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Capítulo 1

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C a p í t u l o 1

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O PROBLEMA DO CÂNCER

NO BRASIL

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O problema do câncer no Brasil

Capítulo 1

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O Brasil apresenta um quadro sanitário em que se combinam doen-ças ligadas à pobreza, típicas dos países em desenvolvimento, e doenças crônico-degenerativas, características dos países mais afluentes. Essa situação reflete,inquestionavelmente, as contradições do processo de desenvolvimento do País.

Analisando-se a distribuição da mortalidade pelas principais causas demorte nas macrorregiões do Brasil, percebe-se que a posição relativa da morta-lidade por câncer figura sempre entre as primeiras daquelas causas, ao lado dasdoenças do aparelho circulatório, das causas externas, das doenças do aparelhorespiratório, das afecções do período perinatal e das doenças infecciosas e para-sitárias. Vale ressaltar que, apesar de muito melhor, a qualidade do registro doóbito pelo câncer ainda fica comprometida pela classificação do mesmo comocausa mal definida. No Brasil, em 1998, a mortalidade por causas mal definidasera a segunda causa de morte (15%). A análise por macrorregião revela que nasregiões Norte e Nordeste as causas mal definidas ocupavam a primeira posição,responsáveis por 24% e 30% do registro dos óbitos, respectivamente. Na regiãoCentro-Oeste as causas mal definidas encontravam-se na quarta posição (11%)e nas regiões Sul e Sudeste essas causas ocupavam a quinta colocação, atribu-indo-se a elas 8% e 10% do registro dos óbitos, respectivamente.

Excluindo-se as causas mal definidas, o câncer constitui a terceira causade morte no Brasil, atrás somente das doenças do aparelho circulatório e dascausas externas, sendo assim a segunda causa de morte por doença. Em 1998,os neoplasmas foram responsáveis por 11,92% dos 929.023 óbitos registrados,sendo que 54,21% dos óbitos por neoplasia ocorreram entre os homens e 45,74%,entre as mulheres. Considerando-se somente as mortes por doença (ou seja, ex-cluindo-se as causas externas), as neoplasias representam a segunda causa demorte em todas as regiões do país. Os neoplasmas seguem-se às doençascardiovasculares como causa de morte, e sua proporcionalidade aumenta à me-dida que se desloca para o sul: 7,45% (região Nordeste), 8,52% (região Norte);11,22% (região Centro-Oeste), 13,05% (região Sudeste) e 16,06% (região Sul).

Através da análise dos determinantes sociais e indicadoresepidemiológicos do câncer, este livro procura ressaltar a importância dessadoença como um problema de saúde pública em nosso país e também discutir oseu impacto social e econômico. Partindo dessa análise, procede-se à discussãosobre a importância da identificação dos grupos e dos fatores de risco de desen-volvimento do câncer. Como será evidenciado ao longo do texto, a identificaçãodesses fatores e grupos orienta os programas de prevenção e controle e norteia oraciocínio clínico.

INTRODUÇÃO

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Ações de enfermagem para o controle do câncer18

A urbanização, a industrialização e a maior expectativa de vida da

população são os principais fatores que contribuem para o aumento da incidên-cia das doenças crônico-degenerativas, entre elas o câncer, visto que aquelesfatores contribuem para o aumento de agentes cancerígenos ambientais ou parauma maior e mais prolongada exposição dos seres humanos a esses agentes.

1.1- Aumento da expectativa de vida

O crescimento da população idosa é um fenômeno que ocorre não sónos países desenvolvidos, mas também se verifica, de modo crescente, nos paí-ses em desenvolvimento.

A expectativa de vida ao nascer, no Brasil, aumentou progressivamenteno século XX (Figura 1.1). No início daquele século, o brasileiro tinha uma ex-pectativa de vida de menos de 35 anos. No final do século XX, ela estava paramais de 70 anos. Como se verá adiante, a redução das taxas de natalidade e demortalidade tem modificado a estrutura etária da população, tornando-a maisvelha do ponto de vista demográfico.

O envelhecimento da população brasileira está retratado na Tabela 1.1,onde se nota que a população correspondente aos menores de 14 anos diminuiu,enquanto o contingente populacional das demais faixas etárias aumentou. Nes-se intervalo de tempo, a população de idosos (65 ou mais anos) mais do que dupli-cou a sua proporção.

1 - DETERMINANTES SOCIAIS DO CÂNCER

Fonte: De 1900 a 1950, Santos JLF, Demografia: estimativa e projeções. São Paulo, Fauusp, 1978.De 1960 a 2020, United Nations, Periodical on Ageing 84, v. 1, n.1, 1985

Figura 1.1 - Expectativa de vida ao nascer para ambos ossexos, no Brasil, entre 1900 e 2020.

0

20

40

60

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1900 1920 1940 1960 1980 2020 ANO

Idade Média

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Tabela 1.1- Composição etária relativa (%) da contagempopulacional de 1996.

Fonte: IBGE/Contagem populacional.

Contudo, existem disparidades na esperança de vida ao nascer, entreos sexos e entre as populações das diversas regiões brasileiras. A Tabela 1.2mostra como a expectativa de vida é menor nas regiões Norte e Nordeste emaior entre as mulheres.

Tabela 1.2 - Expectativa de vida ao nascer, em anos, por sexo esegundo as grandes regiões, Brasil, 2000.

Fonte: IBGE/DPE/Departamento de População e Indicadores Sociais.Divisão de Estudos e Análises da Dinâmica Demográfica.Projeto UNFPA/BRASIL (BRA/98/P08) - Sistema Integrado de Projeções e EstimativasPopulacionais e Indicadores Sociodemográficos.

Duas são as variáveis biológicas que modificam as populações: a mor-talidade e a fecundidade. Um país de população jovem apresenta altas taxas demortalidade e de fecundidade; quando em fase de explosão demográfica, estacaracteriza-se por uma taxa de mortalidade declinante e uma alta taxa de ferti-lidade; quando em fase de transição demográfica, a taxa de mortalidade é baixae a de fecundidade é gradualmente decrescente. A Tabela 1.3 demonstra aredução progressiva dessas taxas entre a população brasileira, distribuídas pordécadas, no decorrer de mais de um século (de 1891 a 2000): a taxa de natalida-de caiu em 56,3% e a de mortalidade, em 75,2%, verificando-se, assim, que anossa população já entrou na fase da transição.

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Vê-se, assim, que modificações importantes ocorreram na estrutura dapopulação brasileira. Adianta-se que a redução da taxa de mortalidade decor-reu, especialmente, da diminuição dos óbitos por doenças infecciosas. Emborasem a caracterização biológica, a migração é outra variável que também alteraa composição populacional de uma cidade, região ou país. Adiante, ver-se-ácomo a migração interna contribuiu substancialmente para a modificação doperfil das doenças e das causas de morte no Brasil.

Tabela 1.3 - Taxas brutas de natalidade e mortalidade no Brasil, 1990-2000.

Fonte: IBGE(a) Dados do extinto Laboratório Estatístico do IBGE.(b) Censos demográficos.(c) IBGE, Diretoria de Pesquisas, Departamento de População e Indicadores Sociais.Nota: Dados referentes ao Anuário Estatístico do Brasil, 1995.

1.2 - Industrialização e urbanização

A revolução industrial, originada na Inglaterra na segunda metade doséculo XVIII, constituiu um dos grandes marcos da história da humanidade, im-primindo sérias modificações nos padrões de vida e nas relações sociais vigen-tes até então.

No Brasil, o processo de industrialização acelerou-se após a SegundaGuerra Mundial. Desenvolveu-se em ritmos diferentes nas diversas regiões doPaís, ocorrendo uma maior concentração industrial na região Sudeste.São justamente nas regiões de maior industrialização que, atualmente, se verifi-cam as maiores taxas de mortalidade por câncer.

Baseado no conhecimento de que cerca de 80% dos casos de câncerseriam direta ou indiretamente relacionáveis a fatores exógenos, Verhasselt (1977)enfatiza a importância das condições ambientais no desenvolvimento dessadoença. Um estudo da Organização Mundial da Saúde (OMS) a respeito dosefeitos das substâncias químicas sobre a saúde humana estima que, dos quatromilhões de substâncias naturais ou sintéticas já isoladas, sessenta mil estão emuso cotidiano. Entre estas, cinco mil são usadas como aditivos alimentares e1.500 são utilizadas na preparação de pesticidas. É importante salientar que amaioria dos produtos químicos atualmente em uso nunca foi devidamente testa-da quanto à sua toxicidade crônica e aos seus efeitos carcinogênicos.

Algumas substâncias, como os hidrocarbonetos policíclicos aromáti-cos, o níquel, o asbesto e o ácido vinil-clorídrico, estão relacionadas a diversoscânceres ocupacionais. Como no Brasil os instrumentos legais de proteção àsaúde do trabalhador são frágeis, e aqueles destinados a resguardar os interesses

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e direitos do consumidor são de recente implantação e utilização, há condiçõesamplamente favoráveis à disseminação de carcinógenos de origem industrial.Isto tem trazido, e continuará a trazer mais ainda, prejuízos de monta à saúde dapopulação brasileira.

A questão da poluição ambiental não pode ser omitida, ainda que seuefeito carcinogênico não esteja bem estabelecido. Resíduos industriais, a maiorparte das vezes sem o tratamento adequado, são emanados e disseminados peloar ou despejados em cursos d’água, alcançando, inclusive, populações e áreasbem distantes da fonte poluidora. Compromete-se, assim, a saúde da atual popu-lação e das futuras gerações.

Observa-se séria omissão no que diz respeito à aplicação dos procedi-mentos cabíveis e necessários ao controle dos poluentes ambientais. Entre asrazões principais desta omissão, encontra-se a resistência dos empresários emdespender recursos para o controle da poluição e a displicência quanto à fisca-lização do cumprimento das leis de proteção ambiental pelas empresas.

A urbanização, fenômeno que freqüentemente caminha ao lado do pro-cesso de industrialização, tem sido relacionada com uma maior ocorrência decâncer. Verhasselt (1977) afirma que, em escala mundial, tem sido identificadaforte correlação entre a importância da mortalidade proporcional por câncer e ograu de urbanização.

Nos últimos dois séculos, vem ocorrendo sensível aumento na urbani-zação. No começo do século XIX, somente 3% da população mundial viviamem cidades; na década de 1970, essa proporção alcançava 40%, e a perspecti-va era de que, na virada do milênio, a taxa de urbanização atingisse 80%, nospaíses desenvolvidos.

A Figura 1.2 mostra a evolução da composição populacional rural eurbana no Brasil, para o período de 1940 a 1997, revelando a magnitude dofenômeno de urbanização ocorrido no país.

Fonte: Ministério da Saúde. Cadernos. Doenças Crônico-Degenerativas:Evolução e Tendências Atuais I. Brasília, Centro de Documentação do Ministério daSaúde, 1997.

Figura 1.2 - Evolução da composição populacionalurbana e rural, no Brasil, de 1940 a 1997.

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RURAL

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A urbanização, comumente, é acompanhada de modificações nos hábi-tos de vida das pessoas. Os aspectos concernentes ao estilo de vida das popula-ções devem receber atenção quanto à gênese dos tumores, pois a persistência, aacentuação ou a introdução de novos hábitos pode induzir ou propiciar o desen-volvimento das neoplasias malignas. Entre esses hábitos, o tabagismo aparececomo um dos mais importantes, estando diretamente relacionado com os cânce-res de pulmão, boca, laringe e bexiga.

Em escala mundial, a expansão do tabagismo data da Primeira GuerraMundial, e a maior generalização do vício foi notada após a Segunda GrandeGuerra. Nos Estados Unidos, o consumo anual médio de cigarros, por adulto, em1920, era de 750 e elevou-se a 3.900, em 1960. Uma tendência oposta vem sedesenvolvendo nas últimas duas décadas, na maioria dos países desenvolvidos,onde a proporção de fumantes e a quantidade do produto consumido vêm decli-nando substancialmente.

Como resposta à retração da demanda de cigarros nos países industria-lizados, as indústrias de cigarro têm ampliado suas investidas em países do cha-mado Terceiro Mundo, para assegurarem a continuidade de seus negócios, me-diante a incorporação de novos mercados ou a expansão dos já existentes. Umainvestigação conduzida pela Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) emoito cidades da América Latina, em 1970, acusou uma prevalência de tabagis-mo de 45% entre os homens e de 18% entre as mulheres, nas faixas etárias de15 a 74 anos. Verificou-se, porém, que a proporção entre homens e mulheresfumantes diminuiu de 1971 a 1988, principalmente no Brasil e no Chile.

No Brasil, a epidemia tabagística se acelerou vertiginosamente, a partirde 1970. No período entre 1970 e 1980, o consumo de cigarros cresceu 132%,enquanto a população de 20 anos ou mais cresceu 37% e a população geral,28%. Na segunda metade de 1970, havia 25 milhões de fumantes; em 1987,contava-se, nas capitais brasileiras, com cerca de 33 milhões, o que implica umcrescimento da ordem de 32% em dez anos (Rosemberg, 1987). Em 1989, umapesquisa realizada em 363 municípios brasileiros possibilitou a estimativa deque existiam no Brasil 30,6 milhões de fumantes, ou seja, 23,9% dos maiores de5 anos de idade (Brasil, 1992).

O Brasil é, desde 1993, em termos mundiais, o maior exportador e oterceiro produtor de tabaco. O recolhimento dos impostos que incidem sobre osprodutos industrializados do tabaco muito significa para a economia do País,embora os prejuízos ambientais, sanitários e econômicos, vistos a longo prazo,superem as aparentes e imediatas vantagens econômicas. Aqui, um maço decigarros é taxado em 74%, enquanto, nos países desenvolvidos, o imposto chegaa representar até 85% do preço do maço.

Sabe-se que o aumento da taxação é acompanhado por uma diminui-ção do consumo de cigarros. Ao mesmo tempo que caminha nesse sentido, pare-ce que o Brasil ainda vive as contradições entre a arrecadação de impostos e oscustos sociais e econômicos do tabagismo: enquanto em 1974 os produtos do

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tabaco participavam com 28% da arrecadação do Imposto sobre Produtos Indus-trializados (IPI), em 1977 este já somava 36%. Em 1979, os tributos incidentessobre o tabaco e seus derivados compunham cerca de 10% do total da receitafederal. Em 1991, 69,4% do preço final do cigarro correspondiam à tributaçãogovernamental (Brasil, 1992).

Estes últimos dados explicam por que o combate ao tabagismo encon-tra tantos obstáculos e enfrenta tantas contradições, que se superam na medidaem que se demonstra o seu impacto negativo sobre a vida e a saúde das pessoas,individual e coletivamente. O câncer de pulmão é um exemplo incontestávelde como essa influência nefasta se instala e se sustenta, ao longo de décadas.Sabe-se que, num dado país, a mortalidade por este tumor é diretamente propor-cional ao consumo per capita de cigarros ou similares ali medido. No Brasil,como em muitos outros países, este consumo tem sido sistematicamente progres-sivo, a partir de 1945. Tomando-se a mortalidade por câncer de pulmão no RioGrande do Sul, onde se observam os maiores índices nacionais de produção econsumo per capita de tabaco, verifica-se que, de 1935 a 1990, as taxas demortalidade por câncer de pulmão, entre os homens, ascenderam abruptamentea 15/100.000 habitantes, a partir de 1975, e ultrapassaram 30/100.000 habitan-tes, em 1990 (ou seja, respectivamente, 30 e 45 anos depois da explosão daoferta e do consumo de cigarros verificada no mercado brasileiro). Tendênciasemelhante, ainda que com ângulos menos agudos, observa-se no grupo dasmulheres gaúchas, entre as quais a taxa era de 5/100.000, em 1980, e em 1990estava quase duplicada. Deve ser ressaltado que isto ocorreu, respectivamen-te, 20 e 30 anos após a revolução sexual, que se deu na década de 1960 e queresultou na incorporação da mulher ao mercado de trabalho, fazendo com queela assumisse hábitos e costumes até então predominantemente masculinos, entreeles, o tabagismo.

1.3 - Avanço tecnológico no setor da saúde

Nas seções anteriores, discutiram-se alguns fenômenos de ordem soci-al que têm contribuído para o aumento da incidência do câncer. Nesta seção,será examinado como a disponibilidade de recursos tecnológicos mais avança-dos se relaciona com o diagnóstico e controle do câncer.

O aumento da mortalidade proporcional por câncer não se deve, ne-cessariamente, ao aumento real da doença. O avanço da ciência e da tecnologiapossibilitou a melhoria dos meios de diagnóstico e de tratamento. A utilizaçãodestes recursos, aliada ao desenvolvimento socioeconômico, contribuiu para odeclínio da mortalidade por enfermidades controláveis, como a tuberculose, adesnutrição, o diabetes melito e outras afecções, em várias regiões do mundo. Amortalidade dos que escapam destas doenças é desviada para os dois principaisgrupos das que ainda não foram controladas: as doenças cardiovasculares e asneoplásicas. A importância do câncer vem, assim, aumentando, à medida queocorre o controle progressivo de outras enfermidades.

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Os progressos tecnológicos observados na Medicina, nas últimas déca-das, proporcionaram o aprimoramento dos meios propedêuticos e, por conse-guinte, a maior acuidade diagnóstica para o câncer. Esta condição explica partedo aumento verificado na prevalência dessa doença.

É oportuno considerar que o impacto da melhoria dos recursos de diag-nóstico e de tratamento não pode ser avaliado sem que se analise o acesso dapopulação aos serviços de saúde. Também, há que se considerar que os custosda assistência médico-hospitalar aumentam com a incorporação de novastecnologias, ao contrário do que ocorre em outras áreas do conhecimento huma-no e do mercado de bens e serviços.

Segundo levantamento recente, realizado em maio de 2001, existemno Brasil 149 hospitais credenciados como CACON – Centro de Alta Complexi-dade em Oncologia - especializados no tratamento do câncer no Brasil. DessesCentros, 4% estão localizados na Região Norte, 6% na Região Centro-Oeste,19% na Região Nordeste, 21% na Região Sul e 51% na Região Sudeste. Ressal-te-se a grande concentração na região Sudeste. Há, portanto, uma razoáveldisponibilidade de recursos para tratamento do câncer neste nível do sistema desaúde.

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O problema do câncer no Brasil

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Uma nova distribuição demográfica reduz as pressões advindas de

uma população infantil e jovem sobre os sistemas educacional e sanitário mas,por outro lado, aumenta, significativamente, a pressão para a assistência médi-co-social aos idosos.

O envelhecimento cursa com uma maior suscetibilidade às doenças, oque torna os indivíduos idosos usuários assíduos dos serviços de saúde. Por suavez, as doenças que mais os afligem, as crônico-degenerativas, implicam con-sultas regulares, exames complementares múltiplos e repetidos e tratamentoslongos e custosos.

O Sistema Único de Saúde (SUS) do Brasil, é formado por dois grandessubsetores: o subsetor privado, composto por empresas, com ou sem fins lucra-tivos (filantrópicas), contratadas ou credenciadas para prestação de serviço aoSUS; empresas de assistência médica e de seguro saúde, clínicas e hospitaisparticulares. O outro é o subsetor público, composto por instituições municipais,estaduais e federais, presentes majoritariamente nos níveis primário e secundá-rio e nas áreas de alto custo do nível terciário, pelos hospitais universitários epelos serviços de saúde dos ministérios militares, que possuem clientela, orça-mento e regulamentação próprias.

Já pela composição do sistema de saúde, pode-se deduzir o quão difícilé calcular os custos reais da assistência médica no Brasil. Isto mais se complica,na área do câncer, pela multiplicidade de procedimentos (de baixa e alta com-plexidade) e ações (da prevenção à paliação) requeridos, e que permeiam todosos níveis de um sistema que possui setores estanques e desintegrados, do qualnão se dispõe da informação sobre a duplicação de ações e sobre os custos detodos os setores.

Porém, como o SUS representa o maior deles, em estrutura e número deusuários e, por isso, certamente também em orçamento, os seus gastos podemsugerir a magnitude dos custos com a saúde e a doença dos brasileiros. Só emdezembro de 1996, o DATASUS processou 914.637 internações (Sistema deInternações Hospitalares - SIH / SUS) e 99.514.572 procedimentos ambulatoriais (Sis-tema de Informações Ambulatoriais - SIA / SUS), pelo que se pagou, respectivamente,R$ 246.897.454,28 e R$ 276.965.883,98, num total mensal de R$ 523.863.338,26.A isto não se somam os gastos do Ministério da Saúde com pessoal, o repasse deverbas para a Fundação Nacional de Saúde e nem os custos dos hospitais própriosdo Ministério da Saúde, da Fundação Oswaldo Cruz, da Central de Medicamen-tos, dos hospitais das universidades federais e da gestão semiplena.

Entre as internações hospitalares mais onerosas, em média, naquelemês, destacam-se as devidas anomalias congênitas (R$ 1.045,56), neoplasias(R$ 516,69), doenças do aparelho circulatório (R$ 434,49), transtornos mentais(R$ 427,43) e afecções perinatais (R$ 399, 48). A comparação dos custos médios

2 - IMPACTO ECONÔMICO E SOCIAL

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das internações efetuadas nos anos de 1991 e 1996 (Tabela 1.4), demonstra que,neste intervalo de cinco anos, exceto pelos transtornos mentais, a média doscustos dos procedimentos ascendeu em todos os demais grupos. Duas deduçõesse impõem, a partir dessa comparação. Primeira, a política dedesinstitucionalização dos doentes mentais, aplicada no Brasil, nos últimos anos(o que também pode explicar o aumento do custo médio das internações poranomalias congênitas); segunda: o quanto pode a incorporação tecnológica,que, repete-se, sempre aumenta os custos médico-hospitalares, por irracional eindiscriminadamente aplicada, estar-se somando ao custo médio observado nosdemais grupos de causas listados na Tabela 1.4.

Tabela 1.4 - Custo médio (em dólares) das internações mais onerosasdistribuídas por grupos de causas e ano, no Brasil.

Vale informar que, sob a rubrica neoplasias, incluem-se somente asinternações relativas a procedimentos codificados como oncológicos, ou seja,terapêuticos, a maioria cirúrgicos, e que cerca de 80% dos pacientes com cân-cer são atendidos e tratados ambulatorialmente. Do que se pode deduzir emquanto seriam majorados os custos da assistência na área do câncer, caso fos-sem computados todos os procedimentos e exames de prevenção, diagnóstico,estadiamento, tratamento, paliação e acompanhamento dos pacientes.

É justo salientar que o câncer não é problema de saúde pública exclu-sivo dos países industrializados, posto que seus efeitos podem ser percebidos emregiões mais pobres ou subdesenvolvidas, com o agravante de que estas áreasapresentam outros sérios problemas de saúde, como as doenças infecciosas e adesnutrição.

Embora não sejam comumente discutidas, as repercussões de ordemeconômica e social do câncer são de grande monta. Para Rice & Hodgson (1980),as implicações para os doentes, a família e a sociedade em geral são a dor, osofrimento, a incapacidade e a morte; representam milhões de anos de vida per-didos, uma vasta quantidade de recursos destinados à detecção, ao diagnósticoe ao tratamento e, ainda, recursos econômicos desperdiçados, devido à reduçãodo potencial de trabalho humano.

Fonte: Ministério da Saúde - Cenepi - 1993 e DataSus - 1997.

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O problema do câncer no Brasil

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Os custos sociais do câncer, ainda que sejam de difícil quantificação,são, seguramente, bastante elevados. Eles são classificados em diretos e indiretos.Entre os custos diretos, estão os gastos com a prevenção, o diagnóstico e o trata-mento. Nos custos indiretos são computadas as perdas de produção, decorren-tes do tempo potencial do trabalho perdido por causa da mortalidade, morbidadee incapacidade provocadas por essa doença.

Fica evidente o seu alto custo econômico, se for levado em conta queela é de natureza crônica, pode provocar invalidez e exige internação hospita-lar e acompanhamento ambulatorial freqüentes, e que seu diagnóstico e trata-mento são realizados por equipe multiprofissional, altamente especializada e deformação e manutenção onerosas, empregando geralmente tecnologia sofistica-da e dispendiosa .

É fácil depreender a relação direta que há entre recursos despendidos eo estádio em que o câncer é diagnosticado. A Tabela 1.5, usando como exem-plos os cânceres de mama e de colo do útero, exemplifica e quantifica bem essarelação, e até a extrapola, uma vez que, quanto mais avançado o estágio dadoença, maior o número dos procedimentos de diagnóstico e terapêuticos apli-cáveis, que se multiplicam quando se observa a recidiva tumoral; emcontraposição, a sobrevida das mulheres é progressivamente reduzida.

O investimento nas áreas de prevenção e diagnóstico precoce traz,assim, maior benefício social e econômico do que o custeio do tratamento dadoença em fase avançada.

Os custos indiretos das neoplasias malignas são também muito expres-sivos. Vale observar, por exemplo, que o peso da mortalidade por câncer emFortaleza, em dois anos, pode ser expresso em aproximadamente 15.894 anosde vida média ativa potencial perdidos. Considerando-se as faixas etárias emque ocorrem os óbitos, a mediana de renda por faixa etária e algumas premissasde econometria, as perdas econômicas futuras estimadas seriam da ordem de505.487 salários mínimos (Silva, 1987).

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CÂNCER DE MAMA

(1) União Internacional de Controle do Câncer (UICC) - 1989.(2)Sistema Único de Saúde - Ministério da Saúde - 1994.Obs: Sem os custos de procedimentos paliativos aplicados ao estádio IV (p.e., RT anti-hemorrágica).

Tabela 1.5 - Relações entre o benefício e o custo direto* das ações decontrole do câncer cérvico-uterino e de mama.

CÂNCER DE COLO DO ÚTERO

*Média dos procedimentos diagnósticos e terapêuticas aplicáveis sem repetiçãodos procedimentos unitários previstos.(1)Médias de fontes internacionais.(2)Sistema Único de Saúde - Ministério da Saúde - 1995.

Vale também discutir como a dependência tecnológica pune os países

em desenvolvimento, cujo cidadão paga cem vezes mais que um estadunidense

para tratar um caso de câncer, independentemente da localização primária des-

te (Tabela 1.6). Deve-se considerar, porém, que o alto percentual de casos de

doença avançada, verificados correntemente em países subdesenvolvidos, tam-

bém influencia o custo final do tratamento. Quando é feita a correlação entre

esse custo e o benefício que ele traz ao paciente, medida pelo custo por anos de

vida ganhos, verifica-se que ele é variável não só com a idade do paciente ao

diagnóstico, mas também com a localização primária do tumor (Tabela 1.7).

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O problema do câncer no Brasil

Capítulo 1

29

Tabela 1.6 - Custo* por caso tratado nos Estados Unidos da Américae em países em desenvolvimento, de acordo com algumas

localizações primárias de câncer.

Tabela 1.7 - Custo* por anos de vida ganhos de casos tratados**no nível terciário.

Os dados anteriormente descritos evidenciam o tributo pago pela socie-dade, como conseqüência das neoplasias malignas, justificando a urgência daadoção de medidas eficazes para seu controle.

Fonte: Cromwell, 1969/71 (In: Barnum; Greenberg, 1989).* % per capita do PIB (números subestimados).

Fontes: Barnum; Greenberg, 1989. * % per capita do PIB (números subestimados).**Média de todos os estádios.

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Ações de enfermagem para o controle do câncer30

A epidemiologia permite o estudo da distribuição das várias formas de

câncer entre a população, a observação e análise das variações de sua ocorrên-cia em diferentes grupos ou comunidades e os fatores de risco a que eles seexpõem.

Mediante a correlação existente entre os dados de morbidade e mortali-dade e as diferenças verificadas nas condições ambientais, hábitos de vida oude constituição genética observadas entre esses grupos, é possível se estabele-cerem hipóteses sobre as prováveis causas do câncer.

Como este não representa uma única moléstia, mas sim um processocomum a um grupo heterogêneo de doenças que diferem em sua etiologia,freqüência e manifestações clínicas, é necessário estabelecer critérios de clas-sificação para o seu estudo. Usualmente, em Cancerologia, utilizam-se classifi-cações segundo a localização primária, o tipo histopatológico e a extensãoanatômica dos tumores.

Os estudos comparativos de freqüência do câncer devem considerar sem-pre a cobertura e a qualidade dos serviços de diagnóstico, na medida em que asvariações observadas entre as diferentes regiões do território nacional podemrefletir apenas esses componentes. A comparabilidade dos dados dependerá sem-pre também da utilização uniforme dos critérios adotados em diferentes regiões,instituições e até entre profissionais de um mesmo serviço de saúde.

3.1 - Conceitos e definições

Para se medir a freqüência das doenças e a mortalidade por elasprovocada, utilizam-se taxas, ou coeficientes, que têm três elementosessenciais:

• grupo de população exposto ao risco de adoecer ou morrer;• o fator tempo; e• o número de casos, de doenças, ou de mortes ocorridos na população

exposta, em um certo período de tempo.

Assim, a taxa de mortalidade por câncer é expressa pela seguinteequação:

As taxas de mortalidade podem ser específicas para várias características,tais como sexo, idade, tipo ou localização de tumores, etc., permitindo compara-ções entre diferentes subgrupos de uma mesma população.

Taxa de mortalidade geral = N.º de mortes por câncer, local, período X 100.000

por câncer População exposta ao risco, local, meio do período

3 - A EPIDEMIOLOGIA DO CÂNCER

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O problema do câncer no Brasil

Capítulo 1

31

A morbidade pode ser expressa pelas taxas de incidência e prevalência,assim definidas:

Incidência

Prevalência

A incidência expressa o risco de uma determinada população desenvol-ver uma doença. A prevalência é a quantidade de casos existentes de uma do-ença (casos novos e antigos), relacionando-se, portanto, com a incidência e coma duração da doença. Doenças agudas e fatais como a raiva, por exemplo, têm,assim, incidência e prevalência semelhantes.

As taxas são utilizadas para comparar dados de diferentes populações.Entretanto, a análise comparativa entre taxas deve ser cuidadosa. Diferençasentre elas podem refletir, por exemplo, apenas diferenças na composição etáriadas populações estudadas. Por esta razão, utiliza-se o recurso da padronizaçãode taxas por idade, visando a anular o efeito, neste caso, da diferença observadana estrutura etária das populações. A padronização das taxas por idade permitea comparabilidade dos coeficientes de distintos Registros de Câncer ou países,mesmo que as populações tenham diferentes distribuições etárias.

A Agência Internacional para Pesquisa sobre o Câncer (IARC, sigla emInglês), em suas publicações sobre a incidência do câncer nos cinco continen-tes, tem adotado três populações-modelo de padronização: africana, mundial eeuropéia. A primeira é representativa de uma população jovem; a terceira, típi-ca de uma população idosa; enquanto a segunda representa um padrão interme-diário entre os dois extremos de modelos (Waterhouse et al, 1987).

A Tabela 1.8 mostra, a título de ilustração, a mortalidade e a incidênciabrutas por câncer, segundo o sexo, em Fortaleza, em 1985, e as taxas ajustadaspor idade, segundo a população padrão mundial de 1960. Como Fortaleza temuma população predominantemente jovem, a padronização com o modelo mun-dial aumenta em muito as taxas da capital cearense.

Taxa de incidência = N.º de casos novos da doença, local, período X 100.000

População exposta ao risco, local, meio do período

Taxa de prevalência = N.º de casos da doença, local, período X 100.000

População no meio do período, local

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Ações de enfermagem para o controle do câncer32

Tabela 1.8 - Comparação das taxas* bruta e padronizada** demortalidade e incidência de câncer, por sexo, em Fortaleza, 1985.

Para limitar-se a influência da idade, também pode ser usada a compara-ção restrita ao grupo etário compreendido entre os 35 e 64 anos, compondo-se achamada população “truncada”. Na Tabela 1.9, figuram taxas de incidência decâncer, padronizadas pela população mundial, inclusive a truncada, comparan-do-se dados de registros selecionados no mundo. Foram selecionados os Registrosde Câncer com as 10 maiores taxas, as 10 intermediárias e as 10 menores. Astaxas para os Registros de Câncer brasileiros foram inseridas segundo a sua po-sição relativa na tabela. A primeira coluna indica o ranque correspondente aoRegistro de Câncer. Tal comparação mostra que as taxas de incidência brasilei-ras encontram-se num nível intermediário. Dentre os Registros de Câncer brasi-leiros presentes nesta publicação, Porto Alegre apresenta as maiores taxas(24a posição), seguido de Goiânia (72a posição) e por último Belém (147a posição).

3.2 - Mortalidade

Como os coeficientes de mortalidade são calculados a partir dos dadoscontidos nos atestados de óbito, a precisão dessas informações interfere noscoeficientes de mortalidade obtidos.

Em 1975, o Ministério da Saúde promoveu em Brasília uma reunião como objetivo de implantar um Sistema de Vigilância Epidemiológica a nível nacio-nal, quando foi aprovado o modelo único de Declaração de Óbito e Declaraçãode Óbito Fetal. Esta padronização permitiu a implantação do SIM – Sistema deInformação de Mortalidade, um sistema pioneiro no emprego de um documentoindividualizado e padronizado (Declaração de Óbito – DO) para a coleta deinformações sobre óbitos. Houve um grande avanço com a implantação do SIM,pois, no período anterior, diversas unidades da federação possuíam distintas for-mas de atestado médico da morte, e várias não seguiam a padronização interna-cional de coleta de dados proposta pela Organização Mundial de Saúde - OMS.

A declaração de óbito é um documento em grande parte pré-codificado,o que permitiu a padronização da coleta de variáveis, facilitando o processamentoe a análise da consistência das informações captadas. Na década de 1990, coma utilização da informática, foi possível a descentralização das ações e o fortale-cimento do SIM. Com o avanço da descentralização da produção das informa-

Fonte: Registro de Câncer de Base Populacional de Fortaleza, 1985. * Por 100.000 habitantes ** pela população mundial de 1960.

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O problema do câncer no Brasil

Capítulo 1

33

ções em saúde, os níveis estadual e federal desempenharão um novo papel nagestão dos sistemas de informação. No seu novo papel, estes níveis deverãodesenvolver atividades dirigidas ao controle da qualidade dos sistemas e forne-cer suporte técnico aos municípios. A descentralização da informação poderátrazer grandes vantagens para o aprimoramento da qualidade da informação epermitirá um maior e melhor monitoramento da coleta de dados (Almeida,1998).

Tabela 1.9 -Taxas padronizadas de incidência de câncer, por 100.000habitantes, segundo o sexo, em diversas regiões do mundo.

Fonte: Cancer Incidence in five Continents, Vol. VII - IARC.

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Ações de enfermagem para o controle do câncer34

Nas Tabelas 1.10 e 1.11, estão retratadas, segundo o sexo, as taxasbrutas de mortalidade por câncer, dos óbitos registrados no período entre 1979 e1998, para alguns tumores selecionados. A taxa bruta de mortalidade expressa amedida do risco a que uma determinada população está submetida. Percebe-seque, à exceção do câncer de estômago, houve um acréscimo do risco durante operíodo estudado, tanto para homens quanto para as mulheres. No sexo mascu-lino, os tumores que tiveram aumento mais expressivo na taxa de mortalidadeforam: próstata, pulmão e cólon e reto. Já para o sexo feminino, os tumoresforam mama, pulmão e cólon e reto.

Vale ressaltar que o aumento observado também reflete a melhoria daqualidade da informação, o acesso aos serviços de saúde e a qualidade dosserviços de diagnóstico.

Tabela 1.10 - Taxas brutas de mortalidade para topografias selecionadas,homens, Brasil, 1979 a 1998.

Fontes: Sistema de Informação sobre Mortalidade - SIM/DATASUS/MS. Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. Divisão de Epidemiologia e Avaliação - CONPREV/INCA/MS.

Tabela 1.11 - Taxas brutas de mortalidade para topografias selecionadas,mulheres, Brasil, 1979 a 1998.

Fontes: Sistema de Informação sobre Mortalidade - SIM/DATASUS/MS. Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. Divisão de Epidemiologia e Avaliação - CONPREV/INCA/MS.

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O problema do câncer no Brasil

Capítulo 1

35

Utilizando-se como parâmetro de análise o coeficiente ajustado por idade(taxa padronizada) para descontar o efeito da estrutura etária da população epermitir a comparabilidade dos dados, observa-se que, nas mulheres, amortalidade por câncer do colo uterino, no período de 1979 a 1998 (Figura 1.3),é quase estacionária e a por câncer de estômago apresenta um decréscimoimportante. Já a mortalidade devida aos cânceres de mama e pulmão está emfranca ascensão. No que se refere aos homens, para este mesmo período(Figura 1.4), observa-se um expressivo declínio na mortalidade por câncer deestômago. A mortalidade por câncer de próstata teve também um aumentoexpressivo nestas duas décadas. A mortalidade por câncer de pulmão teve omaior crescimento entre 1979 e 1987. No período entre 1988 e 1998, estecrescimento diminuiu o ritmo.

Figura 1.3 - Coeficientes de mortalidade ajustado (1) por idade (por100.000 hab.), por meio do método direto, para asneoplasias malignas selecionadas, Mulheres – Brasil, 1979a 1998.

(1) População padrão mundial, modificada por Doll et al. (1966).Fontes: Sistema de Informação sobre Mortalidade - SIM/DATASUS/MS.

Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. Divisão de Epidemiologia e Avaliação - CONPREV/INCA/MS.

Coe

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0,00

2,00

4,00

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14,00

1979

1980

1981

1982

1983

1984

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1986

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1988

1989

1990

1991

1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

mama colo do útero estômago pulmão

1979 1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998

Coeficiente de mortalidade

Ano

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Ações de enfermagem para o controle do câncer36

Figura 1.4 - Coeficientes de mortalidade ajustado por idade (1) (por100.000 hab.), por meio do método direto, para asneoplasias malignas selecionadas, homens, Brasil,1979 a 1998.

Os coeficientes de mortalidade por neoplasias malignas traçam umatendência firmemente ascendente com o avanço da faixa etária. Na Figura 1.5,distribuem-se os coeficientes de mortalidade por neoplasia maligna em homense mulheres, em 1998, de acordo com a faixa etária. Nota-se como, para ambosos sexos, a partir dos 30 anos de idade, os coeficientes aumentam abrupta eprogressivamente, significando que, se o câncer é uma doença que muito mataidosos, também mata muitos adultos jovens, no Brasil. Ressalte-se ainda que,apesar de ambas as curvas possuírem o mesmo formato, a curva referente aosexo masculino é muito mais acentuada, evidenciando riscos diferentes de mor-te por sexo.

(1) População padrão mundial, modificada por Doll et al. (1996).Fontes: Sistema de Informação sobre Mortalidade - SIM/DATASUS/MS.

Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. Divisão de Epidemiologia e Avaliação - CONPREV/INCA/MS.

Coe

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Coeficiente bruto

Ano

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O problema do câncer no Brasil

Capítulo 1

37

Importa considerar-se, também, a mortalidade proporcional geral, quepermite avaliar a proporção representada pelas mortes por câncer em relaçãoàs demais causas de morte. A Figura 1.6 apresenta a mortalidade proporcionalpelos principais grupos de doenças, distribuída por macrorregiões brasileiras,dos 929.023 óbitos registrados em 1998. De um modo geral, observa-se que acontribuição das doenças neoplásicas para a mortalidade, no Brasil, é maior nasregiões economicamente mais desenvolvidas do que nas subdesenvolvidas, ser-vindo estes dados como expressão dos contrastes regionais que marcam o nossopaís.

Chama a atenção a contribuição cada vez maior da mortalidade devidaa causas externas (acidentes, violências, etc), que está entre as primeiras causasde morte. Outro destaque fica por conta das causas mal definidas que variamdesde a primeira até a quinta posição, evidenciando, assim, a diferença da qua-lidade do registro do óbito nas diferentes macrorregiões do país.

As tendências demográficas e epidemiológicas sugerem que, em trintaanos, mantidas as condições atuais, mais de 85% dos brasileiros estarão vivendoem áreas urbanas, e os menores de 14 anos de idade constituirão, até o ano2000, cerca de 32% da população. O número de idosos terá dobrado, e 12% dapopulação terão 60 ou mais anos de idade. As doenças cardiovasculares, ocâncer e as causas externas serão, conjuntamente, responsáveis por 75% dosóbitos.

Coe

fici

ente

por

100

.000

hab

.

Fontes: Sistema de Informação sobre Mortalidade - SIM/DATASUS/MS. Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. Divisão de Epidemiologia e Avaliação - CONPREV/INCA/MS.

Figura 1.5 - Coeficientes de mortalidade para todasas neoplasias malignas, por faixa etária,para homens e mulheres, Brasil, 1998.

Coeficiente de mortalidade

Faixaetária

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Ações de enfermagem para o controle do câncer38

3.3 - Morbidade

As fontes para a obtenção de dados da morbidade por câncer são osinquéritos epidemiológicos, os Registros Hospitalares de Câncer (RHC) e osRegistros de Câncer de Base Populacional (RCBP).

No Brasil, comparado a outras doenças, o câncer é relativamente bemdotado de informações específicas, contando-se, atualmente, com cerca decinqüenta RHC, implantados em hospitais especializados no tratamento do cân-cer, credenciados como CACON. Com relação aos RCBP, sete estão em fase deprodução de dados, localizados em Belém-PA, Goiânia-GO, Fortaleza-CE, Sal-vador-BA, São Paulo-SP, Campinas-SP e Porto Alegre-RS. Outros treze RCBP estãoimplantados ou em fase de implantação. São eles: Manaus-AM, Palmas-TO,Natal–RN, Recife-PE, Aracaju-SE, João Pessoa-PB, Teresina-PI, Vitória-ES, Riode Janeiro-RJ, Belo Horizonte-MG, Curitiba-PR, Brasília-DF e Cuiabá-MT.

Os RCBP dedicam-se à coleta contínua e sistemática da ocorrência e dascaracterísticas de todos os casos novos de câncer, em uma população geografi-camente definida, representando, portanto, registros de incidência de câncer.

Fontes: Sistema de Informação sobre Mortalidade - SIM/DATASUS/MS. Divisão de Epidemiologia e Avaliação - CONPREV/INCA/MS.

Figura 1.6 - Mortalidade proporcional, em 1998, distribuí-da por grupos de causas selecionados emacroregiões brasileiras.

%

Causas por

regiões

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O problema do câncer no Brasil

Capítulo 1

39

O RHC, recomendado para todos os hospitais, especializados ou não notratamento do câncer, tem como principal objetivo o registro do atendimento edo seguimento dos casos, a partir das informações coletadas do prontuário médi-co, acumulando informações que permitem a avaliação da extensão e da quali-dade da sobrevida dos doentes de câncer tratados na respectiva instituição. Sis-tematiza, igualmente, os dados que possibilitam e estimulam outros tipos de in-vestigação clínica e epidemiológica sobre aspectos relacionados com as carac-terísticas dos pacientes, da doença e da intervenção médica. O Instituto Nacio-nal de Câncer - INCA - tem procurado incentivar a criação e o funcionamento deregistros de câncer nos outros centros de tratamento, sejam especializados notratamento do câncer ou não. Atualmente, repete-se, há cerca de cinqüenta RHCimplantados em todo o Brasil.

As informações mais atualizadas dos RCBP podem ser vistas naFigura 1.7, em que se apresenta a taxa de incidência padronizada de todas asneoplasias das seis cidades brasileiras com dados publicados.

As taxas de incidência de câncer, obtidas desses seis RCBPs revelaram-se bastante diferenciadas entre as regiões. Porto Alegre, Goiânia e São Pauloapresentam as maiores taxas de incidência padronizada de todas as formas decâncer.

Fonte: 1 IARC - Cancer incidence in five continents - vol. VII +2 Câncer no Brasil - Dados dos registros de base populacional vol. II.3 Câncer em Goiânia - Tendências - 1988 a 1997.

Figura 1.7 - Taxas de incidência de câncer, padroni-zadas pela população mundial, nascidades brasileiras onde existe RCBP.

Taxas de incidência

RCBP

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Ações de enfermagem para o controle do câncer40

Quando comparadas por sexo (Figuras 1.8 e 1.9), observa-se que em Belémo tumor mais incidente é o de colo do útero, enquanto que, para as demais loca-lidades, a maior incidência é dos tumores de mama, sendo as maiores taxasencontradas em São Paulo e Porto Alegre. Já para o sexo masculino, observa-seem Belém e Fortaleza o tumor de estômago como sendo o mais incidente. EmCampinas, Goiânia e São Paulo, o tumor mais incidente é o de próstata. Chamaa atenção, em Porto Alegre, o câncer de pulmão como a principal incidência emhomens.

O câncer de pele, que não o melanoma cutâneo, é um tipo de tumor dedifícil estudo epidemiológico, tendo em vista que, na quase totalidade dos casos,é de bom prognóstico, sendo tratado mais em ambulatórios, consultórios, clíni-cas ou hospitais gerais, por conseguinte, apresentando grande subnotificação.Os RCBP coletam os dados sobre o câncer de pele, sendo recomendável apre-sentar as publicações com as informações sobre o total de tumores incluindo-osou não. As Figuras 1.8 e 1.9, apresentam as taxas de incidência das principaislocalizações anatômicas de câncer, nas seis cidades brasileiras com RCBP comdados publicados recentemente. Excluído o câncer de pele, observa-se que,para o sexo masculino, os cânceres de estômago, pulmão e próstata alternam-senas três primeiras posições. Nas mulheres, esta alternância se dá entre asneoplasias do colo uterino e de mama.

Fonte: 1 IARC/Cancer incidence in five continents - vol. VII.2 Câncer no Brasil - Dados dos registros de base populacional vol. II.3 Câncer em Goiânia - Tendências - 1998 a 1997.4 Incidência de câncer do município de São Paulo, 1983-1998-1993.- Padronizada pela população mundial.

Figura 1.8 -Taxas de incidência* das localizaçõesmais frequentes nas cidades brasileirascom RCBP, sexo masculino.

Taxas de incidência

Causas porregiões

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O problema do câncer no Brasil

Capítulo 1

41

O câncer do colo uterino se destaca em relação a outros tipos de câncer,nas cidades de Belém e Fortaleza, havendo, nas outras cidades, o predomínio docâncer de mama. O de estômago é o terceiro câncer mais freqüente, entre asmulheres, nas cidades estudadas.

Relacionando-se os dados de incidência e mortalidade, nota-se que adistribuição das localizações primárias, nos dados de incidência, não correspondeà distribuição da mortalidade, o que se deve às diferenças dos padrões de sobre-vivência observados entre os diferentes tumores.

O câncer de pele, por exemplo, que tem uma incidência alta, não constada Tabela 1.10, por ter uma baixa letalidade. O câncer de estômago, ao contrá-rio, por ser diagnosticado tardiamente, no Brasil, mostra alta incidência (Figuras1.8 e 1.9) e mortalidade (Tabela 1.10), o que demonstra a curta sobrevivênciados pacientes, razão pela qual a mortalidade por câncer de estômago tende aigualar-se à sua incidência. Desse modo, uma idéia sobre a incidência do cân-cer em algumas localizações anatômicas pode ser inferida a partir de dados demortalidade.

Constata-se que as maiores taxas de incidência dos

cânceres de esôfago, próstata e pulmão referem-se ao

Rio Grande do Sul. Formule uma hipótese que

explique este achado e discuta-a com os seus

professores e colegas.

Figura 1.9 - Taxas de incidência* das localizações de câncer maisfreqüentes nas cidades brasileiras com Registro deCâncer de Base Populacional, sexo feminino.

Fonte: 1 IARC/Cancer incidence in five continents - vol. VII.2 Câncer no Brasil - Dados dos registros de base populacional vol. II.3 Câncer em Goiânia - Tendências - 1998 a 1997.4 Incidência de câncer do município de São Paulo, 1983-1998-1993.* Padronizada pela população mundial.

Taxas de incidência

Causas porregiões

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Ações de enfermagem para o controle do câncer42

Analisando-se os dados mais recentemente divulgados por RHC brasilei-ros (Figuras 1.10 e 1.11), observa-se que, entre as dez localizações maisfreqüentes, colo uterino, mama feminina, pele, estômago, próstata, linfonodos eesôfago são locais primários de tumor encontrados em ambos os registros. Astrês restantes variam em localização e em classificação. Pode-se observar, tam-bém, que o porcentual de casos não estadiáveis ou de estádio desconhecido épredominante (55,1%) em um dos RHC (sem informação) e menor (15,1%) nooutro (tratamento prévio, não estadiável ou sem estádio). Dos casos estadiados,é de ressaltar-se a proporção de estádios avançados da doença (III e IV). Consi-derando-se que o colo do útero, a mama, a pele, a boca, a tireóide, o olho, ocorpo do útero e a próstata são localizações acessíveis ao exame físico, quedispensam ambiente e equipamentos sofisticados para serem examinadas, e queo pulmão, o esôfago, o estômago e os ossos podem ser examinados por meio deequipamentos e tecnologia já há muito incorporados à prática médica brasileira,os dados desses dois RHC sugerem uma deficiência considerável no diagnósticodo câncer, feito nos pacientes que chegam para serem atendidos nesses hospi-tais. Desta análise excluiu-se a localização linfonodos, constante entre as dezmais freqüentes localizações nesses dois RHC, uma vez que eles podem referir-se a leucemias, linfomas ou metástases linfáticas, cuja exigência é variável en-tre estes diagnósticos, em termos médicos e tecnológicos.

Ressalta-se que os dados de um RHC representam a realidade institucional:a freqüência relativa dos casos, distribuídos por locais primários, pode significarapenas que a instituição oferece um serviço de boa (freqüência elevada) ou má(freqüência baixa) qualidade, em alguma subespecialidade oncológica; se é, ounão, um centro de referência para o encaminhamento de pacientes com deter-minados tipos de câncer (por exemplo, tumores da cabeça e pescoço, tumoresgenitais femininos, tumores próprios da infância, etc.); se representa uma institui-ção de abrangência local, regional ou nacional; ou se constitui ou não a alterna-tiva de atendimento especializado para uma determinada população.

A comparação entre os dados das Figuras 1.10 e 1.11 demonstra como arealidade das duas instituições difere, em termos da localização primária dotumor, da freqüência relativa dos tumores comuns aos dois RHC e da distribui-ção dos estádios ou da extensão da doença.

Nota-se a presença do estômago e da próstata, entre as dez principaislocalizações primárias de tumores registrados, em ambos os RHC mostrados,porém em porcentuais mais baixos do que os presumíveis, tendo-se em vista asaltas taxas de mortalidade (Tabela 1.10 e Figura 1.4) e incidência (Figura 1.8)observadas, mesmo que os dados desses RHC não se superponham, obrigatoria-mente, àquelas taxas. Porém, considerando-se o câncer da mama feminina e odo colo uterino, pode-se inferir como os dados hospitalares os classificam tãomais altos, como o fazem os de mortalidade e de incidência.

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O problema do câncer no Brasil

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Isto pode significar que os pacientes com câncer prostático, por exem-plo, estejam sendo atendidos e tratados em serviços de Urologia de hospitaisgerais, sem que os casos sejam adequadamente registrados e analisados, mor-mente se eles não ocorrem em cidades que dispõem de RCBP, embora se possaincluir entre os óbitos registrados, na eventualidade da morte dos pacientes.

Fonte: Registro do Hospital Aristides Maltez.

Figura 1.10 -Distribuição porcentual topográfica e por estádios dosdez tumores mais freqüentes no Hospital AristidesMaltez, Salvador-BA, de 1991 a 1994.

Figura 1.11 - Distribuição porcentual topográfica e por está-dios dos dez tumores mais freqüentes noHospital A. C. Camargo, São Paulo-SP, 1994.

Topografia

Fonte: Registro do Hospital A. C. Camargo – 1996.

Topografia

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0% 2% 4% 6% 8% 10% 12% 14%

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Ações de enfermagem para o controle do câncer44

Veja-se que os dados do Hospital do Câncer do INCA (Figura 1.12) desta-cam que, para os 503 casos de câncer de próstata, atendidos de 1990 a 1994,ocorreu um decréscimo de 15% dos casos classificados em estádio D (commetástases) e um aumento de 10%, para os classificados nos estádios A, B e C.Em contrapartida, observou-se um incremento de 35% de casos registrados sema informação sobre o estádio da doença.

Os RHC constituem uma fonte de aferição da qualidade do diagnóstico eda assistência prestada aos pacientes com câncer atendidos nos hospitais. So-mente por meio de um RHC eficaz e atuante, pode-se assegurar o seguimentosistemático de pacientes tratados, estabelecendo-se, assim, a abrangência e aconfiabilidade necessárias aos dados que permitirão o cálculo da sua sobrevida,que, em última análise, guarda relação com a localização e histologia do tumorprimário, o tempo em que se chegou ao diagnóstico do tumor e do tipo de trata-mento aplicado.

Como os RHC brasileiros são de implantação recente, inexistem dadosnacionais sobre o tempo e a qualidade da sobrevida de pacientes tratados decâncer, visto que essa análise necessita de longos períodos de acompanhamen-to, que, dependendo do tipo tumoral, serão, no mínimo, de cinco ou dez anos.

A partir da Figura 1.13, e recordando-se que, quanto mais avançada adoença, pior será o prognóstico dos pacientes, pode-se imaginar o quanto preju-dicada é a sobrevida destes. A condição dos estádios dispostos na figura é aindamais inaceitável, quando se recorda que os órgãos em questão (boca, colo uterinoe mama) são de fácil acesso ao auto-exame ou ao exame físico, e que já secontam com critérios, técnicas e métodos de detecção muito bem estabelecidospara esses tipos de câncer.

Fonte: Registro do Hospital do Câncer/INCA/MS.

Figura 1.12 - Casos de câncer de próstata atendidos noHospital do Câncer / INCA, de 1990 a 1994,distribuídos pelos estádios clínicos do tumor.

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De imediato, os dados de um RHC demonstram a qualidade do prontuá-rio médico, sua única fonte de dados. Como ocorre com os atestados de óbito, opreenchimento correto e, no caso dos prontuários, as anotações sistemáticassobre os quadros clínico e cirúrgico dos pacientes, a incorporação dos resulta-dos dos exames complementares realizados e a manutenção de um prontuárioorganizado dependem do médico, sendo ele o principal agente determinante daqualidade dos dados levantados e publicados. Parte da Figura 1.10 atesta a po-breza de dados de prontuários médicos, relativos a uma doença cujos tratamen-to e prognóstico devem basear-se em critérios bem definidos de avaliação dasua extensão, ou seja, no seu estadiamento.

É também função do RHC contribuir para que dados completos e confiáveissejam produzidos pelo corpo médico do hospital, o que, por sua vez, pode levarà melhoria da assistência prestada.

Fonte: Registro Hospitalar de Câncer do INCA - 1993

Câncer de mama

Câncer de colo do útero

Câncer de boca

Figura 1.13 -Distribuição por estádios clínicos dos ca-sos de câncer de boca, de colo do útero ede mama, atendidos no Hospital doCâncer / INCA, em 1993.

Estádios

Estádios

Estádios

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Ações de enfermagem para o controle do câncer46

3.4 - Epidemiologia dos tumores da criança e do adolescente

Desde 1970, vem-se observando um aumento linear das taxas de curados tumores na infância, estando estas, atualmente, variando entre 70% e 90%dos casos, nos Estados Unidos. No Brasil, as crianças e jovens com leucemialinfática aguda (LLA) curam-se em 70% a 80% dos casos.

Paralelamente, tem-se verificado um aumento progressivo, e também li-near, das taxas de incidência dos tumores da criança, sobretudo a LLA, os tumo-res do sistema nervoso central (SNC), os linfomas não Hodgkin e o tumor deWilms e outros tumores renais. Por exemplo, de dez a quinze casos de câncer,entre indivíduos com menos de quinze anos de idade, no Brasil, quatro são deLLA.

Supostamente, a criança tem mais anos a perder, ou a ganhar, uma vezque a sua expectativa de vida é maior do que a do adulto. Atualmente, o índicede anos de vida ganhos para as crianças com câncer só não é maior do que paraas mulheres com câncer de mama.

Quando se tenta interpretar as tendências das taxas relativas aos tumoresna infância, encontram-se duas principais dificuldades: a primeira, a raridade daocorrência do câncer nesta fase da vida e, a segunda, a utilização de modelosmais aplicáveis ao câncer de adultos - embora já haja modelos mais apropriadosà avaliação estatística do câncer da criança, em alguns países ou regiões.

A maioria dos registros de câncer apresenta seus dados dispostos em ca-tegorias de idade com intervalos de cinco anos e por localização primária dotumor. Apesar de este formato ser satisfatório para a maioria dos tumores doadulto, ele se mostra inadequado para a área infantil, visto que, exceto pelostumores do SNC, os tumores da criança se classificam por tipo cito ouhistopatológico, e não pela topografia do tumor primário. Ademais, há grandesvariações nas taxas específicas por idade, ano a ano, e muitos padrõesdemográficos infantis podem não se expressar, à utilização de intervalos de tem-po tão longos, relativamente às crianças. Uma forma de se superar esta distorçãoseria a distribuição de dados por ano e por milhão de pessoas (e não por 100.000habitantes, como se costumam calcular as taxas, o que exclui os cânceres maisraros, como o são os tumores na infância).

Outra dificuldade relevante se deve ao fato de os censos demográficosrealizarem-se a cada dez anos, o que faz com que as taxas de incidência emortalidade sejam calculadas com base em populações intercensitárias estima-das. Este artifício matemático induz a erros, sobretudo quando o numerador seconstitui de números muito pequenos, caso dos tumores na infância.

Vale considerar, também, que, a cada dia, as classificações desses tumo-res ganham mais detalhamento, por conta dos avanços continuamente observa-dos nas técnicas laboratoriais, que se baseiam na Biologia Molecular, naImunologia e na Genética Celular. A incorporação dos novos conhecimentos etecnologias disponíveis tem-se tornado essencial aos estudos sobre a etiologia

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dos tumores na infância e à prática da Oncologia Pediátrica - o diagnóstico dostumores e o tratamento e acompanhamento, a longo prazo, das crianças delestratadas.

Faz-se necessário, assim, que os registros de câncer disponham os seusdados de modo a permitir que estes sejam classisficados, por subgrupos etários epor morfologia tumoral.

Levando-se em consideração as limitações anteriormente ressaltadas,tentar-se-á, a seguir, apresentar e discutir alguns aspectos das taxas de incidên-cia e de mortalidade por câncer, entre as crianças e adolescentes brasileiros.Para tanto, utilizar-se-ão os últimos dados publicados, referentes a cinco RCBP:Campinas (1992), Goiânia (1991), Porto Alegre (1991), Belém (1989) e Fortaleza(1985).

As taxas brutas foram calculadas para os cinco tipos tumorais maisfreqüentes em cada registro, com base no denominador de três faixas etárias - 0a 4 anos, 5 a 9 anos e 10 a 14 anos, exceto as de mortalidade, em Belém, cujosdados distribuem-se em apenas duas faixas, de 0 a 9 anos e de 10 a 19 anos(Tabela 1.12).

Os dados de incidência (Tabela 1.13) não coincidem inteiramente comos da literatura internacional, como se verá a seguir.

Os casos incluídos sob a rubrica “Outros linfomas”, que se refere a casosclassificados como linfoma não Hodgkin ou Doença de Hodgkin, encontram-seentre os mais incidentes, nos registros de Campinas, Belém e Porto Alegre.

Em Campinas, chama a atenção, também, a alta incidência de tumoresdo tecido conjuntivo. São igualmente atípicas as taxas da leucemia mielóide,em Fortaleza e em Porto Alegre, e as de tumores de “Glândulas outras que não atiróide”, em Goiânia.

Por outro lado, a classificação de “Tumor de olho”, entre os mais inciden-tes em Belém, vem corroborar dados de registros hospitalares, que apontam parauma alta ocorrência de casos de retinoblastoma no Brasil, se comparada com aencontrada em países da Europa e da América do Norte.

Já a classificação da incidência das leucemias linfóides e dos tumoresencefálicos, entre o grupo dos cinco tumores mais freqüentes, nos cinco registrosora analisados, é acorde com os dados de registros de outros países, o que indicaque, a despeito das dificuldades metodológicas já apontadas no início desta seção,o modelo serve para demonstrar os grupos de casos mais marcantes.

Já as taxas de mortalidade (Tabela 1.12) mostram que a LLA, em todos osregistros, põe-se entre as cinco primeiras causas de morte por câncer, de formavariável entre os sexos e as faixas etárias, e que entre essas cinco não se encon-tram os tumores encefálicos em Belém (o que é de se estranhar, visto que a taxade incidência destes tumores é maior do que a calculada para os demais registros).

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A presença de “Tumor de olho” entre as cinco primeiras causas de morteno registro de Campinas, também pode ter a mesma interpretação, dada a inci-dência maior deste tumor no Brasil, novamente corroborando dados de registroshospitalares de câncer.

Por outro lado, o achado de “Tumores de faringe” em Campinas, de “Cau-sas mal definidas” em Goiânia e de “Tumores de traquéia, brônquios e pulmão”em Belém, mais provavelmente se deva à distorção, já discutida anteriormente,que a inadequação da distribuição topográfica e cronológica dos tumores, utili-zada nos registros de câncer, traz à classificação dos tumores das crianças eadolescentes.

As dificuldades metodológicas, a especificidade de tumores e as ressal-vas, feitas a partir dos dados apresentados anteriormente, demandam a adoçãode métodos e técnicas apropriados à coleta e análise dos dados de incidência emortalidade dos tumores de ocorrência na infância e na adolescência. Da mes-ma maneira, requer-se de uma metodologia específica para a análise dos dadosdo seguimento feito com os pacientes tratados, de modo a oferecer-se umametodologia igualmente adequada para o estudo analítico das conseqüências,através dos anos, dos tratamentos aplicados.

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Tabela 1.12 - Taxas brutas de mortalidade por cânceres na infância eadolescência, distribuídas por faixa etária e sexo, em anos diversos.

Fonte: Registro de Câncer de Base Populacional.

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Tabela 1.13 - Taxas brutas de incidência de cânceres na infância eadolescência, distribuídas por faixa etária e sexo, em anos diversos.

Fonte: Registro de Câncer de Base Populacional.

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3.5 - Estimativa de incidência e mortalidade por câncer no Brasil

Os dados de projeção exercem um papel importante como orientadoresde decisões e base de planejamento, mesmo que impliquem com um pequenograu de imprecisão. O uso do método matemático de estimativa da ocorrênciade doenças e óbitos pressupõe que a tendência de crescimento da populaçãoem estudo é regular e que as características da composição social e econômicada população futura serão iguais, quando não resultado de uma evoluçãogradual.

A Tabela 1.14 mostra o número total de novos casos e óbitos por câncerestimados para o Brasil, em 2001, distribuídos por sexo e localização primária:serão, no total, 305.330 casos novos e 117.550 óbitos.

Da sua análise e pelo que já foi estudado até agora, pode-se deduzir queações de prevenção, detecção e diagnóstico são tão importantes quanto as tera-pêuticas, se se pretende modificar o quadro de morbi-mortalidade por câncer,que já se prolonga por décadas no Brasil.

Tabela 1.14 - Estimativas para o ano 2001 do número de casos novose dos óbitos por câncer, entre homens e mulheres, segundo

localização primária, no Brasil.

Fonte: INCA/MS.