente aos múltiplos problemas
desse contexto; a libertação dos pobres e oprimidos, aqui a evangelização é entendida
como serviço preferencial à libertação dos oprimidos; a valorização da Igreja local
como extensão da Igreja universal, respeitando a pluralidade cultural e espiritual das
expressões de fé contidas no continente (AGOSTINI, 2007, pp.41-54).
De 27 de janeiro a 13 de fevereiro de 1979, realizou-se em Puebla de los
Angeles, México, a III Conselho do Episcopado Latino-Americano, na qual se
aprofunda a perspectiva da evangelização da América Latina. Como antecedentes
desse evento fazia-se sentir uma evolução visível da Igreja, mas em âmbito da base,
isto é, da organização do povo cristão e de sua relação com a hierarquia, como uma
busca de ser uma Igreja mais pobre, com uma estrutura hierárquica mais simples e
uma renovação religiosa e sacerdotal mediante às comunidades eclesiais de base
(CEBs), entendida como expressão progressiva de uma nova “evangelização
libertadora”. São nesses anos que se produzem os primeiros ensaios de Teologia da
Libertação. Contudo, não faltaram os que reagiram a Medellín, inclusive o próprio
CELAM.
No desenvolvimento da Conferência de Puebla, chamou a atenção a presença
do Papa João Paulo II realizando a abertura com um discurso proferido no dia 28 de
janeiro de 1979. Sua presença comporta certo receio por representar, apesar de
popularidade e familiaridade, certa tendência em refrear o movimento teológico-
pastoral Latino-Americano.
Os trabalhos efetivos foram abertos por um discurso de Dom Aloísio Lorsheider,
que sublinhou o caráter autônomo da Conferência, tanto em método como na
recepção ou não dos documentos preparatórios. Vinte e um subtemas deram
rosto aos trabalhos, e esses subtemas se organizaram em torno de quatro núcleos
básicos: visão pastoral da realidade na Igreja da América Latina; Desígnio de Deus
sobre a América Latina; A evangelização na América Latina; Igreja Missionária a
serviço da evangelização da América Latina; e outro tema que pode ser entendido
como quinto núcleo, Sob o dinamismo do Espírito: opções pastorais.
61
O conteúdo de Puebla não ignora a história em sua elaboração, tem presente
nesse exercício a Conferência de Medellín e o Concílio Vat. II, bem como a exortação
apostólica Evangelli Nuntiandi, de Paulo VI. Outra importante referência de Puebla é
a realidade humana que o povo latino-americano vivia naquele momento histórico e a
experiência pastoral das Igrejas locais e a reflexão teológica que delas brotavam.
Partindo dessas referências Puebla revela diversas orientações, e aqui destacam-se
algumas: viver a fé a partir dos desafios históricos, socioculturais e eclesiais do
continente (nn. 87-89); a repercussão que essa realidade teve e ainda tem sobre a
tarefa evangelizadora da Igreja (compreende um sentido de evolução histórica) (n.
85); a evangelização, toda ela é perpassada pelo engajamento da Igreja pelos mais
pobres por sua evangelização integral e libertadora (n. 733); uma preferência em favor
dos jovens (n. 1186); busca claramente a defesa e a promoção dos pobres, tão
atingidos na década que precedeu Puebla pela multiplicação dos regimes de força
ditatorial no continente (n. 320); aprofundou a questão da cultura e da evangelização
das culturas latino-americanas (n. 395, 396, 450); assinala-se o desenvolvimento das
CEBs e as assumem como centros de evangelização e motores de libertação e de
desenvolvimento (n. 96).
Por fim, Puebla deixou um legado para a Igreja da América Latina, que se funda
no encontro entre evangelização e libertação e se desdobra em múltiplas dimensões
como: a situação de pecado social, que exige da Igreja uma evangelização libertadora
orientada para um sentido de conversão ao mesmo tempo pessoal e coletiva dos
homens; a procura de alcance não só da pessoa, mas da cultura vigente por um
princípio de encarnação; expressão da evangelização em termos de comunhão e
libertação, dinâmica essa que mais marcou Puebla; assume a evangelização como
força motriz de um processo permanente de libertação, livrando assim, a Igreja de
conchaves ideológicos9.
Aparecida retoma a dimensão do discípulo missionário de Jesus. A V
Conferência Geral dos bispos Latino-Americanos e Caribenhos realizou-se entre os
dias 13 e 31 de maio de 2007, na cidade de Aparecida, SP, Brasil, com o tema central:
discípulos missionários de Jesus Cristo. Como contribuições do documento de
9 Tais conchaves ideológicos estão relacionados a suspeita da influência do Marxismo e do Comunismo sobre as elaborações e intervenções pastorais da Teologia da Libertação (Cf. SARANYANA, 2005, p. 113.).
62
preparação para a Conferência têm-se, como destaque, as seguintes contribuições: o
anseio pela felicidade, verdade (n. 104, 127), fraternidade e paz; a vivência da fé no
continente Latino-Americano com gratidão (nn. 23-32); a reafirmação do discipulado
e missionariedade dos seguidores de Jesus (nn. 131, 136, 149) ; e o compromisso em
favor da vida (nn. 358-364); opção preferencial pelos pobres e excluídos (nn. 391-
405). Sobre o tema central da Conferência e seu desdobramento, “para que nele
todos tenham vida”, observa-se uma tríplice relação vital: com o Senhor, com a
comunidade e com àqueles a quem são enviados os discípulos de Jesus. Nele tenham
vida, manifesta a convicção de que em Deus vivo, revelado em Jesus, encontram-se
o sentido, a fecundidade e a dignidade da vida humana. Ele urge a missão de entregá-
la, promovê-la e defendê-la em toda a sua integridade, com a consciência de que
alcançará um dia a plenitude quando “Deus será todo em todos” (1Cor 15,28).
Dentro de uma compreensão acerca de uma Igreja discípula e missionária
aponta-se para épocas cheias de luz, mas marcada também por momentos sombrios.
Sublinha-se também uma leitura dos sinais dos tempos e os desafios que lhes são
próprios, não podendo assim, dissociar o mistério de Cristo do caminhar histórico da
realidade latino-americana.
Dessa forma, a Igreja deve, em primeiro lugar, fazer-se discípula da Palavra,
deixando-se interpelar e evangelizar, escutando seu Senhor no hoje da história como
comunidade de discípulos, vivenciando a dinâmica inspiradora do discípulo, isto é, o
encontro com Jesus Cristo, a comunhão e a missão que brotam desse encontro.
E frente à realidade histórica, o documento de preparação da Conferência
solicita atenção à cultura e aos meios de comunicação social, que plasmam
fortemente a mentalidade contemporânea; ao esforço do empenho em favor da vida,
na ressalva da sua dignidade e integralidade; a reafirmação da opção pelos pobres e
marginalizados da sociedade; a promoção de um adequado discernimento no
despertar religioso onde as diversas seitas10 representam uma preocupação para a
Igreja; e por fim, um adequado anúncio do Evangelho como resposta cheia de
esperança e vida aos legítimos anseios do nosso tempo. O organismo das mensagens
das Conferências do Episcopado Latino-Americano, e posteriormente, também
10 Refere-se a preocupação da Igreja em relação especialmente a proliferação de numerosas e pequenas seitas, derivadas de igrejas históricas, de caráter neopentecostal oriundo de uma onda protestante estadunidense (SARANYANA, 2005).
63
Caribenha, como se vê a nomenclatura a partir da Conferência de Aparecida, forja a
interpretação e operacionalização mais situada da mensagem do Concílio Vaticano II,
o diálogo com o mundo em sua diversidade de contextos.
Na Igreja e na sociedade, por muito tempo, os jovens não foram considerados
membros efetivamente contribuintes em suas conduções e agremiações. A indefinição
sobre quem realmente é o “jovem” em grande medida ocasionou essa espécie de
marginalização. Antes da apresentação da caminhada e organização da Pastoral da
Juventude, uma resposta histórica ao apelos do Vaticano II e das Conferências Latino-
Americanas, torna-se oportuno o entendimento sobre o “jovem” (PUEBLA, n. 2).
2.3 A JUVENTUDE
O conceito de Juventude não está dado, não é algo que possa se assumir de
uma vez por todas, pois também é produto de uma construção histórico-cultural. Ariès
exemplifica concretamente tal afirmação ao recordar que durante os primeiros séculos
da reinvenção das escolas de educação infantil no Ocidente, não se fazia distinção
formal entre crianças e jovens. Dos 10 aos 25 anos todos eram considerados infantes
(ARIÉS, 1981).
O critério para a distinção e constituição das salas de aula resumia-se ao grau
de aprendizado apresentado pelos alunos e não a diferença etária ou mesmo de
necessidades existenciais e de maturidade distintas. Somente no início do século XIX
optou-se por separar os maiores de 20 anos, chamados “barbados” dos menores.
O Período da segunda infância – adolescência – foi distinguido graças ao
estabelecimento progressivo e tardio de uma relação entre a idade e a classe
escolar [...]. Os mestres se habituavam a compor a suas classes em função
da idade dos alunos. As idades, outrora confundidas, começaram a se
separar na medida em que coincidiam com as classes, pois desde o fim do
século XVI a classe fora reconhecida como unidade estrutural. Sem o colégio
e suas células vivas, a burguesia não dispensaria às diferenças mínimas de
idade de suas crianças a atenção que lhes demonstra (ARIÈS, 1981, p. 115).
Como fruto desse processo surge o modelo educacional, organizado por etapas
pautado na idade o que possibilitou maior convivência dos adolescentes e jovens
entre si e a formação de grupos específicos e, com isso, o aumento da consciência
64
de serem um agrupamento distinto das crianças e dos adultos, com necessidades e
costumes diferentes dos demais.
[...] desde o último quartel do século XIX houve muitas tentativas conflitantes
de imaginar e definir o status do jovem – fosse mediante esforços combinados
para arregimentar adolescentes usando políticas nacionais, fosse a partir de
visões proféticas, artísticas, que refletiam o desejo dos jovens de viverem
segundo suas próprias regras (SAVAGE, 2009, p. 11).
Na esteira das iniciativas para a afirmação da identidade do jovem, um período
histórico que marca uma virada decisiva para isso foi maio de 1968. Com o advento
da cultura “Rock and Roll” nos EUA e posteriormente no Reino Unido e, daí,
espalhando-se por quase todo o mundo, algo começou a mudar. Também o
crescimento da mídia, associada à economia e ao mercado no Ocidente que
descobriu na juventude um bom nicho de consumidores (SAVAGE, 2009).
Os anos 1960 foram marcados, no ocidente, pela eclosão de uma cultura
juvenil nunca antes tornada visível na cena pública. Teria se dado, naquela
ocasião, uma mudança radical nos modos pelos quais as gerações se
relacionavam [...] Massas de jovens, coesas justamente por conta de sua
relativa homogeneidade etária, entraram bruscamente no espaço da cena
pública, buscando inventar os seus próprios territórios existenciais e políticos
(ANGRA DO Ó, 2009, p. 25).
Na França, universitários da Sorbonne fizeram protestos contra o governo de
Charles de Gaulle, que tento conter as manifestações com força policial e prisões. A
tentativa de repressão pela força fez eclodir um movimento ainda maior pelas ruas de
Paris. Os jovens enxergaram na revolta a oportunidade de acentuar suas
especificidades e colocar em questão os valores da velha sociedade:
Maio de 1968 representou uma ruptura na história das experiências
geracionais, especialmente no que diz respeito às lutas políticas. Naquele
momento teria se dado a eclosão de uma singular predominância da
juventude por sobre a maturidade no jogo político. Aquele que teria sido um
instante de rebelião juvenil que mudaria o mundo inclusive – e quase diria
principalmente – porque oporia os jovens aos velhos, para descrédito destes
últimos (ANGRA DO Ó, 2009, p. 23).
Os grafites feitos pelas ruas de Paris com uma diversidade de frases de ordem
refletiam o quando os jovens desejavam ver seus valores assumidos também por toda
65
sociedade. Afirmava-se de uma vez por todas a luta contra os velhos valores que até
então haviam organizado a sociedade e que não contemplavam as particularidades
geracionais (AGUIAR, 2008). Citar algumas dessas frases pode expressar o que
desejam os jovens nesse momento da história e como sua força e articulação
acabaram por ajudar a forjar o conceito de “juventude”: “Parem o mundo, eu quero
descer”, “Não as estruturas”, “A economia está ferida, pois que morra”, “Trabalhador,
você tem vinte e cinco anos, mas seu sindicato é de outro século”, “Professores, vocês
nos fazem envelhecer”, “Abaixo a sociedade de consumo”, “Os jovens fazem amor,
os velho gestos obscenos” (ANGRA DO Ó, 2009).
As lutas de maio de 1968 colocaram a juventude no centro do debate político,
cultural, social, e mesmo eclesial, como fora visto nas contribuições das Conferências
do Episcopado Latino-Americano e Caribenho. É, portanto, momento bastante
significativo para o início do reconhecimento do valor e do potencial de contribuição
da juventude para a realidade, sem esperar que se tornassem adultos:
Desde ali, a juventude passou a ser dita de forma radicalmente nova, como
um estágio do desenvolvimento humano que bastava a si mesmo. O jovem
não seria, nunca mais, um intermediário entre a criança e o homem adulto –
e aliás, seria em nome da experiência da juventude que as idéias de infância
e de maturidade se reinventariam. Lutava-se, em Maio de 1968, contra um
mundo que se definia como intolerável: um mundo que acolhia em si os
bombardeios norte-americanos contra os civis vietnamitas; um mundo no qual
os estudantes viam como o desenho do seu futuro à submissão a um
capitalismo cada vez mais impessoal e massacrante; um mundo no qual o
saber o poder se irmanam, num promiscuidade que acabava por relegar às
margens a criação, a invenção, o sonho (ANGRA DO Ó, 2009, p. 25-26).
Para avançar na tentativa de oferecer parâmetros para a leitura sobre a
realidade da juventude o uso desse termo “Juventude” para falar da vivência
contemporânea do jovem parece não contemplar mais o que se observa desse
fenômeno estudado pelas Ciências Humanas, Psicológicas e Biomédicas. Se nos
primórdios da conceituação e reconhecimento da juventude, como visto até aqui, o
termo era suficiente, com o tempo observou-se que a manifestação juvenil é diversa,
evocando assim o termo “juventudes” num esforço de abarcá-la com mais precisão
(SAVAGE, 2009).
Groppo defenderá a acepção de que a juventude é uma realidade social e não
mera mistificação ideológica. Ela não é simplesmente um ordenamento natural, mas
66
principalmente um fenômeno de ordem social e, portanto, uma criação histórica e não
um invariante universal (GROPPO, 2016). Afirmar que a juventude é uma realidade
social historicamente construída é também admitir que ela não pode, num mundo
marcado por uma diversidade de expressões tão grande, ser monolítica. Por isso,
torna-se coerente falar de “Juventudes” ao invés de Juventude. O que a história e a
análise sociológica demonstram é que, o que existe efetivamente, são grupos juvenis
múltiplos e diversos, não uma única juventude concreta (REZENDE, 1989).
Eisenstadt (1976) afirma que são três os tipos de grupos juvenis, a saber: a
escola, os controlados pelos adultos e os grupos juvenis informais, esses últimos tidos
comumente como “desviantes”. É nos grupos, que muitas vezes se assemelham em
importância ao convívio familiar que ser forja a juventude. Na crítica de Groppo apesar
de seu olhar funcionalista Eisenstadt fortalece a argumentação acerca das Juventudes
como sendo uma construção histórico-social (GROPPO, 2016). Groppo proporá uma
concepção “dialética” sobre a juventude:
Concebo a dialética das juventudes e da condição juvenil, primeiro, como a
presença de elementos contraditórios no interior dos diversos grupos juvenis,
elementos que colocam constantemente aquilo que é definido institucional e
oficialmente em estado de superação, pela própria dinâmica interna das
coletividades juvenis e de suas relações com a sociedade mais geral
(GROPPO, 2016).
Embora não seja o momento de fazer esse confronto conceitual, a concepção
dialética das juventudes é próxima, preservadas as especificidades, à concepção
mounieriana de conversão constante a que a pessoa humana convocada a viver em
seus contextos cotidianos. Isso implica dizer que as expressões de juventudes são
tantas quantos os jovens viventes. Essa concepção de juventudes oferecerá a
continuidade histórica com as rupturas estabelecidas nas concepções monolíticas de
organização social, como observou-se nos eventos ocorridos em maio de 1968 pelo
mundo. Essas rupturas oportunizam o surgimento de novas perspectivas.
Os elementos desse confronto conceitual serão melhor desenvolvidos na
terceira parte do trabalho. Agora, depois da apresentação das concepções e
contribuições de Concílio Vaticano II sobre a eclesiologia contemporânea da Igreja de
Roma, das contribuições do CELAM e dessa conceituação sobre juventudes é
67
oportuno apresentar a caminhada da Pastoral da Juventude como uma possível
expressão da vivência de todos esses apelos.
2.4 A PASTORAL DA JUVENTUDE
No site11 oficial da Pastoral da Juventude, mantido em parceria com a CNBB,
encontra-se um recorte de um texto organizado por Silva (2009), um breve relato sobre
a história dessa iniciativa pastoral, que tem como destinatário principal a própria
juventude. Esse recorte narra os eventos que geraram sua concepção teológico-
pastoral em torno da evangelização da juventude no Brasil.
O site traz ainda como a PJ se organiza nacionalmente, por isso, optou-se por
elegê-lo como uma das fontes para esse primeiro momento de exposição sobre sua
organização e dinamicidade. Na terceira parte do trabalho analisar-se-á sua atuação
em confronto com as categorias de análise dessa pesquisa, pela análise documental,
a saber: “Documento 85 da CNBB”, “Estudos da CNBB 103”, “Pastoral da Juventude:
um jeito de ser e fazer”, e ainda a coleta de dados feita ao longo da pesquisa.
A história da Pastoral da Juventude começa nos anos 1970, e tem seu primórdio
na Ação Católica Especializada (JAC, JEC, JOC, JUC), nos anos 1960. Apoia-se na
Teologia da Libertação e na Pedagogia do Oprimido, correspondentes às expectativas
que as Conferências de Medellín e Puebla trouxeram à ação pastoral com a opção
concreta pelos pobres e pelos jovens (DICK, 1999, pp. 7-9). A juventude,
particularmente sensível aos problemas sociais, reclama as mudanças profundas e
rápidas que assegurem uma sociedade mais justa: exigência que, constantemente,
sente tentação de expressar por meio da violência (PUEBLA, 1968, n.3). É um fato
constatável que o excessivo idealismo dos jovens os coloca facilmente sob a ação de
grupos de diversas tendências extremistas (PUEBLA, 1968, n. 4). As dioceses
passaram, então, a organizar a evangelização dos jovens em pequenos grupos (entre
12 a 25 jovens) e, para melhor acompanhar a organização e formação dos jovens,
iniciou-se a articulação de encontros nacionais com o propósito de melhorar a
comunicação e proporcionar o intercâmbio e a sistematização de experiências.
11 http://www.pj.org.br acesso realizado em outubro de 2016.
68
A PJ, no seu todo, foi valorizando e incluindo em sua caminhada novas
experiências de trabalho com a juventude a partir de suas especificidades, a saber:
juventude rural, juventude estudantil, juventude universitária e juventude dos meios
populares – o que lhe foi exigindo uma nova forma de se articular e se organizar. Os
encontros e assembleias tornaram-se momentos ricos de refletir sobre o
acompanhamento dos jovens para a vida em grupo. Aí a Pastoral da Juventude
iniciava os Seminários para Assessores, que serviram como laboratório e espaços de
reflexões importantes sobre temas como: o processo de formação na fé, a
metodologia de trabalho com jovens, o mundo do trabalho, a cultura, as políticas
públicas de Juventude, o planejamento da ação pastoral, a missão, e tantas outras
discussões.
A PJ realizava seu planejamento e deliberação (definindo Planos de Ação,
organização interna. etc.) nas Assembleias Nacionais da Pastoral da Juventude. A
partir da 11ª ANPJ contudo, em 1995, surgiu a PJB (Pastoral da Juventude do Brasil),
uma organização onde as quatro pastorais de juventude: Pastoral da Juventude (PJ),
Pastoral da Juventude do Meio Popular (PJMP), Pastoral da Juventude Estudantil
(PJE), e Pastoral da Juventude Rural (PJR) reivindicavam participação paritária – o
que trouxe muitos questionamentos para a PJ como tal.
A Assembleia da PJB não era mais a Assembleia da PJ. Esse é um importante
período histórico, pois, a partir desse evento, a PJ não concentra mais sua articulação
no espaço da Pastoral da Juventude do Brasil, mas decide fazer um caminho de
reflexão, que vai culminar em um novo modelo de organização própria, sem deixar de
pertencer ao todo. A nova forma de organização trouxe também momentos de
conflitos e crises, que possibilitaram a abertura de discussões sobre o melhor espaço
e metodologia para se alcançar os adolescentes e jovens. Para a organização interna
da PJ essas mudanças causaram principalmente dois problemas.
O primeiro diz respeito ao fato da PJ não ter mais um espaço próprio de
deliberação e planejamento em que pudesse discutir sua articulação nacional interna
e seus desafios específicos. O segundo relaciona-se com a participação da PJ nestas
Assembleias que ficou reduzida, pois as vagas foram distribuídas igualmente entre as
pastorais e não por regionais como antes. Isso provocou um grande distanciamento
das dioceses com a instância nacional. A partir de então, a PJ passou a organizar-se
69
com atividades anuais permanentes, a saber: a Semana de Cidadania, a Semana do
Estudante e o dia Nacional da Juventude. Os eventos são realizados de forma
processual e em consonância com a Campanha da Fraternidade (CF), com as
Diretrizes Gerais da Evangelização da Igreja no Brasil e tendo presente o Documento
85 da CNBB.
Esses encontros são organizados e animados por um Conselho Nacional da
PJ. Ele é composto por representantes dos grupos de jovens respectivos aos seus
Regionais, conforme a organização pastoral da CNBB: Leste 1 e 2; Nordeste 1, 2, 3,
4 e 5; Noroeste 1; Norte 1 e 2; Centro Oeste 1; Oeste 1 e 2; Sul 1, 2, 3 e 4; do
CONJUVE (representante dos movimentos juvenis das congregações) e uma
Secretária Nacional. Com a ajuda dessa estrutura, a PJ busca exercer sua missão de
evangelização na opção pelos pobres e jovens, em consonância com a Igreja na
América Latina. Esse compromisso convoca seus membros a encontrarem-se com os
jovens de todas as realidades eclesiais e sociais:
Sonhamos com uma juventude participativa, consciente, engajada e formada,
sabendo e conhecendo seu meio e sua realidade; uma juventude missionária,
organizada, ousada, autêntica, realizada, feliz, verdadeira e sonhadora
(SILVA, 2009, p. 9).
O objetivo da PJ é despertar os jovens para a pessoa e a proposta de Jesus
Cristo, desenvolvendo com eles um processo global de formação a partir da fé para
formar líderes capacitados para agirem na comunidade, na própria pastoral e em
outros ministérios da Igreja, nos diferentes meios como a escola, a universidade e a
zona rural. Comprometidos com a libertação integral da pessoa e da sociedade,
levando uma vida em comunhão e participação (CNBB, Doc. 76).
Essa mesma juventude atuante é formada por processos que educam para a
fé, visando a construção de pessoas comunitárias e cidadãs em consonância com a
luta pela justiça social com participação e comunhão. A caminhada formativa nos
grupos de jovens se desenvolve por meio de quatro passos: a convocação, a
nucleação, a iniciação e a militância: "Sonhamos em reavivar, no homem e na mulher,
a liberdade e a igualdade, em dignidade e direitos, tendo por base os valores do
Evangelho" (SILVA, 2009, p. 9). Os quatro eixos temáticos da ação da PJ são: a
formação, a ação, a espiritualidade e a articulação. E seus princípios são:
70
1. No seguimento a Jesus Cristo, evangelizar e deixar-se evangelizar a partir
das diferentes realidades e culturas, privilegiando a juventude empobrecida.
2. A partir do projeto e da Pessoa de Jesus Cristo ter o jovem como protagonista
e agente libertador, tornando-o sujeito da história, à partir do seu meio.
3. Ter nos jovens empobrecidos, em particular, nos excluídos, o seu referencial
na formação de agentes de transformação.
4. Assumir a originalidade da juventude nas diferentes realidades e
experiências.
5. Valorizar e reconhecer a Pessoa em todas as suas dimensões, fazendo
emergir a Nova Mulher e o Novo Homem.
6. Enfatizar a gestação da Nova Mulher e do Novo Homem, vivenciando as
diferenças e valorizando o que é próprio de cada um.
7. Resgatar e construir a cidadania como meio de superação da opressão e da
exclusão.
8. Ter, em seus jovens, os sujeitos da ação transformadora, gerando o Novo.
9. Ajudar o jovem a experimentar e a vivenciar o sentido pascal na própria vida.
10. À maneira de Jesus Cristo, que se encarnou e resgatou os valores da cultura
de seu povo, cultivar uma espiritualidade enculturada nas diversas realidades do
jovem latino-americano.
11. Aprofundar uma espiritualidade ecumênica e aberta ao diálogo inter-
religioso, considerando que os valores da paz, da justiça, do amor e da vida são
valores universais.
12. Ajudar, principalmente pelo testemunho, a concretizar a proposta de Jesus
Cristo na realidade onde vivemos.
Novamente em Silva:
Sonhamos uma igreja mais apaixonada, profética, evangelizadora,
acolhedora, orante, missionária, transformadora e comprometida com o
Projeto de Jesus Cristo, procurando maior participação dos jovens na
comunidade, valorizando o ecumenismo e com uma opção preferencial pelos
pobres, adaptada às diferentes realidades (SILVA, 2009, p. 9).
A apresentação de recortes da história da PJ, de sua evolução e organização,
a metodologia de grupo, os eixos temáticos e os princípios norteadores da sua ação,
oferecem uma aproximação da experiência vivida pelos grupos de jovens ao longo de
71
todo o país. Esses dados serão enriquecidos com a coleta de dados feita na pesquisa
exploratória e que será confrontada com as categorias de análise oriundas da
Personalismo de Emmanuel Mounier.
72
PARTE III
DA ANÁLISE DE DADOS
3.1 DADOS DA PARTORAL DA JUVENTUDE (PJ) NA ATUALIDADE
Para apresentar a atual experiência vivida pela PJ no Brasil é necessário fazer
uma digressão histórica para recuperar o percurso realizado até aqui com relação à
formação dos grupos juvenis ligados à Igreja. A PJ, como se visualiza atualmente, não
foi sempre assim e contemporaneamente prova a urgência de novas mudanças para
sua própria subsistência e eficácia evangelizadora.
A ação católica (AC), movimento iniciado pelo Papa Pio XI, chega ao Brasil em
1932, especialmente nos estados do Nordeste, como Ação Católica geral. Desse
movimento embrionário desenvolve-se a Ação Católica Especializada, de íntima
relação com a história da PJ, como observou-se na segunda parte desse trabalho.
Possuía uma direção política e pedagógica que buscava a liberdade para a
coletividade e não contemplava especificamente as necessidades da juventude como
um todo.
Frente à efervescência vivenciada na ação católica, engajada com
problemáticas sociais, anuncia-se a necessidade de que a juventude desse
movimento tivesse sua própria identidade, que respondesse às especificidades das
suas necessidades:
No congresso de 1948, a Ação Católica se especializou em setores específicos. Surge a JAC, JEC, JIC, JOC e JUC. Foi um passo decisivo que a Igreja deu para ajudar os jovens a viverem sua fé, a partir do seu meio social específico. Distinguiram-se principalmente a JOC (no mundo do trabalho) e a JEC e JUC (no mundo estudantil). Esta experiência de educação da fé foi despertando uma maneira de se posicionar diante da vida através do método VER-JULGAR-AGIR. Pouco a pouco os jovens da Ação Católica foram descobrindo as contradições da sociedade e da Igreja (HACK, 1982, p. 10).
Os movimentos pastorais, de forma geral, olhavam para a juventude com um
anseio de renovação de seus próprios movimentos e como verdadeiros nichos
vocacionais para as congregações e Diocese. Não dispendia-se energias pastorais
especificas e mesmo metodologias próprias para atender às descobertas da
juventude, apoiá-la, aconselhá-la, educá-la, considerando-a em seu contexto
existencial. O despertar da ação católica acabou sendo, de uma maneira ou de outra,
como que o primórdio da história da Pastoral da Juventude.
73
No desenvolvimento de sua história, a PJ viu o esmorecer dos movimentos
juvenis da Ação Católica. Tal fato não apresentou-se como um enfraquecimento da
articulação da juventude na Igreja. Mas favoreceu, pesarosamente, ver jovens que,
por falta de apoio da hierarquia da Igreja, passaram a viver na clandestinidade e
associarem-se a militâncias seculares, partidárias e de protestos extremos.
A Ação Católica, portanto, abriu caminhos para a reflexão e o amadurecimento
do papel do jovem na Igreja e sua contribuição particular na evangelização e
transformação da realidade. A década áurea desse movimento embrionário encontra
apoio no Centro de Juventude Anchietanum, em São Paulo capital, pela iniciativa dos
Padres José Maria Herreros e Luiz Arnaldo Serafin, que juntos trabalharam pela
juventude numa perspectiva formativa, por meio de retiro e diversos encontros (DICK,
1999).
Com o passar dos anos, especialmente no final da década de 1980 em diante,
observa-se na Igreja o florescimento de movimentos juvenis diferentes em proposta
metodológica e finalidade em relação à Igreja. Com a chegada do Novo Milênio, as
chamadas “novas comunidades e movimentos” cativam e cultivam a fidelidade da
juventude com uma diversidade de propostas carismáticas.
A Pastoral da Juventude vai aprofundando sua especificidade, amadurece
enquanto método, dinâmicas de animação, projetos e intervenções. Mas nesse novo
quadro já não caracteriza-se como a única proposta para os anseios juvenis em geral
no interior da Igreja. Muitos jovens não se identificam mais com sua proposta de
vivência do Evangelho.
A Igreja, que assumira o compromisso de acompanhar e apoiar a juventude
desde Puebla, sente-se interpelada a acolher e articular a diversidade de propostas
de trabalhos juvenis de Evangelização. Para tanto, propõe e busca amadurecer o
Setor Diocesano da Juventude, nas animações pastorais das Dioceses no Brasil. A
Pastoral da Juventude, por sua vez, é convocada a fazer parte desse mesmo
movimento de articulação pastoral.
É evidente que um movimento pastoral como a PJ, com sua característica de
militância e embate, não se apresenta totalmente favorável à proposição da
articulação da Juventude na Igreja. Antes, porém, de desenvolver uma reflexão acerca
desse embate, algo que ficará evidenciado na análise dos dados extraídos dos
documentos, questionários e entrevistas, aqui analisados, apresentar-se-á essa
74
proposta de animação pastoral juvenil e, posteriormente, a implicação disso na vida
da PJ.
3.1.1 O Setor Juventude
A Igreja preocupa-se atualmente, e como em outros tempos, com o
fortalecimento da comunhão. Compreende-a como uma comunhão orgânica, como
articulação dos carismas suscitados por Deus, presentes no seu interior. No que toca
à juventude, o Estudo 103 da CNBB (2013), propõe uma transição de mentalidade, a
começar pela própria escolha do nome, sobre a articulação da juventude no Brasil:
Pastoral Juvenil. A partir de então essa será a expressão oficial da juventude da Igreja
no Brasil, e não a Pastoral da Juventude (PJ).
Tal proposição não prescinde de toda a história dos movimentos pastorais
juvenis no Brasil. Aponta-a como amadurecimento desse mesmo processo histórico.
O Setor Diocesano de juventude é assinalado pela Igreja como a maturidade da
história da juventude na Igreja do Brasil e como resposta aos apelos do Documento
85 da CNBB (2007). No âmbito dessa proposta, os bispos são os primeiros
responsáveis pela animação pastoral de toda a juventude em sua porção do povo de
Deus. E desde a CNBB, via Comissão Episcopal Pastoral para a Juventude, promove
tal responsabilização. Não como maneira de inibir o protagonismo juvenil, mas como
maneira de aproximar sempre mais o Pastor e o povo. Sua organização se dá como
pode ser observado no esquema abaixo:
75
Figura 01. Esquema da organização da Comissão Episcopal Pastoral para a Juventude
Fonte: CNBB (2013, p. 94)
Além da aproximação dos fiéis jovens aos seus pastores pode-se observar
nesse organograma uma preocupação com a agregação, articulação e diálogo entre
as diversas expressões juvenis da Igreja. Como definido no Estudo 103:
A Pastoral Juvenil é a organização da ação da Igreja, presente em cada uma das expressões juvenis ou na articulação entre elas, que garante a Evangelização da Juventude. Anteriormente, toda a Pastoral Juvenil no Brasil era conhecida com o nome de Pastoral da Juventude (PJ). A partir do Documento 85, ao reconhecer a significativa presença eclesial das demais expressões a favor dos jovens, a Pastoral Juvenil se compreende, principalmente, como a ação organizada eclesial de cada uma delas e de todas elas em conjunto (CNBB, 2013, n.7)
76
Mas o que essa organização tem a ver com a vida da PJ no Brasil? Com a
articulação das diversas expressões juvenis no interior da Igreja em um mesmo
movimento de Evangelização, a PJ, outrora detentora exclusiva e oficialmente
reconhecida da expressão dos jovens na Igreja, passa a partilhar com outras
expressões carismáticas essa mesma animação.
A PJ, dentro dessa proposta de animação e articulação pastoral, é uma
representante das quatro Pastorais da Juventude (PJ, PJMP, PJR e PJE12) e que têm
sua organização voltada aos grupos juvenis eclesiais. O organograma abaixo ajuda a
entender a identidade e missão da Coordenação da Pastoral Juvenil Nacional (CNBB,
2013, p. 97):
Figura 02. Organograma da Coordenação da Pastoral Juvenil Nacional
Fonte: CNBB (2013, p. 97)
12 PJR (Pastoral da juventude rural); PJE (Pastoral da Juventude estudantil) e PJMP (Pastoral
da Juventude do meio popular).
77
Primariamente, pode-se afirmar que a Pastoral da Juventude, com todo seu
ideal de promoção do protagonismo juvenil, em matéria da Evangelização da
Juventude, foi afetada por essa organização no mínimo em dois aspectos, a saber: a.
a fragilização do protagonismo, pois a nova organização aproxima mais os bispos e a
hierarquia da Igreja na participação e deliberação de pontos de animação da
Evangelização Juvenil e também b. na significatividade da sua representação nesse
organograma, outrora, quase exclusivo.
Para abordar a experiência da PJ na atualidade, caberia aqui ainda
apresentação de dados que revelassem o número de grupos a essa articulados, bem
como, em qual fase de maturidade cada um deles está. Mas, infelizmente, não há
nenhuma publicação oficial sobre esses dados e ainda existe certa resistência, da
parte de lideranças da PJ, em oferecê-los. Contudo, a coleta de dados documental e
via questionário, acerca da vida da Juventude na PJ e na Igreja, abaixo exposta,
colaborarão para que construamos um quadro de compreensão mais ampla, e, ao
mesmo tempo, aprofundada, da PJ.
3.2 Das estruturas de coleta de dados
Como enunciado na parte introdutória dessa dissertação, vários instrumentos
de coleta de dados foram aqui empregados, para possibilitar a triangulação desses
dados e o suporte para a argumentação aqui elaborada. Em assim sendo, passamos
abaixo à apresentação e à análise dos instrumentos empregados e dos dados assim
coletados.
3.2.1 Análise documental
A análise documental se constitui:
em um procedimento para rever ou avaliar documentos – quer impressos, quer eletrônicos (informatizado ou digital). Como outros métodos analíticos na pesquisa qualitativa, a análise de documentos requer que os dados sejam examinados e interpretados para fazer emergir significado, ganhar compreensão e desenvolver conhecimento empírico (CORBIN & STRAUSS, 2008; RAPLEY, 2007). O documentos contêm texto (palavras) e imagens, que foram registradas sem a intervenção do pesquisador. Para os objetivos dessa discussão, outras evidências mudas ou traçáveis, tais como os artefatos culturais, não foram aqui incluídos. Atkinson e Coffey (1997) referem-se aos documentos como “fatos sociais”, os quais são
78
produzidos, compartilhados e usados de formas socialmente organizadas (BOWEN, 2009).
Como objeto de sua ação, a pesquisa documental, enquanto instrumento de
coleta de dados, pode fazer uso de tabelas, fotografias, atas, relatórios, notas, projetos
de lei, diários, ofícios, discursos, mapas, testamentos, inventários, depoimentos orais
e escritos, correspondência, documentos arquivados em repartições públicas,
associações, igrejas, hospitais e sindicatos (SANTOS, 2000).
Nesse sentido, os documentos aqui analisados foram de diversas ordens, mas
em especial aqueles vinculados à Igreja. Iniciamos com a caminhada histórica do
CELAM, reconhecida via de recepção e interpretação das orientações do magistério
da Igreja, forjadas no Concílio Vaticano II, sendo sua base teológica já apresentada
na segunda parte desse trabalho. Numa síntese, aí encontram-se as linhas de ações
pastorais que revelam a visão oficial da Igreja acerca da ação pastoral com a
juventude. Abaixo elencar-se-á algumas contribuições dessa história magisterial como
parte da análise documental.
Da Conferência Episcopal Latino Americana ocorrida em Medellín (1968, n.14),
destaca-se a necessidade de uma ação pastoral de conjunto para fortalecer o sentido
de pertença do jovem junto à Igreja e vice-versa. O que implicou na criação de centros
de estudo sobre a Juventude e o desenvolvimento de um processo de formação cristã
autêntico, promotor de uma melhor compreensão da juventude sobre si e da Igreja
sobre ela. Também, como atestam os documentos de nn. 17-20, os Bispos assumiram
o compromisso de confiar e promover o protagonismo dos movimentos juvenis em
suas Dioceses, estimulando-os na luta pela transformação das estruturas sociais.
Já da Conferência de Puebla (1979), salienta-se que a Igreja faz opção
preferencial pela juventude, por reconhecer nela uma ação dinamizadora do corpo
social. Afirma mais uma vez a necessidade de uma pastoral orgânica, orientando-a
para o amadurecimento de um discernimento vocacional (documento n. 1187). Ainda,
a decisão de promover um itinerário de amadurecimento dos jovens na fé, cujo o
fundamento é Jesus Cristo, tornando-os apóstolos e promotores das transformações
sociais necessárias e fazendo da Pastoral da Juventude uma pastoral de alegria e de
esperança (nn. 1203-1205).
79
Na Conferência de Santo Domingo (1992), reafirma-se a opção preferencial
pelos jovens e a promoção do seu protagonismo através do método ver-julgar-agir,
bem como a necessidade de uma ação pastoral orgânica, promovendo espaços de
diálogo e participação na Igreja. Para tanto, assume-se o compromisso de dinamizar
cada vez mais os momentos litúrgicos. (nn. 115-120).
Como resultante da Conferência de Aparecida (2007), o número 446 do
Documento de conclusão do CELAM, traz a mais recente contribuição da
interpretação e esforço de aplicação do discurso oficial da Igreja sobre a
Evangelização junto à juventude. E apresenta as seguintes pistas de ação:
- Renovar a opção preferencial pelos jovens dando impulso à Pastoral Juvenil
nas comunidades;
- Propor aos jovens o encontro com Jesus Cristo e em seu seguimento na Igreja
que lhes garante a realização de sua dignidade, estimule-os a formar sua
personalidade, proponha-lhes uma opção vocacional, introduza-os na oração pessoal,
na Lectio Divina, na frequência dos sacramentos, na direção espiritual e no
apostolado;
- Privilegiar, na Pastoral Juvenil, processos de educação e amadurecimento na
fé como resposta de sentido e orientação da vida e garantia do compromisso
missionário;
- Implementar uma catequese atraente para os jovens, introduzindo-os no
mistério de Deus;
- Com o amadurecimento do processo de crescimento na fé formá-los para a
atuação social e política visando a mudança das estruturas sociais conforme a
proposta da Doutrina Social da Igreja;
- Promover maior sintonia entre o mundo adulto e juvenil;
- Assegurar a participação dos jovens em peregrinações, jornadas nacionais e
mundiais da juventude com a devida preparação espiritual e missionária e
acompanhamentos de seus pastores.
Analiticamente, pode-se afirmar que a contribuição histórica do CELAM, de
Medellín à Aparecida, na discussão da caminhada da juventude na Igreja, tem como
pontos centrais: 1. uma firme opção preferencial pela juventude; 2. a promoção do
80
protagonismo juvenil; 3. a elaboração e proposição de itinerários e centros de
formação para o amadurecimento da e na fé; 4. a necessidade de uma pastoral
orgânica; 5. a promoção de ações transformadoras da sociedade;
Esses cinco pontos podem servir como indicadores para a realização de uma
análise acerca da contribuição do magistério latino-americano, isto é, do desempenho
da Igreja em relação à juventude e vice-versa. Apresentam-se como razoáveis
critérios de avaliação da recepção desses ensinamentos na vivência sociocomunitária
dos membros dos mais diversos grupos juvenis, em especial, pela proposta dessa
pesquisa, da Pastoral da Juventude.
No intuito de fortalecer e entender melhor esses cinco pontos, apresentar-se-á
parte privilegiada da contribuição do Documento 85 da CNBB, lançado em 2007,
concomitante à presença do Papa Bento XVI no Brasil para a abertura da V
Conferência Episcopal Latino-americana e Caribenha e seu encontro com a
Juventude no Estádio do Pacaembu. Com o objetivo de apreender melhor o afetivo e
efetivo compromisso de cuidar e caminhar com a Juventude do Brasil, na busca
conjunta de proposições que pudessem favorecer sua verdadeira evangelização (n.4).
Nesse Documento encontram-se outras 8 linhas de ação, que formam uma boa
parte do arcabouço teórico de referência magisterial para toda a ação pastoral da
Igreja no Brasil no que tange à juventude, a saber:
- Promover a Formação Integral, visando auxiliar especialmente na elaboração
e realização do Projeto de Vida Pessoa;
- Promover a espiritualidade, especialmente por meio de experiências de
oração que respeitem as características de seu desenvolvimento;
- Promover a pedagogia da formação pela proposição de itinerários
consistentes;
- Formar o jovem discípulo missionário, promovendo um autêntico encontro com
Cristo, único capaz de dar sentido à vida;
- Promover as estruturas de acompanhamento dos jovens, especialmente na
implementação do Setor Juventude como ação estratégica que favoreça a expressão
da diversidade juvenil no interior da Igreja;
81
- Formar assessores para acompanharem os jovens em seu desenvolvimento
e ações missionárias;
- Promover uma mentalidade que favoreça o diálogo entre Fé e Razão;
- Atuar nos mais diversos segmentos sociais e no interior da Igreja no combate
contra a vulnerabilidade da vida para que ela se desenvolva em todo o seu potencial.
Da Conferência Episcopal de Santo Domingo (1992) até o lançamento do
Documento 85 da CNBB (2007) e a abertura da V Conferência Epsicopal Latino-
americana e Caribenha de Aparecida (2007), passaram-se 15 anos. Nas linhas de
ação propostas pelo Documento verifica-se um esforço de orientação em torno dos
cinco pontos apresentados até então na elaboração das Conferências Episcopais
Latino-americanas. Há, também, a continuidade da recepção dessa elaboração
magisterial, no interior da Igreja no Brasil, bem como sua efetiva contribuição para a
continuidade dele, pois Aparecida reafirmará a necessidade de fomentar e formar
discípulos missionários de Jesus Cristo, elemento presente já no Documento 85.
Pode-se afirmar que há uma consonância entre os apelos da história magisterial
do CELAM e as linhas de ação propostas pelo Documento 85 da CNBB. Com isso,
pode-se afirmar também a consolidação de uma orientação magisterial Latino-
americana em matéria de evangelização da juventude, isto é, de um discurso oficial
acerca dessa pauta.
Nessa análise documental, como observado até aqui, uma das grandes
preocupações quanto aos desafios da Igreja na América Latina, é a consolidação de
uma pastoral de conjunto. Em matéria de evangelização da juventude, e em resposta
aos apelos de Aparecida, no ano de 2013, a CNBB lança na série Estudos da CNBB
o número 103: “Pastoral Juvenil no Brasil: Identidade e Horizontes”.
Nele retoma-se um apanhado histórico da ação evangelizadora junto à
juventude, destacando, especialmente, elementos da construção do Documento 85
da CNBB, o Evento da Jornada Mundial da Juventude do Rio de Janeiro e a
Campanha da Fraternidade sobre a juventude, ambas realizadas em 2013, a
revitalização da Pastoral Latino-americana e outro apanhado histórico acerca da
Pastoral Juvenil e da Juventude.
A análise das contribuições desse estudo revelará uma resposta ao anseio de
articulação da Igreja no Brasil na contemplação da diversidade de expressões juvenis
para a evangelização, isto é, um esforço de consolidar o sonho de uma pastoral
82
orgânica, que abrigue todos os grupos juvenis dos diversos movimentos carismáticos
presentes no interior da Igreja e o desenvolvimento dos jovens que deles participam.
Em linhas gerais, o estudo 103 faz uma leitura histórica acerca da evolução dos
movimentos pastorais juvenis, antes e a partir da década de 1960. Visa, com isso,
acentuar a perspectiva de que a proposta do Setor Diocesano da Juventude, isto é, a
Pastoral Juvenil, nada mais é do que uma resposta natural ao desenvolvimento
histórico do envolvimento juvenil na Igreja do Brasil, bem como do acompanhamento
do clero e religiosos juntos a estes:
A comunhão, fruto da unidade, é anunciada no Evangelho e trabalhada permanentemente pela Igreja. Os discípulos missionários de Jesus Cristo se abrem a este convite e se empenham em sua busca. A organização diocesana, convicta de valor e missão, convoca todas as forças para esse objetivo comum. E para a área juvenil não pode ser diferente (CNBB, 2013, p.57)
Essa convicção e intervenção da Igreja Diocesana para a promoção da
comunhão entre os diversos movimentos juvenis busca responder aos apelos do
documento do CELAM para a juventude: “Civilização do Amor”, que, por sua vez,
deseja promover uma pastoral orgânica também, na ação evangelizadora da
juventude.
O chamado Setor Diocesano da Juventude é o espaço de comunhão, capaz de
congregar as diversas formas de trabalho juvenil. Desde setembro de 1995, o Setor
Juventude da CNBB, instância nacional diretamente relacionada ao Setor Diocesano,
tem realizado encontros nacionais com congregações religiosas e movimentos
juvenis, com vistas a aprofundar o diálogo e a parceria com a PJ no Brasil. Todo esse
esforço ganha uma intensificação em 2007, com o Documento 85, apresentado
anteriormente (CNBB, 2013).
Os principais objetivos do Setor Juventude são:
- favorecer e dinamizar a pastoral juvenil diocesana a partir de todas as forças
presentes;
- favorecer a integração e o diálogo entre os segmentos juvenis;
- garantir espaço de reflexão, discernimento, tomada de posição e celebração
conjunta;
83
- propor algumas diretrizes, metas, prioridades e atividades comuns;
- resgatar, no coração de todos, o amor pela juventude;
- auxiliar a Igreja com suas comunidades na acolhida aos jovens, garantindo
sua opção efetiva por eles;
- fortalecer o sentido de pertença eclesial e de corresponsabilidade sobre a
missão evangelizadora da Igreja;
- ser expressão eclesial e social da diversidade juvenil;
- auxiliar a diocese a responder com mais capacidade e resultados ao clamor
dos jovens por vida plena em todas as suas dimensões.
Na sequência do estudo 103 encontra-se a apresentação das razões para a
criação e a animação do Setor Diocesano da Juventude, bem como dos critérios para
sua boa organização. Destacam-se os seguintes critérios:
- respeito pela identidade, ritmo, projetos de cada expressão;
- valorização do protagonismo juvenil;
- progressiva abertura aos outros organismos eclesiais e não eclesiais (ONGs,
grupos culturais, governo e instituições);
- não sobrecarregar nenhuma das expressões com responsabilidade de
coordenar o Setor.
Tendo procedido ao exercício de análise de alguns documentos fundamentais
3.2.2 Dos questionários
O questionário, como instrumento de coleta de dados, representa, de acordo
com Gil (2008), a tradução dos objetivos da pesquisa num rol de questões específicas,
de caráter aberto ou não estruturado (respostas subjetivas e dadas por escrito),
fechado ou estruturado (respostas sintéticas, de assinalamento de respostas) ou
semiestruturado (composto por questões abertas e fechadas, arranjadas de acordo
com os interesses da investigação). A intenção do questionário é aquela de descrever
características, modos de interpretar fenômenos, concepções, etc.,e um determinado
84
grupo. Ainda segundo Gil (2008), as vantagens do questionário são: a. abarcar um
grande número de pessoas; b. abre a possibilidade de abranger uma área geográfica
extensa e na qual os informantes estejam dispersamente localizados; c. redução de
gastos para a coleta de dados; d. desde que bem construído, facilita levantar e analisar
as opiniões, concepções e conhecimentos dos informantes em relação a fatos,
crenças, sentimentos, comportamentos e padrões éticos de ação. O mesmo autor
(2008, p. 122), também explicita as limitações desse instrumento de coleta de dados:
a) exclui pessoas que não sabem ler ou escrever, o que, em certas circunstâncias, traduz a graves deformações nos resultados da investigação; b)Impede auxílio ao informante quando este não entende corretamente as instruções ou perguntas; c)Não oferece a garantia de que a maioria das pessoas devolvam-no devidamente preenchido, o que pode implicar a significativa diminuição da representatividade da amostra; d)Envolve, geralmente, número relativamente pequeno de perguntas, porque é sabido que questionários muito extensos apresentam alta probabilidade de não serem respondidos; e e)Proporciona resultados bastante críticos em relação à subjetividade, pois os itens podem ter significado diferente para cada sujeito pesquisado.
Em relação aos questionários aplicados de forma eletrônica on line, Wright
(2005) afirma que com o aperfeiçoamento da comunicação mediada pelos
computadores, essa forma de coleta de dados vem se popularizando crescentemente.
O autor aponta, como vantagens próprias aos questionários on line: a. alcançar, em
tempo real ou na mesma janela de tempo, respondentes em diversas localizações
geográficas, mesmo muito distantes do local onde se encontra o pesquisador; b.
favorecer que dúvidas sobre o preenchimento sejam dirimidas rapidamente, pois a
comunicação entre o pesquisador e o respondente é facilitada; c. economia de
recursos, pois o custo com a distribuição e coleta de respostas não se estende para
além daqueles provenientes do custo da internet e de tempo; d. acessar respondentes
que, de forma geral, sofrem estigmas quando os questionários são respondidos
presencialmente, como aqueles com deformidades físicas, formas graves de
distúrbios alimentares, ou com outras formas de patologias ou condições físicas; e. a
tabulação dos dados, feita de maneira automática – e eficiente – pelos softwares
empregados para essa forma de coleta de dados. Como desvantagens são citadas
pelo mesmo autor (2005): a. incerteza sobre a validade dos dados e b. o acesso ao
85
questionário, que depende de certas condições de tecnologia, energia, facilidade do
respondente com o uso de computadores, celulares ou tabletes.
Considerando essas possíveis vantagens e desvantagens, em relação à
pesquisa aqui relatada: tendo em vista a abrangência geográfica da PJ, e a faixa etária
a ser investigada, ponderamos que o questionário eletrônico seria uma forma de
favorecer alcançar um maior número de respondentes, que potencialmente já teriam,
pelo fator idade, mais familiaridade com os meios tecnológicos para responder
efetivamente ao questionário. Quanto à questão da confiabilidade da identificação da
mostra ou das respostas, observamos que mesmo questionários realizados
presencialmente carecem de confiabilidade total na coleta das respostas. E, por outro
lado, responder presencialmente a um questionário pode inibir ou influenciar as
respostas, enquanto o relativo anonimato do ambiente virtual pode favorecer a
emissão de respostas mais de acordo com o que o respondente, de fato, pensa.
Porém, o inverso também pode ser verdadeiro.
Em assim sendo, para ampliar a validade e a confiabilidade dos dados
coletados, é que empregamos a técnica de triangulação dos dados, por meio da qual
diferentes métodos e instrumentos de coleta de dados são empregados e os dados
coletados são cotejados entre si, possibilitando levantar tensões, convergências,
divergências e discrepâncias.
Quanto aos procedimentos de aplicação dos questionários propriamente dito,
assim procedemos. No dia 24 de agosto de 2016 foi feito um pré-teste do questionário,
aplicado a 20 sujeitos, considerados representativos do público que se pretendia
alcançar com o questionário. Em não havendo maiores problemas com o teor das
questões, ou com o design do questionário, de maneira geral, no dia 02 de setembro
de 2016 fora disponibilizado, via Google Docs, o primeiro questionário dessa
pesquisa. Ele ficou aberto para a contribuição dos respondentes até o dia 25 de
outubro do mesmo ano. Visou coletar uma primeira contribuição dos membros da PJ
acerca da definição, identidade e valores dessa pastoral, o engajamento de seus
membros em âmbito grupal e o engajamento de cada um dos respondentes.
O questionário foi elaborado a partir, especialmente, das contribuições do texto
“Pastoral da Juventude: um jeito de ser e fazer. Orientações para a caminhada: um
CORPO em construção” de Lorival Rodrigues Silva (2009). E proposto aos
respondentes em forma de Escala Likert questionando-os sobre seu grau de
86
concordância e discordância acerca do enunciado em confronto com o que vivenciam
junto a PJ atualmente.
Nessa primeira fase da coleta de dados o número de respondentes foram 64
pessoas, de 16 estados brasileiros, 37 municípios e 21 Dioceses da Igreja no Braisl.
Foi contemplada a participação de todas as regiões da nação brasileira nas seguintes
porcentagem de respondentes: 31% da região Sul, 24% da região Norte, 23% da
região Sudeste, 12% da região Centro-Oeste e 10% da região Nordeste.
Uma outra fase da coleta de dados, via questionário, foi realizada entre 07 de
dezembro de 2016 a 25 de fevereiro de 2017. Contou com a participação de 29
respondentes e visou aprofundar as razões da adesão e permanência dos
respondentes nas vivências sociocomunitárias da PJ. Esse questionário resultou
necessário a partir da coleta de dados do questionário anterior, que levantou
informações relevantes para outros aspectos que não tinham sido inicialmente
pensados, quando da elaboração dos objetivos da pesquisa. Os respondentes desse
segundo questionário foram escolhidos dentre aqueles sujeitos que exercem as
funções de coordenadores de grupos de base da PJ, membros ativos e iniciantes dos
grupos, militantes e assessores. Representam 2 regiões do Brasil: Sudeste e Norte.
Essa escolha se deveu aos limites temporais da pesquisa, privilegiando-se focar as
respostas em grupos que poderiam mais bem representar os dados buscados.
Estamos cientes de que isso pode significar uma limitação para os dados da pesquisa,
mas ponderamos também que outras investigações podem ser feitas, na continuidade
desse estudo, para clarificar tais pontos.
3.2.3 As entrevistas
Uma outra fase da coleta de dados, via questionário, foi realizada entre 07 de
dezembro de 2016 a 25 de fevereiro de 2017. Contou com a participação de 29
respondentes e visou aprofundar as razões da adesão e permanência dos
respondentes nas vivências sociocomunitárias da PJ. Esse questionário resultou
necessário a partir da coleta de dados do questionário anterior, que levantou
informações relevantes para outros aspectos que não tinham sido inicialmente
pensados, quando da elaboração dos objetivos da pesquisa. Os respondentes desse
segundo questionário foram escolhidos dentre aqueles sujeitos que exercem as
funções de coordenadores de grupos de base da PJ, membros ativos e iniciantes dos
87
grupos, militantes e assessores. Representam 2 regiões do Brasil: Sudeste e Norte.
Essa escolha se deveu aos limites temporais da pesquisa, privilegiando-se focar as
respostas em grupos que poderiam mais bem representar os dados buscados.
Estamos cientes de que isso pode significar uma limitação para os dados da pesquisa,
mas ponderamos também que outras investigações podem ser feitas, na continuidade
desse estudo, para clarificar tais pontos.
O objetivo das entrevistas foi aprofundar a compreensão dos dados coletados
na primeira fase da pesquisa, especialmente no que toca a ação efetiva da PJ a partir
da sua identidade, valores e ação evangelizadora. As entrevistas foram realizadas no
período de 30 de outubro de 2016 a 30 de novembro do mesmo ano. Tendo entre os
respondentes representantes de 4 regiões do Brasil: Sudeste, Nordeste, Centro-oeste
e Norte.
Para Kvale (1996), a entrevista tem por objetivo descrever os significados de
temas centrais na vida de determinados sujeitos, considerados exemplares devido às
suas experiências de vida, profissionais, acadêmicas, etc. A principal tarefa da
entrevista é compreender a concepção e interpretação que os entrevistados têm de
determinado fenômeno, mas de uma forma mais aprofundada e detalhada do que
aqueles dados coletados via questionários, por exemplo. Dessa forma, quando
empregados em conjunto, questionários e entrevistas podem complementar-se,
ampliando a riqueza e a confiabilidade dos dados coletados. Kvale (1996) também
destaca algumas características da entrevista: são mais pessoais do que os
questionários; há a possibilidade de argumentação, por parte do respondente;
consomem mais tempo e o perfil do entrevistado é parte direta do instrumento de
coleta de dados, pois a entrevista se baseia na especialidade do respondente, em
determinado campo, como acima mencionado.
Em relação aos tipos, uma entrevista pode ser informal, baseada em um guião
de perguntas, e ter respostas abertas ou fechadas. As entrevistas por nós realizada
foram baseadas em um guião, e de caráter aberto.
As entrevistas on line fazendo uso do correio eletrônico, como aquelas aqui
realizadas, apresentam as vantagens de reduzir as limitações tempo-espaciais;
reduzir os custos da pesquisa; priorizam o conforto dos participantes, pois esses
podem responder à entrevista conforme sua disponibilidade; encorajam a reflexão
interativa, pois há tempo para que as respostas sejam mais elaboradas e eliminam os
88
problemas das transcrições, que existem nas entrevistas gravadas (ruídos, mal
entendidos, etc). Como limitações, as entrevistas on line: requerem que os
respondentes tenham familiaridade com recursos tecnológicos e acesso fácil a esses;
têm pouca ou nenhuma “pista social”, referentes às expressões faciais/corporais, que
compõem a comunicação verbal, agregando significado a essa; demora nas
respostas, o que pode comprometer a análise dos dados; há menos possibilidade do
entrevistado enriquecer suas respostas com histórias, exemplos, etc. (BOWDEN;
GALINDO-GONZALEZ, 2015). Buscamos superar, ou ao menos contornar, algumas
dessas limitações disponibilizando-nos ao contato frequente com os respondentes,
para apoiar o processo de coleta dos dados.
Naquilo que se refere aos aspectos éticos, tanto nos questionários como nas
entrevistas, apresentou-se em seu cabeçalho um termo de consentimento informado
aos respondentes, nos seguintes termos:
Esse questionário é um instrumento que visa coletar dados, oferecidos pelos próprios membros dos diversos grupos de PJ, como expressão da sua própria voz e olhar sobre si. Compõe uma pesquisa nível stricto sensu em educação sobre a caminhada da PJ. Sua participação é voluntária. Asseguramos o sigilo quanto à identificação dos respondentes, e após a conclusão da pesquisa, esperamos contribuir para a caminhada da mesma PJ.
A totalidade dos respondentes concordou em contribuir com a pesquisa, bem
como com o compartilhamento dos seus resultados, como forma de contribuição para
a caminhada da Pastoral da Juventude.
3.3 Da análise dos dados
Esse espaço de diálogo será constituído do confronto entre a análise
documental que expressa o que pode ser reconhecido como o discurso oficial do
magistério da Igreja, apresentado e promovido por instâncias de animação pastoral,
como o CELAM, a CNBB e pelos dados coletados na pesquisa junto aos participantes,
assessores e pastores diretamente envolvidos com a vivência sociocomunitária dos
membros da Pastoral da Juventude tendo como base teórica de análise algumas
categorias de análise do Personalismo de Emmanuel Mounier.
89
3.3.1 O perfil dos respondentes dos questionários
O primeiro questionário, com alguns dados outrora observados, oferece
informações elementares e pertinentes para a análise dos dados coletados,
apresentados e analisados a partir de agora por meio da utilização dos gráficos
abaixo. Do ponto de vista do perfil dos respondentes observa-se:
Fonte: Arquivo pessoal do autor (2016).
Existe certo equilíbrio de gênero entre os respondentes o que também pode
indicar um equilíbrio de participação nesse quesito nos grupos da Pastoral da
Juventude.
45%55%
GRÁFICO 1 - GÊNERO
Masculino
Feminino
90
Fonte: Arquivo pessoal do autor (2016).
Na leitura dos dados apresentados no histograma etário, constata-se que os
respondentes estão na faixa etária correspondente ao período de vida chamado
“juventude”, conforme compreensão do governo federal a sancionar a Lei
11.129/2005, que criou a Secretaria e o Conselho Nacional de Juventude, com
responsabilidades sobre as políticas públicas voltadas “aos jovens na faixa etária
entre 15 (quinze) e 29 (vinte e nove) anos.
Essa constatação corrobora com a pertinência da pesquisa, pois são dados
construídos pelos próprios jovens acerca da identidade, valores a sua vivência
sociocomunitária nos mais diversos grupos de PJ ao longo do Brasil. A presença de
respondentes que excedem essa faixa etária informa que os grupos de PJ admitem a
participação de adultos em suas atividades e, ainda, que eles exerçam, na maioria
das vezes, como admoesta a Igreja, um papel de assessoria e acompanhamento de
seus membros.
3.3.2 Da análise de dados das diversas fases da pesquisa
0
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 34 36 42 43
Oc
orr
ên
cia
Idade
Gráfico 2 - Histograma etário
91
As sete afirmações abaixo serviram como base para a indagação, em primeiro
lugar, acerca de uma definição, da identidade, dos valores da PJ, posteriormente
sobre o engajamento dos membros da PJ e, finalmente, sobre o seu próprio
engajamento na PJ. Dessa forma o questionário lança mão das mesmas sete
expressões para indagar sobre três níveis e forma distintas de pertencimento e
interpretação acerca da PJ. As afirmações foram:
1. Somos uma juventude participativa, consciente, engajada, sabendo e
conhecendo sua realidade; uma juventude missionária, organizada, autêntica, feliz e
sonhadora.
2. Sonhamos em reavivar, no homem e na mulher, a liberdade e a igualdade,
em dignidade e direitos, tendo por base os valores do Evangelho.
3. Sonhamos com uma sociedade que tenha como prioridade a pessoa humana
- o ser - um projeto social claro, com condições e oportunidade para todos.
4. Somos uma igreja mais apaixonada, profética, evangelizadora, acolhedora,
orante, missionária, transformadora e comprometida com o Projeto de Jesus Cristo,
adaptada às diferentes realidades.
5. Acreditamos na Civilização do Amor e seus valores básicos: sim à vida, sim
ao amor como vocação humana; sim à liberdade; sim à verdade e ao diálogo; sim ao
respeito pelas culturas.
6. Defendemos o primado pela vida sobre qualquer outro interesse; primado
pela pessoa sobre as coisas; da ética sobre a técnica; do testemunho e da experiência
sobre as palavras e as doutrinas.
7. Sonhamos com um país liberto das estruturas de corrupção, injustiça,
consumismo exacerbado, com uma terra sem males, sem discriminação de raça,
classe social, ou qualquer forma de exclusão; que incentive o protagonismo juvenil
possibilitando ao jovem acesso à educação, moradia e emprego.
Abaixo os gráficos que trazem os dados em número de concordância e
discordância referentes ao primeiro ponto do questionário sobre a definição,
identidade e valores da PJ.
92
Gráfico 03. Afirmação 1. Somos uma juventude participativa, consciente, engajada, sabendo e conhecendo sua realidade; uma juventude missionária, organizada, autêntica, feliz e sonhadora.
Fonte: Arquivo pessoal do autor (2016).
Gráfico 04. Afirmação 2. Sonhamos em reavivar, no homem e na mulher, a liberdade e a igualdade, em dignidade e direitos, tendo por base os valores do Evangelho.
Fonte: Arquivo pessoal do autor (2016).
Gráfico 05. Afirmação 3. Sonhamos com uma sociedade que tenha como prioridade a pessoa humana - o ser - um projeto social claro, com condições e oportunidade para todos.
0 05
8
51
0
10
20
30
40
50
60
Discordoabsolutamente
Discordo empartes
Nem concordoe nem
discordo
Concordo empartes
Concordoabsolutamente
Gráfico 3 - Questão 1.1
0 1 1
8
54
0
10
20
30
40
50
60
Discordoabsolutamente
Discordo empartes
Nem concordoe nem
discordo
Concordo empartes
Concordoabsolutamente
Gráfico 4 - Questão 1.2
93
Fonte: Arquivo pessoal do autor (2016).
Gráfico 06. Afirmação 4. Somos uma igreja mais apaixonada, profética, evangelizadora, acolhedora, orante, missionária, transformadora e comprometida com o Projeto de Jesus Cristo, adaptada às diferentes realidades.
Fonte: Arquivo pessoal do autor (2016).
Gráfico 07. Afirmação 5. Acreditamos na Civilização do Amor e seus valores básicos: sim a vida, sim ao amor como vocação humana; sim à liberdade; sim à verdade e ao diálogo; sim ao respeito pelas culturas.
0 1 15
57
0
10
20
30
40
50
60
Discordoabsolutamente
Discordo empartes
Nem concordoe nem
discordo
Concordo empartes
Concordoabsolutamente
Gráfico 5 - Questão 1.3
1 0
8
13
42
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
Discordoabsolutamente
Discordo empartes
Nem concordoe nem
discordo
Concordo empartes
Concordoabsolutamente
Gráfico 6 - Questão 1.4
94
Fonte: Arquivo pessoal do autor (2016).
Gráfico 08. Afirmação 6. Defendemos o primado pela vida sobre qualquer outro interesse; primado pela pessoa sobre as coisas; da ética sobre a técnica; do testemunho e da experiência sobre as palavras e as doutrinas.
Fonte: Arquivo pessoal do autor (2016).
Gráfico 09. Afirmação 07. Sonhamos com um país liberto das estruturas de corrupção, injustiça, consumismo exacerbado, com uma terra sem males, sem discriminação de raça, classe social, ou qualquer forma de exclusão; que incentive o protagonismo juvenil possibilitando ao jovem acesso à educação, moradia e emprego.
0 0 27
55
0
10
20
30
40
50
60
Discordoabsolutamente
Discordo empartes
Nem concordoe nem
discordo
Concordo empartes
Concordoabsolutamente
Gráfico 7 - Questão 1.5
20
7
17
38
0
5
10
15
20
25
30
35
40
Discordoabsolutamente
Discordo empartes
Nem concordoe nem
discordo
Concordo empartes
Concordoabsolutamente
Gráfico 8 - Questão 1.6
95
Fonte: Arquivo pessoal do autor (2016).
Pela análise dessa série de gráficos constata-se que a concordância absoluta
sempre se mostrou majorativa, com ocorrência de 38 dos 64 respondentes
escolhendo essa opção, equivalente a 57% da mostra. Se somadas à concordância
parcial, sempre acima de 45 das respostas, equivalentes a 62% dos respondentes,
podemos afirmar que os sujeitos se mostram, de forma geral, convictos dos pontos
positivos da PJ. Constate-se maior índice de dúvida na quarta questão, acerca do
pertencimento à Igreja e do profetismo, ainda assim, totalizando apenas 12.5% de
dúvida e 1,6% de discordância parcial, conforme o gráfico 06.
Essa segunda série de gráficos correspondem a segunda parte do questionário
e analisa a opinião dos respondentes sobre como observam de modo geral o
engajamento dos membros da PJ, a partir das mesmas sete expressões antes
apresentadas.
Gráfico 10. Afirmação 1. Somos uma juventude participativa, consciente, engajada, sabendo e conhecendo sua realidade; uma juventude missionária, organizada, autêntica, feliz e sonhadora.
0 0 06
58
0
10
20
30
40
50
60
70
Discordoabsolutamente
Discordo empartes
Nem concordoe nem
discordo
Concordo empartes
Concordoabsolutamente
Gráfico 9 - Questão 1.7
96
Fonte: Arquivo pessoal do autor (2016).
Gráfico 11. Afirmação 2. Sonhamos em reavivar, no homem e na mulher, a liberdade e a igualdade, em dignidade e direitos, tendo por base os valores do Evangelho.
Fonte: Arquivo pessoal do autor (2016).
Gráfico 12. Afirmação 3. Sonhamos com uma sociedade que tenha como prioridade a pessoa humana - o ser - um projeto social claro, com condições e oportunidade para todos.
0 0
9
18
37
0
5
10
15
20
25
30
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Discordoabsolutamente
Discordo empartes
Nem concordoe nem
discordo
Concordo empartes
Concordoabsolutamente
Gráfico 10 - Questão 2.1
0 04
16
44
0
5
10
15
20
25
30
35
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45
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Discordoabsolutamente
Discordo empartes
Nem concordoe nem
discordo
Concordo empartes
Concordoabsolutamente
Gráfico 11 - Questão 2.2
97
Fonte: Arquivo pessoal do autor (2016).
Gráfico 13. Afirmação 04. Somos uma igreja mais apaixonada, profética, evangelizadora, acolhedora, orante, missionária, transformadora e comprometida com o Projeto de Jesus Cristo, adaptada às diferentes realidades.
Fonte: Arquivo pessoal do autor (2016).
Gráfico 14. Afirmação 5. Acreditamos na Civilização do Amor e seus valores básicos: sim a vida, sim ao amor como vocação humana; sim à liberdade; sim à verdade e ao diálogo; sim ao respeito pelas culturas.
0 0 1
19
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0
5
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Nem concordoe nem
discordo
Concordo empartes
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Grafico 12 - Questão 2.3
0 1
11 12
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5
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30
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Nem concordoe nem
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Concordo empartes
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Gráfico 13 - Questão 2.4
98
Fonte: Arquivo pessoal do autor (2016).
Gráfico 15. Afirmação 6. Defendemos o primado pela vida sobre qualquer outro interesse; primado pela pessoa sobre as coisas; da ética sobre a técnica; do testemunho e da experiência sobre as palavras e as doutrinas.
Fonte: Arquivo pessoal do autor (2016).
Gráfico 16. Afirmação 7. Sonhamos com um país liberto das estruturas de corrupção, injustiça, consumismo exacerbado, com uma terra sem males, sem discriminação de raça, classe social, ou qualquer forma de exclusão; que incentive o protagonismo juvenil possibilitando ao jovem acesso à educação, moradia e emprego.
0 1 2
13
48
0
10
20
30
40
50
60
Discordoabsolutamente
Discordo empartes
Nem concordoe nem
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Concordo empartes
Concordoabsolutamente
Gráfico 14 - Questão 2.5
0 0
6
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38
0
5
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15
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30
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40
Discordoabsolutamente
Discordo empartes
Nem concordoe nem
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Concordo empartes
Concordoabsolutamente
Gráfico 15 - Questão 2.6
99
Fonte: Arquivo pessoal do autor (2016).
Nesse segundo momento do questionário, embora haja um aumento na
ocorrência das concordâncias parciais e uma redução no índice de concordância
absoluta, a concordância é mais uma vez predominante entre o que se apresenta
como ideal e o engajamento dos membros da PJ. O que também se repete é a maior
ocorrência de dúvidas acerca do pertencimento a Igreja e seu caráter profético, como
observa-se no gráfico 11, questão 2.4, observando-se até a ocorrência de uma
discordância parcial.
Na terceira série de gráfico, apresentada a seguir, observar-se-á uma análise
das respostas no quesito de engajamento pessoal dos respondentes em relação ao
PJ, tendo como referência as mesmas expressões das partes anteriores do
questionário.
Gráfico 17. Afirmação 1. Somos uma juventude participativa, consciente, engajada, sabendo e conhecendo sua realidade; uma juventude missionária, organizada, autêntica, feliz e sonhadora.
0 0 2
9
53
0
10
20
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50
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Discordoabsolutamente
Discordo empartes
Nem concordoe nem
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Concordo empartes
Concordoabsolutamente
Gráfico 16 - Questão 2.7
100
Fonte: Arquivo pessoal do autor (2016).
0 0
7
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44
0
5
10
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Discordo empartes
Nem concordoe nem
discordo
Concordo empartes
Concordoabsolutamente
Gráfico 17 - Questão 3.1
101
Gráfico 18. Afirmação 2. Sonhamos em reavivar, no homem e na mulher, a liberdade e a igualdade, em dignidade e direitos, tendo por base os valores do Evangelho.
Fonte: Arquivo pessoal autor (2016).
Gráfico 19. Afirmação 3. Sonhamos com uma sociedade que tenha como prioridade a pessoa humana - o ser - um projeto social claro, com condições e oportunidade para todos.
Fonte: Arquivo pessoal do autor (2016).
Gráfico 20. Afirmação 4. Somos uma igreja mais apaixonada, profética, evangelizadora, acolhedora, orante, missionária, transformadora e comprometida com o Projeto de Jesus Cristo, adaptada às diferentes realidades.
0 0
7 7
50
0
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30
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Discordo empartes
Nem concordoe nem
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Concordo empartes
Concordoabsolutamente
Gráfico 18 - Questão 3.2
0 0
6 8
50
0
10
20
30
40
50
60
Discordoabsolutamente
Discordo empartes
Nem concordoe nem
discordo
Concordo empartes
Concordoabsolutamente
Grafico 19 - Questão 3.3
102
Fonte: Arquivo pessoal autor (2016).
Gráfico 21. Afirmação 5. Acreditamos na Civilização do Amor e seus valores básicos: sim a vida, sim ao amor como vocação humana; sim à liberdade; sim à verdade e ao diálogo; sim ao respeito pelas culturas.
Fonte: Arquivo pessoal do autor (2016).
0 1
8
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0
5
10
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Discordoabsolutamente
Discordo empartes
Nem concordoe nem
discordo
Concordo empartes
Concordoabsolutamente
Gráfico 20 - Questão 3.4
0 0
7 5
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0
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50
60
Discordoabsolutamente
Discordo empartes
Nem concordoe nem
discordo
Concordo empartes
Concordoabsolutamente
Gráfico 21 - Questão 3.5
103
Gráfico 22. Afirmação 6. Defendemos o primado pela vida sobre qualquer outro interesse; primado pela pessoa sobre as coisas; da ética sobre a técnica; do testemunho e da experiência sobre as palavras e as doutrinas.
Fonte: Arquivo pessoal do autor (2016).
Gráfico 23. Afirmação 7. Sonhamos com um país liberto das estruturas de corrupção, injustiça, consumismo exacerbado, com uma terra sem males, sem discriminação de raça, classe social, ou qualquer forma de exclusão; que incentive o protagonismo juvenil possibilitando ao jovem acesso à educação, moradia e emprego.
Fonte: arquivo pessoal do autor (2016).
0 1
811
44
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
50
Discordoabsolutamente
Discordo empartes
Nem concordoe nem
discordo
Concordo empartes
Concordoabsolutamente
Gráfico 22 - Questão 3.6
0 1 25
56
0
10
20
30
40
50
60
Discordoabsolutamente
Discordo empartes
Nem concordoe nem
discordo
Concordo empartes
Concordoabsolutamente
Gráfico 23 - Questão 3.7
104
Na opinião dos respondentes, em análise sobre seu próprio engajamento na
vivência sociocomunitária dos grupos da PJ, permanece a predominância na
concordância absoluta. Em relação às outras duas dimensões do questionário,
ocorreu um aumento, ainda que pequeno, na dúvida acerca de vários aspectos como,
por exemplo, o primado da vida, o pertencimento da Igreja e sua profecia, a construção
de uma sociedade que respeite mais o ser humano.
O segundo questionário, de natureza aberta, foi aplicado entre dezembro de
2016 a fevereiro de 2017, teve por objetivo evidenciar os motivos que levaram os
jovens a aderirem e perseverarem na proposta de vivência sociocomunitária da PJ.
Abaixo apresentar-se-ão as contribuições dos respondentes tendo como base uma
categorização extraída das sete expressões utilizadas até aqui e dos 4 principais eixos
de atuação da PJ, a saber, espiritualidade-evangelização, eclesiologia, formação e
engajamento social. Isso se desdobrou em duas questões, também respondidas numa
escala de Likert: 1. motivo do ingresso na PJ e 2. motivo da permanência na PJ.
Gráfico 24. Motivo do ingresso na PJ
Fonte: Arquivo pessoal do autor (2017).
6
10
13
5
0
2
4
6
8
10
12
14
Igreja Espiritualidade /Evangelização
Formação /ExperiênciaComunitária
Engajamento Social
Gráfico 24 - Questão 1 - Motivo do Ingresso
105
Gráfico 25. Motivo de permanência na PJ.
Fonte: Arquivo pessoal do autor (2017).
Como indica o gráfico 24 o interesse na participação dos jovens nos grupos da
PJ, com 13 ocorrências em 29 respostas, foi a formação e a experiência de estar em
grupo, secundado pela vivência da espiritualidade e evangelização (10 respostas),
pertencimento à Igreja e engajamento social 6 e 5 respostas, respectivamente.
Com a leitura do gráfico 25 observa-se que com o passar do tempo, já como
membros dos grupos, há uma transição sobre as razões da permanência em relação
ao ingresso. Essa transição evidencia um fortalecimento da preocupação com o
engajamento social, bem como o pertencimento ao grupo, a experiência comunitária.
Abaixo analisar-se-ão, as entrevistas realizadas na coleta de dados, mais uma
contribuição que oferecerá novos elementos para o maior entendimento da vivência
sociocomunitária dos membros da PJ.
3.3.3 Das entrevistas
O objetivo das entrevistas foi aprofundar o entendimento da experiência
sociocomunitária dos membros da PJ, especialmente no confronto entre discurso,
qualidade de pessoa e ação, tríplice síntese apresentada por Mounier para a aquisição
e manutenção do estado de pessoa. O que também se relaciona com os elementos
2
11
1920
0
5
10
15
20
25
Igreja Espiritualidade /Evangelização
Formação /ExperiênciaComunitária
Engajamento Social
Gráfico 25 - Questão 2 - Motivo da Permanência
106
extraídos dos diversos questionários, com o intuito analisar essa experiência
sociocomunitária juvenil no interior da Igreja e da sociedade.
A base das entrevistas foram as sete afirmações utilizadas no primeiro
questionário da coleta de dados e explicitadas no ponto 3.3.2 da análise de dados.
Foram acrescentadas as seguintes indagações: “Concorda? Como isso é vivido? Por
meio de quais iniciativas?”
Como apresentado na primeira parte desse trabalho Mounier reconhece a
comunidade uma “pessoa de pessoas”, portanto um organismo vivo, dinâmico e
exigente, especialmente do ponto de vista da interação entre os que a compõem. A
dinâmica da Comunidade está intimamente relacionada a comunicação, ao ser-com,
a relação entre o “eu” e o “tu” que constitui o “nós”, preservando a especificidades do
eu e do tu, portanto sem dilui-los. Abaixo observar-se-á se e como a PJ promove esse
encontro, no entender dos entrevistados.
Ao serem indagados sobre a definição, identidade e valores da PJ, e como
efetivamente são vivenciados, pôde-se observar, em âmbito comunitário, que há todo
um esforço e dinâmica da PJ para a promoção dos grupos e assembleias em diversos
níveis. Nessas, os debates giram em torno de elementos de significação, isto é, o
sentido da vida, felicidade, bem como, da experiência que vivem e das ações que
realizam:
Por meio dos encontros e reuniões, assembleias e conferências, os jovens, com a ajuda dos assessores, tomam consciência de que o projeto de Deus é inclusivo e que o mundo em que vivemos distorce a noção de felicidade, restringindo a uns poucos as condições mínimas para viver esta felicidade.” (Assessor, 39 anos, Arquidiocese de São Paulo)
[...] vivido desde o grupo de base quando um jovem anima o outro a ser diferente no ambiente que frequentam. Por organizações espontâneas, ou provocativa desde a catequese de crisma e o sacramento de maturação. (Assessoria Nacional, 53 anos, Regional da PJ – Picos).
Enquanto PJ nacional fazemos de três em três anos nossa Ampliada que reúne lideranças da PJ de todos os regionais da CNBB do país. Essa ampliada serve para deliberar, articular e eleger os serviços da PJ. É um momento intenso de avaliação, de construção de diretrizes, de projetos que tem como finalidade intervir na realidade de maneira efetiva.” (Coordenadora Nacional da PJ, 27 anos - Manaus)
107
Dos sete entrevistados essas foram as menções mais significativas em matéria
de experiência comunitária. Preservada as limitações da pesquisa e o acesso a esses
elementos pode-se inferir que há uma validação da experiência na PJ de seu caráter
de educação sociocomunitária, pois, busca-se fomentar, por meio da comunidade,
uma transformação social a partir dos seus ideais. Por educação sociocomunitária
entendemos, aqui, seguindo, aquelas formas de preparar e nutrir, no outro e em nós
mesmos, num espírito de comunhão, a compreensão de que:
o amor constitui o esteio que permanece, ao longo de toda a vida, como o elemento central da ética do cuidado, que tem de estar sempre presente na educação. (...) A cooperação entre todos os membros de uma dada comunidade social, por sua vez, representa o cimento imprescindível tanto para a transmissão dos valores humanos universais e fundamentais como para a promoção do contacto com as raízes histórico-culturais, pertença de partida, que ancora qualquer viagem cultural de qualquer ser humano sobre a Terra (AZEVEDO, 2010, p. 12).
Do ponto de vista da acepção mounieriana há uma dedicação em promover
comunidade, especialmente pela promoção de grupos de jovens menores. A massa,
muitas vezes, é promotora de despersonalização. A autêntica comunidade tende a ser
numericamente menor. As “Ampliadas” promovidas pela PJ, constituem-se de
representantes e assessores dos grupos o que pode promover a autêntica expressão
do pensamento dos grupos, porém também podem incorrer em dispersão, em
afirmação de interesses mais individualizados causando sobreposições ideológicas.
Por meio apenas desse instrumento, não é possível estabelecer uma inferência
que seja precisa em matéria de conteúdos nesses encontros, nem mesmo se ocorrem
sobreposições de interesses individualizados, mas há de se destacar que
metodologicamente existe a promoção do encontro e do debate entre seus membros
o que pode, sempre mais, favorecer a manifestação do ser em sua peculiaridade.
Na mesma linha da análise feita a partir dos gráficos 24 e 25, a maior ocorrência
de menção acerca da experiência da PJ é o engajamento sócio-político. Na análise
das entrevistas infere-se que essa é a principal característica dessa ação pastoral na
Igreja. Tal engajamento se efetivam por meio de iniciativa como as mencionadas pelos
entrevistados.
108
[...] envolvida em discussões sobre políticas públicas para a juventude, fazendo-se presente nos conselhos municipais de Juventude [...] Cultiva relações com assentamentos do MST [...] Tem participação na organização do ‘Grito dos excluídos [...] Realiza atividades na semana da cidadania. (Militante, 28 anos – Limeira - SP).
São muitos os grupos que refletem e defendem políticas públicas para a juventude. (Assessor Nacional da Comissão Episcopal para a Juventude da CNBB, 54 anos – Brasília - DF).
Recentemente, encerramos a campanha nacional contra a violência e extermínio de jovens (durou 6 anos), hoje ainda temos os projetos nacionais da PJ que atendem as dimensões da formação integral da juventude: formação, relações, cultura, política, social, etc [...] Projeto: A juventude quer viver13 [...] E não fazemos isso só, estamos em parceria com outras pastorais, fazendo pastoral de conjunto, mutirões, reuniões, etc. (Coordenadora Nacional 27 anos – Manaus - AM).
A PJ no Brasil tem projetos que acentua bastante essas temáticas como por exemplo o projeto AJURI14 e TEIAS DE COMUNICAÇÃO15. (Assessor Nacional da Comissão Episcopal para a Juventude da CNBB, 54 anos, Brasília
Manifestações públicas em coletivo ou não. Campanhas de solidariedade permanente, movimentos sociais, grito dos excluídos, DNJ, Semana da cidadania...” (Assessor Nacional, 53 anos - Picos - PI)
Esse elenco de respostas oferece um olhar amplo sobre a atuação efetiva da
PJ objetivando a transformação da realidade, mais um fator que reforça seu caráter
sociocomunitário, bem como, sua resposta aos apelos do CELAM acerca da escolha
preferencial da Juventude na ação evangelizadora da Igreja Latino-americana.
No entanto, a opinião dos entrevistados revela também alguma tensão presente
no interior da PJ, especialmente em matéria de efetivação do que se afirma como
13 A “Campanha Nacional contra a Violência e Extermínio de Jovens” é uma das ações
assumidas e dinamizadas pelo A Juventude quer viver/AJQV. De forma prática, ele busca posicionar-se publicamente sobre temas que afetam diretamente a vida da juventude, como também construir estratégias de participação e intervenção política nos diversos setores sociais organizados (governamentais e não governamentais), buscando mobilizar a juventude pela garantia de direitos.
14 A palavra AJURI quer dizer ajuntamento ou reunião. O termo traz o sentido desse projeto que quer conhecer, respeitar e defender a realidade social e cultural dos povos tradicionais, como os ribeirinhos, quilombolas e indígenas. Desta forma é possível lutar pela dignidade e vida dessas comunidades, pautando e valorizando a imensa diversidade dos biomas brasileiros: a Amazônia, a Caatinga, o Cerrado, o Pantanal, os Pampas e a Mata Atlântica.
15 O Projeto Tecendo Relações tem como objetivo colaborar na construção da identidade de jovens que desejam aprofundar as temáticas da sexualidade, afetividade, diversidade, corporeidade e gênero, contribuindo, assim, para a defesa da dignidade da pessoa humana e para a construção de relações mais respeitosas, amorosas, igualitárias, dialógicas e horizontais.”
109
ideal, bem como a ocorrência de apelos para o compromisso da Igreja na promoção
do protagonismo juvenil.
É dever da Igreja alimentar os sonhos dos jovens e especialmente na PJ estes sonhos não se tornem apenas pessoais, mas coletivos. O protagonismo juvenil é justamente o incentivo para que estes ideais se transformem em práticas: que os participantes da PJ façam mais do que belos discursos - que realmente assumam postos e representações na sociedade, em associações, sindicatos, movimentos sociais e ecológicos, enfim, ponham em prática este discurso e protagonismo. (Assessor, 39 anos, Arquidiocese de São Paulo - SP)
Na verdade precisamos ser uma igreja assim: comprometida, profética, etc. Francisco nos convida a isso, a estarmos e nos colocarmos em saída, "saí do sofá". Não sei se a igreja de Francisco encontra espaço em todas as nossas dioceses. Porque ainda temos grupos de jovens perseguidos em nossas comunidades, dos quais não são acolhidos e acolhidas. Nós da PJ acreditamos que queremos ser uma igreja jovem de fato comprometida, mesmo que nossa igreja tenha muitos limites ainda. Hoje estabelecemos parcerias que para nós são muito importantes, e ainda estamos em espaço de fato que vão nos permitindo construir o reino de Deus. Estabelecemos uma parceria com a Pastoral carcerária, estamos no Conjuve, nas conferencias de juventude, entre outros espaços. (Coordenadora Nacional, 27 anos, Manaus - AM)
A partir da opinião dos membros e assessores até aqui, mais uma vez se
confirma a suspeita fragilidade da perspectiva de pertencimento da PJ a Igreja.
Todavia, menções referentes a esse assunto não são inexistentes, como observado,
e podem ser reveladoras de uma tensão entre as pretensões da PJ, especialmente
em seu anseio de protagonismo juvenil, e o incentivo dado pela Igreja. Embora haja
ênfase, mostrada no primeiro questionário, na adesão dos respondentes, membros
da PJ, aos princípios dessa. Ou seja, parece haver uma dissonância entre o que os
membros que trabalham na gestão da PJ consideram como pertencimento da PJ à
Igreja e como os próprios membros, que estão na base da PJ, entendem tal
pertencimento.
Na entrevista aos serem indagados sobre presença da corrupção, da injustiça,
do consumismo exacerbado, da perspectiva de uma terra sem males, sem
discriminação de raça, de classe social, ou qualquer forma de exclusão alguns
assessores evocam a influência do sistema capitalista como sendo o grande mal a ser
vencido, superado:
110
Em nossa vivência, entendemos que o capitalismo intensificou ou gerou muitos desses males. O entendemos como algo que exclui, degrada e mata, principalmente a Juventude. Portanto fazemos um combate dentro das instâncias participativas, para que o jovem tenha acesso à educação, saúde, lazer, cultura, etc. ou seja, que a juventude de tenha direito a vida (Coordenador de grupo de base, 22 anos, Guarulhos).
Verifica-se reforçada a perspectiva crítica dos membros da PJ e de seus
assessores em matéria de iniciativas e práticas de engajamento sócio-político. Do
ponto de vista do Personalismo, isso é uma grande força do cristão. Todavia, o cristão
católico deve engajar-se na luta pela transformação sócio-política reconhecendo-se
povo de Deus, Igreja de Cristo.
Trata-se de um engajamento integral. Mounier nunca incentivou um
engajamento social desprovido de seu pertencimento cristão católico. Ele sempre foi
crítico dessa dicotomia, inclusive suas iniciativas de engajamento respondiam a um
apelo de pertencimento a Cristo e a sua Igreja. Da coleta de dados realizada pode-se
aferir que esse é um ponto crítico na vivência sociocomunitária dos membros da PJ,
isto é, tanto pode significar uma força impulsionadora de uma transformação social
efetiva como pode também, se permanecer como iniciativa isolada, resvalar para
radicalismos e ativismos vazios.
Por outro lado, Mounier também reconheceu no mesmo ser humano a busca
de conversão constante. Na existência humana não há um status definido e estático
de uma vez por todas. O ser humano faz suas conquistas e segue provando de novas
experiências, portanto, constantemente é chamado a realizar novas sínteses. O
desejo de que essas novas experiências ocorram também e com relevância no seio
da PJ pode estar indicado tanto no segundo questionário, nos motivos de adesão à
PJ (formação/experiência comunitária) como no grande número de respondentes que
indicaram sua absoluta concordância aos princípios fundantes da PJ.
Muitos dos entrevistados revelaram em suas respostas elementos dessa
categorização do Personalismo. Especialmente sobre a experiência de formação dos
seus membros, e também em expressões de autocrítica. Isso pode conduzir a fé de
que também a PJ, “comunidade juvenil”, “pessoa de pessoas”, vive, mesmo que
inconscientemente esse processo de conversão.
111
[...] percebemos mais os ideais do que práticas efetivas: a defesa da vida em todos os momentos poderia ser mais assumida pela Pastoral da Juventude; também não vemos pronunciamentos desta pastoral a respeito das pesquisas científica que colocam o ser humano como meio e não como fim. Há uma certa tendência a um não conhecimento da própria Doutrina Social da Igreja. Em alguns casos, ideologias externas à Igreja atingem mais a Pastoral do que a própria Doutrina Social, colocando em perigo alguns valores essenciais do Evangelho.” (Assessor, 39 anos, Arquidiocese de São Paulo - SP)
A pastoral da Juventude vive o processo de educação na fé, que tem as dimensões da formação integral. São por meio desses que pensamos nossa ação junto aos jovens. Porque de fato, queremos formar jovens semelhantes a Jesus: humano, fraterno e livre (Coordenadora Nacional, 27 anos, Manaus - AM).
Pode-se afirmar que a PJ, pela vivência de seus membros, também prova desse
importante elemento da constituição e desenvolvimento do ser humano, a saber, a
conversão constante. É um movimento limitado, pois sujeito aos condicionamentos
das mediações históricas dos mais diversos âmbitos, e até mesmo provocado por
eles, como, por exemplo, nos âmbitos eclesiais, sociais, antropológicos e ideológicos.
112
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como observado no início da análise de dados: na opinião dos jovens
participantes da PJ existe da parte de seus jovens membros uma identificação com
os seus ideais, valores, propostas, que, por sua vez encontra correspondência com a
preocupação do CELAM, de Medellín à Aparecida, no que toca a promoção do
protagonismo juvenil nas diversas instâncias de atuação da PJ.
Por outro lado, observa-se divergências no ponto de vista da leitura de alguns
assessores, especialmente no que diz respeito ao engajamento dos membros da PJ
e seu sentido de pertença a Igreja. Isso desperta a suspeita de que os diversos grupos
de PJ podem ser reconhecidos como meros espaços de concentração juvenil que até
promove uma identificação com Jesus Cristo, mas que carece da afirmação e
reconhecimento de sua pertença eclesial.
Isso entra em conflito com a quinta linha de ação proposta pelo Documento 85
da CNBB, a saber: na implementação do Setor Diocesano da Juventude como ação
estratégica que favoreça a expressão da diversidade juvenil no interior da Igreja, uma
vez que esse supõe o pertencimento eclesial. Se há fragilidade no sentido eclesial de
pertença, suas instâncias de autoridade na animação também incorrem em risco de
relativização por parte dos membros da PJ.
Ainda sobre o Setor Diocesano da Juventude e a Pastoral Juvenil Nacional,
observa-se uma tensão na relação com membros da PJ, pois da sua parte há o
questionamento acerca da significatividade da sua representatividade frente aos
demais movimentos juvenis no interior da Igreja denotando, em alguns momentos, o
não reconhecimento dessa instância de animação, por entender-se que as PJs
representam quase que exclusivamente a história da Evangelização da Juventude no
Brasil.
Tal postura contrapõe-se a perspectiva elaborada e desenvolvida pelo
magistério da Igreja à luz da interpretação Latino-Americana acerca da necessidade
de uma pastoral orgânica. Isso dificulta o desenvolvimento e aquisição do estado de
pessoa de seus membros, pois, segundo a perspectiva do Personalismo de
Emmanuel Mounier, alimenta nos seus membros uma espécie de dicotomia,
prejudicial ao desenvolvimento do ser humano integral. Afirmar o pertencimento e não
113
pertencer é estabelecer uma cisão no interior de si e da instituição a que se afirma
pertencer.
Porém, sem uma duração persistente, essa dicotomia pode oferecer aos
membros da PJ em sua vivência sociocomunitária a oportunidade de experienciar a
conversão constante, também apontada por Mounier como indispensável para a
aquisição do estado de pessoa. Algo que aproxima-se dessa postura pode ser
observado na vida dos membros da PJ pela boa prática formativa a partir de itinerários
de formação visando o desenvolvimento integral de seus membros, como, por
exemplo, o subsídio formativo “Na trilha do Grupo de Jovens”16.
Observa-se, portanto, que existem, no interior da PJ, esforços de conversão
constante, o que ofereceria a possibilidade do crescimento contínuo e a eficácia de
sua ação evangelizadora. Mas é sabido também que existem tensões entre as
orientações da Igreja, como a organização e animação do setor diocesano de
juventude e a PJ, pois esta afirma a perda de autonomia e até mesmo investimento
financeiro.
Esse movimento de contraposição e conciliação remete à compreensão
mounieriana de aquisição e perda do estado de pessoa. O constante migrar entre a
personalização e a individualização, da unidade à dispersão. A vivência
sociocomunitária da PJ, composta por seres humanos, em formação, especialmente
pela fase de vida em que vivem, não poderia abrigar postura diferente.
Ao mesmo tempo que se observa a busca nas agregações dos grupos juvenis
um potencial de realização humano há uma crise de pertencimento a instituição que
os abriga e identifica, isto é, a Igreja. Uma imagem que pode muito bem expressar
esse movimento existencial é o espiral. A vivência sociocomuitária, a existência, se
desenvolve como uma linha curva que mantém um plano regular, que abriga o
afastamento e a reaproximação num movimento constante.
Essa perspectiva de desenvolvimento contínuo também encontra-se na
compreensão de uma educação sob o enfoque sociocomunitário como afirma
Azevedo:
16 Material produzido pelo Centro de Capacitação de Juventude visando abordar os principais
temas do desenvolvimento da Juventude. Presta-se como material de apoio para as discussões nos grupos de vivência da PJ.
114
A educação de cada um e de todos, ao longo de toda a vida e com a vida, só é possível no quadro destas dinâmicas sociocomunitárias fundadas, em síntese, no encontro, no re-conhecimento, na cooperação e no compromisso pessoal e social, quatro passos de dinâmicas que valorizem, reconheçam e comprometam os múltiplos poderes de um amplo leque de instituições e pessoas, seja para que ninguém fique de fora do acesso e do usufruto dos bens educacionais seja para que a solidariedade seja o real cimento de sustentação do desenvolvimento humano e da vida em comum (AZEVEDO, 2010).
Um dos critérios para boa organização do Setor Diocesano da Juventude é a
relação aberta com outros organismos eclesiais e com instituições fora da Igreja que
tenham objetivos comuns. Isso parece ser uma oportunidade de concretização do
ideal da Igreja de se associar as angústias e alegrias da humanidade, nesse caso,
específico, da juventude. Frente a isso, a experiência de militância proposta pela PJ
enriquece essa proposição e revela o quão ela pode fortalecer a atuação
evangelizadora da juventude na sociedade, especialmente no que tange a
transformação social.
O critério de não sobrecarregar nenhuma das expressões juvenis presentes na
diocese com a coordenação do Setor Juventude, revela forte teor democrático. A PJ
ao longo de sua história sempre se contrapôs a intervenções antidemocráticas. Essa
é uma boa oportunidade de promover, também no interior da Igreja a democracia pela
admissão da participação de todos. Uma postura contrária a isso, trai os propósitos
de maior participação ansiados pela proposta mais genuína da PJ.
O setor diocesano juvenil parece apresentar uma proposta mais abrangente em
relação à juventude, o que pode oferecer maior significatividade a representação e
ação juvenil na Igreja. A PJ, por mais resistência que possa oferecer ao novo modelo
de articulação pastoral proposto pela Pastoral Juvenil, não pode ficar alheia a tal
esforço de organicidade, pois o mesmo visa fortalecer a representatividade juvenil em
sua diversidade, algo que sempre foi uma bandeira da própria PJ.
Essa pesquisa, preservados seus limites, oferece mais uma oportunidade e
provocação do esforço de consolidar um olhar mais crítico, em âmbito acadêmico,
115
acerca de práticas ou vivências sociocomunitárias próprias do espaço religioso,
inicialmente tido como avesso e pouco significativo para a vida acadêmica.
Do ponto de vista da presença de uma ideologia “esquerdista”, ou talvez
“marxista” na experiência dos grupos da Pastoral da Juventude, uma vez que essa se
apoia na experiência teológica militante vivida pela Igreja da América Latina com a
Teologia da Libertação, e que foi apontado por alguns dos entrevistados, observamos
que parece haver um enfraquecimento nesse sentido. De fato, houve pouquíssimas
menções, nas respostas aos questionários, sobre uma militância que seja de
ordenamento político partidária na experiência vivida pelos respondentes.
No entanto, parece haver, sim, certa inflexibilidade das propostas de articulação
e amadurecimento pastoral apresentadas pela CNBB e pela hierarquia da Igreja,
frente às pessoas que compõem a PJ, e os demais movimentos de caráter juvenil,
cada vez mais presentes no interior da Igreja. Que muitas vezes conduz, não de forma
ingênua, à crença de que há uma espécie de jargão ideológico do tipo “si hay gobierno,
soy contra”. O que parece confirmar a constatação, de alguns entrevistados, quanto
às ideologias subsistentes no interior da PJ, que enfraquecem, por vezes, no entender
desses entrevistados, a sua pertença a todo o esforço eclesial de Evangelização da
Juventude.
O pensamento personalista de Mounier serve como contraponto à rigidez de
toda e qualquer estrutura organizativa que não permita a expressão da pessoa em
sua liberdade, bem como, a todo tipo de contradição entre discurso, qualidade de
pessoa e ação. Isso toca à PJ especialmente em matéria do seu pertencimento à
Igreja, como afirmado anteriormente, pois a mesma é uma pastoral da Igreja. No teor
das respostas às entrevistas e àquelas de caráter aberto, do segundo questionário,
percebe-se que há tensões entre assessores da PJ e os jovens que a compõem, no
que toca à animação e direção dos grupos juvenis. A tensão em si não é negativa,
mas quando ocorre contra a concepção identitária promove a desintegração da
pessoa e da comunidade, tão criticada por Mounier, pois reprime a indispensável
capacidade humana de comunicação.
Como expresso nas respostas dos questionários 1 e 2, muitos jovens sentem-
se convocados ao seguimento de Jesus Cristo, seus ensinamentos, e seu
comprometimento com os marginalizados da sociedade. No entanto, poucas são as
116
manifestações em matéria de uma espiritualidade juvenil. Verifica-se um
comprometimento com a transformação social, a partir de Jesus sim, mas talvez numa
perspectiva histórica de Jesus e não do Cristo da fé.
Do ponto de vista do Personalismo, como observado na primeira parte da
pesquisa, prefere-se a ruptura com associações e experiências se essas forem
desprovidas de espiritualidade, não como um imperativo ditatorial qualquer, mas como
afirmação da espiritualidade humana como constituinte do que o ser humano é. A
persistência na fragilidade de menções a vivências espirituais nos faz questionar
também o processo de integração da pessoa na PJ.
O retorno à leitura e vivência de provocações e orientações da Doutrina Social
da Igreja, associada à leitura personalista, podem oferecer elementos de
amadurecimento da própria experiência sociocomunitária dos membros da Pastoral
da Juventude do Brasil. Esse entrecruzamento, inclusive, apresenta-se como uma
provocação de aprofundamento para novas pesquisas sobre essa mesma experiência
de pastoral juvenil.
Do modo geral, pode-se afirmar que a PJ possui elementos que favorecem a
integração e aquisição do estado de pessoa, proposto por Mounier, e que podem
favorecer o amadurecimento humano dos jovens. Porém, existem fatores ideológicos
que acentuam também o risco de desintegração e dispersão dos jovens, o que pode
torná-los inflexíveis e frágeis na prática da comunicação, no sentido mounieriano. O
fator que mais nos chamou a atenção, nesse aspecto, relaciona-se ao que parece
que vem se constituindo como uma fragilidade no sentimento de pertencimento à
Igreja, como observado em nas respostas ao questionário 1, em especial na questão
04.
Os pontos de tensões apresentados nessa pesquisa não são a única leitura
sobre a experiência sociocomunitária dos membros da PJ. A perspectiva
sociocomunitária oferece a possibilidade do desenvolvimento de uma releitura e
ruptura com a diversidade de discursos apresentados, oficiais ou extra oficiais.
Realizar uma leitura sobre os fatores envolvidos na dinâmica da PJ e seus discursos
e práticas, revela a complexidade e dinamicidade do processo de ressignificação das
propostas tidas como oficiais. Pois nem sempre os indivíduos envolvidos têm clareza
117
desse discurso e muito menos da ressignificação própria da sua experiência e daquela
do grupo, na interpretação da realidade.
118
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122
ANEXO I
Conhecendo a PJ
Esse questionário é um instrumento que visa coletar dados, oferecidos pelos próprios
membros dos diversos grupos de PJ, como expressão da sua própria voz e olhar sobre
si. Compõe uma pesquisa nível strito sensu em educação sobre a caminhada da PJ.
Os dados, após conclusão da pesquisa, serão disponibilizados como contribuição
para a caminhada da mesma PJ.
Concorda
( ) Sim
( ) Não
Gênero
( ) Masculino
( ) Feminio
Idade:
______________
Diocese:
______________
1.Sobre a definição, identidade e valores da PJ
"Somos quem podemos ser... sonhos que podemos ter." (Engenheiros do Havaí)
1.1) Somos uma juventude participativa, consciente, engajada, sabendo e
conhecendo sua realidade; uma juventude missionária, organizada, autêntica, feliz e
sonhadora.
1. Discordo absolutamente
2. Discordo em partes
3. Nem concordo e nem discordo
4. Concordo em partes
5. Concordo absolutamente
123
1.2) Sonhamos em reavivar, no homem e na mulher, a liberdade e a igualdade, em
dignidade e direitos, tendo por base os valores do Evangelho.
1. Discordo absolutamente
2. Discordo em partes
3. Nem concordo e nem discordo
4. Concordo em partes
5. Concordo absolutamente
1.3) Sonhamos com uma sociedade que tenha como prioridade a pessoa humana - o
ser - um projeto social claro, com condições e oportunidade para todos.
1. Discordo absolutamente
2. Discordo em partes
3. Nem concordo e nem discordo
4. Concordo em partes
5. Concordo absolutamente
1.4) Somos uma igreja mais apaixonada, profética, evangelizadora, acolhedora,
orante, missionária, transformadora e comprometida com o Projeto de Jesus Cristo,
adaptada às diferentes realidades.
1. Discordo absolutamente
2. Discordo em partes
3. Nem concordo e nem discordo
4. Concordo em partes
5. Concordo absolutamente
1.5) Acreditamos na Civilização do Amor e seus valores básicos: sim a vida, sim ao
amor como vocação humana; sim à liberdade; sim à verdade e ao diálogo; sim ao
respeito pelas culturas.
1. Discordo absolutamente
2. Discordo em partes
3. Nem concordo e nem discordo
4. Concordo em partes
5. Concordo absolutamente
124
1.6) Defendemos o primado pela vida sobre qualquer outro interesse; primado pela
pessoa sobre as coisas; da ética sobre a técnica; do testemunho e da experiência
sobre as palavras e as doutrinas.
1. Discordo absolutamente
2. Discordo em partes
3. Nem concordo e nem discordo
4. Concordo em partes
5. Concordo absolutamente
1.7) Sonhamos com um país liberto das estruturas de corrupção, injustiça,
consumismo exacerbado, com uma terra sem males, sem discriminação de raça,
classe social, ou qualquer forma de exclusão; que incentive o protagonismo juvenil
possibilitando ao jovem acesso à educação, moradia e emprego.
1. Discordo absolutamente
2. Discordo em partes
3. Nem concordo e nem discordo
4. Concordo em partes
5. Concordo absolutamente
2. Sobre o engajamento dos membros da PJ
"Temos mil razões para viver." (Dom Helder Câmara)
2.1) Somos uma juventude participativa, consciente, engajada, sabendo e
conhecendo sua realidade; uma juventude missionária, organizada, autêntica, feliz e
sonhadora.
1. Discordo absolutamente
2. Discordo em partes
3. Nem concordo e nem discordo
4. Concordo em partes
5. Concordo absolutamente
125
2.2) Sonhamos em reavivar, no homem e na mulher, a liberdade e a igualdade, em
dignidade e direitos, tendo por base os valores do Evangelho.
1. Discordo absolutamente
2. Discordo em partes
3. Nem concordo e nem discordo
4. Concordo em partes
5. Concordo absolutamente
2.3) Sonhamos com uma sociedade que tenha como prioridade a pessoa humana - o
ser - um projeto social claro, com condições e oportunidade para todos.
1. Discordo absolutamente
2. Discordo em partes
3. Nem concordo e nem discordo
4. Concordo em partes
5. Concordo absolutamente
2.4) Somos uma igreja mais apaixonada, profética, evangelizadora, acolhedora,
orante, missionária, transformadora e comprometida com o Projeto de Jesus Cristo,
adaptada às diferentes realidades.
1. Discordo absolutamente
2. Discordo em partes
3. Nem concordo e nem discordo
4. Concordo em partes
5. Concordo absolutamente
2.5) Acreditamos na Civilização do Amor e seus valores básicos: sim a vida, sim ao
amor como vocação humana; sim à liberdade; sim à verdade e ao diálogo; sim ao
respeito pelas culturas.
1. Discordo absolutamente
2. Discordo em partes
3. Nem concordo e nem discordo
4. Concordo em partes
5. Concordo absolutamente
126
2.6) Defendemos o primado pela vida sobre qualquer outro interesse; primado pela
pessoa sobre as coisas; da ética sobre a técnica; do testemunho e da experiência
sobre as palavras e as doutrinas.
1. Discordo absolutamente
2. Discordo em partes
3. Nem concordo e nem discordo
4. Concordo em partes
5. Concordo absolutamente
2.7) Sonhamos com um país liberto das estruturas de corrupção, injustiça,
consumismo exacerbado, com uma terra sem males, sem discriminação de raça,
classe social, ou qualquer forma de exclusão; que incentive o protagonismo juvenil
possibilitando ao jovem acesso à educação, moradia e emprego.
1. Discordo absolutamente
2. Discordo em partes
3. Nem concordo e nem discordo
4. Concordo em partes
5. Concordo absolutamente
3. Sobre seu engajamento na PJ
"A coisa não está nem na chegada e nem na partida está na travessia." (Guimarães
Rosa)
3.1) Somos uma juventude participativa, consciente, engajada, sabendo e
conhecendo sua realidade; uma juventude missionária, organizada, autêntica, feliz e
sonhadora.
1. Discordo absolutamente
2. Discordo em partes
3. Nem concordo e nem discordo
4. Concordo em partes
5. Concordo absolutamente
127
3.2) Sonhamos em reavivar, no homem e na mulher, a liberdade e a igualdade, em
dignidade e direitos, tendo por base os valores do Evangelho.
1. Discordo absolutamente
2. Discordo em partes
3. Nem concordo e nem discordo
4. Concordo em partes
5. Concordo absolutamente
3.3) Sonhamos com uma sociedade que tenha como prioridade a pessoa humana - o
ser - um projeto social claro, com condições e oportunidade para todos.
1. Discordo absolutamente
2. Discordo em partes
3. Nem concordo e nem discordo
4. Concordo em partes
5. Concordo absolutamente
3.4) Somos uma igreja mais apaixonada, profética, evangelizadora, acolhedora,
orante, missionária, transformadora e comprometida com o Projeto de Jesus Cristo,
adaptada às diferentes realidades.
1. Discordo absolutamente
2. Discordo em partes
3. Nem concordo e nem discordo
4. Concordo em partes
5. Concordo absolutamente
3.5) Acreditamos na Civilização do Amor e seus valores básicos: sim a vida, sim ao
amor como vocação humana; sim à liberdade; sim à verdade e ao diálogo; sim ao
respeito pelas culturas.
1. Discordo absolutamente
2. Discordo em partes
3. Nem concordo e nem discordo
4. Concordo em partes
5. Concordo absolutamente
128
3.6) Defendemos o primado pela vida sobre qualquer outro interesse; primado pela
pessoa sobre as coisas; da ética sobre a técnica; do testemunho e da experiência
sobre as palavras e as doutrinas.
1. Discordo absolutamente
2. Discordo em partes
3. Nem concordo e nem discordo
4. Concordo em partes
5. Concordo absolutamente
3.7) Sonhamos com um país liberto das estruturas de corrupção, injustiça,
consumismo exacerbado, com uma terra sem males, sem discriminação de raça,
classe social, ou qualquer forma de exclusão; que incentive o protagonismo juvenil
possibilitando ao jovem acesso à educação, moradia e emprego.
1. Discordo absolutamente
2. Discordo em partes
3. Nem concordo e nem discordo
4. Concordo em partes
5. Concordo absolutamente
129
ANEXO II
Aprofundando o conhecimento da PJ
Essa entrevista é um instrumento que visa coletar dados, oferecidos pelos membros
e assessores dos diversos grupos de PJ, como expressão da sua própria voz e olhar
sobre si. Compõe uma pesquisa nível strito sensu em educação sobre a caminhada
da PJ. Os dados, após conclusão da pesquisa, serão disponibilizados como
contribuição para a caminhada da mesma PJ.
Concorda?
( ) Sim
( ) Não
Idade:
____________
Diocese:
____________
Função:
____________
Afirma-se sobre alguns ideais da Pastoral da Juventude:
1. Somos uma juventude participativa, consciente, engajada, sabendo e conhecendo
sua realidade; uma juventude missionária, organizada, autêntica, feliz e sonhadora.
Concorda? Como isso é vivido? Por meio de quais iniciativas?
2. Sonhamos em reavivar, no homem e na mulher, a liberdade e a igualdade, em
dignidade e direitos, tendo por base os valores do Evangelho. Concorda? Como isso
é vivido? Por meio de quais iniciativas?
130
3. Sonhamos com uma sociedade que tenha como prioridade a pessoa humana (o
ser), um projeto social claro, com condições e oportunidade para todos. Concorda?
Como isso é vivido? Por meio de quais iniciativas?
4. Somos uma igreja mais apaixonada, profética, evangelizadora, acolhedora, orante,
missionária, transformadora e comprometida com o Projeto de Jesus Cristo, adaptada
às diferentes realidades. Concorda? Como isso é vivido? Por meio de quais
iniciativas?
5. Acreditamos na Civilização do Amor e seus valores básicos: sim a vida, sim ao amor
como vocação humana; sim à liberdade; sim à verdade e ao diálogo; sim ao respeito
pelas culturas. Concorda? Como isso é vivido, por meio de quais iniciativas?
6. Defendemos o primado pela vida sobre qualquer outro interesse; primado pela
pessoa sobre as coisas; da ética sobre a técnica; do testemunho e da experiência
sobre as palavras e as doutrinas. Concorda? Como isso é vivido, por meio de quais
iniciativas?
7. Sonhamos com um país liberto das estruturas de corrupção, injustiça, consumismo
exacerbado, com uma terra sem males, sem discriminação de raça, classe social, ou
qualquer forma de exclusão; que incentive o protagonismo juvenil possibilitando ao
jovem acesso à educação, moradia e emprego. Concorda? Como isso é vivido, por
meio de quais iniciativas?
131
ANEXO III
Aprofundando o conhecimento - PJ II
Esse questionário é um instrumento que visa coletar dados, oferecidos pelos próprios
membros dos diversos grupos de PJ, como expressão da sua própria voz e olhar sobre
si. Compõe uma pesquisa nível strito sensu em educação sobre a caminhada da PJ.
Os dados, após conclusão da pesquisa, serão disponibilizados como contribuição
para a caminhada da mesma PJ.
Concorda
( ) Sim
( ) Não
Gênero
( ) Masculino
( ) Feminino
Idade:
___________
Diocese:
___________
Função:
___________
1. Quais motivos levaram você a aderir aos grupos da PJ?
2. Quais motivos fazem você permanecer na PJ?