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Brasil: o período Vargas (1930-1945) Prof. Alvaro Senra A Revolução de 1930 é um dos marcos mais importantes da história brasileira no século XX. Ela pode ser analisada como fruto da combinação de elementos internos (o esgotamento da política oligárquica, que predominou na Primeira República) e externos (a crise econômica internacional desencadeada a partir de 1929). O momento que levou ao seu desencadeamento foi o rompimento do pacto que garantia o poder das elites oligárquicas, ou seja, a Política do Café-com-Leite. O mandato de Washington Luís se encerraria em 1930, e o candidato com pretensões ao cargo era o presidente (era como se chamavam os governadores durante a Primeira República) do estado de Minas Gerais, Antônio Carlos de Andrada. A emergência da crise levou Washington Luís, como representante da oligarquia paulista, a preferir a candidatura de outro representante de São Paulo, Júlio Prestes. O presidente mineiro considerou esta preferência como uma traição aos acordos políticos, e aliou-se a Getúlio Vargas, chefe do governo gaúcho, visando ao lançamento de uma candidatura oposicionista. O resultado foi a formação da Aliança Liberal, reunindo fundamentalmente as oligarquias dissidentes de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraíba, cujo líder, João Pessoa, foi indicado candidato a vice-presidente. A Aliança Liberal também ganhou o apoio de setores descontentes de outros estados, e buscou incorporar reivindicações das classes médias, dos tenentes, além de prometer aos trabalhadores a concessão de uma legislação social. As eleições foram realizadas, com atos de corrupção dos dois lados, e resultaram na vitória de Júlio Prestes; inicialmente, houve uma tendência à aceitação do resultado por parte dos oposicionistas, mas o assassinato de João Pessoa reacendeu o inconformismo, principalmente por parte dos tenentes que haviam apoiado Vargas e a Aliança Liberal.

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Page 1: Brasil: o período Vargas (1930-1945) - cohistoria.onlinecohistoria.online/upload/7/Brasil - o periodo Vargas (1930-1945).pdf... do estado de Minas Gerais, ... Getúlio Vargas, chefe

Brasil: o período Vargas (1930-1945)

Prof. Alvaro Senra

A Revolução de 1930 é um dos marcos mais importantes da história brasileira no

século XX. Ela pode ser analisada como fruto da combinação de elementos internos (o

esgotamento da política oligárquica, que predominou na Primeira República) e externos

(a crise econômica internacional desencadeada a partir de 1929). O momento que levou

ao seu desencadeamento foi o rompimento do pacto que garantia o poder das elites

oligárquicas, ou seja, a Política do Café-com-Leite.

O mandato de Washington Luís se encerraria em 1930, e o candidato com

pretensões ao cargo era o presidente (era como se chamavam os governadores durante a

Primeira República) do estado de Minas Gerais, Antônio Carlos de Andrada. A

emergência da crise levou Washington Luís, como representante da oligarquia paulista,

a preferir a candidatura de outro representante de São Paulo, Júlio Prestes. O presidente

mineiro considerou esta preferência como uma traição aos acordos políticos, e aliou-se a

Getúlio Vargas, chefe do governo gaúcho, visando ao lançamento de uma candidatura

oposicionista. O resultado foi a formação da Aliança Liberal, reunindo

fundamentalmente as oligarquias dissidentes de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e

Paraíba, cujo líder, João Pessoa, foi indicado candidato a vice-presidente. A Aliança

Liberal também ganhou o apoio de setores descontentes de outros estados, e buscou

incorporar reivindicações das classes médias, dos tenentes, além de prometer aos

trabalhadores a concessão de uma legislação social.

As eleições foram realizadas, com atos de corrupção dos dois lados, e resultaram

na vitória de Júlio Prestes; inicialmente, houve uma tendência à aceitação do resultado

por parte dos oposicionistas, mas o assassinato de João Pessoa reacendeu o

inconformismo, principalmente por parte dos tenentes que haviam apoiado Vargas e a

Aliança Liberal.

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Comício da Aliança Liberal no Rio de Janeiro (Fonte: internet)

No dia 3 de outubro de 1930 desencadeou-se um movimento rebelde, a partir do

Rio Grande do Sul, de Minas Gerais e do Nordeste; as tropas rebeladas avançaram em

direção ao Rio de Janeiro, esperando-se a ocorrência de violentos combates em na

divisa entre Paraná e São Paulo; estes, no entanto, não ocorreram, pois Washington Luís

foi deposto por uma Junta Militar, que entregou o poder a Vargas. Terminava a

Primeira República, e subia ao poder no Brasil uma aliança de oligarquias dissidentes,

com o apoio das classes urbanas; no contexto político que se seguia em nível

internacional, de abandono das práticas econômicas liberais, esta aliança foi obrigada a

redesenhar a economia e a política no Brasil, reorganizando o Estado a partir de

perspectivas intervencionistas.

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Vargas à frente dos revolucionários de 1930 (Fonte: internet)

- o Governo Provisório (1930-1934)

Assumindo o governo, Vargas procurou consolidar as bases de seu poder,

nomeando interventores para os estados, e atendendo aos interesses dos grupos que o

apoiaram. Ao mesmo tempo, reformulava as políticas estatais, criando o Ministério do

Trabalho, Indústria e Comércio, dando início a práticas de intervenção nas relações

sociais e trabalhistas, disciplinando a classe trabalhadora para as necessidades de

expansão do capital. Tratava-se de conceder benefícios aos operários, mas delimitar

suas reivindicações através de sindicatos vinculados ao Estado.

A marca dos primeiros tempos de seu governo, no entanto, foram os conflitos

entre os vários setores que haviam apoiado a Revolução de 1930. A Aliança Liberal

reunira oligarquias dissidentes (cuja visão política não diferia muito daquela que estava

no poder na Primeira República), tenentes (que, em sua maioria, tinham tendências

nacionalistas e autoritárias), além de elaborar políticas que resultassem em apoio da

burguesia industrial, das classes médias e do proletariado urbano. O resultado foi uma

heterogeneidade política e disputas entre os vários grupos, que acabaram sendo

manipulados habilmente por Vargas, que sempre buscou fortalecer seu poder pessoal.

Em 1932, Vargas enfrentou a Revolução Constitucionalista, que unificou a

oligarquia paulista numa revolta contra o governo nacional; as causas deste movimento

estão na insatisfação com a nomeação do interventor João Alberto, um antigo tenente,

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cuja política beneficiou os setores populares urbanos; ao mesmo tempo, a crise

econômica tornava difícil a situação dos cafeicultores. Os conflitos entre o governo

Vargas, seu representante em São Paulo e as elites do estado chegaram ao auge com a

morte de estudantes em manifestação contra o governo federal, no mês de julho;

acusando o governo federal de implantar uma ditadura, as elites paulistas se levantaram

em nome da reconstitucionalização do país, buscando assim obter o apoio de outros

grupos regionais, o que não conseguiram.

Trincheira no Vale do Paraíba, durante a Revolução Constitucionalista (Fonte; internet)

Após três meses de guerra civil, as tropas federais derrotaram os paulistas.

Vargas, no entanto, teve para com os vencidos uma política conciliatória, e convocou

eleições para uma Assembléia Nacional Constituinte, uma das bandeiras de luta dos

participantes da Revolução Constitucionalista.

A Revolução de 1930 promoveu um deslocamento do centro do poder no Brasil;

desde o fim dos governos militares conhecidos como República da Espada, em 1894, a

oligarquia cafeeira paulista havia concentrado em suas mãos tanto o poder econômico

(por controlar o principal produto de exportação do país, o café, fato essencial numa

nação primário-exportadora, de fraco mercado interno e dependente dos centros

capitalistas internacionais) quanto o poder político (compartilhado com a oligarquia

mineira, detentora do maior eleitorado, na Política do Café-com-Leite). Após 1930,

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nenhum dos grupos que ascendeu ao poder com Vargas teve condições, isoladamente,

de articular um governo estável; neste contexto, o próprio Estado ampliou seu poder de

intervenção, num processo que se iniciou com as primeiras medidas tomadas logo após

a chegada de Vargas ao poder, e culminou com a implantação, em 1937, da ditadura do

Estado Novo. Vejamos o que diz a respeito a historiadora Sonia Regina de Mendonça:

O golpe de outubro de 1930 resultou no deslocamento da tradicional

oligarquia cafeeira do epicentro do poder, enquanto os demais setores

sociais a ele articulados e vitoriosos não tiveram condições,

individualmente, nem de legitimar o novo regime, nem, tampouco, de

solucionar a crise econômica. O período 1930-37 pode, por isso

mesmo, ser definido como de crise política aberta, sem que nenhuma

das frações de classe envolvidas lograsse tornar-se hegemônica em

sucessão à burguesia cafeeira, o que acabou garantindo ao Estado - a

burocracia estatal - a possibilidade de atuar com relativa margem de

autonomia face aos interesses em disputa. Sonia Regina de Mendonça.

A consolidação da república oligárquica. In: Maria Yedda Linhares

(org.) História Geral do Brasil .6ª ed., Rio de Janeiro: Campus,

1990.

Nós podemos então afirmar que, nos seus primeiros anos, foi a própria fraqueza

dos vários setores que compunham a aliança que sustentava Vargas que acabou por

favorecer a centralização política e a multiplicação dos instrumentos de controle da

sociedade brasileira pelo Estado. Este processo não foi simples, e em vários momentos e

por vários sujeitos (os conflitos entre tenentes e oligarquias dissidentes no início da

década de 1930, a Revolução Constitucionalista, as disputas em torno da Constituição

de 1934, a formação da Aliança Nacional Libertadora e da Ação Integralista

Brasileira) o poder de Vargas foi questionado e, por vezes, pareceu estar bastante

fragilizado. A habilidade política do presidente, assim como o uso implacável da

repressão, quando necessário, garantiram-lhe superar a crise e, em 1937, assumir

prerrogativas ditatoriais.

- o Governo Constitucional (1934-1937)

As eleições para a Assembléia Nacional Constituinte foram as primeiras

realizadas no Brasil com o voto secreto, velha aspiração dos grupos descontentes da

Primeira República; além disso, quarenta deputados classistas foram escolhidos por

sindicatos e associações patronais. Os setores agrários e os deputados comprometidos

com as posições defendidas pela Igreja Católica (que organizou a Liga Eleitoral

Católica - LEC, combatendo o divórcio, o comunismo, e defendendo o ensino religioso

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nas escolas) constituíam a maioria dos constituintes. O resultado final foi uma

constituição que garantia os direitos liberais, estendia o direito de voto às mulheres e

ampliava os direitos sociais dos trabalhadores. Ao final dos trabalhos, Vargas foi eleito

presidente constitucional pelos deputados.

A década de1930 vivenciou a renovação e a mobilização de grandes setores da

sociedade brasileira, que viam possibilidades de influir nos rumos da nação. Do

conservadorismo católico a experiências de esquerda em governos municiais, do voto

feminino à valorização da cultura popular. Merece destaque a atuação de grupos de

militantes negros, combatiam o racismo e buscavam oportunidades iguais.

A Voz da Raça, jornal da Frente Negra Brasileira (Fonte: internet)

Em 1931, foi fundada a Frente Negra Brasileira, que se estabeleceu como

partido político em 1936 e atuou até sua proibição pela ditadura do Estado Novo. Ela

chegou a ter milhares de militantes, que não se restringiam às atividades políticas

convencionais, promovendo ações culturais, instituindo escolas, etc. A preservação da

memória de sua existência é de grande importância para o conhecimento da história da

luta contra a desigualdade racial no Brasil.

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A Frente Negra valorizava a educação dos jovens (Fonte: internet)

A Constituição de 1934 teve vida curta. Ao mesmo tempo em que o Estado se

fortalecia, um quadro de radicalização política se instalava no Brasil, a exemplo do que

ocorria em outros países da Europa e da América no contexto de crise do capitalismo

liberal desencadeado após 1929.

O período em que Vargas esteve no poder coincidiu com um momento de

profundas mudanças na política internacional; nos anos 1930, o liberalismo econômico

e político, que durante décadas foi hegemônico como força ideológica, cedeu lugar a

práticas intervencionistas e, também, a uma profunda crítica do Estado liberal. Pela

direita, os movimentos inspirados no fascismo propunham a salvação do capitalismo a

partir do abandono das instituições liberais e sua substituição por um Estado totalitário,

francamente intervencionista nas relações econômicas e sociais. À esquerda, o

socialismo viu crescer sua influência junto com o aumento do prestígio da União

Soviética, única nação que escapou da crise de 1929.

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Integralistas fazem a saudação fascista (Fonte: internet)

No Brasil, esta polarização se reproduziu no conflito entre a Ação Integralista

Brasileira (AIB), liderada por Plínio Salgado, que havia unificado correntes políticas de

direita inspiradas no fascismo, e a Aliança Nacional Libertadora (ANL), que se inspirou

na experiência das Frentes Populares Antifascistas européias, reunindo diversos grupos

políticos de centro e de esquerda, com o objetivo de combater o fascismo. Este quadro

de radicalização política se estabeleceu logo após a instituição do governo

constitucional de Vargas, em 1934, e atingiu seu ponto mais alto com a Intentona

Comunista (1935), a fracassada tentativa de levante militar comandada por militares de

esquerda vinculados à ANL. Nesta insurreição, destacou-se a figura de Luiz Carlos

Prestes, líder histórico do comunismo no Brasil.

O período de forte repressão à esquerda que se seguiu à Intentona Comunista

coincidiu com a aproximação de Vargas com a direita, tornando o Estado cada vez mais

autoritário e levando, em novembro de 1937, ao estabelecimento da ditadura do Estado

Novo.

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Jornal A Manhã noticia a insurreição da ANL em 1935 (Fonte: internet)

Em setembro de 1937 o governo divulgou um documento (que, depois, se soube

que foi escrito por Olímpio Mourão Filho, militante integralista); chamado de Plano

Cohen, esse documento denunciava uma suposta tentativa de tomada do poder pelos

comunistas, levando o governo a decretar o Estado de Guerra naquele mesmo mês,

suspendendo os direitos dos cidadãos e cancelando as eleições presidenciais previstas

para 1938, quando, pela Constituição de 1934, finalizaria o mandato presidencial.

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Vargas anuncia o Estado Novo, em 1937 (Fonte: internet)

- a ditadura do Estado Novo (1937-1945)

Em 10 de novembro de 1937 Vargas anunciou o fechamento do Congresso Nacional e

iniciou o período ditatorial de seu governo, caracterizado pela centralização e pelo

nacionalismo.

A Constituição de 1937 estabeleceu as normas do regime que se instaurava. A nova lei

máxima do país foi escrita pelo jurista Francisco Campos, e inspirada na constituição autoritária

da Polônia, daí o apelido de Polaca. Ela concentrou o poder nas mãos do Executivo e acabou

com a autonomia dos estados. Os partidos políticos foram extintos, mas, estabelecendo uma

diferença em relação aos regimes fascistas, não foi criado um partido único que sustentasse o

Estado.

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Cerimônia de queima das bandeiras dos estados, representando o fim do federalismo e a

centralização do poder durante o Estado Novo (Fonte: internet)

O Estado Novo montou uma forte estrutura de propaganda do regime e de culto

à figura de Vargas. O Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) exercia forte

fiscalização sobre a imprensa e a vida cultural. Ao mesmo tempo, fortaleceram-se os

elementos nacionalistas da vida cultural. O amplo uso do rádio permitiu difundir a

música e as manifestações da cultura popular brasileira.

Carnaval no período do Estado Novo (Fonte: internet)

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A natureza ditatorial do Estado Novo manifestou-se na dura repressão aos

elementos oposicionistas, com largo uso de prisões e da tortura, sobretudo aos

elementos de esquerda. No entanto, a propaganda, a supressão da oposição e a adoção

de elementos reais de melhoria das condições de vida da população, como a ampliação

dos empregos urbanos,a legislação trabalhista e a fixação, em 1940, dos valores do

salário-mínimo, deram grande sustentação social ao regime varguista.

Desfile comemorativo do Dia do Trabalho, durante o Estado Novo (Fonte: internet)

Após 1942, em consonância com o desenrolar da II Guerra Mundial, quando as

forças militares aliadas começaram a superar os exércitos fascistas, fazendo prever um

retorno à hegemonia das democracias liberais, o Estado Novo iniciou seu declínio.

Dentro do próprio governo, havia setores que defendiam a aproximação com os aliados

e a liberalização do regime. O Brasil do Estado Novo, apesar de ser um regime

ditatorial, sustentou o esforço de guerra dos países democráticos, e chegou a mandar 25

mil soldados para a Itália, sob comando norte-americano. Desde 1942, a política externa

brasileira passara a apoiar os países aliados, o que repercutiu internamente com o desejo

de volta à democracia expresso por vários grupos da sociedade, como a União Nacional

dos Estudantes (UNE), ou por intelectuais de tendência liberal, que se expressaram no

Manifesto dos Mineiros.

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Soldados da Força Expedicionária Brasileira (FEB) em combate na Itália (Fonte: internet)

Em 1945 Vargas concedeu anistia a vários opositores que estavam presos, além

de prever que haveria eleições gerais e a convocação de uma Assembléia Nacional

Constituinte, que elaboraria novas leis para o país. Vários partidos políticos foram,

então, se formando, representando as várias correntes de opinião que existiam na

sociedade brasileira. Os principais partidos daquele período foram:

- Partido Social Democrático (PSD), partido representativo das oligarquias rurais

estaduais, criado por iniciativa de Getúlio Vargas.

- Partido Trabalhista Brasileira (PTB), de base urbana e sindical, e também ligado a

Vargas.

- União Democrática Nacional (UDN), de oposição liberal-conservadora a Vargas, que

reunia parte da burguesia e da classe média das cidades.

- Partido Comunista Brasileiro (PCB), existente desde 1922, mas proibido desde a

década de 1930; tornado legal, seu principal líder era Luís Carlos Prestes.

No ano de 1945, o principal conflito se deu em torno da questão se o retorno à

democracia se daria ou não com Vargas no poder. Os queremistas (reunindo os setores

nacionalistas) queriam Constituinte com Getúlio. Em 29 de outubro de 1945, Getúlio

Vargas foi derrubado por um golpe militar, apoiado pelos setores de oposição, que pôs

no poder José Linhares, presidente do Supremo Tribunal Federal. Tinha fim o período

de quinze anos, iniciado com a Revolução de 1930, em que Vargas exerceu o cargo de

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Presidente da República. Tinha início o período democrático, que se estenderia até

1964.

- Vargas e a modernização econômica

Inicialmente, a aliança política que chegou ao poder em 1930,

predominantemente representante de setores agrários ligados ao mercado interno, não

possuía um projeto de incentivo especial à industrialização do país. Ainda em 1935,

Vargas teve conflito agudo com a burguesia industrial, por ocasião de assinatura de

tratado comercial com os Estados Unidos, que previa tarifas privilegiadas para a entrada

de produtos industriais no Brasil, em troca de vantagens para o café e outros produtos

primários brasileiros, o que prejudicava certos similares já produzidos no Brasil. O

Estado pós-1930 conservava, então, fortes características liberal-conservadoras, embora

já houvesse de leis reguladoras no trabalho, implantadas principalmente nas indústrias

paulistas. Vale lembrar que algumas dessas leis já existiam desde a década de 1920, mas

não tinham sido postas em prática.

O quadro de depressão econômica internacional na década de 1930, assim como

a nova correlação de forças políticas e sociais no Brasil, onde o peso dos setores ligados

ao mercado interno se fortalecera, acabou por favorecer um processo de acumulação e

crescimento econômico que atribuía peso maior a esse mercado interno.

A queda do valor das exportações de café significava também a diminuição da

capacidade de importar mercadorias, e as forças industriais, produtoras para o mercado

interno, começaram a avançar rapidamente. Entre 1933 e 1939, a indústria de

transformação cresceu a taxas médias de 11% ao ano. Naquele período, setores como os

minerais não metálicos e a metalurgia cresceram em média, respectivamente, 20 e 21%

ao ano. A participação da indústria no produto físico nacional cresceu de 21% para 43%

entre 1919 e 1939. A agricultura viu seu peso relativo cair de 79 para 57%. Mesmo no

caso da agricultura, as culturas voltadas para o mercado interno cresceram anualmente

3,3%, enquanto os setores voltados para a exportação atingiram 2,2%.

A burguesia industrial formulou na década de 1930 um projeto mais abrangente

e diversificado de reivindicações, tentando estabelecer identificação entre

industrialização e interesse nacional, repelindo as acusações de artificialismo da

indústria, defendendo uma política de apoio do Estado à iniciativa privada capitalista. A

tendência foi de aproximação com o governo Vargas e o apoio ao golpe de Estado de 10

de novembro de 1937, que instituiu a ditadura do Estado Novo. Vargas respondeu

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tomando medidas de apoio estatal, como a criação da Carteira de Crédito Agrícola e

Industrial do Banco do Brasil, cujas atribuições, a princípio muito limitadas, se

ampliaram sob pressões das entidades empresariais.

Ao longo da década de 1940 teve início a atuação sistemática do Estado no

âmbito empresarial. Foram criadas a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), a

Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), a Companhia Nacional de Álcalis (CNA) e a

Fábrica Nacional de Motores (FNM). A modernização capitalista do Brasil atingia

patamares mais altos, com o desenvolvimento de uma indústria pesada e de base. Ainda

nos primeiros anos desta década, o Estado criou e dirigiu uma série de institutos

reguladores de produção e comercialização de produtos primários (café, açúcar e álcool,

cacau, sal, mate, pinho), assim como constituiu alguns conselhos de assessoria para

questões econômicas. Amadureceram as condições para que, em 1944, o importante

líder empresarial Roberto Simonsen propusesse a idéia do planejamento da atividade

econômica pelo Estado, como principal instrumento de aceleração da industrialização.

Apesar de seu caráter repressivo e de sua cobertura ideológica de tipo fascista, o

Estado Novo promoveu uma acelerada industrialização; além disso, promulgou um

conjunto de leis de proteção do trabalho, há muito reivindicadas pelos sindicatos

(salário mínimo, férias pagas, direito à aposentadoria, etc.), ainda que ao preço de impor

uma legislação sindical corporativista, copiada diretamente da Carta del Lavoro de

Mussolini, que vinculava os sindicatos ao aparelho estatal e anulava sua autonomia.

Após 1945, ano que marca o fim da ditadura varguista, as bases de existência da

sociedade brasileira haviam sido profundamente alteradas em relação a antes de 1930,

permitindo que estivessem criadas as condições para a modernização capitalista do país.