boletim do kaos 7

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Nova edição do Jornal Boletim do Kaos com entrevista com Gilberto DImenstein (Folha Beco Escola Aprendiz) e Junior (AfroRegaae) .

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ONDE PEGAR O SEU EXEMPLARSÃO PAULO - CAPITAL

Região CentralDGT Filmes Rua 13 de Maio, 70Ação Educativa Rua General Jardim, 660Sebo 264 Rua Rua Álvares Machado, 42Liberdade - (11) 3105-8217Restaurante Santa MadalenaRua Sta Madalena, 27 - Bela VistaConduta Galeria 24 de MaioPorte Ilegal - Galeria 24 de MaioEspaço MatilhaRua Rêgo Freitas, 542

Zona LesteLoja Suburbano ConvictoRua Nogueira Vioti, 56 - Itaim Pta(11) 2569-9151Locadora New HolidayRua Nogueira Vioti (11) 2572-2000Casa de Cultura do Itaim PaulistaPça Lions Clube, s/nº - Itaim Pta.Sebo MutanteRua Barão de Alagoas, 76-A - Itaim Paulista

Zona SulItaú Cultural (Na Biblioteca/Midiateca)Av. Paulista, 149 - 2º MezaninoBar do Zé Batidão Rua Bartolomeu dosSantos, 797 - Chácara SantanaLoja 1 da Sul Rua Comendador Santana,138 - Capão RedondoLoja 1 da Sul Av Adolfo Pinheiro, 384Loja 31 - Galeria Borba GatoEstudio 1 da SulRua Grissom, 80-a - Metrô CapãoSarau da Cooperifa (Toda quarta as 20h30)Rua Bartolomeu dos Santos, 797Chácara SantanaSarau do Binho Rua Avelino Lemos Jr., 60Campo Limpo (11) 5844-6521Sarau da Ademar Rua Pablo Pimentel, 65Cidade Ademar (11) 5622-4410

Zona OesteBar do Santista/Sarau Elo da CorrenteRua Jurubim, 788-a Pirituba

Zona NorteCCJ - Vila Nova CachoeirinhaAv Dep. Emílio Carlos, 3641Banca de JornalAlt. Nº 450 da Rua Dr César Castiglioni Jr.Sarau da Brasa - Bar da CarlitaRua Prof.Viveiros Raposo, 234

SuzanoCentro Cultural de SuzanoRua Benjamin Constant, 682 - Centro

SantosDULIXO no Marapé[email protected]

www.boletimdokaos.blogspot.comPeça pelo email:[email protected]

No ambiente atual, a sociedade enfrenta problemas sociaiscomplexos, nesse panorama iniciativas de trabalhos sociais que melhoramas comunidades e organizam a população em busca de um lugar maiscivilizado se tornaram essenciais. Em 2009 os problemas ainda continuam,mas hoje já temos exemplos de organizações que mudaram as realidadesonde atuam e são referências no mundo e dois dos maiores exemplosdesse trabalho estão na capa.

Trabalhos que romperam a sua experiência local e ganharamprojeção servindo de exemplo. Essas iniciativas capitalizaram e ampliaram,em muito, seu poder de ação. Fazendo jus à frase de Machado de Assis,outro personagem dessa edição, o mestre carioca dizia. “O dinheiro nãotraz felicidade — para quem não sabe o que fazer com ele.”

O exemplo esta aí, AfroReggae transformou a guerra do tráficocarioca em cultura. Em São Paulo, o Bairro Escola Aprendiz mostrou que,unindo ações e integrando a comunidade, mudamos a nossa realidade.

Só falta agora os governantes se espelharem nessas atitudespara formar um Brasil Aprendiz, onde o estudo e o ser humano, será ogrande foco do investimento público e privado.

Alexandre De Maio

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COORDENADOR FALA

COMO AFROREGGAE

MUDOU A REALIDADE DA

COMUNIDADES ONDE

NASCEU E HOJE É

REFERÊNCIA NO PAÍS

Ele é coordenador do AfroReggae e,como ele mesmo se denomina, “um sonhador”.Mas além de sonhador posso afirmar que eleé um realizador, aliás, ele é o que podemoschamar de sucesso do Terceiro Setor. José,no entanto, não quer expandir seu trabalhode uma maneira qualquer. “Não queremosvirar um Mc Donald´s”, afirma.

Conheça esse agitador cultural ementrevista exclusiva ao Jornal Boletim do Kaos.

Texto e entrevista: Alessandro Buzo

O AfroReggae nasceu depois da chacinade Vigário Geral. O que você lembra des-se dia? Como vê essa lembrança nacomunidade e o que acha que mudou,com relação à falta de segurança e aoabuso de poder, de lá pra cá?Eu não sou de Vigário Geral e não estava lá nodia da chacina. Nós fomos para lá impulsi-onados pela chacina, pela brutalidade que elafoi. Não sabíamos o que fazer, mas tínhamosde agir. Começamos as oficinas de formaamadora. De lá para cá, Vigário mudou muito.Sem modéstia alguma, digo que o AfroReggaetem enorme participação nas mudanças

ocorridas por lá. A gente tirou a favela das páginaspoliciais e a colocou nas páginas culturais. Levamospara lá pessoas que nunca tinham entrado numa favela.Levamos a opinião e o poder público. E principalmente:transformamos diretamente a vida de muitas pessoasque moram lá.

Vi num filme você dizer que antes do AfroReggaenada dava certo na sua vida (e dos integrantesdo grupo). Foi a chacina que trouxe força paravencer em nome de quem morreu, ou em nomeda comunidade atingida?Não existe essa relação com a chacina. No AfroReggaea gente acredita muito em Shiva, Deus da destruição eda transformação. Muitos integrantes do AfroReggaechegaram ao limite. Cada um com uma história, comuma particularidade. E quando não havia maisesperança, veio a luz.

O que acha das favelas do Rio de Janeiro nasquais a Polícia diz ter expulsado os traficantes,como Santa Marta e Cidade de Deus?Sempre digo que a violência no Rio já foi muito pior. Adiferença é que antes não aparecia. Quanto maisaparece, melhor, pois a opinião pública e o governotomam atitudes.

Vigário Geral e Parada de Lucas, que são juntas paraquem não conhece, estiveram por 25 anos dominadaspor facções diferentes (de um lado o ComandoVermelho e do outro o Terceiro Comando). Como pôde,por tantos anos, haver essa divisão? Como a comu-nidade via isso?Essas duas favelas, como tantas outras, viveram a ausênciado Estado. Na ausência de um poder, aparecem outros. Aguerra entre Lucas e Vigário foi a pior que já existiu no Rio,quiçá no Brasil. Foram 25 anos de muita violência. Muitasmortes. Famílias foram divididas. Tinham que se encontrarbem longe da região, num lugar neutro. Se alguém de umadas comunidades visse o encontro, essas pessoas poderiamser taxadas de “xis noves”. E mesmo quem não tinhanenhuma relação com o tráfico acabava, de certa forma,envolvido nesta história. O ódio entre as duas comunidadesvirou um sentimento quase institucionalizado. Para quemnão é de favela é difícil descrever a hostilidade e a rivalidadeem que viviam.

Há poucos anos um só comando domina essas duasfavelas. O que mudou para a comunidade ?Muita coisa. Hoje os moradores têm o direito de ir e vir,direito básico, mas que até bem pouco tempo atrás eles nãotinham. Os tiros, que eram diários, se tornaram escassos.Mas a paz não é só porque hoje existe apenas uma facção.Muita coisa mudou na favela. A consciência, a cidadania eaté os investimentos cresceram muito nos últimos tempos.

“COMEÇAMOS ASOFICINAS DE FORMAAMADORA. A GENTETIROU A FAVELA DAS

PÁGINAS POLICIAIS EA COLOCOU NAS

PÁGINAS CULTURAIS”

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O limite entre uma favela e outra é conhe-cido como "Faixa de Gaza". Fale desse lugare conte como era morar ali antes e como émorar hoje.A Faixa de Gaza é a rua que marcava a fronteiraentre Vigário e Lucas. Ali não há uma só casa quenão tenha as paredes furadas pelas balas. Du-rante praticamente todos os dias, em 25 anos,houve tiroteio ali. Muitos se foram e há casasabandonadas por lá. Ninguém ousava passar porali. Hoje é uma região pacífica, usada, inclusive,para cruzar a fronteira entre as duas favelas.

O AfroReggae está prestes a inaugurar umamega sede em Vigário Geral. Comente sobreo lugar. Como foi conquistar isso?Ele é a materialização de um sonho. Será erguidono local onde foi a primeira sede do AfroReggae,só que muito maior. Como o AfroReggae, ele éaudacioso. Queremos levar a elite para a favela.O projeto gráfico é do Luiz Stein e a curadoriavai ser do antropólogo Hermano Vianna. Será umcentro de educação artística. Lá haverá aulasque só existirão lá. Se um menino rico de Ipanemaquiser fazer aula com o DJ mais bombado domundo, ele terá de ir até Vigário. O Centro Cul-tural Waly Salomão é a simbolização da ponteque queremos construir: uma via de mão dupla,que une classes sociais diferentes, coresdiferentes, crenças diferentes.

Em quantas comunidades do Rio de Janeiroo AfroReggae está presente? E quais são?São quatro núcleos: Vigário, Lucas, Complexodo Alemão e Cantagalo. Também temos oficinasem Nova Iguaçu. Mas hoje o AfroReggae não estárestrito aos núcleos. A atuação vai Brasil afora.Temos projetos regulares e sedimentados emMinas, na Índia, na Inglaterra, entre outros.Através da nossa parceria com a Hering, quevende nossas peças em todas as lojas do Brasil,estamos, de certa forma, no país inteiro.

Por que, diferente da CUFA,vocês não abrem filiais emoutros estados?Não queremos virar um McDonald´s do Terceiro Setor.

Vi você dizer que cobra caro para seapresentar no exterior. Você é tipo um "RobinHood", tira dos ricos e dá aos pobres?Não. Mas o AfroReggae quer ser autossustentável

e para isso temos de cobrar. A diferençaé que a gente não quer ficar rico. Nãovisamos apenas o lucro. Queremoslucrar sim, mas para reinvestir.

Achei incrível você dizer que, paraalgum rico ajudar, basta aumentar osalário e diminuir a carga horária de suaempregada doméstica. Comente isso.As pessoas mitificam muito as coisas.Mudar o mundo não é tão fácil, masquando se deixa de olhar o tempo todopara o próprio umbigo, os resultados jáaparecem. Todo o mundo tem responsa-bilidade por essa situação em queestamos e todo o mundo pode contri-buir para mudar. Basta querer. Às vezes,atitudes que parecem pequenas fazemuma grande diferença.

Conhece a Literatura Periférica,produzida nos guetos, principal-

mente de São Paulo? O que acha de suburbanos publicandolivros, se-jam eles de São Paulo, Rio de Janeiro ou qualqueroutro estado?Conheço! Já li coisas do Ferréz, da Cooperifa; o que você temescrito; Bill, Celso; Ecio Salles (que nasceu no Complexo doAlemão); Octavio Junior (do Complexo da Penha); DJ Raffa (Brasília)e mais um monte de gente que manda super bem. Alguns com umgrande impacto na mídia e outros nem tanto, mas de igualprofundidade e qualidade.

Gosta de hip hop, o que você curte no rap Nacional?Curtia muito o Faces do Subúrbio (Pernambuco) e Câmbio Negro(Brasília), ambos pararam. Mas tem muita gente na ativa que curtoa sonoridade: Gog (Brasilia), Da Guedes (Porto Alegre), ClãNordestino (Maranhão) e mais um monte de gente.

Um livro? Che Guevara, uma biografia, de Jon Lee Anderson.Um filme? O Último Samurai.Um time? Uma vez Flamengo, sempre Flamengo.Um sonho? Não ver mais meninos no tráfico.

Por que o AfroReggae faz tanto sucesso?Porque ele une as diferenças, quebra barreiras e estereótipos.Há espaço para todos: negros e brancos, pobres e ricos.

Fale do grupo musical AfroReggae?Foi o primeiro dos 14 grupos artísticos do AfroReggae e é umaimportante ferramenta de captação de recursos (através da vendados CDs). Eles estão terminando o terceiro CD de inéditas que serálançado ainda neste ano. O som está mais maduro e com maisinfluências do Reggae. Mas as batidas de percussão, quecaracterizam o som dos caras, estão lá. A música de trabalho “Temposem medida” já está entre as mais pedidas de algumas rádios.

O que acha de reality shows como “BBB” e “A Fazenda”?Não assisto e a minha opinião não terá conteúdo verdadeiro,porque acredito que para falar bem ou mal temos de terembasamento e, nesse caso, eu não tenho.

Pensa em ser político um dia?Não.

O que o Rio de Janeiro tem de ruim?O tráfico, a violência, a falta de disciplina e de educação. Ochamado “jeitinho”, que aqui é muito forte.

E de bom?A alegria, a espontaneidade, a irreverência e a esperança. E comose não bastasse, a cidade é linda.

Quando vem a São Paulo, o que faz e o que gosta nacidade? Gosto de ir a favelas, à Fiesp, de encontrar amigos e dadiversidade cultural.

Quem é José Junior? Um sonhador.

Do concretismo ao TwitterAlexandre De Maio

A arte concreta se encontra, hoje, com arevolução tecnológica do Twitter. A técnica literáriado microconto se encaixa perfeitamente nos 140caracteres desse novo microblog.

Em 1956, Oswald de Andrade já era moderno.Fazendo seu “poemas-pílula”, se transformou novanguardista mais radical do concretismo.

Hoje, o microconto ganhou muitos adeptos eé usado até em mensagens de celulares. A poesia nãotem hora nem lugar. O guatemalteco AugustoMonterroso, assim como o estadunidense ErnestHemingway são apontados como os grandes nomes dogênero. Ernest mostra que a limitação de caracteresnão prejudica a criatividade e, nesse microconto, contaa história de uma tragédia familiar:

Vendem-se: sapatos de bebê, sem uso.

No Brasil, o escritor Marcelino Freire publicou,em 2004, a obra “Os cem menores contos doséculo”. No livro, desafia 100 escritores a produzircontos com no máximo 50 letras. Outro autor dedestaque é Samir Mesquita, com os livros Dois Palitos e18H30. Nesses, os microcontos também têm no máximo50 letras.

As novas tecnologias de informação ecomunicação se mostram aliadas na divulgação daliteratura e nomes como Dalton Trevisan, LuizRufatto e João Gilberto Noll já se destacam nessaprática. Em uma sociedade na qual a cultura midiáticaimpera e a propaganda e a publicidade têm forteinfluência, nada melhor que o microconto parasequestrar a atenção desse público.

Na Internet, a grande dica é o portalmicrocontos.com.br

Dicas para escrever um microcontoPara escrever um microconto você tem de pegar o leitorno impacto, por isso recursos expressivos são umaboa maneira de chamar a atenção. Outra dica é começara história no meio da ação e só descrever o que fornecessário, pois o leitor irá preencher as lacunas. Umrecurso indispensável é a tal da reviravolta, como noconto convencional ou na crônica.

“Uma vida inteira pela frente.O tiro veio por trás.” Cíntia Moscovich

Arruda: “Se for o Capeta, dizque eu tô no banho.” Andrea Del Fuego

A Bíblia: “Olha, Pai, eu tentei,mas acho que não deu muitocerto não…” Antonio Prata

Gravidez: “Deu pra engordar”Cristina Alves

Minha vida colorida assimBaixa estima se acaba aquiMeu futuro encontreino conhecimentoAgora sou o que sonhei,nesse momentoFerréz

“O CENTRO CULTURAL WALYSALOMÃO É A SIMBOLIZAÇÃODA PONTE QUE QUEREMOSCONSTRUIR: UMA VIA DE MÃODUPLA, QUEUNE CLASSESSOCIAISDIFERENTES,CORESDIFERENTES,CRENÇASDIFERENTES”

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Como você começou sua carreirano jornalismo?Desde pequeno eu adoro andar a pépela cidade de São Paulo, acho que játinha ali um germe de alguém quegostava de descobrir o seu mundo. E,ao mesmo tempo, eu não tinha muitoencantamento pela escola, mas tinhamuito encantamento pela vida. Então,muito da minha educação se deu pelaobservação. Acho que sempre fui umaespécie de repórter, mesmo mirim,observando o mundo e nunca muitoconfortável em ambientes fechados,trancados.

Hoje você tem coluna na Folha deSão Paulo e um boletim na CBN,descobrindo pessoas e histórias.Qual a dica para escrever um bomperfil?Eu fui repórter nacional por muitotempo, ficando em Brasília 13 anos.Fui diretor da sucursal da Folha ecolunista de política, depois fuicorrespondente em Nova Iorque e,

quando todo o mundo talvez imaginasse queeu pudesse voltar para Brasília ou continuarem Nova Iorque, vim cobrir a cidade de SãoPaulo e seus personagens. Aí tem um poucoda alma de educador. Estou sempre atentoao que uma pessoa, por mais que sejadesconhecida, por mais anônima e simplesque seja, tenha uma boa história para contar.Temos de ter um olhar aberto para saber queem muitos lugares inesperados épossível encontrar boas histórias.

Você fez o livro Conexão Cabo Frio,que denunciava corrupção noItamaraty. Você foi perseguido?Não, não. Havia um tempo emBrasília que eu me dediquei areportagem investigativa. Cone-xão Cabo Frio foi uma delas, fizparte de um grupo que ajudou adesvendar todo um esquemacomplexo de evasão de dinheirodo Itamaraty. Na época foi umescândalo enorme. É claro quehavia pressões, ameaças veladas, mas eu nãoprecisei mudar de país por causa disso. O queeu tive um pouco mais de dificuldade foi an-tes disso. No tempo de estudante, em queainda era época do fim do regime militar, aísim, eu tive de deixar a cidade de São Paulo.Mas Brasília é uma cidade com muitas tramoias,muitas jogadas... e a Folha de S. Paulo nessaépoca tinha uma posição de muita agres-sividade, muita busca de transparência. Eu nãoera só diretor do jornal nessa época, mastambém era colunista e repórter.

E o livro República dos padrinhos,publicado antes desse?Esse livro foi o primeiro ainda na época do ogoverno Sarney. Isso que estão dizendo agorado Sarney, eu já tinha escrito no República dosPadrinhos, livro com o qual ganhei o prêmioEsso de jornalismo. Nele eu já mostrava, naquelaépoca, todo o esquema de apadri-nhamentodele com o Congresso. Exatamente como éagora com favorecimentos, o livro teve uma

super repercussão. E hoje eu ficoolhando...

Como você vê hoje, ele ainda nogoverno?Mesmo com tantos escândalos nadaacontece. Você vê que existemestruturas no poder brasileiro, quenão são intocáveis, mas que estãolá e têm proteções grandes, envol-vem empresários, senadores, de-putados.

Foi por isso que você saiu dessejornalismo investigativo e mudou seu focopara a educação?Não, não. É porque teve um tempo que eu faziamuitas investigações com foco em BrasíliaConexão Cabo Frio foi um dos exemplos. Desviode verbas dentro do Congresso envolvendofundo de pensão de deputados, teve outraparticipação que eu tive, mesmo que de formacolateral, na descoberta dos testes nucleares,no final do governo militar. Então foram várias.Comecei a fazer investigações sobre assas-sinatos e violência de crianças: a criança como

foco no desrepeitos dos diretoshumanos. E a educação foi vindo apartir daí. Mas não me desiludi comjornalismo investigativo. Sócaminhei para outro lado, tentandocompatibilizar jornalismo comeducação.

Tudo que você faz tem assimum cunho muito político. Vocêpensa em se candidatar ouparticipar mais ativamente dapolítica?Zero. Eu já tive vários convites deocupar cargos políticos, já tivesondagens para participar deesquemas partidários, mas eu nãofaço isso. Primeiro, porque nãogosto. Não tenho nem interesse,nem prazer. Mas também porqueacho que a ação do jornalistavoltado para questões sociais eeducacionais é uma ação política.Quantas pessoas a gente nãoinfluencia falando desses temasnuma CBN, numa Folha de S. Paulo,num site como o Catraca Livre?Dando aula, escrevendo livros...tem uma série de livros meus queé usada há 10, 15 anos pelasescolas públicas e privadas. Isto éuma ação política e se eu nãotivesse esse grau de apartidarismo,talvez não tivesse essa força.

Nisso tudo como é que nasceua ideia do Bairro Escola?Olha, a ideia tem várias fontes deinspiração. Eu te diria que umadelas foi um contato muito grandeque eu tive com crianças de rua,especialmente em Salvador, emque eu vi como que a culturaproduzia autoestima. Uma outrafonte forte de influência foi eu termorado em Nova Iorque numperíodo de muita efervescência,no final da década de 90, em queeu pude assistir ao que asorganizações comunitárias e ascomunidades faziam de extraor-dinário quando se reuniam paramelhorar a saúde, a educação, eessa cidade foi um laboratório paramim. Quando volto para São Paulo,volto num momento muito difícil,no final da década de 90, que foi opico dos sequestros, dos assas-sinatos, da violência, a cidade tinhapassado pelas gestões Pitta eMaluf. Aí houve um grupo depessoas do qual eu fiz parte quepensou: será que é possível criar,em uma determinada região dacidade, uma experiência quemostre a capacidade da cidade dese revitalizar a partir do conhe-cimento? Aí surge a ideia do BairroEscola.

Houve uma recente recomen-dação da ONU do projeto. Oque isso significa o que vocêainda sonha alcançar?O projeto já foi reconhecido comoreferência pela ONU, pela Unesco,agora a Universidade de Harvardfez um documento recomendandoo Bairro Escola para o presidenteObama como projeto inovador, Anossa ideia é simplesmente não

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liderar nada, é apenas ajudar outras cidadesa criarem essa articulação da comunidadecom a escola. Para se criar comunidadesinteligentes no sentido de se criar talentohumano.

A juventude tem a distância de umclique o mundo inteiro dentro docomputador. Mas esse acesso não ésempre a solução. Muitos gastam seutempo só em redes de relacionamen-tos. O que você acha? É preciso maisdo que o simples acesso à informação?O grande papel do educador hoje é ajudaro jovem a saber lidar com esse excesso deinformação, transformando isso numconhecimento útil para a vida dele.

A principal questão dos governos quevão se candidatar no ano que vem é aeducação, grande déficit brasileiro.Por onde você acha que deveríamoscomeçar essa necessária revolução?Para toda questão complexa não há respostasimples. Mas tem alguns ponto que consi-dero fundamentais. O primeiro ponto étrabalhar a educação na faixa de 0 a 6 anos.A pré-escola e a creche. Por quê? Porque jáfoi provado que se você não tem estímulonessa faixa etária, se carrega um déficit parao resto da sua vida. É preciso que as criançasfiquem mais tempo na escola com atividadeslúdicas como música, dança, teatro, cinemadando a oportunidade para o jovem desen-volver seus vários talentos. Outro pontomuito importante é uma estratégia para au-mentar o envolvimento dos pais nas esco-las. Eu te diria que é uma desafio gigantesco,não apenas de um governo, é uma políticade Estado que tem anos para tocar, e que éum desafio mais complexo do que a aboliçãoda escravatura. A abolição teve um problemasério. A abolição não deu acesso à deeducação para os negros. É por esse motivoque o fim da escravidão foi incompleto. Aluta pela educação é o mais atual e urgenteabolicionismo porque a pior escravidão é aignorância. A falta de educação.

Qual a saída para o jovem de periferiaque muitas vezes tem uma escola ruim,professores desmotivados?O jovem de periferia muitas vezes tem umaescola ruim, um professor ruim, o lazer ruim,uma cultura escassa, numa cidade de altaexigência. Sobra para ele uma dificuldadeimensa de ter um bom ensino médio, de terum bom emprego e até de entrar numa boafaculdade. É um drama enorme. Na minhavisão devem se formar grandes processos,de cobrança, de pressão pela educação pú-blica, coisa que não tem. O que que é pres-são? É as pessoas votarem em vereadores,deputados, senadores e governadores quetêm uma proposta clara com a educação.

O que voce acha dessa nova cena daliteratura marginal, os saraus e todaessa cultura periférica efervescente?Esse é o lado que se encaixa nessa cidade,que é muito melhor do que se imagina, quesão esses grupos periféricos trazendo umaliteratura, poeisa, música, dança e todo umprocesso áudio visual diferenciados. Essa

é uma cidade que está surgindo, existeuma garra, uma visão de mundo diferenteque explica uma cidade que está mudando.

Você é uma pessoa muito ativa. Mas oque te motiva realmente?O que me motiva de fato é essa sensaçãodeliciosa de que a minha capacidade decomunicar é uma capacidade de mudar ascoisas.

UMA BOAFACULDADE VAI

SER SEMPREIMPORTANTE,

MAS NÃO ÉNECESSARIAMENTE

NELA QUE VOCÊFORMA UM

JORNALISTA

O QUE ME MOTIVA É ESSAMISTURA DE EDUCAÇÃOCOM A COMUNICAÇÃO

DEVEM SE FORMAR GRANDESPROCESSOS DE COBRANÇA,

DE PRESSÃO PELA EDUCAÇÃOPÚBLICA, COISA QUE NÃO

TEM. O QUE É PRESSÃO? É ASPESSOAS VOTAREM EM

VEREADORES, DEPUTADOS,SENADORES E

GOVERNADORES QUE TÊMUMA PROPOSTA CLARA COM A

EDUCAÇÃO

Como nasceu a ideia do Catraca Livre?Nasceu do próprio Bairro Escola Aprendiz,que é a ideia de que todo o bairro setrasforme numa sala de aula em que vocêabre espaços. São Paulo tem centenas deatividades diárias nos mais variados luga-res, mesmo na periferia existem muitos con-certos de música, dança, teatro, palestrase oficinas culturais, que estavam mal utili-zados. Então surgiu essa ideia, vamos mos-trar o que a cidade oferece de graça ou apreço acessível, ao mesmo tempo vamoscapacitar as pessoas a usarem isso. Entãoo Catraca nasce ao mesmo tempo comoum projeto de multimeios, não é só praInternet, mas o Catraca está no Jornal Agora,ele tem uma Newsletter, ele esta na radio,na televisão, informando as pessoas ausarem esse mecanismo.

Gilberto comenta alguns deseus livros

Meninas da NoiteFoi um dos trabalhosmais importantes quefiz. Foi uma investi-gação que durou vá-rios meses. Mostran-do a exploração sexu-al de meninas no Bra-sil. Especialmente naAmazônia e no Nor-deste. Que foi quandoentrou na agenda brasileira o tema daprostituição infantil.

A Guerra dos MeninosFoi uma intensa reportagem para mostrarcomo o assasinato de crianças era algosistemático no Brasil.

O Cidadão de PapelFoi a ideia de tentar colo-car em sala de aula a preo-cupação da temática so-cial brasileira a partir dacriança e do adolescente,especialmente da violên-cia. A ideia foi tentarexplicar pro jovem comofuncionava aquilo. E foiuma surpresa minha. Porque eu nunca tinhaescrito um livro educacional e o livro foium sucesso e vendeu 900 mil cópias. É um

livro que vende há 15 anos. Ele é usadonas escolas porque até então não tinhaum livro com linguagem jornalística queexplicasse essa temática social.

Democracia em pedaçosÉ parecido com Cidadão de Papelpreocupado, não com a sala de aula, masem perceber como os direitos humanoseram e são desrespeitados no Brasil.

Aprendiz do FuturoÉ uma continuação do cidadão de papelmas é muito influenciado pela minhavivência nos EUA, especialmente em NY.Lá eu vi a explosão da questão da Inter-net, da bio-tecnologia, engenharia gené-tica, os novos meios de comunicação,das novas demandas que estavam nasociedade. Eu quis refletir essas novasdemandas no livro.

Armadilhas do Poder, Os bastidoresda imprensa.Esse livro foi feito para ensinar aspessoas a lerem a imprensa. Contandocomo funcionavam os bastidores daimprensa. Foi muito da minha vivênciade Brasília.

Mudou muito a imprensa dessesanos para cá?A imprensa mudou e esta cada vez maisparticipativa, cada vez mais apartidária,sem dúvida. A novidade é uma mudançamuito grande no sistema de difusão deinformação. Hoje você tem TV porassinatura, a entrada dos blogs, sites, aInternet mudou o panorama da imprensa.

Sobre o polêmico fim da obrigato-riedade do diploma de jornalista.O que pensa disso?Eu nunca fui favorável ao diplomajornalístico Embora seja favorável àfaculdade de jornalismo, eu não soufavorável ao diploma. Por que? Porqueeu acho que para ser jornalista nãoprecisa fazer faculdade. Você precisadesenvolver uma técnica e para issovocê pode fazer um curso de extensão.Uma boa faculdade vai ser sempreimportante mas não é necessariamente,nela que você forma um jornalista.

A História RealFoi um investigação sobre osbastidores da Eleição do FHC, eufiz com Josia de Souza.

As Aventuras da ReportagemEu fiz com Ricardo Kotsho. Foi umareflexão pratica sobre a reportagem.

O GRANDE PAPELDO EDUCADOR

HOJE É AJUDAR OJOVEM A SABERLIDAR COM ESSE

EXCESSO DEINFORMAÇÃO,

TRANSFORMANDOISSO NUM

CONHECIMENTOÚTIL PARA A VIDA

DELE

Page 8: Boletim do Kaos 7

Joaquim Maria Machado de Assis nasceu em 21 de Junho de 1839 nacidade do Rio de Janeiro. Filho de um operário mestiço, Francisco Joséde Assis, e de D. Maria Leopoldina Machado de Assis. Perde a mãe muitocedo e é criado pela madrasta, Maria Inês, também mulata, que se dedicaao menino e o matricula na escola pública. Mesmo sem ter acesso acursos regulares, empenhou-se em aprender. Consta que, em SãoCristóvão, conheceu uma senhora francesa, proprietária de uma padaria,cujo forneiro lhe deu as primeiras lições de francês.

Aos 16 anos, publica o seu primeiro trabalho literário, o poema "Ela", narevista Marmota Fluminense. A Livraria Paula Brito acolhia novos talentosda época, tendo publicado o citado poema e feito de Machado de Assisseu colaborador efetivo. Aos 17 anos, consegue emprego comoaprendiz de tipógrafo na Imprensa Nacional e começa a escrever du-rante o tempo livre. Conhece o então diretor do órgão, Manuel Antôniode Almeida, autor de Memórias de um sargento de milícias, que setorna seu protetor.

Passados não muitos anos, em 1860, a convite de Quintino Bocaiúva,passa a fazer parte da redação do jornal Diário do Rio de Janeiro. Alémdesse, escrevia também para a revista O Espelho, A Semana Ilustradae Jornal das Famílias. Mas o seu primeiro livro só foi impresso em1861, com o título Queda que as mulheres têm para os tolos, no qualaparece como tradutor.

Em 1867, é nomeado ajudante do diretor de publicação do Diário Oficiale, em 12 de novembro de 1869, casa-se com Carolina Augusta Xavierde Novais. O escritor era um típico homem de letras brasileiro bemsucedido, confortavelmente amparado por um cargo público e por umcasamento feliz que durou 35 anos. D. Carolina, mulher culta, apresentaMachado aos clássicos portugueses e a vários autores da língua inglesa.

Talvez por essa razão, veio a tornar-se um grande amigo do escritorJosé Veríssimo, que dirigia a Revista Brasileira, com quem teve a ideiade fundar a Academia Brasileira de Letras. Machado desde o princípioapoiou a ideia e compareceu às reuniões preparatórias e, no dia 28 dejaneiro de 1897, quando se instalou a Academia, foi eleito presidenteda instituição, cargo que ocupou até sua morte, ocorrida no Rio deJaneiro em 29 de setembro de 1908. Sua oração fúnebre foi proferidapelo acadêmico Rui Barbosa.

Dizem os críticos que Machado era "urbano, aristocrata, cosmopolita,reservado e cínico, ignorou questões sociais como a independênciado Brasil e a abolição da escravatura. Passou ao longe do nacionalismo,tendo ambientado suas histórias sempre no Rio, como se não houvesseoutro lugar.

Sua obra divide-se em duas fases, uma Romântica e outra Parnasianista,quando desenvolveu inconfundível estilo desiludido, sarcástico eamargo. O domínio da linguagem é sutil, preciso e reticente. O humorpessimista e a complexidade do pensamento, além da desconfiança narazão, fazem com que se afaste de seus contemporâneos.

Frases

A vida sem luta é um mar morto no centrodo organismo universal.

Cada qual sabe amar a seu modo; o modo,

pouco importa; o essencial é que saiba amar.

Creia em si, mas não duvide sempre dos outros.

InsistênciaMe desculpePor não saber agir pra poder atingirum relacionamento perfeitoe eu achar que faz parte,pois nós temos defeitos.

Me desculpePelas vezes que você foi jogar,jogar com os amigose eu achar que faz partejogar um pouco comigo.

Me desculpePor reclamar sua ausência,enquanto vocênem queria a minha presençae eu achar que faz parte,a minha insistência.

Me perdoeSe falei demais,perturbei tua paz,mas não vou te esquecerjamais...

Lu Sousa

Varal de LiteraturaPor Beatriz Monteiro

Um espaço no site Catraca Livre queoferece sinopses, comentários etrechos sobre livros recém lan-çados já disponíveis nas livrarias.Uma iniciativa para estimular aleitura e aproximar o leitor desseuniverso.

“Noturno - Trilogia da Escuri-dão”, de Guillermo Del Toro e oescritor Chuck Hogan.Essa trilogia vampiresca vai contraa onda romântica que invade, hoje,o mundo contemporâneo como nasérie “True Blood”, e o filme “Cre-púsculo”. No livro, vampiros sãoespécies de seres virais e nada seassemelham a humanos. “Noturno”abre com a Lenda de Joseph Sardu,datada na década de 30. Mas éapenas um aquecimento para o queestá por vir. O primeiro capítulo éseparado pelo Prólogo, Começo e aAterrissagem. Nele, o leitor já conse-gue sentir o tom da história, oraapocalíptico, desvendado atravésde um cenário caótico.A escrita é cinematográfica e édifícil se desprender da descriçãodetalhada da situação. Contada emdetalhes, a história começa com aaterrissagem de um Boeing 777 querepentinamente se apaga. A cabine

de controle fica sem comunicação.Equipes de emergência são acionadas. Ocaos é instalado.“Noturno” foi lançado pela editora Roccoe está disponível nas livrarias a partir deR$ 46,50. No site você confere um trechodo livro.

“Terras Baixas”, de Joseph O´NeillJovem executivo holandês Hans Van DenBroek mora em Nova Iorque, em um loft nobairro de Tribeca com sua mulher, Rachele filho. Mas, o casal é forçado a se mudarapós os ataques de 11 de setembro. Ocasamento acaba. Rachel volta para suacidade natal, Londres, e Hans fica em NovaIorque. O livro começa com a lembrançade Hans e com um telefonema noticiandoa morte de um colega. Durante a separa-ção, Hans acabou encontrando confortoem um pequeno clube de críquete,formado apenas por estrangeiros da Ásiae das Antilhas que, como ele, tentavamsobreviver nessa terra desco-nhecida epor vezes hostil. “Terras Baixas” não éapenas um livro sobre as dificuldades deviver num país que não é sua pátria, étambém sobre o valor da amizade.O livro ganhou um fã renomado, opresidente dos Estados Unidos, BarackObama. Foi eleito também um dos melhoresromances sobre após ataques 9/11. Aquino Brasil, “Terras Baixas” foi lançado pelaeditora Alfaguara, por R$ 42.90

Não levantea espadasobre a

cabeça dequem te

pediuperdão

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1 - Homens Crânios – Sigla2 - Antiga premiação de Hip Hop emSão Paulo3 - Líder do grupo Jigabo4 - Rap da Zona Oeste5 – Rapper e poeta da Cooperifa – Jairo?

Por Crônica MendesNina Fideles

6 – Educador Brasileiro – Paulo?7 – Poeta da Resistência Negra8 – Na Mira da? – Coletânea derap nacional9 – Realidade?10 – Site cultural

Time: São Paulo Futebol ClubeFamília: Muito mais que um núcleo tradicionalLiteratura: O aprender das palavrasRap: Música

1 - HC2 - Hip Hop Top3 - PMC4 - RZO5 – Periafricania6 – Freire7 – Trindade8 – Sociedade9 – Cruel10 – Catraca Livre

Um livro: A Hora ObscuraUm escritor: CamõesUm poeta: Waly SalomãoUm filme: V de VingançaUm ator:Denzel WashingtonUma atriz: Marilía PêraO que te dá prazer:A vida ao som da músicaO que você nãosuporta: Ignorância3 lugares quefrequenta: Os palcos davida, casa de mamãe e aComuna Urbana do MSTem JandiraUm sonho: Respirardebaixo da água

Umapersonalidade:Arnaldo AntunesUm artista:Bezerra da Silva

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www.marildafoto.blogger.com.br

Maiores informações e muito mais opçõesacesse nossos parceiros e informe-se no siteda Ação Educativa que tem uma agendasobre os vários eventos no mêswww.acaoeducativa.org.br/agendadaperiferia

No site Catraca Livre você tem uma agendaque tem eventos, cursos, cinema, teatro,exposições, palestras e encontroswww.catracalivre.com.br

Quem quiser divulgar seu evento napróxima edição entre em contatopelo e-mail:[email protected]

Difícil para mim escrever sobre a DGTporque faço parte do time. E utilizar esseespaço “Q Representa” para fazer umamédia com os amigos não seria possível.Essa matéria, nessa coluna, só é possívelporque, independente do meu corre lá,a DGT Filmes representa de verdade e jáfaz 11 anos.

Mesmo sendo uma empresa comercial,vou explicar porque ela representa. Queoutra empresa iria passar meses fre-quentando e filmando um sarau na perife-ria de São Paulo, entrevistando pessoas,indo até suas casas, trabalhos, tendohoras e mais horas de captação deimagens, dias de locação, horas de ilhade edição, sem nenhum real envolvido,sem estar ganhando nada, sem ter cap-tado nenhuma recurso de edital ou aindade lei de incentivo? Foi o que a DGTFilmes fez (e eu vi, porque fui assistentede produção), para a realização do filme“Povo Lindo, Povo Inteligente – Sa-rau da Cooperifa”, de Sérgio Gagliardie Mauricio Falcão.

Mas não é só por isso que a DGT repre-senta. O que dizer de outro filme quetem sido exibido em diversas salas, falode “Osvaldinho da Cuíca - CidadãoSamba”, de Toni Nogueira, Simone Soule Osvaldinho da Cuíca? Assim como“Povo Lindo...”, ele não teve recursoscaptados e, por um longo tempo, imagensforam feitas e pesquisadas, autorizaçõesde imagens foram solicitadas; um grandetrabalho que culminou nessa grandeobra, que encanta plateias onde ele éexibido.

Entre outros projetos 0800 que viraramsucesso, tem o clipe da música “Cablo-

Estivemos no mês de setembro noSarau do Ademar, que acontece uma vez pormês no Nakasa Bar que fica na Cidade Ademar,zona sul de São Paulo. Justamente nessaedição, se comemorava 1 ano de atividades.

O lugar foi idealizado por um grupode amigos, com forte presença feminina,frequentadores da Cooperifa, também na ZonaSul (Chacará Santana).

Surgiu a necessidade de criar umespaço na quebrada de origem deles e assimsurgiu o Sarau, que tem como lema “Palavra,poder para o povo”.

Eles tratam a literatura com o devidorespeito, cada edição teve uma temática e ospoetas da casa são bastante fortes no uso dadita “palavra” e mostram que, com textos epoesias muitas vezes de constatação, podemtrazer sim o “poder para o povo”. Isso acontecequando a mente se deixa desalienar pelo quevem pela TV e passamos a resgatar nossahistória, como diria o Z´Africa Brasil,“antigamente quilombos, hoje periferia”.

O Sarau do Ademar faz parte de umsérie de atividades literárias que a cada diaaumenta nas periferias de São Paulo,principalmente fazendo transformações econseguindo resultados positivos, não sótrazendo escritores e poetas que antes nãotinham voz, como ainda formando cidadãosmelhores.

Eu indico. Visite o Sarau do Ademare tenha um domingo sem Faustão, com muitapoesia e gente feliz.

NaKasa BarRua Públio Pimental, 65 (altura do nº 3.800 daAv. Cupecê) – Cidade Ademar. Zona Sul.Entrada Franca. (11) 5622-4410.saraudaademar.blogspot.com

quinho Comum”, do Thaíde, queconcorreu ao Prêmio VMB e Hutúz.

A DGT sempre foi assim, correu atrás deconteúdo e qualidade, mesmo quandofinanceiramente era uma loucura, assimfez seu nome no mercado.

Além desses citados, documentários fo-ram produzidos na Índia e outros países.

O próprio quadro “Buzão CircularPeriférico” que apresento na TV Cultura,dentro do Programa Manos e Minas, é umaprodução DGT e não poderia ser feito poroutros senão a equipe que chega nasquebradas e fica à vontade, sabe valorizaro trabalho das comunidades. E olha queaté o momento que escrevo essa “home-nagem” 33 quadros já foram gravadosestamos há um ano e meio em canal aberto,mostrando o que de melhor existe naperiferia.

Poderia aqui ficar resgando seda, mas nãoé preciso, já ficou bem claro porque eu(Alessandro Buzo), afirmo que a DGT Filmesrepresenta.

Mas não poderia deixar de citar o últimofeito sem interesse financeiro que a DGTapostou e fez virar realidade. Falo do meuprimeiro filme, no qual divido com ToniNogueira a direção, uma ficção com 52minutos, que mobilizou uma comunidadeno Itaim Paulista para ser produzida, quetem 100% de atores das quebradas einiciantes, que sem um real foi produzidacom filmagens entre novembro de 2008 efevereiro de 2009, “Profissão MC” acabade ser lançado.

Isso tudo é DGT Filmes!

Dia 7 a 31Varal LiterárioExposição poeta, escri-tora ecompositora Dé-bora Garcia.Local: Centro Cultural Boa VistaRua Katsutosh Naito, 957 – BoaVista – Suzano – SP

Dia 8VII Bienal Internacional doLivro de Pernambuco com SérgioVaz (SP), Sacolinha (SP), GabrielSantana (Rede de BibliotecasComunitárias de PE) e SamaroneLima – “A voz do povo –Literatura e periferia”.

Dia 09Programação Café Cultural 18H- Conversa com o escritor: “Mar-ginal Recife versus Cooperifa –Sérgio Vaz (SP), Sacolinha (SP),Cida Pedrosa, Walmir Jordão eMiró. Mais informaçõessacolagraduado.blogspot.com

Dia 10Pavio da CulturaTodo segundo sábado do mês,escritores, poetas, músicos,dançarinos, cineastas, cordelistas,repentistas e capoeiristas se reúnempara apresentarem um pouco da suaarte neste espaço que reúne 100pessoas a cada encontro. Dessa vez ohomenageado é o escritor e jornalistaEuclides da Cunha.Local: Centro Cultural de Suzano -Rua Benjamin Constant, 682 - Centro– Suzano - SP - GRATUITO

Dia 10Cine Cultura - 16 H -Sempre nosegundo sábado de cada mês, oCentro Cultural Boa Vista exibe umfilme para a comunidade local.Filme do mês: O último rei da EscóciaLocal: Centro Cultural Boa VistaRua Katsutosh Naito, 957 – Boa Vista– Suzano – SP - GRATUITO

Dia 12Dia das Criança da Ponte Preta do Jd.Leme - Com partcipação da Cooperifa,Cortez Editora, Ação Educativa,Eutotur Câmbio e Tia Dag (Casa doZezinho)Informaçõescolecionadordepedras1.blogspot.com

Dia 12 - Cine EscadãoUma programação especial dedicada aosdireitos das crianças e dos adolescentes.Cinema, Graffitie Shows comCA.GE.BE. e AFRO RUDE Entrega doEstatuto da Criança e do Adolescenteaos convidados, seguida de sessão devídeos Fabicine, sobre DireitosHumanos.Pipoca, refrigerante ebrinquedos pra molecada do Morro doJardim Peri NovoGrátis!Endereço: ESCADÃO 18 A - ALTURADO Nº 1000 DA AV. MASAOWATANABE - JARDIM PERI NOVO [email protected]

Dia 16Fogueira, Literatura e PipocaTodo terceira sexta-feira do mês umafogueira incendeia o centro cultural boa

vista. Numa roda em torno da fogueira, osparticipantes discutem sobre literatura durante 1h.Depois, acontece um sarau das 20h às 22hencerrando a atividade.Tema do mês: O marxismo na LiteraturaFacilitador: Jazon, historiador.Local: Centro Cultural Boa VistaRua Katsutosh Naito, 957 – Boa Vista – Suzano –SP - GRATUITO

Dia 25Estação CatracaEspaço Cultural Rio VerdeVárias atraçõesRua Belmiro Braga, 119.Tel. (11) 3459-5321- Vila Madalena

Dia 27A Periferia no Centro as 18hSarau do Metrô Santa Cecília - Pavio da CulturaAcontece sempre na última terça-feira do mês, às18 horas. Nesse mês teremos a presença dos poetasde Suzano comandados pelo escritor Sacolinha,agitador cultural que desenvolve os saraus "Pavio daCultura" e "Fogueira, Literatura e Pipoca".Local: Espaço Cultural do Metrô Santa CecíliaMetrô Santa Cecília – Pça. Mal. DeodoroPróximo às catracas.

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Senghor nasceu na cidade de Joal, noSenegal, e iniciou seus estudos em Dakar. Em 1928foi estudar na França, onde entrou para a Sorbonne,tornando-se o primeiro africano a completar umalicenciatura nesta universidade parisiense.

Como escritor, ao lado de León Damas eAimé Césaire, desenvolveu a “Négritude” -movimento literário que exaltava a identidadenegra, lamentando o impacto negativo que acultura europeia teve junto das tradiçõesafricanas.

Em 1939 foi alistado na 59ª Divisão daInfantaria Colonial das forças francesas e, em plenaSegunda Guerra Mundial, esteve preso por doisanos num campo de concentração nazista, ondeteve experiências marcantes e tempo para redigiros seus poemas.

Entre suas obras, destaca-se a primeiracoleção de poemas “Chants d´ombre”, publi-cada em 1945, ano em que foi eleito deputado doSenegal. Publicou outras obras como: “HostiesNoires” (1948); “Ethiopiques” (1956); “Nocturnes”(1961) e “Elegies Majeurs” (1979).

Em 1948 funda, com Mamadou Dia, o BlocoDemocrático Senegalês que ganhou as eleiçõeslegislativas de 1951.

Foi eleito, em 1955, Secretário de Estadoda presidência do Conselho, antes de tornar-se oprimeiro presidente da República do Senegal, em1960, eleito por unanimidade, cargo que manteveaté 1980, graças a reeleições sucessivas.

Senghor é dos intelectuais africanos quelutou contra a dominação colonial francesa noSenegal, tanto através de seus poemas, como comsuas ações políticas. Defensor do socialismoaplicado à realidade africana, tentou desenvolvera agricultura, combater a corrupção e manter umapolítica de cooperação com a França

O poema a seguir, “Femme Noire” (MulherNegra), exalta a mulher negra, um ser sagrado nacultura africana, valorizada por gerar a vida.

Mulher Negra (Léopold Sédar Senghor)

Sebos aderem ao sis-tema de créditos virtual e passama oferecer, em certos lugares,livros nunca antes encontrados

Uma revolução, aindaque tímida, vem acontecendonos sebos de todo o Brasil. Maisde uma centena deles já aderiramao Programa Nacional de Trocade Livros, encabeçado pelo por-tal Estante Virtual. Mas o que issosignifica?

Assim como a fronteirageográfica entre pessoas foifacilmente derrubada com aInternet, a do livro também. Hoje,o caminho que um livro é capazde percorrer é infinito perto doque poderia alcançar se depen-desse de um espaço físico paraexistir.

Em São Paulo, vinte equatro sebos espalhados pelacidade já oferecem a possibi-lidade de troca por um exemplarpresente no acervo ou através

de crédito virtual a ser gasto comtítulos presentes no banco de dadosdo portal Estante Virtual.

Clientes que frequentamsebos levam, em média, de cinco adez livros para serem avaliados pelolivreiro. Com o montante arrecadado,acabam indo para casa com outrasobras ou com o crédito para aquisiçãode outro exemplar via web.

Alguns sebos favorecem atroca presencial oferecendo umbônus extra de 5% na troca porcrédito local, como é o caso do SeboMandrak, localizado no bairro daLapa, zona oeste de São Paulo.

A busca incessante e ogasto demasiado por um livroacabou. Na era digital, sebos seservem de ferramentas para aumen-tar o número de exemplares semi-novos à venda. Com isso, os acervosaumentarão sua oferta, facilitando ademocracia e o acesso à leitura.

Conheça o Programa Nacional de Troca de Livros,encabeçado pelo portal Estante Virtual

Nota da jornalista:A escrivaninha em que

escrevo, hoje, tem como deco-ração uma série de livros, entreeles, alguns que fortaleceramminha personalidade. “Mongó-lia”, de Bernardo Carvalho; “CheGuevara”, de Jorge Castañeda;Santa Maria do Circo, de DavidToscana e “Eu Vi Ramallah”,de Mourid Barghouti.Todos eles lidos apenasuma vez. Se levá-los aosebo e os vender, comosemino-vos, terei a somade um crédito capaz deformar um outro repertório delivros e serei responsável portransmitir a outro leitor a mesmaemoção que tive quando termi-nei de ler cada obra descritaacima.

Por Beatriz Monteiropara o site Catraca Livre

Mulher nua, mulher negraVestida de tua cor que é vida, de tua forma que é beleza!Cresci à tua sombra; a doçura de tuas mãos acariciou os meus olhos.E eis que, no auge do verão, em pleno Sul, eu te descubro,Terra prometida, do cimo de alto desfiladeiro calcinado,E tua beleza me atinge em pleno coração,como o golpe certeiro de uma águia.Fêmea nua, fêmea escura.Fruto sazonado de carne vigorosa,êxtase escuro de vinho negro, boca que faz lírica a minha bocasavana de horizontes puros,savana que freme com as carícias ardentes do vento Leste.Tam-tam escultural, tenso tambor que murmura sob os dedos do vencedorTua voz grave de contralto é o canto espiritual da Amada.Fêmea nua, fêmea negra,Lençol de óleo que nenhum sopro enruga,óleo calmo nos flancos do atleta, nos flancos dos príncipes do Mali.Gazela de adornos celestes, as pérolas são estrelassobre a noite da tua pele.Delícia do espírito, as cintilações de ouro sobre tuapele que ondulaà sombra de tua cabeleira.Dissipa-se minha angústia, ante o sol dos teus olhos.Mulher nua, fêmea negra,Eu te canto a beleza passageira para fixá-la eternamente,antes que o zelo do destino te reduza a cinzaspara alimentar as raízes da vida.

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Um leão indomávelSempre que termino de ver e ouvir FelaAnikulapo Kuti, me dá uma sensaçãode rebeldia renovada. Fico indócil,louco para olhar os inimigos nos olhos.Fela é um leão indomável da África queincomoda. É o artista-ativista que maisme impressiona desde sempre. Nele eem suas obras, acontece a mistura maisexata de contemplação e chamamentoà ação que a arte provoca sobre mim.A música de Fela é docemente política.Sua política é violentamente musical.Por isso pretendo resenhar, aqui, aincômoda atuação no seu tempo e avitalidade que ele pode representarpara a nossa própria insubmissão,especialmente para o hip hop e paraas literaturas divergentes. Tudo o quearticulo devo e dedico ao meu mestrequerido, Carlos Moore, minha escolaprincipal sobre Fela. Sua biografia -FELA: This Bitch of a Life - e nossaslongas conversas fundam o queescrevo sobre o maior rebelde musi-cal que a África já produziu, que oresto do mundo apenas começa aconhecer, e os artistas revolucio-nários do Brasil precisam descobrirurgentemente.

Fela Kuti e o pan-africanismoFela nasceu na Nigéria em 1938 e lámorreu em 1997. Passou pela vidacomo um furacão, demolindo todo equalquer mito relacionado à Áfricaparadisíaca que o ocidente inventoue que mesmo nós, os negros dadiáspora, ainda hoje engolimos felizessem perceber o gosto enganador quenos envenena. Como músico, pensa-dor e ativista político, ele é um dosprincipais responsáveis pela cons-trução e divulgação de um discursoque reorienta as bases do pan-africanismo clássico gerado, de forapara dentro, na conjuntura do marxis-mo que dominou a primeira metade doSéculo XX e que orientou, majoritaria-mente, o processo de descolonizaçãodos países africanos. Há um sentidooriginal libertador, mas tem sido conta-minado, crescentemente, na mesmavelocidade que crescem materialmen-te e se estabelecem no poder osfantoches negros que traíram osgrandes revolucionários pan-africanis-tas, perseguindo-os, depondo-os eassassinando-os, um a um, até instala-rem o desespero de rumos que invadea África atual. Falo também desta farsabatizada hoje de RenascimentoAfricano. Herdeiro dos descaminhosdesta conjuntura que se afasta daorientação dos grandes pan-africanis-tas da primeira leva, a exemplo deKwame Nkruma de Ghana, Fela Kuti

articula sua visão e ação a partir das contradiçõesinternas do continente. Aplicando sua lúcidapercepção mais diretamente à Nigéria, corroída porpresidentes e chefes terríveis. Revela a apropriaçãoque foi feita do discurso pan-africanista “clássico”,agora aparelhado e transformado em ideologias deEstado, que acobertam e justificam os regimescorruptos e tirânicos que se instalam já nas primeirasdécadas após a descolonização.

Fela Kuti questiona esta contradição, de maneiramais profunda, através da música. Complementandoas experiências sonoras que vinha praticando, seudiscurso verbal completa o conjunto de elementosexpressivos, filosóficos, religiosos e políticosprimordiais na sua fenomenal criação: o Afrobeat.Sua arte estabelece uma tensão máxima deenfrentamento aos opressores internos, delatando,principalmente, militares e políticos que barba-rizavam o povo nigeriano. Como ele mesmo disse, oapartheid na África do Sul era mais compreensívelque o regime nigeriano hostil ao povo negro, pois,enquanto aquele estabelecia o conflito entrebrancos-racistas-europeus e negros-colonizados-africanos, esse colocava negros oprimidos eviolentados em conflito com seus pares, ou seja,negros opressores. Ambos numa mesma nação negrae independente.

Sua postura crítica rendeu-lhe intensa perseguiçãopor parte das autoridades nigerianas, o que resultouem centenas de prisões e violações não só de seucorpo e dilapidação de seu patrimônio, mas tambémna violência de Estado sobre seus entes maisqueridos e parceiros de forma geral. De tudo isso, amais traumática experiência foi a morte de sua mãe,atirada do segundo andar quando a RepúblicaKalakuta foi invadida por centenas de soldados nadécada de 70. Kalakuta era a propriedade de Fela,base de articulação e vivência de sua comuna. Eraum território proclamado independente por ele, comsuas próprias razões e leis. Lá moravam suasesposas, músicos e parceiros próximos, bem comose hospedavam visitantes vindos a passeio ou atrabalho. Na área ainda funcionava sua casa noturna,África Shrine e um estúdio de gravação.

Fela se apresentava na casa regularmente. Muitagente, ilustre ou não, do mundo inteiro, foi visitá-lona Shrine. Foi lá, inclusive, que ele conheceuGilberto Gil, Steve Wonder e Carlos Moore, que viriaa ser seu único biógrafo autorizado. Carlos Moore éo elo da corrente em rebeldia que pode nos ligar, noBrasil, diretamente a Fela Kuti. A todos nós, das artesdivergentes brasileiras, cabe também conhecer,compreender e divulgar obras, pensamentos eações de ativistas como Fela Anikulapo Kuti, quededicam sua vida à nossa causa - que não é nacional,mas racial.

Fela Kuti: Pai do AfrobeatO feito que consagra Fela Kuti é a elaboração damúsica Afrobeat. Chegando ao auge nas décadasde 70 e 80, trata-se de uma fusão da músicatradicional da Nigéria com as inovações do Highlifede Ghana, além de ritmos cubanos e elementos dosopro do jazz. Tudo potencializado no encontro,

pontual, com as guitarras e baixos da soul music norte-americana.Definitivamente, há um Fela antes e um Fela depois de sua descoberta deJames Brown, que chega em sua vida juntamente com Malcolm X. Daí resultouuma música de pegada brutal justaposta por letras de alta tensão política eracial.

Fela afirmou que a politização profunda de sua música, sua descoberta daafricanidade real, se deu quando morou nos EUA. A responsável por isso foiSandra Smith Isidore, sua namorada então. Sandra, uma negra encantadora edespojada, pertencia aos quadros do Black Panters. Foi ela que primeiroquestionou Fela sobre a importância do que falavam suas letras. Tambémapresentou a ele a autobiografia de Malcolm X e a música de James Brown. Foia redescoberta da África e a redefinição de sua carreira e vida.

As canções de Fela quebram totalmente com as convenções tradicionais dasmúsicas ocidentais e/ou “comercias”. Para se ter uma ideia, são músicas de15, 20 minutos ou mais. Introduções longas, improvisações, repetições,chamamentos e respostas. O mais genial é a junção desses elementos emsuas performances ao vivo, por se tratar de um instrumentista múltiplo, religiosopraticante no palco e também um grande dançarino. Some-se a isso acompetência de seus músicos juntamente com os coros e coreografias desuas esposas e não haverá limites conhecidos. Corpos, movimentos, vozes,pinturas, indumentárias e rituais religiosos estabelecem a química única dapresença de Fela Anikulapo Kuti ao vivo.

Fela Kuti jamais repetia a maneira de interpretar uma música, ou mesmo aelaboração de um “show”, porque não era música, e não era show, era ritual,confraternização, celebração do equilíbrio espiritual e declaração de guerra.Era único. Um pouco disso tudo pode ser observado nos diversos registrosdele e suas performances que circulam pelo mundo. Muito rapidamente, noYoutube, por exemplo, pode-se encontrar bastante material musical e trechosde vídeos, principalmente fragmentos do filme “Presidente Negro”, quesobreviveram àquela invasão militar de 1977 em sua casa, e também em “Amúsica é a arma”, este possível de ser encontrado em DVD, com legenda emportuguês.

Quando o hip hop do Brasil, e do mundo, criar efetivamente a esperada simbiosecom a música Afrobeat - na linha direta de Fela Kuti - será uma linguagem novae definitivamente explosiva. Isso já está em curso, falta apenas mais expansão..Articulação Nacional Fela Kuti

Na saudação dirigida à nossa Articulação Nacional Fela Kuti, o Mestre CarlosMoore, de forma vigorosa e objetiva, localiza a potencialidade do artista edestaca a importância de se realizar o Fela Day. Para ele, a crescenteimportância da celebração deste dia pelo mundo, a cada 15 de outubro,demonstra que, apesar de sua morte, a mensagem libertária e anti-imperialistade suas canções inspira as novas gerações, expandindo o alcance de suaobra. Daí a fundamental importância das artes divergentes promoverem seuencontro com a expressividade do Afrobeat. Isso não representará uma

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assimilação passiva da rebeldia do outro,mas, ao contrário, emprestará seu vigorjovem e atual para que a música de Fela nãoseja usurpada de sua identidade originaltransgressiva; e fará uma interlocuçãoguerrilheira. Identificado com aqueles queenfrentam os processos opressivos emassificadores da sociedade, Fela Kuti nuncapermitiu o rebaixamento de sua arte a simplesproduto da indústria cultural - nem estéticanem comercialmente.

Carlos Moore nos lembra que o papel princi-pal do artista e do intelectual é estar sempreatento e despertar a sociedade para osperigos que a ameaçam e para as tensõesque a dividem. Por isso ele afirma que aexpansão de popularização do pensamentoe da música de Fela Kuti no Brasil é umfenômeno politicamente importante,culturalmente salutar e artisticamente rico.Então, nos momentos que promovemos estaexpansão, através de ações como o Dia deFela, por exemplo, trata-se de uma políticaestratégica fundamental na chamadaresistência cultural brasileira. Ao citar FrantzFanon de Os condenados da terra, Moorecoloca Fela na linha dos pensadores que sevoltam para a compreensão das contra-dições internas do continente negro. “Eledenunciou o absurdo grotesco dasiniquidades sociais em todos os países.Fela foi, inclusive, o primeiro a identi-ficar, de maneira clara, a emergência deum novo monstro planetário, semfronteiras físicas, éticas ou morais: aglobalização capitalista. Ele chamou onovo sistema de ‘Ladrões Interna-cionais’ (International Thief Thief) e de‘Monstros sem Nação (Beasts WithoutNation)”, lembra o mestre.

Carlos vê, na música de Fela, um alerta paraos descaminhos que pode seguir o Brasilnesse processo recente de crescimento.Uma “leitura” atenta de Fela pode nos revelarintenções não tão louváveis na aproximaçãoBrasil-África em curso. Ou seja, as cançõescitadas podem, perfeitamente, ser aplicadasao nosso país no caso dele se tornar tambémum explorador imperialista dos povosafricanos. “Acho que a música Afrobeate a mensagem política libertária do FelaKuti podem ajudar os brasileiros acontemplar e lutar por um mundo maisjusto, mais democrático e mais solidário- dentro e fora das fronteiras do Brasil.”,conclui Carlos Moore.

Fela Day ou Dia de FelaDesde maio de 2007, planejo um evento docoletivo Blackitude; Vozes Negras da Bahiavoltado para um tributo a Fela Kuti. Enquantobusco formas e meios para realizar estagrande produção, lancei, nacionalmente, umchamamento aos parceiros da Bahia e doBrasil, para construirmos nosso próprio FelaDay, evento que acontece já regularmenteem algumas cidades do mundo. Pois bem,elegendo o dia 15 de outubro como pontoculminante, por se tratar de seu aniversáriode nascimento, e alternando os temas FelaDay e Dia de Fela, começamos o que chamode Articulação Nacional Fela Kuti, em funçãodo título da primeira convocação de meublog, Gramática da Ira.

A resposta foi imediata e, no diade hoje, contamos com trintaadesões em 7 estados: BA, CE,MG, PE, RJ, RS, SP; e promessa demais dois que ainda não docu-mentaram com texto escrito seudesejo de aliança. A ideia cen-tral é realizarmos todo tipo eporte de evento possível.Logicamente, com cada qualdentro de sua convicção edisponibilidade, a ideia é praticara simultaneidade descentrada.Shows, filmes, palestras, exposi-ções, saraus, aulas, programa derádio, graffiti, etc. Aliás, devidoà dinâmica de cada parceiro, jáadmitimos não apenas um Dia deFela, mas uma Semana e, emalguns casos específicos, até oMês. Um exemplo evidentedessa demanda é, exatamente,este texto, lançado antes dasemana de Fela, como fruto daadesão do Boletim do Kaos e daSuburbano Convicto Produ-ções. Aliás, efetivamente, nossotributo se inaugura, orgulhosa-mente, aqui. Junte-se a nós!

Para baixar músicas de Fela:http://periecos.blogspot.com/search/la-bel/Fela%20Kuti%20Discografia

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Quebrada Digital:Um novo espaço para a cenacultural de São Paulo

Depois de 10 anos de experiência publicando revistas dehip hop, hoje me dedico ao jornal Boletim do Kaos e à revista Raça.Mas, recentemente, comecei a trabalhar no site Catraca Livre. Paraquem não conhece, um site que diariamente dá dicas de eventos,shows, encontros e cursos gratuitos a preços populares na cidadede São Paulo.

A proposta do sítio tem ganhado muitos adeptos e já passados 230 mil visitantes unicos por mês. Nesse endereço virtual,também publico a Revolução das Catracas, uma história em quadrinhosinterativa. Só no Twiiter são mais de 8 mil seguidores, o siteainda mantém parceria com o outros veículos como os jornais Folhade S. Paulo e Agora, rádios CBN, 105FM, Heliópolis e num blocono programa Radiola da TV Cultura, além da recente parceriacom a All TV, todo quinta as 17H.

E foi convivendo com a equipe que nasceu o espaçoQuebrada Digital, onde semanalmente destaco eventos do centro àperiferia. Há mais de um mês no ar, já divulgamos vários saraus, muitasrodas de samba, exibições de filmes, shows, peças de teatro, eventose cursos.

A cada semana também destacamos alguma produção musi-cal e, em parceria com DGT, postamos o Quadro Buzão CircularPeriférico.

A ideia do espaço é mostrar que a cultura leva muitaspessoas da periferia para o centro, atrás de informação,música, teatro e diversão. Mas o caminho inverso também épossível. Hoje, nos bairros mais afastados da cidade,encontramos diversos pólos de expressões artísticas, todoscom espírito comunitário e sempre Catraca Livre, ou seja, degraça.

A periferia e os becos do centro também são referências decultura de qualidade da cidade.

Para divulgar e acessarO espaço Quebrada Digital fica dentro do site Catraca Livre(www.catracalivre.com.br) e a cada semana divulgamos eventos,projetos, músicas, enfim o espaço é seu. Entre em con-tato paradivulgar seu trabalho ou acesse para saber o que tem de interessante

na cidade do centro à periferia, sempre a preço populares ouCatraca Livre. Contato:[email protected]

Por Alexandre De Maio

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Tempos diferentes, estilos diferentes,o mesmo vicío: a l iteratura.

Por Alexandre De Maio

(*1909+2002)

João do Nascimento Santosnasceu no município de Chorrochó,na Bahia, em 1959. Migrante, resideem São Paulo com a família há mais de20 anos. Autor dos folhetos: Saudadedo meu Sertão (xilogravura de VadoPimenta), Missão de um trovador,Nenhum Retrato e Sertão de Labuta eFé. Em 2008 lançou seu primeiro livro:Cordéis e Poesias para Cantar peloselo Elo da Corrente Edições.

Iniciou sua proximidade coma literatura de cordel durante a infância,através dos seus familiares que liam ecompunham poesias desse estilo. Ointeresse pelos temas, a proximidadeda linguagem e as histórias regionaislhe incentivaram a comparar as letrase os sons dos versos e, por isso,aprendeu a ler aos dez anos de formaautodidata. Desde então, começou apraticar a escrita e tornou-se poeta,produzindo versos com coerência nasrimas, métricas e sílabas que carac-terizam a literatura de cordel, além deapresentar de forma criativa a realidadedo sertão nordestino e sua lida longeda terra natal.

Tornou seu trabalho públicoem 2001, musicando suas poesias,escrevendo roteiros para teatro eparticipando em antologias de cordel.Foi autor do espetáculo Nossa Terra,Nossa Gente, sob a direção de Neusade Souza, trabalho que foi apre-sentado no teatro “Clementina deJesus” (CEU Vila Atlântica), em 2004.Participou da revista Não Funciona(Poesia Maloqueirista) e da antologiado Sarau Elo da Corrente, lugar quefrequenta assiduamente às quintas-feiras. Atualmente, trabalha como vigi-lante, recita suas poesias nos sarausdas periferias de São Paulo e realizaoficinas de cordel em escolas ecentros culturais.

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“... Sou nascido no sertãoPor isto conto a históriaQuando cai chuva abundanteLavrador tem a vitóriaQuando a seca apertaSe perde até a memória

Saudade do meu sertãoÉ a coisa que me mataDa apargata de rabichoFeita de couro de vacaPra botar água no poteCarregava numa lata

O Sertão estando chovendoNão há coisa mais belaO caboclo tem de tudoCome leite na tigelaCaboclo lava no poçoNão precisa de gamela

Não esqueço do sertãoDa carne de bode assadaDa mochila de farofaQue eu comia na estradaDo cantar da siriemaQue eu ouvia na chapada

No sertão eu fui criadoSem brincar só trabalhandoEis aqui minha razãoDe ficar sempre lembrandoSe Deus me determinarBreve estarei voltando...”

(Trecho da poesia“Saudade do meu Sertão”).

Antônio Gonçalves da Silva,mais conhecido como Patativa do Assaré(Assaré, Ceará, 5 de março de 1909 — 8de julho de 2002) foi um poeta popular,compositor, cantor e improvisador brasileiro.

Uma das principais figuras damúsica nordestina do século XX. Segundofilho de uma família pobre que vivia daagricultura de subsistência, cedo ficoucego de um olho por causa de uma doença.Com a morte de seu pai, quando tinha noveanos de idade, passa a ajudar sua família nocultivo, das terras. Aos doze anos, frequen-ta a escola local, em que é alfabetizado,por apenas alguns meses. A partirdessa época, começa a fazerrepentes e a se apresentar emfestas e ocasiões importantes.Por volta dos vinte anos recebeo pseudônimo de Patativa, porser sua poesia comparável àbeleza do canto dessa ave.Sendo muito amigo da famíliaDiniz.

Indo constantemente àFeira do Crato onde participavado programa da rádio Araripe,declamou seus poemas. Numadestas ocasiões é ouvido porJosé Arraes de Alencar que,convencido de seu potencial, lhedá o apoio e o incentivo para a publicaçãode seu primeiro livro, Inspiração Nordestina,de 1956.

Este livro teria uma segundaedição com acréscimos em 1967, passandoa se chamar Cantos do Patativa. Em 1970é lançada nova coletânea de poemas,Patativa do Assaré: novos poemascomentados, e em 1978 foi lançado Cantelá que eu canto cá. Os outros dois livros,Ispinho e Fulô e Aqui tem coisa, foramlançados respectivamente nos anos de1988 e 1994. Foi casado com Belinha, comquem teve nove filhos. Faleceu na mesmacidade onde nasceu.

Obteve popularidade a nívelnacional, possuindo diversas premiações,títulos e homenagens (tendo sido nomeadopor cinco vezes Doutor Honoris Causa). Noentanto, afirmava nunca ter buscado a fama,bem como nunca ter tido a intenção defazer profissão de seus versos. Patativanunca deixou de ser agricultor e de morarna mesma região onde se criou (Cariri) no

interior do Ceará. Seu trabalho se distingue pelamarcante característica da oralidade. Seuspoemas eram feitos e guardados na memória,para depois serem recitados. Daí o impres-sionante poder de memória de Patativa, capazde recitar qualquer um de seus poemas, mesmoapós os noventa anos de idade.

A transcrição de sua obra para os meiosgráficos perde boa parte da significaçãoexpressa por meios não-verbais (voz, ento-nação, pausas, ritmo, pigarro e a linguagem cor-poral através de expressões faciais, gestos) querealçam características expressas somente noato performático (como ironia, veemência,

hesitação, etc.). A complexidadeda obra de Patativa é evidentetambém pela sua capacidade decriar versos tanto nos moldescamonianos (inclusive sonetos naforma clássica), como poesia derima e métrica populares (porexemplo, a décima e a sextilhanordestina). Ele próprio diferenci-ava seus versos feitos emlinguagem culta daqueles emlinguagem do dia-a-dia (denomi-nada por ele de poesia "matuta").

Patativa transitava entreambos os campos comuma facilidade camaleô-

nica e capacidade criadora e intelectualainda não totalmente compreendidaspelo meio acadêmico. Sua obra, dedimensão tanto estética quanto política,aborda diferentes temas e possuioutras vertentes além da social/militante; como a telúrica, religiosa,filosófica, lírica, humorística/irônica,motes/glosas, entre outras.

As múltiplas tentativas de categori-zação da obra de Patativa do Assaré (muitasvezes subjetivas e sem base teórica) expõemfalhas inerentes dos próprios parâmetros dejulgamento.

Estes, na maior parte, baseados empressuposições e preconceitos que levam adois extremos: a representação idealizada domito ou a exclusão pela classe social, nível deescolaridade, etc.

O AUTÊNTICO TALENTO BRASILEIRODa redação

RAÍZES POÉTICAS

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