bolsonaro versus rio branco: transição hegemônica, américa ...2011/02/15  · contra-hegemonia e...

16
11 julio-diciembre 2020 ISSN: 1909-3063 ISSN-e: 1909-7743 pp.11–26 Revista de Relaciones Internacionales, Estrategia y Seguridad 2020 Vol . 15(2) Editorial Neogranadina doi : https://doi.org/10.18359/ries.4673 Bolsonaro versus Rio Branco: transição hegemônica, América do Sul e política externa * Carlos Eduardo Vidigal a Raúl Bernal-Meza b Resumo: o artigo parte da hipótese de uma transição hegemônica do poder norte-americano para o chinês. A partir disso, é possível propor um contraponto da atual inserção internacional do Brasil com a que ocorreu na transição da hegemonia britânica para a norte-americana, com o surgimento de desafios equivalentes aos ex- perimentados no início da República. Na primeira parte do texto, é apresentada a trajetória da política exterior brasileira, do final do século x ix à década de 1950, quando surgiram as primeiras críticas à ordem internacional do pós-guerra. A segunda parte aborda o recente processo de globalização, da forma como o Brasil tem tratado a ascensão da China e os avanços e recuos na integração sul-americana. Na terceira parte, a política externa de Rio Branco e as relações com a Grã-Bretanha, com os Estados Unidos e com os países latino-americanos são comparadas com a política externa proposta pelo governo Bolsonaro, e em quanto a nova política se diferencia da política externa universalista dos governos de Lula. Nas conclusões, propõe-se uma hipótese prospectiva, a qual vislumbra cenários internacionais e globais para o país. Palavras-chave: transição hegemônica; Rio Branco; Bolsonaro; China; América do Sul Fecha de recepción: 24/03/2020 Aceptado: 15/04/2020 Disponible en línea: 16/07/2020 Cómo citar: Vidigal, C. E., & Bernal-Meza, R. (2020). Bolsonaro versus Rio Branco: transição hegemônica, América do Sul e política externa. Revista de Relaciones Internacionales, Estrategia y Seguridad, 15(2). https:// doi.org/10.18359/ries.4673 * Artigo de pesquisa desenvolvido no âmbito do Projeto Enlace 010201010371 “Chile na História das Políticas Externas da Argentina e do Brasil: 1990-2015”, da Universidade Arturo Prat, Chile. a Doutor em Relaçðes Internacionais e professor do Departamento de História da Universidade de Brasília (unb), na área de História da América. unb, Brasília, Brasil. orcid: https://orcid.org/0000-0002-0808-7185 E-mail: [email protected] b Estudos pós-doutorais na unb e na Universidade de São Paulo. Doutor em Sociologia; com estudos na Sorbonne Université (Paris iii) e na Pontificia Universidad Católica Argentina; doutorado por esta última. Mestrado em Relações Internacionais, Flacso-Programa de Buenos Aires, Argentina. Ex-funcionário das Nações Unidas, da Unesco e da Cepal. Pesquisador do Instituto de Estudios Internacionales de la Universidad Arturo Prat del Estado de Chile, Chile. orcid: https://orcid.org/0000-0003-3546-6137 E-mail: [email protected]

Upload: others

Post on 19-Jan-2021

2 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Bolsonaro versus Rio Branco: transição hegemônica, América ...2011/02/15  · Contra-hegemonia e ordem capitalista mundial por meio do brics, brics-plus e de outros agru-pamentos,

11

julio-diciembre 2020 emspemspISSN 1909-3063 ISSN-e 1909-7743emspemsppp11ndash26

Revista de Relaciones Internacionales

Estrategia y Seguridad2020

Vol 15(2)Editorial

Neogranadina

Carlos Eduardo Vidigal Rauacutel Bernal-Meza

doi httpsdoiorg1018359ries4673

Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Carlos Eduardo Vidigala Rauacutel Bernal-Mezab

Resumo o artigo parte da hipoacutetese de uma transiccedilatildeo hegemocircnica do poder norte-americano para o chinecircs A partir disso eacute possiacutevel propor um contraponto da atual inserccedilatildeo internacional do Brasil com a que ocorreu na transiccedilatildeo da hegemonia britacircnica para a norte-americana com o surgimento de desafios equivalentes aos ex-perimentados no iniacutecio da Repuacuteblica Na primeira parte do texto eacute apresentada a trajetoacuteria da poliacutetica exterior brasileira do final do seacuteculo xix agrave deacutecada de 1950 quando surgiram as primeiras criacuteticas agrave ordem internacional do poacutes-guerra A segunda parte aborda o recente processo de globalizaccedilatildeo da forma como o Brasil tem tratado a ascensatildeo da China e os avanccedilos e recuos na integraccedilatildeo sul-americana Na terceira parte a poliacutetica externa de Rio Branco e as relaccedilotildees com a Gratilde-Bretanha com os Estados Unidos e com os paiacuteses latino-americanos satildeo comparadas com a poliacutetica externa proposta pelo governo Bolsonaro e em quanto a nova poliacutetica se diferencia da poliacutetica externa universalista dos governos de Lula Nas conclusotildees propotildee-se uma hipoacutetese prospectiva a qual vislumbra cenaacuterios internacionais e globais para o paiacutes

Palavras-chave transiccedilatildeo hegemocircnica Rio Branco Bolsonaro China Ameacuterica do Sul

Fecha de recepcioacuten 24032020emspAceptado 15042020 Disponible en liacutenea 16072020

Coacutemo citar Vidigal C E amp Bernal-Meza R (2020) Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad 15(2) httpsdoiorg1018359ries4673

Artigo de pesquisa desenvolvido no acircmbito do Projeto Enlace 010201010371 ldquoChile na Histoacuteria das Poliacuteticas Externas da Argentina e do Brasil 1990-2015rdquo da Universidade Arturo Prat Chile

a Doutor em Relaccedilethes Internacionais e professor do Departamento de Histoacuteria da Universidade de Brasiacutelia (unb) na aacuterea de Histoacuteria da Ameacuterica unb Brasiacutelia Brasil orcid httpsorcidorg0000-0002-0808-7185 E-mail cvidigalgmailcom

b Estudos poacutes-doutorais na unb e na Universidade de Satildeo Paulo Doutor em Sociologia com estudos na Sorbonne Universiteacute (Paris iii) e na Pontificia Universidad Catoacutelica Argentina doutorado por esta uacuteltima Mestrado em Relaccedilotildees Internacionais Flacso-Programa de Buenos Aires Argentina Ex-funcionaacuterio das Naccedilotildees Unidas da Unesco e da Cepal Pesquisador do Instituto de Estudios Internacionales de la Universidad Arturo Prat del Estado de Chile Chile orcid httpsorcidorg0000-0003-3546-6137 E-mail bernalmezahotmailcom

12

Bolsonaro versus Rio Branco transicioacuten hegemoacutenica Ameacuterica del Sur y poliacutetica externa

Resumen el artiacuteculo parte de la hipoacutetesis de una transicioacuten hegemoacutenica del poder estadounidense al chino De ahiacute es posible proponer un contrapunto de la insercioacuten internacional actual de Brasil con lo que ocurrioacute en la transicioacuten de la hegemoniacutea britaacutenica a la estadounidense con el surgimiento de desafiacuteos equivalentes a los experimentados al comienzo de la Repuacuteblica La primera parte del texto presenta la trayectoria de la poliacutetica exterior brasilentildea desde finales del siglo xix hasta la deacutecada de 1950 cuando surgieron las primeras criacuteticas al orden internacional de posguerra La segunda parte aborda el reciente proceso de globalizacioacuten la forma en que Brasil ha gestionado el ascenso de China y los avances y retrocesos en la integracioacuten sudamericana En la tercera parte se comparan la po-liacutetica exterior de Riacuteo Branco las relaciones con Gran Bretantildea los Estados Unidos y los paiacuteses latinoamericanos con la poliacutetica exterior propuesta por el gobierno de Bolsonaro y coacutemo la nueva poliacutetica se difiere de la poliacutetica exterior universalista de los gobiernos de Lula En las conclusiones se propone una hipoacutetesis prospectiva la que vislumbra escenarios internacionales y globales para el paiacutes

Palabras clave transicioacuten hegemoacutenica Rio Branco Bolsonaro China Ameacuterica del Sur

Bolsonaro versus Rio Branco Hegemonic Transition South America and Foreign Policy

Abstract The article builds on the hypothesis of a hegemonic transition from American to Chinese power Hence it proposes the transition from British to American hegemony as a counterpoint to the current international insertion of Brazil because the emerging challenges are equivalent to those experienced at the beginning of the Republic The first section presents the track record of Brazilian foreign policy from the late 19th century to the 1950s when the first criticisms of the postwar international order emerged The second section addresses the recent globali-zation process how Brazil has managed the rise of China and the advances and setbacks in South American inte-gration The third section compares the Rio Branco foreign policy and the relations with Great Britain the United States and Latin American with the foreign policy proposed by Bolsonarorsquos government It also establishes how the new policy differs from the universalist foreign policy of Lularsquos administrations Finally a prospective hypothesis is outlined which glimpses international and global scenarios for the country

Keywords Hegemonic transition Rio Branco Bolsonaro China South America

13Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Introduccedilatildeo Transiccedilotildees hegemocircnicas constituem tema relevante nos estudos internacionais Nas uacuteltimas deacutecadas dois autores que as historiaram tiveram seus estu-dos amplamente divulgados no Brasil e nos demais paiacuteses da regiatildeo Paul Kennedy (1987) abordou o impacto das transiccedilotildees como ascensatildeo e queda das grandes potecircncias abrangendo os quinhentos anos de existecircncia do sistema internacional Eric Hobsbawm (1994) estudou a transiccedilatildeo da ordem internacional mdash a qual definiu como ldquomudanccedila de eacutepocardquo mdash sob a influecircncia que tiveram a ascensatildeo e decliacutenio das potecircncias sobre a ordem internacional durante o seacuteculo xx

Na aacuterea de Teoria das Relaccedilotildees Internacionais o tema das transiccedilotildees hegemocircnicas teve lugar em uma das correntes menos privilegiadas a teoria globalista ou marxista Do ponto de vista teoacuterico o globalismo concebe as relaccedilotildees internacionais como um conjunto estruturado a partir das for-maccedilotildees socioeconocircmicas nacionais e de suas muacutel-tiplas interligaccedilotildees no plano internacional cujo conhecimento se vincula estreitamente com a aacuterea da economia poliacutetica e que permite a formulaccedilatildeo mais segura do conceito de ldquointerdependecircnciardquo (Keohane e Nye 1977 Tarzi 2007 Pearson e Ro-chester 2007)

As raiacutezes das concepccedilotildees globalistas se encon-tram na tradiccedilatildeo marxista na vertente que se es-tende de Lecircnin a Wallerstein passando por Cox Tilly e Arrighi entre outros Na Ameacuterica Latina a corrente teoacuterica que desenvolveu estudos sobre as transiccedilotildees hegemocircnicas de forma mais apropriada foi o estruturalismo com seu enfoque de econo-mia poliacutetica com as contribuiccedilotildees de Prebisch Furtado Santa Cruz Pinto e Sunkel a partir dos anos 1950 ateacute o neoestruturalismo de Tomassini Ferrer Bernal-Meza e outros nas deacutecadas finais do seacuteculo xx Naquelas anaacutelises as relaccedilotildees inter-nacionais eram compreendidas como um sistema mundial no qual as diversas partes da estrutura mdash centro e periferia ou centro semiperiferia e pe-riferia mdash estatildeo inter-relacionadas de forma fun-cional e necessaacuteria (Bernal-Meza 2013) Novos aportes de Gullo (2014 2018) e de Bricentildeo Ruiz e Simonoff (2015) somam-se a essa perspectiva

ampliando as possibilidades de compreensatildeo dos efeitos das transiccedilotildees hegemocircnicas sobre os paiacuteses latino-americanos No caso do Brasil a atual con-juntura internacional natildeo tem sido vista na litera-tura como uma transiccedilatildeo hegemocircnica mas como uma crescente globalizaccedilatildeo com desafios para a inserccedilatildeo internacional (Cervo 2008 Lessa e Oli-veira 2013)

O artigo parte da hipoacutetese ou do pressuposto de que esteja em andamento uma transiccedilatildeo he-gemocircnica do poder norte-americano para o chinecircs (Fiori 1999 Arrighi 2008 Mandelbaum 2010 Li e Farah 2013 Nasr 2014 Li 2014 2019) o que permite fazer um contraponto da atual inserccedilatildeo internacional do Brasil com a que ocorreu na tran-siccedilatildeo da hegemonia britacircnica para a norte-ame-ricana entre o fim do seacuteculo xix e o periacuteodo do entreguerras Natildeo se trata de uma abordagem sis-tecircmica mas sim da anaacutelise dos efeitos da transiccedilatildeo hegemocircnica em paiacuteses perifeacutericos no caso o Bra-sil A ascensatildeo da China marcaria o surgimento de desafios equivalentes aos experimentados no final do Impeacuterio e no iniacutecio da Repuacuteblica e equacio-nados em sua maioria nos dez anos da gestatildeo do Baratildeo do Rio Branco1 entre 1902 e 1912 (Fonseca Jr 2012)

Tomada como um pressuposto a transiccedilatildeo eacute na verdade uma hipoacutetese que se comprovaraacute ou natildeo no futuro Isso porque a China ainda natildeo eacute um ator com as capacidades de exercer uma hegemo-nia em todas as aacutereas e agendas do sistema inter-nacional Tampouco eacute o ator mais importante nem o que exerce maior poder hegemocircnico nas relaccedilotildees internacionais do Brasil Portanto o que se propotildee eacute uma hipoacutetese prospectiva de trabalho a qual vis-lumbra cenaacuterios internacionais e globais futuros

A China tem uma posiccedilatildeo dual na ordem ca-pitalista mundial uma situaccedilatildeo complexa de he-gemonia e contra-hegemonia (Li 2020 Li 2012) Contra-hegemonia e ordem capitalista mundial por meio do brics brics-plus e de outros agru-pamentos como o Consenso de Beijing (Li 2014

1 Joseacute Maria da Silva Paranhos Juacutenior filho do Visconde do Rio Branco foi nomeado Baratildeo do Rio Branco em 1888 no reinado de D Pedro II (1840-1889) Monarquista de for-maccedilatildeo Rio Branco destacou-se como diplomata no periacuteo-do republicano e foi ministro das Relaccedilotildees Exteriores

14

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

Vadell e Ramos 2019) hegemonia em suas relaccedilotildees com a semiperiferia e a periferia Ameacuterica Latina e Aacutefrica (Li e Farah 2013 Becard e Lessa 2019 Li 2020 Bernal-Meza e Li 2020)

Na primeira parte do artigo eacute apresentada a trajetoacuteria da poliacutetica exterior brasileira do final do seacuteculo xix agrave deacutecada de 1960 quando surgiram as primeiras criacuteticas agrave ordem internacional do poacutes-guerra ao sistema interamericano e agrave depen-decircncia das economias latino-americanas em re-laccedilatildeo agraves potecircncias centrais O debate que permeia essa seccedilatildeo diz respeito agrave construccedilatildeo da hegemo-nia norte-americana na Ameacuterica Latina agrave forma como o Baratildeo do Rio Branco adequou a poliacutetica exterior brasileira agrave conjuntura do iniacutecio do seacuteculo xx e sua influecircncia nas deacutecadas seguintes A se-gunda trata do recente processo de globalizaccedilatildeo de como o Brasil respondeu agrave nova conjuntura e como tem tratado de temas como a ascensatildeo da China o decliacutenio relativo dos Estados Unidos e os avanccedilos e recuos na integraccedilatildeo sul-americana nas deacutecadas iniciais do seacuteculo xxi Na terceira parte a poliacutetica externa de Rio Branco e as relaccedilotildees com a Gratilde-Bretanha com os Estados Unidos e com os paiacuteses latino-americanos satildeo comparadas com a poliacutetica externa do governo Bolsonaro aleacutem dis-so eacute avaliado como a nova poliacutetica se diferencia da poliacutetica externa universalista dos governos de Lula da Silva (Lessa e Oliveira 2013 Bernal-Meza e Bizzozero 2014 Cervo e Bueno 2015)

A questatildeo eacute a de saber se Bolsonaro ldquodesafiardquo Rio Branco ao se aproximar da potecircncia decli-nante os Estados Unidos e se afastar da potecircncia ascendente a China ainda se no acircmbito sul-ame-ricano a tendecircncia seria a de esvaziar a integraccedilatildeo regional e afirmar a ldquolideranccedilardquo brasileira ao con-traacuterio da busca do equiliacutebrio nas relaccedilotildees platinas adotadas por Rio Branco Nas consideraccedilotildees finais nossa conclusatildeo eacute uma hipoacutetese as diferenccedilas principais entre a transiccedilatildeo hegemocircnica do pas-sado e a atual mdash e que explicariam as opccedilotildees do governo Bolsonaro mdash seriam 1 os viacutenculos histoacute-ricos entre as economias as sociedades e as cultu-ras britacircnica e norte-americana em contraste com as diferenccedilas poliacuteticas sociais e culturais entre os Estados Unidos e a China 2 a proximidade geo-graacutefica econocircmica e cultural do Brasil em relaccedilatildeo

aos Estados Unidos mais forte nos dias de hoje do que 130 anos atraacutes e a distacircncia geograacutefica e cultu-ral em relaccedilatildeo agrave China 3 a dependecircncia estrutural na aacuterea de defesa o que praticamente impossibilita a ldquoopccedilatildeo chinesardquo ou a ldquoopccedilatildeo dos bricsrdquo A proxi-midade das Forccedilas Armadas brasileiras com as instituiccedilotildees similares estadunidenses a provisatildeo de equipamento militar dos Estados Unidos e de seus aliados europeus e a ausecircncia de fornecimento por parte da China inibem a possibilidade de apro-ximaccedilatildeo com a China nessa aacuterea

O recuo ao periacuteodo de Rio Branco como con-traponto agrave atual poliacutetica externa do Brasil adveacutem do fato de ele ter consolidado a transiccedilatildeo do eu-ropeiacutesmo para o americanismo nos termos pro-postos por Bueno (2003) Nesse sentido sua gestatildeo tornou-se um marco no posicionamento brasileiro diante da transiccedilatildeo hegemocircnica do Reino Unido para os Estados Unidos da Ameacuterica ilustrado pela criaccedilatildeo da primeira embaixada brasileira em Washington-dc

De Rio Branco agrave poliacutetica externa independente autonomia e permissibilidade Rio Branco concluiu no plano poliacutetico a etapa de convergecircncias entre os Estados Unidos e o Brasil iniciada com a Proclamaccedilatildeo da Repuacuteblica (1889) deste uacuteltimo Sua gestatildeo promoveu o apoio brasi-leiro agraves posiccedilotildees norte-americanas diante da Ve-nezuela em 1902 e da Colocircmbia no ano seguinte (Doratioto e Vidigal 2015) Essa poliacutetica com breves periacuteodos de distanciamento mdash durante a ldquopoliacutetica externa independenterdquo e o ldquopragmatismo ecumecircnico e responsaacutevelrdquo mdash tem sido mantida ateacute o presente Os governos do Partido dos Trabalha-dores (pt) embora tenham participado e impul-sionado o Foacuterum de Diaacutelogo entre Iacutendia Brasil e Aacutefrica do Sul (Ibas) e o brics nunca imaginaram esses agrupamentos como contra-hegemocircnicos ante os Estados Unidos o que eacute igualmente vaacutelido para os governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro

A historiografia em especial a partir dos tra-balhos de Aacutelvaro Lins (1996) e de Luiz Viana Filho (1959) convergiu em torno da ideia de que Rio

15Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Branco natildeo foi um homem de Estado que tenha se orientado pelo militarismo ou pelo imperialismo Pautado pela convicccedilatildeo nos sentimentos paciacutefi-cos dos governos aos quais serviu considerava primordial o reconhecimento pelos demais paiacute-ses sul-americanos de que o paiacutes natildeo tinha feito uso da forccedila natildeo se apresentando como potencial ameaccedila aos vizinhos entre os anos 1870 e o iniacutecio do novo seacuteculo Certamente natildeo se deve receber de maneira acriacutetica a autoimagem que Rio Branco fazia de si e dos governos brasileiros pois muitos foram os seus criacuteticos e conhecidos satildeo os atritos com o ministro argentino Estanislao Zeballos ou o jogo entre competiccedilatildeo e entente do Brasil com a Argentina e o Chile (Meneses 1988) para citar apenas um exemplo

Durante sua gestatildeo dois de seus colaboradores expressaram posicionamentos distintos um mais vinculado aos desiacutegnios de Washington outro simultaneamente criacutetico e admirador Joaquim Nabuco e Domiacutecio da Gama Para Nabuco a Dou-trina Monroe e o corolaacuterio Roosevelt significavam que os paiacuteses americanos haviam se desprendido da Europa ldquocomo a lua da terrardquo o que levou o his-toriador Joseacute Honoacuterio Rodrigues a sugerir que Na-buco tivesse por princiacutepio marchar sempre com eles ao menos sempre que possiacutevel (Nabuco 1949 Franccedila 2007) Domiacutecio da Gama afastava-se da visatildeo de Nabuco sobre a Doutrina Monroe pois a considerava carente de reciprocidade portanto em desacordo com interesses brasileiros

A poliacutetica brasileira para a Ameacuterica do Sul e na regiatildeo do Prata foi e talvez seja ainda mateacuteria con-troversa A amizade que deveria reger as relaccedilotildees com a Argentina e o Chile natildeo excluiacutea a criaccedilatildeo de um poder dissuasoacuterio por parte do Rio de Janeiro Ao lado da rivalidade tradicional entre os trecircs paiacuteses mdash excetuando talvez as relaccedilotildees Brasil-Chile mdash havia a compreensatildeo por parte do Rio de Janeiro sobre a necessidade de estabelecer relaccedilotildees amigaacute-veis no Cone Sul (Argentina Boliacutevia Chile Para-guai e Uruguai) notadamente em sua dimensatildeo geopoliacutetica

A partir de 1909 as tensotildees na regiatildeo arrefe-ceram sem que a rivalidade entre a Argentina e o Brasil saiacutesse da agenda O siacutembolo dessa aproxi-maccedilatildeo foi a frase proferida por Saacuteenz Pentildea ldquoTodo

nos une nada nos separardquo (citado por Bandeira 2003 p 125) Na conjuntura da Primeira Guerra Mundial a Argentina o Brasil e o Chile assina-ram o Tratado do abc voltado para a coordenaccedilatildeo das poliacuteticas de defesa do Cone Sul O abc natildeo foi bem-recebido nos Estados Unidos por ser poten-cialmente um contrapeso agrave sua influecircncia nem nos paiacuteses sul-americanos sob o argumento de que uma poliacutetica pan-americana natildeo deveria com-portar preponderacircncias restritas que eliminassem a ampla participaccedilatildeo dos Estados nacionais da re-giatildeo (Bandeira 2004)

Quanto agraves relaccedilotildees do Brasil com a Gratilde- Bretanha vista como ldquopotecircncia decadenterdquo estive-ram subordinadas ao decliacutenio econocircmico britacircni-co Diferentemente da Argentina cuja orientaccedilatildeo principal seguiraacute voltada para Londres ateacute a Se-gunda Guerra Mundial o Brasil priorizou os laccedilos com Washington desde a Proclamaccedilatildeo da Repuacute-blica em 1889

Desde o iniacutecio do seacuteculo xx a Gratilde-Bretanha passou a dar liberdade de accedilatildeo para os Estados Unidos no Hemisfeacuterio Ocidental explicitado por Balfour em 1903 ao afirmar que os britacircni-cos natildeo desejavam a colonizaccedilatildeo a aquisiccedilatildeo de territoacuterios ou as alteraccedilotildees no equiliacutebrio de po-der ldquoa Doutrina Monroe natildeo estava portanto em tela de juiacutezordquo (citado por Bueno 2003 p 32) A adoccedilatildeo por Londres do nihil obstat diante da presenccedila estadunidense na Ameacuterica Latina con-corria para a adoccedilatildeo de praacuteticas imperialistas por parte de Washington mas prevalecia a ideia de que era do interesse dos capitalistas britacircnicos que a potecircncia norte-americana assumisse o pa-pel de poliacutecia internacional Como destacou Po-lanyi em A grande transformaccedilatildeo (Polanyi 1957) o padratildeo-ouro e o constitucionalismo eram os instrumentos que tornaram conhecida a voz da City de Londres em muitos dos paiacuteses menores que adotaram esses siacutembolos de adesatildeo agrave nova ordem internacional No caso do Brasil a passa-gem da hegemonia britacircnica para a estadunidense se deu de forma amistosa ao longo de algumas deacutecadas ainda que natildeo isenta de momentos de desconfianccedila como nos eventos da Proclamaccedilatildeo da Repuacuteblica e nos anos iniciais do novo regime (Bueno 2003 Cervo e Bueno 2015)

16

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

O processo modernizador do Brasil nos finais do seacuteculo xix dependeu do comeacutercio com os Esta-dos Unidos pois os superaacutevits na balanccedila comercial geravam excedentes para atender amortizaccedilotildees serviccedilos de empreacutestimos britacircnicos e para custear o complexo exportador nas matildeos dos ingleses A concorrecircncia comercial entre norte-americanos e ingleses segundo Cervo estabeleceu-se no Brasil apenas em pequena escala Nessa conjuntura os Estados Unidos elevaram seu interesse no paiacutes com a intenccedilatildeo de abrir mercados e equilibrar suas contas (Cervo e Bueno 2015)

Nas deacutecadas iniciais do seacuteculo xx o Brasil es-treitou laccedilos com os Estados Unidos manteve boas relaccedilotildees econocircmicas e diplomaacuteticas com a Gratilde-Bre-tanha e atuou de forma autocircnoma nas questotildees mais delicadas das relaccedilotildees sul-americanas em especial as do Cone Sul Nas quatro deacutecadas que se seguiram agrave Primeira Guerra Mundial a poliacutetica exterior brasileira foi regida principalmente pelas demandas das relaccedilotildees com os Estados Unidos As accedilotildees ou ensaios de autonomia representados pela participaccedilatildeo brasileira nas negociaccedilotildees do poacutes-gue-rra pelo comeacutercio compensado com a Alemanha permitiriam a Getuacutelio Vargas mdash que ascendera agrave Presidecircncia na Revoluccedilatildeo de 1930 cargo no qual permaneceria ateacute 1945 mdash o exerciacutecio da ldquopoliacutetica de barganhardquo com esse paiacutes e com os Estados Unidos (Bandeira 2004 Seitenfus 2003 Cervo e Bueno 2015 Doratioto e Vidigal 2015)

Na construccedilatildeo da nova ordem mundial do se-gundo poacutes-guerra o Brasil se alinhou aos Estados Unidos na Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (onu) e no processo de construccedilatildeo do Sistema Interame-ricano Durante os governos Dutra Vargas Cafeacute Filho e os anos iniciais de Kubitschek o Brasil procurou buscar recursos financeiros e tecnoloacute-gicos junto aos Estados Unidos para a promoccedilatildeo do desenvolvimento econocircmico Das primei-ras conferecircncias interamericanas do poacutes-guerra (Chapultepec Rio de Janeiro Bogotaacute) ateacute 1958 estabeleceu-se um diaacutelogo de surdos enquanto o Brasil no que foi acompanhado pela maioria dos paiacuteses latino-americanos reivindicava uma defi-niccedilatildeo expliacutecita por parte de Washington quanto aos aportes a serem feitos na regiatildeo o governo norte-americano cobrava compromisso com as

instituiccedilotildees internacionais com os preceitos da Guerra Fria e com as necessidades impostas pela aacuterea de seguranccedila O resultado foi o crescente des-conforto das lideranccedilas poliacuteticas latino-america-nas diante da atitude reticente de Washington e do anti-americanismo em alguns paiacuteses

Em maio de 1958 por ocasiatildeo da viagem do vice- presidente Nixon ao Peru e agrave Venezuela o governo americano percebeu a dimensatildeo da insatisfaccedilatildeo dos paiacuteses sul-americanos com o tratamento que Was-hington vinha dispensando agraves suas demandas e a necessidade de rever sua poliacutetica para a regiatildeo Entre os desdobramentos da visita de Nixon destacou-se a iniciativa do presidente Kubitschek de escrever a Eisenhower propondo um esforccedilo conjunto de cooperaccedilatildeo econocircmica dos paiacuteses americanos em prol de projetos nacionais de desenvolvimento logo denominada ldquoOperaccedilatildeo Pan-Americanardquo (Cervo e Bueno 2015 Cervo 2008 Lafer 2002) Diante do novo quadro na poliacutetica regional o governo norte-americano levou o debate para o acircmbito do Conselho Econocircmico e Social da Organizaccedilatildeo dos Estados Americanos (oea) onde foi criado o Comitecirc dos 21 encarregado de gerir a implementaccedilatildeo da opa2 Os trabalhos realizados no Comitecirc permitem identificar uma poliacutetica protelatoacuteria por parte da representaccedilatildeo norte-americana com o intuito de esvaziar o conteuacutedo ldquodesenvolvimentistardquo da pro-posta brasileira em favor de uma visatildeo essencial-mente assistencialista (Vidigal 2009)

A poliacutetica externa de Jacircnio Quadros autointi-tulada ldquoPoliacutetica Externa Independenterdquo procurou superar os constrangimentos das deacutecadas anterio-res por meio de uma orientaccedilatildeo que priorizava a expansatildeo do comeacutercio e a diversificaccedilatildeo dos laccedilos internacionais o estabelecimento de relaccedilotildees di-plomaacuteticas com paiacuteses socialistas a luta contra o subdesenvolvimento e o empenho em favor da in-tegraccedilatildeo econocircmica regional sem romper com a posiccedilatildeo tradicional do Brasil em outros pontos da agenda internacional como o respeito ao ldquomundo livrerdquo agrave oea e agrave onu

2 Iniciativa do governo Juscelino Kubitschek junto agrave ad-ministraccedilatildeo de Eisenhower incorporada agrave oea que objetivava a promoccedilatildeo do desenvolvimento dos paiacuteses latino-americanos com o apoio dos Estados Unidos da Ameacuterica

17Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Da autonomia dos anos 2000 ao ldquonovo alinhamentordquo Embora Lula tenha incentivado e participado de alianccedilas contra-hegemocircnicas no acircmbito da eco-nomia poliacutetica internacional como o Ibas e o brics natildeo se pode afirmar que ele ou sua suces-sora Dilma Rousseff tenha desenvolvido uma po-liacutetica internacional contraacuteria aos Estados Unidos (Pecequilo 2012 Cervo e Bueno 2015) Sempre se tratou de relaccedilotildees ldquocentraisrdquo ou ldquocruciaisrdquo para o Brasil mas tambeacutem de grande assimetria Para o Brasil pensar nos Estados Unidos eacute pensar em sua poliacutetica exterior (Pecequilo 2012) como uma ldquoparceria estrateacutegicardquo que influencia as estruturas socioeconocircmicas do paiacutes ao longo do tempo (Cer-vo 2008) Essa tradiccedilatildeo que remonta a Rio Branco apresentou-se na trajetoacuteria histoacuterica do paiacutes como parceria estrateacutegica em alguns momentos ou como alinhamento em outros

A poliacutetica externa do pt se caracterizou pelo multilateralismo e pelo fortalecimento e cons-truccedilatildeo de parcerias estrateacutegicas O que diferencia esse passado com a etapa iniciada com a presidecircn-cia de Bolsonaro talvez seja a adesatildeo agrave poliacutetica de rechaccedilo do globalismo e do multilateralismo

O governo Bolsonaro comeccedilou a aproximar-se dos Estados Unidos por meio de ideias mdash expres-sas pela visatildeo do ministro Ernesto Arauacutejo mdash e de accedilotildees Durante a campanha e nos primeiros me-ses de governo manifestaccedilotildees do Presidente de seu filho Eduardo e de um dos mentores de seu projeto Olavo de Carvalho demonstravam que o estreitamento dos laccedilos com Washington era mais o resultado de contatos com grupos poliacuteticos norte-americanos simpatizantes de Trump do que fruto de um entendimento poliacutetico consistente

Bolsonaro introduziu cinco mudanccedilas na po-liacutetica externa sul-americana do Brasil em com-paraccedilatildeo ao periacuteodo 2003-2016 1 recolocou o paiacutes em uma relaccedilatildeo estreita agrave poliacutetica exterior norte--americana 2 retirou seu apoio e logo comeccedilou a incentivar mdash juntamente com o presidente chileno Pintildeera mdash um novo agrupamento para substituir a Uniatildeo de Naccedilotildees Sul-Americanas (Unasul) 3 abandonou o respaldo poliacutetico ao governo vene-zuelano identificando-o como a principal ameaccedila

para a seguranccedila e estabilidade da regiatildeo 4 pas-sou a tratar o Mercado Comum do Sul (Mercosul) como um tema secundaacuterio na agenda 5 reduziu a prioridade que Brasiacutelia mdash desde 1985 mdash atribuiacutea a Buenos Aires em favor do Chile primeiro paiacutes a ser visitado pelo novo presidente

Qual poderia ser a explicaccedilatildeo de colocar o Chile como o primeiro paiacutes a visitar Sinalizar que foi devido agrave sintonia poliacutetica natildeo o explica posto que Macri eacute tatildeo liberal quanto Pintildeera Eacute possiacutevel entatildeo Bolsonaro tenha tentado retomar a visatildeo que Rio Branco tinha em relaccedilatildeo ao Cone Sul e buscar uma nova aproximaccedilatildeo com o Chile O Brasil e o Chile compartilham hoje uma posiccedilatildeo criacutetica a respeito do regionalismo poliacutetico sul-americano em par-ticular sobre a Unasul mas a Argentina tambeacutem Entretanto o imaginaacuterio do Chile em relaccedilatildeo a pa-radigmas e visotildees sobre o sistema internacional eacute distinto do brasileiro Satildeo dois paiacuteses com capaci-dades atributos e recursos de poder enormemente diferentes Em parte o modelo de inserccedilatildeo inter-nacional e seus instrumentos satildeo semelhantes em ambos os paiacuteses a visatildeo ideal do tipo de Estado a internacionalizaccedilatildeo da economia e o papel das empresas assim como papel que desempenha o capital privado Mas tambeacutem grandes diferenccedilas o Brasil tem uma histoacuterica vocaccedilatildeo industrialista mdash que natildeo existe atualmente no Chile mdash e uma aspiraccedilatildeo a concertar internamente os diversos segmentos e recursos de poder induacutestria ciecircncia e teacutecnica pesquisa e desenvolvimento papel do mercado interno de consumo e outros todas ques-totildees que satildeo muito relativas no modelo chileno

O Brasil eacute um global trader que se pensou glo-bal player cujos interesses satildeo tanto econocircmicos como poliacuteticos e sugerem a aspiraccedilatildeo a uma par-ticipaccedilatildeo influente na tomada de decisotildees no siste-ma internacional e nos organismos internacionais Na interpretaccedilatildeo de Cervo e Bueno esta foi a he-ranccedila dos dois governos de Lula a de desempe-nhar o papel que era devido no acircmbito hemisfeacuterico e no cenaacuterio internacional (Cervo e Bueno 2015) O Brasil pressupunha que seus vizinhos regionais reconhecessem a priori suas condiccedilotildees de lide-ranccedila e hegemonia sob um soft power Poreacutem nos anos recentes sob os governos da Concertaccedilatildeo o Chile buscou colocar-se como modelo de inserccedilatildeo

18

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

regional e tem procurado disputar com o Brasil essa condiccedilatildeo de lideranccedila natural (Bernal-Meza 2015 Flisfisch 2011)

Provavelmente a decisatildeo de visitar primeira-mente o Chile tenha sido resultado da influecircncia do ministro da Economia Paulo Guedes Egresso do curso de Economia da Universidade de Chicago e admirador do liberalismo e do ldquomodelordquo chileno Guedes teceu elogios ao Chile em diversas ocasiotildees em visatildeo superficial sobre o sucesso econocircmico da-quele modelo e a viabilidade de aplicaacute-lo ao Brasil de hoje Ademais somou-se aos criacuteticos da Unasul e da poliacutetica de contemporizaccedilatildeo com Caracas

Segundo o embaixador Pinheiro Guimaratildees secretaacuterio-geral do Ministeacuterio das Relaccedilotildees Ex-teriores (mre tambeacutem chamado de ldquoItamaratyrdquo) durante os governos de Lula essas posiccedilotildees jaacute tin-ham antecedentes

no periacuteodo de Michel Temer o Brasil se juntou aos paiacuteses da Alianccedila do Paciacutefico e aos paiacuteses do Grupo de Lima contra a Venezuela infringindo os prin-ciacutepios de autodeterminaccedilatildeo e de natildeo intervenccedilatildeo gerando desconfianccedilas e ressentimentos no esforccedilo de agradar aos Estados Unidos em sua campanha para derrubar o governo venezuelanordquo (Guimaratildees 2018 sp)

No discurso de posse o ministro das Relaccedilotildees Exteriores pocircs a figura do presidente Bolsonaro como um libertador do Brasil e definiu a nova etapa da poliacutetica exterior como aquela que se libertava do passado Em suas palavras ldquoo presidente Bolso-naro estaacute libertando o Brasil por meio da verdade Noacutes vamos tambeacutem libertar a poliacutetica externa va-mos libertar o Itamaraty como o presidente Bolso-naro prometeu que fariacuteamos em seu discurso da vitoacuteriardquo (Arauacutejo 2019 sp)

Segundo Cervo (2019) Bolsonaro e Cardoso coincidem

os dois presidentes tecircm uma visatildeo de mundo e da inserccedilatildeo internacional do Brasil semelhante satildeo li-berais nesse sentido inovadores relativamente ao periacuteodo anterior a seus mandatos de governos mais nacionalistas e introspectivos Isso significa para a poliacutetica exterior um novo ciclo de abertura da eco-nomia a empreendimentos capitais e tecnologias vindas de forardquo (sp)

Para Cervo (2002) natildeo haveria ruptura na poliacute-tica exterior porque ela apresenta haacute seacuteculos trecircs traccedilos que compotildeem a estrateacutegia brasileira de longo prazo universalismo cooperaccedilatildeo e pacifismo Mas haacute que se recordar daquelas diretrizes que marca-ram a poliacutetica externa de Cardoso (Bernal-Meza 2002) Nesse sentido eacute possiacutevel que o viacutenculo com os Estados Unidos e as potecircncias do capitalismo central o apoio agraves instituiccedilotildees de governanccedila glo-bal sustentada pela hegemonia norte-americana e a posiccedilatildeo a favor do Ocidente ante os conflitos mundiais bem como o suposto enfrentamento ci-vilizatoacuterio deixem para traacutes o que Bandeira (2004) denominou de ldquorelaccedilotildees perigosasrdquo

O americanismo do governo Bolsonaro entre-tanto parece desmentir Cervo ou seja concilia o alinhamento poliacutetico aos Estados Unidos com a repulsa ao universalismo e mesmo agrave cooperaccedilatildeo e ao pacifismo O chanceler Ernesto Arauacutejo elogia Trump como ldquoum cavalheiro cruzado que luta para resgatar a identidade do Ocidenterdquo Para Arauacutejo (2017) Trump e sua poliacutetica internacional repre-sentam a disposiccedilatildeo para uma luta global para re-cuperar o passado simboacutelico que tem representado a histoacuteria e a cultura das naccedilotildees ocidentais para a sobrevivecircncia e o domiacutenio do Ocidente

Um grande questionamento eacute o que aconteceraacute com o papel que a poliacutetica exterior brasileira tem desempenhado na regiatildeo e se ela retornaraacute agrave dispo-siccedilatildeo para a lideranccedila que marcou o periacuteodo Lula ou se deixaraacute nas matildeos de potecircncias secundaacuterias mdash como o Chile mdash essa posiccedilatildeo o paiacutes que Bolso-naro considera um modelo No plano da poliacutetica internacional um posicionamento em linha com a poliacutetica de Trump poderia ter grandes impactos Uma maior aproximaccedilatildeo mdash ou coincidecircncias mdash com a poliacutetica de Washington afastaria o Brasil de sua tendecircncia mais tradicional a da autonomia mdash cujo efeito seria um afastamento relativo do brics e a predisposiccedilatildeo do presidente Bolsonaro a resta-belecer uma relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo militar com os Estados Unidos (Cervo 2019) o que despertaria na regiatildeo velhos temores mdash nunca esquecidos mdash so-bre o subimperialismo brasileiro

Haacute que se considerar nesses aspectos que a poliacutetica externa do governo Bolsonaro tem sido in-formada por diferentes grupos de interesse o que

19Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

resulta muitas vezes em uma praacutetica erraacutetica in-consistente e excessivamente ideoloacutegica (Stunkel 2019 Spector 2019) Diferentemente de outras si-tuaccedilotildees semelhantes mdash Dutra Castelo Branco ou Collor mdash desta feita o Itamaraty natildeo atuou como contraponto agrave presidecircncia alimentando muitas vezes o discurso ideoloacutegico

Bolsonaro e Trump parecem ter muitos pontos em comum Entre as coincidecircncias mais delicadas estaacute seu rechaccedilo ao ldquoglobalismordquo3 o que revela que ambos os presidentes estatildeo dispostos a depreciar o que as diplomacias de seus proacuteprios paiacuteses cons-truiacuteram sob o sistema internacional contemporacirc-neo a criaccedilatildeo e fortalecimento das organizaccedilotildees internacionais o sistema das Naccedilotildees Unidas e as negociaccedilotildees mundiais sobre assuntos que impor-tavam agrave sociedade internacional Accedilotildees que se plasmaram em temas e agendas globais como o meio ambiente e a mudanccedila climaacutetica Ambas se-riam tendecircncias de mudanccedila profunda que impac-tariam todo o cenaacuterio latino-americano O mais preocupante eacute imaginar o Brasil imerso em um enfrentamento a respeito do papel do Ocidente na defesa da chamada ldquocultura ocidentalrdquo posto que ela tem sido o instrumento mais importante do co-lonialismo e da dominaccedilatildeo das potecircncias ociden-tais sobre a periferia do mundo

O que parecia ser manifestaccedilotildees de desinte-resse (ao menos) a respeito de seu soacutecio estrateacute-gico sul-americano Bolsonaro ao natildeo incluir a Argentina em sua primeira viagem ao exterior e as declaraccedilotildees de seu ministro da Economia a respeito do Mercosul o que indicava que este natildeo seria uma prioridade para o Brasil pode trazer consequecircncias negativas para as relaccedilotildees sul-ame-ricanas Deve-se recordar que a base de qualquer entendimento de cooperaccedilatildeo governanccedila re-gional e continuidade para fazer da regiatildeo uma

3 ldquoGlobalismordquo em sentido pejorativo foi o termo utilizado por Bolsonaro e por seus principais auxiliares para cri-ticar nos meses iniciais de seu governo as poliacuteticas de inserccedilatildeo do Brasil no cenaacuterio global por meio de uma par-ticipaccedilatildeo proativa em foros multilaterais e nos debates sobre os temas mais sensiacuteveis da agenda internacional Argumento apresentado pelo ministro Arauacutejo em seu dis-curso de posse por meio de uma obviedade ldquoNatildeo estamos aqui para trabalhar pela ordem global Aqui eacute o Brasilrdquo (Arauacutejo 2019 sp)

zona militarmente desnuclearizada passa por uma relaccedilatildeo cordial entre o Brasil e a Argentina A construccedilatildeo de uma ldquozona de pazrdquo no Atlacircntico Sul por meio da superaccedilatildeo das hipoacuteteses de con-flito entre a Argentina e o Chile tem se baseado na continuidade dessa relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo A partir dessas perspectivas a presidecircncia Bolso-naro natildeo soacute implicaria o retorno da Ameacuterica do Sul agraves concepccedilotildees ideoloacutegicas radicalizadas que se supunham superadas que incluem novos viacutenculos estreitos em mateacuteria de seguranccedila com os Estados Unidos mas tambeacutem o iniacutecio de uma etapa de in-certeza na regiatildeo

Alinhamento com Washington incertezas quanto a PequimO alinhamento com Washington agrave eacutepoca de Rio Branco seguia um roteiro previsiacutevel diante da potecircncia ascendente a adesatildeo aos princiacutepios do Direito Internacional a incorporaccedilatildeo acriacutetica do conceito de ldquobom governordquo e a convicccedilatildeo de que o progresso da naccedilatildeo dependia dos desiacutegnios do norte Nada parecido se via em relaccedilatildeo a Londres que ainda conservava o status de principal centro financeiro internacional mas que perdia impor-tacircncia no intercacircmbio de mercadorias Mais de um seacuteculo depois o novo alinhamento mdash e este eacute o contraponto que se mencionou na introduccedilatildeo mdash manteacutem o principal das relaccedilotildees internacionais do paiacutes voltado para os Estados Unidos De acordo com a hipoacutetese de trabalho inicial a de estarmos em meio a uma transiccedilatildeo hegemocircnica dos Estados Unidos para a China Bolsonaro estaria em dis-sonacircncia com Rio Branco

Os primeiros meses de 2019 revelaram que o governo Bolsonaro sustentava na poliacutetica externa o principal das promessas de campanha acompa-nhadas do mote ldquoo Brasil acima de tudordquo Inspira-do no governo de Trump o discurso de supremacia contrastava com o silecircncio diante da poliacutetica pro-tecionista de Washington que elevara a tarifa para a importaccedilatildeo do accedilo e subsidiava a produccedilatildeo de soja ambas as medidas prejudiciais para os inte-resses brasileiros Ante eventuais perdas setoriais o governo seguia fiel ao princiacutepio do alinhamento em dissonacircncia com o legado de Rio Branco

20

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

A crise na Venezuela e os interesses econocircmi-cos do agronegoacutecio no mercado chinecircs levariam o governo a modificar em parte a retoacuterica inicial o que indicaria estar em curso ajustes e reorientaccedilotildees na aacuterea No dia 23 de fevereiro o autoproclamado presidente interino da Venezuela Juan Guaidoacute liderou um esforccedilo de tentar fazer com que ca-minhotildees com alimentos adentrassem a Venezue-la como forma de pressionar o governo Maduro Em Pacaraima o chanceler brasileiro explicava se tratar de um ato humanitaacuterio altruiacutesta ldquoum mo-mento de criaccedilatildeo de uma nova realidade na Ve-nezuelardquo Quanto agrave possibilidade de intervenccedilatildeo Arauacutejo considerava que ldquonatildeo haacute menor expectativa de conflito mas claro que o Exeacutercito estaacute prepa-rado caso isso possa se materializarrdquo (Cronologia 2019 sp)

Na visatildeo do vice-presidente Mouratildeo que natildeo ocultava a influecircncia estadunidense a crise vene-zuelana soacute seria superada com a neutralizaccedilatildeo de agentes externos em especial a presenccedila cubana Se essa situaccedilatildeo continuasse a Venezuela correria o risco de se tornar um ldquonatildeo Estadordquo (Arauacutejo Ritt-ner e Murakawa 2019) Mouratildeo ao mesmo tempo que natildeo contemporizava com o governo Maduro indicava natildeo estar de acordo in totum com o alin-hamento com Washington nessa questatildeo ao colo-car em duacutevida a legitimidade de Juan Guaidoacute

Em relaccedilatildeo agrave China a visita de Mouratildeo e seu encontro com Xi Jiping marcaram a superaccedilatildeo de desconfianccedilas manifestadas durante a campan-ha e os meses iniciais de governo Para Mouratildeo a prioridade era restabelecer o funcionamento da Comissatildeo Sino-Brasileira de Alto Niacutevel de Concer-taccedilatildeo e Cooperaccedilatildeo (Cosban) e reorganizar sua es-trutura para que voltasse a ser um mecanismo de alto niacutevel Em sua percepccedilatildeo a China tem sido um parceiro confiaacutevel do Brasil desde 2009 ano em que se tornou seu maior parceiro comercial e no qual ocorreu a i Cuacutepula do brics Nesses dez anos de parceria estrateacutegica o fluxo comercial bilateral alcanccedilou usd$ 100 bilhotildees embora o Brasil expor-tasse muito mais produto in natura que produtos com valor agregado uma das reclamaccedilotildees que te-ria apresentado ao primeiro mandataacuterio chinecircs

A China vinha se transformando em um enor-me desafio regional e internacional para o Brasil

Em vinte anos a China transitou de ser vista como ldquoa oportunidaderdquo para ser percebida como desafio (Bernal-Meza 2014) de potencial grande merca-do para as importaccedilotildees e a exportaccedilatildeo de capitais a fazer de seus soacutecios latino-americanos periferia primaacuterio-exportadora A evoluccedilatildeo das relaccedilotildees econocircmicas entre a China e o Brasil de maneira bilateral e no acircmbito das relaccedilotildees no brics estaria sinalizando uma tendecircncia estrutural da configu-raccedilatildeo de um padratildeo de relaccedilotildees centro-periferia (Beckerman e Moncaut 2016 Becard 2017 Bernal- Meza 2019a 2019b)

O ingresso da China na economia poliacutetica da Ameacuterica do Sul deslocou o Brasil do lugar prepon-derante que ocupava dentro do bloco Mercosul e no contexto regional A respeito dos processos de integraccedilatildeo latino-americanos mdash em particu-lar do Mercosul mdash a China se transformou em um fator de profundo desequiliacutebrio porque foi se transformando no principal e segundo soacutecio mais importante da inserccedilatildeo econocircmica internacional da Ameacuterica do Sul (Hiratuka 2016 Dussel 2016) Isso afetou igualmente a posiccedilatildeo do Brasil como a principal economia para seus vizinhos No plano interno a presenccedila econocircmica chinesa parece es-tar condicionando a eventual autonomia do des-envolvimento industrial e tecnoloacutegico brasileiro ao exercer um crescente controle sobre a estrutura energeacutetica no setor eleacutetrico (Becard Lessa e Silveira 2020 Becard 2017)

A presenccedila chinesa na Ameacuterica Latina con-correu para enfraquecer a influecircncia brasileira sobre a integraccedilatildeo regional Entre os interesses brasileiros figurava a ideia de natildeo seguir a poliacuteti-ca adotada por Washington em relaccedilatildeo a algumas empresas chinesas em particular a gigante de te-lecomunicaccedilotildees Huawei Nesse sentido Mouratildeo que foi ldquoalertadordquo pelo governo norte-americano sobre os riscos das operaccedilotildees da empresa chi-nesa teria sugerido a Xi Jinping a criaccedilatildeo de um ambiente de confianccedila quanto agrave companhia ldquode modo que nenhum paiacutes que vaacute receber a empresa e a tecnologia que vocecircs vatildeo instalar e fique preocu-pado com que todos dados que estaratildeo em seu po-der pertenceratildeo tambeacutem ao governo [chinecircs] Esta eacute a discussatildeordquo (Arauacutejo et al 2019 sp) A expecta-tiva de abertura brasileira agrave tecnologia 5g chinesa

21Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

se vinculava ao fato de o paiacutes ainda natildeo estar inte-grado digitalmente e de ter um marco regulatoacuterio defasado no setor A presidecircncia brasileira passava a se posicionar de forma equidistante em relaccedilatildeo aos interesses de Washington e Pequim o que se estendia agrave poliacutetica adotada diante da guerra co-mercial entre as duas maiores economias Poucos casos ilustravam com tanta transparecircncia um dos mais importantes efeitos da transiccedilatildeo hegemocircnica em curso

Mouratildeo fora convencido pelo secretaacuterio-geral do Itamaraty Otaacutevio Brandelli quanto agrave adequa-ccedilatildeo de uma conduta flexiacutevel e pragmaacutetica Em face de uma guerra comercial dessa natureza o gover-no brasileiro deveria saber explorar as oportuni-dades Por exemplo como a administraccedilatildeo Trump taxou parcela das importaccedilotildees da China inicial-mente em torno de usd$ 250 bilhotildees os produtos envolvidos passaram a chegar mais caros no mer-cado norte-americano e eventualmente poderiam ser substituiacutedos por produtos brasileiros o que acrescentaria usd$ 5 bilhotildees ou mais nas nossas exportaccedilotildees A guerra comercial deveria assim ser tratada com paciecircncia

O limite da visatildeo do vice-presidente brasi-leiro mdash que dava vazatildeo agraves pressotildees do agrone-goacutecio mdash era evidente Temas como transferecircncia de tecnologia e cooperaccedilatildeo industrial natildeo foram abordados Indagado sobre o fato de o conflito de interesses entre Estados Unidos e China natildeo ser apenas comercial mas tambeacutem tecnoloacutegico a res-posta foi igualmente simplista ldquoVocecirc olha o 5g As quatro empresas que detecircm a tecnologia satildeo duas chinesas e duas finlandesas Cadecirc a americanardquo (Arauacutejo et al 2019 sp) Ou seja o governo bra-sileiro mdash afastadas as desconfianccedilas iniciais em relaccedilatildeo agrave China mdash voltava a se ocupar dos temas tratados em governos anteriores exportaccedilotildees de alimentos e mineacuterios investimentos diretos com geraccedilatildeo de empregos acordos de cooperaccedilatildeo em tecnologia estes uacuteltimos sem viacutenculo claro com qualquer projeto mais amplo de industrializaccedilatildeo e desenvolvimento tecnoloacutegico

O governo Bolsonaro aparentemente estava satisfeito com o status internacional do paiacutes sem atentar minimamente ao processo de desindus-trializaccedilatildeo das uacuteltimas deacutecadas (Benaion 2006

Cano 2012 Oliveira 2018) Para Chang (2018) nos anos 1980 e 1990 o Brasil conheceu o ponto mais alto da industrializaccedilatildeo que atingiu 35 da produccedilatildeo nacional No final de 2017 representa-va apenas 12 e a tendecircncia era de decliacutenio O Brasil tem nesse sentido voltado no tempo Em-presaacuterios de Satildeo Paulo natildeo parecem estar preocu-pados com o decliacutenio da induacutestria manufatureira No longo prazo essa poliacutetica eacute prejudicial para o paiacutes No governo Dilma Rousseff vaacuterios subsiacutedios foram canalizados para a induacutestria mas as altas taxas de juros natildeo favoreceram mudanccedilas efetivas (Oliveira 2018)

O processo de desindustrializaccedilatildeo as poliacuteticas econocircmicas e o conformismo com a condiccedilatildeo ldquosu-bordinadardquo do paiacutes instruiacuteram em outro momento o uso do conceito de ldquoperiferia proacutesperardquo para o crescimento econocircmico de meados da deacutecada de 2000 sustentado pela demanda chinesa (Doratioto e Vidigal 2015) As taxas de crescimento da China beneficiaram as exportaccedilotildees latino-americanas de produtos agriacutecolas mineacuterios petroacuteleo e produtos manufaturados de baixo valor agregado Conco-rreram por sua vez para reforccedilar o caraacuteter liberal perifeacuterico de economias como a brasileira (Filguei-ras e Gonccedilalves 2007)

Na poliacutetica externa era clara a intenccedilatildeo de re-duzir o peso do Itamaraty nas decisotildees relativas aos assuntos de seguranccedila e defesa fronteiras narcotraacutefico e outros delitos internacionais e imi-graccedilatildeo como no tema da crise na Venezuela e em outros assuntos sensiacuteveis na aacuterea da poliacutetica in-ternacional Quanto ao chanceler Ernesto Arauacutejo que havia impressionado negativamente a maioria dos estudiosos de poliacutetica externa e internacional em razatildeo de certo ldquomessianismordquo na defesa do Oci-dente e da administraccedilatildeo Trump passou a atuar de modo mais comedido e profissional como na ocasiatildeo da assinatura do acordo Mercosul-Uniatildeo Europeia no dia 28 de junho de 2019

Bolsonaro no final de reuniatildeo do g-20 em Osaka (28 e 29 de junho de 2019) se disse satis-feito com os resultados do encontro do brics e do proacuteprio g-20 aleacutem de destacar a importacircncia da conclusatildeo do acordo Mercosul-Uniatildeo Europeia Na reuniatildeo dos brics Bolsonaro desistiu de pro-por aos demais liacutederes o apoio a uma mudanccedila

22

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

de governo na Venezuela Foi tambeacutem a oportu-nidade para reconhecer o interesse brasileiro em manter bom diaacutelogo com o principal parceiro co-mercial do paiacutes

Os ajustes percebidos na conduccedilatildeo da poliacutetica externa natildeo significaram uma mudanccedila de rumo do governo Bolsonaro no que tange agrave priorizaccedilatildeo dos laccedilos com os Estados Unidos a Europa e o Ja-patildeo parceiros preferenciais nas deacutecadas de 1960 1970 e sob o governo de Cardoso Nesse sentido as relaccedilotildees com a China a despeito do discurso em prol de uma parceria estrateacutegica ou coisa que o valha tecircm sido tratadas de forma setorial mdash co-meacutercio investimentos cooperaccedilatildeo tecnoloacutegica mdash e descompromissada com qualquer planejamento Os laccedilos histoacutericos com os Estados Unidos em to-das as suas dimensotildees favorecem a acomodaccedilatildeo e a recusa em tratar seriamente a hipoacutetese da ldquoopccedilatildeo chinesardquo o que natildeo necessariamente eacute negativo

ConclusatildeoAs transiccedilotildees hegemocircnicas no marco da econo-mia poliacutetica mundial tecircm constituiacutedo um pro-blema externo e interno para os paiacuteses inseridos em uma relaccedilatildeo centro-periferia A ascensatildeo da China e sua presenccedila econocircmica na Ameacuterica do Sul tecircm levado alguns paiacuteses a incluiacute-la em seus caacutelculos estrateacutegicos A Argentina o Brasil e o Chile podem desempenhar um papel crucial nesse processo tendo em vista a relevacircncia geopoliacutetica e econocircmica do Cone Sul pois a polarizaccedilatildeo Es-tados Unidos-China cria janelas de oportunidade e gera maior permissibilidade no sistema interna-cional como diria Heacutelio Jaguaribe

Destacamos a identificaccedilatildeo das grandes linhas de continuidade e de ruptura que tecircm implicado o discurso do presidente Bolsonaro e dos principais colaboradores em relaccedilatildeo agrave tradiccedilatildeo da poliacutetica externa brasileira O contraponto inicial com a poliacutetica e o pensamento de Rio Branco com des-taque para as boas e privilegiadas relaccedilotildees com os Estados Unidos permitiu identificar periacuteodos de maior proximidade ou de distanciamento de Was-hington Bolsonaro estaacute proacuteximo dessa tradiccedilatildeo a de ver o Brasil como soacutecio proacuteximo dos Estados Unidos mas se afasta de praacuteticas autonomistas

como a da poliacutetica externa independente e a do pragmatismo responsaacutevel Praacuteticas essas que per-mitiriam avaliar de modo desassombrado as re-laccedilotildees com a China

Tanto a ascensatildeo da China como a posiccedilatildeo que ocupa Pequim na estrutura econocircmica brasileira planteiam desafios equivalentes ao que o Brasil ex-perimentou no comeccedilo do seacuteculo xx Agrave diferenccedila da visatildeo de Rio Branco durante a transiccedilatildeo da he-gemonia natildeo parece haver no governo de Bolsona-ro um olhar seguro sobre os impactos da transiccedilatildeo hegemocircnica nem do papel que o Brasil deveria des-empenhar na estrateacutegia global da China

Um terceiro tema de preocupaccedilatildeo eacute o das re-laccedilotildees com a Argentina A visita subsequente a Buenos Aires a assinatura do acordo para negociar um tratado de livre-comeacutercio entre o Mercosul e a Uniatildeo Europeia e o anuacutencio de que ambos os go-vernos iniciariam gestotildees conjuntas para a assina-tura de acordos de livre-comeacutercio com os Estados Unidos restabeleceram o bom diaacutelogo entre Bra-siacutelia e Buenos Aires ainda que persistam duacutevidas no governo Macri (Landim 2019) As incertezas se estenderam ao governo eleito em dezembro de 2019 em decorrecircncia de criacuteticas de natureza ideo-loacutegicas realizadas tanto por Bolsonaro quanto por Alberto Fernaacutendez Entretanto o diaacutelogo bilateral tende a se normalizar sem maiores pretensotildees no plano regional

O viacutenculo estrateacutegico entre Brasiacutelia e Buenos Aires tem sido chave para sustentar um espiacuterito de cooperaccedilatildeo e integraccedilatildeo na Ameacuterica do Sul que se baseia na credibilidade das accedilotildees e na boa feacute de uns e outros governos Desde 1985 o Brasil e a Argentina desenvolveram o que Cervo (2008) denominou de ldquorelaccedilotildees em eixordquo que se estabe-lecem ldquoquando precisamente a imagem um do outro corresponde agrave do parceiro que consegue estabelecer uma uniatildeo co-responsaacutevel [] Em outros termos o eixo comporta uma vertente exoacute-gena que o transcende porque abarca as relaccedilotildees regionais mesmo que coletivas []rdquo (pp 211-212) Eacute esse tipo de relaccedilotildees e sua projeccedilatildeo no Cone Sul que foi potencialmente afetada pelas primei-ras declaraccedilotildees e accedilotildees do governo Bolsonaro Ao promover um alinhamento com os Estados Uni-dos mdash ou ldquosem recompensardquo como diria Gerson

23Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Moura mdash reproduz o que o Brasil e outros paiacuteses latino-americanos adotaram como ldquoestrateacutegiardquo na deacutecada de 1990 sem os resultados esperados E ao abandonar a tradiccedilatildeo iniciada em 1961 e adaptada agraves diferentes conjunturas que se sucederam abriu matildeo de exercer o poder de barganha do paiacutes para fazer concessotildees sem contrapartidas equivalentes Nas circunstacircncias atuais diante da transiccedilatildeo he-gemocircnica Estados Unidos-China considerando os interesses do Brasil na Ameacuterica do Sul a equidis-tacircncia talvez seja o melhor caminho Diaacutelogo es-treito com Washington e autonomia em temas de interesse do paiacutes foram as opccedilotildees de Rio Branco

Referecircncias Arauacutejo E (2017) Trump e o Ocidente Cadernos de Poliacutetica

Exterior iii(6) 323-357

Arauacutejo E (2019 2 de janeiro) Discurso do minis-tro Ernesto Arauacutejo durante cerimocircnia de posse no Ministeacuterio das Relaccedilotildees Exteriores Brasiacutelia Re-cuperado de httpwwwitamaratygovbrpt-BRdiscursos-artigos-e-entrevistas-categoriaminis-tro-das-relacoes-exteriores-discursos19907-dis-curso-do-ministro-ernesto-araujo-durante-cerimo-nia-de-posse-no-ministerio-das-relacoes-exteriores-brasilia-2-de-janeiro-de-2019

Arauacutejo C Rittner D e Murakawa F (2019 30 de abril) Brasil descarta vetar presenccedila da Huawei em 5g avisa Mouratildeo (entrevista com o vice-presidente Hamilton Mouratildeo) g1 Recuperado de httpsvalorglobocombrasilnoticia20190607brasil-descarta-vetar-pre-senca-da-huawei-em-5g-avisa-mouraoghtml

Arrighi G (2008) Adam Smith em Pequim origens e fun-damentos do seacuteculo xxi Satildeo Paulo Brasil Boitempo

Bandeira L A M (2004) As relaccedilotildees perigosas Brasil-Es-tados Unidos Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Bra-sileira

Bandeira L A M (2003) Brasil Argentina e Estados Uni-dos da Triacuteplice Alianccedila ao Mercosul (1870-2003) Rio de Janeiro Editora Revan

Becard D (2017) China y Brasil iquestmodelo de relaciones Sur-Sur Em E Pastrana B e H Gehring (eds) La proyeccioacuten de China en Ameacuterica Latina y el Caribe (pp 387-408) Bogotaacute Colocircmbia Editorial Javeriana

Becard D Lessa A e Silveira L (2020) One step closer The politics and the economics of chinarsquos strategy in Brazil and the case of the electric power sector Em R Bernal-Meza R e X Li (eds) China-Latin America

relations in the 21st Century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 55-81) Nova York Estados Unidos Palgrave Macmillan

Becard D Barros-Platiau A e Lessa A (2019) Brazil in the brics after tem years Past present and near futu-re perspectives Em X Li (ed) The international po-litical economy of the brics (pp 135-149) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Beckerman M e Moncaut N (2016) Las relaciones en-tre China y Ameacuterica Latina iquestHacia la desestructura-cioacuten de los sistemas productivos de la regioacuten Em C Moneta e S Cesariacuten (eds) La tentacioacuten pragmaacutetica China-ArgentinaAmeacuterica Latina lo actual lo proacuteximo y lo distante (pp 185-202) Saacuteenz Pentildea Argentina Uni-versidad Nacional de Tres de Febrero

Benaion N (2006) Subordinaccedilatildeo reiterada imperialismo e desenvolvimento no Brasil Manaus Brasil Editora da Universidade Federal do Amazonas

Bernal-Meza R (2019a) Brazil as an emerging power The impact of international and internal deteriorational effect on the brics Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 118-134) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Bernal-Meza R (2019b) Brasil ascenso declinacioacuten y nuevos desafiacuteos de una potencia emergente (2003-2018) Revista Izquierdas 49(2020) 516-540

Bernal-Meza R (2015) Pensamiento chileno en la poliacuteti-ca exterior y en las teoriacuteas de relaciones internaciona-les Em M Artaza e C Ross (eds) La poliacutetica exterior de Chile 1990-2009 (pp 21-47) Santiago Chile ril Editores

Bernal-Meza R (2014) La heterogeneidad de la imagen de China en la poliacutetica exterior latinoamericana Pers-pectivas para la concertacioacuten de poliacuteticas Comentario Internacional 14 113-134

Bernal-Meza R (2013) Ameacuterica Latina en el mundo el pensamiento latino-americano y la teoriacutea de relaciones internaciones Buenos Aires Argentina Grupo Editor Latinoamericano

Bernal-Meza R (2002) A poliacutetica exterior do Brasil 1990-2002 Revista Brasileira de Poliacutetica Internacional 45(1) 36-71

Bernal-Meza R e Bizzozero L (eds) (2014) La poliacutetica internacional de Brasil de la regioacuten al mundo Monte-videacuteu Uruguai Ediciones Cruz del Sur

Bernal-Meza R e Li X (eds) (2020) China-Latin Ameri-ca relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges Nova York Estados Uni-dos Palgrave Macmillan

24

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

Bolsonaro J (2018) O caminho da prosperidade pro-posta de Plano de Governo Recuperado de httpdivulgacandcontastsejusbrcandidaturasof i-cial2018BRBR2022802018280000614517propos-ta_1534284632231pdf

Bricentildeo Ruiz J e Simonoff A (orgs) (2015) Integracioacuten y cooperacioacuten regional en Ameacuterica Latina una relectura a partir de la teoriacutea de la autonomiacutea Buenos Aires Ar-gentina Editorial Biblos

Bueno C (2003) Poliacutetica externa da Primeira Repuacuteblica os anos de apogeu (1902-1918) Satildeo Paulo Brasil Paz e Terra

Cano W (2012) A desindustrializaccedilatildeo no Brasil (texto para discussatildeo 200) Campinas Brasil Instituto de Economia da Unicamp

Cervo A L (2019 28 de novembro) Governo Bolso-naro natildeo traraacute ruptura agrave poliacutetica externa Exame Recuperado de httpsexameabrilcombrmundogoverno-bolsonaro-nao-trara-ruptura-a-politica-ex-terna-avalia-amado-cervo

Cervo A (2008) Inserccedilatildeo internacional formaccedilatildeo dos conceitos brasileiros Satildeo Paulo Brasil Saraiva

Cervo A (2002) Relaccedilotildees Internacionais do Brasil a era Cardoso Revista Brasileira de Poliacutetica Internacional 45(1) 5-35

Cervo A e Bueno C (2015) Histoacuteria da poliacutetica exterior do Brasil Brasiacutelia Brasil Editora da Universidade de Brasiacutelia

Chang H H (2018 15 jan) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da histoacuteria da economia El Paiacutes Recuperado de ht-tpsbrasilelpaiscombrasil20180105econo-mia1515177346_780498html

Cronologia relembre os fatos mais importantes da cri-se venezuelana g1 httpsg1globocommundonoticia20190430cronologia-relembre-os-fa-tos-mais-importantes-na-crise-venezuelanaghtml

Doratioto F e Vidigal C (2015) Histoacuteria das Relaccedilotildees In-ternacionais do Brasil Satildeo Paulo Brasil Editora Saraiva

Dussel Peters E (coord) (2016) La nueva relacioacuten comer-cial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestInte-gracioacuten o desintegracioacuten regional Meacutexico-df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universidades de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico

Filgueiras L e Gonccedilalves R (2007) A economia poliacutetica do governo Lula Rio de Janeiro Brasil Contraponto

Fiori J(1999) Estado e moedas no desenvolvimento das naccedilotildees Petroacutepolis Brasil Vozes

Flisfisch A (2011) La Poliacutetica exterior chilena y Ameacuterica del Sur Estudios Internacionales (168) 115-141

Fonseca Jr G (2012) Rio Branco diante do Monroiacutesmo e do Pan-Americanismo anotaccedilotildees Em M Pereira e M Gomes (orgs) Baratildeo do Rio Branco 100 anos de memoacuteria (pp 565-602) Brasiacutelia Brasil Fundaccedilatildeo Alexandre de Gusmatildeo

Franccedila T (2007) Self made nation Domiacutecio da Gama e o pragmatismo do bom senso (tese de doutorado) Brasiacute-lia Brasil Universidade de Brasiacutelia

Guimaratildees S (2018) A poliacutetica exterior e a posiccedilatildeo do Brasil no mundo Recuperado de httpswwwnodalam201812a-politica-exterior-e-a-posicao-do-brasil-no-mundo-por-samuel-pinheiro-guimaraes-2

Gullo M (2018) Relaciones internacionales una teoriacutea criacutetica desde la periferia latinoamericana Buenos Ai-res Argentina Editorial Biblos

Gullo M (2014) A subordinaccedilatildeo fundante breve histoacuteria da construccedilatildeo do poder pelas naccedilotildees Florianoacutepolis Brasil Insular

Hiratuka C (2016) Impactos de China sobre el proceso de integracioacuten regional de Mercosur Em E Dussel Peters (coord) La nueva relacioacuten comercial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestIntegracioacuten o desintegracioacuten (pp 195-243) Meacutexico df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universida-des de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico Recuperado de httpswww3ecouni-campbrNeitimagesdestaque2016_La_nueva_rela-cion_comercial_ALC_Chinapdf

Hobsbawm E (1994) Extremes The Short Twentieth Cen-tury 1914-1991 Londres Inglaterra Michael Joseph Ltd

Kennedy P (1987) The rise and fall of the great powers Economic change and military conflict from 1500 to 2000 Nova York Estados Unidos Vintage Books

Keohane R e Nye J (1977) Power and interdependence World politics in transition Boston Estados Unidos Little Brown and Company

Lafer C (2002) JK e o programa de metas (1956-1961) Rio de Janeiro Brasil Fundaccedilatildeo Getuacutelio Vargas

Landim R (2019 6 de setembro) Brasil e Argentina adiam em 9 anos livre-comeacutercio de autos Folha de S Paulo Recuperado de httpswww1folhauolcombrmerca-do201909brasil-e-argentina-adiam-em-9-anos-li-vre-comercio-de-autosshtml

Lessa A e Oliveira H A (orgs) (2013) Parcerias estra-teacutegicas do Brasil v 1 os significados e as experiecircncias tradicionais Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

25Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Li X (2020) Revisiting China-Latin America economic relations An unintended consequence of different industrialization strategies Em R Bernal-Meza e X Li (eds) China-Latin America relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 225-251) Nova York Estados UnidosLondres Inglaterra Palgrave Macmillan

Li X (2019a) Chinarsquos dual position in the capitalist world order A dual complexity of hegemony and counter-he-gemony Em Li X (ed) The international political eco-nomy of the brics (pp 1-17) Abindon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2019b) The international political economy of the brics Nova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2014) The brics and beyond The international political economy of the emergence of a new world or-der Farnham Reino Unido Ashgate

Li X (2012) China y el orden mundial capitalista el nexo de la transformacioacuten interna de China y su impacto externo Em R Bernal-Meza e S Quintanar (eds) Regionalismo y Orden Mundial Surameacuterica Europa China (pp 29-53) Buenos Aires Argentina Nuevoha-cerUniversidad Nacional del Centro de la Provincia de Buenos Aires

Li X e Farah A (eds) (2013) China-Africa relations in an era of great transformations Farnham Reino Unido Ashgate

Lins A (1996) Rio Branco (Biografia) Satildeo Paulo Brasil Editora Alfa Omega

Mandelbaum M (2010) The frugal superpower Americarsquos global leadership in a cash-strapped era Nova York Es-tados Unidos Public Affairs

Meneses E (1988) Coping with decline Chilean fo-reign policy during the twentieth century 1902-1972 Oxford Reino Unido University of OxfordBodleian Library

Nabuco J (1949) Obras completas v xii Rio de Janeiro Brasil Instituto Progresso Editorial sa

Nasr V (2014) The dispensable nation American foreign policy in retreat Nova York Estados Unidos Anchor and Doubleday

Oliveira R (2018 15 de janeiro) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da his-toacuteria da economia (entrevista com Ha-Joon Chang) El Paiacutes Recuperado de httpsbrasilelpaiscombra-sil20180105economia1515177346_780498html

Pearson F e Rochester M (2007) Relaciones internacio-nales situacioacuten global en el siglo xxi Meacutexico-df Meacute-xico Mc Graw Hill

Pecequilo C (2012) As relaccedilotildees Brasil-Estados Unidos Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

Polanyi K (1957) The great transformation the political and economic origins of our time Boston Estados Uni-dos Beacon Press

Rodrigues J Seitenfus R e Rodrigues L (orgs) (1995) Uma histoacuteria diplomaacutetica do Brasil (1531-1945) Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Brasileira

Seitenfus R (2003) O Brasil vai agrave guerra o processo de envolvimento brasileiro na Segunda Guerra Mundial 3a ed Satildeo Paulo Brasil Barueri

Spector M (2019 25 abril) Eacute hora de construir uma po-liacutetica externa poacutes-Bolsonaro Folha de S Paulo Re-cuperado de httpswww1folhauolcombr colunasmatiasspektor201904e-hora-de-construir-a-politi-ca-externa-pos-bolsonaroshtml

Stunkel O Com Bolsonaro a poliacutetica externa se tor-nou uma caixa de surpresas (entrevista agrave Deutsche Welle Brasil) Recuperado de httpswwwterracombrnoticiasbrasil com-bolsonaro-politica-ex-terna-se-tornou-uma-caixa-de-surpresas 7f6f-814287c0240a2f3f93ad aa39af65jpo4zbzghtml

Tarzi S (2007) Neorealism neoliberalism and the inter-national system International Studies (41) 115-128

Vadell J e Ramos L (2019) The role of declining Brazil and ascending China in the brics initiative Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 75-94) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Viana F L (1959) A vida do Baratildeo do Rio Branco Rio de Janeiro Brasil Joseacute Olympio

Vidigal C (2009) Relaccedilotildees Brasil-Argentina o primeiro ensaio Curitiba Brasil Juruaacute

Page 2: Bolsonaro versus Rio Branco: transição hegemônica, América ...2011/02/15  · Contra-hegemonia e ordem capitalista mundial por meio do brics, brics-plus e de outros agru-pamentos,

12

Bolsonaro versus Rio Branco transicioacuten hegemoacutenica Ameacuterica del Sur y poliacutetica externa

Resumen el artiacuteculo parte de la hipoacutetesis de una transicioacuten hegemoacutenica del poder estadounidense al chino De ahiacute es posible proponer un contrapunto de la insercioacuten internacional actual de Brasil con lo que ocurrioacute en la transicioacuten de la hegemoniacutea britaacutenica a la estadounidense con el surgimiento de desafiacuteos equivalentes a los experimentados al comienzo de la Repuacuteblica La primera parte del texto presenta la trayectoria de la poliacutetica exterior brasilentildea desde finales del siglo xix hasta la deacutecada de 1950 cuando surgieron las primeras criacuteticas al orden internacional de posguerra La segunda parte aborda el reciente proceso de globalizacioacuten la forma en que Brasil ha gestionado el ascenso de China y los avances y retrocesos en la integracioacuten sudamericana En la tercera parte se comparan la po-liacutetica exterior de Riacuteo Branco las relaciones con Gran Bretantildea los Estados Unidos y los paiacuteses latinoamericanos con la poliacutetica exterior propuesta por el gobierno de Bolsonaro y coacutemo la nueva poliacutetica se difiere de la poliacutetica exterior universalista de los gobiernos de Lula En las conclusiones se propone una hipoacutetesis prospectiva la que vislumbra escenarios internacionales y globales para el paiacutes

Palabras clave transicioacuten hegemoacutenica Rio Branco Bolsonaro China Ameacuterica del Sur

Bolsonaro versus Rio Branco Hegemonic Transition South America and Foreign Policy

Abstract The article builds on the hypothesis of a hegemonic transition from American to Chinese power Hence it proposes the transition from British to American hegemony as a counterpoint to the current international insertion of Brazil because the emerging challenges are equivalent to those experienced at the beginning of the Republic The first section presents the track record of Brazilian foreign policy from the late 19th century to the 1950s when the first criticisms of the postwar international order emerged The second section addresses the recent globali-zation process how Brazil has managed the rise of China and the advances and setbacks in South American inte-gration The third section compares the Rio Branco foreign policy and the relations with Great Britain the United States and Latin American with the foreign policy proposed by Bolsonarorsquos government It also establishes how the new policy differs from the universalist foreign policy of Lularsquos administrations Finally a prospective hypothesis is outlined which glimpses international and global scenarios for the country

Keywords Hegemonic transition Rio Branco Bolsonaro China South America

13Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Introduccedilatildeo Transiccedilotildees hegemocircnicas constituem tema relevante nos estudos internacionais Nas uacuteltimas deacutecadas dois autores que as historiaram tiveram seus estu-dos amplamente divulgados no Brasil e nos demais paiacuteses da regiatildeo Paul Kennedy (1987) abordou o impacto das transiccedilotildees como ascensatildeo e queda das grandes potecircncias abrangendo os quinhentos anos de existecircncia do sistema internacional Eric Hobsbawm (1994) estudou a transiccedilatildeo da ordem internacional mdash a qual definiu como ldquomudanccedila de eacutepocardquo mdash sob a influecircncia que tiveram a ascensatildeo e decliacutenio das potecircncias sobre a ordem internacional durante o seacuteculo xx

Na aacuterea de Teoria das Relaccedilotildees Internacionais o tema das transiccedilotildees hegemocircnicas teve lugar em uma das correntes menos privilegiadas a teoria globalista ou marxista Do ponto de vista teoacuterico o globalismo concebe as relaccedilotildees internacionais como um conjunto estruturado a partir das for-maccedilotildees socioeconocircmicas nacionais e de suas muacutel-tiplas interligaccedilotildees no plano internacional cujo conhecimento se vincula estreitamente com a aacuterea da economia poliacutetica e que permite a formulaccedilatildeo mais segura do conceito de ldquointerdependecircnciardquo (Keohane e Nye 1977 Tarzi 2007 Pearson e Ro-chester 2007)

As raiacutezes das concepccedilotildees globalistas se encon-tram na tradiccedilatildeo marxista na vertente que se es-tende de Lecircnin a Wallerstein passando por Cox Tilly e Arrighi entre outros Na Ameacuterica Latina a corrente teoacuterica que desenvolveu estudos sobre as transiccedilotildees hegemocircnicas de forma mais apropriada foi o estruturalismo com seu enfoque de econo-mia poliacutetica com as contribuiccedilotildees de Prebisch Furtado Santa Cruz Pinto e Sunkel a partir dos anos 1950 ateacute o neoestruturalismo de Tomassini Ferrer Bernal-Meza e outros nas deacutecadas finais do seacuteculo xx Naquelas anaacutelises as relaccedilotildees inter-nacionais eram compreendidas como um sistema mundial no qual as diversas partes da estrutura mdash centro e periferia ou centro semiperiferia e pe-riferia mdash estatildeo inter-relacionadas de forma fun-cional e necessaacuteria (Bernal-Meza 2013) Novos aportes de Gullo (2014 2018) e de Bricentildeo Ruiz e Simonoff (2015) somam-se a essa perspectiva

ampliando as possibilidades de compreensatildeo dos efeitos das transiccedilotildees hegemocircnicas sobre os paiacuteses latino-americanos No caso do Brasil a atual con-juntura internacional natildeo tem sido vista na litera-tura como uma transiccedilatildeo hegemocircnica mas como uma crescente globalizaccedilatildeo com desafios para a inserccedilatildeo internacional (Cervo 2008 Lessa e Oli-veira 2013)

O artigo parte da hipoacutetese ou do pressuposto de que esteja em andamento uma transiccedilatildeo he-gemocircnica do poder norte-americano para o chinecircs (Fiori 1999 Arrighi 2008 Mandelbaum 2010 Li e Farah 2013 Nasr 2014 Li 2014 2019) o que permite fazer um contraponto da atual inserccedilatildeo internacional do Brasil com a que ocorreu na tran-siccedilatildeo da hegemonia britacircnica para a norte-ame-ricana entre o fim do seacuteculo xix e o periacuteodo do entreguerras Natildeo se trata de uma abordagem sis-tecircmica mas sim da anaacutelise dos efeitos da transiccedilatildeo hegemocircnica em paiacuteses perifeacutericos no caso o Bra-sil A ascensatildeo da China marcaria o surgimento de desafios equivalentes aos experimentados no final do Impeacuterio e no iniacutecio da Repuacuteblica e equacio-nados em sua maioria nos dez anos da gestatildeo do Baratildeo do Rio Branco1 entre 1902 e 1912 (Fonseca Jr 2012)

Tomada como um pressuposto a transiccedilatildeo eacute na verdade uma hipoacutetese que se comprovaraacute ou natildeo no futuro Isso porque a China ainda natildeo eacute um ator com as capacidades de exercer uma hegemo-nia em todas as aacutereas e agendas do sistema inter-nacional Tampouco eacute o ator mais importante nem o que exerce maior poder hegemocircnico nas relaccedilotildees internacionais do Brasil Portanto o que se propotildee eacute uma hipoacutetese prospectiva de trabalho a qual vis-lumbra cenaacuterios internacionais e globais futuros

A China tem uma posiccedilatildeo dual na ordem ca-pitalista mundial uma situaccedilatildeo complexa de he-gemonia e contra-hegemonia (Li 2020 Li 2012) Contra-hegemonia e ordem capitalista mundial por meio do brics brics-plus e de outros agru-pamentos como o Consenso de Beijing (Li 2014

1 Joseacute Maria da Silva Paranhos Juacutenior filho do Visconde do Rio Branco foi nomeado Baratildeo do Rio Branco em 1888 no reinado de D Pedro II (1840-1889) Monarquista de for-maccedilatildeo Rio Branco destacou-se como diplomata no periacuteo-do republicano e foi ministro das Relaccedilotildees Exteriores

14

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

Vadell e Ramos 2019) hegemonia em suas relaccedilotildees com a semiperiferia e a periferia Ameacuterica Latina e Aacutefrica (Li e Farah 2013 Becard e Lessa 2019 Li 2020 Bernal-Meza e Li 2020)

Na primeira parte do artigo eacute apresentada a trajetoacuteria da poliacutetica exterior brasileira do final do seacuteculo xix agrave deacutecada de 1960 quando surgiram as primeiras criacuteticas agrave ordem internacional do poacutes-guerra ao sistema interamericano e agrave depen-decircncia das economias latino-americanas em re-laccedilatildeo agraves potecircncias centrais O debate que permeia essa seccedilatildeo diz respeito agrave construccedilatildeo da hegemo-nia norte-americana na Ameacuterica Latina agrave forma como o Baratildeo do Rio Branco adequou a poliacutetica exterior brasileira agrave conjuntura do iniacutecio do seacuteculo xx e sua influecircncia nas deacutecadas seguintes A se-gunda trata do recente processo de globalizaccedilatildeo de como o Brasil respondeu agrave nova conjuntura e como tem tratado de temas como a ascensatildeo da China o decliacutenio relativo dos Estados Unidos e os avanccedilos e recuos na integraccedilatildeo sul-americana nas deacutecadas iniciais do seacuteculo xxi Na terceira parte a poliacutetica externa de Rio Branco e as relaccedilotildees com a Gratilde-Bretanha com os Estados Unidos e com os paiacuteses latino-americanos satildeo comparadas com a poliacutetica externa do governo Bolsonaro aleacutem dis-so eacute avaliado como a nova poliacutetica se diferencia da poliacutetica externa universalista dos governos de Lula da Silva (Lessa e Oliveira 2013 Bernal-Meza e Bizzozero 2014 Cervo e Bueno 2015)

A questatildeo eacute a de saber se Bolsonaro ldquodesafiardquo Rio Branco ao se aproximar da potecircncia decli-nante os Estados Unidos e se afastar da potecircncia ascendente a China ainda se no acircmbito sul-ame-ricano a tendecircncia seria a de esvaziar a integraccedilatildeo regional e afirmar a ldquolideranccedilardquo brasileira ao con-traacuterio da busca do equiliacutebrio nas relaccedilotildees platinas adotadas por Rio Branco Nas consideraccedilotildees finais nossa conclusatildeo eacute uma hipoacutetese as diferenccedilas principais entre a transiccedilatildeo hegemocircnica do pas-sado e a atual mdash e que explicariam as opccedilotildees do governo Bolsonaro mdash seriam 1 os viacutenculos histoacute-ricos entre as economias as sociedades e as cultu-ras britacircnica e norte-americana em contraste com as diferenccedilas poliacuteticas sociais e culturais entre os Estados Unidos e a China 2 a proximidade geo-graacutefica econocircmica e cultural do Brasil em relaccedilatildeo

aos Estados Unidos mais forte nos dias de hoje do que 130 anos atraacutes e a distacircncia geograacutefica e cultu-ral em relaccedilatildeo agrave China 3 a dependecircncia estrutural na aacuterea de defesa o que praticamente impossibilita a ldquoopccedilatildeo chinesardquo ou a ldquoopccedilatildeo dos bricsrdquo A proxi-midade das Forccedilas Armadas brasileiras com as instituiccedilotildees similares estadunidenses a provisatildeo de equipamento militar dos Estados Unidos e de seus aliados europeus e a ausecircncia de fornecimento por parte da China inibem a possibilidade de apro-ximaccedilatildeo com a China nessa aacuterea

O recuo ao periacuteodo de Rio Branco como con-traponto agrave atual poliacutetica externa do Brasil adveacutem do fato de ele ter consolidado a transiccedilatildeo do eu-ropeiacutesmo para o americanismo nos termos pro-postos por Bueno (2003) Nesse sentido sua gestatildeo tornou-se um marco no posicionamento brasileiro diante da transiccedilatildeo hegemocircnica do Reino Unido para os Estados Unidos da Ameacuterica ilustrado pela criaccedilatildeo da primeira embaixada brasileira em Washington-dc

De Rio Branco agrave poliacutetica externa independente autonomia e permissibilidade Rio Branco concluiu no plano poliacutetico a etapa de convergecircncias entre os Estados Unidos e o Brasil iniciada com a Proclamaccedilatildeo da Repuacuteblica (1889) deste uacuteltimo Sua gestatildeo promoveu o apoio brasi-leiro agraves posiccedilotildees norte-americanas diante da Ve-nezuela em 1902 e da Colocircmbia no ano seguinte (Doratioto e Vidigal 2015) Essa poliacutetica com breves periacuteodos de distanciamento mdash durante a ldquopoliacutetica externa independenterdquo e o ldquopragmatismo ecumecircnico e responsaacutevelrdquo mdash tem sido mantida ateacute o presente Os governos do Partido dos Trabalha-dores (pt) embora tenham participado e impul-sionado o Foacuterum de Diaacutelogo entre Iacutendia Brasil e Aacutefrica do Sul (Ibas) e o brics nunca imaginaram esses agrupamentos como contra-hegemocircnicos ante os Estados Unidos o que eacute igualmente vaacutelido para os governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro

A historiografia em especial a partir dos tra-balhos de Aacutelvaro Lins (1996) e de Luiz Viana Filho (1959) convergiu em torno da ideia de que Rio

15Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Branco natildeo foi um homem de Estado que tenha se orientado pelo militarismo ou pelo imperialismo Pautado pela convicccedilatildeo nos sentimentos paciacutefi-cos dos governos aos quais serviu considerava primordial o reconhecimento pelos demais paiacute-ses sul-americanos de que o paiacutes natildeo tinha feito uso da forccedila natildeo se apresentando como potencial ameaccedila aos vizinhos entre os anos 1870 e o iniacutecio do novo seacuteculo Certamente natildeo se deve receber de maneira acriacutetica a autoimagem que Rio Branco fazia de si e dos governos brasileiros pois muitos foram os seus criacuteticos e conhecidos satildeo os atritos com o ministro argentino Estanislao Zeballos ou o jogo entre competiccedilatildeo e entente do Brasil com a Argentina e o Chile (Meneses 1988) para citar apenas um exemplo

Durante sua gestatildeo dois de seus colaboradores expressaram posicionamentos distintos um mais vinculado aos desiacutegnios de Washington outro simultaneamente criacutetico e admirador Joaquim Nabuco e Domiacutecio da Gama Para Nabuco a Dou-trina Monroe e o corolaacuterio Roosevelt significavam que os paiacuteses americanos haviam se desprendido da Europa ldquocomo a lua da terrardquo o que levou o his-toriador Joseacute Honoacuterio Rodrigues a sugerir que Na-buco tivesse por princiacutepio marchar sempre com eles ao menos sempre que possiacutevel (Nabuco 1949 Franccedila 2007) Domiacutecio da Gama afastava-se da visatildeo de Nabuco sobre a Doutrina Monroe pois a considerava carente de reciprocidade portanto em desacordo com interesses brasileiros

A poliacutetica brasileira para a Ameacuterica do Sul e na regiatildeo do Prata foi e talvez seja ainda mateacuteria con-troversa A amizade que deveria reger as relaccedilotildees com a Argentina e o Chile natildeo excluiacutea a criaccedilatildeo de um poder dissuasoacuterio por parte do Rio de Janeiro Ao lado da rivalidade tradicional entre os trecircs paiacuteses mdash excetuando talvez as relaccedilotildees Brasil-Chile mdash havia a compreensatildeo por parte do Rio de Janeiro sobre a necessidade de estabelecer relaccedilotildees amigaacute-veis no Cone Sul (Argentina Boliacutevia Chile Para-guai e Uruguai) notadamente em sua dimensatildeo geopoliacutetica

A partir de 1909 as tensotildees na regiatildeo arrefe-ceram sem que a rivalidade entre a Argentina e o Brasil saiacutesse da agenda O siacutembolo dessa aproxi-maccedilatildeo foi a frase proferida por Saacuteenz Pentildea ldquoTodo

nos une nada nos separardquo (citado por Bandeira 2003 p 125) Na conjuntura da Primeira Guerra Mundial a Argentina o Brasil e o Chile assina-ram o Tratado do abc voltado para a coordenaccedilatildeo das poliacuteticas de defesa do Cone Sul O abc natildeo foi bem-recebido nos Estados Unidos por ser poten-cialmente um contrapeso agrave sua influecircncia nem nos paiacuteses sul-americanos sob o argumento de que uma poliacutetica pan-americana natildeo deveria com-portar preponderacircncias restritas que eliminassem a ampla participaccedilatildeo dos Estados nacionais da re-giatildeo (Bandeira 2004)

Quanto agraves relaccedilotildees do Brasil com a Gratilde- Bretanha vista como ldquopotecircncia decadenterdquo estive-ram subordinadas ao decliacutenio econocircmico britacircni-co Diferentemente da Argentina cuja orientaccedilatildeo principal seguiraacute voltada para Londres ateacute a Se-gunda Guerra Mundial o Brasil priorizou os laccedilos com Washington desde a Proclamaccedilatildeo da Repuacute-blica em 1889

Desde o iniacutecio do seacuteculo xx a Gratilde-Bretanha passou a dar liberdade de accedilatildeo para os Estados Unidos no Hemisfeacuterio Ocidental explicitado por Balfour em 1903 ao afirmar que os britacircni-cos natildeo desejavam a colonizaccedilatildeo a aquisiccedilatildeo de territoacuterios ou as alteraccedilotildees no equiliacutebrio de po-der ldquoa Doutrina Monroe natildeo estava portanto em tela de juiacutezordquo (citado por Bueno 2003 p 32) A adoccedilatildeo por Londres do nihil obstat diante da presenccedila estadunidense na Ameacuterica Latina con-corria para a adoccedilatildeo de praacuteticas imperialistas por parte de Washington mas prevalecia a ideia de que era do interesse dos capitalistas britacircnicos que a potecircncia norte-americana assumisse o pa-pel de poliacutecia internacional Como destacou Po-lanyi em A grande transformaccedilatildeo (Polanyi 1957) o padratildeo-ouro e o constitucionalismo eram os instrumentos que tornaram conhecida a voz da City de Londres em muitos dos paiacuteses menores que adotaram esses siacutembolos de adesatildeo agrave nova ordem internacional No caso do Brasil a passa-gem da hegemonia britacircnica para a estadunidense se deu de forma amistosa ao longo de algumas deacutecadas ainda que natildeo isenta de momentos de desconfianccedila como nos eventos da Proclamaccedilatildeo da Repuacuteblica e nos anos iniciais do novo regime (Bueno 2003 Cervo e Bueno 2015)

16

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

O processo modernizador do Brasil nos finais do seacuteculo xix dependeu do comeacutercio com os Esta-dos Unidos pois os superaacutevits na balanccedila comercial geravam excedentes para atender amortizaccedilotildees serviccedilos de empreacutestimos britacircnicos e para custear o complexo exportador nas matildeos dos ingleses A concorrecircncia comercial entre norte-americanos e ingleses segundo Cervo estabeleceu-se no Brasil apenas em pequena escala Nessa conjuntura os Estados Unidos elevaram seu interesse no paiacutes com a intenccedilatildeo de abrir mercados e equilibrar suas contas (Cervo e Bueno 2015)

Nas deacutecadas iniciais do seacuteculo xx o Brasil es-treitou laccedilos com os Estados Unidos manteve boas relaccedilotildees econocircmicas e diplomaacuteticas com a Gratilde-Bre-tanha e atuou de forma autocircnoma nas questotildees mais delicadas das relaccedilotildees sul-americanas em especial as do Cone Sul Nas quatro deacutecadas que se seguiram agrave Primeira Guerra Mundial a poliacutetica exterior brasileira foi regida principalmente pelas demandas das relaccedilotildees com os Estados Unidos As accedilotildees ou ensaios de autonomia representados pela participaccedilatildeo brasileira nas negociaccedilotildees do poacutes-gue-rra pelo comeacutercio compensado com a Alemanha permitiriam a Getuacutelio Vargas mdash que ascendera agrave Presidecircncia na Revoluccedilatildeo de 1930 cargo no qual permaneceria ateacute 1945 mdash o exerciacutecio da ldquopoliacutetica de barganhardquo com esse paiacutes e com os Estados Unidos (Bandeira 2004 Seitenfus 2003 Cervo e Bueno 2015 Doratioto e Vidigal 2015)

Na construccedilatildeo da nova ordem mundial do se-gundo poacutes-guerra o Brasil se alinhou aos Estados Unidos na Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (onu) e no processo de construccedilatildeo do Sistema Interame-ricano Durante os governos Dutra Vargas Cafeacute Filho e os anos iniciais de Kubitschek o Brasil procurou buscar recursos financeiros e tecnoloacute-gicos junto aos Estados Unidos para a promoccedilatildeo do desenvolvimento econocircmico Das primei-ras conferecircncias interamericanas do poacutes-guerra (Chapultepec Rio de Janeiro Bogotaacute) ateacute 1958 estabeleceu-se um diaacutelogo de surdos enquanto o Brasil no que foi acompanhado pela maioria dos paiacuteses latino-americanos reivindicava uma defi-niccedilatildeo expliacutecita por parte de Washington quanto aos aportes a serem feitos na regiatildeo o governo norte-americano cobrava compromisso com as

instituiccedilotildees internacionais com os preceitos da Guerra Fria e com as necessidades impostas pela aacuterea de seguranccedila O resultado foi o crescente des-conforto das lideranccedilas poliacuteticas latino-america-nas diante da atitude reticente de Washington e do anti-americanismo em alguns paiacuteses

Em maio de 1958 por ocasiatildeo da viagem do vice- presidente Nixon ao Peru e agrave Venezuela o governo americano percebeu a dimensatildeo da insatisfaccedilatildeo dos paiacuteses sul-americanos com o tratamento que Was-hington vinha dispensando agraves suas demandas e a necessidade de rever sua poliacutetica para a regiatildeo Entre os desdobramentos da visita de Nixon destacou-se a iniciativa do presidente Kubitschek de escrever a Eisenhower propondo um esforccedilo conjunto de cooperaccedilatildeo econocircmica dos paiacuteses americanos em prol de projetos nacionais de desenvolvimento logo denominada ldquoOperaccedilatildeo Pan-Americanardquo (Cervo e Bueno 2015 Cervo 2008 Lafer 2002) Diante do novo quadro na poliacutetica regional o governo norte-americano levou o debate para o acircmbito do Conselho Econocircmico e Social da Organizaccedilatildeo dos Estados Americanos (oea) onde foi criado o Comitecirc dos 21 encarregado de gerir a implementaccedilatildeo da opa2 Os trabalhos realizados no Comitecirc permitem identificar uma poliacutetica protelatoacuteria por parte da representaccedilatildeo norte-americana com o intuito de esvaziar o conteuacutedo ldquodesenvolvimentistardquo da pro-posta brasileira em favor de uma visatildeo essencial-mente assistencialista (Vidigal 2009)

A poliacutetica externa de Jacircnio Quadros autointi-tulada ldquoPoliacutetica Externa Independenterdquo procurou superar os constrangimentos das deacutecadas anterio-res por meio de uma orientaccedilatildeo que priorizava a expansatildeo do comeacutercio e a diversificaccedilatildeo dos laccedilos internacionais o estabelecimento de relaccedilotildees di-plomaacuteticas com paiacuteses socialistas a luta contra o subdesenvolvimento e o empenho em favor da in-tegraccedilatildeo econocircmica regional sem romper com a posiccedilatildeo tradicional do Brasil em outros pontos da agenda internacional como o respeito ao ldquomundo livrerdquo agrave oea e agrave onu

2 Iniciativa do governo Juscelino Kubitschek junto agrave ad-ministraccedilatildeo de Eisenhower incorporada agrave oea que objetivava a promoccedilatildeo do desenvolvimento dos paiacuteses latino-americanos com o apoio dos Estados Unidos da Ameacuterica

17Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Da autonomia dos anos 2000 ao ldquonovo alinhamentordquo Embora Lula tenha incentivado e participado de alianccedilas contra-hegemocircnicas no acircmbito da eco-nomia poliacutetica internacional como o Ibas e o brics natildeo se pode afirmar que ele ou sua suces-sora Dilma Rousseff tenha desenvolvido uma po-liacutetica internacional contraacuteria aos Estados Unidos (Pecequilo 2012 Cervo e Bueno 2015) Sempre se tratou de relaccedilotildees ldquocentraisrdquo ou ldquocruciaisrdquo para o Brasil mas tambeacutem de grande assimetria Para o Brasil pensar nos Estados Unidos eacute pensar em sua poliacutetica exterior (Pecequilo 2012) como uma ldquoparceria estrateacutegicardquo que influencia as estruturas socioeconocircmicas do paiacutes ao longo do tempo (Cer-vo 2008) Essa tradiccedilatildeo que remonta a Rio Branco apresentou-se na trajetoacuteria histoacuterica do paiacutes como parceria estrateacutegica em alguns momentos ou como alinhamento em outros

A poliacutetica externa do pt se caracterizou pelo multilateralismo e pelo fortalecimento e cons-truccedilatildeo de parcerias estrateacutegicas O que diferencia esse passado com a etapa iniciada com a presidecircn-cia de Bolsonaro talvez seja a adesatildeo agrave poliacutetica de rechaccedilo do globalismo e do multilateralismo

O governo Bolsonaro comeccedilou a aproximar-se dos Estados Unidos por meio de ideias mdash expres-sas pela visatildeo do ministro Ernesto Arauacutejo mdash e de accedilotildees Durante a campanha e nos primeiros me-ses de governo manifestaccedilotildees do Presidente de seu filho Eduardo e de um dos mentores de seu projeto Olavo de Carvalho demonstravam que o estreitamento dos laccedilos com Washington era mais o resultado de contatos com grupos poliacuteticos norte-americanos simpatizantes de Trump do que fruto de um entendimento poliacutetico consistente

Bolsonaro introduziu cinco mudanccedilas na po-liacutetica externa sul-americana do Brasil em com-paraccedilatildeo ao periacuteodo 2003-2016 1 recolocou o paiacutes em uma relaccedilatildeo estreita agrave poliacutetica exterior norte--americana 2 retirou seu apoio e logo comeccedilou a incentivar mdash juntamente com o presidente chileno Pintildeera mdash um novo agrupamento para substituir a Uniatildeo de Naccedilotildees Sul-Americanas (Unasul) 3 abandonou o respaldo poliacutetico ao governo vene-zuelano identificando-o como a principal ameaccedila

para a seguranccedila e estabilidade da regiatildeo 4 pas-sou a tratar o Mercado Comum do Sul (Mercosul) como um tema secundaacuterio na agenda 5 reduziu a prioridade que Brasiacutelia mdash desde 1985 mdash atribuiacutea a Buenos Aires em favor do Chile primeiro paiacutes a ser visitado pelo novo presidente

Qual poderia ser a explicaccedilatildeo de colocar o Chile como o primeiro paiacutes a visitar Sinalizar que foi devido agrave sintonia poliacutetica natildeo o explica posto que Macri eacute tatildeo liberal quanto Pintildeera Eacute possiacutevel entatildeo Bolsonaro tenha tentado retomar a visatildeo que Rio Branco tinha em relaccedilatildeo ao Cone Sul e buscar uma nova aproximaccedilatildeo com o Chile O Brasil e o Chile compartilham hoje uma posiccedilatildeo criacutetica a respeito do regionalismo poliacutetico sul-americano em par-ticular sobre a Unasul mas a Argentina tambeacutem Entretanto o imaginaacuterio do Chile em relaccedilatildeo a pa-radigmas e visotildees sobre o sistema internacional eacute distinto do brasileiro Satildeo dois paiacuteses com capaci-dades atributos e recursos de poder enormemente diferentes Em parte o modelo de inserccedilatildeo inter-nacional e seus instrumentos satildeo semelhantes em ambos os paiacuteses a visatildeo ideal do tipo de Estado a internacionalizaccedilatildeo da economia e o papel das empresas assim como papel que desempenha o capital privado Mas tambeacutem grandes diferenccedilas o Brasil tem uma histoacuterica vocaccedilatildeo industrialista mdash que natildeo existe atualmente no Chile mdash e uma aspiraccedilatildeo a concertar internamente os diversos segmentos e recursos de poder induacutestria ciecircncia e teacutecnica pesquisa e desenvolvimento papel do mercado interno de consumo e outros todas ques-totildees que satildeo muito relativas no modelo chileno

O Brasil eacute um global trader que se pensou glo-bal player cujos interesses satildeo tanto econocircmicos como poliacuteticos e sugerem a aspiraccedilatildeo a uma par-ticipaccedilatildeo influente na tomada de decisotildees no siste-ma internacional e nos organismos internacionais Na interpretaccedilatildeo de Cervo e Bueno esta foi a he-ranccedila dos dois governos de Lula a de desempe-nhar o papel que era devido no acircmbito hemisfeacuterico e no cenaacuterio internacional (Cervo e Bueno 2015) O Brasil pressupunha que seus vizinhos regionais reconhecessem a priori suas condiccedilotildees de lide-ranccedila e hegemonia sob um soft power Poreacutem nos anos recentes sob os governos da Concertaccedilatildeo o Chile buscou colocar-se como modelo de inserccedilatildeo

18

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

regional e tem procurado disputar com o Brasil essa condiccedilatildeo de lideranccedila natural (Bernal-Meza 2015 Flisfisch 2011)

Provavelmente a decisatildeo de visitar primeira-mente o Chile tenha sido resultado da influecircncia do ministro da Economia Paulo Guedes Egresso do curso de Economia da Universidade de Chicago e admirador do liberalismo e do ldquomodelordquo chileno Guedes teceu elogios ao Chile em diversas ocasiotildees em visatildeo superficial sobre o sucesso econocircmico da-quele modelo e a viabilidade de aplicaacute-lo ao Brasil de hoje Ademais somou-se aos criacuteticos da Unasul e da poliacutetica de contemporizaccedilatildeo com Caracas

Segundo o embaixador Pinheiro Guimaratildees secretaacuterio-geral do Ministeacuterio das Relaccedilotildees Ex-teriores (mre tambeacutem chamado de ldquoItamaratyrdquo) durante os governos de Lula essas posiccedilotildees jaacute tin-ham antecedentes

no periacuteodo de Michel Temer o Brasil se juntou aos paiacuteses da Alianccedila do Paciacutefico e aos paiacuteses do Grupo de Lima contra a Venezuela infringindo os prin-ciacutepios de autodeterminaccedilatildeo e de natildeo intervenccedilatildeo gerando desconfianccedilas e ressentimentos no esforccedilo de agradar aos Estados Unidos em sua campanha para derrubar o governo venezuelanordquo (Guimaratildees 2018 sp)

No discurso de posse o ministro das Relaccedilotildees Exteriores pocircs a figura do presidente Bolsonaro como um libertador do Brasil e definiu a nova etapa da poliacutetica exterior como aquela que se libertava do passado Em suas palavras ldquoo presidente Bolso-naro estaacute libertando o Brasil por meio da verdade Noacutes vamos tambeacutem libertar a poliacutetica externa va-mos libertar o Itamaraty como o presidente Bolso-naro prometeu que fariacuteamos em seu discurso da vitoacuteriardquo (Arauacutejo 2019 sp)

Segundo Cervo (2019) Bolsonaro e Cardoso coincidem

os dois presidentes tecircm uma visatildeo de mundo e da inserccedilatildeo internacional do Brasil semelhante satildeo li-berais nesse sentido inovadores relativamente ao periacuteodo anterior a seus mandatos de governos mais nacionalistas e introspectivos Isso significa para a poliacutetica exterior um novo ciclo de abertura da eco-nomia a empreendimentos capitais e tecnologias vindas de forardquo (sp)

Para Cervo (2002) natildeo haveria ruptura na poliacute-tica exterior porque ela apresenta haacute seacuteculos trecircs traccedilos que compotildeem a estrateacutegia brasileira de longo prazo universalismo cooperaccedilatildeo e pacifismo Mas haacute que se recordar daquelas diretrizes que marca-ram a poliacutetica externa de Cardoso (Bernal-Meza 2002) Nesse sentido eacute possiacutevel que o viacutenculo com os Estados Unidos e as potecircncias do capitalismo central o apoio agraves instituiccedilotildees de governanccedila glo-bal sustentada pela hegemonia norte-americana e a posiccedilatildeo a favor do Ocidente ante os conflitos mundiais bem como o suposto enfrentamento ci-vilizatoacuterio deixem para traacutes o que Bandeira (2004) denominou de ldquorelaccedilotildees perigosasrdquo

O americanismo do governo Bolsonaro entre-tanto parece desmentir Cervo ou seja concilia o alinhamento poliacutetico aos Estados Unidos com a repulsa ao universalismo e mesmo agrave cooperaccedilatildeo e ao pacifismo O chanceler Ernesto Arauacutejo elogia Trump como ldquoum cavalheiro cruzado que luta para resgatar a identidade do Ocidenterdquo Para Arauacutejo (2017) Trump e sua poliacutetica internacional repre-sentam a disposiccedilatildeo para uma luta global para re-cuperar o passado simboacutelico que tem representado a histoacuteria e a cultura das naccedilotildees ocidentais para a sobrevivecircncia e o domiacutenio do Ocidente

Um grande questionamento eacute o que aconteceraacute com o papel que a poliacutetica exterior brasileira tem desempenhado na regiatildeo e se ela retornaraacute agrave dispo-siccedilatildeo para a lideranccedila que marcou o periacuteodo Lula ou se deixaraacute nas matildeos de potecircncias secundaacuterias mdash como o Chile mdash essa posiccedilatildeo o paiacutes que Bolso-naro considera um modelo No plano da poliacutetica internacional um posicionamento em linha com a poliacutetica de Trump poderia ter grandes impactos Uma maior aproximaccedilatildeo mdash ou coincidecircncias mdash com a poliacutetica de Washington afastaria o Brasil de sua tendecircncia mais tradicional a da autonomia mdash cujo efeito seria um afastamento relativo do brics e a predisposiccedilatildeo do presidente Bolsonaro a resta-belecer uma relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo militar com os Estados Unidos (Cervo 2019) o que despertaria na regiatildeo velhos temores mdash nunca esquecidos mdash so-bre o subimperialismo brasileiro

Haacute que se considerar nesses aspectos que a poliacutetica externa do governo Bolsonaro tem sido in-formada por diferentes grupos de interesse o que

19Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

resulta muitas vezes em uma praacutetica erraacutetica in-consistente e excessivamente ideoloacutegica (Stunkel 2019 Spector 2019) Diferentemente de outras si-tuaccedilotildees semelhantes mdash Dutra Castelo Branco ou Collor mdash desta feita o Itamaraty natildeo atuou como contraponto agrave presidecircncia alimentando muitas vezes o discurso ideoloacutegico

Bolsonaro e Trump parecem ter muitos pontos em comum Entre as coincidecircncias mais delicadas estaacute seu rechaccedilo ao ldquoglobalismordquo3 o que revela que ambos os presidentes estatildeo dispostos a depreciar o que as diplomacias de seus proacuteprios paiacuteses cons-truiacuteram sob o sistema internacional contemporacirc-neo a criaccedilatildeo e fortalecimento das organizaccedilotildees internacionais o sistema das Naccedilotildees Unidas e as negociaccedilotildees mundiais sobre assuntos que impor-tavam agrave sociedade internacional Accedilotildees que se plasmaram em temas e agendas globais como o meio ambiente e a mudanccedila climaacutetica Ambas se-riam tendecircncias de mudanccedila profunda que impac-tariam todo o cenaacuterio latino-americano O mais preocupante eacute imaginar o Brasil imerso em um enfrentamento a respeito do papel do Ocidente na defesa da chamada ldquocultura ocidentalrdquo posto que ela tem sido o instrumento mais importante do co-lonialismo e da dominaccedilatildeo das potecircncias ociden-tais sobre a periferia do mundo

O que parecia ser manifestaccedilotildees de desinte-resse (ao menos) a respeito de seu soacutecio estrateacute-gico sul-americano Bolsonaro ao natildeo incluir a Argentina em sua primeira viagem ao exterior e as declaraccedilotildees de seu ministro da Economia a respeito do Mercosul o que indicava que este natildeo seria uma prioridade para o Brasil pode trazer consequecircncias negativas para as relaccedilotildees sul-ame-ricanas Deve-se recordar que a base de qualquer entendimento de cooperaccedilatildeo governanccedila re-gional e continuidade para fazer da regiatildeo uma

3 ldquoGlobalismordquo em sentido pejorativo foi o termo utilizado por Bolsonaro e por seus principais auxiliares para cri-ticar nos meses iniciais de seu governo as poliacuteticas de inserccedilatildeo do Brasil no cenaacuterio global por meio de uma par-ticipaccedilatildeo proativa em foros multilaterais e nos debates sobre os temas mais sensiacuteveis da agenda internacional Argumento apresentado pelo ministro Arauacutejo em seu dis-curso de posse por meio de uma obviedade ldquoNatildeo estamos aqui para trabalhar pela ordem global Aqui eacute o Brasilrdquo (Arauacutejo 2019 sp)

zona militarmente desnuclearizada passa por uma relaccedilatildeo cordial entre o Brasil e a Argentina A construccedilatildeo de uma ldquozona de pazrdquo no Atlacircntico Sul por meio da superaccedilatildeo das hipoacuteteses de con-flito entre a Argentina e o Chile tem se baseado na continuidade dessa relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo A partir dessas perspectivas a presidecircncia Bolso-naro natildeo soacute implicaria o retorno da Ameacuterica do Sul agraves concepccedilotildees ideoloacutegicas radicalizadas que se supunham superadas que incluem novos viacutenculos estreitos em mateacuteria de seguranccedila com os Estados Unidos mas tambeacutem o iniacutecio de uma etapa de in-certeza na regiatildeo

Alinhamento com Washington incertezas quanto a PequimO alinhamento com Washington agrave eacutepoca de Rio Branco seguia um roteiro previsiacutevel diante da potecircncia ascendente a adesatildeo aos princiacutepios do Direito Internacional a incorporaccedilatildeo acriacutetica do conceito de ldquobom governordquo e a convicccedilatildeo de que o progresso da naccedilatildeo dependia dos desiacutegnios do norte Nada parecido se via em relaccedilatildeo a Londres que ainda conservava o status de principal centro financeiro internacional mas que perdia impor-tacircncia no intercacircmbio de mercadorias Mais de um seacuteculo depois o novo alinhamento mdash e este eacute o contraponto que se mencionou na introduccedilatildeo mdash manteacutem o principal das relaccedilotildees internacionais do paiacutes voltado para os Estados Unidos De acordo com a hipoacutetese de trabalho inicial a de estarmos em meio a uma transiccedilatildeo hegemocircnica dos Estados Unidos para a China Bolsonaro estaria em dis-sonacircncia com Rio Branco

Os primeiros meses de 2019 revelaram que o governo Bolsonaro sustentava na poliacutetica externa o principal das promessas de campanha acompa-nhadas do mote ldquoo Brasil acima de tudordquo Inspira-do no governo de Trump o discurso de supremacia contrastava com o silecircncio diante da poliacutetica pro-tecionista de Washington que elevara a tarifa para a importaccedilatildeo do accedilo e subsidiava a produccedilatildeo de soja ambas as medidas prejudiciais para os inte-resses brasileiros Ante eventuais perdas setoriais o governo seguia fiel ao princiacutepio do alinhamento em dissonacircncia com o legado de Rio Branco

20

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

A crise na Venezuela e os interesses econocircmi-cos do agronegoacutecio no mercado chinecircs levariam o governo a modificar em parte a retoacuterica inicial o que indicaria estar em curso ajustes e reorientaccedilotildees na aacuterea No dia 23 de fevereiro o autoproclamado presidente interino da Venezuela Juan Guaidoacute liderou um esforccedilo de tentar fazer com que ca-minhotildees com alimentos adentrassem a Venezue-la como forma de pressionar o governo Maduro Em Pacaraima o chanceler brasileiro explicava se tratar de um ato humanitaacuterio altruiacutesta ldquoum mo-mento de criaccedilatildeo de uma nova realidade na Ve-nezuelardquo Quanto agrave possibilidade de intervenccedilatildeo Arauacutejo considerava que ldquonatildeo haacute menor expectativa de conflito mas claro que o Exeacutercito estaacute prepa-rado caso isso possa se materializarrdquo (Cronologia 2019 sp)

Na visatildeo do vice-presidente Mouratildeo que natildeo ocultava a influecircncia estadunidense a crise vene-zuelana soacute seria superada com a neutralizaccedilatildeo de agentes externos em especial a presenccedila cubana Se essa situaccedilatildeo continuasse a Venezuela correria o risco de se tornar um ldquonatildeo Estadordquo (Arauacutejo Ritt-ner e Murakawa 2019) Mouratildeo ao mesmo tempo que natildeo contemporizava com o governo Maduro indicava natildeo estar de acordo in totum com o alin-hamento com Washington nessa questatildeo ao colo-car em duacutevida a legitimidade de Juan Guaidoacute

Em relaccedilatildeo agrave China a visita de Mouratildeo e seu encontro com Xi Jiping marcaram a superaccedilatildeo de desconfianccedilas manifestadas durante a campan-ha e os meses iniciais de governo Para Mouratildeo a prioridade era restabelecer o funcionamento da Comissatildeo Sino-Brasileira de Alto Niacutevel de Concer-taccedilatildeo e Cooperaccedilatildeo (Cosban) e reorganizar sua es-trutura para que voltasse a ser um mecanismo de alto niacutevel Em sua percepccedilatildeo a China tem sido um parceiro confiaacutevel do Brasil desde 2009 ano em que se tornou seu maior parceiro comercial e no qual ocorreu a i Cuacutepula do brics Nesses dez anos de parceria estrateacutegica o fluxo comercial bilateral alcanccedilou usd$ 100 bilhotildees embora o Brasil expor-tasse muito mais produto in natura que produtos com valor agregado uma das reclamaccedilotildees que te-ria apresentado ao primeiro mandataacuterio chinecircs

A China vinha se transformando em um enor-me desafio regional e internacional para o Brasil

Em vinte anos a China transitou de ser vista como ldquoa oportunidaderdquo para ser percebida como desafio (Bernal-Meza 2014) de potencial grande merca-do para as importaccedilotildees e a exportaccedilatildeo de capitais a fazer de seus soacutecios latino-americanos periferia primaacuterio-exportadora A evoluccedilatildeo das relaccedilotildees econocircmicas entre a China e o Brasil de maneira bilateral e no acircmbito das relaccedilotildees no brics estaria sinalizando uma tendecircncia estrutural da configu-raccedilatildeo de um padratildeo de relaccedilotildees centro-periferia (Beckerman e Moncaut 2016 Becard 2017 Bernal- Meza 2019a 2019b)

O ingresso da China na economia poliacutetica da Ameacuterica do Sul deslocou o Brasil do lugar prepon-derante que ocupava dentro do bloco Mercosul e no contexto regional A respeito dos processos de integraccedilatildeo latino-americanos mdash em particu-lar do Mercosul mdash a China se transformou em um fator de profundo desequiliacutebrio porque foi se transformando no principal e segundo soacutecio mais importante da inserccedilatildeo econocircmica internacional da Ameacuterica do Sul (Hiratuka 2016 Dussel 2016) Isso afetou igualmente a posiccedilatildeo do Brasil como a principal economia para seus vizinhos No plano interno a presenccedila econocircmica chinesa parece es-tar condicionando a eventual autonomia do des-envolvimento industrial e tecnoloacutegico brasileiro ao exercer um crescente controle sobre a estrutura energeacutetica no setor eleacutetrico (Becard Lessa e Silveira 2020 Becard 2017)

A presenccedila chinesa na Ameacuterica Latina con-correu para enfraquecer a influecircncia brasileira sobre a integraccedilatildeo regional Entre os interesses brasileiros figurava a ideia de natildeo seguir a poliacuteti-ca adotada por Washington em relaccedilatildeo a algumas empresas chinesas em particular a gigante de te-lecomunicaccedilotildees Huawei Nesse sentido Mouratildeo que foi ldquoalertadordquo pelo governo norte-americano sobre os riscos das operaccedilotildees da empresa chi-nesa teria sugerido a Xi Jinping a criaccedilatildeo de um ambiente de confianccedila quanto agrave companhia ldquode modo que nenhum paiacutes que vaacute receber a empresa e a tecnologia que vocecircs vatildeo instalar e fique preocu-pado com que todos dados que estaratildeo em seu po-der pertenceratildeo tambeacutem ao governo [chinecircs] Esta eacute a discussatildeordquo (Arauacutejo et al 2019 sp) A expecta-tiva de abertura brasileira agrave tecnologia 5g chinesa

21Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

se vinculava ao fato de o paiacutes ainda natildeo estar inte-grado digitalmente e de ter um marco regulatoacuterio defasado no setor A presidecircncia brasileira passava a se posicionar de forma equidistante em relaccedilatildeo aos interesses de Washington e Pequim o que se estendia agrave poliacutetica adotada diante da guerra co-mercial entre as duas maiores economias Poucos casos ilustravam com tanta transparecircncia um dos mais importantes efeitos da transiccedilatildeo hegemocircnica em curso

Mouratildeo fora convencido pelo secretaacuterio-geral do Itamaraty Otaacutevio Brandelli quanto agrave adequa-ccedilatildeo de uma conduta flexiacutevel e pragmaacutetica Em face de uma guerra comercial dessa natureza o gover-no brasileiro deveria saber explorar as oportuni-dades Por exemplo como a administraccedilatildeo Trump taxou parcela das importaccedilotildees da China inicial-mente em torno de usd$ 250 bilhotildees os produtos envolvidos passaram a chegar mais caros no mer-cado norte-americano e eventualmente poderiam ser substituiacutedos por produtos brasileiros o que acrescentaria usd$ 5 bilhotildees ou mais nas nossas exportaccedilotildees A guerra comercial deveria assim ser tratada com paciecircncia

O limite da visatildeo do vice-presidente brasi-leiro mdash que dava vazatildeo agraves pressotildees do agrone-goacutecio mdash era evidente Temas como transferecircncia de tecnologia e cooperaccedilatildeo industrial natildeo foram abordados Indagado sobre o fato de o conflito de interesses entre Estados Unidos e China natildeo ser apenas comercial mas tambeacutem tecnoloacutegico a res-posta foi igualmente simplista ldquoVocecirc olha o 5g As quatro empresas que detecircm a tecnologia satildeo duas chinesas e duas finlandesas Cadecirc a americanardquo (Arauacutejo et al 2019 sp) Ou seja o governo bra-sileiro mdash afastadas as desconfianccedilas iniciais em relaccedilatildeo agrave China mdash voltava a se ocupar dos temas tratados em governos anteriores exportaccedilotildees de alimentos e mineacuterios investimentos diretos com geraccedilatildeo de empregos acordos de cooperaccedilatildeo em tecnologia estes uacuteltimos sem viacutenculo claro com qualquer projeto mais amplo de industrializaccedilatildeo e desenvolvimento tecnoloacutegico

O governo Bolsonaro aparentemente estava satisfeito com o status internacional do paiacutes sem atentar minimamente ao processo de desindus-trializaccedilatildeo das uacuteltimas deacutecadas (Benaion 2006

Cano 2012 Oliveira 2018) Para Chang (2018) nos anos 1980 e 1990 o Brasil conheceu o ponto mais alto da industrializaccedilatildeo que atingiu 35 da produccedilatildeo nacional No final de 2017 representa-va apenas 12 e a tendecircncia era de decliacutenio O Brasil tem nesse sentido voltado no tempo Em-presaacuterios de Satildeo Paulo natildeo parecem estar preocu-pados com o decliacutenio da induacutestria manufatureira No longo prazo essa poliacutetica eacute prejudicial para o paiacutes No governo Dilma Rousseff vaacuterios subsiacutedios foram canalizados para a induacutestria mas as altas taxas de juros natildeo favoreceram mudanccedilas efetivas (Oliveira 2018)

O processo de desindustrializaccedilatildeo as poliacuteticas econocircmicas e o conformismo com a condiccedilatildeo ldquosu-bordinadardquo do paiacutes instruiacuteram em outro momento o uso do conceito de ldquoperiferia proacutesperardquo para o crescimento econocircmico de meados da deacutecada de 2000 sustentado pela demanda chinesa (Doratioto e Vidigal 2015) As taxas de crescimento da China beneficiaram as exportaccedilotildees latino-americanas de produtos agriacutecolas mineacuterios petroacuteleo e produtos manufaturados de baixo valor agregado Conco-rreram por sua vez para reforccedilar o caraacuteter liberal perifeacuterico de economias como a brasileira (Filguei-ras e Gonccedilalves 2007)

Na poliacutetica externa era clara a intenccedilatildeo de re-duzir o peso do Itamaraty nas decisotildees relativas aos assuntos de seguranccedila e defesa fronteiras narcotraacutefico e outros delitos internacionais e imi-graccedilatildeo como no tema da crise na Venezuela e em outros assuntos sensiacuteveis na aacuterea da poliacutetica in-ternacional Quanto ao chanceler Ernesto Arauacutejo que havia impressionado negativamente a maioria dos estudiosos de poliacutetica externa e internacional em razatildeo de certo ldquomessianismordquo na defesa do Oci-dente e da administraccedilatildeo Trump passou a atuar de modo mais comedido e profissional como na ocasiatildeo da assinatura do acordo Mercosul-Uniatildeo Europeia no dia 28 de junho de 2019

Bolsonaro no final de reuniatildeo do g-20 em Osaka (28 e 29 de junho de 2019) se disse satis-feito com os resultados do encontro do brics e do proacuteprio g-20 aleacutem de destacar a importacircncia da conclusatildeo do acordo Mercosul-Uniatildeo Europeia Na reuniatildeo dos brics Bolsonaro desistiu de pro-por aos demais liacutederes o apoio a uma mudanccedila

22

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

de governo na Venezuela Foi tambeacutem a oportu-nidade para reconhecer o interesse brasileiro em manter bom diaacutelogo com o principal parceiro co-mercial do paiacutes

Os ajustes percebidos na conduccedilatildeo da poliacutetica externa natildeo significaram uma mudanccedila de rumo do governo Bolsonaro no que tange agrave priorizaccedilatildeo dos laccedilos com os Estados Unidos a Europa e o Ja-patildeo parceiros preferenciais nas deacutecadas de 1960 1970 e sob o governo de Cardoso Nesse sentido as relaccedilotildees com a China a despeito do discurso em prol de uma parceria estrateacutegica ou coisa que o valha tecircm sido tratadas de forma setorial mdash co-meacutercio investimentos cooperaccedilatildeo tecnoloacutegica mdash e descompromissada com qualquer planejamento Os laccedilos histoacutericos com os Estados Unidos em to-das as suas dimensotildees favorecem a acomodaccedilatildeo e a recusa em tratar seriamente a hipoacutetese da ldquoopccedilatildeo chinesardquo o que natildeo necessariamente eacute negativo

ConclusatildeoAs transiccedilotildees hegemocircnicas no marco da econo-mia poliacutetica mundial tecircm constituiacutedo um pro-blema externo e interno para os paiacuteses inseridos em uma relaccedilatildeo centro-periferia A ascensatildeo da China e sua presenccedila econocircmica na Ameacuterica do Sul tecircm levado alguns paiacuteses a incluiacute-la em seus caacutelculos estrateacutegicos A Argentina o Brasil e o Chile podem desempenhar um papel crucial nesse processo tendo em vista a relevacircncia geopoliacutetica e econocircmica do Cone Sul pois a polarizaccedilatildeo Es-tados Unidos-China cria janelas de oportunidade e gera maior permissibilidade no sistema interna-cional como diria Heacutelio Jaguaribe

Destacamos a identificaccedilatildeo das grandes linhas de continuidade e de ruptura que tecircm implicado o discurso do presidente Bolsonaro e dos principais colaboradores em relaccedilatildeo agrave tradiccedilatildeo da poliacutetica externa brasileira O contraponto inicial com a poliacutetica e o pensamento de Rio Branco com des-taque para as boas e privilegiadas relaccedilotildees com os Estados Unidos permitiu identificar periacuteodos de maior proximidade ou de distanciamento de Was-hington Bolsonaro estaacute proacuteximo dessa tradiccedilatildeo a de ver o Brasil como soacutecio proacuteximo dos Estados Unidos mas se afasta de praacuteticas autonomistas

como a da poliacutetica externa independente e a do pragmatismo responsaacutevel Praacuteticas essas que per-mitiriam avaliar de modo desassombrado as re-laccedilotildees com a China

Tanto a ascensatildeo da China como a posiccedilatildeo que ocupa Pequim na estrutura econocircmica brasileira planteiam desafios equivalentes ao que o Brasil ex-perimentou no comeccedilo do seacuteculo xx Agrave diferenccedila da visatildeo de Rio Branco durante a transiccedilatildeo da he-gemonia natildeo parece haver no governo de Bolsona-ro um olhar seguro sobre os impactos da transiccedilatildeo hegemocircnica nem do papel que o Brasil deveria des-empenhar na estrateacutegia global da China

Um terceiro tema de preocupaccedilatildeo eacute o das re-laccedilotildees com a Argentina A visita subsequente a Buenos Aires a assinatura do acordo para negociar um tratado de livre-comeacutercio entre o Mercosul e a Uniatildeo Europeia e o anuacutencio de que ambos os go-vernos iniciariam gestotildees conjuntas para a assina-tura de acordos de livre-comeacutercio com os Estados Unidos restabeleceram o bom diaacutelogo entre Bra-siacutelia e Buenos Aires ainda que persistam duacutevidas no governo Macri (Landim 2019) As incertezas se estenderam ao governo eleito em dezembro de 2019 em decorrecircncia de criacuteticas de natureza ideo-loacutegicas realizadas tanto por Bolsonaro quanto por Alberto Fernaacutendez Entretanto o diaacutelogo bilateral tende a se normalizar sem maiores pretensotildees no plano regional

O viacutenculo estrateacutegico entre Brasiacutelia e Buenos Aires tem sido chave para sustentar um espiacuterito de cooperaccedilatildeo e integraccedilatildeo na Ameacuterica do Sul que se baseia na credibilidade das accedilotildees e na boa feacute de uns e outros governos Desde 1985 o Brasil e a Argentina desenvolveram o que Cervo (2008) denominou de ldquorelaccedilotildees em eixordquo que se estabe-lecem ldquoquando precisamente a imagem um do outro corresponde agrave do parceiro que consegue estabelecer uma uniatildeo co-responsaacutevel [] Em outros termos o eixo comporta uma vertente exoacute-gena que o transcende porque abarca as relaccedilotildees regionais mesmo que coletivas []rdquo (pp 211-212) Eacute esse tipo de relaccedilotildees e sua projeccedilatildeo no Cone Sul que foi potencialmente afetada pelas primei-ras declaraccedilotildees e accedilotildees do governo Bolsonaro Ao promover um alinhamento com os Estados Uni-dos mdash ou ldquosem recompensardquo como diria Gerson

23Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Moura mdash reproduz o que o Brasil e outros paiacuteses latino-americanos adotaram como ldquoestrateacutegiardquo na deacutecada de 1990 sem os resultados esperados E ao abandonar a tradiccedilatildeo iniciada em 1961 e adaptada agraves diferentes conjunturas que se sucederam abriu matildeo de exercer o poder de barganha do paiacutes para fazer concessotildees sem contrapartidas equivalentes Nas circunstacircncias atuais diante da transiccedilatildeo he-gemocircnica Estados Unidos-China considerando os interesses do Brasil na Ameacuterica do Sul a equidis-tacircncia talvez seja o melhor caminho Diaacutelogo es-treito com Washington e autonomia em temas de interesse do paiacutes foram as opccedilotildees de Rio Branco

Referecircncias Arauacutejo E (2017) Trump e o Ocidente Cadernos de Poliacutetica

Exterior iii(6) 323-357

Arauacutejo E (2019 2 de janeiro) Discurso do minis-tro Ernesto Arauacutejo durante cerimocircnia de posse no Ministeacuterio das Relaccedilotildees Exteriores Brasiacutelia Re-cuperado de httpwwwitamaratygovbrpt-BRdiscursos-artigos-e-entrevistas-categoriaminis-tro-das-relacoes-exteriores-discursos19907-dis-curso-do-ministro-ernesto-araujo-durante-cerimo-nia-de-posse-no-ministerio-das-relacoes-exteriores-brasilia-2-de-janeiro-de-2019

Arauacutejo C Rittner D e Murakawa F (2019 30 de abril) Brasil descarta vetar presenccedila da Huawei em 5g avisa Mouratildeo (entrevista com o vice-presidente Hamilton Mouratildeo) g1 Recuperado de httpsvalorglobocombrasilnoticia20190607brasil-descarta-vetar-pre-senca-da-huawei-em-5g-avisa-mouraoghtml

Arrighi G (2008) Adam Smith em Pequim origens e fun-damentos do seacuteculo xxi Satildeo Paulo Brasil Boitempo

Bandeira L A M (2004) As relaccedilotildees perigosas Brasil-Es-tados Unidos Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Bra-sileira

Bandeira L A M (2003) Brasil Argentina e Estados Uni-dos da Triacuteplice Alianccedila ao Mercosul (1870-2003) Rio de Janeiro Editora Revan

Becard D (2017) China y Brasil iquestmodelo de relaciones Sur-Sur Em E Pastrana B e H Gehring (eds) La proyeccioacuten de China en Ameacuterica Latina y el Caribe (pp 387-408) Bogotaacute Colocircmbia Editorial Javeriana

Becard D Lessa A e Silveira L (2020) One step closer The politics and the economics of chinarsquos strategy in Brazil and the case of the electric power sector Em R Bernal-Meza R e X Li (eds) China-Latin America

relations in the 21st Century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 55-81) Nova York Estados Unidos Palgrave Macmillan

Becard D Barros-Platiau A e Lessa A (2019) Brazil in the brics after tem years Past present and near futu-re perspectives Em X Li (ed) The international po-litical economy of the brics (pp 135-149) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Beckerman M e Moncaut N (2016) Las relaciones en-tre China y Ameacuterica Latina iquestHacia la desestructura-cioacuten de los sistemas productivos de la regioacuten Em C Moneta e S Cesariacuten (eds) La tentacioacuten pragmaacutetica China-ArgentinaAmeacuterica Latina lo actual lo proacuteximo y lo distante (pp 185-202) Saacuteenz Pentildea Argentina Uni-versidad Nacional de Tres de Febrero

Benaion N (2006) Subordinaccedilatildeo reiterada imperialismo e desenvolvimento no Brasil Manaus Brasil Editora da Universidade Federal do Amazonas

Bernal-Meza R (2019a) Brazil as an emerging power The impact of international and internal deteriorational effect on the brics Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 118-134) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Bernal-Meza R (2019b) Brasil ascenso declinacioacuten y nuevos desafiacuteos de una potencia emergente (2003-2018) Revista Izquierdas 49(2020) 516-540

Bernal-Meza R (2015) Pensamiento chileno en la poliacuteti-ca exterior y en las teoriacuteas de relaciones internaciona-les Em M Artaza e C Ross (eds) La poliacutetica exterior de Chile 1990-2009 (pp 21-47) Santiago Chile ril Editores

Bernal-Meza R (2014) La heterogeneidad de la imagen de China en la poliacutetica exterior latinoamericana Pers-pectivas para la concertacioacuten de poliacuteticas Comentario Internacional 14 113-134

Bernal-Meza R (2013) Ameacuterica Latina en el mundo el pensamiento latino-americano y la teoriacutea de relaciones internaciones Buenos Aires Argentina Grupo Editor Latinoamericano

Bernal-Meza R (2002) A poliacutetica exterior do Brasil 1990-2002 Revista Brasileira de Poliacutetica Internacional 45(1) 36-71

Bernal-Meza R e Bizzozero L (eds) (2014) La poliacutetica internacional de Brasil de la regioacuten al mundo Monte-videacuteu Uruguai Ediciones Cruz del Sur

Bernal-Meza R e Li X (eds) (2020) China-Latin Ameri-ca relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges Nova York Estados Uni-dos Palgrave Macmillan

24

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

Bolsonaro J (2018) O caminho da prosperidade pro-posta de Plano de Governo Recuperado de httpdivulgacandcontastsejusbrcandidaturasof i-cial2018BRBR2022802018280000614517propos-ta_1534284632231pdf

Bricentildeo Ruiz J e Simonoff A (orgs) (2015) Integracioacuten y cooperacioacuten regional en Ameacuterica Latina una relectura a partir de la teoriacutea de la autonomiacutea Buenos Aires Ar-gentina Editorial Biblos

Bueno C (2003) Poliacutetica externa da Primeira Repuacuteblica os anos de apogeu (1902-1918) Satildeo Paulo Brasil Paz e Terra

Cano W (2012) A desindustrializaccedilatildeo no Brasil (texto para discussatildeo 200) Campinas Brasil Instituto de Economia da Unicamp

Cervo A L (2019 28 de novembro) Governo Bolso-naro natildeo traraacute ruptura agrave poliacutetica externa Exame Recuperado de httpsexameabrilcombrmundogoverno-bolsonaro-nao-trara-ruptura-a-politica-ex-terna-avalia-amado-cervo

Cervo A (2008) Inserccedilatildeo internacional formaccedilatildeo dos conceitos brasileiros Satildeo Paulo Brasil Saraiva

Cervo A (2002) Relaccedilotildees Internacionais do Brasil a era Cardoso Revista Brasileira de Poliacutetica Internacional 45(1) 5-35

Cervo A e Bueno C (2015) Histoacuteria da poliacutetica exterior do Brasil Brasiacutelia Brasil Editora da Universidade de Brasiacutelia

Chang H H (2018 15 jan) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da histoacuteria da economia El Paiacutes Recuperado de ht-tpsbrasilelpaiscombrasil20180105econo-mia1515177346_780498html

Cronologia relembre os fatos mais importantes da cri-se venezuelana g1 httpsg1globocommundonoticia20190430cronologia-relembre-os-fa-tos-mais-importantes-na-crise-venezuelanaghtml

Doratioto F e Vidigal C (2015) Histoacuteria das Relaccedilotildees In-ternacionais do Brasil Satildeo Paulo Brasil Editora Saraiva

Dussel Peters E (coord) (2016) La nueva relacioacuten comer-cial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestInte-gracioacuten o desintegracioacuten regional Meacutexico-df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universidades de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico

Filgueiras L e Gonccedilalves R (2007) A economia poliacutetica do governo Lula Rio de Janeiro Brasil Contraponto

Fiori J(1999) Estado e moedas no desenvolvimento das naccedilotildees Petroacutepolis Brasil Vozes

Flisfisch A (2011) La Poliacutetica exterior chilena y Ameacuterica del Sur Estudios Internacionales (168) 115-141

Fonseca Jr G (2012) Rio Branco diante do Monroiacutesmo e do Pan-Americanismo anotaccedilotildees Em M Pereira e M Gomes (orgs) Baratildeo do Rio Branco 100 anos de memoacuteria (pp 565-602) Brasiacutelia Brasil Fundaccedilatildeo Alexandre de Gusmatildeo

Franccedila T (2007) Self made nation Domiacutecio da Gama e o pragmatismo do bom senso (tese de doutorado) Brasiacute-lia Brasil Universidade de Brasiacutelia

Guimaratildees S (2018) A poliacutetica exterior e a posiccedilatildeo do Brasil no mundo Recuperado de httpswwwnodalam201812a-politica-exterior-e-a-posicao-do-brasil-no-mundo-por-samuel-pinheiro-guimaraes-2

Gullo M (2018) Relaciones internacionales una teoriacutea criacutetica desde la periferia latinoamericana Buenos Ai-res Argentina Editorial Biblos

Gullo M (2014) A subordinaccedilatildeo fundante breve histoacuteria da construccedilatildeo do poder pelas naccedilotildees Florianoacutepolis Brasil Insular

Hiratuka C (2016) Impactos de China sobre el proceso de integracioacuten regional de Mercosur Em E Dussel Peters (coord) La nueva relacioacuten comercial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestIntegracioacuten o desintegracioacuten (pp 195-243) Meacutexico df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universida-des de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico Recuperado de httpswww3ecouni-campbrNeitimagesdestaque2016_La_nueva_rela-cion_comercial_ALC_Chinapdf

Hobsbawm E (1994) Extremes The Short Twentieth Cen-tury 1914-1991 Londres Inglaterra Michael Joseph Ltd

Kennedy P (1987) The rise and fall of the great powers Economic change and military conflict from 1500 to 2000 Nova York Estados Unidos Vintage Books

Keohane R e Nye J (1977) Power and interdependence World politics in transition Boston Estados Unidos Little Brown and Company

Lafer C (2002) JK e o programa de metas (1956-1961) Rio de Janeiro Brasil Fundaccedilatildeo Getuacutelio Vargas

Landim R (2019 6 de setembro) Brasil e Argentina adiam em 9 anos livre-comeacutercio de autos Folha de S Paulo Recuperado de httpswww1folhauolcombrmerca-do201909brasil-e-argentina-adiam-em-9-anos-li-vre-comercio-de-autosshtml

Lessa A e Oliveira H A (orgs) (2013) Parcerias estra-teacutegicas do Brasil v 1 os significados e as experiecircncias tradicionais Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

25Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Li X (2020) Revisiting China-Latin America economic relations An unintended consequence of different industrialization strategies Em R Bernal-Meza e X Li (eds) China-Latin America relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 225-251) Nova York Estados UnidosLondres Inglaterra Palgrave Macmillan

Li X (2019a) Chinarsquos dual position in the capitalist world order A dual complexity of hegemony and counter-he-gemony Em Li X (ed) The international political eco-nomy of the brics (pp 1-17) Abindon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2019b) The international political economy of the brics Nova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2014) The brics and beyond The international political economy of the emergence of a new world or-der Farnham Reino Unido Ashgate

Li X (2012) China y el orden mundial capitalista el nexo de la transformacioacuten interna de China y su impacto externo Em R Bernal-Meza e S Quintanar (eds) Regionalismo y Orden Mundial Surameacuterica Europa China (pp 29-53) Buenos Aires Argentina Nuevoha-cerUniversidad Nacional del Centro de la Provincia de Buenos Aires

Li X e Farah A (eds) (2013) China-Africa relations in an era of great transformations Farnham Reino Unido Ashgate

Lins A (1996) Rio Branco (Biografia) Satildeo Paulo Brasil Editora Alfa Omega

Mandelbaum M (2010) The frugal superpower Americarsquos global leadership in a cash-strapped era Nova York Es-tados Unidos Public Affairs

Meneses E (1988) Coping with decline Chilean fo-reign policy during the twentieth century 1902-1972 Oxford Reino Unido University of OxfordBodleian Library

Nabuco J (1949) Obras completas v xii Rio de Janeiro Brasil Instituto Progresso Editorial sa

Nasr V (2014) The dispensable nation American foreign policy in retreat Nova York Estados Unidos Anchor and Doubleday

Oliveira R (2018 15 de janeiro) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da his-toacuteria da economia (entrevista com Ha-Joon Chang) El Paiacutes Recuperado de httpsbrasilelpaiscombra-sil20180105economia1515177346_780498html

Pearson F e Rochester M (2007) Relaciones internacio-nales situacioacuten global en el siglo xxi Meacutexico-df Meacute-xico Mc Graw Hill

Pecequilo C (2012) As relaccedilotildees Brasil-Estados Unidos Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

Polanyi K (1957) The great transformation the political and economic origins of our time Boston Estados Uni-dos Beacon Press

Rodrigues J Seitenfus R e Rodrigues L (orgs) (1995) Uma histoacuteria diplomaacutetica do Brasil (1531-1945) Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Brasileira

Seitenfus R (2003) O Brasil vai agrave guerra o processo de envolvimento brasileiro na Segunda Guerra Mundial 3a ed Satildeo Paulo Brasil Barueri

Spector M (2019 25 abril) Eacute hora de construir uma po-liacutetica externa poacutes-Bolsonaro Folha de S Paulo Re-cuperado de httpswww1folhauolcombr colunasmatiasspektor201904e-hora-de-construir-a-politi-ca-externa-pos-bolsonaroshtml

Stunkel O Com Bolsonaro a poliacutetica externa se tor-nou uma caixa de surpresas (entrevista agrave Deutsche Welle Brasil) Recuperado de httpswwwterracombrnoticiasbrasil com-bolsonaro-politica-ex-terna-se-tornou-uma-caixa-de-surpresas 7f6f-814287c0240a2f3f93ad aa39af65jpo4zbzghtml

Tarzi S (2007) Neorealism neoliberalism and the inter-national system International Studies (41) 115-128

Vadell J e Ramos L (2019) The role of declining Brazil and ascending China in the brics initiative Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 75-94) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Viana F L (1959) A vida do Baratildeo do Rio Branco Rio de Janeiro Brasil Joseacute Olympio

Vidigal C (2009) Relaccedilotildees Brasil-Argentina o primeiro ensaio Curitiba Brasil Juruaacute

Page 3: Bolsonaro versus Rio Branco: transição hegemônica, América ...2011/02/15  · Contra-hegemonia e ordem capitalista mundial por meio do brics, brics-plus e de outros agru-pamentos,

13Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Introduccedilatildeo Transiccedilotildees hegemocircnicas constituem tema relevante nos estudos internacionais Nas uacuteltimas deacutecadas dois autores que as historiaram tiveram seus estu-dos amplamente divulgados no Brasil e nos demais paiacuteses da regiatildeo Paul Kennedy (1987) abordou o impacto das transiccedilotildees como ascensatildeo e queda das grandes potecircncias abrangendo os quinhentos anos de existecircncia do sistema internacional Eric Hobsbawm (1994) estudou a transiccedilatildeo da ordem internacional mdash a qual definiu como ldquomudanccedila de eacutepocardquo mdash sob a influecircncia que tiveram a ascensatildeo e decliacutenio das potecircncias sobre a ordem internacional durante o seacuteculo xx

Na aacuterea de Teoria das Relaccedilotildees Internacionais o tema das transiccedilotildees hegemocircnicas teve lugar em uma das correntes menos privilegiadas a teoria globalista ou marxista Do ponto de vista teoacuterico o globalismo concebe as relaccedilotildees internacionais como um conjunto estruturado a partir das for-maccedilotildees socioeconocircmicas nacionais e de suas muacutel-tiplas interligaccedilotildees no plano internacional cujo conhecimento se vincula estreitamente com a aacuterea da economia poliacutetica e que permite a formulaccedilatildeo mais segura do conceito de ldquointerdependecircnciardquo (Keohane e Nye 1977 Tarzi 2007 Pearson e Ro-chester 2007)

As raiacutezes das concepccedilotildees globalistas se encon-tram na tradiccedilatildeo marxista na vertente que se es-tende de Lecircnin a Wallerstein passando por Cox Tilly e Arrighi entre outros Na Ameacuterica Latina a corrente teoacuterica que desenvolveu estudos sobre as transiccedilotildees hegemocircnicas de forma mais apropriada foi o estruturalismo com seu enfoque de econo-mia poliacutetica com as contribuiccedilotildees de Prebisch Furtado Santa Cruz Pinto e Sunkel a partir dos anos 1950 ateacute o neoestruturalismo de Tomassini Ferrer Bernal-Meza e outros nas deacutecadas finais do seacuteculo xx Naquelas anaacutelises as relaccedilotildees inter-nacionais eram compreendidas como um sistema mundial no qual as diversas partes da estrutura mdash centro e periferia ou centro semiperiferia e pe-riferia mdash estatildeo inter-relacionadas de forma fun-cional e necessaacuteria (Bernal-Meza 2013) Novos aportes de Gullo (2014 2018) e de Bricentildeo Ruiz e Simonoff (2015) somam-se a essa perspectiva

ampliando as possibilidades de compreensatildeo dos efeitos das transiccedilotildees hegemocircnicas sobre os paiacuteses latino-americanos No caso do Brasil a atual con-juntura internacional natildeo tem sido vista na litera-tura como uma transiccedilatildeo hegemocircnica mas como uma crescente globalizaccedilatildeo com desafios para a inserccedilatildeo internacional (Cervo 2008 Lessa e Oli-veira 2013)

O artigo parte da hipoacutetese ou do pressuposto de que esteja em andamento uma transiccedilatildeo he-gemocircnica do poder norte-americano para o chinecircs (Fiori 1999 Arrighi 2008 Mandelbaum 2010 Li e Farah 2013 Nasr 2014 Li 2014 2019) o que permite fazer um contraponto da atual inserccedilatildeo internacional do Brasil com a que ocorreu na tran-siccedilatildeo da hegemonia britacircnica para a norte-ame-ricana entre o fim do seacuteculo xix e o periacuteodo do entreguerras Natildeo se trata de uma abordagem sis-tecircmica mas sim da anaacutelise dos efeitos da transiccedilatildeo hegemocircnica em paiacuteses perifeacutericos no caso o Bra-sil A ascensatildeo da China marcaria o surgimento de desafios equivalentes aos experimentados no final do Impeacuterio e no iniacutecio da Repuacuteblica e equacio-nados em sua maioria nos dez anos da gestatildeo do Baratildeo do Rio Branco1 entre 1902 e 1912 (Fonseca Jr 2012)

Tomada como um pressuposto a transiccedilatildeo eacute na verdade uma hipoacutetese que se comprovaraacute ou natildeo no futuro Isso porque a China ainda natildeo eacute um ator com as capacidades de exercer uma hegemo-nia em todas as aacutereas e agendas do sistema inter-nacional Tampouco eacute o ator mais importante nem o que exerce maior poder hegemocircnico nas relaccedilotildees internacionais do Brasil Portanto o que se propotildee eacute uma hipoacutetese prospectiva de trabalho a qual vis-lumbra cenaacuterios internacionais e globais futuros

A China tem uma posiccedilatildeo dual na ordem ca-pitalista mundial uma situaccedilatildeo complexa de he-gemonia e contra-hegemonia (Li 2020 Li 2012) Contra-hegemonia e ordem capitalista mundial por meio do brics brics-plus e de outros agru-pamentos como o Consenso de Beijing (Li 2014

1 Joseacute Maria da Silva Paranhos Juacutenior filho do Visconde do Rio Branco foi nomeado Baratildeo do Rio Branco em 1888 no reinado de D Pedro II (1840-1889) Monarquista de for-maccedilatildeo Rio Branco destacou-se como diplomata no periacuteo-do republicano e foi ministro das Relaccedilotildees Exteriores

14

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

Vadell e Ramos 2019) hegemonia em suas relaccedilotildees com a semiperiferia e a periferia Ameacuterica Latina e Aacutefrica (Li e Farah 2013 Becard e Lessa 2019 Li 2020 Bernal-Meza e Li 2020)

Na primeira parte do artigo eacute apresentada a trajetoacuteria da poliacutetica exterior brasileira do final do seacuteculo xix agrave deacutecada de 1960 quando surgiram as primeiras criacuteticas agrave ordem internacional do poacutes-guerra ao sistema interamericano e agrave depen-decircncia das economias latino-americanas em re-laccedilatildeo agraves potecircncias centrais O debate que permeia essa seccedilatildeo diz respeito agrave construccedilatildeo da hegemo-nia norte-americana na Ameacuterica Latina agrave forma como o Baratildeo do Rio Branco adequou a poliacutetica exterior brasileira agrave conjuntura do iniacutecio do seacuteculo xx e sua influecircncia nas deacutecadas seguintes A se-gunda trata do recente processo de globalizaccedilatildeo de como o Brasil respondeu agrave nova conjuntura e como tem tratado de temas como a ascensatildeo da China o decliacutenio relativo dos Estados Unidos e os avanccedilos e recuos na integraccedilatildeo sul-americana nas deacutecadas iniciais do seacuteculo xxi Na terceira parte a poliacutetica externa de Rio Branco e as relaccedilotildees com a Gratilde-Bretanha com os Estados Unidos e com os paiacuteses latino-americanos satildeo comparadas com a poliacutetica externa do governo Bolsonaro aleacutem dis-so eacute avaliado como a nova poliacutetica se diferencia da poliacutetica externa universalista dos governos de Lula da Silva (Lessa e Oliveira 2013 Bernal-Meza e Bizzozero 2014 Cervo e Bueno 2015)

A questatildeo eacute a de saber se Bolsonaro ldquodesafiardquo Rio Branco ao se aproximar da potecircncia decli-nante os Estados Unidos e se afastar da potecircncia ascendente a China ainda se no acircmbito sul-ame-ricano a tendecircncia seria a de esvaziar a integraccedilatildeo regional e afirmar a ldquolideranccedilardquo brasileira ao con-traacuterio da busca do equiliacutebrio nas relaccedilotildees platinas adotadas por Rio Branco Nas consideraccedilotildees finais nossa conclusatildeo eacute uma hipoacutetese as diferenccedilas principais entre a transiccedilatildeo hegemocircnica do pas-sado e a atual mdash e que explicariam as opccedilotildees do governo Bolsonaro mdash seriam 1 os viacutenculos histoacute-ricos entre as economias as sociedades e as cultu-ras britacircnica e norte-americana em contraste com as diferenccedilas poliacuteticas sociais e culturais entre os Estados Unidos e a China 2 a proximidade geo-graacutefica econocircmica e cultural do Brasil em relaccedilatildeo

aos Estados Unidos mais forte nos dias de hoje do que 130 anos atraacutes e a distacircncia geograacutefica e cultu-ral em relaccedilatildeo agrave China 3 a dependecircncia estrutural na aacuterea de defesa o que praticamente impossibilita a ldquoopccedilatildeo chinesardquo ou a ldquoopccedilatildeo dos bricsrdquo A proxi-midade das Forccedilas Armadas brasileiras com as instituiccedilotildees similares estadunidenses a provisatildeo de equipamento militar dos Estados Unidos e de seus aliados europeus e a ausecircncia de fornecimento por parte da China inibem a possibilidade de apro-ximaccedilatildeo com a China nessa aacuterea

O recuo ao periacuteodo de Rio Branco como con-traponto agrave atual poliacutetica externa do Brasil adveacutem do fato de ele ter consolidado a transiccedilatildeo do eu-ropeiacutesmo para o americanismo nos termos pro-postos por Bueno (2003) Nesse sentido sua gestatildeo tornou-se um marco no posicionamento brasileiro diante da transiccedilatildeo hegemocircnica do Reino Unido para os Estados Unidos da Ameacuterica ilustrado pela criaccedilatildeo da primeira embaixada brasileira em Washington-dc

De Rio Branco agrave poliacutetica externa independente autonomia e permissibilidade Rio Branco concluiu no plano poliacutetico a etapa de convergecircncias entre os Estados Unidos e o Brasil iniciada com a Proclamaccedilatildeo da Repuacuteblica (1889) deste uacuteltimo Sua gestatildeo promoveu o apoio brasi-leiro agraves posiccedilotildees norte-americanas diante da Ve-nezuela em 1902 e da Colocircmbia no ano seguinte (Doratioto e Vidigal 2015) Essa poliacutetica com breves periacuteodos de distanciamento mdash durante a ldquopoliacutetica externa independenterdquo e o ldquopragmatismo ecumecircnico e responsaacutevelrdquo mdash tem sido mantida ateacute o presente Os governos do Partido dos Trabalha-dores (pt) embora tenham participado e impul-sionado o Foacuterum de Diaacutelogo entre Iacutendia Brasil e Aacutefrica do Sul (Ibas) e o brics nunca imaginaram esses agrupamentos como contra-hegemocircnicos ante os Estados Unidos o que eacute igualmente vaacutelido para os governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro

A historiografia em especial a partir dos tra-balhos de Aacutelvaro Lins (1996) e de Luiz Viana Filho (1959) convergiu em torno da ideia de que Rio

15Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Branco natildeo foi um homem de Estado que tenha se orientado pelo militarismo ou pelo imperialismo Pautado pela convicccedilatildeo nos sentimentos paciacutefi-cos dos governos aos quais serviu considerava primordial o reconhecimento pelos demais paiacute-ses sul-americanos de que o paiacutes natildeo tinha feito uso da forccedila natildeo se apresentando como potencial ameaccedila aos vizinhos entre os anos 1870 e o iniacutecio do novo seacuteculo Certamente natildeo se deve receber de maneira acriacutetica a autoimagem que Rio Branco fazia de si e dos governos brasileiros pois muitos foram os seus criacuteticos e conhecidos satildeo os atritos com o ministro argentino Estanislao Zeballos ou o jogo entre competiccedilatildeo e entente do Brasil com a Argentina e o Chile (Meneses 1988) para citar apenas um exemplo

Durante sua gestatildeo dois de seus colaboradores expressaram posicionamentos distintos um mais vinculado aos desiacutegnios de Washington outro simultaneamente criacutetico e admirador Joaquim Nabuco e Domiacutecio da Gama Para Nabuco a Dou-trina Monroe e o corolaacuterio Roosevelt significavam que os paiacuteses americanos haviam se desprendido da Europa ldquocomo a lua da terrardquo o que levou o his-toriador Joseacute Honoacuterio Rodrigues a sugerir que Na-buco tivesse por princiacutepio marchar sempre com eles ao menos sempre que possiacutevel (Nabuco 1949 Franccedila 2007) Domiacutecio da Gama afastava-se da visatildeo de Nabuco sobre a Doutrina Monroe pois a considerava carente de reciprocidade portanto em desacordo com interesses brasileiros

A poliacutetica brasileira para a Ameacuterica do Sul e na regiatildeo do Prata foi e talvez seja ainda mateacuteria con-troversa A amizade que deveria reger as relaccedilotildees com a Argentina e o Chile natildeo excluiacutea a criaccedilatildeo de um poder dissuasoacuterio por parte do Rio de Janeiro Ao lado da rivalidade tradicional entre os trecircs paiacuteses mdash excetuando talvez as relaccedilotildees Brasil-Chile mdash havia a compreensatildeo por parte do Rio de Janeiro sobre a necessidade de estabelecer relaccedilotildees amigaacute-veis no Cone Sul (Argentina Boliacutevia Chile Para-guai e Uruguai) notadamente em sua dimensatildeo geopoliacutetica

A partir de 1909 as tensotildees na regiatildeo arrefe-ceram sem que a rivalidade entre a Argentina e o Brasil saiacutesse da agenda O siacutembolo dessa aproxi-maccedilatildeo foi a frase proferida por Saacuteenz Pentildea ldquoTodo

nos une nada nos separardquo (citado por Bandeira 2003 p 125) Na conjuntura da Primeira Guerra Mundial a Argentina o Brasil e o Chile assina-ram o Tratado do abc voltado para a coordenaccedilatildeo das poliacuteticas de defesa do Cone Sul O abc natildeo foi bem-recebido nos Estados Unidos por ser poten-cialmente um contrapeso agrave sua influecircncia nem nos paiacuteses sul-americanos sob o argumento de que uma poliacutetica pan-americana natildeo deveria com-portar preponderacircncias restritas que eliminassem a ampla participaccedilatildeo dos Estados nacionais da re-giatildeo (Bandeira 2004)

Quanto agraves relaccedilotildees do Brasil com a Gratilde- Bretanha vista como ldquopotecircncia decadenterdquo estive-ram subordinadas ao decliacutenio econocircmico britacircni-co Diferentemente da Argentina cuja orientaccedilatildeo principal seguiraacute voltada para Londres ateacute a Se-gunda Guerra Mundial o Brasil priorizou os laccedilos com Washington desde a Proclamaccedilatildeo da Repuacute-blica em 1889

Desde o iniacutecio do seacuteculo xx a Gratilde-Bretanha passou a dar liberdade de accedilatildeo para os Estados Unidos no Hemisfeacuterio Ocidental explicitado por Balfour em 1903 ao afirmar que os britacircni-cos natildeo desejavam a colonizaccedilatildeo a aquisiccedilatildeo de territoacuterios ou as alteraccedilotildees no equiliacutebrio de po-der ldquoa Doutrina Monroe natildeo estava portanto em tela de juiacutezordquo (citado por Bueno 2003 p 32) A adoccedilatildeo por Londres do nihil obstat diante da presenccedila estadunidense na Ameacuterica Latina con-corria para a adoccedilatildeo de praacuteticas imperialistas por parte de Washington mas prevalecia a ideia de que era do interesse dos capitalistas britacircnicos que a potecircncia norte-americana assumisse o pa-pel de poliacutecia internacional Como destacou Po-lanyi em A grande transformaccedilatildeo (Polanyi 1957) o padratildeo-ouro e o constitucionalismo eram os instrumentos que tornaram conhecida a voz da City de Londres em muitos dos paiacuteses menores que adotaram esses siacutembolos de adesatildeo agrave nova ordem internacional No caso do Brasil a passa-gem da hegemonia britacircnica para a estadunidense se deu de forma amistosa ao longo de algumas deacutecadas ainda que natildeo isenta de momentos de desconfianccedila como nos eventos da Proclamaccedilatildeo da Repuacuteblica e nos anos iniciais do novo regime (Bueno 2003 Cervo e Bueno 2015)

16

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

O processo modernizador do Brasil nos finais do seacuteculo xix dependeu do comeacutercio com os Esta-dos Unidos pois os superaacutevits na balanccedila comercial geravam excedentes para atender amortizaccedilotildees serviccedilos de empreacutestimos britacircnicos e para custear o complexo exportador nas matildeos dos ingleses A concorrecircncia comercial entre norte-americanos e ingleses segundo Cervo estabeleceu-se no Brasil apenas em pequena escala Nessa conjuntura os Estados Unidos elevaram seu interesse no paiacutes com a intenccedilatildeo de abrir mercados e equilibrar suas contas (Cervo e Bueno 2015)

Nas deacutecadas iniciais do seacuteculo xx o Brasil es-treitou laccedilos com os Estados Unidos manteve boas relaccedilotildees econocircmicas e diplomaacuteticas com a Gratilde-Bre-tanha e atuou de forma autocircnoma nas questotildees mais delicadas das relaccedilotildees sul-americanas em especial as do Cone Sul Nas quatro deacutecadas que se seguiram agrave Primeira Guerra Mundial a poliacutetica exterior brasileira foi regida principalmente pelas demandas das relaccedilotildees com os Estados Unidos As accedilotildees ou ensaios de autonomia representados pela participaccedilatildeo brasileira nas negociaccedilotildees do poacutes-gue-rra pelo comeacutercio compensado com a Alemanha permitiriam a Getuacutelio Vargas mdash que ascendera agrave Presidecircncia na Revoluccedilatildeo de 1930 cargo no qual permaneceria ateacute 1945 mdash o exerciacutecio da ldquopoliacutetica de barganhardquo com esse paiacutes e com os Estados Unidos (Bandeira 2004 Seitenfus 2003 Cervo e Bueno 2015 Doratioto e Vidigal 2015)

Na construccedilatildeo da nova ordem mundial do se-gundo poacutes-guerra o Brasil se alinhou aos Estados Unidos na Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (onu) e no processo de construccedilatildeo do Sistema Interame-ricano Durante os governos Dutra Vargas Cafeacute Filho e os anos iniciais de Kubitschek o Brasil procurou buscar recursos financeiros e tecnoloacute-gicos junto aos Estados Unidos para a promoccedilatildeo do desenvolvimento econocircmico Das primei-ras conferecircncias interamericanas do poacutes-guerra (Chapultepec Rio de Janeiro Bogotaacute) ateacute 1958 estabeleceu-se um diaacutelogo de surdos enquanto o Brasil no que foi acompanhado pela maioria dos paiacuteses latino-americanos reivindicava uma defi-niccedilatildeo expliacutecita por parte de Washington quanto aos aportes a serem feitos na regiatildeo o governo norte-americano cobrava compromisso com as

instituiccedilotildees internacionais com os preceitos da Guerra Fria e com as necessidades impostas pela aacuterea de seguranccedila O resultado foi o crescente des-conforto das lideranccedilas poliacuteticas latino-america-nas diante da atitude reticente de Washington e do anti-americanismo em alguns paiacuteses

Em maio de 1958 por ocasiatildeo da viagem do vice- presidente Nixon ao Peru e agrave Venezuela o governo americano percebeu a dimensatildeo da insatisfaccedilatildeo dos paiacuteses sul-americanos com o tratamento que Was-hington vinha dispensando agraves suas demandas e a necessidade de rever sua poliacutetica para a regiatildeo Entre os desdobramentos da visita de Nixon destacou-se a iniciativa do presidente Kubitschek de escrever a Eisenhower propondo um esforccedilo conjunto de cooperaccedilatildeo econocircmica dos paiacuteses americanos em prol de projetos nacionais de desenvolvimento logo denominada ldquoOperaccedilatildeo Pan-Americanardquo (Cervo e Bueno 2015 Cervo 2008 Lafer 2002) Diante do novo quadro na poliacutetica regional o governo norte-americano levou o debate para o acircmbito do Conselho Econocircmico e Social da Organizaccedilatildeo dos Estados Americanos (oea) onde foi criado o Comitecirc dos 21 encarregado de gerir a implementaccedilatildeo da opa2 Os trabalhos realizados no Comitecirc permitem identificar uma poliacutetica protelatoacuteria por parte da representaccedilatildeo norte-americana com o intuito de esvaziar o conteuacutedo ldquodesenvolvimentistardquo da pro-posta brasileira em favor de uma visatildeo essencial-mente assistencialista (Vidigal 2009)

A poliacutetica externa de Jacircnio Quadros autointi-tulada ldquoPoliacutetica Externa Independenterdquo procurou superar os constrangimentos das deacutecadas anterio-res por meio de uma orientaccedilatildeo que priorizava a expansatildeo do comeacutercio e a diversificaccedilatildeo dos laccedilos internacionais o estabelecimento de relaccedilotildees di-plomaacuteticas com paiacuteses socialistas a luta contra o subdesenvolvimento e o empenho em favor da in-tegraccedilatildeo econocircmica regional sem romper com a posiccedilatildeo tradicional do Brasil em outros pontos da agenda internacional como o respeito ao ldquomundo livrerdquo agrave oea e agrave onu

2 Iniciativa do governo Juscelino Kubitschek junto agrave ad-ministraccedilatildeo de Eisenhower incorporada agrave oea que objetivava a promoccedilatildeo do desenvolvimento dos paiacuteses latino-americanos com o apoio dos Estados Unidos da Ameacuterica

17Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Da autonomia dos anos 2000 ao ldquonovo alinhamentordquo Embora Lula tenha incentivado e participado de alianccedilas contra-hegemocircnicas no acircmbito da eco-nomia poliacutetica internacional como o Ibas e o brics natildeo se pode afirmar que ele ou sua suces-sora Dilma Rousseff tenha desenvolvido uma po-liacutetica internacional contraacuteria aos Estados Unidos (Pecequilo 2012 Cervo e Bueno 2015) Sempre se tratou de relaccedilotildees ldquocentraisrdquo ou ldquocruciaisrdquo para o Brasil mas tambeacutem de grande assimetria Para o Brasil pensar nos Estados Unidos eacute pensar em sua poliacutetica exterior (Pecequilo 2012) como uma ldquoparceria estrateacutegicardquo que influencia as estruturas socioeconocircmicas do paiacutes ao longo do tempo (Cer-vo 2008) Essa tradiccedilatildeo que remonta a Rio Branco apresentou-se na trajetoacuteria histoacuterica do paiacutes como parceria estrateacutegica em alguns momentos ou como alinhamento em outros

A poliacutetica externa do pt se caracterizou pelo multilateralismo e pelo fortalecimento e cons-truccedilatildeo de parcerias estrateacutegicas O que diferencia esse passado com a etapa iniciada com a presidecircn-cia de Bolsonaro talvez seja a adesatildeo agrave poliacutetica de rechaccedilo do globalismo e do multilateralismo

O governo Bolsonaro comeccedilou a aproximar-se dos Estados Unidos por meio de ideias mdash expres-sas pela visatildeo do ministro Ernesto Arauacutejo mdash e de accedilotildees Durante a campanha e nos primeiros me-ses de governo manifestaccedilotildees do Presidente de seu filho Eduardo e de um dos mentores de seu projeto Olavo de Carvalho demonstravam que o estreitamento dos laccedilos com Washington era mais o resultado de contatos com grupos poliacuteticos norte-americanos simpatizantes de Trump do que fruto de um entendimento poliacutetico consistente

Bolsonaro introduziu cinco mudanccedilas na po-liacutetica externa sul-americana do Brasil em com-paraccedilatildeo ao periacuteodo 2003-2016 1 recolocou o paiacutes em uma relaccedilatildeo estreita agrave poliacutetica exterior norte--americana 2 retirou seu apoio e logo comeccedilou a incentivar mdash juntamente com o presidente chileno Pintildeera mdash um novo agrupamento para substituir a Uniatildeo de Naccedilotildees Sul-Americanas (Unasul) 3 abandonou o respaldo poliacutetico ao governo vene-zuelano identificando-o como a principal ameaccedila

para a seguranccedila e estabilidade da regiatildeo 4 pas-sou a tratar o Mercado Comum do Sul (Mercosul) como um tema secundaacuterio na agenda 5 reduziu a prioridade que Brasiacutelia mdash desde 1985 mdash atribuiacutea a Buenos Aires em favor do Chile primeiro paiacutes a ser visitado pelo novo presidente

Qual poderia ser a explicaccedilatildeo de colocar o Chile como o primeiro paiacutes a visitar Sinalizar que foi devido agrave sintonia poliacutetica natildeo o explica posto que Macri eacute tatildeo liberal quanto Pintildeera Eacute possiacutevel entatildeo Bolsonaro tenha tentado retomar a visatildeo que Rio Branco tinha em relaccedilatildeo ao Cone Sul e buscar uma nova aproximaccedilatildeo com o Chile O Brasil e o Chile compartilham hoje uma posiccedilatildeo criacutetica a respeito do regionalismo poliacutetico sul-americano em par-ticular sobre a Unasul mas a Argentina tambeacutem Entretanto o imaginaacuterio do Chile em relaccedilatildeo a pa-radigmas e visotildees sobre o sistema internacional eacute distinto do brasileiro Satildeo dois paiacuteses com capaci-dades atributos e recursos de poder enormemente diferentes Em parte o modelo de inserccedilatildeo inter-nacional e seus instrumentos satildeo semelhantes em ambos os paiacuteses a visatildeo ideal do tipo de Estado a internacionalizaccedilatildeo da economia e o papel das empresas assim como papel que desempenha o capital privado Mas tambeacutem grandes diferenccedilas o Brasil tem uma histoacuterica vocaccedilatildeo industrialista mdash que natildeo existe atualmente no Chile mdash e uma aspiraccedilatildeo a concertar internamente os diversos segmentos e recursos de poder induacutestria ciecircncia e teacutecnica pesquisa e desenvolvimento papel do mercado interno de consumo e outros todas ques-totildees que satildeo muito relativas no modelo chileno

O Brasil eacute um global trader que se pensou glo-bal player cujos interesses satildeo tanto econocircmicos como poliacuteticos e sugerem a aspiraccedilatildeo a uma par-ticipaccedilatildeo influente na tomada de decisotildees no siste-ma internacional e nos organismos internacionais Na interpretaccedilatildeo de Cervo e Bueno esta foi a he-ranccedila dos dois governos de Lula a de desempe-nhar o papel que era devido no acircmbito hemisfeacuterico e no cenaacuterio internacional (Cervo e Bueno 2015) O Brasil pressupunha que seus vizinhos regionais reconhecessem a priori suas condiccedilotildees de lide-ranccedila e hegemonia sob um soft power Poreacutem nos anos recentes sob os governos da Concertaccedilatildeo o Chile buscou colocar-se como modelo de inserccedilatildeo

18

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

regional e tem procurado disputar com o Brasil essa condiccedilatildeo de lideranccedila natural (Bernal-Meza 2015 Flisfisch 2011)

Provavelmente a decisatildeo de visitar primeira-mente o Chile tenha sido resultado da influecircncia do ministro da Economia Paulo Guedes Egresso do curso de Economia da Universidade de Chicago e admirador do liberalismo e do ldquomodelordquo chileno Guedes teceu elogios ao Chile em diversas ocasiotildees em visatildeo superficial sobre o sucesso econocircmico da-quele modelo e a viabilidade de aplicaacute-lo ao Brasil de hoje Ademais somou-se aos criacuteticos da Unasul e da poliacutetica de contemporizaccedilatildeo com Caracas

Segundo o embaixador Pinheiro Guimaratildees secretaacuterio-geral do Ministeacuterio das Relaccedilotildees Ex-teriores (mre tambeacutem chamado de ldquoItamaratyrdquo) durante os governos de Lula essas posiccedilotildees jaacute tin-ham antecedentes

no periacuteodo de Michel Temer o Brasil se juntou aos paiacuteses da Alianccedila do Paciacutefico e aos paiacuteses do Grupo de Lima contra a Venezuela infringindo os prin-ciacutepios de autodeterminaccedilatildeo e de natildeo intervenccedilatildeo gerando desconfianccedilas e ressentimentos no esforccedilo de agradar aos Estados Unidos em sua campanha para derrubar o governo venezuelanordquo (Guimaratildees 2018 sp)

No discurso de posse o ministro das Relaccedilotildees Exteriores pocircs a figura do presidente Bolsonaro como um libertador do Brasil e definiu a nova etapa da poliacutetica exterior como aquela que se libertava do passado Em suas palavras ldquoo presidente Bolso-naro estaacute libertando o Brasil por meio da verdade Noacutes vamos tambeacutem libertar a poliacutetica externa va-mos libertar o Itamaraty como o presidente Bolso-naro prometeu que fariacuteamos em seu discurso da vitoacuteriardquo (Arauacutejo 2019 sp)

Segundo Cervo (2019) Bolsonaro e Cardoso coincidem

os dois presidentes tecircm uma visatildeo de mundo e da inserccedilatildeo internacional do Brasil semelhante satildeo li-berais nesse sentido inovadores relativamente ao periacuteodo anterior a seus mandatos de governos mais nacionalistas e introspectivos Isso significa para a poliacutetica exterior um novo ciclo de abertura da eco-nomia a empreendimentos capitais e tecnologias vindas de forardquo (sp)

Para Cervo (2002) natildeo haveria ruptura na poliacute-tica exterior porque ela apresenta haacute seacuteculos trecircs traccedilos que compotildeem a estrateacutegia brasileira de longo prazo universalismo cooperaccedilatildeo e pacifismo Mas haacute que se recordar daquelas diretrizes que marca-ram a poliacutetica externa de Cardoso (Bernal-Meza 2002) Nesse sentido eacute possiacutevel que o viacutenculo com os Estados Unidos e as potecircncias do capitalismo central o apoio agraves instituiccedilotildees de governanccedila glo-bal sustentada pela hegemonia norte-americana e a posiccedilatildeo a favor do Ocidente ante os conflitos mundiais bem como o suposto enfrentamento ci-vilizatoacuterio deixem para traacutes o que Bandeira (2004) denominou de ldquorelaccedilotildees perigosasrdquo

O americanismo do governo Bolsonaro entre-tanto parece desmentir Cervo ou seja concilia o alinhamento poliacutetico aos Estados Unidos com a repulsa ao universalismo e mesmo agrave cooperaccedilatildeo e ao pacifismo O chanceler Ernesto Arauacutejo elogia Trump como ldquoum cavalheiro cruzado que luta para resgatar a identidade do Ocidenterdquo Para Arauacutejo (2017) Trump e sua poliacutetica internacional repre-sentam a disposiccedilatildeo para uma luta global para re-cuperar o passado simboacutelico que tem representado a histoacuteria e a cultura das naccedilotildees ocidentais para a sobrevivecircncia e o domiacutenio do Ocidente

Um grande questionamento eacute o que aconteceraacute com o papel que a poliacutetica exterior brasileira tem desempenhado na regiatildeo e se ela retornaraacute agrave dispo-siccedilatildeo para a lideranccedila que marcou o periacuteodo Lula ou se deixaraacute nas matildeos de potecircncias secundaacuterias mdash como o Chile mdash essa posiccedilatildeo o paiacutes que Bolso-naro considera um modelo No plano da poliacutetica internacional um posicionamento em linha com a poliacutetica de Trump poderia ter grandes impactos Uma maior aproximaccedilatildeo mdash ou coincidecircncias mdash com a poliacutetica de Washington afastaria o Brasil de sua tendecircncia mais tradicional a da autonomia mdash cujo efeito seria um afastamento relativo do brics e a predisposiccedilatildeo do presidente Bolsonaro a resta-belecer uma relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo militar com os Estados Unidos (Cervo 2019) o que despertaria na regiatildeo velhos temores mdash nunca esquecidos mdash so-bre o subimperialismo brasileiro

Haacute que se considerar nesses aspectos que a poliacutetica externa do governo Bolsonaro tem sido in-formada por diferentes grupos de interesse o que

19Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

resulta muitas vezes em uma praacutetica erraacutetica in-consistente e excessivamente ideoloacutegica (Stunkel 2019 Spector 2019) Diferentemente de outras si-tuaccedilotildees semelhantes mdash Dutra Castelo Branco ou Collor mdash desta feita o Itamaraty natildeo atuou como contraponto agrave presidecircncia alimentando muitas vezes o discurso ideoloacutegico

Bolsonaro e Trump parecem ter muitos pontos em comum Entre as coincidecircncias mais delicadas estaacute seu rechaccedilo ao ldquoglobalismordquo3 o que revela que ambos os presidentes estatildeo dispostos a depreciar o que as diplomacias de seus proacuteprios paiacuteses cons-truiacuteram sob o sistema internacional contemporacirc-neo a criaccedilatildeo e fortalecimento das organizaccedilotildees internacionais o sistema das Naccedilotildees Unidas e as negociaccedilotildees mundiais sobre assuntos que impor-tavam agrave sociedade internacional Accedilotildees que se plasmaram em temas e agendas globais como o meio ambiente e a mudanccedila climaacutetica Ambas se-riam tendecircncias de mudanccedila profunda que impac-tariam todo o cenaacuterio latino-americano O mais preocupante eacute imaginar o Brasil imerso em um enfrentamento a respeito do papel do Ocidente na defesa da chamada ldquocultura ocidentalrdquo posto que ela tem sido o instrumento mais importante do co-lonialismo e da dominaccedilatildeo das potecircncias ociden-tais sobre a periferia do mundo

O que parecia ser manifestaccedilotildees de desinte-resse (ao menos) a respeito de seu soacutecio estrateacute-gico sul-americano Bolsonaro ao natildeo incluir a Argentina em sua primeira viagem ao exterior e as declaraccedilotildees de seu ministro da Economia a respeito do Mercosul o que indicava que este natildeo seria uma prioridade para o Brasil pode trazer consequecircncias negativas para as relaccedilotildees sul-ame-ricanas Deve-se recordar que a base de qualquer entendimento de cooperaccedilatildeo governanccedila re-gional e continuidade para fazer da regiatildeo uma

3 ldquoGlobalismordquo em sentido pejorativo foi o termo utilizado por Bolsonaro e por seus principais auxiliares para cri-ticar nos meses iniciais de seu governo as poliacuteticas de inserccedilatildeo do Brasil no cenaacuterio global por meio de uma par-ticipaccedilatildeo proativa em foros multilaterais e nos debates sobre os temas mais sensiacuteveis da agenda internacional Argumento apresentado pelo ministro Arauacutejo em seu dis-curso de posse por meio de uma obviedade ldquoNatildeo estamos aqui para trabalhar pela ordem global Aqui eacute o Brasilrdquo (Arauacutejo 2019 sp)

zona militarmente desnuclearizada passa por uma relaccedilatildeo cordial entre o Brasil e a Argentina A construccedilatildeo de uma ldquozona de pazrdquo no Atlacircntico Sul por meio da superaccedilatildeo das hipoacuteteses de con-flito entre a Argentina e o Chile tem se baseado na continuidade dessa relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo A partir dessas perspectivas a presidecircncia Bolso-naro natildeo soacute implicaria o retorno da Ameacuterica do Sul agraves concepccedilotildees ideoloacutegicas radicalizadas que se supunham superadas que incluem novos viacutenculos estreitos em mateacuteria de seguranccedila com os Estados Unidos mas tambeacutem o iniacutecio de uma etapa de in-certeza na regiatildeo

Alinhamento com Washington incertezas quanto a PequimO alinhamento com Washington agrave eacutepoca de Rio Branco seguia um roteiro previsiacutevel diante da potecircncia ascendente a adesatildeo aos princiacutepios do Direito Internacional a incorporaccedilatildeo acriacutetica do conceito de ldquobom governordquo e a convicccedilatildeo de que o progresso da naccedilatildeo dependia dos desiacutegnios do norte Nada parecido se via em relaccedilatildeo a Londres que ainda conservava o status de principal centro financeiro internacional mas que perdia impor-tacircncia no intercacircmbio de mercadorias Mais de um seacuteculo depois o novo alinhamento mdash e este eacute o contraponto que se mencionou na introduccedilatildeo mdash manteacutem o principal das relaccedilotildees internacionais do paiacutes voltado para os Estados Unidos De acordo com a hipoacutetese de trabalho inicial a de estarmos em meio a uma transiccedilatildeo hegemocircnica dos Estados Unidos para a China Bolsonaro estaria em dis-sonacircncia com Rio Branco

Os primeiros meses de 2019 revelaram que o governo Bolsonaro sustentava na poliacutetica externa o principal das promessas de campanha acompa-nhadas do mote ldquoo Brasil acima de tudordquo Inspira-do no governo de Trump o discurso de supremacia contrastava com o silecircncio diante da poliacutetica pro-tecionista de Washington que elevara a tarifa para a importaccedilatildeo do accedilo e subsidiava a produccedilatildeo de soja ambas as medidas prejudiciais para os inte-resses brasileiros Ante eventuais perdas setoriais o governo seguia fiel ao princiacutepio do alinhamento em dissonacircncia com o legado de Rio Branco

20

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

A crise na Venezuela e os interesses econocircmi-cos do agronegoacutecio no mercado chinecircs levariam o governo a modificar em parte a retoacuterica inicial o que indicaria estar em curso ajustes e reorientaccedilotildees na aacuterea No dia 23 de fevereiro o autoproclamado presidente interino da Venezuela Juan Guaidoacute liderou um esforccedilo de tentar fazer com que ca-minhotildees com alimentos adentrassem a Venezue-la como forma de pressionar o governo Maduro Em Pacaraima o chanceler brasileiro explicava se tratar de um ato humanitaacuterio altruiacutesta ldquoum mo-mento de criaccedilatildeo de uma nova realidade na Ve-nezuelardquo Quanto agrave possibilidade de intervenccedilatildeo Arauacutejo considerava que ldquonatildeo haacute menor expectativa de conflito mas claro que o Exeacutercito estaacute prepa-rado caso isso possa se materializarrdquo (Cronologia 2019 sp)

Na visatildeo do vice-presidente Mouratildeo que natildeo ocultava a influecircncia estadunidense a crise vene-zuelana soacute seria superada com a neutralizaccedilatildeo de agentes externos em especial a presenccedila cubana Se essa situaccedilatildeo continuasse a Venezuela correria o risco de se tornar um ldquonatildeo Estadordquo (Arauacutejo Ritt-ner e Murakawa 2019) Mouratildeo ao mesmo tempo que natildeo contemporizava com o governo Maduro indicava natildeo estar de acordo in totum com o alin-hamento com Washington nessa questatildeo ao colo-car em duacutevida a legitimidade de Juan Guaidoacute

Em relaccedilatildeo agrave China a visita de Mouratildeo e seu encontro com Xi Jiping marcaram a superaccedilatildeo de desconfianccedilas manifestadas durante a campan-ha e os meses iniciais de governo Para Mouratildeo a prioridade era restabelecer o funcionamento da Comissatildeo Sino-Brasileira de Alto Niacutevel de Concer-taccedilatildeo e Cooperaccedilatildeo (Cosban) e reorganizar sua es-trutura para que voltasse a ser um mecanismo de alto niacutevel Em sua percepccedilatildeo a China tem sido um parceiro confiaacutevel do Brasil desde 2009 ano em que se tornou seu maior parceiro comercial e no qual ocorreu a i Cuacutepula do brics Nesses dez anos de parceria estrateacutegica o fluxo comercial bilateral alcanccedilou usd$ 100 bilhotildees embora o Brasil expor-tasse muito mais produto in natura que produtos com valor agregado uma das reclamaccedilotildees que te-ria apresentado ao primeiro mandataacuterio chinecircs

A China vinha se transformando em um enor-me desafio regional e internacional para o Brasil

Em vinte anos a China transitou de ser vista como ldquoa oportunidaderdquo para ser percebida como desafio (Bernal-Meza 2014) de potencial grande merca-do para as importaccedilotildees e a exportaccedilatildeo de capitais a fazer de seus soacutecios latino-americanos periferia primaacuterio-exportadora A evoluccedilatildeo das relaccedilotildees econocircmicas entre a China e o Brasil de maneira bilateral e no acircmbito das relaccedilotildees no brics estaria sinalizando uma tendecircncia estrutural da configu-raccedilatildeo de um padratildeo de relaccedilotildees centro-periferia (Beckerman e Moncaut 2016 Becard 2017 Bernal- Meza 2019a 2019b)

O ingresso da China na economia poliacutetica da Ameacuterica do Sul deslocou o Brasil do lugar prepon-derante que ocupava dentro do bloco Mercosul e no contexto regional A respeito dos processos de integraccedilatildeo latino-americanos mdash em particu-lar do Mercosul mdash a China se transformou em um fator de profundo desequiliacutebrio porque foi se transformando no principal e segundo soacutecio mais importante da inserccedilatildeo econocircmica internacional da Ameacuterica do Sul (Hiratuka 2016 Dussel 2016) Isso afetou igualmente a posiccedilatildeo do Brasil como a principal economia para seus vizinhos No plano interno a presenccedila econocircmica chinesa parece es-tar condicionando a eventual autonomia do des-envolvimento industrial e tecnoloacutegico brasileiro ao exercer um crescente controle sobre a estrutura energeacutetica no setor eleacutetrico (Becard Lessa e Silveira 2020 Becard 2017)

A presenccedila chinesa na Ameacuterica Latina con-correu para enfraquecer a influecircncia brasileira sobre a integraccedilatildeo regional Entre os interesses brasileiros figurava a ideia de natildeo seguir a poliacuteti-ca adotada por Washington em relaccedilatildeo a algumas empresas chinesas em particular a gigante de te-lecomunicaccedilotildees Huawei Nesse sentido Mouratildeo que foi ldquoalertadordquo pelo governo norte-americano sobre os riscos das operaccedilotildees da empresa chi-nesa teria sugerido a Xi Jinping a criaccedilatildeo de um ambiente de confianccedila quanto agrave companhia ldquode modo que nenhum paiacutes que vaacute receber a empresa e a tecnologia que vocecircs vatildeo instalar e fique preocu-pado com que todos dados que estaratildeo em seu po-der pertenceratildeo tambeacutem ao governo [chinecircs] Esta eacute a discussatildeordquo (Arauacutejo et al 2019 sp) A expecta-tiva de abertura brasileira agrave tecnologia 5g chinesa

21Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

se vinculava ao fato de o paiacutes ainda natildeo estar inte-grado digitalmente e de ter um marco regulatoacuterio defasado no setor A presidecircncia brasileira passava a se posicionar de forma equidistante em relaccedilatildeo aos interesses de Washington e Pequim o que se estendia agrave poliacutetica adotada diante da guerra co-mercial entre as duas maiores economias Poucos casos ilustravam com tanta transparecircncia um dos mais importantes efeitos da transiccedilatildeo hegemocircnica em curso

Mouratildeo fora convencido pelo secretaacuterio-geral do Itamaraty Otaacutevio Brandelli quanto agrave adequa-ccedilatildeo de uma conduta flexiacutevel e pragmaacutetica Em face de uma guerra comercial dessa natureza o gover-no brasileiro deveria saber explorar as oportuni-dades Por exemplo como a administraccedilatildeo Trump taxou parcela das importaccedilotildees da China inicial-mente em torno de usd$ 250 bilhotildees os produtos envolvidos passaram a chegar mais caros no mer-cado norte-americano e eventualmente poderiam ser substituiacutedos por produtos brasileiros o que acrescentaria usd$ 5 bilhotildees ou mais nas nossas exportaccedilotildees A guerra comercial deveria assim ser tratada com paciecircncia

O limite da visatildeo do vice-presidente brasi-leiro mdash que dava vazatildeo agraves pressotildees do agrone-goacutecio mdash era evidente Temas como transferecircncia de tecnologia e cooperaccedilatildeo industrial natildeo foram abordados Indagado sobre o fato de o conflito de interesses entre Estados Unidos e China natildeo ser apenas comercial mas tambeacutem tecnoloacutegico a res-posta foi igualmente simplista ldquoVocecirc olha o 5g As quatro empresas que detecircm a tecnologia satildeo duas chinesas e duas finlandesas Cadecirc a americanardquo (Arauacutejo et al 2019 sp) Ou seja o governo bra-sileiro mdash afastadas as desconfianccedilas iniciais em relaccedilatildeo agrave China mdash voltava a se ocupar dos temas tratados em governos anteriores exportaccedilotildees de alimentos e mineacuterios investimentos diretos com geraccedilatildeo de empregos acordos de cooperaccedilatildeo em tecnologia estes uacuteltimos sem viacutenculo claro com qualquer projeto mais amplo de industrializaccedilatildeo e desenvolvimento tecnoloacutegico

O governo Bolsonaro aparentemente estava satisfeito com o status internacional do paiacutes sem atentar minimamente ao processo de desindus-trializaccedilatildeo das uacuteltimas deacutecadas (Benaion 2006

Cano 2012 Oliveira 2018) Para Chang (2018) nos anos 1980 e 1990 o Brasil conheceu o ponto mais alto da industrializaccedilatildeo que atingiu 35 da produccedilatildeo nacional No final de 2017 representa-va apenas 12 e a tendecircncia era de decliacutenio O Brasil tem nesse sentido voltado no tempo Em-presaacuterios de Satildeo Paulo natildeo parecem estar preocu-pados com o decliacutenio da induacutestria manufatureira No longo prazo essa poliacutetica eacute prejudicial para o paiacutes No governo Dilma Rousseff vaacuterios subsiacutedios foram canalizados para a induacutestria mas as altas taxas de juros natildeo favoreceram mudanccedilas efetivas (Oliveira 2018)

O processo de desindustrializaccedilatildeo as poliacuteticas econocircmicas e o conformismo com a condiccedilatildeo ldquosu-bordinadardquo do paiacutes instruiacuteram em outro momento o uso do conceito de ldquoperiferia proacutesperardquo para o crescimento econocircmico de meados da deacutecada de 2000 sustentado pela demanda chinesa (Doratioto e Vidigal 2015) As taxas de crescimento da China beneficiaram as exportaccedilotildees latino-americanas de produtos agriacutecolas mineacuterios petroacuteleo e produtos manufaturados de baixo valor agregado Conco-rreram por sua vez para reforccedilar o caraacuteter liberal perifeacuterico de economias como a brasileira (Filguei-ras e Gonccedilalves 2007)

Na poliacutetica externa era clara a intenccedilatildeo de re-duzir o peso do Itamaraty nas decisotildees relativas aos assuntos de seguranccedila e defesa fronteiras narcotraacutefico e outros delitos internacionais e imi-graccedilatildeo como no tema da crise na Venezuela e em outros assuntos sensiacuteveis na aacuterea da poliacutetica in-ternacional Quanto ao chanceler Ernesto Arauacutejo que havia impressionado negativamente a maioria dos estudiosos de poliacutetica externa e internacional em razatildeo de certo ldquomessianismordquo na defesa do Oci-dente e da administraccedilatildeo Trump passou a atuar de modo mais comedido e profissional como na ocasiatildeo da assinatura do acordo Mercosul-Uniatildeo Europeia no dia 28 de junho de 2019

Bolsonaro no final de reuniatildeo do g-20 em Osaka (28 e 29 de junho de 2019) se disse satis-feito com os resultados do encontro do brics e do proacuteprio g-20 aleacutem de destacar a importacircncia da conclusatildeo do acordo Mercosul-Uniatildeo Europeia Na reuniatildeo dos brics Bolsonaro desistiu de pro-por aos demais liacutederes o apoio a uma mudanccedila

22

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

de governo na Venezuela Foi tambeacutem a oportu-nidade para reconhecer o interesse brasileiro em manter bom diaacutelogo com o principal parceiro co-mercial do paiacutes

Os ajustes percebidos na conduccedilatildeo da poliacutetica externa natildeo significaram uma mudanccedila de rumo do governo Bolsonaro no que tange agrave priorizaccedilatildeo dos laccedilos com os Estados Unidos a Europa e o Ja-patildeo parceiros preferenciais nas deacutecadas de 1960 1970 e sob o governo de Cardoso Nesse sentido as relaccedilotildees com a China a despeito do discurso em prol de uma parceria estrateacutegica ou coisa que o valha tecircm sido tratadas de forma setorial mdash co-meacutercio investimentos cooperaccedilatildeo tecnoloacutegica mdash e descompromissada com qualquer planejamento Os laccedilos histoacutericos com os Estados Unidos em to-das as suas dimensotildees favorecem a acomodaccedilatildeo e a recusa em tratar seriamente a hipoacutetese da ldquoopccedilatildeo chinesardquo o que natildeo necessariamente eacute negativo

ConclusatildeoAs transiccedilotildees hegemocircnicas no marco da econo-mia poliacutetica mundial tecircm constituiacutedo um pro-blema externo e interno para os paiacuteses inseridos em uma relaccedilatildeo centro-periferia A ascensatildeo da China e sua presenccedila econocircmica na Ameacuterica do Sul tecircm levado alguns paiacuteses a incluiacute-la em seus caacutelculos estrateacutegicos A Argentina o Brasil e o Chile podem desempenhar um papel crucial nesse processo tendo em vista a relevacircncia geopoliacutetica e econocircmica do Cone Sul pois a polarizaccedilatildeo Es-tados Unidos-China cria janelas de oportunidade e gera maior permissibilidade no sistema interna-cional como diria Heacutelio Jaguaribe

Destacamos a identificaccedilatildeo das grandes linhas de continuidade e de ruptura que tecircm implicado o discurso do presidente Bolsonaro e dos principais colaboradores em relaccedilatildeo agrave tradiccedilatildeo da poliacutetica externa brasileira O contraponto inicial com a poliacutetica e o pensamento de Rio Branco com des-taque para as boas e privilegiadas relaccedilotildees com os Estados Unidos permitiu identificar periacuteodos de maior proximidade ou de distanciamento de Was-hington Bolsonaro estaacute proacuteximo dessa tradiccedilatildeo a de ver o Brasil como soacutecio proacuteximo dos Estados Unidos mas se afasta de praacuteticas autonomistas

como a da poliacutetica externa independente e a do pragmatismo responsaacutevel Praacuteticas essas que per-mitiriam avaliar de modo desassombrado as re-laccedilotildees com a China

Tanto a ascensatildeo da China como a posiccedilatildeo que ocupa Pequim na estrutura econocircmica brasileira planteiam desafios equivalentes ao que o Brasil ex-perimentou no comeccedilo do seacuteculo xx Agrave diferenccedila da visatildeo de Rio Branco durante a transiccedilatildeo da he-gemonia natildeo parece haver no governo de Bolsona-ro um olhar seguro sobre os impactos da transiccedilatildeo hegemocircnica nem do papel que o Brasil deveria des-empenhar na estrateacutegia global da China

Um terceiro tema de preocupaccedilatildeo eacute o das re-laccedilotildees com a Argentina A visita subsequente a Buenos Aires a assinatura do acordo para negociar um tratado de livre-comeacutercio entre o Mercosul e a Uniatildeo Europeia e o anuacutencio de que ambos os go-vernos iniciariam gestotildees conjuntas para a assina-tura de acordos de livre-comeacutercio com os Estados Unidos restabeleceram o bom diaacutelogo entre Bra-siacutelia e Buenos Aires ainda que persistam duacutevidas no governo Macri (Landim 2019) As incertezas se estenderam ao governo eleito em dezembro de 2019 em decorrecircncia de criacuteticas de natureza ideo-loacutegicas realizadas tanto por Bolsonaro quanto por Alberto Fernaacutendez Entretanto o diaacutelogo bilateral tende a se normalizar sem maiores pretensotildees no plano regional

O viacutenculo estrateacutegico entre Brasiacutelia e Buenos Aires tem sido chave para sustentar um espiacuterito de cooperaccedilatildeo e integraccedilatildeo na Ameacuterica do Sul que se baseia na credibilidade das accedilotildees e na boa feacute de uns e outros governos Desde 1985 o Brasil e a Argentina desenvolveram o que Cervo (2008) denominou de ldquorelaccedilotildees em eixordquo que se estabe-lecem ldquoquando precisamente a imagem um do outro corresponde agrave do parceiro que consegue estabelecer uma uniatildeo co-responsaacutevel [] Em outros termos o eixo comporta uma vertente exoacute-gena que o transcende porque abarca as relaccedilotildees regionais mesmo que coletivas []rdquo (pp 211-212) Eacute esse tipo de relaccedilotildees e sua projeccedilatildeo no Cone Sul que foi potencialmente afetada pelas primei-ras declaraccedilotildees e accedilotildees do governo Bolsonaro Ao promover um alinhamento com os Estados Uni-dos mdash ou ldquosem recompensardquo como diria Gerson

23Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Moura mdash reproduz o que o Brasil e outros paiacuteses latino-americanos adotaram como ldquoestrateacutegiardquo na deacutecada de 1990 sem os resultados esperados E ao abandonar a tradiccedilatildeo iniciada em 1961 e adaptada agraves diferentes conjunturas que se sucederam abriu matildeo de exercer o poder de barganha do paiacutes para fazer concessotildees sem contrapartidas equivalentes Nas circunstacircncias atuais diante da transiccedilatildeo he-gemocircnica Estados Unidos-China considerando os interesses do Brasil na Ameacuterica do Sul a equidis-tacircncia talvez seja o melhor caminho Diaacutelogo es-treito com Washington e autonomia em temas de interesse do paiacutes foram as opccedilotildees de Rio Branco

Referecircncias Arauacutejo E (2017) Trump e o Ocidente Cadernos de Poliacutetica

Exterior iii(6) 323-357

Arauacutejo E (2019 2 de janeiro) Discurso do minis-tro Ernesto Arauacutejo durante cerimocircnia de posse no Ministeacuterio das Relaccedilotildees Exteriores Brasiacutelia Re-cuperado de httpwwwitamaratygovbrpt-BRdiscursos-artigos-e-entrevistas-categoriaminis-tro-das-relacoes-exteriores-discursos19907-dis-curso-do-ministro-ernesto-araujo-durante-cerimo-nia-de-posse-no-ministerio-das-relacoes-exteriores-brasilia-2-de-janeiro-de-2019

Arauacutejo C Rittner D e Murakawa F (2019 30 de abril) Brasil descarta vetar presenccedila da Huawei em 5g avisa Mouratildeo (entrevista com o vice-presidente Hamilton Mouratildeo) g1 Recuperado de httpsvalorglobocombrasilnoticia20190607brasil-descarta-vetar-pre-senca-da-huawei-em-5g-avisa-mouraoghtml

Arrighi G (2008) Adam Smith em Pequim origens e fun-damentos do seacuteculo xxi Satildeo Paulo Brasil Boitempo

Bandeira L A M (2004) As relaccedilotildees perigosas Brasil-Es-tados Unidos Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Bra-sileira

Bandeira L A M (2003) Brasil Argentina e Estados Uni-dos da Triacuteplice Alianccedila ao Mercosul (1870-2003) Rio de Janeiro Editora Revan

Becard D (2017) China y Brasil iquestmodelo de relaciones Sur-Sur Em E Pastrana B e H Gehring (eds) La proyeccioacuten de China en Ameacuterica Latina y el Caribe (pp 387-408) Bogotaacute Colocircmbia Editorial Javeriana

Becard D Lessa A e Silveira L (2020) One step closer The politics and the economics of chinarsquos strategy in Brazil and the case of the electric power sector Em R Bernal-Meza R e X Li (eds) China-Latin America

relations in the 21st Century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 55-81) Nova York Estados Unidos Palgrave Macmillan

Becard D Barros-Platiau A e Lessa A (2019) Brazil in the brics after tem years Past present and near futu-re perspectives Em X Li (ed) The international po-litical economy of the brics (pp 135-149) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Beckerman M e Moncaut N (2016) Las relaciones en-tre China y Ameacuterica Latina iquestHacia la desestructura-cioacuten de los sistemas productivos de la regioacuten Em C Moneta e S Cesariacuten (eds) La tentacioacuten pragmaacutetica China-ArgentinaAmeacuterica Latina lo actual lo proacuteximo y lo distante (pp 185-202) Saacuteenz Pentildea Argentina Uni-versidad Nacional de Tres de Febrero

Benaion N (2006) Subordinaccedilatildeo reiterada imperialismo e desenvolvimento no Brasil Manaus Brasil Editora da Universidade Federal do Amazonas

Bernal-Meza R (2019a) Brazil as an emerging power The impact of international and internal deteriorational effect on the brics Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 118-134) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Bernal-Meza R (2019b) Brasil ascenso declinacioacuten y nuevos desafiacuteos de una potencia emergente (2003-2018) Revista Izquierdas 49(2020) 516-540

Bernal-Meza R (2015) Pensamiento chileno en la poliacuteti-ca exterior y en las teoriacuteas de relaciones internaciona-les Em M Artaza e C Ross (eds) La poliacutetica exterior de Chile 1990-2009 (pp 21-47) Santiago Chile ril Editores

Bernal-Meza R (2014) La heterogeneidad de la imagen de China en la poliacutetica exterior latinoamericana Pers-pectivas para la concertacioacuten de poliacuteticas Comentario Internacional 14 113-134

Bernal-Meza R (2013) Ameacuterica Latina en el mundo el pensamiento latino-americano y la teoriacutea de relaciones internaciones Buenos Aires Argentina Grupo Editor Latinoamericano

Bernal-Meza R (2002) A poliacutetica exterior do Brasil 1990-2002 Revista Brasileira de Poliacutetica Internacional 45(1) 36-71

Bernal-Meza R e Bizzozero L (eds) (2014) La poliacutetica internacional de Brasil de la regioacuten al mundo Monte-videacuteu Uruguai Ediciones Cruz del Sur

Bernal-Meza R e Li X (eds) (2020) China-Latin Ameri-ca relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges Nova York Estados Uni-dos Palgrave Macmillan

24

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

Bolsonaro J (2018) O caminho da prosperidade pro-posta de Plano de Governo Recuperado de httpdivulgacandcontastsejusbrcandidaturasof i-cial2018BRBR2022802018280000614517propos-ta_1534284632231pdf

Bricentildeo Ruiz J e Simonoff A (orgs) (2015) Integracioacuten y cooperacioacuten regional en Ameacuterica Latina una relectura a partir de la teoriacutea de la autonomiacutea Buenos Aires Ar-gentina Editorial Biblos

Bueno C (2003) Poliacutetica externa da Primeira Repuacuteblica os anos de apogeu (1902-1918) Satildeo Paulo Brasil Paz e Terra

Cano W (2012) A desindustrializaccedilatildeo no Brasil (texto para discussatildeo 200) Campinas Brasil Instituto de Economia da Unicamp

Cervo A L (2019 28 de novembro) Governo Bolso-naro natildeo traraacute ruptura agrave poliacutetica externa Exame Recuperado de httpsexameabrilcombrmundogoverno-bolsonaro-nao-trara-ruptura-a-politica-ex-terna-avalia-amado-cervo

Cervo A (2008) Inserccedilatildeo internacional formaccedilatildeo dos conceitos brasileiros Satildeo Paulo Brasil Saraiva

Cervo A (2002) Relaccedilotildees Internacionais do Brasil a era Cardoso Revista Brasileira de Poliacutetica Internacional 45(1) 5-35

Cervo A e Bueno C (2015) Histoacuteria da poliacutetica exterior do Brasil Brasiacutelia Brasil Editora da Universidade de Brasiacutelia

Chang H H (2018 15 jan) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da histoacuteria da economia El Paiacutes Recuperado de ht-tpsbrasilelpaiscombrasil20180105econo-mia1515177346_780498html

Cronologia relembre os fatos mais importantes da cri-se venezuelana g1 httpsg1globocommundonoticia20190430cronologia-relembre-os-fa-tos-mais-importantes-na-crise-venezuelanaghtml

Doratioto F e Vidigal C (2015) Histoacuteria das Relaccedilotildees In-ternacionais do Brasil Satildeo Paulo Brasil Editora Saraiva

Dussel Peters E (coord) (2016) La nueva relacioacuten comer-cial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestInte-gracioacuten o desintegracioacuten regional Meacutexico-df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universidades de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico

Filgueiras L e Gonccedilalves R (2007) A economia poliacutetica do governo Lula Rio de Janeiro Brasil Contraponto

Fiori J(1999) Estado e moedas no desenvolvimento das naccedilotildees Petroacutepolis Brasil Vozes

Flisfisch A (2011) La Poliacutetica exterior chilena y Ameacuterica del Sur Estudios Internacionales (168) 115-141

Fonseca Jr G (2012) Rio Branco diante do Monroiacutesmo e do Pan-Americanismo anotaccedilotildees Em M Pereira e M Gomes (orgs) Baratildeo do Rio Branco 100 anos de memoacuteria (pp 565-602) Brasiacutelia Brasil Fundaccedilatildeo Alexandre de Gusmatildeo

Franccedila T (2007) Self made nation Domiacutecio da Gama e o pragmatismo do bom senso (tese de doutorado) Brasiacute-lia Brasil Universidade de Brasiacutelia

Guimaratildees S (2018) A poliacutetica exterior e a posiccedilatildeo do Brasil no mundo Recuperado de httpswwwnodalam201812a-politica-exterior-e-a-posicao-do-brasil-no-mundo-por-samuel-pinheiro-guimaraes-2

Gullo M (2018) Relaciones internacionales una teoriacutea criacutetica desde la periferia latinoamericana Buenos Ai-res Argentina Editorial Biblos

Gullo M (2014) A subordinaccedilatildeo fundante breve histoacuteria da construccedilatildeo do poder pelas naccedilotildees Florianoacutepolis Brasil Insular

Hiratuka C (2016) Impactos de China sobre el proceso de integracioacuten regional de Mercosur Em E Dussel Peters (coord) La nueva relacioacuten comercial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestIntegracioacuten o desintegracioacuten (pp 195-243) Meacutexico df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universida-des de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico Recuperado de httpswww3ecouni-campbrNeitimagesdestaque2016_La_nueva_rela-cion_comercial_ALC_Chinapdf

Hobsbawm E (1994) Extremes The Short Twentieth Cen-tury 1914-1991 Londres Inglaterra Michael Joseph Ltd

Kennedy P (1987) The rise and fall of the great powers Economic change and military conflict from 1500 to 2000 Nova York Estados Unidos Vintage Books

Keohane R e Nye J (1977) Power and interdependence World politics in transition Boston Estados Unidos Little Brown and Company

Lafer C (2002) JK e o programa de metas (1956-1961) Rio de Janeiro Brasil Fundaccedilatildeo Getuacutelio Vargas

Landim R (2019 6 de setembro) Brasil e Argentina adiam em 9 anos livre-comeacutercio de autos Folha de S Paulo Recuperado de httpswww1folhauolcombrmerca-do201909brasil-e-argentina-adiam-em-9-anos-li-vre-comercio-de-autosshtml

Lessa A e Oliveira H A (orgs) (2013) Parcerias estra-teacutegicas do Brasil v 1 os significados e as experiecircncias tradicionais Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

25Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Li X (2020) Revisiting China-Latin America economic relations An unintended consequence of different industrialization strategies Em R Bernal-Meza e X Li (eds) China-Latin America relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 225-251) Nova York Estados UnidosLondres Inglaterra Palgrave Macmillan

Li X (2019a) Chinarsquos dual position in the capitalist world order A dual complexity of hegemony and counter-he-gemony Em Li X (ed) The international political eco-nomy of the brics (pp 1-17) Abindon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2019b) The international political economy of the brics Nova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2014) The brics and beyond The international political economy of the emergence of a new world or-der Farnham Reino Unido Ashgate

Li X (2012) China y el orden mundial capitalista el nexo de la transformacioacuten interna de China y su impacto externo Em R Bernal-Meza e S Quintanar (eds) Regionalismo y Orden Mundial Surameacuterica Europa China (pp 29-53) Buenos Aires Argentina Nuevoha-cerUniversidad Nacional del Centro de la Provincia de Buenos Aires

Li X e Farah A (eds) (2013) China-Africa relations in an era of great transformations Farnham Reino Unido Ashgate

Lins A (1996) Rio Branco (Biografia) Satildeo Paulo Brasil Editora Alfa Omega

Mandelbaum M (2010) The frugal superpower Americarsquos global leadership in a cash-strapped era Nova York Es-tados Unidos Public Affairs

Meneses E (1988) Coping with decline Chilean fo-reign policy during the twentieth century 1902-1972 Oxford Reino Unido University of OxfordBodleian Library

Nabuco J (1949) Obras completas v xii Rio de Janeiro Brasil Instituto Progresso Editorial sa

Nasr V (2014) The dispensable nation American foreign policy in retreat Nova York Estados Unidos Anchor and Doubleday

Oliveira R (2018 15 de janeiro) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da his-toacuteria da economia (entrevista com Ha-Joon Chang) El Paiacutes Recuperado de httpsbrasilelpaiscombra-sil20180105economia1515177346_780498html

Pearson F e Rochester M (2007) Relaciones internacio-nales situacioacuten global en el siglo xxi Meacutexico-df Meacute-xico Mc Graw Hill

Pecequilo C (2012) As relaccedilotildees Brasil-Estados Unidos Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

Polanyi K (1957) The great transformation the political and economic origins of our time Boston Estados Uni-dos Beacon Press

Rodrigues J Seitenfus R e Rodrigues L (orgs) (1995) Uma histoacuteria diplomaacutetica do Brasil (1531-1945) Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Brasileira

Seitenfus R (2003) O Brasil vai agrave guerra o processo de envolvimento brasileiro na Segunda Guerra Mundial 3a ed Satildeo Paulo Brasil Barueri

Spector M (2019 25 abril) Eacute hora de construir uma po-liacutetica externa poacutes-Bolsonaro Folha de S Paulo Re-cuperado de httpswww1folhauolcombr colunasmatiasspektor201904e-hora-de-construir-a-politi-ca-externa-pos-bolsonaroshtml

Stunkel O Com Bolsonaro a poliacutetica externa se tor-nou uma caixa de surpresas (entrevista agrave Deutsche Welle Brasil) Recuperado de httpswwwterracombrnoticiasbrasil com-bolsonaro-politica-ex-terna-se-tornou-uma-caixa-de-surpresas 7f6f-814287c0240a2f3f93ad aa39af65jpo4zbzghtml

Tarzi S (2007) Neorealism neoliberalism and the inter-national system International Studies (41) 115-128

Vadell J e Ramos L (2019) The role of declining Brazil and ascending China in the brics initiative Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 75-94) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Viana F L (1959) A vida do Baratildeo do Rio Branco Rio de Janeiro Brasil Joseacute Olympio

Vidigal C (2009) Relaccedilotildees Brasil-Argentina o primeiro ensaio Curitiba Brasil Juruaacute

Page 4: Bolsonaro versus Rio Branco: transição hegemônica, América ...2011/02/15  · Contra-hegemonia e ordem capitalista mundial por meio do brics, brics-plus e de outros agru-pamentos,

14

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

Vadell e Ramos 2019) hegemonia em suas relaccedilotildees com a semiperiferia e a periferia Ameacuterica Latina e Aacutefrica (Li e Farah 2013 Becard e Lessa 2019 Li 2020 Bernal-Meza e Li 2020)

Na primeira parte do artigo eacute apresentada a trajetoacuteria da poliacutetica exterior brasileira do final do seacuteculo xix agrave deacutecada de 1960 quando surgiram as primeiras criacuteticas agrave ordem internacional do poacutes-guerra ao sistema interamericano e agrave depen-decircncia das economias latino-americanas em re-laccedilatildeo agraves potecircncias centrais O debate que permeia essa seccedilatildeo diz respeito agrave construccedilatildeo da hegemo-nia norte-americana na Ameacuterica Latina agrave forma como o Baratildeo do Rio Branco adequou a poliacutetica exterior brasileira agrave conjuntura do iniacutecio do seacuteculo xx e sua influecircncia nas deacutecadas seguintes A se-gunda trata do recente processo de globalizaccedilatildeo de como o Brasil respondeu agrave nova conjuntura e como tem tratado de temas como a ascensatildeo da China o decliacutenio relativo dos Estados Unidos e os avanccedilos e recuos na integraccedilatildeo sul-americana nas deacutecadas iniciais do seacuteculo xxi Na terceira parte a poliacutetica externa de Rio Branco e as relaccedilotildees com a Gratilde-Bretanha com os Estados Unidos e com os paiacuteses latino-americanos satildeo comparadas com a poliacutetica externa do governo Bolsonaro aleacutem dis-so eacute avaliado como a nova poliacutetica se diferencia da poliacutetica externa universalista dos governos de Lula da Silva (Lessa e Oliveira 2013 Bernal-Meza e Bizzozero 2014 Cervo e Bueno 2015)

A questatildeo eacute a de saber se Bolsonaro ldquodesafiardquo Rio Branco ao se aproximar da potecircncia decli-nante os Estados Unidos e se afastar da potecircncia ascendente a China ainda se no acircmbito sul-ame-ricano a tendecircncia seria a de esvaziar a integraccedilatildeo regional e afirmar a ldquolideranccedilardquo brasileira ao con-traacuterio da busca do equiliacutebrio nas relaccedilotildees platinas adotadas por Rio Branco Nas consideraccedilotildees finais nossa conclusatildeo eacute uma hipoacutetese as diferenccedilas principais entre a transiccedilatildeo hegemocircnica do pas-sado e a atual mdash e que explicariam as opccedilotildees do governo Bolsonaro mdash seriam 1 os viacutenculos histoacute-ricos entre as economias as sociedades e as cultu-ras britacircnica e norte-americana em contraste com as diferenccedilas poliacuteticas sociais e culturais entre os Estados Unidos e a China 2 a proximidade geo-graacutefica econocircmica e cultural do Brasil em relaccedilatildeo

aos Estados Unidos mais forte nos dias de hoje do que 130 anos atraacutes e a distacircncia geograacutefica e cultu-ral em relaccedilatildeo agrave China 3 a dependecircncia estrutural na aacuterea de defesa o que praticamente impossibilita a ldquoopccedilatildeo chinesardquo ou a ldquoopccedilatildeo dos bricsrdquo A proxi-midade das Forccedilas Armadas brasileiras com as instituiccedilotildees similares estadunidenses a provisatildeo de equipamento militar dos Estados Unidos e de seus aliados europeus e a ausecircncia de fornecimento por parte da China inibem a possibilidade de apro-ximaccedilatildeo com a China nessa aacuterea

O recuo ao periacuteodo de Rio Branco como con-traponto agrave atual poliacutetica externa do Brasil adveacutem do fato de ele ter consolidado a transiccedilatildeo do eu-ropeiacutesmo para o americanismo nos termos pro-postos por Bueno (2003) Nesse sentido sua gestatildeo tornou-se um marco no posicionamento brasileiro diante da transiccedilatildeo hegemocircnica do Reino Unido para os Estados Unidos da Ameacuterica ilustrado pela criaccedilatildeo da primeira embaixada brasileira em Washington-dc

De Rio Branco agrave poliacutetica externa independente autonomia e permissibilidade Rio Branco concluiu no plano poliacutetico a etapa de convergecircncias entre os Estados Unidos e o Brasil iniciada com a Proclamaccedilatildeo da Repuacuteblica (1889) deste uacuteltimo Sua gestatildeo promoveu o apoio brasi-leiro agraves posiccedilotildees norte-americanas diante da Ve-nezuela em 1902 e da Colocircmbia no ano seguinte (Doratioto e Vidigal 2015) Essa poliacutetica com breves periacuteodos de distanciamento mdash durante a ldquopoliacutetica externa independenterdquo e o ldquopragmatismo ecumecircnico e responsaacutevelrdquo mdash tem sido mantida ateacute o presente Os governos do Partido dos Trabalha-dores (pt) embora tenham participado e impul-sionado o Foacuterum de Diaacutelogo entre Iacutendia Brasil e Aacutefrica do Sul (Ibas) e o brics nunca imaginaram esses agrupamentos como contra-hegemocircnicos ante os Estados Unidos o que eacute igualmente vaacutelido para os governos de Michel Temer e Jair Bolsonaro

A historiografia em especial a partir dos tra-balhos de Aacutelvaro Lins (1996) e de Luiz Viana Filho (1959) convergiu em torno da ideia de que Rio

15Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Branco natildeo foi um homem de Estado que tenha se orientado pelo militarismo ou pelo imperialismo Pautado pela convicccedilatildeo nos sentimentos paciacutefi-cos dos governos aos quais serviu considerava primordial o reconhecimento pelos demais paiacute-ses sul-americanos de que o paiacutes natildeo tinha feito uso da forccedila natildeo se apresentando como potencial ameaccedila aos vizinhos entre os anos 1870 e o iniacutecio do novo seacuteculo Certamente natildeo se deve receber de maneira acriacutetica a autoimagem que Rio Branco fazia de si e dos governos brasileiros pois muitos foram os seus criacuteticos e conhecidos satildeo os atritos com o ministro argentino Estanislao Zeballos ou o jogo entre competiccedilatildeo e entente do Brasil com a Argentina e o Chile (Meneses 1988) para citar apenas um exemplo

Durante sua gestatildeo dois de seus colaboradores expressaram posicionamentos distintos um mais vinculado aos desiacutegnios de Washington outro simultaneamente criacutetico e admirador Joaquim Nabuco e Domiacutecio da Gama Para Nabuco a Dou-trina Monroe e o corolaacuterio Roosevelt significavam que os paiacuteses americanos haviam se desprendido da Europa ldquocomo a lua da terrardquo o que levou o his-toriador Joseacute Honoacuterio Rodrigues a sugerir que Na-buco tivesse por princiacutepio marchar sempre com eles ao menos sempre que possiacutevel (Nabuco 1949 Franccedila 2007) Domiacutecio da Gama afastava-se da visatildeo de Nabuco sobre a Doutrina Monroe pois a considerava carente de reciprocidade portanto em desacordo com interesses brasileiros

A poliacutetica brasileira para a Ameacuterica do Sul e na regiatildeo do Prata foi e talvez seja ainda mateacuteria con-troversa A amizade que deveria reger as relaccedilotildees com a Argentina e o Chile natildeo excluiacutea a criaccedilatildeo de um poder dissuasoacuterio por parte do Rio de Janeiro Ao lado da rivalidade tradicional entre os trecircs paiacuteses mdash excetuando talvez as relaccedilotildees Brasil-Chile mdash havia a compreensatildeo por parte do Rio de Janeiro sobre a necessidade de estabelecer relaccedilotildees amigaacute-veis no Cone Sul (Argentina Boliacutevia Chile Para-guai e Uruguai) notadamente em sua dimensatildeo geopoliacutetica

A partir de 1909 as tensotildees na regiatildeo arrefe-ceram sem que a rivalidade entre a Argentina e o Brasil saiacutesse da agenda O siacutembolo dessa aproxi-maccedilatildeo foi a frase proferida por Saacuteenz Pentildea ldquoTodo

nos une nada nos separardquo (citado por Bandeira 2003 p 125) Na conjuntura da Primeira Guerra Mundial a Argentina o Brasil e o Chile assina-ram o Tratado do abc voltado para a coordenaccedilatildeo das poliacuteticas de defesa do Cone Sul O abc natildeo foi bem-recebido nos Estados Unidos por ser poten-cialmente um contrapeso agrave sua influecircncia nem nos paiacuteses sul-americanos sob o argumento de que uma poliacutetica pan-americana natildeo deveria com-portar preponderacircncias restritas que eliminassem a ampla participaccedilatildeo dos Estados nacionais da re-giatildeo (Bandeira 2004)

Quanto agraves relaccedilotildees do Brasil com a Gratilde- Bretanha vista como ldquopotecircncia decadenterdquo estive-ram subordinadas ao decliacutenio econocircmico britacircni-co Diferentemente da Argentina cuja orientaccedilatildeo principal seguiraacute voltada para Londres ateacute a Se-gunda Guerra Mundial o Brasil priorizou os laccedilos com Washington desde a Proclamaccedilatildeo da Repuacute-blica em 1889

Desde o iniacutecio do seacuteculo xx a Gratilde-Bretanha passou a dar liberdade de accedilatildeo para os Estados Unidos no Hemisfeacuterio Ocidental explicitado por Balfour em 1903 ao afirmar que os britacircni-cos natildeo desejavam a colonizaccedilatildeo a aquisiccedilatildeo de territoacuterios ou as alteraccedilotildees no equiliacutebrio de po-der ldquoa Doutrina Monroe natildeo estava portanto em tela de juiacutezordquo (citado por Bueno 2003 p 32) A adoccedilatildeo por Londres do nihil obstat diante da presenccedila estadunidense na Ameacuterica Latina con-corria para a adoccedilatildeo de praacuteticas imperialistas por parte de Washington mas prevalecia a ideia de que era do interesse dos capitalistas britacircnicos que a potecircncia norte-americana assumisse o pa-pel de poliacutecia internacional Como destacou Po-lanyi em A grande transformaccedilatildeo (Polanyi 1957) o padratildeo-ouro e o constitucionalismo eram os instrumentos que tornaram conhecida a voz da City de Londres em muitos dos paiacuteses menores que adotaram esses siacutembolos de adesatildeo agrave nova ordem internacional No caso do Brasil a passa-gem da hegemonia britacircnica para a estadunidense se deu de forma amistosa ao longo de algumas deacutecadas ainda que natildeo isenta de momentos de desconfianccedila como nos eventos da Proclamaccedilatildeo da Repuacuteblica e nos anos iniciais do novo regime (Bueno 2003 Cervo e Bueno 2015)

16

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

O processo modernizador do Brasil nos finais do seacuteculo xix dependeu do comeacutercio com os Esta-dos Unidos pois os superaacutevits na balanccedila comercial geravam excedentes para atender amortizaccedilotildees serviccedilos de empreacutestimos britacircnicos e para custear o complexo exportador nas matildeos dos ingleses A concorrecircncia comercial entre norte-americanos e ingleses segundo Cervo estabeleceu-se no Brasil apenas em pequena escala Nessa conjuntura os Estados Unidos elevaram seu interesse no paiacutes com a intenccedilatildeo de abrir mercados e equilibrar suas contas (Cervo e Bueno 2015)

Nas deacutecadas iniciais do seacuteculo xx o Brasil es-treitou laccedilos com os Estados Unidos manteve boas relaccedilotildees econocircmicas e diplomaacuteticas com a Gratilde-Bre-tanha e atuou de forma autocircnoma nas questotildees mais delicadas das relaccedilotildees sul-americanas em especial as do Cone Sul Nas quatro deacutecadas que se seguiram agrave Primeira Guerra Mundial a poliacutetica exterior brasileira foi regida principalmente pelas demandas das relaccedilotildees com os Estados Unidos As accedilotildees ou ensaios de autonomia representados pela participaccedilatildeo brasileira nas negociaccedilotildees do poacutes-gue-rra pelo comeacutercio compensado com a Alemanha permitiriam a Getuacutelio Vargas mdash que ascendera agrave Presidecircncia na Revoluccedilatildeo de 1930 cargo no qual permaneceria ateacute 1945 mdash o exerciacutecio da ldquopoliacutetica de barganhardquo com esse paiacutes e com os Estados Unidos (Bandeira 2004 Seitenfus 2003 Cervo e Bueno 2015 Doratioto e Vidigal 2015)

Na construccedilatildeo da nova ordem mundial do se-gundo poacutes-guerra o Brasil se alinhou aos Estados Unidos na Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (onu) e no processo de construccedilatildeo do Sistema Interame-ricano Durante os governos Dutra Vargas Cafeacute Filho e os anos iniciais de Kubitschek o Brasil procurou buscar recursos financeiros e tecnoloacute-gicos junto aos Estados Unidos para a promoccedilatildeo do desenvolvimento econocircmico Das primei-ras conferecircncias interamericanas do poacutes-guerra (Chapultepec Rio de Janeiro Bogotaacute) ateacute 1958 estabeleceu-se um diaacutelogo de surdos enquanto o Brasil no que foi acompanhado pela maioria dos paiacuteses latino-americanos reivindicava uma defi-niccedilatildeo expliacutecita por parte de Washington quanto aos aportes a serem feitos na regiatildeo o governo norte-americano cobrava compromisso com as

instituiccedilotildees internacionais com os preceitos da Guerra Fria e com as necessidades impostas pela aacuterea de seguranccedila O resultado foi o crescente des-conforto das lideranccedilas poliacuteticas latino-america-nas diante da atitude reticente de Washington e do anti-americanismo em alguns paiacuteses

Em maio de 1958 por ocasiatildeo da viagem do vice- presidente Nixon ao Peru e agrave Venezuela o governo americano percebeu a dimensatildeo da insatisfaccedilatildeo dos paiacuteses sul-americanos com o tratamento que Was-hington vinha dispensando agraves suas demandas e a necessidade de rever sua poliacutetica para a regiatildeo Entre os desdobramentos da visita de Nixon destacou-se a iniciativa do presidente Kubitschek de escrever a Eisenhower propondo um esforccedilo conjunto de cooperaccedilatildeo econocircmica dos paiacuteses americanos em prol de projetos nacionais de desenvolvimento logo denominada ldquoOperaccedilatildeo Pan-Americanardquo (Cervo e Bueno 2015 Cervo 2008 Lafer 2002) Diante do novo quadro na poliacutetica regional o governo norte-americano levou o debate para o acircmbito do Conselho Econocircmico e Social da Organizaccedilatildeo dos Estados Americanos (oea) onde foi criado o Comitecirc dos 21 encarregado de gerir a implementaccedilatildeo da opa2 Os trabalhos realizados no Comitecirc permitem identificar uma poliacutetica protelatoacuteria por parte da representaccedilatildeo norte-americana com o intuito de esvaziar o conteuacutedo ldquodesenvolvimentistardquo da pro-posta brasileira em favor de uma visatildeo essencial-mente assistencialista (Vidigal 2009)

A poliacutetica externa de Jacircnio Quadros autointi-tulada ldquoPoliacutetica Externa Independenterdquo procurou superar os constrangimentos das deacutecadas anterio-res por meio de uma orientaccedilatildeo que priorizava a expansatildeo do comeacutercio e a diversificaccedilatildeo dos laccedilos internacionais o estabelecimento de relaccedilotildees di-plomaacuteticas com paiacuteses socialistas a luta contra o subdesenvolvimento e o empenho em favor da in-tegraccedilatildeo econocircmica regional sem romper com a posiccedilatildeo tradicional do Brasil em outros pontos da agenda internacional como o respeito ao ldquomundo livrerdquo agrave oea e agrave onu

2 Iniciativa do governo Juscelino Kubitschek junto agrave ad-ministraccedilatildeo de Eisenhower incorporada agrave oea que objetivava a promoccedilatildeo do desenvolvimento dos paiacuteses latino-americanos com o apoio dos Estados Unidos da Ameacuterica

17Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Da autonomia dos anos 2000 ao ldquonovo alinhamentordquo Embora Lula tenha incentivado e participado de alianccedilas contra-hegemocircnicas no acircmbito da eco-nomia poliacutetica internacional como o Ibas e o brics natildeo se pode afirmar que ele ou sua suces-sora Dilma Rousseff tenha desenvolvido uma po-liacutetica internacional contraacuteria aos Estados Unidos (Pecequilo 2012 Cervo e Bueno 2015) Sempre se tratou de relaccedilotildees ldquocentraisrdquo ou ldquocruciaisrdquo para o Brasil mas tambeacutem de grande assimetria Para o Brasil pensar nos Estados Unidos eacute pensar em sua poliacutetica exterior (Pecequilo 2012) como uma ldquoparceria estrateacutegicardquo que influencia as estruturas socioeconocircmicas do paiacutes ao longo do tempo (Cer-vo 2008) Essa tradiccedilatildeo que remonta a Rio Branco apresentou-se na trajetoacuteria histoacuterica do paiacutes como parceria estrateacutegica em alguns momentos ou como alinhamento em outros

A poliacutetica externa do pt se caracterizou pelo multilateralismo e pelo fortalecimento e cons-truccedilatildeo de parcerias estrateacutegicas O que diferencia esse passado com a etapa iniciada com a presidecircn-cia de Bolsonaro talvez seja a adesatildeo agrave poliacutetica de rechaccedilo do globalismo e do multilateralismo

O governo Bolsonaro comeccedilou a aproximar-se dos Estados Unidos por meio de ideias mdash expres-sas pela visatildeo do ministro Ernesto Arauacutejo mdash e de accedilotildees Durante a campanha e nos primeiros me-ses de governo manifestaccedilotildees do Presidente de seu filho Eduardo e de um dos mentores de seu projeto Olavo de Carvalho demonstravam que o estreitamento dos laccedilos com Washington era mais o resultado de contatos com grupos poliacuteticos norte-americanos simpatizantes de Trump do que fruto de um entendimento poliacutetico consistente

Bolsonaro introduziu cinco mudanccedilas na po-liacutetica externa sul-americana do Brasil em com-paraccedilatildeo ao periacuteodo 2003-2016 1 recolocou o paiacutes em uma relaccedilatildeo estreita agrave poliacutetica exterior norte--americana 2 retirou seu apoio e logo comeccedilou a incentivar mdash juntamente com o presidente chileno Pintildeera mdash um novo agrupamento para substituir a Uniatildeo de Naccedilotildees Sul-Americanas (Unasul) 3 abandonou o respaldo poliacutetico ao governo vene-zuelano identificando-o como a principal ameaccedila

para a seguranccedila e estabilidade da regiatildeo 4 pas-sou a tratar o Mercado Comum do Sul (Mercosul) como um tema secundaacuterio na agenda 5 reduziu a prioridade que Brasiacutelia mdash desde 1985 mdash atribuiacutea a Buenos Aires em favor do Chile primeiro paiacutes a ser visitado pelo novo presidente

Qual poderia ser a explicaccedilatildeo de colocar o Chile como o primeiro paiacutes a visitar Sinalizar que foi devido agrave sintonia poliacutetica natildeo o explica posto que Macri eacute tatildeo liberal quanto Pintildeera Eacute possiacutevel entatildeo Bolsonaro tenha tentado retomar a visatildeo que Rio Branco tinha em relaccedilatildeo ao Cone Sul e buscar uma nova aproximaccedilatildeo com o Chile O Brasil e o Chile compartilham hoje uma posiccedilatildeo criacutetica a respeito do regionalismo poliacutetico sul-americano em par-ticular sobre a Unasul mas a Argentina tambeacutem Entretanto o imaginaacuterio do Chile em relaccedilatildeo a pa-radigmas e visotildees sobre o sistema internacional eacute distinto do brasileiro Satildeo dois paiacuteses com capaci-dades atributos e recursos de poder enormemente diferentes Em parte o modelo de inserccedilatildeo inter-nacional e seus instrumentos satildeo semelhantes em ambos os paiacuteses a visatildeo ideal do tipo de Estado a internacionalizaccedilatildeo da economia e o papel das empresas assim como papel que desempenha o capital privado Mas tambeacutem grandes diferenccedilas o Brasil tem uma histoacuterica vocaccedilatildeo industrialista mdash que natildeo existe atualmente no Chile mdash e uma aspiraccedilatildeo a concertar internamente os diversos segmentos e recursos de poder induacutestria ciecircncia e teacutecnica pesquisa e desenvolvimento papel do mercado interno de consumo e outros todas ques-totildees que satildeo muito relativas no modelo chileno

O Brasil eacute um global trader que se pensou glo-bal player cujos interesses satildeo tanto econocircmicos como poliacuteticos e sugerem a aspiraccedilatildeo a uma par-ticipaccedilatildeo influente na tomada de decisotildees no siste-ma internacional e nos organismos internacionais Na interpretaccedilatildeo de Cervo e Bueno esta foi a he-ranccedila dos dois governos de Lula a de desempe-nhar o papel que era devido no acircmbito hemisfeacuterico e no cenaacuterio internacional (Cervo e Bueno 2015) O Brasil pressupunha que seus vizinhos regionais reconhecessem a priori suas condiccedilotildees de lide-ranccedila e hegemonia sob um soft power Poreacutem nos anos recentes sob os governos da Concertaccedilatildeo o Chile buscou colocar-se como modelo de inserccedilatildeo

18

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

regional e tem procurado disputar com o Brasil essa condiccedilatildeo de lideranccedila natural (Bernal-Meza 2015 Flisfisch 2011)

Provavelmente a decisatildeo de visitar primeira-mente o Chile tenha sido resultado da influecircncia do ministro da Economia Paulo Guedes Egresso do curso de Economia da Universidade de Chicago e admirador do liberalismo e do ldquomodelordquo chileno Guedes teceu elogios ao Chile em diversas ocasiotildees em visatildeo superficial sobre o sucesso econocircmico da-quele modelo e a viabilidade de aplicaacute-lo ao Brasil de hoje Ademais somou-se aos criacuteticos da Unasul e da poliacutetica de contemporizaccedilatildeo com Caracas

Segundo o embaixador Pinheiro Guimaratildees secretaacuterio-geral do Ministeacuterio das Relaccedilotildees Ex-teriores (mre tambeacutem chamado de ldquoItamaratyrdquo) durante os governos de Lula essas posiccedilotildees jaacute tin-ham antecedentes

no periacuteodo de Michel Temer o Brasil se juntou aos paiacuteses da Alianccedila do Paciacutefico e aos paiacuteses do Grupo de Lima contra a Venezuela infringindo os prin-ciacutepios de autodeterminaccedilatildeo e de natildeo intervenccedilatildeo gerando desconfianccedilas e ressentimentos no esforccedilo de agradar aos Estados Unidos em sua campanha para derrubar o governo venezuelanordquo (Guimaratildees 2018 sp)

No discurso de posse o ministro das Relaccedilotildees Exteriores pocircs a figura do presidente Bolsonaro como um libertador do Brasil e definiu a nova etapa da poliacutetica exterior como aquela que se libertava do passado Em suas palavras ldquoo presidente Bolso-naro estaacute libertando o Brasil por meio da verdade Noacutes vamos tambeacutem libertar a poliacutetica externa va-mos libertar o Itamaraty como o presidente Bolso-naro prometeu que fariacuteamos em seu discurso da vitoacuteriardquo (Arauacutejo 2019 sp)

Segundo Cervo (2019) Bolsonaro e Cardoso coincidem

os dois presidentes tecircm uma visatildeo de mundo e da inserccedilatildeo internacional do Brasil semelhante satildeo li-berais nesse sentido inovadores relativamente ao periacuteodo anterior a seus mandatos de governos mais nacionalistas e introspectivos Isso significa para a poliacutetica exterior um novo ciclo de abertura da eco-nomia a empreendimentos capitais e tecnologias vindas de forardquo (sp)

Para Cervo (2002) natildeo haveria ruptura na poliacute-tica exterior porque ela apresenta haacute seacuteculos trecircs traccedilos que compotildeem a estrateacutegia brasileira de longo prazo universalismo cooperaccedilatildeo e pacifismo Mas haacute que se recordar daquelas diretrizes que marca-ram a poliacutetica externa de Cardoso (Bernal-Meza 2002) Nesse sentido eacute possiacutevel que o viacutenculo com os Estados Unidos e as potecircncias do capitalismo central o apoio agraves instituiccedilotildees de governanccedila glo-bal sustentada pela hegemonia norte-americana e a posiccedilatildeo a favor do Ocidente ante os conflitos mundiais bem como o suposto enfrentamento ci-vilizatoacuterio deixem para traacutes o que Bandeira (2004) denominou de ldquorelaccedilotildees perigosasrdquo

O americanismo do governo Bolsonaro entre-tanto parece desmentir Cervo ou seja concilia o alinhamento poliacutetico aos Estados Unidos com a repulsa ao universalismo e mesmo agrave cooperaccedilatildeo e ao pacifismo O chanceler Ernesto Arauacutejo elogia Trump como ldquoum cavalheiro cruzado que luta para resgatar a identidade do Ocidenterdquo Para Arauacutejo (2017) Trump e sua poliacutetica internacional repre-sentam a disposiccedilatildeo para uma luta global para re-cuperar o passado simboacutelico que tem representado a histoacuteria e a cultura das naccedilotildees ocidentais para a sobrevivecircncia e o domiacutenio do Ocidente

Um grande questionamento eacute o que aconteceraacute com o papel que a poliacutetica exterior brasileira tem desempenhado na regiatildeo e se ela retornaraacute agrave dispo-siccedilatildeo para a lideranccedila que marcou o periacuteodo Lula ou se deixaraacute nas matildeos de potecircncias secundaacuterias mdash como o Chile mdash essa posiccedilatildeo o paiacutes que Bolso-naro considera um modelo No plano da poliacutetica internacional um posicionamento em linha com a poliacutetica de Trump poderia ter grandes impactos Uma maior aproximaccedilatildeo mdash ou coincidecircncias mdash com a poliacutetica de Washington afastaria o Brasil de sua tendecircncia mais tradicional a da autonomia mdash cujo efeito seria um afastamento relativo do brics e a predisposiccedilatildeo do presidente Bolsonaro a resta-belecer uma relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo militar com os Estados Unidos (Cervo 2019) o que despertaria na regiatildeo velhos temores mdash nunca esquecidos mdash so-bre o subimperialismo brasileiro

Haacute que se considerar nesses aspectos que a poliacutetica externa do governo Bolsonaro tem sido in-formada por diferentes grupos de interesse o que

19Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

resulta muitas vezes em uma praacutetica erraacutetica in-consistente e excessivamente ideoloacutegica (Stunkel 2019 Spector 2019) Diferentemente de outras si-tuaccedilotildees semelhantes mdash Dutra Castelo Branco ou Collor mdash desta feita o Itamaraty natildeo atuou como contraponto agrave presidecircncia alimentando muitas vezes o discurso ideoloacutegico

Bolsonaro e Trump parecem ter muitos pontos em comum Entre as coincidecircncias mais delicadas estaacute seu rechaccedilo ao ldquoglobalismordquo3 o que revela que ambos os presidentes estatildeo dispostos a depreciar o que as diplomacias de seus proacuteprios paiacuteses cons-truiacuteram sob o sistema internacional contemporacirc-neo a criaccedilatildeo e fortalecimento das organizaccedilotildees internacionais o sistema das Naccedilotildees Unidas e as negociaccedilotildees mundiais sobre assuntos que impor-tavam agrave sociedade internacional Accedilotildees que se plasmaram em temas e agendas globais como o meio ambiente e a mudanccedila climaacutetica Ambas se-riam tendecircncias de mudanccedila profunda que impac-tariam todo o cenaacuterio latino-americano O mais preocupante eacute imaginar o Brasil imerso em um enfrentamento a respeito do papel do Ocidente na defesa da chamada ldquocultura ocidentalrdquo posto que ela tem sido o instrumento mais importante do co-lonialismo e da dominaccedilatildeo das potecircncias ociden-tais sobre a periferia do mundo

O que parecia ser manifestaccedilotildees de desinte-resse (ao menos) a respeito de seu soacutecio estrateacute-gico sul-americano Bolsonaro ao natildeo incluir a Argentina em sua primeira viagem ao exterior e as declaraccedilotildees de seu ministro da Economia a respeito do Mercosul o que indicava que este natildeo seria uma prioridade para o Brasil pode trazer consequecircncias negativas para as relaccedilotildees sul-ame-ricanas Deve-se recordar que a base de qualquer entendimento de cooperaccedilatildeo governanccedila re-gional e continuidade para fazer da regiatildeo uma

3 ldquoGlobalismordquo em sentido pejorativo foi o termo utilizado por Bolsonaro e por seus principais auxiliares para cri-ticar nos meses iniciais de seu governo as poliacuteticas de inserccedilatildeo do Brasil no cenaacuterio global por meio de uma par-ticipaccedilatildeo proativa em foros multilaterais e nos debates sobre os temas mais sensiacuteveis da agenda internacional Argumento apresentado pelo ministro Arauacutejo em seu dis-curso de posse por meio de uma obviedade ldquoNatildeo estamos aqui para trabalhar pela ordem global Aqui eacute o Brasilrdquo (Arauacutejo 2019 sp)

zona militarmente desnuclearizada passa por uma relaccedilatildeo cordial entre o Brasil e a Argentina A construccedilatildeo de uma ldquozona de pazrdquo no Atlacircntico Sul por meio da superaccedilatildeo das hipoacuteteses de con-flito entre a Argentina e o Chile tem se baseado na continuidade dessa relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo A partir dessas perspectivas a presidecircncia Bolso-naro natildeo soacute implicaria o retorno da Ameacuterica do Sul agraves concepccedilotildees ideoloacutegicas radicalizadas que se supunham superadas que incluem novos viacutenculos estreitos em mateacuteria de seguranccedila com os Estados Unidos mas tambeacutem o iniacutecio de uma etapa de in-certeza na regiatildeo

Alinhamento com Washington incertezas quanto a PequimO alinhamento com Washington agrave eacutepoca de Rio Branco seguia um roteiro previsiacutevel diante da potecircncia ascendente a adesatildeo aos princiacutepios do Direito Internacional a incorporaccedilatildeo acriacutetica do conceito de ldquobom governordquo e a convicccedilatildeo de que o progresso da naccedilatildeo dependia dos desiacutegnios do norte Nada parecido se via em relaccedilatildeo a Londres que ainda conservava o status de principal centro financeiro internacional mas que perdia impor-tacircncia no intercacircmbio de mercadorias Mais de um seacuteculo depois o novo alinhamento mdash e este eacute o contraponto que se mencionou na introduccedilatildeo mdash manteacutem o principal das relaccedilotildees internacionais do paiacutes voltado para os Estados Unidos De acordo com a hipoacutetese de trabalho inicial a de estarmos em meio a uma transiccedilatildeo hegemocircnica dos Estados Unidos para a China Bolsonaro estaria em dis-sonacircncia com Rio Branco

Os primeiros meses de 2019 revelaram que o governo Bolsonaro sustentava na poliacutetica externa o principal das promessas de campanha acompa-nhadas do mote ldquoo Brasil acima de tudordquo Inspira-do no governo de Trump o discurso de supremacia contrastava com o silecircncio diante da poliacutetica pro-tecionista de Washington que elevara a tarifa para a importaccedilatildeo do accedilo e subsidiava a produccedilatildeo de soja ambas as medidas prejudiciais para os inte-resses brasileiros Ante eventuais perdas setoriais o governo seguia fiel ao princiacutepio do alinhamento em dissonacircncia com o legado de Rio Branco

20

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

A crise na Venezuela e os interesses econocircmi-cos do agronegoacutecio no mercado chinecircs levariam o governo a modificar em parte a retoacuterica inicial o que indicaria estar em curso ajustes e reorientaccedilotildees na aacuterea No dia 23 de fevereiro o autoproclamado presidente interino da Venezuela Juan Guaidoacute liderou um esforccedilo de tentar fazer com que ca-minhotildees com alimentos adentrassem a Venezue-la como forma de pressionar o governo Maduro Em Pacaraima o chanceler brasileiro explicava se tratar de um ato humanitaacuterio altruiacutesta ldquoum mo-mento de criaccedilatildeo de uma nova realidade na Ve-nezuelardquo Quanto agrave possibilidade de intervenccedilatildeo Arauacutejo considerava que ldquonatildeo haacute menor expectativa de conflito mas claro que o Exeacutercito estaacute prepa-rado caso isso possa se materializarrdquo (Cronologia 2019 sp)

Na visatildeo do vice-presidente Mouratildeo que natildeo ocultava a influecircncia estadunidense a crise vene-zuelana soacute seria superada com a neutralizaccedilatildeo de agentes externos em especial a presenccedila cubana Se essa situaccedilatildeo continuasse a Venezuela correria o risco de se tornar um ldquonatildeo Estadordquo (Arauacutejo Ritt-ner e Murakawa 2019) Mouratildeo ao mesmo tempo que natildeo contemporizava com o governo Maduro indicava natildeo estar de acordo in totum com o alin-hamento com Washington nessa questatildeo ao colo-car em duacutevida a legitimidade de Juan Guaidoacute

Em relaccedilatildeo agrave China a visita de Mouratildeo e seu encontro com Xi Jiping marcaram a superaccedilatildeo de desconfianccedilas manifestadas durante a campan-ha e os meses iniciais de governo Para Mouratildeo a prioridade era restabelecer o funcionamento da Comissatildeo Sino-Brasileira de Alto Niacutevel de Concer-taccedilatildeo e Cooperaccedilatildeo (Cosban) e reorganizar sua es-trutura para que voltasse a ser um mecanismo de alto niacutevel Em sua percepccedilatildeo a China tem sido um parceiro confiaacutevel do Brasil desde 2009 ano em que se tornou seu maior parceiro comercial e no qual ocorreu a i Cuacutepula do brics Nesses dez anos de parceria estrateacutegica o fluxo comercial bilateral alcanccedilou usd$ 100 bilhotildees embora o Brasil expor-tasse muito mais produto in natura que produtos com valor agregado uma das reclamaccedilotildees que te-ria apresentado ao primeiro mandataacuterio chinecircs

A China vinha se transformando em um enor-me desafio regional e internacional para o Brasil

Em vinte anos a China transitou de ser vista como ldquoa oportunidaderdquo para ser percebida como desafio (Bernal-Meza 2014) de potencial grande merca-do para as importaccedilotildees e a exportaccedilatildeo de capitais a fazer de seus soacutecios latino-americanos periferia primaacuterio-exportadora A evoluccedilatildeo das relaccedilotildees econocircmicas entre a China e o Brasil de maneira bilateral e no acircmbito das relaccedilotildees no brics estaria sinalizando uma tendecircncia estrutural da configu-raccedilatildeo de um padratildeo de relaccedilotildees centro-periferia (Beckerman e Moncaut 2016 Becard 2017 Bernal- Meza 2019a 2019b)

O ingresso da China na economia poliacutetica da Ameacuterica do Sul deslocou o Brasil do lugar prepon-derante que ocupava dentro do bloco Mercosul e no contexto regional A respeito dos processos de integraccedilatildeo latino-americanos mdash em particu-lar do Mercosul mdash a China se transformou em um fator de profundo desequiliacutebrio porque foi se transformando no principal e segundo soacutecio mais importante da inserccedilatildeo econocircmica internacional da Ameacuterica do Sul (Hiratuka 2016 Dussel 2016) Isso afetou igualmente a posiccedilatildeo do Brasil como a principal economia para seus vizinhos No plano interno a presenccedila econocircmica chinesa parece es-tar condicionando a eventual autonomia do des-envolvimento industrial e tecnoloacutegico brasileiro ao exercer um crescente controle sobre a estrutura energeacutetica no setor eleacutetrico (Becard Lessa e Silveira 2020 Becard 2017)

A presenccedila chinesa na Ameacuterica Latina con-correu para enfraquecer a influecircncia brasileira sobre a integraccedilatildeo regional Entre os interesses brasileiros figurava a ideia de natildeo seguir a poliacuteti-ca adotada por Washington em relaccedilatildeo a algumas empresas chinesas em particular a gigante de te-lecomunicaccedilotildees Huawei Nesse sentido Mouratildeo que foi ldquoalertadordquo pelo governo norte-americano sobre os riscos das operaccedilotildees da empresa chi-nesa teria sugerido a Xi Jinping a criaccedilatildeo de um ambiente de confianccedila quanto agrave companhia ldquode modo que nenhum paiacutes que vaacute receber a empresa e a tecnologia que vocecircs vatildeo instalar e fique preocu-pado com que todos dados que estaratildeo em seu po-der pertenceratildeo tambeacutem ao governo [chinecircs] Esta eacute a discussatildeordquo (Arauacutejo et al 2019 sp) A expecta-tiva de abertura brasileira agrave tecnologia 5g chinesa

21Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

se vinculava ao fato de o paiacutes ainda natildeo estar inte-grado digitalmente e de ter um marco regulatoacuterio defasado no setor A presidecircncia brasileira passava a se posicionar de forma equidistante em relaccedilatildeo aos interesses de Washington e Pequim o que se estendia agrave poliacutetica adotada diante da guerra co-mercial entre as duas maiores economias Poucos casos ilustravam com tanta transparecircncia um dos mais importantes efeitos da transiccedilatildeo hegemocircnica em curso

Mouratildeo fora convencido pelo secretaacuterio-geral do Itamaraty Otaacutevio Brandelli quanto agrave adequa-ccedilatildeo de uma conduta flexiacutevel e pragmaacutetica Em face de uma guerra comercial dessa natureza o gover-no brasileiro deveria saber explorar as oportuni-dades Por exemplo como a administraccedilatildeo Trump taxou parcela das importaccedilotildees da China inicial-mente em torno de usd$ 250 bilhotildees os produtos envolvidos passaram a chegar mais caros no mer-cado norte-americano e eventualmente poderiam ser substituiacutedos por produtos brasileiros o que acrescentaria usd$ 5 bilhotildees ou mais nas nossas exportaccedilotildees A guerra comercial deveria assim ser tratada com paciecircncia

O limite da visatildeo do vice-presidente brasi-leiro mdash que dava vazatildeo agraves pressotildees do agrone-goacutecio mdash era evidente Temas como transferecircncia de tecnologia e cooperaccedilatildeo industrial natildeo foram abordados Indagado sobre o fato de o conflito de interesses entre Estados Unidos e China natildeo ser apenas comercial mas tambeacutem tecnoloacutegico a res-posta foi igualmente simplista ldquoVocecirc olha o 5g As quatro empresas que detecircm a tecnologia satildeo duas chinesas e duas finlandesas Cadecirc a americanardquo (Arauacutejo et al 2019 sp) Ou seja o governo bra-sileiro mdash afastadas as desconfianccedilas iniciais em relaccedilatildeo agrave China mdash voltava a se ocupar dos temas tratados em governos anteriores exportaccedilotildees de alimentos e mineacuterios investimentos diretos com geraccedilatildeo de empregos acordos de cooperaccedilatildeo em tecnologia estes uacuteltimos sem viacutenculo claro com qualquer projeto mais amplo de industrializaccedilatildeo e desenvolvimento tecnoloacutegico

O governo Bolsonaro aparentemente estava satisfeito com o status internacional do paiacutes sem atentar minimamente ao processo de desindus-trializaccedilatildeo das uacuteltimas deacutecadas (Benaion 2006

Cano 2012 Oliveira 2018) Para Chang (2018) nos anos 1980 e 1990 o Brasil conheceu o ponto mais alto da industrializaccedilatildeo que atingiu 35 da produccedilatildeo nacional No final de 2017 representa-va apenas 12 e a tendecircncia era de decliacutenio O Brasil tem nesse sentido voltado no tempo Em-presaacuterios de Satildeo Paulo natildeo parecem estar preocu-pados com o decliacutenio da induacutestria manufatureira No longo prazo essa poliacutetica eacute prejudicial para o paiacutes No governo Dilma Rousseff vaacuterios subsiacutedios foram canalizados para a induacutestria mas as altas taxas de juros natildeo favoreceram mudanccedilas efetivas (Oliveira 2018)

O processo de desindustrializaccedilatildeo as poliacuteticas econocircmicas e o conformismo com a condiccedilatildeo ldquosu-bordinadardquo do paiacutes instruiacuteram em outro momento o uso do conceito de ldquoperiferia proacutesperardquo para o crescimento econocircmico de meados da deacutecada de 2000 sustentado pela demanda chinesa (Doratioto e Vidigal 2015) As taxas de crescimento da China beneficiaram as exportaccedilotildees latino-americanas de produtos agriacutecolas mineacuterios petroacuteleo e produtos manufaturados de baixo valor agregado Conco-rreram por sua vez para reforccedilar o caraacuteter liberal perifeacuterico de economias como a brasileira (Filguei-ras e Gonccedilalves 2007)

Na poliacutetica externa era clara a intenccedilatildeo de re-duzir o peso do Itamaraty nas decisotildees relativas aos assuntos de seguranccedila e defesa fronteiras narcotraacutefico e outros delitos internacionais e imi-graccedilatildeo como no tema da crise na Venezuela e em outros assuntos sensiacuteveis na aacuterea da poliacutetica in-ternacional Quanto ao chanceler Ernesto Arauacutejo que havia impressionado negativamente a maioria dos estudiosos de poliacutetica externa e internacional em razatildeo de certo ldquomessianismordquo na defesa do Oci-dente e da administraccedilatildeo Trump passou a atuar de modo mais comedido e profissional como na ocasiatildeo da assinatura do acordo Mercosul-Uniatildeo Europeia no dia 28 de junho de 2019

Bolsonaro no final de reuniatildeo do g-20 em Osaka (28 e 29 de junho de 2019) se disse satis-feito com os resultados do encontro do brics e do proacuteprio g-20 aleacutem de destacar a importacircncia da conclusatildeo do acordo Mercosul-Uniatildeo Europeia Na reuniatildeo dos brics Bolsonaro desistiu de pro-por aos demais liacutederes o apoio a uma mudanccedila

22

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

de governo na Venezuela Foi tambeacutem a oportu-nidade para reconhecer o interesse brasileiro em manter bom diaacutelogo com o principal parceiro co-mercial do paiacutes

Os ajustes percebidos na conduccedilatildeo da poliacutetica externa natildeo significaram uma mudanccedila de rumo do governo Bolsonaro no que tange agrave priorizaccedilatildeo dos laccedilos com os Estados Unidos a Europa e o Ja-patildeo parceiros preferenciais nas deacutecadas de 1960 1970 e sob o governo de Cardoso Nesse sentido as relaccedilotildees com a China a despeito do discurso em prol de uma parceria estrateacutegica ou coisa que o valha tecircm sido tratadas de forma setorial mdash co-meacutercio investimentos cooperaccedilatildeo tecnoloacutegica mdash e descompromissada com qualquer planejamento Os laccedilos histoacutericos com os Estados Unidos em to-das as suas dimensotildees favorecem a acomodaccedilatildeo e a recusa em tratar seriamente a hipoacutetese da ldquoopccedilatildeo chinesardquo o que natildeo necessariamente eacute negativo

ConclusatildeoAs transiccedilotildees hegemocircnicas no marco da econo-mia poliacutetica mundial tecircm constituiacutedo um pro-blema externo e interno para os paiacuteses inseridos em uma relaccedilatildeo centro-periferia A ascensatildeo da China e sua presenccedila econocircmica na Ameacuterica do Sul tecircm levado alguns paiacuteses a incluiacute-la em seus caacutelculos estrateacutegicos A Argentina o Brasil e o Chile podem desempenhar um papel crucial nesse processo tendo em vista a relevacircncia geopoliacutetica e econocircmica do Cone Sul pois a polarizaccedilatildeo Es-tados Unidos-China cria janelas de oportunidade e gera maior permissibilidade no sistema interna-cional como diria Heacutelio Jaguaribe

Destacamos a identificaccedilatildeo das grandes linhas de continuidade e de ruptura que tecircm implicado o discurso do presidente Bolsonaro e dos principais colaboradores em relaccedilatildeo agrave tradiccedilatildeo da poliacutetica externa brasileira O contraponto inicial com a poliacutetica e o pensamento de Rio Branco com des-taque para as boas e privilegiadas relaccedilotildees com os Estados Unidos permitiu identificar periacuteodos de maior proximidade ou de distanciamento de Was-hington Bolsonaro estaacute proacuteximo dessa tradiccedilatildeo a de ver o Brasil como soacutecio proacuteximo dos Estados Unidos mas se afasta de praacuteticas autonomistas

como a da poliacutetica externa independente e a do pragmatismo responsaacutevel Praacuteticas essas que per-mitiriam avaliar de modo desassombrado as re-laccedilotildees com a China

Tanto a ascensatildeo da China como a posiccedilatildeo que ocupa Pequim na estrutura econocircmica brasileira planteiam desafios equivalentes ao que o Brasil ex-perimentou no comeccedilo do seacuteculo xx Agrave diferenccedila da visatildeo de Rio Branco durante a transiccedilatildeo da he-gemonia natildeo parece haver no governo de Bolsona-ro um olhar seguro sobre os impactos da transiccedilatildeo hegemocircnica nem do papel que o Brasil deveria des-empenhar na estrateacutegia global da China

Um terceiro tema de preocupaccedilatildeo eacute o das re-laccedilotildees com a Argentina A visita subsequente a Buenos Aires a assinatura do acordo para negociar um tratado de livre-comeacutercio entre o Mercosul e a Uniatildeo Europeia e o anuacutencio de que ambos os go-vernos iniciariam gestotildees conjuntas para a assina-tura de acordos de livre-comeacutercio com os Estados Unidos restabeleceram o bom diaacutelogo entre Bra-siacutelia e Buenos Aires ainda que persistam duacutevidas no governo Macri (Landim 2019) As incertezas se estenderam ao governo eleito em dezembro de 2019 em decorrecircncia de criacuteticas de natureza ideo-loacutegicas realizadas tanto por Bolsonaro quanto por Alberto Fernaacutendez Entretanto o diaacutelogo bilateral tende a se normalizar sem maiores pretensotildees no plano regional

O viacutenculo estrateacutegico entre Brasiacutelia e Buenos Aires tem sido chave para sustentar um espiacuterito de cooperaccedilatildeo e integraccedilatildeo na Ameacuterica do Sul que se baseia na credibilidade das accedilotildees e na boa feacute de uns e outros governos Desde 1985 o Brasil e a Argentina desenvolveram o que Cervo (2008) denominou de ldquorelaccedilotildees em eixordquo que se estabe-lecem ldquoquando precisamente a imagem um do outro corresponde agrave do parceiro que consegue estabelecer uma uniatildeo co-responsaacutevel [] Em outros termos o eixo comporta uma vertente exoacute-gena que o transcende porque abarca as relaccedilotildees regionais mesmo que coletivas []rdquo (pp 211-212) Eacute esse tipo de relaccedilotildees e sua projeccedilatildeo no Cone Sul que foi potencialmente afetada pelas primei-ras declaraccedilotildees e accedilotildees do governo Bolsonaro Ao promover um alinhamento com os Estados Uni-dos mdash ou ldquosem recompensardquo como diria Gerson

23Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Moura mdash reproduz o que o Brasil e outros paiacuteses latino-americanos adotaram como ldquoestrateacutegiardquo na deacutecada de 1990 sem os resultados esperados E ao abandonar a tradiccedilatildeo iniciada em 1961 e adaptada agraves diferentes conjunturas que se sucederam abriu matildeo de exercer o poder de barganha do paiacutes para fazer concessotildees sem contrapartidas equivalentes Nas circunstacircncias atuais diante da transiccedilatildeo he-gemocircnica Estados Unidos-China considerando os interesses do Brasil na Ameacuterica do Sul a equidis-tacircncia talvez seja o melhor caminho Diaacutelogo es-treito com Washington e autonomia em temas de interesse do paiacutes foram as opccedilotildees de Rio Branco

Referecircncias Arauacutejo E (2017) Trump e o Ocidente Cadernos de Poliacutetica

Exterior iii(6) 323-357

Arauacutejo E (2019 2 de janeiro) Discurso do minis-tro Ernesto Arauacutejo durante cerimocircnia de posse no Ministeacuterio das Relaccedilotildees Exteriores Brasiacutelia Re-cuperado de httpwwwitamaratygovbrpt-BRdiscursos-artigos-e-entrevistas-categoriaminis-tro-das-relacoes-exteriores-discursos19907-dis-curso-do-ministro-ernesto-araujo-durante-cerimo-nia-de-posse-no-ministerio-das-relacoes-exteriores-brasilia-2-de-janeiro-de-2019

Arauacutejo C Rittner D e Murakawa F (2019 30 de abril) Brasil descarta vetar presenccedila da Huawei em 5g avisa Mouratildeo (entrevista com o vice-presidente Hamilton Mouratildeo) g1 Recuperado de httpsvalorglobocombrasilnoticia20190607brasil-descarta-vetar-pre-senca-da-huawei-em-5g-avisa-mouraoghtml

Arrighi G (2008) Adam Smith em Pequim origens e fun-damentos do seacuteculo xxi Satildeo Paulo Brasil Boitempo

Bandeira L A M (2004) As relaccedilotildees perigosas Brasil-Es-tados Unidos Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Bra-sileira

Bandeira L A M (2003) Brasil Argentina e Estados Uni-dos da Triacuteplice Alianccedila ao Mercosul (1870-2003) Rio de Janeiro Editora Revan

Becard D (2017) China y Brasil iquestmodelo de relaciones Sur-Sur Em E Pastrana B e H Gehring (eds) La proyeccioacuten de China en Ameacuterica Latina y el Caribe (pp 387-408) Bogotaacute Colocircmbia Editorial Javeriana

Becard D Lessa A e Silveira L (2020) One step closer The politics and the economics of chinarsquos strategy in Brazil and the case of the electric power sector Em R Bernal-Meza R e X Li (eds) China-Latin America

relations in the 21st Century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 55-81) Nova York Estados Unidos Palgrave Macmillan

Becard D Barros-Platiau A e Lessa A (2019) Brazil in the brics after tem years Past present and near futu-re perspectives Em X Li (ed) The international po-litical economy of the brics (pp 135-149) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Beckerman M e Moncaut N (2016) Las relaciones en-tre China y Ameacuterica Latina iquestHacia la desestructura-cioacuten de los sistemas productivos de la regioacuten Em C Moneta e S Cesariacuten (eds) La tentacioacuten pragmaacutetica China-ArgentinaAmeacuterica Latina lo actual lo proacuteximo y lo distante (pp 185-202) Saacuteenz Pentildea Argentina Uni-versidad Nacional de Tres de Febrero

Benaion N (2006) Subordinaccedilatildeo reiterada imperialismo e desenvolvimento no Brasil Manaus Brasil Editora da Universidade Federal do Amazonas

Bernal-Meza R (2019a) Brazil as an emerging power The impact of international and internal deteriorational effect on the brics Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 118-134) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Bernal-Meza R (2019b) Brasil ascenso declinacioacuten y nuevos desafiacuteos de una potencia emergente (2003-2018) Revista Izquierdas 49(2020) 516-540

Bernal-Meza R (2015) Pensamiento chileno en la poliacuteti-ca exterior y en las teoriacuteas de relaciones internaciona-les Em M Artaza e C Ross (eds) La poliacutetica exterior de Chile 1990-2009 (pp 21-47) Santiago Chile ril Editores

Bernal-Meza R (2014) La heterogeneidad de la imagen de China en la poliacutetica exterior latinoamericana Pers-pectivas para la concertacioacuten de poliacuteticas Comentario Internacional 14 113-134

Bernal-Meza R (2013) Ameacuterica Latina en el mundo el pensamiento latino-americano y la teoriacutea de relaciones internaciones Buenos Aires Argentina Grupo Editor Latinoamericano

Bernal-Meza R (2002) A poliacutetica exterior do Brasil 1990-2002 Revista Brasileira de Poliacutetica Internacional 45(1) 36-71

Bernal-Meza R e Bizzozero L (eds) (2014) La poliacutetica internacional de Brasil de la regioacuten al mundo Monte-videacuteu Uruguai Ediciones Cruz del Sur

Bernal-Meza R e Li X (eds) (2020) China-Latin Ameri-ca relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges Nova York Estados Uni-dos Palgrave Macmillan

24

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

Bolsonaro J (2018) O caminho da prosperidade pro-posta de Plano de Governo Recuperado de httpdivulgacandcontastsejusbrcandidaturasof i-cial2018BRBR2022802018280000614517propos-ta_1534284632231pdf

Bricentildeo Ruiz J e Simonoff A (orgs) (2015) Integracioacuten y cooperacioacuten regional en Ameacuterica Latina una relectura a partir de la teoriacutea de la autonomiacutea Buenos Aires Ar-gentina Editorial Biblos

Bueno C (2003) Poliacutetica externa da Primeira Repuacuteblica os anos de apogeu (1902-1918) Satildeo Paulo Brasil Paz e Terra

Cano W (2012) A desindustrializaccedilatildeo no Brasil (texto para discussatildeo 200) Campinas Brasil Instituto de Economia da Unicamp

Cervo A L (2019 28 de novembro) Governo Bolso-naro natildeo traraacute ruptura agrave poliacutetica externa Exame Recuperado de httpsexameabrilcombrmundogoverno-bolsonaro-nao-trara-ruptura-a-politica-ex-terna-avalia-amado-cervo

Cervo A (2008) Inserccedilatildeo internacional formaccedilatildeo dos conceitos brasileiros Satildeo Paulo Brasil Saraiva

Cervo A (2002) Relaccedilotildees Internacionais do Brasil a era Cardoso Revista Brasileira de Poliacutetica Internacional 45(1) 5-35

Cervo A e Bueno C (2015) Histoacuteria da poliacutetica exterior do Brasil Brasiacutelia Brasil Editora da Universidade de Brasiacutelia

Chang H H (2018 15 jan) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da histoacuteria da economia El Paiacutes Recuperado de ht-tpsbrasilelpaiscombrasil20180105econo-mia1515177346_780498html

Cronologia relembre os fatos mais importantes da cri-se venezuelana g1 httpsg1globocommundonoticia20190430cronologia-relembre-os-fa-tos-mais-importantes-na-crise-venezuelanaghtml

Doratioto F e Vidigal C (2015) Histoacuteria das Relaccedilotildees In-ternacionais do Brasil Satildeo Paulo Brasil Editora Saraiva

Dussel Peters E (coord) (2016) La nueva relacioacuten comer-cial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestInte-gracioacuten o desintegracioacuten regional Meacutexico-df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universidades de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico

Filgueiras L e Gonccedilalves R (2007) A economia poliacutetica do governo Lula Rio de Janeiro Brasil Contraponto

Fiori J(1999) Estado e moedas no desenvolvimento das naccedilotildees Petroacutepolis Brasil Vozes

Flisfisch A (2011) La Poliacutetica exterior chilena y Ameacuterica del Sur Estudios Internacionales (168) 115-141

Fonseca Jr G (2012) Rio Branco diante do Monroiacutesmo e do Pan-Americanismo anotaccedilotildees Em M Pereira e M Gomes (orgs) Baratildeo do Rio Branco 100 anos de memoacuteria (pp 565-602) Brasiacutelia Brasil Fundaccedilatildeo Alexandre de Gusmatildeo

Franccedila T (2007) Self made nation Domiacutecio da Gama e o pragmatismo do bom senso (tese de doutorado) Brasiacute-lia Brasil Universidade de Brasiacutelia

Guimaratildees S (2018) A poliacutetica exterior e a posiccedilatildeo do Brasil no mundo Recuperado de httpswwwnodalam201812a-politica-exterior-e-a-posicao-do-brasil-no-mundo-por-samuel-pinheiro-guimaraes-2

Gullo M (2018) Relaciones internacionales una teoriacutea criacutetica desde la periferia latinoamericana Buenos Ai-res Argentina Editorial Biblos

Gullo M (2014) A subordinaccedilatildeo fundante breve histoacuteria da construccedilatildeo do poder pelas naccedilotildees Florianoacutepolis Brasil Insular

Hiratuka C (2016) Impactos de China sobre el proceso de integracioacuten regional de Mercosur Em E Dussel Peters (coord) La nueva relacioacuten comercial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestIntegracioacuten o desintegracioacuten (pp 195-243) Meacutexico df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universida-des de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico Recuperado de httpswww3ecouni-campbrNeitimagesdestaque2016_La_nueva_rela-cion_comercial_ALC_Chinapdf

Hobsbawm E (1994) Extremes The Short Twentieth Cen-tury 1914-1991 Londres Inglaterra Michael Joseph Ltd

Kennedy P (1987) The rise and fall of the great powers Economic change and military conflict from 1500 to 2000 Nova York Estados Unidos Vintage Books

Keohane R e Nye J (1977) Power and interdependence World politics in transition Boston Estados Unidos Little Brown and Company

Lafer C (2002) JK e o programa de metas (1956-1961) Rio de Janeiro Brasil Fundaccedilatildeo Getuacutelio Vargas

Landim R (2019 6 de setembro) Brasil e Argentina adiam em 9 anos livre-comeacutercio de autos Folha de S Paulo Recuperado de httpswww1folhauolcombrmerca-do201909brasil-e-argentina-adiam-em-9-anos-li-vre-comercio-de-autosshtml

Lessa A e Oliveira H A (orgs) (2013) Parcerias estra-teacutegicas do Brasil v 1 os significados e as experiecircncias tradicionais Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

25Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Li X (2020) Revisiting China-Latin America economic relations An unintended consequence of different industrialization strategies Em R Bernal-Meza e X Li (eds) China-Latin America relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 225-251) Nova York Estados UnidosLondres Inglaterra Palgrave Macmillan

Li X (2019a) Chinarsquos dual position in the capitalist world order A dual complexity of hegemony and counter-he-gemony Em Li X (ed) The international political eco-nomy of the brics (pp 1-17) Abindon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2019b) The international political economy of the brics Nova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2014) The brics and beyond The international political economy of the emergence of a new world or-der Farnham Reino Unido Ashgate

Li X (2012) China y el orden mundial capitalista el nexo de la transformacioacuten interna de China y su impacto externo Em R Bernal-Meza e S Quintanar (eds) Regionalismo y Orden Mundial Surameacuterica Europa China (pp 29-53) Buenos Aires Argentina Nuevoha-cerUniversidad Nacional del Centro de la Provincia de Buenos Aires

Li X e Farah A (eds) (2013) China-Africa relations in an era of great transformations Farnham Reino Unido Ashgate

Lins A (1996) Rio Branco (Biografia) Satildeo Paulo Brasil Editora Alfa Omega

Mandelbaum M (2010) The frugal superpower Americarsquos global leadership in a cash-strapped era Nova York Es-tados Unidos Public Affairs

Meneses E (1988) Coping with decline Chilean fo-reign policy during the twentieth century 1902-1972 Oxford Reino Unido University of OxfordBodleian Library

Nabuco J (1949) Obras completas v xii Rio de Janeiro Brasil Instituto Progresso Editorial sa

Nasr V (2014) The dispensable nation American foreign policy in retreat Nova York Estados Unidos Anchor and Doubleday

Oliveira R (2018 15 de janeiro) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da his-toacuteria da economia (entrevista com Ha-Joon Chang) El Paiacutes Recuperado de httpsbrasilelpaiscombra-sil20180105economia1515177346_780498html

Pearson F e Rochester M (2007) Relaciones internacio-nales situacioacuten global en el siglo xxi Meacutexico-df Meacute-xico Mc Graw Hill

Pecequilo C (2012) As relaccedilotildees Brasil-Estados Unidos Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

Polanyi K (1957) The great transformation the political and economic origins of our time Boston Estados Uni-dos Beacon Press

Rodrigues J Seitenfus R e Rodrigues L (orgs) (1995) Uma histoacuteria diplomaacutetica do Brasil (1531-1945) Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Brasileira

Seitenfus R (2003) O Brasil vai agrave guerra o processo de envolvimento brasileiro na Segunda Guerra Mundial 3a ed Satildeo Paulo Brasil Barueri

Spector M (2019 25 abril) Eacute hora de construir uma po-liacutetica externa poacutes-Bolsonaro Folha de S Paulo Re-cuperado de httpswww1folhauolcombr colunasmatiasspektor201904e-hora-de-construir-a-politi-ca-externa-pos-bolsonaroshtml

Stunkel O Com Bolsonaro a poliacutetica externa se tor-nou uma caixa de surpresas (entrevista agrave Deutsche Welle Brasil) Recuperado de httpswwwterracombrnoticiasbrasil com-bolsonaro-politica-ex-terna-se-tornou-uma-caixa-de-surpresas 7f6f-814287c0240a2f3f93ad aa39af65jpo4zbzghtml

Tarzi S (2007) Neorealism neoliberalism and the inter-national system International Studies (41) 115-128

Vadell J e Ramos L (2019) The role of declining Brazil and ascending China in the brics initiative Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 75-94) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Viana F L (1959) A vida do Baratildeo do Rio Branco Rio de Janeiro Brasil Joseacute Olympio

Vidigal C (2009) Relaccedilotildees Brasil-Argentina o primeiro ensaio Curitiba Brasil Juruaacute

Page 5: Bolsonaro versus Rio Branco: transição hegemônica, América ...2011/02/15  · Contra-hegemonia e ordem capitalista mundial por meio do brics, brics-plus e de outros agru-pamentos,

15Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Branco natildeo foi um homem de Estado que tenha se orientado pelo militarismo ou pelo imperialismo Pautado pela convicccedilatildeo nos sentimentos paciacutefi-cos dos governos aos quais serviu considerava primordial o reconhecimento pelos demais paiacute-ses sul-americanos de que o paiacutes natildeo tinha feito uso da forccedila natildeo se apresentando como potencial ameaccedila aos vizinhos entre os anos 1870 e o iniacutecio do novo seacuteculo Certamente natildeo se deve receber de maneira acriacutetica a autoimagem que Rio Branco fazia de si e dos governos brasileiros pois muitos foram os seus criacuteticos e conhecidos satildeo os atritos com o ministro argentino Estanislao Zeballos ou o jogo entre competiccedilatildeo e entente do Brasil com a Argentina e o Chile (Meneses 1988) para citar apenas um exemplo

Durante sua gestatildeo dois de seus colaboradores expressaram posicionamentos distintos um mais vinculado aos desiacutegnios de Washington outro simultaneamente criacutetico e admirador Joaquim Nabuco e Domiacutecio da Gama Para Nabuco a Dou-trina Monroe e o corolaacuterio Roosevelt significavam que os paiacuteses americanos haviam se desprendido da Europa ldquocomo a lua da terrardquo o que levou o his-toriador Joseacute Honoacuterio Rodrigues a sugerir que Na-buco tivesse por princiacutepio marchar sempre com eles ao menos sempre que possiacutevel (Nabuco 1949 Franccedila 2007) Domiacutecio da Gama afastava-se da visatildeo de Nabuco sobre a Doutrina Monroe pois a considerava carente de reciprocidade portanto em desacordo com interesses brasileiros

A poliacutetica brasileira para a Ameacuterica do Sul e na regiatildeo do Prata foi e talvez seja ainda mateacuteria con-troversa A amizade que deveria reger as relaccedilotildees com a Argentina e o Chile natildeo excluiacutea a criaccedilatildeo de um poder dissuasoacuterio por parte do Rio de Janeiro Ao lado da rivalidade tradicional entre os trecircs paiacuteses mdash excetuando talvez as relaccedilotildees Brasil-Chile mdash havia a compreensatildeo por parte do Rio de Janeiro sobre a necessidade de estabelecer relaccedilotildees amigaacute-veis no Cone Sul (Argentina Boliacutevia Chile Para-guai e Uruguai) notadamente em sua dimensatildeo geopoliacutetica

A partir de 1909 as tensotildees na regiatildeo arrefe-ceram sem que a rivalidade entre a Argentina e o Brasil saiacutesse da agenda O siacutembolo dessa aproxi-maccedilatildeo foi a frase proferida por Saacuteenz Pentildea ldquoTodo

nos une nada nos separardquo (citado por Bandeira 2003 p 125) Na conjuntura da Primeira Guerra Mundial a Argentina o Brasil e o Chile assina-ram o Tratado do abc voltado para a coordenaccedilatildeo das poliacuteticas de defesa do Cone Sul O abc natildeo foi bem-recebido nos Estados Unidos por ser poten-cialmente um contrapeso agrave sua influecircncia nem nos paiacuteses sul-americanos sob o argumento de que uma poliacutetica pan-americana natildeo deveria com-portar preponderacircncias restritas que eliminassem a ampla participaccedilatildeo dos Estados nacionais da re-giatildeo (Bandeira 2004)

Quanto agraves relaccedilotildees do Brasil com a Gratilde- Bretanha vista como ldquopotecircncia decadenterdquo estive-ram subordinadas ao decliacutenio econocircmico britacircni-co Diferentemente da Argentina cuja orientaccedilatildeo principal seguiraacute voltada para Londres ateacute a Se-gunda Guerra Mundial o Brasil priorizou os laccedilos com Washington desde a Proclamaccedilatildeo da Repuacute-blica em 1889

Desde o iniacutecio do seacuteculo xx a Gratilde-Bretanha passou a dar liberdade de accedilatildeo para os Estados Unidos no Hemisfeacuterio Ocidental explicitado por Balfour em 1903 ao afirmar que os britacircni-cos natildeo desejavam a colonizaccedilatildeo a aquisiccedilatildeo de territoacuterios ou as alteraccedilotildees no equiliacutebrio de po-der ldquoa Doutrina Monroe natildeo estava portanto em tela de juiacutezordquo (citado por Bueno 2003 p 32) A adoccedilatildeo por Londres do nihil obstat diante da presenccedila estadunidense na Ameacuterica Latina con-corria para a adoccedilatildeo de praacuteticas imperialistas por parte de Washington mas prevalecia a ideia de que era do interesse dos capitalistas britacircnicos que a potecircncia norte-americana assumisse o pa-pel de poliacutecia internacional Como destacou Po-lanyi em A grande transformaccedilatildeo (Polanyi 1957) o padratildeo-ouro e o constitucionalismo eram os instrumentos que tornaram conhecida a voz da City de Londres em muitos dos paiacuteses menores que adotaram esses siacutembolos de adesatildeo agrave nova ordem internacional No caso do Brasil a passa-gem da hegemonia britacircnica para a estadunidense se deu de forma amistosa ao longo de algumas deacutecadas ainda que natildeo isenta de momentos de desconfianccedila como nos eventos da Proclamaccedilatildeo da Repuacuteblica e nos anos iniciais do novo regime (Bueno 2003 Cervo e Bueno 2015)

16

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

O processo modernizador do Brasil nos finais do seacuteculo xix dependeu do comeacutercio com os Esta-dos Unidos pois os superaacutevits na balanccedila comercial geravam excedentes para atender amortizaccedilotildees serviccedilos de empreacutestimos britacircnicos e para custear o complexo exportador nas matildeos dos ingleses A concorrecircncia comercial entre norte-americanos e ingleses segundo Cervo estabeleceu-se no Brasil apenas em pequena escala Nessa conjuntura os Estados Unidos elevaram seu interesse no paiacutes com a intenccedilatildeo de abrir mercados e equilibrar suas contas (Cervo e Bueno 2015)

Nas deacutecadas iniciais do seacuteculo xx o Brasil es-treitou laccedilos com os Estados Unidos manteve boas relaccedilotildees econocircmicas e diplomaacuteticas com a Gratilde-Bre-tanha e atuou de forma autocircnoma nas questotildees mais delicadas das relaccedilotildees sul-americanas em especial as do Cone Sul Nas quatro deacutecadas que se seguiram agrave Primeira Guerra Mundial a poliacutetica exterior brasileira foi regida principalmente pelas demandas das relaccedilotildees com os Estados Unidos As accedilotildees ou ensaios de autonomia representados pela participaccedilatildeo brasileira nas negociaccedilotildees do poacutes-gue-rra pelo comeacutercio compensado com a Alemanha permitiriam a Getuacutelio Vargas mdash que ascendera agrave Presidecircncia na Revoluccedilatildeo de 1930 cargo no qual permaneceria ateacute 1945 mdash o exerciacutecio da ldquopoliacutetica de barganhardquo com esse paiacutes e com os Estados Unidos (Bandeira 2004 Seitenfus 2003 Cervo e Bueno 2015 Doratioto e Vidigal 2015)

Na construccedilatildeo da nova ordem mundial do se-gundo poacutes-guerra o Brasil se alinhou aos Estados Unidos na Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (onu) e no processo de construccedilatildeo do Sistema Interame-ricano Durante os governos Dutra Vargas Cafeacute Filho e os anos iniciais de Kubitschek o Brasil procurou buscar recursos financeiros e tecnoloacute-gicos junto aos Estados Unidos para a promoccedilatildeo do desenvolvimento econocircmico Das primei-ras conferecircncias interamericanas do poacutes-guerra (Chapultepec Rio de Janeiro Bogotaacute) ateacute 1958 estabeleceu-se um diaacutelogo de surdos enquanto o Brasil no que foi acompanhado pela maioria dos paiacuteses latino-americanos reivindicava uma defi-niccedilatildeo expliacutecita por parte de Washington quanto aos aportes a serem feitos na regiatildeo o governo norte-americano cobrava compromisso com as

instituiccedilotildees internacionais com os preceitos da Guerra Fria e com as necessidades impostas pela aacuterea de seguranccedila O resultado foi o crescente des-conforto das lideranccedilas poliacuteticas latino-america-nas diante da atitude reticente de Washington e do anti-americanismo em alguns paiacuteses

Em maio de 1958 por ocasiatildeo da viagem do vice- presidente Nixon ao Peru e agrave Venezuela o governo americano percebeu a dimensatildeo da insatisfaccedilatildeo dos paiacuteses sul-americanos com o tratamento que Was-hington vinha dispensando agraves suas demandas e a necessidade de rever sua poliacutetica para a regiatildeo Entre os desdobramentos da visita de Nixon destacou-se a iniciativa do presidente Kubitschek de escrever a Eisenhower propondo um esforccedilo conjunto de cooperaccedilatildeo econocircmica dos paiacuteses americanos em prol de projetos nacionais de desenvolvimento logo denominada ldquoOperaccedilatildeo Pan-Americanardquo (Cervo e Bueno 2015 Cervo 2008 Lafer 2002) Diante do novo quadro na poliacutetica regional o governo norte-americano levou o debate para o acircmbito do Conselho Econocircmico e Social da Organizaccedilatildeo dos Estados Americanos (oea) onde foi criado o Comitecirc dos 21 encarregado de gerir a implementaccedilatildeo da opa2 Os trabalhos realizados no Comitecirc permitem identificar uma poliacutetica protelatoacuteria por parte da representaccedilatildeo norte-americana com o intuito de esvaziar o conteuacutedo ldquodesenvolvimentistardquo da pro-posta brasileira em favor de uma visatildeo essencial-mente assistencialista (Vidigal 2009)

A poliacutetica externa de Jacircnio Quadros autointi-tulada ldquoPoliacutetica Externa Independenterdquo procurou superar os constrangimentos das deacutecadas anterio-res por meio de uma orientaccedilatildeo que priorizava a expansatildeo do comeacutercio e a diversificaccedilatildeo dos laccedilos internacionais o estabelecimento de relaccedilotildees di-plomaacuteticas com paiacuteses socialistas a luta contra o subdesenvolvimento e o empenho em favor da in-tegraccedilatildeo econocircmica regional sem romper com a posiccedilatildeo tradicional do Brasil em outros pontos da agenda internacional como o respeito ao ldquomundo livrerdquo agrave oea e agrave onu

2 Iniciativa do governo Juscelino Kubitschek junto agrave ad-ministraccedilatildeo de Eisenhower incorporada agrave oea que objetivava a promoccedilatildeo do desenvolvimento dos paiacuteses latino-americanos com o apoio dos Estados Unidos da Ameacuterica

17Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Da autonomia dos anos 2000 ao ldquonovo alinhamentordquo Embora Lula tenha incentivado e participado de alianccedilas contra-hegemocircnicas no acircmbito da eco-nomia poliacutetica internacional como o Ibas e o brics natildeo se pode afirmar que ele ou sua suces-sora Dilma Rousseff tenha desenvolvido uma po-liacutetica internacional contraacuteria aos Estados Unidos (Pecequilo 2012 Cervo e Bueno 2015) Sempre se tratou de relaccedilotildees ldquocentraisrdquo ou ldquocruciaisrdquo para o Brasil mas tambeacutem de grande assimetria Para o Brasil pensar nos Estados Unidos eacute pensar em sua poliacutetica exterior (Pecequilo 2012) como uma ldquoparceria estrateacutegicardquo que influencia as estruturas socioeconocircmicas do paiacutes ao longo do tempo (Cer-vo 2008) Essa tradiccedilatildeo que remonta a Rio Branco apresentou-se na trajetoacuteria histoacuterica do paiacutes como parceria estrateacutegica em alguns momentos ou como alinhamento em outros

A poliacutetica externa do pt se caracterizou pelo multilateralismo e pelo fortalecimento e cons-truccedilatildeo de parcerias estrateacutegicas O que diferencia esse passado com a etapa iniciada com a presidecircn-cia de Bolsonaro talvez seja a adesatildeo agrave poliacutetica de rechaccedilo do globalismo e do multilateralismo

O governo Bolsonaro comeccedilou a aproximar-se dos Estados Unidos por meio de ideias mdash expres-sas pela visatildeo do ministro Ernesto Arauacutejo mdash e de accedilotildees Durante a campanha e nos primeiros me-ses de governo manifestaccedilotildees do Presidente de seu filho Eduardo e de um dos mentores de seu projeto Olavo de Carvalho demonstravam que o estreitamento dos laccedilos com Washington era mais o resultado de contatos com grupos poliacuteticos norte-americanos simpatizantes de Trump do que fruto de um entendimento poliacutetico consistente

Bolsonaro introduziu cinco mudanccedilas na po-liacutetica externa sul-americana do Brasil em com-paraccedilatildeo ao periacuteodo 2003-2016 1 recolocou o paiacutes em uma relaccedilatildeo estreita agrave poliacutetica exterior norte--americana 2 retirou seu apoio e logo comeccedilou a incentivar mdash juntamente com o presidente chileno Pintildeera mdash um novo agrupamento para substituir a Uniatildeo de Naccedilotildees Sul-Americanas (Unasul) 3 abandonou o respaldo poliacutetico ao governo vene-zuelano identificando-o como a principal ameaccedila

para a seguranccedila e estabilidade da regiatildeo 4 pas-sou a tratar o Mercado Comum do Sul (Mercosul) como um tema secundaacuterio na agenda 5 reduziu a prioridade que Brasiacutelia mdash desde 1985 mdash atribuiacutea a Buenos Aires em favor do Chile primeiro paiacutes a ser visitado pelo novo presidente

Qual poderia ser a explicaccedilatildeo de colocar o Chile como o primeiro paiacutes a visitar Sinalizar que foi devido agrave sintonia poliacutetica natildeo o explica posto que Macri eacute tatildeo liberal quanto Pintildeera Eacute possiacutevel entatildeo Bolsonaro tenha tentado retomar a visatildeo que Rio Branco tinha em relaccedilatildeo ao Cone Sul e buscar uma nova aproximaccedilatildeo com o Chile O Brasil e o Chile compartilham hoje uma posiccedilatildeo criacutetica a respeito do regionalismo poliacutetico sul-americano em par-ticular sobre a Unasul mas a Argentina tambeacutem Entretanto o imaginaacuterio do Chile em relaccedilatildeo a pa-radigmas e visotildees sobre o sistema internacional eacute distinto do brasileiro Satildeo dois paiacuteses com capaci-dades atributos e recursos de poder enormemente diferentes Em parte o modelo de inserccedilatildeo inter-nacional e seus instrumentos satildeo semelhantes em ambos os paiacuteses a visatildeo ideal do tipo de Estado a internacionalizaccedilatildeo da economia e o papel das empresas assim como papel que desempenha o capital privado Mas tambeacutem grandes diferenccedilas o Brasil tem uma histoacuterica vocaccedilatildeo industrialista mdash que natildeo existe atualmente no Chile mdash e uma aspiraccedilatildeo a concertar internamente os diversos segmentos e recursos de poder induacutestria ciecircncia e teacutecnica pesquisa e desenvolvimento papel do mercado interno de consumo e outros todas ques-totildees que satildeo muito relativas no modelo chileno

O Brasil eacute um global trader que se pensou glo-bal player cujos interesses satildeo tanto econocircmicos como poliacuteticos e sugerem a aspiraccedilatildeo a uma par-ticipaccedilatildeo influente na tomada de decisotildees no siste-ma internacional e nos organismos internacionais Na interpretaccedilatildeo de Cervo e Bueno esta foi a he-ranccedila dos dois governos de Lula a de desempe-nhar o papel que era devido no acircmbito hemisfeacuterico e no cenaacuterio internacional (Cervo e Bueno 2015) O Brasil pressupunha que seus vizinhos regionais reconhecessem a priori suas condiccedilotildees de lide-ranccedila e hegemonia sob um soft power Poreacutem nos anos recentes sob os governos da Concertaccedilatildeo o Chile buscou colocar-se como modelo de inserccedilatildeo

18

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

regional e tem procurado disputar com o Brasil essa condiccedilatildeo de lideranccedila natural (Bernal-Meza 2015 Flisfisch 2011)

Provavelmente a decisatildeo de visitar primeira-mente o Chile tenha sido resultado da influecircncia do ministro da Economia Paulo Guedes Egresso do curso de Economia da Universidade de Chicago e admirador do liberalismo e do ldquomodelordquo chileno Guedes teceu elogios ao Chile em diversas ocasiotildees em visatildeo superficial sobre o sucesso econocircmico da-quele modelo e a viabilidade de aplicaacute-lo ao Brasil de hoje Ademais somou-se aos criacuteticos da Unasul e da poliacutetica de contemporizaccedilatildeo com Caracas

Segundo o embaixador Pinheiro Guimaratildees secretaacuterio-geral do Ministeacuterio das Relaccedilotildees Ex-teriores (mre tambeacutem chamado de ldquoItamaratyrdquo) durante os governos de Lula essas posiccedilotildees jaacute tin-ham antecedentes

no periacuteodo de Michel Temer o Brasil se juntou aos paiacuteses da Alianccedila do Paciacutefico e aos paiacuteses do Grupo de Lima contra a Venezuela infringindo os prin-ciacutepios de autodeterminaccedilatildeo e de natildeo intervenccedilatildeo gerando desconfianccedilas e ressentimentos no esforccedilo de agradar aos Estados Unidos em sua campanha para derrubar o governo venezuelanordquo (Guimaratildees 2018 sp)

No discurso de posse o ministro das Relaccedilotildees Exteriores pocircs a figura do presidente Bolsonaro como um libertador do Brasil e definiu a nova etapa da poliacutetica exterior como aquela que se libertava do passado Em suas palavras ldquoo presidente Bolso-naro estaacute libertando o Brasil por meio da verdade Noacutes vamos tambeacutem libertar a poliacutetica externa va-mos libertar o Itamaraty como o presidente Bolso-naro prometeu que fariacuteamos em seu discurso da vitoacuteriardquo (Arauacutejo 2019 sp)

Segundo Cervo (2019) Bolsonaro e Cardoso coincidem

os dois presidentes tecircm uma visatildeo de mundo e da inserccedilatildeo internacional do Brasil semelhante satildeo li-berais nesse sentido inovadores relativamente ao periacuteodo anterior a seus mandatos de governos mais nacionalistas e introspectivos Isso significa para a poliacutetica exterior um novo ciclo de abertura da eco-nomia a empreendimentos capitais e tecnologias vindas de forardquo (sp)

Para Cervo (2002) natildeo haveria ruptura na poliacute-tica exterior porque ela apresenta haacute seacuteculos trecircs traccedilos que compotildeem a estrateacutegia brasileira de longo prazo universalismo cooperaccedilatildeo e pacifismo Mas haacute que se recordar daquelas diretrizes que marca-ram a poliacutetica externa de Cardoso (Bernal-Meza 2002) Nesse sentido eacute possiacutevel que o viacutenculo com os Estados Unidos e as potecircncias do capitalismo central o apoio agraves instituiccedilotildees de governanccedila glo-bal sustentada pela hegemonia norte-americana e a posiccedilatildeo a favor do Ocidente ante os conflitos mundiais bem como o suposto enfrentamento ci-vilizatoacuterio deixem para traacutes o que Bandeira (2004) denominou de ldquorelaccedilotildees perigosasrdquo

O americanismo do governo Bolsonaro entre-tanto parece desmentir Cervo ou seja concilia o alinhamento poliacutetico aos Estados Unidos com a repulsa ao universalismo e mesmo agrave cooperaccedilatildeo e ao pacifismo O chanceler Ernesto Arauacutejo elogia Trump como ldquoum cavalheiro cruzado que luta para resgatar a identidade do Ocidenterdquo Para Arauacutejo (2017) Trump e sua poliacutetica internacional repre-sentam a disposiccedilatildeo para uma luta global para re-cuperar o passado simboacutelico que tem representado a histoacuteria e a cultura das naccedilotildees ocidentais para a sobrevivecircncia e o domiacutenio do Ocidente

Um grande questionamento eacute o que aconteceraacute com o papel que a poliacutetica exterior brasileira tem desempenhado na regiatildeo e se ela retornaraacute agrave dispo-siccedilatildeo para a lideranccedila que marcou o periacuteodo Lula ou se deixaraacute nas matildeos de potecircncias secundaacuterias mdash como o Chile mdash essa posiccedilatildeo o paiacutes que Bolso-naro considera um modelo No plano da poliacutetica internacional um posicionamento em linha com a poliacutetica de Trump poderia ter grandes impactos Uma maior aproximaccedilatildeo mdash ou coincidecircncias mdash com a poliacutetica de Washington afastaria o Brasil de sua tendecircncia mais tradicional a da autonomia mdash cujo efeito seria um afastamento relativo do brics e a predisposiccedilatildeo do presidente Bolsonaro a resta-belecer uma relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo militar com os Estados Unidos (Cervo 2019) o que despertaria na regiatildeo velhos temores mdash nunca esquecidos mdash so-bre o subimperialismo brasileiro

Haacute que se considerar nesses aspectos que a poliacutetica externa do governo Bolsonaro tem sido in-formada por diferentes grupos de interesse o que

19Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

resulta muitas vezes em uma praacutetica erraacutetica in-consistente e excessivamente ideoloacutegica (Stunkel 2019 Spector 2019) Diferentemente de outras si-tuaccedilotildees semelhantes mdash Dutra Castelo Branco ou Collor mdash desta feita o Itamaraty natildeo atuou como contraponto agrave presidecircncia alimentando muitas vezes o discurso ideoloacutegico

Bolsonaro e Trump parecem ter muitos pontos em comum Entre as coincidecircncias mais delicadas estaacute seu rechaccedilo ao ldquoglobalismordquo3 o que revela que ambos os presidentes estatildeo dispostos a depreciar o que as diplomacias de seus proacuteprios paiacuteses cons-truiacuteram sob o sistema internacional contemporacirc-neo a criaccedilatildeo e fortalecimento das organizaccedilotildees internacionais o sistema das Naccedilotildees Unidas e as negociaccedilotildees mundiais sobre assuntos que impor-tavam agrave sociedade internacional Accedilotildees que se plasmaram em temas e agendas globais como o meio ambiente e a mudanccedila climaacutetica Ambas se-riam tendecircncias de mudanccedila profunda que impac-tariam todo o cenaacuterio latino-americano O mais preocupante eacute imaginar o Brasil imerso em um enfrentamento a respeito do papel do Ocidente na defesa da chamada ldquocultura ocidentalrdquo posto que ela tem sido o instrumento mais importante do co-lonialismo e da dominaccedilatildeo das potecircncias ociden-tais sobre a periferia do mundo

O que parecia ser manifestaccedilotildees de desinte-resse (ao menos) a respeito de seu soacutecio estrateacute-gico sul-americano Bolsonaro ao natildeo incluir a Argentina em sua primeira viagem ao exterior e as declaraccedilotildees de seu ministro da Economia a respeito do Mercosul o que indicava que este natildeo seria uma prioridade para o Brasil pode trazer consequecircncias negativas para as relaccedilotildees sul-ame-ricanas Deve-se recordar que a base de qualquer entendimento de cooperaccedilatildeo governanccedila re-gional e continuidade para fazer da regiatildeo uma

3 ldquoGlobalismordquo em sentido pejorativo foi o termo utilizado por Bolsonaro e por seus principais auxiliares para cri-ticar nos meses iniciais de seu governo as poliacuteticas de inserccedilatildeo do Brasil no cenaacuterio global por meio de uma par-ticipaccedilatildeo proativa em foros multilaterais e nos debates sobre os temas mais sensiacuteveis da agenda internacional Argumento apresentado pelo ministro Arauacutejo em seu dis-curso de posse por meio de uma obviedade ldquoNatildeo estamos aqui para trabalhar pela ordem global Aqui eacute o Brasilrdquo (Arauacutejo 2019 sp)

zona militarmente desnuclearizada passa por uma relaccedilatildeo cordial entre o Brasil e a Argentina A construccedilatildeo de uma ldquozona de pazrdquo no Atlacircntico Sul por meio da superaccedilatildeo das hipoacuteteses de con-flito entre a Argentina e o Chile tem se baseado na continuidade dessa relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo A partir dessas perspectivas a presidecircncia Bolso-naro natildeo soacute implicaria o retorno da Ameacuterica do Sul agraves concepccedilotildees ideoloacutegicas radicalizadas que se supunham superadas que incluem novos viacutenculos estreitos em mateacuteria de seguranccedila com os Estados Unidos mas tambeacutem o iniacutecio de uma etapa de in-certeza na regiatildeo

Alinhamento com Washington incertezas quanto a PequimO alinhamento com Washington agrave eacutepoca de Rio Branco seguia um roteiro previsiacutevel diante da potecircncia ascendente a adesatildeo aos princiacutepios do Direito Internacional a incorporaccedilatildeo acriacutetica do conceito de ldquobom governordquo e a convicccedilatildeo de que o progresso da naccedilatildeo dependia dos desiacutegnios do norte Nada parecido se via em relaccedilatildeo a Londres que ainda conservava o status de principal centro financeiro internacional mas que perdia impor-tacircncia no intercacircmbio de mercadorias Mais de um seacuteculo depois o novo alinhamento mdash e este eacute o contraponto que se mencionou na introduccedilatildeo mdash manteacutem o principal das relaccedilotildees internacionais do paiacutes voltado para os Estados Unidos De acordo com a hipoacutetese de trabalho inicial a de estarmos em meio a uma transiccedilatildeo hegemocircnica dos Estados Unidos para a China Bolsonaro estaria em dis-sonacircncia com Rio Branco

Os primeiros meses de 2019 revelaram que o governo Bolsonaro sustentava na poliacutetica externa o principal das promessas de campanha acompa-nhadas do mote ldquoo Brasil acima de tudordquo Inspira-do no governo de Trump o discurso de supremacia contrastava com o silecircncio diante da poliacutetica pro-tecionista de Washington que elevara a tarifa para a importaccedilatildeo do accedilo e subsidiava a produccedilatildeo de soja ambas as medidas prejudiciais para os inte-resses brasileiros Ante eventuais perdas setoriais o governo seguia fiel ao princiacutepio do alinhamento em dissonacircncia com o legado de Rio Branco

20

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

A crise na Venezuela e os interesses econocircmi-cos do agronegoacutecio no mercado chinecircs levariam o governo a modificar em parte a retoacuterica inicial o que indicaria estar em curso ajustes e reorientaccedilotildees na aacuterea No dia 23 de fevereiro o autoproclamado presidente interino da Venezuela Juan Guaidoacute liderou um esforccedilo de tentar fazer com que ca-minhotildees com alimentos adentrassem a Venezue-la como forma de pressionar o governo Maduro Em Pacaraima o chanceler brasileiro explicava se tratar de um ato humanitaacuterio altruiacutesta ldquoum mo-mento de criaccedilatildeo de uma nova realidade na Ve-nezuelardquo Quanto agrave possibilidade de intervenccedilatildeo Arauacutejo considerava que ldquonatildeo haacute menor expectativa de conflito mas claro que o Exeacutercito estaacute prepa-rado caso isso possa se materializarrdquo (Cronologia 2019 sp)

Na visatildeo do vice-presidente Mouratildeo que natildeo ocultava a influecircncia estadunidense a crise vene-zuelana soacute seria superada com a neutralizaccedilatildeo de agentes externos em especial a presenccedila cubana Se essa situaccedilatildeo continuasse a Venezuela correria o risco de se tornar um ldquonatildeo Estadordquo (Arauacutejo Ritt-ner e Murakawa 2019) Mouratildeo ao mesmo tempo que natildeo contemporizava com o governo Maduro indicava natildeo estar de acordo in totum com o alin-hamento com Washington nessa questatildeo ao colo-car em duacutevida a legitimidade de Juan Guaidoacute

Em relaccedilatildeo agrave China a visita de Mouratildeo e seu encontro com Xi Jiping marcaram a superaccedilatildeo de desconfianccedilas manifestadas durante a campan-ha e os meses iniciais de governo Para Mouratildeo a prioridade era restabelecer o funcionamento da Comissatildeo Sino-Brasileira de Alto Niacutevel de Concer-taccedilatildeo e Cooperaccedilatildeo (Cosban) e reorganizar sua es-trutura para que voltasse a ser um mecanismo de alto niacutevel Em sua percepccedilatildeo a China tem sido um parceiro confiaacutevel do Brasil desde 2009 ano em que se tornou seu maior parceiro comercial e no qual ocorreu a i Cuacutepula do brics Nesses dez anos de parceria estrateacutegica o fluxo comercial bilateral alcanccedilou usd$ 100 bilhotildees embora o Brasil expor-tasse muito mais produto in natura que produtos com valor agregado uma das reclamaccedilotildees que te-ria apresentado ao primeiro mandataacuterio chinecircs

A China vinha se transformando em um enor-me desafio regional e internacional para o Brasil

Em vinte anos a China transitou de ser vista como ldquoa oportunidaderdquo para ser percebida como desafio (Bernal-Meza 2014) de potencial grande merca-do para as importaccedilotildees e a exportaccedilatildeo de capitais a fazer de seus soacutecios latino-americanos periferia primaacuterio-exportadora A evoluccedilatildeo das relaccedilotildees econocircmicas entre a China e o Brasil de maneira bilateral e no acircmbito das relaccedilotildees no brics estaria sinalizando uma tendecircncia estrutural da configu-raccedilatildeo de um padratildeo de relaccedilotildees centro-periferia (Beckerman e Moncaut 2016 Becard 2017 Bernal- Meza 2019a 2019b)

O ingresso da China na economia poliacutetica da Ameacuterica do Sul deslocou o Brasil do lugar prepon-derante que ocupava dentro do bloco Mercosul e no contexto regional A respeito dos processos de integraccedilatildeo latino-americanos mdash em particu-lar do Mercosul mdash a China se transformou em um fator de profundo desequiliacutebrio porque foi se transformando no principal e segundo soacutecio mais importante da inserccedilatildeo econocircmica internacional da Ameacuterica do Sul (Hiratuka 2016 Dussel 2016) Isso afetou igualmente a posiccedilatildeo do Brasil como a principal economia para seus vizinhos No plano interno a presenccedila econocircmica chinesa parece es-tar condicionando a eventual autonomia do des-envolvimento industrial e tecnoloacutegico brasileiro ao exercer um crescente controle sobre a estrutura energeacutetica no setor eleacutetrico (Becard Lessa e Silveira 2020 Becard 2017)

A presenccedila chinesa na Ameacuterica Latina con-correu para enfraquecer a influecircncia brasileira sobre a integraccedilatildeo regional Entre os interesses brasileiros figurava a ideia de natildeo seguir a poliacuteti-ca adotada por Washington em relaccedilatildeo a algumas empresas chinesas em particular a gigante de te-lecomunicaccedilotildees Huawei Nesse sentido Mouratildeo que foi ldquoalertadordquo pelo governo norte-americano sobre os riscos das operaccedilotildees da empresa chi-nesa teria sugerido a Xi Jinping a criaccedilatildeo de um ambiente de confianccedila quanto agrave companhia ldquode modo que nenhum paiacutes que vaacute receber a empresa e a tecnologia que vocecircs vatildeo instalar e fique preocu-pado com que todos dados que estaratildeo em seu po-der pertenceratildeo tambeacutem ao governo [chinecircs] Esta eacute a discussatildeordquo (Arauacutejo et al 2019 sp) A expecta-tiva de abertura brasileira agrave tecnologia 5g chinesa

21Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

se vinculava ao fato de o paiacutes ainda natildeo estar inte-grado digitalmente e de ter um marco regulatoacuterio defasado no setor A presidecircncia brasileira passava a se posicionar de forma equidistante em relaccedilatildeo aos interesses de Washington e Pequim o que se estendia agrave poliacutetica adotada diante da guerra co-mercial entre as duas maiores economias Poucos casos ilustravam com tanta transparecircncia um dos mais importantes efeitos da transiccedilatildeo hegemocircnica em curso

Mouratildeo fora convencido pelo secretaacuterio-geral do Itamaraty Otaacutevio Brandelli quanto agrave adequa-ccedilatildeo de uma conduta flexiacutevel e pragmaacutetica Em face de uma guerra comercial dessa natureza o gover-no brasileiro deveria saber explorar as oportuni-dades Por exemplo como a administraccedilatildeo Trump taxou parcela das importaccedilotildees da China inicial-mente em torno de usd$ 250 bilhotildees os produtos envolvidos passaram a chegar mais caros no mer-cado norte-americano e eventualmente poderiam ser substituiacutedos por produtos brasileiros o que acrescentaria usd$ 5 bilhotildees ou mais nas nossas exportaccedilotildees A guerra comercial deveria assim ser tratada com paciecircncia

O limite da visatildeo do vice-presidente brasi-leiro mdash que dava vazatildeo agraves pressotildees do agrone-goacutecio mdash era evidente Temas como transferecircncia de tecnologia e cooperaccedilatildeo industrial natildeo foram abordados Indagado sobre o fato de o conflito de interesses entre Estados Unidos e China natildeo ser apenas comercial mas tambeacutem tecnoloacutegico a res-posta foi igualmente simplista ldquoVocecirc olha o 5g As quatro empresas que detecircm a tecnologia satildeo duas chinesas e duas finlandesas Cadecirc a americanardquo (Arauacutejo et al 2019 sp) Ou seja o governo bra-sileiro mdash afastadas as desconfianccedilas iniciais em relaccedilatildeo agrave China mdash voltava a se ocupar dos temas tratados em governos anteriores exportaccedilotildees de alimentos e mineacuterios investimentos diretos com geraccedilatildeo de empregos acordos de cooperaccedilatildeo em tecnologia estes uacuteltimos sem viacutenculo claro com qualquer projeto mais amplo de industrializaccedilatildeo e desenvolvimento tecnoloacutegico

O governo Bolsonaro aparentemente estava satisfeito com o status internacional do paiacutes sem atentar minimamente ao processo de desindus-trializaccedilatildeo das uacuteltimas deacutecadas (Benaion 2006

Cano 2012 Oliveira 2018) Para Chang (2018) nos anos 1980 e 1990 o Brasil conheceu o ponto mais alto da industrializaccedilatildeo que atingiu 35 da produccedilatildeo nacional No final de 2017 representa-va apenas 12 e a tendecircncia era de decliacutenio O Brasil tem nesse sentido voltado no tempo Em-presaacuterios de Satildeo Paulo natildeo parecem estar preocu-pados com o decliacutenio da induacutestria manufatureira No longo prazo essa poliacutetica eacute prejudicial para o paiacutes No governo Dilma Rousseff vaacuterios subsiacutedios foram canalizados para a induacutestria mas as altas taxas de juros natildeo favoreceram mudanccedilas efetivas (Oliveira 2018)

O processo de desindustrializaccedilatildeo as poliacuteticas econocircmicas e o conformismo com a condiccedilatildeo ldquosu-bordinadardquo do paiacutes instruiacuteram em outro momento o uso do conceito de ldquoperiferia proacutesperardquo para o crescimento econocircmico de meados da deacutecada de 2000 sustentado pela demanda chinesa (Doratioto e Vidigal 2015) As taxas de crescimento da China beneficiaram as exportaccedilotildees latino-americanas de produtos agriacutecolas mineacuterios petroacuteleo e produtos manufaturados de baixo valor agregado Conco-rreram por sua vez para reforccedilar o caraacuteter liberal perifeacuterico de economias como a brasileira (Filguei-ras e Gonccedilalves 2007)

Na poliacutetica externa era clara a intenccedilatildeo de re-duzir o peso do Itamaraty nas decisotildees relativas aos assuntos de seguranccedila e defesa fronteiras narcotraacutefico e outros delitos internacionais e imi-graccedilatildeo como no tema da crise na Venezuela e em outros assuntos sensiacuteveis na aacuterea da poliacutetica in-ternacional Quanto ao chanceler Ernesto Arauacutejo que havia impressionado negativamente a maioria dos estudiosos de poliacutetica externa e internacional em razatildeo de certo ldquomessianismordquo na defesa do Oci-dente e da administraccedilatildeo Trump passou a atuar de modo mais comedido e profissional como na ocasiatildeo da assinatura do acordo Mercosul-Uniatildeo Europeia no dia 28 de junho de 2019

Bolsonaro no final de reuniatildeo do g-20 em Osaka (28 e 29 de junho de 2019) se disse satis-feito com os resultados do encontro do brics e do proacuteprio g-20 aleacutem de destacar a importacircncia da conclusatildeo do acordo Mercosul-Uniatildeo Europeia Na reuniatildeo dos brics Bolsonaro desistiu de pro-por aos demais liacutederes o apoio a uma mudanccedila

22

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

de governo na Venezuela Foi tambeacutem a oportu-nidade para reconhecer o interesse brasileiro em manter bom diaacutelogo com o principal parceiro co-mercial do paiacutes

Os ajustes percebidos na conduccedilatildeo da poliacutetica externa natildeo significaram uma mudanccedila de rumo do governo Bolsonaro no que tange agrave priorizaccedilatildeo dos laccedilos com os Estados Unidos a Europa e o Ja-patildeo parceiros preferenciais nas deacutecadas de 1960 1970 e sob o governo de Cardoso Nesse sentido as relaccedilotildees com a China a despeito do discurso em prol de uma parceria estrateacutegica ou coisa que o valha tecircm sido tratadas de forma setorial mdash co-meacutercio investimentos cooperaccedilatildeo tecnoloacutegica mdash e descompromissada com qualquer planejamento Os laccedilos histoacutericos com os Estados Unidos em to-das as suas dimensotildees favorecem a acomodaccedilatildeo e a recusa em tratar seriamente a hipoacutetese da ldquoopccedilatildeo chinesardquo o que natildeo necessariamente eacute negativo

ConclusatildeoAs transiccedilotildees hegemocircnicas no marco da econo-mia poliacutetica mundial tecircm constituiacutedo um pro-blema externo e interno para os paiacuteses inseridos em uma relaccedilatildeo centro-periferia A ascensatildeo da China e sua presenccedila econocircmica na Ameacuterica do Sul tecircm levado alguns paiacuteses a incluiacute-la em seus caacutelculos estrateacutegicos A Argentina o Brasil e o Chile podem desempenhar um papel crucial nesse processo tendo em vista a relevacircncia geopoliacutetica e econocircmica do Cone Sul pois a polarizaccedilatildeo Es-tados Unidos-China cria janelas de oportunidade e gera maior permissibilidade no sistema interna-cional como diria Heacutelio Jaguaribe

Destacamos a identificaccedilatildeo das grandes linhas de continuidade e de ruptura que tecircm implicado o discurso do presidente Bolsonaro e dos principais colaboradores em relaccedilatildeo agrave tradiccedilatildeo da poliacutetica externa brasileira O contraponto inicial com a poliacutetica e o pensamento de Rio Branco com des-taque para as boas e privilegiadas relaccedilotildees com os Estados Unidos permitiu identificar periacuteodos de maior proximidade ou de distanciamento de Was-hington Bolsonaro estaacute proacuteximo dessa tradiccedilatildeo a de ver o Brasil como soacutecio proacuteximo dos Estados Unidos mas se afasta de praacuteticas autonomistas

como a da poliacutetica externa independente e a do pragmatismo responsaacutevel Praacuteticas essas que per-mitiriam avaliar de modo desassombrado as re-laccedilotildees com a China

Tanto a ascensatildeo da China como a posiccedilatildeo que ocupa Pequim na estrutura econocircmica brasileira planteiam desafios equivalentes ao que o Brasil ex-perimentou no comeccedilo do seacuteculo xx Agrave diferenccedila da visatildeo de Rio Branco durante a transiccedilatildeo da he-gemonia natildeo parece haver no governo de Bolsona-ro um olhar seguro sobre os impactos da transiccedilatildeo hegemocircnica nem do papel que o Brasil deveria des-empenhar na estrateacutegia global da China

Um terceiro tema de preocupaccedilatildeo eacute o das re-laccedilotildees com a Argentina A visita subsequente a Buenos Aires a assinatura do acordo para negociar um tratado de livre-comeacutercio entre o Mercosul e a Uniatildeo Europeia e o anuacutencio de que ambos os go-vernos iniciariam gestotildees conjuntas para a assina-tura de acordos de livre-comeacutercio com os Estados Unidos restabeleceram o bom diaacutelogo entre Bra-siacutelia e Buenos Aires ainda que persistam duacutevidas no governo Macri (Landim 2019) As incertezas se estenderam ao governo eleito em dezembro de 2019 em decorrecircncia de criacuteticas de natureza ideo-loacutegicas realizadas tanto por Bolsonaro quanto por Alberto Fernaacutendez Entretanto o diaacutelogo bilateral tende a se normalizar sem maiores pretensotildees no plano regional

O viacutenculo estrateacutegico entre Brasiacutelia e Buenos Aires tem sido chave para sustentar um espiacuterito de cooperaccedilatildeo e integraccedilatildeo na Ameacuterica do Sul que se baseia na credibilidade das accedilotildees e na boa feacute de uns e outros governos Desde 1985 o Brasil e a Argentina desenvolveram o que Cervo (2008) denominou de ldquorelaccedilotildees em eixordquo que se estabe-lecem ldquoquando precisamente a imagem um do outro corresponde agrave do parceiro que consegue estabelecer uma uniatildeo co-responsaacutevel [] Em outros termos o eixo comporta uma vertente exoacute-gena que o transcende porque abarca as relaccedilotildees regionais mesmo que coletivas []rdquo (pp 211-212) Eacute esse tipo de relaccedilotildees e sua projeccedilatildeo no Cone Sul que foi potencialmente afetada pelas primei-ras declaraccedilotildees e accedilotildees do governo Bolsonaro Ao promover um alinhamento com os Estados Uni-dos mdash ou ldquosem recompensardquo como diria Gerson

23Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Moura mdash reproduz o que o Brasil e outros paiacuteses latino-americanos adotaram como ldquoestrateacutegiardquo na deacutecada de 1990 sem os resultados esperados E ao abandonar a tradiccedilatildeo iniciada em 1961 e adaptada agraves diferentes conjunturas que se sucederam abriu matildeo de exercer o poder de barganha do paiacutes para fazer concessotildees sem contrapartidas equivalentes Nas circunstacircncias atuais diante da transiccedilatildeo he-gemocircnica Estados Unidos-China considerando os interesses do Brasil na Ameacuterica do Sul a equidis-tacircncia talvez seja o melhor caminho Diaacutelogo es-treito com Washington e autonomia em temas de interesse do paiacutes foram as opccedilotildees de Rio Branco

Referecircncias Arauacutejo E (2017) Trump e o Ocidente Cadernos de Poliacutetica

Exterior iii(6) 323-357

Arauacutejo E (2019 2 de janeiro) Discurso do minis-tro Ernesto Arauacutejo durante cerimocircnia de posse no Ministeacuterio das Relaccedilotildees Exteriores Brasiacutelia Re-cuperado de httpwwwitamaratygovbrpt-BRdiscursos-artigos-e-entrevistas-categoriaminis-tro-das-relacoes-exteriores-discursos19907-dis-curso-do-ministro-ernesto-araujo-durante-cerimo-nia-de-posse-no-ministerio-das-relacoes-exteriores-brasilia-2-de-janeiro-de-2019

Arauacutejo C Rittner D e Murakawa F (2019 30 de abril) Brasil descarta vetar presenccedila da Huawei em 5g avisa Mouratildeo (entrevista com o vice-presidente Hamilton Mouratildeo) g1 Recuperado de httpsvalorglobocombrasilnoticia20190607brasil-descarta-vetar-pre-senca-da-huawei-em-5g-avisa-mouraoghtml

Arrighi G (2008) Adam Smith em Pequim origens e fun-damentos do seacuteculo xxi Satildeo Paulo Brasil Boitempo

Bandeira L A M (2004) As relaccedilotildees perigosas Brasil-Es-tados Unidos Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Bra-sileira

Bandeira L A M (2003) Brasil Argentina e Estados Uni-dos da Triacuteplice Alianccedila ao Mercosul (1870-2003) Rio de Janeiro Editora Revan

Becard D (2017) China y Brasil iquestmodelo de relaciones Sur-Sur Em E Pastrana B e H Gehring (eds) La proyeccioacuten de China en Ameacuterica Latina y el Caribe (pp 387-408) Bogotaacute Colocircmbia Editorial Javeriana

Becard D Lessa A e Silveira L (2020) One step closer The politics and the economics of chinarsquos strategy in Brazil and the case of the electric power sector Em R Bernal-Meza R e X Li (eds) China-Latin America

relations in the 21st Century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 55-81) Nova York Estados Unidos Palgrave Macmillan

Becard D Barros-Platiau A e Lessa A (2019) Brazil in the brics after tem years Past present and near futu-re perspectives Em X Li (ed) The international po-litical economy of the brics (pp 135-149) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Beckerman M e Moncaut N (2016) Las relaciones en-tre China y Ameacuterica Latina iquestHacia la desestructura-cioacuten de los sistemas productivos de la regioacuten Em C Moneta e S Cesariacuten (eds) La tentacioacuten pragmaacutetica China-ArgentinaAmeacuterica Latina lo actual lo proacuteximo y lo distante (pp 185-202) Saacuteenz Pentildea Argentina Uni-versidad Nacional de Tres de Febrero

Benaion N (2006) Subordinaccedilatildeo reiterada imperialismo e desenvolvimento no Brasil Manaus Brasil Editora da Universidade Federal do Amazonas

Bernal-Meza R (2019a) Brazil as an emerging power The impact of international and internal deteriorational effect on the brics Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 118-134) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Bernal-Meza R (2019b) Brasil ascenso declinacioacuten y nuevos desafiacuteos de una potencia emergente (2003-2018) Revista Izquierdas 49(2020) 516-540

Bernal-Meza R (2015) Pensamiento chileno en la poliacuteti-ca exterior y en las teoriacuteas de relaciones internaciona-les Em M Artaza e C Ross (eds) La poliacutetica exterior de Chile 1990-2009 (pp 21-47) Santiago Chile ril Editores

Bernal-Meza R (2014) La heterogeneidad de la imagen de China en la poliacutetica exterior latinoamericana Pers-pectivas para la concertacioacuten de poliacuteticas Comentario Internacional 14 113-134

Bernal-Meza R (2013) Ameacuterica Latina en el mundo el pensamiento latino-americano y la teoriacutea de relaciones internaciones Buenos Aires Argentina Grupo Editor Latinoamericano

Bernal-Meza R (2002) A poliacutetica exterior do Brasil 1990-2002 Revista Brasileira de Poliacutetica Internacional 45(1) 36-71

Bernal-Meza R e Bizzozero L (eds) (2014) La poliacutetica internacional de Brasil de la regioacuten al mundo Monte-videacuteu Uruguai Ediciones Cruz del Sur

Bernal-Meza R e Li X (eds) (2020) China-Latin Ameri-ca relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges Nova York Estados Uni-dos Palgrave Macmillan

24

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

Bolsonaro J (2018) O caminho da prosperidade pro-posta de Plano de Governo Recuperado de httpdivulgacandcontastsejusbrcandidaturasof i-cial2018BRBR2022802018280000614517propos-ta_1534284632231pdf

Bricentildeo Ruiz J e Simonoff A (orgs) (2015) Integracioacuten y cooperacioacuten regional en Ameacuterica Latina una relectura a partir de la teoriacutea de la autonomiacutea Buenos Aires Ar-gentina Editorial Biblos

Bueno C (2003) Poliacutetica externa da Primeira Repuacuteblica os anos de apogeu (1902-1918) Satildeo Paulo Brasil Paz e Terra

Cano W (2012) A desindustrializaccedilatildeo no Brasil (texto para discussatildeo 200) Campinas Brasil Instituto de Economia da Unicamp

Cervo A L (2019 28 de novembro) Governo Bolso-naro natildeo traraacute ruptura agrave poliacutetica externa Exame Recuperado de httpsexameabrilcombrmundogoverno-bolsonaro-nao-trara-ruptura-a-politica-ex-terna-avalia-amado-cervo

Cervo A (2008) Inserccedilatildeo internacional formaccedilatildeo dos conceitos brasileiros Satildeo Paulo Brasil Saraiva

Cervo A (2002) Relaccedilotildees Internacionais do Brasil a era Cardoso Revista Brasileira de Poliacutetica Internacional 45(1) 5-35

Cervo A e Bueno C (2015) Histoacuteria da poliacutetica exterior do Brasil Brasiacutelia Brasil Editora da Universidade de Brasiacutelia

Chang H H (2018 15 jan) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da histoacuteria da economia El Paiacutes Recuperado de ht-tpsbrasilelpaiscombrasil20180105econo-mia1515177346_780498html

Cronologia relembre os fatos mais importantes da cri-se venezuelana g1 httpsg1globocommundonoticia20190430cronologia-relembre-os-fa-tos-mais-importantes-na-crise-venezuelanaghtml

Doratioto F e Vidigal C (2015) Histoacuteria das Relaccedilotildees In-ternacionais do Brasil Satildeo Paulo Brasil Editora Saraiva

Dussel Peters E (coord) (2016) La nueva relacioacuten comer-cial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestInte-gracioacuten o desintegracioacuten regional Meacutexico-df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universidades de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico

Filgueiras L e Gonccedilalves R (2007) A economia poliacutetica do governo Lula Rio de Janeiro Brasil Contraponto

Fiori J(1999) Estado e moedas no desenvolvimento das naccedilotildees Petroacutepolis Brasil Vozes

Flisfisch A (2011) La Poliacutetica exterior chilena y Ameacuterica del Sur Estudios Internacionales (168) 115-141

Fonseca Jr G (2012) Rio Branco diante do Monroiacutesmo e do Pan-Americanismo anotaccedilotildees Em M Pereira e M Gomes (orgs) Baratildeo do Rio Branco 100 anos de memoacuteria (pp 565-602) Brasiacutelia Brasil Fundaccedilatildeo Alexandre de Gusmatildeo

Franccedila T (2007) Self made nation Domiacutecio da Gama e o pragmatismo do bom senso (tese de doutorado) Brasiacute-lia Brasil Universidade de Brasiacutelia

Guimaratildees S (2018) A poliacutetica exterior e a posiccedilatildeo do Brasil no mundo Recuperado de httpswwwnodalam201812a-politica-exterior-e-a-posicao-do-brasil-no-mundo-por-samuel-pinheiro-guimaraes-2

Gullo M (2018) Relaciones internacionales una teoriacutea criacutetica desde la periferia latinoamericana Buenos Ai-res Argentina Editorial Biblos

Gullo M (2014) A subordinaccedilatildeo fundante breve histoacuteria da construccedilatildeo do poder pelas naccedilotildees Florianoacutepolis Brasil Insular

Hiratuka C (2016) Impactos de China sobre el proceso de integracioacuten regional de Mercosur Em E Dussel Peters (coord) La nueva relacioacuten comercial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestIntegracioacuten o desintegracioacuten (pp 195-243) Meacutexico df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universida-des de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico Recuperado de httpswww3ecouni-campbrNeitimagesdestaque2016_La_nueva_rela-cion_comercial_ALC_Chinapdf

Hobsbawm E (1994) Extremes The Short Twentieth Cen-tury 1914-1991 Londres Inglaterra Michael Joseph Ltd

Kennedy P (1987) The rise and fall of the great powers Economic change and military conflict from 1500 to 2000 Nova York Estados Unidos Vintage Books

Keohane R e Nye J (1977) Power and interdependence World politics in transition Boston Estados Unidos Little Brown and Company

Lafer C (2002) JK e o programa de metas (1956-1961) Rio de Janeiro Brasil Fundaccedilatildeo Getuacutelio Vargas

Landim R (2019 6 de setembro) Brasil e Argentina adiam em 9 anos livre-comeacutercio de autos Folha de S Paulo Recuperado de httpswww1folhauolcombrmerca-do201909brasil-e-argentina-adiam-em-9-anos-li-vre-comercio-de-autosshtml

Lessa A e Oliveira H A (orgs) (2013) Parcerias estra-teacutegicas do Brasil v 1 os significados e as experiecircncias tradicionais Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

25Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Li X (2020) Revisiting China-Latin America economic relations An unintended consequence of different industrialization strategies Em R Bernal-Meza e X Li (eds) China-Latin America relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 225-251) Nova York Estados UnidosLondres Inglaterra Palgrave Macmillan

Li X (2019a) Chinarsquos dual position in the capitalist world order A dual complexity of hegemony and counter-he-gemony Em Li X (ed) The international political eco-nomy of the brics (pp 1-17) Abindon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2019b) The international political economy of the brics Nova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2014) The brics and beyond The international political economy of the emergence of a new world or-der Farnham Reino Unido Ashgate

Li X (2012) China y el orden mundial capitalista el nexo de la transformacioacuten interna de China y su impacto externo Em R Bernal-Meza e S Quintanar (eds) Regionalismo y Orden Mundial Surameacuterica Europa China (pp 29-53) Buenos Aires Argentina Nuevoha-cerUniversidad Nacional del Centro de la Provincia de Buenos Aires

Li X e Farah A (eds) (2013) China-Africa relations in an era of great transformations Farnham Reino Unido Ashgate

Lins A (1996) Rio Branco (Biografia) Satildeo Paulo Brasil Editora Alfa Omega

Mandelbaum M (2010) The frugal superpower Americarsquos global leadership in a cash-strapped era Nova York Es-tados Unidos Public Affairs

Meneses E (1988) Coping with decline Chilean fo-reign policy during the twentieth century 1902-1972 Oxford Reino Unido University of OxfordBodleian Library

Nabuco J (1949) Obras completas v xii Rio de Janeiro Brasil Instituto Progresso Editorial sa

Nasr V (2014) The dispensable nation American foreign policy in retreat Nova York Estados Unidos Anchor and Doubleday

Oliveira R (2018 15 de janeiro) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da his-toacuteria da economia (entrevista com Ha-Joon Chang) El Paiacutes Recuperado de httpsbrasilelpaiscombra-sil20180105economia1515177346_780498html

Pearson F e Rochester M (2007) Relaciones internacio-nales situacioacuten global en el siglo xxi Meacutexico-df Meacute-xico Mc Graw Hill

Pecequilo C (2012) As relaccedilotildees Brasil-Estados Unidos Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

Polanyi K (1957) The great transformation the political and economic origins of our time Boston Estados Uni-dos Beacon Press

Rodrigues J Seitenfus R e Rodrigues L (orgs) (1995) Uma histoacuteria diplomaacutetica do Brasil (1531-1945) Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Brasileira

Seitenfus R (2003) O Brasil vai agrave guerra o processo de envolvimento brasileiro na Segunda Guerra Mundial 3a ed Satildeo Paulo Brasil Barueri

Spector M (2019 25 abril) Eacute hora de construir uma po-liacutetica externa poacutes-Bolsonaro Folha de S Paulo Re-cuperado de httpswww1folhauolcombr colunasmatiasspektor201904e-hora-de-construir-a-politi-ca-externa-pos-bolsonaroshtml

Stunkel O Com Bolsonaro a poliacutetica externa se tor-nou uma caixa de surpresas (entrevista agrave Deutsche Welle Brasil) Recuperado de httpswwwterracombrnoticiasbrasil com-bolsonaro-politica-ex-terna-se-tornou-uma-caixa-de-surpresas 7f6f-814287c0240a2f3f93ad aa39af65jpo4zbzghtml

Tarzi S (2007) Neorealism neoliberalism and the inter-national system International Studies (41) 115-128

Vadell J e Ramos L (2019) The role of declining Brazil and ascending China in the brics initiative Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 75-94) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Viana F L (1959) A vida do Baratildeo do Rio Branco Rio de Janeiro Brasil Joseacute Olympio

Vidigal C (2009) Relaccedilotildees Brasil-Argentina o primeiro ensaio Curitiba Brasil Juruaacute

Page 6: Bolsonaro versus Rio Branco: transição hegemônica, América ...2011/02/15  · Contra-hegemonia e ordem capitalista mundial por meio do brics, brics-plus e de outros agru-pamentos,

16

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

O processo modernizador do Brasil nos finais do seacuteculo xix dependeu do comeacutercio com os Esta-dos Unidos pois os superaacutevits na balanccedila comercial geravam excedentes para atender amortizaccedilotildees serviccedilos de empreacutestimos britacircnicos e para custear o complexo exportador nas matildeos dos ingleses A concorrecircncia comercial entre norte-americanos e ingleses segundo Cervo estabeleceu-se no Brasil apenas em pequena escala Nessa conjuntura os Estados Unidos elevaram seu interesse no paiacutes com a intenccedilatildeo de abrir mercados e equilibrar suas contas (Cervo e Bueno 2015)

Nas deacutecadas iniciais do seacuteculo xx o Brasil es-treitou laccedilos com os Estados Unidos manteve boas relaccedilotildees econocircmicas e diplomaacuteticas com a Gratilde-Bre-tanha e atuou de forma autocircnoma nas questotildees mais delicadas das relaccedilotildees sul-americanas em especial as do Cone Sul Nas quatro deacutecadas que se seguiram agrave Primeira Guerra Mundial a poliacutetica exterior brasileira foi regida principalmente pelas demandas das relaccedilotildees com os Estados Unidos As accedilotildees ou ensaios de autonomia representados pela participaccedilatildeo brasileira nas negociaccedilotildees do poacutes-gue-rra pelo comeacutercio compensado com a Alemanha permitiriam a Getuacutelio Vargas mdash que ascendera agrave Presidecircncia na Revoluccedilatildeo de 1930 cargo no qual permaneceria ateacute 1945 mdash o exerciacutecio da ldquopoliacutetica de barganhardquo com esse paiacutes e com os Estados Unidos (Bandeira 2004 Seitenfus 2003 Cervo e Bueno 2015 Doratioto e Vidigal 2015)

Na construccedilatildeo da nova ordem mundial do se-gundo poacutes-guerra o Brasil se alinhou aos Estados Unidos na Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (onu) e no processo de construccedilatildeo do Sistema Interame-ricano Durante os governos Dutra Vargas Cafeacute Filho e os anos iniciais de Kubitschek o Brasil procurou buscar recursos financeiros e tecnoloacute-gicos junto aos Estados Unidos para a promoccedilatildeo do desenvolvimento econocircmico Das primei-ras conferecircncias interamericanas do poacutes-guerra (Chapultepec Rio de Janeiro Bogotaacute) ateacute 1958 estabeleceu-se um diaacutelogo de surdos enquanto o Brasil no que foi acompanhado pela maioria dos paiacuteses latino-americanos reivindicava uma defi-niccedilatildeo expliacutecita por parte de Washington quanto aos aportes a serem feitos na regiatildeo o governo norte-americano cobrava compromisso com as

instituiccedilotildees internacionais com os preceitos da Guerra Fria e com as necessidades impostas pela aacuterea de seguranccedila O resultado foi o crescente des-conforto das lideranccedilas poliacuteticas latino-america-nas diante da atitude reticente de Washington e do anti-americanismo em alguns paiacuteses

Em maio de 1958 por ocasiatildeo da viagem do vice- presidente Nixon ao Peru e agrave Venezuela o governo americano percebeu a dimensatildeo da insatisfaccedilatildeo dos paiacuteses sul-americanos com o tratamento que Was-hington vinha dispensando agraves suas demandas e a necessidade de rever sua poliacutetica para a regiatildeo Entre os desdobramentos da visita de Nixon destacou-se a iniciativa do presidente Kubitschek de escrever a Eisenhower propondo um esforccedilo conjunto de cooperaccedilatildeo econocircmica dos paiacuteses americanos em prol de projetos nacionais de desenvolvimento logo denominada ldquoOperaccedilatildeo Pan-Americanardquo (Cervo e Bueno 2015 Cervo 2008 Lafer 2002) Diante do novo quadro na poliacutetica regional o governo norte-americano levou o debate para o acircmbito do Conselho Econocircmico e Social da Organizaccedilatildeo dos Estados Americanos (oea) onde foi criado o Comitecirc dos 21 encarregado de gerir a implementaccedilatildeo da opa2 Os trabalhos realizados no Comitecirc permitem identificar uma poliacutetica protelatoacuteria por parte da representaccedilatildeo norte-americana com o intuito de esvaziar o conteuacutedo ldquodesenvolvimentistardquo da pro-posta brasileira em favor de uma visatildeo essencial-mente assistencialista (Vidigal 2009)

A poliacutetica externa de Jacircnio Quadros autointi-tulada ldquoPoliacutetica Externa Independenterdquo procurou superar os constrangimentos das deacutecadas anterio-res por meio de uma orientaccedilatildeo que priorizava a expansatildeo do comeacutercio e a diversificaccedilatildeo dos laccedilos internacionais o estabelecimento de relaccedilotildees di-plomaacuteticas com paiacuteses socialistas a luta contra o subdesenvolvimento e o empenho em favor da in-tegraccedilatildeo econocircmica regional sem romper com a posiccedilatildeo tradicional do Brasil em outros pontos da agenda internacional como o respeito ao ldquomundo livrerdquo agrave oea e agrave onu

2 Iniciativa do governo Juscelino Kubitschek junto agrave ad-ministraccedilatildeo de Eisenhower incorporada agrave oea que objetivava a promoccedilatildeo do desenvolvimento dos paiacuteses latino-americanos com o apoio dos Estados Unidos da Ameacuterica

17Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Da autonomia dos anos 2000 ao ldquonovo alinhamentordquo Embora Lula tenha incentivado e participado de alianccedilas contra-hegemocircnicas no acircmbito da eco-nomia poliacutetica internacional como o Ibas e o brics natildeo se pode afirmar que ele ou sua suces-sora Dilma Rousseff tenha desenvolvido uma po-liacutetica internacional contraacuteria aos Estados Unidos (Pecequilo 2012 Cervo e Bueno 2015) Sempre se tratou de relaccedilotildees ldquocentraisrdquo ou ldquocruciaisrdquo para o Brasil mas tambeacutem de grande assimetria Para o Brasil pensar nos Estados Unidos eacute pensar em sua poliacutetica exterior (Pecequilo 2012) como uma ldquoparceria estrateacutegicardquo que influencia as estruturas socioeconocircmicas do paiacutes ao longo do tempo (Cer-vo 2008) Essa tradiccedilatildeo que remonta a Rio Branco apresentou-se na trajetoacuteria histoacuterica do paiacutes como parceria estrateacutegica em alguns momentos ou como alinhamento em outros

A poliacutetica externa do pt se caracterizou pelo multilateralismo e pelo fortalecimento e cons-truccedilatildeo de parcerias estrateacutegicas O que diferencia esse passado com a etapa iniciada com a presidecircn-cia de Bolsonaro talvez seja a adesatildeo agrave poliacutetica de rechaccedilo do globalismo e do multilateralismo

O governo Bolsonaro comeccedilou a aproximar-se dos Estados Unidos por meio de ideias mdash expres-sas pela visatildeo do ministro Ernesto Arauacutejo mdash e de accedilotildees Durante a campanha e nos primeiros me-ses de governo manifestaccedilotildees do Presidente de seu filho Eduardo e de um dos mentores de seu projeto Olavo de Carvalho demonstravam que o estreitamento dos laccedilos com Washington era mais o resultado de contatos com grupos poliacuteticos norte-americanos simpatizantes de Trump do que fruto de um entendimento poliacutetico consistente

Bolsonaro introduziu cinco mudanccedilas na po-liacutetica externa sul-americana do Brasil em com-paraccedilatildeo ao periacuteodo 2003-2016 1 recolocou o paiacutes em uma relaccedilatildeo estreita agrave poliacutetica exterior norte--americana 2 retirou seu apoio e logo comeccedilou a incentivar mdash juntamente com o presidente chileno Pintildeera mdash um novo agrupamento para substituir a Uniatildeo de Naccedilotildees Sul-Americanas (Unasul) 3 abandonou o respaldo poliacutetico ao governo vene-zuelano identificando-o como a principal ameaccedila

para a seguranccedila e estabilidade da regiatildeo 4 pas-sou a tratar o Mercado Comum do Sul (Mercosul) como um tema secundaacuterio na agenda 5 reduziu a prioridade que Brasiacutelia mdash desde 1985 mdash atribuiacutea a Buenos Aires em favor do Chile primeiro paiacutes a ser visitado pelo novo presidente

Qual poderia ser a explicaccedilatildeo de colocar o Chile como o primeiro paiacutes a visitar Sinalizar que foi devido agrave sintonia poliacutetica natildeo o explica posto que Macri eacute tatildeo liberal quanto Pintildeera Eacute possiacutevel entatildeo Bolsonaro tenha tentado retomar a visatildeo que Rio Branco tinha em relaccedilatildeo ao Cone Sul e buscar uma nova aproximaccedilatildeo com o Chile O Brasil e o Chile compartilham hoje uma posiccedilatildeo criacutetica a respeito do regionalismo poliacutetico sul-americano em par-ticular sobre a Unasul mas a Argentina tambeacutem Entretanto o imaginaacuterio do Chile em relaccedilatildeo a pa-radigmas e visotildees sobre o sistema internacional eacute distinto do brasileiro Satildeo dois paiacuteses com capaci-dades atributos e recursos de poder enormemente diferentes Em parte o modelo de inserccedilatildeo inter-nacional e seus instrumentos satildeo semelhantes em ambos os paiacuteses a visatildeo ideal do tipo de Estado a internacionalizaccedilatildeo da economia e o papel das empresas assim como papel que desempenha o capital privado Mas tambeacutem grandes diferenccedilas o Brasil tem uma histoacuterica vocaccedilatildeo industrialista mdash que natildeo existe atualmente no Chile mdash e uma aspiraccedilatildeo a concertar internamente os diversos segmentos e recursos de poder induacutestria ciecircncia e teacutecnica pesquisa e desenvolvimento papel do mercado interno de consumo e outros todas ques-totildees que satildeo muito relativas no modelo chileno

O Brasil eacute um global trader que se pensou glo-bal player cujos interesses satildeo tanto econocircmicos como poliacuteticos e sugerem a aspiraccedilatildeo a uma par-ticipaccedilatildeo influente na tomada de decisotildees no siste-ma internacional e nos organismos internacionais Na interpretaccedilatildeo de Cervo e Bueno esta foi a he-ranccedila dos dois governos de Lula a de desempe-nhar o papel que era devido no acircmbito hemisfeacuterico e no cenaacuterio internacional (Cervo e Bueno 2015) O Brasil pressupunha que seus vizinhos regionais reconhecessem a priori suas condiccedilotildees de lide-ranccedila e hegemonia sob um soft power Poreacutem nos anos recentes sob os governos da Concertaccedilatildeo o Chile buscou colocar-se como modelo de inserccedilatildeo

18

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

regional e tem procurado disputar com o Brasil essa condiccedilatildeo de lideranccedila natural (Bernal-Meza 2015 Flisfisch 2011)

Provavelmente a decisatildeo de visitar primeira-mente o Chile tenha sido resultado da influecircncia do ministro da Economia Paulo Guedes Egresso do curso de Economia da Universidade de Chicago e admirador do liberalismo e do ldquomodelordquo chileno Guedes teceu elogios ao Chile em diversas ocasiotildees em visatildeo superficial sobre o sucesso econocircmico da-quele modelo e a viabilidade de aplicaacute-lo ao Brasil de hoje Ademais somou-se aos criacuteticos da Unasul e da poliacutetica de contemporizaccedilatildeo com Caracas

Segundo o embaixador Pinheiro Guimaratildees secretaacuterio-geral do Ministeacuterio das Relaccedilotildees Ex-teriores (mre tambeacutem chamado de ldquoItamaratyrdquo) durante os governos de Lula essas posiccedilotildees jaacute tin-ham antecedentes

no periacuteodo de Michel Temer o Brasil se juntou aos paiacuteses da Alianccedila do Paciacutefico e aos paiacuteses do Grupo de Lima contra a Venezuela infringindo os prin-ciacutepios de autodeterminaccedilatildeo e de natildeo intervenccedilatildeo gerando desconfianccedilas e ressentimentos no esforccedilo de agradar aos Estados Unidos em sua campanha para derrubar o governo venezuelanordquo (Guimaratildees 2018 sp)

No discurso de posse o ministro das Relaccedilotildees Exteriores pocircs a figura do presidente Bolsonaro como um libertador do Brasil e definiu a nova etapa da poliacutetica exterior como aquela que se libertava do passado Em suas palavras ldquoo presidente Bolso-naro estaacute libertando o Brasil por meio da verdade Noacutes vamos tambeacutem libertar a poliacutetica externa va-mos libertar o Itamaraty como o presidente Bolso-naro prometeu que fariacuteamos em seu discurso da vitoacuteriardquo (Arauacutejo 2019 sp)

Segundo Cervo (2019) Bolsonaro e Cardoso coincidem

os dois presidentes tecircm uma visatildeo de mundo e da inserccedilatildeo internacional do Brasil semelhante satildeo li-berais nesse sentido inovadores relativamente ao periacuteodo anterior a seus mandatos de governos mais nacionalistas e introspectivos Isso significa para a poliacutetica exterior um novo ciclo de abertura da eco-nomia a empreendimentos capitais e tecnologias vindas de forardquo (sp)

Para Cervo (2002) natildeo haveria ruptura na poliacute-tica exterior porque ela apresenta haacute seacuteculos trecircs traccedilos que compotildeem a estrateacutegia brasileira de longo prazo universalismo cooperaccedilatildeo e pacifismo Mas haacute que se recordar daquelas diretrizes que marca-ram a poliacutetica externa de Cardoso (Bernal-Meza 2002) Nesse sentido eacute possiacutevel que o viacutenculo com os Estados Unidos e as potecircncias do capitalismo central o apoio agraves instituiccedilotildees de governanccedila glo-bal sustentada pela hegemonia norte-americana e a posiccedilatildeo a favor do Ocidente ante os conflitos mundiais bem como o suposto enfrentamento ci-vilizatoacuterio deixem para traacutes o que Bandeira (2004) denominou de ldquorelaccedilotildees perigosasrdquo

O americanismo do governo Bolsonaro entre-tanto parece desmentir Cervo ou seja concilia o alinhamento poliacutetico aos Estados Unidos com a repulsa ao universalismo e mesmo agrave cooperaccedilatildeo e ao pacifismo O chanceler Ernesto Arauacutejo elogia Trump como ldquoum cavalheiro cruzado que luta para resgatar a identidade do Ocidenterdquo Para Arauacutejo (2017) Trump e sua poliacutetica internacional repre-sentam a disposiccedilatildeo para uma luta global para re-cuperar o passado simboacutelico que tem representado a histoacuteria e a cultura das naccedilotildees ocidentais para a sobrevivecircncia e o domiacutenio do Ocidente

Um grande questionamento eacute o que aconteceraacute com o papel que a poliacutetica exterior brasileira tem desempenhado na regiatildeo e se ela retornaraacute agrave dispo-siccedilatildeo para a lideranccedila que marcou o periacuteodo Lula ou se deixaraacute nas matildeos de potecircncias secundaacuterias mdash como o Chile mdash essa posiccedilatildeo o paiacutes que Bolso-naro considera um modelo No plano da poliacutetica internacional um posicionamento em linha com a poliacutetica de Trump poderia ter grandes impactos Uma maior aproximaccedilatildeo mdash ou coincidecircncias mdash com a poliacutetica de Washington afastaria o Brasil de sua tendecircncia mais tradicional a da autonomia mdash cujo efeito seria um afastamento relativo do brics e a predisposiccedilatildeo do presidente Bolsonaro a resta-belecer uma relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo militar com os Estados Unidos (Cervo 2019) o que despertaria na regiatildeo velhos temores mdash nunca esquecidos mdash so-bre o subimperialismo brasileiro

Haacute que se considerar nesses aspectos que a poliacutetica externa do governo Bolsonaro tem sido in-formada por diferentes grupos de interesse o que

19Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

resulta muitas vezes em uma praacutetica erraacutetica in-consistente e excessivamente ideoloacutegica (Stunkel 2019 Spector 2019) Diferentemente de outras si-tuaccedilotildees semelhantes mdash Dutra Castelo Branco ou Collor mdash desta feita o Itamaraty natildeo atuou como contraponto agrave presidecircncia alimentando muitas vezes o discurso ideoloacutegico

Bolsonaro e Trump parecem ter muitos pontos em comum Entre as coincidecircncias mais delicadas estaacute seu rechaccedilo ao ldquoglobalismordquo3 o que revela que ambos os presidentes estatildeo dispostos a depreciar o que as diplomacias de seus proacuteprios paiacuteses cons-truiacuteram sob o sistema internacional contemporacirc-neo a criaccedilatildeo e fortalecimento das organizaccedilotildees internacionais o sistema das Naccedilotildees Unidas e as negociaccedilotildees mundiais sobre assuntos que impor-tavam agrave sociedade internacional Accedilotildees que se plasmaram em temas e agendas globais como o meio ambiente e a mudanccedila climaacutetica Ambas se-riam tendecircncias de mudanccedila profunda que impac-tariam todo o cenaacuterio latino-americano O mais preocupante eacute imaginar o Brasil imerso em um enfrentamento a respeito do papel do Ocidente na defesa da chamada ldquocultura ocidentalrdquo posto que ela tem sido o instrumento mais importante do co-lonialismo e da dominaccedilatildeo das potecircncias ociden-tais sobre a periferia do mundo

O que parecia ser manifestaccedilotildees de desinte-resse (ao menos) a respeito de seu soacutecio estrateacute-gico sul-americano Bolsonaro ao natildeo incluir a Argentina em sua primeira viagem ao exterior e as declaraccedilotildees de seu ministro da Economia a respeito do Mercosul o que indicava que este natildeo seria uma prioridade para o Brasil pode trazer consequecircncias negativas para as relaccedilotildees sul-ame-ricanas Deve-se recordar que a base de qualquer entendimento de cooperaccedilatildeo governanccedila re-gional e continuidade para fazer da regiatildeo uma

3 ldquoGlobalismordquo em sentido pejorativo foi o termo utilizado por Bolsonaro e por seus principais auxiliares para cri-ticar nos meses iniciais de seu governo as poliacuteticas de inserccedilatildeo do Brasil no cenaacuterio global por meio de uma par-ticipaccedilatildeo proativa em foros multilaterais e nos debates sobre os temas mais sensiacuteveis da agenda internacional Argumento apresentado pelo ministro Arauacutejo em seu dis-curso de posse por meio de uma obviedade ldquoNatildeo estamos aqui para trabalhar pela ordem global Aqui eacute o Brasilrdquo (Arauacutejo 2019 sp)

zona militarmente desnuclearizada passa por uma relaccedilatildeo cordial entre o Brasil e a Argentina A construccedilatildeo de uma ldquozona de pazrdquo no Atlacircntico Sul por meio da superaccedilatildeo das hipoacuteteses de con-flito entre a Argentina e o Chile tem se baseado na continuidade dessa relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo A partir dessas perspectivas a presidecircncia Bolso-naro natildeo soacute implicaria o retorno da Ameacuterica do Sul agraves concepccedilotildees ideoloacutegicas radicalizadas que se supunham superadas que incluem novos viacutenculos estreitos em mateacuteria de seguranccedila com os Estados Unidos mas tambeacutem o iniacutecio de uma etapa de in-certeza na regiatildeo

Alinhamento com Washington incertezas quanto a PequimO alinhamento com Washington agrave eacutepoca de Rio Branco seguia um roteiro previsiacutevel diante da potecircncia ascendente a adesatildeo aos princiacutepios do Direito Internacional a incorporaccedilatildeo acriacutetica do conceito de ldquobom governordquo e a convicccedilatildeo de que o progresso da naccedilatildeo dependia dos desiacutegnios do norte Nada parecido se via em relaccedilatildeo a Londres que ainda conservava o status de principal centro financeiro internacional mas que perdia impor-tacircncia no intercacircmbio de mercadorias Mais de um seacuteculo depois o novo alinhamento mdash e este eacute o contraponto que se mencionou na introduccedilatildeo mdash manteacutem o principal das relaccedilotildees internacionais do paiacutes voltado para os Estados Unidos De acordo com a hipoacutetese de trabalho inicial a de estarmos em meio a uma transiccedilatildeo hegemocircnica dos Estados Unidos para a China Bolsonaro estaria em dis-sonacircncia com Rio Branco

Os primeiros meses de 2019 revelaram que o governo Bolsonaro sustentava na poliacutetica externa o principal das promessas de campanha acompa-nhadas do mote ldquoo Brasil acima de tudordquo Inspira-do no governo de Trump o discurso de supremacia contrastava com o silecircncio diante da poliacutetica pro-tecionista de Washington que elevara a tarifa para a importaccedilatildeo do accedilo e subsidiava a produccedilatildeo de soja ambas as medidas prejudiciais para os inte-resses brasileiros Ante eventuais perdas setoriais o governo seguia fiel ao princiacutepio do alinhamento em dissonacircncia com o legado de Rio Branco

20

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

A crise na Venezuela e os interesses econocircmi-cos do agronegoacutecio no mercado chinecircs levariam o governo a modificar em parte a retoacuterica inicial o que indicaria estar em curso ajustes e reorientaccedilotildees na aacuterea No dia 23 de fevereiro o autoproclamado presidente interino da Venezuela Juan Guaidoacute liderou um esforccedilo de tentar fazer com que ca-minhotildees com alimentos adentrassem a Venezue-la como forma de pressionar o governo Maduro Em Pacaraima o chanceler brasileiro explicava se tratar de um ato humanitaacuterio altruiacutesta ldquoum mo-mento de criaccedilatildeo de uma nova realidade na Ve-nezuelardquo Quanto agrave possibilidade de intervenccedilatildeo Arauacutejo considerava que ldquonatildeo haacute menor expectativa de conflito mas claro que o Exeacutercito estaacute prepa-rado caso isso possa se materializarrdquo (Cronologia 2019 sp)

Na visatildeo do vice-presidente Mouratildeo que natildeo ocultava a influecircncia estadunidense a crise vene-zuelana soacute seria superada com a neutralizaccedilatildeo de agentes externos em especial a presenccedila cubana Se essa situaccedilatildeo continuasse a Venezuela correria o risco de se tornar um ldquonatildeo Estadordquo (Arauacutejo Ritt-ner e Murakawa 2019) Mouratildeo ao mesmo tempo que natildeo contemporizava com o governo Maduro indicava natildeo estar de acordo in totum com o alin-hamento com Washington nessa questatildeo ao colo-car em duacutevida a legitimidade de Juan Guaidoacute

Em relaccedilatildeo agrave China a visita de Mouratildeo e seu encontro com Xi Jiping marcaram a superaccedilatildeo de desconfianccedilas manifestadas durante a campan-ha e os meses iniciais de governo Para Mouratildeo a prioridade era restabelecer o funcionamento da Comissatildeo Sino-Brasileira de Alto Niacutevel de Concer-taccedilatildeo e Cooperaccedilatildeo (Cosban) e reorganizar sua es-trutura para que voltasse a ser um mecanismo de alto niacutevel Em sua percepccedilatildeo a China tem sido um parceiro confiaacutevel do Brasil desde 2009 ano em que se tornou seu maior parceiro comercial e no qual ocorreu a i Cuacutepula do brics Nesses dez anos de parceria estrateacutegica o fluxo comercial bilateral alcanccedilou usd$ 100 bilhotildees embora o Brasil expor-tasse muito mais produto in natura que produtos com valor agregado uma das reclamaccedilotildees que te-ria apresentado ao primeiro mandataacuterio chinecircs

A China vinha se transformando em um enor-me desafio regional e internacional para o Brasil

Em vinte anos a China transitou de ser vista como ldquoa oportunidaderdquo para ser percebida como desafio (Bernal-Meza 2014) de potencial grande merca-do para as importaccedilotildees e a exportaccedilatildeo de capitais a fazer de seus soacutecios latino-americanos periferia primaacuterio-exportadora A evoluccedilatildeo das relaccedilotildees econocircmicas entre a China e o Brasil de maneira bilateral e no acircmbito das relaccedilotildees no brics estaria sinalizando uma tendecircncia estrutural da configu-raccedilatildeo de um padratildeo de relaccedilotildees centro-periferia (Beckerman e Moncaut 2016 Becard 2017 Bernal- Meza 2019a 2019b)

O ingresso da China na economia poliacutetica da Ameacuterica do Sul deslocou o Brasil do lugar prepon-derante que ocupava dentro do bloco Mercosul e no contexto regional A respeito dos processos de integraccedilatildeo latino-americanos mdash em particu-lar do Mercosul mdash a China se transformou em um fator de profundo desequiliacutebrio porque foi se transformando no principal e segundo soacutecio mais importante da inserccedilatildeo econocircmica internacional da Ameacuterica do Sul (Hiratuka 2016 Dussel 2016) Isso afetou igualmente a posiccedilatildeo do Brasil como a principal economia para seus vizinhos No plano interno a presenccedila econocircmica chinesa parece es-tar condicionando a eventual autonomia do des-envolvimento industrial e tecnoloacutegico brasileiro ao exercer um crescente controle sobre a estrutura energeacutetica no setor eleacutetrico (Becard Lessa e Silveira 2020 Becard 2017)

A presenccedila chinesa na Ameacuterica Latina con-correu para enfraquecer a influecircncia brasileira sobre a integraccedilatildeo regional Entre os interesses brasileiros figurava a ideia de natildeo seguir a poliacuteti-ca adotada por Washington em relaccedilatildeo a algumas empresas chinesas em particular a gigante de te-lecomunicaccedilotildees Huawei Nesse sentido Mouratildeo que foi ldquoalertadordquo pelo governo norte-americano sobre os riscos das operaccedilotildees da empresa chi-nesa teria sugerido a Xi Jinping a criaccedilatildeo de um ambiente de confianccedila quanto agrave companhia ldquode modo que nenhum paiacutes que vaacute receber a empresa e a tecnologia que vocecircs vatildeo instalar e fique preocu-pado com que todos dados que estaratildeo em seu po-der pertenceratildeo tambeacutem ao governo [chinecircs] Esta eacute a discussatildeordquo (Arauacutejo et al 2019 sp) A expecta-tiva de abertura brasileira agrave tecnologia 5g chinesa

21Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

se vinculava ao fato de o paiacutes ainda natildeo estar inte-grado digitalmente e de ter um marco regulatoacuterio defasado no setor A presidecircncia brasileira passava a se posicionar de forma equidistante em relaccedilatildeo aos interesses de Washington e Pequim o que se estendia agrave poliacutetica adotada diante da guerra co-mercial entre as duas maiores economias Poucos casos ilustravam com tanta transparecircncia um dos mais importantes efeitos da transiccedilatildeo hegemocircnica em curso

Mouratildeo fora convencido pelo secretaacuterio-geral do Itamaraty Otaacutevio Brandelli quanto agrave adequa-ccedilatildeo de uma conduta flexiacutevel e pragmaacutetica Em face de uma guerra comercial dessa natureza o gover-no brasileiro deveria saber explorar as oportuni-dades Por exemplo como a administraccedilatildeo Trump taxou parcela das importaccedilotildees da China inicial-mente em torno de usd$ 250 bilhotildees os produtos envolvidos passaram a chegar mais caros no mer-cado norte-americano e eventualmente poderiam ser substituiacutedos por produtos brasileiros o que acrescentaria usd$ 5 bilhotildees ou mais nas nossas exportaccedilotildees A guerra comercial deveria assim ser tratada com paciecircncia

O limite da visatildeo do vice-presidente brasi-leiro mdash que dava vazatildeo agraves pressotildees do agrone-goacutecio mdash era evidente Temas como transferecircncia de tecnologia e cooperaccedilatildeo industrial natildeo foram abordados Indagado sobre o fato de o conflito de interesses entre Estados Unidos e China natildeo ser apenas comercial mas tambeacutem tecnoloacutegico a res-posta foi igualmente simplista ldquoVocecirc olha o 5g As quatro empresas que detecircm a tecnologia satildeo duas chinesas e duas finlandesas Cadecirc a americanardquo (Arauacutejo et al 2019 sp) Ou seja o governo bra-sileiro mdash afastadas as desconfianccedilas iniciais em relaccedilatildeo agrave China mdash voltava a se ocupar dos temas tratados em governos anteriores exportaccedilotildees de alimentos e mineacuterios investimentos diretos com geraccedilatildeo de empregos acordos de cooperaccedilatildeo em tecnologia estes uacuteltimos sem viacutenculo claro com qualquer projeto mais amplo de industrializaccedilatildeo e desenvolvimento tecnoloacutegico

O governo Bolsonaro aparentemente estava satisfeito com o status internacional do paiacutes sem atentar minimamente ao processo de desindus-trializaccedilatildeo das uacuteltimas deacutecadas (Benaion 2006

Cano 2012 Oliveira 2018) Para Chang (2018) nos anos 1980 e 1990 o Brasil conheceu o ponto mais alto da industrializaccedilatildeo que atingiu 35 da produccedilatildeo nacional No final de 2017 representa-va apenas 12 e a tendecircncia era de decliacutenio O Brasil tem nesse sentido voltado no tempo Em-presaacuterios de Satildeo Paulo natildeo parecem estar preocu-pados com o decliacutenio da induacutestria manufatureira No longo prazo essa poliacutetica eacute prejudicial para o paiacutes No governo Dilma Rousseff vaacuterios subsiacutedios foram canalizados para a induacutestria mas as altas taxas de juros natildeo favoreceram mudanccedilas efetivas (Oliveira 2018)

O processo de desindustrializaccedilatildeo as poliacuteticas econocircmicas e o conformismo com a condiccedilatildeo ldquosu-bordinadardquo do paiacutes instruiacuteram em outro momento o uso do conceito de ldquoperiferia proacutesperardquo para o crescimento econocircmico de meados da deacutecada de 2000 sustentado pela demanda chinesa (Doratioto e Vidigal 2015) As taxas de crescimento da China beneficiaram as exportaccedilotildees latino-americanas de produtos agriacutecolas mineacuterios petroacuteleo e produtos manufaturados de baixo valor agregado Conco-rreram por sua vez para reforccedilar o caraacuteter liberal perifeacuterico de economias como a brasileira (Filguei-ras e Gonccedilalves 2007)

Na poliacutetica externa era clara a intenccedilatildeo de re-duzir o peso do Itamaraty nas decisotildees relativas aos assuntos de seguranccedila e defesa fronteiras narcotraacutefico e outros delitos internacionais e imi-graccedilatildeo como no tema da crise na Venezuela e em outros assuntos sensiacuteveis na aacuterea da poliacutetica in-ternacional Quanto ao chanceler Ernesto Arauacutejo que havia impressionado negativamente a maioria dos estudiosos de poliacutetica externa e internacional em razatildeo de certo ldquomessianismordquo na defesa do Oci-dente e da administraccedilatildeo Trump passou a atuar de modo mais comedido e profissional como na ocasiatildeo da assinatura do acordo Mercosul-Uniatildeo Europeia no dia 28 de junho de 2019

Bolsonaro no final de reuniatildeo do g-20 em Osaka (28 e 29 de junho de 2019) se disse satis-feito com os resultados do encontro do brics e do proacuteprio g-20 aleacutem de destacar a importacircncia da conclusatildeo do acordo Mercosul-Uniatildeo Europeia Na reuniatildeo dos brics Bolsonaro desistiu de pro-por aos demais liacutederes o apoio a uma mudanccedila

22

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

de governo na Venezuela Foi tambeacutem a oportu-nidade para reconhecer o interesse brasileiro em manter bom diaacutelogo com o principal parceiro co-mercial do paiacutes

Os ajustes percebidos na conduccedilatildeo da poliacutetica externa natildeo significaram uma mudanccedila de rumo do governo Bolsonaro no que tange agrave priorizaccedilatildeo dos laccedilos com os Estados Unidos a Europa e o Ja-patildeo parceiros preferenciais nas deacutecadas de 1960 1970 e sob o governo de Cardoso Nesse sentido as relaccedilotildees com a China a despeito do discurso em prol de uma parceria estrateacutegica ou coisa que o valha tecircm sido tratadas de forma setorial mdash co-meacutercio investimentos cooperaccedilatildeo tecnoloacutegica mdash e descompromissada com qualquer planejamento Os laccedilos histoacutericos com os Estados Unidos em to-das as suas dimensotildees favorecem a acomodaccedilatildeo e a recusa em tratar seriamente a hipoacutetese da ldquoopccedilatildeo chinesardquo o que natildeo necessariamente eacute negativo

ConclusatildeoAs transiccedilotildees hegemocircnicas no marco da econo-mia poliacutetica mundial tecircm constituiacutedo um pro-blema externo e interno para os paiacuteses inseridos em uma relaccedilatildeo centro-periferia A ascensatildeo da China e sua presenccedila econocircmica na Ameacuterica do Sul tecircm levado alguns paiacuteses a incluiacute-la em seus caacutelculos estrateacutegicos A Argentina o Brasil e o Chile podem desempenhar um papel crucial nesse processo tendo em vista a relevacircncia geopoliacutetica e econocircmica do Cone Sul pois a polarizaccedilatildeo Es-tados Unidos-China cria janelas de oportunidade e gera maior permissibilidade no sistema interna-cional como diria Heacutelio Jaguaribe

Destacamos a identificaccedilatildeo das grandes linhas de continuidade e de ruptura que tecircm implicado o discurso do presidente Bolsonaro e dos principais colaboradores em relaccedilatildeo agrave tradiccedilatildeo da poliacutetica externa brasileira O contraponto inicial com a poliacutetica e o pensamento de Rio Branco com des-taque para as boas e privilegiadas relaccedilotildees com os Estados Unidos permitiu identificar periacuteodos de maior proximidade ou de distanciamento de Was-hington Bolsonaro estaacute proacuteximo dessa tradiccedilatildeo a de ver o Brasil como soacutecio proacuteximo dos Estados Unidos mas se afasta de praacuteticas autonomistas

como a da poliacutetica externa independente e a do pragmatismo responsaacutevel Praacuteticas essas que per-mitiriam avaliar de modo desassombrado as re-laccedilotildees com a China

Tanto a ascensatildeo da China como a posiccedilatildeo que ocupa Pequim na estrutura econocircmica brasileira planteiam desafios equivalentes ao que o Brasil ex-perimentou no comeccedilo do seacuteculo xx Agrave diferenccedila da visatildeo de Rio Branco durante a transiccedilatildeo da he-gemonia natildeo parece haver no governo de Bolsona-ro um olhar seguro sobre os impactos da transiccedilatildeo hegemocircnica nem do papel que o Brasil deveria des-empenhar na estrateacutegia global da China

Um terceiro tema de preocupaccedilatildeo eacute o das re-laccedilotildees com a Argentina A visita subsequente a Buenos Aires a assinatura do acordo para negociar um tratado de livre-comeacutercio entre o Mercosul e a Uniatildeo Europeia e o anuacutencio de que ambos os go-vernos iniciariam gestotildees conjuntas para a assina-tura de acordos de livre-comeacutercio com os Estados Unidos restabeleceram o bom diaacutelogo entre Bra-siacutelia e Buenos Aires ainda que persistam duacutevidas no governo Macri (Landim 2019) As incertezas se estenderam ao governo eleito em dezembro de 2019 em decorrecircncia de criacuteticas de natureza ideo-loacutegicas realizadas tanto por Bolsonaro quanto por Alberto Fernaacutendez Entretanto o diaacutelogo bilateral tende a se normalizar sem maiores pretensotildees no plano regional

O viacutenculo estrateacutegico entre Brasiacutelia e Buenos Aires tem sido chave para sustentar um espiacuterito de cooperaccedilatildeo e integraccedilatildeo na Ameacuterica do Sul que se baseia na credibilidade das accedilotildees e na boa feacute de uns e outros governos Desde 1985 o Brasil e a Argentina desenvolveram o que Cervo (2008) denominou de ldquorelaccedilotildees em eixordquo que se estabe-lecem ldquoquando precisamente a imagem um do outro corresponde agrave do parceiro que consegue estabelecer uma uniatildeo co-responsaacutevel [] Em outros termos o eixo comporta uma vertente exoacute-gena que o transcende porque abarca as relaccedilotildees regionais mesmo que coletivas []rdquo (pp 211-212) Eacute esse tipo de relaccedilotildees e sua projeccedilatildeo no Cone Sul que foi potencialmente afetada pelas primei-ras declaraccedilotildees e accedilotildees do governo Bolsonaro Ao promover um alinhamento com os Estados Uni-dos mdash ou ldquosem recompensardquo como diria Gerson

23Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Moura mdash reproduz o que o Brasil e outros paiacuteses latino-americanos adotaram como ldquoestrateacutegiardquo na deacutecada de 1990 sem os resultados esperados E ao abandonar a tradiccedilatildeo iniciada em 1961 e adaptada agraves diferentes conjunturas que se sucederam abriu matildeo de exercer o poder de barganha do paiacutes para fazer concessotildees sem contrapartidas equivalentes Nas circunstacircncias atuais diante da transiccedilatildeo he-gemocircnica Estados Unidos-China considerando os interesses do Brasil na Ameacuterica do Sul a equidis-tacircncia talvez seja o melhor caminho Diaacutelogo es-treito com Washington e autonomia em temas de interesse do paiacutes foram as opccedilotildees de Rio Branco

Referecircncias Arauacutejo E (2017) Trump e o Ocidente Cadernos de Poliacutetica

Exterior iii(6) 323-357

Arauacutejo E (2019 2 de janeiro) Discurso do minis-tro Ernesto Arauacutejo durante cerimocircnia de posse no Ministeacuterio das Relaccedilotildees Exteriores Brasiacutelia Re-cuperado de httpwwwitamaratygovbrpt-BRdiscursos-artigos-e-entrevistas-categoriaminis-tro-das-relacoes-exteriores-discursos19907-dis-curso-do-ministro-ernesto-araujo-durante-cerimo-nia-de-posse-no-ministerio-das-relacoes-exteriores-brasilia-2-de-janeiro-de-2019

Arauacutejo C Rittner D e Murakawa F (2019 30 de abril) Brasil descarta vetar presenccedila da Huawei em 5g avisa Mouratildeo (entrevista com o vice-presidente Hamilton Mouratildeo) g1 Recuperado de httpsvalorglobocombrasilnoticia20190607brasil-descarta-vetar-pre-senca-da-huawei-em-5g-avisa-mouraoghtml

Arrighi G (2008) Adam Smith em Pequim origens e fun-damentos do seacuteculo xxi Satildeo Paulo Brasil Boitempo

Bandeira L A M (2004) As relaccedilotildees perigosas Brasil-Es-tados Unidos Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Bra-sileira

Bandeira L A M (2003) Brasil Argentina e Estados Uni-dos da Triacuteplice Alianccedila ao Mercosul (1870-2003) Rio de Janeiro Editora Revan

Becard D (2017) China y Brasil iquestmodelo de relaciones Sur-Sur Em E Pastrana B e H Gehring (eds) La proyeccioacuten de China en Ameacuterica Latina y el Caribe (pp 387-408) Bogotaacute Colocircmbia Editorial Javeriana

Becard D Lessa A e Silveira L (2020) One step closer The politics and the economics of chinarsquos strategy in Brazil and the case of the electric power sector Em R Bernal-Meza R e X Li (eds) China-Latin America

relations in the 21st Century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 55-81) Nova York Estados Unidos Palgrave Macmillan

Becard D Barros-Platiau A e Lessa A (2019) Brazil in the brics after tem years Past present and near futu-re perspectives Em X Li (ed) The international po-litical economy of the brics (pp 135-149) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Beckerman M e Moncaut N (2016) Las relaciones en-tre China y Ameacuterica Latina iquestHacia la desestructura-cioacuten de los sistemas productivos de la regioacuten Em C Moneta e S Cesariacuten (eds) La tentacioacuten pragmaacutetica China-ArgentinaAmeacuterica Latina lo actual lo proacuteximo y lo distante (pp 185-202) Saacuteenz Pentildea Argentina Uni-versidad Nacional de Tres de Febrero

Benaion N (2006) Subordinaccedilatildeo reiterada imperialismo e desenvolvimento no Brasil Manaus Brasil Editora da Universidade Federal do Amazonas

Bernal-Meza R (2019a) Brazil as an emerging power The impact of international and internal deteriorational effect on the brics Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 118-134) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Bernal-Meza R (2019b) Brasil ascenso declinacioacuten y nuevos desafiacuteos de una potencia emergente (2003-2018) Revista Izquierdas 49(2020) 516-540

Bernal-Meza R (2015) Pensamiento chileno en la poliacuteti-ca exterior y en las teoriacuteas de relaciones internaciona-les Em M Artaza e C Ross (eds) La poliacutetica exterior de Chile 1990-2009 (pp 21-47) Santiago Chile ril Editores

Bernal-Meza R (2014) La heterogeneidad de la imagen de China en la poliacutetica exterior latinoamericana Pers-pectivas para la concertacioacuten de poliacuteticas Comentario Internacional 14 113-134

Bernal-Meza R (2013) Ameacuterica Latina en el mundo el pensamiento latino-americano y la teoriacutea de relaciones internaciones Buenos Aires Argentina Grupo Editor Latinoamericano

Bernal-Meza R (2002) A poliacutetica exterior do Brasil 1990-2002 Revista Brasileira de Poliacutetica Internacional 45(1) 36-71

Bernal-Meza R e Bizzozero L (eds) (2014) La poliacutetica internacional de Brasil de la regioacuten al mundo Monte-videacuteu Uruguai Ediciones Cruz del Sur

Bernal-Meza R e Li X (eds) (2020) China-Latin Ameri-ca relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges Nova York Estados Uni-dos Palgrave Macmillan

24

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

Bolsonaro J (2018) O caminho da prosperidade pro-posta de Plano de Governo Recuperado de httpdivulgacandcontastsejusbrcandidaturasof i-cial2018BRBR2022802018280000614517propos-ta_1534284632231pdf

Bricentildeo Ruiz J e Simonoff A (orgs) (2015) Integracioacuten y cooperacioacuten regional en Ameacuterica Latina una relectura a partir de la teoriacutea de la autonomiacutea Buenos Aires Ar-gentina Editorial Biblos

Bueno C (2003) Poliacutetica externa da Primeira Repuacuteblica os anos de apogeu (1902-1918) Satildeo Paulo Brasil Paz e Terra

Cano W (2012) A desindustrializaccedilatildeo no Brasil (texto para discussatildeo 200) Campinas Brasil Instituto de Economia da Unicamp

Cervo A L (2019 28 de novembro) Governo Bolso-naro natildeo traraacute ruptura agrave poliacutetica externa Exame Recuperado de httpsexameabrilcombrmundogoverno-bolsonaro-nao-trara-ruptura-a-politica-ex-terna-avalia-amado-cervo

Cervo A (2008) Inserccedilatildeo internacional formaccedilatildeo dos conceitos brasileiros Satildeo Paulo Brasil Saraiva

Cervo A (2002) Relaccedilotildees Internacionais do Brasil a era Cardoso Revista Brasileira de Poliacutetica Internacional 45(1) 5-35

Cervo A e Bueno C (2015) Histoacuteria da poliacutetica exterior do Brasil Brasiacutelia Brasil Editora da Universidade de Brasiacutelia

Chang H H (2018 15 jan) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da histoacuteria da economia El Paiacutes Recuperado de ht-tpsbrasilelpaiscombrasil20180105econo-mia1515177346_780498html

Cronologia relembre os fatos mais importantes da cri-se venezuelana g1 httpsg1globocommundonoticia20190430cronologia-relembre-os-fa-tos-mais-importantes-na-crise-venezuelanaghtml

Doratioto F e Vidigal C (2015) Histoacuteria das Relaccedilotildees In-ternacionais do Brasil Satildeo Paulo Brasil Editora Saraiva

Dussel Peters E (coord) (2016) La nueva relacioacuten comer-cial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestInte-gracioacuten o desintegracioacuten regional Meacutexico-df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universidades de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico

Filgueiras L e Gonccedilalves R (2007) A economia poliacutetica do governo Lula Rio de Janeiro Brasil Contraponto

Fiori J(1999) Estado e moedas no desenvolvimento das naccedilotildees Petroacutepolis Brasil Vozes

Flisfisch A (2011) La Poliacutetica exterior chilena y Ameacuterica del Sur Estudios Internacionales (168) 115-141

Fonseca Jr G (2012) Rio Branco diante do Monroiacutesmo e do Pan-Americanismo anotaccedilotildees Em M Pereira e M Gomes (orgs) Baratildeo do Rio Branco 100 anos de memoacuteria (pp 565-602) Brasiacutelia Brasil Fundaccedilatildeo Alexandre de Gusmatildeo

Franccedila T (2007) Self made nation Domiacutecio da Gama e o pragmatismo do bom senso (tese de doutorado) Brasiacute-lia Brasil Universidade de Brasiacutelia

Guimaratildees S (2018) A poliacutetica exterior e a posiccedilatildeo do Brasil no mundo Recuperado de httpswwwnodalam201812a-politica-exterior-e-a-posicao-do-brasil-no-mundo-por-samuel-pinheiro-guimaraes-2

Gullo M (2018) Relaciones internacionales una teoriacutea criacutetica desde la periferia latinoamericana Buenos Ai-res Argentina Editorial Biblos

Gullo M (2014) A subordinaccedilatildeo fundante breve histoacuteria da construccedilatildeo do poder pelas naccedilotildees Florianoacutepolis Brasil Insular

Hiratuka C (2016) Impactos de China sobre el proceso de integracioacuten regional de Mercosur Em E Dussel Peters (coord) La nueva relacioacuten comercial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestIntegracioacuten o desintegracioacuten (pp 195-243) Meacutexico df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universida-des de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico Recuperado de httpswww3ecouni-campbrNeitimagesdestaque2016_La_nueva_rela-cion_comercial_ALC_Chinapdf

Hobsbawm E (1994) Extremes The Short Twentieth Cen-tury 1914-1991 Londres Inglaterra Michael Joseph Ltd

Kennedy P (1987) The rise and fall of the great powers Economic change and military conflict from 1500 to 2000 Nova York Estados Unidos Vintage Books

Keohane R e Nye J (1977) Power and interdependence World politics in transition Boston Estados Unidos Little Brown and Company

Lafer C (2002) JK e o programa de metas (1956-1961) Rio de Janeiro Brasil Fundaccedilatildeo Getuacutelio Vargas

Landim R (2019 6 de setembro) Brasil e Argentina adiam em 9 anos livre-comeacutercio de autos Folha de S Paulo Recuperado de httpswww1folhauolcombrmerca-do201909brasil-e-argentina-adiam-em-9-anos-li-vre-comercio-de-autosshtml

Lessa A e Oliveira H A (orgs) (2013) Parcerias estra-teacutegicas do Brasil v 1 os significados e as experiecircncias tradicionais Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

25Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Li X (2020) Revisiting China-Latin America economic relations An unintended consequence of different industrialization strategies Em R Bernal-Meza e X Li (eds) China-Latin America relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 225-251) Nova York Estados UnidosLondres Inglaterra Palgrave Macmillan

Li X (2019a) Chinarsquos dual position in the capitalist world order A dual complexity of hegemony and counter-he-gemony Em Li X (ed) The international political eco-nomy of the brics (pp 1-17) Abindon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2019b) The international political economy of the brics Nova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2014) The brics and beyond The international political economy of the emergence of a new world or-der Farnham Reino Unido Ashgate

Li X (2012) China y el orden mundial capitalista el nexo de la transformacioacuten interna de China y su impacto externo Em R Bernal-Meza e S Quintanar (eds) Regionalismo y Orden Mundial Surameacuterica Europa China (pp 29-53) Buenos Aires Argentina Nuevoha-cerUniversidad Nacional del Centro de la Provincia de Buenos Aires

Li X e Farah A (eds) (2013) China-Africa relations in an era of great transformations Farnham Reino Unido Ashgate

Lins A (1996) Rio Branco (Biografia) Satildeo Paulo Brasil Editora Alfa Omega

Mandelbaum M (2010) The frugal superpower Americarsquos global leadership in a cash-strapped era Nova York Es-tados Unidos Public Affairs

Meneses E (1988) Coping with decline Chilean fo-reign policy during the twentieth century 1902-1972 Oxford Reino Unido University of OxfordBodleian Library

Nabuco J (1949) Obras completas v xii Rio de Janeiro Brasil Instituto Progresso Editorial sa

Nasr V (2014) The dispensable nation American foreign policy in retreat Nova York Estados Unidos Anchor and Doubleday

Oliveira R (2018 15 de janeiro) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da his-toacuteria da economia (entrevista com Ha-Joon Chang) El Paiacutes Recuperado de httpsbrasilelpaiscombra-sil20180105economia1515177346_780498html

Pearson F e Rochester M (2007) Relaciones internacio-nales situacioacuten global en el siglo xxi Meacutexico-df Meacute-xico Mc Graw Hill

Pecequilo C (2012) As relaccedilotildees Brasil-Estados Unidos Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

Polanyi K (1957) The great transformation the political and economic origins of our time Boston Estados Uni-dos Beacon Press

Rodrigues J Seitenfus R e Rodrigues L (orgs) (1995) Uma histoacuteria diplomaacutetica do Brasil (1531-1945) Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Brasileira

Seitenfus R (2003) O Brasil vai agrave guerra o processo de envolvimento brasileiro na Segunda Guerra Mundial 3a ed Satildeo Paulo Brasil Barueri

Spector M (2019 25 abril) Eacute hora de construir uma po-liacutetica externa poacutes-Bolsonaro Folha de S Paulo Re-cuperado de httpswww1folhauolcombr colunasmatiasspektor201904e-hora-de-construir-a-politi-ca-externa-pos-bolsonaroshtml

Stunkel O Com Bolsonaro a poliacutetica externa se tor-nou uma caixa de surpresas (entrevista agrave Deutsche Welle Brasil) Recuperado de httpswwwterracombrnoticiasbrasil com-bolsonaro-politica-ex-terna-se-tornou-uma-caixa-de-surpresas 7f6f-814287c0240a2f3f93ad aa39af65jpo4zbzghtml

Tarzi S (2007) Neorealism neoliberalism and the inter-national system International Studies (41) 115-128

Vadell J e Ramos L (2019) The role of declining Brazil and ascending China in the brics initiative Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 75-94) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Viana F L (1959) A vida do Baratildeo do Rio Branco Rio de Janeiro Brasil Joseacute Olympio

Vidigal C (2009) Relaccedilotildees Brasil-Argentina o primeiro ensaio Curitiba Brasil Juruaacute

Page 7: Bolsonaro versus Rio Branco: transição hegemônica, América ...2011/02/15  · Contra-hegemonia e ordem capitalista mundial por meio do brics, brics-plus e de outros agru-pamentos,

17Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Da autonomia dos anos 2000 ao ldquonovo alinhamentordquo Embora Lula tenha incentivado e participado de alianccedilas contra-hegemocircnicas no acircmbito da eco-nomia poliacutetica internacional como o Ibas e o brics natildeo se pode afirmar que ele ou sua suces-sora Dilma Rousseff tenha desenvolvido uma po-liacutetica internacional contraacuteria aos Estados Unidos (Pecequilo 2012 Cervo e Bueno 2015) Sempre se tratou de relaccedilotildees ldquocentraisrdquo ou ldquocruciaisrdquo para o Brasil mas tambeacutem de grande assimetria Para o Brasil pensar nos Estados Unidos eacute pensar em sua poliacutetica exterior (Pecequilo 2012) como uma ldquoparceria estrateacutegicardquo que influencia as estruturas socioeconocircmicas do paiacutes ao longo do tempo (Cer-vo 2008) Essa tradiccedilatildeo que remonta a Rio Branco apresentou-se na trajetoacuteria histoacuterica do paiacutes como parceria estrateacutegica em alguns momentos ou como alinhamento em outros

A poliacutetica externa do pt se caracterizou pelo multilateralismo e pelo fortalecimento e cons-truccedilatildeo de parcerias estrateacutegicas O que diferencia esse passado com a etapa iniciada com a presidecircn-cia de Bolsonaro talvez seja a adesatildeo agrave poliacutetica de rechaccedilo do globalismo e do multilateralismo

O governo Bolsonaro comeccedilou a aproximar-se dos Estados Unidos por meio de ideias mdash expres-sas pela visatildeo do ministro Ernesto Arauacutejo mdash e de accedilotildees Durante a campanha e nos primeiros me-ses de governo manifestaccedilotildees do Presidente de seu filho Eduardo e de um dos mentores de seu projeto Olavo de Carvalho demonstravam que o estreitamento dos laccedilos com Washington era mais o resultado de contatos com grupos poliacuteticos norte-americanos simpatizantes de Trump do que fruto de um entendimento poliacutetico consistente

Bolsonaro introduziu cinco mudanccedilas na po-liacutetica externa sul-americana do Brasil em com-paraccedilatildeo ao periacuteodo 2003-2016 1 recolocou o paiacutes em uma relaccedilatildeo estreita agrave poliacutetica exterior norte--americana 2 retirou seu apoio e logo comeccedilou a incentivar mdash juntamente com o presidente chileno Pintildeera mdash um novo agrupamento para substituir a Uniatildeo de Naccedilotildees Sul-Americanas (Unasul) 3 abandonou o respaldo poliacutetico ao governo vene-zuelano identificando-o como a principal ameaccedila

para a seguranccedila e estabilidade da regiatildeo 4 pas-sou a tratar o Mercado Comum do Sul (Mercosul) como um tema secundaacuterio na agenda 5 reduziu a prioridade que Brasiacutelia mdash desde 1985 mdash atribuiacutea a Buenos Aires em favor do Chile primeiro paiacutes a ser visitado pelo novo presidente

Qual poderia ser a explicaccedilatildeo de colocar o Chile como o primeiro paiacutes a visitar Sinalizar que foi devido agrave sintonia poliacutetica natildeo o explica posto que Macri eacute tatildeo liberal quanto Pintildeera Eacute possiacutevel entatildeo Bolsonaro tenha tentado retomar a visatildeo que Rio Branco tinha em relaccedilatildeo ao Cone Sul e buscar uma nova aproximaccedilatildeo com o Chile O Brasil e o Chile compartilham hoje uma posiccedilatildeo criacutetica a respeito do regionalismo poliacutetico sul-americano em par-ticular sobre a Unasul mas a Argentina tambeacutem Entretanto o imaginaacuterio do Chile em relaccedilatildeo a pa-radigmas e visotildees sobre o sistema internacional eacute distinto do brasileiro Satildeo dois paiacuteses com capaci-dades atributos e recursos de poder enormemente diferentes Em parte o modelo de inserccedilatildeo inter-nacional e seus instrumentos satildeo semelhantes em ambos os paiacuteses a visatildeo ideal do tipo de Estado a internacionalizaccedilatildeo da economia e o papel das empresas assim como papel que desempenha o capital privado Mas tambeacutem grandes diferenccedilas o Brasil tem uma histoacuterica vocaccedilatildeo industrialista mdash que natildeo existe atualmente no Chile mdash e uma aspiraccedilatildeo a concertar internamente os diversos segmentos e recursos de poder induacutestria ciecircncia e teacutecnica pesquisa e desenvolvimento papel do mercado interno de consumo e outros todas ques-totildees que satildeo muito relativas no modelo chileno

O Brasil eacute um global trader que se pensou glo-bal player cujos interesses satildeo tanto econocircmicos como poliacuteticos e sugerem a aspiraccedilatildeo a uma par-ticipaccedilatildeo influente na tomada de decisotildees no siste-ma internacional e nos organismos internacionais Na interpretaccedilatildeo de Cervo e Bueno esta foi a he-ranccedila dos dois governos de Lula a de desempe-nhar o papel que era devido no acircmbito hemisfeacuterico e no cenaacuterio internacional (Cervo e Bueno 2015) O Brasil pressupunha que seus vizinhos regionais reconhecessem a priori suas condiccedilotildees de lide-ranccedila e hegemonia sob um soft power Poreacutem nos anos recentes sob os governos da Concertaccedilatildeo o Chile buscou colocar-se como modelo de inserccedilatildeo

18

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

regional e tem procurado disputar com o Brasil essa condiccedilatildeo de lideranccedila natural (Bernal-Meza 2015 Flisfisch 2011)

Provavelmente a decisatildeo de visitar primeira-mente o Chile tenha sido resultado da influecircncia do ministro da Economia Paulo Guedes Egresso do curso de Economia da Universidade de Chicago e admirador do liberalismo e do ldquomodelordquo chileno Guedes teceu elogios ao Chile em diversas ocasiotildees em visatildeo superficial sobre o sucesso econocircmico da-quele modelo e a viabilidade de aplicaacute-lo ao Brasil de hoje Ademais somou-se aos criacuteticos da Unasul e da poliacutetica de contemporizaccedilatildeo com Caracas

Segundo o embaixador Pinheiro Guimaratildees secretaacuterio-geral do Ministeacuterio das Relaccedilotildees Ex-teriores (mre tambeacutem chamado de ldquoItamaratyrdquo) durante os governos de Lula essas posiccedilotildees jaacute tin-ham antecedentes

no periacuteodo de Michel Temer o Brasil se juntou aos paiacuteses da Alianccedila do Paciacutefico e aos paiacuteses do Grupo de Lima contra a Venezuela infringindo os prin-ciacutepios de autodeterminaccedilatildeo e de natildeo intervenccedilatildeo gerando desconfianccedilas e ressentimentos no esforccedilo de agradar aos Estados Unidos em sua campanha para derrubar o governo venezuelanordquo (Guimaratildees 2018 sp)

No discurso de posse o ministro das Relaccedilotildees Exteriores pocircs a figura do presidente Bolsonaro como um libertador do Brasil e definiu a nova etapa da poliacutetica exterior como aquela que se libertava do passado Em suas palavras ldquoo presidente Bolso-naro estaacute libertando o Brasil por meio da verdade Noacutes vamos tambeacutem libertar a poliacutetica externa va-mos libertar o Itamaraty como o presidente Bolso-naro prometeu que fariacuteamos em seu discurso da vitoacuteriardquo (Arauacutejo 2019 sp)

Segundo Cervo (2019) Bolsonaro e Cardoso coincidem

os dois presidentes tecircm uma visatildeo de mundo e da inserccedilatildeo internacional do Brasil semelhante satildeo li-berais nesse sentido inovadores relativamente ao periacuteodo anterior a seus mandatos de governos mais nacionalistas e introspectivos Isso significa para a poliacutetica exterior um novo ciclo de abertura da eco-nomia a empreendimentos capitais e tecnologias vindas de forardquo (sp)

Para Cervo (2002) natildeo haveria ruptura na poliacute-tica exterior porque ela apresenta haacute seacuteculos trecircs traccedilos que compotildeem a estrateacutegia brasileira de longo prazo universalismo cooperaccedilatildeo e pacifismo Mas haacute que se recordar daquelas diretrizes que marca-ram a poliacutetica externa de Cardoso (Bernal-Meza 2002) Nesse sentido eacute possiacutevel que o viacutenculo com os Estados Unidos e as potecircncias do capitalismo central o apoio agraves instituiccedilotildees de governanccedila glo-bal sustentada pela hegemonia norte-americana e a posiccedilatildeo a favor do Ocidente ante os conflitos mundiais bem como o suposto enfrentamento ci-vilizatoacuterio deixem para traacutes o que Bandeira (2004) denominou de ldquorelaccedilotildees perigosasrdquo

O americanismo do governo Bolsonaro entre-tanto parece desmentir Cervo ou seja concilia o alinhamento poliacutetico aos Estados Unidos com a repulsa ao universalismo e mesmo agrave cooperaccedilatildeo e ao pacifismo O chanceler Ernesto Arauacutejo elogia Trump como ldquoum cavalheiro cruzado que luta para resgatar a identidade do Ocidenterdquo Para Arauacutejo (2017) Trump e sua poliacutetica internacional repre-sentam a disposiccedilatildeo para uma luta global para re-cuperar o passado simboacutelico que tem representado a histoacuteria e a cultura das naccedilotildees ocidentais para a sobrevivecircncia e o domiacutenio do Ocidente

Um grande questionamento eacute o que aconteceraacute com o papel que a poliacutetica exterior brasileira tem desempenhado na regiatildeo e se ela retornaraacute agrave dispo-siccedilatildeo para a lideranccedila que marcou o periacuteodo Lula ou se deixaraacute nas matildeos de potecircncias secundaacuterias mdash como o Chile mdash essa posiccedilatildeo o paiacutes que Bolso-naro considera um modelo No plano da poliacutetica internacional um posicionamento em linha com a poliacutetica de Trump poderia ter grandes impactos Uma maior aproximaccedilatildeo mdash ou coincidecircncias mdash com a poliacutetica de Washington afastaria o Brasil de sua tendecircncia mais tradicional a da autonomia mdash cujo efeito seria um afastamento relativo do brics e a predisposiccedilatildeo do presidente Bolsonaro a resta-belecer uma relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo militar com os Estados Unidos (Cervo 2019) o que despertaria na regiatildeo velhos temores mdash nunca esquecidos mdash so-bre o subimperialismo brasileiro

Haacute que se considerar nesses aspectos que a poliacutetica externa do governo Bolsonaro tem sido in-formada por diferentes grupos de interesse o que

19Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

resulta muitas vezes em uma praacutetica erraacutetica in-consistente e excessivamente ideoloacutegica (Stunkel 2019 Spector 2019) Diferentemente de outras si-tuaccedilotildees semelhantes mdash Dutra Castelo Branco ou Collor mdash desta feita o Itamaraty natildeo atuou como contraponto agrave presidecircncia alimentando muitas vezes o discurso ideoloacutegico

Bolsonaro e Trump parecem ter muitos pontos em comum Entre as coincidecircncias mais delicadas estaacute seu rechaccedilo ao ldquoglobalismordquo3 o que revela que ambos os presidentes estatildeo dispostos a depreciar o que as diplomacias de seus proacuteprios paiacuteses cons-truiacuteram sob o sistema internacional contemporacirc-neo a criaccedilatildeo e fortalecimento das organizaccedilotildees internacionais o sistema das Naccedilotildees Unidas e as negociaccedilotildees mundiais sobre assuntos que impor-tavam agrave sociedade internacional Accedilotildees que se plasmaram em temas e agendas globais como o meio ambiente e a mudanccedila climaacutetica Ambas se-riam tendecircncias de mudanccedila profunda que impac-tariam todo o cenaacuterio latino-americano O mais preocupante eacute imaginar o Brasil imerso em um enfrentamento a respeito do papel do Ocidente na defesa da chamada ldquocultura ocidentalrdquo posto que ela tem sido o instrumento mais importante do co-lonialismo e da dominaccedilatildeo das potecircncias ociden-tais sobre a periferia do mundo

O que parecia ser manifestaccedilotildees de desinte-resse (ao menos) a respeito de seu soacutecio estrateacute-gico sul-americano Bolsonaro ao natildeo incluir a Argentina em sua primeira viagem ao exterior e as declaraccedilotildees de seu ministro da Economia a respeito do Mercosul o que indicava que este natildeo seria uma prioridade para o Brasil pode trazer consequecircncias negativas para as relaccedilotildees sul-ame-ricanas Deve-se recordar que a base de qualquer entendimento de cooperaccedilatildeo governanccedila re-gional e continuidade para fazer da regiatildeo uma

3 ldquoGlobalismordquo em sentido pejorativo foi o termo utilizado por Bolsonaro e por seus principais auxiliares para cri-ticar nos meses iniciais de seu governo as poliacuteticas de inserccedilatildeo do Brasil no cenaacuterio global por meio de uma par-ticipaccedilatildeo proativa em foros multilaterais e nos debates sobre os temas mais sensiacuteveis da agenda internacional Argumento apresentado pelo ministro Arauacutejo em seu dis-curso de posse por meio de uma obviedade ldquoNatildeo estamos aqui para trabalhar pela ordem global Aqui eacute o Brasilrdquo (Arauacutejo 2019 sp)

zona militarmente desnuclearizada passa por uma relaccedilatildeo cordial entre o Brasil e a Argentina A construccedilatildeo de uma ldquozona de pazrdquo no Atlacircntico Sul por meio da superaccedilatildeo das hipoacuteteses de con-flito entre a Argentina e o Chile tem se baseado na continuidade dessa relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo A partir dessas perspectivas a presidecircncia Bolso-naro natildeo soacute implicaria o retorno da Ameacuterica do Sul agraves concepccedilotildees ideoloacutegicas radicalizadas que se supunham superadas que incluem novos viacutenculos estreitos em mateacuteria de seguranccedila com os Estados Unidos mas tambeacutem o iniacutecio de uma etapa de in-certeza na regiatildeo

Alinhamento com Washington incertezas quanto a PequimO alinhamento com Washington agrave eacutepoca de Rio Branco seguia um roteiro previsiacutevel diante da potecircncia ascendente a adesatildeo aos princiacutepios do Direito Internacional a incorporaccedilatildeo acriacutetica do conceito de ldquobom governordquo e a convicccedilatildeo de que o progresso da naccedilatildeo dependia dos desiacutegnios do norte Nada parecido se via em relaccedilatildeo a Londres que ainda conservava o status de principal centro financeiro internacional mas que perdia impor-tacircncia no intercacircmbio de mercadorias Mais de um seacuteculo depois o novo alinhamento mdash e este eacute o contraponto que se mencionou na introduccedilatildeo mdash manteacutem o principal das relaccedilotildees internacionais do paiacutes voltado para os Estados Unidos De acordo com a hipoacutetese de trabalho inicial a de estarmos em meio a uma transiccedilatildeo hegemocircnica dos Estados Unidos para a China Bolsonaro estaria em dis-sonacircncia com Rio Branco

Os primeiros meses de 2019 revelaram que o governo Bolsonaro sustentava na poliacutetica externa o principal das promessas de campanha acompa-nhadas do mote ldquoo Brasil acima de tudordquo Inspira-do no governo de Trump o discurso de supremacia contrastava com o silecircncio diante da poliacutetica pro-tecionista de Washington que elevara a tarifa para a importaccedilatildeo do accedilo e subsidiava a produccedilatildeo de soja ambas as medidas prejudiciais para os inte-resses brasileiros Ante eventuais perdas setoriais o governo seguia fiel ao princiacutepio do alinhamento em dissonacircncia com o legado de Rio Branco

20

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

A crise na Venezuela e os interesses econocircmi-cos do agronegoacutecio no mercado chinecircs levariam o governo a modificar em parte a retoacuterica inicial o que indicaria estar em curso ajustes e reorientaccedilotildees na aacuterea No dia 23 de fevereiro o autoproclamado presidente interino da Venezuela Juan Guaidoacute liderou um esforccedilo de tentar fazer com que ca-minhotildees com alimentos adentrassem a Venezue-la como forma de pressionar o governo Maduro Em Pacaraima o chanceler brasileiro explicava se tratar de um ato humanitaacuterio altruiacutesta ldquoum mo-mento de criaccedilatildeo de uma nova realidade na Ve-nezuelardquo Quanto agrave possibilidade de intervenccedilatildeo Arauacutejo considerava que ldquonatildeo haacute menor expectativa de conflito mas claro que o Exeacutercito estaacute prepa-rado caso isso possa se materializarrdquo (Cronologia 2019 sp)

Na visatildeo do vice-presidente Mouratildeo que natildeo ocultava a influecircncia estadunidense a crise vene-zuelana soacute seria superada com a neutralizaccedilatildeo de agentes externos em especial a presenccedila cubana Se essa situaccedilatildeo continuasse a Venezuela correria o risco de se tornar um ldquonatildeo Estadordquo (Arauacutejo Ritt-ner e Murakawa 2019) Mouratildeo ao mesmo tempo que natildeo contemporizava com o governo Maduro indicava natildeo estar de acordo in totum com o alin-hamento com Washington nessa questatildeo ao colo-car em duacutevida a legitimidade de Juan Guaidoacute

Em relaccedilatildeo agrave China a visita de Mouratildeo e seu encontro com Xi Jiping marcaram a superaccedilatildeo de desconfianccedilas manifestadas durante a campan-ha e os meses iniciais de governo Para Mouratildeo a prioridade era restabelecer o funcionamento da Comissatildeo Sino-Brasileira de Alto Niacutevel de Concer-taccedilatildeo e Cooperaccedilatildeo (Cosban) e reorganizar sua es-trutura para que voltasse a ser um mecanismo de alto niacutevel Em sua percepccedilatildeo a China tem sido um parceiro confiaacutevel do Brasil desde 2009 ano em que se tornou seu maior parceiro comercial e no qual ocorreu a i Cuacutepula do brics Nesses dez anos de parceria estrateacutegica o fluxo comercial bilateral alcanccedilou usd$ 100 bilhotildees embora o Brasil expor-tasse muito mais produto in natura que produtos com valor agregado uma das reclamaccedilotildees que te-ria apresentado ao primeiro mandataacuterio chinecircs

A China vinha se transformando em um enor-me desafio regional e internacional para o Brasil

Em vinte anos a China transitou de ser vista como ldquoa oportunidaderdquo para ser percebida como desafio (Bernal-Meza 2014) de potencial grande merca-do para as importaccedilotildees e a exportaccedilatildeo de capitais a fazer de seus soacutecios latino-americanos periferia primaacuterio-exportadora A evoluccedilatildeo das relaccedilotildees econocircmicas entre a China e o Brasil de maneira bilateral e no acircmbito das relaccedilotildees no brics estaria sinalizando uma tendecircncia estrutural da configu-raccedilatildeo de um padratildeo de relaccedilotildees centro-periferia (Beckerman e Moncaut 2016 Becard 2017 Bernal- Meza 2019a 2019b)

O ingresso da China na economia poliacutetica da Ameacuterica do Sul deslocou o Brasil do lugar prepon-derante que ocupava dentro do bloco Mercosul e no contexto regional A respeito dos processos de integraccedilatildeo latino-americanos mdash em particu-lar do Mercosul mdash a China se transformou em um fator de profundo desequiliacutebrio porque foi se transformando no principal e segundo soacutecio mais importante da inserccedilatildeo econocircmica internacional da Ameacuterica do Sul (Hiratuka 2016 Dussel 2016) Isso afetou igualmente a posiccedilatildeo do Brasil como a principal economia para seus vizinhos No plano interno a presenccedila econocircmica chinesa parece es-tar condicionando a eventual autonomia do des-envolvimento industrial e tecnoloacutegico brasileiro ao exercer um crescente controle sobre a estrutura energeacutetica no setor eleacutetrico (Becard Lessa e Silveira 2020 Becard 2017)

A presenccedila chinesa na Ameacuterica Latina con-correu para enfraquecer a influecircncia brasileira sobre a integraccedilatildeo regional Entre os interesses brasileiros figurava a ideia de natildeo seguir a poliacuteti-ca adotada por Washington em relaccedilatildeo a algumas empresas chinesas em particular a gigante de te-lecomunicaccedilotildees Huawei Nesse sentido Mouratildeo que foi ldquoalertadordquo pelo governo norte-americano sobre os riscos das operaccedilotildees da empresa chi-nesa teria sugerido a Xi Jinping a criaccedilatildeo de um ambiente de confianccedila quanto agrave companhia ldquode modo que nenhum paiacutes que vaacute receber a empresa e a tecnologia que vocecircs vatildeo instalar e fique preocu-pado com que todos dados que estaratildeo em seu po-der pertenceratildeo tambeacutem ao governo [chinecircs] Esta eacute a discussatildeordquo (Arauacutejo et al 2019 sp) A expecta-tiva de abertura brasileira agrave tecnologia 5g chinesa

21Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

se vinculava ao fato de o paiacutes ainda natildeo estar inte-grado digitalmente e de ter um marco regulatoacuterio defasado no setor A presidecircncia brasileira passava a se posicionar de forma equidistante em relaccedilatildeo aos interesses de Washington e Pequim o que se estendia agrave poliacutetica adotada diante da guerra co-mercial entre as duas maiores economias Poucos casos ilustravam com tanta transparecircncia um dos mais importantes efeitos da transiccedilatildeo hegemocircnica em curso

Mouratildeo fora convencido pelo secretaacuterio-geral do Itamaraty Otaacutevio Brandelli quanto agrave adequa-ccedilatildeo de uma conduta flexiacutevel e pragmaacutetica Em face de uma guerra comercial dessa natureza o gover-no brasileiro deveria saber explorar as oportuni-dades Por exemplo como a administraccedilatildeo Trump taxou parcela das importaccedilotildees da China inicial-mente em torno de usd$ 250 bilhotildees os produtos envolvidos passaram a chegar mais caros no mer-cado norte-americano e eventualmente poderiam ser substituiacutedos por produtos brasileiros o que acrescentaria usd$ 5 bilhotildees ou mais nas nossas exportaccedilotildees A guerra comercial deveria assim ser tratada com paciecircncia

O limite da visatildeo do vice-presidente brasi-leiro mdash que dava vazatildeo agraves pressotildees do agrone-goacutecio mdash era evidente Temas como transferecircncia de tecnologia e cooperaccedilatildeo industrial natildeo foram abordados Indagado sobre o fato de o conflito de interesses entre Estados Unidos e China natildeo ser apenas comercial mas tambeacutem tecnoloacutegico a res-posta foi igualmente simplista ldquoVocecirc olha o 5g As quatro empresas que detecircm a tecnologia satildeo duas chinesas e duas finlandesas Cadecirc a americanardquo (Arauacutejo et al 2019 sp) Ou seja o governo bra-sileiro mdash afastadas as desconfianccedilas iniciais em relaccedilatildeo agrave China mdash voltava a se ocupar dos temas tratados em governos anteriores exportaccedilotildees de alimentos e mineacuterios investimentos diretos com geraccedilatildeo de empregos acordos de cooperaccedilatildeo em tecnologia estes uacuteltimos sem viacutenculo claro com qualquer projeto mais amplo de industrializaccedilatildeo e desenvolvimento tecnoloacutegico

O governo Bolsonaro aparentemente estava satisfeito com o status internacional do paiacutes sem atentar minimamente ao processo de desindus-trializaccedilatildeo das uacuteltimas deacutecadas (Benaion 2006

Cano 2012 Oliveira 2018) Para Chang (2018) nos anos 1980 e 1990 o Brasil conheceu o ponto mais alto da industrializaccedilatildeo que atingiu 35 da produccedilatildeo nacional No final de 2017 representa-va apenas 12 e a tendecircncia era de decliacutenio O Brasil tem nesse sentido voltado no tempo Em-presaacuterios de Satildeo Paulo natildeo parecem estar preocu-pados com o decliacutenio da induacutestria manufatureira No longo prazo essa poliacutetica eacute prejudicial para o paiacutes No governo Dilma Rousseff vaacuterios subsiacutedios foram canalizados para a induacutestria mas as altas taxas de juros natildeo favoreceram mudanccedilas efetivas (Oliveira 2018)

O processo de desindustrializaccedilatildeo as poliacuteticas econocircmicas e o conformismo com a condiccedilatildeo ldquosu-bordinadardquo do paiacutes instruiacuteram em outro momento o uso do conceito de ldquoperiferia proacutesperardquo para o crescimento econocircmico de meados da deacutecada de 2000 sustentado pela demanda chinesa (Doratioto e Vidigal 2015) As taxas de crescimento da China beneficiaram as exportaccedilotildees latino-americanas de produtos agriacutecolas mineacuterios petroacuteleo e produtos manufaturados de baixo valor agregado Conco-rreram por sua vez para reforccedilar o caraacuteter liberal perifeacuterico de economias como a brasileira (Filguei-ras e Gonccedilalves 2007)

Na poliacutetica externa era clara a intenccedilatildeo de re-duzir o peso do Itamaraty nas decisotildees relativas aos assuntos de seguranccedila e defesa fronteiras narcotraacutefico e outros delitos internacionais e imi-graccedilatildeo como no tema da crise na Venezuela e em outros assuntos sensiacuteveis na aacuterea da poliacutetica in-ternacional Quanto ao chanceler Ernesto Arauacutejo que havia impressionado negativamente a maioria dos estudiosos de poliacutetica externa e internacional em razatildeo de certo ldquomessianismordquo na defesa do Oci-dente e da administraccedilatildeo Trump passou a atuar de modo mais comedido e profissional como na ocasiatildeo da assinatura do acordo Mercosul-Uniatildeo Europeia no dia 28 de junho de 2019

Bolsonaro no final de reuniatildeo do g-20 em Osaka (28 e 29 de junho de 2019) se disse satis-feito com os resultados do encontro do brics e do proacuteprio g-20 aleacutem de destacar a importacircncia da conclusatildeo do acordo Mercosul-Uniatildeo Europeia Na reuniatildeo dos brics Bolsonaro desistiu de pro-por aos demais liacutederes o apoio a uma mudanccedila

22

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

de governo na Venezuela Foi tambeacutem a oportu-nidade para reconhecer o interesse brasileiro em manter bom diaacutelogo com o principal parceiro co-mercial do paiacutes

Os ajustes percebidos na conduccedilatildeo da poliacutetica externa natildeo significaram uma mudanccedila de rumo do governo Bolsonaro no que tange agrave priorizaccedilatildeo dos laccedilos com os Estados Unidos a Europa e o Ja-patildeo parceiros preferenciais nas deacutecadas de 1960 1970 e sob o governo de Cardoso Nesse sentido as relaccedilotildees com a China a despeito do discurso em prol de uma parceria estrateacutegica ou coisa que o valha tecircm sido tratadas de forma setorial mdash co-meacutercio investimentos cooperaccedilatildeo tecnoloacutegica mdash e descompromissada com qualquer planejamento Os laccedilos histoacutericos com os Estados Unidos em to-das as suas dimensotildees favorecem a acomodaccedilatildeo e a recusa em tratar seriamente a hipoacutetese da ldquoopccedilatildeo chinesardquo o que natildeo necessariamente eacute negativo

ConclusatildeoAs transiccedilotildees hegemocircnicas no marco da econo-mia poliacutetica mundial tecircm constituiacutedo um pro-blema externo e interno para os paiacuteses inseridos em uma relaccedilatildeo centro-periferia A ascensatildeo da China e sua presenccedila econocircmica na Ameacuterica do Sul tecircm levado alguns paiacuteses a incluiacute-la em seus caacutelculos estrateacutegicos A Argentina o Brasil e o Chile podem desempenhar um papel crucial nesse processo tendo em vista a relevacircncia geopoliacutetica e econocircmica do Cone Sul pois a polarizaccedilatildeo Es-tados Unidos-China cria janelas de oportunidade e gera maior permissibilidade no sistema interna-cional como diria Heacutelio Jaguaribe

Destacamos a identificaccedilatildeo das grandes linhas de continuidade e de ruptura que tecircm implicado o discurso do presidente Bolsonaro e dos principais colaboradores em relaccedilatildeo agrave tradiccedilatildeo da poliacutetica externa brasileira O contraponto inicial com a poliacutetica e o pensamento de Rio Branco com des-taque para as boas e privilegiadas relaccedilotildees com os Estados Unidos permitiu identificar periacuteodos de maior proximidade ou de distanciamento de Was-hington Bolsonaro estaacute proacuteximo dessa tradiccedilatildeo a de ver o Brasil como soacutecio proacuteximo dos Estados Unidos mas se afasta de praacuteticas autonomistas

como a da poliacutetica externa independente e a do pragmatismo responsaacutevel Praacuteticas essas que per-mitiriam avaliar de modo desassombrado as re-laccedilotildees com a China

Tanto a ascensatildeo da China como a posiccedilatildeo que ocupa Pequim na estrutura econocircmica brasileira planteiam desafios equivalentes ao que o Brasil ex-perimentou no comeccedilo do seacuteculo xx Agrave diferenccedila da visatildeo de Rio Branco durante a transiccedilatildeo da he-gemonia natildeo parece haver no governo de Bolsona-ro um olhar seguro sobre os impactos da transiccedilatildeo hegemocircnica nem do papel que o Brasil deveria des-empenhar na estrateacutegia global da China

Um terceiro tema de preocupaccedilatildeo eacute o das re-laccedilotildees com a Argentina A visita subsequente a Buenos Aires a assinatura do acordo para negociar um tratado de livre-comeacutercio entre o Mercosul e a Uniatildeo Europeia e o anuacutencio de que ambos os go-vernos iniciariam gestotildees conjuntas para a assina-tura de acordos de livre-comeacutercio com os Estados Unidos restabeleceram o bom diaacutelogo entre Bra-siacutelia e Buenos Aires ainda que persistam duacutevidas no governo Macri (Landim 2019) As incertezas se estenderam ao governo eleito em dezembro de 2019 em decorrecircncia de criacuteticas de natureza ideo-loacutegicas realizadas tanto por Bolsonaro quanto por Alberto Fernaacutendez Entretanto o diaacutelogo bilateral tende a se normalizar sem maiores pretensotildees no plano regional

O viacutenculo estrateacutegico entre Brasiacutelia e Buenos Aires tem sido chave para sustentar um espiacuterito de cooperaccedilatildeo e integraccedilatildeo na Ameacuterica do Sul que se baseia na credibilidade das accedilotildees e na boa feacute de uns e outros governos Desde 1985 o Brasil e a Argentina desenvolveram o que Cervo (2008) denominou de ldquorelaccedilotildees em eixordquo que se estabe-lecem ldquoquando precisamente a imagem um do outro corresponde agrave do parceiro que consegue estabelecer uma uniatildeo co-responsaacutevel [] Em outros termos o eixo comporta uma vertente exoacute-gena que o transcende porque abarca as relaccedilotildees regionais mesmo que coletivas []rdquo (pp 211-212) Eacute esse tipo de relaccedilotildees e sua projeccedilatildeo no Cone Sul que foi potencialmente afetada pelas primei-ras declaraccedilotildees e accedilotildees do governo Bolsonaro Ao promover um alinhamento com os Estados Uni-dos mdash ou ldquosem recompensardquo como diria Gerson

23Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Moura mdash reproduz o que o Brasil e outros paiacuteses latino-americanos adotaram como ldquoestrateacutegiardquo na deacutecada de 1990 sem os resultados esperados E ao abandonar a tradiccedilatildeo iniciada em 1961 e adaptada agraves diferentes conjunturas que se sucederam abriu matildeo de exercer o poder de barganha do paiacutes para fazer concessotildees sem contrapartidas equivalentes Nas circunstacircncias atuais diante da transiccedilatildeo he-gemocircnica Estados Unidos-China considerando os interesses do Brasil na Ameacuterica do Sul a equidis-tacircncia talvez seja o melhor caminho Diaacutelogo es-treito com Washington e autonomia em temas de interesse do paiacutes foram as opccedilotildees de Rio Branco

Referecircncias Arauacutejo E (2017) Trump e o Ocidente Cadernos de Poliacutetica

Exterior iii(6) 323-357

Arauacutejo E (2019 2 de janeiro) Discurso do minis-tro Ernesto Arauacutejo durante cerimocircnia de posse no Ministeacuterio das Relaccedilotildees Exteriores Brasiacutelia Re-cuperado de httpwwwitamaratygovbrpt-BRdiscursos-artigos-e-entrevistas-categoriaminis-tro-das-relacoes-exteriores-discursos19907-dis-curso-do-ministro-ernesto-araujo-durante-cerimo-nia-de-posse-no-ministerio-das-relacoes-exteriores-brasilia-2-de-janeiro-de-2019

Arauacutejo C Rittner D e Murakawa F (2019 30 de abril) Brasil descarta vetar presenccedila da Huawei em 5g avisa Mouratildeo (entrevista com o vice-presidente Hamilton Mouratildeo) g1 Recuperado de httpsvalorglobocombrasilnoticia20190607brasil-descarta-vetar-pre-senca-da-huawei-em-5g-avisa-mouraoghtml

Arrighi G (2008) Adam Smith em Pequim origens e fun-damentos do seacuteculo xxi Satildeo Paulo Brasil Boitempo

Bandeira L A M (2004) As relaccedilotildees perigosas Brasil-Es-tados Unidos Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Bra-sileira

Bandeira L A M (2003) Brasil Argentina e Estados Uni-dos da Triacuteplice Alianccedila ao Mercosul (1870-2003) Rio de Janeiro Editora Revan

Becard D (2017) China y Brasil iquestmodelo de relaciones Sur-Sur Em E Pastrana B e H Gehring (eds) La proyeccioacuten de China en Ameacuterica Latina y el Caribe (pp 387-408) Bogotaacute Colocircmbia Editorial Javeriana

Becard D Lessa A e Silveira L (2020) One step closer The politics and the economics of chinarsquos strategy in Brazil and the case of the electric power sector Em R Bernal-Meza R e X Li (eds) China-Latin America

relations in the 21st Century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 55-81) Nova York Estados Unidos Palgrave Macmillan

Becard D Barros-Platiau A e Lessa A (2019) Brazil in the brics after tem years Past present and near futu-re perspectives Em X Li (ed) The international po-litical economy of the brics (pp 135-149) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Beckerman M e Moncaut N (2016) Las relaciones en-tre China y Ameacuterica Latina iquestHacia la desestructura-cioacuten de los sistemas productivos de la regioacuten Em C Moneta e S Cesariacuten (eds) La tentacioacuten pragmaacutetica China-ArgentinaAmeacuterica Latina lo actual lo proacuteximo y lo distante (pp 185-202) Saacuteenz Pentildea Argentina Uni-versidad Nacional de Tres de Febrero

Benaion N (2006) Subordinaccedilatildeo reiterada imperialismo e desenvolvimento no Brasil Manaus Brasil Editora da Universidade Federal do Amazonas

Bernal-Meza R (2019a) Brazil as an emerging power The impact of international and internal deteriorational effect on the brics Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 118-134) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Bernal-Meza R (2019b) Brasil ascenso declinacioacuten y nuevos desafiacuteos de una potencia emergente (2003-2018) Revista Izquierdas 49(2020) 516-540

Bernal-Meza R (2015) Pensamiento chileno en la poliacuteti-ca exterior y en las teoriacuteas de relaciones internaciona-les Em M Artaza e C Ross (eds) La poliacutetica exterior de Chile 1990-2009 (pp 21-47) Santiago Chile ril Editores

Bernal-Meza R (2014) La heterogeneidad de la imagen de China en la poliacutetica exterior latinoamericana Pers-pectivas para la concertacioacuten de poliacuteticas Comentario Internacional 14 113-134

Bernal-Meza R (2013) Ameacuterica Latina en el mundo el pensamiento latino-americano y la teoriacutea de relaciones internaciones Buenos Aires Argentina Grupo Editor Latinoamericano

Bernal-Meza R (2002) A poliacutetica exterior do Brasil 1990-2002 Revista Brasileira de Poliacutetica Internacional 45(1) 36-71

Bernal-Meza R e Bizzozero L (eds) (2014) La poliacutetica internacional de Brasil de la regioacuten al mundo Monte-videacuteu Uruguai Ediciones Cruz del Sur

Bernal-Meza R e Li X (eds) (2020) China-Latin Ameri-ca relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges Nova York Estados Uni-dos Palgrave Macmillan

24

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

Bolsonaro J (2018) O caminho da prosperidade pro-posta de Plano de Governo Recuperado de httpdivulgacandcontastsejusbrcandidaturasof i-cial2018BRBR2022802018280000614517propos-ta_1534284632231pdf

Bricentildeo Ruiz J e Simonoff A (orgs) (2015) Integracioacuten y cooperacioacuten regional en Ameacuterica Latina una relectura a partir de la teoriacutea de la autonomiacutea Buenos Aires Ar-gentina Editorial Biblos

Bueno C (2003) Poliacutetica externa da Primeira Repuacuteblica os anos de apogeu (1902-1918) Satildeo Paulo Brasil Paz e Terra

Cano W (2012) A desindustrializaccedilatildeo no Brasil (texto para discussatildeo 200) Campinas Brasil Instituto de Economia da Unicamp

Cervo A L (2019 28 de novembro) Governo Bolso-naro natildeo traraacute ruptura agrave poliacutetica externa Exame Recuperado de httpsexameabrilcombrmundogoverno-bolsonaro-nao-trara-ruptura-a-politica-ex-terna-avalia-amado-cervo

Cervo A (2008) Inserccedilatildeo internacional formaccedilatildeo dos conceitos brasileiros Satildeo Paulo Brasil Saraiva

Cervo A (2002) Relaccedilotildees Internacionais do Brasil a era Cardoso Revista Brasileira de Poliacutetica Internacional 45(1) 5-35

Cervo A e Bueno C (2015) Histoacuteria da poliacutetica exterior do Brasil Brasiacutelia Brasil Editora da Universidade de Brasiacutelia

Chang H H (2018 15 jan) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da histoacuteria da economia El Paiacutes Recuperado de ht-tpsbrasilelpaiscombrasil20180105econo-mia1515177346_780498html

Cronologia relembre os fatos mais importantes da cri-se venezuelana g1 httpsg1globocommundonoticia20190430cronologia-relembre-os-fa-tos-mais-importantes-na-crise-venezuelanaghtml

Doratioto F e Vidigal C (2015) Histoacuteria das Relaccedilotildees In-ternacionais do Brasil Satildeo Paulo Brasil Editora Saraiva

Dussel Peters E (coord) (2016) La nueva relacioacuten comer-cial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestInte-gracioacuten o desintegracioacuten regional Meacutexico-df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universidades de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico

Filgueiras L e Gonccedilalves R (2007) A economia poliacutetica do governo Lula Rio de Janeiro Brasil Contraponto

Fiori J(1999) Estado e moedas no desenvolvimento das naccedilotildees Petroacutepolis Brasil Vozes

Flisfisch A (2011) La Poliacutetica exterior chilena y Ameacuterica del Sur Estudios Internacionales (168) 115-141

Fonseca Jr G (2012) Rio Branco diante do Monroiacutesmo e do Pan-Americanismo anotaccedilotildees Em M Pereira e M Gomes (orgs) Baratildeo do Rio Branco 100 anos de memoacuteria (pp 565-602) Brasiacutelia Brasil Fundaccedilatildeo Alexandre de Gusmatildeo

Franccedila T (2007) Self made nation Domiacutecio da Gama e o pragmatismo do bom senso (tese de doutorado) Brasiacute-lia Brasil Universidade de Brasiacutelia

Guimaratildees S (2018) A poliacutetica exterior e a posiccedilatildeo do Brasil no mundo Recuperado de httpswwwnodalam201812a-politica-exterior-e-a-posicao-do-brasil-no-mundo-por-samuel-pinheiro-guimaraes-2

Gullo M (2018) Relaciones internacionales una teoriacutea criacutetica desde la periferia latinoamericana Buenos Ai-res Argentina Editorial Biblos

Gullo M (2014) A subordinaccedilatildeo fundante breve histoacuteria da construccedilatildeo do poder pelas naccedilotildees Florianoacutepolis Brasil Insular

Hiratuka C (2016) Impactos de China sobre el proceso de integracioacuten regional de Mercosur Em E Dussel Peters (coord) La nueva relacioacuten comercial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestIntegracioacuten o desintegracioacuten (pp 195-243) Meacutexico df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universida-des de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico Recuperado de httpswww3ecouni-campbrNeitimagesdestaque2016_La_nueva_rela-cion_comercial_ALC_Chinapdf

Hobsbawm E (1994) Extremes The Short Twentieth Cen-tury 1914-1991 Londres Inglaterra Michael Joseph Ltd

Kennedy P (1987) The rise and fall of the great powers Economic change and military conflict from 1500 to 2000 Nova York Estados Unidos Vintage Books

Keohane R e Nye J (1977) Power and interdependence World politics in transition Boston Estados Unidos Little Brown and Company

Lafer C (2002) JK e o programa de metas (1956-1961) Rio de Janeiro Brasil Fundaccedilatildeo Getuacutelio Vargas

Landim R (2019 6 de setembro) Brasil e Argentina adiam em 9 anos livre-comeacutercio de autos Folha de S Paulo Recuperado de httpswww1folhauolcombrmerca-do201909brasil-e-argentina-adiam-em-9-anos-li-vre-comercio-de-autosshtml

Lessa A e Oliveira H A (orgs) (2013) Parcerias estra-teacutegicas do Brasil v 1 os significados e as experiecircncias tradicionais Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

25Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Li X (2020) Revisiting China-Latin America economic relations An unintended consequence of different industrialization strategies Em R Bernal-Meza e X Li (eds) China-Latin America relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 225-251) Nova York Estados UnidosLondres Inglaterra Palgrave Macmillan

Li X (2019a) Chinarsquos dual position in the capitalist world order A dual complexity of hegemony and counter-he-gemony Em Li X (ed) The international political eco-nomy of the brics (pp 1-17) Abindon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2019b) The international political economy of the brics Nova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2014) The brics and beyond The international political economy of the emergence of a new world or-der Farnham Reino Unido Ashgate

Li X (2012) China y el orden mundial capitalista el nexo de la transformacioacuten interna de China y su impacto externo Em R Bernal-Meza e S Quintanar (eds) Regionalismo y Orden Mundial Surameacuterica Europa China (pp 29-53) Buenos Aires Argentina Nuevoha-cerUniversidad Nacional del Centro de la Provincia de Buenos Aires

Li X e Farah A (eds) (2013) China-Africa relations in an era of great transformations Farnham Reino Unido Ashgate

Lins A (1996) Rio Branco (Biografia) Satildeo Paulo Brasil Editora Alfa Omega

Mandelbaum M (2010) The frugal superpower Americarsquos global leadership in a cash-strapped era Nova York Es-tados Unidos Public Affairs

Meneses E (1988) Coping with decline Chilean fo-reign policy during the twentieth century 1902-1972 Oxford Reino Unido University of OxfordBodleian Library

Nabuco J (1949) Obras completas v xii Rio de Janeiro Brasil Instituto Progresso Editorial sa

Nasr V (2014) The dispensable nation American foreign policy in retreat Nova York Estados Unidos Anchor and Doubleday

Oliveira R (2018 15 de janeiro) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da his-toacuteria da economia (entrevista com Ha-Joon Chang) El Paiacutes Recuperado de httpsbrasilelpaiscombra-sil20180105economia1515177346_780498html

Pearson F e Rochester M (2007) Relaciones internacio-nales situacioacuten global en el siglo xxi Meacutexico-df Meacute-xico Mc Graw Hill

Pecequilo C (2012) As relaccedilotildees Brasil-Estados Unidos Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

Polanyi K (1957) The great transformation the political and economic origins of our time Boston Estados Uni-dos Beacon Press

Rodrigues J Seitenfus R e Rodrigues L (orgs) (1995) Uma histoacuteria diplomaacutetica do Brasil (1531-1945) Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Brasileira

Seitenfus R (2003) O Brasil vai agrave guerra o processo de envolvimento brasileiro na Segunda Guerra Mundial 3a ed Satildeo Paulo Brasil Barueri

Spector M (2019 25 abril) Eacute hora de construir uma po-liacutetica externa poacutes-Bolsonaro Folha de S Paulo Re-cuperado de httpswww1folhauolcombr colunasmatiasspektor201904e-hora-de-construir-a-politi-ca-externa-pos-bolsonaroshtml

Stunkel O Com Bolsonaro a poliacutetica externa se tor-nou uma caixa de surpresas (entrevista agrave Deutsche Welle Brasil) Recuperado de httpswwwterracombrnoticiasbrasil com-bolsonaro-politica-ex-terna-se-tornou-uma-caixa-de-surpresas 7f6f-814287c0240a2f3f93ad aa39af65jpo4zbzghtml

Tarzi S (2007) Neorealism neoliberalism and the inter-national system International Studies (41) 115-128

Vadell J e Ramos L (2019) The role of declining Brazil and ascending China in the brics initiative Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 75-94) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Viana F L (1959) A vida do Baratildeo do Rio Branco Rio de Janeiro Brasil Joseacute Olympio

Vidigal C (2009) Relaccedilotildees Brasil-Argentina o primeiro ensaio Curitiba Brasil Juruaacute

Page 8: Bolsonaro versus Rio Branco: transição hegemônica, América ...2011/02/15  · Contra-hegemonia e ordem capitalista mundial por meio do brics, brics-plus e de outros agru-pamentos,

18

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

regional e tem procurado disputar com o Brasil essa condiccedilatildeo de lideranccedila natural (Bernal-Meza 2015 Flisfisch 2011)

Provavelmente a decisatildeo de visitar primeira-mente o Chile tenha sido resultado da influecircncia do ministro da Economia Paulo Guedes Egresso do curso de Economia da Universidade de Chicago e admirador do liberalismo e do ldquomodelordquo chileno Guedes teceu elogios ao Chile em diversas ocasiotildees em visatildeo superficial sobre o sucesso econocircmico da-quele modelo e a viabilidade de aplicaacute-lo ao Brasil de hoje Ademais somou-se aos criacuteticos da Unasul e da poliacutetica de contemporizaccedilatildeo com Caracas

Segundo o embaixador Pinheiro Guimaratildees secretaacuterio-geral do Ministeacuterio das Relaccedilotildees Ex-teriores (mre tambeacutem chamado de ldquoItamaratyrdquo) durante os governos de Lula essas posiccedilotildees jaacute tin-ham antecedentes

no periacuteodo de Michel Temer o Brasil se juntou aos paiacuteses da Alianccedila do Paciacutefico e aos paiacuteses do Grupo de Lima contra a Venezuela infringindo os prin-ciacutepios de autodeterminaccedilatildeo e de natildeo intervenccedilatildeo gerando desconfianccedilas e ressentimentos no esforccedilo de agradar aos Estados Unidos em sua campanha para derrubar o governo venezuelanordquo (Guimaratildees 2018 sp)

No discurso de posse o ministro das Relaccedilotildees Exteriores pocircs a figura do presidente Bolsonaro como um libertador do Brasil e definiu a nova etapa da poliacutetica exterior como aquela que se libertava do passado Em suas palavras ldquoo presidente Bolso-naro estaacute libertando o Brasil por meio da verdade Noacutes vamos tambeacutem libertar a poliacutetica externa va-mos libertar o Itamaraty como o presidente Bolso-naro prometeu que fariacuteamos em seu discurso da vitoacuteriardquo (Arauacutejo 2019 sp)

Segundo Cervo (2019) Bolsonaro e Cardoso coincidem

os dois presidentes tecircm uma visatildeo de mundo e da inserccedilatildeo internacional do Brasil semelhante satildeo li-berais nesse sentido inovadores relativamente ao periacuteodo anterior a seus mandatos de governos mais nacionalistas e introspectivos Isso significa para a poliacutetica exterior um novo ciclo de abertura da eco-nomia a empreendimentos capitais e tecnologias vindas de forardquo (sp)

Para Cervo (2002) natildeo haveria ruptura na poliacute-tica exterior porque ela apresenta haacute seacuteculos trecircs traccedilos que compotildeem a estrateacutegia brasileira de longo prazo universalismo cooperaccedilatildeo e pacifismo Mas haacute que se recordar daquelas diretrizes que marca-ram a poliacutetica externa de Cardoso (Bernal-Meza 2002) Nesse sentido eacute possiacutevel que o viacutenculo com os Estados Unidos e as potecircncias do capitalismo central o apoio agraves instituiccedilotildees de governanccedila glo-bal sustentada pela hegemonia norte-americana e a posiccedilatildeo a favor do Ocidente ante os conflitos mundiais bem como o suposto enfrentamento ci-vilizatoacuterio deixem para traacutes o que Bandeira (2004) denominou de ldquorelaccedilotildees perigosasrdquo

O americanismo do governo Bolsonaro entre-tanto parece desmentir Cervo ou seja concilia o alinhamento poliacutetico aos Estados Unidos com a repulsa ao universalismo e mesmo agrave cooperaccedilatildeo e ao pacifismo O chanceler Ernesto Arauacutejo elogia Trump como ldquoum cavalheiro cruzado que luta para resgatar a identidade do Ocidenterdquo Para Arauacutejo (2017) Trump e sua poliacutetica internacional repre-sentam a disposiccedilatildeo para uma luta global para re-cuperar o passado simboacutelico que tem representado a histoacuteria e a cultura das naccedilotildees ocidentais para a sobrevivecircncia e o domiacutenio do Ocidente

Um grande questionamento eacute o que aconteceraacute com o papel que a poliacutetica exterior brasileira tem desempenhado na regiatildeo e se ela retornaraacute agrave dispo-siccedilatildeo para a lideranccedila que marcou o periacuteodo Lula ou se deixaraacute nas matildeos de potecircncias secundaacuterias mdash como o Chile mdash essa posiccedilatildeo o paiacutes que Bolso-naro considera um modelo No plano da poliacutetica internacional um posicionamento em linha com a poliacutetica de Trump poderia ter grandes impactos Uma maior aproximaccedilatildeo mdash ou coincidecircncias mdash com a poliacutetica de Washington afastaria o Brasil de sua tendecircncia mais tradicional a da autonomia mdash cujo efeito seria um afastamento relativo do brics e a predisposiccedilatildeo do presidente Bolsonaro a resta-belecer uma relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo militar com os Estados Unidos (Cervo 2019) o que despertaria na regiatildeo velhos temores mdash nunca esquecidos mdash so-bre o subimperialismo brasileiro

Haacute que se considerar nesses aspectos que a poliacutetica externa do governo Bolsonaro tem sido in-formada por diferentes grupos de interesse o que

19Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

resulta muitas vezes em uma praacutetica erraacutetica in-consistente e excessivamente ideoloacutegica (Stunkel 2019 Spector 2019) Diferentemente de outras si-tuaccedilotildees semelhantes mdash Dutra Castelo Branco ou Collor mdash desta feita o Itamaraty natildeo atuou como contraponto agrave presidecircncia alimentando muitas vezes o discurso ideoloacutegico

Bolsonaro e Trump parecem ter muitos pontos em comum Entre as coincidecircncias mais delicadas estaacute seu rechaccedilo ao ldquoglobalismordquo3 o que revela que ambos os presidentes estatildeo dispostos a depreciar o que as diplomacias de seus proacuteprios paiacuteses cons-truiacuteram sob o sistema internacional contemporacirc-neo a criaccedilatildeo e fortalecimento das organizaccedilotildees internacionais o sistema das Naccedilotildees Unidas e as negociaccedilotildees mundiais sobre assuntos que impor-tavam agrave sociedade internacional Accedilotildees que se plasmaram em temas e agendas globais como o meio ambiente e a mudanccedila climaacutetica Ambas se-riam tendecircncias de mudanccedila profunda que impac-tariam todo o cenaacuterio latino-americano O mais preocupante eacute imaginar o Brasil imerso em um enfrentamento a respeito do papel do Ocidente na defesa da chamada ldquocultura ocidentalrdquo posto que ela tem sido o instrumento mais importante do co-lonialismo e da dominaccedilatildeo das potecircncias ociden-tais sobre a periferia do mundo

O que parecia ser manifestaccedilotildees de desinte-resse (ao menos) a respeito de seu soacutecio estrateacute-gico sul-americano Bolsonaro ao natildeo incluir a Argentina em sua primeira viagem ao exterior e as declaraccedilotildees de seu ministro da Economia a respeito do Mercosul o que indicava que este natildeo seria uma prioridade para o Brasil pode trazer consequecircncias negativas para as relaccedilotildees sul-ame-ricanas Deve-se recordar que a base de qualquer entendimento de cooperaccedilatildeo governanccedila re-gional e continuidade para fazer da regiatildeo uma

3 ldquoGlobalismordquo em sentido pejorativo foi o termo utilizado por Bolsonaro e por seus principais auxiliares para cri-ticar nos meses iniciais de seu governo as poliacuteticas de inserccedilatildeo do Brasil no cenaacuterio global por meio de uma par-ticipaccedilatildeo proativa em foros multilaterais e nos debates sobre os temas mais sensiacuteveis da agenda internacional Argumento apresentado pelo ministro Arauacutejo em seu dis-curso de posse por meio de uma obviedade ldquoNatildeo estamos aqui para trabalhar pela ordem global Aqui eacute o Brasilrdquo (Arauacutejo 2019 sp)

zona militarmente desnuclearizada passa por uma relaccedilatildeo cordial entre o Brasil e a Argentina A construccedilatildeo de uma ldquozona de pazrdquo no Atlacircntico Sul por meio da superaccedilatildeo das hipoacuteteses de con-flito entre a Argentina e o Chile tem se baseado na continuidade dessa relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo A partir dessas perspectivas a presidecircncia Bolso-naro natildeo soacute implicaria o retorno da Ameacuterica do Sul agraves concepccedilotildees ideoloacutegicas radicalizadas que se supunham superadas que incluem novos viacutenculos estreitos em mateacuteria de seguranccedila com os Estados Unidos mas tambeacutem o iniacutecio de uma etapa de in-certeza na regiatildeo

Alinhamento com Washington incertezas quanto a PequimO alinhamento com Washington agrave eacutepoca de Rio Branco seguia um roteiro previsiacutevel diante da potecircncia ascendente a adesatildeo aos princiacutepios do Direito Internacional a incorporaccedilatildeo acriacutetica do conceito de ldquobom governordquo e a convicccedilatildeo de que o progresso da naccedilatildeo dependia dos desiacutegnios do norte Nada parecido se via em relaccedilatildeo a Londres que ainda conservava o status de principal centro financeiro internacional mas que perdia impor-tacircncia no intercacircmbio de mercadorias Mais de um seacuteculo depois o novo alinhamento mdash e este eacute o contraponto que se mencionou na introduccedilatildeo mdash manteacutem o principal das relaccedilotildees internacionais do paiacutes voltado para os Estados Unidos De acordo com a hipoacutetese de trabalho inicial a de estarmos em meio a uma transiccedilatildeo hegemocircnica dos Estados Unidos para a China Bolsonaro estaria em dis-sonacircncia com Rio Branco

Os primeiros meses de 2019 revelaram que o governo Bolsonaro sustentava na poliacutetica externa o principal das promessas de campanha acompa-nhadas do mote ldquoo Brasil acima de tudordquo Inspira-do no governo de Trump o discurso de supremacia contrastava com o silecircncio diante da poliacutetica pro-tecionista de Washington que elevara a tarifa para a importaccedilatildeo do accedilo e subsidiava a produccedilatildeo de soja ambas as medidas prejudiciais para os inte-resses brasileiros Ante eventuais perdas setoriais o governo seguia fiel ao princiacutepio do alinhamento em dissonacircncia com o legado de Rio Branco

20

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

A crise na Venezuela e os interesses econocircmi-cos do agronegoacutecio no mercado chinecircs levariam o governo a modificar em parte a retoacuterica inicial o que indicaria estar em curso ajustes e reorientaccedilotildees na aacuterea No dia 23 de fevereiro o autoproclamado presidente interino da Venezuela Juan Guaidoacute liderou um esforccedilo de tentar fazer com que ca-minhotildees com alimentos adentrassem a Venezue-la como forma de pressionar o governo Maduro Em Pacaraima o chanceler brasileiro explicava se tratar de um ato humanitaacuterio altruiacutesta ldquoum mo-mento de criaccedilatildeo de uma nova realidade na Ve-nezuelardquo Quanto agrave possibilidade de intervenccedilatildeo Arauacutejo considerava que ldquonatildeo haacute menor expectativa de conflito mas claro que o Exeacutercito estaacute prepa-rado caso isso possa se materializarrdquo (Cronologia 2019 sp)

Na visatildeo do vice-presidente Mouratildeo que natildeo ocultava a influecircncia estadunidense a crise vene-zuelana soacute seria superada com a neutralizaccedilatildeo de agentes externos em especial a presenccedila cubana Se essa situaccedilatildeo continuasse a Venezuela correria o risco de se tornar um ldquonatildeo Estadordquo (Arauacutejo Ritt-ner e Murakawa 2019) Mouratildeo ao mesmo tempo que natildeo contemporizava com o governo Maduro indicava natildeo estar de acordo in totum com o alin-hamento com Washington nessa questatildeo ao colo-car em duacutevida a legitimidade de Juan Guaidoacute

Em relaccedilatildeo agrave China a visita de Mouratildeo e seu encontro com Xi Jiping marcaram a superaccedilatildeo de desconfianccedilas manifestadas durante a campan-ha e os meses iniciais de governo Para Mouratildeo a prioridade era restabelecer o funcionamento da Comissatildeo Sino-Brasileira de Alto Niacutevel de Concer-taccedilatildeo e Cooperaccedilatildeo (Cosban) e reorganizar sua es-trutura para que voltasse a ser um mecanismo de alto niacutevel Em sua percepccedilatildeo a China tem sido um parceiro confiaacutevel do Brasil desde 2009 ano em que se tornou seu maior parceiro comercial e no qual ocorreu a i Cuacutepula do brics Nesses dez anos de parceria estrateacutegica o fluxo comercial bilateral alcanccedilou usd$ 100 bilhotildees embora o Brasil expor-tasse muito mais produto in natura que produtos com valor agregado uma das reclamaccedilotildees que te-ria apresentado ao primeiro mandataacuterio chinecircs

A China vinha se transformando em um enor-me desafio regional e internacional para o Brasil

Em vinte anos a China transitou de ser vista como ldquoa oportunidaderdquo para ser percebida como desafio (Bernal-Meza 2014) de potencial grande merca-do para as importaccedilotildees e a exportaccedilatildeo de capitais a fazer de seus soacutecios latino-americanos periferia primaacuterio-exportadora A evoluccedilatildeo das relaccedilotildees econocircmicas entre a China e o Brasil de maneira bilateral e no acircmbito das relaccedilotildees no brics estaria sinalizando uma tendecircncia estrutural da configu-raccedilatildeo de um padratildeo de relaccedilotildees centro-periferia (Beckerman e Moncaut 2016 Becard 2017 Bernal- Meza 2019a 2019b)

O ingresso da China na economia poliacutetica da Ameacuterica do Sul deslocou o Brasil do lugar prepon-derante que ocupava dentro do bloco Mercosul e no contexto regional A respeito dos processos de integraccedilatildeo latino-americanos mdash em particu-lar do Mercosul mdash a China se transformou em um fator de profundo desequiliacutebrio porque foi se transformando no principal e segundo soacutecio mais importante da inserccedilatildeo econocircmica internacional da Ameacuterica do Sul (Hiratuka 2016 Dussel 2016) Isso afetou igualmente a posiccedilatildeo do Brasil como a principal economia para seus vizinhos No plano interno a presenccedila econocircmica chinesa parece es-tar condicionando a eventual autonomia do des-envolvimento industrial e tecnoloacutegico brasileiro ao exercer um crescente controle sobre a estrutura energeacutetica no setor eleacutetrico (Becard Lessa e Silveira 2020 Becard 2017)

A presenccedila chinesa na Ameacuterica Latina con-correu para enfraquecer a influecircncia brasileira sobre a integraccedilatildeo regional Entre os interesses brasileiros figurava a ideia de natildeo seguir a poliacuteti-ca adotada por Washington em relaccedilatildeo a algumas empresas chinesas em particular a gigante de te-lecomunicaccedilotildees Huawei Nesse sentido Mouratildeo que foi ldquoalertadordquo pelo governo norte-americano sobre os riscos das operaccedilotildees da empresa chi-nesa teria sugerido a Xi Jinping a criaccedilatildeo de um ambiente de confianccedila quanto agrave companhia ldquode modo que nenhum paiacutes que vaacute receber a empresa e a tecnologia que vocecircs vatildeo instalar e fique preocu-pado com que todos dados que estaratildeo em seu po-der pertenceratildeo tambeacutem ao governo [chinecircs] Esta eacute a discussatildeordquo (Arauacutejo et al 2019 sp) A expecta-tiva de abertura brasileira agrave tecnologia 5g chinesa

21Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

se vinculava ao fato de o paiacutes ainda natildeo estar inte-grado digitalmente e de ter um marco regulatoacuterio defasado no setor A presidecircncia brasileira passava a se posicionar de forma equidistante em relaccedilatildeo aos interesses de Washington e Pequim o que se estendia agrave poliacutetica adotada diante da guerra co-mercial entre as duas maiores economias Poucos casos ilustravam com tanta transparecircncia um dos mais importantes efeitos da transiccedilatildeo hegemocircnica em curso

Mouratildeo fora convencido pelo secretaacuterio-geral do Itamaraty Otaacutevio Brandelli quanto agrave adequa-ccedilatildeo de uma conduta flexiacutevel e pragmaacutetica Em face de uma guerra comercial dessa natureza o gover-no brasileiro deveria saber explorar as oportuni-dades Por exemplo como a administraccedilatildeo Trump taxou parcela das importaccedilotildees da China inicial-mente em torno de usd$ 250 bilhotildees os produtos envolvidos passaram a chegar mais caros no mer-cado norte-americano e eventualmente poderiam ser substituiacutedos por produtos brasileiros o que acrescentaria usd$ 5 bilhotildees ou mais nas nossas exportaccedilotildees A guerra comercial deveria assim ser tratada com paciecircncia

O limite da visatildeo do vice-presidente brasi-leiro mdash que dava vazatildeo agraves pressotildees do agrone-goacutecio mdash era evidente Temas como transferecircncia de tecnologia e cooperaccedilatildeo industrial natildeo foram abordados Indagado sobre o fato de o conflito de interesses entre Estados Unidos e China natildeo ser apenas comercial mas tambeacutem tecnoloacutegico a res-posta foi igualmente simplista ldquoVocecirc olha o 5g As quatro empresas que detecircm a tecnologia satildeo duas chinesas e duas finlandesas Cadecirc a americanardquo (Arauacutejo et al 2019 sp) Ou seja o governo bra-sileiro mdash afastadas as desconfianccedilas iniciais em relaccedilatildeo agrave China mdash voltava a se ocupar dos temas tratados em governos anteriores exportaccedilotildees de alimentos e mineacuterios investimentos diretos com geraccedilatildeo de empregos acordos de cooperaccedilatildeo em tecnologia estes uacuteltimos sem viacutenculo claro com qualquer projeto mais amplo de industrializaccedilatildeo e desenvolvimento tecnoloacutegico

O governo Bolsonaro aparentemente estava satisfeito com o status internacional do paiacutes sem atentar minimamente ao processo de desindus-trializaccedilatildeo das uacuteltimas deacutecadas (Benaion 2006

Cano 2012 Oliveira 2018) Para Chang (2018) nos anos 1980 e 1990 o Brasil conheceu o ponto mais alto da industrializaccedilatildeo que atingiu 35 da produccedilatildeo nacional No final de 2017 representa-va apenas 12 e a tendecircncia era de decliacutenio O Brasil tem nesse sentido voltado no tempo Em-presaacuterios de Satildeo Paulo natildeo parecem estar preocu-pados com o decliacutenio da induacutestria manufatureira No longo prazo essa poliacutetica eacute prejudicial para o paiacutes No governo Dilma Rousseff vaacuterios subsiacutedios foram canalizados para a induacutestria mas as altas taxas de juros natildeo favoreceram mudanccedilas efetivas (Oliveira 2018)

O processo de desindustrializaccedilatildeo as poliacuteticas econocircmicas e o conformismo com a condiccedilatildeo ldquosu-bordinadardquo do paiacutes instruiacuteram em outro momento o uso do conceito de ldquoperiferia proacutesperardquo para o crescimento econocircmico de meados da deacutecada de 2000 sustentado pela demanda chinesa (Doratioto e Vidigal 2015) As taxas de crescimento da China beneficiaram as exportaccedilotildees latino-americanas de produtos agriacutecolas mineacuterios petroacuteleo e produtos manufaturados de baixo valor agregado Conco-rreram por sua vez para reforccedilar o caraacuteter liberal perifeacuterico de economias como a brasileira (Filguei-ras e Gonccedilalves 2007)

Na poliacutetica externa era clara a intenccedilatildeo de re-duzir o peso do Itamaraty nas decisotildees relativas aos assuntos de seguranccedila e defesa fronteiras narcotraacutefico e outros delitos internacionais e imi-graccedilatildeo como no tema da crise na Venezuela e em outros assuntos sensiacuteveis na aacuterea da poliacutetica in-ternacional Quanto ao chanceler Ernesto Arauacutejo que havia impressionado negativamente a maioria dos estudiosos de poliacutetica externa e internacional em razatildeo de certo ldquomessianismordquo na defesa do Oci-dente e da administraccedilatildeo Trump passou a atuar de modo mais comedido e profissional como na ocasiatildeo da assinatura do acordo Mercosul-Uniatildeo Europeia no dia 28 de junho de 2019

Bolsonaro no final de reuniatildeo do g-20 em Osaka (28 e 29 de junho de 2019) se disse satis-feito com os resultados do encontro do brics e do proacuteprio g-20 aleacutem de destacar a importacircncia da conclusatildeo do acordo Mercosul-Uniatildeo Europeia Na reuniatildeo dos brics Bolsonaro desistiu de pro-por aos demais liacutederes o apoio a uma mudanccedila

22

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

de governo na Venezuela Foi tambeacutem a oportu-nidade para reconhecer o interesse brasileiro em manter bom diaacutelogo com o principal parceiro co-mercial do paiacutes

Os ajustes percebidos na conduccedilatildeo da poliacutetica externa natildeo significaram uma mudanccedila de rumo do governo Bolsonaro no que tange agrave priorizaccedilatildeo dos laccedilos com os Estados Unidos a Europa e o Ja-patildeo parceiros preferenciais nas deacutecadas de 1960 1970 e sob o governo de Cardoso Nesse sentido as relaccedilotildees com a China a despeito do discurso em prol de uma parceria estrateacutegica ou coisa que o valha tecircm sido tratadas de forma setorial mdash co-meacutercio investimentos cooperaccedilatildeo tecnoloacutegica mdash e descompromissada com qualquer planejamento Os laccedilos histoacutericos com os Estados Unidos em to-das as suas dimensotildees favorecem a acomodaccedilatildeo e a recusa em tratar seriamente a hipoacutetese da ldquoopccedilatildeo chinesardquo o que natildeo necessariamente eacute negativo

ConclusatildeoAs transiccedilotildees hegemocircnicas no marco da econo-mia poliacutetica mundial tecircm constituiacutedo um pro-blema externo e interno para os paiacuteses inseridos em uma relaccedilatildeo centro-periferia A ascensatildeo da China e sua presenccedila econocircmica na Ameacuterica do Sul tecircm levado alguns paiacuteses a incluiacute-la em seus caacutelculos estrateacutegicos A Argentina o Brasil e o Chile podem desempenhar um papel crucial nesse processo tendo em vista a relevacircncia geopoliacutetica e econocircmica do Cone Sul pois a polarizaccedilatildeo Es-tados Unidos-China cria janelas de oportunidade e gera maior permissibilidade no sistema interna-cional como diria Heacutelio Jaguaribe

Destacamos a identificaccedilatildeo das grandes linhas de continuidade e de ruptura que tecircm implicado o discurso do presidente Bolsonaro e dos principais colaboradores em relaccedilatildeo agrave tradiccedilatildeo da poliacutetica externa brasileira O contraponto inicial com a poliacutetica e o pensamento de Rio Branco com des-taque para as boas e privilegiadas relaccedilotildees com os Estados Unidos permitiu identificar periacuteodos de maior proximidade ou de distanciamento de Was-hington Bolsonaro estaacute proacuteximo dessa tradiccedilatildeo a de ver o Brasil como soacutecio proacuteximo dos Estados Unidos mas se afasta de praacuteticas autonomistas

como a da poliacutetica externa independente e a do pragmatismo responsaacutevel Praacuteticas essas que per-mitiriam avaliar de modo desassombrado as re-laccedilotildees com a China

Tanto a ascensatildeo da China como a posiccedilatildeo que ocupa Pequim na estrutura econocircmica brasileira planteiam desafios equivalentes ao que o Brasil ex-perimentou no comeccedilo do seacuteculo xx Agrave diferenccedila da visatildeo de Rio Branco durante a transiccedilatildeo da he-gemonia natildeo parece haver no governo de Bolsona-ro um olhar seguro sobre os impactos da transiccedilatildeo hegemocircnica nem do papel que o Brasil deveria des-empenhar na estrateacutegia global da China

Um terceiro tema de preocupaccedilatildeo eacute o das re-laccedilotildees com a Argentina A visita subsequente a Buenos Aires a assinatura do acordo para negociar um tratado de livre-comeacutercio entre o Mercosul e a Uniatildeo Europeia e o anuacutencio de que ambos os go-vernos iniciariam gestotildees conjuntas para a assina-tura de acordos de livre-comeacutercio com os Estados Unidos restabeleceram o bom diaacutelogo entre Bra-siacutelia e Buenos Aires ainda que persistam duacutevidas no governo Macri (Landim 2019) As incertezas se estenderam ao governo eleito em dezembro de 2019 em decorrecircncia de criacuteticas de natureza ideo-loacutegicas realizadas tanto por Bolsonaro quanto por Alberto Fernaacutendez Entretanto o diaacutelogo bilateral tende a se normalizar sem maiores pretensotildees no plano regional

O viacutenculo estrateacutegico entre Brasiacutelia e Buenos Aires tem sido chave para sustentar um espiacuterito de cooperaccedilatildeo e integraccedilatildeo na Ameacuterica do Sul que se baseia na credibilidade das accedilotildees e na boa feacute de uns e outros governos Desde 1985 o Brasil e a Argentina desenvolveram o que Cervo (2008) denominou de ldquorelaccedilotildees em eixordquo que se estabe-lecem ldquoquando precisamente a imagem um do outro corresponde agrave do parceiro que consegue estabelecer uma uniatildeo co-responsaacutevel [] Em outros termos o eixo comporta uma vertente exoacute-gena que o transcende porque abarca as relaccedilotildees regionais mesmo que coletivas []rdquo (pp 211-212) Eacute esse tipo de relaccedilotildees e sua projeccedilatildeo no Cone Sul que foi potencialmente afetada pelas primei-ras declaraccedilotildees e accedilotildees do governo Bolsonaro Ao promover um alinhamento com os Estados Uni-dos mdash ou ldquosem recompensardquo como diria Gerson

23Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Moura mdash reproduz o que o Brasil e outros paiacuteses latino-americanos adotaram como ldquoestrateacutegiardquo na deacutecada de 1990 sem os resultados esperados E ao abandonar a tradiccedilatildeo iniciada em 1961 e adaptada agraves diferentes conjunturas que se sucederam abriu matildeo de exercer o poder de barganha do paiacutes para fazer concessotildees sem contrapartidas equivalentes Nas circunstacircncias atuais diante da transiccedilatildeo he-gemocircnica Estados Unidos-China considerando os interesses do Brasil na Ameacuterica do Sul a equidis-tacircncia talvez seja o melhor caminho Diaacutelogo es-treito com Washington e autonomia em temas de interesse do paiacutes foram as opccedilotildees de Rio Branco

Referecircncias Arauacutejo E (2017) Trump e o Ocidente Cadernos de Poliacutetica

Exterior iii(6) 323-357

Arauacutejo E (2019 2 de janeiro) Discurso do minis-tro Ernesto Arauacutejo durante cerimocircnia de posse no Ministeacuterio das Relaccedilotildees Exteriores Brasiacutelia Re-cuperado de httpwwwitamaratygovbrpt-BRdiscursos-artigos-e-entrevistas-categoriaminis-tro-das-relacoes-exteriores-discursos19907-dis-curso-do-ministro-ernesto-araujo-durante-cerimo-nia-de-posse-no-ministerio-das-relacoes-exteriores-brasilia-2-de-janeiro-de-2019

Arauacutejo C Rittner D e Murakawa F (2019 30 de abril) Brasil descarta vetar presenccedila da Huawei em 5g avisa Mouratildeo (entrevista com o vice-presidente Hamilton Mouratildeo) g1 Recuperado de httpsvalorglobocombrasilnoticia20190607brasil-descarta-vetar-pre-senca-da-huawei-em-5g-avisa-mouraoghtml

Arrighi G (2008) Adam Smith em Pequim origens e fun-damentos do seacuteculo xxi Satildeo Paulo Brasil Boitempo

Bandeira L A M (2004) As relaccedilotildees perigosas Brasil-Es-tados Unidos Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Bra-sileira

Bandeira L A M (2003) Brasil Argentina e Estados Uni-dos da Triacuteplice Alianccedila ao Mercosul (1870-2003) Rio de Janeiro Editora Revan

Becard D (2017) China y Brasil iquestmodelo de relaciones Sur-Sur Em E Pastrana B e H Gehring (eds) La proyeccioacuten de China en Ameacuterica Latina y el Caribe (pp 387-408) Bogotaacute Colocircmbia Editorial Javeriana

Becard D Lessa A e Silveira L (2020) One step closer The politics and the economics of chinarsquos strategy in Brazil and the case of the electric power sector Em R Bernal-Meza R e X Li (eds) China-Latin America

relations in the 21st Century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 55-81) Nova York Estados Unidos Palgrave Macmillan

Becard D Barros-Platiau A e Lessa A (2019) Brazil in the brics after tem years Past present and near futu-re perspectives Em X Li (ed) The international po-litical economy of the brics (pp 135-149) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Beckerman M e Moncaut N (2016) Las relaciones en-tre China y Ameacuterica Latina iquestHacia la desestructura-cioacuten de los sistemas productivos de la regioacuten Em C Moneta e S Cesariacuten (eds) La tentacioacuten pragmaacutetica China-ArgentinaAmeacuterica Latina lo actual lo proacuteximo y lo distante (pp 185-202) Saacuteenz Pentildea Argentina Uni-versidad Nacional de Tres de Febrero

Benaion N (2006) Subordinaccedilatildeo reiterada imperialismo e desenvolvimento no Brasil Manaus Brasil Editora da Universidade Federal do Amazonas

Bernal-Meza R (2019a) Brazil as an emerging power The impact of international and internal deteriorational effect on the brics Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 118-134) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Bernal-Meza R (2019b) Brasil ascenso declinacioacuten y nuevos desafiacuteos de una potencia emergente (2003-2018) Revista Izquierdas 49(2020) 516-540

Bernal-Meza R (2015) Pensamiento chileno en la poliacuteti-ca exterior y en las teoriacuteas de relaciones internaciona-les Em M Artaza e C Ross (eds) La poliacutetica exterior de Chile 1990-2009 (pp 21-47) Santiago Chile ril Editores

Bernal-Meza R (2014) La heterogeneidad de la imagen de China en la poliacutetica exterior latinoamericana Pers-pectivas para la concertacioacuten de poliacuteticas Comentario Internacional 14 113-134

Bernal-Meza R (2013) Ameacuterica Latina en el mundo el pensamiento latino-americano y la teoriacutea de relaciones internaciones Buenos Aires Argentina Grupo Editor Latinoamericano

Bernal-Meza R (2002) A poliacutetica exterior do Brasil 1990-2002 Revista Brasileira de Poliacutetica Internacional 45(1) 36-71

Bernal-Meza R e Bizzozero L (eds) (2014) La poliacutetica internacional de Brasil de la regioacuten al mundo Monte-videacuteu Uruguai Ediciones Cruz del Sur

Bernal-Meza R e Li X (eds) (2020) China-Latin Ameri-ca relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges Nova York Estados Uni-dos Palgrave Macmillan

24

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

Bolsonaro J (2018) O caminho da prosperidade pro-posta de Plano de Governo Recuperado de httpdivulgacandcontastsejusbrcandidaturasof i-cial2018BRBR2022802018280000614517propos-ta_1534284632231pdf

Bricentildeo Ruiz J e Simonoff A (orgs) (2015) Integracioacuten y cooperacioacuten regional en Ameacuterica Latina una relectura a partir de la teoriacutea de la autonomiacutea Buenos Aires Ar-gentina Editorial Biblos

Bueno C (2003) Poliacutetica externa da Primeira Repuacuteblica os anos de apogeu (1902-1918) Satildeo Paulo Brasil Paz e Terra

Cano W (2012) A desindustrializaccedilatildeo no Brasil (texto para discussatildeo 200) Campinas Brasil Instituto de Economia da Unicamp

Cervo A L (2019 28 de novembro) Governo Bolso-naro natildeo traraacute ruptura agrave poliacutetica externa Exame Recuperado de httpsexameabrilcombrmundogoverno-bolsonaro-nao-trara-ruptura-a-politica-ex-terna-avalia-amado-cervo

Cervo A (2008) Inserccedilatildeo internacional formaccedilatildeo dos conceitos brasileiros Satildeo Paulo Brasil Saraiva

Cervo A (2002) Relaccedilotildees Internacionais do Brasil a era Cardoso Revista Brasileira de Poliacutetica Internacional 45(1) 5-35

Cervo A e Bueno C (2015) Histoacuteria da poliacutetica exterior do Brasil Brasiacutelia Brasil Editora da Universidade de Brasiacutelia

Chang H H (2018 15 jan) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da histoacuteria da economia El Paiacutes Recuperado de ht-tpsbrasilelpaiscombrasil20180105econo-mia1515177346_780498html

Cronologia relembre os fatos mais importantes da cri-se venezuelana g1 httpsg1globocommundonoticia20190430cronologia-relembre-os-fa-tos-mais-importantes-na-crise-venezuelanaghtml

Doratioto F e Vidigal C (2015) Histoacuteria das Relaccedilotildees In-ternacionais do Brasil Satildeo Paulo Brasil Editora Saraiva

Dussel Peters E (coord) (2016) La nueva relacioacuten comer-cial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestInte-gracioacuten o desintegracioacuten regional Meacutexico-df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universidades de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico

Filgueiras L e Gonccedilalves R (2007) A economia poliacutetica do governo Lula Rio de Janeiro Brasil Contraponto

Fiori J(1999) Estado e moedas no desenvolvimento das naccedilotildees Petroacutepolis Brasil Vozes

Flisfisch A (2011) La Poliacutetica exterior chilena y Ameacuterica del Sur Estudios Internacionales (168) 115-141

Fonseca Jr G (2012) Rio Branco diante do Monroiacutesmo e do Pan-Americanismo anotaccedilotildees Em M Pereira e M Gomes (orgs) Baratildeo do Rio Branco 100 anos de memoacuteria (pp 565-602) Brasiacutelia Brasil Fundaccedilatildeo Alexandre de Gusmatildeo

Franccedila T (2007) Self made nation Domiacutecio da Gama e o pragmatismo do bom senso (tese de doutorado) Brasiacute-lia Brasil Universidade de Brasiacutelia

Guimaratildees S (2018) A poliacutetica exterior e a posiccedilatildeo do Brasil no mundo Recuperado de httpswwwnodalam201812a-politica-exterior-e-a-posicao-do-brasil-no-mundo-por-samuel-pinheiro-guimaraes-2

Gullo M (2018) Relaciones internacionales una teoriacutea criacutetica desde la periferia latinoamericana Buenos Ai-res Argentina Editorial Biblos

Gullo M (2014) A subordinaccedilatildeo fundante breve histoacuteria da construccedilatildeo do poder pelas naccedilotildees Florianoacutepolis Brasil Insular

Hiratuka C (2016) Impactos de China sobre el proceso de integracioacuten regional de Mercosur Em E Dussel Peters (coord) La nueva relacioacuten comercial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestIntegracioacuten o desintegracioacuten (pp 195-243) Meacutexico df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universida-des de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico Recuperado de httpswww3ecouni-campbrNeitimagesdestaque2016_La_nueva_rela-cion_comercial_ALC_Chinapdf

Hobsbawm E (1994) Extremes The Short Twentieth Cen-tury 1914-1991 Londres Inglaterra Michael Joseph Ltd

Kennedy P (1987) The rise and fall of the great powers Economic change and military conflict from 1500 to 2000 Nova York Estados Unidos Vintage Books

Keohane R e Nye J (1977) Power and interdependence World politics in transition Boston Estados Unidos Little Brown and Company

Lafer C (2002) JK e o programa de metas (1956-1961) Rio de Janeiro Brasil Fundaccedilatildeo Getuacutelio Vargas

Landim R (2019 6 de setembro) Brasil e Argentina adiam em 9 anos livre-comeacutercio de autos Folha de S Paulo Recuperado de httpswww1folhauolcombrmerca-do201909brasil-e-argentina-adiam-em-9-anos-li-vre-comercio-de-autosshtml

Lessa A e Oliveira H A (orgs) (2013) Parcerias estra-teacutegicas do Brasil v 1 os significados e as experiecircncias tradicionais Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

25Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Li X (2020) Revisiting China-Latin America economic relations An unintended consequence of different industrialization strategies Em R Bernal-Meza e X Li (eds) China-Latin America relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 225-251) Nova York Estados UnidosLondres Inglaterra Palgrave Macmillan

Li X (2019a) Chinarsquos dual position in the capitalist world order A dual complexity of hegemony and counter-he-gemony Em Li X (ed) The international political eco-nomy of the brics (pp 1-17) Abindon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2019b) The international political economy of the brics Nova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2014) The brics and beyond The international political economy of the emergence of a new world or-der Farnham Reino Unido Ashgate

Li X (2012) China y el orden mundial capitalista el nexo de la transformacioacuten interna de China y su impacto externo Em R Bernal-Meza e S Quintanar (eds) Regionalismo y Orden Mundial Surameacuterica Europa China (pp 29-53) Buenos Aires Argentina Nuevoha-cerUniversidad Nacional del Centro de la Provincia de Buenos Aires

Li X e Farah A (eds) (2013) China-Africa relations in an era of great transformations Farnham Reino Unido Ashgate

Lins A (1996) Rio Branco (Biografia) Satildeo Paulo Brasil Editora Alfa Omega

Mandelbaum M (2010) The frugal superpower Americarsquos global leadership in a cash-strapped era Nova York Es-tados Unidos Public Affairs

Meneses E (1988) Coping with decline Chilean fo-reign policy during the twentieth century 1902-1972 Oxford Reino Unido University of OxfordBodleian Library

Nabuco J (1949) Obras completas v xii Rio de Janeiro Brasil Instituto Progresso Editorial sa

Nasr V (2014) The dispensable nation American foreign policy in retreat Nova York Estados Unidos Anchor and Doubleday

Oliveira R (2018 15 de janeiro) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da his-toacuteria da economia (entrevista com Ha-Joon Chang) El Paiacutes Recuperado de httpsbrasilelpaiscombra-sil20180105economia1515177346_780498html

Pearson F e Rochester M (2007) Relaciones internacio-nales situacioacuten global en el siglo xxi Meacutexico-df Meacute-xico Mc Graw Hill

Pecequilo C (2012) As relaccedilotildees Brasil-Estados Unidos Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

Polanyi K (1957) The great transformation the political and economic origins of our time Boston Estados Uni-dos Beacon Press

Rodrigues J Seitenfus R e Rodrigues L (orgs) (1995) Uma histoacuteria diplomaacutetica do Brasil (1531-1945) Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Brasileira

Seitenfus R (2003) O Brasil vai agrave guerra o processo de envolvimento brasileiro na Segunda Guerra Mundial 3a ed Satildeo Paulo Brasil Barueri

Spector M (2019 25 abril) Eacute hora de construir uma po-liacutetica externa poacutes-Bolsonaro Folha de S Paulo Re-cuperado de httpswww1folhauolcombr colunasmatiasspektor201904e-hora-de-construir-a-politi-ca-externa-pos-bolsonaroshtml

Stunkel O Com Bolsonaro a poliacutetica externa se tor-nou uma caixa de surpresas (entrevista agrave Deutsche Welle Brasil) Recuperado de httpswwwterracombrnoticiasbrasil com-bolsonaro-politica-ex-terna-se-tornou-uma-caixa-de-surpresas 7f6f-814287c0240a2f3f93ad aa39af65jpo4zbzghtml

Tarzi S (2007) Neorealism neoliberalism and the inter-national system International Studies (41) 115-128

Vadell J e Ramos L (2019) The role of declining Brazil and ascending China in the brics initiative Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 75-94) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Viana F L (1959) A vida do Baratildeo do Rio Branco Rio de Janeiro Brasil Joseacute Olympio

Vidigal C (2009) Relaccedilotildees Brasil-Argentina o primeiro ensaio Curitiba Brasil Juruaacute

Page 9: Bolsonaro versus Rio Branco: transição hegemônica, América ...2011/02/15  · Contra-hegemonia e ordem capitalista mundial por meio do brics, brics-plus e de outros agru-pamentos,

19Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

resulta muitas vezes em uma praacutetica erraacutetica in-consistente e excessivamente ideoloacutegica (Stunkel 2019 Spector 2019) Diferentemente de outras si-tuaccedilotildees semelhantes mdash Dutra Castelo Branco ou Collor mdash desta feita o Itamaraty natildeo atuou como contraponto agrave presidecircncia alimentando muitas vezes o discurso ideoloacutegico

Bolsonaro e Trump parecem ter muitos pontos em comum Entre as coincidecircncias mais delicadas estaacute seu rechaccedilo ao ldquoglobalismordquo3 o que revela que ambos os presidentes estatildeo dispostos a depreciar o que as diplomacias de seus proacuteprios paiacuteses cons-truiacuteram sob o sistema internacional contemporacirc-neo a criaccedilatildeo e fortalecimento das organizaccedilotildees internacionais o sistema das Naccedilotildees Unidas e as negociaccedilotildees mundiais sobre assuntos que impor-tavam agrave sociedade internacional Accedilotildees que se plasmaram em temas e agendas globais como o meio ambiente e a mudanccedila climaacutetica Ambas se-riam tendecircncias de mudanccedila profunda que impac-tariam todo o cenaacuterio latino-americano O mais preocupante eacute imaginar o Brasil imerso em um enfrentamento a respeito do papel do Ocidente na defesa da chamada ldquocultura ocidentalrdquo posto que ela tem sido o instrumento mais importante do co-lonialismo e da dominaccedilatildeo das potecircncias ociden-tais sobre a periferia do mundo

O que parecia ser manifestaccedilotildees de desinte-resse (ao menos) a respeito de seu soacutecio estrateacute-gico sul-americano Bolsonaro ao natildeo incluir a Argentina em sua primeira viagem ao exterior e as declaraccedilotildees de seu ministro da Economia a respeito do Mercosul o que indicava que este natildeo seria uma prioridade para o Brasil pode trazer consequecircncias negativas para as relaccedilotildees sul-ame-ricanas Deve-se recordar que a base de qualquer entendimento de cooperaccedilatildeo governanccedila re-gional e continuidade para fazer da regiatildeo uma

3 ldquoGlobalismordquo em sentido pejorativo foi o termo utilizado por Bolsonaro e por seus principais auxiliares para cri-ticar nos meses iniciais de seu governo as poliacuteticas de inserccedilatildeo do Brasil no cenaacuterio global por meio de uma par-ticipaccedilatildeo proativa em foros multilaterais e nos debates sobre os temas mais sensiacuteveis da agenda internacional Argumento apresentado pelo ministro Arauacutejo em seu dis-curso de posse por meio de uma obviedade ldquoNatildeo estamos aqui para trabalhar pela ordem global Aqui eacute o Brasilrdquo (Arauacutejo 2019 sp)

zona militarmente desnuclearizada passa por uma relaccedilatildeo cordial entre o Brasil e a Argentina A construccedilatildeo de uma ldquozona de pazrdquo no Atlacircntico Sul por meio da superaccedilatildeo das hipoacuteteses de con-flito entre a Argentina e o Chile tem se baseado na continuidade dessa relaccedilatildeo de cooperaccedilatildeo A partir dessas perspectivas a presidecircncia Bolso-naro natildeo soacute implicaria o retorno da Ameacuterica do Sul agraves concepccedilotildees ideoloacutegicas radicalizadas que se supunham superadas que incluem novos viacutenculos estreitos em mateacuteria de seguranccedila com os Estados Unidos mas tambeacutem o iniacutecio de uma etapa de in-certeza na regiatildeo

Alinhamento com Washington incertezas quanto a PequimO alinhamento com Washington agrave eacutepoca de Rio Branco seguia um roteiro previsiacutevel diante da potecircncia ascendente a adesatildeo aos princiacutepios do Direito Internacional a incorporaccedilatildeo acriacutetica do conceito de ldquobom governordquo e a convicccedilatildeo de que o progresso da naccedilatildeo dependia dos desiacutegnios do norte Nada parecido se via em relaccedilatildeo a Londres que ainda conservava o status de principal centro financeiro internacional mas que perdia impor-tacircncia no intercacircmbio de mercadorias Mais de um seacuteculo depois o novo alinhamento mdash e este eacute o contraponto que se mencionou na introduccedilatildeo mdash manteacutem o principal das relaccedilotildees internacionais do paiacutes voltado para os Estados Unidos De acordo com a hipoacutetese de trabalho inicial a de estarmos em meio a uma transiccedilatildeo hegemocircnica dos Estados Unidos para a China Bolsonaro estaria em dis-sonacircncia com Rio Branco

Os primeiros meses de 2019 revelaram que o governo Bolsonaro sustentava na poliacutetica externa o principal das promessas de campanha acompa-nhadas do mote ldquoo Brasil acima de tudordquo Inspira-do no governo de Trump o discurso de supremacia contrastava com o silecircncio diante da poliacutetica pro-tecionista de Washington que elevara a tarifa para a importaccedilatildeo do accedilo e subsidiava a produccedilatildeo de soja ambas as medidas prejudiciais para os inte-resses brasileiros Ante eventuais perdas setoriais o governo seguia fiel ao princiacutepio do alinhamento em dissonacircncia com o legado de Rio Branco

20

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

A crise na Venezuela e os interesses econocircmi-cos do agronegoacutecio no mercado chinecircs levariam o governo a modificar em parte a retoacuterica inicial o que indicaria estar em curso ajustes e reorientaccedilotildees na aacuterea No dia 23 de fevereiro o autoproclamado presidente interino da Venezuela Juan Guaidoacute liderou um esforccedilo de tentar fazer com que ca-minhotildees com alimentos adentrassem a Venezue-la como forma de pressionar o governo Maduro Em Pacaraima o chanceler brasileiro explicava se tratar de um ato humanitaacuterio altruiacutesta ldquoum mo-mento de criaccedilatildeo de uma nova realidade na Ve-nezuelardquo Quanto agrave possibilidade de intervenccedilatildeo Arauacutejo considerava que ldquonatildeo haacute menor expectativa de conflito mas claro que o Exeacutercito estaacute prepa-rado caso isso possa se materializarrdquo (Cronologia 2019 sp)

Na visatildeo do vice-presidente Mouratildeo que natildeo ocultava a influecircncia estadunidense a crise vene-zuelana soacute seria superada com a neutralizaccedilatildeo de agentes externos em especial a presenccedila cubana Se essa situaccedilatildeo continuasse a Venezuela correria o risco de se tornar um ldquonatildeo Estadordquo (Arauacutejo Ritt-ner e Murakawa 2019) Mouratildeo ao mesmo tempo que natildeo contemporizava com o governo Maduro indicava natildeo estar de acordo in totum com o alin-hamento com Washington nessa questatildeo ao colo-car em duacutevida a legitimidade de Juan Guaidoacute

Em relaccedilatildeo agrave China a visita de Mouratildeo e seu encontro com Xi Jiping marcaram a superaccedilatildeo de desconfianccedilas manifestadas durante a campan-ha e os meses iniciais de governo Para Mouratildeo a prioridade era restabelecer o funcionamento da Comissatildeo Sino-Brasileira de Alto Niacutevel de Concer-taccedilatildeo e Cooperaccedilatildeo (Cosban) e reorganizar sua es-trutura para que voltasse a ser um mecanismo de alto niacutevel Em sua percepccedilatildeo a China tem sido um parceiro confiaacutevel do Brasil desde 2009 ano em que se tornou seu maior parceiro comercial e no qual ocorreu a i Cuacutepula do brics Nesses dez anos de parceria estrateacutegica o fluxo comercial bilateral alcanccedilou usd$ 100 bilhotildees embora o Brasil expor-tasse muito mais produto in natura que produtos com valor agregado uma das reclamaccedilotildees que te-ria apresentado ao primeiro mandataacuterio chinecircs

A China vinha se transformando em um enor-me desafio regional e internacional para o Brasil

Em vinte anos a China transitou de ser vista como ldquoa oportunidaderdquo para ser percebida como desafio (Bernal-Meza 2014) de potencial grande merca-do para as importaccedilotildees e a exportaccedilatildeo de capitais a fazer de seus soacutecios latino-americanos periferia primaacuterio-exportadora A evoluccedilatildeo das relaccedilotildees econocircmicas entre a China e o Brasil de maneira bilateral e no acircmbito das relaccedilotildees no brics estaria sinalizando uma tendecircncia estrutural da configu-raccedilatildeo de um padratildeo de relaccedilotildees centro-periferia (Beckerman e Moncaut 2016 Becard 2017 Bernal- Meza 2019a 2019b)

O ingresso da China na economia poliacutetica da Ameacuterica do Sul deslocou o Brasil do lugar prepon-derante que ocupava dentro do bloco Mercosul e no contexto regional A respeito dos processos de integraccedilatildeo latino-americanos mdash em particu-lar do Mercosul mdash a China se transformou em um fator de profundo desequiliacutebrio porque foi se transformando no principal e segundo soacutecio mais importante da inserccedilatildeo econocircmica internacional da Ameacuterica do Sul (Hiratuka 2016 Dussel 2016) Isso afetou igualmente a posiccedilatildeo do Brasil como a principal economia para seus vizinhos No plano interno a presenccedila econocircmica chinesa parece es-tar condicionando a eventual autonomia do des-envolvimento industrial e tecnoloacutegico brasileiro ao exercer um crescente controle sobre a estrutura energeacutetica no setor eleacutetrico (Becard Lessa e Silveira 2020 Becard 2017)

A presenccedila chinesa na Ameacuterica Latina con-correu para enfraquecer a influecircncia brasileira sobre a integraccedilatildeo regional Entre os interesses brasileiros figurava a ideia de natildeo seguir a poliacuteti-ca adotada por Washington em relaccedilatildeo a algumas empresas chinesas em particular a gigante de te-lecomunicaccedilotildees Huawei Nesse sentido Mouratildeo que foi ldquoalertadordquo pelo governo norte-americano sobre os riscos das operaccedilotildees da empresa chi-nesa teria sugerido a Xi Jinping a criaccedilatildeo de um ambiente de confianccedila quanto agrave companhia ldquode modo que nenhum paiacutes que vaacute receber a empresa e a tecnologia que vocecircs vatildeo instalar e fique preocu-pado com que todos dados que estaratildeo em seu po-der pertenceratildeo tambeacutem ao governo [chinecircs] Esta eacute a discussatildeordquo (Arauacutejo et al 2019 sp) A expecta-tiva de abertura brasileira agrave tecnologia 5g chinesa

21Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

se vinculava ao fato de o paiacutes ainda natildeo estar inte-grado digitalmente e de ter um marco regulatoacuterio defasado no setor A presidecircncia brasileira passava a se posicionar de forma equidistante em relaccedilatildeo aos interesses de Washington e Pequim o que se estendia agrave poliacutetica adotada diante da guerra co-mercial entre as duas maiores economias Poucos casos ilustravam com tanta transparecircncia um dos mais importantes efeitos da transiccedilatildeo hegemocircnica em curso

Mouratildeo fora convencido pelo secretaacuterio-geral do Itamaraty Otaacutevio Brandelli quanto agrave adequa-ccedilatildeo de uma conduta flexiacutevel e pragmaacutetica Em face de uma guerra comercial dessa natureza o gover-no brasileiro deveria saber explorar as oportuni-dades Por exemplo como a administraccedilatildeo Trump taxou parcela das importaccedilotildees da China inicial-mente em torno de usd$ 250 bilhotildees os produtos envolvidos passaram a chegar mais caros no mer-cado norte-americano e eventualmente poderiam ser substituiacutedos por produtos brasileiros o que acrescentaria usd$ 5 bilhotildees ou mais nas nossas exportaccedilotildees A guerra comercial deveria assim ser tratada com paciecircncia

O limite da visatildeo do vice-presidente brasi-leiro mdash que dava vazatildeo agraves pressotildees do agrone-goacutecio mdash era evidente Temas como transferecircncia de tecnologia e cooperaccedilatildeo industrial natildeo foram abordados Indagado sobre o fato de o conflito de interesses entre Estados Unidos e China natildeo ser apenas comercial mas tambeacutem tecnoloacutegico a res-posta foi igualmente simplista ldquoVocecirc olha o 5g As quatro empresas que detecircm a tecnologia satildeo duas chinesas e duas finlandesas Cadecirc a americanardquo (Arauacutejo et al 2019 sp) Ou seja o governo bra-sileiro mdash afastadas as desconfianccedilas iniciais em relaccedilatildeo agrave China mdash voltava a se ocupar dos temas tratados em governos anteriores exportaccedilotildees de alimentos e mineacuterios investimentos diretos com geraccedilatildeo de empregos acordos de cooperaccedilatildeo em tecnologia estes uacuteltimos sem viacutenculo claro com qualquer projeto mais amplo de industrializaccedilatildeo e desenvolvimento tecnoloacutegico

O governo Bolsonaro aparentemente estava satisfeito com o status internacional do paiacutes sem atentar minimamente ao processo de desindus-trializaccedilatildeo das uacuteltimas deacutecadas (Benaion 2006

Cano 2012 Oliveira 2018) Para Chang (2018) nos anos 1980 e 1990 o Brasil conheceu o ponto mais alto da industrializaccedilatildeo que atingiu 35 da produccedilatildeo nacional No final de 2017 representa-va apenas 12 e a tendecircncia era de decliacutenio O Brasil tem nesse sentido voltado no tempo Em-presaacuterios de Satildeo Paulo natildeo parecem estar preocu-pados com o decliacutenio da induacutestria manufatureira No longo prazo essa poliacutetica eacute prejudicial para o paiacutes No governo Dilma Rousseff vaacuterios subsiacutedios foram canalizados para a induacutestria mas as altas taxas de juros natildeo favoreceram mudanccedilas efetivas (Oliveira 2018)

O processo de desindustrializaccedilatildeo as poliacuteticas econocircmicas e o conformismo com a condiccedilatildeo ldquosu-bordinadardquo do paiacutes instruiacuteram em outro momento o uso do conceito de ldquoperiferia proacutesperardquo para o crescimento econocircmico de meados da deacutecada de 2000 sustentado pela demanda chinesa (Doratioto e Vidigal 2015) As taxas de crescimento da China beneficiaram as exportaccedilotildees latino-americanas de produtos agriacutecolas mineacuterios petroacuteleo e produtos manufaturados de baixo valor agregado Conco-rreram por sua vez para reforccedilar o caraacuteter liberal perifeacuterico de economias como a brasileira (Filguei-ras e Gonccedilalves 2007)

Na poliacutetica externa era clara a intenccedilatildeo de re-duzir o peso do Itamaraty nas decisotildees relativas aos assuntos de seguranccedila e defesa fronteiras narcotraacutefico e outros delitos internacionais e imi-graccedilatildeo como no tema da crise na Venezuela e em outros assuntos sensiacuteveis na aacuterea da poliacutetica in-ternacional Quanto ao chanceler Ernesto Arauacutejo que havia impressionado negativamente a maioria dos estudiosos de poliacutetica externa e internacional em razatildeo de certo ldquomessianismordquo na defesa do Oci-dente e da administraccedilatildeo Trump passou a atuar de modo mais comedido e profissional como na ocasiatildeo da assinatura do acordo Mercosul-Uniatildeo Europeia no dia 28 de junho de 2019

Bolsonaro no final de reuniatildeo do g-20 em Osaka (28 e 29 de junho de 2019) se disse satis-feito com os resultados do encontro do brics e do proacuteprio g-20 aleacutem de destacar a importacircncia da conclusatildeo do acordo Mercosul-Uniatildeo Europeia Na reuniatildeo dos brics Bolsonaro desistiu de pro-por aos demais liacutederes o apoio a uma mudanccedila

22

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

de governo na Venezuela Foi tambeacutem a oportu-nidade para reconhecer o interesse brasileiro em manter bom diaacutelogo com o principal parceiro co-mercial do paiacutes

Os ajustes percebidos na conduccedilatildeo da poliacutetica externa natildeo significaram uma mudanccedila de rumo do governo Bolsonaro no que tange agrave priorizaccedilatildeo dos laccedilos com os Estados Unidos a Europa e o Ja-patildeo parceiros preferenciais nas deacutecadas de 1960 1970 e sob o governo de Cardoso Nesse sentido as relaccedilotildees com a China a despeito do discurso em prol de uma parceria estrateacutegica ou coisa que o valha tecircm sido tratadas de forma setorial mdash co-meacutercio investimentos cooperaccedilatildeo tecnoloacutegica mdash e descompromissada com qualquer planejamento Os laccedilos histoacutericos com os Estados Unidos em to-das as suas dimensotildees favorecem a acomodaccedilatildeo e a recusa em tratar seriamente a hipoacutetese da ldquoopccedilatildeo chinesardquo o que natildeo necessariamente eacute negativo

ConclusatildeoAs transiccedilotildees hegemocircnicas no marco da econo-mia poliacutetica mundial tecircm constituiacutedo um pro-blema externo e interno para os paiacuteses inseridos em uma relaccedilatildeo centro-periferia A ascensatildeo da China e sua presenccedila econocircmica na Ameacuterica do Sul tecircm levado alguns paiacuteses a incluiacute-la em seus caacutelculos estrateacutegicos A Argentina o Brasil e o Chile podem desempenhar um papel crucial nesse processo tendo em vista a relevacircncia geopoliacutetica e econocircmica do Cone Sul pois a polarizaccedilatildeo Es-tados Unidos-China cria janelas de oportunidade e gera maior permissibilidade no sistema interna-cional como diria Heacutelio Jaguaribe

Destacamos a identificaccedilatildeo das grandes linhas de continuidade e de ruptura que tecircm implicado o discurso do presidente Bolsonaro e dos principais colaboradores em relaccedilatildeo agrave tradiccedilatildeo da poliacutetica externa brasileira O contraponto inicial com a poliacutetica e o pensamento de Rio Branco com des-taque para as boas e privilegiadas relaccedilotildees com os Estados Unidos permitiu identificar periacuteodos de maior proximidade ou de distanciamento de Was-hington Bolsonaro estaacute proacuteximo dessa tradiccedilatildeo a de ver o Brasil como soacutecio proacuteximo dos Estados Unidos mas se afasta de praacuteticas autonomistas

como a da poliacutetica externa independente e a do pragmatismo responsaacutevel Praacuteticas essas que per-mitiriam avaliar de modo desassombrado as re-laccedilotildees com a China

Tanto a ascensatildeo da China como a posiccedilatildeo que ocupa Pequim na estrutura econocircmica brasileira planteiam desafios equivalentes ao que o Brasil ex-perimentou no comeccedilo do seacuteculo xx Agrave diferenccedila da visatildeo de Rio Branco durante a transiccedilatildeo da he-gemonia natildeo parece haver no governo de Bolsona-ro um olhar seguro sobre os impactos da transiccedilatildeo hegemocircnica nem do papel que o Brasil deveria des-empenhar na estrateacutegia global da China

Um terceiro tema de preocupaccedilatildeo eacute o das re-laccedilotildees com a Argentina A visita subsequente a Buenos Aires a assinatura do acordo para negociar um tratado de livre-comeacutercio entre o Mercosul e a Uniatildeo Europeia e o anuacutencio de que ambos os go-vernos iniciariam gestotildees conjuntas para a assina-tura de acordos de livre-comeacutercio com os Estados Unidos restabeleceram o bom diaacutelogo entre Bra-siacutelia e Buenos Aires ainda que persistam duacutevidas no governo Macri (Landim 2019) As incertezas se estenderam ao governo eleito em dezembro de 2019 em decorrecircncia de criacuteticas de natureza ideo-loacutegicas realizadas tanto por Bolsonaro quanto por Alberto Fernaacutendez Entretanto o diaacutelogo bilateral tende a se normalizar sem maiores pretensotildees no plano regional

O viacutenculo estrateacutegico entre Brasiacutelia e Buenos Aires tem sido chave para sustentar um espiacuterito de cooperaccedilatildeo e integraccedilatildeo na Ameacuterica do Sul que se baseia na credibilidade das accedilotildees e na boa feacute de uns e outros governos Desde 1985 o Brasil e a Argentina desenvolveram o que Cervo (2008) denominou de ldquorelaccedilotildees em eixordquo que se estabe-lecem ldquoquando precisamente a imagem um do outro corresponde agrave do parceiro que consegue estabelecer uma uniatildeo co-responsaacutevel [] Em outros termos o eixo comporta uma vertente exoacute-gena que o transcende porque abarca as relaccedilotildees regionais mesmo que coletivas []rdquo (pp 211-212) Eacute esse tipo de relaccedilotildees e sua projeccedilatildeo no Cone Sul que foi potencialmente afetada pelas primei-ras declaraccedilotildees e accedilotildees do governo Bolsonaro Ao promover um alinhamento com os Estados Uni-dos mdash ou ldquosem recompensardquo como diria Gerson

23Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Moura mdash reproduz o que o Brasil e outros paiacuteses latino-americanos adotaram como ldquoestrateacutegiardquo na deacutecada de 1990 sem os resultados esperados E ao abandonar a tradiccedilatildeo iniciada em 1961 e adaptada agraves diferentes conjunturas que se sucederam abriu matildeo de exercer o poder de barganha do paiacutes para fazer concessotildees sem contrapartidas equivalentes Nas circunstacircncias atuais diante da transiccedilatildeo he-gemocircnica Estados Unidos-China considerando os interesses do Brasil na Ameacuterica do Sul a equidis-tacircncia talvez seja o melhor caminho Diaacutelogo es-treito com Washington e autonomia em temas de interesse do paiacutes foram as opccedilotildees de Rio Branco

Referecircncias Arauacutejo E (2017) Trump e o Ocidente Cadernos de Poliacutetica

Exterior iii(6) 323-357

Arauacutejo E (2019 2 de janeiro) Discurso do minis-tro Ernesto Arauacutejo durante cerimocircnia de posse no Ministeacuterio das Relaccedilotildees Exteriores Brasiacutelia Re-cuperado de httpwwwitamaratygovbrpt-BRdiscursos-artigos-e-entrevistas-categoriaminis-tro-das-relacoes-exteriores-discursos19907-dis-curso-do-ministro-ernesto-araujo-durante-cerimo-nia-de-posse-no-ministerio-das-relacoes-exteriores-brasilia-2-de-janeiro-de-2019

Arauacutejo C Rittner D e Murakawa F (2019 30 de abril) Brasil descarta vetar presenccedila da Huawei em 5g avisa Mouratildeo (entrevista com o vice-presidente Hamilton Mouratildeo) g1 Recuperado de httpsvalorglobocombrasilnoticia20190607brasil-descarta-vetar-pre-senca-da-huawei-em-5g-avisa-mouraoghtml

Arrighi G (2008) Adam Smith em Pequim origens e fun-damentos do seacuteculo xxi Satildeo Paulo Brasil Boitempo

Bandeira L A M (2004) As relaccedilotildees perigosas Brasil-Es-tados Unidos Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Bra-sileira

Bandeira L A M (2003) Brasil Argentina e Estados Uni-dos da Triacuteplice Alianccedila ao Mercosul (1870-2003) Rio de Janeiro Editora Revan

Becard D (2017) China y Brasil iquestmodelo de relaciones Sur-Sur Em E Pastrana B e H Gehring (eds) La proyeccioacuten de China en Ameacuterica Latina y el Caribe (pp 387-408) Bogotaacute Colocircmbia Editorial Javeriana

Becard D Lessa A e Silveira L (2020) One step closer The politics and the economics of chinarsquos strategy in Brazil and the case of the electric power sector Em R Bernal-Meza R e X Li (eds) China-Latin America

relations in the 21st Century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 55-81) Nova York Estados Unidos Palgrave Macmillan

Becard D Barros-Platiau A e Lessa A (2019) Brazil in the brics after tem years Past present and near futu-re perspectives Em X Li (ed) The international po-litical economy of the brics (pp 135-149) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Beckerman M e Moncaut N (2016) Las relaciones en-tre China y Ameacuterica Latina iquestHacia la desestructura-cioacuten de los sistemas productivos de la regioacuten Em C Moneta e S Cesariacuten (eds) La tentacioacuten pragmaacutetica China-ArgentinaAmeacuterica Latina lo actual lo proacuteximo y lo distante (pp 185-202) Saacuteenz Pentildea Argentina Uni-versidad Nacional de Tres de Febrero

Benaion N (2006) Subordinaccedilatildeo reiterada imperialismo e desenvolvimento no Brasil Manaus Brasil Editora da Universidade Federal do Amazonas

Bernal-Meza R (2019a) Brazil as an emerging power The impact of international and internal deteriorational effect on the brics Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 118-134) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Bernal-Meza R (2019b) Brasil ascenso declinacioacuten y nuevos desafiacuteos de una potencia emergente (2003-2018) Revista Izquierdas 49(2020) 516-540

Bernal-Meza R (2015) Pensamiento chileno en la poliacuteti-ca exterior y en las teoriacuteas de relaciones internaciona-les Em M Artaza e C Ross (eds) La poliacutetica exterior de Chile 1990-2009 (pp 21-47) Santiago Chile ril Editores

Bernal-Meza R (2014) La heterogeneidad de la imagen de China en la poliacutetica exterior latinoamericana Pers-pectivas para la concertacioacuten de poliacuteticas Comentario Internacional 14 113-134

Bernal-Meza R (2013) Ameacuterica Latina en el mundo el pensamiento latino-americano y la teoriacutea de relaciones internaciones Buenos Aires Argentina Grupo Editor Latinoamericano

Bernal-Meza R (2002) A poliacutetica exterior do Brasil 1990-2002 Revista Brasileira de Poliacutetica Internacional 45(1) 36-71

Bernal-Meza R e Bizzozero L (eds) (2014) La poliacutetica internacional de Brasil de la regioacuten al mundo Monte-videacuteu Uruguai Ediciones Cruz del Sur

Bernal-Meza R e Li X (eds) (2020) China-Latin Ameri-ca relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges Nova York Estados Uni-dos Palgrave Macmillan

24

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

Bolsonaro J (2018) O caminho da prosperidade pro-posta de Plano de Governo Recuperado de httpdivulgacandcontastsejusbrcandidaturasof i-cial2018BRBR2022802018280000614517propos-ta_1534284632231pdf

Bricentildeo Ruiz J e Simonoff A (orgs) (2015) Integracioacuten y cooperacioacuten regional en Ameacuterica Latina una relectura a partir de la teoriacutea de la autonomiacutea Buenos Aires Ar-gentina Editorial Biblos

Bueno C (2003) Poliacutetica externa da Primeira Repuacuteblica os anos de apogeu (1902-1918) Satildeo Paulo Brasil Paz e Terra

Cano W (2012) A desindustrializaccedilatildeo no Brasil (texto para discussatildeo 200) Campinas Brasil Instituto de Economia da Unicamp

Cervo A L (2019 28 de novembro) Governo Bolso-naro natildeo traraacute ruptura agrave poliacutetica externa Exame Recuperado de httpsexameabrilcombrmundogoverno-bolsonaro-nao-trara-ruptura-a-politica-ex-terna-avalia-amado-cervo

Cervo A (2008) Inserccedilatildeo internacional formaccedilatildeo dos conceitos brasileiros Satildeo Paulo Brasil Saraiva

Cervo A (2002) Relaccedilotildees Internacionais do Brasil a era Cardoso Revista Brasileira de Poliacutetica Internacional 45(1) 5-35

Cervo A e Bueno C (2015) Histoacuteria da poliacutetica exterior do Brasil Brasiacutelia Brasil Editora da Universidade de Brasiacutelia

Chang H H (2018 15 jan) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da histoacuteria da economia El Paiacutes Recuperado de ht-tpsbrasilelpaiscombrasil20180105econo-mia1515177346_780498html

Cronologia relembre os fatos mais importantes da cri-se venezuelana g1 httpsg1globocommundonoticia20190430cronologia-relembre-os-fa-tos-mais-importantes-na-crise-venezuelanaghtml

Doratioto F e Vidigal C (2015) Histoacuteria das Relaccedilotildees In-ternacionais do Brasil Satildeo Paulo Brasil Editora Saraiva

Dussel Peters E (coord) (2016) La nueva relacioacuten comer-cial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestInte-gracioacuten o desintegracioacuten regional Meacutexico-df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universidades de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico

Filgueiras L e Gonccedilalves R (2007) A economia poliacutetica do governo Lula Rio de Janeiro Brasil Contraponto

Fiori J(1999) Estado e moedas no desenvolvimento das naccedilotildees Petroacutepolis Brasil Vozes

Flisfisch A (2011) La Poliacutetica exterior chilena y Ameacuterica del Sur Estudios Internacionales (168) 115-141

Fonseca Jr G (2012) Rio Branco diante do Monroiacutesmo e do Pan-Americanismo anotaccedilotildees Em M Pereira e M Gomes (orgs) Baratildeo do Rio Branco 100 anos de memoacuteria (pp 565-602) Brasiacutelia Brasil Fundaccedilatildeo Alexandre de Gusmatildeo

Franccedila T (2007) Self made nation Domiacutecio da Gama e o pragmatismo do bom senso (tese de doutorado) Brasiacute-lia Brasil Universidade de Brasiacutelia

Guimaratildees S (2018) A poliacutetica exterior e a posiccedilatildeo do Brasil no mundo Recuperado de httpswwwnodalam201812a-politica-exterior-e-a-posicao-do-brasil-no-mundo-por-samuel-pinheiro-guimaraes-2

Gullo M (2018) Relaciones internacionales una teoriacutea criacutetica desde la periferia latinoamericana Buenos Ai-res Argentina Editorial Biblos

Gullo M (2014) A subordinaccedilatildeo fundante breve histoacuteria da construccedilatildeo do poder pelas naccedilotildees Florianoacutepolis Brasil Insular

Hiratuka C (2016) Impactos de China sobre el proceso de integracioacuten regional de Mercosur Em E Dussel Peters (coord) La nueva relacioacuten comercial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestIntegracioacuten o desintegracioacuten (pp 195-243) Meacutexico df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universida-des de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico Recuperado de httpswww3ecouni-campbrNeitimagesdestaque2016_La_nueva_rela-cion_comercial_ALC_Chinapdf

Hobsbawm E (1994) Extremes The Short Twentieth Cen-tury 1914-1991 Londres Inglaterra Michael Joseph Ltd

Kennedy P (1987) The rise and fall of the great powers Economic change and military conflict from 1500 to 2000 Nova York Estados Unidos Vintage Books

Keohane R e Nye J (1977) Power and interdependence World politics in transition Boston Estados Unidos Little Brown and Company

Lafer C (2002) JK e o programa de metas (1956-1961) Rio de Janeiro Brasil Fundaccedilatildeo Getuacutelio Vargas

Landim R (2019 6 de setembro) Brasil e Argentina adiam em 9 anos livre-comeacutercio de autos Folha de S Paulo Recuperado de httpswww1folhauolcombrmerca-do201909brasil-e-argentina-adiam-em-9-anos-li-vre-comercio-de-autosshtml

Lessa A e Oliveira H A (orgs) (2013) Parcerias estra-teacutegicas do Brasil v 1 os significados e as experiecircncias tradicionais Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

25Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Li X (2020) Revisiting China-Latin America economic relations An unintended consequence of different industrialization strategies Em R Bernal-Meza e X Li (eds) China-Latin America relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 225-251) Nova York Estados UnidosLondres Inglaterra Palgrave Macmillan

Li X (2019a) Chinarsquos dual position in the capitalist world order A dual complexity of hegemony and counter-he-gemony Em Li X (ed) The international political eco-nomy of the brics (pp 1-17) Abindon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2019b) The international political economy of the brics Nova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2014) The brics and beyond The international political economy of the emergence of a new world or-der Farnham Reino Unido Ashgate

Li X (2012) China y el orden mundial capitalista el nexo de la transformacioacuten interna de China y su impacto externo Em R Bernal-Meza e S Quintanar (eds) Regionalismo y Orden Mundial Surameacuterica Europa China (pp 29-53) Buenos Aires Argentina Nuevoha-cerUniversidad Nacional del Centro de la Provincia de Buenos Aires

Li X e Farah A (eds) (2013) China-Africa relations in an era of great transformations Farnham Reino Unido Ashgate

Lins A (1996) Rio Branco (Biografia) Satildeo Paulo Brasil Editora Alfa Omega

Mandelbaum M (2010) The frugal superpower Americarsquos global leadership in a cash-strapped era Nova York Es-tados Unidos Public Affairs

Meneses E (1988) Coping with decline Chilean fo-reign policy during the twentieth century 1902-1972 Oxford Reino Unido University of OxfordBodleian Library

Nabuco J (1949) Obras completas v xii Rio de Janeiro Brasil Instituto Progresso Editorial sa

Nasr V (2014) The dispensable nation American foreign policy in retreat Nova York Estados Unidos Anchor and Doubleday

Oliveira R (2018 15 de janeiro) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da his-toacuteria da economia (entrevista com Ha-Joon Chang) El Paiacutes Recuperado de httpsbrasilelpaiscombra-sil20180105economia1515177346_780498html

Pearson F e Rochester M (2007) Relaciones internacio-nales situacioacuten global en el siglo xxi Meacutexico-df Meacute-xico Mc Graw Hill

Pecequilo C (2012) As relaccedilotildees Brasil-Estados Unidos Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

Polanyi K (1957) The great transformation the political and economic origins of our time Boston Estados Uni-dos Beacon Press

Rodrigues J Seitenfus R e Rodrigues L (orgs) (1995) Uma histoacuteria diplomaacutetica do Brasil (1531-1945) Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Brasileira

Seitenfus R (2003) O Brasil vai agrave guerra o processo de envolvimento brasileiro na Segunda Guerra Mundial 3a ed Satildeo Paulo Brasil Barueri

Spector M (2019 25 abril) Eacute hora de construir uma po-liacutetica externa poacutes-Bolsonaro Folha de S Paulo Re-cuperado de httpswww1folhauolcombr colunasmatiasspektor201904e-hora-de-construir-a-politi-ca-externa-pos-bolsonaroshtml

Stunkel O Com Bolsonaro a poliacutetica externa se tor-nou uma caixa de surpresas (entrevista agrave Deutsche Welle Brasil) Recuperado de httpswwwterracombrnoticiasbrasil com-bolsonaro-politica-ex-terna-se-tornou-uma-caixa-de-surpresas 7f6f-814287c0240a2f3f93ad aa39af65jpo4zbzghtml

Tarzi S (2007) Neorealism neoliberalism and the inter-national system International Studies (41) 115-128

Vadell J e Ramos L (2019) The role of declining Brazil and ascending China in the brics initiative Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 75-94) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Viana F L (1959) A vida do Baratildeo do Rio Branco Rio de Janeiro Brasil Joseacute Olympio

Vidigal C (2009) Relaccedilotildees Brasil-Argentina o primeiro ensaio Curitiba Brasil Juruaacute

Page 10: Bolsonaro versus Rio Branco: transição hegemônica, América ...2011/02/15  · Contra-hegemonia e ordem capitalista mundial por meio do brics, brics-plus e de outros agru-pamentos,

20

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

A crise na Venezuela e os interesses econocircmi-cos do agronegoacutecio no mercado chinecircs levariam o governo a modificar em parte a retoacuterica inicial o que indicaria estar em curso ajustes e reorientaccedilotildees na aacuterea No dia 23 de fevereiro o autoproclamado presidente interino da Venezuela Juan Guaidoacute liderou um esforccedilo de tentar fazer com que ca-minhotildees com alimentos adentrassem a Venezue-la como forma de pressionar o governo Maduro Em Pacaraima o chanceler brasileiro explicava se tratar de um ato humanitaacuterio altruiacutesta ldquoum mo-mento de criaccedilatildeo de uma nova realidade na Ve-nezuelardquo Quanto agrave possibilidade de intervenccedilatildeo Arauacutejo considerava que ldquonatildeo haacute menor expectativa de conflito mas claro que o Exeacutercito estaacute prepa-rado caso isso possa se materializarrdquo (Cronologia 2019 sp)

Na visatildeo do vice-presidente Mouratildeo que natildeo ocultava a influecircncia estadunidense a crise vene-zuelana soacute seria superada com a neutralizaccedilatildeo de agentes externos em especial a presenccedila cubana Se essa situaccedilatildeo continuasse a Venezuela correria o risco de se tornar um ldquonatildeo Estadordquo (Arauacutejo Ritt-ner e Murakawa 2019) Mouratildeo ao mesmo tempo que natildeo contemporizava com o governo Maduro indicava natildeo estar de acordo in totum com o alin-hamento com Washington nessa questatildeo ao colo-car em duacutevida a legitimidade de Juan Guaidoacute

Em relaccedilatildeo agrave China a visita de Mouratildeo e seu encontro com Xi Jiping marcaram a superaccedilatildeo de desconfianccedilas manifestadas durante a campan-ha e os meses iniciais de governo Para Mouratildeo a prioridade era restabelecer o funcionamento da Comissatildeo Sino-Brasileira de Alto Niacutevel de Concer-taccedilatildeo e Cooperaccedilatildeo (Cosban) e reorganizar sua es-trutura para que voltasse a ser um mecanismo de alto niacutevel Em sua percepccedilatildeo a China tem sido um parceiro confiaacutevel do Brasil desde 2009 ano em que se tornou seu maior parceiro comercial e no qual ocorreu a i Cuacutepula do brics Nesses dez anos de parceria estrateacutegica o fluxo comercial bilateral alcanccedilou usd$ 100 bilhotildees embora o Brasil expor-tasse muito mais produto in natura que produtos com valor agregado uma das reclamaccedilotildees que te-ria apresentado ao primeiro mandataacuterio chinecircs

A China vinha se transformando em um enor-me desafio regional e internacional para o Brasil

Em vinte anos a China transitou de ser vista como ldquoa oportunidaderdquo para ser percebida como desafio (Bernal-Meza 2014) de potencial grande merca-do para as importaccedilotildees e a exportaccedilatildeo de capitais a fazer de seus soacutecios latino-americanos periferia primaacuterio-exportadora A evoluccedilatildeo das relaccedilotildees econocircmicas entre a China e o Brasil de maneira bilateral e no acircmbito das relaccedilotildees no brics estaria sinalizando uma tendecircncia estrutural da configu-raccedilatildeo de um padratildeo de relaccedilotildees centro-periferia (Beckerman e Moncaut 2016 Becard 2017 Bernal- Meza 2019a 2019b)

O ingresso da China na economia poliacutetica da Ameacuterica do Sul deslocou o Brasil do lugar prepon-derante que ocupava dentro do bloco Mercosul e no contexto regional A respeito dos processos de integraccedilatildeo latino-americanos mdash em particu-lar do Mercosul mdash a China se transformou em um fator de profundo desequiliacutebrio porque foi se transformando no principal e segundo soacutecio mais importante da inserccedilatildeo econocircmica internacional da Ameacuterica do Sul (Hiratuka 2016 Dussel 2016) Isso afetou igualmente a posiccedilatildeo do Brasil como a principal economia para seus vizinhos No plano interno a presenccedila econocircmica chinesa parece es-tar condicionando a eventual autonomia do des-envolvimento industrial e tecnoloacutegico brasileiro ao exercer um crescente controle sobre a estrutura energeacutetica no setor eleacutetrico (Becard Lessa e Silveira 2020 Becard 2017)

A presenccedila chinesa na Ameacuterica Latina con-correu para enfraquecer a influecircncia brasileira sobre a integraccedilatildeo regional Entre os interesses brasileiros figurava a ideia de natildeo seguir a poliacuteti-ca adotada por Washington em relaccedilatildeo a algumas empresas chinesas em particular a gigante de te-lecomunicaccedilotildees Huawei Nesse sentido Mouratildeo que foi ldquoalertadordquo pelo governo norte-americano sobre os riscos das operaccedilotildees da empresa chi-nesa teria sugerido a Xi Jinping a criaccedilatildeo de um ambiente de confianccedila quanto agrave companhia ldquode modo que nenhum paiacutes que vaacute receber a empresa e a tecnologia que vocecircs vatildeo instalar e fique preocu-pado com que todos dados que estaratildeo em seu po-der pertenceratildeo tambeacutem ao governo [chinecircs] Esta eacute a discussatildeordquo (Arauacutejo et al 2019 sp) A expecta-tiva de abertura brasileira agrave tecnologia 5g chinesa

21Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

se vinculava ao fato de o paiacutes ainda natildeo estar inte-grado digitalmente e de ter um marco regulatoacuterio defasado no setor A presidecircncia brasileira passava a se posicionar de forma equidistante em relaccedilatildeo aos interesses de Washington e Pequim o que se estendia agrave poliacutetica adotada diante da guerra co-mercial entre as duas maiores economias Poucos casos ilustravam com tanta transparecircncia um dos mais importantes efeitos da transiccedilatildeo hegemocircnica em curso

Mouratildeo fora convencido pelo secretaacuterio-geral do Itamaraty Otaacutevio Brandelli quanto agrave adequa-ccedilatildeo de uma conduta flexiacutevel e pragmaacutetica Em face de uma guerra comercial dessa natureza o gover-no brasileiro deveria saber explorar as oportuni-dades Por exemplo como a administraccedilatildeo Trump taxou parcela das importaccedilotildees da China inicial-mente em torno de usd$ 250 bilhotildees os produtos envolvidos passaram a chegar mais caros no mer-cado norte-americano e eventualmente poderiam ser substituiacutedos por produtos brasileiros o que acrescentaria usd$ 5 bilhotildees ou mais nas nossas exportaccedilotildees A guerra comercial deveria assim ser tratada com paciecircncia

O limite da visatildeo do vice-presidente brasi-leiro mdash que dava vazatildeo agraves pressotildees do agrone-goacutecio mdash era evidente Temas como transferecircncia de tecnologia e cooperaccedilatildeo industrial natildeo foram abordados Indagado sobre o fato de o conflito de interesses entre Estados Unidos e China natildeo ser apenas comercial mas tambeacutem tecnoloacutegico a res-posta foi igualmente simplista ldquoVocecirc olha o 5g As quatro empresas que detecircm a tecnologia satildeo duas chinesas e duas finlandesas Cadecirc a americanardquo (Arauacutejo et al 2019 sp) Ou seja o governo bra-sileiro mdash afastadas as desconfianccedilas iniciais em relaccedilatildeo agrave China mdash voltava a se ocupar dos temas tratados em governos anteriores exportaccedilotildees de alimentos e mineacuterios investimentos diretos com geraccedilatildeo de empregos acordos de cooperaccedilatildeo em tecnologia estes uacuteltimos sem viacutenculo claro com qualquer projeto mais amplo de industrializaccedilatildeo e desenvolvimento tecnoloacutegico

O governo Bolsonaro aparentemente estava satisfeito com o status internacional do paiacutes sem atentar minimamente ao processo de desindus-trializaccedilatildeo das uacuteltimas deacutecadas (Benaion 2006

Cano 2012 Oliveira 2018) Para Chang (2018) nos anos 1980 e 1990 o Brasil conheceu o ponto mais alto da industrializaccedilatildeo que atingiu 35 da produccedilatildeo nacional No final de 2017 representa-va apenas 12 e a tendecircncia era de decliacutenio O Brasil tem nesse sentido voltado no tempo Em-presaacuterios de Satildeo Paulo natildeo parecem estar preocu-pados com o decliacutenio da induacutestria manufatureira No longo prazo essa poliacutetica eacute prejudicial para o paiacutes No governo Dilma Rousseff vaacuterios subsiacutedios foram canalizados para a induacutestria mas as altas taxas de juros natildeo favoreceram mudanccedilas efetivas (Oliveira 2018)

O processo de desindustrializaccedilatildeo as poliacuteticas econocircmicas e o conformismo com a condiccedilatildeo ldquosu-bordinadardquo do paiacutes instruiacuteram em outro momento o uso do conceito de ldquoperiferia proacutesperardquo para o crescimento econocircmico de meados da deacutecada de 2000 sustentado pela demanda chinesa (Doratioto e Vidigal 2015) As taxas de crescimento da China beneficiaram as exportaccedilotildees latino-americanas de produtos agriacutecolas mineacuterios petroacuteleo e produtos manufaturados de baixo valor agregado Conco-rreram por sua vez para reforccedilar o caraacuteter liberal perifeacuterico de economias como a brasileira (Filguei-ras e Gonccedilalves 2007)

Na poliacutetica externa era clara a intenccedilatildeo de re-duzir o peso do Itamaraty nas decisotildees relativas aos assuntos de seguranccedila e defesa fronteiras narcotraacutefico e outros delitos internacionais e imi-graccedilatildeo como no tema da crise na Venezuela e em outros assuntos sensiacuteveis na aacuterea da poliacutetica in-ternacional Quanto ao chanceler Ernesto Arauacutejo que havia impressionado negativamente a maioria dos estudiosos de poliacutetica externa e internacional em razatildeo de certo ldquomessianismordquo na defesa do Oci-dente e da administraccedilatildeo Trump passou a atuar de modo mais comedido e profissional como na ocasiatildeo da assinatura do acordo Mercosul-Uniatildeo Europeia no dia 28 de junho de 2019

Bolsonaro no final de reuniatildeo do g-20 em Osaka (28 e 29 de junho de 2019) se disse satis-feito com os resultados do encontro do brics e do proacuteprio g-20 aleacutem de destacar a importacircncia da conclusatildeo do acordo Mercosul-Uniatildeo Europeia Na reuniatildeo dos brics Bolsonaro desistiu de pro-por aos demais liacutederes o apoio a uma mudanccedila

22

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

de governo na Venezuela Foi tambeacutem a oportu-nidade para reconhecer o interesse brasileiro em manter bom diaacutelogo com o principal parceiro co-mercial do paiacutes

Os ajustes percebidos na conduccedilatildeo da poliacutetica externa natildeo significaram uma mudanccedila de rumo do governo Bolsonaro no que tange agrave priorizaccedilatildeo dos laccedilos com os Estados Unidos a Europa e o Ja-patildeo parceiros preferenciais nas deacutecadas de 1960 1970 e sob o governo de Cardoso Nesse sentido as relaccedilotildees com a China a despeito do discurso em prol de uma parceria estrateacutegica ou coisa que o valha tecircm sido tratadas de forma setorial mdash co-meacutercio investimentos cooperaccedilatildeo tecnoloacutegica mdash e descompromissada com qualquer planejamento Os laccedilos histoacutericos com os Estados Unidos em to-das as suas dimensotildees favorecem a acomodaccedilatildeo e a recusa em tratar seriamente a hipoacutetese da ldquoopccedilatildeo chinesardquo o que natildeo necessariamente eacute negativo

ConclusatildeoAs transiccedilotildees hegemocircnicas no marco da econo-mia poliacutetica mundial tecircm constituiacutedo um pro-blema externo e interno para os paiacuteses inseridos em uma relaccedilatildeo centro-periferia A ascensatildeo da China e sua presenccedila econocircmica na Ameacuterica do Sul tecircm levado alguns paiacuteses a incluiacute-la em seus caacutelculos estrateacutegicos A Argentina o Brasil e o Chile podem desempenhar um papel crucial nesse processo tendo em vista a relevacircncia geopoliacutetica e econocircmica do Cone Sul pois a polarizaccedilatildeo Es-tados Unidos-China cria janelas de oportunidade e gera maior permissibilidade no sistema interna-cional como diria Heacutelio Jaguaribe

Destacamos a identificaccedilatildeo das grandes linhas de continuidade e de ruptura que tecircm implicado o discurso do presidente Bolsonaro e dos principais colaboradores em relaccedilatildeo agrave tradiccedilatildeo da poliacutetica externa brasileira O contraponto inicial com a poliacutetica e o pensamento de Rio Branco com des-taque para as boas e privilegiadas relaccedilotildees com os Estados Unidos permitiu identificar periacuteodos de maior proximidade ou de distanciamento de Was-hington Bolsonaro estaacute proacuteximo dessa tradiccedilatildeo a de ver o Brasil como soacutecio proacuteximo dos Estados Unidos mas se afasta de praacuteticas autonomistas

como a da poliacutetica externa independente e a do pragmatismo responsaacutevel Praacuteticas essas que per-mitiriam avaliar de modo desassombrado as re-laccedilotildees com a China

Tanto a ascensatildeo da China como a posiccedilatildeo que ocupa Pequim na estrutura econocircmica brasileira planteiam desafios equivalentes ao que o Brasil ex-perimentou no comeccedilo do seacuteculo xx Agrave diferenccedila da visatildeo de Rio Branco durante a transiccedilatildeo da he-gemonia natildeo parece haver no governo de Bolsona-ro um olhar seguro sobre os impactos da transiccedilatildeo hegemocircnica nem do papel que o Brasil deveria des-empenhar na estrateacutegia global da China

Um terceiro tema de preocupaccedilatildeo eacute o das re-laccedilotildees com a Argentina A visita subsequente a Buenos Aires a assinatura do acordo para negociar um tratado de livre-comeacutercio entre o Mercosul e a Uniatildeo Europeia e o anuacutencio de que ambos os go-vernos iniciariam gestotildees conjuntas para a assina-tura de acordos de livre-comeacutercio com os Estados Unidos restabeleceram o bom diaacutelogo entre Bra-siacutelia e Buenos Aires ainda que persistam duacutevidas no governo Macri (Landim 2019) As incertezas se estenderam ao governo eleito em dezembro de 2019 em decorrecircncia de criacuteticas de natureza ideo-loacutegicas realizadas tanto por Bolsonaro quanto por Alberto Fernaacutendez Entretanto o diaacutelogo bilateral tende a se normalizar sem maiores pretensotildees no plano regional

O viacutenculo estrateacutegico entre Brasiacutelia e Buenos Aires tem sido chave para sustentar um espiacuterito de cooperaccedilatildeo e integraccedilatildeo na Ameacuterica do Sul que se baseia na credibilidade das accedilotildees e na boa feacute de uns e outros governos Desde 1985 o Brasil e a Argentina desenvolveram o que Cervo (2008) denominou de ldquorelaccedilotildees em eixordquo que se estabe-lecem ldquoquando precisamente a imagem um do outro corresponde agrave do parceiro que consegue estabelecer uma uniatildeo co-responsaacutevel [] Em outros termos o eixo comporta uma vertente exoacute-gena que o transcende porque abarca as relaccedilotildees regionais mesmo que coletivas []rdquo (pp 211-212) Eacute esse tipo de relaccedilotildees e sua projeccedilatildeo no Cone Sul que foi potencialmente afetada pelas primei-ras declaraccedilotildees e accedilotildees do governo Bolsonaro Ao promover um alinhamento com os Estados Uni-dos mdash ou ldquosem recompensardquo como diria Gerson

23Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Moura mdash reproduz o que o Brasil e outros paiacuteses latino-americanos adotaram como ldquoestrateacutegiardquo na deacutecada de 1990 sem os resultados esperados E ao abandonar a tradiccedilatildeo iniciada em 1961 e adaptada agraves diferentes conjunturas que se sucederam abriu matildeo de exercer o poder de barganha do paiacutes para fazer concessotildees sem contrapartidas equivalentes Nas circunstacircncias atuais diante da transiccedilatildeo he-gemocircnica Estados Unidos-China considerando os interesses do Brasil na Ameacuterica do Sul a equidis-tacircncia talvez seja o melhor caminho Diaacutelogo es-treito com Washington e autonomia em temas de interesse do paiacutes foram as opccedilotildees de Rio Branco

Referecircncias Arauacutejo E (2017) Trump e o Ocidente Cadernos de Poliacutetica

Exterior iii(6) 323-357

Arauacutejo E (2019 2 de janeiro) Discurso do minis-tro Ernesto Arauacutejo durante cerimocircnia de posse no Ministeacuterio das Relaccedilotildees Exteriores Brasiacutelia Re-cuperado de httpwwwitamaratygovbrpt-BRdiscursos-artigos-e-entrevistas-categoriaminis-tro-das-relacoes-exteriores-discursos19907-dis-curso-do-ministro-ernesto-araujo-durante-cerimo-nia-de-posse-no-ministerio-das-relacoes-exteriores-brasilia-2-de-janeiro-de-2019

Arauacutejo C Rittner D e Murakawa F (2019 30 de abril) Brasil descarta vetar presenccedila da Huawei em 5g avisa Mouratildeo (entrevista com o vice-presidente Hamilton Mouratildeo) g1 Recuperado de httpsvalorglobocombrasilnoticia20190607brasil-descarta-vetar-pre-senca-da-huawei-em-5g-avisa-mouraoghtml

Arrighi G (2008) Adam Smith em Pequim origens e fun-damentos do seacuteculo xxi Satildeo Paulo Brasil Boitempo

Bandeira L A M (2004) As relaccedilotildees perigosas Brasil-Es-tados Unidos Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Bra-sileira

Bandeira L A M (2003) Brasil Argentina e Estados Uni-dos da Triacuteplice Alianccedila ao Mercosul (1870-2003) Rio de Janeiro Editora Revan

Becard D (2017) China y Brasil iquestmodelo de relaciones Sur-Sur Em E Pastrana B e H Gehring (eds) La proyeccioacuten de China en Ameacuterica Latina y el Caribe (pp 387-408) Bogotaacute Colocircmbia Editorial Javeriana

Becard D Lessa A e Silveira L (2020) One step closer The politics and the economics of chinarsquos strategy in Brazil and the case of the electric power sector Em R Bernal-Meza R e X Li (eds) China-Latin America

relations in the 21st Century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 55-81) Nova York Estados Unidos Palgrave Macmillan

Becard D Barros-Platiau A e Lessa A (2019) Brazil in the brics after tem years Past present and near futu-re perspectives Em X Li (ed) The international po-litical economy of the brics (pp 135-149) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Beckerman M e Moncaut N (2016) Las relaciones en-tre China y Ameacuterica Latina iquestHacia la desestructura-cioacuten de los sistemas productivos de la regioacuten Em C Moneta e S Cesariacuten (eds) La tentacioacuten pragmaacutetica China-ArgentinaAmeacuterica Latina lo actual lo proacuteximo y lo distante (pp 185-202) Saacuteenz Pentildea Argentina Uni-versidad Nacional de Tres de Febrero

Benaion N (2006) Subordinaccedilatildeo reiterada imperialismo e desenvolvimento no Brasil Manaus Brasil Editora da Universidade Federal do Amazonas

Bernal-Meza R (2019a) Brazil as an emerging power The impact of international and internal deteriorational effect on the brics Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 118-134) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Bernal-Meza R (2019b) Brasil ascenso declinacioacuten y nuevos desafiacuteos de una potencia emergente (2003-2018) Revista Izquierdas 49(2020) 516-540

Bernal-Meza R (2015) Pensamiento chileno en la poliacuteti-ca exterior y en las teoriacuteas de relaciones internaciona-les Em M Artaza e C Ross (eds) La poliacutetica exterior de Chile 1990-2009 (pp 21-47) Santiago Chile ril Editores

Bernal-Meza R (2014) La heterogeneidad de la imagen de China en la poliacutetica exterior latinoamericana Pers-pectivas para la concertacioacuten de poliacuteticas Comentario Internacional 14 113-134

Bernal-Meza R (2013) Ameacuterica Latina en el mundo el pensamiento latino-americano y la teoriacutea de relaciones internaciones Buenos Aires Argentina Grupo Editor Latinoamericano

Bernal-Meza R (2002) A poliacutetica exterior do Brasil 1990-2002 Revista Brasileira de Poliacutetica Internacional 45(1) 36-71

Bernal-Meza R e Bizzozero L (eds) (2014) La poliacutetica internacional de Brasil de la regioacuten al mundo Monte-videacuteu Uruguai Ediciones Cruz del Sur

Bernal-Meza R e Li X (eds) (2020) China-Latin Ameri-ca relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges Nova York Estados Uni-dos Palgrave Macmillan

24

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

Bolsonaro J (2018) O caminho da prosperidade pro-posta de Plano de Governo Recuperado de httpdivulgacandcontastsejusbrcandidaturasof i-cial2018BRBR2022802018280000614517propos-ta_1534284632231pdf

Bricentildeo Ruiz J e Simonoff A (orgs) (2015) Integracioacuten y cooperacioacuten regional en Ameacuterica Latina una relectura a partir de la teoriacutea de la autonomiacutea Buenos Aires Ar-gentina Editorial Biblos

Bueno C (2003) Poliacutetica externa da Primeira Repuacuteblica os anos de apogeu (1902-1918) Satildeo Paulo Brasil Paz e Terra

Cano W (2012) A desindustrializaccedilatildeo no Brasil (texto para discussatildeo 200) Campinas Brasil Instituto de Economia da Unicamp

Cervo A L (2019 28 de novembro) Governo Bolso-naro natildeo traraacute ruptura agrave poliacutetica externa Exame Recuperado de httpsexameabrilcombrmundogoverno-bolsonaro-nao-trara-ruptura-a-politica-ex-terna-avalia-amado-cervo

Cervo A (2008) Inserccedilatildeo internacional formaccedilatildeo dos conceitos brasileiros Satildeo Paulo Brasil Saraiva

Cervo A (2002) Relaccedilotildees Internacionais do Brasil a era Cardoso Revista Brasileira de Poliacutetica Internacional 45(1) 5-35

Cervo A e Bueno C (2015) Histoacuteria da poliacutetica exterior do Brasil Brasiacutelia Brasil Editora da Universidade de Brasiacutelia

Chang H H (2018 15 jan) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da histoacuteria da economia El Paiacutes Recuperado de ht-tpsbrasilelpaiscombrasil20180105econo-mia1515177346_780498html

Cronologia relembre os fatos mais importantes da cri-se venezuelana g1 httpsg1globocommundonoticia20190430cronologia-relembre-os-fa-tos-mais-importantes-na-crise-venezuelanaghtml

Doratioto F e Vidigal C (2015) Histoacuteria das Relaccedilotildees In-ternacionais do Brasil Satildeo Paulo Brasil Editora Saraiva

Dussel Peters E (coord) (2016) La nueva relacioacuten comer-cial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestInte-gracioacuten o desintegracioacuten regional Meacutexico-df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universidades de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico

Filgueiras L e Gonccedilalves R (2007) A economia poliacutetica do governo Lula Rio de Janeiro Brasil Contraponto

Fiori J(1999) Estado e moedas no desenvolvimento das naccedilotildees Petroacutepolis Brasil Vozes

Flisfisch A (2011) La Poliacutetica exterior chilena y Ameacuterica del Sur Estudios Internacionales (168) 115-141

Fonseca Jr G (2012) Rio Branco diante do Monroiacutesmo e do Pan-Americanismo anotaccedilotildees Em M Pereira e M Gomes (orgs) Baratildeo do Rio Branco 100 anos de memoacuteria (pp 565-602) Brasiacutelia Brasil Fundaccedilatildeo Alexandre de Gusmatildeo

Franccedila T (2007) Self made nation Domiacutecio da Gama e o pragmatismo do bom senso (tese de doutorado) Brasiacute-lia Brasil Universidade de Brasiacutelia

Guimaratildees S (2018) A poliacutetica exterior e a posiccedilatildeo do Brasil no mundo Recuperado de httpswwwnodalam201812a-politica-exterior-e-a-posicao-do-brasil-no-mundo-por-samuel-pinheiro-guimaraes-2

Gullo M (2018) Relaciones internacionales una teoriacutea criacutetica desde la periferia latinoamericana Buenos Ai-res Argentina Editorial Biblos

Gullo M (2014) A subordinaccedilatildeo fundante breve histoacuteria da construccedilatildeo do poder pelas naccedilotildees Florianoacutepolis Brasil Insular

Hiratuka C (2016) Impactos de China sobre el proceso de integracioacuten regional de Mercosur Em E Dussel Peters (coord) La nueva relacioacuten comercial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestIntegracioacuten o desintegracioacuten (pp 195-243) Meacutexico df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universida-des de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico Recuperado de httpswww3ecouni-campbrNeitimagesdestaque2016_La_nueva_rela-cion_comercial_ALC_Chinapdf

Hobsbawm E (1994) Extremes The Short Twentieth Cen-tury 1914-1991 Londres Inglaterra Michael Joseph Ltd

Kennedy P (1987) The rise and fall of the great powers Economic change and military conflict from 1500 to 2000 Nova York Estados Unidos Vintage Books

Keohane R e Nye J (1977) Power and interdependence World politics in transition Boston Estados Unidos Little Brown and Company

Lafer C (2002) JK e o programa de metas (1956-1961) Rio de Janeiro Brasil Fundaccedilatildeo Getuacutelio Vargas

Landim R (2019 6 de setembro) Brasil e Argentina adiam em 9 anos livre-comeacutercio de autos Folha de S Paulo Recuperado de httpswww1folhauolcombrmerca-do201909brasil-e-argentina-adiam-em-9-anos-li-vre-comercio-de-autosshtml

Lessa A e Oliveira H A (orgs) (2013) Parcerias estra-teacutegicas do Brasil v 1 os significados e as experiecircncias tradicionais Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

25Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Li X (2020) Revisiting China-Latin America economic relations An unintended consequence of different industrialization strategies Em R Bernal-Meza e X Li (eds) China-Latin America relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 225-251) Nova York Estados UnidosLondres Inglaterra Palgrave Macmillan

Li X (2019a) Chinarsquos dual position in the capitalist world order A dual complexity of hegemony and counter-he-gemony Em Li X (ed) The international political eco-nomy of the brics (pp 1-17) Abindon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2019b) The international political economy of the brics Nova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2014) The brics and beyond The international political economy of the emergence of a new world or-der Farnham Reino Unido Ashgate

Li X (2012) China y el orden mundial capitalista el nexo de la transformacioacuten interna de China y su impacto externo Em R Bernal-Meza e S Quintanar (eds) Regionalismo y Orden Mundial Surameacuterica Europa China (pp 29-53) Buenos Aires Argentina Nuevoha-cerUniversidad Nacional del Centro de la Provincia de Buenos Aires

Li X e Farah A (eds) (2013) China-Africa relations in an era of great transformations Farnham Reino Unido Ashgate

Lins A (1996) Rio Branco (Biografia) Satildeo Paulo Brasil Editora Alfa Omega

Mandelbaum M (2010) The frugal superpower Americarsquos global leadership in a cash-strapped era Nova York Es-tados Unidos Public Affairs

Meneses E (1988) Coping with decline Chilean fo-reign policy during the twentieth century 1902-1972 Oxford Reino Unido University of OxfordBodleian Library

Nabuco J (1949) Obras completas v xii Rio de Janeiro Brasil Instituto Progresso Editorial sa

Nasr V (2014) The dispensable nation American foreign policy in retreat Nova York Estados Unidos Anchor and Doubleday

Oliveira R (2018 15 de janeiro) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da his-toacuteria da economia (entrevista com Ha-Joon Chang) El Paiacutes Recuperado de httpsbrasilelpaiscombra-sil20180105economia1515177346_780498html

Pearson F e Rochester M (2007) Relaciones internacio-nales situacioacuten global en el siglo xxi Meacutexico-df Meacute-xico Mc Graw Hill

Pecequilo C (2012) As relaccedilotildees Brasil-Estados Unidos Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

Polanyi K (1957) The great transformation the political and economic origins of our time Boston Estados Uni-dos Beacon Press

Rodrigues J Seitenfus R e Rodrigues L (orgs) (1995) Uma histoacuteria diplomaacutetica do Brasil (1531-1945) Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Brasileira

Seitenfus R (2003) O Brasil vai agrave guerra o processo de envolvimento brasileiro na Segunda Guerra Mundial 3a ed Satildeo Paulo Brasil Barueri

Spector M (2019 25 abril) Eacute hora de construir uma po-liacutetica externa poacutes-Bolsonaro Folha de S Paulo Re-cuperado de httpswww1folhauolcombr colunasmatiasspektor201904e-hora-de-construir-a-politi-ca-externa-pos-bolsonaroshtml

Stunkel O Com Bolsonaro a poliacutetica externa se tor-nou uma caixa de surpresas (entrevista agrave Deutsche Welle Brasil) Recuperado de httpswwwterracombrnoticiasbrasil com-bolsonaro-politica-ex-terna-se-tornou-uma-caixa-de-surpresas 7f6f-814287c0240a2f3f93ad aa39af65jpo4zbzghtml

Tarzi S (2007) Neorealism neoliberalism and the inter-national system International Studies (41) 115-128

Vadell J e Ramos L (2019) The role of declining Brazil and ascending China in the brics initiative Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 75-94) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Viana F L (1959) A vida do Baratildeo do Rio Branco Rio de Janeiro Brasil Joseacute Olympio

Vidigal C (2009) Relaccedilotildees Brasil-Argentina o primeiro ensaio Curitiba Brasil Juruaacute

Page 11: Bolsonaro versus Rio Branco: transição hegemônica, América ...2011/02/15  · Contra-hegemonia e ordem capitalista mundial por meio do brics, brics-plus e de outros agru-pamentos,

21Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

se vinculava ao fato de o paiacutes ainda natildeo estar inte-grado digitalmente e de ter um marco regulatoacuterio defasado no setor A presidecircncia brasileira passava a se posicionar de forma equidistante em relaccedilatildeo aos interesses de Washington e Pequim o que se estendia agrave poliacutetica adotada diante da guerra co-mercial entre as duas maiores economias Poucos casos ilustravam com tanta transparecircncia um dos mais importantes efeitos da transiccedilatildeo hegemocircnica em curso

Mouratildeo fora convencido pelo secretaacuterio-geral do Itamaraty Otaacutevio Brandelli quanto agrave adequa-ccedilatildeo de uma conduta flexiacutevel e pragmaacutetica Em face de uma guerra comercial dessa natureza o gover-no brasileiro deveria saber explorar as oportuni-dades Por exemplo como a administraccedilatildeo Trump taxou parcela das importaccedilotildees da China inicial-mente em torno de usd$ 250 bilhotildees os produtos envolvidos passaram a chegar mais caros no mer-cado norte-americano e eventualmente poderiam ser substituiacutedos por produtos brasileiros o que acrescentaria usd$ 5 bilhotildees ou mais nas nossas exportaccedilotildees A guerra comercial deveria assim ser tratada com paciecircncia

O limite da visatildeo do vice-presidente brasi-leiro mdash que dava vazatildeo agraves pressotildees do agrone-goacutecio mdash era evidente Temas como transferecircncia de tecnologia e cooperaccedilatildeo industrial natildeo foram abordados Indagado sobre o fato de o conflito de interesses entre Estados Unidos e China natildeo ser apenas comercial mas tambeacutem tecnoloacutegico a res-posta foi igualmente simplista ldquoVocecirc olha o 5g As quatro empresas que detecircm a tecnologia satildeo duas chinesas e duas finlandesas Cadecirc a americanardquo (Arauacutejo et al 2019 sp) Ou seja o governo bra-sileiro mdash afastadas as desconfianccedilas iniciais em relaccedilatildeo agrave China mdash voltava a se ocupar dos temas tratados em governos anteriores exportaccedilotildees de alimentos e mineacuterios investimentos diretos com geraccedilatildeo de empregos acordos de cooperaccedilatildeo em tecnologia estes uacuteltimos sem viacutenculo claro com qualquer projeto mais amplo de industrializaccedilatildeo e desenvolvimento tecnoloacutegico

O governo Bolsonaro aparentemente estava satisfeito com o status internacional do paiacutes sem atentar minimamente ao processo de desindus-trializaccedilatildeo das uacuteltimas deacutecadas (Benaion 2006

Cano 2012 Oliveira 2018) Para Chang (2018) nos anos 1980 e 1990 o Brasil conheceu o ponto mais alto da industrializaccedilatildeo que atingiu 35 da produccedilatildeo nacional No final de 2017 representa-va apenas 12 e a tendecircncia era de decliacutenio O Brasil tem nesse sentido voltado no tempo Em-presaacuterios de Satildeo Paulo natildeo parecem estar preocu-pados com o decliacutenio da induacutestria manufatureira No longo prazo essa poliacutetica eacute prejudicial para o paiacutes No governo Dilma Rousseff vaacuterios subsiacutedios foram canalizados para a induacutestria mas as altas taxas de juros natildeo favoreceram mudanccedilas efetivas (Oliveira 2018)

O processo de desindustrializaccedilatildeo as poliacuteticas econocircmicas e o conformismo com a condiccedilatildeo ldquosu-bordinadardquo do paiacutes instruiacuteram em outro momento o uso do conceito de ldquoperiferia proacutesperardquo para o crescimento econocircmico de meados da deacutecada de 2000 sustentado pela demanda chinesa (Doratioto e Vidigal 2015) As taxas de crescimento da China beneficiaram as exportaccedilotildees latino-americanas de produtos agriacutecolas mineacuterios petroacuteleo e produtos manufaturados de baixo valor agregado Conco-rreram por sua vez para reforccedilar o caraacuteter liberal perifeacuterico de economias como a brasileira (Filguei-ras e Gonccedilalves 2007)

Na poliacutetica externa era clara a intenccedilatildeo de re-duzir o peso do Itamaraty nas decisotildees relativas aos assuntos de seguranccedila e defesa fronteiras narcotraacutefico e outros delitos internacionais e imi-graccedilatildeo como no tema da crise na Venezuela e em outros assuntos sensiacuteveis na aacuterea da poliacutetica in-ternacional Quanto ao chanceler Ernesto Arauacutejo que havia impressionado negativamente a maioria dos estudiosos de poliacutetica externa e internacional em razatildeo de certo ldquomessianismordquo na defesa do Oci-dente e da administraccedilatildeo Trump passou a atuar de modo mais comedido e profissional como na ocasiatildeo da assinatura do acordo Mercosul-Uniatildeo Europeia no dia 28 de junho de 2019

Bolsonaro no final de reuniatildeo do g-20 em Osaka (28 e 29 de junho de 2019) se disse satis-feito com os resultados do encontro do brics e do proacuteprio g-20 aleacutem de destacar a importacircncia da conclusatildeo do acordo Mercosul-Uniatildeo Europeia Na reuniatildeo dos brics Bolsonaro desistiu de pro-por aos demais liacutederes o apoio a uma mudanccedila

22

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

de governo na Venezuela Foi tambeacutem a oportu-nidade para reconhecer o interesse brasileiro em manter bom diaacutelogo com o principal parceiro co-mercial do paiacutes

Os ajustes percebidos na conduccedilatildeo da poliacutetica externa natildeo significaram uma mudanccedila de rumo do governo Bolsonaro no que tange agrave priorizaccedilatildeo dos laccedilos com os Estados Unidos a Europa e o Ja-patildeo parceiros preferenciais nas deacutecadas de 1960 1970 e sob o governo de Cardoso Nesse sentido as relaccedilotildees com a China a despeito do discurso em prol de uma parceria estrateacutegica ou coisa que o valha tecircm sido tratadas de forma setorial mdash co-meacutercio investimentos cooperaccedilatildeo tecnoloacutegica mdash e descompromissada com qualquer planejamento Os laccedilos histoacutericos com os Estados Unidos em to-das as suas dimensotildees favorecem a acomodaccedilatildeo e a recusa em tratar seriamente a hipoacutetese da ldquoopccedilatildeo chinesardquo o que natildeo necessariamente eacute negativo

ConclusatildeoAs transiccedilotildees hegemocircnicas no marco da econo-mia poliacutetica mundial tecircm constituiacutedo um pro-blema externo e interno para os paiacuteses inseridos em uma relaccedilatildeo centro-periferia A ascensatildeo da China e sua presenccedila econocircmica na Ameacuterica do Sul tecircm levado alguns paiacuteses a incluiacute-la em seus caacutelculos estrateacutegicos A Argentina o Brasil e o Chile podem desempenhar um papel crucial nesse processo tendo em vista a relevacircncia geopoliacutetica e econocircmica do Cone Sul pois a polarizaccedilatildeo Es-tados Unidos-China cria janelas de oportunidade e gera maior permissibilidade no sistema interna-cional como diria Heacutelio Jaguaribe

Destacamos a identificaccedilatildeo das grandes linhas de continuidade e de ruptura que tecircm implicado o discurso do presidente Bolsonaro e dos principais colaboradores em relaccedilatildeo agrave tradiccedilatildeo da poliacutetica externa brasileira O contraponto inicial com a poliacutetica e o pensamento de Rio Branco com des-taque para as boas e privilegiadas relaccedilotildees com os Estados Unidos permitiu identificar periacuteodos de maior proximidade ou de distanciamento de Was-hington Bolsonaro estaacute proacuteximo dessa tradiccedilatildeo a de ver o Brasil como soacutecio proacuteximo dos Estados Unidos mas se afasta de praacuteticas autonomistas

como a da poliacutetica externa independente e a do pragmatismo responsaacutevel Praacuteticas essas que per-mitiriam avaliar de modo desassombrado as re-laccedilotildees com a China

Tanto a ascensatildeo da China como a posiccedilatildeo que ocupa Pequim na estrutura econocircmica brasileira planteiam desafios equivalentes ao que o Brasil ex-perimentou no comeccedilo do seacuteculo xx Agrave diferenccedila da visatildeo de Rio Branco durante a transiccedilatildeo da he-gemonia natildeo parece haver no governo de Bolsona-ro um olhar seguro sobre os impactos da transiccedilatildeo hegemocircnica nem do papel que o Brasil deveria des-empenhar na estrateacutegia global da China

Um terceiro tema de preocupaccedilatildeo eacute o das re-laccedilotildees com a Argentina A visita subsequente a Buenos Aires a assinatura do acordo para negociar um tratado de livre-comeacutercio entre o Mercosul e a Uniatildeo Europeia e o anuacutencio de que ambos os go-vernos iniciariam gestotildees conjuntas para a assina-tura de acordos de livre-comeacutercio com os Estados Unidos restabeleceram o bom diaacutelogo entre Bra-siacutelia e Buenos Aires ainda que persistam duacutevidas no governo Macri (Landim 2019) As incertezas se estenderam ao governo eleito em dezembro de 2019 em decorrecircncia de criacuteticas de natureza ideo-loacutegicas realizadas tanto por Bolsonaro quanto por Alberto Fernaacutendez Entretanto o diaacutelogo bilateral tende a se normalizar sem maiores pretensotildees no plano regional

O viacutenculo estrateacutegico entre Brasiacutelia e Buenos Aires tem sido chave para sustentar um espiacuterito de cooperaccedilatildeo e integraccedilatildeo na Ameacuterica do Sul que se baseia na credibilidade das accedilotildees e na boa feacute de uns e outros governos Desde 1985 o Brasil e a Argentina desenvolveram o que Cervo (2008) denominou de ldquorelaccedilotildees em eixordquo que se estabe-lecem ldquoquando precisamente a imagem um do outro corresponde agrave do parceiro que consegue estabelecer uma uniatildeo co-responsaacutevel [] Em outros termos o eixo comporta uma vertente exoacute-gena que o transcende porque abarca as relaccedilotildees regionais mesmo que coletivas []rdquo (pp 211-212) Eacute esse tipo de relaccedilotildees e sua projeccedilatildeo no Cone Sul que foi potencialmente afetada pelas primei-ras declaraccedilotildees e accedilotildees do governo Bolsonaro Ao promover um alinhamento com os Estados Uni-dos mdash ou ldquosem recompensardquo como diria Gerson

23Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Moura mdash reproduz o que o Brasil e outros paiacuteses latino-americanos adotaram como ldquoestrateacutegiardquo na deacutecada de 1990 sem os resultados esperados E ao abandonar a tradiccedilatildeo iniciada em 1961 e adaptada agraves diferentes conjunturas que se sucederam abriu matildeo de exercer o poder de barganha do paiacutes para fazer concessotildees sem contrapartidas equivalentes Nas circunstacircncias atuais diante da transiccedilatildeo he-gemocircnica Estados Unidos-China considerando os interesses do Brasil na Ameacuterica do Sul a equidis-tacircncia talvez seja o melhor caminho Diaacutelogo es-treito com Washington e autonomia em temas de interesse do paiacutes foram as opccedilotildees de Rio Branco

Referecircncias Arauacutejo E (2017) Trump e o Ocidente Cadernos de Poliacutetica

Exterior iii(6) 323-357

Arauacutejo E (2019 2 de janeiro) Discurso do minis-tro Ernesto Arauacutejo durante cerimocircnia de posse no Ministeacuterio das Relaccedilotildees Exteriores Brasiacutelia Re-cuperado de httpwwwitamaratygovbrpt-BRdiscursos-artigos-e-entrevistas-categoriaminis-tro-das-relacoes-exteriores-discursos19907-dis-curso-do-ministro-ernesto-araujo-durante-cerimo-nia-de-posse-no-ministerio-das-relacoes-exteriores-brasilia-2-de-janeiro-de-2019

Arauacutejo C Rittner D e Murakawa F (2019 30 de abril) Brasil descarta vetar presenccedila da Huawei em 5g avisa Mouratildeo (entrevista com o vice-presidente Hamilton Mouratildeo) g1 Recuperado de httpsvalorglobocombrasilnoticia20190607brasil-descarta-vetar-pre-senca-da-huawei-em-5g-avisa-mouraoghtml

Arrighi G (2008) Adam Smith em Pequim origens e fun-damentos do seacuteculo xxi Satildeo Paulo Brasil Boitempo

Bandeira L A M (2004) As relaccedilotildees perigosas Brasil-Es-tados Unidos Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Bra-sileira

Bandeira L A M (2003) Brasil Argentina e Estados Uni-dos da Triacuteplice Alianccedila ao Mercosul (1870-2003) Rio de Janeiro Editora Revan

Becard D (2017) China y Brasil iquestmodelo de relaciones Sur-Sur Em E Pastrana B e H Gehring (eds) La proyeccioacuten de China en Ameacuterica Latina y el Caribe (pp 387-408) Bogotaacute Colocircmbia Editorial Javeriana

Becard D Lessa A e Silveira L (2020) One step closer The politics and the economics of chinarsquos strategy in Brazil and the case of the electric power sector Em R Bernal-Meza R e X Li (eds) China-Latin America

relations in the 21st Century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 55-81) Nova York Estados Unidos Palgrave Macmillan

Becard D Barros-Platiau A e Lessa A (2019) Brazil in the brics after tem years Past present and near futu-re perspectives Em X Li (ed) The international po-litical economy of the brics (pp 135-149) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Beckerman M e Moncaut N (2016) Las relaciones en-tre China y Ameacuterica Latina iquestHacia la desestructura-cioacuten de los sistemas productivos de la regioacuten Em C Moneta e S Cesariacuten (eds) La tentacioacuten pragmaacutetica China-ArgentinaAmeacuterica Latina lo actual lo proacuteximo y lo distante (pp 185-202) Saacuteenz Pentildea Argentina Uni-versidad Nacional de Tres de Febrero

Benaion N (2006) Subordinaccedilatildeo reiterada imperialismo e desenvolvimento no Brasil Manaus Brasil Editora da Universidade Federal do Amazonas

Bernal-Meza R (2019a) Brazil as an emerging power The impact of international and internal deteriorational effect on the brics Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 118-134) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Bernal-Meza R (2019b) Brasil ascenso declinacioacuten y nuevos desafiacuteos de una potencia emergente (2003-2018) Revista Izquierdas 49(2020) 516-540

Bernal-Meza R (2015) Pensamiento chileno en la poliacuteti-ca exterior y en las teoriacuteas de relaciones internaciona-les Em M Artaza e C Ross (eds) La poliacutetica exterior de Chile 1990-2009 (pp 21-47) Santiago Chile ril Editores

Bernal-Meza R (2014) La heterogeneidad de la imagen de China en la poliacutetica exterior latinoamericana Pers-pectivas para la concertacioacuten de poliacuteticas Comentario Internacional 14 113-134

Bernal-Meza R (2013) Ameacuterica Latina en el mundo el pensamiento latino-americano y la teoriacutea de relaciones internaciones Buenos Aires Argentina Grupo Editor Latinoamericano

Bernal-Meza R (2002) A poliacutetica exterior do Brasil 1990-2002 Revista Brasileira de Poliacutetica Internacional 45(1) 36-71

Bernal-Meza R e Bizzozero L (eds) (2014) La poliacutetica internacional de Brasil de la regioacuten al mundo Monte-videacuteu Uruguai Ediciones Cruz del Sur

Bernal-Meza R e Li X (eds) (2020) China-Latin Ameri-ca relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges Nova York Estados Uni-dos Palgrave Macmillan

24

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

Bolsonaro J (2018) O caminho da prosperidade pro-posta de Plano de Governo Recuperado de httpdivulgacandcontastsejusbrcandidaturasof i-cial2018BRBR2022802018280000614517propos-ta_1534284632231pdf

Bricentildeo Ruiz J e Simonoff A (orgs) (2015) Integracioacuten y cooperacioacuten regional en Ameacuterica Latina una relectura a partir de la teoriacutea de la autonomiacutea Buenos Aires Ar-gentina Editorial Biblos

Bueno C (2003) Poliacutetica externa da Primeira Repuacuteblica os anos de apogeu (1902-1918) Satildeo Paulo Brasil Paz e Terra

Cano W (2012) A desindustrializaccedilatildeo no Brasil (texto para discussatildeo 200) Campinas Brasil Instituto de Economia da Unicamp

Cervo A L (2019 28 de novembro) Governo Bolso-naro natildeo traraacute ruptura agrave poliacutetica externa Exame Recuperado de httpsexameabrilcombrmundogoverno-bolsonaro-nao-trara-ruptura-a-politica-ex-terna-avalia-amado-cervo

Cervo A (2008) Inserccedilatildeo internacional formaccedilatildeo dos conceitos brasileiros Satildeo Paulo Brasil Saraiva

Cervo A (2002) Relaccedilotildees Internacionais do Brasil a era Cardoso Revista Brasileira de Poliacutetica Internacional 45(1) 5-35

Cervo A e Bueno C (2015) Histoacuteria da poliacutetica exterior do Brasil Brasiacutelia Brasil Editora da Universidade de Brasiacutelia

Chang H H (2018 15 jan) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da histoacuteria da economia El Paiacutes Recuperado de ht-tpsbrasilelpaiscombrasil20180105econo-mia1515177346_780498html

Cronologia relembre os fatos mais importantes da cri-se venezuelana g1 httpsg1globocommundonoticia20190430cronologia-relembre-os-fa-tos-mais-importantes-na-crise-venezuelanaghtml

Doratioto F e Vidigal C (2015) Histoacuteria das Relaccedilotildees In-ternacionais do Brasil Satildeo Paulo Brasil Editora Saraiva

Dussel Peters E (coord) (2016) La nueva relacioacuten comer-cial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestInte-gracioacuten o desintegracioacuten regional Meacutexico-df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universidades de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico

Filgueiras L e Gonccedilalves R (2007) A economia poliacutetica do governo Lula Rio de Janeiro Brasil Contraponto

Fiori J(1999) Estado e moedas no desenvolvimento das naccedilotildees Petroacutepolis Brasil Vozes

Flisfisch A (2011) La Poliacutetica exterior chilena y Ameacuterica del Sur Estudios Internacionales (168) 115-141

Fonseca Jr G (2012) Rio Branco diante do Monroiacutesmo e do Pan-Americanismo anotaccedilotildees Em M Pereira e M Gomes (orgs) Baratildeo do Rio Branco 100 anos de memoacuteria (pp 565-602) Brasiacutelia Brasil Fundaccedilatildeo Alexandre de Gusmatildeo

Franccedila T (2007) Self made nation Domiacutecio da Gama e o pragmatismo do bom senso (tese de doutorado) Brasiacute-lia Brasil Universidade de Brasiacutelia

Guimaratildees S (2018) A poliacutetica exterior e a posiccedilatildeo do Brasil no mundo Recuperado de httpswwwnodalam201812a-politica-exterior-e-a-posicao-do-brasil-no-mundo-por-samuel-pinheiro-guimaraes-2

Gullo M (2018) Relaciones internacionales una teoriacutea criacutetica desde la periferia latinoamericana Buenos Ai-res Argentina Editorial Biblos

Gullo M (2014) A subordinaccedilatildeo fundante breve histoacuteria da construccedilatildeo do poder pelas naccedilotildees Florianoacutepolis Brasil Insular

Hiratuka C (2016) Impactos de China sobre el proceso de integracioacuten regional de Mercosur Em E Dussel Peters (coord) La nueva relacioacuten comercial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestIntegracioacuten o desintegracioacuten (pp 195-243) Meacutexico df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universida-des de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico Recuperado de httpswww3ecouni-campbrNeitimagesdestaque2016_La_nueva_rela-cion_comercial_ALC_Chinapdf

Hobsbawm E (1994) Extremes The Short Twentieth Cen-tury 1914-1991 Londres Inglaterra Michael Joseph Ltd

Kennedy P (1987) The rise and fall of the great powers Economic change and military conflict from 1500 to 2000 Nova York Estados Unidos Vintage Books

Keohane R e Nye J (1977) Power and interdependence World politics in transition Boston Estados Unidos Little Brown and Company

Lafer C (2002) JK e o programa de metas (1956-1961) Rio de Janeiro Brasil Fundaccedilatildeo Getuacutelio Vargas

Landim R (2019 6 de setembro) Brasil e Argentina adiam em 9 anos livre-comeacutercio de autos Folha de S Paulo Recuperado de httpswww1folhauolcombrmerca-do201909brasil-e-argentina-adiam-em-9-anos-li-vre-comercio-de-autosshtml

Lessa A e Oliveira H A (orgs) (2013) Parcerias estra-teacutegicas do Brasil v 1 os significados e as experiecircncias tradicionais Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

25Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Li X (2020) Revisiting China-Latin America economic relations An unintended consequence of different industrialization strategies Em R Bernal-Meza e X Li (eds) China-Latin America relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 225-251) Nova York Estados UnidosLondres Inglaterra Palgrave Macmillan

Li X (2019a) Chinarsquos dual position in the capitalist world order A dual complexity of hegemony and counter-he-gemony Em Li X (ed) The international political eco-nomy of the brics (pp 1-17) Abindon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2019b) The international political economy of the brics Nova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2014) The brics and beyond The international political economy of the emergence of a new world or-der Farnham Reino Unido Ashgate

Li X (2012) China y el orden mundial capitalista el nexo de la transformacioacuten interna de China y su impacto externo Em R Bernal-Meza e S Quintanar (eds) Regionalismo y Orden Mundial Surameacuterica Europa China (pp 29-53) Buenos Aires Argentina Nuevoha-cerUniversidad Nacional del Centro de la Provincia de Buenos Aires

Li X e Farah A (eds) (2013) China-Africa relations in an era of great transformations Farnham Reino Unido Ashgate

Lins A (1996) Rio Branco (Biografia) Satildeo Paulo Brasil Editora Alfa Omega

Mandelbaum M (2010) The frugal superpower Americarsquos global leadership in a cash-strapped era Nova York Es-tados Unidos Public Affairs

Meneses E (1988) Coping with decline Chilean fo-reign policy during the twentieth century 1902-1972 Oxford Reino Unido University of OxfordBodleian Library

Nabuco J (1949) Obras completas v xii Rio de Janeiro Brasil Instituto Progresso Editorial sa

Nasr V (2014) The dispensable nation American foreign policy in retreat Nova York Estados Unidos Anchor and Doubleday

Oliveira R (2018 15 de janeiro) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da his-toacuteria da economia (entrevista com Ha-Joon Chang) El Paiacutes Recuperado de httpsbrasilelpaiscombra-sil20180105economia1515177346_780498html

Pearson F e Rochester M (2007) Relaciones internacio-nales situacioacuten global en el siglo xxi Meacutexico-df Meacute-xico Mc Graw Hill

Pecequilo C (2012) As relaccedilotildees Brasil-Estados Unidos Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

Polanyi K (1957) The great transformation the political and economic origins of our time Boston Estados Uni-dos Beacon Press

Rodrigues J Seitenfus R e Rodrigues L (orgs) (1995) Uma histoacuteria diplomaacutetica do Brasil (1531-1945) Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Brasileira

Seitenfus R (2003) O Brasil vai agrave guerra o processo de envolvimento brasileiro na Segunda Guerra Mundial 3a ed Satildeo Paulo Brasil Barueri

Spector M (2019 25 abril) Eacute hora de construir uma po-liacutetica externa poacutes-Bolsonaro Folha de S Paulo Re-cuperado de httpswww1folhauolcombr colunasmatiasspektor201904e-hora-de-construir-a-politi-ca-externa-pos-bolsonaroshtml

Stunkel O Com Bolsonaro a poliacutetica externa se tor-nou uma caixa de surpresas (entrevista agrave Deutsche Welle Brasil) Recuperado de httpswwwterracombrnoticiasbrasil com-bolsonaro-politica-ex-terna-se-tornou-uma-caixa-de-surpresas 7f6f-814287c0240a2f3f93ad aa39af65jpo4zbzghtml

Tarzi S (2007) Neorealism neoliberalism and the inter-national system International Studies (41) 115-128

Vadell J e Ramos L (2019) The role of declining Brazil and ascending China in the brics initiative Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 75-94) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Viana F L (1959) A vida do Baratildeo do Rio Branco Rio de Janeiro Brasil Joseacute Olympio

Vidigal C (2009) Relaccedilotildees Brasil-Argentina o primeiro ensaio Curitiba Brasil Juruaacute

Page 12: Bolsonaro versus Rio Branco: transição hegemônica, América ...2011/02/15  · Contra-hegemonia e ordem capitalista mundial por meio do brics, brics-plus e de outros agru-pamentos,

22

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

de governo na Venezuela Foi tambeacutem a oportu-nidade para reconhecer o interesse brasileiro em manter bom diaacutelogo com o principal parceiro co-mercial do paiacutes

Os ajustes percebidos na conduccedilatildeo da poliacutetica externa natildeo significaram uma mudanccedila de rumo do governo Bolsonaro no que tange agrave priorizaccedilatildeo dos laccedilos com os Estados Unidos a Europa e o Ja-patildeo parceiros preferenciais nas deacutecadas de 1960 1970 e sob o governo de Cardoso Nesse sentido as relaccedilotildees com a China a despeito do discurso em prol de uma parceria estrateacutegica ou coisa que o valha tecircm sido tratadas de forma setorial mdash co-meacutercio investimentos cooperaccedilatildeo tecnoloacutegica mdash e descompromissada com qualquer planejamento Os laccedilos histoacutericos com os Estados Unidos em to-das as suas dimensotildees favorecem a acomodaccedilatildeo e a recusa em tratar seriamente a hipoacutetese da ldquoopccedilatildeo chinesardquo o que natildeo necessariamente eacute negativo

ConclusatildeoAs transiccedilotildees hegemocircnicas no marco da econo-mia poliacutetica mundial tecircm constituiacutedo um pro-blema externo e interno para os paiacuteses inseridos em uma relaccedilatildeo centro-periferia A ascensatildeo da China e sua presenccedila econocircmica na Ameacuterica do Sul tecircm levado alguns paiacuteses a incluiacute-la em seus caacutelculos estrateacutegicos A Argentina o Brasil e o Chile podem desempenhar um papel crucial nesse processo tendo em vista a relevacircncia geopoliacutetica e econocircmica do Cone Sul pois a polarizaccedilatildeo Es-tados Unidos-China cria janelas de oportunidade e gera maior permissibilidade no sistema interna-cional como diria Heacutelio Jaguaribe

Destacamos a identificaccedilatildeo das grandes linhas de continuidade e de ruptura que tecircm implicado o discurso do presidente Bolsonaro e dos principais colaboradores em relaccedilatildeo agrave tradiccedilatildeo da poliacutetica externa brasileira O contraponto inicial com a poliacutetica e o pensamento de Rio Branco com des-taque para as boas e privilegiadas relaccedilotildees com os Estados Unidos permitiu identificar periacuteodos de maior proximidade ou de distanciamento de Was-hington Bolsonaro estaacute proacuteximo dessa tradiccedilatildeo a de ver o Brasil como soacutecio proacuteximo dos Estados Unidos mas se afasta de praacuteticas autonomistas

como a da poliacutetica externa independente e a do pragmatismo responsaacutevel Praacuteticas essas que per-mitiriam avaliar de modo desassombrado as re-laccedilotildees com a China

Tanto a ascensatildeo da China como a posiccedilatildeo que ocupa Pequim na estrutura econocircmica brasileira planteiam desafios equivalentes ao que o Brasil ex-perimentou no comeccedilo do seacuteculo xx Agrave diferenccedila da visatildeo de Rio Branco durante a transiccedilatildeo da he-gemonia natildeo parece haver no governo de Bolsona-ro um olhar seguro sobre os impactos da transiccedilatildeo hegemocircnica nem do papel que o Brasil deveria des-empenhar na estrateacutegia global da China

Um terceiro tema de preocupaccedilatildeo eacute o das re-laccedilotildees com a Argentina A visita subsequente a Buenos Aires a assinatura do acordo para negociar um tratado de livre-comeacutercio entre o Mercosul e a Uniatildeo Europeia e o anuacutencio de que ambos os go-vernos iniciariam gestotildees conjuntas para a assina-tura de acordos de livre-comeacutercio com os Estados Unidos restabeleceram o bom diaacutelogo entre Bra-siacutelia e Buenos Aires ainda que persistam duacutevidas no governo Macri (Landim 2019) As incertezas se estenderam ao governo eleito em dezembro de 2019 em decorrecircncia de criacuteticas de natureza ideo-loacutegicas realizadas tanto por Bolsonaro quanto por Alberto Fernaacutendez Entretanto o diaacutelogo bilateral tende a se normalizar sem maiores pretensotildees no plano regional

O viacutenculo estrateacutegico entre Brasiacutelia e Buenos Aires tem sido chave para sustentar um espiacuterito de cooperaccedilatildeo e integraccedilatildeo na Ameacuterica do Sul que se baseia na credibilidade das accedilotildees e na boa feacute de uns e outros governos Desde 1985 o Brasil e a Argentina desenvolveram o que Cervo (2008) denominou de ldquorelaccedilotildees em eixordquo que se estabe-lecem ldquoquando precisamente a imagem um do outro corresponde agrave do parceiro que consegue estabelecer uma uniatildeo co-responsaacutevel [] Em outros termos o eixo comporta uma vertente exoacute-gena que o transcende porque abarca as relaccedilotildees regionais mesmo que coletivas []rdquo (pp 211-212) Eacute esse tipo de relaccedilotildees e sua projeccedilatildeo no Cone Sul que foi potencialmente afetada pelas primei-ras declaraccedilotildees e accedilotildees do governo Bolsonaro Ao promover um alinhamento com os Estados Uni-dos mdash ou ldquosem recompensardquo como diria Gerson

23Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Moura mdash reproduz o que o Brasil e outros paiacuteses latino-americanos adotaram como ldquoestrateacutegiardquo na deacutecada de 1990 sem os resultados esperados E ao abandonar a tradiccedilatildeo iniciada em 1961 e adaptada agraves diferentes conjunturas que se sucederam abriu matildeo de exercer o poder de barganha do paiacutes para fazer concessotildees sem contrapartidas equivalentes Nas circunstacircncias atuais diante da transiccedilatildeo he-gemocircnica Estados Unidos-China considerando os interesses do Brasil na Ameacuterica do Sul a equidis-tacircncia talvez seja o melhor caminho Diaacutelogo es-treito com Washington e autonomia em temas de interesse do paiacutes foram as opccedilotildees de Rio Branco

Referecircncias Arauacutejo E (2017) Trump e o Ocidente Cadernos de Poliacutetica

Exterior iii(6) 323-357

Arauacutejo E (2019 2 de janeiro) Discurso do minis-tro Ernesto Arauacutejo durante cerimocircnia de posse no Ministeacuterio das Relaccedilotildees Exteriores Brasiacutelia Re-cuperado de httpwwwitamaratygovbrpt-BRdiscursos-artigos-e-entrevistas-categoriaminis-tro-das-relacoes-exteriores-discursos19907-dis-curso-do-ministro-ernesto-araujo-durante-cerimo-nia-de-posse-no-ministerio-das-relacoes-exteriores-brasilia-2-de-janeiro-de-2019

Arauacutejo C Rittner D e Murakawa F (2019 30 de abril) Brasil descarta vetar presenccedila da Huawei em 5g avisa Mouratildeo (entrevista com o vice-presidente Hamilton Mouratildeo) g1 Recuperado de httpsvalorglobocombrasilnoticia20190607brasil-descarta-vetar-pre-senca-da-huawei-em-5g-avisa-mouraoghtml

Arrighi G (2008) Adam Smith em Pequim origens e fun-damentos do seacuteculo xxi Satildeo Paulo Brasil Boitempo

Bandeira L A M (2004) As relaccedilotildees perigosas Brasil-Es-tados Unidos Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Bra-sileira

Bandeira L A M (2003) Brasil Argentina e Estados Uni-dos da Triacuteplice Alianccedila ao Mercosul (1870-2003) Rio de Janeiro Editora Revan

Becard D (2017) China y Brasil iquestmodelo de relaciones Sur-Sur Em E Pastrana B e H Gehring (eds) La proyeccioacuten de China en Ameacuterica Latina y el Caribe (pp 387-408) Bogotaacute Colocircmbia Editorial Javeriana

Becard D Lessa A e Silveira L (2020) One step closer The politics and the economics of chinarsquos strategy in Brazil and the case of the electric power sector Em R Bernal-Meza R e X Li (eds) China-Latin America

relations in the 21st Century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 55-81) Nova York Estados Unidos Palgrave Macmillan

Becard D Barros-Platiau A e Lessa A (2019) Brazil in the brics after tem years Past present and near futu-re perspectives Em X Li (ed) The international po-litical economy of the brics (pp 135-149) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Beckerman M e Moncaut N (2016) Las relaciones en-tre China y Ameacuterica Latina iquestHacia la desestructura-cioacuten de los sistemas productivos de la regioacuten Em C Moneta e S Cesariacuten (eds) La tentacioacuten pragmaacutetica China-ArgentinaAmeacuterica Latina lo actual lo proacuteximo y lo distante (pp 185-202) Saacuteenz Pentildea Argentina Uni-versidad Nacional de Tres de Febrero

Benaion N (2006) Subordinaccedilatildeo reiterada imperialismo e desenvolvimento no Brasil Manaus Brasil Editora da Universidade Federal do Amazonas

Bernal-Meza R (2019a) Brazil as an emerging power The impact of international and internal deteriorational effect on the brics Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 118-134) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Bernal-Meza R (2019b) Brasil ascenso declinacioacuten y nuevos desafiacuteos de una potencia emergente (2003-2018) Revista Izquierdas 49(2020) 516-540

Bernal-Meza R (2015) Pensamiento chileno en la poliacuteti-ca exterior y en las teoriacuteas de relaciones internaciona-les Em M Artaza e C Ross (eds) La poliacutetica exterior de Chile 1990-2009 (pp 21-47) Santiago Chile ril Editores

Bernal-Meza R (2014) La heterogeneidad de la imagen de China en la poliacutetica exterior latinoamericana Pers-pectivas para la concertacioacuten de poliacuteticas Comentario Internacional 14 113-134

Bernal-Meza R (2013) Ameacuterica Latina en el mundo el pensamiento latino-americano y la teoriacutea de relaciones internaciones Buenos Aires Argentina Grupo Editor Latinoamericano

Bernal-Meza R (2002) A poliacutetica exterior do Brasil 1990-2002 Revista Brasileira de Poliacutetica Internacional 45(1) 36-71

Bernal-Meza R e Bizzozero L (eds) (2014) La poliacutetica internacional de Brasil de la regioacuten al mundo Monte-videacuteu Uruguai Ediciones Cruz del Sur

Bernal-Meza R e Li X (eds) (2020) China-Latin Ameri-ca relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges Nova York Estados Uni-dos Palgrave Macmillan

24

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

Bolsonaro J (2018) O caminho da prosperidade pro-posta de Plano de Governo Recuperado de httpdivulgacandcontastsejusbrcandidaturasof i-cial2018BRBR2022802018280000614517propos-ta_1534284632231pdf

Bricentildeo Ruiz J e Simonoff A (orgs) (2015) Integracioacuten y cooperacioacuten regional en Ameacuterica Latina una relectura a partir de la teoriacutea de la autonomiacutea Buenos Aires Ar-gentina Editorial Biblos

Bueno C (2003) Poliacutetica externa da Primeira Repuacuteblica os anos de apogeu (1902-1918) Satildeo Paulo Brasil Paz e Terra

Cano W (2012) A desindustrializaccedilatildeo no Brasil (texto para discussatildeo 200) Campinas Brasil Instituto de Economia da Unicamp

Cervo A L (2019 28 de novembro) Governo Bolso-naro natildeo traraacute ruptura agrave poliacutetica externa Exame Recuperado de httpsexameabrilcombrmundogoverno-bolsonaro-nao-trara-ruptura-a-politica-ex-terna-avalia-amado-cervo

Cervo A (2008) Inserccedilatildeo internacional formaccedilatildeo dos conceitos brasileiros Satildeo Paulo Brasil Saraiva

Cervo A (2002) Relaccedilotildees Internacionais do Brasil a era Cardoso Revista Brasileira de Poliacutetica Internacional 45(1) 5-35

Cervo A e Bueno C (2015) Histoacuteria da poliacutetica exterior do Brasil Brasiacutelia Brasil Editora da Universidade de Brasiacutelia

Chang H H (2018 15 jan) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da histoacuteria da economia El Paiacutes Recuperado de ht-tpsbrasilelpaiscombrasil20180105econo-mia1515177346_780498html

Cronologia relembre os fatos mais importantes da cri-se venezuelana g1 httpsg1globocommundonoticia20190430cronologia-relembre-os-fa-tos-mais-importantes-na-crise-venezuelanaghtml

Doratioto F e Vidigal C (2015) Histoacuteria das Relaccedilotildees In-ternacionais do Brasil Satildeo Paulo Brasil Editora Saraiva

Dussel Peters E (coord) (2016) La nueva relacioacuten comer-cial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestInte-gracioacuten o desintegracioacuten regional Meacutexico-df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universidades de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico

Filgueiras L e Gonccedilalves R (2007) A economia poliacutetica do governo Lula Rio de Janeiro Brasil Contraponto

Fiori J(1999) Estado e moedas no desenvolvimento das naccedilotildees Petroacutepolis Brasil Vozes

Flisfisch A (2011) La Poliacutetica exterior chilena y Ameacuterica del Sur Estudios Internacionales (168) 115-141

Fonseca Jr G (2012) Rio Branco diante do Monroiacutesmo e do Pan-Americanismo anotaccedilotildees Em M Pereira e M Gomes (orgs) Baratildeo do Rio Branco 100 anos de memoacuteria (pp 565-602) Brasiacutelia Brasil Fundaccedilatildeo Alexandre de Gusmatildeo

Franccedila T (2007) Self made nation Domiacutecio da Gama e o pragmatismo do bom senso (tese de doutorado) Brasiacute-lia Brasil Universidade de Brasiacutelia

Guimaratildees S (2018) A poliacutetica exterior e a posiccedilatildeo do Brasil no mundo Recuperado de httpswwwnodalam201812a-politica-exterior-e-a-posicao-do-brasil-no-mundo-por-samuel-pinheiro-guimaraes-2

Gullo M (2018) Relaciones internacionales una teoriacutea criacutetica desde la periferia latinoamericana Buenos Ai-res Argentina Editorial Biblos

Gullo M (2014) A subordinaccedilatildeo fundante breve histoacuteria da construccedilatildeo do poder pelas naccedilotildees Florianoacutepolis Brasil Insular

Hiratuka C (2016) Impactos de China sobre el proceso de integracioacuten regional de Mercosur Em E Dussel Peters (coord) La nueva relacioacuten comercial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestIntegracioacuten o desintegracioacuten (pp 195-243) Meacutexico df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universida-des de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico Recuperado de httpswww3ecouni-campbrNeitimagesdestaque2016_La_nueva_rela-cion_comercial_ALC_Chinapdf

Hobsbawm E (1994) Extremes The Short Twentieth Cen-tury 1914-1991 Londres Inglaterra Michael Joseph Ltd

Kennedy P (1987) The rise and fall of the great powers Economic change and military conflict from 1500 to 2000 Nova York Estados Unidos Vintage Books

Keohane R e Nye J (1977) Power and interdependence World politics in transition Boston Estados Unidos Little Brown and Company

Lafer C (2002) JK e o programa de metas (1956-1961) Rio de Janeiro Brasil Fundaccedilatildeo Getuacutelio Vargas

Landim R (2019 6 de setembro) Brasil e Argentina adiam em 9 anos livre-comeacutercio de autos Folha de S Paulo Recuperado de httpswww1folhauolcombrmerca-do201909brasil-e-argentina-adiam-em-9-anos-li-vre-comercio-de-autosshtml

Lessa A e Oliveira H A (orgs) (2013) Parcerias estra-teacutegicas do Brasil v 1 os significados e as experiecircncias tradicionais Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

25Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Li X (2020) Revisiting China-Latin America economic relations An unintended consequence of different industrialization strategies Em R Bernal-Meza e X Li (eds) China-Latin America relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 225-251) Nova York Estados UnidosLondres Inglaterra Palgrave Macmillan

Li X (2019a) Chinarsquos dual position in the capitalist world order A dual complexity of hegemony and counter-he-gemony Em Li X (ed) The international political eco-nomy of the brics (pp 1-17) Abindon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2019b) The international political economy of the brics Nova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2014) The brics and beyond The international political economy of the emergence of a new world or-der Farnham Reino Unido Ashgate

Li X (2012) China y el orden mundial capitalista el nexo de la transformacioacuten interna de China y su impacto externo Em R Bernal-Meza e S Quintanar (eds) Regionalismo y Orden Mundial Surameacuterica Europa China (pp 29-53) Buenos Aires Argentina Nuevoha-cerUniversidad Nacional del Centro de la Provincia de Buenos Aires

Li X e Farah A (eds) (2013) China-Africa relations in an era of great transformations Farnham Reino Unido Ashgate

Lins A (1996) Rio Branco (Biografia) Satildeo Paulo Brasil Editora Alfa Omega

Mandelbaum M (2010) The frugal superpower Americarsquos global leadership in a cash-strapped era Nova York Es-tados Unidos Public Affairs

Meneses E (1988) Coping with decline Chilean fo-reign policy during the twentieth century 1902-1972 Oxford Reino Unido University of OxfordBodleian Library

Nabuco J (1949) Obras completas v xii Rio de Janeiro Brasil Instituto Progresso Editorial sa

Nasr V (2014) The dispensable nation American foreign policy in retreat Nova York Estados Unidos Anchor and Doubleday

Oliveira R (2018 15 de janeiro) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da his-toacuteria da economia (entrevista com Ha-Joon Chang) El Paiacutes Recuperado de httpsbrasilelpaiscombra-sil20180105economia1515177346_780498html

Pearson F e Rochester M (2007) Relaciones internacio-nales situacioacuten global en el siglo xxi Meacutexico-df Meacute-xico Mc Graw Hill

Pecequilo C (2012) As relaccedilotildees Brasil-Estados Unidos Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

Polanyi K (1957) The great transformation the political and economic origins of our time Boston Estados Uni-dos Beacon Press

Rodrigues J Seitenfus R e Rodrigues L (orgs) (1995) Uma histoacuteria diplomaacutetica do Brasil (1531-1945) Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Brasileira

Seitenfus R (2003) O Brasil vai agrave guerra o processo de envolvimento brasileiro na Segunda Guerra Mundial 3a ed Satildeo Paulo Brasil Barueri

Spector M (2019 25 abril) Eacute hora de construir uma po-liacutetica externa poacutes-Bolsonaro Folha de S Paulo Re-cuperado de httpswww1folhauolcombr colunasmatiasspektor201904e-hora-de-construir-a-politi-ca-externa-pos-bolsonaroshtml

Stunkel O Com Bolsonaro a poliacutetica externa se tor-nou uma caixa de surpresas (entrevista agrave Deutsche Welle Brasil) Recuperado de httpswwwterracombrnoticiasbrasil com-bolsonaro-politica-ex-terna-se-tornou-uma-caixa-de-surpresas 7f6f-814287c0240a2f3f93ad aa39af65jpo4zbzghtml

Tarzi S (2007) Neorealism neoliberalism and the inter-national system International Studies (41) 115-128

Vadell J e Ramos L (2019) The role of declining Brazil and ascending China in the brics initiative Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 75-94) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Viana F L (1959) A vida do Baratildeo do Rio Branco Rio de Janeiro Brasil Joseacute Olympio

Vidigal C (2009) Relaccedilotildees Brasil-Argentina o primeiro ensaio Curitiba Brasil Juruaacute

Page 13: Bolsonaro versus Rio Branco: transição hegemônica, América ...2011/02/15  · Contra-hegemonia e ordem capitalista mundial por meio do brics, brics-plus e de outros agru-pamentos,

23Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Moura mdash reproduz o que o Brasil e outros paiacuteses latino-americanos adotaram como ldquoestrateacutegiardquo na deacutecada de 1990 sem os resultados esperados E ao abandonar a tradiccedilatildeo iniciada em 1961 e adaptada agraves diferentes conjunturas que se sucederam abriu matildeo de exercer o poder de barganha do paiacutes para fazer concessotildees sem contrapartidas equivalentes Nas circunstacircncias atuais diante da transiccedilatildeo he-gemocircnica Estados Unidos-China considerando os interesses do Brasil na Ameacuterica do Sul a equidis-tacircncia talvez seja o melhor caminho Diaacutelogo es-treito com Washington e autonomia em temas de interesse do paiacutes foram as opccedilotildees de Rio Branco

Referecircncias Arauacutejo E (2017) Trump e o Ocidente Cadernos de Poliacutetica

Exterior iii(6) 323-357

Arauacutejo E (2019 2 de janeiro) Discurso do minis-tro Ernesto Arauacutejo durante cerimocircnia de posse no Ministeacuterio das Relaccedilotildees Exteriores Brasiacutelia Re-cuperado de httpwwwitamaratygovbrpt-BRdiscursos-artigos-e-entrevistas-categoriaminis-tro-das-relacoes-exteriores-discursos19907-dis-curso-do-ministro-ernesto-araujo-durante-cerimo-nia-de-posse-no-ministerio-das-relacoes-exteriores-brasilia-2-de-janeiro-de-2019

Arauacutejo C Rittner D e Murakawa F (2019 30 de abril) Brasil descarta vetar presenccedila da Huawei em 5g avisa Mouratildeo (entrevista com o vice-presidente Hamilton Mouratildeo) g1 Recuperado de httpsvalorglobocombrasilnoticia20190607brasil-descarta-vetar-pre-senca-da-huawei-em-5g-avisa-mouraoghtml

Arrighi G (2008) Adam Smith em Pequim origens e fun-damentos do seacuteculo xxi Satildeo Paulo Brasil Boitempo

Bandeira L A M (2004) As relaccedilotildees perigosas Brasil-Es-tados Unidos Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Bra-sileira

Bandeira L A M (2003) Brasil Argentina e Estados Uni-dos da Triacuteplice Alianccedila ao Mercosul (1870-2003) Rio de Janeiro Editora Revan

Becard D (2017) China y Brasil iquestmodelo de relaciones Sur-Sur Em E Pastrana B e H Gehring (eds) La proyeccioacuten de China en Ameacuterica Latina y el Caribe (pp 387-408) Bogotaacute Colocircmbia Editorial Javeriana

Becard D Lessa A e Silveira L (2020) One step closer The politics and the economics of chinarsquos strategy in Brazil and the case of the electric power sector Em R Bernal-Meza R e X Li (eds) China-Latin America

relations in the 21st Century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 55-81) Nova York Estados Unidos Palgrave Macmillan

Becard D Barros-Platiau A e Lessa A (2019) Brazil in the brics after tem years Past present and near futu-re perspectives Em X Li (ed) The international po-litical economy of the brics (pp 135-149) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Beckerman M e Moncaut N (2016) Las relaciones en-tre China y Ameacuterica Latina iquestHacia la desestructura-cioacuten de los sistemas productivos de la regioacuten Em C Moneta e S Cesariacuten (eds) La tentacioacuten pragmaacutetica China-ArgentinaAmeacuterica Latina lo actual lo proacuteximo y lo distante (pp 185-202) Saacuteenz Pentildea Argentina Uni-versidad Nacional de Tres de Febrero

Benaion N (2006) Subordinaccedilatildeo reiterada imperialismo e desenvolvimento no Brasil Manaus Brasil Editora da Universidade Federal do Amazonas

Bernal-Meza R (2019a) Brazil as an emerging power The impact of international and internal deteriorational effect on the brics Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 118-134) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Bernal-Meza R (2019b) Brasil ascenso declinacioacuten y nuevos desafiacuteos de una potencia emergente (2003-2018) Revista Izquierdas 49(2020) 516-540

Bernal-Meza R (2015) Pensamiento chileno en la poliacuteti-ca exterior y en las teoriacuteas de relaciones internaciona-les Em M Artaza e C Ross (eds) La poliacutetica exterior de Chile 1990-2009 (pp 21-47) Santiago Chile ril Editores

Bernal-Meza R (2014) La heterogeneidad de la imagen de China en la poliacutetica exterior latinoamericana Pers-pectivas para la concertacioacuten de poliacuteticas Comentario Internacional 14 113-134

Bernal-Meza R (2013) Ameacuterica Latina en el mundo el pensamiento latino-americano y la teoriacutea de relaciones internaciones Buenos Aires Argentina Grupo Editor Latinoamericano

Bernal-Meza R (2002) A poliacutetica exterior do Brasil 1990-2002 Revista Brasileira de Poliacutetica Internacional 45(1) 36-71

Bernal-Meza R e Bizzozero L (eds) (2014) La poliacutetica internacional de Brasil de la regioacuten al mundo Monte-videacuteu Uruguai Ediciones Cruz del Sur

Bernal-Meza R e Li X (eds) (2020) China-Latin Ameri-ca relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges Nova York Estados Uni-dos Palgrave Macmillan

24

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

Bolsonaro J (2018) O caminho da prosperidade pro-posta de Plano de Governo Recuperado de httpdivulgacandcontastsejusbrcandidaturasof i-cial2018BRBR2022802018280000614517propos-ta_1534284632231pdf

Bricentildeo Ruiz J e Simonoff A (orgs) (2015) Integracioacuten y cooperacioacuten regional en Ameacuterica Latina una relectura a partir de la teoriacutea de la autonomiacutea Buenos Aires Ar-gentina Editorial Biblos

Bueno C (2003) Poliacutetica externa da Primeira Repuacuteblica os anos de apogeu (1902-1918) Satildeo Paulo Brasil Paz e Terra

Cano W (2012) A desindustrializaccedilatildeo no Brasil (texto para discussatildeo 200) Campinas Brasil Instituto de Economia da Unicamp

Cervo A L (2019 28 de novembro) Governo Bolso-naro natildeo traraacute ruptura agrave poliacutetica externa Exame Recuperado de httpsexameabrilcombrmundogoverno-bolsonaro-nao-trara-ruptura-a-politica-ex-terna-avalia-amado-cervo

Cervo A (2008) Inserccedilatildeo internacional formaccedilatildeo dos conceitos brasileiros Satildeo Paulo Brasil Saraiva

Cervo A (2002) Relaccedilotildees Internacionais do Brasil a era Cardoso Revista Brasileira de Poliacutetica Internacional 45(1) 5-35

Cervo A e Bueno C (2015) Histoacuteria da poliacutetica exterior do Brasil Brasiacutelia Brasil Editora da Universidade de Brasiacutelia

Chang H H (2018 15 jan) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da histoacuteria da economia El Paiacutes Recuperado de ht-tpsbrasilelpaiscombrasil20180105econo-mia1515177346_780498html

Cronologia relembre os fatos mais importantes da cri-se venezuelana g1 httpsg1globocommundonoticia20190430cronologia-relembre-os-fa-tos-mais-importantes-na-crise-venezuelanaghtml

Doratioto F e Vidigal C (2015) Histoacuteria das Relaccedilotildees In-ternacionais do Brasil Satildeo Paulo Brasil Editora Saraiva

Dussel Peters E (coord) (2016) La nueva relacioacuten comer-cial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestInte-gracioacuten o desintegracioacuten regional Meacutexico-df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universidades de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico

Filgueiras L e Gonccedilalves R (2007) A economia poliacutetica do governo Lula Rio de Janeiro Brasil Contraponto

Fiori J(1999) Estado e moedas no desenvolvimento das naccedilotildees Petroacutepolis Brasil Vozes

Flisfisch A (2011) La Poliacutetica exterior chilena y Ameacuterica del Sur Estudios Internacionales (168) 115-141

Fonseca Jr G (2012) Rio Branco diante do Monroiacutesmo e do Pan-Americanismo anotaccedilotildees Em M Pereira e M Gomes (orgs) Baratildeo do Rio Branco 100 anos de memoacuteria (pp 565-602) Brasiacutelia Brasil Fundaccedilatildeo Alexandre de Gusmatildeo

Franccedila T (2007) Self made nation Domiacutecio da Gama e o pragmatismo do bom senso (tese de doutorado) Brasiacute-lia Brasil Universidade de Brasiacutelia

Guimaratildees S (2018) A poliacutetica exterior e a posiccedilatildeo do Brasil no mundo Recuperado de httpswwwnodalam201812a-politica-exterior-e-a-posicao-do-brasil-no-mundo-por-samuel-pinheiro-guimaraes-2

Gullo M (2018) Relaciones internacionales una teoriacutea criacutetica desde la periferia latinoamericana Buenos Ai-res Argentina Editorial Biblos

Gullo M (2014) A subordinaccedilatildeo fundante breve histoacuteria da construccedilatildeo do poder pelas naccedilotildees Florianoacutepolis Brasil Insular

Hiratuka C (2016) Impactos de China sobre el proceso de integracioacuten regional de Mercosur Em E Dussel Peters (coord) La nueva relacioacuten comercial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestIntegracioacuten o desintegracioacuten (pp 195-243) Meacutexico df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universida-des de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico Recuperado de httpswww3ecouni-campbrNeitimagesdestaque2016_La_nueva_rela-cion_comercial_ALC_Chinapdf

Hobsbawm E (1994) Extremes The Short Twentieth Cen-tury 1914-1991 Londres Inglaterra Michael Joseph Ltd

Kennedy P (1987) The rise and fall of the great powers Economic change and military conflict from 1500 to 2000 Nova York Estados Unidos Vintage Books

Keohane R e Nye J (1977) Power and interdependence World politics in transition Boston Estados Unidos Little Brown and Company

Lafer C (2002) JK e o programa de metas (1956-1961) Rio de Janeiro Brasil Fundaccedilatildeo Getuacutelio Vargas

Landim R (2019 6 de setembro) Brasil e Argentina adiam em 9 anos livre-comeacutercio de autos Folha de S Paulo Recuperado de httpswww1folhauolcombrmerca-do201909brasil-e-argentina-adiam-em-9-anos-li-vre-comercio-de-autosshtml

Lessa A e Oliveira H A (orgs) (2013) Parcerias estra-teacutegicas do Brasil v 1 os significados e as experiecircncias tradicionais Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

25Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Li X (2020) Revisiting China-Latin America economic relations An unintended consequence of different industrialization strategies Em R Bernal-Meza e X Li (eds) China-Latin America relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 225-251) Nova York Estados UnidosLondres Inglaterra Palgrave Macmillan

Li X (2019a) Chinarsquos dual position in the capitalist world order A dual complexity of hegemony and counter-he-gemony Em Li X (ed) The international political eco-nomy of the brics (pp 1-17) Abindon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2019b) The international political economy of the brics Nova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2014) The brics and beyond The international political economy of the emergence of a new world or-der Farnham Reino Unido Ashgate

Li X (2012) China y el orden mundial capitalista el nexo de la transformacioacuten interna de China y su impacto externo Em R Bernal-Meza e S Quintanar (eds) Regionalismo y Orden Mundial Surameacuterica Europa China (pp 29-53) Buenos Aires Argentina Nuevoha-cerUniversidad Nacional del Centro de la Provincia de Buenos Aires

Li X e Farah A (eds) (2013) China-Africa relations in an era of great transformations Farnham Reino Unido Ashgate

Lins A (1996) Rio Branco (Biografia) Satildeo Paulo Brasil Editora Alfa Omega

Mandelbaum M (2010) The frugal superpower Americarsquos global leadership in a cash-strapped era Nova York Es-tados Unidos Public Affairs

Meneses E (1988) Coping with decline Chilean fo-reign policy during the twentieth century 1902-1972 Oxford Reino Unido University of OxfordBodleian Library

Nabuco J (1949) Obras completas v xii Rio de Janeiro Brasil Instituto Progresso Editorial sa

Nasr V (2014) The dispensable nation American foreign policy in retreat Nova York Estados Unidos Anchor and Doubleday

Oliveira R (2018 15 de janeiro) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da his-toacuteria da economia (entrevista com Ha-Joon Chang) El Paiacutes Recuperado de httpsbrasilelpaiscombra-sil20180105economia1515177346_780498html

Pearson F e Rochester M (2007) Relaciones internacio-nales situacioacuten global en el siglo xxi Meacutexico-df Meacute-xico Mc Graw Hill

Pecequilo C (2012) As relaccedilotildees Brasil-Estados Unidos Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

Polanyi K (1957) The great transformation the political and economic origins of our time Boston Estados Uni-dos Beacon Press

Rodrigues J Seitenfus R e Rodrigues L (orgs) (1995) Uma histoacuteria diplomaacutetica do Brasil (1531-1945) Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Brasileira

Seitenfus R (2003) O Brasil vai agrave guerra o processo de envolvimento brasileiro na Segunda Guerra Mundial 3a ed Satildeo Paulo Brasil Barueri

Spector M (2019 25 abril) Eacute hora de construir uma po-liacutetica externa poacutes-Bolsonaro Folha de S Paulo Re-cuperado de httpswww1folhauolcombr colunasmatiasspektor201904e-hora-de-construir-a-politi-ca-externa-pos-bolsonaroshtml

Stunkel O Com Bolsonaro a poliacutetica externa se tor-nou uma caixa de surpresas (entrevista agrave Deutsche Welle Brasil) Recuperado de httpswwwterracombrnoticiasbrasil com-bolsonaro-politica-ex-terna-se-tornou-uma-caixa-de-surpresas 7f6f-814287c0240a2f3f93ad aa39af65jpo4zbzghtml

Tarzi S (2007) Neorealism neoliberalism and the inter-national system International Studies (41) 115-128

Vadell J e Ramos L (2019) The role of declining Brazil and ascending China in the brics initiative Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 75-94) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Viana F L (1959) A vida do Baratildeo do Rio Branco Rio de Janeiro Brasil Joseacute Olympio

Vidigal C (2009) Relaccedilotildees Brasil-Argentina o primeiro ensaio Curitiba Brasil Juruaacute

Page 14: Bolsonaro versus Rio Branco: transição hegemônica, América ...2011/02/15  · Contra-hegemonia e ordem capitalista mundial por meio do brics, brics-plus e de outros agru-pamentos,

24

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

ensp C E Vidigal R Bernal-Meza

Bolsonaro J (2018) O caminho da prosperidade pro-posta de Plano de Governo Recuperado de httpdivulgacandcontastsejusbrcandidaturasof i-cial2018BRBR2022802018280000614517propos-ta_1534284632231pdf

Bricentildeo Ruiz J e Simonoff A (orgs) (2015) Integracioacuten y cooperacioacuten regional en Ameacuterica Latina una relectura a partir de la teoriacutea de la autonomiacutea Buenos Aires Ar-gentina Editorial Biblos

Bueno C (2003) Poliacutetica externa da Primeira Repuacuteblica os anos de apogeu (1902-1918) Satildeo Paulo Brasil Paz e Terra

Cano W (2012) A desindustrializaccedilatildeo no Brasil (texto para discussatildeo 200) Campinas Brasil Instituto de Economia da Unicamp

Cervo A L (2019 28 de novembro) Governo Bolso-naro natildeo traraacute ruptura agrave poliacutetica externa Exame Recuperado de httpsexameabrilcombrmundogoverno-bolsonaro-nao-trara-ruptura-a-politica-ex-terna-avalia-amado-cervo

Cervo A (2008) Inserccedilatildeo internacional formaccedilatildeo dos conceitos brasileiros Satildeo Paulo Brasil Saraiva

Cervo A (2002) Relaccedilotildees Internacionais do Brasil a era Cardoso Revista Brasileira de Poliacutetica Internacional 45(1) 5-35

Cervo A e Bueno C (2015) Histoacuteria da poliacutetica exterior do Brasil Brasiacutelia Brasil Editora da Universidade de Brasiacutelia

Chang H H (2018 15 jan) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da histoacuteria da economia El Paiacutes Recuperado de ht-tpsbrasilelpaiscombrasil20180105econo-mia1515177346_780498html

Cronologia relembre os fatos mais importantes da cri-se venezuelana g1 httpsg1globocommundonoticia20190430cronologia-relembre-os-fa-tos-mais-importantes-na-crise-venezuelanaghtml

Doratioto F e Vidigal C (2015) Histoacuteria das Relaccedilotildees In-ternacionais do Brasil Satildeo Paulo Brasil Editora Saraiva

Dussel Peters E (coord) (2016) La nueva relacioacuten comer-cial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestInte-gracioacuten o desintegracioacuten regional Meacutexico-df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universidades de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico

Filgueiras L e Gonccedilalves R (2007) A economia poliacutetica do governo Lula Rio de Janeiro Brasil Contraponto

Fiori J(1999) Estado e moedas no desenvolvimento das naccedilotildees Petroacutepolis Brasil Vozes

Flisfisch A (2011) La Poliacutetica exterior chilena y Ameacuterica del Sur Estudios Internacionales (168) 115-141

Fonseca Jr G (2012) Rio Branco diante do Monroiacutesmo e do Pan-Americanismo anotaccedilotildees Em M Pereira e M Gomes (orgs) Baratildeo do Rio Branco 100 anos de memoacuteria (pp 565-602) Brasiacutelia Brasil Fundaccedilatildeo Alexandre de Gusmatildeo

Franccedila T (2007) Self made nation Domiacutecio da Gama e o pragmatismo do bom senso (tese de doutorado) Brasiacute-lia Brasil Universidade de Brasiacutelia

Guimaratildees S (2018) A poliacutetica exterior e a posiccedilatildeo do Brasil no mundo Recuperado de httpswwwnodalam201812a-politica-exterior-e-a-posicao-do-brasil-no-mundo-por-samuel-pinheiro-guimaraes-2

Gullo M (2018) Relaciones internacionales una teoriacutea criacutetica desde la periferia latinoamericana Buenos Ai-res Argentina Editorial Biblos

Gullo M (2014) A subordinaccedilatildeo fundante breve histoacuteria da construccedilatildeo do poder pelas naccedilotildees Florianoacutepolis Brasil Insular

Hiratuka C (2016) Impactos de China sobre el proceso de integracioacuten regional de Mercosur Em E Dussel Peters (coord) La nueva relacioacuten comercial de Ameacuterica Latina y el Caribe con China iquestIntegracioacuten o desintegracioacuten (pp 195-243) Meacutexico df Meacutexico Red Acadeacutemica de Ameacuterica Latina y el Caribe sobre ChinaUniversidad Nacional Autoacutenoma de MeacutexicoUnioacuten de Universida-des de Ameacuterica Latina y CaribeCentro de Estudios China-Meacutexico Recuperado de httpswww3ecouni-campbrNeitimagesdestaque2016_La_nueva_rela-cion_comercial_ALC_Chinapdf

Hobsbawm E (1994) Extremes The Short Twentieth Cen-tury 1914-1991 Londres Inglaterra Michael Joseph Ltd

Kennedy P (1987) The rise and fall of the great powers Economic change and military conflict from 1500 to 2000 Nova York Estados Unidos Vintage Books

Keohane R e Nye J (1977) Power and interdependence World politics in transition Boston Estados Unidos Little Brown and Company

Lafer C (2002) JK e o programa de metas (1956-1961) Rio de Janeiro Brasil Fundaccedilatildeo Getuacutelio Vargas

Landim R (2019 6 de setembro) Brasil e Argentina adiam em 9 anos livre-comeacutercio de autos Folha de S Paulo Recuperado de httpswww1folhauolcombrmerca-do201909brasil-e-argentina-adiam-em-9-anos-li-vre-comercio-de-autosshtml

Lessa A e Oliveira H A (orgs) (2013) Parcerias estra-teacutegicas do Brasil v 1 os significados e as experiecircncias tradicionais Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

25Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Li X (2020) Revisiting China-Latin America economic relations An unintended consequence of different industrialization strategies Em R Bernal-Meza e X Li (eds) China-Latin America relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 225-251) Nova York Estados UnidosLondres Inglaterra Palgrave Macmillan

Li X (2019a) Chinarsquos dual position in the capitalist world order A dual complexity of hegemony and counter-he-gemony Em Li X (ed) The international political eco-nomy of the brics (pp 1-17) Abindon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2019b) The international political economy of the brics Nova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2014) The brics and beyond The international political economy of the emergence of a new world or-der Farnham Reino Unido Ashgate

Li X (2012) China y el orden mundial capitalista el nexo de la transformacioacuten interna de China y su impacto externo Em R Bernal-Meza e S Quintanar (eds) Regionalismo y Orden Mundial Surameacuterica Europa China (pp 29-53) Buenos Aires Argentina Nuevoha-cerUniversidad Nacional del Centro de la Provincia de Buenos Aires

Li X e Farah A (eds) (2013) China-Africa relations in an era of great transformations Farnham Reino Unido Ashgate

Lins A (1996) Rio Branco (Biografia) Satildeo Paulo Brasil Editora Alfa Omega

Mandelbaum M (2010) The frugal superpower Americarsquos global leadership in a cash-strapped era Nova York Es-tados Unidos Public Affairs

Meneses E (1988) Coping with decline Chilean fo-reign policy during the twentieth century 1902-1972 Oxford Reino Unido University of OxfordBodleian Library

Nabuco J (1949) Obras completas v xii Rio de Janeiro Brasil Instituto Progresso Editorial sa

Nasr V (2014) The dispensable nation American foreign policy in retreat Nova York Estados Unidos Anchor and Doubleday

Oliveira R (2018 15 de janeiro) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da his-toacuteria da economia (entrevista com Ha-Joon Chang) El Paiacutes Recuperado de httpsbrasilelpaiscombra-sil20180105economia1515177346_780498html

Pearson F e Rochester M (2007) Relaciones internacio-nales situacioacuten global en el siglo xxi Meacutexico-df Meacute-xico Mc Graw Hill

Pecequilo C (2012) As relaccedilotildees Brasil-Estados Unidos Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

Polanyi K (1957) The great transformation the political and economic origins of our time Boston Estados Uni-dos Beacon Press

Rodrigues J Seitenfus R e Rodrigues L (orgs) (1995) Uma histoacuteria diplomaacutetica do Brasil (1531-1945) Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Brasileira

Seitenfus R (2003) O Brasil vai agrave guerra o processo de envolvimento brasileiro na Segunda Guerra Mundial 3a ed Satildeo Paulo Brasil Barueri

Spector M (2019 25 abril) Eacute hora de construir uma po-liacutetica externa poacutes-Bolsonaro Folha de S Paulo Re-cuperado de httpswww1folhauolcombr colunasmatiasspektor201904e-hora-de-construir-a-politi-ca-externa-pos-bolsonaroshtml

Stunkel O Com Bolsonaro a poliacutetica externa se tor-nou uma caixa de surpresas (entrevista agrave Deutsche Welle Brasil) Recuperado de httpswwwterracombrnoticiasbrasil com-bolsonaro-politica-ex-terna-se-tornou-uma-caixa-de-surpresas 7f6f-814287c0240a2f3f93ad aa39af65jpo4zbzghtml

Tarzi S (2007) Neorealism neoliberalism and the inter-national system International Studies (41) 115-128

Vadell J e Ramos L (2019) The role of declining Brazil and ascending China in the brics initiative Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 75-94) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Viana F L (1959) A vida do Baratildeo do Rio Branco Rio de Janeiro Brasil Joseacute Olympio

Vidigal C (2009) Relaccedilotildees Brasil-Argentina o primeiro ensaio Curitiba Brasil Juruaacute

Page 15: Bolsonaro versus Rio Branco: transição hegemônica, América ...2011/02/15  · Contra-hegemonia e ordem capitalista mundial por meio do brics, brics-plus e de outros agru-pamentos,

25Bolsonaro versus Rio Branco transiccedilatildeo hegemocircnica Ameacuterica do Sul e poliacutetica externa

Revista de Relaciones Internacionales Estrategia y Seguridad Vol 15(2)

Li X (2020) Revisiting China-Latin America economic relations An unintended consequence of different industrialization strategies Em R Bernal-Meza e X Li (eds) China-Latin America relations in the 21st century The dual complexities of opportunities and challenges (pp 225-251) Nova York Estados UnidosLondres Inglaterra Palgrave Macmillan

Li X (2019a) Chinarsquos dual position in the capitalist world order A dual complexity of hegemony and counter-he-gemony Em Li X (ed) The international political eco-nomy of the brics (pp 1-17) Abindon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2019b) The international political economy of the brics Nova York Estados Unidos Routledge

Li X (ed) (2014) The brics and beyond The international political economy of the emergence of a new world or-der Farnham Reino Unido Ashgate

Li X (2012) China y el orden mundial capitalista el nexo de la transformacioacuten interna de China y su impacto externo Em R Bernal-Meza e S Quintanar (eds) Regionalismo y Orden Mundial Surameacuterica Europa China (pp 29-53) Buenos Aires Argentina Nuevoha-cerUniversidad Nacional del Centro de la Provincia de Buenos Aires

Li X e Farah A (eds) (2013) China-Africa relations in an era of great transformations Farnham Reino Unido Ashgate

Lins A (1996) Rio Branco (Biografia) Satildeo Paulo Brasil Editora Alfa Omega

Mandelbaum M (2010) The frugal superpower Americarsquos global leadership in a cash-strapped era Nova York Es-tados Unidos Public Affairs

Meneses E (1988) Coping with decline Chilean fo-reign policy during the twentieth century 1902-1972 Oxford Reino Unido University of OxfordBodleian Library

Nabuco J (1949) Obras completas v xii Rio de Janeiro Brasil Instituto Progresso Editorial sa

Nasr V (2014) The dispensable nation American foreign policy in retreat Nova York Estados Unidos Anchor and Doubleday

Oliveira R (2018 15 de janeiro) O Brasil estaacute experimen-tando uma das maiores desindustrializaccedilotildees da his-toacuteria da economia (entrevista com Ha-Joon Chang) El Paiacutes Recuperado de httpsbrasilelpaiscombra-sil20180105economia1515177346_780498html

Pearson F e Rochester M (2007) Relaciones internacio-nales situacioacuten global en el siglo xxi Meacutexico-df Meacute-xico Mc Graw Hill

Pecequilo C (2012) As relaccedilotildees Brasil-Estados Unidos Belo Horizonte Brasil Fino Traccedilo

Polanyi K (1957) The great transformation the political and economic origins of our time Boston Estados Uni-dos Beacon Press

Rodrigues J Seitenfus R e Rodrigues L (orgs) (1995) Uma histoacuteria diplomaacutetica do Brasil (1531-1945) Rio de Janeiro Brasil Civilizaccedilatildeo Brasileira

Seitenfus R (2003) O Brasil vai agrave guerra o processo de envolvimento brasileiro na Segunda Guerra Mundial 3a ed Satildeo Paulo Brasil Barueri

Spector M (2019 25 abril) Eacute hora de construir uma po-liacutetica externa poacutes-Bolsonaro Folha de S Paulo Re-cuperado de httpswww1folhauolcombr colunasmatiasspektor201904e-hora-de-construir-a-politi-ca-externa-pos-bolsonaroshtml

Stunkel O Com Bolsonaro a poliacutetica externa se tor-nou uma caixa de surpresas (entrevista agrave Deutsche Welle Brasil) Recuperado de httpswwwterracombrnoticiasbrasil com-bolsonaro-politica-ex-terna-se-tornou-uma-caixa-de-surpresas 7f6f-814287c0240a2f3f93ad aa39af65jpo4zbzghtml

Tarzi S (2007) Neorealism neoliberalism and the inter-national system International Studies (41) 115-128

Vadell J e Ramos L (2019) The role of declining Brazil and ascending China in the brics initiative Em X Li (ed) The international political economy of the brics (pp 75-94) Abingdon InglaterraNova York Estados Unidos Routledge

Viana F L (1959) A vida do Baratildeo do Rio Branco Rio de Janeiro Brasil Joseacute Olympio

Vidigal C (2009) Relaccedilotildees Brasil-Argentina o primeiro ensaio Curitiba Brasil Juruaacute

Page 16: Bolsonaro versus Rio Branco: transição hegemônica, América ...2011/02/15  · Contra-hegemonia e ordem capitalista mundial por meio do brics, brics-plus e de outros agru-pamentos,