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  • Formao, Prticas Pedaggicas e incluso escolar no observatrio

    estadual de educao esPecial

  • Formao, Prticas Pedaggicas e incluso escolar no observatrio

    estadual de educao esPecial

    denise meyrelles de Jesussonia loPes victor

    agda FeliPe silva gonalves(org.)

    So Carlos

    Marquezine & Manzini

    ABPEE

    2015

  • A ia B a i i a P ui a - E u a E ia

    Copyright 2015 dos autores

    Diretoria da Associao Brasileira de Pesquisadores em Educao Especial(2015-2016)

    Presidente

    Enicia Gonalves Mendes (UFSCar)

    Vice-Presidente

    Rosana Glat (UERJ)

    1 Secretrio

    Mrcia Denise Pletsch (UFRRJ)

    2 Secretrio

    Elsa Midori Shimazaki (UEM)

    Tesoureiro

    Vera Lcia Messias Filho Capellini (Unesp de

    Bauru)

    Conselho Fiscal

    Dulcria Tartuci (UFG Campus Catalo)

    Theresinha Guimares Miranda (UFBA)

    Antonio Carlos do Nascimento Osrio (UFMS)

    Comit EditorialEduardo Jos Manzini (Editor)Marilda Moraes Garcia Bruno (UFGD)Sadao Omote (Unesp)heresinha Guimares Miranda (UFBA)

    Conselho EditorialAlexandra Anache Ayache (UFMS) Claudio Roberto Baptista (UFRGS/FACED)David Rodrigues (Faculdade de Motricidade Humana/Portugal)Denise Meyrelles de Jesus (UFES) Enicia Gonalves Mendes (UFSCar)Gilberta M. Jannuzzi (Unicamp)Ivanilde Apoluceno de Oliveira (UFPA) Leila R. O. P. Nunes (UERJ)Lcia de Arajo Ramos Martins (UFRN)Luciana Pacheco Marques (UFJF)Maria Amlia Almeida (UFSCar) Maria Piedade Resende da Costa (UFSCar) Miguel Cludio M. Chacon (Unesp-Marlia)Mnica Magalhes Kassar (UFMS,Corumb)Mnica Pereira dos Santos (UFRJ)Pilar Lacasa (Universidad de Alcal - UAH-Espanha)Rosngela Gavioli Prieto (USP)Sadao Omote (Unesp-Marlia)Soraia Napoleo Freitas (UFSM) heresinha Guimares Miranda (UFBA)Valdelcia Alves da Costa (UFF)

    Ficha catalogrica elaborada peloServio Tcnico de Biblioteca e Documentao - Unesp - Campus de Marlia

    F723 Formao, prticas pedaggicas e incluso escolar no Observatrio Es-tadual de Educao Especial [recurso eletrnico] / Denise Meyrelles

    de Jesus, Sonia Lopes Victor, Agda Felipe Silva Gonalves (org.).

    So Carlos : Marquezine & Manzini : ABPEE, 2015.

    267 p.

    Inclui bibliograia.Apoio: FAPES

    ISBN 978-85-67256-19-11. Professores de educao especial Formao. 2. Prtica

    de ensino. 3. Incluso em educao. 4. Avaliao educacional. 5.

    Educao de crianas. I. Jesus, Denise Meyrelles de. II. Victor, Sonia

    Lopes. III. Gonalves, Agda Felipe Silva.

    1 CDD 371.9

  • sumrio

    ApresentaoFormao Continuada: Contribuies dos Observatrios de Educao EspecialDenise Meyrelles de Jesus; Alexandro Braga Vieira; Camila Helena Rodrigues ................................................................................. 9

    PRIMEIRA PARTEFORMAO DOCENTE E A EDUCAO NA DIFERENACaptulo IA Formao de Professores no Contexto do Observatrio Nacional de Educao Especial: o Estado do Esprito Santo em FocoSonia Lopes Victor ............................................................................................ 19

    Captulo IIObservatrio Nacional de Educao Especial e a Formao de Professores por Meio do Grupo FocalAgda Felipe Silva Gonalves; Cacia Scuassante BolzanMarcela Rbia Tozato; Francielle Sesana Zuqui; Geovanete Lopes de Freitas Belo ......................................................................... 27

    Captulo IIIOlhar Avaliativo na/para Formao Relexivo-Crtica de Professores: as Implicaes do Observatrio Estadual de Educao EspecialCamila Helena Rodrigues; Denise Meyrelles de Jesus ............................................ 39

    Captulo IVObservatrio Estadual de Educao Especial: Dirios Relexivos como Dispositivo Formao Continuada dos Professores EspecializadosLucas Novaes Santos; Carline Santos Borges; Sonia Lopes Victor .......................... 63

    Captulo VFormao de Professores: ONEESP em ContextoAmanda Costa Camizo; Vvia Camila Crtes Porto ....................................... 71

    Captulo VIAtendimento Educacional Especializado: o Que Diz a Literatura?Carline Santos Borges; Lucas Novaes Santos ........................................................ 81

  • SEGUNDA PARTEAVALIAO: DIAGNSTICO, PLANEJAMENTO E APRENDIZAGEM

    Captulo VIIAvaliao e Educao Especial: Dilogos sobre Diagnstico, Planejamento e Rendimento Escolar nas Salas de Recursos MultifuncionaisDenise Meyrelles de Jesus; Alexandro Braga Vieira;Ana Marta Bianchi de Aguiar; Alana Rangel Barreto Soave ................................ 93

    Captulo VIIIAvaliao e Atendimento Educacional Especializado: Por Que Identiicar? Para Que Avaliar?Alexandro Braga Vieira ..................................................................................... 115

    Captulo IXAvaliao e Atendimento Educacional Especializado: Tenses, Possibilidades e DesaiosAna Marta Bianchi de Aguiar; Marta Alves da Cruz Souza ................................ 127

    TERCEIRA PARTEEDUCAO INFANTIL E A EDUCAO NA DIFERENACaptulo XO Atendimento Educacional Especializado para os Alunos da Educao Infantil no Municpio de GuarapariMarta Alves da Cruz Souza; Suelen da Silva Salles; Patrcia Santos Conde .......... 149

    Captulo XIO Atendimento Educacional Especializado (AEE) na Educao Infantil: Narrativas de Professores de Educao EspecialAngela M. Caulyt S. da Silva; Larissy Alves Cotonhoto; Rose Mary Fraga Pereira ................................................................................... 161

    Captulo XIIAnlise do Atendimento Educacional Especializado em uma Sala de Recursos Multifuncionais: um Estudo de CasoSamira Loureno Machado; Paula Viale da Costa; Sonia Lopes Victor ................. 179

    Captulo XIIIA Interlocuo do Currculo Comum na Escola: Implicaes Educao EspecialSumika Soares de Freitas Hernandez Piloto,Rose Mary Fraga Pereira ................... 195

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    QUARTA PARTEPROFESSORES-PESQUISADORES EM FORMAO: PRODUES DOS DOCENTES ESPECIALIZADOS

    Captulo XIVO Dilema de Ser TGD na Organizao EscolarRosemar Santos Soares ....................................................................................... 207

    Captulo XVAtendimento Educacional Especializado (AEE): Servio de Apoio/Sala de Recursos na Concepo InclusivaMara Rubia dos Reis Fonseca ............................................................................. 215

    Captulo XVIA Incluso do Aluno com Deicincia Intelectual para Alm do Acesso Eula Amorim Sanglard Lopes; Angela do Nascimento Paranha Oliveira ............. 221

    Captulo XVIIO Processo Ensino de Aprendizagem da Pessoa com Deicincia Mltipla e a Articulao Entre a Sala de Aula Comum e a Sala de Recursos MultifuncionalCacia Scuassante Bolzan; Fausta Aparecida O. de Queirs Belo de Jesus ............... 227

    Captulo XVIIIAltas Habilidades/Superdotao: Relexes sobre o Atendimento Educacional Especializado em Sala de Recursos MultifuncionalRoberto Carlos Machado ................................................................................... 237

    Captulo XIXAtendimento Educacional Especializado (AEE) na Construo da Comunicao Alternativa do Aluno AutistaAlessandra Silveira Rocha .................................................................................. 245

    Captulo XXAcesso e Permanncia para Alunos com Deicincia Visual na Educao de Jovens e Adultos: Possibilidades e Tenses no Atendimento Educacional EspecializadoSirlei Anacleto Martins; Karolini Galimberti Pattuzzo ........................................ 253

    EncerramentoTrabalho Docente, Educao Especial e Formao do Especialista: Continuando a CaminhadaSonia Lopes Victor; Ivone Martins de Oliveira ................................................... 259

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  • 9

    aPresentao

    Formao continuada: contribuies dos observatrios de educao esPecial

    Denise Meyrelles de Jesus1

    Alexandro Braga Vieira2

    Camila Helena Rodrigues3

    A formao de proissionais da Educao, considerando a dife-rena na escola, tem se constitudo em um dos temas mais atuais nas litera-turas nacional e internacional. Muitos projetos oiciais no Brasil se organi-zaram, nos ltimos dez anos, na perspectiva de formar os docentes e outros proissionais (BRASIL, 2005; 2007), tendo em vista a necessidade de se de-bater os diferentes modos de vida e de aprendizagem na Educao Bsica. Diversas estratgias organizadoras foram usadas nesses processos formativos, predominando a modalidade a distncia e os processos de multiplicao.

    Neste livro digital, apresentamos um conjunto de produes que foram constitudas a partir de uma perspectiva de formao continuada denominada Observatrio Estadual de Educao Especial no Esprito Santo, realizada com professores que atuam na modalidade de Educao Especial.

    1 Profa. Dra. Centro de Educao/Programa de Ps-graduao em Educao UFES. E-mail: [email protected] Prof. Dr. Centro de Educao UFES. E-mail: [email protected] Pedagoga pela Universidade Federal do Esprito Santo UFES. E-mail: [email protected]

  • Denise M. de Jesus; Sonia L. Victor; Agda F. S. Gonalves (Org.)

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    Essa proposta de formao se desenvolveu por meio de uma ao cola-

    borativa entre professores e alunos da Universidade Federal do Esprito

    Santo e docentes da Educao Bsica, perpassando desde a organizao

    da proposio curricular at sua execuo propriamente dita. Dessa for-

    ma, as produes deste livro so advindas desse processo formativo e se

    constituram por meio da produo de professores da universidade, alunos

    ps-graduandos, bolsistas de iniciao cientica e professores-docentes da Educao Bsica participantes da referida proposta de formao.

    O Observatrio Estadual de Educao Especial no Esprito Santo pode ser apresentado como um projeto de pesquisa-formao realizado nos anos de 2014/2015 e coordenado por trs professoras da Universidade Federal do Esprito Santo (duas do campus de Goiabeiras e uma de So Mateus). Teve por objetivo aprofundar a formao de sessenta professores especializados em Educao Especial, sendo que todos j haviam participa-do do Observatrio Nacional da Educao Especial (seo Esprito Santo) coordenado, nacionalmente, pela Professora Dra. Eniceia Gonalves Mendes, da Universidade Federal de So Carlos.

    Dos sessenta proissionais envolvidos, trinta eram oriundos da regio metropolitana de Vitria (Vitria, Serra, Vila Velha, Cariacica e Guarapari) e os outros trinta da regio norte do Esprito Santo (So Mateus, Linhares, Alto Rio Novo e Sooretama).

    Essa pesquisa-formao teve como eixo de discusso a necessida-de de buscar articulaes entre a Educao e a diferena humana, assumin-do o grupo como dispositivo de formao continuada e desenvolvimento proissional. Sendo assim, deiniu-se como princpios orientadores do pro-cesso formativo: a educabilidade de todos os alunos (MEIRIEU, 2005); o professor como sujeito de seu prprio conhecimento (ZEMELMAN, 2006); e a construo coletiva do conhecimento, pela via do dispositivo grupal (JESUS; VIEIRA; EFFGEN, 2014).

    A partir dessa premissa, professores e alunos da universidade, jun-tamente com docentes da Educao Bsica, buscaram, com tal movimento, constituir linhas de pensamento e encaminhamentos para os desaios exis-tentes nos processos de escolarizao dos alunos pblico-alvo da Educao Especial, tendo como eixo balizador a noo de que todos tm direito

  • Formao, Prticas Pedaggicas e Incluso Escolar no Observatrio Estadual de Educao Especial

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    social Educao e que isso implica, conforme nos sugere Boaventura de Souza Santos (2006), uma justia cognitiva.

    O grupo envolvido no estudo tomou como deinidor do curr-culo da formao os interesses constitutivos do saber docente em dilogo com a teorizao pertinente. Para tal, os participantes foram convidados, pela via de grupos focais, a analisar e a problematizar os componentes necessrios a sua formao e atuao docente. Com esse movimento, os professores foram assumidos como sujeitos de conhecimento, sendo tal perspectiva amplamente defendida por Zemelman (2006) quando destaca a vontade/necessidade de o sujeito conhecer como condio prvia para a construo do conhecimento.

    Quando encarada a partir dos sujeitos, a realidade torna-se um con-junto de espaos de construo: esse o papel do momento histri-co, na medida em que neste que tem lugar a interveno da prtica (ZEMELMAN, 2006, p. 461).

    O currculo da pesquisa-formao foi, ento, organizado com os docentes especializados em Educao Especial dos diferentes municpios capixabas envolvidos na dinmica formativa. Pensou-se uma formao com os formandos e no para eles. No quadro que se segue podemos observar a proposta inal que foi dialogada com o grupo de estudos.

  • Denise M. de Jesus; Sonia L. Victor; Agda F. S. Gonalves (Org.)

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    Quadro 1 Temticas levantadas pelos professores e que subsidiaram a proposta da pesquisa-formao do Observatrio Estadual de Educao Especial no Esprito Santo.

    Temticas Direito Educao: polticas de acesso, permanncia e aprendizagem. Incluso escolar: fundamentos scio-ilosicos. Dilogos tericos: a perspectiva das pedagogias institucionais: contribuies de Philippe

    Meirieu. Dilogos tericos: a abordagemhistrico-cultural e a pedagogia histrico-crtica: contri-

    buies Educao dos alunos pblico-alvo da Educao Especial. Currculo: as diferentes abordagens curriculares em interface com a perspectiva da

    Educao inclusiva: pensando o pblico-alvo da Educao Especial nos diferentes nveis e modalidades de ensino.

    Aprendizagem e avaliao: diagnstico, planejamento e gesto do trabalho pedaggico. Polticas de Infncia e Juventude: desaios atuais. Intersetorialidade: polticas e as articulaes na escola. Formao inicial e continuada de professores: ser professor em tempos de incluso. Trabalho Colaborativo: articulando diferentes proissionais e mltiplas possibilidades de

    ao. Tecnologias assistivas e comunicao alternativa. Alfabetizao: pressupostos tericos e prticos no contexto da Educao inclusiva. Autismo. Educao de Surdos. Altas Habilidades/Superdotao. Deicincias Mltiplas. Deicincia Visual. Deicincia Intelectual.

    A meta da formao foi assumir os professores como proissionais relexivos-crticos, situao que exige que se aposte na construo coletiva do conhecimento. Assim, tal construo apoiou-se no conhecimento de professores universitrios, mestrandos, doutorandos, bolsistas de iniciao cientica e docentes especializados da Educao Bsica, sem hierarquias, mas reconhecendo a natureza da contribuio de cada um, desde a teoria advinda das pesquisas at s teorias constitudas na/pela escola.

    Nesse contexto, os participantes foram se capacitando como mediadores de formao em seus espaos de trabalho, juntamente com seus colegas de proisso. Cabe dizer que esse processo se efetivou com vrias contradies, mas, tambm, com muitas negociaes e aes ins-tituintes. Com esse movimento, os mediadores sistematizaram, dentro de suas possibilidades, projetos de formao continuada em contexto,

  • Formao, Prticas Pedaggicas e Incluso Escolar no Observatrio Estadual de Educao Especial

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    considerando, muitas vezes, metodologias prximas s que utilizamos na pesquisa-formao.

    O processo de formao constitudo nos locais de trabalho dos docentes foi registrado/problematizado, sendo utilizada, para tal tarefa, a elaborao de dirios relexivos (S-CHAVES, 2004) que, muitas vezes, foram assumidos pelos mediadores como o amigo mais prximo, o espao propcio para a escrita de algumas conidncias e dvidas e uma oportuni-dade de registro de possveis encaminhamentos, mas tambm um espao para registro das linhas de raciocnio e de ao produzidas na/pela for-mao, enim, um rico dispositivo de relexo crtica. Segundo S-Chaves (2004, p. 15), os dirios relexivos so:

    [...] instrumentos de dilogo entre formador e formando(s) que no so produzidos no inal do perodo para ins avaliativos, mas so continu-amente (re)elaborados na ao e partilhados por forma a recolherem, em tempo til, outros modos de ver e de interpretar que facilitem ao formando uma ampliao e diversiicao do seu olhar, forando-o tomada de decises, necessidade de fazer opes, de julgar, de deinir critrios, de se deixar invadir por dvidas e por conlitos, para deles poder emergir mais consciente, mais informado, mais seguro de si e mais tolerante quanto hipteses dos outros (grifos nossos).

    Tal ferramenta tambm foi muito importante para desencadear um processo de dilogo formativo-relexivo entre formandos e formadores, pois o grupo pertencente universidade encontrava nos dirios relexivos um caminho profcuo para acompanhar os movimentos formativos dis-parados pelos professores nas escolas em que atuavam. Cumpre destacar a existncia de tenses na produo dos dirios relexivos, sendo tal situao materializada tanto para o grupo de formandos quanto para o de forma-dores, visto no ser fcil sintetizar e ser crtico de sua prpria prtica, mas tambm ser responsivo ao outro com anlises que contribuam para dispa-rar novas relexes.

    Mesmo assim, por meio da anlise dos dirios relexivos, per-cebemos que esses instrumentos estavam repletos de pistas que aponta-vam desaios que precisam ser considerados pelas polticas de Educao Especial, estando, tambm, recheados de possibilidades que expressavam os movimentos ocorridos no cotidiano escolar, como no prprio fazer do-

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    cente rebatimentos da apropriao do conhecimento abordado a partir dos aportes tericos do curso.

    Dessa forma, podemos dizer que tanto a formao realizada na universidade quanto na escola e o registro desse processo nos dirios rele-xivos (e o seu acompanhamento pelos professores-formadores) se constitu-ram em oportunidades para que todos pudessem se formar em processo, pois, como sinaliza S-Chaves (2004), a relexo-crtica sobre a ao-prti-ca alimentada pelo dilogo terico se coloca como um dos elementos fun-damentais para os processos de formao docente e para o delineamento de novos possveis frente os desaios existentes na prtica docente.

    [...] a relexo sobre a prtica permite revelar aspectos ocultos na pr-pria experincia (ou que durante ela no foi possvel ter em ateno) ela no foi nova informao, esta pode permitir um novo olhar, com o qual se torna possvel revisitar essa experincia e apreci-la de novo, desenvolver novas compreenses, insigths que, caso se queira (ou possa) se poder fazer, intervir em actividades futuras (S-CHAVES, 2004, p.14, grifos nossos).

    Assim, os movimentos constitudos pela pesquisa-formao Observatrio Estadual de Educao Especial no Esprito Santo deram sustentao produo deste livro digital, situao possvel, mediante o convite feito aos formadores e aos formandos para escrever artigos que evi-denciassem as aes realizadas no transcorrer da formao (tanto na uni-versidade quanto na escola), as discusses tericas suscitadas, bem como as prticas pedaggicas (re)signiicadas.

    O livro est organizado em quatro partes. A primeira tem como eixo sistematizador a Formao Docente e a Educao na Diferena. Traz um conjunto de produes dedicadas a problematizar a formao docente em interface com os pressupostos da Educao Especial em uma perspectiva inclusiva. Para tanto, constitui-se por meio de cinco artigos que enfatizam os processos formativos desencadeados ao longo da pesquisa-formao do Observatrio Estadual de Educao Especial no Esprito Santo, sendo que alguns textos apresentam as contribuies/movimentos das prticas for-mativas realizadas no momento nacional, outras no momento estadual e algumas no cotidiano da escola.

  • Formao, Prticas Pedaggicas e Incluso Escolar no Observatrio Estadual de Educao Especial

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    A segunda toma como eixo balizador a temtica Avaliao: diag-nstico, planejamento e aprendizagem, adotando como foco os processos de avaliao realizados com os alunos que apresentam deicincia, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotao nas escolas de ensino comum. Esta parte traz trs artigos que colocam em anlise a avalia-o em interface com os pressupostos da Educao Especial em uma pers-pectiva inclusiva, apontando cenrios que nos permitem perceber os desa-ios existentes no cotidiano escolar quando os proissionais da Educao se vm desaiados a escolarizar estudantes pblico-alvo da Educao Especial, mas tambm prticas inventivas que desvelam movimentos para fazer da avaliao uma ao que retroalimenta a formao e atuao docente, as prticas pedaggicas e os diferentes percursos de aprendizagem dos alunos.

    A terceira parte traz como foco a Educao Infantil e a Educao na diferena. Constituiu-se por meio de produes direcionadas a pensar a Educao Especial no contexto da Educao Infantil, trazendo, os artigos, relexes interessantes para pensarmos a oferta do atendimento educacio-nal especializado para as crianas matriculadas nessa etapa de ensino, a or-ganizao/vivncia dos currculos escolares para a escolarizao da criana pequena e narrativas de professores que evidenciam prticas pedaggicas institudas/instituintes considerando as peculiaridades do saber-fazer no contexto da Educao Infantil.

    A quarta parte se organiza por meio de discusses sobre Professores-pesquisadores em formao: contribuies dos docentes especializados. Nesta parte, so apresentados sete artigos cujo eixo condutor se coloca nas prti-cas cotidianas da ao docente, tendo como foco a escolarizao de alunos pblico-alvo da Educao Especial na Educao Bsica. Os temas versam sobre o atendimento educacional especializado, o acesso e a permanncia na escola de alunos com deicincia visual, a organizao escolar e o aluno com transtornos globais do desenvolvimento, a articulao entre a sala de aula comum e a sala de recursos com alunos com deicincia mltipla e relexes sobre as altas habilidades/superdotao e o atendimento educa-cional especializado.

    Assim, o presente livro, aqui intitulado de Formao, prticas pe-daggicas e incluso escolar no Observatrio Estadual de Educao Especial, traz um amplo espectro de conhecimentos produzidos coletivamente no

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    contexto da formao continuada, pela via de uma pesquisa-formao, apontando evidncias que tal processo foi constitutivo de novos conheci-mentos para formandos e formadores.

    O objetivo deste livro dar continuidade ao processo de forma-o desencadeado pelo Observatrio Estadual de Educao Especial no Esprito Santo, pois, por meio da leitura/anlise dos conhecimentos ex-pressos nos diferentes textos, essa dinmica formativa vai se estendendo e se enredando s aes pedaggicas dos cotidianos educativos atravessados pelos princpios da Educao Especial em uma perspectiva inclusiva.

    Nosso desejo que os conhecimentos aqui constitudos possam se somar s experincias/saberes dos professores, ajudando-os a ampliar seus saberes-fazeres e a potencializar suas prticas de ensino aes ne-cessrias para pensarmos na educabilidade de todos. Desejamos que essa leitura possa fazer emergir novas/outras experincias e conhecimentos e que os professores possam ser nossos leitores.

    REFERNCIAS

    BRASIL. Ministrio da Educao. Secretaria de Educao Especial. Programa educao inclusiva: Direito Diversidade. 2005.

    BRASIL. Ministrio da Educao. Secretaria de Educao Especial. Atendimento edu-cacional especializado: orientaes gerais e Educao a Distancia. 2007

    JESUS. D, VIEIRA. A, EFFGEN. A. Pesquisa-Ao Colaborativo-Crtica: em busca de uma epistemologia. Educao e Realidade, Porto Alegre, v. 39, n. 3, p. 651-966, jul./set. 2014.

    MEIRIEU, P. Cotidiano da escola e da sala de aula: o fazer e o compreender. Porto Alegre: Artmed, 2005.

    S-CHAVES, I. Portflios relexivos: estratgia de formao e de superviso. 2 ed. Aveiro: Universidade, 2004.

    SANTOS, B. S. A gramtica do tempo: para uma nova cultura poltica. So Paulo: Editora Cortez, 2006.

    ZEMELMAN, H. Sujeito e sentido: consideraes sobre a vinculao do sujeito ao conhecimento que constri. In: SANTOS, B. S. (Org.). Conhecimento prudente para uma vida descente. 2. ed. So Paulo: Cortez, 2006.

  • 17

    Primeira ParteFormao docente

    e a educao na diFerena

  • 18

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    caPtulo i

    a Formao de ProFessores no contexto do observatrio nacional de educao

    esPecial: o estado do esPrito santo em Foco

    Sonia Lopes Victor1

    INTRODUO

    Nas polticas atuais para educao especial, o Atendimento Educacional Especializado (AEE), como se conigura hoje, foi apresen-tado no Plano de Desenvolvimento da Educao (PDE), divulgado pelo Ministrio da Educao em abril de 2007.

    Esse plano inaugurou um novo regime de colaborao entre o Estado e os entes federados, dando autonomia para os estados e munic-pios, que aderiram ao Plano de Metas Compromisso Todos pela Educao, elaborarem os seus respectivos Planos de Aes Articuladas (PAR).

    Nessa direo, o Decreto n. 6.571, de 20082, surge prestar apoio tcnico e inanceiro aos sistemas de ensino dos Estados, do Distrito Federal e dos Municpios e considera o AEE [...] o conjunto de atividades, recur-sos de acessibilidade e pedaggicos organizados institucionalmente, pres-tado de forma complementar ou suplementar formao dos alunos no

    1 Profa. Dra. Centro de Educao / Programa de Ps-Graduao em Educao UFES. E-mail: [email protected] O referido decreto foi revogado e incorporado ao Decreto n. 7.611/11 (BRASIL, 2011).

  • Denise M. de Jesus; Sonia L. Victor; Agda F. S. Gonalves (Org.)

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    ensino regular (BRASIL, 2008a), visando ampliar a oferta aos estudantes com deicincia, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilida-des e superdotao, considerados como o pblico-alvo da educao espe-cial, matriculados na rede pblica de ensino regular. Para tanto, apresenta as salas de recursos multifuncionais como lcus preferencial para esse aten-dimento, considerando-as conforme o Art. 3, 1, ambientes dotados de equipamentos, mobilirios e materiais didticos e pedaggicos para a oferta do atendimento educacional especializado (BRASIL, 2008a).

    Alm disso, reiterado que a formao dos professores que atuam na educao especial ser realizada [...] com especializao adequada em nvel mdio ou superior, para atendimento especializado, bem como pro-fessores do ensino regular capacitados para a integrao desses educandos nas classes comuns [...] (BRASIL, 1996).

    Para Bueno (1999, p. 21), no contexto da discusso sobre a for-mao de professores, o fato da LDBEN n. 9.293/96 permitir a formao do professor de educao especial em nvel mdio [...] expressa a falta de poltica, clara, consistente e avanada com relao formao de professo-res do ensino fundamental, entre eles o professor especializado, em nosso pas, abrindo espaos para uma srie de problemas e contradies que sugerem as mais variadas formas de interpretaes e de encaminhamentos.3

    Conforme Saviani (2009, p. 152), no se pode dizer que a edu-cao especial no tenha sido contemplada na legislao em vigor [...]. No entanto, no contexto da resoluo CNE/CP n.1, de 15 de maio de 2006, que institui diretrizes nacionais para o curso de graduao em pedagogia licenciatura, a formao do professor para o atendimento educacional dos estudantes pblico-alvo da educao especial se constitui como secund-ria, resumindo-se a um rol de atividades demonstrativas da conscincia da diversidade e limitando-se a uma atividade complementar, de carter op-cional, para efeitos de integralizao de estudos (SAVIANI, 2009). Nesse sentido, analisa o referido autor: [...] no que se refere formao de pro-fessores para atuar na Educao Especial a questo permanece em aberto

    3 A Lei n. 12.796 (BRASIL, 2013), de 04 de abril de 2013, que alterou a LDBEN n. 9.293/96, manteve a fragilidade a respeito do lcus de formao do professor de educao especial, reairmando a possibilidade de que essa formao seja oferecida tambm em nvel mdio na modalidade normal com especializao e no apenas no ensino superior com especializao.

  • Formao, Prticas Pedaggicas e Incluso Escolar no Observatrio Estadual de Educao Especial

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    [...] (p. 152), pois o curso de pedagogia, que poderia se constituir o lugar dessa formao no a contempla plenamente.

    Em 2008, a Poltica Nacional de Educao Especial na Perspectiva da Educao Inclusiva (PNEE-PEI) destaca que, para atuar na educao especial, o professor deve ter como base da sua formao inicial e conti-nuada conhecimentos gerais para o exerccio da docncia e conhecimentos especicos da rea (BRASIL, 2008b).

    Nesse sentido, a referida poltica airma a necessidade de o pro-fessor de educao especial ter contemplado, no processo de sua formao, conhecimentos tanto da docncia como os especicos relacionados com as necessidades das diferentes crianas que compem o contexto escolar. Alm desses, prev o domnio de conhecimentos sobre gesto, no intuito de articular as diferentes formas de atendimentos existentes nos sistemas de ensino tendo em vista a intersetorialidade das polticas pblicas. Contudo, ainda no faz referncia quanto ao lugar dessa formao.

    Na Resoluo n. 4, de 2 de outubro de 2009, que institui as dire-trizes operacionais para o AEE na educao bsica, modalidade educao especial, os artigos 12 e 13 estabelecem as exigncias de formao e as atri-buies do professor de educao especial que ir atuar no AEE, destacan-do que, alm de ter formao inicial que o habilite para o exerccio da do-cncia, ele deve ter tambm formao especica para a educao especial.

    Por im, o Decreto n. 7.611/11, no artigo 5, destaca o apoio tcnico e inanceiro para os estados, municpios e distritos, e a instituies comunitrias, confessionais ou ilantrpicas sem ins lucrativos. Para tan-to, elege como duas dessas aes a formao continuada de professores e a formao de gestores, educadores e demais proissionais da escola para a educao na perspectiva da educao inclusiva.

    Contudo, no que tange formao continuada, as alternativas encontradas pelos professores que atuam nos estados, municpios, distritos e instituies ilantrpicas e sem ins lucrativos tm sido os cursos em nvel de aperfeioamento e especializao, na modalidade a distncia, por meio da Universidade Aberta do Brasil (UAB), e na modalidade presencial e semipresencial pela rede nacional de formao continuada de professores na educao bsica (Renafor), que visam a apoiar a formao continuada

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    de professores para atuar nas salas de recursos multifuncionais (SRM) e em classes comuns do ensino regular, em parceria com instituies pblicas de educao superior (Ipes).

    Entendemos que por muito tempo as formaes inicial e con-tinuada do professor de educao especial foram marcadas por prticas que do nfase constituio orgnica do indivduo, fundamentadas no modelo mdico de deicincia, consequentemente, na descrena das pos-sibilidades de sua aprendizagem. Nesse sentido, nosso objetivo neste texto o de analisar a formao do professor de educao especial para o AEE com nfase nas SRM, no contexto do Observatrio Nacional de Educao Especial (ONEESP), com foco especico na formao desses professores no estado do Esprito Santo (ES).

    A PESQUISA DO OBSERVATRIO NACIONAL DE EDUCAO ESPECIAL (ONEESP)

    O ONEESP um grupo de pesquisa em REDE que rene pes-quisadores de instituies de ensino superior brasileiras pblicas e privadas, os quais atuam no campo da educao especial vinculados a programas de ps-graduao stricto sensu.

    No contexto da pesquisa do ONEESP denominada Observatrio Nacional de Educao Especial: Estudo em Rede Nacional sobre as Salas de Recursos Multifuncionais das Escolas Comuns, que visou a uma avaliao de mbito nacional do programa de implantao de Salas de Recursos Multifuncionais, daremos nfase neste artigo s narrativas referentes dis-cusso do eixo temtico sobre formao, realizado em trs dos 11 encontros em formato de grupo focal, com 19 professores de educao especial que atuam em SRM de um dos municpios envolvidos, pertencente Regio Metropolitana da Grande Vitria do estado do Esprito Santo4, ocorridos no perodo de maro a dezembro de 2012, na Universidade Federal do Esprito Santo.

    4 A Regio Metropolitana da Grande Vitria, embora ocupe apenas 5% do territrio capixaba, concentra quase a metade da populao do Esprito Santo. Essa regio responsvel por 63% do PIB total estadual, considerando-se os valores de 2005, e responde por 65% da arrecadao de ICMS do estado. Divide, desde o perodo de 2007 a 2012, a concentrao econmica de maior atratividade para investimento no estado com as regies Litornea Sul e Polo Cachoeiro. Disponvel em: . Acesso em: 26 abr. 2015.

  • Formao, Prticas Pedaggicas e Incluso Escolar no Observatrio Estadual de Educao Especial

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    Os professores de educao especial desse municpio, majori-tariamente, so formados em nvel superior, em cursos de licenciaturas, especialmente, a licenciatura em Pedagogia. Dez dos professores izeram o curso de pedagogia e os demais izeram outras licenciaturas. Todos os professores de educao especial, com exceo de um deles, realizaram de um a at trs cursos de ps-graduao lato sensu na rea de educao/edu-cao especial. Os professores de educao especial tm maior experincia proissional no ensino fundamental, especialmente, nos ltimos anos. A maioria deles atende alunos com deicincia intelectual, entre eles os que apresentam a sndrome de Down, e os alunos com TGD que apresentam autismo ou sndrome de Aspeger, entre outros.

    ACHADOS NO CONTEXTO DO ONEESP SOBRE A FORMAO DE PROFESSORES

    Para a anlise das narrativas desses professores de educao es-pecial quanto formao, optamos em organiz-las observando aspectos a respeito de suas concepes sobre o pblico-alvo da educao especial, suas necessidades formativas para atend-lo, a relao com os demais pro-issionais da escola, com as famlias, as prticas pedaggicas e as condies de trabalho.

    Quanto s concepes, percebemos que os professores ainda tm um olhar clnico-teraputico do aluno pblico-alvo da educao especial, mas reairmam o direito desse aluno de estar na escola por fora da lei. Alm disso, restringem, muitas vezes, a incluso escolar desse aluno ao fato de ele estar matriculado em uma escola regular. No entanto, criticam o entendi-mento por parte da escola e dos seus proissionais, de que esse aluno deva ser responsabilidade quase exclusivamente do professor de educao especial. Nesse sentido, evidenciam que a escola no somente lugar para a sociali-zao desse aluno, sinalizando que a aprendizagem o sentido do trabalho pedaggico e que a incluso no uma escolha e sim um direito do aluno.

    Quanto s necessidades formativas, notamos que a formao entendida como uma obrigao para o exerccio da funo. A referida for-mao, contudo, ainda se constitui como uma busca particular do pro-fessor por incentivo, muitas vezes, dos colegas e no como uma garantia efetiva do poder pblico, apesar das ofertas formativas empreendidas pelo

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    municpio. Consideram que realizam a formao em virtude de dar con-tinuidade ao conhecimento e por gostar da rea. Todavia, muitas vezes, ela surge da necessidade do professor de atender ao aluno pblico-alvo da educao especial.

    No que diz respeito relao com os outros proissionais da es-cola entendem que a escola toda necessita se mobilizar a im de terem uma proposta conjunta para a educao do aluno pblico-alvo da educa-o especial. Para tanto, veem como fundamental a diviso do trabalho pedaggico junto a esse pblico com os demais proissionais da escola. Destacam, entretanto, que os professores regentes das diferentes disciplinas que compem o currculo bsico, muitas vezes, no compartilham a sua ao pedaggica e destinam o atendimento educacional desse aluno ao estagirio, diicultando o trabalho colaborativo na escola. Outro fator que consideram importante a participao efetiva do pedagogo tambm nas questes educacionais relacionadas a esse pblico.

    Quanto relao com a famlia do aluno pblico-alvo da edu-cao especial, destacam que os pais, muitas vezes, parecem esperar dos professores uma postura clnico-teraputica de atendimento educacional semelhante quela desenvolvida no contexto das escolas especializadas. Destacam a necessidade de os pais participarem mais da vida escolar dos seus ilhos e no simplesmente exigirem os avanos cognitivos de grande porte, desconsiderando aqueles que, embora menores, servem de suporte a esses. Por im, evidenciam a importncia da participao da famlia nos momentos de formao continuada na escola.

    Quanto s prticas pedaggicas, entendidas neste artigo pelos aspectos relacionados avaliao, ao planejamento, abordagem dos con-tedos e s metodologias de ensino presentes na SRM, na sala comum e em outros espaos dentro e fora da escola, os professores destacam que, geralmente, os professores regentes no organizam a aula de modo que englobe os alunos pblico-alvo da educao especial. Evidenciam tambm que necessitam aprender abordagens especicas, tcnicas de habilidades de comunicao, Lngua Brasileira de Sinais (Libras) etc. para atenderem s demandas desses alunos. Alm disso, destacam a diiculdade de planejarem com os professores regentes, especialmente aqueles que atuam a partir do 5 ano do ensino fundamental. Atribuem essa diiculdade ao fato desses

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    professores acharem que a responsabilidade desse alunado do professor de educao especial. Revelam que so inmeras as tentativas de atender as especiicidades de aprendizagem desses alunos, sugerindo uma ao peda-ggica com base no acerto e erro. Para tanto, os jogos e atividades diferen-ciadas e/ou adaptadas so acionadas pelos professores visando resolv-las. Muitas vezes, costumam adquirir materiais com os prprios recursos para auxili-los no trabalho pedaggico desenvolvido com esse alunado.

    Quanto s condies de trabalho, evidenciam que as SRM e as escolas, de forma geral, tm poucos materiais pedaggicos que auxiliam no AEE ofertado para os alunos pblico-alvo da educao especial. Nessa an-lise, do nfase falta de materiais de leitura para a realizao de atividades relacionadas ao processo de alfabetizao.

    CONSIDERAES FINAIS

    Entendemos que os conceitos de educao especial, incluso e atendimento educacional especializado (AEE) se constituem no bojo de um processo histrico de lutas dos movimentos sociais, apesar da manu-teno do status quo de um sistema capitalista, de carter neoliberal, que os deine e os materializa na sociedade por meio das polticas de incluso. No entanto, a educao especial, nessa perspectiva, com os recursos e servios de apoio do AEE, [...] no serve somente como controle, mas como espa-o de construo do conhecimento sobre a experincia educativa, escolar e no escolar das pessoas com deicincia [...] em sua natureza multi, inter e transdisciplinar (MAGALHES, 2011, p. 93).

    Nesse sentido, as narrativas desses professores expressam esse con-texto ao discutirem o eixo formao, no qual indicam que as prticas ainda esto em processo de relexo e construo, com vistas a se constiturem como inclusivas.

    REFERNCIAS

    BRASIL. Ministrio da Educao. Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional. LDB n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Lex. Braslia, DF, 1996. Disponvel em: . Acesso em: 15 jan. 2015.

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    BRASIL. Diretrizes curriculares nacionais para a formao de professores da educa-o bsica. Resoluo CNE/CP 1, de 18 de fevereiro de 2002. Disponvel em: . Acesso em: 26 abr. 2015.

    BRASIL. CNE/CEB. Decreto n. 6.571, de 17 de setembro de 2008. Dirio Oicial da Unio, Braslia, DF, 18 set. 2008a.

    BRASIL. Ministrio da Educao. Secretaria de Educao Especial. Poltica nacional de educao especial na perspectiva da educao inclusiva. Braslia, DF: MEC/Seesp, 2008b.

    BRASIL. Presidncia da Repblica. Decreto n. 7.611, de 17 de novembro de 2011. Dirio Oicial da Unio, Braslia, DF, 18 nov. 2011.

    BRASIL. Lei n. 12.796, de 4 de abril de 2013. Congresso Nacional. Altera a Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educao nacional. Lex. Braslia, DF, 4 abr. 2013.

    BUENO, J. G. S. Crianas com necessidades educativas especiais, poltica educacional e a formao de professores: generalistas ou especialistas?Revista Brasileira de Educao Especial,Marlia, v. 3, n. 5, p. 7-27, set. 1999.

    MAGALHES, R. C. B. P. Educao inclusiva: escolarizao, poltica e formao docente. Editora: Liber livro, 2011.

    SAVIANI, D. Formao de professores: aspectos histricos e tericos do problema no contexto brasileiro. Revista Brasileira de Educao, Campinas, v. 14, n. 40, p. 143-155, jan./abr. 2009.

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    caPtulo II

    observatrio nacional de educao esPecial e a Formao de ProFessores

    Por meio do gruPo Focal

    Agda Felipe Silva Gonalves1

    Cacia Scuassante Bolzan2

    Marcela Rbia Tozato3

    Francielle Sesana Zuqui4

    Geovanete Lopes de Freitas Belo5

    INTRODUO

    Este estudo, que ora se apresenta, conigura-se como uma an-lise do uso da tcnica de grupo focal para formao de professor utiliza-da na pesquisa nacional intitulada Observatrio Nacional de Educao Especial: estudo em rede nacional sobre as salas de recursos multifuncio-nais nas escolas comuns (ONEESP), iniciada em janeiro de 2011, tendo como principal objetivo a avaliao do Programa de Salas Multifuncionais implantado pelo MEC desde o ano de 2005.

    A pesquisa nacional constitui-se em uma rede de colaborao in-vestigativa, desdobrando-se em estudos regionais e locais e totalizando um 1 Profa. Dra. Centro Universitrio Norte do Esprito Santo / Programa de Ps-Graduao em Ensino na Educao Bsica-PPGEEB-CEUNES UFES. E-mail:[email protected] Professora do Centro de AEE de Linhares. E-mail: [email protected] Pedagoga na rede estadual no municpio de Linhares. E-mail: [email protected] Dra. pela Universidade Federal do Esprito Santo. E-mail: [email protected] Tcnica e coordenadora da Educao Especial da Superintendncia Regional de Linhares. E-mail: [email protected]

    mailto:[email protected]:[email protected]

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    quadro de 60 pesquisadores da rede nacional, 55 pesquisadores integrantes das redes locais, 49 estudantes de ps-graduao, 76 alunos de graduao, 106 gestores de Educao Especial e professores de salas de recursos multi-funcionais (MENDES, 2012).

    O Estudo em rede nacional sobre as salas de recursos multifun-cionais nas escolas comuns (ONEESP) tem como coordenadora geral a professora Enicia Gonalves Mendes (UFSCar) e como coordenadoras estaduais as professoras Denise Meyrelles de Jesus (UFES), Snia Lopes Victor (UFES) e Agda Felipe Silva Gonalves (UFES-CEUNES). No Esprito Santo, a ao investigativa da coordenao estadual desdobra--se em trs estudos locais, focalizando a regio metropolitana da Grande Vitria e a regio norte do Estado.

    No estudo local referente regio norte do Esprito Santo esto sendo desenvolvidas aes investigativas nos municpios de So Mateus, Linhares, Sooretama, Rio Bananal e Nova Vencia, com a participao de 59 professores das salas de recursos multifuncionais dos municpios envol-vidos na pesquisa. A coordenao do estudo da regio norte conta com a participao de duas alunas mestrandas do PPGE-UFES, duas pesquisado-ras voluntrias do municpio de Linhares e com a colaborao das gestoras da Educao Especial dos municpios envolvidos na pesquisa.

    Assim, este artigo desenhado a partir de um olhar especico, fo-calizando os dados conclusivos do ciclo do Eixo 1- Formao de professores para incluso escolar. A discusso aqui apresentada indica a relexo desse estudo local e de seus pesquisadores, como desdobramento do estudo na-cional, incidindo sobre a regio norte do Esprito Santo.

    importante salientar que a pesquisa nacional foi organizada em cinco etapas, a saber:

    Etapa I. Conduo dos procedimentos ticos; Etapa II. Caracterizao da poltica de incluso escolar do municpio; Etapa III. Caracterizao dos indicadores demogricos e educacionais

    do municpio;

    Etapa IV. Estudo do funcionamento das salas de recursos;

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    Etapa V. Enquete com professores das salas de recursos para avaliao da poltica de salas de recursos.

    REFERENCIAL TERICO

    Os pesquisadores do estudo local da regio norte do Esprito Santo, bem como os pesquisadores da rede nacional, esto vivenciando a quarta eta-pa da pesquisa, focalizando o estudo do funcionamento das salas de recursos que [...] prev metodologia da pesquisa colaborativa e a coleta de dados baseada em entrevista com grupos focais (MENDES, 2010, p. 7).

    A quarta etapa da pesquisa possui trs eixos temticos com per-guntas disparadoras de relexo dentro dos grupos focais: Eixo 1- Formao de professores para incluso escolar; Eixo 2- Avaliao do estudante com ne-cessidades educacionais especiais; Eixo 3- Organizao do ensino nas salas de recursos multifuncionais e classes comuns. Os eixos esto sendo trabalhados por meio de grupos focais (GATTI, 2005), com participao dos profes-sores das salas de recursos multifuncionais dos municpios selecionados. Para este artigo, focalizaremos os dados conclusivos do ciclo do Eixo 1- Formao de professores para incluso escolar, que j foi inalizado no estudo local da regio norte.

    A utilizao da tcnica do grupo focal para coleta de dados e an-lise qualitativa em pesquisas na rea das cincias sociais e, principalmente, na rea da educao tem sido amplamente divulgada. Dessa forma, den-tro do nosso estudo, damos destaques s obras de autores que discutem a importncia da tcnica do grupo focal e a formao do professor, como: Bellotti (2010), Jesus (2006), Gatti (2005), De Antoni et al. (2001), Nvoa (1995), entre outros.

    A utilizao do grupo focal possibilita [...] dar voz aos sujeitos, estabelecer interaes entre os mesmos e, subsidiada por suas falas, com-preender os sentidos [...] (BELLOTTI, 2010, p. 38).

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    Objetivos

    Os trs eixos temticos da pesquisa sero objeto de discusso nos grupos focais, tendo como objetivo fomentar a relexo dos professores participantes do estudo a partir do quadro de indagaes que se segue:

    Como tem sido organizado o atendimento a alunos com idades e de-icincias dspares?

    Que compreenso os professores tm do Atendimento Educacional Especializado (AEE) oferecido em SRM?

    Como ocorre a avaliao dos alunos pblico-alvo da educao especial para seu encaminhamento s SRM?

    Qual a formao que apresentam os professores das SRM e como ava-liam tal formao?

    Que relao existe entre o currculo das SRM e das classes comuns que o aluno frequenta?

    Como os professores tm planejado e desenvolvido o ensino dos alu-nos com NEE nas salas de recursos?

    Que possibilidades e limites oferecem as SRM como servio de apoio para todos os tipos de alunos?

    Objetivamos, aqui, focalizar nossas relexes, indicando a impor-tncia do grupo focal na formao do professor. Relexes essas advindas do estudo local, realizado na regio norte do Esprito Santo. Especiicamente, focalizaremos o encontro do grupo focal realizado no ms de maio de 2012 que inalizou o ciclo do Eixo 1, que teve como temtica relexiva: Formao de professores para incluso escolar. No abordaremos, no entanto, a anlise das respostas s perguntas feitas no eixo temtico, assunto que trataremos em artigo posterior. Para efeito didtico, abordaremos as percepes dos profes-sores capturadas ao inal do encontro, quando expressaram para os pesquisa-dores seus sentimentos ao participarem da dinmica do grupo focal.

    METODOLOGIA

    A equipe coordenadora do estudo local na regio norte do Esprito Santo organizou a estrutura do grupo focal em quatro subgrupos, devido ao grande nmero de participantes da pesquisa, que totaliza 59 professores que atuam nas salas de recursos multifuncionais dos municpios envolvi-

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    dos no trabalho. Assim, os professores foram divididos em quatro subgru-pos de acordo com os municpios, sendo: Grupo 1- professores do mu-nicpio de Linhares; Grupo 2- professores da rede estadual no municpio de Linhares; Grupo 3- professores do municpio de So Mateus; Grupo 4- professores do municpio de So Mateus e Nova Vencia.

    Destacaremos, aqui, as percepes dos participantes do Grupo 3, que reuniu 11 professores das salas de recurso multifuncionais do muni-cpio de So Mateus pertencentes s redes municipal e estadual de ensino.

    A dinmica do Grupo 3 foi coordenada por trs pesquisadoras que gravaram as falas dos professores, bem como atuaram como mode-radoras de todo o processo de desenvolvimento do grupo focal durante o ciclo do Eixo Temtico 1. No papel de moderadoras, as pesquisadoras propuseram as questes de relexo do eixo temtico aos professores par-ticipantes do grupo focal, facilitando os encaminhamentos da conversa coletiva exercendo a funo apontada por Gatti (2005, p. 30) de garantir, [...] de um lado, que os participantes no se afastem muito do tema e, de outro, que todos tenham a oportunidade de se expressar, de participar.

    O grupo de professores foi instigado relexo por meio do Eixo Temtico 1 da pesquisa que focaliza a formao do professor. Os professo-res responderam as perguntas referentes pesquisa6, trocando informaes e experincias durante a discusso dentro do grupo focal.

    6 Eixo Temtico 1: Formao de Professores para Incluso Escolar1) Como vocs ingressaram nessa rea da Educao Especial? 2) Qual foi a formao inicial de vocs? 3) Como foi a formao continuada de vocs? 4) A poltica de incluso escolar trouxe ou no novas demandas para a formao dos professores de educao especial? Em caso positivo, quais? 5) Para atuar nas salas de recursos, o professor especializado precisa ou no de formao continuada? Em caso positivo, de quais tipos? 6) Como vocs acham que deve ser a formao inicial de professores de salas de recursos? 7) Como vocs acham que deve ser a formao continuada de professores de salas de recursos? 8) Vocs se sentem aptos a oferecer o AEE em salas de recursos para alunos de qualquer nvel de ensino (educa-o infantil, ensino fundamental, ensino mdio, ensino superior)? 9) Vocs se sentem aptos a oferecer o AEE em salas de recursos para qualquer tipo de aluno (com deicincias, transtornos globais de desenvolvimento e altas habilidades/superdotao)? 10) Vocs consideram que o papel do professor da salas de recursos est ou no politicamente bem deinido? Justiique sua resposta. 11) Voc sente desejo ou necessidade de aprender mais sobre seu trabalho? Em caso positivo, que demanda voc teria de formao? 12) Voc se sente ou no satisfeita com sua escolha proissional? Justiique sua resposta.

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    Aps responderem as perguntas do Eixo Temtico, sete professo-res, do grupo de onze, expressaram seus sentimentos em relao partici-pao na pesquisa do ONEESP, principalmente em relao ao movimento de relexo ocorrido no grupo focal. Os outros quatro professores mani-festaram seus sentimentos por meio de relatos escritos enviados posterior-mente aos pesquisadores.

    Esse momento de anlise, aps responderem as perguntas, coni-gurou-se como mais um instrumento de coleta de dados, pois trouxe para ns, pesquisadores do ONEESP, a percepo dos professores acerca da im-portncia da formao continuada e da participao na pesquisa.

    DISCUSSO E RESULTADOS

    A interlocuo dos participantes durante o grupo focal possibi-litou aos pesquisadores capturar a percepo dos sentidos construdos por eles sobre a formao continuada, assim como permitiu-nos [...] com-preender com aqueles sujeitos esses sentidos e colaborar para que, pela relexo, pudessem repensar sua realidade e com ela interagir, buscando possibilidades de mudana (BELLOTTI, 2010, p. 51).

    A anlise das falas dos onze professores conigurou um quadro de trs categorias, a saber:

    Categoria 1 - Grupo focal como um instrumento de troca de experincias;

    Categoria 2 - Grupo focal como instrumento de aproximao entre a rede municipal e a estadual;

    Categoria 3 - Grupo focal visto como momento de relexo acerca da formao e da prtica pedaggica.

    Destacamos a seguir a conigurao dessas categorias, contemplan-do as falas e as percepes dos professores acerca da vivncia no grupo focal:

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    CATEGORIA 1 GRUPO FOCAL COMO UM INSTRUMENTO DE TROCA DE EXPERINCIAS

    Nesta categoria os proissionais indicam que a participao no grupo focal possibilitou a troca de experincias entre os participantes7, considerando a experincia um enriquecimento de suas prticas, como po-demos observar nas falas que se seguem:

    Essa troca de experincias enriquece nosso trabalho. (Professora Hana) A gente v que no est s, a gente est no grupo, mas pensa que est sozinha, neste momento a gente v que as angstias so as mesmas e acabamos vendo a sada aqui para algumas situaes (Professora Gilda).

    [...] e eu acho que essa prtica tem que ser constante, pois a gente aprende com a ao do outro e o outro com a nossa ao, vemos que no estamos sozinhos que podemos contar uns com os outros. Isso muito importante (Professora Nilda).

    [...] tivemos o momento para responder ao questionrio, momento este que propiciou saber da opinio das colegas (Professora Janete).

    Os encontros so muito proveitosos onde os trabalhos esto sendo re-alizados em grupo. Tivemos a oportunidade de trocar e relatar infor-maes com os grupos dos municpios, que s vem enriquecer nossa prtica diria (Professora Soraya).

    Podemos inferir, a partir das falas dos professores, que a vivncia do grupo focal possibilitou uma formao, uma relexo por meio das ex-perincias relatadas e compartilhadas. Assim, conforme evidencia Bellotti (2010, p. 39), pudemos observar por meio da vivncia do grupo focal que [...] os encontros se caracterizaram como espaos de formao continu-ada, de relexo da prpria prtica com subsdios para sua reconstruo e ainda como momentos de aprendizagem colaborativa.

    Isso denota a importncia que foi dada para o relato de cada um, todos tiveram a oportunidade de responder as perguntas. O ato da fala um ato de relexo sobre a pergunta e sobre aquilo que vai ser respondido e isto profundo e contagioso no sentido de possibilitar a cada participante

    7 Os nomes dos participantes da pesquisa utilizados neste artigo so ictcios.

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    mostrar-se como pessoa, como proissional, como sujeito ativo dessa rela-o social chamada Educao.

    Pinel (2011) corrobora essa perspectiva de anlise quando nos aponta a importncia da escuta no processo de formao do professor:

    No vivido na formao de professores por essa via, sentimos estar crian-do uma escuta relexiva de cuidado ao vivivido-clnico, que perpassa (ou deveria) a instituio escolar provocando modos-de-ser-sendo--no-mundo alternativos aos sentidos at ento. Na nossa prxis em formao docente, isso capturado (compreendido) tende a diminuir preconceitos e estigmas [...] reconhecendo e atuando nas singularida-des (das pluralidades) de sujeito (PINEL, 2011, p.175-176).

    Entendemos que a experincia vivida no grupo focal favoreceu a relexo dos participantes, pois se permitiram ouvir e serem ouvidos.

    CATEGORIA 2 GRUPO FOCAL COMO INSTRUMENTO DE APROXIMAO ENTRE A REDE MUNICIPAL E A ESTADUAL

    As falas dos professores nessa categoria indicam que o grupo focal tornou-se um meio de aproximao entre os professores da rede municipal e da estadual, experincia que at ento nunca tinham vivenciado.

    A escolha dos participantes do grupo focal deve ter um objetivo e tambm deve ser considerada [...] tarefa importante, pois devem ter pelo menos um trao em comum para o estudo proposto, sendo que este fator pode inluenciar o processo de discusso e o produto dela decorrente (OLIVEIRA et al., 2008, p. 2).

    O processo de discusso e relexo, dentro do grupo focal, foi rico e podemos observar como isso se evidencia nas falas de duas professoras:

    E o que vocs trouxeram nesse encontro, j falei e vou repetir, esse en-contro: municpio e estado, pois aqui tem uma briguinha... eu nunca tive encontro com elas do municpio, eu morreria sem saber que elas trabalhavam na educao especial e elas tambm no sabiam que eu trabalhava com deicincia visual, nem imaginavam que eu trabalho no municpio h muitos anos, ento essa formao que vocs trouxeram est servindo para muita coisa, muita coisa mesmo (Professora Karen).

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    Esse contato com os proissionais de outras salas de recursos, particu-larmente eu tive em Nova Vencia, e estou tendo aqui, pois quando tem reunio somente nos municpios, no temos contato com o esta-do, com a APAE (Professora Liliane).

    Nessa categoria, as falas das duas professoras apontam a necessi-dade do encontro, da troca entre as redes e sistemas de ensino. No grupo focal, organizamos a participao conjunta dos proissionais das redes mu-nicipal e estadual, pois entendemos, como indicam Iervolino e Pelicione (2001, p. 116), que a coleta de dados atravs do grupo focal tem como uma de suas maiores riquezas basear-se na tendncia humana de formar opinies e atitudes na interao com outros indivduos.

    A aproximao entre os proissionais das duas redes de ensi-no, dentro da vivncia do grupo focal, favoreceu a cada professor conhe-cer e reconhecer no eu e no outro uma pessoa com dvidas, frustraes, imperfeies, caminhos, novos caminhos, permitindo ver no outro um companheiro.

    CATEGORIA 3 GRUPO FOCAL VISTO COMO MOMENTO DE REFLEXO ACERCA DA FORMAO E DA PRTICA PEDAGGICA

    Percebemos nessa categoria que houve, por parte de cada profes-sor, uma relexo mais profunda acerca da sua formao, pois, por meio do grupo focal, os participantes [...] se do conta das crenas e atitudes que esto presentes em seus comportamentos e nos dos outros, do que pensam e aprenderam [...] atravs da troca de experincias e opinies entre os par-ticipantes (DE ANTONI et al., 2001, p. 41).

    Essa relexo mais profunda acerca da formao indicada por meio das falas das professoras, participantes do grupo focal, em destaque a seguir:

    Esses encontros esto sendo de grande importncia [...] Por meio da tc-nica dos grupos focais com as entrevistas em pequenos grupos foram discutidas informaes sobre a formao do professor que proporcionou ao professor examinar suas prprias prticas [...] (Professora Esther).

    No estado todo ano eu fao uma capacitao, e o ano que eu falo que no vou, a coordenadora da Educao Especial me d brigueiro, eu vou pra Nova Vencia, Vitria, Vila Velha para fazer capacitao. Pelo

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    municpio eu nunca podia ir, pois era DT. Eu acho que essa capacita-o de vocs, esse encontro, vai acabar com isso (Professora Werusca).

    Eu tenho uma angstia muito grande, pois vm os cursos e s vezes vai at o secretrio de educao fazer o curso, mas no convidam ns que somos das salas de recursos (Professora Clotilde).

    A minha participao nestes encontros est sendo de grande valia, para somar os meus conhecimentos e repensar meus conceitos como educa-dora (Professora Irany).

    Assim, podemos mais uma vez salientar a importncia que foi dada ao ouvir, pois as perguntas eram as mesmas e automaticamente eu ouo o que o outro fala, para reairmar ou no a minha fala, para reletir sobre aquilo que eu fao e aquilo que eu ainda no fao, e aquilo que no posso fazer.

    A vivncia do grupo focal facilita organizar a formao continu-ada numa dimenso coletiva, assumindo a dinmica da troca de experin-cias com o propsito de desenvolver uma formao mtua e a valorao do saber dos professores.

    Nesse sentido, enfatizamos que preciso um trabalho de relexo crtica por parte dos professores sobre suas prticas, o que permitir [...] a (re)construo permanente de uma identidade pessoal. Por isso to importante investir a pessoa e dar um estatuto ao saber da experincia (NVOA, 1992, p. 25).

    Compreendemos, como Jesus (2006), que a participao do pro-fessor em processos de pesquisa e formao relexiva, como no caso dos gru-pos focais organizados pelo ONEESP, instiga a busca pelo conhecimento:

    Assim sendo, o envolvimento dos proissionais da educao com processos de pesquisa se coloca como uma forma constituidora de uma atitude de in-vestigao, portanto instituinte de uma outra forma de estar na proisso, uma forma de emancipao pelo conhecimento (JESUS, 2006, p. 90).

    A prtica da escuta dentro do grupo focal conigurou-se como um processo de formao, pois os participantes, ao escutarem os seus pares relatando a busca de solues em torno da mesma luta, de um mesmo co-

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    tidiano, passaram a reletir sobre suas prprias prticas, instigando, assim, a busca pelo conhecimento.

    Nvoa (1995) indica-nos que preciso adotar um modelo de formao que considera a parceria entre as universidades e as escolas para que os professores se formem no imitadores de outros professores, no s tcnicos, mas criadores, inovadores comprometidos com a Educao. Nesse sentido, o grupo focal organizado pelo ONEESP possibilitou esse tipo de formao.

    CONCLUSES

    A vivncia da relexo desencadeia um movimento de avalia-o em relao pratica pedaggica, instigando a descoberta, atravs de si e dos outros, da construo e desconstruo desse proissional muito novo no cotidiano escolar que o professor de Atendimento Educacional Especializado.

    O professor necessita reletir sobre sua prtica e a partir dessa relexo buscar caminhos tericos para transform-la. Entendemos que a participao do professor nas vivncias de grupos focais possibilita, indu-bitavelmente, essa busca para transformar as prticas.

    Indicamos, partindo de nossa experincia como moderadoras do grupo focal aqui analisado e como pesquisadoras do ONEESP, que os pro-cessos de formao devem privilegiar a relexo do professor e garantir o debate acerca da atual realidade da escola brasileira.

    Entendemos que nesse tipo de formao as discusses se pautam nas questes vivenciadas no cotidiano do grupo, discutindo as dimenses locais que so inluenciadas pelas questes do sistema como um todo, numa interao dialtica, instigando transformaes das prticas e promo-vendo aes coletivas no processo de incluso escolar.

  • Denise M. de Jesus; Sonia L. Victor; Agda F. S. Gonalves (Org.)

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    REFERNCIAS

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    caPtulo III

    olhar avaliativo na/Para Formao reFlexivo-crtica de ProFessores: as

    imPlicaes do observatrio estadual de educao esPecial

    Camila Helena Rodrigues1

    Denise Meyrelles de Jesus2

    INTRODUO

    Temos assistido a um crescimento desenfreado e vertiginoso da era tecnolgica na sociedade atual. E esse desenvolvimento tem desenca-deado uma produo assombrosa de produtos industrializados e de infor-maes. Grande parcela da populao tem acesso a essas informaes na mesma velocidade e proporo em que elas so produzidas, o que muitas vezes faz com que uma informao se sobreponha a outra, e, consequen-temente, no h aprofundamento, estudos e questionamentos desse boom informativo.

    Segundo Alarco (2001a), neste contexto de profundas mudan-as sociais a educao caracteriza-se como o centro da possibilidade de desenvolvimento do ser humano.

    A autora adverte que ns educadores temos uma responsabilidade acrescida na compreenso do tempo presente e na/para a preparao para

    1 Pedagoga pela Universidade Federal do Esprito Santo. E-mail: [email protected] Profa. Dra. da Universidade Federal do Esprito Santo. Centro de Educao / Programa de Ps-graduao em Educao. E-mail: [email protected]

  • Denise M. de Jesus; Sonia L. Victor; Agda F. S. Gonalves (Org.)

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    o futuro, pois compete a ns, professores, a educao das crianas e dos jovens. Esses passam grande parte de suas vidas nas instituies escolares, estas, por sua vez, constituem-se em espaos, em tempos e em contextos de aprendizagem e de desenvolvimento.

    Corroborando essas ideias, pensamos que a escola no tem conse-guido acompanhar as mudanas ocorridas na sociedade. Em meio conjun-tura de transformao da sociedade, a escola no convence nem atrai. coisa do passado, sem rasgos do futuro (ALARCO, 2001a, p. 18, grifos nossos).

    As escolas ainda esto estruturadas de uma maneira hierrqui-ca, marcada pela disciplinaridade, e, muitas vezes, com metodologias e prticas tradicionais, que no so suicientes para a formao do cidado relexivo, poltico, consciente de seus deveres e fazeres.

    Defendemos que urge mudar a escola! E, para isso, preciso repens-la, pensando-a em contexto (ALARCO, 2001a, p. 19); enfatiza a autora, no entanto, que no podemos icar somente no pensar, necess-rio que passemos para o plano da ao.

    Dessa maneira, entendemos que a escola deve se constituir, se pensar a partir de si prpria. Desejamos uma escola relexiva, constituda por uma organizao que se pensa a si prpria continuamente, que capaz de envolver todos aqueles que dela participam em suas decises e aes.

    A escola tem de ser uma outra escola. A escola, como organizao, tem de ser um sistema aberto, pensante e lexvel. Sistema aberto sobre si mesmo, e aberto comunidade em que se insere (ALARCO, 2003, p. 15).

    Nessa conjuntura,

    Os professores tm que repensar o seu papel. Se certo que conti-nuam a ser fontes de informao, tm de se consciencializar que so apenas uma fonte de informao, entre muitas outras. Deve, no entanto, salientar-se que seu valor informativo tem nveis diferentes conforme o acesso que os seus alunos puderem ter a outras fontes de informa-o. fundamental que os professores percebam esta diversidade (ALARCO, 2003, p. 31, grifo nosso).

  • Formao, Prticas Pedaggicas e Incluso Escolar no Observatrio Estadual de Educao Especial

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    Da emerge a necessidade da formao de professores relexi-vos, da formao na ao para a aco, a investigao sobre as prticas (ALARCO, 2001a, p. 29). Alarco (2003) nos diz que o professor tem, tambm ele, de se considerar num constante processo de auto-formao e identiicao proissional. [...] tem que ser um professor relexivo numa co-munidade proissional relexiva (ALARCO, 2003, p. 32, grifo nosso).

    A autora nos ajuda a reletir sobre a necessidade de repensarmos a proisso professor, advertindo-nos que os professores precisam urgen-temente de se recontextualizarem na sua identidade e responsabilidades proissionais (ALARCO, 2003, p. 32).

    Pimenta (1996), em seu estudo sobre a Didtica na Licenciatura, analisando as prticas docentes como caminho para se repensar a formao de professores, tanto a inicial quanto a continuada, trabalha com os sabe-res da docncia e a identidade do professor. Assim, a autora discute que a identidade proissional no imutvel e nem est no exterior pronta a ser adquirida. Mas

    [...] um processo de construo do sujeito historicamente situado. A proisso de professor, como as demais, emerge em dado contexto e mo-mento histricos, como resposta s necessidades que esto postas pelas sociedades, adquirindo estatuto de legalidade (PIMENTA, 1996, p. 75).

    Para ela, a identidade proissional se constri

    [...] a partir da signiicao da proisso; da reviso constante dos signi-icados sociais da proisso; da reviso das tradies. Mas tambm da re-airmao de prticas consagradas culturamente e que permanecem sig-niicativas. Prticas que resistem a inovaes porque prenhes de saberes vlidos s necessidades da realidade. [...] Constri-se, tambm, pelo signiicado que cada professor, enquanto ator e autor, confere atividade docente no seu cotidiano a partir de seus valores, de seu modo de situar--se no mundo, de sua histria de vida, de suas representaes, de seus saberes, de suas angustias e anseios, do sentido que tem em sua vida o ser professor. Assim como a partir de sua rede de relaes com outros pro-fessores, nas escolas, nos sindicatos e em outros agrupamentos (PIMENTA, 1996, p. 76, grifos nossos).

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    Dialogando com a autora, acreditamos que a identidade docente constitui-se pelo entrelaamento da signiicao que os professores do proisso, correlacionadas s aes docentes, bem como nas redes de rela-es entre os proissionais das instituies escolares, visando a uma maior sistematizao da proissionalizao docente.

    Roldo (2007), ao discutir a natureza da construo do conheci-mento proissional docente, destaca um caminho para a proissionalizao do professorado, dividindo-o em dois processos sociais distintos, mas que se complementam. O primeiro extrnseco e tem uma natureza poltico--organizativa, caracteriza-se pela institucionalizao da escola como orga-nizao pblica, e do currculo que a legitima no plano social (ROLDO, 2007, p. 96). Isso decorre a partir da necessidade de alfabetizar a populao e viabilizar um maior grau de politizao dessa populao. De acordo com Pimenta, a airmao social da escola que vai funcionar como uma ala-vanca principal [...] do processo gradual de airmao dos docentes como grupo proissional socialmente identiicvel (PIMENTA, 1996, p. 96).

    O segundo processo social possui uma natureza intrnseca, estando associado necessidade de legitimao dos docentes como um grupo social detentor de um saber distintivo. Esse processo se concretiza a partir da

    [...] airmao de um conhecimento proissional especico, corporiza-do, e, por sua vez, estimulado pelo reconhecimento da necessidade de uma formao prpria para o desempenho da funo, reconhecimento que constitui um dos grandes passos [...] para o reconhecimento social dos docentes enquanto grupo proissional (PIMENTA, 1996, p. 96).

    Nvoa (1995), ao problematizar esse processo da proissionaliza-o docente, ressalta que ele no linear nem unidirecional. Constitui-se, no entanto, como um percurso repleto de lutas e de conlitos, de hesi-taes e de recuos [...]. A compreenso do processo de proissionalizao exige, portanto, um olhar atento s tenses que o atravessam (p. 21).

    O autor, ao discutir os dilemas da proisso docente, retrata a falta de reconhecimento dessa proisso.

    Os professores nunca viram o seu conhecimento especico devidamen-te reconhecido. Mesmo quando se insiste na importncia da sua misso a tendncia sempre para considerar que lhes basta dominarem bem a

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    matria que ensinam e possurem um certo jeito para comunicar e para lidar com os alunos. O resto dispensvel (NVOA, 2002, p. 22).

    De acordo com o Nvoa (2002, p. 22), essa falta de reconheci-mento acaba por produzir o desprestgio da proisso, cujo saber no tem qualquer valor de troca no mercado acadmico e universitrio.

    Percebemos que se agrega a esse desprestgio uma invisibilidade da proisso, provocada pelo silenciamento dos professores. Como nos diz Nvoa (2007):

    Fala-se muito das escolas e dos professores. Falam os jornalistas, os colu-nistas, os universitrios, os especialistas. No falam os professores. H uma ausncia dos professores, uma espcie de silncio de uma proisso que perdeu visibilidade no espao pblico (NVOA, 2007, p. 9, grifos nossos).

    Nvoa (2007), ao fazer uma anlise de documentos (artigos, te-ses, livros, dentre outros) sobre a formao de professores, constata que h recorrncia da utilizao dos mesmos conceitos e linguagens, das mesmas maneiras de falar e de pensar os problemas da proisso docente, o que ele denomina como consenso discursivo, o qual

    [...] bastante redundante e palavroso, que se multiplica em refern-cias ao desenvolvimento proissional dos professores, articulao da formao inicial, induo e formao em servio numa perspectiva de aprendizagem ao longo da vida, ateno aos primeiros anos de exer-ccio proissional, insero dos jovens professores nas escolas, ideia de uma formao de professores baseada na investigao, s novas com-petncias dos professores do sculo XXI, importncia das culturas colaborativas [...] (NVOA, 2007, p. 3).

    Mesmo havendo um consenso discursivo no que diz respeito proissionalidade docente, Nvoa (2007) adverte-nos que o discurso em demasia esconde uma grande pobreza das prticas:

    [...] temos um discurso coerente, em muitos aspectos consensual, es-tamos de acordo quanto ao que preciso fazer, mas raramente temos conseguido fazer aquilo que dizemos que preciso fazer (p. 4).

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    O autor tece crticas ao processo que invisibilisa aqueles que, se-gundo ele, devem ser os produtores/construtores da proissionalidade do-cente os prprios professores. Partindo dessa perspectiva, os professores tm que se assumir como produtores da sua proisso (NVOA, 1992, p. 17). Assim, o autor acredita que preciso que haja o regresso dos profes-sores ao centro das preocupaes polticas, uma vez que:

    Os professores, neste incio do sculo XXI, como elementos insubsti-tuveis no s na promoo da aprendizagem, mas, tambm, no desen-volvimento de processos de integrao que respondam aos desaios da diversidade e de mtodos apropriados de utilizao de novas tecnolo-gias (NVOA, 2007, p. 2).

    O autor enfatiza a necessidade de emergir um processo de cons-truo da proissionalidade docente dentro da proisso, ou seja, impres-cindvel que os professores se constituam, que se vejam como partcipes ativos da construo de sua identidade proissional.

    Para concretizao desse processo preciso evitar a pobreza de prticas, instaurando, para isso, polticas que reforcem os professores, os seus saberes e os seus campos de atuao, polticas essas que no transfor-mem os professores numa proisso dominada pelos universitrios, pelos peritos ou pela indstria do ensino (NVOA, 2007, p. 5).

    Assim, assinala trs medidas que visam superao dos dilemas que cercam o processo de construo e airmao da proissionalidade do-cente. Apresentaremos, de forma sinttica, essas trs medidas discutidas pelo autor.

    Na primeira, prescreve-se que preciso passar a formao de pro-fessores para dentro da proisso. Por meio desta medida, Nvoa sublinha a necessidade de os professores terem um lugar predominante na formao dos seus pares (2007, p. 6). Continuando a discusso, airma que a mu-dana necessria nesse cenrio s poder acontecer se a comunidade dos formadores de professores e a comunidade de professores no se torna-rem mais permeveis e imbricadas. Ou seja, h de se instaurar um dilogo mais prximo entre as Universidades (denominadas como comunidades dos formadores de professores) com os prprios professores (comunidade de professores); dilogo no qual os professores no sejam meros consumi-

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    dores das teorias produzidas pelas Universidades, mas que sejam copar-ticipantes das pesquisas sobre o seu saber-fazer e tambm dos processos formativos.

    O autor refora que se faz urgente

    [...] devolver a formao de professores aos professores, porque o refor-o de processos de formao baseados na investigao s faz sentido se eles forem construdos dentro da proisso.

    Enquanto forem apenas injunes do exterior, sero bem pobres as mudanas que tero lugar no interior do campo proissional docente (NVOA, 2009, p. 6).

    Resumindo esta primeira medida, destacamos que preciso que haja uma maior presena dos professores nas formaes de professores, no apenas como formandos, mas, tambm, como formadores de seus pares.

    A segunda medida indica que preciso promover novos modelos de organizao da proisso. Ao apresentar essa medida, o autor faz uma discusso interessante, pois, ao discutir a construo de novos modelos de organizao da proisso, Nvoa (2007) perpassa pelo consenso discursivo dizendo que muitos desses discursos no se realizaro se a proisso conti-nuar marcada por fortes tradies individualistas ou por rgidas regulaes externas, designadamente burocrticas (p. 7).

    Para essa nova organizao da proisso, proposta pelo autor, impli-ca-se reforar um sentimento de pertena e de identidade proissional, que essencial para que os professores se apropriem dos processos de mudana e os transformem em prticas concretas de interveno (NVOA, 2007, p. 8).

    Destaca-se, nesse ponto, um conceito que Nvoa denomina como colegibilidade partilhada, que se constitui como redes coletivas de trabalho. A colegibilidade partilhada prev a anlise partilhada de prti-cas, tendo como pressuposto a ideia da docncia como coletivo, visando transformar a experincia coletiva em conhecimento proissional e ligar a formao de professores ao desenvolvimento de projetos educativos nas escolas (2009, p. 7). Prev, tambm, a criao de redes de (auto)formao participada, as quais permitem

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    [...] compreender a globalidade do sujeito, assumindo a formao como um processo interactivo e dinmico. A troca de experincias e a partilha de saberes consolidam espaos de formao mtua, nos quais cada professor chamado a desempenhar, simultaneamente, o papel de formador e de formando (NVOA, 1992, p. 14).

    Todavia, enfatizamos que, para que esses processos se consoli-dem, crucial que haja alteraes nas condies existentes nas escolas e nas polticas pblicas voltadas aos professores. Pois, sem essas alteraes, segundo Nvoa (2007, p. 6):

    intil apelar relexo se no houver uma organizao das escolas que facilite. intil reivindicar uma formao mtua, inter-pares, co-laborativa, se a deinio das carreiras docentes no for coerente com esse propsito.

    Corroborando essa ideia e buscando um possvel dilogo com Alarco (2001a; 2001b; 2003), trazemos a deinio de escola relexiva, proposta pela autora; uma vez que acreditamos que por meio de uma escola relexiva que ser () possvel se pensar e concretizar novos/outros modelos de organizao da proisso docente. Assim, a autora conceitua a escola relexiva como uma:

    [...] organizao que continuamente se pensa a si prpria, na sua mis-so social e na sua organizao, e se confronta com o desenrolar da sua atividade em um processo heurstico simultaneamente avaliativo e formativo (ALARCO apud ALARCO, 2001a, p. 25).

    E continua dizendo:

    uma escola que se assume como instituio educativa que sabe o que quer e para onde vai. Na observao cuidadosa da realidade social, des-cobre os melhores caminhos para desempenhar a misso que lhe cabe na sociedade. Aberta comunidade exterior, dialoga com ela. Atenta comunidade interior, envolve todos na construo do clima de escola, na deinio e na realizao de seu projeto, na avaliao da sua qualidade educativa. Consciente da diversidade pessoal, integra espaos de liber-dade na malha necessria de controles organizativos. Enfrenta as situ-aes de modo dialogante e conceitualizador, procurando compreender antes de agir (ALARCO, 2001, p. 26, grifos nossos).

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    Acreditamos que preciso que as instituies escolares mergulhem no conceito de escola relexiva trazido pela autora, pois, como podemos ver, a escola, ao assumir-se relexiva, constitui-se em um espao propcio para o trabalho coletivo e partilhado, uma vez que as deinies, as organizaes, as prticas e as avaliaes da escola sero realizadas por todos os envolvidos nesse processo, de alunos at a comunidade em torno da escola.

    No entanto, Alarco (2003) nos adverte que a escola relexiva no pode ser comanda do/pelo exterior, devendo, contudo, se autogerir. A escola relexiva:

    Tem o seu projeto prprio, construdo com a colaborao de seus mem-bros. Sabe para onde quer ir e avalia-se permanentemente na sua cami-nhada. Contextualiza-se na comunidade que serve e com esta interage. Acredita nos seus professores, cuja capacidade de pensamento e de aco sempre fomenta. Envolve os alunos na construo de uma escola cada vez melhor (ALARCO, 2003, p. 38, grifos nossos).

    Assim, a autora airma que se quisermos mudar a escola

    devemos assumi-la como organismo vivo, dinmico, capaz de atuar em situao, de interagir e desenvolver-se ecologicamente e de aprender a cons-truir conhecimento sobre si prpria (ALARCO, 2001a, p. 27, grifo nosso).

    Dialogando com a autora, acreditamos que a escola relexiva instituda pelo pensamento e pela prtica relexivos, os quais se entrelaam nos dilogos produzidos entre e pelos seus membros (ALARCO, 2001a). Assinalamos que escola relexiva vai ao encontro da concepo apresentada por Nvoa (2007), sobre a necessidade da construo de novos modelos de organizao proissional, pois por meio desta que delegada aos pro-fessores a corresponsabilizao pela produo de conhecimento sobre as instituies escolares, ou seja, os professores, numa perspectiva que assuma a escola como escola relexiva, devem ser produtores de conhecimento, pesquisadores da sua prtica cotidiana, do seu saber-fazer docente.

    A terceira e ltima medida apontada por Nvoa (2007) consiste em reforar a presena pessoal e pblica dos professores. Enfatiza-se que pre-ciso que os professores participem ativamente, inserindo-se como perten-centes aos movimentos/processos de mudanas, uma vez que o sucesso de

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    qualquer reforma depende do envolvimento activo dos professores no seu desenvolvimento e concretizao (NVOA, 2007, p. 8).

    A concretizao de mudanas impe, de acordo com o autor, uma abertura dos professores ao exterior, exigindo uma grande capacida-de de comunicao dos professores e um reforo da sua presena pblica (NVOA, 1992, p .8). Ele ainda salienta que provvel que a proisso de professor, ao estabelecer esse vnculo comunicativo com a sociedade, assu-mindo sua presena pblica, torne-se mais vulnervel. Entretanto, ressalta que a sobrevivncia da proisso depende da qualidade do trabalho inter-no nas escolas, mas tambm, da sua capacidade de interveno no espao pblico da educao (NVOA, 2009, p. 9). O autor refora ser a maior visibilidade pblica da proisso a condio necessria para a airmao do seu prestgio e do seu estatuto social.

    Retomando o foco do nosso estudo a formao continuada de professores especializados , constatamos que a situao da proissionali-dade docente, no que tange aos professores ditos professores da Educao Especial, parece-nos ser ainda mais complexa, devido s peculiaridades da ao desses proissionais.

    Esses professores, destinados a dar suporte ao processo de escola-rizao dos alunos pblico-alvo da Educao Especial, so vistos como es-pecialistas, encontrando-se em separado nas instituies escolares. Por meio das narrativas dos professores-cursistas, participantes desta pesquisa, houve recorrncia nas falas da realizao de trabalhos isolados e solitrios, uma vez que o trabalho colaborativo3, em parceria entre este proissional e o professor da sala de aula comum, no se efetiva, muitas vezes, devido falta de (re)conhecimento desse proissional como parte integrante da escola.

    No esse tipo de organizao escolar que admitimos. Apostamos, no entanto, em uma escola relexiva, que desde a sua organizao at a execuo da ao prope um trabalho articulado entre todos os envolvi-dos no processo, que assume os alunos pblico-alvo da Educao Especial como alunos da escola, no como alunos dos professores especializados. Assumimos compromisso com uma escola que incentiva e mobiliza seus membros participao, co-construo, ao dilogo, relexo, inicia-

    3 Ver Poltica Nacional de Educao Especial na Perspectiva da Educao Inclusiva (BRASIL, 2008).

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    tiva, experimentao (ALARCO, 2001a, p. 26), escola essa que se v comprometida com o processo de ensino-aprendizagem e com a garantia de acesso ao currculo, no s para os alunos com deicincia, transtorno global do desenvolvimento, altas habilidades/superdotao, mas tambm para todos os alunos que nela se inserem.

    Nesta pesquisa, percebemos que houve utilizao da relexo como estratgia de formao de professores relexivo-crticos, por meio da provocao de questionamentos a partir da bibliograia do curso de for-mao bem como pela proposta de que os professores participantes da pesquisa fossem pesquisadores de sua prtica cotidiana.

    OBSERVATRIO NACIONAL DE EDUCAO ESPECIAL: DESDOBRAMENTOS NO ES-TADO DO ESPRITO SANTO

    Para entendermos em que contexto nosso estudo foi realizado, precisamos compreender o que foi a pesquisa do Observatrio Nacional de Educao Especial (ONEESP) e seus desdobramentos no estado do Esprito Santo.

    O Observatrio Nacional caracterizou-se como uma pesquisa que teve como principal objetivo fazer uma avaliao de mbito nacional do programa de implantao de Salas de Recursos Multifuncionais4 (SRM) da Secretaria de Educao Especial/MEC (MENDES, 2010, p. 28, grifos nossos).

    Por meio do Observatrio buscou-se identiicar em que medida esse tipo de servio tem servido para apoiar a escolarizao de crianas e jo-vens com necessidades educacionais especiais? Que limites e possibilidades as SRM oferecem? (MENDES, 2010, p. 28).

    Para a realizao/implementao do ONEESP foram seleciona-dos 16 estados brasileiros, 25 pesquisadores (representantes de 22 universi-dades e 18 programas de ps-graduao). A coordenadora nacional do pro-jeto, professora doutora Enicia Gonalves Mendes, props, inicialmente, a conduo de um estudo em rede, que envolveria estudos locais com pro-

    4 Esse programa foi implementado no ano de 2005 pela Secretaria de Educao Especial/Ministrio da Educao (SEESP/MEC).

  • Denise M. de Jesus; Sonia L. Victor; Agda F. S. Gonalves (Org.)

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    fessores de salas de recursos (cada estado, conduzindo a pesquisa de acordo com as suas especiicidades) combinados com um estudo nacional do tipo survey que pretendeu coletar dados com uma amostra de 2.500 professo-res das SRM, atravs de questionrio disponibilizado em stio de internet (MENDES, 2010, p. 28).

    A equipe coordenadora, no estado do Esprito Santo, foi compos-ta pelas pesquisadoras: Profa. Dra. Agda Felipe S. Gonalves, Profa. Dra. Denise Meyrelles de Jesus e Profa. Dra. Sonia Lopes Victor, todas vincula-das Universidade Federal do Esprito Santo.

    Houve uma diviso em dois grupos para a realizao do estudo, um teve como foco de pesquisa a regio metropolitana da Grande Vitria