baixos d’alegria - revista...

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36 www.backstage.com.br INSTRUMENTOS Jorge Pescara é artista-solo exclusivo da Jazz Station Records e contrabaixista com Ithamara Koorax. É autor do livro Dicionário Brasileiro de Contrabaixo Elétrico N Baixos D’Alegria Uma tradição mantida em família nos séculos passados, a luthieria (arte da construção manual de instrumentos musicais) é hoje para o contrabaixo elétrico o sonho de consumo no que tange aos instrumentos vendidos no mercado mundial. No Brasil, esta história teve início com um senhor chamado Victorio Giannini, que, com muito amor à arte e pouca estrutura, confeccionou baixos que estão sendo usados até este século, e esta arte chega aos nossos dias carregando a marca da modernidade. ão podemos ainda competir com Vinnie Fodera, Carl Tompson ou Jerzy Drozdy, mas, aos poucos, estamos caminhando para atingir estes objetivos e muitos outros. De tempos em tempos, falaremos sobre o trabalho destes verdadeiros mestres na arte de dar vida às nossas ferramentas de trabalho. Nesta edição, começamos por uma etiqueta vinda do Rio de Janeiro. Caros leitores, esta é a história dos baixos D´Alegria. A D’Alegria iniciou suas ativida- des em janeiro de 2003, com dois sóci- os, Rodrigo Werneck e Daniel Ale- gria. Ambos engenheiros eletrônicos da área de telecomunicações que de- cidiram mudar de ramo de atividade por volta dessa mesma época. Como Daniel era um estudante de contra- baixo e baixista amador, chegou a es- tudar com o baixista André Carneiro (Fernanda Abreu) nas horas vagas, estava acostumado a prestar serviços de reparos em baixos, guitarras e vio- lões, sendo uma conseqüência natural o fato de optar pela construção de contrabaixos elétricos na nova carrei- ra. Outro fator determinante na esco- lha de qual instrumento seria privile- giado pela empresa recém-formada foi o próprio mercado, pois o baixista, se- gundo Rodrigo Werneck, gosta mais de instrumentos customizados (feito à mão) do que guitarristas de um modo geral, tanto aqui quanto no exterior. O primeiro modelo desenvolvido pela D’Alegria foi o baixo DART (se- guindo posteriormente a tradição de manter os modelos todos iniciados com a letra D), em 2003. Embora te- nha sido totalmente desenhado na D’Alegria, seguia alguns padrões de mercado. Este baixo recebeu um cir- cuito eletrônico de equalização ativa e ganho, criado e construído manual- mente, peça por peça, no próprio atelier, por ambos os sócios. Este ins- trumento é fornecido em versões de 4, Daniel Alegria instalando ponte

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INSTRUMENTOS

Jorge Pescara é artista-solo exclusivo da Jazz

Station Records e contrabaixista com Ithamara

Koorax. É autor do livro Dicionário Brasileiro de

Contrabaixo Elétrico

N

Baixos D’AlegriaUma tradição mantidaem família nosséculos passados, aluthieria (arte daconstrução manual deinstrumentosmusicais) é hoje parao contrabaixo elétricoo sonho de consumono que tange aosinstrumentosvendidos no mercadomundial. No Brasil,esta história teveinício com um senhorchamado VictorioGiannini, que, commuito amor à arte epouca estrutura,confeccionou baixosque estão sendousados até esteséculo, e esta artechega aos nossosdias carregando amarca damodernidade.

ão podemos ainda competir comVinnie Fodera, Carl Tompson ouJerzy Drozdy, mas, aos poucos,

estamos caminhando para atingir estesobjetivos e muitos outros. De tempos emtempos, falaremos sobre o trabalho destesverdadeiros mestres na arte de dar vidaàs nossas ferramentas de trabalho. Nestaedição, começamos por uma etiquetavinda do Rio de Janeiro. Caros leitores,esta é a história dos baixos D´Alegria.

A D’Alegria iniciou suas ativida-des em janeiro de 2003, com dois sóci-os, Rodrigo Werneck e Daniel Ale-gria. Ambos engenheiros eletrônicosda área de telecomunicações que de-cidiram mudar de ramo de atividadepor volta dessa mesma época. ComoDaniel era um estudante de contra-baixo e baixista amador, chegou a es-tudar com o baixista André Carneiro

(Fernanda Abreu) nas horas vagas,estava acostumado a prestar serviçosde reparos em baixos, guitarras e vio-lões, sendo uma conseqüência naturalo fato de optar pela construção decontrabaixos elétricos na nova carrei-ra. Outro fator determinante na esco-lha de qual instrumento seria privile-giado pela empresa recém-formada foio próprio mercado, pois o baixista, se-gundo Rodrigo Werneck, gosta maisde instrumentos customizados (feito àmão) do que guitarristas de um modogeral, tanto aqui quanto no exterior.

O primeiro modelo desenvolvidopela D’Alegria foi o baixo DART (se-guindo posteriormente a tradição demanter os modelos todos iniciadoscom a letra D), em 2003. Embora te-nha sido totalmente desenhado naD’Alegria, seguia alguns padrões demercado. Este baixo recebeu um cir-cuito eletrônico de equalização ativae ganho, criado e construído manual-mente, peça por peça, no próprioatelier, por ambos os sócios. Este ins-trumento é fornecido em versões de 4,

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INSTRUMENTOS

5 ou 6 cordas, com trastes ou fretless,além da opção ativo/passivo para umpúblico mais antenado com a sonori-dade moderna e visual arrojado.

Seguindo a introdução da marca, foicriado o modelo DEFENDER para umalinha mais vintage. Sem ser apenas umaréplica dos Fender Jazz Bass ou Precision,este instrumento traz algumas caracte-rísticas próprias como os pickups EMGhumbucking HZ passivos. Nos primeirosdois anos de existência, quando aindanão podiam se dar ao luxo de ter umacartela de endorsees, a D´Alegria jápossuía alguns ilustres clientes como obaixista Arthur Maia (Gilberto Gil, NeyMatogrosso, Lulu Santos, Cama deGato, solo).

Iniciando a distribuição em lojas noeixo Rio-São Paulo e vendas diretas aoconsumidor ou por encomenda, a D’Ale-gria conseguiu, em 2004, o primeiro distri-

buidor oficial para o exterior, logo após aentrada de Trevor Boulder (ex-DavidBowie e atual baixista do Uriah Heep)

como endorsee da marca. Nessa mesmaépoca, entra Felipe Andreoli (Angra)como endorsee brasileiro. “Após a entra-da desse segundo endorsee, a D’Alegriafoi evoluindo e ganhando mais notorie-

dade. Tínhamos o Arthur Maia comocliente de referência e logo em seguidadois endorsees de peso patrocinados ecom seus instrumentos signatures cons-truídos especificamente para eles”.

Em 2005, é lançado o modelo DRAGS-TER baseado no Music Man Sting Ray,sempre mantendo algumas característicasindividuais. Já em 2006, chega ao merca-do o DYNAMO, baixo com escala curtaconstruído em parceria com o baixistaAndré Gomes (Pepeu Gomes, Cheiro deVida, etc). “Daí fomos fechando contra-tos com parceiros de distribuição no exte-rior. Hoje temos um no Canadá, um noJapão, um na França, um na Inglaterra edois nos Estados Unidos, sendo que aquino Brasil nosso foco principal é a vendadireta, sob encomenda”. Segundo Ro-drigo, esses distribuidores lá de fora tra-balham com uma rede de lojas e facili-tam a teia para chegar ao consumidor.

O primeiro modelodesenvolvido pela

D’Alegria foi o baixoDART, em 2003. Emboratenha sido totalmente

desenhado na D’Alegria,seguia alguns padrões

de mercado

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“Paralelamente fomos investindo naparte de marketing, tanto colocandoanúncios em revistas aqui e lá fora,quanto na mídia espontânea, gerandopress releases, organizando workshops eshows case, participando de feiras comoa Expomusic, Namme outros eventos me-nores nos Estados Uni-dos, além do LondonGuitar Show, fosse dire-tamente ou através denossos distribuidores”.

Completando a li-nha de contrabaixoselétricos D’Alegria foilançado há alguns me-ses o DISCOVERY, umfretless vertical de 30¨,leve e fácil de carregar,mas com uma sonori-dade honesta de baixoacústico, e mais recen-temente a primeira gui-tarra da empresa, batiza-da de DIMENSSION, embora os rapazescontinuem focados especificamentenos baixos. A seguir um pequeno bate-bola com um dos sócios da empresa,Rodrigo Werneck.

Gostaria de saber, resumidamente,

qual é a política da empresa D’Alegria.

“Nossa política é produzir e fornecerinstrumentos de alta qualidade, feitos ar-tesanalmente, com madeiras totalmentebrasileiras e não ameaçadas de extinção.Essa é uma de nossas premissas, pois não

trabalhamos com as madeiras mais tra-dicionais como Mogno, Jacarandá oumesmo Ash, Alder, Maple ou Ébano. En-tão só trabalhamos com madeiras brasilei-ras tipo Frejó, Tauari, Cumarú, Ipê, Ro-xinho, etc, que são de excelente quali-

dade e não estão ameaçadas de ex-tinção no momento, de forma a ter umdiferencial e não agredir o meio ambi-ente, obviamente. Além disso, trabalha-mos exclusivamente com instrumentostopo de linha, ou seja, para um públicoalvo Top A e B, porque não nos interessafabricar instrumentos mais baratos cain-do com isso a qualidade final. Usamoshardware também de primeira qualida-de como Gotoh, Hipshot, Grover, cordasElixir, pickups EMG e o ToneChaserEQ, que é um circuito patenteado por

nós e fabricado pela empresa Tone-Chaser, junto com os captadores comcobertura de madeira que estão em nos-sos instrumentos”.

Qual é a média de instrumentos que

vocês constroem por

mês aqui?

“Cinco ou seis pormês, pois somos só nósdois, eu e meu sócioDaniel, aqui no atelier,então podemos ofere-cer ao mercado geralem média uns sessentainstrumentos por ano.Nos desdobramos, des-de escolher o corte dasmadeiras em nossos for-necedores até o ajustefinal do instrumentopronto para a entrega”.

E como é feito o aca-

bamento de seus baixos?

“Era todo in house, mas agora terceiriza-mos esta fase para poder ter um leque mai-or de opções em cores, tintas metalizadas,desenhos específicos e quando os instru-mentos estão prontos para receber seladora,pintura e verniz, eles são enviados para lá edepois retornam para a instalação dehardware, montagem final e regulagem. Oacabamento é feito em Poliuretano bri-lhante ou acetinado dependendo da op-ção do cliente, podendo ser translúcidoaparecendo o desenho das madeiras ou só-lido, ou mesmo sendo transparente sem cornenhuma, apenas os vernizes. Isto semmudar qualquer madeira do corpo”.

Algum detalhe específico na construção?

“Apenas que os cortes são todos lami-nados, porque não usamos peças inteiraspara evitar empenamento, sendo a cons-trução em alta qualidade. Tanto que nósdamos 10 anos de garantia para todos nos-

“Nossa política é produzir e fornecer instrumentos dealta qualidade, feitos artesanalmente, com madeirastotalmente brasileiras e não ameaçadas de extinção.

Essa é uma de nossas premissas, pois não trabalhamoscom as madeiras mais tradicionais como Mogno”

Daniel Alegria (esquerda) e Rodrigo Werneck (direita)

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INSTRUMENTOS

e-mail para esta coluna:

[email protected]

sos instrumentos independente de comosejam confeccionados. Eles demoram, nomáximo, três meses para serem fabricadose são entregues com gig bag acolchoadoou semicase, que é uma capa mais rígida,sendo opcional um estojo ou um flight

case. Os preços diferenciados já estão em-butidos com estas opções, sendo básica agig bag tradicional”.

Qual é a base de preço para seus ins-

trumentos?

“O preço final para cliente nos dias dehoje parte de R$ 3mil, podendo chegaraté o dobro deste valor, dependendo cla-ro, do modelo e dos opcionais escolhidos”.

Como entrar em contato com a empresa?

“Os contatos conosco são feitos via tele-fone (0 xx 21 2522 7486) ou por [email protected], ou mesmo através donosso site www.dalegria.com que é bemcompleto e atualizado com informações detodos os modelos, fotos, dados técnicos,amostras sonoras em MP3, vídeos, seção deeventos e novidades além de uma sessãode colunas com o Bruno Migliari, RodrigoMontanhaur, Geraldo Vieira e em breve oZuzo Moussawer. No www.youtube.comhá muita coisa em vídeo com os instru-mentos D’Alegria, temos também umapágina no www.myspace.com/dalegria,além de uma comunidade bem movi-mentada no Orkut”.

Quais são os endorsees atuais?

Trevor Bolder (Inglaterra), do UriahHeep (ex-David Bowie e Wishbone Ash;

Trae Pierce (EUA), do Blind Boys ofAlabama (tocou também com JamesBrown, Dr. Hook e Sugarfoot) - ganhou 3Grammy’s; Zuzo Moussawer (solo); AndréNeiva (Cama de Gato, Márcio Mon-tarroyos, Neguinho da Beija-Flor); Bruno

Migliari (Frejat, Ana Carolina, OrlandoMorais); Geraldo Vieira (Joe Roberts, ex-Raul Seixas, O Terço, Guilherme Aran-tes); Rodrigo Montanhaur (solo).

Futuro para a D’Alegria?

“Temos a idéia de focar mais no mer-cado externo, pois neste nicho de luthi-eria aqui no Brasil a nossa marca já estábem fortalecida, apenas temos que con-tinuar com a mesma linha de divulga-ção e trabalhando firme. Assim com no-mes fortes junto com a marca pretende-mos expandir nossos negócios para aEuropa, especificamente”.

Algum plano para outros modelos de

instrumentos?

“É possível que em 2007 tenhamosalgo novo, que já está na prancha de de-senho, mas não quero antecipar nadapor enquanto”.

Bom, com esta pequena entrevistaencerramos a coluna deste mês. Em fu-turas edições poderemos abordar a traje-tória de algum outro luthier brasileiro.

É aguardar e viver.Paz Profunda.

“Temos a idéia de focar mais no mercado externo,pois neste nicho de luthieria aqui no Brasil a nossamarca já está bem fortalecida, apenas temos quecontinuar com a mesma linha de divulgação e

trabalhando firme”