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Governo Federal Dilma Vana Rousseff Presidente Ministério da Educação Aluísio Mercadante Ministro CAPES Jorge Almeida Guimarães Presidente Diretor de Educação a Distância João Carlos Teatini de Souza Clímaco Governo do Estado Ricardo Vieira Coutinho Governador UNIVERSIDADE ESTADUAL DA PARAÍBA Antonio Guedes Rangel Junior Reitor José Ethan Vice-Reitor Pró-Reitor de Ensino de Graduação Eli Brandão da Silva Coordenação Institucional de Programas Especiais – CIPE Secretaria de Educação a Distância – SEAD Eliane de Moura Silva Assessora de EAD Coord. da Universidade Aberta do Brasil - UAB/UEPB Cecília Queiroz

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Governo FederalDilma Vana Rousseff

Presidente

Ministério da EducaçãoAluísio Mercadante

Ministro

CAPESJorge Almeida Guimarães

Presidente

Diretor de Educação a DistânciaJoão Carlos Teatini de Souza Clímaco

Governo do EstadoRicardo Vieira Coutinho

Governador

UNIVERSIDADE ESTADUAL DA PARAÍBAAntonio Guedes Rangel Junior

Reitor

José EthanVice-Reitor

Pró-Reitor de Ensino de Graduação

Eli Brandão da Silva

Coordenação Institucional de Programas Especiais – CIPESecretaria de Educação a Distância – SEAD

Eliane de Moura Silva

Assessora de EADCoord. da Universidade Aberta do Brasil - UAB/UEPB

Cecília Queiroz

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FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL - UEPB

EDITORA DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DA PARAÍBARua Baraúnas, 351 - Bodocongó - Bairro Universitário - Campina Grande-PB - CEP 58429-500

Fone/Fax: (83) 3315-3381 - http://eduepb.uepb.edu.br - email: [email protected]

Editora da Universidade Estadual da Paraíba

DiretorCidoval Morais de Sousa

Coordenação de EditoraçãoArão de Azevedo Souza

Conselho EditorialCélia Marques Teles - UFBADilma Maria Brito Melo Trovão - UEPBDjane de Fátima Oliveira - UEPBGesinaldo Ataíde Cândido - UFCGJoviana Quintes Avanci - FIOCRUZRosilda Alves Bezerra - UEPBWaleska Silveira Lira - UEPB

Universidade Estadual da ParaíbaAntonio Guedes Rangel JuniorReitor

José EthanVice-Reitor

Pró-Reitor de Ensino de Graduação Eli Brandão da Silva

Coordenação Institucional de Programas Especiais-CIPE Secretaria de Educação a Distância – SEADEliane de Moura Silva

Cecília QueirozAssessora de EAD

Coordenador de TecnologiaÍtalo Brito Vilarim

Projeto GráficoArão de Azevêdo Souza

Revisora de Linguagem em EADRossana Delmar de Lima Arcoverde (UFCG)

Revisão LinguísticaMaria Divanira de Lima Arcoverde (UEPB)

Diagramação Arão de Azevêdo SouzaGabriel Granja

401.43 P659l Pinto, Ana Claúdia Soares.

Língua Portuguesa VI./ Ana Claúdia Soares Pinto – Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), Coordenadoria Institucional de Programas Especiais (CIPE), Secretaria de Educação à Distância (SEAD). Campina Grande: EDUEPB, 2013. 156 p.: Il. Color.

Licenciatura em Letras/Português 1. Língua Portuguesa. 2. Semântica. 3. I. Título. II. EDUEPB/ Coordenadoria Institucional de Programas Especiais (CIPE).

21. ed.CDD

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Língua Portuguesa VI

Ana Cláudia Soares Pinto

Campina Grande-PB2013

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Sumário

I UnidadeDiferentes perspectivas da semântica..............................................7

II UnidadeSignificado e contexto.....................................................................19

III UnidadeSignificado e léxico I.......................................................................35

IV UnidadeSignificado e léxico II.....................................................................53

V UnidadeSemântica e Enunciação................................................................71

VI UnidadeSemântica e pragmática I.................................................................91

VII UnidadeSemântica e pragmática II...........................................................111

VIII UnidadeSemântica e Ensino......................................................................131

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I UNIDADE

Diferentes perspectivas da semântica

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Apresentação“Nada essencial pode ser ensinado. Mas tudo tem que ser aprendido.”Millôr Fernandes

Como estudante do 6° período do Curso de Letras você certamente já dedicou bastante tempo ao estudo da Língua Portuguesa nas suas diversas dimensões. Neste 6° módulo, porém, você será convidado a “olhar” para ela sob uma nova perspectiva: a semântica.

Nosso objetivo é que possamos refletir sobre mais essa perspectiva da nossa língua que é responsável pelas ques-tões da significação. Aqui vamos poder pensar como o sig-nificado está atrelado a linguagem em seu efetivo funciona-mento e nas suas diversas dimensões.

Nosso propósito é pois permitir a você o acesso aos te-mas centrais da semântica através de alguns dos mais im-portantes autores da área. Vamos descobrir que há diferen-tes abordagens teóricas que tratam da significação, embora todas tenham seu foco de análise situada em fatos concretos da língua.

As reflexões semânticas desenvolvidas neste semestre vão nos levar a “descobrir” pormenores da linguagem que não nos damos conta no dia a dia ou muitas vezes não fo-mos trabalhados/estimulados a pensar sobre eles.

Vamos, então, iniciar nossos estudos em semântica? Re-tornando a citação de Millôr no inicio desta apresentação lembre-se de que o essencial não pode ser ensinado, mas pode ser estimulado, encorajado, mediado, isso é o que nos propomos a fazer nesse módulo. Porém, resultados positivos dependerão, sobretudo, de você. Que deve continuar, como fez nos módulos anteriores, realizando todas as leituras e ati-vidades e estabelecendo interação com colegas professores e tutores sempre que aparecerem dúvidas.

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ObjetivosAo final desta unidade que ora iniciamos, esperamos que você:

• Demonstre compreensão sobre a natureza do termo semântica;

• Reflita sobre as implicações que estão envolvidas no significado do que é dito;

• Tenha um conhecimento panorâmico sobre as abordagens usa-das para a investigação do significado na literatura semântica.

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10 SEAD/UEPB I Língua Portuguesa VI

Algumas reflexões iniciais...

Buscando começar a pensar nas questões de significação e de como se dá a relação entre as palavras e as coisas (mundo), observe-mos a imagem abaixo:

Tela de René Magritte1

No quadro, diante da pintura realista de um cachimbo, somos con-vidados a duvidar de nossa percepção com a frase “ isto não é um ca-chimbo” (Ceci n’est pas une pipe). De fato, a imagem de um cachimbo não é o próprio objeto cachimbo, mas um signo que o representa. A palavra cachimbo, por sua vez, também é uma representação. Remete ao conceito genérico de cachimbo e não a um cachimbo real, parti-cular.

Ufa!!! Percebemos já de início, que as questões de significação re-vestem-se de representações e nuances difíceis de percebermos em um primeiro momento, não é mesmo?

O que é semântica?Geralmente, ao se introduzir uma determinada disciplina espera-se

que haja uma definição ou delimitações sobre o assunto por ela aborda-do. No nosso caso, em particular, começamos citando Chierchia (2003, p.21) quando afirma que a semântica é o ramo da lingüística que trata do significado. As expressões da nossa linguagem “significam” alguma coisa, e isto é o que nos permite comunicar.

Historicamente, assim tem sido definida a semântica, como vertente teórica que investiga o significado linguístico. Dessa forma, porém, a significação é desvelada através da reflexão sobre a linguagem, sobre as atividades/operações que fazemos quando usamos a língua no dia a dia. Cançado (2008, p. 15) aborda o estudo da semântica dentro de um campo maior de conhecimentos que ela se refere como o conheci-mento específico que cada falante tem sobre a língua e a linguagem.

1 Telas de René Magritte podem ser encon-tradas nesta página de um blog: <http://blog.uncovering.org/archves/2006/03/renemagritte-1html>

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Leia abaixo o que nos diz a autora:

Ao conhecimento da língua, chamaremos de gra-mática, entendendo-se por gramática o sistema de regras e/ou princípios que governam o uso dos sig-nos da língua. A linguística assume que o falante de qualquer língua possui diferentes tipos de conheci-mento em sua gramática: o vocabulário adquirido, como pronunciar as palavras, como construir as pa-lavras, como construir as sentenças e como entender o significado das palavras e das sentenças. Refletin-do essa divisão, a descrição linguística tem diferen-tes níveis de análise: o léxico, que é o conjunto de palavras de uma língua; a fonologia, que é o estudo dos sons de uma língua e de como esses sons se combinam para formar as palavras; a morfologia, que é o estudo das construções das palavras;a sin-taxe, que é o estudo de como as palavras podem ser combinadas em sentenças; e a semântica, que é o estudo do significado das palavras e das sentenças.

O percurso que fizemos até aqui nos trouxe um direcionamento que é o foco do estudo da semântica – o significado. Por sua vez, esse dire-cionamento nos inquieta porque não esclarece sobre a natureza do ter-mo – significado. Que significado? Em que limites de análise? Com que implicações teóricas, entre outros questionamentos. Questões diversas em torno da investigação do significado nos fazem perceber que uma definição para o objeto de estudo da semântica não é assim tão objetiva. A compreensão e a definição sobre o que é a significação não apresen-ta consenso sequer para os semanticistas2 por isso ela é abordada por várias concepções/perspectivas diferentes de semântica que veremos a seguir.

Atividade IAntes de aprofundarmos o estudo sobre a significação, leia a tirinha abaixo e reflita sobre a forma como as palavras se relacionam com a realidade que nomeiam. Para isso responda aos itens 1 e 2:

2 Chamamos de semanticista a pessoa que é especialista em semântica, estuda a sig-nificação das palavras e dos constituintes gramaticais.

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1. No primeiro quadrinho, como entendemos a fala do coronel quando diz: “Agora eu nem consigo tirar”? Que significações podem estar implícitas nessa fala?

2. O significado da palavra circulação é o mesmo na fala da secretária e do coronel? Explique o que significa a expressão circulação interrompida quando dita por cada um.

Diferentes perspectivas semânticas Podemos recuperar na literatura semântica, três grandes abordagens

teóricas adotadas para o estudo do significado, como faz brevemente Cançado (2008), quando cita: a) a abordagem referencial, que advoga a relação entre o referente no mundo e as palavras que o representam; b) a abordagem mentalista, na qual o sentido está em um nível interme-diário entre o mundo e as palavras, denominado nível de representação mental; c) a abordagem pragmática, a qual estuda os usos situados da língua, ou seja, os usos que correspondem ao modo como as palavras são pronunciadas em certas circunstâncias.

Partindo do princípio de que utilizamos a língua para falar sobre ob-jetos, indivíduos, fatos, eventos,... externos à própria língua, a aborda-gem referencial trata o significado associado a uma noção de referência, ou seja, uma ligação entre as expressões linguísticas e o mundo. A no-ção de referencialidade é intuitiva. Se perguntarmos a qualquer cidadão com relativo conhecimento de mundo o que a expressão “presidente do Brasil” refere, ele responderá Fernando Henrique Cardoso, se a conversa aconteceu entre 1995 e 2002, ou Lula, se ela aconteceu entre 2003 e 2010, ou Dilma Rousseff, se ela aconteceu de 2011 para cá e assim por diante. Logo, referência parece ser comumente a relação que uma pala-vra ou expressão estabelece com o mundo: a referência de uma palavra ou expressão, no nível linguístico, é o que ela aponta no mundo.

Vejamos a exemplificação dada por Cançado (2008, p.p.23-24) para a noção de referência e de significação:

“Por exemplo, certas palavras fazem referência a determinados objetos, e aprender o que significam essas palavras é conhecer a referência delas no mundo: (20) Noam Chomsky refere-se a um famo-so linguista. Só podemos usar a sentença acima de uma forma adequada, se estamos nos referindo ao mesmo linguista a que todas as pessoas se referem quando usam o nome Noam Chomsky. Referência não é uma relação como implicação ou contra-dição, que se dá entre expressões linguísticas. Ao contrário, é uma relação entre expressões e objetos extralinguísticos.”

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Ao ler essa citação percebemos que, a abordagem referencial fun-damenta-se no processo de comunicação, nas formas através das quais as regras e os princípios gramaticais combinam palavras e expressões significativas, baseando-se em condições de verdade. O significado é, pois, entendido como uma relação entre a linguagem por um lado, e, por outro, aquilo sobre o qual a linguagem fala. Nessa perspectiva, o significado depende de que se identifique um objeto no mundo, o que, por sua vez, permite-nos chegar a um valor de verdade da sentença. O que a sentença significa, depende de suas condições de verdade.

O significado de uma sentença não se confunde com o estado de coisa que ela descreve ou refere; há mais de uma maneira de expressar--se acerca de um mesmo evento. As condições de verdade dependem de uma análise dos elementos que compõem a sentença, a referência de cada termo é estipulada de acordo com a sua extensão empírica; assim, é possível afirmar algo acerca de uma entidade, e, ao mesmo tempo compreender a unidade de significação. A sentença “A Terra gira em torno do Sol” tem uma significação traduzível. Além disso, seu valor de verdade diz que há uma situação (de fato) na qual o planeta x (cujo significado ou extensão pode ser verificado) tem a propriedade de girar em torno de uma estrela (cada termo pode ser verificado); a sentença é verdadeira, o estado de coisa no mundo existe do modo como o con-teúdo proposicional da sentença descreve ou afirma; do contrário seria falsa. Logo, para a perspectiva referencial, o valor de verdade não está na linguagem, mas nos fatos do mundo.

Distanciando-se da semântica referencial, baseada em inferências e condições de verdade, a segunda abordagem para o significado é apontada por Cançado (2008) como a mentalista ou representacional, para a qual o significado é o modo pelo qual representamos a nós mes-mos o conteúdo daquilo que se diz. Tal estudo envolve a ligação entre linguagem e construções mentais criadas pelas pessoas a respeito do que dizem ou observam. Por exemplo, a palavra ‘cão’ seria a expressão de uma representação na mente dos sujeitos falantes do português; mais especificamente, de um conceito que poderíamos tomar como sendo o conceito cão, e tal conceito seria invariável (uma vez adquirido) e compartilhado entre sujeitos.

Chiercia (2003) nos diz que essas representações ocorrem tanto de forma mais concreta, por imagens mentais, quanto de forma mais abstrata, quando se afirma que o significado de uma expressão reside no conceito que associamos a ela.

“Uma possibilidade é em termos de imagens men-tais. É evidente, por exemplo, que à palavra ave está associada a imagem ou esquema mental de uma ave, que codifica as informações sobre as aves mais ou menos como faria uma fotografia.(...) Uma segunda variante dessa abordagem consiste em sustentar que o significado de uma expressão reside no conceito ou pensamento que associamos a ela.(...)Quando se fala de conceitos é natural pensar em algo como uma linguagem do pensa-

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mento interna à mente, um “mentalês”.Aproxima-damente, a ideia é que os conceitos são expressões do mentalês e que entender uma sentença consis-te, essencialmente, em traduzi-la para o mentalês” (CHIERCIA,2003 p.41-42).

O que podemos apreender a partir dessa citação? Primeiramente, você percebe que o autor reafirma o que acabamos de enunciar sobre a abordagem representacional/mentalista, nesta o sentido acontece em um nível intermediário entre o mundo e as palavras, que corresponde ao nível de representação mental. Portanto percebe-se um compromis-so com a forma das representações mentais internas que constituem a estrutura conceitual e com as relações formais entre esse nível e outros níveis de representação (sintático, fonológico, visual, etc.).

Nesta abordagem mentalista, tem-se a semântica cognitiva, que pressupõe a relação da linguagem com uma representação através de esquemas e imagens, mapeando domínios conceituais distintos, onde o uso da metáfora corresponde a um processo cognitivo fundamental.

Cançado (2008, p.143) apresenta o seguinte exemplo: João gastou seu tempo com a Maria. Essa sentença seria metafórica, pois a inter-pretação do tempo é de algo que se gasta, ou seja, de um objeto que pode ser consumido. Portanto, a interpretação dessa sentença seria a manifestação de um mapa cognitivo que transporta a noção do tempo para uma noção de objetos consumíveis no tempo. Exemplo bastante esclarecedor não é? E assim fica claro que para a semântica cognitiva o pensamento é estruturado por esquemas de imagens assumindo a extensão de conceitos temporais/espaciais para outros campos semân-ticos, em uma relação metafórica.

A terceira abordagem para o significado é denominada de pragmá-tica, para a qual o significado decorre do uso da língua em diferentes situações de fala(a relação entre a intenção da pessoa ao comunicar e a receptividade do interlocutor). Assim, há que se levar em conta o contexto em que a frase foi produzida e quais eram as pessoas en-volvidas, o sentido não se dá apenas pelas palavras e sua relação no mundo, mas pelo que o falante quis comunicar. Leia abaixo o que nos diz Chiercia sobre isso:

“ Não há dúvida de que para conhecer o signi-ficado de uma palavra é preciso enfronhar-se na história da comunidade lingüística que a usa. Tam-bém é verdade que palavras e sintagmas podem ser usados de maneira muito diversificada, e qua-se sempre o são. Mas é exatamente aí que está o problema. Tome uma sentença qualquer como O cachorro está no jardim. Essa sentença pode ser usada para realizar as ações mais variadas. De-pendendo do contexto, pode constituir uma ordem, um pedido de ajuda, um insulto, uma pergunta.” (Chiercia, 2003 p.44)

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Ao lermos a citação de Chiercia notamos que o fundamental para a perspectiva pragmática é estudar os tipos de efeitos intencionais do falante, ou seja, sua intenção ao falar uma expressão para determinada pessoa e em determinado contexto. Para o autor, o sentido não está atrelado apenas às condições de verdade de uma sentença, mas a to-das as condições que envolvem uma situação comunicativa.

A abordagem pragmática é representada pela semântica argumen-tativa de Ducrot e pela Teoria dos Atos da Fala de Austin. A semântica argumentativa é uma abordagem que não tem a função de falar sobre o mundo, mas a de convencer o interlocutor sobre algo. Assim, o foco que deve ser dado ao enunciado é a sua eficiência aos propósitos do convencimento. A Teoria dos Atos da Fala enfatiza a ideia de que parte do sentido de uma sentença tem uma função social, refletindo que, além de descrever o mundo, com a linguagem realizamos ações, como alterar a “realidade” e até mesmo criar novas realidades.

Finalizando, podemos afirmar que a abordagem pragmática centra a questão do significado no uso da língua implicando uma oposição à noção de significado dada pela lógica clássica, que define valor de verdade em consonância com o que está fora da linguagem, ou seja, na relação entre a palavra e o mundo.

Atividade II1. Diante do que foi apresentado sobre as diferentes vertentes que tratam das questões do significado, discorra sobre a seguinte proposição: Sobre as abordagens para o estudo do significado, referencial, mentalista e pragmática. Teça comentários, posicionando-se em relação a estas concepções.

2. Comente a citação abaixo buscando recuperar os aspectos teóricos abordados nesse tópico. Seus comentários ajudarão você a identificar os pontos positivos de sua aprendizagem e também os aspectos que devem ser melhor trabalhados.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Leituras recomendadas

Este livro faz uma apresen-tação geral e gradual das prin-cipais áreas da Linguística. São apresentadas por autores dife-rentes oito campos de investi-

gação entre eles a Semântica abordada pela autora Roberta Pires de Oliveira nas p.p.17 -46. Vale a pena conferir!

Em Manual de Semântica: Noções Básicas e Exercícios, a autora Márcia Cançado ofere-ce um panorama da bibliogra-fia básica na área de semântica, por meio de uma exposição teó-rica e um conjunto de exercícios

possibilitando o acesso a temas e autores centrais da área.

Resumo

O problema sobre a significação foi desde sempre objeto de inves-tigação dos estudiosos da linguagem.As ênfases e perspectivas foram se modificando ao longo dos estudos, de modo que a compreensão e a definição sobre o que é a significação evocam diferentes verten-tes teóricas na literatura semântica. Assim, consideramos três grandes abordagens teóricas: a) a abordagem referencial, que advoga a rela-ção entre o referente no mundo e as palavras que o representam; b) a abordagem mentalista, na qual o sentido está em um nível intermedi-ário entre o mundo e as palavras, denominado nível de representação mental; c) a abordagem pragmática,a qual estuda os usos situados da língua, ou seja, os usos que correspondem ao modo como as palavras são pronunciadas em certas circunstâncias.

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Língua Portuguesa VI I SEAD/UEPB 17

AutoavaliaçãoApós a apresentação desse panorama geral da disciplina e das questões relativas à significação, resolva a atividade proposta a seguir, de modo que você construa significados para uma informação dita irrelevante.

Sempre que possível socialize suas respostas no AVA. Interagindo se aprende melhor!

ReferênciasCANÇADO, Márcia. Manual de semântica: noções básicas e exercícios. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008.

CHIERCIA, Gennaro. Semântica. Campinas: Unicamp/Eduel, 2003.

ILARI, Rodolfo; GERALDI, João Wanderley. Semântica. São Paulo: Editora Ática, 1992.

LOPES, Edward. Fundamentos da Linguística Contemporânea. São Paulo. Editora Cultrix, 2001.

OLIVEIRA, R. P. de. Semântica. In: Mussalin, F. Bentes, A. C. Introdução à linguística. domínios e fronteiras Vol 2. São Paulo: Cortez, 2003.p.p. 17-46.

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II UNIDADE

Significado e contexto

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20 SEAD/UEPB I Língua Portuguesa VI

Apresentação

Com a unidade anterior você tomou conhecimento de que a semântica é o estudo do significado das línguas na-turais, isto é, a ciência das significações de palavras que ul-trapassa os signos e símbolos da linguagem humana. Assim, você já sabe de que não se trata de um objeto de estudo simples e objetivo, e que podemos abordá-lo a partir de diferentes vertentes teóricas.

Pois bem, nesta unidade nós continuaremos a tratar so-bre questões relacionadas ao plano das significações enve-redando por um território que é exterior àquele delimitado pelos elementos linguísticos - aquilo que está fora da lin-guagem: o contexto. A linguagem não tem uma significação imutável, daí a relevância de levar em conta os contextos em que os enunciados são produzidos.

Nesta unidade, também exploraremos o jogo de pressu-postos e implícitos que constituem a significação dos enun-ciados. É importante, então, que você continue atento e in-teragindo com os colegas, tutores e professores para que a aprendizagem aconteça da melhor forma possível.

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Língua Portuguesa VI I SEAD/UEPB 21

Objetivos

Ao final desta unidade, esperamos que você seja capaz de:

• Compreender a noção de conceito e sua importância para a significação dos enunciados;

• Entender os pressupostos e implícitos como dados do contexto e como recursos frequentemente utilizados no plano das signi-ficações;

• Estabelecer a construção do significado dos textos partindo do jogo de pressupostos e implícitos.

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22 SEAD/UEPB I Língua Portuguesa VI

Da noção de contexto

Os estudos semânticos constituem uma área complexa, pois falar da relação entre as estruturas linguísticas e a sua significação nos leva a enxergar um território exterior à linguagem, o universo dos referentes linguísticos. Por esse motivo a significação só pode ser alcançada, em qualquer contexto, a partir dos possíveis significados das palavras e de suas combinações avaliadas e verificadas em situações específicas, na busca daquele que melhor se ajusta ao contexto da enunciação. Vamos tentar deixar um pouco mais clara as relações entre o significado e o contexto em que ocorrem, a partir do exemplo a seguir:

Observemos o seguinte texto:

Na compra deste CD-Rom você ganha um corte de cabelo grátis.

O que se entende, se não dispusermos de outras informações, é que existe uma promoção que oferece corte de cabelo grátis a quais-quer pessoas, na compra de um determinado CD-Rom,não é mesmo?.No entanto, não é esse absolutamente, o sentido produzido pelo autor no contexto da propaganda, vejamos:

Nesse contexto recuperamos a significação entendendo que tra-ta-se de CD-Rom dirigido a vestibulandos, com questões de vestibu-lares e o prometido corte de cabelo faz referência ao trote a que por vezes são submetidos os calouros que conseguem uma vaga em certas universidades. O contexto é, pois, o que determina o sentido adequado a ser construído para uma enunciação.

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Língua Portuguesa VI I SEAD/UEPB 23

Atividade I

Há algum tempo, A Bamerindus Seguros no dia dos namorados veiculou, em revistas e jornais de circulação, uma propaganda com o seguinte enunciado: Tanta coisa para fazer no escuro e você vai fazer logo seguro?

1. A expressão “no escuro” pode ter duas significações. Qual são elas?

2. Que relação de significações pode-se estabelecer entre a expressão “no escuro” e o fato da propaganda ter sido veiculada no dia dos namorados?

3. Considerando o contexto e o jogo semântico das palavras nessa enunciação, como entendemos a propaganda? Ou melhor, que significados a seguradora quer construir a respeito do seu produto?

Não deixe de responder as atividades e quando possível socialize suas respostas no AVA. Interagindo se aprende

melhor!

As relações entre significado e contexto

Para melhor nos aprofundarmos nas questões entre significado e contexto, é necessário que descortinemos os limites entre a semânti-ca e a pragmática, uma vez que ambas estão ligadas ao contexto e consequentemente às questões de significação. A primeira se debruça sobre o campo do significado das sentenças enquanto a segunda está voltada para o estudo do contexto, das empiricidades das sentenças.

Especificamente nos voltando para a semântica, observamos que o linguísta busca descrever/entender o conhecimento semântico que o falante tem de sua língua, possibilitando um reconhecimento a priori

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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do assunto sobre o qual um texto trata e na maneira como são inter-pretadas. Por exemplo, esse conhecimento permite que um falante de Português ao se deparar em uma manchete de jornal, com os dize-res “Bolsa despenca”, pode imaginar situações como: (a) o mercado de ações anda mal; (b) ou que está sendo reduzido o incentivo às pesqui-sas acadêmicas; ou ainda (c) que um objeto sofreu uma queda.

Para determinar o significado da frase acima, o uso do contexto é essencial. Por ter sido definido que o texto hipotético estaria em uma manchete de jornal, certamente, já se pode notar alguma rejeição à alternativa c. Se, além disso, for apontado que o suposto jornal é es-pecializado em finanças, parece natural esperar que se dê prioridade à alternativa a. Ainda, o conhecimento semântico que o falante do Portu-guês tem o leva a atribuir duas interpretações para a seguinte sentença: “A gatinha da minha vizinha anda doente.” São, pois, fenômenos dessa natureza que constituem a base de uma investigação semântica.

Quanto à perspectiva pragmática, esta busca explicar como os fa-lantes fazem, através de suas ações intencionais, para significar mais do que está simplesmente dito. Cançado (2008, p.17) faz uma ampla explanação sobre essa perspectiva a partir da sentença: (i) “A porta está aberta.” Vejamos:

O que significa essa sentença?Que existe uma de-terminada situação em que um objeto denomina-do porta encontra-se em um estado de não fecha-do (seja não trancado ou apenas afetado em seu deslocamento). Agora imaginemos o seguinte: um professor está dando aula, e algum estudante para na frente da sala e fica olhando para dentro: o pro-fessor dirige-se a ele, com uma atitude amigável, e profere a sentença (i). Certamente, nessa situação, a sentença não será entendida como o estado de a porta estar aberta ou não, mas sim, como um convite para que o estudante entre. Vejamos ainda essa mesma sentença em uma outra situação: um estudante muito agitado está atrapalhando a aula ;o professor diz a mesma sentença ,só que agora sua intenção é repreender esse aluno.A sentença será entendida como uma ordem para que o estu-dante saia.[...]Entender o que o professor falou em cada contexto específico parece envolver dois tipos de conhecimento.Por um lado, devemos entender o que o professor falou explicitamente,o que a sen-tença em português a porta está aberta significa:a esse tipo de conhecimento , chamamos de semân-tica.[...] Por outro lado, não conseguiríamos enten-der o que o professor falou ,se não entendêssemos também qual era a intenção dele ao falar aquela expressão para determinada pessoa em determina-do contexto: a esse tipo de conhecimento, chama-mos de pragmática. A pragmática estuda os usos situados da língua e lida com certos tipos de efeitos intencionais.

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Assim, tanto a semântica quanto a pragmática estão ligadas ao contexto, porém com objetivos diferentes, podemos dizer, de maneira geral, que uma distinção coerente entre as duas correntes diz respeito a intenção do falante,considerada pela pragmática ao tentar recons-truir qual a intenção comunicativa do falante ao enunciar uma dada sentença.

Para ampliarmos nosso entendimento, consideremos a seguinte si-tuação: Maria é a empregada de Rita. Ambas sabem que a roupa está estendida no varal. De repente, Rita diz: Tá chovendo. Maria mais que depressa sai correndo para tirar a roupa do varal, dizendo: Já tô indo tirar a roupa do varal.

Observe que os atos de Maria, não respondem ou se relacionam diretamente a sentença que Rita enunciou. Se atentarmos apenas para o significado da sentença, notaremos que Rita afirma que no momento em que ela profere a sentença está chovendo e nada mais. Ela não pede explicitamente para que Maria recolha a roupa do varal. Mas é possível “deduzir” que foi isso que Rita quis dizer se contextualizarmos sua fala, isto é, se atentarmos para outros elementos dados pela situa-ção de fala: Rita e Maria sabem que a roupa está no varal, que Maria é a empregada, que chuva molha a roupa, que o que Rita disse é ver-dade (ela não esta brincando), etc.

Tanto a resposta quanto os atos de Maria mostram que ela en-tendeu o pedido indireto de Rita (sua intenção). Esse significado é lin-guístico, porque ele depende do que foi dito na situação, mas não é propriamente semântico, porque ele depende de informações da esfera da pragmática que envolve elementos contextuais a partir do que foi dito na sentença.

Antes de seguirmos nosso estudo sobre os fenômenos semânticos, convém assinalar que nem sempre é clara essa divisão entre semântica e pragmática, tanto que, muitas vezes, não conseguimos precisar o que pode está inserido em uma ou em outra perspectiva. O estudo da abordagem pragmática será contemplado com ênfase em unidades posteriores do nosso livro.

Atividade II

1. Tente imaginar outra situação em que a sentença “Tá chovendo” sugira uma interpretação diferente daquela dada anteriormente no texto. Descreva quais elementos do contexto contribuem para a inferência em questão. Eis alguns casos que você pode explorar: pedido de carona, convite para ficar em casa, orientação de mãe para filho...

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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2. Releia o que nos foi apresentado até aqui e exponha sobre os dois tipos de conhecimento que estão envolvidos no significado do que é dito, em relação ao contexto.

Pressupostos e implícitos As informações veiculadas pela enunciação linguística apresentam

graus diferentes de explicitude. Podem ser consideradas implícitas todas as informações que uma sentença1 veicula, sem que o falante se com-prometa explicitamente com sua verdade. Essas informações precisam, então, ser “inferidas” a partir da sentença por meio de algum raciocínio que parte da própria sentença. É o que ocorre nos casos da pressupo-sição e do acarretamento.

Para entendermos a noção de acarretamento,vejamos os exemplos abaixo:

(1) a- Esta minha cadeira é de madeira.

b- Esta minha cadeira é de cor clara.

c- Esta minha cadeira é de madeira clara.

Imagine uma situação em que eu mostro a você uma cadeira da minha casa. Como falante do português você sabe que,se as sentenças (1a) e (1b) forem ambas verdadeiras,a sentença (1c) não pode deixar de ser verdadeira.Se a expressão esta cadeira estiver sendo usada para falar da mesma cadeira nas três sentenças , e se a cadeira for realmente clara e de madeira, a última sentença tem de ser verdadeira.

Essa constatação se dá em função das informações contidas em (1c) já estarem em (1a) e (1b) ,juntas. O interessante é que mesmo sem conhecer o objeto de que se fala, a relação semãntica entre as sentenças (1a) e (1b) nos faz concluir que, forçosamente, se (1a) e (1b) forem verdadeiras, (1c) também será. Dizemos que (1a) e (1b) juntas acarretam ( 1c).

Vejamos agora os exemplos abaixo:

(2) a- Isto na minha mão é pequeno e é um botão.

b- Isto na minha mão é um botão pequeno.

E agora será que (2a) acarreta (2b)? Se você achou que não,acertou.O problema aqui é outro.Imaginemos que estamos falan-do sobre botões ,que, geralmente são pequenos em relação a outros

1 Nos textos de semântica, é comum usar-mos a palavra sentença como sinônimo de oração.

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objetos.Assim estamos certos em afirmar (2a),não é isso? Mas pode ser que esse botão,apesar de ser um objeto pequeno,não seja um botão pequeno comparado com outros botões..Nesse caso, seria perfeita-mente razoável negar (2b).Portanto, a sentença (2 a) não acarreta a sentença (2b),pois, se a sentença (2 a) for verdadeira, a sentença em (2b) não tem que ser necessariamente verdadeira, ou mesmo podemos perceber que a informação da sentença (2b) não está contida na infor-mação da sentença (2 a).

Baseando-nos nesses exemplos,podemos falar sobre acarre-tamento como uma relação semântica entre duas sentenças toda vez que a verdade de uma implica a verdade de outra. Segundo Cançado (2003,p.28) às definições para a noção de acarretamento podem ser assim estabelecida:

Perceba que podemos usar uma ou outra definição,pois são inter-cambiáveis , e de certo modo têm o mesmo sentido.Colocamos aqui as três formulações porque às vezes é mais prático/fácil analisar as sentenças utilizando uma das definições e não outra.

Atividade III

Crie pelo menos dois exemplos de acarretamento entre sentenças.Mostre que são acarretamentos,usando as definições acima.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Aplicando as definições de acarretamento

Nesse momento,como um procedimento metodológico, vamos aplicar as definições de acaretamento na sentença proposta abaixo:

A sentença (a) não acarreta a sentença (b),porque, se é verdade que hoje o sol está brlhando, não é necesariamente verdade que hoje está quente, ou seja, se (a) é verdade, (b) não é verdade necassaria-mente.Percebemos também que a informação de que hoje está quente não está contida na informação de que hoje o sol está brilhando, ou seja, a informação da sentença (b) não está contida na informação da sentença (a).Ou ainda, se negarmos a sentença (b), ela não ficará contraditória2 à sentença (a): hoje o sol está brilhando,mas hoje não está quente; é perfeitamente possível que essas duas sentenças estejam descrevendo fatos que ocorram simultaneamente no mundo.

Atividade IV

Para cada par de sentenças, diga se a sentença (a) acarreta a sentença (b) e justifique sua resposta usando uma das três definições apresentadas:

1.(a) Pedro e Antônio são gêmeos. (b) Pedro e Antônio têm a mesma fisionomia.

2.(a)A presidente do Brasil concedeu uma entrevista. (b) Existe uma presidente no Brasil.

3.(a)Houve um roubo no banco.(b) O banco foi roubado.

2 Consideramos que duas sentenças contra-ditórias quando elas descrevem situações que não podem ser verdadeiras juntas.

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Falando de pressupostos...

Assim como o acarretamento,a pressuposição envolve uma rela-ção entre a verdade das sentenças. Existe, entretanto,uma diferença marcante entre esses dois tipos de aspectos semânticos.Uma senten-ça pressuposta pode ser inferida, a partir da verdade de outra,mas também é uma informação considerada como algo já conhecido pe-los interlocutores.A pressuposição é um “pano de fundo da conversa-ção3”, sem o qual as informações novas não podem ser compreendi-das ou não soam naturais (DUCROT, 1987). Os pressupostos fazem parte de muitas das conversações que temos,até porque explicitá-los significaria,muitas vezes, informar o óbvio,o esperado num dado con-texto.

Comecemos com o seguinte exemplo: João parou de beber.

Para aceitar o fato de João ter deixado de beber,é preciso que to-memos como certa uma outra informação que, embora não dita na sentença, é necessária para que seu conteúdo seja verdadeiro. Essa informação é o pressuposto de que partimos no momento de elaborar nosso raciocínio.Assim, só é natural dizer que João parou de beber se, de algum modo, o falante supõe que os interlocutores já sabem que João bebia. Por isso dizemos que a pressuposição,além de ser uma inferência feita a partir de uma sentença,é também uma maneira de apresentar uma informação como algo que, supõe-se,já era conhecido antes,é uma informação velha.

Mais exemplos:

1. (a) Sandra deixou de vender perfumes.

(b) Sandra vendia perfumes.

Veja que, se alguém afirma (1a), não pode dizer que essa pessoa afirmou explicitamente que Sandra vendia perfumes.Mesmo assim, o falante de (1a) se compromete com a verdade de (1b), porque a ex-pressão deixar de (fazer alguma coisa) pressupõe que a pessoa já fazia aquilo antes.Seria totalmente incoerente dizer “Sandra deixou de ven-der perfumes mas ela nunca vendeu perfumes”.

Até aqui os exemplos nos mostram situações em que existe pressu-posição e também acarretamento Isso acontece muitas vezes: muitos dos exemplos de pressuposição também são de acarretamento, mas atenção!!! Nem sempre os exemplos de acarretamento são de pressu-posição.

3 Fundo conversacional são as informações que são tomadas como verdadeiras pelo falante(s) e ouvinte(s) num dado contexto.

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O que faz da pressuposição um aspecto semântico diferente do acarretamento?

Dizemos que uma sentença pressupõe outra toda vez que tanto a ver-dade como a falsidade da primeira acarretam a verdade da segunda.So-bre isto atentemos para o que diz Ilari (2010,p.85)

Diz-se que uma informação é pressuposta quando ela se mantém mesmo que neguemos a sentença que a veicula. Se alguém nos disser que o carro parou de trepidar depois que foi ao mecânico,concluímos que o carro morria antes de ir ao mecânico; se esse mesmo alguém nos disser que o carro não parou de trepidar apesar de ter ido ao mecânico,também con-cluíremos que o carro trepidava antes.Sempre que um certo conteúdo está presente tanto na sentença como em sua negação,dizemos que a sentença pres-supõe esse conteúdo.

Assim, a pressuposição, ao contrário do acarretamento, resiste à ne-gação.Vejamos um exemplo para que posamos esclarecer melhor essa diferença:

2. (a) João adorou ter conseguido um bom emprego.

(b) João não conseguiu um bom emprego.

(c) João tentou conseguir um bom emprego.

Veja bem, temos aí um acarretamento entre (2 a) e (2 c ); se (2 a) for verdadeira, (2 c) tem de ser verdadeira também.Mas não é só um acarre-tamento.Temos também uma pressuposição,pois quando negamos (2 a) em (2 b) ainda podemos inferir que João tentou conseguir um emprego antes.Ou seja, a negação da sentença elimina o acarretamento,mas não afeta a pressuposição.Diferente do acarretamento, a pressuposição não é destruída pela negação. Esquematizando para conferir melhor:

Conforme assinalei quando do início da exposição sobre pressupostos,uma maneira de entender a pressuposição entre as sentenças é constatar que algo já devia ser conhecido e aceito pelos interlocutores.

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No exemplo acima, o fato de João tentar conseguir um emprego deve ser um conhecimento compartilhado não importa se ele conseguiu ou não.Em qualquer das duas situações, (2 a) ou (2 b), continua sendo verdadeiro o fato que ele tentou. Por isso, finalizando, podemos dizer também que a pressuposição faz parte de um conhecimento que já estava presente , ou está sendo considerado como anterior e necessário de outro.

Agora, finalizando mesmo, uma última observação sobre as pressupo-sições.Existem diversas expressões e formas sintáticas que têm a função de “ativar” pressupostos.Vamos citar aqui alguns desses ativadores/acionado-res de pressuposição apresentados por Cançado (2003,.p.p 36-38)

1. Verbos factivos: PressuposiçãoMaria esqueceu que cachorros voam. Cachorros voam.2. Verbos de mudança de estado: PressuposiçãoJoão começou a trabalhar. João não trabalhava.3. Estruturas clivadas: PressuposiçãoNão foi o seu comportamento que me aborreceu.

Alguma coisa me aborreceu.

4. Expressões temporais: PressuposiçãoDesde que saiu de casa, Maria não mantém contato conosco.

Maria saiu de casa.

Atividade VEspecifique as relações estabelecidas (acarretamento e/ou pressuposição) entre as sentenças (a) e (b), justificando a sua resposta.

1. (a) Não foi Maria que perdeu o trem(b) Alguém perdeu o trem.

2(a) João é solteiro. (b) João não é casado.

3. (a) João acha que Maria já saiu.(b) Maria saiu. dica. utilize o bloco

de anotações para responder as atividades!

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Leituras recomendadas

Introdução à Semântica - brincando com a gramática apresenta ao leitor uma bem humorada explanação, reche-ada com exercícios fundamen-

tais ao conhecimento das principais operações sintáticas relevantes para a significação do português brasileiro.

Em Manual de Semântica: Noções Básicas e Exercícios, a autora Márcia Cançado ofere-ce um panorama da bibliogra-fia básica na área de semântica, por meio de uma exposição te-

órica e um conjunto de exercícios possibilitando o acesso a temas e autores centrais da área.

Resumo

Tratamos das questões entre significado e contexto, a partir dos limi-tes entre a semântica e a pragmática, uma vez que ambas estão ligadas ao contexto e consequentemente às questões de significação. A primei-ra se debruça sobre o campo do significado das sentenças enquanto a segunda está voltada para o estudo do contexto, das empiricidades das sentenças. Dentro dessa área enfocamos a pressuposição como um aspecto semântico mais complexo do que o acarretamento. Uma sentença B é pressuposta por uma sentença A se tanto a verdade de A quanto a não verdade exigem a verdade de B. A pressuposição, diz-se, resiste à negação. Além disso, a pressuposição marca no enunciado um conhecimento já compartilhado entre os interlocutores.

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AutoavaliaçãoPara você avaliar o que aprendeu nesta unidade, sugerimos uma atividade em que, na sua resposta, você poderá envolver aspectos dos diversos tópicos abordados:

Todos nós sabemos que o poeta Olavo Bilac é, na literatura brasileira, um dos principais representantes do movimento literário do Parnasianismo, que se apresentou, entre outros aspectos de seu ideário, como uma reação ao romantismo. Suponha que, num concurso público foi proposta a seguinte questão dissertativa:

Por que Olavo Bilac é romântico?

Em sua opinião, essa pergunta é capciosa?Imagine que você é um dos candidatos do concurso, e quer pedir a anulação da questão. Que argumentos (linguísticos, pedagógicos, e.tc.) você usaria para tentar a anulação dessa questão?

ReferênciasCANÇADO, Márcia. Manual de semântica: noções básicas e exercícios. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008.

CHIERCIA, Gennaro. Semântica. Campinas: Unicamp/Eduel, 2003.

DUCROT, Oswald. O dizer e o dito. Campinas, São Paulo: Pontes, 1987.

ILARI, Rodolfo. Introdução à semântica – brincando com a gramática. São Paulo: Editora Contexto, 2010.

MÜLLER, Ana Lúcia de Paula & VIOTTI, Evani de Carvalho. Semântica Formal. In: FIORIN, José Luiz (org.) Introdução à Linguística: princípios de análise. São Paulo: Contexto, 2001.

OLIVEIRA, R. P. de. Semântica. In: Mussalin, F. Bentes, A. C. Introdução à linguística. domínios e fronteiras Vol 2. São Paulo: Cortez, 2003.p.p. 17-46.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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III UNIDADE

Significado e léxico I

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Apresentação

Estudando as primeiras unidades deste curso de Língua Portuguesa VI iniciamos nossos estudos em Semântica. Desse modo, já refletimos sobre as diferentes perspectivas teóricas que tratam da significação bem como exercitamos os conhe-cimentos sobre as questões entre significado e contexto.

Assim, com uma visão mais abrangente, é chegada a hora de continuar por outras nuances da investigação em Semântica. Trataremos, nesta unidade, de estudar o léxico, iniciando com uma discussão sobre os processos de vague-za e ambiguidade, processos de indeterminação de senti-dos que são recorrentes na língua.

Nossa proposta é observarmos que o léxico não pode ser entendido como uma lista de itens para etiquetar o mundo, pois as palavras possuem uma mobilidade semântica deter-minada pelo contexto no qual está inserida, ou seja, quando falamos de palavras e de seus respectivos significados, de-vemos falar também dos fatores que cercam a enunciação dessa palavra.

Para isso, leia com atenção este material, reflita sobre o que está sendo apresentado, analise as atividades propostas e, acima de tudo, peça ajuda, caso precise. Estamos aqui, professor e tutor sempre a postos.

Com esse propósito, estabelecemos os objetivos de nos-sa unidade.

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ObjetivosAo final desta unidade, esperamos que você:

• Entenda como se constitui a indeterminação semântica;

• Diferencie a noção de vagueza e ambiguidade;

• Identifique, dentro da ambiguidade, os processos de homoní-mia e polissemia.

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Indeterminação de sentidos

Umas das características das línguas naturais é a sua capacidade de indeterminação ou o fato de estarem suscetíveis a diversas interpre-tações Todo falante sabe que dar o significado das palavras não é uma tarefa simples. A riqueza do funcionamento do léxico faz com que nem todos os enunciados produzidos na língua possuam sentido determina-do podendo variar de acordo com o contexto e, mais especificamente, de acordo com as crenças atribuídas por cada falante. Geralmente, é mais fácil definir uma palavra se esta é dada no contexto de uma sentença, pois para cada palavra haverá diversos significados, quanto diversos forem os contextos em que ela se realize.

Vejamos a exemplificação dada por Cançado (2008, p.58) em re-lação ao significado do verbo quebrar:

O Paulo quebrou o vaso com um martelo.

O Paulo quebrou o vaso com o empurrão que levou.

O Paulo quebrou sua promessa.

O Paulo quebrou a cabeça no acidente.

Paulo quebrou a cabeça com aquele problema.

Paulo quebrou a cara.

Paulo quebrou a empresa

Parece óbvio que o verbo quebrar não apresenta o mesmo sentido em todas as sentenças sendo influenciado pelas possibilidades de uso dos diferentes contextos em que é apresentado. Vemos com isso que a definição de uma palavra ou expressão só é possível a partir da ma-neira contextualizada em que se apresenta, haja vista exercer nuances diferentes em cada ocorrência.

Assim,quando aos itens lexicais,são atribuídos mais de um sentido ou que possuem um sentido único, porém, por demais generalizado dizemos que há a ocorrência de uma indeterminação semântica que é discutida pelos semanticistas em termos de vagueza ou ambiguidade.

Vagueza pode ser, de um modo geral, apresentada como o oposto de uma definição precisa. Compreendendo, assim, os casos em que um termo, por ser muito abrangente, não pode ser especificado fora do contexto. Por exemplo, ao dizer a sentença:

Luís é alto.

precisamos especificar qual é o parâmetro de comparação,pois ser alto em relação as pessoas ditas “comuns” não se trata de ter a mesma altura de quem é alto em relação ao time de basquete,por exemplo.

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Da mesma forma, se afirmarmos que um elefante é grande estamos corretos, mas também estaremos certos se considerarmos uma formiga de 10 cm um animal grande.De um modo geral,adjetivos ou expres-sões que emitem julgamentos são termos vagos.

Já a ambiguidade se refere à indeterminação de sentido que cer-tas palavras ou expressões apresentam, dificultando a compreensão do enunciado. Esse processo é subdividido em homonímia e polissemia. Da homonímia, fazem parte termos cujos sentidos são incompatíveis. É o caso de banco, interpretado como estabelecimento bancário - e banco - assento para mais de uma pessoa, com ou sem encosto, típico dos jardins, como exemplificado abaixo em que a homonímia é a raiz da ambiguidade da frase:

O cadáver foi encontrado perto do banco.

De modo diferente, a polissemia ocorre quando os possíveis sen-tidos da palavra ambígua tem alguma relação entre si, não sendo in-compatíveis, pois parecem ser diferentes facetas de um mesmo sentido base. Vejamos o seguinte exemplo:

pé: pé de cadeira; pé de mesa,pé de fruta, pé de página,etc.

O sentido de pé, como sendo a base de sustentação de algo, é recuperado em todas as expressões como sendo o sentido em comum entre elas, não sendo, portanto, incompatíveis. Para estabelecer essa relação entre as palavras polissêmicas, usamos a nossa intuição de falante e o contexto em que a palavra se encontra.

Dadas essas explicações iniciais e breves, em seguida, vamos nos aprofundar/explorar a diferença entre os processos mencionados, mas antes disso, prá exercitar, que tal resolver a questão abaixo?

Atividade ITomando como referência o exemplo da palavra pé, faça o mesmo raciocínio em relação às palavras polissêmicas de cada sequência abaixo. Leia-as e identifique o sentido que têm em comum:

1. xadrez (tecido) – xadrez (prisão) – xadrez (jogo)

2. rede de deitar – rede de comutadores – rede elétrica

3. orelha de caderno – orelha de livro – orelha ( do corpo)dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Ambiguidade x VaguezaJá sabemos que as palavras e as sentenças podem ter mais de um

significado, mas nem sempre é claro detectar se em uma determinada situação ocorre ambiguidade ou outra espécie semelhante de fenôme-no linguístico. Na frase abaixo, é possível percebermos a existência de duplo sentido:

Ele viu seu amigo enquanto descia o morro.

Podemos questionar: quem descia o morro? O amigo ou a pessoa que viu o tal amigo? A partir desses questionamentos, explicitamos a ocorrência da ambiguidade.

Porém, há casos em que esse fenômeno gera incertezas; daí a im-portância de analisá-lo cuidadosamente. Para isso, torna-se preciso di-ferenciar ambiguidade de vagueza já que ambas situam-se no mesmo campo semântico: o do “indeterminado” e do “não especificado”.

Moura (2000, p.81) nos diz que a vagueza ocorre quando não podemos determinar se uma certa frase se aplica ou não a objetos específicos e esta gera proposições indefinidas quanto ao valor de ver-dade. Vejamos:

Mauro é bom pai.

A expressão acima pode ser verdadeira ou falsa conforme a defini-ção de “bom”. O que é ser bom pai? É acompanhar o desenvolvimen-to dos filhos, é proporcionar a eles moradia digna, escola, estudo de língua estrangeira? Não temos uma delimitação precisa do significado de “bom”. Essa indefinição entre o verdadeiro e o falso é típica da vagueza.

Os adjetivos, em especial, são palavras vagas, pois não há um limite preciso de sua aplicabilidade. Por exemplo,quando classificamos alguém como baixo, inteligente ou bom, estamos usando palavras re-lativas, que são totalmente dependentes de um contexto. Isso não signi-fica dizer que os termos vagos apresentam dois ou mais sentidos, pelo contrário, apresentam sentido único, porém tão genérico que esses ter-mos podem ser especificados em uma diversidade e contextos.

Cançado ao se reportar à noção de vagueza nos diz que

esse fenômeno semântico está associado a expres-sões que fazem referências apenas de uma manei-ra aproximada, deixando o contexto acrescentar as informações não especificadas nas expressões vagas. (...) Certos quantificadores, como vários, alguns, etc. não especificam quem são as pessoas exatas de quem falamos. Até mesmo adjetivos que parecem mais determinados, podem ser vagos. Se

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pensarmos em verde, não saberemos o limite cer-to de onde essa cor passa para o azul (como um azul esverdeado) ou, em direção inversa, quando passa para o amarelo (como um amarelo limão). Em realidade, podemos observar que quase todas as palavras da língua tem uma certa vagueza de sentido. (Cançado,2008,p.60)

Agora, vejamos o que nos diz Ilari sobre a noção de vagueza:

A vagueza afeta palavras de todos os tipos:- Substantivos (toda montanha tem um cume, mas onde começa o pé da montanha?)- Adjetivos (a quantos graus deve estar a água, para ser qualificada de quente?) - Advérbios (o significa levantar cedo? e morar per-to?) (Ilari, 2010, p. p.201 – 202)

Assim, a vagueza parece ser uma característica das línguas natu-rais. Trata-se de uma maneira econômica de nos expressarmos, sem que sejamos obrigados a determinadas escolhas às vezes complicadas no uso da língua, ou seja, podemos nos entender reciprocamente sem precisar definir com detalhes todos os limites da categorização do que estamos enunciando.

Para maior compreensão da vagueza, vamos conhecer um pouco a Teoria da Precisificação. De um modo geral, podemos dizer que a pre-cisificação consiste em transformar sentenças indefinidas em definidas (verdadeiras ou falsas). Sobre isso vejamos a citação de Moura (2000):

Uma precisificação é um operador semântico que transforma um sentido indeterminado num sentido mais determinado. Ou seja, dado um sentido le-xical Si indeterminado, em relação ao qual mais de uma interpretação é possível, a adjunção a ele de um precisificação P produz um sentido lexical S1 mais determinado. Se pensarmos em termos de compatibilidade de interpretações, Si é compatível com mais de uma interpretação, ao passo que S1 é incompatível com algumas dessas interpretações. (Moura, 2000, p.3)

Em outras palavras, a precisificação pressupõe uma função de in-terpretação que atribui valor a um item lexical indeterminado a partir de uma situação de uso. Vejamos o exemplo de Chierchia (2003, p.66), a seguir:

A: Hugo é alto.

B: Como alto?Ele não tem nem 1,65m.

A: Mas eu estava pensando alto para um jóquei.

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Nesse exemplo, inicialmente, não está claro que critério é relevante para alguém ser considerado alto, então para sair da indefinição foi levantada uma dúvida e um sentido específico foi associado a uma situação contextual. A precisificação (alto em relação a um jóquei) se-leciona o sentido desejado e elimina os outros possíveis, como também precisifica a sentença como verdadeira já que entre os jóqueis, alguém com 1,65m de altura tende a ser considerado alto.

Agora observemos o seguinte enunciado:

Antônio gosta da universidade.

Uma vez que universidade remete pelo menos a três sentidos – es-paço físico, instituição acadêmica e as pessoas que dela participam – o sentido do enunciado acima fica indeterminado, pois não se sabe se Antônio gosta da construção da universidade, dos conhecimentos que são ensinados pela instituição, de seus frequentadores ou até mesmo de dois ou três sentidos simultâneos. Então, pode-se deslocar a sen-tença de um nível de indeterminação para um nível de determinação, precisificando universidade, como no exemplo a seguir;

Antônio gosta do prédio da universidade.

Antônio gosta de explorar os conhecimentos da universidade.

É oportuno atentarmos para uma diferença nos casos de precisifi-cação acima: No primeiro caso, o que é relevante para definir um ad-jetivo como alto é a precisificação que só se faz pela contextualização, pois o léxico não é suficientemente informativo para a interpretação. Já no segundo caso, universidade é precisificada pela associação às palavras prédio e conhecimentos, mas a precisificação não se faz pelo contexto, e sim retoma sentidos já existentes no léxico (espaço físico e instituição).

Um item lexical corresponde, pois, a um conjunto de sentidos (pre-cisificações) que podem advir diretamente do léxico (casos de polisse-mia) ou do contexto (nos casos de vagueza).

Para tomar nota:

A palavra polissêmica apresenta mais de um sentido, es-tando seus sentidos associados a um item lexical e mantendo entre si algum tipo de relação semântica. Já a vagueza envolve diferentes possibilidades de interpretação, determinadas pelo contexto e não previamente disponíveis na língua.

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Em seguida, nos voltaremos especificamente para a ambiguidade, explorando as noções de homonímia e polissemia. Mas antes de pros-seguirmos que tal exercitar um pouco os conceitos apresentados???

Atividade II1. Verifique, nas sentenças abaixo, que tipo de relação está ocorrendo: ambiguidade ou vagueza. Explique sua resposta fundamentando sua opção.

a) João atirou em um pato correndo.b) Algumas pessoas adoram física. c) Carlos é um rapaz satisfeito. d) Todo homem ama a sua mulher.

2. Converse com pessoas conhecidas e descubra se alguma delas já viveu alguma uma situação semelhante a que será descrita abaixo em que uma diferença de entendimento sobre o que é “perto” ou “longe”, “cedo” ou “tarde” , “muito” ou “pouco” causou algum tipo de desentendimento. Em seguida, socialize no AVA as histórias que você descobrir. Vai ser legal, hein, esta atividade!!!

A noção do que seria perto ou logo ali é muito diferente para as pessoas da cidade grande e da cidade pequena, da ci-dade e da roça, como mostra uma história de que foram prota-gonistas um advogado e um caipira. O caipira foi chamado a atuar como testemunha de defesa num julgamento, confirman-do que o acusado não poderia ter percorrido uma determinada distância entre o momento em que foi visto no centro do povo-ado, e o momento em que ocorreu o crime numa fazenda da região. Durante o julgamento, o advogado pede que o caipira dê informações objetivas sobre a distância, e o caipira, usan-do de sua própria noção de distância, responde: “A fazenda é logo ali, só um tirinho”. O advogado perde a causa e aprende que a linguagem é mais complicada do que parece.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Homonímia e polissemia

Ambiguidade Nos estudos sobre léxico é preciso considerar a opacidade da lín-

gua. Nada está claro, posto “não há uma relação direta entre lingua-gem e mundo e sim um trabalho social designando o mundo por um sistema simbólico cuja semântica vai se construindo situadamente” (Marcuschi, 2004, p. 268). Portanto, convém reiterar, neste início de tópico, a instabilidade do léxico, que é construído de acordo com o contexto de uso.

Já vimos que a ambiguidade lexical ocorre quando um termo por si só possui duplicidade de sentido. Como já vimos, no início da unidade, o item lexical banco em O cadáver foi encontrado perto do banco é o que torna a sentença ambígua. Entretanto, a ambiguidade lexical pode ser gerada por dois tipos de fenômenos distintos: a homonímia e a polis-semia. Separadamente, exploraremos cada um dos fenômenos, tudo bem?

HomonímiaA homonímia ocorre quando os sentidos da palavra ambígua não

são relacionados. Existem palavras homógrafas como manga (fruta / parte do vestuário), com sentidos totalmente diferentes para a mesma grafia e o mesmo som; e as homófonas, com sentidos totalmente di-ferentes, para o mesmo som de grafias diferentes, como por exemplo, a palavra sexta/cesta nos enunciados que seguem: Cláudia trouxe os ovos na sexta/Cláudia trouxe os ovos na cesta.

Essa divisão entre homófonas e homógrafas não constitui grande relevância por isso, para nossos estudos trataremos somente do termo homonímia.

Rocha (1998) conceitua homonímia como “[...] a propriedade de duas ou mais formas, inteiramente distintas pela significação ou fun-ção, terem a mesma estrutura fonológica” (Rocha, 1998p. 68) Ou seja, estes vocábulos podem possuir a mesma sonoridade e até o mesmo aspecto gráfico, mas possuem significados diferentes, constituindo, as-sim, entradas lexicais diferentes. Entendamos entradas lexicais por uma lista de itens (lexemas, vocábulos dêiticos, formas dependentes, afixos, bases, desinências, vogais temáticas) que o falante vai adquirindo ao longo de sua experiência com a língua.

Para exemplificação, observemos a imagem do folheto abaixo que faz parte de uma campanha de combate à exploração sexual infantil:

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O recurso utilizado para chamar a atenção do público é a ho-monímia do item lexical pena, pois nos leva a duas entradas lexicais diferentes, uma remete a dó, compaixão e outra remete a condenação aplicada por um juiz a um réu. A homonímia dessa propaganda faz divulgar a campanha, justamente, através desse jogo de ambiguidade linguística reforçando a ideia de que exploração sexual infantil é um caso de polícia, e não apenas de dó, compaixão.

PolissemiaExiste uma diferença entre homonímia e polissemia tradicionalmente

assumida pela literatura semântica, mais especificamente pela lexicolo-gia. Todos os dois fenômenos lidam com os vários sentidos para uma mesma palavra, entretanto, polissemia ocorre quando os possíveis senti-dos da palavra ambígua têm alguma relação entre si, isto é, uma ligação semântica por um sentido básico inicial, constituindo assim uma entrada lexical que pode ser utilizada em seu sentido literal ou metafórico.

De acordo com Rocha (op.cit.p. 68) a polissemia tem como carac-terística o “[...] fato de uma palavra poder sofrer adaptações semânticas às diversas circunstâncias em que é usada [...]”, no entanto, não há uma perda do seu sentido “básico”, que comumente lhe é constituído, mas sim, um “aproveitamento” desse sentido em prol da construção de uma dada significação.

Analisando a polissemia em um exemplo, vejamos a propaganda a seguir:

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Ao observarmos o título da propaganda Espírito Santo um estado de alegria, logo percebemos um caso de polissemia no item lexical “estado”, o qual apresenta uma única entrada no dicionário e dois sentidos; podendo ser considerado tanto como divisão territorial do país, como remetendo ao sentido de alegria e felicidade de todos aqueles que vivem aquela região. A princípio, temos a leitura de que aquele estado é uma região de alegria devido ao progresso econômico e a inclusão social (iniciativas do governo) divulgadas pela propaganda, mas ao mesmo tempo atentamos para a segunda leitura em que “estado” relaciona-se a “estado de espírito”.

As imagens também são fundamentais para a construção dessa polis-semia, haja vista termos uma visão panorâmica da região, com constru-ções urbanísticas e a imagem de uma família feliz e sorridente numa planí-cie verde, onde o céu está azul e em tudo transparece paz e tranquilidade, denotando a ideia de que naquele estado vive-se um “estado” permanente de alegria e bem estar.

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Atividade III

1. Leia atentamente o diálogo abaixo e determine que sentidos pai e filho atribuem ao verbo ficar. Assim sendo, o diálogo constitui uma situação de polissemia ou uma homonímia? Explique sua resposta.

2. É comum encontrarmos no gênero publicidade diversos textos que utilizam a polissemia/homonímia, a fim de tornar o enunciado mais atraente. Sua atividade será, pois, pesquisar em textos publicitários da mídia impressa enunciados cujo recurso responsável pelo efeito de sentido seja a ambiguidade.

Não deixe de responder as atividades e quando possível socialize suas respostas no AVA.

Interagindo se aprende melhor!

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Continuando nossa conversa

Lyons (1987) nos diz que a polissemia (ou significado múltiplo) é uma propriedade de lexemas simples e que “aí está a diferença, a prin-cípio, entre homonímia e polissemia” (LYONS, 1987, p. 142)

Segundo o autor, todos os dicionários - padrão respeitam a distin-ção entre homonímia e polissemia. Por exemplo, o dicionário Aurélio (2004) traz a palavra manga com duas entradas:

manga¹ s.f. Parte do vestuário onde se enfia o braço. 2. Qualquer peça em forma de tubo que reveste ou protege outra peça.

manga² s.f. O fruto da mangueira.

Em contrapartida, traz a palavra víbora com apenas uma entrada, porém com mais de um sentido:

víbora s.f. 1. Zool. Nome comum às cobras venenosas da família dos viperídeos.

2. Fig. Pessoa de má índole ou mau gênio.

Por meio desses exemplos, é possível observar que os dicionaris-tas, em geral, tratam com um caso de homonímia palavras com mais de uma entrada e com sentidos distintos, como no caso da palavra manga. Já quando um único lexema apresenta significados diferentes, como a palavra víbora, é tratada como um caso de polissemia.

A distinção entre homonímia e polissemia, embora aparentemente fácil de ser percebida/formulada, é difícil de ser aplicada com seguran-ça e coerência, uma vez que os lexemas não têm um número determi-nado de significados distintos. Podemos dizer, ainda, que a polifonia - diferente da homonímia - é um fenômeno externo à língua, ou seja, depende de fatores externos para ser entendido; fatores sociais e cul-turais, por exemplo. Assim, ao tratarmos de polissemia temos que ser capazes de especificar, a interação que há entre o contexto e o item lexical.

Um outro aspecto importante a ressaltar é o fato de uma mesma palavra poder ser considerada uma homonímia em relação a determi-nado sentido e ser uma polissemia em relação a outros. Como ilustra-ção vejamos, abaixo, os exemplos retirados de Cançado (op.cit, p. 64):

a) pasta1 = pasta de dente, pasta de comer (sentido básico = massa)

b) pasta2 = pasta de couro, pasta ministerial (sentido básico = lugar específico)

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O item lexical pasta pode ser tanto polissemia, nos vários sentidos associados a cada ocorrência, quanto homonímia, pois pela nossa in-tuição de falante, os sentidos de pasta, entre a) e b), são totalmente distintos.

Para encerrar...

Espero que essa unidade nos instigue a reflexão de como funcio-nam esses dois fenômenos de significação da língua. Muito além de classificações é importante que fiquem as inquietações, as intuições, os questionamentos a respeito do dinamismo da língua quando se trata de sentido. As classificações podem nos auxiliar, mas não devem limitar o estudo, uma vez que a determinação do sentido é social e não se dá somente no eixo das estruturas linguísticas.

Atividade IV

Leia a tirinha que segue e responda ao que é proposto:

1. O humor da tira está baseado na ambiguidade de sentido da palavra reflexos. Veja os significados trazidos pelo dicionário para a palavra reflexo e explique a origem da ambiguidade dos quadrinhos, considerando o contexto.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Leituras recomendadas

Em Manual de Semântica: Noções Básicas e Exercícios, a autora Márcia Cançado ofere-ce um panorama da bibliogra-fia básica na área de semântica,

por meio de uma exposição teórica e um conjunto de exercícios possi-bilitando o acesso a temas e autores centrais da área.

Neste livro escrito por cole-gas admiradores de Rodolfo Ilari ele é homenageado da ma-neira que mais gosta: por meio de artigos originais e sugestivos, que, partindo de questões por

ele discutidas, abrem reveladores horizontes em relação à linguagem e inspiram reflexões amplas e necessárias.

Resumo

Tratamos dos processos de indeterminação de sentidos com uma discussão sobre a vagueza e a ambiguidade. Especificamente, obser-varmos a ambiguidade buscando diferenciar homonímia de polissemia. Distinção esta que, aparentemente é fácil de ser percebida, mas difícil de ser aplicada com segurança e coerência, uma vez que os lexemas não têm um número determinado de significados distintos. De um modo geral, podemos dizer que a polifonia - diferente da homonímia - é um fenômeno externo à língua, ou seja, depende de fatores externos para ser entendido. Assim, ao tratarmos de polissemia temos que ser capazes de especificar, a interação que há entre o contexto e o item lexical.

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Autoavaliação

Para refletir...

Depois das discussões promovidas por esta unidade acerca da indeterminação de sentidos e, consequentemente da ambiguidade, é possível afirmar que a placa abaixo é ambígua? Socialize sua resposta no AVA.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Referências

CANÇADO, Márcia. Manual de semântica: noções básicas e exercícios. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008.

CHIERCIA, Gennaro. Semântica. Campinas: Unicamp/Eduel, 2003.

ILARI, Rodolfo. Introdução à semântica – brincando com a gramática. São Paulo: Editora Contexto, 2010.

LYONS, John. Linguagem e Linguística: uma introdução. Cambridge University Press,1979

MOURA, Heronides M. de M. Significação e contexto: uma introdução a questões de semântica e pragmática. 2ª. ed. Florianópolis: Insular, 2000.MARCUSCHI, Luiz Antônio. O léxico: lista, rede ou cognição social? In: NEGRI, L. FOLTRAN, M. J. & OLIVEIRA, R.P. de. Sentido e significação: em torno da obra de Rodolfo Ilari. São Paulo: Contexto, 2004, p.263 – 284.

OLIVEIRA, R. P. de. Semântica. In: Mussalin, F. Bentes, A. C. Introdução à linguística. domínios e fronteiras Vol 2. São Paulo: Cortez, 2003.p.p. 17-46.

ROCHA, Luiz Carlos. Estruturas Morfológicas do Português. Belo Horizonte: Ed. da UFMG, Coleção Aprender, 1998.

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IV UNIDADE

Significado e léxico II

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Apresentação“Sinônimos?Esses que pensam que existem sinônimos desconfio que não sabem distinguir as diferentes nuanças de uma cor.” Mário Quintana

Nesta unidade daremos continuidade ao estudo das pro-priedades semânticas relativas ao léxico que iniciamos na unidade III. Vamos tratar, entre outros, de alguns fenômenos do significado como a sinonímia, a antonímia e a hiponímia, para isso nos apoiaremos em noções como referência no mundo e valor de verdade das sentenças.

Tentaremos mostrar como esses fenômenos, além de des-crever relações de sentido entre palavras, servem também para reconhecer relações de sentido entre construções gra-maticais ou mesmo efeitos de sentido advindos do contexto.

Iniciemos, portanto, pensando na citação de Mário Quin-tana no inicio desta apresentação na qual ele desfaz a ilusão de uma sinonímia perfeita, que faz com que muitos creiam que sinônimos são sempre permutáveis em qualquer contex-to. É sobre questões como essas que queremos investigar, descobrir, estudar... Mas lembre - se de que esse estudo só se completa com sua efetiva participação, por isso, continue realizando todas as leituras e atividades e estabelecendo in-teração com colegas, professores e tutores sempre que apa-recerem dúvidas e/ou contribuições.

Proveitosos estudos!!!

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ObjetivosAo término desta unidade, esperamos que você:

• Entenda as relações de sinonímia e antonímia como relações construídas (con) textualmente;

• Diferencie a relação hierárquica que há entre a hiperonímia e a hiponímia;

• Identifique a metonímia como um processo de associação se-mântica entre o significado de um termo e o significado de ou-tro.

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Relações de sinonímia e antonímia

“As coisas têm exatamente o nome que eu dou a elas.”Lewis Carroll. Alice no país das maravilhas.

Acreditamos que aspectos importantes do emprego dos itens lexi-cais da nossa língua podem e devem ser proveitosamente analisados tomando-se como foco as relações de sentido que estes contraem com outros itens lexicais Na semântica lexical, as palavras são definidas umas em relação às outras. Nesta unidade, especificamente, analisa-remos cinco dessas relações: a sinonímia, a antonímia, a hiponímia, a hiperonímia e a metonímia.

As palavras podem ser consideradas sinônimas quando apresenta a possibilidade de serem substituídas umas pelas outras em um determi-nado contexto sem acarretar alteração de sentido. A antonímia, por sua vez, diz respeito a palavras que apresentam significados contrários. E, finalmente, a hiponímia e a hiperonímia são relações de sentido entre palavras tal que o significado de uma está incluído no significado da outra, sendo o termo mais genérico chamado de hiperônimo e o termo mais específico chamado de hipônimo.

Sinonímia e paráfrase De um modo geral, poderíamos dizer que a sinonímia é a relação

que existe entre duas palavras, expressões ou grupos de palavras que podem se alternar em determinados contextos, dependendo do uso que lhes é atribuído. É o que pode ser visto no exemplo abaixo em que as sentenças “gorila” e “macacos” possuem uma relação de sinonímia com o emprego metafórico e literal respectivamente. “Eu já era gorila, para que ia comer macacos?” João Batista Figueiredo, dizendo em ví-deo gravado em 1987 por que recusou um prato feito com cérebro de macaco oferecido pelo rei de Marrocos. (Veja – 12/01/2000).

Para Lyons (1979), a sinonímia está associada diretamente a sua dependência do contexto. Ele evidencia isso exemplificando os pares de palavras como solteiro e casado. A negação de um implica a afirmação do outro e a afirmação de um implica a negação do outro.

“João não é casado” implica “João é solteiro”

“João é casado” implica “João não é solteiro”

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Contudo, as relações de sinonímia não são assim tão simples, uma vez que não basta apenas a similaridade de palavras e expressões em sentenças para que elas tornem-se sinônimas. Segundo Ilari e Geral-di (1994) podemos primeiro refletir que, para duas expressões serem sinônimas, não bastam que tenham a mesma referência no mundo. Vejamos o exemplo:

a) Os alunos de linguística da E@D

b) Os alunos mais legais da E@D

Nas sentenças acima, os referentes são os mesmos, entretanto isso não significa dizer que o sentido é o mesmo. Em (a) e (b) os referentes os alunos são sinônimos, porém, os sentidos são distintos e não de-notam as mesmas propriedades no mundo. Para serem sinônimas as palavras e/ou expressões devem manter uma relação direta de verdade e falsidade, ou seja, sempre que aparecerem em diferentes contextos não devem passar de verdadeira para falsa e vice-versa. Dessa forma, um primeiro aspecto do conhecimento que um falante tem sobre o significado das sentenças que uma teoria semântica deve capturar é o fato de que ele sabe em que condições o mundo precisa estar para que uma sentença seja verdadeira. É por isso que na semântica se afirmam que o significado de uma sentença são as suas condições de verdade.

Vejamos os exemplos dados por Ilari e Geraldi (1994,p.45):

I - Todo careca sonha descer uma ladeira de bicicleta com os cabe-los soltos ao vento.

II - Todo calvo sonha descer uma ladeira de bicicleta com os cabe-los soltos ao vento

III - O Argemiro não se irrita quando o chamam de calvo, mas não suporta ser chamado de careca.

IV - O Argemiro não se irrita quando o chamam de careca, mas não suporta ser chamado de calvo.

Nos exemplos I e II observa-se que, dizendo uma ou outra sentença não se altera a verdade ou a falsidade. Isso resulta do fato de que as palavras calvo e careca têm o mesmo sentido e referência nas senten-ças nos levando a concluir que são sinônimas. Já nos exemplos III e IV se trocarmos as palavras há uma mudança de sentido, pois altera – se as referências das duas sentenças e, consequentemente, a verdade ou a falsidade da sentença III passa a ser diferente da sentença IV o que nos leva a concluir que não podemos considerar as palavras calvo e careca como sinônimas nesse contexto. Dessa forma, podemos perce-ber que para considerarmos duas palavras sinônimas é necessário que atentemos para a situação de fala em que a sentença está inserida, e estabeleçamos a as condições de verdade e falsidade para que haja a sinonímia.

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A escolha entre séries sinonímicas, muitas vezes, denota atitudes dos falantes ou adquirem significados específicos em função do seu contexto de uso, por exemplo, pandorga, papagaio, arraia, pipa, entre outros são termos utilizados no Brasil para designar um mesmo objeto..

Cançado (2008, p.42) se referindo a dependência da sinonímia ao contexto nos explica que

na maioria dos casos, pode-se dizer apenas que existe uma sinonímia baseada somente no signifi-cado conceitual da palavra,sem se levar em con-ta o estilo, as associações sociais ou dialetais, ou mesmo os registros.As palavras como gordo e obeso, por exemplo,podem ser intercambiáveis em determinados contextos,porém, provavelmente, a segunda ocorrência será mais usada por um endo-crinologista e a primeira tem uso corrente.

Portanto, devemos sempre pensar a sinonímia dentro do contexto de ocorrência. Isso significa abandonar a ideia da existência de sinô-nimos perfeitos, pois as palavras só estabelecem relação de sinonímia no enunciado e, como possuem mais de um sentido, podem ter uma equivalência adequada somente a um de seus sentidos e não à totali-dade deles.

Outra questão curiosa é a noção de sinonímia entre sentenças (pa-ráfrase) em que prevalece o significado informacional ou o conteúdo explícito. Como vimos há pouco, a sinonímia entre palavras e expres-sões não se mostra apenas com termos de sentidos semelhantes, mas sim atrelada ao contexto. É o que vemos também na sinonímia das sentenças abaixo:

a) Aquelas mulheres do canto estão chamando.

b) Aquelas senhoras do canto estão chamando.

c) Aquelas damas do canto estão chamando.

Neste exemplo, podemos perceber que as palavras mulheres, se-nhoras e damas estão descritas de forma que qualquer falante de Lín-gua Portuguesa, em qualquer uma das situações acima, poderá com-preender perfeitamente o conteúdo das sentenças sem que haja danos sintáticos ou semânticos, pois têm o mesmo conteúdo ou se equivalem semanticamente. Essa é, portanto, segundo Cançado (2008) a noção de sinonímia de conteúdo,quando uma sentença (x) acarreta uma sen-tença (y) e (y) acarreta (x).

Porém, dependendo da conotação que se estabelecem na fala, es-sas sentenças podem ser consideradas diferentes. Escolhendo uma, e não outra, os falantes podem estar passando alguma informação im-portante sobre atitudes em relação à situação e sobre os envolvidos nela. Imaginemos que um garçom fala a sentença (c) para o colega e

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alguém a quem ele se refere não gosta do emprego da palavra damas. Neste caso percebe-se que as sentenças aparentemente sinônimas não o são, e que damas tem um sentido diferente dependendo de quem esta escutando.

Vejamos outros exemplos em que, embora haja sinonímia de conte-údo na sentença, há essa diferença de perspectiva:

a) A polícia procura Sara./ Sara é procurada pela polícia.

b) Pedro trabalha comigo./ Eu trabalho com Pedro.

Da mesma forma que os falantes têm critérios/razões para escolher determinadas palavras sinônimas em detrimento de outras, a escolha da perspectiva do tópico da sentença e/ou foco que é dado não acon-tece em vão e denota também uma diferença de significação. Isso pode ser observado nas sentenças do exemplo (a) que, apesar de existir um acarretamento mútuo, parece-nos que se quer colocar em evidên-cia na primeira sentença que Sara é uma pessoa perigosa que cometeu algo errado, enquanto a segunda parece apenas sugerir que Sara está apenas desaparecida. Da mesma forma no exemplo (b) as sentenças constituem uma sinonímia de conteúdo, mas a escolha do falante por uma ou outra vai depender de qual referente se quer colocar em evi-dência, nesse caso Pedro ou eu.

Portanto, [...] mesmo entre sentenças, a sinonímia perfeita não existe. Isso se procurarmos duas sen-tenças idênticas em termos de estrutura sintática, de entonação, de sugestões, de possibilidades metafóricas e até mesmo de estruturas fonéticas e fonológicas. Se esperarmos encontrar a sinonímia nessas circunstâncias, então não é com surpresa que poderemos afirmar que esta não existe. (Can-çado, 2008, p. 44)

As observações feitas até aqui nos fazem perceber que só faz sen-tido se falar em sinonímia relacionada à contextualização e ao uso em que as palavras/sentenças são empregadas.

Atividade I

Diga se as sentenças abaixo constituem sinonímia de conteúdo e faça comentários pertinentes ao uso desses exemplos na língua.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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60 SEAD/UEPB I Língua Portuguesa VI

a) João quebrou o vaso./ O vaso foi quebrado por João.

b) Aquele menino é muito esperto./Aquele garoto é muito esperto.

c) Rubens está se separando de Márcia. /Márcia está se separando de Rubens.

d) Os velhos não são respeitados neste país. / Os idosos não são respeitados neste país.

Antonímia e contradição

Geralmente,quando há uma relação de oposição entre o signifi-cado de duas unidades lexicais que apresentam, em comum, alguns traços semânticos permitindo relacioná-las de forma pertinente, surge a antonímia. De um modo geral, exemplos como grande/ pequeno; subir /descer; jovem / velho são antônimos.

Antônio Houaiss define antonímia como sendo uma “relação de sentido que opõe dois termos”. Segundo ele, esta oposição pode se dar sob a forma de uma gradação (grande / pequeno; jovem / velho), ou numa reciprocidade (comprar / vender, perguntar / responder), ou, ainda, numa complementaridade (ele não é casado / ele é solteiro).

Porém, segundo Cançado (2008), essa definição/delimitação não é suficiente, visto que os sentidos das palavras podem se opor de várias formas, ou mesmo que existam palavras que nem tenham um oposto verdadeiro. Por exemplo, quente não faz oposição a frio de uma mes-ma maneira que vender opõe-se a comprar e assim por diante.

Também, em alguns casos, conforme pontuam Ilari e Geraldi (1994), a antonímia nem sempre traz a incompatibilidade tão óbvia, tudo vai depender da capacidade de interpretação de cada interlocutor.

Buscando alargar essa noção de antonímia, ou seja, a oposição de sentidos para as sentenças, temos o que chamamos de contradi-ção, embora a contradição não ocorra exatamente como a antonímia.Muitas vezes temos até mesmo a antonímia entre palavras de determi-nadas sentenças, não envolvendo a contradição entre as mesmas.. A antonímia se apoia nas noções de “contrário” ou “oposto” e não envol-vem necessariamente uma contradição. Veja que, embora as sentenças abaixo nomeiem itens lexicais considerados opostos, elas não envolvem uma relação de contradição. Em todos os casos, os pares de senten-ças podem ser simultaneamente verdadeiros ou falsos. Nos exemplos abaixo, nascer/morrer não são processos contraditórios, pois não existe ligação contextual entre ambos. Já em (c) e (d), a relação de oposição encontra-se nos resultados obtidos pelas duas ações.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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a) Carlos nasceu na Bahia. b) Carlos morreu na Bahia.

c) Carlos abriu a porta. d) Carlos fechou a porta

A noção de contradição, por sua vez, está ligada às noções de acarretamento, ela acontece quando a situação descrita na sentença nunca puder ser verdadeira, ou melhor, quando não existir uma situa-ção possível no mundo. Como por exemplo: João beijou Maria, mas Maria não foi beijada por João. Pensando numa relação entre senten-ças, duas sentenças são contraditórias quando ambas não podem ser simultaneamente verdadeiras, ou seja, se uma delas é verdadeira, a outra é necessariamente falsa, como podemos ver no par de sentenças: Paulo está alegre. Paulo está triste.

Antes de encerrarmos este tópico, vale resaltar que as mesmas considerações feitas em relação a não existência da sinonímia perfeita podem ser feitas em relação à antonímia. Não se pode pensar em an-tônimos perfeitos, haja vista a multiplicidade de sentidos de um termo que faz com que o mesmo estabeleça vários pares de antônimos, em função do sentido que lhe é atribuído. Vejamos o exemplo abaixo:

a) Eu não gosto de pão integral.

b) Não compramos leite integral.

c) Viso à obtenção da aposentadoria integral

Em (a), podemos afirmar que há várias oposições para pão integral, ou seja, todos os outros tipos de pão que não têm como matéria prima a farinha integral. Em (b), opomos leite integral a leite desnatado ou semi-desnatado. De modo muito diferente, integral em (c) possui outro sentido, opondo-se a uma aposentadoria parcial ou proporcional.

Atividade IIAponte as contradições semânticas do soneto a seguir, explicando-as a partir das noções que foram apresentadas:

Amor é fogo que arde sem se ver,É ferida que dói, e não se sente;É um contentamento descontente,É dor que desatina sem doer.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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É um não querer mais que bem querer;É solitário andar por entre a gente;É nunca contentar-se de contente;É cuidar que se ganha em se perder.

É querer estar preso por vontade;É servir a quem vence, o vencedor;É ter com quem nos mata, lealdade.

Mas como causar pode seu favorNos corações humanos amizade,Se tão contrário a si é o mesmo Amor?

(Luís Vaz de Camões)

Hiperonímia, hiponímia e metonímia De uma forma objetiva, a hiperonímia caracteriza algo de maneira

geral- Eu vou ao médico - e hiponímia algo de caráter especifico - Eu vou ao clínico geral. É importante ressaltar que esses termos relacio-nam-se entre si, ou seja, um depende e se estabelece através do outro.

A opção por um hipônimo ou um hiperônimo produz efeitos de sentidos específicos. Ao afirmar, por exemplo, “toda manhã, como uma banana”, o falante poderia substituir o hipônimo banana pelo hiperô-nimo fruta, se a informação relevante fosse a preocupação com uma alimentação saudável. No entanto, ao dizer “o médico me recomendou comer uma banana toda manhã”, possivelmente haveria propriedades específicas dessa fruta relacionadas a uma condição de saúde própria desse falante.

Em um texto, a retomada de hipônimos por hiperônimos é um importante recurso para garantir a articulação entre suas partes, por exemplo, nesta afirmação: “Comprei um anel de diamante. Não sei o que está acontecendo comigo, mas estou gostando de brilhantes. É uma nova fase.” (Gisele Bündchen, Top Model, Veja 05/07/2000), ob-servamos o uso do hipônimo “anel de diamante” e do hiperônimo “bri-lhantes” fazendo-nos perceber que não há uma relação de “um para um” entre as palavras e as coisas do mundo. A escolha de uma palavra revela intenções específicas de um falante e constrói sentidos diversos.

Ilari e Geraldi (1994) classificam algumas palavras que poderiam ter uma relação de hiponímia e hiperonímia como acarretamentos, ou seja, palavras que nomeiam um conjunto de experiências em algum sentido comparáveis, e que possibilitam estabelecer relação de signi-ficado entre duas frases: O leão estava muito agitado, logo não era aconselhável aproximar-se do animal (relação de hiponímia); Gosto muito de praticar esportes, mas a natação é a minha atividade predileta (relação de hiperonímia.

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Lyons (1979) afirma que hipônimos e hiperônimos são palavras per-tencentes a um mesmo campo semântico1, sendo a hiponímia frequen-temente denominada de inclusão, isto é, a relação de um termo mais específico em um termo mais geral. Embora, um termo hiperônimo não implique, em geral, o seu hipônimo, ocorre muitas vezes que o contexto situacional do hiperônimo o determinará no sentido de um de seus hi-pônimos. Essa é a origem da sinonímia dependente do contexto. Dessa forma, a relação por hiponímia é aquela que ocorre entre uma palavra de sentido mais específico e outra de sentido mais genérico, que tem com a primeira traços semânticos comuns. Já a relação por hiperoní-mia corresponde ao processo inverso - ocorre entre uma palavra de sentido genérico e outra de sentido específico. Vejamos:

• Do específico para o genérico – (hipônimo) → poltrona hipôni-mo de assento /leão hipônimo de animal;

• Do genérico para o específico – (hiperônimo) → veículo hiperô-nimo de bicicleta / esporte hiperônimo de natação.

Para exemplificar os efeitos de sentido dos hipônimos e hiperônimos em um texto, observemos a letra da música "Família" dos Titãs e veja-mos a relação que é estabelecida entre o hiperônimo família e seus termos específicos:

Família! Família!Papai, mamãe, titia

Família!Família!Almoça junto todo dia

Nunca perde essa mania ...

Mas quando a filhaQuer fugir de casa

Precisa descolar um ga-nha - pão

Filha de família se não casa

Papai, mamãeNão dão nem um

tostão...

Família êh! Família ah!Família! oh! êh! êh! êh!Família êh! Família ah!

Família!...

Família! Família!Vovô, vovó, sobrinha

Família! Família!Janta junto todo dia Nun-

ca perde essa mania...

Mas quando o nenêFica doente

Uô! Uô!Procura uma farmácia de

plantãoO choro do nenê é estri-

denteUô! Uô!

Assim não dá prá ver televisão...

Família êh! Família ah!Família! oh! h! êh!

Família êh! Família ah!Família! hiá! hiá!

hiá!...

Família! Família!Cachorro, gato, galinha

Família! Família!Vive junto todo dia

Nunca perde essa mania...

A mãe morre de medo debarata

Uô! Uô!O pai vive com medo de

ladrãoJogaram inseticida pela

casaUô! Uô!

Botaram cadeado noportão...

Família êh! Família ah!Família!

Família êh! Familia ah!Família! oh! êh! êh! êh!Família êh! Família ah!Família! hiá! hiá! hiá!...

Voltemo-nos agora para exploração da metonímia que é tradicio-nalmente tratada pelos gramáticos como um dos recursos estilísticos da língua, processo em que se emprega um termo para designar outro.

De modo geral, na perspectiva linguística, a metonímia é uma difu-são semântica, um processo de associação em que um valor semântico transfere-se a outro, ou seja, o falante de uma determinada língua

1 Campo semântico é toda a área de signi-ficação de uma palavra ou de um conjunto de palavras, ou seja, o conjunto de palavras unidas pelo sentido.

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64 SEAD/UEPB I Língua Portuguesa VI

faz uma aproximação entre o significado de um termo e o significado de outro. Tais processos metonímicos podem compreender inúmeras relações como, por exemplo, as de abstrato-concreto, continente- con-teúdo, autor- obra, marca-produto, causa – efeito, etc. Assim, temos metonímia em enunciados como:

• É preciso respeitar a velhice; Ele ficou com os louros;

• Bebeu só um copo;

• Leu os pré-socráticos;

• Comprou um pacote de gilete;

• Ganhar a vida com o suor do rosto.

A relação que se estabelece entre os elementos é a de contiguida-de, ou seja, uma proximidade, uma vizinhança, um contato, em que parte do conteúdo semântico de uma palavra ou expressão associado a esta palavra ou expressão, é relacionado à outra palavra ou expressão numa comparação implícita, só que parcial (entre um todo significativo e um traço significativo de outro todo significativo).

Vejamos uma exemplificação dessa relação de contiguidade nestes versos de Carlos Queiroz Telles:

Que tarde!

Além do calor e da prova,Aquela minissaiasentada bem ao meu lado! Assim não há memóriaQue resista...

A sistematicidade dos processos metonímicos permite que se faça um estudo baseado no léxico, o que implica estabelecer uma aproxi-mação entre metonímia e polissemia. Nessa perspectiva, processos de alternância como, por exemplo, autor/obra, parte/todo que, sistema-ticamente ocorrem entre nomes, são definidos como polissema, pois a explicação para o fato de tais termos serem polissêmicos está na natureza lexical dos mesmos. Desse modo, podemos explicar uma me-tonímia como: São Paulo votou no PT. São Paulo, sendo um nome de cidade é polissêmico, pois possui três facetas que podem ser acionadas em conjunto ou separadamente; lugar, pessoa e instituição.

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Finalizando, é importante lembrar que a metonímia não é usada apenas na linguagem verbal; vai aparecer também em outras lingua-gens, como a visual, por exemplo. As indicações de lugares em placas são, em geral, metonímicas: os talheres significam “restaurante”; uma taça quer dizer “bar”; uma ducha tem o sentido “lugar onde se pode tomar banho”, entre outros.

O quadro de René Magritte (imagem ao lado) também é um exem-plo2, pois as folhas significam as próprias árvores.

Atividade IIILeia um trecho de notícia sobre um trabalho acadêmico que investigou as transformações do samba para, em seguida, responder ao que se pede:

1. Em que sentido foi empregada a palavra sinônimo nesse texto?Explique.

2. Como se dá a relação de hiponímia e hiperonímia entre as palavras pagode e samba? Fundamente sua resposta com trechos do texto.

3. A construção do anúncio abaixo foi pautada em um processo metonímico. Explique-o indicando que associações semânticas podem ser feitas e que efeitos de sentido sugere.

Revista Exame, nº 892.

2 O Exemplo retirado da Revista Portuguesa, nº 64, fev/2011.

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Leituras recomendadas

Este livro possibilita a alunos e professores entrar em contato com o problema do significado, enfocando diversas correntes da semântica. São várias as possibi-lidades que se apresentam: tanto pode ser explorado o livro como

um todo, quanto podem ser destacadas passagens que servem às dife-rentes orientações semânticas vigentes.

Em Manual de Semântica: Noções Básicas e Exercícios, a autora Márcia Cançado ofere-ce um panorama da bibliogra-fia básica na área de semântica, por meio de uma exposição te-

órica e um conjunto de exercícios possibilitando o acesso a temas e autores centrais da área.

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Língua Portuguesa VI I SEAD/UEPB 67

Resumo

Analisamos cinco propriedades semânticas relativas ao léxico, fre-quentemente encontrados em enunciados da Língua Portuguesa: a sinonímia, a antonímia, a hiponímia, a hiperonímia e a metonímia. A sinonímia ocorre quando as palavras podem apresentam a possi-bilidade de serem substituídas umas pelas outras em um determinado contexto sem acarretar alteração de sentido. A antonímia, por sua vez, diz respeito às palavras que apresentam significados contrários. Através da análise dessas relações lexicais, concluímos que não há sinônimos e antônimos perfeitos, pois se trata de relações construídas (con) tex-tualmente. A hiponímia e a hiperonímia são relações de sentido entre palavras tal que o significado de uma está incluído no significado da outra. E, finalmente a metonímia que é um processo de associação em que um valor semântico de um termo transfere-se a outro.

Autoavaliação

O poema Formas do Nu trabalha com a oposição entre o “vestido” e o “despido” através de uma criteriosa escolha de vocábulos – no que diz respeito ao léxico – de forma a estabelecer as significações que são sugeridas. Assim sendo, faça uma análise do poema explorando os campos lexicais e, consequentemente, mostrando como as relações de sinonímia e antonímia são construídas textualmente.

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FORMAS DO NU

A aranha passa a vidatecendo cortinadoscom o fio que fiade seu cuspe privado.Jamais para velar-se:e por isso são ralos.Para enredar os outrosé que usa os enredados.Ela sabe evitarque a enrede seu trabalho,mesmo se, dela mesma,o trama, autobiográfico.E em muito menos tempoque tomou em tramá-lo,o véu que não a velouaí deixa, abandonado.

2.Somente na metadeé aruá couraçado.Na metade cimento,na laje do telhado.Porque apesar do tetoque o veste pelo alto,o aruá existe nu,nu de pele, esfolado.Sua casa tem tetomas não tem assoalho:cai descalça no mangue,chão também escoriado.E o morador da casase mistura por baixocom a lama já mucosa:bicho e chão penetrados.

3.Que animais prezam o nu quanto o burro e o cavalo(que aliás em Pernambucojamais andam calçados).A sela e a cangalhadeixam-nos sufocadoscomo se respirassem também pelos costados.É vê-los se espojarna escova má do pastoquando lhes tiram o arreioe os soltam no cercado:se espojando, têm todosos gestos se asfixiado:espasmos, estertoresde asmático afogado.

4.O homem é o animalmais vestido e calçado.Primeiro, a pano e feltrose isola do ar abraço.Depois, a pedra e cal,de paredes trajado,se defende do abismohorizontal do espaço.Para evitar a terra,calça nos pés sapatos,nos sapatos, tapetes,e nos tapetes, soalhos.Calça as ruas: e comonão pode todo o mato,para andar nele estendepassadeiras de asfalto.

João Cabral de Melo Neto

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Língua Portuguesa VI I SEAD/UEPB 69

ReferênciasCANÇADO, Márcia. Manual de semântica: noções básicas e exercícios. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008.

CHIERCIA, Gennaro. Semântica. Campinas: Unicamp/Eduel, 2003.

HOUAISS, Antônio. Dicionário eletrônico da língua portuguesa. São Paulo: Objetiva, 2001.

ILARI, Rodolfo; GERALDI, João Wanderley. Semântica. São Paulo: Editora Ática, 1994.

LYONS, John. Linguagem e Linguística: uma introdução. Cambridge University Press,1979

MOURA, Heronides M. de M. Significação e contexto: uma introdução a questões de semântica e pragmática. 2ª. ed. Florianópolis: Insular, 2000.

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V UNIDADE

Semântica e Enunciação

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Apresentação

“A linguagem propõe, de certo modo, formas “va-zias” de que cada locutor se apropria em situação de discurso, e que se relaciona com a sua “pes-soa”, definindo-se ao mesmo tempo como eu e definindo um parceiro como tu.” Benveniste

Nesta unidade trabalharemos a perspectiva teórica da semântica enunciativa, na qual o significado se constrói na e pela linguagem. O que prevalece não é o enunciado ex-plícito, mas o contexto da enunciação, considerando inten-ções e inferências e os enunciadores. A enunciação é o ato de produzir enunciados, que são as realizações linguísticas concretas.

Buscaremos fundamentação nas reflexões acerca da enunciação feitas, principalmente, por estudiosos como: Oswald Ducrot (1987) e Ingedore Villaça Koch (2007). As-sim, desenvolveremos estudos sobre escalas argumentativas, operadores argumentativos e polifonia, entendendo que toda a argumentação centraliza-se na própria linguagem, sendo esta sempre polifônica.

Como nas demais unidades, apresentaremos teorias e trabalharemos atividades que possam envolvê-lo (a) como um (a) efetivo (a) usuário (a) da nossa língua. Lembre-se sempre de que para uma melhor compreensão de nossos estudos é preciso que você realize todas as atividades pro-postas e tire dúvidas quando necessário.

Comecemos, então, mais esta etapa de aprendizagem! Estamos na 5ª unidade, ou seja, mais da metade do cami-nho já foi percorrido. Entusiasmo!!!

Proveitosos estudos!!!

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Objetivos

Ao término desta unidade, esperamos que você:

• Reconheça a importância do estudo da semântica da enuncia-ção para a leitura;

• Identifique o papel dos operadores argumentativos para a ar-gumentação textual;

• Compreenda, a partir do estudo da semântica da enunciação, o significado e o sentido como aspectos fundamentais para os estudos da linguagem.

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Um pouco de contextualização

Iniciando, vamos relembrar nossos estudos sobre Saussure feitos em módulos anteriores. Saussure considerado o pai da ciência da lingua-gem como a conhecemos modernamente, em seu Curso de Linguísti-ca Geral (1916), constitui, como objeto de estudo, a língua enquanto oposição à fala. Nessa percepção, a língua é um sistema composto por signos que se interrelacionam e que se definem nessa interrelação: um signo é o que outro não é e se estabelece e se fundamenta sozinho, sem precisar recorrer a nada exterior a ele. Assim, tudo o que está fora des-se sistema, ou seja, o sujeito, a história, o referente e o mundo, estão no domínio da fala, não mais da língua.

Isso fica fortemente fundamentado no seu Curso: considerando o signo como formado por uma parte significado e uma parte significan-te, Saussure inclui a significação dentro do sistema, não considerando uma relação com o mundo, mas dentro da própria língua.

A incorporação do falante nos estudos semânticos se deu, principal-mente, pelos estudos de Émile Benveniste, que desenvolveu uma teoria linguística voltada para a enunciação. Por ser um estruturalista, sua teoria não poderia deixar de passar pela ideia saussureana de língua como sistema, no entanto, Benveniste faz a diferença desenvolvendo um modelo teórico que assume que a estrutura da língua e o sujeito que acessa essa estrutura estão relacionados.

A inclusão da enunciação nos estudos linguísticos

De acordo com Benveniste (1989) a enunciação é uma realização individual em que o sujeito, ao apropriar-se da língua, garante sua posição de locutor. Para ele, sem alguém que acesse esse sistema, a língua não é língua de fato: é apenas uma possibilidade não realizada.

Assim, a enunciação é a língua sendo posta em uso em um ato individual de utilização, podemos perceber que Benveniste estabelece uma diferença entre língua e enunciação. A língua é um sistema que funciona quando é posto em funcionamento, ou seja, na enunciação. Além disso, só existe uma enunciação quando há um locutor e um co-locutor, isto é, um alocutário (quem recebe a mensagem), que vai junto com ele produzir sentido para o enunciado. Para Benveniste, isso esta-belece uma certa relação com o mundo, porque enquanto o locutor se apropria da língua para referir ao mundo, o colocutor pode correferir da mesma forma. Essa referência, entretanto, possui um centro interno

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ao falante porque, ao se apropriar da língua, o locutor introduz aquele que fala (ele próprio) na sua fala, criando um centro de referência in-terno. Não se trata de referir o mundo, então, mas de referir o tempo, o espaço e o locutor.

Dessa forma, mesmo quando não está explicitado, o enunciado é marcado pela subjetividade do sujeito. Isso se dá, por exemplo, com as formas verbais, sempre produzidas a partir do “centro da enunciação”, ou seja, são formas verbais que possuem um referente dentro do dis-curso. Assim, “agora” e verbos no presente significam “o momento em que o enunciador fala”, “ontem” e verbos no passado significam “antes da enunciação” e verbos e advérbios de futuro significam “depois da enunciação”.

Da mesma forma que Benveniste, Bakhtin (1992) defende com vee-mência a importância do enunciado, dizendo que ignorar sua natureza e suas características em qualquer análise de discurso significa enfra-quecer o vínculo que existe entre língua e vida. Para Bakhtin (op.cit.), a questão maior está em definir o que de fato na língua vem do uso corrente - social - e o que nela vem do indivíduo. Por isso, ele destaca a importância do estudo da natureza do enunciado e da diversidade dos gêneros do discurso. “O estudo do enunciado, em sua qualidade de unidade real da comunicação verbal, também deve permitir com-preender melhor a natureza das unidades da língua (como sistema): as palavras e as orações” (p. 287).

Segundo a visão bakhtiniana, a vida social é definidora na constru-ção dos significados. Nesse sentido, a palavra tem importante papel, pois, para ele, é por meio da palavra, que nos definimos em relação ao outro, ou seja, em uma análise mais aguçada, nos definimos em rela-ção à coletividade. Vejamos como o autor refere-se ao termo palavra, enfatizando o papel que ela exerce nas transformações sociais:

As palavras são tecidas a partir de uma multidão de fios ideológicos e servem de trama a todas as rela-ções sociais em todos os domínios [...] a palavra é capaz de registrar as fases transitórias mais intimas, mais efêmeras das mudanças sociais. (BAKHTIN, 1981, p.41)

Assim, a palavra deixa e ser um item no dicionário e passa a ser parte constituinte das mais diversas enunciações de diferentes locutores em situações específicas. Ao prosseguir suas reflexões sobre a impor-tância da palavra, Bakhtin afirma que:

Na realidade, não são as palavras o que pronun-ciamos ou escutamos, mas verdades ou mentiras, coisas boas ou coisas más, importantes ou triviais, agradáveis ou desagradáveis etc. A palavra está sempre carregada de um conteúdo ou de um senti-do ideológico ou vivencial. (BAKHTIN, 1981, p. 95)

De acordo com essa concepção, a palavra sempre provém de al-guém e dirige-se a alguém, carregada de significado, seja ideológico, seja de vida. Por isso, para Bakhtin, a enunciação é um produto da

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76 SEAD/UEPB I Língua Portuguesa VI

interação de dois ou mais sujeitos, pelo qual o locutor se institui na in-teração viva com vozes sociais. Desse modo temos a língua na concep-ção interacional que parte de um diálogo entre o eu e o outro, entre os muitos eus e os muitos outros. Assim, a enunciação é intrinsecamente dialógica: o eu se estabelece pelo reconhecimento do tu, e esse reco-nhecimento se dá pelo reconhecimento do outro.

A Semântica da Enunciação conceitua a enunciação como uma relação do locutor com a língua, que se apropria dela colocando-a em funcionamento. Trata-se de um sujeito capaz de apropriar-se dela e fazê-la significar

Segundo Oswald Ducrot (1980), a enunciação, é o fato, é aquilo que constitui o surgimento de um enunciado num determinado tempo e espaço. O autor salienta que “o sentido do enunciado é, [...] uma descrição, uma representação que ele traz de sua enunciação, uma imagem do acontecimento histórico constituído pelo aparecimento do enunciado”. Nesse sentido, Ducrot propõe um modelo de semântica que considera a argumentatividade como algo inscrito na própria lín-gua: não falamos sobre o mundo, falamos para construir o mundo e a partir dele tentar convencer nosso interlocutor da nossa verdade. Portanto, as relações estabelecem-se em suas funções argumentativas, ou seja, leva o interlocutor a uma determinada conclusão ou a desviar--se dela.

Assim, nessa perspectiva da semântica argumentativa, Ducrot de-senvolveu estudos sobre escalas argumentativas, operadores argumen-tativos e polifonia. Tópicos que veremos a seguir.

Antes de prosseguirmos, que tal praticar um pouco?

Atividade I

1. Explique com suas palavras o que você assimilou sobre a diferença entre língua e enunciação. Explicite sua resposta a partir da noção desenvolvida por Saussure e por Benveniste.

2. Considerando que a enunciação é intrinsecamente dialógica (o eu se estabelece pelo reconhecimento do tu), analise a crônica abaixo comentando como o locutor “exige” o leitor para dividir com ele o sentimento que enuncia e como isso é revelado a partir das escolhas linguísticas.

A crônica que trazemos, em seguida, foi escrita para ser publicada no Jornal Zero Hora no dia seguinte ao jogo de Brasil e Holanda, realizado em 2 de julho de 2010. O jogo, que decidiria a grande final da Copa do Mundo de 2010.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Precisava o segundo tempo?

Velho truque jornalístico. Para ganhar tempo, escrever duas crô-nicas antes do jogo: por que ganhamos e por que perdemos.

Quando os dois times saíram para o intervalo ontem, comecei a redigir mentalmente a minha “por que ganhamos”. Ia começar inventando um incidente nos bastidores, Robben chegando no ves-tiário holandês reclamando da marcação do Michel Bastos, que não o largava um minuto - e o Michel Bastos chegando atrás dele.

Eu não tinha a menor dúvida de que venceríamos o jogo. Infe-lizmente, depois do intervalo houve o segundo tempo, que destruiu as pretensões do Brasil e a minha crônica. Uma das coisas que mudaram no segundo tempo foi que o Michel Bastos, constrangido por um cartão amarelo, teve que descolar do melhor jogador ho-landês para não ser expulso. Outra foi que não apareceu ninguém para ajudá-lo a conter o lado direito do ataque holandês, por onde os laranjas chegavam com mais perigo.

Felipe Melo, a aposta do Dunga que menos deu certo, não só fez o gol de empate da Holanda como faltou constantemente ao trabalho, que era ajudar o Michel Bastos naquele lado. E ainda foi expulso e deixou seu time com dez. Quer dizer, nem o Felipe Melo nem nós precisávamos desse segundo tempo.

Um dos paradoxos do futebol moderno é que, quanto mais o conjunto supera o indivíduo, mais ele depende da jogada individu-al. Com defesas compactas marcando em cima e rebatendo tudo, cresce a importância do driblador, do cara que vai pra cima do adversário e abre defesas com seu atrevimento e brilho pessoal.

Nesta seleção se esperava isso do Robinho, que jogou bem, fez gols e passes para gols, mas raras vezes foi o individuo diferente de que o conjunto precisava. Quase sempre suas tentativas de ser o Robinho conhecido, o que ia para cima, falharam.

Contei. Só três dos 23 jogadores da nossa seleção jogam no Brasil, contra nove da seleção holandesa que jogam na Holanda. Era de se esperar que o Brasil levasse vantagem naquelas coisas que uma experiência internacional ensinaria, como manter a cabe-ça fria nas grandes decisões. Não foi o que se viu ontem. O Brasil não teve onde buscar nem a calma nem a sabedoria para mudar o resultado. Perdeu provincianamente.

Luis Fernando Veríssimo

Jornal Zero Hora, 3 de julho de 2010

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A argumentação (na língua)

A Semântica Argumentativa postula uma pragmática integrada à descrição linguística, em que o semântico, o sintático e o pragmático se interligam, de modo que a argumentatividade está inscrita na própria língua, ou seja, a língua é argumentativa na sua essência, no seu modo de existir enquanto tal (DUCROT, 1999). Ducrot (1989, p. 18) explicita esta ideia na seguinte afirmação:

A argumentação pode estar diretamente deter-minada pela frase, e não simplesmente pelo fato de que o enunciado da frase veicula. Neste caso, dir-se-á que a argumentação está na língua, nas frases, que as próprias frases são argumentativas.

Assim, pode-se verificar que inerente à atividade da língua está a atividade argumentativa, o fato de que, toda vez que se fala se argu-menta. O homem, em interação com o seu meio social, necessita cons-tantemente defender pontos de vista, convencer alguém de alguma coi-sa, isto é, argumentar a fim de estabelecer uma comunicação profícua.

Desta forma, podemos dizer que na argumentação, em sentido estrito, qualquer enunciação possui uma função argumentativa, está relacionada a outras enunciações porque direciona sentidos. A dire-ção argumentativa é marcada nos enunciados pelos Operadores Ar-gumentativos, termo de Ducrot, criador da semântica argumentativa, para apontar que alguns elementos da gramática de uma língua ser-vem para indicar a força argumentativa em enunciados e os sentidos para o qual apontam.

É oportuno estabelecermos aqui a diferença entre sentença e enun-ciado. Guimarães (2006) entende por sentença, o tipo de construção linguística, dotada de significado, tomada isoladamente, fora do seu contexto de enunciação. Ou seja, a sentença é a unidade da língua saussureana. Não se trata, portanto, de abrir mão da noção de senten-ça, mas de incorporá-la e suplantá-la. O enunciado, por outro lado, é a sentença tomada dentro de seu contexto, ou seja, ele é o funciona-mento dessa sentença em uma situação de enunciação. Dessa forma, mesmo que uma sentença seja repetida diversas vezes em um mesmo texto, significará coisas diferentes em cada uma dessas vezes, porque será parte de um novo enunciado.

Um enunciado traz consigo uma relação com a pessoa que o enun-ciou. Assim, ele não é mais uma sentença, significando sozinha, mas um acontecimento que tem seu significado dado pela pessoa que falou, de onde, falou, e, além disso, com quem falou. Fora do seu contexto de enunciação, o significado da sentença é apenas parcial.

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A escala argumentativaAo se descrever semanticamente um enunciado, deve-se levar em con-

ta a noção argumentativa a qual está marcada no enunciado. Isso equiva-le a dizer que orientar argumentativamente é apresentar A como sendo o que se considera como devendo fazer o interlocutor concluir C. O que leva à conclusão é o próprio A. Dessa forma, o conteúdo de A é dado como razão para se crer em C. Koch (1997), ao apresentar os estudos de Ducrot, afirma que é a semântica argumentativa quem recupera os elementos gra-maticais como responsáveis pela construção da argumentação do texto.

Ducrot (1981) define a escala argumentativa dando-lhe a noção de classe argumentativa que ocorre quando um conjunto de argumentos que têm a mesma força argumentativa para levar a uma conclusão.

Exemplo: João é o melhor candidato (conclusão R)Argumento 1: tem boa formação em Economia; Argumento 2: tem experiência no cargo; Argumen-to 3: não se envolve em negociatas etc. (todos os argumentos têm o mesmo peso para levar o alocu-tário a concluir R.

De acordo com os argumentos apresentados no exemplo acima, ter boa formação em Economia, além de ter experiência no cargo que ocupa, não se envolvendo em negociatas, são pré-requisitos que levam o alocutário à conclusão de que João seja o melhor candidato.

Na medida em que uma classe argumentativa comporta semelhan-te relação de ordem, Ducrot a denomina escala argumentativa.

Assim, temos uma escala argumentativa em enunciados como:

Ele é um político ambicioso. Quer ser prefeito, go-vernador e até presidente.

Considerando p como argumento a uma conclusão r, pode-se afir-mar que, ocorrendo a presença de vários argumentos, eles se organi-zam numa escala do argumento mais fraco para o mais forte, demons-trada pelo o uso do até. Também essa escala pode ocorrer em direção oposta, do argumento mais forte para o mais fraco, quando se tem a expressão pelo menos.

Esperamos que compareçam o presidente da em-presa, os diretores, ou pelo menos os gerentes.

Considerando que a linguagem é argumentativa, é possível afir-mar, como acredita Ducrot (1981), que ela não é somente informa-cional, ou seja, sua significação depende, também, do uso que se faz dela. Isso significa que o conteúdo semântico dos enunciados pode ser modificado de acordo com as necessidades e intenções comunicativas dos interlocutores. Diante disso, reconhecemos que existem na língua,

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marcas que evidenciam esse uso, ou seja, mecanismos linguísticos que direcionam a argumentatividade do texto chamados de operadores ar-gumentativos.

Os operadores argumentativos são, segundo Ducrot (1981), ele-mentos que estabelecem a relação argumentativa entre os enunciados, pois os orienta para uma determinada conclusão. Têm, por esse mo-tivo, a função de lhes determinar a força argumentativa e a direção para a qual apontam, sendo importantes instrumentos de construção de sentido do texto. Podemos observar que são vários os recursos de que a língua dispõe no sentido da argumentação, o que torna impos-sível delimitar todas as estratégias que podem ser utilizadas durante o que Ducrot chamou de “jogo comunicativo”.

Os operadores argumentativos

Koch (2007), ancorada na teoria de Ducrot, faz um estudo sobre o uso dos operadores argumentativos, demonstrando que a argumen-tação discursiva põe em jogo determinados “dispositivos” existentes na língua, direcionando a conclusão do interlocutor, por exemplo, enun-ciados como: “Ela já está em idade de casar” e “Ela ainda está em idade de casar” nos levam a dois pontos de vista diferentes. No primeiro, podemos entender que “Ela é jovem” ou “Ela acabou de sair da adoles-cência”, ao contrário do segundo, no qual podemos encadear “Apesar de estar velha” ou entendermos que “Ela já é uma mulher madura”.

Dessa forma, os operadores argumentativos transformam os enun-ciados em proposições das quais podemos tirar uma conclusão e não outra, seja de forma implícita ou não, podem ligar duas proposições, uma proposição com a conclusão ou ainda, a conclusão com duas ou mais proposições.

Reiterando o que foi dito, vejamos a afirmação do próprio Ducrot, (1981):

“(...) o valor argumentativo de uma frase não é somente uma consequência das informações por ela trazidas, mas a frase pode comportar diversos morfemas, expressões ou termos que, além de seu conteúdo informativo, servem para dar uma orien-tação argumentativa ao enunciado, a conduzir o destinatário em tal ou qual direção” (p.178).

Ducrot defende essa tese por meio de uma discussão sobre o pa-pel dos operadores argumentativos que, em vista de sua significação, podem ser utilizados para realizar o ato de argumentar. Vejamos, na

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propaganda a seguir, um exemplo de como os operadores direcionam a argumentação:

Bola. Alegria do povo. Quando gira, traz emoção, felicidade. Enche o País de esperança.

Redonda como o mundo, foi achar no Brasil a sua pátria de chuteiras. Adotou-nos porque viu que o nosso povo tem garra. E que, até mesmo uma pelota, ele tra-balha com engenho e arte.

A bola conhece o Brasil. Como nós.

(Agência bancária Bradesco)

O ápice da propaganda ocorre com o uso do operador argumenta-tivo até mesmo, pois o objetivo da persuasão, nesse caso, é levar a crer que, assim como o brasileiro é apaixonado pela bola e esta o conhece intimamente, a agência bancária Bradesco também sabe que o “nosso povo tem garra” e, em tudo, trabalha com engenho e arte, até mesmo uma pelota.

Alguns dos principais operadores argumentativos podem ser carac-terizados como:

• Operadores que somam argumentos a favor de uma mesma conclusão (e, também, ainda, nem (=e não), não só..., mas também, tanto... como, além de... além disso..., a par de... etc.)

Ex: João não possui só um bom currículo na área administrativa, mas também larga experiência com publico.

• Operadores que introduzem uma conclusão a argumentos an-teriores (Portanto, logo, por conseguinte, pois, em decorrência, consequentemente, etc.)

Ex: Estavam todos preocupados com a etapa de elaboração do projeto, portanto buscavam mais informações com os professores.

• Operadores que estabelecem relações de comparação entre elementos (Mais que, menos que, tão... como, etc.)

Ex: As atividades de leitura são tão importantes quanto às de rees-crita para a produção textual.

• Operadores que contrapõem argumentos orientados para con-clusões contrárias (Mas, (porém, contudo, no entanto), embora (ainda que, posto que, apesar de (que), etc.)

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Ex: Estavam animados para o evento, mas não compareceram.

• Operadores que introduzem argumentos alternativos que ge-ram conclusões opostas (Ou, ou então, quer... quer, seja... seja, etc.)

Ex: Podemos viajar ou você vai continuar demorando?

Esses operadores não se esgotam na listagem acima, evidentemen-te há outros tipos que, como esses, fazem parte da gramática da língua. Muitos deles aparecem nas gramáticas tradicionais sob a denominação de palavras denotativas de inclusão, de exclusão, de retificação, etc., porém tais palavras também são responsáveis pela força argumentativa dos nossos textos, sejam eles orais ou escritos.

É o operador argumentativo que estabelece a diferença entre duas frases aparentemente iguais. Após análises de expressões como “pou-co” e “um pouco”, Oliveira, (2001) defende que os enunciados com esses morfemas são sinônimos do ponto de vista factual, porém apre-sentam orientações argumentativas diferentes, como podemos observar na exemplificação abaixo:

a) João comeu pouco. b) João comeu um pouco.

(...) Não seria possível atribuir uma análise formal a essas sentenças porque em termos informativos elas veiculam o mesmo conteúdo: João não comeu mui-to. No entanto, sabemos intuitivamente que elas não são equivalentes, porque não podemos substituir uma pela outra. Ao contrário, há contextos específi-cos para o uso de cada uma dessas formas, o que significa dizer que seus encadeamentos discursivos são distintos. Imaginemos a situação de uma crian-ça que está ameaçada pelo pai: se não comer, não brinca. O pai pergunta para a mãe: “E o Joãozinho, comeu?”. Supondo que a mãe saiba da ameaça, se ela responde com (a) sua fala vai na direção de que ele não comeu: se ele comeu pouco, então ele não comeu. E o coitado do Joãozinho fica sem brincar. Se a mãe responde com (b), sua fala vai na dire-ção de comer: se ele comeu um pouco (um tanto de comida),então ele comeu. E, portanto, ele pode brincar.A hipótese é de que os operadores pouco e um pouco direcionam diferentemente uma mesma es-cala de comer que vai de comer muito a não comer: um pouco direciona a escala no sentido de comer e pouco no de não comer. (OLIVEIRA, 2001, p. 29)

Se a semântica da enunciação analisa sempre em termos de ar-gumentação, então a fala da mãe com “um pouco” vai na direção de comer e, portanto, é um argumento a favor do menino sair para

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brincar,ao passo que com “pouco” a estrutura argumentativa é inversa.

Para refletir...Como já dissemos, não há texto neutro, objetivo, imparcial: os índi-

ces de subjetividade se introjetam no discurso, permitindo que se capte a sua orientação argumentativa.

Koch, (2007)

Atividade II

1. Em termos de valor de verdade, as sentenças a seguir são idênticas. No entanto, do ponto de vista argumentativo, elas se comportam de forma bem diferente. Procure descrever a contribuição de sentido proporcionada pelo “até” nas sentenças:

a) O presidente do Brasil esteve na festa.

b) Até o presidente do Brasil esteve na festa.

2. A partir da análise de “pouco” e “um pouco”, reflita sobre o par:

a) João dormiu um pouco. / b) João dormiu pouco.

3. No gênero notícia é comum encontrarmos textos que se utilizam de estratégias argumentativas para relatar os fatos. Sua atividade será, pois, pesquisar em textos de notícia da mídia impressa operadores argumentativos e comentar seu papel como recursos direcionadores da argumentação.

Não deixe de responder as atividades e quando possível socialize suas respostas no AVA.

Interagindo se aprende melhor!

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Polifonia Muitas vezes, os enunciados que produzimos, tanto na oralidade

quanto na escrita, não constituem ideias novas, mas uma nova manei-ra de dizer aquilo que já nos foi dito. Ducrot (1987), afirma que todo discurso é atravessado por várias vozes. Assim, ele questiona o pres-suposto de que o falante é único e que cada enunciado só pode ser relacionado a um único autor, destacando uma situação de polifonia em que há dois tipos de personagens: os locutores e os enunciadores, sendo os locutores, aqueles que são apresentados no enunciado, e os enunciadores, como os seres cujas vozes estão presentes na enuncia-ção, mas que não são responsáveis pela ocorrência de palavras.

A polifonia se registra num lugar de afirmação do heterogêneo, das várias vozes que são parte integrante dos discursos do projeto de fala do sujeito comunicante que, utilizando-se da cena enunciativa proposta por ele, argumenta, faz com que os atuantes do processo de enuncia-ção movam-se, dando vida aos conteúdos discursivos, através da pa-lavra, esse material privilegiado da comunicação. Dessa forma, Ducrot demonstra que as palavras, organizadoras do discurso, dizem muito mais do que parecem estar dizendo, ou seja, a superfície textual, o que está explícito através das formas linguísticas é um dos componentes da construção do sentido do texto; não é, pois, o único. Desse modo, não existe um discurso que já não seja constitutivamente, permeado, de alguma forma, pelo seu outro. Podemos dizer com Bakhtin (1999) que “a palavra vai à palavra”, ou seja, que em determinados enunciados a argumentação do enunciador é o que realmente se evidencia.

Alguns atos de linguagem permitem observar, de forma clara, a pre-sença de uma pluralidade de sujeitos responsáveis por um enunciado. Assim, um enunciado, de um discurso qualquer, fala muito mais do que parece estar falando. Porém, o que está explícito por meio das formas linguísticas é apenas um dos componentes da construção do sentido. Você deve estar pensando: como estas múltiplas vozes aparecem nos textos? Vejamos um exemplo:

Embora não goste de carne vermelha, Maria frequenta churrascarias.

Podemos perceber que há nessa frase dois “fragmentos”: o primeiro diz “Maria não gosta de carne vermelha” e o segundo “frequenta chur-rascarias”. Esses dois “fragmentos” seriam, a princípio, contraditórios entre si, mas podem ser colocados em uma mesma frase graças ao fun-cionamento da conjunção ‘embora’. A esses dois fragmentos, chama-mos “vozes enunciativas”, ou seja, vêm de “enunciadores” diferentes. Isso não significa que são duas pessoas afirmando coisas diferentes, mas que na mesma frase podemos ter dois “pontos de vista” incorpo-rados no discurso da mesma pessoa. Assim é a “polifonia”. Além do embora, existem outras conjunções que possuem esse funcionamento, como, o mas, o entretanto, e, no entanto, por exemplo.

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A seguir, observemos mais um caso da presença de outra voz no texto:

João não é um traidor. Pelo contrário, tem-se mos-trado um bom amigo.

Como sabemos a expressão pelo contrário deveria exercer a fun-ção de ligar ideias opostas, não é o que acontece de forma explícita, pois as expressões em destaque não são contraditórias. Nesse caso, a expressão pelo contrário ecoa vozes implicitamente que afirmam que João é um traidor e um bom amigo. Assim, a expressão pelo contrário é um índice da presença de outra voz no texto, ou seja, de que o texto é polifônico.

Nesse sentido, a teoria polifônica da enunciação desenvolvida por Ducrot, revela-se como uma atitude de contestação de um sujeito úni-co. É essencial do sujeito falante estar em relação constante com outro. Para mostrar as diversas vozes que compõem os enunciados, Ducrot contempla duas ideias básicas. Uma, que atribui à enunciação um ou mais sujeitos que seria sua origem, outra, que vê a necessidade de diferenciar entre os vários sujeitos falantes duas categorias de persona-gens: os locutores e os enunciadores. - Locutor: responsável pelo enun-ciado. / Enunciadores: encenações de pontos de vista, de perspectivas diferentes no interior do enunciado.

Utilizada nos enunciados em que várias “vozes” são percebidas si-multaneamente, a polifonia comumente pode ser encontrada na lin-guagem publicitária, assim como em outros diversos tipos de discurso que circulam socialmente.

No anúncio da Semp Toshiba, apresentado abaixo, por exemplo, podemos notar a presença de polifonia no slogan da marca que ao uti-lizar o pronome “nosso”, já indica a presença de duas ou mais pessoas envolvidas no discurso. Com o termo “nosso” já se subentende que quem está falando tanto pode ser o leitor como o fornecedor do produ-to. Nosso negócio é diversão pode ser interpretado tanto do ponto de vista do leitor como do fornecedor.

Slogan: nosso negócio é diversão

No exemplo seguinte (propaganda de um Outdoor), podemos de-tectar a presença da polifonia através de um operador argumentativo.

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Em seu texto – “Aceitam-se usados... mas com amor” – verifica-se a presença do mas introduzindo um argumento definitivo e que faz uma espécie de ressalva a primeira parte do enunciado.

Podemos ver que a propaganda foi criada para obter doações de córneas, ou, como se diz popularmente, doação de olhos. Para isso, aproveita um enunciado bastante comum em anúncios de classificados, Aceitam-se usados – e em seguida coloca o argumento contrário, que opera no aspecto emocional do público alvo - ... mas com amor – para obter efeito persuasivo. Mais uma vez, é como se pudéssemos enxergar dois enunciadores: um responsável pela primeira parte do enunciado; e um segundo, responsável pela segunda parte, que contraria a primeira.

Encerremos este tópico refletindo com Koch (1998) acerca do ca-ráter polifônico dos textos. “A noção de polifonia (...) pode ser definida como a incorporação que o locutor faz ao seu discurso de asserções atribuídas a outros enunciadores ou personagens discursivos – ao(s) interlocutores, a terceiros ou à opinião pública em geral.”

Atividade III

É possível notarmos a presença da polifonia nas peças publicitárias que geralmente apresentam textos curtos e atraentes para persuadir o leitor, mas de forma breve, com informação concisa. Sua atividade é, pois, procurar em textos publicitários enunciados polifônicos e fazer um comentário expondo seu entendimento sobre o efeito da polifonia naquele texto.

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Leituras recomendadas

A Inter-ação Pela Lin-guagem aborda a lin-guagem como lugar de interação dos membros de uma sociedade levan-do ao estabelecimento de vínculos e compromissos e estuda sequencias tex-

tuais ou textos inteiros, descrevendo e explicando a capacidade do ser humano de interagir socialmente por meio de uma língua, das mais diversas formas e com os mais variados resultados.

Esta obra apresenta, a todos os interessados, textos de introdução a um conjunto fundamental de disci-plinas das ciências da linguagem: Fonologia, fonética, morfologia, sintaxe, semântica, pragmática, le-xicologia e lexicografia.

Apresenta, de forma leve e objetiva, as teorias que são a base da pesquisa linguística. Pensadores consagrados, como Charles Bally, Émile Benveniste e Mikhail Bakhtin, entre outros, têm suas ideias analisadas de modo

comparativo, com a preocupação de formular um modelo de Linguís-tica da enunciação.

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Resumo

Estudamos a semântica da enunciação buscando estabelecer a di-ferença entre sentença e enunciado. Por sentença, entende-se o tipo de construção linguística, dotada de significado, tomada isoladamente, fora do seu contexto de enunciação. O enunciado, por outro lado, é a sentença tomada dentro de seu contexto, ou seja, ele é o funcionamen-to dessa sentença em uma situação de enunciação. Considerando que a linguagem é argumentativa, é possível afirmar que sua significação depende, também, do uso que se faz dela. Isso significa que o conte-údo dos enunciados pode ser modificado de acordo com as intenções comunicativas dos interlocutores. Observamos as marcas que eviden-ciam esse uso, os chamados operadores argumentativos - elementos que estabelecem a relação argumentativa entre os enunciados. Por fim, tratamos da polifonia que se registra num lugar de afirmação do hete-rogêneo, das várias vozes que são parte integrante dos discursos.

Autoavaliação

Este é o momento em que você deverá avaliar se seu aprendizado se deu a contento. Portanto, a proposta de autoavaliação que sugerimos deve ser realizada com bastante segurança. Se surgirem dúvidas, retome as leituras, discuta com o professor e com os colegas, de modo que se sinta preparado para realizar a atividade abaixo:

Faça uma análise da argumentação presente no texto “Apelo” identificando os operadores argumentativos que são responsáveis pela força argumentativa do mesmo.

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APELO

Amanhã faz um mês que a senhora está longe de casa. Primei-ros dias, para dizer a verdade, não senti falta, bom chegar tarde, esquecido na conversa da esquina. Não foi ausência por uma se-mana: o batom ainda no lenço, o prato na mesa por engano, a imagem de relance no espelho.

Com os dias, Senhora, o leite de primeira vez coalhou. A notícia de sua perda veio aos poucos: a pilha de jornais ali no chão, nin-guém os guardou debaixo da escada. Toda a casa era um corredor deserto, e até o canário ficou mudo. Para não dar parte de fraco, ah, Senhora, fui beber com os amigos. Uma hora da noite eles iam e eu ficava só, sem o perdão de sua presença a todas as aflições do dia, como a última luz na varanda.

E comecei a sentir falta das pequenas brigas por causa do tem-pero da salada – meu jeito de querer bem. Acaso é saudade, Se-nhora? Às suas violetas, na janela, não lhes poupei água e elas murcham. Não tenho botão na camisa, calço a meia furada. Que fim levou o saca-rolha? Nenhum de nós sabe, sem a Senhora, con-versar com os outros: bocas raivosas mastigando. Venha para casa, Senhora, por favor.

Dalton Trevisan

Não esqueça de socializar suas respostas no AVA. Interagindo se aprende melhor!

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Referências

BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e Filosofia da Linguagem. São Paulo: Hucitec, 2.ed., 1981.

BENVENISTE, Émile. Problemas de linguística geral. v.2 Campinas: Pontes, 1989.

DUCROT, Oswald. Dizer e não dizer. Princípios de semântica linguística. Trad. de Eduardo Guimarães, Campinas, São Paulo: Pontes, 1987.

______________. Os Topoi na Teoria da Argumentação na Língua. In: Revista Brasileira de Letras, 1999, v.1, n.1.

FLORES, Valdir N. e TEIXEIRA, Marlene. Introdução à Linguística da Enunciação. São Paulo: Contexto, 2005.

GUIMARÃES, Eduardo. Semântica e Pragmática, In: GUIMARÃES, E.; ZOPPI-FONTANA, M. Introdução às Ciências da Linguagem: a palavra e a frase. Campinas: Pontes, 2006.

___________________. Texto e Argumentação: Um estudo das conjunções do Português. 4ª edição Campinas, São Paulo: Pontes, 2007.

KOCH, Ingedore G. Villaça. A Inter-ação pela linguagem. São Paulo: Contexto, 2007.

______________________.O texto e a construção dos sentidos. 2 ed., São Paulo, Contexto, 1998.

OLIVEIRA, R. P. Semântica. In: MUSSALIM, F. BENTES, A. C. (orgs.). Introdução à Linguística: domínios e fronteiras. São Paulo: Cortez, 2001. v. 2. p. 27-33.

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VI UNIDADE

Semântica e pragmática I

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Apresentação“Não se indague qual é o significado de uma pala-vra: indague-se qual é o seu uso.”

Wittgenstein

Continuaremos trabalhando com nosso objeto de estudo – a significação, o sentido da linguagem - e, especificamen-te, nesta unidade, temos como proposta levantar reflexões acerca da relação entre Semântica e Pragmática. Para isso, abordaremos alguns fenômenos típicos da linguagem hu-mana em cujo tratamento a situação de enunciação precisa ser tomada como o ponto de partida para a análise.

Estudaremos fenômenos linguísticos como a dêixis, a anáfora e as implicaturas conversacionais assumindo a po-sição de que o tratamento do significado, em um sentido mais amplo, deve ser determinado pelo estudo da semântica e pelo estudo da pragmática.

Como forma de compreender bem mais esse novo tópico da Semântica, é importante que você continue interagindo com o material, ampliando suas pesquisas a partir das leitu-ras recomendadas buscando, assim, as relações necessárias para o entendimento do conteúdo.

Está aí o convite para juntos trilharmos mais este cami-nho de aprendizagem!

Proveitosos estudos!!!

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Objetivos

Ao término desta unidade, esperamos que você:

• Entenda a estreita relação que há entre a Semântica e a Prag-mática;

• Diferencie o fenômeno da dêixis do fenômeno da anáfora;

• Identifique a noção de implicatura como uma das ideias da pragmática que é determinada por princípios básicos do ato comunicativo.

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Um pouco de contextualização...

A Semântica não é a única área da linguística que estuda o sig-nificado, ela está extremamente entrelaçada com o estudo de outros processos cognitivos,além dos processos especificamente linguísticos. Segundo Cançado (2008, p. 16) parece bem provável que certos as-pectos do significado encontrem-se fora do estudo de uma teoria se-mântica. Vejamos o seguinte exemplo:

A - Você quer um milhão de dólares sem fazer nada?

B - Não!!! (responde o interlocutor, com uma entonação e uma ex-pressão facial que significam: claro que quero!)

O que faz com que um falante de português interprete a sentença B são fatores extralinguísticos, pois baseando-nos somente no sistema linguístico o item lexical não levaria a uma interpretação oposta a que todos nós provavelmente entendemos.

Para Cançado (op.cit.),

fica claro que nem sempre o sistema semântico e o único responsável pelo significado; ao contrá-rio, em várias situações, o sistema semântico tem o seu significado alterado por outros sistemas cog-nitivos para uma compreensão final do significa-do. Por exemplo, vem sendo explorado por alguns estudiosos que alguns aspectos do significado são explicados em termos de teorias da ação, ou seja, dentro do domínio de uma teoria da pragmática. (2008, p. 17)

Podemos perceber que, para a autora, a semântica precisa dar con-ta de fenômenos além dos estudados pela semântica formal. Por isso, para ela, é necessário trazer à tona a preocupação com as realizações dos falantes e com os processos pelos quais combinamos palavras e produzimos significados. Podemos, grosso modo, dizer que a semântica está associada ao estudo do valor de verdade das sentenças e a prag-mática está associada ao estudo do significado da linguagem, inserida em contextos específicos.

Vamos considerar, agora, a seguinte sentença: A porta está aberta. (Já mencionada, inclusive na nossa 2ª unidade) Qual é o conceito que forma-mos quando ouvimos uma sentença como essa, fora de contexto? Em ter-mos bem intuitivos, formamos o conceito de um objeto físico que serve para marcar o ponto de entrada ou saída de uma sala, e o de que esse objeto físi-co não está obstruindo nem a entrada, nem a saída de ninguém dessa sala.

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Entretanto, se usamos a sentença em diferentes contextos, ela pode adquirir diferentes significados. Vejamos:

• Professor dando aula e passa ex-aluno pela porta da sala: O professor diz: A porta está aberta! Essa sentença, nesse contex-to, é um convite para que o aluno entre.

• Professor dando aula e um aluno atrapalha sua aula. (você nunca viu isso, não é?). O professor diz: A porta está aberta. Já nesse diferente contexto, a mesma sentença quer dizer que o aluno se retire da sala.

• Professor em um discurso de formatura de curso, diz: A porta está aberta! Nesse contexto, a sentença pode dizer que os alu-nos tem muitas possibilidades pela frente, etc.

Entender o que o professor falou em cada contexto específico pare-ce envolver dois tipos de conhecimento: Por um lado, devemos entender o que o professor falou explicitamente, o que a sentença em português a porta está aberta significa, referente ao conhecimento da expressão fora de contextos de uso como fizemos no primeiro momento do exem-plo. Por outro lado, não conseguiríamos entender o que o professor falou, se não entendêssemos também qual era a intenção dele ao falar aquela expressão nas diferentes situações de uso como fizemos quando apresentamos os três contextos de usos da sentença; a esse tipo de conhecimento, chamamos de pragmática. A pragmática estuda os usos situados da língua e lida com certos tipos de efeitos intencionais.

Embora a divisão entre semântica e pragmática nem sempre seja tão clara e nem sempre consigamos precisar o que está no terreno de uma e no terreno da outra, uma maneira mais segura de separar a semântica da pragmática é através da noção de intenção do falante: a pragmática busca reconstruir o que o falante quis dizer ao proferir uma sentença, qual era a sua intenção comunicativa, isto é, o falante quer que o ouvinte perceba sua intenção ao proferir uma dada sentença, o que o levou a dizer o que disse.

Já podemos notar que as relações entre semântica e pragmática são bastante estreitas,não é?

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O que é pragmática? O que é semântica? Qual a fronteira entre ambas?

De acordo com uma visão mais tradicional, a Pragmática pode ser entendida como a ciência do uso linguístico e a Semântica tenta descrever o significado das palavras e das sentenças (OLIVEIRA, 2003, p 17). De maneira geral, a Semântica é entendida como a ciência que estuda a significação (ILARI & GERALDI, 1994, p.5). Quase sempre a fronteira entre ambas é delineada a partir da ideia do contexto. Isto é, a significação que independe do contexto é colocada no campo da semântica, e a significação contextualmente dependente é colocada no campo da pragmática. Porém, pensando na perspectiva semântica, argumenta-se que se deve “[...] tomar cuidado com essa definição por-que a interpretação do sentido da sentença requer levar em considera-ção o contexto, a situação de fala” (OLIVEIRA, 2012, p.5)

Por exemplo: Eu estou feliz significa que o falante no momento em que enuncia essa sentença está num estado de felicidade. Dessa forma, segundo Oliveira (2006,p.5), em determinado momento, essa senten-ça poderá ser verdadeira para um falante, mas poderá ser falsa para um outro falante.Ou então, essa sentença, em determinado momento, poderá ser verdadeira para um falante e, em outro momento, pode-rá ser falsa para esse mesmo falante. Sem levar em conta o contexto é complicado estabelecer, no caso, completamente o significado da sentença Eu estou feliz e da grande maioria das sentenças da língua natural.Assim, tanto a Semântica quanto a Pragmática estão ligadas ao contexto,porém com metas diferentes.

De acordo com Oliveira, 2012, p.7, esses dois campos: Semântica e Pragmática, inicialmente, podem ser assim separados:

Semântica → Significado da sentença (SS), o que a sentença diz;

Pragmática → Significado do falante (SF), o que o falante quer dizer com a sentença que ele profere.

Para entendermos um pouco melhor essa diferenciação, considere-mos a seguinte situação apresentada por Chiercia, 2003, p. 44.

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Uma sentença qualquer, como O cachorro está no jardim pode ser usada para realizar as ações mais variadas, [...] basta imaginar que essa sentença ocorra nos seguintes contextos: a) Você é meu empregado e está incumbido de im-pedir que o cachorro vá para o jardim. (Equivalente funcional: Tire o cachorro do jardim!)b) Eu tenho medo de cachorro. Estou vendo no jardim o perigoso cachorro dos vizinhos e sei que você sabe mandá-lo embora. (Equivalente funcio-nal: Socorro!)c) Teu pai era meu empregado doméstico e de vez em quando levava meu cachorro para passear. Você ficou rico e veio me ver. Eu o vejo chegar em seu Porsche novo,o recebo com ar indiferente e digo: “O cachorro está no jardim”(Equivalente fun-cional: Você não passa de um empregado.)d) Queremos roubar uma casa. Eu pergunto o que faremos se o cachorro estiver no jardim, e você me responde: “Na hora, a gente dá um jeito.” Pulamos para dentro do jardim e, naturalmente, o dober-mann corre na nossa direção. Eu digo “O cachorro está o jardim” e você me responde: “sobe naquela árvore”. (Equivalente funcional: O que faço ago-ra?).

No exemplo acima, a sentença apresenta diversas interpretações pragmáticas. Para entendê-las, o falante precisa de outras informações além daquelas oriundas de sentença – o significado da sentença –, como, por exemplo, o contexto, as intenções, o uso, etc. Assim, a ideia é que a pragmática precisa do significado da sentença, aliado as inten-ções do falante no momento de proferimento da sentença.

Dessa forma, a Pragmática tenta reconstruir o que o falante preten-de dizer ao enunciar uma sentença, ou melhor, a pragmática pretende reconstruir qual a intenção comunicativa do falante ao enunciar uma dada sentença. Em outras palavras, o falante deseja que o ouvinte en-tenda/note sua intenção ao enunciar uma dada sentença. Já a Semân-tica pretende reconstruir o sentido de uma frase.

Atividade I1. Crie um exemplo em que o sentido da sentença não coincide com o sentido do falante. Explique o mais detalhadamente que você conseguir a passagem do SS para o SF.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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2. A sentença: (a) João casou e teve filhos.

Veicula uma ordem nos eventos: primeiro João casou e depois teve filhos. Compare com:

(b) João teve filhos e casou.

Em qual há uma inversão na ordem dos eventos. Você diria que esse significado – a inversão – é semântico ou pragmático? Explique com base no que foi apresentado.

3. Na época da AIDS, imediatamente antes do carnaval, uma ONG levou sua campanha para frente do Congresso Nacional, com o intuito de sensibilizar deputados e senadores sobre a necessidade do uso de camisinhas. Os agentes da campanha entregavam camisinhas aos parlamentares. Ao notar a aproximação de uma agente, um parlamentar disse: - Sou casado!

O que ele quis dizer? Qual sua intenção com essa fala? Justifique a sua resposta

Significado e uso (pragmática)

Ao se estudar o significado no uso linguístico, está-se, como diz Pinto (2000, p.48), apostando “nos estudos da linguagem, levando em conta também a fala, e nunca nos estudos da língua isolada de sua produção social”.

A conversação é o lugar por excelência de onde saem os exemplos de significações dependentes do contexto e das condições de uso da língua. Além dos exemplos dados no tópico anterior, quando diferen-ciamos a semântica da pragmática, vejamos o exemplo abaixo, tratado primeiramente por Grice (1989) como uma implicatura conversacional, tema que trataremos adiante com mais ênfase.

Enunciado – João: “Bateram no meu carro.”

Implicatura: o carro de João não foi totalmente destruído.

A partir do enunciado de João, pelo conhecimento que temos quanto

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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à maneira como os participantes de uma conversação se comportam, podemos inferir não apenas o que ele diz – que alguém bateu em seu carro -, mas também que o carro não foi completamente destruído, pois, caso o tivesse sido, João teria dito. Assim, o significado compreendido a partir da sentença que João enuncia é muito mais amplo do que apenas o significado dependente das condições de verdade dessa sentença, é um significado retirado do contexto da conversação, que inclui o conhe-cimento partilhado entre falante e ouvinte.

Um outro exemplo de significado retirado de características da situa-ção de fala é o significado de palavras que fazem referência explícita ao aqui e agora da conversação. Por exemplo, suponhamos uma situação em que Maria está numa loja escolhendo um vestido e, apontando para um azul que ela acabou de experimentar, diz: Fico com este.

A falante está se baseando em algumas características óbvias da si-tuação:

• o momento presente leva ao uso do verbo no presente do indica-tivo, que expressa a ação transcorrida num momento simultâneo ao momento da fala;

• a pessoa que fala é a própria Maria, por isso o uso do verbo na primeira pessoa do singular, que serve para fazer referência ao indivíduo que, na situação de fala, assume o papel de locutor;

• o objeto presente do qual se fala, o vestido, leva ao uso do de-monstrativo “este”, com papel de identificar algum objeto presen-te na situação de fala, como um dos assuntos a que a interação verbal diz respeito.

Em outras palavras, somente em relação ao contexto imediato da si-tuação de fala é que podemos compreender o significado da fala de Ma-ria, pois, sem ele, não teríamos como saber quem fica com o quê. Mais um caso de significado baseado no uso linguístico, em que se vai muito além do significado dependente das condições de verdade da sentença.

O presente do indicativo, a primeira e a segunda pessoas do verbo, os demonstrativos são algumas expressões que permitem identificar pes-soas, coisas, momentos e lugares a partir da situação de fala. Tomando o demonstrativo (por exemplo, este) como o exemplo mais típico desse fenômeno, e lembrando que o demonstrativo vem idealmente acompa-nhado de um gesto de apontar, a linguística chama essas palavras de dêiticos, ou seja, “palavras que mostram”. Os dêiticos realizam o fenô-meno da dêixis (ato de mostrar), que é dos traços que distinguem a lin-guagem humana das linguagens artificiais, tornando-a apropriada para o uso em situações correntes.

São elementos cujas interpretações dependem de informações con-textuais, embora exista um caráter sistemático para a interpretação des-ses elementos. Vejamos os seguintes exemplos1:

1 Exemplos adaptados de Cançado, (2008, p.18)

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I - Este gato é muito bonito.

II - Eu adoro chocolate.

III- Aqui é o país da impunidade.

IV - Aquele ali, eu levo.

Nos exemplos acima temos expressões que só podemos entender, se nos remetermos ao contexto de fala. Em I, o falante tem que apontar o gato no mundo, para que o ouvinte encontre a que gato ele se refere; em II, o ouvinte tem que localizar o indivíduo que fala, para saber a quem a palavra eu se refere; em III, o ouvinte tem que saber onde o falante está situado, para identificar sobre qual país ele fala; em IV , só o apontamento leva o ouvinte a identificar qual é o objeto a ser levado. Portanto, dependemos do contexto para encontrar os referentes desses elementos. De acordo com Ilari & Geraldi (1994), podemos entender que o sentido dos dêiticos é um certo “roteiro para encontrar referen-tes”. É uma espécie de “ancoragem” da fala na realidade.

Continuando, vamos distinguir agora o fenômeno da anáfora do fenômeno da dêixis. A anáfora também consiste em identificar objetos, pessoas, momentos, lugares e ações, entretanto, isso se dá por uma referência a outros objetos, pessoas etc., anteriormente mencionados no discurso ou na sentença.

Dizemos que as expressões são interpretadas anaforicamente, quando sua interpretação é derivada da expressão antecedente, as-sim, as expressões anafóricas servem tipicamente para “retomar” outras passagens de um texto. Um exemplo típico é o demonstrativo isso em frases como “a gasolina subiu de novo, e isso vai gerar outros aumen-tos de preços”; nesse contexto, ficamos sabendo que a palavra isso faz referência ao aumento da gasolina, olhando para o texto que precede.

Atividade II

1. Podemos falar sobre dois tipos de significado em relação ao advérbio “hoje”, aquele que ignora o contexto de uso e o que depende deste contexto. Quais seriam as duas análises?Explique-as.

2. Explique esta tira, mostrando que o desentendimento de Hagar e Eddie Sortudo resulta interpretações diferentes dadas à palavra aqui.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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HAGAR (Dik Brown)

3. Todas as frases que seguem foram copiadas de para-choques de caminhões, portanto foram escritas para ser lidas pelos passageiros de outros veículos, na estrada. Tente dizer a quem fazem referência os pronomes grifados3:

a) “Mulher feia e frete barato eu não carrego”

b) “Eu sou imortal, pois não tenho onde cair morto”

c) “Se você tem olho gordo, use colírio Diet”

d) “Muitos me seguem, mas um só me acompanha”

e) “Respeite o meu trabalho, respeitarei o seu passeio”

f) “Não me acompanhe que não sou novela”

Implicaturas conversacionais

A noção de implicatura é uma das ideias mais importantes da prag-mática. Primeiramente, pode-se demonstrar que a origem dessa es-pécie de inferência pragmática se encontra fora da organização da língua, em princípios gerais da interação cooperativa, entretanto, esses princípios têm um efeito visível em vários pontos da estrutura da língua.

Um segundo ponto é o fato de que a implicatura dá uma explica-ção até certo ponto explícita de como é possível “dizer mais do que é efetivamente dito”.

3 Atividade coletada de Ilari, 2010, p.62.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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102 SEAD/UEPB I Língua Portuguesa VI

Vejamos os exemplos abaixo:

(1) A - Professor, parece que eu vou ser reprovado!?

B - Parece? Você já viu suas notas?

(2) A - Você aceita um sorvete?

B - Estou ficando gorda.

Nas situações (1) e (2) há a necessidade de o ouvinte construir im-plicaturas para manter o significado do dito. No (1) o professor não res-ponde a pergunta de seu aluno, mas o faz uma outra pergunta, o que leva esse aluno a implicar que suas notas estão tão ruins que ele não parece estar reprovado, mas já está reprovado. Da mesma forma, na situação (2), A pergunta "Você quer um sorvete?", à resposta conven-cional bastaria um sim ou não, no entanto a resposta foge do conven-cional "Estou ficando gorda" e leva A a implicar que B está cooperando com o princípio de comunicação e que sua resposta na verdade, é uma negativa à pergunta feita.

O que esses exemplos nos mostram é que o que está sendo comu-nicado é muito mais do que uma interpretação semântica poderia nos fornecer. Essa lacuna entre o que é dito e o que está sendo comunicado efetivamente é preenchida pela noção de implicatura.

As Máximas de Grice Grice (1975, 1978 apud Cançado, 2008) afirma que as implicatu-

ras conversacionais podem ser previstas por um princípio de coopera-ção entre os falantes: o princípio cooperativo.

Esse princípio, aplicado em situações de comunicação bem es-pecíficas, tem regras que explicita o acordo mútuo existente entre os participantes de uma conversação. É a cooperação entre falantes e ouvintes. Para o autor, os participantes de uma conversação sempre serão cooperativos no sentido de que a sua contribuição para aquela conversação seja adequada aos objetivos da mesma. Trata-se de um princípio bastante simples e que pode ser entendido como um princípio de economia ou de menor esforço do ato comunicativo. A realização linguística desse princípio é traduzida, por Grice, (op. cit.) em uma série de normas ou máximas, identificadas da seguinte maneira:

I – Máxima de Qualidade:

Relacionada inicialmente à supermáxima "Afirme coisas verdadei-ras"; Tente fazer da sua contribuição uma verdade.

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II – Máxima de Quantidade:

Relacionada à quantidade de informação que deve ser fornecida numa mensagem.

III – Máxima de relevância;

Ligada à máxima "Seja Relevante”. Faça com que suas contribui-ções sejam relevantes.

IV – Máxima de Modo

Ligada à supermáxima "Seja Claro"

Essas máximas especificam, de uma maneira geral, o que os partici-pantes devem fazer para conversar de maneira maximamente eficiente, racional e cooperativa: eles devem falar com sinceridade, de modo relevante e claro e, ao mesmo tempo, fornecer informação suficiente. Entretanto, às vezes, alguns desses parâmetros não são respeitados, e o falante pode ter consciência disso ou não. Eles são um tipo de guia de orientação que servirá como base para a comunicação. É realmente difícil imaginar a comunicação sem que essas máximas estejam presen-tes. Veja, por exemplo, se não respeitássemos a máxima da relevância, os diálogos seriam uma sucessão de falas desconexas, do tipo:

A: Você já almoçou?

B: Realmente eu vendo carros.

Portanto, parece ser verdadeira a afirmação de que nossa comuni-cação é regida por alguns princípios cooperativos, como as máximas d e Grice. Vejamos, abaixo, outros exemplos de como essas máximas ajudam o ouvinte a chegar a algumas inferências. Um primeiro exem-plo envolve a máxima da relevância (faça que suas contribuições se-jam relevantes):

A - Você vai me dar uma aliança de brilhante de presente?

B - Puxa! Como está quente, hoje.

A - Eu perguntei se você vai me dar uma aliança?

B - Em compensação, acho que finalmente vai chover.

Implicatura: B não lhe dará uma aliança de presente.

No diálogo acima, B "desconversa" e foge da pergunta de A não obedecendo a máxima de relevância. Mas, tomando como ponto de partida que A acredita que a informação de B é relevante para a res-posta de sua pergunta, A é levada a implicar que B não só não lhe dará uma aliança de presente como não quer nenhum tipo de compromisso sério.

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104 SEAD/UEPB I Língua Portuguesa VI

Vejamos agora um exemplo envolvendo a máxima de quantidade (faça a sua contribuição tão informativa quanto necessária para o objetivo da comunicação):

A - Você me ama?

B - Eu gosto de estar em sua companhia.

Implicatura: B não ama A.

No exemplo acima há uma quebra por excessos de informações. B pode gostar da companhia de A e também o amar. Mas se assumimos haver uma máxima de quantidade que rege a comunicação, o falante B não passaria a informação desnecessária Eu gosto de estar em sua companhia, se ele realmente o (a) amasse.

O exemplo que segue diz respeito à máxima de qualidade (tente fazer da sua contribuição uma verdade). Quando alguém profere os seguin-tes enunciados, ele está fazendo as seguintes implicaturas também:

Ex: João é engenheiro civil e engenheiro mecânico.

Implicatura: Eu acredito que ele é engenheiro civil e mecânico e tenho evidências adequadas disso.

Em circunstâncias cooperativas, quando alguém afirma algo, im-plica que acredita nela; quando alguém pergunta algo, implica que deseja sinceramente uma resposta. Por isso, sentenças como: João é engenheiro civil e engenheiro mecânico, mas eu não acredito que ele seja, são consideradas pragmaticamente estranhas, pois contradizem a máxima da qualidade.

A última máxima a ser exemplificada é a máxima de modo (seja cla-ro, evite ambiguidades, evite obscuridade, seja breve e seja ordenado), vejamos:

A - Essa enfermeira parece ser eficiente. B - Sem dúvida, ela é muito boa.

A - Em qual das obras de Grice se encontra as Implicaturas Conversacio-nais?

B – No livro, Logic and conversation, de 1989, editada pela Harvard Uni-versity Press, a partir do terceiro parágrafo da página 22 até o final da 40.

A máxima de modo criada por Grice (seja claro) não aparece nessas situações, necessitando mais uma vez de implicaturas conversacionais dos envolvidos no ato conversacional para manter o princípio de coo-peração. O duplo sentido criado pelo adjetivo boa, no primeiro caso, é a evidência da falta de clareza de informações, o que proporciona uma quebra no uso convencional dos termos e expande as possibilidades de compreensão. A prolixidade exagerada, no segundo exemplo, também promove essa falta de clareza de informações e necessita de implica-ção, pois, não há resposta clara à pergunta e sugere certa imposição de saber sobre o interlocutor.

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De uma forma ou outra as Implicaturas Conversacionais de Gri-ce trouxeram uma nova visão à pragmática, em especial a sua visão do Princípio Cooperativo da comunicação e como os enunciados nem sempre se limitam ao convencional. O potencial comunicativo que car-regamos é imenso e impossível estruturá-lo; a nossa situação de ser social nos põe em um emaranhado de possibilidades comunicativas infinitas. Segundo Cançado (op.cit.), o falante sempre está observando o princípio cooperativo e, quando o está violando, ele quer transmitir alguma informação extra que está de acordo com o princípio; além do mais o ouvinte supõe que o falante sabe que ele pode entender essa informação. Todo o esforço é válido para manter/implicar a comuni-cação.

Atividade III

I - Baseado na noção de implicatura abordada acima, dê, para os diálogos abaixo, s possíveis implicaturas. Explique quais são as máximas envolvidas.

1) A. Você vai à festa hoje à noite? B. Meus pais vêm me visitar.

2) A. Você leu o texto para o seminário? B. Eu pretendo.

3) A. Você dirige tem muito tempo? B. Eu aprendi a dirigir e aprendi a andar.

4) A. Me empresta sua blusa amarela. B. Ela está novinha: acabei de comprar.

II – Comente o comportamento dos envolvidos no fato anedótico a seguir, em termos das máximas de Grice: dica. utilize o bloco

de anotações para responder as atividades!

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106 SEAD/UEPB I Língua Portuguesa VI

Um dia, um vendedor encontrou um menino sentado na escada de frente de uma casa. Ele perguntou ao menino: ”Sua mãe está em casa?” “Sim”, respondeu o menino. Então, o vendedor tocou a campainha várias vezes, bateu na porta e chamou por alguém. Ninguém respondeu. O vendedor, então, se dirigiu ao menino dizendo: “Eu pensei que você tivesse dito que sua mãe estava em casa!” “Ela está”, retrucou o menino,”só que esta não é a nossa casa”.

III – Como você interpreta a fala de Helga no terceiro quadrinho? Explique com base nas nossas reflexões teóricas.

HAGAR (Dik Brown)

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Leituras recomendadas

Esta obra apresenta, a to-dos os interessados, textos de introdução a um con-junto fundamental de disci-plinas das ciências da lin-guagem: Fonologia, fonética, morfologia, sinta-xe, semântica, pragmática, lexicologia e lexicografia.

Introdução à Semânti-ca - brincando com a gra-mática apresenta ao leitor uma bem humorada ex-planação, recheada com exercícios fundamentais ao conhecimento das princi-pais operações sintáticas

relevantes para a significação do português brasileiro.

Resumo

Tratamos das questões entre Semântica e Pragmática observando que tanto a Semântica quanto a Pragmática estão ligadas ao contexto, porém com metas diferentes. A Semântica diz respeito ao significado da sentença, o que a sentença diz e a Pragmática volta-se para o sig-nificado do falante, o que o falante quer dizer com a sentença que profere. Dentro dessa perspectiva, analisamos o fenômeno da dêixis e da anáfora entendendo que os dêiticos são uma espécie de “ancora-gem” da fala na realidade, enquanto que a interpretação das expres-sões anafóricas é derivada da expressão antecedente, são expressões que servem tipicamente para “retomar” outras passagens de um texto. Por fim, refletimos, um pouco, sobre as implicaturas conversacionais observando que potencial comunicativo que carregamos é imenso e a nossa situação de ser social nos põe em um emaranhado de diversas possibilidades comunicativas.

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Para refletir...

“Há muitas coisas na estrutura das línguas que só podem ser explicadas se admitirmos que elas se constituíram para a interação face a face”. Lyons

AutoavaliaçãoÀs vezes a malícia e o humor nascem de um mal-entendido que tem a ver com o “assunto de que se fala”, tendo origem num “equívoco de dêixis”. Veja como isto acontece na história a seguir:

Bilhete complicado

O Gumercindo quando jovem era daqueles cavalheiros à moda antiga, que gostava de tudo certinho e no seu devido tempo. Namorava uma linda donzela, por quem estava real-mente apaixonado.

Um dia, quando fazia uma viagem de negócios, Gumercindo entrou em uma loja e comprou um presente para a namo-rada: finíssimo par de luvas de ”pelica”. Só que na hora do embrulho, a balconista se enganou, e colocou na caixa uma calcinha de renda, e o pacote foi despachado pelo correio, com o seguinte bilhete:

"Estou mandando este presente para fazer-lhe uma surpresa. Sei que você não usa, pois nunca vi usar. Pena não estar aí para ajudá-la a vestir. Fiquei em dúvida com a cor, no entanto a balconista experimentou na minha frente e me mostrou que esta era a mais bonita. Achei meio larga na frente, mas ela me explicou que era para a mão entrar mais fácil e os dedos se mexerem bem. Você não deve lavar em casa por recomenda-ção do fabricante. Depois de usar, passe talco e vire do avesso para não dar mau cheiro. Espero que goste, pois este presente vai cobrir aquilo que vou lhe pedir muito em breve. Receba um afetuoso abraço do seu Gumercindo.”(Marcos Vinícius Ribeiro Dias, Humor na Marolândia. Paraguaçu, MG – Editora e Gráfica Papiro, 1996)

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Sempre que possível socialize suas respostas no AVA. Interagindo se aprende melhor!

ReferênciasCANÇADO, Márcia. Manual de semântica: noções básicas e exercícios. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008.

CHIERCIA, Gennaro. Semântica. Campinas: Unicamp/Eduel, 2003.

GUIMARÃES, E., Semântica e Pragmática, In: GUIMARÃES, E.; ZOPPI-FONTANA, M. Introdução às Ciências da Linguagem: a palavra e a frase. Campinas: Pontes, 2006.

ILARI, Rodolfo. Introdução à semântica – brincando com a gramática. São Paulo: Editora Contexto, 2010.

_______________ ; GERALDI, João Wanderley. Semântica. São Paulo: Editora Ática, 1994.

LYONS, John. Linguagem e Linguística: uma introdução. Cambridge University Press,1979

OLIVEIRA, R. P. de. Conceitos básicos de semântica: Módulo 1. Disponível em, < http: // www. cce. UFSC. br./ pires/> .Acesso em 14/ago. 2012.

OLIVEIRA, R. P. de. Semântica. In: Mussalin, F. Bentes, A. C. Introdução à linguística. domínios e fronteiras Vol 2. São Paulo: Cortez, 2003.p.p. 17-46.

PINTO, Joana P. Pragmática. In: MUSSALIM, F.; BENTES, A.C. (orgs.) Introdução à linguística 2: domínio e fronteiras. São Paulo: Cortez, 2000.

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VII UNIDADE

Semântica e pragmática II

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Apresentação“É o uso das palavras em diferentes interações lin-guísticas que determina o seu sentido.” Wittgenstein

Na unidade anterior iniciamos nossas reflexões acerca da relação entre Semântica e Pragmática mostrando que a situação de enunciação deve sempre ser tomada como ponto de partida para a análise dos fenômenos linguísticos. Como vimos, a enunciação são as realizações linguísticas concretas e a pragmática nos mostra como fazer inferências necessárias para chegar ao sentido dos enunciados.

Nesta unidade, continuaremos trilhando os caminhos da estreita relação que há entre essas duas correntes que abor-dam a significação e estudaremos como o uso de determi-nado enunciado volta-se para a realização de algum tipo de ação: informar, perguntar, mostrar, prometer, entre outras.

Para isso, abordaremos, especificamente, a teoria do ato comunicativo em seus três níveis: locucionário, ilocucioná-rio e perlocucionário. Mas lembre-se de que esse estudo só se completa com sua efetiva participação, por isso nunca é demais lembrar: faça as leituras e reflexões sugeridas, pra-tique com as atividades propostas e, sobretudo, tenha per-sistência, muita persistência, base de todo bom estudante e pesquisador.

Já na reta final da nossa disciplina, reafirmamos o que fizemos nas demais unidades, estamos aqui, professores e tutores sempre a postos para ajudá-lo (a), caso precise.

Proveitosos estudos!!!

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Objetivos

Ao término desta unidade, esperamos que você:

• Entenda o ato comunicativo como um ato de linguagem que busca realizar ações no mundo muito mais do que apenas des-crever o mundo;

• Diferencie os enunciados performativos dos enunciados cons-tativos;

• Identifique os possíveis atos envolvidos em uma determinada enunciação.

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Teoria dos atos de fala

Os estudos sobre a linguagem têm ocupado papel importante na sociedade atual, o que se deve à sua importância e ao fato de que é fundamental a compreensão de seu funcionamento e as especificida-des de cada uma de suas modalidades.

A fim de tentarmos entender a capacidade que tem o ser humano de interagir socialmente por meio da linguagem, das mais diversas for-mas e com os mais diversos propósitos, é necessário estabelecermos o significado de ato de fala. Convém inicialmente atentarmos para o fato de que, na interação, o ato de fala é um conceito distinto da sentença, já que esta é identificável apenas no âmbito gramatical, en-quanto aquele depende de níveis da linguagem, tais como convenções, entonações, posições tomadas numa troca conversacional e relações sociais existentes entre as partes.

Para que um ato seja considerado de fala, é necessário proferir-se um enunciado linguístico o qual terá uma certa força capaz de produzir no interlocutor determinados efeitos. Ainda que, em certas situações, possamos considerar que o silêncio é convincente, não existe ato de fala sem o pronunciamento de um enunciado. Se alguém diz que quem cala, consente, é porque antes desse calar já existiu um enunciado que implicava como resposta um consentimento.

A questão da contextualização também será importante nessa nova visão da linguagem. Isso significa dizer que o significado das palavras não está na coisa em si, mas no contexto em que a frase é proferida, ele muda completamente o modo de observar a linguagem.

Segundo Ilari (2010, p. 27), é possível realizar várias ações diferen-tes a partir do mesmo conteúdo utilizando os modos do verbo e outros recursos linguísticos; assim, o conteúdo “cachorro + estar preso” poder ser objeto de: uma informação (“o cachorro está preso”); uma pergun-ta (“o cachorro está preso?”); uma reação de surpresa (“minha nossa! O cachorro está preso há três dias!”); uma reação de dúvida ou perple-xidade (“o cachorro está preso?! De onde você tirou essa ideia?); um desejo (“ tomara que o cachorro esteja preso.”); uma ordem (“prenda o cachorro [para que as visitas possam entrar]”).

Assim, ao fazermos uso de um determinado enunciado estamos sempre realizando algum tipo de ação: informar, perguntar, mostrar perplexidade, prometer, autorizar, entre outros.

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Atividade I

1. O ator russo Stanislawski, autor de um dos mais célebres métodos de formação e atores, mandava que seus alunos pronunciassem de várias maneiras uma mesma expressão (por exemplo, “esta noite”), sugerindo diferentes tipos de expectativas. A proposta é que você escolha uma frase simples (como “são três horas”) e pense em maneiras diferentes de dizê-la, que deverão corresponder a ações diferentes visando o interlocutor (por exemplo: informar a hora a um desconhecido, dar a entender que o interlocutor está se atrasando para o serviço, dar a entender que é tempo de ambos saírem para tomar um café).Se preferir, insira essa fala numa pequena cena criada por você.

Passemos agora a um segundo momento do nosso percurso em direção ao conhecimento dos atos de fala: os postulados austinianos.

Enunciados performativos e constativos

Austin (1990) em conferências postumamente publicadas em 1962 sob o título de How to do things with words faz uma distinção entre enunciados constativos e enunciados performativos e apresenta os atos de fala mostrando que é possível existir uma estruturação dentro da lin-guagem. Além de apresentar, que, para ele, as palavras são muito mais do que apenas sentenças que poderiam ser consideradas verdadeiras ou falsas. Há algumas proposições que não podem ser consideradas nem verdadeiras e nem falsas, entretanto existem e tem seu significado. Assim, Austin distinguiu dois tipos de enunciados: os constativos e os performativos.

Por exemplo, quando se fala que Maria mora em Londres, está-se dando a possibilidade de verificar se esse enunciado é verdadeiro ou

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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falso, é só saber se realmente Maria mora em Londres ou não. Tem-se, então, um enunciado constativo. Mas se for falado “Fecha a porta”, não será nem verdadeiro nem falso, mas será a realização de um pedi-do ou de uma ordem, desde que se observem as condições de verifica-ção, como se há uma porta a ser fechada, se a pessoa pode fechá-la. Há, nesse caso, um enunciado performativo. Assim, temos:

• Enunciados constativos: aqueles que descrevem ou relatam um estado de coisas, e que, por isso, se submetem ao critério de verificação, se são falsas ou verdadeiras as sentenças. Na práti-ca, são os enunciados frequentemente denominados de afirma-ções, descrições ou relatos, como: Eu jogo futebol; A Terra gira em torno do sol; A mosca caiu na sopa, etc.

• Enunciados performativos: enunciados que não descrevem, não relatam, nem constatam absolutamente nada, e, portanto, não se submetem ao critério de verdade e falsidade. Dessa forma podemos dizer que são enunciados que, quando proferidos na primeira pessoa do singular do presente do indicativo, na forma afirmativa e na voz ativa, realizam uma ação. Vejamos alguns exemplos: Eu te batizo em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo; Eu te condeno a dez meses de trabalho comunitário; De-claro aberta a sessão; Ordeno que você saia; Eu te perdoo.

Tais enunciados, no exato momento em que são proferidos, rea-lizam a ação denotada pelo verbo; não servem para descrever nada, mas sim para executar atos: o ato de batizar, de condenar, de perdoar, de abrir uma sessão, etc. Nesse sentido, dizer algo é fazer algo. Com efeito, dizer, por exemplo, Declaro aberta a sessão não é informar sobre a abertura da sessão, é abrir a sessão. São os enunciados performati-vos que constituem o maior foco de interesse de Austin.

É necessário ressaltar, no entanto, que o simples fato de proferir um enunciado performativo não garante a sua concretização. Para que um enunciado performativo obtenha sucesso, ou seja, para que a ação por ele designada seja de fato realizada, é preciso, ainda, que as ocorrências sejam adequadas. Um enunciado performativo pronun-ciado em circunstâncias inadequadas é considerado nulo, sem efeito é um enunciado que simplesmente fracassa. Assim, por exemplo, se um faxineiro (e não o presidente da câmara) diz Declaro aberta a sessão, o performativo não se realiza, pois a sessão não será aberta, porque o faxineiro não tem poder ou autoridade para abrir a sessão. O enuncia-do é, portanto, inexistente, sem efeito, nas palavras de Austin, “infeliz”.

Por isso Austin vai estudar as condições de felicidade e fracassos dos performativos. Assim, para que um enunciado seja bem-sucedido são necessários alguns critérios que Austin denominou "condições de felicidade”. Os principais são:

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1. O falante deve ter autoridade para executar o ato, como no exemplo mostrado anteriormente;

2. As situações em que as palavras são proferidas devem ser apro-priadas, se o presidente da câmara declara aberta a sessão, sozinho, em sua casa, o performativo não se realiza, porque não está sendo enunciado nas circunstâncias apropriadas;

3. A enunciação deve ser executada corretamente pelos partici-pantes. O uso da forma incorreta torna nulo o performativo. Por exemplo, no batismo é preciso usar a fórmula correta para que o performativo se realize. Se o padre diz: eu te perdoo em lugar de eu te batizo o batismo não ocorre;

4. Deve existir um procedimento convencional que tenha efeito convencional.

É pela observância ou não observância de todas ou de algumas destas condições que depende o sucesso ou o insucesso dos enuncia-dos performativos. Nas condições felizes, ocorre o que Austin chama “apreensão”, ou seja, que o “objetivo ilocucionário” foi realizado atra-vés de sua força”. (OTTONI, 1988, p. 81). Assim, um noivo dizer para sua noiva, numa Igreja, diante de um padre e de testemunhas, “sim, eu aceito (casar-me com você)” constitui um performativo feliz porque atende a todas as exigências do rito “casamento”. Se, contudo, o irmão da noiva diz “eu aceito” no casamento, o performativo não acontece, tendo-se em vista que aquele que o enunciou não estava autorizado para realizá-lo conforme as convenções do rito.

Vejamos um outro exemplo: Suponha-se que um homem tenha dito a sua mulher: Por meio deste, divorcio-me de você. O simples fato de dizer que se está separando não fará com que o divórcio se consuma, pois não há o rito (para se divorciar é preciso que haja um procedimen-to convencional, como um juiz e os papéis para serem assinados), por-tanto esse enunciado só terá sucesso, se ocorrer no ato em que o casal estiver assinando o divórcio, caso contrário, ele não obterá sucesso.

Atividade II

1. Dê as condições de felicidade para cada ato ilocutivo abaixo:

a) o ato ilocutivo de prometer;b) o ato ilocutivo de desculpar;c) o ato ilocutivo de saudar;d) o ato ilocutivo de nomear;e) o ato ilocutivo de protestar.

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2. Encarregado de escrever um breve texto, num cartão que deverá acompanhar um presente de casamento, você escreveu:

“Tomara que os noivos encontrem a felicidade.”

Mas aí você relê o texto e se dá conta de que o texto não é muito bom. Para melhorar o cartão, você considera a possibilidade e usar ou-tras fórmulas “optativas” em vez de tomara..., oxalá, Deus queira que... , que bom seria se..., meus votos são de que..., os amigos... fazem votos de que os noivos..., desejamos aos noivos que... entre outras. Comente por que você rejeitaria algumas e usaria outras.

Continuando...Observemos a tirinha a seguir para melhor ilustração:

HAGAR, o horrível. Folha de S. Paulo. Ilustrada. 18 de jul. 2000. p 7

Após a leitura da tira, podemos observar, no primeiro quadrinho que, na fala de Hagar, existe uma omissão da parte da pergunta de seu interlocutor que poderia ser repetida na resposta, da seguinte forma: “o doutor Zook disse que eu tenho de parar de beber, de comer demais e de ficar fora até tarde.”, mas os personagens estão vivenciando uma si-tuação de interação, por isso, a ausência da primeira parte da pergunta não prejudica a compreensão do texto.

No segundo quadrinho, quando Hagar diz que o médico recomen-dou mudanças de hábitos e concorda com isso, o leitor espera que ele realmente faça as mudanças sugeridas pelo médico, mas as reticências desse quadrinho preparam o leitor para a surpresa final: Hagar não está disposto a parar de beber, comer demais e ficar fora até tarde. Para ele, a mudança de médico é mais viável. Observemos que, neste segundo quadrinho, há, supostamente, um performativo implícito, em que, nas palavras de Austin, assume-se um compromisso ou declara-se uma intenção. Fica evidente, porém, ao observarmos o último quadri-

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nho, que não há consonância entre aquilo que é esperado pelo interlo-cutor de Hagar (e de seus leitores) e aquilo que o próprio Hagar deseja: conservar seus vícios.

A situação descrita pelo autor da tira e performada por Hagar tem relação como o que diz Austin (1976, p. 42):

Se alguns de nossos pensamentos são incorretos (em oposição a insincero), isto pode resultar em uma infelicidade de diferente tipo: [...]b) “Eu o aconselho a fazer X” é um enunciado per-formativo.Consideremos o caso de alguém que aconselha outra pessoa a fazer algo que, de fato não lhe seja interessante, mesmo que aquele que aconselhou pense que o seja. Este caso é diferente, posto que aqui inexiste a intenção de pensar que o ato de aconselhar possa ser nulo ou anulável, e do mes-mo modo, inexiste a tentação de se pensar que seja insincero. O melhor é introduzir aqui uma nova di-mensão de crítica – diremos tratar-se de um mau conselho.

Vejamos que, na tira, o aconselhamento do médico não deixou de ser um enunciado performativo pelo simples fato de Hagar não achar interessante deixar os vícios nos quais vivia. Pode-se considerar que o personagem Hagar considerou um “mau conselho” a primeira parte das orientações do médico, mas concordou com ele que deveria fazer mudanças – o segundo conselho – só que uma mudança que gera surpresa no leitor da tira e no interlocutor de Hagar.

Como já dissemos segundo Austin, para que um performativo seja feliz, é preciso existir um procedimento formalmente aceito, que apre-sente um determinado efeito convencional e que inclua o proferimento de certas palavras, por certas pessoas e em certas circunstâncias. No caso da tira, tudo isso, até certo momento, estava nas “condições de felicidade” e, portanto, o performativo final se realizaria com sucesso, mas, com “falha” no último quadro, o performativo acontece nas con-dições de infelicidade.

É importante ressaltar que Austin, encontra alguns problemas ao determinar critérios gramaticais como os verbos na primeira pessoa do singular do presente do indicativo etc. para os enunciados performati-vos. Ele constata que: nem todo enunciado performativo tem verbo na primeira pessoa do singular do presente do indicativo na forma afirma-tiva e na voz ativa. Exemplos: Proibido fumar; Vocês estão autorizados a sair; Todos os funcionários estão convidados para a reunião de hoje. Observe que, os atos de proibição, autorização e convite se realizam sem o emprego de proíbo, autorizo e convido; e que nem todo enun-ciado na primeira pessoa do singular do presente do indicativo na for-ma afirmativa e na voz ativa é performativo. Eis alguns exemplos: Eu jogo futebol; Eu corro; Eu estudo francês. Nesses exemplos, os atos de jogar futebol, correr e estudar francês não se realizam no proferimento

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de tais sentenças.

Austin define ainda, dois tipos de performativos que amenizariam as constantes inquietações em face aos critérios gramaticais: Eu ordeno que você saia é uma frase que tem uma indicação muito precisa do ato que realiza, trata-se de uma ordem e nada mais. Já Saia é vago ou ambíguo, pode ser uma ordem, um pedido, um conselho etc.

Antes de prosseguirmos, que tal praticar um pouco?

Atividade III

1. Há ações que se realizam pelo simples fato de pronunciar certas palavras de uma certa maneira, em determinadas circunstâncias.Assim, por exemplo, a frase “Eu vos declaro marido e mulher”, pronunciada por um juiz ,muda o estado civil dos noivos de solteiros para casados.Faça um levantamento das fórmulas que são habitualmente utilizadas:

a) Para fechar um negócio;b) Para concluir uma ligação telefônica;c) Para pedir alguém em namoro;d) Para nomear um funcionário para um determinado cargo;e) Para pedir um sanduíche e um refrigerante, na lanchonete;f) Para pedir esmolas.

2. Quais verbos abaixo apresentam usos tipicamente performativos e por quê?

garantir preocupar indicar desculparsaber esquecer avisar concordardesejar discordar

Escolha uma destas frases:

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“Eu te absolvo de teus pecados, em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo.”

“Condeno o réu a cinco anos de reclusão, nos termos da lei...”

“Defiro o pedido de inscrição na 3ª série do curso colegial do Sr. José da Silva.”

“Edmundo, hoje você joga com a camisa 7, certo?”

3. A propósito da frase que você terá escolhido, explique em detalhes o que pretende quem pronuncia, e o que é necessário para que essa frase possa ser levada a sério, produzindo o efeito desejado.

Ato locucionário, ilocucionário, perlocucionário

Ao concluir que todos os enunciados são performativos, pois, no momento em que são enunciados, realizam algum tipo de ação, Austin estabelece características entre três tipos de atos que se realizam em cada enunciado: o locucionário, o ilocucionário e o perlocucionário. (Em alguns estudos poderemos encontrar outras nomenclaturas para definir esses atos de fala, por exemplo, podemos encontrar locucioná-rios/locutivos; ilocucionários/ilocutivos; perlocucionário/perlocuttivos).

• Atos locucionários: aqueles que dizem alguma coisa, ou seja, são os atos linguísticos do dizer; é o ato de proferir uma senten-ça com um certo significado e um conteúdo informacional,ou seja, o sentido restrito da sentença, a descrição dos estados de coisas.

• Atos ilocucionários: aqueles que refletem a posição do/a locutor/a em relação ao que ele/a diz e que se realizam na linguagem; é a intenção do proferimento do falante,ou seja, as ações que realizamos quando falamos: ordenamos, pergunta-mos, avisamos, etc.

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• Atos perlocucionários: aqueles que produzem certos efeitos e consequências por meio da enunciação da sentença, ou seja, o resultado que conseguimos com nosso ato de fala: assustamos, convencemos,desagradamos, etc.

Dessa forma, quando se enuncia a frase Eu vou estar em casa hoje à noite, há o ato de enunciar cada elemento linguístico que compõe a frase. É o ato locucionário. Paralelamente, no momento em que se enuncia essa frase, realiza-se o ato de força que pode ser de promes-sa, de pergunta, de afirmação etc. É o ato ilocucionário. Quando se enuncia essa frase, o resultado pode ser de ameaça, de agrado ou de desagrado. Trata-se do ato perlocucionário, um ato que não se realiza na linguagem, mas pela linguagem.

“Falar uma língua é realizar atos de fala, tais como fazer afirmações, dar ordens, fazer perguntas, fa-zer promessas e assim por diante: e, deforma mais abstrata, atos de fala como referir e predicar; e, em segundo lugar, estes atos se tornam, em geral, possíveis e são realizados de acordo com certas re-gras para o uso dos elementos linguísticos”. (Searle 1969:23)

Mais uma tirinha para exemplificação...

Nessa tira, Mafalda1 indaga sua mãe sobre os planos que ela ti-nha quando criança e interrompe seu questionamento, pois já sabe a resposta. Na verdade, a resposta aparece no quadro três, ao ver a mãe como uma perfeita dona-de-casa. É interessante observar que a fisionomia da menina muda ao longo dos quadros. No primeiro qua-dro, ela aparece pensativa; no segundo quadro aparece satisfeita, e no último quadro, a expressão dela é de tristeza, pois sabe que sua mãe é e, provavelmente, sempre almejou ser apenas uma dona-de-casa. Ma-falda esperava que sua mãe tivesse outras ambições, como ter diploma universitário, ou então, trabalhar fora.

1 As tiras de Quino têm a preocupação com a discussão de certos temas que sugerem críticas sociais. Dessa forma, o humor e a ironia estão presentes nessas narrativas. Pode-se dizer que Quino mostra aos seus leitores suas análises do contexto social histórico-político do momento

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O desfecho inesperado é o que provoca o efeito de humor nessa tira, já que a garota muda o que pretendia falar, e o leitor tem que inferir que ela mudou o foco do assunto porque já tinha descoberto a resposta da pergunta do primeiro quadro.

Após analisar como ocorrem os processos dos atos de fala nesse exemplo da tira de Mafalda, confirma-se que falar uma língua é reali-zar ações. Os enunciados possuem uma força ilocucionária, ou seja, existem intenções à medida que se profere algo e perlocucionária, em que o ouvinte reage diante da força apresentada no enunciado fazendo com que as intenções do falante o alcancem, para que este realize os atos de fala propostos pelo falante.

Chierchia (2003) representou a situação enunciativa esquematica-mente da seguinte maneira:

GRAMÁTICA

Significado (em sentido estrito)(conteúdo, força, pressuposições).

USO

Ato locutivo(aquilo que é dito)

Ato ilocutivo(aquilo que é feito)

Ato perlocutivo(os efeitos obtidos)

Em alguns estudos o ato perlucutivo, não ganha à relevância essen-cial para ser considerado. Vejamos o que nos diz Cançado sobre isto:

“A distinção entre os atos ilocutivo e perlocutivo é importante: o ato perlocutivo é o efeito que o falan-te espera conseguir sobre o ouvinte, ao pronunciar tal proferimento. Por isso, o ato perlocutivo não é geralmente, considerado relevante para o estudo do significado linguístico [...] Em relação aos ou-tros dois, é importante realçar que não podemos pensar que os atos ilocutivos são consequências dos atos locutivos”. (CANÇADO, 2008, p. 127)

Dessa forma. Em Vou desligar o videogame a sentença não se es-tabelece sozinha, ou seja, não se pode saber se é uma ameaça, um pedido, uma ordem... Já no uso a sentença, a força empregada no ato de proferir essa sentença, vai determinar a força ilocutiva particular, isto é, determina se o proferimento é uma ameaça, ordem ou pedido. Para Cansado apud Kempson (1977:59) “[...] um falante profere sentenças com um determinado significado (ato locutivo) e com uma terminada força (ato ilocutivo) para tingir determinado efeito sobre o ouvinte (ato perlocutivo)”.

Existem casos em que a força ilocutiva está explícita no próprio ato

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locutivo, recebendo o nome de proferimento performativo: nesse tipo de proferimento,as forças locutiva e ilocutiva parecem coincidir:

i) Prometo-lhe que não chegarei atrasada.

ii) Aposto como ele vai voltar atrás.

iii) Concordo que você participe do grupo.

Em relação a esses tipos de proferimentos, Austin afirma não haver sentido em considerá-los verdadeiros ou falsos, pois não constituem descrições, mas sim, ações. Entretanto, vejamos que podemos ter pro-ferimentos com os mesmos verbos, mas que constituem apenas descri-ções de situações:

iv) Ela prometeu que não chegaria atrasada.

v) Ela apostou que ele voltaria atrás.

vi) Ela concordou que você participasse do grupo.

As sentenças acima não podem ser entendidas como ações de pro-messa, de aposta ou de concordância, mas como descrições de algu-mas situações e, portanto dizer algo sobre a verdade ou a falsidade das sentenças.

Existem proferimentos falados e escritos, mas, sem dúvidas, é con-senso entre os teóricos que os proferimentos falados são mais ricos na expressão de emoções, afetos e estados de espírito dos locutores do que os escritos, ou pelo menos o fazem de maneira mais direta. Isso acontece porque nos proferimentos falados existe a influência da expressão facial, do tom de voz, do olhar, etc., do falante. No caso dos proferimentos escritos podemos tentar enriquecer a expressão desses aspectos através de recursos gráficos como, por exemplo, quando co-locamos todas as letras do texto em maiúsculas ou várias interrogações ao final da frase, mas nada é tão significativo quanto um tom de voz alterado ou um olhar de desconfiança ou leve sorriso ao falar, assim como tantos outros gestos que não podem ser transmitidos através da escrita.

É imprescindível salientar que a Teoria dos Atos de Fala trouxe para o foco de atenção dos estudos linguísticos os elementos do contexto (quem fala com quem se fala, para que se fala, onde se fala, o que se fala etc.), os quais fornecem importantes pistas para a compreensão dos enunciados. Essa proposta muito tem influenciado e inspirado os estudos posteriores destinados a aprofundar as questões que envolvem a análise dos diferentes tipos de discurso. Com efeito, os atos de fala são, hoje, uma fonte inesgotável de trabalhos tanto na área da Prag-mática, quanto na área da Linguística em geral, bem como em outras áreas de estudos linguísticos.

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Atividade IV

1. Leia o texto abaixo e responda ao que se pede:

Procuração

Pela presente procuração por mim feita e assina-da, eu, abaixo-assinado, José de Tal, português com quarenta anos de idade, proprietário, mo-rador na rua do Tal número tal, constituo meu procurador o senhor O. de B., a fim de receber os aluguéis das casas de minha propriedade, dar recibos, despejar inquilinos, proceder a consertos e por tudo responder como se fora eu próprio, podendo também subestabelecer, se convier.José de Tal

a) Procure explicar qual a função de uma procuração.

b) Explique em que sentido uma procuração cria ou altera uma situação jurídica.

c) Copie a procuração acima, utilizando seu próprio nome e o nome de algum conhecido, em lugar de José de Tal e O. de B.

d) Procure, no texto da procuração, as palavras que indicam a ação que você realiza por meio dela.

2. Os trechos a seguir tratam dos hackers brasileiros e foram extraídos praticamente sem modificações de um longo artigo intitulado “Internet: A nova face da rebeldia” (Época 3.4.2000). Nesse artigo foi utilizado várias vezes um recurso que consiste em reproduzir textualmente as falas das personagens envolvidas, classificando-as logo em seguida através de um verbo (ver as passagens grifadas).

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Qual o pai ou mãe que não se sentem tranquilos ao contemplar o filho num aposento qualquer da casa, “brincando” no teclado e na tela do computador, longe dos perigos das ruas? Pois esse tipo de cena pode ser o prólogo de complicações internacionais. Um balanço recente do site americano Attrition.org, especializado na divulgação de invasões pela Internet, demonstra que o Brasil lidera o setor, superando até os Estados Unidos. Sites como o da Nasa, da Otan e de subsidiárias

da Microsoft, não oferecem resistência à primeira geração de hackers brasileiros.

[Estes] são, numa descrição genérica, filhos das classes média e alta, cursam boas escolas e exibem traços de arrogância, típicos das camadas superiores da pirâmide econômica.

São audaciosos. Em fevereiro, tiraram do ar o site da rede de televisão CNN, freqüentado diariamente por milhões de pessoas em todo o planeta. Fizeram o mesmo com o Yahoo, segundo portal mais visado da Web. “Eles se movem pelo desafio e pela busca de notoriedade”, sustenta o delegado Lima e Silva. “Para mim, é a versão contemporânea dos meninos que se sentiam felizes ao matar um passarinho com estilingue”. Os “meninos” de hoje apelam para outras analogias. “Quando arrombo um site, sinto a liberdade de quem salta de bumgee-jump”, compara H.R.B., do grupo Crime Boys.

No quesito de notoriedade, o delegado acertou. “Ao selecionar as vítimas, damos preferência a empresas famosas”, reconhece Lei-tão, companheiro de H.R.B. [...] “Na mesma invasão eles mandam recados para namoradinhas e detonam o governo”, espanta-se Lima e Silva. [...]

Há rivalidade entre os grupos. “Nós fazemos algo construtivo”, garante JZ, convencido de que tem um discurso político a defen-der. “O problema é que não consigo viver sem computador”, argu-menta Sys Vinit. O rapaz, que jamais experimentou drogas, diz-se viciado em ataques. [...e ] prefere as noites da sexta-feira. Por uma razão triunfalista. “Na segunda só vão falar nisso”, exulta. Nutre um sonho explosivo: imprimir sua marca no site da CIA. Não é à toa que investigações sigilosas do FBI e da Interpol aterrissam no país. Acostumados a agir fora do alcance das leis, hackers brasileiros se empertigam quando notam que há “tiras de fora” em seu encalço. Prometem ousadias maiores. E picham: “We are the world!”. O mundo é deles. Para quem não divisa fronteiras, não se orienta por fusos horários nem se constrange ao pilhar a privacidade alheia, o planeta até que ficou pequeno.

Considere cada um dos verbos que foram utilizados para caracterizar uma fala. Que informações ele traz sobre a fala a que se refere?

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Leituras recomendadas

Introdução à Semântica - brin-cando com a gramática apresen-ta ao leitor uma bem humorada explanação, recheada com exer-cícios fundamentais ao conheci-mento das principais operações sintáticas relevantes para a signifi-cação do português brasileiro.

O livro de Moura é muito útil para aqueles que querem adquirir noções básicas da semântica lin-guística com questões situadas na interface da semântica e da prag-mática. O ponto forte do está na clareza e simplicidade com que trata de questões complexas no

campo de semântica. O autor também destaca, com êxito, as dificul-dades no que tange à demarcação da fronteira entre a semântica e a pragmática.

ResumoApresentamos reflexões acerca da relação entre Semântica e Prag-

mática mostrando que a situação de enunciação deve sempre ser to-mada como ponto de partida para a análise dos fenômenos linguísti-cos. Assim, abordamos a significação a partir do uso de determinado enunciado que se volta para a realização de algum tipo de ação: in-formar, perguntar, mostrar, prometer, entre outras. Por fim, descrevemos e problematizamos, a teoria do ato comunicativo em seus três níveis: locucionário, ilocucionário e perlocucionário.

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128 SEAD/UEPB I Língua Portuguesa VI

Autoavaliação

Qualquer fala pode assumir sentidos muito específicos, conforme as circunstâncias.

Explique de que modo isso se aplica ao texto abaixo, extraído da seção “Contraponto”, que o jornal Folha de S. Paulo dedica diariamente à crônica política:

Questão de tempo

Já quase no final do jantar de reconciliação que o PFL ofereceu anteontem a FHC, formou-se uma roda em torno do presidente. Ao comentar as rusgas do partido com o Planalto, Bernardo Cabral recorreu a uma piada.

Um casal tinha apenas um jegue para conduzi-lo até a cidade onde passaria sua lua de mel. Logo no início da viagem, o jegue mancou de uma pata. O marido advertiu o animal:

— Jegue, esta é a sua primeira mancada. Não faça isso de novo!

A viagem continuou e o jegue voltou a mancar. Levou uma surra. Na terceira vez, o marido pegou o revólver e o matou. A mulher protestou:

— Você é um bruto. Não deveria ter feito isso com o jegue.

O marido devolveu:

— Primeira mancada!

Em seguida, Cabral emendou:

— Resta saber de quem será a primeira mancada. Do PFL ou do governo?

Um pouco de descontração não faz mal a ninguém, não é mesmo?

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Língua Portuguesa VI I SEAD/UEPB 129

Referências

AUSTIN, Jhon. L. Quando dizer é fazer. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990.

CANÇADO, Márcia. Manual de semântica: noções básicas e exercícios. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008.

CHIERCHIA, Gennaro. Semântica. Campinas, SP: Editora da UNICAMP; Londrina, 2003.

GUIMARÃES, E., Semântica e Pragmática, In: GUIMARÃES, E.; ZOPPI-

FONTANA, M. Introdução às Ciências da Linguagem: a palavra e a frase. Campinas: Pontes, 2006.

ILARI, Rodolfo. Introdução à semântica – brincando com a gramática. São Paulo: Editora Contexto, 2010.

OTTONI, Paulo. Visão performativa da linguagem. Campinas: Editora da Unicamp, 1998.

QUINO. Toda Mafalda. São Paulo: Martins Fontes. 1993.

SEARLE, J. R. – Speech Acts: An Essay in the Philosophy of Language. Cambridge: CUP, 1969

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VIII UNIDADE

Semântica e Ensino

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Apresentação“Entre coisas e palavras - principalmente entre pa-lavras circulamos.”Carlos Drummond de Andrade

Após esse percurso de sete unidades entre teorias, exem-plos e inúmeras significações, chegamos à reta final da dis-ciplina. O estudo do significado como mostramos desde o início é amplo e variado e, claro, sua exploração não acaba com este módulo. Mostramos um pouco dessa grande va-riedade e das contribuições importantes da área. Esperamos que tenha sido proveitoso e que, principalmente, vocês te-nham se encantado pelo estudo da Semântica.

Nesta última unidade, revisaremos alguns temas aborda-dos anteriormente e traremos propostas de atividades que possam ser aplicadas em sala de aula na construção de uma prática pedagógica que estimule cada vez mais a reflexão sobre a linguagem. Assim, nosso enfoque não será mais te-oria, embora nos utilizemos dela para situar a reflexão e o objetivo das atividades sugeridas.

Dessa forma, apresentaremos algumas propostas como sugestão que vocês poderão adaptar para suas aulas, se-gundo a realidade de ensino em que vivem.

Ademais, vivamos a alegria de concluir mais uma disci-plina. Parabéns!!!

Proveitosos estudos!

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Língua Portuguesa VI I SEAD/UEPB 133

Objetivos

Ao término desta unidade, esperamos que você:

• Relembre o funcionamento dos itens lexicais no texto como re-lações semânticas de efeito de sentido diversos em diferentes situações comunicativas;

• Revise as relações de sinonímia e antonímia como relações construídas (con) textualmente;

• Conheça alternativas para trabalhar com temas de semântica em sala de aula.

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Vamos relembrar?

Semântica e pragmática são dois domínios da linguagem extrema-mente interrelacionados que tem em comum como objeto empírico o significado das expressões linguísticas nas línguas naturais. Entretanto, cada área vê o significado de uma forma diferente. Segundo o filósofo Paul Grice, a semântica se ocupa do significado literal da sentença, en-quanto a pragmática estuda o significado do falante. Vimos essa distin-ção e demos alguns exemplos de seu papel na unidade VI, enfatizando, inclusive, que a distinção entre semântica e pragmática por vezes não e fácil de ser feita.

Para Moura (2000), a fronteira entre pragmática e semântica se estabelece no contexto, assim, para melhor nos aprofundarmos nas questões entre significado e contexto, é necessário retomarmos os li-mites entre a semântica e a pragmática, uma vez que ambas estão ligadas ao contexto e consequentemente às questões de significação. A primeira está associada ao estudo do valor de verdade das senten-ças enquanto a segunda está voltada para o estudo do significado da linguagem, inserida em contextos específicos. Mesmo sem perceber, todo leitor sempre analisa o contexto criado por um texto, pois é com base nessa informação que é possível atribuir sentido ao texto. Alguns gêneros textuais, como os textos publicitários, apostam frequentemente nessa competência dos leitores, para persuadir o público a quem se dirigem. Observemos:

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Como falante de Português reconhecemos a expressão de tirar o chapéu que é usada para fazer referência a algo surpreendente, que causa admiração, não é verdade? O texto acima tomou como ponto de partida a estação do ano – inverno – em que ocorreria um festival gastronômico em um grande shopping da cidade de São Paulo. Trocou chapéu por gorro, tornando a conhecida expressão mais adequada ao momento em que aconteceria o evento a ser divulgado.

Há, na publicidade, diferentes elementos visuais que reforçam o contexto que deve orientar a leitura: o prato e os talheres aludem ao festival gastronômico; o cachecol, que serve de toalha de mesa, remete ao momento do ano em que ele acontecerá (de 10 de julho a 12 de agosto). Nesse contexto, em “Pratos de tirar o gorro”, a expressão tirar o gorro torna-se equivalente a de tirar o chapéu. O sentido da expres-são também é preservado e funciona como um incentivo aos leitores para participarem do festival gastronômico: se os pratos são “de tirar o gorro”, significa que merecem ser experimentados. O contexto é, pois, o que determina o sentido adequado a ser construído para uma enunciação.

Atividade I1

Partindo dos elementos contextuais, discutir com os alunos a diferença de sentido estabelecida em cada quadrinho. Em seguida propor às seguintes questões:

1. Para entender a tira, é preciso identificar o contexto estabelecido em cada um dos quadrinhos. Quais são esses contextos?

1 Exemplo de atividade retirado de Abaurre (2008, p.254)

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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1.1. Embora a fala das personagens seja exatamente a mesma, ela traduz um sentido diferente para cada uma das situações em que ocorre. Quais são esses sentidos?

2. Explique por que a identificação do contexto é fundamental para a compreensão do sentido do enunciado “Essa vassoura está me matando”.

Exploração do poema “Teologia” de José Paulo Paes. Antes da leitura, levantar hipóteses sobre a temática a partir do título. Registrar as hipóteses e, em seguida ler o poema.

Teologia

A minhoca cavoca que cavoca.Ouvira falar da grande luz, o Sol.Mas quando põe a cabeça de fora,a Mão a segura e a enfia no anzol.

1. A hipótese levantada anteriormente se confirmou? Em caso negativo, explique qual foi o recurso utilizado pelo autor pra causar esse efeito de surpresa no leitor.

2. Considerando o contexto do poema, qual é o sentido da palavra Mão? Explique.

Atenção!!!

Como se trata de sugestões,esperamos a sua avaliação e/ou adaptação do que foi proposto,tendo em vista a realidade de sua sala de aula.Contamos com a socialização de todos no

AVA.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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E os implícitos e pressupostos, qual é a sua relação com o contexto?

Sabemos que, frequentemente, na nossa vida de leitor, encontra-mos textos em que nem tudo que importa para a compreensão está neles registrado. Ou seja, há textos em que o que não foi escrito tam-bém deve ser levado em consideração para que ele possa ser mais amplamente compreendido.

Trataremos desse tipo de informação ao retomarmos os pressupos-tos e implícitos, com o objetivo de expor o caráter argumentativo que um enunciado carrega e que deve ser assimilado por seu leitor. Assim, conforme assevera Koch (2004, p. 27) “não basta conhecer o significa-do literal das palavras ou sentenças da língua: é preciso saber reconhe-cer todos seus empregos possíveis, que podem variar de acordo com as intenções do falante e circunstâncias de produção”.

Segundo Ducrot, (1987, p. 77) “pressupor não é dizer o que o ouvinte sabe ou o que se pensa que ele sabe ou deveria saber, mas situar o diálogo na hipótese de que ele já soubesse”. O conteúdo posto refere-se à informação contida literalmente nas palavras da sentença, enquanto os pressupostos são as informações que podem ser recupe-radas no implícito das sentenças. Assim, para a proposição (i) Pedro parou de fumar, o pressuposto seria Pedro fumava antes.

No pressuposto reside uma informação indiscutível para o falante e/ou ouvinte e nesse âmbito o locutor partilha com o ouvinte a respon-sabilidade, sendo, portanto, coextensivo no interior do diálogo. Já o conteúdo implícito só pode ser descoberto por um trabalho de conjec-tura feito a partir de uma avaliação global da situação comunicativa, em que o ouvinte procura recuperar as intenções do falante. Mensa-gens que comportam esse tipo de implícito são sempre interpretadas como “indiretas” e obrigam, tipicamente, o ouvinte a perguntar: ”O que foi que ele quis dizer com isso?”, “Aonde ele quis chegar?” etc. Portanto, o implícito da frase (i) poderia ser Até Pedro parou de fumar, por que você não se anima? Portanto, pressuposto e implícito não pos-suem a mesma origem interpretativa, uma vez que os subentendidos estão ligados às circunstâncias da enunciação e os pressupostos são transmitidos pela frase.

Existem diversas expressões e formas sintáticas que têm a função de “ativar” pressupostos.Vamos citar aqui alguns desses ativadores/acionadores de pressuposição apresentados por Cançado (2003, p.p 36-38)

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138 SEAD/UEPB I Língua Portuguesa VI

1. Verbos factivos: Maria esqueceu que cachorros voam.

Pressuposição Cachorros voam.

2. Verbos de mudança de estado: João começou a trabalhar.

Pressuposição

João não trabalhava.

3. Estruturas clivadas:

Não foi o seu comportamento que me aborreceu.

Pressuposição

Alguma coisa me aborreceu.

4. Expressões temporais: Desde que saiu de casa, Maria não mantém con-tato conosco.

Pressuposição

Maria saiu de casa.

Para Koch (2004), a manutenção dos pressupostos constitui um dos fatores de coerência do discurso, em detrimento do reconhecimento do pressuposto estar aliado à aceitação de verdade do que é posto.

Atividade II

A história abaixo foi extraída do livro Humor na Marolândia, do humorista mineiro Marcos Vinícius Ribeiro Dias. Após debater com a turma, propor as seguintes questões:

Especialidade de político

Certo deputado, em viagem ao interior de seu Estado, de re-pente, percebeu que estava sem dinheiro, e resolveu trocar um cheque especial numa agência de seu banco, porém, naquele mo-mento, descobriu que estava sem um só documento. Aí virou para o gerente e falou:

−Eusoudeputado,osenhordevemeconhecerdosjornais,datelevisão, do programa de abertura…

O gerente respondeu que sua fisionomia não lhe era estranha, mas explicou-lhe também que a responsabilidade dele pela agên-cia é grande, e quando acontecem fatos como este, ele faz um teste com o cliente, por exemplo:

−Outrodia,falouogerente,esteveaquinaagênciaoChicoBu-dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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arque de Holanda, na mesma situação, então eu pedi a ele que fizesse um poema, e ele fez uma composição excelente em cinco minutos, nós pagamos o cheque. Na semana passada, foi a Noêmia Mourão, que pintou uma tela maravilhosa. Outro dia, foi o Roberto Dinamite, que marcou quatro gols no nosso caixa, e também o Marquinhos que, além de mostrar que tinha dois metros de altura, colocou cinquenta bolinhas de papel no cesto do lixo. Então…

O político ficou meio sem graça e falou para o gerente:

−Maseunãoseifazernada!

E o gerente, sorrindo, falou para o deputado:

−Podedirigir-seaocaixaquevamospagaroseucheque.

1. A história reforça uma opinião corrente sobre qual seria a especialidade dos políticos. Qual é essa opinião?

2. Para muitos brasileiros, Chico Buarque é antes de tudo um músico. Entretanto, nesta história, ele é dado como exemplo de outra atividade. Qual?

3. É provável que alguns leitores da história não conheçam uma ou outra das personagens (Roberto Dinamite, Noêmia Mourão e Marquinhos). Mas no contexto da história é clara a especialidade que eles representam. Qual a especialidade de cada um?

► A propaganda é um ambiente muito propício para passar mensagens implícitas. Lemos uma propaganda e logo vamos nos sentindo “obrigados” a comprar as coisas. Proponha aos alunos uma pesquisa de textos de propaganda que possam ser analisados em sala de aula para ver o que de implícito pode ser descoberto.

► Os implícitos, chamados popularmente de “indiretas” acabam sendo uma forma importante que temos de dizer coisas que não temos coragem ou não queremos dizer abertamente. Porém, muitas vezes esses implícitos saem sem querer, e acabam nos deixando numa tremenda “saia justa”. Você poderá colecionar com os alunos casos como esses e explorar essas histórias em sala, levantando com eles a polêmica sobre a necessidade de pensar mais antes de dizer alguma coisa.

Não deixe de postar no AVA sua avaliação sobre a aplicação das atividades.Assim, abriremos um debate

sobre o que está sendo proposto.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Que tal agora refletirmos acerca de algumas relações lexicais?

Nenhuma língua utiliza duas palavras ou expressões para dizer a mesmíssima coisa. Isso seria desperdício e implicaria a existência de palavras e expressões com sentidos iguais, que teriam sempre o mes-mo sentido em qualquer contexto. Mas isso não existe. Por menor que seja a mudança, ela sempre ocorre quando trocamos uma palavra ou expressão por outra. O estudo de fenômenos como os da sinonímia e da paráfrase nos ajudam a melhor compreender as possibilidades/relações de sentido entre as palavras e expressões.

De um modo geral, podemos dizer que a sinonímia é a relação que existe entre duas palavras, expressões ou grupos de palavras que podem se alternar em determinados contextos, dependendo do uso que lhes é atribuído. É o que pode ser visto no exemplo abaixo em que as sentenças “gorila” e “macacos” possuem uma relação de sinonímia com o emprego metafórico e literal respectivamente. “Eu já era gorila, para que ia comer macacos?” João Batista Figueiredo, dizendo em ví-deo gravado em 1987 por que recusou um prato feito com cérebro de macaco oferecido pelo rei de Marrocos. (Veja – 12/01/2000).

Os sinônimos nunca apresentam uma identidade completa de sig-nificado. A escolha entre séries sinonímicas, muitas vezes, denota atitu-des dos falantes ou adquirem significados específicos em função do seu contexto de uso, por exemplo, pandorga, papagaio, arraia, pipa, entre outros são termos utilizados no Brasil para designar um mesmo objeto.

Quando, ao escrever um texto, você procurar um sinônimo para retomar alguma ideia e evitar repetições, deve garantir que a nova palavra escolhida seja adequada ao contexto do texto que está sendo elaborado.

Cançado (2008, p.42) se referindo a dependência da sinonímia ao contexto nos explica que

na maioria dos casos, pode-se dizer apenas que existe uma sinonímia baseada somente no signifi-cado conceitual da palavra,sem se levar em con-ta o estilo, as associações sociais ou dialetais, ou mesmo os registros.As palavras como gordo e obeso, por exemplo,podem ser intercambiáveis em determinados contextos,porém, provavelmente, a segunda ocorrência será mais usada por um endo-crinologista e a primeira tem uso corrente.

Portanto, devemos sempre pensar a sinonímia dentro do contexto de ocorrência. Isso significa abandonar a ideia da existência de sinô-

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nimos perfeitos, pois as palavras só estabelecem relação de sinonímia no enunciado e, como possuem mais de um sentido, podem ter uma equivalência adequada somente a um de seus sentidos e não à totali-dade deles. Como ilustração, Junior (2008, p.159) nos apresenta o par limpo/higienizado que é geralmente dado como sinônimo. Na frase “O banheiro está totalmente limpo”, podemos ver que as duas palavras funcionam sem problemas (O banheiro está totalmente higienizado.). Já na frase “Hoje, o céu está limpo e não vai chover.”, as palavras não funcionam mais como sinônimas (Hoje, o céu está higienizado e não vai chover. (?!)).

Atividade III21. É comum vermos em livros didáticos, listas de palavras que são dadas isoladas como sinônimas. A lista abaixo é um exemplo disso. Peça aos alunos que formulem frases em que essas palavras funcionem e outras em que não funcionem com sinônimas, ou seja, frases que permitam e outras que não permitam que as duas palavras possam ser usadas, uma no lugar da outra, sem problemas.

a) Feliz/ contente;b) Difícil/ complicado;c) Dar/oferecer;d) Cão /cachorro;e) Firme/sólido.

2. Nas paráfrases, embora tenhamos o mesmo referente, ao se fazer uma substituição novos aspectos são enfocados e isso pode alterar bastante o sentido geral do texto mudando a nossa forma de ver o referente. Dependendo da situação, pode-se usar desse expediente, de propósito, para ressaltar características positivas ou negativas de algo ou alguém que está sendo representado. Vejamos um exemplo de paráfrases colhidas em revistas sobre o ex Presidente Luis Inácio Lula da Silva:

Presidente Luís Inácio

Presidente Lula. O pai da fome zero. O único que não sabia de nada. O sindicalista que virou Presidente da República. O amigo de José Dirceu.

3. Sabendo que a imprensa usa muito esse expediente para enfocar características daquilo de que ela trata, peça aos alunos que procurem em revistas de opinião do tipo Veja, Época e Istoé, paráfrases utilizadas sobre personagens importantes do cenário político. Explore as diferenças de sentido de cada paráfrase nos exemplos que a turma trouxer, observando como esse

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

2 Sugestão de atividade retirada de Júnior (2008, p.159)

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procedimento interfere na maneira como vemos culturalmente o que está sendo representado.

4. 3Partindo do princípio de que toda repetição é deselegante e revela pobreza de recursos expressivos, os velhos manuais de redação recomendavam às vezes, que se procurassem formas alternativas para dizer as mesmas coisas. Às vezes, as alternativas eram estapafúrdias. Assim, em vez de “o café”, seria possível dizer, conforme o contexto, “rubiácea escaldante”, “infusão nacional por excelência”, “ouro verde”, “carro-chefe das nossas exportações” etc. Descubra um editorial de jornal em que um mesmo indivíduo (ou um mesmo fato, problema, etc.) seja designado de três modos diferentes.

Continuando nossa conversa...

Os fenômenos linguísticos da polissemia e da homonímia são fe-nômenos que segundo Cançado (2008) tem em comum o fato de uma mesma palavra fonológica apresentar vários sentidos, sendo que, na polissemia, estes sentidos mantém alguma relação entre si, o que não ocorre na homofonia.

Relembrando o que abordamos na unidade III, a polissemia tem como característica a adaptação semântica às diversas circunstâncias em que é usada, não há perda do seu sentido “básico”, que comumen-te lhe é constituído, mas sim, um “aproveitamento” deste sentido em prol da construção de uma dada significação. É, pois, a utilização de um item já existente em seu sentido figurado ou metafórico.

Com relação à homofonia, Rocha (1998) conceitua esse fenômeno como “[...] a propriedade de duas ou mais formas, inteiramente distin-tas pela significação ou função, terem a mesma estrutura fonológica” (p. 68). Ou seja, estes vocábulos podem possuir a mesma sonoridade e até o mesmo aspecto gráfico, mas possuem significados diferentes. Ao passo que na polissemia temos uma única palavra, isto é, uma só entrada lexical, com algumas características diferentes, as palavras homônimas tem duas ou mais entradas lexicais. Que tal praticar um pouco sobre isso?

3 Proposta de atividade sugerida em Ilari (2010, p.149)

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Atividade IV

A polissemia permite que uma mesma palavra seja multifuncional, isto é, funcione em vários textos, com os mais diferentes sentidos.

Palavras “multiuso”

Você é capaz de calcular quantas vezes já usou a palavra coisa? E suas derivadas – coisinha, coisificar, coisar, coisíssima? Eis aí uma coisa difícil de calcular. A palavra coisa apresenta tantos significa-dos, que acaba servindo para quase todas as situações do cotidia-no. Ela está nas conversas do dia a dia, na literatura, nas letras de música, nos títulos de livros, no discurso político, na televisão. O dicionário eletrônico Houaiss de língua portuguesa registra dezeno-ve significados para essa palavra. De todos, o mais geral é “tudo quanto existe ou possa existir, de natureza corpórea ou incorpórea”. Como se vê, coisa é tudo. Por outro lado, usar essa palavra para tudo pode revelar pobreza de vocabulário. (Cereja, 2010, p. 138.)

1. Peça aos alunos que prestem atenção, durante alguns dias, no uso da palavra “coisa” e nos sentidos que ela recebeu. Peça que eles anotem em relação a qual referente ela foi utilizada em cada vez que foi dita por alguém. Promova um debate para apresentação e socialização de como concluíram que a palavra estava sendo utilizada em relação àquele referente específico.

2. A gíria se fundamenta, basicamente, na utilização de palavras comuns à língua com outro sentido. Partindo desse fato, proponha à turma a análise do banner de divulgação de uma campanha do Ministério do Meio Ambiente que faz uso da gíria em seu slogan. Atente para explorar o slogan, o público alvo, propósito comunicativo, entre outros aspectos.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Banner de divulgação de uma campanha do Ministério do Meio Ambiente a favor da redução do uso de sacolas plásticas.

E aí, você já aplicou alguma das atividades sugeridas? Não deixe de socializar no AVA como foi sua experiência!

Estendendo um pouquinho a conversa...

Observamos no decorrer do curso, que não é rara a utilização de termos ambíguos em enunciados da modalidade oral ou escrita da lín-gua. Em algumas situações, a exemplo de textos publicitários, poéticos, e humorísticos, a ambiguidade chega a ser utilizada como recurso de expressão na construção do efeito de sentido desejado. Por outro lado, em outros contextos, nos quais se exige uma linguagem objetiva, como em textos acadêmicos, tal recurso passa a ser visto como um problema que afeta a clareza e precisão do texto.

A ambiguidade é a característica de enunciados construídos de for-ma a possuir mais de um sentido. Segundo Ilari e Geraldi (1994), tal fato ocorre em diferentes níveis além do lexical, logo a ambiguidade pode ser estrutural ou contextual -, o que depende da natureza do recurso responsável pelo efeito de múltiplos sentidos. Se sentir neces-sidade rever a 3ª unidade que aborda sistematicamente a noção de ambiguidade.

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Atividade V

1. Nas sentenças abaixo, proponha que a turma identifique as ambiguidades, suas causas e apresente soluções que as eliminem do texto:

a) Foi aí que o americano disse ao brasileiro que estava impossível viver no seu país.

b) João, cara, você nem sabe: José acabou de chegar com seu carro todo arranhado.

c) Maria viu a prima com sua saia nova e achou que ficou muito cafona.

d) Tudo o que eu queria era que João entregasse logo para José o rádio dele.

e) Maria deu a Joana a régua dela, mas estava quebrada e não serviu pra fazer a tarefa de Geometria.

f) Se João cuidasse das coisas dele, José não ficava tão bravo assim.

g) Se o mecânico não consertar o seu carro, João, é sinal de que ele não é um bom mecânico.

h) O mecânico não consertou o carro dele e João, por isso, resolveu mudar para um mecânico melhor.

2. Na música popular é comum que os compositores utilizem palavras polissêmicas para permitir uma interpretação maliciosa da letra. Peça que os alunos façam um levantamento de músicas populares em que isso acontece, transcrevam algumas letras e identifiquem as causas criadas pelos compositores para permitir esse duplo sentido.

3. É muito comum que programas de televisão recorram à ambiguidade como recurso para tiradas humorísticas. Peça aos alunos que assistam a alguns programas humorísticos de TV e anotem algo sobre como a ambiguidade foi utilizada nos quadros desses programas. Uma outra alternativa seria a de encenar quadros humorísticos baseados nos quadros de TV ou em textos feitos pelos próprios alunos.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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Encerrando a nossa conversa...

Este último tópico, terá como sugestão a apresentação de algumas propostas de trabalho tanto de compreensão quanto de produção tex-tual a partir da leitura do texto A palavra de Pablo Neruda. Esta suges-tão encontra-se no livro: “Estudar vocabulário: como e para quê?” e aqui reproduzo acreditando que irá ajudá-lo (a) na construção de uma prática pedagógica mais proveitosa e gratificante.

Partimos da leitura do texto A palavra de Pablo Neruda, no qual ele faz referência às consequências da colonização espanhola na América e à importância das palavras em sua vida.

A palavra

...Sim senhor, tudo o que queira, mas são as palavras as que cantam, as que sobem e baixam... Prosterno-me diante delas... Amo-as, uno-me a elas, persigo-as, mordo-as, derreto-as... Amo tanto as palavras... As inesperadas... As que avidamente a gente espera, espreita até que de repente caem... Vocábulos amados... Brilham como pedras coloridas, saltam como peixes de prata, são espuma, fio, metal, orvalho... Persigo algumas palavras... São tão belas que quero colocá-las todas em meu poema... Agarro-as no voo, quando vão zumbindo, e capturo-as, limpo-as, aparou-as, preparo-me diante do prato, sinto-as cristalinas, vibrantes, ebúr-neas, vegetais, oleosas, como frutas, como algas, como ágatas, como azeitonas... E então as revolvo, agito-as, bebo-as, sugo-as, trituro-as, adorno-as, liberto-as... Deixo-as como estalactites em meu poema, como pedacinhos de madeira polida, como carvão, como restos de um naufrágio, presentes na onda... Tudo está na palavra... Uma ideia inteira muda porque uma palavra mudou de lugar ou porque outra se sentou como uma rainha dentro de uma frase que não a esperava e que a obedeceu... têm sombra, transpa-rência, peso, plumas, pelos, têm tudo o que se lhes foi agregado de tanto vagar pelo rio, de tanto transmigrar de pátria, de tanto ser raí-zes... São antiquíssimas e recentíssimas. Vivem no féretro escondido e na flor apenas desabrochada... Que bom idioma o meu, que boa língua herdamos dos conquistadores torvos... Estes andavam a passos largos pelas tremendas cordilheiras, pela Américas encres-padas, buscando batatas, butifarras, feijõezinhos, tabaco negro, ouro, milho, ovos fritos, com aquele apetite voraz que nunca mais se viu no mundo... Tragavam tudo: religiões, pirâmides, tribos, ido-latrias iguais às que traziam em suas bolsas... Por onde passavam a terra ficava arrasada... Mas caíam das botas dos bárbaros, das

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barbas, dos elmos, das ferraduras, como pedrinhas, as palavras, as palavras luminosas que permaneceram aqui resplandecentes... o idioma. Saímos perdendo... saímos ganhando... Levaram tudo e os deixaram tudo... Deixaram-nos as palavras.(Pablo Neruda, Confesso que vivi: memórias.Trad.Olga Savary.Rio de Janeiro:Difel,1974 p. 51-52)

Questões relacionadas à construção de sentidos do texto

1. Qual a importância das palavras para o narrador? Explique sua resposta.

2. Que julgamento o narrador faz da ação do colonizador?Justifique sua resposta, ilustrando-a com fragmentos retirados do texto.

3. O texto está escrito em dois eixos: as palavras e os conquistadores. Faça o levantamento dos substantivos, adjetivos e verbos que se referem a cada um, formando dois campos lexicais.

Ex: Palavras: cantam, sobem, peixes de prata, cristalinas...

Conquistadores: torvos, andavam a passos largos, tragavam...

3.1. Observe os dois campos e diga qual é o sentimento do narrador em relação às palavras e aos conquistadores. Explique sua resposta.

4. Compare a resposta dada à questão 3 com as dadas às questões 1 e 2.Elas se confirmam ou divergem? Por quê?

5. Que sentidos as metáforas e sinestesias podem atribuir ao texto? (Identifique algumas metáforas e sinestesias e explique o processo conotativo que está em jogo no texto).

6. O texto finaliza com: “Saímos perdendo... saímos ganhando... Levaram tudo e nos deixaram o ouro... Levaram tudo e nos deixaram tudo...” Esse fragmento é incoerente?Como você explica essa redação?E como interpreta esse trecho?

7. A que/quem o narrador se refere, quando afirma “Tragavam tudo: religiões, pirâmides, tribos, idolatrias iguais às que eles traziam...”? Como você encontrou sua resposta?

8. Considerando os contextos “Conquistadores torvos... buscando batatas, ouro... ovos fritos; tragavam tudo; a terra ficava arrasada...”, o que significa “apetite voraz”?

9. Em países governados por reis, é possível encontrar vassalos que se curvam

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até o chão diante de sua majestade em sinal de respeito e admiração. No início do texto em estudo, o narrador afirma ter essa atitude para com as palavras. Identifique e transcreva a passagem que confirma essa atitude.

10. No texto há uma referência, de forma indireta, à dinâmica de ampliação do léxico e à riqueza de sentidos que os vocábulos podem ter. Identifique os fragmentos que podem ser relacionados a:

a) Arcaísmos e neologismos:b) Empréstimos linguísticos:c) Conjunto de sentidos de uma palavra, por ser empregada em vários contextos:d) Uso inadequado da palavra:

Questões relacionadas à produção textual

O processo de ensino/aprendizagem da escrita está diretamente ligado às práticas de letramento e a teorias de gênero textual, para que a atividade de escritura, na escola, não se limite apenas a uma tarefa escolar, cujo leitor é o próprio professor.Assim,a escolha lexical por parte do aluno está relacionada ao gênero textual , ao registro linguístico,ao tema, ao interlocutor,enfim,às condições de produção do texto.

• Escreva uma carta a um amigo, dizendo-lhe que leu o texto de Neruda e resuma-o. Ao usar as palavras que seu amigo possivelmente não conheça, utilize alguns dos recursos que a língua portuguesa oferece, para explicá-las (isto é, ou seja, em outras palavras, dois pontos, parênteses, vírgula, travessões).

• Leia a sequência narrativa abaixo e substitua o verbo dizer por outros verbos de elocução mais adequados às situações demonstradas

Na casa da mamãe Elena a preparação do chouriço tinha todo um ritual. (...) Sentavam-se pelas tardes na mesa de jantar e entre conver-sas e brincadeiras o tempo passava voando até começar a escurecer. Então Mamãe Elena dizia:

- Por hoje, terminamos com isto.

Dizem que para bom entendedor meia palavra basta; sendo assim, depois de escutar esta frase todos sabiam o que tinham de fazer. (...) Numa tardes dessas, antes que Mamãe Elena dissesse que podiam se levantar da mesa, Tita, que então contava quinze anos de idade, lhe disse com voz trêmula que Pedro Muzquiz queria vir falar com ela...

- E de que este senhor tem de vir me falar? – disse Mamãe Elena depois de um silêncio interminável que fez a alma de Tita se encolher.

Com voz apenas perceptível disse:

- Não sei.

Mamãe Elena lançou-lhe um olhar que para Tita encerrava todos os

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anos de repressão que haviam flutuado sobre a família e disse:

-Pois mais vale que lhe informes que se é para pedir tua mão, não o faça. (...)(Laura Esquivel, Como água para chocolate, São Paulo: Martins Fontes, 1993)

Essas sugestões de trabalho com o vocabulário, relacionadas ao texto, contribuem para diversificar os exercícios tão previsíveis de sinônimos e antônimos, atentando para outras possibilidades de explorar os processos de criação de sentidos, abrindo, assim, novas perspectivas para um ensino mais criativo e exitoso.

Leituras recomendadas

A obra se fundamenta nos conceitos e princípios da se-mântica. Todo o trabalho pro-posto contempla uma relação direta entre língua e cultura, muito mais do que um enfoque

estrutural do sistema linguístico. Ela acentua o conhecimento dos fe-nômenos muito mais do que da terminologia que se adota em sua classificação.

O livro de Moura é muito útil para aqueles que querem adquirir noções básicas da semântica lin-guística com questões situadas na interface da semântica e da prag-mática. O ponto forte do está na clareza e simplicidade com que trata de questões complexas no

campo de semântica. O autor também destaca, com êxito, as dificul-dades no que tange à demarcação da fronteira entre a semântica e a pragmática.

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Resumo

Esta última unidade constitui-se da revisão de alguns temas estuda-dos nas unidades anteriores através de várias atividades propostas que possam ser aplicadas em sala de aula visando à construção de uma prática pedagógica que estimule cada vez mais a reflexão sobre a lin-guagem. Não foram enfatizadas de forma explícitas teorias, no entanto, em cada atividade proposta, estas estavam presentes.

Para refletir...

“Ao contrário do que acontece com a “gramática”, simplesmente não existe em nosso ensino a tradição de tratar do sentido através de exercícios específicos, e isso leva o professor da escola média a acre-

ditar que, nessa área, não há nada de interessante a fazer”.

Ilari

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AutovaliaçãoCom base nas leituras feitas e nas sugestões de atividades, deixe aqui sua autoavaliação. Tome como norte para tal atividade a passagem abaixo:

Os vários significados que podem ser atribuídos a uma pa-lavra são determinados pelo contexto no qual a palavra está inserida, ou seja, quando falamos de palavras e seus respec-tivos significados, devemos falar também, dos fatores que cer-cam a enunciação dessa palavra.

dica. utilize o bloco de anotações para responder as atividades!

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ReferênciasABAURRE, Maria Luiza. Português, contexto, interlocução e sentido. São Paulo: Moderna, 2008.

BEZERRA, Maria Auxiliadora. (org.). Estudar vocabulário: como e para quê? Campina Grande: Bagagem, 2004.

CANÇADO, Márcia. Manual de semântica: noções básicas e exercícios. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008.

CEREJA, Wiliam Roberto. Português linguagens: vol. 1 São Paulo: Saraiva, 2010.

ILARI, Rodolfo. Introdução à semântica – brincando com a gramática. São Paulo: Editora Contexto, 2010.

_______________ ; GERALDI, João Wanderley. Semântica. São Paulo: Editora Ática, 1994.

JUNIOR, Celso Ferrarezi. Semântica para a educação básica. São Paulo: Parábola Editorial, 2008.

KOCH, I. G. V. Argumentação e linguagem. 9. ed. São Paulo: Cortez, 2004.

MOURA, Heronides Maurícilo de Melo. Significação e contexto: uma introdução a questões de semântica e pragmática. 2ª d.Florianópolis: Editora Insular, 2000.

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