brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 nº 369 · descreve, na petição inicial, atos...

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1 Outubro/2017 Sessões de 1º a 31 de outubro de 2017 73 número

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Outubro/2017

Sessões de 1º a 31 de outubro de 2017

73 número

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Outubro de 2017

Compilação dos Informativos nos 880 a 883

O Informativo por Temas apresenta todos os resumos de julgamentos divulgados pelo

Informativo STF concluídos no mês a que se refere e é organizado por ramos do Direito e por assuntos.

SUMÁRIO

Direito Administrativo

Agentes Políticos

Constituição Federal de 1988 e defensores admitidos sem concurso público Controle de Constitucionalidade

Extinção de Tribunais de Contas dos Municípios Concurso Público

CNJ e anulação de concurso público Domínio Público

Amazônia Legal e regularização fundiária Responsabilidade da Administração

Responsabilidade administrativa por dívidas trabalhistas de empresas terceirizadas

Direito Eleitoral

Eleições

Candidatura avulsa e repercussão geral

Direito Internacional

Estrangeiro

Extradição e instrução deficiente

Direito Penal

Crimes Previstos na Legislação Extravagante

HC: Crime militar impróprio e competência

Princípio da congruência e “grandes devedores”

Transmissão clandestina de sinal de internet: atipicidade Parte Geral

Atentado violento ao pudor e regime inicial semiaberto

Direito Processual Civil

Formação, Suspensão e Extinção do Processo

Ministério Público comum e especial e legitimidade processual

Direito Processual Penal

Ação Penal

Princípio do promotor natural e substituição de órgão acusador ao longo do processo

Teoria do domínio do fato e autoria Jurisdição e Competência

Imunidade parlamentar e medida cautelar

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DIREITO ADMINISTRATIVO

Agentes Políticos

Constituição Federal de 1988 e defensores admitidos sem concurso público

A Primeira Turma, por maioria, deu provimento a agravo regimental em recurso

extraordinário em que discutida a situação de advogados contratados sem concurso

público para exercer cargo em defensoria pública estadual depois de promulgada a

Constituição Federal de 1988.

A Lei Complementar 55/1994, do Estado do Espírito Santo, que permitiu a

incorporação de advogados admitidos sem a realização de concurso público à

defensoria, foi declarada inconstitucional pela Suprema Corte no julgamento da Ação

Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 1199/ES (DJU de 19.4.2006), ressaltados os

efeitos ex tunc da decisão.

Nesse sentido, a administração estadual solicitou o cumprimento da sentença da

ADI e, por conseguinte, o desligamento dos advogados, alegando que sua manutenção

estaria causando prejuízos à instituição.

Dessa forma, a Turma decidiu pela regularização da composição da defensoria,

no sentido de substituir os advogados contratados pelos indivíduos aprovados em

concurso que aguardam na fila, visando à organização mais eficiente e apropriada da

administração.

Conforme tese fixada em repercussão geral (Tema 476), os princípios da

segurança jurídica e da proteção da confiança legítima não podem justificar a

manutenção no cargo de candidato admitido sem concurso público. O Colegiado

ressaltou, ainda, a inaplicabilidade do disposto no art. 22 (1) do Ato de Disposições

Constitucionais Transitórias (ADCT) ao caso em questão, visto que a contratação dos

advogados se deu após a instalação da constituinte.

Vencida a ministra Rosa Weber (relatora), que negou provimento ao agravo, por

entender a necessidade de resguardo dos princípios da segurança jurídica, boa-fé e

confiança, haja vista a decorrência de mais de vinte anos de exercício do cargo pelos

contratados.

(1) ADCT: “Art. 22. É assegurado aos defensores públicos investidos na função até a data de instalação da

Assembléia Nacional Constituinte o direito de opção pela carreira, com a observância das garantias e vedações

previstas no art. 134, parágrafo único, da Constituição”.

RE 856550/ES, rel. orig. Min. Rosa Weber, red. p/ o ac. Min. Alexandre de

Moraes, julgamento em 10.10.2017.

(Informativo 881, Primeira Turma)

Controle de Constitucionalidade

Extinção de Tribunais de Contas dos Municípios

A Constituição Federal não proíbe a extinção de Tribunais de Contas dos

Municípios.

Esse é o entendimento do Plenário que, por maioria, julgou improcedente pedido

formulado em ação direita de inconstitucionalidade ajuizada contra emenda à

Constituição do Estado do Ceará, que extinguiu o Tribunal de Contas dos Municípios

desse ente federado.

4

A requerente asseverou que a promulgação da citada emenda consiste em desvio do

poder de legislar. Sustentou que o ato atacado foi aprovado como retaliação por

parlamentares que tiveram, na condição de gestores municipais, as contas rejeitadas

pelo Tribunal de Contas dos Municípios do Estado do Ceará.

O Colegiado entendeu que a fraude na edição de lei com o objetivo de alcançar

finalidade diversa do interesse público deve ser explicitada e comprovada. A mera

menção à existência de parlamentares com contas desaprovadas não conduz à conclusão

de estarem viciadas as deliberações cujo tema é a atividade de controle externo.

As alegações de ausência de economia orçamentária e perda de eficiência com a

promulgação da emenda questionada são insuficientes para configurar a

inconstitucionalidade do ato. É impertinente, no processo objetivo, adentrar questões

fáticas como, por exemplo, a produção do Tribunal de Contas dos Municípios e do

Tribunal de Contas do Estado.

Afastado o desvio de poder de legislar arguido na petição inicial, cumpre analisar o

argumento segundo o qual o art. 31, § 1º e § 4º (1), da Constituição Federal impede a

extinção de Tribunais de Contas dos Municípios mediante norma de Constituição

estadual.

Os Estados, considerada a existência de tribunal de contas estadual e de tribunais

de contas municipais, podem optar por concentrar o exame de todas as despesas em

apenas um órgão, sem prejuízo do efetivo controle externo. O meio adequado para fazê-

lo é a promulgação de norma constitucional local.

O legislador constituinte permitiu a experimentação institucional dos entes

federados, desde que não fossem criados conselhos ou tribunais municipais, devendo ser

observado o modelo federal, com ao menos um órgão de controle externo.

É possível, portanto, a extinção de tribunal de contas responsável pela fiscalização

dos Municípios por meio da promulgação de Emenda à constituição estadual, pois a

Constituição Federal não proibiu a supressão desses órgãos.

Não se faz necessária a participação dos Municípios no processo, sobretudo quando

considerado que a estrutura de controle externo é integralmente arcada pelo Estado.

Quanto à iniciativa, a requerente sustenta a inconstitucionalidade da propositura

por parlamentar.

O poder constituinte originário viabilizou aos tribunais de contas disporem sobre a

própria organização e funcionamento, e o fez com o propósito de assegurar-lhes a

autonomia necessária para exercer atividade fundamental à integridade do erário.

Essa norma protetiva não impede a extinção do Tribunal de Contas dos Municípios

mediante emenda cujo processo de elaboração tenha sido deflagrado por deputados

estaduais. O rito de emendamento constitucional observa regras próprias no tocante à

iniciativa. Ante a densidade representativa envolvida no procedimento de

reconfiguração da ordem constitucional, a regra para apresentação de emenda é mais

rigorosa, atingindo as entidades políticas que efetivamente traduzam a vontade popular

manifestada por meio do sufrágio.

Segundo a Constituição do Estado do Ceará, propostas de emendas constitucionais

podem ser apresentadas por 1/3 dos membros da Assembleia Legislativa, pelo

Governador do Estado ou por mais da metade das Câmaras Municipais. No caso, o foi

por deputados estaduais, consoante determinado na Carta Estadual.

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É inviável, a partir de leitura sistemática dos preceitos constitucionais, assentar a

impossibilidade de emenda à Constituição, de iniciativa parlamentar, versar a extinção

de tribunal de contas estadual.

A requerente sustenta que a tramitação da proposta de emenda à Constituição

violou o princípio democrático, a inviabilizar a plena atuação da minoria parlamentar.

Descreve, na petição inicial, atos praticados no processamento da emenda (pedido de

vista, questões de ordem e recursos), que alega contrariarem o Regimento Interno da

Assembleia Legislativa do Estado do Ceará e a Constituição Federal.

Descabe potencializar o princípio democrático, transformando-o em alavanca para

ingerência do Supremo Tribunal Federal (STF) no Legislativo. A intervenção judicial

pressupõe, no campo do controle concentrado, ofensa à Constituição Federal. As

alegadas violações ao Regimento Interno não autorizam, por si sós, a atuação do STF no

campo do controle concentrado, exceto quando revelam a subversão de norma

constitucional, à qual a produção legislativa deve amoldar-se. No caso concreto, não foi

o que ocorreu. Ademais, o princípio democrático não pode ser utilizado como guarda-

chuva de regras regimentais em vigor no território nacional, o que transformaria o STF

no guardião de todo e qualquer procedimento legislativo.

Vencido o ministro Alexandre de Moraes, que julgou procedente o pedido,

acompanhado pelo ministro Gilmar Mendes.

Pontuou que o art. 75 (2) da Constituição Federal impede a extinção desses órgãos

de controle. Além disso, entendeu haver ocorrido desvio de finalidade e que a referida

emenda violou o princípio sensível previsto no art. 34, VII, “d” (3), da Constituição

Federal.

(1) CF/1988: “Art. 31. A fiscalização do Município será exercida pelo Poder Legislativo Municipal, mediante

controle externo, e pelos sistemas de controle interno do Poder Executivo Municipal, na forma da lei. § 1º O controle

externo da Câmara Municipal será exercido com o auxílio dos Tribunais de Contas dos Estados ou do Município ou

dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios, onde houver. [...] § 4º É vedada a criação de Tribunais,

Conselhos ou órgãos de Contas Municipais”.

(2) CF/1988: “Art. 75. As normas estabelecidas nesta seção aplicam-se, no que couber, à organização,

composição e fiscalização dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, bem como dos Tribunais e

Conselhos de Contas dos Municípios”.

(3) CF/1988: “Art. 34. A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para: [...] VII -

assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais: [...] d) prestação de contas da administração pública,

direta e indireta”.

ADI 5763/CE, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 26.10.2017.

(Informativo 883, Plenário) 1ª Parte: 2ª Parte: 1ª Parte: 2ª Parte:

Concurso Público

CNJ e anulação de concurso público

A Segunda Turma, por maioria, concedeu a ordem em mandados de segurança

para cassar ato do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que, nos autos de processo de

controle administrativo, determinou a anulação de concurso público para admissão nas

serventias extrajudiciais no Estado do Rio de Janeiro.

No caso, a anulação se deu em razão da incompatibilidade com os princípios da

moralidade e da impessoalidade, caracterizada pela existência de relacionamento

pessoal entre o presidente da comissão do concurso e duas candidatas aprovadas. O

CNJ também assentou a parcialidade da comissão examinadora ao entender que houve

favorecimento das candidatas na correção das questões das provas.

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A Turma pontuou que o CNJ, na sua competência de controle administrativo,

não pode substituir-se ao examinador, seja nos concursos para o provimento de cargos

em cartórios, seja em outros concursos para provimento de cargos de juízes ou de

servidores do Poder Judiciário.

As duas candidatas não puderam se manifestar após o aditamento do

requerimento inicial no âmbito do CNJ, situação que ampliou substancialmente o

objeto da apuração ao acrescentar novas causas de pedir que, ao final, constituíram-se

os fundamentos únicos do ato combatido. Nesse contexto, o Colegiado destacou a

ocorrência de violação da garantia do devido processo legal, tendo em vista a ausência

de nova notificação dos interessados para que se manifestassem sobre os novos

fundamentos.

Também não é possível afirmar a existência de irregularidade ou favorecimento

a ensejar a medida extrema adotada pelo CNJ, uma vez que o conselho entendeu haver

“fortes indicações de parcialidade”, sem, contudo, demonstrar as “evidências de

favorecimento” que justificaram anulação de todo o concurso.

Vencido o Ministro Dias Toffoli, que concedeu parcialmente a ordem, somente

para desconstituir a deliberação do CNJ de anulação de todo o concurso, mantendo o

ato no tocante à parte relativa às candidatas que possuíam relacionamento pessoal com

o presidente da comissão do concurso.

Entendeu que o contraditório e a ampla defesa foram assegurados com a

notificação inicial a todos os interessados, o que lhes possibilitou, inclusive, o

acompanhamento do feito e mesmo, se assim desejassem (como de fato foi feito por

parte dos candidatos) a apresentação voluntária de suas conclusões quanto às questões

surgidas no curso do procedimento.

No que concerne, à anulação de todo o concurso público, com impacto aos

demais candidatos, destacou que não se pode partir, apenas, de presunções incidentes

sobre ato de nítido caráter subjetivo (correção de provas discursivas) para concluir

pelo favorecimento de candidatos sem que haja indícios outros a corroborar a

conclusão. Admitir-se o contrário seria transformar as etapas dotadas de algum nível

de subjetividade em concursos públicos em fases de incerteza, sujeitas a constantes

anulações, com nítido prejuízo à segurança jurídica que deve pautar tal espécie de

certame.

MS 28775/DF, rel. orig. Min. Dias Toffoli, red. p/ o ac. Min. Ricardo

Lewandowski, julgamento em 17.10.2017.

MS 28777/DF, rel. Min. Dias Toffoli, red. p/ o ac. Min. Ricardo Lewandowski,

julgamento em 17.10.2017.

MS 28797/DF, rel. Min. Dias Toffoli, red. p/ o ac. Min. Ricardo Lewandowski,

julgamento em 17.10.2017.

(Informativo 882, Segunda Turma)

Domínio Público

Amazônia Legal e regularização fundiária

O Plenário conheceu em parte de ação direta de inconstitucionalidade e, por

maioria, julgou parcialmente procedente o pedido para aplicar a técnica da interpretação

conforme à Constituição, sem redução de texto:

a) ao § 2º (1) do art. 4º da Lei 11.952/2009, a fim de afastar qualquer

entendimento que permita a regularização fundiária das terras públicas ocupadas por

7

quilombolas e outras comunidades tradicionais da Amazônia Legal em nome de

terceiros ou de forma a descaracterizar o modo de apropriação da terra por esses grupos;

e

b) ao art. 13 (2) do mesmo diploma, a fim de afastar quaisquer interpretações que

concluam pela desnecessidade de fiscalização dos imóveis rurais até quatro módulos

fiscais, devendo o ente federal utilizar-se de todos os meios referidos em suas

informações para assegurar a devida proteção ambiental e a concretização dos

propósitos da norma, para somente então ser possível a dispensa da vistoria prévia,

como condição para a inclusão da propriedade no programa de regularização fundiária

de imóveis rurais de domínio público na Amazônia Legal.

De início, o Colegiado assentou o prejuízo da pretensão relativa ao art. 15, I, §§

2º, 4º e 5º, da Lei 11.952/2009 por perda do objeto, tendo em vista a superveniência da

Lei 13.465/2017, que alterou substancialmente o inciso I e o § 2º do art. 15 e revogou os

§§ 4º e 5º. Assim, conheceu do pleito apenas no tocante ao § 2º do art. 4º e ao art. 13 da

Lei 11.952/2009.

Reportou-se à jurisprudência do Supremo Tribunal no sentido de que incumbe ao

Estado e à própria coletividade a especial obrigação de defender e preservar, em

benefício das presentes e futuras gerações, o direito ao meio ambiente ecologicamente

equilibrado.

A correta política pública procura reduzir a desigualdade social e promover o

desenvolvimento sustentável da região, possibilitando o acesso às políticas de moradia,

crédito rural, assistência técnica e extensão rural, dependentes da regularização do título

ou da posse ou da propriedade para se concretizar.

Relativamente ao § 2º do art. 4º, o Plenário entendeu que se abriu a possibilidade

para exegese que permita a terceiros — não integrantes dos grupos identitários de

remanescentes de quilombos e comunidades tradicionais — ter acesso a essas terras, se

comprovados os demais requisitos para a regularização fundiária.

A Constituição, nos arts. 216 (4) do texto permanente e 68 (5) do Ato das

Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), defere especial proteção aos

territórios ocupados pelas comunidades com modos tradicionais de criar, fazer e viver e

pelos remanescentes quilombolas.

Extraiu a conceituação de comunidade quilombola do art. 2º do Decreto

4.887/2003 e a das comunidades tradicionais do art. 3º do Decreto 6.040/2007 — que

instituiu a Política de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades

Tradicionais. Ambas as regras se encontram no âmbito de tutela especial abarcado pela

Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho sobre Povos Indígenas e

Tribais, internalizada pelo Decreto 5.051/2004.

A questão central, no que concerne à caracterização das comunidades tradicionais

e de sua espécie quilombola, é a terra. Eles mantêm uma relação com a terra que é mais

do que posse ou propriedade. É uma relação de identidade entre a comunidade e sua

terra, que recebe especial atenção na Constituição e nos compromissos internacionais

assumidos pelo Estado brasileiro. Essa tutela, entretanto, não se verifica no dispositivo

legal em análise.

Mostra-se deficiente a proteção conferida pelo § 2º do art. 4º da Lei 11.952/2009,

sendo preciso dar à norma interpretação de acordo com os ditames constitucionais de

forma a assegurar, em sua correta e máxima efetividade, a garantia dos direitos

territoriais dessas comunidades.

8

A respeito das comunidades remanescentes de quilombos, a Constituição

assegura-lhes a propriedade das terras que ocupam tradicionalmente. O Decreto

4.887/2003, apontado pela União como norma específica em relação aos quilombolas,

não trata de procedimento de regularização fundiária de terras da União.

Sobre as demais comunidades tradicionais, não há norma específica para a

regularização de terras públicas por elas ocupadas, pois o Decreto 6.040/2007 não

dispõe sobre a delimitação e demarcação de terras a essa população.

Logo, a Lei 11.952/2009, que seria de aplicação apenas subsidiária a esses grupos,

passava a ser de aplicação cogente, porquanto não era derrogada por qualquer outra,

colocando em risco o exercício dos direitos a eles resguardados constitucionalmente.

Além disso, o estatuto legal impugnado destina-se a promover a titulação de terras

a proprietários individuais, consoante se infere de seu art. 5º, que cuida da regularização

da ocupação ao próprio ocupante, seu cônjuge ou companheiro. Acontece que a

propriedade de terras ocupadas pelas citadas comunidades é de feição coletiva e, sem a

garantia de um tratamento específico, possibilita-se a não observância dessa

característica.

Noutro passo, quanto ao art. 13 da Lei 11.952/2009, o Colegiado compreendeu

que o direito ao meio ambiente equilibrado foi garantido a todos, de modo difuso, pelo

texto constitucional, em seu art. 225, caput. Sendo assim, deve o legislador tornar certa

a máxima efetividade dos direitos fundamentais, vedado, de toda maneira, proteção

insuficiente à segurança desses direitos.

Os direitos fundamentais não podem ser tidos somente como proibições de

intervenção, expressando ainda um postulado de proteção. Pode-se dizer que os direitos

fundamentais expressam não apenas uma proibição do excesso, como também podem

ser traduzidos como proibições de proteção insuficiente ou imperativos de tutela.

A tutela desse direito seria fragilizada diante da simples dispensa da vistoria

prévia nos imóveis de até quatro módulos fiscais, se apenas essa medida fosse eleita

para a verificação do cumprimento dos requisitos legais para a titulação do domínio ou

concessão de direito real de uso.

Um exame mais aprofundado da questão posta desautorizaria simples conclusão

pela retirada da norma do ordenamento jurídico.

O Tribunal conjugou os interesses sensíveis que o problema da dispensa da

vistoria prévia colocou. A ausência do laudo de vistoria assumiu maior gravidade após a

Lei 13.465/2017, que modificou vários dispositivos da Lei 11.952/2009. Com efeito, se

antes a União ancorava-se também na realização de vistoria final para a concessão

definitiva do título de domínio ou do termo de concessão de uso, agora, a nova redação

conferida ao art. 16 não mais previa referida exigência, comprovando-se o cumprimento

das cláusulas resolutivas pela juntada de documentação pertinente. Ou seja, os imóveis

de até quatro módulos fiscais, via de regra, não passariam por qualquer vistoria no

processo de regularização fundiária.

O reconhecimento de sua inconstitucionalidade, contudo, não podia levar ao

comprometimento dos propósitos dessa legislação. Foi necessário encontrar um ponto

de equilíbrio entre a eficiência na fiscalização dessas pequenas propriedades a serem

regularizadas e a proteção do meio ambiente amazônico, de forma a assegurar a real

possibilidade de melhoria na qualidade de vida das pessoas que retiravam da floresta

seu sustento e que colaboravam para a manutenção do desenvolvimento sustentável da

região.

9

Vencido o ministro Marco Aurélio, que acompanhou o relator quanto ao

conhecimento da ação, mas, na parte conhecida, considerou-a improcedente. Vencido,

em parte, o ministro Alexandre de Moraes, com relação ao que decidido sobre o art. 13,

ao entender pela presunção iuris tantum da boa-fé da declaração do ocupante do imóvel,

no que foi acompanhado pelo ministro Gilmar Mendes.

(1) Lei 11.952/2009: “Art. 4o Não serão passíveis de alienação ou concessão de direito real de uso, nos termos

desta Lei, as ocupações que recaiam sobre áreas: (...) § 2o As terras ocupadas por comunidades quilombolas ou

tradicionais que façam uso coletivo da área serão regularizadas de acordo com as normas específicas, aplicando-se-

lhes, no que couber, os dispositivos desta Lei”.

(2) Lei 11.952/2009: “Art. 13. Os requisitos para a regularização fundiária dos imóveis de até 4 (quatro)

módulos fiscais serão averiguados por meio de declaração do ocupante, sujeita a responsabilização nas esferas penal,

administrativa e civil, dispensada a vistoria prévia. Parágrafo único. É facultado ao Ministério do Desenvolvimento

Agrário ou, se for o caso, ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão determinar a realização de vistoria de

fiscalização do imóvel rural na hipótese prevista no caput deste artigo”.

(3) CF/1988: “Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum

do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e

preservá-lo para as presentes e futuras gerações. (...) § 4º A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra

do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da

lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos

naturais”.

(4) CF/1988: “Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial,

tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes

grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: (...) II - os modos de criar, fazer e viver”.

(5) ADCT: “Art. 68. Aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é

reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos”.

ADI 4269/DF, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 18.10.2017.

(Informativo 882, Plenário) 1ª Parte: 2ª Parte: 1ª Parte: 2ª Parte:

Responsabilidade da Administração

Responsabilidade administrativa por dívidas trabalhistas de empresas terceirizadas

A Primeira Turma, em conclusão e por maioria, desproveu agravo regimental em

reclamação ajuizada contra decisão da Justiça do Trabalho, em que se alegou violação à

autoridade do Supremo Tribunal Federal (STF) por contradição à Ação Declaratória de

Constitucionalidade (ADC) 16/DF (DJE de 9.9.2011).

Afirmou o reclamante ter sido condenado ao pagamento de verbas trabalhistas

inadimplidas por empresa contratada, o que afrontaria o disposto no art. 71, § 1º, da Lei

8.666/1993 (1), declarada constitucional pela ADC 16/DF (Informativo 880).

O Colegiado negou seguimento à reclamação, entendendo que, por ser relacionada

a paradigma de tema de repercussão geral (Tema 246), firmado no julgamento do

Recurso Extraordinário (RE) 760.931/DF (DJE de 12.9.2017), superveniente à ADC em

questão, haveria a necessidade de esgotamento de todas as instâncias ordinárias antes

que o processo fosse julgado pela Suprema Corte, conforme art. 988, § 5º, II, do Código

de Processo Civil/2015 (2).

Vencidos os ministros Alexandre de Moraes e Marco Aurélio, que deram

provimento ao recurso e julgaram procedente o pedido veiculado na reclamação. O

ministro Alexandre de Moraes salientou não ter sido incluída no tema a substituição da

decisão da ADC 16/DF pela do RE 760.931/DF e, consequentemente, não estabelecido

o necessário esgotamento das instâncias inferiores. O ministro Marco Aurélio frisou que

não cabe entender suplantada a eficácia do acórdão alusivo à ação declaratória.

(1) Lei 8.666/1993: “Art. 71. O contratado é responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais

e comerciais resultantes da execução do contrato. § 1o A inadimplência do contratado, com referência aos encargos

10

trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem

poderá onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e edificações, inclusive perante o

Registro de Imóveis”.

(2) CPC/2015: “Art. 988. (...) § 5º É inadmissível a reclamação: (...) II – proposta para garantir a observância

de acórdão de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida ou de acórdão proferido em julgamento de

recursos extraordinário ou especial repetitivos, quando não esgotadas as instâncias ordinárias”.

Rcl 27789 AgR/BA, rel. Min. Roberto Barroso, julgamento em 17.10.2017.

(Informativo 882, Primeira Turma)

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DIREITO ELEITORAL

ELEIÇÕES

Candidatura avulsa e repercussão geral

O Plenário, ao resolver questão de ordem suscitada pelo ministro Roberto Barroso

(relator), reconheceu a repercussão geral da questão constitucional tratada em recurso

extraordinário com agravo. Nele, se discute a possibilidade de candidato sem filiação

partidária disputar eleições (candidatura avulsa).

No caso, o recorrente, sem filiação partidária, teve a sua candidatura para a

eleição de prefeito em 2016 indeferida.

O Plenário, de início e por maioria, entendeu que, muito embora a questão

constitucional em debate esteja prejudicada na hipótese dos autos — em razão do o

esgotamento do pleito municipal de 2016 —, ela deve se revestir do caráter de

repercussão geral tendo em vista sua relevância social e política.

Vencidos, no ponto, os ministros Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski,

Gilmar Mendes e Marco Aurélio, que entenderam pela prejudicialidade do recurso.

Superada a preliminar, acompanharam os demais quanto à questão de ordem.

ARE 1054490 QO/RJ, rel. Min. Roberto Barroso, julgamento em 5.10.2017.

(Informativo 880, Plenário)

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DIREITO INTERNACIONAL

Estrangeiro

Extradição e instrução deficiente

A Segunda Turma deferiu pedido de extradição instrutória formulado pelo

Governo da Bélgica, apresentado sem a cópia dos textos legais aplicáveis aos fatos que,

em tese, correspondem aos crimes de tráfico de drogas e de associação para o tráfico.

Considerou que o requerimento foi instruído de forma deficiente. No entanto, a

defesa não discutiu isso, e o estrangeiro demonstrou interesse em ser prontamente

extraditado.

O Colegiado assentou haver sido compulsada a lei sobre o tráfico de substâncias

em vigor na Bélgica, ser a conduta típica e prevista, especificamente, no tratado de

extradição.

Sublinhou que o STF não poderia conceder o pleito extradicional, se existissem

dúvidas quanto à legalidade, estivesse prescrita a pretensão ou houvesse outra

impossibilidade.

O ministro Celso de Mello mencionou o art. 87 (1) da nova Lei de Migração (Lei

13.445/2017), com o registro de que, apesar de ainda não estar em regime de plena

eficácia, o diploma estabelece alguns parâmetros presentes na espécie.

(1) Lei 13.445/2017: “Art. 87. O extraditando poderá entregar-se voluntariamente ao Estado requerente,

desde que o declare expressamente, esteja assistido por advogado e seja advertido de que tem direito ao processo

judicial de extradição e à proteção que tal direito encerra, caso em que o pedido será decidido pelo Supremo Tribunal

Federal. ”

Ext 1512/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 24.10.2017.

(Informativo 883, Segunda Turma)

13

DIREITO PENAL

Crimes Previstos na Legislação Extravagante

HC: Crime militar impróprio e competência

A Primeira Turma, em conclusão e por maioria, indeferiu a ordem em habeas

corpus pelo qual se discutia a competência para o julgamento de militar denunciado

pela suposta prática do crime de falsidade ideológica na forma continuada [CPM, art.

312, c/c o art. 80 (1)]. No caso, o paciente teria atestado, falsamente, a

regularidade técnica para navegação de embarcações civis. A defesa alega a

incompetência da justiça militar para o julgamento do feito (Informativo 755).

A Turma apontou que o crime em comento tem natureza formal. Configura-

se, portanto, independentemente do resultado e, ademais, é praticado em

detrimento da fé pública militar. Incide, portanto, o art. 9º, II, “e”, do CPM (2); e o

art. 124 da CF (3).

Vencido o ministro Luiz Fux (relator), que concedeu a ordem.

(1) CPM: “Art. 312. Omitir, em documento público ou particular, declaração que dêle devia constar,

ou nêle inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar

direito, criar obrigação ou alterar a verdade sôbre fato jurìdicamente relevante, desde que o fato atente

contra a administração ou o serviço militar: Pena - reclusão, até cinco anos, se o documento é público;

reclusão, até três anos, se o documento é particular. (...) Art. 80. Aplica-se a regra do artigo anterior, quando

o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas

condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes ser

considerados como continuação do primeiro”.

(2) CPM: “Art. 9º. Consideram-se crimes militares, em tempo de paz: II - os crimes previstos neste

Código, embora também o sejam com igual definição na lei penal comum, quando praticados: ... e) por

militar em situação de atividade, ou assemelhado, contra o patrimônio sob a administração militar, ou a

ordem administrativa militar”.

(3) CF: “Art. 124. à Justiça Militar compete processar e julgar os crimes militares definidos em lei”.

HC 110233/AM, rel. orig. Min. Luiz Fux, red. p/ o ac. Min. Marco Aurélio,

julgamento em 10.10.2017.

(Informativo 881, Primeira Turma)

Princípio da congruência e “grandes devedores”

A Segunda Turma denegou a ordem em habeas corpus, em que discutida a

possibilidade de incidir causa especial de aumento de pena não arrolada na inicial acusatória,

bem como o enquadramento da paciente nos termos da Portaria 320/2008 da Procuradoria-

Geral da Fazenda Nacional (PGFN).

A paciente foi condenada pela conduta tipificada no art. 1º, I, c/c art, 12, I, ambos da

Lei 8.137/1990. O impetrante argumentou em favor da não incidência dessa causa de

aumento, uma vez que a quantia devida pela paciente não a caracterizava como grande

devedora.

O Colegiado registrou que, não obstante o princípio da correlação entre imputação e

sentença — qual seja, princípio da congruência — representar uma das mais relevantes

garantias do direito de defesa, não houve contrariedade no caso, uma vez que o juízo criminal

não desbordou dos limites da imputação oferecida pelo Ministério Público. Ressaltou,

ademais, que a vultosa quantia sonegada — cerca de 4 milhões de reais — é elemento

suficiente para caracterização do grave dano à coletividade, constante no inciso I do art. 12, da

lei 8.137/1990 (1). Em síntese, o Colegiado assentou que os fatos foram suficientemente

elucidados na exordial acusatória, sendo que o juiz, não se desbordando dos lindes da

razoabilidade e da proporcionalidade, pode aplicar essa agravante.

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Por fim, quanto à Portaria 320/2008 da PGFN, a Turma anotou que essa norma

infralegal apenas dispõe sobre o Projeto Grandes Devedores no âmbito dessa Procuradoria,

conceituando, para os seus fins, “grandes devedores”, com o objetivo de estabelecer, na

Secretaria de Receita Federal do Brasil, método de cobrança prioritário a esses sujeitos

passivos de vultosas obrigações tributárias, sem limitar ou definir, no entanto, o grave dano à

coletividade.

(1) Lei 8.137/1990: “Art. 12. São circunstâncias que podem agravar de 1/3 (um terço) até a metade as penas previstas

nos arts. 1°, 2° e 4° a 7°: I - ocasionar grave dano à coletividade; ”.

HC 129284/PE, rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 17.10.2017.

(Informativo 882, Segunda Turma)

Transmissão clandestina de sinal de internet: atipicidade

A Primeira Turma deferiu a ordem de habeas corpus para absolver o paciente,

com base no artigo 386, III (1), do Código de Processo Penal. No caso, foi imputada ao

paciente a prática da infração descrita no artigo 183 da Lei 9.472/1997 (2), em virtude

de haver transmitido, clandestinamente, sinal de internet por meio de radiofrequência.

A defesa sustentou a atipicidade formal e material da conduta. Asseverou que o

oferecimento de serviços de internet não pode ser entendido como atividade de

telecomunicação. Aduziu, também, ser ínfima a lesão ao bem jurídico tutelado.

O Colegiado destacou que o artigo 61, §1º (3), da Lei 9.472/97 preceitua que o

serviço de valor adicionado não constitui serviço de telecomunicação, classificando-se o

provedor como usuário do serviço que lhe dá suporte, com os direitos e deveres

inerentes a essa condição.

Pontuou que, em seu artigo 183, a Lei define o crime de atividade clandestina,

restringindo-o às telecomunicações.

Em conclusão, a Turma decidiu que a oferta de serviço de internet, concebido

como serviço de valor adicionado, não pode ser considerada atividade clandestina de

telecomunicações.

(1) Código de Processo Penal de 1941: “Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte

dispositiva, desde que reconheça (...) III - não constituir o fato infração penal; ”

(2) Lei 9.472/1997: “Art. 183. Desenvolver clandestinamente atividades de telecomunicação: Pena - detenção

de dois a quatro anos, aumentada da metade se houver dano a terceiro, e multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais).”

(3) Lei 9.472/1997: “Art. 61. Serviço de valor adicionado é a atividade que acrescenta, a um serviço de

telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas utilidades relacionadas ao acesso,

armazenamento, apresentação, movimentação ou recuperação de informações. § 1º Serviço de valor adicionado não

constitui serviço de telecomunicações, classificando-se seu provedor como usuário do serviço de telecomunicações

que lhe dá suporte, com os direitos e deveres inerentes a essa condição”.

HC 127978, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 24.10.2017.

(Informativo 883, Primeira Turma)

Parte Geral

Atentado violento ao pudor e regime inicial semiaberto

A Segunda Turma, em conclusão de julgamento, negou provimento a recurso

ordinário em habeas corpus em que se pretendia a absolvição do recorrente pela prática

de atentado violento ao pudor, em razão de suposta insuficiência probatória.

A defesa alegou que a condenação estaria lastreada em elementos produzidos na

fase inquisitorial. Além disso, argumentou que a recusa do recorrente em fornecer

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material para realização de exame de DNA teria sido valorada na condenação, sendo

cediço que o réu não é obrigado a produzir prova que lhe prejudique.

A Turma assinalou que a condenação não se baseou exclusivamente nos elementos

de informação do inquérito, bem assim que, abstraída a presunção de inocência do

recorrente em razão da falta de exame de DNA, subsistiria prova suficiente para lastrear

a condenação.

Por fim, o Colegiado, por maioria, concedeu a ordem, de ofício, para fixar o regime

semiaberto para início de cumprimento de pena.

A respeito, afirmou que, de acordo com a jurisprudência da Corte, caso favoráveis

todas as circunstâncias judiciais, de modo que a pena-base seja fixada no mínimo legal,

não cabe a imposição de regime inicial mais gravoso.

Vencido, no ponto, o ministro Edson Fachin, que não concedeu a ordem de ofício,

considerada a gravidade concreta do delito.

RHC 131133/SP, rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 10.10.2017.

(Informativo 881, Segunda Turma)

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DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Formação, Suspensão e Extinção do Processo

Ministério Público comum e especial e legitimidade processual

A Segunda Turma negou provimento a dois agravos regimentais em reclamações,

ajuizadas por membros do Ministério Público Especial junto aos Tribunais de Contas.

Em ambos os casos, se trata de concessão indevida de aposentadoria especial a servidor

público civil, em suposta afronta ao que decidido pelo STF na ADI 3.772/DF (DJE de

7.11.2008).

A Turma concluiu pela ausência de legitimidade ativa de causa, visto que a

legitimidade processual extraordinária e independente do Ministério Público comum

não se estende ao Ministério Público junto aos Tribunais de Contas, cuja atuação se

limita ao controle externo, nos termos da Constituição.

Rcl 24156 AgR/DF, rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 24.10.2017.

Rcl 24158 AgR/DF, rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 24.10.2017.

(Informativo 883, Segunda Turma)

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DIREITO PROCESSUAL PENAL

Ação Penal

Princípio do promotor natural e substituição de órgão acusador ao longo processo

A Primeira Turma, por maioria, indeferiu a ordem em habeas corpus no qual se

pugnava a nulidade absoluta da ação penal, em face de violação ao princípio do promotor

natural.

No caso, a denúncia se deu por promotor que não o atuante em face do Tribunal do

Júri, exclusivo para essa finalidade. O paciente foi denunciado como incurso nas penas dos

arts. 121, caput, do Código Penal (CP) e 12 da Lei 6.378/1976, por haver ministrado

medicamentos em desacordo com a regulamentação legal, tendo a vítima falecido.

A Turma reconheceu não haver ferimento ao princípio do promotor natural. No caso

concreto, a priori, houve o entendimento de que seria crime não doloso contra a vida,

fazendo os autos remetidos ao promotor natural competente. Não obstante, durante toda a

instrução se comprovou que, na verdade, tratava-se de crime doloso. Com isso, o promotor

que estava no exercício ofereceu a denúncia e remeteu a ação imediatamente ao promotor

do Júri, que poderia, a qualquer momento, não a ratificar.

O colegiado entendeu, dessa maneira, configurada ratificação implícita. Outrossim,

asseverou estar-se diante de substituição, consubstanciada nos princípios constitucionais do

Ministério Público (MP) da unidade e da indivisibilidade, e não da designação de um

acusador de exceção.

Vencido o ministro Marco Aurélio, por considerar violado o princípio do promotor

natural.

HC 114093/PR, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de

Moraes, julgamento em 3.10.2017.

(Informativo 880, Primeira Turma)

Teoria do domínio do fato e autoria

A teoria do domínio do fato não preceitua que a mera posição de um agente na escala

hierárquica sirva para demonstrar ou reforçar o dolo da conduta. Do mesmo modo também

não permite a condenação de um agente com base em conjecturas.

Com base nessa orientação, a Segunda Turma deu provimento ao recurso de apelação

a fim de absolver o réu, com base no art. 386, V (1), do CPP.

No caso, o apelante, deputado federal e ex-governador, foi condenado por peculato-

desvio, por supostas irregularidades verificadas durante a fase licitatória e de execução de

obras para drenagem de águas pluviais na construção e ampliação de quatro grandes lagoas

para deságue final que objetivava pôr termo a enchentes.

Inicialmente, a Turma declarou a nulidade parcial da sentença que condenou o réu por

participação nos atos de gestão praticados por secretário.

Ao considerar a participação do réu em fatos estranhos, não narrados na denúncia, a

sentença afrontou o princípio da ampla defesa e contraditório. O réu foi surpreendido,

depois de finda a instrução probatória, com fato que lhe era desconhecido e acerca do qual

não lhe foi oportunizado se manifestar.

Também se ofendeu o princípio do devido processo legal, tendo em vista que houve na

hipótese, ação penal ex officio, em desobediência ao modelo constitucional que enuncia ser

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função institucional privativa do Ministério Público a promoção da ação penal pública [CF,

art. 129, I (2)].

Ressaltou que o Ministério Público imputou ao réu responsabilidade por dar

continuidade a irregularidades iniciadas em gestão anterior, e que, segundo sua avaliação,

seriam de “gritante notoriedade”.

Afirmou que, embora a norma processual preceitue não depender de prova os fatos

notórios, nesta categoria, porém, não se enquadram os fatos que demandam tarefa

intelectiva do autor para serem compreendidos e aceitos, como é o caso das irregularidades

descritas nos autos.

Portanto, os elementos probatórios apontados pelo parquet são insuficientes para

concluir pela participação do réu. As fraudes perpetradas não eram notórias ao ponto de

prescindir de maior substrato probatório.

Destacou que nada mais se argumentou sobre a atuação do réu na empreitada

criminosa além do fato dele ter assinado os instrumentos de repasse e ter dado continuidade

à obra que foi considerada irregular pelo TCU.

A razão para a ausência de argumentos mais concretos a comprovar o dolo e autoria,

ao que tudo indica pela frequente menção à “superioridade hierárquica do réu”, é a

consideração pelo Ministério Público de que a adoção da teoria do domínio do fato

dispensaria o aprofundamento do papel por ele desenvolvido nas fraudes denunciadas.

No caso vertente não se evidenciou qualquer controvérsia entre a função do réu na

empreitada criminosa, se o seu papel seria fundamental ou não, se seria autor ou mero

partícipe. A dúvida existente reside, na realidade, em momento ainda anterior a tal

apreciação, pois sequer se demonstrou estar o réu envolvido nas fraudes noticiadas.

Assim, não há razão para discutir a medida da participação de um agente que sequer se

comprovou ter anuído ou efetivamente concorrido para a prática delituosa. Só há motivo

para discutir a medida da participação depois de confirmada a sua existência.

É por isso que a adoção da teoria do domínio do fato, nos moldes em que utilizada pelo

juízo de primeiro grau, não socorre ao apelo acusatório. Antes disso, acaba por infirmá-lo,

na medida em que restringe o conceito aberto de autor preceituado pelo art. 29 (3) do CP.

(1) CPP/1941: “Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que

reconheça: (...) V – não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal”.

(2) CF/1988: “Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: I - promover, privativamente, a ação

penal pública, na forma da lei”.

(3) CP/1940 “Art. 29 - Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na

medida de sua culpabilidade”.

AP 975/AL, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 3.10.2017.

(Informativo 880, Segunda Turma)

Jurisdição e Competência

Imunidade parlamentar e medida cautelar

O Plenário, por maioria, julgou parcialmente procedente ação direta de

inconstitucionalidade na qual se pedia interpretação conforme à Constituição para que a

aplicação das medidas cautelares, quando impostas a parlamentares, fossem submetidas

à deliberação da respectiva Casa Legislativa em 24 horas.

Primeiramente, a Corte assentou que o Poder Judiciário dispõe de competência para

impor, por autoridade própria, as medidas cautelares a que se refere o artigo 319 (1) do

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Código de Processo Penal (CPP). Vencido, nesse ponto, o ministro Marco Aurélio que

julgou ser inaplicável a referida norma legal.

Prosseguindo no julgamento, o Tribunal, também por votação majoritária,

deliberou encaminhar, para os fins a que se refere art. 53, §2º (2), da Constituição

Federal (CF), a decisão que houver aplicado medida cautelar sempre que a execução

desta impossibilitar direta ou indiretamente o exercício regular do mandato legislativo.

Salientou que, na independência harmônica que rege o princípio da separação dos

Poderes, as imunidades parlamentares, assim como a vitaliciedade na magistratura, a

irredutibilidade de vencimentos e a inamovibilidade, na independência harmoniosa que

rege o princípio da separação de Poderes, são instrumentos de vital importância, visto

buscarem, prioritariamente, a proteção dos parlamentares no exercício de suas funções,

contra os abusos e pressões dos demais Poderes. Constitui-se, pois, um direito

instrumental de garantia de liberdade de opiniões, palavras e votos dos membros do

Poder Legislativo bem como de sua proteção contra prisões arbitrárias e processos

temerários.

O Plenário asseverou que essas imunidades não dizem respeito à figura do

parlamentar em si, mas à função por ele exercida, ao Poder que ele representa, no intuito

de resguardar a atuação do Legislativo perante o Executivo e perante o Judiciário,

consagrando-se como garantia de independência perante os outros dois Poderes

constitucionais.

Afirmou que, no tocante à imunidade parlamentar processual em relação à prisão, a

ratio da norma constitucional é somente permitir o afastamento do parlamentar do

exercício de seu mandato conferido pelo povo em uma única hipótese: prisão em

flagrante delito por crime inafiançável. O art. 53, §2º, da CF protege o integral exercício

do mandato parlamentar, ao referir, expressamente, que a restrição à liberdade de ir e vir

do parlamentar somente poderá ocorrer na referida hipótese. Dessa forma, a norma

constitucional estabeleceu, implicitamente, a impossibilidade de qualquer outro tipo de

prisão cautelar.

Nesse contexto, a Corte ponderou que, sendo a finalidade da imunidade formal

proteger o livre exercício do mandato parlamentar contra interferências externas, a ratio

da norma constitucional não pode ser contornada pela via das medidas cautelares

diversas da prisão.

Assim, ato emanado do Poder Judiciário que houver aplicado medida cautelar que

impossibilite direta ou indiretamente o exercício regular do mandato legislativo, deve

ser submetido ao controle político da Casa Legislativa respectiva, nos termos do art. 53,

§ 2º, da CF.

Vencidos os ministros Edson Fachin, Roberto Barroso, Luiz Fux, Rosa Weber e

Celso de Mello, que julgaram improcedente o pedido. Entenderam que os poderes

conferidos ao Congresso para sustar processos penais em curso são estritos,

circunscritos às hipóteses especificamente limitadas na CF, pois as medidas cautelares

penais não são instrumentais apenas ao processo penal, mas também meios de tutela da

fase pré-processual investigativa e da ordem pública.

Nesse sentido, a outorga constitucional de poder para sustar um processo penal não

compreende a concessão de poderes para impedir a adoção de providências cautelares

necessárias à tutela da ordem pública (visando a impedir reiteração delitiva), bem como,

à tutela da investigação e completa elucidação dos fatos.

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(1) CPP: “Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão: I - comparecimento periódico em juízo, no

prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; II - proibição de acesso ou frequência a

determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer

distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; III - proibição de manter contato com pessoa

determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante;

IV - proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação

ou instrução; V - recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado

tenha residência e trabalho fixos; VI - suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza

econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais; VII -

internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os

peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração; VIII -

fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu

andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial; IX - monitoração eletrônica”.

(2) CF: ”Art. 53. Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões,

palavras e votos. (...) § 2º Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser

presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas

à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão”.

ADI 5526/DF, rel. orig. Min. Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes,

julgamento em 11.10.2017.

(Informativo 881, Plenário)

1ª Parte: 2ª Parte: 3ª Parte: 1ª Parte: 2ª Parte:

3ª Parte: 4ª Parte: 5ª Parte: 6ª Parte:

Supremo Tribunal Federal Secretaria de Documentação - SDO

Coordenadoria de Jurisprudência Comparada e Divulgação de Julgados - CJCD

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