capacitaÇÃo tecnolÓgica e inovaÇÃo na indÚstria … · elaboração própria a partir de...
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
INSTITUTO DE ECONOMIA
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
CAPACITAÇÃO TECNOLÓGICA E INOVAÇÃO NA INDÚSTRIA DE REFINO DE PETRÓLEO
NO BRASIL: O CASO PETROBRÁS
LETÍCIA KAYOCO PONZONI DRE 106.113.242
Orientador: Prof. Paulo Tigre
RIO DE JANEIRO
JUNHO 2009
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CAPACITAÇÃO TECNOLÓGICA E INOVAÇÃO NA INDÚSTRIA DE REFINO DE PETRÓLEO NO
BRASIL: O CASO PETROBRÁS
LETÍCIA KAYOCO PONZONI
Dissertação submetida ao corpo docente do Programa de
Pós-graduação do Instituto de Economia da Universidade
Federal do Rio de Janeiro como parte dos requisitos
necessários à obtenção do título de mestre em Ciências
Econômicas.
Banca Examinadora:
_________________________________________ Prof. Dr. Paulo Bastos Tigre (Orientador) Instituto de Economia / UFRJ _________________________________________ Prof. Dr. José Eduardo Cassiolato Instituto de Economia / UFRJ _________________________________________ Prof. Dr. José Vitor Bomtempo Martins Escola de Química / UFRJ
RIO DE JANEIRO
JUNHO 2009
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Agradecimentos
Em primeiro lugar, agradeço ao meu orientador, o Professor Paulo Tigre, pela atenção, apoio, e valiosas sugestões para este trabalho.
Agradeço também ao Engenheiro Dorodame Leitão, pela gentileza de me conceder seu livro que relata sua vasta e valiosa experiência na área de refino da Petrobras. Este material foi de grande importância para a realização deste trabalho.
Sou grata também ao meu chefe na Petrobras, Gustavo Casareski, por ter permitido a minha ausência durante o período em que ainda cursava disciplinas do mestrado. Sem esta concessão, esta dissertação não teria sequer começado a ser feita.
Agradeço ao André, por todo o seu amor, companheirismo, cuidado e compreensão aos meus momentos de ausência.
Sou grata a todas as minhas queridas amigas, pelos momentos de alegria que me proporcionam. Devo um agradecimento especial à Silvia, pela torcida e por ouvir meus desabafos diariamente, e à Clarice, pelas palavras de conforto e por seus conselhos.
Aos meus irmãos, Andréa e Pedro, por sua preocupação e tolerância.
Finalmente, expresso toda a minha gratidão aos meus pais, Cayoco e Pedro, pelas “consultorias técnicas” em química, e pelo apoio incondicional. Agradeço por todo o carinho e dedicação com que sempre me trataram.
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Resumo:
O presente trabalho tem o objetivo de analisar a evolução da capacitação tecnológica da Petrobras no segmento de refino de petróleo. Para isto, foi abordado um referencial teórico relacionado ao tema, com questões como fontes de inovação e aprendizado tecnológico. É apresentada também uma caracterização da indústria de refino, destacando-se sua elevada intensidade de capital e os principais processos de refino. Finalmente, faz-se uma análise da capacitação tecnológica da Petrobras propriamente dita, onde se observa a existência de path-dependencies no que tange aos avanços alcançados pela empresa, que passou da posição de importadora de tecnologias tangíveis da forma de “pacotes fechados” para o domínio e desenvolvimento de tecnologias próprias.
Palavras-chave: refino de petróleo; Petrobras capacitação tecnológica; P&D.
Abstract:
This work aims to analyze the evolution of Petrobras’ technological capability in the oil refining industry. To attain this purpose, an approach to the theoretical framework regarding this subject, including issues as innovation sources and technological learning, was made. Additionally, the study presents a characterization of the refining industry, highlighting its capital-intensive aspect and the main refining processes. Lastly, an analysis about Petrobras’ technological capability is presented indicating the existence of path-dependencies concerning the progress achieved by the company, which parted from the position of a black-box technology importer to the knowledge and development of its own technologies.
Keywords: oil refining; Petrobras; technological capability; R&D.
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ÍNDICE
INTRODUÇÃO ....................................................................................................................8
CAPÍTULO I - REFERENCIAL TEÓRICO: FONTES DE INOVAÇÃ O, APRENDIZADO E CAPACITAÇÃO..............................................................................11
I.1. AS FONTES DE INOVAÇÃO........................................................................................................................ 11
I.2. APRENDIZADO TECNOLÓGICO................................................................................................................. 16
I.3. AS “CAPACIDADES DINÂMICAS”.............................................................................................................. 21 I.3.1. Os processos da firma..................................................................................................................... 22 I.3.2. A posição estratégica ...................................................................................................................... 22 I.3.3. As trajetórias da firma .................................................................................................................... 23
I.4. CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................................................... 24
CAPÍTULO II - CARACTERIZAÇÃO DA INDÚSTRIA DE REFINO DE PETRÓLEO........................................................................................................................26
II.1. CARACTERÍSTICAS ECONÔMICAS........................................................................................................... 26
II.2. CARACTERÍSTICAS TÉCNICAS................................................................................................................. 30 II.2.1. Caracterização do petróleo ........................................................................................................... 30 II.2.2. Os processos de refino................................................................................................................... 32
II.3. TRAJETÓRIA DO SETOR EM NÍVEL MUNDIAL........................................................................................... 40 II.3.1. Um breve histórico......................................................................................................................... 40 II.3.2. O perfil da demanda por derivados ............................................................................................... 46 II.3.3. Tendências e desafios para o setor ................................................................................................ 50
CAPÍTULO III - A INDÚSTRIA DE REFINO BRASILEIRA E A CAPACITAÇÃO TECNOLÓGICA DA PETROBRÁS ...............................................................................53
III.1. A CONSTRUÇÃO DAS REFINARIAS BRASILEIRAS: UM BREVE HISTÓRICO................................................ 53
III.2. A DEMANDA POR DERIVADOS DE PETRÓLEO NO BRASIL ....................................................................... 55
III.3. EVOLUÇÃO DA CAPACITAÇÃO TECNOLÓGICA DA PETROBRÁS NO REFINO DE PETRÓLEO...................... 58 III.3.1. Capacitação técnica e importação de tecnologia na forma de caixa preta ................................. 59 III.3.2. O início da “abertura dos pacotes tecnológicos” ........................................................................ 61 III.3.3. O início da atividade centralizada de Engenharia Básica e a adaptação de tecnologias............ 64 III.3.4. Os choques do petróleo e o aumento da importância do CENPES .............................................. 65 III.3.5. O PROTER e a consolidação do desenvolvimento tecnológico próprio ...................................... 71
III.4. PANORAMA ATUAL DO REFINO BRASILEIRO.......................................................................................... 75 III.4.1. Os dados da PINTEC sobre P&D ................................................................................................ 75 III.4.2. O desenvolvimento de tecnologias para as novas refinarias........................................................ 79
CONCLUSÃO.....................................................................................................................85
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................................88
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ÍNDICE DE FIGURAS E TABELAS
Tabela 2.1: Composição do petróleo por elemento químico, em percentual da massa. Fonte: Lage et al (2007). ..................................................................................................................................... 30
Figura 2.1: Evolução da capacidade de refino mundial por região (em mil barris por dia). Fonte: Elaboração própria a partir de British Petroleum (2008). .............................................................. 42
Figura 2.2: Evolução da demanda mundial de derivados de petróleo por tipo de produto (em mil barris por dia). Fonte: Elaboração própria a partir de British Petroleum (2008). ............................ 47
Figura 3.1: Evolução da participação dos diversos produtos no consumo brasileiro de derivados de petróleo. Fonte: MME (2008)....................................................................................................... 55
Figura 3.2: Composição dos gastos com inovação na indústria de refino de petróleo por tipo de atividade inovativa. Fonte: Elaboração própria a partir de IBGE (2005) e Eurostat (2004)............ 76
Figura 3.3: Participação do número de pessoas ocupadas em atividades internas de P&D sobre o número total de pessoas ocupadas na indústria no Brasil. Fonte: Elaboração própria a partir de IBGE (2005). ............................................................................................................................... 78
Figura 3.4: Evolução do volume de óleo cru processado nas refinarias brasileiras, segundo a origem (em mil barris por dia). Fonte: Elaboração própria a partir de ANP (2001) e ANP (2008). ............ 79
Figura 3.5: Esquema de refino a ser adotado na Refinaria Abreu e Lima. Fonte: EPE (2008). ....... 82
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LISTA DE SIGLAS
API: American Petroleum Institute
CENPES: Centro de Pesquisas e Desenvolvimento Leopoldo Américo Miguez de Mello
COMPERJ: Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro
E&P: Exploração e Produção de Petróleo
FCC: Craqueamento Catalítico Fluido
GLP: Gás Liquefeito de Petróleo
HDT: Hidrotratamento
INPI: Instituto Nacional de Propriedade Industrial
LCO: Óleo Leve de Reciclo
P&D: Pesquisa e Desenvolvimento
PINTEC: Pesquisa Industrial de Inovação Tecnológica
PROÁLCOOL: Programa Nacional do Álcool
PROTER: Programa de Tecnologias Estratégicas do Refino
RAT: Resíduo Atmosférico
RFCC: Craqueamento Catalítico Fluido de Resíduos
UCR: Unidade de Coqueamento Retardado
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INTRODUÇÃO
O objetivo desta dissertação será analisar a trajetória da Petrobrás no tocante à
capacitação tecnológica da indústria de refino de petróleo brasileira, desde a sua criação, na
década de 1950, até os dias de hoje.
O suprimento energético adequado é um fator de fundamental importância para o
desenvolvimento de um país. E o petróleo, por sua vez, é a principal fonte de energia
primária da matriz energética mundial, desde o fim da Segunda Guerra.
O maior interesse pelo segmento de refino do petróleo, especificamente, decorre
principalmente de sua atuação como um “intermediário” entre a atividade de exploração e
produção (E&P) e a venda dos derivados aos consumidores finais. Vale lembrar que a
demanda dos consumidores é essencialmente pelos derivados, e não pelo petróleo cru.
Desta forma, cumpre-se uma importante função econômica, no sentido de buscar suprir a
demanda por derivados a partir da matéria-prima disponível. Neste sentido, o mundo se
depara com um grande desafio, já que o petróleo disponível está cada vez mais pesado,
enquanto a demanda se concentra cada vez mais em derivados leves e médios.
Frente a este desafio, entende-se que, no Brasil, foi (e é) de fundamental
importância a trajetória da Petrobrás na busca de soluções, por meio da evolução de sua
capacitação tecnológica.
A hipótese com a qual se está trabalhando é a de que o processo de capacitação
tecnológica da Petrobrás apresenta um caráter cumulativo. Cada etapa do seu aprendizado
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foi essencial para o êxito nas etapas seguintes. A evolução tecnológica da empresa foi um
processo gradual e cumulativo.
A metodologia da dissertação consiste, primeiramente, em uma revisão da literatura
teórica acerca da questão da tecnologia e inovação, que guarda estreita relação com o tema
abordado. Mais especificamente, sobre as diferentes fontes de inovação que podem ser
adotadas pelas empresas, serão utilizadas ideias apresentadas por Tigre (2006), e os
conceitos definidos pela PINTEC – Pesquisa Industrial de Inovação Tecnológica, divulgada
pela IBGE. Outro tema a ser abordado no referencial teórico é a questão do aprendizado
tecnológico, com base em artigos como o de Malerba (1992).
Como fontes secundárias para o trabalho serão utilizados artigos e livros com
relatos de pessoas que vivenciaram diversas etapas do desenvolvimento tecnológico da
Petrobras na área de refino, a exemplo de Leitão (2005) e Leite (2005). Serão abordados
aspectos como as fontes de inovação mais utilizadas em cada uma destas etapas, e a
natureza do aprendizado tecnológico. Tais conceitos já terão sido desenvolvidos no capítulo
de referencial teórico. Ainda no campo das fontes secundárias, serão utilizadas, para
caracterização técnica e econômica da indústria de refino, referências como Enos (1962),
Szklo e Uller (2008) e Ferraz et al (1996).
Pretende-se utilizar ainda, como fonte primária de informação, alguns dados da
PINTEC 2005. Pretende-se mostrar o perfil atual da estratégia inovativa da indústria de
refino de petróleo brasileira, que é composta essencialmente pela Petrobras.
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A dissertação está dividida em três capítulos. No primeiro, pretende-se apresentar o
referencial teórico da dissertação. Serão abordadas questões como as fontes de inovação e o
aprendizado tecnológico.
No Capítulo II, iremos discorrer sobre as características fundamentais da indústria
de refino de petróleo, incluindo seus aspectos técnicos e econômicos. Pretende-se abordar
também um panorama do setor em nível mundial.
Finalmente, o terceiro capítulo tratará da indústria de refino brasileira, e, mais
especificamente, da evolução tecnológica da Petrobrás nesta área.
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CAPÍTULO I - REFERENCIAL TEÓRICO: FONTES DE INOVAÇ ÃO,
APRENDIZADO E CAPACITAÇÃO
Este capítulo tem por objetivo apresentar os fundamentos teóricos presentes na
literatura econômica que são mais relevantes para a análise da capacitação tecnológica da
indústria de refino de petróleo na Petrobras. Na primeira seção, é apresentada uma tipologia
sobre as principais fontes de inovação que podem ser adotadas pelas empresas. A atenção
atribuída ao tema justifica-se na medida em que se pretende analisar quais foram e como
evoluíram as principais fontes de inovação utilizadas pela Petrobras ao longo de sua
trajetória na área de refino.
Na seção I.2, discorremos sobre o aprendizado tecnológico, principalmente a partir
da taxonomia de Malerba (1992). A indústria de refino brasileira passou por diversos tipos
de processos de aprendizado durante sua evolução. Finalmente, a última seção apresenta o
conceito de “capacidades dinâmicas”, desenvolvido por Teece e Pisano (1994), que
consiste na habilidade das empresas em adaptar-se a alterações que ocorrem no ambiente.
Considera-se procedente a análise deste conceito na medida em que as ações da Petrobras
ao longo de toda a sua história foram fundamentais para que a companhia se capacitasse
para a busca de novas soluções diante das mudanças no cenário econômico.
I.1. As fontes de inovação
Crescentemente, a inovação tem sido um instrumento fundamental para a melhora
da produtividade e competitividade das firmas, bem como para estimular o
desenvolvimento econômico dos países. Para a realização das inovações, as empresas
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recorrem a diferentes fontes de tecnologia e aprendizado. Estas fontes podem ser internas
ou adquiridas externamente à firma.
Tigre (2006) propõe uma tipologia que sumariza as principais fontes de tecnologia
adotadas pelas empresas, quais sejam: i) Desenvolvimento Tecnológico Próprio; ii)
Contatos de Transferência de Tecnologia; iii) Tecnologia Incorporada; iv) Conhecimento
Codificado; v) Conhecimento Tácito; vi) Aprendizado Cumulativo.
O desenvolvimento tecnológico próprio consiste principalmente em atividades
internas de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D). Tais atividades normalmente são divididas
em três tipos: pesquisa básica, pesquisa aplicada e desenvolvimento experimental, muito
embora esta divisão não seja linear.
A pesquisa básica consiste em trabalhos teóricos ou experimentais que visam
contribuir para a compreensão de fenômenos ou teorias, sem ter como objetivo aplicação
específica imediata. O foco principal da pesquisa básica é o avanço científico. Em função
das elevadas incertezas e do longo prazo de seus resultados, esta atividade em geral é
evitada pelas empresas, ficando normalmente a cargo das universidades. Por outro lado, a
pesquisa aplicada é dirigida a um objetivo prático específico, podendo, inclusive, encontrar
possíveis usos para as descobertas feitas na pesquisa básica. Finalmente, o desenvolvimento
experimental consiste no trabalho sistemático orientado no sentido de desenvolver ou
aperfeiçoar materiais, produtos e processos. Segundo IBGE (2006), no âmbito deste tipo de
atividade, os principais destaques são o desenho, a construção e o teste de protótipos ou de
instalações-piloto.
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Já os contratos de transferência de tecnologia, por sua vez, são uma forma de se
adquirir conhecimentos externos à firma. Podem ocorrer por meio de assistência técnica, da
obtenção de licença para fabricação de produtos já existentes no mercado, ou da aquisição
de serviços técnicos e de engenharia (TIGRE, 2006). Este tipo de contrato normalmente se
dá em nível internacional, já que, para a empresa que detém a tecnologia, não é vantajoso
fomentar suas concorrentes, que atuam no mesmo mercado.
De acordo com Longo (1978), os acordos de transferência de tecnologia se dão de
diferentes formas, podendo propiciar ou não uma verdadeira transmissão de conhecimentos.
Em muitos casos, o acordo abarca simplesmente uma ‘venda de instruções’, sem o repasse
dos conhecimentos que as geraram. Em outras ocasiões, a transferência pode se dar de
maneira mais completa, com uma maior ‘abertura do pacote tecnológico’. Contudo, para
que isto seja possível, é necessário que o receptor esteja capacitado para absorver este
conhecimento, principalmente em termos de recursos humanos.
Outro tipo de fonte de inovação utilizada pelas empresas é a tecnologia incorporada,
que consiste principalmente na aquisição de máquinas e equipamentos. Esta é a principal
fonte de inovação da maioria das empresas dos países em desenvolvimento. No entanto, a
compra de tecnologias tangíveis, não acompanhada de esforços tecnológicos próprios, gera
limitações para a empresa, na medida em que restringe a capacidade de adaptação e
aperfeiçoamento destas tecnologias adquiridas. Estas limitações ficam mais evidentes
quando as máquinas e equipamentos são importados, já que, muitas vezes, as tecnologias
desenvolvidas no contexto de um país não são adequadas às condições locais de outros.
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A fonte de inovação baseada no conhecimento codificado consiste na busca em
manuais, livros, revistas técnicas, internet, etc. (TIGRE, 2006). Conforme explica Lemos
(1999), são conhecimentos que podem ser transformados em mensagens, sendo
manipulados como informações.
O conhecimento tácito, por sua vez, não é facilmente transferível, e não pode ser
explicitado formalmente. Trata-se de habilidades provenientes de experiências acumuladas
de indivíduos ou organizações. Tigre (2006) destaca como exemplos da aquisição deste tipo
de conhecimento a contratação de consultorias, a absorção de informações de clientes e
treinamentos.
Finalmente, as empresas podem inovar a partir do aprendizado cumulativo, nas suas
diversas formas: fazendo, usando, pesquisando, etc. Estes conceitos serão mais bem
desenvolvidos na próxima seção, que trata especificamente dos processos de aprendizado.
As diversas empresas, nos variados países, apresentam diferentes perfis no tocante à
adoção de cada uma destas fontes. Nos países em desenvolvimento, é comum as empresas
investirem intensivamente na aquisição de novas máquinas e equipamentos e muito pouco
em desenvolvimento tecnológico próprio. Já as grandes empresas dos países desenvolvidos
são bem mais intensivas em atividades internas de P&D.
Neste sentido, Bell e Pavitt (1993) enfatizam a importância do investimento em
desenvolvimento tecnológico próprio de forma complementar à aquisição de tecnologias
tangíveis. Os autores fazem a distinção entre os conceitos de capacidade produtiva e
capacitação tecnológica. O primeiro refere-se aos recursos utilizados estritamente para
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produção industrial, que apresentam um determinado nível de eficiência e combinações de
insumos dadas. É o caso, por exemplo, da incorporação de novas máquinas e equipamentos
e das habilidades operacionais. Já a capacitação tecnológica é entendida pelos autores como
os recursos necessários para se gerar e dominar as mudanças técnicas. Neste conceito,
incluem-se habilidades, conhecimentos, experiências, e articulações com instituições. O
processo pelo qual estas capacitações crescem ou se fortalecem é denominado acumulação
tecnológica.
Bell e Pavitt (1993) ressaltam que as firmas dinâmicas tecnologicamente raramente
têm um papel passivo, com a simples aquisição de equipamentos para a produção. Elas, em
grande medida, geram tecnologias próprias, podendo agregá-las aos bens de capital
adquiridos, e desenvolver projetos e especificações, inclusive em parceira com os próprios
fornecedores. Desta forma, estas firmas podem ter o controle de decisões estratégicas sobre
a tecnologia. Nos países industrializados, em geral as empresas usuárias de tecnologias
possuem conhecimentos e habilidades requeridos para que possam exercer funções de
criação, de forma ativa. Entre estas funções, podem ser destacados o aperfeiçoamento de
processos em uso, a modificação de produtos já existentes, a diversificação de matérias-
primas ou de materiais de consumo, e a criação de novos processos a serem adotados pelas
firmas fornecedoras.
Os autores chamam atenção para a crescente importância dos recursos intangíveis,
inclusive em termos quantitativos. Destaca-se que, nas grandes empresas dos países
desenvolvidos, os dispêndios com P&D – principalmente com a criação de novos
conhecimentos e assimilação de conhecimentos externos - muitas vezes chegam a ser
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superiores aos gastos com aquisição de capital fixo. O investimento em capital intangível é
necessário para que as firmas sejam capazes, não só de operar os equipamentos e máquinas,
mas também de selecionar os que melhor atendam aos seus propósitos, de melhorar seu
desempenho, de replicá-los, e de aperfeiçoá-los de modo a adaptá-los às suas
particularidades. Neste sentido, Cassiolato e Lastres (1998) argumentam que investir
apenas para ter acesso a novas tecnologias e sistemas avançados não basta, uma vez que o
conhecimento e o aprendizado estão amarrados a pessoas, sendo portanto recomendável o
investimento na capacitação e treinamento de recursos humanos.
I.2. Aprendizado tecnológico
Na literatura econômica, a noção de aprendizado tecnológico está relacionada a um
processo cumulativo, através do qual os agentes - usualmente as firmas - adquirem e
ampliam seus estoques de conhecimentos, com vistas a um aperfeiçoamento contínuo de
suas tecnologias e habilidades.
Malerba (1992) sugere uma abordagem ampla do processo de aprendizagem, que
não se limita àquele decorrente da atividade produtiva, e cujos efeitos vão além da redução
de custos. Neste sentido, o autor apresenta quatro proposições acerca do processo de
aprendizado. A primeira é que se trata de um processo custoso e orientado. Não ocorre
simplesmente de forma automática, como um subproduto da atividade de produção. As
firmas podem agir no sentido de promover o aprendizado tecnológico, com objetivos
específicos, e estas ações têm um custo. A segunda proposição é a de que o aprendizado
pode decorrer de diferentes fontes de conhecimento, as quais podem ser internas ou
externas à empresa. O aprendizado interno se dá em áreas de atividade da empresa, tais
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como produção, P&D e marketing. O aprendizado de fonte externa inclui conhecimentos
adquiridos de outras empresas da mesma indústria, de fornecedores, de clientes, ou de
instituições de pesquisa.
A terceira assertiva baseia-se na ideia do aprendizado como um processo
cumulativo que aumenta o estoque de conhecimento da firma. Desta forma, as empresas
podem ser caracterizadas pelos diferentes níveis e tipos de conhecimentos que têm
acumulados. Finalmente, supõe-se que o estoque de conhecimento da empresa gera, em
maior medida, inovações incrementais. A maioria dos novos produtos e processos consiste
em modificações e aperfeiçoamentos dos já existentes.
Para Malerba (1992), os processos de aprendizado podem se dar de diversas
maneiras. Neste sentido, o autor apresenta uma taxonomia que divide estes processos em
seis tipos: aprender fazendo, aprender usando, aprender com os avanços da ciência e
tecnologia, aprender com spillovers interindustriais, aprender interagindo, e aprender
pesquisando.
O processo de aprender fazendo (learning by doing) é interno à firma e está
relacionado ao desenvolvimento de habilidades crescentes na atividade produtiva. Arrow
(1962), o principal expositor deste conceito, entende que quanto mais experiência a
empresa tem em um determinado processo produtivo, maior será a sua produtividade. Esta
forma de aprendizagem é proveniente da repetição de tarefas operacionais e da maior
familiarização com o processo produtivo. Isto permite o desenvolvimento de competências
cada vez maiores na produção e, consequentemente, a melhoria da produtividade. Neste
modelo, o aprendizado é tratado como um subproduto da atividade produtiva, o que
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equivale a supor que as firmas aprendem “automaticamente”, não havendo a necessidade de
esforços explícitos para aprender. As outras formas de aprendizado presentes na taxonomia
de Malerba (1992) mostram que esta abordagem é bastante limitada, já que são observadas
nas empresas iniciativas direcionadas para o aprendizado, o qual é muito mais abrangente
do que aquele decorrente da experiência operacional.
Rosenberg (1982) ressalta que há formas de aprendizado que levam a melhorias no
processo produtivo, mas não necessariamente provêm da experiência neste processo
estritamente. O autor dá especial enfoque ao que denomina de aprendizado pelo uso
(learning by using). Trata-se da aquisição de conhecimento resultante da utilização do
produto pelos usuários finais, ou seja, em um momento posterior ao da atividade produtiva.
Ressalta-se que este tipo de aprendizado é importante principalmente em indústrias de bens
de capital, pois o desempenho destes bens é de difícil previsibilidade, só podendo ser
medido a partir de um longo período de experiência. Sugere-se que uma empresa pode
melhorar seus processos e produtos se conseguir compreender os problemas que são
gerados na utilização dos bens que produz.
Por sua vez, o aprendizado a partir de avanços da ciência consiste na absorção, pela
empresa, de novos conhecimentos gerados pela comunidade científica e tecnológica.
Segundo Tigre (2006), este tipo de aprendizado resulta do monitoramento dos resultados de
pesquisas realizadas em universidades e centros tecnológicos. Neste sentido, algumas
empresas se caracterizam pela forte interação com estas instituições. As empresas buscam
detectar, entre os resultados alcançados por estes centros de geração de conhecimento,
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quais poderiam vir a ser aplicáveis a seus objetivos, por meio do desenvolvimento
experimental.
O processo de aprendizado a partir de spill-overs inter-industriais está relacionado
aos conhecimentos gerados em outras empresas, inclusive competidoras. Conforme explica
Tigre (2006), esta forma de aprendizado ocorre a partir da imitação ou contratação,
permanente ou temporária, de técnicos experientes de outras firmas.
Um tipo de aprendizado que ganha bastante destaque na literatura econômica é
aquele que ocorre através da interação (learning by interacting). Este conceito é
desenvolvido principalmente por Lundvall (1992), que tem como focos de trabalho o
aprendizado interativo e a inovação. O “aprender interagindo” se dá em diversas
dimensões. Internamente à firma, destaca-se a relevância do relacionamento entre diversos
departamentos, como os de vendas, de produção e de P&D, para a geração de inovações de
produto e de processo. Há ainda os relacionamentos “inter-firmas”, os quais não são
enfatizados pela teoria econômica tradicional, a qual considera a relação entre firmas
apenas no âmbito da competição no mercado, enquanto Lundvall (1992) atenta para a
cooperação entre firmas, que pode ser muito importante para o processo de inovação. A
interação com o setor público também pode cumprir um papel significativo no processo de
aprendizado. Sua participação pode ocorrer por meio do suporte a atividades científicas, de
regulamentações, da provisão de infra-estrutura de educação e treinamentos, de um sistema
de financiamento, entre outros. As medidas do setor público nestes aspectos podem exercer
forte influência na taxa e na direção das inovações.
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O aprendizado pela interação pode se dar em diferentes níveis. Neste sentido,
Johnson (1992) apresenta uma classificação em quatro tipos de aprendizado, em ordem
crescente do nível de interação. Primeiramente, com o menor nível de interação social, tem-
se a simples impressão de experiências imediatas (imprinting learning), que ocorre de
forma individual. O segundo nível é o aprendizado pela repetição (rote learning), em que o
agente absorve mecanicamente as informações, sem necessariamente compreender o que
está se passando. Há ainda o aprendizado pela resposta (feedback learning), no qual o
agente faz uma ação a fim de observar a reação de outrem. Finalmente, tem-se a busca
sistemática por novos conhecimentos (systematic and organised searching for new
knowledge), a forma de aprendizado que apresenta o maior nível de interação, envolvendo
parcerias com universidades e institutos de pesquisa e/ou departamentos próprios de P&D.
Queiroz (2006) caracteriza o aprendizado pela interação como um processo
conjunto, a partir de laços de cooperação que se estabelecem entre os dois agentes, que
atuam em um determinado contexto institucional, e cujo principal resultado é a introdução
de inovações.
Na taxonomia de Malerba (1992), há ainda o aprendizado pela pesquisa (learning by
searching), que abarca a realização, internamente à firma, de atividades formais de
pesquisa – tais como P&D. Trata-se de esforços sistemáticos de busca, com o objetivo de
gerar novos conhecimentos. O desenvolvimento deste tipo de aprendizado requer uma
capacitação prévia, tanto em relação aos recursos humanos necessários para desenvolvê-lo
como no tocante à infra-estrutura requerida para as pesquisas.
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Além da taxonomia proposta por Malerba (1992), existem na literatura econômica
diversos outros tipos de processos de aprendizado, tal como o “aprendizado por adaptação”,
proposto por Katz (1976) apud Queiroz (2006). Trata-se do processo pelo qual se logra
modificar processos ou produtos existentes, para que possam funcionar em um contexto
diferente daquele para o qual foram inicialmente criados. O autor, a partir de seus estudos
empíricos, ressaltou a importância dos esforços, por parte das firmas, de adaptação de
tecnologias importadas para a melhora de desempenho de processos e produtos que não
poderiam simplesmente ser replicados nas mesmas condições de seus países de origem.
Como exemplos destas idiossincrasias, podem ser citados a necessidade de utilização de
matérias-primas diferentes daquelas para as quais as tecnologias foram projetadas, ou a
adaptação de projetos visando à adaptação às condições locais.
I.3. As “capacidades dinâmicas”
O caráter dinâmico do ambiente econômico, um dos pressupostos básicos da
abordagem neo-schumpeteriana, nos remete ao conceito de “capacidades dinâmicas”
(dynamic capabilities) das firmas. Teece e Pisano (1994) definem este conceito como a
aptidão, por parte das empresas, de adaptar, integrar e reconfigurar suas habilidades
organizacionais, seus recursos e suas competências, em resposta às mudanças no ambiente.
Os autores identificam três conjuntos de fatores que contribuem substancialmente
para a determinação das capacidades dinâmicas de uma empresa: os seus processos, a sua
posição e as suas trajetórias. Os processos referem-se às rotinas, às suas práticas recorrentes
e ao seu padrão de aprendizagem. Já a posição de uma firma diz respeito à sua dotação de
tecnologia e de conhecimento, à sua gama de clientes, ao seu relacionamento com
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fornecedores, e até mesmo a possíveis alianças estratégicas com concorrentes. Finalmente,
as trajetórias são entendidas como as alternativas estratégicas disponíveis para a firma e as
futuras oportunidades.
I.3.1. Os processos da firma
No tocante aos processos da firma, é muito importante que os gerentes coordenem e
integrem as atividades internas da empresa de forma eficiente e efetiva. Vem ganhando
relevância também a integração com atividades e tecnologias externas à firma, por meio de
alianças estratégicas, relações com fornecedores e clientes, e colaboração tecnológica.
Além da questão da integração, outro aspecto fundamental dos processos da firma é
o aprendizado, em um sentido amplo. Segundo Teece e Pisano (1994), o aprendizado
ocorre não só por meio da imitação, como em uma relação “mestre-aprendiz”, mas também
por esforços conjuntos para a compreensão de problemas complexos. Os processos de
aprendizado são intrinsecamente coletivos, e requerem códigos de comunicação comuns e
procedimentos de pesquisa coordenados. Também deve fazer parte dos processos da firma
a habilidade de identificar as mudanças no ambiente, avaliar o mercado, e captar a
necessidade de se reconfigurar a estrutura de ativos da empresa e de realizar as
transformações. Para que se tenha esta habilidade, é exigido que tenha um
acompanhamento constante dos mercados e das tecnologias.
I.3.2. A posição estratégica
Em relação à posição estratégica de uma empresa, são identificados alguns tipos de
ativos que compõem a sua estrutura: os ativos tecnológicos, complementares, financeiros e
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locacionais. Quanto aos ativos tecnológicos, ressalta-se que boa parte das tecnologias não
pode ser transacionada no mercado, e que a proteção à propriedade e utilização de um ativo
tecnológico pode ser um importante fator de diferenciação entre as firmas.
Os ativos complementares são aqueles que se fazem necessários quando de uma
inovação tecnológica, para que os novos produtos sejam comercializados. Normalmente,
tais ativos ficam à jusante do processo produtivo, como por exemplo aqueles ligados às
atividades de marketing e distribuição. Já os ativos financeiros consistem basicamente na
disponibilidade de caixa e no grau de alavancagem de uma empresa. Finalmente, os ativos
locacionais referem-se ao ambiente em que a firma se estabelece no que tange aos aspectos
legais, regulatórios e políticos. A natureza deste ambiente pode gerar singularidades à
empresa (TEECE & PISANO, 1994).
I.3.3. As trajetórias da firma
Quanto às trajetórias, entende-se que os possíveis destinos de uma empresa vão
depender de sua posição corrente, e também de sua trajetória passada (path-dependence). A
ideia central é que “a história tem importância”, ao contrário do que sugere o mainstream
da teoria econômica. Os investimentos feitos previamente pela firma irão afetar a sua
posição no futuro. Isto ocorre porque, conforme destaca Teece (2005), muitas vezes o
aprendizado é um processo de experimentação, realimentação e avaliação.
Nelson (1995) destaca o caráter cumulativo que a tecnologia pode assumir. Isto
significa que os avanços técnicos de hoje aprimoram e são construídos a partir da
tecnologia que estava disponível no período anterior. Além das tecnologias físicas, o autor
24
destaca que aprendizado e conhecimento também são cumulativos. Conforme processos de
produção especializados são desenvolvidos, há um aumento das barreiras à entrada em
função da maior escala e capital requeridos. Assim, firmas já estabelecidas em uma
indústria possuem vantagens em relação a potenciais entrantes.
Outro fator referente à trajetória da firma que irá contribuir para definir as suas
capacidades dinâmicas são as oportunidades tecnológicas. A intensidade e a velocidade a
que uma indústria pode avançar vão depender, em parte, das oportunidades tecnológicas
perante as quais se encontre. Estas oportunidades serão função do ritmo ao qual novas
descobertas científicas estão sendo feitas. Porém, cabe a ressalva de que tais oportunidades
podem não ser totalmente exógenas à indústria, já que algumas firmas participam
ativamente de atividades de pesquisa ou as apoiam. Além disto, a capacidade de identificar
tais oportunidades dependerá da natureza dos vínculos entre a empresa e as instituições que
realizam pesquisa básica – principalmente universidades.
I.4. Considerações finais
Este capítulo teve como objetivo apresentar o arcabouço teórico que irá balizar o
desenvolvimento do tema central desta dissertação. O assunto das fontes de inovação é
tratado na medida em que a adoção destas diferentes fontes caracterizou em grande medida
as diversas fases de desenvolvimento tecnológico da Petrobras, desde a aquisição pura e
simples de máquinas e equipamentos até o desenvolvimento de tecnologias próprias a partir
de atividades de internas de P&D.
25
Já a abordagem do aprendizado tecnológico é considerada fundamental, já que o
setor de refino da Petrobras passou por diversos estágios de aprendizado, desde aquele
restrito à esfera operacional, no início de sua trajetória, até aquele desenvolvido a partir de
atividades sistemáticas de pesquisa, como será observado no terceiro capítulo desta
dissertação.
Finalmente, o tema das “Capacidades Dinâmicas” mostra-se aderente ao objetivo
deste trabalho na medida em que todas as fases de aprendizado tecnológico da Petrobras
foram essenciais para tornar a empresa capaz de identificar e desenvolver maneiras de
adaptar seus ativos às transformações no ambiente econômico, o qual supõe-se caracterizar-
se por um forte dinamismo.
26
CAPÍTULO II - CARACTERIZAÇÃO DA INDÚSTRIA DE REFIN O DE
PETRÓLEO
O refino de petróleo tem um papel fundamental na cadeia petrolífera, na medida em
que permite a transformação do petróleo cru – que por si só tem pouquíssimas aplicações –
em derivados que são largamente demandados em diversos setores da economia, tais como
transportes, indústria e geração elétrica. Esta função de produzir os derivados requeridos a
partir do óleo bruto disponível vem se tornando cada vez mais desafiadora, já que a
qualidade do cru tem se deteriorado nos últimos anos, enquanto os requisitos de qualidade
dos combustíveis têm sido cada vez mais rígidos.
Este capítulo busca uma maior compreensão destes desafios. Para isto, serão
apresentados aspectos gerais da indústria de refino de petróleo. Na primeira seção,
apresentam-se algumas características econômicas da indústria, tais como seu caráter
intensivo em capital e as elevadas economias de escala. Posteriormente, faz-se uma
caracterização mais técnica da atividade, destacando-se os atributos do petróleo bruto, os
principais processos de refino e suas funções. Por fim, na terceira seção, discute-se a
trajetória do setor em nível mundial, destacando-se principalmente as mudanças no perfil
da demanda por derivados e as tendências para o setor, afetadas diretamente por esta
mudança.
II.1. Características econômicas
O segmento de refino tem um papel fundamental na cadeia de valor do petróleo, em
virtude da sua atuação como um “intermediário” entre a atividade de exploração e produção
27
(E&P) e a venda dos derivados aos consumidores finais. Vale lembrar que a demanda dos
consumidores é essencialmente pelos derivados, e não pelo petróleo cru. Desta forma,
cumpre-se uma importante função econômica, no sentido de buscar a adequação do óleo
cru produzido à demanda de derivados. Conforme pode ser observado em Dunham et al
(2006), embora haja movimentos de busca por fontes alternativas, o refino de petróleo
constitui-se na trajetória dominante no atendimento à demanda por combustíveis líquidos.
Neste sentido, mostra-se fundamental a integração vertical do refino, tanto com
atividades à montante – exploração e produção de petróleo bruto – quanto com aquelas à
jusante – transporte e distribuição. Conforme ressalta Tavares (2005), a integração vertical
facilita a continuidade e a estabilidade do fluxo produtivo da indústria. A integração
vertical com a atividade de produção do óleo cru é relevante em função da elevada
quantidade de petróleo necessária para suprir uma refinaria de escala eficiente. Desta
forma, a maioria das grandes empresas refinadoras optam por atuar também na produção de
petróleo ou pela realização de contratos de longo prazo com produtores, de forma a garantir
o suprimento.
Um traço relevante desta indústria é seu caráter intensivo em capital e tecnologia. O
investimento inicial requerido é muito alto, e é maior quanto mais complexa for a refinaria.
Ademais a indústria é caracterizada também pelas elevadas economias de escala, no nível
da planta e da empresa. De acordo com Martins (2003), no refino são observadas as
principais fontes de economia de escala, tais como economias geométricas e mínimo
múltiplo comum. As economias geométricas ocorrem com a chamada “regra dos 2/3”, já
que a produção varia proporcionalmente ao volume das unidades processadoras, e o custo
28
de construção das mesmas aumenta de acordo com a sua área de superfície. Já o princípio
do mínimo múltiplo deve-se à indivisibilidade técnica dos processos, pois nem sempre é
possível comprar equipamentos que produzam a quantidade exata desejada. Martins (2003)
expõe:
A indivisibilidade dos processos de refino é decorrente da necessidade de um fluxo constante de produtos intermediários entre as unidades de processamento, capaz de mantê-las operando, com rentabilidade, a níveis próximos de sua capacidade máxima operacional (p. 45).
Na tipologia desenvolvida por Ferraz et al (1996), a atividade de refino de petróleo
se enquadra no grupo da Indústria de Commodities, mais especificamente no segmento de
Química Básica. Esta categoria caracteriza-se principalmente pela estrutura de mercado
oligopolista, com uma elevada participação no mercado de um número reduzido de
empresas. Além disto, são observadas elevadas escalas técnicas de produção. Dada a
elevada relação capital/produto, a capacidade de mobilizar recursos para investimentos
torna-se decisiva para a competitividade das empresas. Desta forma, o porte empresarial e o
acesso a fontes de financiamento mostram-se ativos essenciais. No tocante ao porte, neste
grupo de indústrias, o tamanho médio das empresas em termos de faturamento é bem
superior ao das indústrias como um todo. No grupo das indústrias de commodities,
destacam-se ainda como aspectos relevantes para a competitividade a conformidade técnica
das matérias-primas utilizadas e a padronização dos processos.
Outro aspecto típico deste grupo de indústrias é a baixa diferenciação de produtos.
A atração de clientes se dá principalmente através do atendimento a especificações
técnicas. De acordo com Martins (2003), na indústria de refino de petróleo, as principais
barreiras à entrada associadas à concorrência por qualidade são a escala mínima necessária
29
para a produção de derivados que atendam às requisições e a necessidade de
desenvolvimento de extensas redes de distribuição. Conforme ressalta Tavares (2005), o
crescente rigor das especificações de qualidade, principalmente no tocante ao grau de
emissão de poluentes, tem contribuído para reforçar as barreiras à entrada decorrentes de
economias de escala, pois o grau de complexidade exigido para a obtenção de derivados
com estas características requer escalas de produção ainda maiores. A fonte de
competitividade na indústria de refino está muito mais na natureza dos seus processos do
que na diferenciação de produtos.
Na indústria de refino, seu projeto inicial condiciona muito toda a sua trajetória.
Conforme explica Martins (2003), durante a fase de projeto de uma nova refinaria, existe
uma grande flexibilidade quanto ao tipo de petróleo a ser processado e aos tipos de
produtos a serem obtidos. Porém, uma vez construída a refinaria, esta flexibilidade fica
muito limitada, tornando-se restrita a mudanças incrementais. Isto faz com que ritmo do
progresso técnico nesta indústria seja relativamente lento. Desta forma, alterações radicais
no perfil de um parque de refino normalmente irão depender de investimentos em novas
plantas.
Além disso, em um nível mais amplo, a indústria de refino é considerada
tecnologicamente madura, na medida em que a maioria dos processos de refino utilizados
atualmente já existiam décadas atrás. Porém, isto não diminui a importância da busca por
inovações, já que a implantação de alterações nestes processos com vista a adaptá-los a
mudanças no ambiente econômico constitui-se em um dos principais desafios da indústria
nos últimos anos.
30
II.2. Características técnicas
II.2.1. Caracterização do petróleo
O petróleo é um recurso natural não renovável, composto por uma mistura de
hidrocarbonetos – ou seja, moléculas constituídas de carbono e hidrogênio - e algumas
impurezas. É a principal fonte de energia primária da matriz energética mundial, desde o
fim da Segunda Guerra (PINTO JR. et al, 2007). Apesar de ser considerado uma
commodity, não é um produto homogêneo. Existem diversos tipos de óleo, com diferentes
características quanto à densidade, ao teor de enxofre e às famílias de hidrocarbonetos
predominantes. Na Tabela 2.1, a seguir, tem-se a composição do petróleo por elemento
químico.
Elemento % em massa
Carbono 83,00 a 87,00%
Hidrogênio 11,00 a 14,00%
Enxofre 0,06 a 6,00%
Nitrogênio 0,11 a 1,70%
Oxigênio 0,50%
Metais 0,30% Tabela 2.1: Composição do petróleo por elemento químico, em percentual da massa. Fonte: Lage et al (2007).
Quanto à densidade, os petróleos são classificados de acordo com o grau API1, que
é uma forma convencional de expressá-la, através de um índice adimensional, de acordo
com normas do American Petroleum Institute. Quanto maior é a densidade do óleo, menor
é o seu grau API. Petróleos com grau superior a 31º API, ou densidade menor que 0,87
31
ton/m3, são considerados leves. E crus com menos de 10º API, ou densidade superior a 1,00
ton/m3 são classificados como extra-pesados (ANP, 2009). Quanto mais pesado for um tipo
de petróleo, menor é o seu valor comercial.
O enxofre é a impureza mais abundante no petróleo, que pode ser classificado de
acordo com a presença desta substância na sua composição. Atualmente, o óleo é
classificado como “doce” quando seu teor de enxofre é menor que 0,5%, e “azedo” quando
superior a 2,5%. Nas faixas intermediárias, são considerados semi-doces ou semi-azedos
(SZKLO & ULLER, 2008). Em geral, frações mais pesadas do petróleo tendem a conter
maior teor de contaminantes. Compostos de enxofre são indesejáveis, pois provocam
corrosão nos equipamentos, contaminam catalisadores no processo de refino e causam
poluição ao meio ambiente.
Quanto ao tipo de cadeia, os hidrocarbonetos são classificados nas famílias:
parafínicos (normais ou iso-parafínicos), naftênicos e aromáticos. Os parafínicos
apresentam cadeias abertas e saturadas - sem duplas ligações - , que podem conter de um
até quarenta átomos de carbono. Os parafínicos normais apresentam a cadeia sem
ramificações, e os iso-parafínicos possuem cadeia ramificada. Os naftênicos são
constituídos de cadeias cíclicas, também sem duplas ligações, e contêm cinco ou seis
átomos de carbono - ciclo-pentano ou ciclo-hexano. Já os aromáticos compõem-se de um a
cinco anéis benzênicos (contêm duplas ligações conjugadas).
1 O grau API é calculado da seguinte forma: ºAPI = 5,1315,141
6,15/6,15−
d. Onde d15,6/15,6 é a razão entre densidade
do insumo a 15,6ºC e a densidade a água a 15,6ºC.
32
Cada derivado de petróleo tem seus requisitos de desempenho, e cada uma destas
famílias de hidrocarbonetos possui características próprias que proveem determinadas
propriedades aos seus derivados. Um exemplo disto é que os aromáticos possuem boa
resistência à detonação (elevada octanagem), o que é um requisito de qualidade para a
gasolina. Já os parafínicos normais apresentam maior número de cetano, o que provê
facilidade de ignição espontânea, característica desejável para o óleo diesel. Nos iso-
parafínicos, o grau de octanagem é superior ao dos parafínicos normais, mas inferior ao dos
aromáticos. Diferentes tipos de petróleo apresentam distintas proporções de cada uma
destas famílias de hidrocarbonetos (LAGE et al, 2007).
O valor de cada tipo de petróleo, bem como sua utilização para a produção de
determinados derivados, vai depender de suas características, com relação às classificações
mencionadas anteriormente. E um dos grandes desafios da indústria de refino é buscar uma
conformidade entre estas características dos petróleos disponíveis e os atributos requeridos
para os derivados demandados.
II.2.2. Os processos de refino
A atividade de refino de petróleo consiste na transformação do óleo bruto em
produtos finais comercializáveis, através da separação e conversão em diversas frações. O
cru que entra como carga na refinaria normalmente é uma mistura – blend – de alguns tipos
de petróleo.
A capacidade instalada de uma planta é definida pela capacidade de carga da
unidade de destilação atmosférica, que é o único processo que tem como carga o óleo cru, e
33
por isto está presente em todas as refinarias. Entretanto, há a necessidade de se considerar
também os outros processos da refinaria – de conversão e de tratamento -, que têm como
carga produtos intermediários. Quanto mais destes processos a refinaria tiver, mais
complexa ela será. A principal medida utilizada para a complexidade das refinarias é o
Índice de Nelson. Conforme explicam Szklo e Uller (2008), este índice é calculado pela
média dos fatores de complexidade de cada unidade da refinaria, ponderada pelas suas
respectivas capacidades de processamento. O fator de complexidade de cada unidade
consiste na razão entre o custo por barril de capacidade da dita unidade e o custo por barril
de capacidade da destilação atmosférica.
As diversas refinarias apresentam diferentes configurações, quanto à capacidade, à
complexidade e aos processos de refinação presentes. Esta configuração, denominada
“esquema de refino”, define e limita as quantidades e tipos de produto que serão obtidos,
dado um tipo de petróleo utilizado como carga.
Conforme expõem Uller et al (2003), os processos de uma refinaria usualmente são
classificados em quatro grupos: processos de separação, de conversão, de tratamento e
auxiliares.
II.2.2.1. Processos de separação
Os processos de separação são de natureza física, não afetando a estrutura das
moléculas. Normalmente, o primeiro processo sofrido pelo petróleo em uma refinaria é o de
dessalgação, pois o mesmo possui variadas quantidades de sais solúveis, areia e
34
sedimentos, que podem causar corrosão e prejudicar o desempenho de outras unidades de
refino.
A dessalgação prepara o óleo que será carga da unidade de destilação atmosférica,
que é o principal processo físico de refinação. Este processo separa o petróleo nas suas
diversas frações (ou cortes), através dos seus diferentes pontos de ebulição, sob pressão
atmosférica. Os cortes mais leves – com menor ponto de ebulição – ficam localizadas no
topo da torre (ou coluna) de destilação, e os mais pesados – com maior ponto de ebulição –
ficam na parte inferior.
As frações que saem da coluna de destilação são os seguintes, em ordem crescente
de densidade: gás combustível, GLP (Gás Liquefeito de Petróleo), naftas, querosene,
gasóleo leve, gasóleo pesado e resíduo atmosférico. A nafta pode ser utilizada para
obtenção de gasolina ou como insumo para a indústria petroquímica. Já as frações de
gasóleo gerarão o diesel. O GLP e a nafta são considerados derivados leves. O querosene e
o diesel são os cortes médios. E o óleo combustível e o asfalto, provenientes do resíduo, são
frações pesadas, sendo também chamados de derivados ‘escuros’.
Os cortes mais pesados que saem da torre de destilação atmosférica – denominados
de resíduo atmosférico (RAT) – em geral seguirão para a unidade de destilação a vácuo.
Este processo separa estas frações a uma pressão muito inferior à atmosférica, podendo
variar de 0,01 a 0,05 atm (a pressão atmosférica é de 1 atm). Esta baixíssima pressão reduz
os pontos de ebulição dos diferentes cortes, permitindo que a separação ocorra a
temperaturas menores. Este processo é importante porque a temperatura à qual o RAT
entraria em ebulição sob pressão atmosférica é muito alta, o que geraria efeitos indesejáveis
35
como a decomposição dos hidrocarbonetos e danificação dos equipamentos. Os produtos de
saída da torre de destilação a vácuo são o gasóleo leve, o gasóleo pesado e o resíduo de
vácuo. Usualmente, o primeiro é encaminhado a uma unidade de hidrotratamento para
obtenção de óleo diesel, o segundo vai para o craqueamento catalítico para obtenção de
gasolina, e o último é incorporado ao pool de escuros ou levado a unidades de conversão
para que se obtenham frações mais nobres, dependendo da configuração da refinaria.
As primeiras refinarias (na verdade, destilarias), no século XIX, continham apenas
a unidade de destilação atmosférica. Porém, Tavares (2005) ressalta que atualmente é difícil
que esta se encontre isoladamente, devido à quantidade limitada de derivados nobres que é
capaz de produzir. As unidades de destilação, por si só, produzem uma quantidade
significativa de óleo combustível, produto cuja demanda está em declínio em todo o
mundo.
II.2.2.2. Processos de conversão
Os processos de conversão, diferentemente dos de separação, são de natureza
química, pois alteram profundamente a estrutura das moléculas. Tais processos surgiram
diante da necessidade de obtenção de frações mais leves do petróleo, principalmente a
gasolina, pois as unidades de destilação produziam elevadas quantidades de derivados
pesados. Vários processos de conversão são chamados de “processos de fundo de barril”,
pois convertem resíduos – que ficam na parte inferior das torres de destilação – em cortes
mais leves e conseqüentemente mais nobres.
36
O primeiro processo desta natureza foi o craqueamento térmico, que surgiu no início
do século XX. Este processo consiste em quebrar as moléculas de frações pesadas
provenientes da destilação, transformando-as em moléculas menores, por meio de
temperaturas muito elevadas.
Porém, atualmente, o processo de conversão mais usado é o craqueamento catalítico
fluido, também chamado de FCC. A principal diferença deste em relação ao craqueamento
térmico é a presença do catalisador, que permite que a quebra ocorra em condições menos
severas, inclusive de temperatura. O FCC substituiu em grande medida o craqueamento
térmico, que passou a ser cada vez menos utilizado. A carga do craqueamento catalítico é,
em geral, o gasóleo de vácuo. O produto de maior rendimento do FCC é a gasolina, seguida
do GLP e do gasóleo leve, também chamado de diesel de craqueamento.
O FCC torna a refinaria mais flexível em relação à carga a ser utilizada, permitindo
maior adaptação a óleos mais pesados. Há muitos estudos em torno do desenvolvimento de
novos tipos de catalisadores, que contribuam para o provimento dos derivados mais
demandados. Assim, este tipo de processo de conversão apresenta um grande potencial de
inovação e aprendizado tecnológico. Isto se deve principalmente às diferentes combinações
possíveis de variáveis operacionais e aos diversos tipos de sistemas catalíticos que podem
ser desenvolvidos, de acordo com as características da carga a ser processada e com os
tipos de derivados que se deseje obter. Um bom exemplo disto foi o desenvolvimento pela
Petrobrás, a partir de atividades internas de pesquisas, de um projeto próprio de
craqueamento catalítico, específico para processar resíduos - o RFCC, que será mais
detalhado no capítulo III.
37
Outro importante processo de conversão é o coqueamento retardado, que consiste
em quebrar as moléculas por meio de elevadas temperaturas, sob condições bastante
severas. O objetivo principal é reduzir a produção de óleos residuais, que têm baixo valor.
Em geral, a carga deste processo é o resíduo de vácuo, e os seus produtos são gasóleo,
nafta, GLP e coque. O coque é essencialmente carbono sólido, e, dependendo da sua
natureza, pode ser usado como combustível para indústrias e termelétricas, ou na produção
de anodo para a indústria de alumínio. Esta unidade não é tão recorrente nas refinarias
quanto o craqueamento catalítico, mas vem ganhando importância por ter como carga uma
fração de baixíssimo valor – o resíduo de vácuo – e gerar produtos bem mais nobres, com
destaque para os cortes médios, como o diesel. Outra vantagem do coqueamento retardado
é a possibilidade de processar cargas com elevados teores de impurezas, que não poderiam
ser processadas em unidades que utilizem catalisadores. Desta forma, este processo mostra-
se aderente às requisições brasileiras, dados o seu déficit de oferta de diesel frente à
demanda e a redução da qualidade dos petróleos disponíveis.
Há também o processo hidrocraqueamento catalítico (HCC), que surgiu na década
de 1960. Consiste na quebra de moléculas da carga e posterior hidrogenação das moléculas
menores, por ação conjugada do catalisador, altas temperaturas e pressões, e grandes
volumes de hidrogênio. Pode operar com cargas que variam desde nafta, até gasóleos
pesados ou resíduos. Desta forma, é comum que a carga seja composta pelas frações cuja
quebra em FCC é complicada, como é o caso do resíduo de vácuo (SZKLO & ULLER,
2008). O HCC favorece a produção de destilados médios de alta qualidade, como por
exemplo o diesel com elevado número de cetano. Outra vantagem do HCC é a qualidade
das frações no que diz respeito a contaminantes, pois, como resultado das elevadas pressões
38
(de 34 a 97 atm) e da alta concentração de H2, impurezas como enxofre, nitrogênio e metais
são radicalmente reduzidas ou eliminadas. Ainda não há nenhuma unidade de HCC nas
refinarias do Brasil, em função do elevado investimento necessário à sua construção. No
entanto, há estudos na Petrobrás no sentido de, no longo prazo, agregar uma unidade deste
tipo em uma de suas refinarias – a REDUC – em função do seu favorecimento à produção
de diesel de alta qualidade.
Entre os processos de conversão, além dos de quebra, que acabam de ser explicados,
há também os que alteram a estrutura das moléculas de outras formas, visando mudanças
nas suas propriedades físico-químicas. Um exemplo deste tipo de processo é a reforma
catalítica, que consiste em converter hidrocarbonetos naftênicos e parafínicos em
aromáticos, com a participação de um catalisador (ou um conjunto deles). A carga é
principalmente a nafta proveniente da torre de destilação. O objetivo deste processo é
produzir gasolina com maior octanagem.
O desenvolvimento de processos de conversão vem ganhando muita importância
nas últimas décadas, pois possibilita um aumento significativo da produção de derivados
mais leves, e conseqüentemente mais nobres.
II.2.2.3. Processos de tratamento
Os processos de tratamento têm como principal objetivo melhorar a qualidade dos
produtos, por meio da redução ou eliminação de contaminantes, como compostos
sulfurados ou nitrogenados. As cargas podem ser frações leves, médias ou pesadas.
39
Um importante processo deste tipo é o Hidrotratamento Catalítico (HDT), que, por
meio da reação com o hidrogênio (H2) e com auxílio de catalisadores, remove impurezas do
petróleo. Além de prover a reação de dessulfurização, o HDT aumenta a qualidade das
frações por meio da saturação de olefinas, transformando-as em parafinas. Com isto, reduz-
se a formação de goma nos combustíveis. A melhora de qualidade promovida por este
processo possibilita que produtos intermediários adquiram especificações de forma a se
tornarem produtos finais. Exemplo disto é a produção de diesel a partir do gasóleo. A
geração deste produto é favorecida pelo HDT, não só em virtude da remoção de impurezas,
mas também pelas reações de hidrogenação dos compostos insaturados, o que aumenta o
número de cetano, o requisito de qualidade mais importante do diesel.
Outro processo deste tipo é o Merox (MERcaptans OXidation). Consiste na
lavagem da carga - constituída principalmente de hidrocarbonetos C4 e C3 - com soda
cáustica (NaOH). Para cargas de hidrocarbonetos leves o MEROX se constitui num
processo de efetiva dessulfurização, em que o enxofre é totalmente retirado. E para cargas
de hidrocarbonetos mais pesados, ele é um processo de adoçamento, uma vez que, neste
caso, os compostos de enxofre agressivos (mercaptanas) são transformados em compostos
menos nocivos (dissulfetos). Em ambos os casos, a soda cáustica é regenerada.
Este grupo de processos tornou-se mais importante a partir da década de 1980,
quando a regulamentação ambiental tornou-se mais rígida em todo o mundo,
principalmente nos Estados Unidos.
40
II.2.2.4. Processos auxiliares
Finalmente, há o grupo de processos auxiliares, que dão suporte à realização dos
outros processos, anteriormente citados. Podem ser mencionadas como exemplos a geração
de hidrogênio e a recuperação de enxofre. A primeira tem como matérias-primas o gás
natural ou a nafta leve, e seu objetivo é gerar o hidrogênio necessário às unidades de
Hidrotratamento e Hidrocraqueamento. Já a recuperação de enxofre recebe o gás sulfídrico
residual proveniente das unidades de tratamento, a partir do qual gera enxofre puro e vapor
d’água. Este enxofre puro é vendido a diversas indústrias, que o utilizam como matéria-
prima. A unidade de recuperação de enxofre deve estar sempre associada às unidades de
tratamento, para que o mesmo não seja liberado ao meio ambiente.
II.3. Trajetória do setor em nível mundial
II.3.1. Um breve histórico
Nesta seção, será traçado um breve histórico da indústria de refino de petróleo em
nível mundial. Primeiramente, serão abordados alguns aspectos gerais desta evolução, e em
seguida será dado um maior foco nas principais inovações que ocorreram no âmbito desta
indústria.
II.3.1.1. Aspectos gerais
O surgimento da primeira refinaria data de 1861. Sua atividade era tão somente a
destilação do petróleo cru, com o objetivo principal de produzir querosene para iluminação.
Não era atribuída muita importância aos outros cortes da destilação. Com a invenção da
41
lâmpada elétrica, em substituição aos lampiões, o querosene foi perdendo utilidade para
fins de iluminação.
A partir de 1876, com o surgimento dos motores de ciclo Otto, a demanda por
gasolina começou a aumentar. Já o diesel começou a ser demandado quando da invenção
do motor do ‘ciclo diesel’, em 1892, na Alemanha. A partir de 1920, com o aumento
massivo da produção de veículos automotores, passaram a ser consumidas quantidades cada
vez maiores destes produtos (SANTOS, 2007). Desta forma, foi sendo estimulado um
aumento da capacidade de refino, e também o desenvolvimento de novos processos, que
gerassem maiores frações destes produtos e aumentassem sua qualidade. Foram sendo
desenvolvidos os processos de conversão e tratamento.
No início do século XX, surgiu o primeiro processo de conversão, o craqueamento
térmico. Posteriormente, em 1936, foi desenvolvido o craqueamento catalítico (WISDOM
et al, 1997 apud TAVARES, 2005). Este processo apresentou uma melhora em relação ao
craqueamento térmico, em função das condições menos rigorosas sob as quais deveria
ocorrer. Conforme é explicado em MME (2007a), este processo vem sendo a principal
unidade de conversão das refinarias por muitos anos, devido a melhorias contínuas em seu
projeto mecânico e nos catalisadores utilizados. As quantidades e características dos
mesmos vão sendo modificadas de acordo com os tipos de petróleo a serem processados e
de derivados que se queiram obter.
Alguns anos depois, na década de 1940, teve origem o coqueamento retardado, cujo
objetivo era gerar gasóleo para craqueamento a partir de resíduos pesados. O coque gerado,
que representa uma fatia significativa dos rendimentos deste processo, era considerado um
42
subproduto, sendo vendido ao preço de carvão mineral. Conforme explica Tavares (2005),
este quadro mudou um pouco com a evolução da indústria de alumínio, quando o coque do
tipo agulha mostrou-se um excelente material para a produção dos eletrodos necessários
para a obtenção deste metal.
Nas últimas quatro décadas, a capacidade de refino mundial cresceu de forma
sustentada, conforme pode ser visto na Figura 2.1.
0
10.000
20.000
30.000
40.000
50.000
60.000
70.000
80.000
90.000
1967
1969
1971
1973
1975
1977
1979
1981
1983
1985
1987
1989
1991
1993
1995
1997
1999
2001
2003
2005
2007
Mil
barr
is/d
ia
Am. Norte Am. Sul e Central Europa e Eurásia Oriente Médio África Ásia Pacífica
Figura 2.1: Evolução da capacidade de refino mundial por região (em mil barris por dia). Fonte: Elaboração própria a partir de British Petroleum (2008).
De 1967 a 2007, a capacidade de refino mundial cresceu a uma taxa média de 1,9%
ao ano, subindo de 41 para 88 milhões de barris por dia (bpd). Houve apenas um período de
redução, ao longo da década de 80, em função dos choques do petróleo na década de 70. Os
principais países responsáveis pela elevação foram Estados Unidos, China, Índia, Coréia do
43
Sul e Japão. Observa-se um aumento da fatia da Ásia Pacífica, especialmente a partir da
década de 90, nestes quatro últimos países.
A capacidade de refino da China, desde então, vem crescendo, a uma média de 6%
ao ano. Isto se deve ao aumento da demanda por derivados no país, estimulada fortemente
pelo maior número de automóveis, motivado pelo elevado crescimento econômico. Na
Índia, o aumento da capacidade desde a década de 90 também foi impulsionado pelo
crescimento da demanda por derivados, tanto na indústria quanto no setor de transportes. O
governo indiano criou um programa para incentivar a construção de novas refinarias, a fim
de reduzir a dependência externa de óleo diesel e óleo combustível (TAVARES, 2005).
Porém, em termos absolutos, os Estados Unidos continuam tendo o maior parque
refinador do mundo em termos de capacidade de processamento, com 18 milhões de barris
por dia, respondendo por 20% do total mundial. Neste país, a capacidade aumentou
continuamente ao longo da década de 1970, mas reduziu-se na década de 80, em
decorrência dos choques do petróleo, que ocasionaram um excesso de capacidade, com
redução das margens de refino, e, conseqüentemente, o fechamento de muitas refinarias. A
capacidade de refino dos Estados Unidos voltou a subir a partir de meados da década de 90,
apesar de algumas refinarias - as mais simples e de menor escala - terem fechado neste
período. Esta elevação ocorreu principalmente por conta da ampliação das refinarias já
existentes.
44
II.3.1.2. Inovações nos processos de refino:
Foi no início do século XX que o primeiro processo de craqueamento de frações
pesadas de petróleo para a produção de gasolina encontrou aplicação comercial. O
surgimento deste novo processo teve como pano de fundo o rápido aumento da demanda
por gasolina, a queda no consumo de querosene e uma redução relativa da demanda por
frações mais pesadas (FREEMAN, 1982).
Conforme explica Enos (1962a), o primeiro processo comercialmente aplicado de
craqueamento de cortes pesados foi introduzido em 1913 pelo químico William Burton, da
Standard Oil Company de Indiana. Como uma transformação crucial trazida pelo “processo
de Burton”, destaca-se que anteriormente a atividade de refino consistia simplesmente na
separação física do petróleo cru em suas diferentes frações. Com a introdução deste
processo, a atividade passou a constituir-se em uma indústria de processamento químico,
em que as proporções dos produtos a serem obtidos não ficariam mais restritas àquela
disponível na matéria-prima – o óleo cru. Antes da existência do processo de
craqueamento, o rendimento de gasolina era de cerca de 15% da carga processada, e depois
passou a ser de 40%.
O novo processo despertou o interesse de diversas outras empresas de petróleo, que
tinham que pagar direitos de patente para utilizá-lo. Isto estimulou a busca pelo
desenvolvimento de novos processos de craqueamento, por meio de melhorias a partir da
invenção de Burton. Um importante exemplo disto foram os processos “Dubbs” – que têm
este nome em função de seus inventores, Jesse A. Dubbs e Carbon P. Dubbs, que eram pai
e filho. A inovação trazida pelo primeiro foi a ideia de um processo contínuo de
45
craqueamento térmico - no lugar daquele por batelada. Já o segundo desenvolveu um
método de recirculação de frações residuais, a fim de aumentar o rendimento de gasolina
(ENOS, 1962b). O processo Dubbs teve a importante colaboração da então nova empresa
de engenharia de processos, a Universal Oil Products Company – UOP, tanto no que tange
à proteção por meio de patente quanto no provimento de laboratórios de pesquisas.
A partir de então, os maiores progressos alcançados no âmbito dos processos de
craqueamento seriam aqueles relacionados à área de catálise. O primeiro processo de
craqueamento catalítico foi desenvolvido pelo engenheiro francês Eugene Houdry.
Conforme explica Enos (1962b), a principal inovação deste processo foi o aumento, não só
da quantidade de gasolina produzida, mas também da sua qualidade, principalmente no
tocante à octanagem. Este processo foi introduzido pelas empresas de petróleo Socony
Vacuum e Sun Oil.
No entanto, o “processo de Houdry” era de natureza semi-contínua, na medida em
que em sua configuração, um mesmo vaso era utilizado para realização de craqueamento da
carga – gasóleo – e para regeneração do catalisador. Esta característica lhe conferia
algumas limitações, já que havia dificuldades para se estabelecer condições operacionais
apropriadas e para sincronizar estas duas operações.
Em função disto, este processo sofreu algumas alterações de modo a tornar-se
contínuo. Assim foi desenvolvido o processo Thermofor Catalytic Cracking (TCC), cuja
primeira planta foi instalada em 1944. A novidade deste processo consistia na existência de
dois vasos, sendo que em um deles ocorria a reação de craqueamento e no outro se dava a
regeneração, de forma contínua (ENOS, 1962b).
46
O sucesso observado na adoção destes processos, bem como os elevados custos com
licenças para seu uso, motivaram outras grandes empresas de petróleo a concentrar esforços
no desenvolvimento de seus próprios processos. Outro fator que estimulou esta estratégia
era a limitação trazida pelo fato de que nas operações até então utilizadas as reações
ocorriam em leito fixo. Desta forma, a partir de ações conjuntas de pesquisa de um grupo
de grandes firmas petroleiras, liderado pela Standard Oil de New Jersey, foi desenvolvido o
craqueamento catalítico fluido (FCC). Sua principal vantagem com relação às tecnologias
até então existentes era que a presença do catalisador se daria em um leito fluidizado, na
forma de pequenas partículas. Isto propiciaria um maior contato deste com a carga, e
consequentemente, uma maior eficiência em comparação com os processos que ocorriam
em leito fixo (FREEMAN, 1982). Uma particularidade desta inovação em relação às
anteriores foi o seu caráter colaborativo, já que os avanços obtidos foram provenientes de
atividades conjuntas de P&D, entre diversas empresas, no lugar de esforços independentes.
II.3.2. O perfil da demanda por derivados
Nas últimas quatro décadas, a demanda por derivados de petróleo cresceu a uma
taxa de 2,5% ao ano, conforme pode ser visto a seguir, na Figura 2.2. As exceções são os
meados da década de 1970 e a década de 1980, que foram os períodos que sucederam os
choques do petróleo.
47
0
10000
20000
30000
40000
50000
60000
70000
80000
90000
1967
1969
1971
1973
1975
1977
1979
1981
1983
1985
1987
1989
1991
1993
1995
1997
1999
2001
2003
2005
2007
Mil
barr
is/d
ia
Destilados Leves Destilados Médios Óleo Combustível Outros
Figura 2.2: Evolução da demanda mundial de derivados de petróleo por tipo de produto2 (em mil barris por dia). Fonte: Elaboração própria a partir de British Petroleum (2008).
Os impactos das crises do petróleo não foram apenas na quantidade demandada de
derivados. Com a recuperação desta demanda, a partir de meados dos anos 80, observou-se
uma mudança na sua composição. Nota-se um aumento da demanda por derivados leves e
médios - principalmente gasolina automotiva e óleo diesel, respectivamente - e uma
redução da participação do óleo combustível.
A diminuição da participação do óleo combustível na demanda mundial por
derivados foi impulsionada após os choques da década de 70, na medida em que os
elevados preços do petróleo estimularam a busca por combustíveis alternativos, que neste
2 Neste gráfico, a classificação dos derivados está de acordo com a metodologia do British Petroleum, que é a seguinte: i) Destilados Leves: gasolina automotiva e gasolina de aviação; ii) Destilados Médios: querosene de aviação, querosene para aquecimento e óleo diesel; iii) Óleo Combustível: inclui também bunker para navios e óleo cru utilizado diretamente como combustível; iv) Outros: gás de refinaria, GLP, solventes, coque de petróleo, lubrificantes, betume, parafina, e outros produtos refinados.
48
caso foram o carvão e, posteriormente, o gás natural. A tendência de substituição do óleo
combustível por gás natural vem sendo observada continuamente em todo o mundo,
principalmente em função de o segundo ser muito menos poluente que o primeiro.
Em 1967, o óleo combustível era responsável por 27% do consumo mundial de
derivados. Esta participação reduziu-se para 17% em 1987, e para 11% em 2007 (BRITISH
PETROLEUM, 2008). Embora esta tendência tenha ocorrido em nível mundial, ela se deu
com maior intensidade nos Estados Unidos e na Europa, onde o produto em questão vem
sendo substituído pelo gás natural, principalmente na geração de energia elétrica. Nestas
regiões, vem havendo uma redução não só da participação relativa de óleo combustível,
mas também do volume absoluto consumido.
A crescente demanda por gasolina explica-se principalmente pelos Estados Unidos,
principal mercado consumidor deste produto. Este aumento na demanda vem sendo
suprido, em grande parte, por importações. A gasolina é o principal derivado consumido
neste país, já que sua frota de automóveis é movida, predominantemente, a este
combustível. Tal produto é atualmente responsável por 46% da demanda norte-americana
por derivados. A China, por sua vez, apresentou, nas últimas décadas, um aumento da
demanda de todos os derivados, inclusive de gasolina (BRITISH PETROLEUM, 2008).
Já o aumento da demanda por destilados médios vem sendo observado em diversos
países. Tavares (2005) explica que o aumento do consumo destes produtos - óleo diesel,
querosene e querosene de aviação - deve-se principalmente ao forte crescimento da
atividade de aviação, do transporte rodoviário, e do uso de óleo diesel em veículos
49
comerciais, particularmente nos países em desenvolvimento da Ásia. Em várias regiões
deste continente, este efeito foi acentuado por políticas de subsídios por parte dos governos.
No caso da Europa, o diesel é, tradicionalmente, o derivado mais consumido. Esta
tendência se acentuou a partir da década de 80, quando os governos de diversos países
europeus começaram a implementar políticas de incentivos para o consumo de diesel. Estas
políticas se deram principalmente por meio da menor taxação sobre o diesel em
comparação com a gasolina, favorecendo assim o consumo do primeiro em detrimento da
segunda, devido aos preços mais atrativos. Estas políticas de “dieselização” da frota têm
como objetivos a redução de emissões de gás carbônico e a economia de combustível.
Conforme expõe Pock (2007), o motor a diesel emite cerca de 30% a menos de CO2 se
comparado com a gasolina, pois tem um maior poder calorífico.
Na Figura 2.2, observa-se ainda um aumento de consumo da categoria “Outros”, o
que se deve, em grande parte, à demanda de GLP (Gás Liquefeito de Petróleo),
principalmente a partir de meados da década de 80. Este aumento se deu majoritariamente
nos Estados Unidos, no Oriente Médio e na Ásia Pacífica. Quanto ao uso final, o
crescimento se deu principalmente na utilização do GLP como matéria-prima para a
indústria petroquímica – no caso do Oriente Médio - e nos setores residencial e comercial –
no caso da China (CHANDRA et al, 2002).
50
II.3.3. Tendências e desafios para o setor
Conforme foi visto na seção anterior, vem-se observando na demanda mundial de
derivados de petróleo uma tendência de aumento da participação de frações leves e médias
em detrimento das mais pesadas – principalmente óleo combustível.
Além da composição da demanda, outro aspecto que vem ganhando relevância é a
questão ambiental. Na medida em que são cada vez mais rígidas as restrições em relação à
emissão de poluentes por veículos e indústrias, as exigências sobre os derivados de petróleo
estão aumentando. Os produtos devem ter menor teor de contaminantes, principalmente de
compostos sulfurados. Neste contexto, Szklo et al (2006, p.695) destacam:
“De fato, o controle dos níveis de enxofre das correntes da refinaria vem se mostrando um aspecto de suma importância em função do crescente enrijecimento das restrições ambientais impostas, através dos padrões de qualidade dos combustíveis nos países desenvolvidos” (tradução nossa).
Contudo, ao passo que a demanda vem se concentrando em derivados menos
pesados e mais limpos, a disponibilidade de cru está no caminho inverso, tendendo para os
mais pesados e com maior teor de enxofre.
Diante de tais perspectivas, a importância relativa das unidades de conversão e
tratamento vem aumentando. Dada a redução gradativa da qualidade das matérias-primas –
o petróleo -, paralelamente ao aumento da qualidade exigida dos produtos derivados, tem-se
como tendência o aumento da complexidade das refinarias, por meio de investimentos em
unidades de conversão e de tratamento. Assim, aumenta-se a capacidade de converter
frações pesadas e impuras em produtos mais leves e limpos. Neste sentido, Williams (2003)
expõe: “Para que se venha a empregar o crescente fluxo de crus pesados e extra-pesados,
51
serão recomendados aumentos na capacidade de conversão mundial, já que vem sendo
observado um excesso de oferta de derivados escuros” (tradução nossa).
De acordo com Energy Information Administration (2005), para que se atenda o
crescimento da demanda projetado, a capacidade instalada de destilação no mundo deve
aumentar, até 2025, em 45 milhões de barris por dia, chegando a cerca de 130 milhões de
barris por dia.
O aumento da capacidade de destilação deve ocorrer em maior medida no Oriente
Médio, nas Américas do Sul e Central e na região da Ásia Pacífica. Já para os refinadores
dos Estados Unidos e da Europa, esperam-se incrementos relativamente modestos na
capacidade de destilação e a continuidade de investimentos maciços na complexidade das
plantas. Tais investimentos visam a geração de derivados leves e médios a partir de óleos
pesados, bem como o aumento da qualidade dos produtos a fim de atender às
especificações ambientais. Os Estados Unidos, que têm o maior parque refinador do mundo
em termos de capacidade, deve seguir investindo especialmente em novas e mais
complexas unidades de conversão.
Vale ressaltar que os investimentos nas refinarias dos países emergentes também
deverão contemplar upgrades nos esquemas de refino a fim de se reduzir a produção de
óleo combustível e aumentar a de derivados mais nobres, como diesel, GLP, nafta e
gasolina.
52
Desta maneira, a grande vantagem das refinarias com maior complexidade é que se
tornam mais flexíveis, já que estão mais preparadas para processar óleos de menor
qualidade, seja pela maior densidade, seja pelo seu elevado teor de contaminantes.
53
CAPÍTULO III - A INDÚSTRIA DE REFINO BRASILEIRA E A
CAPACITAÇÃO TECNOLÓGICA DA PETROBRÁS
III.1. A construção das refinarias brasileiras: um breve histórico
A primeira refinaria do Brasil, a Refinaria Riograndense, data de 1932, e era
localizada em Uruguaiana, no estado do RS. Tinha capacidade de 150 barris por dia (bpd),
processava apenas óleo importado do Uruguai e da Argentina e produzia apenas querosene
e diesel. Posteriormente, em 1936, foram construídas mais duas refinarias de pequeno
porte: a Ipiranga, em Rio Grande (RS) e a Matarazzo, em São Caetano (SP). Tratava-se, na
verdade, de destilarias, pois o único processo presente nestas plantas era o de destilação
simples.
Foi a partir da década de 1950 que passou a haver, propriamente, uma indústria de
refino no Brasil, já que até então o que se tinha eram meras destilarias. Com a criação da
Petrobrás, em 1953, a Refinaria Mataripe (BA), que havia sido criada pelo governo poucos
anos antes3, foi incorporada ao patrimônio da Companhia, passando a se chamar Refinaria
Landulpho Alves Mataripe - RLAM. Em 1954, sua capacidade de processamento dobrou,
com a instalação de uma unidade de craqueamento térmico.
Ainda em 1954, entraram em funcionamento mais duas refinarias privadas: a
Manguinhos, no Rio de Janeiro e a Refinaria União4, em Santo André (SP). Já no ano
seguinte, entrou em operação a segunda refinaria da Petrobrás, a RPBC, em Cubatão (SP),
3 Os técnicos responsáveis pela construção (de 1948 a 1950) e início da operação da Refinaria de Mataripe foram treinados nos Estados Unidos, já que se tratava de uma iniciativa pioneira no Brasil à época.
54
com capacidade de processar 45 mil barris por dia. Em 1956, começou a funcionar a
Refinaria de Manaus – REMAN, cujo controle passou para as mãos da Petrobrás quinze
anos depois.
Daí por diante, todas as novas refinarias construídas no Brasil são da Petrobras. Nos
anos 60 e 70, foram criadas sete novas refinarias no país: REDUC (RJ), REGAP (MG),
REFAP (RS), REPLAN (SP), REPAR (PR), REVAP (SP), e a Fábrica de Asfalto
Fortaleza, que posteriormente passou a se chamar LUBNOR. Neste período, além da
construção das novas refinarias, o país assistiu à ampliação das já existentes, o que levaria a
um aumento de capacidade de 1000% em vinte anos – de cerca de 150 mil bpd no início da
década de 60 para 1,5 milhão de bpd no começo dos anos 80. Este aumento de capacidade
tinha como objetivo atender ao aumento constante da demanda por derivados neste período,
decorrente do crescimento industrial, com destaque para o setor automobilístico.
Atualmente, o país conta com quatorze refinarias, sendo que onze pertencem à
Petrobrás5, empresa que responde por 98% da capacidade de refino brasileira, que é de 2,0
milhões de barris por dia.
4 A Refinaria União foi incorporada à Petrobras em 1974, passando a se chamar Refinaria de Capuava – RECAP. 5 Dentre estas onze pertencentes à Petrobras, não está sendo considerada a Refinaria Ipiranga, um terço da qual fôra adquirida pela estatal em 2007. As refinarias da Petrobrás são, em ordem decrescente de capacidade atual: REPLAN (SP), RLAM (BA), REVAP (SP). REDUC (RJ), REPAR (PR), REFAP (RS), RPBC (SP), REGAP (MG), RECAP (SP), REMAN (AM) e LUBNOR (CE). As outras são a Refinaria Ipiranga (RS, 33% Petrobrás), Manguinhos (RJ) e Univen (SP).
55
III.2. A demanda por derivados de petróleo no Brasi l
O consumo total de derivados no Brasil no ano de 2007 foi de 120 milhões de
metros cúbicos (MME, 2008), ou 2,1 milhões de barris por dia, sendo que o diesel é o
produto mais demandado.
O Brasil vem seguindo a tendência mundial de redução da participação dos
combustíveis pesados em detrimento dos leves e médios na demanda por derivados. Por
muito tempo, o óleo combustível foi o derivado de maior consumo no país. Conforme pode
ser visto na Figura 3.1, durante a década de 1970 este combustível era responsável por
cerca de 30% da demanda brasileira por derivados. Porém, a partir da década de 80, foi
continuamente perdendo participação.
Figura 3.1: Evolução da participação dos diversos produtos no consumo brasileiro de derivados de petróleo. Fonte: MME (2008).
0%
20%
40%
60%
80%
100%
1971
1975
1979
1983
1987
1991
1995
1999
2003
2007
Outros Não-Energéticos
OutrosEnergéticos
Querosene
ÓleoCombustível
GLP
Nafta
Gasolina
Diesel
0%
20%
40%
60%
80%
100%
1971
1975
1979
1983
1987
1991
1995
1999
2003
2007
Outros Não-Energéticos
OutrosEnergéticos
Querosene
ÓleoCombustível
GLP
Nafta
Gasolina
Diesel
56
No Brasil, a substituição do óleo combustível pelo carvão foi impulsionada pelos
choques do petróleo da década de 1970. Diante desta situação adversa, o governo brasileiro
indicou a necessidade de se reduzir a importação de petróleo, apresentando incentivos ao
uso de fontes alternativas de energia. Assim, estimulou-se a produção doméstica do carvão
vapor, bem como foram concedidos incentivos fiscais e subsídios ao uso deste combustível
nas indústrias de aço, papel e cimento. Além disto, foram impostas cotas para compra de
óleo combustível. Esta política de restrição, embora tenha durado pouco tempo, teve o
efeito de gerar, entre os industriais, incertezas sobre o fornecimento deste combustível, o
que os levou a buscar substitutos (ARAÚJO & GHIRARDI, 1986).
Mais recentemente, a partir da década de 90, o óleo combustível vem sendo
crescentemente substituído pelo gás natural. Este último tem diversas vantagens sobre o
primeiro, tais como a maior eficiência, os menores custos de manutenção e o menor nível
de emissão de poluentes. No entanto, a oferta nacional de óleo combustível não se reduziu
na mesma proporção que a demanda, fazendo com que o Brasil seja um exportador líquido
deste produto. De acordo com MME (2008), atualmente, 51% da produção nacional de tal
derivado é exportada.
Neste mesmo contexto, o consumo relativo de gasolina também se reduziu, embora
em intensidade bem menor do que o do óleo combustível. Analogamente, parte da demanda
por gasolina foi substituída pelo álcool, em resposta aos incentivos do PROÁLCOOL -
Programa Nacional do Álcool, lançado em 1975. Seu objetivo inicial era estimular a
produção de álcool anidro a partir da cana-de-açúcar, para que este fosse misturado à
gasolina em proporção superior à que estava ocorrendo. Tal aumento de produção ocorreria
57
por meio do aproveitamento da capacidade ociosa das destilarias anexas aos engenhos de
açúcar (ARAÚJO & GHIRARDI, 1986). Os incentivos para estas práticas se deram na
forma de subsídios e financiamentos públicos, e a Petrobrás ficou responsável pela compra
e mistura do etanol à gasolina.
Posteriormente, com o segundo choque do petróleo, o PROÁLCOOL foi ampliado,
com o incentivo à produção e compra de veículos movidos exclusivamente a álcool
hidratado, por meio de vantagens fiscais e creditícias, além de preços favoráveis deste
combustível em relação à gasolina. Nesta fase do Programa, incentivou-se também o
aumento da capacidade de produção de etanol, por meio da construção de novas destilarias
autônomas. Porém no final da década de 80, houve o problema de desabastecimento de
álcool, pois o intenso aumento da compra e produção de veículos movidos a etanol deixou
de ser acompanhado por estímulos à produção do combustível. Isto afetou fortemente a
credibilidade do Programa frente aos consumidores, fazendo com que o combustível
praticamente caísse no esquecimento por um período. O uso do álcool ganhou novo fôlego
no início da década de 2000, com o surgimento dos veículos flex fuel. Atualmente, o Brasil
é um exportador líquido de gasolina. As vendas externas respondem por 17% da produção
nacional deste combustível (MME, 2008).
A participação do óleo diesel no consumo brasileiro de derivados é crescente, tendo
este combustível o maior consumo no país, com uma fatia de 36% em 2007 (MME, 2008).
Isto se deve principalmente ao fato de o setor de transporte no Brasil estar concentrado
fortemente no modal rodoviário. Além disto, conforme ressalta Oliveira (2003), no
contexto dos choques do petróleo, quando houve diversos incentivos à substituição de
58
derivados por combustíveis alternativos, o diesel não encontrava substitutos. Atualmente, a
demanda por diesel não é totalmente suprida pelas refinarias brasileiras. O Brasil importa
12% do consumo nacional do produto.
No caso do GLP, a possibilidade de substituição por fontes alternativas também é
limitada. Isto ocorre porque seu consumo é concentrado no setor residencial, e seu
deslocamento para o gás natural se restringe às áreas urbanas onde há infra-estrutura de
canalização, que ainda são reduzidas. A demanda por este produto deve seguir
acompanhando o crescimento demográfico e o do número de domicílios (MME, 2007b).
Assim como no caso do diesel, parte do GLP consumido no Brasil – 15% - também precisa
ser importado (MME, 2008).
A nafta também vem apresentando um aumento de participação na demanda
nacional de derivados. Este produto é o principal insumo da indústria petroquímica. O
Brasil é um importador líquido de nafta. Atualmente, as importações respondem por 34%
do consumo deste produto.
III.3. Evolução da capacitação tecnológica da Petro brás no refino de petróleo
Conforme já mencionado, inicialmente, o processamento de petróleo no Brasil se
dava apenas por meio de destilarias. Os processos de conversão, configurando a atividade
de refino propriamente dita, começaram a existir no país a partir da década de 1950.
59
III.3.1. Capacitação técnica e importação de tecnologia na forma de caixa
preta
Quando da criação da Petrobrás, uma das principais preocupações em relação à área
de refino foi com a capacitação de seus quadros técnicos. Isto se deve ao fato de que o país
não dispunha de pessoal suficiente – nem em quantidade nem em qualidade – com
conhecimentos tecnológicos sobre a atividade, já que a maioria dos engenheiros formados
no país à época eram especializados em construção civil. Desta forma, foi instituído pela
Petrobrás o Curso de Refinação de Petróleo6, que posteriormente passou a se chamar Curso
de Engenharia de Processamento. Este curso, que tinha duração de dezoito meses, aceitava
como candidatos engenheiros de todos os tipos. O objetivo era formar profissionais
capacitados para cumprir funções de responsabilidade na operação das refinarias (LEITÃO,
1985). Este curso foi o primeiro passo da longa trajetória de capacitação tecnológica da
Petrobrás na área de refino.
O Curso de Refinação de Petróleo, inicialmente, era ministrado principalmente por
professores estrangeiros – americanos e canadenses - , já que o Brasil carecia de
profissionais capacitados para este fim. Posteriormente, de forma gradativa, os egressos do
curso, já capacitados, foram passando a exercer esta função. O curso abarcava aulas em
classe, e também aulas práticas em laboratórios, priorizando inicialmente a capacitação
para operação, em detrimento da qualificação em projetos de processamento. O período
final do curso consistia em um estágio na RLAM, primeira refinaria da Petrobrás
(LEITÃO, 2005).
60
De acordo com Leitão (1985), a construção da RLAM foi feita sob o regime turn-
key, sob o qual o proprietário do empreendimento apenas tem que "virar a chave" para dar
partida em sua unidade industrial. Neste regime, o fornecedor de tecnologia vende a
unidade já funcionando, e se responsabiliza pelas informações necessárias à construção da
unidade, à sua partida e às operações iniciais, incluindo compra e montagem de
equipamentos. Não são fornecidas ao comprador da tecnologia informações sobre os
conhecimentos existentes para se chegar ao projeto básico, ou sobre a especificação dos
equipamentos. Por isso, a tecnologia adquirida é considerada como uma “caixa-preta” ou
“pacote fechado”. O projetista contratado para construção e assistência na operação da
RLAM foi a empresa americana M. W. Kellogg.
Esta refinaria, devido ao seu pioneirismo, teve fundamental importância para o
aprendizado operacional da Petrobrás. Este aprendizado, adquirido na fase inicial de
funcionamento da RLAM, enquadra-se no conceito de learning-by-doing proposto por
Arrow (1962), pois era oriundo da repetição de tarefas operacionais, ficando restrito à
esfera produtiva, na medida em que não se tinha conhecimento sobre a tecnologia que
estava sendo utilizada.
Associados a este pioneirismo, contribuíram fortemente para este aprendizado os
inúmeros problemas operacionais enfrentados nas unidades da RLAM. Muitos destes
problemas foram gerados pelo desconhecimento dos projetistas estrangeiros sobre as
condições locais de operação, o que levou a erros de montagem e de operação. Um
6 Este curso havia sido criado pelo Conselho Nacional de Petróleo (CNP) em 1950, e foi transferido à Petrobras quando da sua criação. Para abarcar o curso, a empresa criou, em sua estrutura, o CENAP (Centro de Aperfeiçoamento e Pesquisas de Petróleo).
61
exemplo destes erros, relatado por Leitão (2005), foi o projeto de tubulações de água
enterradas, com o objetivo de “evitar o congelamento da água”, já que o mesmo foi copiado
de padrões americanos, não tendo sido feitas adaptações à diferença de temperatura entre as
localidades. Este foi um dos inconvenientes trazidos pela incorporação de tecnologias
tangíveis na forma de pacotes fechados.
Problemas como este acabaram levando ao afastamento da M. W. Kellogg da
operação da refinaria, a qual passou a ser de responsabilidade da Petrobrás. A detecção
destes problemas foi possível graças à maior familiarização com o processo produtivo,
conquistada a partir do learning-by-doing, que, de fato, permitiu o desenvolvimento de
maiores competências na esfera da produção e, consequentemente, melhorias no processo
produtivo.
III.3.2. O início da “abertura dos pacotes tecnológicos”
O afastamento da empresa projetista estrangeira favoreceu, ainda que de forma
incipiente, alguma “abertura dos pacotes tecnológicos”, que vinham do exterior totalmente
“fechados”. No caso da RLAM, sentiu-se esta necessidade, na tentativa de detectar e sanar
os sérios problemas operacionais enfrentados, os quais os padrões estrangeiros não estavam
sendo capazes de resolver. Um exemplo desta limitação é que a tecnologia importada não
estava preparada para processar óleos com teor de parafinas tão alto como o do petróleo
baiano (50%), pois não havia no mundo projeto pronto adequado neste sentido. Isto
culminou em transtornos na unidade de lubrificantes, como a formação de “cristais” do tipo
agulha, que entupiam os filtros. Seria necessário que se fizessem testes e pesquisas
específicas para este fim. Como na época – início da década de 1960 - não havia
62
disponíveis unidades-piloto, vários testes foram feitos na própria unidade industrial. Foram
realizadas algumas modificações nos projetos originais na tentativa de se resolver
problemas como este.
Neste contexto, além do learning-by-doing, forma de aprendizado predominante,
observava-se um princípio de aprendizado por adaptação – learning-by-adapting, conceito
proposto por Katz (1976) apud Queiroz (2006). Isto porque a Petrobrás teve a experiência
da planta de lubrificantes da RLAM, na qual seus técnicos trabalharam no esforço de
adaptar tecnologias importadas, projetadas sob um contexto diferente do brasileiro, a
condições específicas da matéria-prima local.
No caso da RPBC, em Cubatão (SP), o início do “desempacotamento” das
tecnologias foi possibilitado pela existência de atividades de acompanhamento e controle
do processo, permitindo a formação de grupos de projetos de processamento. Estes grupos
eram formados pelos próprios engenheiros da refinaria, que realizaram pequenas mudanças
nas unidades para melhorar seu desempenho. Em função disto, foi em Cubatão que
surgiram os primeiros núcleos de atividades de projeto de processamento. Tais atividades
não ocorreram de forma tão significativa na RLAM devido ao seu pioneirismo, associado
aos diversos problemas encontrados e à dificuldade de mão-de-obra de nível médio
capacitada para a operação. Diante desta situação, os engenheiros tiveram que se envolver
diretamente na operação propriamente dita, havendo pouca disponibilidade para o
acompanhamento e controle do processo (LEITÃO, 2005).
No entanto, o aprendizado pelo desempacotamento ficava muito limitado em função
de não haver uma atividade unificada e organizada de Pesquisa Tecnológica e de
63
Engenharia Básica. Por isto, na medida em que não se dispunha de laboratórios apropriados
e plantas-piloto, as atividades de projeto e pesquisa tecnológica ficavam restritas a
iniciativas isoladas, como serviços técnicos de pequeno porte e modificações pontuais.
Nas décadas de 60 e 70, as principais preocupações da área de operações do refino
eram o aumento da capacidade, por meio da construção de novas refinarias - para atender
ao aumento da demanda - , e a formação de pessoal para operá-las e administrá-las. Neste
período, a demanda por derivados era crescente, mas sua composição pouco se alterava.
Desta forma, praticamente todas as refinarias foram projetadas para gerar um mesmo perfil
de produção, rico em gasolina e óleo combustível. Além disto, elas estavam preparadas
para processar principalmente óleo leve importado. Em face destes fatores, aliados ao fato
de que a Petrobrás não tinha uma atividade centralizada de projetos de processamento, os
projetos básicos das novas refinarias continuavam vindo do exterior (LEITÃO, 1985).
Assim, embora o Centro de Pesquisas da Petrobras – CENPES – já houvesse sido criado,
em 1966, as demandas por trabalhos desta natureza eram bastante limitadas.
Assim, observa-se que as fontes de inovação utilizadas neste período eram,
essencialmente, o treinamento, por meio do curso de refinação, e a incorporação de
tecnologia, através da aquisição de máquinas e equipamentos do exterior. Até então, havia
pouquíssimos esforços de desenvolvimento tecnológico próprio. Adotando-se os conceitos
de Bell e Pavitt (1993), estava-se desenvolvendo fortemente uma capacidade produtiva,
mas a capacitação tecnológica ainda era muito limitada.
64
III.3.3. O início da atividade centralizada de Engenharia Básica e a adaptação
de tecnologias
Apenas em meados da década de 70 passou a haver na Petrobras a atividade
centralizada e institucionalizada de Engenharia Básica, também chamada de Projeto de
Processamento ou Process Design. Tal atividade surgiu como um órgão do CENPES. Este
foi um marco importante para o aprendizado tecnológico na empresa, na medida em que foi
fundamental para viabilizar a adaptação e melhoria de tecnologias já adquiridas. Isto
ocorreria por meio da abertura dos pacotes tecnológicos importados, e da realização de
modificações a fim de adaptar tais tecnologias a condições locais específicas. Para isto, é
essencial que a empresa conte com atividades estruturadas de pesquisa tecnológica e de
engenharia básica, para que possa conhecer os fundamentos de cada tecnologia.
Logo após a institucionalização da Superintendência de Engenharia Básica no
CENPES, foram feitos acordos de transferência de tecnologia com empresas licenciadoras
internacionais. Neste sentido, Leite (2005) destaca a assinatura do acordo de cooperação
técnica com a Pullman Kellogg, empresa americana de tecnologia. Este acordo, assinado
em 1977, estabelecia a colaboração em Pesquisa e Desenvolvimento e em projetos
conceituais de alguns processos de refino, com ênfase no craqueamento catalítico fluido -
FCC. O projeto básico, de FCC, seria executado em conjunto com o CENPES, e a Kellogg
se comprometia a trazer pessoal qualificado para efetuar a transferência de tecnologia e
fornecer assistência técnica.
O contrato continha cláusulas que previam a efetiva “abertura do pacote
tecnológico”, com o fornecimento de informações e conhecimentos aos técnicos da
65
Engenharia Básica. Desta forma, a Petrobras começava a conhecer internamente as
tecnologias que iria operar, capacitando-se assim para o desenvolvimento de projetos
básicos de processos de refino – ainda que sob instrução de empresas estrangeiras -, e não
apenas para operacionalizá-los. Desta forma, começavam a ser adotadas fontes de inovação
complementares à incorporação de tecnologias, quais sejam, os contratos de transferência
de tecnologia. No caso deste acordo de cooperação da Petrobrás com a Pullman Kellogg, a
transferência se deu, conforme a classificação apresentada por Longo (1978), de forma
mais completa, com uma efetiva transmissão de conhecimentos. Este autor ressalva que,
para que isto seja possível, é necessário que o receptor esteja preparado para absorver este
conhecimento, principalmente no que diz respeito a recursos humanos. Era este o caso da
Petrobrás, em virtude do curso de refinação e de todos os outros avanços no aprendizado
tecnológico que a empresa havia alcançado até então.
Para a capacitação da equipe de Engenharia Básica, o CENPES contava, não só com
os conhecimentos provenientes da transferência de tecnologia, mas também com a
experiência operacional já existente até então, alcançada por meio das atividades de
assimilação e desempacotamento da tecnologia importada.
III.3.4. Os choques do petróleo e o aumento da importância do CENPES
O segundo choque do petróleo, em 1979, mudou substancialmente o cenário da
indústria de refino no país. A composição do consumo de derivados alterou-se
significativamente, com destaque para a queda drástica da demanda por óleo combustível,
conforme foi visto na seção III.2. Aliado a isto, a disponibilidade de óleo leve importado –
que as refinarias estavam preparadas para processar – ficou muito reduzida, e seu preço
66
muito elevado, ficando disponíveis os crus mais pesados. Desta forma, o parque de refino
existente deixou de estar adequado ao perfil da demanda nacional e à matéria-prima
disponível. Paralelamente, os recursos financeiros disponíveis para investimentos na
atividade de refino ficaram comprimidos, já que com a crise de oferta de petróleo no
mundo, foi dada prioridade total às atividades de E&P.
Desta maneira, conforme comenta Fantine (2003), não havia no mundo tecnologia
disponível para resolver inteiramente o problema específico do Brasil a custos compatíveis,
dada a crise econômica pela qual o país passava. Assim, mostrava-se fundamental que se
fizessem modificações nas condições de operação e que as unidades existentes fossem
adaptadas para um novo perfil de produção. Para isto, seria essencial “abrir os pacotes
tecnológicos”, a fim de descobrir brechas para alterações e recalcular projetos. Buscava-se,
com isto, que fosse possível alterar os equipamentos e processos, de sorte a adequá-los às
requisições nacionais, assumindo-se assim padrões próprios.
Isto só seria possível com a realização de estudos e pesquisas tecnológicas, o que
aumentou substancialmente a quantidade de trabalho demandada ao CENPES7. Cabe
destacar que, como explica Leitão (1985), quando esta demanda surgiu, o CENPES já
estava preparado, com sua equipe capacitada, estruturada e tecnologicamente madura, e
contando com laboratórios e unidades-piloto já montadas e em funcionamento. Desta
forma, o fato de que já havia sido criada a atividade centralizada e organizada de
Engenharia Básica foi fundamental para que o CENPES fosse capaz de atender a tais
demandas, e de buscar soluções no sentido de adaptar o parque de refino brasileiro ao novo
67
perfil de consumo. Assim, entende-se que tais investimentos proveram a Petrobrás de
“capacidades dinâmicas” - conceito apresentado por Teece e Pisano (1994) - na medida em
que possibilitou que a empresa estivesse apta a adaptar seus recursos em resposta a uma
mudança no ambiente econômico.
O aumento da demanda das áreas operacionais de refino pela assistência tecnológica
do CENPES configura uma forma de “aprendizado pela interação intra-firma”, cujo
conceito é apresentado por Lundvall (1992). O autor ressalta, por exemplo, a relevância do
relacionamento entre departamentos de produção e de P&D de uma empresa.
No sentido de adequar a produção ao novo perfil da demanda, com redução do
rendimento de óleo combustível, foram instituídos, no início da década de 1980, cinco
programas: o Programa de Craqueamento de Cargas Pesadas (PROCRAP); Programa de
Minimização da Produção de Resíduo de Vácuo (PROMIRV); Programa de Queima de
Resíduo de Vácuo (PROQUERV); Programa de Investimentos em Novas Unidades; e
Programa de Qualidade (PROQUAL). Tais programas foram chamados de Programas de
Fundo de Barril, devido ao seu objetivo de converter frações pesadas e residuais em cortes
mais leves, e conseqüentemente mais nobres.
Merece destaque o PROCRAP, pelo qual foram feitas alterações nas unidades de
craqueamento existentes para que fossem capazes de quebrar resíduos pesados, o que
implicava uma maior severidade dos processos. Em decorrência deste programa, o
consumo de catalisadores aumentou muito, em função da busca por soluções que
7 O Centro de Pesquisas e Desenvolvimento Leopoldo Américo Miguez de Mello – CENPES, da Petrobrás,
68
possibilitassem o rendimento de frações leves e médias a partir de resíduos. Mostrava-se
necessária a aquisição de novos tipos de catalisadores, que fossem resistentes à severidade
das novas condições operacionais, e que oferecessem os perfis de produção desejados.
(FANTINE, 2003).
Neste contexto, aumentava a importância da atuação do CENPES em atividades de
pesquisas na área de catalisadores. A capacitação técnica na área já vinha sendo
desenvolvida desde o início da década de 70, com cursos específicos que, inclusive, traziam
professores estrangeiros. Foram desenvolvidos também projetos de pesquisa com o objetivo
de avaliar e desenvolver catalisadores. Entretanto, a Petrobrás continuava importando todo
o seu consumo destas substâncias. Diante desta situação, mostrava-se estratégico aos
interesses do refino nacional a entrada da Petrobrás na atividade de fabricação de
catalisadores, bem como o seu domínio sobre as tecnologias desta natureza. Estas
substâncias, que sempre foram de grande importância para a atividade de refino, tiveram
sua demanda elevada com os programas de Fundo de Barril.
Diante desta percepção, a empresa fechou um acordo com a Akzo Nobel e a
Oxiteno8, respectivamente holandesa e brasileira, empresas fabricantes de catalisadores.
Este acordo estabelecia a criação da joint-venture Fábrica Carioca de Catalisadores S.A. –
FCC. S.A., em 1985, que funcionaria na zona industrial de Santa Cruz, no Rio de Janeiro.
Conforme destaca Leite (2005), além da criação da fábrica, instituía-se também um pacto
de cooperação técnica em P&D, pelo qual haveria uma transferência de tecnologia nas
havia sido criado em 1966, mas sua importância foi evidenciada e mais reconhecida neste contexto.
69
áreas de formulação, preparo e avaliação de catalisadores. Posteriormente, seria
desenvolvido conjuntamente o projeto básico e seria disponibilizada assistência técnica
para a pré-operação e a partida da nova unidade de produção. Desta forma, ocorreu um
processo de aprendizado pela interação (learning-by-interacting), cujo conceito fôra
desenvolvido por Lundvall (1992), que destaca, entre outros aspectos, a relevância da
interação inter-firmas.
Conforme ressalta Leitão (2005), a Akzo aceitou a exigência da Petrobrás referente
à ampla abertura do “pacote tecnológico”, incluindo informações sobre os fundamentos da
tecnologia da fabricação, tanto no nível dos conhecimentos básicos como nos de processo.
Em troca, a empresa holandesa teria acesso a um mercado cativo de catalisadores no Brasil.
A fábrica entrou em operação em 1989. Observa-se, novamente, a busca por inovações
através da transferência de tecnologia feita de uma maneira mais completa, com uma
efetiva transmissão de conhecimentos.
Diante da crescente importância atribuída aos catalisadores, foi criada, dentro do
CENPES, a Divisão de Catalisadores. Conforme explica Leite (2005), o objetivo era
absorver um conhecimento abrangente sobre catalisadores de FCC, através de um programa
de capacitação na Akzo Nobel, que possibilitou o treinamento, na Holanda, de engenheiros
da FCC S.A., de técnicos e pesquisadores do CENPES e de engenheiros do então
Departamento Industrial. Com isto, na medida em que foi em busca de novas soluções no
8 No início da década de 2000, a Oxiteno saiu da sociedade, ficando a Petrobrás e a Akzo Nobel com 50% cada uma. Em 2004, a participação da Akzo Nobel na FCC. S.A. foi adquirida pela norte-americana Albemarle.
70
refino, a Petrobrás passou a dominar também a tecnologia no segmento de catalisadores,
adquirindo assim conhecimento integrado da cadeia fabricação-uso.
Paralelamente foi aprofundado o conhecimento na área de processo. A equipe de
projetos da Engenharia Básica consolidou sua capacitação, tornando-se apta a projetar
integralmente uma unidade de FCC. A Petrobras executou então projetos de modernização
em todas as suas unidades existentes nas refinarias. Além disto, implantou a Unidade
Multipropósito de FCC, em escala protótipo, nas instalações da Unidade de Negócio Six,
em São Mateus do Sul (PR), que visava estudar parâmetros de engenharia para gerar dados
para os projetos básicos dessa tecnologia (LEITE, 2005). Isto permitiu que a Petrobrás
desenvolvesse novos padrões de projetos para suas unidades de craqueamento catalítico, de
modo a ampliá-las e adaptá-las às novas tendências da demanda. Desta forma, o país passou
a deter uma tecnologia própria, saindo da posição de importador de projetos prontos
(FANTINE, 2003). Logo, o conhecimento mais profundo acerca das tecnologias que eram
utilizadas permitiu que fosse realizado desenvolvimento tecnológico próprio, por meio de
atividades internas de P&D.
Além das ações no âmbito do PROCRAP, outro caso de sucesso que merece
destaque com relação à adaptação da tecnologia existente às novas condições da demanda,
no campo dos Programas de Fundo de Barril, foi o Hidrotratamento do LCO – sigla em
inglês de Óleo Leve de Reciclo. O LCO é uma fração média e instável proveniente das
unidades de FCC, que até então era utilizada como mistura ao óleo combustível a fim de
reduzir a sua viscosidade. Foram feitas pesquisas para verificar a possibilidade de
encaminhar o LCO à unidade de hidrotratamento a fim de reduzir a sua instabilidade e seu
71
teor de contaminantes, e adicioná-lo ao pool de óleo diesel. Estas pesquisas foram
realizadas nas unidades-piloto do CENPES.
Como relata Leitão (2005), os testes resultaram em sucesso deste novo tipo de
operação, e a primeira refinaria a utilizá-la foi a REVAP – Refinaria do Vale do Paraíba - ,
em São José dos Campos (SP), em 1983, onde apresentou retornos econômicos
significativos. Pouco tempo depois, o projeto já estava implantado também na REGAP, em
Betim (MG), gerando lucros semelhantes. Esta nova operação teve uma grande importância
estratégica para o refino brasileiro, pois o óleo diesel, além de apresentar valor comercial
bastante superior ao do óleo combustível, já estava se mostrando o derivado mais
demandado do país.
III.3.5. O PROTER e a consolidação do desenvolvimento tecnológico próprio
Diante do desafio de se processar cada vez mais petróleo nacional, cuja
característica predominante era o baixo grau API, foi criado, em 1994, o Programa de
Tecnologias Estratégicas do Refino – PROTER. Seu objetivo é criar tecnologias que
possibilitem o processamento de petróleos nacionais pesados, o que implicaria a otimização
do parque de refino existente, por meio do aumento da conversão de frações residuais e
maximização da produção de combustíveis mais nobres.
Um importante destaque do PROTER é o desenvolvimento do craqueamento
catalítico fluido de resíduos, o RFCC. Conforme explicam Leite et al (2008), a meta era
desenvolver um conversor Petrobras que possibilitasse o processamento de 100% de
resíduo atmosférico do petróleo pesado proveniente da Bacia de Campos. Esta foi uma das
72
principais novidades do PROTER, já que o esforço em craquear frações residuais em
unidades de FCC vinha ocorrendo desde o início da década de 1980, com o PROCRAP.
Mas até então, não se havia logrado o processamento de 100% destas frações. Para isto, foi
criada uma carteira de projetos de P&D com vistas a adaptar a tecnologia tradicional de
FCC à conversão de resíduos. Seriam necessárias melhorias na formulação de catalisadores,
visando o aumento da seletividade, para o processamento de cargas mais pesadas.
No âmbito do PROTER, foram implementadas diversas inovações no processo de
craqueamento catalítico. Tais inovações, quando aplicadas conjuntamente, formaram uma
nova concepção de projeto para o processamento de frações residuais, própria da Petrobras.
Gerou-se assim o ‘pacote tecnológico’ Petrobrás Advanced Converter Residue Cracking –
PACRC. Destacam-se a seguir algumas das principais inovações abarcadas por esta
tecnologia (LEITE, 2005):
• A tecnologia PASS (Petrobras Advanced Separation System), patenteada
pela Petrobras: sistema que permite a rápida separação, no final do reator,
entre os hidrocarbonetos e o catalisador gasto, evitando assim o sobre-
craqueamento da gasolina e outras reações secundárias indesejáveis;
• O injetor de carga Ultramist, também patenteado pela Petrobras: injeta a
carga a uma velocidade muito elevada, por meio de vapor, a fim de gerar
uma névoa fina de gotículas de óleo, facilitando o seu contato com o
catalisador na base do reator. Isto leva a um aumento do rendimento de
gasolina e GLP;
73
• O uso de aditivo à base de zeólita ZSM-5 ao catalisador, visando o aumento
da produção de GLP e de olefinas leves para a indústria petroquímica. Esta
tecnologia, já dominada pela Petrobras, através da FCC.S.A., já vinha sendo
utilizada em unidades convencionais, e pôde ser aplicada também no
processamento de resíduos;
• Um sistema catalítico projetado especialmente para o processamento de
cargas pesadas, com as seguintes propriedades: prover maior acessibilidade
da carga, maximizar a produção de olefinas leves para a petroquímica, e
reduzir a produção de coque e gás no processo;
• A nova tecnologia de fabricação de catalisadores, Amethyst, que aumenta
sua acessibilidade às grandes moléculas, gerando um aumento da conversão
e uma redução do rendimento de coque;
• Melhorias mecânicas e novos dispositivos, tais como o que evita a deposição
de coque no vaso separador, conferindo maior confiabilidade às plantas.
A combinação destas inovações possibilitou o projeto de três novas unidades de
RFCC, que processam resíduo atmosférico sem a necessidade de nenhum pré-tratamento.
Na Refinaria de Capuava (RECAP-SP), entrou em operação em 1999 uma unidade capaz
de processar 3 mil m3/dia de resíduo atmosférico. No ano de 2001, teve partida a unidade
de RFCC da Refinaria Landulpho Alves de Mataripe (RLAM-BA), com capacidade de 10
mil m3/dia. E recentemente, em 2006, foi posta em marcha a unidade de craqueamento de
74
resíduos da Refinaria Alberto Pasqualine (REFAP-RS), com 7 mil m3/dia (LEITE et al,
2008).
Desta forma observa-se que, a partir de maiores investimentos em P&D, a Petrobrás
vem sendo capaz de desenvolver tecnologias próprias, adequadas às especificidades locais
do Brasil, tanto no que tange à demanda por derivados quanto à disponibilidade de matéria-
prima. Assim, a empresa não está mais engessada por pacotes fechados desenvolvidos de
acordo com padrões estrangeiros.
Também no âmbito do PROTER, a Petrobras desenvolveu, pioneiramente, a
tecnologia H-Bio, processo para a hidroconversão de óleos vegetais, patenteado pela
empresa. Este processo tem como objetivo aumentar a produção de diesel por meio da
inserção de matérias-primas renováveis no esquema de refino. O óleo vegetal é misturado
às frações de diesel que servirão de carga à unidade de Hidrotratamento (HDT), cuja
principal função é a redução do teor de enxofre. Este processo já está sendo utilizado nas
refinarias Gabriel Passos – REGAP, Alberto Pasqualini - REFAP, Presidente Getúlio
Vargas - REPAR, e Paulínia - REPLAN (EPE, 2008). O sucesso desta tecnologia foi
atestado após a realização, pelo CENPES, de testes em escala piloto. Tais testes foram
realizados com 10% de óleo de soja na carga9. A empresa prevê a implementação deste
processo em outras refinarias, e estuda a possibilidade de expandir a tecnologia para outras
matérias-primas.
9 Anteriormente, o CENPES havia feito testes com 30% de óleo vegetal na carga de HDT, mas, com esta elevada proporção, foram encontradas restrições operacionais devido ao alto consumo de hidrogênio e a limitações do equipamento.
75
O H-Bio vai ao encontro do desafio enfrentado pela Petrobrás de adequar seu
parque de refino à demanda por derivados, já que o diesel é o combustível mais consumido
do Brasil, que ainda depende da importação deste produto. Além de contribuir para o
suprimento de parte da demanda de diesel, o processo provê uma maior qualidade ao
combustível, gerando um produto com menor teor de enxofre e maior número de cetano.
III.4. Panorama atual do refino brasileiro
Esta seção irá analisar a atual situação da atividade de refino no Brasil, com foco
nos aspectos relacionados à capacitação tecnológica. Primeiramente, traçaremos um perfil
da indústria com relação à intensidade em P&D, a partir de alguns dados extraídos da
PINTEC. E posteriormente, iremos discorrer sobre as tecnologias desenvolvidas
recentemente pelo CENPES com foco nas novas refinarias, que estão sendo construídas: a
Refinaria Abreu e Lima, que terá como prioridade a produção de óleo diesel, e o
COMPERJ, que produzirá principalmente produtos petroquímicos de primeira e segunda
geração.
III.4.1. Os dados da PINTEC sobre P&D
Ao contrário do que ocorria no início da atuação da Petrobras no refino de petróleo,
quando sua principal fonte de tecnologia era a importação de máquinas e equipamentos,
atualmente esta indústria no Brasil é altamente intensiva em atividades internas de P&D.
Isto pode ser observado a partir de dados da PINTEC do ano de 2005, que é a versão mais
recente disponível. Na Figura 3.2, a seguir, temos um comparativo da indústria de refino de
petróleo brasileira com a de dois países europeus - França e Espanha - , com relação à
76
composição dos gastos com inovação em suas diferentes categorias. Os dados referentes a
estes dois países foram obtidos a partir da Community Innovation Survey 4 – CIS 4,
pesquisa publicada pelo órgão estatístico europeu Eurostat.
0%
20%
40%
60%
80%
100%
Brasil França Espanha
Outros
Aquis externade P&D
Aquis demáq e equip
P&D Interna
Figura 3.2: Composição dos gastos com inovação na indústria de refino de petróleo por tipo de atividade inovativa. Fonte: Elaboração própria a partir de IBGE (2005) e Eurostat (2004).
Na Figura 3.2, verifica-se que na indústria de refino brasileira, que se concentra
essencialmente na Petrobras, do total de dispêndios com atividades inovativas, 61%
destinam-se a atividades internas de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), e apenas 5% à
aquisição de máquinas e equipamentos. Observa-se que nesta indústria o Brasil apresenta
um perfil mais intensivo em atividades de desenvolvimentos tecnológico próprio do que os
países europeus, que tradicionalmente investem muito mais em pesquisa. Nos três países, a
principal fonte de inovação é a P&D interna. Na França, esta atividade é complementada
77
majoritariamente pela contratação de serviços de P&D de outras instituições. Já na
Espanha, a principal fonte complementar à realização de pesquisas no âmbito da indústria é
a aquisição de máquinas e equipamentos.
Assim, notamos que a principal fonte de inovação da Petrobras na atividade de
refino é a realização de P&D internamente. Com isto, mostra-se que se investe muito mais
no desenvolvimento tecnológico próprio do que na simples aquisição de bens tangíveis.
Neste sentido, observou-se que a empresa apresenta um perfil semelhante ao de grandes
empresas de países desenvolvidos, as quais, segundo Bell e Pavitt (1993), muitas vezes
investem mais em P&D do que na aquisição de capital fixo. Desta maneira, seguindo-se a
distinção proposta por estes autores, a empresa atualmente, além de possuir uma grande
capacidade produtiva de refino, detém uma forte capacitação tecnológica na área. Esta
capacitação lhe permite ter um papel mais ativo, com a agregação de tecnologias próprias
aos bens de capital adquiridos de terceiros, e o desenvolvimento de projetos e processos
internos.
Além disto, na indústria de refino, do total de gastos com atividades internas de
P&D, 99,9% são de natureza contínua10 (não ocasional), o que mostra que este tipo de
atividade faz parte da rotina da Petrobras. Assim, entende-se que a empresa detém um
processo consistente de “aprendizado pela pesquisa” – learning-by-searching, presente na
taxonomia de Malerba (1992) -, já que o conceito supõe esforços sistemáticos de busca
visando a geração de novos conhecimentos. Este processo compõe, de forma fundamental,
as “capacidades dinâmicas” da Companhia.
78
Também com base nos dados da PINTEC 2005, foi analisada a proporção de
pessoas ocupadas em atividades internas de P&D em relação ao número total de pessoas
ocupadas na indústria. Este indicador corrobora a maior intensidade em P&D da atividade
de refino com relação à indústria brasileira de um modo geral, conforme vemos na Figura
3.3, a seguir:
3,8%
0,8%
0%
1%
2%
3%
4%
Refino de petróleo Indústrias de transformação
Figura 3.3: Participação do número de pessoas ocupadas em atividades internas de P&D sobre o número total de pessoas ocupadas na indústria no Brasil. Fonte: Elaboração própria a partir de IBGE (2005).
Na classificação de setores adotada pelo IBGE, a indústria de refino de petróleo está
entre as cinco que apresentam maior valor para este indicador. Trata-se, principalmente,
dos profissionais que trabalham no CENPES, órgão que concentra as atividades de pesquisa
da empresa.
10 Este dado, excepcionalmente, foi colhido da PINTEC 2000, pois nas versões mais recentes da pesquisa (2003 e 2005) o mesmo não está disponível.
79
III.4.2. O desenvolvimento de tecnologias para as novas refinarias
É bem verdade que as refinarias brasileiras ainda não estão capacitadas para
processar apenas óleos nacionais. Conforme se pode constatar na Figura 3.4, a seguir, a
participação do petróleo importado no volume processado no Brasil vem se reduzindo nos
últimos anos, mas ainda é bastante significativa. De acordo com os dados de ANP (2008),
atualmente 23% do petróleo processado pelas refinarias brasileiras é importado, sendo que
os principais países exportadores são a Nigéria (10%) e a Arábia Saudita (3%), países
sabidamente ricos em óleo leve.
Nacional
Importado
0
200
400
600
800
1.000
1.200
1.400
1.600
1.800
1991 1993 1995 1997 1999 2001 2003 2005 2007
Mil
barr
is/d
ia
Figura 3.4: Evolução do volume de óleo cru processado nas refinarias brasileiras, segundo a origem (em mil barris por dia). Fonte: Elaboração própria a partir de ANP (2001) e ANP (2008).
Na medida em que o Brasil não é capaz de refinar todo o seu óleo produzido
internamente, observa-se que o país, ao passo que importa óleo leve (mais nobre), exporta
óleo pesado, de menor valor agregado. Neste sentido Szklo et al (2006) expõem:
80
However, over the short term, the current status of Brazil’s refinery industry, the profile of oil products domestic market, which is focused on medium and light distillates, and the flexible dynamics of the international oil market make the oil exports strategy the most feasible possibility for adding value to Brazilian heavy acid oils. (Szklo et al, 2006, p.699)
Entretanto, conforme pode ser visto na Figura 3.4, a participação do petróleo
nacional no volume processado nas refinarias brasileiras vem aumentando continuamente.
Isto se deve em grande parte à diretriz da Petrobras no sentido de se capacitar a refinar
petróleo brasileiro, principalmente proveniente da Bacia de Campos, que se caracteriza por
ser bastante pesado.
Esta participação deve seguir aumentando, já que o Plano de Negócios da Petrobrás
prevê montantes significativos de investimentos no sentido de reduzir a necessidade de
importação de petróleo. O objetivo central do segmento de refino da empresa é suprir o
déficit da produção nacional de óleo diesel e de insumos para a indústria petroquímica -
eteno e propeno - através da utilização de matéria-prima nacional. Os grandes projetos da
companhia neste sentido são as novas refinarias Abreu e Lima e COMPERJ. A estratégia
de investir nestes novos projetos está relacionada com uma característica marcante da
indústria, exposta no capítulo II, que é a limitada flexibilidade na fase posterior à
construção de uma refinaria. Desta forma, alterações radicais no perfil de produção de um
parque de refino estão condicionadas à construção de novas plantas, muito embora a
Petrobras tenha alcançado inúmeros avanços por meio de alterações nas refinarias
existentes em busca de adequá-las às novas condições de demanda e oferta.
A Refinaria Abreu e Lima, também chamada de Refinaria do Nordeste (RNEST),
está sendo construída em Pernambuco, e espera-se que entre em operação em 2011. Esta
81
refinaria está sendo projetada para ser capaz de processar óleo pesado – brasileiro e
venezuelano - e para produzir principalmente óleo diesel, que é o produto que apresenta
maior déficit de oferta no Brasil. Sua capacidade de processamento será de 230 mil barris
por dia de petróleo com cerca de 16ºAPI, com rendimento de até 162 mil barris por dia de
óleo diesel, e o restante de GLP, nafta petroquímica, bunker e coque. Este diesel terá um
reduzido teor de enxofre, 50 ppm (partes por milhão), o que significa atender à exigência
ambiental que entrará em vigência a partir de 2010.
Em função destas especificidades, esta refinaria terá um esquema de refino
totalmente inovador em nível nacional. Tradicionalmente, após o óleo bruto entrar na
destilação atmosférica, o resíduo atmosférico segue para uma unidade de destilação a
vácuo, de onde se retiram o gasóleo, que é encaminhado ao FCC (presente em todas as
atuais refinarias da Petrobras), e o resíduo de vácuo, que vai para o coqueamento retardado
(quando existente na refinaria, já que esta unidade não é tão comum no Brasil). Na RNEST,
diferentemente, não haverá unidade de FCC, já que esta favorece a produção de gasolina,
derivado que apresenta excesso de oferta no país. Também não haverá unidade de
destilação a vácuo. O RAT proveniente da destilação atmosférica seguirá diretamente para
a unidade de coqueamento retardado (UCR).
Este esquema de refino diverge completamente daqueles observados nas refinarias
já existentes no país, as quais foram construídas antes da década de 1980, sob um cenário
bem diferente do que assistimos hoje. Desta forma, A RNEST será a primeira refinaria no
Brasil a ser projetada de acordo com o perfil de demanda que temos hoje.
82
Conforme é explicado em EPE (2008), a refinaria disporá de apenas três processos
básicos: a destilação atmosférica alimentará diretamente uma unidade de coqueamento
retardado e as correntes das duas unidades serão encaminhadas às unidades de
hidrotratamento, com o objetivo de melhorar sua qualidade. Este esquema de refino está
representado na Figura 3.5, a seguir:
Figura 3.5: Esquema de refino a ser adotado na Refinaria Abreu e Lima. Fonte: EPE (2008).
Esta configuração será possível graças a uma inovação tecnológica desenvolvida
pelo CENPES, que atestou o seu sucesso após a realização de pesquisas e testes em escalas
piloto e industrial. O Centro de Pesquisas da Petrobras propôs este esquema de refino em
função de seu forte favorecimento ao rendimento de diesel. Este rendimento poderá chegar
a ser 18% superior ao do esquema tradicional, em que a carga da UCR é o resíduo de vácuo
83
(REVISTA BRASIL ENERGIA, 2006). A UCR da nova refinaria será projetada
especificamente para ter como carga o RAT, em vez do resíduo de vácuo, que era o mais
usual. Inclusive, esta inovação tem uma patente depositada no INPI (Instituto Nacional de
Propriedade Industrial), em nome da Petrobras.
Outra tecnologia desenvolvida pelo CENPES, mais recentemente, é o FCC
Petroquímico, registrada pela Petrobrás com a marca FCC Plus. O projeto básico desta
nova tecnologia foi concluído em 2008 (PETROBRAS, 2009). As unidades de FCC
tradicionais originalmente têm o objetivo de favorecer a produção de gasolina. No entanto,
atualmente o Brasil apresenta um excesso de oferta deste derivado, e um déficit de oferta de
matérias-primas para petroquímica. Em função disto, o CENPES realizou pesquisas,
buscando formas de adaptar o FCC no sentido de maximizar a produção de olefinas leves,
que são produtos petroquímicos básicos.
As principais modificações de ordem operacional são o uso de temperaturas mais
altas no reator e maior circulação do catalisador, o que configura uma severidade mais
elevada, levando ao craqueamento das frações mais pesadas e à maximização do
rendimento de olefinas leves. Além disso, o emprego de aditivos à base de zeólitas ZSM-5
contribui para a maior produção de olefinas leves. Com isso, será possível aumentar em
quatro vezes a quantidade de propeno e em até dez vezes a quantidade de eteno (REVISTA
PETRO E QUÍMICA, 2006).
Esta tecnologia inovadora foi testada em escalas piloto e de bancada, sendo
finalmente comprovada em escala protótipo no Parque Tecnológico de São Mateus do Sul
(PR). Estes testes empregaram, inclusive, catalisadores produzidos na FCC.S.A
84
(MAINENTI et al, 2006). Esta unidade de processamento será parte fundamental do
COMPERJ (Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro), um grande pólo petroquímico que
está sendo construído no município de Itaboraí. Seu principal objetivo é a produção de
matéria-prima para o setor petroquímico brasileiro, a partir do processamento do petróleo
pesado proveniente da Bacia de Campos. O COMPERJ atualmente está na fase de projeto
básico, e o início de sua operação está previsto para 2012, com uma capacidade para
processar 150 mil barris por dia de petróleo pesado.
O COMPERJ terá, em uma mesma planta industrial, uma unidade de refino e
petroquímicos básicos (onde se inclui o processo FCC Petroquímico), e um conjunto de
unidades de 2ª geração, que vai transformar estes produtos básicos em produtos como
estireno e poliestireno. Este é um outro aspecto inovador desta tecnologia, possibilitar uma
maior integração refino-petroquímica.
O FCC Petroquímico foi um marco na evolução da capacitação tecnológica da
Petrobras no segmento de refino, na medida em que se trata de uma tecnologia
desenvolvida inteiramente pelo CENPES. Trata-se de um salto tecnológico comparável à
produção de petróleo em águas profundas, já que nenhuma outra empresa do mundo detém
esta técnica, pois ela foi desenvolvida com o objetivo de atender a necessidades específicas
do Brasil.
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CONCLUSÃO
Esta dissertação teve como objetivo analisar a trajetória da indústria de refino no
Brasil com foco na evolução da capacitação tecnológica da Petrobras. Esta análise tem
como pano de fundo os crescentes desafios enfrentados pela indústria, principalmente no
tocante às mudanças no perfil da demanda, ao enrijecimento das restrições ambientais e à
pior qualidade do óleo a ser processado.
No início da atuação da Petrobras na atividade de refino, sua principal –
praticamente única – fonte de inovação era a compra de tecnologias importadas na forma de
“pacotes fechados”, e seu aprendizado se restringia à esfera operacional - learning-by-
doing. Atualmente, o quadro é bem diferente. Conforme foi observado por meio da análise
de dados da PINTEC, a indústria de refino no Brasil – representada essencialmente pela
Petrobras – tem como base de sua estratégia inovativa as atividades internas de P&D. Além
disto, estas atividades são todas de natureza contínua, o que demonstra o caráter sistemático
das atividades de pesquisa, configurando assim o “aprendizado pela pesquisa” - learning-
by-searching – presente na taxonomia de Malerba (1992).
A postura ativa da Petrobras no sentido de se estruturar tecnologicamente, com a
qualificação de recursos humanos, construção de plantas-piloto e de laboratórios de
pesquisa, foi fundamental para o sucesso que a empresa vem conquistando com relação à
busca de tecnologias que propiciem a melhor adaptação do parque de refino nacional ao
perfil da demanda por derivados.
86
O primeiro passo da empresa no sentido da capacitação tecnológica na área de
refino, o curso de Refinação de Petróleo na década de 1950, foi primordial para todos os
avanços seguintes, na medida em que na época não havia no país profissionais qualificados
nesta área. Posteriormente, a experiência operacional, a criação do CENPES, e a
institucionalização da atividade de Engenharia Básica foram decisivos para que a empresa
chegasse ao patamar atual: detentora de um centro de pesquisas consolidado e atuante, que
lhe permite a realização de atividades sistemáticas de P&D.
Estas atividades possibilitaram o desenvolvimento de tecnologias próprias, mais
adequadas ao perfil brasileiro de demanda por derivados e de oferta de petróleo bruto, tais
como: o FCC Petroquímico, que visa maximizar a produção de olefinas leves para servirem
de matéria-prima para a indústria petroquímica; o RFCC, projetado especialmente para
processar frações residuais do petróleo pesado brasileiro; e o coqueamento retardado de
RAT, que visa maximizar a produção de óleo diesel, derivado com maior déficit de oferta
no país. Estas tecnologias foram desenvolvidas internamente na medida em que se via a
necessidade de se atender a particularidades brasileiras, tanto no que tange à demanda
quanto à oferta.
Desta forma, este trabalho verificou que o processo de capacitação tecnológica da
Petrobras apresenta um caráter cumulativo. Cada etapa do seu aprendizado foi essencial
para o êxito nas etapas seguintes. A evolução tecnológica, desde a criação da empresa,
quando a mesma apenas comprava tecnologias importadas na forma de “caixa preta”, até os
dias de hoje, em que a companhia possui o domínio de diversas tecnologias de refinação,
foi um processo gradual e cumulativo. Assim, entende-se que este processo confirma a
87
ideia de path-dependence, segundo a qual a posição de uma firma em um dado momento é
fortemente condicionada por sua trajetória passada. A experiência da empresa na área, tanto
no aspecto operacional quanto no tecnológico, a proveu de “capacidades dinâmicas”, que
lhe permitem adaptar-se a mudanças no ambiente econômico.
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