caderno diário crise anos 30 1314

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1 A Grande Depressão e o seu impacto social Por Raul Silva Nos anos 30, a Grande Depressão abalou a confiança no capitalismo liberal e na democracia. Perturbada e decadente, a Europa questionou o liberalismo político e a democracia parlamentar. As massas populares, afetadas pelo desemprego e seduzidas pelo exemplo da Rússia bolchevista, agitaram-se ao ponto de intimidar as classes dirigentes. As classes médias, alicerce do liberalismo e grandes vítimas da queda do poder de compra, sentiram-se atraiçoadas e perderam toda a confiança no Estado burguês. Pela Europa fora, o totalitarismo fascista foi moda e teve, na Itália e na Alemanha, os seus grandes paradigmas. Antiparlamentar, antiliberal e antimarxista, o fascismo distinguiu-se por subordinar o indivíduo aos interesses de um Estado forte e dirigista, que controlava a sociedade, a economia, a educação e a cultura; por impor o culto do Chefe a quem todos deviam uma obediência estrita. Um feroz aparelho repressivo e uma gigantesca máquina de propaganda serviram os seus desígnios. Onde a democracia resistiu à crise ensaiaram-se novas soluções económicas e políticas marcadas pelo intervencionismo do New Deal e pelas experiências das Frentes Populares. CADERNODIÁRIO AGRUPAMENTO DE LOUSADA NORTE N.º 1 http:// lousadanorte.blogspot .com lousadahistoria@gmail .com 17 de Novembro de 2013

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Page 1: Caderno Diário Crise Anos 30 1314

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A Grande Depressão e o seu impacto socialPor Raul Silva

Nos anos 30, a Grande Depressão abalou a confiança no capitalismo liberal e na democracia.

Perturbada e decadente, a Europa questionou o liberalismo político e a democracia

parlamentar. As massas populares, afetadas pelo desemprego e seduzidas pelo exemplo da

Rússia bolchevista, agitaram-se ao ponto de intimidar as classes dirigentes. As classes médias,

alicerce do liberalismo e grandes vítimas da queda do poder de compra, sentiram-se

atraiçoadas e perderam toda a confiança no Estado burguês.

Pela Europa fora, o totalitarismo fascista foi moda e teve, na Itália e na Alemanha, os seus

grandes paradigmas. Antiparlamentar, antiliberal e antimarxista, o fascismo distinguiu-se por

subordinar o indivíduo aos interesses de um Estado forte e dirigista, que controlava a

sociedade, a economia, a educação e a cultura; por impor o culto do Chefe a quem todos

deviam uma obediência estrita. Um feroz aparelho repressivo e uma gigantesca máquina de

propaganda serviram os seus desígnios.

Onde a democracia resistiu à crise ensaiaram-se novas soluções económicas e políticas

marcadas pelo intervencionismo do New Deal e pelas experiências das Frentes Populares.

CADERNODIÁRIO

AGRUPAMENTO DE LOUSADA NORTE

N.º 1

http://lousadanorte.blogspot.com

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Nas origens da criseExercícios

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A prosperidade efémera

“Os anos 20 (1924-1929) foram anos de prosperidade. O American way of life invadiu a Europa. Aos benefícios da sociedade de consumo associou-se a busca de prazer e a evasão e intensificou-se a vida nocturna. Os teatros, os cinemas, os night-clubs e outras salas de espectáculos e de jogos das grandes cidades tornaram-se locais habitualmente frequentados. As novas bebidas (cocktail), as novas músicas (jazz) e as novas danças (charleston, lambeth walk, swing e rumba) passaram a animar a vida nocturna. Rallies de automóveis, corridas de carros e de cavalos e outros desportos (como o futebol) constituíram outros divertimentos que envolviam grandes massas. O rápido desenvolvimento dos meios de transporte (comboio, automóvel, avião) e dos meios de comunicação (rádio, telégrafo, telefone) acelerou o quotidiano das pessoas, favorecendo uma maior mobilidade espacial e do ritmo de vida. A moda de viajar entrou nos hábitos e prazeres das classes médias. Às viagens de negócios acrescentaram-se as viagens lúdicas, de turismo, quer no interior dos próprios países, quer para países estrangeiros, criando-se e desenvolvendo-se novas infra-estruturas para apoio destes lazeres: agências de viagens, serviços de hotelaria, mapas, guias turísticos, bilhetes-postais ilustrados, etc. Paralelamente a este novo estilo de vida, o período entre as duas guerras mundiais caracterizou-se por uma latente inquietação e instabilidade nos comportamentos sociais. A paz estabelecida pelo Tratado de Versalhes, que pôs fim à Primeira Guerra Mundial (1919), foi uma paz aparente, já que, na Alemanha e na Itália, o nazismo e o fascismo iniciavam a sua caminhada galopante. A crise de 1929 viria a agravar essa instabilidade gerando mesmo angústias e miséria que iriam ter consequências a todos os níveis.”

Eric Hobswam, A Era dos Extremos, Editorial Presença

1. Partindo dos documentos, descreva as principais transformações na vida urbana nos anos 20.

O apelo ao consumo

Cartaz da Revista Time,novembro de 1927

O dinheiro fácil

“Para incitar os empresários a investir acena-se-lhes com o crédito fácil, a política do dinheiro fácil. Alguns aproveitam a facilidade do recurso ao crédito que lhes é concedido, não para criarem novas empresas, mas sim para especularem: compram-se acções na bolsa a contar com uma alta das cotações. A verdade é que quanto mais os especuladores compram, mais as acções sobem. Sem se darem bem conta do que haviam feito, nas vésperas de 1929, os bancos tinham emprestado somas enormes a especuladores que só poderiam reembolsá-los se se mantivesse, indefinidamente, a espiral crescente das cotações em Wall Street.”

Jean-Luc Chalumeau, O Capitalismo, Publicações Dom Quixote

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A dimensão financeira, económica e social da criseExercícios

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A prosperidade efémera

“A crise torna-se, a partir do crash de Wall Street, uma crise mundial, o que demonstra como a América se vai transformando, aos poucos, na locomotiva da economia capitalista. As repercussões sociais desta crise, são, também, mundiais, afectando todos os países, com economias pouco desenvolvidas e diversificadas, que fornecem matérias-primas aos EUA e à Europa. (…) Por todo o lado falem fábricas por falta de compradores. Por todo o lado instala-se o desemprego, e as dificuldades económicas das populações agudizam-se. A fome, que parecia uma realidade passada, reemerge. Nos EUA, põe-se em questão o American way of life, instalando-se dúvidas quanto à validade do modelo capitalista tal como é aplicado. Este modelo incentivou, nos anos da pseudo prosperidade, a um consumo desenfreado, concedendo créditos ao consumo privado de forma pouco criteriosa e as pe s soas que não pos su íam capac idade de endividamento. Quanto mais se consumia, mais os bancos emprestavam, numa espiral que só podia conduzir a um fim – a ruptura do sistema financeiro e, consequentemente, produtivo, logo que as dificuldades financeiras começaram a emergir (as pessoas não pagavam aos bancos o que lhes deviam e deixaram de consumir por não terem meios para tal).Com a retracção do consumo privado, as empresas vêem-se com uma enorme quantidade de stocks invendáveis por causa da falta de liquidez financeira do s con sumidore s . Mi lha re s de emprego s desaparecerem em pouco tempo por já não se justificarem em época de retracção económica. Os bancos, com falta de confiança na capacidade de pagamento de quem pede empréstimos, encerram as linhas de crédito, restringindo ainda mais o consumo. A falta de dinheiro no sistema leva-os a retirar os créditos concedidos a muitos bancos europeus e a não efectuar novos empréstimos. Muito bancos europeus, dependentes de créditos americanos entram em ruptura.”

2. Tendo em conta os documentos, caraterize a crise económica dos anos 30.

O fim do American way of life

Habitantes de Kentucky aguardam, numa fila, a distribuição de alimentos pela Cruz Vermelha (1937)

As manifestações da crise

“Era o fim do mundo para um povo que tinha apostado tudo na riqueza. As indústrias, equipadas para grandes produções não encontravam compradores. O número de desempregados subia. Há na América um desemprego endémico e, mesmo antes da crise, contavam-se já 2 milhões de desempregados. Mas, quando as pessoas cessaram as suas compras, então o desemprego aumentou em progressão geométrica, devido à baixa dos preços, à falta de confiança, ao crash de Wall Street.”

André Maurois, 1933 - Chantiers Américains, Paris, Gallimard

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Da origem à mundialização da criseGuia de estudo

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Objetivo 1. Reconhecer as causas da crise

A crise teve a sua origem nos Estados Unidos da América.

Durante a Primeira Grande Guerra, os americanos eram possuidores da maior parte do ouro mundial,

provenientes dos pagamentos que a Europa fazia pelo trigo, patróleo, manufaturas e armas, tornando-se,

portanto, credores da Europa, controlando assim as empresas do mundo inteiro. Após a guerra, os países

europeus, falidos, compram menos aos americanos e as vendas decrescem, por isso diminui a produção, sobe

o desemprego e baixam os preços. Perante esta pequena crise, o governo decreta o aumento das taxas

alfandegárias para combater as importações e a economia recupera.

Os chamados Loucos anos 20 vão marcar o melhor período da América, que se torna a 1.ª potência industrial

e financeira do mundo. O consumo em massa é estimulado pelas vendas a crédito, salários altos e pela

publicidade, especialmente os bens de consumo e electrodomésticos. É a América way of life de que são

indicadores culturais: o cinema, a rádio, o desporto, o jazz, os jornais, o telefone, ou seja, a sociedade de

consumo, e o “self mada man”, um mito americano.

Mas, o crescimento económico dos anos 20 tinha o seus pontos fracos:

- a prosperidade não era geral, os países europeus viviam anos de crise;

- o desenvolvimento dos setores produtivos é diverso: a construção naval, aço e têxteis declinam, a produção

agrícola é excedentária, provocando a queda dos preços e a ruína dos agricultores;

- a repartição da riqueza é desigual, uma vez que o lucro dos empresários era muito superior ao aumento

dos salários pelo que os assalariados recorrem à compra a prestações, na ânsia de consumo;

- o crédito atinge até a compra de ações que atingem valores irreais.

Objetivo 2. Explicar em que consistiu o Crash de Wall Street

Em 1928, acontece uma enorme subida de preços do produtos, o que vai contrariar o baixo poder de

compra da população. Segue-se a dificuldade em escoar a produção, o desemprego e falências.

Do ponto e vista financeiro, a situação não era melhor devido à especulação na compra de ações e à

facilidade em obter crédito bancário, apesar do aumento dos juros, o que permitirá a acumulação de

avultados lucros nas instituições bancárias. No entanto, estas viviam temendo o reembolso do capital

correspondente às ações super-valorizadas e das economias depositadas. A partir de setembro de 1929, à

bolsa de Nova York acorreram muitos especuladores a quererem vender as suas ações por considerarem que

já não compensava a sua transação. Em 24 de outubro forma postas à venda cerca de 17 milhões de ações

que não encontraram comprador. Gerou-se o pânico e todos queriam desfazer-se das suas ações, a qualquer

preço. Foi, assim, o crash de Wall Street, na famosa quinta-feira negra.

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Da origem à mundialização da criseGuia de estudo

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Objetivo 3. Enumerar os efeitos que teve a quinta-feira negra na economia ocidental

A crise na bolsa americana traz, de imediato, consequências:

1. As ações desvalorizam e as pessoas tentam vendê-las a preços baixíssimos, sem haver quem as compre

outras correm aos bancos a levantar os seus depósitos.

2. Os bancos encerram por não poderem pagar as dívidas dos acionistas nem devolver os depósitos.

Objetivo 4. Justificar a mundialização da crise

Inicia-se, deste modo, a grande depressão dos anos 30 que, oriunda dos Estados Unidos da América se irá

estender ao resto do mundo, provocando o declínio do comércio internacional:

- Aos países fornecedores de matérias-primas aos americanos: Austrália, Nova Zelândia, México, Brasil,

Índia.

- Países dependentes dos empréstimos dos Estados Unidos: Alemanha e Aústria.

As principais caraterísticas desta crise mundial são: empresas fabris, comerciais e bancárias a falirem,

produção, preços, salários e poder de compra a descer, desemprego e miséria a subir, racionamentos e “sopa

dos pobres” a surgir.